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DA MATEMÁTICA BABILÔNICA À MATEMÁTICA ESCOLAR José Damião Souza de Oliveira Maria Isabel da Costa Pereira Eixo temático: Etnomatemática e as relações entre tendências em educação matemática Resumo: Este artigo visa mostrar um estudo realizado por bolsista e ex-bolsista do PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) da UFRN, a partir de estudos e discussões realizadas em uma disciplina ofertada pelo PPGECNM (Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática), a qual estávamos matriculados como aluno especial e/ou ouvinte. Focamos neste trabalho parte da obra de Manuel Campos de Almeida intitulada Origens da matemática, sendo este um dos livros abordados nesta disciplina, o qual trata da Matemática produzida e praticada pelos Babilônicos. Para tanto, buscamos traçar um paralelo da visibilidade da matemática babilônica e a matemática escolar, através do ensino da história da matemática, para que possamos produzir um material voltado ao ensino desta disciplina, a qual faça uso de metodologias de ensino que possam propiciar aos alunos uma aprendizagem significativa. Palavras chave: Matemática babilônica; Contabilidade arcaica; Matemática escolar. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo lançar mão da história da matemática em particular de parte da história da matemática babilônica ou Etnomatemática babilônica, fazendo uma ligação da história da matemática deste povo, com o que conhecemos por Etnomatemática, mostrando a relação dos métodos de contagem utilizados pelos povos da Mesopotâmia com a matemática escolar. De fato, desde o início das civilizações o homem está em decorrente processo de assimilação e acomodação, no qual sempre busca instrumentos e técnicas que facilitem sua vida. Nesta perspectiva, Ubiratan D’Ambrosio vislumbra o programa Etnomatemática dividido em três aspectos: Etno: É hoje algo muito amplo, referente ao contexto cultural e, portanto inclui considerações como linguagem, jargão, códigos de comportamento, mitos e símbolos; Matema: É uma raiz difícil, que vai à direção de explicar, conhecer, entender; Tica: Vem sem dúvidas de Tchne, que é a mesma raiz de arte ou técnica de explicar, de conhecer, de entender os diversos contextos culturais. (D’AMBRÓSIO, 1990, p.5)

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DA MATEMÁTICA BABILÔNICA À MATEMÁTICA ESCOLAR

José Damião Souza de Oliveira

Maria Isabel da Costa Pereira

Eixo temático: Etnomatemática e as relações entre tendências em educação matemática

Resumo: Este artigo visa mostrar um estudo realizado por bolsista e ex-bolsista do

PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) da UFRN, a partir de

estudos e discussões realizadas em uma disciplina ofertada pelo PPGECNM (Programa

de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática), a qual estávamos

matriculados como aluno especial e/ou ouvinte. Focamos neste trabalho parte da obra de

Manuel Campos de Almeida intitulada Origens da matemática, sendo este um dos livros

abordados nesta disciplina, o qual trata da Matemática produzida e praticada pelos

Babilônicos. Para tanto, buscamos traçar um paralelo da visibilidade da matemática

babilônica e a matemática escolar, através do ensino da história da matemática, para que

possamos produzir um material voltado ao ensino desta disciplina, a qual faça uso de

metodologias de ensino que possam propiciar aos alunos uma aprendizagem

significativa.

Palavras chave: Matemática babilônica; Contabilidade arcaica; Matemática escolar.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo lançar mão da história da matemática

em particular de parte da história da matemática babilônica ou Etnomatemática

babilônica, fazendo uma ligação da história da matemática deste povo, com o que

conhecemos por Etnomatemática, mostrando a relação dos métodos de contagem

utilizados pelos povos da Mesopotâmia com a matemática escolar. De fato, desde o

início das civilizações o homem está em decorrente processo de assimilação e

acomodação, no qual sempre busca instrumentos e técnicas que facilitem sua vida.

Nesta perspectiva, Ubiratan D’Ambrosio vislumbra o programa Etnomatemática

dividido em três aspectos:

Etno: É hoje algo muito amplo, referente ao contexto cultural e,

portanto inclui considerações como linguagem, jargão, códigos de

comportamento, mitos e símbolos; Matema: É uma raiz difícil, que vai

à direção de explicar, conhecer, entender; Tica: Vem sem dúvidas de

Tchne, que é a mesma raiz de arte ou técnica de explicar, de conhecer,

de entender os diversos contextos culturais.

