PUBLICAÇÕES AVULSAS do museu nacional 111

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ISSN 0100-6304 PUBLICAÇÕES AVULSAS DO MUSEU NACIONAL NÚMERO 111 RIO DE JANEIRO Julho de 2006

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ISSN 0100-6304

PUBLICAÇÕES AVULSAS

DO

MUSEU NACIONAL

NÚMERO 111

RIO DE JANEIRO

Julho de 2006

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ISSN 0100-6304

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PUBLICAÇÕES AVULSAS

DO

MUSEU NACIONAL

NÚMERO 111

JULHO – 2006

RIO DE JANEIRO

MUSEU NACIONAL

Publ. Avul. Mus. Nac. Rio de Janeiro n.111 p.1-136 jul.2006

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Publicações Avulsas do Museu Nacional é um periódico editado pelo Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro desde 1945, com tiragem de 600 exemplares. Relativo a artigos científicos inéditos nas áreas de Antropologia, Arqueologia, Botânica, Geologia, Paleontologia e Zoologia, está indexado nas seguintes bases de dados bibliográficos: Biological Abstracts, C.A.B. International, ISI - Thomson Scientific, NISC Colorado, Periodica, Ulrich’s International Periodicals Directory, Zoological Record.

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Capa – O “manati”, Trichechus manatus, segundo gravura do “Exoticorum Libri Decem” de Charles de L’Ecluse, obra publicada em Antuérpia no ano de 1605 © 2006 – Museu Nacional/UFRJ

Publicações Avulsas do Museu Nacional - n.1 (1945) – Rio de Janeiro: Museu Nacional.

1945 – 2006, 1 – 111 2006, 110

Irregular

ISSN 0100-6304

1. Ciência - Periódicos. I. Museu Nacional (Brasil).

CDD500.1

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OS ANIMAIS DO DESCOBRIMENTO: A FAUNA BRASILEIRA MENCIONADA NOS DOCUMENTOS RELATIVOS

À VIAGEM DE PEDRO ÁLVARES CABRAL (1500-1501)1

(Com 17 figuras)

DANTE MARTINS TEIXEIRA2, 4

NELSON PAPAVERO3, 4

RESUMO: Durante a expedição à Índia realizada nos anos de 1500 e 1501, a esquadra comandada pelo fidalgo português Pedro Álvares Cabral terminaria por alcançar a costa brasileira no sul da Bahia. A terra seria avistada em 22 de abril de 1500 e os navios permaneceriam em nosso litoral até 2 de maio, retomando em seguida seu curso para o Cabo da Boa Esperança. Poucos documentos originais relativos a essa viagem são conhecidos até o momento, estando as informações sobre a fauna do Novo Mundo restritas à famosa “Carta de Pero Vaz de Caminha”, ao “Relato do Piloto Anônimo” e a três missivas de diplomatas ou de mercadores italianos atuantes em Lisboa na época. Ao todo, as cinco fontes consideradas mencionam 14 animais, elenco composto por dois moluscos, um crustáceo, dois peixes, oito aves e um único mamífero aquático. Entre as espécies identificadas, os registros de peixes-boi, Trichechus manatus (Mammalia, Trichechidae), e de araras-vermelhas, Ara chloroptera (Aves, Psittacidae), revelam-se de particular interesse por exemplificar de forma cabal as significativas alterações observadas na distribuição geográfica de animais brasileiros após 500 anos de colonização. Palavras-chave: Pedro Álvares Cabral. Pero Vaz de Caminha. Giovanni Matteo Camerini, “il Cretico”. Bartolomeo Marchionni. Domenico Pisani di Giovanni. Relato do Piloto Anônimo. Descobrimentos. Navegações Portuguesas. ABSTRACT: The voyage of Pedro Alvares Cabral to Brazil (1500-1501) and the animals mentioned in the original accounts. During the expedition to India in the years 1500 and 1501, the Portuguese nobleman Pedro Álvares Cabral arrived at the Brazilian coast in southern Bahia. The land was sighted in the 22nd of April 1500 and the fleet remained here until the 2nd of May, following its course to the Cape of Good Hope in sequence. The scant information about this voyage come from few original documents, but notices on the New World animals are only reported in the famous letter of Pero Vaz de Caminha, in the “Narrative of the Anonymous Pilot”, and in three letters of diplomats or Italians merchants settled in Lisbon at that time. A total of 14 animals are mentioned in the five sources considered, a core encompassing two molluscs, one crustaceans, two fishes, eight birds and a single mammal. Among the identified species, the records of the West Indian Manatee, Trichechus manatus (Mammalia, Trichechidae), and the Red-and-green Macaw, Ara chloroptera (Aves, Psittacidae), are of particular interest and could be considered a prime example of the significant changes in the geographic distribution of animals observed in Brazil after 500 years of occupation. Key words: Pedro Álvares Cabral. Pero Vaz de Caminha. Giovanni Matteo Camerini, “il Cretico”. Bartolomeo Marchionni. Domenico Pisani di Giovanni. The Narrative of the Anonymous Pilot. Discoveries. Portuguese Navigations.

INTRODUÇÃO Evento central para a história de nosso país, a viagem de Pedro Álvares Cabral (1500-1501) pode ser entendida como um dos desdobramentos da busca do caminho marítimo para as Índias levada a cabo por Portugal no século XV (Fig.1). Motivo de variadas controvérsias, a descoberta do Brasil daria origem a uma bibliografia

1 Submetido em 09 de março de 2005. Aceito em 22 de março de 2006 2 Museu Nacional/UFRJ, Departamento de Vertebrados. Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, 20940-040, Rio de Janeiro, RJ,

Brasil. 3 Museu de Zoologia da USP. Avenida Nazareth 481, Ipiranga, 04299-970, São Paulo, SP, Brasil. 4 Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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particularmente copiosa, cuja análise escapa aos objetivos imediatos da presente contribuição1. Cabe, portanto, comentar apenas que, em 9 de março de 1500, o fidalgo lusitano partiria de Lisboa no comando de 13 navios, a maior de todas as frotas até então lançadas ao mar pela Coroa, atingindo as Canárias em 14 de março e o arquipélago do Cabo Verde em 23 de março, quando a nau de Vasco de Ataíde desapareceria sem deixar vestígios. Depois de dois dias de buscas inúteis, a armada retomaria seu curso, cruzando o Equador em 9 de abril e abrindo para sudoeste na execução da famosa manobra da “volta do mar”. O domingo de Páscoa seria celebrado em 19 de abril cerca de 250km ao largo do litoral brasileiro. Em 21 de abril, nos arredores do arquipélago de Abrolhos, a equipagem encontraria algas flutuantes e outros indícios de terra, avistando o cume do monte Pascoal no dia seguinte, 22 de abril, embora ainda estivessem distantes da costa em torno de 70km. Após navegar mais 40km até o cair da tarde, as embarcações terminariam por ancorar a 36km da praia, concluindo um trajeto de 44 dias desde sua partida do cais do Restelo.

Fig.1- Representação dos navios da frota de Cabral existente na “Memória das Armadas” (1566-1567), cujo original se encontra depositado na Academia das Ciências de Lisboa.

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OS ANIMAIS DO DESCOBRIMENTO

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Com a luz da manhã de 23 de abril, os barcos conseguiriam fundear a 3km do litoral próximo à foz do rio do Frade, momento em que se avistam indígenas e se efetua a primeira tentativa de reconhecimento da terra recém-descoberta. Os fortes ventos e a chuva intensa desgarrariam as naves durante a noite, forçando a armada a zarpar, no dia 24 de abril, em busca de melhor abrigo. Após percorrer cerca de 45km, passando pelas falésias de Trancoso e Porto Seguro, a frota deitaria âncora próximo à foz do rio Mutari nos arredores do ilhéu de Coroa Vermelha, atual baía de Cabrália (Fig.2). No final da tarde, Afonso Lopes, piloto da capitânia, tomaria um esquife para investigar o novo porto e capturaria dois rapazes que pescavam, trazendo-os à presença de Cabral.

Fig.2- Mapa do sul da Bahia, mostrando o deslocamento da armada de Cabral ao longo do litoral e as principais localidades e eventos mencionados no texto (baseado em GUEDES, 1997): (1) ponto aproximado da primeira ancoragem, efetuada em 22 de abril de 1500; (2) ponto aproximado da segunda ancoragem, efetuada em 23 de abril de 1500; (3) ponto aproximado da terceira ancoragem, efetuada em 24 de abril de 1500; (4) ponto aproximado da quarta ancoragem, efetuada em 25 de abril de 1500.

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Em 25 de abril, membros da tripulação levariam ambos os visitantes para a terra e começariam a aproximar-se dos habitantes locais, que auxiliariam na aguada. Durante a tarde, todos os capitães desembarcariam no ilhéu, enquanto o degredado Afonso Ribeiro seria posto a circular entre os nativos, visitando uma de suas aldeias localizada a pouco menos de 10km do litoral. A 26 de abril, domingo da Pascoela, Cabral mandaria erguer um altar no ilhéu da Coroa Vermelha, onde Frei Henrique celebraria a primeira missa em território brasileiro. Prossegue o congraçamento com os índios e o comando da esquadra decide enviar a naveta de mantimentos, sob as ordens de Gaspar de Lemos, de volta a Portugal com a notícia da descoberta. Ao longo dos quatro dias seguintes, a tripulação completaria o abastecimento de lenha e água fresca, transferiria os suprimentos da naveta para as outras embarcações e perambularia pelos arredores, ao passo que os carpinteiros começariam a talhar uma alentada cruz de madeira. Esta seria erguida próxima à praia em 1o de maio, tendo lugar o ofício da segunda missa. Em 2 de maio, 11 dias após a chegada, Gaspar de Lemos iniciaria sua solitária viagem a Lisboa e o restante da armada partiria para as Índias, de onde apenas seis navios retornariam em meados de 1501.

Até o momento, as parcas informações existentes sobre a viagem de Cabral baseiam-se em algumas dezenas de originais quinhentistas que compreendem documentos diversos e textos de cronistas, bem como três narrativas de efetivos participantes da expedição (teste J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; BAIÃO, 1940; MAGALHÃES & MIRANDA, 1999; P.R. PEREIRA, 1999). Impresso poucos anos depois do retorno da frota (in MONTALBODDO, 1507), o “Relato do Piloto Anônimo” permaneceria até a primeira metade do século XIX como o único testemunho dessa natureza conhecido, quando viriam à luz as cartas de Pero Vaz de Caminha (in CASAL, 1817) e do Mestre João Faras (in VARNHAGEN, 1843). Além de causar grande comoção entre os estudiosos do assunto, tais achados logo se converteriam em autênticos instrumentos de afirmação da identidade nacional, processo que acabaria por conduzir a “Carta de Pero Vaz de Caminha” ao centro das atenções, relegando os dois outros escritos a uma posição francamente secundária (vide também J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001). Estando fundamentados no “Relato do Piloto Anônimo”, os comentários dos cronistas de época tampouco lograram conservar todo o seu prestígio, enquanto certas cartas pertinentes jamais chegaram a gozar de semelhante privilégio, às vezes tornando-se conhecidas em data muito recente.

Por congregar os primeiros testemunhos fidedignos sobre as terras brasileiras, o material em questão constituiria uma fonte singular para as mais diferentes especialidades, dando origem a vasto número de ensaios capazes de abranger desde os campos da literatura e lingüística (e.g. A.A.B. de ANDRADE, 1972; A.G. da Cunha et al. in CAMINHA, 1999a; A. CARVALHO, 1996; J.M. GARCIA, 2000; MATTOS E SILVA, 1996; S.B. PEREIRA, 1964; M.A. RIBEIRO, 2003; SEIXO, 1997; M. SIMÕES, 1985), até a antropologia, náutica, astronomia e botânica (e.g. BARRETO, 1983; M.B. de CARVALHO, 1960; COUTINHO, 1956-1957; COUTO, 1998; CUNHA, 1992; FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002; F.L. Fernandes in GUEDES, 2003; GUEDES, 1975, 1997; GUERREIRO, 1992; HENRIQUES & MARGARIDO, 1989; LIMA, 1984; PIRES, 1980; RAMINELLI, 1996; SEABRA, 2000). No entanto, raros foram os zoólogos a dedicar algumas linhas a esses textos (e.g. CRISTÓVÃO, 1999; FEIO, 1953; FERRONHA et al., 1993; FRANÇA, 1926; MELLO-LEITÃO, 1941; NOMURA, 1996, 2005; O.M. de O. PINTO, 1942; TEIXEIRA & PAPAVERO, 2003), lacuna amiúde preenchida por autores estranhos às ciências naturais com resultados muito pouco felizes.

Malgrado a ausência de trabalhos abrangentes sobre os animais mencionados nos documentos relativos à viagem de Cabral justifique qualquer iniciativa voltada para o assunto, cabe lembrar que tais relatos também fornecem um quadro privilegiado da natureza brasileira antes da ocupação européia, circunstância assaz favorável para determinar a existência de eventuais alterações na fauna local após cinco séculos de colonização. Segundo demonstram pesquisas recentes, a ação antrópica observada em

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tempos históricos teria a capacidade de promover modificações nas biotas regionais e na distribuição das espécies comparáveis aos efeitos causados por mudanças climáticas e outros fenômenos da mesma magnitude, influenciando não só frágeis ambientes insulares, mas também amplas massas continentais em prazo surpreendentemente curto. Quase sempre desprezado pela maioria dos especialistas, tal aspecto pode assumir importância fundamental em estudos sistemáticos, evolutivos e biogeográficos (OLSON, 1989, 1990; SIMMONS, 1982; TEIXEIRA, 1999, 2002).

AS FONTES CONSULTADAS

Dos vários originais quinhentistas sobre a armada de Cabral às Índias, apenas três constituem autênticos testemunhos de membros da equipagem sobre as terras brasileiras, elenco formado pela “Carta de Mestre João Faras”, o chamado “Relato do Piloto Anônimo” e a famosa “Carta de Pero Vaz de Caminha”, cuja autenticidade se afigura indubitável (compare L.L. Dominguez in C.M. DIAS, 1921-1924 versus ABREU, 1900). Só os dois últimos registros, contudo, possuem informações de caráter zoológico relevantes para a iniciativa proposta, enquanto o primeiro trata da navegação efetuada e de observações astronômicas (fac-símile in J.B. de CARVALHO, 1967). Idêntica premissa tornaria significativo o exame das missivas daqueles que, como Giovanni Matteo Camerini, Bartolomeo Marchionni e Domenico Pisani di Giovanni, deram notícias sobre o retorno da frota a Lisboa (in J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; T.O.M. de SOUZA, 1946, 1956).

Contrariando certas propostas correntes (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001), os comentários de diversos cronistas do século XVI acerca da descoberta do Brasil (e.g. CASTANHEDA, 1551; CORREIA, 1975; GALVÃO, 1563; LAS CASAS, 1995) não participam do corpo documental trabalhado por incorporarem demasiadas observações fundamentadas na experiência de integrantes das famosas “expedições exploradoras” ou de elementos ligados à subseqüente exploração do pau-brasil, Caesalpinia echinata (Leguminosae, Caesalpinoidea), base de nossa economia em seus primórdios (FERRAZ, 1939; GUEDES, 1970a, 1970b; B.J. de SOUZA, 1939). Muitas vezes obscura, a natureza desses relatos torna-se melhor definida, por exemplo, nas passagens dedicadas à viagem de Cabral pertencentes à “Chronica do felicissimo rei Dom Emanuel”, onde Damião de Goes fornece detalhes sobre a fauna, a flora e os habitantes da “Terra de Santa Cruz” obtidas graças a três indígenas levados para Lisboa, no ano de 1513, pelo comerciante George Lopes Bixorda (GOES, 1566). Outrossim, vários desses textos sofreriam forte influência da obra de MONTALBODDO (1507), relação marcada a ponto de o “Itinerarium Portugallensium” de MADRIGNANO (1508) ser às vezes entendido como mera tradução para o latim do “Paesi novamente retrovati” (e.g. MORAES, 1983). Evento análogo ocorreria no caso das contribuições de CASTANHEDA (1551), CORREIA (1975) e LAS CASAS (1995), onde as principais – e por vezes únicas – referências a animais brasileiros também estariam calcadas na versão do “Relato do Piloto Anônimo” incluída nessa mesma coleção de viagens (vide adiante)2. 1. A “CARTA DE PERO VAZ DE CAMINHA”

A julgar pelas poucas informações disponíveis (in A. de M. BASTOS, 1932; CAMARGO, 1966; CORTESÃO, 1943; DINIS, 1961; J.L. LISBOA, 1994a; I. da R. PEREIRA, 1989; H.C. SIMÕES, 1999), Pero Vaz de Caminha pertenceria a uma família burguesa citadina dona de razoável condição social, tendo nascido no Porto em meados do século XV. Seu pai, Vasco Fernandes de Caminha, ocuparia o destacado cargo de recebedor-mor das províncias de Trás-os-Montes e Entre Douro e Minho, além de atuar como “mestre da balança da moeda” no Porto, Tânger e outras vilas d’África. Em sua presumível cidade natal, Pero Vaz de Caminha exerceria a mesma função pelo menos desde 1479, posição ratificada por Dom

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Manuel I em 1496. Cavaleiro das casas de Dom Afonso V, Dom João II e Dom Manuel I, nosso primeiro cronista chegaria a comandar as tropas do Porto na batalha do Toro (1475), além de participar das sessões da Câmara local de 1488 a 1498 e por ela ser incumbido, em 1497, de redigir os capítulos apresentados pela cidade à reunião das Cortes em 1498. Casado com Catarina Vaz de Caminha, deixaria pelo menos uma filha, Isabel de Caminha, que desposou um certo Jorge de Ozouro, beneficiário do famoso pedido encontrado no final da carta enviada a Dom Manuel I. Escrivão da futura feitoria portuguesa na Índia, Pero Vaz de Caminha morreria em Calicute entre os 50 e os 55 anos de idade durante os combates travados nos últimos meses de 1500, em 16 de outubro ou 16 de dezembro. De acordo com certas leituras da “Carta”, Caminha seria um humanista conhecedor de autores latinos familiarizado com o estilo e construções clássicas, enquanto outras interpretações pretendem afirmar sua participação em viagens pretéritas pela costa africana (J.L. LISBOA, 1994a). A narrativa em questão, porém, parece não guardar maiores preocupações literárias, recordando mais os “livros de viagem” tão apreciados na época que um texto erudito ou técnico (vide CAMPBELL, 1988).

Segundo determinadas fontes (e.g. BAIÃO, 1940; CORTESÃO, 1943), a “Carta de Pero Vaz de Caminha” teria sido descoberta por José Seabra da Silva, guarda-mor da Torre do Tombo desde 1766, entre numerosos papéis enviados pela Secretaria de Estado durante a gestão anterior de Damião de Goes (Fig.3). Como essa transferência implicava a perda de qualquer caráter reservado, os novos depositários decidiriam providenciar a execução de uma cópia, datada de 19 de fevereiro de 1773, na qual constam as assinaturas do próprio Seabra da Silva e do escrivão Eusébio Manuel da Silva. Em torno de 1790, parte do texto seria reproduzida pelo renomado historiador castelhano Juan Bautista Muñoz (vide também ABREU, 1908; M. de S. PINTO, 1934), detalhe comprovado por NAVARRETE (1825-1837).

Acredita-se que a mesma cópia tenha chegado ao Brasil com a fuga da família real portuguesa, sendo incorporada ao Arquivo da Real Marinha no Rio de Janeiro. Sabendo de tais circunstâncias, o Padre Manuel Aires do Casal, Presbítero Secular do Grão Priorado do Crato, traria à luz versão bastante sofrível do original na primeira edição da “Corografia Brazilica” (CASAL, 1817). Celebrada com um entusiasmo inaudito logo após sua publicação, a “Carta de Pero Vaz de Caminha” pronto se transformaria em um dos pilares de nossa historiografia oficial, obtendo sucessivas impressões ao longo das décadas seguintes. Conforme demonstram as várias resenhas tentativas elaboradas até o momento (e.g. ARROYO, 1976; AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; CABRAL, 1878; CONTIER, 1966; P.R. PEREIRA, 1999; M. de S. PINTO, 1933, 1934; PRADO, 1998), trata-se provavelmente do relato quinhentista sobre o Brasil mais difundido de todos os tempos, havendo notícia de pelo menos 109 edições entre 1817 e 1975 (ARROYO, 1976). Além de não abarcar as numerosas versões posteriores, esse montante tampouco contabiliza as incontáveis transcrições e excertos incluídos em ensaios e contribuições diversas, as quais compreendem desde obras de divulgação e livros de arte até variantes ilustradas dirigidas ao público infanto-juvenil3.

