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INFLUÊNCIAS E APROXIMAÇÕES DE PAULO FREIRE DAS METODOLOGIAS CRÍTICAS APLICADAS À EDUCAÇÃO FÍSICA

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  • PAULO FREIRE E AS METODOLOGIAS CRTICAS DA EDUCAO FSICA:

    INFLUNCIAS E APROXIMAES

    Tzusy Estivalet de Mello MARIMON1

    [email protected]

    RESUMO

    O presente trabalho, em andamento, objetiva analisar as metodologias crticas da

    Educao Fsica, verificando a influncia da Teoria freiriana nestas e as aproximaes existentes.

    A Educao Fsica no Brasil, surge nas escolas no sculo XIX como fruto do higienismo, da

    eugenia e do militarismo, onde passa por uma renovao de seus conhecimentos a partir da

    dcada de 1980, junto abertura democrtica do pas. A partir desta dcada, inmeras discusses

    acerca do papel da Educao Fsica comearam a surgir e junto a elas, a elaborao de novas

    metodologias. Entre essas novas abordagens este estudo investiga as metodologias crtico-

    superadora, aberta, crtico-emancipatria e as abordagens culturais, por entender que as mesmas

    trazem tona as razes oprimidas, rompendo com uma pedagogia elitista, reprodutora do sistema

    hegemnico, estando, portanto, prximas Teoria freiriana. Para a anlise dessas leituras tem-se

    como referencial o legado freiriano e autores da pedagogia crtica da Educao Fsica, entre os

    quais Celi Nelza Zulke Taffarel, Marcos Neira e Mrio Garcia, Coletivo de Autores, Eleonor

    Kunz e Valter Bracht. Percebe-se o direcionamento dessas abordagens da Educao Fsica para

    uma leitura crtica do mundo, onde autores se baseiam nas concepes freirianas para buscar

    amparo s suas inquietudes, estando presentes nas propostas destas metodologias vrios

    conceitos e categorias de Paulo Freire, alm de ser enfatizada a ao problematizadora e

    participativa em todas as etapas do ensino.

    Palavras-chave: Educao Fsica Metodologias crticas Paulo Freire.

    Introduo

    Partindo das leituras do Legado Freiriano e da Histria da Educao Fsica no Brasil

    realizados para elaborao de minha dissertao de mestrado, percebi o quanto Paulo Freire

    exerce influncia sobre as metodologias crticas da Educao Fsica. Esta influncia fica evidente

    no apenas atravs das referncias feitas a Freire ou nas citaes extradas de obras freirianas,

    mas tomam corpo quando se afirmam como princpios, significados e valores culturais a serem

    trabalhados pela disciplina de Educao Fsica na escola.

    Sabemos da importncia da obra de Paulo Freire, a qual brotou em meados dos anos 60

    com a educao popular e nos dias de hoje se mostra to viva quanto atual.

    1 Mestranda do programa de Ps-graduao em Educao (PPGE)-UNINOVE; Bolsista CAPES. So

    Paulo/SP.

  • Freire em sua obra, no se preocupou em construir uma teoria, uma metodologia de

    ensino, mas sim, em trazer tona, as questes oprimidas, sendo um de seus grandes lemas no a

    reproduo de suas idias, mas a reinveno destas idias em novos contextos (Freire, 1979),

    o que de fato, ocorre em algumas das abordagens metodolgicas da Educao Fsica.

    Para melhor situar as idias de Paulo Freire nas Teorias Crticas da Educao Fsica,

    faremos um breve histrico da Educao Fsica no Brasil e aps analisaremos algumas das

    Teorias Crticas da Educao Fsica, buscando as influncias e aproximaes junto as idias de

    Paulo Freire.

    Um breve histrico: A Educao Fsica Escolar no Brasil

    Primeiro Momento: Enquadrar e servir

    No Brasil, a Educao Fsica Escolar surge no sculo XIX com forte influncia dos

    mdicos higienistas preocupados com a alta taxa de mortalidade da populao branca brasileira,

    por falta de cuidados bsicos de higiene. Esta insero foi ainda reforada pelos interesses

    militares e do nacionalismo (Betti, 1991).

