OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DO NOROESTE FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS CURSO DE PEDAGOGIA CARINA ELIAS SANTANA OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL Santo Antônio de Pádua 2020

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DO NOROESTE FLUMINENSE DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS

CURSO DE PEDAGOGIA

CARINA ELIAS SANTANA

OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM NO

CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Santo Antônio de Pádua

2020

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CARINA ELIAS SANTANA

OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM NO

CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Trabalho de conclusão de curso

apresentado ao curso de Licenciatura em

Pedagogia como requisito parcial para

conclusão do curso.

Orientadora:

Prof.a Dr.a, Andréa Cardoso Reis

Santo Antônio de Pádua

2020

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Ficha catalográfica automática - SDC/BINFGerada com informações fornecidas pelo autor

Bibliotecário responsável: Sandra Lopes Coelho - CRB7/3389

S231m Santana, Carina Elias OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM NOCONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL / Carina Elias Santana ; AndréaCardoso Reis, orientadora. Santo Antônio de Pádua, 2020. 41 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia)-Universidade Federal Fluminense, Instituto do NoroesteFluminense de Educação Superior, Santo Antônio de Pádua,2020.

1. Afetividade. 2. Educação Infantil. 3. MediaçãoSocial. 4. Produção intelectual. I. Cardoso Reis, Andréa,orientadora. II. Universidade Federal Fluminense. Instituto doNoroeste Fluminense de Educação Superior. III. Título.

CDD -

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CARINA ELIAS SANTANA

OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM NO

CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Trabalho de conclusão de curso

apresentado ao curso de Licenciatura em

Pedagogia como requisito parcial para

conclusão do curso.

Aprovada em ____ de __________________ de 2020.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________

Profª. Drª Andréa Cardoso Reis - UFF

_____________________________________________

Profª. Drª Maria Goretti Andrade Rodrigues - UFF

_____________________________________________

Profª. Drª Virgínia Georg Schindhelm - UFF

Santo Antônio de Pádua

2020

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Aos meus pais com amor...

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AGRADECIMENTOS

Pelas lentes

dos afetos

enxergo o mundo...

Vivo tentando poetizar tudo

Dos “corações” fiz minha marca

Com amor escolhi trilhar a minha jornada

Busco sempre a boa parte da existência

Enxergando em tudo uma potência

Que move...move...move...move

Que preenche...preenche

Que ensina...ensina

Que instiga

Que

traz

vida...

De nada adiantaria falar de afeto, sem falar dos afetos que me conduziram até

aqui...Afetos que potencializam o meu existir...Que me movem a amar...Que dão sentido a

quem eu sou.

Por isso, antes de agradecer trago aqui um pouquinho do porquê de tanto amor!

Tudo começou no dia 12 de junho de 1996...quando o mundo celebrava o amor...Nasci

depois de uma perda. De acordo com os meus pais fui um “bebê arco-íris” que ao mundo

deles trouxe cor.

Nomeada de “Carina”, que no dicionário de nomes significa “querida” diz muito de

como fui bem recebida e também de como escolhi viver a vida.

Fui criada cheia de amor! E hoje o que me move é levar até as pessoas nem que seja

um pouquinho de cor... A cor do amor!

Por isso, sou só gratidão! Por todos que me acompanham nessa jornada de 24 anos de

vida, e alguns que nos últimos 05 anos aceitaram o convite e embarcaram comigo na jornada

da minha vida.

Grata sou....

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Ao Senhor por ser o Motivo da minha existência, a Fonte de todo amor que de mim

transborda, a Verdade que traz luz ao meu caminho, a Certeza que seguindo os passos dEle

em momento algum estarei sozinha.

Aos meus pais Simone e Marco Aurélio toda gratidão e amor. Por serem pais super

presentes. Por toda luta, toda oração, todo investimento, toda dedicação. Por me cobrirem de

amor. Por sempre encontrarem formas de me fazer feliz, mesmo em meio a dor. Por serem

meus melhores amigos. Por trocarem noites de sono preocupados comigo. Por trabalharem

“duro” para não me faltar nada. Por demonstrarem amor constantemente. Por abrirem a porta

para que eu iniciasse a minha jornada.

Às minhas irmãs, Cínthia e Carolina, sou grata por poder compartilhar a vida. Por

fazerem de tudo para me ver contente. Por não me deixarem desistir em nenhum minuto. Por

acreditarem em mim a qualquer custo. Por me cobrirem de oração. Por enxugarem as minhas

lágrimas. Por proferirem palavras que motivaram, consolaram, deram sentido. Por todo

momento que foram abrigo.

À minha avó Maria, que é a minha maior saudade, meu Álbum de afetos bons, com

quem cresci abraçada. Sou grata por cuidar de mim. Por acreditar nos meus sonhos. Por me

ensinar tanto mesmo estando longe.

À minha sobrinha Gabriella, por me ensinar com seu criançamento. Por me desafiar a

todo tempo. Por me fazer rir com seus momentos de descobrimentos. Por encher a minha vida

de amor. Por me incentivar a não desistir de sonhar.

Aos meus cunhados Douglas e Guilherme por serem tão parceiros e amigos.

À minha orientadora, Andréa, a quem devo muito por ter chegado até aqui. De forma

fofa e aconchegante me recebeu com muito carinho desde o momento que aceitou o convite

de comigo embarcar nessa jornada. Lembro com riqueza de detalhes quando a abordei e fiz o

convite. A forma afetuosa com quem me recebeu fez toda a diferença. Grata sou pelo cuidado,

carinho, paciência e principalmente por todo afeto com que regou as minhas ideias e valorizou

a minha pesquisa. Sempre com doçura respondeu muitos dos meus e-mails desesperados, me

acalmou, me entendeu, me orientou. Foi minha bússola.

Ao professor Fernando Paiva por ser tão amigo. Por todo apoio, oração, preocupação e

ensinamentos. Por ter sido mais que um professor. Foi um irmão de oração, um pai

conselheiro, um orientador, uma inspiração.

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A todos os professores que por mim passaram, marcaram, ensinaram e contribuíram

para a minha formação. Em especial as professoras Maria Goretti e Virgínia por gentilmente

terem aceitado o convite para participar da minha banca.

A todos os funcionários do INFES que com carinho e simpatia participaram da minha

vida e me alegraram no dia a dia.

À minha amiga Cintia pelos 18 anos de amizade. Por embarcar comigo nas mais

divertidas aventuras. Por me cobrir de oração. Por sempre ter um conselho diante de qualquer

questão. Por ser corajosa e me encorajar. Por ser uma amiga virtuosa.

À minha amiga Mariana Augusta, por em momento algum ter me abandonado. Por ter

sido corretora, editora, incentivadora, poetiza, potência. Por nos momentos conflitantes ter

sido paciência e amor. Por me ensinar sobre a vida. Por compartilhar os memes mais

engraçados da vida.

À minha amiga Isabelle por ter sido a materialização da paciência, do cuidado e da

gentileza. Por ter trazido calmaria e humor aos meus dias. Por ter me feito enxergar o mundo

pelas lentes da inclusão.

À minha amiga Ana Cláudia pela criatividade. Por ter trazido movimento, linhas,

pinturas, recortes, teatro e muita poesia. Por me mostrar que não há barreiras quando se quer

algo na vida.

À minha amiga Amanda por ter sido tão carinhosa e engraçada. Pelas risadas nas

conversas de madrugada. Por trazer humor. Pela animação. Por toda atenção.

À minha amiga Larissa por dividir as inquietações. Pelo companheirismo. Pela doçura.

Pelo incentivo.

Ao meu amigo Tharlys por todo companheirismo. Por me fazer enxergar um mundo

mais artístico. Por me incentivar. Por me alegrar. Por me inspirar.

Ao meu amigo Darlan por toda musicalidade. Por me alegrar com uma música autoral.

Pelo incentivo. Pela potência de suas palavras.

Aos meus amados amigos virtuais Ludmilla, Gustavo, Karina Elísia, Nathan e Felipe

por todo carinho e incentivo.

Aos meus alunos, pelo afeto, alegria e cumplicidade.

A todos que por mim passaram, gratidão!

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Aprender a ser educador passa pelos caminhos da

humildade do ensinar aprendendo. E aprender

ensinando passa pelos caminhos do calor, do

acolhimento, pelos caminhos do coração.

(Rubem Alves)

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RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo entender o universo afetivo que está compreendido dentro

das relações que acontecem no cotidiano de uma sala de Educação Infantil a partir dos estudos

de Henry Wallon, Vygotsky e outros autores que contribuem com as reflexões acerca das

“experiências escolares”. Com essa investigação, buscou-se dar ênfase nos movimentos dos

afetos que potencializam a aprendizagem e influenciam no desenvolvimento das crianças de

forma integral. Assim, a primeira parte expõe os caminhos traçados para a o desenvolvimento

da pesquisa. Na segunda parte o conceito de afetividade é estudado à luz da teoria walloniana

onde é ressaltada a importância desta teoria para se entender como os laços são construídos

nas relações entre os professores e as crianças e como o desenvolvimento social influência

nesse processo. A terceira parte reflete sobre os movimentos dos afetos, tendo como

referência narrativas oriundas de observações realizadas em uma turma de Educação Infantil.

