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Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária ANO XXVII – Nº 323 – MAIO 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Supremo Tribunal Federal – Nº 21/91 Superior Tribunal de Justiça – Nº 19/91 Tribunal Superior do Trabalho – Nº 01/94 Tribunal Regional Federal 1ª Região – Nº 06/92 Tribunal Regional Federal 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0 Tribunal Regional Federal 3ª Região – Nº 21/2010 Tribunal Regional Federal 4ª Região – Nº 07/0042596-9 Tribunal Regional Federal 5ª Região – Nº 09/98 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Valdinéia de Cássia Tessaro de Souza CONSELHO EDITORIAL Arion Sayão Romita, Carlos Henrique Bezerra Leite, Érica Paula Barcha Correia, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Jorge Luiz Souto Maior, José Carlos Arouca, Marcus Orione G. Correia, Maria Garcia, Marisa Ferreira dos Santos, Mauricio Godinho Delgado, Raimar Machado, Sergio Pinto Martins, Wladimir Novaes Filho, Wladimir Novaes Martinez COMITÊ TÉCNICO Enoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Rúbia Zanotelli de Alvarenga, Thereza Christina Nahas COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Ben-Hur Silveira Claus, Flávio Roberto Batista, Jorge Luiz Souto Maior, Marcus Orione, Pablo Biondi, Paulo Sérgio Jakutis, Pollyanna Silva Guimarães, Rafael de Almeida Ribeiro, Ricardo Araujo Cozer ISSN 2179-1643

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Revista SÍNTESETrabalhista e Previdenciária

Ano XXVII – nº 323 – MAIo 2016

ReposItóRIo AutoRIzAdo de JuRIspRudêncIASupremo Tribunal Federal – Nº 21/91

Superior Tribunal de Justiça – Nº 19/91Tribunal Superior do Trabalho – Nº 01/94

Tribunal Regional Federal 1ª Região – Nº 06/92Tribunal Regional Federal 2ª Região – Nº 1999.02.01.057040-0

Tribunal Regional Federal 3ª Região – Nº 21/2010Tribunal Regional Federal 4ª Região – Nº 07/0042596-9

Tribunal Regional Federal 5ª Região – Nº 09/98

dIRetoR eXecutIVo

Elton José Donato

GeRente edItoRIAl e de consultoRIA

Eliane Beltramini

cooRdenAdoR edItoRIAl

Cristiano Basaglia

edItoRA

Valdinéia de Cássia Tessaro de Souza

conselho edItoRIAl

Arion Sayão Romita, Carlos Henrique Bezerra Leite, Érica Paula Barcha Correia, Gustavo Filipe Barbosa Garcia, Jorge Luiz Souto Maior, José Carlos Arouca,

Marcus Orione G. Correia, Maria Garcia, Marisa Ferreira dos Santos, Mauricio Godinho Delgado, Raimar Machado, Sergio Pinto Martins,

Wladimir Novaes Filho, Wladimir Novaes Martinez

coMItê técnIco

Enoque Ribeiro dos Santos, Ilse Marcelina Bernardi Lora, Rúbia Zanotelli de Alvarenga, Thereza Christina Nahas

colAboRAdoRes destA edIção

Ben-Hur Silveira Claus, Flávio Roberto Batista, Jorge Luiz Souto Maior, Marcus Orione, Pablo Biondi, Paulo Sérgio Jakutis, Pollyanna Silva Guimarães,

Rafael de Almeida Ribeiro, Ricardo Araujo Cozer

ISSN 2179-1643

1989 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação mensal de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos trabalhistas e previdenciários.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected].

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA SÍNTESE TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA Nota: Continuação da Revista IOB Trabalhista e Previdenciária

v. 1, n. 1, jul. 1989

Publicação periódica Mensal

v. 27, n. 323, Maio 2016

ISSN 2179-1643

1. Direito trabalhista – periódicos – Brasil

CDU: 349.2(81)(05) CDD: 7340

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

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Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

Carta do Editor

Nesta edição da Revista SÍNTESE Trabalhista e Previdenciária esco-lhemos como Assunto Especial o tema “A Execução Trabalhista e o Novo CPC”, com dois artigos publicados pelos Magistrados Ben-Hur Silveira Claus e Paulo Sérgio Jakutis.

Os autores irão analisar a aplicação do diploma processual civil ao direito processual do trabalho no tocante à fase de cumprimento da senten-ça trabalhista.

Já na Parte Geral levamos a você um vasto conteúdo com a publica-ção de Acórdãos na Íntegra, Seções Especiais, Doutrinas, Clipping Jurídico, Tabela de Atualização de Débitos Trabalhistas e Bibliografia Complementar.

Na Seção de Doutrinas publicamos os seguintes artigos: “A Legaliza-ção da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do Di-reito”, dos Mestres Marcus Orione, Jorge Luiz Souto Maior, Flávio Roberto Batista e Pablo Biondi; e “Reflexões acerca da Diferença de Tempo de Ser-viço Como Critério Excludente da Equiparação Salarial”, da Dra. Pollyanna Silva Guimarães.

Por fim, entre as Seções Especiais publicadas destacamos a Seção Especial “Com a Palavra, o Procurador”, com a publicação de um texto do Procurador Federal Dr. Ricardo Araujo Cozer intitulado “Desconstruindo o Princípio da Subordinação Objetiva ou Estrutural”.

Desejamos a você uma excelente leitura!

Eliane BeltraminiGerente Editorial e de Consultoria

Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto EspecialA ExEcução TrAbAlhisTA E o Novo cPc

DouTriNAs

1. O CPC 2015 e o Direito Processual do Trabalho: Reflexões acerca da Aplicação do NCPC ao Processo do TrabalhoBen-Hur Silveira Claus ............................................................................................ 9

2. A Fase de Cumprimento da Sentença no Processo do Trabalho e o Novo CPCPaulo Sérgio Jakutis .............................................................................................. 27

Parte Geral

DouTriNAs

1. A Legalização da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do DireitoMarcus Orione, Jorge Luiz Souto Maior, Flávio Roberto Batista e Pablo Biondi .... 43

2. Reflexões acerca da Diferença de Tempo de Serviço Como Critério Excludente da Equiparação SalarialPollyanna Silva Guimarães ................................................................................... 71

JurisPruDêNciA TrAbAlhisTA

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Superior do Trabalho .............................................................................. 87

2. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região ......................................................... 98

3. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região ..................................................... 103

4. Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região ..................................................... 110

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Trabalhista ............................................................. 124

JurisPruDêNciA PrEviDENciáriA

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ................................................................................... 139

2. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 144

3. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 154

4. Superior Tribunal de Justiça ................................................................................ 162

5. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .............................................................. 168

6. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .............................................................. 172

7. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .............................................................. 179

8. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .............................................................. 182

9. Tribunal Regional Federal da 5ª Região .............................................................. 188

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Previdenciária ........................................................ 192

Seção Especial

com A PAlAvrA, o ProcurADor

1. Desconstruindo o Princípio da Subordinação Objetiva ou EstruturalRicardo Araujo Cozer .................................................................................. 207

PArEcEr JuríDico

1. Cargo em Comissão – Exoneração Ad Nutum – Gestante – Possibilidade – Existência de Estabilidade Somente para Fins de IndenizaçãoRafael de Almeida Ribeiro ........................................................................... 213

Clipping Jurídico ......................................................................................................... 229

Tabelas Práticas .......................................................................................................... 231

Bibliografia Complementar ............................................................................................ 235

Índice Alfabético e Remissivo ....................................................................................... 236

Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

Assunto Especial – Doutrina

A Execução Trabalhista e o Novo CPC

O CPC 2015 e o Direito Processual do Trabalho: Reflexões acerca da Aplicação do NCPC ao Processo do Trabalho

BEn-HuR SILvEIRA CLAuSJuiz do Trabalho, Mestre em Direito.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O direito material conforma o procedimento; 2 O subsistema jurídico tra-balhista brasileiro; 3 A compatibilidade como critério científico à aplicação subsidiária do processo comum; 4 O critério científico da compatibilidade subsiste ao advento do novo CPC; Conclusão; Referências.

Perante novos dispositivos do processo comum, o intérprete ne-cessita fazer uma primeira indagação: se, não havendo incom-patibilidade, permitir-se-ão a celeridade e a simplificação, que sempre foram almejadas. Nada de novos recursos, novas forma-lidades inúteis e atravancadoras.

Valentin Carrion

INtrodução

O presente ensaio tem por finalidade refletir sobre a aplicação do CPC de 2015 ao processo do trabalho. Isso porque o art. 15 do CPC de 2015 prevê que, na ausência de normas que regulem processos trabalhistas, as disposições do novo CPC lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamen-te1. Trata-se de um problema teórico a ser estudado pela ciência processual trabalhista e de um problema prático a ser equacionado pela jurisdição tra-balhista. O tema é complexo. Iniciemos pela investigação da relação onto-lógica que se estabelece entre direito material e procedimento.

1 o dIreIto materIal coNforma o procedImeNto

O sistema jurídico brasileiro compreende os subsistemas jurídicos de-rivados dos distintos ramos do direito material: o subsistema jurídico traba-

1 NCPC: “Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletivamente e subsidiariamente”.

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lhista, o subsistema jurídico tributário, o subsistema jurídico do consumidor, o subsistema jurídico civil, o subsistema jurídico penal, etc. Cada subsistema jurídico conforma o respectivo procedimento com peculiaridades próprias ao direito material correspondente. Isso porque há uma relação ontológica entre o direito material e o respectivo direito processual. Essa relação on-tológica fica mais evidente quando é percebida a natureza instrumental do direito processual: o processo é instrumento à realização do direito material. Diz-se que há uma relação ontológica entre o direito material e o respectivo direito processual porque as normas de procedimento guardam uma origi-nária relação com o direito substancial correspondente, na medida em que as normas de procedimento têm por finalidade a aplicação das normas do direito substancial respectivo.

Depois de assinalar que o procedimento não é pura forma, Mauro Cappelletti registra que sobre o procedimento recai o imenso desafio de nossa época, cabendo-lhe articular rapidez, eficiência, justiça, liberdade individual e igualdade, uma das mais eloquentes formulações acerca da relação ontológica em que se entrelaçam procedimento e direito material2.

Na teoria jurídica, essa genética relação entre direito substancial e procedimento é compreendida como expressão do fenômeno do perten-cimento que se estabelece desde sempre entre objeto (direito material) e método (procedimento). Daí a consideração epistemológica de que direito substancial e procedimento são categorias conceituais que operam em uma espécie de círculo hermenêutico: as respostas procedimentais nos remetem ao direito material a ser concretizado. Em outras palavras: somos recondu-zidos ao direito material quando nos dirigimos às questões procedimentais. A circularidade entre pergunta e resposta vem à teoria jurídica enquanto legado da filosofia hermenêutica de Gadamer: o direito processual somente se deixa compreender no retorno ao direito material em que reconhece sua própria identidade; em uma metáfora, o direito processual mira-se na super-fície do lago do direito material em busca de sua identidade.

No estudo acerca da relação ontológica que se estabelece entre direi-to substancial e procedimento, a teoria jurídica percorreu um rico itinerário hermenêutico cujo inventário não tem espaço neste pequeno ensaio. En-tretanto, parece indispensável lembrar, com Mauro Cappelletti, a peculia-ridade desse fenômeno. Para o jurista italiano, a natureza instrumental do processo o reconduz ao direito substancial a que serve3:

2 Proceso, ideologías e sociedad. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa-América, 1974. p. 90.3 Idem, p. 5-6.

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Al igual de todo instrumento, también ese derecho y esa técnica deben en verdad adecuarse, adaptarse, conformarse lo más estrechamente posible a la naturaleza particular de su objeto y de su fin, o sea a la naturaleza particular del derecho sustancial y a la finalidad de tutelar los institutos de ese derecho.

No direito processual civil brasileiro, uma das lições mais didáticas acerca da relação entre direito substancial e procedimento é recolhida na doutrina de Ada Pellegrini Grinover. A relação originária existente entre direito material e procedimento é identificada pela jurista na instrumenta-lidade do processo que, conquanto autônomo, está conexo à pretensão de direito material e tem como escopo a atuação da norma objetiva e a viabi-lização da tutela do direito violado ou ameaçado. Daí a conclusão de Ada Pellegrini Grinover, no sentido de que “o processo, o procedimento e seus princípios tomam feição distinta, conforme o direito material que se visa a proteger”4.

No âmbito do subsistema jurídico trabalhista, a natureza especial desse ramo do Direito exerce uma influência ainda maior na conformação do vínculo originário que se estabelece entre direito material e procedi-mento. Depois de afirmar que o direito processual do trabalho pretende ser um direito de renovação, Mozart Victor Russomano sublinha o fato de que o procedimento trabalhista “[...] é herança recebida do direito do tra-balho, ao qual o direito processual do trabalho corresponde, como conse-quência histórica”5. Para o jurista, o caráter tutelar do direito material se projeta sobre o procedimento6. Para recuperar a expressão consagrada por Héctor-Hugo Barbagelata7, é dizer: o particularismo do direito material do trabalho se comunica ao procedimento laboral. Na feliz síntese formulada por Wagner D. Giglio acerca do estudo do tema, somos conduzidos à con-sideração superior de que “o caráter tutelar do direito material do trabalho se transmite e vigora também no direito processual do trabalho”8.

Uma das características de qualquer sistema de conhecimento – a lição é de Carlos Eduardo Oliveira Dias – é a sua capacidade de produzir seus próprios princípios. É isso o que distingue determinado sistema “[...] e

4 Processo do trabalho e processo comum. Revista de Direito do Trabalho, 15:87.5 Direito processual do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1977. p. 21-22.6 Idem, p. 43.7 El particularismo del derecho del trabajo y los derechos humanos laborales. 2. ed. Montevideo: Fundación

de Cultura Universitária, 2009. p. 39. 8 Direito processual do trabalho. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 83-4. Para Wagner D. Giglio, a autonomia

do direito processual do trabalho decorre do fato de que esse ramo jurídico possui princípios próprios. O jurista destaca quatro princípios próprios ao direito processual do trabalho: a) princípio protecionista; b) princípio da jurisdição normativa; c) princípio da despersonalização do empregador; d) princípio da simplificação procedimental (p. 83-86).

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permite que se possa identificar nesse sistema alguns dos principais atribu-tos tendentes ao reconhecimento de sua autonomia científica”9. A histórica capacidade com que o direito processual do trabalho tem produzido seus próprios princípios permite afirmar – com Wagner D. Giglio10 – que o sub-sistema jurídico trabalhista é dotado dessa autonomia científica de que fala o jurista.

Embora a pesquisa do tema não estivesse completa sem a referência à posição de Valentin Carrion, para quem o processo do trabalho é simples desdobramento do processo civil, na teoria justrabalhista brasileira, prevale-ce a concepção de que o processo do trabalho é dotado de autonomia cien-tífica em relação ao processo civil, isso porque se apresenta conformado por princípios próprios e constitui subsistema jurídico procedimental especial, como tal reconhecido pela ciência jurídica nacional. Na pesquisa realiza-da por Carlos Henrique Bezerra Leite, alinham-se nessa última corrente de pensamento Amauri Mascaro Nascimento, Sergio Pinto Martins, Mozart Victor Russomano, Humberto Theodoro Júnior, José Augusto Rodrigues Pinto, Wagner D. Giglio e Coqueijo Costa11.

Com efeito, a existência de princípios próprios e a condição de sub-sistema procedimental especial reconhecido como tal pela teoria jurídica brasileira conferem ao direito processual do trabalho a fisionomia própria sem a qual já não se poderia compreender a jurisdição trabalhista brasileira na atualidade. É neste contexto que ganha densidade hermenêutica a obser-vação de Américo Plá Rodriguez, de que a articulação entre os princípios próprios a cada ramo do Direito conforma a especialidade de cada subsiste-ma jurídico. Isso porque os princípios harmonizam as normas, evitando que o subsistema se converta em uma série de elementos desarticulados. Assim é que se mostra precisa a conclusão do jurista quando observa que “[...] a vinculação entre os diversos princípios contribui mais eficazmente para a sistematização do conjunto e para delinear a individualidade peculiar a cada ramo do Direito”12.

É o que ocorre também no âmbito do subsistema jurídico trabalhista brasileiro.

9 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho. Porto Alegre: HS Editora, n. 379, jul. 2015. p. 15.

10 Direito processual do trabalho. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 79.11 Direito processual do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 89.12 Princípios de direito do trabalho. 1. ed. 4. tir. São Paulo: LTr, 1996. p. 16. Sem itálico no original.

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2 o SubSIStema jurídIco trabalhISta braSIleIro

O subsistema jurídico trabalhista brasileiro faz revelar, com notável intensidade, a relação ontológica desde sempre estabelecida entre o direito material do trabalho e o direito processual do trabalho: à urgência do crédi-to trabalhista alimentar há de corresponder um procedimento simplificado, célere e efetivo. Simplificado para ser célere. Simplificado para ser efetivo. As palavras de Manoel Carlos Toledo Filho sintetizam o projeto procedi-mental em formação na década de 193013: “[...] o processo do trabalho foi desde sempre pensado para ser simples, desburocratizado e maximamente expedito”.

Um procedimento complexo e moroso não atenderia à exigência de rápida realização do direito material do trabalho. O nascente direito pro-cessual do trabalho enfrentará esse desafio, no final da década de 1930, mediante a edição de normas procedimentais originais e simplificadas, porquanto as normas do então vigente CPC de 1939 caracterizavam-se pelo formalismo e individualismo e, portanto, não poderiam responder ao desafio que então se apresentava, conforme revela a pesquisa de Manoel Carlos de Toledo Filho. Para demonstrar o vínculo genético da novel ciên-cia processual trabalhista com o cânone da simplicidade das formas, o ju-rista recolhe da doutrina do processualista Carlos Ramos Oliveira a seguinte passagem histórica, registrada em 1938:

Nada de complicações processuais que possam retardar e dificultar a marcha e a solução dos casos que lhe são afetos. Nada de prazos dilatados. Nada de provas tardias. Nada de formalismos inúteis e prejudiciais. Nada disso. A ju-risdição do trabalho deve ser simples e célere.14 (Justiça do trabalho. Revista do Trabalho, p. 65, fev. 1938)

Manifestada muito tempo depois, a preocupação do processualista Júlio César Bebber diante dos riscos que a burocratização do procedimen-to pode causar ao processo parece nos remeter à época do surgimento do subsistema jurídico trabalhista e aos desafios de simplificação das fórmulas procedimentais então colocados para a ciência processual laboral nascente. Depois de lembrar que os formalismos e a burocracia são vícios que entra-vam o funcionamento do processo, o jurista observa que tais vícios

[...] são capazes de abranger e de se instalar com efeitos nefastos, pelo que se exige que a administração da justiça seja estruturada de modo a aproximar os

13 Os poderes do juiz do trabalho face ao novo Código de Processo Civil. In: MIESSA, Elisson (Org.). Novo Código de Processo Civil e seus reflexos no processo do trabalho. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 330.

14 idem, ibidem. Consultar a nota de rodapé nº 10, p. 330.

14 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������� RST Nº 323 – Maio/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

serviços das populações de forma simples, a fim de assegurar a celeridade, a economia e a eficiência das decisões.15

Como já assinalado, no contexto histórico do surgimento do subsiste-ma jurídico laboral brasileiro, disposições procedimentais originais e simpli-ficadas são, então, concebidas para promover a consecução dos objetivos fundamentais do direito do trabalho, o que não seria possível se a aplicação do direito material do trabalho dependesse das normas procedimentais do então vigente CPC de 1939. É nesse contexto que ganha especial significa-do a expressão melhoria procedimental empregada por Luciano Athayde Chaves na resenha histórica dos primórdios do direito processual do tra-balho. A melhoria procedimental de que depende a realização do direito material nascente pressupõe normas procedimentais diversas das formalis-tas normas procedimentais do direito processual comum vigente à época. A feliz síntese do jurista justifica a transcrição16:

Naquele momento, o processo comum era mais formalista e profundamente individualista. Esta era a ideologia que orientou a sua construção. Em razão disso, não seria possível à recém-criada Justiça do Trabalho valer-se de um processo comum que não atendia às características sociais do direito do tra-balho. Por isso, as normas processuais trabalhistas foram instituídas como uma melhoria procedimental em face do procedimento comum, que poderia – como ainda pode – ser aplicado, mas somente em função da melhoria da prestação jurisdicional especializada.

Quando do surgimento da CLT em 1942, sua parte processual teve mais inspiração no Decreto-Lei nº 1.237/1939 do que no CPC de 1939, conforme a pesquisa realizada por Bruno Gomes Borges Fonseca. O jurista destaca esse antecedente normativo para “[...] demonstrar que o compro-misso histórico do processo do trabalho sempre foi diferente do processo comum”17.

É nesse contexto histórico que ganha sentido a afirmação teórica de que os arts. 769 e 889 da CLT foram concebidos como normas de conten-ção; normas de contenção ao ingresso indevido de normas de processo comum incompatíveis com os princípios do direito processual do trabalho; normas de contenção à influência de preceitos do processo comum que

15 Princípios do processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1997. p. 132.16 Interpretação, aplicação e integração do direito processual do trabalho. In: CHAVES, Luciano Athayde (Org.).

Curso de processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2009. p. 41-42. Sem grifo no original.17 Reflexos do novo Código de Processo Civil na atuação do Ministério Público do Trabalho. In: MIESSA, Elisson

(Org.). Op. cit., p. 370.

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acarretem formalismo procedimental; normas de contenção a institutos que impliquem burocracia procedimental.

3 a compatIbIlIdade como crItérIo cIeNtífIco à aplIcação SubSIdIárIa do proceSSo comum

No estudo da heterointegração do subsistema jurídico laboral prevista nos arts. 769 e 889 da CLT, a teoria jurídica assentou o entendimento de que a aplicação subsidiária do processo comum no processo do trabalho é realizada sob o critério da compatibilidade previsto nesses preceitos conso-lidados. Vale dizer, a compatibilidade prevista nos arts. 769 e 889 da CLT opera como critério científico fundamental para “[...] calibrar a abertura ou o fechamento para o processo comum”, na inspirada formulação adotada por Homero Batista Mateus da Silva18 no estudo do direito processual do trabalho brasileiro.

A especialidade do subsistema jurídico trabalhista sobredetermina essa compatibilidade, conferindo-lhe dúplice dimensão: compatibilidade axiológica e compatibilidade teleológica. Essa dúplice dimensão da com-patibilidade é identificada por Manoel Carlos Toledo Filho sob a denomina-ção de compatibilidade sistêmica19. Vale dizer, a compatibilidade é aferida tanto sob o crivo dos valores do direito processual do trabalho quanto sob o crivo da finalidade do subsistema procedimental trabalhista, de modo a que o subsistema esteja capacitado à realização do direito social para o qual foi concebido. O critério científico da compatibilidade visa à própria preservação do subsistema processual trabalhista, na acertada observação de Paulo Sérgio Jakutis20. Com efeito, o diálogo normativo entre subsistemas jurídicos pressupõe “[...] buscar alternativas que não desfigurem o modelo originário, pois isso o desnaturaria enquanto paradigma independente”21, conforme preleciona Carlos Eduardo Oliveira Dias ao abordar o tema do diálogo das fontes formais de direito no âmbito da aplicação subsidiária do processo comum ao processo do trabalho.

A norma de direito processual comum, além de ser compatível com as regras do processo do trabalho, deve ser compatível com os princípios que norteiam o direito processual do trabalho, conforme preleciona Mauro

18 Curso de direito do trabalho aplicado. Processo do trabalho. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 9, 2015. p. 33.

19 Os poderes do juiz do trabalho face ao novo Código de Processo Civil. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 330.

20 A influência do novo CPC no ônus da prova trabalhista. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 439.21 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre:

HS Editora, n. 379, p. 18, jul. 2015.

16 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������� RST Nº 323 – Maio/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

Schiavi22. Os princípios do direito processual do trabalho restariam desca-racterizados caso se concluísse pela aplicação automática do processo co-mum ao processo do trabalho, razão pela qual a observância do critério da compatibilidade se impõe quando se examina o problema da aplicabilidade subsidiária do processo comum ao subsistema jurídico trabalhista. Daí a pertinência da observação de Carlos Eduardo Oliveira Dias sobre o tema: “[...] o que mais tem relevância, nesse processo intelectivo, é o pressuposto da compatibilidade, ou seja, o fato da norma a ser utilizada se ajustar aos fundamentos do direito processual do trabalho”23. Ausente o pressuposto da compatibilidade, já não se pode pretender prosseguir no processo de heterointegração: falta a ponte que comunicaria os sistemas. A compati-bilidade é essa ponte que permite que alguns dispositivos do processo co-mum ingressem no subsistema processual laboral. Uma ponte estreita, já se percebe. Uma ponte cuja edificação estará sempre entregue à soberana consideração do direito processual do trabalho enquanto ramo autônomo da processualística.

Depois de afirmar que a ideia de compatibilidade é muito cara ao processo do trabalho, Bruno Gomes Borges da Fonseca assevera que tal compatibilidade “[...] ocorrerá apenas na hipótese de o texto do processo comum afinar-se com o princípio da proteção”24. Assim, somente será pos-sível a aplicação subsidiária quando a norma de processo comum guardar plena compatibilidade com os fundamentos do processo do trabalho. Caso isso não ocorra, de acordo com Carlos Eduardo Oliveira Dias, “[...] sacrifi-ca-se o processo integrativo, mas não se pode afetar o núcleo principioló-gico do processo do trabalho”25. Isso porque as regras de processo comum somente podem ser aplicadas subsidiariamente se forem compatíveis com as singularidades do processo do trabalho. Se a regra do CPC for incompatí-vel com a principiologia e singularidades do processo do trabalho, pondera Mauro Schiavi, ela não será aplicada26.

No estudo do tema da heterointegração do subsistema processual tra-balhista, Guilherme Guimarães Ludwig afirma que a aplicação subsidiária do processo comum ao processo do trabalho tem por fundamento a realiza-

22 A aplicação supletiva e subsidiária do Código de Processo Civil ao processo do trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 57-58.

23 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 379, p. 17, jul. 2015.

24 Reflexos do novo Código de Processo Civil na atuação do Ministério Público do Trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 369.

25 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 379, p. 19, jul. 2015.

26 A aplicação supletiva e subsidiária do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 56.

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ção do princípio da eficiência, conferindo conteúdo específico à compati-bilidade prevista nos arts. 769 e 889 da CLT. Ao discorrer sobre o princípio da eficiência no âmbito da heterointegração do subsistema procedimental trabalhista, o jurista ressalta que o princípio da eficiência opera tanto como fator de abertura quanto como fator de fechamento do subsistema procedi-mental, ponderando27:

Quando analisado sob a perspectiva do processo do trabalho, o princípio da eficiência, enquanto autêntico vetor de interpretação da norma processual, deve também funcionar como um filtro que restrinja a adoção das regras do novo Código de Processo Civil e do correspondente modelo colaborativo, em caráter subsidiário ou supletivo, na medida em que elas não guardem compatibilidade com as diretrizes fundamentais do ramo processual laboral, em que se prestigia o valor celeridade em favor do credor trabalhista.

Fixadas algumas balizas teóricas acerca da heterointegração do sub-sistema processual trabalhista, cumpre agora enfrentar a questão da subsis-tência do critério da compatibilidade diante do advento do CPC de 2015.

4 o crItérIo cIeNtífIco da compatIbIlIdade SubSISte ao adveNto do Novo cpc

Diante do fato de o art. 15 do CPC não fazer referência ao critério científico da compatibilidade, surge a questão de saber se esse requisito previsto nos arts. 769 e 889 da CLT teria subsistido ao advento do novo CPC para efeito de aplicação subsidiária do processo comum ao processo do trabalho. No âmbito da teoria do processo civil, a resposta de Nelson Nery Junior é positiva. Depois de afirmar que o novo CPC aplica-se sub-sidiariamente ao processo trabalhista na falta de regramento específico, o jurista pondera que, “de qualquer modo, a aplicação subsidiária do CPC deve guardar compatibilidade com o processo em que se pretenda aplicá--lo”, acrescentando que a aplicação supletiva também deve levar em conta este princípio28.

A resposta da teoria jurídica trabalhista também é positiva, porquanto prevaleceu o entendimento de que o art. 15 do CPC de 2015 não revogou os arts. 769 e 889 da CLT29, preceitos nos quais está prevista a compatibili-

27 O princípio da eficiência como vetor de interpretação da norma processual trabalhista e a aplicação subsidiária e supletiva do novo Código de Processo Civil. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 108.

28 Comentários ao Código de Processo Civil – Novo CPC – Lei nº 13.015/2015. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 232.

29 O art. 15 do NCPC não revogou o art. 769 da CLT. Essa é a conclusão que tem prevalecido entre os teóricos do direito processual do trabalho. Essa conclusão tem prevalecido com base nos seguintes fundamentos: a) não houve revogação expressa do art. 769 da CLT pelo novo CPC (LINDB, art. 2º, § 1º); b) o art. 769 da CLT é norma especial, que, por isso, prevalece sobre a norma geral do art. 15 do NCPC; c) o art. 769 da CLT é mais amplo do que o art. 15 do NCPC, não tendo o art. 15 do NCPC regulado inteiramente a

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dade como critério científico necessário à aplicação subsidiária do processo comum. Para Wânia Guimarães Rabêllo de Almeida, não houve revogação total ou parcial do art. 769 da CLT, porquanto o preceito celetista é muito mais amplo do que o art. 15 do novo CPC30, entendimento no qual tem a companhia de inúmeros juristas, entre os quais estão Guilherme Guima-rães Feliciano31, Homero Batista Mateus da Silva32, Carlos Eduardo Oliveira Dias33, Manoel Carlos Toledo Filho34, Danilo Gonçalves Gaspar35 e Mauro Schiavi36. Assim é que, para Wânia Guimarães Rabêllo de Almeida, “[...] o CPC somente será fonte supletiva ou subsidiária do direito processual do trabalho naquilo que for compatível com suas normas, por força do art. 769 da CLT”37.

Nada obstante o art. 15 do novo CPC estabeleça a possibilidade de aplicação subsidiária e supletiva do Código de Processo Civil de 2015 ao processo do trabalho na ausência de normas processuais trabalhistas, tal aplicação só ocorre quando está presente o pressuposto da compatibilidade previsto nos arts. 769 e 889 da CLT. O exame da presença do pressuposto da compatibilidade é realizado sob a óptica do direito processual do traba-lho, e não sob a óptica do direito processual comum. Isso porque a previsão legal dos arts. 769 e 889 da CLT estabelece que tal exigência de compatibili-dade é dirigida à consideração do juiz do trabalho38, mas também porque se trata de uma contingência hermenêutica imposta à preservação da autono-mia científica do direito processual do trabalho enquanto subsistema proce-

matéria do art. 769 da CLT (LINDB, art. 2º, §§ 1º e 2º), de modo que ambos os preceitos harmonizam-se; d) o subsistema procedimental trabalhista é reconhecido no sistema jurídico brasileiro como subsistema procedimental especial informado pelas normas de contenção dos arts. 769 e 889 da CLT.

30 A teoria dinâmica do ônus da prova. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 457.31 O princípio do contraditório no novo Código de Processo Civil. Aproximações críticas. In: MIESSA, Elisson

(Org.). Op. cit., p. 126.32 Curso de direito do trabalho aplicado. Processo do trabalho. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 9,

2015. p. 33.33 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre:

HS Editora, n. 379, p. 15, jul. 2015. 34 Os poderes do juiz do trabalho face ao novo Código de Processo Civil. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit.,

p. 332.35 Noções conceituais sobre tutela provisória no novo CPC e suas implicações no processo do trabalho. In:

MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 386.36 A aplicação supletiva e subsidiária do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho. In: MIESSA, Elisson

(Org.). Op. cit., p. 56.37 A teoria dinâmica do ônus da prova. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 457.38 Tem razão Jorge Luiz Souto Maior quando pondera, com perspicácia, que “[...] os fundamentos do novo

CPC baseiam-se em uma visão de mundo que considera necessário conter a atuação de juízes sociais. Mas a racionalidade do processo do trabalho, obviamente, é outra, tanto que as regras de proteção do processo do trabalho são direcionadas ao juiz, a quem cumpre definir, portanto, como o procedimento deve se desenvolver, gostem disso, ou não, os elaboradores do novo CPC. Aliás, é indisfarçável o desejo dos elaboradores do NCPC de suprimir, por via transversa, práticas processuais trabalhistas” (A radicalidade do artigo 769 da CLT como salvaguarda da Justiça do Trabalho. Justiça do Trabalho, Editora HS, a. 32, n. 384, p. 38, mar. 2015).

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dimental especial. Para Danilo Gonçalves Gaspar, é certo que “[...] que não se elimina a necessidade de compatibilização da norma com o processo do trabalho, tal qual previsto na CLT”39, entendimento no qual é acompanhado por Ricardo José Macedo de Britto Pereira. Para esse jurista, a aplicação subsidiária prevista no art. 15 do CPC de 2015 deve ocorrer “[...] sem afetar a exigência de compatibilidade como determina o art. 769 da CLT”40.

A subsistência do critério científico da compatibilidade decorre da não revogação do art. 769 da CLT, mas também acaba por se impor enquan-to exigência hermenêutica necessária à salvaguarda do subsistema jurídico trabalhista enquanto ramo procedimental especial dotado de autonomia científica. Daí porque tem razão Carlos Eduardo Oliveira Dias quando pon-dera que seria até desnecessário que o legislador processual comum ressal-vasse a necessidade de que, na aplicação subsidiária do novo CPC, fosse observada a compatibilidade com o outro ramo do direito processual, “[...] pois, se isso não existisse, estaria inviabilizada a própria existência autôno-ma desse segmento”41. De fato, pudesse ser eliminado o critério científico da compatibilidade na aplicação subsidiária do processo comum, haveria o risco de desconstrução estrutural do direito processual do trabalho, tal qual adverte Carlos Eduardo Oliveira Dias com pertinácia42:

[...] não se pode adotar uma solução normativa exógena que, independente-mente de ser fundada em omissão da CLT, não guarde compatibilidade com o processo laboral e possa vir a ser fator de sua desconstrução sistêmica.

A posição de Iuri Pereira Pinheiro alinha-se aos entendimentos antes referidos. Para o jurista, não se pode esquecer que o direito processual do trabalho constitui ramo dotado de autonomia científica, no qual a colmata-ção de lacunas exige a compatibilidade ideológica proclamada nos arts. 769 e 889 da CLT. Daí a conclusão do jurista no sentido de que, “a despeito da previsão simplista do novo CPC, a sua aplicação subsidiária ao processo do trabalho irá se operar apenas diante de sintonia principiológica, sob pena de mácula à autonomia do ramo processual especializado”43. A especialidade do subsistema jurídico trabalhista exige que se lhe confira um tratamento metodológico diferenciado, que preserve a sua própria fisionomia, de modo

39 Noções conceituais sobre tutela provisória no novo CPC e suas implicações no processo do trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 386.

40 O novo Código de Processo Civil e seus possíveis impactos nos recursos trabalhistas. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 568.

41 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 379, p. 18, jul. 2015.

42 Idem, p. 20-21.43 Reflexões acerca da penhorabilidade de bens à luz do novo CPC – Avanços, retrocessos e a possibilidade da

derrocada de alguns mitos. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 496.

20 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������� RST Nº 323 – Maio/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

que a heterointegração seja realizada com a observância dos princípios do direito material que lhe são inerentes e que afetam diretamente a prática jurisdicional trabalhista, conforme o magistério de Carlos Eduardo Oliveira Dias44.

Também para Mauro Schiavi a exigência de compatibilidade se im-põe à aplicação do CPC de 2015 ao processo do trabalho. Para o jurista, da conjugação do art. 15 do novo CPC com os arts. 769 e 889 da CLT, resulta que o novo CPC aplica-se ao processo do trabalho da seguinte forma: “[...] supletiva e subsidiariamente, nas omissões da legislação processual traba-lhista, desde que compatível com os princípios e singularidades do processo trabalhista”45.

Nada obstante considere que o art. 15 do novo CPC configura-se como norma de sobredireito, Élisson Miessa pondera que não ocorreu revo-gação dos arts. 769 e 889 da CLT. O jurista observa que “[...] a inserção de normas comuns em um microssistema jurídico sempre impõe a compatibili-dade com o sistema em que a norma será inserida, sob pena de se desagre-gar a base do procedimento específico”, para concluir que “[...] os arts. 769 e 889 da CLT sobrevivem à chegada do art. 15 do NCPC”46.

Mesmo para Edilton Meireles, jurista que considera que o art. 769 da CLT foi revogado pelo art. 15 do novo CPC, o critério da compatibilidade permanece sendo indispensável à aplicação subsidiária da norma de pro-cesso comum ao processo do trabalho, conclusão que adota por ser a le-gislação trabalhista norma especial em relação ao CPC. O jurista considera que “[...] a regra supletiva ou subsidiária deve guardar coesão e compatibi-lidade com o complexo normativo ou a regra que se pretender integrar ou complementar”, para concluir que, “[...] se a norma do novo CPC se revela incompatível com o processo do trabalho (em seus princípios e regras), lógi-co que não se poderá invocar seus dispositivos de modo a serem aplicados de forma supletiva ou subsidiária”47.

A posição de Edilton Meireles acerca do tema da autonomia do di-reito processual do trabalho faz evocar a precitada doutrina de Valentin Carrion. Ambos os juristas parecem convergir quanto ao entendimento de que o direito processual do trabalho não seria dotado de autonomia científi-

44 O novo CPC e a preservação ontológica do processo do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre: HS Editora, n. 379, p. 18, jul. 2015.

45 A aplicação supletiva e subsidiária do Código de Processo Civil ao processo do trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 56.

46 O novo Código de Processo Civil e seus reflexos no processo do trabalho. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 28.47 O novo CPC e sua aplicação supletiva e subsidiária no processo do trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op.

cit., p. 46.

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ca em relação ao direito processual civil. A concepção de Valentin Carrion sobre o tema opera sob o pressuposto teórico de que “o direito processual do trabalho não possui princípio próprio algum, pois todos os que o nor-teiam são do processo civil (oralidade, celeridade, etc.); apenas deu (ou pretendeu dar) a alguns deles maior ênfase e relevo”48. O direito processual do trabalho, para Valentin Carrion, não surge do direito material laboral e, por isso, não poderia aspirar à autonomia em relação ao direito processual civil, do qual seria mera subespécie.

Nada obstante Valentin Carrion negue a autonomia do direito proces-sual do trabalho em relação ao processo civil, o jurista conclui, nos comen-tários do art. 769 da CLT, que a aplicação subsidiária de normas do pro-cesso comum ao subsistema jurídico trabalhista submete-se ao requisito da compatibilidade. Vale dizer, a compatibilidade subsiste enquanto requisito científico indispensável à heterointegração, ainda quando não se reconheça autonomia científica ao processo do trabalho em relação ao processo civil.

Na formulação teórica concebida por Valentin Carrion, a heteroin-tegração de normas de processo comum ao processo do trabalho somente será viável

[...] desde que: a) não esteja aqui regulado de outro modo (“casos omissos”, “subsidiariamente”); b) não ofendam os princípios do processo laboral (“in-compatível”); c) se adapte aos mesmos princípios e às peculiaridades deste procedimento; d) não haja impossibilidade material de aplicação (institutos estanhos à relação deduzida no juízo trabalhista); a aplicação de institutos não previstos não deve ser motivo para maior eternização das demandas e tem de adaptá-las às peculiaridades próprias.49

Diante das indagações teóricas que têm sido suscitadas quanto à apli-cação do novo CPC ao processo do trabalho, parece oportuno transcrever a específica lição de Valentin Carrion sobre o método científico a ser adotado pelo juslaboralista no estudo do acerca da aplicação de novos dispositivos do processo comum ao processo laboral. Preleciona o jurista:

Perante novos dispositivos do processo comum, o intérprete necessita fazer uma primeira indagação: se, não havendo incompatibilidade, permitir-se-ão a celeridade e a simplificação, que sempre foram almejadas. Nada de novos recursos, novas formalidades inúteis e atravancadoras.50

48 Comentários à CLT. 38. ed. Atualizado por Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 679.49 Idem, p. 678-679.50 Idem, p. 679.

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A concepção de tutela constitucional do processo de que nos falam Tereza Aparecida Asta Gemignani e Daniel Gemignani valoriza a compa-tibilidade como critério capaz de preservar a especialidade do subsistema jurídico trabalhista. Para os juristas,

[...] essa concepção de tutela constitucional do processo, que sustenta a es-pinha dorsal do modelo adotado pelo processo trabalhista, nos termos do art. 769 da CLT, vai impedir, por incompatibilidade, a aplicação das dispo-sições contidas no novo CPC quando enveredam pela diretriz privatística.51

Portanto, o critério científico da compatibilidade subsiste ao advento do novo CPC, permanecendo indispensável ao processo hermenêutico de avaliação da aplicação do processo comum ao processo do trabalho.

coNcluSão

Sobre o procedimento recai o desafio de articular rapidez, eficiência, justiça, liberdade individual e igualdade.

Na teoria jurídica, a genética relação existente entre direito substan-cial e procedimento é compreendida como expressão do fenômeno do per-tencimento que se estabelece desde sempre entre objeto (direito material) e método (procedimento). Daí a consideração epistemológica de que direito substancial e procedimento são categorias conceituais que operam em uma espécie de círculo hermenêutico: as respostas procedimentais nos remetem ao direito material a ser concretizado.

A existência de princípios próprios e a condição de subsistema proce-dimental especial reconhecido como tal pela teoria jurídica brasileira confe-rem ao direito processual do trabalho a fisionomia própria sem a qual já não se poderia compreender a jurisdição trabalhista brasileira na atualidade.

No contexto histórico do surgimento do subsistema jurídico laboral brasileiro, disposições procedimentais originais e simplificadas são, então, concebidas para promover a consecução dos objetivos fundamentais do di-reito do trabalho, o que não seria possível se a aplicação do direito material do trabalho dependesse das normas procedimentais do então vigente CPC de 1939. É nesse contexto histórico que ganha sentido a afirmação teórica de que os arts. 769 e 889 da CLT foram concebidos como normas de con-tenção; normas de contenção ao ingresso indevido de normas de processo comum incompatíveis com os princípios do direito processual do trabalho;

51 Litisconsórcio e intervenção de terceiros: o novo CPC e o processo do trabalho. In: MIESSA, Elisson (Org.). Op. cit., p. 269.

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normas de contenção à influência de preceitos do processo comum que acarretem formalismo procedimental; normas de contenção a institutos que impliquem burocracia procedimental.

No estudo da heterointegração do subsistema jurídico laboral prevista nos arts. 769 e 889 da CLT, a teoria jurídica assentou o entendimento de que a aplicação subsidiária do processo comum no processo do trabalho é realizada sob o critério da compatibilidade previsto nesses preceitos conso-lidados.

A especialidade do subsistema jurídico trabalhista sobredetermina essa compatibilidade, conferindo-lhe dúplice dimensão: compatibilidade axiológica e compatibilidade teleológica. Vale dizer, a compatibilidade é aferida tanto sob o crivo dos valores do direito processual do trabalho quan-to sob o crivo da finalidade do subsistema procedimental trabalhista, de modo a que o subsistema esteja capacitado à realização do direito social para o qual foi concebido. O critério científico da compatibilidade visa à própria preservação do subsistema processual trabalhista enquanto ramo procedimental autônomo.

Ausente o pressuposto da compatibilidade, já não se pode pretender prosseguir no processo de heterointegração: falta a ponte que comunicaria os sistemas. A compatibilidade é essa ponte que permite que alguns dis-positivos do processo comum ingressem no subsistema processual laboral, com vistas a ampliar a sua efetividade. Uma ponte estreita, já se percebe. Uma ponte cuja edificação estará sempre entregue à soberana consideração do direito processual do trabalho enquanto ramo autônomo da processua-lística.

Nada obstante o art. 15 do novo CPC estabeleça a possibilidade de aplicação subsidiária e supletiva do Código de Processo Civil de 2015 ao processo do trabalho na ausência de normas processuais trabalhistas, tal aplicação só ocorre quando está presente o pressuposto da compatibilidade previsto nos arts. 769 e 889 da CLT. O exame da presença do pressuposto da compatibilidade é realizado sob a óptica do direito processual do traba-lho, e não sob a óptica do direito processual comum. Isso porque a previsão legal dos arts. 769 e 889 da CLT estabelece que tal exigência de compati-bilidade é dirigida à consideração do juiz do trabalho52, mas também por-

52 Tem razão Jorge Luiz Souto Maior quando pondera, com perspicácia, que “[...] os fundamentos do novo CPC baseiam-se em uma visão de mundo que considera necessário conter a atuação de juízes sociais. Mas a racionalidade do processo do trabalho, obviamente, é outra, tanto que as regras de proteção do processo do trabalho são direcionadas ao juiz, a quem cumpre definir, portanto, como o procedimento deve se desenvolver, gostem disso, ou não, os elaboradores do novo CPC. Aliás, é indisfarçável o desejo dos elaboradores do NCPC

24 ����������������������������������������������������������������������������������������������������������� RST Nº 323 – Maio/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

que se trata de uma contingência hermenêutica imposta à preservação da autonomia científica do direito processual do trabalho enquanto subsistema procedimental especial.

Às indagações teóricas que têm surgido quanto à aplicação do novo CPC ao processo do trabalho parece que já se antecipara, há muito anos, Valentin Carrion: “Perante novos dispositivos do processo comum, o in-térprete necessita fazer uma primeira indagação: se, não havendo incom-patibilidade, permitir-se-ão a celeridade e a simplificação, que sempre foram almejadas. Nada de novos recursos, novas formalidades inúteis e atravancadoras”53. O gênio antecipa-se.

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53 Comentários à CLT. 38. ed. Atualizada por Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 679.

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Assunto Especial – Doutrina

A Execução Trabalhista e o Novo CPC

A Fase de Cumprimento da Sentença no Processo do Trabalho e o Novo CPC

PAuLO SéRgIO JAkuTISJuiz do Trabalho.

SUMÁRIO: Introdução; I – O processo protetivo do trabalho; II – A aplicação subsidiária do NCPC; III – A execução trabalhista: fase ou processo?; Conclusões; Referências.

INtrodução

Pensei este texto, inicialmente, como uma breve comparação entre o que foi a execução no processo do trabalho, até recentemente, e o que será essa mesma execução após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (que abrevio, doravante, como NCPC). Comecei, então, a relacionar mentalmente os assuntos que poderiam ser objeto de alguma reflexão e não levei mais do que alguns minutos para concluir que, uma de duas: a) ou todos os percalços da execução trabalhista poderiam, de certa forma, so-frer alguma consideração, quando pensados por meio das lentes do NCPC; b) ou tudo se resumia, nesse assunto, à questão central da aplicabilidade/sub - sidiariedade/supletividade dos vários diplomas legais que regem as execu-ções desenvolvidas cotidianamente pelas Varas do Trabalho Brasil a dentro.

Mais alguma reflexão foi necessária para convencer-me de que, em verdade, as coisas não eram tão simples assim. É certo que toda alteração legal, especialmente quando tem as proporções desta que estamos vivendo, traz desconfortos e incertezas, mas essa situação não deve induzir aqueles que se dispõem a pensar o novo ambiente legal à tentação de querer resol-ver – para si e para os demais – todos o problemas de uma só vez, de forma enciclopédica. Já se disse, com bastante sabedoria, que

[S]e o lavrador semeara primeiro trigo, e sobre o trigo semeara centeio, e sobre o centeio semeara milho grosso e miúdo, e sobre o milho semeara ce-vada, que havia de nascer? Uma mata brava, uma confusão verde. Eis aqui o

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que acontece aos sermões deste gênero. Como semeiam tanta variedade, não podem colher coisa certa. Quem semeia misturas, mal pode colher trigo.1

Assim como acontece com os sermões, também os artigos que se perdem em vários assuntos acabam por não germinar ideia alguma em lu-gar nenhum. Como a publicação de um novo e complexo texto legal já, por si só, é causa de inevitáveis turbilhões, nada recomenda que qualquer tentativa de exegese da novidade legal contribua com o caos, ao invés de buscar aplacá-lo. Por conta disso, não tardei muito a concluir que o melhor caminho a seguir seria, obviamente, lançar foco sobre um aspecto particular da execução trabalhista, deixando as pretensões de uma visão panorâmica para outro momento, ou mesmo para mãos mais capacitadas.

Da mesma forma, também me convenci de que nem tudo, no nosso universo legal do processo do trabalho, se resolve com a questão da apli-cação, ou não, do NCPC, embora essa dificuldade deva ser abordada neste artigo – e, de certa forma, em todos os que se debrucem sobre o NCPC, quando preocupados com a compatibilização deste com o processo do tra-balho – , sob pena de que a concepção final da ideia, ainda que relacionada a um único tópico da execução, reste mutilada e imperfeita, caso se tente evitar essa etapa.

Feita essa justificativa, que, espero, prepara o leitor para o que se segue, passo, sem demora, a tratar desse ponto preliminar: a compatibili-dade entre o NCPC e a execução trabalhista, partindo, para tanto, de uma ponto ainda mais distante (de meu objetivo), qual seja, da indagação sobre a existência (e necessidade) – nos dias atuais – de um verdadeiro processo do trabalho.

I – o proceSSo protetIvo do trabalho

Na atualidade, a sociedade brasileira tem necessidade de um proces-so do trabalho2?

Se o leitor respondeu negativamente a essa questão e não tem pa-ciência – ou interesse – em ouvir argumentos contrários, perderá tempo em

1 VIEIRA, Padre Antônio. Sermão da Sexagésima. Disponível em: <http://www.culturatura.com.br/obras/Serm%C3%A3o%20da%20Sexag%C3%A9sima.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.

2 De acordo com as preferências do leitor, essa mesma questão pode ser apresentada com algumas variações que, aqui e ali, podem ser encontradas em debates políticos, artigos de jornais, propostas orçamentárias e outros tantos textos que surgem de tempos em tempos e de acordo com as variações das correntes políticas em evidência no cenário nacional, nos seguintes termos: a) “[...] ainda temos necessidade de uma Justiça do Trabalho?”; b) “[...] por que não se abandona a velha CLT e adota-se, de uma vez, a íntegra do CPC para a condução dos processos envolvendo reivindicações trabalhista?”.

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seguir com a leitura deste artigo, razão pela qual abrevio, desde logo, esse desprazer. Mas, se, por outro lado, há alguma réstia de curiosidade a ilumi-nar o leitor, saiba que, neste artigo, se dirá que o processo do trabalho foi e continua sendo indispensável à sociedade brasileira. Sendo assim, toda a celeuma a respeito da aplicação do NCPC se resolve com base nessa pers-pectiva, isto é, na necessidade de preservação de um processo do trabalho distinto do processo comum e voltado para as necessidades específicas de-rivadas da solução de um conflito que é singular e, por isso mesmo, exige uma atenção diferenciada em relação a todos os demais que afloram na nossa sociedade.

O primeiro aspecto que se destaca na justificativa da existência de um processo do trabalho diz respeito à finalidade instrumental desse ramo do processo, vale dizer, o processo do trabalho, enquanto processo, se jus-tifica como um instrumento destinado à resolução justa dos conflitos sociais relacionados com o trabalho, sendo certo que, de forma preponderante, essa solução ocorre por meio da aplicação do direito material do trabalho ao caso concreto. Sintetizando esses dizeres, o processo do trabalho tem a razão de ser dele na aplicação do direito material do trabalho. Ora, como o direito do trabalho é fundamentalmente diverso do direito material civil (embora com algumas raízes fincadas nele), não é difícil perceber que a aplicação do direito material do trabalho precisa de um processo que não o prejudique, isto é, que não o torne coisa diversa do que ele é. Essa afirmação é correntemente encontrada nas reflexões que buscam entender a própria razão de ser do processo. Quando se afirma, por exemplo, que a melhor legislação de direito material seria de pouca utilidade se desacompanhada de mecanismos processuais que a tornassem respeitada, não se está fazendo mais do que destacar que o direito material e o direito processual são maté-rias interdependentes. Veja-se, para melhor ilustrar esse ponto, o que diz a doutrina do processo civil sobre a imbricação deste com o direito material na questão da legitimação para a ação:

A legitimidade processual nada mais é do que reflexo da própria legitima-ção de direito material. Da mesma forma que a validade e eficácia de um ato concernente à relação jurídica substancial depende de estar o agente investido de condição legal para praticá-lo, também o ato processual con-substanciado na demanda deve envolver sujeitos que, em tese, encontram--se naquela situação da vida trazida à apreciação do juiz. Se apenas o pro-prietário pode alienar, somente quem se diz proprietário tem legitimidade para reivindicar. É sempre a situação substancial afirmada que determina a legitimação. [...] Também tratando-se de legitimação extraordinária, não se pode prescindir da relação material. Sustenta-se, com sólidos argumentos, a necessidade de haver nexo entre as relações jurídicas de titularidade do legi-

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timado ordinário e do extraordinário. A legitimação extraordinária somente é admissível quando se tratar de mecanismo destinado à tutela do interesse do legitimado extraordinário, ante a inércia do substituído. Tal análise depende fundamentalmente das relações jurídicas substanciais de que fazem parte os titulares desses interesses. Impossível solucionar o problema sem o exame do direito material. Bedaque, Direito e processo..., op. cit. p. 117.

Se, então, o direito material e o processual são coisas que, conquanto independentes, têm pontos de contatos que impedem uma absoluta sepa-ração entre ambos (situação que em tudo se semelha ao que ocorre com o processo do trabalho e com o processo comum), não deve causar nenhum espanto a afirmação de que o que justifica a existência do processo do tra-balho, em um primeiro momento, é, justamente, a presença, no nosso or-denamento, do direito material do trabalho como ramo distinto do direito civil. Essa distinção, caminhando um pouco mais adiante, está, justamente, em dois pontos fundamentais que o direito processual nunca pode ofuscar: a) o direito material do trabalho, nos termos do art. 7º da Constituição Fede-ral, existe para melhorar a condição social do trabalhador; e b) a principal ferramenta para que essa melhoria ocorra está no caráter protetivo do direito material do trabalho. Essa característica, muito mais do que qualquer outra, é que faz com que o direito do trabalho se distancie do direito civil e que o torna uma coisa diversa deste último. Sendo assim, o que faz com que o pro-cesso do trabalho se justifique é, antes de qualquer coisa, a necessidade de instrumentalizar a aplicação de um direito material que trata de forma dis-tinta (desigual) as partes envolvidas nas relações reguladas por ele. Dito de outra forma: desaparecendo o direito material do trabalho, não há qualquer necessidade de o direito processual do trabalho existir. Todavia, enquanto o direito material do trabalho for como é, tratando desigualmente as partes da relação de trabalho, não se pode abrir mão de um direito processual que leve em conta essa desigualdade e que se preocupe com ela (em não neutralizar o tratamento diferenciado que a legislação trabalhista material dá às partes).

Um desdobramento dessa premissa pode ser também enunciado aqui, porque relevante para justificar a existência de um direito processual do trabalho, diverso do processo comum. O direito material do trabalho está preocupado com a venda da força de trabalho de um ser humano para outro, ou para uma abstração jurídica qualquer (empresas, condomínios, massas falidas, etc.). Essa situação é incomparável à compra e venda de um objeto, ou de um imóvel, porque o trabalho é atributo do ser humano, confundindo-se com a própria condição humana. O ser humano, na socie-dade contemporânea, não tem no trabalho apenas a fonte da subsistência

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– o que já é muito e justificaria, certamente, uma atenção especial à relação trabalhista –, mas encontra no labor a própria identificação dele enquanto ser3. O trabalho não nos define completamente, porque não somos apenas trabalhadores, mas no papel de trabalhador está, seguramente, um dos mais importantes traços de nossa personalidade. Por isso, quando um trabalhador é demitido sob a alegação de prática de justa causa, não está ocorrendo, simplesmente, a quebra de um contrato, como quando alguém compra uma mercadoria com defeito. Ao se afirmar, por exemplo, que o trabalhador foi desidioso, toda a imagem que o trabalhador faz dele mesmo, enquanto ser humano (que tem na profissão um definitivo traço de personalidade, repita--se sempre), é atingida (e, em determinados casos, também a imagem que a comunidade na qual o obreiro está inserido, se a notícia alcança outras pessoas). Como o trabalho é uma parte importantíssima de nossa vida, à qual, normalmente, dedicamos mais da metade do tempo que passamos acordados, sendo responsável, da mesma forma, por boa medida de nossa própria identidade, não é preciso grande esforço para perceber a presença de uma questão muito mais complexa no conflito nascido de um despedi-mento do que na compra e venda de um objeto, por mais valioso que este seja. Naturalmente, a conclusão pela presença de um juiz especializado nesse tipo de conflito, formado com a visão do alcance social a ser dado às decisões que proferir, é consequência que se coaduna com a singularidade da situação conflituosa aqui descrita. Esse ponto completa a apresentação da visão que, creio, justifica a existência de um processo trabalhista in-dependente do processo civil: de um lado, a presença de uma legislação adjetiva potencializando – em vez de obstaculizar – as conquistas obtidas pelo direito substantivo do trabalho, não se contrapondo a ele, o que ocor-reria, inevitavelmente, caso o direito material trabalhista fosse veiculado com indiferença à realidade desigual a que os litigantes estão submetidos. De outro, a criação e manutenção de aparelhos jurisdicionais especializa-dos, dedicados à complexidade – e singularidade – do conflito trabalhista, em que, ao mesmo tempo, estão envolvidas questões econômicas (a mão de

3 Nossa personalidade é formada, em certo sentido, por várias facetas. Um mesmo indivíduo comporta-se de certa forma, revelando aspectos específicos da personalidade dele enquanto atuando como diretor de uma escola de ensino fundamental e, certamente, revela aspectos outros dessa mesma personalidade enquanto torcedor de um time, em um campo de futebol. Robert Erza Park afirma: “Não é provavelmente um mero acidente histórico que a palavra ‘pessoa’, em sua acepção primeira, queira dizer máscara. Mas, antes, o reconhecimento do fato de que todo homem está sempre e em todo lugar, mais ou menos conscientemente, representando um papel... É nesses papéis que nos conhecemos uns aos outros; é nesses papéis que nos conhecemos a nós mesmos. [...] Em certo sentido, e na medida em que esta máscara representa a concepção que formamos de nós mesmos – o papel que nos esforçamos por chegar a viver –, esta máscara é o nosso mais verdadeiro eu, aquilo que gostaríamos de ser. Ao final, a concepção que temos de nosso papel torna-se uma segunda natureza e parte integral de nossa personalidade. Entramos no mundo como indivíduos, adquirimos um caráter e nos tornamos pessoas” (apud GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Rio de Janeiro: Vozes, 1975. p. 27).

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obra é, no sistema capitalista, um insumo, visto preponderantemente pelo capitalista como parte do custo), políticas (o capital e o trabalho têm, na relação capitalista, interesses conflitantes, e essa tensão já chegou a dividir o mundo em dois grandes blocos, separados por uma guerra fria que parecia não ter fim) e humanas das mais relevantes (a relação trabalhista é cruel-mente complexa, porque, embora haja a divergência de interesses, aponta-da anteriormente, o trabalho – único bem possuído pela grande maioria dos seres humanos – precisa dos meios de produção para que, por meio deles, obtenha colocação – emprego – e, por conseguinte, subsistência, enquanto o capital tem abundância de oferta de mão de obra e recursos, o que permi-te a ele, caso não se fixem limites, ampla vantagem em relação ao primeiro), tudo aconselhando se mediar a divergência dos interesses de ambos por quem conhece com profundidade essa realidade.

II – a aplIcação SubSIdIárIa do Ncpc

Se se aceita que o processo do trabalho é algo diverso do processo comum e que essa diversidade ainda se justifica, é preciso fixar em que medida se permitirá a este último interferir no primeiro, vez que, como já se viu, o processo do trabalho não consegue existir sem se utilizar de inúmeros e importantes conceitos que só estão resolvidos/regulados no processo civil.

O ponto de partida é o art. 7694 da CLT. Nele se fia a esperança de que não passarão para o lado do processo trabalhista quaisquer artigos, interpretações, princípios ou decisões, relacionados com o processo civil, que possam colocar em risco a essência do direito processual do trabalho, enquanto um instrumento voltado para a aplicação do direito do trabalho. O art. 769 é, pois, uma porta de proteção, como essas que pretendem cortar o fogo nos grandes edifícios de nossas metrópoles. Foi isso, exatamente, o que fez o legislador celetista: ele criou uma porta corta-fogo, uma barreira de acesso ao universo trabalhista, de sorte a evitar que todas as normas do processo civil pudessem ser importadas para o instrumental de resolução de conflitos obreiros, na intenção óbvia de manter um sistema diferenciado do outro. Por quê? A resposta também parece óbvia: porque o sistema proces-sual trabalhista tem particularidades que podem se perder se, sem qualquer critério, franquear-se a entrada de qualquer dispositivo processual ao siste-ma. Essas constatações, percebe-se, deixam claro que: a) a importação não apenas é possível, mas indispensável para que o sistema consiga funcionar; b) a proteção é feita pelo e para o sistema especial (não em prol do genérico)

4 A recente – e já polêmica – Instrução Normativa nº 39 do TST reafirmou o art. 769 da CLT como a norma que resolve a questão da compatibilidade/harmonização da CLT com o NCPC.

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e tem intenção de preservá-lo diferenciado do sistema geral (as razões pelas quais essa diferenciação é desejável já foram expostas nas páginas prece-dentes, embora não se tenha segurança em afirmar que o legislador celetista tivesse, em 1943, a completa compreensão dessa situação e não tivesse optado por agir nessa intenção apenas por conta de vislumbrar no proces-so do trabalho a necessidade de um procedimento mais simples e célere); c) como consequência, todo o arcabouço teórico e legislativo pertencente ao processo civil é, também e em geral, pertencente ao processo do tra-balho (porque o art. 769 da CLT não faz restrição a determinado diploma, capítulo, título ou artigo do processo comum, colocando – em tese – todo o aparato processual ao alcance do operador trabalhista), embora nem todo ele possa ser aplicado à resolução de todos os casos práticos trabalhistas. É o art. 769, mais uma vez, que fundamenta o ponto, informando que – e isso, quero crer, deve ser verificado à luz do caso concreto e não a priori, generi-camente – a importação estará liberada toda vez que tal procedimento não trouxer perigo para o sistema processual especializado.

Em outras palavras, temos que a senha que permite o acesso do uni-verso do processo civil para o processo do trabalho, a chave para a porta de segurança criada pelo art. 769, é simplesmente essa: a preservação do siste-ma processual do trabalho, com as particularidades e especificidades típicas dele, no caso concreto. Logo, se se tem dúvida da aplicação de uma norma processual civil a um conflito trabalhista, a única pergunta pertinente a ser feita para sanar-se essa insegurança, à luz de uma interpretação teleológica do art. 769 – e não meramente gramatical –, é: a solução oferecida por esse dispositivo está de acordo com o que o processo do trabalho pretende ser, enquanto instrumento de aplicação do direito material do trabalho e ferra-menta destinada a dar eficácia aos objetivos de elevação da condição social dos trabalhadores, traçados pelo art. 7º da Constituição Federal?

Sendo positiva a resposta, a senha está aceita e a porta franqueada, sendo irrelevante qualquer outra consideração, inclusive a relacionada à existência de norma celetista tratando especificamente do ponto. Não há desrespeito à primeira parte do art. 769 da CLT nessa colocação, pois os casos omissos, referidos pelo dispositivo em questão, são apenas uma das causas da aplicação subsidiária do direito processual comum. A lógica de-senvolvida até aqui, porém, demonstra que esta não é a única ocasião em que o recurso à norma estrangeira ao sistema obreiro pode – ou deve – ser usada. Quando o legislador diz que, havendo omissão, está aberta a porta para a importação de recursos do sistema não especializado (geral), enuncia a hipótese mais comum, mais elementar, em que a importação pode ocor-rer, mas não proíbe que esta ocorra em outras situações. Não fosse assim,

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estaríamos fadados a uma aplicação tão obtusa e literal do preceito que, da mesma forma, estaríamos obrigados – por uma questão de coerência – a concluir que ausente dispositivo apto à solução do problema no processo do trabalho e no processo civil, não seria possível se recorrer a nenhum outro diploma legal (nem mesmo à Constituição Federal) ou outra fonte de Direito, vez que o art. 769 não faz menção a tais hipóteses. A situação tan-ge ao absurdo, além de ferir o texto expresso do art. 8º do próprio diploma consolidado.

Contrapondo-se a esse quase irracional posicionamento, tem-se a constatação insofismável de que a legislação processual civil emana do mesmo legislador das normas processuais trabalhistas, o que permite per-ceber que a aplicação subsidiária das disposições estrangeiras, ligadas ao direito comum, não se configurariam em nenhum exercício arbitrário de quem quer que fosse. Quando o legislador do processo civil dá origem a um dispositivo novo, o faz com respaldo na tramitação regular dos diplo-mas legais, como fruto do sistema de representação que nossa sociedade elegeu como possível para o estágio em que se encontra nossa democracia. A única distinção entre o procedimento pertinente a essa norma e aquela publicada como, por exemplo, alteração ao texto da CLT está em que esta última deverá se alojar a um texto logicamente estruturado e com alicerce nas particularidades próprias do direito trabalhista, entre as quais, como tantas vezes já referido, está a desigualdade de forças entre empregado e empregador. Logo, se o legislador do processo civil cria norma que, embo-ra voltada para realidade própria do processo civilista, não desrespeita os traços específicos do processo do trabalho, nenhum embaraço existiria na utilização desse preceito pelo operador trabalhista. Isso é da lógica do nosso sistema processual, que está ancorado em um oceano de normas comuns, permitindo, inclusive, que se estude esse agrupamento conjunto como uma teoria geral do processo.

Agora, se a nova norma atende, de forma ainda mais adequada, às es-pecificações da instrumentalidade do processo do trabalho, superando um antigo artigo celetista, em eficiência e, mais importante, na configuração de um processo mais apto a conferir ao trabalhador e ao capital um provimento jurisdicional mais justo (porque derivado de uma situação artificialmente equilibrada e destinada a compensar uma realidade desigual), qual seria a razão para se prestigiar o artigo celetista, em detrimento daquele novo dis-positivo? Só se se defendesse a tese de que o novo dispositivo legal só pode ser aplicado – ainda que traga disposições genéricas – aos casos imagina-dos pelo legislador que concebeu o preceito (hipótese inaceitável quando o conflito não é referido pela lei). Contrariando esse raciocínio obscuro, a

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utilização do novo dispositivo pelo operador trabalhista não configuraria ato de arbitrariedade, porquanto derivado o preceito legal do sistema legis-lativo com todas as garantias respectivas, nem ofenderia qualquer elemen-to fundamental do sistema processual brasileiro, porquanto, como visto, o art. 769 da CLT tem a finalidade de proteger o processo do trabalho (para que este não se descaracterize e deixe de viabilizar a proteção ao hipossufi-ciente) e não de inviabilizá-lo ou torná-lo obsoleto.

