Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

45
Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os campos disciplinares

Transcript of Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Page 1: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Museologia e sua reivindicação por um espaço

específico entre os campos disciplinares

Page 2: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

A origem da Museologia

?

Page 3: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Segundo os dicionários franceses, o termo “museologia” não aparece antes de 1931. Com relação aos ingleses, o termo demorou a ser utilizado, com exceção de um uso no David Murray’s Museum, 1904 (AGREN, 1992, apud CERAVOLO, 2004, p. 48).

• Contudo, segundo van Mensch, o primeiro a usar o termo Museologia foi P. L. Martin, em Praxis der Naturgeschichte (1869), e o primeiro a usar o termo Museografia foi C.F. Neickelius, em Museographie oder Anleitung zum rechten Begriff und nutzlicher Anlegung der Museorum oder Raritätenkammern (1727).

• Em 1883 o alemão J. G. Th. Von Graesse escreveu o livro Zeitschrift für Museologie und Antiquitätenkunde sowie verwandte Wissenschaften, destacando o termo Museologia (VAN MENSCH, 1992).

Page 4: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Von Graesse, em seu livro que leva no título o termo

“Museologia”, de 1883, aponta e é constantemente

mencionada como já demarcando uma possível

existência da Museologia já àquele tempo:

“Se alguém tivesse falado ou escrito sobre

Museologia como um ramo da ciência há trinta ou

vinte anos, a única resposta de muitas pessoas

seria um compassivo, desdenhoso sorriso”

(tradução nossa).

Page 5: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• A modernização dos museus e a busca pela

profissionalização do trabalho nessas instituições –

uma revolução nos museus - levou à criação da

Museums Association, no Reino Unido, em 1889. Essa

associação iniciou, em 1901, o Museums Journal, a

primeira publicação para o campo dos museus naquele

país.

• Em 1908 foi oferecido o primeiro treinamento de

profissionais para museus nos EUA, no museu da

Pensilvânia (VAN MENSCH, 1992). Outros países

seguiram o exemplo, com a criação de associações

nacionais dedicadas aos museus.

Page 6: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Na década de 1920, como aponta Scheiner

Uma das experiências mais emblemáticas do período foi a criação, em 1927, na Escola do Louvre, de um Curso de Museografia (2º. Ciclo), primeiro curso na

França com o objetivo de qualificar e formar conservadores para os museus do país. Por este motivo, o ano de 1927 ficou conhecido na França como ‘o ano da Museologia’ (SCHEINER, 2007).

• Cabe ressaltar que, em 1932, foi criado no Brasil, no Museu Histórico Nacional, o Curso de Museus - o primeiro da América Latina a realizar o estudo sistemático das práticas de museus.

Page 7: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Mensch considera como fase “pré-científica” esse estágio onde os termos ainda estavam intimamente ligados ao trabalho de museu. Van Mensch também identifica que “a emancipação da museologia como disciplina acadêmica está conectada com o processo de profissionalização do trabalho de museu” e isso não é coincidência (VAN MENSCH);

• Nossos trabalhos anteriores destacaram que a Museologia se desenvolve e “ganha corpo” a partir de meados da década de 1950, refletindo sobre o Museu, algumas vezes apresentado como instituição, outras como fenômeno. Alguns teóricos – como Stránský, Gregorova, Klausewitz, Maroevic – alinhavam as discussões apresentando a Museologia como disciplina científica e não como ciência, como seus antecessores (Neustupny, por exemplo).

Page 8: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• No Seminário Regional da UNESCO sobre a função educativa dos museus, ocorrido no Rio de Janeiro, em 1958, a Museologia foi definida como ‘o ramo do conhecimento ligado ao estudo dos objetivos e organização de museus’, definição adotada em 1974, na 11ª Assembleia Geral do ICOM, em Copenhague (Dinamarca).

• Na década de 1960 houve uma tentativa de vincular a Museologia às ciências humanas e sociais, não como saber específico, porém ligada a áreas como História, Sociologia, Antropologia, Educação e até mesmo à recém-criada Ciência da Informação, como afirma Scheiner.

• A autora apresenta como exemplo um simpósio ocorrido na Alemanha Oriental, em 1964, onde definiu-se a Museologia como ciência da documentação (SCHEINER, 2005, p. 179).

