FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO ... · QUADRO N.º 9: Justificativas às...
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FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO COMUNITÁRIO:
INFÂNCIA E JUVENTUDE
HÁ CRITÉRIOS PARA O PERDÃO?
Angela Caren Dal Pos
Porto Alegre, JUNHO DE 2003
70
FUNDAÇÃO ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO COMUNITÁRIO:
INFÂNCIA E JUVENTUDE
HÁ CRITÉRIOS PARA O PERDÃO?
UM OLHAR SOBRE O SUBJETIVISMO NA REMISSÃO
E MEDIDA SOCIOEDUCATIVA
Angela Caren Dal Pos
Porto Alegre, JUNHO DE 2003
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ORIENTADOR:
JORGE TRINDADE
DOUTOR (PH.D.) PELA WISCONSIN INTERNATIONAL
UNIVERSITY (ESTADOS UNIDOS)
MESTRE PELA UNIVERSIDADE EXTREMADURA
ESPANHA
LIVRE-DOCENTE PELA ULBRA/RS E DIRETOR-
ADJUNTO DA FACULDADE DE DIREITO DA
ULBRA/RS
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TERMO DE APRESENTAÇÃO
Trabalho de conclusão de curso de Pós-Graduação – Especializaçãoem Direito Comunitário: Infância e Juventude
HÁ CRITÉRIOS PARA O PERDÃO? UM OLHAR SOBRE OSUBJETIVISMO NA REMISSÃO E MEDIDA SOCIOEDUCATIVA
Apresentado por
ANGELA CAREN DAL POS
Para obtenção de título de Especialista em Direito Comunitário :Infância e Juventude
na ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
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... as piores atrocidades contra a infância se cometeram (e se cometem
ainda hoje) muito mais em nome do amor e da compaixão, que em nome da
própria repressão. Tratava-se (e ainda se trata) de substituir a má, porem
também “boa” vontade, nada mais – porém nada menos - , pela justiça. No
amor não há limites, na justiça sim. Por isso, nada contra o amor quando o
mesmo se apresenta como um complemento da justiça. Pelo contrário, tudo
contra o “amor” quando se apresenta como um substituto cínico ou ingênuo
da justiça.
Emilio Garcia Mendez, 2000.
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DEDICO este trabalho aos amores de minha vida:
Deus, meus pais, meus irmãos Michele e Marcio, meu
querido Fabiano.
Aos primeiros por contribuírem fundamentalmente
para a construção do que sou; ao último por seu amor,
apoio e compreensão incondicionais.
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AGRADEÇO a todas as pessoas queridas, que
fazem parte de minha vida, especialmente a Fabiane
Rios Lisardo, pelo incentivo e paciência com a privação
de nossa convivência em prol da dedicação a esse
trabalho.
Também aos colegas Promotores de Justiça que
concordaram em responder essa pesquisa, sem os quais
esse trabalho não seria possível.
Ao Professor Emílio Garcia Mendez, por sua obra
inspiradora.
Ao Professor Jorge Trindade por sua amizade e
orientação, e por me fazer acreditar que seria possível
essa realização.
À Fundação Escola Superior do Ministério Público
pelo incentivo financeiro que me foi proporcionado.
À Administração do Ministério Público do Rio Grande do
Sul, por estimular o aprimoramento profissional de seus
membros.
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SUMÁRIO:
Lista de Quadros................................................................................ IX
Lista de Gráficos................................................................................. X
Lista de Tabelas................................................................................. XI
Lista de Abreviaturas..........................................................................XII
Resumo .............................................................................................XIII
Introdução.............................................................................................1
I- PARTE: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
1- DA PENA À MEDIDA SOCIOEDUCATIVA.....................................4
2- AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO ECA..............................36
3- A REMISSÃO................................................................................52
II- PARTE: CONTRIBUIÇÃO PESSOAL
4- ASPECTOS METODOLÓGICOS..................................................67
5- APRESENTAÇÃO E DICUSSÃO DOS RESULTADOS................69
6- CONCLUSÃO................................................................................98
7- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................XIV
8- ANEXO.........................................................................................XX
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LISTA DE QUADROS
QUADRO N.º 01: Divisão da História em Períodos........................................5
QUADRO N.º 2: Momentos da Concessão da Remissão.............................53
QUADRO N.º 3: Valoração dos Critérios......................................................71
QUADRO N.º 4: Critérios e Valores Atribuídos............................................73
QUADRO N.º 5: Justificativas às Respostas da Pergunta 6........................76
QUADRO N.º 6: Justificativas às Respostas da Pergunta 7A.....................79
QUADRO N.º 7: Justificativas às Respostas da Pergunta 7B.....................82
QUADRO N.º 8: Justificativas às Respostas da Pergunta 7C.....................85
QUADRO N.º 9: Justificativas às Respostas da Pergunta 7D.....................89
80
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LISTA DE GRÁFICOS:
GRÁFICO N.º 01: População e
Amostra.............................................68
GRÁFICO N.º 2: Promotores de Justiça
Participantes........................69
82
83
LISTA DE TABELAS:
TABELA N.º 1 : N.º DE PROMOTORES DE JUSTIÇA EM RELAÇÃO À
FUNDAMENTAÇÃO OU NÃO DO PEDIDO DE REMISSÃO QUANDO DA
HOMOLOGAÇÃO À
JUÍZO...............................................................................74
TABELA N.º 2 : N.º DE PROMOTORES DE JUSTIÇA EM RELAÇÃO À
CONCESSÃO OU NÃO DE REMISSÃO MESMO QUANDO O
ADOLESCENTE NÃO ADMITE O
FATO.....................................................................................75
TABELA N.º 3 : SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORS DE JUSTIÇA
PARA A PERGUNTA
7A...................................................................................79
TABELA N.º 4 : SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORS DE JUSTIÇA
PARA A PERGUNTA
7B...................................................................................81
84
TABELA N.º 5 : SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORS DE JUSTIÇA
PARA A PERGUNTA
7C...................................................................................85
TABELA N.º 6 : SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORS DE JUSTIÇA
PARA A PERGUNTA
7D...................................................................................88
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
TERMOS SIGLAS
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ECA
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE PSC
LIBERDADE ASSISTIDA LA
CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO CNH
LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS LCP
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RESUMO
A presente monografia buscou realizar um estudo prático acerca dos
critérios utilizados para a concessão da remissão, escolha das medidas
sócio educativas e fixação do prazo, pelos Promotores de Justiça da Infância
e Juventude do Rio Grande do Sul.
Teve por objetivo demonstrar a subjetividade e discricionariedade que
envolve a efetividade desses institutos, podendo configurar violação de
direitos do adolescente em conflito com a lei, na medida que permite a
concessão de remissão e aplicação de medida socioeducativa, de caráter
penal, sem o devido processo legal, sujeitas unicamente à conveniência do
Promotor de Justiça ou Magistrado, desrespeitando o princípio da igualdade
e a doutrina de proteção integral instituídos no ECA .
Foi realizada pesquisa através de questionário respondido por
Promotores da Infância e da Juventude, titulares ou substitutos, acerca do
modo e critérios utilizados para a concessão da remissão e escolha da
medida socioeducativa a ser aplicada e o prazo estipulado para o
cumprimento, bem como a justificativa. O estudo revelou enorme
disparidade nas respostas para casos hipotéticos idênticos, ou seja, que não
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há consenso nos critérios, estando no âmbito da subjetividade e
discricionariedade do aplicador do Direito. Também demonstrou a fragilidade
do sistema no que tange à suscetibilidade de violação de direitos
constitucionais em relação à Infância e Juventude, ensejando a reflexão e
discussão de pontos significativos para o aprimoramento das questões
envolvendo o direito menorista.
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INTRODUÇÃO:
A idéia do presente trabalho surgiu a partir de uma inquietação,
enquanto Promotora de Justiça Criminal, muitas vezes chamadas para atuar
na área da Infância e Juventude, ao ter que aplicar remissão, cumulada ou
não com medida socioeducativa, sem encontrar, no Estatuto da Criança e do
Adolescente, a resposta acerca dos critérios a serem adotados para tal,
quais os atos infracionais passíveis de remissão, qual medida adequada,
quanto de medida é suficiente, o que me dava a sensação de poder
desmedido e arbitrário. Ainda mais quando comparado ao Direito Penal,
onde, ressalva feita à transação nos crimes de menor potencial ofensivo,
não é possível aplicação de pena sem o devido processo legal. Não parecia
correta a aplicação de medida socioeducativa, entendida de natureza penal,
sem o respeito dos direitos processuais constitucionais, como é garantido
aos adultos, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Tal inquietação aumentou a partir de uma aula ministrada pelo
eminente professor, aqui muitas vezes doravante citado, Emílio Garcia
Mendez, acerca da subjetividade e discricionariedade no Estatuto da Criança
90
e do Adolescente, despertando a vontade de aprofundar a matéria e
contribuir com o debate para o melhoramento do Direito Menorista.
Esse olhar que me proponho a lançar sobre o estatuto, pretende
explorar a Natureza Jurídica Penal das Medidas socioeducativas e o
problema da falta de critérios legais definidos para a concessão da remissão
e para a escolha e dosimetria dessas medidas a serem aplicadas,
configurando ato subjetivo e discricionário do aplicador do direito, atentando
contra os direitos fundamentais do jovem em conflito com a lei.
Trata-se de um estudo prático acerca dos critérios utilizados para a
concessão da remissão e escolha das medidas sócio educativas pelos
Promotores de Justiça da Infância e Juventude do Rio Grande do Sul.
O problema levantado leva a refletir acerca do tema e buscar soluções,
pois inúmeras disparidades vêm sendo praticadas, a ponto de configurarem
sérias injustiças contra os adolescentes infratores, ao aplicar-se, para casos
idênticos, respostas muito diferentes, a critério única e exclusivamente do
entendimento do Promotor de Justiça, o que vai de encontro com os
propósitos do Estatuto da Criança e do Adolescente. A pesquisa, ainda que
realizada somente junto aos membros do Ministério Público, permite chegar
às mesmas conclusões quando da remissão e aplicação de medida
socioeducativa pelo magistrado como forma de extinção ou suspensão do
processo.
Não se pretende, de modo algum, questionar a idoneidade e zelo no
desempenho das atribuições dos Promotores de Justiça ou Magistrados que
laboram junto à Justiça Menorista, mas apenas demonstrar a necessidade
91
de limitar-se o subjetivismo e discricionariedade, pois, como diz Mendez1, as
maiores atrocidades são cometidas em nome do amor, pois nesse não há
limites, na justiça sim.
Tais questionamentos poderão permitir a elaboração de projetos
visando a alteração legislativa e outros aperfeiçoamentos, ou, pelo menos, e
já terá tido grande valia, a reflexão no assunto e contribuição para a
modificação da consciência e de atitude, dos aplicadores do direito, no trato
das questões envolvendo a Infância e Adolescência.
PARTE IRevisão Bibliográfica
1 MENDEZ, Emílio Garcia. Por uma Reflexão sobre o arbítrio e o Garantismo na Jurisdiçãosocieducativa. Porto Alegre: AJURIS, ESMP-RS, FESDEP-RS, 2000, P. 13.
92
93
1- DA PENA À MEDIDA SOCIOEDUCATIVA
1.1-Evolução Histórica da Pena:
Historicamente, observamos que os sistemas punitivos evoluíram com o
passar do tempo, acompanhando a evolução do pensamento que se seguiu
com a evolução do próprio homem.
94
“Leciona Carnelutti que el primado históricopertence al derecho penal. Cuándo el derecho nace,nace como derecho penal.2 Pode-se afirmar, portanto,que um dos principais motivos da racionalização ehumanização do direito foi a resistência imposta pelopensamento folosófico-jurídico às manifestações debarbárie dos Tribunais do Santo Ofício daInquisição.”3
É importante ter em mente os períodos da divisão clássica da história, a
fim de melhor compreender os acontecimentos de acordo com o contexto
histórico.4
QUADRO N.º 1: DIVISÃO DA HISTÓRIA EM PERÍODOS
Nome do Período Marcos Históricos Divisores
Idade Antiga Abrange o desenvolvimento das antigas civilizaçõesorientais e clássicas até a queda do Império Romano doOcidente
Idade Média Compreendida entre a queda do Império Romano doOcidente e a tomada de Constantinopla pelos turcos (1453)
Idade Moderna Inicia com a queda de Constantinopla e termina com aRevolução Francesa de 1789.
Idade Contemporânea Tem início com a Revolução Francesa, alcançando nossosdias
2 CARNELUTTI, apud CARVALHO, Salo de. Pena e Garantias. Rio de Janeiro: Lumen Juris,2001, p. 33.3 CARVALHO, Salo de. Pena e Garantias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 23.
4 SOUTO MAIOR, Armando. História Geral: para o ensino de 2º grau. 21. ed. São Paulo:Nacional, 1978, p. 5.
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O Direito Penal é uma construção social – para existir é necessário a
formação do ESTADO –na concepção de poder centralizado.
Antes da concepção de Estado centralizado, a sociedade reunia-se em
pequenos grupos de iguais. Embora não existente ainda o Direito Penal,
esses grupos tinham seus próprios mecanismos de resolução de conflitos.
A origem do Direito Penal está ligada a religião, à superstição religiosa
e a pena teria origem sagrada.5
As comunidades primitivas acreditavam, em razão de seu precário
conhecimento científico, que os fenômenos meteorológicos eram fruto de
influências espirituais, os quais tinham participação direta na vida das
pessoas, premiando-os ou castigando-os em razão de seu comportamento.
Era necessário adequar a conduta humana de forma a obter a benevolência
ou proteção desses seres imaginários.6
As religiões primitivas se fundavam no tabu, ou seja, na lei religiosa que
representava uma expressão de controle social dos povos, garantido pelas
sanções sobrenaturais.7
Daí que as violações das proibições emanadas dos tabus impunham
penas severíssimas, sendo a mais comum a de morte. Como a infração de
um tabu representava uma ofensa ao ser sobrenatural, cuja ira recairia sobre
todo o grupo, era necessário que toda a comunidade participasse do ato de
castigar, eximindo-se, assim, da vingança que ocorreria. A pena, embora
5 ARROJO, Manuel Lopez-Rey y. apud PIERANGELI, José Henrique. Escritos JurídicosPenais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.340.6 PIERANGELI, José Henrique. Escritos Jurídicos Penais. 2. ed. São Paulo: Revista dosTribunais, 1999, p.341.7 PIMENTEL, Manoel Pedro. apud PIERANGELI, op. cit., p.341.
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tendo a função reparatória de aplacar a ira da entidade, não correspondia a
uma reparação social, porque o delito ainda estava ligado a idéia de pecado
e não como uma ofensa contra o organismo social existente. 8
Num segundo período, as formas primárias de reação penal encontram
lugar na vingança ilimitada ou vingança de sangue, consistente em uma
indiscriminação absoluta e irracional de aplicação de pena às coisas, aos
animais e até aos cadáveres, inclusive aqueles já sepultados. As penas se
caracterizavam pela vindita, não estando submetidas a qualquer critério de
proporcionalidade ou de justiça.
O cometimento de um crime causava uma reação não só da vítima,
mas também de seus parentes, sua tribo ou clã, resultando em lutas de
grupos, com graves conseqüências, pois eram improdutivas e extenuantes,
enfraquecendo o próprio grupo, em razão da retaliação dos familiares e
despojamento dos bens. Isso criou a necessidade de limitar-se a pena, a fim
de que atingisse tão-só ao autor do delito. Refere Boschi9 que:
“Como corolário disso, a vingança de sangueacabou sendo substituída por duas outras penas demenor espectro: a de expulsão do ofensor e a de seubanimento do próprio grupo. Elas eram visivelmentesuperiores à vingança de sangue porque preveniam aeclosão de movimentos grupais de vingança e, ainda,porque ao direcionar seus efeitos só sobre a pessoado autor da falta, funcionavam, direta ouindiretamente, como instrumentos de proteção dosinocentes ”
8 PIERANGELI, op. cit., p.341/342.9 BOSCHI, José Antonio Paganella. Das Penas e seus Critérios de Aplicação. 2. ed. PortoAlegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 91.
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O talião representou um grande avanço para a época, sendo apontado
como a primeira manifestação explícita de punição proporcional à falta
cometida. Em Roma, afirmava-se quod aliquis tale quid patitur, quale fecit, e
a lei mosaica proclamava o olho por olho, dente por dente.
O talião apresentava duas formas: uma similar ao suplício encontrável
na lei mosaica (hebreus), na Lei das XII Tábuas (romanos), no Código de
Hamurabi (babilônicos) e na maioria das existentes naquela época; outra,
dita talião simbólico, consistia em castigar o agente exatamente no órgão
corporal utilizado para a prática do crime: cortava-se a mão do ladrão, a
língua do caluniador, marcava-se o rosto da adúltera, castrava-se o
estuprador.
“É assim que se vê o filho órfão guardar a bala, deque pereceu seu pai, para devolvê-la em ocasiãooportuna, ao peito do assassino. É assim que ohomem do povo, a quem a calúnia feriu no maisfundo de sua dignidade, não tem outra idéia senão ade cortar a língua de seu caluniador. É ainda assimque, nos atentados contra a honra feminina, nãoraras vezes a desafronta só se dá por justa ecompleta, castrando-se o delinqüente.”10
Refere Pierangeli11:
“A solução talional, encontra, ainda hoje, apoionas concepções retribucionistas, e mesmo avisualização da pena como imperativo categórico deKant, não passa de uma projeção talional.”
10 BARRETO, Tobias apud Boschi, op. cit., p. 9111 Pierangelli, op. cit., p. 344
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Entretanto, adverte o mesmo autor que:
“não se pode querer encontrar no talião ascaracterísticas modernas de retribuição adequada àreparação da ordem, e da paz social, anulando-secom ela o alarme produzido pelo delito, e arestauração da fé no ordenamento jurídico estatal,concepção moderna dos fins da pena, como possaalguém pensar.”
Embora o talião tenha introduzido as primeiras formas de composição e
a reparação do dano através da entrega de dinheiro, bens objetos de
natureza ou prestação de serviços, está muito longe da concepção moderna
de reação penal.
A composição foi outro sistema considerado bastante avançado na
limitação da vingança privada, onde a vítima e seus familiares ao receberem
bens, dinheiro, etc., na forma estabelecida pelas regras consuetudinárias ou
escritas em textos legais, renunciavam à vingança e ao talião. Com essa
pena, redirecionou-se a reação ao patrimônio e não mais ao corpo do autor
da falta.
A perda da paz, por sua vez, foi considerada a mais grave das penas
conhecidas pelos germanos que predominaram, já na Idade Média, do
século V até o século XI, sendo muitas vezes empregada como sucedâneo
da vingança de sangue. Era uma conseqüência do sistema talional: quem
lesa a paz, perde a paz.
O homem germano da época atribuía grande valor para a liberdade e
individualidade, integrado a um grupo social. Quando essa ordem do grupo
era rompida, havia uma agressão ao direito à paz, que era imposta pelos
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deuses, surgindo o delito. A lesão à paz alheia significava um atentado ao
culto, que impunha ao outro a vingança.
A paz significava a ordem e o direito, e a perda da paz correspondia à
perda da proteção jurídica, ou seja, referia-se à pessoa do agressor e aos
seus bens, permitindo qualquer lesão à sua pessoa e coisas, levando, em
definitivo, à sua morte e à destruição ou devastação de seus bens. Isso
poderia ocorrer pela mão do particular ou por atos populares. Entretanto, à
medida que se foi tornando público o direito penal, a vingança foi sendo
limitada por via da composição, que de optativa passou a ser obrigatória.
Atualmente, as atuais abordagens abolicionistas destacam essa
experiência histórica individualista, posto que até o século XIII a influência
germânica impunha-se com este gênero de sanções mais reparatórias do
que punitivas.12
Retomando a análise das civilizações antigas existentes, verifica-se que
o sistema talional, ainda na forma de vingança privada, era muito comum.
Apesar da limitação da proporcionalidade ditada por esse sistema, as penas
aplicadas consistiam nos mais diversos suplícios corporais, especialmente
para os crimes considerados mais graves. As sociedades antigas (v.g.
China, Índia, Japão, Coréia, Sião, Egito, Babilônia) experimentaram as mais
dolorosas sanções que iam desde marca de ferro na testa, amputação de
partes do corpo, escravidão, trabalhos forçados, a outras extremamente
cruéis, tais como picotamento dos olhos com ferro em brasa, abraçar uma
coluna de ferro incandescente, desquartização, cozimento, forca,
crucificação, decapitação, morte por imersão, sepultamento em vida. Só
12 ZAFFARONI, Raul Eugênio, PIERANGELLI, José Henrique. Manual de Direito PenalBrasileiro, Parte Geral. 4. ed. revista. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 180.
100
para dar alguns exemplos, na Babilônia, o Código de Hamurabi previa que
as crianças podiam ser objeto de furto porque eram consideradas coisas. No
furto calamitoso, o autor era atirado vivo às chamas, a mulher adúltera era
atirada às águas dos rios, com as mãos atadas; o furto com rompimento de
obstáculo levava à morte e ao emparedamento. Na Fenícia, à profanação
dos templos de Astarte, Anat ou Reschuf, a pena era a de morte executada
com o encerramento do ofensor no interior de um boi - sem as vísceras -
sob o qual se acendia uma grande fogueira, que aquecia o metal de
sustentação até a incandescência, produzindo queimaduras atrozes, e, em
seguida, a morte. Em Roma, os ofensores dos fundamentos da religião eram
atirados vivos às chamas (crematio), crucificados, mortos por submersão na
água, ou esquartejado por animais.
