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DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DA DOCÊNCIA: SENTIDOS E SIGNIFICADOS COMPARTILHADOS EM PESQUISA NARRATIVA Filomena Maria de Arruda Monteiro Universidade Federal de Mato Grosso Resumo O presente estudo faz parte de uma pesquisa maior que vem sendo desenvolvida com o propósito de compreender o desenvolvimento profissional de professores em exercício que atuam no primeiro ciclo em três escolas municipais, concebendo a experiência como um dos contextos formativos diferenciado no processo de tornar-se professor O recorte apresentado neste momento emergiu das análises iniciais na tentativa de explicitar indagações em torno de como os professores que atuam no primeiro ciclo significam e ressignificam o trabalho docente, buscando compreender como suas experiências vividas na docência são percebidas, narradas e como explicam a relação destas com o processo de aprender a ensinar. Nessa perspectiva, fazemos uma aproximação com a pesquisa narrativa (Clandinin e Connelly, 2011), passando a considerar as experiências profissionais e as histórias pessoais dos professores pesquisados, obtidas por meio de relatos orais e escritos no contexto do exercício docente, interrelacionando perspectivas individuais e culturais. Tal aproximação se ancora na busca de encontrar novas formas de estudar o desenvolvimento profissional da docência a partir da “experiência/sentido”, contando e/ou vivendo histórias narrativamente, enfatizando principalmente sua dimensão temporal e relacional, em prol de práticas de formação e investigação socialmente mais justas e de transformações educacionais significativas (Zeichner, 2009). Palavras chaves: Desenvolvimento profissional da docência, pesquisa narrativa, aprendizagem docente Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade EdUECE - Livro 4 00717

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DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DA DOCÊNCIA: SENTIDOS E

SIGNIFICADOS COMPARTILHADOS EM PESQUISA NARRATIVA

Filomena Maria de Arruda Monteiro

Universidade Federal de Mato Grosso

Resumo

O presente estudo faz parte de uma pesquisa maior que vem sendo desenvolvida

com o propósito de compreender o desenvolvimento profissional de professores em

exercício que atuam no primeiro ciclo em três escolas municipais, concebendo a

experiência como um dos contextos formativos diferenciado no processo de tornar-se

professor O recorte apresentado neste momento emergiu das análises iniciais na

tentativa de explicitar indagações em torno de como os professores que atuam no

primeiro ciclo significam e ressignificam o trabalho docente, buscando compreender

como suas experiências vividas na docência são percebidas, narradas e como explicam a

relação destas com o processo de aprender a ensinar. Nessa perspectiva, fazemos uma

aproximação com a pesquisa narrativa (Clandinin e Connelly, 2011), passando a

considerar as experiências profissionais e as histórias pessoais dos professores

pesquisados, obtidas por meio de relatos orais e escritos no contexto do exercício

docente, interrelacionando perspectivas individuais e culturais. Tal aproximação se

ancora na busca de encontrar novas formas de estudar o desenvolvimento profissional

da docência a partir da “experiência/sentido”, contando e/ou vivendo histórias

narrativamente, enfatizando principalmente sua dimensão temporal e relacional, em prol

de práticas de formação e investigação socialmente mais justas e de transformações

educacionais significativas (Zeichner, 2009).

Palavras chaves: Desenvolvimento profissional da docência, pesquisa narrativa,

aprendizagem docente

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Introdução: reflexões teórico-metodológicas

As reflexões oriundas de pesquisas desenvolvidas pelo grupo de Estudos e

Pesquisas em Política e Formação docente, que coordeno na UFMT, são o foco deste

texto. Em trabalhos anteriores, procuramos problematizar processos de

formação/investigação narrados em experiências de formação inicial e continuada

(MONTEIRO et al, 2010). A atual pesquisa vem sendo desenvolvida com o propósito

de compreender o desenvolvimento profissional de professores em exercício que atuam

no primeiro ciclo em três escolas municipais, concebendo a experiência como um dos

contextos formativos diferenciado no processo de tornar-se professor, uma vez que

devem ao mesmo tempo ensinar e aprender a ensinar num contexto complexo “de

descoberta, aprendizagem, adaptação e transição” (MARCELO & VAILLANT, 2009).

O recorte apresentado neste estudo emergiu das análises iniciais da pesquisa em

desenvolvimento na tentativa de explicitar indagações em torno de como os professores

que atuam no primeiro ciclo significam e ressignificam o trabalho docente, buscando

compreender como suas experiências vividas na docência são percebidas, narradas e

como explicam a relação destas com o processo de aprender a ensinar.

Larrosa (2002, p.24) nos propõe pensar a experiência/sentido, ressaltando que é,

sobretudo dar sentido ao que somos e ao que nos acontece. E acrescenta ainda o autor

ser a experiência aquilo que se adquiri no modo como alguém responde ao que lhe vai

acontecendo ao longo da vida e no modo como damos sentido ao acontecer do que nos

acontece. Em outro texto o mesmo autor esclarece que a experiência é um percurso,

uma passagem, é sempre o real singular..., cujo resultado seja a formação ou

tranformação do sujeito da experiência (LARROSA, 2011, p.17).

Assumimos que compreender a experiência de outrem, implica em se colocar ao

lado desta, dialogando com dela, para através da indagação colaborativa possibilitar que

esta seja reconstituída e ressignificada.

Nessa perspectiva, a concepção de desenvolvimento profissional aqui defendida

tem como propósito recontextualizar o profissional docente, o que significa

reconhecermos que o sentido desse processo para os professores vai sendo construído

pelo entrelaçamento das dimensões pessoais/profissionais, dos contextos e demais

aspectos constitutivos da profissionalidade docente, das políticas e práticas formativas

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num movimento permanente de indagação, problematização, experienciação e

ressignificação do exercício docente. Embora esse processo revele tamanha

complexidade e multidimensionalidade, é uma necessidade individual/coletiva e

organizacional que pressupões comprometer-se com uma aprendizagem contínua e com

o desejo “de marcar a vida dos alunos” (DAY, 2001). Significa também, o processo pelo

qual os professores revivem, renovam e ampliam seu compromisso refletindo sobre os

propósitos éticos e morais do ensino, considerando que as conseqüências desses

compromissos se alimentam das experiências. (DAY,2001;CONTRERAS, 2002;

ZEICHNER,2008).

Vaillant & Marcelo (2012) citando Ávalo (2000) ressaltam

[...] Junto ao poder epistemológico dado pelo fortalecimento de seuconhecimento, ser profissional significa poder decidir e influir namudança educacional, quer dizer, contar com poder público... Odesenvolvimento profissional envolve, então, a oportunidade parafortalecer as condições que permitem o exercício de poderprofissional: o que se denomina em inglês deempowerment.(VAILLANT& MARCELO, 2012, p.170)

Em síntese o desenvolvimento profissional está intimamente entrelaçado ao

trabalho docente e suas condições, ás experiências e aprendizagens formativas,

incluindo tomada de decisões para melhoria na prática pessoal/profissional e nos

aspectos organizacionais. É preciso conhecer e compreender todo cenário profissional

para se estabelecer políticas públicas que possam apoiar inovações institucionais,

fortalecendo o trabalho docente.

Em razão disto, reafirmamos que os processos de desenvolvimento profissional

demandam modos mais flexíveis de organização e desenvolvimento do trabalho docente

com foco em um trabalho mais colaborativo, necessidade de tempo e espaço para

consolidação das aprendizagens oriundas de diferentes contextos e formas coletivas de

negociação.

Cabe salientar que há muito para compreendermos sobre os múltiplos

significados construídos pelos professores nesse movimento contínuo e dinâmico que

envolve o processo de desenvolvimento ao longo de sua carreira profissional.

Nesse sentido, é relevante a importância que assume as investigações que

buscam compreender como se dá o processo de aprender a aprender a ensinar, tomando

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como referencia as experiências/aprendizagens vividas no exercício da docência.

Arroyo (2007, p.194) argumenta ser necessário dedicarmos mais tempo a indagarmos

sobre como são vividas as experiências na docência, as tensões e os impasses na

educação, pois saber mais sobre a docência seria um dos saberes mais formativos, seria

o norteador para a conformação do currículo de formação. Ainda nesse sentido,

Rabelo (2011, p.184) enfatiza que resgatar a dimensão do ofício de ensinar é uma forma

de romper com o professorado anônimo, sem nome e impessoal.

Diante das reflexões apresentadas, passamos a olhar a docência como

experiência-saber dotada de sentidos e significados, lugar de produção de subjetividades

e intersubjetividades, num movimento de ressignificação, ancorado pelos

conhecimentos problematizados no entrecruzamento de diferentes culturas em um

contexto específico - a escola, lugar privilegiado de aprendizagem e de desenvolvimento

profissional da docência.

Clandinin & Connelly (1988), enfatizam que o conhecimento prático dos

professores é constituído de um conjunto de convicções e significados que surge tanto

da experiência pessoal como social e que se expressam nas ações, pressupondo uma

relação dialética entre teoria e prática. É um conhecimento que vai sendo construído

pela convergência de várias aprendizagens (dimensão teórica, dimensão experiencial,

dimensão afetiva e outras) à medida que o profissional vai confrontando-as com a

prática real e as internaliza em suas ações. Tais aprendizagens são construídas

inicialmente nas primeiras experiências escolares e acompanham a trajetória

profissional dos professores em vista da natureza dinâmica e complexa dos contextos

em que atuam.

Nesse sentido, Mizukami et al. (2006) tomando como referência diversos

estudos sobre as aprendizagens da docência, destaca alguns pontos importantes que

caracterizam os processos de aprendizagem ao longo das trajetórias dos professores.

Pontos que envolvem a natureza individual e coletiva das aprendizagens, o contexto de

influência da escola, os conhecimentos necessários para a docência, os aspectos

relacionados às práticas e aos conhecimentos da e para a prática, assim como aspectos

relacionados à reflexividade dos professores.

Desse modo, as aprendizagens profissionais dos professores precisam ser

compreendidas a partir de múltiplos contextos e diversas experiências vivenciadas ao

longo dos percursos pessoais e profissionais.

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Os estudos que focalizam a aprendizagem da docência indicam que pesquisadores

como Cochran Smith e Lytle, sugerem que para favorecer o desenvolvimento

profissional é preciso oportunizar aos professores explorarem e questionarem ideologias

e práticas suas e de outros professores. Esse processo de indagação, problematização,

segundo Mezirow (1990, apud VAILLANT& MARCELO, 2012, p. 41) se apresenta

como o processo de interpretar ou reinterpretar o significado de uma experiência.

Nesse sentido, do diálogo entre os pressupostos teórico-metodológico, nasce

nossa opção metodológica numa aproximação com a pesquisa narrativa (CLANDININ

E CONNELLY, 2011), passando a considerar as experiências profissionais e as

histórias pessoais das professoras pesquisadas, obtidas por meio de relatos orais e

escritos no contexto do exercício docente, interrelacionando perspectivas individuais e

culturais. Tal aproximação se ancora na busca de encontrar novas formas de estudar o

desenvolvimento profissional de professores a partir da “experiência/sentido”, contando

e/ou vivendo histórias narrativamente, enfatizando principalmente sua dimensão

temporal e relacional, em prol de práticas de formação e investigação socialmente mais

justas e de transformações educacionais significativas (Zeichner, 2009).

