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1 3 - PROCESSOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM E AVALIAÇÃO AS CONCEPÇÕES DE DOCENTES DA REDE MUNICIPAL DO RECIFE A RESPEITO DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM Maria Dutra. UFPE Michelle Soares, UFPE RESUMO: Este artigo analisa as concepções sobre práticas avaliativas de professoras de escolas públicas municipais da Região Metropolitana do Recife, enfatizando as estratégias utilizadas para avaliar os alunos (as), bem como a utilidade da avaliação da aprendizagem no âmbito escolar. Tomou-se como referencial principalmente as contribuições de Luckesi (2000); Hoffmann (2000); André (1999); Perrenoud (1990;1992) e Santos (2007) em relação a avaliação da aprendizagem. Participaram da pesquisa quatro professoras de escolas municipais e foram realizadas entrevistas semiestruturadas com essas docentes, visando analisar suas concepções a cerca do ato de avaliar. O material das entrevistas foi tratado a partir da abordagem da Análise do discurso. Os resultados indicam que as professoras apresentam diferentes concepções a respeito da avaliação da aprendizagem, esta avaliação está imbricada com as concepções de ensino que orientam a prática docente. Portanto, as considerações apontam para a necessidade de maiores discussões no ambiente escolar sobre o que é realmente o ato de avaliar e suas implicações. PALAVRAS-CHAVE: Avaliação da aprendizagem; concepções; docentes. INTRODUÇÃO No que se refere à escola, o sistema tradicional de ensino é marcado pelo modelo tradicional que deixa a mercê um trabalho avaliativo que valorize o educando. O cenário da educação brasileira é caracterizado pelo sistema de atribuição de notas, que de alguma forma classifica o aluno e atribui um juízo de valor: A escola como outras instituições da sociedade, define um conjunto de normas de excelência que ensejam comparações entre os sujeitos e, em consequência, o estabelecimento de hierarquias (ANDRÉ, 1996, P.17). É importante destacar que essas características são frutos de uma construção social onde a escola é seu principal palco. É nesse ambiente que as hierarquias 1 e juízos de valor são reproduzidos. 1 Hierarquia apoiada na concepção de Perrenoud (1990), onde se destaca que desde cedo os alunos se observam e se medem, surgindo dessa forma hierarquias: os mais e menos inteligente; o forte e o fraco em matemática; os bons e os ruins em esportes, etc.

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3 - PROCESSOS DE ENSINO-APRENDIZAGEM E AVALIAÇÃO

AS CONCEPÇÕES DE DOCENTES DA REDE MUNICIPAL DO RECIFE A

RESPEITO DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM

Maria Dutra. UFPE

Michelle Soares, UFPE

RESUMO: Este artigo analisa as concepções sobre práticas avaliativas de professoras de escolas públicas

municipais da Região Metropolitana do Recife, enfatizando as estratégias utilizadas para avaliar os alunos (as),

bem como a utilidade da avaliação da aprendizagem no âmbito escolar. Tomou-se como referencial

principalmente as contribuições de Luckesi (2000); Hoffmann (2000); André (1999); Perrenoud (1990;1992) e

Santos (2007) em relação a avaliação da aprendizagem. Participaram da pesquisa quatro professoras de escolas

municipais e foram realizadas entrevistas semiestruturadas com essas docentes, visando analisar suas concepções

a cerca do ato de avaliar. O material das entrevistas foi tratado a partir da abordagem da Análise do discurso. Os

resultados indicam que as professoras apresentam diferentes concepções a respeito da avaliação da

aprendizagem, esta avaliação está imbricada com as concepções de ensino que orientam a prática docente.

Portanto, as considerações apontam para a necessidade de maiores discussões no ambiente escolar sobre o que é

realmente o ato de avaliar e suas implicações.

PALAVRAS-CHAVE: Avaliação da aprendizagem; concepções; docentes.