Por fim, na quarta parte são narradas e enfatizadas as experiências afetivas desencadeadas nos

diálogos e brincadeiras entre as crianças e professoras, ressaltando a influência da mediação

social.

Palavras-chave: Afetividade. Educação Infantil. Mediação Social

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ABSTRACT

This research aimed to understand the affective universe that is understood within the

relationships that take place in the daily life of an Early Childhood Education room from the

studies of Henry Wallon, Vygotsky and other authors who contribute to the reflections about

“school experiences”. With this investigation, we sought to emphasize the movements of

affects that enhance learning and influence the development of children in an integral way.

Thus, the first part sets out the paths outlined for the development of research. In the second

part, the concept of affectivity is studied in the light of Wallonian theory, where the

importance of this theory is emphasized in order to understand how bonds are built in the

relationships between teachers and children and how social development influences this

process. The third part reflects on the movements of affects, having as reference narratives

from observations made in a class of Early Childhood Education. Finally, in the fourth part,

the affective experiences triggered in the dialogues and games between children and teachers

are narrated and emphasized, highlighting the influence of social mediation.

Keywords: Affectivity. Child Education. Social Mediation

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11

2 A AFETIVIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: CONSTRUINDO LAÇOS E

APRENDENDO COM AS RELAÇÕES SOCIAIS ............................................................. 15

2.1 Conceito de afetividade na visão de Wallon ...................................................................... 15

2.2 Como o desenvolvimento social e intelectual da criança influencia a construção de laços

afetivos na Educação Infantil ................................................................................................... 17

2.3 A construção dos laços afetivos entre os professores e as crianças na Educação Infantil . 21

3 OS AFETOS QUE ME MOVEM A APRENDER: AFETIVIDADE E

APRENDIZAGEM ................................................................................................................. 24

3.1 O professor e a criança: influenciando e sendo influenciado ............................................. 24

3.2 A escuta sensível de uma professora .................................................................................. 29

4 COMPREENDENDO AS RELAÇÕES DE AFETO EM UMA ESCOLA DE

EDUCAÇÃO INFANTIL: O UNIVERSO AFETIVO “NARRADOS” NOS DIÁLOGOS

E NAS BRINCADEIRAS ENTRE AS PROFESSORAS E AS CRIANÇAS. ................... 31

CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 35

REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 37

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1 INTRODUÇÃO

Posso dizer que as questões que se relacionam com a “infância” ou as “infâncias”,

com o “ser criança” me envolvem, me cativam, me tocam, me fazem querer saber um pouco

mais. Tenho a perspectiva da criança como um ser potente, que apesar de pequena em

estatura, é capaz de provocar e desencadear nos adultos sentimentos e aprendizagens sem que

eles mesmos percebam ou tenham consciência dessas experiências.

Um exemplo disso, pode ser percebido por meio da linguagem poética que está

presente no imaginário infantil como ilustrado pelo escritor Manoel de Barros (1996)

Carrego meus primórdios em um andor.

Minha voz tem um vício de fontes.

Eu queria avançar para o começo

Chegar ao criançamento das palavras....

Avançar para o começo, lá onde as crianças “brincam com as palavras”, na

intenção de me aproximar das formas como elas pensam, é um de meus objetivos com esta

pesquisa.

Daqui há algum tempo estarei como professora em uma sala de aula da Educação

Infantil convivendo com uma diversidade de crianças, aproximando-me de cada uma delas de

forma diferente, vivenciando diferentes tipos de situações provocadas por elas.

Vejo como de suma importância a busca por tentar compreender essa dimensão

que articula o imaginário e a afetividade no universo das aprendizagens das crianças.

Entender de que forma ocorre esse intercâmbio de sentidos e significados entre crianças e

educador(as) no âmbito da Educação Infantil.

Acredito que o que me levou a escolher o tema de pesquisa sobre a relação

afetividade e sua interferência no processo de aprendizagem das crianças da Educação Infantil

esteja relacionado a qualidade das interações entre os educadores (as) infantis e as crianças,

ou seja, como uma interação que tanto pode aproximar quanto afastar educadores e crianças e

que pode interferir nos processos de aprendizagem. Compreender como as “experiências

escolares” acontecem a partir dessas interações e como elas impactam a vida de ambos,

crianças e educadores é o principal foco dessa pesquisa.

A relação dos educadores com as crianças nos espaços pedagógicos na Educação

Infantil vai muito além do “ensinar e aprender”, ou seja, a relação entre ambos não está

limitada ao conhecimento, de forma que ao interagirem nesses espaços pedagógicos,

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constroem laços afetivos que de determinada maneira influenciam no desempenho escolar das

crianças.

Partindo do ponto de que a Educação Infantil é um período muito importante na

vida das crianças, já que é a primeira etapa da educação básica, onde a criança tem seus

primeiros contatos com a instituição escolar, é de grande relevância que a relação dos

educadores com as crianças aconteça de forma prazerosa, acolhedora e que seja significativa

no processo ensino-aprendizagem.

Quando a criança ingressa na Educação Infantil ela passa por um momento de

transição entre a cultura familiar e a cultura escolar. A criança se distancia temporariamente

de um grupo social e cultural restrito e começa a pertencer e interagir com um grupo social e

cultural mais amplo e com maior diversidade.

Nesse momento, vários fatores são considerados importantes para que a criança

possa estabelecer vínculos sócio afetivos que façam com que se sinta segura no novo

ambiente.

Um deles e talvez o mais importante seja a forma como o educador estabelece

relações de aproximação e cooperação com as crianças, ou seja, quais são suas concepções

sobre desenvolvimento e aprendizagem, a observação e a escuta para as necessidades das

crianças que chegam em uma instituição nova para a criança (a escola) diferente da instituição

familiar.

Sendo assim, como o afeto na relação entre educadores e crianças pode influenciar

no desenvolvimento e aprendizagem das crianças na Educação Infantil?

Para tentar responder a essa questão estabelecemos como objetivos:

Compreender a relação afeto e aprendizagem das crianças na Educação Infantil;

Analisar, a partir da seleção de alguns referenciais teóricos no campo da

psicologia do desenvolvimento e aprendizagem, o conceito de afetividade;

Identificar como os laços de afetividade entre crianças e educadores são

construídos no ambiente da Educação Infantil;

De acordo com os estudos da psicologia da educação, realizados por teóricos

como Vigotski e Wallon, a afetividade é um fator intrínseco na aprendizagem da criança.

Partindo dessa ideia, essa pesquisa teve a intenção de investigar como o afeto na

relação entre educadores e crianças pode influenciar no desenvolvimento e aprendizagem das

crianças da Educação Infantil, acreditando que possa auxiliar os profissionais que lidam com

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a aprendizagem tanto de conhecimentos formais como não formais nesse nível da educação

básica.

Defendo a ideia de que o desenvolvimento cognitivo da criança está

intrinsecamente vinculado à relação de afeto que os educadores e as crianças constroem na

prática pedagógica da Educação Infantil. Defendo ainda a importância de dar ênfase aos

processos de afetividade na prática pedagógica, de modo que os professores compreendam a

importância desses processos na dimensão do ensino e aprendizagem.

Acredito que dentro dessa proposta pode-se contribuir para um ambiente

agradável e significativo nos espaços de educação infantil que auxilie o desenvolvimento e a

aprendizagem da criança não só na construção de conhecimentos formais como não formais

que atravessam os espaços pedagógicos e que envolvem condutas éticas de participação e

envolvimento na sociedade.

Como metodologia deste trabalho realizei uma pesquisa de base qualitativa, com

revisão bibliográfica sobre o tema, uma vez que buscarei entender a relação entre a

afetividade e a prática docente no desenvolvimento escolar das crianças da Educação Infantil,

tomando como referenciais teórico-metodológicos principais os estudos no campo da

psicologia do desenvolvimento e aprendizagem de Vygotsky e Wallon. Busquei diálogos com

filósofos educadores como Paulo Freire e Jorge Larrosa de forma a desenvolver reflexões

sobre a forma como as “experiências escolares” afetam os alunos nos seus processos de

aprendizagem. Complementando o estudo, analisei a partir de minhas memórias de formação

as práticas pedagógicas do estágio realizado no contexto da educação infantil.

Assim sendo, na segunda seção abordo, a partir da teoria walloniana, o conceito

de afeto ressaltando a importância desta teoria para tratar as questões afetivas em uma sala de

aula de Educação Infantil, destacando como o desenvolvimento social das crianças influencia

a construção de laços afetivos, e como esses laços são construídos nas relações entre os

professores e as crianças.

Na terceira seção, abordo os movimentos dos afetos na sala de aula de uma turma

de Educação Infantil e como eles potencializam a aprendizagem das crianças, diante de tudo

que as envolvem no ambiente escolar, onde através de minhas narrativas de formação que

apresentam os resultados de um estágio supervisionado na Educação Infantil proveniente da

disciplina de PPE I (Pesquisa e Prática de Ensino I), ressalto a dinâmica da influência entre o

professor e a criança e também a importância de uma escuta sensível no fazer pedagógico de

uma professora.

