Hipóstase
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HIPÓSTASE
Foto detalhe
Vanu TG
Na verdade
Serie: Do Verbo Ser
Calcogravura com Chine- colli de Litogravura
Papel tamanho 33,2x23,5 cm Hahnemuhle300g
Estampa: 24,5x18cm
“Hipóstase / hypostasis - é um termo grego que pode se
referir à natureza de algo, ou a uma instância em particular
daquela natureza. O termo passou a ser um sinônimo da
palavra latina persona, o indivíduo de uma natureza
racional. A partir do século IV passou a ser contrastado
com o termo “ousia” como significando 'realidade
individual' nos contextos cristológicos e trinitários. O termo
ainda é utilizado em grego moderno com o significado de
"existência", juntamente com o termo ὕπαρξις (hýparxis) e
τρόπος ὑπάρξεως (tropos hypárxeos), este último
significando "existência individual". O termo é utilizado
para indicar a "a auto-manifestação de um indivíduo" que
pode ser expandida por meio de outras coisas. Por exemplo,
um pintor que inclui seu pincel em seu próprio prosopon.”
03
Disponível em http://www.catolicismoromano.com.br/content/view/1046/41/ Acesso MAR 2014
Índice
Mayara Polizer
ANAMNESE Para falar de identidade, ou falta dela, Mayara Polizer se coloca na condição de agente do tempo, apagando fotografias 3x4 com um químico fotográfico chamado Revelador.
08
Fernanda Heitzman
PROPOSON A artista se camufla em meio à multidão, utilizando uma máscara que tampa sua cabeça, um capuz feito de tela, fazendo com que consiga enxergar o que há à sua volta e permaneça incógnita. É um paradoxo, pois, ao mesmo tempo em que se camufla, faz-se perceber.
12
APRESENTAÇÃO................................... 07
Regina Prospero
TURVA Buscando criticar a obsessão constante por um corpo perfeito presentes nas alterações exibidas como padrão no mundo contemporâneo, Regina Prospero venda seus próprios olhos com carne, após limpar o espelho com a mesma, como se seu “ eu” ou alter ego fosse maleável de acordo com seu interesse.
Luísa Mantoani
MUNDUS MULIEBRIS Com várias identidades exageradas e transformadas, Luísa Mantoani joga para o público a reflexão dos parâmetros de ideal para a atual sociedade e seus impactos nos indivíduos. Transporta a ideia apresentada na série fotográfica para a ação de se maquiar enquanto caminha.
Juliana Sofia Lepera
EXCESSO A identidade feminina construída através da imposição de um comportamento quase teatral. Baseada em expressões que coletou de filme antigos, e que também são notáveis no mundo atual , Juliana Sofia Lepera as expõem e as critica em sua video-performance.
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20
Fotos
Anamnese – Regina Próspero
Prosópon – Fernanda Heitzman
Excesso – Juliana Lepera
Turva – Claudia Geminiani Falkas
Mundus Muliebris – Carolina Vigna-Marú
06
A parte que nos caracteriza e nos apresenta: o rosto, exposto e vulnerável,
face do embrulho que guarda nosso intelecto, nossa memória, nosso
aprendizado, área que se estende da testa ao queixo, escolhido para a foto
de identidade como documento oficial do governo, mas também
concebido por nós como identidade. Marcado pelo tempo, e pela
experiência, modificado diariamente por todo o tipo de maquiagem ou
cirurgia, à mercê de uma incessante busca eterna pela beleza e juventude,
vítima diária do culto contemporâneo da boa aparência. Mas
principalmente protagonista de um paradoxo: dos mais pintados, aos nus,
somos todos incapazes de ver nossa própria face.