Retomando os argumentos de Clandinin e Connelly (2011, p.99), estes

apontam para a necessidade de se “negociar relacionamentos, propósitos, transições e

modos de ser útil”, visto que o que se busca é a interpretação/compreensão das

experiências enquanto fenômenos historiados e narrados conforme as significações de

quem narra. Esse é um processo que além de complexo exige um tempo de aproximação

que pode ser longo, implicando negociação e colaboração com as escolas envolvidas. A

interação e a colaboração entre pesquisador e participantes ao longo da pesquisa, é

condição essencial, visto que nesse processo relacional o pesquisador passa a ser parte

do fenômeno em estudo e das experiências historiadas. Para Day (2005, p. 232), a

colaboração supõe uma negociação cuidadosa de confiança e comunicação eficaz, em

que ambas as partes são aprendizes em um contexto reforçado pelo diálogo profissional.

Por isso, concordamos com Rabelo (2011, p. 177) ao salientar que a interação entre

investigador e participante guia um contar e recontar mútuo e colaborativo, pois a

narrativa é uma interpretação da pessoa que será também interpretada por nós e somente

através dessa interpretação podemos fazer jus ao mundo cultural. Assumimos um

comprometimento cada vez maior com as experiências narradas.

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Assim, a imersão na escola e o diálogo com as experiências, aprendendo a

trabalhar colaborativamente num contexto marcado por tensões, desafios e

possibilidades, nos fez reconhecer que essa opção metodológica colocava em confronto

algumas de nossas concepções como professores/formadores/pesquisadores. Ao mesmo

tempo demarcava um quadro de referências que permitia caracterizar e compreender a

complexidade dos processos de aprender a aprender a ensinar em uma revalorização

epistemológica da experiência (NÓVOA, 1995). Desse modo, as narrativas obtidas

nesta pesquisa revelam, num esforço interpretativo, essa tentativa de elucidar as

explicações das intenções do que fazem ou tentam fazer naquele contexto específico.

Diálogos compartilhados sobre as experiências/aprendizagens vividas na docência:

Neste tópico apresentamos como fomos compondo o estudo narrativamente,

procurando entrelaçar contextos, tempos, aprendizagens, experiências e significados

resultantes das narrativas produzidas nas escolas durante o ano de 2013.

Compor textos de campo significa estar alerta para as coisas que osparticipantes fazem e dizem como parte de sua experiência em curso eisso significa manter registros sobre como eles vivenciam aexperiência de estar na pesquisa. Os participantes também têmsentimentos e pensamentos sobre a pesquisa. (CLANDININ &CONNELLY, 2011, p.128)

Os contextos escolhidos para desenvolvimento da pesquisa foram três escolas

municipais que possuíam apenas o 1º Ciclo, atendendo alunos na faixa etária de 6 a 9

anos. A pesquisa será desenvolvida ao longo de quatro anos, tendo iniciada nas escolas

no primeiro semestre de 2013. Os encontros aconteciam nos momentos de formação

definidos pelas respectivas escolas e denominados Roda de Conversa, momento

destinado a formação na unidade educativa e prevista no calendário escolar. Constitui-se

em momento para o estudo coletivo, em consonância com a política da SME segundo a

qual

A formação dos profissionais da educação está prioritariamentecentrada na escola, e se constituirá em um processo de estudos ereflexões contínua visando o fortalecimento da consciência coletivados profissionais, o fortalecimento da autonomia, da identidadeprofissional, bem como o desenvolvimento de conhecimentos desaberes essenciais ao exercício da prática educativa (CUIABÁ, 2008,p. 22).

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Os professores que estão em exercício nas turmas regulares do 1º ciclo das

escolas pesquisadas, abrangem um total de cinquenta e sete, destes vinte e quatro são

principiantes (possuem de 2 meses a cinco anos de experiência) e trinta e três

experientes (exercem a docência a mais de seis anos) conforme mostra tabela abaixo:

Distribuição dos professores em Principiantes e Experientes

Escolas Total de Professores Nº de ProfessoresPrincipiantes

Nº de Professores Experientes

A 18 05 13

B 22 11 11

C 17 08 09

Total 57 24 33

Fonte: Dados organizados com base no levantamento feito nas escolas.

Todos possuem formação em nível superior e a maioria desses professores

continuou os estudos em cursos de pós-graduação, o que demonstra que estes estão

imbricados em um processo de busca do conhecimento e de formação continuada. Das

três escolas, a escola A apresenta um número elevado de professores experientes e as

demais (B e C) possuem um corpo docente dividido equilibradamente entre professores

principiantes e professores experientes. Encontramos também, dentre os professores

principiantes, um elevado número de contratados. Vale ressaltar, no entanto, que a

passagem da fase de principiante para experiente requer muito mais do que o passar do

tempo, pois implica na construção de uma “cultura profissional em ação”, possibilitando

ao professor a construção de repertórios que lhe auxiliam a como lidar com a

improvisação.

Dada à extensão do estudo, as análises narrativas realizadas consideram cada

escola como estudos de caso com suas situações particulares, composto por um

conjunto de textos de campos com descrições dos contextos, acontecimentos, eventos e

pelas narrativas dos professores coletadas em diferentes momentos, produzindo a

análise “historiada”. Ou seja, o encontro da narrativa partilhada e ressignificada do

participante e do investigante (CLANDININ E CONNELLY, 2011).

Como não é possível, no escopo deste artigo, trazer a análise detalhadas dos

vários relatos narrativos obtidas para comporem o estudo, nossa opção foi por destacar

primeiramente excertos da “narrativa de apresentação” de um grupo de professores

iniciantes. Tal narrativa foi proposta com intuito de estabelecer o dialogo colaborativo

inicial entre participante e investigante nas escolas pesquisadas, aqui identificadas pela

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inicial do professor (P), seguida pela identificação da escola (A, B ou C) numa

sequência numérica. Posteriormente evidenciaremos os relatos de entrevista de uma

professora iniciante que atua na escola B, por sinalizarem um contexto diferenciado e

significativo articulado a um trabalho mais coletivo, com sentidos e significados

potencializadores sobre fazer e saber .

a) O que professores tem a nos dizer sobre a docência:

Nas narrativas de apresentação os professores afirmam gostar do que fazem, se

identificando com o trabalho realizado com as crianças, destacando a dimensão afetiva

nesse processo. Mostram também dificuldades próprias da docência nos anos iniciais do

ensino fundamental, visto às especificidades requeridas ao profissional nessa etapa.

Gosto do que faço e tenho prazer em ensinar através da didática com a ludicidade. (PB1)Embora eu seja iniciante eu amo muito o que faço. (PB3)Minha jornada de trabalho é um tanto cansativa devido a distância entre as duas escolas, mas a paixão quetenho pela educação e a vontade de ver mudanças na mesma é o que me motiva a levantar-me as quatroda manhã e tomar dois ônibus para estar aqui. (PC1)Amo minha profissão apesar dos percalços, mas as crianças são minha inspiração para desempenhar omeu trabalho. (PC2)Nesta escola estou com uma turma de segundo ano e a experiência de alfabetizar tem sido desafiadora egratificante. (PC3)

Day (2005, p.30), citando Michael Eraut (1995), afirma que a responsabilidade

moral e profissional dos docentes devem constituir a principal motivação para seu

desenvolvimento profissional . O referido autor aponta, ainda, que o desenvolvimento

profissional deve considerar a “apaixonada vocação” dos professores, mantendo a sua

motivação e entusiasmo para construir o processo de “comportar-se como

profissionais” durante toda a carreira. Ao destacarem o prazer, o amor, a paixão, a

inspiração e a gratificação os professores participantes da pesquisa parecem se

aproximar dessa “apaixonada vocação” como elemento motivador, citada pelo autor.

Embora fosse solicitado aos professores que se apresentassem compartilhando

aspectos de suas histórias, experiências, aprendizagens, reflexões e também dúvidas,

questões, etc., alguns acrescentaram suas perspectivas de futuro articulando

temporalmente à sua condição no presente. Marcam tempos e temporalidades diferentes

Pretendo continuar meus estudos construindo e enriquecendo cada dia mais meu conhecimento. (PC1)Estou realizando metas que propus desde a minha formação e só agora estou conseguindo fazer umaespecialização. (PC2)

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Como profissional da educação procuro dar o melhor de mim pesquisando o tema a ser trabalhado antesde levar para a sala de aula e estou sempre procurando aprender mais para obter o bom resultado nestaminha profissão. [...] estou procurando sempre buscar conhecimento. (PB3)Como professora procuro descobrir as várias maneiras para ajudar meus alunos, buscando também comos colegas mais maduros na profissão experiências que deram certo, que me ajudam a direcionar a minhapratica pedagógica. (PB2)

Day (2005) ressalta que os professores são sujeitos ativos e precisam estar

preparados para cumprir os fins educativos devendo demonstrar compromisso e

entusiasmo frente à aprendizagem contínua. O autor adota um conceito de

desenvolvimento profissional que inclui a aprendizagem a partir da experiência, que

pode ser individual e sem ajuda externa ou da partilha de experiências dos seus pares.

Tais aprendizagens tendem a desencadear processos de reflexão e

ressignificação de crenças, valores, percepções e compreensões acerca do “ser

professor”. Isso implica também em significativos processos de ressignificação

identitárias (NÓVOA, 1995; ZEICHNER, 2009).

b) Compondo sentidos e significados iniciais sobre aprender a ensinar

As narrativas da professora iniciante refletem os sentidos construídos na

experiência como lugar de criação do possível, significada a partir das relações

estabelecidas entre as tensões e os desafios enfrentados no contexto específico de

inserção profissional ao mesmo tempo em que vai ampliando, negociando e

ressignificando esse lugar no cotidiano escolar, e igualmente, apontando alternativas

compartilhadas no fazer docente.

Eu passei no concurso agora, assumi em 2011. Porque o que eu ouvia na rede é que as pessoas se fechame não sei nem por que direito, eu não sei explicar, mas, elas se fecham né, minha sala, meus alunos,minhas lembrancinhas... num individualismos muito grande. Então a gente soube articular isso aquidentro da escola e a coordenadora também conseguiu fazer essa articulação com os professores queestavam aqui, entendeu? Com os novos e com aqueles que tinham uma experiência, então deu certo.

No cotidiano a gente continua tentando desenvolver uma prática em conjunto... é o planejamento emconjunto, mas eu já to vendo outras necessidades né, porque se tratando de ciclo a gente vai ter váriosencaminhamentos dentro da sala, várias outras necessidades.Eu senti esse ano que só o planejamentocoletivo não dá um suporte, para direcionar a questão de conteúdos a se trabalhar.... a questão de projetos,isso ai eu acho que ele atende bem, a gente consegue atingir com um planejamento coletivo, mas oplanejamento de uma escola em ciclo exige muito do professor...., então eu sei que se eu chegar lá semalguma coisa pensada, vai ser complicado...

Acho que errei muito, é muito difícil não trazer a nossa vivência... teve dia de não render quase nada, dechegar em casa desesperada, principalmente porque a tarde eu conseguia desenvolver o que tinhaplanejado e de manhã não ia de jeito nenhum... vai chegando a quinta a sexta feira e você já está esgotadatem vez que não rende mais não dá, é incrível.... vejo a necessidade de ter outras estratégias, como osjogos... é do terceiro bimestre pra cá que eu comecei a achar os meios para começar a lidar com cada um,extremamente complicados...a sala de aula é uma caixinha de surpresa, não da para gente prevê. Porque é

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lá que a gente sente o reflexo de muitas coisas...todas as coisas que acontecem chegam lá na sala, entãoesses encaminhamentos são difíceis... durante o ano você vai sofrendo várias angustias (risos). Mas nãotive medo, porque eu sabia que se a coisa ficasse muito crítica alguém ia me socorrer (risos), esse é umponto muito positivo nesta escola. Se você não tiver quem te apóia aqui dentro, se for uma escola maior,com mais dificuldade de apoio, sofre. Eu tenho necessidade ainda de formação continuada, ela deveexistir.... o que é sempre significativo para o professor, pelo menos para mim, é ver esses avanços, essasaprendizagens, esse desenvolvimento das crianças.

