Improbidade Dano Ao Erário Endividamento

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T R I B U N A L D E J U S T I Ç A RS ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MIAS Nº 70047735162 2012/CÍVEL IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. INCONSTITUCIONALIDADE. AGENTES POLÍTICOS. FUNÇÃO ADMINISTRATIVA. PETIÇÃO INICIAL. RECEBIMENTO. 1. A Lei n.º 8.429/92, que regulamentou o artigo 37, § 4º, da CR, (I) ostenta natureza nacional, aplicando-se à Administração Pública federal, estadual, municipal e distrital, (II) não desrespeitou a bicameralidade do processo legislativo, conforme decidido no julgamento da ADI 2.182/DF e (III) aplica-se aos Prefeitos, Vice-Prefeitos, Secretários e Vereadores que tenham praticado atos de improbidade no exercício da função administrativa. 2. Presentes indícios da existência de atos de improbidade administrativa descritos na petição inicial, é de ser recebida a ação, forte no art. 17, § 8º, da Lei n.º 8.429/92. Hipótese em que o Ministério Público imputa ao Prefeito, que concorreu à reeleição, a violação da proibição legal de contrair, nos dois últimos quadrimestres do mandato, obrigação de despesa sem a existência de disponibilidade de caixa, situação que gerou a inscrição das parcelas não pagas nos restos a pagar. Negado seguimento ao recurso. AGRAVO DE INSTRUMENTO VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Nº 70047735162 COMARCA DE SÃO LEOPOLDO 1

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MIASNº 700477351622012/CÍVEL

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI Nº 8.429/92. INCONSTITUCIONALIDADE. AGENTES POLÍTICOS. FUNÇÃO ADMINISTRATIVA. PETIÇÃO INICIAL. RECEBIMENTO.

1. A Lei n.º 8.429/92, que regulamentou o artigo 37, § 4º, da CR, (I) ostenta natureza nacional, aplicando-se à Administração Pública federal, estadual, municipal e distrital, (II) não desrespeitou a bicameralidade do processo legislativo, conforme decidido no julgamento da ADI 2.182/DF e (III) aplica-se aos Prefeitos, Vice-Prefeitos, Secretários e Vereadores que tenham praticado atos de improbidade no exercício da função administrativa.

2. Presentes indícios da existência de atos de improbidade administrativa descritos na petição inicial, é de ser recebida a ação, forte no art. 17, § 8º, da Lei n.º 8.429/92. Hipótese em que o Ministério Público imputa ao Prefeito, que concorreu à reeleição, a violação da proibição legal de contrair, nos dois últimos quadrimestres do mandato, obrigação de despesa sem a existência de disponibilidade de caixa, situação que gerou a inscrição das parcelas não pagas nos restos a pagar.Negado seguimento ao recurso.

AGRAVO DE INSTRUMENTO VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Nº 70047735162 COMARCA DE SÃO LEOPOLDO

ARY JOSE VANAZZI AGRAVANTE

MINISTERIO PUBLICO AGRAVADO

D E C I S Ã O M ON OC R Á T I C A

1. Os autos dão conta de que o MINISTÉRIO PÚBLICO

ajuizou, em 23 de novembro de 2011, ação civil pública contra ARY JOSE

VANAZZI, Prefeito do Município de São Leopoldo, para condená-lo nas

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sanções do artigo 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92 pela prática dos atos de

improbidade previstos nos artigos 10, inciso IX, e 11, inciso I, do referido

diploma legal. Nos dizeres da petição inicial, entre maio a dezembro de

2008, o Réu contraiu 17 obrigações, cujas despesas não poderiam ser

pagas no mesmo exercício financeiro e inscreveu parcelas em restos a

pagar sem contrapartida de caixa em violação ao artigo 42 da Lei

Complementar n.º 101/2000, fatos que causaram dano ao erário, na medida

em que “promoveu um endividamento ilícito do Poder Executivo de São Leopoldo”

(fl. 50-verso). Informou que, em razão disso, “o TCE/RS emitiu Parecer pelo

não-atendimento à Lei Complementar Federal n.º 101/200, relativamente às Contas

de Gestão Fiscal do Poder Executivo Municipal de São Leopoldo, no exercício de

2008, tendo em vista a ausência de disponibilidade financeira do Executivo para

cobertura das despesas empenhadas nos dois últimos quadrimestres de mandato, bem

como pelo desequilíbrio financeiro apresentado” (fl. 30). Notificado, o Réu

apresentou manifestação, arguindo a (I) inaplicabilidade da Lei de

Improbidade Administrativa aos agentes políticos e (II) inconstitucionalidade

formal e material desse diploma legal. Aduziu que (I) a mera inscrição de

restos a pagar sem a correspondente disponibilidade de caixa não

caracteriza improbidade administrativa, (II) no período em questão, a

previsão orçamentária do Município não se concretizou, em decorrência da

crise econômica nacional da época, (III) os dezessete fatos descritos na

petição inicial se referem a despesas necessárias que foram requeridas e

autorizadas pelos Secretários do Município e (IV) não houve dolo, tampouco

prejuízo ao erário, já que o agente se reelegeu e adimpliu os restos a pagar,

nos primeiros meses do exercício seguinte. Na manifestação de fls. 76/78, o

MUNICÍPIO DE SÃO LEOPOLDO afirmou que não houve prejuízo aos

cofres públicos segundo o Sistema de Controle Interno e se tratava de

despesas relativas à prestação de serviços públicos. Na decisão de fls.

19/21, a MM. Juíza de Direito da 5.ª Vara Cível da Comarca de São

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Leopoldo rejeitou as preliminares arguidas e recebeu a ação. Inconformado,

o Réu interpõe o presente agravo de instrumento. Argui a (I) inaplicabilidade

da Lei n.º 8.429/92 aos agentes políticos e (II) inconstitucionalidade formal e

material da Lei n.º 8.429/92. Alega que (I) a inscrição de restos a pagar sem

a correspondente disponibilidade de caixa não caracteriza improbidade

administrativa, (II) as despesas ordenadas (a) eram necessárias e, em sua

maioria, vinculadas à saúde e à educação e (b) foram requeridas e

autorizadas pelos Secretários do Município, (III) no período em questão, o

País esteve em crise, o que reduziu a arrecadação de impostos e,

consequentemente, o Fundo de Participação dos Municípios, (IV) o agente

reelegeu-se, adimplindo, no exercício seguinte, as despesas, exceto as

pertinentes às obrigações de trato continuado e (V) não houve dolo ou culpa,

tampouco prejuízo ao erário. Pede a atribuição de efeito suspensivo ao

recurso. É o relatório.