Hipóstase apresenta performances de diferentes artistas que expressam em
suas obras conceitos ligados à incapacidade da identificação do individuo,
onde o rosto se torna suporte para esta e outras questões. Anamnes de
Mayara Polizer consiste na ação que apaga fotos 3x4, dissipando a
memória dessas pessoas; Em Prosópon Fernanda Heitzman utiliza uma
máscara-capuz em que camufla o rosto, mas ao mesmo tempo observa a
multidão; Juliana Sofia Lepera pinta a própria face para realçar as
expressões da vídeo-performance Exagero; Regina Próspero envolve
pedaços de carne em sua cabeça, diante de um espelho em Turva; As
fotografias de Luisa Mantoani em Mundus Muliebris mostra a artista
maquiada de forma exagerada e caricata.
Texto de:
Mayara Polizer, Regina Prospero e Fernanda Heitzman
Edição Final, Juliana Sofia Lepera.
07
MAYARA
POLIZER Anamnese
Por Regina Prospero
A performance da artista Mayara Polizer consiste
na ação de apagamento de fotografias 3 por 4
dispostas na parede lado a lado, sem espaçamento
entre elas.Varias fotos de rostos, conhecidos e
desconhecidos, repetidos ou não, cobrem uma área
de aproximadamente 1m², e são apagados com o
auxílio de um pano umedecido com revelador
(químico fotográfico responsável pela aparição das
imagens no processo analógico de revelação de
fotografias). Essa ação faz com que o papel
fotográfico ressensibilize-se com a luz e escureça
cada foto.
As fotos 3 por 4 geralmente são usadas para
concepção de documentos de identidade, como:
RG, passaporte, carteira de motorista, etc. Esses
documentos são pessoais e que todos os cidadãos
precisam ter e carregar consigo para onde for. Ao
tirar o esses documentos deixamos registrados
diversas formas de identificação, como a
assinatura, foto, impressões digitais dos dez dedos
da mão e outras informações como endereço e
formas de localização. Através da carteira de
identidade podemos ser identificados quando
necessário. Identificação em caso de acidentes,
morte, participação em um crime, entre outras
situações os dados do documento poderão ser úteis
para as autoridades competentes.
Apagar um rosto de uma foto com o revelador
significa tirar a identidade da pessoa fotografada,
ela passa a ser uma mancha preta. São apagadas
suas características físicas e singulares, para
posteriormente fazer parte de um grande quadro
negro. A identidade pode ser definida como sendo
um conjunto de caracteres próprios e exclusivos de
8
uma determinada pessoa. Ela permite que o
indivíduo se perceba como sujeito único,
tomando posse da consciência de si mesmo.
Mayara Polizer retira a individualidade de
pessoas, ao final da performance não é possível
diferenciar o rosto, o sexo, a idade, a cor e tipo
físico dos indivíduos das fotos. Desde 2011 o
artista francês JR promove por diversas cidades
do mundo, como Nova York e Turquia, o projeto
intitulado Inside out Project. Ele e sua equipe
convidam as pessoas para tirar autorretratos em
uma cabine de fotos na rua.
09
10 Essas fotos são impressas em grande escala e coladas
lado a lado, formando um grande painel no chão e/ou
paredes. Desde 2011 o artista francês JR promove por
diversas cidades do mundo, como Nova York e
Turquia, o projeto intitulado Inside out Project. Ele e
sua equipe convidam as pessoas para tirar
autorretratos em uma cabine de fotos na rua. Essas
fotos são impressas em grande escala e coladas lado a
lado, formando um grande painel no chão e/ou
paredes. O conceito do projeto é dar a todos a
oportunidade de compartilhar seu retrato e afirmar o
que eles representam com o mundo. No Inside out
Project qualquer individuo pode participar e é
desafiado a usar retratos fotográficos para
compartilhar as histórias não contadas e fazer uma
união das imagens de pessoas de suas
comunidades. Há diferenças e semelhanças entre
as obras de Mayara Polizer e JR. Os fazem painéis
com retratos de desconhecidos, porem, enquanto o
artista francês procura expor as características
pessoais e sociais dessas comunidades, a
performer remove os aspectos individuais.