INTRODUÇÃO

No que se refere à escola, o sistema tradicional de ensino é marcado pelo modelo

tradicional que deixa a mercê um trabalho avaliativo que valorize o educando. O cenário da

educação brasileira é caracterizado pelo sistema de atribuição de notas, que de alguma forma

classifica o aluno e atribui um juízo de valor:

A escola como outras instituições da sociedade, define um conjunto de normas de

excelência que ensejam comparações entre os sujeitos e, em consequência, o

estabelecimento de hierarquias (ANDRÉ, 1996, P.17).

É importante destacar que essas características são frutos de uma construção social

onde a escola é seu principal palco. É nesse ambiente que as hierarquias1 e juízos de valor são

reproduzidos.

1 Hierarquia apoiada na concepção de Perrenoud (1990), onde se destaca que desde cedo os alunos se observam e

se medem, surgindo dessa forma hierarquias: os mais e menos inteligente; o forte e o fraco em matemática; os

bons e os ruins em esportes, etc.

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Pensando nesses aspectos, a partir da disciplina Avaliação da Aprendizagem cursada

no curso de Pedagogia na Universidade Federal de Pernambuco, buscou-se refletir sobre a

situação da avaliação da aprendizagem escolar com a finalidade de compreender as relações

entre as teorias estudadas a respeito da avaliação e as práticas de professores que se

encontravam em exercício da profissão.

Desta forma, foi realizada uma investigação que contou com a participação de quatro

professoras da rede municipal do ensino na Região Metropolitana do Recife. Essa pesquisa

teve como objetivo analisar as concepções docentes a respeito do ato de avaliar, quais as

estratégias utilizadas e o porquê desta avaliação. Para a investigação, optou-se por uma

abordagem qualitativa que permitiu “considerar os diferentes pontos de vista dos

participantes” das situações pesquisadas (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p.12). Para tal, foram

realizadas entrevistas semiestruturadas com essas professoras que foram analisadas a partir da

Análise de Discurso proposta por autores como Billig (1985) e Potter e Wetherell, (1987).

Dessa forma, justifica-se a necessidade da realização dessa pesquisa, pelo fato de ser o

professor o profissional que lida diretamente com a avaliação dos alunos no sistema escolar e

que deve compreender que práticas avaliativas descontextualizadas e pouco reflexivas podem

causar prejuízos aos alunos, que se relacionam tanto com dificuldades de aprendizagem,

quanto com implicações emocionais que influenciam para o fracasso escolar. Portanto,

compreende-se a necessidade de realizar discussões que permeiam as estratégias de avaliação

e as concepções de professores que estão atuando diariamente com as questões que se referem

à avaliação.

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DA AVALIAÇÃO

A avaliação corretiva não se refere somente ao sistema de atribuição de notas. Há

várias maneiras de avaliar os discentes. As provas são uma das marcas que tanto predominam

nas escolas brasileiras. Os alunos já acostumados com essa avaliação tradicional cobram do

professor uma postura corretiva, onde os mesmos têm que classificar suas atividades como

“certas ou erradas”, atribuindo-lhe notas de zero a dez. Como mostra Hoffmann (2000, p.73)

em uma pesquisa realizada com professoras de uma escola em Porto Alegre, onde uma

professora relata que: “Minhas crianças querem que eu coloque sempre o certo e o errado em

tudo o que fazem. E insistem: - põe o certo aqui, profe”. Dessa forma, fica claro que as

próprias crianças já compreendem as relações dessa avaliação que dita o certo e o errado.

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Diante do exposto percebe-se que essa avaliação tradicional corretiva dá abertura para

exclusão e “aferição” do conhecimento dos educandos, podendo tornar o ambiente escolar em

competitivo e classificatório. No entanto, há outras concepções de avaliação que valoriza o ser

humano. A prática avaliativa se relaciona com a intencionalidade do docente, com os

pressupostos teóricos que fundamentam a sua concepção de ensino e aprendizagem. O

construtivismo, por exemplo, defende “a valorização das manifestações das crianças em seus

diferentes estágios de desenvolvimento” Hoffmann (2000, p.75;79), enfatizando que esta é

uma vertente diferente da que trabalha com os absolutismos certos e errados.