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Na quarta seção, narro as relações de mediação social na construção dos laços

afetivos observados durante o estágio em uma Escola de Educação Infantil, ressaltando as

experiências afetivas desencadeadas nos diálogos e nas brincadeiras entre as professoras e as

crianças.

Na conclusão abordo sobre a importância de ter desenvolvido a pesquisa e de que

forma as discussões tratadas contribuem para os estudos e reflexões voltados para a

afetividade no contexto da Educação Infantil.

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2 A AFETIVIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: CONSTRUINDO LAÇOS E

APRENDENDO COM AS RELAÇÕES SOCIAIS

2.1 Conceito de afetividade na visão de Wallon

Inicialmente, é importante afirmar que as relações humanas estão continuamente

envolvidas pelo afeto. O ato de “afetar e ser afetado” é inerente ao ser humano desde seu

nascimento, em todas as relações nas quais está envolvido. E é por meio dessas relações que o

ser humano se constitui como sujeito. Porém, quando se trata do termo “afeto” muitas são as

interpretações. A mais comum é associá-lo somente ao amor como se ambos os termos, em

seus significados, fossem sinônimos.

Na visão de Wallon (1968, apud LEITE & TASSONI, 2002) o afeto é o elemento

fundamental nas relações humanas, o qual está intrinsecamente ligado ao desenvolvimento

cognitivo e social do sujeito, relacionado tanto com experiências consideradas como positivas

quanto com as experiências consideradas como negativas.

Ao se debruçar sobre o estudo do desenvolvimento infantil, Wallon explorou o

desenvolvimento humano de forma integral, isto é, na dimensão cognitiva, afetiva e motora,

não o reduzindo apenas a uma dessas dimensões. Abordou a afetividade com a capacidade

que o ser humano tem de ser afetado pelo meio, que consequentemente potencializa aquilo

que geneticamente já faz parte da sua constituição biológica. Wallon (1975, p.167, apud

ALMEIDA & MAHONEY, 2005, p. 17) destaca que:

A constituição biológica da criança, ao nascer, não será a única lei de seu destino

posterior. Seus efeitos podem ser amplamente transformados pelas circunstâncias de

sua existência, da qual não se exclui sua possibilidade de escolha pessoal... Os meios

em que vive a criança e aqueles com que ela sonha constituem a “forma” que

amolda sua pessoa.

Dessa forma, o desenvolvimento da criança não está ligado somente as

habilidades cognitivas influenciadas pelas estruturas biológicas da qual seu organismo dispõe.

Em sua teoria, Wallon defende que o processo de desenvolvimento humano resulta tanto da

capacidade biológica quanto do meio, que constantemente o afeta de diversas maneiras, em

vários estágios, de acordo com o seu desenvolvimento.

O grande diferencial dessa teoria para pensar o desenvolvimento humano está em

abordar as emoções como fator determinante, pois, segundo ela, as emoções são essenciais já

nos primeiros dias de vida do ser humano, uma vez que é através delas que o ser humano

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expõe suas necessidades mesmo antes de desenvolver a fala. Wallon (1942, p.37, apud

GOMES et al., 2018, p. 7) evidencia que:

(...) o bebê expressa sua insatisfação por meio do choro que de início é sua única

maneira de relacionar-se. Esse choro mobiliza a mãe e ela o interpreta de acordo

com seus valores e significados culturais. A interação entre ambos será responsável

pelo desencadeamento das funções cognitivas da criança.

A emoção pode ser entendida como o primeiro recurso de interação da criança

com o meio social. É definida por Wallon como “a exteriorização da afetividade”. Pode ser

vista como uma linguagem antes da linguagem falada, já que o ser humano se comunica com

o outro desde sua origem pois é geneticamente social.

Para Wallon, as emoções são reações orgânicas, isto é, elas vêm de “dentro para

fora”. É o recurso que liga o orgânico e o social. Ao ser afetada por algo interno (biológico)

ou externo (cultural) a criança vai exteriorizar essa afetividade em forma de emoção. No

decorrer da vida, conforme essa criança vai se desenvolvendo e fortalecendo o vínculo com o

mundo simbólico e cultural, as emoções se complexificam, passando a ser representadas pelo

sentimento, que é a “expressão representacional da afetividade”. No que se refere a esse

desenvolvimento, Wallon (1942, p.40 apud GOMES et al., 2018, p. 8) diz que:

[...] a criança passará por diferentes fases, cuja superação se dará por meio da

vivência de uma ruptura, ou, nas palavras do autor, de uma crise...esse momento de

ruptura é de fundamental importância e deve ser valorizado, uma vez que, tendo

acumulado experiências e desenvolvido outros recursos, em determinado momento o

sujeito necessita haver-se com essas coisas para garantir seu processo de

individualização e autonomização.

A teoria walloniana deixa claro que a afetividade tem um papel determinante em

todas as relações humanas, e quando se trata do processo de ensino e aprendizagem, de acordo

com Wallon, a afetividade deve ser pensada dentro de sala de aula como um recurso

potencializador da aprendizagem, entendendo que a integração entre afetividade e cognição é

fundamental para o desenvolvimento intelectual da criança e também na construção da sua

identidade.

A abordagem dos estudos de Wallon para pensar a dinâmica da afetividade na

Educação Infantil e suas influências na aprendizagem se faz necessária, uma vez que ao

conceber a afetividade como um conceito fundamental de sua teoria, Wallon não negligência

os demais aspectos do desenvolvimento da criança de forma a fragmentar esses aspectos, mas

os trata de forma integral, compreendendo a escola como um ambiente que não deve se

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limitar a transmissão de conhecimento e sim proporcionar formação integral (intelectual,

afetiva e social) da criança.

2.2 Como o desenvolvimento social e intelectual da criança influencia na

construção dos laços afetivos na Educação Infantil

O afeto envolve o ser humano antes mesmo do seu nascimento visto que o bebê

está fisicamente ligado ao organismo da mãe. Eles se afetam simultaneamente, a mãe por

sentir em seu corpo as consequências de estar gerando um bebê, o bebê por ser

constantemente afetado pelo cuidado que sua mãe tem por sua existência, o qual potencializa

as suas disposições biológicas.

Ao saber que está gerando um bebê, é comum que a mãe se empenhe em tomar os

devidos cuidados com o seu corpo, que por um período estimado de nove meses não será mais

exclusivamente seu, mas, também, “a morada de um novo ser”. É por meio dos cuidados que

a mãe tem com a sua saúde, com o seu corpo, que o bebê também é cuidado.

Ao nascer o ser humano se depara com um mundo fisicamente pronto e,

juntamente com esse mundo exterior ao ventre da mãe, ele é envolvido por um meio cultural

em contínua construção que vai influenciar seu desenvolvimento social para a vida inteira.

As relações iniciais do bebê, segundo Wallon (1968;1989, apud LEITE &

TAGLIAFERRO, 2005, p. 249), são de natureza emocional, nas quais o bebê recém-nascido

se comunica com o mundo através de reflexos e movimentos impulsivos (que são limitados

por sua disposição biológica) os quais expressam aquilo que o afeta fisicamente. É esse meio

social no qual o recém-nascido está inserido que interpreta esses estados afetivos de bem ou

mal-estar, dando significado a essas primeiras emoções, as quais tem por consequência um

efeito mobilizador que faz com que as pessoas que estão inseridas nesse ambiente se

mobilizem para assegurar o bem-estar do bebê.

É por meio das emoções básicas que o ser humano, em seus primeiros momentos

de contato com o mundo, expressa as suas necessidades e no decorrer das trocas de afeto entre

o bebê e as pessoas com que ele convive que ele vai se desenvolvendo biológica, social e

psicologicamente.

Dessa forma, as condições orgânicas, em interação com o mundo externo, são

mantenedoras da existência e do desenvolvimento humano, uma vez que o ser humano se

desenvolve na interdependência entre fatores biológicos e sociais.

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Para Wallon não pode haver psiquismo sem um equipamento biológico que o

comporte, por isso ele estuda a criança de forma contextualizada, isto é, pensa a criança

dentro do contexto na qual ela interage e desenvolve.

De forma a elucidar melhor a sua teoria, Wallon demarcou domínios funcionais

(quatro ao todo) os quais a criança percorre durante o seu desenvolvimento, sendo eles: os da

afetividade (afetivo), do ato motor, do conhecimento (cognitivo) e da pessoa.

Ao que diz respeito a esses domínios funcionais Mahoney e Almeida (2005, p.18)

explicam que:

O conjunto afetivo oferece as funções responsáveis pelas emoções, pelos

sentimentos e pela paixão [...]; O conjunto motor oferece a possibilidade de

deslocamento do corpo no tempo e no espaço, as reações posturais que garantem o

equilíbrio corporal, bem como o apoio tônico para as emoções e sentimentos se

expressarem; O conjunto cognitivo oferece um conjunto de funções que permite a

aquisição e a manutenção do conhecimento por meio de imagens, noções, ideias e

representações. É ele que permite ainda registrar e rever o passado, fixar e analisar o

presente e projetar futuros possíveis e imaginários; A pessoa – o quarto conjunto

funcional – expressa a integração em todas as suas inúmeras possibilidades.