2. Preliminares. Inconstitucionalidade da Lei n.º 8.429/92. Inquina o Agravante de inconstitucional a Lei n.º 8.429/92 por (I) não ter

respeitado a bicameralidade do processo legislativo, nos termos do artigo 65

da Constituição da República, e (II) infringir o princípio federativo, uma vez

que a competência para legislar sobre Direito Administrativo é privativa de

cada ente político, nos termos do artigo 37, § 4º, da Constituição da

República. Sem razão.

A um, porque o Supremo Tribunal Federal, em 12 de maio de

2010, concluiu o julgamento da ADIn n.º 2.182/DF, Relator Min. Marco

Aurélio, ajuizada pelo PTN para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº

8.429/92 por violação ao artigo 65 da Constituição da República, para julgar

improcedente a ação, em acórdão assim ementado:

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“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. 1. QUESTÃO DE ORDEM: PEDIDO ÚNICO DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE EXAMINAR A CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. 2. MÉRITO: ART. 65 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA LEI 8.429/1992 (LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA): INEXISTÊNCIA. 1. Questão de ordem resolvida no sentido da impossibilidade de se examinar a constitucionalidade material dos dispositivos da Lei 8.429/1992 dada a circunstância de o pedido da ação direta de inconstitucionalidade se limitar única e exclusivamente à declaração de inconstitucionalidade formal da lei, sem qualquer argumentação relativa a eventuais vícios materiais de constitucionalidade da norma. 2. Iniciado o projeto de lei na Câmara de Deputados, cabia a esta o encaminhamento à sanção do Presidente da República depois de examinada a emenda apresentada pelo Senado da República. O substitutivo aprovado no Senado da República, atuando como Casa revisora, não caracterizou novo projeto de lei a exigir uma segunda revisão. 3. Ação direta de inconstitucionalidade improcedente.”

A dois, porque a Lei º 8.429/92 tem natureza nacional, nos

termos do artigo 37, § 4º, da Constituição da República, que atribuiu ao

Congresso Nacional competência para, em âmbito nacional, legislar sobre

os atos de improbidade administrativa e a forma de sua repressão.

Por pertinente, transcreve-se trecho do voto proferido pelo

eminente Desembargador Paulo de Tarso Viera Sanseverino no julgamento

da Apelação Cível n.º 70031191471, Terceira Câmara Cível, julgada em 03

de dezembro de 2009, verbis:

“De outra parte, suscitou-se a inconstitucionalidade material da Lei de Improbidade, por se tratar de lei federal que não poderia, por esse motivo, ser aplicada a agentes estaduais e municipais, por redundar em malferimento do art. 37, §4º, da CF.

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No que se refere à inconstitucionalidade material, não procede a alegação de que a Lei de Improbidade deveria ter interpretação restrita aos agentes públicos federais. É de se registrar, antes de tudo, que a competência legislativa não está prevista expressamente na CF. A doutrina a tem definido com base no art. 37, §4º, pautando-se pelas medidas de “ressarcimento, indisponibilidade, suspensão de direitos políticos e perda da função” determinadas pelo referido dispositivo.Deste modo, exceto em relação à perda da função, a competência legislativa sobre essas matérias é exclusiva da União, com fundamento no art. 22, inc. I, “d”, por se tratar de matérias de direito civil e eleitoral. Tenho, assim, que a Lei nº 8.429/92 regulamenta o art. 37, §4º, da Constituição Federal, com aplicação nas três esferas políticas. Sua abrangência é nacional, não se tratando de lei de âmbito restrito aos servidores federais. A competência para legislar sobre matéria de competência administrativa, de regra, é própria de cada ente político. No entanto, hão de ser uniformes os mecanismos de punição por improbidade administrativa, até mesmo para preservar o princípio da igualdade, evitando-se que a antijuridicidade administrativa, que não se deslembre, é uma só, seja punido de formas e graduações díspares nos multifários municípios deste país. O único modo de operacionalizar referida uniformidade é através da edição, pela União, de lei com eficácia nacional e não apenas federal.Em suma, o art. 37 da Constituição Federal ao prever a aplicação dos princípios gerais de administração para as três esferas políticas, prevendo expressamente no seu parágrafo 4º, a repressão de atos de improbidade administrativa, conferiu à União competência administrativa para regulamentar a matéria em âmbito nacional, não procedendo a argüição de inconstitucionalidade material da Lei nº 8.426/92.”

Nesse sentido já decidi ao participar do julgamento da

Apelação Cível n.º 70032515090, desta Vigésima Segunda Câmara Cível,

Relator Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro, em 10 de dezembro de 2009,

assim ementado:

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“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AGRAVO RETIDO. AUSÊNCIA DE PEDIDO DE APRECIAÇÃO NAS RAZÕES DE APELAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO.Não se conhece do agravo retido quando ausente pedido de apreciação expresso nas razões de apelação.Inteligência do art. 523, § 1º, do CPC.agravo retido. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGENTE POLÍTICO. stf. JULGAMENTO DA RECLAMAÇÃO Nº 2.138. AUSÊNCIA DE EFEITO VINCULANTE. INCONSTITUCIONALIDADE formal e material da LEI 8.429/92. INEXISTÊNCIA.O Prefeito Municipal, ainda que qualificado como agente político, é parte legítima para figurar no pólo passivo de Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa, sendo que o julgamento pelo STF da Reclamação n° 2.138-6 não possui efeito vinculante, o que inclusive é assentado por precedentes daquela Corte.Inexistência de inconstitucionalidade formal e material da Lei 8.429/92.Precedentes do TJRGS, STJ e STF.(...)”

Rejeita-se, portanto, a preliminar.

3. Aplicabilidade da Lei n.º 8.429/92. Trata a espécie de ação

de improbidade administrativa que imputa a Prefeito a prática de ato

tipificado na Lei nº 8.429/92.

A sujeição dos agentes políticos às sanções previstas no

referido diploma legal é tema já enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal.

No julgamento da Reclamação nº 2.138/DF, por maioria, a Corte Suprema

extinguiu a ação de improbidade ajuizada contra ex-Ministro de Estado sob o

fundamento de que, na qualidade de agente político, se submetem apenas

às normas da Lei nº 1.079/1950.

A extensão desse entendimento a outros agentes políticos,

como os Prefeitos, é matéria controvertida.

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O Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de se

pronunciar a esse respeito. No julgamento do Resp 456.649/MG, julgado em

05.09.2006, esse assunto veio à tona no voto do Min. Luiz Fux, que expôs a

matéria e seguiu a decisão do Supremo Tribunal Federal na referida

Reclamação. Na oportunidade, o Min. Teori Zavascki acompanhou o Relator

apenas pela conclusão. Por plenamente esclarecedor da relevância do

assunto, transcreve-se:

“A controvérsia a ser dirimida nos presentes autos cinge-se em definir se a conduta do ex-prefeito, consistente na negativa do fornecimento de informações solicitadas pela Câmara Municipal, pode ser enquadrada, simultaneamente, no Decreto-lei n.º 201⁄67 que disciplina as sanções por infrações político-administrativas, e na Lei n.º 8.429⁄92, que define os atos de improbidade administrativa.

