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DISSIPANDO O “MAL CONSTRUÍDO” NO DIREITO: A PESQUISA COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NO ENSINO JURÍDICO DISSIPANT LE « MAL CONSTRUIT » DANS LE DROIT : LA RECHERCHE COMME PRINCIPE EDUCATIF DANS L'EDUCATION JURIDIQUE Rosalice Fidalgo Pinheiro RESUMO No cenário jurídico nacional, nota-se relativo atraso da pesquisa no Direito em relação a outras ciências. É nesse momento que se indaga, a partir da idéia sustentada por Pedro Demo, se a pesquisa, para além de um princípio científico, pode ser considerada como princípio educativo no ensino jurídico. Seria este o caminho capaz de conferir ao jurista a formação de um intelectual crítico, apto a ler a realidade com sentido social e atuar com vistas a transformá-la? Para enfrentar este problema, procede-se ao exame do ensino do Direito Privado, dividindo-se o trabalho em sete tópicos. Os três primeiros dedicam-se a delinear o paradoxo identificado na atuação do jurista por Pietro Barcellona e Michel Miaille, depositando-se na “pedagogia do ser” o caminho para dissipá-lo. Os quatro tópicos restantes ocupam-se da pesquisa, partindo da indagação acerca de seu significado para contrapô-lo ao panorama da pesquisa jurídica nacional. Eleita como princípio educativo, e não apenas científico, a pesquisa é diretriz capaz de formar no aluno dos cursos jurídicos, o pensamento crítico. Eis a pretensão última que se espera alcançar: formar um jurista apto a romper com o “círculo mágico de fórmulas abstratas” e o “mal construído” do Direito, e atuar como intelectual crítico, empreendendo a leitura e transformação da realidade com um sentido social. PALAVRAS-CHAVES: ENSINO JURÍDICO JURISTA PESQUISA ENGENHEIRO SOCIAL - “MAL CONSTRUÍDO” – PENSAMENTO CRÍTICO. RESUME Dans la scène juridique, il ya de retard sur la recherche dans le droit par rapport à d'autres sciences. C'est là où il demande de l'idée soutenue par Pedro Demo, si la recherche en plus d'un principe scientifique, peut être considérée comme un principe educatif en matière d'éducation juridique. Il serait en mesure de le donner à le juriste la formation d'un intellectuel critique, capable de lire la réalité avec un sens social et d'agir afin de la transformer? Pour résoudre ce problème, si procéde à l'examen de l'enseignement du droit privé, divisant le travail en sept thèmes. Les trois premiers sont consacrés aux décrivant le paradoxe dans l'action du juriste par Pietro Barcellona et Michel Miaille, déposant dans la "pédagogie de l'être" la voie à la dissiper. Les quatre autres traitent de sujet de la recherche, en partant de la question sur le son sens pour le pondre en contrepoint à la paysage de la recherche juridique. Elu comme un principe 4587

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DISSIPANDO O “MAL CONSTRUÍDO” NO DIREITO: A PESQUISA COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NO ENSINO JURÍDICO

DISSIPANT LE « MAL CONSTRUIT » DANS LE DROIT : LA RECHERCHE COMME PRINCIPE EDUCATIF DANS L'EDUCATION JURIDIQUE

Rosalice Fidalgo Pinheiro

RESUMO

No cenário jurídico nacional, nota-se relativo atraso da pesquisa no Direito em relação a outras ciências. É nesse momento que se indaga, a partir da idéia sustentada por Pedro Demo, se a pesquisa, para além de um princípio científico, pode ser considerada como princípio educativo no ensino jurídico. Seria este o caminho capaz de conferir ao jurista a formação de um intelectual crítico, apto a ler a realidade com sentido social e atuar com vistas a transformá-la? Para enfrentar este problema, procede-se ao exame do ensino do Direito Privado, dividindo-se o trabalho em sete tópicos. Os três primeiros dedicam-se a delinear o paradoxo identificado na atuação do jurista por Pietro Barcellona e Michel Miaille, depositando-se na “pedagogia do ser” o caminho para dissipá-lo. Os quatro tópicos restantes ocupam-se da pesquisa, partindo da indagação acerca de seu significado para contrapô-lo ao panorama da pesquisa jurídica nacional. Eleita como princípio educativo, e não apenas científico, a pesquisa é diretriz capaz de formar no aluno dos cursos jurídicos, o pensamento crítico. Eis a pretensão última que se espera alcançar: formar um jurista apto a romper com o “círculo mágico de fórmulas abstratas” e o “mal construído” do Direito, e atuar como intelectual crítico, empreendendo a leitura e transformação da realidade com um sentido social.

PALAVRAS-CHAVES: ENSINO JURÍDICO – JURISTA – PESQUISA – ENGENHEIRO SOCIAL - “MAL CONSTRUÍDO” – PENSAMENTO CRÍTICO.

RESUME

Dans la scène juridique, il ya de retard sur la recherche dans le droit par rapport à d'autres sciences. C'est là où il demande de l'idée soutenue par Pedro Demo, si la recherche en plus d'un principe scientifique, peut être considérée comme un principe educatif en matière d'éducation juridique. Il serait en mesure de le donner à le juriste la formation d'un intellectuel critique, capable de lire la réalité avec un sens social et d'agir afin de la transformer? Pour résoudre ce problème, si procéde à l'examen de l'enseignement du droit privé, divisant le travail en sept thèmes. Les trois premiers sont consacrés aux décrivant le paradoxe dans l'action du juriste par Pietro Barcellona et Michel Miaille, déposant dans la "pédagogie de l'être" la voie à la dissiper. Les quatre autres traitent de sujet de la recherche, en partant de la question sur le son sens pour le pondre en contrepoint à la paysage de la recherche juridique. Elu comme un principe

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educatif, et pas seulement scientifique, la recherche est la directive capable de guider les élèves du cours de droit pour la pensée critique. C'est le dernier mouvement, qui devrait atteindre: créer un juriste capable de briser le « cercle magique des formules abstraites » et le « mal construit » du droit, et agir en tant que critique intellectuelle, faisant la lecture et la transformation de la réalité avec un sens sociale.

MOT-CLES: L'ÉDUCATION JURIDIQUE - JURISTE - RECHERCHE - INGÉNIERIE SOCIALE - "MAL CONSTRUIT" - LA PENSÉE CRITIQUE.

INTRODUÇÃO

Afirmar com Pietro Barcellona, que "a sociedade dos juristas-engenheiros é uma quimera, uma abstração",[1] constitui-se um paradoxo. Eis que o século XX rompeu com a imagem do jurista como mero vigilante de uma ordem jurídica cristalizada, para fazê-lo participante de sua construção.