Assim, os conjuntos funcionais são de suma importância para se entender o

desenvolvimento humano e atuam como uma unidade organizadora, que ao se relacionarem

entre si desencadeiam a formação da pessoa em sua singularidade. Neste sentido, a pessoa não

é vista por Wallon como algo “acabado”, mas em constante transformação, pois na teoria

walloniana o processo de desenvolvimento é constante.

Por entender o desenvolvimento da criança de forma integral, Wallon não enxerga

a criança como um ser incompleto. A criança precisa ser vista conforme o momento do

desenvolvimento ao qual se encontra. Isto posto, Wallon (2007, p.198, apud ACIOLY-

RÉGNIER & FERREIRA, 2010, p. 27) pontua que:

É contra a natureza tratar a criança fragmentariamente. Em cada idade, ela constitui

um conjunto indissociável e original. Na sucessão de suas idades, ela é um único e

mesmo ser em curso de metamorfoses. Feita de contrastes e de conflitos, a sua

unidade será por isso ainda mais susceptível de desenvolvimento de novidade.

No decorrer de sua teoria, Wallon identifica a existência de cinco estágios que

caracterizam o papel da afetividade diante da dimensão temporal do desenvolvimento

humano, onde em cada um deles há a predominância de um dos conjuntos funcionais listados

anteriormente, ainda que os demais estejam presentes e em constante relação.

Esses estágios são distintos, descontínuos (cada estágio é completo em si), e são

caracterizados pelos diferentes aspectos que diferenciam por idades as atividades e também as

Page 21: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

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habilidades, sendo que a passagem de um estágio para o outro não ocorre de forma linear,

pois não há uma idade fixa para tal, visto que esse desenvolvimento está relacionado com o

contexto no qual a criança está inserida e é constantemente afetada.

Nesse contexto, Wallon (1995, apud GUEDES, 2007, p. 4) afirma que

[...] cada fase constitui, entre as possibilidades da criança e o meio, um sistema de

relações que os faz especificarem-se reciprocamente. O meio não pode ser o mesmo

em todas as idades. É composto por tudo aquilo que possibilita os procedimentos de

que dispõe a criança para obter a satisfação das suas necessidades. Mas por isso

mesmo é o conjunto dos estimulantes sobre que se exerce e se regula a sua atividade.

Cada etapa é ao mesmo tempo um momento da evolução mental e um tipo de

comportamento.

Os cinco estágios são estruturados por Wallon como impulsivo-emocional (0 a 1

ano); sensório-motor e projetivo (1 a 3 anos); personalismo (3 a 6 anos); categorial (6 a 11

anos) e puberdade e adolescência (11 anos em diante).

Como já citado anteriormente, ao propor os estágios de desenvolvimento, Wallon

não se preocupou em definir as idades em que cada estágio acontece, mas focou nas

características de cada um deles, pois entende que a criança já está em desenvolvimento desde

o período em que está sendo gerada no útero da mãe. Entretanto, a dimensão temporal desses

estágios tem seu ponto de início no nascimento.

O primeiro estágio, intitulado de “impulsivo-emocional”, é dividido em dois

momentos: o da impulsividade que tem seu início no nascimento da criança e vai até os 3

meses de idade, e o emocional que vai de 3 meses a 1 ano. Wallon afirma que esse estágio é

[...] predominantemente afetivo, onde as emoções são o principal instrumento de

interação com o meio. A relação com o ambiente desenvolve, na criança,

sentimentos intraceptivos e fatores afetivos. O movimento, como campo funcional,

ainda não está desenvolvido, a criança não possui perícia motora. Os movimentos

infantis são um tanto quanto desorientados, mas a contínua resposta do ambiente ao

movimento infantil permite que a criança passe da desordem gestual às emoções

diferenciadas. (WALLON 2008, p. 119, apud COSTA, 2012, p. 3).

O segundo estágio é o “sensório-motor e projetivo”, que assim como o primeiro

estágio é divido em dois momentos: o sensório-motor que ocorre dos 12 meses aos 18 meses

de idade e o projetivo que vai de 18 meses aos 3 anos de idade. Segundo Wallon, nesse

estágio

[...] a inteligência predomina e o mundo externo prevalece nos fenômenos

cognitivos. A inteligência, nesse período, é tradicionalmente particionada entre

inteligência prática, obtida pela interação de objetos com o próprio corpo, e

inteligência discursiva, adquirida pela imitação e apropriação da linguagem. Os

pensamentos, muito comumente se projetam em atos motores. Surge quando o

Page 22: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

20

movimento deixa de se relacionar exclusivamente com a percepção e manipulação

de objetos. A expressão gestual e oral é caracterizada pelo pensamento como

representação das imagens mentais por meio de ações, cedendo lugar à

representação, que independe do movimento. A atividade projetiva produz

representação e se opõe a ela, permitindo que a criança avance em relação ao

pensamento presente e imediato a simulação e a imitação são imprescindíveis para

novas aprendizagens. A partir deste estágio a criança é capaz de dar significado ao

símbolo e ao signo. (Wallon apud COSTA, 2012, p. 3)

O terceiro estágio é o do “personalismo”, e é para Wallon o estágio decisivo no

desenvolvimento da criança, pois nele a criança se descobre diferente dos outros e aprende

com essa oposição. Esse estágio é voltado, então, para a consciência sobre si e também para a

construção da personalidade,

[...] se estende aproximadamente dos três aos seis anos de idade, é um período

crucial para a formação da personalidade do indivíduo e da autoconsciência. Uma

consequência do caráter autoafirmativo deste estágio é a crise negativista: a criança

opõe-se sistematicamente ao adulto. Por outro lado, também se verifica uma fase de

imitação motora e social. (Wallon 2008, p. 95, apud COSTA, 2012, p. 3-4)

O quarto estágio é o “categorial”. Neste estágio as categorias mentais da criança

são formadas e consequentemente o poder de abstração da mente é ampliado, onde a

diferenciação entre si mesmo e o outro fica mais nítida. Wallon (2008, p.96 apud COSTA,

2012, p. 4) pontua que:

... a criança começa a desenvolver as capacidades de memória e atenção voluntárias.

[...] Se formam as categorias mentais: conceitos abstratos que abarcam vários

conceitos concretos sem se prender a nenhum deles. No estágio categorial, o poder

de abstração da criança é consideravelmente amplificado. Provavelmente por isto

mesmo, é nesse estágio que o raciocínio simbólico se consolida como ferramenta

cognitiva.

O quinto e último estágio do desenvolvimento infantil é o da puberdade e

adolescência, que está compreendido dos 11 anos em diante, onde

A criança começa a passar pelas transformações físicas e psicológicas da

adolescência. É um estágio caracterizadamente afetivo onde passa por uma série de

conflitos internos e externos. O grande marco desse estágio são a busca de

autoafirmação e o desenvolvimento da sexualidade (WALLON, 2008, p. 123, apud

COSTA, 2012, p. 4).

Ainda que na teoria walloniana sejam descritos esses cinco estágios, Wallon deixa

claro que o desenvolvimento não se encerra no estágio da adolescência, já que durante toda a

sua existência o indivíduo encontra-se em constante interação com o ambiente onde todas as

Page 23: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

21

vezes que ele é afetado por algo novo ele busca adaptação e com isso aprende. Nesse meio, a

afetividade e a cognição estão em constante dialogicidade, proporcionando uma aprendizagem

mais ampla.

Como vimos, sob a ótica da teoria walloniana, as interações com o meio são

essenciais no desenvolvimento social e intelectual da criança, uma vez que ao interagir e

aprender com o novo que é apresentado culturalmente desde seu nascimento, ela vai se

desenvolvendo e consequentemente obtendo conquistas no plano da inteligência.

É fato que as experiências afetivas na vida das crianças se iniciam no ambiente

familiar, onde elas são envolvidas e afetadas por toda dinâmica de vida da sua família e todos

que as cercam, onde os cuidados dos pais, os limites que são impostos por eles, a forma como

interagem culturalmente entre si e com o mundo, influenciam diretamente na forma como elas

constroem seus laços afetivos.

Nesse contexto, é necessário ressaltar a importância do ambiente escolar no

desenvolvimento social e intelectual da criança, pois ao interagir com os professores e outras

crianças, que estão imersas em outros saberes e outras vivências, que estão para além daquilo

que a criança já tem contato no ambiente familiar, no qual já está inserida e aprendendo

diariamente, o seu desenvolvimento social e intelectual é potencializado.

Sendo assim, a inserção da criança na escola, em uma turma da Educação Infantil,

proporciona inúmeras oportunidades que potencializam o seu desenvolvimento, pois é um

ambiente repleto de diversidades onde ao conviver e ser afetado pelo outro que é diferente, a

criança aprende e se devolve em meio aos conflitos produzidos pelo até então desconhecido.

2.3 A construção dos laços afetivos entre os professores e as crianças na

Educação Infantil

A escola exerce um importante papel no desenvolvimento da criança, pois é um

ambiente culturalmente diverso e que pode oferece várias possibilidades de aprendizagem.