A avaliação da aprendizagem não deve ser encarada como elemento pontual do

cotidiano da sala de aula. Ela é um dos elementos didáticos mais carregados de simbolismo no

ambiente escolar, carrega consigo uma roupagem negativa, punitiva e corretiva. Mudar a

prática avaliativa requer uma ruptura de uma cultura escolar já estabelecida. Mesmo que a

prática do professor reflita a perspectiva de uma avaliação mediadora, a escola como um todo

deve apoia-lo. Nas palavras de Perrenoud (1992, p.156) a escola deve “mudar, senão

totalmente, pelo menos o suficiente para que não nos envolvamos ingenuamente nas

mudanças das práticas de avaliação sem nos preocuparmos com o que as torna possíveis ou as

limita”.

Desta forma, o autor defende a necessidade de trabalhar na escola uma avaliação

democrática, principalmente no que se refere à didática, a relação docente e discente e a

organização pedagógica da escola. No entanto, mesmo que ocorra uma tentativa de mudar o

cenário da escola em prol de uma avaliação que favoreça o educando, o professor deverá estar

atento para as especificidades dos alunos, como frisa Perrenoud (1990, p. 18),

Toda situação didática proposta ou imposta de maneira uniforme a todos os alunos

será fatalmente inadequada para um grupo deles. Para alguns, fácil demais, para

outra difícil demais. Mesmo que a situação esteja adequada em relação ao nível de

desenvolvimento cognitivo dos alunos, ela pode parecer sem sentido para uns, sem

valor ou sem interesse para outros, a ponto de não engendrar nenhuma atividade

notável, e, portanto, não promover construção de conhecimentos novos.

Além desses aspectos, André (1996) destaca que a realização de uma estratégia de

diferenciação vai exigir uma pesquisa referente a atividades e momentos de aprendizagem que

sejam mobilizadoras e significativas, em prol das diferenças peculiares e culturais presentes

na sala de aula. Para tanto, essa autora ainda afirma que “para que haja diferenciação é preciso

vencer uma série de preconceitos e resistências” (2007, p. 19), ou seja, vencer determinadas

representações que estão impregnadas na escola de que alguns discentes são inteligentes e

outros não, para assim rejeitar as ideias de que o fracasso escolar é marcado pela fatalidade.

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Ao discutir a avaliação da aprendizagem escolar, Luckesi (2000, p. 4) ressalta que o

professor poderá recusar ou excluir seus alunos desde as formas mais sutis até as menos

explícitas. A primeira possibilidade ocorre quando o docente julga seus alunos em seu

interior, afirmando a ideia pré-estabelecida de que tal educando “é do tipo que dá trabalho e

que não vai mudar”. Essa visão, por mais silenciosa que pareça, estará excluindo o aluno e

colocando-o fora do “círculo de relações”. Por outro lado e não muito diferente, a recusa

explícita acontece quando o professor deixa claro, ou seja, explícito, a recusa aos seus alunos.

De qualquer maneira, ambas as possibilidades impedem o acolhimento como enfatiza

Luckesi (2000, p. 1),

A disposição de acolher está no sujeito do avaliador, e não no objeto da avaliação. O

avaliador é o adulto da relação de avaliação, por isso ele deve possuir a disposição de

acolher. Ele é o detentor dessa disposição. E, sem ela, não há avaliação. Não é

possível avaliar um objeto, uma pessoa ou uma ação, caso ela seja recusada ou

excluída, desde o início, ou mesmo julgada previamente.

Santos 2007 (p. 17) corrobora com as colocações de Luckesi frisando que “os

educadores precisam começar a fazer mudanças importantes, adotando práticas que

contribuam para a construção do conhecimento”. Para tal, acredita-se que esta prática é

possível, no entanto, complexa, pois exige dedicação e responsabilidade do docente para

mudar esse cenário presente nas salas de aula das escolas brasileiras.

METODOLOGIA

Como já mencionado, a pesquisa fez parte da disciplina Avaliação da Aprendizagem

do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Pernambuco e tinha como finalidade

compreender as relações entre as teorias estudadas a respeito da avaliação da aprendizagem

com as práticas de professores que se encontravam em exercício da profissão, as estratégias

utilizadas e o objetivo das professoras em avaliar a aprendizagem dos alunos. Para tanto,

contou com a participação de quatro professoras de escolas municipais da Região

Metropolitana do Recife.