Esses suplícios seguiram-se por todo o período da Idade Média. A partir
do ano 1232, com o nascimento da inquisição, tornaram-se penas estatais,
aplicadas desumana e desmedidamente, com o fim de assegurar o poder
político alcançado pelo consórcio entre o Estado e a Igreja Católica. Tinham
por fim não a reconstrução moral do homem, mas expressar a ira dos reis e
da Igreja contra todos os que se insubordinassem contra o poder absoluto
ou ousassem pensar diferentemente da cartilha religiosa. Inclusive o modelo
inquisitivo, ainda hoje aplicado em nosso sistema penal e processual penal,
fundado na fusão da figura do julgador, acusador e defensor na mesma
pessoa, tem sua origem na inquisição católica. Essa época perdurou até a
implantação da Revolução Francesa.13
A propósito, Foucault14 descreveu o doloroso suplício de Damiens,
condenado por parricídio, em 02/03/1757, remetendo-nos ao período da
13 BOSCHI, op. cit., p. 95.14 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 25. ed. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 9/11.
101
barbárie primitiva em plena época pré-iluminista, demonstrando como somos
propensos a violar os direitos humanos, na medida em que negamos a
própria natureza do outro, a fim de justificar as crueldades que cometemos
contra nossos iguais.
Similar desconsideração do “outro” deu-se na época das “descobertas”
da América pelo povo europeu onde, segundo Düssel15:
“Houve uma violência irracional nas colônias, nãoapenas física, mas cultural, que simplesmente negoua identidade do ‘outro’, seja através de uma posturaassimilacionista, seja através da simples exclusão eeliminação. Tudo isto está simbolizado no ‘mitosacrificial’, isto é, toda a violência derramada naAmérica Latina era, na verdade, um ‘benefício’ ou,antes, um ‘sacrifício necessário’. E diante disso, osíndios, negros ou mestiços eram duplamenteculpados por ‘serem inferiores’ e por recusarem ‘omodo civilizado de vida’ ou a ‘salvação’, enquanto oseuropeus eram ‘inocentes’, pois tudo o que fizeramfoi visando a atingir o melhor.”
Como reflexo, a imensa população latino-americana, representada
pelos índios, negros e mestiços, segue miserável e oprimida,
desconsiderada em sua alteridade cultural por uma cultura eurocentrista de
marginalização, em razão da qual se seguiu a disciplina dos sistemas penais
latino-americanos, característicos por sua prática violenta e genocida contra
essa mesma população, que é a que compõe o cárcere.
Refere Zaffaroni16:
15 DÜSSEL apud SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. Da “Invasão” da América aosSistemas Penais de Hoje: Discurso da “Inferioridade Latino-Americana”. Revista de EstudosCriminais 7. Porto Alegre: Notadez, 2002, p. 106.16 ZAFFARONI, R.E., PIERANGELLI, J.H. op. cit., p. 180.
102
“o panorama histórico da lei penal, é um dosaspectos mais sangrentos da história. Ele, muitoprovavelmente, tem custado à humanidade maisvidas que todas as guerras e é suscetível de ferirnossa sensibilidade atual mais profundamente doque o próprio fenômeno da guerra, se por talentendemos a guerra tradicional, posto que esta, emgeral, não supera a tremenda frieza, premeditação eracionalização que caracterizavam as crueldades eaberrações registradas na história da legislaçãopenal.”
Na Idade Média, a pena privativa de liberdade ainda não tinha surgido
como alternativa à barbárie, sendo resultado da modernidade. A prisão
preventiva existia, não como pena, mas como forma de assegurar o corpo
do condenado até a aplicação da pena, que era a morte ou a perda do
membro - a prisão processual data desde a época das penas
compensatórias.
Em 1763, Cesare Beccaria inicia escrever a obra “Dos Delitos e das
Penas”, o qual viria a ser o primeiro e mais contundente libelo público contra
o uso desvirtuado e abusivo do direito penal,17e que inspiraria os grandes
movimentos de transformação dos séculos XVIII e XIX. Referiu ele que a
“finalidade das penalidades não é torturar e afligir um ser sensível, nem
desfazer um crime que já está praticado (...) Os castigos têm por finalidade
única obstar os seus concidadãos do caminho do crime.(...) Uma pena para
ser justa, precisa ter apenas o grau de riscos suficiente para afastar os
homens da senda do crime.”18
Consoante o pensamento de Foucault, além dessas variáveis de
influência introduzidas pelos iluministas, o próprio poder político da época
17 BOSCHI, op. cit., p. 97.18 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. São Paulo: Martin Claret, 2002, p. 49 e 54.
103
contribuiu para a revisão do paradigma inquisitorial, temeroso dos distúrbios
que os suplícios em praça pública provocavam na multidão insatisfeita que
poderia precipitar sua recusa ao poder punitivo e, eventualmente, à própria
recusa do poder do Rei. Suavizar e humanizar os suplícios representava,
então a base da Reforma, uma nova economia e uma nova tecnologia do
poder de punir.19
O aumento desmesurado da criminalidade em fins do século XVII e
início do XVIII, em razão da pobreza causada pelas guerras que assolaram a
Europa durante os séculos XVI e XVII, e que ameaçava as pequenas
minorias tanto quanto a classe burguesa emergente, fez com que fosse
repensada a pena de morte, pois já não era mais uma solução adequada,
vez que não se podia aplicá-la a tanta gente. Tinha-se que enfrentar
verdadeiros exércitos de vagabundos e mendigos. Para fazer frente ao
fenômeno sociocriminal, criaram-se instituições de correção de grande valor
histórico-penitenciário.20
O contexto histórico era propício para a mudança de paradigma. A
Revolução Industrial tinha consolidado o sistema capitalista; o tempo vira
uma mercadoria.
A Revolução Francesa de 1789 - revolução política igualitária, baseada
na ficção de que todos os homens são iguais, pressupondo a existência de
um mercado regido pela oferta e pela procura - inaugura a ideologia
positivista e desencadeia a Revolução burguesa, que obtém o poder político
e econômico da época.
19 BOSCHI, op. cit., p. 98.20 BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: causas e alternativas. 2. ed.São Paulo: Saraiva, 2001, p. 15.
104
A penitenciária surge no final do século XVII, para atender a demanda
da nova criminalidade, com influência religiosa, inspirada na prisão canônica
medieval, cuja clausura, isolamento e meditação, na maioria das vezes, fazia
com que o preso chegasse ao arrependimento, alcançando-se o objetivo
principal de auto-correção, idéias voltadas a reabilitação do recluso. A
finalidade da instituição consistia, ainda, na reforma dos delinqüentes por
meio do trabalho e da disciplina.21
Na Inglaterra, embora criadas para tratar a pequena delinqüência,
essas instituições que visavam a recuperação do preso pelo combate ao
ócio e a vadiagem eram denominadas de houses of correction ou bridwells,
surgindo, posteriormente, no mesmo estilo, as workhouses, assinalando o
surgimento da pena privativa de liberdade moderna.
Assim é que os autores afirmam que o surgimento da pena privativa de
liberdade não foi apenas uma busca de humanização da pena, mas de impor
o modelo capitalista. O trabalho na prisão era empregado com sentido
utilitário, visando alcançar maior produtividade possível, quer em benefício
do estado, quer de particulares. Tinha o fim de evitar que se desperdiçasse
mão-de-obra e ao mesmo tempo de controlá-la, regulando a sua utilização
de acordo com as necessidades de valoração do capital, constituindo-se um
importante instrumento para controlar salários, na medida que aumentava a
oferta de mão- de-obra no mercado.
Somente a partir século XIX, a pena privativa de liberdade passa a ser
a mais importante, figurando nos Códigos Penais do mundo inteiro, não mais
com caráter processual, mas de pena, autônoma, substituindo
gradativamente a pena de morte.
21 idem. p. 12, 13 e 16.
105
Tempo é aquilo que todos tem por igual, por isso a pena privativa de
liberdade passou a ser a pena mais democrática. Como retira o tempo das
pessoas, pode ser aplicada de forma precisa e justa.22
Por um caráter idealista, a pena privativa de liberdade passou a ser o
centro do sistema punitivo moderno, havendo uma evolução das penas
brutais para estas, numa humanização da pena.
Deixa-se de punir o corpo do condenado para punir a alma: é a
humanização da pena, seguindo o pensamento de Foucault.
Atualmente a pena privativa de liberdade tem recebido duras críticas,
especialmente frente à crise que se opera no sistema carcerário, fazendo
com que cada vez mais se busque alternativas à prisão. Entretanto, ainda
não se encontrou um substituto à pena de prisão para os crimes mais
graves. Sem desconsiderar a violação de direitos humanos que se verifica a
todo o tempo no cárcere, há que se ter em mente que a pena deve ter
caráter de dissuasão. Ou seja, deve ser, de tal forma ameaçadora, que
represente um risco à forma de vida inferior a da camada mais inferior da
sociedade. O caráter dissuasivo consiste em que não se torne interessante
para a pessoa receber a pena. Como por exemplo, não pode ser tão boa
que uma pessoa que não tenha comida deseje ir para a cadeia, porque fora
22 MENDEZ, Emilio Garcia. Criminologia, Direito Penal e Prevenção Comunitária. PalestraProferida no Curso de Pós Graduação em Direito Comunitário, Infância e Juventude, daESMP- Escola Superior do Ministério Público, em 05/10/01.
106
passa fome23, o que não significa que o sistema deva ser gerador de
violência e violador da dignidade da pessoa humana.
23 MENDEZ, Emilio Garcia. Criminologia, Direito Penal e Prevenção Comunitária. PalestraProferida no Curso de Pós Graduação em Direito Comunitário, Infância e Juventude, daESMP- Escola Superior do Ministério Público, em 05/10/01.
107
1.2- Teorias da Pena
1.2.1-Teoria Absoluta ou Retributiva.
A pena para os clássicos tem o fim exclusivo de castigar o delinqüente,
conforme a expressão: ao mal do crime, o mal da pena (punitur cuia
peccarum est). Sustentam que a pena encontra em si mesma a sua
justificação, sem que possa ser considerada um meio para fins ulteriores.
São representantes dessa teoria Kant e Hegel, além de Carrara, Binding,
Welzel e Mezger.
Kant24 elabora sua concepção retributiva da pena sobre a idéia de que
a lei penal é um imperativo categórico. A pena deve ser aplicada somente
porque houve infringência à lei, sem nenhuma consideração sobre a
utilidade da pena para ele ou para os demais integrantes da sociedade.
Afirma que, em caso de dissolução do Estado, este deve preocupar-se em
que antes que isso ocorra “o último assassino mantido na prisão deva ser
executado antes da dissolução, a fim de que cada um sofra a pena de seu
crime, e que o homicídio não recaía sobre o povo que deixasse de impor
esse castigo, pois poderia ser considerado cúmplice dessa violação pura da
justiça.”
24 KANT, Immanuel, apud BITTENCOURT, op. cit., p. 110.
108
Hegel25, seguindo os passos de Kant, afirmava que a pena é a negação
da negação do direito. A sua imposição seria a condição para o
restabelecimento da ordem jurídica violada, afirmação que já continha a
idéia de que a pena, além de retribuir, também visava a prevenir, como mais
tarde sustentariam os relativistas.
A teoria retribucionista é característica do Estado absolutista, em que a
unidade entre a moral e o direito, entre o Estado e a religião, impunham a
pena a quem, agindo contra o soberano, rebelava-se também contra o
próprio Deus. Posteriormente, com a ascensão da burguesia e um
considerável acúmulo de capital, fazia-se necessária a implantação de meios
para assegurar o capital. O Estado absoluto concentrou, então, a seu redor,
e com uso ilimitado o poder necessário para o desenvolvimento posterior do
capitalismo. Nesse sentido, “a pena não podia ter senão as mesmas
características e constituir um meio a mais para realizar o objetivo
capitalista.26
Com o surgimento do Estado burguês e a divisão de poderes, temos a
laicização do Direito. A pena passa a ser concebida como a retribuição à
perturbação da ordem (jurídica) adotado pelos homens e consagrada pelas
leis. A pena devia ser imposta àquele que violou o contrato social.
Uma das críticas que se impõe a essa teoria centra-se na idéia de que
se ao mal do crime se impõe o mal da pena, como justificar essa questão: se
o mal já está feito, e não há um sentido construtivo para a punição, por que
punir? Em razão disso fala-se em uma nova retribuição, preocupada com os
25 BOSCHI, op. cit., p. 106.26 RAMIREZ, Juan Bustos e MALARÉE, H. Hormazabal apud BITENCOURT, op. cit., p. 105.
109
limites da própria retribuição (tipificação) e com a resposta (pena) à crise do
ideal ressocializador.27
1.2.2- Teoria Relativa ou Prevencionista:
Desenvolveram-se em oposição às teorias absolutas, concebendo a
pena como um meio para a obtenção de ulteriores objetivos. Pune-se para
que o indivíduo não mais peque (punitur er ne peccetur).
Para essa corrente, a prevenção colimada pelas penas é geral e
especial por se endereçar simultaneamente aos cidadãos em geral e ao
criminoso, em particular, respectivamente.
Ensina Boschi28:
“A prevenção é classificada, ainda, como positivaou integradora e negativa, porque, com a pena, secorrige o réu (prevenção integradora especial), e, aomesmo tempo, se reforça a autoridade do Estado e osentimento, nas pessoas, de necessidade de respeitoàs leis (prevenção integradora geral); comoprevenção negativa, porque, com ela, ao mesmotempo em que se neutraliza (castiga-se) o réu(prevenção especial negativa), dissuade-se oscidadãos ‘honestos’ a não praticarem crimes dequalquer espécie (prevenção geral negativa).”
A teoria da prevenção geral foi sustentada por Feuerbach29, através da
“teoria da coação psicológica”, segundo a qual a pena é uma ameaça da lei
27 BOSCHI, op. cit., p. 107.28 Idem, p. 112.29 ZAFFARONI, R.E., PIERANGELLI, J.H., op. cit., p. 120.
110
aos cidadãos para que se abstenham de cometer delitos. Além dele, foram
partidários dessa corrente doutrinária Bentham e Schopenhauer.
O utilitarismo afirmado por Bentham30 sustenta que o valor essencial é
a maior felicidade para o maior número. No exemplo de Kant, a punição não
teria sentido, porque não teria nenhum caráter pedagógico. O valor essencial
é a utilidade pública, enquanto que, no retribucionismo, é a justiça.
Quanto aos defensores da prevenção especial, destacam-se Von Liszt,
Marc Ancel e Ferri.
As idéias prevencionistas desenvolveram-se no período do Iluminismo.
São teorias que surgem na transição do Estado absoluto ao Estado liberal.
Muitas são as críticas à essa teoria.
Roxim31 assinala, quanto prevenção geral, ser difícil entender possa ser
justo que se imponha um mal a alguém para que outros se omitam de
cometer um mal.
Hassemer32 questiona os resultados das penas, vez que a prevenção
geral pressupõe que a prática do fato, a condenação e a execução cheguem
ao conhecimento de todos, o que nem sempre ocorre.
Quanto à prevenção especial, critica-se o fato de não estabelecer se o
objetivo é evitar que o criminoso reincida pelo mesmo crime ou por outro.
30 MENDEZ, Emilio Garcia. Criminologia, Direito Penal e Prevenção Comunitária. PalestraProferida no Curso de Pós Graduação em Direito Comunitário, Infância e Juventude, daESMP- Escola Superior do Ministério Público, em 05/10/01.31 ROXIM, Claus. Apud BOSCHI, op. cit., p. 106.32 HASSEMER, Winfried. Apud BOSCHI, op. cit., p. 106.
111
Também não evita que os criminosos habituais continuem cometendo seus
crimes.
A função intimidativa da pena é contestada também a partir do
argumento de que as pessoas não lêem o Código Penal, antes de praticar
um crime, para medir as vantagens e desvantagens, mas ao contrário,
confiam em não serem apanhados pela Justiça. As posições contrárias à
essa teoria afirmam que a pena, por si só, não é intimidativa, pois, se não,
os índices de criminalidade em países que adotam pena capital não seriam
altos. Pelo inverso, a eficácia da sanção depende da maior ou menor
fiscalização do poder público.
Em relação à função ressocializadora, afirmam que essa não seria
possível, em razão de que a prisão não é lugar adequado para ressocializar,
tendo em vista que constitui instrumento de reprodução da repressão das
minorias sobre as maiorias desassistidas da população, não há programas
de tratamento, as relações em seu interior são tensas e impregnadas de
desconfiança, além de que as pessoas teriam direito de serem diferentes,
não podendo ser imposto um tratamento sem seu consentimento. Ademais,
como justificar a punição das pessoas de bem, socializadas, aquelas que
pertencem a estratos superiores e para quem a cadeia nada acrescentará?33
Segundo Boschi34, se a ressocialização não é filosoficamente
sustentável pelas razões acima, faz-se necessário, nos casos em que a
pena privativa de liberdade é absolutamente necessária, que o Estado crie
as condições mínimas, garantindo os direitos fundamentais da pessoa, para
que o condenado, espontaneamente, avalie a situação em que se encontra e
33 BOSCHI, op. cit., p. 12234 idem, op. cit., p. 123.
112
decida, se quiser, redirecionar sua vida ao mundo sem traumas e sem
crises.
1.2.3- Teorias Mistas ou Unificadoras:
Partem da teoria absoluta e tratam de cobrir suas falhas acudindo a
teorias relativas. São as mais difundidas na atualidade e, por um lado,
pensam que a retribuição é impraticável em todas as suas conseqüências e,
de outro não se animam a aderir à prevenção especial. Uma de suas
manifestações é o lema seguido pela jurisprudência alemã: “prevenção geral
mediante retribuição justa.”35
Os ecléticos recusam estudar a pena sob o ângulo restrito da dualidade
retribuição/prevenção. Inserem um novo ingrediente: a sociedade a ser
defendida contra o crime e em cujo o meio o delinqüente deve ser inserido,
sem traumas.
Podemos citar como partidários dessas teorias, ressalvadas as
variações da doutrina de cada um, Roxim, Hassemer, Jakobs, Mario
Romano e Pagliaro.
No Brasil, com o advento das leis n.º 7.209 e 7.210 de 1984,
abandonou-se o sistema do duplo binário – que ensejava a aplicação
cumulativa de pena e de medida de segurança – reservando-se a última
somente para os casos de inimputabilidade ou semi-imputabilidade.
35 ZAFFARONI, op. cit., p. 120.
113
A reforma preservou o caráter utilitarista da pena, conforme se pode
extrair, dentre outros dispositivos, do enunciado do art. 59 do Código
Penal36, que alude às finalidades repressiva e preventiva da pena.
Do mesmo modo, o art. 1º da Lei de Execuções Penais37 considera de
igual valia e importância a preocupação com a ressocialização do
delinqüente, embora a palavra ressocialização não conste explicitamente do
texto.
Assinala Boschi38:
“Contudo, o conjunto da legislação penal,excetuada a recente Lei 9.714/98, vai de encontro aogarantismo, na medida em que, por meio dela,maximiza-se o Estado Penal e se enfraquecem asliberdades fundamentais, o que é revelador daprofunda intolerância oficial, que o vê, assim, como ogrande inimigo, e não como a grande vítima de umsistema político e econômico desigual, privilegiador einjusto.”
1.2.4-Modelo Garantista:
36 Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, àpersonalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bemcomo ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário o suficientepara reprovação e prevenção do crime:37 Art. 1º. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisãocriminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e dointernado.38 BOSCHI, op. cit., p. 127.
114
As diversas críticas dirigidas às teorias penalógicas da modernidade -
absolutas e relativas -, propiciaram a construção do modelo penalógico
garantista.39
Luigi Ferrajoli40 e Eugênio Raúl Zaffaroni41 apontam para a
desnecessidade de uma teoria da pena, pois esta seria apenas uma
manifestação fática, em essência política, isenta de qualquer fundamentação
jurídica racional. Tal como a guerra - modelo sancionatório nas relações
internacionais -, a pena caracterizar-se-ia como um meio extremo e cruel,
isento de justificativa jurídica.42
Assim, em interação com as críticas marginais das teorias anteriores,
propõe o modelo garantista não mais uma teoria justificante do poder de
punir, mas uma doutrina normativa sobre os limites e condições de
legitimidade da pena fundadas em fins específicos: a) diminuição de dor e
sofrimento causada pela aplicação da pena; b) reconhecimento da pena na
esfera da política; e tutela do pólo débil na relação contra qualquer tipo de
vingança emotiva e desproporcional (pública ou privada).43
39 CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: O Modelo Garantista de Limitação doPoder Punitivo. In CARVALHO, Salo de. (org) Crítica e Execução Penal. Doutrina,Jurisprudência e Projetos Legislativos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 27.40 FERRAJOLI, Luigi. Apud CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: O ModeloGarantista de Limitação do Poder Punitivo. In CARVALHO, Salo de. (org) Crítica eExecução Penal. Doutrina, Jurisprudência e Projetos Legislativos. Rio de Janeiro: LumenJuris, 2002, p. 28/29.41 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Apud CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: OModelo Garantista de Limitação do Poder Punitivo. Op. cit., p. 28/29.42 CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: O Modelo Garantista de Limitação doPoder Punitivo. Op. cit., p. 29.43 Idem, p. 30.
115
A pena apresenta-se como instrumento político de negação da
vingança, como limite ao poder punitivo, como o mal menor em relação às
possibilidades vindicativas que se produziriam na sua inexistência,
justificando-se como técnica de minimalização da violência e do arbítrio. Não
há legitimação da pena, mas do direito, como regulador e inibidor da
violência política da sanção.
