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    Mecanismos coesivos: um estudo sobre o que os professores do ensinomdio apontam como problemas de coeso em textos escritos

    Alexandro Teixeira Gomes (UFPI)

    RESUMO: Este trabalho investiga o que os professores do ensino mdio apontam como problemas de coeso emtextos escritos. Os dados analisados foram obtidos por meio da aplicao de um questionrio a 15 professores doensino mdio e da correo, pelos mesmos professores, de dois textos dissertativos por ns adaptados. Comofundamento terico, usamos, principalmente, Halliday e Hasan (1976), Beaugrande e Dressler (1997), Koch(2002, 2004), Fvero (2002). Os resultados mostram que os docentes parecem no estar seguros quando se tratade mecanismos coesivos, prendendo-se, muitas vezes, a aspectos de pontuao e/ou acentuao ou marcandoelementos empregados corretamente como erro de coeso.

    Palavras-chave: Mecanismos coesivos; Texto escrito; Professor.

    Consideraes iniciais

    Com a evoluo dos estudos do texto, muitos assuntos relacionados ao tema ganhamnovas abordagens e passam a ser, via de regra, discutidos sob um novo prisma. Um exemplode nossa assertiva a conceituao de coeso textual e de seus mecanismos que deixa de ladouma taxionomia baseada em uma sintaxe imanente, isto , restrita aos nveis puramentefrsicos para receber a devida importncia em uma perspectiva mais ampla: a textual.

    Porm, apesar de j se haver hoje inmeros trabalhos voltados para o tema da coesotextual e de seus mecanismos (cf. HALLIDAY; HASAN, 1976; BEAUGRANDE;DRESSLER, 1997; MATEUS et al., 1993; KOCH, 2002, 2004; FVERO, 2002; FVERO;KOCH, 1983; VAN DIJK, 1984), parece ainda no haver consenso sobre o conceito decoeso e, conseqentemente, de seus mecanismos, primeiro, conforme j assinalamos, por setratar de um assunto que, s ento, com a evoluo dos estudos de texto, ganha a devida

    importncia e passa a ser amplamente considerado, e, segundo, devido ao fato de, em muitoscontextos, confundir-se com outro conceito que em muito dificulta um entendimento coerentedo fenmeno: o conceito de coerncia, o qual no ser discutido aqui. Por esse motivo,dedicamo-nos a nosso estudo A correo de textos por professores do ensino mdio: umainvestigao de problemas de coeso em textos escritos, que tem por objetivo mostrar comoos professores do ensino mdio avaliam os mecanismos de coeso na correo de produestextuais escritas de seus alunos. Neste artigo, limitar-nos-emos a mostrar o que os professoresdo ensino mdio apontam como problemas de coeso em textos escritos.

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    1. Aspectos metodolgicos da pesquisa

    Os dados que formam nosso corpusforam obtidos atravs da correo, por 15 professoresdo ensino mdio de escolas dos estados do Cear e do Rio Grande do Norte nos meses demaro, abril e maio de 2006, de dois textos argumentativos, adaptados para os propsitosdesta pesquisa, ou seja, em cada produo foram substitudos cinco conectores, empregadosadequadamente, por outros que gerassem problemas na construo do sentido do texto. Essas

    produes, ambas de carter dissertativo, foram retiradas do jornal O Povo, que circulou noestado do Cear, no dia 07 de maro de 2006. O primeiro texto corresponde ao gnero Cartado leitor, enquanto o segundo corresponde ao gnero Artigo de opinio. A escolha de textoscom predominncia da seqncia argumentativa justifica-se pelo fato de os mecanismosanalisados aparecerem com certa freqncia nos textos argumentativos (cf. Bezerra, 2006;Galdeano, 2000).

    So diversos os tipos de mecanismos coesivos considerados na literatura sobre o assunto.Assim, podemos considerar como mecanismo coesivo formas lexicais, formas pronominais,elipse, procedimentos de recorrncia, conectores etc. Em nosso trabalho, consideramos apenasos conectores, entendendo como conectores o que, tradicionalmente, tem-se denominadoconjunes, preposies e advrbios (cf. Bronckart, 1999; Koch, 2002; Antunes, 2005).Justificamos tal escolha pelo nosso entendimento de que os conectores mantm a unidade dotexto, ampliam a fora argumentativa, evitam contradies internas que poderiam prejudicar acoerncia do texto e fortalecem a articulao entre unidades maiores do texto.

