Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

12
1 Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa Turma 5: 4ª feira- 8h às 11h20 Local: CEFORTEPE Orientadora de Estudos: Juliana M. A. Vieira Unidade 5Gêneros Textuais Síntese dos Cadernos Ano 1 Os diferentes textos a serviço da perspectiva do alfabetizar letrando Ivane Pedrosa de Souza Telma Ferraz Leal Histórico Autores como Soares (2004) e Morais(2005) têm apontado que a ênfase predominante em torno do conceito de alfabetização nas décadas finais do século passado voltava-se para uma compreensão da mesma como processo que envolve atividades de codificação e decodificação da escrita. As atividades propostas giravam em torno da repetição e memorização de letras, sílabas, palavras e/ ou frases soltas, sendo quase sempre acompanhadas de medo e insegurança decorrentes das ameaças de castigo caso “erros”fossem cometidos na hora de “dizer a lição”. O rompimento da concepção de língua escrita como código para uma concepção da mesma como sistema de notação alfabética, realizado por meio de diversos estudos, entre eles, os de Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1986), trouxe avanços significativospara o fazer pedagógico. Atrelada a esta compreensão, veio também a de que é pormeio da interação com os usos e funções da língua escrita que a aprendizagem ocorre. Assim, fica claro não mais haver sentido em se trabalhar com os alunos os textos “artificiais” encontrados em cartilhas. Para circunstanciar e fundamentar essa discussão, mobilizamos também o conhecimento de que as crianças chegam à escolacom conhecimentos sobre a linguagem adquirido nas mais diversas situações. Este caráter espontâneo das trocas comunicativas possibilita às mesmas serem produtoras ativas de enunciados, aspecto que evidencia que as crianças estão plenamente inseridas num contexto comunicativo, sendo capazes de produzir falas e compreender o que escutam com certa desenvoltura.

Transcript of Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

Page 1: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

1

Pacto Nacional pela

Alfabetização na Idade Certa

Turma 5: 4ª feira- 8h às 11h20

Local: CEFORTEPE

Orientadora de Estudos: Juliana M. A. Vieira

Unidade 5–Gêneros Textuais

Síntese dos Cadernos

Ano 1

Os diferentes textos a serviço da perspectiva do alfabetizar letrando

Ivane Pedrosa de Souza

Telma Ferraz Leal

Histórico

Autores como Soares (2004) e Morais(2005) têm apontado que a ênfase predominante

em torno do conceito de alfabetização nas décadas finais do século passado voltava-se

para uma compreensão da mesma como processo que envolve atividades de codificação

e decodificação da escrita.

As atividades propostas giravam em torno da repetição e memorização de letras,

sílabas, palavras e/ ou frases soltas, sendo quase sempre acompanhadas de medo e

insegurança decorrentes das ameaças de castigo caso “erros”fossem cometidos na hora

de “dizer a lição”.

O rompimento da concepção de língua escrita como código para uma concepção da

mesma como sistema de notação alfabética, realizado por meio de diversos estudos,

entre eles, os de Emília Ferreiro e Ana Teberosky (1986), trouxe avanços

significativospara o fazer pedagógico. Atrelada a esta compreensão, veio também a de

que é pormeio da interação com os usos e funções da língua escrita que a aprendizagem

ocorre.

Assim, fica claro não mais haver sentido em se trabalhar com os alunos os textos

“artificiais” encontrados em cartilhas.

Para circunstanciar e fundamentar essa discussão, mobilizamos também o conhecimento

de que as crianças chegam à escolacom conhecimentos sobre a linguagem adquirido nas

mais diversas situações. Este caráter espontâneo das trocas comunicativas possibilita às

mesmas serem produtoras ativas de enunciados, aspecto que evidencia que as crianças

estão plenamente inseridas num contexto comunicativo, sendo capazes de produzir falas

e compreender o que escutam com certa desenvoltura.

Page 2: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

2

Morais e Albuquerque (2004) realçam que as práticas de leitura e escrita, vivenciadas

em situações informais, são inúmeras e gerammotivação e oportunidade de reflexãoem

torno dos diferentes textos que circulam em nossa sociedade. Informalmente, as

crianças vão descobrindo características sobre seus estilos, usos e finalidades.