Em se tratando do cenário institucional, diferentemente do que ocorreu com

outras professoras iniciantes das demais escolas pesquisadas, esta professora iniciante

enfatiza como um dos aspectos formativos e significativo, a qualidade das relações

estabelecidas com colegas de apoio permanente, o que passou a ser uma fonte de

desenvolvimento profissional. Ou seja, a existência de momentos contínuos de apoio e

partilha colaborativa de situações a serem enfrentadas no cotidiano da sala de aula

contribuíram significativamente na constituição do processo de aprender a ensinar dessa

professora. Entretanto, esse cenário institucional também é narrado como complexo,

com contradições, tensões e conflitos.

No que se refere à sala de aula, percebe-se que para a professora esta é

enfatizado como sendo o lugar privilegiado da docência, de reconhecimento e

legitimação profissional. Ao relatar como pensa a docência emergem dificuldades

relacionadas com os alunos e com a gestão do trabalho escolar, dificuldades que

parecem impossíveis de serem antecipadas. Já o tempo é revelado como um dos

aspectos que muito interferiu no fazer dessa professora quando declara “durante o ano

você vai sofrendo várias angustias”. Um tempo vivido em constante instabilidade e

insegurança, de reorganizações freqüentes à realidade. As situações de dificuldades,

muito embora perturbadoras do fazer profissional, tornaram-se, para esta professora,

um desafio, conduzindo à reflexão e à tentativa de resolução dos problemas, passando

a ser potencializador do desenvolvimento pessoal/profissional. Por outro lado, ao longo

desse tempo, podemos notar que a professora vai deixando aquela situação inicial de

instabilidade ao ir confrontando-se com a necessidade de ressignificar as aprendizagens

advindas de contextos formativos diversos, os seus desejos e as suas concepções

relativas à realidade, apontando que a ressignificação do exercício profissional não se

dá de forma imediata. Pacheco e Flores (1999) por sua vez, destacam a forte influência

das primeiras experiências de ensino na trajetória do professor iniciante que implica

num processo de reanálise e ressignificação de suas crenças inicias e práticas e

consequentemente uma redefinição de sua identidade profissional. Assim, aponta para

a necessidade do processo de inserção profissional centrar no desenvolvimento da

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construção das identidades docentes através de uma articulação entre biografia pessoal,

prática reflexiva, apoio dos pares e uma conscientização crescente do contínuo

desenvolvimento profissional.

O desenvolvimento do sentimento de pertença ao grupo e da identidade profissional não

é um processo linear e sim um lugar de lutas e de conflitos e de construção de maneiras

de ser e de estar na profissão (Nóvoa, 1992). É nesse processo de desenvolvimento do

sentimento de pertença e da identidade que cada um se apropria do sentido da sua

história pessoal/profissional , reconstruindo identidades, para assimilar mudanças, novas

perspectivas, inovações,(ibdem). Por isso as percepções narradas pelas professoras

sobre o seu próprio desenvolvimento revelaram-se essenciais para a construção desse

processo.

Percebemos que a professora destaca um ponto importante para compartilhamento de

sentidos sobre o processo de aprender a ensinar: o pensar sobre o que se vai fazer é

necessário, mas com isso novas indagações se colocam, novos percursos deverão ser

trilhados. No final de sua fala, declara que o que é significativo para o professor é ver o

avanço de seus alunos, revelando sua satisfação pessoal e profissional, consubstanciadas

numa experiência profissional positiva. Além disso, seu relato está enredado por uma

política curricular e educativa. E revela acreditar na política de formação continuada

como possibilidade de desenvolvimento profissional quando diz “Eu tenho necessidade

ainda de formação continuada, ela deve existir...”

Algumas palavras finais ainda que provisórias

A dimensão colaborativa da pesquisa compartilhada no cotidiano das escolas

tem possibilitado a compreensão sobre alguns aspectos do emaranhado de

complexidades que envolvem o processo de aprender a aprender a ensinar tanto para os

participantes quanto para os investigantes. Esse diálogo com diferentes processos de

desenvolvimento profissional construído em diferentes escolas, requerendo processos

formativos diferenciados, tem nos apontado a necessidade de considerarmos nessa

trama de complexidade, o entrelaçamento das várias dimensões: pessoais, institucionais,

organizacionais, bem como das diretrizes de políticas públicas.

Por outro lado, as narratividades vêm provocando algumas reflexões e ações

para que os professores não só passem a acreditar em suas práticas, mas especialmente,

nas tomadas de decisão para suas intervenções no processo de aprender a ensinar. Ou

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como afirma IMBERNÓN (2010), para que os professores percebam que são capazes de

construir, a partir de suas próprias experiências, um conhecimento profissional docente

teoricamente.

Por fim, na tentativa de ressignificar também esse processo para nossos

percursos como investigantes, temos procurado nutrir nossas experiências de forma

mais ampla, tentando nos deixar atravessar por aquilo que investigamos.

Referências Bibliográficas

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AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E INSTITUCIONAIS E SUAS

RELAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL

DOCENTE NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

Ilma Passos Alencastro Veiga

UniCEUB-UnB

Introdução

O excesso dos discursos faz lembrar o final do século XIX, quando osprofessores eram investidos de todos os poderes (até o de ganharguerras), mas, nessa época, havia um consenso social em torno damissão dos professores. Hoje, não há. E o excesso de discursos tende,apenas, a esconder a pobreza das políticas (NÓVOA, 1999, p.14).

As colocações de Nóvoa referenciam a importância política, social e pedagógica

do tema escolhido para o presente estudo. O desenvolvimento profissional não é um

tema novo, sempre esteve em evidência nas discussões políticas e nos programas

oficiais. A partir da década de 1990, os docentes de forma geral, e em particular os da

educação superior, ficaram em evidência no que diz respeito à falta de formação ou

formação inadequada, à desvalorização financeira, ao desprestígio social, à dificuldade

em lidar com uma população estudantil heterogênea em virtude da democratização do

acesso à educação superior, entre outros motivos.

Neste estudo, procuro compreender as relações entre as políticas educacionais e

institucionais e o desenvolvimento profissional docente na educação superior.

Inicialmente, apresento a concepção de desenvolvimento profissional docente. Na

segunda parte, tenho como foco o ciclo de políticas, baseada nas ideias de Ball (2004-

2006) e Mainardes (2006-2007). Na terceira, situo a proposta de formação docente

concretizada por instituições de educação superior e suas articulações com os ciclos de

políticas. Na parte final, procuro vislumbrar possíveis rumos para o desenvolvimento

profissional de docentes da educação superior.

1- Desenvolvimento profissional docente para a educação superior

Parto do pressuposto de que o processo de desenvolvimento profissional vai

mais além da formação inicial e continuada de docentes para a educação superior,

capazes de compreender sua atuação profissional no contexto em que estão inseridos,

contribuindo para a inovação da prática pedagógica. O desenvolvimento profissional

docente, no meio acadêmico, constitui-se como uma área de pesquisa que apresenta

expressiva preocupação, tendo em vista a relevância de se desenvolverem ações

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EdUECE - Livro 400730

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formativas direcionadas para as dimensões pessoais, profissionais e organizacionais da

profissão docente (NÓVOA, 1992).

É também compreendido como um processo individual e coletivo que se

concretiza no espaço-tempo de trabalho do professor, contribuindo para a apropriação e

ou revisão de concepções e práticas (VEIGA et al., 2012). O conceito de

“desenvolvimento” tem conotação de processo em continuidade, evolução, movimento.

Para Imbernón (2005), o termo desenvolvimento supera a tradicional justaposição entre

a formação inicial e continuada dos professores. Como processo contínuo e coletivo, o

desenvolvimento profissional não se conclui. A proposta colaborativa favorece a

constituição de culturas inovadoras coletivas e compartilhadas que contribuem para

revitalizar os processos de ensinar, aprender, pesquisar e avaliar na educação superior.

Cruz (2006, p.145) chama a atenção para o objetivo primordial do

desenvolvimento docente “[...] melhorar a habilidade dos professores para pensar; para

ele o desenvolvimento do curriculum não somente deverá conhecer seu conteúdo, mas

também adquirir habilidade para planejá-lo”. Dessa forma, a compreensão do

desenvolvimento profissional dos docentes como um processo contínuo e planejado

significa entender que a formação abarca a trajetória do professor em exercício na

educação superior. Trata-se de uma proposta sistemática de um programa voltado para a

melhoria da ação docente, por meio do desenvolvimento teórico e da investigação da

prática. Benedito, Ferrer e Ferreres (1995, p.311) destacam o entendimento de

desenvolvimento profissional no trecho, a seguir:

[...] qualquer projeto de melhorar a prática, crenças e conhecimentosprofissionais, com o propósito de aumentar a capacidade docenteinvestigadora e da gestão. Este conceito inclui o diagnóstico dasnecessidades atuais e futuras de uma organização e seus membros, e odesenvolvimento de programas e atividades para satisfação destasnecessidades.

Os autores compreendem que o processo de desenvolvimento profissional

docente engloba desde os momentos iniciais de ingresso na atividade docente. O

processo é coletivo, integrado, institucional e planejado, tendo como foco a ação

profissional. Um projeto institucional e integrado implica dar voz aos professores e

torná-los autores da proposta de formação que abre espaços para o diálogo. O programa

de desenvolvimento profissional que ocorre no espaço formal da instituição, “[...] além

de responder às necessidades institucionais, precisa também ter uma visão de conjunto,

tanto dos indivíduos participantes e alvo de formação, como da sociedade globalizada”.

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EdUECE - Livro 400731

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(VEIGA et al., 2012, p.133). Vale ressaltar que desenvolvimento profissional nessa

perspectiva envolve a formação, a profissionalização, estabelecendo entre elementos

uma relação dialética.

As concepções abordadas não só enfatizam a função educativa e formativa,

como envolvem a melhoria das condições de trabalho, a remuneração, o plano de

carreira para destacar alguns elementos mais comuns que devem ser incorporados no

desenvolvimento profissional docente. Isto significa que o desenvolvimento não se

reduz à melhoria do trabalho pedagógico, mas vê o processo como algo voltado para o

institucional como um todo. Ele se refere à teoria e à prática, está relacionado com as

questões gerais da profissão. É uma concepção mais ampla, que visa à melhoria da

profissão, do profissional, do institucional e do contexto social onde o professor está

inserido.

2- Breves considerações sobre o ciclo de políticas educacionais

A opção pela abordagem do ciclo de políticas foi motivada pela importância dos

diferentes atores na produção, interpretação e implementação das políticas; as possíveis

interpretações dos textos da política; a necessidade de articular as políticas com o

desenvolvimento profissional docente. A abordagem do ciclo da política é constituída

de três contextos: de influência da política, de produção da política (textos) e da prática

ou efeitos das políticas aos quais se agregaram posteriormente mais dois contextos: o

dos resultados e o da estratégia política.

Considero que o ciclo de políticas, apresentado por Ball (2006), em especial os

três primeiros contextos, possibilitam a reflexão sobre as relações entre políticas

institucionais e o desenvolvimento profissional docente.

Conforme Ball (2006), o contexto da influência política abrange grupos de

interesse que procuram formular as políticas, elaborar os discursos, momento em que a

agenda é organizada. A política recebe influência das ideias e do contexto em que foi

produzida, no âmago do contexto institucional, momento em que a Instituição de Ensino

Superior (IES) formula a política institucional e desenvolvimento profissional docente

com participação de seus atores (professores, gestores, tutores, assessores,

funcionários), definindo finalidades, metas, objetivos a serem atingidos.