    Na metodologia de tabulao e anlise dos dados, elaboramos, inicialmente, quadrosdemonstrativos que colocassem em realce os aspectos quantitativos e qualitativos dasrespostas dos professores, bem como fragmentos que explicitassem suas propostas decorreo dos mecanismos de coeso. Para manter a identidade dos docentes, atribumos a cada

    professor um cdigo composto de dois dgitos, onde o primeiro digito a letra Pque indicaprofessor e o segundo digito, um nmero, contado a partir do numeral 1 e mantendo aseqncia de acordo com a ordem de aplicao do instrumento de anlise.

    Salientamos que, alm de solicitar aos professores a correo das produes textuais,pedimos, ainda, que os mesmos respondessem algumas questes de entendimento tericosobre o assunto, com o objetivo de contrastar teoria e prtica dos docentes.

    2. Percurso terico

    Para se chegar concepo de coeso e de seus mecanismos tal qual conhecemos naliteratura atual, muitas propostas foram apresentadas por diferentes autores e com diferentesenfoques, durante a evoluo da lingstica textual, ramo da lingstica que tem dado maiorimportncia ao estudo de tal fenmeno. Como exemplo desses autores, citamos Halliday eHasan (1976), Halliday (1985), Beaugrande e Dressler (1997), Mateus et al. (1993), Koch(2002, 2004), Fvero (2002), Fvero e Koch (1983, 1985), Van Dijk (1984).

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    A seguir, apresentaremos as propostas classificatrias de alguns autores que intentaramabarcar a totalidade e complexidade da referida categoria. Nosso objetivo no nem discutirnem avaliar tais propostas, mas apenas apresent-las como fundamento terico.

    2.1 A coeso e seus mecanismos na perspectiva de Halliday & Hasan

    Halliday e Hasan (1976), na obra que se tornou ponto de partida sobre o assunto,apresentam um conceito de coeso baseado num critrio semntico, ao afirmarem que acoeso ocorre quando a interpretao de algum elemento no discurso dependente dainterpretao de outro. Para eles, atravs da coeso, estabelecem-se relaes de sentidoquedefinem o texto como um texto, ou seja, atravs das relaes coesivas possvel diferenciarum texto de um no-texto. Segundo Halliday e Hasan, a coeso uma condio necessria,ainda que no suficiente para a criao do texto. atravs dela que se cria a textura (outessitura) de um texto e, conforme j assinalamos, possvel distinguir um texto de um no-texto. Os autores apontam quatro fatores responsveis pela coeso textual como podemosobservar na passagem abaixo:

    There are four ways by which cohesion is created in English: by

    reference, ellipsis, conjunction, and lexical organization. We can

    illustrate all of these from the following text.Little Boy Blue, come blow your horn!The sheeps in the meadow, the cows in the corn.

    Where is the boy that looks after the sheep?Hes under the haycock, fast asleep.

    Will you go wake him? No, not I!For if I do, hell be sure to cry.

    The use of he him heto refer back to the boy that looks after thesheep is an instance of reference. The forms no not I and if I doexemplify ellipsis; they have to be interpreted as no I (will) not (wakehim) and if I (wake him). The word for expresses a conjunctive

    relationship between I will not and if I do he will cry. The wordsheep in line three reiterates sheep in line two; cow relates to sheep,cornto meadow, and wakeand asleep; these are all examples of lexicalcohesion.1

    1 H quatro maneiras pela qual a coeso estabelecida em ingls: pela referncia, elipse, conjuno eorganizao lexical. Podemos ilustrar todas elas no seguinte texto:Menininho triste venha soprar seu berranteAs ovelhas esto no prado, a vaca est no milhoAonde est o garoto que cuida das ovelhas?Ele est embaixo do palheiro, adormecido.