Depositada nos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, Lisboa (AN/TT gaveta 15, maço 8, número 2), a “Carta de Pero Vaz de Caminha” foi examinada de forma superficial durante os eventos da comemorativa “Mostra do Descobrimento” realizada em São Paulo entre abril e setembro de 2000. No entanto, as insuperáveis limitações encontradas tornariam inevitável o uso de alguns dos vários fac-símiles publicados nas últimas décadas (e.g. AGUILAR, 2000; ARROYO, 1963, 1976; CAMINHA, 1999a; CORTESÃO, 1943; F. GARCIA, 1900; S.B. PEREIRA, 1964). Grosso modo, a leitura paleográfica e a versão atualizada baseiam-se no trabalho de CORTESÃO (1943), introduzindo mudanças consideradas necessárias. Não obstante, as passagens relativas aos animais seriam comparadas com outras propostas disponíveis (e.g.

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ABUD et al., 1968; J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; A.G. da Cunha et al. in CAMINHA, 1999a; C.M. DIAS, 1921-1924; J.M. GARCIA, 1983; GUEDES, 1997; P.R. PEREIRA, 1999, 2002; M.A. RIBEIRO, 2003; TEIXEIRA & PAPAVERO, 2003), sem que fosse possível descobrir qualquer variação substantiva em termos de conteúdo (Anexo 1).

Fig.3- Página inicial da “Carta de Pero Vaz de Caminha”. Original depositado na Torre do Tombo, Lisboa.

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Versão para o português atual da carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei Dom Manuel, datada de 1o de maio de 1500

“Senhor4,

posto que o Capitão-Mor desta vossa frota – e assim os outros capitães – escrevam a Vossa Alteza a nova do achamento desta vossa nova terra que ora nesta navegação se achou, não deixarei também de dar disto minha conta a Vossa Alteza assim como eu melhor puder, ainda que para o bem contar e falar o saiba fazer pior que todos. Porém tome Vossa Alteza minha ignorância por boa vontade a qual, bem certo creia que, nem para aformosentar ou enfear, haja de pôr aqui mais do que aquilo que vi e me apareceu.

Da marinhagem e singraduras do caminho aqui não darei conta a Vossa Alteza, porque não o saberei fazer e os pilotos devem ter esse cuidado. Portanto, Senhor, do que hei de falar começo e digo que a partida de Belém, como Vossa Alteza sabe, foi segunda-feira, 9 de março. E sábado, 14 do dito mês, entre as 8 e 9 horas nos achamos entre as Canárias, mais perto da Grã-Canária. E ali andamos todo aquele dia em calma, à vista delas cerca de três ou quatro léguas5.

E domingo, 22 do dito mês, às 10 horas pouco mais ou menos, houvemos vista das ilhas de Cabo Verde, scilicet6, da ilha de São Nicolau segundo dito de Pero Escobar, piloto7. E a noite seguinte à segunda-feira, [quando] lhe amanheceu se perdera da frota Vasco de Ataíde8 com a sua nau9, sem haver aí tempo forte nem contrário para [que tal] pudesse ser. Fez o Capitão10 suas diligências para o achar a uma e a outras partes, [mas ele] não apareceu mais. E assim seguimos nosso caminho por esse mar, de longo11 até terça-feira das oitavas de Páscoa, que foram [aos] 21 dias de abril12, que topamos alguns sinais de terra sendo da dita ilha, segundo diziam os pilotos, cerca 660 ou 670 léguas13. Os quais [sinais] eram muita quantidade de ervas compridas a que os mareantes chamam botelho14 e assim outras a que também chamam de rabo-de-asno15.

E à quarta-feira seguinte pela manhã, topamos aves a que chamam fura-buchos. E neste dia, a horas de véspera16, avistamos terra, scilicet, primeiramente de um grande monte mui alto e redondo e [depois] de outras serras mais baixas ao sul dele e de terra chã com grandes arvoredos. Ao qual monte alto o Capitão pôs nome – o Monte Pascoal – e à terra a Terra de Vera Cruz.

Mandou lançar o prumo – acharam 25 braças17 – e ao sol posto, cerca de 6 léguas da terra18, surgimos âncoras em 19 braças19. Ancoragem limpa. Ali jouvemos20 toda aquela noite e à quinta-feira pela manhã fizemos vela e seguimos direitos a terra, indo os navios pequenos adiante21 por 17, 16, 15, 14, 13, 12, 10 e 9 braças22 até meia légua da terra23, onde todos lançamos âncoras em direito da boca de um rio24. E chegaríamos a esta ancoragem às 10 horas pouco mais ou menos. E dali houvemos vista de homens que andavam pela praia, obra de sete ou oito segundo os navios pequenos disseram por chegarem primeiro.

Ali lançamos os batéis25 e esquifes26 fora e vieram todos os capitães das naus a esta nau do Capitão-Mor e ali falaram. E o Capitão mandou Nicolau Coelho27 em terra no batel para ver aquele rio. E tanto que ele começou a ir para lá, acudiram homens pela praia, quando dois, quando três, de maneira que quando o batel chegou à boca do rio eram ali 18 ou 20 homens pardos, todos nus sem nenhuma coisa que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos e suas setas. Vinham todos rijos para o batel e Nicolau Coelho lhes fez sinal que [de]pusessem os arcos. E eles os [de]puseram.

Ali não pôde haver deles fala nem entendimento que [se] aproveitasse pelo mar quebrar na costa. Somente deu-lhes um barrete vermelho, uma carapuça de linho que levava na cabeça e um sombreiro preto. E um deles lhe deu um sombreiro de compridas penas de aves com uma copazinha pequena de penas vermelhas e pardas como as de papagaio. E

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outro lhe deu um ramal grande de continhas brancas miúdas que querem parecer de aljaveira28, as quais peças creio que o Capitão manda a Vossa Alteza. E com isso se volveu às naus por ser tarde e não poder deles haver mais fala por azo do mar.

À noite seguinte ventou tanto sueste com chuvaceiros que fez caçar as naus29 e especialmente a capitânia. E à sexta pela manhã, às 8 horas pouco mais ou menos, por conselho dos pilotos mandou o Capitão levantar âncoras e fazer vela. E fomos de longo da costa contra o norte, com os batéis e esquifes amarrados à popa, para ver se achávamos algum abrigo e bom pouso onde jouvéssemos para tomar água e lenha, não por já nos minguar mas para nos acertarmos aqui. E quando fizemos vela já estariam na praia, assentados junto com o rio, obra de 60 ou 70 homens que juntaram ali poucos e poucos. Fomos de longo e o Capitão mandou aos navios pequenos que fossem mais chegados a terra e que se achassem pouso seguro para as naus, que amainassem30. E sendo nós pela costa obra de dez léguas31 desde onde nos levantamos, acharam os ditos navios pequenos um arrecife com um porto dentro, muito bom e muito seguro, com uma mui larga entrada32. E meteram-se dentro e amainaram. E as naus arribaram sobre eles. E um pouco antes [do] sol posto amainaram obra de uma légua33 do arrecife e ancoraram em 11 braças34.

E sendo nosso piloto Afonso Lopes35 em um daqueles navios pequenos por mando do Capitão por ser homem vivo e destro para isso, meteu-se logo no esquife a sondar o porto [a]dentro e tomou, em uma almadia36, dois daqueles homens da terra, mancebos e de bons corpos. E um deles trazia um arco e seis ou sete setas e na praia andavam muitos com seus arcos e setas e não lhe aproveitaram. Trouxe-os logo, já de noite, ao [navio do] Capitão, onde foram recebidos com muito prazer e festa.

A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes bem feitos. Andam nus sem nenhuma cobertura, nem estimam cobrir nenhuma coisa nem mostrar suas vergonhas. E estão acerca disto com tanta inocência como têm de mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos por eles senhos37 ossos de osso branco do comprimento de uma mão travessa38 e da grossura de um fuso de algodão e agudo na ponta como um furador. Metem-nos pela parte de dentro do beiço e o que lhes fica entre o beiço e os dentes é feito como roque de xadrez39 [Fig.4]. E em tal maneira o trazem ali encaixado que não lhes dá paixão nem lhes estorva a fala, nem comer, nem beber. Os seus cabelos são corredios e andavam tosquiados, de tosquia alta mais que de sobre-pente40, de boa grandura e rapados até por cima das orelhas. E um deles trazia por debaixo da solapa, de fonte a fonte por detrás, uma maneira de cabeleira de penas de ave amarela41, muito basta e muito cerrada, que seria do comprimento de um couto42 [e] que lhe cobria o toutiço e as orelhas. A qual [cabeleira] andava pegada nos cabelos, pena a pena, com uma confeição branda como a cera - e não o era43 – de maneira que andava a cabeleira mui redonda, mui basta e mui igual, que não fazia míngua mais lavagem para a levantar.

Fig.4- Os vários tipos de tembetás dos tupinambás segundo gravura da “Warhaftige Historia” de Hans Staden, obra publicada em Marpurg no ano de 1557.

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Quando eles vieram, o Capitão estava sentado em uma cadeira e [tinha] uma alcatifa aos pés por estrado. E [estava] bem vestido, com um colar de ouro mui grande ao pescoço. Sancho de Tovar44, Simão de Miranda45, Nicolau Coelho, Aires Correia46 e nós outros que aqui na nau com ele imos, [ficamos] assentados no chão por esta alcatifa. Acenderam-se tochas e entraram e não fizeram nenhuma menção de cortesia nem de falar ao Capitão, nem a ninguém. Peró um deles pôs olho no colar do Capitão e começou a acenar com a mão para a terra e depois para o colar, como que nos dizia que havia em terra ouro. E também viu um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e então para o castiçal, como que também havia prata. Mostraram-lhes um papagaio pardo que aqui o Capitão traz, tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como que os havia aí. Mostraram-lhes um carneiro, não fizeram dele menção. Mostraram-lhes uma galinha, quase tiveram medo dela e não lhe queriam pôr a mão – e depois a tomaram como espantados.

Deram-lhes de comer pão e pescado cozido, confeitos, fartes, mel e figos em passa47. Não quiseram comer daquilo quase nada e se alguma coisa provavam, logo lançavam-na fora. Trouxeram-lhes vinho em uma taça, puseram-lhe assim a boca tamalavez48 e não gostaram nada dele, nem o quiseram mais. Trouxeram-lhes água em uma albarrada49, tomaram dela senhos bocados e não beberam. Somente lavaram as bocas e lançaram fora.

Viu um deles umas contas de rosário brancas. Acenou que lhas dessem e folgou muito com elas e lançou-as ao pescoço e depois as tirou e embrulhou-as no braço. E acenava para a terra e então para as contas e para o colar do Capitão, como que dariam ouro por aquilo. Isto tomávamo[s] nós assim por o desejarmos, mas se ele queria dizer que levaria as contas e mais o colar, isto nós não queríamo[s] entender porque não lho havíamos de dar. E depois [re]tornou as contas a quem lhas deu e então se estiraram assim de costas na alcatifa a dormir sem ter nenhuma maneira de cobrirem suas vergonhas, as quais não eram fanadas50 e [tinham] as cabeleiras delas bem rapadas e feitas. O Capitão lhes mandou pôr à cabeça senhos coxins e o da cabeleira procurava assaz por não a quebrar. E lhes lançaram um manto em cima e eles consentiram e jouveram e dormiram.

Ao sábado pela manhã, o Capitão mandou fazer vela e fomos demandar a entrada, a qual era mui larga e alta de seis [a] sete braças51. E entraram todas as naus dentro e ancoraram em cinco [ou] seis braças52. A qual ancoragem dentro é tão grande, tão formosa e tão segura que podem jazer dentro dela mais de 200 navios e naus.

E tanto que as naus foram pousadas e ancoradas, vieram todos os capitães a esta nau do Capitão-Mor. E daqui mandou o Capitão que Nicolau Coelho e Bartolomeu Dias53 fossem em terra e levassem aqueles dois homens e os deixassem ir com seu arco e setas. Aos quais [homens] mandou dar senhas camisas novas, senhas carapuças vermelhas e dois rosários de contas brancas de osso, que eles levaram nos braços, e senhos cascavéis e senhas campainhas. E mandou com eles para lá ficar um mancebo degredado54 criado de Dom João Telo55, a que chamam Afonso Ribeiro56, para lá andar com eles e saber de seu viver e maneira[s]. E a mim mandou que fosse com Nicolau Coelho.

Fomos assim de flecha direitos à praia. Ali logo acudiram obra de 200 homens, todos nus e com arcos e setas nas mãos. Aqueles que nós levávamos acenaram-lhes que se afastassem e [de]pusessem os arcos e eles os [de]puseram e não se afastavam muito. Bastou que [de]pusessem os arcos e então saíram os que nós levávamos – e o mancebo degredado com eles – os quais assim como saíram não pararam mais, nem esperava um pelo outro senão a quem mais correria. E passaram um rio que por ali corre, de água doce e de muita água, que lhes dava pela braga – e muitos outros com eles. E foram assim correndo além do rio entre umas moitas de palmas57 onde estavam outros e ali pararam.

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E naquilo foi o degredado com um homem que, logo ao sair do batel, o agasalhou e o levou até lá. E logo o [re]tornaram a nós e com ele vieram os outros que levamos, os quais já vinham nus e sem carapuças. E então começaram a chegar muitos. E entravam pela beira do mar para os batéis até que não mais podiam. E traziam cabaços d’água e tomavam alguns barris que nós levávamos, enchia[m]-nos d’água e trazia[m]-nos aos batéis. Não que eles de todo chegassem a bordo do batel, mas lançavam-no[s] da mão junto a ele e nós tomávamo-los. E pediam que lhes dessem alguma coisa. Levava Nicolau Coelho cascavéis e manilhas58 e [a] uns dava um cascavel e a outros uma manilha, de maneira que quase nos queriam dar a mão com aquela encarna59. Nos davam daqueles arcos e setas por sombreiros, carapuças de linho e por qualquer coisa que [algum] homem lhes quisesse dar60. Partiram dali os outros dois mancebos, que não os vimos mais.

Muitos deles, ou quase a maior parte [de] todos que ali andavam, traziam aqueles bicos de osso nos beiços. E alguns que andavam sem eles traziam os beiços furados e nos buracos traziam uns espelhos de pau que pareciam espelhos de borracha61. Alguns traziam três bicos daqueles, scilicet, um na metade e dois nos cabos62. E andavam aí outros quartejados de cores, scilicet, deles a metade da sua própria cor e metade de tintura negra, maneira de azulada63, e outros quartejados de escaques. Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem gentis, com cabelos muito pretos compridos pelas espáduas e suas vergonhas tão altas, tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que, de as olharmos muito bem não tínhamos nenhuma vergonha64.

Ali por então não houve mais fala nem entendimento com eles por a berberia65 deles ser tamanha que não se entendia nem ouvia ninguém. Acenamos-lhes que se fossem e assim o fizeram e passaram-se além do rio. E saíram três ou quatro homens nossos dos batéis e encheram não sei quantos barris de água que nós levávamos. E [re]tornamos às naus. Em nós assim vindo, acenaram-nos que [re]tornássemos. [Re]tornamos e eles mandaram o degredado e não quiseram que ficasse lá com eles. O qual [degredado] levava uma bacia pequena e duas ou três carapuças vermelhas para dar lá ao Senhor, se aí o houvesse66. Não curaram de lhe tomar nada e assim o mandaram com tudo. Então Bartolomeu Dias o fez outra vez [re]tornar [e] que lhes desse aquilo. E ele [re]tornou e deu aquilo, em vista de nós, àquele que de primeira o agasalhou. E então veio e trouxemo-lo.

Este que o agasalhou era já [entrado] de dias e andava todo, por louçainha, cheio de penas pegadas pelo corpo que parecia assetado como São Sebastião. Outros traziam carapuças de penas amarelas, outros de vermelhas e outros de verdes. E uma daquelas moças era toda tingida, de fundo a cima, daquela tintura. A qual [moça], [de]certo, era tão bem feita, tão redonda e sua vergonha – que ela não tinha – tão graciosa que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições, fizera vergonha por não terem a sua como ela. Nenhum deles era fanado, mas todos assim como nós. E com isso retornamos e eles se foram.

À tarde, saiu o Capitão-Mor em seu batel com todos nós outros e com os outros capitães das naus em seus batéis a folgar pela baía a carão da praia67. Mas ninguém saiu em terra pelo Capitão não querer nela estar sem embargo de ninguém. Ele somente saiu com todos em um ilhéu grande que está nesta baía, que de baixa-mar fica mui vazio peró é cercado de água por todas as partes, que não pode ninguém ir a ele sem [ser de] barco ou a nado. Ali ele folgou [com] todos nós outros bem uma hora e meia. E aí andando marinheiros com um chinchorro68, pescaram e mataram pescado miúdo, não muito. E então volvemos-nos às naus já bem de noite.

Ao domingo de Pascoela69 pela manhã, determinou o Capitão de ir ouvir missa e pregação naquele ilhéu. Mandou a todos os capitães que se corregessem nos batéis70 e fossem com

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ele – e assim foi feito. Mandou naquele ilhéu armar um esperavel71 e dentro dele levantar um altar muito bem corrigido. E ali, com todos nós outros, fez dizer missa, a qual disse o padre frei Henrique72 em voz entoada e oficiada com aquela mesma voz pelos outros padres e sacerdotes que ali todos eram. A qual missa, segundo meu parecer, foi ouvida por todos com muito prazer e devoção. Ali era com o Capitão a bandeira de Cristo73 com que saiu de Belém, a qual esteve sempre alta à parte do Evangelho.

Acabada a missa, o padre desvestiu-se e pôs-se em uma cadeira alta – [estando] nós todos lançados por esta areia – e pregou uma solene e proveitosa pregação da história do Evangelho. E em fim dela, tratou de nossa vinda e do achamento desta terra, conformando-se com o sinal da cruz sob cuja obediência vimos, a qual veio muito a propósito e fez muita devoção.

Enquanto estivemos à missa e à pregação, seria na praia outra tanta gente – pouco mais ou menos como os de ontem – com seus arcos e setas, os quais andavam folgando e nos olhando. E se assentaram. Depois de acabada a missa, [estando] nós assentados [assistindo] à pregação, muitos deles se levantaram e tangeram corno ou buzina74 e começaram a saltar e dançar um pedaço. E alguns deles se metiam em almadias, duas ou três que aí tinham, as quais não são feitas como as que eu já vi. São somente três traves atadas juntas. E ali se metiam quatro, cinco ou esses que queriam, não se afastando quase nada da terra senão enquanto podiam tomar pé.

Acabada a pregação, moveu o Capitão todos para os batéis com nossa bandeira alta. E embarcamos e fomos assim todos contra [a] terra para passarmos ao longo por onde eles estavam, indo adiante Bartolomeu Dias em seu esquife por mandado do Capitão, com um pau de uma almadia que lhes levara o mar, para lho dar – e todos nós obra de um tiro de pedra atrás dele75. Como eles viram o esquife de Bartolomeu Dias logo se chegaram todos à água, metendo-se nela até onde mais podiam. Acenaram-lhes que [de]pusessem os arcos e muitos deles logo os iam logo pôr em terra e outros não os punham. Andava ai um que falava muito aos outros que se afastassem, mas não que já a mim parecesse que lhe tinham acatamento nem medo. Este que os assim andava afastando trazia seu arco e setas e andava tinto de tintura vermelha76 pelos peitos e espáduas e pelos quadris, coxas e pernas até embaixo. E os vazios, com a barriga e estômago, eram de sua própria cor. E a tintura era assim vermelha que a água não a comia nem desfazia. Antes, quando saía da água, era mais vermelho.

Saiu um homem do esquife de Bartolomeu Dias e andava entre eles sem eles entenderem nada nele quanto para lhe fazerem mal, senão que lhe davam cabaças d’água77 e acenavam aos do esquife que saíssem em terra. Com isto volveu-se Bartolomeu Dias ao Capitão e viemos às naus para comer tangendo trombetas e gaitas78, sem lhes dar mais opressão. E eles tornaram a se assentar na praia e assim por então ficaram.

Neste ilhéu onde fomos ouvir missa e pregação a água espraia muito e descobre muita areia e muito cascalho. Foram alguns, estando nós aí, buscar marisco e não o acharam. E acharam alguns camarões grossos e curtos, entre os quais vinha um camarão muito grande e muito grosso que em nenhum tempo o vi tamanho. Também acharam cascas de berbigões e de amêijoas, mas não toparam com nenhuma peça inteira.

E tanto que comemos, vieram logo todos os capitães a esta nau por mandado do Capitão-Mor, com os quais ele se apartou e eu na companhia. E perguntou assim a todos se nos parecia ser bem mandar a nova do achamento desta terra a Vossa Alteza pelo navio dos mantimentos, para melhor mandar descobrir e saber dela mais do que agora nós podíamos saber por irmos de nossa viagem. E entre muitas falas que no caso se fizeram, foi por todos – ou a maior parte – dito que seriam muito bem. E nisso concluíram.

E tanto que a conclusão foi tomada, perguntou mais se seria bom tomar aqui, por força, um par destes homens para os mandar a Vossa Alteza e deixar aqui por eles

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dois desses degredados. A isto acordaram que não era necessário tomar pela força homens, porque era geral costume dos que assim levavam à força para alguma parte dizerem que há aí tudo o que lhes perguntam. E que melhor e muito melhor informação da terra dariam dois homens desses degredados que aqui deixassem do que eles dariam se os levassem, por ser gente que ninguém entende. Nem eles tão cedo aprenderiam a falar para o saberem tão bem dizer o que muito melhor estes outros não digam, quando cá Vossa Alteza mandar. E que, portanto, não curassem aqui de por força tomar ninguém – nem fazer escândalo – para de todo mais os amansar e pacificar, senão somente deixar aqui os dois degredados quando daqui partíssemos. E assim, por melhor parecer a todos, ficou determinado.