O segundo contexto, o da produção das políticas, contempla os textos

institucionais. São geralmente textos complexos que assumem várias formas, tais como:

discursos, pronunciamentos, textos normativos, legais, formais que precisam ser

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(re)interpretados. Esses textos são identificados como padrões discursivos e são produto

de acordos realizados em diferentes esferas administrativas. A produção de textos

políticos é que dá forma à “política de fato”, como explicita Mainardes (2007, p.27). Do

ordenamento legal e normativo no âmbito institucional, destaco os seguintes

documentos: Estatuto e Regimento, Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI),

Proposta Pedagógica Institucional (PPI), Projetos Pedagógicos de Curso (PPC),

Programa de Desenvolvimento Profissional, portarias e informativos diversos.

O terceiro momento do ciclo é o contexto da prática ou efeitos da política.

Nesse momento, os textos políticos são (re)interpretados com suas contradições,

consequências e efeitos. É nesse contexto da prática que os professores, especialistas e

outros fazem a leitura dos textos com base em suas experiências, valores, objetivos,

necessidades sentidas e detectadas. É o momento da implantação da política. Para

efetivar as políticas propostas, a Instituição implanta o Núcleo de Assessoria

Pedagógica, acompanha sua execução e avalia para colher os efeitos do processo de

desenvolvimento profissional docente. A instituição educativa procura estabelecer

pontos, aspectos que sirvam de base para analisar os efeitos da proposta de

desenvolvimento profissional docente. No contexto da prática, “[...] os educadores são

influenciados pelo discurso da política; contudo, a leitura diferenciada dos mesmos

pode conduzir a consequências não práticas pelos reformadores e levar a implicações

práticas diferentes” (SHIROMA et al., 2005, p.434).

3- O ciclo de políticas e o desenvolvimento profissional docente: análise de uma

proposta institucional

Para exemplificar o movimento do ciclo de políticas institucionais e a relação

com o desenvolvimento profissional docente, considero relevante a análise de um

Programa implementado por uma Universidade Comunitária. Para tanto, busco suas

origens, pressupostos, objetivos e práticas, clarificando suas possibilidades formativas e

investigativas.

O ciclo das políticas ocorre também no plano das instituições de educação

superior. Estas não são isentas das influências internacional e nacional. Nesse contexto,

os efeitos da globalização sobre a mudança organizacional são de larga extensão e

ambíguas. As instituições sofrem pressões para atingirem sua missão, suas finalidades

para que sejam empreendedoras e promovam a inovação que as garanta como

sustentáveis.

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A presença de agências internacionais de auxílio financeiro e de cooperação

técnica destacou-se na sociedade brasileira; as mais diretamente ligadas à educação são

o Banco Mundial (BM) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência

e a Cultura (UNESCO). Esses atores, isto é, as agências multilaterais desenvolveram

uma série de ideias e discursos que marcaram a agenda do governo brasileiro para a

educação, com ênfase na política neoliberal. A universidade incorpora a lógica

empresarial tanto em sua estrutura de poder como na organização do trabalho docente,

incluindo-se aí os processos avaliativos institucionais e externos. O Estado avaliador

segue orientações dos organismos internacionais, instituindo, assim, a avaliação

centralizada e controladora para os diversos níveis educacionais do país. A tecnologia,

as inovações e a produção de ciência fazem parte do movimento para o crescimento

econômico. A educação é subordinada à economia mediada pelas influências das

políticas. A universidade, como instituição educativa, e os docentes também sofrem os

impactos das mudanças oriundas de documentos, resoluções, pareceres internacionais e

nacionais. Nesse sentido, a universidade precisa estar atenta ao alerta feito por Goergen

(2002, p.71):

As incertezas que afligem a universidade não são apenasinstitucionais. Os próprios docentes universitários, como não poderiadeixar de ser, encontram-se envolvidos nessa crise de identidade.Invadem-nos incertezas a respeito do que somos, do que e comodevemos ensinar, de quais temas devemos privilegiar em nossaspesquisas, a serviço de quem estamos ou deveríamos estar.

O desenvolvimento profissional docente encontra-se em uma situação complexa

que exprime as tensões, conflitos e contradições da sociedade. De um lado, estão as

propostas que visam à adaptação da universidade às orientações hegemônicas; de outro,

a concepção reducionista de docência e distante das dimensões epistemológicas e

humanas da profissão. O ordenamento legal e normativo no âmbito nacional é: a

LDBEN nº 9394/96 que, em seu art. 66, se refere à formação docente da educação

superior da seguinte forma: “A preparação para o exercício do magistério superior far-

se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e

doutorado”.

O amparo legal para o processo de formação de docentes para a educação

superior é bastante tímido. O docente, de acordo com o ordenamento legal, será

“preparado” e não formado. O parágrafo único do art. 66 reconhece o notório saber,

título concedido por universidade com curso de doutorado em área afim e sem formação

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pedagógica. O art. 67 enfatiza a valorização dos profissionais de educação ao assegurar-

lhes por meio de estatutos e planos de carreira do magistério público progressão

funcional, período reservado a estudos, condições adequadas de trabalho e outros

elementos necessários à valorização profissional.

O Decreto nº 2.207/97, que regulamenta o Sistema Federal de Ensino, determina

que as instituições de ensino superior, no segundo ano de sua existência, tenham seus

professores titulados na pós-graduação stricto sensu, estabelecendo o percentual de

mestres e doutores até o oitavo ano. Os programas de pós-graduação voltam-se para a

formação de pesquisadores em seus campos científicos e sem exigência quanto à

formação pedagógica de professores. A CAPES, em 1998, instituiu para bolsistas de

mestrado e doutorado os estágios de docência ou docência orientada e, muitas vezes,

sob a coordenação de um professor-tutor sem formação pedagógica. A resolução nº 3/99

do Conselho Nacional de Educação (CNE) exige a oferta de uma disciplina sobre

Metodologia do Ensino Superior ou outra terminologia nos cursos de pós-graduação

lato sensu.

Assim, o desenvolvimento profissional docente fica a cargo das iniciativas

individuais e dos regimentos das instituições responsáveis pela oferta de cursos de pós-

graduação. Veiga (2006, p.91) afirma que

[...] O Governo (MEC/SESU/CAPES/INEP) determina os parâmetrosde qualidade institucional, e muitas instituições de educação superiororganizam e desenvolvem um programa de preparação de seusdocentes, orientados por tais parâmetros.

Fica evidente que as políticas públicas não estabelecem diretamente orientações

para o desenvolvimento profissional do professor da educação superior. Não existem

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores de Educação

Superior, nem Pareceres ou Resoluções voltadas para o desenvolvimento profissional de

docentes para esse nível de ensino, de forma mais ampla e mais exigente.

Esclareço que as influências internacionais e nacionais, apresentadas no item

anterior e retiradas de documentos oficiais, são pontos de partida para a compreensão

das influências políticas no tocante ao tratamento legal que se tem dado à educação e,

em particular, à educação superior.

3.1- O ciclo de políticas e a proposta institucional de uma Universidade

Comunitária

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400735

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Para analisar o processo de desenvolvimento profissional docente da educação

superior, optei pela abordagem do ciclo de políticas por reconhecer os atores e grupos

de interesses que disputam e influenciam na definição da política; os discursos e a

produção de textos, no caso, a proposta de desenvolvimento profissional docente; o

contexto da implantação da política, ou seja, o da prática.

O contexto da influência da política no âmbito institucional torna evidente que

ela é parte de uma totalidade maior em que devem ser pensadas as influências

internacionais e nacionais. A política pública posta à educação brasileira pelas

agências/atores multilaterais, brevemente discutidas no item anterior, articulou com os

ditames neoliberais. A influência internacional ressoou nas proposições nacionais e,

consequentemente, no âmbito das instituições de ensino superior, como, por exemplo,

na formação sob a perspectiva da pedagogia das competências e na concepção

mercadológica. A política institucional para tratar do desenvolvimento profissional do

corpo docente foi desencadeada pela influência e visão do reitor à época que propôs a

criação do Núcleo de Pedagogia Universitária (NPU), como espaço formativo e

investigativo.

O contexto da produção das políticas em nível institucional é o momento que

dá forma à política, gerando textos que servem de suporte para que, posteriormente,

sejam colocados em prática a fim de serem trabalhados. Para exemplificar o movimento

da produção da política institucional, considero necessário explicitar os documentos

legais que orientaram o processo de desenvolvimento profissional docente, tais como o

Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), a Proposta Pedagógica Institucional

(PPI) e os Projetos Pedagógicos de Curso (PPC), entre outros.

O Núcleo de Pedagogia Universitária teve como um de seus pilares principais a

influência de uma política institucional para tratar da formação do corpo docente,

oferecendo condições necessárias ao trabalho. Esse programa de formação funcionou

desde 1992, instituído por meio da Resolução nº 004/92, do Conselho Universitário

(CONSUNI).

[...] acompanhando o movimento que ocorre no Brasil e emoutros países, veio implementando algumas ações no sentido depossibilitar a qualificação pedagógica de seus docentes (PPP,1999, p.11).

Foi um programa institucional desenvolvido de 1992 até fevereiro de 2010. O

NPU, em seus vários projetos e atividades, produziu diferentes políticas institucionais,

como ter um caráter permanente para romper com o didatismo, ser um processo de

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mudança de práticas conservadoras de formação docente, destinar recursos financeiros,

materiais, físicos e humanos para sustentar as condições necessárias ao funcionamento

do Núcleo.

A primeira característica do Núcleo é partir da prática, da aula analisada como

espaço e tempo da produção de conhecimentos. Outra característica importante é o

fortalecimento das dimensões epistemológica, pedagógica e política. São dimensões

básicas do processo de desenvolvimento profissional docente. Entre as

intencionalidades definidas pelo NPU, destaco:

a) planejar, coordenar e realizar ações voltadas para a qualificação pedagógica dos

professores da IES;

b) articular diretrizes e ações de qualificação pedagógica com os demais programas

institucionais, particularmente com o Programa de Avaliação.

Não é possível compreender as intencionalidades expressas nos documentos do

NPU, de forma compartimentada e estanque. São intenções que se entrelaçam.

Em fevereiro de 2010, foi criado o Programa de Formação de Professor,

vinculado à Pró-Reitoria Acadêmica, visando contribuir para o desenvolvimento

profissional do corpo docente da Universidade. O Programa tem sua origem nos

fundamentos teórico-metodológicos do NPU, assumindo as atividades já programadas.

Por um período de crise institucional, o NPU passou por um processo de redução em

alguns aspectos. Novos ordenamentos legais foram produzidos no sentido de organizar

o Programa. Uma das orientações normativas é o acompanhamento de professores

iniciantes. O assessoramento como “[...] um ato de intervenção para o que está em crise

ou o que escapar à ordem, no sentido terapêutico, é uma possibilidade” (VEIGA, 2012,

p.179).

Percebi que o Núcleo de Pedagogia Universitária (NPU), na prática,

implementou vários projetos, atividades e avaliou qualitativamente o ensino de

graduação. Vale destacar os objetivos atingidos:

envolver professores na pesquisa e na reflexão do processo de

desenvolvimento de suas práticas pedagógicas;

inserir inovações no campo da didática e da avaliação;

assumir um novo paradigma epistemológico e não ficar só na questão

metodológica;

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EdUECE - Livro 400737

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melhorar o desempenho na sala de aula, o que resultou em boas avaliações

institucionais e do MEC;

propiciar avanço importante no desempenho do professor.