Os ilícitos previstos na Lei n.º  8.429⁄92 encerram delitos de responsabilidade quando perpetrados por agentes políticos diferenciando-se daqueles praticados por servidores em geral.

Determinadas autoridades públicas não são assemelhados aos servidores em geral, por força do cargo por elas exercido, e, conseqüentemente, não se inserem na redução conceitual do art. 2º da  Lei n.º 8.429⁄92 ("Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior"), posto encartados na lei que prevê os crimes de responsabilidade.

O agente político exerce parcela de soberania do Estado e  pour cause atuam com a independência inextensível  aos servidores em geral, que estão sujeitos às limitações hierárquicas e ao regime comum de responsabilidade.

Ademais, a responsabilidade do agente político obedece a padrões diversos e é perquirida por outros meios. A imputação de improbidade a esses agentes implica em categorizar a  conduta como "crime de responsabilidade", de natureza especial.

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A Lei de Improbidade Administrativa admite no seu organismo atos de improbidade subsumíveis  a regime jurídico diverso, como se colhe do art. 14, § 3º da lei 8.429⁄92 ("§ 3º Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma prevista nos arts. 148 a 182 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares."), por isso que se infere excluída da abrangência da lei os crimes de responsabilidade imputáveis aos agentes políticos.

O Decreto-lei n.º 201⁄67, disciplina os crimes de responsabilidade dos a dos agentes políticos (prefeitos e vereadores), punindo-a com rigor maior do que o da lei de improbidade. Na concepção axiológica, os crimes de responsabilidade abarcam os crimes e as infrações político-administrativas com sanções penais, deixando, apenas, ao desabrigo de sua regulação, os ilícitos civis, cuja transgressão implicam sanção pecuniária.

Conclusivamente, os fatos tipificadores dos atos de improbidade administrativa não podem ser imputados aos agentes políticos, salvo através da propositura da correspectiva ação por crime de responsabilidade.

O realce político-institucional do thema iudicandum  sobressai das conseqüências das sanções inerentes aos atos ditos ímprobos, tais como a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos.

As sanções da ação por improbidade  podem ser mais graves que as sanções criminais tout court , mercê  do gravame para o equilíbrio jurídico-institucional, o que lhe empresta notável colorido de  infração penal que distingue os atos ilícitos civis dos atos ilícitos criminais.

Resta inegável que, no atinente aos agentes políticos, os delitos de improbidade encerram crimes de responsabilidade e, em assim sendo, revela importância prática a indicação da autoridade potencialmente apenável e da autoridade aplicadora da pena.

A ausência de uma correta exegese das regras de apuração da improbidade pode conduzir a situações ilógicas, como aquela  retratada na Reclamação 2138, de relatoria do Ministro Nelson Jobim, que por seu turno, calcou-se na Reclamação 591, assim sintetizada: "A ação de improbidade tende a impor sanções gravíssimas:perda do cargo e inabilitação, para o exercício de unção pública, por prazo

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que pode chegar a dez anos. Ora, se um magistrado houver de responder pela prática da mais insignificante das contravenções, a que não seja cominada pena maior que multa, assegura-se-lhe foro próprio, por prerrogativa de função. Será julgado pelo Tribunal de Justiça, por este Tribunal Supremo. Entretanto a admitir a tese que  que ora rejeito, um juiz de primeiro grau poderá destituir do cargo um Ministro do STF e impor-lhe pena de inabilitação para outra função por até dez anos. Vê-se que se está diante de solução que é incompatível como o sistema."

A eficácia jurídica da solução da  demanda de improbidade faz sobrepor-se a essência  sobre o rótulo, e contribui para emergir a questão de fundo sobre a questão da forma.

Consoante assentou o Ministro Humberto Gomes de Barros na Rcl 591: "a ação tem como origem atos de improbidade que geram responsabilidade de natureza civil, qual seja aquela de ressarcir o erário, relativo à indisponibilidade de bens. No entanto, a sanção traduzida na suspensão dos direitos políticos tem natureza, evidentemente, punitiva. É uma sanção, como aquela da perda de função pública, que transcende a seara do direito civil A circunstância de a lei denominá-la civil em nada impressiona. Em verdade, no nosso ordenamento jurídico jurídico, não existe qualquer separação estanque entre as leis civis e as leis penais."

A doutrina, à luz do sistema, conduz à inexorável conclusão de que os agentes políticos, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade, não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da lei de improbidade. O fundamento é a prerrogativa pro populo e não privilégio no dizer de Hely Lopes Meirelles, verbis:

"Os agentes políticos exercem funções governamentais, judiciais e quase-judiciais, elaborando normas legais, conduzindo os negócios públicos, decidindo e atuando com independência nos assuntos de sua competência. São as autoridades públicas supremas do Governo e da Administração, na área de sua atuação, pois não são hierarquizadas, sujeitando-se apenas aos graus e limites constitucionais e legais da jurisdição. Em doutrina, os agentes políticos têm plena liberdade funcional, equiparrável à independência dos juízes nos seus julgamentos, e, para tanto, ficam a salvo de responsabilização civil por seus eventuais erros de atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má-fé ou abuso de poder. (...)

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Realmente, a situação dos que governam e decidem é bem diversa da dos que simplesmente administram e executam encargos técnicos e profissionais, sem responsabilidade de decisão e opções políticas. Daí por que os agentes políticos precisam de ampla liberdade funcional e maior resguardo para o desempenho de suas funções. As prerrogativas que se concedem aos agentes políticos não são privilégios pessoais; são garantias necessárias ao pleno exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias. Sem essas prerrogativas funcionais os agentes políticos ficariam tolhidos na sua liberdade de opção e decisão ante o temor de responsabilização pelos padrões comuns da culpa civil e do erro técnico a que ficam sujeitos os funcionários profissionalizados (cit. p. 77)" (Direito Administrativo Brasileiro, 27ª ed., p. 76).