Se a nova norma estrangeira favorece mais a vocação protetiva do processo do trabalho do que aquela existente na própria CLT, a correta – e finalística – interpretação do art. 769 celetista não deve sugerir a prevalên-cia do texto consolidado, porque isso não está de acordo com o processo judiciário do trabalho, descrito em linhas básicas pelo título X. A melhor in-terpretação, consentânea com a verdadeira proteção ao sistema processual trabalhista (que é o escopo do art. 769, como demonstrado), está na sobre-posição do texto novo ao antigo, passando-se a aplicar o preceito mais fa-vorável à atuação do processo do trabalho, de sorte que ele consiga realizar as especificidades que o distinguem, quando, no caso concreto do conflito obreiro, estas se fizerem necessárias. Portanto, a questão que deve inquietar o operador do processo do trabalho – única aceitável, diante do quadro des-crito anteriormente – não é se existe, ou não, um dispositivo na CLT que re-gule a situação fática de forma diferente daquela normatizada pelo preceito derivado de um novo diploma processual. Faz parte da “cultura trabalhista” a noção de que a norma mais favorável, em caso de conflito de normas, prevalece. A adaptação desse princípio para o processo depende, apenas, da percepção de qual é a verdadeira função do art. 769 da CLT, sendo que esta não é, e certamente nunca foi, a de tornar o processo trabalhista uma ferramenta de proteção ao devedor.

Basta, portanto e tão somente, ao operador do processo trabalhista decidir qual dos preceitos se presta a mais e melhor a resolver o conflito laboral nos moldes preconizados pela Constituição Federal (com elevação da condição social dos trabalhadores) e pelo direito do trabalho (com pro-teção ao economicamente mais débil, diante da maior força econômica da oura parte).

Essa forma de perceber e entender o art. 769 da CLT e a integração entre o processo civil e o processo do trabalho nada tem de nova ou ori-ginal. Ela foi – e é – recorrentemente utilizada por aqueles que se sentem obrigados a se apropriar de elementos estrangeiros que, por qualquer razão, se tornam imprescindíveis à continuidade de certas atividades e, demonstra a história, pode produzir excelentes resultados. Cite-se como exemplo o

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antigo mote antropofagista de Oswald de Andrade, que, em memórias, de-clarava: “Desde cedo guardo a noção de que mesmo as coisas espantosas nunca me espantaram. Encaixo tudo, somo, incorporo”. Os modernistas, cercados pelos movimentos artísticos que floresciam na Europa, não pode-riam ignorar os avanços que as estéticas cubistas ou dodecafônicas traziam para as artes plásticas e para a música, respectivamente, mas se recusavam a deixar as ricas experiências próprias que possuíam para simplesmente ade-rirem à realidade do outro.

É essa mesma a luta, mutatis mutandis, que, agora, vivenciamos, mais uma vez, no processo do trabalho. Com um pouco de boa vontade, porém, não parece difícil perceber que não se precisa estigmatizar o processo civil, nem há necessidade de ignorá-lo na intenção de fortalecer o processo traba-lhista. Tampouco há sentido em copiá-lo, reproduzindo o que não se encai-xa na realidade que emerge do conflito entre o capital e o trabalho. O ponto de equilíbrio dessa equação está em degluti-lo – em termos modernistas/antropofágicos –, utilizando-o naquilo em que ele interessa às necessidades do direito do trabalho, isto é, remodelando-o dentro dos horizontes que o direito material fixa para o direito processual do trabalho e deixando de lado as arestas em que a adequação não é possível.

Sem dizer que o faz, a jurisprudência trabalhista há muito adota pro-cedimentos escancaradamente antropofágicos e, quero crer, tem sido impe-lida a fazê-lo sob pena de não conseguir, simplesmente, entregar a presta-ção jurisdicional demandada pelas partes. É o caso, nas palavras de Luciano Athayde Chaves (As lacunas..., op. cit. p. 70-71), do art. 830 da CLT, que exigia a autenticação dos documentos a serem juntados pela parte, quando a jurisprudência aplicava a disposição do art. 365, IV, do CPC, que permitia a autenticação pelo próprio advogado (em 2009, com a redação dada ao art. 830 pela Lei nº 11.925, o exemplo perdeu a força, posto que a norma celetista passou a reproduzir o conteúdo do artigo do CPC) e da Súmula nº 303 do TST, que consagra a utilização dos §§ 2º e 3 do art. 475 do CPC (os quais tratam da desnecessidade de remessa ex officio para os feitos com valores inferiores a certo montante), mesmo diante da expressa determina-ção pela remessa de ofício, constante do art. 1º do Decreto-Lei nº 779/1969 e, sem dúvida, do art. 818 da CLT, que trata do ônus da prova, assim como também o faz o art. 333 do CPC. Enorme parte da doutrina e da jurisprudên-cia trabalhista, diante dessa normatização bilateral, acaba concluindo pelo abandono do artigo celetista em favor da previsão civilista mais recente5.

5 Homero Batista Mateus da Silva (Curso... Processo do Trabalho, op. cit., p. 38) percebe o problema e escreve: “Tema bastante intrincado diz respeito à distribuição do ônus da prova, porque o art. 818 da Consolidação das Leis do Trabalho efetivamente cuida do assunto, mas o faz de forma tão genérica (prova quem alega) que para

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A questão, ao que tudo indica, não é necessariamente de antiguidade do dispositivo obreiro ou de injustiça deste (em que pese ser possível vislum-brar injustiça em todo artigo que não resolve o que deveria resolver), mas de imperfeição. O art. 818 da CLT não agrada porque é genérico demais, principalmente quando comparado com o art. 333 do CPC, bem mais espe-cífico6. Já que estamos tratando de execução, nada melhor do que relembrar o desprezo amplo, geral e irrestrito que vem recebendo o art. 884 da CLT, quando trata da matéria que pode ser discutida nos embargos à execução, preferindo-se, amplamente, o quanto está disposto no CPC.

Todos esses exemplos servem para comprovar que, de fato, não se está propondo novidade alguma quando se preconiza a utilização do NCPC, no universo trabalhista, apenas de forma antropofágica, isto é, apenas naquilo em que este for útil para fazer do processo trabalhista o que ele precisa ser (um instrumento para aplicar de forma justa o direito material do trabalho).

Essa seria, também, uma forma de se entender – em favor do processo do trabalho e em harmonia com o art. 769 da CLT – o alcance do termo “supletiva”, constante do art. 15 do NCPC7. “Supletivo”, consoante o Di-cionário Michaelis, significa “[Q]ue serve de suplemento; que completa. 2 Gram [D]iz-se das palavras que completam o sentido da palavra princi-pal”. Portanto, as normas do processo comum se aplicariam ao processo do trabalho quando pudessem “completar” estas últimas, o que ocorreria não apenas na ausência da norma trabalhista, mas também quando as normas do processo comum fossem mais favoráveis aos fins do processo do trabalho (não fossem contrárias a ele ou aos princípios que o norteiam).

Ressalto, por oportuno, que as considerações aqui apresentadas são não muito mais que uma tentativa de justificar/fundamentar esse procedi-mento (supletivo, antropofágico, de adequação e/ou sobrevivência dos ope-radores e do próprio processo do trabalho, ou qualquer outro nome que se lhe queira aplicar) já existente, dando-lhe condições de resistir a uma aná-

muitos acaba sendo frustrante. É comum o convívio com a inteligência do art. 333 do CPC pelo menos naquilo em que ele propõe uma distribuição diferente, deixando com o autor a prova do fato constitutivo da pretensão (negada pela defesa, evidentemente) e com o réu o ônus da prova dos fatos impeditivos, modificativos e extintivos da pretensão”.

6 Há exceções. Há quem entenda que o art. 818 da CLT dispõe sobre a distribuição do ônus da prova com o mesmo alcance que o art. 333 do CPC, embora com linguagem mais simples. É uma forma de ver – e interpretar – o artigo celetista que não deixa de ter certo apelo, principalmente quando se quer aplicar o art. 333, sem dizer que se está desrespeitando o art. 769 da CLT. Entretanto, essa não é a visão da maioria dos operadores, e, a julgar pela manifestação da jurisprudência – inclusive do TST –, o prestígio do art. 818 é baixíssimo. Veja-se, por exemplo, que a Súmula nº 6 – que trata da equiparação salarial –, no inciso VIII, prescreve: “É do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação salarial”.

7 “Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”.

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lise crítica, em confronto com a legislação de hoje, e de indicá-lo como o procedimento – que a prática cotidiana do processo consagrou – possível de ser adotado pelo operador do direito trabalhista nas dificuldades advindas da entrada em vigor do NCPC.

III – a execução trabalhISta: faSe ou proceSSo?

Avanço que já existia nas modificações mais recentes do CPC de 1973, o cumprimento da sentença deixou de ser um processo de execução apartado para tornar-se mera fase processual, que se seguiria à formação do título executivo judicial. Esse entendimento foi preservado pelo NCPC, como se percebe pelo art. 513, em que se dispõe que o devedor será inti-mado, na pessoa do advogado, para cumprir a sentença.

Por outro lado – e como sabemos –, a CLT prevê, no art. 880, que

[R]equerida a execução, o juiz ou presidente do Tribunal mandará expedir mandado de citação do executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acor-do no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas ou, quando se tratar de pagamento em dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou garanta a execu-ção, sob pena de penhora. (grifei)

Sendo a citação a própria notícia do processo ao réu – enquanto a intimação é mera notícia da prática de ato processual –, não se pode negar que o confronto dos dois artigos acima mencionados leva, em um primeiro momento, à conclusão pelas diferenças entre o que pretendeu o legislador trabalhista e o que quis o legislador do NCPC. Em uma primeira leitura, parece correto afirmar que, diferentemente do quanto ocorre no processo civil, a CLT ainda prevê um processo de execução e um processo de conhe-cimento, como ocorria anteriormente na redação original do CPC de 1973. Por conta disso e aplicando-se o art. 769 da CLT, apenas com base no que está nele expresso (interpretação meramente gramatical), seríamos obriga-dos a concluir que o juiz trabalhista deveria, ao terminar a fase (ou processo) de conhecimento, determinar que a secretaria confeccionasse um mandado de citação, penhora e avaliação a ser, posteriormente, encaminhado a um oficial de justiça (nos locais onde não há uma central, como em São Paulo, reunindo tais servidores), o qual, por sua vez, efetuaria a diligência junto à sede da empresa devedora e efetuaria a citação. Esse procedimento todo redundaria na inércia da devedora (resumo, aqui, apenas o que acontece na maioria dos casos, sem atentar para as hipóteses – como o pagamento espontâneo – menos comuns), e isso obrigaria o oficial a retornar ao local da citação e efetuar a penhora e a avaliação de bens suficientes à garantia do

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juízo. Tudo, obviamente, consumindo uma quantidade considerável de dias e tempo, tanto para a Secretaria da Vara quanto para o oficial e, pior ainda, para o credor, que tem que esperar isso tudo para receber a notícia, algum tempo depois, de que o credor apresentou embargos à execução, discutindo algum ponto a impedir a realização imediata da hasta pública.

Comparando-se essa realidade com aquela prevista pelo NCPC, em que o credor é intimado para pagar por meio do advogado existente no processo, não é preciso muito esforço (principalmente porque a inércia do devedor já redunda na penhora via dos convênios estabelecidos com a jus-tiça, tais como Bacen, ARISP e outros) para se perceber quão melhor, para a execução e para o credor, é o sistema do NCPC e que o procedimento descrito pela CLT não tem mais qualquer razão de ser.

O problema, porém, é aquele de sempre: é possível se pensar em uma fase de cumprimento do título judicial trabalhista – em vez de processo de execução – com o texto da CLT fazendo expressa menção à citação? Pode o juiz trabalhista intimar a devedora, por meio do advogado, para efetuar o pagamento do valor devido, mesmo quando o advogado não tem poderes para receber citação?

Alguns julgados têm, com segurança, respondido positivamente a es-sas indagações, como dão exemplo as ementas que se seguem:

EMENTA: Execução. Citação na pessoa do advogado. Nulidade. A execução trabalhista é comumente considerada como simples fase processual, e não como processo autônomo. Daí a possibilidade de impulsão da execução de ofício, pelo juiz, e, ainda, a desnecessidade de ser pessoal a citação. Se a citação alcançou a finalidade do ato que, em suma, é o conhecimento do valor exequendo e a possibilidade de adimplemento da dívida, é plenamente válido o ato irregularmente praticado, uma vez que a forma, quando não essencial para a validade do ato, é apenas instrumento para a consecução da finalidade do processo. Nulidade que não se pronuncia. Agravo de petição a que se nega provimento. (Agravo de Petição, Acórdão nº 20090950296, Pro-cesso nº 01593-2006-262-02-00-7, 11ª T., Rel. Eduardo de Azevedo Silva, Revisor(a): Maria Aparecida Duenhas, Data de Julgamento: 27.10.2009, Data de Publicação: 17.11.2009)

EMENTA: Agravo de Petição. Citação do executado na pessoa do advogado. Possibilidade. O § 1º do art. 475-J do CPC, que permite a citação do executa-do na pessoa de seu advogado, tem plena aplicação na Justiça do Trabalho. Há lacuna na CLT quanto a essa possibilidade, atraindo a aplicação subsidiá-ria do Código de Processo Civil, que consagra maior efetividade à execução, especialmente quando se torna forçada e, particularmente, quando se veri-fica dificuldade em localizar o representante do executado, que também é

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beneficiado pela celeridade, evitando, muitas vezes, desnecessária a conde-nação por atentado á dignidade da Justiça. A execução é fase processual que visa materializar o comando jurisdicional exarado na fase de conhecimento, de forma que a citação, no caso, pode desvestir-se de maiores formalidades, mormente quando o processo esteja sendo patrocinado por profissional de-vidamente habilitado. Agravo de Petição não provido. (Agravo de Petição, Acórdão nº 20130698096, Processo nº 01817005320085020031-A20, 14ª T., Rel. Davi Furtado Meirelles, Revisor(a): Francisco Ferreira Jorge Neto, Data de Julgamento: 28.06.2013, Data de Publicação: 05.07.2013)

O que as decisões transcritas deixam antever, creio, é que, de certa forma e apesar do termo “citação” fazer parte do art. 880 da CLT, a exe-cução da sentença trabalhista sempre foi verdadeiramente uma mera fase subsequente à fixação do título executivo judicial. Isso porque, também de forma clara, está previsto, expressamente, pelo art. 8788 da CLT que o juiz poderia dar início à execução de ofício e não há como concluir que ele, juiz, contrariando o princípio da inércia da jurisdição e obedecendo aos “estranhos” ditames do art. 878 da CLT, pudesse determinar a citação do devedor, mesmo em face do patente desinteresse do credor. Citar é dar notícia da existência de uma ação que alguém (que não pode ser o juiz, obviamente) está promovendo, e, no caso da execução trabalhista de ofício, o credor pode, muito bem, não estar promovendo nada.

Mas é possível harmonizar essas incongruências se se conclui que a palavra “citação” está mal empregada no art. 880 da CLT, pois, em realida-de, o juiz não está citando o devedor, mas apenas dando a ele ciência do valor líquido que deve ou do prazo para cumprir a obrigação de fazer ou não fazer. E nada além disso.

Mais simples, todavia, do que todo esse exercício de interpretação sistemática – e chegando ao mesmo resultado – da CLT seria concluir pela melhor adequação do procedimento previsto pelo NCPC (intimação para pagar e não citação) às finalidades do processo trabalhista e, como conse-quência disso (nos termos da fundamentação já apresentada nas linhas an-teriores), pela compatibilidade (supletiva?) desse procedimento aos artigos da CLT sobre o tema.

Qualquer que seja o caminho, parece certo concluir que a melhor interpretação, para o atual estágio da legislação, sobre o procedimento a se

8 “Art. 878. A execução poderá ser promovida por qualquer interessado, ou ex officio pelo próprio Juiz ou Presidente ou Tribunal competente, nos termos do artigo anterior.

Parágrafo único. Quando se tratar de decisão dos Tribunais Regionais, a execução poderá ser promovida pela Procuradoria da Justiça do Trabalho.”

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seguir, após a formação do título executivo judicial trabalhista, seria pela existência de uma fase e não de um (novo) processo (de execução) e, por conseguinte, pela possibilidade da intimação para pagamento na pessoa do advogado do devedor.

As dificuldades não terminam por aí, entretanto. O NCPC (art. 523) fixa prazo de até 15 dias para o pagamento (após a intimação) ocorrer, e a CLT dispõe que o prazo é de 48 horas. Além disso, o NCPC traz a multa de 10% para o caso do não pagamento no prazo supra, e a CLT nada dispõe sobre multa desse tipo. O que fazer?

No meu sentir, a multa só pode ser considerada, no processo do tra-balho, se se concordar que o prazo a ser aplicado para o pagamento é o de 15 dias. Esse foi o lapso temporal que o legislador considerou adequado para que o devedor conseguisse os recursos para efetuar o pagamento, não me parecendo correto concluir que a multa poderia ser imposta, mesmo com a utilização de um prazo menor (48 horas, v.g.). Esse mesmo raciocínio traz uma complicação a mais para o problema: o legislador civilista, agora, conta prazos em dias úteis9 e não de forma corrida, parecendo razoável concluir que o prazo pensado pelo legislador do processo comum é, então, maior do que simplesmente os 15 dias corridos.

Essas dificuldades têm me levado a considerar o prazo de 48 horas, sem multa, como sendo o mais compatível com a realidade do processo trabalhista, vez que preservado o prazo mais exíguo – que é do interesse do credor – sem se retirar deste – e do julgador – a possibilidade de eventuais penalidades ao devedor, caso se constate que a negativa de pagamento te-nha alguma conotação de ato atentatório à dignidade da justiça e não derive da mera falta de meios para cumprir com a obrigação.

coNcluSõeS

1) O NCPC pode ser aplicado ao processo do trabalho se se concluir que a norma do processo comum não colide com a razão de ser do pro-cesso trabalhista, qual seja, a de ser instrumento da aplicação do direito material do trabalho ao caso concreto e de contribuir para a melhoria da condição social dos trabalhadores;

2) Essa aplicação, porém, não ocorre somente quando a CLT não te-nha disposição específica sobre o tema, mas sempre que a norma proces sual civilista se mostre mais apta a fazer com que o direito material do trabalho

9 A já referida IN 39 do TST é no sentido – que me parece totalmente acertado – de que a contagem em dias úteis não se aplica ao processo do trabalho.

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se aplique de forma adequada à solução justa do conflito, complementan-do, nessa medida, as disposições expressas e os princípios específicos do processo do trabalho;

3) Como consequência dos itens precedentes, é correto concluir que, atualmente, existe, também no processo do trabalho, uma fase de cumpri-mento da sentença que se segue à formação do título executivo judicial, ao invés da necessidade de um processo de execução, afirmação que leva à conclusão de que a intimação (não citação) para pagamento pode ser feita, na pessoa do advogado, para que o devedor pague em 48 horas o débito apurado, sob pena de penhora.

referÊNcIaS

BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo, influência do direito ma-terial sobre o processo. São Paulo: Malheiros, 2011.

CHAVES, Luciano Athayde. Interpretação, aplicação e integração do direito pro-cessual do trabalho. In: CHAVES, Luciano Athayde (org.). Direito processual do trabalho: reforma e efetividade. São Paulo: LTr, 2007.

GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Rio de Janeiro: Vozes, 1975.

SILVA, Homero Mateus Batista da. Curso de direito do trabalho aplicado: processo do trabalho. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

VIEIRA, Padre Antônio. Sermão da Sexagésima. Disponível em: <http://www.cultu-ratura.com.br/obras/Serm%C3%A3o%20da%20Sexag%C3%A9sima.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.

Parte Geral – Doutrina

A Legalização da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do Direito

MARCuS ORIOnEProfessor da Faculdade de Direito da USP.

JORgE LuIz SOuTO MAIORProfessor da Faculdade de Direito da USP.

FLávIO ROBERTO BATISTAProfessor da Faculdade de Direito da USP.

PABLO BIOnDIDoutor em Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da USP.

SUMÁRIO: 1 A crítica marxista do Direito no século XX; 2 A obra de Bernard Edelman; 3 A crítica do processo de legalização da classe operária; 4 A atualidade d’A legalização da classe operária perante o direito coletivo do trabalho brasileiro; 5 A recuperação das ilusões perdidas; Referências.

1 a crítIca marxISta do dIreIto No Século xx

Engels e Kautsky, certa feita, mencionaram com muito acerto que o Direito “ocupa posição muito secundária nas pesquisas teóricas de Marx”, aparecendo em primeiro plano “a legitimidade histórica, as situações espe-cíficas, os modos de apropriação, as classes sociais de determinadas épo-cas” (Engels; Kautsky, 2012, p. 34). Em Marx, portanto, o Direito nunca aparece no centro da análise. Ainda assim, mesmo tangenciando o fenô-meno jurídico, a investigação marxiana deixou as indicações necessárias para uma compreensão científica e materialista do direito, sobretudo em O capital. Isto porque a crítica da economia política, ao consistir em uma críti-ca do cerne da sociedade burguesa, de sua “anatomia” (Marx, 2008, p. 47), permite um vislumbre mais acurado sobre os outros aspectos da vida social do capitalismo, sobretudo no tocante às suas formas históricas.

A crítica marxista do Direito propriamente dita é posterior, portanto, a Marx e Engels, ainda que este último tenha se aproximado muito dela ao estudar a ideologia jurídica. Foi somente a partir do início do século XX

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que o fenômeno jurídico começou a receber uma atenção maior por parte da análise marxista, e isto se deve ao evento mais importante do período e, quiçá, de todo o século: a revolução russa.

Com o triunfo da revolução de outubro de 1917, instaurou-se na Rússia uma ditadura revolucionária do proletariado sob a direção políti-ca do partido bolchevique. Naquele momento, teve início um processo de transição ao socialismo, que se materializou no desmantelamento do apa-relho de Estado burguês e na expropriação da burguesia russa. Foi no calor da tentativa de construção de uma nova sociedade, isto é, de ultrapassagem da ordem social burguesa, que o problema do direito se colocou para os marxistas como um tema a ser aprofundado.

Pode-se dizer que o marco inaugural da crítica marxista do direito é a polêmica entre Petr Stucka e Evgeny Bronislavovich Pachukanis. Na referida polêmica, houve um rico debate metodológico sobre a abordagem do Direito, sendo que a contribuição pachukaniana revelou-se muito mais sofisticada – ainda que tenha sido relegada ao esquecimento por força da contrarrevolução burocrática stalinista, a qual, inclusive, custou a vida do autor. De qualquer maneira, é certo que

o momento mais alto do pensamento jurídico marxista se dá com Evgeny Pachukanis. Num notável aprofundamento das teses de Marx, Pachukanis se põe a identificar a específica relação social que dá base à manifestação jurí-dica. Para além de Stutchka – que, se identificava o direito à luta de classes, não lhe apontava os mecanismos íntimos –, Pachukanis se põe a identificar a especificidade do Direito. (Mascaro, 2009, p. 48)

Enquanto Stucka (1988, p. 16) pensava o Direito como um “sistema (ou ordenamento) de relações sociais correspondente aos interesses da clas-se dominante e tutelado pela força organizada desta classe”, qualquer que fosse o caráter do modo de produção dominante (feudal, capitalista, socia-lista, etc.), Pachukanis propôs que o Direito seria uma manifestação própria das formações sociais capitalistas, consistindo em uma forma social gerada pela estrutura mercantil da ordem social burguesa.

Para Pachukanis, não é suficiente identificar a divisão de classes no seio de uma sociedade para se determinar a presença do Direito. Isto porque o Direito, tal como o valor, a mercadoria, o capital, etc., é uma categoria social que diz respeito a um determinado modo de produção e organização da vida material. Não se pode, assim, imaginar que os traços distintivos do fenômeno jurídico estariam presentes em sociedades muito distintas entre si (feudal, capitalista, socialista), apenas modificando-se a classe dominante favorecida (aristocracia, burguesia, proletariado). Esta seria uma maneira de

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se eternizar a forma jurídica, o que impede o conhecimento de suas carac-terísticas peculiares. Eis a ponderação de Pachukanis contra a formulação de Stucka:

O conceito de direito é aqui considerado exclusivamente do ponto de vista de seu conteúdo; a questão da forma jurídica como tal de nenhum modo é exposta. Porém, não resta dúvida de que a teoria marxista não deve ape-nas examinar o conteúdo material da regulamentação jurídica nas diferentes épocas históricas, mas dar também uma explicação materialista sobre a regu-lamentação jurídica como forma histórica determinada. (Pachukanis, 1988, p. 21)

As incursões de Pachukanis, na sua mais famosa obra, A teoria geral do direito e o marxismo, são frutos do materialismo histórico-dialético, em que o autor situa o direito na perspectiva histórica, destacando um perío-do, o capitalismo, que lhe atribui elementos próprios que o caracterizam. Portanto, a noção de forma jurídica, que não se confunde com o conteúdo jurídico, é a mais perfeita tradução de como componentes específicos do capitalismo moldam determinadas categorias econômico/sociais e lhes dão conotação específica. A forma social somente é possível dadas determina-ções históricas, observadas características típicas de um modo de produção. Em outro modo de produção distinto, a forma também assume outra cono-tação. Assim, as especificidades do capitalismo moldam a forma jurídica, assim como essa última é moldada por aquele. A respeito de tais especifici-dades, que permitem o perfeito acoplamento da forma jurídica ao capital, trataremos no decorrer do artigo.

Antes de nos aprofundarmos ainda mais no tratamento dado a Pachukanis ao Direito, algumas palavras sobre conceitos básicos marxistas se fazem necessárias.

A obra de Marx considera o trabalho como dado central para se entender o processo econômico de produção e circulação do capital. Ao discutir em especial com os economistas clássicos, como Ricardo e Adam Smith, o trabalho aparece como o único meio de produção capaz de valo-rizar o valor.

Aqui é importante perceber que todas as mercadorias possuem valor de uso e valor de troca.

O valor de uso da mercadoria é qualidade intrínseca, inerente a ela, no sentido de que, conforme a sua natureza, atenda às necessidades huma-nas. Uma cadeira serve para se sentar, assim como uma faca para cortar os alimentos. Esses são os valores de uso de uma cadeira e de uma faca. É claro

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que o valor de uso deve ser visto historicamente, mas o ponto do qual se parte é da coisa em si mesma.

O valor de troca faz aderir uma qualidade extrínseca às mercadorias no sentido de que, segundo a natureza das relações sociais (e não somente à sua própria) marcadas pela exploração do trabalho alheio, passam a ser mensuradas no mercado. Aqui não bastam as qualidades específicas de que são dotadas, mas também as qualidades sociais de que passam a ser dota-das, determinadas pela quantidade de trabalho despendido para a sua pro-dução. No mercado, realiza-se uma troca de equivalentes. Uma faca, obser-vada a quantidade de trabalho necessário para que fosse produzida, poderia valer duas cadeiras, e assim por diante. No entanto, para evitar que todos precisem ir com facas e cadeiras para o mercado, o que seria impossível, constituiu-se mercadoria considerada o equivalente universal: o dinheiro.

Perceba-se: troca de mercadorias e dinheiro já existiam antes do capi-talismo. O que, então, faz com que sejam percebidas como forma específica do capital? A resposta está exatamente na mercadoria chamada força de trabalho. Ou seja, de novo o trabalho como central na teoria de Marx.

Sendo o trabalho o único meio de produção que produz valor, no ca-pitalismo, a grande sacada é a sua dominação e expropriação por outro que detém os demais meios de produção, como forma de acumulação de sua riqueza. Prestem atenção: o trabalho enquanto fator de riqueza das nações, no lugar de coisas inanimadas, como os metais ou a terra (para os fisiocra-tas), o que já havia sido percebido por autores como Adam Smith (A riqueza das nações). No entanto, a percepção de sua expropriação como forma de acúmulo de riqueza de uma classe e montagem de todo um sistema (o capi-talismo) é obra do engenho de Marx.

Vamos explicar melhor como o trabalho é o único valor que gera valor.

Uma pedra, na natureza, é apenas uma pedra. Descoberto que se trata de uma jazida de plutônio, trata-se de matéria-prima importantíssima. No entanto, acreditar que a jazida ou os instrumentos utilizados no seu pro-cessamento é que geram a riqueza se trata de uma ingenuidade.

Sem o trabalho de alguém que, devidamente preparado, descobrisse as propriedades daquela jazida ou mesmo sem a descoberta, pelo trabalho humano, das formas de processamento, aquela jazida seria, na natureza, uma como tantas outras. Mas não apenas o trabalho intelectual é importante aqui. Esse de nada valeria sem o esforço de operários que realizam, com a força de seus músculos, o processamento.

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Portanto, nem matéria-prima nem máquinas, como se costuma pen-sar, produzem a riqueza do capitalista. O que produz a sua riqueza é a apro-priação do trabalho alheio, para gerar valor (mais-valia). Assim, detendo os outros meio de produção, o capitalista quer agregar valor a esse capital e somente pode fazê-lo por meio da exploração do trabalho alheio.

O trabalho, nessa fase da obra de Marx, que culmina com O Capital em seus três livros, assume uma conotação menos ontológica e passa a estar mais ligado às relações sociais de produção e reprodução da vida material.

Logo, dinheiro ou troca de mercadorias aqui somente têm sentido com a apropriação da força de trabalho alheia, esta também considerada agora no capitalismo como mercadoria. Essa a grande sacada do capitalis-mo em relação aos outros modos de produção. Para que se possa aumentar a extração da mais-valia, diversamente de outras expropriações que já ocor-reram anteriormente no seio da sociedade, é importante que o possuidor desta mercadoria (força de trabalho) se sinta livre e igual a qualquer proprie-tário, para operar no mercado a sua troca.

Essa nova relação social específica, que diverge de troca de merca-dorias em uma sociedade com escravos (antiguidade) ou com servos (idade média), promove uma nova dimensão do valor de troca das mercadorias em geral, com o dado específico de que a mercadoria força de trabalho aparece – apenas aparece, atenção para esse termo – como se fosse realizada por sujeitos proprietários que são tratados como livres e iguais.

Retornando a Pachukanis, é imprescindível, pois, conceber-se o Di-reito enquanto forma social, e uma forma que se distingue por trazer em si o chamado princípio da subjetividade jurídica, entendido como “o princípio formal da liberdade e da igualdade; da autonomia da personalidade, etc.” (Pachukanis, 1988, p. 10). O que caracteriza o Direito, então, não é uma normatividade organizada, como supõem os juristas tradicionais, ou inte-resse de classe inscrito na dominação de uma classe sobre a outra, qualquer que seja o caráter da formação social, como quer Stucka, mas sim a figura do sujeito de direito, a consagração do indivíduo como uma pessoa abstra-ta, desgarrada de vinculações estamentais.

Ora, esse indivíduo abstrato só tem lugar na história em um período bastante determinado, é dizer, à época das relações de produção capitalis-tas. Foi com o entranhamento da relação de capital na produção material da vida que a sociedade burguesa erigiu-se como tal. Isto se deu, sobre-tudo, com a subsunção real do trabalho ao capital e com o surgimento da grande indústria capitalista, organizada em torno do trabalho produtivo

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do trabalhador coletivo e do ciclo do capital industrial. Nessa perspectiva, compreende-se a emergência do sujeito abstrato, que reflete a abstração do trabalho na troca de mercadorias e também na própria produção do valor. O teórico pachukaniano Márcio Bilharinho Naves (2014, p. 55-56) nos traz uma elaboração muito profícua a este respeito:

Ao revestir-se da forma de um sujeito – nas condições de um modo de pro-dução especificamente capitalista, isto é, sob as condições da subsunção real do trabalho ao capital –, o indivíduo se transmuta em vontade pura, abstraída de qualquer determinação. [...] Assim, a constituição do sujeito de direito está vinculada ao processo de abstração próprio da sociedade do capital, de tal modo que podemos dizer que ao trabalho abstrato vai corresponder à abs-tração do sujeito, ou seja, o processo de equivalência mercantil derivado do caráter abstrato que toma o trabalho em certas condições sociais determina o processo de equivalência entre os sujeitos, que só é possível se as pessoas perderem qualquer qualidade social que possa diferenciá-las.

Como se nota, a linha de raciocínio apresentada por Pachukanis, e que está centrada no papel distintivo do princípio da subjetividade e do nexo necessário entre capitalismo e direito – tanto no sentido de que não há capitalismo sem Direito quanto no sentido de que só pode haver Direito, em sua expressão mais acabada, sob o capitalismo –, é a que melhor diferencia o fenômeno jurídico de outras instâncias da vida social. Aliás, como bem identificou o jurista soviético, esta diferenciação é condizente com um pro-cesso histórico real que, com o advento da ordem social burguesa, separou a forma jurídica da moral, da religião1, dos costumes, etc., permitindo um desenvolvimento singular de suas categorias:

Não devemos nos esquecer que a evolução dialética dos conceitos corres-ponde à evolução dialética do próprio processo histórico. A evolução his-tórica não implica apenas uma mudança no conteúdo das normas jurídicas e uma modificação das instituições jurídicas, mas também um desenvolvi-mento da forma jurídica como tal. Esta, depois de haver surgido num estágio determinado da civilização, permanece, durante longo tempo, num estado embrionário com uma leve diferenciação interna e sem delimitação no que

1 “O Direito é forma que vai se sofisticando na medida em que se separa das outras manifestações da humanidade, como, por exemplo, a religião. Assim, por exemplo, em períodos mais remotos da humanidade, quando o Direito não tinha a mesma função atual [...], a sua convergência com a noção de religião era muito mais comum. Por exemplo: nos primórdios, o sistema de provas era determinado pelo chefe religioso. Aliás, sequer havia o que se provar se o Deus/homem que governasse determinasse a solução do conflito, prescindindo até mesmo de provas. Em momento posterior, as ordálias ou juízos de Deus eram também um bom exemplo de como a prova estava [...] ligada à questão religiosa. Aquele que ultrapassasse as limitações impostas (como passar incólume por um chão de brasas, por exemplo) contava com a aquiescência divina, já que a verdade estaria ao seu lado. Com o tempo, admitiu-se o sistema de prova legal [...], (que) corresponde a uma necessidade do nascituro capitalismo, envolvido com a ideia liberal da legalidade em seu sentido estrito.” (CORREIA, 2013, p. 556)

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concerne às esferas próximas (costumes, religião). Foi apenas desenvolven-do-se progressivamente que ela atingiu o seu supremo apogeu, a sua máxima diferenciação e precisão. Este estágio de desenvolvimento superior corres-ponde a relações econômicas e sociais determinadas. Ao mesmo tempo este estágio caracteriza-se pelo aparecimento de um sistema de conceitos ge-rais que refletem teoricamente o sistema jurídico como totalidade orgânica. (Pachukanis, 1988, p. 35-36)

Por conta da repressão stalinista, a teoria pachukaniana foi brutal-mente interrompida no seu desenvolvimento. Pachukanis foi executado em 1938, no contexto dos famigerados Processos de Moscou2. Desse modo, a produção teórica marxista sobre o Direito sofreu um revés muito grande. Sob o stalinismo, inclusive, predominou a doutrina de Andrei Vichinsky, que identificava o direito à legalidade posta e fazia a mais completa apolo-gia ao regime stalinista e à deformação burocrática do Estado nascido com a revolução de outubro.

Com o trágico desfecho da revolução russa, que acabou enterrada pela degeneração stalinista, o impulso teórico que colocou em foco o pro-blema do direito se perdeu. A transição socialista na URSS foi abortada, de modo que a ditadura revolucionária do proletariado, o regime dos soviets, foi substituída pela ditadura burocrática de um partido bolchevique irreco-nhecível, dirigido por uma camarilha que aniquilou moral e fisicamente a vanguarda e as lideranças da revolução. No campo de estudo do Direito, esse retrocesso colossal se manifestou no fim das pesquisas mais profundas. O fenômeno jurídico voltaria a ter uma dimensão marginal nas obras mar-xistas.

Com efeito, encontramos considerações sobre o Direito em autores clássicos do marxismo do século XX, como, por exemplo, Louis Althusser em seu Sobre a reprodução (1995). Todavia, faltavam estudos de fôlego que se debruçassem direta e prioritariamente sobre a questão do Direito. Faltava um sopro renovador que pudesse retomar o caminho trilhado por Pachukanis e avançar nas elaborações. Este sopro não foi dado por Althusser, mas al-guns de seus seguidores tomaram para si, de certa maneira, esta tarefa. Den-tre eles, Bernard Edelman mostrou-se o mais brilhante.

2 Em 1938, a pretexto do assassinato de Kirov, um quadro do partido bolchevique, desencadeou-se na URSS uma onda de perseguições contra antigos militantes do partido, que consistiu em um recrudescimento da burocratização e da repressão política que assolavam o país desde o final da década de 1920. Figuras históricas do partido bolchevique como Kamenev, Zinoviev, Bukharin e muitas outras foram forçadas a confessarem crimes que não cometeram, o que resultou em sua condenação e execução – muitos desses, inclusive, haviam integrado blocos com Stalin antes de serem renegados. A maioria da antiga direção bolchevique foi fisicamente eliminada nos Processos de Moscou. Trotsky foi condenado, mas se encontrava no exílio. Em 1940, foi assassinado por um agente da GPU.

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2 a obra de berNard edelmaN

A denúncia dos crimes de Stalin e a poderosa vaga revolucionária de 1968, a última em solo europeu, enfraqueceram o prestígio e a hegemonia do aparato stalinista na esquerda francesa. Desenhou-se, assim, um cená-rio de oportunidade para uma renovação do marxismo, tanto em relação à dogmática oficial patrocinada por Moscou quanto em relação a algumas tendências reformistas.

Não houve na França, como na Rússia de 1917, uma insurreição pro-letária que culminou com o início de uma transição socialista. Contudo, a vaga revolucionária de 1968 colocou a classe operária em movimento, em um ascenso fortíssimo que se enfrentou não apenas com o governo conser-vador de Charles De Gaulle, mas também com a linha política do PCF, que canalizou a força espetacular do levante operário e popular para o terreno reformista das negociações econômicas – o que deu sobrevida a um go-verno que estava prestes a cair e que de fato poderia cair se houvesse uma decidida direção revolucionária à frente do movimento de massas.

A frustração de um ascenso revolucionário que terminou em nego-ciações econômicas conduzidas por uma direção política conciliatória co-locou a questão do “terreno” da luta de classes, ou seja, do espaço social em que ela se realiza. Provou-se novamente na prática a tese leninista de que, no confronto econômico, prevalece a consciência sindicalista, “tradeu-nionista”, “uma convicção de que é preciso reunir-se em sindicatos, lutar contra os patrões, cobrar do governo a promulgação de umas e outras leis necessárias aos operários, etc.” (Lênin, 2010, p. 89), mas sem se colocarem em causa a dominação do capital e a questão do poder. Isso porque a luta econômica e sindical se limita a barganhar o preço da força de trabalho, deixando intocado o problema da sua comercialização, é dizer, o cerne do modo de produção capitalista.

Ora, um conflito que se encerra na sua pauta econômica, que não ultrapassa as determinações mercantis do capitalismo, é um conflito que se dá no interior da arena do Direito, e com pleno respeito às suas linhas de demarcação. Prevalecem, nessas condições, tanto a forma jurídica em sua generalidade quanto o seu arcabouço institucional sindical, o qual instrui e dá sustentação à permanência da relação capital-trabalho. Não se pode es-quecer que a estrutura sindical é um componente necessário de um regime social em que a força de trabalho é uma mercadoria e que, como tal, precisa passar por foros de negociação do seu preço. Dado o liame intrínseco entre Direito e mercadoria no capitalismo, como bem demonstrou Pachukanis, a

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forma jurídica demonstra todo o seu peso ao envolver e disciplinar o mer-cado de trabalho.

Na conjuntura inaugurada em 1968, portanto, restou escancarada a influência do Direito sobre a luta de classes. Apesar do ímpeto revolucio-nário inicial, o movimento de massas se viu prisioneiro das armadilhas do terreno jurídico, as quais necessariamente o conduziriam à conciliação de classes, à restauração da ordem e à reprodução da sociabilidade do capital. Discutir o direito sob um ponto de vista marxista, então, tornou-se uma necessidade urgente naquele contexto. Neste contexto é que surge o mar-xismo que assenta bases nas proposições de Louis Althusser, que, em sua posição de afastamento contínuo do stalinismo e de crítica implacável ao reformismo, logrou produzir obras de enorme importância para a crítica do fenômeno jurídico. E é exatamente no contexto da crítica althusseriana que se deve conceber a obra de Bernard Edelman.

Em 1973, Edelman inicia esse movimento de crítica radical do Direi-to com a obra O direito captado pela fotografia (2001). Três anos depois, Michel Miaille lança a sua Introdução crítica ao direito (2005), igualmente partindo das premissas pachukanianas. Em 1978, outras duas obras desses autores foram publicadas: O Estado do direito, de Michel Miaille (1980), e A legalização da classe operária, de Bernard Edelman (2016).

Em que pese a importância dos textos de Miaille, colocaremos nos-so foco no trabalho de Edelman. Neste autor, encontramos uma teoria do Direito que parte decididamente dos pressupostos pachukanianos e que se propõe a sofisticá-los por meio da teoria do sujeito – e de sua interpelação ideológica – em Althusser. Segundo Louis Althusser (1995, p. 23), “não há ideologia que não seja pelo sujeito e para sujeitos3”, no sentido de que o indivíduo é “sempre já” (isto é, desde sempre) sujeitado pela ideologia, constituído por ela concretamente por meio das práticas materiais que a instituem e dos aparelhos ideológicos que cuidam da sua reprodução. Em uma apertada síntese, desde o instante em que qualquer sujeito vem ao mundo já se encontra sujeito a uma ideologia na qual estará inserido, sendo que, individualmente, não terá condições de superá-la. Na realidade, mais do que isto, há aparelhos que reforçam esta ideologia, tais como a escola, o sindicato, a mídia (para usar um exemplo mais atual) e outros.

Em seu livro O direito captado pela fotografia, Bernard Edelman mos-tra-se caudatário desta concepção althusseriana, indicando um caminho de diálogo com a linha teórica de Pachukanis:

3 Todas as citações de obras em idioma estrangeiro serão traduzidas por nós livremente.

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Os “indivíduos” são interpelados como sujeitos pelo direito. Essa interpela-ção é constitutiva de seu ser jurídico mesmo, no sentido de que é esta inter-pelação “tu és um sujeito de direito” que lhes dá o poder concreto, que lhes permite uma prática concreta. “Já que tu és o sujeito de direito, tu és capaz de adquirir e de (te) vender”. (Edelman, 2001, p. 26)

Coerentemente com a crítica pachukaniana, Edelman identifica o mercado como o espaço de realização das práticas materiais que ensejam a figura do sujeito de Direito. A forma mercantil engendra um indivíduo à imagem e semelhança do portador de mercadorias, um sujeito formalmente livre, igual aos outros e potencialmente proprietário. Entre os três aspectos centrais desse sujeito de direito, destaca-se a propriedade, ou seja, a sua característica de ser “um proprietário de mercadorias abstrato e transposto para as nuvens”, para usarmos a expressão pachukaniana (1988, p. 78). É com referência na propriedade que as categorias jurídicas de liberdade e igualdade se estabelecem. Uma vez que a liberdade e a igualdade são cate-gorias derivadas da esfera mercantil do valor e da troca, elas se colocam em função dos proprietários de mercadorias. É por meio da realização contra-tual delas que a propriedade se transfere de mãos em mãos no processo incessante de permutas. Edelman (2001, p. 110) conclui que “a movimen-tação da propriedade privada cria, de fato, uma liberdade e uma igualdade, mas esta liberdade e esta igualdade são aquelas mesmas da propriedade privada”. Na perspectiva do mercado, o trabalhador deve estar apto para vender a sua força de trabalho, como proprietário dela. Não pode ser tra-tado de forma distinta dos que possuem o capital, que da força de trabalho extraem o principal elemento de concentração de suas riquezas. Caso con-trário, não passaria de um escravo ou de um servo. No entanto, como não estamos mais na antiguidade ou na idade média, a expropriação da força de trabalho precisa contar com a aquiescência do próprio trabalhador. Portan-to, ao se conceber a figura do sujeito de Direito como homem livre, igual e proprietário, para a circulação da principal mercadoria que deve ser expro-priada pelo capital, a força de trabalho, há a consolidação concomitante de uma ideologia jurídica – a que qualquer indivíduo se encontra submetido e que corresponde a categorias estudadas por Althusser, como a de que o sujeito é interpelado pela ideologia, no sentido de que não tem condições, individualmente, de a ela resistir, nela já se inserindo desde o instante em que passa a existir como ser vivente.

Assim, consagra-se uma imagem abstrata do homem na sociedade burguesa, um indivíduo que é nivelado pelo mercado e que dele participa independentemente da sua ascendência social. Os indivíduos se apresentam como portadores não apenas das mercadorias que oferecem, mas também

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das relações sociais que dão base às trocas. Personificando a equivalência do trabalho abstrato, eles são postos como “equivalentes vivos”, de tal sorte que “o processo do valor-de-troca torna-se o processo do sujeito, e o pro-cesso do sujeito, o processo do valor-de-troca” (Edelman, 2001, p. 111).

Esmiuçando a relação entre a forma jurídica e a forma mercantil, Edelman explicita as funções concretas e ideológicas do direito, postulando que ele, em sua vivência, “fixa as formas de funcionamento do conjunto Das relações sociais, torna eficaz, no mesmo momento, a ideologia jurídica, que é a relação imaginária dos indivíduos com as relações sociais em geral”, assumindo a “dupla função de fixar concretamente e ‘imaginariamente’ – e seria melhor dizer que a fixação concreta jurídica é ao mesmo tempo ideo-lógica – o conjunto das relações sociais” (Edelman, 2001, p. 104). E nisto, inclusive, se vê mais uma apropriação do pensamento de Althusser acerca da ideologia, concebendo-a como uma “relação imaginária dos indivíduos com as relações sociais em geral”.

Como síntese da crítica de Edelman à forma jurídica em sua generali-dade, vale citar a seguinte passagem:

O que me proponho a demonstrar ao deixar voluntariamente de lado o que se passa “alhures”, no “laboratório secreto da produção”, é que o direito toma a esfera da circulação como dado natural; que esta esfera, tomada em si como absoluta, não é nenhuma outra senão a noção ideológica que porta o nome hobbesiano, rousseauniano, kantiano ou hegeliano, de sociedade civil; e que o direito, ao fixar a circulação, não faz senão promulgar os de-cretos dos direitos do homem e do cidadão; que ele escreve sobre a fronte do valor-de-troca os signos da propriedade, da liberdade e da igualdade, mas que estes signos, no secreto “alhures”, leem-se como exploração, escravidão, desigualdade, egoísmo sagrado. (Edelman, 2001, p. 107)

Foi sob esta perspectiva de crítica radical que Edelman desvendou como o Direito, introduzindo categorias charmosas na vida social, chan-cela a exploração capitalista e seus desdobramentos. Em sua investigação implacável, nem mesmo noções como liberdade e igualdade foram poupa-das. A base dos direitos humanos, tidos como um dos maiores marcos da civilização, restou desmistificada. O passo seguinte do autor seria levar esta concepção aos domínios do direito do trabalho, o que elevaria sua contri-buição ao marxismo a um novo patamar.

3 a crítIca do proceSSo de legalIzação da claSSe operárIa

Em A legalização da classe operária, Edelman apresenta uma crítica do direito do trabalho, em especial do direito coletivo do trabalho. Por meio

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dessa crítica, ele demonstra como a forma jurídica incide sobre a luta de classes, inclusive nos momentos em que esse conflito aparece mais clara-mente, como nas greves operárias. A grandeza dessa obra reside, assim, não apenas no rigor metodológico e na extensão do campo de análise, mas também no fato de ela conjugar dois elementos muito caros ao marxismo: as formas sociais do capitalismo (no caso, o Direito) e a luta de classes, esta contradição fundamental que tem colocado a história em movimento até dos dias de hoje.

O conteúdo da obra consiste em um desvelamento profundo das ilu-sões da doutrina jurídica acerca do direito do trabalho e de seu papel na sociedade. Na contramão desta tradição que vê no ramo juslaboral ape-nas um inventário de conquistas obreiras históricas, ou mesmo um sinal de triunfo da dignidade humana, Edelman (2016, p. 18) alerta que “a classe operária pode ser ‘desviada’, precisamente por suas próprias ‘vitórias’, que podem apresentar-se também como um processo de integração ao capital”, lembrando, ainda, que “a ‘participação’ nunca esteve ausente da estratégia da burguesia, e há veneno em seus ‘presentes’”.

Edelman não despreza as medidas de bem-estar que foram obtidas sob pressão do movimento operário. Contudo, seu esforço é o de salientar o outro lado da moeda, ou, se quisermos, o “preço” que foi pago por essas concessões do capital. Esse preço, por certo, não foi a supressão da luta de classes. Em sua filiação althusseriana, Edelman seguramente entende que “a luta de classes e a existência das classes são uma só e mesma coisa”, uma vez que a divisão da sociedade em classes “não se faz post festum; é a ex-ploração de uma classe por outra e, portanto, a luta de classes que constitui a divisão em classes. Pois a exploração já é luta de classes” (Althusser, 1978, p. 27). É por isso que nosso autor fala em desvio desse conflito, e não na sua abolição. Ocorre que, com as conquistas econômicas da classe operária e sua integração política (e jurídica, pelo reconhecimento de direitos) à so-ciedade burguesa, o enfrentamento entre capital e trabalho desloca-se para o âmbito institucional dos partidos da ordem e do sindicalismo oficial, ou seja, para o campo do Estado em sua concepção ampliada, de maneira que “as próprias lutas operárias são travadas nesses aparelhos, elas se desenvol-vem nessas estruturas e essas estruturas provocam efeitos sobre o combate” (Edelman, 2016, p. 19).

Eis aí o cerne da questão. O terreno sobre o qual se realiza o embate está longe de ser indiferente para o seu resultado. Enquanto uma forma, o Direito envolve o seu conteúdo e o submete às constrições necessárias para moldá-lo em favor da reprodução da sociabilidade do capital – de tal sorte

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que as posições jurídicas conquistadas pela classe operária não traduzem o seu poder de classe propriamente, mas antes o poder da ordem social que se organiza juridicamente. Isto porque a relação entre capital e trabalho é uma relação jurídica entre sujeitos, é um antagonismo social expresso em um liame entre contratantes.

Todos os avanços do movimento operário que foram contemplados legalmente são concretizados a partir das categorias jurídicas que instruem a sociedade burguesa e o Direito como uma de suas formas sociais. Logo, não é possível imaginar que a classe operária possa se amparar no direito para questionar o modo de produção capitalista. Tampouco é possível que ela construa no interior da forma jurídica qualquer estratégia de poder, pois o poder, nessa sociedade, só pode ser aquele que corresponde à sua estru-turação capitalista.

Para o direito do trabalho, as consequências desse raciocínio são tre-mendas. Visto como uma espécie de direito de resistência pelos juristas progressistas, ou mesmo como o embrião para um novo direito, como uma possibilidade de renovação geral da ordem jurídica e do seu liberalismo tradicional, o direito do trabalho se revela, graças à inquirição implacável de Edelman, como mais um espaço de consagração do domínio burguês. Transcrevamos as palavras do autor em toda a sua crueza:

Devemos nos livrar de uma vez por todas da ilusão tenaz de um “direito ope-rário” que manteria distância do direito burguês, que seria um tubo de ensaio em que se elaboraria um “novo direito”. Tradicionalmente, os especialistas têm empregado seus esforços nesse sentido. É necessário, dizem esses espe-cialistas, autonomizar o direito do trabalho, dar-lhe seus títulos, reconhecer sua especificidade. Ele é, continuam eles, um direito coletivo, um direito de massa, para as massas, que não tem mais nada – ou cada vez menos – a ver com o direito “comum”, leia-se, o direito civil. Desse esforço nasceu o “socialismo dos juristas”, que se perpetua até hoje sob as espécies sutis e técnicas das relações entre direitos: direito do trabalho/direito civil, direito do trabalho/direito comercial, direito do trabalho/direito público...

Como se o trabalho estivesse “do lado” do capital e do Estado! Como se o “direito operário” não fosse o direito burguês para o operário! E como se, enfim, milagrosamente, o direito do trabalho fosse uma zona juridicamente “protegida”!

Não existe o “direito do trabalho”; existe um direito burguês que se ajusta ao trabalho, ponto final. (Edelman, 2016, p. 19)

É claro que, para chegar a um diagnóstico tão “drástico” como esse, Edelman não se limitou a construções simplórias ligadas à metáfora marxia-

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na da relação entre estrutura e superestrutura. O autor guiou-se pela com-preensão acerca das formas sociais e de suas consequências. Uma vez que tais formas cristalizam as relações de produção que as engendram, delas não se pode esperar qualquer tipo de subversão contra a ordem existente. Nessa ordem de considerações, não se poderia conceber o direito do tra-balho como um direito do trabalhador contra a classe capitalista, ou então imaginá-lo como um ramo jurídico “menos burguês”. Ao longo de sua obra, Edelman demonstra à exaustão que as relações entre capital e trabalho, ao serem mediadas juridicamente pelo direito coletivo do trabalho, encontram um ponto de sustentação bastante sólido, e que a forma jurídica aplicada ao embate capital-trabalho sofistica a supremacia burguesa a partir da “captu-ra” do movimento operário, do seu enredamento.

Ao dizer que não existe um direito do trabalho que “pertença” ao trabalhador, ou que possua uma substancialidade distinta daquela que compõe o direito burguês em geral, Edelman recupera a radicalidade de Pachukanis, já que este, coerentemente com o caminho teórico que trilhou, propôs que o direito é sempre o direito burguês, não podendo prestar-se ao serviço de construção de um outro tipo de sociedade, ou mesmo de contra-posição aos interesses da classe capitalista. O pensador russo compreendia que “o aniquilamento de certas categorias (precisamente de certas catego-rias e não de tais ou quais prescrições) do direito burguês em nenhum caso significa a sua substituição pelas novas categorias do direito proletário”. E é assim pelo mesmo motivo que a supressão “das categorias do valor, do capital, do lucro, etc., no período de transição para o socialismo evoluído, não significa o aparecimento de novas categorias proletárias do valor, do capital, etc.” (Pachukanis, 1988, p. 26-27). Portanto, por mais que o direito do trabalho apresente figuras alternativas àquelas do direito civil, mais libe-ral em sua compleição, daí não se infere que elas atentem contra a lógica da sociedade burguesa.

Em acréscimo, a sutileza da função cumprida pelo direito do trabalho está no seu modo de envolver o proletariado em sua oposição face à bur-guesia. A “legalização da classe operária” consiste nesse expediente de sub-sunção de uma classe potencialmente revolucionária e que traz em si uma negatividade ínsita em relação à burguesia e ao capitalismo, aos ditames da forma jurídica. Significa fazer com que o confronto de classe se realize em uma arena segura, em que os limites do enfrentamento estejam bem delimitados, impedindo-se uma radicalização que ultrapasse as margens de tolerância das relações de produção. Para tanto, o capital tem a “astúcia” de dar à classe operária “uma língua que não é a sua, a língua da legalidade burguesa, e é por isso que ela se exprime gaguejando, com lapsos e hiatos

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que às vezes rasgam o véu místico (Maio de 1968 na França)” (Edelman, 2016, p. 22). Observe-se, inclusive, que Edelman não é um fatalista, que ele prevê a possibilidade de rupturas com a ordem burguesa. A diferença é que, contrariamente aos adeptos do “socialismo jurídico”, ele vislumbra essa possibilidade nos processos revolucionários, e não no direito ou nos demais aparatos institucionais do capitalismo.

A tarefa assumida por Edelman, pois, é a de decodificar a “lingua-gem” da legalidade burguesa, entender como ela aprisiona o movimento operário nas molduras da sociabilidade capitalista, como se processa o en-quadramento jurídico da classe operária e de sua luta contra o capital.

O primeiro passo para o entendimento desse processo é o correto dimensionamento da relação capital-trabalho. Edelman esmiúça a unidade dialética desse par, pondo em relevo o fato de que, no capitalismo, trabalho e capital se determinam mutuamente. Esta unidade, com efeito, é basilar ao modo de produção capitalista, e não há um único conflito trabalhista que coloque em causa a natureza desse vínculo. Ao contrário, o direito do trabalho reproduz as condições sociais da produção capitalista e conforma a exploração de classe:

Podemos compreender agora como o contrato de trabalho reproduz o direito de propriedade, e como o direito de propriedade reproduz o contrato de trabalho. De um lado, o contrato de trabalho aparece como uma técnica de venda do “trabalho”, que só dá direito a um salário; de outro, o proprietário dos meios de produção compra a força de trabalho sob a forma de salário e a incorpora juridicamente a sua propriedade.

No final das contas, a relação capital/trabalho resolve-se numa relação de título: título de trabalho em oposição ao título de propriedade.

Assim, quando combinam contrato de trabalho e propriedade privada, os tribunais reproduzem de fato a separação do trabalhador de seus meios de produção. (Edelman, 2016, p. 31)

Há, pois, uma simetria entre o contrato de trabalho e o direito de propriedade, ou melhor, uma correlação necessária e que instrui o que Edelman chama de poder jurídico do capital. A dominação do capital sobre o trabalho é exercida sob a forma de um vínculo contratual que atribui direi-tos e deveres para as partes envolvidas em um arranjo aparentemente iguali-tário, destoante do perfil estamental da sociedade feudal, por exemplo. Mas é essa igualdade entre polos contratantes que abriga a coleta do mais-valor e que dá a dinâmica da exploração capitalista.

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A incidência da igualdade jurídica sobre a relação capital-trabalho traz efeitos sobre o modo como esse antagonismo imanente se desenvolve, e Edelman faz uma imersão nessas implicações. O teórico francês aponta, primeiramente, a contratualização das greves: o confronto entre as classes é enquadrado como um confronto entre sujeitos munidos de direitos, de sorte que os antagonistas guardam obrigações entre si mesmo quando entram em choque. E mesmo o alcance e a intensidade desse choque são subme-tidos a uma disciplina jurídica, a uma avaliação de licitude e ilicitude dos atos praticados. Dessa maneira, “a greve é lícita na medida do contrato de trabalho; quando há abuso contratual, há greve abusiva”, o que significa dizer que “a greve, quando se torna extracontratual, torna-se, por consequ-ência, ilícita ou ilegal, segundo sutilezas que não nos interessam por ora” (Edelman, 2016, p. 38).

O intuito último dessa contratualização é a defesa da produção. O critério aferidor da abusividade ou não da greve é o seu potencial lesivo à normalidade da produção capitalista. Não sendo dado à classe burguesa, em condições de normalidade política, simplesmente proibir as greves – ao menos não na época de maturidade do capitalismo –, a política oficial para essas formas de luta proletária é a de contenção segundo regras dedicadas a poupar a produção capitalista de maiores abalos. Nesse sentido, admite-se a prática grevista, mas com a condição de que o empregador seja avisado previamente, que um mínimo do processo produtivo seja mantido em fun-cionamento, que a posse do capital sobre os meios de produção não seja afrontada e que as reivindicações do movimento paredista não ultrapassem o âmbito sindical, quer dizer, a seara econômico-profissional da categoria mobilizada.

Com tudo isso, a forma jurídica não só preserva a fluidez da produção como também pretende forçar os trabalhadores a adotarem uma estratégia de luta previsível e admissível, tolerável para os padrões capitalistas. Me-rece destaque, entre os requisitos usuais para a licitude da greve, o perfil econômico-profissional que se espera das reivindicações do movimento operário. Trata-se simplesmente de se reproduzir a separação formal entre Estado (política) e sociedade civil (interesses econômicos) que caracteriza o capitalismo, além de se interditar a politização da luta operária e a forma-ção de mobilizações que superem a divisão do proletariado em categorias profissionais. Pois é da superação desse fracionamento em interesses pro-fissionais que depende a unificação do proletariado na sua oposição incon-ciliável perante o capital. Somente assim a luta de classes pode atingir um patamar superior, comportando uma disputa não mais em torno do preço de

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venda da força de trabalho, e sim das relações de propriedade que transfor-mam a força de trabalho em mercadoria.

Pelo aspecto ideológico do Direito estudado por Edelman, logo se percebe que a forma jurídica conspira contra qualquer tentativa de se pôr em causa as relações de produção capitalistas. Ela se empenha, ao revés, em naturalizar tais relações e dissimular seu caráter de classe por meio de um discurso humanista muito difundido pelos juristas e que, apropriado pelos Tribunais, fundamenta decisões repressivas contra os trabalhadores em greve, exercendo uma disciplina férrea contra eles sempre que suas mo-bilizações ameaçam sair da esfera sindical-profissional. Daí se entende a visão do autor quanto à impossibilidade de uma ordem jurídica admitir, a título ilustrativo, as greves políticas ou as ocupações dos locais de trabalho.

Tendo em vista todas essas circunstâncias, Edelman não exagera em nada ao sintetizar suas reflexões sobre o direito de greve, tido como um triunfo absoluto da classe operária pelos juristas progressistas e humanistas, da seguinte maneira:

O direito de greve é um direito burguês. Entendamos: não digo que a greve é burguesa, o que seria um absurdo, mas que o direito de greve é um direito burguês. O que quer dizer, muito precisamente, que a greve só atinge a lega-lidade em certas condições, e essas condições são as mesmas que permitem a reprodução do capital. (Edelman, 2016, p. 48)

4 a atualIdade d’a legalIzação da claSSe operárIa peraNte o dIreIto coletIvo do trabalho braSIleIro

Como visto nas seções anteriores, A legalização da classe operária pode ser considerada a principal obra de Edelman do ponto de vista teórico, uma vez que consuma seu projeto crítico do direito e consubstancia o mo-mento em que ele dá o passo decisivo além da elaboração pachukaniana. Por isso, é com estranhamento que se constata que a obra permaneceu por quase quatro décadas inédita em língua portuguesa, sequer tendo recebido traduções em outros idiomas latinos como espanhol ou italiano. Entretanto, sua publicação no Brasil pela Editora Boitempo, em 2016, não poderia se dar em oportunidade melhor: o País encontra-se em momento político ím-par para que o público leitor possa verificar em sua própria vida cotidiana a insuperável atualidade da obra. Mais do que isso, como o próprio Edelman, a despeito de ter abandonado o projeto d’A legalização da classe operária4,

4 A esse respeito, é interessante notar que o original em francês trazia como subtítulo a indicação “Tomo I”, sugerindo que haveria continuidade da obra em outros tomos, que, entretanto, jamais vieram a existir. A leitura do prefácio à edição brasileira é bastante elucidativa das razões de tal abandono, já que a rejeição

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reconheceu no prefácio que elaborou a pedido dos tradutores para a publi-cação no Brasil, a obra pode ser considerada quase profética, depois de ter sido rejeitada à época de sua publicação:

Devo dizer que esta abordagem suscitou verdadeira revolta. Lembro-me que quando expus minhas teses na Escola Normal Superior, onde lecionava na época, a companheira de Althusser, antigo membro da resistência e cegetista ardorosa, interpelou-me violentamente e me chamou de reacionário, de trai-dor e de mercenário da burguesia... Louis Althusser manteve prudentemente o silêncio. Em resumo, este livro foi retirado de cena, e apenas um jornal anarquista lhe fez apologia. Então, o que se pode dizer dele hoje? Que ele era premonitório, mas que a realidade o ultrapassou? Sim e não. Sim, porque o desmoronamento do comunismo se produziu com uma rapidez que me surpreendeu. [...]. Mas, sobretudo, parece-me que minha decodificação jurí-dica da realidade político-econômica conservou todo o seu valor. (Edelman, 2016, p. 9-10)

Com efeito, em 1978, no momento de sua publicação original, a obra talvez não fizesse tanto sentido deste lado do Atlântico. Naquele instante, depois de uma década e meia de uma violenta Ditadura Militar, em que o movimento sindical foi sufocado de todas as formas possíveis pelo Direi-to e pela força e substituído por uma atuação meramente assistencial sem qualquer conteúdo de classe5, o operariado retomava suas lutas a partir de uma organização de base totalmente independente da organização sindical oficial:

Mas nem só de adesismo vivia o movimento. Se as greves por categoria e a chegada de grupos políticos de esquerda às direções sindicais eram impossí-veis dado o alcance da repressão, os ativistas mais combativos não desistiram do trabalho de organização dos trabalhadores nas empresas. (Mattos, 2009, p. 113)

O paciente e clandestino trabalho de base efetuado ao longo de toda a década de 1970, auge da repressão, começou a mostrar seus resultados na fábrica da Scania, em São Bernardo do Campo, em 12 de maio de 1978: ali

à obra foi bastante frustrante ao autor, que a viu realizar-se anos mais tarde, como se pode verificar na transcrição que segue.

5 “Os instrumentos já estavam dados pela própria CLT, que facultava ao Ministério do Trabalho o poder de intervir nas entidades sindicais, destituindo diretorias eleitas e substituindo-as por interventores. [...]. A cassação dos direitos políticos e a instauração de inquéritos policiais militares contra os principais dirigentes sindicais cassados criaram, para os que conseguiram escapar à prisão imediata, a alternativa da clandestinidade e do exílio. [...]. Após nova leva de intervenções, a ditadura, em inícios dos anos 1970, tratou de valorizar um ‘novo’ modelo de atuação sindical, pautado pela ação exclusivamente assistencial e afinado com as ideias de crescimento econômico como pré-requisito para uma posterior política redistributiva.” (MATTOS, 2009, p. 101-111)

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irrompia uma greve, organizada inicialmente sem a presença do sindicato, que desencadearia uma onda de greves que varreria a região do ABC pau-lista até 1980. Há inúmeros relatos disponíveis, entre os quais o de Mattos, anteriormente citado, o brilhante trabalho de Antunes (1988) e o estudo de Abramo (1999). Em todos eles, com variados níveis de detalhamento, é possível perceber inúmeras características do movimento operário de que já falava Lênin em seu clássico Que fazer? (2010): o espontaneísmo, a van-guarda operária e sua relação com a base, a consciência “tradeunionista” em contraposição à consciência social democrata, o ganho organizativo da greve por vezes superando os ganhos materiais para os trabalhadores e o ganho individual de consciência pelos operários a partir de seu engajamen-to na luta. Tratava-se, em suma, de um período de “ilusão”, para dialogar com Edelman, que já noticiava, em 1978, terem sido as “ilusões perdidas”, especialmente a ilusão da existência da classe operária (2016, p. 145).

A história do “novo sindicalismo”, nome que recebeu o movimento inaugurado em 1978, e de sua captura pelo Estado, consumada pela Cons-tituição de 19886 e cada vez mais aprofundada desde então, é a crônica da legalização da classe operária brasileira e justifica o crescente ganho de interesse da obra de Edelman a partir de então.