Pelo exposto, o NPU procurou ir além das respostas prontas, oferecendo ao

docente a possibilidade de pensar sua prática a fim de tomar consciência de sua

profissão. Para atingir tais objetivos, os assessores pedagógicos assumiram um papel

fundamental ao se colocarem na posição de um interlocutor, de um assessor ou de um

tutor qualificador que acompanharam e avaliaram o processo de desenvolvimento

profissional docente.

O Programa de Formação de Professores, ao assumir as intencionalidades e os

fundamentos teórico-metodológicos do NPU, toma-os como marcos de referência para

avaliar, definir prioridades, propor e desenvolver ações formativas, tais como:

Seminário de formação para a docência; Seminário de formação pedagógica para

atuação na educação a distância; Seminário de tecnologias de formação; Seminário de

capacitação pedagógica para docentes; Minicursos de processos cognitivos e aplicação

em sala de aula. Do ponto de vista da responsabilidade institucional, há um

compromisso por parte dos assessores e docentes em formação, com o objetivo de

melhorar a qualidade da educação superior em fase de expansão e reconstrução.

Continuando as referências quanto ao Programa de Formação de Professores,

apresento a trajetória formativa visando à constituição da identidade pessoal,

profissional e institucional. A proposta contempla os seguintes aspectos:

levantamento de necessidades e definição de prioridades:

a) resultados da avaliação de desempenho docente pelo discente,

b) resultados das avaliações institucionais;

contexto institucional: PDI, PPI, PPC;

necessidades e expectativas docentes: pessoal, profissional e institucional;

atividades formativas: Seminários; Cursos lato sensu; assessoramento/orientação

individuais; eventos acadêmicos em diferentes campi; pós-graduação lato e

stricto sensu;

modalidades de formação em serviço: presencial, semipresencial, a distância;

avaliação percorrendo todo o processo formativo.

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EdUECE - Livro 400738

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A trajetória formativa possui uma estrutura flexível, uma proposta compartilhada e

que atende às orientações do PDI, PPI e dos PPCs. De acordo com Veiga et al. (2012,

p.181),

A formação é favorecida quando os professores têm oportunidade derefletir, pesquisar de forma crítica com seus pares sobre as práticaspedagógicas contextualizadas, experimentar novas formas pararepensar e rever a própria prática. Além de possibilitar uma autonomiacompartilhada, o processo possibilita a relação de unicidades da teoriae prática.

Para a autora, a ideia norteadora é formar docentes que têm uma relação estreita

com a prática pedagógica. A prática é o objeto de reflexão e de desenvolvimento

profissional e o eixo estruturante do processo formativo. Dessa forma, os docentes não

se separam do mundo social no qual estão inseridos e é impossível separar pensamento

e ação.

O contexto da prática é o momento de explorar os efeitos da prática institucional

pelos diferentes atores: mentor, assessores e professores cursistas. O professor, no

contato com a prática, constrói novos conhecimentos, sistematiza conceitos, vivencia o

processo. A mentora do NPU defende essa concepção ao afirmar que “[...] o mote

principal é aprender para a construção do conhecimento a partir da prática”. Alguns

assessores revelaram ter consciência da especificidade da educação superior e das

possibilidades que podem favorecer a reflexão coletiva sobre a prática docente. A

coordenadora explicita que “[...] inserir inovações no campo da didática e da

avaliação”.

Em relação ao papel do docente, os assessores responderam: “[...] É criar

possibilidades de autonomia, ter a base para alçar voos principalmente na educação

superior” (Coordenadora); “[...] Hoje, é uma profissão que trata da construção do

conhecimento individual e coletivo. É um papel facilitador da aprendizagem. Tem que

ter profissionalismo” (Assessora Nívia);”[...] o professor tem o papel mediador”

(Assessora Neide).

As respostas das interlocutoras indicaram algumas evidências, tais como: a

docência é concebida como profissão e, portanto, requer formação, cria possibilidades

para facilitar a aprendizagem, o professor tem papel mediador. Muitas ações estão sendo

desencadeadas, como explicitou a coordenadora do Programa: “[...] o uso das

tecnologias é para ampliar o Programa para o ambiente virtual”.

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EdUECE - Livro 400739

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Os professores cursistas que participaram das atividades do Programa pensaram

de forma mais ampla: “[...] levar o Programa até os Centros” (Direito); “[...]

flexibilizar os horários das atividades formativas e do mestrado” (Matemática); “[...] o

professor iniciante tem que conhecer o modelo pedagógico e a nossa forma de

trabalhar” (Engenharia); “[...] o Programa deve ser ampliado e estimulado” (Letras).

Apesar de não ter sido possível realizar observações da prática docente, pude

perceber nas respostas dos professores entrevistados que há uma expectativa maior de

resultados e maior compromisso dos docentes. As sugestões de ampliação e a aceitação

do Programa, apontados pelos interlocutores demonstraram que o processo de

desenvolvimento profissional docente é reconhecido e valorizado por eles.

As dificuldades apresentadas giram em torno de “[...] redução da carga horária

de sete professores assessores interdisciplinares” (Pró-Reitor); “[...] falta de tempo

para planejar e adequar o plano ao grupo de alunos” (Letras); “[...] superação do

modelo tradicional e recuperação do conhecimento” (Mentora); “[...] resistências

pessoais dos professores a serem orientados” (Coordenadora). As dificuldades

apontadas não impediram a continuidade do Programa que, mesmo sofrendo os

impactos da crise institucional, conseguiu estabilizar o processo. O desenvolvimento

profissional docente é um processo complexo de mudança social que envolve também

políticas de resistência e contestação.

A discussão continua

Em termos de síntese da discussão apresentada ao longo deste estudo, evidencio

alguns aspectos a serem analisados pelos professores e suas instituições. Para os

professores, assessores, tutores, é preciso destacar as seguintes iniciativas: compreender

a especificidade da educação superior no contexto das políticas públicas internacionais e

nacionais; analisar as concepções de ciência e os campos epistemológicos que

fundamentam os cursos ofertados pela Instituição; entender o desenvolvimento

profissional docente como uma política institucional para a melhoria do trabalho

docente, englobando desde os momentos iniciais da profissão, acompanhando a

trajetória profissional docente e relacionando com o desenvolvimento da organização

institucional.

Para as instituições, os pontos relevantes são:

instituir políticas de desenvolvimento profissional docente sistematizado e de

caráter permanente e participativo como condição de ingresso na carreira e no

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EdUECE - Livro 400740

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espaço do período probatório, experiência que vem sendo empregada por

algumas instituições de ensino superior;

viabilizar o desenvolvimento profissional docente em redes presenciais, virtuais

ou mistas;

articular um movimento reivindicatório para alterar o Art. 66 da LDB junto ao

Conselho Nacional de Educação, com o objetivo de fortalecer a solicitação já

encaminhada pela Rede Inter-Regional Norte, Nordeste e Centro-Oeste sobre

docência na Educação Superior e Básica (RIDES), para que a profissionalização

docente se torne uma política pública nacional como profissão e como campo de

investigação e produção de conhecimento.

Vale, ainda, destacar a situação complexa da docência que expressa as

contradições da sociedade que, de um lado, procura a adaptação das IES ao

modelo neoliberal e, de outro, tem a convicção de que para ser professor basta o

conhecimento específico.

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Eixo A Didática e a Prática de Ensino na relação com a Formação de ProfessoresSubeixo Desenvolvimento Profissional e Práticas Formativas.

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E FORMAÇÃO DEPROFESSORES NO CENÁRIO DAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO

Iria BrzezinskiRESUMOIntenta-se analisar diversas concepções de políticas educacionais, formação deprofessores, desenvolvimento profissional, profissionalismo, profissionalização eprofissionalidade docente, formação continuada e fazer uma avaliação da políticaemergencial do Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica(PARFOR) da CAPES/EB. Resulta de uma ampla pesquisa de abordagem qualitativa,interpretativa, cujo recorte dá realce à análise de questionários. Seis egressos do cursode Segunda Licenciatura em Dança, do Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia deBrasília (IFB) são os sujeitos da pesquisa. Conclui-se que as políticas de formação deprofessores são pontuais e inorgânicas, o que instiga ainda mais a luta em defesa daconstituição de um subsistema nacional de formação e valorização dos profissionais daeducação articulado ao sistema nacional de educação.Palavras chaves: Políticas Educacionais, Desenvolvimento Profissional; FormaçãoContinuada no Parfor

Em particular, os políticos e líderes educativos queremter evidências concretas do impacto do desenvolvimentoprofissional nos resultados de aprendizagem dosestudantes (GUSKEY; SPARKS 2002).

SOBRE O QUE TEMATIZO?

A presente comunicação, organizada em forma de artigo, a realizar-se no

Simpósio no XVII ENDIPE (11-14/11/2014), na Universidade Estadual do Ceará

(UECE), vincula-se ao Subeixo “Desenvolvimento Profissional e Práticas Formativas”.

É uma pesquisa de abordagem qualitativa interpretativa, com análises conceituais,

documental e de questionários.

Este artigo tem por escopo tematizar concepções de políticas educacionais,

formação de professores, desenvolvimento profissional, profissionalismo,

profissionalização, profissionalidade docente, formação continuada, bem como razer a

público uma avaliação da política emergencial de desenvolvimento profissional

implementada pelo governo popular brasileiro: o Plano Nacional de Formação dos

Professores da Educação Básica (PARFOR) fomentado pela Diretoria de Formação de

Professores da Educação Básica (presencial) da Coordenação de Desenvolvimento de

Pessoal da Educação Superior da Educação Básica (CAPES/EB). O recorte necessário

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400743

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diante da natureza deste trabalho ─ um artigo com limites de caracteres ─ recai no

realce da análise de questionários respondidos pelos egressos do curso presencial de

Segunda Licenciatura em Dança, ministrado pelo Instituto de Educação, Ciência e

Tecnologia de Brasília (IFB).

No que tange ao método de investigação a pesquisa é orientada pelo

materialismo histórico dialético, pois esse instiga a pensar em movimento. Instiga tanto

a ação de pensar os fatos como elementos de uma totalidade histórica, quanto a

submetê-los a uma análise crítica que sustenta epistemologicamente a elaboração de

uma síntese, com vistas à superação daquilo que consistiu o ponto de partida. Trata-se

de uma forma de investigação da realidade com o propósito de captar as relações

estabelecidas na dinâmica das ações humanas.

Em síntese, este artigo é derivado fortemente de minhas aproximações com a

Escola, a formação de professores, as políticas educacionais, a investigação e a

“militância acadêmica” nas entidades de estudos e pesquisas em Educação. Aliás,

acredito que o envolvimento com a escola da educação básica e com as instituições de

ensino superior são minha vida e meu constante labor.

Compartilho ideias de Nóvoa (1992) de que a profissionalização docente,

entendida por mim como sinonímia de desenvolvimento profissional, tem que se

articular com as escolas quer sejam de educação básica, quer seja de ensino superior,

bem como com seus projetos políticos pedagógicos e planos de desenvolvimento

institucional..

Concordo com Costa (2003) que, em minha vida a escola e o trabalho docente

vêm sempre roubando a cena. O interesse investigativo no tocante às políticas

educacionais e de formação de professores também roubam a cena.

Dedicar-me-ei a seguir, de forma breve, à contextualização das políticas

educacionais brasileiras hoje em desenvolvimento, a serviço de um determinado projeto

de mundo, de Estado, de educação, de formação de professores, de escola para dar

realce às reflexões mais detalhadas acerca da formação docente, em particular, do

desenvolvimento profissional por meio de políticas emergenciais de preparo para o

exercício da docência na educação básica.