Page 9: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Contudo, outro grupo percebeu a Museologia como ciência independente, “[...] com teoria e metodologia específicas, variando as concepções sobre seu objeto de estudo e sobre a existência ou não de um sistema próprio – o ‘sistema da museologia’.” (SCHEINER, 2005, p. 179).

• Na Conferência Geral do ICOM em Nova Iorque (1965), concluiu-se que era necessário desenvolver cursos universitários em Teoria Museológica (VAN MENSCH, 1992);

• Em meio a este interesse pela construção da Museologia, surgiu também no âmbito do ICOM, no início da década de 1970, o interesse em criar um Tratado em Museologia, com o objetivo de estabelecer uma terminologia própria para o campo.

Page 10: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• A Museologia começava a ser percebida pelo ICOM como um novo campo disciplinar - fato evidente no Seminário do ICOM sobre Formação Profissional para museus, ocorrido em 1972, onde foi definida como uma “ciência do museu, relativa ao estudo da história e do background dos museus, seu papel na sociedade, sistemas específicos de investigação” (SCHEINER, 2005, p. 180);

• Durante a Mesa Redonda de Santiago do Chile, em 1972, o caráter social da Museologia passou a ser priorizado - e esta, já reconhecida como um novo campo do conhecimento, foi oficialmente associada às Ciências Sociais, passando a ser sistematizada a partir da reunião de pessoas com o interesse em discuti-la - situação essa que seria facilitada com a instalação do ICOFOM (Comitê Internacional para a Museologia, do ICOM);

• Podemos perceber que, com a instauração e fortalecimento do ICOM, a Museologia enquanto área específica também se fortaleceu, sendo debatida como tal.

Page 11: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Stránský - “A teoria museológica e a

museologia têm sua própria história, diferindo

grandemente da história dos museus” (2008, p.

104, grifo nosso);

• A Museologia por sua vez foi criada

sucessivamente, primeiro vinculada aos objetos

e coleções para, em meados do século XX, ser

separada da museografia e posteriormente

tornar-se uma disciplina científica.

Page 12: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Stránský - por muito tempo museografia tem sido apresentada como o que agora se refere à Museologia mas, de acordo com a própria etimologia do termo, deveria apenas referir-se aos relatos descritivos do trabalho de museus.

• Assim, grande parte da literatura sobre museus “é museográfica nesse sentido” (STRÁNSKÝ, 1980, p. 28): “[...] museografia é a soma de todo trabalho que não é de caráter criativo mas que projeta cada criatividade, trabalhos exploratórios no âmbito das atividades práticas de museus” (ibidem).

Page 13: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• É possível encontrar trabalhos que abordam

uma história ou origem da Museologia tendo-a

associado à própria história e origem do

Museu, que nada mais é que um anacronismo.

São poucos os campos do conhecimento que

possuem histórias milenares (ou seriam

práticas que hoje são atribuídas a esses?), mas

não é o caso museológico.

Page 14: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Tal diferença influencia fortemente a forma de ver e analisar o campo. O uso do termo “logia” parece impulsionar um modo de organizar conhecimento que passa pela lógica (ou pelo pensamento organizado de forma científica), muito comum nos outros campos científicos; e que visa um objeto específico de estudo, que por sua vez também poderia estar na constituição do termo – o vocábulo “Museo”.

O termo “estudo de museus” pode abranger teorias sobre o conceito de museu, mas também tudo que se relaciona à prática nesse específico universo. Para os autores da corrente “Museologia”, baseados em seus antecessores, esta divisão se dá da seguinte forma: “O questionamento crítico e teórico do campo museal é a museologia, enquanto que o seu aspecto prático é designado como museografia” (MAIRESSE e DESVALLÉES, 2010, p. 20).

Page 15: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

A nomeação “Museologia” não é exclusiva do Leste Europeu, pois pode ser identificada em outros lugares como países da Europa Ocidental (França, Portugal, Espanha e Alemanha, por exemplo) e nos países da América Latina, principalmente com representantes no ICOFOM LAM. Aqui em nenhum momento defendemos uma unanimidade nesses diferentes espaços em relação à Museologia e os demais termos.