A adoção desse modelo, segundo os defensores desta teoria, implica
como efeito necessário o abandono do propósito ressocializador da pena,
que é absolutamente incompatível com o saber criminológico
contemporâneo e em relação aquilo que, na prática, ela (pena) realmente é:
uma retribuição por aquilo que se fez.44
A proposta do garantismo penal é a de um direito penal mínimo, que
recomenda o uso do direito penal como ultima ratio e dentro do estritamente
necessário para evitar que o ofendido ou a comunidade volte a recorrer às
armas para fazer justiça pelas próprias mãos. Ferrajoli45 refere que o direito
penal é “a proteção do débil contra o mais forte”, ou seja, a proibição e a
ameaça penal protegem as possíveis partes ofendidas contra os delitos,
enquanto o juízo e a imposição da pena protegem, por paradoxal que
pareça, os réus (e os inocentes que como tal se suspeita) contra as
vinganças e outras reações mais severas bem como protege-se o
condenado dos abusos do poder de punir.
44 SUANNES, Adauto apud CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: O ModeloGarantista de Limitação do Poder Punitivo. Op. cit., p. 39.45 FERRAJOLI, Luigi apud BOSCHI, op. cit., p. 109.
116
117
1.3- Evolução Histórica do Direito Menorista
“Até o século XVII, a criança como tal, não existiaem nossas sociedades. O sentimento da infâncianasce, na Europa, com o sentimento da família e coma constituição, pelas grandes ordens religiosas, daeducação separada, que preparava a criança para avida adulta. Este regime de separação durou até osanos cinqüenta e sessenta. Antes dessa data, aidade adulta era vista como a idade ideal, e aeducação consistia em preparar a criança para esseperíodo da vida. Atualmente, tudo foi alterado. Nesseponto somos herdeiros duplos de Freud e deRoussou, onde o primeiro ensinou-nos que a infânciaé a chave mestra da nossa personalidade; e osegundo fez da criança o “bom selvagem” no seio dafamília.”46
No tema da responsabilidade penal dos menores de idade, Mendez
aponta três etapas fundamentais, as quais convencionou chamar a primeira
etapa de caráter penal indiferenciado, a segunda de caráter tutelar e a
terceira de responsabilidade penal.47
A primeira etapa, que se estende desde o nascimento dos códigos
penais de corte claramente retribucionista do século XIX até 1919,
caracterizou-se por considerar os menores de idade praticamente da mesma
forma que os adultos.
46 BRUCKNER, Pascal. Filhos e Vítimas: O Tempo da Inocência. In: Morin Edgar, PrigogineIlya e outros. A Sociedade em Busca de Valores. Lisboa: Instituto Piaget, 1996, p. 57.47 MENDEZ, Emílio Garcia. Por uma Reflexão sobre o arbítrio e o Garantismo na Jurisdiçãosocieducativa. Porto Alegre,: AJURIS, ESMP-RS, FESDEP-RS, 2000, P. 7.
118
No Brasil, a primeira legislação aplicada, em matéria criminal, após
seu descobrimento, foram as Ordenações Filipinas e, nos moldes de
Portugal, tinham caráter penal indiferenciado, representando o modelo
jurídico-penal da Inquisição. As penas eram extremamente graves, com
sentido de intimidação geral, onde a criança era encarada como o adulto,
merecendo o mesmo tratamento jurídico e social. Não havia preocupação
em protegê-la, reeducá-la ou em proporcionar-lhe qualquer forma de
reinserção social.48 A imputabilidade penal iniciava-se aos sete anos,
eximindo-se o menor da pena de morte e concedendo-lhe redução da pena.
Entre dezessete e vinte um anos havia um sistema de “jovem adulto”, o qual
até permitia a condenação à morte, ou ter a pena diminuída conforme certas
circunstância. A imputabilidade penal plena ficava para os maiores de vinte e
um anos.49 A pena era cumprida pelos menores e pelos adultos
indistintamente no mesmo estabelecimento, situação que persistiu até a
criação do primeiro Tribunal de Menores, em 1899. Antes de sete anos,
eram absolutamente incapazes, sendo seus atos equiparados aos cometidos
pelos animais.
48 CHAVES, Sabrina Smith, FURTADO, Leonor. As Medidas Socio-educativas e as Medidastutelares na Legislação Brasileira e Portuguesa. Lisboa: Centro de Estudos Judiciários,2000, p. 19.49 SARAIVA, João Batista Costa Saraiva. Adolescente em Conflito com a Lei. Porto Alegre:Livraria do Advogado, 2003, p.23.
119
Após a Independência, em 1822, a preocupação com a infância, ainda
incipiente, limitava-se aos casos de crianças órfãs e enjeitadas, as quais
eram recolhidas nas Casas dos Expostos.50
Em 1824, é outorgada a Constituição do Império, considerada liberal
em razão da influência dos ideais iluministas, na qual o Código Criminal de
1830 veio a fixar suas linhas mestras. Em decorrência, este vem a abolir
vários suplícios e conferir às penas fins utilitaristas de prevenção e de
recuperação moral e social do criminoso, com as variações propostas pelas
Escolas Clássica, Positiva e de Defesa Social. Passa-se a estabelecer a
responsabilidade penal para menores a partir de 14 anos, os quais deveriam
ser recolhidos em casas de correção.
Refere Mendez51 que o respeito pelos direitos da criança (ou menor)
era inversamente proporcional ao parentesco, ou seja, os pais podiam fazer
o que quisessem com os filhos, pois eram seus “donos”, assim como eram
donos de seus animais, diferentemente do estranho que nada podia fazer
contra a criança, pois, neste caso, era responsabilizado.
Durante o período de vigência do Código Penal de 1830, travava-se
uma luta abolicionista, culminando que, em 1871, é editada a Lei do Ventre
Livre, seguida posteriormente da abolição da escravatura e proclamação da
República (1889). Entra em vigor o novo Código Penal Republicano de 1890.
50 RIZZINI, Irene. A criança e a Lei no Brasil. Rio de Janeiro, UNICEF-CESPI/USU, 2000, p.98 explica que: Nessas casas havia a “roda dos expostos” que era uma espécie de roleta naqual a criança era depositada e penetrava na instituição sem que se identificasse quem aconduzira até o local.
51 MENDEZ, Emilio Garcia. Criminologia, Direito Penal e Prevenção Comunitária. PalestraProferida no Curso de Pós Graduação em Direito Comunitário, Infância e Juventude, daESMP- Escola Superior do Ministério Público, em 05/10/01.
120
No final do Século XIX, as crianças passaram a ser defendidas pela
Lei de Proteção dos Animais, após o episódio de Marie Anne, em Nova York,
em que uma sociedade defensora dos animais ingressou na Justiça visando
a proteção de uma menina de nove anos que sofria maus tratos pelos pais.
A partir daí, a criança, que até então era tratada como “coisa”, passou a
reclamar ao menos a condição de objeto da proteção do Estado, marcando o
surgimento do Direito de Menores. Em 1899, é criado o primeiro Tribunal de
Menores em Illinois, EUA. Triunfa o movimento dos reformadores norte-
americanos, os quais pleiteavam a separação dos adultos e crianças que
estivessem na mesma instituição. Inicia-se a segunda etapa de caráter
tutelar, marcada pela profunda indignação frente à promiscuidade, mas
mantida a idéia de reclusão como resposta às patologias sociais, decorrente
do positivismo filosófico.
No Brasil, a criança passa a ser vista como um magno problema para
a elite intelectual, política e filantrópica da época. A tônica dos discursos era,
a primeira vista, em defesa incondicional da criança, mas uma leitura mais
atenta permitia verificar uma oscilação entre a defesa da criança e a defesa
da sociedade contra essa criança que se torna uma ameaça à “ordem
pública”, ressaltando a necessidade da intervenção do Estado para educar
ou corrigir “os menores”, tornando-os cidadãos úteis e produtivos para o
país.52 Havia necessidade de resolver o problema de uma minoria de
“menores” que não tinha as necessidades básicas satisfeitas ou apenas
parcialmente.
De 1906 a 1927, diversos projetos de lei foram debatidos, com o
objetivo de se regulamentar a proteção e a assistência à infância. Medidas
de prevenção, proteção e assistência eram gestadas, visando à criança
52 RIZZINI, op. cit., p. 18.
121
abandonada (física e moralmente) e delinqüente.53 Em 1923, é criado, no
país, o Tribunal de Menores, mesma época que outros países da América
Latina o fizeram, com a finalidade de resolver os problemas de uma parte da
infância não atingida pela satisfação das suas necessidades essenciais.
“Paralelamente se veio construindo a Doutrina doDireito do Menor, fundada no binômiocarência/delinqüência. Se não mais se confundiamadultos com crianças, desta nova concepção resultaum outro mal: a conseqüente criminalização dapobreza.”54
Nesta, a confusão conceitual, não distinguindo os abandonados dos
infratores, até hoje presente na cultura brasileira, foi o fundamento das
primeiras legislações brasileiras em relação ao novo Direito da Criança,
especialmente o Código de Menores de 1927, chamado Código de Mello
Mattos.
Refere Rizzini55 que:
“ a extensão do texto faz com que destoe dosdemais projetos e decretos que o antecederam;porém, seu conteúdo era, em essência, o mesmo quevinha sendo formado ao longo dos anos. A leitura dalei dá a impressão que se procurou coibir um amploespectro de situações envolvendo a populaçãoinfantil e juvenil. Parece-nos que o legislador, aopropor a regulamentação de medidas de proteção,englobando a assistência, enveredou por uma áreasocial que ultrapassava em muito as fronteiras dojurídico.
53 Idem, p. 89.54 SARAIVA, op. cit., p.3155 RIZZINI, op. cit., p. 28.
122
O que impulsionava era ‘resolver’ o problema dosmenores, prevendo todos os possíveis detalhes eexercendo firme controle sobre os menores, pormecanismos de ‘tutela’, ‘guarda’, ‘vigilância’,‘reeducação’, ‘reabilitação’, ‘preservação’, ‘reforma’ e‘educação’”.
Como conseqüência, o juiz de menores exercia poderes
discricionários absolutos, pois normatizados, a fim de resolver os problemas
da população carente infantil e juvenil, institucionalizando abandonados e
infratores indistintamente, todos considerados em situação irregular. Os
juizes eram os autores da política social para a infância pobre no Brasil.
Bastava pertencer à classe carente, ou não se ajustar ao padrão
estabelecido para estar ao alcance das ações da Justiça de Menores, a fim
de conter a patologia social. As garantias individuais não eram observadas,
e a privação da liberdade era a medida por excelência, tanto para os
infratores, quanto para as “vítimas” ou “protegidos”. Esse modelo vai
perpetuar-se nos anos subseqüentes atingindo seu ápice com o advento do
Código de Menores de 1979.
Em 1930 ocorreu uma crise econômica mundial muito forte, onde
piorou a situação social, resultando num aumento do número de “menores”,
assim entendida a população infanto-juvenil carente, em relação ao número
de “crianças”, consideradas as nascidas em famílias estruturadas. No
entanto, não houve nenhuma modificação na política jurídica com relação à
criança e à adolescência de 1928 a 1989 no Brasil, exceto pelo Código
Penal de 1940 que, por uma questão de política criminal, estabeleceu a
imputabilidade penal aos dezoito anos, mantida atualmente.
Somente a partir de 1989, com a Convenção das Nações Unidas de
Direito da Criança, a Constituição Federal e, em 1990, com o Estatuto da
Criança e do Adolescente, inaugura-se a terceira etapa que é a da
responsabilidade penal dos adolescentes.
123
O conjunto de normas representadas pela Declaração dos Direitos da
Criança, em 1959; as Regras Mínimas das Nações Unidas para a
Administração da Justiça de Menores, conhecidas como regras de Benjing,
em 29/11/1985; a Convenção da ONU de Direitos da Criança em
20/11/1989; as Regras das Nações Unidas para a Proteção dos Menores
Privados de Liberdade, de 14/12/1990, e as Diretrizes das Nações Unidas
para a Prevenção de Delinqüência Juvenil, conhecidas como Diretrizes de
Riad, de 14/12/1990, irão compor mais tarde o novo perfil da normativa
internacional, consagrando a Doutrina da Proteção Integral.56
Essa ideologia, que norteia o Estatuto da Criança e do Adolescente,
parte do pressuposto de que todos os direitos da criança e do adolescente
devem ser reconhecidos. Estabelece que estes direitos se constituem em
especiais e específicos, pela condição que ostentam de pessoas em
desenvolvimento. Para isso, as leis internas e o sistema jurídico dos países
que a adotam devem garantir a satisfação de todas as necessidades das
pessoas até 18 anos, não incluindo apenas o aspecto penal do ato praticado
pela ou contra a criança, mas seu direito à vida, à saúde, à educação, à
convivência familiar e comunitária, ao lazer, à profissionalização, à liberdade,
entre outros,57dos quais destacamos as garantias processuais previstas no
Capítulo III do Estatuto.
Refere Saraiva58 que:
56 SARAIVA, op. cit., p. 34.57 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente e Ato Infracional, Garantias Processuais eMedidas Socioeducativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p.18.58 Idem, op. cit., p. 22/23.
124
“Do ponto de vista das garantias penais,processuais e de execução no sistema da justiça dainfância e juventude para jovens em conflito com aLei, o Estatuto da Criança e do Adolescente trouxeestes agentes da condição de objeto do processo,para o status de sujeitos do processo,conseqüentemente detentores de direitos eobrigações próprios do exercício da cidadania plena,observada sua peculiar condição de pessoa emdesenvolvimento, cumprindo um dos princípiosfundamentais da Constituição Federal Brasileira, queestabelece em seu art. 1º, inciso III, como fundamentoda República, a Dignidade da Pessoa Humana.”
O Estatuto constitui a primeira inovação substancial latino-americana
a respeito do modelo tutelar, pois de 1919 a 1989, as reformas das leis de
menores no país constituíram apenas variações da mesma melodia.59
Juntamente com a Convenção, representou uma ruptura no paradigma
dominante, introduzindo uma alteração significativa daquilo que tinha sido o
vínculo entre o Estado e adultos em relação aos menores e crianças.
Mendez60 refere que houve muitas críticas quando da edição do ECA,
em razão do entendimento de que a norma deve ter relação com a
realidade, refletindo-a. O argumento central era de que o Estatuto era muito
bom, mas estava longe da realidade brasileira, não sendo, pois, para o
Brasil. Esse autor refuta tal posicionamento, utilizando-se do ensinamento
de Boaventura Souza Santos de que, quando a lei é um reflexo da
sociedade é inútil; a lei deve ser um projeto de construção, então a relação
entre a norma e a realidade deve ser de tensão. O pensamento de Baratta61
59 MENDEZ, op. cit., p. 8.60 MENDEZ, Emilio Garcia. Criminologia, Direito Penal e Prevenção Comunitária. PalestraProferida no Curso de Pós Graduação em Direito Comunitário, Infância e Juventude, daESMP- Escola Superior do Ministério Público, em 05/10/01.61 BARATTA apud CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena. In CARVALHO, Salode. (org) Crítica e Execução Penal. Doutrina, Jurisprudência e Projetos Legislativos. Rio deJaneiro: Lumen Juris, 2002, p. 17/18.
125
reforça essa idéia, quando afirma que não há mudança sem utopia, e, no
momento em que o homem renuncia à utopia, acaba por renunciar sua
própria condição humana.
Embora a ruptura de paradigma trazida pelo ECA, a infância paga um
preço alto pelo reconhecimento da categoria diferenciada dos adultos, pois
essa se dá em troca da incapacidade do sujeito.62 Além disso, há o falso
entendimento, baseado no senso comum, de que a inimputabilidade
equivale a impunidade, o que também é um alto custo suportado por esse
grupo.
Na questão da natureza jurídica da responsabilidade dos menores de
18 anos, em caso de transgressão da lei penal, e dos reflexos dessa opção
conceitual na execução das medidas socioedudcativas, por não ter sido
suficientemente abordada em lei ou doutrina, vem deixando grande abertura
à interpretação judicial, dando espaço, por vezes, ao subjetivismo e à
discricionariedade, num retrocesso à doutrina do Código de Menores. Seus
efeitos fazem-se sentir não apenas no campo jurídico, mas especialmente
na administração das políticas públicas de atenção ao jovem em conflito com
a lei.63
Poder-se-á perceber, no transcurso desse trabalho, que a não
admissão da natureza penal das medidas socioeducativas, abre espaço à
subjetividade e acaba por acarretar a desconsideração do correspondente
sistema de garantias constitucionais em prejuízo dos jovens acusados,
62 MENDEZ, Emilio Garcia. Criminologia, Direito Penal e Prevenção Comunitária. PalestraProferida no Curso de Pós Graduação em Direito Comunitário, Infância e Juventude, daESMP- Escola Superior do Ministério Público, em 05/10/01.
63 MENDEZ, op. cit., p. 3 e 4.
126
diferentemente do que ocorre no sistema penal, onde a discricionariedade é
mínima, o suficiente apenas para interpretação da lei e enquadramento do
fato à norma.
Segundo Mendez64, é necessário romper tanto com a visão
pseudoprogressista e falsamente compassiva, de um paternalismo ingênuo,
de caráter tutelar, quanto com a visão retrógrada de um retribucionismo
hipócrita de mero caráter penal repressivo, expresso atualmente pela
proposta de redução da idade na imputabilidade penal, adotando-se o
modelo da responsabilidade penal dos adolescentes, que é o modelo das
garantias.
Em que pese a revolução cultural suscitada pelo ECA, onde a criança
e o adolescente passaram a ser vistos como sujeitos de direitos, esta não
está sendo efetivada de forma plena. Verifica-se, ainda, as más práticas
autoritárias, repressivas e incriminadoras da pobreza, bem como as boas
práticas tutelares compassivas, referidas por Mendez, herança do código de
menores subsistentes em nosso meio. A chamada crise de interpretação do
ECA diz especialmente com a persistência dessa cultura de subjetivismo e
discricionariedade a qual lentamente estão dando lugar à reformulação,
deslocando os fundamentos filosóficos na percepção e tratamento da
infância da “bondade” discricional à justiça garantista.65
Ensina o mesmo autor que
64 idem, op. cit., p. 8 e 9.65 Idem, op. cit., p. 12.
127
“o caráter garantista de uma legislação remete auma dupla caracterização. Por um lado, o respeitorigoroso pelo império da Lei, próprio dasdemocracias constitucionais baseadas numaperspectiva dos direitos humanos, hojenormativamente estabelecidos e, por outro, aexistência de mecanismos e instituições idôneas eeficazes para a realização efetiva dos direitosconsagrados. Desde este ponto de vista, não existemdúvidas de que a cara oposta do garantismo é osubjetivismo e a discricionariedade.”66
Mendez67, assim como Ferrajoli68, sustentam que não existem
discricionariedades e subjetivismos bons. Refere o segundo que a ausência
de regras nunca é tal; a ausência de regras é sempre a regra do mais forte.
Diz o primeiro que, no contexto histórico das relações do Estado e dos
adultos com a infância, a discricionariedade tem funcionado sempre, de fato
e de direito, no médio e no longo prazo, como um mal em si mesmo.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, embora legislação de cunho
garantista, baseada na doutrina da proteção integral, permite ainda, em
razão de suas lacunas e da cultura herdada do direito menorista, a violação
de direitos em decorrência do emprego da discricionariedade e do
subjetivismo pelo aplicador do Direito, especialmente no que tange à
execução das medidas de privação de liberdade e à remissão e aplicação de
medidas socioeducativas, questão que esse trabalho procura demonstrar.
Nesse contexto, o Estado se torna ele próprio um gerador de
violência, como se não bastasse a violência que a criança e o adolescente já
sofrem nas ruas, abandonados, e em suas próprias famílias, vítimas
passivas de espancamento e abuso sexual, estigmatizados como “pivetes” e
66 Idem ibidem.67 Idem, op. cit., p. 14.68 FERRAJOLI, Luigi, apud MENDEZ, op. cit., p. 14.
128
“trombadinhas”, em caso de prática de ato infracional. Não que se entenda
que a criminalidade esteja relacionada diretamente com a miséria, mas esta
população está mais exposta a todo tipo de violência, não podendo ser o
Estado mais um a praticá-la, quando seu dever é dar-lhe proteção integral,
conforme institui o art. 227 da Constituição Federal, que em momento algum
excluiu os adolescentes em conflito com a lei dessa proteção69.
69 VERONESE, Josiane Rose Petry; RODRIGUES, Walkíria Machado. A Figura da Criançae do Adolescente no Contexto Social. In VERONESE, Josiane Rose Petry; RODRIGUES,Walkíria Machado; MIOTO, Regina Célia Tomaso (Autoras e Organizadoras). Infância eAdolescência, O Conflito com a Lei: algumas discussões. Florianópolis: Fundação Boiteux,2001, p. 34.
129
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao regulamentar os artigos
227 e 22870 da Carta Magna, ao tempo em que conferiu direitos
fundamentais e sociais, criou regime jurídico em que o adolescente foi
elevado à dignidade de responder pelos seus atos. A responsabilidade penal
juvenil encontra bases doutrinárias na Constituição Federal e nas Regras
70 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e aoadolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e àconvivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.§ 1º. O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e doadolescente, admitida a participação de entidades não governamentais e obedecendo osseguintes preceitos:I - aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistênciamaterno-infantil;II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para os portadores dedeficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescenteportador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e afacilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos eobstáculos arquitetônicos.§ 2º. A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de usopúblico e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acessoadequado às pessoas portadoras de deficiência.§ 3º. O direito à proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto noartigo 7º, XXXIII;II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;III - garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola;IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade narelação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser alegislação tutelar específica;V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiarde pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa daliberdade;VI - estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais esubsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ouadolescente órfão ou abandonado;VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança e ao adolescentedependente de entorpecentes e drogas afins.§ 4º. A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e doadolescente.§ 5º. A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos econdições de sua efetivação por parte de estrangeiros.§ 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmosdireitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.§ 7º. No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se-á em consideração odisposto no artigo 204.Art. 228.São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas dalegislação especial.