Acabado isto, disse o Capitão que fôssemos nos batéis em terra e ver-se-ia bem o rio quejando era – e também para folgarmos. Fomos todos nos batéis em terra, armados e a bandeira conosco. Eles andavam ali na praia à boca do rio aonde nós íamos. E antes que chegássemos, do ensino que dantes tinham, [de]puseram todos os arcos e acenaram que saíssemos. Tanto que os batéis puseram as proas em terra passaram-se logo todos além do rio, o qual não é mais ancho que um jogo de mancal79. Tanto que desembarcamos, alguns dos nossos passaram logo o rio e foram entre eles. E alguns aguardavam e outros se afastavam, peró era a coisa de maneira que todos andavam misturados. Eles davam desses arcos, com suas setas, por sombreiros, carapuças de linho e por qualquer coisa que lhes davam. Passaram além [do rio] tantos dos nossos e andavam assim misturados com eles que se esquivavam, se afastavam e iam-se deles para cima onde outros estavam. Então o Capitão fez-se tomar ao colo de dois homens e passou o rio e fez todos [re]tornar.

A gente que ali era não seria mais que aquela que soía [estar]. E tanto que o Capitão fez [re]tornar todos, vieram alguns deles a ele não por o [re]conhecerem como Senhor, [pois] cá me parece que não entendem nem tomavam disso conhecimento, mas porque a nossa gente já passava para aquém do rio. Ali falavam e traziam muitos arcos e continhas daquelas já ditas e [as] resgatavam por qualquer coisa, em tal maneira que dali trouxeram para as naus muitos arcos, setas e contas. E então [re]tornou o Capitão aquém do rio e logo muitos acudiram à beira dele. Ali [os] veríeis [tão] galantes, pintados de preto e vermelho e quartejados assim pelos corpos como pelas pernas, que decerto pareciam bem assim.

Também andavam entre eles quatro ou cinco mulheres moças, assim nuas que não pareciam mal, entre as quais andava uma com uma coxa, do joelho até o quadril e a nádega, toda tinta daquela tintura preta e o al.80 todo de sua própria cor. Outra trazia ambos os joelhos com as curvas assim tintas e também os colos dos pés. E suas vergonhas tão nuas e com tanta inocência [mantinham] descobertas que nisso não havia nenhuma vergonha. Também andava aí outra mulher moça com um menino ou menina no colo, atado com um pano – não sei de que – aos peitos, que não lhe aparecia senão as perninhas. Mas as pernas da mãe e o al. não trazia nenhum pano.

E depois moveu[-se] o Capitão para cima ao longo do rio, que anda sempre a carão da praia, e ali esperou um velho que trazia na mão uma pá de almadia. Estando o Capitão com ele perante todos nós, falou sem nunca ninguém o entender. Nem ele a nós [de] quanta coisa que lhe perguntavam [acerca] do ouro, [pois] que nós desejávamos saber se o havia na terra. Trazia este velho o beiço tão furado que lhe caberia pelo furado um grande dedo polegar. E trazia metida no furado uma pedra verde ruim que cerrava por fora aquele buraco. E o Capitão lha fez tirar e ele não sei que diabo falava e ia com ela para a boca do Capitão para lha meter. Estivemos rindo um pouco sobre isso e então o Capitão enfadou-se e o deixou. E um dos nossos deu-lhe pela pedra um sombreiro velho não por ela valer alguma coisa, mas por [a]mostra. Depois o Capitão a houve, creio [que] para a mandar com as outras coisas a Vossa Alteza.

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Andamos por ai vendo a ribeira, a qual é de muita água e muito boa. Ao longo dela há muitas palmas não muito altas em que há muito bons palmitos81. Deles colhemos e comemos muitos. Então [re]tornou o Capitão para baixo, para a boca do rio onde desembarcamos. E além do rio andavam muitos deles, dançando e folgando uns ante os outros sem se tomarem pelas mãos e faziam-no bem. Passou então além do rio Diego Dias82 – que foi almoxarife de Sacavém [e] que é homem gracioso e de prazer – e levou consigo um gaiteiro nosso com sua gaita. E se meteu com eles a dançar tomando-os pelas mãos e eles folgavam, riam e andavam com ele mui bem ao som da gaita. Depois de dançarem, fez-lhe ali andando no chão muitas voltas ligeiras e salto real83, de que eles se espantavam, riam e folgavam muito. E conquanto com aquilo muito os segurou e afagou, tomavam logo uma esquiveza como monteses. E se foram para cima.

Então o Capitão passou o rio com todos nós e fomos pela praia de longo, indo os batéis assim a carão de terra. E fomos até uma lagoa grande de água doce que está junto com a praia, porque toda aquela ribeira do mar é apaulada por cima84 e sai a água por muitos lugares. E depois de passarmos o rio, foram uns sete ou oito deles andar entre os marinheiros que se recolhiam aos batéis. E dali levaram um tubarão que Bartolomeu Dias matou e lho levava e lançou na praia.

Que basta até aqui, como se quer que eles em alguma parte amansassem, logo de uma mão para a outra se esquivavam como pardais de cevadouro. E homem nenhum lhes ousa de falar rijo85 por não se esquivarem mais. E tudo se passa como eles querem para os bem amansarem.

Ao velho com quem falou o Capitão deu uma carapuça vermelha. E com toda a fala que com ele passou e com a carapuça que lhe deu, tanto que se despediu [e] que começou passar o rio foi-se logo recatando e não quis mais [re]tornar do rio para aquém. Os outros dois que o Capitão teve nas naus, a quem deu o que já dito é, nunca mais apareceram aqui, do que tiro ser gente bestial e de pouco saber – e por isso são assim esquivos. Eles, porém, com tudo andam muito bem curados e muito limpos e naquilo me parece ainda mais que são como as aves ou alimárias monteses, que o ar lhes faz melhor pena e melhor cabelo que às mansas porque seus corpos são limpos e tão gordos e tão formosos que mais não podem ser. E isto me faz presumir que não têm casas nem moradas em que se [re]colham e o ar a que se criam os faz tais. Nem nós, até agora, ainda não vimos nenhuma casa nem maneira delas.

Mandou o Capitão àquele degredado, Afonso Ribeiro, que se fosse outra vez com eles, o qual se foi e andou lá um bom pedaço. E à tarde [re]tornou, que o fizeram vir e não o quiseram lá consentir. E deram-lhe arcos e setas, não lhe tomando coisa alguma de seu. Antes, disse ele, que um deles lhe tomara umas continhas amarelas que ele levava e fugia com elas. E ele se queixou e os outros foram logo após ele e lhas tomaram e lhas tornaram a dar. E então mandaram-no vir. Disse ele que não vira, lá entre eles, senão umas choupaninhas de rama verde e de feitos muito grandes86 como os de Entre Douro e Minho. E assim [re]tornamos às naus já quase de noite, a dormir.

À segunda-feira, depois de comer, saímos todos em terra a tomar água. Ali então vieram muitos, mas não tanto como das outras vezes. E já traziam muitos poucos arcos e estiveram assim um pouco afastados de nós. E depois, poucos e poucos, misturaram-se conosco, abraçavam-nos e folgavam. E alguns deles se esquivavam logo. Ali davam alguns arcos por folhas de papel, por alguma carapucinha velha e por qualquer coisa. E em tal maneira se passou a coisa que bem 20 ou 30 pessoas das nossas se foram com eles onde muitos outros deles estavam com moças e mulheres. E trouxeram de lá muitos arcos e barretes de penas de aves, deles verdes e deles amarelos, de que creio o Capitão há de mandar amostra a Vossa Alteza. E folgavam com eles, segundo diziam esses que lá foram.

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Neste dia os vimos mais de perto e mais à nossa vontade por andarmos todos quase misturados. E ali [havia] deles [que] andavam quartejados daquelas tinturas, outros de metades e outros de tanta feição como em panos de armar87. E todos com os beiços furados, muitos com os ossos neles e [alguns] deles sem ossos.

Traziam alguns deles uns ouriços verdes de árvores que na cor queriam parecer de castanheiros, senão quanto eram mais e mais pequenos. E aqueles [ouriços] eram cheios de uns grãos vermelhos pequenos que, esmagando-os entre os dedos, fazia[m] tintura muito vermelha da que eles andavam tintos. E quanto mais se molhavam, tanto mais vermelho ficavam88. Todos andam rapados até acima das orelhas e [também] assim as sobrancelhas e pestanas. Trazem todos as testas, de fonte a fonte, tintas de tintura preta que parece uma fita preta ancha de dois dedos.

E o Capitão mandou àquele degredado Afonso Ribeiro e a outros dois degredados que fossem andar lá entre eles – e assim a Diego Dias por ser homem ledo com que eles folgavam. E aos degredados mandou que ficassem lá esta noite. Foram-se lá todos e andaram entre eles e, segundo eles diziam, foram bem uma légua e meia89 a uma povoação de casas em que haveria nove ou dez casas, as quais diziam que eram tão compridas cada uma como esta nau capitânia. E eram de madeira e das ilhargas de tábuas, de razoada altura e cobertas de palha, todas de uma só casa sem nenhum repartimento. Tinham dentro muitos esteios e de esteio a esteio – atada alta pelos cabos em cada esteio – uma rede em que dormiam. E debaixo, para se aquentarem, faziam seus fogos. E tinha cada casa duas portas pequenas, uma em um cabo e outra no outro. E diziam que em cada casa se acolhiam 30 ou 40 pessoas e que assim os achavam e que lhes davam de comer daquela vianda que eles tinham, scilicet, muito inhame90 e outras sementes que na terra há [e] que eles comem. E como foi tarde, fizeram-nos logo todos retornar e não quiseram que lá ficasse nenhum. E ainda, segundo diziam, queriam vir com eles.

Resgataram lá, por cascavéis e por outras coisinhas de pouco valor que levavam, papagaios vermelhos muito grandes e formosos e dois verdes pequeninos, carapuças de penas verdes e um pano de penas de muitas cores [à] maneira de [um] tecido assaz formoso segundo Vossa Alteza verá, porque o Capitão todas essas coisas vo-las há de mandar, segundo ele disse. E com isto vieram. E nós tornamos às naus.

À terça-feira, depois de comer, fomos em terra dar guarda de lenha e lavar roupa. Estavam na praia, quando chegamos, cerca de 60 ou 70 [homens] sem arcos e sem nada. Tanto que chegamos, vieram-se logo para nós sem se esquivarem. E depois acudiram muitos, que seriam bem 200, todos sem arcos. E misturaram-se todos tanto conosco que [alguns] deles nos ajudavam a acarretar lenha e meter nos batéis. E lutavam com os nossos e tomavam muito prazer.

Enquanto nós fazíamos a lenha, faziam dois carpinteiros uma cruz de um pau que ontem para isso se cortou. Muitos deles vinham ali estar com os carpinteiros e creio que o faziam mais por verem a ferramenta de ferro com que a faziam que por verem a cruz, porque eles não têm coisa que de ferro seja e cortam sua madeira e paus com pedras feitas como cunhas metidas em um pau entre duas talas mui bem atadas. E que por tal maneira andam fortes, segundo os homens que [foram] ontem às suas casas diziam porque lhas viram lá.

A conversação deles conosco já era tanta que quase nos [es]torvavam ao que havíamos de fazer. E o Capitão mandou a dois degredados e a Diego Dias que fossem lá à aldeia – e a outras se houvesse algumas novas – e que de toda maneira não se viessem a dormir às naus, ainda que eles os mandassem. E assim se foram.

Enquanto andávamos nessa mata a cortar lenha, atravessavam alguns papagaios por essas árvores – deles verdes e outros pardos, grandes e pequenos – de maneira que me parece que haverá nesta terra muitos, peró eu não veria mais que até nove ou dez.

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Outras aves então não vimos, somente algumas pombas-seixas e pareceram-me maiores, em boa quantidade, que as de Portugal. Alguns diziam que viram rolas, mas eu não as vi. Mas segundo os arvoredos são muitíssimos, grandes e de infindas maneiras, não duvido que por esse sertão haja muitas aves. E cerca da noite nos volvemos para as naus com nossa lenha.

Eu creio, Senhor, que não dei conta ainda aqui a Vossa Alteza da feição de seus arcos e setas. Os arcos são pretos e compridos, as setas compridas e os ferros delas de canas aparadas segundo Vossa Alteza verá por alguns que, creio, o Capitão a Ela há de enviar.

À quarta-feira não fomos em terra porque o Capitão andou todo o dia no navio de mantimentos a despejá-lo e fazer levar às naus isso que cada uma podia levar. Eles acudiram à praia – muitos segundo das naus vimos – que seriam obra de 300 segundo disse Sancho de Tovar, que lá foi.

Diego Dias e Afonso Ribeiro, o degredado, a que o Capitão ontem mandou que em toda maneira lá dormissem, volveram-se já de noite por eles não quererem que lá dormissem. E trouxeram papagaios verdes e outras aves pretas quase como pegas, senão quanto tinham o bico branco e os rabos curtos.

E quando Sancho de Tovar se recolheu à nau, queriam se vir com ele alguns [homens], mas ele não quis senão dois mancebos dispostos e homens de prol. Mandou-os essa noite mui bem pensar e curar. E comeram toda a vianda que lhes deram. E mandou-lhes fazer cama de lençóis, segundo ele disse. E dormiram e folgaram aquela noite. E assim não foi mais este dia que para escrever seja.

Na quinta-feira, derradeiro de abril, comemos logo quase pela manhã e fomos em terra por mais lenha e água. E querendo o Capitão sair desta nau, chegou Sancho de Tovar com seus dois hóspedes. E por ele não ter ainda comido puseram-lhe toalhas e veio-lhe vianda e comeu. Os hóspedes assentaram-nos em senhas cadeiras e de tudo que lhes deram comeram muito bem, especialmente lacão cozido91 frio e arroz. Não lhes deram vinho por Sancho de Tovar dizer que não o bebiam bem.

Acabado o comer, metemo-nos todos no batel e eles conosco. Deu um grumete a um deles uma armadura grande de um porco montês, bem revolta92, e tanto que a tomou meteu-a logo no beiço. E porque não se lhe queria [re]ter, deram-lhe uma pequena [porção de] cera vermelha e ele corrigiu seu adereço [por] detrás para [re]ter-se e meteu-a no beiço assim revolta para cima. E vinha tão contente com ela como se tivera uma grande jóia. E tanto que saímos em terra foi-se logo com ela e não apareceu mais aí.

Andariam na praia, quando saímos, oito ou dez deles. Daí a pouco começaram a vir e pareceu-me que viriam [n]este dia à praia [uns] 400 ou 450. Traziam alguns deles arcos e setas e os deram todos por carapuças e por qualquer coisa que lhes davam. Comiam conosco do que lhe dávamos e alguns deles bebiam vinho e outros não o podiam beber. Mas parece-me que, se lho avezarem, que o beberão de boa vontade. Andavam todos tão dispostos, tão bem feitos e galantes com suas tinturas que pareciam bem. Acarretavam dessa lenha quanto podiam, com muito boa vontade, e levavam-na aos batéis. E andavam já mais mansos e seguros entre nós do que nós andávamos entre eles.

Foi o Capitão com alguns de nós um pedaço por este arvoredo até uma ribeira grande e de muita água que, a nosso parecer, era essa mesma que vem ter à praia em que nós tomamos água. Ali jouvemos um pedaço bebendo e folgando ao longo dela entre esse arvoredo que é tanto, tamanho, tão basto e de tantas prumagens que não lhe pode homem [algum] dar conta. Entre ele há muitas palmas, de que colhemos muitos bons palmitos.

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Quando saímos do batel, disse o Capitão que seria bom irmos direitos à cruz – que estava encostada a uma árvore junto com o rio para se pôr de manhã, que é sexta-feira – e que nos puséssemos todos em joelhos e a beijássemos, para eles verem o acatamento que lhe tínhamos. E assim o fizemos. A esses dez ou 12 que aí estavam acenaram-lhes que assim fizessem e foram todos logo beijá-la.

Parece-me gente de tal inocência que se [algum] homem os entendesse – e eles a nós – logo seriam cristãos, porque eles não têm nem entendem nenhuma crença, segundo parece. E, portanto, se os degredados que aqui hão de ficar aprenderem bem a sua fala e os entenderem, não duvido – segundo a santa [in]tenção de Vossa Alteza – se fazerem cristãos e crerem em nossa santa fé, à qual praza a Nosso Senhor que os traga porque [de]certo esta gente é boa e de boa simplicidade. E imprimir-se-á rapidamente neles qualquer cunho que lhes quiserem dar. E logo Nosso Senhor lhes deu bons corpos e bons rostos como a bons homens. E Ele que nos por aqui trouxe, creio que não foi sem causa. Vossa Alteza, portanto, deve entender em sua salvação, pois tanto deseja acrescentar na santa fé católica. E prazerá a Deus que, com pouco trabalho, será assim.

Eles não lavram nem criam, nem há aqui boi, nem vaca, nem cabra, nem ovelha, nem galinha, nem nenhuma outra alimária que acostumada seja ao viver dos homens. Nem comem senão desse inhame, que aqui há muito, e dessa semente e frutos que a terra e as árvores lançam de si. E com isso andam tais, tão rijos e tão nédios que não o somos nós tanto com quanto trigo e legumes [que] comemos.

Enquanto ali, [n]este dia, andaram sempre ao som de um tamboril nosso93, dançaram e bailaram com os nossos em maneira que são mais amigos nossos que nós seus. Se [algum] homem lhes acenava se queriam vir às naus, faziam-se logo prestes para isso, de tal maneira que se os homens todos quisera convidar, todos viriam. Porém não trouxemos esta noite às naus senão quatro ou cinco [deles], scilicet, o Capitão-Mor dois, Simão de Miranda um, que já trazia como pajem, e Aires Gomes94 outro, assim [por] pajem. [D]os que o Capitão trouxe, um deles era um de seus hóspedes que, de primeira quando aqui chegamos, lhe trouxeram, o qual veio hoje aqui vestido na sua camisa. E com ele um irmão seu. Os quais [visitantes] esta noite foram muito bem agasalhados, assim de vianda como de cama, de colchões e lençóis para mais os amansar.

E hoje que é sexta-feira, primeiro dia de maio, pela manhã saímos em terra com nossa bandeira e fomos desembarcar acima do rio, contra o sul, onde nos pareceu que seria melhor chantar a cruz para ser melhor vista. E ali o Capitão assinalou onde fizessem a cova para a chantar. E enquanto a ficaram fazendo, ele com todos nós outros fomos pela cruz95 mais abaixo do rio onde ela estava. Trouxemo-la dali com esses religiosos e sacerdotes cantando adiante [à] maneira de procissão. Eram já aí alguns deles, obra de 70 ou 80, e quando nos viram assim vir, alguns deles se foram meter debaixo dela a nos ajudar. Passamos o rio ao longo da praia e fomos pô-la onde havia de ser, que será do rio obra de dois tiros de besta96. Andando ali nisto, vieram bem 150 ou mais.

Chantada a cruz com as armas e a divisa de Vossa Alteza, que primeiro lhe pregaram, armaram altar ao pé dela. Ali disse missa o padre frei Henrique, a qual foi cantada e oficiada por esses já ditos. Ali estiveram a ela conosco cerca de 50 ou 60 deles, todos assentados nos joelhos assim como nós. E quando veio o Evangelho, que nos erguemos todos em pé com as mãos levantadas, eles se levantaram conosco e alçaram as mãos, estando assim até ser acabado. Então tornaram a sentar como nós. E quando levantaram a Deus97, que nos pusemos de joelhos, todos eles se puseram assim como nós estávamos, com as mãos levantadas e de tal maneira assossegados que certifico a Vossa Alteza que nos fez muita devoção. Estiveram assim conosco até acabada a comunhão. E depois da comunhão comungaram esses religiosos, sacerdotes e o Capitão com alguns de nós outros.

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Estando nós comungando, alguns deles alevantaram-se pelo sol ser grande e outros estiveram e ficaram. Um deles, homem de 50 ou 55 anos, ficou ali com aqueles que ficaram. Este, em nós assim estando, ajuntava aqueles que ali ficaram e ainda chamava a outros. Andando assim entre eles falando-lhes, acenou com o dedo para o altar e depois mostrou o dedo para o céu, como que lhes dizia alguma coisa de bem. E nós assim o tomamos. Acabada a missa, tirou o padre a vestimenta de cima98 e ficou em alva99. Assim subiu junto ao altar em uma cadeira e ali nos pregou do Evangelho e dos Apóstolos cujo dia é hoje100, tratando enfim da pregação deste vosso prosseguimento tão santo e virtuoso que nos causou mais devoção.

