Capítulo 1 - booksmile.pt · A gravata vermelha como sangue era o único elemento garrido. A...

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Capítulo 1

A multidão parecia abrir caminho ao casal que seguia com determinação pela margem do rio. A manhã começara pouco antes em Londres e, enquanto os outros peões se entrecho-cavam, aquele homem e aquela mulher pareciam emitir uma aura invisível que impedia todos os outros de se aproximarem demasiado.

O homem era alto e distinto. O cabelo grisalho nas têm-poras era o único pormenor que traía a sua idade. Vestia um fato preto de corte imaculado e um sobretudo igualmente negro. A gravata vermelha como sangue era o único elemento garrido. A mulher a seu lado parecia mais jovem, com o cabelo escuro curto emoldurando uma face pálida mas inegavelmente bela. Parecia também menos descontraída que o seu compa-nheiro, movendo incessantemente os olhos pela multidão.

— Isto não me agrada, Max — disse a Raven em voz baixa.

— Como já me disseste pelo menos sete vezes — repli-cou calmamente o Dr. Nero.

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— É uma armadilha — apressou -se a dizer a Raven. — Uma armadilha óbvia. — Esforçou -se por conter a frus-tração na voz.

— Talvez seja — disse o Nero, surgindo -lhe um indício de sorriso num canto da boca. — Mas o Gregori é um velho aliado em quem muito confio. Se me diz que precisa de se encontrar comigo com urgência, não posso ignorar o seu pedido.

— Mas porquê aqui? — perguntou a Raven. — Estamos completamente expostos.

— O Gregori terá os seus motivos — replicou o Nero. — É demasiado velho e sensato para correr riscos de ânimo leve. — O Nero esperou que a confiança que demonstrava no seu velho amigo tranquilizasse a Raven, mas também ele se preocupava secretamente com a necessidade do Gregori de correr semelhante risco. O Gregori Leonov, tal como o Nero, era um dos membros mais antigos do conselho admi-nistrativo da L.U.V.A., a Liga Unitária de Vilões Autodida-tas, e conseguir tal posição dependia em grande parte de possuir instintos de sobrevivência muito apurados. Era difí-cil para o Nero imaginar o que poderia motivar o seu velho amigo a querer encontrar -se com ele num local tão público, mas sabia que não podia ignorar o pedido.

— Espero que a confiança que nele deposita seja me-recida — replicou a Raven prontamente, a sua raiva a ser traída pelo reforço ligeiro do seu habitualmente subtil sota-que russo. — Porque, se isto correr mal, correrá muito mal e muito depressa.

— É precisamente por esse motivo que aqui estás, ape-sar de o Gregori ter insistido que eu viesse sozinho — disse o Nero, ouvindo -se alguma impaciência no seu tom de voz.

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— Por vezes, deposita demasiada confiança em mim, Max — replicou a Raven, desagradada. — Será melhor par-tirmos. Isto não é nada sensato.

— Cabe -me a mim tomar essa decisão, Raven. E a mais ninguém. — O Nero usou deliberadamente o nome de código dela. Era uma forma subtil mas eficaz de lhe recordar que, apesar de valorizar a sua opinião, não autorizaria que tentasse impor -lhe a sua vontade.

— Muito bem — disse a Raven, parando e olhando -o. — Esforçar -me -ei por ser… discreta.

— Muito bem — repetiu o Nero, olhando o relógio. Estava quase no momento combinado para o encontro.

— Faça -me sinal se houver algum motivo para descon-fiar de alguma coisa.

— Claro — disse o Nero. — Esperemos que não seja necessário.

— Nem mais — replicou a Raven com o semblante carregado. A seguir, virou -se e desapareceu entre a multidão.

O Nero continuou a caminhar pela margem até ao local onde tinha combinado encontrar -se: à sombra do Lon-don Eye. A enorme roda erguia -se a grande altura e ele não conseguiu evitar sentir -se impressionado pela sua dimensão. Admirara muitos feitos de engenharia, sendo um dos prin-cipais a construção do H.I.V.E., mas a roda não deixava de ser um monumento notável.

— Olá, Max.A observação da roda pelo Nero foi interrompida pela

voz do seu velho amigo, mas, quando se virou para ele, o que viu chocou -o. O Gregori Leonov fora sempre um homem corpulento, famoso pelos abraços esmagadores que reservava para os amigos mais próximos. Mas não era esse homem que

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se erguia diante do Nero naquele momento. Estava mais magro e aparentava ser muitos anos mais velho, com pele acinzentada e olhos arregalados, parecendo esperar um ata-que repentino. Não avançou para abraçar o Nero. Nem se-quer lhe estendeu a mão, limitando -se a esboçar um sorriso superficial e triste.

— Gregori — replicou o Nero, sabendo que não con-seguira camuflar a surpresa por ver o seu colega do conselho tão alterado.

— É bom ver -te, velho amigo — disse o Leonov em voz baixa. — Não sabia a quem mais poderia recorrer.

— Que se passa, Gregori? — perguntou o Nero, genui-namente preocupado com o seu amigo.

— Vieste sozinho? — perguntou o Gregori, fitando -o.— Tão sozinho como sempre estou — disse o Nero,

sem vontade de mentir.— Claro. Não devia ter esperado que não trouxesses o

teu anjo da guarda — replicou o Gregori com um sorriso ténue.— A Natalya é muitas coisas, Gregori, mas não é um

anjo. — O Nero arqueou uma sobrancelha.— Não. Suponho que não seja — concordou o Gregori,

rindo -se.O Nero sentiu agrado por ver o seu velho amigo rir e,

por um momento breve, conseguiu ver alguma coisa do ho-mem que fora antes que o véu sombrio da tristeza voltasse a cobrir -lhe a face.

— Vem, meu amigo — disse, conduzindo o Nero pelo cotovelo. — Preparei -nos um local mais privado onde po-deremos conversar. — Levou o Nero em direção aos degraus que conduziam à plataforma de embarque nas cápsulas que rodavam lentamente na roda enorme. Ignorou a fila de

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turistas, limitando -se a acenar com a cabeça a um dos fun-cionários, entrando na cápsula imobilizada. O Nero suspei-tou que o funcionário estaria significativamente mais rico do que quando acordara naquela manhã. A porta fechou -se depois de entrarem e iniciaram a sua ascensão lenta sobre as águas frias e cinzentas do Tamisa.

A cápsula transparente tinha sido concebida para re-ceber uma dúzia de pessoas, mas, naquele momento, apenas com dois passageiros, pareceu ao Nero o local mais privado e, em simultâneo, mais estranhamente exposto em que po-deriam encontrar -se. O Gregori segurava o corrimão, olhando a água, parecendo recuperar as forças antes de se virar para o Nero.