Na escola, as relações de ensino e aprendizagem são atravessadas por diferentes

experiências de afetividade que podem potencializar não só a construção de conhecimento

científico e sistematizado, mas, também, proporcionar uma formação mais integradora de seu

desenvolvimento. No entanto, se essas experiências tiverem uma conotação de rigoroso

desprazer e opressão podem interferir negativamente nessas relações.

Page 24: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

22

Ao que diz respeito à Educação Infantil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional afirma que:

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o

desenvolvimento integral da criança até 5 (cinco) anos de idade, em seus aspectos

físicos, psicológicos, intelectual e social, complementando a ação da família e da

comunidade (BRASIL, 1996, art. 29).

Ainda que as crianças iniciem suas primeiras experiências afetivas no convívio

com suas famílias, é a partir do momento que elas estão inseridas no ambiente escolar, com

outras crianças, que tais experiências são potencializadas tornando-se mais significativas. As

relações afetivas estabelecidas no âmbito da Educação Infantil são essenciais no

desenvolvimento das crianças, por isso a escola tem um papel fundamental nesse processo.

Como pontua Vygotsky (1998) a aprendizagem sempre inclui relações entre

pessoas, pois ao analisarmos a sala de aula, podemos compreender que além das crianças

estarem em constante interação com conhecimento científico apresentado pela professora no

decorrer das aulas, estão se relacionando com outros indivíduos que trazem de casa saberes

diversificados, ou seja, cada criança que compõe uma turma de Educação Infantil traz de casa

aprendizagens baseadas nas suas experiências de vida, que no convívio diário influenciam na

aprendizagem das outras crianças.

Como vimos, o ser humano passa por um processo de amadurecimento que é

biológico e individual do organismo. Mas para Vygotsky (1984, apud KOHL, 2010, p. 58) é o

aprendizado que desperta esse desenvolvimento interno no organismo, onde as forças do

ambiente e da cultura são essenciais nesse processo de desenvolvimento cognitivo, por isso,

na teoria vygotskiana, o papel do outro é fundamental.

Nesta perspectiva, Vygotsky formula o conceito de “Zona de Desenvolvimento

Proximal” que é a distância entre aquilo que a criança já sabe (nível de desenvolvimento real)

e aquilo que a criança pretende alcançar com a mediação (nível de desenvolvimento

potencial). Logo, a Zona de Desenvolvimento Proximal é definida por Vygotsky como o

“caminho que o indivíduo vai percorrer para desenvolver funções que estão em processo de

amadurecimento e que se tornarão funções consolidadas, estabelecidas no seu nível de

desenvolvimento real” (KOHL, 2010, p. 62). Ou seja, é o espaço de intervenção onde para

alcançar uma aprendizagem potente a criança precisa do auxílio de alguém.

Dessa forma, tanto as crianças quanto os professores são mediadores sociais

importantes na construção dos laços afetivos no contexto de uma turma de Educação Infantil,

uma vez que a aprendizagem fomenta o desenvolvimento da criança e o aprendizado cria a

Page 25: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

23

zona de desenvolvimento proximal, que por sua vez desperta os processos internos de

desenvolvimento da criança, que ao aprender em contato com o outro, aquilo que

internamente está se desenvolvendo fica em evidência e ao serem auxiliados no processo de

aprendizagem vão se desenvolvendo.

O papel do professor mediador nesse processo de aquisição de conhecimento é

potencializar a aprendizagem agindo naquilo que está em desenvolvimento na criança, não no

que já está consolidado e nem no que ainda não foi iniciado, pois o aprendizado se tornará

efetivo se levado em conta a zona de desenvolvimento proximal. Por isso, o papel do

professor como um mediador afetivo consiste em promover através das suas práticas

pedagógicas atividades que colaborem para uma aprendizagem prazerosa e significativa que

impulsione o desenvolvimento intelectual e também social das crianças.

A partir do momento que fora da escola as crianças interagem de forma distinta

com o mundo, elas possuem conhecimentos heterogêneos, que muitas das vezes são

desconhecidos pelas outras crianças. Logo, podem ser mediadoras uma das outras na sala de

aula diante das diversas atividades propostas pela professora no seio das relações afetivas que

são desencadeadas no processo educativo.

A escola se constitui, então, como um espaço que pode ser caracterizado como

“mediador do conhecimento” onde para haver conhecimento é necessário haver uma relação

de afeto entre professor/crianças, criança/professor e criança/criança, que possibilite a

aquisição de conhecimentos e enriqueça as relações de ensino e aprendizagem, já que para

Vygotsky, a criança se desenvolve no contato com o outro.

Page 26: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

24

3 OS AFETOS QUE ME MOVEM A APRENDER: AFETIVIDADE E

APRENDIZAGEM

3.1. O professor e a criança: influenciando e sendo influenciado

Durante o convívio diário entre crianças e professoras muitas coisas acontecem,

muitas experiências são vividas e muitos saberes são compartilhados.

No ano de 2018, em um período de 75 horas, tive a oportunidade de acompanhar

bem de perto, por meio da PPE I (Pesquisa e Prática de Ensino I) que corresponde ao estágio

supervisionado na Educação Infantil, uma turma multisseriada, composta por alunos do

terceiro segmento do Maternal (Mat-III) e do primeiro segmento da Pré-escola (Pré-I).

Essa experiência foi de tal forma significante para mim que optei, como parte da

metodologia neste trabalho, fazer do meu campo de estágio na PPE I uma parte do campo de

pesquisa do meu trabalho de conclusão de curso. As questões que envolvem a afetividade no

processo de aprendizagem sempre me despertaram muita atenção e interesse, e eu pude

perceber que a minha experiência de estágio na Educação Infantil me oferecia um importante

material de análise. Por este motivo, pensei na possibilidade de construir um diálogo entre a

pesquisa que venho desenvolvendo e minhas observações participantes realizadas naquele

período de estágio.

No período em que permaneci na escola meu olhar já se voltada para as interações

entre as crianças e entre as crianças e as professoras, e como as relações de afeto mediavam

essa relação. Eu mesma vivi momentos bastante potentes em que me vi mediadora no

processo educativo das crianças daquela escola.

Por meio das minhas anotações em meu diário de campo, e de fragmentos do

relatório que elaborei, percebi que meus registros do período de estágio me permitiam uma

oportunidade de realizar análises que hoje considero foram fundamentais para o recorte do

objeto desta pesquisa, ou seja, a análise das a relações afetivas no âmbito de uma turma de

Educação Infantil.

Lidar com o “novo” requer muita coragem. O novo é “amedrontador”, pois é

“confrontador”, mas também é “impulsionador”, pois provoca a curiosidade. Trago essa

afirmativa pautada naquilo que senti ao passar pelos portões da escola nos dias de estágio,

onde “[...] fui confrontada por diversas dúvidas e situações nunca antes vividas. Em muitos

momentos tive medo e a sensação de estar fazendo tudo errado. (SANTANA, 2018, p.23).

Page 27: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

25

Mas por outro lado, fui movida pelo afeto que me alcançava a todo instante em tudo que os

meus olhos conseguiam vislumbrar durante minha permanência e vivência da dinâmica no

interior da escola, mais restritamente na sala de aula.

Assim, o medo se transformou em “movimentos de afetos”, melhor dizendo, os

afetos que se moviam nas relações que aconteciam no decorrer das aulas me moviam a

aprender sobre tudo que acontecia ao meu redor, principalmente na forma como as crianças

interagiam juntamente com sua professora com tudo que estava disponível no ambiente

escolar.

No decorrer dos dias compreendi que a sala de aula de uma turma de Educação

Infantil é intensamente rodeada de afetos, posso dizer que o afeto é o componente principal

das relações das crianças com tudo a sua volta, principalmente com o aprendizado.

A todo o momento, no decorrer da dinâmica das aulas, as crianças passeavam com

seus olhares atentos e curiosos em busca de algo que as “tocassem” e lhes “ganhassem” a

atenção. Posso então dizer, que os olhinhos atentos e curiosos das crianças caminhavam pela

sala em busca de experiências.

De acordo com LARROSA (2002, p.21) “A experiência é o que nos passa, o que

nos acontece, o que nos toca [...]”. Por isso, é importante que o professor tenha um bom

relacionamento com as crianças e aprenda com o saber da experiência.

Essa experiência de aprendizagem que acontece por “aquilo que nos passa”, por

atravessamentos, podem chegar à criança por intermédio do acolhimento, do cuidado,

impulsionando-a a viver experiências às vezes prazerosas, às vezes não tão prazerosas, mas

que podem resultar em aprendizagens potentes.

É importante destacar que “a experiência que nos passa” pode significar uma

experiência de conhecimento e não somente uma mera transferência de informação.

Experiência de saberes que dialogam diretamente com a pesquisa que aqui realizamos sobre

como as relações de afetividade dialogam com um “saber para a experiência”.

(...) talvez nos falte um saber para a experiência. Um saber que esteja atravessado

também de paixão, de incerteza, de singularidade. Um saber que dê um lugar a

sensibilidade, que esteja de alguma maneira incorporado a ela, que tenha corpo. Um

saber, além do mais, atravessado de alteridade, alterado e alterável. Um saber que

capte a vida, que estremeça a vida. (LARROSA, 2011, p. 26).