Aplicar-se a Lei de Improbidade, cegamente, pode conduzir à situações insustentáveis enunciadas pelo voto preliminar do Ministro Jobim, assim descritos:

a) o afastamento cautelar do Presidente da República (art. 20, par. único. da Lei 8.429⁄92) mediante iniciativa de membro do Ministério Público, a despeito das normas constitucionais que fazem o próprio processo penal a ser movido perante esta Corte depender da autorização por dois terços da Câmara dos Deputados (CF, art. 102, I, b, c;c o art. 86, caput); ou ainda o seu afastamento definitivo, se transitar em julgado a sentença de primeiro grau na ação de improbidade que venha a determinar a cassação de seus direitos políticos e a perda do cargo:b) o afastamento cautelar ou definitivo do presidente do Congresso Nacional e do presidente da Câmara dos Deputados nas mesma condições do item anterior, a despeito de o texto constitucional assegurar-lhes ampla imunidade material, foro por prerrogativa de função em matéria criminal perante o STF (CF, art. 102, I, b) e regime próprio de responsabilidade parlamentar (CF, art. 55, II);c) o afastamento cautelar ou definitivo do presidente do STF, de qualquer de seus membros ou de membros de qualquer Corte Superior, em razão de decisão de juiz de primeiro grau;d) o afastamento cautelar ou definitivo de Ministro de Estado, dos Comandantes das Forças Armadas, de Governador de Estado, nas mesmas condições dos itens anteriores;e) o afastamento cautelar ou definitivo do procurador-geral em razão de ação de improbidade movida por membro do Ministério Público e recebida pelo juiz de primeiro grau nas condições dos itens anteriores" 

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Politicamente, a Constituição Federal inadmite o concurso de regimes de responsabilidade dos agentes políticos pela Lei de Improbidade e pela norma definidora dos Crimes de Responsabilidade, posto  inaceitável bis in idem.

A submissão dos agentes políticos ao regime jurídico dos crimes de responsabilidade, até mesmo por suas severas punições, torna inequívoca a total ausência de uma suposta "impunidade" deletéria ao Estado Democrático de Direito”.

Posteriormente, no julgamento do Resp 764.836/SP, em 19 de

fevereiro de 2008, a Primeira Turma, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel.

para acórdão Ministro Francisco Falcão, novamente, enfrentou esse tema, e,

por maioria, orientou-se pela sujeição dos Prefeitos à responsabilidade da

Lei nº 8.245/1992, conforme se lê da seguinte ementa:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO. COMPETÊNCIA. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 7/STJ.I - Ex-prefeito não se enquadra dentre aquelas autoridades que estão submetidas à Lei nº 1.070/1950, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade, podendo responder por seus atos na via da ação civil pública de improbidade administrativa.II - O STF, ao julgar a ADIN 2797, declarou a inconstitucionalidade dos parágrafos 1º e 2º do artigo 84 do CPP, acrescidos por força da Lei nº 10.628/02, remanescendo patente a inexistência de foro privilegiado na hipótese.III - Acerca da existência de improbidade administrativa, verifica-se que a irresignação do recorrente, forte na afirmação de que não configurada atitude ímproba, ou mesmo que seria desproporcional a condenação, impõe o reexame do conjunto probatório, o que é insusceptível no âmbito do recurso especial.Incide na espécie o teor da súmula 7/STJ.IV - Sendo indicadas diversas matérias constantes de dispositivos infraconstitucionais, a não apreciação destas pelo Tribunal a quo atrai o comando da súmula 282 do STF.V - Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte improvido”.

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Na oportunidade, o Relator, Min. José Delgado, suscitara, em

preliminar, não ser aplicável aos Prefeitos das sanções previstas na Lei nº

8.429/92, verbis:

“O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação n. 2.138, decidiu, por maioria de votos, que os agentes políticos, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade, não respondem por improbidade administrativa com base na Lei 8.429⁄92, mas apenas por crime de responsabilidade.

 O referido julgamento foi concluído em data de 13.06.2007. O Pleno do STF, por maioria, julgou procedente a reclamação, vencidos os Senhores Ministros Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Celso de Mello, Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence. O Informativo n. 471 do STF noticia o resultado do julgamento da forma seguinte: Quanto ao mérito, o Tribunal, por maioria, julgou procedente a reclamação para assentar a competência do STF para julgar o feito e declarar extinto o processo em curso neste juízo reclamado. Após fazer distinção entre os regime de responsabilidade político-administrativa previstos na CF, quais sejam, o do art. 37, § 4º, regulado pela Lei 8.429⁄92, e o regime de crime de responsabilidade fixado no art. 102, I, c, da CF e disciplinado pela Lei 1.079⁄50, entendeu-se que os agentes políticos, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade, não respondem por improbidade administrativa com base na Lei 8.429⁄92, mas apenas por crime de responsabilidade em ação que somente pode ser proposta perante o STF nos termos do art. 102, I, CF. Vencidos, quanto ao mérito, por julgarem improcedente a reclamação, os Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio, Celso de Mello, estes acompanhando o primeiro, Sepúlveda Pertence, que se reportava ao voto que proferira na ADI 2.797⁄DF (DJU de 19.12.2006), e Joaquim Barbosa. O Min. Carlos Velloso, tecendo considerações sobre a necessidade de preservar-se a observância do princípio da moralidade, e afirmando que os agentes políticos respondem pelos crimes de responsabilidade tipificados nas respectivas leis especiais (CF, art. 85, parágrafo único), mas, em relação ao que não estivesse tipificado como crime de responsabilidade, e estivesse definido como ato de improbidade,

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deveriam responder na forma da lei própria, isto é, a Lei 8.429⁄92, aplicável a qualquer agente público, concluiu que, na hipótese dos autos, as tipificações da Lei 8.429⁄92, invocada na ação civil pública, não se enquadravam como crime de responsabilidade definido na Lei 1.079⁄50 e que a competência para julgar a ação seria do juízo federal de 1º grau.  É de se ressaltar que o entendimento do STF, por maioria, seguiu linha adotada no parecer apresentado, na mesma causa, pelo Ministério Público Federal, da lavra do então Vice-Procurador Geral Dr. Haroldo Ferraz da Nóbrega, nos termos seguintes: O ponto central da presente demanda reside na impossibilidade de se processar o Ministro de Estado com fundamento na aludida lei de improbidade - Lei nº 8.429⁄92. Nos parece correta a tese de que, diante dos termos do art. 102, I, c, da Carta da República, compete ao Supremo Tribunal Federal, processar e julgar, nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os ministros de Estado. Configura-se, pois, usurpação da competência dessa Excelsa Corte julgar Ministro de Estado por improbidade   administrativa, quando o correto seria processá-lo e julgá-lo por crime de responsabilidade.Como bem assinalou a ora reclamante OS AGENTES POLÍTICOS, POR ESTAREM REGIDOS POR NORMAS ESPECIAIS DE RESPONSABILIDADE, NÃO SE SUJEITAM AO MODELO DE COMPETÊNCIA PREVISTO DO REGIME COMUM DA LEI DE IMPROBIDADE. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL, NA VERDADE, DISTINGUE O REGIME DE RESPONSABILIDADE DOS AGENTES POLÍTICOS DOS DEMAIS AGENTES PÚBLICOS.Como se sabe, a doutrina de direito administrativo brasileiro, capiteneada pelo saudoso HELY LOPES MEIRELLES, diferencia de forma nítida os agentes políticos dos agentes públicos em geral. Nos ensina o citado mestre que os agentes políticos   exercem funções relevantes de supremacia, decidindo e atuando com independência nos assuntos de sua competência. Assinala que os agentes políticos são dotados de plena liberdade funcional e, para tanto, ficam a salvo de responsabilização civil por seus eventuais erros de atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má-fé ou abuso de poder. Tais prerrogativas são outorgadas com o único objetivo de garantir o livre exercício da função política que lhes é incumbida, não se confundindo com privilégios pessoais. Com efeito, são garantias necessárias ao pleno exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias.