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    1.2 A coeso e seus mecanismos na perspectiva de Beaugrande & Dressler

    Para Beaugrande e Dressler (1997, p. 36), a coeso consiste na conexo atravs derelaes gramaticais dos componentes da superfcie do texto, ou seja, todos os

    procedimentos que servem para marcar relaes entre os elementos superficiais de um textose incluem no conceito de coeso.

    A classificao dos autores leva em considerao basicamente a forma, em que a coeso vista como a manifestao de um plano mais profundo, que a coerncia.

    Beaugrande e Dressler apontam quatro grupos de mecanismos coesivos. So eles:

    1. Mecanismos que tm o objetivo de marcar de maneira explcita a existncia de relaes

    internas entre elementos ou contedos. Esse grupo se subdivide em: a) Repetio; b)

    Repetio parcial; c) Paralelismo; d) Parfrase;

    2. Mecanismos coesivos que ajudam a economizar e simplificar a estrutura textual. Esse

    grupo se subdivide em: a) Formas pronominais; b) Elipse;

    3. Mecanismos coesivos que ocorrem no interior dos acontecimentos e das situaes que

    constituem o mundo textual. Esse grupo se subdivide em: a) Tempo e aspecto verbal; b)

    Conexo;

    4. Mecanismo coesivo para textos falados: Entonao.

    1.3 A coeso e seus mecanismos na perspectiva de Fvero

    Fvero (2002), aps criticar a classificao de Halliday e Hasan (1976) e a classificaode Beaugrande e Dressler (1997), prope uma reclassificao dos mecanismos de coesotextual em termos de funoque esses mecanismos exercem na construo do texto. Dessaforma a autora cita trs tipos de coeso com seus respectivos mecanismos. So eles:

    1. Coeso referencial: Esse grupo engloba: a) Substituio; b) Reiterao;

    Voc ir acord-lo? No, eu no!Por que se eu for, ele certamente vai chorar.

    O uso de ele... o... elepara remeter-se a o menino que cuida das ovelhas um exemplo de referncia. Asformas no, eu no e se eu for... exemplificam elipse; elas tm de ser interpretadas como no eu no (ireiacord-lo) e se eu(acord-lo) a palavra porqueexpressa uma relao conjuntiva entre eu no irei e se eufor, ele chorar. A palavra ovelhasna linha trs reitera ovelhasna linha dois; vacarelaciona-se a ovelha, milhoaprado e acordadoa adormecido. Todos estes so exemplos de coeso lexical.

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    2. Coeso recorrencial: Esse grupo engloba: a) Paralelismo; b) Parfrase; c) Recursosfonolgicos, segmentais e supra-segmentais;

    3. Coeso seqencial: Esse grupo engloba: a) Seqenciao temporal; b) Seqenciao por

    conexo.

    1.4 A coeso e seus mecanismos na perspectiva de Koch

    Para Koch (2002), existem recursos na lngua que tm por funo estabelecer relaes desentido entre enunciados ou parte de enunciados, como, por exemplo: oposio ou contraste,finalidade, conseqncia, localizao temporal, explicao ou justificativa, adio deargumentos ou idias, etc. por meio de mecanismos como estes que se vai tecendo otecido (tessitura) do texto. A este fenmeno que se denomina coeso textual.

    A autora, assim como Fvero (2002), prope uma classificao baseada na funo dosmecanismos coesivos na construo da textualidade. Distingue-se, pois, desta principalmenteao considerar apenas duas modalidades de coeso e seus mecanismos:

    1. Coeso referencial: Esse grupo engloba: a) Artigos; b) Pronomes; c) Elipse; d) Numerais;

    e) Advrbios; f) Pr-formas verbais; g) Expresses ou grupos nominais definidos; h)

    Nominalizaes; i) Expresses sinnimas ou quase-sinnimas; j) Nomes genricos; l)

    Hipernimos ou indicadores de classe;

    2. Coeso seqencial: Esse grupo engloba: a) recorrncia de termos; b) recorrncia deestruturas ou paralelismo sinttico; c) recorrncia de contedos semnticos ou parfrase; d)

    recorrncia de recursos fonolgicos segmentais e/ou supra-segmentais; e) recorrncia de

    tempo e aspecto verbal; f) procedimento de manuteno temtica; g) progresso temtica; h)

    encadeamento; i) conexo.