Esses recorrem aos referenciais dos autores do Leste Europeu para lançar suas próprias discussões e reflexões sobre. O único consenso, se assim poderíamos dizer, seria o de adotar o termo “Museologia” para uma área ou campo que se debruça sobre o objeto de análise “Museu”. No entanto, há outra linha de pensamento que se denomina “Museum Studies”.

Page 16: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Museologia – relação específica entre o Humano e o Real

• Gregorová, baseada em Stránský:

Museologia é a ciência que estuda a relação específica

entre o homem e a realidade, que consiste em colecionar

e conservar intencional e sistematicamente objetos inanimados,

materiais, móveis e principalmente tridimensionais que por sua

vez documentam o desenvolvimento da natureza e da

sociedade e humanidade através do uso cientifico e cultural-

educacional destes (1980, p. 20, tradução nossa).

Page 17: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Stránský, ao considerar museu como uma específica forma de apropriação da realidade, e não a realidade como tal, percebe que se trata de uma realidade vista de um ponto de vista humano.

• Assim, para esse autor, o objeto de estudo da Museologia seria uma relação específica com a realidade; uma forma de apreender as coisas que definem o “caráter do museu”, que denomina de musealidade, deve ser o objeto central da Museologia – sendo esse o diferencial desse campo em detrimento de outros ramos da ciência, delimitando ainda sua posição dentro do sistema das ciências (1987, p. 289).

Page 18: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Bellaigue também considera como premissa que “museu é a expressão de uma relação específica entre o homem e a realidade resultando na preservação de seu patrimônio natural e cultural objetivando a pesquisa e a documentação (e o desenvolvimento)” (1987, p. 59).

• De que realidades esses teóricos estão falando? Se cada indivíduo percebe a realidade a partir dos seus referenciais, como seria possível definirmos que certas relações específicas (segundo nossos recortes) podem ser chamadas de museu, musealidade ou museologia?

• Assim, é imprescindível apontar que a relação específica está nos olhos do teórico, e não do humano analisado, cuja relação é nomeada pelo primeiro.

Page 19: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Para entender uma possível relação entre o

Humano e o Real, faz-se necessário deslocar o

olhar do Humano observado para o Humano

observador. São os teóricos, a partir de suas

inferências, quem determinam a especificidade

na relação, quem definem o objeto e seus

limites. São os teóricos ou atores de dado

recorte que criam e recriam o Museu;

• Assim, poderíamos afirmar que existe uma

relação específica – mas ela está mais para o

campo do que para o objeto.

Page 20: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Teoria ou teorias?

• Na introdução do pequeno livro “Conceitos chaves da Museologia”,

Mairesse e Desvallées chamam a atenção para o fato de que o

Comitê Internacional de Museologia do ICOM - ICOFOM, desde

seus primórdios, tem se debruçado sobre questões que são

essenciais para o entendimento do conceito de Museu e para a

própria consolidação do campo da Museologia.

• E é neste contexto chamado ICOFOM que teóricos – com

desdobramentos em todo mundo - iniciam um projeto que resultou

no livro mencionado e no Dicionário Enciclopédico de Museologia.

Page 21: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Ao refletir sobre trabalhos que discutem Museu e Museologia, principalmente em grupos dedicados a esse tipo de reflexão, tais como ICOFOM e ICOFOM LAM, não foi encontrada uma “definição geral” sobre o que vem a ser Museologia. Mas percebe-se uma tendência, entre os autores do campo, a privilegiar uma definição de Museologia que pode ser oriunda da formação do termo: seu objeto de estudo é o Museu;

• Aqui poderia encerrar-se a discussão, se não nos chamasse atenção também o fato de que o próprio objeto de estudo parece comportar muitas e diferentes definições, especialmente duas que muitas vezes são postas de forma antagônica: instituição e fenômeno, gerando uma discussão em torno da natureza do objeto do campo.

Page 22: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• O ICOFOM, segundo van Mensch, assumiu um papel crucial na aceitação da Museologia como uma ciência. Contudo, a transição de uma formulação empírica para uma formulação teórica da Museologia ainda não está completa, para alguns dos autores presentes nesse comitê;

• Gluzinski (1983 apud VAN MENSCH 1992) afirma que a Museologia não pode ser ao mesmo tempo a ciência de dado campo de atividade e ser esse campo de atividade propriamente dito;

• Se coloca então em cheque o grande desejo de alguns museólogos em reivindicar a existência de um campo Museologia. Para Spielbauer (1981 apud VAN MENSCH 1992), a ideia fundamental parece ser o fato de que “se a Museologia tem um lugar na universidade, os museólogos ganharão prestígio, apoio e posição no âmbito da profissão de museu e da comunidade em geral”, isto é, a reivindicação pela existência de um campo está profundamente ligada à reivindicação por um status profissional ou, até mesmo, por uma necessidade de existência dessa específica profissão.