Autores como Leal (2005) e Santos (2005) têm enfatizado que o desenvolvimentodas

capacidades mais elaboradas, tanto no que se refere à compreensão e produção de textos

orais, como quanto às capacidades de ler e escrever, não ocorremespontaneamente.

Portanto, cabe à escola a sistematização dos conhecimentos relativos à produção e à

compreensão de textos orais e escritos. Por conta disso, enfatizamos junto aos

professores a importância de favorecer o contato dos alunos com textos diversos, para

que, desta forma, possam não só, conforme distinção de Magda Soares (1998), se

“alfabetizarem” – adquirir a tecnologia da escrita alfabética, mas também, tornarem-se

“letrados”, ou seja, fazerem uso efetivo e competente desta tecnologia da escrita em

situações reais de leitura e produção de textos.

Desafios da alfabetização

Um primeiro desafio é pensar sobre situações diversificadas de leitura e escrita. Estas

situações, segundo Leal e Albuquerque (2005), podem ser agrupadas em quatro tipos

principais:

1) Situações de interação, mediadas pela escrita, em que se busca causar algum efeito

sobre interlocutores(as) em diferentes esferas de participação social (circulação de

informações cotidianas, como textos jornalísticos, epistolares, científicos, instrucionais,

literários, publicitários, dentre outros);

2) Situações voltadas para a construção e sistematização do conhecimento,

caracterizadas sobretudo pela leitura e pela produção de gêneros textuais que usamos

como auxílio para organização e memorização, quando necessário, de informações, tais

como anotações, resumos, esquemas e outros gêneros que utilizamos para estudar temas

diversos;

3) Situações voltadas para Autoavaliação e expressão “para si próprio(a)” de

sentimentos, desejos, angústias, como forma de auxílio ao crescimento pessoal e ao

resgate de identidade, assim como ao próprio ato de investigar-se e resolver seus

próprios dilemas, com utilização de diários pessoais, poemas, cartas íntimas, sem

destinatários(as);

4) Situações em que a escrita é utilizada para automonitoração de suas próprias ações,

para organização do dia-a-dia, para apoio mnemônico, tais como as agendas, o

calendários, os cronogramas e outros. trabalho efetivo implica, portanto, na realização

em sala de aula de atividades, as mais variadas, em torno dos eixos do componente

curricular Língua Portuguesa (oralidade, leitura, produção textual e análise linguística).

Sem dúvidas que um foco a ser priorizado nas turmas de primeiro ano deve ser a

apropriação do Sistema de Escrita Alfabética, mas o propósito do alfabetizar letrando

evidencia a necessidade de uma constante articulação entre tal eixo e os demais eixos. O

que nem sempre é fácil.

Page 3: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

3

É comum ouvirmos professores alfabetizadores perguntarem: “Por que, apesar

deusarmos textos diversos em sala de aula, trabalhando numa perspectiva do letramento,

não conseguimos alfabetizar os alunos?

Tal questionamento ocorre justamente porque, muitas vezes, busca-se construir práticas

que pendem para um dos lados: ou se realiza um trabalho intenso de apropriação do

sistema de escrita, ou se realiza um trabalho voltado para a interação por meio dos

textos. O desafio é construir práticas que contemplem as duas dimensões e que, na

medida do possível, as articulem.

É preciso, portanto, entender que apenas a reflexão em torno dos conhecimentos

decorrentes dos usos dos textos na sala de aula não garante, necessariamente, a

apropriação, pelos alunos, dos princípios que regem nosso sistema de escrita. Por outro

lado, a reflexão sobre o sistema de escrita não garante, necessariamente, o

desenvolvimento das capacidades de compreender e produzir textos. Há conhecimentos

e capacidades específicos de cada eixo, como está evidenciado nos quadros de direitos

de aprendizagem, na unidade 1, os quais dependem, muitas vezes, de atividades

específicas.

Podemos desenvolver atividades com foco mais claro no desenvolvimento de

habilidades de leitura e produção de textos, atividades com foco na aprendizagem do

sistema de escrita, e atividades em que as duas dimensões sejam contempladas, como os

presentes em livros didáticos com textos de tradição oral, como as parlendas, trava-

línguas, dentre outros.