— O que sabes da Iniciativa Renascimento? — per-guntou, fitando -o com olhos semicerrados.

— Rumores soprados pelo vento. Nada de substancial — replicou o Nero com firmeza. Era mentira, claro. Desco-brira mais do que queria realmente saber acerca daquele projeto secreto quando interrogara o Cypher, depois da sua tentativa fracassada para se apossar do H.I.V.E. no ano an-terior. O Cypher enlouquecera. Havia poucas dúvidas quanto a isso, mas o Nero não tinha motivos para duvidar do que lhe dissera. Os seus esforços posteriores tinham conseguido comprovar o que desejara ardentemente que não fosse ver-dade. O Número Um, líder supremo da L.U.V.A., tentava em segredo reconstruir o Supremo, uma inteligência artificial psicótica, inacreditavelmente perigosa e renegada. Os seus esforços eram camuflados por uma organização sombria co-nhecida apenas como Iniciativa Renascimento e assim es-condidos dos vilões do mundo. O Nero não conseguia descortinar qual seria a motivação do Número Um. Quase

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perdera a vida às mãos da inteligência artificial diabólica e isso bastava para o convencer de que aquele plano não era apenas arriscado. Era uma loucura. Não conseguia com-preender. O Número Um fora crucial na destruição da má-quina desgovernada e, apesar disso, parecia agora tentar em segredo trazê -la de volta à vida.

— Suspeito que saberás mais do que isso, velho amigo — replicou o Gregori tristemente. — E também suspeito que saberás quem está por trás desta loucura. Venci -te em demasiados jogos de cartas para não saber quando fazes bluff.

— Suponhamos… hipoteticamente… que sei — replicou o Nero com cuidado, ligeiramente incomodado por ver que o Gregori conseguia lê -lo tão bem. — Porque estamos aqui?

— Porque sabes tão bem como eu… Não… Sabes me-lhor do que eu que não poderemos permitir que o Número Um tenha sucesso.

Ali estava. O Gregori dissera o seu nome. O Número Um. Esse elemento tornava aquilo uma conspiração, mesmo que, naquele momento, os incluísse apenas aos dois. Homens mais poderosos tinham perdido as vidas por muito menos. O Nero sabia que ainda podia afastar -se, fingindo não per-ceber o que o Gregori sugeria, mas fazê -lo seria permitir que aquela loucura continuasse sem controlo e isso custaria se-guramente a vida ao Leonov. Era um preço que o Nero não estava disposto a pagar.

— Max, é pior do que julgas — disse o Gregori, aba-nando a cabeça. — O Número Um não tenta apenas re-construir o Supremo. Gostava que fosse assim tão simples. — Esfregou os olhos, suspirando longamente.

— O que é, Gregori? — perguntou o Nero, colocando uma mão sobre o ombro do amigo. — Que planeia ele?

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— Descobri uma coisa, Max. Uma coisa que não devia ter descoberto. O Número Um soube e enviou os Executo-res atrás de mim e da minha família.

O Nero arregalou os olhos. Todos os membros da L.U.V.A. conheciam a existência dos Executores. Eram os carrascos privativos do Número Um, um esquadrão da morte impla-cável que não deixava ninguém vivo. Eram um pesadelo assassino e o Número Um lançara -os contra o Gregori.

— A minha mulher e as minhas filhas morreram, Max. Foram mortas por aqueles carniceiros. Sobrevivi por milagre.

Soaram campainhas de alarme dentro da cabeça do Nero. Os Executores nunca deixavam sobreviventes, a não ser que quisessem. Se tivessem seguido o Gregori até ali…

— Porque fez ele isto, Gregori? O que descobriste?— Temos de travá -lo, Max. Está…O vidro atrás do Gregori estalou e o Nero viu -o arre-

galar os olhos de choque. Tentou ampará -lo, mas este caiu ao chão, morto. Não ouvira um tiro ou qualquer outro som, mas a bala do atirador furtivo atingira o alvo com eficácia letal. Subitamente, o Nero sentia -se horrivelmente exposto, quase cem metros acima do solo numa bolha de vidro e sem qualquer motivo para acreditar que não seria o alvo seguinte. Pressionou o botão na parte lateral do seu relógio. Ela podia não ser um anjo, mas naquele momento teria de depositar toda a sua fé na Raven.

A Raven observou de perto enquanto os dois homens entravam na cápsula que a rotação da enorme roda fez subir lentamente. Não lhe agradou. Tornava -se cada vez mais di-fícil vê -los enquanto a cápsula ia subindo e teria de procurar

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um ponto de observação mais favorável. De repente, ouviu um ruído que lhe provocou uma descarga de adrenalina. Nenhum dos transeuntes em redor o ouvira. Não fora mais sonoro do que alguém a tossir educadamente. No entanto, para Raven, fora claramente o disparo silenciado de uma espingarda de grande potência. Olhou para cima e viu o buraco da bala no vidro reforçado da cápsula dentro da qual o Nero se erguia. Sem hesitar, despiu o sobretudo e expôs a armadura de couro negro e o arnês que envergava por baixo. Começou a correr, dirigindo -se para a roda, com o apito insistente do sinal de emergência do Nero enchendo--lhe os ouvidos.

Num telhado distante, um observador usava binóculos poderosos para acompanhar os acontecimentos. Era com-pletamente calvo além de uma tira de cabelo branco que lhe passava sobre as orelhas e lhe contornava a cabeça, fa-zendo -o parecer um monge. O pequeno auricular ativou -se enquanto baixava os binóculos e expunha os seus olhos cinzentos frios.

— Atirador Um para controlo. O alvo secundário foi abatido. O alvo primário está na mira — informou -o uma voz.

— Não dispares, Atirador Um — instruiu tranquila-mente o homem —, mas mantém -no na mira. Partirá con-nosco ou não partirá. Percebido?

— Percebido. Alvo será mantido na mira — replicou a voz ao seu ouvido.

— Atirador Dois para controlo — disse outra voz —, tenho uma mulher não identificada com equipamento mili-tar dirigindo -se para a zona do alvo.

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O homem ergueu novamente os binóculos e procurou a área em redor da base da roda, encontrando imediatamente uma figura vestida de negro correndo a toda a velocidade para a estrutura.

— Parece -me que conseguimos isolar o lobo do rebanho — disse para si mesmo com um sorriso ténue. — Controlo para todas as unidades, a mulher não identificada é o novo alvo primário. Esperem até se afastar da multidão e abatam--na.

Várias vozes manifestaram a sua compreensão da nova ordem. O homem ergueu os binóculos, fixando -os no único ocupante vivo da cápsula, que se aproximava do ponto má-ximo da sua elevação.