Contudo, o paradoxo logo se desfaz: o jurista[2] ainda continua envolto por um "círculo mágico de fórmulas abstratas", pois difícil é abandonar o "terreno seguro", apto a guiá-lo pelo horizonte normativo, mesmo que isso signifique esquecer-se da justiça do caso concreto. Por conseguinte, a construção que os juristas empreendem revela-se, por vezes, na reprodução de um construído que já existe.[3] Ao indagar-se por que os bacharéis continuam, por vezes, incapazes de empreender uma leitura axiológica do sistema jurídico, a resposta aponta para o ensino jurídico.

Os avanços tecnológicos, vivenciados nas últimas décadas, converteram o conhecimento mais recente em objeto de propriedade, que confere posição dominante ao seu titular. [4] Porém, a universidade brasileira não tem se mostrado capaz de empreender a construção e reconstrução desse conhecimento, tão-pouco, com sentido social.

No cenário jurídico nacional, esse panorama agrava-se: a unidisciplinaridade e a escassez da investigação científica, pretensamente neutra, contribuem para render relativo atraso à pesquisa no Direito em relação a outras ciências.

É nesse momento que se indaga a partir da idéia sustentada por Pedro Demo, se a pesquisa, para além de um princípio científico, pode ser considerada como princípio educativo no ensino jurídico. Seria este o caminho capaz de conferir ao jurista a formação de um intelectual crítico, capaz de ler a realidade com sentido social e atuar com vistas a transformá-la?

Para enfrentar esse problema, reservam-se as páginas que se seguem, tecendo a pesquisa como princípio educativo no Direito Privado. Os três primeiros dedicam-se a delinear o paradoxo identificado na atuação do jurista por Pietro Barcellona e Michel Miaille, depositando-se na "pedagogia do ser" o caminho para dissipá-lo. O restante do trabalho, dividido em quatro tópicos, ocupa-se da pesquisa, partindo da indagação acerca de seu significado para contrapô-lo ao panorama de pesquisa jurídica nacional. A pesquisa

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como princípio educativo e não apenas científico é eleita como diretriz capaz de formar no aluno dos cursos jurídicos, o pensamento crítico. Eis a pretensão última que se espera alcançar: formar um jurista apto a romper com o "círculo mágico de fórmulas abstratas" e atuar como intelectual crítico, capaz de ler e transformar a realidade com um sentido social.

1 FÓRMULAS ABSTRATAS: O CÍRCULO MÁGICO DO JURISTA

O século XX retratou na imagem do jurista um novo papel: o de engenheiro social, ampliando seus horizontes com vistas a abarcar a esfera social.

Em defesa desse papel, o Direito aproxima-se da sociedade, levando o jurista a atuar como intérprete das instâncias ou necessidades de uma sociedade em transformação.[5] Neste passo, o operador jurídico deixa de ser visto como vigilante de uma ordem jurídica cristalizada. Ao descobrir o significado dos valores que emergem da sociedade, torna-se, por meio de lei, um participante de sua construção.[6]

Contudo, adverte Pietro Barcellona, que "a sociedade dos juristas-engenheiros é uma quimera, uma abstração", pois há duas sociedades diversas: a dos grupos sociais que guardam consigo o interesse que o Direito desempenhe tão-somente uma função marginal, como mero guardião de uma política empresarial; e de outro, aquela que demanda justiça para os excluídos.[7]

Nessa dualidade social, o jurista ainda continua preso ao que Pietro Barcellona denomina de um "círculo mágico de fórmulas abstratas", pois abandonar o "terreno seguro da sistemática normativa" consiste em colocar em xeque a autonomia do Direito e a legitimação do jurista como cientista.[8] Eis que como cientista que é, não poderia se ocupar da política ou da práxis social, sem deixar de sê-lo. Cabe-lhe tão-somente guiar-se pelo horizonte normativo, esquecendo-se da justiça do caso concreto.

Essa é a imagem do jurista que, por vezes, predomina nas faculdades de direito, reduzido a mero técnico. Para tanto, ainda se recorre ao esquema da subsunção: o caso concreto deve ser reconduzido a uma hipótese normativa. Porém, o ingresso dos fatos aos conceitos gerais é precedido da depuração de suas particularidades, que impedem seu enquadramento.[9] Nesta perspectiva, o fato concreto mostra-se idêntico ao fato previsto, delineando uma racionalidade dedutiva.

Esse procedimento afasta o Direito de seus condicionantes econômicos, culturais, históricos e concretos, encerrando a atividade dos intérpretes em uma reconstrução do sistema,[10] por meio da investigação de conceitos gerais, que delineiam a racionalidade do complexo normativo. Esta racionalidade dedutiva, que compõe o círculo mágico do jurista, é transposta para o ensino jurídico, e de modo emblemático, para o ensino do direito civil.

Arremata Pietro Barcellona, que a superação dessa cultura jurídica requer a renúncia ao sistema e a recuperação do caráter histórico e social das abstrações jurídicas.[11] E para

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alcançá-lo, a presente discussão direciona-se para uma indagação: o que se quer do acadêmico de Direito?

2 O "MAL CONSTRUÍDO" DO DIREITO

O "recuo do formalismo jurídico", pronunciado por Franz Wieacker,[12] nas primeiras décadas do século XX, mostrou que a tarefa do profissional do Direito vai além da mera subsunção dos fatos às previsões normativas. É preciso descobrir os valores que inspiraram a norma jurídica. Trata-se de delinear uma percepção axiológica do Direito, pois:

...um advogado que não tenha todas essas noções será capaz talvez de uma tarefa mecânica de subsunção: pegar o fato e encontrar a norma aplicável; mas ele não será capaz, jamais, de, através de uma análise de interesses, de uma análise axiológica do texto legal, exercer uma advocacia criativa, que abra caminhos novos e que seja a provocação para que o Judiciário também exerça uma tarefa de jurisprudência criativa. [13]

O Direito constrói-se na combinação dialética entre a lei e a jurisprudência. Para tanto, caminha a tarefa do intérprete na aplicação dos princípios jurídicos. Demanda-lhe um esforço no sentido de construir a regra aplicável ao caso concreto, o que não se faz sem uma ponderação de valores.