A pratica de colocar fotografias em caixas
de sapatos ou em gavetas é uma
necessidade não só de guardar, mas de
esquecer temporariamente, Esquecer
sabendo que esta lá, que pode ser
ressuscitada. Nessa Perspectiva, o cotidiano
é a relação de proximidade e distancia,
lembrança e esquecimento.
José de Souza Martins
A sociologia da Fotografia e da Imagem.
guardados na carteira que onde mesmo que
esquecido, permanece como indicio de afeto.
Percebi esse índice de afeto a partir da difícil coleta
dessas fotos para a realização de um trabalho
chamado Anamnese, composta pela coleta de
fotografia 3X4 , pesquisas e experimentações com os
processos analógicos de revelação fotográfica, e ao
final o apagamentos dessas fotos. No dia 12 de
novembro de 2013, retirei de uma caixa preta velada
uma placa com 200 fotografias, medindo no total 1
x80 , e iniciei o apagamento das fotografias usado um
químico fotográfico chamado revelador, interessante
pensar que após mil tentativas, o que iria funcionar
para fazer o serviço de apagar identidades seria
chamado Revelador, a minha ação durou uma hora,
mas a ação da luz ainda permaneceu por mais um
tempo, e retorna a cada vez que é exposta a obra com
o objetivo de coletar mais fotografias.
A imagem sempre em mudança nunca tem um
resultado final, fazendo referencia ao tempo fluxo
continuo real, mas também ao tempo fotográfico,
considerado por Barthes como o passado, Anamnese
consegue ser o oposto da fotografia tradicional não
temporalizada e idêntica a si próprias no tempo, ao
mesmo tempo ser como ela, que mortifica a imagem
através da subversão de procedimentos técnicos da
revelação fotográfica analógica , mas além de
despertar questões metalinguísticas, se propõem
também a falar de identidade, criando o paradoxo de
se apagar uma identidade com uma substancia
chamado revelador, tornando efêmeras as imagens
para falar da efemeridade das pessoas ali
representadas.
Por Mayara Polizer
Memorias das perdas, memorias desejadas e
indesejadas. Memorias do que opõe a sociedade
moderna à sociedade tradicional, memorias do
comunitário que não dura, que não permanece,
memoria de uma sociedade de ruptura, e não de
coesões e permanências. Memoria de uma sociedade
de perdas sociais continuas e constitutivas, de uma
sociedade que precisa ser recriada todos os dias, de
uma sociedade mais de estranhamentos do que de
afetos. ¹
O retrato seja no campo pictórico seja no campo da
fotografia, dadas as distinções sempre esteve a
serviço da representação estética, muito usado nas
academias que buscavam a mimese, ou para
burguesia que queria projeção, mais tarde nos cartões
de visita fotográficos do século XIX, ou ainda hoje
com as selfies, fotos de perfil, books, 3x4, uma
variedade de retratos que apresentam e nos
representam para o mundo. Mas de todas essas
citados, a única que sai do campo da vaidade é a foto
3x4. Esse tipo de foto, como todo artefato social,
carrega em si um conhecimento sobre sua gênese, e
diferente das outras modalidades de retratos, tem em
sua origem um objetivo burocrático. São fotografias
concebidas como oficiais de documentos de
identificação, tidos como pessoais, obrigatórios, e de
uso cotidiano, que também detém o poder de nos
tornar cidadãos, ou seja, ter um nome, e
principalmente numero diante do governo, portadores
de direito e deveres. Por outro lado, esta pequena
foto também subverte seu proposito para adotar um
muito mais subjetivo, se tornando pequenas relíquias,
tesouros, lembranças de um ente querido, de um
amor, irmão, alguém ausente, já falecido, que são
11
FERNANDA
HEITZMAN Prosópon
Por Sara Oliveira
No vídeo Prosopons, em grego, máscaras, a
performer caminha com a cabeça coberta por um
capuz (espécie de saco de batatas) que permite
que veja e seu rosto não seja visto. Percebemos
isso quando ela caminha naturalmente. Este fato
por si só já leva a crer que a artista deseja anular
sua identidade. Identidade, aliás, que está presente
em sua produção, que muitas vezes apresenta
figuras humanas sem revelar seus rostos, também
anulando a relação de tempo/espaço.