As professoras escolhidas para a pesquisa deveriam ter mais de quatro anos de

formação e atuar nas séries iniciais do ensino fundamental. Elas serão identificadas na

pesquisa como P1; P2; P3 e P4.

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A professora P1 é formada em pedagogia, tem oito anos de profissão e atua no 2º ano

do 1º ciclo2 do ensino fundamental. Para realizar as atividades em sala de aula, ela se apóia no

livro didático e considera na avaliação a participação oral e escrita dos seus alunos. A

professora P2 é graduada em Letras e possui especialização na área de Gestão Escolar –

Mídias na Educação. Ela tem dez anos de experiência em sala de aula e acompanha sua turma

do 4º ano do 2º ciclo, realizando atividades mecânicas dos livros didáticos e os avaliando

através da participação e da prova.

A professora P3 é formada em pedagogia, tem quatorze anos de experiência e

acompanha sua turma que pertence ao 4º ano do 2º ciclo. Ela realiza planejamentos semanais

e avalia seus alunos através da participação em atividades e provas aplicadas durante o ano.

A professora P4 é graduada em pedagogia, tem sete anos de experiência e atua no ensino da

EJA. Ela se apóia nos livros didáticos e realiza diversas atividades com seus alunos e os avalia

de forma sistemática e contínua.

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com as professoras que depois foram

transcritas e analisadas. Para o âmbito deste artigo serão analisadas quatro questões dessas

entrevistas: Qual a sua concepção de avaliação? Ao longo de sua carreira como tem visto a

avaliação? Qual estratégia você utiliza para avaliar o seu aluno? Qual a importância do ato

avaliativo?

Para a análise, adotamos a abordagem desenvolvida pela psicologia social discursiva,

proposta por autores como Billig (1985, 1991) e Potter e Wetherell (1987). Nessa perspectiva,

os discursos são entendidos como formas de ação social com os mais diversos efeitos. É uma

abordagem que enfatiza a função e a variabilidade dos discursos. Compreende-se que é

essencial uma mudança na maneira como entendemos a linguagem; no lugar de procurar algo

que estaria subjacente ao discurso, algo ao qual teríamos acesso por intermédio do discurso,

direcionamos nossa atenção para a maneira como o discurso é construído, para sua forma de

organização, suas funções.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As professoras respostas das professoras em relação à primeira pergunta (Qual a sua

concepção de avaliação?) foram: P1: “Importante, pois ajuda na contribuição para melhorar o

ensino aprendizagem”. P2: “Acredito que avaliar é medir o grau de conhecimento do aluno,

2 O ciclo é um sistema de ensino baseado numa proposta de avaliação continuada e formativa. Para criar esse

sistema o Brasil se espelhou aos moldes Europeus, com a justificativa de diminuir a evasão e a repetência

escolar.

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ou seja, é utilizar de algumas estratégias para confirmar se ele aprendeu ou não. P3: Avaliar

é acompanhar sistematicamente e de forma contínua a aprendizagem dos alunos; P4: “É um

procedimento pedagógico importante e necessário para a conclusão e aprovação da ação de

construção do indivíduo”.

A primeira professora justifica que a avaliação é importante enfatizando a sua

contribuição ao do processo ensino-aprendizagem. Dessa forma, a sua concepção está ligada a

valorização desse processo na medida em que o professor, através da avaliação, media o

processo de ensino-aprendizagem, avaliando e analisando as possibilidades de aprendizagem

do educando.

A segunda docente assemelha seu discurso à primeira geração das classificações

conceptuais, exposta por Simões (2000) que relata que esta é uma avaliação direcionada a

medição dos resultados dos alunos. Esta professora ainda complementa a sua resposta

ressaltando sobre a utilização de algumas estratégias para a confirmação da aprendizagem dos

alunos. No entanto, as estratégias podem ser utilizadas de diversas formas, dependendo dos

níveis de escolarização dos discentes.