    A obrigatoriedade da Educao Fsica foi, portanto, instituda com objetivos pautados

    pela higiene, sade e eugenia, preocupada em oferecer atividades saudveis que produzissem

    homens preparados para atividades intelectuais (fsico a servio do intelecto) e mulheres prontas

    para gerar filhos fortes e cuidar da famlia. Essa funo originada no bero do movimento

    higienista perdurou por todo o sculo XIX (Castellani-Filho, 1988).

    Com as mudanas derivadas pela tecnologia, emergente no sculo XX, a sociedade

    brasileira sofre a sedentarizao provocada principalmente pelos meios de transporte. Mas no

    campo da Educao Fsica houve poucas mudanas, continuando esta com seu carter utilitrio

    caracterstico do sculo passado, ou seja, a Educao Fsica Escolar continuava com o objetivo

    de formar homens fortes para o bem da ptria.

    Para contextualizarmos melhor a prtica dessa disciplina na escola, a situaremos em trs

    perodos: o estado novo, a ditadura militar e a ps-ditadura ou perodo de abertura poltica.

    No 1 perodo, o qual perdurou at 1945, tivemos na presidncia Getlio Vargas, que

    decretou com uma nova Constituio o nascer de uma nova era2. Esta foi muito bem pensada,

    elaborada e de cunho autoritrio e fascista, sendo, na verdade, o incio de uma ditadura. Neste

    2 No artigo Educao Conveniente do Blog Controvrsia , Rosane Pavam diz que o nascer de uma nova era veio acompanhado de uma nova Constituio, tirada da gaveta e inspirada no fascismo italiano. No artigo, a autora indica aos interessados no assunto da Educao nesta poca, a leitura da tese de doutorado A dimenso da educao nacional: um estudo scio-histrico sobre as estatsticas oficiais da escola brasileira (2007, FE/USP), que cobre o perodo de 1871 at a dcada de 40.

  • perodo, cabia Educao Fsica, enquanto instrumento da ideologia do poder dominante,

    atender as necessidades de segurana nacional aos perigos internos (revoltas existentes) e

    externos (Brasil na 2 guerra), formando mo de obra adestrada para assegurar o processo

    acelerado de industrializao implantado no pas. Assim, a Educao Fsica continuava a ser vista como poderoso auxiliar no fortalecimento do Estado e possante meio para o aprimoramento

    da raa (Castellani-Filho, 1988).

    Com o fim das grandes guerras (19311945) e do Estado Novo, deu-se incio a uma srie

    de debates promovidos por diversos educadores sobre os rumos da educao. Em relao

    Educao Fsica, surgiu como proposta integr-la como disciplina educativa no mbito da rede

    pblica de ensino. Nesta mesma poca, o modelo denominado Escola Nova3 ganha fora na

    Educao, repercutindo no discurso da Educao Fsica.

    Reforando a idia da Educao Fsica Eugenista e a servio da militarizao, Betti

    (1991) comenta que, quanto aos contedos, at os anos 60, a Educao Fsica esteve centrada

    nos movimentos ginsticos europeus, especialmente os de Ling, Janh e depois, da escola

    francesa. O mtodo francs, principal referncia nesta poca, preconizava uma Educao Fsica

    orientada pelos princpios antomo-fisiolgicos, visando o desenvolvimento harmnico do corpo

    e, na idade adulta, manuteno e melhoria do funcionamento dos rgos, enquanto valores

    subjacentes buscavam um homem obediente, submisso e que respeitasse as autoridades

    superiores sem questionamento, alm disso, no havia preocupao com o ensino de conceitos de

    qualquer espcie (Coletivo de Autores, 1992).

    Na dcada de 1970, o governo militar apoiou a Educao Fsica na escola visando

    formao de um exrcito composto por uma juventude forte e saudvel que se traduzisse na

    formao de hbitos de disciplina mental e corporal favorveis ao desempenho pleno, correto e

    til da personalidade" (BETTI, 1991, p.76) e tambm desmobilizao de foras oposicionistas.