Page 23: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Assim, para van Mensch, “o status de programas de capacitação em museus muito depende do grau em que o trabalho de museu é considerado uma profissão e o grau em que a museologia é reconhecida mais ou menos como uma disciplina autônoma”;

• Ele aponta que a resistência de curadores de museu em relação à Museologia ser uma disciplina aplicada pode estar relacionada à manutenção de seu status quo e ainda afirma que essas colocações, no âmbito do ICOFOM, muitas vezes são hostis;

• Um desses defensores, Nair (1986 apud VAN MENSCH 1992), afirmou: “Nós devemos parar de nos preocupar em definir museologia. Definir museologia e dar a ela uma conotação espiritual e mesmo metafísica parece ser o hobby de alguns museólogos. Eles estão perdendo o tempo deles. Museologia é simplesmente uma ferramenta para uma boa organização e gerenciamento em museus”.

Page 24: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Stránský tinha uma ambição: de que para uma efetiva contribuição teórica da Museologia não bastariam apenas opiniões e pontos de vistas individuais sobre o assunto, mas sim um sistema de conhecimentos fruto de um “amplo esforço profissional” (2008, p.101). Stránský aponta um caminho: é preciso “permitir o tempo necessário para a criação de uma base de publicações” (STRÁNSKÝ, 2008, p.101).

• Esse autor também pontua a existência de diferentes termos que referem-se ao mesmo fenômeno, o Museu: Museografia, Teoria Museológica, Museística. Mas grande parte desses termos está ligada apenas à prática, unindo teoria e prática em torno do mesmo objeto.

Page 25: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Ainda que se trate de uma organização de

pensamento que de nenhuma forma se propõe

a ser conclusiva e definitiva, sabe-se e é

amplamente aceito que nos países de língua

anglo-saxônica prevalece a nominação do

campo dos museus como “Museum Studies”,

enquanto na corrente francófona (também

presente nos demais países latinos e no Leste

Europeu) o termo usado é Museologia.

Page 26: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

“Museum Studies” - um embate teórico-prático em uma

área em ascensão

• Mesmo considerando a existência do termo museologia, desde o final do século XIX, os termos mais usados, no contexto da língua inglesa, eram “prática de museu”, “administração de museu”, “trabalho de museu” e “organização de museu” (AQUILINA, 2011, p. 11);

• Segundo Cushman, nos Estados Unidos surgiu a necessidade de se criar estudos específicos para museus – “museums studies” – em meio a própria demanda criada pela proliferação de museus, considerando as seguintes questões: “os funcionários dos museus deveriam ser experts ou generalistas? Eles deveriam ser treinados em escolas ou em museus?” (1984, p. 8, tradução nossa). Lideranças de museus, então, decidem definir padrões e métodos “para preparar o campo do museu” (loc. cit.).

Page 27: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Um dos primeiros a estabelecer princípios e parâmetros para os funcionários de museus foi George Brown Goode, em 1895 (CUSHMAN, 1984, p. 8) e foi em 1905, na Pensilvânia, que iniciou-se o primeiro curso específico de museus (Pennsylvania Museum’s School of Industrial Art), criado por iniciativa de Sarah Yorke Stevenson, uma egiptóloga (ibidem, p. 9);

• Em 1908 foi criado um curso de treinamento para profissionais de museus na Universidade de Iowa, cujas aulas começaram em 1911 (ibidem, p. 10).

Page 28: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Na década de 1920 foram criados os dois mais conhecidos programas de treinamento de museus: na Universidade de Harvard e no Museu de Newark, em Nova Jersey. Um dos principais nomes no ensino em Harvard foi Paul Sarchs e em Newark foi John Cotton Dana (CUSHMAN, 1984, p. 12-13).

