Mono 2 Semestre Elaine Completa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS Departamento de Geografia TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Com fé e orgulho: A Nação e a Ideologia Nacional em Geografia do Brasil de Moisés Gicovate Elaine Queiroz Silva Orientadora: Rogata Soares Del Gaudio Dezembro de 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

Departamento de Geografia

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Com fé e orgulho: A Nação e a Ideologia Nacional em Geografia do

Brasil de Moisés Gicovate

Elaine Queiroz Silva

Orientadora: Rogata Soares Del Gaudio

Dezembro de 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS

Departamento de Geografia

Com fé e orgulho: A Nação e a Ideologia Nacional em Geografia do Brasil de Moisés Gicovate

Elaine Queiroz Silva

Trabalho apresentado ao

Instituto de Geociências da

Universidade Federal de

Minas Gerais, para

obtenção do Título de

Licenciatura em Geografia.

Orientadora: Rogata Soares Del Gaudio.

Belo Horizonte Instituto de Geociências da UFMG

2011

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À Pátria

"Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste!

Criança! Não verás nenhum país como este!

Olha que céu! Que mar! Que rios! Que floresta!

A Natureza, aqui perpetuamente em festa,

É um seio de mãe a transbordar carinhos.

Vê que a vida há no chão! Vê que vida há nos ninhos,

Que se balançam no ar, entre os ramos inquietos!

Vê que luz, que calor, que multidão de insetos!

Vê que grande extensão de matas, onde impera

Fecunda e luminosa, a eterna primavera!

Boa terra! Jamais negou a quem trabalha

O pão que mata a fome, o teto que agasalha...

Quem com o seu suor a fecunda e umedece,

Vê pago o seu esforço, e é feliz, e enriquece.

Criança! Não verás nenhum país como este!

Imita na grandeza a terra em que nasceste!"

Olavo Bilac

“O Estado deve fazer o que é útil. O indivíduo deve fazer o que é belo.”

Oscar Wilde

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AGRADECIMENTOS

I'm a lucky man, to count on both hands the ones I love

Some folks just have one, others, they've got none1

(Just Breath - Pearl Jam)

Com diz o trecho da canção acima, me sinto muito sortuda por poder

contar em ambas as mãos as pessoas que amo e é à paciência e

companheirismo delas que dedico esse trabalho.

Primeiramente a minha mãe, que mesmo quando eu não tinha mais

vontade e muito menos força me incentivou a ir em frente. Me amou mesmo

quando nem eu mesma me suportava, na minha adolescência pseudo-

revoltada, rasgada e cheia de clichês juvenis. Obrigada mãe, sem você eu não

teria chegado nem aqui nem em lugar nenhum.

Aos meus amigos e parentes (que muitas vezes são antes de tudo meus

amigos): André, Julia, Vinícius, Kika, Rafael, Tetê, Corine, Patrícia, Carlos

Henrique e Flávia. Assim como muitos outros que marcaram minha vida, muito

obrigada. Como diria Oscar Wilde ―Escolho meus amigos não pela pele ou

outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e

tonalidade inquietante. A mim não interessam os bons de espírito nem os maus

de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. (...) Tenho

amigos para saber quem eu sou. Pois os vendo loucos e santos, bobos e

sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que "normalidade" é uma

ilusão imbecil e estéril.2‖

À professora Doralice pela orientação e incentivo durante vários

momentos da graduação.

À professora e orientadora Rogata, obrigada pela paciência e pelos

valiosos ensinamentos que não me serviram somente para poder concluir este

1 “Eu sou um homem de sorte, por contar em ambas as mãos às pessoas que amo. Algumas

pessoas só tem uma, outras, não tem nenhuma‖ (tradução nossa) 2 WILDE, Oscar. Loucos e Santos. Disponível em

pensador.uol.com,BR/resumo_do_livros_contos_de_oscar_de_wilde/. Acesso em 2011.

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trabalho, mas também me ajudarão a escolher qual caminho quero traçar daqui

para frente.

Por último e não menos importante quero agradecer aquele que é meu

maior companheiro, melhor amigo, meu grande amor. Lucas. Se hoje consegui

concluir este trabalho devo muito a você, sua ajuda, seu tempo, sua paciência,

seu amor, sua dedicação e tudo mais que você me deu durante este tempo são

coisas impossíveis serem mensuradas e de serem agradecidas, por mais que

eu diga obrigada todos os dias dos anos que ainda passaremos juntos. Mesmo

assim gostaria de começar a agradecer por agora: Muito obrigada meu amor.

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RESUMO

O presente trabalho analisa o livro didático Geografia do Brasil de

autoria de Moisés Gicovate, publicado pela Edições Melhoramentos de São

Paulo, durante o período do Estado Novo brasileiro (1937-1945). Tal análise

objetiva entender o pensamento geográfico escolar durante o Estado Novo,

especificamente no caso do livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate, qual

o ideário de nação presente na obra e que era repassado aos escolares que

tinha acesso a educação formal. Objetivamos analisar se na obra de Gicovate,

objeto dessa pesquisa, é possível verificar se o autor repassou e corroborou a

ideologia nacional do período Varguista.

A edição utilizada para esse trabalho é a sexta edição publicada em

1946 pela Edições Melhoramentos, que fazia parte da Companhia

Melhoramentos de São Paulo. É importante salientar que mesmo esta edição

não tendo sido publicada durante o Estado Novo, a obra foi elaborada segundo

as normas da reforma educacional de 1942, contendo, portanto os

pressupostos educacionais que regiam a educação neste período.

Acreditamos que essas análises possam ajudar a compreender a

constituição do corpus geográfico escolar, assim como e de que forma

Geografia do Brasil de Moisés Gicovate, possivelmente teria contribuído para

esse processo.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Capa e Folha de Rosto do Livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate ... 11

Figura 2 – Índice do livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate ................................. 12

Figura 3 - Programa de Geografia do Brasil para a 3º série Ginasial presente no livro

Geografia do Brasil de Moisés Gicovate ............................................................................ 40

Figura 4 – Dedicatória ao professor Lourenço Filho presente em Geografia do Brasil . 48

Figura 5 – Trecho de um rio Amazonas presente em Geografia do Brasil, p. 52 .......... 52

Figura 6 – Imagem do Rio São Francisco presente em Geografia do Brasil, p.54 ........ 52

Figura 7 - Representação raça negróide presente em Geografia do Brasil, p.67 .......... 54

Figura 8 - Representação da raça mongolóide ou indígena presente em Geografia do

Brasil,p.63 ............................................................................................................................. 54

Figura 9 - "O gaúcho" presente em Geografia do Brasil, p.66 ......................................... 55

Figura 10 - Imagem de Getúlio Vargas presente na obra, p.116 .................................... 57

Figura 11 – Mapa das Regiões Naturais Brasileiras presente em Geografia do Brasil,

p.121 ..................................................................................................................................... 58

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS ............................................................................................................. 4

RESUMO ................................................................................................................................ 6

LISTA DE FIGURAS .............................................................................................................. 7

SUMÁRIO ............................................................................................................................... 8

1. PORQUE ESTE TEMA? ................................................................................................ 9

2. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 10

3. A NAÇÃO E A IDEOLOGIA NACIONAL .................................................................... 15

3.1 Nação e a construção da Ideologia Nacional ..................................................... 15

3.2 O discurso Nacionalista de Vargas: o projeto e seus desdobramentos .......... 22

4. A EDUCAÇÃO DURANTE O ESTADO NOVO: MUDANÇAS A FAVOR DE UMA

EDUCAÇÃO ―INSTRUMENTAL‖ ........................................................................................ 28

4.1 A Reforma Gustavo Capanema - 1942 ............................................................... 28

4.2 A importância da disciplina escolar Geografia no contexto histórico do Estado

Novo 34

4.3 O Livro Didático ..................................................................................................... 40

5. A NAÇÃO E A IDEOLOGIA NACIONAL EM GEOGRAFIA DO BRASIL ................ 45

5.1 Com fé na educação e orgulho da Nação .......................................................... 45

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 62

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ................................................................................... 64

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1. PORQUE ESTE TEMA?

No decorrer da minha trajetória na graduação nenhum tema me

inquietou e me interessou tanto quanto a construção do pensamento geográfico

escolar. Ao me deparar com temas discutidos nos projetos de pesquisa que

participei como bolsista de iniciação científica, ―A influência de Através do

Brasil para a construção do pensamento geográfico escolar‖ e sua segunda

etapa, ―A construção do pensamento geográfico escolar no Brasil: de Através

do Brasil para os livros didáticos de Geografia (1930-1960)‖ sob orientação das

professoras Doutoras Rogata Soares Del Gaudio e Doralice Barros Pereira,

pude responder algumas das dúvidas que sempre tive a respeito da

constituição do corpus da geografia escolar, ao mesmo tempo em que me

deparo com novas questões. Ao longo dessa ultima etapa de pesquisa, ―A

construção do pensamento geográfico escolar no Brasil: de Através do Brasil

para os livros didáticos de Geografia (1930-1960)‖, pude ter contato com vários

livros didáticos entre eles o livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate, que

chamou minha atenção pela forma diferenciada e exaltada, em relação aos

demais livros, como o autor apresenta a nação e deixa transparecer qual a

ideologia nacional do momento histórico no qual a obra foi escrita ou pelo

menos, a qual vertente se vinculava o autor.

Além disso, durante a elaboração do relatório da pesquisa pude

entender um pouco melhor o quão rica e turbulenta a fase que se estende entre

os anos de 1937 e 1945, conhecida como Estado Novo3, foi para a educação e,

conseqüentemente, para a geografia como disciplina escolar4.

3 A implantação do Estado Novo aconteceu em 10 de novembro de 1937, por meio de um golpe que transformou

Getúlio Vargas de presidente da República em ditador-presidente. O Estado Novo foi um regime de cunho totalitário semelhante ao fascismo italiano, também chamado de getulismo. (FAUSTO, 2001)

4 No artigo História das Disciplinas Escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa, publicado em 1990, André

Chervel mostra que o termo disciplina e a expressão ―disciplina escolar‖, até o final do sécu lo XIX, designavam

somente a vigilância dos estabelecimentos e a repressão às más condutas. Posteriormente , em 1870, o termo passou a ser utilizado em conjunto com o verbo disciplinar e passou a designar um sinônimo de exercício intelectual a disciplinar a inteligência das crianças. No sentido de conteúdos de ensino, o termo aparece somente nos primeiros

anos do século XX quando ―passa a significar matéria de ensino suscetível de servir de exercício intelectual‖ (CHERVEL, 1990). Após as primeiras décadas do século XX, firmou-se o uso do termo nesse novo sentido.

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2. INTRODUÇÃO

Com base nas inquietações despertadas pela participação nos projetos

de pesquisa citados anteriormente, o presente trabalho procura entender o

processo de construção do pensamento geográfico escolar durante o Estado

Novo, em especial, com base na análise da obra Geografia do Brasil, de

Moisés Gicovate. Qual o ideário de nação apresentado pelo autor e que era

repassado à população que tinha acesso a educação formal5? Como essa obra

se articula à construção da ideologia nacional no período considerado (1937-

1945)?

O autor de Geografia do Brasil, Moisés Gicovate, professor, advogado,

jornalista e escritor nasceu em 6 de março de 1912, no Rio de Janeiro.

Publicou vários livros de Geografia, dentre eles, Geografia do Brasil (1946),

Geografia Geral (1946), Manual de Geologia (1945), além da biografia de

Euclides da Cunha e textos sobre Lima Barreto. Era sócio-correspondente do

Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, do Grêmio Euclides da Cunha e

membro efetivo do Instituto Paulista de Direito Agrário. Faleceu em 26 de abril

de 1992.

A obra era destinada ao ensino de Geografia para a terceira série do

ensino ginasial ou secundário, hoje correspondente a oitava série do ensino

fundamental.

A edição utilizada para esse trabalho é a sexta edição publicada em

1946 pela Edições Melhoramentos, que fazia parte da Companhia

Melhoramentos de São Paulo. É importante salientar que mesmo esta edição

não tendo sido publicada durante o Estado Novo, a obra foi elaborada segundo

as normas da reforma educacional de 1942, contendo, portanto os

pressupostos educacionais que regiam a educação neste período.

5 A escola foi no imaginário republicano, signo da instauração da nova ordem, arma para efetuar o

progresso na sociedade excludente que se estruturou nas malhas da opção imigrantista, nos fins do século XIX e início deste, a escola foi, entretanto, facultada a poucos. (CARVALHO(b), 1989, p. 12).

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Figura 1 - Capa e Folha de Rosto do Livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate

O livro possui duzentos e quarenta e quatro páginas divididas em seis

unidades que tem respectivamente os seguintes títulos: O Espaço Brasileiro,

População Brasileira, Organização Política e Administrativa, O Sistema de

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Viação, A produção Agrícola e A Indústria e o Comércio. Essas unidades são

dividas em lições, contendo o livro, ao todo, trinta lições. Todas essas lições

são finalizadas com atividades teóricas e práticas e ao final de cada unidade há

uma bibliografia.

Figura 2 – Índice do livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate

Como metodologia, escolhemos a Análise do Discurso6 devido ao objeto

da pesquisa estar centrado nos discursos, como aponta Foucault:

Falar, nomear, conhecer, transmitir, esse conjunto de atos se formaliza e se reproduz incessantemente por meio, da fixação de uma regularidade subjacente a toda ordem social: o discurso. A palavra organizada em discurso incorpora em si, desse modo, toda sorte de hierarquias e enquadramentos de valor intrínsecos às estruturas sociais de que emanam. (apud Sevcenko, 1989:19-20)

6 Considera-se a Análise de Discurso como um recurso teórico-metodológico para abordar a linguagem

escrita, enquanto materialidade do discurso escolar, permitindo a compreensão de alguns significados da

Geografia e da sua representação no livro didático; especificamente, a intermediação da Geografia Política

e da Geopolítica como constituição relevante desta ciência e do seu ensino, em uma análise que, para

além de conteúdos, procura compreender o discurso em sua cena constitutiva. (SILVA, 2006:03)

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Ou seja, os processos discursivos carregam as tensões ocorridas nos

seus momentos de acontecimento, constituindo-se numa rica fonte de estudos,

pois podem revelar os valores sociais que a ação humana mais considerava

naquele momento. Nesse sentido, o livro didático se coloca como um grande

potencial a ser explorado uma vez que carrega discursos que poderiam ser

repassados a mais de uma geração.

