PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na...

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Todos os direitos reservados: permitido citação com referência à fonte. Waina Ferreira Miranda Email: [email protected] Blog: www.aconselhamentoseculo21.blogspot.com

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Finalmente publico minha Monografia apresentada como requisito para aprovação final no Curso de Pós Graduação em Aconselhamento da Faculdade Teológica Batista de São Paulo. Ano 2010.Os resultados deste estudo têm implicações nas áreas de aconselhamento, saúde mental, acompanhamento e socorrismo em catástrofes, desastres, emergências e outros. Podendo ser útil ainda às pessoas que, ao lidarem com suas perdas desejam ampliar sua reflexão sobre seus significados.

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Todos os direitos reservados: permitido citação com referência à fonte.

Waina Ferreira Miranda

Email: [email protected]

Blog: www.aconselhamentoseculo21.blogspot.com

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WAINA FERREIRA MIRANDA

PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS:A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

Monografia apresentada como requisito para aprovação final no Curso de Pós Graduação em Aconselhamento da Faculdade Teológica Batista de São Paulo

Orientador: Profª Drª Fátima Cristina Costa Fontes.

São Paulo

2010

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DEDICO ESTE TRABALHO

Primeiramente a ti JESUS CRISTO, meu grande e absoluto amor.

Só tem uma coisa que somente eu e Tu podemos acessar: meus pensamentos. Por isso, amo aqueles nossos momentos que eu fico pensando e suspirando, suspirando de tanta paixão por Ti, adorando-o com meu coração dilatado. De fato, há delícias em tua presença. Fico emocionada quando penso que Tu permitistes todas minhas dores para me tornar mais apta ainda para seus propósitos em minha vida. Amo-te tanto Emannuel. Não sei mais viver sem Ti.

Como um TRIBUTO a memória de meu querido pai, Maurício da Silva Miranda,

que me educou no caminho da justiça e da hombridade e, serviu-me de referencial para que eu pudesse crer que Deus é um Pai cuidadoso e provedor como ele meu pai o era comigo, a tal ponto que hoje, se só me fosse possível definir Deus com apenas duas palavras eu diria: Cuidadoso e Provedor.

À minha PERDA maior, a morte de meu pai que aconteceu em 01 de Junho de 2005.

Perda essa que resultou em uma completa resignificação de minha vida e que me inspirou a realizar este trabalho me fazendo percorrer por meio de leituras e reflexões todo o caminho dos que sofrem a perda de uma pessoa amada na busca de compreender a si e a outros no processo desestabilizar do Luto. Tenho profundo respeito por esta fase de minha vida.

À toda minha FAMÍLIA e, em especial, à minha querida mãe, exemplo de conselheira,

que apesar de sua simplicidade e pouca instrução sempre trouxe aos filhos conselhos sábios e pertinentes e ao meu irmão que sofreu as consequências do Luto em sua saúde física (coração),

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mas que pôde encontrar na fé em Cristo forças para sair da depressão.

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AGRADEÇO DE CORAÇÃO:

Ao Deus da Bíblia que me vocacionou, capacitou e me qualificou para toda boa obra, inclusive para esta monografia e que me conduziu ao curso de Aconselhamento no tempo certo. Se não fôra o Senhor, o que seria de mim?

De forma muito especial, às pessoas que estiveram direta e indiretamente envolvidas na perda de meu pai.

- À minha prima Bernadete, companheira constante no cuidado com meu pai durante o tempo que ele esteve no hospital e a primeira pessoa a chorar comigo quando recebemos a notícia de sua morte. Obrigada Dete, nunca vou esquecer o que você fez por meu pai e por mim nesse período.

- O apoio e acolhimento dos meus “tutores de resiliência”, ou melhor dizendo, meus cuidadores durante o processo inicial do meu Luto: Pr. Tiago, (”a quem honra honra”) e Matheus e Giselle, um estimadíssimo casal de amigos que torna a ausência de minha família mais tolerável. Obrigada Matheus e Giselle por vocês fazerem parte da minha vida e confiarem em mim.

- Ao Pr. Davi Klawa por suas palavras via telefone que nunca vou esquecer: “você sabe que você tem toda uma igreja em sua retaguarda”.

- E agradeço também à todos meus amigos que estiveram irmanados comigo nesta fase de Luto seja através de um telefonema, email, torpedos ou presença de amor.

À Simone, uma amiga mais chegada do que uma irmã, e a Ester duas respostas de Deus para o meu grito de socorro: “Deus eu preciso de ajuda”! À primeira, por suprir-me e a segunda por acompanhar-me com suporte terapêutico durante todo o tempo de realização deste trabalho.

Aos meus “amigos de fé meus irmãos camaradas” do Ministério Jovem da 1ª Igreja Batista da Lapa, à irmã Raquel e irmã Izabel, que se uniram a mim expressando afeto e cuidado ao participarem deste trabalho com suas indispensáveis Intercessões.

Às minhas parceiras de oração do Grupo de Intercessão Missionária da 1ª Ig. Batista da Lapa Flávia, Sara e Renata, que seguraram a “corda” durante a ausência de minha liderança para que eu pudesse fazer este trabalho.

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À minha amada igreja, 1ª Igreja Batista da Lapa, que representada por sua diretoria patrocinou este curso, tornando possível a realização dessa importante etapa em minha vida, e eu espero ter honrado com este trabalho as palavras que ouvi do Pr. Orlando quando me comunicou a decisão da diretoria: “nós achamos que você merece”.

Ao Pr. João Marcos Morilha, meu pastor e amigo, que há 18 anos tem sido um facilitador/abençoador para o desenvolvimento de meus dons ministeriais. Amo você pastor com um amor parental. Obrigada por me amar como eu sou.

À Profª Drª Fátima Fontes, pela dedicada e amorosa orientação, por compartilhar comigo seus livros e ainda por suas aulas cheias de entusiasmo, criatividade, inteligência e competência.

À todos meus professores e, em especial, à Profª Drª Patrícia Pazinato que através de suas aulas didáticas de metodologia científica estimulou em mim um espírito investigativo que me levou a acreditar em meu potencial científico e ao desejo de continuar nessa caminhada ingressando em um tempo de produção intelectual e literária.

Aos meus colegas de curso pelos meses de companheirismo e pelos momentos agradáveis em aula e nas confraternizações.

À Rosângela e à Rosalice por me ajudarem nas correções gramaticais e à Isabela pela tradução do Resumo para o inglês.

...a todos, o meu mais sincero agradecimento.

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Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a

consolação; que nos consola em toda a nossa tribulação, para que também possamos consolar os

que estiverem em alguma tribulação, com a consolação com que nós mesmos somos consolados

por Deus.

2Coríntios 1:4

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PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS:

A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

RESUMO

Este trabalho, cujo tema é o aconselhamento como fonte de ajuda a adultos

enlutados por perda de pessoas significativas, é um estudo exploratório sobre as

vivências do Luto e suas repercussões no adulto enlutado por morte de pessoa

significativa para ele, descrevendo o vasto leque de emoções, experiências e

mudanças psicológicas e fisiológicas que ocorrem como resultado da perda. A

autora relaciona a experiência de lidar com o pesar por Morte a partir de três temas

principais: Morte, O processo de Luto e o Aconselhamento do Luto. Tal estudo se

justifica por se fazer necessário que no campo do aconselhamento se amplie os

estudos na direção do cuidado com os enlutados. O estudo propõe investigar a

importância e possíveis benefícios do aconselhamento como um instrumento que

ajudará o adulto enlutado a lidar com a morte e demonstrar as práticas de

intervenção de aconselhamento para o adulto enlutado. O método de estudo

adotado é a pesquisa bibliográfica e o referencial teórico é Collin Murray

Parkes(1998). Os resultados deste estudo têm implicações nas áreas de

aconselhamento, saúde mental, acompanhamento e socorrismo em catástrofes,

desastres, emergências e outros. Podendo ser útil ainda às pessoas que, ao lidarem

com suas perdas desejam ampliar sua reflexão sobre seus significados.

Palavras chaves: Morte. Luto. Perdas. Enlutamento. Grupo de apoio ao Luto.

Conselheiro. Aconselhamento Pastoral.

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GRIEF COUNSELING FOR ADULTS:The importance of the support in coping with the pain of loss.

ABSTRACT

This work aims to study counseling as a source of help and support to adults in grief

at the loss of a beloved person. It is a research about the experience of Grief and its

consequences in the life of an adult mourning the death of a significant one,

describing a wide range of emotions, experiences, and psychological and

physiological changes that occurred as a result of the loss. The author relates the

experience of coping with the sorrow by Death from three main points: Death, The

Process of Grief and Grief Counseling. This study regards as necessary the care with

bereaved people in the field of counseling. It investigates the importance and benefits

of counseling as an instrument to help bereaved adult to cope with death and also

shows practices of counseling intervention in the bereaved life. The results of this

research have impacts on the fields of counseling, mental health care, hospice

services and life saving in catastrophes, disasters, emergencies and others.

Keywords: Death. Grief. Losses. Mourning. Grief Support Group. Counselor. Pastoral

Counseling.

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S U M Á R I O

INTRODUÇÃO...........................................................................................................11

1. BREVES REFLEXÕES SOBRE A MORTE E SEUS DESDOBRAMENTOS......15

2. O PROCESSO DE LUTO.....................................................................................20

2.1.Conceito de Luto............................................................................................21

2.2.Reações normais de Luto..............................................................................21

2.3.Fases do Luto................................................................................................24

2.4.Variações do Luto: patológico e traumático...................................................26

2.5.Luto e Saúde Integral: emocional e física......................................................33

3. PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS............37

3.1.A ajuda que o conselheiro pode prestar aos enlutados.................................39

3.2.Processos terapêuticos e procedimentos de ajuda........................................42

3.3.Os benefícios de grupos de ajuda e apoio aos enlutados.............................46

CONSIDERAÇOES FINAIS.......................................................................................49

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................54

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INTRODUÇÃO

Amor e Luto estão entrelaçadosParkes.

O livro bíblico de Eclesiastes diz: "para tudo há o seu tempo. Há tempo para

nascer e tempo para morrer”.1 Embora o morrer faça parte do cotidiano dos seres

vivos, falar sobre Tanatologia2 ainda é tema evitado, reprimido ou considerado

deprimente, haja vista a reação de uma pessoa quando se comentou com ela sobre

o tema desse trabalho: “você está fazendo terapia? Deveria, porque este assunto é

mórbido!”. Nunca foi fácil falar ou escrever sobre assuntos que envolvam perdas,

dor, sofrimentos e, uma gama de sentimentos outros, muitas vezes dilacerantes,

como é o caso da Morte e o que se segue a ela, o Luto.

O presente trabalho é um estudo exploratório a respeito do tema: O

aconselhamento como fonte de ajuda a adultos enlutados por perda de pessoas

significativas. Buscar-se-á responder a seguinte questão: Qual a importância e

possíveis benefícios do Aconselhamento para os adultos enlutados?

Pode-se experimentar sentimentos semelhantes ao Luto diante de outras

perdas como: desemprego, separações, perda de posição socioeconômica, retirada

de um órgão, mudanças forçadas, dentre outras. Para objetivar nosso estudo

limitamo-nos à perda por morte de pessoa importante para o enlutado.

O entusiasmo e a motivação inicial que despertou o interesse pelo estudo do

tema foi o Luto paterno vivenciado pela própria autora. Esta experiência pessoal

estimulou seu espírito investigativo levando-a a desenvolver esse trabalho como

requisito final para conclusão do curso de Aconselhamento.

Esta pesquisa se justifica, pelo fato da morte de alguém amado se configurar

como a causa de uma devastadora dor na vida de um indivíduo (COLLINS, 2004).

Mediante a morte de alguém querido, alguns se descrevem como tendo sofrido uma

“colisão”, levando algumas delas a se desestruturarem emocionalmente, fato esse

evidenciado pelo sofrimento emocional e físico.

1 A BÍBLIA. Livro de Eclesiastes capítulo 3, versículo 2. Trad. João Ferreira de Almeida. Versão Revista e Atualizada no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.

2 Tanatologia: “área de estudos sobre a morte que inclui tanto um corpo de conhecimento específico quanto os cuidados de pacientes no fim da vida, os processos de luto antes e depois da morte, e temas como suicídio, comportamentos autodestrutivos, eutanásia e suicídio assistido”. (KOVÁCS, 2003, p.148)

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Justifica-se tal estudo ainda pela relevância acadêmica do tema. De acordo

com alguns estudiosos da Tanatologia no Brasil, como área de pesquisa e

intervenção há ainda muito que ser explorado nessa área e faz-se necessário que

no campo do aconselhamento se amplie os estudos na direção do cuidado com os

enlutados. O estudo será importante também para o exercício profissional dos

Conselheiros em suas comunidades de pertença, podendo servir de base para a

criação de trabalhos de suporte e assistência aos enlutados.

Tal estudo tem como objetivo geral explorar o processo de Luto, seus efeitos

e o aconselhamento do Luto. E seus objetivos específicos são: 1) Investigar a

importância e possíveis benefícios do aconselhamento como um instrumento que

ajudará o adulto enlutado a lidar com a morte; 2) Demonstrar as práticas de

intervenção de aconselhamento para o adulto enlutado.