Com efeito, não se pode esquecer a inarredável contribuição de Althusser no sentido de que, na sociedade capitalista, a dominação de clas-se é exercida por meio de uma multiplicidade de aparelhos, repressivos e ideológicos, que conjuntamente formam o que se convencionou chamar de Estado7. O que permite a Edelman apontar o sindicato como um aparelho ideológico de Estado (2016, p. 123) no sentido althusseriano é uma estra-tégia de controle que deve ser exercida de acordo com a configuração do aparelho repressivo de Estado8. Com o enfraquecimento do aparato militar do Poder Executivo a partir da redemocratização em 1988, desenhou-se a

6 “A redemocratização do país, com a aprovação da Constituição de 1988 e as eleições presidenciais de 1989, encerra, em certo sentido, a ‘era’ do novo sindicalismo brasileiro. O fim do controle do Ministério do Trabalho sobre os sindicatos, do ‘estatuto-padrão’ e da proibição de sindicalização do funcionalismo público foram conquistas inscritas naquela Carta. Porém, a manutenção da unicidade sindical, do monopólio da representação, do imposto sindical e do poder normativo da Justiça do Trabalho indicou que o programa do novo sindicalismo não se concretizou completamente na legislação, pois a estrutura oficial, com a herança corporativista, continuou pesando.” (MATTOS, 2009, p. 125)

7 “No entanto, teremos de nos dar conta um dia de que a hegemonia burguesa somente triunfa por seu recorte social, que lhe permite governar por aparelhos interpostos.” (EDELMAN, 2016, p. 148)

8 Nesse contexto, é importante apontar que Edelman vê nos sindicatos instrumentos de colaboração entre as classes e não de luta: “Dito de outro modo, quanto mais fora o sindicato está de sua base, mais ele é descentrado das lutas, mais escapa da ‘espontaneidade’ operária e mais é eficaz. A institucionalização da negociação supõe uma ‘máquina’ sindical ‘concentrada’ no mesmo modo da concentração estatal ou capitalista. [...]. Quando substituímos a luta de classes por uma negociação, conduzida por um ‘poder’ concretizado em aparelhos que funcionam com base na representação, na hierarquia, na disciplina, não há dúvida de que estamos em plena colaboração de classe” (EDELMAN, 2016, p. 140).

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estrutura para que o controle sobre o aparato sindical no direito brasileiro fosse exercido na modalidade de um controle judicial (Corregliano, 2013). As elaborações críticas de Edelman a decisões judiciais e manifestações da doutrina francesa sobre diversos aspectos do direito sindical ajustam-se per-feitamente ao processo observado no Brasil pós-1988.

Um primeiro ponto interessante diz respeito à questão da represen-tação sindical. A Constituição de 1988 fez-nos persistir convivendo com o modelo oriundo Decreto nº 19.770, de 19 de março, de 1931, integrado, posteriormente, à CLT de 1943, que, embora tivesse sido revogado em duas ocasiões, foi revigorado, sobretudo, por iniciativa dos governos militares de Dutra e do golpe de 64, modelo este em que, de maneira atrelada à unici-dade sindical, é atribuída ao sindicato a exclusividade da representação de sua categoria nos limites territoriais em que ele estiver constituído. A exclu-sividade de representação resolve um problema antigo da organização do movimento operário na forma sindical e que Edelman ironicamente abor-da na forma de uma pergunta: a quem pertence a classe operária? (2016, p. 109). Sua resposta a esta questão, ao mesmo tempo em que aponta a re-presentação sindical como solução jurídica apresentada pelo Estado, expõe seus limites e tece sua crítica:

A burguesia contaminou a organização operária, intimou-a a transformar-se em burocracia, funcionando segundo o modelo do poder burguês; intimou--a a “representar” a classe operária segundo o esquema burguês da repre-sentação; impôs-lhe uma língua, um direito, uma ideologia do comando da hierarquia que fariam das massas um sujeito submisso, sensato e “respon-sável”. [...]. Entretanto, as coisas não são tão simples. Investidos do poder legal de representar a classe trabalhadora, os sindicatos são excedidos por sua própria legalidade. Por quê? Simplesmente porque a classe operária não é “representável”: não constitui um corpo – como o eleitorado, por exemplo –, não constitui uma soberania abstrata – como a nação ou o povo –, é uma classe que conduz a luta de classes. Sua existência de classe é “extralegal”, “inapreensível”. Ela não pertence a “ninguém”, senão a ela mesma, ou a sua própria liberdade. (Edelman, 2016, p. 111-112)

O problema da representação sindical no Brasil é especialmente sen-sível porque, como já constatado em outra oportunidade (Batista, 2012, p. 245-255), ocorre em um duplo nível. Além de o sindicato, por si só, operar por meio de dirigentes eleitos, atraindo o problema apontado por Edelman de buscar adequar ao esquema burguês de representação a classe operária, que não é passível de tal submissão, o sistema de exclusividade de representação organizado em torno do sindicato único por categoria pres-supõe a existência de uma configuração uniforme dos membros de tal ca-

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tegoria. Embora esta questão não se coloque da mesma maneira na França, Edelman também debruçou-se sobre ela ao investigar as restrições impostas pelo Poder Judiciário francês à prática de atividades políticas no seio da empresa. Sua percepção elucida o que se encontra por trás da exclusividade de representação da categoria:

Isso quer dizer que, do ponto de vista da empresa, a comunidade de traba-lhadores é uma comunidade “social”, cuja homogeneidade encontraria seu sentido no humano. Isso quer dizer também que a empresa capitalista apa-rece como o único lugar onde os homens são ligados pelo humano, o único lugar onde não se opera nenhuma discriminação, já que o trabalho torna os homens iguais; portanto, o único lugar onde eles realizam sua liberdade de trabalhador. (Edelman, 2016, p. 96)

É claro que há um sentido para que a crítica do autor francês, de-bruçando-se a tema diverso, caiba tão perfeitamente à exclusividade de representação do direito sindical brasileiro. Em nenhum dos casos se está diante de um ato de vontade arbitrário do Estado, mas de uma disposição essencial da própria função do Direito na ordem capitalista, em seu duplo viés de mascarar a exploração do trabalho e assegurar a continuidade da reprodução. Revelando o pano de fundo desta elaboração, Edelman profere algumas de suas mais fortes palavras:

Apenas a ordem jurídica coloca, concretamente, o homem no lugar das classes, o “trabalho” no lugar da força de trabalho, o salário no lugar do mais-valor; apenas a ordem jurídica considera a exploração do homem pelo homem o produto de um livre contrato, o exercício da liberdade; e somente ela considera o Estado de classe a expressão da “vontade geral”. (Edelman, 2016, p. 87)

Eis a questão da representação sindical descortinada. O assim cha-mado “interesse da categoria”, tido como dado e, por isso, considerado unitário, é tratado juridicamente na mesma chave rousseauniana de uma vontade geral da nação que moveria a atuação do Estado. Se, entretanto, seria cabível imaginar que a política seja a forma adequada de encontrar a vontade geral em meio à multiplicidade de vontades no Estado como pen-sado por Rousseau, o mesmo não se dá em relação à categoria profissional – colocando-se a questão nestes termos apenas para dialogar com o aspecto normativo do Direito brasileiro, já que Edelman entende que o raciocínio estende-se à classe operária de forma geral – em que a política não teria espaço, reeditando-se na organização sindical a separação entre Estado e sociedade civil na forma de uma oposição entre o âmbito profissional e o âmbito político:

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Os juristas forjaram uma arma extremamente eficaz: o trabalho, dizem, é profissional. À primeira vista, o termo parece bem anódino, e é antes uma tautologia. Não se deixem enganar: ele exprime, de fato e apesar das apa-rências, a própria estrutura do poder político burguês. Com efeito, quando dizemos que o trabalho é profissional, exprimimos a simples ideia de que ele se manifesta numa relação estritamente privada. E exprimimos também essa outra ideia de que, por esse motivo, ele não tem nada a ver com a política. Aqui, profissional se opõe ao político. O resultado é que a noção de trabalho está ela própria sujeita a uma distinção tão velha quanto a burguesia, a uma distinção da constituição do poder político burguês, a saber, a distinção so-ciedade civil/Estado. (Edelman, 2016, p. 48)

O principal efeito dessa separação entre âmbito profissional – em que estão colocadas as relações de classe entre capital e trabalho – e âmbito político – em que não há coletivos, mas cidadãos operando enquanto indi-víduos perante o Estado – é o mascaramento do caráter de classe do Estado, que, no modo de produção capitalista, assume a aparência de um tercei-ro imparcial que media a relação entre as classes (2013). Assim, o capital pode, ao mesmo tempo em que exerce sua dominação por meio do conjun-to de aparelhos de Estado, colocar-se no nível das aparências como mais um ator da disputa de interesses que ali se trava, exclusivamente por meio dos indivíduos que o personificam, os capitalistas. Na fina ironia que caracteriza a obra de Edelman, lê-se uma formulação poderosa desta questão:

Lindo, não? O capital não é “responsável” por sua política, não é “respon-sável” por “seu” Estado! De um lado, a extorsão de mais-valor, de outro, o Estado, e se pode ver, concretamente, a eficácia da separação sociedade civil/Estado. (Edelman, 2016, p. 52)

Ou, de forma ainda mais sintética: “Em nome do Direito, os traba-lhadores não podem vincular sua luta contra o capital a sua luta contra o Estado” (Edelman, 2016, p. 57).

A separação, por assim dizer, “filosófica” entre o profissional e o po-lítico desemboca, do ponto de vista prático, em trabalho que, na França como no Brasil, foi elaborado pela reiteração de decisões judiciais tratando dos limites de conteúdo a animar o exercício do direito de greve. Tais li-mites passam por diversos aspectos. No Brasil, tem ganhado proeminência em tempos recentes a questão do atendimento às necessidade inadiáveis da comunidade em caso de greve em serviços essenciais, nos termos defi-nidos pelos arts. 9º, § 1º, da Constituição e 10 e 11 da Lei nº 7.783/1989, tema este abordado apenas de passagem por Edelman, quando registra que o prejuízo inerentemente causado pela greve é um dos pontos a ser leva-

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do em conta na discussão de sua contratualização promovida pelo Direito. Edelman aponta, a esse respeito, a moralização inerente à imposição de limites materiais ao exercício da greve9.

Uma das principais preocupações de Edelman no que tange aos limi-tes do direito de greve é a possibilidade do uso deste meio de ação sindical em defesa de interesses políticos. O problema também se coloca aqui no Brasil, tendo sido inclusive objeto de recente pesquisa de pós-graduação (Baboin, 2013) que aponta por aqui fenômeno semelhante ao descrito por Edelman: a construção jurisprudencial de um conceito de direito de greve, moldado na forja da oposição entre profissional e político, que exclui por si só qualquer pauta de reivindicações que extrapole a relação imediata entre capital e trabalho e o conteúdo do contrato de trabalho peculiar aos grevistas. Confira-se:

No interior mesmo do direito de greve, o trabalho dos Tribunais traçou as linhas demarcatórias que lhe permitem tê-lo bem na mão. Releia o leitor o acórdão da Corte de Cassação: o direito de greve é uma “modalidade de defesa dos interesses profissionais”. Está tudo aí. Isso permitirá distinguir as greves lícitas – entenda-se aquelas que respondem à defesa dos interesses profissionais, isto é, que têm em vista apenas uma melhoria das cláusulas do contrato de trabalho (salário, condições de trabalho, etc.) – das greves ilícitas ou abusivas – entenda-se aquelas que excedem o bom funcionamento do contrato de trabalho, as greves políticas, ditas “políticas”. (Edelman, 2016, p. 42-43)

A consequência jurídica de uma greve ser tida como política e, por-tanto, ilícita ou abusiva é bastante simples: o peso da força do Estado se aba-te contra o movimento operário. O aparelho repressivo será movimentado e recolocará tudo em seu devido lugar, como convém ao Direito, de modo geral. Por isso, interessam mais de perto a Edelman, e também às reflexões deste texto, as consequências teóricas do eventual aspecto político de uma greve. Como se verá, este debate recolocará a questão com que foi aberta esta seção, demonstrando o limite, bastante estreito, das possibilidades de legalização da classe operária.

9 Esta moralização é pressuposta ao conceito do Direito brasileiro de necessidade inadiável da comunidade, uma repaginação sindical do antigo brocardo romano alterum non laedere. Edelman também percebeu essa relação entre os modelos de comportamento pressupostos no Direito de forma bastante perspicaz: “A luta de classes, de acordo, mas ‘com lealdade’. Como se a luta de classes fosse leal! E o que é a ‘lealdade’? A ideologia contratual, a boa-fé, o respeito das convenções, etc. É por isso que o operário não deve aproveitar-se de sua posição na produção para trapacear patrão. Não. Ele deve comportar-se como um parceiro responsável, ‘fair play’. [...]. O ‘grevista normal’ é a tradução ‘ousada’ do ‘bom pai de família’, e eis aí a moral burguesa transferida para o direito de greve!” (EDELMAN, 2016, p. 44). Como nota de curiosidade, não é incomum encontrar em manuais didáticos destinados ao ensino do direito sindical a informação de que os sindicatos carregariam uma “função ética” (BRITO FILHO, 2009, p. 140).

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E a greve política? Muito simples. Uma vez que a greve é usada para fins de poder, ela se torna política. Em poucas palavras, a classe operária “não tem o direito” de usar seu poder fora dos limites da legalidade burguesa, que é, evi-dentemente, a expressão do poder de classe da burguesia. Como podemos ver, não se trata mais, de modo algum, de um conflito de direito. Trata-se de luta de classes: de um lado, o direito, inclusive o direito de greve; de outro, o “fato” das massas, isto é, a greve; de um lado, um poder legal; de outro, um poder bruto, elementar, inorganizado. (Edelman, 2016, p. 56)

A greve política, portanto, devolve à classe operária seu caráter “de fato”, seu aspecto de “massa”, sua desorganização. Retira-a do Direito, em que foi mutilada, para colocá-la de volta a seu lugar de origem: a luta de classes. Outro fenômeno que voltou a ocupar a pauta de preocupações do movimento de trabalhadores recentemente apresenta um desafio ainda maior ao Direito: a questão das greves conduzidas espontaneamente a partir da base, sem a participação dos sindicatos, que Edelman apelida de greves selvagens (2016, p. 116). Sua preocupação com este tema assume, também, um tom premonitório, antecipando o problema em que se enredam hoje os Tribunais brasileiros. Em termos althusserianos: como interpelar o grevista não organizado em sindicato como sujeito? Em termos jurídicos: quem re-presenta a coletividade de trabalhadores em greve? A tática tem animado o movimento de trabalhadores brasileiro desde o bem-sucedido movimento grevista dos trabalhadores de limpeza urbana do Rio de Janeiro, em março de 2014, em razão da catatonia que atingiu os operadores do Direito que, atônitos, ainda não sabem como reagir ao fenômeno.

Muito ao contrário de se animar com as greves selvagens, Edelman identifica que o descolamento entre base e representação sindical é o que permite que a classe burguesa atue para dividir a classe operária, incenti-vando parte dos trabalhadores a não aderir ao movimento, com isso, enfra-quecendo-o. Sua sentença, embora controversa, é categórica: “Ora, uma representação sindical de todos os grevistas derrotaria essa tática” (Edelman, 2016, p. 117).

5 a recuperação daS IluSõeS perdIdaS

Edelman encerra sua obra fazendo a ponte para o jamais desenvolvi-do tratamento da legalização da classe operária sob a perspectiva do Estado – que constaria de volume posterior da obra que, como vimos, nunca veio à lume. Ele atribui à conclusão o título de “ilusões perdidas”. Parafraseando--o, este texto será encerrado com outra leitura sobre a atualidade de sua obra, que buscará transbordar suas poucas indicações sobre a direção do

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tratamento da questão do Estado para refletir um fenômeno recente e bas-tante relevante no Brasil: a multiplicação de movimentos sociais reivindica-tivos de direitos.

Antes de tudo, é importante observar que os movimentos sociais rei-vindicativos de direitos veem recair sobre si várias das estratégias de legali-zação discutidas por Edelman em seu texto. Para ficar em apenas dois exem-plos, pode-se observar como o Movimento Passe Livre, embora difuso e horizontal, é interpelado pelo Estado a tornar-se sujeito de direito por meio da submissão à estapafúrdia obrigatoriedade de informar previamente à po-lícia o trajeto de suas manifestações, sujeitando-se à severa repressão poli-cial em caso de recusa ou de alteração imprevista do trajeto; ou a recente declaração do Governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, que buscava desqualificar o movimento de ocupação de escolas por estudantes secundaristas com a observação de que seu movimento apresentava “nítido cunho político”. Assim, bastaria aplicar ipsis litteris as ideias da obra a tais realidades, para constatar que tudo faz parte de uma mesma luta de classes, empreendida com as mesmas armas pelo lado da burguesia e do Estado. É possível, entretanto, ir além da pura e simples justaposição das reflexões sobre os sindicatos aos movimentos sociais reivindicativos.

É que está cada vez mais claro que tais movimentos recuperaram as duas ilusões mencionadas por Edelman: a ilusão da existência da classe operária – em tempos de discursos “pós-modernos” que apontam o fim da luta de classes, os integrantes de movimentos sociais que constituem uma das últimas trincheiras de resistência capitularam apenas parcialmente ao se crerem a expressão contemporânea do que é a classe trabalhadora – e a ilusão jurídica, “a crença obstinada de que a liberdade se transforma em direitos” (Edelman, 2016, p. 149). É essa recuperação das ilusões que coloca duas questões, diferentes mas complementares, que se relacionam diretamente com a conclusão de Edelman e demonstram a manutenção de sua importância: as tais ilusões mantêm seu caráter ilusório mesmo após serem contemporaneamente retomadas? É negativo que tais ilusões sejam retomadas?

A resposta, a partir de Edelman, parece ser afirmativa para ambas as questões.

Quanto à primeira, basta retomar seu já mencionado prefácio, em que sustenta que “minha decodificação jurídica da realidade político-eco-nômica conservou todo o seu valor” (Edelman, 2016, p. 10). Seria possí-vel acrescentar que esta decodificação não somente conservou seu valor como o conservará enquanto a humanidade viver sob a égide do modo

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de produção capitalista. Isso significa que a ilusão da existência da classe operária não perde seu caráter ilusório nesta retomada, antes o aprofunda. A pulverização dos movimentos sociais em pautas específicas, normalmen-te orientadas em torno do acesso a bens como saúde, educação, moradia, transporte, etc., afasta ainda mais a possibilidade de existência concreta da classe operária – que jamais operará como classe enquanto estiver organi-zada em torno de demandas tão restritas – e sua aparência de existência, consubstanciada nesta já consagrada expressão, sempre utilizada no plural, “movimentos sociais”. Ao lado da ilusão da existência de uma “classe tra-balhadora” onde operar a legalidade burguesa, é possível antever a ilusão da existência de um “movimento negro” ou de “um movimento feminista” e assim por diante. Aliás, é difícil constatar mesmo, se a legalidade burguesa continuar a reger os fatos, a noção do que seja negro ou do que seja gênero – na medida em que a raça e o gênero, por exemplo, têm a sua conformação indicada por este sistema legal. De certa forma e de maneira premonitória, este fato se emerge, através do espelho, da frase que encerra A legalização da classe operária de Bernard Edelman.

A segunda questão, especialmente no que toca à retomada da ilusão jurídica, já havia sido objeto de reflexão crítica de Edelman: “Este é o sonho da burguesia: um capitalismo garantido de uma vez por todas pelo Direito. Este é também o sonho de um certo ‘socialismo’: um socialismo de uma vez por todas garantido pelo Direito” (Edelman, 2016, p. 61)10. A retomada da ilusão jurídica parece fazer bastante sentido em um momento histórico em que uma terceira ilusão, não abordada por Edelman, vem sendo perdida: a ilusão da transformação social revolucionária.

Duas advertências de Edelman parecem ter sido escritas para serem lidas pelos movimentos sociais de quatro décadas mais tarde. De um lado, sua crítica pontual e poderosa, derivada de Lênin, à reivindicação de di-reitos como estratégia da classe operária: “Hegemonia burguesa, isso sim, pois, uma vez que a ‘liberdade’ se transforma em direitos, esses direitos são reapropriados no sistema dos espaços” (Edelman, 2016, p. 150).

Sua segunda advertência é bem mais profunda. Antes mesmo que ela fosse cogitada, coloca em xeque a recuperação das ilusões perdidas como horizonte estratégico da atuação da classe operária na luta de classes e aponta o caráter revolucionário da perda de tais ilusões. Sua colocação como palavras finais deste texto deve ter muito menos o sentido de uma citação e muito mais o sentido de sua nova enunciação com a mesma força,

10 Muito ilustrativo de tal situação é o mote utilizado recentemente por uma manifestação de rua que aglutinou diversos movimentos sociais: “Contra a direita, por mais direitos”.

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mas em um outro momento político e jurídico. São também essas palavras que parecem demonstrar que, ao contrário do que possa sugerir uma leitura apressada, seu prefácio à tradução não representa uma negação de suas convicções, mas uma sólida manifestação de sua revolucionária desilusão:

O fim da grande mitologia política se anuncia no horizonte. A “esquerda” está morta, seguindo de perto o “socialismo”. Nossa herança foi dilapidada. As velhas aspirações políticas estão morrendo. Quem lamentaria? As doen-ças do marxismo devoraram a si mesmas, e o marxismo hoje, e talvez pela primeira vez, pode ser liberado de seu triunfalismo. E o “impossível” revo-lucionário, o impossível de todas as revoluções, pode começar a nascer de nossas ilusões perdidas. (Edelman, 2016, p. 147)

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Parte Geral – Doutrina

Reflexões acerca da Diferença de Tempo de Serviço Como Critério Excludente da Equiparação Salarial

POLLYAnnA SILvA guIMARÃESAdvogada, Especialista em Direito do Trabalho pelo Instituto de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

RESUMO: O critério excludente da equiparação salarial consistente na diferença de tempo de ser-viço, superior a dois anos, entre empregados comparados, viola diretamente os princípios da igual-dade, da isonomia salarial, da proteção à dignidade do trabalhador e da razoabilidade. Tal critério é inadequado aos fundamentos do instituto da equiparação salarial, aos objetivos do direito do trabalho e do Estado Democrático de Direito e à ideia de justiça.

PALAVRAS-CHAVE: Direito do trabalho; igualdade; equiparação salarial; tempo de serviço.

ABSTRACT: The exclusion criterion of equal pay made up of the difference in the service time, fixed in two years, between employees compared, directly violates the principles of the equality, wage equa-lity, worker dignity protection and reasonableness. This criterion is inappropriate to the fundamentals of the equal pay institute, to the objectives of the Labor Law and of the Democratic State of Law and to the idea of justice.

KEYWORDS: Labor law; equality; equal pay; service time.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O fundamento da equiparação salarial; 2 Equiparação salarial: breve apre-sentação; 3 A diferença de tempo de serviço superior a dois anos, entre empregados comparados, como critério excludente da equiparação salarial; 4 O critério do tempo de serviço frente aos princí-pios constitucionais e ao sistema jurídico trabalhista brasileiro; 5 A norma de criação do critério do tempo de serviço como legislação simbólica; Conclusão; Referências.

INtrodução

Em pesquisas sobre o instituto da equiparação salarial, pouco se en-contra, nas fontes de estudo atuais, reflexões acerca deste direito instituído. Constata-se existirem, tão somente, repetições doutrinárias e jurispruden-ciais de entendimentos antigos que não comportam adequação frente à Constituição Federal de 1988 e ao que se espera de um Estado Democrático de Direito.

Diante desta realidade, acreditando que a evolução do direito pode ocorrer por meio da interpretação, de modo a suprir deficiências, desvios

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e incoerências das normas legisladas, bem como criar alternativas frente à morosidade das mudanças legislativas e, até mesmo, de entendimentos jurisprudenciais interpretativos engessados, o presente estudo objetiva cha-mar a atenção para a necessidade de se discutir acerca das circunstâncias em que a igualdade de salários se impõe e sobre as normas que regem o instituto da equiparação salarial, previsto na Consolidação das Leis Traba-lhistas.

Neste escopo, destaca-se a necessidade de reflexão a respeito das normas que dispõem sobre situações excludentes da possibilidade de apli-cação da equiparação salarial, em especial da norma que apresenta, como critério de exclusão da equiparação, a existência de diferença de tempo de serviço superior a dois anos entre os empregados comparados.

1 o fuNdameNto da eQuIparação SalarIal

Em estudo acerca da equiparação salarial, José Luiz Ferreira Prunes, ao analisar a origem do instituto, constata que “há e sempre houve entre os homens um desejo de igualdade”1. No entanto, compreendendo a comple-xidade humana, observa, também, que “o homem procura a disparidade em todos os setores, tentando superar os demais e também superar-se”2.

Desse modo, presente o paradoxo, natural do homem, entre a recusa da desigualdade e a busca por distinção, é possível concluir que o que o ho-mem preconiza, na verdade, é a repulsa por desigualdades odiosas, injustas. Daí se infere o sentido da estreita relação entre igualdade e justiça.

Nesse sentido, coerentemente, o Estado e o Direito, ambos cria-dos para atender a necessidades humanas de justiça e igualdade, elevam este último valor, como princípio metajurídico, à condição positivada de “princípio informador de todo o sistema jurídico” e de “autêntico direito subjetivo”3.

Ressalta-se, contudo, dada a vinculação à ideia de justiça, que o prin-cípio da igualdade “não significa identidade indiscriminada”, sendo permi-tido o “trato especial em situações especiais”4, conforme ressalta Fernando Américo Veiga Damasceno, ao dispor sobre o princípio da igualdade de tra-tamento, em monografia focada no preceito “trabalho igual, salário igual”.

1 PRUNES, José Luiz Ferreira. Equiparação salarial. In MAGANO, Octavio Bueno (Coord.). Curso de direito do trabalho: em homenagem a Mozart Victor Russomano. São Paulo: Saraiva, 1985. p. 273.

2 Idem, p. 274.3 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006. p. 791. 4 DAMASCENO, Fernando Américo Veiga. Equiparação salarial. 2. ed. São Paulo: LTr, 1995. p. 27.

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Destarte, consoante também esclarece Alexandre de Moraes, há de se compreender que

o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desi-gualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça.5

Assim, concernente ao homem em geral, a igualdade, em sua con-dição normativa, apresenta-se como princípio geral, motivo pelo qual se encontra normatizada internacionalmente, na maioria das constituições e em leis infraconstitucionais.

No Brasil, ao que limita o presente estudo, é possível se inferir o prin-cípio da igualdade de várias passagens do Texto Constitucional, encontran-do-o, de forma mais expressa e abrangente, no art. 5º, caput e inciso I, da Constituição Federal de 1988, que assim dispõe:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviola-bilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à proprie-dade, nos termos seguintes:

I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

[...].6

No que tange especificamente ao direito do trabalho, o princípio da igualdade aparece com o escopo de evitar a discriminação no ambiente de trabalho e se encontra consagrado, constitucionalmente, no art. 7º, incisos XXX e XXXI, da Constituição Federal de 1988.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de crité-rio de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

XXXI – proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência.7

5 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 31.6 Brasil. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,

Subsecretaria de Edições Técnicas, 2004. p. 15.7 Idem, p. 20-21.

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Referentemente à igualdade de salários, disposta nos dispositivos constitucionais, como um direito fundamental, torna-se fácil compreender a sua importância, bastando, para isso, uma simples verificação da fase histó-rica que precedeu a criação normativa.

A história das relações de trabalho assalariadas revela “que inúmeros empregadores davam acentuada preferência ao trabalho das mulheres e dos menores, visando à redução do custo da mão de obra, uma vez que lhes pagavam salários inferiores aos desejados pelos trabalhadores adultos”8.

Observa-se, igualmente, que outras discriminações também eram praticadas em razão de critérios subjetivos e arbitrários, ante a ambição de lucro, tão exaltada no liberalismo econômico, a qual

levou os empregadores a uma discriminação injusta e desumana na fixação dos salários de seus trabalhadores, aproveitando-se do excesso de oferta em determinados setores de mão de obra, marginalizada por circunstâncias so-ciais ou históricas. Pagavam-se salários reduzidos aos menores e às mulhe-res; aproveitava-se a existência de minorias raciais ou religiosas, socialmen-te repudiadas; e, até mesmo, o estado civil ou nacionalidade influía nessa orientação odiosa, pagando-se menos do que se pagava a outros obreiros, para trabalho de igual valor.9

É deste contexto histórico que se originou, principalmente na coleti-vidade trabalhadora, um forte sentimento de injustiça, ponderando-se que “o homem, salvo exceções de desprendimentos por nobreza ou indiferença, labuta visando à recompensa” e que, “no campo das relações trabalhistas, existindo um contrato, a consequência direta da prestação de trabalho é o salário”10.

Foi a partir deste sentimento que se fez surgir uma consciência ética quanto à necessidade, considerada como um princípio, de que a todo tra-balho igual deve corresponder salário igual.

Tal princípio, de não discriminação ou isonomia salarial, passou a ser, pois, normatizado em várias legislações, inicialmente na Constituição mexicana, posteriormente na Constituição alemã, chegando a ser consagra-do internacionalmente por meio do Tratado de Versalhes, da Organização Internacional do Trabalho, da Declaração Universal dos Direitos do Ho-mem, bem como em outras convenções internacionais, e se espalhou em

8 SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: LTr, v. I, 2005. p. 429.9 DAMASCENO, Fernando Américo Veiga. Op. cit., p. 31.10 PRUNES, José Luiz Ferreira. Equiparação salarial. São Paulo: LTr, 1977. p. 07.

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legislações de diversos Estados, entre eles o Brasil, para o fim de reprimir a prática discriminatória.

No Brasil, o aforismo “salário igual para trabalho igual”, além de cons-titucionalmente previsto, é referendado pela legislação infraconstitucional brasileira, especialmente na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), na qual a isonomia salarial é encontrada já em seu início, no art. 5º, que esta-belece que “a todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual, sem distinção de sexo”11.

E traz a CLT, em atenção ao princípio da isonomia salarial, um dos mecanismos normativos mais relevantes para o fim de proteger o empre-gado de possível discriminação salarial, bem como para se estabelecerem os parâmetros comparativos que poderão determinar um trabalho de igual valor ao qual corresponderá igual salário, que consiste no instituto da equi-paração salarial.

2 eQuIparação SalarIal: breve apreSeNtação

Considerando que existem inúmeros estudos acerca do instituto, es-pecialmente no que se refere à sua definição, a equiparação salarial será brevemente apresentada a partir de seu conceito, o qual é elaborado apro-priadamente por Mauricio Godinho Delgado, que a conceitua como

a figura jurídica mediante a qual se assegura ao trabalhador idêntico salário ao do colega perante o qual tenha exercido, simultaneamente, função idênti-ca, na mesma localidade, para o mesmo empregador. A esse colega compa-rado dá-se o nome de paradigma (ou espelho) e ao trabalhador interessado na equalização confere-se o epíteto de equiparando. Designam-se, ainda, ambos pelas expressões paragonados ou comparados.12

O referido instituto encontra-se disciplinado no art. 461 da CLT, que assim dispõe:

Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade. (Redação dada pela Lei nº 1.723, de 08.11.1952)

§ 1º Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas

11 Brasil. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 1º maio 1943. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 23 maio 2013.

12 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 788.

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cuja diferença de tempo de serviço não for superior a 2 (dois) anos. (Redação dada pela Lei nº 1.723, de 08.11.1952)

§ 2º Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira, hipótese em que as promoções deverão obedecer aos critérios de antigüidade e merecimento. (Redação dada pela Lei nº 1.723, de 08.11.1952)

§ 3º No caso do parágrafo anterior, as promoções deverão ser feitas alter-nadamente por merecimento e por antingüidade, dentro de cada categoria profissional. (Incluído pela Lei nº 1.723, de 08.11.1952)

§ 4º O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mental atestada pelo órgão competente da Previdência Social não servirá de paradigma para fins de equiparação salarial. (Incluído pela Lei nº 5.798, de 31.08.1972).13

Pelo artigo celetista, conclui-se que são requisitos concorrentes para a ocorrência da equiparação salarial: a) identidade de função; b) trabalho de igual valor (feito com igual produtividade e com a mesma perfeição téc-nica); c) identidade de empregador; d) mesma localidade; e e) ausência de situações excludentes. Além desses requisitos explícitos na norma, infere-se como requisito implícito f) a necessidade de que os comparados tenham ao menos laborado simultaneamente, em algum tempo, na mesma função, na mesma localidade e para o mesmo empregador.

Também, pelo art. 461 da CLT, pode-se extrair da literalidade da lei que são causas excludentes da equiparação salarial: a) diferença de tempo de serviço superior a dois anos entre os comparados; b) existência de pes-soal organizado em quadro de carreira; e c) situação em que o paradigma é readaptado.

Quanto à interpretação jurisprudencial atinente à equiparação sala-rial, merece destaque a Súmula nº 6 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que procura definir um entendimento acerca dos elementos constituintes do instituto. Dita súmula dispõe:

EQUIPARAÇÃO SALARIAL – ART. 461 DA CLT (redação do item VI alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I – Para os fins previstos no § 2º do art. 461 da CLT, só é válido o quadro de pessoal organizado em carreira quando homologado pelo Ministério do

13 Brasil. Op. cit.

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Trabalho, excluindo-se, apenas, dessa exigência o quadro de carreira das entidades de direito público da administração direta, autárquica e fundacio-nal aprovado por ato administrativo da autoridade competente. (ex-Súmula nº 06 – alterada pela Res. 104/2000, DJ 20.12.2000)

II – Para efeito de equiparação de salários em caso de trabalho igual, conta--se o tempo de serviço na função e não no emprego. (ex-Súmula nº 135 – RA 102/1982, DJ 11.10.1982 e DJ 15.10.1982)

III – A equiparação salarial só é possível se o empregado e o paradigma exer-cerem a mesma função, desempenhando as mesmas tarefas, não importando se os cargos têm, ou não, a mesma denominação. (ex-OJ da SBDI-1 nº 328 – DJ 09.12.2003)

IV – É desnecessário que, ao tempo da reclamação sobre equiparação sa-larial, reclamante e paradigma estejam a serviço do estabelecimento, des-de que o pedido se relacione com situação pretérita. (ex-Súmula nº 22 – RA 57/1970, DO-GB 27.11.1970)

V – A cessão de empregados não exclui a equiparação salarial, embora exercida a função em órgão governamental estranho à cedente, se esta res-ponde pelos salários do paradigma e do reclamante. (ex-Súmula nº 111 – RA 102/1980, DJ 25.09.1980)

VI – Presentes os pressupostos do art. 461 da CLT, é irrelevante a circuns-tância de que o desnível salarial tenha origem em decisão judicial que be-neficiou o paradigma, exceto se decorrente de vantagem pessoal, de tese jurídica superada pela jurisprudência de Corte Superior ou, na hipótese de equiparação salarial em cadeia, suscitada em defesa, se o empregador pro-duzir prova do alegado fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito à equiparação salarial em relação ao paradigma remoto.

VII – Desde que atendidos os requisitos do art. 461 da CLT, é possível a equiparação salarial de trabalho intelectual, que pode ser avaliado por sua perfeição técnica, cuja aferição terá critérios objetivos. (ex-OJ da SBDI-1 298 – DJ 11.08.2003)

VIII – É do empregador o ônus da prova do fato impeditivo, modifica-tivo ou extintivo da equiparação salarial. (ex-Súmula nº 68 – RA 9/1977, DJ 11.02.1977)

IX – Na ação de equiparação salarial, a prescrição é parcial e só alcan-ça as diferenças salariais vencidas no período de 5 (cinco) anos que pre-cedeu o ajuizamento. (ex-Súmula nº 274 – alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)

X – O conceito de “mesma localidade” de que trata o art. 461 da CLT refere--se, em princípio, ao mesmo município, ou a municípios distintos que, com-

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provadamente, pertençam à mesma região metropolitana. (ex-OJ da SBDI-1 nº 252 – inserida em 13.03.2002).14

Assim, brevemente apresentado o instituto da equiparação salarial e já esclarecidos o princípio da igualdade e o da isonomia salarial e a impor-tância destes, o presente estudo passa a analisar o seu principal objeto, qual seja, o critério excludente da equiparação salarial consistente na diferença de tempo de serviço superior a dois anos, entre paragonados, interpretado e confirmado pelo TST, nos termos da Súmula nº 6, inciso II, com redação datada de 1982, conforme anteriormente destacado.

3 a dIfereNça de tempo de ServIço SuperIor a doIS aNoS, eNtre empregadoS comparadoS, como crItérIo excludeNte da eQuIparação SalarIal

Conforme já exposto, a legislação trabalhista brasileira adotou como critério de exclusão, para a verificação quanto à aplicação do instituto da equiparação salarial, a diferença de tempo, no exercício da função, superior a dois anos, entre os comparados.

Ao se pesquisarem os fundamentos da criação de tal excludente, esta tem a sua justificativa posta na intenção do legislador de definir, conforme se infere do disposto no art. 461, § 1º, da CLT, que o trabalho de igual valor deva corresponder não somente àquele prestado com a mesma perfeição técnica e com a mesma produtividade, mas também àquele prestado por pessoa cuja diferença no exercício da função não seja superior a dois anos, ou seja, passando de dois anos no exercício da função, o trabalho de uma pessoa paradigma teria maior valor.

No que tange à intenção do legislador, esta é explicada, doutrinária e jurisprudencialmente, muitas vezes por meio de mera repetição sem refle-xão, como sendo uma presunção de existência de “uma maior eficácia do empregado mais antigo”, emprestando-se “a esta permanência mais longa na função uma presumida experiência maior no ofício do que teria o em-pregado mais moderno”15.

Explica-se, também, como uma permissão, conferida pelo legislador, de se “recompensar aquele que há mais tempo vem colaborando” com o empregador na atividade empresarial, o que “seria uma verdadeira promo-ção econômica, conquistada pela antiguidade no serviço”16.

14 Brasil. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 06, Res. Res. 185/2012. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho, Brasília, 25, 26 e 27 set. 2012.

15 DAMASCENO, Fernando Américo Veiga. Op. cit., p. 139.16 Idem, p. 140.

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Por fim, afirma-se ainda que a intenção do legislador seria a de con-sagração da “possibilidade de o empregado ascender economicamente na categoria profissional para a qual foi ajustado, ainda que o empregador não possua um quadro de carreira organizado”17.

Ocorre que, ao se refletir racionalmente acerca de tais considerações expostas, é possível se chegar à conclusão de que nenhuma delas se presta para justificar a criação de tal critério de exclusão da equiparação salarial. Pelo contrário, chega-se à conclusão de que não há justificativas plausíveis para a sua existência e que a justificativa pode, até mesmo, esconder um ob-jetivo normativo de qualificação simbólica, ocultando tal critério, por detrás da impressão de boa intenção do legislador, a verdadeira intenção de não efetivação plena de um direito fundamental.

Primeiramente, a presunção “de que a antiguidade na função traz, como corolário, maior prática e maior domínio de suas atividades e, em consequência, maior experiência”18 não se adéqua à realidade observável. Partindo-se do entendimento de que o direito deve buscar a sua realização a partir da percepção que se tem sobre a realidade, a realidade nos denuncia, há todo momento, o quão discriminatória é dita presunção.

A experiência, de fato, “nos mostra, muitas vezes, ser o novato mais diligente e operoso que o veterano”19.

A premissa não encontra base científica sólida. Pode perfeitamente ocorrer [como de fato ocorre] que o empregado mais novo na função se desempenhe melhor que o colega mais antigo, sendo sumamente injusto negar-lhe a equi-paração apenas em decorrência do fator tempo na função.20

Na prática, é possível que um trabalhador com menos tempo de serviço na função tenha desempenho igual ou até superior ao do paradigma, nos quesitos produtividade e perfeição técnica. É possível que um candidato ao emprego já traga experiência profissional, habilitação profissional, dedica-ção ao trabalho, motivações e aptidões que lhe permitam alcançar melhor desempenho do que outros empregados que exercem a mesma função ao mesmo empregador e na mesma localidade.21

17 Idem, ibidem.18 BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 801.19 Idem, ibidem.20 DAMASCENO, Fernando Américo Veiga. Op. cit., p. 139.21 FIGUEIREDO, Antônio Borges de. Excludentes da equiparação salarial: uma crítica necessária. 2009.

Disponível em: <http://www.jurisite.com.br/doutrinas/Trabalho/douttrab82.html>. Acesso em: 17 maio 2013.

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Dita presunção, assim, vai de encontro aos princípios da igualdade e da isonomia salarial, “trabalho igual, salário igual”, criando situação dis-criminatória. Ademais, não se pode esquecer que as presunções jurídicas existentes no âmbito do direito do trabalho devem ser destinadas a prote-ger o empregado22, conforme ensina Amauri Mascaro Nascimento, e não o contrário.

Em segundo lugar, a consideração de que o legislador pretenderia conceder uma permissão ao empregador de premiar o empregado mais anti-go pela maior colaboração deste para com a empresa, considerando o tem-po de trabalho, autorizando “uma verdadeira promoção econômica, con-quistada pela antiguidade no serviço”23, trata-se de uma verdadeira falácia.

Frisa-se, inicialmente, que o empregado mais antigo não é mais valo-rizado por estar a mais tempo na empresa, já que nenhuma retribuição rece-be a mais por isso. O seu salário não aumenta em função da antiguidade. O empregado estará a receber o mesmo valor, independentemente da existên-cia de outro empregado. O seu salário somente será aumentado na hipótese de se criar uma vantagem pessoal, mas para todos, cujo critério seja o tempo de serviço ou na função, como um adicional, por exemplo. Certo é que, sem uma vantagem pessoal estabelecida, não há aumento salarial pela simples situação de maior tempo de serviço ou na função.

Assim, o que se constata não é a valorização do empregado mais velho, mas sim a desvalorização do empregado novo na empresa, que é obrigado a realizar o mesmo trabalho, do mesmo modo, percebendo salário inferior em comparação a outro mais velho ou não tão novo, o que implica desvalorização do trabalho.

No mais, a legislação trabalhista já permite, em toda a sua extensão, a criação de qualquer prêmio ou direito, pelo empregador, desde que em be-nefício ao seu empregado. Assim, caso o empregador queira recompensar o seu empregado mais antigo, pode ele criar institutos que venham a premiá--lo. Tais institutos terão caráter personalíssimo e não se comunicarão para fins de equiparação salarial. É o exemplo dos biênios, triênios, quinquênios, etc.

Nesse sentido, expõe Fernando Américo Damasceno que

o tempo de casa efetivamente deve proporcionar ao empregado vantagens, não apenas que o fixem na empresa, mas também demonstre a satisfação do empregador para aquele que com ele colabora há mais tempo. Mas este

22 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 461. 23 DAMASCENO, Fernando Américo Veiga. Op. cit., p. 140.

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salário majorado em função do tempo de casa traduz-se através dos adicio-nais por tempo de serviço e outros pagamentos similares, que têm em vista a condição peculiar do empregado na empresa, sem qualquer relação direta com o valor do trabalho que efetua.24

Portando, o efeito, ou objetivo mesmo, do critério de exclusão con-sistente na diferença de tempo de serviço superior a dois anos, na verdade, é a manutenção de empregados na empresa, desestimulando-os a procurar outro empregador, ante a pena de desvalorização do trabalho ou do ofício exercido. Isso também, já de início, certamente diminui o pouco poder de negociação do empregado no que tange ao salário e à celebração do con-trato de trabalho.

Desse modo, deve-se reconhecer que dito critério excludente colide com um dos principais objetivos do direito do trabalho, que é a valorização do trabalho, e sua justificativa mostra-se, no mínimo, ilógica e irracional para um Estado Democrático de Direito.

O mesmo raciocínio vale para a justificativa fundamentada na inten-ção de consagração da ascensão econômica do empregado, pois, da mesma forma, não ocorre um plus salarial para o empregado antigo, apenas um decréscimo para o empregado novo na empresa. É a consagração da desva-lorização do trabalho.

Por tudo isso, constata-se que o critério de exclusão do direito à equi-paração salarial, consistente na diferença de tempo de serviço superior a dois anos, trata-se de critério violador, no mínimo, dos princípios da igual-dade, da isonomia salarial, da proteção e, também, da razoabilidade, em flagrante incoerência com o escopo do instituto em questão.

Não cabe sequer argumentar no sentido de uma sobreposição do dis-posto na legislação trabalhista, infraconstitucional, ante aos mencionados princípios, inclusive constitucionalmente consagrados na Constituição Fe-deral de 1988. Certamente, não se pode ignorar que princípios são normas e, como tais, são autoaplicáveis, e, mais que isso, são normas superiores e o norte de todo o sistema jurídico.

Portanto, ao contrário de se perder tempo em discutir se o tempo de dois anos deve ser apurado pelo tempo na empresa ou pelo tempo de exer-cício na função, importa discutir é a posição da referida norma excludente frente aos princípios constitucionais e a recepção da mesma pela Constitui-ção Federal de 1988, isto é, a sua constitucionalidade, bem como discutir

24 Idem, ibidem.

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a compatibilidade da interpretação do Tribunal Superior do Trabalho (TST), de 1982, face à Constituição de 1988.

4 o crItérIo tempo de ServIço freNte aoS prINcípIoS coNStItucIoNaIS e ao SIStema jurídIco trabalhISta braSIleIro

Tratando-se do princípio da igualdade, insculpido na Carta Constitu-cional, temos que o mesmo

se configura como uma eficácia transcendente, de modo que toda situação de desigualdade persistente à entrada em vigor da norma constitucional deve ser considerada não recepcionada, se não demonstrar compatibilidade com os valores que a Constituição, como norma suprema, reclama.25

Partindo-se do princípio de que “a desigualdade na lei se produz quando a norma distingue de forma não razoável ou arbitrária um trata-mento específico a pessoas diversas”26, ao se analisar o critério de exclusão em foco, conclui-se pela sua não receptividade constitucional e por seu resultado discriminatório.

Como esclarece Alexandre de Moraes:

Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discrimi-natórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoá-vel, de acordo com critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida consi-derada, devendo estar presente, por isso, uma razoável relação de proporcio-nalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos.27

Certamente, conforme exposto no presente estudo, “não há razão de ordem lógica ou teleológica para o referido tratamento diferenciado entre trabalhadores”28, quando da consideração do tempo de dois anos de serviço na empresa ou no exercício da função. Inexiste justificativa razoável e ra-cional, de acordo com valorativos genericamente aceitos, motivo pelo que dito critério viola, também, o princípio da razoabilidade.

Daí a incoerência da norma celetista, cujo objetivo é a aplicação do princípio basilar da igualdade, mas que traz em seu bojo critério arbitrário e

25 MORAES, Alexandre de. Op. cit., p. 32.26 Idem, ibidem.27 Idem, ibidem.28 FIGUEIREDO, Antônio Borges de. Op. cit.

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não razoável de inferência da igualdade perseguida, cujo resultado, assim, é o tratamento desigual a iguais.

Destaca-se, outrossim, a incoerência da norma até mesmo com o pró-prio sistema do Direito do trabalho, o qual se estrutura sob o princípio da proteção, na medida em que viola tal princípio ao negar a devida “proteção à parte hipossuficiente na relação empregatícia – o obreiro”29.

Além disso, diante da norma incoerente, ignoram os aplicadores do Direito, por conseguinte, o princípio in dubio pro operario, ao passo que, na interpretação do Direito, em face de um texto jurídico que oferece “dú-vidas a respeito de seu verdadeiro sentido e alcance, [...] entre as hipóte-ses interpretativas cabíveis”30, ignoram o Texto Constitucional e interpretam de forma prejudicial ao trabalhador. Desse modo, além de tudo, como um efeito de cascata, os aplicadores do Direito violam também o princípio da razoabilidade ante a falta de reflexão e bom senso.

5 a Norma de crIação do crItérIo tempo de ServIço como legISlação SImbÓlIca

Por fim, pelo estudo feito, importa destacar a percepção de que o verdadeiro sentido e alcance da norma de exclusão referenciada neste tra-balho cumpre nada mais que uma função simbólica e insincera, servindo de legislação-álibi para o Estado, que, sob a aparência de boas intenções do legislador, age de modo estratégico e instrumental a serviço do meio sistê-mico “poder”, representado pelo econômico.

Implica legislação simbólica, nos termos esclarecidos por Marcelo Neves, por consistir em um “agir ocultamente estratégico”, cuja ilusão pro-vocada pode ser inconsciente ou consciente(manipulação)31.

E não se pode esquecer que

o direito do trabalho realiza uma função social e econômica na medida em que se esforça para equacionar devidamente os interesses contrapostos do trabalho e do capital, mas também não é destinado à realização de valores econômicos, salvo se essa realização puder coincidir com os seus objetivos sociais, pois se assim não fosse seria parte do direito econômico.32

Ademais, chama-se a atenção à relevante questão que se trata do efeito desse simbolismo normativo, álibi do Estado e do econômico, que é a

29 DELGADO, Mauricio Godinho. Op. cit., p. 198.30 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. cit., p. 447.31 NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. 3. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011. p. 119.32 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. cit., p. 463.

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obstrução do caminho para que os problemas sociais sejam resolvidos, para que direitos sejam plenamente efetivados.

Daí se poder inferir, também, como possível resultado desse efeito obstrutivo a “acomodação entre os operadores do Direito, o que restringe o debate ou a análise do debate sobre tal importante assunto, na praxe foren-se e nas atividades acadêmicas”33, face à norma trabalhista e às existentes súmulas e orientações jurisprudenciais que dispõem sobre a equiparação salarial.

Referentemente aos requisitos para a equiparação salarial, essa obs-trução se observa facilmente na interpretação jurisprudencial que “perma-nece presa a literalidade de textos legais formalmente vigentes há várias décadas”34, sobressaindo aqui a excludente da equiparação salarial disposta na hipótese de diferença de tempo de serviço superior a dois anos entre as pessoas comparadas, que não expressa qualquer fim voltado à efetivação de direitos trabalhistas.

Não se percebe, pois, que o mencionado quesito excludente “consti-tui uma forma de manipulação ou de ilusão que imuniza o sistema político contra outras alternativas, desempenhando uma função ‘ideológica’”35.

coNcluSão

Ao se analisar, racionalmente, o critério excludente da equiparação salarial consistente na diferença de tempo de serviço superior a dois anos, entre empregados comparados, chega-se a conclusão de que tal critério tem como resultado a violação do princípio basilar da igualdade, dos princípios da isonomia salarial, o qual procura evitar discriminações praticadas em razão de critérios arbitrários e ilógicos, da proteção e, também, da razoabi-lidade, em clara incoerência com os fundamentos do instituto da equipara-ção salarial.

Não somente considerando-se que tais princípios violados, especial-mente o da igualdade, se encontram consagrados no texto da Constituição Federal de 1988 e formam a base de todo o sistema jurídico, pode-se con-cluir, também, que o critério do tempo de serviço é inconstitucional e não foi recepcionado pela Carta Magna.

33 FIGUEIREDO, Antônio Borges de. Op. cit.34 Idem.35 NEVES, Marcelo. Op. cit., p. 40.

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Por fim, como efeito produzido no mundo social, o critério analisado ainda cumpre uma função de desvalorização do trabalho e diminui as con-dições de pactuação nas relações laborais, em desfavor do empregado e dos objetivos do direito do trabalho.

Ademais, o critério do tempo de serviço cumpre a função de criar a ilusão de que a sua existência está fundamentada no respeito ao princípio da igualdade e, assim, desestimula discussões acerca de seus fundamentos, quando na realidade representa clara discriminação injusta e odiosa, in-compatível com os objetivos de um Estado Democrático de Direito e com a ideia de justiça.

Assim exposto, comungando com o entendimento de Amauri Mascaro Nascimento, de que “as construções da doutrina podem cumprir uma função integrativa ao lado da analogia e da equidade e, mais ainda, uma função corretiva mais ampla retificadora dos desvios do direito positi-vo, caso em que se sobrepõem às leis na medida em que a doutrina explica o sentido de uma lei”36, espera-se que o presente trabalho possa contribuir para renovar e reavivar o debate acerca do instituto da equiparação salarial e, por que não, provocar a correção das incoerências que o envolvem.

referÊNcIaS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Subsecretaria de Edições Técnicas, 2004.

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FIGUEIREDO, Antônio Borges de. Excludentes da equiparação salarial: uma crítica necessária. 2009. Disponível em: <http://www.jurisite.com.br/doutrinas/Trabalho/douttrab82.html>. Acesso em: 17 maio 2013.

36 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. cit., p. 445.

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MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

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Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Acórdão na Íntegra

33392

Tribunal Superior do TrabalhoProcesso nº TST‑RO‑13300‑09.2013.5.16.0000(1ª Turma)

recurSo ordINárIo em ação cautelar INomINada – medIda cautelar para SuSpeNder execução de acordo homologado em juízo em ação cIvIl pÚblIca – preSeNça do fumuS boNI IurIS e do perIculum IN mora – coNfIguradoS oS reQuISItoS para a maNuteNção da medIda cautelar coNcedIda No acÓrdão do trIbuNal regIoNal

1. Trata-se de ação cautelar ajuizada pela Empresa Maranhense de Administração Portuária – Emap – em face do Ministério Público do Trabalho da 16ª Região, objetivando conferir efeito suspensivo à exe-cução do acordo firmado e homologado em 31.08.2009 nos autos da Ação Civil Pública nº 0077400-03.2009.5.16.0003, até julgamento final da ação principal a ser ajuizada em trinta dias (no caso, ação anulatória). 2. A pretensão cautelar requerida e deferida teve por fun-damento central preservar o resultado útil da ação anulatória que ao tempo do ajuizamento da ação cautelar seria proposta, mas que na presente data encontra-se no juízo competente para sua apreciação, ainda sem sentença de mérito. 3. Nada há a reparar no acórdão recor-rido, porque corretamente destacou a presença do fumus boni iuris, consubstanciado no direito de ação anulatória de termo de acordo alegadamente eivado de vícios quanto aos poderes da procuradora que o firmou, bem como do periculum in mora, consubstanciado na iminência da execução de multa por obrigação de fazer em va-lor elevadíssimo de quatrocentos e noventa e três milhões de reais (R$ 493.000.000,00), valor que seria imobilizado em detrimento do fim social da empresa pública, possivelmente inviabilizando suas ati-vidades e a própria prestação de serviços à população. 4. Inalterados os fatos, mantém-se o acórdão que bem detectou a presença conco-mitante dos requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora.

Recurso ordinário conhecido e não provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário nº TST--RO-13300-09.2013.5.16.0000, em que é Recorrente Ministério Público do Trabalho da 16ª Região e Recorrido Empresa Maranhense de Administração Portuária – Emap.

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Trata-se de recurso ordinário oposto pelo Ministério Público do Tra-balho da 16ª Região contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região, que julgou procedente a presente ação cautelar para conferir efeito suspensivo à execução do acordo judicial firmado nos autos da Ação Civil Pública nº 774/2009-003 até o final do julgamento da Ação Anulatória (PET 0016300-17.2013.5.16.0000) (fls. 330/332).

No recurso ordinário às fls. 338/354, o Ministério Público do Traba-lho da 16ª Região insiste que se encontram ausentes os requisitos enseja-dores do deferimento da medida cautelar concedida no acórdão recorrido, já que o acordo objeto de anulação foi firmado por detentores do poder de transigir, formalmente nomeados e, ademais, por atos inequívocos, ra-tificado pela requerente através de seus representantes legais, merecendo total reforma o presente julgado. Por essa razão, em estando ausentes o fumus boni iuris e o periculum in mora justificáveis a obstar os comandos sentenciais, requer o provimento a este recurso para julgar improcedente a ação cautelar, restabelecendo, assim, a imediata possibilidade de exigir-se o cumprimento do acordo entabulado em sede de ação civil pública.

Despacho positivo de admissibilidade do recurso ordinário pela Pre-sidência do TRT da 16ª Região à fl. 356.

Contrarrazões pela requerente às fls. 373/376.

Os autos são encaminhados a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Tempestiva a interposição (fls. 333 e 355), representação processual regular (SJ 436 do TST), desnecessário preparo, estão presentes os requisitos extrínsecos de admissibilidade do recurso ordinário.

De par com isso, persiste o objeto recursal, consoante pesquisa reali-zada nos andamentos processuais dos processos subjacentes.

Colhe-se do andamento processual no site do TRT da 16ª Região que o processo principal (ACP 0077400-03.2009.5.16.0003), que tramita pe-rante a 3ª Vara do Trabalho de São Luís do Estado do Maranhão, encontra--se com andamento sobrestado, aguardando julgamento da presente ação cautelar.

Já a ação anulatória incidental à ação civil pública (PET 0016300-17.2013.5.16.0000), ajuizada perante o TRT da 16ª Região, foi julgada em

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12.02.2015 (publicação 26.02.2015), sendo acolhida a preliminar de in-competência funcional ou hierárquica do Tribunal arguida pelo Ministério Público para, declinando da competência deste Tribunal, remeter os autos à 3ª Vara do Trabalho de São Luís para apreciação da ação anulatória, em 26.11.2015. Nesse panorama, verifica-se que a ação anulatória ainda não foi julgada pelo Juízo competente.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso or-dinário e passo ao exame do seu mérito.

Trata-se de ação cautelar ajuizada pela Empresa Maranhense de Ad-ministração Portuária – Emap em face do Ministério Público do Trabalho da 16ª Região, objetivando conferir efeito suspensivo à execução do acor-do firmado e homologado em 31.08.2009 nos autos da Ação Civil Pública nº 0077400-03.2009.5.16.0003, até julgamento final da ação principal a ser ajuizada em trinta dias (no caso, ação anulatória). Destacou a requerente que o acordo foi firmado por advogada da empresa sem poderes especiais para transigir, e mesmo que o tivesse, por norma regulamentar da empresa pública, a transação estava sujeita a aprovação do Presidente da Emap e do Conselho de Administração; alegou que está sendo executada por uma multa na importância de quatrocentos e noventa e três milhões de reais (R$ 493.000.000,00), valores que não tem condições de dispor frente à sua estrutura de empresa pública.

A decisão monocrática proferida na cautelar deferiu a medida liminar postulada às fls. 208/210, com o seguinte teor:

DESPACHO

Trata-se de Medida Cautelar Inominada, com pedido de liminar inaudita altera pars, ajuizada por Emap – Empresa Maranhense de Administração Por-tuária com vistas a dar efeito suspensivo à execução de todos os termos de acordo firmado e homologado pelo juízo competente em 31.08.2009, nos autos da Ação Civil Pública nº 774-2009-003, ajuizada pelo Ministério Pú-blico do Trabalho (fls. 71/73), até julgamento final da ação principal a ser ajuizada em trinta dias.

O requerente questiona a validade do citado acordo aduzindo que firmado por advogada da empresa sem poderes especiais para transigir, e mesmo que o tivesse, por norma regulamentar da empresa pública, a transação estava sujeita a aprovação do Presidente da Emap e do Conselho de Administração. Além do que, assumiu obrigações e prazos inexequíveis pela empresa públi-ca, a exemplo da multa diária desproporcional aceita, e que podem acarretar graves prejuízos a Emap.

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Alega a título de periculum in mora que está prestes a ser executada de as-treintes astronômica decorrente desse acordo irregular. E que, em 22.04.2013 as partes tentaram em audiência uma forma tangível de cumprimento do acordo, o que não foi possível, diante da postura do Ministério Público do Trabalho que pretende a simples execução da multa e imediata demissão de praticamente todos os servidores da Emap com a consequente realização de concurso público para o provimento das vagas.

Destaca que o Juiz da execução previu como termo final o dia 01.06.2013 para as partes transigirem, sob pena de retomar a execução, atualmente no valor de R$ 493.000.000,00 (quatrocentos de noventa e três milhões), des-proporcional em relação aos recursos que dispõe a ora requerente.

Sustenta, ainda, que houve parcial cumprimento do acordo dentro das pos-sibilidades da Emap, não sendo caso de recalcitrância da requerente em seu cumprimento, mas de impossibilidade de cumprir os prazos estabelecidos para tanto. Porém a intenção da atual gestão é adequar-se às exigências le-gais, conforme orientações do MPT, sendo por isso, aplicável ao caso a regra do art. 413 do Código Civil vigente quanto à exigência da multa prevista no acordo.

Diante dos argumentos supra, entende estar preenchidos os requisitos do fumus boni juris e do periculum in mora, vez que sua pretensão encontra-se respaldada em um juízo de verossimilhança do direito invocado.

Com a inicial vieram vários documentos (fls. 017-200).

Em suma, é o relatório.

Decido.

A concessão da medida liminar inaudita altera pars está condicionada à aná-lise da presença dos requisitos autorizadores, quais sejam: o fumus boni juris e o periculum in mora.

In casu, o pleito da requerente visa obter efeito suspensivo à execução de acordo judicial firmado nos autos da Ação Civil Pública nº 774/2009, em curso na 3ª Vara do Trabalho de São Luis, cujo prazo final de suspensão, de-finido pelo juiz da execução, está previsto para 31.05.2013 (fl. 06) até o jul-gamento definitivo de ação principal (Ação Anulatória), que pretende propor em 30 dias, questionando a regularidade do mencionado acordo por ter sido celebrado por advogado(a) sem poderes para tanto, bem como, inobservadas regras dispostas no Decreto Judicial nº 25.262/2009 – Estatuto da Emap.

Analisando os autos, percebe-se que, em 22.04.2013, em audiência marcada para nova transação entre as partes (fl. 74), restou definido o seguinte: a) os litigantes decidiram sustar a execução da decisão visando a elaboração e apresentação de um cronograma de ações a serem implementadas visando o cumprimento integral do acordo e o valor a ser pago a título de dano moral;

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b) assume o compromisso de participar de audiência na sede do MPT, na próxima semana, ficando com o prazo de 30 dias a contar de 01.05.2013, para apresentar o termo de ajuste que busca alcançar; c) vencido o prazo, sem apresentação do termo deste ajuste, o juízo fica autorizado a adotar as ações necessárias à execução, mormente no que se refere à multa firmada pelo descumprimento do acordo outrora firmado.

Apesar de a Emap alegar que o MPT não permitiu tal solução, exigindo a simples execução da multa e a imediata demissão de praticamente todos os seus funcionários e a realização de concurso público, a requerente não cola-cionou nada que comprovasse essa postura do Ministério Público, tão pouco um esboço do cronograma de ações como se comprometera na audiência do dia 22.04.2013.

Entretanto, pela cópia da procuração de fl. 70 e da norma regulamentar da empresa pública (fls. 20/26), vê-se que a pretensão da requerente de questio-nar o referido acordo via ação anulatória é plenamente plausível, haja vista o que dita o art. 831, parágrafo único da CLT combinado com o art. 486 do CPC, in verbis: Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.

Considerando, ainda, que se trata de empresa Pública e o fato de o valor da multa a ser executada esta em patamares alarmantes (R$ 493.000.000,00), entendo que se apresenta plausível a pretensão da requerente de, preventi-vamente, suspender a execução da multa do acordo firmado entre as partes enquanto discutida a sua regularidade via ação judicial.

Por seu turno, o receio de dano irreparável ou de difícil reparação também está presente, vez que vencido o prazo judicial no último dia 31 de maio e existindo comando judicial prevendo a continuidade da execução e cons-trição de valores de modo a fazer cumprir a citada astreintes, por certo a sua execução causará inviabilidade financeira a parte requerente dado o seu valor.

Nesses termos, sem prejuízo da ulterior análise do mérito da presente Ação Cautelar, Defiro a medida liminar ora postulada, para conferir efeito suspen-sivo à execução do acordo judicial firmado nos autos da Ação Civil Publica nº 774/2009-003, até o julgamento de mérito desta Ação Cautelar.

Dê-se ciência ao requerente e ao Juízo Titular da 3ª Vara do Trabalho de São Luís.

Notifique-se o Ministério Público do Trabalho na condição de parte reque-rida para, querendo, apresentar contestação no prazo de 20 (vinte) dias, nos termos do art. 802, caput, c/c art.188 do CPC.

Cumpra-se.

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O Ministério Público do Trabalho da 16ª Região contrapôs-se por meio de agravo regimental, ressaltando ser necessária a presença concomi-tante dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, o que não constou da decisão monocrática.

No acórdão que examinou agravo regimental, fls. 301/303, o Cole-giado manteve a decisão liminar cautelar por seus próprios fundamentos, verbis:

Relatório

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

Trata-se de Agravo Regimental interposto pelo Ministério Público do Traba-lho (fls. 251-259), contra decisão monocrática prolatada por esta Desembar-gadora (fls. 204-206), que concedeu liminar, nos autos da Cautelar Inomina-da intentada pela Emap – Empresa Maranhense de Administração Portuária, conferindo efeito suspensivo à execução do acordo judicial firmado nos au-tos da Ação Civil Pública nº 774/2009-003, até o julgamento de mérito desta Ação Cautelar.

Em síntese, o agravante alega que o despacho concessivo da liminar foi emi-tido sem que houvesse a concomitância dos requisitos ensejadores a sua con-cessão, quais sejam: prova inequívoca, convencimento da verossimilhança das alegações e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Nesse sentido, argumenta que a cláusula especial Et Extra assinada pelo Pre-sidente da empresa/requerida garante à mandatária os poderes específicos elencados na parte final do art. 38 do CPC, afastando a alegada presença do fumus boni iuris da Emap de obter a suspensão da execução da multa a que deu causa.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo (fl. 284) pelo que merece conhecimento.

MÉRITO

Defesa do ato impugnado

Através da decisão monocrática de fls. 204-206, foi concedida a medida li-minar para conferir efeito suspensivo à execução do acordo judicial firmado entre a Emap e o MPT nos autos da Ação Civil Pública nº 774/2009-003, até o julgamento de mérito da presente Ação Cautelar.

O Parquet Trabalhista, ora agravante, sustenta que a cláusula especial Et Extra assinada pelo Presidente da empresa/requerida garante à mandatária os poderes específicos elencados na parte final do art. 38 do CPC, o que por si só afasta a alegação da Emap da existência de fumus boni iuris para obter

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a suspensão da execução da multa a que deu causa por descumprimento do acordo judicial e, por consequência, deve ser revogada a liminar deferida.

Com efeito, a pretensão do Ministério Público do Trabalho em ver reconhe-cido os poderes da mandatária elencados na parte final do art. 38 do CPC, para afastar a decisão liminar concessiva da suspensão da execução da multa por descumprimento do acordo avençado entre as partes, em sede de agravo regimental, implica adentrar na questão meritória da ação cautelar, o que não é possível diante do momento primeiro em que se encontra a presente ação. Em sede de liminar, somente admite-se a análise superficial acerca da existência dos requisitos necessários para a concessão do pedido liminar, quais sejam: o fumus boni iuris e o periculum in mora. E, como destacado na decisão agravada, apesar das alegações do agravante, entendo presente a fumaça do bom direito.

Destaca-se que restou consignado nos fundamentos da liminar a plausibili-dade da pretensão da requerente de questionar o referido acordo via ação anulatória, a teor do disposto no parágrafo único do art. 831 c/c o art. 486, do CPC. Portanto, havendo a possibilidade de anulação do citado acordo, fatalmente restará impedido qualquer questionamento acautelatório acerca dos poderes da mandatária, sobretudo diante da própria fase em que se en-contra o processo principal (meramente instrutória e sem qualquer decisão definitiva), bem como poderá combater um futuro e suposto prejuízo.

Como se vê, não há elementos suficientes para modificar o entendimento esposado na decisão liminar agravada. Portanto, ratifica-se os argumentos lançados na decisão agravada às fls. 204-206.

Por tais fundamentos,

Acordam os Desembargadores do Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região, por unanimidade, conhecer do agravo e, no mérito, por maio-ria, negar-lhe provimento para manter a decisão agravada.

O processo foi encaminhado ao Ministério Público para parecer, o que constou às fls. 312/320, opinando pela improcedência da ação e con-sequente revogação da medida liminar.

Em acórdão, o Pleno do Eg. TRT da 16ª Região, fls. 330/332, julgou procedente a ação cautelar, conferindo efeito suspensivo à execução do acor-do judicial firmado nos autos da Ação Civil Pública nº 774/2009-003 até o final do julgamento da Ação Anulatória (PET 0016300-17.2013.5.16.0000), verbis:

Relatório

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos.

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Trata-se de Medida Cautelar Inominada, ajuizada pela Emap – Empresa Ma-ranhense de Administração Portuária com vistas a dar efeito suspensivo a execução de todos os termos de acordo firmado e homologado pelo Juízo competente em 31.08.2009, nos autos da Ação Civil Pública nº 0077400-03.2009.5.16.0003, ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, até julga-mento final da ação principal a ser proposta em 30 (trinta) dias.