    Assim, estreitaram-se os vnculos entre esporte e nacionalismo (Id., ib.). Fortaleceu-se, desta

    maneira, o contedo esportivo na escola, reforando valores como a racionalidade, a eficincia e

    a produtividade.

    Para caracterizar o esporte nesse momento histrico em que o mesmo servia como

    analgsico no movimento social, importante salientar que os atletas de alto nvel foram

    transformados em heris da ptria com uma massiva divulgao dos seus feitos. Seguindo

    nesta mesma linha de cegueira da sociedade, a ditadura foi prdiga em enaltecer a necessidade

    3 A Escola Nova foi um movimento de renovao educacional muito forte na Europa, nos Estados Unidos e no

    Brasil. Se por um lado defendia-se a universalizao da escola pblica, laica e gratuita, por outro seu objetivo era

    preparar os homens para acompanhar o crescimento industrial e econmico da sociedade de consumo.

  • da prtica da Educao Fsica em todos os nveis de ensino, instituindo neste perodo a

    obrigatoriedade desta no Ensino Superior como uma ttica poltica de ocupao do tempo dos

    estudantes universitrios para assim afast-los das chamadas revolucionrias.

    Observa-se, atravs do exposto, que o governo intensifica as prticas de dominao nas

    relaes de poder utilizando o tecnicismo de forma estratgica na Educao Fsica para assim

    neutralizar os corpos e dificultar a resistncia ante o poder ditatorial.

    A crise e o despertar

    A partir da dcada de 1980, com o novo cenrio poltico inerente a abertura democrtica,

    a Educao Fsica entra em crise de identidade, contestando fortemente os paradigmas de esporte

    de rendimento para a escola. Como fruto deste descontentamento, surgem novas formas de se

    pensar a Educao Fsica, resultando em discusses, livros e artigos que, alm de criticar o

    ocorrido at ento, buscavam elaborar novas propostas para a Educao Fsica na escola.

    Darido (2003), nesta mesma direo, diz que o perodo ps-ditadura foi marcado pela

    busca por mudanas quanto a questes filosficas e didtico-metodolgicas. Em termos tericos

    considera-se que a partir dos anos 1980, esto sendo encaminhados para uma resoluo, grandes

    dilemas paradigmticos na rea de Educao Fsica Escolar, porm, no que se refere sua prtica

    ainda h longo caminho a ser percorrido. (Darido, 2003)

    Por este pequeno resumo histrico sobre a Educao Fsica no Brasil, acreditamos que

    ficou evidente o papel atribudo a disciplina at os anos 1980, isto , de servir a interesses

    ideolgicos, tendo pouca preocupao com o Homem em si, suas necessidades e carncias.

    Entre as novas abordagens que surgiram na crise da Educao Fsica nos anos 80,

    podemos citar: abordagem desenvolvimentista, construtivista-interacionista, ensino-aberto,

    crtico-superadora, sistmica, da psicomotricidade, crtico-emancipatria, plural ou cultural, dos

    jogos cooperativos, da sade renovada e dos PCNs.

    No objetivo deste trabalho, fazer um aprofundamento em todas estas abordagens, mas

    sim, analisar algumas metodologias da Educao Fsica que se aproximam ou tem influncias da

    Teoria Freiriana. Como esta anlise encontra-se em elaborao, nos ateremos aos princpios

    freirianos da dialogicidade, historicidade, e conscientizao.

    Analisaremos entre as abordagens que surgiram na dcada de 80, as abordagens crticas:

    crtico-superadora, fundada em princpios marxistas; crtico-emancipatria, a qual teve suas

    primeiras elaboraes fortemente influenciadas por Paulo Freire; a metodologia de ensino-

    aberto, menos conhecida, mas que tambm tem influncia freiriana; e tambm a abordagem

    cultural, a qual est baseada no multiculturalismo crtico.

  • Abordagem crtico-superadora

    Esta abordagem foi elaborada em 1991 pelo Grupo de Trabalho Pedaggico. Este grupo

    se auto-intitulou como o Coletivo de Autores4.

