ORGULHO DE SER FANOR?

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ORGULHO DE SER FANOR? Adalton dos Anjos e Karina Costa Venda de faculdades particulares em Salvador deixa estudantes apreensivos. “Diga aos quatro ventos que não ficaremos parados nem calados”. Esse é o lema que foi criado pelos estudantes da Faculdade Ruy Barbosa depois de receberem a notícia da venda da faculdade para o grupo cearense Fanor (Faculdades Nordeste) no dia 28 de julho, após a matricula dos alunos. A negociação foi efetivada meses depois de a Fanor adquirir também a FTE (Faculdades de Tecnologias Empresariais) e a Área 1, e realocar os alunos dos campi do Rio Vermelho e Brotas, respectivamente, para um novo prédio na Avenida Paralela. Temerosos com as possíveis mudanças que vieram junto com a venda, os alunos da Faculdade Ruy Barbosa se organizaram desde o primeiro dia de aula, com uma assembléia geral que contou com a adesão da maioria dos estudantes, surpreendendo a todos. A mobilização começou pelo curso de Direito e depois chegou a Psicologia, “os dois mais prejudicados com mudanças nas grades” segundo Juliana Novaes, estudante do 1º semestre de Psicologia. As novas propostas pedagógicas prevêem a redução da carga horária, a implantação do sistema de módulos da Fanor, a extinção de disciplinas e a reformulação de outras. Em Direito, por exemplo, eles reduziram a grade curricular de 6 para 5 matérias e tiraram as propedêuticas, “as propedêuticas que tanto aparecem na OAB”, afirma a estudante do 3º semestre de Direito Camila Pavim. Em Psicologia as mudanças na carga horária resultaram no corte de 200 horas e com isso o curso passa a ter 4000 horas. Segundo Guilherme Tanajura, 1º semestre de Psicologia, a nova grade da Fanor propõe que o seu curso tenha 8 semestres, cada um com 5 disciplinas. Atualmente o curso de Psicologia tem 10 semestres com 7 disciplinas cada um. Para o Professor Adriano Miranda, Diretor Geral da Faculdade Ruy Barbosa, as mudanças, que foram aprovadas pelo Ministério da Educação, vão contribuir para melhorar ainda mais a proposta pedagógica do curso. Todos os cursos terão uma disciplina ministrada a cada dia da semana, além

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ORGULHO DE SER FANOR?

Adalton dos Anjos e Karina Costa

Venda de faculdades particulares em Salvador deixa estudantes apreensivos.

“Diga aos quatro ventos que não ficaremos parados nem calados”. Esse é o lema que foi criado pelos estudantes da Faculdade Ruy Barbosa depois de receberem a notícia da venda da faculdade para o grupo cearense Fanor (Faculdades Nordeste) no dia 28 de julho, após a matricula dos alunos. A negociação foi efetivada meses depois de a Fanor adquirir também a FTE (Faculdades de Tecnologias Empresariais) e a Área 1, e realocar os alunos dos campi do Rio Vermelho e Brotas, respectivamente, para um novo prédio na Avenida Paralela.

Temerosos com as possíveis mudanças que vieram junto com a venda, os alunos da Faculdade Ruy Barbosa se organizaram desde o primeiro dia de aula, com uma assembléia geral que contou com a adesão da maioria dos estudantes, surpreendendo a todos. A mobilização começou pelo curso de Direito e depois chegou a Psicologia, “os dois mais prejudicados com mudanças nas grades” segundo Juliana Novaes, estudante do 1º semestre de Psicologia.

As novas propostas pedagógicas prevêem a redução da carga horária, a implantação do sistema de módulos da Fanor, a extinção de disciplinas e a reformulação de outras. Em Direito, por exemplo, eles reduziram a grade curricular de 6 para 5 matérias e tiraram as propedêuticas, “as propedêuticas que tanto aparecem na OAB”, afirma a estudante do 3º semestre de Direito Camila Pavim. Em Psicologia as mudanças na carga horária resultaram no corte de 200 horas e com isso o curso passa a ter 4000 horas. Segundo Guilherme Tanajura, 1º semestre de Psicologia, a nova grade da Fanor propõe que o seu curso tenha 8 semestres, cada um com 5 disciplinas. Atualmente o curso de Psicologia tem 10 semestres com 7 disciplinas cada um.