Esses, que sempre estiveram à pregação, assim como nós estavam olhando para ele. E aquele que digo chamava alguns que viessem para ali. Alguns vinham e outros se iam. Acabada a pregação, Nicolau Coelho trazia muitas cruzes de estanho com crucifixos que lhe ficaram ainda da outra vinda101. E houveram por bem que lançasse a cada um a sua ao pescoço. Pela qual coisa se assentou o padre frei Henrique ao pé da cruz e ali, a um e um, lançava [a] sua atada em um fio ao pescoço, fazendo-lha primeiro beijar e levantar as mãos. Vinham muitos a isso e lançaram-nas todas, que seriam cerca de 40 ou 50.

E isto acabado já era bem uma hora depois do meio-dia. Viemos às naus a comer, [para] onde o Capitão trouxe consigo aquele mesmo que fez aos outros aquela mostrança para o altar e para o céu – e um irmão seu com ele. Ao qual [homem] fez muita honra e deu-lhe uma camisa mourisca e ao outro uma camisa dessas outras.

E segundo o que a mim e a todos pareceu, esta gente não lhes falece outra coisa para ser toda cristã que entender-nos. Porque assim tomavam aquilo que nos viam fazer como nós mesmos, por onde pareceu a todos que nenhuma idolatria nem adoração têm. E bem creio que se Vossa Alteza aqui mandar quem mais entre eles devagar ande, que todos serão tornados ao desejo de Vossa Alteza. E se para isso alguém vier não deixe logo de vir clérigo para os batizar, porque já então terão mais conhecimento de nossa fé pelos dois degredados que aqui entre eles ficam, os quais ambos hoje também comungaram102.

Entre todos estes que hoje vieram não veio mais que uma mulher moça, a qual esteve sempre à missa [e] à qual deram um pano para que se cobrisse, pondo-lhe ao redor de si. Peró ao assentar não fazia memória de o muito estender para se cobrir. Assim, Senhor, a inocência desta gente é tal que a de Adão não seria quanta em vergonha. Ora veja Vossa Alteza [se] quem em tal inocência vive, ensinando-lhes o que pertence para a sua salvação, se converterá ou não. Acabado isso fomos assim perante eles beijar a cruz, despedimo-nos e viemos comer.

Creio, Senhor, que com esses dois degredados que aqui ficam, ficam mais dois grumetes que esta noite se saíram desta nau no esquife em terra fugidos, os quais não vieram mais103. E cremos que ficarão aqui, porque de manhã, prazendo a Deus, faremos daqui nossa partida.

Esta terra, Senhor, me parece que – da ponta que mais vimos contra o sul até a outra ponta que vem contra o norte de que nós houvemos vista deste porto – será tamanha que haverá nela bem 20 ou 25 léguas104 de costa. Traz ao longo do mar, em algumas partes, grandes barreiras – delas vermelhas e delas brancas. E a terra por cima [é] toda chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta é toda praia palma105, muito chã e muito formosa. Pelo sertão nos pareceu, do mar, muito grande, porque a estender os olhos não podíamos ver senão terra e arvoredos, que nos parecia mui longa terra.

Até agora nela não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem nenhuma coisa de metal, nem de ferro. Nem lho vimos. Peró a terra em si é de muito bons ares, assim frios e temperados como os de Entre Douro e Minho, porque neste tempo de agora assim os achávamos como os de lá. Águas são muito, infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo por bem das águas que tem.

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Peró o melhor fruto que nela se pode fazer me parece que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza nela deve lançar. E que aí não houvesse mais que ter aqui esta pousada para esta navegação de Calicute, bastaria quanto mais disposição para nela se cumprir e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, scilicet, acrescentamento da nossa santa fé.

E desta maneira, Senhor, dou aqui a Vossa Alteza [conta] do que nesta vossa terra vi. E [que] Ela me perdoe se algum pouco me alonguei, que o desejo que tinha de tudo vos dizer mo fez assim pôr pelo miúdo. Pois que é certo, Senhor, que assim neste encargo que levo, como em qualquer outra coisa que de vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida. A Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé Jorge de Ozouro, meu genro, o que d’Ela receberei em muita mercê106.

Beijo as mãos de Vossa Alteza.

Deste Porto Seguro, da vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500.

Pero Vaz de Caminha” 2. O “RELATO DO PILOTO ANÔNIMO”

Objeto de acerbas discussões, a presente narrativa teria como autor um dos integrantes da frota de Cabral cuja identidade permanece duvidosa até os dias de hoje. Publicada no primeiro volume da “Navigationi et Viaggi”, essa relação seria atribuída por RAMUSIO (1550) a “un pilotto portoghese”, assertiva que daria origem ao epíteto “Relato do Piloto Anônimo” consagrado em inúmeras fontes (vide também MAKINO, 1967). Assumida por alguns estudiosos (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001), a recente denominação de “Relato do Português Anônimo” reflete a hipótese do responsável cabível não ter sido um piloto, mas um escrivão embarcado (fide GREENLEE, 1938). Além de Pero Vaz de Caminha, o único elemento a exercer tal ofício cujo nome resistiu ao tempo foi João de Sá, que já havia participado da expedição anterior de Vasco da Gama e viajava novamente para as Índias no navio de Simão de Miranda ou do próprio Cabral (A.A.B. de ANDRADE, 1972; GREENLEE, 1938). Contrariando as especulações sobre o “Relato do Piloto Anônimo” constituir mera compilação da “Carta de Pero Vaz de Caminha” e de outros documentos oficiais, a maioria dos especialistas prossegue encarando esses textos como depoimentos independentes de duas testemunhas distintas acerca dos mesmos episódios (vide C.M. DIAS, 1921-1924).

As circunstâncias e data de elaboração do “Relato do Piloto Anônimo” ainda permanecem muito obscuras, malgrado o conteúdo sugira um informe posterior ao retorno da frota de Cabral a Lisboa, evento ocorrido entre junho e julho de 1501. A correspondência do veneziano Domenico Malipiero, no entanto, demonstra que esse grande curioso das navegações ibéricas mantinha uma autêntica rede de informantes em Portugal e Espanha, entre os quais se alinhavam Angelo Trevigiano e Giovanni Matteo Camerini, ambos secretários de Domenico Pisani di Giovanni, embaixador de Veneza junto à corte dos Reis Católicos (BERCHET, 1892-1896). Visitante ocasional de Lisboa e signatário de uma carta sobre a expedição de Cabral escrita em 27 de junho de 1501 (vide adiante), Giovanni Matteo pode ter desempenhado um papel relevante na enigmática trajetória do “Relato do Piloto Anônimo”, pois seu colega Angelo Trevigiano lograra obter cópia de ensaios do cronista Pietro Martire de Anghiera, enviando para Domenico Malipiero – entre agosto e dezembro de 1501 – uma descrição das três primeiras viagens de Colombo, além de notícias referentes às investidas de Alonso Niño e Vicente Yáñez Pinzón no continente americano (MORAES, 1983; T.O.M. de SOUZA, 1964; TEIXEIRA & PAPAVERO, 2002).

Apesar de existirem comentários sobre o monarca de Portugal ter empregado as observações do “Piloto Anônimo” para conceber a famosa “Carta aos Reis Católicos” de

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29 de julho de 1501 (cópia em C.M. DIAS, 1921-1924), boa parte dos historiadores esposa a idéia de Dom Manuel I só haver tomado conhecimento do “Relato” através de sua publicação. Tampouco se sabem maiores detalhes a esse respeito, havendo apenas a conjetura de que o suposto original português – ou uma versão em vêneto – teria chegado a Veneza logo depois do regresso da armada de Cabral. Várias cópias desse documento perdido foram produzidas durante a primeira metade do século XVI, havendo notícia de quatro manuscritos ligeiramente distintos entre si, dos quais três se encontram depositados na “Biblioteca Nazionale de San Marco”, enquanto o último hoje pertence ao acervo da “Library of Congress” dos EUA (P.R. PEREIRA, 1999).

Atento a todas as descobertas realizadas no outro lado do oceano, Fracanzano da Montalboddo incluiria o “Relato do Piloto Anônimo” em seu “Paesi novamente retrovati” sob o título “De la navigatione de Lisbona a Callichut, de lengua Portugallese in italiana” (MONTALBODDO, 1507) (Figs.5-6). Em virtude do enorme sucesso alcançado por essa coletânea de viagens (vide adiante), o mesmo capítulo seria reproduzido, com algumas, alterações, em obras como o “Novus Orbis” de GRYNAEUS (1532) e a “Delle Navigationi et Viaggi” de RAMUSIO (1550), onde foi denominado de “Navigationi del capitano Pedro Alvires scrita per un pilotto portoghese & tradote de lingua portoghesa in la italiana”. Até a divulgação das cartas de Pero Vaz de Caminha e do Mestre João Faras na primeira metade do século XIX, o “Relato do Piloto Anônimo” permaneceria como o único testemunho existente sobre a descoberta do Brasil da autoria de um participante da viagem de Cabral, portanto constituindo fonte privilegiada para numerosos cronistas do século XVI interessados no Novo Mundo (e.g. CASTANHEDA, 1551; GALVÃO, 1563). Embora seu prestígio tenha declinado bastante com o passar dos anos, existiriam pelo menos 23 edições, completas ou parciais, vindas à luz até 1956 (teste MAKINO, 1967), total acrescido de várias contribuições recentes (e.g. J.M. GARCIA, 1983; P.R. Pereira, 1999; I.M. SANTOS, 2000; H.C. SIMÕES, 1999; TEIXEIRA & PAPAVERO, 2003). A presente análise leva em conta tanto o livro de MONTALBODDO (1507) quanto aquele de RAMUSIO (1550), tendo reproduções atuais como material de apoio (e.g. H.C. SIMÕES, 1999; TEIXEIRA & PAPAVERO, 2003). As diferentes traduções disponíveis (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; ALBUQUERQUE, 1989; CORTESÃO, 1922; J.M. GARCIA, 1983; FIGUEIREDO, 1874; LEONE, 1969; P.R. PEREIRA, 1999; D. RIBEIRO & MOREIRA NETO, 1992; H.C. SIMÕES, 1999; RODRIGUES, 1905; T.O.M. de SOUZA, 1946) foram revisadas, comparando-se os respectivos trechos pertinentes. Por estar calcada no pretenso original português desaparecido, a versão de MONTALBODDO (1507) seria escolhida como referência, haja vista que a variante de RAMUSIO (1550) se revela muito similar (Anexo 2).

Contrariando certas afirmativas (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001), o “Relato do Piloto Anônimo” apresenta claras discrepâncias com a “Carta de Pero Vaz de Caminha”, tópico que despertou a atenção de diversos interessados (e.g. ABREU, 1908; CORTESÃO, 1922; GREENLEE, 1938). Entre os exemplos mais notáveis, alinha-se a menção do dia 24 de abril de 1500 como data de abordagem das terras brasileiras, a minuciosa descrição de um “peixe monstruoso” ausente do manuscrito de Caminha e a inexistência de qualquer alusão ao esqualo citado por esse último. Com efeito, embora possa ser caracterizado como uma narrativa de razoável precisão, o “Relato do Piloto Anônimo” apresenta limitado valor em termos da História Natural, pois suas escassas informações sobre a fauna e flora em geral passam ao largo de maiores detalhes. Além disso, os trechos relativos aos animais foram quase todos concentrados em um único capítulo independente de qualquer seqüência cronológica, particularidade destinada a dificultar sobremaneira eventuais comparações com a “Carta de Pero Vaz de Caminha” (vide Tab.1). Ao menos em parte, tal concisão pode ser atribuída ao fato de a descoberta de um litoral selvagem constituir um evento menor na demanda de Portugal pelas cobiçadas riquezas do Oriente, principal fio condutor dessa narrativa (apud J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001).

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Fig.5- Fronstispício da primeira edição do “Paesi novamente retrovati” de Fracanzano da Montalboddo, obra publicada em Veneza no ano de 1507.

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Fig.6- Página inicial do “Relato do Piloto Anônimo” no “Paesi novamente retrovati” de Fracanzano da Montalboddo, obra publicada em Veneza no ano de 1507.

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TABELA 1. Relação cronológica dos animais citados na “Carta de Pero Vaz de Caminha” e no “Relato do Piloto Anônimo” (9 de março a 2 de maio de 1500).

DATA PRINCIPAIS EVENTOS ANIMAIS CITADOS NA “CARTA DE PERO VAZ DE CAMINHA”

ANIMAIS CITADOS NO “RELATO DO

PILOTO ANŌNIMO”

Segunda-feira 9 de março

Partida de Lisboa nenhum nenhum

Terça-feira, 21 de abril

Primeiros sinais de terra nenhum nenhum

Quarta-feira, 22 de abril

Monte Pascoal avistado, esquadra fundeia a meia légua do litoral

“fura-buchos” nenhum

Quinta-feira, 23 de abril

Primeiro desembarque nenhum nenhum

Sexta-feira, 24 de abril

Esquadra levanta âncora, para fundear, cerca de dez léguas ao norte, na baía de Cabrália. Dois indígenas visitam a nau capitânia

“papagaio pardo” nenhum

Sábado, 25 de abril

Esquadra penetra pela barra e vai fundear na enseada. Tripulantes desembarcam

“pescado miúdo” nenhum

Domingo, 26 de abril

Celebrada a Primeira Missa no ilhéu de Coroa Vermelha. Tripulantes circulam nos arredores

“camarões” “berbigões” “amêijoas” “tubarão”

nenhum

Segunda-feira, 27 de abril

Aguada. Tripulantes circulam nos arredores

“papagaios verdes pequenos” “papagaios vermelhos”

“papagaios”

Terça-feira, 28 de abril

Principia a construção da cruz. Tripulantes cortam lenha e circulam nos arredores

“papagaios pardos grandes e pequenos” “papagaios verdes grandes e pequenos” “pombas seixas” “rolas”

nenhum

Quarta-feira, 29 de abril

Descarga da naveta de mantimentos

“aves pretas como pegas” “papagaios verdes”

nenhum

Quinta-feira, 30 de abril

Aguada. Tripulantes cortam lenha e circulam nos arredores

nenhum nenhum

Sexta-feira, 1o de maio

Celebrada a Segunda Missa no continente

nenhum nenhum

Sábado, 2 de maio

Partida da esquadra para as Índias

nenhum nenhum

Animais citados sem ordem cronológica discernível

nenhum “papagaios” “peixe monstruoso”

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Tradução para o português dos trechos sobre o Brasil existentes no “Relato do Piloto Anônimo”, segundo versão publicada no “Paesi Novamente Retrovati” de Fracanzano

da Montalboddo (1507)

“Onde, em pessoa, o Rei [Dom] Manuel consignou o estandarte real ao Capitão Capítulo LXIII

No ano de 1500, mandou o Sereníssimo Rei de Portugal, por nome chamado Dom Manuel107, uma armada sua de naus e navios às partes da Índia. Na qual armada havia 12 naus e navios108 e tinha a armada por Capitão-Mor Pedro Álvares [Cabral], fidalgo. As quais naves e navios partiram e bem aparelhadas e providas de todas e quaisquer coisas que necessárias lhes fossem por um ano e meio. Das 12 naus, ordenou que dez descarregassem em Calicute109 e as outras duas para a Arábia para efeito de que fossem para um lugar chamado Sofala110, porque queriam mercadejar naquele lugar – o qual lugar de Sofala acharam estar no caminho de Calicute. E assim as outras dez naves levavam mercadorias que à dita viagem lhes fossem necessárias. E aos 7 do mês de março no dito ano estavam prontos. E naquele dia, que era um domingo, andaram à distância de duas milhas111 desta cidade em um lugar chamado Restelo112, onde está uma igreja chamada Santa Maria de Belém, no qual lugar o Sereníssimo Rei foi ele mesmo em pessoa entregar ao Capitão o estandarte real para a dita armada.

E na segunda-feira, que eram nove dias de março, partiu a dita armada com bom tempo para a sua viagem113.

E no dia 14 do dito mês, passou a dita armada pela ilha de Canária.

E no dia 22 passou pela ilha de Cabo Verde.

E no dia 23 separou-se uma nau da dita armada, de tal forma que nunca mais se ouviu dela até o presente, nem se pode saber. Como as naus correram com a tormenta Capítulo LXIV

No dia 24 de abril, que foi a quarta-feira da oitava da Páscoa, houve a dita armada vista de uma terra, de que houve grande prazer. E chegaram a terra para ver que terra era, a qual acharam ser terra muito abundante em árvores e gente que por ali andava pela costa do mar. E lançaram âncora na foz de um rio pequeno. E depois de lançadas as ditas âncoras o Capitão mandou deitar um batel ao mar, pelo qual mandou ver que gentes eram aquelas. E acharam que eram gentes de cor parda, entre o branco e preto, bem dispostas, com cabelos longos. E andam nus como nasceram, sem vergonha alguma. E cada um deles portava seu arco com flechas, como homens que estivessem em defesa do dito rio. Na dita armada não havia ninguém que compreendesse sua língua e, visto isso, aqueles do batel voltaram ao Capitão e nesse instante fez-se noite, na qual noite formou-se grande tormenta. E no dia seguinte, pela manhã, levantamos âncora e com grande tormenta andamos percorrendo a costa para o norte, o vento era siroco114, para ver se encontrávamos algum porto onde pudesse estar a dita armada. Finalmente encontramos um porto onde lançamos âncora e onde encontramos aqueles indígenas que andavam em suas barquinhas a pescar. E um de nossos batéis foi até onde estavam esses homens e agarraram dois deles e os levaram ao Capitão para saber que gente eram. E como hei dito, não se compreendiam nem por fala nem por sinais. E naquela noite o Capitão reteve-os com ele. No dia seguinte mandou-os vestir com uma camisa e um vestido e um barrete vermelho, pelo qual vestir ficaram muito contentes e maravilhados com as coisas que lhes foram mostradas. Depois os mandou pôr em terra. Raiz de que fazem pão e seus outros costumes Capítulo LXV

E naquele mesmo dia, que era a oitava da Páscoa, a 26 de abril, determinou o Capitão-Mor ouvir missa. E mandou armar uma tenda naquela praia onde mandou

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construir um altar. E todos aqueles da dita armada foram ouvir missa e sermão. Ali se juntaram muitos daqueles homens, bailando e cantando com seus cornos. E logo que foi dita a missa, todos se retiraram para as suas naus. E aqueles homens da terra entraram pelo mar adentro até as axilas, cantando e fazendo-lhes prazer e festa. Depois, tendo o Capitão jantado, a gente da dita armada voltou em terra, tendo recreio e prazer com aqueles homens da terra, [os quais] começaram a tratar com aqueles da armada. E davam dos seus arcos e flechas por campainhas, folhas de papel e pedaços de pano. E folgaram com eles todo aquele dia. Nesse lugar encontramos um rio de água doce e à tarde voltamos às naus. E no outro dia, determinou o Capitão-Mor carregar água e lenha. E todos aqueles da dita armada foram a terra e os homens daquele lugar vieram ajudar a conseguir lenha e água. E alguns dos nossos andaram até a terra de onde são estes homens, que estaria três milhas distante do mar115, e obtiveram por troca papagaios e uma raiz chamada inhame, que é seu pão que comem os árabes116. Aqueles da armada davam-lhes campainhas e folhas de papel em pagamento das ditas coisas. Nesse lugar estivemos cinco ou seis dias. O aspecto dessa gente é de serem homens pardos. Andam nus sem vergonha, os cabelos são longos e trazem a barba pelada. E as pálpebras dos olhos e os supercílios estavam pintados com figuras de cores brancas, pretas, azuis e vermelhas. Trazem os lábios da boca, isto é aquele de baixo, perfurado – e nos buracos põe um osso tão grande como um prego. Outros trazem aí uma pedra azul ou verde, longa, pendente dos ditos buracos. Da mesma forma, as mulheres andam sem vergonha e são belas mulheres de corpo, com cabelos longos. Suas casas são de madeira, cobertas de folhas e ramos de árvores, com muitos esteios de pau. No meio das ditas casas – e dos ditos esteios para a parede – põem uma rede de algodão117 dependurada na qual fica um homem. Entre uma rede e outra fazem uma fogueira de modo que em uma só casa haverá de 40 a 50 leitos armados à maneira de teares. Papagaios na terra recentemente descoberta Capítulo LXVI

Nesta terra não vimos ferro – nem nenhum outro metal – e cortam a madeira com pedra. E há muitas aves de muitos tipos, especialmente papagaios de muitas cores, entre os quais existem alguns grandes como galinhas e outras aves muito belas. Das penas das ditas aves fazem chapéus e barretes que usam. A terra é muito abundante de muitas árvores, muitas águas boas, inhames e algodão. Nestes lugares não vimos animal algum118. A terra é grande e não sabemos se é ilha ou terra firme, mas acreditamos que seja terra firme pela sua grandeza e tem muito bom ar. Estes homens possuem redes, são grandes pescadores e pescam muitos tipos de peixes, entre os quais vimos um peixe que apanharam que seria grande como uma pipa, mais comprido e redondo. Tinha a cabeça como de um porco e os olhos pequenos. Não tinha dentes e tinha orelhas do comprimento de um braço e da largura de meio braço. Debaixo do corpo tinha dois buracos e a cauda era do comprimento de um braço e larga de outro tanto. Não tinha nenhum pé em lugar algum, tinha pêlos como os do porco, o couro era grosso como um dedo. Suas carnes eram brancas e gordas como as de porco. E nestes dias que estivemos aqui, determinou o Capitão fazer saber ao nosso Sereníssimo Rei o achado desta terra e deixar nela dois homens banidos e condenados à morte que tínhamos na dita armada para tal fim. E logo o dito Capitão despachou um navio de mantimentos que tinham consigo além das outras 12 naus supracitadas, o qual navio levou cartas ao Rei as quais continham quanto havíamos visto e descoberto. Despachado o dito navio, o Capitão foi a terra e mandou fazer uma cruz muito grande de madeira e mandou-a chantar na praia. Por fim, como dito, deixou dois homens banidos no dito lugar, os quais começaram a chorar119. E os homens daquela terra confortavam-nos e mostravam ter piedade deles.