Constata-se, então, que o jurista tem por missão criar a regra jurídica, de tal modo, que ela se aproxime ao máximo do ideal de justiça. Por conseguinte, o Direito não é um "dado", mas um construído.[14]

Abre-se, então, espaço para uma indagação, realizada por Michel Miaille: "de facto, que significa isso de o jurista construir?"[15] E responde: "é preciso convir que a 'construção' dos nossos juristas é, a maior parte do tempo, do tipo da 'reprodução' de um construído que já existe".[16] É suficiente melhorar o Direito, sem, no entanto, intervir na sua essência? Por outras palavras, bastaria "encher odres velhos com vinho novo"?[17]

É necessária uma ruptura com esse panorama, formando bacharéis capazes de empreender uma leitura axiológica do sistema jurídico. Para tanto, requer-se da universidade a formação de uma capacidade de reflexão crítica nos acadêmicos de Direito. Eis que:

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O jurista não pode ser um homem que vá atrás dos fatos. Ele tem de ser um homem capaz de exercer uma reflexão crítica sobre a adequação entre a norma e os problemas, e de exercer esta reflexão crítica não apenas numa linha de eficácia, não apenas numa linha a que realmente o empirismo leva que a de verificar se o Direito está servindo eficientemente ao sistema, mas uma linha crítica aos próprios valores fundamentais do próprio sistema dominante, numa linha que seja capaz de propor uma reformulação dos próprios valores fundamentais do sistema dominante.[18]

Ocorre que por meio de um ensino que apenas reproduz conhecimento, essa capacidade crítica não é alcançada. E:

Não é suficiente porque o ensino meramente exegético - e de uma exegese no mal sentido, no sentido de uma interpretação da lei com os recursos meramente de gramática ou, no máximo, da sistemática externa do Código, da taxonomia, ou de argumentos ligados a trabalhos preparatórios da lei, esse ensino, evidentemente não leva a nada, leva a formação de leguleios, leva à formação de rábulas. E, por respeitáveis que sejam os seus esforços, não são advogados porque não estarão aptos àquela tarefa de desbravamento de caminhos, de provocação da criação de uma jurisprudência nova (...), porque como juízes não estarão aptos a esta criação.[19]

Impõe-se uma indagação: como formar nos alunos que reflitam criticamente acerca do Direito, e atuem, no sentido de construir, em lugar de reproduzir o conhecimento jurídico?

Antes de responder essa pergunta, é necessário voltar as atenções para a relação de ensino-aprendizagem que se desenvolve nos cursos de Direito, com vistas a encontrar na "pedagogia do ter" a tradução do "mal construído do direito".

3 POR UMA "PEDAGOGIA DO SER"[20]

Nos cursos jurídicos, verifica-se que o ensino do Direito civil desenrola-se sob a égide de uma "pedagogia fundada sobre a memorização", transmitindo-se um saber formal presente nos livros e no professor, bastando apreender, memorizar e aplicar regras e proposições.[21] No entanto, a pedagogia que precisa estar presente no ensino do Direito civil em constante transformação é uma "pedagogia da capacidade de pensar e de saber", pela qual o professor ajude o aluno a compreender e a pensar por si mesmo, mediante um processo de trocas intersubjetivas.[22] Trata-se da "pedagogia do ser", destinada a descobrir e pôr em evidência, as qualidades de cada estudante e completamente oposta a uma "pedagogia do ter", baseada em "ter" notas, diplomas ou conhecimentos.[23]

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Partindo-se do pressuposto de que uma "pedagogia do ter" seria insuficiente para gerar juristas aptos a desempenhar sua responsabilidade social, indaga-se quais seriam os caminhos para alcançar uma "pedagogia do ser".

Nos quadros de uma pedagogia fundada sobre a memorização, o aluno é reduzido a um papel meramente passivo da relação ensino-aprendizagem. Sob essa ótica, o ensino do Direito Civil é caracterizado por um procedimento de exclusão, através da "interdição": somente a palavra do professor ocupa espaço, deixando à margem a palavra do aluno. Assim, tolhem-se suas experiências e impede-se o diálogo com outras disciplinas.[24] Essa relação de ensino-aprendizagem, na qual resta ausente o diálogo e a troca de idéias, é aperfeiçoada pela utilização do método expositivo.

Surgem, então, os inconvenientes de uma aula expositiva, presentes na obtenção de um "conhecimento puramente formal e receptivo do saber - já que o conteúdo das notas do professor vai direto ao caderno do aluno, sem a intermediação das informações pelo acadêmico." [25]

Não obstante tais críticas, José Lamartine Corrêa de Oliveira coloca-se contra o exegetismo, e em defesa das preleções.[26] Do mesmo modo, advertem Paulo Freire e Ira Shor, [27] que o professor pode ser muito crítico fazendo preleções.

Portanto, a questão não está propriamente no método a ser utilizado, mas em sua exclusividade, rejeitando-se outras formas de ensino como seminários e estudo de casos, mostrando-se como um obstáculo para a abertura de um espaço, no qual os alunos expressem suas opiniões.

A conseqüência desse ensino, é a reprodução e não a construção ou criação de novos saberes jurídicos, o que se reflete na sociedade, através do desempenho da atividade do jurista. Trata-se da concretização do que Michel Miaille descreve ao argumentar: "É preciso convir que a 'construção' dos nossos juristas é a maior parte do tempo, do tipo da 'reprodução' de um construído que já existe".[28]

Ocorre que a "reprodução" do conhecimento jurídico traz consigo a atuação ideológica. Ao apresentar conceitos, princípios e soluções do Direito Civil, como dogmas, distanciados dos problemas que o geraram, os valores a serem recepcionados são os mesmos que se encontram presentes em sua base, delineada no século XIX, por uma orientação patrimonialista.

Portanto, os valores transmitidos por esse ensino não serão aqueles que tornarão o jurista apto, a desempenhar sua responsabilidade social. Trata-se do que Eroulths Cortiano JR. demonstra, no caso do ensino do direito de propriedade:

A Constituição de 1988 assumiu francamente um posicionamento possibilitador da construção de um novo discurso proprietário, agora baseado na função social da propriedade e na supremacia dos valores existenciais diante dos valores patrimoniais. A implantação da nova sistemática proprietária, entretanto, não se faz de modo pronto com o advento da Constituição: somente a atividade constante do operador do direito permitirá que o novo modelo de propriedade, plural e solidário, prevaleça diante do

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ultrapassado discurso, que teima em manter-se no discurso do ensino do direito de propriedade.

Em um ensino jurídico descontextualizado, dogmático e unidisciplinar - como é o ensino do direito no Brasil - o princípio proprietário e o modelo proprietário ganham longa vida, e superam suas próprias rupturas... [29]

Diante de tais afirmações, poder-se-ia indagar se o mesmo que ocorre com o ensino do direito de propriedade, não é exatamente o que ocorre com o ensino dos contratos e da família.

Se assim for considerado, o ensino jurídico não cumpre com sua tarefa de transformação da sociedade. Evidencia-se que a educação não é a alavanca para transformação da sociedade, justamente porque deveria sê-lo.[30]

A educação somente pode ser considerada como fator de transformação social, na medida em que se formem sujeitos que, ao exercer sua atividade profissional na sociedade, atuem neste sentido.[31]

No entanto, o quadro descrito do ensino jurídico do Direito Civil não contribuiu para que isso ocorresse, ao contrário, formam-se juristas sem percepção crítica, incapazes de lerem sua própria realidade.[32]

Portanto, surge uma questão a ser resolvida: trata-se de saber como formar juristas capazes de lerem sua própria realidade, atuando na transformação da sociedade na qual se encontram inseridos. Para responder à esta questão, entra em cena, a pesquuisa e a necessidade para a qual ela aponta: a construção de um pensamento crítico.