Como aproximação ao tema, primeiramente, apresenta-se algumas

considerações sobre a Morte e o Processo de Luto.

No capítulo I, são feitas breves reflexões sobre a morte e seus

desdobramentos. O objetivo desse primeiro capítulo não é o aprofundamento teórico

da questão da morte, mas enfocar a maneira pela qual o homem lida com este

fenômeno humano universal e inevitável: seus medos, suas angústias, suas

defesas, suas atitudes diante da morte.

No capítulo II a pesquisa centra-se exclusivamente no Processo de Luto

vivenciado por adultos que sofreram perda por morte, deixando de fora do mesmo o

Luto noutras faixas etárias específicas, como é o caso das crianças e adolescentes,

uma vez que eles têm características próprias na forma de sentir a perda e de

viverem o Luto, sendo necessários determinados cuidados específicos. A

abordagem desta pesquisa não envolve morte e Luto por suicídio, pois a questão é

complexa e poderia nos levar além dos objetivos desse trabalho, e também não trata

das diferentes formas de expressão de Luto em culturas distintas. Mas abrange as

variáveis que afetam o curso do Luto desencadeando em Luto Patológico ou

traumático e as questões de saúde emocional e física decorrentes do estresse

causado pela perda. Este capítulo objetiva perceber os efeitos cognitivos,

psicológicos, comportamentais e físicos que entram em ação quando o homem se

encontra diante da morte de uma pessoa especial.

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No capítulo III são abordadas as Práticas de aconselhamento para adultos

enlutados considerando a ajuda e o papel do conselheiro diante de pessoas em

situação de Luto, a demonstração das práticas terapêuticas e procedimentos de

ajuda por meio do aconselhamento e, por último, os benefícios de grupos de apoio

aos enlutados. Nesse trabalho trataremos do aconselhamento dentro de uma

perspectiva pastoral circunscrita, principalmente, ao universo das comunidades de

fé3 de natureza cristã.

A autora adotou como método de estudo a pesquisa bibliográfica que

consiste de livros, artigos online, monografias, teses, revistas e outros. O referencial

teórico que norteia este estudo é o autor clássico Collin Murray Parkes (1998),

psiquiatra, tanatólogo, que mediante suas pesquisas com viúvos e viúvas contribuiu

significativamente para a temática do Luto vivenciada por adultos, especificidade de

nosso trabalho. Vale ressaltar também as importantes contribuições de outros

autores pesquisados como: Kubler-Ross (1998), Bowlby (1998), Worden (1998),

dentre outros.

Na bibliografia que versa sobre a dor da perda que sucede a morte de uma

pessoa amada, os adjetivos, habitualmente, para descrevê-la são: esmagadora,

avassaladora, assustadora, dolorosa, dilacerante, profunda, visceral, intensa. A

magnitude da reação e a desmesura desse acometimento na vida de uma pessoa

constituem-se em um desafio difícil e delicado, porém gratificante para o

conselheiro, que irmanado como parceiro dessa travessia, pode oferecer uma

presença de amor, escuta empática e ser instrumento de ajuda que capacitará as

pessoas a lidarem com este sofrimento que vulnerabiliza, desorganiza e muitas

vezes paralisa a vida do sobrevivente.

Todas as perdas envolvem o rompimento de laços afetivos e há que se

considerar que as implicações dessa experiência não estão limitadas ao psiquismo,

mas a uma experiência humana com raízes em diversas áreas do conhecimento,

inclusive a Teologia.

Ainda que nós, os cristãos, sejamos consolados pela certeza da

ressurreição, não somos poupados do vazio e aflição de sermos obrigados a nos

separar de alguém que amamos. No entanto, este trabalho mostra que manter a fé e

3 Entendemos por comunidade de fé cristã a união daqueles que acreditam em Jesus Cristo como Salvador e Senhor, acreditam na Bíblia como palavra de Deus e anunciam a mensagem de Cristo a outros.

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uma atitude positiva diante dos infortúnios que a vida nos apresenta, contribui para

superar as adversidades e restabelecer a esperança de viver.

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1. BREVES REFLEXÕES SOBRE A MORTE E SEUS DESDOBRAMENTOS

Que homem há, que viva e não veja a morte? Ou que livre a sua alma das garras do sepulcro?

Salmos 89:48

“Para morrer basta estar vivo”, diz a sabedoria popular, mostrando-nos a

vulnerabilidade da vida. Mesmo sendo um fato inevitável para todo ser vivente, falar

de morte é considerado assunto “non” grato, mórbido, assombroso, que nos causa

repulsa. A morte se configura como intrusa, uma invasora que põe fim a existência

dos seres vivos sem pedir permissão e, embora o avanço tecnológico possa retardá-

la, não há como evitá-la, pois cedo ou tarde ela nos “pregará uma peça” e se fará

presente em nossas vidas ou nos levará aqueles que nos são tão preciosos. E

quando ela ceifa a vida de quem amamos, a sensação de dor é tão absurda que

temos a impressão de que vivemos um pesadelo. Nesta hora tudo o que ansiamos é

acordar desse sonho ruim. A tarefa mais difícil é constatar que esse sonho é real e

que é impossível escapar dele.

O abalo da morte é tão grande que se torna difícil o homem tratá-la com

naturalidade encarando-a como sendo mais uma etapa do ciclo da vida, há uma

recusa em se acreditar que é mortal e se age como se a morte não existisse.

Observa-se que esta inaptidão em aceitar a morte faz com que seja criado muito

tabu e negação em torno dela. Para Kubler-Ross (1998) desde os tempos remotos o

homem teve aversão à morte e possivelmente continuará a rechaçá-la. Em seu

inconsciente o homem não compreende que a morte seja possível quando se trata

dele mesmo, sendo inconcebível imaginar de fato o fim de sua existência na terra e,

se a vida tiver um fim, a morte vai sempre estar ligada a uma ação má, a um

acontecimento apavorante e não a uma causa natural ou idade avançada.

(KUBLER-ROSS, 1998).

Entre os seres vivos, somente o homem tem consciência de sua própria

morte. De acordo com Walsh e McGoldrick (1998) o medo da morte é o que nos

provoca maior terror. O medo de morrer é natural e instintivo, atinge a todos, não

importando crenças, idade, gênero, nível sócio-econômico. Talvez porque a morte

seja um evento associado a sofrimento e dor é que ela nos causa tanto medo. O

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pensador e escritor cristão C.S.Lewis (2007) esboça muito bem esse fato quando se

refere ao Luto pela morte de sua esposa:

Ninguém me disse que o Luto se parecia tanto com o medo. Não estou com medo, mas a sensação é a mesma; A mesma agitação no estômago, a mesma inquietação, o bocejo, a boca seca. (LEWIS, 2007, p.29).

A morte provoca uma sensação de impotência muito grande, pois temos de

enfrentá-la como uma condição irreversível, que não podemos controlar ou mudar.

Convivemos com situações de morte diariamente ainda que vivamos em uma

sociedade que a nega o tempo todo. A morte do outro nos remete à nossa finitude e,

de certa forma, está nos preparando para este grande momento. Uma correta

perspectiva da morte nos auxilia a uma maior autenticidade e consciência. Morte e

vida estão amalgamadas durante todo o nosso ciclo de vida. Fugir da morte é fugir

da vida. (LEO, 2005; KOVÁCS, 2005).

Kubler-Ross (1998) declara que entre os mais importantes motivos para fugir

do enfrentamento da morte está o fato de que hoje morrer tornou-se um evento

solitário, desumano e impessoal porque o paciente é levado ao confinamento

hospitalar, rodeado por aparelhagens e profissionais ávidos por prolongar-lhe a vida,

não se preocupando tanto em dar-lhe um tratamento mais humano, como por

exemplo, segurar a mão do paciente, sorrir-lhe e prestar atenção a uma pergunta.

O Artigo 41 do Código de Ética Médica brasileiro4, determina que é vedado ao

médico “abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu

representante legal”, ou seja, eles são impedidos de respeitar a vontade do paciente

no que diz respeito à decisão de desejar ou não prolongar sua vida, quando não há

mais nada que a medicina possa fazer.

A revista Veja5, em sua matéria “A ética na vida e na morte”, diz que “os

questionamentos acerca dos limites entre uma vida insuportável pela doença e uma

morte digna surgem em grande parte das conquistas espetaculares da medicina

ocorridas, sobretudo, nas últimas duas décadas”.

Rubem Alves (2003), em seu artigo “Sobre a morte e o Morrer”, ilustra esse

dilema angustiante do paciente diante da morte:

4 CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA BRASILEIRO. Artigo 41. Disponível em <http://www.portalmedico.org.br/novocodigo/integra_5.asp> Acesso em: 15. Mai. 2010

5 LOPES, Adriana D. A ética na vida e na morte. Veja. São Paulo, edição 2162, nº 17, p. 100-106, abr./2010.

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[...] a morte e a vida não são contrárias, são irmãs [...] tenho muito medo do morrer. O morrer pode vir acompanhado de dores, humilhações, aparelhos e tubos enfiados no meu corpo, contra a minha vontade, sem que eu nada possa fazer, porque já não sou mais dono de mim mesmo; solidão, ninguém tem coragem ou palavras para, de mãos dadas comigo, falar sobre a minha morte, medo de que a passagem seja demorada. Bom seria se, depois de anunciada, ela acontecesse de forma mansa e sem dores, longe dos hospitais, em meio às pessoas que se ama, em meio a visões de beleza. (ALVES, 2000, p.3)

A sociedade ocidental não encara bem a morte e nega seu impacto ao

remover os moribundos do aconchego de seus lares e comunidades. (WALSH;

MCGOLDRICK, 1998). Kubler-Ross (1998, p.11) nos lembra que “já vão longe os

dias em que era permitido a um homem morrer em paz e dignamente em seu próprio

lar”.

Antigamente havia tempo para as despedidas, todos participavam e

vivenciavam a perda iminente com intensidade, inclusive as crianças. Os mortos

eram velados em casa, e os próprios familiares cuidavam da preparação do corpo e

enterro, mas hoje os agentes funerários cuidam de tudo, fazendo a todos

expectadores e não participantes. Desde o século vinte até os dias de hoje o que se

observa é um desejo de que a morte não seja lembrada. Símbolos como o vestir-se

de preto, são quase inexistentes hoje em dia. Velório, despedida, sepultamento,

orações, silêncio, rituais necessários para uma melhor percepção da morte, estão

cada vez mais discretos e rápidos. O enfrentamento da morte e a vivência do

processo de Luto são diretamente atingidos por esta atitude de discrição. (TINOCO,

2003).

Eufemismos e expressões como, “passagem”, “partiu”, “fim”, “está dormindo”,

“passou desta para melhor”, “descansou”, “foi para o andar de cima”, “foi fazer uma

longa viagem”, ou “foi morar no céu”, como é dito às crianças, são usados para

referir-se a ausência inalterável da pessoa morta, dificultando a assimilação e

integração desta em nosso cotidiano. Quanto maior seu evitamento, maior nossa

dificuldade em enfrentá-la e reconhecer que a morte faz parte de um processo

natural da vida e que negá-la é como negar a vida, pois começamos a morrer assim

que nascemos como bem expressa a composição de Toquinho e Vinicius de Moraes

(1971):

Tem dias que eu fico pensando na vida E sinceramente não vejo saída. Como é, por exemplo, que dá pra entender:

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A gente mal nasce, começa a morrer. Depois da chegada vem sempre a partida,Porque não há nada sem separação [...] (TOQUINHO; VINICIUS DE MORAES, 1971)

Nesses últimos anos proliferam cemitérios onde ao invés de jazigos

constroem-se jardins sobre os túmulos que parecem ter a intenção de esconder o

“pavor” da morte, passando-nos a falsa ilusão de que ali não existe morte, mas

apenas vida expressa através das belas plantas.

O avanço da medicina e da tecnologia acirrou o desenfreado desejo pela

eterna juventude do homem pós-moderno, culminando na fantasia de perenidade da

vida humana e gerando, por meio do apego a tudo isso, muito mais angústia e

sofrimento pela conclusão do indiscutível fim de sua existência.

O desejo de transcender à morte leva o homem a desafiá-la e tentar vencê-la,

haja vista as tentativas da ciência em perpetuar a vida através de experimentos de

congelamento do corpo humano após a morte, na esperança de que num futuro

qualquer se possa descobrir como fazê-lo tornar a viver. Porém, KOVÁCS (2008),

considera que a procura do homem não é pela vida eterna, mas pelo anseio de ser

eternamente jovem, para manter os prazeres, formosura e energia que esta fase

proporciona e não a experiência da velhice infindável cheia de perdas, fealdade e

aflições. É relevante aqui observarmos que somos uma sociedade orientada para a

juventude vivendo como que não crendo na extinção de nossa própria vida,

relegando o pensar na morte para os idosos. De qualquer modo, acabaremos por

admiti-la. A morte do outro nos obriga a encararmos a realidade de nossa própria

mortalidade.

O contexto histórico cultural de uma sociedade contribui para a orientação do

homem em relação à morte. Por “orientação quanto à morte” entende-se ser a

amplitude total de pensamento, sentimento e comportamento direta ou indiretamente

relacionados com a morte. Nossas concepções atuais sobre a morte constituem

parte da herança que as gerações anteriores, as antigas culturas nos legaram.