O requerente questiona a validade do citado acordo aduzindo que firmado por advogada da empresa sem poderes especiais para transigir, e mesmo que os tivesse, por norma regulamentar da empresa pública, a transação estava sujeita à aprovação do Presidente da Emap e do Conselho de Administração.

Além do que, assumiu obrigações e prazos inexequíveis pela empresa públi-ca, a exemplo da multa diária desproporcional aceita, e que podem acarretar graves prejuízos à Emap.

Alega que está prestes a ser executada de astreintes astronômica decorrente desse acordo irregular. E que, em 22.04.2013 as partes tentaram em audiên-cia uma forma tangível de cumprimento do acordo, o que não foi possível, diante da postura do Ministério Público do Trabalho que pretende a simples execução da multa e imediata demissão de praticamente todos os servidores da Emap, com a consequente realização de concurso público para o provi-mento das vagas.

Destaca que o Juiz da execução previu como termo final o dia 01.06.2013 para as partes transigirem, sob pena de retomar a execução dessa ação no valor de R$ 493.000.000,00 (quatrocentos de noventa e três milhões), des-proporcional em relação aos recursos que dispõe a ora requerente.

Sustenta, ainda, que houve parcial cumprimento do acordo dentro das pos-sibilidades da Emap, não sendo caso de recalcitrância da requerente em seu cumprimento, mas de impossibilidade de cumprir os prazos estabelecidos para tanto. Porém a intenção da atual gestão é adequar-se às exigências le-gais, conforme orientações do MPT, sendo por isso, aplicável ao caso a regra do art. 413 do Código Civil vigente quanto à exigência da multa prevista no acordo.

Liminar concedida às fls. 227-228.

O MPT apresentou contestação às fls. 213-226, pela improcedência da pre-sente ação cautelar.

O Agravo Regimental interposto pelo MPT às fls. 251-259, foi, por unanimi-dade, conhecido e, no mérito, por maioria, improvido confirmando a liminar agravada.

O MPT, em parecer de fls. 300-308, opinou pela improcedência da medida cautelar e, subsidiariamente, pela cessação da eficácia da medida cautelar.

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Em suma, é o relatório.

VOTO

Cabimento

Pelo cabimento da ação cautelar, haja vista que cumpridas as condições legais para a tramitação regular da presente ação.

Mérito

A ação cautelar constitui modalidade de tutela de urgência, cujo objetivo consiste em impedir que a demora no trâmite processual acarrete dano ir-reparável ou de difícil reparação às partes, prejudicando o resultado útil da prestação jurisdicional.

Por seu turno, o art. 798 do CPC concede o poder geral de cautela ao ma-gistrado, desde que presentes os pressupostos do fumus boni iuris e do periculum in mora, a fim de evitar o perecimento do direito objeto de disputa pelos litigantes.

No caso, em síntese, a requerente (Emap) pretende a suspensão da exe-cução de todos os termos do acordo firmado nos autos da Ação Civil Pú-blica nº 0077400-03.2009.5.16.0003, em trâmite na 3ª Vara do Trabalho de São Luís, até o final do julgamento da Ação Anulatória (PET 0016300-17.2013.5.16.0000), do qual sou igualmente relatora.

Com efeito, após a instrução da presente ação, não houve produção de pro-vas outras que afastasse a convicção desse Juízo ad quem, pela qual reitero as razões exposta na medida liminar, em que se identificou razoável ve-rossimilhança das razões da entidade requerente. Na oportunidade, assim decidiu esse Juízo às fls. 227-229:

[...]

Considerando, ainda, que se trata de empresa pública e o fato de o valor da multa a ser executada está em patamares alarmantes (R$ 493.000.000,00), entendo que se apresenta plausível a pretensão da requerente de, preventi-vamente, suspender a execução da multa do acordo firmado entre as partes enquanto discutida a sua regularidade via ação judicial.

Por seu turno, o receio de dano irreparável ou de difícil reparação também está presente, vez que vencido o prazo judicial no último dia 31 de maio e existindo comando judicial prevendo a continuidade da execução e constri-ção de valores de modo a fazer cumprir a citada astreintes, por certo a sua execução causará inviabilidade financeira- à parte requerente dado o seu valor.

Nesses termos, sem prejuízo da ulterior análise do mérito da presente Ação Cautelar, Defiro a medida liminar ora postulada, para conferir efeito suspen-

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sivo a execução do acordo judicial firmado nos autos da Ação Civil Pública nº 774/2009-003, até o julgamento de mérito desta Ação Cautelar.

[...]

Pelo exposto, confirma-se a decisão liminar e julga-se procedente a presente ação cautelar, para conferir efeito suspensivo à execução do acordo judicial firmado nos autos da Ação Civil Pública nº 774/2009-003 até o final do jul-gamento da Ação Anulatória (PET 0016300-17.2013.5.16.0000).

Por tais fundamentos,

Acordam os Desembargadores do Pleno do Tribunal Regional do Traba-lho da 16ª Região, por unanimidade, admitir a Ação Cautelar Inominada e, no mérito, por maioria, julgá-la procedente para conferir efeito suspensi-vo à execução do acordo judicial firmado nos autos da Ação Civil Pública nº 0077400- 03.2009.5.16.0003, até o final do julgamento da Ação Anula-tória (PET 0016300-17.2013.5.16.0000). Custas pela requerente, calculadas sobre o valor atribuído à causa.

Contra essa decisão, o Ministério Público do Trabalho da 16ª Região opõe recurso ordinário. Em suas razões, fls. 338/354, o MPT insiste que se encontram ausentes os requisitos ensejadores do deferimento da medida cautelar concedida no acórdão recorrido, já que o acordo objeto de anula-ção foi firmado por detentores do poder de transigir, formalmente nomeados e, ademais, por atos inequívocos, ratificado pela requerente através de seus representantes legais, merecendo total reforma o presente julgado. Por essa razão, em estando ausentes o fumus boni iuris e o periculum in mora justifi-cáveis a obstar os comandos sentenciais, requer o provimento a este recurso para julgar improcedente a ação cautelar, restabelecendo, assim, a imediata possibilidade de exigir-se o cumprimento do acordo entabulado em sede de ação civil pública.

Razão não lhe assiste.

Nos termos do relato, a pretensão cautelar requerida e deferida teve por fundamento central preservar o resultado útil da ação anulatória que ao tempo do ajuizamento da ação cautelar seria proposta, mas que na presente data encontra-se no juízo competente para sua apreciação, ainda sem sen-tença de mérito.

Coaduna-se com as decisões proferidas, quer a monocrática, quer o acórdão ora recorrido que a manteve, porque corretamente destacaram a presença do fumus boni iuris, consubstanciado no direito de ação anula-tória de termo de acordo alegadamente eivado de vícios quanto aos pode-res da procuradora que o firmou, bem como do periculum in mora, con-

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substanciado na iminência da execução de multa por obrigação de fazer em valor elevadíssimo de quatrocentos e noventa e três milhões de reais (R$ 493.000.000,00), valor que seria imobilizado em detrimento do fim so-cial da empresa pública, possivelmente inviabilizando suas atividades e a própria prestação de serviços à população e que, confrontada com a razoa-bilidade das alegações para anular o acordo firmado, não prepondera.

Portanto, nada há a reparar no acórdão ora recorrido, na medida em que os fatos não se alteraram, pois, consultados os andamentos processuais da ação civil pública, onde firmado o acordo, e a ação anulatória, ambas se encontram no Juízo competente para prolação de decisão de mérito.

Dessa forma, as razões trazidas em recurso pelo Parquet, tendentes à validade do acordo firmado, apesar de abalizadas, não tem o condão de excluir a fumaça do bom direito bem como o periculum in mora detectados.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário.

ISTO POSTO

Acordam os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Tra-balho, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso ordinário.

Brasília, 06 de abril de 2016.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001) Hugo Carlos Scheuermann Ministro Relator

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional do Trabalho da 2ª RegiãoProcesso nº 0003112‑55.2013.5.02.0061 (20150042288)61ª VT de São PauloRecorrente: Julio Edward AssisRecorrido: Companhia Paulista de Trens Metropolitanos – CPTM

EMENTA

O fato de o empregado ter contato com o numerário da bilheteria não tem o condão de transformá-lo em exercente da área de segurança. O seu cargo está relacionado com a parte operacional da estação, conforme perfil do cargo que ocupava (Agente Operacional I). Desta forma, o autor não tem direito a receber o adicional de risco, posto que não atuava nas funções típicas de segurança operacional ou da segurança patrimonial. Nego provimento.

I – RELATÓRIO

Interpõe recurso ordinário o reclamante às fls. 199/206, afirmando que merece ser reformada a sentença no tocante ao adicional de risco.

Contrarrazões às fls. 211/220.

É o relatório.

II – CONHECIMENTO

voto

O recurso é tempestivo.

Custas isentas à fl. 197.

Conheço do recurso por estarem presentes os requisitos legais.

III – FUNDAMENTAÇÃO

A prova dos fatos que daria origem ao adicional de risco pleiteado competia ao autor, nos termos do art. 818 da CLT, por se tratar de fato cons-

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titutivo do seu direito (art. 333, I, do CPC). Não basta serem feitas meras alegações (allegatio et non probatio quasi non allegatio).

Desse ônus o recorrente não se desincumbiu.

Consta no perfil do cargo de agente operacional I (documento de nº 5, volume em apartado) que o empregado deve “Efetuar a venda, conferência, abastecimento e controle dos bilhetes, prestando conta dos valores movi-mentados, efetuando depósitos, mantendo o limite estabelecido de numerá-rio no guichê, preenchendo toda documentação relativa ao sistema de arre-cadação, atendendo com presteza aos usuários para utilização do sistema”.

A responsabilidade relativa à arrecadação e transporte dos valores recolhidos nas bilheterias não tem a natureza da segurança operacional ou patrimonial típicas, de acordo com o perfil do cargo de agente de segurança operacional (documento nº 7, volume em apartado).

O Agente Operacional I não tem obrigação contratual de fazer a de-fesa do patrimônio da empresa em caso de roubos e furtos, pois tal respon-sabilidade cabe aos agentes de segurança.

O Agente Operacional I não era responsável pelas ocorrências poli-ciais, o que o diferencia do agente de segurança.

O autor exercia atividades totalmente diferentes das do agente de se-gurança, não fazia segurança patrimonial e sequer andava armado.

Em depoimento o autor disse que: “trabalha na bilheteria, com valo-res, linha de bloqueios (passagem de idosos, deficientes), inibindo o pessoal para não pular catraca, que cuida da operação da plataforma, também re-colhem os bilhetes dos baldes; que basicamente são essas atribuições; que a sala de rendas é anexa à sala da bilheteria; quem busca o numerário é uma empresa de transporte de valores; que o depoente transporta numerário ape-nas da bilheteria para a sala de renda; que não solicita acompanhamento de segurança, pois a sala é anexa” (fl. 194).

A própria testemunha do autor, Reginado, ao descrever as funções exercidas, demonstra as diferenças existentes nas funções de agente ope-racional I e do agente de segurança. Consta do depoimento que: “[...] que trabalhou junto com o reclamante de 2008 a 2011, aproximadamente, na estação Guaianazes; que havia destacamento de agente de segurança no local; que os agentes ficam nas plataformas; que se há alguma desavença entre um usuário e o agente de operação (cargo do reclamante), chamariam os agentes de segurança; que o primeiro atendimento ao usuário é feito pelo agente de operação e se surge algum problema com o usuário os agentes de

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seguranças são acionados; que o cargo do depoente não faz rondas, mas o agente de segurança, sim” (fl. 194).

O fato de o empregado ter contato com o numerário da bilheteria não tem o condão de transformá-lo em exercente da área de segurança. O seu cargo está relacionado com a parte operacional da estação, conforme perfil do cargo que ocupava (Agente Operacional I).

Desta forma, o autor não tem direito a receber o respectivo adicional, posto que não atuava nas funções típicas de segurança operacional ou da segurança patrimonial.

O benefício do adicional de risco de vida foi deferido aos empre-gados da área de segurança por meio de negociação coletiva: “A CPTM concederá o adicional de 15% (quinze por cento) do salário nominal aos empregados integrantes dos cargos de Agente, Encarregado e Supervisor de Segurança, quando atuando nas funções típicas da Segurança Operacional ou da Segurança Patrimonial” (cláusula 20 – documento de nº 10, cláusula 18 – documentos de nºs 11, 12, 13, cláusula 15 – documentos de nºs 14, 15, 16, todos do volume em apartado).

As normas benéficas devem ser interpretadas restritivamente (art. 114 do Código Civil).

Maria Helena Diniz é clara no sentido de que “o juiz não poderá dar a esses atos negociais interpretação ampliativa, devendo limitar-se, unica-mente, aos contornos traçados pelos contraentes, vedada a interpretação com dados alheios ao seu texto” (Código Civil anotado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 764).

O fato de o autor ser responsável pelo numerário arrecadado nas bi-lheterias da estação não se equipara ao risco de vida a que se expõem os agentes e os encarregados de segurança, que atendem e encaminham ocor-rências com usuários, inclusive roubos, furtos, agressões, tumultos, aciden-tes, etc.

Ressalte-se que o referido adicional foi criado com o objetivo de inde-nizar aqueles que se expõem ao risco iminente, utilizando inclusive arma de fogo, após treinamento específico e acompanhamento psicológico, o que não é o caso do autor.

Além do mais, a reclamada possui quadro de carreira, não pertencen-do o autor à categoria dos agentes de segurança, beneficiários do adicional de risco. Ao adicional ele não tem direito. Não se pode utilizar da interpre-

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tação teleológica para estender o benefício a quem não exerce as funções típicas da segurança operacional ou patrimonial.

A primazia da realidade mostra que o autor não exercia a função ale-gada para ter direito ao adicional de risco de vida.

Cito, na oportunidade, jurisprudência deste E. Regional sobre o tema:

ADICIONAL DE RISCO DE VIDA – CPTM – “Adicional de risco de vida, previsto no acordo coletivo de trabalho firmado pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos e o sindicato profissional somente é devido aos empre-gados e nas condições ali previstas, não se estendendo a trabalhadores, que não estejam inseridos no desenvolvimento das funções típicas de segurança, operacional ou patrimonial”. Recurso ordinário a que se nega provimento. (11ª T., Recurso Ordinário nº 01903-2005-027-02-00-9, ano 2008, Acórdão nº 20090330069, v.u., J. 05.05.2009, Relª Desª Dora Vaz Treviño, publicado em 19.05.2009)

PROVA – INDEFERIMENTO – FATO JÁ CONFESSADO – CERCEAMENTO NÃO CONFIGURADO – Não implica cerceamento de defesa o indeferimen-to pelo Juízo da ouvida de testemunhas a respeito de fatos já expressamente confessados pela parte. Com efeito, não admitem produção de provas os fatos afirmados por uma parte e confessados pela outra (art. 334, II, do CPC). In casu, reconhecida a desigualdade funcional em face dos agentes de se-gurança, base da pretensão inicial para auferir o pagamento de adicional de risco previsto em acordo coletivo destinado especificamente aos emprega-dos da Ré que se ativam nas funções de segurança (Agentes, Encarregados e Supervisores de Segurança), tornou-se impertinente a pretensão de ouvir testemunhas para fazer prova da versão inicial já abdicada pelo autor em depoimento pessoal. Não provada a alegada identidade de funções, não in-cumbe ao Judiciário estender benefício previsto em Acordo Coletivo, in casu o adicional de risco, para empregado não exercente das funções a que a norma expressamente se destina. Recurso do reclamante a que se nega pro-vimento. (4ª T., Recurso Ordinário nº 01669-2004-002-02-00-2, ano 2007, Acórdão nº 20071026635, v.u., J. 27.11.2007, Rel. Juiz Ricardo Artur Costa e Trigueiros, publicado em 07.12.2007)

Não houve qualquer violação ao inciso XXVI do art. 7º da Consti-tuição.

Assim sendo, nego provimento ao recurso.

A jurisprudência mencionada no recurso não vincula o julgador, nem representa fundamento para embargos de declaração. Não precisa ser ana-lisada, pois a análise é das razões do recurso e não do teor de acórdãos. As razões do recurso foram analisadas.

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Atentem as partes para a previsão do parágrafo único do art. 538 do CPC e arts. 17 e 18 do CPC, não cabendo embargos de declaração para rever fatos e provas e a própria decisão.

IV – DISPOSITIVO

Pelo exposto, Acordam os Magistrados da 18ª Turma do Tribunal Re-gional do Trabalho da Segunda Região: conhecer do recurso, por atendidos os pressupostos legais, e, no mérito, negar-lhe provimento. Mantido o valor arbitrado para efeito do cálculo das custas.

Sergio Pinto Martins Juiz Relator

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região1ª Turma – 1ª CâmaraRecurso OrdinárioProc. TRT/15ª Região nº 0011122‑59.2014.5.15.0007Origem: 1ª Vara do Trabalho de AmericanaRecorrente: Município de Nova OdessaRecorrida: Anete de Cassia AmaralJuiz Sentenciante: Ana Paula Alvarenga Martins

dIfereNçaS SalarIaIS – auSÊNcIa de crItérIoS legaIS de progreSSão eNtre cada padrão SalarIal do cargo de ofIcIal admINIStratIvo – IlegalIdade recoNhecIda

A Administração Pública é regida pelos princípios da legalidade, da publicidade e da impessoalidade, cabendo ao Município demonstrar os critérios legais utilizados para o enquadramento e progressão en-tre cada padrão salarial para justificar o tratamento diferenciado para cada trabalhador. Não comprovada a existência de tais critérios, deve ser reconhecida a ilegalidade e o direito do obreiro a diferenças sa-lariais.

Inconformado com a sentença (ID d06eb05) que julgou parcialmente procedentes os pedidos, recorre o reclamado (ID 8070d26), pretendendo o afastamento da condenação ao pagamento de diferenças salariais decorren-tes do reenquadramento funcional.

Contrarrazões (ID 127c845).

Manifestação da Procuradoria do Trabalho pelo prosseguimento do feito (ID c8b367b).

É o relatório.

VOTO

1 do coNhecImeNto

Presentes os pressupostos de admissibilidade, decido conhecer do re-curso interposto.

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2 do proceSSameNto da remeSSa ofIcIal

A diretriz jurisprudencial majoritária (Súmula nº 303 do C. TST), cal-cada no § 2º do art. 475 do CPC, estabelece que não são submetidas ao duplo grau de jurisdição sentenças com condenação inferior a 60 salários mínimos.

No presente caso, entretanto, há uma peculiaridade, pois o valor fi-xado na Origem apenas corresponde a um arbitramento ilíquido da matéria controvertida.

Com efeito, a Súmula nº 490 do E. STJ assim dispõe quanto à questão:

“A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.”

Destarte, a fim de evitar alegação de nulidade, decido conhecer da remessa oficial na forma do art. 475, I do CPC e art. 1º, incisos IV, V e VI do Decreto-Lei nº 779/1969.

Retifique-se a autuação para fazer constar o processamento da remes-sa oficial.

3 da matérIa comum ao recurSo voluNtárIo e à remeSSa ofIcIal

3.1 DAS DIFERENÇAS SALARIAIS – DO REENqUADRAMENTO

Na inicial, a reclamante narrou que foi admitida por meio de regu-lar concurso público em 11.07.1994, para ocupar o emprego público de “Oficial Administrativa”, sendo que em 20.12.2011 teria sido comissionada no cargo de Assessora de Fiscalização, passando ao padrão de vencimento P-43. Aduz, contudo, que ao ser exonerada da função, em 21.09.2012, seu padrão de vencimento “teve uma degradação que redundou em diminui-ção de seu salário-base, ou seja, como se observa da Tabela de Padrão em anexo, o Padrão que a Reclamante era classificada P-43 deixou de existir, então na transição para o retorno ao cargo de oficial administrativa passou a receber o salário equivalente ao padrão P-25, enquanto deveria receber equivalente ao padrão maior, notadamente pela complexidade do trabalho que exerce” (ID 03fe822 – p. 3). Pugnou, desse modo, pelo pagamento de diferenças salariais em relação ao atual padrão de vencimentos P-62.

Em defesa, o reclamado argumentou, em síntese, que o pleito da re-clamante seria, na verdade, de equiparação salarial, ainda que não tenha indicado empregados paradigmas, asseverando que “o direito à equipara-

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ção depende do reconhecimento da isonomia funcional, que, por sua vez pressupõe a averiguação do trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, com igual produtividade e mesma per-feição técnica, por trabalhadores cuja diferença de tempo de serviço na função não seja superior a dois anos, nos termos do disposto no art. 461, § 1º da CLT e Súmula nº 6 do TST. Ocorre que diante da declaração de vín-culo de emprego entre a Reclamante e o Reclamado – Município de Nova Odessa, torna-se inviável a equiparação salarial pleiteada, por ausência dos requisitos do art. 461 da CLT, tal como, a indicação do paradigma, condi-ção indispensável à apuração do pleito” (ID 8e578e6 – p. 2 e 3).

O MM. Juízo de Origem julgou o pleito parcialmente procedente sob os seguintes fundamentos:

“É incontroverso o fato de que a autora foi admitida pela reclamada por meio de aprovação em concurso público para o cargo de ‘oficial administrativo’. Na inicial, a reclamante afirmou que está enquadrada no padrão salarial P-33 da tabela de salários elaborada pela ré, cujo valor do seu salário é de R$ 1.239,84. Ao argumento de que os demais servidores que exercem a mesma função recebem padrão salarial P-62 da mesma tabela (R$ 2.773,95), pretende a condenação da reclamada no pagamento da diferença salarial existente entre um padrão e outro. O Município defendeu-se sob o funda-mento de que o pedido da autora é de equiparação salarial e que não pre-enche os requisitos do art. 461 da CLT. Conforme se infere da inicial, a pre-tensão da autora não se trata de equiparação salarial, mas de correção do seu enquadramento funcional, motivo pelo qual não se vislumbra ofensa aos preceitos da Constituição e aos verbetes sumulares mencionados na defesa. Não há nos autos justificativa para o tratamento diferenciado atribuído pelo Município aos oficiais administrativos. Tendo em vista que a ré não escla-receu os requisitos para enquadramento dos oficiais administrativos nas va-riações P-18 a P-62 (id 76100d1 – p. 2), bem como não comprovou motivo impeditivo ao direito pretendido pela autora, ela faz jus à diferença salarial existente entre o salário-base do padrão P-33 e o do P-62, com reflexos nos décimos terceiros salários, férias acrescidas do terço constitucional, gratifica-ção de função, adicional por tempo de serviços, assim como de horas extras, se o caso, bem como no FGTS, este para depósito em conta vinculada, uma vez que o contrato de trabalho permanece em vigor, parcelas vencidas e vincendas, enquanto perdurar a situação.” (ID d06eb05 – p. 2)

Em sede de recurso, o reclamado reitera sua tese no sentido de que tratar-se-ia de pedido de “equiparação salarial travestido de diferença sala-rial” (ID 8070d26 – p. 3), invocando a vedação contida na OJ 297 da SDI-I do C. TST.

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Pois bem.

Ab initio, é preciso consignar que o presente caso não trata de equi-paração salarial, mas sim do pedido recebimento de diferenças salariais em decorrência do alegado enquadramento incorreto da reclamante na tabela de padrões salariais do município (ID 76100d1), de sorte que inaplicável a Orientação Jurisprudencial nº 297 da SDI-1 do C. TST.

Portanto, não há afronta ao inciso XIII do art. 37 da Constituição Fe-deral, tampouco dissenso da jurisprudência pacificada nos Tribunais Supe-riores, mesmo porque a Orientação Jurisprudencial nº 125 da SDI-1 do C. TST, assim dispõe, in verbis:

“DESVIO DE FUNÇÃO – QUADRO DE CARREIRA

O simples desvio funcional do empregado não gera direito a novo enquadra-mento, mas apenas às diferenças salariais respectivas, mesmo que o desvio de função haja iniciado antes da vigência da CF/1988.”

Acrescente-se que a defesa não apresentou qualquer elemento apto a justificar o tratamento diferenciado entre os níveis salariais do cargo de “Oficial Administrativo”.

Note-se que a reclamante tem mais 20 anos no emprego público e aduziu que ocupou funções com graus variados de responsabilidade, como a “elaboração de contratos de licitações, posto fiscal e por fim a função comissionada de assessora de fiscalização de obras e posturas”, tendo afir-mado também que, com o retorno ao cargo de oficial administrativa, passou a receber o salário equivalente ao padrão P-25, enquanto deveria receber equivalente ao padrão maior, dada a suposta complexidade do trabalho. Entretanto, tais alegações não foram impugnadas pela defesa, presumindo--se verdadeiras, na forma do art. 302 do CPC.

Considerando, ainda, que a Administração Pública é regida pelos princípios da legalidade, da publicidade e da impessoalidade, cabia ao re-clamado demonstrar porque o enquadramento funcional da autora se deu no padrão P-25, com salário-base substancialmente menor, comprovando os critérios de progressão entre cada padrão salarial e eventuais outras con-dições objetivas previamente previstas em lei. Entretanto, de tal encargo processual não se desincumbiu.

Neste sentido já decidiu a esta Câmara, em voto de relatoria da Exma. Desembargadora Maria Cristina Mattioli, nos autos do Processo nº 0000426-32.2012.5.15.0007, no qual o município reclamado figurava

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no polo passivo, em matéria atinente a diferenças salariais por enquadra-mento incorreto, in verbis:

“ENQUADRAMENTO SALARIAL

As reclamantes foram admitidas pelo reclamado mediante prévia aprovação em concurso público e para exercerem a função de ‘oficial administrativo’, cujos contratos permanecem em vigor. Alegam que, de acordo com a ‘tabela de vencimentos’ publicada em 31.12.2011, o salário de ambas está classifi-cado no padrão P-18 (antigo M-06), mas executam as mesmas atribuições do oficial administrativo que recebe pelo padrão P-62 (antigo M-22), requeren-do as diferenças salariais existentes entre um padrão e outro.

A sentença reconheceu a ilegalidade da situação e determinou o reenqua-dramento das reclamantes, além do pagamento das diferenças salariais e re-flexos, decisão ora impugnada pelo Município sob o argumento de que a equiparação salarial é inaplicável à relação entre as partes, por ser vedada constitucionalmente no serviço público e por não ocorrer identidade de fun-ções, eis que o único servidor ocupante de emprego público de oficial ad-ministrativo com o padrão perseguido pelas reclamantes (P-62) é o Sr. Pedro Geraldo Torelli, responsável pela Tesouraria, enquanto as autoras trabalham na recepção/administrativo do Departamento de Recursos Humanos e de Pessoal.

Em primeiro lugar, o pleito apresentado pelas reclamantes não é de equipa-ração salarial, mas de correto enquadramento nas diversas faixas salariais da função de oficial administrativo, o que não é vedado ao ente público.

Em segundo, o Município não apresentou justificativa legal ou administrativa para a existência destas diversas faixas salariais para a mesma função e qual a forma de classificação dos empregados entre as faixas, ou seja, qual o critério para que um oficial administrativo tenha salário superior a outro. Veja que os empregados relacionados no item nº 83 tratam do cargo de oficial adminis-trativo, cujos padrões de vencimento variam do M-06 (atual P-18) até M-22 (atual P-62), conforme relação de empregos e padrões à fl. 32.

A simples alegação de que o oficial que recebe o salário mais alto trabalha no setor de tesouraria e as reclamantes na recepção/administrativo do Depar-tamento de Recursos Humanos e de Pessoal, mesmo com funções diversas, é irrelevante para o deslinde da questão, pois não justifica a diferença na remuneração e o enquadramento inicial de cada trabalhador.

O tratamento diferenciado e não justificado legalmente não pode ser aceito, pois pode até ser utilizado como forma de burlar os preceitos constitucionais e beneficiar apadrinhados políticos. Ademais, verifica-se que o Município não trouxe ao processo nenhum ato administrativo que descrevesse as ativi-dades inerentes a cada padrão salarial ou eventuais condições que permitis-

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sem a progressão salarial do Oficial Administrativo, o que torna irregular o ato e gera procedência do pleito das reclamantes.

Assim, não tendo o reclamado se desvencilhado de seu ônus probatório, mantenho a decisão de origem.

Nego provimento.” (Publicado em 08.03.2013, g.n.)

Destarte, não comprovada qualquer justificativa legal para o trata-mento diferenciado da obreira, decido negar provimento ao recurso do re-clamado e à remessa oficial, nestes termos consignando as razões de decidir para fins de prequestionamento.

4 da remeSSa ofIcIal

4.1 DOS HONORáRIOS ADVOCATíCIOS

O MM. Juízo de origem deferiu o pagamento de “honorários advoca-tícios na base de 15% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20 do Código de Processo Civil” (ID d06eb05 – p. 2).

Porém, com o advento da EC 45/2004 foi editada a Instrução Norma-tiva nº 27/2005 pelo C. TST que estabeleceu, no art. 5º que, “os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência” ressalvadas as “lides de-correntes da relação de emprego”, que é exatamente o caso dos autos. Des-se modo, incompatível o art. 20, caput, do CPC na hipótese ora em análise.

Nesta Justiça Especializada, são devidos honorários advocatícios quando satisfeitos os requisitos estabelecidos nos arts. 14 e 16 da Lei nº 5.584/1970 (Súmulas nºs 219 e 329 do C. TST). Inocorridos, como no caso sub judice, ante a inexistência de assistência sindical, decido dar pro-vimento à remessa oficial para excluir a condenação quanto ao pagamento de honorários advocatícios.

4.2 DOS jUROS E CORREÇÃO MONETáRIA

Está correta a decisão de piso que determinou a “correção monetá-ria, na forma da Súmula nº 381 do C. TST. Juros a partir do ajuizamento da ação, observando os parâmetros delimitados na Orientação Jurisprudencial nº 7 do Tribunal Pleno do C. TST“ (ID d06eb05 – p. 3), posto que em conso-nância com os termos da diretriz majoritária desta Câmara julgadora.

Destarte, decido negar provimento à remessa oficial, nestes termos consignando as razões de decidir para fins de prequestionamento.

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Por tais fundamentos, decido conhecer e negar provimento ao recur-so do reclamado e conhecer e dar parcial provimento à remessa oficial para excluir da condenação o pagamento de honorários advocatícios, tudo nos termos da fundamentação.

Retifique-se a autuação para fazer constar o processamento da remes-sa oficial.

Tereza Aparecida Asta Gemignani Desembargadora do Trabalho Relatora

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Acórdão na Íntegra

33395

Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região135000068094Órgão Julgador: 2ª T.Tipo do Recurso: RONº Processo: 0001441‑83.2012.5.24.0072Relator(a): Rel. Des. Francisco das C. Lima FilhoData de Publicação: 22.02.2016Relator: Des. Francisco das C. Lima FilhoRevisor: Des. Amaury Rodrigues Pinto JuniorRecorrentes: 1) Telheira Santa Lourdes Ltda. – EPP

2) Denivaldo Nunes Franca FeitosaAdvogados: 1) Antonio Costa Corcioli e outros

2) Josemiro Alves de Oliveira e outro Recorridos: 1) Denivaldo Nunes Franca Feitosa

2) Telheira Santa Lourdes Ltda. – EPPAdvogados: 1) Josemiro Alves de Oliveira e outro

2) Antonio Costa Corcioli e outros Origem: 2ª Vara do Trabalho de Três Lagoas/MS

INjÚrIa racIal – aSSédIo dIScrImINatÓrIo caracterIzado – INdeNIzação por daNoS moraIS – reSpoNSabIlIdade do empregador

Atos de agressão e discriminação com conotação racista advindos de prepostos da empresa, a par de constituir conduta tipificada por nor-ma penal como injúria racial, agride de forma inadmissível a dignida-de humana do trabalhador, caracterizando a figura do assédio moral discriminatório que, como variante do assédio psicológico, é caracte-rizado por conduta não desejada no ambiente laboral ou em conexão com o trabalho, vinculada a qualquer circunstância pessoal de ori-gem, raça, orientação sexual, idade, compleição física entre outras, com o propósito ou efeito de criar um entorno intimidatório, hostil, discriminatório ou degradante, provocando lesão a direitos inerentes à pessoa humana do trabalhador como a dignidade e a igualdade. Se mesmo tendo plena ciência da conduta do preposto o empregador se omite em adotar medidas preventivas ou de punição do agressor, deve ser responsabilizado pela indenização pelos danos morais so-fridos pela vítima. Intelecção do previsto nas normas constantes dos arts. 5º, inciso X, da Carta de 1988, e 186 e 932, inciso III, do Código Civil, a ser arbitrada tomando-se em consideração o critério de pro-

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porcionalidade que leve em conta a gravidade da conduta e da lesão de forma a que, pedagogicamente, sirva de exemplo e estímulo a inibir prática de novos ilícitos. Recurso parcialmente provido.

RELATÓRIO

Vistos, relatados e discutidos estes autos (Processo nº 0001441-83.2012.5.24.0072-RO.1), em que são partes as acima indicadas.

Com o objetivo de reformar a sentença de fls. 627/635, complemen-tada pela decisão de embargos de declaração de fls. 667/667/verso, profe-ridas pelo Juiz Hélio Duques dos Santos, Auxiliar na 2ª Vara do Trabalho de Três Lagoas/MS, que acolheu em parte as pretensões contidas na inicial, recorrem as partes, conforme as razões de fls. 637/653 e fls. 668/676.

Contrarrazões às fls. 658/663 e 678/686.

Depósito recursal e custas comprovadas às fls. 654/655.

Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 80 do RITRT.

É o relatório.

VOTO

1 coNhecImeNto

Porque presentes os pressupostos de cabimento e admissibilidade, conheço integralmente do recurso apresentado pela demandada e das con-trarrazões.

Todavia, conheço apenas parcialmente do recurso interposto pelo autor, não o fazendo quanto ao pedido de adicional de insalubridade em razão de suposto contato com agentes biológicos, por manifesta inovação.

Com efeito, o aludido adicional foi requerido em razão de contato com agentes químicos – argila – e físicos calor.

Contestado o pleito, em sede de impugnação o autor reiterou as men-cionadas causas de pedir, sem mencionar, entretanto, contato com agentes biológicos.

Quando da realização da pericia, apresentou questionamentos sobre a presença de agentes físicos e químicos, apenas.

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O único momento em que mencionou contato com agentes bioló-gicos foi quando do pedido de indenização por danos extrapatrimoniais em decorrência de suposta atribuição de limpeza de banheiros, o que foi indeferido.

Entretanto, nas razões recursais veicula pretensão de reforma da sen-tença quanto ao indeferimento das diferenças de adicional de insalubridade com causa de pedir inédita, qual seja, o contato com agentes biológicos pela limpeza de banheiros.

Manifestamente inovadora, portanto, a tese, dela não conheço.

2 mérIto

2.1 RECURSOS DAS PARTES HORAS ExTRAS. INTERVALO INTRAjORNADA

A sentença considerou a fidedignidade dos cartões de ponto, confir-mada pela prova testemunhal, apontando jornada das 6h30min às 17h de segunda a sexta e das 6h30min às 11h aos sábados.

Deferiu, então, horas extras a partir da oitava diária ou quadragésima quarta semanal, considerando ainda o intervalo intrajornada usufruído par-cialmente em uma hora por dia.

Insurgem-se as partes.

A demandada sustenta haver divisão na prova, porquanto contradi-tórios os depoimentos das testemunhas no que tange ao gozo do intervalo intrajornada, com aquelas apresentadas pelo autor sinalizando uma hora diária e a da demandada afirmando categoricamente que o intervalo era de duas horas por dia, o que levaria a se concluir que o trabalhador não se desincumbiu do ônus de desmerecer os cartões de ponto, que devem prevalecer.

Pretende, assim, a exclusão da condenação das horas extras prati-cadas.

O autor, de seu turno, almeja a majoração da condenação, ao argu-mento de que a prova testemunhal confirmou a jornada apontada na inicial – das 2h às 17h, com intervalo de uma hora diária, postulando então dife-renças de horas suplementares e do adicional noturno.

Apenas a tese defendida pelo autor merece acolhimento, data venia.

Ao impugnar especificamente os registros de ponto de fls. 193/219, o trabalhador assumiu o ônus de comprovar a jornada apontada na inicial.

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A meu juízo se desincumbiu do encargo.

Com efeito, dividida a prova oral, o detalhado cotejo dos depoimen-tos mitiga as anotações constantes dos cartões de ponto.

De fato, a testemunha Damião Martins Mota afirmou ter laborado “em setores próximos” ao autor (fl. 545, item 2) Ademais, Damião disse que durante uma semana trabalhou no mesmo setor que o autor, como fornador, o que guarda coerência com a afirmação de que “o autor trabalhava das 2h da manhã até às 17h” e que “trabalhou somente uma semana neste horário, sendo que no restante do período contratual das 6h30min da manhã às 17h” (fl. 545, itens 3 e 4), enquanto aquela de nome José Luiz Neves Jesus, ainda que tenha trabalhado apenas um mês no período em que o deman-dante prestou serviços, tinha entre suas atribuições o labor no forno, mesmo setor em que o autor trabalhava (fl. 546, item 2, e 547, item 12).

Afirmou, ademais, que “trabalhou no mesmo horário do autor, das 2h às 17h” (fl. 546, item 3).

A única testemunha apresentada pela acionada, de nome Antonio Marcos Pinto de Andrade, ocupava até o momento em que ouvida, função de confiança junto à empresa, de gerente de produção e de qualidade, ten-do confirmado que o horário informado pela acionada era registrado nos cartões de ponto.

Nesse contexto, conclui-se que os aludidos depoimentos confirmam a jornada declinada na inicial, porquanto uníssonas as duas versões das testemunhas do autor, em contraponto ao que afirmado por aquela apresen-tada pela empresa.

Com relação ao intervalo intrajornada, correto o deferimento de uma hora no cômputo da jornada e consequente pagamento de diferenças de horas extras, eis que a esse respeito a prova testemunhal aponta para o gozo de uma hora diária de intervalo.

As duas testemunhas indicadas pelo autor afirmaram que o intervalo era usufruído diariamente em uma hora (fl. 545, item 5, fl. 546, item 5).

O preposto nada afirmou a respeito e a testemunha indicada pela demandada, que é ocupante de cargo de confiança, nada soube dizer a res-peito do intervalo, confirmando apenas a veracidade dos registros de ponto.

Ocorre que, a teor do art. 74, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, para os estabelecimentos que contém com mais de dez trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem

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expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré-assinalação do período de repouso.

Nada mais fez a testemunha do autor do que confirmar a pré-assina-lação do intervalo, sem precisar, entretanto, qual era o tempo efetivamente usufruído.

Nesse quadro, pré-anotado o intervalo a prova oral o desconstituiu ao evidenciar a concessão apenas parcial.

Dou, pois, provimento ao recurso interposto pelo autor para reconhe-cer como verdadeira a jornada apontada na inicial – das 2h às 17h, com uma hora de intervalo – porém mantidos os demais critérios fixados pela sentença (fl. 630/verso) e ainda o adicional noturno com os respectivos re-flexos e, como consequência, nego provimento ao apelo apresentado pela acionada.

2.2 RECURSO DA DEMANDADA

2.2.1 danos extrapatrimoniais

A sentença deferiu indenização por danos extrapatrimoniais, arbitra-da em R$ 5.000,00, por entender ter sido comprovada a prática de ato ilícito pela empresa, consistente em injúrias pejorativas e raciais causadoras de inequívoco abalo íntimo e moral ao trabalhador.

Em recurso, a empresa sustenta a contradição entre os depoimentos das testemunhas apresentadas pelo autor e defende a ausência da compro-vação da suposta prática de injúrias.

Não prospera a tese.

Com efeito, afirmou o trabalhador ter sido assediado moralmente ao ser “constantemente chamado de preguiçoso, irresponsável e burro, entre outros adjetivos discriminadores e vexatórios” (fl. 10).

A partir dessa afirmação, assumiu o encargo de comprovar os atos discriminatórios e vexatórios de que se disse vítima (arts. 818 da Consolida-ção das Leis do Trabalho e 333, I, do Estatuto Processual Civil).

O exame da prova oral, que, ao contrário do sustentado pela recor-rente, não revela qualquer contradição, evidencia as alegadas agressões ao trabalhador por parte de preposto da empresa, algumas delas com evidente conotação racista decorrente de preconceito racial.

De fato, a testemunha Damião Martins Mota, cujo depoimento se vê à fl. 545, itens 18, 19, 35 e 36, afirmou:

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Já presenciou o Sr. Marcelo agredindo verbalmente o reclamante, por meio de palavras como “preto, vagabundo”, e dizendo que ele só estava ali para enrolar o trabalho; O próprio depoente já foi agredido verbalmente pelo Sr. Marcelo, tendo sido chamado de “vagabundo e preguiçoso”; Presenciou o Sr. Marcelo ofendendo o reclamante na hora da folga das 9h; Presenciou o Sr. Marcelo agredindo o reclamante em diversas oportunidades.

E aquela de nome José Luiz Neves de Jesus, declarou:

Já presenciou o reclamante sendo agredido verbalmente pelo gerente Sr. Marcelo por meio de nomes como “preto e preguiçoso”; O depoente nun-ca foi agredido verbalmente por referido funcionário, mas que presenciou as agressões ao reclamante porque já trabalhou no forno (fls. 714-717.547, itens 18 e 19) Como se vê, os atos de violência moral praticados pelo prepos-to da empresa, além de revelar agressão à honra e a dignidade do trabalha-dor, evidenciam uma conduta racista e discriminatória que, pelo menos em tese, constitui o delito de injúria racial.

Trata-se, pois, de crime tipificado no Código Penal (art. 140, § 3º), que se consuma no momento da ofensa à honra de alguém, por meio de palavras ofensivas, depreciativas, discriminatórias, que ofendam a dignida-de e o decoro, referentes à raça, cor, etnia, religião, deficiência física, idade ou origem.

De fato, a injúria racial, delito introduzido no Código Penal pela Lei nº 9.459/1997, ocorre quando são dirigidos a uma pessoa integrante de de-terminada raça insulto, palavras ou tratamento pejorativo de forma a ofender e conspurcar a reputação e o amor próprio e, portanto, a honra da vítima.

Induvidosamente, a forma como o gerente da empresa sistematica-mente se dirigia e qualificava o autor, com adjetivos como “preto, vagabun-do” e “preto preguiçoso”, a par de discriminá-lo em razão da cor, agredia sua honra pessoal e profissional, atingindo-o de forma direta em sua digni-dade, à medida que o diminuía e o injuriava perante os demais colegas ex-clusivamente em razão da cor, em um inaceitável preconceito racional sem que a empresa tenha adotado qualquer medida concreta seja para evitar aquela criminosa conduta ou para reprimi-la, o que é suficiente para quali-ficar aquele insidioso comportamento como assédio moral discriminatório.

De fato, o assédio moral discriminatório, como variante do assédio psicológico, é caracterizado por conduta não desejada no ambiente laboral ou em conexão com o trabalho, vinculada a qualquer circunstância pessoal de origem, raça, orientação sexual, idade, compleição física entre outras, com o propósito ou efeito de criar um entorno intimidatório, hostil, dis-

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criminatório ou degradante que tenha aptidão de provocar lesão a direitos inerentes à pessoa humana como a dignidade ou a igualdade como ocorreu no caso examinado, em que o trabalhador era tratado de forma vexatória, discriminatória e humilhante pelo preposto da empresa, em razão da raça e da cor da epiderme.

É certo que a acionada tenta convencer que as testemunhas teriam fraudado os depoimentos na tentativa de favorecer o trabalhador.

Entretanto, referida afirmação não foi comprovada por qualquer meio.

Ademais, e ao contrário do sustentado, os depoimentos colhidos tota-lizaram cerca de quarenta tópicos cada, nos quais não se constata qualquer incoerência; antes, seguem a mesma linha de informações quanto à forma de tratamento e insultos discriminatórios e racistas por parte do gerente da empresa em relação ao trabalhador.

Por outro lado, o julgador pode formar sua convicção de forma livre desde que fundado nos elementos de provas constantes dos autos, ainda quando não alegados pelas partes (art. 131 do Código de Processo Civil).

No caso concreto, o que se extrai da prova é que o gerente, portanto, preposto da empresa, por puro preconceito racial, tratava de forma desres-peitosa e humilhante o trabalhador, a ele atribuindo qualificativos racistas que se mostram absolutamente inaceitáveis.

Há cerca de duas semanas tive a oportunidade de afirmar em mani-festação doutrinária que “o racismo é a convicção sobre a superioridade de determinadas raças”, com base em diferentes motivações, em especial as características físicas e outros traços do comportamento humano. Consiste, pois, “em uma atitude depreciativa não baseada em critérios científicos em relação a algum grupo social ou étnico”.

E naquela oportunidade ponderei que “esse tipo de LIMA FILHO, Francisco das C. A questão do preconceito racial. In: Gente de Opinião. Edi-ção de 08.11.2015. Embora cientificamente exista apenas uma raça: a Raça Humana. comportamento existe desde os mais remotos tempos na História da Humanidade, e quase sempre foi usado como instrumento de defesa de um grupo contra invasores pacíficos que apresentavam características distintas. Porém, ganhou mais fôlego com a colonização pelas potências eu-ropeias que se sentiam superiores aos povos conquistados ou colonizados, especialmente nas Américas e África”.

E continuei afirmando:

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No Brasil, em que pese um discurso, muitas vezes hipócrita, de fraternidade e igualdade, a discriminação racial, fruto do preconceito, ainda existe e de forma bastante acentuada, embora insistentemente negada. Um país que se pretende democrático não pode conviver com a discriminação e o precon-ceito de qualquer natureza ou origem. O preconceito que leva à discrimi-nação ainda é muito forte no Brasil e termina levando muitas vezes certos segmentos sociais como os negros, os homossexuais, os povos indignas, nor-destinos, os obesos e tantos outros grupos a serem vítimas de discriminação, em que pese sermos signatários de vários documentos internacionais proi-bitórios da discriminação, como, por exemplo, da Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racional (ONU), e encontrar-se expresso no Texto Magno não apenas o direito à igualdade, mas também o pluralismo e a fraternidade (arts. 1º e 3º da Carta de 1988)”.

E essa triste e condenável realidade ficou evidenciada no tratamento que foi dado ao autor pela gerência da empresa, ao contrário do que se ten-tou demonstrar nas razões do recurso.

A conduta empresarial, a par de afrontar o previsto no art. 3º, IV, da Constituição da República, fere as disposições contidas na Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, incorporada ao ordena-mento jurídico nacional pelo Decreto nº 62.150 de 19 de janeiro de 1968 e, portanto, integrante do bloco de constitucionalidade.

A referida normativa internacional tem como objetivo proteger os tra-balhadores contra atos de discriminação, em matéria de emprego e profis-são, motivadas por raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, vinculando não apenas o Poder Público, mas também os particulares em face da eficácia horizontal dos direitos funda-mentais.

Se isso não bastasse, chama a atenção o comportamento omissivo, se não comissivo, da empresa, ao deixar de adotar providências ou medidas para prevenir e reprimir esse inadmissível e criminoso comportamento.

Nesse quadro, a acionada deve responder pelos atos de seus prepos-tos, máxime quando omissa na adoção de medidas de prevenção e repre-ensão da conduta ilícita, nos termos do previsto nos arts. 932, inciso III, do Código Civil, pelos danos sofridos pelo trabalhador.

Tem, pois, a recorrente o dever de indenizar o trabalhador pelos da-nos que este sofreu com a conduta racista e discriminatória, inclusive aque-les de natureza extrapatrimonial, na forma do previsto no inciso X do art. 5º do Texto Maior e 186 do Código Civil.

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Tendo em vista a gravidade da conduta discriminatória antes regis-trada, impõe-se a manutenção da sentença quanto ao reconhecimento da responsabilidade da empresa pela indenização.

Quanto ao valor arbitrado, embora entenda que devesse ser majorado face à gravidade do comportamento empresarial, não há recurso do traba-lhador a esse respeito; porém, deve-se registrar que a reparação pelos danos decorrentes desse tipo de ilícito deve ser exemplar de modo a desestimular a repetição do ato.

Nego, pois, provimento ao apelo.

2.2.2 trabalho em feriados. pagamento em dobro

Insurge-se, ainda a empresa contra o deferimento da dobra pelo labor em feriados, ao argumento de que aqueles em que houve trabalho foram devidamente remunerados.

Não colhe a tese, data venia.

De acordo com o contido nos cartões de ponto de fls. 193/219, hou-ve trabalho em feriados não devidamente remunerados ou compensados, conforme se observa dos registros constantes de fls. 199, 208, 212 e 219.

Correta, pois, a sentença.

Nego provimento, assim, o recurso.

2.3 RECURSO DO AUTOR

2.3.1 Salário

A sentença indeferiu a integração das parcelas remuneratórias pagas inoficiosamente na remuneração do trabalhador.

Pugna o trabalhador pela reforma do julgado, sob o argumento de que a prova revelou pagamento extrafolha.

Não prospera o apelo.

Os contracheques apontam o pagamento de salário fixo, além de ou-tras parcelas adicionais, como horas extras e adicional de insalubridade.

A prova testemunhal não confirma pagamento fora da folha, chegan-do inclusive a ser contraditória em alguns trechos em que se informa o recebimento inoficioso e em seguida o pagamento salarial fixo nos contra-cheques.

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As testemunhas apresentadas pelo autor afirmam:

Não se recorda como era paga a remuneração do fornador; Acredita que ganhava R$ 10,00 por caminhão carregado, valor que não constava dos ho-lerites; Recebia o valor constante dos holerites. (Testemunha Damião Martins Mota, fl. 545, itens 8, 12 e 15) O salário do depoente era cerca de R$ 600,00 constante do seu holerite, sendo que em algumas oportunidades recebeu quantia inferior aquela constante dos recibos de pagamentos; nunca recebeu nenhuma quantia para o carregamento de caminhões; o fornador ganhava cerca de R$ 1.000,00; não sabe informar com precisão o salário do fornador nem a forma como este era pago. (Testemunha José Luiz Neves Jesus, fl. 547, itens 14 a 17) Por fim, a testemunha Antônio Marcos Pinto de Andrade, indi-cada pela empresa afirma:

Atualmente o salário do fornador é de cerca de R$ 1.200,00 mais a insalu-bridade a que tem direito; a remuneração do fornador é fixa, não havendo o pagamento de nenhuma parcela variável; não há pagamento de diária para os fornadores; o reclamante não realizava a atividade de carregamento, sen-do que esta era desempenhada pela 1ª testemunha ouvida, Sr. Damião e por outro funcionário de nome Fernando. (f. 548, itens 12 a 15) Nesse quadro, fácil constatar que o autor não se desincumbiu do ônus de comprovar paga-mento diverso daquele constante dos contracheques de fls. 220/227.

Tratando-se de fato que, pelo menos em tese constitui delito, não pode ser presumido.

Nego provimento.

2.3.2 adicional de insalubridade

Fundada no laudo pericial, a sentença considerou ter o autor traba-lhado em contato com agente insalubre – calor em grau médio, porém re-jeitou o pedido alusivo ao adicional em razão de ter sido quitado, conforme revelam os contracheques de fls. 220/227.

Insurge-se o autor.

Defende que o labor é considerado de natureza “pesada” pelas nor-mas técnicas do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE e era prestado em temperatura ambiente acima do permitido, Ademais, mantinha contato permanente com agentes biológicos em razão da limpeza dos banheiros, o que não teria sido aferido pelo exame.

Essa constatação, sustenta, garante o direito à percepção do adicional em grau máximo, e não médio.

Pugna, então, pela reforma da decisão.

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Também aqui não colhe a tese.

A perícia é conclusiva no sentido de que o autor trabalhou em am-biente com temperatura acima do limite, fazendo jus ao adicional de insa-lubridade em grau médio.

Informou, ainda, que não havia contato com agentes químicos, não existindo insalubridade em razão desse fato, com o que não concorda o trabalhador.

Entretanto, encontra-se pacificado o entendimento jurisprudencial no sentido de que a exposição do trabalhador ao calor excessivo garante o direito ao adicional de insalubridade em grau médio, conforme exegese da NR-15 do MTE, Anexo III, e Orientação Jurisprudencial nº 173, inciso II, da 1ª Seção de Dissídios Individuais – SDI-1 do Col. Tribunal Superior do Trabalho.

De outro lado, recente julgamento, datado de 18.11.12015, proferido no RO 0024088-38.2013.5.24.0072, esta Turma entendeu, em acórdão de minha relatoria:

Em que pese o laudo pericial contido no Id 428860 não emitir parecer conclusivo no tocante à aferição da insalubridade, em razão do local de trabalho encontrar-se desativado, agiu com acerto o Magistrado ao consi-derar laudo produzido em outra reclamatória trabalhista (Proc. 0024159-40.2013.5.24.0072), por guardar simultaneidade com o tempo de vigência do contrato de trabalho da reclamante e realizado no mesmo ambiente de prestação do serviço.

O laudo utilizado como paradigma apresenta avaliações conclusivas, onde se analisou os riscos potenciais à saúde da demandante, seguindo orientações contidas na Portaria nº 3.311/1989 do Ministério do Trabalho (Id d9b38bf).

O exame constatou que a reclamante faz jus ao adicional de insalu-bridade no grau médio (20% sobre o salário mínimo), por exercer atividade moderada exposta ao calor sem o descanso adequado e exigido pelo Anexo 3 da NR-15 e trabalhar continuamente (Id d9b38bf – p. 11).

Nego, pois, provimento.

Quanto ao contato com agentes químicos, concluiu a perícia:

Agentes Químicos – No caso em questão, o reclamante, quando indagado, confirmou que não tinha contato com a fabricação das telhas, ou seja, não manipulava argila tampouco os produtos químicos necessários à sua produ-ção (oleína, querosene e RS CERAM 20).

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Importante ressaltar que o reclamante fazia uso de luvas de nitrílica, o que afasta de forma eficaz eventual agente químico insalutífero que possa atacar a derme do trabalhador.

Assim, fica neutralizada a insalubridade quanto a esses agentes. (fl. 564)

Por fim, os contracheques constantes de fl. 220/227 revelam o pa-gamento do adicional de insalubridade em grau médio, nada havendo a deferir a esse título, como corretamente posto pela sentença.

Nego provimento, pois, o recurso.

2.3.3 Nulidade do aviso-prévio

A sentença rejeitou o pedido de declaração da nulidade do aviso--prévio e de pagamento da indenização, ao fundamento de que a prova oral não desmereceu os documentos exibidos.

Em recurso, o autor defende a robustez da prova testemunhal que revelaria o labor no período do aviso-prévio.

Não colhe a tese também aqui.

A prova testemunha se apresenta dividida a respeito.

De fato, a primeira testemunha apresentada pelo autor afirmou “que o autor trabalhou durante o período de aviso, mas não sabe se trabalhou du-rante todo o período” (fl. 545, item 22), enquanto a segunda diz ter existido trabalho “durante os 30 dias de aviso” (fl. 546, item 10).

Todavia, os registros de ponto revelam labor durante vinte e três dias, de 27.04 a 19.05.2012, com os demais abonados (fl. 219).

Portanto, a incongruência dos depoimentos confirma a veracidade do registro de ponto, razão pela qual correta a sentença que indeferiu o pagamento indenizado do aviso-prévio, ante a regular fruição e respectiva diminuição, atendido o requisito do art. 488, Parágrafo único, da CLT.

Nego provimento.

2.3.4 perdas e danos

Por fim, a sentença indeferiu a pretendida indenização por danos ma-teriais decorrentes da contratação de advogado, contra o que o autor se insurge, ao argumento de que a reparação é devida nos moldes dos arts. 389 e 404 do Código Civil.

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Não colhe a tese.

Tenho defendido ser pacífica a indispensabilidade do advogado para que se possa postular perante o Colendo Tribunal Superior do Trabalho, ainda que se trate de reclamatória promovida pelo trabalhador.

Nesse sentido, dispõe a Súmula nº 425 da Colenda Corte:

JUS POSTULANDI NA JUSTIÇA DO TRABALHO – ALCANCE – Res. 165/2010, DEJT divulgado em 30.04.2010 e 03 e 04.05.2010

O jus postulandi das partes, estabelecido no art. 791 da CLT, limita-se às Varas do Trabalho e aos Tribunais Regionais do Trabalho, não alcançando a ação rescisória, a ação cautelar, o mandado de segurança e os recursos de competência do Tribunal Superior do Trabalho.

Esse entendimento demonstra que os honorários do procurador da parte vencedora devem ser suportados pela parte vencida.

Data venia, não se pode negar que as partes da reclamação traba-lhista, pelo menos em tese, têm o direito de acessar o Colendo Tribunal Superior do Trabalho e o Excelso Supremo Tribunal Federal, até mesmo em obséquio ao princípio da tutela jurisdicional efetiva.

Ora, se é exigido para esse acesso presença do profissional de direi-to, há que se entender que nos termos dos arts. 5º, XXXV, e 133 da Carta de 1988 combinados com os arts. 14 da Lei nº 5.584/1970 e 389 e 402 do Código Civil, a parte vencida deverá arcar com as despesas processuais, aí incluídas, por óbvio, os honorários do advogado do vencedor.

Além disso, não se mostra justo que o trabalhador, que contratou advogado para melhor postular direito negado pelo empregador, venha re-ceber menos daquilo que efetivamente é devido se tiver que arcar com o pagamento pelos serviços prestados por esse profissional, que na atualidade torna-se indispensável, pelo menos na grande maioria das ações trabalhis-tas em razão da complexidade das questões que nelas são discutidas, sob pena de correr o risco de ser privado do próprio direito por falta da devida assistência jurídica.

Foi esse o entendimento esposado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça em julgamento que se tornou paradigma na Justiça do Trabalho, no qual este relator foi inclusive citado.

Afirmou-se naquele julgado:

Como os honorários contratuais são retirados do patrimônio do lesado, para que haja reparação integral do dano sofrido o pagamento dos honorários advocatícios previsto na Lei Civil só pode ser o dos contratuais.

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Desse modo, aplica-se, na pior das hipóteses, o que previsto nos arts. 394 e 402 do Código Civil, de modo que o trabalhador possa receber de forma integral aquilo a que tem direito.

Entretanto no julgamento do IUJ 0024142.55.2015.5.24.0000, pre-valeceu, por maioria, o não cabimento das perdas e danos no processo do trabalho, no qual se discuta a relação de emprego, cujo acórdão ficou assim ementado:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – PERDAS E DANOS – Honorários advocatícios na Justiça do Trabalho, nas lides decorrentes da relação de emprego, devem atender às disposições das Súmulas nºs 219 e 329 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho.

Desse modo, e embora ressalvando o entendimento acima esposado, por questão de política judiciária, me curvo ao entendimento prevalecente no Pleno para negar provimento ao recurso.

Posto isso

Acordam os Desembargadores da Egrégia Segunda Turma do Tribu-nal Regional do Trabalho da Vigésima Quarta Região, por unanimidade, aprovar o relatório, conhecer parcialmente do recurso interposto pelo autor e integralmente do recurso da demandada e das contrarrazões e, no mérito, dar provimento parcial ao recurso obreiro para reconhecer como verdadeira a jornada apontada na inicial – das 2h às 17h, com uma hora de intervalo e deferir o adicional noturno com os respectivos reflexos e, negar provimento ao da demandada, nos termos do voto do Desembargador Francisco das C. Lima Filho (Relator).

Dada a gravidade da conduta empresarial, entendo que se deva ofi-ciar ao Ministério Público da União para a adoção de medidas que entenda cabíveis, tomando em consideração inclusive o previsto no art. 5º, incisos XLI e XLII, da Carta Suprema.

Desse modo, após o trânsito em julgado da presente decisão, oficie-se o Ministério Público Federal, com a remessa de cópia do presente acórdão.

Custas de R$ 240,00, calculadas sobre R$ 12.000,00, novo valor ar-bitrado à condenação.

Campo Grande/MS, 17 de fevereiro de 2016.

Francisco das C. Lima Filho Relator

Parte Geral – Jurisprudência Trabalhista – Ementário33396 – Adicional de insalubridade – cortador de cana-de-açúcar – fuligem resultante da

queima da cana – contato com hidrocarbonetos aromáticos – pagamento devido

“Trabalhador rural. Cortador de cana-de-açúcar. Fuligem resultante da queima da cana. Con-tato com hidrocarbonetos aromáticos. Adicional de insalubridade em grau máximo. A ex-posição do trabalhador rural à fuligem resultante da queima da palha da cana coloca-o em contato – pela via dérmica e respiratória – com hidrocarbonetos aromáticos (HPAs), substân-cias químicas descritas como insalubres no Anexo 13 da NR-15 da Portaria nº 3.214/1978 do Ministério do Trabalho e Emprego, fazendo jus – o empregado exposto – ao adicional de insalubridade em grau máximo. Recurso do reclamante provido, no particular. Adicional de insalubridade. Exposição a calor acima dos limites de tolerância. Trabalhador rural. Trabalho em plantação de cana-de-açúcar. O trabalhador rural que exerce sua atividade exposto a calor excessivo, inclusive em ambiente externo com carga solar, acima dos limites de tole-rância, nas condições previstas no Anexo 3 da NR-15 da Portaria nº 3.214/1978, do MTE, tem direito ao adicional de insalubridade, conforme entendimento esposado na Orientação Jurisprudencial nº 173, II, da SBDI-1 do TST.” (TRT 15ª R. – RO 0001147-38.2013.5.15.0107 – (64692/2015) – Rel. Fabio Allegretti Cooper – DJe 25.01.2016 – p. 4535)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 317, nov. 2015, ementa nº 33065 do TRT 13ª R.

33397 – Adicional de insalubridade – uso de headset – pagamento devido

“Adicional de insalubridade. Uso de headset. O magistrado não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar o seu entendimento conforme os demais elementos probatórios trazidos aos autos e de acordo com a legislação de regência, com base no livre convencimento motiva-do, nos termos do art. 131 do CPC, aplicado supletivamente, consoante alegação recursal. Saliente-se que o Anexo 13 da NR-15 determina que as atividades de recepção de sinais em fones são insalubres somente quando relacionadas à telegrafia e radiotelegrafia, bem como manipulação de aparelhos do tipo Morse, atividades não desenvolvidas pela reclamante. Os fones de ouvido tipo headset, dotados de controle de volume com ajuste pelo próprio opera-dor, são utilizados exclusivamente para conversações telefônicas, de forma similar a qualquer aparelho telefônico doméstico comum. Assim, o texto do Anexo 13 da NR-15 não se aplica ao trabalho da reclamante, que está relacionado com a voz humana.” (TRT 2ª R. – Proc. 0001036-47.2014.5.02.0021 – (20151061046) – Relª Wilma Gomes da Silva Hernandes – DJe 15.12.2015)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 264, jun. 2011, assunto especial intitulado “A acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade”.

33398 – Aposentadoria compulsória – empregador público – efeitos

“Recurso de revista. Empregado público. Aposentadoria compulsória. Efeitos sobre o contrato de trabalho. Provimento. Ao interpretar o art. 40 da Constituição Federal e atuando em sua função uniformizadora de jurisprudência, esta Corte Superior pacificou o entendimento de que a previsão constitucional acerca da aposentadoria compulsória se aplica ao servidor pú-blico contratado sob o regime da CLT (empregado público). Pacífico, ainda, o entendimento de que tal modalidade de aposentadoria dos empregados públicos é causa de extinção do contrato de trabalho decorrente de lei, mais especificamente o art. 51 da Lei nº 8.213/1991, não se tratando, pois, de dispensa sem justa causa. Vale dizer, ao completar 70 anos de idade

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o empregado público será aposentado por força de lei, independente da sua vontade ou do empregador, não podendo ser transferida a este a responsabilidade pela ruptura do contra-to de trabalho, razão pela qual não há falar em pagamento de verbas rescisória, in casu, o aviso-prévio e a multa de 40% do FGTS. Precedentes. Recurso de revista conhecido e pro-vido (RR 1599-41.2010.5.12.0041, Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, 2ª T., DEJT 20.04.2012).” (TRT 18ª R. – RO 0011298-64.2013.5.18.0015 – Rel. Israel Brasil Adourian – DJe 02.02.2016 – p. 197)

33399 – Assédio moral – cobrança excessiva de metas – prova documental – indenização devida

“Assédio moral. Cobrança excessiva de metas. A prova documental juntada com a inicial, relativa a mensagens eletrônicas cobrando o atingimento de metas, visitação a clientes para tanto, comparação entre gerências e agências, cobranças de clientes, metas para venda de cartões de crédito, consórcios de vida e previdência, dentre outros, além de meta para abertu-ra de contas, ainda que não ataque diretamente a reclamante, demonstra a gestão por estresse. Isto revela um proceder uniforme de assédio. Há inclusive uma mensagem que finaliza com a seguinte afirmação: tínhamos prazo e não cumprimos a ação. A bomba está prestes a ex-plodir. Some-se a isso a afirmação da testemunha da reclamante de que as metas não tinham fim e sempre havia aumento da necessidade de performance. Sentença mantida.” (TRT 4ª R. – RO 0000591-39.2013.5.04.0011 – 1ª T. – Rel. Des. Marçal Henri dos Santos Figueiredo – DJe 15.12.2015)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 208, out. 2006, assunto especial intitulado “Assédio moral”.

Comentário Editorial SÍnTESENo presente caso a reclamante comprovou o assédio moral sofrido devido à cobrança excessiva de metas imposta pelo empregador com a juntada de documentos.

O assédio moral é uma prática que pode ser prolongada no tempo acarretando doenças físicas e psicológicas no empregado.

As articulistas Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas e Ana Beatriz da Silva assim co-mentam:

“O assédio moral consiste, basicamente, em um ou mais agentes denegrirem, abusarem e desqualificarem a moral de um membro da empresa, principalmente de forma hierárquica (vertical descendente). Uma série de torturas humilhantes, repetitivas e constrangedoras, com a finalidade de simplesmente causar desequilíbrio emocional na vítima ou para induzi-la a se demitir.

Sônia Aparecida Costa Mascaro Nascimento afirma que o

‘assédio moral se caracteriza por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dig-nidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente de trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções’ (2004, p. 922-930).

O assédio moral se traduz em uma conduta abusiva, reiterada, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, tendo por finalidade gerar no assediado a sensação de exclusão do ambiente laboral ou do convívio social. Isso porque o assédio moral não ocorre exclusivamente na relação de trabalho, pode ser praticado em qualquer ambiente onde haja uma coletividade, como em universidades, escolas, comunidades eclesiásticas, cor-porações militares, entre outros.

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[...]

A configuração do assédio moral no trabalho se baseia na repetição ao longo do tempo de práticas vexatórias e constrangedoras, que explicitam a degradação deliberada das condições de trabalho.

As consequências serão diferenciadas para a vítima (empregado assediado), para o assediador (caso este não seja o empregador pessoa física) e para a empresa envolvida com o assédio moral. Diante da violência sofrida no ambiente de trabalho, ambas as partes sofrem prejuízos, pois a conduta ilícita viola o dever jurídico de respeito e consideração à pessoa do trabalhador, contaminando, assim, o meio ambiente de trabalho que deveria ser equilibrado e saudável.