— Controlo para todas as unidades aéreas. Iniciem a aproximação.

A Raven sentiu um arrepio enquanto atravessava a praça em direção à roda. O pulsar das pás de helicópteros era in-confundível e indicava a aproximação destes. A seguir, algo que se assemelhava a uma vespa furiosa zumbiu -lhe junto ao ouvido e soube que passara a ser o alvo do atirador furtivo. Mergulhou para trás de uma bilheteira próxima e o vidro por cima estilhaçou -se numa explosão de fragmentos minúsculos. De repente, as pessoas começaram a gritar e a fugir enquanto mais tiros ricocheteavam contra o passadiço de metal a cen-tímetros dela. Não teria hipóteses de perceber onde estavam os atiradores. Precisaria de se expor para isso e, avaliando pela frequência dos tiros, haveria mais do que um atirador. Assim que expusesse a cabeça para tentar perceber onde estariam, um tiro fá -la -ia rebentar. Retirou um pequeno

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cilindro cinzento do invólucro que trazia ao peito e atirou -o violentamente contra o chão. O dispositivo estourou de ime-diato, envolvendo a área circundante em fumo branco denso.

Aprisionado na cápsula, o Nero sentia -se mais indefeso a cada instante que passava. A Raven estava certa. Fora uma loucura deixar -se cair naquela armadilha, mas não pe-sara os riscos, preocupando -se apenas com o desespero que ouvira na voz do amigo, e pagava agora o preço. No seu mundo, era raro encontrar alguém em quem pudesse real-mente confiar e pessoas com essa qualidade adquiriam um valor incalculável. Era uma fraqueza que o responsável por aquela situação explorara. Sabia que tentariam capturá -lo vivo. Era por isso que não estava já morto. E isso significava que teria de tentar fugir. Ser capturado não seria uma opção. Procurou desesperadamente algo na cápsula que lhe pudesse ser útil, mas não encontrou nada. Podia apenas esperar que a Raven conseguisse chegar até ele.

Ouviu gritos de pânico vindos de baixo. Correu para o extremo da cápsula e olhou a base da roda a tempo de ver a área encher -se com uma nuvem crescente de fumo branco. De repente, sentia -se calmo. Se alguém conseguisse salvá -lo, seria ela. Um indício de movimento captou -lhe a atenção e virou -se na direção do rio. Aproximando -se da roda numa formação rigorosa, quatro helicópteros negros avançavam poucos metros acima da superfície da água. Reconheceu as silhuetas inconfundíveis de soldados fortemente armados pendurados dos lados.

— O que quer que pretendas fazer, Natalya — mur-murou o Nero para si mesmo —, apressa -te.

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O homem calvo continuou a olhar pelos binóculos en-quanto a mulher se protegia dos tiros que iam atingindo a estrutura que usava para se esconder na base da roda.

— Atenção aos alvos, atiradores — disse, calmamente. — Prefiro evitar baixas civis, se for possível.

De repente, a posição da mulher foi envolvida por fumo branco.

— A todas as unidades. Passar para visualização de infravermelhos — instruiu o homem. — Esperem que se exponha e disparem.

Enquanto olhava, um minúsculo projétil arrastando um cabo fino ergueu -se da nuvem e atingiu o centro da roda, 50 metros acima. Momentos depois, a mulher ergueu -se da nuvem a grande velocidade, puxada pelo cabo que acabara de disparar.

— Atirador Três para controlo, é demasiado rápida. Não consigo fixar o alvo — informou uma voz pelo au-ricular.

— Sigam -na — bradou o homem, com um pânico re-pentino surgindo -lhe na voz anteriormente calma. — Uni-dades aéreas, avancem para a cápsula AGORA!

A Raven subiu para o aço curvo do centro da roda com grande velocidade, enquanto o cabo se recolhia para o suporte preso ao seu antebraço. Um disparo atingiu o metal a seus pés com uma faísca e ela lançou -se para diante num salto mortal, aterrando de costas e deslizando para os raios daquela roda colossal. Disparou novamente o gancho e o cabo de

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monofilamento ergueu -se em direção à prisão de vidro do Nero. A unidade no antebraço apitou para confirmar que atingira o alvo e pressionou os controlos para subir nova-mente pelos ares. Embateu com força contra um dos lados da cápsula, esforçando -se desesperadamente por alcançar a pequena escada metálica que permitia subir ao topo. Con-seguiu segurá -la e balouçou, mais de cem metros acima das águas frias e cinzentas do Tamisa. De repente, sentiu uma dor dilacerante na coxa quando um dos atiradores furtivos quase atingiu o alvo, deixando um ferimento superficial que começou a sangrar profusamente. Içou -se, tentando ignorar a dor na perna. O Nero olhava -a do interior da cápsula com uma expressão de preocupação intensa. A Raven chegou ao topo da cápsula e tentou forçar a abertura de emergência, mas estava fechada com firmeza. Procurou freneticamente nas bolsas do seu cinto o equipamento que lhe permitiria rebentar a cobertura, mas estacou quando uma sombra imensa a cobriu e uma enorme rajada de vento ameaçou arrancá -la do seu poleiro. Helicópteros rodearam a cápsula de todos os lados, cada um repleto com soldados de elite envergando fardas com um símbolo estranho que representava um anjo empunhando uma espada. Nunca o vira antes. Todos lhe apontavam as armas. Olhou para baixo e viu o Nero aba-nando a cabeça lentamente.

— Vai — disse ele, apesar de a Raven ter visto apenas os seus lábios movendo -se. Mesmo que todos os seus ins-tintos lhe gritassem que ignorasse o que ele lhe dizia, ela sabia que estava certo.

— Mãos na cabeça e ajoelha -te — ordenou uma voz através de um altifalante montado no helicóptero mais pró-ximo —, ou disparamos.

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A Raven virou -se lentamente para o helicóptero e er-gueu as mãos. A seguir, com um movimento veloz, lançou ao interior da aeronave uma granada de fumo que colocara na mão momentos antes. O fumo encheu imediatamente a cabina e a Raven correu os poucos metros que a separavam do abismo e saltou. Conseguiu agarrar o patim do helicóptero enquanto o piloto, cego, o fazia rodopiar em direção ao rio. Começou a içar -se, sabendo que se conseguisse entrar na cabina poderia lutar pelos controlos. De repente, algo que lhe pareceu um punho gigantesco atingiu -a nas costas e os seus dedos soltaram -se, caindo como uma boneca de trapos para a água gelada em baixo. O embate contra o rio foi ruidoso e, a seguir, não se ouviu mais nada.

— Bom tiro, unidade quatro — disse o homem calvo calmamente enquanto via o corpo inerte da mulher atingir a água. — Draguem o rio. Quero ver o cadáver.