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EXATAMENTE POR ESSA CARACTERÍSTICA PECULIAR, NÃO PARECE HAVER DÚVIDA   DE   QUE ESSES AGENTES POLÍTICOS SÃO REGIDOS POR ESTATUTOS PRÓPRIOS, DIFERENTES DOS DEMAIS SERVIDORES PÚBLICOS. ASSIM SENDO, A CARTA DA REPÚBLICA DEFINE QUE TAIS AGENTES POLÍTICOS ESTÃO SUBMETIDOS A UM REGIME ESPECIAL DE RESPONSABILIDADE, COMO OCORRE COM OS MINISTROS DE ESTADO.OBSERVE-SE, A PROPÓSITO, QUE EM DIVERSAS SITUAÇÕES   ENVOLVENDO AGENTES POLÍTICOS, A CONSTITUIÇÃO FEDERAL   ESTABELECE PARÂMETROS PRÓPRIOS PARA INSTAURAÇÃO DE   PROCESSOS E RESPONSABILIZAÇÃO DAS AUTORIDADES INVESTIDAS DESTE MUNUS.(...)Daí porque nos parecer correto o entendimento de que não se   pode   processar   o   agente   político   com   base exclusivamente na Lei nº 8.429⁄92. O regime de crime de responsabilidade fixado no art. 102, I, c da Carta Magna e disciplinado pela Lei n. 1.079, de 1950 é que se dessume coerente com o nosso sistema constitucional.Com efeito, os atos de improbidade, enquanto crimes de responsabilidade, estão amplamente contemplados no Capítulo V da Lei 1.079, de 10.04.1950 - instituto que regula os crimes de responsabilidade (Dos crimes contra a probidade na administração - art. 9º). Observe-se que a pena imposta, a exemplo daquela prevista na lei de improbidade, é extremamente severa: perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública pelo prazo de até cinco anos (art. 2º). Por outro lado, consoante disposto no art. 3º da L. 1079⁄1950, a imposição da penalidade não exclui o processo e julgamento do acusado por crime comum.DENOTA-SE, PORTANTO, QUE A LEI DOS CRIMES DE RESPONSABILIDADE, TAIS COMO OS ILÍCITOS ARROLADOS NA LEI   8.429⁄92, SÃO DELITOS POLÍTICO- ADMINISTRATIVOS. NÃO SE MOSTRA   PLAUSÍVEL, PORTANTO, A INCIDÊNCIA DE AMBOS OS DIPLOMAS LEGAIS SOBRE UM MESMO AGENTE. NÃO SE PODE DESPREZAR O ESPECIAL SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO DO AGENTE POLÍTICO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO.LOGO, PODE-SE CONCLUIR QUE AOS AGENTES POLÍTICOS, COMO   OS MINISTROS DE ESTADO, POR ESTAREM SUBMETIDOS A UM REGIME     ESPECIAL DE RESPONSABILIDADE, NÃO SE APLICAM AS REGRAS COMUNS DA LEI DE IMPROBIDADE. ASSIM SENDO,

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CONFIGURA-SE A PLENA E EXCLUSIVA COMPETÊNCIA DESSE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR OS DELITOS POLÍTICO-ADMINISTRATIVOS, NA HIPÓTESE DO ART. 102, I, C, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.Como bem ressaltado por V. Exª. ao deferir a medida cautelar 'não se cuida de assegurar ao agente político um regime de imunidade em face dos atos de improbidade. O agente político há de responder pelos delitos de responsabilidade perante os órgãos competentes para  processá-lo e julgá-lo. Também não impressiona, nesta fase inicial de análise, a consideração segundo a qual a ação de improbidade seria dotada de caráter reparatório. A simples possibilidade de superposição ou concorrência de regimes de responsabilidade e, por conseguinte, de possíveis decisões colidentes exige uma clara definição na espécie. Os conflitos entre poderes e desinteligências institucionais decorrentes dessa indefinição de competência também parecem recomendar um preciso esclarecimento da matéria.' (fls. 291).Na linha do que foi exposto, vale colacionar recente artigo do eminente advogado e ex-Procurador-Geral da República, ARISTIDES JUNQUEIRA ALVARENGA, publicado no Caderno Direito & Justiça, do Jornal Correio Braziliense do dia 30.09.2002:'Ato de improbidade administrativa: crime de responsabilidade Já deixei expresso, alhures (Reflexões sobre Improbidade Administrativa no Direito Brasileiro, in Improbidade Administrativa - Questões Polêmicas e Atuais, Coordenadores: Cassio Scarpinella Bueno e Pedro Paulo de Rezende Porto Filho, São Paulo, Malheiros Editores, 2001, p. 86 e seguintes), que pode-se conceituar improbidade administrativa como espécie do gênero imoralidade administrativa, qualificada pela desonestidade de conduta do agente público, mediante a qual este se enriquece ilicitamente, obtém vantagem indevida, para si ou para outrem, ou causa dano ao erário.Firmado esse conceito, além da sanção de suspensão dos direitos políticos, prevista nos artigos 15, V, e 37, 4º, da Constituição Federal, a perda da função pública, também prevista no mesmo parágrafo do artigo 37, é de imposição cogente, já que não há lugar para ímprobo na administração pública, esteja ele exercendo função pública inerente a cargo efetivo, comissionado ou eletivo.Por isso, se a perda da função pública for considerada sanção desproporcional à conduta do agente público descrita na Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992, certamente não se estará diante de improbidade administrativa, ainda que daquela conduta redunde dano ao erário ou ao patrimônio público em geral. Que se use, então, outra via processual, como a ação popular ou a ação civil pública em defesa do patrimônio público, mas jamais a ação ordinária prevista na Lei de Improbidade Administrativa, evitando, assim, sua banalização.