Sem dúvida, as consequências mais dramáticas do assédio são reservadas para a vítima da conduta abusiva reiterada (e rejeitada) de natureza psicológica, acarretando prejuízo no seu rendimento laboral, decorrente do desequilíbrio psíquico instalado gradativamente, um intenso sofrimento que pode evoluir para um quadro psicossomático, gerando o aparecimento de ma-zelas físicas. Destacam-se também outros danos que podem ocorrer na vida da vítima, como a baixa estima profissional e pessoal e o prejuízo no convívio social e familiar.

O início das manifestações de injúria contra um funcionário da empresa é mais sutil e não mui-to perceptível. Com o passar do tempo, as atitudes depreciativas passam a ser mais frequen-tes; com isso, a vítima acaba por se desestruturar emocionalmente e se tornar um funcionário com medo.” (O assédio moral no ambiente laboral. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 12 abr. 2016)

33400 – Atleta profissional – luvas – pagamento devido

“Luvas. Nos termos do art. 12, da Lei nº 6.354/1976, luvas são valores pagos ao emprega-do-atleta, pelo empregador, por ocasião da assinatura do contrato, independentemente da forma de pagamento convencionada. O acolhimento do pedido de rescisão indireta a par-tir de 05.05.2014 resolve a questão, antecipando o pagamento da parcela designada para 20.07.2014, uma vez que o parcelamento trata-se de mera liberalidade das partes.” (TRT 1ª R. – RO 0010544-57.2014.5.01.0049 – 7ª T. – Rel. Alvaro Luiz Carvalho Moreira – DOERJ 19.01.2016)

Comentário Editorial SÍnTESEA vertente tem por escopo cuidar do instituto das luvas.

O Mestre Fábio Menezes de Sá Filho assim contribui:

“Sobre as luvas, primeiramente, é importante salientar que o termo tem a sua origem no Direi-to Civil graças ao antigo e já revogado Decreto nº 24.150, de 20 de abril de 1934, também conhecido por Lei de Luvas. Silva explica que este termo, de existência polêmica no direito de locação atual, advém do fato de que o pretendente ou locatário sempre estava obrigado a dar uma importância em dinheiro, além do aluguel pactuado, para ter a preferência da locação.

A natureza jurídica das luvas, tal qual a dos bichos, é de gratificação, uma vez que visa a pre-miar o atleta que está aceitando mudar de empregador, cuja mudança enseja, muitas vezes, a necessidade de se transferir de um Município, Estado ou, até mesmo, país, para outro, assim, devendo se adaptar a uma nova cultura, condição climática, entre outras situações. A própria mudança de clube pode ser salientada, visto que as estruturas financeira e administrativa de cada agremiação desportiva são bastante díspares. Além da mudança de ambiente de trabalho, esse prêmio serve também para recompensá-lo pelos serviços prestados ao longo da carreira. Quanto mais importante for o jogador, para os meios futebolísticos, quantias relevan-tes serão pagas a título de luvas.

Antes de o art. 12 da Lei nº 6.354/1976 ser revogado pela Lei nº 12.395/2011, as luvas eram entendidas como sendo a quantia paga ao atleta pelo seu clube, na forma do que fosse convencionado, pela assinatura do pacto laboral. Isso não tem prejudicado bastante a sua atual convenção entre atletas e clubes por se tratar de um costume antigo na seara desportiva. No entanto, é notório que a ausência de disposição legal já está resultando em uma permuta

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dos valores antes pagos a título de luvas para uma verba de natureza civil, que é o direito de imagem, o que muitas vezes pode supostamente apontar indícios de fraude.

Também conhecido por prêmio de assinatura, Catharino, citado por Barros, afirma que as lu-vas podem ser pagas tanto em dinheiro quanto em títulos ou bens, ou, ainda, em automóveis, mas é possível afirmar também que poderiam ser adimplidas sob a forma de prestação de serviços. Quando em dinheiro, podem ser pagas em sua totalidade no ato da contratação, ou em parcelas sucessivas, havendo de ser levados em consideração a eficiência e os atributos do atleta antes de firmar o pacto laboral com o clube.

Contudo, além do caso de mora contumaz do empregador apenas o pagamento parcelado sucessivamente em meses é que poderia caracterizar essa gratificação como parcela salarial, pois há clubes que ofertam contratos de trabalho aos jogadores de futebol, atribuindo parte do pagamento da contraprestação fixa mensal no valor das luvas, no intuito de desvirtuar o adim-plemento do salário. Trata-se de uma prática semelhante à do pagamento da verba a título de direito de imagem, conforme mencionado.

Assim, além da punição para os casos de mora contumaz, apenas se houvesse tal desvirtua-mento no pagamento mensal das luvas é que estas poderiam ter natureza salarial, para todos os efeitos legais, uma vez que estariam repetindo um ato que deveria ser espontâneo, mas passaria a ser obrigatório, em virtude da fraude. No que tange ao adimplemento das gratifica-ções em que há comprovada reiteração no pagamento destas, Nascimento, com uma ressalva ao final da lição, afirma que:

Por influência dos usos e costumes, as gratificações tornaram-se uma tradição. Os emprega-dores repetiram o ato espontâneo que passou, assim, a entrar nos quadros normais da relação de emprego. Essa reiteração criou, para o empregado, uma expectativa de contar com o valor correspondente nos seus ingressos econômicos. Desse modo, a gratificação, gradativamente, transformou-se. O empregado passou a exigi-la, sempre que habitual. Sensível ao aspecto econômico, a legislação trabalhista passou a considerar o que era antes uma liberalidade, uma verdadeira obrigação do empregador. Assim, as gratificações constituem uma modalidade de salário. Porém, ainda há controvérsias quanto à exata caracterização das gratificações salariais.

As controvérsias existem, pois não é em todos os casos que ocorrem fraudes à legislação trabalhista. Portanto, o atleta deve tomar alguns cuidados quando da negociação das luvas de maneira parcelada.

Primeiramente, deve ficar atento para que o período escolhido a título de parcelamento mensal das luvas não seja superior ao estipulado relativamente à duração do seu contrato de traba-lho. A precaução, nesse caso, é em virtude da prática de alguns empregadores de incluir no montante desse prêmio de assinatura, o que seria devido no valor da importância fixa mensal, reduzindo este valor, substancialmente.

Portanto, se as luvas forem convencionadas por um período superior ao da vigência do pacto laboral, o prejuízo só será notado, por exemplo, quando o empregado futebolista necessitar ir ao Poder Judiciário para buscar a resolução deste pacto, por mora contumaz do empregador, conforme dispõe o art. 31, caput e §§ 1º e 2º, combinado com o art. 28, II, §§ 3º e 5º, III e IV, ambos da Lei dos Desportos. Essa preocupação é relevante, pois, conforme previsto no art. 28, II, da Lei dos Desportos, ao ocorrer a rescisão contratual em decorrência da mora contumaz do empregador, será devido, como indenização ao atleta, o valor da cláusula compensatória desportiva (CCD), calculada com base no que foi pactuado no contrato, conforme o disposto no mesmo art. 28, no seu § 3º. Levando-se em consideração que foi a CCD pactuada no seu valor mínimo, a indenização ao empregado devida será o valor total de salários mensais a que teria direito o atleta até o término do seu contrato. E já que o § 1º do art. 31 da Lei dos Desportos dispõe que as gratificações e os prêmios são entendidos como salário para os fins previstos no caput do mesmo artigo, então o jogador só poderia cobrar em juízo a incidência do valor das luvas na CCD relativamente às parcelas mensais sucessivas, que coincidissem com o período da vigência do contrato de trabalho.

Quanto a outro cuidado que o atleta deve tomar, destaca-se a necessidade de se precaver também para que o valor das luvas não seja estipulado de maneira excessiva, em detrimento

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do seu salário, pelos mesmos motivos expostos anteriormente. Nesse sentido, invoca-se, mais uma vez, a lição de Catharino, pois:

Quando o salário propriamente dito é pequeno e a ‘gratificação’ é elevada, fica fortalecida a convicção que esta deriva de obrigação assumida pelo patrão, embora a ela queira se furtar. Quando isto se dá, muitas vezes é até flagrante a fraude grosseira ao salário.

Portanto, a gratificação conhecida por luvas terá natureza salarial quando pactuada mensal-mente e em fraude à legislação trabalhista, integrando o salário para todos os efeitos legais, ou quando da aplicação do art. 31, § 1º, da Lei dos Desportos.

No entanto, as decisões dos órgãos da Justiça do Trabalho, quando atribuem natureza salarial às luvas, não costumam fazer essa distinção entre pagamento mensal, em parcela única e em poucas parcelas [...].” (Análise sobre a legalidade dos bichos e das luvas dos atletas profis-sionais de futebol após as alterações na legislação laboral desportiva. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 04 fev. 2016)

33401 – Auxílio-doença – alta previdenciária – retorno do empregado – inaptidão para o trabalho declarada pelo médico da empresa – limbo previdenciário – pagamento de salários – obrigatoriedade

“Auxílio-doença. Alta previdenciária. Retorno do empregado. Inaptidão para o trabalho de-clarada pelo médico da empresa. Limbo previdenciário. Pagamento de salários. Com a con-cessão da alta previdenciária, e a consequente cessação do pagamento do benefício, o contra-to de trabalho não mais se encontra suspenso, restabelecendo-se todos os seus efeitos. Assim, não é lícito ao empregador manter em vigor o contrato de trabalho e impedir que o emprega-do reassuma sua função ou outra mais adequada após a alta pelo INSS, em razão da inaptidão declarada pelo médico da empresa. A legislação trabalhista e previdenciária não confere ao empregador o direito de suspender o contrato de trabalho em caso de doença do empregado. Para tanto, é necessário que a Previdência Social conceda ou restabeleça o benefício (art. 75 do Decreto nº 3.048/1999 e art. 476 da CLT). Portanto, após a alta previdenciária, cabe ao empregador providenciar a recolocação da empregada em função compatível com o seu esta-do de saúde e lhe pagar os salários correspondentes. Não o fazendo, considera-se a situação da obreira como à disposição do empregador (art. 4º da CLT), restando devido o pagamento dos salários desde a alta previdenciária até a data do retorno ao trabalho.” (TRT 17ª R. – RO 0000196-31.2015.5.17.0006 – Rel. Marcello Maciel Mancilha – DJe 28.01.2016 – p. 193)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST 316, out. 2015, ementa nº 33001 do TRT 3ª R.

33402 – Auxílio-doença – cessação – retorno ao trabalho – incapacidade laborativa – retor-no ao INSS – obrigatoriedade

“Cessação do auxílio-doença. Período no qual o obreiro postula a manutenção do benefício junto à previdência social. Ausência de pagamento de salários e de benefício previdenciário. Limbo jurídico. Cessado o benefício previdenciário, a empresa tem obrigação de convocar o trabalhador para o exame médico, de modo a aferir a existência de aptidão laborativa, e, a partir de então, convocar o trabalhador para retorno ao posto de trabalho, adaptando-o, se necessário, em função compatível com sua capacidade física naquele momento. E, em caso de constatação de incapacidade laborativa total, é obrigação da empresa encaminhar o empregado novamente ao INSS, diligenciando, junto ao órgão previdenciário, para que o auxílio-doença seja prorrogado. In casu, o médico da empresa constatou a inaptidão total do trabalhador, e encaminhou novo pedido de concessão do auxílio-doença, o que foi negado pelo Órgão Previdenciário. A ré, a despeito da decisão do órgão Previdenciário, que negou a

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concessão de novo benefício, deixou de convocar o empregado para o trabalho, permitindo, assim, que durante o período de postulação de novo benefício junto ao Órgão, na via admi-nistrativa, o reclamante permanecesse, por mais de 10 meses, em espécie de limbo jurídico, sem salário e sem benefício previdenciário. Esta conduta omissiva empresária importou na transferência para o empregado do ônus exclusivo de discutir, na via administrativa, possível inaptidão laborativa, o que afronta princípios constitucionais da valorização do trabalho e da dignidade da pessoa humana, fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º da CF/1988). Assim, o comportamento da ré autoriza concluir que ela concordou com as au-sências no período de postulação junto ao órgão previdenciário, devendo se responsabilizar, por conseguinte, pelo pagamento dos salários e demais benefícios do período de afastamen-to, sob pena de se relegar o trabalhador a um limbo, sem proteção jurídica.” (TRT 3ª R. – RO 0010156-63.2014.5.03.0029 – Relª Angela Castilho Rogedo Ribeiro – DJe 17.12.2015 – p. 158)

33403 – Aviso-prévio proporcional – liberação do empregado – termo inicial

“Lei nº 12.506/2011. Aviso-prévio proporcional. Na hipótese de aviso laborado há que se liberar o empregado a partir do 31º dia pagando-lhe indenização quanto aos dias excedentes. Sob a luz da lei que trata da proporcionalidade do aviso prévio, Lei nº 12.506/2011, há que se interpretar a matéria considerando-se o objetivo do aviso: oportunizar ao empregador a busca por um novo empregado e ao empregado a por um novo emprego. Assim, conclui-se que a intenção do legislador não foi a de criar a opção, ao empregador, de manter o empregado por mais de trinta dias laborando em sistema de aviso-prévio, pois seria um claro obstáculo à bus-ca por um novo emprego. Nesse cenário, o empregado deverá ser liberado do cumprimento do aviso a partir do trigésimo primeiro dia e pagos de forma indenizada os dias excedentes de trinta.” (TRT 17ª R. – ROPS 0000911-70.2015.5.17.0007 – Rel. Gerson Fernando da Sylveira Novais – DJe 28.01.2016 – p. 145)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 270, dez. 2011, assunto especial intitulado “As novas regras do aviso-prévio proporcional”.

33404 – Correção monetária – crédito trabalhista – IPCA-E – inconstitucionalidade parcial – efeitos

“Correção monetária. Crédito trabalhista. IPCA-E. Dívidas públicas e privadas. ADI 4.357/DF. ADI 4425/DF. Inconstitucionalidade parcial do § 12 do art. 100 da Constituição Federal e, por arrastamento, do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, que alterou o art. 1º da Lei nº 9.494/1997. 1. Em sede de execução contra a Fazenda Pública, declarada pelo STF a inconstituciona-lidade parcial por arrastamento do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, fruto da declaração de inconstitucionalidade da expressão ‘índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança’, constante do § 12 do art. 100, da Constituição Federal, deixa de ter amparo ju-rídico, a partir de 30.06.2009, a adoção da TR como fator de atualização monetária dos débitos judiciais trabalhistas, porquanto não mais prevalece o sistema instituído pelo art. 5º da Lei nº 11.960/2009. 2. Adotado entendimento que recusa substrato constitucional para adoção do índice oficial da caderneta de poupança para atualização de débitos judiciais, sob o argumento que a atualização monetária deve corresponder ao índice de desvalorização da moeda em certo período de tempo, e entendendo a Suprema Corte que o índice da poupança não reflete a perda de poder aquisitivo da moeda, não pode a dívida judicial trabalhista con-tinuar a ser corrigida monetariamente pela poupança. Os textos legais que assim dispunham

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não sobrevivem, sendo arrastados para a ilegalidade pela decisão proferida pelo Supremo. 3. De fato, se a correção monetária em decisões judiciais tem como finalidade única e exclu-siva recompor a depreciação da moeda nacional e manter o real poder aquisitivo da dívida reconhecida judicialmente, não se pode impor ao credor privado critério de atualização mo-netária que a Suprema Corte recusou para o credor de dívida pública, de igual natureza, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da isonomia e da igualdade. Não se concebe a existência de índices diferentes para devedores públicos e privados. As dívidas derivadas dos direitos adquiridos frente ao regime jurídico da CLT, forjadas no desenvolvimento da relação contratual de emprego ostentam a mesma natureza jurídica, seja o devedor pessoa de direito público ou privado. 4. Nesse contexto, como os índices de correção monetária devem refletir a inflação acumulada no período, como forma de preservar o valor aquisitivo originário da moeda, garantindo quanto possível seu real e efetivo poder de compra frente ao decurso do tempo, entendo que a partir de 14.03.2013 deve ser adotado o índice de variação do IPCA--E para atualização monetária dos débitos judiciais de natureza trabalhista.” (TRT 15ª R. – RO 0001449-70.2013.5.15.0009 – (64291/2015) – Rel. João Alberto Alves Machado – DJe 25.01.2016 – p. 6091)

33405 – Dano moral – acusação de atestado falso – ausência de comprovação – indenização – cabimento

“Danos morais. Acusação de falsidade de atestados médicos. Ausência de comprovação. Indenização devida. Restando demonstrado nos autos que a empresa reclamada recusou o recebimento dos atestados médicos do obreiro, sob a alegação de que teriam conteúdo ‘du-vidoso’, a ela cabe o ônus de provar as suas alegações, nos termos dos arts. 818 da CLT e 333, I, do CPC. Não provada a irregularidade dos atestados, recai sobre ela a consequência do ato, pois configurados os elementos caracterizadores da responsabilidade subjetiva, com violação à honra e à dignidade do trabalhador, sendo devida uma indenização pelos danos morais decorrentes. Dano moral. Valor da indenização. Critérios subjetivos. Princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Para fixação do valor da indenização por dano moral devem ser levados em consideração alguns critérios, tais como a intensidade do sofrimento, a gravidade das acusações, a repercussão da ofensa e a posição social do ofendido e do ofensor, bem como o caráter pedagógico da condenação. Assim, respeitados tais critérios, mantém-se a indenização no valor concedido na origem, eis que atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.” (TRT 13ª R. – RO 0130722-65.2014.5.13.0028 – Rel. Carlos Coelho de Miranda Freire – DJe 08.12.2015 – p. 26)

33406 – Dano moral – assédio sexual – comprovação – indenização – pagamento devido

“Assédio sexual. Indenização por danos morais. Incabível a indenização por danos morais quando as condutas ilícitas perpetradas pela reclamada, noticiadas na inicial, não restam robustamente comprovadas nos autos. Inteligência dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil.” (TRT 8ª R. – RO 0000656-37.2015.5.08.0016 – Rel. Mario Leite Soares – DJe 29.01.2016 – p. 130)

33407 – Dano moral coletivo – contratação de aprendizes – cota mínima – empresa em dificuldades financeiras – fato relevante – observação

“Recurso ordinário. Contratação de cota mínima de aprendizes. Empresa paralisada. Impos-sibilidade de cominação de obrigação de fazer, aplicação de multa ou condenação à inde-nização por danos morais coletivos pela não contratação de aprendizes. Comprovado nos autos que a empresa notificada teve sua atividade paralisada desde o ano de 2008 e que a

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quantidade de empregados oscilou de maneira considerável nestes anos de paralisação, fica demonstrado que a empresa está tentando retomar suas atividades, estando impossibilita-da, considerando as dificuldades por que passa, de contratar aprendizes, sendo inviável a aplicação de multas ou demais condenações decorrentes deste fato. Recurso a que se nega provimento.” (TRT 8ª R. – RO 0000376-54.2015.5.08.0117 – 3ª T. – Relª Desª Fed. Francisca Oliveira Formigosa – DJe 15.12.2015 – p. 161)

33408 – Dano moral coletivo – descumprimento de normas trabalhistas – efeitos

“Recurso da reclamada. Dano moral coletivo. Inexistência. O Juízo de origem entendeu pela existência de dano moral coletivo e fixou a indenização no importe de R$ 40.000,00. A ré nega que venha descumprindo normas trabalhistas desde o ano de 2009, uma vez que a fiscalização in loco feita pelo Oficial de Justiça relatou o cumprimento fiel do que determi-na a legislação trabalhista, prejudicando a tese autoral de reincidência, ‘descaso’. Ademais, atenta para o fato de que o infortúnio ocorrido em seu estabelecimento (falecimento de um trabalhador) não se relaciona com acidente de trabalho, mas sim com suicídio. Xisto Tiago Medeiros Neto conceitua dano moral coletivo como a ‘lesão injusta e intolerável a interesses ou direitos titularizados pela coletividade (considerada em seu todo ou em qualquer de suas expressões – grupo, classe ou categorias de pessoas), os quais possuem natureza extrapatri-monial, refletindo valores e bens fundamentais para a sociedade’. Ocorre que o dano moral coletivo não se confunde com a mera ilegalidade, sendo necessária a demonstração de algu-ma consequência negativa para a sociedade, analisando-se a gravidade da violação cometida frente à ordem jurídica, sendo prescindível a demonstração da repercussão de eventual viola-ção na consciência coletiva do grupo social. Além da gravidade da conduta, apurada diante de um ilícito que enseje imediata repulsa social, o dano moral coletivo também não se dos pressupostos gerais da responsabilidade civil, devendo existir a demonstração do nexo causal entre a conduta empresarial no cumprimento da norma e a lesão à coletividade, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil Brasileiro. Após análise exaustiva das provas dos autos, conclui-se que não há comprovação do nexo de causalidade entre a morte do trabalhador e as condições do meio ambiente de trabalho da ré. Quanto aos autos de infração, constata-se terem sido lavrados em sua maioria em 30.05.2011 (somente o AI de fl. 14 foi lavrado em 13.06.2011). Não obstante, a ré procurou regularizar sua conduta, não havendo qualquer indício de reiteração de conduta. Não se observa, assim, uma intensa gravidade da violação cometida frente à ordem jurídica, ou melhor, não se identifica uma prática deliberada ou o descaso do empregador no que respeita à higidez dos trabalhadores. Tutela inibitória. Manu-tenção das astreintes. A multa fixada por descumprimento de obrigação de fazer, chamada de astreintes, tem por fim coagir econômica e psicologicamente o réu a cumprir o comando ju-dicial referente à obrigação imposta e encontra amparo legal no art. 11 da Lei nº 7.347/1985. A eventual adequação da conduta da empresa ao comando legal não afasta a penalidade imposta, porquanto tal penalidade é mecanismo útil para que esta situação regular perdure, ou seja, é instrumento para que a ré não volte a violar o comando judicial. Ora, a penalidade somente irá incidir caso descumprida as obrigações de fazer e não fazer. Recurso da reclama-da conhecido e parcialmente provido.” (TRT 11ª R. – RO 0000716-24.2013.5.11.0201 – Relª Ruth Barbosa Sampaio – DJe 03.12.2015 – p. 3)

33409 – Dano moral – discriminação – prova testemunhal – valoração – indenização devida

“Indenização por dano moral. Cabimento. Configurada a discriminação que sofreu a recla-mante, comprovada através da prova testemunhal, é devida indenização relativa aos danos sofridos.” (TRT 8ª R. – RO 0002242-89.2014.5.08.0131 – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Marcus Augusto Losada Maia – DJe 01.02.2016 – p. 10)

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33410 – Dano moral – doença emocional – stress – nexo causal não provado – indenização indevida

“Dano moral. Doença emocional. Stress. Nexo causal não provado. Combinação de fatores psicológicos exógenos ao trabalho. Indenização indevida. Reconhecido que a doença emo-cional, da qual padece a trabalhadora, teve origem decorrente da combinação de fatores não dependentes da condição de trabalho ao seu surgimento, não guardando com ele nexo etio-lógico, resulta indevida a indenização por dano moral pretendida pela demandante. Recurso a que se nega provimento.” (TRT 13ª R. – RO 0086900-04.2014.5.13.0003 – Relª Juíza Ana Paula Azevedo Sá Campos Porto – DJe 04.12.2015 – p. 9)

33411 – Empregador – contratação obrigatória de portadores de deficiência – observação

“Contratação de portadores de deficiência e reabilitados. Lei nº 8.213/1991, art. 93, IV. Des-cumprimento. O Órgão judicante, ao fazer a subsunção dos fatos à lei regente, ‘atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum’ (LINDB, art. 5º). Nessa diretriz, sob a ótica da hermenêutica jurídica, não seria razoável conceber que a intenção do legis-lador ordinário, ao editar o art. 93 da Lei nº 8.213/1991 (mens legis), foi a punição sumária do empregador. Inexistindo prova da completa indiferença da reclamada em levar a efeito os ditames do art. 93, IV, da Lei nº 8.213/1991, não vinga a insurreição deduzida perante esta instância revisora. Recurso desprovido.” (TRT 10ª R. – RO 0001632-47.2011.5.10.0010 – Relª Desª Elaine Machado Vasconcelos – DJe 25.01.2016 – p. 302)

33412 – Estabilidade provisória – gestante – dispensa imotivada – dano moral – indenização devida

“Dano moral. Empregada dispensada grávida. Devido. O prejuízo e o dano causados à recla-mante são manifestos, caracterizando-se como in re ipsa, uma vez que foi dispensada enquan-to em garantia de estabilidade provisória.” (TRT 1ª R. – RO 0011661-19.2014.5.01.0038 – 6ª T. – Rel. Jorge Orlando Sereno Ramos – DOERJ 01.02.2016)

33413 – Execução fiscal – dívida de natureza não tributária – inaplicabilidade – desconside-ração da personalidade jurídica – inexistência

“Execução fiscal. Dívida de natureza não tributária. Inaplicabilidade do art. 135 do CTN. Desconsideração da personalidade jurídica. Inexistência dos requisitos do art. 50 do CC. Con-forme a interpretação adotada pelo TST, não há possibilidade de despersonificação da pessoa jurídica para a responsabilização de seus sócios, aos moldes do art. 135, III do CTN, quando se tratar de execução fiscal para cobrança de dívidas de natureza não tributária. A hipótese versa sobre execução de dívida ativa oriunda de multa por infração a normas trabalhistas, não tratando, portanto, de dívida de natureza tributária. Outrossim, a constrição dos bens particu-lares dos sócios, ativos, depende da existência de requisito do art. 50 do CC, qual seja, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, o que, no particular, também não restou demonstra-do.” (TRT 23ª R. – Ap 0070900-50.2005.5.23.0007 – 1ª T. – Rel. Des. Roberto Benatar – DJe 28.01.2016 – p. 6)

33414 – Execução – fraude – imóvel alienado antes da propositura da ação – não ocorrência

“Imóvel alienado antes da propositura da ação. Fraude à execução. Não ocorrência. A frau-de à execução pressupõe a alienação ou oneração de bens no curso de demanda, capaz de reduzir o devedor à insolvência. Se o imóvel foi alienado antes mesmo do ajuizamento da ação, não há cogitar a possibilidade de fraude à execução.” (TRT 18ª R. – Ap 0000709-70.2011.5.18.0051 – 2ª T. – Rel. Paulo Pimenta – DJe 26.01.2016 – p. 14)

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33415 – Execução – imóvel arrematado – efeitos

“Imóvel arrematado que se encontra elencado em arrolamento de bens, no processo de inven-tário de sócio. Ausência de interesse recursal da empresa executada e ilegitimidade de parte da herdeira para opor embargos à arrematação. O imóvel arrematado pertence ao espólio do sócio da executada, que também figura no polo passivo como devedor. Assim, o provimento jurisdicional impugnado não atinge a empresa, primeira agravante, sendo certo que a herdeira do sócio falecido, segunda agravante, não detém a posse direta do bem penhorado, pois ainda não houve a homologação da partilha, e não pode sequer ser tida por terceira, como restou decidido por esta E. Turma em processo diverso. Impõe-se, portanto, a declaração de ofício da ilegitimidade de parte da filha do sócio falecido e da ausência de interesse recursal da em-presa executada, julgando-se extintos, sem resolução do mérito, os embargos à arrematação opostos por ambas, nos termos do art. 267, VI do CPC, de aplicação subsidiária.” (TRT 2ª R. – Proc. 0001244-62.2011.5.02.0271 – (20151060856) – Rel. Sergio Roberto Rodrigues – DJe 15.12.2015)

33416 – Horas in itinere – limites do poder negocial – impossibilidade de renúncia – pactuação do tempo de percurso – validade

“Horas in itinere. Limites do poder negocial. Impossibilidade de renúncia. Pactuação do tem-po de percurso. Validade. Razoabilidade. I – Ofende o interesse público e configura desres-peito aos comandos constitucionais mínimos a renúncia às horas in itinere, mas não a pac-tuação a respeito da quantidade de horas, razão por que são válidas as normas coletivas que fixam um número ou limitam a quantidade de horas in itinere. II – Tem-se por desarrazoada e desproporcional a cláusula de norma coletiva que estabelece quantitativo fixo temporal das horas in itinere inferior a 50% (cinquenta por cento) do tempo efetivamente gasto pelo trabalhador (Súmula nº 8, TRT 18ª R.).” (TRT 18ª R. – RO 0001022-91.2014.5.18.0191 – 3ª T. – Relª Iara Teixeira Rios – DJe 02.02.2016 – p. 133)

33417 – Incompetência territorial – princípio da ponderação de interesses – observação

“Incompetência territorial. Art. 651 da CLT. Inaplicabilidade. Princípio da ponderação de in-teresses. Acesso à justiça. Ainda, quando a hipótese do art. 651, da CLT, determine a remessa dos autos para outro Regional ou Vara Trabalhista mais distante do mesmo Regional, diante do caso concreto, podemos afastar a aplicação da regra infraconstitucional, tendo-a como inconstitucional materialmente, de modo a fazer valer a garantia estampada na Carta Magna do pleno acesso à justiça, por meio da técnica de ponderação de interesses.” (TRT 5ª R. – RO 0000055-17.2014.5.05.0641 – 1ª T. – Rel. Des. Edilton Meireles – DJe 15.12.2015)

33418 – Insalubridade – expedição do perfil profissiográfico previdenciário – obrigatorie-dade

“Agravo de instrumento. Recurso de revista. Litisconsórcio passivo. Argumentos da empresa amparados em premissa fática ausente no acórdão recorrido. Súmula nº 126/TST. Embora a empresa alegue que a presente demanda não comporta a hipótese de litisconsórcio passivo, ao argumento de que não restaram preenchidos os requisitos legais para que as duas reclama-das figurassem no polo passivo da demanda, verifica-se que tal premissa fática não encontra respaldo no acórdão recorrido. Com efeito, nada há no acórdão do Regional que indique a existência de dois contratos de trabalho distintos, razão pela qual a admissibilidade do recurso de revista da empresa importa em contrariedade à Súmula nº 126/TST. Agravo de instrumento não provido. Atividade insalubre. Expedição do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP). Trata-se de discussão a respeito da obrigação do empregador em fornecer o Perfil Profissiográ-

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fico Profissional na hipótese específica de o labor de condições insalubres ter sido concedido em ação judicial anterior, que já transitou em julgado. A empresa afirma que: ‘se o laudo pericial não demonstrou a existência de atividade insalubre, sendo reconhecida a condição insalubre apenas e exclusivamente por prova testemunhal, não pode a recorrente emitir do-cumento diversamente do que restou constatado na perícia produzida em processo anterior’. Ao contrário do que é alegado pela empresa, o TRT registra que ‘Transitada em julgado a decisão da RT 189/2006, surgiu para o Reclamante o direito a obter da empresa Ré o docu-mento denominado Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP. Isto porque, declarado que o labor desempenhado pelo Autor era insalubre, por força do art. 68, do Decreto nº 3.048/1999, deverá a empresa fornecer tal formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social’. É irrefragável que a dita decisão transitou em julgado, razão pela qual as con-dições a que estava submetido o trabalhador não desobriga a empresa do reconhecimento de que o empregado efetivamente laborou em condições insalubres. Acrescente-se que os dispositivos de lei indicados como violados pela empresa não dispõem que o empregador está desobrigado da emissão do Perfil Profissiográfico Profissional na hipótese de o adicional de insalubridade ter sido deferido em ação anterior. Incólumes os arts. 195 da CLT e 68 e 58, § 4º da Lei nº 8.213/1991. No que se refere à divergência colacionada, essa não viabiliza o provimento do agravo. Na ementa indicada pelo autor consta que: ‘guias DSS-8030’. PPP. Reconhecimento da periculosidade em juízo após a rescisão. Emissão desnecessária. Como se vê, além da impossibilidade de se identificar qualquer tese jurídica, o dissenso refere-se a adi-cional de periculosidade, hipótese diversa da dos presentes autos. No paradigma também não está expressa a existência de ação anterior indicando que as condições insalubres foram con-firmadas. Logo, a admissibilidade da revista esbarra no óbice das Súmulas nºs 296 e 297/TST. Fixação de astreintes. Multa diária. Esta Corte Superior tem se posicionado no sentido de que a multa diária pelo descumprimento de obrigação de fazer, prevista no art. 461, § 4º do CPC, constitui instrumento legítimo à disposição do magistrado. Inviável o reconhecimento da ausência de razoabilidade ou proporcionalidade, tendo em vista o fato de o TRT não haver sequer registrado o valor das astreintes. Incidência da Súmula nº 126/TST. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (TST – AIRR 0092600-91.2008.5.17.0121 – Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte – DJe 11.12.2015 – p. 1730)

33419 – Jornada de trabalho – turnos ininterruptos de revezamento – negociação coletiva – jornada superior a oito horas – invalidade

“Turnos ininterruptos de revezamento. Negociação coletiva. Jornada superior a oito horas. Invalidade. Horas extras a partir da sexta diária. Como pacificado neste Tribunal, a teor do disposto no inciso I da Sumula nº 38, ‘é inválida a negociação coletiva que estabelece jornada superior a oito horas em turnos ininterruptos de revezamento, ainda que o excesso de trabalho objetive a compensação da ausência de trabalho em qualquer outro dia, inclusive aos sába-dos, sendo devido o pagamento das horas laboradas acima da sexta diária, acrescidas do res-pectivo adicional, com adoção do divisor 180’.” (TRT 3ª R. – RO 0011293-86.2014.5.03.0027 – Rel. Juiz Conv. Rodrigo Ribeiro Bueno – DJe 29.01.2016 – p. 141)

33420 – Jornalista – empregado público – reconhecimento

“Empregado público. Atividades típicas da profissão de jornalista. Configuração. Malgrado contratada para o exercício de cargo denominado ‘Comunicador Social I’, com jornada diária de 8 horas, restou comprovada a efetiva ativação da reclamante como jornalista, profissão cuja legislação federal, de aplicação cogente pela Administração Pública, por força da vin-culação ao princípio da legalidade (arts. 37, caput, da Constituição Federal e 2º, caput, da

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Lei nº 9.784/1999), fixa duração normal do trabalho em no máximo 5 horas por dia (art. 303 da CLT). Nesse panorama, são devidas como extraordinárias as horas trabalhadas além da quinta diária, a teor da Orientação Jurisprudencial nº 407, da SDI-I do TST. Recurso ordinário parcialmente conhecido e desprovido.” (TRT 10ª R. – RO 0000668-46.2014.5.10.0011 – Relª Desª Elaine Machado Vasconcelos – DJe 11.12.2015 – p. 51)

33421 – Motoristas e cobradores – cota de aprendizes – base de cálculo – observação

“Cota de aprendizes. Base de cálculo. Motoristas e cobradores. Inserção. O fato de o Código de Trânsito Brasileiro exigir a idade superior a 21 anos para condução de veículo coletivo de transporte de passageiros, assim como o Decreto nº 6.481/2008 proscrever o labor aos menores de 18 anos em serviços externos que impliquem o manuseio e porte de valores que coloquem em risco sua segurança, não representam óbice à inserção das funções de motorista e cobrador na base de cálculo para fins de aprendizagem. A legislação de regência não excepciona qualquer atividade do cumprimento da cota legal. Ademais, a margem da contratação vai até os 24 anos, permitindo a admissão de maiores de 18 anos para o cargo de cobrador e maiores de 21 anos para a função de motorista, motivo pelo qual mostra-se até mesmo razoável exigir o limite mínimo de 5% para a contratação. O § 2º do art. 10, do Decreto nº 5.598/2005, que regulamenta a aprendizagem profissional é taxativo ao prescrever que ‘Deverão ser incluídas na base de cálculo todas as funções que demandem formação profissional, independentemente de serem proibidas para menores de dezoito anos’. Ainda, embora o art. 11 do referido Decreto fixe a prioridade na admissão de adolescentes entre 14 e 18 anos, traz como exceções a esta prevalência as atividades vedadas aos menores de 18 anos, assim como aquelas que, por sua natureza, sejam incompatíveis com o desenvolvimen-to psicológico, físico e moral dos aprendizes. Diante deste cenário, não há justificativa para não se computar os motoristas e cobradores na base de cálculo para fins de apuração da cota de aprendizagem a ser cumprida pela impetrante. Recurso da União a que se dá provimen-to.” (TRT 15ª R. – RO 0000053-81.2012.5.15.0045 – (23/2015) – Rel. José Otávio de Souza Ferreira – DJe 04.12.2015 – p. 236)

33422 – Participação nos lucros e resultados – resultado financeiro líquido positivo – obser-vação

“A participação nos lucros e resultados é aquela paga em razão do efetivo resultado finan-ceiro líquido positivo alcançado pela empresa em determinado período, sendo parte desse lucro destinado à distribuição entre os empregados, em conformidade com os critérios pre-viamente estabelecidos em regular negociação coletiva, os quais podem envolver. Índices de produtividade, qualidade ou lucratividade da empresa. E, ainda, programas de metas, re-sultados e prazos, pactuados previamente, conforme a norma disposta no art. 2º, § 1º, da Lei nº 10.101/2000.” (TRT 1ª R. – RO 0002917-84.2013.5.01.0421 – 9ª T. – Rel. Antonio Carlos de Azevedo Rodrigues – DOERJ 15.12.2015)

33423 – Prescrição – pronúncia de ofício – impossibilidade

“Prescrição. Pronúncia de ofício. Impossibilidade. Incompatibilidade do art. 219, § 5º, do CPC com o processo do trabalho. O art. 219, § 5º, do CPC, que possibilita a pronúncia de ofício da prescrição pelo juiz, não se aplica subsidiariamente ao Processo do Trabalho, porque não se coaduna com a natureza alimentar dos créditos trabalhistas e com o princípio da proteção ao hipossuficiente. Precedentes desta Subseção Especializada. Recurso de embargos conhecido e não provido’ (E-RR 82841-64.2004.5.10.0016, Relª Min. Dora Maria da Costa, Subseção

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I Especializada em Dissídios Individuais, DEJT 07.03.2014).” (TRT 18ª R. – RO 0010420-98.2015.5.18.0006 – Rel. Mario Sergio Bottazzo – DJe 29.01.2016 – p. 410)

33424 – Processo do trabalho – multa do art. 475-J do CPC – inaplicabilidade

“Multa do art. 475-J do CPC. Inaplicável ao processo do trabalho. É inaplicável ao processo do trabalho a multa prevista no art. 475-J do CPC, visto que a matéria possui disciplina específica nos §§ 1º-B e 2º da CLT.” (TRT 23ª R. – RO 0001382-15.2011.5.23.0022 – 1ª T. – Rel. Des. Roberto Benatar – DJe 28.01.2016 – p. 7)

33425 – Rescisão indireta – descumprimento de normas legais pelo empregador – cabi-mento

“Rescisão indireta. Descumprimento de normas legais pelo empregador. Tratamento com ri-gor excessivo. Art. 483, alínea b, da CLT. Reconhecimento. Comprovados os fatos que ense-jaram o pleito de rescisão indireta, mormente porque bem caracterizado o descumprimento da legislação trabalhista, pois ficou demonstrado o tratamento com rigor excessivo do em-pregador para com o obreiro, caracterizando, inclusive, assédio moral, configura-se a hipó-tese de rescisão indireta prevista na alínea b do art. 483 da CLT. Assédio moral. Requisitos. Prática de atos assediantes. Meio ambiente de trabalho. O assédio moral decorre de práticas abusivas do empregador ou de colegas de trabalho, de forma reiterada e prolongada, dete-riorando o ambiente laboral e desestabilizando psicologicamente o trabalhador, por meio de constrangimentos e humilhações capazes de ofender os seus direitos personalíssimos. Danos morais. Fixação do valor indenizatório. Critérios. Razoabilidade e equidade. No ordenamento jurídico pátrio não existe fórmula objetiva para estabelecer o valor da indenização por lesão extrapatrimonial cabendo ao juiz fixar o valor da reparação da dor moral com razoabilidade e equidade, de acordo com as circunstâncias do caso concreto e levando em consideração a extensão do dano, o grau de culpa do ofensor, a capacidade econômica das partes e o caráter compensatório da indenização para a vítima e pedagógico para o agressor, devendo o respec-tivo valor ser suficiente para desencorajar este à reincidência e não acarretar enriquecimento sem causa.” (TRT 14ª R. – RO 0010757-57.2014.5.14.0031 – 1ª T. – Rel. Juiz Conv. Shikou Sadahiro – DJe 15.12.2015 – p. 651)

33426 – Responsabilidade trabalhista solidária – consórcio de empregadores urbanos – ca-bimento

“Consórcio de empregadores urbanos. Aplicação analógica. Responsabilidade solidária. A aplicação analógica do consórcio de empregadores previsto no art. 25-A da Lei nº 8.212/1991 ao meio urbano é possível por força do art. 8º da CLT, haja vista que o aplicador do direito não pode fechar os olhos para a evolução dos fenômenos sociais. Ao mesmo tempo que atende às demandas laborais dos consorciados, com a prestação de serviço em atividades focadas para um objetivo comum, o instituto assegura ao empregado a segurança e continuidade da rela-ção de trabalho, sendo vantajoso ao obreiro que apesar de vinculado a um empregador único, pode reivindicar dos demais integrantes do consórcio os direitos trabalhistas e previdenciários em virtude da responsabilidade solidária estabelecida entre os empregadores consorciados. Horas extras. Divisor 200. Carga horária semanal de 40 horas. No cálculo das horas extras do empregado submetido ao limite semanal de 40 horas de trabalho aplica-se o divisor 200. Inteligência da Súmula nº 431 do c. TST. Recursos ordinários conhecidos e parcialmente providos.” (TRT 16ª R. – ROS 0063500-45.2012.5.16.0003 – 1ª T. – Rel. Des. José Evandro de Souza – DJe 03.12.2015 – p. 42)

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO ��������������������������������������������������������������137

33427 – Responsabilidade trabalhista solidária – dirigente de clube esportivo – desconside-ração da personalidade jurídica – alcance

“Desconsideração da personalidade jurídica. Responsabilidade solidária do dirigente do clu-be esportivo. Nos termos do art. 27 da Lei nº 9.615/1998, os bens particulares dos dirigentes respondem pelas obrigações contraídas pelo clube na hipótese de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.” (TRT 18ª R. – Ap 0011189-85.2015.5.18.0013 – Rel. Paulo Sergio Pimenta – DJe 11.12.2015 – p. 244)

33428 – Responsabilidade trabalhista subsidiária – contratos de compra e venda de cana futura – inextensão

“Contratos de compra e venda de cana futura. Natureza comercial. Ausência de responsabi-lidade subsidiária. Os contratos de compra e venda de cana juntados aos autos pela quarta reclamada demonstram a natureza comercial do ajuste, visando o fornecimento de cana para entrega futura, sem indicativos de contratação de mão de obra. Dos elementos probatórios constantes dos autos depreende-se que houve prestação de serviços a diversos fornecedores por meio da primeira ré. A quarta ré insere-se nessa relação como compradora dos produtos, situação que exclui sua responsabilidade sobre as obrigações trabalhistas que envolveram a relação de trabalho. As testemunhas foram uníssonas no sentido de que o pagamento da empresa de transporte e de corte de cana é realizado pelo proprietário rural, sem qualquer intervenção da quarta ré. Do mesmo modo, em caso de quebra da produção, era o fornecedor quem deveria arcar com o prejuízo. Conclui-se, pois, que a quarta reclamada figura como contratante de produtos (cana para entrega futura) e não como contratante de prestação de serviços terceirizados.” (TRT 9ª R. – RO 0002060-62.2014.5.09.0459 – Rel. Sérgio Murilo Rodrigues Lemos – DJe 26.01.2016 – p. 222)

33429 – Rurícola – hora noturna reduzida – inaplicabilidade

“Recurso de revista interposto sob a égide da Lei nº 13.015/2014. 1. Enquadramento sindical. Vigilante. Categoria diferenciada. De acordo com a Súmula nº 374 desta Corte, o empregado integrante de categoria profissional diferenciada não tem o direito de haver de seu emprega-dor vantagens previstas em instrumento coletivo no qual a empresa não foi representada por órgão de classe de sua categoria. Recurso de revista conhecido e provido. 2. Trabalhador rural. Hora noturna reduzida. Inaplicabilidade. O trabalhador rural não tem direito à redução da hora noturna, tendo em vista a ausência de previsão em tal sentido na Lei nº 5.889/1973. Recurso de revista conhecido e provido. 3. Horas extras. Intervalo intrajornada. 3.1 Na forma do item I da Súmula nº 437, do TST, ‘após a edição da Lei nº 8.923/1994, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empre-gados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração’. 3.2 Por outro lado, ‘ultrapassada habitualmente a jornada de seis horas de trabalho, é devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, obrigando o empregador a remunerar o período para descanso e alimentação não usufruído como extra, acrescido do respectivo adicional, na forma prevista no art. 71, caput e § 4º, da CLT’ (Súmula nº 437, IV, do TST). Recurso de revista não conhecido.” (TST – RR 0000088-48.2011.5.15.0151 – Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira – DJe 11.12.2015 – p. 1130)

138 ����������������������������������������������������������RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA – EMENTÁRIO

33430 – Sindicato – contribuição assistencial – definição em instrumento coletivo – efeitos

“Sindicato. Cobrança de contribuição assistencial definida em instrumento coletivo. Assis-tência judiciária gratuita. Possibilidade. Buscando o Sindicato a cobrança de recursos para melhor atuação perante os trabalhadores representados, deve ser aplicada a dinâmica descrita no art. 87 do CDC, que isenta as associações que promovem demandas coletivas do reco-lhimento de custas e despesas processuais, além do pagamento de honorários advocatícios à parte contrária, à exceção de comprovada má-fé, porquanto, ainda que a entidade sindical esteja atuando em seu nome, o proveito econômico obtido pelo provimento judicial benefi-ciará a categoria como um todo.” (TRT 17ª R. – RO 0003084-80.2014.5.17.0014 – Relª Ana Paula Tauceda Branco – DJe 15.12.2015 – p. 334)

Comentário Editorial SÍnTESEVide RST nº 321, mar. 2016, ementa nº 33344 do TRT 9ª R.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

33431

Supremo Tribunal Federal13.10.2015 Primeira Turma

AgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 910.280

Distrito Federal

Relator: Min. Roberto Barroso

Agte.(s): Estado do Piauí

Proc.(a/s)(es): Procurador‑Geral do Estado do Piauí

Agdo.(a/s): Zilda Maria Romao Ribeiro

Adv.(a/s): Jamilla Vitória Holanda França Silva e Outro(a/s)

EMENTA

dIreIto coNStItucIoNal e dIreIto do trabalho – agravo regImeNtal em recurSo extraordINárIo com agravo – competÊNcIa da juStIça do trabalho – coNtrato de trabalho aNterIor à cf/1988 – INexIStÊNcIa de traNSpoSIção ao regIme jurídIco ÚNIco – alegação de NulIdade do coNtrato de trabalho – SÚmula Nº 284/Stf – precedeNteS

1. A controvérsia dos autos não é fundada em vínculo estatutário ou em contrato de trabalho temporário submetido à lei especial. Trata--se de contrato que fora celebrado antes do advento da Constituição Federal de 1988, em época na qual se admitia a vinculação à Admi-nistração Pública de servidores sob o regime da CLT. A competência, portanto, é da Justiça do Trabalho. Precedentes.

2. O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE 906.491-RG, sob a relatoria do Ministro Teori Zavascki, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional em análise e reafirmou a jurisprudência da Corte sobre a questão.

3. As razões do recurso extraordinário quanto à nulidade do vínculo com a Administração Pública não guardam pertinência com a fun-damentação do acórdão recorrido. Nessas circunstâncias, incide a Súmula nº 284/STF.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Ministra Rosa Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráfi-cas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 13 de outubro de 2015.

Ministro Luís Roberto Barroso Relator

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):

1. Trata-se de agravo regimental cujo objeto é decisão que negou provimento ao agravo, tendo em vista estar correta a decisão do Tribunal de origem que inadmitiu o recurso extraordinário (art. 544, § 4º, II, a, do CPC), sob os seguintes fundamentos: (i) não sendo demonstrado que a contratação ocorreu sob a égide de lei especial, ausente se revela a relação jurídico--administrativa, o que atrai a competência da Justiça do Trabalho para diri-mir as controvérsias surgidas da contratação sob o regime da CLT, na forma do art. 114, I, da Carta; e (ii) quanto à controvérsia sobre a condenação ao pagamento de FGTS, incide a Súmula nº 284/STF, uma vez que a premissa apontada no recurso extraordinário (nulidade de contratação) não fez parte dos fundamentos do acórdão recorrido.

2. A parte agravante afasta o fundamento da decisão agravada, reafir-mando as teses do recurso extraordinário.

3. É o relatório.

VOTO

O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):

1. O agravo não deve ser provido, tendo em vista que a parte recor-rente se limita a repetir as alegações do recurso extraordinário, sem trazer novos argumentos suficientes para modificar a decisão ora agravada.

2. O Tribunal Superior do Trabalho, ao apreciar a controvérsia, profe-riu acórdão assim ementado:

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������141

“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DE-CISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014 – COM-PETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO – EMPREGADO ADMITIDO SEM CONCURSO PÚBLICO, ANTES DA PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 – É inviável a conversão do regime celetista para o es-tatutário, na hipótese de servidores admitidos sem aprovação em concurso público antes da Constituição Federal de 1988, em razão da norma inserta no art. 37, II, deste Diploma. Assim, permanece vinculado à legislação traba-lhista, circunstância que atrai a competência da Justiça do Trabalho. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

PRESCRIÇÃO – FGTS – Como a parte reclamante foi contratada sob a vigên-cia da Constituição Federal de 1967, não houve transmudação do regime jurídico de celetista para estatutário, circunstância que afasta a prescrição bienal prevista na Súmula nº 382 do TST. Precedentes. Agravo de instrumen-to a que se nega provimento.

FGTS – MUDANÇA DE REGIME JURÍDICO – Uma vez que a autora perma-neceu regida pelas normas da CLT, faz jus aos depósitos do FGTS a partir da data de promulgação da Constituição Federal de 1988, nos exatos termos da Lei nº 8.036/1990. Agravo de instrumento a que se nega provimento.”

3. A parte recorrente reafirma as alegações do recurso extraordinário que consistem: (i) na incompetência da Justiça do Trabalho; e (ii) na incons-titucionalidade da condenação ao pagamento de FGTS.

4. O Supremo Tribunal Federal, ao referendar a liminar concedida pelo Ministro Nelson Jobim na ADI 3.395, afastou qualquer interpretação do art. 114, I, da Constituição, incluído pela EC 45/2004, que reputasse à Justiça do Trabalho competência para o julgamento das causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores vinculados por relação jurídico--administrativa. Em outras palavras, estando o servidor protegido por um vínculo dessa natureza, a competência para solucionar as lides é da Justiça comum. Veja-se a ementa da ADI 3.395-MC:

“INCONSTITUCIONALIDADE – Ação direta. Competência. Justiça do Tra-balho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Co-mum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico--estatutária.”

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5. O entendimento foi reafirmado por esta Corte, no RE 573.202-RG (Rel. Min. Ricardo Lewandowski – Tema 43), no qual se assentou a compe-tência da Justiça comum para julgamento das “causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local”.

6. A controvérsia em análise não é relativa a trabalho temporário sub-metido a lei especial, mas a contrato de trabalho celebrado em época na qual se admitia a vinculação à Administração Pública de servidores sob regime da CLT. Portanto, o decidido nos citados precedentes não serve de fundamento para afastar a competência da Justiça trabalhista.

7. Ademais, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal, ao apre-ciar o ARE 906.491-RG, sob a relatoria do Ministro Teori Zavascki, reconhe-ceu a existência de repercussão geral da questão constitucional em análise e reafirmou a jurisprudência da Corte sobre a questão (Tema 853: “Compe-tência da Justiça do Trabalho para processar e julgar reclamação trabalhista, fundada em contrato de trabalho regido pela CLT, na qual figura o Poder Público no polo passivo”).

8. Quanto ao direito aos depósitos do FGTS, o recurso extraordinário não pode ser conhecido. O Tribunal de origem assentou ser devido o reco-lhimento dos depósitos de FGTS, uma vez que, na espécie, o contrato cele-tista não se altera em razão da posterior instituição do regime jurídico único estatutário no ente público, porque o disposto no art. 37, II, da Constituição impossibilita a transposição automática.

9. Tal como assentado na decisão agravada, as razões do recurso extraordinário encontram-se dissociadas do que foi decidido pelo acórdão do Tribunal de origem, o que atrai a aplicação da Súmula nº 284/STF: “é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua funda-mentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.

10. Diante do exposto, nego provimento ao agravo regimental.

PRIMEIRA TURMA ExTRATO DE ATA

AgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 910.280

Proced.: Distrito Federal

Relator: Min. Roberto Barroso

Agte.(s): Estado do Piauí

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������143

Proc.(a/s)(es): Procurador-Geral do Estado do Piauí

Agdo.(a/s): Zilda Maria Romao Ribeiro

Adv.(a/s): Jamilla Vitória Holanda França Silva e outro(a/s)

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos ter-mos do voto do Relator. Unânime. Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber. 1ª Turma, 13.10.2015.

Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Marco Aurélio, Luiz Fux, Roberto Barroso e Edson Fachin. Compareceu o Senhor Ministro Teori Zavascki para julgar processos a ele vinculados.

Subprocuradora-Geral da República, Dra. Deborah Duprat.

Carmen Lilian Oliveira de Souza Secretária da Primeira Turma

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

33432

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.571.185 – RS (2015/0305472‑9)Relator: Ministro Humberto MartinsAgravante: Cirne Placido TisattoAdvogado: Isabel Cristina Trapp FerreiraAgravado: Instituto Nacional do Seguro Social

EMENTA

prevIdeNcIárIo – revISão de beNefícIo – decadÊNcIa – coNfIguração – beNefícIo coNcedIdo aNteS da medIda provISÓrIa Nº 1.523-9/1997 e da leI Nº 9.528/1997 – termo a Quo do prazo decadeNcIal – matérIa SubmetIda ao rIto do art. 543-c do cpc – recurSoS eSpecIaIS NºS 1.309.529/pr e 1.326.114/Sc

1. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.309.529/PR e do REsp 1.326.114/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), firmou en-tendimento no sentido de que “incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormente a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.06.1997)”.

2. No caso dos autos, conforme consta do acórdão recorrido, o benefí-cio previdenciário foi concedido em momento anterior a 27.06.1997. A ação revisional do benefício previdenciário, por seu turno, foi ajui-zada somente em 05.07.2010, quando, portanto, já configurada a de-cadência, visto que o prazo decenal teve como termo a quo para a sua contagem, conforme consignado, a data de 28.06.1997.

Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça “A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimen-tal, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).” Os Srs. Ministros

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������145

Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães (Presi-dente) e Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Humberto Martins Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):

Cuida-se de agravo regimental interposto por Cirne Plácido Tisatto contra decisão monocrática de minha relatoria que não conheceu do recur-so especial nos termos da seguinte ementa (fls. 395/402, e-STJ):

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – REVISÃO DE BENEFÍCIO – DE-CADÊNCIA – CONFIGURAÇÃO – BENEFÍCIO CONCEDIDO ANTES DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.523-9/1997 E DA LEI Nº 9.528/1997 – TER-MO A QUO DO PRAZO DECADENCIAL – MATÉRIA SUBMETIDA AO RITO DO ART. 543-C DO CPC – RECURSOS ESPECIAIS NºS 1.309.529/PR E 1.326.114/SC – ACÓRDÃO DE ORIGEM – SÚMULA Nº 83/STJ – RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

Extrai-se dos autos que o recurso especial foi interposto com funda-mento no art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, o qual busca reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região assim ementa-do (fl. 138, e-STJ):

PREVIDENCIÁRIO – DIREITO ADQUIRIDO AO MELHOR BENEFÍCIO – RETROAÇÃO DO PERÍODO BÁSICO DE CÁLCULO – POSSIBILIDADE – INAPLICABILIDADE DO ART. 26 DA LEI Nº 8.870/1994 AOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DE 05.04.1991 – REAJUSTAMENTO DO TETO DOS BENEFÍCIOS (ART. 14 DA EC 20/1998, E ART. 5º DA EC 41/2003)

1. O segurado tem direito adquirido ao cálculo do benefício de conformida-de com as regras vigentes quando da reunião dos requisitos da aposentação independentemente de prévio requerimento administrativo para tanto. Pre-cedentes do STF e do STJ.

2. Muito embora o art. 122 da Lei nº 8.213/1991 tenha previsto a retroação do período básico de cálculo nos casos de aposentadoria integral (regra re-produzida nas normas regulamentadoras), é possível a extensão desse direito aos casos de concessão de aposentadoria proporcional, em face do princípio da isonomia e em respeito ao critério da garantia do benefício mais vantajo-

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so, como, aliás, preceitua o Enunciado nº 5 do próprio Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS: “A Previdência Social deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientá-lo nesse sentido.”

3. Os salários de contribuição que integrarão o novo Período Básico de Cál-culo (PBC) deverão ser atualizados até a data em que reconhecido o direito adquirido, apurando-se nessa data a Renda Mensal Inicial (RMI), a qual de-verá ser reajustada, nos mesmos meses e índices oficiais de reajustamento utilizados para os benefícios em manutenção, até a Data do Início do Benefí-cio – DIB. A Data de Início de Pagamento (DIP) deverá coincidir com a DER.

4. Os critérios revisionais previstos no art. 26 da Lei nº 8.870/1994 aplicam--se apenas aos benefícios com data de início entre 05 de abril de 1991 e 31 de dezembro de 1993. Precedentes do STJ e desta Corte.

5. O Pleno da Corte Suprema, por ocasião do julgamento do RE 564354, no dia 08 de setembro de 2010, reafirmou o entendimento manifestado no AgRg-RE 499.091-1/SC, decidindo que a incidência de novos tetos previ-denciários, estabelecidos pela legislação, a benefícios em manutenção que tenham sido limitados ao teto quando de sua concessão, não representa apli-cação retroativa, nem aumento ou reajuste, mas apenas readequação dos valores percebidos ao novo teto.

Alega o agravante, preliminarmente, que não houve decadência, vis-to que “neste caso em que o segurado não exerceu o direito ao acesso da contraprestação mensal, a regra previdenciária estabelece que seus efeitos nascem com o requerimento, a qualquer tempo, e o universo patrimonial das contraprestações somente serão pagas a partir deste” (fl. 417, e-STJ).

Aduz, no mérito, que o preceito fundamental do direito adquirido é o alicerce do recurso interposto e, inclusive, foi nesse fundamento o reco-nhecimento do direito ao benefício em data anterior. Ressalta que o direi-to adquirido não estaria sujeito à decadência, ante à exceção prevista no art. 102, § 1º, da Lei nº 8.213/1991.

Argumenta que, “para demonstrar que não se trata de revisão, mas sim de nova concessão, compararmos o tema da desaposentação, pois esta trata da discussão quanto as contribuições vertidas após aposentadoria, por-tanto, no caso da desaposentação haveria a substituição do primeiro bene-fício concedido para, somando-se as novas contribuições gerar uma nova renda”. Aduz que “o que quer o autor, ora recorrente, aqui é a mesma ideia central, qual seja, desfazer-se do primeiro ato concessório para, verificando seu tempo anterior buscar uma outra aposentadoria com outras caracte-rísticas, portanto, não só postulando uma revisão, não!! está abrindo mão

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������147

do primeiro benefício para conceder outro, com os requisitos de tempo de contribuição e carência, distintas e diversa” (fl. 422, e-STJ).

Pugna, por fim, caso não seja reconsiderada a decisão agravada, pela submissão do presente agravo à apreciação da Turma.

Dispensada a oitiva do agravado.

É, no essencial, o relatório.

EMENTA

prevIdeNcIárIo – revISão de beNefícIo. decadÊNcIa – coNfIguração – beNefícIo coNcedIdo aNteS da medIda provISÓrIa Nº 1.523-9/1997 e da leI Nº 9.528/1997 – termo a Quo do prazo decadeNcIal – matérIa SubmetIda ao rIto do art. 543-c do cpc – recurSoS eSpecIaIS NºS 1.309.529/pr e 1.326.114/Sc

1. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.309.529/PR e do REsp 1.326.114/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), firmou en-tendimento no sentido de que “incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormente a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.06.1997)”.

2. No caso dos autos, conforme consta do acórdão recorrido, o benefí-cio previdenciário foi concedido em momento anterior a 27.06.1997. A ação revisional do benefício previdenciário, por seu turno, foi ajui-zada somente em 05.07.2010, quando, portanto, já configurada a de-cadência, visto que o prazo decenal teve como termo a quo para a sua contagem, conforme consignado, a data de 28.06.1997.

Agravo regimental improvido.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):

Em que pese o esforço contido nas razões de agravo regimental, não prospera a pretensão recursal de reforma da decisão prolatada.

Conforme consignado na análise monocrática, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.309.529/PR e do REsp 1.326.114/SC, Rel.

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Min. Herman Benjamin, submetido à sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), firmou entendimento no sentido de que “incide o pra-zo de decadência do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormente a esse pre-ceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.06.1997)”.

A propósito, a ementa dos referidos julgados:

PREVIDENCIÁRIO – MATÉRIA REPETITIVA – ART. 543-C DO CPC E RE-SOLUÇÃO STJ Nº 8/2008 – RECURSOS REPRESENTATIVOS DE CONTRO-VÉRSIA (RESPS 1.309.529/PR E 1.326.114/SC) – REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PELO SEGURADO – DE-CADÊNCIA – DIREITO INTERTEMPORAL – APLICAÇÃO DO ART. 103 DA LEI Nº 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA MP 1.523-9/1997, AOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DESTA NORMA – POSSIBILIDADE – TERMO A QUO – PUBLICAÇÃO DA ALTERAÇÃO LEGAL – AGRAVO REGI-MENTAL – INDEFERIMENTO DE INTERVENÇÃO COMO AMICUS CURIAE E DE SUSTENTAÇÃO ORAL

[...]

MATÉRIA SUBMETIDA AO REGIME DO ART. 543-C DO CPC

8. Trata-se de pretensão recursal do INSS com o objetivo de declarar a de-cadência do direito do recorrido de revisar benefícios previdenciários an-teriores ao prazo do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997 (DOU 28.06.1997), posteriormente convertida na Lei nº 9.528/1997, por ter transcorrido o decênio entre a publicação da citada norma e o ajuizamento da ação.

9. Dispõe a redação supracitada do art. 103: “É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.”

SITUAÇÃO ANÁLOGA – ENTENDIMENTO DA CORTE ESPECIAL

10. Em situação análoga, em que o direito de revisão é da Administração, a Corte Especial estabeleceu que “o prazo previsto na Lei nº 9.784/1999 somente poderia ser contado a partir de janeiro de 1999, sob pena de se conceder efeito retroativo à referida Lei” (MS 9.122/DF, Rel. Min. Gilson Dipp, Corte Especial, DJe 03.03.2008). No mesmo sentido: MS 9.092/DF, Rel. Min. Paulo Gallotti, Corte Especial, DJ 25.09.2006; e MS 9.112/DF, Relª Min. Eliana Calmon, Corte Especial, DJ 14.11.2005.

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O OBJETO DO PRAZO DECADENCIAL

11. O suporte de incidência do prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei nº 8.213/1991 é o direito de revisão dos benefícios, e não o direito ao benefício previdenciário.

12. O direito ao benefício está incorporado ao patrimônio jurídico, e não é possível que lei posterior imponha sua modificação ou extinção.

13. Já o direito de revisão do benefício consiste na possibilidade de o segu-rado alterar a concessão inicial em proveito próprio, o que resulta em direito exercitável de natureza contínua sujeito à alteração de regime jurídico.

14. Por conseguinte, não viola o direito adquirido e o ato jurídico perfeito a aplicação do regime jurídico da citada norma sobre o exercício, na vigência desta, do direito de revisão das prestações previdenciárias concedidas antes da instituição do prazo decadencial.

RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA

15. Incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormen-te a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.06.1997).

16. No mesmo sentido, a Primeira Seção, alinhando-se à jurisprudência da Corte Especial e revisando a orientação adotada pela Terceira Seção antes da mudança de competência instituída pela Emenda Regimental STJ nº 14/2011, firmou o entendimento, com relação ao direito de revisão dos benefícios concedidos antes da Medida Provisória nº 1.523-9/1997, que alterou o caput do art. 103 da Lei de Benefícios, de que “o termo inicial do prazo de deca-dência do direito ou da ação visando à sua revisão tem como termo inicial a data em que entrou em vigor a norma fixando o referido prazo decenal (28.06.1997)” (REsp 1.303.988/PE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª S., DJ 21.03.2012).

CASO CONCRETO

17. Concedido, no caso específico, o benefício antes da Medida Provisória nº 1.523-9/1997 e havendo decorrido o prazo decadencial decenal entre a publicação dessa norma e o ajuizamento da ação com o intuito de revisão de ato concessório ou indeferitório, deve ser extinto o processo, com resolução de mérito, por força do art. 269, IV, do CPC.

18. Agravos Regimentais não providos e Recurso Especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução nº 8/2008 do STJ.

(REsp 1.309.529/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., Julgado em 28.11.2012, DJe 04.06.2013)

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PREVIDENCIÁRIO – MATÉRIA REPETITIVA – ART. 543-C DO CPC E RE-SOLUÇÃO STJ Nº 8/2008 – RECURSOS REPRESENTATIVOS DE CONTRO-VÉRSIA (RESPS 1.309.529/PR E 1.326.114/SC) – REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO PELO SEGURADO – DE-CADÊNCIA – DIREITO INTERTEMPORAL – APLICAÇÃO DO ART. 103 DA LEI Nº 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA MP 1.523-9/1997 AOS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTES DESTA NORMA – POSSIBILIDADE – TERMO A QUO – PUBLICAÇÃO DA ALTERAÇÃO LEGAL – MATÉRIA SUB-METIDA AO REGIME DO ART. 543-C DO CPC

1. Trata-se de pretensão recursal do INSS com o objetivo de declarar a de-cadência do direito do recorrido de revisar benefícios previdenciários an-teriores ao prazo do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997 (DOU 28.06.1997), posteriormente convertida na Lei nº 9.528/1997, por ter transcorrido o decênio entre a publicação da citada norma e o ajuizamento da ação.

2. Dispõe a redação supracitada do art. 103: “É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.”

SITUAÇÃO ANÁLOGA – ENTENDIMENTO DA CORTE ESPECIAL

3. Em situação análoga, em que o direito de revisão é da Administração, a Corte Especial estabeleceu que “o prazo previsto na Lei nº 9.784/1999 so-mente poderia ser contado a partir de janeiro de 1999, sob pena de se con-ceder efeito retroativo à referida Lei” (MS 9.122/DF, Rel. Min. Gilson Dipp, Corte Especial, DJe 03.03.2008).

No mesmo sentido: MS 9.092/DF, Rel. Min. Paulo Gallotti, Corte Especial, DJ 25.09.2006; e MS 9.112/DF, Relª Min. Eliana Calmon, Corte Especial, DJ 14.11.2005.

O OBJETO DO PRAZO DECADENCIAL

4. O suporte de incidência do prazo decadencial previsto no art. 103 da Lei nº 8.213/1991 é o direito de revisão dos benefícios, e não o direito ao bene-fício previdenciário.

5. O direito ao benefício está incorporado ao patrimônio jurídico, não sendo possível que lei posterior imponha sua modificação ou extinção.

6. Já o direito de revisão do benefício consiste na possibilidade de o segurado alterar a concessão inicial em proveito próprio, o que resulta em direito exer-citável de natureza contínua sujeito à alteração de regime jurídico.