Para o Professor Adriano Miranda, Diretor Geral da Faculdade Ruy Barbosa, as mudanças, que foram aprovadas pelo Ministério da Educação, vão contribuir para melhorar ainda mais a proposta pedagógica do curso. Todos os cursos terão uma disciplina ministrada a cada dia da semana, além disso, quatro matérias serão obrigatórias para qualquer aluno da Faculdade Ruy Barbosa: Língua Portuguesa, Metodologia da Pesquisa, Ciências Humanas e Sociais e Carreira, Liderança e Trabalho em equipe.

“A gente não quer desfazer a venda, a gente quer manter a qualidade”, comenta Camila. Muitos professores renomados têm se desiludido com a nova filosofia da faculdade e estão saindo da instituição, sobretudo no curso de Direito. Gisele Dias, 3 º semestre de Direito comenta: “o professor que tem prestígio e ideologia, tem consciência do que é, não vai aceitar as mudanças”. Em Psicologia, Juliana disse que até agora nenhum professor saiu, mas ela teme que ocorra o mesmo que está acontecendo em Direito.

Miranda justifica a filosofia que é utilizada na Fanor e que agora foi implantada na Ruy Barbosa como algo que não é novo: “foi pensada por educadores como Anísio Teixeira e Paulo Freire, que incentivavam toda a forma de construção de conhecimento. Dentro dessa metodologia, não há como a qualidade do ensino e da instituição ser afetada”, afirma o diretor numa entrevista concedida por email.

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Para os alunos que entraram na Faculdade Ruy Barbosa até o último processo seletivo não haverá alterações na grade curricular. Segundo Gisele, as mudanças já viriam nesse semestre, mas a mobilização dos estudantes e a ameaça de processo por quebra de contrato fizeram com que a nova direção da faculdade adiasse as alterações. A estudante acha que em 2009.1 todos os calouros terão a grade reformulada e o contrato pronto.

Uma comissão interina foi formada e tinha como membros os líderes de cada sala que participavam de reuniões, deliberações e comunicavam aos alunos o que estava acontecendo. Outras ações estão sendo pensadas pelos estudantes da Faculdade Ruy Barbosa, mas, por enquanto, eles apenas afixaram um cartaz no mural para lembrar a todos da luta. “Não dá para a gente tirar estudantes da sala de aula todo o tempo. Por isso a gente está promovendo mobilizações com o cartaz, mas a comissão está prevendo outras coisas” afirma Gisele.

Os alunos acreditam que futuramente eles possam ter suas aulas transferidas da sede da faculdade, no Rio Vermelho, para o novo prédio da Fanor, na Avenida Paralela, como aconteceu com os estudantes da FTE e Área 1, e que o nome da faculdade mude também. Contudo, o diretor negou essas informações, ele disse que existe um projeto para a ampliação dos espaços para graduação usando o prédio da pós-graduação, na Pituba.

Na FTE e na Área 1 os alunos também passaram pela mesma preocupação dos estudantes da Ruy Barbosa. Um semestre depois da fusão das duas faculdades com a Fanor eles estão mais calmos com relação às novidades. No início houve muitas dificuldades “desde a hora de fazer a matricula, pois o sistema que passou a ser utilizado era o da Fanor e nenhum funcionário sabia utilizá-lo, até na hora de pagar a mensalidade, por que o boleto não estava mais chegando nas casas dos alunos”, comenta Carol Azevedo, estudante do 4º semestre de Administração na FTE .