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Tormenta tão grande que quatro naus pereceram Capítulo LXVII

E no outro dia, que foi o dia 2 de março do dito ano, a armada fez vela pelo caminho para fazer a volta do Cabo da Boa Esperança, o qual caminho seria através do mar por mais de 1.200 léguas, sendo quatro milhas por légua120 ...” 3. AS CARTAS DOS MISSIVISTAS ITALIANOS

O universo documental examinado compreende várias notícias sobre o retorno da frota de Cabral elaboradas por negociantes, banqueiros e diplomatas de Veneza, Florença, Gênova e Cremona atuantes em território português (T.O.M. de SOUZA, 1946). Desde o início do “périplo africano”, calculava-se que a eventual abertura de um caminho marítimo para as Índias representaria o fim do monopólio dos grupos mercantis da Itália na circulação de artigos entre o Oriente e o Ocidente, base da riqueza e poderio de numerosos Estados peninsulares. Na Lisboa dos séculos XV e XVI, a forte presença italiana fazia-se sentir tanto através dos pilotos e outros elementos úteis para as navegações quanto nas parcerias comerciais e financeiras celebradas com os atores locais interessados nas viagens ultramarinas, conjuntura propícia para a articulação de extensa rede de informantes atentos a qualquer murmúrio sobre as descobertas recentes, vigilância destinada a crescer de maneira vertiginosa após a bem sucedida expedição de Vasco da Gama em 1499. De certa forma, portanto, o material estudado poderia ser entendido como um conjunto de relatórios produzidos por observadores privilegiados para sócios ou autoridades de suas respectivas cidades natais.

Sob o ponto de vista das ciências naturais, o primeiro personagem merecedor de atenção seria o já mencionado Giovanni Matteo Camerini – chamado “il Cretico” por seus contemporâneos121 – erudito secretário de Domenico Pisani di Giovanni, embaixador de Veneza na Espanha (vide adiante). Por estar em Lisboa em 23 de junho de 1501, data de chegada do primeiro navio da armada de Cabral, Giovanni Matteo teria a oportunidade de inquirir membros da tripulação e obter detalhes sobre a carga embarcada, articulando uma carta onde testemunhos dos navegantes mesclam-se a comentários próprios influenciados pela leitura de antigos geógrafos e outros autores clássicos (Anexo 3).

Datada de 27 de junho de 1501, a mensagem em foco parece ser dirigida ao Doge Agostino Barbarigo, havendo notícia de cópia encaminhada para o embaixador extraordinário da Sereníssima República em Lisboa, Pietro Pasqualigo, além de especulações sobre uma outra remetida a Domenico Pisani di Giovanni. Na qualidade de primeiro relato a divulgar as peripécias da expedição de Cabral em Veneza (GREENLEE, 1938), a narrativa de Giovanni Matteo tomaria corpo já em 1501 através de um misterioso impresso hoje desaparecido (teste Girolamo Priuli in FULIN, 1881). Tampouco o original parece ter sobrevivido, embora existam dois traslados na “Biblioteca Marciana” de Veneza (“Collezione Viaggiatori Antichi” MS. Ital. Cl. 6, n° 208 e “Codex Contarini” A, VI 277), além de um terceiro depositado no “Museo Civico” vizinho (“Archivio Veneto” XXIV, parte I). A versão mais conhecida, entretanto, viria à luz na famosa coletânea de viagens de Fracanzano da Montalboddo sob o título de “Copia de uno capitulo di lettere de .D. Creticho nontio de la Ilustrissima Signoria de Venetia in Portugallo Data a di xxvii. Zugno .M. ccccci.” (MONTALBODDO, 1507). Alcançando grande notoriedade pelas sucessivas edições do “Paesi novamente retrovati” (e.g. MONTALBODDO, 1508a, 1508b, 1508c, 1512, ca. 1515, 1517, 1519, ca. 1532), essa variante continuaria despertando interesse nos séculos posteriores (e.g. BERCHET, 1892-1896; FULIN, 1881; ROMANIN, 1853-1861), sendo reproduzida mesmo nos dias de hoje (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; GREENLEE, 1938; GUEDES, 1997; T.O.M. de SOUZA, 1946).

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O segundo missivista digno de nota seria Bartolomeo Marchionni, rico banqueiro florentino residente em Portugal e um dos quatro armadores da “Anunciada”, pequena caravela redonda que se revelaria a mais rápida de todas as embarcações da esquadra de Cabral, tendo retornado das Índias em 23 de junho de 1501. Na qualidade de associado da empreitada, Marchionni escreveria duas cartas ao mesmo destinatário não especificado, uma em 27 de junho de 1501 e outra após o dia 29 de julho desse mesmo ano, data de arribada do último navio da frota em Lisboa. A exemplo do caso anterior, não existe indício dos originais, estando a relação vigente baseada em transcrições de época da “Biblioteca Riccar diana” de Florença (“Collezione Pietro Vaglienti”, MS 1910; vide Fig.7). Descobertas no segundo quartel do século passado (in GREENLEE, 1938), as cartas de Marchionni voltariam a ser editadas nos anos seguintes (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; T.O.M. de SOUZA, 1946). Apenas a primeira tece breves consi derações sobre elementos da nossa fauna (Anexo 4).

Domenico Pisani di Giovanni, embaixador de Veneza na Es panha e Portugal, surge como o terceiro e último depoente relevante para os objetivos do atual ensaio. Enviada a Agostino Barbarigo, Doge de Veneza, sua carta de 27 de julho de 1501 contenta-se em repetir numerosas passagens citadas por Giovanni Matteo Camerini sem nada acrescentar ao assunto tratado (Anexo 5). Até o momento, a única versão conhecida per tence aos “Diarii” de Marino Sanuto (1466-1536) publicados no final do século XIX (in SANUTO, 1879-1902). O mesmo texto encontra-se disponível em alguns traba lhos mais recentes (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; BERCHET, 1892-1896; CORTESÃO, 1922; A.B. de B. PEREIRA, 1936; T.O.M. de SOUZA, 1946; TEIXEIRA & PAPAVERO, 2003).

Fig.7- Primeira página da carta de Bartolomeo Marchionni, segundo cópia pertencente à “Collezione Pietro Vaglienti” (MS 1910). Original depositado na “Biblioteca Riccardiana”, Florença.

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Tradução da carta de Giovanni Matteo Camerini, “Il Cretico”, escrita ao Doge Agostino Barbarigo em 27 de junho de 1501, segundo versão do “Paesi Novamente Retrovati” de

Fracanzano da Montalboddo (1507) “Cópia de um capítulo da carta de Dom Cretico, núncio da Ilustríssima Senhoria de Veneza em Portugal, datada de 27 de junho de 1501 Capítulo CXXV

Sereníssimo Príncipe etc. Creio [que] Vossa Serenidade122, por carta do magnífico embaixador123, já tinha ouvido que este Sereníssimo Rei124 havia mandado navios para a Índia, os quais agora regressaram. Mas dos 13 que foram perderam-se sete na viagem125. Em primeiro lugar, Sereníssimo Príncipe, [seguiram] pela costa da Mauritânia e da Getúlia126 para o sul até Cabo Verde, a que os clássicos chamavam Hespéria, onde estão as ilhas Hespérides127. Aqui principia a Etiópia128 e daqui para diante [o território] era desconhecido dos clássicos. Daqui corre a costa da Etiópia para o Levante, tanto quanto corresponde à linha da Sicília129. Dista esta costa nove, cinco ou seis graus para cá da linha equinocial130 e no meio desta costa está a Mina deste Sereníssimo Rei131. E depois daqui estende-se um cabo para o sul que ultrapassa o trópico de Capricórnio por nove graus. Este cabo chama-se da Boa Esperança132. Seguem-se as vastidões da Barbária133. Neste ponto, mais de cinco mil milhas134 de litoral estendem-se para o nosso lado. Deste cabo [da Boa Esperança] para adiante ainda se estende um cabo chamado pelos clássicos de Promontório Prasim, o outro lado do qual foi conhecido pelos clássicos135. Daqui [o litoral] ainda corre quase direito ao Levante para a Troglodítia136, onde se encontra um outro veio de ouro, o qual chamam Sofala137, onde os clássicos afirmam haver maior cópia de ouro que em [qualquer] outra parte. Daqui entram no mar Barbárico138 e depois naquele da Índia e chegam a Calicute139. Esta é a viagem deles, a qual é de mais de 15 mil milhas140, mas atravessando a encurtarão bastante141. Acima do Cabo da Boa Esperança, em direção ao ocidente, descobriram uma terra nova a que chamam dos Papagaios por [nela] haver alguns com braço e meio de comprimento, de várias cores, dos quais havemos visto dois. Julgaram que esta terra seria terra firme porque percorreram pela costa mais de duas mil milhas142 e não lhe encontraram fim. Habitam-na homens nus e formosos. Na ida perderam quatro navios143, dois mandaram à Mina Nova144, os quais acreditam estar perdidos145. Sete chegaram a Calicute146, onde a princípio foram bem vistos e lhes foi dada uma casa por aquele Senhor147, onde ficaram alguns dos navios. Os outros estavam em alguns lugares vizinhos. E depois chegaram os mercadores do Sultão, os quais se irritaram porque estes se meteram com eles e queriam carregar primeiro. O feitor deste Sereníssimo Rei148 queixou-se com o Senhor [de Calicute], o qual pensava que ele se entendesse com os mouros. E disse que se eles carregassem ele lhes tiraria as especiarias, pelo que brigaram e toda terra favorecia os mouros. E [estes] correram à casa designada para os portugueses e fizeram em pedaços todos que estavam em terra, os quais eram uns 40, entre os quais se encontrava o feitor que se havia metido n’água para fugir. Sabendo disso, as outras naves vieram e derrotaram as gentes [e navios] do Sultão, que eram dez. E com a artilharia fizeram grande dano à terra e queimaram muitas casas, [pois] os telhados eram cobertos de palha. E por estes tumultos partiram de Calicute e foram conduzidos pelo seu guia, o qual era um judeu batizado149, a outra terra cerca de 40 milhas150 mais além, chamada Cochim151, de um outro Rei inimigo daquele de Calicute152, o qual lhes fez ótima acolhida e possui maior cópia de especiarias que o de Calicute. Carregaram por um preço que não ouso dizer, porque eles afirmam haver recebido um quintal de canela por um ducado ou menos153. Esse Senhor de Cochim mandou os seus embaixadores com estes navios a este Sereníssimo Rei [de Portugal] e também dois reféns que regressaram em segurança154. No retorno os mouros e aqueles de Calicute se puseram em ordem para prendê-los e armaram mais de 150 navios com mais de 15 mil homens. Todavia, como [os portugueses] estavam carregados, não quiseram combater nem aqueles os puderam afrontar porque estes se puseram à bolina, o que eles não sabem fazer155. Na volta, chegaram a uma ilha onde está

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o corpo de São Tomé apóstolo156. O Senhor desta [ilha] fez-lhes muitos obséquios157, deu-lhes relíquias do dito santo e pediu-lhes que carregassem especiarias a crédito até a viagem de regresso. Estes estavam carregados e não podiam carregar mais. Estiveram de viagem 14 meses, mas na volta somente quatro e dizem que no futuro a farão em oito ou dez meses no máximo. No regresso, sete navios vieram a salvo. O outro foi de encontro a um banco, do qual se salvou a gente. Este era de cerca de 600 botas158. Ainda não chegou aqui senão um de 300 botas159 – os outros estão perto, segundo dizem – e este entrou no porto na noite de São João160. Eu estava com o Sereníssimo Rei, que me chamou e disse-me [que com ele] me congratulasse, que os seus navios da Índia eram chegados carregados de especiarias. E assim eu me alegrei com ele do modo devido. Mandou fazer festa no palácio naquela noite e repiques de sinos por toda a terra. No dia seguinte, fez uma procissão solene por toda a terra. Depois disso, encontrando-me novamente com Sua Majestade, [ele] voltou aos seus navios e disse-me [que] deveria escrever a Vossa Serenidade para que mande, de agora em diante, suas galeras levar as especiarias daqui, que ele as veria com bons olhos e que poderíamos nos julgar estar em casa. E que ele proibiria o Sultão de ir às especiarias e quer mandar para esta viagem 40 navios, dos quais uns iriam e outros voltariam. Enfim, acredita ter a Índia sob seu comando. Este navio que entrou é de Bartolomeo florentino161, junto com a carga que é de cerca de 300 quintais de pimenta162, 120 quintais de canela163, 50 ou 60 quintais de laca164, 15 quintais de benjoim165. Cravo166 não tem porque os mouros o levaram, nem gengibre167 porque não há onde eles carregaram, mas nasce em Calicute. Especiarias miúdas não há de nenhum tipo. Dizem ter perdido muitas jóias naquele tumulto de Calicute. Também não omitirei que aqui vieram embaixadores de um Rei da Etiópia chamado Rei de Ubenam168, o qual mandou a este Sereníssimo Rei [de Portugal] um presente de escravos e dentes de marfim, se bem que coisas tais como estas há muito tempo [já] apareceram. Perto dali também nasce pimenta, mas não se pode comparar com a outra169. Além disso, esse navio encontrou, em seu regresso, dois grandíssimos navios partidos das Minas Novas e [que] se dirigiam para a Índia, os quais levavam grande soma de ouro. E receando que os nossos os quisessem apresar, de imediato lhes ofereceram 15 mil dobras170, porque cada um valia mais de 500 mil ducados171. Mas os nossos não lhes quiseram tomar coisa alguma. Em vez disso, ofereceram-lhes presentes e boa companhia para poderem navegar naqueles mares.” Tradução da carta de Bartolomeo Marchionni escrita a destinatário desconhecido em

27 de junho de 1501

“Em seguida cópia de uma outra carta vinda de Lisboa da parte de Bartolomeu Marchionni, datada de 27 de junho do ano de 1501172. Ao dia 23 deste [mês], chegou aqui um navio que vem de Calicute conhecido pelo nome de ‘Anunciada’173. E contou como as outras caravelas, que com ele faziam conserva174, tinham ficado para trás poucas léguas, [sendo] que cada légua tem três milhas e meia das nossas175. A qual nave trouxe infinitas novas e aqui por esta te darei algumas que serão mais a propósito.

Diz haver quatro meses que, de conserva, partiram de uma terra nos confins de Calicute, todas carregadas de especiarias, e que em seu caminho para lá se perderam cinco navios do seu comando. Esses iam à Mina Nova do ouro e a Calicute176. Seguiram oito e juntos chegaram a Calicute177. Foram-lhes feitas grandes honrarias e boa acolhida. Tendo mandado suas mercadorias para terra, o feitor do Rei [de Portugal] começou a ocupar-se delas178. E nesse porto estavam 30 navios dos mouros para carregar e transportar [mercadorias] a um porto do Mar Oceano179, dito Bizidem, de onde depois vão para Damasco180. E querendo carregar primeiro, os portugueses entraram em tal desavença que os mouros, tomados de soberba, mataram todos os portugueses que se encontravam em terra, até o feitor do Rei. Visto isto, aqueles [tripulantes] dos navios portugueses se recolheram para os navios e foram meter fogo aos navios dos mouros e começaram a bombardear a terra. Nela destruíram muitas

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casas e mataram muita gente, incendiando 15 daqueles navios dos mouros.

Por conselho de um indiano181, partiram dali e foram ter a uma outra terra182 onde encontraram um Rei inimigo daquele de Calicute183. E foram-lhes feitas grandes honras e grande e perfeita acolhida. Ali negociaram todas as suas mercadorias e encheram todos os navios de especiarias e de outras coisas. Esse Rei lhes queria dar muitas especiarias a crédito, sob palavra, até o seu regresso, as quais não quiseram tomar por terem carga suficiente em seus navios. E daí partiram amigos e pediram-lhes que, no futuro, fizessem sempre escala somente ali. O dito Rei enviou um embaixador ao nosso Rei184 com infinitos presentes, suplicando e recomendando-lhes que voltassem ao dito lugar. E partiram. Os mouros de Calicute haviam armado 150 velas com 15.000 mouros e vinham para atacar os nossos. Como os nossos se puseram à orça por estarem carregados e sem interesse em combater, elas foram estupidamente contra o vento185.

Em seu retorno encontraram muitos reis e senhores, de todos tendo obtido boa acolhida e presentes. Encontraram o corpo de São Tomé apóstolo186, que não puderam obter, e muitas outras relíquias que trouxeram para cá em quantidade para o Rei. Vêm com esses navios quatro embaixadores de dois senhores e todos querem submeter-se ao nosso Rei187. E contam muitas outras coisas, para as quais não existem folhas bastantes para escrever e eu não tenho tempo. E esta é a carga levada por esta caravela e pela outra que vem:

300 quintais de pimenta fina188 160 quintais de canela189 60 quintais de laca190 14 quintais de benjoim191

Estas são as coisas dignas de menção e muitas outras especiarias miúdas. E [também] que cada um dos outros sete navios que lhe estão atrás possui sua carga das ditas especiarias.

Trouxeram dois papagaios de diversas cores com o comprimento de um côvado e meio192, o qual tem mais do que um e meio dos nossos193. São coisas admiráveis e dão notícia de muitas outras e várias aves e animais194, de modo que mostram ser verdade as histórias de Plínio, tido por mentiroso195.

Bartolomeo Marchionni, em Lisboa” Tradução da carta de Domenico Pisani di Giovanni escrita ao Doge Agostino Barbarigo

em 27 de julho de 1501, segundo os “Diarii” de Marino Sanuto (1879-1902)

“Creio que Vossa Serenidade196, por carta do magnífico embaixador Senhor Piero Pasqualigo197, doutor, já tenha ouvido isto, ou por capítulo de uma carta do Senhor Cretico, doutor, que está junto ao Rei de Portugal198, [datada] de 27 de junho em Lisboa, como esse Sereníssimo Rei havia mandado navios para a Índia, os quais no momento retornaram. Mas dos 13 perderam-se sete199. E sua viagem, Sereníssimo Príncipe, faz-se primeiro pela costa da Mauritânia e da Getúlia200 pelo sul até o Cabo Verde, que os clássicos chamavam de Hespérias, onde estão as ilhas das Hespérides201. Aqui principia a Etiópia, tão ao levante que corresponde, em linha reta, à Sicília202. Dista a dita costa da linha equinocial cinco ou seis graus e no meio da dita costa fica a Mina deste sereníssimo Rei203. Depois se estende um cabo tão em direção ao austro que ultrapassa o trópico de Capricórnio nove graus. Chamam este cabo de Cabo da Boa Esperança204 [e] o que vem em seguida é a Barbária205. Neste lugar, mais de cinco mil milhas de litoral estendem-se para o nosso lado até este cabo206. Depois se engolfa para um cabo, chamado pelos clássicos de Promontório Prasim, até o qual conheciam os clássicos207. Do outro lado, depois, [o litoral] corre quase reto rumo ao

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Levante para a Troglodítia208, onde acharam uma mina de ouro à qual chamam de Sofala, onde os clássicos afirmam haver maior cópia de ouro que em qualquer outra parte209. Daqui entraram no mar Barbárico210 e depois no mar da Índia e chegaram a Calicute211. Este é seu caminho, que tem mais de 15 mil milhas212, mas o encurtarão muito atravessando213.