130
Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Juventude,
incorporadas pelo Estatuto Brasileiro, que, no artigo 103, conceituou o ato
infracional como a conduta descrita como crime ou contravenção penal,
remetendo o intérprete aos princípios garantistas do Direito Penal Comum,
tendo como normas específicas as do Estatuto.71
O reconhecimento da responsabilidade penal dos adolescentes
significa a garantia dos direitos fundamentais desses jovens, no mínimo nos
mesmos moldes daqueles garantidos aos adultos frente ao sistema penal.
Não é conveniente adotar eufemismos, como uma suposta responsabilidade
social, não-penal, pois é justamente a adoção do modelo penal juvenil,
previsto no ECA, que permite a preservação das liberdades individuais, além
de ser um componente essencial para a construção da cidadania, pois essa
não pode ser concebida na ausência de responsabilidade.
Os adolescentes devem seguir sendo inimputáveis penalmente,
negando-se a redução da idade da imputabilidade penal, porém penalmente
responsáveis pelos seus atos típicos, ilícitos e culpáveis. Há necessidade
de demonstrar-se a exata dimensão do problema da delinqüência juvenil, a
fim de que não se acredite que a redução da maioridade penal seja a
solução para o problema da insegurança pública que assola a sociedade.
Segundo Volpi72 os mitos envolvendo o problema dos adolescentes
dizem respeito ao tamanho do problema, periculosidade e irresponsabilidade
dos adolescentes, ou seja, a mídia, autoridades e profissionais que atuam
com o tema encarregam-se de apresentar o panorama como grave, quando
não existem números e pesquisas seguras a respeito; existe a crença de
71 SARAIVA, op. cit., p.39.72 VOLPI, Mário. Sem Liberdade, Sem Direitos. São Paulo: Cortez, 2001, p. 14/16.
131
que os adolescentes estão propensos a praticar crimes cada vez mais
graves, quando os estudos revelam que a maioria envolve-se em delitos
contra o patrimônio; quanto ao terceiro mito, relacionado com a tendência
dos adolescentes de cometerem crimes porque a legislação é muito branda,
na verdade o Estatuto da Criança e do Adolescente inovou, implantando a
responsabilização juvenil.
Entende Carvalho73 que:
“O efeito da miserabilidade do tema violência,ofuscando as possibilidades de seu controle pacífico,é a barbarização do cotidiano, a confusão entrepolítica pública de segurança e vingança privada,obtendo-se como subproduto trágico, o vilipêndio donúcleo rígido da Constituição que são os direitos egarantias fundamentais.”
É preciso modificar esse olhar desviado da realidade e superar os
mitos que circundam o assunto envolvendo adolescente infrator e a violência
em geral, a fim de que se possa realizar uma melhor aplicação dos
mecanismos oferecidos pelo ECA, dentro de sua doutrina garantidora de
direitos, que é a da proteção integral. Forçoso é que não nos deixemos
levar pela crença da resolução dos problemas de segurança pública, única e
exclusivamente, através da proliferação de leis cada vez mais rígidas,
baseadas no comando “lei e ordem”, da qual também advém os movimentos
pela redução da menoridade penal.
Há necessidade de legislação reguladora das medidas
socioeducativas, a fim de enfrentar a sobrevivência da cultura da “proteção”
subjetiva e discricional, mantendo-se integralmente as garantias
fundamentais dos adolescentes, sujeitos de direito.
73 CARVALHO, op. cit., p. 22.
132
O homem precisou descobrir a si mesmo, como ser humano, para só
então descobrir a infância e passar a ver esses seres em desenvolvimento
não mais como coisas, mas como sujeitos de direitos. Apesar de sermos
ainda incipientes na implantação das inovações trazidas pelo ECA e de
modificação de paradigma, o que se percebe é uma propensão muito forte a
retornar ao ponto anterior, cedendo às pressões resultantes da violência que
nos cerca, do que mantermos o que já foi alcançado.
Até hoje o homem não conseguiu chegar a um consenso na resposta
para a pergunta: Por que punir? Mas segue punindo tanto adultos como
adolescentes, de forma cada vez mais rigorosa, com a edição de novas leis
capitulando novos crimes, com penas cada vez mais severas, tolhendo
direitos fundamentais até então consagrados, sem que se adote uma política
séria e viável de contenção da criminalidade.
Por isso, as conquistas até aqui obtidas precisam ser discutidas e
reafirmadas a todo o tempo em nossos dias, numa luta incessante, a fim de
que jamais se retroceda, um passo sequer, no que diz respeito aos direitos
alcançados, e assim se possa tornar as barbáries cometidas contra nossas
crianças e adolescentes, apenas um fato histórico, jamais repetido.
133
134
2- AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO ECA
As medidas socioeducativas estão previstas no artigo 112 do Estatuto
da Criança e do Adolescente, podendo ser divididas em não privativas de
liberdade - advertência, reparação de dano, prestação de serviços à
comunidade e liberdade assistida - ou privativas de liberdade -semiliberdade
e internamento, com ou sem atividades externas.
São aplicáveis aos adolescentes autores de ato infracional, entendido
este como toda conduta descrita como crime ou contravenção penal, nos
termos do art. 103 do ECA.74 Com esse dispositivo, o Estatuto explicita a
observância da garantia constitucional do princípio da tipicidade, excluindo a
antiga idéia do ambíguo conteúdo típico do desvio de conduta, preconizado
pelo Código de Menores.
74 Art. 103 – Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravençãopenal.
135
A autoridade - Juiz ou Promotor de Justiça – deve levar em conta a
capacidade do adolescente de cumprir a medida escolhida, bem como as
circunstâncias e a gravidade da infração.
Sotto Maior75, comentando o §1º do art. 112 do ECA, refere que:
“a imposição de medida irrealizável, além doinerente desprestígio à própria Justiça da Infância eda Juventude, acabaria reforçando juízo negativo (eformulado com freqüência pelos adolescentes) deincapacidade ou inaptidão para as coisas da vida,provocador de inevitável rebaixamento da auto-estima. Ao invés de benefícios, a aplicação da medidatraria prejuízos à formação da personalidade doadolescente. A parte final do parágrafo em tela, poroutro lado, refere-se à necessária relação eproporcionalidade entre a medida aplicada e ascircunstâncias e gravidade da infração. A decisãodesproporcionada ou que não guarde qualquerrelação com o fato infracional praticado tenderá aperder contato com o processo educativo que lhe dárazão de existir, restando, neste aspecto, inócua einjusta.”
Inobstante a intenção de estabelecer o norte para a aplicação das
medidas socioeducativas, o Estatuto silencia acerca dos critérios a serem
adotados a fim de que a medida seja proporcional e não fira os direitos
fundamentais do adolescente infrator, especialmente quando estabelecida
em sede de remissão pelo Promotor de Justiça, pois ausentes as garantias
processuais, especialmente o devido processo legal e o contraditório.76
75 SOTTO MAIOR, Olímpio. Comentário ao art. 112 do ECA. in CURY, M.; AMARAL E SILA,A; MENDEZ, E.G. (Coord). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, ComentáriosJurídicos e Sociais. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p.341-342.
76 Vide texto capítulo 3, Da remissão.
136
Apenas estabelece, por força do art.113, o qual remete ao art. 100,
que se devem levar em conta as necessidades pedagógicas da criança ou
do adolescente, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos
vínculos familiares e comunitários. Visa essa regra ao bem-estar do
destinatário da medida, a qual deverá ter caráter educativo, capaz de auxiliar
o jovem a superar os conflitos da chamada crise da adolescência,
especialmente marcada pelo insurgimento contra os padrões sociais
estabelecidos e, por isto mesmo, determinante das transgressões aos
comandos legais.77
Ainda, prevê o ECA a possibilidade de aplicação das medidas
socioeducativas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a
qualquer tempo. Graças a esta regra, as decisões que aplicam medida
socioeducativa não fazem coisa julgada.
O art. 114 do ECA dispõe, como pressuposto para a aplicação das
medidas socioeducativas, a existência de provas suficientes da autoria e da
materialidade da infração, ressalvada a hipótese de remissão.
Nessa ressalva verifica-se verdadeiro flagrante da violação de direitos
fundamentais, na medida em que permite a aplicação de medida
socioeducativa não privativa de liberdade, que tem caráter punitivo, em sede
de remissão com exclusão, suspensão ou extinção do processo, sem
necessidade de que estejam provadas a autoria e materialidade da infração.
Uma “pena” é aplicada ao infrator, sem que sejam observados seus
direitos ao devido processo legal e ao contraditório, sob a justificativa de que
se trata de “composição”, determinada pelo ajuste e concordância, pela
77 SOTTO MAIOR, Olímpio. Comentário ao art. 113 do ECA. In CURY, M.; AMARAL E SILA,A; MENDEZ, E.G. (Coord). Op. cit., p. 344.
137
aceitação de sua concessão por parte do adolescente - e de seus pais ou
responsável -, além de que não prevalece para efeito de antecedentes e não
pode incluir a aplicação das medidas socioeducativas de semiliberdade e
internação.
O Estatuto, que é mundialmente conhecido por ser um dos mais
modernos do mundo, destacando como princípio basilar o da proteção
integral, no entanto, permite tamanha disposição quanto aos direitos
fundamentais do adolescente.
Conforme Alves Lima78:
“É preciso que se preste muita atenção à lógicaprotetiva do Estatuto, evitando-se que o exercício dopoder corretivo descambe para um disfarçado abusode autoridade.”
O mesmo autor, comentando a dispensa da prova da autoria e da
materialidade para a imposição da advertência, assevera:
“Embora a advertência possa vir a ser aplicada noprimeiro contato com o sistema de Justiça daInfância e da Juventude, na audiência deapresentação ao órgão do Ministério Público (art. 179do ECA), nada impede que decorra do procedimentoapuratório do ato infracional, através do respectivoprocedimento contraditório. Dessa forma, não sepode estabelecer a dispensa da apuração do atoinfracional como regra de proceder.
78 ALVES LIMA, Miguel Moacyr. Comentário ao art. 115 do ECA. In CURY, M.; AMARAL ESILA, A; MENDEZ, E.G. (Coord). Op. cit., p. 350.
138
Em segundo lugar, a afirmação de que a medidapode ser imposta independentemente da prova damaterialidade do fato contraria não só o espírito doEstatuto, um sistema jurídico edificado sobre oprincípio dos direitos fundamentais dos seusdestinatários, mas também a exigência expressa doparágrafo único do seu art. 114.” 79
Acrescente-se que a ressalva atenta contra o próprio princípio da
tipicidade, previsto no art. 113, pois esse remete o exegeta aos Princípios
Garantistas do Direito Penal Comum, dentre os quais o de que não há pena
sem crime e sem processo no qual reste provada a autoria e materialidade,
sob pena de arbitrariedade.
O processo é a garantia da sociedade contra a restrição de direitos
substanciais de modo arbitrário e desarrazoado.80 A dispensa da prova da
autoria e materialidade para a cumulação de medida socioeducativa com a
remissão fere também o princípio da inocência, segundo o qual o acusado é
inocente até que seja declarado culpado por uma sentença transitada em
julgado. Como conseqüência, não deveria ser possível a aplicação de pena,
no caso, de medida socioeducativa, sem o devido processo legal e sem que
restem comprovadas a autoria e materialidade do ato infracional.
79 Art 114 do ECA: A imposição das medidas previstas nos incisos II a VI do art. 112pressupõe a existência de provas suficientes da autoria e da materialidade da infração,ressalvada a hipótese de remissão, nos termos do art. 127.
Parágrafo único. A advertência poderá ser aplicada sempre que houver prova damaterialidade e indícios suficientes da autoria.80 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. São Paulo: Atlas, 1998, p. 27
139
2.1- Medidas socioeducativas não privativas de liberdade:
2.1.1- Advertência:
Prevista no art. 115 do ECA, consiste em admoestação verbal do
adolescente infrator.
Pode ser aplicada sempre que houver prova da materialidade e indícios
suficientes da autoria, ressalvada a hipótese de remissão, em que são
dispensados, conforme acima analisado.
2.1.2- Reparação do dano:
Sempre que possível, quando o ato infracional tiver reflexos
patrimoniais, poderá ser determinado pela autoridade que o adolescente
restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma,
compense o prejuízo da vítima (art. 116 do ECA).
Assim, se a vítima não tiver seu dano ressarcido através da medida
socioeducativa aplicada ao adolescente, poderá buscar esse direito na
esfera civil, pois esta responsabilidade não é excluída pelo Estatuto.81
A medida socioeducativa de obrigação de reparar o dano se aplica ao
adolescente, assim entendido aquele que tenha entre doze anos completos
e dezoito incompletos.
81 VERONESE, Josiane Rose Petry; QUANDT, Guilherme de Oliveira; OLIVEIRA, Lucienede Cássia Policarpo. O Ato Infracional e a Aplicação das Medidas Socioeducativas. InVERONESE, Josiane Rose Petry; RODRIGUES, Walkíria Machado; MIOTO, Regina CéliaTomaso (Autoras e Organizadoras). Infância e Adolescência, O Conflito com a Lei: algumasdiscussões. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2001, p. 56.
140
O Estatuto inova ao prever que a autoridade (Promotor de Justiça ou
Juiz) poderá ir além da mera tentativa de composição patrimonial,
estabelecendo a faculdade de determinar que o adolescente repare o dano
decorrente de sua ação ilícita, como medida socioeducativa. Havendo
impossibilidade da reparação, seja pela condição financeira do adolescente,
ou pelo diminuto valor jurídico do ato, a medida poderá ser substituída por
outra.82
Ressalva Nogueira83 que:
82 CORREA JUNIOR, Luiz Carlos de Azevedo. Direito do Menor. São Paulo: Atlas, 1991, p.34.83 NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 4. ed. SãoPaulo: Saraiva, 1998, p. 180.
141
“a medida de obrigação de reparar o dano, salvomelhor juízo, parece-nos de duvidosaconstitucionalidade, pois não pode o Juiz deMenores84 impô-la como medida obrigatória, masapenas tentar a composição do dano como previa oCódigo revogado (art. 103), já que nem mesmo aoadulto condenado criminalmente pode ser impostapelo juiz criminal a obrigação de reparar o danocausado, nem mesmo como condição do ‘sursis’,embora a não-reparação do dano pelo condenadoconstitua causa obrigatória de revogação dessebenefício (CP, art. 81, II). Como, pois, impor talmedida obrigatoriamente ao adolescente ou a seu paiem procedimento que apura a prática de atoinfracional?(...) Assim, a imposição da reparação dodano pelo Juiz de Menores não deixa de serexorbitante, sem que haja a devida apuração da culpaem processo regular, o que deve ocorrer na esferacivil, já que na esfera minorista existe previsãosomente da apuração da prática de ato infracional,não impedindo, todavia, que seja tentada umacomposição amigável para reparação do dano, masnão imposição obrigatória como está previsto.”
Deve-se, sempre, estar atento ao espírito do ECA quanto à proteção
dos direitos dos adolescentes.
A obrigação de reparar o dano alcança não somente aos casos de atos
infracionais que atinjam o patrimônio da vítima, mas também àqueles em
que o dano à esfera patrimonial se dá por via indireta e nas hipóteses de
dano moral.
Quanto à dispensa da prova da materialidade e autoria na remissão,
refere Alves Lima85:
84 Ou o Promotor de Justiça. Nota da autora.85 ALVES LIMA, Miguel Moacyr. Comentário ao art. 116 do ECA. In CURY, M.; AMARAL ESILA, A; MENDEZ, E.G. (Coord). Op. cit., p. 357.
142
“Quando a medida vier acoplada ao benefício daremissão, a autoridade deverá contar com a prova damaterialidade, bem como com elementos deconvicção, embora não concludentes, masfortemente indicativos (indiciários) da autoria do atoinfracional. Caso contrário, estaríamos diante de umasituação legal desconectada do princípio de justiça,ou de justa causa, e portanto, estranha ao modelojurídico-processual do Estatuto. Ao falar-se emprincípio do contraditório não se pode concebernenhuma forma de sanção, ainda que de carátersócio-educativo, sem formação de culpa, ainda quenão plena. Estaríamos embutindo no sistema doEstatuto da Criança e do Adolescente um viésautoritário de incontroláveis conseqüências.Estaríamos quebrando a lógica da proteção integral,em homenagem à lógica da tutela repressiva que oideário básico da atual lei menorista rechaça deforma direta e aberta, como se vê de suapreocupação com a salvaguarda dos direitos egarantias individuais, dos direitos e garantiasprocessuais da criança e do adolescente- no casodestes, ainda que infratores.”
Conclui-se que o ECA, em vários artigos isolados permite a violação de
direitos individuais dos adolescentes, os quais devem ser corrigidos por meio
de uma interpretação sistemática dos objetivos do Estatuto em conformidade
com a Constituição Federal.
2.1.3- Prestação de Serviços à Comunidade:
Estabelece o art. 117 do ECA que:
“A prestação de serviços comunitários consiste narealização de tarefas gratuitas de interesse geral, porperíodo não excedente a seis meses junto aentidades assistenciais, hospitais, escolas e outrosestabelecimentos congêneres, bem como emprogramas comunitários ou governamentais.
143
Parágrafo único. As tarefas serão atribuídasconforme as aptidões do adolescente, devendo sercumpridas durante jornada máxima de oito horassemanais, aos sábados, domingos e feriados ou emdias úteis, de modo a não prejudicar a freqüência àescola ou à jornada normal de trabalho.
Nada impede que a autoridade judiciária fixe um número de horas a
serem cumpridas pelo adolescente, cominando um lapso temporal máximo
para cumprimento da medida. O número total de horas deve respeitar os
limites de oito horas semanais e seis meses para o término da medida.86
A atividade deverá ser não remunerada, a fim de que cumpra a
finalidade de responsabilização do adolescente.87
A prestação de serviços à comunidade, inobstante o conteúdo
pedagógico, encobre forte natureza punitiva. Tanto é que em nada difere das
prestações de serviço à comunidade aplicadas no Direito Penal, sendo uma
forma de pena restritiva de direitos, alternativa à privativa de liberdade.
Por isso mesmo, cabem as mesmas críticas quanto ao desrespeito ao
devido processo legal e ao contraditório para sua aplicação, bem como à
dispensa da prova da autoria e da materialidade, em sede de remissão.
86 CORREA JUNIOR, op. cit. p. 35.87 VERONESE, Josiane Rose Petry; QUANDT, Guilherme de Oliveira; OLIVEIRA, Lucienede Cássia Policarpo. O Ato Infracional e a Aplicação das Medidas socioeducativas. InVERONESE, Josiane Rose Petry; RODRIGUES, Walkíria Machado; MIOTO, Regina CéliaTomaso (Autoras e Organizadoras). Op. cit., p. 60.
144
2.1.4- Liberdade Assistida:
Prevista no art. 118 do ECA, será aplicada sempre que se mostrar a
medida mais indicada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o
adolescente, por meio de pessoa capacitada (orientador), a fim de criar
condições para reforçar vínculos entre o jovem, seu grupo de convivência e
sua comunidade.
É fixada por um prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer
tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o
orientador, o Ministério Público e o defensor.
A liberdade assistida depende de estrutura prévia da comunidade, que
contem com programas específicos de atendimento, a fim de que tenha
êxito. O comprometimento do adolescente e de alguém de sua família, bem
como o papel do orientador, são essenciais para atingir-se o caráter
socializante.
O art. 119 apresenta rol exemplificativo das atividades a serem
desempenhadas pelo orientador, especialmente a promoção social do
adolescente, supervisão da freqüência e aproveitamento escolar, promoção
da profissionalização e sua inserção no mercado de trabalho e apresentação
de relatório do caso.
Tratando-se também de medida com caráter repressivo, uma vez que
restringe direitos, aplica-se a mesma crítica acerca do desrespeito ao devido
processo legal e ao contraditório para sua aplicação, bem como à dispensa
da prova da autoria e da materialidade, em sede de remissão.
145
2.2- Medidas socioeducativas privativas de liberdade:
2.2.1- Regime de Semiliberdade:
Dispõe o art. 120 que o regime de semiliberdade pode ser determinado
desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada
a realização de atividades externas, independentemente de autorização
judicial, sendo vedada determinação em sentido contrário88, diferentemente
do que ocorre com a internação. Ressalvadas suas peculiaridades, amolda-
se ao regime aberto previsto na legislação penal.
É obrigatória a escolarização e a profissionalização durante o
cumprimento, não comportando prazo determinado. Aplica-se, no que
couber, as regras relativas à internação, levando em conta a finalidade
limitativa e de proteção como razão comum da disciplina das duas medidas.
Assim como a internação, devem ser observadas as garantias
processuais previstas no art. 114 e arts. 110 e 111 da Lei menorista, não
podendo ser aplicada em sede de remissão.
Prevê o parágrafo segundo do art. 120 que se aplicam as disposições
relativas à internação, no que couber, ao que se entende cabíveis as
determinações de reavaliação periódica para manutenção da medida a cada
seis meses, o prazo máximo de três anos, a possibilidade de aplicar outra
88 CURY, Munir; GARRIDO. P. & MAÇURA. Estatuto da Criança e do Adolescente Anotado.São Paulo: RT, 1991, p.64.
146
medida após esse período, a liberação compulsória aos vinte e um anos, o
procedimento de desinternação (art. 121, §§ 2º a 6º do ECA).89
A dificuldade prática é que infelizmente não dispomos de casas de
semiliberdade para o recolhimento de adolescentes, como forma de
transição para o regime aberto, que seria o de liberdade assistida.90
2.2.2- Internação:
A internação é medida privativa de liberdade, prevista no art. 124 do
ECA. Por isso, é normatizada pelos princípios da brevidade,
excepcionalidade e respeito à dignidade humana em estágio de
desenvolvimento. Havendo outra medida adequada, não deve ser aplicada a
internação.