Acreditamos que essas análises possam ajudar a compreender a

constituição do corpus geográfico escolar, assim como e de que forma

Geografia do Brasil de Moisés Gicovate, possivelmente teria contribuído para

esse processo. Salientamos ainda que esta obra e as demais do autor ainda

não possuem estudos significativos acerca de seus conteúdos.

A análise do livro buscou responder às seguintes inquietações: Qual

concepção era norteadora dos discursos sobre educação durante o Estado

Novo? Qual a função social e política do livro didático e como eram efetivadas

no período? Como tais questões podem ser percebidas no discurso

apresentado em Geografia do Brasil?

Para isso no primeiro capítulo apresentaremos nossos referenciais

teóricos no tocante aos conceitos de nação e ideologia nacional e ainda

tentaremos entender o que constituiu o discurso nacionalista durante o período

em que Vargas esteve no poder, principalmente durante o Estado Novo.

No segundo capítulo faremos um breve histórico dos acontecimentos

relacionados à educação durante o Estado Novo, principalmente recapitulando

as modificações que aconteceram durante o período em que Gustavo

Capanema esteve à frente do Ministério da Educação e Saúde. Ainda

tentaremos entender a evolução do ensino de Geografia durante o Estado

Novo, quais modificações ocorreram e foram relevantes para a construção do

pensamento geográfico escolar. Destacaremos também a importância dos

livros didáticos para as políticas educacionais naquele momento e como as

legislações abordavam e regulamentavam a produção de destes.

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No terceiro capítulo faremos a análise de obra buscando entender qual o

conceito de nação presente na obra e como ele pode ter contribuído

discursivamente para a construção da ideologia nacional no período.

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3. A NAÇÃO E A IDEOLOGIA NACIONAL

Criamos nosso mito. O mito é uma crença, uma paixão. Não é necessário que seja uma realidade. É realidade efetiva, porque estimulo, esperança,fé, ânimo. Nosso

mito é a nação; nossa fé, a grandeza da nação.

FRANCISCO CAMPOS, 1940

Neste capítulo pretendemos entender melhor a construção do discurso

nacionalista de Vargas com base na discussão acerca do significado do termo

nação e seus desdobramentos. Além disso, discutiremos o vem a ser a

ideologia nacional e sua relação com a geografia.

Muitos autores (CHAUÍ, 2000; BARROS, 2000; SILVA, 2006; VLACH,

1984) afirmam que o discurso nacionalista permeou a sociedade, e

principalmente a educação, durante todo o período em que Vargas esteve no

poder, em especial durante o Estado Novo. A seguir discutiremos o que de fato

veio a ser esse discurso nacionalista, o conteúdo e a forma como este se

manifestou nas políticas e projetos do Estado nesse período com enfoque para

a Educação e em especial, para o ensino de Geografia.

3.1 Nação e a construção da Ideologia Nacional

Desde o século XIX a consolidação do Estado como um projeto territorial

e social vem tendo o nacionalismo7 como um recurso ideológico necessário e

sempre utilizado, especialmente na Europa.

Na construção do discurso nacionalista, tanto na Europa, quanto no

Brasil, o território se tornou progressivamente um patrimônio que a nação deve

preservar como herança e um direito para as novas gerações.

7 Para Gellner (2000), o nacionalismo seria a ligação entre o Estado e uma cultura

―nacionalmente‖ definida (GELLNER, 2000:107). Hobsbawn (1991) ―único nacionalismo historicamente justificável era aquele ajustado ao progresso – isto é, aquele que alargava, e não restringia a escala de operação humana na economia, na sociedade e na cultura‖. (HOBSBAWN, 1991:53)

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A geografia [...] foi entendida [no processo de constituição das disciplinas escolares no Brasil] como ferramenta poderosa da educação do povo. De um lado, porque fazia do território brasileiro o elemento central de seu conteúdo, porque sua descrição valorizava sua dimensão, suas riquezas, sua beleza; de outro, porque a idéia de território por ela veiculada permitia a substituição do sujeito pelo objeto. Em outras palavras: a idéia de território dissimulou as ações concretas dos líderes (políticos, intelectuais, etc.) que conduziam, de ―cima para baixo‖, a construção da nação e do cidadão para consolidar o Estado brasileiro, dissimulando mesmo o fato de que o estado construía a nação brasileira. (VLACH, 2004: 195)

Em seu artigo A geopolítica no estudo da geografia e da história (1945),

Moisés Gicovate cita uma frase de Napoleão Bonaparte "A política de um

Estado está na sua geografia". Para o autor

Muito convirá que cada nação tenha o seu plano geopolítico, relacionado com a realidade geográfica e histórica, com as necessidades de defesa, e em função das forças mundiais. A natureza dinâmica da geopolítica é fundada, como vimos, no ajustamento do Estado ao ambiente natural, interno e externo. Os fatores que devem ser considerados e examinados na organização de um plano geopolítico são: a situação, forma e extensão do país; clima e energia climática; população; recursos naturais, capacidade industrial, organização social e política. A vida das nações pode ser considerada como a sucessão de acontecimentos geográficos — históricos — políticos. (GICOVATE, 1945:223)]

Assim, a apropriação do conhecimento produzido pela geografia foi e

tem sido estratégica tanto para a valorização e legitimação dos direitos da

sociedade ao seu território, como para produzir um imaginário territorial como

componente indissociável da ―idéia de nação‖. Porém o que vem a ser essa

―idéia de nação‖ 8?

Em seu famoso ensaio sobre o tema, O que é uma nação? Ernest

Renan disse que três coisas constituem o ―princípio espiritual‖ de uma nação:

―... a posse em comum de um rico legado de lembranças..., desejo de viver em

conjunto, a vontade de continuar a fazer valer a herança que receberam esses

indivíduos" (Renan, 1990:18-19).

Benedict Anderson no livro Comunidades Imaginadas, ao citar Hugh

Seton-Watson observa que ―não é possível elaborar nenhuma ‗definição

cientifica‘ de nação; mas o fenômeno existiu e continua a existir‖

8 Se acompanharmos a periodização proposta por Eric Hobsbawm, em seu estudo sobre a

invenção histórica do Estado-nação, podemos datar o aparecimento de ―nação‖ no vocabulário político na altura de 1830, e seguir suas mudanças em três etapas: de 1830 a 1880, fala-se em ―princípio da nacionalidade‖; de 1880 a 1918, fala-se em ―idéia nacional‖; e de 1918 aos anos 1950- 60, fala-se em ―questão nacional‖. (CHAUÌ, 2000:10)

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(ANDERSON,2008:29). Para o autor tanto a nacionalidade ou condição

nacional, quanto o nacionalismo são produtos culturais específicos e, por isso,

não devemos deixar de considerar tanto sua origem quanto seus processos

históricos específicos. Dentro dessa perspectiva mais antropológica ele define

a nação como uma ―comunidade política imaginada‖ que é ao mesmo tempo

intrinsecamente limitada e soberana. Para Anderson as diferenças entre as

nações estariam nas variadas formas como elas são imaginadas.

Ela é imaginada porque mesmo os membros das mais minúsculas das nações jamais conhecerão, encontrarão, ou sequer ouvirão falar da maioria de seus companheiros, embora todos tenham em mente a imagem viva da comunhão entre eles. (ANDERSON, 2008:32)

Stuart Hall em A identidade cultural na pós-modernidade, citando Enoch

Powell aponta que "a vida das nações, da mesma forma que a dos homens, é

vivida, em grande parte, na imaginação" (HALL, 2003:48).

Para Hall uma cultura nacional seria resultante de processos culturais

ligados a sua própria condição nacional e acima de tudo, seria um “discurso‖,

ou seja, ―uma construção de sentidos que influencia e organiza tanto nossas

ações quanto a concepção que temos da ‗comunidade‘ da qual fazemos parte‖

(HALL, 2003:51). Assim, as culturas nacionais constroem identidades ao

produzirem sentidos sobre ―a nação", sentidos com os quais podemos nos

identificar. Esses sentidos estão contidos nas informações e documentos assim

como em toda história da nação, sendo essas memórias os conectores entre

seu presente e seu passado. Eles seriam a base para imagens e identidades

que dela são construídas. (HALL, 2003:52).

Hall (2003) aponta várias questões em uma tentativa de entender melhor

a nação. Nesta pesquisa, nos apropriamos de duas: Como é imaginada a

nação moderna? E quais estratégias são utilizadas para construir nosso senso

comum sobre o pertencimento e sobre a identidade nacional?

Para Hall há cinco elementos principais para a construção dessas

respostas. Primeiramente, haveria uma “narrativa da nação‖ que é amplamente

contada e recontada nas histórias e nas literaturas nacionais (incluindo a

literatura didática), na mídia e na cultura popular. Essas fornecem imagens,

panoramas, cenários, eventos históricos, símbolos e rituais nacionais que

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simbolizam ou representam as experiências socialmente partilhadas (perdas,

vitórias e desastres) que dão sentido à nação. E como membros de tal

"comunidade imaginada‖, acabamos por compartilhar de tal narrativa (HALL,

2003:49).

Em segundo lugar, há as origens, a continuidade, a tradição e a

intemporalidade. Segundo Hall (2003) a identidade nacional é representada

como ―primordial‖, algumas vezes estando ―adormecida‖, porém sempre pronta

para ser "acordada‖. Os elementos essenciais do caráter nacional permanecem

imutáveis, podendo a qualquer momento e por qualquer intenção, serem

trazidos a tona novamente.

Hall (2003) afirma que a terceira estratégia discursiva seria constituída

por aquilo que Hobsbawm e Ranger (ano) chamam de ―invenção da tradição‖

Tradições que parecem ser ou alegam ser antigas são muitas vezes de origem bastante recente e algumas vezes inventadas... Tradição inventada significa um conjunto de práticas..., de natureza ritual ou simbólica, que buscam inculcar certos valores e normas; de comportamentos através da repetição, a

qual, automaticamente, implica continuidade com um passado

histórico adequado". Por exemplo, "nada parece ser reais antigo e vinculado ao passado imemorial do que a pompa que rodeia a monarquia britânica e suas manifestações cerimoniais públicas. No entanto..., na sua forma moderna, ela é o produto do final do século XIX e XX. ( HOBSBAWN e RANGER, apud HALL,2003:49).

A quarta estratégia de construção da narrativa da cultura nacional é o

que o autor chama de ―mito fundacional‖ ou, como apresenta Marilena Chauí

(2000) o ―mito fundador‖. Segundo a autora ―um mito fundador é aquele que

não cessa de encontrar novos meios para exprimir-se, novas linguagens, novos

valores e idéias, de tal modo que, quanto mais parece ser outra coisa, tanto

mais é a repetição de si mesmo.‖ (CHAUÍ, 2000:05)

O mito fundador oferece um repertório inicial de representações da realidade e, em cada momento da formação histórica, esses elementos são reorganizados tanto do ponto de vista de sua hierarquia interna (isto é, qual o elemento principal que comanda os outros) como da ampliação de seu sentido (isto é, novos elementos vêm se acrescentar ao significado primitivo). Assim, as ideologias, que necessariamente acompanham o movimento histórico da formação, alimentam-se das representações produzidas pela fundação, atualizando-as para adequá-las à nova quadra histórica. É exatamente por isso que, sob novas roupagens, o mito pode repetir-se indefinidamente. (CHAUÌ, 2000:06)

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Em relação ao Brasil, esse processo de constituição dos ―mitos

fundadores‖ pode ser constatado em diversos momentos, como por exemplo,

na construção mítica de nossa ―natureza‖ (CHAUÍ, 2000).

Por último, Hall (2003) afirma que a identidade nacional é também

muitas vezes simbolicamente baseada na idéia de um povo, mas é raramente

esse povo primordial que persiste ou que exercita o poder nas realidades do

desenvolvimento nacional.

Hall (2003), ao citar Timothy Brennan ainda lembra que a palavra

―nação‖ refere-se "tanto ao moderno Estado-nação quanto a algo mais antigo e

nebuloso - a natio - 9 uma comunidade local, um domicílio, uma condição de

pertencimento" (BRENNAN, apud HALL, 2003:51).

As identidades nacionais representariam, portanto, precisamente o

resultado dessa soma de condicionantes formadores da nação. Tais

condicionantes ofereceriam tanto a qualidade de membro do Estado-nação

político, quanto uma identificação com a cultura nacional. Assim, todos

pertenceríamos àquilo que Hall chama de ―grande família nacional‖, pois

independentemente de quão diferentes sejamos em termos de classe, gênero

ou raça, uma cultura nacional busca unificá-los numa identidade cultural (HALL,

2003:60).

O que este autor chama de cultura nacional para nós se aproxima do

modo como entendemos nessa pesquisa a ―ideologia nacional‖: ―uma

dimensão estrutural do modo de produção capitalista [que] (...) reporta-se a

uma comunidade de cidadãos livres e iguais, comunidade fortemente vinculada

a um território e cuja soberania se expressa no ―seu‖ Estado‖ (ALMEIDA,

2006:69).

Se a cultura, para Hall (2003) é um processo social, as ideologias, para

Therborn (1991), também podem ser entendidas como processos sociais, uma

vez que a ideologia fará ―referência a [um] aspecto da condição humana pela

9 Chauí sobre o termo ―natio‖ aponta que este ―significa o parto de animais, o parto de uma

ninhada. Por significar o ―parto de uma ninhada‖, a palavra natio/nação passou a significar, por extensão, os indivíduos nascidos ao mesmo tempo de uma mesma mãe, e, depois, os indivíduos nascidos num mesmo lugar‖ (CHAUÌ, 2000:09)

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qual os seres humanos vivem suas vidas como atores conscientes no mundo

que cada um deles compreende em diversos graus. A ideologia é o meio pelo

do qual operam essa consciência e este significado.‖ (THERBORN, 1991:01-

02, tradução nossa). Para Therborn (1991), as ideologias seriam processos

sociais de ―interpelação‖ dos sujeitos que se sobrepõe, competem e reforçam

umas as outras.

