Museologia Social 1989

download Museologia Social 1989

of 55

Transcript of Museologia Social 1989

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    1/55

    1

    Museu EtnolgicoMonte Redondo

    Museuse Sociedade

    Mrio C. Moutinho

    Reflexes sobre a funo social do Museu

    5Cadernosde Patrimnio

    1989

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    2/55

    2

    Museuse Sociedade

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    3/55

    3

    ndice das matrias

    1 - Introduo 72 - Um balano possvel 93 - Novos rumos da museologia 33

    3.1 - A mesa redonda de Santiago do Chile 353.2 - Projecto experimental "Casa del Museo" 383.3 - O Centro Nacional Sueco de Exposies

    Itinerantes 423.4 - Museus locais em Portugal 454 - Para uma nova museologia 535 - Em busca de um novo conceito de museologia 85

    Anexos:

    - Definio evolutiva de Ecomuseu. G.H.Rivire 118- Declarao do Qubec 120

    - Declarao do Oaxtepec 123- I Jornadas sobre a funo social do museu - MINOM 127- Curso de especializao em Museologia Social

    Universidade Autnoma de Lisboa 147

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    4/55

    4

    1 - INTRODUO

    Este livro de certa forma uma tentativa de arrumar ideias e dvidas sobre afuno do museu na sociedade contempornea. Fruto da experincia vivida nopequeno museu de Monte Redondo desde 1981 este livro traduz igualmente as

    longas conversas e desabafos com o grupo de amigos que ao longo destes anos temdado corpo a este projecto e reflecte o conhecimento de muitas outras experincias,tanto no pas como no estrangeiro, nas quais se busca certo um novo rumo para amuseologia.

    Monte Redondo, 23 de Outubro de 1989

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    5/55

    5

    2. UM BALANO POSSVEL

    2. Um balano possvel

    Falar de museus na maior parte das vezes falar de instituies onde so apresentados aos

    visitantes coleces de objectos, expostos em vitrinas ou estrados, suspensos no ar por meio de fiosde nylon invisveis, iluminados com luz indirecta ou focos orientados, acompanhados por legendasmais ou menos explicativas, as quais no devem ser muito extensas para no esgotar a ateno dopblico. Idealmente estas legendas referem o nome sbio do objecto e o nome corrente, o ano oupoca de realizao; se for obra de arte refere-se o nome do autor, datas e o nome da obra. debom tom indicar a origem do objecto e por vezes os materiais em que foi confeccionado.

    Todos os objectos so expostos seguindo uma ordem, de preferncia cronolgica, se bemque uma organizao temtica no seja de desperdiar. Ao longo de galerias ou salas que se ligampelos cantos umas s outras, sob vigilncia de guardas sonmbulos criteriosamente colocados emlugares de onde possam sem se deslocar, abranger o maior espao possvel, os visitantes podemfacilmente passar em frente de cada objecto sem ter o incomodo de voltar atrs, com o perigo de seperderem ou depararem por mais de uma vez com os mesmos objectos.

    A visita geralmente individual se bem que seja possvel em muitos museus, na condiode se tratar de um grupo, prever uma visita guiada, onde os guias mais ou menos preparadosdebitam um conjunto de informaes claras e definitivas sobre o que o visitante deve saber.Perguntas extras so regularmente iludidas ou encaminhadas para o conservador que como bviono est presente.

    Outra forma de visitar um museu, pedindo na entrada um folheto explicativo onde seencontra alm do mapa do museu, informaes sobre a origem e dependncia administrativa dainstituio. No caso de existir um catlogo, este dever ser comprado na loja do museu. Sendo emgeral de boa impresso, em papel couch e capa de pelo menos 300 gr., com fotografias a cor degrande definio, o seu preo ultrapassa largamente o custo do bilhete, acabando na maior parte dasvezes, por o exemplar de servio ser apenas folheado rpida e envergonhadamente, para depoisvoltar a ser colocado no seu lugar. Neste caso os mostrurios de bilhetes postais suscitando aateno, significam uma alternativa mais econmica e igualmente a cores. Sendo geralmente

    proibido fotografar, que mais no seja devido aos danos que o flash "pode" provocar nos objectos,o visitante poder adquirir alguns diapositivos ou mesmo uma pequena coleco destes.Como geralmente existem apenas dois tipos de museu - os que tm muito pblico e os que

    s tm o visitante isolado, a visita traduz-se no primeiro caso, num perptuo furar por entre osoutros, espreitando em bicos de ps um ou outro objecto, prescutando avidamente um dos rarosbancos no ocupados e espraiando a vista longamente sobre as massas do cimo de uma escadariaou apoiando-se no varandim da galeria superior. Se o visitante esta sozinho, desloca-se passandopelo centro de cada sala, para num olhar circular passar em revista todo o material exposto eapreciar os tectos de cada sala. Pontualmente, abeirar-se- de um objecto que mirar com particularcuidado e se possvel num gesto rpido fora do alcance do guarda, apalpar o objecto ou certificar-se- por meio de um pequeno toque, se se trata de um objecto massio ou oco.

    Em todos os casos, se deparar com uma vitrina ou estrado vazio, ler em detalhe as

    informaes referentes ao objecto ausente e o local para onde foi por emprstimo. Sempre quepasse junto de uma porta semiaberta, culposamente investigar aonde d acesso, ou o contedo quel se encontra.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    6/55

    6

    Caso a visita seja em grupo, (familiar, amigos, escolas ou turstico) cochichar-se-o aparteshumorsticos, indicando paralelismos entre particularidades de algum dos membros do grupo ecenas ou personagens representadas. As obras de escultura e em menor grau as de pintura,propiciam comparaes sussurradamente hilariantes. Os museus de etnologia tambm se prestampara este fim, em medida igual aos de paleontologia. Se se tratar de um aqurio, bater-se- nosvidros observando a reaco apavorada dos peixinhos. Praticamente, todos os museus fornecem

    motivos aos casais amorosos para comparaes e clandestinos gestos de ambiguidade e carinho. tambm verdade no sentido oposto para casais em ruptura de afecto.H no entanto um pblico "entendido" no assunto, que no perder a ocasio para expor

    seriamente, informaes recolhidas no guia Michelin ou qualquer outra publicao congnere.A visita ao museu divide-se em geral em trs partes. A visita coleco exposta, da qual

    temos vindo a referir alguns aspectos, a passagem pela cafetaria e as compras na loja, no caso deestas existirem.

    Na cafetaria, mais ou menos bem fornecida e a preos populares, a pausa permite verificarse h muitos estrangeiros e adivinhar donde so. Comenta-se a parte j visitada e o cansao paraver o resto, fazendo cortes abreviadores do fim da visita.

    Na loja, verificar-se- que tudo muito caro, quer se trate de publicaes quer dereprodues. Eventualmente, far-se- um investimento cultural que depender das disponibilidades

    de cada um.Existem tambm os museus encerrados ao pblico, onde a visita se limita frontaria doedifcio e ao azedume dos comentrios. Menos grave so os museus com seces e salaseternamente vedadas para recuperao do prprio edifcio, situao que tem a vantagem deagudizar a curiosidade dos visitantes.

    Todos estes pontos de que temos vindo a falar e que traduzem uma imagem e utilizaogeneralizada das instituies museolgicas tradicionais significam para ns, que o museu no vivido pelo pblico em geral, da forma prevista pelos seus conservadores. Esta constatao, apenasnos leva a supor, que o museu tal como existe em geral, desempenha uma funo na sociedadedistinta daquela que a museologia lhe atribui. um facto que os museus existem cada vez em maiornmero, que as instncias polticas reconhecem os museus como parte do aparelho cultural de cadasociedade. Em muitos pases os museus recebem verbas vultuosas ou transformam-se emimportantes empresas comerciais. Noutros casos como em Portugal, nenhum governo anunciarialevianamente o encerramento de um s museu por qualquer razo, e ideologicamente os museusso inundados de apoios, verbas, pessoal e prestgio.

    No entanto, a funo primordial dos museus, reunir, conservar e expor para fim de estudo,educao e lazer, s concretizada e assim entendida pelo pblico, em raros casos, devidoessencialmente ao esforo e dedicao dos seus directores, seno fundadores, ruindo como umcastelo de cartas quando o acaso da vida os afasta das instituies que to esforadamenteconstruram.

    Qual a funo real dos museus nas sociedades contemporneas, uma pergunta carecendourgentemente de uma resposta. Algumas reflexes podero eventualmente servir de guia a umabusca mais profunda.

    O museu tradicional no um instrumento de educao, na medida em que a percepo dascoleces no essencial superficial, sectria, como tambm no o de estudo na medida em que a

    informao prestada, no faz apelo reflexo nem conscincia crtica de cada um.Aceitamos mais facilmente, que o museu seja um instrumento de lazer, entendido este,como o confrontar de cada um, como um conjunto de situaes, no fazendo parte do quotidiano. Oespao museolgico em geral, amplo, rico, recheado de coisas valiosas ou exticas, conduzindo outilizador num jogo de orientao e adaptao contnuo, a nosso ver motivao profunda dochamamento museolgico. Mas este chamamento tem ainda mais um atractivo, o do espectculocamuflado. O apelo feito em nome da cultura mas o fruto, sabe-o o pblico, o evoluir num meioritual, cheio de proibies e consentimentos, de evidncias e clandestinos.

    De certa maneira, visitar um museu tradicional uma boa aventura, independentemente deesta ser estimulante ou frustrante. A diferena reside no nmero maior ou menor de estmulosassimilados, geralmente independentes do significado ou da compreenso que se manifesta dosobjectos expostos.

    neste sentido alis que se modernizam os museus, utilizando novas tecnologias, emparticular na rea da informtica ou da comunicao participativa.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    7/55

    7

    O objecto exposto dentro de um vitrina com a tal legenda reduzida e uma iluminaoesttica, ou seja o objecto passivo, tem vindo a ser progressivamente substitudo pelo objecto activoo qual se movimenta e ilumina vontade do visitante, mediante um simples carregar de botes. Sefor caso disso, a legenda escrita ser falada e ouvir-se- um som evocando um contexto. Numa salaaparentemente toda s escuras, focos luminosos faro reviver o passado, exaltando volumes,contrastes e cores.

    crans, passam montagens audiovisuais, videos debitam imagens sabiamente seleccionadase teclados de terminais de computadores oferecem-se ao visitante, que ter assim o poder deinstantaneamente fazer desfilar a informao requerida ou na maior parte das vezes j sugerida.

    Nestes museus, o mundo da aventura ainda mais evidente. O visitante sabe-se controladopelas sistemas electrnicos havendo mesmo casos em que a sala com os agentes de segurana faceaos seus monitores, pode tambm ser visitada. Tem-se ento a sensao de entrar na sala decontrole de Huston, assistindo ao lanamento de uma nave espacial. Se a visita for efectuada com aajuda de um receptor individual que debita as informaes em vrias lnguas, ento de facto -setransportado para um outro universo, quo distante do quotidiano.

    nos museus de cincia e tecnologia que o museu moderno melhor se afirma; os objectosfuncionam, pode-se fazer experincias, tem-se a sensao de que tudo explicado, e mesmo se sedesejar, automaticamente impresso numa mquina super-rpida que apesar de custar milhes ,

    trabalhou sem falha para cada um dos visitantes.So estes museus, onde o visitante solicitado por um maior nmero de estmulos, que setm mais desenvolvido nos ltimos anos, atraindo multides de turistas, de alunos, de visitantesdesejosos de mergulharem no mundo das fbulas.