Leitura e Produção de texto

O trabalho com textos no primeiroano do Ensino Fundamental precisa serfeito de modo

a desenvolver diferentescapacidades e conhecimentos. As situaçõesem que outras

pessoas leem para as criançassão importantes para que elas aprendam a:

compreender textos lidos por outraspessoas, de diferentes gêneros e

comdiferentes propósitos;

antecipar sentidos e ativarconhecimentos prévios relativos aostextos a serem

lidos pelos professores oupelas crianças;

reconhecer finalidades de textos lidospelo professor ou pelas crianças;

localizar informações explícitas emtextos de diferentes gêneros e temáticas,lidos

pelo professor ou outro leitorexperiente;

realizar inferências em textos dediferentes gêneros e temáticas, lidospelo

professor ou outro leitor experiente;

estabelecer relações lógicas entrepartes de textos de diferentes gêneros

etemáticas, lidos pelo professor ou outroleitor experiente;

apreender assuntos / temas tratados emtextos de diferentes gêneros e

temáticas,lidos pelo professor ou outro leitorexperiente;

interpretar frases e expressões em textosde diferentes gêneros e temáticas,

lidospelo professor ou outro leitor experiente;

estabelecer relação de intertextualidadeentre textos;

relacionar textos verbais e não verbais,construindo sentidos.

As situações de leitura compartilhada ajudamas crianças a desenvolver

conhecimentossobre a escrita e estratégias de leituraque serão mobilizadas nas situações

de leituraautônoma, ou seja, aquelas em que elasprecisam ler sem ajuda. Este

Page 4: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

4

pressupostoé corroborado pelas ideias defendidas porVygotsky (1989, 1994) de que

aprendemosna interação, ou seja, as nossas apropriações se dão em nível interpsíquico

antes de setornarem intrapsíquicos.

Ainda no primeiro ano, como as criançasestão se apropriando do Sistema de Escrita

Alfabética, já podemos estimular situaçõesde leitura autônoma. Nesses momentoselas

aprendem a:

•ler textos não verbais, com compreensão;

• ler textos (poemas, canções, tirinhas,textos de tradição oral, dentre outros),com

autonomia;

• ler em voz alta, com fluência, emdiferentes situações;

• localizar informações explícitas em textosde diferentes gêneros e temáticas, lidoscom

autonomia;

• realizar inferências em textos dediferentes gêneros e temáticas, lidos comautonomia;

• estabelecer relações lógicas entrepartes de textos de diferentes gêneros etemáticas,

lidos com autonomia;

• apreender assuntos / temas tratados emtextos de diferentes gêneros e temáticas,lidos

com autonomia;

• interpretar frases e expressões em textosde diferentes gêneros e temáticas, lidoscom

autonomia.

É importante ressaltar que as crianças recémalfabetizadas leem com muita dificuldadee

ficam cansadas mais rapidamentedo que as que já têm maior tempo / experiêncialeitora.

Textos longos em situaçõesde leitura autônoma podem desencorajaras crianças.

Desse modo, a escolha dos textos é tão importante quanto o planejamentodas

estratégias de mediação.

Em relação à produção de textos, reflexõessemelhantes podem ser feitas. Há

aprendizagensque podem começar antes queas crianças sejam capazes de escrever

deacordo com os princípios do sistema deescrita. Desse modo, é necessário

preversituações compartilhadas de produção de textos, em que o professor seja o

escriba.

Produções coletivas são ricas, por possibilitarem a explicitação de estratégias de escrita.

As crianças aprendem sobre a linguagem, mas aprendem também sobre como planejar,

revisar, avaliar textos. Nas situações compartilhadas de produção de textos, as crianças

podem aprender a:

•refletir sobre o contexto de produção de textos;

• planejar a escrita de textos considerando o contexto de produção: organizar roteiros,

planos gerais dos textos para atender a diferentes finalidades, com ajuda de escriba;

• produzir textos de diferentes gêneros, atendendo a diferentes finalidades, por meio da

atividade de um escriba;

• gerar e organizar o conteúdo textual, estruturando os períodos e utilizando recursos

coesivos para articular ideias e fatos;

• utilizar vocabulário diversificado e adequado ao gênero e às finalidades propostas;

• revisar coletivamente os textos durante o processo de escrita em que o professor é

escriba, retomando as partes já escritas e planejando os trechos seguintes.