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7. Por conseguinte, não viola o direito adquirido e o ato jurídico perfeito a aplicação do regime jurídico da citada norma sobre o exercício, na vigência desta, do direito de revisão das prestações previdenciárias concedidas antes da instituição do prazo decadencial.

RESOLUÇÃO DA TESE CONTROVERTIDA

8. Incide o prazo de decadência do art. 103 da Lei nº 8.213/1991, instituído pela Medida Provisória nº 1.523-9/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, no direito de revisão dos benefícios concedidos ou indeferidos anteriormen-te a esse preceito normativo, com termo a quo a contar da sua vigência (28.06.1997).

9. No mesmo sentido, a Primeira Seção, alinhando-se à jurisprudência da Corte Especial e revisando a orientação adotada pela Terceira Seção antes da mudança de competência instituída pela Emenda Regimental STJ nº 14/2011, firmou o entendimento – com relação ao direito de revisão dos benefícios concedidos antes da Medida Provisória nº 1.523-9/1997, que alterou o caput do art. 103 da Lei de Benefícios – de que “o termo inicial do prazo de deca-dência do direito ou da ação visando à sua revisão tem como termo inicial a data em que entrou em vigor a norma fixando o referido prazo decenal (28.06.1997)” (REsp 1.303.988/PE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª S., DJ 21.03.2012).

CASO CONCRETO

10. Concedido, in casu, o benefício antes da Medida Provisória nº 1.523-9/1997 e havendo decorrido o prazo decadencial decenal entre a publicação dessa norma e o ajuizamento da ação com o intuito de rever ato concessório ou indeferitório, deve ser extinto o processo, com resolução de mérito, por força do art. 269, IV, do CPC.

11. Recurso Especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução nº 8/2008 do STJ.”

(REsp 1.326.114/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., Julgado em 28.11.2012, DJe 13.05.2013)

No caso dos autos, conforme consta do acórdão recorrido, o bene-fício previdenciário foi concedido em momento anterior a 27.06.1997. A ação revisional do benefício previdenciário, por seu turno, foi ajuizada so-mente em 05.07.2010, quando, portanto, já configurada a decadência, visto que o prazo decenal teve como termo a quo para a sua contagem, conforme consignado, a data de 28.06.1997.

Ressalte-se, por fim, não ser o caso de aplicação do precedente AgRg--REsp 1.407.710/PR, de relatoria do Ministro Herman Benjamim, ao caso

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dos autos, porquanto, no citado precedente , pleiteia-se o reconhecimento de tempo especial, e aqui o que se busca é a revisão da renda mensal (direi-to a melhor benefício).

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como penso. É como voto.

Ministro Humberto Martins Relator

CERTIDÃO DE jULGAMENTO SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2015/0305472-9 AgRg-REsp 1.571.185/RS

Números Origem: 50128772620104047100 RS-50128772620104047100

Pauta: 18.02.2016 Julgado: 18.02.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Assusete Magalhães

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Flaubert Machado Araújo

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

AUTUAÇÃO

Recorrente: Cirne Placido Tisatto

Advogado: Isabel Cristina Trapp Ferreira

Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social

Assunto: Direito previdenciário – Benefícios em espécie – Aposentadoria por tempo de serviço (art. 52/4)

AGRAVO REGIMENTAL

Agravante: Cirne Placido Tisatto

Advogado: Isabel Cristina Trapp Ferreira

Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

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“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães (Presidente) e Diva Malerbi (Desembargadora convoca-da do TRF da 3ª Região) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

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Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Recurso Especial nº 1.559.345 – SP (2015/0246058‑2)Relator: Ministro Humberto MartinsAgravante: Angelo Donizetti MatieloAdvogado: Alexandra Delfino Ortiz e outro(s)Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

EMENTA

prevIdeNcIárIo – auxílIo-acIdeNte – apoSeNtadorIa – cumulação – INvIabIlIdade – coNceSSão da apoSeNtadorIa poSterIor à vIgÊNcIa da leI Nº 9.528/1997

1. A possibilidade de acumulação do auxílio-acidente com proven-tos de aposentadoria requer que a lesão incapacitante e a concessão da aposentadoria sejam anteriores às alterações promovidas pela Lei nº 9.528/1997.

2. No caso dos autos, verifica-se que a eclosão da doença incapa-citante ocorreu antes da inovação legislativa, mas a aposentadoria não. Assim, observa-se que o acórdão recorrido merece censura, pois proferiu entendimento em desarmonia ao entendimento jurispruden-cial desta Corte, segundo o qual é possível a acumulação do auxílio--acidente e da aposentadoria desde que a lesão incapacitante e a con-cessão do benefício sejam anteriores às alterações promovidas pela Lei nº 9.528/1997. Precedentes.

Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça “A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimen-tal, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)”. Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães (Presi-dente) e Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

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Ministro Humberto Martins Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):

Cuida-se de agravo regimental interposto por Angelo Donizetti Matielo contra decisão monocrática da Presidência do STJ que apreciou recurso especial interposto com o objetivo de reformar acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que legitimou a percepção cumulada de auxílio-acidente e aposentadoria (fls. 487/497, e-STJ).

A decisão agravada deu provimento ao recurso especial do INSS, haja vista o entendimento exarado no REsp 1296673/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, nos seguintes termos:

“A Primeira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema nº 555, ao qual está vinculado ao Recurso Especial Repetitivo nº 1.296.673/MG, processado nos moldes do art. 543-C do CPC, firmou entendimento no sentido de que ‘a acumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria pressupõe que a eclosão da lesão incapacitante, apta a gerar o direito ao auxílio-acidente, e a concessão da aposentadoria sejam anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.213/1991, promovida em 11.11.1997 pela Medida Provisória nº 1.596-14/1997, poste-riormente convertida na Lei nº 9.528/1997’, nos termos da seguinte ementa:

[...]

Nessa linha, o acórdão recorrido está em confronto com o entendimento firmado no âmbito desta Corte, pois admitiu a cumulação dos benefícios previdenciários, não obstante a aposentadoria seja posterior ao advento da Lei nº 9.528/1997 (fl. 151).

Ante o exposto, com fulcro no art. 557, § 1º-A, do CPC c/c art. 1º da Resolu-ção STJ nº 17/2013, dou provimento ao recurso especial para julgar improce-dente o pedido formulado na inicial, ficando o autor isento do pagamento de custas e honorários de advogado em razão do disposto no art. 129, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991.

Publique-se. Intimem-se.”

Nas razões do regimental, a agravante aduz que o provimento dado ao apelo nobre a prejudicou, visto que, quando da eclosão da lesão inca-pacitante (24.08.1995), que ensejou a concessão do benefício de auxílio--acidente, o art. 86, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 previa a vitaliciedade deste

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benefício. Pugna, por fim, caso não seja reconsiderada a decisão agravada, pela submissão do presente agravo à apreciação da Turma.

É, no essencial, o relatório.

EMENTA

prevIdeNcIárIo – auxílIo-acIdeNte – apoSeNtadorIa – cumulação – INvIabIlIdade – coNceSSão da apoSeNtadorIa poSterIor à vIgÊNcIa da leI Nº 9.528/1997

1. A possibilidade de acumulação do auxílio-acidente com proven-tos de aposentadoria requer que a lesão incapacitante e a concessão da aposentadoria sejam anteriores às alterações promovidas pela Lei nº 9.528/1997.

2. No caso dos autos, verifica-se que a eclosão da doença incapa-citante ocorreu antes da inovação legislativa, mas a aposentadoria não. Assim, observa-se que o acórdão recorrido merece censura, pois proferiu entendimento em desarmonia ao entendimento jurispruden-cial desta Corte, segundo o qual é possível a acumulação do auxílio--acidente e da aposentadoria desde que a lesão incapacitante e a con-cessão do benefício sejam anteriores às alterações promovidas pela Lei nº 9.528/1997. Precedentes.

Agravo regimental improvido.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins (Relator):

Em que pese o esforço contido nas razões de agravo regimental, não prospera a pretensão recursal de reforma da decisão prolatada. Conforme consignado na análise monocrática, a redação original do art. 86 da Lei nº 8.213/1991 previa que o auxílio-acidente era benefício vitalício, sendo permitida a cumulação do referido auxílio pelo segurado com qualquer re-muneração ou benefício não relacionados com o mesmo acidente.

Assim dispunha o normativo:

“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido ao segurado quando, após a consolidação das lesões decorrentes do acidente do trabalho, resultar seque-la que implique:

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I – redução da capacidade laborativa que exija maior esforço ou necessidade de adaptação para exercer a mesma atividade, independentemente de reabi-litação profissional;

II – redução da capacidade laborativa que impeça, por si só, o desempenho da atividade que exercia à época do acidente, porém, não o de outra, do mesmo nível de complexidade, após reabilitação profissional; ou

III – redução da capacidade laborativa que impeça, por si só, o desempenho da atividade que exercia à época do acidente, porém não o de outra, de nível inferior de complexidade, após reabilitação profissional.

§ 1º O auxílio-acidente mensal e vitalício corresponderá a 50% (cinquen-ta por cento) do salário-de-benefício do segurado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendi-mento auferido pelo acidentado.

§ 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício não prejudi-cará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente.”

O referido normativo sofreu alteração significativa com o advento da MP 1.596-14/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997, que afastou a vitali-ciedade do auxílio-acidente e passou expressamente a proibir a acumulação do benefício acidentário com qualquer espécie de aposentadoria do regime geral, passando a integrar o salário de contribuição para fins de cálculo da aposentadoria previdenciária.

Vejamos:

“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultar sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.

[...]

§ 2º O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou ren-dimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria.”

A possibilidade de acumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria requer que a lesão incapacitante e a concessão da aposen-tadoria sejam anteriores às alterações promovidas pela Lei nº 9.528/1997.

Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte:

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“PREVIDENCIÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISÓRIA – CUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE COM APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO – POSSIBILIDADE, DESDE QUE A APOSENTADORIA E A MOLÉSTIA INCAPACITANTE SEJAM ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.528/1997 – SÚMULA Nº 507 DO STJ – PROVIMENTO NEGADO

1. Nos termos da Súmula nº 507 do STJ, ‘a acumulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão incapacitante e a aposentado-ria sejam anteriores a 11.11.1997, observado o critério do art. 23 da Lei nº 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho’.

2. Hipótese em que a aposentadoria e a doença incapacitante são anteriores à inovação legal inserida pela Lei nº 9.528/1997.

3. Agravo regimental não provido.”

(AgRg-AR 4.753/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, 3ª S., Julgado em 12.08.2015, DJe 20.08.2015)

“AGRAVO REGIMENTAL – CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS – AUXÍLIO-ACI-DENTE E APOSENTADORIA – ART. 86, §§ 2º E 3º, DA LEI Nº 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.596-14/1997, POSTERIORMENTE CONVERTIDA NA LEI Nº 9.528/1997 – MARCO LEGAL – PUBLICAÇÃO DA CITADA MP (11.11.1997) – MATÉRIA DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ Nº 8/2008

1. ‘A acumulação do auxílio-acidente com proventos de aposentadoria pres-supõe que a eclosão da lesão incapacitante, ensejadora do direito ao auxílio--acidente, e o início da aposentadoria sejam anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.213/1991 [...], promovida em 11.11.1997 pela Me-dida Provisória nº 1.596-14/1997, que posteriormente foi convertida na Lei nº 9.528/1997.’ (REsp 1.296.673/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 03.09.2012)

2. Posteriormente foi editada a Súmula nº 507/STJ, segundo a qual ‘a acu-mulação de auxílio-acidente com aposentadoria pressupõe que a lesão in-capacitante e a aposentadoria sejam anteriores a 11.11.1997, observado o critério do art. 23 da Lei nº 8.213/1991 para definição do momento da lesão nos casos de doença profissional ou do trabalho’.

3. Por se tratar de pretensão de rediscussão de matéria decidida sob o rito dos repetitivos e posteriormente sumulada, aplica-se multa de 5% sobre o valor da causa atualizado, prevista no art. 557, § 2º, do CPC, por impugnação infundada.

4. Agravo Regimental não provido com aplicação de multa.”

(AgRg-AgRg-AREsp 546.261/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., J. 02.12.2014, DJe 02.02.2015)

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“DIREITO PREVIDENCIÁRIO – AUXÍLIO-SUPLEMENTAR – APOSENTADO-RIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – CONCESSÃO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.528/1997 – CUMULAÇÃO INDEVIDA – MAJORAÇÃO DO AUXÍLIO-ACIDENTE – 50% SOBRE O SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO – RE 613.033/SP – REPERCUSSÃO GERAL – APLICAÇÃO RETROATIVA – IM-POSSIBILIDADE

1. Somente é legítima a cumulação do auxílio-suplementar previsto na Lei nº 6.367/1976, incorporado pelo auxílio-acidente após o advento da Lei nº 8.213/1991, com aposentadoria, quando esta tenha sido concedida em data anterior à vigência da Lei nº 9.528/1997. Hipótese em que foi concedi-da a aposentadoria por tempo de contribuição ao segurado no ano de 2006, não sendo devida a cumulação pugnada.

[...] Omissis.”

(REsp 1.365.970/RS, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., Julgado em 02.05.2013, DJe 10.05.2013)

“PREVIDENCIÁRIO – ACUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE E APOSEN-TADORIA – ART. 86, §§ 2º E 3º, DA LEI Nº 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA MP 1.596-14/1997, CONVERTIDA NA LEI Nº 9.528/1997 – LESÃO INCAPACITANTE E APOSENTADORIA DEVEM SER OBSERVADAS ANTES DA PUBLICAÇÃO DA MP 1.596-14/1997 (11.11.1997)

1. Agravo regimental no qual se sustenta a possibilidade de acumular au-xílio-acidente com aposentadoria por tempo de contribuição ocorrida em 01.11.1998.

2. A acumulação de auxílio-acidente com proventos de aposentadoria só é devida se a eclosão da lesão incapacitante, ensejadora do auxílio-acidente, e o início da aposentadoria forem anteriores à alteração do art. 86, §§ 2º e 3º, da Lei nº 8.213/1991, ocorrida em 11.11.1997 pela Medida Provisória nº 1.596-14/1997, convertida na Lei nº 9.528/1997. Entendimento adotado pela Terceira Seção e agora também assentado na Primeira Seção desta Corte por meio do julgamento do REsp 1.296.673/MG, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC e da Resolução nº 8/2008.

3. Agravo regimental não provido.”

(AgRg-REsp 1.308.248/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., Julgado em 20.11.2012, DJe 26.11.2012)

No caso dos autos, verifica-se que a eclosão da doença incapacitante ocorreu antes da inovação legislativa, mas a aposentadoria por contribuição se deu somente 8.4.2010.

É o que se extrai do seguinte trecho (fls. 115/116, e-STJ):

160 ������������������������������������RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

“Desse modo, é cabível a cumulação do benefício de auxílio-acidente NB 115.161.151-1 (fl. 98) com a aposentadoria por tempo de contribuição (NB 150.431.280-2) (fl. 23) desde 08.04.2010.”

Assim, observa-se que o acórdão recorrido merece censura, pois pro-feriu entendimento em desarmonia ao entendimento jurisprudencial desta Corte, segundo o qual é possível a acumulação do auxílio-acidente e da aposentadoria desde que a lesão incapacitante e a concessão do benefício sejam anteriores às alterações promovidas pela Lei nº 9.528/1997.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como penso. É como voto.

Ministro Humberto Martins Relator

CERTIDÃO DE jULGAMENTO SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2015/0246058-2 AgRg-REsp 1.559.345/SP

Números Origem: 00069736920118260362 129011 12902011 20120000630011 20130000313156 3620120110069730 69736920118260362

Pauta: 18.02.2016 Julgado: 18.02.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Humberto Martins

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Assusete Magalhães

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Flaubert Machado Araújo

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

AUTUAÇÃO

Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social

Recorrido: Angelo Donizetti Matielo

Advogado: Alexandra Delfino Ortiz e outro(s)

Assunto: Direito previdenciário – Benefícios em espécie – Auxílio-acidente (Art. 86)

AGRAVO REGIMENTAL

Agravante: Angelo Donizetti Matielo

Advogado: Alexandra Delfino Ortiz e outro(s)

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������161

Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães (Presidente) e Diva Malerbi (Desembargadora convoca-da do TRF da 3ª Região) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

33434

Superior Tribunal de JustiçaAgRg no Agravo em Recurso Especial nº 581.160 – PR (2014/0234394‑9)Relator: Ministro Benedito GonçalvesAgravante: Jorge Estevão MartinsAdvogado: Willyan Rower Soares e outro(s)Agravado: Instituto Nacional do Seguro SocialAdvogado: Procuradoria‑Geral Federal – PGF

EMENTA

prevIdeNcIárIo – agravo regImeNtal No agravo em recurSo eSpecIal – coNverSão de tempo comum em eSpecIal apÓS a leI Nº 9.032/1995 – ImpoSSIbIlIdade – reSp 1.310.034/pr, SubmetIdo ao rIto do art. 543-c do cpc

1. Evidencia-se que a decisão recorrida assentou compreensão que está em consonância com o entendimento fixado no julgamento do REsp 1.310.034/PR (DJe de 19.12.2012), submetido ao rito do art. 543-C do CPC, de que a lei a reger a conversão entre tempos de serviço comum e especial é aquela vigente no momento da aposenta-doria. Assim, se na data da reunião dos requisitos da aposentadoria já não vigorava a redação original do art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, mas a redação dada pela Lei nº 9.032/1995 (art. 57, § 5º), não há di-reito à conversão de tempo de trabalho comum em especial.

2. No caso concreto, o pedido de aposentadoria deu-se em 31.10.2011, razão pela qual não é possível a pretendida conversão.

3. Agravo regimental não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos ter-mos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Sérgio Kukina (Presi-dente), Regina Helena Costa, Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região) e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 16 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������163

Ministro Benedito Gonçalves Relator

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão, assim ementada:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO – AGRAVO EM RECURSO ESPE-CIAL – CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL APÓS A ALTE-RAÇÃO DO ART. 57, § 3º, DA LEI Nº 8.213/1991 PELA LEI Nº 9.032/1995 – ENTENDIMENTO ASSENTADO NO JULGAMENTO DO EDCL-RESP 1.310.034/PR, SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC – AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.

O agravante alega, em síntese, que: (a) deve ser aplicada a norma vigente à época do labor, que permitia a conversão de tempo comum em especial; (b) a lei nova não pode retroagir para atingir direito adquirido; (c) a Lei nº 9.032/1995 não vedou expressamente a conversão de tempo comum em especial, mas tão somente deixou de prever tal hipótese; (d) houve a violação dos arts. 1º, IV, 5º caput, XXXVI, 6º, 7º, XXII e XXIV, e 201, § 1º, da Constituição da República.

Ao final, pede a reconsideração da decisão ou o julgamento pelo colegiado.

É o relatório.

EMENTA

prevIdeNcIárIo – agravo regImeNtal No agravo em recurSo eSpecIal – coNverSão de tempo comum em eSpecIal apÓS a leI Nº 9.032/1995 – ImpoSSIbIlIdade – reSp 1.310.034/pr, SubmetIdo ao rIto do art. 543-c do cpc

1. Evidencia-se que a decisão recorrida assentou compreensão que está em consonância com o entendimento fixado no julgamento do REsp 1.310.034/PR (DJe de 19.12.2012), submetido ao rito do art. 543-C do CPC, de que a lei a reger a conversão entre tempos de serviço comum e especial é aquela vigente no momento da aposenta-doria. Assim, se na data da reunião dos requisitos da aposentadoria já não vigorava a redação original do art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, mas a redação dada pela Lei nº 9.032/1995 (art. 57, § 5º), não há di-reito à conversão de tempo de trabalho comum em especial.

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2. No caso concreto, o pedido de aposentadoria deu-se em 31.10.2011, razão pela qual não é possível a pretendida conversão.

3. Agravo regimental não provido.

VOTO

O Senhor Ministro Benedito Gonçalves (Relator): Originalmente o art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/1991 possuía a seguinte redação:

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta lei, ao segurado que tiver trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

[...]

§ 3º O tempo de serviço exercido alternadamente em atividade comum e em atividade profissional sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão, segundo critérios de equivalência estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, para efeito de qualquer benefício. Sendo assim, era permitida tanto a conversão de tempo especial em comum quanto a inversa, ou seja, a conversão de tempo comum em es-pecial. Para tanto, aplicavam-se os fatores de conversão previstos no art. 64 do Decreto nº 611/1992 (Regulamento dos Benefícios da Previdência Social).

No entanto, a Lei nº 9.032/1995 alterou significativamente a discipli-na do art. 57, que passou a ter os seguintes comandos:

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições espe-ciais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, con-sistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de--benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da apo-sentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49.

§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições es-

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peciais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exi-gido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previ-dência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995)

Verifica-se, pois, o que anteriormente estava regulado no § 3º passou a ser regido pelo § 5º, no qual trata tão somente da conversão do tempo de trabalho especial em comum.

Interpretando referido dispositivo, a Primeira Seção do STJ, no jul-gamento do REsp 1.310.034/PR, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, entendeu que, de fato, a alteração trazida pela Lei nº 9.032/1995 veda a possibilidade de conversão de tempo comum em especial. Além disso, fixou que é no momento do requerimento do benefício de aposentadoria que se verificará qual a disciplina a ser aplicada no que se refere à possibilida-de de conversão entre tempos de serviço de naturezas diversas (comum e especial). Destarte, os benefícios requeridos a partir de 29.04.1995, data da vigência da Lei nº 9.032/1995, somente permite a conversão de tempo especial em comum, não mais, portanto, a conversão de tempo comum em especial.

Conforme assentado no voto condutor dos embargos de declaração no recurso especial representativo de controvérsia acima mencionado:

No presente recurso representativo da controvérsia, repita-se, o objeto da controvérsia é saber qual a lei que rege a possibilidade de converter tempo comum em especial, e o que ficou estipulado (item “3” da ementa) no acór-dão embargado é que a lei vigente no momento da aposentadoria disciplina o direito vindicado.

Tal postulado se justifica pelo fato de que, embora a natureza especial do labor seja regida pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço, a apo-sentadoria é expectativa de direito e sobre esse aspecto é consabido que não há direito adquirido a regime jurídico. Em outras palavras, somente com a

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reunião dos requisitos da aposentadoria é que será possível constatar o direi-to à conversão do tempo de serviço comum em especial.

No caso dos autos, a aposentadoria foi requerida em 31.10.2011, o que torna indevida a conversão de tempo de serviço comum em especial.

Por fim, é imperioso esclarecer que, no que se refere às aludidas vio-lações dos dispositivos constitucionais, é inviável sua apreciação na via eleita, uma vez que o recurso especial não se presta à análise de matéria constitucional, cuja competência é do Supremo Tribunal Federal.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É o voto.

CERTIDÃO DE jULGAMENTO PRIMEIRA TURMA

Número Registro: 2014/0234394-9 AgRg-AREsp 581.160/PR

Números Origem: 50006261420124047000 PR-50006261420124047000

Em Mesa Julgado: 16.02.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Benedito Gonçalves

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sérgio Kukina

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Bonifácio Borges de Andrada

Secretária: Belª Bárbara Amorim Sousa Camuña

AUTUAÇÃO

Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social

Advogado: Procuradoria-Geral Federal – PGF

Agravado: Jorge Estevão Martins

Advogado: Willyan Rower Soares e outro(s)

Assunto: Direito previdenciário – Benefícios em espécie – Aposentadoria por tempo de contribuição (Art. 55/6)

AGRAVO REGIMENTAL

Agravante: Jorge Estevão Martins

Advogado: Willyan Rower Soares e outro(s)

Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

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Advogado: Procuradoria-Geral Federal – PGF

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Sérgio Kukina (Presidente), Regina Helena Costa, Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região) e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoNumeração Única: 0029644‑54.2009.4.01.3800Apelação Cível nº 2009.38.00.030598‑2/MGRelator(a): Juiz Federal Régis de Souza AraújoApelante: Thiago Martins CoutoAdvogado: Aureslindo Silvestre de Oliveira e outro(a)Apelado: União FederalProcurador: José Roberto Machado FariasApelado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: Adriana Maia Venturini

EMENTA

prevIdeNcIárIo – peNSão por morte – fIlho – maIor de 21 aNoS – INexIStÊNcIa de prevISão legal – beNefícIo INdevIdo

1. A pensão por morte é devida ao conjunto de dependentes do se-gurado que vier a falecer, aposentado ou não, independentemente do período de carência (arts. 26, inciso I, e 74 da Lei nº 8.213/1991). A qualidade de segurado do instituidor da pretensa pensão e a de-pendência econômica do beneficiário são requisitos básicos para a obtenção do benefício.

2. O art. 77, § 2º, inciso II, da Lei nº 8.213/1991, estabelece que a parte individual da pensão por morte extingue-se para o filho pela emancipação ou ao completar 21 anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.

3. . Não há, portanto, previsão legal para a pretensão do autor de continuidade da percepção da pensão por morte após atingir a idade limite prevista na Lei nº 8.112/1991, sob o fundamento de que é es-tudante universitário, já que a lei só permite a percepção de pensão por morte ao maior de 21 (vinte e um) anos se inválido ou com de-ficiência e apenas enquanto persistir a situação de invalidez. Nesse sentido: AC 0006417-06.2007.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal José Alexandre Franco, 1ª Câmara Regional Previdenciária de Juiz de Fora, e-DJF1 p. 1467 de 14.07.2015.

4. Apelação desprovida.

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������169

ACÓRDÃO

Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação.

Brasília, 2 de dezembro de 2015.

Juiz Federal Régis de Souza Araújo Relator Convocado

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Régis de Souza Araújo (Relator Convocado):

Trata-se de ação ajuizada por Thiago Martins Couto contra a União Federal e o INSS, para fins de manutenção de pensão por morte até que complete seu curso universitário, ou, ao menos, atinja a idade de 25 anos.

O pedido foi julgado improcedente.

Recorre o autor, sustentando estar desempregado e ser a pensão a única forma de concluir o curso universitário.

Contrarrazões da União às fls. 82/98.

VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Régis de Souza Araújo (Relator Convocado): A pensão por morte é devida ao conjunto de dependentes do segurado que vier a falecer, aposentado ou não, independentemente do período de carên-cia (arts. 26, inciso I, e 74 da Lei nº 8.213/1991). A qualidade de segurado do instituidor da pretensa pensão e a dependência econômica do benefi-ciário são requisitos básicos para a obtenção do benefício.

O art. 77, § 2º, inciso II, da Lei nº 8.213/1991, estabelece que a parte individual da pensão por morte extingue-se para o filho pela emancipação ou ao completar 21 anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.

Não há, portanto, previsão legal para a pretensão do autor de con-tinuidade da percepção da pensão por morte após atingir a idade limite prevista na Lei nº 8.112/1991, sob o fundamento de que é estudante univer-sitário, já que a lei só permite a percepção de pensão por morte ao maior

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de 21 (vinte e um) anos se inválido ou com deficiência e apenas enquanto persistir a situação de invalidez.

Nesse sentido é o entendimento desta Turma:

PREVIDENCIÁRIO – PENSÃO POR MORTE – FILHO MAIOR VÁLIDO – DE-PENDÊNCIA ECONÔMICA – LEI Nº 8.213/1991, ART. 16, I E § 4º, ART. 77, § 2º, II – RECURSO NÃO PROVIDO – 1. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado, o filho me-nor de 21 anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicial-mente (Lei nº 8.213/1991, art. 16, I, com redação da Lei nº 12.470/2011). 2. Não há presunção de dependência ao filho maior de 21 anos válido ou capaz de trabalhar e prover o seu sustento, ainda que demonstre ser uni-versitário e esteja em fase de conclusão dos estudos, tendo em vista que a pensão se extingue com a maioridade (Lei nº 8.213/1991, art. 77, § 2º, II). 3. A pensão pela morte do pai será devida até o limite de vinte e um anos de idade, salvo se inválido, não se podendo estender até os 24 anos para os estudantes universitários, pois não há amparo legal para tanto. Precedentes. (STJ, REsp 742.034/PB, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., J. 27.09.2007, DJ 22.10.2007, p. 347; no mesmo sentido: REsp 1008866/PR, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., J. 16.04.2009, DJe 18.05.2009; TRF 1ª R., AC 0014733-97.2013.4.01.9199/MG, Rel. Desª Fed. Ângela Catão, 1ª T., e-DJF1 p. 116 de 18.11.2014) 4. A apelante não prova a dependência eco-nômica com relação aos pais depois de sua maioridade, pois a juntada de cópias de contas e da sua condição de estudante não é suficiente para afastar a presunção de que, com a maioridade, tem renda própria para sua subsis-tência ou pelo menos tem condições de ter. 5. Não provimento da apela-ção. (AC 0006417-06.2007.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal José Alexandre Franco, 1ª Câmara Regional Previdenciária de Juiz de Fora, e-DJF1 p. 1467 de 14.07.2015)

Ante ao exposto, nego provimento à apelação.

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO SECRETARIA jUDICIáRIA

37ª Sessão Ordinária do(a) Primeira Turma

Pauta de: 02.12.2015 Julgado em: 02.12.2015

Ap 0029644-54.2009.4.01.3800/MG

Relator: Exmo. Sr. Juiz Federal Regis de Souza Araujo

Revisor: Exmo(a). Sr(a).

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������171

Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas

Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Mauricio Ribeiro Manso

Secretário(a): Lílio da Silva Ramos

Apte.: Thiago Martins Couto

Adv.: Aureslindo Silvestre de Oliveira e outro(a)

Apdo.: União Federal

Procur.: José Roberto Machado Farias

Apdo.: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Procur.: Adriana Maia Venturini

Nº de Origem: 296445420094013800 Vara: 10ª

Justiça de Origem: Justiça Federal Estado/Com.: MG

SUSTENTAÇÃO ORAL CERTIDÃO

Certifico que a(o) egrégia(o) Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, julgou nos termos do voto do Relator.

Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Juíza Federal Raquel Soares Chiarelli e Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira.

Brasília, 2 de dezembro de 2015.

Lílio da Silva Ramos Secretário(a)

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

33436

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoRemessa Ex Officio – Turma Espec. I – Penal, Previdenciário e Propriedade IndustrialNº CNJ: 0038752‑47.2015.4.02.5101 (2015.51.01.038752‑4)Relator: Desembargador Federal Messod Azulay NetoParte Autora: Darith Bellas CoutinhoAdvogado: Daniel Marinho SeraphimParte Ré: INSS – Instituto Nacional do Seguro SocialProcurador: Procurador FederalOrigem: 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00387524720154025101)

EMENTA

remeSSa NeceSSárIa – prevIdeNcIárIo – apoSeNtadorIa proporcIoNal por tempo de coNtrIbuIção – ec 20/1998 – regraS de traNSIção – reQuISItoS de pedágIo e Idade míNIma cumprIdoS – beNefícIo aSSegurado – dIreIto ao recebImeNto daS parcelaS em atraSo – correção e juroS de mora – aplIcabIlIdade da leI Nº 11.960/2009 – remeSSa parcIalmeNte provIda.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, decidem os Membros da 2ª Turma Especializada deste TRF 2ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa, nos termos do relatório e do voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

Des. Fed. Messod Azulay Neto Relator 2ª Turma Especializada

RELATÓRIO

Trata-se de Remessa consignada em face de sentença de fls. 119/122 destes autos eletrônicos, que julgou procedente o pedido para condenar o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS a implantar a aposentadoria proporcional por tempo de contribuição em favor da parte autora, a par-tir da data do requerimento administrativo, com o pagamento das parcelas

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atrasadas corrigidas e acrescidas de juros, a partir da citação, condenando--a, ainda, ao pagamento de verba honorária fixada em quantia certa de R$ 1.000,00.

Decorrido o prazo recursal (fl. 150), subiram os autos a este Tribunal por força da remessa necessária.

O Ministério Público Federal se manifesta no sentido de sua não in-tervenção no feito (fl. 180).

Dispensada a revisão, na forma regimental.

É o relatório.

Des. Fed. Messod Azulay Neto Relator 2ª Turma Especializada

VOTO

Verifica-se que o exame para deslinde da controvérsia, em sede de remessa, reside em verificar a possibilidade de concessão do benefício pre-videnciário de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.

O Juiz sentenciante, ao considerar o conjunto probatório trazido aos autos pelas partes, entendeu que o autor faz jus à concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, por ter completado o tempo mínimo exigido pela legislação previdenciária antes da vigência da EC 20/1998.

Somando-se o tempo de serviço do autor observa-se que o mesmo já detinha, à época do requerimento administrativo, tempo suficiente para a concessão da aposentadoria proporcional, conforme consignado na senten-ça, nos seguintes termos:

“Com base na documentação carreada aos autos (certificado de reservista do Ministério da Aeronáutica – fl. 9; Certidão emitida pelo Ministério da Aeronáutica – fls. 10 e 67; CNIS – fls. 11, 25 e 27; Guias da Previdência Social – fls. 28/30; CTPS do autor – fls. 34/66), verifica-se que o autor tinha 32 (trinta e dois) anos e 07 (sete) meses dias de tempo de contri-buição até a data do requerimento administrativo (24.09.2010 – fl. 22), conforme tabela abaixo colacionada: [...] O tempo apurado, apesar de insuficiente à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição em sua forma integral, é suficiente à concessão em sua forma proporcional. O autor completou, pois, 24 anos de tempo de contribuição até a data da

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Emenda Constitucional nº 20/1998 (15.12.1998), sendo exigido o tempo de 32 anos, 4 meses e 23 dias para a concessão da aposentadoria propor-cional, considerado o acréscimo de 40%. Assim, na data de entrada do requerimento administrativo, o autor superava o mínimo prescrito para a aposentação em 02 meses e 07 dias. Verifica-se, ainda, que a autor havia implementado o requisito etário na DER, dado que contava com 58 anos de idade (nascimento em 23.01.1953 – fl. 6).”

Sobre o tema, dispõem os arts. 52 e 53, II, ambos da Lei nº 8.213/1991:

“Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a ca-rência exigida nesta Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos, se do sexo masculino.”

“Art. 53. A aposentadoria por tempo de serviço, observado o disposto na Seção III deste Capítulo, especialmente no art. 33, consistirá numa renda mensal de:

I – [...]

II – para o homem: 70% (setenta por cento) do salário-de-benefício aos 30 (trinta) anos de serviço, mais 6% (seis por cento) deste, para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (cem por cento) do salário--de-benefício aos 35 (trinta e cinco) anos de serviço.para a mulher: 70% (setenta por cento) do salário-de-benefício aos 25 (vinte e cinco) anos de serviço, mais 6% (seis por cento) deste, para cada novo ano completo de atividade, até o máximo de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício aos 30 (trinta) anos de serviço.”

No que pertine aos requisitos da regra transitória instituída pela EC 20/1998, quais sejam, idade e pedágio, forçoso destacar sobre o tema o voto proferido pelo eminente Ministro Arnaldo Esteves Lima no julgamento do REsp 797209/MG, DJe 18.05.2009, do qual colho os seguintes excertos, que bem elucidam a controvérsia, in verbis:

“Com efeito, a Emenda nº 20, de 15.12.1998, extinguiu a aposentadoria proporcional, ressalvando o direito adquirido daqueles que tivessem preen-chidos os requisitos na data de sua edição. Dessa forma, para fazer jus à aposentadoria proporcional consoante a regra revogada, o segurado deve preencher os requisitos necessários até a edição da referida emenda. Do con-trário, deverá submeter-se à regra de transição. Por óbvio, não é possível que o segurado venha a se valer da regra nova em uma parte (utilização do tempo posterior ao advento da EC) e ao mesmo tempo escapar da incidência da regra em outra parte, qual seja, a da idade mínima e do pedágio. Contu-do, não é esse o caso dos autos. No que toca à aposentadoria integral, vale lembrar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do

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§ 7º do art. 201 da CF/1988 associava tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem e 30 anos para mulher) à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Como a exigência da idade mínima não foi aprovada pela Emenda nº 20/1998, a regra de transição para a aposentadoria integral restou sem efeito, já que, no texto permanente (art. 201, § 7º, inciso I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência do preenchimento dos requisitos de idade ou ‘pe-dágio’. Ressalta-se, ademais, que as exigências de idade mínima e período adicional, para a aposentadoria integral, antes previstas no art. 188 do Re-gulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/1999), foram suprimidas pelo Decreto nº 4.729, de 09.06.2003, que deu nova redação ao art. 188. A Instrução Normativa nº 118 do INSS, de 14.04.2005 (Estabelece critérios a serem adotados pela área de Benefício), em consonância com o Regulamen-to, disciplinou a concessão da aposentadoria integral sem as exigências do art. 9º, incisos I e II, da EC 20. Confira-se:

Art. 109. Os segurados inscritos no RGPS até o dia 16 de dezembro de 1998, inclusive os oriundos de outro Regime de Previdência Social, desde que cumprida a carência exigida, atentando-se para o contido no § 2º, do art. 38 desta IN, terão direito à aposentadoria por tempo de contribuição nas seguintes situações: I – aposentadoria por tempo de contribuição, conforme o caso, com renda mensal no valor de cem por cento do salário-de-benefício, desde que cumpridos: a) 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; b) 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. II – aposentadoria por tempo de contribuição com renda mensal proporcional, desde que cumpridos os se-guintes requisitos, cumulativamente: a) idade: 53 (cinquenta e três) anos para o homem; 48 (quarenta e oito) anos para a mulher; b) tempo de contribuição: 30 (trinta) anos, se homem, e 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, se mulher; c) um período adicional de contribuição equivalente a quarenta por cento do tempo que, em 16 de dezembro de 1998, faltava para atingir o tem-po de contribuição estabelecido na alínea b deste inciso. A matéria foi bem esclarecida na obra Manual de Direito Previdenciário, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari, 7. ed., LTr, p. 571/572, litteris: ‘As regras de transição previstas para os segurados inscritos no RGPS até 16.12.1998 estão contidas no art. 9º da Emenda Constitucional nº 20/1998. Com relação aos critérios para concessão de aposentadoria integral pelas regras de transição, estas não têm aplicabilidade por serem mais gravosas ao segurado, já que são previstos os seguintes requisitos: a idade mínima, de 53 anos para o homem, e de 48 anos, para a mulher; e, para atingir o tempo de contribuição de trinta e cinco anos, se homem, e de trinta anos, se mulher, o cumprimento de um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltasse para atingir o limite de tempo de contribuição. Essa situação foi reconhecida pelo INSS quando da edição da Instrução Normativa INSS/DC nº 57/2001 e mantido o entendimento con-forme as instruções normativas subsequentes. Ou seja, não se exige idade

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mínima e o pedágio de vinte por cento para a concessão da aposentadoria integral pelas regras de transição. No entanto, a idade mínima e o pedágio de quarenta por cento são exigidos dos segurados que pretendam optar pela aposentadoria proporcional, de acordo com as regras de transição’.”

Assim, considerando o tempo de serviço prestado pela parte autora até 16.12.1998, conforme apurado na sentença, conclui-se que a mesma contava com tempo de serviço mínimo para aposentadoria proporcional, na medida em que alcançou os trinta anos de tempo de serviço anterior à edição da EC 20/1998, a qual assegura a concessão de aposentadoria, a qualquer tempo, aos segurados que tenham preenchido os requisitos exigi-dos até a data de sua publicação, com base nos critérios da legislação então vigente.

Por outro lado, o tempo de contribuição da parte autora não alcança os 35 (trinta e cinco) anos exigidos pelo art. 201, § 7º, inciso I, da Constitui-ção Federal, para a concessão do benefício integral, daí porque merece ser mantida a sentença que reconheceu o seu direito ao benefício proporcional.

As prestações em atraso devem ser corrigidas monetariamente, desde quando devidas as parcelas e os juros de mora devem incidir a partir da citação, nos termos da lei.

A Corte Especial do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, no julga-mento do REsp 1.205.946, publicada em 02.02.2012, da Relatoria do Min. Benedito Gonçalves, sob o rito do art. 543-C do CPC, consignou que a Lei nº 11.960/2009, de 30.06.2009 – que conferiu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 (“Art. 1º-F. Nas condenações impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora, haverá a incidência uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.”) é norma de natureza eminentemente processual e deve ser aplicada de imediato aos processos pendentes.

No julgamento conjunto das ADIs 4.357, 4.327, 4.400 e 4.425, o Su-premo Tribunal Federal assentou a inconstitucionalidade da expressão “na data de expedição do precatório”, contida no § 2º; os §§ 9º e 10; e das ex-pressões “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” e “independentemente de sua natureza”, constantes do § 12, todos disposi-tivos do art. 100 da CF, com a redação dada pela EC 62/2009 (ADI 4.357, Redator para o acórdão o Ministro Luiz Fux, Plenário, DJe 26.09.2014).

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Igualmente restou declarada a inconstitucionalidade, em parte, por arrastamento do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a alteração da Lei nº 11.960/2009, restando assentado que esta norma, ao reproduzir as regras da Emenda Constitucional nº 62/2009 quanto à atualização monetária e à fixação de juros moratórios de créditos inscritos em precatórios, contrariaria o direito à propriedade e o princípio da isonomia.

Deve ser ressaltado que a inconstitucionalidade declarada foi apenas no que se refere à aplicação da Taxa Referencial – TR para a correção mone-tária dos débitos da Fazenda Pública no período entre a inscrição do crédito em precatório e o seu efetivo pagamento.

É bem verdade que, em 16.04.2015, foi reconhecida a repercussão geral quanto ao regime de atualização monetária e juros moratórios inciden-te sobre condenações judiciais da Fazenda Pública, conforme previsão do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009, estando ainda a questão pendente de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (RE 870947 RG/SE).

Em sua manifestação o Ministro Luiz Fux ressaltou:

“No julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a fixação dos juros moratórios com base na TR apenas quanto aos débitos estatais de natureza tributária. Foi o que restou consignado na ementa daquele julgado:

[...]

Pois bem. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar as ADIs 4.357 e 4.425, de-clarou a inconstitucionalidade da correção monetária pela TR apenas quanto ao segundo período, isto é, quanto ao intervalo de tempo compreendido en-tre a inscrição do crédito em precatório e o efetivo pagamento. Isso porque a norma constitucional impugnada nas ADIs (art. 100, § 12, da CRFB, incluído pela EC 62/2009) referia-se apenas à atualização do precatório e não à atua-lização da condenação ao concluir-se a fase de conhecimento.

[...]

A redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, tal como fixada pela Lei nº 11.960/2009, é, porém, mais ampla, englobando tanto a atualização de requisitórios quanto à atualização da própria condenação.

[...]

Na parte em que rege a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública até a expedição do requisitório (i.e., entre o dano efetivo/ajuizamento da demanda e a condenação), o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 ainda não foi objeto de pronunciamento expresso do Supremo Tribunal Fe-

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deral quanto à sua constitucionalidade e, portanto, continua em pleno vigor. Ressalto, por oportuno, que este debate não se colocou nas ADIs 4.357 e 4.425, uma vez que, naquelas demandas do controle concentrado, o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997 não foi impugnado originariamente e, assim, a decisão por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o aludido dispositivo infraconstitucional.

[...]

O julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, sob a perspectiva formal, teve esco-po reduzido. Daí a necessidade e urgência em o Supremo Tribunal Federal pronunciar-se especificamente sobre a questão e pacificar, vez por todas, a controvérsia judicial que vem movimentando os tribunais inferiores e avolu-mando esta própria Corte com grande quantidade de processos.

Manifesto-me pela existência da repercussão geral da seguinte questão cons-titucional: A validade jurídico-constitucional da correção monetária e dos ju-ros moratórios incidentes sobre condenações impostas à Fazenda Pública se-gundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança (Taxa Referencial – TR), conforme determina o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009.”

De todo o exposto e, considerando que esta Corte, a teor da Súmula nº 56 apenas declarou inconstitucional a expressão “haverá a incidência uma única vez”, constante do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, conclui-se que, ao menos até que sobrevenha decisão na referida repercussão geral, para o período anterior à expedição do precatório, permanece válida a alteração perpetrada no artigo pela Lei nº 11.960/2009.

Nesse sentido, tem se manifestado o STF: Rcl 21147 MC, Relª Min. Cármen Lúcia, Julgado em 24.06.2015, publicado em Processo Eletrônico DJe-128, Divulg. 30.06.2015, Public. 01.07.2015 e Rcl 19095, Rel. Min. Gilmar Mendes, J. 26.06.2015, publicado em Processo Eletrônico DJe-128, Divulg. 30.06.2015, Public. 01.07.2015.

Pelo exposto, dou parcial provimento à remessa, nos termos da fun-damentação supra.

É como voto.

Des. Fed. Messod Azulay Neto Relator

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoAgravo em Apelação/Reexame Necessário nº 0002443‑35.2014.4.03.6103/SP2014.61.03.002443‑2/SPRelator: Desembargador Federal Sergio NascimentoAgravante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: SP098659 Marcos Aurelio Camara Portilho Castellanos e outro(a)Advogado: SP000030 Hermes Arrais AlencarInteressado(a): Mauro Ferreira da SilvaAdvogado: SP187040 Andre Gustavo Lopes da Silva e outro(a)Remetente: Juízo Federal da 3ª Vara de S. J. Campos/SPAgravada: Decisão de folhas 171/175Nº Orig.: 00024433520144036103 3ª Vr. São José dos Campos/SP

EMENTA

prevIdeNcIárIo – proceSSo cIvIl – agravo do § 1º, art. 557 do cpc – atIvIdade eSpecIal – expoSIção a ruído – perfIl profISSIográfIco prevIdeNcIárIo e laudo técNIco extemporÂNeoS – IrrelevÂNcIa

I – A extemporaneidade do laudo técnico não afasta a validade de suas conclusões, vez que tal requisito não está previsto em lei e, ade-mais, a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.

II – Independentemente do período, faz prova de atividade especial o laudo técnico e o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, ins-tituído pelo art. 58, § 4º, da Lei nº 9.528/1997, pois ambos trazem a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho.

III – Mantidos os termos da decisão agravada por seus próprios fun-damentos.

IV – Agravo do INSS improvido (art. 557, § 1º do CPC).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,

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por unanimidade, negar provimento ao agravo (art. 557, § 1º, CPC) inter-posto pelo INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 16 de fevereiro de 2016.

Sergio Nascimento Desembargador Federal Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Sérgio Nascimento (Relator): Trata-se de agravo previsto no § 1º do art. 557 do CPC, interposto pelo Ins-tituto Nacional do Seguro Social – INSS em face da decisão de fls. 171/175, que negou seguimento à sua apelação e deu parcial provimento à remessa oficial, mantendo-se a revisão da aposentadoria por tempo de contribuição do autor.

Alega o agravante, em síntese, que não restou comprovado o exercí-cio habitual e permanente de atividade especial, por exposição a ruído, uma vez que o Perfil Profissiográfico Previdenciário e laudo técnico, elaborados em 2006 e 2014, são extemporâneos aos períodos laborados na empresa General Motors do Brasil Ltda.

É o relatório.

Sergio Nascimento Desembargador Federal Relator

VOTO

A parte autora apresentou Perfil Profissiográfico Previdenciário (fls. 72/74) e laudo técnico individual (fls. 123/124), emitidos em 23.08.2006 e 29.01.2014, respectivamente. Tais documentos comprovam que o autor esteve exposto a ruído em nível superior ao limite estabelecido na legisla-ção, de 85 a 87 decibéis (código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/1979, Anexo I), nos períodos de 31.08.1987 a 05.03.1997 e de 19.11.2003 a 23.08.2006, laborados junto à empresa General Motors do Brasil Ltda.

A extemporaneidade do PPP e do laudo técnico não afasta a validade de suas conclusões, vez que tal requisito não está previsto em lei e, ademais,

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a evolução tecnológica propicia condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.

Ademais, independentemente do período, faz prova de atividade es-pecial o laudo técnico e o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, ins-tituído pelo art. 58, § 4º, da Lei nº 9.528/1997, pois ambos trazem a identi-ficação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho.

Destarte, mantidos os termos da decisão agravada por seus próprios fundamentos.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo previsto no § 1º do art. 557 do CPC, interposto pelo INSS.

Sergio Nascimento Desembargador Federal Relator

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 0008033‑78.2015.4.04.9999/RSRelator: Juiz Federal Osni Cardoso FilhoApelante: Lucia Becker KretschmerAdvogado: Andre Luis Anschau Mielke

Fernanda Kohl KrewerApelado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Procuradoria Regional da PFE‑INSS

EMENTA

prevIdeNcIárIo – adIcIoNal de 25% prevISto No art. 45 da leI Nº 8.213/1991 excluSIvameNte para apoSeNtadorIa por INvalIdez – exteNSão a outroS beNefícIoS – ImpoSSIbIlIdade

1. O que se pretende com o acréscimo percentual previsto art. 45 da Lei nº 8.213/1991 é auxiliar financeiramente o segurado que, em face da sua condição de inválido, não seja capaz de, por si só, realizar as mais simples tarefas ordinárias sem o auxílio permanente de terceira pessoa.

2. Desigualdade alguma há quando a legislação previdenciária trata de majorar a aposentadoria por invalidez a todos os que, inativados à conta deste evento (invalidez), necessitarem do auxílio de terceira pessoa.

3. Inviável equiparar situações totalmente distintas, em que a necessi-dade do amparo de terceira pessoa advém de causas dissociadas das que motivaram a inativação, razão pela qual estender o percentual a outros benefícios caracteriza indevida atuação do Poder Judiciário como legislador positivo e viola o princípio da legalidade (arts. 5º, II, e 37, caput, da Constituição Federal).

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente jul-gado.

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Porto Alegre (RS), 27 de janeiro de 2016.

Juiz Federal Osni Cardoso Filho Relator

RELATÓRIO

Lucia Becker Kretschmer interpôs recurso de apelação em face da sentença na qual julgado improcedente o pedido de acréscimo de 25% (vin-te e cinco por cento) ao benefício de aposentadoria por idade que percebe, e que está previsto no art. 45 da Lei nº 8.213, exclusivamente, para o valor da aposentadoria por invalidez.

Com contrarrazões, subiram os autos para julgamento.

VOTO

A disciplina legal da matéria controvertida se encontra no art. 45 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, in verbis:

Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).

Parágrafo único. O acréscimo de que trata este artigo:

a) será devido ainda que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal;

b) será recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado;

c) cessará com a morte do aposentado, não sendo incorporável ao valor da pensão.

O que se pretende, com a concessão do acréscimo percentual é au-xiliar financeiramente o segurado que, em face da sua condição de inváli-do, não seja capaz de, por si só, realizar as mais simples tarefas ordinárias sem o auxílio permanente de terceira pessoa. Esta circunstância, de extrema dependência física, ocasiona gastos adicionais, a que o segurado em con-trapartida poderá enfrentar apenas com seus próprios proventos. Possui na-tureza personalíssima, eis que previsto este acréscimo para atender um risco social determinado do beneficiário, não se transferindo à pensão por morte.

Este incremento na renda mensal dos proventos de aposentadoria por invalidez possui, portanto, caráter assistencial, e para ele, destaque-se, não

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existe qualquer previsão de contribuição específica, pois o segurado não contribui especificamente para fazer-lhe jus, de modo que não se pode as-sociar fonte prévia de custeio para a sua concessão, razão pela qual não há ofensa ao que dispõe o art. 195, § 5º, da Constituição Federal de 1988.

Ocorre que qualquer debate acerca da possível extensão do acrésci-mo a benefícios diversos (que não tenham a invalidez como origem) implica reconhecer, também, que o legislador disse menos do que deveria dizer, o que, de fato, caracterizaria indevida atuação do Poder Judiciário como legislador positivo.

A criação do adicional decorre de mera opção legislativa, não de mandamento explícito da Constituição Federal. Seu sentido é unívoco: con-ceder o adicional apenas aos que estiverem na condição de aposentados por invalidez, o que afasta, em princípio, qualquer vício de inconstitucio-nalidade.

Essa foi, em síntese, a compreensão que prevaleceu na Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que prestigiou o voto minoritário do Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, e o principal argumento que aqui se está utilizando, da violação ao princípio da legalida-de, conforme ementa abaixo reproduzida:

“PROCESSUAL CIVIL – PREVIDENCIÁRIO – EMBARGOS INFRINGENTES – ADICIONAL DE 25% PREVISTO NO ART. 45 DA LEI Nº 8.213/1991 – APO-SENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO – INAPLICABILIDADE

1. O acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria, nos casos em que o titular necessita de assistência permanente de outra pessoa, é devido apenas nos ca-sos de benefício por invalidez. Inteligência do art. 45 da Lei nº 8.213/1991. 2. A extensão do benefício a casos outros que não a aposentadoria por inva-lidez viola os princípios da legalidade (art. 5º, II e 37, caput, da Constituição Federal) e da contrapartida (art. 195, § 5º, da Constituição Federal). 3. A falta de igual proteção a outros beneficiários com igual necessidade de assistência não constitui necessária lacuna ou violação da igualdade, pela razoável com-preensão de que ao inválido o grau de dependência é diretamente decorren-te da doença motivadora do benefício – isto não se dando automaticamente nos demais benefícios previdenciários. 4. A extensão do auxílio financeiro pela assistência ao inválido para outros benefícios previdenciários é critério político, de alteração legislativa, e não efeito de inconstitucionalidade legal. 5. Embargos infringentes aos quais se dá provimento.” (Embargos Infringentes nº 0019056-55.2014.404.9999/SC, Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira, por maioria, DE 01.06.2015, publicação em 02.06.2015)

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Nessa mesma linha, é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justi-ça, cassando, inclusive, julgado da Quinta Turma deste Tribunal:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – NÃO OCORRÊNCIA – ADICIONAL DE 25% (VINTE E CINCO POR CENTO) DE QUE TRATA O ART. 45 DA LEI Nº 8.213/1991 – INCIDÊNCIA EM BENEFÍCIO DIVERSO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ – IM-POSSIBILIDADE

1. Não ocorre ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem dirime, fundamentadamente, as questões que lhe são submetidas, aprecian-do integralmente a controvérsia posta nos autos, não se podendo, ademais, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou au-sência de prestação jurisdicional. 2. O art. 45 da Lei nº 8.213/1991, ao tratar do adicional de 25% (vinte e cinco por cento), restringiu sua incidência ao benefício da aposentadoria por invalidez, na hipótese de o segurado neces-sitar de assistência permanente de outra pessoa, cujo acréscimo, entretanto, não poderá ser estendido a outras espécies de benefícios. 3. Recurso especial provido.

(REsp 1533402/SC, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 01.09.2015, DJe 14.09.2015)

No excelente artigo Igualdade perante a Lei e Due Process of Law – Contribuição ao estudo da limitação constitucional do Poder Legislativo (In: ________. Problemas de direito positivo: estudos e pareceres. Rio de Janeiro 1953. p. 38-64), F.C. de San Tiago Dantas dá bem a noção do que me pare-ce aplicável à solução da situação jurídica posta em questão.

A primeira distinção que limita constitucionalmente a função legis-lativa, afirma este autor, é a generalidade da lei. A lei é geral, sempre que o seu preceito se aplica a qualquer indivíduo que se venha a encontrar na situação típica nela considerada.

Assim, desigualdade alguma há, quando a legislação previdenciária trata de majorar a aposentadoria por invalidez quando, a todos os que, ina-tivados à conta deste evento (invalidez), necessitarem do auxílio de terceira pessoa.

Não há aí, para ficar ainda na expressão do doutrinador referido, dis-tinção arbitrária, porque a renda do benefício passa a ser maior por força de uma situação específica associada à acentuação da invalidez originária.

Neste contexto, a saber, de que somente é devido o acréscimo a quem tem seu estado de saúde agravado por conta de um evento inicial ou simultâneo que lhe causou a invalidez, não há como equiparar-lhe si-

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tuações totalmente distintas em que a necessidade do amparo de terceira pessoa advém de causas dissociadas das que motivaram a inativação (idade e tempo de contribuição, por exemplo).

Para lembrar pela derradeira vez o estudo mencionado acima: Sem-pre que a diferenciação feita (na lei) corresponde, no nosso sentir, a um re-ajustamento proporcional de situações desiguais, a lei satisfaz os requisitos de uma lei justa.

Logo, não deve o percentual ser estendido a outros benefícios, sob pena de violação ao princípio da legalidade.

Mantidos os ônus sucumbenciais conforme fixados em sentença, cuja exigibilidade permanece suspensa em razão da parte autora ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.

preQueStIoNameNto

Para fins de possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais susci-tadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expres-samente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronuncia-mento judicial em sentido diverso do que está declarado.

Em face do que foi dito, voto por negar provimento à apelação.

Juiz Federal Osni Cardoso Filho Relator

ExTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27.01.2016

Apelação Cível nº 0008033-78.2015.4.04.9999/RS

Origem: RS 00011292720148210119

Relator: Juiz Federal Osni Cardoso Filho

Presidente: Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida

Procurador: Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontella

Apelante: Lucia Becker Kretschmer

Advogado: Andre Luis Anschau Mielke Fernanda Kohl Krewer

Apelado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Advogado: Procuradoria Regional da PFE-INSS

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������187

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27.01.2016, na sequência 925, disponibilizada no DE de 15.01.2016, da qual foi intimado(a) Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.

Relator Acórdão: Juiz Federal Osni Cardoso Filho

Votante(s): Juiz Federal Osni Cardoso Filho Des. Federal João Batista Pinto Silveira Desª Federal Vânia Hack de Almeida

Gilberto Flores do Nascimento Diretor de Secretaria

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Acórdão na Íntegra

33439

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoGabinete do Desembargador Federal Rubens CanutoApelação/Reexame Necessário nº 33177/CE (0004276‑49.2015.4.05.9999)Apelante: INSS – Instituto Nacional do Seguro SocialRepte.: Procuradoria Representante da EntidadeApelado: Tereza Cecilia Menescal CarneiroAdv./Proc.: Antonio Washington Frota e outrosRemte.: Juízo de Direito da 2ª Vara da Comarca de Massapé/CEOrigem: 2ª Vara da Comarca de Massapê/CERelator: Des. Fed. Edilson NobreRelator p/ Acórdão: Des. Fed. Rubens Canuto

EMENTA

prevIdeNcIárIo – beNefícIo – peNSão por morte – INStItuIdor da peNSão – coNtrIbuINte INdIvIdual – dívIda com o INSS relatIva ao período de 04/1995 a 01/2003 – parcelameNto – leI Nº 10.684/2003 – pagameNto de apeNaS 06 (SeIS) parcelaS de um total de 89 (oIteNta e Nove) – INdeferImeNto do beNefícIo Na vIa admINIStratIva pela perda da QualIdade de Segurado do falecIdo – apelação do INSS e remeSSa ofIcIal provIdaS

1. Trata-se de apelação e remessa oficial contra sentença que jul-gou procedente o pedido de concessão de pensão por morte da par-te autora, ora apelada, desde a data do requerimento administrativo (08.01.2009), bem como de pagamento das parcelas atrasadas, res-peitada a prescrição quinquenal, acrescidos de juros de mora, corre-ção monetária e honorários advocatícios de 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos da Súmula nº 111/STJ.

2. Benefício de pensão por morte que foi indeferido pelo INSS, em razão de o falecido ter perdido a qualidade de segurado do RGPS – Regime Geral da Previdência Social bem antes do evento morte.

3. Na espécie, constata-se que o instituidor da pensão (contribuinte individual) requereu em 26.08.2003 o parcelamento, nos termos da Lei nº 10.684/2003, de sua dívida junto à Previdência Social, corres-pondente ao período de 04/1995 a 01/2003.

4. O saldo devedor de R$ 4.711,25 que foi dividido em 89 parce-las mensais, onde foram recolhidas apenas 06 parcelas no valor de

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R$ 52,00 cada, compreendendo o período de 31.08.2003 (primeira) a 20.01.2004 (última). Depois do supracitado período, o de cujus somente veio a recolher outra prestação da mencionada dívida em 20.04.2007 (competência 04/2007), ou seja, 03 anos e 04 meses após o último pagamento.

5. Caso em que o recolhimento desta última prestação (competência 04/2007), 01 mês e 19 dias antes do óbito do instituidor da pensão (08.06.2007), quando este só havia adimplido 06 seis prestações refe-rente a uma dívida de 07 anos com a Previdência, foi realizado ape-nas com o intuito de restabelecer a condição de segurado do falecido e, por consequência, obter o benefício de pensão por morte para a apelada que, até então, não possuía tal direito.

6. Ao contrário, se o de cujus, após o deferimento do parcelamento da dívida em 2003, viesse cumprindo fielmente suas obrigações mês a mês, não haveria o que se discutir, a pensão seria devida. Todavia, parou de realizar os pagamentos acordados anteriormente com a Pre-vidência.

7. Adimplemento da última prestação que não é suficiente para o res-tabelecimento da qualidade de segurado do falecido. Pelo contrário, vislumbra-se aí um caráter de burlar a previdência neste pagamento, feito exclusivamente com a finalidade de obtenção da pensão por morte sem o adimplemento das contribuições previdenciárias de-vidas.

8. Apelação e remessa oficial providas.

ACÓRDÃO

Vistos, etc.

Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, dar provimento à apelação e à remessa oficial, unanimidade, nos termos do Relatório, Voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 02 de fevereiro de 2016 (data de Julgamento).

Des. Fed. Rubens Canuto Relator p/ Acórdão

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VOTO-CONDUTOR

O Sr. Des. Fed. Rubens Canuto (Relator):

Trata-se de pedido de concessão de pensão por morte que foi indefe-rido pelo INSS, com fundamento no fato de que o falecido havia perdido a qualidade de segurado do RGPS – Regime Geral da Previdência Social bem antes do evento morte.

Apesar de o Voto do Exmo. Sr. Des. Fed. Edílson Pereira Nobre Júnior assegurar a concessão do benefício, venho data máxima venia divergir da r. decisão proferida pelo nobre Magistrado.

É que, no presente caso, não é possível reconhecer a manutenção da qualidade de segurado do instituidor da pensão no momento do óbito. Compulsando os autos (fls. 38/39), constata-se que o falecido (contribuin-te individual) requereu em 26.08.2003 o parcelamento, nos termos da Lei nº 10.684/2003, de sua dívida junto à Previdência Social, correspondente ao período de 04/1995 a 01/2003.

De acordo com a documentação colacionada ao feito (Sistema de Cobrança – Extrato de Parcelamento Especial, fls. 38/39), o saldo devedor de R$ 4.711,25 foi dividido em 89 parcelas mensais. Foram recolhidas ape-nas 06 parcelas no valor de R$ 52,00 cada, compreendendo o período de 31.08.2003 (primeira) a 20.01.2004 (última). Depois do supracitado perío-do, o de cujus somente veio a recolher outra prestação da mencionada dí-vida em 20.04.2007 (competência 04/2007, fl. 12), ou seja, 03 anos e 04 meses após o último pagamento.

Nesta senda, entendo que o recolhimento desta última prestação (competência 04/2007), 01 mês e 19 dias antes do óbito do instituidor da pensão (08.06.2007, fl. 14), quando este só havia adimplido 06 (seis) pres-tações referente a uma dívida de 07 anos com a Previdência, foi realizado apenas com o intuito de restabelecer a condição de segurado do falecido e, por consequência, obter o benefício de pensão por morte para a apelada que, até então, não possuía tal direito.

Ao contrário, se o de cujus, após o deferimento do parcelamento da dívida em 2003, viesse cumprindo fielmente suas obrigações mês a mês, não haveria o que se discutir, a pensão seria devida. Todavia, parou de re-alizar os pagamentos acordados anteriormente com a Previdência. Por isso, não considero esta última prestação suficiente para fins de restabelecimento da qualidade de segurado do falecido. Pelo contrário, vejo um caráter de burlar a previdência neste pagamento, feito exclusivamente com a finalida-

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ����������������������������������������191

de de obtenção da pensão por morte sem o adimplemento das contribui-ções previdenciárias devidas.

Pedindo todas as vênias, voto no sentido de dar provimento à apela-ção do INSS e à remessa oficial, deixando de condenar a parte autora em custas e honorários advocatícios, em face do deferimento da justiça gratuita (fl. 18).

É como voto.

Parte Geral – Jurisprudência Previdenciária – Ementário33440 – Ação acidentária – fratura da tíbia e da fíbula da perna esquerda decorrente de uma

partida de futebol – acidente do trabalho – não configuração – efeitos

“Apelação. Ação acidentária. Fratura da tíbia e da fíbula da perna esquerda decorrente de uma partida de futebol, não resultante de acidente de trabalho. Infortúnio que não possui qualquer relação com a atividade laboral. Prestação de natureza previdenciária. Sentença prolatada por magistrado no exercício de competência federal delegada. Art. 108, inc. II e do art. 109, § 3º, ambos da CF. Faculdade concedida ao Tribunal Regional Federal da 4ª região para apreciar e julgar a questão. Não conhecimento. Declínio da competência. ‘[...] Inexistindo na comarca vara da Justiça Federal, o juiz estadual é competente para conhecer e julgar os feitos que se refiram a benefício de natureza previdenciária. No entanto, o recurso cabível será sempre para o Tribunal Regional Federal na área de jurisdição do juiz de primeiro grau [...]’ (AC 2011.034584-3, de Curitibanos, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, J. 01.11.2011) (TJSC, Apelação Cível nº 2013.058537-1, de Forquilhinha, Rel. Des. Carlos Adilson Silva, J. 23.06.2015).” (TJSC – AC 2015.038635-3 – Rel. Des. Luiz Fernando Boller – DJe 18.12.2015)

Comentário Editorial SÍnTESECuida a ementa em destaque da não configuração do acidente do trabalho sofrido pelo atleta.

Ocorre que, o autor não apresentou os documentos que comprovassem o acidente sofrido, entre eles a CAT – Comunicado de Acidente do Trabalho, entendo assim, o Tribunal, pelo não reconhecimento do acidente.

Acerca do acidente do trabalho, destacamos o seguinte trecho de autoria da Dra. Cristiane Ribeiro da Silva:

“O exercício de qualquer atividade profissional provoca riscos, por isso, em quase todos os países a preocupação com a proteção do trabalhador vem prevista nas próprias Constituições, como é o caso das Constituições do México, Portugal, Cuba, Espanha, da extinta União So-viética e Peru.

No Brasil, a higiene e segurança do trabalho passou a ser prevista na Constituição Federal apenas em 1946 (art. 154, VIII), o que permaneceu na Constituição de 1967, reformulada em 1969 (art. 165, IX), e foi reforçada na Magna Carta de 1988.

A Constituição de 1988, por meio de seu art. 7º, XXII, inclui entre os direitos sociais do tra-balhador a ‘redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança’, determina, ainda, o pagamento de ‘adicionais de remuneração’ ao empregado que executa ‘atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei’. Preceitua também o mencionado artigo, em seu inciso XXVIII, o ‘seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa’.

Desde o advento da Lei nº 5.316/1967, o acidente do trabalho passou a ser uma prestação previdenciária, cuidando-se de forma de seguro social de responsabilidade do INSS, sendo mantida pelas legislações posteriores, incluindo as Leis nºs 6.367/1976 e 8.213/1991.

No nível hierárquico da norma ordinária, a Constituição Federal de 1988 está regulamentada pelas Leis nºs 8.212/1991 e 8.213/1991, que correspondem, respectivamente, ao custeio e aos benefícios. Portanto, no âmbito destas duas leis figuram o custeio e os benefícios do programa de acidentes do trabalho.