Saber que tem relação com aprendizagem, uma aprendizagem mediada pelos

afetos. Aprendizagem mediada pela sensibilidade, por um saber que se desdobra em

Page 28: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

26

descoberta e que tão bem percebemos na forma como as crianças manipulam os objetos a sua

volta, como elaboram seus “por quês” motivados pela curiosidade, como fantasiam, como

criam seus “faz-de-conta” e constroem linguagem com as outras crianças.

[...] aprender é um processo que pode deflagrar no aprendiz uma curiosidade

crescente, que pode torná-lo mais e mais criador. Quanto mais criticamente se

exerça a capacidade de aprender, mais se constrói e desenvolve a curiosidade do

educando e essa curiosidade é despertada quando o aluno gosta da escola e se sente

bem em sala de aula. (FREIRE, 2005 apud SANTANA, 2018, p.23)

Quando a criança chega na escola, pela primeira vez, muitas coisas ainda não

fazem sentido, pois a escola representa para ela um mundo desconhecido, uma vez que era no

seio de sua família que ela vivia as mais intensas e diversificadas relações, onde para cada

uma delas havia um significado, que era entendido de acordo com a forma que sua família

interagia culturalmente com o mundo. Por isso,

[...] a criação de laços afetivos entre professor e aluno é essencial nessa etapa da

educação, visto que, a criança está tendo seus primeiros contatos com a escola, e

necessariamente precisa se sentir segura e acolhida, de modo que crie um significado

no ambiente escolar e nas práticas realizadas pelo professor. (SANTANA, 2018,

p.24)

Quando a criação de laços afetivos potentes não é construída de forma

significativa na sala de aula, isso pode influenciar na adaptação da criança no ambiente

escolar e também na forma com que ela lida com o conhecimento compartilhado no decorrer

das aulas.

Umas das primeiras coisas que eu identifiquei desde os primeiros momentos que

tive contato direto com a turma e toda dinâmica que a envolvia, foi que a professora e as

crianças não tinham construído um laço afetivo intenso e potente, pois as crianças “[...] não

possuíam um bom relacionamento com a professora regente. E isso consequentemente

influenciava no comportamento delas em sala de aula, fazendo com que elas não tivessem

interesse em realizar as atividades e até mesmo em não querer permanecer em sala de aula”.

(SANTANA, 2018, p.23).

A conduta da professora no que diz respeito à adaptação das crianças, em seus

primeiros momentos na escola, não estava sendo compreendida pelas crianças, tanto que elas,

em sua maioria, não demonstravam interesse em muitas das atividades propostas e sempre

buscavam algo no ambiente para interagir.

Page 29: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

27

Percebi que esse comportamento das crianças, por diversas vezes, causava um

desconforto para a professora que, em certos momentos, não conseguia reverter a situação, e

acionava a direção da escola, que em alguns casos buscava até mesmo a intervenção dos pais.

A vida afetiva, como a vida intelectual é uma adaptação contínua e as duas

adaptações são, não somente paralelas, mas interdependentes, pois os sentimentos

exprimem os interesses e os valores das ações, das quais a inteligência constitui a

estrutura. (PIAGET, 1971, p.271 apud SANTANA, 2018, p.23)

O processo de adaptação das crianças na escola não está estritamente voltado para

o conhecimento. “Para Piaget o desenvolvimento intelectual compreende-se em afetivo e

cognitivo, isto é, [...] afetividade e aprendizagem não se separam.” (SANTANA, 2018, p.23).

Uma criança que não se sente parte do ambiente escolar, consequentemente não vai se

relacionar de forma prazerosa com o que é trazido pela professora nas aulas, porque se ela não

tiver prazer em estar na sala de aula, automaticamente ela não vai ter a aprendizagem como

algo significativo e prazeroso.

A aprendizagem que não nos afeta, não passa de informação. Para Larrosa (2002,

p. 22) “A informação não é experiência”, a experiência diz respeito à paixão, com o que nos

passa. O que se difere de conhecimento. Logo, podemos ter contato com diversos saberes e

mesmo assim não ter tido nenhuma experiência.

Os dias foram passando e fui tendo a confirmação do que eu já havia observado

que foi a influência das práticas da professora na interação das crianças nas aulas. Enquanto a

professora não buscou adaptar suas práticas pedagógicas, com o que para as crianças era um

caminho interessante e prazeroso para aprenderem, as aulas não fluíam.

Assim como as práticas da professora influenciavam os alunos, a forma como as

crianças lidavam de forma negativa com aquilo que era apresentado a elas também

influenciava a professora, que nesse caso, enxergou a necessidade de modificar a forma como

ela apresentava o conhecimento para as crianças. O que antes era só transferência de

informações, começou a se transformar em experiências potentes, em saber de experiência.

Nessa dinâmica de conflito na relação entre a professora e as crianças, consegui

observar os afetos que moviam cada uma delas a aprender. Tudo aquilo que as conduziam às

memórias afetivas, o que elas viviam fora dos muros da escola era o que elas mais achavam

interessante, pois se viam representadas naquilo que a professora estava ensinando e logo

viam significado.

Page 30: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

28

As expressões “Meu pai faz isso, tia!”; “Lá em casa tem um brinquedo desse!”;

“Minha vó me ensinou isso quando a gente foi na roça!”; “Eu já vi isso no desenho!”; “Ih,

tia!; Isso já aconteceu lá em casa!”; “Ah! Eu já sei isso!”; dentre outras, demonstravam o

quão próximo as crianças estavam do conteúdo que estava sendo ensinado.

Nos olhares de cada uma eu conseguia ver o prazer de uma aprendizagem que

perpassava a experiência das crianças e se transformava em saber de experiência, uma vez

que, através das aulas, as crianças relembravam suas experiências e viviam outras

experiências que envolviam agora, o conhecimento apresentado pela professora.

A professora era constantemente afetada pelas crianças e influenciada nas suas

práticas pedagógicas, o que a conduzia nas elaborações das aulas, na ludicidade com que ela

tratava os assuntos trabalhados e até mesmo na organização física da sala de aula. As aulas

que anteriormente eram pensadas pela professora somente como uma transferência de

informações e cumprimento de cronograma escolar, ganharam um novo sentido quando

passaram a ter como protagonista os interesses das crianças.

As crianças eram diretamente influenciadas pela forma como a professora dava

devida atenção a quem elas eram e o que elas representavam na sala de aula. Quando os

conteúdos não “conversavam” com elas, a falta de interesse era notória e a permanência na

sala de aula era algo que causava muito conflito.

Quando a dinâmica das aulas era vista pelas crianças como “chata e sem sentido”

fazia com que o comportamento delas se mostrasse contrário aos objetivos propostos pela

professora. Mas, quando as aulas passaram a ser pensadas a partir daquilo que era potente

para elas, paralelamente ao interesse delas, a influência do prazer em participar das aulas

transparecia em seus comportamentos.

Logo, percebemos que a influência dentro de uma sala de aula de Educação

Infantil é mútua. Nos “movimentos dos afetos” o professor e as crianças vão interagindo com

o ambiente e o conhecimento.

Essa interação com o ambiente físico e com outros sujeitos (professores, equipe

pedagógica, crianças) vai permitindo a criança construir conhecimentos. Conhecimentos que

não se limitam a um conjunto de saberes sistematizados (científicos) mas que se estabelecem,

também, por meio de diferentes trocas sociais. Por exemplo, brincando as crianças, aprendem

e negociam regras sociais, aprendem o sentido do respeito, da solidariedade, do

companheirismo, das consequências da verdade e da mentira. Não apenas conhecimentos

científicos podem sem aprendidos na escola como também conhecimentos sociais.

Page 31: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

29

3.2. A escuta sensível de uma professora

Quando cheguei na turma, a primeira reação das crianças foi a de conversar comigo

de querer saber tudo sobre mim. Uma das perguntas feitas por elas nesse primeiro

contato foi: “Tia, você gosta de criança?”.[...] Essa pergunta me fez refletir durante

todo estágio, pois, através dela, percebi que essas crianças buscavam alguém que as

escutassem, que desse valor a criancice delas, que compreendessem o que elas

“queriam dizer mesmo não dizendo” ( SANTANA, 2018, p. 24).

O diálogo é fundamental em uma relação, pois através dele se exterioriza aquilo

que se sente, que se passa, que nos afeta. E quando o diálogo acontece sem as palavras é

necessário escutar o silêncio, desenvolver uma escuta sensível e ficar atento aquilo que não é

audível.

A minha chegada à sala de aula despertou uma grande curiosidade nas crianças

onde a primeira reação delas foi de construir um diálogo, iniciar uma conversa onde elas

conseguissem entender o que eu estava fazendo ali, no espaço delas. Muitas vieram até mim e

me encheram de perguntas, porém, outras optaram por um diálogo silencioso, onde as

palavras eram ditas através do brilho do olhar, das expressões faciais curiosas e até mesmo de

um sorriso no canto da boca, que era timidamente escondido por uma chupeta.