Nas situações em que as crianças são estimuladas a escrever sozinhas elas mobilizam os

conhecimentos e estratégias aprendidos nas situações partilhadas, mas, sem dúvidas, há

outras aprendizagens em jogo, pois o escritor precisa saber coordenar as ações de

Page 5: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

5

definir o que vai dizer(conteúdo do texto), como vai dizer e como registrar no

papel.

No quadro de direitos de aprendizagem destacamos algumas aprendizagens importantes

no primeiro ano do Ensino Fundamental que podem ser introduzidas nas situações de

escritapelas próprias crianças:

•refletir sobre o contexto de produção de textos;

• planejar a escrita de textos considerando o contexto de produção: organizar roteiros,

planos gerais dos textos para atender a diferentes finalidades, com autonomia;

• produzir textos de diferentes gêneros com autonomia, atendendo a diferentes

finalidades;

• gerar e organizar o conteúdo textual, estruturando os períodos e utilizando recursos

coesivos para articular ideias e fatos;

• utilizar vocabulário diversificado e adequado ao gênero e às finalidades propostas;

• revisar autonomamente os textos durante o processo de escrita, retomando as partes já

escritas e planejando os trechos seguintes;

• revisar os textos após diferentes versões, reescrevendo-os de modo a aperfeiçoar sua

funcionalidade e adequação aos objetivos, aos leitores, à situação de interlocução (o que

implica rever ortografia, pontuação, sintaxe, coesão, estrutura composicional, coerência,

estilo de linguagem, estratégias discursivas).

Em relação aos textos orais, também podemos destacar que é relevante promover

situações planejadas de ensino, que possam ajudar as crianças a aprender a:

•participar de interações orais em sala de aula (questionando, sugerindo, argumentando

e respeitando os turnos e a vez de intervir);

• escutar textos de diferentes gêneros, sobretudo os mais formais, comuns em situações

públicas, analisando-os criticamente;

• planejar intervenções orais em situações públicas: exposição oral, debate, contação de

história;

• produzir textos orais de diferentes gêneros, com diferentes propósitos, sobretudo os

mais formais comuns em instâncias públicas (debate, entrevista, exposição, notícia,

propaganda, relato de experiências orais, dentre outros);

• analisar a pertinência e a consistência de textos orais, considerando as finalidades e

características dos gêneros;

• reconhecer a diversidade linguística, valorizando as diferenças culturais entre

variedades regionais, sociais, de faixa etária, de gênero dentre outras;

• relacionar fala e escrita, tendo em vista a apropriação do sistema de escrita, as

variantes linguísticas e os diferentes gêneros textuais;

• valorizar os textos de tradição oral, reconhecendo-os como manifestações culturais.

Nenhuma dessas aprendizagens sãoconsolidadas em um ano. No primeiro ano, podemos

planejar situações diversificadas, de modo que as crianças ampliem seus conhecimentos

e capacidades.

O fundamental, no entanto, é que todas essas aprendizagens ocorram em situações

significativas, nas quais as crianças falem, escrevam, escutem, leiam para participar de

situações de interação real e intervirem na sociedade.

Ano 2

Por que ensinar gêneros textuais na escola?

Page 6: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

6

Maria Helena Santos Dubeux

Leila Nascimento da Silva

Em uma perspectiva sociointeracionista, os eixos centrais do ensino da língua

materna são a compreensão e a produção de textos. Nessas atividades, convergem de

forma indissociável fatores linguísticos, sociais e culturais. Nelas, os interlocutores são

participantes de um processo de interação, e, para isso, precisam ter domínio da mesma

língua e compartilharem as situações e as formas como os discursos se organizam,

considerando seus propósitos de usos e os diversos contextos sociais e culturais em que

estão inseridos. (SANTOS, MENDONÇA E CAVALCANTE, 2006).

O texto, portanto, não é uma construção fixa e abstrata, mas, sim, palco de negociações

e produções de múltiplos sentidos. Os textos são produzidos em situações marcadas pela

cultura e assumem formas e estilos próprios, também historicamente marcados.

Diferentes textos assemelham-se, como diz Bakhtin (1997), porque se configuram

segundo características dos gêneros textuais que estão disponíveis nas interações

sociais. Desse modo, pode-se dizer que a comunicação verbal só é possível por meio de

algum gênero que se materializa em textos que assumem formas variadas para atender a

propósitos diversos.