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Mas não são, apenas, os artigos 15, V, e 37, 4º, no texto da Constituição da República, a prever atos de improbidade administrativa com a conseqüente sanção de perda da função pública, inerente a exercício de cargo público.Com efeito, o artigo 85, V, do texto constitucional, presente, repetindo textos anteriores, diz ser crime de responsabilidade do presidente da República os atos que atentem contra a probidade da administração, ou seja, os atos de improbidade administrativa, que serão definidos  em lei especial.Essa é a Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950, recepcionada pela atual Constituição da República, cujo artigo 9º define os atos de improbidade, mediante definições perigosamente abertas, tal como as dos artigos 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429⁄92. Ora, se os atos de improbidade administrativa do presidente da República são crimes de responsabilidade, a fortiori, as condutas funcionais de improbidade administrativa, definidas na Lei nº 8.429⁄92, têm a mesma natureza jurídica, ou seja, são crimes de responsabilidade, pois, se assim é quanto ao presidente da República, nada se justifica que sua natureza se transmude em razão, apenas, da diferença da função pública exercida pelo agente público. Se assim não for, cair-se-á no ilogismo de se admitir que uma circunstância meramente acidental é capaz de mudar a essência das coisas.Porque ato de improbidade administrativa é, na sua essência, crime de responsabilidade (também denominado, quiçá com maior propriedade, de infração político-administrativa), praticável não só pelo presidente da República, mas por todo e qualquer agente público, a Lei nº 1.079⁄50 estendeu sua aplicação aos ministros de Estado (art. 13), aos ministros do Supremo Tribunal Federal (art. 39), ao procurador-geral da República (art. 40), aos governadores e secretários dos estados-membros (art. 74), fazendo questão de repetir, relativamente a cada um deles, que o procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo atenta contra a probidade da Administração e é crime de responsabilidade.Por se tratar de crime de responsabilidade, o processo e julgamento dos agentes públicos, sejam ou não agentes políticos, aos quais se imputa a autoria de ato de improbidade administrativa, hão de obedecer às regras de competência constitucionalmente  fixadas.Assim, pelos atos de improbidade que praticar, porque constitutivos de crime de responsabilidade, o presidente da República há de ser processado e julgado pelo Senado Federal, mediante prévia licença da Câmara dos Deputados, nos termos do artigo 86 da Constituição Federal; os ministros de Estado e os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, quando não se tratar de crime de responsabilidade conexo com o do presidente da República, os

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ministros do próprio Supremo Tribunal Federal, os membros dos Tribunais Superiores, os ministros do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente serão processados e julgados, originariamente, pelo Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, c, da Constituição Federal); os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os juízes dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os membros do Ministério Público da União que oficiem perante Tribunais, quando a eles imputada a prática de ato de improbidade, ou seja, a prática de crime de responsabilidade, deverão eles ser processados e julgados, originariamente, pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, a, da Constituição Federal); os governadores dos estados e do Distrito Federal, pela Assembléia Legislativa, nos trilhos da Lei nº 1.079⁄50, com a devida adequação ao texto constitucional vigente; os prefeitos e vereadores, pela Câmara Municipal, segundo regras estampadas nos artigos 4º e 7º, respectivamente, do Decreto-lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967.Obviamente, os agentes públicos que não têm foro por prerrogativa de função constitucionalmente  fixado, serão processados e julgados por juiz de primeiro grau de jurisdição. Pode não ser o desejável por muitos, que desconfiam da eficácia sancionatória, quando se trata de foro por prerrogativa de função, mas legem habemus e urge cumprir a lei que nos rege, principalmente quando essa lei é a Constituição da República Federativa do Brasil. Seu descumprimento torna inviável o Estado de Direito democrático.'Por fim, cabe ressaltar a impropriedade dos efeitos da sentença proferida em primeira instância que, além de ter decretado a suspensão dos direitos políticos de Ministro de Estado pelo prazo de 08 anos e a perda da função pública, condenou-o, ainda, a perda do cargo efetivo de Ministro de 1ª Classe do Ministério das Relações Exteriores, por fatos ligados ao exercício de sua função ministerial.Ante o exposto, opina o Ministério Público Federal pela procedência da presente reclamação para que a Ação de Improbidade Administrativa nº 1999.34.00.016727-9, em curso na 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal seja extinta sem o julgamento do mérito, ou sucessivamente, seja avocado o conhecimento do processo à essa Excelsa Corte e cassada a v. sentença prolatada.” (grifamos).  Esta Primeira Turma, ao apreciar o REsp. n. 456.649, relatado pelo Min. Luiz Fux, seguiu, por maioria, o mesmo entendimento do Supremo Tribunal Federal. Foi vencido, na ocasião, apenas, o Min. Francisco Falcão.

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Neste julgamento, o Min. Luiz Fux proferiu o seguinte voto:

“Sr. Presidente, considero-me habilitado a votar, máxime porque restei vencido na própria Corte Especial em relação a esta questão. A Reclamação nº 591⁄SP, da relatoria do Sr. Ministro Nilson Naves, deixou patente que há uma distinção entre crimes de prefeito (Decreto-Lei nº 201⁄67) e atos de improbidade. A própria Lei de Improbidade, em várias passagens, denota que aquela lei é aplicável aos prefeitos, porque tem peculiaridades e sanções que só são aplicáveis aos prefeitos, não obstante possa haver uma categorização também no Decreto-Lei nº 201⁄67 de que um dos crimes de prefeito é praticar a improbidade, o que não significa dizer que não seja aplicada a Lei nº 8.429⁄92, tanto mais que uma é penal stricto sensu e a outra tem natureza civil, penal e administrativa. Fiquei vencido nesse ponto de vista. Muito embora tenha me seduzido com o acórdão vitorioso à época do Supremo Tribunal Federal, depois verificou-se em amplos debates na Corte Especial que aquela decisão era uma decisão adotada com uma composição muito diversa daquela que hoje tem o Supremo Tribunal Federal como a voz suprema dos nossos Tribunais: dizer qual é a orientação a se seguir neste caso, porque aquele era um caso isolado, se não me engano, de um ministro, e a decisão foi muito dividida. Muito embora tenha até me afinado por um voto com aquela tese, pertenço a um Tribunal de jurisprudência e restei vencido. Verifico que, recentemente, as Turmas de Direito Penal têm decidido o seguinte: "O prefeito municipal, a teor do disposto no artigo 29, inciso X, da  Constituição Federal, de fato, na qualidade de chefe do Poder Executivo local, possui prerrogativa de foro, caso venha a ser processado pela prática de crime comum. Nessa hipótese, conforme redação da norma constitucional, será, de regra, julgado pelo Tribunal de Justiça." Agora, é claro que, se está neste Tribunal, a causa não foi processada por crime comum, e, sim, por improbidade desse prefeito, certamente. Então, continua a jurisprudência atual, a qual tenho que me curvar por pertencer a um Tribunal de jurisprudência. "Verificada a hipótese em que os fatos apurados por Promotor de Justiça e que, posteriormente, vieram a dar ensejo ao ajuizamento de ação civil pública não tratavam, ainda que de forma indireta, de