    Comparados com estes, os museus tradicionais de objectos passivos de pintura, denumismtica, de mobilirio, de arqueologia ou mesmo contendo tudo isto e mais alguma coisa nassuas exposies, so de facto cada vez mais, os parentes pobres da museologia.

    Claro est que a modernizao do museu no inferior ou superior ao valor em dlares, oufrancos que valem as coleces de tantos museus, no chamamento que fazem o pblico visitar omuseu mais rico do mundo! Passar juntinho a uma coroa de diamantes, ser um dos eleitos para veruma raridade, poder quase tocar num jarro chins, so igualmente estmulos para outras reas dapersonalidade de cada visitante.

    No captulo da conservao, o panorama que se pode constatar no por certo dosmelhores. excepo das grandes empresas museais, que dotadas de grandes meios humanos efinanceiros, garantem efectivamente a conservao dos esplios, a maioria dos museus somenteum depsito precrio de objectos. Carecendo de inventrios correctos, e de instalaes apropriadase devidamente mantidas, as reservas apenas garantem uma gradual degradao dos esplios aosabor das humidades, das arrumaes inadequadas e das mos alheias. Um inqurito cuidadoso,pouco vivel alis, aos museus portugueses no deixaria de confirmar, que com excepo de algunsmuseus de Lisboa e pouco mais, a funo de conservao dos testemunhos que encerram, s minimamente assegurada.

    Mas as reservas dos museus, no estando abertas ao pblico, no condicionam a percepoque o visitante far do museu. Igualmente, as condies em que cada coleco foi reunida,raramente so dadas a conhecer ao pblico. reas passadas em silncio, por certo para noperturbar a funo exposio. Com efeito, os objectos foram seleccionados segundo critrios

    subjectivos de qualidade de raridade ou de origem. Na prtica "apercebemo-nos que a maioria dosobjectos conservados nos museus (a proporo varia bem entendido de um pas para outro),provm do meio de vida de certas minorias scio-culturais privilegiadas. Objectos de origem maismodesta encontraram tambm o caminho do museu, mas so em grande parte objectos aos quais aantiguidade ou uma origem extica conferiam um certa honorabilidade" (Marc Maure, Rflexionsur une nouvelle fonction du muse, Icom-Education, Paris, 1977/78, p. 28). Em ambos os casos, ascoleces e a sua consequente exposio, no teve por objectivo o esclarecimento de uma dadacondio social em toda a sua complexidade. A maioria das coleces no passa de um conjuntoparcelar e parcelador da realidade. A "cultura" que veiculam naturalmente a cultura daqueles quereuniram as coleces ou de quem as encomendou.

    Esta constatao fcil de confirmar se repararmos na forma com que os museus se do aconhecer ao pblico atravs de qualquer roteiro dos museus que regularmente so publicados na

    imprensa.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    8/55

    8

    Vejamos por exemplo o que nos dado saber sobre os principais museus, na revista"Sbado" (N 10 de 27 de Agosto 1988).

    LISBOA

    1. Aqurio Vasco da Gama. Museu oceanogrfico iniciado com a coleco do Rei D.

    Carlos, espcies raras de peixes, rpteis e aves. Fauna viva de gua doce e salgada,incluindo tanque com trs otrias ou lees marinhos, tartarugas e aquaterrrio compiranhas.

    2. Casa-Museu Doutor Anastcio Gonalves. Antigo atelier/residncia do pintor JosMalhoa. Pintura portuguesa dos sc. XIX e XX. Obras de Columbano, Malhoa e SilvaPorto. Cermica chinesa e mobilirio portugus e estrangeiro, pratas.

    3. Museu de Etnologia. Povos e culturas de cinco continentes. Rica e completa coleco deetnografia portuguesa e africana.

    4. Museu Joo de Deus. Museu pedaggico, bibliogrfico e artstico. Livros, desenhos,

    quadros. medalhas e imobilirio do poeta.5. Museu da Marinha. Cartografia, coleco de miniaturas de barcos, pinturas, objectos e

    outros documentos ligados Marinha portuguesa. Trs astrolbios do sculo XVII. Secode aviao naval.

    6. Museu Militar. Peas de artilharia, armas ligeiras e de caa, armaduras, maquetas debatalhas. Trabalhos em talha, pintura e painis de azulejos.

    7. Museu de Miniaturas dos Bombeiros. Miniaturas de viaturas dos bombeiros. Todo o tipode material utilizado pelos "soldados da paz" em Portugal. Na R. do Acar (junto Mitra,Xabregas), parque de viaturas antigas.

    8. Museu Nacional de Arte Antiga. Arte portuguesa e estrangeira do sc. XII ao princpiodo sc. XIX. Pintura, escultura, ourivesaria, cermica, mobilirio, tecidos, azulejos e artesacra.

    9. Museu Nacional do Azulejo. Instalado no Convento da Madre de Deus. Importantecoleco de azulejos portugueses e estrangeiros, do sc. XV at actualidade.

    10. Museu Nacional dos Coches. Coches de gala e de luxo dos sc. XVII ao XIX. Arreios,artigos equestres e indumentrias. Coleco de instrumentos da charamela real. Galeria deretratos da dinastia de Bragana.

    11. Museu Nacional do Teatro. A histria do teatro em Portugal. Trajos e adereos de cena,

    maquetas de cenrio, figurinos, acessrios, programas, cartazes, bilhetes, coplas emanuscritos.

    12. Museu Nacional do Traje. Tecidos de arte dos scs. IV a XIX. Trajos civis e da corte.Bonecas e brinquedos dos sc. XIX e XX. Jardim botnico, sc. XVIII.

    13. Museu de So Roque. Pintura, livros sagrados, metais, tecidos, alfaias litrgicas eparamentaria. Arte italiana do sculo XVIII, encomendada a Roma por D. Joo V.

    14. Museu dos Servios Geolgicos de Portugal. Coleco de fosseis, rochas, minerais emateriais arqueolgicos.

    15. Palcio Marqueses de Fronteira. Jardins e Palcio dos scs. XVII e XVIII habitado pelosactuais marqueses. Azulejos portugueses, holandeses e espanhis(?), polcromos e a azul e

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    9/55

    9

    branco do sc. XVII, incl. Galerias dos Reis. Recheio de diversas pocas e retratos defamlia dos scs. XVIII e XIX. Galeria de arte contempornea portuguesa.

    16. Palcio Nacional da Ajuda - Museu. Antiga residncia de D. Lus e D. Maria Pia, do sc.XIX. Pintura, mobilirio, escultura. Tapearias de Goya e panos dos Tvoras. Porcelanas,Pratas e jias da famlia real.

    17. Centro de Arte Moderna. Coleco representativa de escultura e pintura portuguesa destesculo.

    18. Jardim Botnico. Quatro hectares, cerca de 2500 txones cultivados. Visitas guiadas.

    19. Mosteiro dos Jernimos-Torre de Belm. Igreja, claustros, Refeitrio, Coro Alto e Salado Captulo. Na Torre, realce para a Nave, Salas do Torreo e Terraos.

    20. Museu Antoniano. Ourivesaria e paramentos, iconografia e bibliografia relativos vida deSanto Antnio.

    21. Museu do Ar. Mais de 70 avies, algumas raridades da aviao civil e militar portuguesa.Coleco de miniaturas de aeronaves.

    22. Museu Arqueolgico. Coleces de arqueologia pr-histrica, pr-colombiana, romana,visigtica e medieval. Cermica. Escultura medieval. Numismtica e epigrafia.

    23. Museu Arqueolgico de S. Miguel de Odrinhas. O principal centro de testemunhosromanos existentes na regio de Sintra. Runas de uma vila do sc. IV d.C. Mosaicos,necrpole medieval, monlitos calcrios. Capela do sculo XII.

    24. Museu-Escola de Artes Decorativas Portuguesas (Fundao Ricardo Esprito Santo).Peas de grande valor dos sc. XVII e XVIII; mobilirio, pratas, tecidos, faianas,porcelanas, bronzes, quadros, tapearias.

    25. Museu de Arte Popular. Etnografia portuguesa (arte popular, vesturio, instrumentosmusicais e agrcolas, mobilirio, tecelagem e cermica).

    26. Museu Calouste Gulbenkian. Museu construdo para a coleco particular de CalousteGulbenkian. Arte egpcia, islmica, oriental e europeia, da antiguidade ao sc. XIX.Mobilirio, tapetes, tecidos, livros, pintura.

    27. Museu da Cidade. Evoluo da cidade de Lisboa at implantao da Repblica.Documentos, gravuras, maquetas ("Lisboa antes do terramoto de 1755").

    28. Museu dos Condes de Castro Guimares. Mobilirio, porcelanas e ourivesaria. Pintura e

    escultura do sculo XIX. Na Biblioteca, a mais valiosa pea do museu: a "Crnica de D.Afonso Henriques", de Duarte Galvo, manuscrito iluminado do sculo XVI.

    29. Museu dos Correios e Telecomunicaes. Amostragem do passado das comunicaes nonosso Pas; da telegrafia pr-elctrica telefonia . O servio postal em Portugal, de 1520at aos nossos dias. Projeco de videogramas.

    30. Museu Etnogrfico. Trajos e costumes etnogrficos regionais: o forcado, o campino, ocavaleiro. Pintura e escultura sobre temas ribatejanos.

    31. Museu Etnogrfico da Sociedade de Geografia de Lisboa. Importante acervo etnogrfico,incl. esculturas africanas, instrumentos musicais, objectos timorenses, indianos e chineses,

    sarcfagos e figurinhas funerrias (Egipto), peas do sc. XIX. Pintura, mobilirio,escultura. Tapearias de Goya e panos dos Tvoras. Porcelanas. Pratas e jias da famliareal.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    10/55

    10

    32. Palcio Nacional de Mafra. Palcio e Convento do sculo XVIII de arquitectura barroca eneoclssica. Aposentos reais. Sala do Trono e Sala da bno. Coleco de Arte Sacra.

    33. Palcio Nacional da Pena. Palcio romntico do sculo XIX, projecto do arquitecto alemobaro von Eschweg, mandado construir por D. Fernando II. Mobilirio, artes decorativas.

    34. Palcio Nacional de Sintra. Azulejos (scs. XV-XVI). Conjunto de vrios estilos epocas, do gtico ao manuelino. Original exemplar da arte "mudjar" e de "islamerie".Mobilirio, pintura, estatutria e artes decorativas.

    35. Panteo Nacional. Templo barroco onde se encontram os tmulos de escritores ePresidentes da Repblica. Cenotfios de figuras da Histria de Portugal, Diaporama com ahistria do monumento.

    36. Planetrio Gulbenkian. Dias 20 e 21, s 16h "O Universo" e s 17h. sesso dedivulgao. Dia 24, sesses de divulgao. Dia 24, sesses de divulgao 11h. 15h. e16.15h.