Para melhor entendermos essa discussão, é importante enfocar as diferenças entre

gêneros textuais e tipos textuais.

Referimo-nos a tipos textuais para tratarmos de sequências teoricamente definidas pela

natureza linguística da sua composição: narração, exposição, argumentação, descrição,

injunção.

Não são textos com funções sociais definidas. São categorias teóricas determinadas pela

organização dos elementos lexicais, sintáticos e relações lógicas presentes nos

conteúdos a serem falados ou escritos, distinguindo-se capacidades de linguagem

requeridas para a produção de diferentes gêneros textuais. (MARCUSCHI, 2005;

MENDONÇA 2005; SANTOS, MENDONÇA E CAVALCANTE 2006).

Os gêneros textuais, segundo Schneuwly e Dolz (2004), são instrumentos culturais

disponíveis nas interações sociais. São historicamente mutáveis e, consequentemente,

relativamente estáveis. Emergem em diferentes domínios discursivos e se concretizam

em textos, que são singulares.

Assim, para que a interação entre falantes aconteça, cada sociedade traz consigo um

legado de gêneros, por meio dos quais são partilhados conhecimentos comuns. Em

consequência das mudanças sociais, os gêneros se alteram, desaparecem, se

transformam em outros gêneros.

Desse modo, novos gêneros textuais vão se constituindo, em um processo permanente,

em função de novas atividades sociais. Se isso nãoocorresse, a comunicação seria quase

impossível,pois cada demanda comunicativaexigiria a construção de um texto

configuradode modo completamente novo, quepor sua vez precisaria ser compreendido

pelos envolvidos na atividade para que a interação acontecesse. Segundo Bakhtin,

(1997, p. 302):

Aprendemos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do outro,

sabemos de imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir-lhe o gênero,

Page 7: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

7

adivinhar-lhe o volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada

estrutura composicional, prever-lhe o fim. (…) Se não existissem os gêneros do

discurso e se não osdominássemos, se tivéssemosde construir cada um de nossos

enunciados, a comunicação verbal seria quase impossível.

Por possuírem aspectos relativamente estáveis/ comuns, os gêneros servem como

modelos, de modo que textos diferentes são apontados como pertencentes ao mesmo

gênero na medida em que possuem, por exemplo, “conteúdos”, “construções

composicionais” e “estilos” semelhantes entre si.

A partir dessas citações, percebemos a relação que Schneuwly (2004) estabelece entre o

conceito de instrumento e o papel dos gêneros como mediadores das atividades de

interação verbal das pessoas na sociedade. O autor explica:

Há visivelmente um sujeito, o locutor-enunciador, que age discursivamente

(falar/escrever), numa situação definida por uma série de parâmetros, com a ajuda

de um instrumento que aqui é um gênero, um instrumento semiótico complexo,

isto é, uma forma de linguagem prescritiva, que permite, a um só tempo, a

produção e a compreensão de textos (SCHNEUWLY, 2004, p. 23-24).

Koch e Elias (2009) destacam que os gêneros textuais são diversos e sofrem variações

na sua constituição em função dos seus usos. Explicando essa dinâmica de ampliação

dos gêneros, as autoras apresentam como exemplos o e-mail e o blog, que como

recursos recentes decorrentes do progresso tecnológico, são respectivamente

transmutações das cartas e dos diários. Portanto, o grande desafio para o ensino relativo

ao componente curricular Língua Portuguesa é trabalhar com essa diversidade textual na

sala de aula, explorando de forma aprofundadao que é peculiar a um gênero

textualespecífico, tendo em vista situações de uso também diversas.

No trabalho em sala de aula com os gêneros duas dimensões se articulam.

A primeirase refere aos aspectos socioculturais relacionados a sua condição de

funcionamento na sociedade e a segunda se relaciona aos aspectos linguísticos que se

voltam para a compreensão do que o texto informa ou comunica. Refletindo sobre essas

relações, como defendem Schneuwly e Dolz(2004), enfatizamos a importância de se

proporcionar aos alunos contatos com os mais diversos gêneros textuais. Para esses

autores, o ensino da leitura e da escrita na escola pode ser sistematizado de forma que o

aluno possa refletir, apropriar-se e usar diversos gêneros textuais. Conforme sintetizam

Mendonça e Leal (2005), com uma proposta de aprendizagem em espiral, um mesmo

gênero pode ser trabalhado em anos escolares diversos ou até na mesma série, com

variações e aprofundamento diversos.