Pode-se afirmar que a ideologia nacional é uma dimensão estrutural básica para uma ―interpelação‖ que nos é feita cotidianamente: aquela que nos constitui como cidadãos, ou seja, como membros de uma coletividade cuja soberania se expressa no Estado nacional. (DEL GAUDIO, 2007:59)

Ao pensarmos na constituição da nação brasileira seus mitos fundadores

e suas narrativas temos que

Combinando nessa dupla estrutura – histórica e não-histórica –, está posto ao público o conjunto narrativo que imagina o Brasil. Falas sobre a história que ao mesmo tempo extraem do factual representado proposições para o que a Nação dever ser. Mitos que são também política, os textos considerados nem de longe se querem inocentes. A história que trazem contém aconselhamentos para fazer do Brasil uma melhor nação, receitando normas e modos de fazer vários de como tornar esse um grande povo em uma terra rica e unificada. (SOUZA, 1997, p.20).

No artigo Ideologia nacional e discurso geográfico sobre a natureza

brasileira, Del Gaudio afirma que na

―ausência de uma revolução nacional fundadora‖, ou de um ―grande mito político nacional a construção da ideologia nacional assenta-se, sobretudo, no discurso sobre sua natureza veiculado, principalmente, mas não exclusivamente, pela geografia. (DEL GAUDIO, 2007:49)

Desse modo a natureza desponta como uma alternativa para a falta de

―mitos fundadores‖ nacionais baseados na história brasileira. Assim se

perpetua uma visão edênica da natureza brasileira que se torna a base de

nosso nacionalismo patriótico10 (DEL GAUDIO, 2007:49-50). Nesse contexto

podemos afirmar que a natureza no Brasil desponta como nosso grande ―mito

fundador‖ (CASTRO, 2006; DEL GAUDIO, 2007; CHAUI, 2000). As imensas

florestas e rios, observados como elementos sagrados, cuja função de unificar,

10

O nacionalismo patriótico, que varrerá a Europa a partir de Napoleão, dos fracassos de 1848 e da ―via prussiana para o capitalismo‖ com Bismarck, encontra na idéia revolucionária da pátria e nas elaborações de Herder, no final do século XVIII, os elementos para produzir, por meio do Estado nacional, o sentimento nacional como consciência patriótica, o que permitirá, por seu turno, um duplo tratamento do ―popular‖: como resíduo tradicional da nação (folclore) e como perigo contínuo para a pátria (as classes populares). (Chauí, 1983: 30)

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21

permitiu emergir entre os brasileiros, a comunhão. Essa imagem do Brasil,

Paraíso Terreno, Jardim do Éden decorreu de uma criação mítica construída

desde a chegada dos portugueses e reiterada através dos anos por

estrangeiros (relatos de expedições) e nacionais (testemunhos dos

desbravamentos). O Mito Edênico que integra a natureza e a extensão

territorial à idéia de paraíso brasileiro contribuiu, de fato, para a construção da

ideologia nacional no Brasil (DEL GAUDIO, 2007).

À ―relativa ausência‖ de um ―mito fundador‖ assentado na história, apresenta-se o ―mito fundador‖ assentado na natureza, na extensão territorial, nas benesses do clima e das águas, nas riquezas naturais (minerais) brasileiras, em suma, em sua geografia. Portanto, a geografia, notadamente a escolar (em sua singularidade que inclui certa perenidade temática), contribui para a conformação do que Vlach (1988) e Chauí (1983) denominam de ―nacionalismo patriótico.‖ (DEL GAUDIO, 2007: 51).

Em relação à discussão sobre a natureza brasileira há, pelo menos,

duas concepções dominantes. A primeira afirma que a natureza brasileira seria

―edênica‖, e o Brasil, ―um paraíso terreal‖. A segunda afirma que o Brasil seria

um ―lugar abandonado por Deus‖, um lugar ―infernal‖, está é ―associada muitas

vezes à construção discursiva das primeiras missões jesuítas sobre o Brasil‖

(DEL GAUDIO, 2007:56). Porque então a primeira prevaleceria? Acreditamos

que seja por ela construir uma percepção ―positiva‖ da nação brasileira (DEL

GAUDIO, 2007:56).

Com Vargas no poder, os discursos e as realizações do governo, assim

como as diretrizes constitucionais passaram frequentemente a abordar e

estimular a construção do nacionalismo. Ianni (1971) observa que ―o

nacionalismo nos anos de 1930-45, se torna um elemento importante que

permeia todos os debates sobre processos políticos econômicos da sociedade

brasileira‖. (Ianni, 1971:36)

Aos poucos o nacionalismo associou-se à idéia de desenvolvimento,

industrialização, independência e criação de um capitalismo nacional. Essa

concepção/construção, ainda que contraditória, amalgamou as propostas de

governantes, empresários, técnicos, líderes, políticos e militares que defendiam

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a emancipação econômica do País, pois para estes grupos, era possível

conquistar nova posição para o Brasil nas relações internacionais.

3.2 O discurso Nacionalista de Vargas: o projeto e seus

desdobramentos

A questão nacional esteve presente, de várias formas e com diversas

finalidades, nos projetos econômicos e políticos desenvolvidos pelo Estado

naquele momento histórico. Discutiremos aqui o conteúdo e a forma como o

projeto nacionalista, encampado pelo Estado, manifestou-se. Assim torna-se

clara a necessidade de entender mais precisamente qual nacionalismo o

governo Vargas articulava, assim como quais propostas nacionalistas levou

adiante em seus projetos e práticas políticas.

Um aspecto interessante do nacionalismo brasileiro é apontado por Boris

Fausto no livro O pensamento nacionalista autoritário

No Brasil e em outros países do que viria a ser chamado Terceiro Mundo, a questão nacional tinha outra dimensão, sendo apropriada tanto pela direita quanto pela esquerda, com diferentes matizes que vão do tradicionalismo ufanista à luta de libertação nacional contra o imperialismo. Daí não ser possível mencionar o nacionalismo como um elemento típico da direita, pois ele transita, ainda que com marcas próprias, de um campo para o outro do universo político. (FAUSTO, 2001:16)

Ao pensarmos no desenvolvimento da sociedade capitalista em um país

periférico dois pontos relacionados ao período se destacam e serão

fundamentais para entender as políticas econômicas e sociais de Vargas.

Primeiramente, a presença do Estado capitalista e empreendedor que se

envolveu na produção direta dentro do campo econômico e enquanto

mantenedor de um rol de garantias e direitos sociais, na óptica do trabalhismo.

A segunda, intimamente relacionada à primeira, é a própria conformação do

capitalismo monopolista neste momento, ligado às novas formas de

manifestação do imperialismo. (BRITO, 2006)

Temos como marco para este momento de desenvolvimento capitalista

uma crise, conhecida como ―Grande Depressão‖, cujo fenômeno emblemático

foi o ―crash” ou ―quebra‖ da bolsa de valores de Nova York, em 1929. É

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importante salientar que esta crise, no modo de produção capitalista,

representa um momento de destruição do capital que não foi reaplicado. Neste

sentido, a crise de 1929, que se estendeu pela década de 30, representou

também o envelhecimento de padrões tecnológicos e de produção. A nova

divisão de mercados e nova ordenação do comércio internacional propiciaram

o aparecimento de um novo sistema monetário, com a hegemonia do dólar.

Nos anos seguintes estes problemas entrelaçam-se e aprofundam-se estando

o contexto global bastante complicado às vésperas da Segunda Grande Guerra

Mundial.

Este cenário, fortemente agravado por duas guerras mundiais e pela

Depressão, acabou por gerar uma relativa desarticulação da economia

mundial, abrindo espaços para a elaboração e execução de projetos

nacionalistas em diversos países. Assim cada país procurou ―proteger-se‖

exportando mais, importando menos e expandindo seus mercados internos,

levando assim ao acirramento da ―luta‖ entre as economias nacionais

(HOBSBAWM, 1995:90).

Uma das características principais deste período passou a ser a

intervenção do Estado, que passou a regulamentar, direcionar, planejar e atuar

diretamente em certos setores de base da vida econômica, agindo como

suporte de políticas de apoio e incentivo ao desenvolvimento – caso em que se

inscreve o Brasil.

Neste contexto a recuperação da economia brasileira incluiu, entre

outras metas, a recuperação da economia cafeeira, que ainda era o principal

produto de exportação. Simultaneamente, o Estado implementou uma política

de desvalorização da moeda, visando ao aumento das exportações, a captação

de moeda estrangeira para investimentos e o controle da balança comercial.

(BRITO, 2006)

O Brasil ainda teria problemas específicos a enfrentar no próprio

contexto latino-americano. De um lado, as próprias dificuldades atravessadas

pelo Brasil, seu relativo atraso econômico, o despreparo de suas Forças

Armadas e a falta de estabilidade política, nesse início da década de 1930,

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levavam o governo a temer a perda de espaço e influência política na América

Latina. Por outro, uma possível ameaça partindo da Argentina que vinha

realizando uma política de fortalecimento de suas Forças Armadas buscando

ampliar sua influência no continente, com ajuda da Alemanha. (BRITO, 2006)

Todas essas preocupações intensificaram o nacionalismo já existente no

interior do governo brasileiro, fazendo da perspectiva industrializante um

projeto político do Estado. A proposta de que o Brasil deveria transformar-se

em potência regional ampliando seus mercados com a produção de

manufaturados, sobretudo para a América do Sul, passou a ser defendida pelo

Ministério de Relações Exteriores. Para os militares, a questão fundamental

deslocava-se da hegemonia econômica para a busca, fundamentalmente, da

hegemonia militar. Era ―interesse da nação, desta forma, sua independência,

pelo caminho do fortalecimento de sua economia, sem ingerência estrangeira

no seu desenvolvimento‖ (BRITO, 2006:06)

Dessa maneira, todas as medidas adotadas e as projetadas para o

futuro do país tinham como ―eixo central‖, para governo brasileiro, a concepção

de que o desenvolvimento econômico era a base para a unidade e para a

manutenção da segurança nacional. Isto aconteceria tanto ―internamente, na

medida em que permitiria a integração das diversas regiões do país, afastando

motivos para possíveis discordâncias nascidas das disparidades locais‖, quanto

―externamente, porque fortaleceria as posições econômicas e sociopolíticas

brasileiras frente a outras nações‖. (BRITO, 2006:07)

Assim, o nacionalismo praticado durante essa fase do Estado Novo, quando o cenário da Segunda Guerra Mundial estava presente como pano de fundo, era calcado no entendimento de que a emancipação econômica do país não significava confronto com o capital externo. Este, ao contrário, deveria ser o trampolim para levar o Brasil a um novo patamar de desenvolvimento no qual, resguardada a sua soberania, caberia ao país um papel de destaque no cenário mundial, como nação industrializada. Com este projeto, ao mesmo tempo em que o governo Vargas abandonava o projeto de um desenvolvimento subsidiado nacionalmente — embora não deixasse de lado a importância do controle, pelo Estado nacional, dos rumos deste desenvolvimento — preparava as bases de seu alinhamento com o governo norte-americano. (BRITO, 2006:08)

O nacionalismo do governo Vargas esteve sempre muito mais

relacionado com as preocupações em torno da questão da unidade nacional do

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25

que em contrapor-se ao capital estrangeiro, muitas vezes financiador dos

projetos governamentais.

De acordo com Bastos (2006), o problema das definições do

nacionalismo econômico varguista a partir os interesses nacionais de

desenvolvimento econômico, é que este não manteve, ao longo do tempo, a

adesão a formas particulares de intervenção estatal e de associação com o

capital estrangeiro. O que apresentou uma maior continuidade foi a adesão ao

nacional-desenvolvimentismo, ou seja, a vinculação do interesse nacional com

o desenvolvimento particularmente industrial, associado à diversificação do

mercado interno e aliado a valorização ufanista das riquezas naturais.

Assim, a industrialização brasileira aconteceu com a presença marcante

do Estado como gestor preferencial deste processo, mediante a importação de

capitais e tecnologia, tanto de produtos como processos. A primeira grande

empresa criada no país, nestes termos, foi a Companhia Siderúrgica Nacional,

que surgiu de uma associação entre capitais dos governos brasileiro e norte-

americano, a que se seguiram nos anos 40 e 50 a Fábrica Nacional de

Motores, a Petrobrás e a Eletrobrás (SINGER, 1995, p. 224).

Além desta busca pelo desenvolvimento econômico do país, o projeto

político-ideológico implantado por Vargas, principalmente durante o Estado

Novo, apoiou-se em diversos mecanismos, dos quais podemos apontar como

de grande importância as Interventorias11, o Departamento de Administração

do Serviço Público, o DASP12, e o Departamento de Imprensa e Propaganda, o

DIP13. Além desses, o presidente também valeu-se de uma proposta

11

Logo após a promulgação da Constituição de 1937, Vargas de imediato instituiu nos Estados o regime de Interventoria desta forma o governo federal assumiu a responsabilidade de administração dos Estados. Segundo Francisco Campos tal medida foi necessária pois só assim o governo poderia traçar estratégias ―compatíveis com os objetivos de unidade, de integração e de defesa da nacionalidade‖. (CAMPOS Apud RODRIGUES, 1991: 118) 12

Sua função era de reestruturar o sistema administrativo com vistas a racionalizá-lo, além

disso, deveria organizar o orçamento e fiscalizar seu cumprimento, de acordo com as instruções e determinações do presidente. O poder exercido pelo DASP era tamanho que os próprios interventores eram controlados por ele. (RODRIGUES, 1991: 126) 13 O DIP, órgão que era subordinado diretamente ao governo federal, tinha como propósito

divulgar a proposta de reconstrução nacional em sua unidade, evitando, desta forma possíveis fragmentações que por ventura pudessem vir a surgir em alguns Estados da Federação. A imprensa constitui-se como um dos mecanismos de controle mais eficiente do novo regime, voltou-se prioritariamente para o exercício da censura e da propaganda da ideologia política estadonovista.O rádio, e principalmente o programa ―A hora do Brasil‖, também se constituíram

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socializante, no sentido de proporcionar ―bem-estar‖ ou seja, ou seja uma

melhor qualidade de vida à população brasileira, principalmente as camadas

mais populares, no que dizia respeito a setores que envolviam o trabalho, a

saúde e a educação.