    MUSEUS - PORTO

    37. Casa-Museu de Guerra Junqueiro. Casa atribuda ao arquitecto Nasoni. Coleco deescultura, mobilirio, ourivesaria, tapearias e metais dos sculos XII a XIX quepertenceram ao poeta Guerra Junqueiro. Loua chinesa e hispano-rabe.

    38. Casa de Serralves. Casa de 1931 do arquitecto Marques da Silva. Exposies temporrias.Jardins.

    39. Casa-Museu Teixeira Lopes - Galerias Diogo de Macedo. Originais de Teixeira Lopesem gesso, mrmore, bronze e desenhos. Coleces de pintura e escultura, faiana,tapearias e jias. Nas Galerias, pintura e escultura, coleco de arte negra.

    40. Museu de Arqueologia e Pr-Histria. Peas paleolticas, utenslios solutrenses, espliosneo-eneolticos e coleces de materiais dos Castros. Fosseis humanos e esqueletos deoutros primatas. Cermicas da Idade de Ferro, vasos gregos e coleco de Arte Egpcia.

    41. Museu Militar do Porto. Armamento, uniformes, confederaes, canhes e carros decombate. Bandeiras da nacionalidade. Espada de D. Afonso Henriques.

    42. Museu Municipal de Etnografia e Histria da Pvoa de Varzim. Arqueologia doconcelho, azulejaria e cermica, ex-votos, documentao etnogrfica e antropolgica sobrea comunidade martima e as freguesias rurais do concelho. Traje e siglas poveiras.

    43. Museu Nacional de Soares dos Reis. A mais importante coleco de escultura do sc.XIX, sobretudo Soares do Reis e Teixeira Lopes. Pintura das escolas portuguesa dos sc.XVI a XX, holandesa e francesa, ourivesaria, cermica portuguesa antiga, porcelanas emobilirio.

    44. Museu Romntico da Quinta da Macieirinha. Residncia do rei D. Carlos Alberto deSabia. Coleco de objectos do perodo romntico em especial mobilirio e artesornamentais. Jardins.

    45. Palcio da Associao Comercial do Porto. Ptio das Naes, Escadaria Nobre, Sala doTribunal do Comrcio, Sala dos Retratos e Sala rabe, de estilizao mourisca, inspiradano Palcio do Alhambra. Pinturas de Veloso Salgado.

    Ao todo 45 instituies, sendo 35 em Lisboa e arredores e 9 no Porto e arredores.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    11/55

    11

    Em todos os casos a descrio dos museus feita tendo em considerao a natureza dascoleces e se repararmos bem, praticamente todas se referem a objectos usados pelas classesdominantes: pratas, mobilirio luso-indiano, arte portuguesa ou estrangeira, arte sacra, coches degala e luxo, retratos da Dinastia de Bragana, trajos civis e da corte, Galeria dos Reis, livros raros,loua chinesa, a espada de D. Afonso Henriques, jias da famlia Regente. Quando disso no caso, trata-se de objectos que adquirem valor devido sua raridade, ou, ao facto de terem sido

    recolhidos pelo rei D. Carlos, ou outro eminente coleccionador. tudo rico, valioso e digno de servisto. Tambm em muitos casos, a tnica posta no espao museolgico, referindo-sesumariamente as caractersticas dos edifcios, todos eles pertena de reis, rainhas, marqueses eoutros dignatrios da monarquia. Como referimos, percorrendo os museus institudos, quase sepode constatar que nunca houve entre ns camponeses e operrios. E dizemos quase, porque em 4ocasies se fala da etnologia portuguesa "Cincia" que como sabemos "s aplicada ao," Museu deEtnologia, Museu Etnogrfico de Vila Franca de Xira, Museu de Arte Popular e Museu Municipalde Etnografia e Histria da Pvoa de Varzim.

    Com excepo do Museu da Pvoa de Varzim onde se valoriza a interpretao de umacomunidade martima e das freguesias rurais do concelho, aco cuja validade tem alis sidolargamente reconhecida. Nos outros casos, so tambm os objectos que definem o museu. Devemosno entanto fazer uma distino entre o Museu de Etnologia por um lado e os Museu de Arte

    Popular e Etnogrfico de Vila Franca de Xira. No primeiro caso, estvamos em presena de ummuseu tradicional, que cumpre com rigor o projecto museolgico de recolher, conservar e divulgar.Nos outros casos, os mitos do romantismo, dominam, com particular relevo para o Museu de ArtePopular. Este a nosso ver o exemplo mais perfeito do discurso museolgico alienante.

    "Herdeiro do esplio e esprito da exposio do Mundo Portugus, o museu de Artepopular o corolrio da funo utilitarista conferida etnologia domstica.

    Esta etnologia, produto e sustentculo do Estado Novo, tinha por misso tarefas depropaganda reaccionria e constitua a componente interna do esforo de justificao do regime.

    Nesta perspectiva, podemos, portanto, interpretar este museu como mais um instrumentodo S.N.P., tendente a apresentar o povo trabalhador de uma perspectiva ldica e idlica o que, comose sabe consituu pedra de toque de todo o ruralismo portugus dos anos quarenta.

    Nada do que diz respeito verdadeiramente ao "nosso povo" est ali representado; as suasaspiraes, as suas misrias, as suas lutas so ali substitudas por pseudo-manifestaes popularessadas directamente da frtil imaginao de etnlogos de avirio. O povo est e continuaria a estarna "parvalheira", no museu est a sua imagem urbana e oficial - na santa terrinha esto as pulgas,piolhos e mau-cheiro, no museu est o colorido e o verniz!(...)

    Expe esta casa uma srie de peas completamente desligadas de tudo e todos, a maiorparte delas criadas propositadamente para o efeito (galos de Barcelos, loua da Bajouca, colherescom o nome de Salazar gravadas no cabo, etc., etc.).

    A imagem transmitida a de um povo ordeiro, limpo, temente a Deus, amante da famlia edos chefes, um povo pobrezinho, ignorante mas intuitivo, um povo bonitinho vivendo em casinhasportuguesas caiadinhas, arrumadinhas, com caminhas lavadinhas e peniquinhos em loicinharegionalzinha... etctrazinha." (Csar L. Lopes, Fernando J. Moreira, Museus, cidades, lutas egentes, "Anttese", Almada, 1986 N 5 p. 13).

    A cultura dos outros foi sempre menos digna de ser documentada. "Nunca se saberia

    visitando a maioria dos museus Americanos que o homem negro existe na Amrica (JohnKINARD, director do Museu de ANACOSTIA.) Poder-se-ia dizer exagerando apenas um pouco,que visitando os museus de certos pases que nunca houve nem camponeses nem operrios e quetoda a gente vivia em castelos" (Marc Maure op. cit., p. 30).

    Isto sem falar da pilhagem que esteve na base da maioria das coleces coloniais queencheram tantos museus de etnografia por esta Europa fora. Um jornalista guineense dizia-me emtom de desabafo, que tinha dificuldade em compreender porque razo aqueles objectos que asautoridades coloniais mais proibiam, eram aqueles que de imediato e avidamente, eram levadospara os museus da metrpole. Se considerarmos que a maioria dos visitantes potenciais dosmuseus, no fazem parte logicamente das classes privilegiadas, somos obrigados a reconhecer quena falta de contedo referente s condies de vida gerais de cada pais, o visitante buscar nosmuseus o que no propriamente discurso museal, mas somente o espectculo museolgico. O

    museu como espao de recreio, parece-nos por certo a principal e mais utilizada funo damuseologia tradicional.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    12/55

    12

    Paralelamente modernizao dos museus, que se traduz numa nova encenaomuseolgica, a ideia de aprofundar a dimenso espectculo, manifesta-se igualmente numa outraforma de museologia tradicional, geralmente denominada por museu vivo. Esta denominao, quese presta alis a confuses, no representa uma alterao nos objectivos culturais da museologiatradicional, mas to somente uma forma diferente de transmitir o mesmo discurso.

    Voltadas mais para o mundo da ruralidade e na ausncia de meios financeiros capazes de

    introduzir tecnologias modernas de encenao, o museu vivo apresenta encenaes animadas porpessoas, funcionrios dos museus, pagos para esse fim ou actuando no quadro do voluntariado.Estas encenaes, podem ter lugar no edifcio do museu ou ao ar livre. No primeiro casofrequentemente faz-se apelo a artesos, que instalados por exemplo num tear, vo fabricandomantas, ferrando cavalos, assoprando vidro ou simplesmente vestem-se os funcionrios "moda"de certo sculo. Foi-nos dado visitar um museu vivo no norte do Canad (tratava-se damusealizao de um antigo entreposto de comrcio) onde todo o pessoal tinha sido vestido sc.XVIII: dos guardas s guias, passando pela recepcionista, de facto tudo mexia. O apogeu da visita,tinha lugar no interior de uma tenda ndia, onde 2 ndios verdadeiros, sentados na fumarada de umapequena fogueira recebiam, lacrimejando, os visitantes com acenos de cabea. Em vo procuramosmais alguma coisa que no fosse o confronto com uma situao pouco, mesmo muito pouco,corrente.

    Entre ns os artesos de que falamos tm a vantagem de responder s perguntas pormonossilabos e com ar de cansao ir adiantando trabalho, quando os visitantes se acalmam. Estetipo de encenao nada tem em si de novidade, se pensarmos por exemplo, que na exposio doscentenrios, teve-se o cuidado de mandar vir naturais das colnias, entenda-se africanos, paramobilar as cubatas, pilar o milho ou animar qualquer outro quadro. Processo idntico foi utilizadopara animar a exposio das casinhas tpicas portuguesas.

    Uma outra manifestao deste tipo, o cortejo histrico etnogrfico. Utilizando dezenas oucentenas de voluntrios, durante uma tarde, o museu desce rua. De um modo geral, os quadrosrepresentados manifestam uma grande imaginao e uma dedicao sem limites, das crianas aosmais velhos. Num dos ltimos desfiles que presencimos, podemos ver Leite de Vasconcelos frente, logo seguido de lavadeiras em trajo de semana e de domingo, apanhadeiras de erva em trajode domingo e de semana, pastores com ovelhas, boieiros com bois e assim de seguida. Depois,vinham as majoretes ao ritmo dos tambores tocados por braos com tatuagem tipo "Amor de meAngola 1966". Num carro, representando as vindimas, algumas mulheres escorrendo suor, picavamcom tesouras as cepas repetidamente sugerindo o corte dos cachos, que por serem em nmerolimitado continuariam agrafados s parreiras at ao pr-do-sol.

    Estes cortejos que a nosso ver so uma forma de expresso museolgica, deixam-nossempre partilhados entre duas constataes: por um lado, o esforo e a dedicao que traduzem epor outro lado, a manipulao histrico-etnogrfica em que so enleados pelos promotores,particulares ou autarquias.

    a dinmica popular canalizada para a aberrao, para a reproduo da ideologia e domundo dos mitos da burguesia do romantismo.