    Baseada no materialismo histrico-dialtico, o qual muito influenciou Paulo Freire, a

    abordagem crtico superadora tem como objetivo possibilitar ao aluno a anlise e a interpretao

    da realidade compreendendo que toda produo humana tem relao com o momento histrico,

    emitindo um juzo que depende de pessoa para pessoa (Coletivo de Autores, 1992).

    Nesta concepo, no se trata somente de aprender o jogo pelo jogo, o esporte pelo

    esporte ou a dana pela dana, o elemento trabalhado nas aulas de Educao Fsica escolar, vo

    alm da prtica desportiva. Para os autores, esses contedos devem receber um outro

    tratamento metodolgico, a fim de que possam ser historicizados criticamente e apreendidos, na

    sua totalidade, enquanto conhecimentos construdos culturalmente, sendo, ainda,

    instrumentalizados para uma interpretao crtica da realidade que envolve o aluno. Portanto, a

    abordagem crtico-superadora:

    Busca desenvolver uma reflexo pedaggica sobre o acervo de formas de

    representao do mundo que o homem tem produzido no decorrer da

    histria, exteriorizadas pela expresso corporal: jogos, danas, lutas,

    exerccios ginsticos, esporte, malabarismo, contorcionismo, mmica e

    outros que podem ser identificados como forma de representao simblica

    de realidades vividas pelo homem, historicamente criadas e culturalmente

    desenvolvidas (Coletivo de Autores, 1992, p. 38).

    Para a proposta, o objeto da rea de conhecimento da Educao Fsica a cultura

    corporal nos seus diferentes temas (o esporte, a ginstica, o jogo, as lutas, a dana e a mmica),

    sistematizando este conhecimento em ciclos (1 - da organizao da identidade dos dados da

    realidade; 2 - da iniciao sistematizao do conhecimento; 3 - da ampliao da

    sistematizao do conhecimento; 4 - do aprofundamento da sistematizao do conhecimento), e

    propondo que este seja tratado de forma historicizada, de maneira a ser apreendido em seus

    movimentos contraditrios (Bracht, 1999).

    Os autores defendem que uma proposta crtica de Educao Fsica deve partir de uma

    anlise das estruturas de poder e dominao de nossa sociedade. Tendo como base o

    4 Trata-se do grupo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE): professores Celi Nelza Zulke Taffarel, Eliane

    de Abreu Moraes, Merca do Carmo Andrade, Michele Ortega Escobar, Vera Luis Lins Costa e tambm do grupo da

    Universidade Federal de Santa Maria (UFSM): professores Amauri Bassli de Oliveira, Carlos Luiz Cardoso, Reiner

    Hildebrandt e Wenceslau Virglio C. L. Filho.

  • materialismo histrico-dialtico de Marx, para os autores o professor de Educao Fsica deve

    ser um educador comprometido com um projeto poltico pedaggico, que nasce das necessidades

    de emancipao de uma classe emergente dentro da nossa atual estrutura de diviso de classes,

    ou seja, a classe trabalhadora. Segundo os autores (1992):

    Todo educador deve ter definido seu projeto poltico-pedaggico...

    preciso que tenha bem claro: qual o projeto de sociedade e de homem que

    persegue? Quais os interesses de classe que defende? Quais os valores, a

    tica e a moral que elege para consolidar atravs de sua prtica? Como

    articula suas aulas com esse projeto maior de homem e de sociedade? (p.

    26).

    evidente nesta abordagem, a importncia dada histria da cultura corporal para a formao

    de um sujeito crtico e autnomo. Em relao historicidade e as prticas de ensino, Freire

    (1994), diz que:

    A concepo e a prtica bancrias, imobilistas, fixistas, terminam por desconhecer os homens como seres histricos, enquanto a

    problematizadora parte exatamente do carter histrico e da historicidade

    dos homens. Por isto mesmo que os reconhece como seres que esto

    sendo, como seres inacabados, inconclusos, em e com uma realidade, que

    sendo histrica tambm, igualmente inacabada (p. 42).