A alusão feita ao descaso dos governantes anteriores para com a

população brasileira foi constante em quase todos os discursos proferidos

durante o Estado Novo. Em contrapartida, o governo utilizou estas propostas

socializantes, como estratégias que viriam proporcionar o bem estar à

sociedade. Essa prática foi inteligentemente utilizada por Vargas pois

constituiu-se como um suporte para a sustentação do projeto político (ditatorial)

imposto ao país durante o Estado Novo. Assim

sob o novo regime o indivíduo tinha garantia dos seus direitos sociais: o direito ao trabalho; o direito a um padrão razoável de vida: o direito a atividade criadora; o direito à segurança contra os azares e os infortúnios da vida – o desemprego, o acidente, a doença, a velhice; o direito a condições de vida sã, criando ao Estado o dever de administrar a higiene pública, e sobre todos, o direito a educação, sem cujo exercício não é possível tornar acessível a todos o gozo dos demais bens da civilização e da cultura.(CAMPOS, 1940 Apud RODRIGUES, 1991:132).

Francisco Campos, ministro da Educação e Saúde no governo Vargas

até 1934 foi um dos maiores articuladores do Estado Novo e também defendia

que

o direito a educação o mais importante dos novos direitos, particularmente pelo conceito que a constituição lhe atribui, não a considerando apenas como simples, instrumento para um melhor gozo da vida, senão como meio de dar à vida um sentido e um fim: orientação e direção para todas as atividades sociais. (CAMPOS, 1940 Apud RODRIGUES, 1991:132).

No Estado Novo, a nacionalização da educação foi entendida como o

direito de a Nação atuar na escola pelos meios necessários à ―pedagogia

cívica‖ para formar e consolidar os sentimentos patrióticos da juventude de

todos os Estados da Federação, e para assimilar por sua ―incorporação moral,

espiritual, cultural e física a comunhão brasileira‖ (RODRIGUES, 1991:137).

Além disso, Vargas afirmou que

num instrumento altamente eficaz na propaganda e na doutrinação política varguista por atingir milhões de brasileiros, inclusive analfabetos e crianças. (RODRIGUES, 1991: 127)

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A educação da mocidade, nos preceitos básicos estabelecidos pelo Novo Estado, seria um elemento, não só eficaz, como até decisivo na luta contra o comunismo e outras ideologias, que pretendem contrariar e subverter o ideal de nacionalidade e as nossas inspirações cívicas, segundo as quais a juventude, agora mais do que nunca será formada (VARGAS, 1938 Apud RODRIGUES, 1991:140).

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4. A EDUCAÇÃO DURANTE O ESTADO NOVO:

MUDANÇAS A FAVOR DE UMA EDUCAÇÃO

“INSTRUMENTAL”

No capitulo anterior apresentamos como o discurso nacionalista

permeou a sociedade brasileira durante todo o Estado Novo. Neste capítulo

faremos um breve histórico dos acontecimentos relacionados à educação

durante o Estado Novo, principalmente recapitulando as modificações que

aconteceram durante o período em que Gustavo Capanema esteve à frente do

Ministério da Educação e Saúde.

4.1 A Reforma Gustavo Capanema - 1942

O discurso que coloca a educação como um instrumento governamental

utilizado para fortalecer a construção do Estado Novo pode ser percebido em

vários setores da sociedade como a imprensa, a igreja, os sindicatos, entre

outros. A educação é apontada como o instrumento para a regeneração do

Estado. A partir da construção do "saber" da elite e do controle do "saber"

destinado às massas - que tinha como princípios a obediência, a fidelidade e a

servidão ao Estado - se construía a segurança do regime autoritário do período

ditatorial de Vargas. Portanto, na educação residia uma das possibilidades de

controle da elite dominante sob massa dominada. (fonte)

Essa visão instrumental da educação que pressupõe a escola como um

dos ―aparelhos ideológicos do Estado‖ (ALTHUSSER, 1985) era fortalecida no

âmbito nacional, aparecendo de forma clara no discurso do Ministro da

Educação e Saúde do governo Vargas, Gustavo Capanema, que permaneceu

no cargo de 1934 a 1945. Capanema, em 1937, sobre o assunto, traduz esta

visão ao afirmar que a condução e o controle da educação seriam função do

Estado, esclarecendo que para ele a educação não é "neutra, deve tomar

partido, ou melhor, deve adotar uma filosofia e seguir uma tábua de valores"

(CAPANEMA, 1937:21)

Podemos comparar tal concepção instrumentalista da educação com o

tratamento dado à escola pela Alemanha Nazista, pois nesse contexto, a

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29

escola seria de fundamental importância para a disseminação de qualquer

ideologia. George Mosse, em seu livro La cultura nazi (ano), destaca a grande

importância que o controle da educação pelo Estado teve para a agregação da

juventude alemã ao regime nazista e para implementação do conceito de

ordem para a sociedade (MOSSE, 1975:25). De forma similar à Alemanha

nazista, no Brasil estado-novista a escola, assim como a imprensa, no caso

brasileiro através do DIP, foi um dos lugares onde os fundamentos ideológicos

favoráveis ao Estado eram divulgados e trabalhados.

As experiências de construção nacional em processo na época, como o nazismo, o fascismo e o comunismo, tratavam a educação como o instrumento por excelência de fabricação de tipos ideais de homens que assegurassem a construção e a continuidade de tipos também ideais de nações. Assim a ação educativa era vista como um recurso de poder e, portanto, ardorosamente disputada; o desacordo quanto às questões educacionais parecia expressar desacordos éticos e filosóficos insuperáveis. (SCHWARTZMAN et alli, 1984:176)

Objetivando transformar a educação para adequá-la a essa concepção

instrumentalista, o ministro Capanema implementa vários Decretos-lei durante

todo o período que esteve a frente do ministério, que se intensificaram durante

o período ditatorial de 1937 a 1945. Tais decretos foram intitulados de Lei

Orgânica do Ensino, também chamadas de Reforma Capanema.

Tratar a educação no Estado Novo é desafiante em vários sentidos.

Reformas substanciais foram implementadas no ministério Gustavo

Capanema, que teve sua vigência no período de 1934 a 1945, ou seja,

desde antes do Estado Novo (1937) até o momento da redemocratização

do país. (BOMENY, 1999:137)

Esta reforma da educação iniciou-se pela elaboração do Plano Nacional

de Educação, que teve como base os resultados de um grande inquérito sobre

a educação nacional realizado em 1936. Em janeiro daquele ano, Capanema

distribuiu um extenso e minucioso inquérito que deveria ser respondido por

professores, estudantes, jornalistas, escritores, cientistas, sacerdotes e

políticos objetivando a elaboração de um Plano Nacional de Educação.

Tal inquérito ainda reavivara vários debates em torno da educação como

o monopólio estatal do ensino, o ensino secundário dividido em ciclos, o ensino

religioso e o papel da Igreja dentro do ensino, entre outros. As primeiras

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perguntas indagavam sobre definição, compreensão e duração do Plano

Nacional de Educação, e dos princípios que deveriam orientá-lo.

O inquérito seria uma tentativa de diminuir as divergências entre as

opiniões de diversos setores da sociedade acerca das diretrizes gerais para o

ensino no Brasil.

Por vezes interpretada como "um belo gesto", a iniciativa do plano foi cercada, no entanto, de algum descrédito. A própria idéia, implícita no questionário, de através do plano proceder-se à definição de um modelo único de educação para todo o país foi questionada. Para alguns, um plano como aquele só teria sentido se fosse o caso de se estar pretendendo a construção de um tipo humano especifico, "estandardizado", a serviço do Estado. Neste caso, no entanto, caberia apenas ao Estado e só a ele dizer: "A educação se fará em tal sentido, obedecerá à esta orientação, tais idéias serão pregadas e outras que não estas sistematicamente excluídas." (SCHWARTZMAN et alli, 1984:181)

Em maio de 1937, o Conselho Nacional de Educação encaminha a

Capanema o texto final do Plano Nacional de Educação, redigido a partir das

questões apresentadas no inquérito de 1936. Este foi definido como um código,

um conjunto de princípios e normas que viriam a definir como seria o ensino no

país. Em sua primeira parte apresentava os princípios gerais da educação

nacional, regulamentava a liberdade de cátedra14, o ensino da religião, da

educação moral e cívica, a educação física, definia que a educação nacional

deveria "formar o homem completo, útil à vida social, pelo preparo e

aperfeiçoamento de suas faculdades morais e intelectuais e atividades físicas".

(SCHWARTZMAN et alli, 1984)

Já em sua segunda parte, o plano abordava os ―institutos educativos‖ e

ainda como a educação nacional deveria ser organizada

Haveria um "ensino comum", "anterior a qualquer especialização", e que iria do pré-primário ao secundário. Ao lado deste, um ensino especializado, que iria do nível elementar ao superior, orientado, até o nível médio, para os que ficassem fora do sistema secundário: seu objetivo era ministrar "cultura de aplicação imediata á vida prática" ou preparar "para as profissões técnicas

14

A liberdade de cátedra é um principio que assegura a ―liberdade‖de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, permitindo assim que docentes expressem, com relação à matéria ensinada, suas próprias convicções e pontos de vista, sem que haja a imposição de um único critério metodológico ou didático, quando houver vários reconhecidos cientificamente. Para o Plano Nacional da Educação de 1937 a liberdade de cátedra era restritiva em alguns pontos, sendo vedada a propaganda política, assim como manifestações ―contra a ordem pública e os bons costumes‖ e ―contra a solidariedade das classes sociais e das nações entre si‖, entre outras coisas. (SCHWARTZMAN et alli, 1984:183)

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de artífices, tendo sempre em vista a alta dignidade do trabalho e o respeito devido ao trabalhador". O ensino superior, sempre especializado, se divida em três grandes ramos: o de "caráter cultural puro", para o desenvolvimento da pesquisa e o "ensino artístico, literário, científico e filosófico de ordem especulativa"; o de "caráter cultural aplicado", que era o de ensino das profissões liberais regulamentadas; e o "de caráter técnico", que era uma forma de aprofundamento de conhecimentos obtidos nos cursos secundário, profissional e médio. Segundo o plano, o ensino pré-primário seria uma atribuição da família e de escolas privadas, com participação eventual dos poderes públicos, voltado principalmente para crianças pobres ou cujas mães tenham que trabalhar. O ensino primário ficava como atribuição dos estados, havendo possibilidades de diferentes padrões em diferentes estados. (SCHWARTZMAN et alli,, 1984:184)

O plano ainda dava grande ênfase ao ensino de línguas, tornando

obrigatório o português, o francês e o latim, sendo possível uma opção entre o

alemão, o inglês e o grego. Além disso, determinava quais seriam as outras

disciplinas e como seriam suas cargas horárias

Além das línguas, havia o ensino de matemática, geografia, história, desenho, física, química e história natural. No segundo ciclo a "cosmografia" era incluída junto com a matemática, e era acrescentado o ensino de filosofia. O plano chegava ao detalhe de dar o número de horas semanais para o ensino de cada uma das matérias ao longo dos sete anos. Ao final do curso, o aluno teria um total de 26 horas semanais de latim, 25 de português, 24 de matemática, e 29 de outras línguas; 33 horas de física, química, história natural e desenho; 16 horas de geografia e história; e oito horas de filosofia. (SCHWARTZMAN et alli, 1984: 185, grifos nossos)

A prática pedagógica teria que ser organizada com vistas exatamente a

se obter uma uniformidade, padronizando todas as informações que deveriam

ser veiculadas. As escolas secundárias e técnicas de todos os Estados da

Federação deveriam desenvolver um currículo mínimo comum e obrigatório.

Também deveriam ser produzidos livros didáticos, da mesma forma,

padronizados e distribuídos para as escolas de todo o país.

Além disso, diferenciava o foco dos diferentes ramos de ensino

especializado: o doméstico, o de serviço social, o profissional agrícola, o do

ensino da pesca, o do ensino industrial, o do ensino comercial. Especificava

qual ensino seria dado de acordo com a origem social dos alunos, assim como

de acordo com o seu gênero, homens e mulheres, desta forma, estabelecendo

qual seria o papel social das mulheres naquele momento, uma vez que esses

cursos não se diferenciavam tanto ao saber, mas sim pelo sexo e pela função,

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sendo o ―doméstico‖ usado claramente em substituição ao ―profissional‖.

(SCHWARTZMAN et alli, 1984)

Teríamos, assim, a educação superior, a educação secundária, a educação primária, a educação profissional e a educação feminina; uma educação destinada à elite da elite, outra educação para a elite urbana, uma outra para os jovens que comporiam o grande "exército de trabalhadores necessários à utilização da riqueza potencial da nação" e outra ainda para as mulheres. A educação deveria estar, antes de tudo, a serviço da nação, "realidade moral, política e econômica" a ser constituída. (SCHWARTZMAN et alli, 1984:189)

O ensino superior é o que recebe mais atenção no plano, mesmo sendo

o que se destinava à menor parcela da população, uma vez que o acesso a

este era destinado somente àqueles que cursavam o ensino secundário

comum.

Mesmo com todos os esforços de Capanema para agilizar a

implementação do Plano, este não entrou em vigor tão rapidamente. Porém,

com o estabelecimento do regime ditatorial do Estado Novo ainda em 1937, o

Ministério tornou-se livre de todas as amarras burocráticas que impediam que

as medidas propostas por Capanema fossem colocadas em ação e as idéias

presentes no plano foram sendo implantadas, principalmente em 1942 através

da Lei Orgânicas do Ensino, das quais destacamos:

O Decreto-lei 4.048, de 22 de janeiro, que cria o Serviço Nacional de

Aprendizagem Industrial – SENAI;

O Decreto-lei 4.073, de 30 de janeiro, que regulamenta o ensino

industrial;

O Decreto-lei 4.244, de 9 de abril, que regulamenta o ensino

secundário;

O Decreto-lei 4.481, de 16 de julho, que dispõe sobre a obrigatoriedade

dos estabelecimentos industriais empregarem um total de 8%

correspondente ao número de operários e matriculá-los nas escolas

do SENAI;

O Decreto-lei 4.436, de 7 de novembro, que amplia o âmbito do SENAI,

atingindo também o setor de transportes, das comunicações e da

pesca;

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33

O Decreto-lei 4.984, de 21 de novembro, compele que as empresas

oficiais com mais de cem empregados a manter, por conta própria, uma

escola de aprendizagem destinada à formação profissional de seus

aprendizes.

O ensino ficou composto, neste período, por cinco anos de curso

primário, quatro de curso ginasial e três de colegial, podendo ser na

modalidade clássico ou científico. O ensino colegial perdeu o seu caráter

preparatório para o ensino superior, e passou a preocupar-se mais com a

formação geral. Apesar desta divisão do ensino secundário, entre clássico e

científico, a predominância recaiu sobre o científico, reunindo cerca de 90%

dos alunos do colegial (PILETTI, 1996: 90).