    Situao idntica pode tambm ser constatada em inmeros museus de provncia, emparticular vilas e aldeias onde o esforo abnegado de grupos da populao pem de p um "museuverdadeiro", com sala de exposio permanente. Em busca de uma imagem do passado,

    amontoavam-se centenas ou milhares de objectos supostamente organizados em nome daEtnografia. Reconstituem-se interiores e cenas da vida rural por meio de manequins de lojaretocadas e vestidos para o efeito. Animam-se teares, rocas e descamisadas. Cria-se umailuminao, artificial de preferncia, e abre-se uma bilheteira. Durante semanas a azfama grande,sendo os visitantes aos milhares. Vindos das redondezas ou at mesmo forasteiros, todos clamamelogios e encorajamentos. Autarcas e jornalistas comentam o sucesso na imprensa local ou regionale at mesmo haver uma meno de 40 segundos no "Pas Pas".

    Depois, os nimos acalmam-se, os objectos comeam a confundir-se, porque nem houvetempo de fazer um inventrio cuidadoso, a poeira instala-se, o vidro da bilheteira parte-se e avontade de construir esvai-se progressivamente. Visitado o museu uma vez, j l no se volta. Naausncia de espectculo, este discurso museolgico esgota-se rapidamente.

    No de nimo leve que temos vindo a fazer este balano da museologia.

    Os problemas que se levantam so complexos e dramticos. As classes trabalhadorasadoptam a ideologia dominante ao tentar reproduzir em pequena escala os museus nacionais.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    13/55

    13

    O resultado no pode fatalmente ser outro que no seja a frustrao, pois os museusnacionais no foram construdos ao longo de dcadas para existirem fora da grande cidade oumesmo da capital.

    A ideia de museu - mostrurio de raridades - se em geral j no funciona na cidade, falta demeios financeiros por exemplo, muito menos servir aos pequenos meios rurais abandonados inrcia de um desenvolvimento adiado.

    A maioria dos pequenos museus da aldeia, traduzem assim o desajuste entre os contextossociais locais e a adopo de uma receita cultural enganadora.Se pensarmos agora no panorama museolgico portugus e, de certo modo, no panorama

    internacional, fcil de constatar que ele pode ser caracterizado do seguinte modo.

    A nvel das principais instituies.

    Desajuste entre os objectivos do discurso museolgico e a percepo que o pblicoem geral tem dos museus.

    A nvel dos pequenos museus.Desajuste entre contextos sociais e as iniciativas museolgicas.

    Passmos em revista alguns dos aspectos da museologia tradicional, constatamos que amuseologia um importante movimento cultural, e tem uma fora mobilizadora sem igual.

    Referimos desajustes que a nosso ver condicionam o seu futuro e que no momento actualsignificam bloqueios ao seu desenvolvimento.

    "Falta de um poltica museolgica nacional!" diro aqueles que sempre delegam em algunsaquilo que no desejam fazer.

    "Conformismo! Mudanas que significam canseiras!" diro outros. Pelo nosso ladodefendemos que o desenvolvimento da museologia no nosso pas implica um debate generalizadosobre as funes que um museu, pequeno ou grande, deve assumir, luz da anlise dasexperincias inovadoras que se tm desenvolvido nos ltimos 20 anos um pouco por todo o lado eem Portugal nesta dcada de 80.

    Este trabalho pretende ser um contributo para esse debate, e assim, apresentaremos por umlado as ideias contidas em textos hoje fundamentais para uma crtica construtiva dos diferentesprocessos museolgicos, e por outro lado procuraremos extrair ensinamentos de um conjunto deaces museais que decididamente procuram alicerar uma nova concepo da museologia aoservio da sociedade onde esto inseridos. Esses textos e aces que estruturam o vasto movimentointernacional para uma nova museologia, representam hoje em dia uma alternativa museologiatradicional, pondo em evidncia a funo social do museu. Esta ser a ideia de base que sustentareste trabalho.

    No se deduza aqui que a Museologia Tradicional tal como foi definida pelo ConselhoInternacional dos Museus no nosso entender uma museologia que subitamente perdeu a sua razo

    de existir, face a um novo projecto museolgico. Reunir, conservar e divulgar testemunhosmateriais do homem e do seu meio e em particular exp-los para fins de estudo, de educao e delazer continuar a ser uma funo fundamental da museologia. O que ns pensamos que estafuno assumir toda a sua importncia na histria da humanidade se for fecundada pelosprincpios de uma nova museologia preocupada sobretudo com um projecto da interveno aoservio do desenvolvimento. Por outro lado, constatamos que tm sido criados novos processosmuseolgicos independentes dos museus existentes, reconhecendo assim que as ideias da novamuseologia no tem por objectivo dar uma hipottica soluo aos problemas da museologiatradicional, mas so sobretudo o desenvolvimento de prticas inovadoras buscando continuamenteo caminho a seguir.

    deste caminho para o qual se procura definir os perfis que se ocupou a Mesa Redonda daSantiago do Chile reunida em 1972 sob a gide da UNESCO.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    14/55

    14

    3 - NOVOS RUMOS DA MUSEOLOGIA

    3 - Novos rumos da Museologia

    3.1. A Mesa Redonda de Santiago do Chile.

    A reflexo desenvolvida partiu de um balano duro mas realista sobre as condies a nvelmundial, do desenvolvimento material e cultural. Em primeiro lugar reconhece-se o desajuste entredesenvolvimento geral da civilizao causado pela crescente utilizao de meios tecnolgicos e odesenvolvimento cultural. De igual modo este desajuste aumentou o fosso que separa as regiescom grande desenvolvimento material e as regies da periferia. Considera-se ainda que muitos dos

    problemas da sociedade contempornea correspondem a situaes de injustia. A complexidade dacrise existente reclama solues que apelam participao de vrias disciplinas e a implementaode processos que busquem transformar esta situao, tm de ser obra das diferentes classes sociaistendo por base uma participao profunda e consciente.

    neste contexto que cabe museologia uma interveno activa nos processos detransformao social, econmica e cultural. Naturalmente que uma instituio museolgicaorientada para este tipo de interveno, dever ser pensada de forma bem diferente da damuseologia tradicional. Esse novo museu, aqui denominado por "museu integral" uma instituioao servio e inseparvel da sociedade que lhe d vida. Capaz de estimular em cada comunidadeuma vontade de aco, aprofundando a conscincia crtica de cada um dos seus membros.Buscando os fundamentos da aco nas condies histricas de desenvolvimento de cadacomunidade. A este museu, compete igualmente uma prtica directa nos processos dedesenvolvimento fazendo uso da interdisciplinaridade em particular na rea das cincias humanas.

    Neste sentido a transformao dos objectivos da museologia implica uma revoluo dasmentalidades dos conservadores e administradores da museologia tradicional e o alargamento doleque de competncias ao dispor de cada processo. De igual modo as tcnicas museolgicastradicionais devero ser actualizadas de forma a facilitar a comunicao tendo em considerao osmeios financeiros realmente acessveis a cada projecto. Todo o trabalho a desenvolver dever serconstantemente avaliado tendo em vista o aprofundamento das relaes entre a comunidade e omuseu. neste quadro que so ento propostos alguns objectivos referentes aos museus situadosem reas rurais e reas urbanas e a preocupaes respeitantes ao desenvolvimento tcnico ecientfico e aos processos de educao permanente os quais so assim expostos:

    Os museus em reas rurais devero promover exposies sobre as tecnologias que podemcontribuir para o desenvolvimento, bem como apresentar solues alternativas para a resoluo deproblemas sociais e ecolgicos tendo sempre em vista o aumento da conscincia crtica das

    populaes e o reforo dos laos nacionais. Prope-se a realizao de exposies sobre problemasrurais em meios urbanos, a realizao de exposies itinerantes e a criao de museus de stio.

    Quanto aos museus urbanos, estes devem preocupar-se com os problemas contemporneosde desenvolvimento no s atravs de exposies, mas tambm criando meios adaptados deinvestigao. Os museus dotados de maiores meios devero suscitar a criao de museus nas reassuburbanas, e desenvolver a sua actividade, focando as condies de vida na grande cidade.

    Referente questo do desenvolvimento tcnico e cientfico compete aos museus estimulareste, tendo em conta as condies reais de cada comunidade e participar na divulgao dosprogressos realizados nestas reas atravs de exposies itinerantes.

    Enfim no que diz respeito educao permanente, todos os museus devero possuir umservio de educao dentro e fora do prprio museu, participar directamente nas polticas nacionais

    de educao, preparar programas a difundir nas escolas e cursos dirigidos aos professores. Nestesentido tambm proposta a criao de coleces e a montagem de exposies no quadro daactividade escolar.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    15/55

    15

    A mesa redonda de Santiago representa hoje em dia um passo muito importante no processode transformao da museologia. Ao por em evidncia a prioridade da aco museal no campo dainterveno social, abriu efectivamente as portas para um repensar global da museologia.

    3.2. Projecto experimental "Casa del Museo"

    Foi no Mxico onde as resolues ento tomadas tiveram um reflexo imediato ao levar oMuseu Nacional de Antropologia do Instituto Nacional de Antropologia e Histria do Mxico alanar o Projecto experimental "A casa do Museu" nos lugares de Zona do Observatrio, ElPedregal de Santo Domingo e na Cidade Nezahualcoytl, todos trs sendo bairros populares.

    Na primeira rea de interveno, Zona Observatrio, apesar da vontade da equipadinamizadora pretender modificar a relao museu/populao os resultados no corresponderam asperspectivas na medida em que a populao abrangida quedou-se numa atitude passiva e decepticismo e em relao ao projecto. A razo desta atitude foi por certo o facto de a equipa no tercompreendido de imediato que a atribuio de novas tarefas ao museu implicava uma nova gestoglobal desse mesmo museu.

    Toda a planificao e realizao das exposies e outras actividades ento desenvolvidas

    era realizado por especialistas a partir do Museum Nacional, afastando por conseguinte qualquerrazo que justificasse a participao dos grupos locais. Conscientes desta situao foi iniciado novoprojecto em El Pedregal onde as aces de sensibilizao foram mais profundas, integrandoprogressivamente no projecto grupos de trabalho. Por parte dos especialistas houve o cuidado deno pretenderem decidir sobre tudo aquilo que tomava forma passando antes a orientar, guiar esistematizar as determinaes comunitrias. Organizaram-se grupos onde se discutia e estudava astemticas das exposies. Assim na verdade "estava-se criando uma nova concepo de museu, oqual comeava a ser um meio de comunicao e de educao na medida em que atravs deste seestava participando num processo de ensino aprendizagem integrado no desenvolvimento dacomunidade" (Miriam Arroyo. Information Sobre La Casa del Museo. Comunicao ao IV AtelierInternacional do MINOM, p. 5).

    Foi ento que se sentiu a necessidade de criar uma formao alternativa em museologiacapaz de dar continuidade a museus deste tipo, onde fossem aprofundados conhecimentos em reasto diversas como: produo e montagem de exposies, visitas guiadas e actividadescomplementares, investigao, promoo e difuso. Um curso destinado a 50 jovens foi organizadoem Nezahualcoyotl.