(KASTENBAUM & AISENBERG, 1983). Os mesmos autores prosseguem expondo

que a relação entre religião e morte faz com que nossa cultura veja o morrer como

castigo ou punição. Nesse sentido, os autores expressam a doutrina cristã que

postula que a morte é fruto da desobediência do homem no jardim do Éden. Na

opinião de Kastenbaum & Aisenberg (1983, p.101) “a religião é um dos esforços

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culturais altamente organizados para triunfar sobre a morte, para transcendê-la”. A

Bíblia esboça este fato, no capitulo 15, versículo 55 do livro de Coríntios em que

profere: “onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?”

Segundo os cristãos, ou seja, de acordo com sua doutrina e filosofia, há

continuação pós-morte. Cristo, através de sua crucificação e ressurreição, derrotou a

morte e prometeu que todo aquele que nele crê “não morrerá, eternamente”6.

Quando se trata da morte de um ser amado, esta visão transcendental pode até

amenizar o desconforto e ajudar a enfrentá-la, mas nem sempre diminui a dor e a

necessidade de consolo.

A morte daqueles a quem amamos nos assola, privando-nos,

temporariamente, da alegria de viver, nos levando a um vazio, falta de sentido e

ânimo para continuar vivendo. A dor acompanha a morte e o processo de Luto se

faz necessário para a elaboração de nossa perda (KOVÁCS, 2008). No capítulo

seguinte examinaremos as vivências do Luto adulto por morte e suas repercussões,

descrevendo o vasto leque de emoções, experiências, mudanças e condições que

ocorrem como resultado da perda.

6A BÍBLIA. Português. Livro de João, capítulo 11, versículo 26. Tradução de João Ferreira de Almeida. Versão Revista e Atualizada no Brasil. 2ª Ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.

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2. O PROCESSO DE LUTO

Estou cansado de tanto gemer; todas as noites faço nadar o meu leito, de minhas lágrimas o alago.

Salmos 6:6

“Bem-aventurados os que choram porque serão consolados”Mateus 5:4

Amor e Luto são duas faces da mesma moeda: não é possível sentir o

primeiro sem correr o risco de se deparar com o segundo. Possivelmente, somente

ao entender a natureza do amor e o significado dos vínculos afetivos pode se

compreender completamente o impacto de uma perda e o comportamento humano

que o acompanha. Muitos autores escreveram sobre o desenvolvimento do apego.

Bowlby (1998) está entre os que mais contribuíram para este assunto escrevendo

muitos livros e artigos sobre apegos e perdas. Sua Teoria do Apego é

fundamentalmente uma teoria da origem e natureza do amor. Esta diz respeito à

formação dos laços afetivos entre as crianças e seus progenitores ou figuras de

cuidado. Segundo a sua teoria a formação do apego nasce da necessidade que se

tem de se sentir seguro e protegido. Este sistema de apego mantém-se na vida

adulta, cooperando para a formação de atitudes do indivíduo nas relações

amorosas.

Os padrões de apego influenciam os padrões de Luto, conclusão a que

chegou Bowlby (1998) através de seus estudos. A dimensão de sofrimento no Luto e

a reação a ele estão proporcionalmente relacionadas com a extensão de apego ao

objeto perdido, ou seja, quanto maior nosso investimento afetivo maior nossa dor à

perda e maior energia necessária para este desligamento. As dependências físicas

ou psíquicas são fatores que podem agravar o desligamento com o objeto.

(KOVÁCS, 2008). Ligamo-nos uns aos outros com um forte sentido de posse, por

isso quando a morte nos separa do objeto amado, esta é vista como perda, e não

como uma transição inerente à existência (FRANCO, 2005 Apud CATERINA, 2008).

Luto. Este é o começo de um período muito difícil, de um tempo de dor e de

emoções confusas, de um tempo de mudanças e transformações das realidades

internas e externas.

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2.1. Conceito de Luto

A palavra Luto é definida no Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa

(2009, p.1236), como: “sentimento de pesar pela morte de alguém.” Para Freud

(1916, p.245), é a “reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração

que ocupou o lugar de um ente querido, como o país, a liberdade ou ideal de

alguém, e assim por diante”. De acordo com Collins (2004, p.407), “Luto é uma

reação natural à perda de qualquer pessoa, objeto, ou oportunidade que era

importante para nós”. Parkes (2008, p.15), descreve o Luto como sendo a

“expressão dos vínculos que as pessoas estabelecem umas com as outras.” E

conforme Lazán (1989, p.12), “o Luto é a elaboração congnitiva e emocional do

impacto de um trauma sobre a pessoa”. Assim o sentimento de Luto pode ocorrer

sempre que uma parte da vida se vai ou é tirada de nós.

Outros tipos de perdas e mudanças podem nos remeter ao Luto, como

divórcios, desemprego, migração forçada, morte de um animal de estimação,

esterilidade/infertilidade, amputação de um membro, aposentadoria, a perda da casa

ou de outro bem valioso, de uma paixão ou de uma amizade significativa. Portanto,

Luto é uma fase de pesar pelo qual passamos cada vez que perdemos algo de valor,

de importância central para nós. O Luto é uma reação à perda e perdas são comuns

em nossas vidas, entretanto Parkes (1998) adverte que o termo Luto é mais

comumente usado para designar a perda de uma pessoa em especial, uma pessoa

querida.

2.2. Reações normais de Luto.

O Luto é um processo e não um estado estático, é uma reação normal,

transitória, que a maior parte de nós experimentará um dia, envolvendo uma

variedade de pensamentos, comportamentos e sentimentos como dor, angústia e

outros sofrimentos por uma perda significativa. É uma experiência pessoal que cada

um vive ao seu modo e leva-se tempo para recuperar, podendo durar até um espaço

de dois anos quando se trata de Luto normal.

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Quem já passou por tal circunstância sabe que os sentimentos são múltiplos,

confusos e intensos. De acordo com alguns pesquisadores o processo de Luto é

composto de um conjunto de emoções expressas através de tristeza, saudade,

culpa, medo, auto-acusação, raiva, irritabilidade, ambivalência, sensação de

ansiedade e impotência, solidão, fadiga, desamparo, choque, anseio, alívio,

estarrecimento. Os estudiosos também apontam que pessoas em Luto manifestam

considerável déficit de memória, distúrbios do sono e do apetite, sonhos com o

morto que dão à pessoa enlutada a sensação de que são reais, isolamento social,

confusão mental levando a pensamentos desordenados e falta de concentração,

sensação cognitiva da presença do morto e, descrença com relação ao mundo e a

Deus. Afora as sensações fisiológicas, que também são normais e consideradas

significativas no processo de Luto, sendo as mais comuns: palpitações cardíacas,

vazio no estômago, perda do interesse sexual, aperto no peito, nó na garganta,

visão borrada, hipersensibilidade ao barulho, sensação de despersonalização (nada

parece real), falta de energia e boca seca. Estes aspectos são características

frequentemente associadas ao Luto normal, mas devemos considerar as diferenças

individuais. (PARKES,1998 e WORDEN, 1998).

Perdas são grandes desafios da vida, parece que para algumas pessoas o

Luto é uma experiência intensa, para outras, moderada e o início do processo de

Luto é diferente de pessoa para pessoa, para uns podendo acontecer logo após a

perda e para outros adiado para alguma experiência futura, como por exemplo,

quando se vê uma fotografia da pessoa falecida ou em datas comemorativas como

aniversários de nascimento e falecimento ou festividades como o Natal. Dificilmente

alguém fica indiferente a ela quando se trata de uma pessoa importante para si, e se

acontecer em condições especiais agrava seu impacto e potencializa ainda mais sua

desorganização psíquica. Nas pesquisas de Parkes (1998), ele não encontrou

alguém que não tivesse tido alguma reação à perda em maior ou menor grau. Ele

compara a dor da perda como a uma ferida física relatando-a da seguinte forma:

O luto assemelha-se a uma ferida física mais do que qualquer outra doença. A perda pode ser referida como um “choque”. Assim como no caso do machucado físico, o “ferimento” aos poucos se cura. Ocasionalmente, porém, podem ocorrer complicações, a cura é mais lenta ou um outro ferimento se abre naquele que estava quase curado. Nesses casos surgem as condições anormais, que podem ser ainda mais complicadas com o aparecimento de outros tipos de doenças.

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Muitas vezes parece que o resultado será fatal. (PARKES 1998, p.22).

Quando alguém está em sofrimento acha que sua dor é a maior e pior de

todas, que a vida é dura demais com ele, pois para cada indivíduo sua aflição é

única. Cada um sabe dimensionar sua dor e seus recursos para enfrentá-la. As

viúvas enlutadas das investigações de Parkes (1998), falavam que a sensação que

tinham era como que tivessem perdido um pedaço de si mesmas. Uma viúva

descreveu seus sentimentos quando viu o corpo do marido: “é como se eu estivesse

virada do avesso, com uma horrível ferida”. Muitas vezes a comparação é feita com

amputação. As viúvas falavam que o marido foi “arrancado”, “como se metade de

mim tivesse desaparecido”. (p.124).

O Luto com frequência dura muito mais do que os próprios enlutados

esperam e gostariam. É comum sentir-se deprimido e debilitado depois da perda, em

geral isto é temporário para muitas pessoas enlutadas. Mas a sociedade com sua

impaciência com o pesar, pressiona o enlutado para que volte à vida normal

rapidamente, contribuindo para que ele acredite que suas reações ao Luto não são

normais. Familiares e amigos cheios de boas intenções, mas sem estarem cientes

da dinâmica do processo de Luto, emitem palavras do tipo “seja forte”, “reaja”, “pare

de chorar”. Percebe-se que este fenômeno pode ser mais grave ainda nas

comunidades religiosas de pertença dos enlutados, quando, muitas vezes, são

encorajados a manter autocontrole sobre suas emoções em nome da crença em

Deus e são precocemente orientados a abandonar a experiência do trabalho de

Luto. A mensagem subliminar que é passada é a de que aqueles que reagem

demasiadamente consternados em sua dor, são considerados insuficientes e fracos

em sua fé em Deus. É muito difícil para o enlutado enfrentar essa mensagem

poderosa que o incentiva a reprimir seus sentimentos, sem levar em conta a

necessidade de sua psiquê de viver o Luto abertamente. Assim, o enlutado passa a

ter uma conduta meramente aceitável em seu “meio”, mascara sua dor, correndo o

risco de vir a ter uma disfunção emocional ou fisiológica em seu processo de Luto.

Reafirmando essa posição, Worden (1998, p. 92) relata que “o Luto

mascarado ou reprimido geralmente assume uma das duas formas: tanto ele pode

ser mascarado por sintomas físicos, quanto por algum tipo de conduta aberrante ou

mal-adaptada.” O mesmo autor referiu que se as pessoas não vivem seu Luto de

forma direta podem apresentar queixas sintomáticas semelhantes àquelas

Page 24: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

apresentadas pela pessoa que faleceu. Amiúde, a dor pode ser um símbolo de Luto

mascarado ou diversos tipos de distúrbios psicossomáticos podem esconder um

Luto não-resolvido subjacente. Vamos voltar a falar sobre este assunto mais a frente

quando estivermos tratando das questões de Luto e adoecimento.

Parkes (1998) também destaca outro ponto importante: assim como é preciso

que as pessoas tenham um tempo para se enlutar, é preciso também que tenham

um tempo para pôr fim ao Luto, para parar de se afastar da vida e para recomeçar

uma nova vida.

A perda de uma pessoa querida pode ser devastadora e a pessoa pode ser

levada a se sentir esmagada pela dor. Algumas entram em colapso quase que

imediatamente, ao passo que outras descobrem que têm tremendas reservas

interiores que as capacita a lidar até mesmo com períodos prolongados de crise

intensa. Ainda que um sujeito enlutado possa nunca se recuperar completamente da

perda, a maioria consegue retornar a uma vida produtiva e à restauração de seu

bem-estar mental e físico. (COLLINS, 2002; COLLINS, 2004).

Parece haver um consenso quanto à necessidade de se elaborar o Luto por

um processo, bem como quanto ao seu alto valor adaptativo quando transcorre de

uma forma natural e em condições normais.

Antes de prosseguirmos mostrando como o Processo de Luto se desenvolve

e algumas condições que desfiguram seu curso, nos utilizamos das palavras

animadoras de Parkes (1998):

Assim como ossos quebrados podem se tornar mais fortes do que os não quebrados, a experiência de enlutamento pode fortalecer e trazer maturidade àqueles que até então estiveram protegidos de desgraças. A dor do Luto é tanto parte da vida quanto a alegria de viver; é, talvez, o preço que pagamos pelo amor, o preço do compromisso. Ignorar esse fato ou fingir que não é bem assim é cegar-se emocionalmente, de maneira a ficar despreparado para as perdas que irão inevitavelmente ocorrer em nossa vida, e também para ajudar os outros a enfrentar suas próprias perdas. (PARKES, 1998, p. 23).