Permitiu -se um sorriso de viés enquanto via os soldados de elite descerem nos seus cabos de um dos helicópteros para o topo da cápsula. A missão estava terminada. Tinham capturado a presa.

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Capítulo 2

três meses mais tarde

O professor Pike tirou os óculos e esfregou os olhos com um suspiro prolongado. Ansiava por voltar ao departamento de Ciência e Tecnologia. Era aí que pertencia realmente e não ali, tentando preencher o vazio deixado por um dos seus melhores e mais antigos amigos. Recostou -se na cadeira que ainda via como sendo a cadeira do Nero e olhou o gabinete do diretor à sua volta. Nada fora tocado desde que o amigo dali saíra pela última vez, quase três meses antes.

Não era a primeira ocasião em que o professor assumia o papel de diretor interino do H.I.V.E. Substituíra tempora-riamente o Nero quando este era chamado em missão ou convocado ao conselho administrativo da L.U.V.A. Mas daquela vez era diferente e sabia -o bem. Os dias tornaram--se semanas e depois meses e ficou cada vez mais claro que algo estaria muito mal. A única coisa que o tranquilizava era saber que a Raven o tinha acompanhado e seria ela a

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melhor pessoa do mundo para zelar pela segurança de alguém numa situação perigosa. Claro que o professor tinha comu-nicado a situação ao conselho, sendo -lhe assegurado que investigavam e que, até nova ordem, seria ele o diretor da escola. Provocou -lhe algum desconforto perceber que, na realidade, sabiam tão pouco como ele acerca do paradeiro do Nero e da Raven, mas sabia que não devia afirmá -lo diretamente. Depois, sem aviso, foi convocado a meio da noite ao gabinete do diretor para uma chamada não progra-mada do Número Um, o comandante supremo da L.U.V.A. Esperava que o monitor na secretária se acendesse, esforçando -se para conter a ansiedade que lhe trepava gra-dualmente pela espinha acima.

O terminal de comunicações emitiu um trinado ele-trónico e o símbolo da L.U.V.A., um punho caindo sobre um globo fraturado, preencheu o ecrã.

— Professor Pike? — disse pelo intercomunicador uma voz feminina de tom neutro.

— Sim, é o professor Pike — replicou.— Aguarde o contacto do Número Um — disse a voz.

Em seguida, silêncio. No momento seguinte, o ecrã mostrava a silhueta de uma figura sentada. Era impossível perceber qualquer pormenor da verdadeira aparência do homem além do facto de ter uma cabeça.

— Bom dia, professor. Lamento fazer uma chamada imprevista a estas horas, mas fomos informados de um pro-blema sério — afirmou tranquilamente o Número Um.

— Com certeza — replicou o professor, ainda que ambos soubessem que, mesmo que estivesse ocupado a fa-zer uma neurocirurgia, teria de abandonar tudo para aten-der a chamada.

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— Intercetámos uma transmissão — prosseguiu o Número Um. — Foi enviada às principais agências noti-ciosas do mundo e não tardará a ser difundida por todo o lado. Penso que deverá vê -la antes de continuarmos a nossa discussão.

Abriu -se uma janela no canto do ecrã mostrando a imagem parada de um homem sentado a uma secretária diante de um cenário cinzento. No centro da parede, so-bre a cabeça do homem, via -se um símbolo composto por um anjo estilizado em voo ascendente com uma espada erguida numa mão. Sobre o anjo, uma única palavra: ESPERANÇA. O homem era magro, pálido e completa-mente calvo com a exceção de uma faixa cuidadosamente aparada de cabelo branco visível sobre cada orelha. Olhava diretamente para a câmara. O seu olhar fixo era um pouco perturbador.

— Cidadãos do mundo — disse o homem quando a reprodução do vídeo se iniciou —, chamo -me Sebastian Trent. Comando uma nova organização que em breve in-tegrará de forma essencial a presente guerra contra o terror. Esta organização atua com o apoio total das agências de segurança dos países democráticos e pretende ser a ponta da lança no confronto contínuo contra os grupos terroris-tas que pretendem destruir para sempre a nossa forma de vida. Esta organização chama -se ESPERANÇA, Estratégia Permanente de Ação e Segurança, e desejamos devolver a todos no mundo precisamente isso: a esperança. É nosso dever combater as forças do mal onde as encontrarmos, levando a luz aos cantos mais sombrios do mundo e en-frentando todos os que pretenderem atacar sem aviso gente inocente.

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Obviamente, não era a primeira vez que o professor ouvia retórica daquele tipo, mas havia qualquer coisa ine-gável naquele homem e na convicção com que falava que o distinguiam dos políticos comuns e das suas torrentes de frases feitas.

— Sei que muitos de vós sentirão que já ouviram isto — continuou o Trent — e, por isso, as nossas ações deverão ser mais sonoras que as palavras. Estou aqui hoje não apenas para anunciar publicamente a constituição da nossa nova organização, mas também para mostrar que somos mais que capazes de produzir resultados.

A imagem alterou -se e o professor susteve a respiração. Era o Nero, parecendo velho, magro e pálido, vestindo um fato -macaco prisional laranja em vez do seu habitual fato imaculado. Havia um brilho desafiador familiar nos seus olhos, mas, além disso, pouco na figura desmazelada seria reconhecido por alguém que o conhecesse.

— Este homem chama -se Maximilian Nero. — O Trent fez uma pausa. — É uma das figuras principais naquela que será a organização criminosa mais perigosa que o mundo já conheceu. Foi capturado por agentes da ESPERANÇA en-quanto planeava um ato terrorista em Londres, um plano que, com a sua captura e com a morte dos seus cúmplices, deixa de ameaçar o povo inocente daquela cidade. A sua captura permitiu -nos uma visão muito completa do funcio-namento desta organização e será o primeiro e mais crucial dos passos para a sua destruição derradeira.

A imagem do Nero desapareceu e foi substituída no-vamente pelo Sebastian Trent.

— Neste preciso momento, agentes da ESPERANÇA estão ativos por todo o mundo, caçando os cúmplices deste

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homem e anulando de forma permanente as suas operações. Chegou o momento de as forças da justiça resgatarem o nosso mundo das garras daqueles que desejam destruí -lo, dando -nos a todos esperança. O combate acaba de começar. Obrigado.

A imagem dissipou -se, deixando o símbolo do anjo no ecrã.

— Uma situação potencialmente desastrosa — afirmou calmamente o Número Um. — Pretendemos resolvê -la tão rapidamente quanto possível. Não podemos permitir que alguém com os conhecimentos do Nero permaneça nas mãos dos nossos inimigos.