Além disso, a Reforma Capanema se destacou pela política

nacionalizante, que reprimiu as escolas de núcleos estrangeiros dentro do país,

como as escolas dos imigrantes chineses, japoneses e principalmente, dos

imigrantes alemães. Várias escolas de imigrantes foram fechadas, a

importação e o uso de livros didáticos estrangeiros foram restritos. Novas

escolas foram abertas para atender a esses alunos. Essa política de

nacionalização do ensino mostrou bem qual foi o conteúdo do projeto

nacionalista no Brasil pós 1937. Como aponta Lourenço Filho, diretor do

Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, órgão do ministério da Educação

que foi responsável por dar subsídios ao ministro Capanema para sua política

de nacionalização do ensino

O espírito dessas crianças brasileiras, formado em língua, nos costumes, nas tradições dos pais, só poderia tender para a pátria de origem, constituindo um empecilho a coesão nacional. Mesmo na raça latina e assimilável como é a italiana, nota-se uma grande tendência para conservar a língua e os costumes, quando formando regulares aglomerações; nas colônias alemãs, então, a propensão conservadora é ainda muito maior, agravada pela diferença de língua e dos costumes. Em certas regiões do país a necessidade da Escola Nacional é bastante grande; abri-la é conquistar milhares de cidadãos para a pátria. (LOURENÇO FILHO, apud SCHWARTZMAN et alli, 1984:73)

Ao mesmo tempo em que o fascismo e o nazismo se tornavam

exemplos pela utilização da educação como instrumento de controle e criação

de um ideal ufanista de nação, se tornavam uma ameaça dentro da realidade

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34

brasileira devido às numerosas comunidades imigrantes que o país possuía,

sobretudo, a comunidade alemã. Essa foi uma das justificativas para a política

de nacionalização e padronização do ensino realizada por Capanema.

Dentre as inovações implementadas por Capanema podemos elencar a

criação do sistema ―S‖ de ensino (SENAI, SESI e SENAC), a obrigatoriedade

de freqüência do ensino secundário, a preocupação com o ensino da mulher,

as restrições ao ensino livre, a dispersão do espírito patriótico através das

disciplinas escolares, entre outras.

Capanema pretendia por meio da reforma, que os diversos níveis de

ensino cumprissem funções distintas, sendo que

O importante na escola primária seria a transmissão do "sentimento patriótico", no estilo "Por que me ufano do meu país, bandeira, hino etc.", conforme anotação de próprio punho de Capanema. A escola secundária iria mais longe: da deveria formar uma verdadeira "consciência patriótica" própria de "homens portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso infundir nas massas, que é preciso tornar habituais entre o povo. (SCHWARTZMAN et alli, 1984:193)

As reformas na educação realizadas por Capanema, mesmo diante de

várias possibilidades, por meio dos Decretos-lei, acabaram por não abordar a

Educação Moral e Cívica como disciplina escolar. Porém, essa deveria estar

incorporada aos conteúdos difundidos por disciplinas como a Geografia e a

História.

4.2 A importância da disciplina escolar Geografia no

contexto histórico do Estado Novo

Em linhas gerais, a função ideológica da Geografia é evidenciada desde

quando a mesma se constitui como ciência na Alemanha no século XIX

passando a ser chamada de Geografia Moderna. É nesta época que a

disciplina começa a ser ensinada em todas as escolas e universidades alemãs,

definindo a sua grande importância para o processo de unificação alemã (1871)

e também na derrota da França na guerra Franco-Prussiana (1871) (BARROS,

2000)

Devido a essa função ideológica, a Geografia encontra durante o

período em que Vargas esteve à frente do poder no Brasil o palco ideal para se

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35

desenvolver cientificamente e se consolidar enquanto disciplina escolar. Isso

devido à nova estrutura política, centrada numa administração pública

estruturada e concentradora do poder, que precisava conhecer melhor o

território a ser administrado e disseminar o discurso nacionalista na sociedade.

Para isso, o discurso sobre o espaço geográfico cumpriria a função que o

Estado necessitava.

Assim a década de trinta constituiu-se como um marco para a Geografia

no Brasil e por isso

A evolução do pensamento geográfico no Brasil é analisada, quase sempre, a partir da década de 30, quando o país em conseqüência de uma revolução que destruiu grande parte das estruturas da Primeira República (1889/1930), realizou mudanças sensíveis no seu sistema de ensino... (ANDRADE, 1994:52).

Vargas, ciente da importância dos conhecimentos geográficos, tomou

algumas medidas que beneficiaram a consolidação da Geografia enquanto

ciência e disciplina escolar. Sobre essa importância, Gicovate afirma que

Por outro lado, a política é a arte de governar, e sua atuação se dá necessariamente através da geografia e da história, e tanto no domínio interno como no internacional. Só, assim, poderá a política ser previdente e realista. MACKINDER afirmou que "o homem de Estado do futuro deve conhecer alguma coisa das regiões naturais geográficas se for um construtor de estabilidade". LUIGI DI MARCHI preceitua: "A história política tem, pois, de acomodar-se às condições do seu ambiente físico, deve obedecer às condições naturais que dão ao povo e ao Estado uma direção e evolução política" (GICOVATE, 1945:221)

Entre estas medidas podemos destacar a criação do curso superior de

Geografia na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da

Universidade de São Paulo, em 1934, e da Faculdade do Brasil no Rio de

Janeiro, em 1935. Outro fator que faz ressaltar a importância da Geografia na

década de 30 é a criação Conselho Brasileiro de Geografia, em 1937, e do

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 1938.

Portanto, é na década de 1930, no contexto da política do nacionalismo, e

de um novo tipo de desenvolvimento capitalista no Brasil, agora com suas

atividades assentadas na indústria e no comércio interno, que a Geografia

tem seu reconhecimento enquanto ciência, atingindo seu momento de maior

peso e influência junto ao Estado e à sociedade brasileira. (BARROS, 2000:

20)

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36

A Geografia ia ao encontro das transformações implementadas pela

política nacionalista, que necessitavam do pleno conhecimento do território

brasileiro, através do desenvolvimento de estudos sobre as mais variadas

regiões do país. O caráter científico do conhecimento produzido nos cursos e

instituições ligadas ao estudo geográfico ia-se adequando ao discurso

nacionalista proposto pelo Estado e construía, simultaneamente, o discurso a

ser proferido nas escolas.

No ensino, a Geografia atingiu grande importância, sendo uma das

peças centrais dos currículos que buscavam a formação de um espírito

patriótico e de um ideário de Estado nacional unido e forte. Durante todo o

período em que Vargas esteve no poder esta ênfase concedida à disciplina

Geografia esteve presente. Primeiramente, na Reforma Francisco Campos, de

1931, quando é dada a esta disciplina uma importância diferenciada das

propostas educacionais de até então e sendo retomada com a Reforma

Capanema, de 1942.

A Reforma Francisco Campos, de 1931, estabeleceu de forma clara a

relação definitiva do Estado com o ensino, pois a educação passa a fazer parte

de uma política estabelecida e dirigida pelo Estado, com fins e objetivos

específicos. Nesta reforma se consolidou a nova forma de abordar a Geografia,

principalmente porque membros da elite e do Estado vão percebendo que este

novo foco dado aos estudos geográficos poderia proporcionar um

conhecimento melhor e maior do território e seus potenciais, como também

auxiliar na consolidação de projetos sócio-econômicos através do aspecto

ideológico.

Assim, a disciplina Geografia passa a ser obrigatória para o ensino

fundamental em todas as séries e começa a contar com o recurso das aulas

práticas, precursores dos trabalhos de campo, que já eram adotadas em

escolas de outros países

Francisco Campos deixa o Ministério da Educação em setembro de

1932 e é substituído por Washington Pires. Em julho de 1934, Gustavo

Capanema assume o cargo e depois de 11 anos, segundo o Decreto Lei n.º

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37

4.244 de 9/04/1942, a Reforma Francisco Campos foi substituída pela Lei

Orgânica do Ensino Secundário, também conhecida como a Reforma Gustavo

Capanema.

De acordo com a Reforma Gustavo Capanema a Geografia adquiriu

grande valor como disciplina, assim como acontecia nos colégios europeus,

passando a ser ensinada nas sete séries do curso secundário.

Nesta reforma, o programa de Geografia, pela primeira vez, foi disposto

em unidades bem estruturadas, considerando os níveis de dificuldades para os

alunos e com proposta metodológica estruturada do geral para o particular.

Assim, a construção do conhecimento geográfico deveria partir da descrição

genérica no curso ginasial, para um estudo mais apurado – uma descrição

mais apurada - no curso colegial.

O programa de Geografia estava dividido em unidades didáticas que

correspondiam a níveis de estudos interdependentes.

A Lei Orgânica consagrou o princípio da autonomia, como disciplinas da História Geral e da História do Brasil; igual critério adotou com respeito à Geografia. Não se tratava de uma medida inspirada por meras razões didáticas, senão traduzia uma das linhas mestras da Reforma Capanema e de cunho, acentuadamente, nacionalista (HOLLANDA, 1957 APUD RODRIGUES, 1991:147).

Segundo a Portaria Ministerial, n.º 170, de 11 de julho de 1942, foram

expedidos os programas de Geografia Geral e Geografia do Brasil para o curso

ginasial, que eram os seguintes:

CURSO GINASIAL

PRIMEIRA SÉRIE GEOGRAFIA GERAL I – A TERRA NO ESPAÇO Idéia do Universo O sistema solar A terra e a lua Círculos e zonas terrestres: coordenadas geográficas Orientação Representação II – ESTRUTURA DA TERRA A crosta terrestre Os continentes, os oceanos e mares, os litorais A atmosfera e os climas Águas correntes e lagos

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III – OS GRUPOS HUMANOS População; raças Nações Cidades Línguas e religiões; as atividades culturais A habitação e a alimentação IV – A CIRCULAÇÃO Os meios de transportes Os meios de comunicações V – A AGRICULTURA Evolução da vida agrícola A produção vegetal A produção animal VI – A INDÚSTRIA E O COMÉRCIO Histórico da indústria e do comércio A produção industrial O comércio interno e internacional Os principais centro industriais e comerciais do mundo SEGUNDA SÉRIE GEOGRAFIA DOS CONTINENTES I – OS CONTINENTES E AS REGIÕES POLARES Características dos Continentes: dados comparativos As regiões polares II – A AMÉRICA III – A EUROPA IV – A ÁFRICA V – A ÁSIA E A AUSTRÁLIA VI – A OCEANIA Cada item desta série eram assim abordados: a) Fisiografia b) Regiões Naturais c) População, raças, línguas e religiões d) Divisões políticas e cidades principais e) Recursos econômicos TERCEIRA SÉRIE GEOGRAFIA FÍSICA E HUMANA DO BRASIL I – O ESPAÇO BRASILEIRO O espaço e a posição O relevo O litoral Os climas A hidrografia O revestimento vegetal II – A POPULAÇÃO BRASILEIRA Formação étnica; etnias Línguas e religiões Distribuição da população Imigração A habitação e a alimentação As fronteiras III – ORGANIZAÇÃO POLÍTICA E ADMINISTRATIVA A organização constitucional A divisão política do país A União. Os Estados O Distrito Federal Os territórios

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A divisão municipal IV – CIRCULAÇÃO, OS SISTEMAS DE VIAÇÃO Os transportes: estradas de rodagem; estradas de ferro; navegação marítima e fluvial; a aviação. As comunicações: correios, telégrafos, telefone, radio. V – A PRODUÇÃO AGRÍCOLA Solos agrícolas; esgotamento e conservação Os principais produtos de origem vegetal Defesa da produção agrícola VI – A PRODUÇÃO MINERAL E ANIMAL Recursos Minerais Criação de animais: produtos de origem animal VII – A INDÚSTRIA E O COMÉRCIO Recursos Minerais As fontes de energia A evolução industrial e as principais indústrias nacionais O comércio interno e o comércio externo QUARTA SÉRIE GEOGRAFIA REGIONAL DO BRASIL I – DIVISÃO REGIONAL DO BRASIL Conceito de Região natural As regiões brasileiras II – A REGIÃO NORTE II – A REGIÃO NORDESTE V – A REGIÃO LESTE V – A REGIÃO SUL VI – A REGIÃO CENTRO-OESTE De cada uma dessas regiões far-se-á o seguinte estudo: a) Descrição física; b) Povoamento; c) Divisão em Estados; d) Cidades; e) Vida cultural; f) Recursos econômicos; g) A circulação. (Programas de Ensino da Portaria Ministerial de 11/07/1942. In: BRASIL, 1952:428)

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Figura 3 - Programa de Geografia do Brasil para a 3º série Ginasial presente no livro Geografia do Brasil de Moisés Gicovate

Os conteúdos de Geografia distribuídos desta forma, em unidades,

sofreram diversas alterações nos anos seguintes. Porém esta estrutura

proposta pela Reforma Gustavo Capanema perdurou por quase duas décadas

nas escolas, e só veio a sofrer modificações em 1961, com a Lei de Diretrizes e

Bases n.º 4.024.

Além de nortear o funcionamento do ensino durante o período em que

Vargas esteve a frente do país, as reformas elaboradas por Francisco Campos

e Gustavo Capanema também foram decisivas para toda a produção de livros

didáticos, em particular os de Geografia.

4.3 O Livro Didático

Entre o século XIX e o início do século XX o mercado de livros didáticos

para e no Brasil era dominada por casas editoras européias, especialmente

francesas e portuguesas, com obras inspiradas, sobretudo, em modelos

franceses e alemães. Somente no início do século XX começaram a despontar

e crescer casas editoriais e autores nacionais.

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41

A produção desses manuais surgiu com o objetivo de atender às

reclamações feitas nos relatórios oficiais sobre a ausência dos livros didáticos

nacionais, assim como apareceram afinadas às propostas de nacionalização

da literatura escolar.

Ao longo das discussões acerca das políticas educacionais com o

estabelecimento do Estado Novo aconteceu o primeiro processo centralizado

de avaliação dos livros didáticos. Oliveira et alii, na obra A política do livro

didático (1984), demonstra que a necessidade de construção da ―consciência

nacional‖ e afirmação do ―Estado Nacional‖, levou o governo a se livrar de ―tudo

o que ameaçasse o projeto de definição da brasilidade‖ (1984: 34) e diante

dessa necessidade, o livro didático tornou-se ―potencialmente um dos grandes

veículos de transmissão do ideário estado-novista‖ (OLIVEIRA et alii,1984: 34).