    Aconteceu, porm, que o sucesso do trabalho em El Pedrogal fruto alis dos ensinamentosrecolhidos na primeira experincia e que em 1980 se cimentavam atravs do curso de formao denovos muselogos foi pressentido pelos conservadores da museologia tradicional como umaameaa aos seus museus institudos. Consideravam ento que o projecto da casa do Museu maisno era que um esbanjar do dinheiro e de recursos humanos. Por outro lado se aceitasse que oprojecto estava afirmando claramente que era possvel criar uma museologia participativa issosignificava reconhecer que algo devia mudar nas suas concepes museolgicas pondo em causa otrabalho que estavam fazendo. Lembre-se alis que na Mesa Redonda j tinha sido previsto queuma nova museologia implicava a mudana de atitude dos conservadores da administrao e

    estruturas da museologia tradicional.Num meio adverso, receoso de mudana, ao projecto da Casa do Museu foram sendoretirados progressivamente todos os apoios, de modo que em 1980 foi dado por encerrado. Mas asrazes ficaram e quando trs anos depois a administrao do Instituto foisubstituda, uma novaoportunidade foi criada para desenvolver a metodologia formada ao longo dos anos de existnciado projecto da Casa do Museu. Foi ento criado o "Programa para o desenvolvimento da funoeducativa dos Museus".

    Este Programa est na base de uma nova rede museolgica que composta hoje por quase50 museus comunitrios! A coordenao do Programa e realizado por uma equipa interdisciplinarque se encarrega do Programa Nacional. No seio de cada Estado e consoante o desenvolvimento doprograma existe um segundo nvel de gesto directamente ligado rede de promotores que vivem etrabalhavam nas comunidades onde so desenvolvidos projectos museolgicos.

    Quando o promotor conseguir difundir o projecto do museu e divulgar as suaspotencialidades, criam-se ento cinco grupos de trabalho que exercero as funes indispensveis vida de cada Museu.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    16/55

    16

    Podem distinguir-se vrias etapas neste processo.Em primeiro lugar o Programa ocupa-se da formao dos promotores dos museus

    comunitrios ao qual incumbe criar os meios necessrios para que uma dada comunidade, conhea,valorize e compreenda o que um museu e quais as suas funes, criando assim a possibilidade dosseus membros participarem em todas as aces do museu desde a planificao s aces de criao,conservao e de difuso.

    Numa segunda etapa compete ao promotor suscitar a formao de grupos no seio dacomunidade "em grupo aprende-se a trabalhar com outros, a partilhar obrigaes a contribuir comos seus conhecimentos e capacidades, o patrimnio cultural vai progressivamente pertencendo scolectividades que tambm vo assumindo a responsabilidade da sua preservao: o tempo dedesenvolvimento desta etapa flexvel; o promotor vai aprendendo a aplicar os elementosmetodolgicos: investigao participante, formao de grupos, planificao e sistematizao dotrabalho, formao em museologia comunitria" ((Idem 23 p. 11)).

    Quando o promotor conseguir difundir o projecto do museu e divulgar as suaspotencialidades, criam-se ento cinco grupos de trabalho que exercero as funes indispensveis vida de um museu comunitrio: Investigao, promoo e difuso, produo e montagem, visitasguiadas e actividades complementares.

    Passa-se ento fase propriamente de actividade museolgica atravs da montagem de

    experincia geralmente com objectos emprestados pela comunidade convertendo o museu numlugar onde a comunidade se exprime, planifica e sistematiza os seus problemas em busca desolues.

    "O processo de formao do museu comunitrio no foi fcil nem rpido, tem porfundamento a sensibilizao que o promotor desenvolve na comunidade: rompendo comesteretipos avana-se, aprendendo a aprender, aprendendo a pensar, perdendo o medo da mudanae respeitando as diferenas. A educao assim considerada como um processo dedesenvolvimento integral e permanente do homem, demarcado pelos conceitos da educaopopular a qual procura uma formao libertadora, a transformao para o bem estar social medianteuma atitude crtica com a qual o homem tomar parte na construo da sua prpria cultura e da suahistria pessoal e colectiva" ((Idem 23 p. 17)).

    3.3. O Centro Nacional Sueco de Exposies Itinerantes

    Um outro projecto de aco museolgica teve lugar na Sucia e buscava igualmenteaprofundar a participao das populaes na tomada de conscincia dos seus prprios problemas.

    O Centro Nacional Sueco de Exposies Itinerantes (Riksutstllningar) iniciou a ttuloexperimental a sua actividade na dcada de sessenta.

    Em conjunto com o Centro Nacional do Teatro (Riksteatern) e o Centro Nacional dosconcertos (Rikskonserter) estas instituies tinham por objectivo descentralizar estas manifestaesculturais, consolidar os recursos da vida cultural de cada regio, estimular a promoo deactividades culturais por iniciativa de grupos inovadores, desenvolvendo o esprito criativo. Em1976, transformou-se em organismo permanente sob a tutela do Ministrio da Educao o qualgarante os meios necessrios ao seu funcionamento. O C.N.S.E.I. organiza exposies sob proposta

    e em colaborao com escolas, sindicatos, crculos de estudos, associaes, comits culturaisbibliotecas. Estas exposies que assumem vrias formas ocupando tanto 1 m2 como 200 m2,utilizando meios elementares ou tecnologias sofisticadas abordam temas variados tais como,histria local, contextos sociais, ecologia, artes/artesanato entre outros.

    Na aco do C.N.S.E.I. a exposio considerada por um lado como meio e nunca comouma finalidade, e como um pretexto para um contacto por outro lado. Assim a presena daquelesque conceberam e realizaram qualquer exposio parte integrante deste processo. Neste sentido aexposio aparece com um meio de comunicao acessvel s camadas da populao apartadas dosprincipais meios de comunicao.

    Na medida em que uma exposio, uma vez despida do seu aspecto formal a que estamoshabituados, pode ser apresentada em qualquer lugar, e materializada com poucos meios revela-se

    como um meio de comunicao privilegiado, onde o processo de concretizao por si s umaforma de enriquecimento para o grupo de autores.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    17/55

    17

    No fundo o C.N.S.E.I., um organismo que presta assistncia aos grupos que tendo umamensagem a transmitir carecem dum conselho ou dum apoio material.

    Para l da aco quotidiana deste organismo, talvez que um dos aspectos mais fecundosdesta museologia tenha sido o facto de desdramatizar a ideia de exposio, generalizando este meiode comunicao, demonstrando em simultneo a sua eficacidade.

    o caso hoje exemplar do projecto "Reino do vidro". Durante os anos 70 na regio de

    Smland, centro tradicional vidreiro, um milhar de trabalhadores perderam os seus postos detrabalho tendo o nmero de empresas passado de 26 para 16. Por iniciativa do Sindicato foramcriados crculos de estudo nos quais participaram activamente cerca de 400 pessoas. Para estaspessoas tratava-se de retraar a sua prpria histria tal como tinha realmente sucedido e no comoaparecia at ento nos relatrios das sociedades. Neste processo, os participantes encontraram aconfirmao do que tinham necessidade: o saber que tinham sido eles que tinham construdo asaldeias volta das empresas. Foi uma forma de ganhar confiana nas suas prprias foras. Aodesejo de combater o desemprego foi-se sentido a necessidade de documentar estudos, realizandonumerosas exposies que circularam em toda a regio. O C.N.S.E.I., colaborou como conselheiroe assistente, tendo na etapa seguinte levado a histria dos operrios vidreiros, retratada numaexposio denominada "A luta pelo trabalho - Modelo Reino do Vidro" por todo o pais e emparticular nas regies onde a crise de desemprego se fazia mais sentir. Eram os operrios de

    Smland que acompanhavam a exposio, que lanavam o debate, que acompanhavam a exposio,que prestavam esclarecimentos, que estabeleciam contactos. Hoje ningum tem dvidas emreconhecer que este importante movimento que se exprimiu atravs de estudos e exposies teveuma aco dinamizadora sobre o prprio movimento sindical e contribuiu para o renascimento daindstria vidreira na regio, abrindo novas empresas, criando as bases de novas produes. (TittiHasselrot, Les expositions pour la libert d'expression, informao Riksutstllningar.)

    Certo que este tipo de aces nem sempre traz resultados to directamente perceptveis,mas na medida que o objectivo das exposies so quase sempre fomentar o debate, a crtica depreconceitos, o aprofundamento das ideias, no temos dvidas em afirmar que toda a formao doindivduo que est em causa.

    3.4. Museus Locais em Portugal

    Em Portugal os museus que se reclamam de uma nova perspectiva museolgica, foramcriados em geral nos ltimos 10 anos. Localizados um pouco por todo o pas, so fruto deiniciativas locais, realizadas no quadro de associaes culturais, de defesa do patrimnio ou deautarquias.

    Assumindo formas e meios diversos, hoje em dia possvel isolar algumas linhas de foracomuns sua actividade.

    So museus que consideram as suas coleces como um meio particularmente eficaz paraatingir objectivos que se situam no plano do desenvolvimento do meio onde esto inseridos.

    Representando graus de conceptualizao diversos, estes museus alargam a sua interveno

    em particular s reas da valorizao dos recursos locais, do fomento do emprego e do apoio aoensino.As suas coleces renem actualmente para l de objectos em geral oferecidos pelas

    populaes, ou provenientes de escavaes arqueolgicas, todo um acervo de memria colectiva,de prticas profissionais, de conhecimentos do meio fsico e humano das suas reas de influncia,de capacidade de organizao e de mobilizao de diversas faixas etrias e scio-profissionais.

    Esta a verdadeira riqueza que estes museus contm, riqueza essa sempre emtransformao, e em correspondncia, com os processos de transformao que abrangem todas asreas da vida do pas.

    nossa convico que o acervo de um novo museu e composto pelos problemas dacomunidade que lhe da vida.

    Assim sendo, fcil de admitir que o novo museu tem de ser gerido e equipado por forma a

    poder lidar com um acervo, cujos limites so de difcil definio e pior ainda, sempre em contnuamudana.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    18/55

    18

    este desafio que os novos museus locais enfrentam todas os dias, num ambientegeralmente inquieto e receosos de evoluo.

    Mais ainda, este desafio continuamente perturbado pela ideia dominante de Museugeneralizada entre todas as camadas da nossa populao, ideia essa que contraria continuamente ummuseu, que no sendo feito "imagem do pai", no seria um verdadeiro museu.

    Da que tantas iniciativas locais tenham sucumbido tentao de montar rapidamente

    exposies permanentes, sem que para isso tenham reunido e assegurado os meios necessrios sua manuteno.

    So casos em que a coleco material assume um papel dominante em relao coleco"imaterial", sabendo ns, que o que faz a especificidade de cada comunidade no tanto adiversidade dos seus artefactos mas sim a natureza dos seus problemas de desenvolvimento.

    Trata-se de museus feitos para um pblico exterior que tarda em aparecer, e no voltadospara as necessidades das comunidades onde esto inseridos.

    tambm verdade que o papel das autarquias (salvo raras excepes) neste domnio,parecendo primeira vista como um factor favorvel criao de museus, se revela sobretudocomo factor de inrcia, na medida em que estas pretendem fomentar museus apenas como meio de

    afirmar eleitoralmente as suas preocupaes ao nvel da cultura.Subsdios que cerceiam a criatividade e esvaziam potencialidades. neste contexto que apesar de tudo, se tm criado os novos museus locais em Portugal.Assumindo geralmente a forma de ecomuseus, estas iniciativas cobrem uma rea definida

    (freguesia, concelho, rea cultural...) identificando e valorizando o patrimnio a existente. A sede,onde se montam pequenas exposies permanentes e/ou temporrias serve de local de acolhimentoe de orientao. A funcionam os servios administrativos, o fundo de documentao local, abiblioteca, as oficinas, as salas de reunio, etc.