4 CONHECIMENTO E PESQUISA NA UNIVERSIDADE

Se o conhecimento jurídico não é mais considerado como pronto e acabado, não se pode esperar que as faculdades de Direito sejam meros centros de reprodução de um Direito, mas sim de sua construção.

Os avanços tecnológicos, vivenciados nas últimas décadas, converteram o conhecimento em principal fator de progresso pessoal e coletivo. Na "sociedade de conhecimento", este último representa a grande propriedade, ao colocar seu titular em posição dominante.[33]

Contudo, esse conhecimento é exclusivo e excludente: requer os meios adequados para sua produção e gestão, afastando de seu acesso aqueles que não são detentores desses meios. Por conseguinte, o conhecimento revela-se no conjunto de ferramentas que determinam o desenvolvimento econômico e o progresso da sociedade.[34]

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Cabe à universidade construir e reconstruir esse conhecimento. Porém, os contornos dessa tarefa, emoldurados sob a tríade - ensino, pesquisa e extensão -, revelam-se deficientes. A universidade não vai além de um ensino que se traduz em reprodução do conhecimento e pouco chega à pesquisa e extensão:

A trilogia 'ensino, pesquisa, extensão' sinaliza, assim, uma etapa vencida da universidade, na qual continuamos ainda apegados porque não estamos conseguindo acompanhar o ritmo de mudanças imposto pela intensividade do conhecimento e também porque fazemos parte de um processo recente e certamente ainda imaturo. É fundamental perceber, então, que uma instituição universitária que apenas repassa conhecimento de segunda mão não é, a rigor, necessária. A tarefa de repassar conhecimento vai sendo tomada, com grandes vantagens, pela instrumentação eletrônica. É neste sentido que a aula, se for apenas para expor idéias alheias, de fora para dentro e de cima para baixo, não cabe, por dois motivos principais: porque não ocorre a reconstrução do conhecimento, e porque não permite competência profissional renovadora.[35]

Se a causa central da universidade é o conhecimento, na sua construção e reconstrução repousa sua tarefa. Mas, não basta dominar conhecimentos, pois na sociedade atual, estes logo se desfazem com o tempo. É preciso saber construí-los e reconstruí-los com um sentido social. E, para tanto, Pedro Demo sustenta a pesquisa não apenas como um princípio científico, mas educativo.[36]

5 O QUE É PESQUISA?

Para Pedro Demo "pesquisa é a atividade básica da ciência, a atividade científica pela qual se descobre a realidade, partindo do pressuposto de que ela não se desvenda na superfície e não é o que se apresenta a primeira vista." [37]

Para Magda Macedo "pesquisa é a investigação e o estudo, minudentes e sistemáticos, com fito de descobrir ou estabelecer fatos ou princípios relativos a um campo qualquer do conhecimento. Ela é uma atividade voltada para solução de problemas através do emprego de processos científicos." [38]

Dessas definições retira-se um elemento comum: pesquisar é descobrir. Por meio da pesquisa descobre-se o que não é visível para explicar o que é visível. Por outras palavras, é possível comparar a pesquisa à visita que se faz a uma casa, nos termos propostos por Michel Miaille:

i) O visitante de uma casa pode ser conduzido por um guia, com vistas a descobrir seus compartimentos. Porém, há portas que sempre ficarão fechadas, comportando zonas que não se visitam, pois seu itinerário não corresponde à lógica do edifício;

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ii) Diversamente, o próprio visitante poderia se deixar conduzir nesta visita, destituído de um guia. Neste caso, ele abriria as portas que quisesse, até mesmo, aquelas que normalmente estariam fechadas ao público;

iii) E por fim, poderia não se tratar de um visitante, mas do próprio morador dessa casa. Alguém que conheceria seu interior, em cada canto, em cada detalhe, não havendo zonas para descobrir.[39]

Trata-se de três visões diferentes de uma mesma casa, ou ainda, de três casas diferentes. Do mesmo modo, há várias percepções possíveis do Direito, cada uma com sua racionalidade, com seus interesses e conseqüências.

Da metáfora de Michel Miaille retira-se uma lição: a exemplo do que ocorre com a casa, o aluno é introduzido em um universo jurídico. Por essa introdução apresenta-se a tarefa de abrir certas portas, de lhe conduzir os passos para um determinado sentido, chamando a atenção para este ou aquele ponto.[40] A pesquisa no Direito pode ser comparada a esse itinerário, cujo sentido e desenvolvimento não são deixados ao acaso, mas direcionados para certo sentido, e a visão que tiverem do Direito Privado, dependerá, portanto, da visão que lhes for mostrada por esta visita guiada. E se todo itinerário comporta uma lógica e suas conseqüências, isto significa que nenhuma pesquisa é neutra.

Resta saber qual é o lugar da pesquisa no Direito.

6 O PANORAMA DA PESQUISA JURÍDICA NO BRASIL

A situação da pesquisa jurídica no Brasil pode ser descrita como de relativo atraso em relação a outras ciências. Segundo Marcos Nobre, concorrem para tanto, dois fatores: (i) o isolamento do Direito em relação a outras ciências; e (ii) a confusão entre prática profissional e pesquisa acadêmica. [41]

Em atenção ao primeiro desses fatores, as pesquisas jurídicas ocorrem, com frequência, no cenário nacional, em centros isolados e não em grupos. Trata-se da imagem

...do doutrinador 'perdido' em sua biblioteca, imerso em um mar de livros, a construir uma opinião abalizada sobre os fatos e a norma. Principalmente, porque a identidade da doutrina está assentada em um duplo fator: a primazia da dogmática (ainda que incorporando um certo fascínio pelas outras contribuições possíveis da Economia, da História, da Estatística, da Antropologia e, sobretudo, da Sociologia ao discurso jurídico) e o 'magistério' dos professores (expresso em manuais e decantados pelo prestígio universitário).[42]

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Esse isolamento do jurista encontra tradução no ensino jurídico: a propriedade, a família e o contrato são constantemente apresentados como se fossem "gavetas fechadas", que somente se abrem no momento em que são estudados.[43]

Esse afastamento refere-se, ainda, a outras categorias do saber. Estuda-se a civilística dissociada não apenas de outras áreas do Direito, mas de outras ciências, como a história, a sociologia, a filosofia e a antropologia. O contato com as ciências humanas importa, tão-somente, quando delas se extraí algum elemento de reflexão jurídica, subtraindo-se no restante.[44] Cobre-se o ensino jurídico de uma unidisciplinaridade, fragmentando-se o conhecimento em disciplinas, cujo resultado apresenta-se na interdição do diálogo com outros saberes.[45]

Por conseguinte, as soluções jurídicas, enunciadas pela legislação ou criadas pela jurisprudência, apresentam-se destituídas dos problemas que as geraram. Arremata-se o Direito como um "dado" e não como um "construído", que se esboça na distância entre o Direito vivido e o Direito ensinado.