No momento que fui abordada percebi que, para além do que eu representava para

elas, havia a necessidade de que eu as compreendesse e estivesse disposta a entender o mundo

delas. A expressão “Tia, você gosta de crianças?” me disse muita coisa. Posso reescrevê-la

como “Tia, você está disposta a nos escutar e nos entender?” e isso fez todo sentido para mim,

porque entendi que para construirmos uma boa relação era necessário que o nosso diálogo

fosse acolhedor e que eu as escutasse independente se fosse com ou sem o uso da palavra.

Ao escutá-las nos aproximamos. Algumas me contaram sobre o nome dos pais,

quantos irmãos tinham, quanto tempo faltava para a hora do recreio, que segundo eles,

demorava muito, mas a merenda era legal, porque às vezes eles comiam fruta, iogurte e

também podiam correr, e outras diziam que estavam com sono porque chegavam muito cedo

na escola. Cada uma tinha algo para me dizer, enquanto eu era só “escuta”.

Nessa dinâmica da escuta, entendi que escutar é conectar-se com aquilo que o

outro está sentindo, é valorizar aquilo que o outro traz, aquilo que o outro é. Através da escuta

nos conectamos, nos afetamos, nos conhecemos.

Após ser recepcionada pelas crianças de forma tão afetiva, comecei a observar

como era importante para o aprendizado das crianças serem escutadas pela professora durante

Page 32: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

30

as aulas. Presenciei muitos conflitos quando a insatisfação ou o silenciamento tomava conta

da sala de aula.

Freire (1996 apud SANTANA, 2018, p. 24) diz que a aprendizagem “[...] exige

disponibilidade ao diálogo, o que implica saber escutar, pois é escutando os alunos que

aprendemos a falar ‘com ele’, e não apenas ‘para eles’”. Por isso, que uma escuta sensível é

necessária em uma turma de Educação Infantil, pois, em todo tempo as crianças buscam se

comunicar e expressar aquilo que faz cada um ser quem é, ou seja, buscam se fazer

conhecidos.

É importante ressaltar, que a escuta permite que a professora conheça a criança,

possibilitando que ela tenha acesso ao mundo dela e consiga entender a forma como ela se

envolve com o conhecimento, de forma a impulsioná-la na busca por uma aprendizagem

potente e prazerosa que é muito importante para o desenvolvimento integral do aluno durante

sua permanência na escola.

Escutar é obviamente algo que vai mais além da possibilidade auditiva de cada um.

Escutar,[...] significa a disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta

para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do outro. Isto não

quer dizer, evidentemente, que escutar exija de quem realmente escuta sua redução

ao outro que fala. (FREIRE, 1996, p. 75).

A escuta sensível de uma professora é uma forma de potencializar os

“movimentos dos afetos” na interação das crianças no ambiente da sala de aula, sendo uma

oportunidade da criança se enxergar como um sujeito participativo e importante e que não

está paralelo ao conhecimento, mas é o protagonista dele.

Page 33: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

31

4 COMPREENDENDO AS RELAÇÕES DE AFETO EM UMA ESCOLA DE

EDUCAÇÃO INFANTIL: O UNIVERSO AFETIVO “NARRADO” NOS DIÁLOGOS

E NAS BRINCADEIRAS ENTRE AS PROFESSORAS E AS CRIANÇAS

No primeiro dia de estágio eu cheguei à escola muito preocupada com o que eu

poderia encontrar na sala de aula. Confesso que foi um dos momentos mais

encantadores que vivi nesses quase três anos cursando pedagogia. A porta foi aberta.

A diretora me apresentou para turma. E, todos os olhares que segundos antes

estavam atentos ao vídeo (que estava sendo passado no celular da professora) se

voltaram para mim. Optei por sentar no fundo da sala, para poder ter uma visão

geral de tudo que estava acontecendo naquele ambiente. Porém, não permaneci mais

de dois minutos sentada sem interagir com ninguém. Com a minha presença, todos

os alunos (treze ao todo) ficaram curiosos em querer saber quem era eu. Enquanto a

professora recortava a atividades que posteriormente foi passada, eles se

organizaram e começaram a “sessão entrevista”. E, um por um perguntaram: “Oi tia!

Tudo bom? Qual é o seu nome? Você tem marido? Tia, você gosta de criança? Qual

é nome da sua rua? Você tem filhos? Qual é o nome da sua mãe? O que você está

fazendo aqui? Que dia você vai embora? Vai voltar que dia? Tia, você é bonita! Eu

te amo! Você me ama também?”. Foi um momento muito divertido, eles me

receberam tão bem, de uma forma tão carinhosa e engraçada, que todo medo e

preocupação pré-estágio foi embora. (SANTANA, 2018, p.11)

A minha chegada na sala de aula trouxe movimento para o ambiente. Quando a

porta foi aberta, um mundo que até então estava fechado para mim, teoricamente, se abriu,

materializou-se e se colocava a disposição para que eu aprofundasse naquilo que para mim era

“novo”.

Através dos olhares curiosos das crianças que se voltaram para mim desde o

momento que entrei na sala, pude enxergar que eu era a “novidade do dia” e que a minha

presença tinha atravessado a rotina deles, de maneira que para se sentirem seguros, buscaram

saber tudo sobre mim, através de variadas e criativas perguntas.

Até então, eu ainda não tinha tido contato com a professora, mas desde o primeiro

momento na sala de aula, ela me deu a liberdade de interagir com as crianças durante as

atividades propostas por ela, o que, consequentemente, possibilitou um primeiro contato

potente com as crianças onde cada uma delas teve a oportunidade de saber tudo que queriam

sobre mim, na tentativa de se sentirem aceitos e próximos a mim.

Nessa dinâmica, de me conhecer e se fazerem conhecidos, compreendi que não foi

só a porta da sala de aula que foi aberta para mim, mas também a porta do “mundo das

crianças”, o mundo que cada uma delas fazia parte e interagia uns com outros a partir dele.

A começar desse momento, eu estava imersa em um mundo novo, onde as

experiências afetivas eram constantes e intensas a cada movimento que as crianças faziam, ou

Page 34: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

32

seja, nos movimentos dos afetos, as crianças iam se relacionando e construindo

conhecimentos.

Os dias foram passando e a cada movimento das crianças eu conseguia perceber

que a forma de cada uma expressar suas emoções era singular e por vezes girava em torno de

conflitos. Percepção que, de acordo com a teoria walloniana, me fez lembrar que é

aproximadamente neste período que a criança está passando pelo estágio do “personalismo”

no qual os conflitos são intensos, e que ela vai tomando consciência de si como sujeito social,

isto é, vai construindo sua personalidade.

Assim, por meio dos conflitos, as crianças também aprendiam umas com as outras

e iam a todo tempo deixando suas marcas no ambiente escolar e também nos colegas de

classe. Houve momentos em que me vi como mediadora em meio aos conflitos, no quais o

diálogo em todos eles, foi um importante instrumento de mediação, que propiciava a retomada

do diálogo entre as crianças da turma e também potencializava as aprendizagens que foram

geradas através deles.

Esse dia foi muito complicado. No início da aula, dois alunos (um do maternal III e

o outro do Pré I) entraram em conflito. No momento as crianças ficaram muito

inquietas, pois o aluno da pré I estava muito agressivo e gritando muito. Com o

objetivo de entreter o restante dos alunos, enquanto a professora tentava acalmar o

aluno com comportamento agressivo, os fiz questionamentos, do tipo: “Vocês

dormiram bem hoje? Como vocês estão? Como vieram para escola hoje?”. E eles

atentos me responderam, compartilhando como tinha sido o dia deles até a chegada a

escola. Percebi que a professora não estava conseguindo acalmar o aluno. Perguntei

a ela se eu podia tentar. Com a confirmação, fui falar com ele. Confesso que tive um

pouco de medo, me senti despreparada, mas, resolvi arriscar. Segurei-o pelas mãos e

disse: “Vai ficar tudo bem! Deixa a tia ajudar você um pouquinho? ”. Olhei bem

fixamente nos olhos dele e o questionei: “O que está acontecendo? Não precisa ficar

bravo, todo mundo aqui gosta de te ver feliz, inclusive o seu amiguinho (nesse

momento falei o nome do aluno que estava brigando com ele)! O que você mais

gosta de fazer? ”. Ele respondeu que gostava de assistir desenho de dinossauros.

Nisso, peguei o caderno de desenho dele e juntos desenhamos um dinossauro

andando de skate, conforme estava desenhado na blusa que ele estava vestido. Nesse

tempo, a professora estava interagindo com a turma através de músicas.

(SANTANA, 2018, p. 12-13)

É importante mais uma vez ressaltar o papel da escuta sensível na dinâmica da

sala de aula de Educação Infantil, visto que nesse período as crianças estão aprendendo a lidar

com as suas emoções, seus sentimentos, tentando a todo momento se individualizarem dos

outros colegas, o que causa as “crises de oposições”, assim como a que foi retratada acima,

onde duas crianças entraram em conflito na busca por se afirmarem um perante ao outro.