Segundo Mendez91:
“A utilização da expressão ‘privação da liberdade’resulta altamente conveniente no sentido de não seignorar o complexo sistema de garantias de fundo eprocessuais que devem acompanhá-la.Tradicionalmente, os sistemas de Justiça de‘menores’ produzem uma alta quota de sofrimentosreais encobertos por uma falsa terminologia tutelar.
89 VERONESE, Josiane Rose Petry; QUANDT, Guilherme de Oliveira; OLIVEIRA, Lucienede Cássia Policarpo. O Ato Infracional e a Aplicação das Medidas socioeducativas. InVERONESE, Josiane Rose Petry; RODRIGUES, Walkíria Machado; MIOTO, Regina CéliaTomaso (Autoras e Organizadoras). Op.cit., p. 70.90 NOGUEIRA, Op. cit., p. 120.91 MENDEZ, Emílio Garcia. Comentário ao art. 121 do ECA. In CURY, M.; AMARAL E SILA,A; MENDEZ, E.G. (Coord). Op. cit., p. 373.
147
Neste sentido, o espírito e a letra do art. 121traduzem, plenamente, aquilo que está disposto noinc. ‘b’, ponto 10, das ‘Regras Mínimas das NaçõesUnidas para a Proteção dos Jovens Privados deLiberdade.’
As atividades externas são permitidas, salvo se houver vedação
expressa da autoridade judiciária.
Não comporta prazo determinado, porém não poderá exceder a três
anos, devendo ser realizada uma avaliação a cada seis meses a fim de
verificar a necessidade de sua manutenção, caso em que a fundamentação
é obrigatória.
Após o lapso temporal máximo, o adolescente deve ser posto em
liberdade, semiliberdade ou liberdade assistida, sendo a liberação
obrigatória em caso de o adolescente atingir a idade de vinte e um anos. Em
qualquer hipótese, a desinternação depende de autorização judicial, ouvido
o Ministério Público.
Considerando seu caráter de excepcionalidade, a internação
exclusivamente deve ser aplicada quando não houver em hipótese alguma
outra medida adequada e somente quando o ato infracional for cometido
com violência ou grave ameaça à pessoa, quando houver reiteração no
cometimento de outras infrações graves, ou por descumprimento reiterado e
injustificável de outra medida. Neste último caso, não poderá a internação
superar o prazo de três meses (Art. 122 do ECA).
148
O aspecto mais importante do art. 122 do ECA está no § 2º, que inverte
o ônus da prova, obrigando a autoridade judicial a demonstrar que não
existe outra medida mais adequada que a internação.92
A internação deverá ser cumprida em estabelecimento exclusivo para o
atendimento de adolescentes, diverso daquele destinado a abrigo,
obedecendo critérios de separação por idade, compleição física e gravidade
da infração. Durante o período de internamento, deverá haver a prática de
atividades pedagógicas, afim de favorecer a reinserção do jovem.
O Estatuto busca com isso terminar com qualquer possibilidade de
promiscuidade pela manutenção de adolescentes internados em
estabelecimentos com adultos, bem como em locais não condizentes com a
reeducação e dignidade da pessoa humana.
Os direitos do adolescente internado estão elencados no art. 124 do
ECA, sendo vedada a incomunicabilidade, com possibilidade de suspensão
temporária de visitas, em caso da existência de motivos sérios e fundados
de sua prejudicialidade ao adolescente. O Estado deverá zelar pela
integridade física e mental dos internos, cabendo-lhe adotar as medidas
adequadas de contenção de segurança.
Assim como a semiliberdade, devem ser observadas as garantias
processuais previstas no art. 114 e arts. 110 e 111 da Lei menorista, não
podendo ser aplicada em sede de remissão.
A esse respeito, ressalta-se a necessidade de respeitar esses mesmos
princípios para a aplicação de todas as medidas socioeducativas, haja vista
terem caráter penal, poderem ser revisadas a qualquer tempo para aplicação
92 Idem, p.377.
149
de medida mais gravosa, poderem ser convertidas em internação em caso
de descumprimento injustificado e reiterado, o que vai contra às garantias
processuais, ao respeito à dignidade humana em estágio de
desenvolvimento e da doutrina da proteção integral, adotados pelo ECA.
150
151
3- REMISSÃO:
O Instituto da Remissão foi previsto no Estatuto da Criança e do
Adolescente, em seus artigos 126, 127 e 128, constituindo formas de
exclusão do processo quando concedido pelo Promotor de Justiça, e de
suspensão ou extinção do processo, quando concedido pelo Juiz.
A primeira forma está prevista no caput do art. 126 que prevê:
“Antes de iniciado o procedimento judicial paraapuração de ato infracional, o representante doMinistério Público poderá conceder a remissão comoforma de exclusão do processo, atendendo àscircunstâncias e conseqüências do fato, ao contextosocial, bem como à personalidade do adolescente esua maior ou menor participação no ato infracional.”
Já a segunda forma está prevista no parágrafo único do mesmo
dispositivo, assim narrado:
“Iniciado o procedimento, a concessão da remissãopela autoridade judiciária importará na suspensão ouextinção do processo.”
152
Neste trabalho, abordaremos mais especificamente a remissão
concedida pelo Promotor de Justiça, embora seja importante traçarmos a
diferenciação entre as duas e fazermos algumas considerações genéricas,
vez que os questionamentos suscitados abrangem também a remissão e
aplicação de medida socioeducativa pelo Magistrado.
A remissão faz-se admissível em dois momentos distintos: na fase
pré-processual, concedida pelo Promotor de Justiça, antes do oferecimento
da Representação, tendo como efeito a exclusão do processo de
conhecimento; ou já na fase judicializada, com exclusão ou suspensão do
processo, aplicada pelo Juiz de Direito da Infância e Juventude, quando já
oferecida a representação.
QUADRO N.º 2: MOMENTOS DA CONCESSÃO DA REMISSÃO
FASE QUEM CONCEDE EFEITO
Pré-processual Promotor de Justiça Exclusão do processo
Judicializada Juiz de Direito Exclusão ou suspensão do processo
153
“Remissão, do latim remissio, de remittere,significa clemência, misericórdia, indulgência,perdão, renúncia, mas também ‘falta ou diminuiçãode rigor, de força, de intensidade’ (cf. Novo DicionárioAurélio).”93
Alguns autores divergem acerca do tema ao entender que remissão não
é sinônimo de perdão, por ter caráter de transação e permitir a cumulação
de medida socioeducativa. Segundo esses, a expressão tem um sentido
mais amplo que o de simples perdão, que abarcaria apenas a supressão do
processo judicial.94 No caso de ser concedido o perdão puro e simples, sem
aplicação de qualquer medida, tem-se a chamada remissão própria,
enquanto que quando cumulada com medida socioeducativa, é chamada
remissão imprópria.95
O art. 126 estabeleceu, como critérios para a remissão, a análise das
circunstâncias e conseqüências do fato, do contexto social, da personalidade
do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional.
Na seqüência, o art. 127 determina que a concessão da remissão não
implica em reconhecimento ou comprovação da responsabilidade do
adolescente e, em conseqüência, não prevalece para efeito de
antecedentes, admitindo, eventualmente, a aplicação de qualquer das
medidas socioeducativas, exceto a colocação em regime de semiliberdade e
a internação.
93 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Remissão. in CURY, M.; AMARAL E SILA, A; MENDEZ, E.G.(Coord). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, Comentários Jurídicos eSociais, 2.ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p.385.94 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente e Ato Infracional, Garantias Processuais eMedidas Socioeducativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p.56.95 Idem, op. cit., p. 64.
154
Não entraremos na discussão sobre a constitucionalidade da aplicação
de medida socioeducativa pelo Ministério Público no âmbito de sua
competência, uma vez que o advento do enunciado da Súmula 108 do STJ,
estabeleceu a competência exclusiva do Juiz de Direito na aplicação de
medida socioeducativa, pacificando a matéria 96.
O estatuto silenciou acerca dos critérios a serem adotados para a
escolha da medida socioeducativa a ser aplicada e o prazo, o que vem
causando, na prática, uma série de disparidades, pois se verifica que cada
Promotor de Justiça opta por critérios diversos e subjetivos, o que pode
configurar injustiças, na medida em que alguns infratores recebem medidas
bem mais gravosas que outros para casos idênticos, além da violação de
direitos fundamentais.
À primeira vista poderá parecer aceitável o fato de cada Promotor de
Justiça aplicar medida socioeducativa diferente para casos similares, uma
vez que a remissão, como exclusão do processo, aproxima-se ao probation
norte- americano, ou, no nosso direito pátrio, ao instituto da transação penal.
Assim, basta que o Ministério Público proponha a remissão, cumulada com
medida socioeducativa, se for o caso, e, sendo esta aceita pelo infrator e seu
responsável legal, segue para a homologação pelo juízo.
Esse trabalho visa a justamente trazer à discussão algumas questões, a
fim de que a reflexão contribua para o aprimoramento do tema que envolve a
Infância e Adolescência.
96 SARAIVA, op. cit., p. 61, preleciona que : “Na verdade, o ECA ao estabelecer que aremissão concedida (rectius, concertada) pelo Ministério Público sujeita-se para sua eficáciaà homologação do Juiz de Direito (que, como já dito, se não concordar com aquelarepresentará ao Procurador-Geral da Justiça, a exemplo do que também ocorre quandodivergir acerca de pedido de arquivamento de inquérito), implicitamente afirma que será oJuiz de direito quem, homologando a transação efetuada, estará aplicando a medidasocioeducativa ajustada entre as partes.”
155
Alguns dirão que, mesmo em caso de uma sentença condenatória, no
processo penal, cada Juiz dará uma resposta diversa para o mesmo caso.
Ocorre que no Direito Penal, a lei estabelece os limites, máximo e mínimo, e
o tipo de pena a serem fixados, bem como os critérios definidores do
quantum, previstos no art. 59 do Código Penal. O julgador é obrigado a
respeitar estes limites e os critérios, bem como a fundamentar
adequadamente. Além disso, em caso de sentença condenatória, foi
observado o devido processo legal, o contraditório e ampla defesa, o que
não ocorre em sede de remissão e aplicação de medida socioeducativa.
No caso da transação penal, trazida pela Lei n.º 9.099/95, poder-se-ia
afirmar, em defesa da falta de critérios do ECA, que aquele instituto também
permite a aplicação de pena - pecuniária ou de prestação de serviço à
comunidade - a critério do Promotor de Justiça, com a única ressalva de
que, em caso de ser a pena de multa a única aplicável, o juiz poderá reduzi-
la até a metade (art. 76, § 1º, da Lei n.º 9099/95).
Cabe lembrar que o instituto da transação se aplica apenas para os
delitos entendidos de menor potencial ofensivo com pena máxima prevista
de dois anos - art. 61 da Lei n.º 9099/95, combinado com art. 2º da Lei n.º
10.259, de 12 de julho de 2001, que instituiu os Juizados Especiais no
âmbito da Justiça Federal 97-, enquanto a remissão não faz distinção de ato
infracional, podendo ser aplicada a qualquer fato criminoso. Na transação
penal pode ser aplicada pena de multa, o que não é possível em sede de
remissão, pois esta não é prevista como medida socioeducativa. Também, a
97 Lei n.º 10.259 de 12 de julho de 2001, art. 2º : “Compete ao Juizado Especial FederalCriminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça Federal relativos àsinfrações de menor potencial ofensivo.
Parágrafo Único. Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitosdesta Lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa.”
156
transação penal, diferentemente da remissão cumulada com medida,
estabelece requisitos para a sua concessão, previstos no art. 76, § 2º da Lei
n.º 9.099/95.
Ressalvadas as peculiaridades, os institutos têm muitos pontos em
comum, sendo a remissão mais abrangente que a transação penal, o que é
mais grave, na medida em que põe em risco os direitos dos adolescentes
infratores. Mas a mesma crítica que se faz à transação penal cabe à
remissão e à aplicação de medida socioeducativa como exclusão ou
suspensão do processo, pois ambos os institutos desrespeitam o devido
processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a presunção de inocência e
a igualdade. Segundo Lopes Jr98:
“Outra situação que nos parece inaceitável é aaplicação de uma pena sem que tenha antecedido nasua totalidade um processo penal válido, comoocorre, v.g., na transação penal prevista no art. 76 c/c85 da Lei n.º 9.099. Os referidos dispositivospermitem que a pena de multa, aplicada de formaimediata na audiência preliminar, seja convertida empena privativa de liberdade ou restritiva de direitos,quando não for paga pelo acusado. O resultado finalé absurdo: uma pena privativa de liberdade (fruto daconversão), sem culpa e sem que sequer tenhaexistido o processo penal. É um exemplo desubversão de princípios básicos do processo penal”
Tal censura é valida e deve ser estendida ao âmbito do Estatuto da
Criança e do Adolescente, devido a remissão ter o mesmo sentido de
negociação que a transação, além de impor “pena” na forma de advertência,
reparação do dano, prestação de serviço à comunidade e liberdade
98 LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio deJaneiro: Lumen Juris, 2001, p. 10.
157
assistida, que, inclusive também pode ser convertida em privativa de
liberdade pelo descumprimento, conforme art. 122, III do ECA.
Assinala Carvalho99, referindo-se à inconveniência da prescindibilidade
do sistema processual penal, que as críticas dirigidas à violação de direitos
no “processo penal” centralizam-se em dois momentos específicos: atividade
policial (inquérito policial) e atividade executiva (sistema penitenciário),
ressaltando que estes são pautados pelo viés administrativo, e não
jurisdicional. São momentos em que não há verdadeiro processo penal, mas
procedimentos administrativizados (inquisitivos), em essência autoritários e
violadores de direitos, pois inquisitivos – não há respeito dos princípios do
contraditório e ampla defesa. O dirigente faz papel de acusador, advogado e
julgador.
O direito de punir do Estado é limitado pelo direito penal e pelo
processo penal. Quanto mais se utiliza a via administrativa para a resolução
desses conflitos, menos controle formal para que garantias sejam
minimamente respeitadas.
O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a via administrativa na
fase pré-processual, no momento da ouvida do adolescente na Promotoria
de Justiça e análise do procedimento e critérios subjetivos para a tomada de
decisão quanto ao arquivamento, remissão cumulada ou não com aplicação
de medida socioeducativa ou representação. A discricionariedade prejudicial
resulta da disparidade dos critérios utilizados pelos Promotores de Justiça
para concessão da remissão e aplicação de medida socioeducativa, em
99 CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: O Modelo Garantista de Limitação doPoder Punitivo. In CARVALHO, Salo de. (org) Crítica e Execução Penal. Doutrina,Jurisprudência e Projetos Legislativos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 24.
158
razão da omissão da lei e exclusão do processo. A lei e o processo,
limitadores do direito de punir, neste caso, não cumprem seu papel, uma vez
que a primeira não limita o poder discricionário do aplicador do Direito – seja
pela não imposição de critérios legais definidos, seja pela permissão de
exclusão ou suspensão do processo para a imposição da sanção, que tem
caráter penal.
Lopes Jr.100 interpretando modelo garantista de Ferrajoli, ensina que:
“O Direito Penal mínimo é uma técnica de tutela dosdireitos fundamentais e configura a proteção do débilcontra o mais forte; tanto do débil ofendido ouameaçado pelo delito, como também do débilofendido ou ameaçado pela vingança; contra o maisforte, que no delito é o delinqüente, e na vingança é aparte ofendida e os sujeitos públicos ou privadossolidários com ele.101 A proteção vem por meio domonopólio estatal da pena e da necessidade deprévio processo judicial para sua aplicação, e daexistência, no processo, de uma série deinstrumentos e limites, destinados a evitar os abusospor parte do Estado na tarefa de perseguir e punir.”
Por isso a importância de reconhecer-se caráter penal à medida
socioeducativa, a fim de que também aos adolescentes sejam estendidas as
garantias processuais penais, limitando-se a discricionariedade. Refere
Carvalho que, por mais paradoxal que pareça, mesmo sendo mais
estigmatizante, ao dar natureza penal ao ato infracional estaremos
100 LOPES JR, op. cit., p. 17101 FERRAJOLI, apud LOPES JR, op. cit., p. 17.
159
garantindo ao menor direitos materiais e penais mínimos que estão ausentes
no Estatuto da Criança e do Adolescente.102
Lopes Jr.103 destaca, em sua crítica ao sistema de Justiça Negociada,
que a discricionariedade da ação penal e os acordos são resquícios
históricos da ação penal privada e/ou popular, em que a acusação era
disponível, violando o monopólio legal e jurisdicional da violência repressiva
do Estado. A pena não passa mais pelo controle jurisdicional e tampouco se
submete aos limites da legalidade, senão à discricionariedade do Ministério
Público. Esse poder conferido ao Promotor de Justiça termina com a
igualdade entre as partes, vez que é ele quem impõe as condições e o preço
do "negócio”, transformando a acusação em um instrumento de pressão
sobre o acusado, que se vê na conveniência de aceitar uma culpa
inexistente em troca de uma pena menor, ou correr o risco de submeter-se a
um processo que será desde logo desigual.
A desigualdade, na fase administrativa do ECA, não se dá somente
pela superioridade do Promotor de Justiça em relação ao adolescente
hipossuficiente, mas também em relação à escolha de critérios diversos para
a concessão da remissão e aplicação de medida educativa em casos
idênticos, o que acaba por violar também a dignidade da pessoa humana,
princípio contido no art. 1º da Constituição Federal de 1988.
Segue, ainda, Lopes Jr104 dizendo que tampouco os princípios da
presunção de inocência e do ônus probatório da acusação sobrevivem
nessas condições. “O processo penal passa a não ser mais o caminho
102 CARVALHO, Salo de. Teoria Agnóstica da Pena: O Modelo Garantista de Limitação doPoder Punitivo. In CARVALHO, Salo de. (org). Op. cit., p. 26.103 LOPES JR, op. cit., p. 22/25.104 LOPES JR, op. cit., p. 26.
160
necessário para a pena, e com isso o status de inocente pode ser perdido
muito antes do juízo e da sentença e, principalmente, sem que para isso a
acusação tenha que provar o alegado.” Refere esse autor que o sistema
negocial sequer colabora para aumentar a credibilidade da justiça, pois
ninguém gosta de negociar sua inocência.
Evidente, pois, a necessidade de estabelecer limites para a
subjetividade e discricionariedade dos aplicadores do Direito, e isso se faz,
no mínimo, com o estabelecimento de critérios legais definidos para a
concessão da remissão e aplicação de medida socioeducativa, ou com a
obrigatoriedade do devido processo legal para imposição da última, devido
ao reconhecimento de seu caráter penal.
A obrigatoriedade da assistência técnica por advogado durante a fase
administrativa também deve ser buscada, como medida de efetivar os
princípios constitucionais que também foram expressos no Estatuto, de
modo que, se o Estado não tiver condições de proporcionar defensor público
para assistir o infrator, o ato administrativo deve restar prejudicado em favor
do próprio adolescente, devendo a medida socioeducativa ser aplicada
somente com o devido processo legal. Embora reconheça-se a necessidade
do devido processo legal para a aplicação de medida socioeducativa como o
garantia da não violação de direitos, o estabelecimento de critérios definidos
e a obrigatoriedade da assistência por advogado permitiriam um controle da
estrita observação desses critérios, a conveniência de aceitar-se ou não a
remissão e a medida, bem como a possibilidade de atacar recursalmente a
análise dos critérios considerados ou não para a concessão da remissão e
aplicação da medida socioeducativa.
Foi visualizado que as medidas socioeducativas têm forte cunho
repressivo, na medida em que são restritivas de direitos e privativas de
liberdade, estas últimas não podendo ser aplicadas em sede de remissão.
161
Como então permitir que cada Promotor de Justiça utilize critérios
subjetivos para a concessão da remissão e escolha da medida a ser
aplicada e o prazo?
Mesmo os critérios definidos no art. 126 do Estatuto da Criança e do
Adolescente para a remissão são abertos, deixando grande margem de
discricionariedade ao Promotor de Justiça.
Está-se diante de um Direito Penal Juvenil, embora muitos aplicadores
do Direito insistam em que as medidas socioeducativas não tem caráter
penal, pensamento herdado do Código de Menores, baseado na
irresponsabilidade do adolescente.
A implicação de uma medida socioeducativa aplicada é muito grave,
pois pode ser revista a qualquer tempo (art. 128 do ECA), inclusive por uma
mais gravosa, bem como, se não cumprida reiterada e injustificadamente,
convertida em internação (art. 122, III do ECA).
Apesar disso, as medidas socioeducativas tem sido aplicadas como
uma panacéia para os problemas relativos aos adolescentes envolvidos em
ato infracional, a critério do Promotor de Justiça, muitas vezes por períodos
longos, desproporcionais até ao ato infracional, se comparado ao que se
aplicaria em sede de transação penal para um imputável ou em sentença
condenatória, como se não implicasse em conseqüências negativas para o
adolescente e como se houvesse apenas aspecto pedagógico na medida,
sem levar em conta o caráter penal e a peculiar situação do adolescente
como pessoa em desenvolvimento
É preciso estar atento a fim de não sejam dadas respostas mais
severas e duradouras do que as que, em idênticas situações, seriam
impostas aos adultos, garantindo-se os mesmos direitos para os
adolescentes.