    Conforme se observa, todas as tentativas de definio da coeso e descrio de seusmecanismos parecem ser um tanto conflitantes, no sentido de que no h consenso entre osconceitos apresentados. Nesse contexto, pois, est o professor que se depara com tal situaoe, muitas vezes, no sabendo como agir, chega at a interpretar a teoria de forma equivocada,gerando problemas que repercutem no ensino e, conseqentemente, na avaliao das

    produes textuais.Bastos (2001), citando Charroles, comenta que o professor insiste em corrigir um texto

    exigindo a presena de um mximo de marcas de coeso. Tal prtica gera uma srie deimplicaes dentre as quais destacamos o fato de que o professor deve ser conhecedor destasmarcas e dos matizes semnticos, ou seja, dos mltiplos sentidos que estas podem apresentar,sob pena de se gerar problemas que repercutiro na avaliao das produes textuais, objetode nossa pesquisa.

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    Conclumos enfatizando que o uso adequado dos mecanismos coesivos facilita ainterpretao do texto, ao passo que o uso inadequado de tais mecanismos pode resultar emuma quebra na articulao textual, dificultando, assim, a interpretao do texto e,conseqentemente, a construo do sentido.

    3. Anlise e discusso dos dados

    Ao discutirmos os procedimentos metodolgicos usados nesta pesquisa, esclarecemos quenos textos do corpus trocamos 10 conectores empregados corretamente por outros 10empregados de forma inadequada. Nosso objetivo era saber se os professores do ensino mdio

    conseguiriam detectar tais inadequaes. Apresentamos, a seguir, uma tabela mostrando, onmero de conectores identificados por informante.

    Quadro 1: Nmero de ECEIs selecionados pelos professores.

    A partir das informaes reveladas no quadro 1, criamos um grfico, indicando emporcentagem, os acertos dos professores.

    2Sigla nossa: Elementos Coesivos Empregados Inadequadamente, doravante ECEIs.3O informante P5 no identificou os erros no texto, conforme solicitado, mas reescreveu o mesmo de acordocom suas inferncias.

    INFORMANTE N de ECEIs2

    detectados

    P1 00P2 02P3 06P4 07

    P5 00 3P6 03P7 08P8 08P9 07

    P10 02P11 02P12 06P13 05P14 07

    P15 04

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    13,33%

    20%

    13,33%20%

    33,33%

    0%

    No identificaram

    nenhum erro

    Identificaram at 20%

    Identificaram de 21% a

    40%

    Identificaram de 41% a

    60%

    Identificaram de 61% a

    80%

    Identificaram de 81% a

    100%

    Grfico1: Porcentagem de acertos dos ECEIs

    O grfico 14mostra que nenhum informante conseguiu detectar mais de 80% dos ECEIs.Os informantes que mais conseguiram detectar os ECEIs, foram P7 e P8, ambos com oitoacertos cada, de acordo com o que podemos visualizar no quadro 1. Constatamos, ainda, que33,33% acertaram menos de 40% e que 33,33% acertaram mais de 60%.

    Significativo foi o percentual de professores que no detectou nenhum ECEI: 13,33%.Julgamos esse dado significativo, pelo fato de considerarmos pouco provvel que nenhuminformante demonstrasse tanta dificuldade em apontar os elementos coesivos empregadosinadequadamente.

    A partir da interpretao dos dados, percebemos que os professores analisadosdemonstram uma dificuldade de apontar os erros de coeso. Acreditamos que essa dificuldade

    possa ser causada por uma possvel deficincia terica dos docentes.O resultado que apresentamos nos fez refletir sobre as respostas dos professores ao serem

    indagados sobre se, em suas aulas, havia predominncia de algum mecanismo coesivo. Apartir das respostas dos docentes, separamos estes em dois grupos, a saber: a) professores queprimam pelo trabalho com os conectores; b) professores que no privilegiam nenhumelemento, conforme ilustramos no grfico a seguir:

    4Lembramos que a parte do grfico que se refere porcentagem dos professores que no marcaram nenhum errose refere apenas aos conectores que selecionamos. Isso no significa que o informante no tenha assinalado nadaem sua correo.