No entanto, sua ação a coloca em duas condições:
observadora e observada; entra num paradoxo. A
multidão em geral é tão homogênea que ao cobrir
o rosto em São Paulo, onde a multidão é que torna
os rostos invisíveis, atrai toda a atenção para si ao.
mesmo tempo em que sua presença demora a ser
percebida, na estação Sé do metrô, por exemplo É
um destaque por meio da anulação. A cobertura do
rosto evidencia o corpo, pois causa curiosidade e até
medo nos transeuntes. O medo, talvez por lembrar
os carrascos da Idade Média, ou pelo conceito que
temos de que rostos cobertos estejam ligados a más
intenções.
Por outro lado, os comentários e xingamentos são
inevitáveis e, portanto, a busca por uma maior
desenvoltura, por uma desinibição por meio de
esconder o rosto só evidencia seu medo sobre o que
as pessoas vão dizer sobre ela. Desta forma,
também trata dos sentimentos que por vezes temos
que esconder por baixo de uma máscara.
Por Fernanda Heitzman:
Prosópon
Soar através de...
A máscara não se trata
de um adereço, e sim de
um esconderijo de
identidade, proteger-se do
desconhecido, colaborando
para o distanciamento. É
metamorfose: ao esconder
um rosto, revela uma
outra personalidade.
Aparentemente, o aspecto físico da máscara
lembra as máscaras sensoriais de Lygia Clark, uma
vez que as de Clark, como o nome da obra sugere,
tem o propósito de gerar experiências sensoriais
para o auto conhecimento do corpo .Neste
sentido, Prosopons busca também um
autoconhecimento, mas não sensorial, e sim
psicológico, que tenta camuflar a timidez da
performer, lidando com os olhares voltados a ela.
A ação trata de questões particulares da artista,
como o medo de usar o corpo como meio de
expressão e a vergonha. Mas não fica restrita a ela,
por ser um tema de fácil identificação com outros
perfis dos possíveis espectadores. E para isso é
importante que ela também esteja desse outro lado
de “ causadora de constrangimentos". Também
tem certa relação com a performance Reflexos -
ensaio sobre o vazio, de Felipe Vasconcellos, que
produz uma roupa de espelhos e também caminha
pela cidade, no que diz respeito a presença de um
corpo estranho ao resto da multidão e que altera o
espaço onde se inserem. As pessoas fogem, desvi-
Acesse o vídeo em:
https://vimeo.com/87868092
13
am, mudam seu trajeto A relação obra/público nesses
dois trabalhos é bem marcante. O fato de terem
mudado a rotina das pessoas com o simples fato de
estarem presentes já é uma característica da arte
contemporânea. Apropriam-se do espaço público e o
modificam.
Pedro Salazar (câmera):
Acompanhamos a situação? Planejando ou
Improvisando? Acompanhando o fluxo dos elementos
visuais e posicionando uma figura? Central? Na
oposição das paisagens e dos passantes procuramos
expor uma representação contraditória em um corpo:
ele tenta se esconder e se expõe. Mas nada é fácil
nesse ambiente. A partir disso, então, como elaborar
questões em torno do espaço? Ver e ser visto;
contudo, o que se passa quando essa interlocução,
aparentemente silenciosa é transgredida? O que se faz
do sujeito que se vê observado, ao mesmo tempo pelo
olhar mascarado de um corpo irreconhecível e das
lentes de uma câmera, ora imperceptível, ora
intrusiva? Porém, há um terceiro elemento em
diálogo. O observador, o qual também configura este
recorte do espaço, ora se escondendo, por trás, ora se
expondo, estaria no mesmo nível? Surge, então, um
estranhamento a partir do qual torna-se preciso
colocar-se em mais de um lugar ao mesmo tempo.