2.3. Fases do Luto

Alguns estudiosos como Bowlby (1998) e Parkes (1998) definem quatro

fases do Processo de Luto, que não necessariamente ocorrem de forma linear e

Page 25: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

totalmente previsível. Essas fases serão abordadas em forma de itens para uma

melhor apreensão de suas etapas:

1) Fase do entorpecimento (choque) que normalmente dura minutos, horas

ou uma semana que pode ser seguido de manifestações de desespero,

raiva e outras emoções intensas. Parkes (1998) menciona que nesta etapa

não se acredita que a perda é real, e a capacidade de agir e controlar-se é

feita de forma automática, que denota um complexo processo mental no

qual a pessoa afasta-se da situação como uma forma de defesa por ser

algo além do que se pode suportar.

2) Fase do anseio e procura, podendo durar meses e até mesmo anos, onde

há a negação da perda e desejo que a figura perdida retorne. Os

pensamentos são ocupados com o morto constantemente. “Anseio é uma

resposta normal ao Luto. Quando ele diminui, pode ser um sinal de que o

Luto está terminando.” (WORDEN, 1998, p. 39).

3) Fase de desorganização e desespero. Inclui também incerteza, falta de

objetivo, apatia e isolamento. A emoção característica é a depressão, e a

pessoa tende ao isolamento evitando contato e aproximação com aqueles

que podem solicitá-la e protegê-la de alguma maneira. “A pessoa enlutada

encontra dificuldade em funcionar no ambiente.” (WORDEN, 1998, p. 50).

4) Fase de reorganização (readaptação), em que se dá a aceitação e,

movimentos são feitos em prol de dar continuidade a vida ocorrendo

mudanças de atitudes e investimentos em outros aspectos da vida.

O objetivo de se identificar fases do Luto não é para sugerir que toda pessoa

enlutada tenha que passar por esse processo na ordem e na forma acima citadas.

Ademais, cada pessoa experiencia-o com suas particularidades e de maneira

peculiar, podendo ocorrer variações como: em alguns momentos os sintomas são

ambíguos, ora parecendo ter superado a fase aguda do Luto, ora recaindo

novamente num momento de tristeza e angústia.

Worden (2008, p.51), aludindo a estas fases afirma que o conceito de “tarefas

do Luto” apresenta uma compreensão do trabalho de Luto muito mais útil para o

conselheiro. Ele fala de uma abordagem onde o Luto cria tarefas que precisam ser

executadas. Em sua opinião as tarefas sugerem que há algo que o enlutado

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efetivamente precisa fazer sendo o agente de mudanças em sua vida, ao contrário

das fases ou estágios, como alguns as descrevem, que dão a entender como

alguma coisa que tem que ser atravessada e que pode ser influenciada pela

intervenção externa.

Walsh e McGoldrick (1998) concordam com o conceito de tarefas de Worden

quando dizem que há tarefas adaptativas críticas que precisam ser desempenhadas

para que as famílias não fiquem vulneráveis à disfunção. Desta forma, realizar as

quatro tarefas básicas do processo de Luto, implica: 1°) aceitar a realidade da morte;

2°) não sabotar os sentimentos evitando o sofrimento; 3°) ajustar-se a um ambiente

onde a pessoa falecida está ausente e 4°) reinvestir em outras relações e projetos

de vida. Como já foi mencionado anteriormente, a adaptação não têm uma escala

ou sequência fixa.

As autoras acima seguem falando que o amoldamento à perda não significa

necessariamente uma aceitação completa e categórica da perda. Para a maioria dos

indivíduos e suas famílias, elaborar a perda não é garantia de alcançar uma

resolução completa. (WORTMAN; SILVER Apud WALSH; MCGOLDRICK).

Por mais que haja tentativas em se determinar o término do processo de Luto

é difícil ser assertivo em estabelecer datas para a etapa final deste. Para alguns ele

pode durar semanas, para outros meses ou anos. A maioria das viúvas pesquisadas

por Parkes (1998) precisou de 3 ou 4 anos para alcançar a estabilidade perdida.

Bowlby (1998) e Parkes (1998) referem que o processo de Luto encerra-se quando

uma pessoa completa a fase final do Luto de restituição. E na opinião de Worden

(1998), quando as tarefas de Luto são concluídas o Luto está finalizado e, além

disso, ele realça que um sinal de que o Luto foi elaborado é quando não existe mais

dor ao pensar no falecido. Acrescenta ainda que o Luto está finalizado quando a

pessoa consegue reinvestir suas emoções na vida e no viver.

2.4. Variações do Luto: patológico e traumático

Ainda que o Luto envolva elevada medida de sofrimentos não é considerado

doença e, supõe-se que depois de passado algum tempo a pessoa supere a perda e

Page 27: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

volte à vida normal. Todavia, quando o processo de Luto se complica, temos o Luto

patológico que demanda cuidados médicos, psicológicos e apoio social.

Freud (1916), fazendo analogia entre Luto e melancolia, refere que no Luto é

o mundo que se torna pobre e vazio e na melancolia7 (depressão), que para ele era

uma forma patológica de Luto, é a pessoa que se torna pobre e vazia. Diante da

morte, o enlutado tem ciência do que perdeu, mas não o que ele perdeu nesse

alguém e, Parkes (1998) seguindo esta mesma linha, comenta que no Luto

raramente está muito claro o que foi perdido. Apesar de o Luto ser um processo

demorado e doloroso, Freud (1916) refere que este se resolverá por si só

paulatinamente, quando o enlutado encontrar objetos substitutivos para o que foi

perdido, prescindindo de intervenção externa.

Parkes (2006) faz referência ao Luto patológico também com a seguinte

terminologia: Luto crônico, traumático, complicado, adiado ou não-elaborado. Afirma

que apesar de um Luto patológico apresentar “muitas das características

encontradas nos transtornos psiquiátricos, é somente quando ele se prolonga muito

e causa dano às funções da vida normal que pode ser considerado ´patológico´”

(PARKES, p.42). Outros autores consideram a qualidade da dor e as funções

psicológicas atingidas pela perda.

Parkes (1998) alude que muitos dos que procuram ajuda psiquiátrica por Luto,

estão sofrendo de formas intensas e prolongadas de Luto. Suas pesquisas

realizadas com viúvas mostraram que a perda do marido é o tipo mais comum de

perda que ocasiona problemas psicológicos. Há evidências de que perdas de filhos

também podem causar distúrbios psicológicos.

A patologia está mais relacionada com a intensidade da dor e a duração da

reação do que com a presença ou não de comportamentos específicos.

(HOROWITZ, 1980 Apud WORDEN, 1998).

A dimensão do Luto e o ajuste à perda são determinados por alguns fatores

que podem influenciar o resultado do Luto gerando uma reação disfuncional em sua

elaboração:

7 Para a psicanálise,” tanto o termo depressão quanto a expressão estados depressivos, hoje tão presentes em nosso cotidiano, têm sido pouco utilizados. O vocábulo melancolia, escolhido por Freud, foi mais bem aceito e é tradicionalmente empregado.” (EDLER, 2008).

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- O homem é um ser ambíguo. Um relacionamento altamente ambivalente

com hostilidade não-expressa, via de regra, impede as pessoas de terem um Luto

adequado. Na ambivalência, que são sentimentos simultâneos de amor e ódio, há

desejo pela morte do outro e quando esta ocorre, a pessoa que assim o desejou

pode apresentar quantidade excessiva de raiva e culpa e, mitiga esta culpa

permanecendo em um estado de Luto intenso e duradouro. (WORDEN, 1998).

- Indivíduos imaturos (não importa a idade), que mantém uma relação de

apego inseguro ou que são altamente dependentes de outra pessoa, podem

evidenciar problemas no momento do Luto, predispondo-os a uma reação de Luto

patológica. Os que são dependentes em seus relacionamentos, e depois perdem a

fonte dessa dependência, são tomados de sentimentos de fragilidade, desamparo e

sofrem alteração na auto-imagem. (KASTENBAUM & AISENBERG, 1983;

WORDEN, 1998). Quando a dependência é recíproca, o enlutado também tende a

ter problemas. Neste caso, quando a perda é de alguém que se apoiava nele, este

está em posição idêntica à mãe que perde um filho, completa Parkes (1998).

- O histórico de como perdas foi construído no passado sugere em como

serão elaboradas as perdas atuais. Pessoas que tiveram reações complicadas em

suas perdas anteriores são mais propensas às mesmas complicações no presente.

Os que têm uma história prévia de doença depressiva também correm um risco

maior de desenvolver reações disfuncionais ao Luto. Perdas parentais múltiplas e

próximas, como uma mãe que perdeu seu filho logo após ter perdido um dos pais,

podem patologizar o Luto. (WORDEN, 1998).

- Outro determinante importante da intensidade do Luto são os aspectos da

personalidade provenientes da carga genética. Parkes (1998) admite não ter dúvida

de que há pessoas que são mais vulneráveis em sua personalidade aos elementos

estressores. Worden (1998) corrobora tal fato ao referir que os fatores de

personalidade estão relacionados com o caráter e com a forma como ele afeta a

capacidade da pessoa em suportar situações estressantes. Pessoas com dimensões

de personalidade que não toleram extremos de estresse emocional; que constroem

suas defesas em torno de evitação de sentimentos de desamparo; que o conceito

que têm de si mesmas é de que são a pessoa forte da família e que se mantêm

desempenhando esse papel em seu próprio detrimento, têm dificuldades de

vivenciar os sentimentos necessários para uma adequada resolução de uma perda.

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Bolwby (1998) é coerente com esta posição ao atentar para as dimensões da

personalidade para o enfrentamento da perda. O autor destaca 5 tipos de variáveis

que assinalam para o Luto patológico: a) a identidade e o que a pessoa morta

representava em questão de papel e função na vida do enlutado; b) a idade e o sexo

do enlutado – mulheres sucumbem mais e têm maior dificuldade na readaptação; c)

as circunstâncias e os motivos causais da perda – mortes súbitas e inesperadas

tendem a um maior grau de perturbação; d) as circunstâncias sociais e psicológicas

que afetam o enlutado na época em que sofreu a perda e durante os meses ou anos

subsequentes; e) sua capacidade de estabelecer relações amorosas e de reagir a

situações estressantes.

- O Luto na verdade é um fator psicossocial8 e é com apoio social que as

pessoas podem superar melhor seus sofrimentos. A rede social do sujeito enlutado é

um determinante que pode exercer um papel de elevada importância no

desenvolvimento de reações de Luto patológico, como é o caso de morte por

suicídio onde a perda é socialmente não comentada. Neste caso, há uma tendência

dos amigos e familiares de se calar sobre a circunstância da morte. Essas

conspirações de silêncio são danosas, pois as pessoas enlutadas, frequentemente,

necessitam falar de sua perda aos outros. Importa considerar, ainda, outros dois

fatores sociais complicadores: quando a perda é negada; ou seja, quando tanto o

enlutado quanto aqueles que o cercam agem como se a morte não tivesse

acontecido e, a ausência de uma rede adequada de apoio social. A falta de apoio

social provoca o isolamento da pessoa enlutada, porque ela se enraivece pelo

afastamento das pessoas no momento em que ela mais precisaria de ajuda. A raiva

é um dos fenômenos que pode agravar suas reações ao Luto. (WORDEN, 1998;

FREITAS, 2000).

- E como último elemento complicador do Luto que queremos destacar, está

os fatores circunstanciais. Os estudiosos do Luto afirmam que o modo como a morte

acontece repercute substancialmente na resposta ao Luto. Entre as condições que

representam riscos especiais que podem originar complicações psicológicas

traumáticas citamos: exposição à violência de guerra, assistir atos de violência ou

mutilação, mortes por assassinato, homicídio e suicídio, mortes onde não é possível

8 Psicossocial: campo da intervenção psicológica que visa o desenvolvimento humano completo e equilibrado (integral) e a prevenção dos problemas de origem psicológica (que afetam as pessoas) e sociais que afetam muitas pessoas e têm determinantes sociais. (VIDAL, 2007)

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recuperar o corpo incólume, mortes súbitas, múltiplas e precoces, dentre outras.

Parkes (2006) descreve o impacto traumático das perdas múltiplas:

Nas áreas de desastres, mortes múltiplas têm a probabilidade de ser rápidas, inesperadas, horríveis e associadas a desorganização social e outras epidemias. Estas são particularmente traumáticas e complexas. Uma batida de carro que mata o cônjuge e dois filhos de uma pessoa pode não ser um desastre público, mas do ponto de vista do sobrevivente a experiência é igual [...]. Pessoas que experienciam perdas múltiplas não só sofrem os efeitos cumulativos do Luto, mas sua suposição de que o mundo é um lugar seguro onde desastres não acontecem é corroída e substituída por uma expectativa de futuros desastres. (PARKES, 2006, p. 260, 261).

“Um ´trauma´ é um golpe [...]. Todos os Lutos são traumáticos, mas alguns

são mais traumáticos do que outros.” (PARKES, 2006, p.45,159).