1 CONTEXTO E SIGNIFICADOS CONCEITUAIS

Encontram-se nos objetivos deste trabalho razões para defender que as políticas

sociais, entre essas, as políticas educacionais “representam a materialidade de

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EdUECE - Livro 400744

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intervenção do Estado ou o Estado em ação” (AZEVEDO, 1997, p. 5). Por isso mesmo,

devem ser construídas com participação dos representantes do Estado ─ sociedade

política ─ e de diferentes atores sociais engajados em movimentos organizados pela

sociedade civil, entre outros, em entidades científicas, instituições educacionais públicas

e privadas, associações da categoria profissional de trabalhadores da educação,

sindicatos, entidades estudantis.

Com base nesta lógica de direito de participação de todas as classes sociais na

elaboração de políticas públicas, representadas nos citados movimentos, entendo que as

políticas educacionais devem constituir-se como políticas de Estado, superando a idéia

de políticas de governo e, muitas vezes, políticas emanadas de um partido político

hegemônico que detém o poder, e no momento de decisões logra-se vencedor na disputa

entre interesses da classe dominante e da classe desfavorecida.

Os elaboradores de políticas de Estado devem, justamente, atender ao princípio

de que elas sejam planejadas para atravessar mandatos governamentais, visando à

qualidade socialmente referenciada da educação, com mudanças e reformas planejadas

a médio e longo prazo. Historicamente, as políticas educacionais tem sido

implementadas em curto prazo e, na maioria das vezes inesperadas pelas escolas da

educação básica e seus profissionais que são obrigados a atender exigências

determinadas pelos governantes.

Saliento que nos últimos trinta anos, as políticas tem sido primorosas em

atribuir aos professores a responsabilização (cf. FREITAS, 2012b) pelo fracasso

discente na escola pública, em face de seu despreparo e de sua imobilidade pessoal no

que concerne ao desenvolvimento profissional docente.

Nessas três últimas décadas tem sido notório o afastamento do Estado em

relação ao financiamento das políticas sociais, entre essas a educacional1 com uma

profunda redefinição do Estado quando o País passou a seguir o modelo econômico de

Estado Mínimo. Esse modelo implica para a política setorial da educação

contingenciamento de recursos financeiros a um projeto de sociedade que, por tal

motivo, revela-se intrinsicamente contraditório, quando obstaculiza o atendimento ao

1 Apesar de a Lei n. 13.005, de 25/6/2014 que aprovou o PNE apregoar na Meta 20, que será ampliado o“investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete porcento) do Produto Interno Bruto (PIB) do País no 5o (quinto) ano de vigência desta Lei e, no mínimo, oequivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio”, o dispositivo prevê a contabilizaçãodeste esperado percentual de investimento, também os destinados aos programas Pronatec, ProUni,Ciências Sem Fronteiras e FIES, além de matrículas em creches e pré-escolas conveniadas,. É notória adestinação de recursos para o sistema privado de educação.

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400745

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preceito constitucional de ensino obrigatório e gratuito como direito de todos os

cidadãos. A retração de financiamento colide com o ordenamento jurídico expresso no

art. 208, §1º da Constituição Federal (CF/1988): “o acesso ao ensino obrigatório e

gratuito é direito público subjetivo2”.

Desse movimento de refuncionalização do Estado brasileiro emerge uma nova

concepção de gestão imposta ao sistema nacional que advém de determinações

internacionais, sob o qual os espaços públicos foram se privatizando, de tal modo que,

tornou-se difícil discernir se prevalece nesse processo, a privatização do público ou a

publicização do privado.

Na verdade, o discurso do poder instituído exige a elevação do nível de

escolaridade da população, contradizendo também o que fora preconizado como

finalidade da educação no art. 2º da Lei n. 9.394/1996: “pleno desenvolvimento do

educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

O projeto do poder instituído assumiu e continua com o compromisso de que a escola da

educação básica deve traçar um perfil de trabalhador e trabalhadora que atenda às

necessidades requeridas pelo mercado de trabalho, uma vez que os governantes da

Nação brasileira almejavam maior inserção na economia mundial e reconhecimento

internacional.

Essa busca de reconhecimento internacional no ranking das dez maiores

economias do mundo, o Brasil foi conquistando espaços até atingir o 6º lugar (2012).

Segundo avaliação do Fundo Monetário Internacional (FMI), em 2014, o País

retrocedeu ao 7º lugar, mas, mesmo assim, deixou para trás a França, o Reino Unido e a

Indonésia. Logo, deduzo que o Brasil é um país mais rico do que educado: o número de

analfabetos com mais de 15 anos de idade saltou para 13.200 milhões, conforme dados

da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad, 2013), enquanto, em 2012, a Pnad

computou 12.900 milhões analfabetos. Os dados da PNAD revelam grandes assimetrias

regionais. Concentram-se os analfabetos na região nordeste e o menor índice está na região

sul.

Tais dados tem pertencimento a um país em que, desde 1889 foi proclamado como

República Federativa, com regime democrático presidencialista ─ interrompido por longos e

intercalados períodos de ditadura ─ porém, atualmente, alinha-se à concepção de federação

2 Cury (2005) esclarece que direito público subjetivo é aquele pelo qual o titular de um direito pode exigirdireta e imediatamente do Estado o cumprimento de um dever e de uma obrigação. Qualquer pessoa, dequalquer idade e que não teve acesso à escolaridade obrigatória na faixa etária considerada própria ounão, é titular desse direito (Cury, 2007).

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em uma democracia representativa. Esta governança é garantida por um governo popular,

entretanto, submetido ao capitalismo globalizado, cuja ingerência transfere o poder de

tomada de decisões “dos sistemas políticos para os mercados e, as tecnologias cada vez mais

potentes aumentam a força da mão invisível3“ (GORE JUNIOR, 2013, p. 24) do mercado.

Esses são, entre outros, vetores que atrofiam a autogovernabilidade da Nação democrática

brasileira.

Gore Jr (2013, p. 71) analisa o momento contemporâneo de nova fase do

capitalismo nominada por ele “capitalismo trimestral”. Consoante acepção do autor , a mão

invisível do mercado conduz à obsessão por projeções feitos a “cada três meses”, ensejando

lucros a curto prazo. Essa é uma visão parcial e imperfeita da realidade (aparência) que se

contrapõe às programações a serem atingidas a médio e longo prazo, as quais poderiam

chegar a revelar a essência das necessidades e expectativas da maioria dos cidadãos.

O “capitalismo trimestral” invadiu a educação básica e superior no Brasil,

reafirmando-se no MEC em 24/4/2007 o Plano de Desenvolvimento Educacional (PDE),

pelo Presidente Lula e o Ministro Fernando Haddad. Esse instrumento de política

educacional, em que pesem alguns programas pontuais em favor do desenvolvimento e

aprendizagem da docência e da valorização da profissão-professor, foi marcado pela

aproximação do poder executivo da educação com os “corporate reformers4" (RAVITCH,

2011, p.13). Esta expressão de Ravitch, ex-secretária adjunta de educação dos Estados

Unidos do governo George Bush, para identificar os empresários reformadores, aos

quais Ravitch se contrapõe, detonando severas críticas às políticas de avaliação que

foram por ela gerenciadas, mediante aplicação de testes estandartizados.

A autora denuncia que os reformadores corporativos argumentam que as

escolas devem se livrar da burocracia estatal e funcionar como empresas, porque a

eficiência do livre mercado é muito maior do que a dos governos. Esses reformadores

“demonstram sua precária compreensão da educação construindo falsas analogias entre

a educação e o mundo empresarial” (RAVITCH, 2011, p.26).

Freitas (2012b) analisa a obra de Ravich (2011) e sinaliza que esse movimento

de novos reformadores “reflete uma coalizão entre políticos, mídia, empresários,

empresas educacionais, institutos e fundações privadas e pesquisadores alinhados com a

ideia de que o modo de organizar a iniciativa privada é uma proposta mais adequada

3 Maiores detalhes podem ser conferidos em obra publicada em 1776 (1 ed.) pelo escocês SMITH, AdamA riqueza das nações, 1988, que serviu de fundamentação teórica para o liberalismo econômico.4 Reformadores cooperativos, tradução livre da autora.

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400747

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para "consertar” a educação americana, do que as propostas feitas pelos educadores

profissionais” (FREITAS, 2012b, p. 380).

O PDE no Brasil é fruto de coalizão à semelhança do movimento americano.

Tal coalização foi prevista no Decreto n. 6.094, de 24/4/2007, que dispôs sobre o Plano

de Metas Compromisso Todos pela Educação. O PDE, portanto, mantém suas raízes no

“Compromisso Todos pela Educação”, que consiste de um consenso articulado por

Fernando Haddad, em 2005, ao qual se aliaram a elite empresarial brasileira, a iniciativa

privada e os gestores públicos em defesa da educação básica de qualidade, com o

fortalecimento da ideia de metas. Como se sabe, essa ideia de “cumprimento de metas”,

para alcançar “recompensas” vigora na maioria das empresas do mundo.

A satisfação dos empresários foi manifestada por Antônio Matias, vice-

presidente do Banco Itaú no lançamento do PDE: "vários gestores, professores,

especialistas ajudaram a montar essas metas [...]. Ao adotá-las, o governo está

perseguindo, para as políticas públicas, a mesma eficiência com que as empresas estão

acostumadas a lidar".

Aranha e Clemente (2007), apontam que o PDE tem em seu cerne a

constituição de um “sistema simples de cobrança de resultados e recompensas para as

escolas que cumprirem os objetivos”. Essas soluções apressadas foram assumidas pelo

governo federal e diversos Estados da Federação, inspirados nas políticas educacionais

estadunidenses falidas, consoante Ravitch. Freitas (2012, p.346) explica que essas

proposições de políticas educacionais apressadas se ancoram em

[...] uma espécie de ‘teoria da responsabilização’ gerencialista everticalizada” [...]. Esta "nova abordagem" para as políticas públicas deeducação está sendo construída em torno dos conceitos de responsabilização,meritocracia e privatização.

Tais análises induzem a seguinte indagação: Que implicações têm as políticas

educacionais apressadas sob o modelo do “capitalismo trimestral”, para o

desenvolvimento profissional dos professores brasileiros, em particular pela formação

realizada em programas emergenciais a exemplo do PARFOR?

2 DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E FORMAÇÃO DEPROFESSORES: CONCEPÇÕES E POLÍTICAS EDUCACIONAIS

Ao transportar o “modelo” de resultados a curto prazo para o campo das políticas

educacionais essa “nova ortodoxia educacional” (HARGREAVES et al, 2002, p. 13) atinge

o ethos da educação básica, da educação superior e da formação de professores, quando o

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EdUECE - Livro 400748

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Estado regulador exige padrões de aprendizagem elevados na educação básica, todavia os

projetos políticos pedagógicos e as matrizes curriculares são padronizados porque induzidos

por exames de medição de desempenho. Este é um dos objetivos do Estado regulador.

A regulação é uma forma de reproduzir conteúdos, visto que pouco importa aos

elaboradores de políticas e aos gestores da educação, o que os professores devem ensinar

para que o estudante alcance o “preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação

para o trabalho” (art. 2º, Lei n. 9.394/1996).

Como afirmam GUSKEY; SPARKS, (2002), em epígrafe , estudados por Vaillart e

Marcelo (2012, p, 178) são os políticos (elaboradores de políticas) e os líderes educativos

(gestores da educação) que “querem ter evidências concretas do impacto do

desenvolvimento profissional nos resultados de aprendizagem dos estudantes”,

preocupados com a competitividade e com o ranqueamento das escolas.