(D’AMBRÓSIO, 1990, p.5)

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Dentro desta perspectiva estaremos abordando parte da matemática

desenvolvida pelos babilônicos, para que possamos fazer um estudo de seus

instrumentos e mecanismos de contagem, de modo a desenvolver um material voltado

para o ensino da matemática usando como suporte a história de como a matemática foi

produzida pela civilização babilônica utilizar.

REFERENCIAL TEÓRICO

O referido trabalho traz em seu corpo um pouco da história da humanidade,

mostrando a presença da Etnomatemática como um programa novo, mas que esteve

presente na vida dos nossos antepassados e que continua coevo em nossas vidas.

Ubiratan D’Ambrosio (2001) nos traz um exemplo muito interessante de como surge a

Etnomatemática no momento em que ressalta o ato de um australopitesco ao escolher e

lascar um pedaço de pedra, com o objetivo de descarnar um osso, destacando que,

naquele instante, sua mente matemática se revelou. Com isso mostraremos as relações

existentes deste programa com a matemática escolar e a matemática de nosso dia-a-dia,

bem como a que nossos antepassados utilizavam em seu cotidiano, revelando o vínculo

existente entre a história da Matemática e o ensino da matemática.

Realmente, o programa Etnomatemática atenta para as conexões da Educação

Matemática com o mundo social mais amplo, através das diferentes ideias e práticas

desenvolvidas por diversas culturas. Neste sentido (SOUSA; PEREIRA, 2010),

apresentam o contexto, aplicações e atividades desenvolvidas por pesquisadores de

Etnomatemática refletindo sobre a história e uso do Programa Etnomatemática, com a

finalidade de vincular a história da Matemática com o Programa Etnomatemática

elucidando sua existência, objetivos e contribuições para o ensino de Matemática bem

como atividades que envolvam a matemática babilônica e os conteúdos da matemática

escolar.

Para tal abordagem, conforme posto, utilizaremos como texto base para os

estudos realizados da matemática babilônica a obra de Manoel de Campos Almeida

(2011) intitulada por: ORIGENS DA MATEMÁTICA a pré-história da matemática o

neolítico e o alvorecer da história, o qual nos mostra o desenvolvimento da matemática

babilônica.

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Podemos observar os estudos realizados por Almeida (2011) sobre os signos

arcaicos nos tabletes dos sítios arqueológicos de Uruk. Nos quais ele mostra que nos

textos proto-literatos encontrados nestes sítios, foram identificados aproximadamente

1200 sinais, dos quais cerca de 60 são signos numéricos. Alguns desses signos foram

identificados em textos administrativos e talvez por esse motivo tenham sobrevividos

por vários séculos sem sofrerem grandes alterações.

METODOLOGIA

Para a produção deste trabalho foi realizado um estudo teórico de parte do

desenvolvimento da matemática babilônica, onde toma-se como base o livro Origens da

matemática Almeida (2011), obra esta que trás um belo estudo das produções

matemáticas desta civilização. A fim de criar atividades de ensino tomando como

suporte a história da matemática, realizaremos um estudo do desenvolvimento dos

sistemas de contagens babilônicos, bem como da cultura deste povo. Após este estudo

lançaremos mão das atividades das escolas de escribas, assim como de alguns

problemas encontrados em tabletes estudados por pesquisadores, os quais estão

detalhados na obra citada anteriormente.

Os principais tópicos a serem discutidos a seguir são: Simbologia arcaica

numérica; O estudo dos sistemas metro-numéricos cuneiformes tradicionais; e Notação

posicional e tabletes administrativos. Após a realização deste estudo e de uma análise de

como iremos construir tais atividades, traremos os primeiros ensaios das propostas de

atividades para o ensino da matemática onde teremos as produções matemáticas da

civilização babilônica como um suporte didático.

As atividades serão modeladas de modo que após o levantamento das mesmas,

inspirados em fontes originais como a de Almeida (2011), bem como de outros textos a

serem estudados e analisados, estudando as atividades, ajustando de modo que tornem-

se compreensivas pelos alunos, onde a aplicação ocorrerá com o debate e/ou discussão

do professor com os alunos, para que as possíveis lacunas que os alunos venham a

apresentar sejam sanadas pelo professor.

Simbologia arcaica numérica

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Antigamente nossos antepassados utilizavam símbolos para os números 1, 10,

60 e 600 que são os mais encontrados nos textos e devido a isso foram facilmente

traduzidos. Contudo, em alguns casos os cálculos dispostos nos tabletes não

concordavam com os valores dos sinais, fato este interpretado inicialmente pelos

pesquisadores como supostos erros cometidos pelos escribas ou inabilidade de escribas

aprendizes. Além disso, alguns signos possuíam mais de um significado, que variava

conforme a natureza das coisas que estivessem sendo contabilizadas. Daí, os constantes

erros e confusões cometidos pelos escribas.