Page 35: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

33

Para Wallon (1956/1975, p.158 apud ALMEIDA, 2014, p.598) as crianças que

estão passando por esse estágio “[...] em todas as coisas pretende afirmar uma posição

pessoal, nem que seja para contradizer a posição assumida por outros. É afinal a época em

que, deixando de designar-se na terceira pessoa emprega, por vezes com ostentação, os

pronomes: Eu sujeito e Eu complemento.”. Por isso, o diálogo e a escuta se fazem importante

nessas interações entre as crianças e as professoras.

As brincadeiras são muito presentes no cotidiano das crianças, não estando

limitadas somente ao entretenimento das crianças, mas também como um importante

potencializador de aprendizagem, visto que o desenvolvimento cognitivo das crianças

pertencentes a Educação Infantil se faz muito no brincar, na interação com o brinquedo e com

as demais crianças da sala de aula, porque “[...] o brinquedo também cria uma zona de

desenvolvimento proximal na criança, tendo enorme influência em seu desenvolvimento

[....].” (KOHL, 2010, p.68). Além disso, quando interagem e brincam uma com as outras

potencializam o desenvolvimento de habilidades e atitudes na vida social como, por exemplo,

o cuidado nas relações com o outro, o respeito, a responsabilidade e também a atenção.

Nesse dia, as crianças estavam muito agitadas. A professora teve muita dificuldade

para iniciar a aula. A temática da semana foi “Os órgãos dos sentidos”. Para

introduzir esse tema, a professora passou o vídeo do conto da “Chapeuzinho

Vermelho” e as crianças gostaram muito, a ponto de assisti-lo duas vezes. Após o

vídeo, a professora através de imagens, explicou para a turma sobre os órgãos dos

sentidos, e em seguida iniciou a dinâmica da caixa. Onde, ela vendou as crianças, e

uma de cada vez colocou uma das mãos dentro da caixa, e tentava adivinhar o que

havia dentro dela. Foi muito divertido. Terminada a dinâmica as crianças foram para

o intervalo. Na volta, retomamos a atividade. A atividade passada foi de colorir os

órgãos dos sentidos, com giz de cera. De acordo com que as crianças iam

terminando as atividades, eram liberadas para brincar com alguns brinquedos que

estavam espalhados pelo chão da sala. No momento da brincadeira, um grupo de

quatro meninos da turma resolveu brincar de “navio pirata”. Porém, a sala possui um

espaço muito limitado para esse tipo de brincadeira. Começaram então, a correr pela

sala. Eu estava no canto da sala, brincando e conversando com três crianças do

Maternal III e uma do Pré I, quando de repente, o grupo veio em minha direção.

Nisso, o aluno da Pré I pulou na minha frente e disse: “Cuidado com a tia, não

machuca ela! Vão brincar pra lá!”. O agradeci pela proteção e conversei com os

meninos sobre a brincadeira, e que se eles continuassem, eles poderiam se machucar

ou machucar alguém, já que, a sala é muito pequena. Eles não gostaram muito da

ideia, mas, um tempo depois mudaram de brincadeira. (SANTANA, 2018, p. 13-14)

Através de suas interações com outros indivíduos culturalmente diferentes na sala

de aula, é possível afirmar que desde muito cedo as crianças mantêm relações de aprendizado

e desenvolvimento, que com o tempo vão se fortalecendo e influenciando afetivamente no seu

desenvolvimento e também no comportamento das demais crianças que interagem juntamente

Page 36: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

34

com ela, que passam a ser representadas no brincar, onde a criança cria um “imaginário” que

é um mundo próprio dela.

No início da idade pré-escolar, quando surgem os desejos que não podem ser

imediatamente satisfeitos ou esquecido, e permanece ainda a característica do

estágio precedente de uma tendência para a satisfação imediata de desejos, o

comportamento da criança muda. Para resolver essa tensão, a criança em idade pré-

escolar envolve-se num mundo ilusório e imaginário onde os desejos não realizáveis

podem ser realizados [...] (VYGOTSKY, 2003, p.122)

O mundo ilusório ou imaginário do qual trata Vygotsky é o que ele denomina

brinquedo. Como foi o caso da brincadeira de “navio pirata” realizada pelas crianças em um

momento específico na sala de aula, onde através da imaginação, as crianças desenvolveram o

seu próprio brinquedo para satisfazerem de forma fantasiosa o desejo de por um momento se

tornarem “piratas a bordo de um navio”.

Nos movimentos dos afetos busquei a todo o momento ter uma troca com essas

crianças. Não somente de experiências, mas também de aprendizado. Aprendemos muito

juntos. Imaginamos, brincamos, sonhamos e também solucionamos muitos problemas de

formas bem divertidas.

A imaginação nos conduziu a todo tempo. Vencemos aranhas gigantes,

sobrevoamos a um vulcão em erupção e até nascemos de um ovo de dinossauro. O ambiente

da sala de aula era até pequeno, mas a imaginação não tinha medida. Atravessavam os muros

da escola e por vezes viravam até poesia.

Fui “ouvido” e fui “ouvida”.

Enquanto “ouvido” fui aprendiz e quando “ouvida” ensinei.

Com sensibilidade me permiti embarcar no “navio dos piratas” carregado de afeto,

de imaginação e de saberes, o qual teve como condutora a curiosidade e como tripulantes eu e

as crianças.

Fui privilegiada, fui abraçada, fui afetada.

Construímos uma relação muito bonita no decorrer do tempo. Um laço de

confiança e de parceria que abrangeu não somente as crianças, mas também as professoras. E,

isso influenciou diretamente na interação deles comigo.

Ser tripulante desse navio enquanto navegantes no universo afetivo e do saber, me

levou a entender para além do que a teoria me permitiu um dia saber.

Os afetos que se moveram durante o período que pude observar o cotidiano

escolar dessas crianças, me permitiram narrar momentos que jamais esquecerei, os quais

trouxeram clareza a questionamentos que deram origem a esta pesquisa.

Page 37: OS MOVIMENTOS DOS AFETOS: AFETIVIDADE E APRENDIZAGEM …

35

CONCLUSÃO

“ Trago dentro do meu coração

Como num cofre que se não pode fechar de cheio,

Todos os lugares onde estive,

Todos os portos a que cheguei,

Todas as paisagens que vi através

De janelas ou vigias,

Ou de tombadilhos, sonhando,

E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que quero...”

(Fernando Pessoa)

A inquietação acerca dos afetos que se movimentam na nossa interação com o mundo

sempre encheu o meu coração, sendo um dos motivos que potencializaram o meu

envolvimento com a minha pesquisa.

Optar por trilhar o caminho do afeto foi, sem dúvida, um grande desafio que, por

vezes, me tiraram da zona de conforto, porém, foi o caminho mais significativo para mim,

pois sempre acreditei que não tem como pensar a Educação Infantil sem pensar na potência

dos afetos que se movimentam na sala de aula, visto que na interação com o mundo e com o

outro sempre aprendemos e ensinamos algo, deixando marcas uns nos outros.

Partindo das importantes contribuições teóricas de Wallon e Vygotsky, todos os

objetivos propostos inicialmente na pesquisa foram alcançados. Logo, foi possível

compreender a relação afeto e aprendizagem das crianças na Educação Infantil, analisar o

conceito de afetividade, como também, identificar como os laços de afetividade entre crianças

e professores são construídos no ambiente da Educação Infantil.

Sendo assim, foi possível entender que a influência dentro de uma sala de aula de

Educação Infantil é mútua, onde nas interações afetivas, o professor e as crianças vão

interagindo com o ambiente e o conhecimento, vivenciando experiências significativas que

promovem o “saber de experiência”, e quando o professor ao fazer uso de uma escuta sensível

auxilia a criança a se tornar protagonista frente ao conhecimento, permite a aprendizagem se

tornar mais prazerosa e significativa.

Dessa forma, no decorrer dos capítulos foi possível elucidar que a inserção da criança

na escola, em uma turma da Educação Infantil, proporciona inúmeras experiências que

potencializam o desenvolvimento intelectual, afetivo e social, onde ao estabelecer novos

vínculos afetivos a criança se desenvolve como sujeito e vai estabelecendo sua personalidade

por meio dos conflitos, com os quais ela também aprende.

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36

Aprofundar teoricamente o conceito de afetividade e aprendizagem no contexto escolar

de uma turma de Educação Infantil significou muito para mim como admiradora do tema, mas

de forma mais profunda contribuiu para a minha formação acadêmica. Durante a pesquisa fui

conduzida a reflexões que me fizeram repensar de forma mais detalhada como acontece a

dinâmica na relação entre as professoras e as crianças na sala de aula e até mesmo na minha

prática pedagógica como professora regente.

Por fim, as reflexões teóricas discutidas possuem potencial para levar o leitor a refletir

sobre a importância dos aspectos afetivos durante o processo de ensino e aprendizagem,

instigando o leitor/educador a repensar suas práticas pedagógicas, de forma que a relação

entre professores e crianças seja estabelecida propiciando uma relação afetiva que impulsione

a aprendizagem prazerosa e significativa.

Certamente, está pesquisa é de grande valia para o âmbito educacional, principalmente

para os educadores que trabalham com as primeiras etapas da Educação Básica, como

também, para os educadores em formação.

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