Por seu turno, o professor e a professora que encaram de fato a docência como

profissão, o seu desenvolvimento profissional docente, também sofre impactos significativos

em relação ao nível de aprofundamento e dedicação às investigações que envolvem esse

processo contínuo ao longo da vida ativa.

Nesta perspectiva, advogo com fundamento em Estrela (1997, p. 9) que os estudos

sobre a profissão-professor devem “desocultar uma profissão que todos conhecem do

exterior”, haja vista a infinidade de profissionais que não são da área da Educação e

alegam entender do trabalho docente. No contexto educacional brasileiro como

supracitado, até empresários que se baseiam na “Pedagogia de Competências e de

Resultados” e nas “recompensas” se julgam capazes de solucionar melhor “problemas”

da profissão em relação à aprendizagem e desenvolvimento cultural, do que os próprios

educadores.

No tocante à concepção de desenvolvimento profissional detenho-me nos escritos

de Carlos Marcelo (1999) que tem por princípio desvelar que formar professores é fazer

ciência (1999). Por tal razão, a formação inicial e o desenvolvimento profissional não

podem ficar aprisionados ao simples domínio de competências e à avaliação de

desempenho por meio de testes. A formação inicial e continuada tampouco devem se

limitar ao exclusivo domínio de conhecimentos básicos para o exercício da profissão.

Ambas formações devem se pautar no princípio da pesquisa como processo formativo,

considerando que todo professor é também um pesquisador.

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EdUECE - Livro 400749

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Outra afirmação de forte conotação epistemológica, sobre formar professores é

de Denise Vailland e Carlos Marcelo (2012, p. 23-45): “preparar docentes é formar

adultos”.

Nesses autores me respaldo para insistir na ideia de que desenvolvimento

profissional requer continuidade formativa e investigadora por toda a vida Em

particular, o desenvolvimento profissional do professor deve superar “a tradicional

justaposição entre formação inicial e aperfeiçoamento dos docentes” (VAILLAND;

MARCELO, 2002. p. 167) feitos em cursos de curta e curtíssima duração.

DAY (1999, p. 4), mencionado pelos autores Vailland e Marcelo (2012, p. 168)

concebe desenvolvimento profissional docente como um continuun que

[...] inclui todas as experiências de aprendizagem natural e aquelas que,planejadas e conscientes, tentam, direta ou indiretamente, beneficiar osindivíduos, grupos ou escolas e que contribuem para a melhoria da qualidadeda educação nas aulas. É o processo mediante o qual os professores, sozinhosou com outros, revisam, renovam e desenvolvem seu compromisso comoagentes de mudança, com os propósitos morais do ensino e adquirem edesenvolvem conhecimentos, competências e inteligência emocional,essenciais para um bom pensamento profissional, para o planejamento e aprática com as crianças, com os jovens e com os seus companheiros, ao longode cada uma das etapas das suas vidas como docentes.

A complexidade contemporânea da sociedade do conhecimento tem exigido da

profissão docente e da prática pedagógica aproximem para realizar o seu

desenvolvimento profissional, para planejar e para desenvolver o trabalho docente em

salas de aula. Os estudos a respeito recaem em Marcelo (2004, 1999), Alarcão (2004),

Vailland; Marcelo (2012) Hargreaves et al (2002); Hargreaves; Goodson (1996) e, têm

me proporcionado condições de dialogar proficuamente com Isabel Alarcão (2004).

Esses diálogos se voltam notadamente aos conceitos pertinentes à(s) identidade(s) do

professor, à profissionalidade, ao profissionalismo e à profissionalização docente. Essas

concepções constituem fundamentação para o compreender o que é desenvolvimento

profissional do professor.

Profissionalidade, segundo minha compreensão, consiste em um conjunto de

conhecimentos, saberes, capacidades e competências de que dispõe o professor, no

desempenho de suas atividades. Profissionalidade, então, constitui um conjunto de

requisitos profissionais indispensáveis para transformar em professor aquele sujeito

leigo que busca uma formação para o futuro exercício profissional no campo da

docência.

Alarcão (2004, p.1), por sua vez, assinala que

Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

EdUECE - Livro 400750

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profissionalização refere-se ao processo de alguém se tornar profissional. Porex., em Portugal, hoje, para alguém ser professor profissionalizado tem de terum mestrado em ensino que inclui unidades curriculares de matérias daespecialidade e de educação e um estágio pedagógico supervisionado e temde passar num exame de entrada na profissão. Só assim poderá concorrer aum lugar de professor. A formação deverá prepará-lo para o exercício daprofissão docente que tem característica própria: a profissionalidade docente .

Concebo por profissionalismo o desempenho qualificado, competente e

compromissado com os deveres e responsabilidades no exercício da profissão de

professor, de professora, enquanto que profissionalização é configurada pela unidade

dialética profissionalidade e profissionalismo.

Profissionalização docente é um processo marcado por um continuum de

transformações que vão ocorrendo por toda a vida do professor que poderá levá-lo a

atingir condições ideais que garantam uma formação e um exercício profissional de

qualidade socialmente reconhecida.

Alarcão (2004, p. 5) assinala que profissionalidade docente é “a

multidimensionalidade dos saberes (teóricos, processuais, contextuais), dos valores, dos

direitos e dos deveres inerentes à função social de educar, ensinando” [e, que]

profissionalismo “tem a ver com a qualidade do profissional. Assim, diz-se de alguém

que é muito competente científica, pedagógica e eticamente falando, que ‘tem grande

profissionalismo’” (ALARCÃO, I; BRZEZINSKI, 2004, p.1).

Com relação a esses conceitos Marcelo assegura que:

[...] junto ao conceito de “profissionalização” tem-se falado do“profissionalismo”, entendido, nesse caso, como a capacidade dos indivíduose das instituições de desenvolver uma atividade de qualidade, comprometidacom os beneficiários da mudança, num ambiente de colaboração. Os estudossobre o profissionalismo levaram em consideração a necessidade dereprofissionalizar a função docente e perceberam que a ampliação dasfunções é positiva, representando um sintoma claro de que os docentes sãocapazes de realizar funções que vão mais além das tarefas tradicionaiscentradas nos alunos e restritas ao espaço físico da aula (MARCELO, 2010).

Para o autor está fadada ao insucesso a formação que pretende transformar o

docente em

consumidor de fast-food [...] quando se tenta embarcá-lo em atividades quepromovam sua aprendizagem contínua, mas as modalidades que lhes sãooferecidas não vão além de cursos curtos, descontextualizados, afastados dosproblemas concretos e sem aplicação prática” (MARCELO, 2010).

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No próximo item será feita uma avaliação, ainda que preliminar da política de

formação continuada presencial de professores, ou desenvolvimento profissional em

forma de Segunda Licenciatura, implementada pelo PARFOR), no Distrito Federal.

3 PARFOR, a pesquisa em movimento: da euforia à desilusão

A educação não suporta voluntariado, improvisação,práticas missionárias ou outro tipo de caridade, já quedireito, e não benesse. Por isso, exige tratamentoprofissional competente, assegurado por relações detrabalho claramente regulamentadas. (KUENZER,2000, p. 92).

As contundentes argumentações de Kuenzer vão em defesa da educação básica

de qualidade que responda com compromisso social, pedagógico, político, técnico e

tecnológico ao que preceitua a CF/1988 no tocante ao direito ao ensino obrigatório e

gratuito para todos os cidadãos brasileiros de 4 a 17 anos, e para os que não tiveram

oportunidade de cursar a educação básica na idade adequada de escolarização.

Ocorre que o déficit de professores na educação pública “adequadamente

capacitados” (KUNZER, 2000, p.92) levou o MEC a propor formação em serviço para

as pessoas leigas que estavam no exercício da docência, em caráter precário.

Vários indicadores estatísticos e a estimativa para atender a demanda da

educação básica de responsabilidade dos Estados da Federação e do Distrito Federal,

que seria provocada pela Ementa Constitucional n. 59/20095 revelavam a premência de

uma política emergencial de formação em nível superior, para até 2014 estarem

preparados para a ocupação de 651.175 postos de trabalho.

Essa política emergencial de formação inicial e continuada foi instituída pelos

Decreto n. 6.755, de 29/1/2009, Portaria Normativa nº 883, de 16/9/2009 e Portaria

Normativa n.9 de 9/6/2009.

Os princípios dessa política constam nos doze incisos do art. 2 do Decreto

supramencionado. Dentre eles, ressalta-se a oferta de formação para os docentes da

educação básica como compromisso público de Estado; garantia de formação como

compromisso com um projeto social, político e ético; a importância do projeto

5 Alterou, entre outros artigos da Constituição Federal, o art 208 e o art 211. No Inciso I do art. 208 foiprescrita a obrigatoriedade e gratuidade da educação básica dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos deidade e a oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria. No § 4º do art. 211os legisladores previram a exigência de a União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípiosdefinirem formas de colaboração, com a finalidade de assegurar a universalização do ensino obrigatórioregido pelo citado Art.208, § 4º.

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EdUECE - Livro 400752

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formativo nas instituições de ensino superior que reflita a especificidade da formação

docente, assegurando organicidade ao trabalho [...]; garantindo sólida base teórica e

interdisciplinar e valorização profissional traduzida em políticas permanentes de

estímulo à profissionalização, bem como a existência de efetiva colaboração entre os

entes federados na consecução dos objetivos da Política Nacional de Formação de

Profissionais do Magistério da Educação Básica; execução dessa política, mediante

articulação entre o Ministério da Educação, as instituições formadoras e os sistemas e

redes de ensino.

De acordo com art. 4º do citado Decreto, os princípios constantes deste

diploma legal devem reger os Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação

Docente (FPAFD), que são os responsáveis pela elaboração e acompanhamento dos

Planos Estratégicos de Formação de Professores da escola pública em cada Estado da

Federação e no DF. No §1º do art. 4 está preceituado o regime de colaboração entre a

União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por intermédio de programas e

ações coordenados pela Capes da Educação Básica do Ministério da Educação, o que

reforça o significado dos planos estratégicos nos entes Estados e DF.

O Decreto em pauta, entre outros aspectos, é consequência de estudos tanto da

sociedade civil quanto política acerca da instituição de um Sistema Nacional Público de

Formação dos Profissionais do Magistério, proposto pelo MEC e de um diagnóstico

feito pela CAPES/EB da situação da formação docente em nível superior no País.

Lamentavelmente essa proposta não vingou.

Com o intuito de impulsionar o desenvolvimento da política nacional prescrita,

a Diretoria de Educação Presencial da Capes/EB demandou a elaboração e assinatura

dos Acordos de Cooperação Técnica com as Secretarias Estaduais de Educação e

Secretaria do Distrito Federal, assim como de Termos de Adesão de 90 IES formadoras,

inicialmente previstas. A Capes organizou as planilhas de oferta de cursos e vagas por

intermédio da Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da

Educação Básica e do Plano Nacional de Formação dos Professores da Educação Básica

(Parfor), cujo ícone virtual materializou-se na Plataforma Paulo Freire.

Tais políticas implementaram o programa de formação emergencial em cursos

de Primeira Licenciatura para professores atuantes nos sistemas públicos de educação

básica sem formação em nível superior. A Segunda Licenciatura e Complementação

Pedagógica foram ministradas para aqueles docentes que lecionavam disciplinas

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EdUECE - Livro 400753

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incompatíveis com sua área de formação. Este grupo de professores, embora formados

em nível superior é considerado leigo.

Como já explicitado, aqui o interesse volta-se para a formação continuada

presencial de Segunda Licenciatura em Dança do IFB, estruturada curricularmemte à

luz das Diretrizes Operacionais contidas na Resolução CNE/CP n. 1, de 11/2/2009. A

escolha foi determinada por uma variável: é o único curso de formação continuada em

Segunda Licenciatura do DF, no período de abrangência da pesquisa matricial

desenvolvida em âmbito nacional (2009-2014), da qual derivou a pesquisa pelos

representantes da Anfope no FPAFD/DF.