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matéria criminal, nulidade não decorre, portanto, da atuação do referido membro do Parquet." Essa decisão é de abril de 2007, da Seção Criminal. De sorte que não tenho como não me curvar a essa posição, e é de somenos importância qualquer tipo de ressalva que fazia, tanto mais que neste recurso especial admiti embargos de declaração de argumentos expendidos a título de obiter dictum. Por quê? Porque o que discutimos não era ato de improbidade. Eu, de ofício, é que suscitei essa questão preliminar.Assim, Sr. Presidente, sinto-me habilitado a votar e acompanho o voto do Sr. Ministro Francisco Falcão, preliminarmente. Conheço parcialmente do recurso especial e, nessa parte, nego-lhe provimento”.

Como se pode ver, a questão é complexa e graves são as

consequências da sujeição dos agentes políticos à Lei nº 8.429/92, tanto que

o Min. Joaquim Barbosa, no voto em que proferiu na Reclamação nº 2.138,

convergiu, em parte, com o voto Min. Nelson Jobim, Relator, quanto à

aplicação da sanção de perda do cargo prevista na lei: “...há um ponto em que

o meu entendimento converge parcialmente com o do eminente relator. É que, a meu

sentir, não cabe a juiz de primeira instância decretar, muito menos em ação de

improbidade, a perda do cargo político, do cargo de ministro de Estado, por ser esta

uma modalidade de punição que é típica do elenco de mecanismos de controle e

aferição da responsabilidade política no sistema presidencial. Trata-se como já

adiantei, de elemento característico de checks-and-balances tal como magistralmente

concebido na Convenção de Filadélfia, onde pela primeira vez se institucionalizou o

sistema de governo sob o qual vivemos há mais de um século. Explicito o meu voto

neste ponto. O juiz de primeiro grau pode, sim, conduzir ação de improbidade contra

autoridades detentoras de prerrogativa de foro. Em conseqüência, poderá aplicar

todas as sanções previstas na lei 8.429/1992, salvo uma: não poderá decretar a perda

do cargo político, do cargo estruturante à organização do Estado, pois isto

configuraria um fator de desestabilização político-institucional para a qual a lei de

improbidade administrativa não é vocacionada”.

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A harmonização de todas as questões envolvidas nesta

matéria autoriza a aplicação da Lei nº 8.429/92 aos Prefeitos que tenham

participado da prática de atos de improbidade no exercício da função

administrativa. Excluem-se, assim, atos de improbidade no exercício da

função de governo ou política. Segundo Hely Lopes Meirelles, “claro está que

o prefeito não realiza pessoalmente todas as funções do cargo, executando aquelas

que lhe são privativas e indelegáveis e transpassando as demais aos seus auxiliares e

técnicos da Prefeitura (secretários municipais, diretores de departamentos, chefes de

serviços e outros subordinados)”1. Não se confundem as atividades que são de

sua responsabilidade direta, porque requerem a sua execução pessoal, das

atividades que são de sua responsabilidade indireta, uma vez que lhe cabe

apenas a direção ou supervisão hierárquica2. Daí que da qualidade de Chefe

do Poder Executivo não decorre, por si só, sua responsabilidade por todos

os atos de improbidade administrativa praticados por terceiros, agentes

públicos ou não, na sua gestão, sendo indispensável que tenha concorrido

por ação ou omissão. A responsabilidade do Prefeito por ato de improbidade

administrativa é distinta não só da responsabilidade político-administrativa

perante a Câmara de Vereadores, disciplinada pelo Decreto-lei nº 201/67

(art. 4º), bem como da responsabilidade administrativa perante o Tribunal de

Contas pela “fiel execução do mandato de gestão administrativa”3, o qual, quando

da emissão de parecer prévio conclusivo sobre as contas anuais que deve

prestar à Câmara Municipal (art. 31, § 1º, e 71, inciso VIII, da Constituição

da República e art. 49, § 2º, da Lei nº 11.424, de 06 de janeiro de 2000),

pode aplicar-lhe sanção pecuniária em caso de irregularidades ou

ilegalidades. A ação de improbidade administrativa é instrumento para

aplicação de sanções ao agente que praticou ato ímprobo, punindo-o com

1 Direito Municipal Brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 534/5.2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1985, p. 534/5.3 MARTINS-COSTA, Judith. A responsabilidade dos prefeitos na gestão da coisa pública.Revista da Procuradoria-Geral do Município de Porto Alegre. Porto Alegre. v. 7, n. 8, p. 1-114, março de 1995, p. 51.

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sanções que, conquanto não possuam caráter penal, invadem a esfera

pessoal, sujeitando o agente, a par da perda do cargo público, a suspensão

dos direitos políticos. Há de alcançar, assim, apenas a conduta ímproba

própria na prática de atos de administração e de uso de recursos públicos.

Na espécie, a petição inicial imputa a Prefeito a prática de atos

de improbidade na gestão administrativa (assunção de obrigações, cujas

despesas não poderiam ser pagas no mesmo exercício financeiro e a

inscrição de restos a pagar sem a correspondente disponibilidade de caixa,

nos dois últimos quadrimestres de seu mandato). Por isso, incide a Lei nº

8.429/92.

4. Recebimento da petição inicial. A petição inicial imputa ao

Agravante, na qualidade de Prefeito, a prática de 17 atos de improbidade

administrativa por violação ao art. 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal4,

que pretende evitar que o titular de Poder, ao se avizinhar o término do seu

mandato, contraia obrigações sem que haja recursos para honrá-las. No

caso, o Agravante informou, nas razões, que era, ainda, candidato à

reeleição.

As dívidas contraídas, nos dois últimos quadrimestres de 2008

do mandato, ciente da insuficiência da disponibilidade de caixa, as quais

foram, ao final do exercício, inscritas em restos a pagar (fl. 31-verso), são as

seguintes:

4 Art. 42. É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.

Parágrafo único. Na determinação da disponibilidade de caixa serão considerados os encargos e despesas compromissadas a pagar até o final do exercício.