— Não — concordou o professor, atordoado pelo que acabara de ver. Além de tudo indicar que o Nero tinha sido capturado, o que o Trent dissera sobre «a morte dos seus cúmplices» sugeria que a Raven teria morrido durante a operação. Era difícil imaginar uma evolução mais catastrófica dos acontecimentos. — Que pretende fazer?

— Asseguro -lhe que encontraremos uma forma de eli-minar o risco para a L.U.V.A. — respondeu o Número Um.

O professor olhou a figura sombria no ecrã. — Certamente não pretenderá…— Não lhe cabe avaliar as minhas decisões, professor.

Espero não necessitar de lhe recordar a sua posição dentro desta organização — afirmou rapidamente o Número Um com uma entoação gélida da voz. — A sua primeira priori-dade neste momento será o H.I.V.E. e, como tal, parece -me que deverá pensar na forma de melhor transmitir esta notí-cia aos alunos e ao pessoal da escola.

— Será melhor que o façamos em breve — afirmou tristemente o professor. — Há semanas que os boatos

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crescem por aqui. A verdade poderá ser terrível, mas a especulação atual será certamente pior. Deverei informar o pessoal docente e, em seguida, convocar uma assembleia de alunos.

— Muito bem — replicou o Número Um. — Precisarei de considerar também a nomeação de um novo diretor.

— Estou preparado para desempenhar as minhas funções por agora — disse o professor calmamente.

— Precisamos de uma solução mais permanente — disse o Número Um. — Nomearei alguém durante os próximos dias. Sei que colaborará com quem eu escolher, claro.

— Claro — disse o professor. Era óbvio que o Número Um decidira que o regresso do Nero era extremamente im-provável. — Informarei o pessoal docente.

— Ótimo. Compreendo que será difícil, professor, mas saiba que teremos sucesso. Faz ao próximo.

— Faz ao próximo — o professor repetiu o lema da L.U.V.A., palavras que, de repente, pareciam ocas e lhe amargavam a boca.

O ecrã escureceu e o professor deixou -se afundar na cadeira. O Nero tinha sido capturado, a Raven estava morta e o Número Um parecia preocupar -se apenas com a gestão eficiente da escola. O Nero e a Raven tinham sido dois dos seus operacionais mais leais e de serviço mais longo, mas a sua perda pouco parecia importar -lhe. O professor apoiou a cabeça nas mãos e suspirou. Seria um dia muito longo.

O Otto fechou os olhos e inspirou fundo. Tentou blo-quear o som do chuveiro na casa de banho e concentrar -se unicamente na rede de luzes palpitantes que via na sua mente.

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Enquanto se concentrava, a imagem tornou -se mais clara. Parecia quase a vista aérea de uma cidade enorme à noite, com as luzes dos carros percorrendo as ruas a velocidade impossível. Sentia -se cada vez mais próximo da grelha, ana-lisando inconscientemente os padrões das luzes aceleradas, tentando desencriptar a informação que sabia estar armaze-nada no interior. Passara a noite acordado, incapaz de dor-mir enquanto o seu cérebro tentava decifrar estes padrões, sentindo que se aproximava cada vez mais do seu objetivo mas encontrando obstáculos progressivamente mais difíceis ao longo do caminho. Depois, algo encaixou na sua cabeça e sentiu que se alongava e se juntava ao fluxo palpitante em baixo, afastando -o de forma subtil do seu curso original e canalizando -o para um novo destino.

— Otto — disse o Wing, pousando a mão no ombro do amigo. O Otto abriu os olhos com um gemido, sentindo um momento de completa desorientação enquanto as linhas luminosas da grelha eram subitamente substituídas pelas paredes brancas e frias do quarto que partilhava com o Wing. — Estás bem? — perguntou o amigo, parecendo um pouco preocupado.

— Sim… Sim, estou ótimo — gemeu o Otto em res-posta.

— Não pareces ótimo — replicou o Wing, passando -lhe um lenço e apontando -lhe o nariz. O Otto levou o lenço à cara e passou -o pela narina. Viu que ficou manchado de vermelho. — Aliás, pareces alguém que não dorme há dois dias. — A censura era clara na sua voz.

— Estava quase lá — disse o Otto, sentindo -se exausto e continuando a passar o lenço pelo nariz. — Acho que se torna mais fácil.

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— Se isto é fácil, não gostaria de ver como será a difi-culdade — disse o Wing, sentando -se na ponta da sua cama.

O Otto sabia que o amigo se preocupava com ele. Vira o Otto a esforçar -se para controlar aquele estranho novo talento durante as semanas anteriores e, do seu ponto de vista, não lhe parecia que estivesse mais perto de uma res-posta. Começara nos seus sonhos. Fora aí que vira a grelha pela primeira vez e sentira -se imediatamente fascinado pelo desafio do enigma que continha. Mas, aos poucos, começou a ocupar -lhe também as horas que passava acordado, co-meçando a vê -la com clareza cada vez maior na sua mente e, aos poucos, conseguindo mesmo controlá -la de forma consciente.

— Ainda me parece que seria melhor discutirmos isto com o professor — disse o Wing, puxando o cabelo escuro longo e prendendo -o no habitual rabo de cavalo. — Não compreendes totalmente o que acontece. Pode ser perigoso.

— Não — respondeu o Otto com firmeza, olhando o amigo nos olhos. — Tenho de resolver isto sozinho. Quase conseguia hoje. Acho que…

Foi interrompido pelo chamamento insistente da sua caixa negra, o dispositivo de comunicação que todos os alu-nos do H.I.V.E. recebiam e que se esperava que tivessem sempre consigo. Ergueu o dispositivo preto e brilhante da secretária e abriu -o. No ecrã, leu as palavras «Download Completo». O Otto tocou no ecrã tátil e abriu o ficheiro, não conseguindo evitar um pequeno gemido de espanto quando viu o que continha.

— Funcionou — sussurrou, fitando o pequeno ecrã de cristais líquidos com olhos arregalados. — Consegui…

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— O que é? — perguntou o Wing, espreitando -lhe por cima do ombro.

— Isto, meu amigo, é o que tenho estado a tentar durante os últimos dois dias — disse o Otto, radiante, er-guendo o ecrã para que o amigo lesse. Era claramente visível uma página de abertura de aspeto oficial dizendo «Vilania Aplicada, exame final do segundo ano».