Acima do Cabo da Boa Esperança, em direção ao ocidente, descobriram uma terra nova que chamaram Terra dos Papagaios por serem os [seus] papagaios maiores que um braço ou mais, de várias cores, dos quais viram dois. Julgam ser terra firme essa terra, porque correram a costa por 2.000 milhas214 ou mais e nunca lhe acharam fim. Habitam-na homens nus e formosos. No seu caminho perderam, em uma tempestade, quatro navios215. Dois mandaram à dita Mina Nova216, os quais se julgam perdidos217. Sete chegaram a Calicute218, onde a princípio foram bem vistos e lhes foi dada uma casa por aquele Senhor219, onde ficaram algumas das naus. As outras estavam em lugares vizinhos. Chegaram depois dez navios do Sultão, aos quais irritou que os portugueses lhes fossem tolher o aviamento, e queriam carregar primeiro. O feitor do Rei de Portugal220 queixou-se ao Senhor de Calicute o qual julgava [que o feitor] tivesse se entendido com ou mouros. E disse que se eles carregassem lhes tiraria as especiarias, pelo que brigaram e toda a terra favorecia aos mouros. E [estes] correram à casa designada aos portugueses e cortaram em pedaços todos os que estavam em terra, em número de 40, entre os quais o feitor do Rei que se havia metido n’ água para fugir. Sabendo disso, as outras naus vieram e queimaram os navios do Sultão – que eram dez – e as bombardas221 fizeram grande dano na terra e queimaram muitas casas, que tinham o teto coberto de palha. Por causa desse tumulto partiram de Calicute e foram conduzidos por seu guia, que era um judeu batizado222, a uma outra terra, chamada Cochim223, de um outro Rei inimigo do Rei de Calicute224, o qual lhes fez ótima acolhida e que tem maior cópia de especiarias que o de Calicute. Carregaram a um preço que não ouso dizer, pois dizem haver comprado um quintal de canela por um ducado ou menos225. Esse Senhor de Cochim mandou seus embaixadores com esses navios a este Senhor Rei [de Portugal] e ainda reféns que regressaram em segurança226. Na volta, os mouros e aqueles de Calicute se prepararam para prendê-los e armaram 150 navios com 15 mil homens. Todavia, estando carregados, não quiseram [os portugueses] combater, nem aqueles os puderam ofender, porque os lusitanos puseram-se à bolina227, coisa que os outros não sabem fazer. Na volta, chegaram a uma ilha onde estava o corpo de São Tomé228. O Senhor dela229 fez-lhes muitos obséquios e lhes deu relíquias de São Tomé. Pediu-lhes que quisessem levar suas especiarias e que as levassem a crédito até a outra viagem, mas estes já muito carregados e não podiam levar mais. Levaram 14 meses de viagem, mas na volta só quatro e dizem querer, daqui por diante, fazer essa viagem em nove ou dez meses no máximo. No retorno, seis de sete navios chegaram salvos, um encalhou mas seus homens foram salvos. Este era de 600 botas230 e carregado. Mas ainda não chegou aqui senão um de 300 botas231 – os outros estão próximos, segundo dizem – que entrou no porto na tarde do dia de São João232. Achava-me junto ao Rei, o qual me chamou e disse-me que [com ele] me congratulasse, pois seus navios da Índia haviam chegado carregados de especiarias. E assim com ele me congratulei com os devidos modos. Fez uma festa no palácio e repicar de sinos por toda a terra. No dia seguinte fez uma procissão solene. Depois, encontrando-me novamente com Sua Majestade, [ele] retornou ao navio e disse-me que devia escrever à Vossa Serenidade para que, doravante, mandasse as galeras levar as especiarias daqui, às quais veria com bons olhos e poderíamos nos sentir em casa. E que vai proibir totalmente o Sultão de ir às especiarias e quer mandar para esta viagem 40 navios, dos quais uns vão e outros voltam. Enfim, acredita ter a Índia sob seu comando. Este navio que entrou no porto é de Bartolomeo florentino233, cuja carga é de 300 quintais de pimenta234, 120 quintais de canela235, 60 quintais de laca236 e 15 quintais de benjoim237. Cravo238 não tem, porque os

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mouros já o haviam levado, nem gengibre239 porque não há em Cochim, onde carregaram, mas nasce em Calicute. Especiarias miúdas não têm de nenhuma sorte.

Dizem haver perdido muitas jóias naquele tumulto de Calicute. Também não omitirei que aqui vieram embaixadores de um Rei da Etiópia chamado Rei Ubenam240, o qual mandou presentes a esse Rei [de Portugal]: escravos, dentes de marfim e outras coisas das quais já há muitas aqui. Perto dali também nasce pimenta, mas não se pode comparar com a outra241. Além disso, essa nau encontrou, em seu regresso, dois grandíssimos navios partidos das Minas Novas e [que] se dirigiam para a Índia, os quais levavam grande soma de ouro. E receando que os nossos os quisessem pilhar, imediatamente lhes ofereceram 15 mil dobras, pois cada um [deles] valia muitos ducados242. Mas estes não quiseram tomar coisa alguma. Em vez disso, lhes ofereceram presentes e boa companhia para poderem navegar naqueles mares, nada mais.

Datada de Lisboa, dia 27 de julho de 1501”

OS PRODUTOS ANIMAIS MENCIONADOS Mesmo a leitura mais despretensiosa do corpo documental examinado basta para confirmar a existência de notícias sobre os produtos animais utilizados na alimentação ou em diferentes elementos da cultura material dos habitantes locais. Essas passagens, todavia, revelam-se de análise assaz problemática por seu caráter expedito, estando quase sempre representadas por comentários demasiado vagos para permitir qualquer resposta conclusiva.

De acordo com o “Relato do Piloto Anônimo” (in MONTALBODDO, 1507), os indígenas brasileiros seriam “grandes pescadores” capazes de capturar “peixes de muitas espécies” com o auxílio de “redes”, afirmação notável por constituir a única referência explícita às atividades de caça e pesca praticadas pelos nativos, detalhe curioso face às numerosas citações de arcos e flechas (vide Anexos 1, 2 e 3). Ao contrário da impressão conferida pelo texto, as redes empregadas pelos tupis do litoral parecem ter alcançado porte relativamente pequeno, assemelhando-se a puçás com longos cabos próprios para pescarias em águas pouco profundas ou na vizinhança de currais de peixes (SOUSA, 1938; YVES D’EVREUX, 1615), conforme retratado por STADEN (1557) (Fig.8). Um outro registro pode ser encontrado nas observações de Pero Vaz de Caminha sobre a acolhida dispensada aos dois guerreiros levados para a nau capitânia, aos quais teria sido oferecida uma refeição composta de “pão e pescado cozido, confeitos, fartes, mel e figos em passa”. Não está claro, entretanto, se o cronista pretendia mencionar exemplares capturados na costa brasileira ou peixes secos e salgados trazidos de Portugal, mantimento de boca muito comum na época.

Algo mais numerosas e detalhadas são as linhas dedicadas aos artefatos plumários, enfeites descritos como “sombreiros”, “chapéus”, “carapuças”, “barretes” e “panos”, ou como “cabeleiras de penas” e “penas pegadas no corpo” no caso de arranjos decorativos colados com resina nos cabelos ou na superfície da pele. Além de alusões obscuras sobre “penas de muitas cores” e outras expressões semelhantes, esses testemunhos falam de plumas “pardas”, “amarelas”, “verdes” e “vermelhas”, todas atribuídas aos vistosos papagaios da região. Sem dúvida alguma correta no caso das verdes, semelhante assertiva inspira cuidados quando aplicada às penas pardas, amarelas e até às vermelhas, haja vista a proverbial sofisticação da antiga plumária dos tupis (MÉTRAUX, 1928). De fato, tanto retrizes de ictéridas quanto plumas “tapiradas” de algum psitácida (sensu TEIXEIRA, 1984, 1992a) seriam entendidas como “penas amarelas”, ao passo que as escarlates poderiam pertencer a araras-vermelhas, Ara chloroptera Gray, 1859, tiês-sangue, Ramphocelus bresilius (Linnaeus, 1766) (fide SOUSA, 1938), e mesmo a guarás, Eudocimus ruber (Linnaeus, 1758), pois esta ave

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aquática de plumagem muito cobiçada pelos nossos indígenas talvez ocorresse anteriormente na Bahia (TEIXEIRA et al., 1990). Tampouco parece possível estabelecer de qual vertebrado viriam os adereços faciais compostos de “ossos brancos” que os homens traziam “metidos” nos “beiços de baixo”, embora fontes posteriores atribuam tais ornamentos a “ossos de peixes” (e.g. João de Empoli, 1503 in BERCHET, 1892-1896)243.

Fig.8- As pescarias praticadas pelos tupinambás com o detalhe das redes utilizadas. Gravura da “Warhaftige Historia” de Hans Staden, obra publicada em Marpurg no ano de 1557.

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OS ANIMAIS MENCIONADOS Até certo ponto, o descaso conferido pelos zoólogos a esses cinco testemunhos poderia refletir o limitado número de referências disponíveis, as quais dizem respeito a não mais de dois moluscos, um crustáceo, dois peixes, oito aves e um mamífero aquático. Dos 14 elementos considerados, um ocorre em todos os textos (7,14%) e outro aparece nos comentários de Caminha e do “Piloto Anônimo” (7,14%), enquanto um terceiro seria exclusivo desta última narrativa (7,14%). Os 11 restantes (78,58%), porém, foram mencionados apenas na “Carta de Pero Vaz de Caminha”, que surge como a principal fonte de informações nesse sentido, dando notícia sobre nada menos de 13 dos 14 animais em questão (92,86%) (Tab.2). TABELA 2. Relação dos animais citados nas fontes relativas à viagem de Cabral (9 de março a 2 de maio de 1500).

NOMES FONTES IDENTIFICAÇÃO PROPOSTA “Amêijoas” Pero Vaz de Caminha Bivalve não identificado, talvez Lucina pectinata,

Iphigenia brasiliana, Mulinia cleryana, Raeta plicatella, Mactrellona alata, Ventricolaria rigida, Dosinia concentrica, Anomalocardia brasiliana ou Macoma constricta

“Berbigões” Pero Vaz de Caminha Bivalve não identificado, talvez Trachycardium muricatum, Trachycardium magnum, Glycymeris undata, Codakia orbicularis ou Protothaca pectorina

“Camarões” Pero Vaz de Caminha Decapoda não identificado, talvez Farfantepenaeus subtilis, Farfantepenaeus brasiliensis ou Litopenaeus schmitti

“Pescado miúdo” Pero Vaz de Caminha Termo geral conferido a inúmeras espécies de peixes de pequeno porte não identificados

“Tubarão” Pero Vaz de Caminha Termo geral conferido a diversas espécies de seláqueos não identificados (Elasmobranchii, Euselachii)

“Peixe monstruoso” “Piloto Anônimo” Trichechus manatus (Mammalia, Trichechidae) “Fura-buchos” Pero Vaz de Caminha Puffinus sp. (Aves, Procelariidae), possivelmente

Puffinus puffinus “Aves pretas como pegas” Pero Vaz de Caminha Cacicus cela (Aves, Icteridae) “Pombas-seixas” Pero Vaz de Caminha Columba sp. (Aves, Columbidae), possivelmente

Columba cayennensis “Rolas” Pero Vaz de Caminha Colúmbida não identificado (Aves, Columbidae),

possivelmente um representante do gênero Leptotila, Geotrygon ou mesmo Columbina

“Papagaios vermelhos” ou apenas “papagaios”

Pero Vaz de Caminha, “Piloto Anônimo”, Giovanni Matteo, Domenico Pisani & Bartolomeo Marchionni

Ara chloroptera (Aves, Psittacidae)

“Papagaios pardos” Pero Vaz de Caminha Psittacus erithacus (Aves, Psittacidae) “Papagaios pardos” “grandes” e “pequenos”

Pero Vaz de Caminha Psitácidas não identificados (Aves, Psittacidae), possivelmente representantes dos gêneros Touit, Pionus, Amazona, Pionopsitta ou Forpus

“Papagaios verdes” “grandes” e “pequenos” ou apenas “papagaios”

Pero Vaz de Caminha & “Piloto Anônimo”

Psitácidas não identificados (Aves, Psittacidae), possivelmente representantes dos gêneros Ara, Aratinga, Pyrrhura, Brotogeris, Touit, Pionus, Amazona, Pionopsitta, Triclaria ou Forpus

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Conforme muitas vezes acontece em escritos quinhentistas, as alusões acerca dos seres vivos encontradas nesses relatos quase nunca se detêm em aspectos descritivos, estando amiúde reduzidas à mera citação do nome vulgar de uma espécie semelhante do Velho Mundo, detalhe capaz de levantar enormes obstáculos para qualquer tentativa de identificação. Devido a essa particularidade, foram realizadas comparações diretas de todos os trechos pertinentes com exemplares depositados nos acervos de certas instituições, especialmente o Museu Nacional/UFRJ (Rio de Janeiro) e o Museu Bocage (Lisboa), pois a própria natureza da documentação trabalhada tornaria imprescindível estabelecer a aparência externa de alguns animais europeus para, em seguida, buscar elementos análogos na fauna brasileira, única forma possível de contornar a falta de caracteres diagnósticos. Por seu turno, as conclusões obtidas seriam confrontadas com propostas já publicadas (e.g. CORTESÃO, 1943; S.B. PEREIRA, 1964), as quais muitas vezes se revelaram de reduzido valor pela pouca familiaridade de seus autores com variados aspectos das ciências naturais. A seqüência escolhida na apresentação desses resultados procurou preservar a noção taxonômica implícita nos originais do século XVI, distinguindo os “mariscos”, “peixes” e “aves”, malgrado tais categorias nem sempre corresponderem aos seus homônimos contemporâneos.

Os estudos efetuados dispensaram particular atenção às espécies assinaladas para a faixa litorânea da Bahia situada entre os paralelos 16o15’S e 16o50’S, região percorrida pelo Setor de Ornitologia do Museu Nacional-UFRJ entre junho de 1994 e fevereiro de 1995 durante três excursões que totalizaram cerca de 650 horas de atividades de campo (vide TEIXEIRA & ALMEIDA, 1997; TEIXEIRA et al., 1995). A julgar pelos poucos remanescentes observados, esse segmento era domínio da floresta ombrófila densa244, formação capaz de atingir cerca 30m de altura própria de uma área tropical mais úmida caracterizada por temperaturas elevadas (média 25°C) e um curto período seco de 0 a 60 dias, com precipitações anuais de até 2.200mm bem distribuídas ao longo do ano (BRASIL, 1981, 1987; VELOSO et al., 1991). Entremeando essa mata estavam as chamadas “mussunungas”, cobertura arbustiva-arbórea densa e de porte baixo (ca. 7-8m) que constitui objeto de acirrada controvérsia, sendo considerada pelos diferentes especialistas como uma etapa de sucessão da floresta estacional ou da savana-parque, uma formação edáfica e até mesmo uma vegetação de origem antrópica (compare BRASIL, 1981, 1987; ENGEL & JESUS, 1989; JESUS, 1988; KUHLMANN, 1977; VINHA & LOBÃO, 1989). Junto ao mar, destacava-se a presença de restingas de substrato arbustivo denso povoadas de árvores de pequeno porte, além de manguezais mais ou menos extensos com árvores de até 15m de altura (vide também BRASIL, 1976). 3.1 DOS MARISCOS

3.1.1 Das amêijoas

“Tam bem acharom cascas de bergoões e dameijeas mas nõ toparã cõ nhuũa peça jnteira” (“Também acharam cascas de berbigões e de amêijoas, mas não toparam com nenhuma peça inteira”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 6r).

Em Portugal, “amêijoa” seria um nome popular sobretudo associado a determinados bivalves das famílias Veneridae e Mactridae que possuem o mesmo aspecto externo básico, estando caracterizados por uma concha usualmente sólida de formato arredondado ou oval com umbo amiúde saliente e superfície marcada por estrias concêntricas mais ou menos pronunciadas conforme o caso (NOBRE, 1931, 1938-1940; SANCHES, 1989). Aqueles pertencentes aos Veneridae incluiriam a “amêijoa-redonda”, termo aplicado tanto a Dosinia exoleta (Linnaeus, 1758) quanto a Dosinia lupinus (Linnaeus, 1758), a “amêijoa-bicuda”, Venerupis aurea (Gmelin, 1790), a “amêijoa-

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macha” ou “amêijoa-rolada”, Venerupis corrugata (Gmelin, 1791), e a “amêijoa-boa”, Ruditapes decussatus (Linnaeus, 1758), enquanto os Mactridae estariam representados pela “amêijoa-branca”, Spisula solida (Linnaeus, 1767).

Todos os moluscos em questão sempre foram muito apreciados como alimento, detalhe capaz de torná-los bem familiares a um pequeno burguês citadino como Pero Vaz de Caminha (CORTESÃO, 1943; NOBRE, 1931, 1938-1940). Além de compor numerosos pratos tradicionais da cozinha lusitana, as diferentes amêijoas constituíam item significativo na dieta das camadas mais pobres da população, de onde se originava grande parte da mão de obra envolvida em sua coleta (A.A.B. da SILVA, 1891). Pelo menos até o início do século XX, esses mariscos eram objeto de intensa pesca artesanal efetuada com o auxílio dos “rastros”245 ou praticada por simples catadores de mãos nuas, os quais vadeavam a água rasa e se aproveitavam da baixa-mar para recolher os exemplares postos a descoberto. Conhecidos pelo indicativo nome de “unhantes” na região do Aveiro, tais pescadores por vezes cumpriam seu trabalho com o auxílio de “cavadeiras”, pequenas enxadas de cabo curto usadas para mover o sedimento (A.A.B. da SILVA, 1891).

Abundantes em estuários, lagoas litorâneas e praias, as amêijoas dos gêneros Venerupis e Ruditapes são triviais nos mercados, onde os comerciantes muitas vezes oferecem autêntica miscelânea composta por diversas espécies. Atingindo cerca de 46mm de comprimento por 33mm de largura, as valvas de Venerupis corrugata aparecem freqüentemente roladas na areia, despertando a atenção pelo aspecto luzidio característico e colorido amarelo acastanhado ou brancacento com manchas acastanhadas. Com tamanho comparável, as de Ruditapes decussatus podem chegar a 42mm de comprimento por 60mm de largura, oscilando entre o castanho e o branco amarelado com ou sem manchas acastanhadas. Variação semelhante pode ser observada em Venerupis aurea, cujas conchas alcançam apenas 37mm de comprimento por 25mm de largura (NOBRE, 1931, 1938-1940).

A exemplo das anteriores, Dosinia exoleta seria uma amêijoa bastante usual nas redes e entrepostos de pesca, enquanto Dosinia lupinus revela-se bem menos vulgar. Branca amarelada com estrias castanhas irregulares, a concha daquela primeira pode atingir 40mm de comprimento por 43mm de largura, ao passo que a desta última não ultrapassa 26mm de comprimento por 25mm de largura e ostenta uma coloração branca amarelada quase imaculada. Única amêijoa pertencente à família Mactridae, Spisula solida é tão encontradiça quanto as formas anteriores, vivendo sobretudo em praias rasas de fundo arenoso. Com 32mm de comprimento por 40mm de largura, suas valvas também são brancacentas ou de um branco amarelado uniforme (NOBRE, 1931, 1938-1940).

A julgar pelos dados existentes, os portugueses parecem conceber as amêijoas como bivalves de tamanho mediano providos de uma concha mais ou menos sólida com umbo saliente, superfície marcada por estrias concêntricas, formato arredondado ou oval e colorido predominante brancacento ou amarelado. Seria razoável, portanto, atribuir o relato de Caminha às espécies com esse mesmo padrão morfológico que fossem comuns no litoral baiano e pudessem ser encontradas em águas rasas de fundo arenoso com muito cascalho, pois as “amêijoas” da “Carta” teriam sido descobertas graças a conchas vazias e desarticuladas recolhidas na praia pelos homens saídos da missa celebrada em Coroa Vermelha, local descrito como um “ilhéu” que “espraia muito a água e descobre muita areia e muito cascalho”. Embora não permita uma resposta conclusiva, tal premissa ao menos levaria à seleção de nove representantes mais prováveis pertencentes a cinco famílias distintas, conjunto formado por Iphigenia brasiliana (Lamarck, 1818) (Donacidae), Mulinia cleryana (Orbigny, 1846), Raeta plicatella (Lamarck, 1818) e Mactrellona alata (Spengler, 1802)

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(Mactridae), Ventricolaria rigida (Dillwyn, 1817), Dosinia concentrica (Born, 1778) e Anomalocardia brasiliana (Gmelin, 1791) (Veneridae), Lucina pectinata (Gmelin, 1971) (Lucinidae) e Macoma constricta (Bruguière, 1792) (Tellinidae).

Muito similares às amêijoas portuguesas em seu aspecto externo, esses nove moluscos são bastante freqüentes no litoral nordestino, habitando fundos arenosos com algum lodo tanto em águas rasas quanto em profundidades maiores, pois Dosinia concentrica chega a ocorrer pelo menos até os 60m (RIOS, 1994). No entanto, as conchas de Ventricolaria rigida, Mulinia cleryana, Raeta plicatela e Mactrellona alata não costumam ser vistas com facilidade em praias brasileiras, quase só aparecendo roladas na areia após ressacas muito fortes (Arnaldo Campos dos Santos Coelho, com. pess., 2004). Apesar de “fortes ventos” com “chuvaceiros” terem castigado os navios na noite de 23 de abril de 1500, o texto de Caminha não fala de um mar agitado durante os dias de permanência da esquadra portuguesa no Brasil, o que parece restringir as alternativas cabíveis.