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1- contratação, em maio de 2008, da Associação Rádio

Comunitária Feitora FM para veiculação de propaganda no espaço semanal

denominado “Uma Nova Cidade”, no valor de R$ 15.000,00, cujo saldo

inscrito foi de R$ 3.750,00;

2- contratação, em junho de 2008, da empresa K2 Engenharia

Ltda. para elaboração de projeto arquitetônico referente à instalação de

setores administrativos, no valor de R$13.619,20, cujo saldo inscrito foi de

R$ 6.605,311;

3- locação, em maio de 2008, pelo período de seis meses, de

cinco computadores da sociedade empresarial Callao – Comércio e Serviços

de Informática Ltda. para o Departamento de Desenvolvimento de Recursos

Humanos, no valor de R$ 5.820,00, cujo saldo inscrito foi de R$ 1.940,00;

4- contratação, em junho de 2008, da empresa Callao –

Comércio e Serviços de Informática Ltda. para prestação continuada do

serviço de manutenção de computadores da Prefeitura, no valor de R$

8.700,00 por mês, cujo saldo inscrito foi de R$ 9.575,00;

5- contratação, em junho de 2008, da empresa individual

Marco Henrique Abreu Me. para prestação do serviço de manutenção de

linhas telefônicas, pelo período de 12 meses, no valor de R$ 146.098,65,

cujo saldo inscrito foi de R$ 21.781,85;

6- contratação, em dezembro de 2008, da empresa

Concresinos Indústria de Artefatos de Cimento Ltda. para prestação de

serviço de motoniveladora, no valor de R$ 7.800,00, cujo saldo inscrito foi de

R$ 7.671,30;

7- aquisição, em julho de 2008, da empresa Brufa Indústria e

Comércio de Móveis Escolares Ltda. de móveis escolares, no valor de R$

37.660,00, cujo saldo inscrito foi de R$20.700,00;

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8- aquisição, em julho de 2008, da empresa Tubularte Móveis

Ltda. de móveis escolares, no valor de R$ 22.229,92, cujo saldo inscrito foi

de R$11.229,92;

9- aquisição, em julho de 2008, da empresa Escritórius Móveis

e Equipamentos Ltda. de móveis escolares, no valor de R$ 27.800,00, cujo

saldo inscrito foi de R$ 13.900,00;

10- contratação, em setembro de 2008, da empresa Soliel

Instaladora Elétrica Ltda. para execução de obra na subestação na EMEF

Castro Alves, no valor de R$ 39.769,46, cujo saldo inscrito foi de R$

39.769,46;

11- locação, em outubro de 2008, da Associação Antônio

Vieira - UNISINOS de uma pista atlética e de duas quadras para a realização

de jogos escolares, no valor de R$ 10.120,00, cujo saldo inscrito foi de R$

10.120,00;

12- locação, em novembro de 2008, da empresa Cosmos

Promoções Ltda. de aparelhos de som para a Semana da Educação

Municipal, no valor de R$ 5.800,00, que não foi pago;

13- contratação, em setembro de 2008, da empresa Canadá

Engenharia Ltda. para execução das obras de construção de rampa de

concreto armado para acesso à Praça de Brinquedos na EMEF Maria Emilia

de Paula e de reforma na EMEI Vitória Régia, no valor de R$ 100.251,17,

cujo saldo inscrito foi de R$ 94.157,80;

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14- aquisição, em novembro de 2008, da empresa Comércio

de Computadores Ltda. de oito computadores, no valor de R$ 13.290,00,

que não foi pago;

15- aquisição, em novembro de 2008, da empresa Comércio

de Computadores Ltda. de aparelhos de ar-condicionado modelo split e

contratação para a sua instalação, no valor de R$ 35.980,00, que não foi

pago;

16- contratação, em dezembro de 2008, da empresa Brites &

Machry Empreiteira de Construções Ltda. para instalação de gradil e portão

de ferro no acesso à EMEI Girassol, no valor de R$ 8.209,13, que não foi

pago e

17- contratação, em dezembro de 2008, da empresa Canadá

Engenharia Ltda. para execução de reforma na EMEF Maria Edila Schmidt,

no valor de R$ 148.560,10, cujo saldo inscrito foi de R$ 118.725,52.

As condutas descritas constituem ilegalidades. Trata-se de

violação ao art. 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal, aliás, tipificada como

crime na Lei nº 10.028, de 19 de outubro de 2000. São aptas, portanto, a

configurar, em tese, também, ato de improbidade administrativa do artigo 10,

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inciso IX, da Lei n.º 8.429/92, o qual não exige a prova do dolo 5, e do art. 11

do aludido diploma legal.

A propósito do ato de improbidade em apreço, o Superior

Tribunal de Justiça, no julgamento do AgRg no Ag 1282854/SP, Rel. Ministro

MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em

15/03/2011, DJe 22/03/2011, já decidiu que “É de se entender, portanto,

configurado o dolo (ainda que eventual), manifesto na vontade livre e consciente

de contrair despesas em nome do município nos dois últimos quadrimestres de

seu mandato que não podiam ser cumpridas integralmente dentro dele e que

tinham parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que houvesse suficiente

disposição de caixa para este efeito, atentando contra o princípio da legalidade e

moralidade.”

As alegações de que todas as despesas foram requeridas e

autorizadas pelos Secretários, não houve culpa, tampouco dano ao erário

não são suficientes para a rejeição da ação, porque dependem de prova a

ser produzida no curso do processo.

5 Nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, de que é exemplo o julgamento do AgRg no Ag 1365386/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/03/2011, DJe 25/04/2011, verbis:“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. ART. 10 DA LEI 8.429/1992. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO OU CULPA. RESSARCIMENTO.APLICAÇÃO RAZOÁVEL DA SANÇÃO.1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.2. Hipótese em que a Corte de origem consignou que o agravante agiu de forma negligente no exercício de sua função como Presidente da Câmara de Vereadores, por autorizar a liquidação de despesas irregulares (empenhos emitidos em duplicidade).3. O argumento de que não houve má-fé é irrelevante in casu, porquanto a configuração de ato ímprobo por dano ao Erário pode se dar por culpa, nos termos do art. 10 da Lei 8.429/1992. Precedentes do STJ.4. A condenação ao ressarcimento integral do prejuízo e à multa correspondente ao valor do dano foi devidamente motivada e se encontra dentro dos limites do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa, aplicada segundo a avaliação razoável do Tribunal a quo.5. Agravo Regimental não provido.”

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Por último, registre-se que o Agravante sequer efetuou o

traslado dos documentos juntados no processo, o que obsta aferir se a

petição inicial está instruída com a prova da contratação das despesas sem

disponibilidade de caixa, nos dois últimos quadrimestres do mandato.

Ante o exposto, nego seguimento ao recurso.

Intimem-se.

Porto Alegre, 09 de março de 2012.

Des.ª Maria Isabel de Azevedo SouzaRelatora

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