Em 1938, Vargas promulga o decreto-lei 1.006, de 30 de dezembro, e

pela primeira vez no Brasil, há uma lei que regula a produção, importação e

utilização dos livros didáticos (SILVA, 2006). Assim, o Estado passa a planejar

e acompanhar a educação escolar, utilizando-se de vários mecanismos para

direcionar e controlar o saber a ser disseminado, dentre eles o livro didático

que se constitui como e em um instrumento privilegiado do controle estatal

sobre o ensino e aprendizagem, nos diferentes níveis escolares.

O livro didático não é um simples espelho: ele modifica a realidade para educar as novas gerações, fornecendo uma imagem deformada, esquematizada, modelada, freqüentemente de forma favorável: as ações contrárias à moral são quase sempre punidas exemplarmente; os conflitos sociais, os atos delituosos ou a violência cotidiana são sistematicamente silenciados. (CHOPPIN, 2004:557)

O decreto 1.006/1938 criou a Comissão Nacional do Livro Didático

(CNLD), vinculada ao Ministério de Educação e Saúde, encarregada, entre

outras funções, de examinar e autorizar o uso dos livros didáticos que deveriam

ser adotados em todas as modalidades de ensino em todo país. O Ministério da

Educação passou a ter em suas mãos uma ferramenta para controlar o ensino

e assim, disseminar somente o que fosse de interesse do Estado, pois os livros

didáticos só poderiam ser adotados com autorização prévia do governo, que

poderia vetar ou não um livro que fosse considerado impróprio. Competiam as

seguintes atribuições, descritas no Art. 10 do decreto 1.006/1938:

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a) examinar os livros didáticos que lhe forem apresentados, e proferir julgamento favorável ou contrário à autorização de seu uso;

b) estimular a produção e orientar a importação de livros didáticos;

c) indicar os livros didáticos estrangeiros de notável valor, que mereçam ser traduzidos e editados pelos poderes públicos, bem como sugerir-lhes a abertura de concurso para a produção de determinadas espécies de livros didáticos de sensível necessidade e ainda não existentes no país;

d) promover, periodicamente, a organização de exposições nacionais dos livros didáticos cujo uso tenha sido autorizado na forma desta lei.(BRASIL, 1.006/1938, Art. 10)

Além disso, o decreto 1.006/1938 apresentou 11 impedimentos de ordem

ideológica para a autorização de qualquer livro didático:

a) que atente, de qualquer forma, contra a unidade, a independência ou a honra nacional;

b) que contenha, de modo explícito ou implícito, pregação ideológica ou indicação da violência contra o regime político adotado pela Nação;

c) que envolva qualquer ofensa ao Chefe da Nação, ou às autoridades constituídas, ao Exército, à Marinha, ou às demais instituições nacionais;

d) que despreze ou escureça as tradições nacionais, ou tente deslustrar as figuras dos que se bateram ou se sacrificaram pela pátria;

e) que encerre qualquer afirmação ou sugestão, que induza o pessimismo quanto ao poder e ao destino da raça brasileira;

f) que inspire o sentimento da superioridade ou inferioridade do homem de uma região do país com relação ao das demais regiões;

g) que incite ódio contra as raças e as nações estrangeiras;

h) que desperte ou alimente a oposição e a luta entre as classes sociais;

i) que procure negar ou destruir o sentimento religioso ou envolva combate a qualquer confissão religiosa;

j) que atente contra a família, ou pregue ou insinue contra a indissociabilidade dos vínculos conjugais;

k) que inspire o desamor à virtude, induza o sentimento da inutilidade ou desnecessidade do esforço individual, ou combata as legítimas prerrogativas da personalidade humana (SILVA, 2006:50-51 apud BRASIL, 1.006/1938, Art. 20, alíneas a-k).

Ao analisar os impedimentos impostos pelo decreto 1.006 de 1938 para

a publicação de um livro didático, podemos notar grandes contradições nessas

regras. Nesse texto mais uma vez fica nítida a concepção instrumentalista do

ensino, que nesse caso é aplicada ao livro didático. No segundo impedimento

(letra B), “que contenha, de modo explícito ou implícito, pregação ideológica

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ou indicação da violência contra o regime político adotado pela

Nação”,assim como no terceiro (letra C), “que envolva qualquer ofensa ao

Chefe da Nação, ou às autoridades constituídas, ao Exército, à Marinha, ou às

demais instituições nacionais”, já se mostra a parcialidade do discurso que

deveria ser adotado pelos livros didáticos. Observa-se que estes não poderiam

trazer críticas de qualquer natureza ao regime autoritário do período do Estado

Novo.

O quinto impedimento (letra E) “que encerre qualquer afirmação ou

sugestão, que induza o pessimismo quanto ao poder e ao destino da raça

brasileira” podemos notar a imposição de um discurso que coloca tanto o país,

como o seu povo como destinados ao progresso.

O décimo impedimento (letra J) “que atente contra a família, ou pregue

ou insinue contra a indissociabilidade dos vínculos conjugais” , assim como o

décimo primeiro impedimento (letra K) “que inspire o desamor à virtude, induza

o sentimento da inutilidade ou desnecessidade do esforço individual, ou

combata as legítimas prerrogativas da personalidade humana”, também

repassam um discurso de progresso. Porém este discurso aqui é muito mais

voltado para ótica capitalista e desenvolvimentista do período, onde a

constituição e manutenção das famílias eram necessárias para a geração da

mão de obra que levaria o país ao encontro do progresso e da modernidade.

Em seu artigo, História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado

da arte (2004), Alain Choppin destaca que os livros didáticos assumem,

conjuntamente ou não, ―quatro funções essenciais, que podem variar

consideravelmente segundo o ambiente sociocultural, a época, as disciplinas,

os níveis de ensino, os métodos e as formas de utilização‖ (CHOPPIN,

2004:553). Na primeira dessas funções, referencial, o livro didático seria a fiel

tradução de um programa ou uma de suas possíveis interpretações, sendo o

suporte dos conteúdos educativos que um grupo social acredita que seja

importante repassar às novas gerações. Na segunda função, instrumental, o

livro didático colocaria em prática métodos de aprendizagem visando facilitar a

memorização dos conhecimentos. A terceira função, ideológica e cultural,

corresponde, para aquele autor, ao papel mais antigo assumido pelos livros

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didáticos. De acordo com Choppin (2004), esse papel se afirma como um dos

vetores essenciais da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes.

Assim, o livro didático se converte em um ―instrumento privilegiado de

construção de identidade, geralmente ele é reconhecido, assim como a moeda

e a bandeira, como um símbolo da soberania nacional e, nesse sentido,

assume um importante papel político‖ (CHOPPIN, 2004:553). A quarta e última

seria a função documental segundo a qual o livro didático é um conjunto de

documentos, textuais ou icônicos cuja observação ou confrontação pode vir a

desenvolver o espírito crítico do aluno.

Ao analisarmos os impedimentos ideológicos impostos pelo decreto

1.006/38 aos livros didáticos, juntamente com a funções apontadas por

Choppin (2004) podemos concluir que os livros didáticos que fossem

publicados no Brasil deveriam ter duas funções primordiais. A primeira seria a

função referencial e a segunda e mais importante para este trabalho, seria a

função ideológica e cultural.

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5. A NAÇÃO E A IDEOLOGIA NACIONAL EM

GEOGRAFIA DO BRASIL

“A elaboração de um imaginário é parte integrante da legitimação de

qualquer regime político. É por meio do imaginário que se podem atingir

não só a cabeça, mas, de modo especial o coração, isto é, as

aspirações, os medos e as esperanças de um povo.”

(CARVALHO, 2001, p. 10)

Nos capítulos anteriores definimos o nosso entendimento sob o conceito

de nação e de ideologia nacional. Além disso, realizamos um breve panorama

acerca da educação e das políticas relacionadas a ela e ao livro didático no

período do Estado Novo.

No presente capítulo apontaremos como a nação é apresentada no livro

Geografia do Brasil escrito por Moisés Gicovate, assim como a relação do

conteúdo da obra com a ideologia nacional do período Varguista.

Procuraremos demonstrar as relações entre as políticas educacionais do

período e a escrita do autor.

5.1 Com fé na educação e orgulho da Nação

No artigo A geopolítica no estudo da geografia e da história (ano),

Gicovate faz nove apontamentos que, segundo ele, seriam de ―ordem

pedagógica‖ e auxiliariam professores de geografia e de história no

entendimento dos problemas da geopolítica.

1) No estudo dos fatos e fenômenos 'sociais, os métodos de interpretação que já nos fornece a geopolítica não devem ser desprezados;

2) O estudo da geografia política deve ser completado com as noções gerais de geopolítica;

3) Os estudos de história devem fundamentar-se nas realidades geográficas;

4) No ensino superior, especialmente, a geografia e a história devem apresentar as realidades da evolução dos povos de modo a permitir a mais ampla crítica, fundamentada em conhecimentos científicos;

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5) Convirá sempre que o estudo da geografia e da história seja feito pelo método comparado;

6) O ensino da geografia em qualquer nível não deverá esquecer os problemas de "espaço" e de "fronteiras";

7) O ensino da história deve ser desenvolvido especialmente com relação à época contemporânea, na qual apareceram e se desenvolveram as grandes nações coloniais;

8) O ensino da geografia e da história deve tender a elevar o pensamento dos estudantes à consideração não só dos grandes problemas nacionais como dos problemas continentais e mundiais;

9) Aos professores de geografia e de história cabe grande soma de responsabilidade na formação de uma mentalidade pacifista, fundada em razões de justiça internacional. (GICOVATE,1946 :227, grifos nossos)

Destacamos os dois últimos apontamentos por acreditarmos que eles

sejam os mais importantes e significativos para entendermos a concepção do

autor em relação ao ensino de geografia e à sua importância para a construção

dos ―nacionais‖.

Gicovate deixa transparecer a importância do ensino de geografia não

somente como um conhecimento a ser adquirido pelo aluno, mas também para

sua formação ideológica. Uma ideologia que objetiva, como ele mesmo afirma,

à ―formação de uma mentalidade pacifista‖, tão almejada pelos governantes em

um período de intensos conflitos internos - combate aos comunistas, por

exemplo -, e externos, a Segunda Grande Guerra.

Podemos também notar que desta forma para o autor a Geografia seria

um difusor daquilo que Chauí (2000) assinala como um dos ―mitos fundadores‖

nacionais: a concepção dos brasileiros como ―um povo pacifico e ordeiro‖.

Já no prefácio de Geografia do Brasil assinado pela Edições

Melhoramentos e escrito em 1943, dois pontos importantes se destacam. O

primeiro refere-se aos novos rumos que a Geografia, em seu âmbito escolar,

vinha assumindo no Brasil

Em o novo plano de estudos do curso secundário, passou a geografia do Brasil a ocupar o lugar que lhe compete. Por duas séries, a terceira e a quarta, agora se estendem os estudos da disciplina. (GICOVATE, 1946:05)

O segundo ponto diz respeito às intenções patrióticas do livro ligadas a

Reforma Capanema de 1942

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É de notar-se que, ao escrever esta obra, procurou o autor atender não apenas à letra do programa oficial, mas sim e também, ao seu espírito. E muito importante compreendê-lo. Convém salientar, antes de tudo, que a própria lei orgânica do ensino secundário expressamente atribui aos estudos de geografia e de história papel preexcelente na formação da consciência patriótica do jovem brasileiro. Reclama, portanto, para tais estudos, função profundamente educativa, além da função informativa que também lhe cabe. (GICOVATE, 1946:05, grifos nossos)

O primeiro cuidado do programa, como se vê, foi de apresentar a matéria de forma a que nunca se perdesse o sentido de expressão nacional. Não se nega que a qualquer estudo geográfico importa sempre, pela sua própria natureza, a descrição espacial, a localização precisa, o estudo do ambiente diferenciado em cada ponto. Em se tratando de geografia do país, será preciso fazê-lo, no entanto, de modo que cada fato, cada noção, cada relação seja sempre apresentada no grande conjunto que é o país, revelado na unidade fisiográfica e humana que lhe empresta a feição característica. (GICOVATE, 1946:05, grifos nossos)

É nessa compreensão geográfica que o jovem estudante deverá encontrar os elementos com os quais possa “entender” o Brasil, e nos quais posso amá-lo, como nação de bases indestrutíveis. Tanto quanto em estudos anteriores, ainda aqui caberá despertar a atenção para as riquezas naturais, a variedade e beleza dos cenários, a amenidade da terra. Mas não será nisso apenas que o programa atual pretende que se venha a insistir. O que deseja é que se evidenciem as relações naturais do conjunto, que levaram a terra brasileira a ser assento de uma formação social e política de grande unidade, graças às favoráveis condições de clima, de produção e de formação histórica. (GICOVATE, 1946:06, grifos nossos)

Longe esta o programa , como se vê, da simples descrição fisiográfica, parcelada, fragmentária e mnemônica. Longe está também da idéia simplista de exaltação patriótica por meio de descrição literária. A orientação consagrada não só no programa, mas na lei, é a de fazer basear a formação do espírito nacional na verdadeira compreensão dos fatos geográficos e de suas relações.(GICOVATE, 1946:06, grifos nossos)

Destaque para a dedicatória do livro. Assim como em outros livros do

período, como por exemplo, Geographia da Criança de Renato Jardim (1932),

o livro foi dedicado ao professor Lourenço Filho15, figura importante para a

Educação no período e um dos signatários do Manifesto dos Pioneiros16 da

15

Lourenço Filho nasceu em 10 de março de 1897, na Vila de Porto Ferreira, SP, e faleceu em

3 de agosto de 1970, no Rio de Janeiro. Foi um dos signatários do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, movimento que se inicia na década de 1920 e ganha impulso na década de 1930, após a divulgação do Manifesto (1932). Nesse documento, defendia-se a universalização da escola pública, laica e gratuita. Entre outros cargos foi Diretor-Geral do Departamento Nacional de Educação, Presidente da Comissão Executiva do Centro de Formação de Pessoal para Educação Fundamental na América Latina, no México. Também representou o Brasil no Conselho Cultural Interamericano, no mesmo país (1951). 16

Movimento que se inicia na década de 1920 e ganha impulso na década de 1930, após a divulgação do Manifesto (1932). Nesse documento, defendia-se a universalização da escola pública, laica e gratuita.