Diferentemente desta última resposta, a terceira professora considera a avaliação como

contínua que visa o acompanhamento processual do estudante. Esta perspectiva se assemelha

aos pressupostos construtivistas, ressaltado por Santos (2007 p.16), ao afirmar que,

A concepção de ensino construtivista se difere dos modelos não construtivistas de

ensino porque ela deve estimular uma forma de pensar em que o aprendiz, ao invés

de assimilar o conteúdo passivamente, reconstrói o conhecimento existente, dando

um novo significado, o que implica em novo conhecimento.

A última professora considera a avaliação como um procedimento pedagógico, o que

remete a visão de Santos (2007, p.16), quando destaca que “o conceito de avaliação da

aprendizagem está ligado a uma concepção pedagógica mais ampla, isto é, a uma visão de

educação”. Além disso, a docente considera a avaliação necessária para a conclusão e

aprovação do indivíduo. Embora ela tente justificar e atribuir a avaliação em seu sentido

pedagógico, sua justificativa se aproxima a proporcionar a aprovação do sujeito, ou seja,

informa se ele está ou não apto, a determinada função.

Ao longo da sua carreira como tem visto a avaliação? Esta foi à pergunta que norteou

as respostas dos professores da segunda questão. As docentes responderam da seguinte forma:

P1: “minha avaliação é contínua e avalio também o que os alunos trazem de bagagem”; P2

“a avaliação serve para verificar se o aluno está ou não apto a desenvolver alguma

atividade; P3 “a avaliação tem passado por processo de mudança. Ao longo da carreira

vivenciei a avaliação estática e momentânea, assim como dialética e contínua; P4 “como um

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termômetro que só alcançará os objetivos com a participação de ambas as partes: o educando

querendo ou aceitando ser avaliada e o educador se propondo a avaliar de forma amorosa,

construtiva, sobre um clima de harmonia que reflita espontaneidade e uma maximização de

resultados”.

A primeira professora não entendeu claramente a pergunta, pois tentou justificar suas

respostas descrevendo como seria seu processo avaliativo. De alguma forma sua resposta se

assemelha aos pressupostos construtivistas, onde os conhecimentos prévios dos alunos são

considerados fundamentais para o processo de ensino-aprendizagem. A segunda descreveu a

serventia da avaliação, mas não respondeu diretamente a pergunta. No entanto, percebe-se que

seu discurso se assemelha a terceira geração proposta por Simões (2000) que a caracteriza

como a noção de julgamento orientada para o juízo de valor, onde a avaliação se restringe a

apreciação do mérito ou o valor de algo.

A terceira professora justifica sua resposta direcionando-a ao objetivo da pergunta ao

reconhecer que a avaliação tem passado por mudanças, ainda relata que vivenciou alguns

processos avaliativos diferentes. Este discurso se assemelha a concepção de Vasconcellos

(2003) ao reconhecer que há mudanças necessárias a uma práxis transformadora. A última

professora aparentemente descreve em sua resposta preceitos da teoria construtivista, pois

ressalta que para alcançar os objetivos é necessário a participação do educando e do professor

no processo. Este discurso se assemelha ao proposto por Hoffmann (2000), ao considerar o

lado do aluno onde a avaliação propicia a consciência de seus avanços e dificuldades e a do

professor ao ajudar a aperfeiçoar sua prática pedagógica. Outro princípio teórico que essa

docente aponta no seu discurso se assemelha a concepção de Luckesi (2000, p.1), quando

destaca que

A avaliação da aprendizagem, por ser avaliação, é amorosa3, inclusiva, dinâmica e

construtiva, diversa dos exames que não são amorosos, são excludentes, não são

construtivos, mas classificatórios. A avaliação inclui, traz pra dentro; os exames

selecionam, excluem, marginalizam.

Qual estratégia você utiliza para avaliar o seu aluno? Esta foi a pergunta que norteou a

terceira questão. As docentes responderam da seguinte forma: P1, “participação oral e

escrita; P2, “avalio meus alunos através da participação nas atividades e por meio da prova;

P3, “o meu aluno é avaliado como um todo, de forma sistemática e contínua; P4, “a de que o

aluno deve ser estimulado a se exteriorizar de forma natural e que os resultados obtidos não

3 É importante ressaltar que o acolhimento que Luckesi defende está respaldado no amor. E este se faz presente

no sentido de acolher e não no sentido do gostar romântico.