Discriminamos o Luto traumático enfatizando os desastres ambientais que,

embora sempre fizessem parte da história da humanidade, nos últimos tempos vêem

acontecendo cada vez mais frequentemente e com maior intensidade. Inundações e

deslizamentos como têm ocorrido no Brasil, o terremoto no Haiti neste ano,

tsunamis, tornados, ciclones, erupções vulcânicas nas mais altas escalas são

fenômenos que têm atingido várias partes do mundo, vitimizando centenas ou

milhares de pessoas e causando situação de Luto em massa muitas vezes. São

calamidades que resultam em tragédias que afetam a população local provocando

grande estrago material, físico e emocional na vida dos sobreviventes. Segundo os

pesquisadores, essas situações emergências constituem-se em um cenário

propenso para o desenvolvimento de psicopatologias9 como o Transtorno de

Estresse Pós-Traumático – que conforme Parkes (2006), é parte das reações ao

Luto traumático - em pessoas que perderam parentes ou sobreviveram a esses

desastres, diante de tamanha carga emocional e traumática.

Em estudos citados por Parkes (2006) concluiu-se que enlutados que mais

procuraram ajuda psiquiátrica foram aqueles que sofreram um ou mais tipos de

perdas traumáticas. Quando o Luto decorre de uma situação traumática, há um

grande impacto para a identidade e a capacidade de enfrentamento.

Perdas traumáticas ou significativas podem nunca ser totalmente resolvidas.

(WALSH; MCGOLDRICK, 1998)

9 Psicopatologia: “pode ser definida como o conjunto de conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser humano. Como campo de estudo inclui um grande número de fenômenos humanos especiais ligados aos estados mentais e padrões comportamentais em conexão com as doenças mentais e com a psicologia normal.” (DALGALARRONDO, 2000, p.22)

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Define-se o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)10 como sendo a

perturbação psíquica que “afeta pessoas que passaram por um evento psicológico

e/ou físico extremo, interpretado como particularmente doloroso”. (GREENBERG,

2002, p.50 ). Segundo Burns (2005), este quadro surge como uma

resposta tardia a e/ou protraída a um evento ou situação estressante (de curta ou longa duração) de natureza excepcionalmente ameaçadora ou catastrófica, que provavelmente causa angústia invasiva em quase todas as pessoas (por exemplo, desastre natural ou feito pelo homem, combate, acidente sério, testemunhar a morte violenta de outros ou ser vítima de tortura, terrorismo, estupro ou outro crime. (BURNS, 2005, p.15)

Burns (2005) pontua que ainda que uma personalidade pré-disposta ou

história prévia de doença neurótica vulnerabilizem o indivíduo traumatizado e

agravem o curso da síndrome, não são elementos necessários e suficientes para

explicar sua ocorrência.

O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) se diferencia dos demais

transtornos de ansiedade e da maioria dos transtornos mentais por ser causado a

partir de um fator externo. As seqüelas de ter vivido essa tragédia se manifestam na

forma de ataques de pânico, insônia, pesadelos recorrentes, irritabilidade,

isolamento social, dificuldade de sentir determinadas emoções e dores sem

fundamento físico, dentre outros.

Reações emocionais intensas e manifestações compatíveis com o momento

traumático vivenciado são esperadas em crises emergencias como os desastres

ambientais. Contudo, transformam-se em problemas quando não solucionados no

seu devido tempo. Um exemplo, conforme Lazán (1989, p. 15) assinala é “’quando

uma pessoa não elabora seu Luto oportuna e adequadamente e/ou reage de forma

disfuncional diante do trauma e dos sintomas iniciais”, pode-se desenvolver uma

crise reativa secundária como o Luto traumático.

É comum tragédias ou traumas desencadearem uma tremenda crise pessoal,

e esta provocar reações psicossociais. Uma crise é a combinação de duas

realidades: um perigo e uma oportunidade. O perigo está quando a pessoa atingida

10 “Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT): consiste num tipo de recordação que é melhor definido como revivescência, pois é muito mais forte que uma simples recordação. Na revivescência além de recordar as imagens o paciente sente como se estivesse vivendo novamente a tragédia com todo o sofrimento que ela causou originalmente. O transtorno então é a recorrência do sofrimento original de um trauma, que além do próprio sofrimento é desencadeante também de alterações neurofisiológicas e mentais”. Disponível em <http://www.psicosite.com.br/tra/ans/estrespos.htm>. Acesso em 20 Jun. 2010.

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pela crise atua de maneira disfuncional diante de sua realidade e a oportunidade

está no fato de que a pessoa faz da tragédia pessoal um motivo para amadurecer e

crescer em todas as instâncias de sua vida. (LAZÁN, 1989)

Percebe-se que a superação de circunstâncias traumáticas ou outras

adversidades depende da capacidade de resiliência11 de cada um. Pessoas são

diferentes e reagem de formas diferentes em ocorrências similares, “variando de

acordo com a estrutura psíquica e espiritual e com as experiências anteriores da

pessoa no manejo de crises” (HOCH, 2008, p.145). O paradigma da resiliência

parece sugerir que nem todos que experienciam situações traumáticas

inevitavelmente apresentam sinais de trauma.

Para Parkes (1998):

As diferenças entre Estresse pós-traumático e o pesar por Luto, visto como reação psicológica a um evento traumático importante, são claras [...]. O Luto é, afinal, uma resposta normal para um estresse que, embora raro na vida de cada um de nós, será vivido pela maioria, mais cedo ou mais tarde, sem que seja considerado uma doença mental. (PARKES,1998, p.21;20)

Nos parágrafos subseqüentes, consideraremos a acentuada relação existente

entre o Luto por morte de alguém importante e o que acontece no psiquismo de

pessoas que sofreram perdas em sua história de vida, que se ligam a reações

sintomáticas que os levam ao adoecimento físico.

11Resiliência “é a capacidade para desenvolver-se bem, para continuar projetando-se no futuro apesar dos acontecimentos desestabilizadores, de condições de vida difíceis e de traumas às vezes graves. É a capacidade humana universal de lidar e superá-la, aprender ou mesmo ser transformado com a adversidade inevitável da vida”. (ROCCA, 2007, p.10).

Page 33: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

2.5. Luto e Saúde Integral: emocional e física

Dê palavras à sua tristeza; a dor que não fala sussurra para o coração, e pede para ele rachar.

Shakespeare Macbeth, IV, 3, 208

Vários estudos têm averiguado a relação entre Luto e o surgimento de

doenças e morte em pessoas enlutadas.

Há evidência que sentimentos reprimidos, como a raiva, podem ser

causadores de doenças psicossomáticas. A raiva desencadeia um fluxo de energia

pelo corpo. Porque a consideramos não autorizada a ser sentida e expressa, nós a

negamos e recalcamos, o que pode gerar adoecimento. A raiva é um elemento

comum no processo de Luto. Ganhamos muito quando identificamos a raiva e,

depois, a expressamos verbalmente e adequadamente no trabalho de elaboração da

perda. (POUJOL & POUJOL, 2006).

Em uma pesquisa com o propósito de analisar 4.486 viúvos com 55 anos ou

mais durante os seis primeiros meses após o Luto foi descoberta uma taxa de

mortalidade superior à esperada. Em pesquisas recentes constataram-se vários

fatores associados com o acréscimo na taxa de mortalidade entre enlutados. Uma

nova descoberta explica o mecanismo fisiológico por trás da suscetibilidade dos

enlutados: uma supressão do estímulo dos linfócitos – significando uma diminuição

na eficácia do sistema imunológico – entre homens enlutados principalmente. Uma

vez que a AIDS atinge o sistema imunológico, pessoas com AIDS são mais

vulneráveis aos efeitos do Luto. (GREENBERG, 2002; PARKES, 1998).

“Atualmente, estudos demonstram que interações entre emoções e coração

têm correspondentes bioquímicos bem definidos”. (OLIVEIRA, LUZ, 2002 Apud

RUSCHEL, 2006. p.17). Parkes (1998) e colegas, concluíram que a doença que

provocava o maior número de mortes entre viúvos era a doença cardíaca. Muitas

são as causas e origens das doenças cardiovasculares. Alguns dos múltiplos fatores

de risco são: colesterol elevado, pressão alta, fumo, hereditariedade, diabetes

mellitus, obesidade, sedentarismo e tensão psicológica ou estresse. Dentre os

aspectos estressantes relacionados com doenças coronárias, figura-se o Luto.

Page 34: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

Observa-se que eventos como a morte de um familiar, insatisfação pessoal,

profissional e outros, sejam responsáveis por crises de angina ou infarto. A falta de

preparo psicológico para elaborar frustrações e perdas, provavelmente, influencia

também para tornar o indivíduo propenso à doença coronariana ou infarto,

principalmente se for organicamente predisposto ou se apresentar fatores de risco.

(CAMPOS, 1992; et. al Apud RUSCHEL, 2006).

Parkes (1998, p. 34) faz menção a uma citação bíblica, que segundo ele,

provavelmente, é a origem da expressão “coração partido”. “Consertem o ´coração

partido´, disse Isaías e, a partir daí, parece ter persistido a idéia de que um Luto

grave pode danificar de alguma forma o coração.”

Alguns autores asseveram que as crises psicossociais e doença estão

coligadas:

Nem sempre é a partir da doença orgânica que surgem conflitos internos e crises emocionais as quais, juntamente com outros aspectos, caracterizam o quadro de uma doença. Muitas vezes, são conflitos emocionais que vão deteriorar a resistência interna no indivíduo, ou seja, a capacidade de autodefesa frente ao adoecimento, criando condições que facilitem a instalação e/ou o surgimento da doença orgânica. O adoecer tem implicações no organismo e no psiquismo do indivíduo. Quando existem distúrbios psíquicos, pode haver alteração no curso da doença influindo, inclusive, no índice de morbidade e de mortalidade. Para o paciente coronariano, os fatores internos e externos geradores de estresse emocional são fatores determinantes da doença. (GIANNOTTI, 1998; CÔRTE, 1998; OLIVEIRA, 1995 et. al Apud RUSCHEL, 2006. p.17-18)

Embora sejam as mulheres que mostrem mais problemas psicológicos na

experiência de Luto, são os homens que apresentam maior incidência de morte de

ataque cardíaco após óbito do cônjuge, possivelmente, porque são os homens que

têm maior dificuldade de expressar os sentimentos e de buscar ajuda. (PARKES,

1998; WORDEN, 1998).

A literatura não deixa dúvida de que o Luto é um dos agentes estressores que

provocam males físicos. O termo estresse foi introduzido na medicina sendo definido

como “um conjunto de reações que um organismo desenvolve ao ser submetido a

uma situação que exige esforço para adaptação”. (CAMPOS, 1992 apud RUSCHEL,

2006). Como já foi referido, a reação ao estresse, implica em abundantes mudanças

em nosso corpo e

essas mudanças muitas vezes levam a interpretações emocionais, o que fica evidenciado pelo nosso uso de expressões como mãos geladas. Ficamos com as mãos geladas quando estressados porque há uma constrição de vasos sanguíneos nos braços e pernas. Quando estressados,

Page 35: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

podemos sentir o corpo todo rígido. Claro que sim! Isso ocorre porque a tensão muscular aumenta. (GREENBERG, 2002. p.28)

D´Assumpção (2003) menciona que há diversos estudos que apontam uma

estreita relação entre o sofrimento por perdas importantes e o aparecimento do

câncer. O autor salienta que, embora essa ligação seja ainda bastante questionada,

quem lida com pessoas que passam por perdas sabe que isso é bastante comum.

Citamos um estudo de Lindemaan (Apud GREENBERG, 2002) que objetivou

avaliar reações ao Luto, onde ele relata que 33 de 41 pacientes com úlcera

“desenvolveram a doença em relação direta com a perda de uma pessoa

importante.”(p.43).

Embora seja difícil relacionar um evento causal e um sintoma especial que se

segue a ele, o Luto pode ser considerado como circunstância precipitadora de

doenças pré-existentes. As doenças caracterizam-se pelo desconforto e pela

alteração de função que causam. O Luto causa desconforto e altera as funções.

(PARKES, 1998).

Muitas doenças físicas e mentais têm sido imputadas à experiência de perda.

Pouco se conhece sobre as causas das doenças mentais, exceto no caso do

estresse pós-traumático. Este se denuncia por um conjunto de sintomas que

normalmente aparece quando a pessoa sofre sérias ameaças à sua vida ou assiste

cenas aterrorizantes. Os psiquiatras passaram a entendê-lo como um diagnóstico

clínico após tê-lo considerado responsável por muitas das doenças encontradas nos

veteranos de guerra. Suas características são as lembranças apavorantes, vívidas

que dão à pessoa a impressão de estar vivendo o trauma repetidas vezes.

Segundo Parkes (1998), só existem dois distúrbios psiquiátricos funcionais

onde a causa é conhecida, bem definida e possui curso, na maioria das vezes,

previsível: Transtorno de Estresse Pós-Traumático e Luto. O autor diz que:

[...] entre as muitas doenças mentais que podem ser provocadas pelo Luto, as mais freqüentes tendem a envolver formas atípicas de pesar embora difiram em intensidade e duração das reações mais comuns do Luto, com aspectos que podem ser exagerados ou distorcidos, e não diferem quanto ao tipo. Não há sintomas que sejam peculiares ao Luto patológico, ainda que pareça razoável considerar expressões extremas de culpa, sintomas de identificação e adiamento do início do Luto por período superior a duas semanas, como sendo indicadores de que a reação à perda poderá tomar um curso patológico. (PARKES, 1998, p.143).