• Segundo Cushman, a diferença entre os cursos é que o primeiro formava eruditos e o segundo, professores, com objetivos diferentes: “Enquanto Havard enfatizava a História da Arte e sua especialização, Newark usava o museu em si como assunto de aula” (ibidem, p. 15 – tradução nossa).

Page 29: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Na American Association of Museums, em 1926, foram decididos e apontados parâmetros para o treinamento de profissionais de museus, tais como: “O trabalho teórico pode ser ensinado na universidade, e incluiria estudos em cultura geral, arte, história e ciência”; O trabalho prático no museu cobriria a organização de museus, administração, prédios, finanças, coleção, gravações, preparação de exposições, arranjos organizacionais, pesquisa, educação e publicidade” (CUSHMAN, 1984, p. 16);

• Segundo Teather, um dos primeiros nomes importantes na articulação do conceito de “Museum Studies” foi Raymond Singleton (1966-1977) que, em paralelo e diferentemente de Nestupny, tecia uma linha teórica mais pragmática sobre o que poderia ser delimitado como área dos museus (1991, p. 406).

Page 30: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Para Singleton, o termo “museum studies” abrangeria os estudos de Museologia e Museografia, porém possuiria uma amplitude mais abrangente e também seria de melhor adesão por aqueles que se colocam em resistência aos termos Museologia e Museografia (SINGLETON apud TEATHER, loc. cit.);

• Outra questão que favorece o uso do termo, para os que não admitem a existência de um campo específico para museus, é que nem todo estudo de museus (“museum studies”) é necessariamente museológico (ibidem, p. 408);

• Para Aquilina, a preferência pelos termos “museum studies” e “museum work” também deriva do fato dos países que fazem uso desses estarem focados “nas aplicações práticas da museologia” (2011, p. 15).

Page 31: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Teather, em sua tese, reforça as premissas acima apresentadas apontando que a escolha do termo “museum studies” por alguns se dá porque esses defendem que o trabalho de museu é puramente uma técnica.

• Além de mais abrangente, esse termo também seria de melhor compreensão e “autoexplicativo”, em contraponto às diferentes concepções de Museologia e Museografia (1984, p. 3);

• Teather também identifica uma tendência nos países de língua inglesa de evitar discussões fundamentais sobre “Museologia” e, em contrapartida, focarem-se em “aspectos secundários”, tais como os que são pertinentes às práticas em museus.

Page 32: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Esta área – museum studies – pode ser interpretada como técnica ou ciência aplicada (ibidem, p. 4-5). Os programas atuais de museum studies reconhecem a existência de um campo embrionário chamado Museologia, mesmo que com relutância (Teather, 1984, p. 12) – de fato, a ideia de Museologia enquanto estudo teórico tem sido um “fracasso” para a América do Norte (ibidem, p. 10);

• A partir das considerações acima, é possível inferir que há uma forma diferenciada de delimitar uma área de conhecimento para museus em relação aos que a denominam de “Museologia”. No caso do museum studies, o que parece é que há uma grande resistência em se pensar, assumir e legitimar a existência de um campo específico para museus;

• O que esses especialistas admitem é a existência de um escopo mais abrangente que incluiria tanto especificidades como a Museologia (conjunto de teorias sobre museu mas que não justificaria um campo específico) e as diversas aplicações e contribuições metodológicas de outros campos encontradas nos museus.

Page 33: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• O que não é possível inferir, por agora, é como

esse fenômeno acontece de forma tão nítida

nos países de língua inglesa – não se trata

apenas do uso de um termo, de uma tradução,

mas sim de uma ideia, de uma corrente sobre o

que viria a ser a área de estudos de museus.

Page 34: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Nova Museologia – em contraponto à velha?

• O trabalho desenvolvido por Varine e Rivière levou ao conceito de “Nova Museologia”, no início dos anos 1980. Tratava-se da proposta de uma Museologia voltada para as relações e não mais exclusivamente para os objetos, e da construção de um museu pelo Homem e para o Homem, no qual ele torna-se parte do que deva ser preservado (SOARES, 2006, p. 79);

• Para van Mensch, havia divergências de opinião sobre ecomuseu e Nova Museologia no âmbito do ICOFOM. Esse grupo que defendia a Nova Museologia como foco da política do ICOFOM foi liderado por Rivière (1992, p. 21).