Bem mais promissor, o elenco formado por Iphigenia brasiliana, Dosinia concentrica, Anomalocardia brasiliana, Lucina pectinata e Macoma constricta destaca-se por reunir espécies de conchas habitualmente observadas nas praias. Algumas já teriam sido relacionadas às amêijoas do Velho Mundo por textos quinhentistas como o “Tratado Descritivo do Brasil” de 1587, onde Gabriel Soares de Sousa fala do consumo de mariscos parecidos às “amêijoas grandes de Lisboa” conhecidos pelos indígenas como “sernambi”, palavra tupi empregada para distinguir Lucina pectinata em várias partes do Nordeste (R. von IHERING, 1940; RIOS, 1994; SOUSA, 1938; VASCONCELLOS, 1938). Mais adiante, o mesmo autor voltaria a comparar as “amêijoas de Lisboa” com uma segunda forma comestível chamada “tarcoba”, termo que poderia ter dado origem à variante “tarioba” hoje aplicada a Iphigenia brasiliana (RIOS, 1994; SOUSA, 1938). Tampouco deve causar surpresa o fato de Dosinia concentrica também ter recebido o nome de “amêijoa-branca” no Brasil, pois a tradição portuguesa de identificar numerosos bivalves como “amêijoas” parece ter perdurado no país, sobrevindo até mesmo no caso de variedades não muito semelhantes a seus homônimos portugueses. Com efeito, essa designação pode ser conferida tanto a Amiantis purpurata (Lamarck, 1818), Veneridae de vistoso colorido purpúreo registrado do Espírito Santo ao Rio Grande do Sul, quanto a alguns Lucinidae de concha brancacenta ou amarelada como Lucina pectinata e certos membros dos gêneros Codakia, Divaricella e Linga (BOFFI, 1979; R. von IHERING, 1940; J.C. de Mello Carvalho e S. Leontsinis in FERREIRA, 1999).

Mesmo sem expor qualquer justificativa, diversas fontes ousaram identificar as “amêijoas” de Pero Vaz de Caminha como sernambis ou “lambretas”, Lucina pectinata (e.g. MELLO-LEITÃO, 1941; NOMURA, 1996; S.B. PEREIRA, 1964), enquanto outras cometem o equívoco de mencionar “mexilhões” e “búzios” (e.g. H.C. SIMÕES, 1999) ou fornecem listas de espécies conforme os verbetes de dicionários (e.g. D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996). A grande maioria, porém, contenta-se com vagas alusões a “moluscos comestíveis” (e.g. ARROYO, 1963, 1976; P.R. PEREIRA, 2002), havendo mesmo os que sugerem a presença de sambaquis (e.g. M.A. Villela in CAMINHA, 1999b; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996), embora nada no texto original respalde tal especulação. 3.1.2 Dos berbigões

“Tam bem acharom cascas de bergoões e dameijeas mas nõ toparã cõ nhuũa peça jnteira” (“Também acharam cascas de berbigões e de amêijoas, mas não toparam com nenhuma peça inteira”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 6r).

Em Portugal, “berbigão” seria um nome popular tradicionalmente associado a três espécies da família Cardiidae, distinguindo-se o “berbigão” vulgar, Cerastoderma edule (Linnaeus, 1758), o “berbigão-burro”, Acanthocardia tuberculata (Linnaeus, 1758), e o

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“sarilho” ou “berbigão-de-bicos”, Acanthocardia echinata (Linnaeus, 1758) (NOBRE, 1931, 1938-1940; SANCHES, 1989). Grosso modo, os dois últimos possuem a mesma aparência externa, estando caracterizados por uma sólida concha convexa de umbo saliente e formato ovalado com a superfície ornamentada por caneluras e estrias concêntricas, além de numerosos espinhos e tubérculos. Em contraste, Cerastoderma edule também pode ser chamada de “amêijoa” graças à sua concha cordiforme muitas vezes brancacenta com a superfície marcada por finas estrias concêntricas, o que lhe confere certa semelhança aos bivalves tratados no item anterior.

Todos esses moluscos sempre foram aproveitados como alimento, detalhe capaz de torná-los bem conhecidos por Pero Vaz de Caminha (NOBRE, 1931, 1938-1940). Compondo diferentes pratos tradicionais da cozinha lusitana, os berbigões constituíam item significativo na dieta das camadas mais pobres da população, de onde se originava grande parte da mão de obra envolvida na sua coleta (A.A.B. da SILVA, 1891). Além das mesmas técnicas observadas na pesca artesanal das amêijoas, a captura desses mariscos também empregava o “encinho” e outros instrumentos próprios arrolados pela literatura especializada (e.g. A.A.B. da SILVA, 1891)246.

Muito comum em águas portuguesas, Acanthocardia echinata vive ao largo da costa, sendo amiúde arrastada por redes de pesca, ao passo que Cerastoderma edule é encontrada em grande número nos mais diversos tipos de ambientes salobros e Acanthocardia tuberculata pulula no litoral propriamente dito, havendo registro de suas valvas roladas em todas as praias lusitanas (NOBRE, 1938-1940). Chegando a alcançar até 70mm de comprimento por 65mm de largura, a concha de Acanthocardia tuberculata varia do amarelo pardacento ao castanho com manchas transversais anegradas, enquanto a de Acanthocardia echinata atinge 60mm de comprimento por 58mm de largura e costuma ser acastanhada com manchas escuras. Já a de Cerastoderma edule não ultrapassa os 45mm de comprimento por 48mm de largura e apresenta colorido tanto brancacento quanto ferrugíneo (NOBRE, 1938-1940).

À figura do caso anterior, os portugueses parecem conceber os “berbigões” como mariscos mais avantajados providos de sólida concha convexa de umbo saliente e formato ovalado, cuja superfície se mostre ornamentada por caneluras e estrias concêntricas, além de numerosos espinhos e tubérculos. Por conseguinte, seria razoável atribuir os comentários de Caminha a espécies com esse mesmo padrão morfológico que fossem usuais no litoral baiano e ocorressem em águas rasas de fundo arenoso com muito cascalho, pois os “berbigões” da “Carta” teriam sido descobertos graças a conchas vazias e desarticuladas recolhidas na praia pelos homens saídos da missa celebrada em Coroa Vermelha, local descrito como um “ilhéu” que “espraia muito a água e descobre muita areia e muito cascalho”. Mesmo não levando a resultados conclusivos, tal premissa serviria para distinguir cinco representantes mais prováveis pertencentes a quatro famílias distintas, elenco formado por Glycymeris undata (Linnaeus, 1758) (Glycymerididae), Trachycardium muricatum (Linnaeus, 1758) e Trachycardium magnum (Linnaeus, 1758) (Cardiidae), Codakia orbicularis (Linnaeus, 1758) (Lucinidae) e Protothaca pectorina (Lamarck, 1818) (Veneridae). Bastante similares aos berbigões portugueses quanto ao aspecto externo, esses moluscos estão entre os mais freqüentes do litoral nordestino, habitando fundos arenosos com algum lodo tanto em águas rasas quanto em profundidades maiores, pois Trachycardium magnum já foi assinalado pelo menos até os 150m (RIOS, 1994).

Malgrado os dados disponíveis não permitirem maior aproximação, cumpre notar existirem citações de bivalves associados ao nome “berbigão” em outros textos do século XVI relativos ao Brasil. De fato, em seu “Tratado Descritivo” de 1587, Gabriel Soares de Sousa ressalta a “grande multidão de berbigões” existente “nas praias de areia” da Bahia, os quais possuíam a “mesma feição que os de Lisboa”, apesar de terem menor porte e a “casca mais grossa” (SOUSA, 1938). Esses animais eram

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chamados pelos indígenas de “sarnambitingas”, nome empregado atualmente tanto para Trachycardium muricatum quanto para exemplares jovens de Lucina pectinata ou adultos de Dosinia concentrica (J.C. de Mello Carvalho e S. Leontsinis in FERREIRA, 1999; R. von IHERING, 1940; P. da Silva in SOUSA, ca. 1945). Como apenas os dois primeiros são considerados comestíveis e os dois últimos assemelham-se mais a uma amêijoa (vide item anterior), a citação de Gabriel Soares de Sousa parece ajustar-se sobremaneira a Trachycardium muricatum, Cardiidae também conhecido como “berbigão”, “rala-coco” ou “mija-mija” nos dias de hoje. No entanto, vale lembrar que os brasileiros costumam tratar por “berbigões” moluscos bastante distintos, por exemplo Protothaca pectorina e até mesmo Anomalocardia brasiliana, cujo aspecto recorda antes o de uma amêijoa (J.C. de Mello Carvalho e S. Leontsinis in FERREIRA, 1999; R. von IHERING, 1940; RIOS, 1994; P. da Silva in SOUSA, ca. 1945, VASCONCELLOS, 1938).

Apesar de não oferecer qualquer justificativa, determinados autores atribuem os “berbigões” citados por Pero Vaz de Caminha a Anomalocardia brasiliana ou Protothaca pectorina (e.g. MELLO-LEITÃO, 1941; NOMURA, 1996), enquanto outros cometem o equívoco de identificá-los como “mexilhões” ou “búzios” (e.g. H.C. SIMÕES, 1999). Embora alguns cheguem a fornecer listas de espécies seguindo os verbetes de dicionários (e.g. D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996), a grande maioria limita-se a mencionar vagos “moluscos comestíveis” (e.g. ARROYO, 1963, 1976; P.R. PEREIRA, 2002), havendo até os que fazem sugestões sobre a eventual presença de sambaquis (e.g. M.A. Villela in CAMINHA, 1999b; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996), ainda que nada no texto original respalde semelhante conclusão. 3.1.3 Dos camarões

“E acharã alguũs camaroões grosos e curtos. antre os quaaes. vijnha huũ mujto grande camarã e muito grosso que em nhuũ tenpo ovy tamanho” (“E acharam alguns camarões grossos e curtos, entre os quais vinha um camarão muito grande e muito grosso que em nenhum tempo o vi tamanho”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folios 5v e 6r).

No linguajar português, os “camarões” compreenderiam nada menos de 23 espécies da ordem Decapoda pertencentes a 12 famílias distintas entre os Alpheidae, Aristaeidae, Calianassidae, Crangonidae, Hippolytidae, Nematocarcinidae, Palaemonidae, Pandalidae, Pasiphaeidae, Penaeidae, Processidae e Solenoceridae (CALADO & NARCISO, 2002; SANCHES, 1989). No entanto, como as poucas informações biográficas disponíveis associam Pero Vaz de Caminha à figura de um burguês citadino (fide CORTESÃO, 1943), parece razoável supor que o conhecimento do autor da “Carta” sobre os crustáceos locais estivesse mais ou menos limitado aos representantes aproveitados como alimento, premissa capaz de restringir de maneira considerável o conjunto inicial.

Segundo os comentários de A.A.B. da SILVA (1891), os antigos pescadores buscavam essencialmente o “camarão-mouro”, Crangon crangon (Linnaeus, 1758), o “camarão-de-rio”, Palaemon serratus (Pennant, 1777), e sobretudo o “camarão-da-costa”, Penaeus kerathurus (Forskål, 1775), embora tampouco desprezassem Palaemon elegans Rathke, 1837 e Palaemon longirostris Milne-Edwards, 1837, que continuam sendo explorados por métodos artesanais até os dias de hoje (CALADO & NARCISO, 2002). Numerosos em águas salobras e/ou salgadas de ambientes costeiros, todos ocorrem desde a zona intertidal até profundidades de 40m ou mesmo de 130m no caso de Crangon crangon (HOLTHUIS, 1980).

Restrita a essas cinco formas de águas rasas, a pesca tradicional de camarões praticada em Portugal empregava diversos apetrechos curiosos entre numerosos tipos de redes de arrasto ou de tresmalho, além das chamadas “tartaranhas” e dos

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populares “camaroeiros”, aparelho descrito por A.A.B. da SILVA (1891) como “tão vulgar que cada um constrói o seu como melhor lhe parece e com os materiais que mais facilmente arranja”247. Em contraposição, a captura de camarões de águas mais profundas com grandes redes de arrasto e embarcações próprias surge como um fenômeno recente, estando associada a variedades muitas vezes encontradas além dos 200m de profundidade como Aristaeopis edwardsiana (Johnson, 1867), Aristeomorpha foliacea (Risso, 1827), Aristeus antennatus (Risso, 1816), Parapenaeus longirostris (Lucas, 1846), Plesionika martia Milne-Edwards, 1883 e Solenocera membranacea (Risso, 1816) (CALADO & NARCISO, 2002; HOLTHUIS, 1980).

Paupérrimo em detalhes morfológicos, o relato de Caminha tem o escasso mérito de caracterizar os “camarões” observados como “grossos e curtos”, havendo um “muito grande e grosso que em nenhum tempo vi tamanho”. Por conseqüência, seria factível especular que esses animais pudessem exceder – ou no mínimo igualar – o porte dos camarões consumidos em Portugal, cujo comprimento alcança 65mm em Palaemon elegans, 75mm em Palaemon longirostris, 90mm em Crangon crangon, 110mm em Palaemon serratus e nada menos de 220mm em Penaeus kerathurus, justamente a espécie mais apreciada pelo menos desde meados do século XIX (CALADO & NARCISO, 2002; HOLTHUIS, 1980; A.A.B. da SILVA, 1891). A surpresa demonstrada por Caminha, portanto, poderia ter origem em qualquer Decapoda do litoral da Bahia passível de ser atribuído a um camarão com tamanho superior ou igual ao dos seus maiores equivalentes da fauna portuguesa, ou seja, que atingisse em torno de 200mm de comprimento. Além disso, também parece razoável esperar um crustáceo freqüente em águas rasas e fácil de obter com o auxílio de limitados recursos técnicos, pois os exemplares em questão foram apresentados por homens saídos para mariscar no ilhéu da Coroa Vermelha após assistirem a primeira missa celebrada em território brasileiro.

Os sofríveis indícios disponíveis dariam origem a numerosas opiniões divergentes, pois alguns consideram esses “camarões” inidentificáveis enquanto outros falam de “decápodes de pequeno porte” – definição extensível a centenas de táxons distintos – ou mesmo de organismos tão diferentes entre si como pitus, Macrobrachium acanthurus (Wiegmann, 1836), “lagostas” (Palinuridae ou Scyllaridae) e tamburutacas dos gêneros Squilla ou Lysiosquilla (e.g. MELLO-LEITÃO, 1941; O.M. de O. PINTO, 1942; S.B. PEREIRA, 1964). Nos últimos anos, porém, certos autores terminariam por apontar o pitu, Macrobrachium carcinus (Herbst, 1792), como alternativa mais verossímil (e.g. D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996; NOMURA, 1996; H.C. SIMÕES, 1999), já que esse Palaemonidae pode chegar a 300g de massa corporal e 480mm de comprimento entre a cauda e a extremidade das pinças, com o corpo propriamente dito alcançando 240mm de comprimento e 165mm de circunferência no cefalotórax (ARAGÃO et al., 1941)248. Macrobrachium carcinus, entretanto, habitaria apenas águas doces e salobras (teste HOLTHUIS, 1980; MELLO, 2003; RAMOS-PORTO & COELHO, 1998), sendo de registro improvável em um meio tão salino como o de um ilhéu que, a julgar pelo texto original, mesmo na “baixa-mar” permanecia “cercado de água por todas as partes”. Nesse sentido, as raras tentativas de atribuir os comentários de Caminha a camarões marinhos (e.g. A. Neiva in CORTESÃO, 1943) afiguram-se mais razoáveis, conquanto haja poucas espécies comuns e grandes o suficiente nas águas rasas do litoral da Bahia (teste HOLTHUIS, 1980). Além do camarão-verdadeiro, Litopenaeus schmitti Burkenroad, 1936, capaz de atingir 235mm de comprimento, as opções cabíveis incluiriam apenas o camarão-vermelho, Farfantepenaeus subtilis (Pérez-Farfante, 1967), e o camarão-rosa, Farfantepenaeus brasiliensis (Latreille, 1817), os quais não costumam ultrapassar 200 mm (HOLTHUIS, 1980; A. Neiva in CORTESÃO, 1943).

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3.2 DOS PEIXES 3.2.1 Do pescado miúdo

“E pescaram hy amdando marinheiros cõ huũ chimchorro e matarom pescado meudo nõ mujto” (“E aí andando marinheiros com um chinchorro, pescaram e mataram pescado miúdo, não muito”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 4v).

Sem qualquer elemento descritivo, essa breve referência ao “pescado miúdo” pode dizer respeito a quase todos os peixes de pequeno porte do litoral baiano, limitação reconhecida há várias décadas por S.B. PEREIRA (1964). Tampouco o detalhe da captura ter sido efetuada com o auxílio de um “chinchorro” parece ser de alguma valia, pois esse artefato não passa de uma pequena rede de arrasto destinada aos mais variados fins. Com cerca de 20m de comprimento, 2m de largura e malhas de 10mm, os “chinchorros” ou “chinchoxos” eram lançados em sítios pouco profundos por oito a dez homens, sendo empregados em vários pontos da costa portuguesa onde não havia número de braços suficiente para a manobra de aparelhos maiores (A.A.B. da SILVA, 1891). 3.2.2 Dos tubarões

“E leuaram daly huũ tubaram que bertolameu dijaz matou e leuaualho e lançouo na praya” (“E dali levaram um tubarão que Bartolomeu Dias matou e lho levava e lançou na praia”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 7v).

Tal como ocorre no Brasil, os portugueses chamariam de “tubarão” pelo menos 40 espécies de seláqueos (Elasmobranchii, Euselachii) pertencentes a 12 famílias distintas entre os Alopiidae, Carcharhinidae, Cetorhinidae, Chlamydoselachidae, Echinorhinidae, Hexanchidae, Lamnidae, Mitsukurinidae, Pseudotriakidae, Scyliorhinidae, Squalidae, Sphyrnidae e Triakidae (COMPAGNO, 1984a, 1984b; SANCHES, 1989). Nesse caso, sequer a premissa de Pero Vaz de Caminha possuir apenas limitados conhecimentos sobre a fauna lusitana revela-se de alguma valia para promover uma redução significativa das possibilidades observadas.

Segundo os vagos comentários de A.A.B. da SILVA (1891), a pesca praticada em Portugal envolvia numerosos tubarões, com particular destaque para o “galhudo”, Squalus blainvillei (Risso, 1826), a “melga”, Squalus acanthias Smith & Radcliffe, 1912, a “lixa”, Centrophorus squamosus (Bonnaterre, 1788), e a “caneja”, Mustelus mustelus (Linnaeus, 1758). Em maior ou menor grau, esses representantes continuam despertando interesse comercial até os dias de hoje, sendo explorados com o auxílio dos mais diversos meios. Todos são muito comuns na linha da costa, podendo ser encontrados tanto em águas rasas quanto em profundidades maiores, havendo exemplares de Centrophorus squamosus capturados abaixo dos 3.900m. Quanto ao porte, Centrophorus squamosus alcança 158cm e Squalus blainvillei não ultrapassa os 95cm de comprimento, enquanto Squalus acanthias e Mustelus mustelus atingem 150cm (COMPAGNO, 1984a, 1984b).

Despida de qualquer elemento descritivo, a sucinta referência de Caminha parece estar baseada na breve visão do animal “lançado à praia” por Bartolomeu Dias e recolhido pelos habitantes locais, excerto passível de ser atribuído a qualquer um dos 20 tubarões assinalados para as águas rasas do sul da Bahia, universo composto por Carcharhinus acronotus (Poey, 1860), Carcharhinus brevipinna (Müller & Henle, 1839), Carcharhinus falciformis (Bibron, 1839), Carcharhinus leucas (Valenciennes, 1839), Carcharhinus limbatus (Valenciennes, 1839), Carcharhinus porosus (Ranzani, 1839), Carcharhinus signatus (Poey, 1868), Galeocerdo cuvieri (Peron & le Sueur, 1822), Negaprion brevirostris (Poey, 1868), Rhizoprionodon lalandii (Valenciennes, 1839), Rhizoprionodon porosus (Poey, 1861) (Carcharhinidae), Ginglymostoma cirratum

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(Bonnaterre, 1788) (Ginglymostomatidae), Isurus oxyrhinchus Rafinesque, 1809 (Lamnidae), Eugomphodus taurus (Rafinesque, 1810) (Odontaspididae), Sphyrna lewini (Griffith & Smith, 1834), Sphyrna tiburo (Linnaeus, 1758) e Sphyrna tudes (Valenciennes, 1822) (Sphyrnidae), Mustelus canis (Mitchell, 1815), Mustelus higmani Springer & Lowe, 1963 e Mustelus schimitti Springer, 1940 (Triakidae). Embora a maioria possa ser capturada com o auxílio de técnicas rudimentares, Carcharhinus brevipinna, Carcharhinus limbatus e Rhizoprionodon porosus alinham-se entre as presas mais freqüentes dos pescadores artesanais no Brasil oriental (Gustavo W. Nunan, comunicação pessoal, 2004).