Parkes (1998) relata que pesquisas de colegas com pessoas com queixas de

saúde, tais como, glaucoma do ângulo fechado, câncer, distúrbios

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cardiovasculasres, lúpus eritematoso disseminado, tireotoxicose, anemia perniciosa,

pneumonia, artrite reumatóide, tuberculose e colite ulcerativa; apresentavam alto

índice de perdas em suas histórias de vida. O autor segue falando que em outra

pesquisa com 72 viúvas entrevistadas após 2 anos de Luto; 43% queixavam-se que

sua saúde geral piorou após o Luto. Ele ainda cita outra pesquisa onde foi bastante

grande o número de queixas associadas ao Luto: dores de cabeça, problemas

digestivos, reumatismo e asma. O autor complementa dizendo que em suas próprias

pesquisas evidenciou-se que viúvas recém-enlutadas vão ao clínico geral num

intervalo menor do que o faziam antes do Luto. A maior freqüência ao clínico deu-se

por ansiedade, depressão, insônia e outros sintomas psicológicos, que eram

visivelmente atribuíveis ao Luto.

Por fim, mencionamos ainda a pesquisa feita por Madison et. al (Apud

PARKES, 1998) com viúvas com idade inferior a 60 anos, que configurou traços

típicos do Luto. Alguns dos sintomas encontrados foram: depressão, pânico, insônia,

perda de apetite, peso e fadiga. Subsequentemente, Parkes (1998) e companheiros

confirmaram essas pesquisas de Madison na Escola de Medicina de Harvard.

Parece evidente que as reações ao Luto podem repercutir na saúde de uma

forma ou de outra, apesar de não se poder afirmar dogmaticamente que este é,

isoladamente, o causador de algumas enfermidades em pessoas enlutadas.

Convém ressaltar que a maioria das pesquisas não apresenta resultados

conclusivos e é necessário que se faça mais pesquisas na tentativa de estabelecer a

cadeia de causas. O que se pode afirmar é que nas evidências cuidadosamente

coletadas em várias pesquisas realizadas por Parkes, foi possível estabelecer com

precisão a relação entre um sistema orgânico específico e o Luto, e essa correlação

ocorreu com o sistema cardiovascular. (PARKES, 1998).

Diante do exposto neste trabalho até aqui, onde investigamos algumas

reações, sentimentos, comportamentos e sintomatizações, face ao processo de

adultos em situação de enlutamento, apresentaremos no próximo capítulo, os

elementos que deverão compor uma prática eficiente do aconselhamento para com

os aconselhandos adultos em tal situação.

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3. PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS

Não há nada mais importante na vida do que colaborar com Deus na reconstrução de uma vida destruída. Alguns chamam isso de aconselhamento.

Eu chamo de ministério, e tem sido sempre um trabalho de equipe que envolve três pessoas: Deus, o indivíduo necessitado, e eu.

Richard Exceley

A morte de uma pessoa amada, como já vimos, provoca uma ampla gama de

reações que são naturais e esperadas após uma perda significativa. Observa-se que

com frequência as pessoas conseguem suportar uma situação de vida a qual

precisam adaptar-se e, salvo em períodos temporários de tensão ou crise incomuns,

têm os recursos adequados para superá-la. No entanto, algumas apresentam

dificuldades em lidar com seus sentimentos em relação à perda e, por isso não são

capazes de passar pelas tarefas de Luto por si mesmas, completando-as

satisfatoriamente. Nestes casos, o aconselhamento é recomendável para ajudá-las a

resolver seu Luto de forma mais eficaz. Parece que o aconselhamento pode ajudar

na prevenção de desenvolvimento de problemas mais sérios no processo de Luto.

Hurding (1995, p. 36) visualiza o aconselhamento dentro de uma perspectiva

ampla quando o define como sendo: “uma atividade com o objetivo de ajudar aos

outros em todo e qualquer aspecto da vida, dentro de um relacionamento de ajuda.”

E Collins (1992, p. 12) entende que um dos objetivos do aconselhamento é: [...]

“prover encorajamento e orientação para aqueles que tenham perdido alguém

querido ou esteja sofrendo uma decepção [...].”

Schipani (2004) em suas pesquisas e trabalhos na área do cuidado pastoral

explora a natureza da teologia prática do aconselhamento pastoral12. Para este autor

a igreja cristã precisa resgatar o papel essencial do aconselhamento pastoral na vida

das comunidades de fé.

O referido autor enfatiza a singularidade da função dos pastores como sábios

cuidadores do Reino de Deus e recomenda que pastores e outros cuidadores

12 O aconselhamento pastoral costuma ser visto como uma dimensão especializada do cuidado pastoral que se utiliza de variados métodos de cura (terapêuticos) para ajudar as pessoas a lidar com seus problemas e crises conduzindo-as ao crescimento de forma holística. Clinebell (2007). Sua singularidade consiste: pastores treinados são capacitados a integrar insights dos métodos psicoterapêuticos, “por um lado, com os recursos das tradições judaico-cristãs e os recursos de comunidades de fé, por outro”. Clinebell (apud SCHIPANI, 2004, p. 15).

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aconselhem aqueles que passam pelo Luto. “Na verdade são chamados a fazer tal

aconselhamento não como profissionais da saúde mental no sentido psiquiátrico13,

mas como ministros do evangelho e representantes dignos do Cristo cura d´almas.”

(SCHIPANI, 2004, p. 73).

O mesmo autor defende que o aconselhamento pastoral deve ser

considerado a partir de uma perspectiva teológica como ministério da igreja para ser

um sacramento14 vivo do reino e da sabedoria de Deus.

Nessa linha de raciocínio Collins (2004) profere que a igreja tem a seu cargo

o cuidado pastoral uma vez que as escrituras pronunciam que os cristãos devem

carregar as cargas uns dos outros: “o aconselhamento pastoral pode e deveria ser

um ministério exercido por cristãos sensíveis e zelosos, tenham eles sido, ou não,

ordenados ao pastorado.”(p.15).

Clinebell (2007) fazendo eco com Collins (2004), expressa esse mesmo

argumento ao ver a Igreja como uma comunidade terapêutica: “membros da igreja

de um modo geral e a equipe poimênica15 leiga em particular deveriam estar

orientados para atuar como extensão sucedânea da família para aqueles que

carecem de um sistema de apoio, oferecendo-lhes quaisquer ajuda prática e apoio

emocional que necessitem.” (CLINEBELL, 2007, p. 217).

13 Schipani (2004) não aprova o modelo médico/psiquiátrico que trata o aconselhamento pastoral como um ramo da indústria psicoterápica ou das profissões da saúde mental. Sua concepção de aconselhamento pastoral consiste em integrar perspectivas e contribuições psicológicas e teológicas no sentido de aprender uma com a outra aumentando ao máximo o potencial de complementaridade entre cada disciplina, mas mantendo a integridade distinta de cada uma.

14 “Uso aqui o termo sacramento intencionalmente com o sentido triplo de sinal, símbolo e instrumento da graça [...] a igreja é chamada a ser um frutífero instrumento da graça, meio e agente da sabedoria alternativa de Deus no mundo e em benefício do mundo” (SCHIPANI, 2004, p. 78).

15 “Poimênica deriva da palavra grega poimen (pastor) e que também é uma disciplina da teologia prática, voltada principalmente para o aconselhamento pastoral.” “Pode incluir as atividades da igreja dirigidas para manter e restaurar a saúde e integralidade de indivíduos e comunidades no contexto dos propósitos redentores de Deus para toda a criação.” (Schipani, 2004, p.7,15 – notas explicativas).

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3.1. A ajuda que o conselheiro pode prestar aos enlutados

Existem muitas evidencias de que os seres humanos, de todas as idades, serão mais felizes e mais capazes de desenvolver seus talentos quando

estiverem seguros de que, por trás deles, existe uma pessoa ou mais pessoas que virão em sua ajuda caso surjam dificuldades.

John Bowlby

Várias são as fontes de ajuda que uma pessoa que passa pelo Luto pode

receber. Parkes (1998) realça que nossa primeira fonte de apoio é nossa família,

depois os amigos, médicos e os religiosos. Parkes (1998) também destaca que

estas duas últimas classes de pessoas têm recebido pouco treinamento para

prestarem apoio às pessoas que estão morrendo, e aos enlutados.

É essencial que o Conselheiro ou a pessoa que se propõe a acompanhar

enlutados compreenda o impacto que perdas significativas provocam nos indivíduos

enlutados, em seu sistema familiar e em suas outras interações. Sabendo avaliar

adequadamente o impacto o conselheiro poderá ser um instrumento útil para

identificar as medidas de intervenção que serão propostas. Alguns enlutados

carecerão de maior atenção e apoio social de suas comunidades de pertença.

Espera-se da figura de cuidado que ela seja capaz de distinguir formas sadias das

formas doentias de expressão do Luto e faça o encaminhamento para pessoas

especializadas no assunto, quando for o caso. (HOCH, 2008).

O conhecimento dos fatores determinantes do Luto pode ajudar o Conselheiro

a identificar as pessoas enlutadas as quais seria apropriado oferecer

aconselhamento ou outras formas de ajuda para o período do Luto. (PARKES,

1998). Nota-se que nesse processo de reconhecer as pessoas que tendem a reagir

mal ao enlutamento, é importante o papel do pastor como conselheiro para que as

pessoas recebam a ajuda que necessitam. Percebe-se que é vital que o agente de

pastoral saiba ajudar as famílias enlutadas de sua congregação a elaborar as tarefas

de Luto. Clinebell (2007) nos testemunha o quanto foi prejudicial seu pastor não ter

sabido ajudar sua família elaborar a perda de sua irmã mais nova:

A morte de minha irmã mais nova, Rute, em seu primeiro aniversário, quando eu tinha quatro anos e meio, lançou uma sombra profunda sobre a nossa família. Todos nós pagamos um preço alto por não saber como experimentar a cura do nosso pesar. Mais de trinta anos de vivacidade reduzida, de acossamento crônico e de depressão periódica em minha vida, foi o que veio após a morte de Rute, até que minha ferida de pesar,

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infectada, porém oculta, veio a ser lancetada em minha terapia, de modo que pudesse sarar. Se nosso pastor tivesse sabido ajudar nossa família a expressar e resolver nossos devastadores sentimentos de perda e culpa, todos nós poderíamos ter sido poupados de anos de sofrimento desnecessário e de integralidade diminuída. (CLINEBELL, 2007, p.212)

Um conselheiro pode prestar ajuda de diversas formas:

- Colocar-se a disposição após o sepultamento para dar apoio e atenção é

uma atitude esperada de um conselheiro pastoral. Parkes (1998) considera de

grande valia uma visita residencial de um cuidador na hora certa, sendo

recomendável não fazer a visita antes das primeiras 24 horas, porque os enlutados

estão naquele estado de dormência característico sem condições de avaliar seu

estado de confusão. Para Clinebell (2007, p. 216) “é crucial que o apoio assistencial

à família continue durante as semanas e meses após o funeral. Muitas pessoas não

se dão conta de que os enlutados continuam precisando de apoio especial durante o

longo processo de assimilação da perda.”

- O conselheiro pastoral deve estar preparado para mostrar sua aceitação às

manifestações de raiva contra Deus que são naturais nesta hora. Tentar abafar as

emoções dos enlutados com dogmas e sermões exuberantes não ajudará em nada.

Por outro lado, quem busca ajuda de um conselheiro pastoral espera encontrar uma

resposta religiosa para seus problemas. O indicado é que os conselheiros pastorais

ofereçam as respostas para as quais estejam qualificados sem menosprezar a

importância delas. (PARKES, 1998).

- Providenciando ajuda prática. Após o funeral é necessário que a família

enlutada receba ajuda nas questões práticas, como: fazer comida, serviços

domésticos, cuidar dos papéis, etc. O conselheiro ou outro agente de poimênica

podem ser útil ao assumirem muitos dos papéis, tarefas e responsabilidades

costumeiros do enlutado, deixando-o livre para vivenciar seu Luto. Parkes (1998)

considera que demonstrações de afetividade nesta hora são menos importantes do

que mostrar-se presente e prestar apoio prático: “A verdadeira ajuda consiste em

permitir que o enlutado fique disponível para elaborar sua perda.” (PARKES, 1998,

p. 205).

- O conselheiro pode ser útil para orientar a pessoa enlutada a postergar por

alguns meses decisões importantes, como: venda de um bem ou mudanças de casa

ou emprego. (COLLINS, 2004).

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- Compete ao conselheiro ajudar a pessoa enlutada a entender a realidade da

perda para que consiga aceitar o fato. Também faz parte de sua função estimular a

manifestação de suas emoções, acolher, aceitar que, provisoriamente, é o substituto

da pessoa amada. Para tal, deve estar apto a dar conforto e ajudar o enlutado a

resgatar as esperanças, a fim de ajudá-lo a resolver os conflitos de separação do

ente querido e facilitar a tarefa de elaboração do Luto. (FREITAS, 2000). O

conselheiro que gastar seu tempo permitindo ao enlutado “falar sobre seus

sentimentos e temores estará dando uma nova dimensão ao aconselhamento e

maior profundidade à sua relação com essa pessoa”. (PARKES, 1998, p. 222).