162
Ensina Mirabete105 que o objetivo da remissão é:
“evitar ou atenuar os efeitos negativos dainstauração ou continuação do procedimento naJustiça de Menores, como, p. ex., o estigma dasentença. No confronto dos interesses sociais eindividuais tutelados pelas normas do Estatuto -interessa à sociedade defender-se de atosinfracionais, ainda que praticados por adolescentes,mas também lhe interessa proteger integralmente oadolescente, ainda que infrator - o instituto daremissão, tal como o princípio da oportunidade doprocesso penal, é a forma de evitar a instauração doprocedimento, suspendê-lo ou extingui-lo,‘atendendo às circunstâncias e conseqüências dofato, ao contexto social, bem como à personalidadedo adolescente e sua maior ou menor participação noato infracional.”
Quer-se que esse mesmo zelo na proteção do adolescente seja
observado quando da cumulação de medida socioeducativa, a fim de manter
íntegro o princípio da proteção integral. Dificilmente esse objetivo será
alcançado se perpetuado o subjetivismo que envolve a aplicação das
medidas em sede de remissão. Diz Lopes Jr. que “não há dúvida de que
sempre é melhor uma sentença justa, ainda que tardia, que o imediatismo da
injustiça”. Nesse sentido, ressaltamos a importância do processo como
garantidor da justiça.
Preleciona também Mirabete106 que a remissão :
105 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Remissão. in CURY, M.; AMARAL E SILA, A; MENDEZ, E.G.(Coord). Op. cit., p.385.106 MIRABETE, Júlio Fabbrini. Formas de Remissão. in CURY, M.; AMARAL E SILA, A;MENDEZ, E.G. (Coord). Op. cit., p.386.
163
“é medida exclusiva do representante do MinistérioPúblico, que, em lugar de pedir a instauração doprocedimento, a concede (arts. 180, II e 201, I0,podendo incluir a aplicação de qualquer das medidasprevistas em lei (art. 227). A manifestação deve serfundamentada e o pedido homologado pelaautoridade judiciária (art. 181, caput), que, nãoconcordando com sua aplicação, deve remeter osautos ao Procurador-Geral de Justiça (art. 181, § 2º).”
Da acertiva, poder-se-ia apontar um meio de tornar mais ameno o
problema da falta de critérios estabelecidos no ECA para aplicação das
medidas socioeducativas, qual seja, através da fundamentação do Promotor
de Justiça ao requerer a homologação da remissão.
Por se tratar de ato administrativo, discricionário do Ministério Público, é
obrigatória a fundamentação, a fim de permitir o controle deste ato, seja pela
não homologação pelo Juízo e remessa ao Procurador-geral, seja pela via
recursal.
Segundo Moreira Neto107, por discricionário entende-se o ato
administrativo em que há possibilidade de escolha de sua oportunidade, de
sua conveniência, do modo de sua realização, do alcance dos seus efeitos,
do seu conteúdo jurídico, das suas condições acessórias, do momento de
sua exeqüibilidade ou do destinatário ou destinatários de sua vontade.
Constitui elemento do ato administrativo a motivação, “consistente na
explicitação dos pressupostos fáticos, vinculados ou não, do ato
administrativo; embora nem sempre obrigatória, salvo para decisões, sua
adoção é praxe de grande valia para a garantia da moralidade administrativa
107 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 11. ed. Rio deJaneiro: Forense, 1999, p. 106.
164
e para facilitar o emprego dos instrumentos políticos e jurídicos de
controle”108
Para ilustrar a importância da fundamentação das decisões, junta-se a
seguinte jurisprudência:
“SENTENÇA QUE CONCEDE REMISSÃO – NULIDADEPOR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.”109
No corpo do Acórdão são referido os seguintes argumentos:
“A sentença é realmente nula, pois não contémrelatório, nem identifica o adolescente que recebeu aremissão e no tocante à fundamentação limita-se aressaltar que a remissão é oportuna e justa e que oprosseguimento da instrução não teria utilidade. ”
A esse exemplo, o que se observa na prática, de parte de alguns
Promotores de Justiça, haja vista o entendimento de que a remissão
corresponde a um acordo entre Ministério Público, infrator e seu
representante legal, o pedido de homologação ao Juízo sem a devida
fundamentação dos critérios utilizados para a concessão da remissão e a
medida socioeducativa optada e o prazo.
De forma alguma pretende-se criticar o trabalho dos Promotores de
Justiça deste Estado, consabidamente pessoas da mais alta competência e
idoneidade, mas tão-somente fazer uma mea culpa, admitindo que se utiliza
critérios subjetivos, na falta de critérios legais, sem explicitá-los na
108 Idem, p. 101.109 Apelação Cível 17.672.0/5; Marília; Relator Lair Loureiro; Apelante: Ministério Público;Apelado; R.F.S, São Paulo,30/06/94. Cadernos de Direito da Criança e do Adolescente. SãoPaulo: Malheiros, 1995, n.1, p.159/160 .
165
fundamentação, dificultando, assim, o controle destes atos e permitindo que
as disparidades na aplicação das medidas se perpetuem.
Cabe referir, também, a exigência que alguns Promotores de Justiça
fazem para conceder a remissão, de que o infrator admita o ato infracional.
Por esse raciocínio, considerando que a remissão é perdão do fato
delituoso, não se poderia conceder perdão a quem não admite tenha
praticado tal fato. Ocorre que muitos outros Promotores de Justiça
concedem a remissão, atendendo a outros critérios, independentemente da
confissão, por entenderem tratar-se de acordo entre o Ministério Público e o
infrator, conforme veremos adiante na análise na pesquisa, o que assentua a
diversidade do tratamento dado aos adolescentes.
Faz-se necessário buscar uma uniformização destes critérios: seja
através de proposta legislativa; seja pela discussão entre os órgãos do
Ministério Público, por meio de seus Conselhos de Promotores e
Procuradores de Justiça, a fim de unificá-los, ou de, pelo menos, explicitá-los
quando da concessão da remissão; seja, ainda, pelo respeito do devido
processo legal; a fim de evitar-se essas disparidades tão prejudiciais aos
Direitos da Infância e do Adolescente.
A mesma preocupação que motivou estudiosos a montarem uma
comissão técnica para elaborar o projeto de diretrizes socioeducativas como
alternativa prática e propositiva aos movimentos em favor da redução da
menoridade penal, deve ressurgir para buscar respostas aos
questionamentos traçados. Os argumentos referidos por Brancher110,
110 BRANCHER, Leoberto. Justiça para a Juventude. Proteção Integral, publicação daAssociação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e Juventude,Porto Alegre, 2001. Encarte especial – Proposta de Lei de Diretrizes sócio-educativas, n. 27,p. 1.
166
Presidente da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça
da Infância e da Juventude, para justificar a proposta de Lei são os mesmos
pelos quais se invoca a necessidade de nova mobilização para o debate
aqui proposto:
“Como atividade estatal coercitiva, muitas vezes maisrigorosa, e no mais das vezes mais arbitrária comadolescentes do que com adultos, é inadmissível,que, ao contrário do que já ocorre desde a Lei8.069/90 com o processo de conhecimento, aexecução sócio-educativa se proceda sem asgarantias da legalidade expressas pela norma prévia,estrita e certa.”
O nosso olhar sobre o Direito da Infância e da Adolescência precisa ser
pelo viés garantista. Com isso, as prerrogativas fundamentais da pessoa
humana serão estendidas às crianças e aos adolescentes indistintamente,
especialmente no que tange às garantias processuais previstas no Sistema
Penal para os adultos. O paternalismo deve ser renunciado, pois não se
quer repetir os erros da tutela da situação irregular, adotando-se a
responsabilidade juvenil, isenta de discricionariedade e subjetividade dos
aplicadores do direito, respeitando-se os princípios processuais.
167
PARTE IIContribuição Pessoal
168
169
4- ASPECTOS METODOLÓGICOS:
4.1- Metodologia:
O presente trabalho constituiu-se em um estudo exploratório do
problema. O método escolhido foi o misto, quantitativo e qualitativo, através
da aplicação de um questionário conforme modelo constante do anexo, com
questões abertas e fechadas, respondidos por Promotores de Justiça que
atuam nas Promotorias da Infância e Juventude, como titulares ou
substitutos.
A análise quantitativa foi realizada por meio de médias e percentuais
das ocorrências.
A análise qualitativa foi realizada por análise de conteúdo, organizado
em categorizações.
Parte dos questionários foi entregue pessoalmente para os Promotores
de Justiça e parte deles enviada por e-mail, sendo que todos continham as
instruções básicas para o preenchimento e finalidade da pesquisa.
170
Por questionário entende-se o instrumento de pesquisa constituído por
uma série de perguntas organizadas, bem estruturadas e apresentadas que
devem ser respondidas sem a presença do pesquisador, do entrevistador.111
O modelo do questionário enviado consta do anexo do trabalho.
4.2- Descrição da População e Amostra:
A população envolve todos os Promotores de Justiça da Infância e
Juventude e eventuais substitutos que responderem o questionário.
Conforme informação obtida junto ao site do Ministério Público, em junho de
2003, atuam no Rio Grande do Sul, em torno de 170 Promotores de Justiça
junto à Infância e Juventude. A amostra foi composta por Promotores de
Justiça, titulares ou substitutos, que responderam o questionário, totalizando
26 participantes, correspondendo a 15, 29% da população.
GRAFICO N.º 1: POPULAÇÃO E AMOSTRA
111 THUMS, Jorge. Acesso à Realidade, Técnicas de pesquisa e Construção do
Conhecimento. 2ª ed. Porto Alegre: Editora Sulina e Editora da Ulbra, 2000, p. 157.
Promotoresde Justiça daInfância eJuventude Promotoresde JustiçaParticipantes15,29%Fatia 3
171
172
5-APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS:
Responderam o questionário 22 Promotores titulares da Infância e
Juventude e 3 Promotores substitutos.
GRÁFICO N.º 2: PROMOTORES DE JUSTIÇA PARTICIPANTES
Para a questão número 4 da pesquisa, acerca dos critérios utilizados
pelos Promotores de Justiça na escolha da medida socioeducativa e do
Promotoresde Justiçatitulares 88,5%
Promotoresde Justiçasubstitutos11,5%Fatia 3
173
prazo a serem aplicados, devendo serem enumerados pela ordem de
importância, iniciando pelo n.º 1 para atribuir o de maior importância,
observou-se, pela análise do quadro n.º 4, que o critério mais valorado pelos
Promotores de justiça é a gravidade do fato, sendo que 22 Promotores de
Justiça ( 84,6%) atribuíram-lhe o n.º 1 e apenas 3 ( 15,4%) atribuíram o n.º 1
à confissão do delito (1 Promotor de Justiça, representado na coluna P10,
apenas assinalou os critérios apontados na questão n.º 4, não lhes
atribuindo qualquer valor). O segundo critério mais valorado foram os
antecedentes, onde 9 Promotores de Justiça (34,6%) atribuíram-lhe o n.º 2.
A personalidade (assinalada pelo símbolo (**) no quadro n.º 3) recebeu duas
valorações diferentes: o n.º 3, por 6 Promotores de Justiça (23%) e o n.º 7,
por 5 Promotores de Justiça (26,9%). A conduta social teve o n.º 4 atribuído
por 6 Promotores de Justiça (23%). As conseqüências do fato obtiveram n.º
5 por 7 Promotores de Justiça (26,9%). O estudo ou trabalho do infrator
(simbolizado por (*) no quadro n.º 3) também recebeu duas valorações
diferentes: o n.º 6 por 5 Promotores de Justiça (19,3%) e o n.º 10 por 4
Promotores de Justiça (15,3%). Os motivos receberam o n.º 8 por 5
Promotores de Justiça (19,3%); a idade do infrator foi valorada com o n.º 9
por 4 Promotores de Justiça (15,3%), e o comportamento da vítima
(simbolizada por (***) no quadro n.º 3), recebeu, ao mesmo tempo, o n.º 10
por 4 Promotores de Justiça (15,3%) e o n.º 11 por 10 Promotores de Justiça
(38,4%). A empatia recebeu o n.º 12 por 12 Promotores de Justiça (46,1%),
e 6 (23%) não assinalaram a empatia dentre os critérios considerados
(conforme quadro n.º 4). Houve 4 Promotores de Justiça que elencaram
outros critérios: o sentimento do adolescente em relação ao fato
(arrependimento ou não); a situação familiar, se conta com o apoio e amparo
dos pais; a atitude dos pais, o que pensam sobre o que aconteceu e a
atitude que tomaram; o pedido dos pais. Estes critérios não tiveram qualquer
número atribuído pelos Promotores de Justiça.
174
QUADRO N.º 3: VALORAÇÃO DOS CRITÉRIOS
Critériosn.º de Promotores deJustiça que optaram
pelo critério%
valoração atribuída aocritério
Gravidade 22 84,6 1
Antecedentes 9 34,6 2
** Personalidade 6 23 3
Conduta social 6 23 4
Conseqüências 7 26,9 5
* Estudo/trabalho doinfrator 5 19,3 6
** Personalidade 5 19,3 7
Motivos 5 19,3 8
Idade do infrator 4 15,3 9
***Comportamento davítima 4 15,3 10
* Estudo/trabalho doinfrator 4 15,3 10
***Comportamento davítima 10 38,4 11
Empatia 12 46,1 12
Outros 4 15,3 -
Verifica-se que, apesar de os Promotores de Justiça atribuírem o
mesmo valor a determinados critérios, há muita variação quanto aos demais
175
critérios, o que pode ocasionar diferentes soluções para os casos dos
adolescentes em conflito com a lei, conforme se verifica nas respostas da
questão 7. O quadro n.º 4 permite demonstrar os diferentes critérios e sua
valoração, considerados para a concessão da remissão e escolha da medida
socioeducativa e do prazo por cada Promotor de Justiça participante. Cada
coluna representa os valores atribuídos por cada um dos 26 Promotores de
Justiça para os critérios elencados na coluna da esquerda
Pode-se perceber que, por exemplo, enquanto 9 Promotores de Justiça
consideraram os antecedentes como o 2º critério mais importante, 17
Promotores de Justiça consideraram outros critérios suscetíveis de receber a
valoração n.º 2. Assim como os mesmos 9 Promotores de Justiça, que
concidiram na escolha do critério de grau 2, optaram por diferentes critérios
para atribuir o valor 3.
Isso ocorre porque o art. 126 do ECA, o qual refere - “Antes de iniciado
o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do
Ministério Público poderá conceder a remissão como forma de exclusão do
processo, atendendo às circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto
social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor
participação no ato infracional.” – é aberto, ou seja, dá margem a
interpretação e subjetivismo do aplicador do Direito.
Muitos dos critérios elencados na questão n.º 4, adotados pelos
Promotores de Justiça, sequer são mencionados pelo artigo. Observa-se
que há total discricionariedade dos Promotores de Justiça na escolha e
valoração dos critérios para a concessão da remissão e para a fixação de
medida socioeducativa e o prazo. Cada um opta por seus próprios critérios,
da forma que entende relevante, explicando a razão da diversidade de
soluções das respostas para a questão 7.
177
QUADRO N.º 4: CRITÉRIOS E VALORES ATRIBUÍDOS PELOS PROMOTORES DE
JUSTIÇA
P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10 P11 P12 P13 P14 P15 P16 P17 P18 P19
P20 P21 P22 P23 P24 P25 P26
Legendas: cada coluna corresponde às respostas de cada um dos 26 Promotor de
Justiça, representado por P1, P2...P26
X : critério não assinalado pelo Promotor de Justiça;
* : sentimento do adolescente em relação ao fato praticado (arrependimento ou não);
$: situação familiar, se conta com apoio ou amparo dos pais;
#: pedido dos pais
?: atitude dos pais, o que pensam sobre o que aconteceu e a atitude que tomaram;
SIM: critérios assinalado pelo Promotor de Justiça, sem atribuição de valor.
IDADE 9 11 6 5 11 6 7 7 11 SIM X 9 4 8 9 10 12 11 4 7 4 10 X 3 5 8GRAVIDADE 1 3 2 1 1 1 1 1 1 SIM 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 4 1 1 1 1ANTECEDENTES 2 2 5 9 3 3 X 3 2 SIM 2 5 10 2 11 2 3 6 2 5 2 2 6 4 4 4ESTUDO/TRABALHO 10 9 8 6 9 4 6 10 5 SIM 3 6 2 9 6 3 7 10 6 3 7 8 5 7 10 XEMPATIA 12 10 12 8 12 12 X X 12 X X 12 12 12 12 11 10 12 X 11 10 12 X 11 12 XCONFISSÃO 8 1 1 3 5 2 X X 6 SIM 4 3 7 7 10 7 6 2 3 2 6 1 X 8 9 6CONDUTA SOCIAL 3 6 9 4 4 8 3 6 4 SIM 6 6 3 4 8 2 8 8 X 4 5 7 4 10 8 3PERSONALIDADE 7 4 10 7 2 7 2 5 3 SIM X 2 5 3 7 3 9 7 5 8 3 3 3 9 6 2MOTIVOS 5 12 7 11 8 9 8 4 8 SIM X 5 8 6 3 6 4 5 7 9 8 6 X 6 7 9CONSEQUÊNCIAS 4 5 3 2 6 5 5 2 7 SIM X 8 9 5 4 5 5 3 X 10 9 9 2 2 2 5COMPORTAMENTO VÍTIMA 11 8 11 12 10 11 9 11 10 X X 10 11 11 5 8 11 9 X 12 11 11 X 12 11 10CIRCUNSTÂNCIAS 6 7 4 10 7 10 4 8 9 SIM 5 11 6 10 2 4 2 4 X 6 9 5 X 5 3 7OUTROS X X X X X X X X X X X * $ X X X X * # X X X ? X X X
Para a pergunta número 5 cerca do costume de fundamentar
expressamente as razões pelas quais concede ou não a remissão, bem como a
medida socioeducativa a ser aplicada e o prazo, quando as submete a
homologação do Juízo, 24 Promotores de Justiça, representando 92,3%
responderam SIM, e 2 Promotores de Justiça, representando 7,7%
responderam NÃO, conforme tabela n.º 1.
Dos que responderam SIM, 21 explicitaram que sempre fundamentam a
decisão; 3 responderam que fundamentam apenas no termo de apresentação,
não quando submetem a homologação ao Juízo. Dos que responderam NÃO, 1
respondeu que não fundamenta por entender tratar-se de ato discricionário do
Ministério Público, e 1 respondeu que não fundamenta, porque consta do termo
de apresentação a manifestação do adolescente, com as regras do acordo,
ressalvando que, somente em caso de descabida a remissão ou não aceita,
entende necessária a fundamentação.
TABELA N.º 1: N.º DE PROMOTORES DE JUSTIÇA EM RELAÇÃO À
FUNDAMENTAÇÃO OU NÃO DO PEDIDO DE REMISSÃO QUANDO DA HOMOLOGAÇÃO À
JUÍZO:
Quanto à fundamentação n.º Promotores de Justiça %
Fundamentam 24 92,3%
Não fundamentam 2 7,7%
total 26 100%
Para a pergunta número 6, acerca da concessão da remissão, mesmo
quando o infrator não admite a prática do ato infracional, 11 Promotores de
Justiça, representando 42,3%, responderam SIM, e 15 Promotores de Justiça,
representando 57,7% responderam NÃO, com diferente fundamentação,
conforme tabela n.º 2.
TABELA N.º 2: N.º DE PROMOTORES DE JUSTIÇA EM RELAÇÃO À CONCESSÃO OU NÃO
DE REMISSÃO MESMO QUANDO O ADOLESCENTE NÃO ADMITE O FATO:
Quanto à concessão n.º Promotores de Justiça %
Concedem 11 42,3%
Não concedem 15 57,7%
total 26 100%
Quanto aos argumentos apresentados pelos Promotores de Justiça para
fundamentar suas opções de respostas, apresenta-se o quadro n.º 5, a fim de
demonstrar as diferenças.
QUADRO N.º 5: JUSTIFICATIVAS ÀS RESPOSTAS DA PERGUNTA 6:
Fundamenta n.º Promotores
de Justiça
JUSTIFICATIVAS
Sim 2 Em caso de gravidade mínima do fato
Sim 1Em caso de gravidade mínima do fato e ausência deantecedentes.
Sim 2Quando as circunstâncias indicam convenientes a remissão.
Sim 1Em caso de gravidade mínima do fato, ausência deantecedentes e outras circunstâncias indicarem aconveniência da remissão: estudo, boa conduta social, e nãohaja razão para que volte a delinqüir.
Sim 2Porque independentemente da não admissão do fato, asprovas do expediente permitem verificar autoria ematerialidade.
Sim 1Quando a prova revela que o fato não é exatamente aqueleapontado pela vítima, e há confissão parcial do que realmenteocorreu.
Sim 1Em caso de remissão simples ou com advertência, pois nãoimplicam o reconhecimento da reprovabilidade, desde que oadolescente concorde com a providência.
Sim 1Porque o ECA permite, no caso, cumular a remissão comadvertência.
Não 8Pois a admissão é pressuposto para o perdão.
Não 2Porque o adolescente tem o direito de provar a inocência.
Não 1Porque o adolescente tem direito ao contraditório e ampladefesa em sede de procedimento judicial.
Não 1Porque significaria fomentar a falta de responsabilidade edistinção de caráter do infrator, além de poder configurarviolação de direito ou funcionar como deturpação doentendimento acerca da vida em sociedade.
Não 1Porque indica falta de comprometimento com eventualmedida, bem como não teria caráter educativo.
Não 1Porque há vedação legal.
Não 1Porque importa em cerceamento de defesa.