Era o segredo da grelha, o mistério que o Otto conseguira finalmente desvendar. Não conseguia explicar como ou por-quê, mas, de alguma forma, adquirira a capacidade de con-trolar mentalmente computadores. A princípio, apenas para observar o seu funcionamento, mas aparentemente passara a conseguir também controlá -los. Era um talento que se ma-nifestara pela primeira vez, ainda que de forma inconsciente, no ano anterior, quando o Otto fora decisivo na anulação do plano tresloucado do Cypher para roubar o Protocolo Su-premo. Desde então, tentara sem sucesso controlar conscien-temente essa capacidade e, por fim, parecia ter conseguido. Não podia esperar para contar a Laura que obtivera o ficheiro num sistema que, na semana anterior, a ouvira descrever como sendo «impossível de hackear». Mesmo que não con-seguisse explicar -lhe verdadeiramente como o fizera.

— Passaste por isto tudo para poderes fazer batota num exame — disse o Wing com um ligeiro sorriso. — Um exame que terias passado com distinção de qualquer forma.

— É pelo princípio da coisa — replicou o Otto com um sorriso.

— Não sei se aprovo — disse o Wing, arqueando uma sobrancelha. — Os batoteiros nunca vão longe na vida.

— Às vezes, acho que não pertences a este sítio — disse o Otto. — Isso quer dizer que não queres uma cópia?

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— Bom… Não iria tão longe… — respondeu o amigo.De repente, a conversa foi interrompida por três apitos

longos do sistema de som da escola que indicavam um co-municado geral. Seguiu -se, um momento depois, a voz do professor Pike, o professor de Ciência e Tecnologia e atual diretor interino.

— Atenção, alunos. Haverá uma assembleia amanhã às nove horas no átrio principal. Obviamente, a participação é obrigatória.

O altifalante silenciou -se. O Otto conseguia imaginar o efeito que o anúncio teria pela escola. As assembleias de alunos eram extremamente raras porque os professores acre-ditavam que reunir muitos jovens com talento para a vilania no mesmo local não era boa ideia.

— Curioso — disse o Wing em voz baixa. — E invulgar.— Sim. Será que descobriremos finalmente onde o nosso

estimado diretor se tem escondido? — perguntou o Otto. Se as teorias da conspiração delirantes que circulavam pelo H.I.V.E. merecessem algum crédito, qualquer coisa poderia ter acontecido ao Nero, desde o rapto por extraterrestres à aposentação. Mas, com a passagem das semanas e sem sinal dele ou da Raven, tornava -se cada vez mais claro que algo de errado se passava.

— Anda daí — disse o Otto, erguendo -se e alisando a farda negra bastante enrugada. — Vamos procurar os outros.

— Que fizeste desta vez, Malpense?O Otto sorriu ao ouvir o sotaque escocês caloroso e

familiar da Laura Brand atrás dele. Voltou -se para ela e retribuiu -lhe o sorriso sarcástico.

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— Não percebo o que podes querer dizer com isso — replicou com uma expressão de inocência ferida.

— Uma assembleia de alunos costuma significar que alguma coisa correu horrivelmente mal e custa -me acreditar que não estejas envolvido desta vez. — Sorriu. — Vá, conta--me tudo.

— Desta vez, sei tão pouco como qualquer outra pessoa — disse o Otto, falando com toda a sinceridade. — Teremos de esperar para ver.

Ocorriam conversas semelhantes à sua volta no átrio do bloco de alojamento sete, enquanto os alunos se reuniam em grupos.

— O Franz diz que vão anunciar que o Nero era um androide e que era a Raven quem mandava na escola — disse a Laura com um sorriso conspirativo.

— A sério? — perguntou o Otto. — Ouvi dizer que tinham sido os dois raptados pelo gémeo verdadeiro do Nero, que planeia tomar conta do H.I.V.E.

— Parece -me um pouco improvável — disse o Wing, sobressaltando o Otto quando surgiu a seu lado, aproximando--se em silêncio completo.

— Gostava que não fizesses isso — pediu o Otto, sus-pirando. — Há um motivo para ninguém gostar de ninjas, sabes?

— Eu acho que os ninjas são giros — disse a Shelby Trinity, surgindo de forma igualmente silenciosa do outro lado do Otto e sobressaltando -o mais uma vez. A Laura esforçou--se para não rir enquanto via o Wing corar um pouco. A Shelby insistia em que só provocava o Wing para o ver envergonhado, mas a Laura sabia bem que não era só por isso.

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— Bolas — disse o Otto, parecendo exasperado. — Livrem -nos de pessoas que estudam para os exames de Camuflagem e Evasão de nível avançado. É como viver com dois fantasmas.

— Espectros, se não te importas — corrigiu a Shelby com uma piscadela de olho, numa referência à sua vida anterior à vinda para o H.I.V.E., em que prosperara como ladra de joias internacional conhecida como Espectro. — Seja como for, são os ciúmes a falar. Como correm as coisas nas aulas básicas de Camuflagem e Evasão? Já vos tiraram as rodinhas de treino?

— Há mais do que uma forma de entrar num sítio à socapa, sabes? — disse o Otto, tirando a caixa negra do bolso e passando -a à Laura. Ela olhou para o ecrã, arrega-lando os olhos de choque.

— É impossível — sussurrou, sem afastar os olhos do ecrã.

— Parece -me que não — disse o Otto com um sorriso matreiro. — Queres uma cópia?

— Isso seria fazer batota — replicou a Laura, devol-vendo a caixa negra ao Otto. — Claro que quero uma cópia.

— Uma cópia de quê? — perguntou a Shelby impa-cientemente, tentando sem sucesso tirar o dispositivo da mão do Otto.

— Do exame da próxima semana — afirmou este cal-mamente. — Mas de certeza que conseguirás roubar um, já que és tão sorrateira…

A Shelby parecia irritada e impressionada em partes iguais.

— Quando? — perguntou ela, sorrindo.

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— Há umas coisas no departamento de Ciência e Tec-nologia que gostaria de pedir emprestadas durante algum tempo — respondeu o Otto.

— Estou rodeado por pessoas sem caráter — disse o Wing, suspirando.

O professor Pike olhou os outros professores reunidos à sua volta. As suas expressões deixavam poucas dúvidas quanto ao que pensavam. Tinham sido convocados àquela hora da manhã pelo cérebro do H.I.V.E. sem explicações. O único membro da equipa que permanecia tão impassível como sem-pre era a professora Leon, mas era realmente difícil ler expres-sões no focinho de um gato. Limitava -se a fitar o professor, algo que o deixava sempre incomodado. A verdade era que a situação da professora era maioritariamente culpa dele. A mente dela tinha sido transferida para o corpo do seu gato durante um procedimento desastrosamente falhado para au-mentar as suas capacidades com determinadas caraterísticas do animal. Obviamente, o procedimento não correra bem como planeado e a professora nunca o perdoara pelo que acontecera. Havia pouco afeto entre ambos, apesar dos seus esforços cons-tantes para encontrar uma forma de inverter o processo.