A ausência de pesquisa científica no ensino jurídico corresponde a uma porta fechada para "descobrir e interpretar fatos que estão inseridos em uma determinada realidade". [46] Trata-se de dizer: a pesquisa não pode ser neutra, pois como pondera Orlando de Carvalho, "não há sistemas neutros (...) todo o Direito é ideológico." [47]

Impõe-se a interdisciplinaridade à pesquisa jurídica, sendo insuficiente retratar a realidade pelo instrumental de uma única ciência, reduzindo a sua totalidade a esse recorte. A complexidade da realidade requer olhares de todos os lados, delineando uma perspectiva interdisciplinar, que não descuida da profundidade, antes, "representa uma estratégia mais cuidadosa e sistemática de aprofundamento do conhecimento."[48]

Considerando que a interdisciplinaridade não é relativa a uma pessoa, mas a um grupo, torna-se imprescindível ao Direito o olhar da sociologia, da filosofia, da história, da antropologia e de outras ciências que possam dialogar com o jurídico. Isto remete as reflexões para a pesquisa como princípio científico, eis o segundo fator que contribui ao relativo atraso da pesquisa jurídica no Brasil.

O ensino jurídico carrega consigo uma distinção quanto ao significado da pesquisa para os práticos e para os acadêmicos. Para advogados, juízes e promotores, a pesquisa jurídica constitui-se no levantamento dos dados que sustentam uma tese nos tribunais. Para os acadêmicos, a busca das decisões tomadas nos tribunais destina-se a uma análise crítica; a tese ainda não está pronta, pois será o resultado dessa pesquisa.[49] Porém, essa distinção é constantemente dissipada nas faculdades de direito, prevalecendo na academia, o significado que a pesquisa tem para os práticos.

Em Marcos Nobre, essa confusão é sinalizada pela técnica do parecer: toma-se como modelo de pesquisa a escolha de argumentos, presentes em parcela da doutrina e jurisprudência, capazes de fundamentar a tese a ser defendida. Trata-se de um tipo de investigação científica que parte da resposta, em lugar de buscar no material disponível a melhor solução para o caso concreto.[50]

Diante dessa constatação, indaga-se acerca da suficiência da pesquisa como princípio científico. Pondera Pedro Demo, que a universidade brasileira, na tríade - ensino,

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pesquisa e extensão -, pouco ultrapassa as atividades de ensino.[51] Trata-se de dizer: poucas instituições de ensino implantam os programas de educação tutorial e iniciação científica no âmbito do Direito. Desenvolvem-se grupos de pesquisa, quando muito, alavancados pela Pós-graduação stricto sensu, arrematando-se a presença mitigada da pesquisa jurídica no Brasil.

Laura Garbini Both traduz em dados esse panorama da pesquisa, por meio dos programas de educação tutorial:

Com base nos dados da CGRAG, no ano de 2007 existiam 326 grupos PET nas IES brasileiras, distribuídos por praticamente todo o território nacional, agregando 3.200 alunos dos mais diversos campos do conhecimento. Os grupos PET organizados nos cursos de Direito e cadastrados na SESu - conforme a mesma fonte - somam até esse ano de 2008 apenas 5 (cinco): Universidade Federal do Maranhão, Universidade Federal de Santa Catarina, Universidade Federal do Paraná, Universidade de São Paulo e Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Considerando que, segundo dados do MEC, no ano de 2007 existiam 1066 cursos de graduação em Direito reconhecidos no Brasil, tem-se que apenas 0,46% deles constituem grupos PET.[52]

Os programas de educação tutorial revelam decisiva contribuição para construção e reconstrução do conhecimento com sentido social na Universidade. Para, além disso, ainda contribuem para que esse conhecimento seja manejado pelo acadêmico com autonomia.[53] Ambas as contribuições entrelaçam-se para dissipar a confusão entre formação profissional e produção científica, apontando para uma ruptura com o "mal construído" do direito.

Cogita-se, portanto, que a pesquisa seja trazida para dentro do ensino jurídico, não apenas como princípio científico, mas, ainda, educativo. Em relação a primeira das afirmações, a reforma empreendida pela Portaria n. 1886/94, do MEC, deu o primeiro passo neste sentido: a elaboração do trabalho de conclusão de curso. Enunciado sob a forma de uma monografia, este requisito inseriu a pesquisa dentre os pilares da formação jurídica. Não obstante as dificuldades que essa prática tem encontrado, atenua-se o "caráter essencialmente dogmático e profissionalizante do saber jurídico", tornando-o mais crítico e criativo:

Essa inovação deu oportunidade ao docente de mostrar aos alunos a diferença existente entre a pesquisa para produção de trabalho profissional e para a elaboração da monografia, porque na primeira o aluno está fazendo a pesquisa para elaboração de uma peça processual, uma pesquisa jurisprudencial, tem como tese principal a defesa de seu cliente. Na segunda é totalmente diferente, a pesquisa destina-se a elaboração da monografia, a qual segue um 'rito', não processual, mas acadêmico, realizado em várias fases.[54]

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7 A PESQUISA COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NO ENSINO JURÍDICO: EM DIREÇÃO AO PENSAMENTO CRÍTICO

Em face de uma "sociedade do conhecimento", que rapidamente se transforma, é essencial ao jurista, saber pensar por si próprio. Trata-se de aprender a aprender, o que lhe confere autonomia intelectual, seja para ocupar novos espaços de trabalho, ou para se fazer ator das mudanças sociais.

Por conseguinte, mais do que um princípio científico, a pesquisa pode se mostrar como um princípio educativo. "Educar pela pesquisa", como sustenta Pedro Demo, pode se traduzir em um mandato do ensino jurídico? Afirma esse autor, que:

Não há aprendizagem adequada sem pesquisa e elaboração própria. Não se aprende a formular, sem o desafio da autonomia na argumentação. Não aparece o profissional renovado e renovador, se não souber conjugar sabiamente teoria e prática, bem como desconstruir e reconstruir conteúdos. 'Educar pela pesquisa', ao lado de construir e reconstruir conhecimento, é mando central da universidade. Porquanto faz parte do perfil do profissional moderno, da ótica da universidade e sempre conjugando qualidade formal e política.[55]

A sala de aula é o ponto de partida para pesquisa como princípio educativo: professor e aluno tornam-se sujeitos de um processo educacional, calcado da problematização, crítica e criação do Direito. Deste modo, aprender não é apenas construir ou reconstruir o conhecimento, mas, ainda, desconstruí-lo.[56]

Considerando que a pesquisa é uma busca de conhecimento que parte da inquietação e do questionamento, ela contribui à resolução de problemas e é capaz de estabelecer um diálogo com a realidade. Esse diálogo deve ser crítico, contribuindo para construir processos emancipatórios no Direito.