Esse quadro reflete a divergência existente acerca do tema da remissão,
exposto no capítulo 3, no que diz respeito a existência do entendimento de que
é sinônimo de perdão, e por isso a admissão do fato seria pressuposto para a
concessão, abarcando apenas a supressão do processo; e da interpretação de
que vai além do simples perdão, tendo caráter de transação e, por essa razão,
prescindir da admissão do fato e permitir a cumulação de medida
socioeducativa.
As respostas verificadas no quadro n.5 permitem constatar que a maioria
dos Promotores de Justiça (57,7%) não concede a remissão em caso de não
admissão do fato, entretanto, somente 8 referiram o entendimento de que esta
é pressuposto para o perdão. Os demais justificaram no sentido de que o
adolescente tem direito de provar sua inocência e de responder o processo,
sendo que apenas um Promotor de Justiça mencionou que a medida não teria
caráter educativo. A combinação das respostas da questão 6, com as
respostas da tabela 4, questão 7B, permitem observar que, mesmo aqueles
que pensam seja a admissão do fato pressuposto para o perdão (8 Promotores
de Justiça), entendem possível a cumulação de medida socioeducativa, pois 20
Promotores de Justiça apresentaram para o caso dado, de porte ilegal de arma
de fogo, remissão com medida socioeducativa, contra apenas 1 que concedeu
remissão simples e 5 que representaram. Em tese, há uma probabilidade de,
no mínimo, 2 Promotores de Justiça, desses 8, que aplicam medida
socioeducativa cumulada com remissão, mesmo entendendo que a remissão é
perdão, e deveria permitir somente a extinção do processo. Pode-se perceber
que há um tendência desses Promotores de Justiça a entender que mesmo em
caso de remissão como sinônimo de perdão, não estaria excluído o cúmulo de
medida socioeducativa.
Essa divergência no entendimento, não esclarecida pelo ECA, que silencia
acerca da natureza da remissão, se sinônimo de perdão ou com caráter de
transação, e acerca da (im)prescindibilidade da admissão do fato para sua
concessão, permite que cada Promotor de Justiça adote seu próprio
entendimento (verificado no quadro n. 5), tratando de forma diferenciada os
adolescentes autores de ato infracional.
Para a pergunta número 7 acerca de qual a solução dada pelo Promotor
de Justiça para os atos infracionais que seguem, comprovada autoria e
materialidade, considerando os seguintes critérios: adolescente, 16 anos, não
tem antecedentes, admite o fato, estuda, comprometeu-se a não mais praticar
o fato:
a) No caso de direção de veículo automotor sem habilitação, sem
gerar perigo de dano (art. 32 da LCP), 8 Promotores de Justiça ( 30,8%)
apontaram o arquivamento como solução; 7 (26,9%) aplicariam remissão sem
medida; 6 (23%) aplicariam remissão com advertência, e 5 (19,3%) apontaram
a remissão com PSC, conforme Tabela n.º 3.
Dentre os 5 Promotores de Justiça que apontaram a remissão com PSC
como solução, foram fixados diferentes prazos de cumprimento, sendo que 3
Promotores de Justiça estabeleceram 1 mês de PSC; 1 Promotor de Justiça
fixou 2 meses de PSC, e 1 fixou de 2 a 3 meses de PSC, observados no
quadro 6.
TABELA N.º 3: SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORES DE JUSTIÇA PARA A
PERGUNTA 7A:
Solução n.º Promotores de Justiça %
Arquivamento 8 30,8
Remissão sem medida 7 26,9
Remissão + advertência 6 23
Remissão + PSC 5 19,3
Total 26 100
As justificativas apresentadas pelos Promotores de Justiça para
fundamentar suas opções de respostas foram bastante diversificadas, sendo
mostradas no quadro n.º 6.
QUADRO N.º 6: JUSTIFICATIVAS ÀS RESPOSTAS DA PERGUNTA 7A:
n.º Solução JUSTIFICATIVAS
Promotoresde Justiça
7 arquivamento Por tratar-se de fato atípico.
1 arquivamento Não apresentou justificativa.
5 Remissão semmedida
Pois o fato é leve e considerando as características doinfrator (conforme enunciado: sem antecedentes, etc.)
1 Remissão semmedida
Pela pequena gravidade do fato, não sendo caso dearquivamento porque a conduta coloca em risco oadolescente e a sociedade.
1 Remissão semmedida
pois independentemente da atual conclusão jurisprudencial(de que é fato atípico), entende-se que, por ser impossívela obtenção da autorização para condução de veículosautomotores, o descumprimento da norma implica notóriafalta de limites. Em sendo completamente vedado aoadolescente a obtenção da autorização ou CNH, aquelenão comete ilícito administrativo, mas sim contrário à lei.Normalmente, concerta-se remissão com medida deproteção de freqüência escolar obrigatória e a curso detrânsito realizado pela Brigada Militar.
1 Remissão comadvertência
Pois há discussão jurisprudencial sobre a tipicidade do fatoe, normalmente, não há reincidência nesses casos.
3 Remissão comadvertência
Pois considera a advertência sempre necessária a evitar arepetição do delito.
1 Remissão comadvertência
Pelo cometimento do ato, a admissão, a falta deantecedentes e a gravidade moderada do ato.
1 Remissão comadvertência
Pois embora o fato não seja grave, o adolescente precisasaber que não pode dirigir sem habilitação e que estaatitude pode gerar grave conseqüência.
1 Remissão + PSCpor 1 mês
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSCpor 1 mês, 4h/s
A fim de criar consciência de limites que talvez os pais nãotenham criado.
1 Remissão + PSCde 1 a 2 meses
Pois há gravidade mediana, mas denotando predisposiçãoao não acatamento das normas sociais, com potencialrisco.
1 Remissão + PSCpor 2 meses
Pois a resposta, no caso, não leva em consideração adiscussão sobre a atipicidade da conduta descrita napergunta.
1 Remissão + PSCde 2 a 3 meses
Pois o fato é grave e exige uma medida efetiva para quenão volte a ocorrer.
b) No caso de porte ilegal de arma de fogo, 1 Promotor de Justiça
(3,9%) apontou a remissão sem medida socioeducativa como solução para o
caso; 1 Promotor de Justiça (3,9%) optou pela remissão com advertência; 19
(72,9%) referiram a remissão com PSC, e 5 (19,3%) assinalaram a
representação, conforme Tabela n.º 4.
No caso da PSC, novamente os prazos fixados foram diversos: 3
Promotores de Justiça estabeleceram o prazo de 1 mês de PSC; 1 estipulou
prazo de 1 a 2 meses de PSC; 4 fixaram 2 meses de PSC; 6 Promotores de
Justiça estabeleceram 3 meses de PSC; 2 fixaram o prazo de 4 meses; 1 optou
pelo prazo de 4 a 6 meses; 1 aplicou 6 meses de PSC, e 1 não estipulou o
prazo da PSC na pesquisa.
TABELA N.º 4: SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORES DE JUSTIÇA PARA A
PERGUNTA 7B:
Solução n.º Promotores de Justiça %
Remissão sem medida 1 3,9
Remissão + advertência 1 3,9
Remissão + PSC 19 72,9
Representação 5 19,3
Total 26 100
Os fundamentos apresentadas pelos Promotores de Justiça para justificar
suas opções de respostas foram muito diversos, conforme elenco do Quadro
n.º 7.
QUADRO N.º 7: JUSTIFICATIVAS ÀS RESPOSTAS DA PERGUNTA 7B:
n.ºPromotoresde Justiça
Solução JUSTIFICATIVAS
1 Remissão semmedida
Por não ser ato grave, não ter antecedentes, sendo aremissão medida que basta ao fato.
1 Remissão comadvertência
Pelo cometimento do ato, a admissão, a falta deantecedentes e a gravidade moderada do ato.
1 Remissão + PSC(não indicou
prazo)
Pois o fato é grave para a idade do adolescente.
1 Remissão + PSCpor 1 mês, 4h/s
É suficiente pelas características do infrator.
1 Remissão + PSCpor 1 mês
Pela gravidade do fato.
1 Remissão + PSCpor 1 mês
Pelo grande perigo social, indicando violência doadolescente.
1 Remissão + PSCpor 1 a 2 meses
Pela gravidade média do fato, demonstrando certatendência perigosa, compensado, em parte, pelascircunstâncias pessoais favoráveis ao adolescente.
1 Remissão + PSCpor 2 meses, 4h/s
Porque o porte ilegal evidencia grave desvio de conduta,que pode trazer conseqüências graves (roubo, homicídio,etc.).
1 Remissão + PSCpor 2 meses
Pela lesividade que poderia causar com a utilizaçãoindevida da arma, gravidade do fato.
1 Remissão + PSCpor 2 meses
Porque o delito é grave, denota defeito de personalidadeque deve ser corrigido.
1 Remissão + PSCpor 2 meses, 4h/s
Pela gravidade social da conduta, observando-se o grandenúmero de fatos típicos e atos infracionais que envolvem apresença de arma de fogo.
1 Remissão + PSCde 3 meses
Porque é um tipo de delito que costuma estar associado adesvio de conduta, circunstâncias que não costumamaparecer no procedimento.
1 Remissão + PSCpor 3 meses
Porque é um meio para prática de infrações mais graves epode gerar conseqüências fatais para o próprio portador. Aproliferação do uso de armas pela população deve serevitada, principalmente entre adolescentes que agem sobimpulso.
1 Remissão + PSCde 3 meses
Porque o fato é grave pelas conseqüências que podemadvir, sendo necessário uma medida mais efetiva quedemonstre que há responsabilização.
1 Remissão + PSCde 3 meses, 4h/s
Porque, na prática, se procedente a representação, amedida aplicada será a de PSC, sendo o prazo aplicadosuficiente para reeducar o infrator.
1 Remissão + PSCde 3 meses, 4h/s
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSCde 3 meses, 8h/s
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSCde 4 meses
Pois o fato é grave e de sérias conseqüências, ainda maisse a arma vier a ser utilizada.
1 Remissão + PSCde 4 meses 4h/s
Não apresentando justificativa.
1 Remissão + PSCde 4 a 6 meses +acompanhamento
psicológico
Pois há gravidade relevante. O ideal seria aplicação de LAque, na prática, torna-se mais branda que a PSC, logo,pouco aplicável.
1 Remissão + PSCde 6 meses com a
perda da arma
Desde que não haja indícios de que iria cometer crime maisgrave, segundo análise do motivo pelo qual andava armadoe se a arma tinha potencial lesivo.
3 Representação Pois o fato indica periculosidade do adolescente,merecendo mais rigor.
1 Representação Porque a natureza do delito é grave.
1 Representação Não apresentou justificativa.
Da análise do quadro acima, verifica-se que muitos Promotores de Justiça
apresentam a mesma justificativa ou consideram os mesmos critérios
(gravidade do fato, ausência de antecedentes, possibilidade da prática de
crimes mais graves, etc.), entretanto isso não impediu de que estabelecessem
solução diversa para o mesmo caso. Também observa-se que há variação
quanto ao número de horas semanais a serem cumpridas, pois enquanto 6
Promotores de Justiça estabeleceram 4 horas semanais, 1 Promotor de Justiça
estabeleceu 8 horas semanais.
c) No caso de furto simples, de bem com valor inferior a 30 % do salário
mínimo, 4 Promotores de Justiça (15,3%) estabeleceram a remissão sem
medida socioeducativa como solução para o caso; 4 Promotores de Justiça
(15,3%) optaram pela remissão com advertência; 1 (3,9%) estabeleceu a
remissão com reparação do dano ou PSC; 16 (61,6%) fixaram a remissão com
PSC e 1 (3,9%) ressaltou que dependerá do modo de aferir do adolescente,
não exclusivamente do valor do bem, exemplificando que no caso de furto de
chocolate em supermercado, concede remissão simples; para furto em loja
com intuito de revenda ou sem qualquer necessidade, estabelece remissão
com advertência; no caso de reiteração ou de arrombamento, ou outros fatos
que demonstrem mais audácia ao agir, opta pela remissão com PSC, segundo
Tabela n.º 5.
Dentre os 16 Promotores que estabeleceram remissão com PSC,
verificou-se que os prazos não foram unânimes, onde 2 Promotores de Justiça
estipularam 1 mês de PSC; 1 Promotor de Justiça fixou de 1 a 2 meses de
PSC; 8 Promotores de Justiça fixaram 2 meses; 2 estabeleceram prazo para a
PSC de 2 a 3 meses; 2 Promotores de Justiça fixaram 3 meses de PSC, e 1
estipulou de 3 a 4 meses de PSC.
TABELA N.º 5: SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORES DE JUSTIÇA PARA A
PERGUNTA 7C:
Solução n.º Promotores de Justiça %
Remissão sem medida 4 15,3
Remissão + advertência 4 15,3
Remissão + reparação do dano ouPSC 1 3,9
Remissão + PSC 16 61,6
Dependendo do modo de aferir doadolescente poderá ser remissão
simples ou cumulada comadvertência/PSC
1 3,9
Total 26 100
Destacamos no Quadro n.º 8, as diferentes razões apresentadas pelos
Promotores de Justiça para as soluções apontadas para cada caso.
QUADRO N.º 8: JUSTIFICATIVAS ÀS RESPOSTAS DA PERGUNTA 7C:
n.ºPromotoresde Justiça
Solução JUSTIFICATIVAS
4 Remissão semmedida
Por não ser ato grave, não ter antecedentes, sendo aremissão medida que basta ao fato.
1 Remissão comadvertência
Porque não há maiores conseqüências e dificilmente iráreincidir, na maioria dos casos é aventura do adolescente.
1 Remissão comadvertência
Pelo cometimento do ato, a admissão, a falta deantecedentes e a gravidade moderada do ato.
2 Remissão comadvertência
Porque poderia ingressar na esfera do crime de bagatela,entretanto, aplicar a medida de advertência pode ser maisbenéfico ao infrator, na medida em que poderá não maispraticar furtos, dependendo da orientação dada ao adverti-lo.
1 Remissão +reparação do dano
ou PSC
Porque esta espécie de ato infracional é derivada deaspectos eminentemente sociais que, via de regra, refogemao controle do próprio infrator, assim a adoção da medida éproporcional.
1 Remissão + PSCpor 1 mês
Para reprimir a vontade de aquisição fácil das coisas,sobretudo considerando que esse delito, normalmente, éreiterado.
1 Remissão + PSCpor 1mês
Por ser delito de médio potencial ofensivo, uma vez que sepode inferir uma mais audaciosa, além do fato que deveexercer atividade laboral para tentar compreender e avaliarcertos valores da sociedade.
1 Remissão + PSCde 1 a 2 meses
Pelo reduzido potencial ofensivo, mas sinalizador de iníciode progressão infracional, compensado, em parte, pelascircunstâncias pessoais favoráveis ao adolescente.
3 Remissão + PSCpor 2 meses, 4h/s
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSCpor 2 meses, 4h/s
Sendo suficiente pelas características do infrator.
1 Remissão + PSCpor 2 meses, 4h/s
Pois delito de gravidade média, que denota leve desvio depersonalidade.
1 Remissão + PSCpor 2 meses, 6h/s
Dada a forte ocorrência de crimes e atos infracionais contrao patrimônio na Comarca do Promotor, além de entenderser a advertência insuficiente, já que se trata de ato deconduta (subtrair), não prevalecendo a noção de prejuízo.
A reparação de danos dependeria da (in)existência derestituição à vítima.
1 Remissão + PSCpor 2 meses, 8h/s
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSCpor 2 meses
Porque apesar de o fato não ser grave, a conduta éreprovável, e o adolescente precisa saber que agiuerradamente e só sofrendo alguma punição para não maispraticar nenhum ato infracional.
1 Remissão + PSCde 2 a 3 meses oureparação do dano
Porque considera menos grave, no entanto, somente aplicaadvertência quando o valor do bem furtado é bem baixo.
1 Remissão + PSCde 2 a 3 meses
Não apresentou justificativa
1 Remissão + PSCde 3 meses
Porque não admite o princípio da insignificância.
1 Remissão + PSCde 3 meses
Pela gravidade do fato.
1 Remissão + PSCde 3 a 4 meses e
encaminhamento àassistente social
do Município se foro caso
Pela gravidade mínima entre os crimes contra o patrimônio,mas com repercussão social, vez que, ante adisseminação, perturba a paz social.
1 Remissão semmedida ou com
advertência/ PSC
Depende do modo de aferir do adolescente, não só dovalor da coisa subtraída. Ex.: furto de chocolate emsupermercado – remissão simples; furto em loja com intuitode revenda ou sem qualquer necessidade- remissão comadvertência; no caso de reiteração ou de arrombamento, ououtros fatos que demonstrem mais audácia ao agir-remissão com PSC.
Da observação do quadro acima, constata-se que muitos Promotores de
Justiça apresentam a mesma justificativa, entretanto isso não impediu de que
estabelecessem solução diversa para o mesmo caso. Também observa-se que
há variação quanto ao número de horas semanais a serem cumpridas, pois
enquanto 3 Promotores de Justiça estabeleceram 4 horas semanais, 1
Promotor de Justiça estabeleceu 6 horas semanais e 1 Promotor de Justiça
estabeleceu 8 horas semanais.
d) No caso de porte de drogas para uso próprio, pouca quantidade, 1
Promotor de Justiça (3,9%) estabeleceu remissão sem medida socioeducativa;
7 (26,9%) estipularam a remissão com medida de proteção de tratamento ou
freqüência em grupo de auto-ajuda; 3 (11,4%) optaram pela remissão
cumulada com advertência; 2 (7,7%) fixaram a remissão cumulada com
advertência e tratamento; 7 (26,9%) concederam remissão cumulada com
PSC; 5 (19,3%) estabeleceram a remissão cumulada com tratamento ou
freqüência a grupo de auto-ajuda, e 1 Promotor de Justiça (3,9%) optou pela
liberdade assistida, o que é demonstrado pela tabela 6.
TABELA N.º 6: SOLUÇÃO DADA PELOS PROMOTORES DE JUSTIÇA PARA A
PERGUNTA 7D:
Solução n.º Promotores de Justiça %
Remissão sem medida 1 3,9
Remissão + medida de proteção detratamento ou freqüência a grupo deauto-ajuda
7 26,9
Remissão + advertência3 11,4
Remissão + advertência e tratamento2 7,7
Remissão + PSC7 26,9
Remissão + PSC e tratamento oufreqüência a grupo de auto-ajuda 5 19,3
Liberdade Assistida 1 3,9
Total 26 100
Dentre os 12 Promotores que estabeleceram remissão com PSC, com ou
sem tratamento e freqüência a grupo de auto-ajuda, verificou-se que os prazos
não foram os mesmos: 2 Promotores de Justiça não referiram o prazo na
pesquisa; 2 Promotores de Justiça estipularam 1 mês; 1 Promotor de Justiça
fixou de 1 a 2 meses de PSC; 1 Promotores de Justiça fixou 1 mês e meio de
PSC; 5 estabeleceram prazo para a PSC de 2 meses; 1 Promotores de Justiça
fixou de 2 a 3 meses de PSC. Observa-se que o tempo fixado para o
tratamento também é variado, conforme se observa no quadro n.º 9, bem como
as justificativas para as soluções obtidas.
QUADRO N.º 9: JUSTIFICATIVAS ÀS RESPOSTAS DA PERGUNTA 7D:
n.ºPromotoresde Justiça
Solução JUSTIFICATIVAS
1 Remissão semmedida
Pois se o adolescente não registra antecedentes, aremissão é adequada para a hipótese, que se dissociadode outros elementos, (antecedentes, por ex.) nãodemonstra maior periculosidade e merece solução diversade judicial medida de proteção, se for o caso dedependência, por. ex.
1 Remissão +tratamento
Pois ao usuário de drogas devem ser aplicadas medidas deproteção, com encaminhamento a atendimentoespecializado.
1 Remissão +tratamento
Não apresentou justificativa.
1 Remissão +tratamento
Conforme art. 112, inc. VII, combinado com art. 101, VI doECA, por ser a medida mais adequada, visando arecuperação do adolescente.
1 Remissão +tratamento
Pelo prazo indicado por pessoa especializada na área dasaúde, entendendo ser essa a medida mais pertinente aocaso.
1 Remissão +tratamento, por 3 a
6 meses
Não apresentou justificativa
1 Remissão +freqüência em
grupos de auto-ajuda, por 2 meses
Pela situação de perigo pela exposição às drogas, para queo adolescente tenha contato com a realidade de viciados.
1 Remissão +freqüência em
grupos de auto-ajuda, por 1 ano
Para que o adolescente tenha contato com a realidade deviciados e se convença que a droga só faz mal.
2 Remissão +advertência
Pois, neste caso, em que a saúde do adolescente está empauta, a advertência é fundamental.
1 Remissão +advertência
Pelo cometimento do ato, a admissão, a falta deantecedentes e a gravidade moderada do ato.
1 Remissão +advertência e
tratamento
Não apresentou justificativa.
1 Remissão +advertência e
tratamento
Pela pouca quantidade e a condição, em geral, de vítimado uso da droga.
1 Remissão + PSC Porque a resposta estatal ao ato infracional dessa espécieé proporcional.
1 Remissão + PSCpor 1 mês
Sendo suficiente pelas características do infrator.
1 Remissão + PSCpor 1 mês, 4h/s
Pela freqüência de tais atos na Comarca do Promotor,porque os pais solicitam, porque as situações ocorrem porausência de disciplina e atividade que imponham limitaçõese obediência (raríssimos são os casos de situaçõescrônicas de uso de entorpecentes), não entendendo quesomente o diálogo e a compreensão são suficientes paraestes atos, sendo imprescindíveis aqueles limitadores.