O acidente do trabalho, em significação estrita, é o chamado acidente-tipo, ou seja, o que acarreta perturbação funcional – física ou mental – ou lesão corporal, ou ainda, resulta em morte ou incapacidade laborativa – temporária ou permanente, total ou parcial, sendo que, em sentido amplo e por extensão, são considerados acidentes do trabalho outros infortúnios, como a doença profissional, também referida como doença profissional típica (moléstias ca-racterísticas de certas ocupações ou inerentes à peculiaridade da profissão e não ao trabalho), e, finalmente, a doença do trabalho (moléstias profissionais atípicas, adquiridas ou desenca-deadas, ou ainda, agravadas por condições especiais de trabalho).

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO ���������������������������������������������������������193

Apesar do adequado sistema legal vigente no Brasil acerca do acidente do trabalho e medidas preventivas, ainda é alarmante o número de infortúnios verificados, sendo as principais causas de sua ocorrência:

a) falta de conscientização de empregadores e empregados para a importância quanto à pre-venção dos acidentes de trabalho, sendo que muitos empregados não aceitam usar os equi-pamentos de proteção individual e preferem receber os adicionais sobre o salário ao invés de insistir junto às Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (Cipas) e aos sindicatos para que a empresa elimine ou neutralize os riscos de acidente e doenças profissionais. Os empre-gadores, por sua vez, não procedem a reforma de seus estabelecimentos no sentido de eliminar ou reduzir os riscos de acidentes e doenças;

b) formação profissional inadequada, quase sempre sem transmitir ao trabalhador noções fundamentais de prevenção de acidentes correlacionadas com o ofício ensinado;

c) jornadas de trabalho com horas extraordinárias, o que se agrava nas grandes cidades face aos longos períodos de transporte incômodo e fatigante;

d) alimentação insuficiente e imprópria para o trabalhador;

e) prestação de serviços insalubres em jornadas de trabalho concernentes às atividades nor-mais, quando o recomendável é o encurtamento do período de trabalho, e não o adicional de salário, a fim de limitar a agressão dos agentes físicos e químicos a níveis de tolerância.

Os principais reflexos quanto às ocorrências de acidentes do trabalho, das doenças profissio-nais e doenças do trabalho são, basicamente:

a) a estabilidade no emprego;

b) outras reparações, consistentes em danos materiais e danos morais;

c) por vezes as cumulações de ações, com pedidos decorrentes do mesmo fato, propiciando reclamações trabalhistas e reclamações na Justiça Comum (pedido de reintegração num foro e pensão vitalícia em outro, por exemplo), e, ainda, a propositura de ação acidentária contra o INSS, consoante art. 7º, XVIII, da Constituição Federal.

[...]

Consultando-se o dicionário jurídico, Angher (2002, p. 18) conceitua acidente do trabalho como o ‘Sinistro sofrido pelo empregado, decorrente da relação de emprego, causando lesão corporal ou perturbação funcional causadora de morte, perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade de trabalho’.

No Brasil, o acidente do trabalho foi disciplinado pelo Decreto Legislativo nº 3.724/1919, Decreto nº 24.637/1934, Decreto-Lei nº 7.036/1944, Decreto-Lei nº 293/1967, Lei nº 5.316/1967, Lei nº 6.367/1976 e, finalmente, pela Lei nº 8.213/1991, a qual encontra-se em vigor e traz, em seu art. 19, o conceito de acidente do trabalho:

‘[...] é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do tra-balho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.’” (Acidente do trabalho e responsabilidade civil do empregador. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 04 fev. 2016)

33441 – Ação previdenciária – adimplemento de débitos judiciais comuns – impenhorabili-dade – ocorrência

“Agravo de instrumento. Processo civil. Previdenciário. Penhora no rosto dos autos de ação previdenciária. Adimplemento de débitos judiciais comuns. Impenhorabilidade. Violação ao disposto nos arts. 649, IV, do CPC, e 114 e 115 da Lei nº 8.213/1991. 1. O rol de possibili-dades de descontos a serem efetuados no benefício previdenciário do segurado previsto no art. 115 da Lei de Benefícios, e repetido no art. 154 do Decreto nº 3.048/1999, é exaustivo/taxativo. 2. Viola o disposto nos arts. 649, IV, do CPC, e 114 e 115 da Lei nº 8.213/1991 a decisão que determina a penhora no rosto dos autos de ação previdenciária para que os valores decorrentes da condenação judicial sirvam de adimplemento de débitos comuns, ain-

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da que reconhecidos em juízo, na medida em que inexiste previsão legal nesse sentido.” (TRF 4ª R. – AI 0004202-46.2015.4.04.0000/RS – 6ª T. – Relª Desª Fed. Vânia Hack de Almeida – DJe 02.12.2015 – p. 231)

33442 – Aposentadoria especial – segurado individual – tempo de serviço prestado em con-dições prejudiciais à saúde ou integridade física – possibilidade

“Previdenciário. Aposentadoria especial. Segurado individual. Tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à saúde ou integridade física. Possibilidade. 1. O art. 57 da Lei nº 8.213/1991, que regula a aposentadoria especial, não faz distinção entre os segurados, abrangendo também o segurado individual (antigo autônomo), estabelecendo como requisito para a concessão do benefício o exercício de atividade sujeita a condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física do trabalhador. 2. O contribuinte individual faz jus ao reco-nhecimento de tempo de serviço prestado em condições especiais, desde que seja capaz de comprovar o exercício de atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física, nos moldes previstos à época em realizado o serviço – até a vigência da Lei nº 9.032/1995 por enquadramento nos Decretos nºs 53.831/1964 e 83.080/1979 e, a partir da inovação legislativa, com a comprovação de que a exposição aos agentes insalubres se deu de forma habitual e permanente. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.398.098 – (2013/0265822-2) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 04.12.2015 – p. 581)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 319, jan. 2016, ementa nº 33211 do TRT 13ª R.

33443 – Aposentadoria especial – trabalho em condições especiais – ruído – uso de EPI – irrelevância – benefício devido

“Previdenciário. Aposentadoria especial. Tempo laborado em condições especiais. Ruído. Intensidade superior ao limite de tolerância de acordo com o PPP. Aferição da média do ruído deve ser admitida. Agentes químicos previstos na legislação. Uso de EPI. Jurisprudência do STF. Juros e correção. Observância do manual. 1. O cômputo do tempo de serviço para fins previdenciários deve observar a legislação vigente na época da prestação laboral, conforme § 1º, art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com redação do Decreto nº 4.827/2003. 2. Quanto ao agente nocivo ruído, considera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos supe-riores a 80 decibéis até 05.03.1997; de 06.03.1997 a 18.11.2003, superiores a 90 decibéis, e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferida a pressão sonora por meio de laudo ou perícia técnica, constante dos autos ou noticiado no formulário expedido pelo em-pregador. 3. O nível equivalente de pressão sonora (ruído médio) tem o mesmo potencial de lesão auditiva que um nível constante de pressão sonora mesmo intervalo de tempo, sendo o nível médio suficiente para comprovar pressão sonora capaz de lesionar a saúde e justificar a insalubridade. 4. No julgamento do ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, Julgado em 04.12.2014, DJe-029 de 12.02.2015, em termos simplificados, o E. STF, ao interpretar o art. 201, § 1º, da CR/1988, com repercussão geral, assim se posicionou: a) não há presunção absoluta de ineficácia do EPI para neutralização do agente nocivo, isto é, há possibilidade de realização de prova da eficácia do EPI; b) no caso do agente ruído, apenas a informação do PPP de neutralização da agressividade não é suficiente para comprovar a neutralização pelo EPI e há necessidade de prova mais robusta para comprovar a eficácia do EPI. 5. O autor comprovou através dos PPPs a exposição a ruídos superiores aos limites de tolerância em parte dos períodos e a agentes químicos previstos na legislação o que lhe garante o direito à contagem dos períodos pleiteados como tempo de serviço especial e resulta em tempo de

RST Nº 323 – Maio/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA PREVIDENCIÁRIA – EMENTÁRIO ���������������������������������������������������������195

serviço especial superior a 25 anos na data do requerimento. Concessão de aposentadoria especial. Manutenção. 6. Sobre os valores dos benefícios atrasados devem incidir juros mo-ratórios desde a notificação ou desde quando devidos, se posteriores à notificação, além de correção monetária desde quando cada benefício for devido, utilizando-se os percentuais de juros e índices de correção para os débitos previdenciários constantes do Manual de Cálcu-los da Justiça Federal, Res. CFJ 267/2013, compensando-se eventuais benefícios inacumu-láveis recebidos em período concomitante, restrita a execução às parcelas devidas a partir do ajuizamento. 7. Remessa oficial parcialmente provida e apelação do INSS não provida.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 2007.38.00.006276-5/MG – Rel. Juiz Fed. Márcio José de Aguiar Barbosa – DJe 07.12.2015 – p. 621)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 321, mar. 2016, ementa nº 33375 do TRF 4ª R.

33444 – Aposentadoria por idade – períodos de trabalho urbano do falecido marido da au-tora – inclusão – recálculo da RMI – recebimento das diferenças desde o requeri-mento administrativo – efeitos

“Previdenciário. Agravo legal. Revisão de aposentadoria por idade. Inclusão de períodos de trabalho urbano do falecido marido da autora. Recálculo da RMI. Recebimento das diferenças desde o requerimento administrativo. Correção monetária. Decisão mantida. Recurso impro-vido. Agravos legais da Autarquia Federal e da parte autora insurgindo-se contra a decisão monocrática que deu parcial provimento ao apela da autora. As anotações na CTPS do ma-rido da requerente não apresentam qualquer indício de irregularidade que justifique sua não aceitação pela Autarquia. Não há, enfim, motivo para que a Autarquia não os reconheça. Devem ser computados os períodos de trabalho anotados na CTPS do marido da autora, in-clusive os mantidos de 02.08.1971 a 20.09.1971, 01.11.1971 a 19.06.1972 e 08.07.1976 a 25.12.1980. No recálculo da RMI, devem ser considerados os salários-de-contribuição cons-tantes no CNIS, e, quando ausentes, os anotados na CTPS, observados os tetos legais, eis que é atribuição do INSS fiscalizar os recolhimentos previdenciários, não podendo o trabalhador ser penalizado pela ausência destes, a cargo da empresa, aos cofres da Previdência. O valor do auxílio-acidente também deverá ser incluído, para fins de cálculo, no salários-de-contri-buição. A aposentadoria do falecido segurado teve DIB em 27.03.2008, posteriormente à edi-ção da Lei nº 8.213/1991, sendo, portanto, regida pelos seus dispositivos, com as pertinentes alterações, em especial a que modificou a redação do art. 86. Lei nº 9.528, de 10.12.1997 para vedar a cumulação de qualquer aposentadoria com o auxílio-acidente. Sobrevindo a Lei nº 9.528/1997, o valor mensal do auxílio-acidente, pode integrar os salários-de-contribuição computados no cálculo da aposentação. A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a data desta decisão, considerando que o pedido foi julgado impro-cedente pelo juízo a quo. Em vista da necessidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos afetos à Justiça Federal de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E. Corte de Justiça, a fim de orientar e simplificar a pesquisa dos proce-dimentos administrativos e processuais, que regulam o funcionamento da Justiça Federal na Terceira Região, foi editada a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Fede-ral da 3ª Região – Provimento Coge nº 64, de 28 de abril 2005, que impôs obediência aos cri-térios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal. A correção monetária incidirá nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado, em obediên-cia ao Provimento Coge nº 64/2005. A decisão monocrática com fundamento no art. 557,

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caput e § 1º-A, do CPC, que confere poderes ao relator para decidir recurso manifestamente improcedente, prejudicado, deserto, intempestivo ou contrário a jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, sem submetê-lo ao órgão colegiado, não importa em infringência ao CPC ou aos princípios do direito. É assente a orientação pretoriana no sentido de que o órgão colegiado não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não estiver devidamente fundamen-tada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e abuso de poder, e for passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte. Agravos improvidos.” (TRF 3ª R. – Ag-AC 0002538-64.2012.4.03.6126/SP – 8ª T. – Relª Desª Fed. Tania Marangoni – DJe 22.01.2016 – p. 3051)

33445 – Aposentadoria por idade – rurícola – coisa julgada – extinção do feito – condena-ção em litigância por má-fé, custas e honorários – beneficiária da justiça gratuita – efeitos

“Previdenciário e processual civil. Aposentadoria por idade. Trabalhadora rural. Coisa julga-da. Extinção do feito. Condenação em litigância por má-fé, custas e honorários. Beneficiária da justiça gratuita. Pedido de desistência da ação formulado pela autora antes da prolação da sentença. Contestação que alega matéria preliminar. Desnecessidade de intimação do réu ante o seu interesse de ver o feito extinto sem exame do mérito. Homologação do pedido de desistência. Litigância de má-fé, custas processuais e honorários advocatícios excluídos. I – Apelação interposta contra sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito, ante a existência de coisa julgada, e condenou a demandante, bem como o seu advogado, ao pagamento de multa de 1% (um por cento) sobre o valor atribuído à causa, por litigância de má-fé. Condenou ainda a parte autora em custas e em honorários no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), mas com o benefício do art. 12 da Lei nº 1.060/1950. II – Irresignada, apela a autora pugnando pela reforma da sentença, alegando que o magistrado deixou de apreciar o pedido de desistência por ela formulado. Pede que seja afastada a condenação por litigância de má-fé, aduzindo que a ação é lastreada em novo requerimento administrativo, datado de 15.10.2009 (fl. 30), o qual se deu após o trânsito em julgado da primeira demanda em 02.03.2009 (fl. 43). Requer a anulação da sentença para que seja apreciado o pedido de desistência. III – Contrarrazões do INSS argumentando a existência de coisa julgada e a cor-reção da sentença em condenar a demandante por litigância de má-fé. Pleiteia a manutenção da sentença recorrida. IV – O Código de Processo Civil permite ao autor desistir da ação judicial até a prolação da sentença, porém ressalva que tal pedido necessitará da anuência do réu depois de oferecida a sua resposta, conforme estabelecido no art. 267, VIII e § 4º. V – Compulsando os autos, observa-se que a demandante apresentou pedido de desistência posteriormente à resposta da ré (contestação às fls. 34/40). O magistrado deixou de intimar o INSS para manifestar-se sobre sua concordância ou não quanto ao pedido em questão, violando, pois, o art. 267, § 4º do CPC. VI – Embora o natural procedimento, nesses casos de ausência de intimação da parte ré para manifestar-se sobre o pedido de desistência do requerente, seja a anulação da sentença para que seja realizada tal intimação, observa-se que a doutrina vem permitindo a extinção do processo, desde logo, caso o demandado invoque em sua contestação uma matéria preliminar. Nesses casos, conclui-se que é do interesse do próprio postulado a extinção de feito sem exame do mérito. VII – Nas palavras do eminente jurista Fredie Didier: ‘No entanto, mesmo se houver resposta do réu, é possível cogitar de hipótese em que a anuênia é despicienda. Imagine-se a situação em que o próprio réu, em sua defesa, requer a extinção do processo sem julgamento de mérito. Neste caso, não teria como o réu rejeitar a desistência apresentada, por absoluta falta de interesse – para contestar é necessário ter interesse, afirma o art. 3º do CPC. É que a desistência do demandante lhe pro-

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porciona o exato resultado almejado: a extinção do processo sem exame do pedido. A recusa do consentimento não pode ser fruto do mero capricho do réu’ (DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. 12 ed. amp. e atual. Salvador: Editora Jus Podivm, 2010, v. 1, p. 562). VIII – Como o INSS apresentou, em sua contestação, o óbice coisa julgada, demonstrando seu interesse na extinção da demanda sem apreciação do mérito, nos termos do art. 267, V, é despicienda sua intimação, no caso, para se manifestar sobre o pedido de desistência formulado pela autora à fl. 72. IX – Resta afastada, também, a litigância por má-fé da postulante. Ademais, por ser beneficiária da jus-tiça gratuita, não há que se falar em condenação da autora/apelante em custas ou honorários advocatícios. X – Apelação provida para homologar o pedido de desistência e extinguir o pro-cesso sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, V, do CPV, afastando ainda a condena-ção da autora em litigância de má-fé, nas custas processuais e nos honorários advocatícios.” (TRF 5ª R. – AC 0003529-02.2015.4.05.9999 – (584597/SE) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Conv. Ivan Lira de Carvalho – DJe 29.01.2016 – p. 85)

33446 – Aposentadoria por idade – rurícola – regime de economia familiar – reconheci-mento

“Previdenciário. Benefício. Aposentadoria por idade. Trabalhadora rural. Segurada especial. Regime de economia familiar. Documentos insuficientes à aferição da efetiva atividade cam-pesina. Improcedência do pedido. O trabalhador rural tem direito à aposentadoria especial, aos 60 (sessenta) anos, se homem, e aos 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher (art. 201, § 7º, II, CF/1988), comprovados o exercício de labor no campo e o período de carência (art. 143, da Lei nº 8.213/1991). A prova da atividade rural deve ser feita na forma prevista no art. 106 da Lei nº 8.213/1991. Contudo, ante as reconhecidas dificuldades daqueles que vivem na zona rural, em sua maioria desprovidos de qualquer registro de seu trabalho, a juris-prudência tem admitido que a comprovação seja feita mediante início de prova documental, corroborado por depoimentos testemunhais. No caso, para a concessão do benefício de apo-sentadoria por idade, na qualidade de segurada especial, a autora terá que comprovar o exer-cício da atividade rural no período de 1996 a 2010, que corresponde ao período anterior ao requerimento administrativo do benefício, no número de meses igual ao da carência prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/1991 (174 meses). O requisito da qualidade de segurada especial não restou demonstrado pela requerente, porquanto os documentos colacionados são frágeis e insuficientes para demonstrar a atividade agrícola. Observa-se que a declaração do Sindica-to dos Trabalhadores Rurais foi produzida no mesmo dia em que a autora solicitou o benefício na via administrativa, além de não constar a data da filiação da requerente. A mesma fragilida-de de prova é a Declaração fornecida pela loja comercial de produtos agropecuários, vez que não consta a data em que foi emitida. Não restou comprovado pela parte autora o desenvol-vimento da atividade rurícola no período exigido na legislação, ainda que de forma descontí-nua, como tem admitido a jurisprudência, não sendo admitido, pois, a prova exclusivamente testemunhal para fins de demonstrar o exercício do labor agrícola (Súmula nº 149/STJ). Apela-ção improvida. AC 584947/CE.” (TRF 5ª R. – AC 0003742-08.2015.4.05.9999 – (584947/CE) – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Conv. Rubens de Mendonça Canuto Neto – DJe 03.12.2015 – p. 84)

Comentário Editorial SÍnTESENa ementa em estudo foi analisado, para a concessão do benefício de aposentadoria por idade, o reconhecimento do regime de economia familiar.

Na Lei nº 8.213/1991, art. 11, § 1º, encontramos o seguinte conceito:

“Art. 11. […]

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[...]

§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos mem-bros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. (Redação dada ao parágrafo pela Lei nº 11.718, de 20.06.2008, DOU 23.06.2008)”

Nesse sentido, transcrevemos o trecho da lição do Magistrado Dr. Nylson Paim de Abreu:

“Como se verifica do cotejo dos textos legais antes transcritos, resta evidente que o legislador buscou no sistema normativo agrário a definição do regime de economia familiar, para os efeitos previdenciários, porquanto o mesmo está compreendido na definição de propriedade familiar insculpida no art. 4º, II, do Estatuto da Terra. É o que se extrai dos textos da LC 11/1971 (art. 3º, § 1º, b) e das Leis nºs 8.212/1991 (art. 12, § 1º), 8.213/1991 (art. 11, § 1º) e Decreto nº 3.048/1999 (art. 9º, § 5º), cuja simetria encontra parâmetro no art. 4º, II, da Lei nº 4.504/1964 e no Decreto-Lei nº 1.166/1971 (art. 1º, I, b, com a nova redação dada pela Lei nº 9.701/1998).

Outrossim, sobreleva anotar que, segundo o teor do Decreto-Lei nº 1.166/1971, que trata do enquadramento sindical das atividades laboratícias rurais, o regime de economia familiar pode comportar duas classificações: a) trabalhador rural (não empregado): ‘quem, proprietário ou não, trabalhe individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da mesma família, indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração, ainda que com ajuda eventual de terceiros’ (art. 1º, I, b); b) empresário ou empregador rural: ‘quem, proprietário ou não, e mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência e progresso social e econômico em área superior a dois módulos rurais da respectiva região’ (art. 1º, II, b).

Por conseguinte, o regime de economia familiar definido no art. 1º do Decreto-Lei nº 1.166/1971 estabelece duas situações distintas, com repercussões no âmbito da Previdên-cia Social. Na primeira hipótese, o regime de economia familiar abrange os trabalhadores ru-rais cuja atividade agrícola ou pastoril seja exercida pelos membros da família, com a absorção de toda a força de trabalho, e o resultado econômico seja indispensável à própria subsistência. Além disso, a área de exploração do imóvel não pode ser superior a dois módulos rurais. Na segunda hipótese, o regime familiar compreende a absorção de toda a força de trabalho, que garanta a subsistência e o progresso social e econômico do grupo familiar, exercido em área superior a dois módulos rurais.

Como se vê, na primeira situação enquadram-se os segurados especiais descritos no art. 11, VII, da Lei nº 8.213/1991: produtor, parceiro, meeiro, arrendatário rural, pescador e seus as-semelhados. Na segunda, os segurados equiparados a trabalhador autônomo, mencionados no inc. V, do art. 11, daquela norma previdenciária: pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com o auxílio de empregado, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua.

Nesse aspecto é pertinente a lição do Professor Odonel Urbano Gonçalves: ‘No § 8º do art. 195 da CF, todas as pessoas ali apontadas (produtor, parceiro, meeiro, arrendatário, garimpeiro e pescador) podem trabalhar em regime de economia familiar. Este regime caracteriza-se quan-do os membros de uma família trabalham em dependência e colaboração mútua, objetivando a própria subsistência’ (Lei nº 8.213/1991, art. 11, § 1º).

[...]

Para efeitos previdenciários, o trabalho rural, em regime de economia familiar, nos termos do inc. VII e § 1º do art. 11, da Lei nº 8.213/1991, c/c o art. 1º, I, b, do Decreto-Lei nº 1.166/1971, caracteriza-se pelo preenchimento dos seguintes requisitos: a) labor de todos os membros presentes no grupo familiar; b) o trabalho do grupo deve ser indispensável à própria subsistência; c) mútua colaboração, sem auxílio de empregados, ressalvada a hipótese de eventual auxílio de terceiros, v.g., ajuda de vizinhos na colheita, conhecida como troca de mão de obra, desde que não ocorra subordinação e dependência econômica; e d) área total

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do imóvel não superior a dois módulos rurais das respectivas microrregiões e zonas típicas, de acordo com o tipo de exploração (hortigranjeira, lavoura permanente, lavoura temporária, pecuária e florestal, conforme tabelas em anexo).” (Regime de economia familiar. Disponível em: http://online.sintese.com. Acesso em: 28. jan. 2016)

33447 – Aposentadoria por tempo de contribuição – conversão de períodos laborados em condições especiais – agente nocivo – eletricidade – cabimento

“Previdenciário. Aposentadoria por tempo de contribuição. Conversão de períodos laborados em condições especiais. Agente nocivo. Eletricidade. Exposição acima dos limites de tole-rância. Motorista de ônibus. Atividade elencadas no anexo do Decreto nº 53.831/1964. 1. A legislação aplicável para a verificação da atividade exercida sob condição insalubre deve ser a vigente quando da prestação do serviço, e não a do requerimento da aposentadoria. 2. Até o advento da Lei nº 9.032/1995, em 29.04.1995, é possível o reconhecimento do tempo de ser-viço especial com base na categoria profissional do trabalhador. A partir desta lei a compro-vação da atividade especial é feita através dos formulários SB-40 e DSS-8030, até o advento do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, que regulamentou a MP 1.523/1996, convertida na Lei nº 9.528/1997, que passa a exigir o laudo técnico. 3. Conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, comprovada efetiva exposição à eletricidade, ainda que tal agente não conste do rol de atividades do Decreto nº 2.172/1997, a atividade exposta ao referido agente pode ser reconhecida como especial, tendo em vista o caráter meramente exemplificativo dessa lista. 4. Verifica-se que o autor laborou verifica-se que o autor laborou no período de 28.06.1974 a 30.08.1977 como motorista de ônibus, devendo ser considerado como espe-cial, tendo em vista que essa atividade profissional encontra-se elencada no Anexo do Decre-to nº 53.831/1964, pelo código 2.4.4. 5. Só se justifica a fixação de honorários em percentual inferior ao de 10% em feitos cujo valor da condenação atinja montante muito elevado e, em decorrência disso, a fixação do percentual em 10% acabe onerando desproporcionalmente a Fazenda Pública. A fixação de honorários advocatícios em apenas 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação implicaria em remuneração ínfima do trabalho do Advogado, o qual exerceu seu mister de forma diligente e zelosa. É de se ressaltar ainda que a natureza do processo enseja a aplicação da Súmula nº 111 do STJ, o que já implica em redução do valor dos honorários advocatícios. 6. Negado provimento à remessa necessária e dado provimento à apelação, nos termos do voto.” (TRF 2ª R. – AC 2009.51.10.010301-8 – (526595) – 2ª T.Esp. – Relª Simone Schreiber – DJe 25.01.2016 – p. 51)

33448 – Aposentadoria por tempo de contribuição – conversão do tempo laborado em con-dições especiais – ruído – possibilidade

“Previdenciário. Aposentadoria por tempo de contribuição. Conversão do tempo laborado em condições especiais. Ruído. Intensidade superior ao limite de tolerância de acordo com o PPP. Aferição da média do ruído deve ser admitida. Agentes químicos previstos na legisla-ção. Calor. Uso de EPI. Jurisprudência do STF. Possibilidade de conversão do tempo especial em comum mediante aplicação do fator 1,4 para pessoas do sexo masculino. Sucumbência recíproca. 1. O cômputo do tempo de serviço para fins previdenciários deve observar a legis-lação vigente à época da prestação laboral, tal como disposto no § 1º, art. 70 do Decreto nº 3.048/1999, com redação do Decreto nº 4.827/2003. 2. Quanto ao agente nocivo ruído, con-sidera-se especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até 05.03.1997; de 06.03.1997 a 18.11.2003, superiores a 90 decibéis, e, a partir de então, acima de 85 decibéis, desde que aferida a pressão sonora por meio de laudo ou perícia técnica, constante dos autos ou noticiado no formulário expedido pelo empregador. 3. O nível equiva-

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lente de pressão sonora (ruído médio) tem o mesmo potencial de lesão auditiva que um nível constante de pressão sonora mesmo intervalo de tempo, sendo o nível médio suficiente para comprovar pressão sonora capaz de lesionar a saúde e justificar a insalubridade. 4. No julga-mento do ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, Julgado em 04.12.2014, DJe-029 de 12.02.2015, em termos simplificados, o E. STF, ao interpretar o art. 201, § 1º, da CR/1988, com repercussão geral, assim se posicionou: a) não há presunção absoluta de ineficácia do EPI para neutralização do agente nocivo, isto é, há possibilidade de realização de prova da eficá-cia do EPI; b) no caso do agente ruído, apenas a informação do PPP de neutralização da agres-sividade não é suficiente para comprovar a neutralização pelo EPI e há necessidade de prova mais robusta para comprovar a eficácia do EPI. 5. O autor comprovou através dos laudos e PPPs a exposição a ruídos e calor superiores aos limites de tolerância e a agentes químicos previstos na legislação, o que lhe garante o direito à contagem de parte dos períodos pleitea-dos, mediante a conversão em tempo comum pelo multiplicador 1.4, que, somados aos de-mais períodos comuns contabilizados na sentença, resulta em tempo de contribuição inferior a 35 anos na data do requerimento e superior ao necessário para aposentadoria proporcional. 6. Reforma parcial da sentença com exclusão de parte do período de serviço especial reco-nhecido na sentença, com comprovação da eficácia do EPI por laudo pericial, e alteração da aposentadoria por tempo de contribuição de integral para proporcional, nos termos do voto. 7. Sobre os valores dos benefícios atrasados devem incidir juros moratórios desde a notifica-ção ou desde quando devidos, se posteriores à notificação, além de correção monetária desde quando cada benefício for devido, utilizando-se os percentuais de juros e índices de correção para os débitos previdenciários constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal, Res. CFJ 267/2013, compensando-se eventuais benefícios inacumuláveis recebidos em período con-comitante, restrita a execução às parcelas devidas a partir do ajuizamento. 8. Remessa oficial e apelação do INSS parcialmente providas.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 2006.38.00.009563-6/MG – Rel. Juiz Fed. Márcio José de Aguiar Barbosa – DJe 07.12.2015 – p. 615)

33449 – Aposentadoria por tempo de contribuição – renúncia – concessão de novo benefí-cio – possibilidade

“Previdenciário. Processual civil. Aposentadoria por tempo de contribuição/serviço. Renún-cia. Concessão de novo benefício. Computo de tempo de serviço laborado após a concessão do primeiro benefício. Possibilidade. Art. 485, V do CPC. Ofensa do art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 e nos arts. 5º, XXXVI, 194 e 195, todos da CF/1988. Inocorrência. Embargos in-fringentes rejeitados. 1. É possível a renúncia à aposentadoria para fins de aproveitamento do tempo de contribuição e concessão de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, uma vez que a aposentadoria constitui direito patrimonial disponível. Precedentes do STJ e desta Corte (AGA 200901000657626, Desª Fed. Monica Sifuentes, 2ª T., e-DJF1 Data 09.09.2011, AGA 200901000670402, Juiz Marcos Augusto de Sousa (Conv.), 1ª T., eDJF1 Data: 13.07.2010 e AGA 200901000568455, Juiz Rodrigo Navarro de Oliveira (Conv.), 1ª T., e-DJF1 Data 01.06.2010). 2. O Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o tema, firmou o entendimento de que a renúncia à aposentadoria, para fins de concessão de novo benefício, seja no mesmo regime ou em regime diverso, não implica em devolução dos valores percebidos, pois, enquanto esteve aposentado, o segurado fez jus aos seus proventos (REsp 1113682/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Ac. Min. Jorge Mussi, 5ª T., J. 23.02.2010, DJe 26.04.2010 e AgRg-REsp 1.107.638/PR, 5ª T., Relª Min. Laurita Vaz, DJe de 25.05.2009). 3. Não há violação ao disposto no art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/1991, que veda ao segurado aposentado que permanecer exercendo atividade vinculada ao RGPS, ou a ela retornar, a percepção de nova prestação devida em razão do exercício dessa atividade, ressalvadas as

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exceções previstas. O escopo da vedação constante nos dispositivos acima citados é im-pedir que o segurado aposentado que continue em atividade venha a perceber, de forma cumulativa com a aposentadoria concedida, outro benefício não contemplado no rol de ex-ceções, o que não é a hipótese dos autos originários. 4. Embargos infringentes rejeitados.” (TRF 1ª R. – EI 0003256-08.2013.4.01.3305/BA – Rel. Juiz Fed. Conv. Cleberson José Rocha – DJe 29.01.2016 – p. 392)

33450 – Auxílio-reclusão – autora dependente do marido recluso – concessão

“Previdenciário. Agravo legal. Concessão de auxílio-reclusão. Autora dependente do marido recluso. Correção monetária. Requisitos cumpridos para concessão do benefício. Decisão mantida. Recurso improvido. Agravo da Autarquia Federal insurgindo-se contra a decisão monocrática que deu parcial provimento ao apelo da parte autora, para reformar a sentença e julgar parcialmente procedente o pedido, condenando o INSS ao pagamento de auxílio--reclusão, a partir da data do requerimento administrativo. A autora comprova ser esposa do recluso através da apresentação da certidão de casamento, tornando-se dispensável a prova da dependência econômica, que é presumida. O último vínculo empregatício do recluso cessou em 16.11.2011 e ele foi recolhido à prisão em 06.03.2012. Portanto, ele mantinha a qualidade de segurado, nos termos do art. 15, IV, da Lei nº 8.213/1991, que estabelece que o segurado retido ou recluso mantém a qualidade de segurado até 12 (doze) meses após o livramento. No que tange ao limite da renda, o segurado não possuía rendimentos à época da prisão, vez que se encontrava desempregado. Inexiste óbice à concessão do benefício aos dependentes, por não restar ultrapassado o limite previsto no art. 13 da Emenda Constitucio-nal nº 20, de 1998. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais para concessão de auxílio-reclusão, o direito que persegue a autora merece ser reconhecido. Em vista da neces-sidade de serem uniformizados e consolidados os diversos atos normativos afetos à Justiça Fe-deral de Primeiro Grau, bem como os Provimentos da Corregedoria desta E. Corte de Justiça, a fim de orientar e simplificar a pesquisa dos procedimentos administrativos e processuais, que regulam o funcionamento da Justiça Federal na Terceira Região, foi editada a Consolidação Normativa da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região. Provimento COGE nº 64, de 28 de abril 2005, que impôs obediência aos critérios previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos da Justiça Federal. A correção monetária incidirá nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado, em obediência ao Provimento COGE nº 64/2005. A decisão monocrática com fundamento no art. 557, caput e § 1º-A, do CPC, que confere poderes ao relator para decidir recurso manifestamente improcedente, prejudicado, deserto, intempestivo ou contrário a jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, sem submetê-lo ao órgão colegiado, não importa em infringência ao CPC ou aos princípios do direito. É assente a orientação pretoriana no sentido de que o órgão colegiado não deve modificar a decisão do Relator, salvo na hipótese em que a decisão impugnada não estiver devidamente fundamentada, ou padecer dos vícios da ilegalidade e abuso de poder, e for passível de resultar lesão irreparável ou de difícil reparação à parte – Agravo improvido.” (TRF 3ª R. – Ag-AC 0018586-17.2015.4.03.9999/SP – 8ª T. – Relª Desª Fed. Tania Marangoni – DJe 22.01.2016 – p. 2653)

Remissão Editorial SÍnTESEVide RST nº 320, fev. 2016, artigo de Fabio Alessandro Fressato Lessnau intitulado “O novo regime jurídico do auxílio-reclusão em face da Lei nº 13.135/2015”.

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33451 – Benefício assistencial – renda per capita familiar – observação

“Processual civil. Previdenciário. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Benefício assistencial. Renda per capita familiar. Exclusão do benefício previdenciário no valor de um salário mínimo recebido por idoso que faça parte do núcleo familiar. Aplicação, por ana-logia, do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Entendimento assentado no julgamento do REsp 1.355.052/SP, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC. 1. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.355.052/SP, sob o regime dos recursos repetiti-vos do art. 543-C do Código de Processo Civil, firmou o entendimento de que: ‘Aplica-se o pa-rágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993’. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 332.275 – (2013/0144685-1) – 1ª T. – Rel. Min. Benedito Gonçalves – DJe 07.12.2015 – p. 792)

33452 – Benefício previdenciário – decadência – observação

“Previdenciário. Juízo de retratação. Art. 543-B, § 3º, do CPC. Revisão de benefício concedi-do. Decadência. Art. 103, da Lei nº 8.213/1991. Repercussão geral. Inclusão do IRSM relativo a fevereiro/1994 (39,67%). Inocorrência. 1. Definiu o Supremo Tribunal Federal (RE 626.489) que a norma processual de decadência decenal incide a todos os benefícios previdenciários concedidos desde o dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação a partir de 01.08.1997, após não sendo possível revisar a RMI pela inclusão de tempo, sua classificação como especial, ou por erros de cálculo do PBC. 2. Como o pedido de revisão diz respeito à aplicação de disposição de lei que determinou recomposição do benefício da parte autora e, considerando que desde a edição da MP 201/2004 até a data do ajuiza-mento da presente ação não se passaram mais de dez anos, não há falar em decadência.” (TRF 4ª R. – Ap-RN 2009.72.14.000320-2/SC – 6ª T. – Relª Desª Fed. Vânia Hack de Almeida – DJe 02.12.2015 – p. 114)

33453 – Pensão por morte – menor sob guarda – dependência econômica – não comprova-ção – pagamento indevido

“Embargos infringentes. Previdenciário. Pensão por morte. Menor sob guarda. Não compro-vação da dependência econômica. Recurso provido. Prevalência do voto vencido. I – A con-trovérsia nos presentes autos recai sobre a possibilidade de concessão da pensão ao menor sob guarda. II – O benefício de pensão por morte encontra-se disciplinado pelos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991 e é devido ao conjunto de dependentes do segurado que falecer ou tiver morte presumida declarada. III – O autor juntou: certidão da ação de guarda (Processo nº 689/2008), constando que foi dada a guarda definitiva do autor, nascido em 09.06.2005, ao avô Waldomiro Gonçalves, por sentença com trânsito em J. 21.01.2009; Certidão de ca-samento dos avós Waldomiro Gonçalves e Irraide Voms Stein Gonçalves; Certidão de óbito da avó Irraide Voms Stein Gonçalves, em 01.01.2011; Carta de concessão de pensão por morte ao avô Waldomiro Gonçalves, a partir de 01.01.2011. IV – Em audiência houve a oi-tiva somente do avô, sendo que a parte autora abriu mão de produzir outras provas. Em seu depoimento pessoal declarou que: ‘Em 1º de janeiro vai fazer dois anos que a minha mulher faleceu. Estou recebendo a pensão por morte desde o falecimento dela no valor de um salário mínimo. Cuidamos de João Gabriel desde o seu nascimento há cerca de sete anos. A minha

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falecida mulher cuidava dele como filho. O marido da minha filha está preso e o menino sempre ficou em casa desde pequeno’. V – Não há controvérsia sobre a qualidade de segurada da falecida avó, tendo em vista a concessão da pensão por morte ao avô. VI – Em que pese a alteração legislativa, inexistem óbices substanciais à inclusão do menor sob guarda como dependente do guardião segurado, em face dos mandamentos constitucionais de proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, inclusive com a garantia de direitos previden-ciários (art. 227, § 3º, II, da CF). Além disso, há de se prestigiar o acolhimento do menor, sob a forma de guarda, nos termos do art. 227, § 3º, VI, da Magna Carta. VII – O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 33, § 3º, dispõe que ‘a guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários’. VIII – Similitude entre os institutos da tutela e da guarda, por se destinarem à proteção da criança ou adolescente que, por alguma das razões legais, não tem, em sua família originária, a garantia dos direitos à vida e desenvolvimento plenos. A finalidade protetiva permite incluir o menor sob guarda na expressão ‘menor tutelado’ do § 2º do art. 16 da Lei nº 8.213/1991. IX – A possibilidade de inscrição do menor sob guarda, contudo, não afasta a necessária comprovação da dependência econômica, em relação ao segurado guardião, nas relações estabelecidas sob a égide da Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.1996, e suas posteriores reedições, que culminaram na Lei nº 9.528/1997. X – Extrai-se da inicial da ação de guarda proposta pelo avô Sr. Waldomiro, em face do pai e da mãe do menor, que a genitora do autor residia no mesmo endereço dos pais e do filho, podendo-se concluir que era a responsável pelos seus cuidados. XI – Consulta ao Sistema CNIS da Previdência informa que a mãe do requerente sempre exerceu atividade econômica e não há indícios de que possua qualquer in-capacidade para o trabalho. XII – Com a juntada da certidão de nascimento do autor, em nova consulta ao Sistema Dataprev, verifica-se que o pai do requerente também sempre laborou, estando empregado até os dias atuais, não havendo informação de que não contribua para a manutenção do filho menor. XIII – O conjunto probatório não demonstra a dependência econômica do autor em relação à falecida avó guardiã. XIV – Não comprovado o preenchi-mento dos requisitos legais para a concessão de pensão por morte, o direito que persegue o requerente não merece ser reconhecido. XV – Embargos infringentes providos. Prevalência do voto vencido. Tutela antecipada cassada.” (TRF 3ª R. – EI 0021265-24.2014.4.03.9999/SP – 3ª S. – Relª Desª Fed. Tania Marangoni – DJe 28.01.2016 – p. 165)

33454 – Pensão por morte – termo inicial

“Agravo legal. Art. 557. Pensão por morte. Termo inicial do benefício. Aproveitamento das prestações já pagas. Pagamento em duplicidade. Improvimento. 1. O art. 557 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei nº 9.756, de 17 de dezembro de 1998, tem por objeto desobstruir as pautas de julgamento dos tribunais de recursos cuja matéria já tenha entendimento firmado na jurisprudência majoritária das Cortes nacionais, primando pelos princípios da economia e da celeridade processual, reservando o exame pelo órgão colegiado às ações e recursos que reclamem uma discussão para a solução do litígio. 2. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do óbito, em 14.04.2000 (fl. 23), tendo em vista que decorridos menos de 30 (trinta) dias entre o óbito e o requerimento administrativo (fl. 34), nos termos do art. 74, I, da Lei nº 8.213/1991. Nestes termos, deve o INSS providenciar a inclusão da autora no rol de beneficiários da pensão já concedida aos filhos do casal a partir da data do óbito. 3. No entanto, verifica-se que a requerente é mãe e representante legal dos filhos do

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falecido que já receberam a pensão por morte desde a data do óbito do segurado até a data em que atingiram a maioridade, sendo que Samuel de Souza Moraes receberá o benefício até 28.12.2016 (fls. 45/46). Portanto, tem-se que já houve aproveitamento das prestações pagas aos seus filhos, de forma que se impõe a exclusão das parcelas vencidas, pois, de outra forma, implicariam em pagamento em duplicidade. 6. Agravo legal improvido.” (TRF 3ª R. – Ag-Ap-RN 0008995-07.2011.4.03.6140/SP – 7ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Domingues – DJe 07.12.2015 – p. 913)

33455 – Servidor público – pensão por morte – cancelamento – menor sob guarda – resta-belecimento – impossibilidade

“Administrativo. Servidor. Pensão por morte. Cancelamento. Menor sob guarda. Restabele-cimento do benefício. Impossibilidade. Cuida-se de apelação interposta pela União Federal contra sentença que julgou procedente o pedido de reestabelecimento de pensão por morte, que havia sido cancelada por ato da administração que entendeu não haver previsão legal para o pagamento do benefício em favor de menor sob guarda. A pensão por morte rege--se pela legislação em vigor na data do falecimento do segurado, em atenção do princípio tempus regit actum. O Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência no sentido de que a reforma promovida pela Lei nº 9.528/1997 não atingiu aos menores sob guarda no regime previdenciário dos servidores públicos da União, regidos pela Lei nº 8.112/91 (MS: 32102 DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 11.02.2014), de modo que, em tese, seria possível o paga-mento de pensão estatutária ao menor sob guarda judicial, ainda que a hipótese não encontre mais guarida no RGPS (Regime Geral da Previdência Social). O art. 33, § 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece que a guarda, em regra, será deferida no curso de pro-cesso de tutela ou de adoção e apenas excepcionalmente será concedida a guarda judicial autônoma, seja em razão da omissão dos pais ou seus substitutos legais, seja por qualquer outro motivo que resulte no abandono da criança ou do adolescente. Apesar do deferimen-to da guarda judicial da autora pela falecida servidora, sua avó, em 22.10.1996, inexiste elementos nos autos a demonstrar que a situação persistiu inalterada até a data do óbito da instituidora, em 15.11.2011. A autora conta com seu pai, que lhe representa no feito, tendo ele o dever legal de assistência material em relação a sua filha. Precedentes desta Turma. Re-messa necessária e apelo providos para reformar a sentença e, julgar improcedente o pedido.” (TRF 2ª R. – AC 0001220-86.2013.4.02.5108 – 6ª T.Esp. – Relª Salete Maria Polita Maccalóz – DJe 08.01.2016)

Comentário Editorial SÍnTESEA apelação em tela foi interposta pela União contra sentença que julgou procedente o pedido autoral, condenado-a ao restabelecimento da pensão por morte,bem como o pagamento dos valores retidos indevidamente, ao fundamento de que o direito da autora, ora apelada, decorre do art. 217, II, b, da Lei nº 8.112/1990, que garante ao menor sob guarda ou tutela até 21 anos o benefício da pensão por morte.

Na inicial a apelada alegou que teve o seu benefício de pensão por morte cassado, na condição de menor sob guarda de caráter definitivo, deixada por sua avó paterna, servidora pública federal, falecida em 15.11.2001.

A apelante, nas razões recursais, afirma que a cessação da implantação do benefício se deu de maneira lícita, argumentando não haver previsão legal para a concessão à menor sob guarda. Enfatiza, ainda, que não ficou comprovada a dependência econômica entre a apelada e a avó, destacando o fato de os pais estarem vivos.

Na análise da apelação, a 6ª Turma Especializada do TRF 2ª R. entendeu que não ficou com-provada a dependência econômica da apelada com a sua avó, já que aquela possui pai vivo e este em o dever de assistência material em relação a sua filha.

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Diante disso, deu provimento ao recurso, reformando a sentença.

Em seu voto, a Relatora assim se manifestou:

“[...] A autora, ora apelada, hoje na idade de 20 anos, era beneficiária da aludida pensão, em decorrência do juízo de direito da 1ª Vara de Família da Comarca da Capital – Reg. Meier, ter concedido a sua avó paterna, Eunice Pinheiro de Oliveira a guarda definitiva, conforme termo de guarda de fl. 28.

Apesar do deferimento da guarda judicial da autora pela falecida servidora, inexistem ele-mentos nos autos a demonstrar que a situação persistiu inalterada até a data do óbito da instituidora.

Com efeito, a guarda foi concedida em 22.10.1996 (fl. 26), e o óbito da servidora em 15.11.2011 (fl. 28), mais de 14 (quatorze) anos depois.

Acresça-se o fato de que a autora conta com seu pai, que, inclusive, lhe representa neste feito, sobre ele recaindo a responsabilidade de sustento de sua filha.

Com efeito, tendo a autora pai vivo, este tem o dever legal de assistência material em relação a sua filha.

A alegada circunstância de estar o pai da autora desempregado não é capaz de eximi-lo da obrigação de custear-lhe o sustento, a guarda e a educação, exceto em virtude de comprovada impossibilidade decorrente de doença ou invalidez, a inviabilizar a pretensão de transferir esta incumbência aos cofres públicos por meio da pensão por morte almejada.

Não é outro o entendimento desta Turma.

1. A sentença determinou a manutenção à autora, 15 anos, a pensão por morte da avó, falecida em 2004, e que detinha a sua guarda judicial desde 2001 [...] 2. É inaplicável a ON 7, de 19.03.2013, da Secretaria de Gestão Pública do MPOG, que determina a anulação das pensões concedidas a menores sob guarda, com base na derrogação do art. 217 da Lei nº 8.112/1990 pelo art. 5º da Lei nº 9.717/1998, que proíbe a concessão de benefícios nos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos, distintos daqueles previstos no regime geral. 3. Nada obstante, em que pese a guarda judicial, esta modalidade de pensio-namento tem caráter excepcional, pois incumbe aos pais, por primeiro, o dever de sustentar o filho. O dos ascendentes em segundo e terceiro graus é subsidiário e supletivo, ‘restrita aos casos de insuficiência no cumprimento da prestação pelos pais’. [...] 4. Não há direito líquido e certo a ser protegido, à falta de prova pré-constituída de que os pais da impetrante não têm meios para a sua manutenção. [...] 6. A lei de regência não permite, só à vista do afeto, compaixão ou solidariedade, abrir o sistema protetivo para abrigar situações específicas não contempladas. Assim, descabe a manutenção da pensão por morte, por não haver prova da situação socioeconômica do pai e mãe, ambos vivos e capazes. 7. Apelação e remessa neces-sária providas. (AC 201351010212971, DJ de 21.07.2014)

Por estas razões, dou provimento ao recurso e à remessa necessária que ora recebo para, nos termos da fundamentação supra, reformar a sentença e, em consequência, julgar improceden-te a pretensão autoral, invertidos os ônus da sucumbência, porém deixando de condenar a autora por ser beneficiária da gratuidade de justiça.

É como voto.”

33456 – Tempo de serviço – professor – reconhecimento

“Previdenciário. Tempo de serviço em atividade de professor. Aposentadoria de professor. Requisitos cumpridos. 1. Desde a Emenda Constitucional nº 18/1981, o labor como professor passou a ser considerado como de tempo comum, ensejando apenas aposentadoria por tem-po de contribuição, ainda que com redução no número mínimo de anos exigido, sendo-lhe aplicável, portanto, o fator previdenciário, a teor do art. 29, I, da Lei nº 8.213/1991. 2. No caso dos autos, a parte autora tem direito à aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, porquanto implementados os requisitos para sua concessão.” (TRF 4ª R. – Ap-RN 0011351-69.2015.4.04.9999/RS – 6ª T. – Relª Desª Fed. Vânia Hack de Almeida – DJe 02.12.2015 – p. 277)

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33457 – Tempo de serviço especial e comum – uso de EPI – conversão – possibilidade

“Processual civil. Previdenciário. Pleito amparado legalmente. Possibilidade jurídica do pedi-do. Previdenciário. Atividade especial. Uso de EPI. Tempo especial e comum. Possibilidade de conversão. Lei aplicável. Critério. Legislação vigente quando preenchidos os requisitos da aposentadoria. Concessão de aposentadoria especial. Permanência na atividade especial após a implantação do benefício. Possibilidade. Tutela específica. 1. Estando o pedido amparado pelo ordenamento jurídico, deve ser desacolhida a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido. 2. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 3. Possível afastar o enquadramento da atividade especial somente quando comprovada a efetiva utilização de equipamentos de proteção indi-vidual que elidam a insalubridade. A exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. 4. Demonstrado o tempo de serviço especial por 15, 20 ou 25 anos, conforme a atividade exercida pelo segurado e a carência, é devida à parte autora a aposentadoria especial, nos termos da Lei nº 8.213/1991. 5. O sistema previdenciário vigente após a Lei nº 9.032/1995, portanto, somente admite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço previsto no art. 57 da Lei nº 8.213/1991 (15, 20 ou 25 anos, conforme o caso) em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. 6. Somente terão direito à conversão do tempo comum em especial os segu-rados que até 28.04.1995 (data em que limitada a conversão de tempo especial para comum pela Lei nº 9.032/1995) tenham implementado todos os requisitos necessários à concessão do benefício de aposentadoria especial, devendo, nesta hipótese, para fins de aferição do implemento do requisito tempo de serviço especial, ser levada em conta a efetiva conversão do tempo comum em especial. 7. Reconhecida a inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da LBPS pela Corte Especial deste Tribunal, resta assegurada à parte autora a possibilidade de continuar exercendo atividades laborais sujeitas a condições nocivas após a implantação do benefício. 7. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar e/ou restabelecer o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo au-tônomo (sine intervallo).” (TRF 4ª R. – AC 0004630-38.2014.4.04.9999/RS – 6ª T. – Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira – DJe 21.01.2016 – p. 1793)

Seção Especial – Com a Palavra, o Procurador

Desconstruindo o Princípio da Subordinação Objetiva ou Estrutural

RICARDO ARAuJO COzERProcurador do Trabalho lotado na Procuradoria Regional do Trabalho da 7ª Região.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Finalidades de conceitos e definições; 2 Não eventualidade; 3 Casuística; Conclusão.

INtrodução

A subordinação jurídica sempre foi qualificada, conforme os arts. 2º, caput, e 3º, caput, da CLT, como elemento essencial para configurar vínculo empregatício, cuja moldura abarcava a sujeição do trabalhador a diretivas gerais, ordens diretas e casuais aplicações de punições disciplinares oriun-das do empregador ou de seus prepostos.

Mais recentemente, o brilhante doutrinador e Magistrado Mauricio Godinho Delgado inovou as balizas e a orografia daquele instituto, passan-do a adjetivá-lo de subordinação objetiva ou estrutural, assim definidos de sucintamente:

Objetiva é a subordinação que se manifesta pela integração do trabalhador nos fins e objetivos do empreendimento do tomador de serviços, ainda que afrouxadas “[...] as amarras do vínculo empregatício”.1

Estrutural é [...] a subordinação que se expressa “pela inserção do traba-lhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento”.2

Contudo, tais louváveis esforços de renovação conceitual dos septua-genários contornos da subordinação empregatícia serão, sem querer que-rendo, alvo de investida iconoclasta neste artigo jurídico.

1 fINalIdadeS de coNceItoS e defINIçõeS

Conceitos e definições consistem em meras enunciações dos corres-pondentes objetos (físicos, sociológicos, médicos, jurídicos, etc.) em função

1 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 11. ed. São Paulo: LTr, 2012. p. 297/298.2 Idem, p. 298.

208 �������������������������������������������������������������������������RST Nº 323 – Maio/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR

da fisionomia com que normalmente se apresentam ou são percebidos no mundo fático ou imaginário/intelectivo.

Determinados conceitos e definições, a depender de peculiares cir-cunstâncias fáticas que envolvem o objeto conceituado ou definido, podem estar mais distantes da realidade do que a existência de unicórnios.

O importante e o determinante, assim, muito mais do que a usual conotação que se pode extrair de certos conceito e definição de um objeto qualquer, além de se abstrair quão elegante possa ser a formulação vocabu-lar, são a fisiologia e a essência pragmática do objeto em sua dinâmica com o meio com que interage.

Como se demonstrará avante, as subordinações objetiva e estrutural encampam definições que, embora possam levar a crer que se estabeleça uma inequívoca distinção entre judeus e filisteus, já foram sufragadas pela não eventualidade empregatícia.

De mais a mais, reproduzir-se-ão e analisar-se-ão decisões emanadas do Tribunal Superior do Trabalho que evidenciam não servirem as subor-dinações objetiva e estrutural como pontos cardeais para caracterização de vínculos como empregatícios.

2 Não eveNtualIdade

No próprio tratado trabalhista do autor sob comento, colhemos as seguintes definições e delimitações sobre a não eventualidade:

A teoria dos fins do empreendimento (ou fins da empresa) é talvez a formu-lação teórica mais prestigiada entre as quatro aqui enfocadas. Informa tal teorização que eventual será o trabalhador chamado a realizar tarefa não inserida nos fins normais da empresa – tarefas que, por essa mesma razão, serão esporádicas e de pouca duração. [...]

[...]

Completa o autor que a “[...] aferição da natureza eventual dos serviços pres-tados há de ser feita tendo em vista os fins normais da empresa”.

[...]

Por outro lado, difícil será configurar-se a eventualidade do trabalho pactua-do se a atuação do trabalhador contratado inserir-se na dinâmica normal da empresa – ainda que excepcionalmente ampliada essa dinâmica.3

3 Idem, p. 289 e 290.

RST Nº 323 – Maio/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – COM A PALAVRA, O PROCURADOR ����������������������������������������������������������������������������209

Sejamos sinceros. Jogo da verdade. As fórmulas definitórias de subor-dinação objetiva e estrutural e de não eventualidade não são gêmeas uni ou bivitelinas? Ambas aludem aos fins do empreendimento e à inserção na dinâmica normal da empresa.

Em outro falar: qual é a efetiva diferença entre esses institutos jurídi-cos? Se formos leais, responderemos: nenhuma. Como sequela, qual é a uti-lidade das novas definições de subordinação objetiva e estrutural? Também nenhuma, pois se limita a criar mais do mesmo.

Se algum objetivo mira, parece ser o de estimular a formação de ju-risprudência em que a categorização do liame empregatício seja artificial-mente ampliada.

3 caSuíStIca

O Tribunal Superior do Trabalho já proferiu várias decisões em que, se tivesse sido levada em consideração a subordinação objetiva/estrutural travestida de não eventualidade, o vínculo empregatício teria sido reconhe-cido, pois, contradição máxima, nesses casos, se teria deixado de analisar se houvera tradicional subordinação.

Quanto aos trabalhadores em salões de beleza, a jurisprudência do TST é pacífica no sentido da possibilidade de trabalhadores que neles labo-ram prestarem serviços sem subordinação e, portanto, sem a configuração do vínculo de emprego. Confiram-se algumas decisões sobre a matéria:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO DE EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA – VÍNCULO DE EMPREGO – SALÃO DE BELEZA – MANICURE – [...] 1. No presente caso, o acórdão da eg. Segunda Turma ora impugnado reverteu o reconhecimento do vínculo de emprego pelo acórdão do Tribu-nal Regional, conhecendo do recurso de revista da reclamada por violação do art. 3º da CLT e, no mérito, absolvendo-a de toda condenação. Restou consignado nos fundamentos da decisão que “no caso dos autos, após uma análise minuciosa das provas produzidas, o egrégio Colegiado Regional con-cluiu pela presença dos elementos caracterizadores do vínculo de emprego. Todavia, da análise do conjunto fático-probatório descrito no v. acórdão re-gional, entendo que não restou configurado o vínculo de emprego entre a autora e a reclamada. [...] Agravo regimental conhecido e não provido”.

(AgRg-E-RR 2276800-81.2008.5.09.0006, Subseção I Especializada em Dis-sídios Individuais, Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 20.11.2014, Data de Publicação: DEJT 28.11.2014)

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AGRAVO – EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO CONTRA DECISÃO PUBLICADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014, QUE ALTEROU A SISTEMÁTICA PROCEDIMENTAL NA CLT – VÍNCULO DE EMPREGO – SALÃO DE BELEZA – ÔNUS DA PRO-VA – AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO – NÃO PROVIMENTO – Trata-se de agravo de instrumento cujos temas ventilados o Tribunal Regional decidiu em conformidade com entendimento reiterado desta Corte Superior sobre a matéria. Para a hipótese, o art. 557, caput, do CPC autoriza o relator a negar seguimento ao recurso, como ocorreu na espécie. Assim, se a parte não trou-xe no seu agravo nenhum argumento que demovesse a decisão denegatória do agravo de instrumento, há que ser mantido o mencionado decisum. Agra-vo a que se nega provimento.

(Ag-AI-RR 854-79.2012.5.09.0007, 5ª T., Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, Data de Julgamento: 11.03.2015, Data de Publicação: DEJT 20.03.2015)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO DE REVISTA – VÍNCULO DE EMPREGO – NÃO CONFIGURAÇÃO – 1. O Tribunal Regional, com res-paldo nas provas efetivamente produzidas, concluiu pela inexistência dos elementos necessários à formação do vínculo de emprego, ressaltando que a reclamante exerceu “as funções de manicure” possuindo “liberdade de agir, sem horário imposto, recebendo comissões de 70% sobre o trabalho realizado, [...] o conceito de subordinação”. Acrescentou, ainda, que, “em-bora presentes a pessoalidade e a continuidade, a subordinação e o salário deixam de ser definidos, pois se consagraram a autonomia do profissional e a participação nos lucros”. 2. Aplicação da Súmula nº 126 do TST. Inviolados os arts. 3º e 818 da CLT e 333, II, do CPC. Divergência jurisprudencial válida não demonstrada (art. 896, a, da CLT). Agravo de instrumento conhecido e não provido.

(AI-RR 146600-49.2008.5.02.0027, 1ª T., Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, Data de Julgamento: 04.03.2015, Data de Publicação: DEJT 13.03.2015)

É certo que, de outro lado, há vários outros julgados reconhecendo a existência de vínculos empregatícios entre salões de beleza e seus profissio-nais, tudo dependendo de cada caso concreto, esquadrinhado muitas vezes sob o prisma da melhor condição social do trabalho (art. 7º, caput, da CF), pois, como é sabido das bancas estudantis às antigas cátedras dos cursos de Direito, a realidade é muito mais rica e complexa do que legisladores ou juristas podem aprioristicamente antever.

Caso interessante atinou a ourives que postulava reconhecimento de vínculo empregatício com joalheria, sob o fundamento da subordinação

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estrutural, mas que restou vencido no processo. Decalquemos os extratos mais relevantes:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 – PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – VÍNCULO DE EMPREGO – Nega-se provimento ao agravo de instrumento que não logra desconstituir os fundamentos do despacho que denegou se-guimento ao recurso de revista. Agravo de instrumento a que se nega provi-mento.

[...]

O reclamante sustenta que o Regional incorreu em negativa de prestação jurisdicional, pois foi omisso em relação à existência de subordinação estru-tural, a qual ensejaria o reconhecimento do vínculo empregatício. Aponta violação dos arts. 5º, LV, e 93, IX, da Constituição Federal.

Sem razão.

O Regional consignou:

“Insurge-se o autor contra a sentença que julgou improcedente o pleito de reconhecimento da relação de emprego. Sustenta que é incontroversa a subordinação estrutural existente, já que a atividade empresarial dos réus é a confecção e reparação de joias e o comércio destes artigos, es-tando o trabalho do ourives inserido na dinâmica empresarial, essencial para o desenvolvimento da sua atividade-fim. [...]

O juízo de origem indeferiu o pedido de reconhecimento de vínculo em-pregatício e demais verbas pleiteadas, sob o fundamento de que o autor não era empregado, mas sim foi contratado a título de parceria. Registrou que não havia pessoalidade e subordinação, já que o autor podia recu-sar trabalho, caso não concordasse com o preço do serviço, ou poderia passá-lo a outra pessoa.

[...]”

2.2 VÍNCULO DE EMPREGO

O Regional denegou seguimento ao recurso de revista com fulcro na Súmula nº 126 do TST e no art. 896 da CLT.

O reclamante sustenta que atendeu a todos os requisitos aptos a configurar relação e emprego. Alega que, na profissão de ourives, a mera existência de subordinação estrutural é suficiente para se reconhecer o vínculo emprega-tício. Aponta violação do art. 3º da CLT, contrariedade à Súmula nº 331 do TST e divergência jurisprudencial.

Sem razão.

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Conforme transcrição do acórdão no tópico “Preliminar de nulidade do acór-dão regional por negativa de prestação jurisdicional”, os fatos consignados na decisão regional não permitem concluir pela ofensa ao art. 3º da CLT, tampouco o conhecimento do apelo por divergência jurisprudencial, uma vez que ausentes não apenas a subordinação, mas também a pessoalidade (art. 896, c, da CLT e Súmula nº 296, I, do TST).

Inviável a análise da contrariedade à Súmula nº 331 do TST, dada a falta de prequestionamento da matéria nela contida (Súmula nº 297, I e II, do TST).

Nego provimento.

ISTO POSTO

Acordam os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.

(AI-RR 227-86.2014.5.23.0081, 8ª T., Rel. Min. Márcio Eurico Vitral Amaro, Data de Julgamento: 24.02.2016, Data de Publicação: DEJT 26.02.2016)

Extrai-se do mencionado recentemente saído do forno julgado, por-tanto, que a Justiça do Trabalho não aceitou o argumento do autor de que a subordinação estrutural se sobrepõe à análise da existência ou não da subordinação trabalhista tradicional.

coNcluSão

Assim, em razão do que previamente articulado, exterioriza-se a fir-me convicção de que a teoria da subordinação estrutural ou objetiva, que é caracterizada pelo atrelamento do trabalhador ao escopo empresarial (su-bordinação objetiva) e pela inserção do trabalhador na dinâmica do toma-dor de serviços (subordinação estrutural) e que vem ganhando corpo na jurisprudência do TST, é, data venia, vazia de sentido ou mera clonagem do instituto da não eventualidade.

Seção Especial – Parecer Jurídico

Cargo em Comissão – Exoneração Ad Nutum – Gestante – Possibilidade – Existência de Estabilidade Somente para Fins de Indenização

RAFAEL DE ALMEIDA RIBEIROConsultor Jurídico e Parecerista.

coNSulta

Excelentíssimo Senhor Antônio Mondelli Júnior, Presidente da Em-presa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Rural de Bauru – EMDURB, apresenta consulta e solicita elaboração de parecer jurídico sobre legalida-de da exoneração de mulher nomeada para cargo em comissão – demissível ad nutum – que no ato da exoneração encontra-se grávida.

Informa o consulente que, na mencionada empresa pública, tanto os concursados como os nomeados para cargos em comissão têm sua rela-ção de trabalho regida pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), com carteira (CTPS) devidamente assinada, sendo de conhecimento que as em-pregadas nomeadas através do regime celetista estão abrigadas pela esta-bilidade desde a concepção do feto, até 120 (cento e vinte) dias após o nascimento da criança.

Como os cargos em comissão são de livre nomeação e exoneração, o consulente pretende sanar dúvida no sentido da existência ou não de estabi-lidade para as gestantes que se encontram em cargo demissíveis ad nutum.

Assim, faz o Senhor Presidente as seguintes indagações:

a) Pode haver exoneração de gestante nomeada para cargo em co-missão?

b) Existe estabilidade para gestante nomeada para cargo em co-missão?

c) Quais as consequências jurídicas desta exoneração?

Passo ao respectivo parecer jurídico.

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parecer jurídIco

Excelentíssimo Senhor Presidente da EMDURB,

1. Submeto à elevada consideração de Vossa Excelência parecer ju-rídico decorrente de consulta para analisar os aspectos constitucionais e legais da legitimidade em exonerar gestante nomeada para cargo em comis-são, declarado de livre nomeação e exoneração, entendidos como demissí-veis ad nutum1.

2. Hely Lopes Meirelles, ao conceituar o termo “exoneração de ser-vidor público”, acrescenta que a exoneração ad nutum é aquela decorrente de conveniência da Administração, de forma unilateral e sem qualquer jus-tificativa, nos casos em que o servidor assim pode ser dispensado2.

3. Ou seja, a pessoa nomeada para cargo em comissão – que pode ou não ser servidor público de carreira – considerado por lei como de livre nomeação e exoneração poderá ser desligada dos quadros da Administra-ção Pública direta e indireta a qualquer momento pelo agente político que o nomeou (Presidente da República, Governador de Estado, Prefeito Muni-cipal, Presidente de Autarquia, Empresa Pública, Sociedade de Economia Mista, etc.), sem qualquer justificativa, fundamento ou mesmo procedimen-to administrativo disciplinar que demonstre a justa causa para referida exo-neração.

4. O mesmo ocorre com as funções de confiança, que, diferentemen-te dos cargos em comissão, são exercidas exclusivamente por servidores de carreira, que também podem ser exonerados a qualquer momento e sem qualquer justificativa (ad nutum) da respectiva função que ocupam (direto-res ou gerentes, por exemplo), mas que não podem ser exonerados do cargo efetivo e estável que originalmente ocupam mediante nomeação decorrente de concurso público, sem o devido processo legal, considerada a ampla defesa3.

1 Termo jurídico em latim que determina que o ato pode ser revogado pela vontade de uma só das partes. Proveniente da área do direito administrativo, consideram-se ad nutum os atos resolvidos pela autoridade administrativa competente, com exclusividade. Exemplo de ato ad nutum é a demissão de funcionário público não estável, deliberada a juízo de autoridade administrativa competente (www.direitonet.com.br).

2 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. Malheiros, 2008. p. 455.3 “Art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento

efetivo em virtude de concurso público.

§ 1º O servidor público estável só perderá o cargo:

I – em virtude de sentença judicial transitada em julgado;

II – mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa;

III – mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.”

RST Nº 323 – Maio/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – PARECER JURÍDICO����������������������������������������������������������������������������������������������������215

5. Assim dispõe a Constituição Federal em seu art. 37, incisos II e V:

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação pré-via em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

[...]

V – as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocu-pantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previs-tos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessora-mento;

[...].

6. Inclusive, importante anotar que a exoneração de servidor efetivo em função de confiança não lhe dá o direito de continuar recebendo o acréscimo salarial ou mesmo adicionais pela função exercida em nome do princípio da estabilidade financeira e da irredutibilidade de vencimentos, salvo quando devidamente incorporado através de autorização legal.

7. A questão central aqui é saber se, mesmo existindo a possibilidade de exoneração ad nutum de cargo em comissão ou função de confiança, a mulher que está grávida no ato da exoneração tem ou não a estabilida-de que os demais empregados (tanto públicos como privados) ou servido-res públicos adquirem da concepção até 120 dias após o nascimento da criança.