    Com isso, podemos afirmar que esta metodologia alm de trabalhar a questo histrica da cultura

    corporal, preocupa-se com a conscientizao dos alunos e alunas, promovendo assim, uma

    leitura crtica da realidade.

    Abordagem crtico-emancipatria

    A partir do livro Ensino e Mudanas (1991), Eleonor Kunz pe em discusso a

    abordagem crtico-emancipatria, que, juntamente com a metodologia crtico-superadora,

    tornam-se os principais referenciais das denominadas pedagogias crticas da Educao Fsica no

    Brasil.

    A concepo apresentada por Kunz difere da abordagem crtico-superadora,

    principalmente no seu referencial terico. Como foi dito anteriormente, as anlises propostas

    pelo Coletivo de Autores se pautam em um referencial materialista histrico dialtico, visando

    um ensino baseado nos interesses da denominada classe trabalhadora.

    J a metodologia critico-emancipatria tem suas primeiras elaboraes fortemente

    influenciadas pela pedagogia de Paulo Freire (Kunz 1991). Aps, com base nas referencias do

    filsofo alemo Jergen Habermas, pertencente segunda gerao da denominada Escola de

    Frankfurt, Kunz discute a relao entre emancipao e ao comunicativa.

  • A metodologia de ensino para a Educao Fsica, proposta por Kunz, tem por objetivo a

    formao de sujeitos crticos e autnomos para transformao (ou no) da realidade em que esto

    inseridos, por meio de uma educao de carter crtico, reflexivo e fundamentada no

    desenvolvimento de trs competncias: 1) A competncia objetiva, que visa a desenvolver a

    autonomia dos alunos atravs da tcnica; 2) A competncia social, referente aos conhecimentos e

    esclarecimentos que os alunos devem adquirir para entender o prprio contexto scio-cultural; 3)

    A competncia comunicativa, que assume um processo reflexivo responsvel por desencadear o

    pensamento crtico e ocorre atravs da linguagem que pode ser de carter verbal, escrita e/ou

    corporal (Bracht, 1999).

    A proposta de Kunz parte de uma concepo de movimento que ele denomina de

    dialgica5, ou seja, o movimentar-se humano entendido como uma forma de comunicao com

    o mundo. Segundo Romo (2002), sem a dialogicidade,

    [...] o processo de humanizao no pode ocorrer, porque os homens e

    mulheres s se completam na busca permanente da plenitude nunca alcanada e essa busca sempre dialgica, em dois nveis: dilogo entre seres em processo comungado de conscientizao e dilogo deste coletivo

    com o mundo. (p. 12).

    Freire afirma que a relao dialgica necessria para o processo de construo do

    conhecimento (Freire, 1977; 1983). Segundo o autor:

    [...] o dilogo uma exigncia existencial. E, se ele o encontro em que se

    solidarizam o refletir e o agir de seus sujeitos endereados ao mundo a ser

    transformado e humanizado, no pode reduzir-se a um ato de depositar

    idias de um sujeito no outro, nem to pouco tornar-se simples troca de

    idias a serem consumidas pelos permutantes. (Freire, 1983, p. 79).

    Outro princpio importante em sua pedagogia a noo de sujeito tomado numa

    perspectiva iluminista de sujeito capaz de crtica e de atuao autnomas6. A proposta aponta

    para a tematizao dos elementos da cultura do movimento, de forma a desenvolver nos alunos a

    capacidade de analisar e agir criticamente nessa esfera.

    Lavoura et al. (2006), fala que Nesta tendncia, o autor defende o ensino crtico e com

    sentido da emancipao do sujeito, sendo este um ser-no-mundo, e o movimento humano o

    dilogo deste com o mundo, dando um sentido e um significado no seu se-movimentar

    (p.205).

    5 Baseada na teoria freireana.

    6 Perspectiva influenciada pelos estudiosos da Escola de Frankfurt.

  • Desta forma, a metodologia elaborada por Elenor Kunz (1994), prioriza o dilogo e maior

    abertura durante o transcorrer das aulas, proporcionando por parte dos educandos uma maior

    participao no processo pedaggico.