Imag
ens
de
Ped
ro S
alaz
ar
JULIANA SOFIA LEPERA Excesso
Por Regina Prospero
A vídeo-performance Excesso da artista Juliana
Sofia Lepera é constituída por dois vídeos que
divide a imagem, as ações acontecem
simultaneamente para exaltar que não é um
ensaio. No vídeo a performer pinta o próprio
rosto com tinta branca, criando uma mascara, e
posteriormente tinta preta em lugares específicos
como sobrancelhas, olhos e bochechas. Durante a
ação a artista vai modificando suas expressões,
tornando-as exageradas. Ao termino da
performance ela borra toda a maquiagem com as
mãos e volta a ter o rosto sereno do inicio do
vídeo. A ação é diretamente relacionada com as
expressões exageradas de atrizes dos filmes
antigos, como Marilyn Monroe, que tinham que
passar uma imagem muito feminina, com muita
perfeição e sem erros.
Desse modo suas atitudes durante as cenas eram
teatrais e pouco naturais. Esses filmes promoviam
de certa forma, um padrão de beleza que não
admitia mulheres com rostos sofridos como
protagonistas.
Juliana Sofia Lepera também questiona em sua obra
como a maquiagem pode mudar completamente o
rosto de uma pessoa.
Há nos dias atuais uma hipervalorização dos
produtos de beleza, que prometem mudanças
rápidas e com bom resultado.
A maquiagem é uma mascara que pode esconder
defeitos estéticos, e consequentemente para muitos
defeitos internos, aumentando assim a autoestima.
Tanto nos filmes antigos quanto na indústria de
produtos de beleza há uma busca pela perfeição.
15
Os materiais usados e as poses exageradas
são artifícios para busca de um estereótipo, o
da mulher ideal. Como esse estereótipo não
existe e nunca existirá, na performance a
artista faz a ação num lugar escuro, uma
penumbra que passa a sensação de medo,
tanto pelo tamanho da projeção quanto pelas
expressões exageradas.
Acesso em:
http://vimeo.com/88287445
16
Por Juliana Lepera:
A obra Excesso é um resultado da minha pesquisa, sobre
personas imagens que refere-se à personalidade que o
sujeito apresenta aos demais como algo real. No entanto,
pode ser uma versão muito contrária à verdadeira. Mas
mais do que apenas apresentar, essa performance
procura, através do exagero, criticar essa máscara que a
sociedade utiliza na contemporaneidade como algo
corriqueiro e natural. Para a construção desta obra foi
necessário experimentar maquiagens que ressaltassem
diferentes expressões, reparei que em relação a câmera
em um estado performático no momento da filmagem,
perdia total controle sobre as expressões que surgiam,
em uma espécie de transe. Cada expressão vinha sem
qualquer programação, não havia por traz de um sorriso
um sentimento de felicidade ou por traz de olhos
arregalados medo, o que quero dizer aqui é que, ao
adotar personas o sujeito não necessariamente tem
controle sobre essa mascara de expressões como algo
reflexo se alguém fala algo engraçado você sorri, sem ao
menos ter achado divertido. A relação do sujeito com o
outro se coloca como distante ou superficial. Mas o
maior agravante é a falta de acesso com suas verdadeiras
emoções, e assim um distanciamento de sua própria
identidade.
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do
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.