Page 35: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Durante o encontro de 1983 Mayrand propôs a criação de um grupo de trabalho denominado “museologia comunitária” (Van Mensch, 1992, p. 21). Essa proposta a princípio não foi aceita pelo board que não queria se debruçar em apenas uma corrente da Museologia, mas recomendou à Mayrand preparar uma sessão especial sobre ecomuseus no encontro que ocorreria em 1984, no Canadá;

• No entanto esse encontro anual do ICOFOM não ocorreu no Canadá por falta de ação/interlocução tanto do ICOFOM quanto do comitê local, o que pode ter levado, ou propiciado, a realização do I Workshop Internacional para Ecomuseus e Nova Museologia em Quebec, no Canadá, nesse ano.

Page 36: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• O fruto principal desse encontro foi o desejo de criar um novo comitê do ICOM, específico para Nova Museologia, proposta essa que foi rejeitada (1992, p. 22). Posteriormente apresentaram uma nova alternativa, com o estabelecimento do Movimento Internacional da Nova Museologia, em 1985 (Lisboa), que foi aceita pelo ICOM como organização afiliada (VAN MENSCH, 1992, p. 22);

• Esse ocorrido, a criação do MINOM, pode ter sido favorecido pelas divergências e incompreensões entre anglófonos e francófonos ou latinos, como aponta van Mensch citando Desvallées (1992, p. 22-23);

• Contudo, segundo van Mensch, pessoas consideradas chave para a Nova Museologia se mantiveram fiéis ao ICOFOM, como Desvallées e Bellaigue, e outros membros também permaneceram como membros do ICOFOM (p. 23), além do fato da Nova Museologia ainda ser um dos temas de discussão do ICOFOM (1992, p. 23).

Page 37: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Por uma Museologia Crítica

• No livro “Manual de historia de la Museología”, Lorente destaca que a “museologia crítica” surgiu e se desenvolveu principalmente nas universidades norte-americanas (LORENTE, 2012, p. 78), como uma corrente dedicada à análise dos museus mas com interesse em produzir impacto na prática;

• Dentre seus interesses, estão: a representação de culturas minoritárias ou periféricas, a impugnação de discursos colonialistas, propostas de museografias interativas, entre outros. Seu nome deriva de um movimento muito comum a seu tempo, em diferentes áreas: antropologia crítica, arqueologia crítica, história da arte crítica, pedagogia crítica, entre outras, assim como a “nova museologia” a seu tempo.

Page 38: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Esse termo – “museologia crítica” tem seu paralelo com a “antropologia crítica”, para Shelton, e com a “pedagogia crítica”, para Theater; o próprio Lorente passou a usar o termo a partir de suas influencias pela “história da arte crítica” (LORENTE, 2006, p. 28);

• Para Ortega, além de reflexão, a museologia crítica é também ação (2011, p. 16) e, conforme Hérnandez, a teoria crítica da ciência e o racionalismo crítico podem ajudar a entender os fundamentos metodológicos da museologia crítica;

• Hernández considera, entretanto, o fato de que o estudo da museologia em si é uma realidade relativamente recente (ibidem, p. 202). Para a autora, a museologia crítica não pode ser somente uma tentativa de resposta às diferentes formas de entender museu, mas sim uma tentativa de aproximação à realidade museal com o objetivo de analisar e supervisionar tudo que impede seu crescimento e aproximação (ibidem, p. 203).

Page 39: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Para Lorente, antes de mais nada, a defesa por uma “teoria

museológica” é exaustiva. Ficando no passado e amplamente

difundido pelo Leste Europeu, o que hoje permanece são poucos o

que se dedicam a um “exercício filosófico”, e até mesmo os que hoje

se debruçam por uma possível “museologia crítica” tem como base

suas próprias práticas em museus;

• Em um texto dedicado a diferenciação entre “museologia crítica” e

“nova museologia”, já aponta que a distinção entre a primeira como

resposta anglo-saxã à segunda é reducionista. Não é possível,

portanto, reduzi-las a polos geográficos e momentos cronológicos

sucessivos (LORENTE, 2006, p. 26);

• Inclusive pontua, citando Van Mensch, que o termo “nova museologia”

surgiu pela primeira vez em 1958, nos Estados Unidos, em um artigo

dos americanos Mills e Grove (LORENTE, loc. cit.). No entanto, em

seu trabalho de 2012, ressalta que o termo não tinha o mesmo

sentido que seu correlato francês (idem, 2012, p. 79).