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Escola Nova. Em 1937, Lourenço Filho foi nomeado membro do Conselho

Nacional de Educação, órgão responsável pela elaboração do texto final da

reforma de 1942, assim como por sua fiscalização. Nesse mesmo ano, foi

nomeado Diretor-Geral do Departamento Nacional de Educação, do Ministério

da Educação e Saúde. Em 1938, recebeu do Ministro da Educação a

incumbência de implantar o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP),

que passou a dirigir.

Figura 4 – Dedicatória ao professor Lourenço Filho presente em Geografia do Brasil

Outro ponto importante é a ideia de Unidade Nacional, abordada em

diversas partes do livro. Esta havia sido comprometida na Primeira República

devido à inexistência de uma política educacional voltada para a organização

da nação, assim como pelas divergências no modelo federalista.

O ―enaltecimento da natureza, da extensão territorial, do caráter ordeiro e pacífico do povo brasileiro‖ começou a ser forjado na literatura – com o romantismo, por exemplo, que retirava da geografia os elementos capazes de conferir ―unidade‖ ao Brasil, e passou para os livros de leituras dedicados ao ensino primário. Em seguida, simultaneamente, num movimento de ―inversão‖, estes temas foram incorporados à geografia como disciplina escolar – e de certo modo, se apresentam até hoje na formalização dos programas que têm por objetivo, ―estudar a geografia brasileira‖. (DEL GAUDIO, 2007:57)

Diante da efervescência política na qual o país se encontrava, grande

era o temor da ascensão de movimentos separatistas que pudessem

fragmentar a unidade territorial e política brasileira.

Cumprindo o programa instituído pela Reforma de 1942, o autor inicia a

obra com a primeira unidade tratando do espaço brasileiro. Em toda a obra

Gicovate sempre exalta vários pontos favoráveis ao Brasil, como a sua

extensão

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―Olhe para o planisfério, ou compare mapas políticos dos vários continentes. Uma coisa saltará à vista e lhe fará bater mais forte o coração. Nossa terra, o Brasil, logo se destaca pela sua grandeza territorial. E não é só: entre os países independentes e de extensão territorial contínua, o Brasil é o único que apresenta terra ao norte e ao sul do equador. De fato, corre o rio das Amazonas paralelo ao equador; as terras setentrionais dos Estados do Amazonas e do Pará ficam no hemisfério norte. (GICOVATE, 1946:09, grifos nossos)

Na tentativa de criação de um elo de pertencimento e aproximação dos

leitores (que nesse caso seriam alunos) Gicovate sempre trata o Brasil como

nosso, ―nossa terra‖, ―nosso território‖, ―nossos rios‖, etc.

Nosso território se estende, depois, até além do trópico de Capricórnio, já na zona temperada-sul. Ai fica uma parte do território de São Paulo, a quase totalidade do Paraná, Santa Catarina e o Rio Grande do Sul. (GICOVATE, 1946:10, grifos nossos)

Nessa unidade o autor também retoma a idéia de vastidão do território

brasileiro, tentando despertar nos leitores o orgulho do país com base nessa

grandeza.

Nossas terras são atravessadas pelo equador e pelo trópico de

Capricórnio. Simples referência de posição? Não. Esta situação privilegiada

faz que nosso imenso país apresente variedade de climas, e variedade de

recursos econômicos, em sua flora, e em sua fauna. Esta situação evoca a

vastidão de terra, regiões onde rumorejam florestas eternas, os soldados

verdes de cana-de-açúcar, os campos brancos de algodão, os cafeeiros

sem fim, os pinheiros alterosos, as montanhas de minério de ferro, o ouro

dos cascalhos... (GICOVATE, 1946:10, grifos nossos)

Comparativamente, a superfície do Brasil corresponde a cerca da metade

da América do Sul. É cerca de três vêzes maior do que a Argentina; cêrca

de oito vêzes a Bolívia; mais de seis vêzes o Peru. Um pouco menor do que

Europa representa, o nosso país, a décima quinta parte de tôdas as

terras emersas. (GICOVATE, 1946:15, grifos nossos)

Vlach (1988) discute como, através desta exaltação da natureza e de

seus recursos e dessa noção de pertencimento, a geografia ao apresentar seus

conteúdos cumpre um de seus papéis

O ensino de geografia (limitamo-nos a ele), ao caracterizar-se pela ênfase dada à descrição do quadro natural da nação, devidamente mapeado e, cujos recursos (principalmente os minerais) eram enaltecidos, produzia uma imagem ―instantânea‖ da pátria, entendida como terra, ainda que a presença dos homens (mas não das classes sociais) também fosse considerada. (VLACH, 1988: 66)

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50

Nesta primeira unidade o autor ainda apresenta uma visão otimista do

futuro brasileiro, como um país que ainda pode ter maior importância devido a

sua grande extensão, as suas riquezas naturais e a sua unidade territorial

Esta circunstância já não sugere o imenso papel que o nosso país está

destinado a ter? (GICOVATE, 1946:11, grifos nossos)

O Brasil é um bloco maciço e homogêneo. Tudo nele indica unidade.

Impressiona o equilíbrio entre as fronteiras terrestres e marítimas. Um

oceano único banha as suas costas imensas.Isso não parece impor a

integridade e a indivisibilidade de seu território? E não parece

determinar que o Brasil seja uma potência marítima, ao mesmo tempo

que continental? Certo que sim. (GICOVATE, 1946:11, grifos nossos)

Para José Murilo de Carvalho ―o orgulho pela natureza poderia ser

interpretado como um indício da alienação dos brasileiros pela sua própria

história‖, pois ―a história nacional parece ser algo estranho para muitos

brasileiros, como se eles não tivessem nada a ver com ela‖ (CARVALHO,

2003:404). Assim, para Carvalho (2003), essa associação entre ―nacionalidade‖

e território tem sua raiz no mito edênico, que, por sua vez, integra a exuberante

natureza e a grande extensão territorial à idéia de paraíso, de jardim do Éden -

por isso mito Edênico. Esse autor afirma ainda que, ao longo do tempo, essa

―sagração da natureza‖ irá se constituir no grande ―mito fundador‖ da nação

brasileira, pois, ―a visão edênica da nova terra foi reiterada muitas e muitas

vezes pelos portugueses, brasileiros e estrangeiros, até se tornar um

importante ingrediente do ‗imaginário‘ nacional‖ (CARVALHO, 2003:402).

Ainda nesta unidade, Gicovate apresenta o relevo brasileiro,

destacando, sobremaneira, a importância que as estradas de ferro tiveram para

a penetração no território e conseqüentemente, para o progresso do país

As serranias apresentam gargantas aproveitadas pelas estradas de ferro

para galgar os planaltos. As estradas de rodagem ou as estradas de ferro,

obras-primas da engenharia nacional, descortinam belas paisagens. A

estrada de ferro que une Paranaguá a Curitiba é um legítimo orgulho

de nossa engenharia. (GICOVATE, 1946:18, grifos nossos)

A garganta de João Aires, caminho histórico de penetração, a garganta de

Passa Quatro, entre outras, já foram galgadas pelas nossas estradas de

ferro. (GICOVATE, 1946:20, grifos nossos)

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51

Destaca-se em toda a obra de Gicovate a exaltada descrição do litoral e

da rede hidrográfica brasileira, dando grande importância principalmente ao rio

Amazonas, descrito pelo autor de forma bastante arrebatada

O extenso litoral brasileiro é banhado pelo mais importante dos oceanos: o

oceano Atlântico. Só interessa ao nosso país, a parte ocidental do Atlântico-

Sul. (GICOVATE, 1946:24)

Na foz do rio das Amazonas pode ser observado, em certas épocas,

fenômeno gigantesco. A maré, em vez de subir em seis horas, alcança a

altura máxima em um ou dois minutos. Um barulho ensurdecedor se

aproxima e aumenta. Ondas de 3,5 m a 5m formam-se. A água do mar

choca-se violentamente, com a água do rio. Assiste-se à luta entre dois

gigantes. É a pororoca. (GICOVATE, 1946:25)

A observação de um mapa hidrográfico nos mostra que o Brasil possui

uma admirável rêde fluvial. Os extensos rios, navegáveis, em grande

parte ligam as regiões do norte às regiões do sul, as paragens do interior ao

oceano.Tem-se a impressão de que o Criador quis ligar assim todos os

pontos do vasto território, e, ao mesmo tempo, mostrar aos homens

que se devem manter sempre unidos. (GICOVATE, 1946:48, grifos

nossos)

O rei dos rios nasce nas regiões remotas dos Andes. Esta formidável

caudal origina-se no pequenino Vilcanota, na região andina de La Raya, no

Peru meridional. É ai alimentado por um de degêlo de 5000 metros de

altura. O tronco e os braços do Rio-Mar dominam uma área quase tão

grande como a da Austrália. É a maior bacia do mundo com cêrca de seis

milhões e meio de quilômetros quadrados. É o mais volumoso rio da Terra.

(GICOVATE, 1946:51, grifos nossos)

O São Francisco, rio do nordeste, genuinamente brasileiro, foi à base

física da unidade nacional. (GICOVATE, 1946:56, grifos nossos)

Ao longo de toda obra, Gicovate utiliza algumas imagens para ilustrar o

conteúdo abordado. As imagens presentes na obra retratam os cenários, as

tradições e o povo do ―nosso país‖. Elas servem para dar concretude e

materialidade às descrições de Geografia do Brasil. As ilustrações constituíram

ainda, em uma forma bastante eficaz de tornar a leitura mais agradável e em

conjunto com o texto, apresentar o Brasil aos alunos. Apresentaremos algumas

dessas imagens a seguir, para entendermos melhor qual era a representação

que o autor intencionava que os alunos construíssem de suas descrições.

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52

Figura 5 – Trecho de um rio Amazonas presente em Geografia do Brasil, p. 52

A figura acima, representação de um trecho do rio Amazonas está logo

em seguida dos excertos anteriormente citados, com o autor descrevendo a

imponência do Rio Amazonas. Destaque na imagem para imponência e

densidade da floresta em relação ao pescador e sua embarcação – como o

homem seria pequeno em relação à natureza, especialmente à grandiosa

natureza amazônica.

Figura 6 – Imagem do Rio São Francisco presente em Geografia do Brasil, p.54

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53

Já nesta imagem do Rio São Francisco, também situada logo após o

trecho em que o autor o descreve como o ―rio da unidade nacional‖ – epíteto

que o ―Velho Chico‖ carrega até hoje - destaca-se a imponência do próprio rio.

O rio São Francisco, como o rio Tietê, foi uma linha de penetração ao nosso interior. Por ele passaram as bandeiras que iam à procura de aventura, de ouro e de pedras preciosas. No seu curso inferior desenvolveu-se a criação, um dos fatôres do povoamento primitivo e uma das bases econômicas. Apresenta uma extensão navegável de cêrca de 1800 quilômetros. Alguns de seus afluentes também são navegáveis. ―Estrada que caminha‖, é de grande importância econômica para a Bahia e para o planalto mineiro. (GICOVATE, 1946: 56)

Na unidade II Gicovate apresenta a população brasileira como oriunda

do cruzamento de três raças: raça mongolóide (índios), raça caucasóide

(colonizador português) e raça negróide (escravos africanos). Ele descreve de

maneira muito rasa algumas tribos indígenas brasileiras, talvez por não contar

com muitas informações ou por estar seguindo a tendência daquele momento -

de negligenciar o que não era branco, apresentando um outro discurso

ideológico do Governo de Vargas, a questão do ―embranquecimento‖ da raça

brasileira, a ―Eugenia‖17.

Dávila (2006) afirma que

Os eugenistas brasileiros diferiam dos de outros países no grau em que levavam a eugenia para fora do laboratório e para dentro das políticas públicas. (...) O consenso entre os formuladores de políticas era que as escolas eram as linhas de frente da batalha contra a ―degeneração‖. Os educadores transformaram as escolas em laboratórios eugênicos – lugares onde ideias sobre raça e nação eram testadas e aplicadas sobre as crianças. A eugenia tornou-se a justificativa para expandir e alocar recursos educacionais (DÁVILA, 2006, p. 55)

Segundo o autor, o papel fundamental para a colonização brasileira

coube ao europeu, principalmente o português

(...) que descobriu e colonizou a terra. A história da península Ibérica nos

mostra que o português é um tipo muito complexo. Imprimiu, nos primeiros

séculos de nossa formação, traços indeléveis e profundos. A êle devemos a

nossa língua e a nossa religião. As suas instituições político-sociais

serviram de molde às nossas. (GICOVATE, 1946:65)

17

Sobre o debate acerca da questão da eugenia no Brasil, além de outras pesquisas, vale conferir os estudos de AZEVEDO (1987), SCHWARCZ (1993) e HOFBAUER (2006). Sobre as relações entre raça, corpo e higiene publicadas na Revista do Ensino entre os anos de 1902 e 1918, conferir o artigo de GUALTIERI (2008).

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54

Figura 7 - Representação raça negróide presente em Geografia do Brasil, p.67

Figura 8 - Representação da raça mongolóide ou indígena presente em Geografia do

Brasil,p.63

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55

Gicovate aponta que da mistura dessas raças surgiu o mestiço, de

grande importância na população brasileira. Chauí (2001) afirma que a

população ou ―tipo nacional‖, se caracteriza pela ―superioridade do Brasil‖ é

―dada pela excelência dos três elementos que entraram na formação do tipo

(beleza, força e coragem dos índios; afetividade, estoicismo, coragem e labor

do negro; bravura, brio, tenacidade, união, filantropia, amor ao trabalho,

patriotismo do português)‖ e por isso ―o mestiço brasileiro não denota

inferioridade alguma física ou intelectual‖ (CHAUÍ, 2001:32). O autor ainda

destaca o caboclo e seus tipos regionais, o jagunço, o gaúcho e o cearense,

sempre enobrecendo e ressaltando as características positivas desses tipos.

Dentre esses tipos, o mais interessante é o caboclo. Apresenta vários tipos,

que são caracterizados pelo grau de mestiçagem e pelo ambiente

geográfico em que se movem. Costuma-se distinguir o sertanejo do norte ou

jagunço, que habita as caatingas; o gaúcho, que se desenvolve nas

campinas e coxilhas do Brasil meridional; o caboclo ou cearense,

desbravador da Amazônia; o sertanejo do centro, descendente do

bandeirante.O meio em que se desenvolve o gaúcho é pródigo. O clima

bom e as pastagens imensas. Veste o ponche, bombachas, come churrasco

e toma chimarrão. É cavalheiresco e espetacular. Leva uma vida farta e

larga. O jagunço encontrou um meio muito diferente. A terra é madrasta.