Acesse o video em: http://vimeo.com/88287445
REGINA
PRÓSPERO
Turva
Por Cau Falkas “Turva” é o nome da performance apresentada pela aluna Regina Prospero. Aconteceu no dia 5 de outubro às 8 horas, com duração aproximada de 30 minutos na sala de prátrica de performance no prédio 1 da Faculdade de Belas Artes de São Paulo. A artista sentou-se em uma cadeira em frente a uma mesa, colocada junto a uma parede. Sobre esta mesa esta um espelho na posição vertical, também apoiado à parede. Sentada à mesa, passa pedaços de carne em sua imagem no espelho e em seguida costura este pedaço de carne a outro, formando uma tira. Assim faz com os demais pedaços ao longo de sua apresentação. A ação termina quando todos os pedaços estão costurados uns aos outros e Regina coloca sobre sua cabeça e rosto esta peça que agora contém os pedaços de
carne unidos. Segundo Regina Próspero, o trabalho questiona a busca pelo corpo perfeito, fazendo referencia a cirurgias e demais intervenções para atingir um ideal de beleza
18
imposto pela sociedade vigente. Parte do principio de que o conceito de beleza da maioria das pessoas esta associado ao corpo físico, representado aqui pela carne bovina. A referencia artística foi a obra de Artur Barrio intitulada “Livro de Carne”. Mas podemos relacionar diversos outros artistas que utilizaram esta matéria efêmera para construir sua obra como, por exemplo, Adriana Varejão. A artista, ao passar a carne pelo espelho, tem a sensação de que sua vista esta turva, mas na verdade o espelho é que esta com resíduos que não permitem uma definição da imagem refletida. O que é visto ali não condiz com a realidade, como acontece com muitas pessoas portadoras de transtornos. “Turva” é uma ação instigante, pois trata da imagem da artista em contato com um material que algumas vezes causa estranhamento quando utilizado em obras de arte.
19 Neste caso a carne exerce também uma função de
agressiva simplesmente por ser um material que
apodrece, e representa o resíduo de algo que já teve
vida. Efêmera, esta carne cumpre o seu papel de
retirar a imagem perfeita do espelho, embaçando a
figura da artista, deformando sua imagem no
reflexo.
Ao final da ação a performer tapa seus olhos com
os retalhos de carne costurados uns aos outros
passando a impressão de que às vezes é melhor não
ver mesmo aquela imagem turva, deformada de
alguma forma, tão inaceitável e distante do que é
considerado belo, perfeito. Ao assistir a ação, a
princípio o espectador pode não se sentir convidado
diretamente a refletir sobre a vaidade humana, mas
de alguma forma percebe uma conexão com
imagem, pois é esta a principal associação quando
nos referimos a espelhos.
Já a questão da obsessão pode ou não vir a aparecer
ao longo da ação, já que não encontramos nenhuma
referencia direta a ela ao longo da performance.
Seria necessária uma interpretação mais profunda,
ou um conhecimento prévio da proposta por parte
do espectador. A exploração de quem observa e
isso pode ou não ser possível, pois temos muitos
fatores que precisam colaborar para isso como, por
exemplo, uma expressão facial, uma velocidade
maior nos movimentos e etc. “Turva”, traz questões
relacionadas a imagem, mas não encontramos na
ação a relação com a questão da obsessão que foi
uma das motivações da artista para realização da
obra e que estaria permeando toda a questão da
imagem durante o trabalho.
Por Regina Prospero
Minha performance procura discutir a obsessão constante por um corpo perfeito. Sobre como o corpo
pode criar um alter ego, uma personalidade diferente do “eu”, um espelho de si mesmo, disponível para
alteração maleável de acordo com o interesse individual. “A glória do momento é atribuída ao corpo não
natural, conjunto de órgãos anexados à pessoa, instância de conexão com o mundo, o corpo-descartável
em constante busca de manipulação de si e ansiedade de afirmação pessoal, já que o corpo sem
intervenção é desprestigiado, “encarna a parte ruim, o rascunho a ser corrigido” [...]É um corpo
reescrito, caracterizado por sua “subjetividade lixo”, diz Le Breton, que existe numa época em que a
pele, a carne, manifesta o que há de mais profundo no indivíduo, que exprime quem é o sujeito.”