Page 40: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Diferentemente das demais correntes de outras áreas do

conhecimento que se intitulavam novas (como a Nova História), a

nova museologia não era uma corrente construída por teóricos, e sim

por ativistas intrinsecamente ligados às práticas em museus;

• Já o surgimento do termo “museologia crítica”, segundo Lorente,

baseado na tese de Lynn Teather, surgiu em 1979 na Reidwardt

Academie, Holanda, na seção de Museologia da Faculdade de Belas

Artes, por meio do que denomina “uma forma curiosa de organizar

visitas de estudos de museus” (LORENTE, loc. cit.): em vez de uma

visita de estudos para estudantes de museologia ser conduzida por

um diretor de um museu e/ou chefe de seção, foi estimulado aos

alunos uma visita crítica em que esses estivessem mesclados ao

público;

• Nos parece que, apesar do cunho fortemente prático, a nova

museologia procura também consolidar suas questões no âmbito

teórico, com a criação de um grupo no âmbito do ICOM (o MINOM) e

por ter seus “pontífices reconhecidos”, como delineia Lorente.

Page 41: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• Mesmo considerando que alguns “museólogos críticos” são

continuadores da nova museologia (LORENTE, 2012, p. 80), a

primeira importante distinção que esse autor faz entre ambas

as correntes “nova museologia” e “museologia crítica” é que,

apesar de ambas deterem-se ao social, a primeira está focada

principalmente nos ecomuseus, enquanto a segunda em outros

tipos de museus, principalmente os tradicionais e/ou os mais

em voga na atualidade: como os centros de arte

contemporâneos;

• Um exemplo prático seria o surgimento de exposições que

colocam em questão convicções pré-estabelecidas e os

próprios discursos dos museus, convidando o público para

reflexões críticas sobre essas instituições;

• Nos Estados Unidos também pode ser encontrado o termo

“critical museum studies”, segundo Lorente (2006, p. 31).

Page 42: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

O uso do termo museológico

• Segundo o livro “Conceitos Chaves da Museologia”,

(DESVALLÉES; MAIRESSE, 2010, 87p) o termo

museológico é derivado do termo Museologia, enquanto

que, em relação ao termo Museu, é apenas correlato.

• O sufixo logia remete na atualidade a um exercício conjunto

de pensamento que procura ser científico – e mais:

específico, delimitado.

Page 43: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• A partir das inferências acima expostas, que justificam uma separação da Museologia de uma e apenas uma visão de Museu, o uso do termo museológico só pode ser aplicado à Museologia. Sendo assim, prática museológica seria o exercício que aqui fazemos agora – o de pensar e refletir sobre Museologia.

• Praticas relativas a museus são práticas de museus, ou práticas museais, dependendo do entendimento de museal que se tenha. O uso do termo “museológico” quando nos referimos às práticas em museus se dá pela fusão que muitos fazem de Museologia e museu, confusão essa que pode ser encontrada em grande parte dos textos que definem Museologia, e que aqui tentamos romper, usando os próprios autores do campo.

Page 44: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

Referências

• AQUILINA, Janick Daniel. The Babelian Tale of Museology and Museography: A History in Words. In:

International Scientific Electronic Journal, Issue 6, 2011, p. 1-20.

• BELLAIGUE, Mathilde. Museology and the “integrated museum”. In: SYMPOSIUM MUSEOLOGY AND

MUSEUMS. ISS: ICOFOM STUDY SERIES, Helsinki-Espoo, ICOM, International Committee for

Museology/ICOFOM, n. 12, p. 59-62, Sept. 1987.

• BELLAIGUE, Mathilde; MENU, Michel. Museologia e as formas de Memória. In: SIMPÓSIO MUSEUS,

MEMÓRIA E PATRIMÔNIO NA AMÉRICA LATINA E NO CARIBE. ICOFOM LAM, Cuenca, Subcomitê Regional

para a América Latina e Caribe/ICOFOM LAM, p.71-79, 1997.