Mas, no que consiste o pensamento crítico?

Ensina Michel Miaille, que dirigir críticas é exercer sobre coisas ou pessoas um número de juízos que visem corrigir tal erro, colmatar uma lacuna, denunciar insuficiências, em um sentido comum. Assim, criticar não é pôr em causa, pois o conjunto do edifício não é posto em questão, pelo simples fato de tomar posições, juízos, críticas. Eis que as críticas feitas não bastam para disfarçar a afinidade de correntes filosóficas e políticas.[57]

O verdadeiro significado de crítico é buscar o que não é visível para explicar o visível e definindo-se a localização histórico-espacial da construção teórica. Volta-se para a idéia de pesquisa como descoberta, uma vez que ela torna visível o invisível.

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Ocorre que o pensamento abstrato é capaz de evocar coisas ou realidades que estão ausentes. Mas o pensamento crítico é mais do que abstrato: é dialético. O pensamento dialético parte do fato que o mundo é complexo, compreendendo sua existência contraditória. Não se limita a descrever o que é visível, demonstrar como algo se apresenta, pois encara um objeto não apenas em seu estado atual, mas na totalidade de sua existência, tanto no passado que o produziu, como no futuro, que poderá superá-lo. Ele não se contenta em descrever um acontecimento, mas o concebe na totalidade do passado e do futuro da sociedade que o produziu. Por isso, esse pensamento pode fazer aparecer o que a realidade presente esconde, e que se mostra como igualmente importante. O pensamento crítico suscita o que não é visível para explicar o visível, recusando-se a crer que a realidade limita-se ao visível.[58] Portanto, o que não é revelado torna-se importante para fazer conhecer o que está aberto, como argumenta Eroulths Cortiano Jr:

Assim, a compreensão do direito de propriedade passa por saber o que está sendo oculto, e que não pode ser exposto por conta das próprias limitações do discurso. Essa a perspectiva que deve ser usada pelo professor e pelo aluno: tentar desvendar o que não se mostra. Onde se fala proprietário, encontrar o não-proprietário; quando se cuida da propriedade, visualizar as propriedades; no momento em que se aluda à tutela da propriedade, pensar as tutelas de acesso à propriedade. [59]

Abrir portas que sempre permanecem fechadas, significa, portanto, abrir as portas para o "método dialógico",[60] produzindo um pensamento crítico sob um novo cenário da relação de ensino-aprendizagem entre professores e alunos.

Trata-se de uma pedagogia de reflexão crítica, que retire o aluno de seu papel tradicionalmente passivo, evidenciado por alguém que apenas deve ouvir e memorizar e, por fim, repetir tudo o que foi "apreendido" em sala de aula. Eis que a transformação da função do jurista em nossa sociedade ocorre proporcionalmente à mudança do papel desempenhado pelo aluno na relação ensino-aprendizagem. Caminha-se, assim, em direção a uma "pedagogia do ser", que sugere a mudança da própria relação entre professores e alunos, para construção de novos saberes.

Rompe-se com o paradigma tradicional, representado pela "educação bancária",[61] segundo a qual não cabe ao aluno intervir na realidade apresentada pelo professor, e que se limita a tornar a formação do bacharel em Direito, em um acúmulo de informações e reprodução de teorias e proposições afastadas da realidade.

O "método dialógico" encontra-se ligado ao pensamento crítico e ao processo de transformação da sociedade. Eis que o diálogo é uma postura necessária para agir criticamente, para refletir sobre sua realidade, tornando-nos capazes de transformá-la.[62] Ajusta-se ao fato de que a ciência tem historicidade, sendo inevitável que um novo conhecimento seja ultrapassado por outro que há de surgir.[63]

Por outro lado, a reflexão crítica não parte nunca do nada, pois o conhecimento de hoje é o ultrapassar o de ontem, mas não no sentido de melhorá-lo, mas de propor um outro

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modo de colocar o problema. Todo conhecimento científico é obtido violentamente contra outro que se afirma como ciência, exigindo por vezes, golpes de força para se libertar. Há nisto uma transformação do conhecimento que o destrói como pretensão científica e substitui-lhe por outro universo. A reflexão científica convida-nos a um ultrapassar, isto é, abrir portas que se mantêm fechadas, de tal sorte que o pensamento crítico é um esforço de reflexão com todos os riscos e suas aberturas. [64]

A pesquisa, como princípio científico e educativo na universidade, tem como horizonte último a construção da cidadania. Não apenas porque professor e aluno mostram-se como sujeitos do processo educativo, mas porque a pesquisa tende a formar um pensamento crítico. Trata-se de romper o "mal construído" do Direito e formar o jurista como um "intelectual crítico, empenhado não mais em defesa de uma classe, a burguesia, mas da pessoa e seus interesses inalienáveis."[65]

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A mudança no papel a ser desempenhado pelo jurista, nos termos de um engenheiro social, não foi suficiente para afastá-lo do século XIX. Eis que ele ainda continua envolto por um "círculo mágico de fórmulas abstratas", que encerra sua atuação no esquema lógico da subsunção, afastando-o dos condicionantes econômicos, históricos e culturais e encerrando-o na reprodução do sistema. Nestes termos, delineia-se em sua atividade o "mal construído" do Direito.

Atentando-se para o fato de que não basta "encher odres velhos com vinho novo", deposita-se no ensino jurídico a permanência desse papel desempenhado pelo profissional do Direito. Constata-se na "pedagogia do ter" uma relação de ensino aprendizagem que confere ao aluno uma atuação passiva, tornando-o incapaz de ler criticamente a realidade. Proclama-se a formação de um pensamento crítico como objetivo a ser alcançado por uma "pedagogia da capacidade de pensar e saber", que deve se fazer presente no ensino jurídico.

Para tanto, trilhou-se o caminho pavimentado pela pesquisa, cujo panorama no cenário jurídico nacional traduz relativo atraso em relação a outras ciências. Contribuem para isso, a unidisciplinaridade e neutralidade da pesquisa no Direito, e o fato de sua prática traduzi-la de modo mitigado, como princípio, tão-somente, científico.