A preocupação com a qualidade dos cursos também foi debatida entre os alunos. Entretanto não houve grandes mobilizações. Carol conta que na época alguns professores se demitiram dizendo que iam para a Ruy Barbosa, mas os funcionários foram mantidos pela direção da faculdade por ordem dos ex-donos da FTE. O estudante de Engenharia da Computação da Área 1 Bruno Murta diz que a qualidade do ensino não caiu, porém confirma os boatos de que alguns professores foram demitidos: “Realmente alguns professores foram demitidos. Mas por causa da nova maneira que estão ocorrendo as aulas, e não houve queda de qualidade com relação aos professores não. As demissões foram por conta de sobrar professores de mesma matérias”.

Quanto à nova grade, Carol acha legal a aula por turno por que não pára no meio e o aprendizado fica mais fácil, contudo pondera: “é bastante cansativo, e se o aluno precisar faltar um dia, leva 4 faltas e para repor a aula fica complicado”. Já seu amigo Tiago Moura, estudante de Administração, não gosta da mudança “chega uma hora que seu cérebro cansa e você não absorve mais nada” comenta o estudante.

A transferência dos campi das duas faculdades para a Avenida Paralela também gerou polêmica. A faculdade prometeu ônibus dos antigos campi para o novo, mas segundo Carol isso não aconteceu. A estudante também afirmou que eles tiveram atraso de um mês, aproximadamente, para o início das aulas por que as obras do novo prédio ainda não tinham sido concluídas. Hoje o campus que abriga a Área1FTE é bastante moderno e tem capacidade para 15 mil alunos.

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Outra possibilidade que desponta é a venda da Unifacs (Universidade Salvador) para o mesmo grupo. Atualmente trata-se apenas de rumores. Segundo Victor da Paz, 6º semestre do curso de Direito, a reitoria da faculdade declarou que recebeu propostas de vendas, mas a possibilidade não é cogitada, ainda segundo Victor o reitorado da Unifacs “foi veemente em dizer que 36 anos de história não vão ser desconstituídos por dinheiro”. No entanto recentemente a Universidade Salvador fez mudanças no seu sistema administrativo que mudou de sociedade sem fins lucrativos para S.A o que facilitaria uma possível venda. A reitoria em reunião com os alunos, segundo o estudante, alegou que a mudança foi feita apenas para facilitar questões tributárias. A possibilidade causa receio nos alunos, mas até agora não passa de rumores.

A Fanor iniciou suas atividades acadêmicas em 2001 no Ceará. Nesses anos as Faculdades Nordeste vêm ampliando o número de alunos e cursos. Com a compra da FTE, Área 1 e Faculdade Ruy Barbosa o grupo cearense passou a ter 11 mil alunos e 37 cursos de graduação.

Quanto às novas propostas pedagógicas, elas incluem um sistema modular também chamado de “terminalidade”, que causa estranheza para quem está acostumado ao sistema semestral. A nova proposta funciona como se houvesse mini-cursos dentro do próprio curso, onde as matérias são mais integradas e por isso a cada módulo os alunos adquirem habilidades que lhes dão maior autonomia. Além disso, as disciplinas são ministradas por turno, ou seja, a cada dia da semana haverá 4 aulas da mesma matéria.

A Fanor pretende ser a maior instituição de ensino superior da Região Nordeste e para isso investe bastante em infra-estrutura. O suporte para os investimentos vem de um grupo com investimentos gerenciados pelo banco UBS Pactual. Esse ano a meta da Fanor é alcançar a marca dos 14 mil alunos.

Olho 1: “Antes eu tinha orgulho de falar que era Ruy Barbosa agora eu não sei mais o que eu sou”. Gisele Dias 3º semestre de Direito

Olho 2: “A gente não quer desfazer a venda, a gente quer manter a qualidade”. Camila Pavim 3º semestre de Direito

Olho 3: “Eles trataram a minha educação como mercadoria eu também vou tratar eles como mero prestadores de serviço, sinto muito”. Gisele Dias 3º semestre de Direito.