1 Remissão + PSCde 1 a 2 meses
Porque o fato gera preocupação social, sem maiorpotencial ofensivo. Adolescente em situação de risco.
1 Remissão + PSCde 2 meses
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSCde 2 meses, 4h/s
Porque o consumo e a traficância devem ser punidossempre, pela sua natureza gravosa à sociedade em geral.
1 Remissão + PSCde 2 a 3 meses
Porque é necessária a aplicação de medida mais efetivaque mera advertência, a fim de impedir que volte a ocorrer.
1 Remissão + PSC,por 1 mês e meioe freqüência a 20
sessões de gruposde auto-ajuda
Não apresentou justificativa.
1 Remissão + PSC,por 2 meses, 4h/s,
e tratamento
(O tratamento é em caso de ser constatado o vício). Por sermedida necessária para criar freios considerando que odelito, por si só, não revela problemas financeiros ou dedifícil solução.
1 Remissão + PSC,por 2 meses,tratamento e
freqüência escolar
Se assim entender o profissional, pela alta lesividadeprópria.
1 Remissão + PSC,por 2 meses e
freqüência a 10sessões
tratamento
Não apresentou justificativa
1 Remissão + PSC e Pela necessidade de cura da doença (se estiver neste nívelo comprometimento) ou, no mínimo, conscientização da
tratamento gravidade social do ato.
1 Remissão + LApelo prazo mínimo
de 6 meses
Pois o uso de drogas exige acompanhamento doadolescente por profissionais capacitados e seumonitoramento.
Inicia-se a discussão dos resultados pela análise da questão 4 onde se vê
que, apesar de os Promotores de Justiça atribuírem o mesmo valor a
determinados critérios, há muita variação quanto aos demais critérios, o que
pode ocasionar diferentes soluções para os casos dos adolescentes em conflito
com a lei, conforme se verifica nas respostas da questão 7. O quadro n.º 4
permite demonstrar os diferentes critérios e sua valoração considerados para a
concessão da remissão e escolha de medida socioeducativa e do prazo por
cada Promotor de Justiça participante.
Pode-se perceber que, por exemplo, enquanto 9 Promotores de Justiça
consideraram os antecedentes como o 2º critério mais importante, 17
Promotores de Justiça consideraram outros critérios suscetíveis de receber a
valoração n.º 2. Assim como os mesmos 9 Promotores de Justiça, que
coincidiram na escolha do critério de valor 2, optaram por diferentes critérios
para atribuir o valor 3.
Isso ocorre porque o art. 126 do ECA, o qual refere - “Antes de iniciado o
procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do
Ministério Público poderá conceder a remissão como forma de exclusão do
processo, atendendo às circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto
social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor
participação no ato infracional.” – é aberto, ou seja, dá margem a interpretação
e subjetivismo do aplicador do Direito.
Muitos dos elementos relacionados na questão n.º 4, adotados pelos
Promotores de Justiça, sequer são mencionados pelo artigo 126. Observa-se
que há total subjetividade dos Promotores de Justiça na escolha e valoração
dos critérios para a concessão da remissão e para a fixação de medida
socioeducativa e o prazo. Cada um opta por seus próprios critérios, da forma
que entende relevante, o que explica a diversidade de soluções das respostas
para a questão 7.
O art. 127 do Estatuto, ao estabelecer que a concessão da remissão,
cumulada ou não com medida socioeducativa, não implica em reconhecimento
ou comprovação da responsabilidade do adolescente e, em conseqüência, não
prevalece para efeito de antecedentes, também contribui para essa falta de
rigorismo para com a análise e valoração dos critérios, pois dá a entender que
não implica em conseqüências negativas para o adolescente, quando vimos,
na primeira parte do trabalho, que as medidas socioeducativas não têm apenas
caráter pedagógico, mas penal.
A reforçar esse entendimento, quanto ao conteúdo retributivo das medidas
socioeducativas, refere Amaral112 que:
“Se a simples advertência, materializada através darepreensão, da ameaça de sanções mais graves, nãotiver caráter penal, não corresponder a uma punição? Aque corresponderá? Prestação de serviços àcomunidade é pena restritiva de direitos na maioria daslegislações penais de adultos. Liberdade assistida nãopassa do probation da legislação penal comum. Ainternação, eufemismo, corresponde à privação deliberdade. É cediço que a expressão pena pertence aogênero das respostas sansionatórias e que as penas sedividem em disciplinares, administrativas, tributárias,civis, inclusive socioeducativas.”
O Estatuto da Criança e do Adolescente, regulamentando os artigos 227
e 228 da Carta Magna, ao tempo em que conferiu direitos fundamentais e
sociais, criou regime jurídico em que o adolescente foi elevado à dignidade de
responder pelos seus atos. A responsabilidade penal juvenil encontra bases
doutrinárias na Constituição Federal e nas Regras Mínimas das Nações Unidas
para a Administração da Justiça da Juventude, incorporadas pelo Estatuto
Brasileiro, que no artigo 103 conceituou o ato infracional como a conduta
descrita como crime ou contravenção penal, remetendo o intérprete aos
112 AMARAL, Antônio Fernando do. Apud SARAIVA, op. cit., p. 41.
princípios garantistas do Direito Penal Comum, tendo como normas específicas
as do Estatuto.113
A partir, então, desse entendimento, observa-se, na análise das respostas
das 4 soluções para os casos da questão 7, a importância de se estabelecer
critérios legais definidos no ECA, pois da opção subjetiva dos Promotores de
Justiça, resultou soluções muito diversas para o mesmo caso, onde muitos
adotaram medidas bem mais gravosas que outros para casos idênticos.
No item 7A, de direção sem habilitação (art. 32 da LCP), por exemplo,
verifica-se que, inobstante o posicionamento jurisprudencial de que o fato é
atípico, inclusive com manifestação do STF a respeito, apenas 8 Promotores
de Justiça apontaram o arquivamento como solução para o caso, enquanto os
demais aplicaram remissão: 7 remissões simples; 6 remissões com advertência
e 5 Remissões com PSC, variando o prazo de 1 a 3 meses.
Percebe-se a contrariedade ao princípio da tipicidade previsto no art. 103
do ECA, pois concerta-se a remissão com medida socioeducativa, mesmo
quando o fato é atípico, retrocedendo-se ao período anterior ao Estatuto, em
que se agia discricionariamente e até arbitrariamente para conter os desvios de
conduta. Não é essa a finalidade da medida socioeducativa, a qual tem caráter
educativo e retributivo, aplicável apenas ao autor de ato infracional, assim
entendida a conduta descrita na lei penal como crime. Se fosse respeitado o
devido processo legal, haveria a possibilidade de um controle maior desses
atos, aplicando-se a medida socioeducativa somente em caso de fato típico,
provadas autoria e materialidade, imposta por sentença transitada em julgado.
Nos demais itens, 7B, 7C e 7D, também constatou-se grande variedade de
soluções, observadas na tabela e quadros deste capítulo. Mesmo aqueles
Promotores de Justiça que optaram pela remissão cumulada com medida
socioeducativa de PSC, fixaram prazos muito diversos. Também houve
variação no número de horas de cumprimento.
113 SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente e Ato Infracional, Garantias Processuais eMedidas Socioeducativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p.39, referido no capítulo1.3. desse trabalho.
Chama-se atenção para o enunciado da questão 7, que informou
elementos determinados a serem considerados pelos Promotores de Justiça.
Ou seja, foram dados quatro casos hipotéticos idênticos, como se fossem
distribuídos os mesmos quatro expedientes de ato infracional para serem
resolvidos pelos 26 Promotores de Justiça. Entretanto, isso não impediu de que
fossem apresentadas respostas muito diversas, em razão de que o ECA não
estabelece os atos infracionais passíveis de remissão, as medidas cabíveis
para cada um deles, tampouco o prazo de cumprimento, diferentemente do
Direito Penal.
Está-se novamente frente ao subjetivismo e discricionariedade tão
condenados por Mendez114, num retrocesso à doutrina da situação irregular,
onde o Juiz possuía poderes absolutos e ultrapassava as fronteiras do jurídico,
a fim de resolver o problema dos menores, sem respeitar as garantias
individuais e aplicando medida socioeducativa, praticado ato infracional ou não.
Cada Promotor de Justiça, julgando estar fazendo o melhor para que o
adolescente seja ressocializado e não volte a delinqüir, aplica a solução que
lhe aprouver em sede de remissão, na maioria das vezes cumulada com
medida socioeducativa, conforme observado nas tabelas 3, 4, 5 e 6, alguns
com períodos de cumprimento longos, sem respeitar o devido processo legal,
fazendo com que recebam um tratamento muito mais rigoroso daquele
estabelecido para o adulto e sem qualquer critério legal.
Os adolescentes são tratados como objeto do processo, vez que, como
referido por Lopes Jr.115, é lhe imposta a remissão, cumulada ou não com
medida socioeducativa, da qual não tem o direito de negociar as condições ou
o prazo, onde ele e seu responsável se acham na conveniência de concordar,
sob o prenúncio de sofrer um processo e receber medida mais gravosa na
sentença. O ato é administrativo, portanto, como já exposto no capítulo 3,
114 MENDEZ, Emílio Garcia. Por uma Reflexão sobre o arbítrio e o Garantismo na Jurisdiçãosocieducativa. Porto Alegre,: AJURIS, ESMP-RS, FESDEP-RS, 2000, referido no Capítulo 1. 3.desse trabalho.115 LOPES JR., Aury. Sistemas de Investigação Preliminar no Processo Penal. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2001, referido no capítulo 3 desse trabalho.
padece dos mesmos problemas encontrados no inquérito policial e execução
penal, em que impera a inquisitoriedade e o excesso de poder do aplicador do
Direito. Os princípios do Direito Penal e do Processo Penal que funcionam, no
caso do adulto, como um limitador do direito de punir do Estado, no Direito
Menorista são relevados, a fim de resolver o problema do adolescente em
conflito com a lei mais rapidamente, para que não sofra o estigma do processo.
Entretanto, considerando o resultado da pesquisa, mais vale o peso de um
processo justo do que a imposição de uma solução rápida e arbitrária.
As garantias processuais também são desrespeitadas, vez que não há o
devido processo legal e, como conseqüência, não há também contraditório e
ampla defesa. Os adolescentes sequer são assistidos por advogado na
Promotoria de Justiça, ressalvadas algumas exceções. A igualdade entre as
partes é quebrada em razão do absoluto poder do Ministério Público em impor
ao adolescente a solução que entender em sede de remissão, conforme
demonstrado no resultado da questão 7.
A dignidade da pessoa humana é relegada e o princípio da igualdade
desprezado, vez que há tratamento desigual para casos idênticos, pois
depende única e exclusivamente do entendimento do Promotor de Justiça.
Nesse sentido também é que se diz que o adolescente volta a ser tratado como
objeto.
Os princípios da presunção de inocência e do ônus probatório são
violados na medida em que, como referiu Lopes Jr116: “O processo penal passa
a não ser mais o caminho necessário para a pena, e com isso o status de
inocente pode ser perdido muito antes do juízo e da sentença e,
principalmente, sem que para isso a acusação tenha que provar o alegado.
O que traz um certo alento é o resultado da questão n.º 5, que demonstrou
24 (92,3%) dos Promotores de Justiça contra 2 (7,7%) responderam que
fundamentam o pedido de homologação da remissão e medida socioeducativa
quando as submetem a Juízo, o que permite o controle dos atos e dos critérios
116 LOPES JR, op. cit., p. 26, referido no capítulo 3 deste trabalho.
adotados. Para que isso se efetive, todavia, faz-se necessário garantir a
assistência técnica por advogado, mesmo na fase administrativa.
Pode-se inferir, pelo decorrer de todo o trabalho, que o respeito ao devido
processo legal para a aplicação da medida socioeducativa é o que vai garantir
a observância de todos os demais direitos constitucionais do adolescente,
inclusive da proteção integral.
O estabelecimento de critérios legais definidos para a concessão da
remissão e aplicação de medida socioeducativa, determinando quais atos
infracionais são passíveis de quais medidas e o quantum, permite que se
possa restringir a discricionariedade e subjetivismo dos aplicadores do Direito,
bem como exercer o controle sobre esses atos e da estrita observação dos
critérios legais previstos, o que já limita a violação de algumas das garantias
constitucionais.
CONCLUSÃO
O estudo revelou enorme disparidade nas respostas para casos
hipotéticos idênticos, ou seja, mostrou que não há consenso nos critérios
utilizados para a concessão da remissão e escolha da medida socioeducativa a
ser aplicada e seu quantum, estando no âmbito da subjetividade e
discricionariedade dos Promotores de Justiça da Infância e da Juventude
titulares ou substitutos. Tais disparidades não são afetas somente ao âmbito de
atuação do Ministério Público, mas também do Magistrado, considerando que
este também tem o poder de conceder remissão cumulada ou não com medida
socioeducativa.
Através da revisão teórica apontada nos três primeiros capítulos, foi
possível compreender que a medida socioeducativa tem caráter penal.
Portanto, reclama o respeito ao devido processo legal para sua aplicação, em
conformidade com o Direito Penal aplicado aos adultos, sob pena de o ECA ser
mais gravoso que aquele, o que é um contra-senso, além de ferir a
sistematização interna do Estatuto, baseada na doutrina da proteção integral,
e outros princípios constitucionais.
A pesquisa mostrou a necessidade de estabelecer limites ao subjetivismo
e a discricionariedade, herança da doutrina da situação irregular do antigo
Código de Menores: seja adotando entendimento pela obrigatoriedade do
respeito ao devido processo legal para aplicação de medida socioeducativa,
eliminando a possibilidade de cumulá-la na remissão, como forma de exclusão
ou suspensão do processo; seja, pelo menos, pela inclusão no ECA, através de
reforma legislativa, de critérios definidos a serem observados, em sendo
mantida a possibilidade de aplicação de medida socioeducativa em sede de
remissão.
É importante destacar, também, a fragilidade do sistema do ECA, revelada
no estudo, no que tange à suscetibilidade de violação de direitos em relação à
Infância e Juventude e da doutrina da proteção integral.
O grande problema da aceleração do mundo moderno é que o homem não
tem mais tempo para pensar no que está fazendo. A velocidade possibilitou a
acumulação do saber, mas produz um pensamento programático e
combinatório que “pode resolver melhor e mais depressa os problemas que
aparecem, mas a preocupação de ir buscar aquilo que é preciso procurar
continua a ser o problema e o privilégio dos homens”117 Daí porque ser
necessário exercitarmos a lentidão do nosso pensamento, no sentido de
refletirmos acerca da forma pela qual estamos tratando a adolescência em
conflito com a lei e quais os resultados dessa velocidade em resolver os
problemas a ela afetos.
Invocamos a citação de Mendes118, trazida na abertura deste trabalho,
para suscitar essa reflexão, a qual se espera possa despertar o desejo,
naqueles preocupados com o tema, de aprofundar esse estudo:
... as piores atrocidades contra a infância secometeram (e se cometem ainda hoje) muito mais emnome do amor e da compaixão, que em nome da própriarepressão. Tratava-se (e ainda se trata) de substituir amá, porem também “boa” vontade, nada mais – porémnada menos - , pela justiça. No amor não há limites, najustiça sim. Por isso, nada contra o amor quando omesmo se apresenta como um complemento da justiça.Pelo contrário, tudo contra o “amor” quando seapresenta como um substituto cínico ou ingênuo dajustiça.
117 GUILLAUME, Marc. A Competição das Velocidades. In: Morin Edgar, Prigogine Ilya eoutros. A Sociedade em Busca de Valores. Lisboa: Instituto Piaget, 1996, p. 116.118 MENDEZ, Emílio Garcia. Por uma Reflexão sobre o arbítrio e o Garantismo na Jurisdiçãosocieducativa. Porto Alegre,: AJURIS, ESMP-RS, FESDEP-RS, 2000, P. 13.
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SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente em Conflito com a Lei. PortoAlegre: Livraria do Advogado, 2003.
SILVA FILHO, José Carlos Moreira da. Da “Invasão” da América aos SistemasPenais de Hoje: Discurso da “Inferioridade” Latino-Americana. Revista deEstudos Criminais 7. Porto Alegre: Notadez, 2002.
SOTTO MAIOR, Olímpio. Comentário ao art. 112 do ECA. In CURY, M.;AMARAL E SILA, A; MENDEZ, E.G. (Coord). Estatuto da Criança e doAdolescente Comentado, Comentários Jurídicos e Sociais. 2. ed. SãoPaulo: Malheiros, 1996
SOUTO MAIOR, Armando. História Geral: para o ensino de 2º grau. 21. ed.São Paulo: Nacional, 1978.
SUANNES, Adauto. Os fundamentos Éticos do Devido Processo Penal. SãoPaulo: RT, 1999.
THUMS, Jorge. Acesso à Realidade, Técnicas de pesquisa e Contrução doConhecimento. 2 ed. Porto Alegre: Editora Sulina e Editora da Ulbra,2000.
VERONESE, Josiane Rose Petry; QUANDT, Guilherme de Oliveira; OLIVEIRA,Luciene de Cássia Policarpo. O Ato Infracional e a Aplicação dasMedidas Socioeducativas. In VERONESE, Josiane Rose Petry;RODRIGUES, Walkíria Machado; MIOTO, Regina Célia Tomaso (Autorase Organizadoras). Infância e Adolescência, O Conflito com a Lei: algumasdiscussões. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2001.
VERONESE, Josiane Rose Petry; RODRIGUES, Walkíria Machado. A Figurada Criança e do Adolescente no Contexto Social. In VERONESE, JosianeRose Petry; RODRIGUES, Walkíria Machado; MIOTO, Regina CéliaTomaso (Autoras e Organizadoras). Infância e Adolescência, O Conflitocom a Lei: algumas discussões. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2001.
VOLPI, Mário. Sem Liberdade, Sem Direitos. São Paulo: Cortez, 2001.
ZAFFARONI, Raul Eugênio, PIERANGELLI, José Henrique. Manual de DireitoPenal Brasileiro, Parte Geral. 4 ed. São Paulo: RT, 2002.
ZAFFARONI, Raul Eugênio. El Sistema Penal em los Países de AméricaLatina.
ZAFFARONI, Raul Eugênio. La Rinascita del Diritto Penale Liberale o la “CroceRossa” Giudiziaria. In Le Regioni del Garantismo: Discutendo com LuigiFerrajoli. Gianformaggio, Letizia. Torino: Giappichelli, 1993.
ANEXO
Prezado Colega:
A presente pesquisa faz arte de monografia do Curso de Especialização
em Direito Comunitário, Infância e Juventude, da ESMP.
Sua colaboração no preenchimento do formulário que segue é
imprescindível para o êxito do trabalho.
Ressalva-se que os dados serão preservados e destinam-se unicamente
para a formação de estatística acerca da matéria.
Para garantia de que este questionário retorne, favor enviar para os
seguintes endereços eletrônicos: [email protected],
[email protected] e [email protected]
Atenciosamente,
Angela Caren Dal Pos
QUESTIONÁRIO:
1- Iniciais ou nome (facultativo):
2- Comarca:
3- ( ) titular ( ) substituto
4- Quais os critérios que você utiliza para aplicação da remissão e na
escolha da medida socioeducativa e do prazo a serem aplicados? Enumere
pela ordem de importância, iniciando pelo n.º 1 para atribuir o de maior
importância.
( ) idade do infrator ( ) conduta social
( ) gravidade do ato infracional ( ) personalidade do infrator
( ) antecedentes ( ) motivos
( ) se o infrator estuda ou trabalha ( ) conseqüências do ato infracional
( ) empatia com o infrator ( ) comportamento da vítima
( ) confissão do delito ( ) circunstâncias do fato
( ) Outros (indicar) ______
5- Você costuma fundamentar expressamente as razões pelas quais concede
ou não a remissão bem como a medida socioeducativa a ser aplicada e o
prazo, quando as submete a homologação do Juízo?
( ) sim, sempre.
( ) não, pois a motivação já consta do termo de apresentação.
( ) não, pois é ato discricionário do Ministério Público, não havendo
necessidade de motivar, tampouco constar do termo de apresentação.
( ) outros (especifique) _______
( ) sim, porque ______
( ) não, porque ______
6- Você concede remissão mesmo quando o infrator não admite a prática de
ato infracional?
( ) sim, porque ________
( ) não porque ________
7- Qual a solução dada por você para os atos infracionais que seguem
(comprovada autoria e materialidade), considerando os seguintes critérios:
adolescente, 16 anos, não tem antecedentes, admite o fato, estuda,
comprometeu-se a não mais praticar o fato:
a) Em caso direção de veículo automotor sem habilitação, sem gerar
perigo de dano (art. 32 da LCP)
( ) arquivamento.
( ) remissão sem medida socioeducativa.
( ) remissão com medida socioeducativa de _________ pelo prazo de ______.
( ) representação.
Justificativa: _________________________________________.
b) Em caso de porte ilegal de arma de fogo:
( ) arquivamento.
( ) remissão sem medida socioeducativa.
( ) remissão com medida socioeducativa de _________ pelo prazo de ______.
( ) representação.
Justificativa: _________________________________________.
c) Em caso de furto simples, de bem com valor inferior a 30% do salário
mínimo.
( ) arquivamento.
( ) remissão sem medida socioeducativa.
( ) remissão com medida socioeducativa de _________ pelo prazo de ______.
( ) representação.
Justificativa: _________________________________________.
d) Em caso de porte de drogas para uso próprio, pouca quantidade:
( ) arquivamento.
( ) remissão sem medida socioeducativa.
( ) remissão com medida socioeducativa de _________ pelo prazo de ______.
( ) representação.
Justificativa: _________________________________________.