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    60%

    40%

    Professores que

    primam pelo

    trabalho com os

    conectores

    Professores que

    no privilegiam

    nenhum elemento

    Grfico 2: Porcentagem de professores que primam ou no por elementos coesivos.

    Observamos que 60% dos informantes, ao serem indagados sobre se, em suas aulas, haviapredominncia de algum mecanismo coesivo, responderam que privilegiavam o estudo dosconectores. 40% disseram no privilegiar nenhum elemento. Se a maior parte dos informantesdeclara privilegiar o trabalho com os conectores, como se explica o fato de eles noconseguirem identific-los, ou identific-los em parte, nos textos analisados? Explicao paraeste problema, seria ver o que os docentes consideram como conectores. Parece-nos possveldizer que os professores ainda se prendem muito nomenclatura das gramticas tradicionaise, para eles, a palavra conector sinnimo de conjuno/conectivo. Fato que se torna evidentenas palavras do informante P9. Ao ser interrogado sobre seu entendimento de coeso, P9afirma:

    Ex. 1 (Informante P9):

    Vejamos como em suas palavras, o informante P9 ressalta que os elementos coesivosso tambm chamados de conectores, conjunes. Trata-se de uma viso reducionista dofenmeno. Primeiro, por que os elementos coesivos no se restringem aos conectores e,segundo, por que conforme Bronckart (1999), Koch (2002) e Antunes (2005) no s osconectivos funcionam como elementos de conexo textual, mas tambm as preposies,alguns advrbios e suas respectivas locues, da por que diferenciamos conector deconectivo/conjuno.

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    Conforme j dissemos, mesmo nos casos em que o docente no assinala nenhum dosECEIs, ele marca outros elementos que, no seu entender, funcionam como ECEI. Dessesoutros elementos marcados, encontramos casos simples como substituio de pronomes queno contexto no constituem ECEIs (ver exemplo 2), porm, tambm encontramos casos maiscomplexos como nos mostram os exemplos 3, 4, 5, 6, 7 e 8:

    Ex. 2 (Informante P3):

    No exemplo 2, P3 marca o pronome este que, no texto, funciona como forma remissivaretomando art. 16, como ECEI. Quando da correo, o informante diz que a formaadequada seria a repetio do elemento de referncia e no o uso de uma forma remissiva.Colocamos este exemplo como caso simples, ancorados nas pesquisas de Antunes (1996) paraquem a repetio um fenmeno inteiramente previsvel e praticamente inevitvel. Dessamaneira, as duas possibilidades so aceitas e, apesar de o uso de este no constituir umECEI, o fato de ele assim t-lo marcado pode ser entendido como um estilo pessoal.

    Ex. 3 (Informante P1):

    No exemplo 3, o informante P1 considera como ECEI a ausncia do artigo na passagemQueria tirar minhas dvidas. Sabemos que o uso do artigo pode ser considerado umelemento de coeso de extrema relevncia para a construo da tessitura do texto. o que a

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    Lingstica de Texto, como se l em Koch (2002, 2004) chama definitivizao. Entretanto,neste caso especfico a ausncia do artigo no se configura como erro de coeso.

    Ex.4 (Informante P2):

    No exemplo 4, a partir de uma viso tradicional, pautada na anlise de palavras isoladas,P2 no observa que, de fato, temos ali uma locuo conjuntiva e corrige apenas a palavradessa. Tal procedimento parece se moldar mais dentro dos parmetros definidos pela

    postura terica que entende a lngua como um cdigo(mera estrutura na qual tudo significaem funo de uma combinatria de elementos lingsticos) (RUIZ, 2001, p. 127). Nestecaso, longe est o docente de adotar uma postura que privilegie uma escrita e uma leituraorientadas para uma coerncia global, como prope Antunes (2003).

    Ex. 5 (Informante P10):

    Ex. 6 (Informante P10):

    Ex. 7 (Informante P11):

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    Nos exemplos 5, 6 e 7, os informantes se prendem a casos de acentuao e pontuao. Noexemplo 5, P10 marca como ECEI o uso de reticncias e sugere a troca destas por um pontofinal. No exemplo 6, o mesmo informante sugere a falta de um acento na palavra Antonio e,no exemplo 7, P11 marca como ECEI: a ausncia das vrgulas para separar o conectorportanto e o uso de por que separado, quando, segundo o informante, deveria ser junto.