É preciso tomar alguns cuidadosno processo do alfabetizar letrando:

1. Escolher os textos a serem lidos, considerando-se não apenas os gêneros a que

pertencem, mas, sobretudo, o seu conteúdo (o que é dito), em relação aos temas

trabalhados. O objetivo é que as crianças aprendam a ler e escrever, mas também

aprendam por meio da leitura e da escrita.

2. Propor situações de leitura e produção de textos com finalidades claras e

diversificadas, enfocando os processos de interação e não apenas as reflexões sobre

aspectos formais.

3. Escolher os gêneros a serem trabalhos com base em critérios claros, considerando-se,

sobretudo, os conhecimentos e habilidades a serem ensinados; relações entre os gêneros

escolhidos e os temas/conteúdos a serem tratados.

Page 8: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

8

4. Abordar os gêneros considerando não apenas aspectos composicionais e estilísticos,

mas,sobretudo, os aspectos sociodiscursivos (processos de interação, como as

finalidades, tipos de destinatários, suportes textuais, espaços de circulação...)

Ano 3

Os gêneros textuais em foco: pensando na seleção e na progressão dos alunos

Leila Nascimento da Silva

Histórico

Com as contribuições de estudos advindos, principalmente, do campo da psicologia e

das ciências linguísticas, assim como, o aparecimento de novas demandas e exigências

da sociedade, discussões importantes emergiram em relação ao estudo dos textos na sala

de aula e com isso mudanças substanciais vêm acontecendo perceptivelmente.

Na segunda metade do Século XX, muitos documentos oficiais e propostas curriculares,

foram reelaborados e começaram a trazer algumas dessas mudanças teóricas, buscando,

logicamente, instaurar também um movimento de mudanças nas práticasdocentes.

Os fenômenos linguísticos passam a ser entendidos como espaço de interação, no qual

os indivíduos envolvidos participam ativamente, elaborando enunciados para atender a

suas finalidades comunicativas (BAKHTIN, 1953).

O objetivo da escola seria garantir a apropriação pelos alunos das práticas de

linguagem instauradas na sociedade para que eles possam ter participação social

efetiva.

É necessário um trabalho progressivo e aprofundado com os gêneros textuais orais e

escritos, envolvendo situações em que essa exploração faça sentido. Tal posição é

adotada por autores como Bronckart (1999) e Schneuwlye Dolz (2004).

Mas por que tomar os gêneros textuais como objeto de ensino e aprendizagem?

Mais ainda, por que torná-los o foco central no ensino relativo ao componente

curricular Língua Portuguesa?

As práticas de linguagem são mediadas por instrumentos culturais e históricos, ou seja,

por gêneros textuais. Se a escola investe no ensino dos gêneros estará facilitando,

portanto, a apropriação dos usos da língua.

Explica ainda Schneuwly (2004, p. 24) que “o instrumento, para se tornar mediador,

para se tornar transformador da atividade, precisa ser apropriado pelo sujeito; ele não é

eficaz senão à medida que se constroem, por parte do sujeito, os esquemas de sua

utilização”.

A proposta de Dolze Schneuwly (2004) é que esta progressão seja garantida por meio

do aprofundamento dos objetivos didáticos. Assim, um mesmo gênero pode ser

trabalhado em anos/ciclos/ séries diferentes, mas com o passar dos anos essa abordagem

deve ser cada vez mais complexa (aprendizagem em espiral).

Page 9: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

9

Para realizar esse trabalho progressivo comos gêneros, o professor precisa:

Primeiro diagnosticar, ou seja,conhecerbem quais habilidades os seus alunos

jápossuem e estabelecer quais são aquelas almejadas(perfil de entrada e perfil de

saídaesperado para aquele ano).