- O sistema de apoio dos enlutados tende a diminuir quando seus amigos se

afastam por não saberem o que fazer e temerem piorar as coisas. (PARKES, 1998).

Esta é uma boa oportunidade para o conselheiro mostrar-se solidário oferecendo

apoio e encorajamento.

- O agente de poimênica deve tomar cuidado para que a pessoa em Luto não

seja estimulada a uma dependência doentia, escondendo-se da realidade e negando

o que lhe aconteceu. Um dos alvos a ser estabelecido pelo conselheiro para ajudar o

aconselhando a resolver sua perda é mostrar-lhe como ativar recursos disponíveis

tanto internos quanto externos para que consiga lidar de forma saudável com a crise

da perda e suas ramificações nos níveis pessoais e familiar. (CLINEBELL, 2007).

Com o tempo, devido a atenção e apoio da família, dos amigos e de sua

comunidade de fé, a pessoa conseguirá completar o processo de Luto e voltar a sua

vida normal.

3.2. Processos terapêuticos e procedimentos de ajuda

“O amor é incomparavelmente o maior agente terapêutico”Gordon Allport

O autor dessa epígrafe, segundo Collins (2004, p.21), sugeriu que o

conselheiro secular não pode prover o amor que, muitas vezes, o aconselhando

necessita. O amor é “algo que a psiquiatria profissional não pode criar por si

mesma, nem focalizar, nem liberar”. Collins (2004) acresce que o autor da epígrafe

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questiona: seria plausível o cristianismo oferecer uma abordagem fundamentada na

base do amor e, portanto poder auxiliar onde o aconselhamento não-cristão falha?

Collins (2004) dá a entender que para algumas pessoas o amor não é suficiente,

demandam mais ajuda, tornando significante considerar outras influências

terapêuticas. “O ajudador cristão eficiente mostra amor. Isto é básico, fundamental.

Mas ele ou ela também busca desenvolver qualificações terapêuticas e tenta tornar-

se perito no conhecimento das técnicas fundamentais de aconselhamento.”

(COLLINS, 2004, p. 21)

É indispensável que aqueles que se propõem a oferecer uma relação de

ajuda saibam amparar eficazmente pessoas em situação de crise. Elencamos

alguns procedimentos de ajuda terapêutica (processos de aconselhamento) como

propostas para que os agentes de poimênica possam prestar ajuda aos enlutados

(LAZÁN, 1989):

1) Oferecendo uma escuta empática:

A pessoa enlutada precisa sentir-se ouvida e compreendida. Pode-se chamar

de escuta empática quando nos colocamos na “pele do outro”, para perceber o

mundo como a pessoa que sofreu a perda o percebe. Escutar empaticamente

significa estar com ela em sua dor, captar as palavras, os gestos, o tom de voz, a

postura, o rosto, etc. É servir de espelho para que seus pensamentos e sentimentos

possam ser refletidos. Não é recomendável dizer à pessoa que está de Luto que a

entendemos, se não mostrarmos isso pela nossa forma de ouvi-la.

Observa-se que em momentos de dor o que mais desejamos é uma presença

de amor e acolhimento de nosso sofrimento. Os estudiosos do Luto sugerem que a

perda e a dor, primeiramente, sejam reconhecidas e só depois seja feita alguma

tentativa em prol de suavizá-la. Portanto, a escuta empática exige de nós que

seguremos o nosso desejo de: ordenar; dar conselhos; dirigir; dar soluções; impor;

julgar; mandar; criticar; admoestar; culpar; advertir; rotular; ameaçar; dar sermão;

interpretar; moralizar; psicoanalisar; espiritualizar; etc. (LAZÁN, 1989).

2) Facilitando a catarse:

A escuta empática favorece a catarse que é a exposição dos sentimentos

reprimidos. Os condicionamentos sócio-culturais tendem a prejudicar a expressão

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dos sentimentos, tornando possível àqueles que o refreiam a desenvolverem uma

crise secundária pós-Luto. (LAZÁN, 1989).

Não tenha medo de falar com a pessoa afetada acerca de suas emoções: se elas forem elaboradas e resolvidas, não haverá problemas. Se isso não foi feito, a pessoa já se encontra com vários meses de atraso no processo de elaboração do Luto, e a melhor terapia possível nesse momento é justamente começar a falar sobre essas perdas. (LAZÁN, 1989, p. 26).

Incentive-a a falar, “falar é o melhor remédio”. (BURNS, 2005, p.36). Falar

ajuda a aceitar a realidade da perda. Falar tende a evitar sintomatizações. “Quando

a boca cala o corpo fala (surgem os sintomas) e quando a boca fala o corpo sara”

(informação verbal)16.

3) Ajudando na ampliação perceptual:

Uma técnica terapêutica de intervenção importante é facilitar a percepção do

indivíduo enlutado de que seus sintomas e reações iniciais são normais e naturais.

Tranquilizar a pessoa esclarecendo que ela é normal tendo reações normais. “Uma

das melhores formas de ajudar uma pessoa que sofreu perdas é ensinar-lhe o que

foi dito até aqui: o processo normal, natural e necessário do luto.” (LAZÁN, 1989, p.

27).

4) Enfrentamento da questão do suicídio17:

A possibilidade de suicídio é comum em situação de grandes perdas, como

acontecem nas tragédias de grandes proporções. É preciso abordar a questão de

forma aberta e honesta quando se percebe a fixação da idéia. O cuidador não deve

recear fazer perguntas diretas ao enlutado a respeito de qualquer tentativa de

suicídio, como por exemplo, perguntar-lhe: “você tem se sentido tão mal que chegou

a pensar em se matar?”. Pessoas que correm esse risco devem ser encaminhadas a

um psiquiatra. (PARKES, 1998).

Entre os fatores de risco que tendem ao suicídio estão: insônia crônica; ter

visões ou ouvir vozes que lhe dão ordens; sofrer perdas múltiplas dos únicos entes

queridos, várias ameaças de suicídio, história prévia de tentativa de suicídio pessoal

ou de familiares, alcoolismo ou abuso de drogas, etc. Merece atenção também

16 Frase citada pela Profª Fátima Fontes em sala de aula no curso de pós-graduação em Aconselhamento, Faculdade Teológica Batista de São Paulo, ano 2009-2010.

17 Nota da autora: a questão do suicídio não está dentro do foco que demos ao nosso trabalho, mas achamos importante pontuarmos essas poucas instruções de aconselhamento caso seja diagnosticado um potencial suicida no enlutado.

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atitudes suspeitas, tais como: deixar organizados seus futuros assuntos pessoais,

aparentar estar se preparando para uma longa viagem ou uma repentina serenidade

inexplicada etc. (LAZÁN, 1989).

5) Encaminhamento oportuno:

O Conselheiro deve estar alinhado com o tratamento em rede. Principalmente

no caso de trauma psicossocial não pode haver uma intervenção sem a rede social.

Quando a severidade do evento é grande é preciso a ajuda de profissional

adequado como: assistente social, psicólogo ou psiquiatra. “Isto não significa loucura

ou fragilidade, mas indica simplesmente que a reação ao evento foi tão forte que a

pessoa não pode controlar-se sozinha e pode contar com a ajuda para isso.“

(BURNS, 2005, p.35).

O conselheiro ou outro ajudador deve ter acesso às informações necessárias

para que possa fazer esses encaminhamentos de forma adequada e corretamente.

Os enlutados que merecem atenção especial são aqueles “totalmente incapazes de

expressar qualquer forma de Luto; manifestações histéricas ou por demais

demoradas de Luto; isolamento total e prolongado do enlutado (indício de

depressão); tentativas de suicídio; abandono do trabalho e do contato com amigos.”

(LAZÁN, 1989, HOCH, 2008, p.71).

6) Ter e comunicar fé:

A fé é um excelente agente terapêutico: a fé em Deus, no futuro e na

capacidade da pessoa enlutada de superar suas dificuldades e avançar para novos

investimentos. (LAZÁN, 1989).

O agente de pastoral ou outra pessoa que, em nome da comunidade cristã,

trabalha com enlutados têm na fé cristã, na Bíblia e na oração uma fonte inestimável

de recursos para auxiliar pessoas enlutadas. Assuntos como “sofrimento”,

“lágrimas”, “pranto”, “lamentação” etc, são corriqueiros nas páginas da Bíblia. Cabe

ao cuidador saber valer dos textos bíblicos para transmitir o conforto que eles

proporcionam, de forma eficaz e imbuída do espírito que lhes são devidos. (HOCH,

2008).

7) Ajudas adicionais:

Page 45: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

No Brasil há organizações que lidam com as questões de perda, que prestam

ajuda e oferecem treinamento para aqueles que desejam trabalhar com pessoas em

situação de Luto:

Rede SOS Global – tem como missão enviar ajuda integral na forma de

socorro médico, técnico, alimentar, psicológico e espiritual, no prazo mais curto

possível, a partir da Igreja brasileira, para os locais onde acontecem catástrofes de

desastres naturais e, ou humanos (guerra), em qualquer parte do mundo, com

grande número de vítimas necessitando de ajuda emergencial. Site:

http://www.sosglobal.org.br/

Eirene do Brasil – É uma associação internacional, de raízes Latino-

americanas, sem fins lucrativos, de profissionais cristãos que trabalham em favor do

desenvolvimento, fortalecimento e defesa da saúde integral da família no Brasil, na

América Latina e no mundo. Site: http://www.eirene.com.br/quemsomos.html

Instituto Quatro estações – um grupo de profissionais de Psicologia que

criou uma proposta de atuação em serviços para perdas e Luto, a partir da

experiência junto a pessoas que passam ou passaram por situações de luto em sua

vida pessoal ou profissional. Site: http://www.4estacoes.com/quemsomos.asp

LELU– laboratório de estudos e intervenções sobre o Luto da PUC-SP. Site:

http://www4.pucsp.br/clinica/servicos/lelu.htm

SOTAMIG – Sociedade de Tanatologia de Minas Gerais. Site:

http://www.sotamig.com.br/

3.3. Os benefícios de grupos de apoio aos enlutados

Não havendo sábia direção, cai o povo;Mas na multidão de conselheiros há segurança.

Provérbios 11:14

O aconselhamento em grupo também é recomendado para os casos de Luto.

A troca de vivências nos grupos justifica sua importância. Dentre os casos que se

beneficiam de aconselhamento em grupo, pode-se mencionar: situações de

Page 46: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

emergências (psicossocial), crise do Luto, depressões reativas, desajustes

emocionais, etc.

O aconselhamento do Luto em grupo é eficaz para poder oferecer o apoio

emocional que a pessoa enlutada está buscando. “Os conselheiros podem

encaminhar ou coordenar estes grupos de apoio e estimular seu uso.” (WORDEN,

(1998, p. 68).

Algumas pessoas enlutadas têm dificuldades para aceitar a sugestão para

participarem de um grupo de aconselhamento para o Luto. Mas algumas delas

podem encontrar bastante benefício nesta experiência quando os primeiros impactos

do Luto tiverem passado. (PARKES, 1998).

O objetivo principal de um grupo de apoio é ajudar aqueles que apesar da

perda escolheram sobreviver. “E é possível distinguir quem fez essa opção pelo

simples fato de a pessoa procurar algum tipo de ajuda, em suas perdas. Quem

busca ajuda está aberto para recebê-la.” (D´ASSUMPÇÃO, 2003, p. 15)

Conforme D´Assumpção (2003), as funções básicas de um grupo de

aconselhamento de Luto se orientam por alguns princípios:

- um grupo de apoio mútuo deve fornecer a quem está de Luto orientação

adequada e prática sobre o processo evolutivo do Luto, mediante palestras, debates,

exercícios objetivos. Prover orientação também sobre outras formas de ajuda

adequada: espiritual, psicológica, médica e legal. É indispensável que os

organizadores estejam munidos das informações que lhes permitam dar as

respostas apropriadas, aproveitando todas as oportunidades para ajudar os que

necessitam dessa complementação de apoio.

- o apoio em grupo é um bom meio para conhecer pessoas com a mesma

vivência, colaborando, até mesmo, para que os enlutados não se isolem

socialmente. Nele criam-se oportunidades para compartilhar o pesar sem receios,

onde os participantes podem constatar que não são os únicos que sofrem e que

podem existir dores maiores do que as deles.

- Quem está de Luto deve descobrir meios e caminhos para sua recuperação.

Um grupo de suporte ao Luto deve ser um lugar adequado para se trocar ideias,

sentimentos e emoções. Um lugar ideal para que se possa debater os prós e os

contra de algumas mudanças que podem ocorrer num momento de sofrimento.

Page 47: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

Sobre a organização dos grupos de aconselhamento para o Luto, D

´Assumpção (2003) nos apresenta dois modelos de curto prazo, que segundo sua

experiência tem alcançado excelentes resultados. O primeiro modelo é realizado em

seis sessões de duas horas cada uma, uma ou duas vezes por semana. E o

segundo, com duração de um dia. Este autor considera o primeiro modelo mais

eficaz por causa do maior tempo para o trabalho individual, mas afirma que o

segundo modelo também consegue ótimos resultados.