    Tambm nos chamou a ateno quando P11 marcou a ausncia das vrgulas paraseparar o conector portanto e no percebeu que o uso do prprio conector, naquelecontexto, se encontrava inadequado. Atravs de procedimentos como esse, percebemos que

    o ensino da Lngua Portuguesa, mais do que a produo de textos, tem seu objetivo

    voltado para os cnones da gramtica normativa. Esta tomada como um fim em simesmo, revelando o ensino estagnado do verbalismo vazio, descontextualizado. Osexerccios mecnicos de ortografia so freqentes e a avaliao dos trabalhos ficacentrada na correo ortogrfica e na assimilao dos conceitos gramaticais,(TARDELLI, 2002, p. 40).

    Possivelmente, uma prtica que buscasse promover um ensino no qual tanto os conectorescomo os outros mecanismos coesivos fossem trabalhados dentro de um contexto que levasseos educandos a compreenderem como eles concorrem para a construo do sentido,conectando segmentos textuais e estabelecendo relaes entre eles (TARDELLI, 2002, p.62), contribusse mais para um ensino produtivo de lngua.

    Ex. 8 (Informante P15):

    No Exemplo 8, o informante P15 marca como ECEI o vocbulo erigidos. P15, talveztenha marcado tal palavra como erro de coeso, por acreditar que o termo seja inadequado aocontexto. Em seu trabalho, Ruiz (2001, p.112) j havia percebido que aquilo que apontadoexplicitamente no material lingstico, pelo professor, obviamente nem sempre o quenecessariamente demanda alterao local pelo aluno.

    Os exemplos apresentados mostram que muitos docentes parecem no estar seguros,quando se trata de elementos coesivos. Talvez isso esteja ocorrendo por dois motivos:

    primeiro, pelo fato de que os informantes citados, com exceo de um, j terem sado dos

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    bancos das universidades h mais ou menos uma dcada, perodo que os estudos de textosestavam, sensivelmente, ganhando espao nos cursos de Letras das instituies de ensinosuperior. O segundo motivo pode vir da falta de formao continuada de tais docentes. Os 5informantes aludidos, de acordo com o que afirmaram nas entrevistas, no participaram denenhuma capacitao recentemente. E, quando interrogados sobre as atividades desenvolvidas

    para se manterem atualizados, recebemos respostas vagas como:

    Ex. 9 (Informante P2):

    Ex.10 (Informante P15):

    O resultado uma prtica que se ancora com mais firmeza numa base tradicional, deacordo com o que observamos.

    Outro ponto que nos chamou a ateno diz respeito a algumas correes nas quais odocente, simplesmente, sublinhava frases e perodos e/ou colocava uma interrogao no finaldos mesmos (ver exemplo 11), ou seja, apenas realizava uma correo indicativa que,segundo Ruiz (2001, p. 55), no altera o texto, somente indica o local das alteraes a seremfeitas pelo aluno.

    Essa prtica faz com que o aluno muitas vezes nem tome conhecimento do seu erro, dadaa falta de objetividade com que se registram tais correes.

    Tambm nos faz refletir se a postura adotada pelos professores de apenas sublinhar frases

    e perodos ou colocar interrogaes ao final dos mesmos, quando pedimos para que elesfossem pontuais e marcassem o erro de coeso, no seria uma estratgia para preservar suasfaces, ou seja, se o docente no consegue identificar o ECEI e no quer marcar outro elementoque ele sabe que, naquele contexto, no se trata de um ECEI, ento usa estratgias da correodita indicativa e assim, conforme dissemos, preserva sua face.