Segundo deve ser levado em consideração que a escola precisa garantir,sim, a

exploração da diversidade de gêneros textuais, pois cada gênero pode

proporcionardiferentes formas de mobilização dascapacidades de linguagem e, logo,

diferentesaprendizagens. Mas, como foi salientado,não seria necessário um ensino de

todosos gêneros. Isso porque as aprendizagensrelativas a um gênero são

transferíveis paraoutros gêneros, e principalmente, porque “[...] existem

semelhanças entre algunsgêneros textuais que podem servir de referênciapara

adotarmos um plano de trabalhoem que diferentes capacidades textuais

ediferentes conhecimentos sobre a línguapossam ser inseridos em cada grau de

ensino”(MENDONÇA E LEAL, 2007, p. 63).

Dolz e Schneuwly (2004) propõemque, ao longo de um ano letivo, o professorescolha

como objeto de ensino gêneros comcaracterísticas composicionais,

sociodiscursivase linguísticas relativamente diferentesentre si, pois, assim, estará

contribuindopara que seus alunos realizem diferentesoperações de linguagem e se

apropriem depráticas de letramento. Agindoassim, os alunos terão a oportunidade

derefletir sistematicamente sobre gênerossemelhantes e gêneros diferentes entre sino

decorrer de sua escolaridade.

Pensando nesta progressão e nas semelhanças(e diferenças) entre os

gêneros,conseguimos agrupá-los em onze grupos:

1) Textos literários ficcionais

São textos voltados para a narrativa defatos e episódios do mundo imaginário(não real).

Entre estes, podemos destacar:contos, lendas, fábulas, crônicas, obrasteatrais, novelas e

causos.

2) Textos do patrimônio oral, poemas eletras de músicas

Os textos do patrimônio oral, logo quesão produzidos têm autoria, mas, depois,sem um

registo escrito, tornam-seanônimos, passando a ser patrimônio das comunidades. São

exemplos: as travalínguas,parlendas, quadrinhas, adivinhas,provérbios. Também fazem

parte dosegundo agrupamento os poemas e asletras de músicas.

3) Textos com a finalidade de registrar eanalisar as ações humanas individuaise

coletivas e contribuir para que asexperiências sejam guardadas na memóriadas

pessoas

Tais textos analisam e narram situaçõesvivenciadas pelas sociedades, tais como,as

biografias, testemunhos orais e escritos,obras historiográficas e noticiários.

4) Textos com a finalidade de construir e fazercircular entre as pessoas o

conhecimentoescolar/científico

São textos mais expositivos, que socializaminformações, por exemplo, as notas

deenciclopédia, os verbetes de dicionário,os seminários orais, os textos didáticos,os

relatos de experiências científicas e ostextos de divulgação científica.

Page 10: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

10

5) Textos com a finalidade de debater temasque suscitam pontos de vista

diferentes,buscando o convencimento do outro

Com base nos textos do agrupamento 5os sujeitos exercitam suas

capacidadesargumentativas. Cartas de reclamação,cartas de leitores, artigos de

opinião,editoriais, debates regrados e reportagenssão exemplos de textos com

taisfinalidades.

6) Textos com a finalidade de divulgarprodutos e/ou serviços - e

promovercampanhas educativas no setor dapublicidade

Também aqui a persuasão está presente,mas com a finalidade de fazer o outroadquirir

produtos e/ou serviços ou mudardeterminados comportamentos. Sãoexemplos: cartazes

educativos, anúnciospublicitários, placas e faixas.

7) Textos com a finalidade de orientare prescrever formas de realizaratividades

diversas ou formas de agir emdeterminados eventos

Fazem parte do grupo sete os chamadostextos instrucionais, tais como, as receitas,os

manuais de uso de eletrodomésticos,as instruções de jogos, as instruções demontagem e

os regulamentos.

8) Textos com a finalidade de orientara organização do tempo e do espaçonas

atividades individuais e coletivasnecessárias à vida em sociedade.

São eles: as agendas, os cronogramas, oscalendários, os quadros de horários,

asfolhinhas e os mapas.

9) Textos com a finalidade de mediar asações institucionais.

São textos que fazem parte,principalmente, dos espaços de trabalho:os requerimentos,

os formulários, osofícios, os currículos e os avisos.

10) Textos epistolares utilizados para asmais diversas finalidades

As cartas pessoais, os bilhetes, os e-mails,os telegramas medeiam as relaçõesentre as

pessoas, em diferentes tipos desituações de interação.