    Metodologia de ensino-aberto

    Essa proposta tem como idealizadores Reiner Hildebrandt & Ralf Laging na Alemanha

    (Hildebrandt e Laging 1986), em sua primeira obra Concepes abertas no ensino da Educao

    Fsica com a concepo de aulas abertas experincia.

    No Brasil, em 1991, foi publicada Viso Didtica da Educao Fsica, pelo Grupo de

    Trabalhos Pedaggicos UFPe-UFSM, resultado do debate entre o Dr. Hildebrandt - que atuou

    como convidado a partir de 1984 junto UFSM - e pesquisadores brasileiros de diferentes

    instituies (Antunes, 2008).

    Antunes ainda nos fala que:

    O esforo terico de Hildebrandt se deu no sentido de ampliar a

    participao dos estudantes nas situaes didticas e superar uma

    organizao escolar que diminua a autonomia e mobilidade dos mesmos.

    Isto pode ser visto nas novas diretrizes curriculares alems (formao de

    educadores e escolas), onde a perspectiva no est mais centrada no

    esporte. Foram trazidos para a discusso no Brasil os estudos da Alemanha

    que apontavam o se-movimentar e a cultura corporal em geral como eixo

    do currculo escolar (s/p.)

    Para Bracht ( 1999):

    Trabalhando com a perspectiva de que a aula de EF pode ser analisada em

    termos de um continuum que vai de uma concepo fechada a uma

    concepo aberta de ensino, e considerando que a concepo fechada inibe

    a formao de um sujeito autnomo e crtico, essa proposta indica a

    abertura das aulas no sentido de se conseguir a co-participao dos alunos

    nas decises didticas que configuram as aulas (p.80).

    Muitos autores mencionam que o referencial terico desta teoria est na Teoria

    Sociolgica do Interacionismo Simblico (Mead/Blumer) e na Teoria Libertadora de Paulo

    Freire, porm ainda nos faltam leituras sobre esta metodologia.

    Abordagens culturais

    Como referencial de nosso olhar sobre esta metodologia, utilizaremos Neira e Nunes

    (2006), os quais apresentam uma abordagem da cultura corporal de movimento com base no

    multiculturalismo crtico.

    Na obra Pedagogia da cultura corporal: crticas e alternativas (2006), os autores

    criticam a educao bancria e falam da influncia da obra de Paulo Freire no constructo de

    Giroux: A crtica que Freire (1970) faz da educao bancria e sua concepo do

  • conhecimento como um ato ativo e dialtico tambm combina com os esforos de Giroux em

    desenvolver uma perspectiva de currculo que conteste os modelos tcnicos dominantes (p.130).

    Esta abordagem enfatiza que deve se partir da bagagem cultural do aluno. Para Neira e

    Nunes (2006): Ao reconhecer o conhecimento que a criana, o jovem e o adulto trazem quando

    entram na escola, o professor os reconhece como sujeitos capazes, capacidade revelada e

    reconhecida no j sabido, e capacidade potencial para se apropriar e socializar novos

    conhecimentos que a escola lhe pode oferecer (p. 275).

    Outros pontos caractersticos desta metodologia de ensino a horizontalizao na relao

    professor-aluno, e a formao de um sujeito crtico e autnomo. Os autores enfatizam em seu

    livro (2006) a crtica educao bancria de Paulo Freire: Freire ataca o carter verbalista,

    narrativo, dissertativo do currculo tradicional (p.131), e completam que nesta perspectiva:

    Em vez do dilogo h uma comunicao unilateral. Na perspectiva da

    educao problematizadora, ao invs disso, todos os sujeitos esto

    ativamente envolvidos no ato do conhecimento. O mundo objeto a ser conhecido no simplesmente comunicado; o ato pedaggico no consiste em comunicar o mundo em vez disso, educador e educando criam, dialogicamente, um conhecimento do mundo (p. 132)

    Freire (2000), respeito dos conhecimentos dos alunos, diz que: No possvel respeito

    aos educandos, sua dignidade, a seu ser formando-se, sua identidade fazendo-se, se no

    levam em considerao as condies em que eles vem existindo, se no se reconhece a

    importncia dos conhecimentos de experincia feitos com que chegam escola (p.71).