    Queremos, ainda, ressaltar a questo das justificativas dadas pelo professor. Alm desolicitar ao docente a marcao do ECEI, pedimos quele que justificasse o erro coesivoassinalado. Vejamos, em porcentagem, a quantidade de professores que apresentaram

    justificativas:

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    86,60%

    0%13,40%

    Professores que

    justificam o erro

    Professores que

    no justificam o

    erro

    Professores quejustificam o erro

    em parte Grfico 3: Porcentagem de professores que justificam os erros coesivos

    De acordo com a leitura do grfico, 86,6% dos professores no fazem a justificativa doserros, consoante pedimos. Consideramos, neste grupo, os informantes que no justificaramnenhum dos ECEIs encontrados e marcados nas produes analisadas. As correes de taisinformantes ficaram limitadas a apontar o ECEI e, em alguns casos, a corrigi-lo, segundo nos

    mostra o exemplo abaixo:

    Ex 11 (Informante P6):

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    A correo do professor limita-se a marcar o que ele considera como erro e, em algunscasos, a corrigi-lo, sem nenhuma explicao do seu ato de marcar, tampouco do ato decorrigir.

    Outros 13,4% justificaram o erro em parte. Consideramos, neste grupo, os informantesque justificaram alguns dos ECEIs encontrados e marcados nas produes analisadas.Examinando as justificativas feitas por esses professores, constatamos que se trata de

    justificativas pouco objetivas como:

    Ex: 12 (Informante P11):

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    Ex: 13 (Informante P11):

    P3 marcou os erros no texto, mas fez a justificativa numa folha anexa. Os comentriosdeste informante, em muitos casos, no chegam a ser justificativas, para usar o termo dodocente, mas a indicao da forma que deve ser usada naquele contexto. Quanto aos

    comentrios de P11, alm de no haver uma sistematizao de suas observaes, estas sofeitas sem contedo informativo, pois, dizer que uma determinada forma no deve ser usadaem determinado contexto porque est sem nexo, sem sentido no apresenta nenhumainformatividade.

    Em suma, os dados nos mostram que os professores do ensino mdio parecem estar comuma certa dificuldade no que se refere aos mecanismos coesivos e chegam a marcar comoECEI elementos outros que no so considerados como mecanismos de coeso pela literaturaespecfica. Os principais elementos responsveis pelas marcaes imprecisas, feitas pelosdocentes, foram os aspectos ortogrficos e de pontuao alm de aspectos de remisso.

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    Consideraes finais

    Este estudo teve como escopo, mostrar o que os professores do ensino mdio apontamcomo problemas de coeso em textos escritos.

    A partir da anlise dos dados, constatamos que o professor no se encontra seguro, quandose trata de mecanismos coesivos. Os docentes, muitas vezes, se prendem a aspectos de

    pontuao e acentuao, considerando-os como elementos coesivos empregadosinadequadamente. Em outros casos, marcam, em nmero significativo, elementos deremisso, empregados adequadamente, como erro coesivo. Significativo tambm foi o nmerode docentes que afirmaram primar pelo trabalho, em sala de aula, com os conectivos, pormno conseguiram identificar estes elementos no texto. A priori, pensamos que o fato de o

    professor no marcar os ECEIs nos textos fosse provocado por uma deficincia de leitura,porm abandonamos esta idia ao verificarmos o nmero considervel de professores que nomarcaram nenhum ou quase nenhum ECEI. Outro fato que reforou esta deciso refere-se aonmero de docentes que marcaram elementos que no so considerados como ECEIs, ou,naquele contexto especfico, no seriam assim considerados. Acreditamos que pode realmentehaver um dficit, por parte dos docentes, quando o assunto coeso e seus mecanismos,apontando para uma urgente auto-avaliao dos docentes, com o propsito de buscar umaprofundamento terico sobre como funciona a linguagem, para deixar de perceb-la comoum conjunto de regras gramaticais para conceb-la funcional e contextualizada, isto ,interacionista.

    Esperamos que esse trabalho possa contribuir para o levantamento de informaesimportantes que podero oferecer subsdios para a redefinio de polticas educacionaisslidas e relevantes.

    ABSTRACT: This paper is part of the results obtained in our dissertation, in which we aimed at analyzing howHigh Scholl teachers evaluate mechanisms of textual cohesion in the correction of written productions. Withinthis article, we will show what High School teachers point out as cohesion problems in written texts. The resultshave proved that teachers usually do not seem to be sure when dealing with cohesive mechanisms, beingrestricted to aspects of punctuation and/or accentuation or considering elements applied correctly as cohesionerrors.

    Key-words: Cohesive mechanisms; Written text; Teacher.

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