    Todas estas funes so alis reconhecidas como sendo a estrutura de um ecomuseutradicional e a sua concretizao depende em muito da capacidade de cada museu em reunir ummaior ou menor oramento. Actualmente existem em Portugal museus locais que funcionam com100 contos anuais e outros com 100.000 contos. pois fcil compreender os diferentes graus dedesenvolvimento e de prestao de servios destes museus.

    Mas para l daquilo que se consegue fazer com um oramento seja ele qual for, estesmuseus tm uma vertente no quantificvel e que se traduz na capacidade de organizao e demobilizao com vista resoluo dos problemas de desenvolvimento. Falmos de um acervo dememria colectiva, de prticas profissionais, de conhecimento do meio fsico e humano.

    Ora as aces tomadas neste domnio no sendo em geral espectaculares e no fazendoparte de uma visita rpida ao museu, so aquelas que lhe do verdadeiramente vida e quefortalecem as relaes entre o museu e a comunidade. Trata-se por exemplo de programas devalorizao profissional, apoio ao ensino, colaborao com outras instituies em projectoscomuns, aces de formao, etc.

    Aos museus locais em Portugal perfeitamente aplicvel o esquema em que Hugues deVarine identifica a diferena entre museu tradicional e ecomuseu.

    Museu tradicional = Edifcio + Coleco + Pblico

    Ecomuseu = Territrio +Patrimnio +Populao

    Com efeito s se pode conceber um museu tradicional condio de existirem estas 3componentes. A coleco com os seus espaos de reserva, de exibio e os seus tcnicos deconservao e restauro, naturalmente instalados num edifcio que recebe um pblico de visitantesaos quais apenas pedido que observem o que est exposto. Contrariamente, no ecomuseu a ideia

    de coleco alargada a todo o patrimnio incluindo eventuais coleces, patrimnio esse quesituado no seu contexto ocupa por consequncia um territrio. Os fruidores deste processo,

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    19/55

    19

    podendo ser um pblico exterior, so essencialmente as populaes empenhadas no trabalhomuseolgico que para tal devem assumir as funes de tcnicos e gestores num processo demuseologia popular. no seio das populaes que se formam os novos tcnicos de museologia.

    No entanto parece-nos importante realar que nos museus locais em Portugal a valorizaodas competncias locais, ultrapassa o mbito da formao tcnica em museologia. Estes museusafirmam-se igualmente na valorizao profissional dos membros da comunidade, quer atravs da

    valorizao de profisses j existentes quer do fomento de novas reas de trabalho. Como criadoresde emprego estes museus no tm alis limites sua interveno; tanto podem revalorizar edesenvolver actividades

    artesanais como suscitar a criao de empresas em reas inovadoras.A revitalizao dos estaleiros de madeira no rio Tejo no essencial fruto da aco do

    Ecomuseu do Seixal em defesa do patrimnio naval do rio. Os ateliers de ourivesaria em Mrtolaresultam da valorizao do esplio arqueolgico recolhido, abrindo ao mesmo tempo espao criatividade dos novos artfices. Em Monte Redondo, a aco do museu junto das costureiras daregio permite uma valorizao profissional e social destas; em conjunto com o I.E.F.P. criam-seempresas no tercirio; em colaborao com a mdica residente lanam-se campanhas de formao

    na rea da sade que atingem milhares de pessoas. Em Portimo a memria da vida industrial criacondies de desenvolvimento para o turismo cultural e cria condies para o reencontro com aidentidade real da regio.

    Em Vila Franca de Xira, rentabilizam-se os recursos humanos da prpria Cmara eimplica-se a populao num processo de investigao participativa e permanente atravs de umarede informal de investigao e de aces programadas de difuso, ao mesmo tempo que setrabalha na recuperao do queijo de Alverca.

    Em Setbal um vasto programa de Histria ao vivo mobiliza milhares de jovens em buscade um passado menos mtico da Histria de Portugal.

    Em Vilarinho da Furna trabalha-se com vista reflorestao de 2.000 Ha da Serra Amarela,ao estabelecimento de infra-estruturas tursticas e criao de uma reserva faunstica.

    Naturalmente que esta diversidade de reas de interveno no exclui o facto de que outrasinstituies estariam mais vocacionadas para uma ou outra destas actividades, nem a existncia demuitas outras iniciativas atravs do pas. O problema reside no facto de a nvel local taisinstituies, ou no existem, ou repousam na inrcia do funcionalismo pblico. Ao museu s restaagir, l onde a sua aco se pode traduzir na melhoria das condies de vida. No faz na verdadesentido distinguir o que , ou no , rea de interveno do museu. Aco cultural e acoeconmica so alis as duas faces de uma mesma moeda.

    4 - PARA UMA NOVA MUSEOLOGIA

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    20/55

    20

    4 - Para uma nova museologia

    Praticamente todo o trabalho museolgico inovador de que temos vindo a falar, realizadona dcada de setenta e princpio dos anos oitenta foi desenvolvido simultaneamente em vrios

    pases sem que no entanto houvesse um intercmbio internacional. Apenas a actividade, emparticular de homens como Georges Henri-Rivire e Hugues de Varine, ambos presidentes doConselho Internacional dos Museus, estabelecia relaes entre promotores de diferentes projectosno interior de um mesmo pas ou entre pases diferentes. O desenvolvimento da nova museologiafoi assim caracterizado por um certo isolamento de cada projecto. Coube ao grupo dos ecomuseusdo Qubec, em particular a aco de Pierre Mayrand e de Ren Rivard lanar um projecto deencontro internacional onde se reunissem muselogos de vrios pases, representando experinciasdiversas, analisando o que de comum nas suas aces poderia servir de elo a uma colaborao maisestreita, afirmando simultaneamente que a museologia trilhava novos rumos.

    Foi assim que em Outubro de 1984 teve lugar no Qubec o primeiro atelier internacional,dedicado ao tema Ecomuseus/Nova Museologia. Estiveram presentes participantes de Portugal,Canad, Frana, Espanha, Noruega, Alemanha Federal, Mxico, Blgica, Estados Unidos e Sucia.

    Os objectivos do atelier foram assim apresentados: Criar as condies de intercmbio sobrea ecomuseologia e a nova museologia no mundo. Definir as suas relaes com a museologia emgeral. Aprofundar os conceitos e encorajar as prticas. Neste sentido foram organizados grupos detrabalho ou sesses plenrias dedicadas s tcnicas e filosofia da museologia popular. Questes dedefinio. Situao actual dos projectos museais, novas experincias, sentidos da participao,descentralizao e desenvolvimento. Dois outros grupos aprofundaram o contedo do projecto dedeclarao do Qubec e estudaram as condies de desenvolvimento da colaborao internacional.Toda esta proposta de reflexo era enquadrada por um extracto da Declarao de Santiago:

    "Que o museu uma instituio ao servio da sociedade na qual parte integral e quepossui em si prprio os elementos que lhe permitem participar na formao das conscincias dascomunidades que serve".

    Como base para o debate foi utilizado o seguinte texto:"Y a-t-il rellement nouvelle musologie? Ne s'agit pas plutt d'un renouveau normal?

    s'exprimant par certaines initiatives musales intressantes? S'il y a nouvelle musologie, commentpeut-on la diffrencier des pratiques musologiques courantes et sur quoi se baser pour le qualifierainsi? S'il n'y a pas musologie nouvelle, comment rendre compte de ces diffrences fondamentalesentre les nouvelles formes musales et celles issues du muse institutionnel tel qu'on le connataujourd'hui? Certains aspects spcifiques de la nouvelle musologie mritent d'tre examins afinde les dmarquer des autres aspects plus conventionnels des muses. Certains projets musauxdoivent tre vus en fonction non seulement de leurs aspects innovateurs mais galement en fonctiondes valeurs qu'ils adoptent. Tout ceci prsuppose l'examen de ces projets musaux qui sortent del'ordinaire (les aspects formels de la nouvelle musologie) en fonction des nouvelles valeurs etpratiques qui les rendent diffrents des autres formes de muses (les aspects spcifiques dediffrenciation de cette nouvelle musologie).

    Les aspects spcifiques de la nouvelle musologie

    La mmoire collective devient le patrimoine premier: Tous les savoirs, toutes lesperceptions historiques et sociales, tous les tmoignages deviennent sujets et objets de conservationet les biens matriels ne deviennent patrimoniaux qu'en fonction des besoins de cette mmoirecollective, soit pour l'illustrer, soit pour en garder une reprsentation relle plutt qu'imaginaire,soit pour apprhender le futur. Les biens patrimoniaux perdent leur rle matriel au profit d'unefonction communicationnelle. L'objectif n'est plus d'amasser des collections mais bien d'utilisertous les tmoins matriels pour rendre compte, pour expliquer, pour exprimenter...

    Le sujet social remplace les objets de la collection: Tant au niveau de la recherche que de

    l'interprtation, les sujets sociaux sont une des proccupations premires de la nouvelle muslogie -positions sociales et conomiques, combats proltaires ou cologistes, dveloppement industriel ouagricole, avancement culturel... Un questionnement attentif et une recherche des solutions possibles

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    21/55

    21

    aux diffrents problmes trouvent leur voie dans les expositions et les manifestations musalesnouvelles puisqu'ils concernent les populations impliques.

    La poursuite constante du mouvement crateur prvient la stagnation: l'appos l'unede l'autre se trouvent deux forces, l'une centripte reprsente par "l'institutionnalisation": plus oumoins statique, scurisante, s'accaparant (par dlgation ou non) des devoirs publics en matire deconservation du patrimoine, et l'autre centrifuge: moins dfinissable, constamment en qute

    d'innovations et de "mouvement", tirant profit des nergies populaires et des situations, recherchantles appuis de la base et la globalit dans l'action. Il y a en musologie nouvelle cette conscience quetout mouvement tend s'institutionnaliser et que toute institutionnalisation tend dtruire lemouvement qui l'a fait natre par son immobilisme croissant, se sectorialisation et laprofessionnalisation de ses activits. Le dveloppement de la nouvelle musologie est intimementli au respect de l'quilibre entre ces deux forces: institution versus mouvement.

    Les objectifs musaux visent le dveloppement communautaire: Les ojbectifs deconservation et de prsentation du patrimoine ne suffisent plus; ils sont trop centrs sur l'objetmusalis et tendent trop vers le conservatisme. Sans oublier ces onbjectifs conventionnels, lanouvelle musologie en proprose de nouveaux qui visent le dveloppement des communauts, nonseulement du point de vue culturel - peut-on sparer la culture des autres activits de la vie - maisaussi du point de vue social et finalement conomique. A la limite, ces nouveaux objectifs veulent

    susciter une prise en main du dveloppement par la cration d'entreprises et la revitalisationartisanale, agricole et industrielle.L'utilisation de l'espace tend vers un "clatement" territorial: Le muse, c'est bien

    connu, fonctionne principalement entre ses quatre murs. La nouvelle musologie propose undcloisonnement qui peut prendre diffrentes formes: insertion dans des milieux dfavorissmusalement, extension du muse tout un territoire, excursions sporadiques en milieux nonmusaux ou reprsentations auprs de publics ngligs rpartition du muse dans les foyers, dansles familles ou dans d'autres cellules sociales ou productrices (hpitaux, usines, maisons dupeuple...); en d'autres mots, "clatement" selon les besoins et les possibilits de chaque situation.