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sejam encarados como certo ou errado, mas sim como níveis de capacidade da resposta aos

estímulos aplicados”.

A primeira professora atribui duas estratégias de avaliação: a oral e a escrita, no entanto,

não descreve a forma e a intencionalidade que ela é utilizada. Percebe-se que as estratégias

avaliativas podem fazer parte dos instrumentos de avaliação. Este último não precisa ser

perfeito, como esclarece Oliveira e Pacheco (2003, p.126), mas “eficazes e próximos do saber

real” dos alunos. A segunda professora possibilita duas estratégias diferentes de avaliação:

participação nas atividades e prova. Entretanto, também não descreve como elas devem ser

direcionadas, o que dificulta de alguma forma, saber a intencionalidade da sua prática. Nesse

sentido, não objetivando tecer críticas a essa docente, mas a apenas a destacar a crítica

exposta por Oliveira e Pacheco (2003), ao exemplificar a prova como um instrumento que é

desqualificado devido a tendência de seus excessos, e até mesmo de testes realizados nas

escolas que tentam se aproximar dos exames dos vestibulares.

A terceira resposta é caracterizada por uma avaliação formativa, no entanto, a docente

não expões em sua resposta de qual forma ela realiza a sistematização, ou seja, ela não

esclarece o conjunto de critérios que são organizados. A última professora se assemelha a

perspectiva construtivista, pois não considera, como ponto de partida os resultados de seus

alunos como certo ou errado. Este discurso se assemelha a um princípio teórico, defendido

por Hoffmann (2000, p. 85) ao destacar que,

Revela uma concepção dinâmica e evolutiva do conhecimento, de descoberta por

ensaio e erro, de tomada de consciência sobre o que fazer, muito mais que a

preocupação com resultados imediatos ou fórmulas definitivas de solução

apresentadas pelo professor.

A pergunta que norteou a última questão foi “Qual a importância do ato avaliativo? ”.

As professoras responderam da seguinte forma: P1” é importante porque o ensino

aprendizagem deve ser avaliado para melhor desempenho do professor e aluno; P2 “ela é

necessária porque é através dela que nós professores percebemos se os alunos

aprenderam;P3”com a avaliação posso acompanhar as dificuldades e avanços significativos

dos meus alunos; P4”a avaliação é importante, porque com ela posso mediar meu aluno,

sabendo utilizar de alguns instrumentos que me possibilitem diferenciar o meu método de

ensino para favorecer as diferenças de cada educando, fazendo com que, independente do

seu impedimento, cada aluno esteja incluso no processo de ensino-aprendizagem”.

A primeira professora considera a importância da avaliação no sentido do ponto de

partida a melhorar o desempenho do professor e aluno em seus processos de ensino

aprendizagem. O interessante é que ela destaca os dois agentes do processo, não atribuindo

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somente ao estudante a possibilidade de ensinar e aprender. No entanto, a segunda docente

justifica a necessidade do uso da avaliação para a obter a percepção da aprendizagem dos

estudantes. A terceira docente aponta a avaliação como uma forma de acompanhamento de

seus alunos. Este discurso se assemelha ao de Hoffmann (2000, p.77) ao caracterizar a

avaliação mediadora como um acompanhamento que visa ao acesso gradativo do educando a

um saber competente na escola, e, portanto, sua promoção a outras séries e graus de ensino.

A última resposta da professora revela a possibilidade de diferenciar as atividades em

prol do favorecimento da aprendizagem dos educandos, o que se assemelha a concepção de

André (1996, p.19), ao destacar que “a diferenciação não pode se limitar a uma metodologia,

a um nível de idade, a uma categoria de conteúdo ou de competências”. É uma visão ampla

que requer o acompanhamento de cada discente dos processos que vão encaminhar a

aprendizagem, como destaca Perrenoud (1990, p.19) “é algo que vai romper com a

indiferença às diferenças”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se observar através das respostas das docentes, que elas apresentam diferentes

concepções a respeito da avaliação da aprendizagem. No entanto, percebemos que algumas

professoras ainda se encontram perdidas no que se refere a responder diretamente há algumas

perguntas expostas na entrevista. De certa forma, percebe-se que o modelo tradicional de

avaliação pautado na prova, se encontra pouco centrado nos discursos dessas docentes, pois

apenas uma professora aponta essa possibilidade.