É nesse momento, que as críticas suscitadas por Pedro Demo encontram lugar: a tarefa da universidade é construir e reconstruir o conhecimento. Porém, ela não ultrapassa um ensino que consiste em mera reprodução do conhecimento e que pouco chega a pesquisa e extensão.

É preciso saber construir e reconstruir o conhecimento, com um sentido social. Sustenta-se, então, a pesquisa como princípio não apenas cientifico, mas educativo, como propõe aquele autor.

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Voltando as reflexões para o significado do que é pesquisa, a partir da metáfora delineada por Michel Miaille, restou claro que pesquisar é descobrir. Buscar no que não é visível, a explicação do que é visível. Trata-se de recorrer ao pensamento dialético, que se revela interdisciplinar, como premissa de condução para o pensamento crítico. Somente a capacitação do aluno de Direito, como apto a ler criticamente a realidade contribuirá para a formação da cidadania, e do jurista como intelectual crítico.

REFERÊNCIAS

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[1] BARCELLONA, Pietro. La formación del jurista. Madri: Editorial Civitas, 1977, p. 27.

[2] Trata-se do jurista, aqui tomado como aquele que está a operar com o Direito diariamente, seja ele advogado, juiz, professor ou pesquisador, atuando nos diversos setores da vida jurídica.

[3] Como aponta MIAILLE, Michel. Introdução crítica ao direito. 2 ed. Lisboa : Estampa, 1994, p. 174.

[4] FERNÁNDEZ, Rosário Valpuesta. Una reflexion sobre el conocimiento. GARRIGÓS, Lucía Provencio (Ed.). Abarrotes. La constucción social de lãs identidades coletivas en amércia latina. Universidad de Murcia, 2006, p. 418.

[5] BARCELLONA, op. cit., p. 25.

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[6] BARCELLONA, op. cit., p. 26.

[7] Op. cit., p. 27.

[8] Op. cit., p. 40-41.

[9] BARCELLONA, op. cit., p. 34.

[10] BARCELLONA, op. citl, .p. 33.

[11] Op.cit., p. 52.

[12] WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. 2. ed. Lisboa : Calouste Gulbenkian, 1967, p. 626.

[13] OLIVEIRA, José Lamartine Correia de. Por estranho que pareça estudar ainda é preciso. Revista da OAB/RJ. Rio de Janeiro, n. 16, p. 41-53, 2. quadr. 1981, p. 44.

[14] MIAILLE, op. cit., p. 173.

[15] Op. cit., p. 173.

[16] Op. cit., p. 174.

[17] Op. cit., p. 175.

[18] OLIVEIRA, op .cit., p. 48.

[19] OLIVEIRA, op .cit.,, p. 49.

[20] A denominação é de Catherine THIBIERGE: "pédagogie de l'être". (Enseigner le droit civil à l'aube du XXIº siècle. Revue Trimestrielle de Droit Civil, Paris, nº 2, p.306-313, avril-juin, 1998. p. 309)

[21] THIBIERGE, op. cit., p. 310.

[22] "O ensino do direito, que aprova um amplo emprego à memorização e à exposição de saberes formais, ainda que um curso magistral, porque centrado principalmente no conteúdo da matéria, ganharia ao se polarizar também na pessoa dos alunos." Tradução livre de: "L' enseignement du droit, qui accorde une large place à la mémorisation et à l'exposé de savoirs formels lors des cours magistraux, parce que centré principalement sur le contenu de la matière, gagnerait à se polariser aussi sur la personne des étudians." (THIBIERGE, op. cit., p. 310)

[23] THIBIERGE, op. cit., p. 310-311.

[24] CORTIANO JR., Eroulths. O discurso jurídico da propriedade e suas rupturas. Uma análise do ensino do direito de propriedade. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 150.

[25] CORTIANO JR., op. cit., p. 150.

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[26] "A mim me parece que sem a presença - como elemento importante do ensino da aula expositiva não é possível que o estudante chegue lá. Porque para o estudante chegar a esta tarefa de reflexão crítica tem de lhe ser fornecida, inclusive, a noção de sistema. Não apenas 'sistema' no sentido externo, taxinômico, quer dizer, a maneira como as matérias se arrumam entre as normas, dos pensamentos e fundamentos comuns que inspiram normas aparentemente distantes umas das outras nas mesmas leis ou em leis diversas e que, não obstante, se ligam por um pensamento comum. É preciso que isto seja desmontado para o estudante, para que ele perceba qual é a lógica interna do conteúdo do pensamento do sistema dominante para que, conhecendo-a, possa criticá-la." (Por estranho que pareça estudar ainda é preciso, p. 48). Neste sentido, cf. ainda: OLIVEIRA, José Lamartine Correia de. A liberdade e o ensino jurídico. Revista de Direito Civil. Imobiliário, agrário e empresarial, São Paulo, nº 39, ano 11, p. 40-67, jan-mar, 1987, p. 53).

[27] "Ao criticar a educação 'bancária', temos que reconhecer que nem todos os tipos de aulas expositivas podem ser considerados educação 'bancária'. Você pode ser muito crítico fazendo preleções". (Medo e ousadia. O cotidiano do professor. Tradução de Adriana Lopez. 6ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996., p. 53).

[28] Op. cit., p. 174.

[29] CORTIANO JR., op. cit., p. 169.

[30] "Sabemos que não é a educação que modela a sociedade mas, ao contrário, a sociedade é que modela a educação segundo os interesses dos que detêm o poder. Se é assim, não podemos esperar que a educação seja a alavanca da transformação destes últimos. [...] na educação libertadora, o professor usa o espaço educacional sem ser ingênuo. Ele sabe que a educação não é a alavanca para a transformação revolucionária precisamente porque deveria sê-lo! " (FREIRE; SHOR, op. cit., p. 49-50).

[31] É por isso, que aduz Roberto A. R. de AGUIAR: "O advogado não pode, como agente essencial da aplicação e criação do Direito, ser apenas um repetidor, mas um incentivador e agente da transformação técnica, a fim de que a sociedade não fique à mercê dos autoritarismos, dos abusos de poder, das desobediências à legalidade, da banalização da violência e da morte. O advogado há de ter uma ação transformadora dessas práticas ancestrais". (A contemporaneidade e o perfil do advogado. In: CONSELHO FEDERAL DA OAB.OAB e o ensino jurídico. Novas diretrizes curriculares. Brasília: Conselho Federal da OAB, 1996. p. 129-139, p. 131)

[32] "A tarefa reprodutiva da ideologia dominante leva a obscurecer a realidade, a evitar que as pessoas adquiram uma percepção crítica, que 'leiam' sua própria realidade de forma crítica, que aprendam a razão de ser dos fatos que elas descobrem." (FREIRE; SHOR, op. cit., p. 49-50).

[33] FERNÁNDEZ, op. cit., p. 418.