• BRULON SOARES, Bruno César. Em busca do tesouro perdido: a Nova Museologia, o Novo Museu e a

América Latina. 2006. 175 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Museologia) – Escola de

Museologia, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006.

• CUSHMAN, Karen. Museum Studies: The Beginnings, 1900-1926. In: Museem Studies Programm, University of

Delaware, 1984, p. 8-18.

• DESVALLÉES, André; MAIRESSE, François (Ed.). Conceptos claves de Museología. Paris: Armand Colin,

2010. 87p.

• GREGOROVÁ, A. [untitled]. MuWoP: Museological Working Papers = DoTraM: Documents de Travail en

Muséologie. Museology – Science or just practical museum work, Stockholm, ICOM, International Committee for

Museology/ICOFOM/Museum of National Antiquities, v. 1, p.19-21, 1980.

Page 45: Museologia e sua reivindicação por um espaço específico entre os ...

• HERNÁNDEZ HERNÁNDEZ, Francisca. Planteamientos teóricos de la Museología. Gijón: Trea, 2006, p. 202.

• LORENTE LORENTE, Jesús-Pedro. Manual de historia de la museología. Gijón: Trea, 2012.

• LORENTE LORENTE, Jesús-Pedro. Nuevas tendencias en teoría museológica: a vueltas con la museología crítica.

Museos.es, n. 2, 2006, p. 24-33. Disponível em: < http://www.mecd.gob.es/cultura-mecd/dms/mecd/cultura-

mecd/areas-cultura/museos/mc/mes/revista-n-2-2006/desdemuseorev02/Rev02_Jesus-Pedro_Lorente.pdf >.

Acesso em: 6 ago. 2014.

• NEUSTUPNÝ, J. Museology as an academic discipline. MuWoP: Museological Working Papers = DoTraM:

Documents de Travail en Muséologie. Museology – Science or just practical museum work, Stockholm, ICOM,

International Committee for Museology/ICOFOM/Museum of National Antiquities, v. 1, p.28-29, 1980.

• ORTEGA, Nuria Rodríguez. Discursos y narrativas digitales desde la perspectiva de la museología crítica. Museo y

Territorio, n. 4, 2011, p. 14-29. Disponível em: < http://www.museoyterritorio.com/pdf/museoyterritorio04-3.pdf >.

Acesso em: 5 ago. 2014.

• SCHEINER, T. Museology and museums – a relationship to build. In: SYMPOSIUM MUSEOLOGY AND

MUSEUMS. ISS: ICOFOM STUDY SERIES, Helsinki-Espoo, ICOM, International Committee for

Museology/ICOFOM, n. 12, p.251-259, Sept. 1987.

• SCHEINER, T. In: SYMPOSIUM MUSEOLOGY AND MUSEUMS. ISS: ICOFOM STUDY SERIES, Helsinki-Espoo,

ICOM, International Committee for Museology/ICOFOM, n. 12, p.287-292, Sept. 1987.

• SHELTON, Anthony. De la antropología a la museología crítica y viceversa. Museo y Territorio, n. 4, 2011, p. 30-41.

Disponível em: < http://www.museoyterritorio.com/pdf/museoyterritorio04-3.pdf >. Acesso em: 5 ago. 2014.

• SOFKA, V. The chicken or the egg? In: SYMPOSIUM MUSEOLOGY AND MUSEUMS. ISS: ICOFOM STUDY

SERIES, Helsinki-Espoo, ICOM, International Committee for Museology/ICOFOM, n. 12, p.13-15, Sept. 1987.

• STRÁNSKÝ, Z.Z. Sobre o tema “Museologia – ciência ou apenas trabalho prático?” (1980). Revista Eletrônica do

Programa de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio – PPG-PMUS Unirio/MAST , vol. 1, no 1, jul/dez de

2008, p.101-105. Trad. Tereza Scheiner.

• TEATHER, Lynne. Museology and Its Traditions The British Experience, 1845-1945. Ph.D. Dissertation,

Department of Museum Studies, University of Leicester, 1984.

• _________. Museum Studies – Reflecting on Reflective Practice. In: Museum Management and Curatorship, 1991,

v. 10, p. 403-417.

• VAN MENSCH, Peter. Towards a Methodology of Museology. 1992. Tese de PHD. Universidade de Zágreb,

Zágreb, 1992.