    Neira e Nunes (2006), ainda colocam o desenvolvimento da prtica pedaggica da

    Educao Fsica centrada no entendimento do prprio processo de construo da sociedade

    afirmando que:

    ao mesmo tempo em que a escola pode constituir um espao de

    conformao e mesmice, mantendo a ideologia vigente, ela pode

    proporcionar um rico espao de oposio cultura dominante, e a

    conseqente transformao da sociedade (p. 84).

    Caminhos...

    Mesmo no sendo nossa inteno neste trabalho analisar as prticas docentes na

    Educao Fsica Escolar, vale ressaltar que apesar da discusso e o surgimento de vrias

    metodologias alternativas Educao Fsica tecnicista dos anos 1970, as prticas vinculadas ao

    modelo esportivo, biolgico ou, ainda, ao recreacionista no foram abandonadas e podem ser

    consideradas as mais freqentes na prtica do professor de Educao Fsica escolar.

  • Assim, concordamos com Darido (2003), a qual fala que apesar de todas as mudanas

    sociopolticas vivenciadas nas ltimas dcadas, de um discurso que supervaloriza a Educao,

    encontramos um cenrio sombrio nas escolas nos dias de hoje, principalmente porque as

    abordagens permanecem distantes, no influenciando a prtica pedaggica do professor. Freire e

    Scaglia (2003) e Kunz (2003) confirmam esse distanciamento. (Darido, 2003)

    Com base nos estudos realizados desde o incio do curso de graduao em Educao

    Fsica, pode-se perceber o direcionamento da rea para uma leitura crtica do mundo, onde

    muitos autores se baseiam nas concepes freireanas para buscar amparo a suas inquietudes.

    Sabemos, porm, que Paulo Freire, nos leva as provocaes, ao movimento, a indagar os

    valores vigentes e consequentemente olhar a realidade concreta de opresso como uma

    situao que apenas limita, mas que possvel de transformao, tendo no reconhecimento desse

    limite o motor de sua ao libertadora. (Freire, 1985:19)

    partindo deste espao permeado por contradies e abordagens, de onde tambm

    brotam novas prticas que acreditam na possibilidade de se contrapor ao modelo hegemnico de

    educao, que queremos desvendar o porqu do preconceito existente para com a prtica da

    Educao Fsica por parte dos docentes de outras reas.

    Este um primeiro olhar sobre as leituras e reflexes a respeito das Teorias Crticas da

    Educao Fsica, Obras de Paulo Freire e do Legado Freiriano. So muitas as leituras necessrias

    para responder as indagaes existentes, a qual ainda estamos percorrendo o caminho.

    A alegria no chega apenas no encontro do achado mas faz parte do

    processo da busca. Ensinar e aprender no podem dar-se fora da

    procura, fora da boniteza e da alegria [...] O nosso um trabalho

    realizado com gente, mida, jovem ou adulta, mas gente em

    permanente processo de busca. Gente formando-se, mudando,

    crescendo, reorientando-se, melhorando, mas, porque gente, capaz

    de negar os valores, de distorcer-se, de recuar, de transgredir. [...]

    que lido com gente. Lido, por isso mesmo, independentemente do

    discurso ideolgico negador dos sonhos e das utopias, com os

    sonhos, as esperanas tmidas, s vezes, mas s vezes, fortes, dos

    educandos. Se no posso, de um lado, estimular os sonhos

    impossveis, no devo, de outro, negar a quem sonha o direito de

    sonhar. (Freire, 2000, p. 163)

    Referncias Bibliogrficas

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    no ensino da Educao Fsica escolar. Lecturas educacion fisica y deportes (Buenos Aires),

    Buenos Aires: v. 87, 2005. Ao 13 - N 119 - Abril de 2008. Disponvel em:

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