[34] FERNÁNDEZ, op. cit., p. 418.

[35] DEMO, Pedro. Conhecimento e aprendizagem na universidade, março/abril, 1999, p. 4, fotocopiado.

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[36] DEMO, op. cit., p. 4.

[37] ALMEIDA, Maria Suely Cruz de. Os trabalhos de conclusão de curso e a contribuição para a produção do conhecimento científico no ensino do direito. Anais do Conpedi. Manaus, 2006, Fundação Boiteux, p. 5.

[38] ALMEIDA, op. cit., p. 5.

[39] Op. cit., p. 16.

[40] Op. cit., p. 17.

[41] O que é pesquisa em Direito? São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 24.

[42] FRAGALE FILHO, Roberto; VERONESE, Alexandre. A pesquisa em Direito: diagnóstico e perspectivas. RBPG, v. 1, n.2, p. 53-70, nov. 2004, p. 62.

[43] "O estudo do Direito não deve ser feito por setores pré-constituídos, mas por problemas, com especial atenção às exigências emergentes como, por exemplo, a habitação, a saúde, etc. Os problemas concernentes às relações civilísticas devem ser colocados recuperando os valores publicísticos ao Direito Privado e os valores privatísticos ao Direito Público." (PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil. Introdução ao direito civil constitucional. Trad. de: Maria Cristina de Cicco. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 55)

[44] NOBRE, op. cit., p. 26.

[45] CORTIANO JR., op. cit., p. 132.

[46] FACHIN, Luiz Edson. Limites e possibilidades do ensino e da pesquisa jurídica: repensando paradigmas. Direito, Estado e sociedade, n. 15, ago.-dez., p. 1999, p. 66

[47] Apud FACHIN, op. cit., p. 63. Justifica o autor: "...não há sistemas neutros porque o sistema externo 'é um sisitema de educação jurídica, quer dizer, um sistema de comunicação da matéria da lei e um sistema de persuasão sobre o interesse da lei', daí lhe advindo 'um indiscutível relevo para a compreensão do ordenamento: dos seus valores, do seu 'projecto' ideológico e sociológico, numa palavra, da sua táctica e da sua estratégia (...). Sem dúvida, a minha crítica é idológico-política e não podia conscientemente não o ser, porque todo o Direito é ideológico-político (e tanto mais quanto menos o mostra...) como ideológico-político é o seu sistema de exposição." (CARVALHO, Orlando de. Para uma teoria da relação jurídica. 2. ed. Coimbra: Centelha, 1981. v. 1., p. 15)

[48] DEMO, op. cit., p. 4.

[49] Cf. SCAFF, Fernando Facury. Ensino, pesquisa e profissões jurídicas. Jornal da Ciência. Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, n. 2788, 13 de junho de 2005.

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[50] Op. cit., p. 31-32.

[51] Op. cit., p. 4. Segundo Laura Garbini Both: "... as atividades de ensino consistem na promoção de cursos, oficinas, seminários didáticos e técnicos, na realização de visitas técnicas e de trabalhos de campo, na organização de grupos de trabalho e atividades culturais, como também, na participação em congressos, seminários e simpósios; as atividades de pesquisa consistem no desenvolvimento de projetos, trabalhos, artigos, monografias - individuais ou coletivas visando a publicação em periódicos, anais, livros, jornais; e, finalmente, as atividades de extensão consistem no desenvolvimento de atividades para a comunidade interna (na própria Instituição de Ensino Superior) e externa (segmentos da sociedade civil e do poder público)." (O programa de educação tutorial (PET) na formação do bacharel em direito: reflexões teóricas e relato de um experiência no âmbito dos direitos humanos e democracia. Cadernos da escola de direito e relações internacionais da UniBrasil, v. 8, n. 8 (jun./jul. 2008). Curitiba: UniBrasil, 2008, p. 40).

[52] Op. cit., p. 41.

[53] Cf. BOTH, op. cit., p. 42.

[54] ALMEIDA, op. cit., p. 5.

[55] DEMO, op. cit., p. 9.

[56] Paulo Freire e Ira Shor advertem para o fato de que "O educador libertador tem que estar atento para o fato de que a transformação não é só uma questão de métodos e técnicas. Se a educação libertadora fosse somente uma questão de métodos, então o problema seria mudar algumas metodologias tradicionais por outras mais modernas. Mas não é esse o problema. A questão é o estabelecimento de uma relação diferente com o conhecimento e com a sociedade." (Op. cit. p. 48)

[57] Op. cit., p. 21.

[58] "Assim funciona o que eu chamo o pensamento crítico: ele merece este qualificativo neste sentido em que, suscitando o que não é visível, para explicar o visível, ele se recusa a crer e a dizer que a realidade se limita ao visível. Ele sabe que a realidade está em movimento, quer dizer, que qualquer coisa para ser apreendida e analisada tem de o ser no seu movimento interno; não se pode, pois, abusivamente reduzir o real a uma das suas manifestações, a uma das suas fases". (MIAILLE, op. cit., p. 22)

[59] Op. cit., p. 171.

[60] Paulo FREIRE e Ira SHOR explicam o "método dialógico": "[...] o diálogo deve ser entendido como algo que faz parte da própria natureza histórica dos seres humanos. É parte de nosso progresso histórico do caminho para nos tornarmos seres humanos. [...] o diálogo é uma espécie de postura necessária, na medida em que os seres humanos se transformam cada vez mais em seres criticamente comunicativos. O diálogo é o momento em que os humanos se encontram para refletir sobre sua realidade tal como a fazem e re-fazem. Outra coisa: na medida em que somos seres

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comunicativos, que nos comunicamos uns com os outros enquanto nos tornamos mais capazes de transformar nossa realidade, somos capazes de saber que sabemos, que algo mais do que só saber. [...] Através do diálogo, refletindo juntos sobre o que sabemos e não sabemos, podemos, a seguir, atuar criticamente para transformar a realidade." (Op. cit., p. 122-123)

[61] Cf. FREIRE; SHOR, op. cit., p. 123.

[62] FREIRE; SHOR, op. cit., p. 123.

[63] FREIRE; SHOR, op. cit., p. 126.

[64] "Talvez haja portas que possamos abrir que as doutrinas precedentes e as afirmações de hoje mantêm fechadas. É esse ultrapassar a que vos convida toda a reflexão científica: e, como qualquer reflexão científica, ela reveste de algum modo o caráter de uma aventura. Ninguém sabe que dificuldades nos esperam nessa exploração". (MIAILLE, op. cit., p. 25)

[65] AMARAL, Francisco. Racionalidade e sistema no direito civil brasileiro. Separata de: Revista O Direito. Rio de Janeiro, a. 126, n. 1-2, p. 63-81, 1994, p. 81.

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