8. O tema em destaque nesta consulta leva à importante reflexão so-bre o trabalho da mulher na sociedade mundial, razão pela qual trago ao conhecimento do consulente parte de artigo de autoria de Emílio Elias Melo de Britto, Milena Guimarães Andrade Tanure, Renata Guimarães Andrade Tanure, que, ao pretenderem apreciar o direito da estabilidade da gestante durante o aviso-prévio, apresentam parte importante da história da inclusão da mulher no mercado de trabalho e as discriminações superadas ao longo dos anos4:

É possível definir como marco histórico do período de inserção da mulher no mercado de trabalho a I e II grandes guerras mundiais. Anteriormente, a função de provedor da família era exercida exclusivamente por homens e as

4 A estabilidade decorrente da gravidez ocorrida durante o aviso-prévio: uma nova realidade com a Lei nº 12.812/2013.

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mulheres eram destinadas a cuidar da família e da casa. Entretanto, com o início das grandes guerras, os homens, que antes trabalhavam e sustentavam suas casas, tiveram que defender os seus países (Araújo, 2004).

É exatamente neste processo de saída dos homens das residências que as mu-lheres se veem obrigadas a, daquele momento em diante, garantir o sustento de sua família. Ainda após a guerra, este cenário permanece, tendo em vista que muitos dos que foram não voltaram e boa parte dos que regressaram es-tavam impossibilitados de exercer qualquer tipo de força produtiva. É desse modo que se apresenta, historicamente, a introdução da mulher no mercado de trabalho.

[...]

É certo que, a partir da década de 1920, essas transformações sociais das mulheres, e por que não dizer evolutivas, começaram a acontecer. Contu-do, é somente com o aparecimento dos movimentos sociais e políticos nas décadas de 1960 e 1970 que há o rompimento do antigo estigma opressor, o que, inegavelmente, veio a proporcionar o surgimento de outros padrões culturais que levaram as mulheres definitivamente às salas de aula e ao tra-balho (Martins, 2008).

[...]

A primeira lei que protegeu o trabalho feminino somente foi editada em 19 de agosto de 1842, que proibiu as mulheres de trabalharem em subterrâneos, era a Lei de Minas na Inglaterra. Depois desta, na França em 1848, proibiu-se o trabalho noturno das mulheres. Em 1890, na Alemanha, recomendações sobre o trabalho da mulher em fábricas.

No Brasil, as primeiras Constituições (1824 e 1891), baseadas em um ideal liberal e, portanto nas revoluções burguesas, como era de se esperar, rele-gavam a mulher ao segundo plano. Apenas com a Constituição de 1934 há uma significativa ampliação dos diretos sociais destinados às mulheres, pois trazia as seguintes previsões:

Proibia a discriminação do trabalho da mulher quanto a salários (art. 121, § 1º, a). Vedava o trabalho em locais insalubres (art. 121, § 1º, I, d). Garantia o repouso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do empre-go, assegurando instituição de previdência a favor da maternidade (art. 121, § 1º, I, h). Previa os serviços de amparo à maternidade (art. 121, § 3º) (Martins, 2008, p. 575).

Com o Estatuto da Mulher Casada, editado em 1962, a mulher perdeu a sua incapacidade e pôde passar a escolher a sua própria profissão. Em 1967, a Carta Magna proibiu estabelecer critérios de seleção em razão de sexo, per-mitindo a sua livre entrada no mercado (Martins, 2008).

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Por fim, em 1988, a igualdade substancial da mulher entrou em destaque, possibilitando a sua plena liberdade. É a partir do novo ordenamento jurídico que a mulher deixa a sua subordinação ao homem e passa a gerir os seus próprios bens e a colaborar com a responsabilidade da família, passando a existir, assim, uma igualdade entre os cônjuges, normas estas estabelecidas tanto na Constituição de 1988 como no Código Civil de 2002.

9. Em decorrência de toda a evolução da sociedade, principalmente no que se refere ao trabalho e aos direitos da mulher, evitando-se discrimi-nação quando comparada aos homens, temos que a Constituição da Repú-blica Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988, previu entre seus fundamentos, previstos no art. 1º, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho (incisos III e IV), e, no título que trata das garantias fundamentais, temos o capítulo que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos, prevendo a inviolabilidade do direito à vida (art. 5º, caput).

10. Estes fundamentos são de vital importância para a vida em socie-dade, principalmente às mulheres, já que estas, além de terem que cuidar de si, devem também cuidar da geração de uma vida em seu ventre, com toda dignidade possível, sem serem violadas em seus direitos trabalhistas, atentando-se para o direito à vida do nascituro.

11. Para Maria Helena Diniz5:

Nascituro é aquele que há de nascer, cujos direitos a lei põe a salvo; aquele que, estando concebido, ainda não nasceu e que, na vida intrauterina, tem personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos da personalidade, passando a ter personalidade jurídica material, alcançando os direitos patri-moniais, que permaneciam em estado potencial, somente com o nascimento com vida.

12. Tendo o nascituro “direitos que a lei põe a salvo”6, está, portanto, amparado pelos direitos fundamentais que a Constituição Federal descreve como dignidade da pessoa humana e inviolabilidade à vida, razão pela qual a gestante deve estar albergada e protegida para lhe dar proteção, carinho e afeto em todo o período de gravidez e também após seu nascimento com vida, para o regular e salutar desenvolvimento, dando-lhes os primeiros cui-dados, como a amamentação.

5 DINIZ, Maria Helena, 1998, p. 334.6 Código Civil, art. 2º: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo,

desde a concepção, os direitos do nascituro”.

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13. Aqui reside, portanto, o direito à estabilidade desde a concepção até 120 dias após o nascimento com vida, impondo uma proteção muito mais ao feto do que à própria gestante.

14. Ainda assim, evitando-se discussões dogmáticas, filosóficas e oportunistas, a Constituição Federal, ao discorrer sobre direitos sociais – que são direitos fundamentais –, prescreve:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternida-de e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensa-tória, dentre outros direitos;

[...]

XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a du-ração de cento e vinte dias;

[...].

15. Os dispositivos constitucionais que prescrevem licença à gestante com duração de 120 dias e a vedação de dispensa arbitrária ou sem justa causa desde a confirmação da gravidez é de aplicação inconteste às servi-doras ocupantes de cargos públicos, por expressa disposição legal, encarta-da no art. 39, § 3º, da Constituição Federal7.

16. Desta forma, quando da promulgação da Constituição Federal em 1988, ficou evidente que as gestantes tinham o direito e a garantia funda-mental de que os empregadores (fossem pessoas físicas, jurídicas privadas ou públicas) lhes dessem licença de 120 dias sem prejuízo do emprego ou cargo público e do salário recebido, sendo totalmente arbitrária qualquer demissão neste período.

17. Evitando-se discussões jurídicas sobre quando se daria o início da estabilidade no emprego em razão da gravidez, previu-se no art. 10, inciso II, alínea b dos Atos das Disposições Constitucionais Provisórias (ADCT) o início e o fim da garantia de estabilidade.

7 “§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”

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Art. 10. Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o art. 7º, I, da Constituição:

[...]

II – fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:

[...]

b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

18. Por sua vez, ao longo do tempo, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou entendimento no sentido de que as servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de 120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco me-ses após o parto, nos termos do art. 7º, XVIII, da Constituição Federal e do art. 10, II, b, do ADCT (RE 600.057-AgRg, Rel. Min. Eros Grau, Julgamento em 29.09.2009, Segunda Turma, DJe de 23.10.2009)8.

19. O direito fundamental da estabilidade previsto no título dos direi-tos sociais aplicável às gestantes é de vital importância e observância, que nem mesmo acordos coletivos entre patrões, empregados e sindicatos têm o condão de suprimi-la, demonstrando mais uma vez o intuito de proteção também da vida e da dignidade do nascituro, conforme reiteradas decisões do STF.

Estabilidade provisória da empregada gestante (ADCT, art. 10, II, b): incons-titucionalidade de cláusula de Convenção Coletiva do Trabalho que impõe como requisito para o gozo do benefício a comunicação da gravidez ao em-pregador. O art. 10 do ADCT foi editado para suprir a ausência temporária de regulamentação da matéria por lei. Se carecesse ele mesmo de comple-mentação, só a lei a poderia dar: não a convenção coletiva, à falta de dispo-sição constitucional que o admitisse. Aos acordos e Convenções Coletivas de Trabalho, assim como às sentenças normativas, não é lícito estabelecer limitações a direito constitucional dos trabalhadores, que nem à lei se permi-

8 No mesmo sentido: RE 634.093-AgRg, Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento em 22.11.2011, Segunda Turma, DJe de 07.12.2011; RE 597.989-AgRg, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Julgamento em 09.11.2010, Primeira Turma, DJe de 29.03.2011; RE 287.905, Rel. p/o Ac. Min. Joaquim Barbosa, Julgamento em 28.06.2005, Segunda Turma, DJ de 30.06.2006; RMS 24.263, Rel. Min. Carlos Velloso, Julgamento em 01.04.2003, Segunda Turma, DJ de 09.05.2003. Vide: RE 523.572-AgRg, Relª Min. Ellen Gracie, Julgamento em 06.10.2009, Segunda Turma, DJe de 29.10.2009; RMS 21.328, Rel. Min. Carlos Velloso, Julgamento em 11.12.2001, Segunda Turma, DJ de 03.05.2002; RE 234.186, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Julgamento em 05.06.2001, Primeira Turma, DJ de 31.08.2001.

220 ����������������������������������������������������������������������������������������������� RST Nº 323 – Maio/2016 – SEÇÃO ESPECIAL – PARECER JURÍDICO

te. (RE 234.186, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Julgamento em 05.06.2001, Primeira Turma, DJ de 31.08.2001).9

20. Mesmo sendo a estabilidade da gestante um direito fundamen-tal, a doutrina constitucionalista divide-se quando se debate a questão de estarem os direitos sociais protegidos como cláusula pétrea, nos moldes do art. 60, § 4º, inciso IV, da Constituição Federal10.

21. Entendo que o direito subjetivo encartado no art. 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal, que prevê a licença gestante por 120 dias, deve ser encarado como cláusula pétrea, não podendo haver proposta de emenda tendente a abolir este direito fundamental, tendo em vista estar – em razão da proteção à vida que se dá ao nascituro – intimamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à vida, estes sim, cláusulas pétreas incontestáveis.

22. Dando suporte à corrente explicitada acima, trago ensinamento de Paulo Gustavo Gonet Branco na obra Curso de direito constitucional, es-crita em coautoria com o Ministro Gilmar Mendes11, que, ao discorrer sobre cláusulas pétreas implícitas, assim preleciona:

O que se puder afirmar como ínsito à identidade básica da Constituição ideada pelo poder constituinte originário deve ser tido como limitação ao poder de emenda, mesmo que não haja sido explicitado no dispositivo.

[...]

Os princípios que o próprio constituinte originário denominou fundamen-tais, que se leem no Título inaugural da Lei Maior, devem ser considerados intangíveis.

23. Resta claro e pacífico, assim, que a estabilidade à gestante aplica--se às servidoras públicas de cargo efetivo, que não podem ser demitidas ou exoneradas desde a confirmação da gravidez até 120 dias após o nascimen-to da criança.

24. Diferentemente ocorre nos casos de empregadas e servidoras pú-blicas que ocupam cargo em comissão ou função de confiança, que podem

9 No mesmo sentido: AI 448.572-AgRg-ED, Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento em 30.11.2010, Segunda Turma, DJe de 16.12.2010; AI 277.381-AgRg, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Julgamento em 08.08.2006, Segunda Turma, DJ de 22.09.2006; RE 259.318, Relª Min. Ellen Gracie, Julgamento em 14.05.2002, Primeira Turma, DJ de 21.06.2002.

10 Art. 60, § 4º: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

[...]

IV – os direitos e garantias individuais.”11 Editora Saraiva, 6. ed., 2011, p. 150.

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ser exoneradas a qualquer momento destes cargos, sem qualquer justificati-va, já que a própria Constituição Federal prevê a ressalva, por serem cargos demissíveis ad nutum, mas nunca do cargo efetivo que alçaram por concur-so público, tendo estabilidade no cargo de origem e não do cargo ou função de confiança, ainda que tenham perda salarial.

25. Para os cargos em comissão, que podem ser preenchidos por pes-soas estranhas aos quadros da Administração, a regra é a de que as mulhe-res podem ser exoneradas a qualquer momento, mesmo quando grávidas, sendo que a estabilidade impõe uma indenização financeira (compreendida pelo pagamento dos salários ou vencimentos que se dariam até 120 dias do nascimento) e não a impossibilidade de serem exoneradas, já que a exce-ção é prevista na Constituição Federal, ao informar que as nomeações para cargo em comissão são de livre nomeação e exoneração.

26. Esta a orientação pacífica do STF.

SERVIDORA PÚBLICA GESTANTE OCUPANTE DE CARGO EM COMISSÃO – ESTABILIDADE PROVISÓRIA (ADCT/1988, ART. 10, II, B) – CONVENÇÃO OIT Nº 103/1952 – INCORPORAÇÃO FORMAL AO ORDENAMENTO PO-SITIVO BRASILEIRO (DECRETO Nº 58.821/1966) – PROTEÇÃO À MATER-NIDADE E AO NASCITURO – DESNECESSIDADE DE PRÉVIA COMUNICA-ÇÃO DO ESTADO DE GRAVIDEZ AO ÓRGÃO PÚBLICO COMPETENTE – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO – O acesso da servidora pública e da trabalhadora gestantes à estabilidade provisória, que se qualifica como in-derrogável garantia social de índole constitucional, supõe a mera confirma-ção objetiva do estado fisiológico de gravidez, independentemente, quanto a este, de sua prévia comunicação ao órgão estatal competente ou, quando for o caso, ao empregador. Doutrina. Precedentes. As gestantes – quer se trate de servidoras públicas, quer se cuide de trabalhadoras, qualquer que seja o regime jurídico a elas aplicável, não importando se de caráter administrativo ou de natureza contratual (CLT), mesmo aquelas ocupantes de cargo em co-missão ou exercentes de função de confiança ou, ainda, as contratadas por prazo determinado, inclusive na hipótese prevista no inciso IX do art. 37 da Constituição, ou admitidas a título precário – têm direito público subjetivo à estabilidade provisória, desde a confirmação do estado fisiológico de gra-videz até cinco (5) meses após o parto (ADCT, art. 10, II, b), e, também, à licença-maternidade de 120 dias (CF, art. 7º, XVIII, c/c o art. 39, § 3º), sendo--lhes preservada, em consequência, nesse período, a integridade do vínculo jurídico que as une à Administração Pública ou ao empregador, sem prejuízo da integral percepção do estipêndio funcional ou da remuneração laboral. Doutrina. Precedentes. Convenção OIT nº 103/1952. Se sobrevier, no entan-to, em referido período, dispensa arbitrária ou sem justa causa de que resulte a extinção do vínculo jurídico-administrativo ou da relação contratual da gestante (servidora pública ou trabalhadora), assistir-lhe-á o direito a uma in-

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denização correspondente aos valores que receberia até cinco (5) meses após o parto, caso inocorresse tal dispensa. Precedentes (RE 634093-AgRg/DF, Distrito Federal, AgRg no Recurso Extraordinário, Relator Ministro Celso Mello, Julgamento 22.11.2011, Segunda Turma, DJe 232 de 07.12.2011)

“Agravo regimental no recurso extraordinário. Servidora gestante. Cargo em comissão. Exoneração. Licença-maternidade. Estabilidade provisória. Indeni-zação. Possibilidade. 1. As servidoras públicas, em estado gestacional, ainda que detentoras apenas de cargo em comissão, têm direto à licença- mater-nidade e à estabilidade provisória, nos termos do art. 7º, inciso XVIII, c/c o art. 39, § 3º, da Constituição Federal e art. 10, inciso II, alínea b, do ADCT. 2. Agravo regimental não provido” (RE 420.839-AgR/DF, Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 26.04.2012).

CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – LICEN-ÇA-GESTANTE – EXONERAÇÃO – CF, ART. 7º, XVIII; ADCT, ART. 10, II, B

I – Servidora pública exonerada quando no gozo de licença-gestante: a exo-neração constitui ato arbitrário, porque contrário à norma constitucional: CF, art. 7º, XVIII; ADCT, art. 10, II, b.

II – Remuneração devida no prazo da licença-gestante, vale dizer, até cin-co meses após o parto. Inaplicabilidade, no caso, das Súmulas nºs 269 e 271/STF.

III – Recurso desprovido. (RMS 24.263/DF, Segunda Turma, Relator o Minis-tro Carlos Velloso, DJ de 09.05.2003).

27. Como dito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a exoneração de servidora que se encontra em gozo de licença-gestante, mesmo que ocupante de cargo em comissão, caracteriza violação do direito constitucional de estabilidade provisória, razão pela qual tem direito à indenização consistente no pagamento do salário que lhe era pago até o prazo final de 120 dias após o nascimento da criança.

28. Portanto, estando vedada a reintegração de servidora gestante de-vidamente exonerada de cargo em comissão, demissível ad nutum por ex-pressa disposição constitucional, resta à Administração arcar com as conse-quências do ato administrativo, mediante o pagamento dos danos materiais experimentados pela exoneração dentro do período da estabilidade, ante a precariedade do ato de nomeação em cargo ou função de confiança.

29. O tema ora tratado neste parecer inclusive já foi declarado como objeto de repercussão geral no Recurso Extraordinário com Agravo nº 674.103, de relatoria do Ministro Luiz Fux, sendo certo que a decisão

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proferida neste julgamento – até o momento sem data para ocorrer – deverá, necessariamente, ser observada por todos os Tribunais do País, evitando-se maiores questionamentos e pacificando a questão, trazendo, assim, segu-rança jurídica ao tema em debate.

30. Certo é que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) segue a orienta-ção do STF sobre o tema relacionado à exoneração de cargo em comissão de grávida, sendo firme quanto à legitimidade da exoneração ad nutum do servidor designado para o exercício de função pública, ante a precariedade do ato12.

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – DISPENSA DE SERVIDORA CONTRATADA EM CARÁTER TEMPORÁRIO DURAN-TE O PERÍODO DE GESTAÇÃO – ARTS. 7º, XVIII, DA CF E 10, II, B, DO ADCT – INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA DA ESTABILIDADE PROVISÓRIA – POSSIBILIDADE – VALORES POSTERIORES À IMPETRAÇÃO – SÚMULAS NºS 269 E 271/STF – PRECEDENTES – PEDIDO DE APLICAÇÃO DO ART. 97 DO DECRETO Nº 3.048/1999 – INOVAÇÃO RECURSAL

1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as ser-vidoras públicas, incluídas as contratadas a título precário, independente-mente do regime jurídico de cinco meses após o parto, consoante dispõem os arts. 7º, XVIII, da Constituição Federal e 10, II, b, do ADCT, sendo a elas assegurada a indenização correspondente às vantagens financeiras pelo perí-odo constitucional da estabilidade. Precedentes.

2. Como o mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em rela-ção a período pretérito à impetração, os quais devem ser reclamados admi-nistrativamente ou pela via judicial adequada, em razão da incidência do teor das Súmulas nºs 269 e 271/STF, os efeitos financeiros, na espécie, são devidos a partir da data da impetração do mandamus até o quinto mês após o parto.

3. Não se admite, na via do agravo regimental, a inovação argumentativa com o escopo de alterar a decisão agravada.

4. Agravo regimental improvido. (AgRg-RMS 27.308/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior , 6ª T., DJe 28.10.2013)

ADMINISTRATIVO – CARGO COMISSIONADO – EXONERAÇÃO DE GES-TANTE– DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO – PREMIS-SAS FÁTICA E JURÍDICA DISTINTAS DAS DOS AUTOS – ALEGADA VIOLA-ÇÃO DO ART. 35 DA LEI Nº 8.112/1990 – NÃO OCORRÊNCIA – DIREITO

12 Recurso em Mandado de Segurança nº 26.107/ MG, (2008/0005463-1), Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 08.09.2014.

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DA SERVIDORA À PERCEPÇÃO DO VALOR CORRESPONDENTE À REMU-NERAÇÃO PERCEBIDA NO CARGO DURANTE O PERÍODO DA LICENÇA--MATERNIDADE

1. Cinge-se a controvérsia ao direito ou não da impetrante em receber os efeitos financeiros da função comissionada (cargo de confiança) após a exo-neração ad nutum, durante o período da licença-maternidade.

2. Os julgados confrontados partem de premissas fática e jurídica distintas. Enquanto no aresto colacionado discute-se a permanência da gestante no cargo comissionado, o cerne da controvérsia no acórdão recorrido cinge--se ao direito da gestante exonerada do cargo comissionado em receber os valores correspondentes à função durante o período da licença-maternidade. Dissídio jurisprudencial não caracterizado.

3. As servidoras públicas civis contratadas a título precário, embora não te-nham direito à permanência no cargo em comissão, em virtude da regra contida no art. 35, inciso I, da Lei nº 8.112/1990, fazem jus ao recebimento de indenização durante o período compreendido entre o início da gestação até o 5º mês após o parto. Precedentes.

4. Agravo regimental não provido. (AgRg-AREsp 26.843/DF, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., DJe 17.02.2012)

RECURSO ORDINÁRIO – CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDORA PÚBLICA DESIGNADA EM CARÁTER PRECÁRIO – EXONERAÇÃO DURANTE A GESTAÇÃO – LICEN-ÇA-MATERNIDADE – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – ART. 7º, XVIII, DA CONSTITUIÇÃO – ART. 10, II, B, DO ADCT – INDENIZAÇÃO SUBSTITUTI-VA DA ESTABILIDADE PROVISÓRIA – POSSIBILIDADE – VALORES POSTE-RIORES À IMPETRAÇÃO – SÚMULAS NºS 269 E 271/STF – PRECEDENTES

1. As servidoras públicas, incluídas as contratadas a título precário, indepen-dentemente do regime jurídico de trabalho, possuem direito à licença-ma-ternidade e à estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, consoante dispõem o art. 7º, XVIII, da Constituição Federal e o art. 10, inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sendo a elas assegurada indenização correspondente às vanta-gens financeiras pelo período constitucional da estabilidade. Precedentes.

2. O mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito à impetração, os quais devem ser reclamados administrati-vamente ou pela via judicial adequada, em razão da incidência do teor das Súmulas nºs 269 e 271 do STF.

3. Recurso ordinário parcialmente provido para assegurar à impetrante o di-reito à percepção da indenização substitutiva, correspondente à remunera-ção devida a partir da data da impetração do mandamus até o quinto mês

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após o parto (RMS 26069/MG, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, Julgado em 28.04.2011, DJe 01.06.2011).

CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDORA PÚBLICA – DISPENSA DE FUNÇÃO COMISSIONADA NO GOZO DE LICENÇA-MATERNIDADE – ES-TABILIDADE PROVISÓRIA – PROTEÇÃO À MATERNIDADE – OFENSA – RECURSO PROVIDO

1. A estabilidade provisória, também denominada período de garantia de emprego, prevista no art. 10, inciso II, letra b, do ADCT, visa assegurar à trabalhadora a permanência no seu emprego durante o lapso de tempo cor-respondente ao início da gestação até os primeiros meses de vida da criança, com o objetivo de impedir o exercício do direito do empregador de rescindir unilateralmente e de forma imotivada o vínculo laboral.

2. O Supremo Tribunal Federal tem aplicado a garantia constitucional à es-tabilidade provisória da gestante não apenas às celetistas, mas também às militares e servidoras públicas civis.

3. Na hipótese, muito embora não se afaste o caráter precário do exercício de função comissionada, não há dúvida de que a ora recorrente, servidora pública estadual, foi dispensada porque se encontrava no gozo de licença maternidade. Nesse cenário, tem-se que a dispensa deu-se com ofensa ao princípio de proteção à maternidade. Inteligência dos arts. 6º e 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal e 10, inciso II, letra b, do ADCT.

4. Recurso ordinário provido. (RMS 22361/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 08.11.2007, Data da Publicação/Fonte DJ 07.02.2008)

31. O consulente informou quando contratou o presente parecer que os empregados da empresa pública, tanto para cargos efetivos alçados atra-vés de concurso público como os nomeados para cargos em comissão, têm o regime celetista como de observância, razão pela qual, nos termos do art. 114, inciso I da Constituição Federal13, é da Justiça do Trabalho a com-petência para apreciar as demissões e exonerações de empregadas nomea-das para cargos em comissão, quando albergadas pela estabilidade decor-rente da gravidez.

13 “Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

[...].”

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32. Ainda que se saiba do paternalismo notório da Justiça do Trabalho aos empregados, em detrimento do empregador, fato é que o Tribunal Su-perior do Trabalho (TST) vem decidindo de acordo com a orientação do STF sobre a questão, permitindo a exoneração, mas acolhendo a indenização pelo período de 120 dias, determinando o pagamento dos salários e demais direitos referentes ao período de estabilidade, já que havia se exaurido o direito à reintegração.

33. Essa interpretação privilegia a segurança da gestante de forma igualitária, tanto no serviço público quanto no privado, seja nos contratos a prazo indeterminado, nos contratos de experiência ou nos contratos a título precário14.

34. Decorrente das decisões proferidas pelo STF em relação ao tema, o TST acabou por modificar a Súmula nº 244 no ano de 2012, que passou a ter a seguinte redação:

GESTANTE – ESTABILIDADE PROVISÓRIA

I – O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afas-ta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, b, do ADCT, ex-OJ 88 da SBDI-1 – DJ 16.04.2004 e republicada DJ 04.05.2004).

II – A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade.

III – A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitó-rias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determi-nado.

35. Desta forma, sob qualquer ótica de regime jurídico de contrata-ção que se faça a interpretação jurídica, a jurisprudência dos Tribunais Su-periores (STF, STJ e TST) é praticamente pacífica no sentido de que as con-tratadas para cargos em comissão podem ser exoneradas do cargo dentro do período da estabilidade pela gravidez, tendo direito à indenização material pelo tempo em que a estabilidade deveria ser observada (da confirmação da gravidez até 120 dias após o nascimento), sem direito à reintegração, deven-do o STF, em julgamento com repercussão geral, definir e dar fim a qualquer controvérsia sobre o tema, conforme dito no item 29 deste parecer.

14 RR 21700-25.2009.5.01.0079, 6ª T., Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 08.02.2012, Data de Publicação: 13.04.2012.

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36. Por fim, importante questão sobre a exoneração de pessoas nos cargos comissionados é o fato de que o Tribunal Superior do Trabalho vem decidindo de forma majoritária que, nos casos de empregados em cargos em comissão que são exonerados, existe a impossibilidade de pagamento de todas as verbas rescisórias do contrato de trabalho, como aviso-prévio, multa de 40% e FGTS, tendo em vista a precariedade desta nomeação15.

37. Ainda que o TST em sede de recurso de revista tenha compe-tência para julgar casos que atentem contra a Constituição Federal, esse posicionamento colide, salvo melhor juízo, com o que dispõe o art. 7º da Carta Federal, quando em seus incisos (I a XXXIV) apresenta os direitos do trabalhador urbano, entre eles FGTS, aviso-prévio, multa de 40%, sem fazer ressalva entre empregados em cargos em comissão.

38. Diante de tudo o que foi exposto, passo à resposta das questões que foram, a mim, submetidas pelo Senhor Presidente da EMDURB:

Sobre o item (a), Pode haver exoneração de gestante nomeada para cargo em comissão?

Sim. A gestante que ocupa cargo em comissão pode ser exonerada ainda que grávida sem qualquer justificativa do órgão empregador, tendo em vista que a própria Constituição Federal preleciona que estes cargos são demissíveis ad nutum, ou seja, por conveniência da Administração Pública.

Sobre o item (b), Existe estabilidade para gestante nomeada para car-go em comissão?

Existe estabilidade da gestante nomeada para cargo em comissão des-de a confirmação da gravidez até 120 dias após o nascimento, mas que não impede sua exoneração a qualquer momento, sem qualquer justificativa por parte da Administração, conforme resposta do item “a”.

Para que se possibilite a exoneração da gestante grávida, esta deve ser pessoa estranha aos quadros da Administração, já que se for concursada deverá retornar para cargo de origem, não podendo ser exonerada dentro do período da estabilidade.

A mesma situação ocorre para a empregada pública que exerce fun-ção de confiança, que pode ser exonerada da função, mas não do cargo que ocupa por concurso público, tendo estabilidade pela gravidez.

15 RR 1560-35.2011.5.15.0038, DEJT 20.09.2013; RR 64200-85.2009.5.15.0154, DEJT 19.12.2011; RR 59400-46.2009.5.15.0111, DEJT 13.09.2013; RR 284400-85.2009.5.15.0007, DEJT 24.05.2013; RR 168-61.2010.5.15.0049, DEJT 11.05.2012; e RR 219500-39.2009.5.15.0122, DEJT 16.08.2013.

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A estabilidade da gestante trata de verdadeiro direito adquirido, nos termos do art. 5º, inciso XXXVI, da CF.

Sobre o item (c), Quais as consequências jurídicas desta exoneração?

A consequência jurídica da exoneração de gestante de cargo em co-missão dentro do período da estabilidade é a obrigação de indenizá-la mate-rialmente através do pagamento dos salários ou vencimentos que receberia até os 120 dias após o nascimento da criança, sendo vedada a reintegração ao cargo ou função por ser de confiança e demissível ad nutum.

Clipping Jurídico

Eletroacre nomeará candidato aprovado em concurso para cadastro reserva e pre-terido por terceirizada A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Companhia de Eletrici-dade do Acre (Eletroacre) a nomear um eletricista aprovado em concurso público para a formação de cadastro de reserva, por entender que a empresa, ao contratar terceirizados no prazo de validade do concurso para as mesmas atribuições, converteu a expectativa de direito em direito subjetivo. O candidato foi aprovado em 18º lugar para o cargo no concurso público promovido pela Eletroacre, integrante da administração pública indireta do Acre, em 2010, que previa uma vaga para ocupação imediata e a inclusão dos demais aprovados em cadastro de reserva. Na reclamação trabalhista, o eletricista afirmou que a empresa decidiu contratar terceirizados e pediu fosse declarado seu di-reito à nomeação, com a condenação da Eletroacre ao pagamento dos valores relativos aos salários que deixou de receber. O Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região (RO/AC) manteve sentença que julgou o pedido improcedente, por entender que o fato de a empresa não ter eletricistas suficientes para atender a sua demanda e contratar empresas terceirizadas para consecução da sua atividade-fim não comprovaria, por si só, a existência de cargos vagos, pois estes têm previsão legal”. No recurso ao TST, o candidato reiterou sua tese de que a manutenção de terceirizados dentro da validade do concurso, para desenvolver as mesmas atividades do cargo para o qual se realizou concurso, em detrimento dos aprovados para cadastro de reserva, afronta o art. 37, inci-so II, da Constituição Federal. Segundo o Relator, Desembargador Convocado Marcelo Lamego Pertence, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça têm entendido que a contratação precária de pessoal, na validade do concurso público, por comissão, terceirização ou contratação temporária, para as mesmas atribuições do cargo ali previsto, configura preterição dos candidatos aprovados, mesmo fora das vagas do edital ou para preencher cadastro de reserva. Uma vez configurado, como no caso, o desvio de finalidade do ato administrativo, o relator observou que “a expectativa de direito convola-se em direito subjetivo à nomeação”. A decisão foi unânime. Processo: RR 1197-50.2011.5.14.0402. Fonte: Tribunal Superior do Trabalho.

TST cancela Orientação Jurisprudencial nº 155 da SDI-2 O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho aprovou, nesta terça-feira (12), o cancelamen-to da Orientação Jurisprudencial (OJ) nº 155 da Subseção 2 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2). O cancelamento, proposto pela Comissão de Jurisprudência e Pre-cedentes Normativos, baseia-se na necessidade de adequar a jurisprudência do Tribunal às alterações promovidas pelo novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), que tem aplicação subsidiária e supletiva ao processo do trabalho. A OJ 155 tinha a seguinte redação: “155. AÇÃO RESCISÓRIA E MANDADO DE SEGURANÇA – VALOR ATRIBUÍ-DO À CAUSA NA INICIAL – MAJORAÇÃO DE OFÍCIO – INVIABILIDADE – Atribuído o valor da causa na inicial da ação rescisória ou do mandado de segurança e não havendo impugnação, nos termos do art. 261 do CPC, é defeso ao juízo majorá-lo de ofício, ante a ausência de amparo legal. Inaplicável, na hipótese, a Orientação Jurisprudencial da SBDI-2 nº 147 e o art. 2º, II, da Instrução Normativa nº 31 do TST”. O § 3º do art. 292 do novo Código, porém, dispõe que “o juiz corrigirá, de ofício e por arbitramento, o valor da causa quando verificar que não corresponde ao conteúdo patrimonial em discussão ou ao proveito econômico perseguido pelo autor, caso em que se procederá ao recolhi-mento das custas correspondentes”. “O dispositivo, portanto, ao consagrar a correção, de ofício, do valor da causa, torna insubsistente o teor da OJ 155 da SDI-2”, explica o

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Presidente da Comissão de Jurisprudência, Ministro João Oreste Dalazen. Dalazen res-salta que a Instrução Normativa nº 39, que trata dos impactos do novo CPC, considera aplicável o art. 292, § 3º, ao processo do trabalho. Fonte: Tribunal Superior do Trabalho.

Para suspender auxílio-doença, INSS precisa promover reabilitação de seguradoFoi com base no entendimento de que o auxílio-doença não cessa até que o segurado possa retornar a sua atividade habitual ou seja dado como habilitado para desempenhar nova atividade, ou, ainda, que seja aposentado por invalidez (se considerado não recu-perável) que a Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) decidiu confirmar a sentença de 1º grau, determinando ao INSS que restabeleça o benefício de auxílio-doença de P. L. A., indevidamente suspenso. O auxílio-doença encontra-se regulado na Lei nº 8.213/1991 (Lei de Benefícios da Previdência Social) e é concedido àquele que se encontra incapacitado para o trabalho ou atividade por mais de 15 dias. Na hipótese de irreversibilidade da incapacidade do beneficiário para sua atividade habitual, o art. 62 da mesma lei esclarece que o benefício somente cessa nas hipóteses de conversão em aposentadoria por invalidez ou no momento em que o segu-rado estiver capacitado profissionalmente para o exercício de outro trabalho que lhe ga-ranta o sustento. No caso em análise, o Desembargador Federal André Fontes, Relator do processo no TRF2, considerou que o INSS não comprovou que tenha cumprido nenhum desses requisitos legais a fim de justificar a cessação do benefício. Isto é, não demonstrou a reabilitação profissional do segurado. Assim, se a parte autora ainda se encontrava incapacitada para o exercício de sua atividade habitual e o INSS não promoveu sua reabilitação profissional, afigura-se ilegal o cancelamento do auxílio-doença, avaliou o magistrado. Ainda segundo o relator, diante da divergência de posições entre as partes, ninguém melhor que um experto do juízo (perito) para avaliar tecnicamente a questão. No caso, o laudo do perito judicial atesta que a parte autora está acometida de Amaurose (cegueira) no olho direito e baixa visão no olho esquerdo. O documento afirma, ainda, que “[...] o autor deverá ficar em benefício previdenciário e ser submetido à nova perícia médica após o tratamento cirúrgico de catarata”. Em seu voto, Fontes esclarece, ainda, que, com relação à data de início do benefício, também deve ser mantida a decisão de 1ª instância. O entendimento deste juízo é no sentido de que deve ser restabelecido o auxílio-doença desde a cessação indevida do benefício ou do seu requerimento admi-nistrativo e que a sua eventual conversão em aposentadoria por invalidez deve ser feita a partir da juntada do laudo pericial, portanto, não merece reparo a sentença nesse ponto, concluiu o desembargador. Nº do Processo: 0009015-83.2014.4.02.9999. Fonte: Tribu-nal Regional Federal da 2ª Região.

Fechamento da Edição: 18�04�2016

Tabelas Práticas

tabela Única para atualização de débitos (atualização: abril/2016)PODER JUDICIÁRIO FEDERAL – JUSTIÇA DO TRABALHO

tabela Única para atualização de débitos trabalhistasAté 30 de abril de 2016 – Para 1º de maio de 2016** TR prefixada de 1º abril/2016 a 1º maio/2016 (Banco Central) = 0,13040%

Mês/Ano 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994

JAN 0,002828261 0,000873524 0,000266609 0,164217730 0,035758256 0,003459514 0,193525353 0,015393594 0,002940223 0,000234053 0,009090340

FEV 0,002828261 0,000873524 0,000229381 0,140585334 0,030691149 2,827324089 0,123967300 0,012805179 0,002343181 0,000184642 0,006426994

MAR 0,002828261 0,000873524 0,200577761 0,117526614 0,026018268 2,388951478 0,071748640 0,011967457 0,001865441 0,000146078 0,004595305

ABR 0,002085185 0,000624642 0,200798640 0,102634367 0,022427607 1,993950004 0,038926129 0,011029915 0,001501119 0,000116110 0,003239552

MAIO 0,002085185 0,000624642 0,199244532 0,084849840 0,018802488 1,796998906 0,038926129 0,010125690 0,001239775 0,000090555 0,002219328

JUN 0,002085185 0,000624642 0,196493622 0,068737718 0,015964076 1,634526935 0,036938820 0,009290477 0,001034784 0,000070372 0,001515520

JUL 0,001610150 0,000464920 0,194029448 0,058242432 0,013355706 1,309402340 0,033700228 0,008492209 0,000854840 0,000054099 2,837562675

AGO 0,001610150 0,000464920 0,191747651 0,056518614 0,010767257 1,016932543 0,030418114 0,007716682 0,000691115 0,041496732 2,701767722

SET 0,001610150 0,000464920 0,188579515 0,053138976 0,008923635 0,786247520 0,027507789 0,006892972 0,000560879 0,031120993 2,645389188

OUT 0,001194464 0,000366061 0,185390793 0,050282907 0,007195899 0,578335798 0,024375534 0,005902528 0,000447343 0,023117659 2,582401825

NOV 0,001194464 0,000366061 0,181951902 0,046055053 0,005654931 0,420241097 0,021436579 0,004928219 0,000357674 0,016932293 2,518062802

DEZ 0,001194464 0,000366061 0,176156358 0,040814474 0,004455508 0,297158179 0,018378411 0,003775834 0,000290108 0,012435585 2,446597684

Mês/Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

JAN 2,378267676 1,806883477 1,648840612 1,501881662 1,393290572 1,317787094 1,290729409 1,261891951 1,227491019 1,172964197 1,152015733

FEV 2,329321640 1,784530449 1,636663833 1,484866576 1,386133963 1,314961242 1,288964816 1,258630838 1,221532384 1,171464722 1,149854007

MAR 2,286942312 1,767518087 1,625906800 1,478272005 1,374726482 1,311907122 1,288490651 1,257158705 1,216525166 1,170928437 1,148748911

ABR 2,235529602 1,753248399 1,615702059 1,465093489 1,358943710 1,308972406 1,286273116 1,254952499 1,211941603 1,168850221 1,145729912

MAIO 2,160627141 1,741758021 1,605728877 1,458210734 1,350715153 1,307271646 1,284287608 1,252001531 1,206891967 1,167829538 1,143439603

JUN 2,092675863 1,731562581 1,595590495 1,451616042 1,342978255 1,304022023 1,281945493 1,249375344 1,201305895 1,166026860 1,140557414

JUL 2,033969404 1,721065800 1,585231010 1,444519120 1,338817212 1,301237375 1,280079138 1,247401954 1,196322017 1,163977097 1,137153913

AGO 1,974909729 1,711054421 1,574868376 1,436613436 1,334901944 1,299227470 1,276962074 1,244097631 1,189819653 1,161709440 1,134233262

SET 1,924778863 1,700384508 1,565055478 1,431247689 1,330982202 1,296601851 1,272589456 1,241018664 1,185034483 1,159384873 1,130315588

OUT 1,888161743 1,689201991 1,554988483 1,424818906 1,327378369 1,295257374 1,270522316 1,238597206 1,181061393 1,157384912 1,127342785

NOV 1,857439690 1,676762093 1,544864983 1,412261080 1,324378652 1,293555056 1,266832035 1,235178233 1,177278796 1,156103949 1,124980326

DEZ 1,831095716 1,663213555 1,521533784 1,403648294 1,321737820 1,292008521 1,264394282 1,231921034 1,175191656 1,154780570 1,122814417

Mês/Ano 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

JAN 1,120272519 1,097900245 1,082258248 1,064849619 1,057352925 1,050120204 1,037587110 1,034589808 1,032617271 1,023819410 1,005761007

FEV 1,117672812 1,095502191 1,081166270 1,062893895 1,057352925 1,049369904 1,036691409 1,034589808 1,031455851 1,022921285 1,004435152

MAR 1,116863086 1,094712903 1,080903610 1,062414746 1,057352925 1,048820323 1,036691409 1,034589808 1,030902257 1,022749463 1,003474827

ABR 1,114552619 1,092663067 1,080461702 1,060889187 1,056516164 1,047550691 1,035585404 1,034589808 1,030628110 1,021425695 1,001304000

MAIO 1,113600490 1,091274965 1,079430845 1,060407762 1,056516164 1,047164287 1,035350379 1,034589808 1,030155268 1,020329861 1,000000000

JUN 1,111501975 1,089434909 1,078636968 1,059931852 1,055977616 1,045522817 1,034866062 1,034589808 1,029533430 1,019154776

JUL 1,109353158 1,088396579 1,077402265 1,059236993 1,055356011 1,044359400 1,034866062 1,034589808 1,029054920 1,017310392

AGO 1,107414076 1,086800070 1,075344057 1,058124904 1,054142693 1,043077458 1,034717063 1,034373624 1,027971438 1,014970884

SET 1,104722970 1,085209153 1,073654125 1,057916494 1,053185347 1,040916515 1,034589808 1,034373624 1,027352971 1,013079465

OUT 1,103045239 1,084827294 1,071543185 1,057916494 1,052446530 1,039873522 1,034589808 1,034291915 1,026456874 1,011138079

NOV 1,100980899 1,083589834 1,068864610 1,057916494 1,051950009 1,039229200 1,034589808 1,033341241 1,025392517 1,009331376

DEZ 1,099571249 1,082950893 1,067137981 1,057916494 1,051596673 1,038559329 1,034589808 1,033127384 1,024897492 1,008023969

232 ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������RST Nº 323 – Maio/2016 – TABELAS PRÁTICAS

ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO – TR – DIÁRIA (PRO RATA DIE) MÊS ABRIL ANO 2016

DIA/MÊS TR DIÁRIA TR ACUMULADA ÍNDICE 1º ABRIL 0,006516% 0,000000% 1,00000000 02 ABRIL - 0,006516% 1,00006516 03 ABRIL - 0,006516% 1,00006516 04 ABRIL 0,006516% 0,006516% 1,00006516 05 ABRIL 0,006516% 0,013032% 1,00013032 06 ABRIL 0,006516% 0,019549% 1,00019549 07 ABRIL 0,006516% 0,026066% 1,00026066 08 ABRIL 0,006516% 0,032584% 1,00032584 09 ABRIL - 0,039102% 1,00039102 10 ABRIL - 0,039102% 1,00039102 11 ABRIL 0,006516% 0,039102% 1,00039102 12 ABRIL 0,006516% 0,045621% 1,00045621 13 ABRIL 0,006516% 0,052140% 1,00052140 14 ABRIL 0,006516% 0,058659% 1,00058659 15 ABRIL 0,006516% 0,065179% 1,00065179 16 ABRIL - 0,071699% 1,00071699 17 ABRIL - 0,071699% 1,00071699 18 ABRIL 0,006516% 0,071699% 1,00071699 19 ABRIL 0,006516% 0,078220% 1,00078220 20 ABRIL 0,006516% 0,084741% 1,00084741 21 ABRIL - 0,091262% 1,00091262 22 ABRIL 0,006516% 0,091262% 1,00091262 23 ABRIL - 0,097784% 1,00097784 24 ABRIL - 0,097784% 1,00097784 25 ABRIL 0,006516% 0,097784% 1,00097784 26 ABRIL 0,006516% 0,104306% 1,00104306 27 ABRIL 0,006516% 0,110829% 1,00110829 28 ABRIL 0,006516% 0,117352% 1,00117352 29 ABRIL 0,006516% 0,123876% 1,00123876 30 ABRIL - 0,130400% 1,00130400 1º MAIO - 0,130400% 1,00130400

LIMITES DE DEPÓSITOS RECURSAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Novos valores para Depósitos Recursais na Justiça do Trabalho (Ato nº 397/2015 do TST, DJe de 13.07.2015, vigência a partir de 01.08.2015)

Recurso Ordinário R$ 8.183,06

Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Recursos em Ação Rescisória R$ 16.366,10

Ação Rescisória – Depósito prévio de 20% do valor da causa, salvo prova de miserabilidade, nos termos do art. 836 da CLT, alterado pela Lei nº 11.495/2007, cujos efeitos começam a fluir a partir do dia 24.09.2007.

RST Nº 323 – Maio/2016 – TABELAS PRÁTICAS ����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������233

INSS – JANEIRO/2016Tabela de contribuição dos segurados empregado, empregado doméstico e trabalhador avulso, para pagamento de remuneração a partir de 1º de janeiro de 2016.

Salário-de-contribuição (R$) Alíquota para fins de recolhimento ao INSS (%) Até 1.556,94 8,00%

De 1.556,95 até 2.594,92 9,00%

De 2.594,93 até 5.189,82 11,00%

IR FONTE – TABELA PROGRESSIVA MENSAL PARA CÁLCULO A PARTIR DE ABRIL/2015 – MP 670/2015 – DOU 11�03�2015 Base de cálculo em R$ Alíquota % Parcela a deduzir do imposto em R$ Até 1.903.98 – – De 1.903,99 até 2,826,65 7,5 142,80 De 2.826,66 até 3.751,05 15,0 354,80 De 3.751,06 até 4.664,68 22,5 636,13 Acima de 4.664,69 27,5 869,36 Dedução por dependente 189,59

TABELA DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DAS PARCELAS RELATIVAS A BENEFÍCIOS PAGOS COM ATRASO (ART� 33, DECRETO Nº 3�048/1999)

Abril/2016 (Portaria nº 411, de 12.04.2016)

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/94 7,291410

ago/94 6,873501

set/94 6,517638

out/94 6,420686

nov/94 6,303442

dez/94 6,103846

jan/95 5,973037

fev/95 5,874926

mar/95 5,817334

abr/95 5,736450

maio/95 5,628385

jun/95 5,487360

jul/95 5,389275

ago/95 5,259882

set/95 5,206773

out/95 5,146558

nov/95 5,075501

dez/95 5,000001

jan/96 4,918840

fev/96 4,848059

mar/96 4,813880

abr/96 4,799960

maio/96 4,766594

jun/96 4,687838

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/96 4,631336

ago/96 4,581399

set/96 4,581215

out/96 4,575268

nov/96 4,565224

dez/96 4,552477

jan/97 4,512765

fev/97 4,442572

mar/97 4,423991

abr/97 4,373262

maio/97 4,347611

jun/97 4,334607

jul/97 4,304476

ago/97 4,300605

set/97 4,300605

out/97 4,275380

nov/97 4,260893

dez/97 4,225819

jan/98 4,196861

fev/98 4,160250

mar/98 4,159419

abr/98 4,149874

maio/98 4,149874

jun/98 4,140351

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/98 4,128790

ago/98 4,128790

set/98 4,128790

out/98 4,128790

nov/98 4,128790

dez/98 4,128790

jan/99 4,088721

fev/99 4,042235

mar/99 3,870390

abr/99 3,795244

maio/99 3,794106

jun/99 3,794106

jul/99 3,755797

ago/99 3,697014

set/99 3,644174

out/99 3,591380

nov/99 3,524762

dez/99 3,437786

jan/00 3,396015

fev/00 3,361726

mar/00 3,355351

abr/00 3,349322

maio/00 3,344973

jun/00 3,322711

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/00 3,292095

ago/00 3,219338

set/00 3,161793

out/00 3,140126

nov/00 3,128551

dez/00 3,116397

jan/01 3,092891

fev/01 3,077809

mar/01 3,067380

abr/01 3,043036

maio/01 3,009034

jun/01 2,995852

jul/01 2,952742

ago/01 2,905670

set/01 2,879753

out/01 2,868851

nov/01 2,827847

dez/01 2,806518

jan/02 2,801475

fev/02 2,796162

mar/02 2,791138

abr/02 2,788071

maio/02 2,768690

jun/02 2,738295

234 ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������RST Nº 323 – Maio/2016 – TABELAS PRÁTICAS

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

jul/02 2,691464

ago/02 2,637397

set/02 2,576590

out/02 2,510317

nov/02 2,408903

dez/02 2,275985

jan/03 2,216149

fev/03 2,169080

mar/03 2,135131

abr/03 2,100267

maio/03 2,091691

jun/03 2,105800

jul/03 2,120644

ago/03 2,124894

set/03 2,111801

out/03 2,089858

nov/03 2,080702

dez/03 2,070763

jan/04 2,058412

fev/04 2,042076

mar/04 2,034143

abr/04 2,022614

maio/04 2,014355

jun/04 2,006329

jul/04 1,996348

ago/04 1,981880

set/04 1,972020

out/04 1,968673

nov/04 1,965332

dez/04 1,956722

jan/05 1,940038

fev/05 1,929043

mar/05 1,920592

abr/05 1,906673

maio/05 1,889479

jun/05 1,876345

jul/05 1,878411

ago/05 1,877848

set/05 1,877848

out/05 1,875035

nov/05 1,864222

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

dez/05 1,854210

jan/06 1,846822

fev/06 1,839831

mar/06 1,835609

abr/06 1,830666

maio/06 1,828472

jun/06 1,826098

jul/06 1,827377

ago/06 1,825370

set/06 1,825735

out/06 1,822818

nov/06 1,815014

dez/06 1,807422

jan/07 1,796286

fev/07 1,787527

mar/07 1,780050

abr/07 1,772253

maio/07 1,767657

jun/07 1,763073

jul/07 1,757624

ago/07 1,752018

set/07 1,741741

out/07 1,737398

nov/07 1,732201

dez/07 1,724785

jan/08 1,708215

fev/08 1,696509

mar/08 1,687901

abr/08 1,679336

maio/08 1,668657

jun/08 1,652790

jul/08 1,637885

ago/08 1,628440

set/08 1,625028

out/08 1,622594

nov/08 1,614521

dez/08 1,608409

jan/09 1,603758

fev/09 1,593559

mar/09 1,588635

abr/09 1,585464

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

maio/09 1,576791

jun/09 1,567387

jul/09 1,560832

ago/09 1,557250

set/09 1,556005

out/09 1,553520

nov/09 1,549800

dez/09 1,544087

jan/10 1,540390

fev/10 1,526953

mar/10 1,516338

abr/10 1,505648

maio/10 1,494737

jun/10 1,488337

jul/10 1,489976

ago/10 1,491020

set/10 1,492064

out/10 1,484050

nov/10 1,470521

dez/10 1,455529

jan/11 1,446848

fev/11 1,433375

mar/11 1,425676

abr/11 1,416328

maio/11 1,406203

jun/11 1,398234

jul/11 1,395164

ago/11 1,395164

set/11 1,389329

out/11 1,383105

nov/11 1,378693

dez/11 1,370879

jan/12 1,363923

fev/12 1,357002

mar/12 1,351731

abr/12 1,349302

maio/12 1,340721

jun/12 1,333388

jul/12 1,329930

ago/12 1,324236

set/12 1,318303

MêsFator Simplificado

(Multiplicar)

out/12 1,310050

nov/12 1,300814

dez/12 1,293828

jan/13 1,284324

fev/13 1,272616

mar/13 1,266032

abr/13 1,258481

maio/13 1,251100

jun/13 1,246736

jul/13 1,243255

ago/13 1,244873

set/13 1,242885

out/13 1,239538

nov/13 1,232023

dez/13 1,225406

jan/14 1,216646

fev/14 1,209029

mar/14 1,201340

abr/14 1,191569

maio/14 1,182347

jun/14 1,175295

jul/14 1,172247

ago/14 1,170725

set/14 1,168622

out/14 1,162924

nov/14 1,158521

dez/14 1,152413

jan/15 1,145313

fev/15 1,128609

mar/15 1,115667

abr/15 1,099071

maio/15 1,091323

jun/15 1,080625

jul/15 1,072368

ago/15 1,066184

set/15 1,063525

out/15 1,058128

nov/15 1,050043

dez/15 1,038516

jan/16 1,029252

fev/16 1,013942

mar/16 1,004400

Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

artIgo doutrINárIo

• ONovoCPC,asCondiçõesdaAçãoeoProcessodoTrabalho Carlos Henrique Bezerra Leite e Letícia Durval Leite Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

Índice Alfabético e Remissivo

índice por assunto especial

DOUTRINAS

Assunto

A ExEcução TrAbAlhisTA E o Novo cPc

•A Fase de Cumprimento da Sentença no Pro-cesso do Trabalho e o Novo CPC (Paulo SérgioJakutis) .................................................................27

•O CPC 2015 e o Direito Processual do Traba-lho: Reflexões acerca da Aplicação do NCPCao Processo do Trabalho (Ben-Hur Silveira Claus) ...9

Autor

bEN-hur silvEirA clAus

•O CPC 2015 e o Direito Processual do Traba-lho: Reflexões acerca da Aplicação do NCPCao Processo do Trabalho ........................................9

PAulo sérgio JAkuTis

•A Fase de Cumprimento da Sentença no Pro-cesso do Trabalho e o Novo CPC ........................27

índice geral

DOUTRINAS

Assunto

DirEiTo Do TrAbAlho

•A Legalização da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do Direito (Marcus Orione, Jorge Luiz Souto Maior, Flávio Roberto Batista e Pablo Biondi) ............................43

TEmPo DE sErviço

•Reflexões acerca da Diferença de Tempo de Serviço Como Critério Excludente da Equipa-ração Salarial (Pollyanna Silva Guimarães) ..........71

Autor

Flávio robErTo bATisTA

•A Legalização da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do Direito ......43

JorgE luiz souTo mAior

•A Legalização da Classe Trabalhadora Comouma Introdução à Crítica Marxista do Direito ......43

mArcus orioNE

•A Legalização da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do Direito ......43

PAblo bioNDi

•A Legalização da Classe Trabalhadora Como uma Introdução à Crítica Marxista do Direito ......43

PollyANNA silvA guimArãEs

•Reflexões acerca da Diferença de Tempo de Serviço Como Critério Excludente da Equipa-ração Salarial .......................................................71

Seção especial

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

Assunto

PriNcíPio

•Desconstruindo o Princípio da Subordinação Objetiva ou Estrutural Ricardo Araujo Cozer) ......207

Autor

ricArDo ArAuJo cozEr

•Desconstruindo o Princípio da SubordinaçãoObjetiva ou Estrutural ........................................207

PARECER JURÍDICO

Assunto

EsTAbiliDADE

•Cargo em Comissão – Exoneração Ad Nutum – Gestante – Possibilidade – Existência de Es-tabilidade Somente para Fins de Indenização (Rafael de Almeida Ribeiro) ...............................213

Autor

rAFAEl DE AlmEiDA ribEiro

•Cargo em Comissão – Exoneração Ad Nutum – Gestante – Possibilidade – Existência de Es-tabilidade Somente para Fins de Indenização ....213

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

Trabalhista

Ação cAuTElAr

•Recurso ordinário em ação cautelar inomina-da – Medida cautelar para suspender execu-ção de acordo homologado em juízo em ação civil pública – Presença do fumus boni iuris e do periculum in mora – Configurados os re-quisitos para a manutenção da medida caute-lar concedida no acórdão do tribunal regional(TST) ........................................................33392, 87

RST Nº 323 – Maio/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �����������������������������������������������������������������������������������������������������������237 ADicioNAl DE risco

•O fato de o empregado ter contato com o nu-merário da bilheteria não tem o condão de transformá-lo em exercente da área de segu-rança. O seu cargo está relacionado com a parte operacional da estação, conforme perfil do cargo que ocupava (Agente Operacional I). Desta forma, o autor não tem direito a receber o adicional de risco, posto que não atuava nas funções típicas de segurança operacional ou da segurança patrimonial. Nego provimento(TRT 2ª R.) ...............................................33393, 98

DANo morAl

• Injúria racial – Assédio discriminatório ca-racterizado – Indenização por danos morais – Responsabilidade do empregador (TRT 24ª R.) ..............................................................33395, 110

sAlário

•Diferenças salariais – Ausência de critérios le-gais de progressão entre cada padrão salarial do cargo de oficial administrativo – Ilegali-dade reconhecida (TRT 15ª R.) ..............33394, 103

PREVIDENCIÁRIO

AgrAvo

•Previdenciário – Agravo regimental no agra-vo em recurso especial – Conversão de tempo comum em especial após a Lei nº 9.032/1995 – Impossibilidade – REsp 1.310.034/PR, subme-tido ao rito do art. 543-C do CPC (STJ)...33434, 162

APosENTADoriA Por iNvAliDEz

•Previdenciário – Adicional de 25% previsto no art. 45 da Lei nº 8.213/1991 exclusiva-mente para aposentadoria por invalidez – Ex-tensão a outros benefícios – Impossibilidade(TRF 4ª R.) .............................................33438, 182

APosENTADoriA Por TEmPo DE coNTribuição

•Remessa necessária – Previdenciário – Aposen-tadoria proporcional por tempo de contribui- ção – EC 20/1998 – Regras de transição – Re-quisitos de pedágio e idade mínima cumpridos – Benefício assegurado – Direito ao recebimen-to das parcelas em atraso – Correção e juros de mora – Aplicabilidade da Lei nº 11.960/2009 – Remessa parcialmente provida (TRF 2ª R.) ..............................................................33436, 172

Auxílio-AciDENTE

•Previdenciário – Auxílio-acidente – Aposenta-doria – Cumulação – Inviabilidade – conces-são da aposentadoria posterior à vigência daLei nº 9.528/1997 (STJ) ..........................33433, 154

bENEFício PrEviDENciário

•Previdenciário – Revisão de benefício – Deca-

dência – Configuração – Benefício concedido antes da Medida Provisória nº 1.523-9/1997 e da Lei nº 9.528/1997 – Termo a quo do pra-zo decadencial – Matéria submetida ao rito do art. 543-C do CPC – Recursos Especiaisnºs 1.309.529/PR e 1.326.114/SC (STJ) ..33432, 144

comPETêNciA

•Direito constitucional e direito do trabalho – Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo – Competência da Justiça do Tra-balho – Contrato de trabalho anterior à CF/1988 – Inexistência de transposição ao regime jurídi-co único – Alegação de nulidade do contrato de trabalho – Súmula nº 284/STF – Precedentes(STF) ......................................................33431, 139

PENsão

•Previdenciário – Benefício – pensão por morte – Instituidor da pensão – Contribuinte indivi-dual – Dívida com o INSS relativa ao período de 04/1995 a 01/2003 – Parcelamento – Lei nº 10.684/2003 – Pagamento de apenas 06 (seis) parcelas de um total de 89 (oitenta e nove) – Indeferimento do benefício na via adminis-trativa pela perda da qualidade de segurado do falecido – Apelação do INSS e remessa ofi-cial providas (TRF 5ª R.) .........................33439, 188

•Previdenciário – Pensão por morte – Filho – Maior de 21 anos – Inexistência de previsão le-gal – Benefício indevido (TRF 1ª R.) .......33435, 168

TEmPo DE sErviço EsPEciAl

•Previdenciário – Processo civil – Agravo do § 1º, art. 557 do CPC – Atividade especial – Exposição a ruído – Perfil profissiográfico pre-videnciário e laudo técnico extemporâneos –Irrelevância (TRF 3ª R.) ..........................33437, 179

EMENTÁRIO

Trabalhista

ADicioNAl DE iNsAlubriDADE

•Adicional de insalubridade – cortador de cana--de-açúcar – fuligem resultante da queima da cana – contato com hidrocarbonetos aromáti-cos – pagamento devido ........................33396, 124

•Adicional de insalubridade – uso de headset – pagamento devido .............................33397, 124

APosENTADoriA

•Aposentadoria compulsória – empregador pú-blico – efeitos ........................................33398, 124

AsséDio morAl

•Assédio moral – cobrança excessiva de me-tas – prova documental – indenização devida ..............................................................33399, 125

238 ������������������������������������������������������������������������������������������������������������ RST Nº 323 – Maio/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

ATlETA ProFissioNAl

•Atleta profissional – luvas – pagamento devido ..............................................................33400, 126

Auxílio-DoENçA

•Auxílio-doença – alta previdenciária – retorno do empregado – inaptidão para o trabalho de-clarada pelo médico da empresa – limbo pre-videnciário – pagamento de salários – obriga-toriedade ...............................................33401, 128

•Auxílio-doença – cessação – retorno ao tra-balho – incapacidade laborativa – retorno ao INSS – obrigatoriedade ..........................33402, 128

Aviso-Prévio

•Aviso-prévio proporcional – liberação do em-pregado – termo inicial ..........................33403, 129

corrEção moNETáriA

•Correção monetária – crédito trabalhista – IP-CA-E – inconstitucionalidade parcial – efeitos ..............................................................33404, 129

DANo morAl

•Dano moral – acusação de atestado falso – au-sência de comprovação – indenização – cabi-mento ....................................................33405, 130

•Dano moral – assédio sexual – comprovação– indenização – pagamento devido .......33406, 130

•Dano moral coletivo – contratação de apren-dizes – cota mínima – empresa em dificulda-de financeiras – fato relevante – observação ..............................................................33407, 130

•Dano moral coletivo – descumprimento de nor-mas trabalhistas – efeitos .......................33408, 131

•Dano moral – discriminação – prova teste-munhal – valoração – indenização devida ..............................................................33409, 131

•Dano moral – doença emocional – stress – ne- xo causal não provado – indenização indevida ..............................................................33410, 132

EmPrEgADor

•Empregador – contratação obrigatória de por-tadores de deficiência – observação ......33411, 132

EsTAbiliDADE ProvisóriA

•Estabilidade provisória – gestante – dispensa imotivada – dano moral – indenização devida ..............................................................33412, 132

ExEcução

•Execução fiscal – dívida de natureza não tri-butária – inaplicabilidade – desconsidera-ção da personalidade jurídica – inexistência ..............................................................33413, 132

•Execução – fraude – imóvel alienado an-tes da propositura da ação – não ocorrência ..............................................................33414, 132

•Execução – imóvel arrematado – efeitos . 33415, 133

horAs in itinere

•Horas in itinere – limites do poder negocial – impossibilidade de renúncia – pactuação dotempo de percurso – validade ................33416, 133

iNcomPETêNciA

• Incompetência territorial – princípio da ponde-ração de interesses – observação ...........33417, 133

iNsAlubriDADE

• Insalubridade – expedição do perfil profissiográ-fico previdenciário – obrigatoriedade ...... 33418, 133

JorNADA DE TrAbAlho

• Jornada de trabalho – turnos ininterruptos de revezamento – negociação coletiva – jornada superior a oito horas – invalidade ..........33419, 134

JorNAlisTA

• Jornalista – empregado público – reconheci-mento ....................................................33420, 134

moTorisTAs

•Motoristas e cobradores – cota de aprendizes– base de cálculo – observação .............33421, 135

PArTiciPAção Nos lucros

•Participação nos lucros e resultados – resulta-do financeiro líquido positivo – observação ..............................................................33422, 135

PrEscrição

•Prescrição – pronúncia de ofício – impossibili-dade ......................................................33423, 135

ProcEsso Do TrAbAlho

•Processo do trabalho – multa do art. 475-Jdo CPC – inaplicabilidade .....................33424, 136

rEscisão iNDirETA

•Rescisão indireta – descumprimento de normaslegais pelo empregador – cabimento .....33425, 136

rEsPoNsAbiliDADE TrAbAlhisTA

•Responsabilidade trabalhista solidária – con-sórcio de empregadores urbanos – cabimento ..............................................................33426, 136

•Responsabilidade trabalhista solidária – diri-gente de clube esportivo – desconsideraçãoda personalidade jurídica – alcance .......33427, 137

•Responsabilidade trabalhista subsidiária – contratos de compra e venda de cana futura –inextensão .............................................33428, 137

rurícolA

•Rurícola – hora noturna reduzida – inaplica-bilidade .................................................33429, 137

RST Nº 323 – Maio/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �����������������������������������������������������������������������������������������������������������239 siNDicATo

•Sindicato – contribuição assistencial – defini-ção em instrumento coletivo – efeitos ....33430, 138

Previdenciário

Ação AciDENTáriA

•Ação acidentária – fratura da tíbia e da fíbula da perna esquerda decorrente de uma partida de futebol – acidente do trabalho – não con-figuração – efeitos ..................................33440, 192

Ação PrEviDENciáriA

•Ação previdenciária – adimplemento de débi-tos judiciais comuns – impenhorabilidade – ocorrência .............................................33441, 193

APosENTADoriA EsPEciAl

•Aposentadoria especial – segurado individual – tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à saúde ou integridade física – pos-sibilidade ...............................................33442, 194

•Aposentadoria especial – trabalho em con-dições especiais – ruído – uso de EPI – irrele-vância – benefício devido ......................33443, 194

APosENTADoriA Por iDADE

•Aposentadoria por idade – períodos de traba-lho urbano do falecido marido da autora – in-clusão – recálculo da RMI – recebimento das diferenças desde o requerimento administrativo– efeitos .................................................33444, 195

•Aposentadoria por idade – rurícola – coisa julgada – extinção do feito – condenação em litigância por má-fé, custas e honorários – be-neficiária da justiça gratuita – efeitos .....33445, 196

•Aposentadoria por idade – rurícola – regime deeconomia familiar – reconhecimento .....33446, 197

APosENTADoriA Por TEmPo DE coNTribuição

•Aposentadoria por tempo de contribuição – conversão de períodos laborados em condi-ções especiais – agente nocivo – eletricidade – cabimento ...........................................33447, 199

•Aposentadoria por tempo de contribuição – conversão do tempo laborado em condições especiais – ruído – possibilidade ............33448, 199

•Aposentadoria por tempo de contribuição – re-núncia – concessão de novo benefício – pos-sibilidade ...............................................33449, 200

Auxílio-rEclusão

•Auxílio-reclusão – autora dependente do ma-rido recluso – concessão ........................33450, 201

bENEFício AssisTENciAl

•Benefício assistencial – renda per capita fami-liar – observação ...................................33451, 202

bENEFício PrEviDENciário

•Benefício previdenciário – decadência – obser-vação .....................................................33452, 202

PENsão

•Pensão por morte – menor sob guarda – de-pendência econômica – não comprovação – pagamento indevido ...........................33453, 202

•Pensão por morte – termo inicial ...........33454, 203

sErviDor Público

•Servidor público – pensão por morte – can-celamento – menor sob guarda – restabeleci-mento – impossibilidade ........................33455, 204

TEmPo DE sErviço

•Tempo de serviço – professor – reconhecimento ..............................................................33456, 205

•Tempo de serviço especial e comum – uso de EPI – conversão – possibilidade .............33457, 206

CLIPPING JURÍDICO

•Eletroacre nomeará candidato aprovado em concurso para cadastro reserva e preterido porterceirizada .......................................................229

•Para suspender auxílio-doença, INSS precisapromover reabilitação de segurado ....................230

•TST cancela Orientação Jurisprudencial nº 155da SDI-2 ............................................................229

TABELAS PRÁTICAS ............................................. 231

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ....................... 235

ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ..................... 236