— Quem será o novo diretor? — perguntou a profes-sora Leon calmamente, com a joia azul na sua coleira a piscar enquanto os sistemas informáticos do H.I.V.E. sinte-tizavam a voz.

— O Número Um não disse — replicou o professor, tentando conter a frustração na voz. — Ao que parece, chegará em breve.

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— Acho que merecemos mais informação — disse o coronel Francisco, irritado. A sua experiência com a Con-dessa e com o Cypher no ano anterior não contribuíra em nada para melhorar o seu temperamento. Fora necessário algum tempo para que fosse invertida a reprogramação men-tal forçada pela Condessa e, apesar de não ter tido culpa, o coronel continuava a culpar -se claramente, pelo menos em parte, pelo papel que desempenhara na quase destruição da escola.

— Acredito que o Número Um nos diria que não me-recemos nada e que deveríamos ficar gratos pela informação que nos dá — explicou o professor. — Sugiro que, a curto prazo, nos preocupemos apenas com as consequências deste anúncio aos alunos.

— De certeza que precisaremos de fazer o anúncio? — perguntou a professora Leon. — Seria certamente pre-ferível que fosse o novo diretor a lidar com isso, seja ele quem for.

— O Número Um deixou bastante claro que a notícia da captura do Nero e da morte da Raven deverá ser anun-ciada antes da chegada do novo diretor. Suspeito que não queira que uma notícia tão negativa seja a primeira coisa que tenha de anunciar.

— E não têm dúvidas de que a Raven morreu? — per-guntou o coronel Francisco. — Não seria a primeira vez que alguém se enganaria a esse respeito.

— Estão bastante seguros — disse o professor, baixando a voz. — Como todos vós, espero que se enganem, mas o que importa é que não temos notícias deles há três meses e isso parece sustentar a conclusão.

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— Provocará grande inquietação — disse a professora Tennenbaum, responsável pelo departamento de Finanças e Corrupção, com a habitual falta de emoção. — Devere-mos preparar -nos para que os alunos causem um certo al-voroço.

— As patrulhas serão reforçadas em conformidade — replicou o professor. — Já discuti o assunto com o chefe de segurança e ele assegurou -me de que os seus homens estão preparados para qualquer perturbação. — O professor tentava parecer tão confiante quanto conseguia.

— Esperamos que esteja certo — disse a professora Leon. — Para o bem de todos nós.

O Otto, o Wing, a Laura e a Shelby avançaram pelo corredor repleto de alunos em direção ao átrio principal do H.I.V.E. Nas raras ocasiões em que acontecia algo assim, o Otto achava fascinante e até divertido ver os grupos que os colegas à sua volta formavam naturalmente. Claro que era ainda mais fácil perceber as especializações de cada um pela cor dos seus fatos -macaco. Branco para o programa Técnico, azul para o programa Capanga, cinzento para o programa Político e Financeiro, e, por fim, preto para o grupo em que o Otto se integrava, o programa Alfa. Podia parecer uma designação vaga, mas não era preciso ser um génio para perceber que os Alfas eram treinados para serem líderes. O Otto pensava com frequência se estaria certo que ele e os seus colegas tivessem sido categorizados de forma tão completa desde o dia da sua chegada ao H.I.V.E. e sabia por experiência própria que muitos dos alunos

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continuavam a não gostar dos que integravam o programa Alfa, sentindo, talvez de forma justificada, que recebiam tratamento preferencial.

Recordava -se do dia em que questionara o Nero acerca daquele assunto numa das suas aulas de Estudos de Vilania e a forma como o Nero explicara que ser um líder não era algo que alguém fizesse por querer ser popular e que todos os grandes líderes da história souberam que não importava que as pessoas gostassem ou não deles, desde que os respei-tassem ou temessem. O Otto percebia a lógica, mas, no fundo, sentia que teria de haver algo mais.

— Uma moeda pelos teus pensamentos — disse a Laura, percebendo a expressão distante na face do Otto.

— Não é nada de importante. Estava só a pensar no significado disto tudo — respondeu ele. Era mentira, mas duvidou de que a Laura quisesse mesmo saber das suas dú-vidas acerca da hierarquia escolar.

— Não tardaremos a descobrir — disse ela enquanto entravam no átrio principal. O piso de mármore preto polido cobria -se rapidamente com o aglomerado de alunos que eram orientados em secções cuidadosamente ordenadas pelos guardas do H.I.V.E. com os seus fatos -macaco laranja incon-fundíveis.

— Há mais guardas do que é habitual — afirmou o Wing, baixando a voz.

— Sim, é quase como se esperassem problemas — con-siderou o Otto. Sentia uma ansiedade crescente.

— Algum de vocês viu o Franz? — perguntou apressa-damente o Nigel Darkdoom enquanto corria para eles através da multidão. Nunca era um dos alunos mais descontraídos,

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mas parecia ainda mais tenso do que o habitual. — Combi-nou encontrar -se comigo à porta do átrio. Disse que não queria perder o pequeno -almoço para vir à assembleia e que tinha muito tempo para chegar aqui depois de comer qual-quer coisa.

— Mas o refeitório está fechado até ao fim da assem-bleia, não está? — perguntou a Laura, curiosa.

— Sim, eu sei — respondeu o Nigel, olhando urgen-temente em redor enquanto o grupo era conduzido aos seus lugares por um guarda de expressão sisuda. — Mas o Franz tem um esconderijo de comida algures e, da última vez que o vi, ia a caminho de lá. Foi há meia hora.

— Onde quer que esteja, é melhor que se despache — disse o Otto. Os últimos alunos entravam no átrio e as equipas de segurança estariam ocupadas a varrer os blocos de alojamento para reunir os retardatários.

— Eu sei — disse o Nigel, visivelmente preocupado. — Tentei avisá -lo de que o castigo por faltar à assembleia é com o coronel Francisco, mas, mesmo assim, insistiu que havia tempo suficiente.

De repente, um foco de luz iluminou o atril vazio diante da estátua gigante do símbolo da L.U.V.A. com o punho e o globo ao fundo do átrio. O lema da L.U.V.A. era claramente visível no pedestal: «FAZ AO PRÓXIMO.»

A assistência silenciou -se e o silêncio foi subitamente interrompido por uma voz sonora atrás deles com sotaque alemão carregado.

— Mas vinha a caminho! — guinchou o Franz enquanto as cabeças dos alunos reunidos se voltavam em uníssono. Continuava de pijama e um coronel Francisco muito irritado fazia -o avançar em direção aos restantes Alfas. A sua cara

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adquiria uma tonalidade escarlate enquanto todos os pre-sentes no átrio começavam a rir e a sussurrar.

— Oh, não — disse o Nigel em voz baixa enquanto o Franz avançava na sua direção.