Entre as principais contribuições arqueológicas para a compreensão dos

sistemas metro-numéricos arcaicos, no ano de 1936, foram identificados a partir de

textos proto-literato de Uruk, três tipos de signos numéricos, a saber: um sistema

sexagesimal, um sistema decimal e um sistema de frações. Em meados da década de

70, foram realizadas novas investigações no sítio arqueológico de Uruk e contrariando

interpretações de pesquisas realizadas anteriormente, foi observado que os signos

numéricos não pertenciam apenas a três sistemas, mais a uma variedade de sistemas

numéricos e ainda, que o sistema decimal não existia.

Utilizando pioneiramente recursos computacionais para analisar os sinais

numéricos contidos em 6500 tabletes encontrados em Uruk, identificaram cerca de 13

sistemas metro-numéricos, sendo que 10 dos símbolos da figura 1, não estão associados

aos sistemas identificados. Foi denominado de metro-matemático alguns textos proto-

literatos de Uruk, assim como identificado algumas regras dos sistemas numéricos e de

medidas, que expõe alguns dos sistemas metro-numéricos arcaicos, bem como indica a

utilização de cada um dos sistemas, pois alguns destes eram empregados em situações

especificas do cotidiano dos povos arcaicos.

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Figura 1— signos arcaicos para números

Fonte: Almeida (2011)

Nos estudos dos sistemas metrológicos, temos como base trabalhos sobre

textos cuneiformes sumerianos que identificam os signos numéricos, as notações de

unidades numéricas e de medidas contidas nos textos proto-cuneiformes, os quais

continham dois sistemas numéricos, os números sexagesimais e os números de área. As

notações dos números de área são em sua essência as mesmas dos textos proto-literatos

sumerianos de períodos posteriores, com os resultados dessas pesquisas podemos

conjecturar que o sistema de numeração sexagesimal é tão antigo quanto os textos

proto-cuneiformes de Uruk IV, os mais antigos registros de notação de números de área

são de Uruk III.

Segundo Almeida (2011) ao discutir sobre os atuais sistemas de numeração,

nosso sistema decimal não é capaz de dar conta de todas as necessidades, talvez devido

a sua pequena quantidade de submúltiplos, deixando espaço para utilização dos

números sexagesimais e outras. Podemos observar ainda que do quarto milênio a.C até

2000 a.C já existia um sistema de medidas bem estruturado, o que nos leva a pensar que

antes do quarto milênio a.C o sistema já estava se estruturando. Dentro do sistema

sexagesimal estava presente o sistema decimal, de fato, bem como um pouco sobre a

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evolução do sistema sexagesimal sumeriano, pois inicialmente não era posicional e não

dispunha de um símbolo para o zero, que só veio a ser criado por volta de 300 a.C.

Mesmo assim, o símbolo para o zero não estava presente em textos matemáticos, apenas

em textos astronômicos.

O estudo dos sistemas metro-numéricos cuneiformes tradicionais

Tabela 1. Sistemas metro-numéricos cuneiformes tradicionais

Sistema Nome do Sistema Empregado para contar:

S Números sexagesimais para contagem Pessoas e objetos

C Números de capacidade Medir quantidades de

cereais, etc.

M Número de peso (ou metal) Medir quantidades de prata,

etc.

A Número de área Medir áreas de campo, etc.

L Número de comprimento Medir comprimento de

linhas retas ou curvas.

Fonte: Almeida (2011)

A respeito do sistema sexagesimal S, é encontrado desde o proto-literato,

passando pelo sumeriano e proto-acadiano, babilônico antigo chegando até ao sistema

de frações babilônicas antigas. As ideias do sistema sexagesimal posicional babilônico

são desde o período dos proto-literatos, e neste período já se usava o mesmo símbolo

para 1 e 60. Vimos que os textos proto-literatos são datados por volta do quarto milênio

antes de nossa era, o que nos leva a pensar em que momento foi usado o sistema

sexagesimal pela primeira vez. Outro sistema mais antigo e também discutido por

Almeida (2011) é o sistema de números-tokens que se apresenta como um dos primeiros

sistemas de numeração empregado possivelmente em transações comerciais, mostrando

que o sistema de números-tokens tem estreitas relações com o sistema sexagesimal.