A maioria delas descreve suas práticas avaliativas como contínuas, se assemelhando,

desta forma, aos pressupostos construtivistas, como defende Becker (1994),

que o construtivismo significa a ideia de que nada, a rigor, está pronto, acabado e de

que, especificamente, o conhecimento não é dado, em nenhuma instância, como algo

terminado.

Acredita-se, que para avaliar um grupo de alunos, antes de qualquer coisa, precisa-se

diagnosticar o conhecimento prévio do educando sobre determinado assunto. Para esse

diagnóstico ser eficaz é necessário coletar dados essenciais para avaliar o que precisamos.

Segundo Luckesi (2000, p.4) os "dados essenciais são aqueles que estão definidos nos

planejamentos de ensino, a partir de uma teoria pedagógica, e que foram traduzidos em

práticas educativas nas aulas.". Os dados coletados devem refletir o exato momento em que se

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encontra o aprendizado do educando, pois somente assim o professor poderá elaborar um

trabalho eficiente e direcionado àquele grupo.

Após coletados, é fundamental qualificá-los para que possamos saber se o estado em

que o sujeito se encontra é satisfatório ou não. Com base nos dados, o educador deverá ter

clara a teoria que utiliza como suporte na sua prática pedagógica e o planejamento de ensino,

pois ambos servirão de guia para sua prática no decorrer do ano letivo. Também é necessário

que o objetivo de ensino seja definido pelo professor, para que juntos construam determinadas

aprendizagens.

A avaliação não termina com o diagnóstico do grupo de alunos, mas sim com muita

dedicação e perseverança num caminho trilhado por todos em busca da construção da

aprendizagem. Desta forma, a avaliação da aprendizagem é muito importante para o

crescimento do educando, porque é através dela que o professor analisará seu aluno durante o

processo. A parti do exposto defendemos uma proposta de avaliação apoiada na contribuição

de Hoffmann (2000, p.72) ao relatar que existe a possibilidade de exterminar práticas de

realização de provas, a substituir por uma avaliação formativa, onde o aluno é acompanhado

em seu processo, sem haver a preocupação de direcionar notas ou conceitos as suas

atividades.

Ao perceber que ainda se predomina o uso de práticas classificatórias de avaliação,

proponho alguns questionamentos com o intuito de possibilitar uma inquietação ao leitor, para

que o mesmo se posicione de forma crítica e reflexiva: até que ponto os alunos

compreenderam as atividades? Há uma efetiva aprendizagem dos conteúdos? É possível o

desenvolvimento de outros meios avaliativos de ensino? Em que medida a avaliação, para o

aluno pode contribuir para a formação de cidadãos conscientes e críticos?

O bom desempenho nos exames não significa que os alunos tenham compreendido os

conceitos ministrados, e, sim que eles reproduziram um conceito até então memorizado para

aquele momento, e que depois, provavelmente será esquecido. O que ocorre, muitas vezes, é

que os discentes têm que memorizar os conteúdos para que possam atingir o objetivo, e esse

tipo de avaliação não exige raciocínio e formação de conceitos por parte do mesmo. Por esse

motivo, o método avaliativo deve ser um investigador de conhecimentos e seu resultado deve

ser compartilhado com os educandos para que possam juntos, professores e alunos, contribuir

para a qualidade de ensino.

Portanto, os resultados apontam para a necessidade de maiores discussões no ambiente

escolar sobre o que é realmente o ato de avaliar e suas implicações. Levando em conta que

práticas avaliativas descontextualizadas e pouco reflexivas podem causar prejuízos aos

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alunos, que se relacionam tanto com dificuldades de aprendizagem, quanto com implicações

emocionais que influenciam para o fracasso escolar

REFERÊNCIAS

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