11) Textos não verbais

Os textos que não veiculam a linguagemverbal, escrita, tendo, portanto, focona

linguagem não-verbal tais como,as histórias em quadrinhos só comimagens, as charges,

pinturas, esculturase algumas placas de trânsito compõem talagrupamento.

Gêneros de todos esses agrupamentospodem circular nas salas de aula,

possibilitandoque as crianças os reconheçam,compreendam seus usos, suas

finalidades,percebam como se organizam, aprendam ausar as estratégias discursivas

mais recorrentes.

No entanto, como foi exposto noquadro de direitos de aprendizagem gerais,três esferas

discursivas precisam ser priorizadasnos anos iniciais do ensino fundamental:

- a literária,

- a acadêmica/escolar e

- a esfera midiática.

Os gêneros citados noscinco primeiros agrupamentos revestem-sede especial

importância no ciclo de alfabetização,podendo, dessa forma, ganhar espaçoampliado no

cotidiano escolar.

Page 11: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

11

Em cada áreade conhecimento, há o predomínio de determinadosgêneros textuais, que

circulam naescola e também fora dela. Por exemplo, nasaulas de Matemática,

frequentemente lemose produzimos enunciados de problemas, gráficose tabelas; em

Ciências, o nosso contatomaior é com os relatórios de pesquisa, artigosde divulgação

científica, folhetos e cartazeseducativos; nas áreas de História e Geografia,estão

presentes as obras historiográficas, ostestemunhos, os calendários, as cartas, asnotícias,

as reportagens, os artigos de opiniãoe os mapas; em Educação Física é comum

encontrarmos,por exemplo, as regras de jogose brincadeiras. Já em Arte, a leitura de

textosnão-verbais é imprescindível, assim como asbiografias.

Também é preciso pensar...

É preciso pensar problemas de linguagem de diferentes níveis de dificuldade

que vão se aprofundando com o avançar da escolaridade. Tais problemas

estariam relacionados às capacidades de linguagem:

- capacidades de ação (representação do contexto social, no qual a situação

de interação está inserida),

Obs.: significa a predominância de determinado gênero.

- capacidades discursivas (estruturação discursiva dos textos),

Obs.: condição de estruturação do texto, condição de produção do texto, ou

seja, para quem, por que, quem... (finalidade e circunstância).

- capacidades linguístico-discursivas (escolha de unidades linguísticas)

Obs.: tessitura do texto, ou seja, coesão, coerências, paragrafação, ortografia,

advérbio, etc.

(DOLZ E SCHNEUWLY, 2004).

Obs.: É preciso adequar o gênero as estes aspectos. Isto que representa o

crescente no ensino.

O texto é um material.

O discurso é único, mas não é original.

As situações de uso do texto são variáveis.

Mas, por que escolher, em cada ano, exemplaresde gêneros de diferentes agrupamentos?

Primeiro, porque os agrupamentos buscamgarantir que diferentes finalidades

sociaisde leitura e escrita sejam contempladasem sala de aula, por meio de um

trabalhosistemático com gêneros variados.

Segundo, ao explorarmos um gênero de umagrupamento, estamos

proporcionandoque determinadas operações de linguagemsejam desenvolvidas, ou

seja, aquelas maisintimamente ligadas a um agrupamentoe não a outro. Este

aprendizado tambémcontribui para que os alunos consigam lidarmelhor com outros

gêneros do mesmoagrupamento.

Um terceiro aspecto a ser levadoem consideração é o fato de que há alunoscom

mais facilidade, por exemplo, naprodução de textos com a finalidade de

debatertemas controversos; já outros podemter mais habilidade em construir

textosnarrativos ficcionais. Se trabalharmos comgêneros pertencentes a um único

Page 12: Pnaic unidade 5 sintese dos cadernos

12

grupo,os alunos com dificuldades de lidar comgêneros deste grupo poderão encarar o

atoda escrita como um obstáculo constante,algo difícil de ser superado, desmotivando-

os para as outras aprendizagens. Porém,ao variarmos os gêneros, daremos

oportunidadesaos alunos para também mostraremsuas melhores habilidades e,

assim,contribuímos para mantê-los motivados acontinuar seu processo de apropriação

daspráticas de linguagem.