Tem que lutar contra a sêca que, periódicamente, assola o sertão. É tenaz

na luta contra o meio. Só em último caso se desloca. Mal, porém, tem

noticia de que choveu, volta saudoso para o seu rincão natal. Se tivéssemos

duvida ainda sobre o valor de nossa raça, bastaria lembrar um fato positivo :

o desbravamento da Amazônia. (GICOVATE, 1946:66)

Figura 9 - "O gaúcho" presente em Geografia do Brasil, p.66

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56

Para Oliveira ―no início do século XX, assistiu-se à emergência de outro

grande mito nacional – o da democracia racial ou da ―fábula das três raças‖, na

conceituação de Roberto DaMatta. Esta foi e é a grande ideologia nacional que

junta nação e povo‖ (OLIVEIRA, 2000: 35-36).

Seguindo a unidade II, o autor ainda apresenta dados dos censos

populacionais realizados no Brasil

O elemento primordial no desenvolvimento de uma nação é o crescimento de

população ou o índice de vitalidade de uma nação e verificado por meio de

recenseamentos.

Até hoje, cinco foram as operações censitárias entre nós realizadas em períodos

irregulares:

1.° recenseamento - 1872

2.° >> - 1890

3.° >> - 1900

4.° >> - 1920

5.° >> - 1940 (GICOVATE, 1946:78)

Outro ponto importante presente nesta unidade aborda a imigração para

terras brasileiras. Segundo Gicovate ―O Brasil é um país de imigração‖

(GICOVATE, 1946:94), e esta apresentou uma grande importância para o

avanço econômico brasileiro, principalmente durante o primeiro governo de

Getúlio Vargas (1930-1945)

Com a abolição da escravatura e a proclamação da república, sofreu a

economia um colapso. A sua reconstrução teve por base a imigração

voluntária, do trabalhador livre, de raça branca. A constituição de 1934 e o

advento do Estado Nacional, em 1937, estabeleceram um período

científico ou racional da imigração e assimilação, atendendo ao caráter

essencialmente nacional da era renovadora. Basta lembrarmos as leis

então promulgadas, estabelecimento da quota de imigração, e a criação de

um Conselho de Imigração e Colonização. (GICOVATE, 1946:94, grifos

nossos)

Ainda podemos observar em vários trechos da obra a importância dada

pelo autor ao período do ―Estado Nacional‖, atualmente mais conhecido como

Estado Novo.

Seguindo a evolução natural dos fenômenos políticos adotou o país, a 15 de

novembro de 1889, a forma republicana. O ciclo de nossa evolução

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política foi completado com a instituição do Estado Nacional, a 10 de

novembro de 1937.‖ (GICOVATE, 1946:115, grifos nossos)

Figura 10 - Imagem de Getúlio Vargas presente na obra, p.116

Ao denominar o período do Estado Novo de Estado Nacional, Gicovate

em seu livro, acaba por legitimar o governo ditatorial de Vargas. Além disso,

por meio de sua exaltação dos aspectos naturais e sociais da nação, e da

intencional abordagem do país como uma unidade tanto física, quanto política

e social, o autor corrobora o nacionalismo Varguista – a nação e o Estado

como um corpo só. Ao abordar a administração pública, que rege o território

nacional, Gicovate destaca a modernidade trazida pelo Estado Novo, glorifica a

Constituição de 1937 e tenta justificar porque a denominação de Estado

Nacional estaria mais condizente

Embora a organização administrativa de nosso país, antes de 1930, já

cuidasse dos problemas de organização social, do fomento da produção, da

agricultura e do ensino, a verdade é que só depois dessa data se

transformou para preencher os fins de um verdadeiro Estado moderno. Daí

a denominação Estado Novo. Com a Constituição de 1937, mais clara e

perfeita se tornou a organização administrativa do país, no sentido das

exigências da nacionalização de vários serviços. Daí, o Estado Nacional.

(GICOVATE, 1946:127, grifos nossos)

Acerca das divisões internas do Brasil em regiões, Gicovate trabalhou

com cinco regiões, Norte, Nordeste, Leste, Centro-Oeste e Sul, que são

denominadas como regiões naturais no livro. As regiões naturais seriam

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58

(...) uma unidade geográfica que é individualizada por suas feições

topográficas, condições climáticas e natureza do solo. As condições de vida

e de trabalho serão, pois, determinadas por esses elementos dominantes.

(GICOVATE, 1946:120-121, grifos nossos)

Figura 11 – Mapa das Regiões Naturais Brasileiras presente em Geografia do Brasil,

p.121

Novamente o conceito de unidade é retomado, pois o autor deixa claro

que antes de qualquer divisão política, natural ou administrativa, o ―Brasil é um

Estado Soberano‖ e a ―União forma um todo que é integrado pelo território,

pelo povo e pela soberania‖ (GICOVATE, 1946:119). A Região Norte

compreenderia os Estados do Amazonas e Pará, os Territórios do Acre,

Amapá, Rio Branco, Guaporé. A Região Nordeste, compreendia duas partes: o

Nordeste Ocidental, com os Estados do Maranhão e Piauí; e o Nordeste

Oriental, com os Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba,

Pernambuco, Alagoas e o Território de Fernando de Noronha. A Região Leste,

compreendia duas partes; o Leste Setentrional, com os Estados de Sergipe e

Bahia; e o Leste Meridional, com os Estados de Minas Gerais, Espírito-Santo,

Rio de Janeiro e o Distrito Federal. A Região Sul era constituída pelos Estados

de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e o Território de

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Iguaçu. E por último, a Região Centro-Oeste, formada pelos Estados de Goiás,

Mato-Grosso e o Território de Ponta Porã.

Na unidade IV Gicovate trabalha o tema transportes, assim como sua

importância para o desenvolvimento e a integração do Brasil, especialmente

devido ao tamanho do país

Um país de grande extensão territorial e de grandes recursos

econômicos como o nosso, exige vasta rêde de transporte. É certo,

porém, que os meios de transporte se desenvolvem com o aparelhamento

econômico de cada região. (GICOVATE, 1946:135, grifos nossos)

Para esse autor, o desenvolvimento dos transportes e da malha rodoviária

estaria relacionado diretamente ao incremento econômico regional e para

impulsioná-lo, foi criado em 1937 o Departamento Nacional de Estradas de

Rodagem, ou DNER. A criação desse departamento solucionaria aquilo que

seria

Um dos problemas mais importantes para o nosso país é a construção de

rodovias que cortem o território nacional em todos os sentidos: que liguem

todos os recantos de nossa pátria: que permitam a penetração de nosso

interior, incentivando o povoamento; que permitam o escoamento dos

produtos econômicos; e que dêem uma base mais sólida à nossa

unidade. Êsse magno problema foi objeto do Decreto n.° 15 093, de 20 de

março de 1944, que instituiu o ‗plano rodoviário nacional’. (GICOVATE,

1946:146, grifos nossos)

Segundo o autor, o plano rodoviário nacional corresponderia a metas

para o desenvolvimento das estradas no país. Além da questão rodoviária, o

autor também aborda a importância do transporte hidroviário e da aviação,

destacando sempre a modernidade da estrutura brasileira

A extensa costa brasileira oferece numerosos e excelentes portos. Ao todo,

138 portos naturais. Dêstes, 47 são marítimos e os restantes, flúvio-

marítimos. (GICOVATE, 1946:153)

A aviação civil e a aviação militar estão em grande desenvolvimento.

Inúmeros são os cursos de pilotagem. (GICOVATE, 1946:156)

Grande é o número de aeroportos modernos de nosso país.Cabe a aviação,

no momento atual, papel muito importante, no desenvolvimento da

economia e na defesa do nosso território. (GICOVATE, 1946:156)

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Na unidade V o autor apresenta os solos agrícolas, fazendo uma breve

retrospectiva da vida econômica brasileira e apontando a modernidade recém

chegada com a indústria

A nossa evolução econômica seguiu, passo a passo, a nossa evolução

político-social. Desenvolveu-se a vida agrícola e a vida pastoril. Dominou a

mineração. Os processos primitivos cederam lugar aos modernos.

Estabeleceu-se a indústria. Longo e árduo foi esse trabalho de ampliação

interna de nossa fronteira econômica. Foi a luta do Brasil pela posse de si

mesmo. A nossa economia seguiu o caminho aberto pelos bandeirantes.

Fêz a sua marcha para oeste.A história da evolução econômica, entre nós,

apresenta uma característica dominante: uma série de recortes

sensacionais. Cada um dos produtos: o açúcar , o cacau, o couro, o fumo, o

algodão, a borracha, o café, dominou como senhor absoluto, em um

determinado momento de nossa evolução econômica. Verdadeiros pivôs em

volta dos quais girava o nosso sistema econômico. Com função secundária,

outros produtos econômicos. É êsse aspecto interessante e original de

nossa evolução econômica, que deu origem à concepção dos ciclos

sucessivos. (GICOVATE, 1946:171)

Ressalta a vocação agrícola das terras brasileiras, aumentada pela

Modernidade dos novos processos que chegavam ao campo naquele

momento, porém, sem citar os problemas ou o fato de que apenas uma

pequena parcela da população rural tinha acesso a esses novos equipamentos

e técnicas modernas de produção.

É por demais conhecida a fertilidade de nossas terras. Lembremos aqui,

mais uma vez, as palavras de Vaz Caminha quando afirmava que,

plantando, dar-se-á nela tudo. O período incipiente de nossa produção

agrícola já faz parte da história do passado. A monocultura cedeu lugar à

policultura. Os processos empíricos e primitivos estão sendo substituídos

com o emprego de máquinas agrícolas e processos menos rotineiros.

(GICOVATE, 1946:213)

Ainda sobre a modernidade da agricultura e sobre a defesa econômica

da produção afirma que

As realizações da agricultura moderna no Brasil, nos últimos anos são

deveras surpreendentes. Verificou-se o aproveitamento e a valorização da

terra e, mais ainda, de muitos produtos de aplicação industrial. A defesa da

produção agrícola tem sido preocupação constante do govêrno. Não um

protecionismo, mas a defesa dos produtos. Uma visão profunda teve como

conseqüência a valorização da nossa produção agrícola. (GICOVATE,

1946:214)

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Esse autor inicia a unidade VI, A indústria e o Comércio, destacando que

um ―País rico, como é, em todos os reinos da natureza, o Brasil está fadado a

ser um grande país industrial.‖ (GICOVATE, 1946:220) O desenvolvimento, não

somente industrial como de outros setores, estaria sempre ligado a um

discurso de fortalecimento da defesa nacional

O parque industrial brasileiro esta crescendo. Já não necessitamos recorrer

à importação em diversas indústrias. O gôverno está interessado em

estabelecer indústrias básicas para a defesa nacional. Já fabricamos navios

e aviões. (GICOVATE, 1946:222)

Gicovate finaliza o livro apresentando os principais produtos nacionais e

o funcionamento do comércio interno e externo, para deslumbramento e

orgulho dos estudantes.

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estadonovismo foi apresentado inicialmente como um ―aparato‖ neutro,

acima de interesses específicos, voltado para o bem comum de toda população

brasileira. Todavia, sob a aparência de defender uma concepção ideológica

universal, justa e neutra o Estado introduz uma concepção homogeneizante de

mundo que acaba por refletir diretamente na educação, de acordo com a ótica

das classes dominantes. Por seus meios e recursos, a escola foi utilizada como

um dos elementos de divulgação por excelência da ideologia estatal.

A Reforma do Ensino de 1942 implicou na superação do ensino

academicista e literário, que ―era de pouca valia para um país que exigia do

homem ser a força propulsora e produtora da riqueza nacional‖ (CURY, 1978

apud RODRIGUES, 1991:146) e onde a própria Constituição de 10 de

novembro de 1937 ressaltava ser o trabalho, um dever social.

Com base em suas propostas socializantes, conjugadas com o despertar ou

reafirmar de uma fé no progresso brasileiro e do orgulho na exuberância da

natureza nacional, o governo do período Vargas conseguiu atribuir ao trabalho,

que era antes de tudo um dever, um valor social.

Desse modo, o trabalho resultaria em crescimento individual, assim

como no desenvolvimento da ―imaginada‖ Nação brasileira. Para isso a

Geografia foi utilizada a fim de criar no povo um sentimento de pertencimento e

conhecimento da Nação, na medida ―que acaba por fornecer a matriz para a

construção de ―nosso orgulho e identidade nacional‖(DEL GAUDIO, 2007:49)

Por meio das análises aqui expostas, podemos concluir que Geografia do

Brasil, se propôs a cumprir este papel. Acreditamos que isto se relaciona a uma

série de fatores, tanto de ordem pessoal – o pertencimento de classe e/ou

ideológico do próprio autor e seu alinhamento ao Estado e às suas políticas

educacionais -, quanto pela necessidade de cumprimento das normas impostas

à publicação de livros a partir da Reforma de 1942.

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Essa reforma possibilitou vetar – ou pelo menos dificultar – a publicação de

obras didáticas que estivessem em desacordo com o Estado e sua política –

geral e educacional.

Por meio dessa reforma, o Estado Varguista objetivava primeiro, fixar

diretrizes técnico pedagógicas propriamente ditas para regular a educação.

Todavia, mais que isso, a reforma e as mudanças educacionais deste período

buscaram e efetivaram os meios que permitiram disseminar os postulados do

Estado Novo.

A geografia escolar, ao trabalhar diretamente com a construção de uma

‖imagem‖ positiva do Brasil, em que se destacam sua extensão, suas riquezas

e belezas naturais, seu povo ―pacífico e ordeiro‖ e trabalhador, muito contribuiu

, e ainda contribui, para a manutenção da ideologia nacional brasileira – como

pode ser inferido pelos excertos e imagens destacadas no presente texto.

Se a Nação é antes de qualquer coisa ―imaginada‖, consideramos que a

Nação ―imaginada‖ por Moisés Gicovate buscava despertar nos alunos o mais

profundo orgulho em ser brasileiros. Especialmente considerando o que o

Brasil era naquele momento, assim como o potencial do que o país poderia vir

a ser com ajuda deles por meio do trabalho,.

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64

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