O sistema de números de capacidade Š, é um sistema proto-cuneiforme. Este

sistema era utilizado para medir quantidades de grãos, como cereais e outros produtos

agrícolas. Ao que tudo indica, este sistema tem sua origem no sistema de números-

tokens. Alguns tokens eram representados por: cilindros altos, bolas grandes, bolas

pequenas, discos e discos pequenos. Com o surgimento da escrita cuneiforme, os tokens

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foram substituídos por símbolos para o sistema de capacidade babilônico antigo, esse

sistema era usado para determinar a forma de pagamento dos trabalhadores.

O sistema proto-cuneiforme para número de peso era definido como sistema E,

é formado por duas partes: uma superior – usada para pesar quantidades de prata, sendo

a unidade básica N1, a outra a inferior – que tinha como finalidade medir quantidades de

ouro, sendo a unidade N7 (ver figura 1). Com a existência deste sistema de peso,

podemos imaginar a existência de um mecanismo que seria utilizado para realizar suas

medidas, porém não se tem registros da existência de tal instrumento. As primeiras

evidências da existência de uma balança foram encontradas em registros administrativos

datados de 2700 a.C. Os conceitos matemáticos de peso e medida são necessários para a

criação da balança, os mecanismos de medida para volume são derivados de objetos

utilizados para o armazenamento como vasos e tigelas.

No final do período proto-literato o sistema E passou a ser substituído pelo

sistema M, onde todos os números eram múltiplos ou frações de grão de cevada. O

sistema de números de área G, não sofreu muitas alterações com a introdução do

sistema S, os números de área são acompanhados de índices que indicam serem

elementos de área.

O sistema de números de comprimento do período acadiano antigo, tinha como

unidade básica o cúbito que valia cerca de 0,5m e o ninda, que valia aproximadamente

6m. A figura 2 mostra as unidades de comprimento utilizadas durante o período neo-

sumeriano e período babilônico antigo.

Figura 2 — Sistema neo-sumeriano e babilônico antigo de unidades de comprimento.

Fonte: Almeida (2011)

Notação posicional e tabletes administrativos

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O surgimento da notação posicional parece ter ocorrido para facilitar a

identificação dos valores de 1 e 60, pois estes tinham o mesmo símbolo. No período Ur

III, um escriba inventa a notação posicional, provou-se que a existência da notação

posicional está presente em textos matemáticos de 2500 e 2200 a.C, porém tem-se

poucos registros do período Ur III, pois parece que os tabletes eram reutilizados. O

tablete com o mais antigo cálculo é datado de 2039 a.C, no qual os números aparecem

escritos em notação posicional. Alguns registros indicam que o sistema de notação

posicional deve ter surgido pela necessidade de organização dos cálculos pelos escribas,

que trabalhavam em diversos setores administrativos e burocráticos.

Nos tabletes administrativos são encontrados registros referentes às transações

comerciais, que permitem identificar o que e quanto foi comercializado, bem como as

pessoas envolvidas. Nos exemplos mostrados em Almeida (2011), podemos identificar

como são estruturadas e organizadas as informações. A figura 3 registra 120 rações, 30

jarras de cerveja, o nome do responsável, e em algumas coleções tem-se textos só para

registrar produções de mercadorias.

Figura 3 — Tabletes administrativos

Fonte: Almeida (2011)

Os tabletes administrativos também nos informa como se dava as relações

entre os serviços prestados, ou seja, como eram feitos os cálculos para determinar

quanto um trabalhador iria ganhar por dia de trabalho. Vale ressaltar que nesse período

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não existe o conceito de moeda, com isso o pagamento pelo trabalho era feito através de

bens. Também é notável a maneira com que os administradores eram punidos se seus

balanços não estivessem corretos, em casos de dividas o escriba poderia até morrer e

sua família ser escravizada.

Acreditamos que a divisão sexagesimal da hora em 60 minutos e dos minutos

em 60 segundos é uma contribuição da cultura sumeriana, porém nos registros datados

até o terceiro milênio a.C. não nos permite afirmar que os sumerianos conheciam o

tempo como nós conhecemos hoje em dia. Para eles o tempo era cíclico e mitopoético.