    L'interdisciplinarit est de rigueur: A l'encontre de la spcialisation et de l'hermtismedes muses conventionnels, la nouvelle musologie prconise une approche interdisciplinaire, uneapproche horizontale dans le veine de la mthode systmique d'analyse des phnomnes etsituations sociales. Toutes les sciences sont utilises comme un faisceau de lumire pour balayerl'inconnu, les prjugs, les erreurs... pour balayer le pass, le prsent et jusqu'au futur... Au lieu deregarder l'infiniment petit, l'infinement loin, l'infinement prcis, l'approche systmique regardel'infiniment complexe avec les yeux de tous les savoirs, qu'ils soient scientifiques, empiriques oupragmatiques.

    L'interprtation transforme la mthode musographique: Plutt que de prsenter lesfaits et objets par une 'transposition froid', la nouvelle musologie essaie, la manire d'unchanteur, la manire d'un pote, d'interpreter le patrimoine de faon non-hirarchise en utilisantdiverses techniques de crativit 'synectique' pour le dveloppement des thmatiques. (En France,"scnographie" plutt que "interprtation"...) Thmes et sousthmes forment un systme dereprsentation et de communication intgr permettant un accs facile et immdiat par lesrcepteurs viss. Un exemple intressant: l'exposition "L'rable coeur ouvert" conue

    thmatiquement par la population de la HauteBeauce et principalement par les acriculteursdevenus par la suite animateurs et "interprtes"...La mthode musographique est base sur la participation populaire: A tous les

    niveaux de conception, de programmation, de ralisation et d'animation des expositions et desmanifestations musales nouvelles se trouve et participe de plein droit la population. Par sesapports cratifs, par ses savoir-faire et par ses forces vives, elle s'exprime musographiquementdans le respect de ses convictions, utilisant les mass media pour en diffuser la porte et animant lesmanifestations pour en maximiser l'impact ducatif et social. Cette musographique populaire estempreinte de relations la fois libratrices et obligeantes, la fois scientifiques et cratrices. Ellecanalise des nergies jusqu'ici insouponnes et donne ceux qui y participent exprience accrue etconfiance nouvelle. Parfois des cours formels de musologie 'populaire' prparent cette pratique,parfois l'auto-formation et l'auto-didactie s'avrent de meilleurs matres.

    Le visiteur passif est plus ou moins ncessaire: Mmoire collective, sujets sociaux etmouvement crateur changent compltement la notion du visiteur de muse. Contemplation etdlectation intellectuelle sont dpasses par la participation et l'implication du visiteur qui, de ce

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    22/55

    22

    fait, devient partie intgrante du nouveau muse au lieu d'y tre seulement un invit. Par ses savoirset ses forces vives, il est appell soit participer l'aventure musale elle-mme, soit s'impliquerdans le dveloppement socio-culturel et mme conomique de son territoire. Il n'est plus visiteur; ildevient dcideur, acteur, musographe et agent multiplicateur.

    Les attitudes, les relations, les habitudes de travail se veulent nouvelles: Comme cettenouvelle musologie se fonde sur le 'relationnel', il est vident que des changements importants se

    manifestent dans les attitudes et les relations qui doivent exister chez tous les intervenants dans cenouveau processus musal. Finies les attitudes magistrales ou de condescendance; finies lesrelations patronales et de politique douteuse; les possesseurs du problme, ses solutionnaires etmme ses profiteurs doivent d'unir et se concerter; coopration, cogestion, et avaliation sontesentielles".

    Que dizer ento dos resultados deste atelier? Pelo nosso lado julgamos que eles so de duasordens.

    Em primeiro lugar este atelier permitiu maioria dos participantes confrontar os seustrabalhos com experincias realizadas em contextos sociais diferentes e rapidamente constatar queas suas preocupaes e desafios eram partilhados. Que aquilo que os unia se sobrepunha especificidade de cada trabalho e que a cada momento era possvel falar uma linguagem comum. Se

    bem que o conceptualizar da prtica da nova museologia se mostrasse de grande complexidade essefacto devia-se sobretudo enorme quantidade de informao posta a circular e heterogenidade dasprticas concretas de cada museu.

    O denominador comum aparecia como sendo uma vontade de dar um sentido s praticasmuseais que servisse o desenvolvimento das comunidades onde se inseriam. O denominadorera o essencial da declarao da Santiago, era a afirmao que a funo social dos museus no seesgota nos objectivos da museologia instituda.

    A estadia no Ecomuseu de Haute-Beauce foi um pouco a confirmao que esta museologia,quando de facto alicerada na participao da comunidade um processo criativo sem limites.

    Quando os participantes se reuniram em sesso plenria no dia 12 foi adoptado o seguintetexto:

    "Os participantes no 1 atelier Internacional "Ecomuseus/Nova Museologia, identificam-see reconhecem-se nos pontos seguintes:

    1 - A museologia actua com vista a uma evoluo democrtica das sociedades.

    2 - A interveno dos museus no quadro desta evoluo passa por: um reconhecimentoe uma valorizao das identidades e das culturas de todos os grupos humanos,inseridos no seu meio ambiente no quadro da realidade global do mundo.por: uma participao activa destes grupos no trabalho museolgico.

    3 - Existe um movimento caracterizado por prticas comuns podendo assumir formasdiversas em funo das pases e os contextos, que devero conduzir a emergnciade um novo tipo de museu correspondente a estas novas perspectivas.

    4 - Nestas condies, a interdisciplinaridade e a funo social conduzem a umamudana do papel e da funo do muselogo, o que implica uma formao nestesentido.

    Os participantes recomendam que estes reflexos comuns continuem a nvel internacional eque uma estrutura, ou seja uma associao seja criada para este efeito".

    Este ltimo pargrafo traduz a segunda ordem de resultados conseguidos pelo atelier ouseja a afirmao internacional do movimento e a sua consequente organizao.

    Foi ento mandatada para o dia seguinte uma comisso encarregada de dar andamento spropostas citadas e fixar o texto definitivo da declarao do Qubec luz de toda a reflexorealizada at ento.

    Durante a reunio onde foi estabelecido o texto da Declarao do Qubec foramigualmente criados um grupo de trabalho Provisrio (GTP) e o Comit organizador do 2 atelierinternacional.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    23/55

    23

    Este comit dava andamento proposta apresentada e aceite na vspera de que o 2 ateliertivesse lugar em Portugal.

    Os autores da proposta Manuela Carrasco, Antnio Nabais e Mrio Moutinho aoassumirem esta responsabilidade, verdade seja dita, no tiveram muito tempo para reflectir sobretodas as implicaes que tal deciso podia tomar. A ideia surgiu quando na vspera se comearam adefinir alternativas para o local do 2 atelier. Confrontando o conhecimento que tnhamos de tantas

    iniciativas museolgicas portuguesas, com que o que nos tinha sido dado apreender nos diversosgrupos de trabalhos em que tnhamos participado, considermos que no nosso pas havia tambmum importante movimento museolgico que agia de acordo com aquilo que progressivamente sedefina como sendo Nova Museologia. Consideramos igualmente que em Portugal cada grupotrabalhava isoladamente, tolerados, ou em alguns casos apoiados pelas autarquias, mas de um modogeral ignorados pelas diferentes instituies governamentais da rea da cultura. Mais ainda, esteisolamento prejudicava em nosso entender o desenvolvimento da museologia comunitria no nossopas.

    Igualmente reconhecamos que o confronto da nossa prtica museolgica com o que sepassava noutros pases nos tinha ajudado a compreender melhor o nosso prprio trabalho,esclarecendo dvidas apontando caminhos mais promissores, aprofundando a nossa reflexo sobreestes assuntos.

    Foi nesta base que entendemos que uma reunio semelhante em Portugal seria a formamais eficaz de contribuir para a criao de laos entre os diferentes projectos, para afirmar que aaco de tantos museus locais se enquadravam num movimento mais amplo, que era tempo dasinstituies do poder reconhecerem por sua vez o papel essencial dos novos museus que pela suapotencialidade, podiam e participavam no desenvolvimento geral do pas.

    Certo , que a certeza de recebermos todo o apoio de Hugues de Varine ento residente emLisboa pesou na nossa deciso. Quanto aos aspectos materiais em que o encontro se iria realizarquase s tnhamos interrogaes.

    Para nossa orientao os temas ento definidos foram os seguintes:

    Ligao museu -poderes pblicos,Afirmao do movimento da Nova Museologia,Organizao de uma aco de formao,

    sendo trs dias de reunio nos locais do Instituto Franco-Portugus onde H. de Varine era entodirector e 2 dias para visitar experincias portuguesas.

    O Comit organizador nomeado ficou assim composto: Antnio Nabais, Manuel Carrasco,Mrio Moutinho, Hugues de Varine, Pierre Mayrand, Evelyn Lethalle, Marc Maure e EtienneBernard.

    Quanto ao Grupo de Trabalho Provisrio, Pierre Mayrand, Maude Cr, Ren Rivard,Rosanne St. Jacques, Etienne Bernard, Mrio Moutinho, Eullia Janer, Miriam Arroyo de Kerriou,Marc Maure, e William Saad este mais tarde substitudo por Alain Nicolas, as tarefas que lheforam destinadas eram em particular as seguintes:

    clarificar e formular os objectivos da futura associao.redigir os seus estatutos.prever as modalidades de financiamento.definir um plano trianual de encontros.dar assistncia ao comit organizador do 2 atelier,

    O CTP, como passou a ser denominado, reuniu-se em Abril em Lisboa, Julho em Paris eNovembro novamente em Lisboa.

    Progressivamente as tarefas foram sendo realizadas no seio de reunies de intenso debateonde as diferentes sensibilidades aos problemas puderam ser expressas, traduzindo assim a vivnciadas diferentes percepes das prticas museolgicas em diversos pases.

    Pela primeira vez o comit executivo do ICOM recebeu com interesse os projectos do

    movimento. Algo comeava a mudar pois pela primeira vez o ICOM era levado a reconhecer osucesso em termos de ideolgicos e organizativos que tinha sido o atelier do Qubec. A partir deento, o dilogo com o ICOM tem sido uma realidade, correndo hoje em dia projectos comuns. Nos

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    24/55

    24

    diferentes nveis nacionais esta mudana de atitudes teve como consequente imediata o repensardas relaes ICOM-Nova Museologia.

    Em Abril de 1985 a GTP e o Comit Organizador do II Atelier durante a reunio que teveento lugar, definiu o programa do encontro que ficou assim enunciado.

    1 - Estudar as relaes entre os museus e os poderes pblicos e definir em particular o

    papel dos autarcas na organizao e desenvolvimento dos museus locais.