(Bárbara Nascimento Duarte, 2010, “Corpo da modernidade: Lugar da condenação e da salvação do
indivíduo”)
LUISA
MANTOANI Mundus Muliebris Por Carolina Vigna
A artista Luísa Mantoani apresentou, no dia 29 de
outubro de 2013, no Centro Universitário Belas
Artes São Paulo, a performance Mundus Muliebris,
em duas partes: uma exposição fotográfica de uma
ação ocorrida anteriormente e, ao vivo.
As fotografias são portraits de Mantoani, em cores.
Cada imagem mostra a artista maquiada de forma
diferente, mas sempre de forma exagerada e
caricata. As obras foram expostas em uma única
linha, à altura dos olhos, fixadas diretamente sobre
uma parede branca.
A performance ao vivo aconteceu na Unidade I do
Centro Universitário Belas Artes São Paulo e durou
2 horas. Iniciou-se com Mantoani maquiando-se ao
caminhar, sem espelho ou qualquer auxílio. A
performer faz as seguintes paradas: toilette feminino
do primeiro andar; escadaria; e toilette feminino do
segundo andar. Nos 3 locais, permanece imóvel por
aproximadamente 15 minutos em cada. O trabalho
de Mantoani coloca em cheque a noção social do
embelezamento associado à mulher. Tanto a
questão dos exageros, quanto as questões de
gênero, identidade e sociedade.
Em diálogo direto com Olivier de Sagazan, a
artista se coloca também como uma tela a se
desfigurar. Esta sua transfiguração, ao contrário da
de Sagazan, permanece no limiar deste “real”
esperado pela sociedade. Mantoani se desfigura
mas não ao ponto de ser irreconhecível como
mulher, como uma mulher que se maquia. Sagazan
se transforma em outro ser, enquanto Mantoani
permanece em sua identidade e em seu gênero.
Devemos considerar também a relação com as
fotografias de Cindy Sherman. Assim como
Sherman, Mantoani também tem um
posicionamento feminista e questiona o uso de
maquiagem e adereços. Apesar de Sherman ser
consideravelmente mais irônica que Mantoani,
ambas artistas recorrem à caricatura.
O caricato está presente também no clown, de onde
podemos detectar a influência da artista Laura Lima,
com o trabalho Palhaço com Buzina Reta - Monte
de Irônicos.
Mantoani questiona o papel da mulher na sociedade,
tanto através do exagero irônico quanto da
delicadeza do clown, resultando em um trabalho
sensível e comovente. Há também um
posicionamento frente à maquiagem, exagerada ou
não. O exagero é apenas um recurso narrativo, ao
contrário da posição frente à cobertura do rosto e da
pele com produtos artificiais. Esta, por sua vez, é
claramente feminista ao se opor à imposição social
em relação à aparência feminina.
21
22
Por Luísa Mantoani
Esta performance traz a questão da maquiagem
e seus desdobramentos, como o papel na
sociedade, aspectos psicológicos e outras
naturezas. O intuito é jogar para o público o
questionamento do uso dessa técnica e trazer
reflexões pessoais a cada um que acesse a obra.
O trabalho se deu por meio de um estudo sobre
os exageros, criação de personagens e
identidades através do uso da maquiagem,
sendo então exibida uma série fotográfica com
diferentes rostos criados e com característica
particulares.
Minhas referências foram artistas que
provocavam o transtorno estético, utilizando-se
de caracterizações variadas, que deformavam,
escondiam, exageravam e camuflavam, mas
sempre trazendo a discussão da identidade
perante os outros, além da questão para o
próprio indivíduo.
Simultaneamente a essa exibição, me propus a
caminhar pelos espaços da faculdade me
maquiando ao mesmo tempo, sem olhar, sem
me preocupar com a estética, justamente
provocando junto com a série de fotografias, a
reflexão do caráter do “belo” presente no
imaginário da sociedade quando se trata dessa
vaidade e dessa forma de pensar quando se
pensa em apresentar-se ao outro.