Embora possuíssem um símbolo para denotar o tempo não tinham conhecimento da

divisão do dia nos períodos arcaicos, nestes períodos não se tinha a divisão do dia de

trabalho, o que só veio a ocorrer no período Ur III dividido nas seguintes frações 5/6,

2/3, ½ e 1/3, a unidade de tempo era 1/60 de um dia de trabalho, assim o relógio

sumeriano marcava um dia contendo 120 horas sumerianas, com as observações dos

períodos lunares, os tempos de colheitas chegou-se a criação de um ano religioso

composto de 12 meses lunares, com 30 dias cada, no período Ur III notou-se a

necessidade de acrescentar um mês a cada três anos lunares para que pudesse manter os

períodos de colheitas com os rituais religiosos.

ANÁLISE

Diante do estudo exposto, observamos que podemos trabalhar com o ensino da

matemática a partir da história da matemática utilizando a história de nossos

antepassados em especial nesse trabalho a história da matemática babilônica. Para tanto

buscamos analisar atividades que possam ser desenvolvidas com nossos alunos.

A partir das atividades descritas pelas escolas de escribas, podemos propor

atividades semelhantes e/ou iguais, para serem utilizadas no ensino de matemática.

Desta forma temos a proposta de estudar e fazer levantamentos de atividades e de

problemas da matemática babilônica, procurando evidenciar em que momentos

poderíamos fazer uso dessas atividades em sala de aula, retomando a etnomatemática

babilônica.

Veremos a seguir um exemplo de atividade que mostra adaptações que podem

ser realizadas em atividades das escolas de escribas para serem utilizadas no ensino da

matemática.

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Atividades

Atividade da escola de escribas

Nos textos de campo ou nos tabletes que registram as medidas lineares de

campos, divisões de terras, registro de quantidades de sementes necessárias para plantar

uma determinada área conhecida, vemos como é efetuado os cálculos para determinar

áreas de terrenos pelos escribas, além dos tabletes servirem para registros também eram

utilizados como atividades para os aprendizes de escribas. Como podemos ver na figura

a seguir:

Figura 4 — A mais antiga evidência do calculo de área.

Fonte: Almeida (2011)

Como podemos ver na explicação de Almeida (2011, p. 261) a respeito dos

problemas de textos de campos.

Seu obverso e verso têm aproximadamente o mesmo formato e

contem os traços horizontais e verticais que o identificam como um

texto de calculo de área de um campo. Ambas as faces mostram dois

levemente diferentes comprimentos e igualmente duas levemente

diferentes larguras, o que é típico dos campos quadrangulares, como

comprovado por textos posteriores. Damerow e Englund

reconstituíram o tablete baseando em fotos antigas e considerando um

seu fragmento hoje perdido.

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Esta situação trata de uma atividade das escolas de escribas, onde vemos que os

problemas eram contextualizados, porém abstratos, pois provavelmente não se

trabalhava com áreas tão grandes.

Figuras 5 — Período Uruk III: Quantidade de grãos necessários para plantar um campo

irrigado

Fonte: Almeida (2011)

Figuras 6 — Período Ur III: Posições relativa entre terrenos

Fonte: Almeida (2011)

Foi preciso desenvolver alguns métodos em que era necessário dividir o terreno

em campos com outros formatos que poderiam ser medidos, os formatos destes campos

eram aproximadamente triângulos retângulo, retangulares ou trapezoides, quando a área

a ser medida era muito grande, então se dividia em pequenos quadriláteros, em seguida

media-se as dimensões das secções do campo. Para finalizar, o texto traz mais algumas

regras utilizadas nas medições de terrenos para situações particulares das formas dos

campos.

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Considerações finais

Ao finalizar este estudo teórico podemos ver o desenvolvimento da matemática

babilônica – sistema de numeração, simbologia, métodos de contagem e álgebra

babilônica. Como também vemos as possibilidades de fazermos uso destas produções

matemáticas para um ensino, voltado a uma aprendizagem mais humana, onde o aluno

possa ter uma maior interação com o professor e os conteúdos estudados.

Referências

ALMEIDA, Manoel de Campos. Origens da matemática: a pré-história da

matemática: o neolítica e o alvorecer da história. Curitiba, PR: Progressiva, 2011.

D’AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade.

Belo Horizonte: Autêntica, 2001. Coleção Tendências em Educação Matemática.

D’AMBROSIO, Ubiratan. Uma história concisa da matemática no Brasil / Ubiratan

D’Ambrósio. - Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.

SOUSA, Giselle Costa de; PEREIRA, Maria Isabel da Costa. Contexto e conceito

histórico aliado a aplicações da Etnomatemática. In: Colóquio de História e

Tecnologia no Ensino de Matemática.