A fim de garantir a tessitura do referencial teórico, importa neste instante,

distinguir concepções de formação inicial e formação continuada. A rigor, a formação

inicial no Brasil deveria ser realizada em cursos de Primeira Licenciatura, na forma de

pré-serviço. O diploma de licenciatura é condição legal para o licenciado concorrer a

uma vaga na escola básica pública, mediante concurso público de provas e títulos para

ingresso na profissão-professor para atuar nas séries finais do ensino fundamental e no

ensino médio.

Causa estranhamento, todavia, a presença reiterada no arcabouço jurídico que

ancora a legalidade da formação no Brasil, do que é inaceitável em países europeus e da

América Latina: em pleno século XXI, permanecer na LDB/1996 (art. 62) e no Plano

Nacional de Educação (Lei n. 13.005, de 25/6/2014) a admissão no sistema público de

normalistas formados em nível médio (Modalidade Normal) para atuarem na educação

infantil e nos cinco anos iniciais do ensino fundamental.

Esse ordenamento legal consiste um contrassenso à postulação da Associação

Nacional pela Formação de Profissionais de Educação (Anfope) que, desde 1983,

reivindica que o ingresso no sistema estatal ocorra somente por professores formados

em nível superior, na Universidade, lócus de produção da ciência, do livre pensamento,

da criatividade, bem como na condição de IES guardiã e disseminadora do

conhecimento acumulado pela humanidade.

Não é demais recuperar o que escreveu Alarcão (2014) que a formação mínima

para ingresso na carreira de professor em Portugal é o mestrado em ensino.

A propósito, o conceito de formação contínua tem um esclarecimento histórico

de Dias (1991), pois o autor assegura que essa formação emerge e desenvolve-se na

Europa após a segunda 1940, pós guerra decorrente de

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[...] fenómenos tais como a explosão das ciências das técnicas, a planetizaçãono espaço e a aceleração no tempo das dimensões e do ritmo dodesenvolvimento dos sub-sistemas sociais. Tal evolução provoca aobsolescência dos conhecimentos antigos, a emergência de outros novos, acomplexificação de teias de relações cada vez mais sutis entre todos eles(DIAS, 1991, p. 186).

Já na concepção de Patrício, o processo de formação continuada insere-se no

processo de desenvolvimento “profissional, cultural e social” [...] que se confunde com

a própria vida do professor. O autor adverte que neste processo deve ser estimulada

também a “auto-formação” (PATRÍCIO, 1991, p. 202), que parte da volição pessoal,

mas isso não significa que ela seja individualista.

Nóvoa (1991, p. 24) alerta que o engajamento docente é condição precípua para

sua autoformação e heteroformação. É com o “outro” que a formação se concretiza, pela

criação de “redes de (auto) formação participativa, que permitam compreender a

globalidade do sujeito, assumindo a formação como um processo interactivo e

dinâmico”.

Na esteira deste pensamento, um grupo de pesquisadores, em um congresso

realizado na Universidade de Aveiro/Portugal (1991), identificou seis dimensões da

formação docente continuada, e que foram elencadas por (ALARCÃO, 1991, p. 72).

1) Dimensão do desenvolvimento pessoal e social; 2) Dimensão dodomínio da especialidade; 3) Dimensão Pedagógico-didáctica; 4)Dimensão institucional e administrativa; 5) Dimensão histórico-cultural;6) Dimensão investigativa; e 7) Dimensão expressivo-comunicativa

Para a autora a “trilogia: indivíduo, profissão, escola” pode ser contemplada

pelas diversas dimensões da formação continuada propostas pelos pesquisadores

portugueses (1991), caso concebidas de forma dialética, uma vez que “cada uma das

dimensões tem a ver com todas as outras e só adquire o seu sentido pleno no todo que as

integra” (ALARCÃO, 1991, p. 69).

A pesquisadora declara que o desenvolvimento profissional, mediante formação

continuada precisa considerar os destinatários que requerem propostas de formação

diferentes: podem ser professores iniciantes ou professores mais experientes. No caso

do objeto deste artigo, a Segunda Licenciatura é destinada aos experientes em efetivo

exercício no Sistema da Educação Distrital.

A diferença entre o professor experiente e o jovem professor está em que oprofessor no início da sua carreira tem de socorre-se do saber e dasferramentas ainda pouco trabalhadas que adquiriu na sua formação inicial,enquanto o professor experiente tem à sua disposição a ferramenta bem

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EdUECE - Livro 400755

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oleada do tal saber de experiência, feito que hoje começa de novo a valoriza-se e designa-se por epistemologia da prática (ALARCÃO, 1991, p. 74).

Formação continuada, em suma, deve ser entendida como desenvolvimento

profissional que deve conciliar a dimensão de um projeto institucional e pessoal,

orientado por uma política educacional, que, por sua vez, responde às demandas

educacionais da coletividade traduzidas nos projetos políticos pedagógicos das escolas

da educação básica, lócus no qual o professor, a professora desenvolvem seu trabalho

docente.

3.1 O contexto e o texto resultante da investigação em movimento

O Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Distrito Federal (IFB) foi a

única IES que ofertou curso presencial de Segunda Licenciatura do Parfor aos

professores atuantes no sistema educacional da capital do Brasil. É instituição

transformada em instituto no movimento da expansão da Rede Federal de Educação

Profissional, Científica e Tecnológica por intermédio da Lei n. 11.892, de 29/12/2008.

Suas raízes estão na Escola Agrotécnica de Brasília (1962).

O ingresso no curso deu-se em 2012 com uma matrícula de 71

professores/cursistas distribuídos em duas turmas (matutino e vespertino). A matriz

curricular foi organizada para se integralizar em um ano letivo, com carga horária total

de 1.040 horas, incluídas 200 horas de estágio supervisionado. Contaram 45 os

concluintes como licenciados em Dança, em dezembro de 2013, desvelando um

problema também sucedido em nível nacional ─ alta evasão em todos os cursos

ofertados pelo Parfor (69%). No IFB o índice alcançou 37 %.

Como procedimento de pesquisa foram enviados questionários on line para

todos egressos, entretanto, somente seis responderam, representando essa amostra

aleatória do 13% do universo.

Os dados socioeconômicos dos participantes dessa amostra permitem

identificar que todos ingressaram no sistema educacional por meio de concurso público

como professores e exercem a função docente, um deles há 35 anos e os demais há 28,

24, 20, 18 e 10 anos. Dois deles só cursaram Bacharelado em nível superior, porém são

também normalistas, formados em nível médio profissional.

Antes do curso e, na atualidade também continuam exercendo as funções de

professor (a) de Ginástica em Quadras e Dança (1), Artes Plásticas (1), Educação Física

(2), Geografia (1) e Coordenação do Laboratório de Informática (1). Há evidência de

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EdUECE - Livro 400756

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que 83% não eram professores de Dança por mais de 3 anos (área distinta de sua

Primeira Licenciatura) e não foram alocados para a disciplina para a qual foram

formados em Segunda Licenciatura, conforme exige a Resolução CNE/CP n.1/2009, de

11/2/2009.

Avalio que não houve impacto positivo para a elevação da qualidade do ensino

de Dança em suas escolas. A dedicação ao curso como desenvolvimento profissional até

o momento parece inóqua, embora uma professora continue sendo professora de dança,

após a conclusão do curso.

Os respondentes reivindicaram que a formação continuada seja feita em nível

de mestrado profissional, pois haveria maior motivação pelo fato de que, pelo menos

teriam promoção na carreira e aumento salarial.

Com efeito, infiro que os recursos públicos foram gastos de modo

irresponsável, visto que o objetivo seria a formação continuada para proporcionar a

superação da distorção formação versus atuação na educação básica, contribuindo para a

qualificação da educação básica do DF.

Os egressos descreveram em suas respostas às perguntas abertas que:

a) não foram dispensados de suas atividades cotidianas de sala de aula para cursarem a

Segunda Licenciatura. As respostas seguintes desvelam essa realidade:

Falta de apoio/interesse por parte da direção da escola, já que a dispensa nohorário de coordenação (planejamento), segundo a direção da escola“atrapalharia” a organização (P/C 1)6.Tive que faltar poucas vezes (sete) ao curso para desempenhar atividades naescola (P/C 2).A grande dificuldade foi conciliar o tempo. Ter que trabalhar, preparar aulas,continuar no seu dia a dia comum da escola e ao mesmo tempo enfrentaraulas todos os dias no IFB, realizar as atividades, tarefas, exercícios etrabalhos da Licenciatura em Dança (P/C 3).

b) o IFB não contava com um grupo eficiente de gestores e de formadores preparados

para a docência na Licenciatura em Dança, tampouco com infraestrutura com salas

especiais, o que levava à improvisação. Tais deficiências são confirmadas nas respostas

que se seguem.

Apesar de o curso proposto ser de licenciatura, 90% das aulas ministradasforam voltadas para a formação de coreógrafos e bailarinos profissionais enão para a aplicação da disciplina em sala de aula [...]Falta de conhecimento e experiência da quase totalidade do corpo docenteem ministrar aulas voltadas para a área do curso em questão – licenciatura(atuar em sala de aula pública ou particular) – lembrando que o corpodiscente era formado exclusivamente por professores da SEEDF e a meta do

6 Para assegurar o anonimato dos respondentes foram identificados por P/C1, PC/2, ... até P/C6.

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curso era formar profissionais para atuarem com essa disciplina dentro darede pública de ensino do Distrito Federal (P/C1).Falta de preparo para o curso, tanto em preparar o corpo docente, quanto aestrutura física e técnica. As salas de aula não eram adequadas às práticasde dança. Suas dependências ainda não estavam prontas para o curso, assimdesempenhamos nossas atividades de aprendizagem em espaçosimprovisados. Isto desmotivou muitos alunos [...] foram trocados oscoordenadores mais de 6 vezes durante um ano de curso. (P/C2)Falta de organização do IFB (P/C3).O IFB não teve o respeito com muitos alunos/professores [...] foram“empurrando com a barriga” para se livrarem” das turmas dos professoresda Secretaria de Educação .Um fato em uma aula chegou a chamar atenção quando um professor doIFB em discussão sobre educação com a turma e um colega citou PauloFreire. O professor respondeu que nem sabia quem era Paulo Freire. Fatobem intrigante para um docente do IFB (P/C4).Um verdadeiro suplício para encontrarmos soluções (PC/6).

Entre as causas apontadas para levaram os colegas ao abandono do curso foram

recorrentes: a) falta de apoio dos gestores das escolas em que atuavam como professores

da educação básica; b) desgaste físico, emocional e financeiro para cumprir 40

horas/semanais na escola de lotação e assistir aulas todos os dias da semana no IFB; c) a

falta de respeito (deboche, gritos, desprezo) de professores formadores com os

professores/cursistas; d) a falta de domínio de conteúdos e práticas das modalidades de

dança pelos professores do IFB;

e) ausência de bolsa de estudos para os professores/cursistas;

e) as despesas aumentaram muito durante o curso.

É preciso apontar algumas conclusões, entre elas a pesquisa serviu para

confirmar que as atividades do Parfor precisam de acompanhamento in loco dos

coordenadores para evitar resultados tão danosos à cidadania dos estudantes da

educação básica;.

A pesquisa até o momento tem sido referência para instigar a mobilização dos

anfopeanos e associações que comungam a defesa da criiação de um subsistema

nacional de formação e valorização dos profissionais da educação articulado ao sistema

nacional de educação.

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