Assim como no aconselhamento individual, o aconselhamento em grupo deve

ser focal, limitado à melhora dos sintomas específicos e dirigidos para o propósito de

auxiliar os enlutados a descobrir os seus caminhos. A proposta não é tratar de

problemas paralelos, os quais poderão exigir diferentes técnicas e abordagens. Por

isso, como já ressaltamos, é importante se ter profissionais de referência para os

encaminhamentos necessários. (D´ASSUMPÇÃO, 2003).

Há que se tomar cuidado para que o grupo de ajuda mútua não seja

dominado pelos membros mais perturbados. Precisa ser conduzido por um líder

bem-treinado para que não se torne antiterapêutico. (PARKES, 1998).

Os seguintes requisitos para quem deseja trabalhar como coordenador de um

grupo de apoio ao Luto são indispensáveis: ter uma boa experiência em conduzir

grupos; ter conhecimento sólido sobre Tanatologia e já ter elaborado bem suas

próprias perdas. (D´ASSUMPÇÃO, 2003).

Os grupos de aconselhamento do Luto oportunizam a formação de novos

relacionamentos que podem continuar depois que o grupo termina. Destacando-se

como um dos maiores benefícios dos grupos de apoio este é um dos passos

importantes no processo de cura como um todo que podemos facilitar por meio de

nossos esforços de aconselhamento. (WORDEN, 1998).

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá Luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram.

Apocalipse 21:4

A vida, em maior ou menor grau, é cheia de intempéries, não poupa a

ninguém. A morte é a situação de vida mais difícil de lidar e enfrentar. Concordamos

com Collins (2004) quando ele narra que não podemos transformar a morte em algo

bonito ainda que tentemos atenuar o trauma usando eufemismos ou cercando o

corpo falecido com belas flores. É raro alguém conceber a morte como um episódio

importante e significativo, inerente à vida e transicional. Em nossa cultura ocidental

a morte é vista como algo terrível e, por mais que haja esforços para uma educação

para a morte18, provavelmente está longe ainda de esse entendimento mudar.

Entretanto, vários autores garantem que nossa visão sobre a morte influi em nossa

forma de lidar e de se ajustar a situação. Ao encaramos a morte com mais

naturalidade e realidade seu enfrentamento será mais suave e saudável.

Nosso dia-a-dia é feito de pequenos Lutos: perdas de bens, de “status”, de

emprego, de animais de estimação etc., e isso aponta para o estado temporário das

coisas e nos prepara para a perda maior: a morte de alguém que significa muito para

nós. O tema do Luto cedo ou tarde atinge a todos nós. O Luto é inevitável para

aqueles que têm grande apego ao objeto amado. (PARKES,1998). A profundidade

de uma dor é diretamente proporcional à intensidade do amor.

Aqueles que têm pais idosos sabem que a qualquer momento poderão perdê-

los. Fazer de conta que isto nunca acontecerá, não querer tocar no assunto, só

aumenta a dor e angústia quando somos “pegos de surpresa”. Cristo disse: “no

18 Segundo alguns autores da temática do Luto afirmam, a tendência hoje e para os próximos tempos é a de diminuição da negação da morte, pois nos últimos tempos surgiu a Educação para a morte matéria e assunto que vem permitindo que mais pessoas tenham um aprendizado maior sobre a morte, morrer e luto, principalmente os profissionais da área de saúde. No Brasil pesquisadoras como Maria Julia Kovács do LEM - Laboratório de Estudos Sobre a Morte da USP e Maria Helena Franco Bromberg do LELÚ - Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto da PUC são os nomes mais citados e requisitados quando se trata desse assunto.

Page 49: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

mundo tereis aflições”.19 Viver num mundo de negação com dificuldade para aceitar

que a vida é cheia de tribulações denota a nossa imaturidade e falta de sabedoria.

No decorrer da vida, passamos por muitas mudanças que envolvem ganhos e

perdas. É necessário abrir mão e deixar o morto partir. Parkes (1998, p. 28) acredita

ser a base do Luto a nossa “relutância em abrir mão de posses, pessoas, status,

expectativas”. É libertador quando percebemos que podemos viver sem aquilo que

pensávamos que não podíamos viver, que apesar da perda, podemos seguir

adiante, reconstruir e reorientar a vida para novos investimentos, encontrando

substitutos para o objeto perdido.

A morte nos empurra para o desequilíbrio. É preciso nos recolocar no prumo,

ajustar-nos ao ambiente aprendendo a viver com a ausência da pessoa amada.

Acabamos por descobrir que temos a habilidade de nos adaptar às demandas da

vida. Que somos resilientes. No seio das “trevas” algo que ficou intacto em nosso

ser pode ser acionado. (POUJOL & POUJOL, 2006). Além do mais, a morte pode

nos prestar o favor de nos ensinar a valorizar a vida e a dar mais valor aos nossos

queridos que estão vivos e às coisas simples em torno.

As perdas são consideradas como momentos de grande crise pessoal no

desenvolvimento humano, exatamente porque nós, seres humanos, nos apegamos

afetivamente, partilhamos a vida e nos amamos. Na crise nós nos perdemos.

Precisamos de tempo para sair da crise, pois é um processo. Porém, as crises

desencadeiam reações que nos movem para outras direções e oportunizam

mudanças significativas em nossas vidas. É uma ocasião para descobrirmos

algumas verdades sobre nós mesmos e para amadurecermos. Nosso sofrimento nos

humaniza, não seremos mais as mesmas pessoas diante de alguém em sofrimento,

como apregoa Hugo Santos (2008):

Quem não passou pela escola do sofrimento, não só permanece pobre no conhecimento de si mesmo, como será incapaz de se solidarizar com a crise e o sofrimento do outro. Se é verdade que na crise existe cruz, é igualmente verdade que na crise pode haver benção. (Hugo Santos, 2008, p.153)

”Um dos objetivos da poimênica e do aconselhamento é capacitar as pessoas

a reagir às suas crises encarando-as como oportunidades de crescimento. [...] Toda

19 A BÍBLIA. Português. Livro de João, capítulo 16, versículo 13. Tradução de João Ferreira de Almeida. Versão Revista e Atualizada no Brasil. 2ª Ed. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993.

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crise é também uma oportunidade de crescimento espiritual”. (CLINEBELL, 2007,p.

33).

No Luto somos marcados pela dor. Ela é concreta e deve ser corretamente

vivida. É importante que os que desejam ajudar e os próprios enlutados reconheçam

suas necessidades psicológicas. O tempo psicológico para cada individuo é único. A

alma pede tempo e disposição para esse tempo. “O luto é um processo de

aperceber-se de tornar real o fato da perda. [...] A pessoa enlutada sente-se apoiada

quando aqueles que estão próximos mostram não ter medo de deixar emergir sua

tristeza.” (PARKES, p. 205).

O apoio social exerce um papel fundamental para que os enlutados possam

expressar seus sentimentos de forma aberta, sem temerem que suas reações sejam

interpretadas como anormais, o que nem sempre é verdade. Nas palavras de

Greenberg (2002, p. 53) “o apoio social diz respeito a ser aceito, amado, necessário,

´pelo que se é e não pelo que se pode fazer´”. Significa ter alguém com quem se

pode compartilhar alegrias, mas também dores. O apoio social pode ser oferecido

por familiares, amigos, profissionais de saúde, etc. Entre aqueles que oferecem

apoio social deve estar o agente de pastoral.

Normalmente as pessoas não procuram auxílio até que tenham alguma

dificuldade e reconheçam sua necessidade de ajuda. É importante que o pastor

congregacional entenda o aconselhamento pastoral como uma dimensão do cuidado

pastoral e não espere que as pessoas busquem assistência. Clinebell (2007)

aconselha que o pastor tome a iniciativa de oferecer ajuda àqueles que estão

passando por dificuldades:

Uma das mais importantes vantagens do pastor é não precisar esperar até que as pessoas peçam ou procurem ajuda. Conforme a definição do papel profético do pastor, espera-se que nós tomemos a iniciativa no sentido de proporcionar ajuda a pessoas que dela precisam, mas que ainda não estão dispostas a pedir auxílio. [...] o aconselhador pastoral pode tomar a iniciativa, entrando em contato com as pessoas em crise e estabelecendo relacionamentos de confiança com elas, de modo que sejam capazes de aceitar a ajuda oferecida. (CLINEBELL, 2007, p. 34)

Durante o tempo de perda e Luto o pastor tem a oportunidade de expressar

sentimentos solidários e apoio sendo um “amigo-consolador-conselheiro” dos

parentes enlutados (KASTENBAUM & AISENBERG, 1983, p.192-194). Percebe-se

que a comunidade de pertença do pastor o vê como uma figura de pai. Quantas

vezes precisamos da atitude, da presença, do amor de um pai e, por diversos

Page 51: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

motivos, não encontramos. É importante que o pastor aceite seu papel de pai e sua

vocação de parceria com Deus em beneficio do aconselhando.

A comunidade de fé que entende que o cuidado pastoral não é

responsabilidade somente do pastor, mas de todos seus membros, é descrita por

Clinebell (2007, p. 33) como sendo uma comunidade de assistência segundo a

compreensão neotestamentária:

a poimênica é tarefa da congregação inteira, que funciona como uma comunidade que presta assistência, promove cura e possibilita crescimento. Esse ministério geral deveria proporcionar um ambiente interpessoal caracterizado por calor e solicitude, que se torna crucial quando as pessoas sofrem perdas e passam por crises.

Ainda a respeito da igreja (comunidade de fé), o autor explicita: “uma cultura

orientada para a superficialidade interpessoal impede a igreja de ser um organismo

social redentor, um lugar onde as pessoas experimentam transformação”.

(CLINEBELL,2007 p. 14).

A crença da pessoa enlutada interfere na percepção e na maneira como se

reage à perda, sofrendo alterações em sua essência. Reavaliamos os valores da

vida. (WALSH; MCGOLDRICK, 1998; FUKUMITSU, 2004). Quando perdemos

alguém é comum sentir-se confuso, zangado com Deus e até mesmo questionar seu

amor e poder. Mesmo o fato de crer em Deus não explica o inexplicável. Mas com o

tempo, o poder curador da fé emerge e renasce a esperança de que não ficaremos

sucumbidos em nosso sofrimento e crise. (POUJOL & POUJOL, 2006). Parece

“inegável o poder confortador das crenças religiosas. A religião provê apoio,

explicações e esperança no futuro.” (COLLINS, 2004, p.411). Acreditar em Deus e

em vida após a morte é confortante para a maioria.

É difícil e delicada a tarefa de aconselhar alguém que sofreu uma perda. O

conselheiro pastoral ou outro ajudador não deve se intimidar diante do sofrimento do

enlutado, pelo contrário, é importante que irmanado com ele tome sua dor como se

fosse sua, não se distancie e não caia na tentação de considerá-lo suficientemente

forte para agüentar.

O conselheiro precisa estar preparado para intervenção em crise. Conhecer

as reações do homem pós-moderno diante da morte, entender o processo de Luto e

seus efeitos holísticos é vital para um cuidador, como norte para a compreensão e

aceitação do que se passa, e assim auxiliar as pessoas a elaborarem seu Luto de

Page 52: PRÁTICAS DE ACONSELHAMENTO PARA ADULTOS ENLUTADOS: A importância da relação de ajuda na superação da dor da perda.

maneira mais adequada e benéfica. Esse conhecimento será proveitoso também

para os enlutados na busca de significados para suas experiências de Luto.

Se há tempo para nascer e tempo para morrer, há tempo para enlutar e

tempo para deixar de enlutar-se e seguir adiante com a vida.

Esta pesquisa propôs investigar as implicações práticas do aconselhamento

do Luto, verificando sua importância e possíveis benefícios. Nas pesquisas de

Parkes (1998), as viúvas que mostraram maior grau de sofrimento na época da

perda foram as que mais se beneficiaram do aconselhamento. Em outras revisões

bibliográficas, Parkes (1998) concluiu que um serviço de aconselhamento para

pessoas enlutadas implantado em um hospital psiquiátrico no sul de Londres

contribuiu para a diminuição do número de suicídios entre os parentes dos pacientes

mortos. Parkes (1980, p. 9 apud Worden, 1998, p. 81) traz um outro resultado de

suas pesquisas:

A evidência apresentada aqui sugere que os serviços profissionais, os voluntários apoiados pelos profissionais e serviços de auto-ajuda são capazes de reduzir o risco de transtornos psiquiátricos e psicossomáticos resultante do luto. Estes serviços são mais benéficos entre as pessoas enlutadas que sentem que seus familiares não lhes dão apoio ou que, por outras razões, são consideradas como tendo um risco especial.

A partir dessas considerações, conclui-se que ainda há muito que se

pesquisar sobre a eficácia do aconselhamento no Luto. Muitos estudos futuros são

necessários para que se possa estabelecer a relação entre o aconselhamento no

Luto e sua importância e benefícios.

Finalmente, sugerimos que cabe ao conselheiro pastoral representar

o Cristo curador e a igreja como uma comunidade terapêutica que se

preocupa com os outros; servir como mediador da graça divina no

momento em que a pessoa enlutada passará da desorientação ligada à

perda para a absoluta resignificação emocional, cognitiva e comportamental. Será

preciso por um espaço de tempo tornar-se um companheiro dessa jornada, servindo

como um “sábio confortador, praticando o aconselhamento pastoral competente”.

(SCHIPANI, 2004, p. 21).

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