O Francisco empurrou -o para junto do grupo e curvou--se sobre ele, colocando a sua cara a um par de centímetros.

— Vou gostar muito do tempo que passaremos juntos no castigo, Sr. Argentblum — disse, com um sussurro feroz. — Vou gostar mesmo muito.

O Franz engoliu em seco e empalideceu. Não havia muitos na escola que soubessem, mas o Franz deixara o co-ronel Francisco inconsciente enquanto estava sob o efeito do controlo mental da Condessa. Os seus atos podiam ter salvado o H.I.V.E., mas mesmo assim fora bastante humi-lhante para o coronel. O castigo prometia ser o momento de vingança.

— Faz diferença se pedir desculpa? — perguntou o Franz debilmente.

— Não faz diferença nenhuma — respondeu o coronel com um sorriso maldoso. — Vemo -nos depois das aulas. Espero que goste de flexões.

O Franz gemeu.Todas as cabeças que se tinham virado para assistir ao

espetáculo quando o coronel entrou com o Franz se viraram imediatamente para o palco quando as luzes do átrio dimi-nuíram. O professor Pike posicionou -se atrás do atril e o Otto sentiu uma pontada de desilusão. Esperara secretamente que a assembleia tivesse sido convocada para anunciar o regresso do Nero. Nunca o admitiria a ninguém, mas come-çava a sentir a sua falta. Fora um dos poucos professores que considerara alguns dos alunos, o Otto incluído, como algo

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que se aproximasse de seus semelhantes. O professor pigar-reou, colocou uma mão de cada lado do atril e falou para o microfone.

— Convoquei -vos aqui hoje porque tenho más notícias — começou o professor. — Muitos de vós notaram há algum tempo a ausência do Dr. Nero. Lamento informar -vos que ocorreu uma situação grave, uma situação que torna alta-mente improvável que o Dr. Nero consiga retomar os seus deveres como diretor do H.I.V.E. Acredito que a forma mais fácil de explicar a situação será mostrando -vos um ficheiro de vídeo que recebemos hoje de manhã.

O professor acenou brevemente com a cabeça a alguém de um dos lados do palco e um enorme ecrã na parede sobre o atril iluminou -se de repente e preencheu -se com um símbolo estilizado de um anjo empunhando uma espada, com a palavra ESPERANÇA por baixo. O símbolo desa-pareceu e foi substituído pela face angulosa de um homem com resquícios de cabelo cuidadosamente aparados sobre cada orelha. Olhou a câmara por um momento e começou a falar.

Do local onde se erguia, o professor conseguia ver as caras dos alunos iluminadas pelo brilho do ecrã enorme e, enquanto o homem falava, via as suas expressões mudarem. Em primeiro lugar, a curiosidade foi substituída pela confu-são, seguindo -se o choque, a raiva e, finalmente, o desespero. Aquela sucessão de emoções era -lhe familiar. Fora exatamente o que sentira quando vira o vídeo pela primeira vez.

O Otto mal ouviu os gemidos e sussurros à sua volta enquanto o vídeo terminava e o símbolo da ESPERANÇA voltava a encher o ecrã. Parte da reação era choque, mas outra parte era a fração do seu cérebro sobre a qual

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parecia ter pouco controlo consciente analisando já cen-tenas de cenários diferentes, ponderando os resultados daquele desenvolvimento e criando automaticamente respostas múltiplas para cada um, na eventualidade de serem necessárias. Era algo que sempre fizera, quase sem perceber, mas, no passado, acontecera como reação a um perigo iminente. Independentemente do que pudesse ter pensado acerca daquelas notícias devastadoras, não con-seguia perceber de que forma poderiam constituir uma ameaça imediata.

O professor pediu silêncio erguendo as duas mãos e, lentamente, as centenas de conversas urgentemente sussur-radas que ocorriam por todo o átrio silenciaram -se e ele voltou a falar.

— É claro que isto nos motiva mais perguntas do que respostas, mas posso assegurar -vos a todos de que os recur-sos desta escola e da totalidade da L.U.V.A. são canalizados para encontrar respostas. Tanto quanto sabemos, não há neste momento qualquer ameaça à segurança do H.I.V.E. No entanto, teremos de estar preparados para qualquer eventualidade e espero que cada um de vós dê o melhor para assegurar a normalidade no funcionamento da escola. Haverá oportunidades para discutirem esta situação com os vossos professores durante as aulas. A alteração mais imediata será a nomeação de um novo diretor. Ainda não sei quem ocupará a posição ou quando chegará, mas sei que virá em breve. Não será necessário dizer -vos que espero de todos vós a máxima cooperação e respeito para com o novo diretor.

O professor não precisou de explicar a severidade dos castigos para quem decidisse ignorar aquela instrução.

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— É um dia muito triste para o H.I.V.E. — continuou o professor. — Mas o próprio Dr. Nero disse -me em muitas ocasiões que esta escola é mais importante do que qualquer indivíduo, e seguiremos em frente, tal como ele gostaria que fizéssemos.

Afastou -se do atril e as luzes do átrio voltaram a acender -se lentamente.

O Otto virou -se para o Wing enquanto os guardas co-meçavam a encaminhar os alunos para as saídas. A expres-são do amigo era tão difícil de interpretar como sempre, mas o Otto começava a melhorar o seu talento para identificar as pistas subtis na cara do Wing e reconhecia já os sinais de raiva.

— Não acredito — afirmou o Wing com firmeza.— Também preferia que não fosse verdade, tal como

tu — respondeu o Otto —, mas não teriam mostrado este vídeo à escola inteira se não tivessem a certeza.

— A Raven não permitiria que o Nero fosse capturado — disse o Wing, olhando o Otto nos olhos. Ele passara muitas horas a ser treinado pessoalmente pela Raven em técnicas de combate e tornara -se claro para todos que tinham desenvolvido um elo poderoso entre professora e aluno.

— Sim, tens razão — disse o Otto, baixando a voz. — Teria impedido que acontecesse… Ou morreria a tentar…

O Otto deixou as suas palavras pairarem no ar por um momento. A raiva que vira no Wing foi subitamente subs-tituída por algo muito diferente: a resignação.

— Gostava que houvesse alguma coisa que pudéssemos fazer. Devemos as nossas vidas aos dois.

— Estão bem? — perguntou a Laura enquanto come-çavam a dirigir -se lentamente para a saída.

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— Sim — respondeu o Otto em voz baixa. — Ainda não consigo acreditar.

— Sei como é — disse a Shelby, pousando uma mão no ombro do Wing. — Estás bem, grandalhão?

— Sim — respondeu ele. — Mas gostava muito de encontrar este Sebastian Trent.

— Gostávamos todos — disse o Otto, furioso. — Gos-távamos todos.

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