    2 - Aprofundar o papel dos museus locais na investigao cientfica.

    3 - Afirmar a importncia dos museus locais na defesa do patrimnio dos povos e nodesenvolvimento das comunidades.

    4 - Apresentar a Declarao de Qubec com vista a sua adopo.

    5 - Estruturar a Associao Internacional da Nova Museologia.

    Assegurou-se ento o apoio do Instituto Portugus do Patrimnio Cultural, do Instituto

    Franco Portugus, do Ecomuseu do Seixal e do Museu de Monte Redondo bem como das Cmarasde Benavente, Leiria e Seixal. Passou-se fase de difuso do projecto tendo sido organizada emLisboa uma reunio em Julho, onde participaram representantes do Centro Cultural de Condeixa,museus de Beja, Mrtola, Estremoz, Alcochete Benavente e Monte Redondo, ecomuseu do Seixal edo Parque Natural da Serra da Estrela e ainda observadores da Associao de ArqueologiaIndustrial. Outros museus e instituies, apesar de convidados, por diversas razes no estiverampresentes.

    O sentido desta reunio era o de informar os participantes no s do contedo do 1 ateliermas sobretudo divulgar o projecto do 2 atelier e os seus objectivos, solicitando-se a todos a tarefade divulgar esta realizao por forma a abranger o maior nmero possvel de regies do pas. Numabreve sondagem foi testemunhado um acordo de princpio com o contedo da Declarao doQubec e sobre a necessidade de organizar estruturas associativas.

    Este trabalho de difuso relatado na imprensa, na medida do possvel permitiu que naabertura do atelier estivessem presentes, cerca de 70 participantes.

    Assim pela primeira vez se encontravam reunidos representantes de tantos museusportugueses onde, no quotidiano, se procurava atingir os objectivos referidos na Declarao deSantiago e agora tambm do Qubec. Igualmente de no menor importncia era a possibilidade queera dada a estes museus de se informar detalhadamente sobre o panorama da nova museologianoutros pases e expor crtica as suas prprias iniciativas. Pelas suas caractersticas inovadorasforam expostas em plenrio as experincias de Mrtola e S. Pedro da Cova e proporcionadas visitasaos Museus de Benavente e Monte Redondo e Ecomuseu do Seixal. Outros trabalhos foramexpostos em diversas sesses ou por meio da utilizao de painis.

    Reunidos em 3 grupos de trabalho teve lugar uma profunda anlise dos temas propostos, daqual resultou o seguinte texto:

    GRUPO DE TRABALHO "MUSEUS LOCAIS E PODER PBLICO"

    A denominao de museu local, que se apresenta sob diferentes formas, corresponde aquiaos museus que privilegiam a dialctica homem/meio, e fundamentam o seu funcionamento naparticipao da populao local.

    Em nome da inviolabilidade do respeito pela dignidade humana e para responder snecessidades reais dessa populao, o

    dilogo dos museus locais e dos poderes institudos deve estabelecer-se sem concesses.

    Como bem colectivo de utilidade pblica, o museu local no deixa contudo de dependerdos poderes institudos, e garante face a estes, com estes e entre outros organismos, a realidadeduma identidade cultural local das suas componentes. Neste sentido desejvel que em todas as

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    25/55

    25

    ocasies seja reconhecido como parceiro de desenvolvimento local e principalmente, nos domniosda proteco do patrimnio cultural (mvel, imvel e fundirio) e do ordenamento do espao. OMuseu local usa para isso, com a populao, de mtodos e meios que lhe so prprios,preservando-se de qualquer ingerncia ou tomada de posio partidria.

    O Museu local depende por vezes to fortemente do poder poltico local que a suaexistncia pode ser ameaada quando muda a maioria; ora toda a empresa museal por definio,

    perene; devem pois ser encontrados os meios que coloquem o museu ao abrigo destas flutuaes.Isto comea pela definio exacta da sua misso, e pelo posterior reconhecimento pelos poderesinstitudos. Relaes de reciprocidade devem ser estabelecidas em particular entre os museuslocais, regionais e nacionais a fim de que as competncias e conhecimentos se troquem emigualdade e que as prticas da nova museologia sejam aplicados em todos os museus.

    O poder do qual depende o museu local no monoltico, segundo os casos, compostopor autarcas, investigadores, funcionrios da administrao, responsveis associativos ousindicatos. O museu local para defender a sua autonomia, a sua representatividade, a sua eficcia,deve procurar que a partilha do poder se efectue de forma equitvel. Trata-se para o autarca de umasituao nova. Outras experincias a nvel nacional ou internacional deveriam ajud-los a melhorcompreender e assim adoptar, em consequncia, uma posio. Esta abertura deveria igualmentepermitir que o caso de populaes ditas "no tradicionais" exgenas ou minoritrias, fosse

    considerado com correco a fim de que estas tambm possam encontrar meios de se exprimir.A equipa museal tem nestes museus locais, uma funo determinante. Ela em particular ogarante da sua perenidade, no caso em que a sua estabilidade seja assegurada. Os membros devembeneficiar dum estatuto especfico correspondente sua responsabilidade e respectivas misses. Aeficincia da aco do museu local depende tambm das relaes de confiana e de solidariedadeque a equipa conseguir instaurar entre os seus membros. Por vezes podem aparecer conflitos queopem o museu local aos poderes institudos e neste caso seria desejvel que pudessem beneficiarda assistncia do MINOM (Movimento Internacional para uma Nova Museologia).

    Como resultado da sntese das questes debatidas este grupo de trabalho, sugere trspropostas que pedem assembleia plenria para adoptar:

    1 Estudo e elaborao de um cdigo internacional de deontologia da equipa museal do museulocal.

    2 Recenseamento, estudo e divulgao pelo MINOM dos casos de museus locais que tenhamencontrado solues aos problemas: de existncia jurdica, de meios de financiamento, da partilha erepartio das responsabilidades (comisso de gesto).

    3 Recurso, em caso de conflito entre uma equipa museal e o poder do qual ela depende, ao apoio e assistncia do MINOM.

    GRUPO DE TRABALHO "MUSEUS LOCAIS E INVESTIGAES CIENTFICA

    PROPOSIES E RECOMENDAES

    Atendendo riqueza do tema abordado, diversidade de origem dos participantes e aopouco tempo disponvel para reflectir sobre o assunto proposto, o grupo de trabalho apresenta aosparticipantes do atelier uma contribuio a dois nveis, compreendemos:

    - por um lado temas de investigao e de reflexo podendo alimentar o trabalho daassociao MINOM ou de grupos ou de grupos nacionais ou locais.

    - por outro lado recomendaes podendo ser utilizadas pelos aderentes novamuseologia.

    A INVESTIGAO: UMA NECESSIDADE

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    26/55

    26

    O grupo considera a investigao nos museus locais como necessria e importante nasseguintes condies:

    - que a investigao seja adequada s necessidade das comunidades implicadas,

    - que a investigao seja conduzida em colaborao com a populao por

    investigadores integrados no "campo",

    - que o investigador assuma um papel de informao, de coordenao e de mediao:entre as diferentes disciplinas cientficas, entre as populaes e as instituies e osfinanciadores.

    A fundao de museus locais, em bases cientficas levar os investigadores a consider-los,por sua vez, como quadros e como instrumentos de trabalho.

    AS FINALIDADES DA INVESTIGAO

    Uma investigao adequada s necessidades de uma comunidade deve incluir pelo menos

    dois grandes objectivos:- o estabelecimento de um programa e de um projecto muselgicos prprios a uma

    populao,

    - o incentivo de aces de desenvolvimento scio econmico, cultural e de criao.

    INVESTIGAO E FORMAO

    No sendo a identidade local frequentemente objecto do ensino oficial, o contedo daspesquisas (em meio museal) deve constituir um complemento desse ensino. A relao investigador-comunidade conduzir a uma formao recproca, o que dever igualmente viabilizar a constituiode uma equipa local susceptvel de "revezar" o investigador.

    A COMPETNCIA DOS INVESTIGADORES

    A equipa local de investigao dever ser reconhecida como um interlocutor no domniodo trabalho cientfico. Essa equipa dever funcionar em ligao com os investigadores exterioresassim como com as associaes existentes no seio da comunidade.

    Sendo os museus locais o reflexo de uma comunidade e de um territrio, a investigaoneles praticada dever ser sempre interdisciplinar. A competncia do investigador no se medirsomente pelo seu saber no seu prprio ramo mas, tambm, pela sua aptido em trabalhar nainterdisciplinaridade.

    INVESTIGAO E RESTITUIO

    A restituio dever incidir tanto sobre a metodologia como sobre os resultados dainvestigao e poder tomar formas diversas: exposio, documentos audiovisuais, criaes.... aconselhvel que seja realizada em sintonia com a comunidade. A restituio no dever dirigir-seunicamente comunidade implicada mas visar um pblico mais vasto. S uma seleco de bens ede documentos, efectuada em conexo com a programao dar todo o valor restituio.

    PROGRAMA E FINANCIAMENTO

    Pesquisas programadas possibilitaro um trabalho mais coerente no campo do projectomuseogrfico e no do desenvolvimento comunitrio. A programao cientfica facilitar aelaborao de planos de financiamento.

    Uma programao da investigao e dos planos de financiamento definidos, em ligaontima com a comunidade, sero trunfos importantes face aos diferentes poderes detentores dasfontes de financiamento.

  • 7/29/2019 Museologia Social 1989

    27/55

    27

    A reflexo desenvolvida pelo grupo de trabalho permitiu abordar certos aspectos da relaomuseu local-investigao cientfica. Outros - no obstante o interesse por eles suscitado - nopuderam ser aprofundados, nomeadamente: as incidncias no plano cientfico da proliferao dosmuseus locais, as relaes entre as comunidades, os museus locais e outras instituies museais, ocontrolo de uma comunidade sobre o seu patrimnio e sobre o seu futuro.

    Da discusso emanou igualmente uma proposta de anlise do (conceito) que

    comummente designado por museu local. O grupo de trabalho reteve essencialmente duas noes:- a de intimidade do museu local com um territrio e com uma populao, - a de variabilidade decontedo e de meios segundos os contextos locais e/ou nacionais.

    IV Atelieer

    GRUPO DE TRABALHO "MUSEUS LOCAIS E DEFESA DO PATRIMNIO"

    O museu local um instrumento que se prope exprimir os traos culturais de umapopulao nos limites do territrio ao qual ela se identifica.

    Os traos culturais tomam a forma dos testemunhos herdados das geraes precedentes.Mas estes testemunhos no devero limitar-se construo de uma imagem esttica. A imagemproposta no espelho que o museu local deve ser evolutiva e, portanto, igualmente formada portodos os testemunhos contemporneos que exprimem a vida da populao, nas suastransformaes, nas suas lutas e no seu desenvolvimento de maneira a ter em considerao todos osaspectos do seu futuro.

    O Museu local um lugar de encontros e trocas para todas as pessoas, para todos os gruposculturais, sociais e econmicos que laboram nesta construo.

    A expresso museolgica desta imagem pode utilizar os meios tradicionais, pode tambmutilizar qualquer outra prtica de mediao.

    As co