Nenhuma outra alusão de cunho zoológico pertencente à “Carta” teria causado tantas controvérsias, pois determinadas fontes insistem em entender o “tubarão” citado por Caminha e o “peixe monstruoso” descrito no “Relato do Piloto Anônimo” como um único animal (e.g. CARREIRO, 2001; MELLO-LEITÃO, 1941), suposição baseada no fato de ambas as narrativas dizerem respeito a “peixes” e se mostrarem exclusivas dos respectivos originais. Apesar de engenhosa, tal hipótese soa demasiado forçada face à inegável familiaridade dos portugueses com os tubarões e sua relativa falta de experiência com os sirênios tropicais (vide ALMAÇA, 1998), lacuna capaz de transformar a descoberta de qualquer mamífero deste tipo em um evento notável, conforme efetivamente ocorre no “Relato do Piloto Anônimo” (vide adiante). A revelia de detalhes anatômicos mencionados (e.g. a ausência de dentes), certos autores chegariam a propor que o “peixe monstruoso” seria o mesmo esqualo da “Carta” “visto com os olhos de um poeta” (C.M. de Vasconcelos in C.M. DIAS, 1921-1924). Outros especulam sobre Caminha ter preferido não acreditar na existência de um monstro tão exótico, atribuindo um eventual informe dos tripulantes a um simples tubarão (e.g. GREENLEE, 1938), alternativa pouco factível pelo texto indicar sua presença no exato momento em que os indígenas se apossavam do “peixe” morto por Bartolomeu Dias. Como a falta de interesse acerca de semelhante “prodígio” afigura-se inconcebível para um cronista do século XVI, o registro independente de dois animais distintos parece ser a circunstância mais provável à vista de o próprio Caminha confessar não ter participado de vários acontecimentos passados em terra. Apesar de toda a discussão reinante, essa passagem terminaria sendo associada aos verdadeiros tubarões em diversas oportunidades, havendo mesmo aqueles (e.g. S.B. PEREIRA, 1964) prontos a identificar o exemplar em questão como um tubarão-branco, Carcharodon carcharias (Linnaeus, 1758), enquanto os mais comedidos limitam-se a mencionar um “Chondrichthyes não identificado” (e.g. NOMURA, 1996). 3.2.3 Do peixe monstruoso

“Uedessemo un pese che pigliorno: che saria grande come una botte: e piu longo: e tondo: e teneua el capo come porcho e gli occhi picoli e non haueua denti e haueua orecchie longhe un brazo: e larghe mezo brazo da basso del corpo haueua dui busi: e la coda era longa un brazo: e altra tanta larga: e non haueua piedi alcuno in alcuni lochi: haueua pelle come porcho el cuoio era grosso un deto e le sue carne eran bianche e grasse come di porcho” (“Vimos um peixe que apanharam que seria grande como uma pipa, mais comprido e redondo. Tinha a cabeça como de um porco e os olhos pequenos. Não tinha dentes e tinha orelhas do comprimento de um braço e da largura de meio braço. Debaixo do corpo tinha dois buracos e a cauda era do comprimento de um braço e larga de outro tanto. Não tinha nenhum pé em lugar algum, tinha pêlos como os do porco, o couro era grosso como um dedo. Suas carnes eram brancas e gordas como as de porco”. “Relato do Piloto Anônimo” in MONTALBODDO, 1507; capítulo LXVI).

Na qualidade de típico “prodígio” tão apreciado pelos “livros de viagem” quinhentistas (fide CAMPBELL, 1988; CÉARD, 1977; KAPPLER, 1999; LECOUTEUX, 1995), esse “peixe monstruoso” inspiraria vivo espanto ao narrador, que enfrenta enorme dificuldade em descrever um

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animal completamente desconhecido e muito pouco familiar aos olhos de um europeu. Contudo, detalhes como a “cabeça de porco”, os “olhos pequenos”, o “couro grosso” e o corpo “grande como uma pipa” com “dois buracos debaixo” afastam qualquer dúvida sobre a estranha avantesma mencionada não passar de um simples peixe-boi, Trichechus manatus Linnaeus, 1758, fato reconhecido por significativo número de autores (e.g. J.M. GARCIA, 1983; GREENLEE, 1938; I.M. SANTOS, 2000; H.C. SIMÕES, 1999). Com efeito, mesmo a extravagante comparação das longas nadadeiras anteriores desse mamífero aquático com “orelhas” não basta para contradizer o diagnóstico proposto, pois os exóticos sirênios tropicais sempre constituíram notória fonte de inspiração para diversas lendas e as mais inusitadas patranhas (BENWELL & WAUGH, 1965; DURAND, 1983; ELLIS, 1996) (Fig.9).

A citação de um peixe-boi no “Relato do Piloto Anônimo” revela-se bastante indicativa da extensa área antes ocupada por Trichechus manatus, que hoje se encontra restrito a algumas poucas localidades situadas entre a Flórida e o norte de Alagoas (fide EISENBERG & REDFORD, 1999; EMMONS, 1997; G.B.A. da FONSECA et al., 1994; NOWAK, 1991). Na verdade, essa espécie parece ter sido muito comum em boa parte do litoral do Novo Mundo banhado pelo Atlântico, pois existem antigas referências de sua presença desde a Virgínia, costa leste dos EUA (MCATEE, 1950), até o sudeste do Brasil, conforme demonstram os textos de cronistas e aventureiros que percorreram a Bahia, o Espírito Santo e o Rio de Janeiro durante o século XVI.

Escrito por volta de 1570, o “Tratado da Terra do Brasil” de Pero de Magalhães de Gandavo fala dos peixes-boi encontrados tanto em Ilhéus (ca. 14o49’S, 39o02’W) quanto na Capitania do Espírito Santo, onde esses animais seriam particularmente abundantes (GANDAVO, 1965)249. Poucos anos mais tarde, Gabriel Soares de Sousa forneceria numerosos comentários sobre os peixes-boi mortos na “Bahia de Todos os Santos” – alusão que deve incluir as cercanias de Salvador (ca. 12o59’S, 38o31’W) – “com arpões muito grandes atados a grandes arpoeiras mui fortes e no cabo delas atado um barril ou outra bóia que o peixe leva atrás de si com muita fúria, até que o peixe se vaza todo de sangue, e se vem acima da água morto” (SOUSA, 1938). Nas décadas seguintes, a mesma estratégia básica seria empregada em vários outros pontos da costa brasileira (teste CARDIM, 1939; YVES D’EVREUX, 1615), sobrevivendo até pouco tempo na pesca de Trichechus inunguis (Natterer, 1883) da Amazônia (M.N. PEREIRA, 1944; VERISSIMO, 1895).

Fig.9- O “manati”, Trichechus manatus, segundo gravura do “Exoticorum Libri Decem” de Charles de L’Ecluse, obra publicada em Antuérpia no ano de 1605.

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Datada de 31 de maio de 1560, a célebre carta “Quam Plurimarum Rerum Naturalium” do jesuíta Joseph de Anchieta acrescenta haver “um certo peixe, a que chamamos boi-marinho ... freqüente na Capitania do Espírito Santo e em outras paragens do Norte, onde o frio não é tão rigoroso”. Este “peixe” seria “excelente para comer”, sem que fosse possível, entretanto, “discernir se deve ser considerado como carne ou antes como peixe”. “Da sua gordura, que está inerente à pele ... faz-se um molho que bem pode comparar-se à manteiga, e não sei se a excederá. O seu óleo serve para temperar todas as comidas e todo o seu corpo é cheio de ossos sólidos e duríssimos, tais que podem fazer às vezes de marfim”. “Junto aos peitos tem como uns dois braços com que nada” e atinge “um tamanho imenso”, “excedendo ao boi na corpulência” (ANCHIETA, 1933). De fato, alguns espécimens bem desenvolvidos de Trichechus manatus são capazes de ultrapassar 4,5m de comprimento e 600kg de massa corporal (HUSAR, 1978).

Ao contrário dos exemplos anteriores, a presença de peixes-boi para o litoral do Rio de Janeiro afigura-se bem mais nebulosa, tendo por base as palavras de Anthony Knivet, aventureiro inglês que permaneceu prisioneiro no Brasil entre 1591 e 1599 (in PURCHAS, 1626). Como esse assecla do corsário Thomas Cavendish afirma haver divisado “uma sereia e muitos outros peixes estranhos” em Piratininga, localidade situada “três léguas” ao norte do Rio de Janeiro (ca. 22o57’S, 43o05’W), não parece de todo impossível atribuir semelhante observação a Trichechus manatus, pois tais mamíferos seriam confundidos com esses seres imaginários por diversos viajantes do Novo Mundo, a começar pelo próprio Colombo (in VARELA, 1984)250.

Vista amiúde como um fenômeno do século XVI, a ocorrência de Trichechus manatus ao sul de Alagoas pode ter perdurado até data bem mais recente. No livro sobre sua viagem pelo Brasil oriental, o Príncipe de Wied-Neuwied trata o peixe-boi como um mamífero “bastante usual no rio São Mateus”, Espírito Santo (ca. 18o38’S, 39o40’W), de onde exemplares “saíam para o mar” para perambular “ao longo do litoral” e entrar em “outros rios”, havendo notícias de capturas até em Alcobaça, sul da Bahia (ca. 17o30’S, 39o13’W; fide WIED-NEUWIED, 1820-1821, 1826)251. Na verdade, o testemunho do naturalista alemão é reforçado pelo intrigante relato de Olivério Pinto a respeito de sirênios no “alto Rio Doce” durante a década de 1940, ocorrência verbalmente asseverada ao insigne ornitólogo do Museu Paulista “por Pinto da Fonseca”, elemento “bastante conhecedor da fauna daquela região” (O.M. de O. Pinto in WIED-NEUWIED, 1940)252. Não deixa de causar grande surpresa, contudo, que o Setor de Mas tozoologia do Museu Nacional-UFRJ possua uma costela de Trichechus manatus (MN 30493) coletada em 8 de setembro de 1990 pelo Almirante Ibsen Gusmão Câmara na localidade de Barra de Caravelas, sul da Bahia (ca. 17o45’S, 39o10’W). Tendo passado despercebido até o momento, o material em foco foi obtido cerca de 150km ao sul do ilhéu da Coroa Vermelha (ca. 16o20’S, 39o01’W) e pouco mais de 210km ao norte da foz do rio Doce (ca. 19o37’S, 39o48’W) (Fig.10).

Fig.10- Distribuição do peixe-boi, Trichechus manatus, no litoral brasileiro (segundo EISENBERG & REDFORD, 1999; G.B.A. da FONSECA et al., 1994) e as principais localidades mencionadas no texto: (1) Salvador, Bahia; (2) Ilhéus, Bahia; (3) ilhéu da Coroa Vermelha, Bahia; (4) Alcobaça, Bahia; (5) Barra de Caravelas, Bahia; (6) foz do rio São Mateus, Espírito Santo; (7) foz do rio Doce, Espírito Santo; (8) Piratininga, Rio de Janeiro.

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Apesar de não desconhecer por completo o assunto, a literatura contemporânea quase sempre omite parte dos relatos históricos sobre a antiga área geográfica ocupada por Trichechus manatus no Brasil, lacuna capaz de propiciar várias discrepâncias entre os trabalhos considerados (e.g. CABRERA, 1961; CABRERA & YEPES, 1940; CALDAS & LIMA, 2001; DOMNING, 1981, 1982; G.B.A. da FONSECA et al., 1994; GOELDI, 1893; NOWAK, 1991; SILVEIRA, 1988; THORNBACK & JENKINS, 1982; WHITEHEAD, 1977, 1978; WILSON & REEDER, 1992). Essa tendência, contudo, viria a agravar-se de forma acentuada no curso dos últimos anos, pois diversas publicações recentes (e.g. EISENBERG & REDFORD, 1999; EMMONS, 1997) soem desprezar até mesmo contribuições das últimas três décadas, não havendo sequer uma única palavra sobre a distribuição de Trichechus manatus ter sido bem maior que a atual em um passado não muito distante. 3.3 DAS AVES

3.3.1 Dos fura-buchos

“E aaquarta feira segujmte pola manhãa topamos aves aque chamã fura buchos” (“E à quarta-feira seguinte pela manhã, topamos aves a que chamam fura-buchos”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folios 1r e 1v).

De acordo com as fontes consultadas (BOCAGE, 1862; REIS JUNIOR, 1930, 1935; TAIT, 1887, 1924; THEMIDO, 1952), “roriz”, “roli”, “rolim”, “chirêta”, “fárbucho” e “fura-bucho” seriam nomes populares exclusivos de Puffinus puffinus (Brünnich, 1764), pois os seus congêneres em território português – Puffinus gravis (O’Reilly, 1818), Puffinus diomedea (Scopoli, 1769) e Puffinus griseus (Gmelin, 1789) – sempre foram vistos como aves marinhas distintas, recebendo a designação geral de “pardelas” e seus derivados (e.g. “pardela-de-bico-branco”, “pardela-maranhona”, “pardela-preta”, “pardela-de-bico-preto” etc.), assim como de “carrão”, “maranhona”, “pardilhão” ou “moira” (Fig.11). Tal especificidade, contudo, não se manteve no Brasil, onde a variante “virabucho” terminaria sendo aplicada inclusive a Puffinus griseus (compare O.M. de O. PINTO, 1942 versus TEIXEIRA et al., 1985).

Fig.11- O “sheare-water”, Puffinus puffinus, segundo gravura da “Ornithologia” de Francis Willughby, obra publicada em Londres no ano de 1676.

Visitante habitual da costa portuguesa entre os meses de agosto e outubro, Puffinus puffinus chega a aventurar-se pelos grandes rios, penetrando até mesmo na embocadura do Tejo. Além de sinalizar o movimento dos cardumes de peixes miúdos para os pescadores, esses Procellariidae muitas vezes eram aproveitados como alimento, vindo a merecer a fama de autêntica iguaria em determinados casos. Nos anos de abundância da sardinha, os exemplares de Puffinus puffinus compunham bandos assaz numerosos e se tornavam tão lerdos pela quantidade de gordura

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acumulada que acabavam sendo mortos com os remos pelas tripulações (BOCAGE, 1862; REIS JUNIOR, 1930, 1935). Segundo os comentários disponíveis, entretanto, parte significativa das aves era fisgada graças a um anzol iscado com sardinha arrastado na esteira das embarcações, sendo as peças obtidas limpas e tratadas como qualquer outro tipo de pescado. Embora a carne de Puffinus diomedea fosse considerada “seca e de qualidade inferior”, a de Puffinus puffinus era tida como “muito boa”, enquanto Puffinus gravis gozava de especial predileção por ser “gordo e macio”, sucumbindo aos milhares nos idos de 1935. Um único barco podia abater mais de duas centenas de indivíduos por temporada, vendendo-os no mercado sob o sugestivo apodo de “galinha-do-mar” (REIS JUNIOR, 1930, 1935; TAIT, 1887, 1924).

A marcada importância desses Procellariidae no cotidiano e o próprio caráter restrito do nome “fura-bucho” sugere a forte possibilidade de os tripulantes da frota terem divisado aves marinhas muito similares às de Portugal. Na verdade, o relato de Caminha poderia corresponder a migrantes de Puffinus puffinus, pois essa espécie atinge com regularidade as nossas águas durante suas migrações anuais, tendo sido assinalada no Atlântico meridional sobretudo nos meses de outubro a abril entre os 20o e os 50o de latitude Sul, portanto do Espírito Santo à Patagônia (BROOKE, 1990; HARRISON, 1988). Com efeito, de 125 indivíduos anilhados obtidos nas costas da América do Sul (BROOKE, 1990), exatos 113 (90,4%) foram recuperados durante o inverno do hemisfério norte, cabendo às latitudes superiores aos 20oS nada menos de 111 registros (88,8% do total). Uma outra análise envolvendo apenas anilhas provenientes do Brasil comprova a presença de Puffinus puffinus ao longo de quase todo o ano, exceto junho e agosto, para uma faixa litorânea compreendida entre o Maranhão e o Rio Grande do Sul, sendo que 75 dos 82 exemplares pertencentes a essa segunda amostra (91,4% do total) também foram encontrados acima dos 20oS (fide LARA-RESENDE & LEAL, 1982). Curiosamente, o único espécimen oriundo da Bahia seria capturado próximo a Caravelas (ca. 17o45’S, 39o15’W) em abril de 1955, mesmo mês da chegada da esquadra de Cabral na região.

Embora a atribuição dos fura-buchos da “Carta” a Puffinus puffinus afigure-se bastante razoável, vale lembrar que enigmáticos representantes do gênero foram descobertos há poucos anos incubando no arquipélago de Fernando de Noronha (ca. 3o50’S, 32o25’W) e nas ilhas Itatiaia ao largo de Vila Velha, Espírito Santo (ca. 20o22’S, 40o17’W), ocorrência digna de nota por não haver qualquer notícia prévia dessas aves procriarem em território nacional (compare EFE & MUSSO, 1994; SCHULZ NETO, 1995, 2004; SOTO & FILIPPINI, 2000 versus HARRISON, 1988; MURPHY, 1936; SICK, 1985). Atribuídos a Puffinus assimilis Gould, 1838 ou a Puffinus lherminieri Lesson, 1839 conforme o autor considerado (compare SCHULZ NETO, 1995, 2004 versus SOTO & FILIPPINI, 2000, 2003), tais exemplares não puderam ser identificados de forma satisfatória devido à ausência de coleta do material zoológico necessário, permanecendo como uma autêntica incógnita até o momento (TEIXEIRA & NACINOVIC, 2002). Como Puffinus puffinus e alguns de seus congêneres podem aninhar em localidades muito distantes de seus sítios reprodutivos mais tradicionais (BIERREGAARD JUNIOR et al., 1975; FINCH, 1973; GREENWAY, 1958), ainda não é possível decidir se o fenômeno observado nas ilhas brasileiras constitui o derradeiro testemunho de colônias antes existentes no Atlântico meridional ou mero produto de uma expansão recente devida às mudanças climáticas dos últimos anos, alterações que teriam afetado diversas aves marinhas (SCHREIBER & SCHREIBER, 1989). Por outro lado, também não deve ser esquecido o fato de Santa Helena, uma das ilhas subtropicais do Atlântico Sul, ter abrigado uma variedade de Puffinus conhecida de restos fossilizados datados do Pleistoceno (BLOFELD, 1852; OLSON, 1975). Vista como Puffinus lherminieri em um primeiro momento (fide LAMBRECHT, 1933), esse Procellariidae terminaria sendo descrito há algumas décadas como Puffinus pacificoides Olson, 1975, tendo

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aparentemente desaparecido antes da chegada do homem ao local no ano de 1502 (MURPHY, 1936; OLSON, 1985).

Grande parte das publicações disponíveis (e.g. ARROYO, 1963, 1976; AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; J.M. GARCIA, 1983; NOMURA, 1996, 2005; I.M. SANTOS, 2000; M. SIMÕES, 1985) associa os fura-buchos a Puffinus puffinus graças ao trabalho de CORTESÃO (1943), cujos comentários espelham a opinião do naturalista português Baltasar de Osório e o ensaio sobre as aves mencionadas por Pero Vaz de Caminha elaborado por Olivério Pinto, apesar de o insigne ornitólogo paulista ter deixado implícito que membros dos gêneros Pachyptila e Pterodroma tampouco deviam ser descartados (O.M. de O. PINTO, 1942). Haveria, contudo, deslizes de maior ou menor amplitude, pois algumas fontes mostram-se capazes de confundir os fura-buchos com outros Procellariiformes (e.g. CORTESÃO, 1943; H.C. SIMÕES, 1999), com gaivotas como Larus cirrocephalus Vieillot, 1818 (e.g. M.A. Villela in CAMINHA, 1999b; MELLO-LEITÃO, 1941) ou mesmo com obscuras “garças marinhas” (e.g. CARREIRO, 2001; P.R. PEREIRA, 2002), referência desprovida de qualquer significado. 3.3.2 Das “aves pretas como pegas”

“Diego dijaz e afonso Ribeiro o degradado aque ocapitã omtem mandou que em toda maneira la dormisem. volueranse ja denoute por eles nom quererem que la dormisem e trouuerã papagayos verdes e outras aues pretas casy como pegas se nõ quãto tiijnham obico bramco eos Rabos curtos” (“Diego Dias e Afonso Ribeiro, o degredado, a que o Capitão ontem mandou que em toda maneira lá dormissem, volveram-se já de noite por eles não quererem que lá dormissem. E trouxeram papagaios verdes e outras aves pretas quase como pegas, senão quanto tinham o bico branco e os rabos curtos”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 10r).

Em Portugal, “pega” ou “pega-rabuda” seriam nomes conferidos a Pica pica (Linnaeus, 1758), ave das mais vulgares encontrada até nos parques e jardins de áreas urbanas populosas (BOCAGE, 1862; GOODWIN, 1986; TAIT, 1924; THEMIDO, 1952). Além do colorido alvinegro contrastante, esse Corvidae apresenta uma silhueta rabilonga característica (Fig.12), pois dos seus 48cm de comprimento, nada menos de 26cm (cerca de 54%) correspondem às longas e estreitas penas da cauda.

Entre os poucos componentes da fauna brasileira capazes de recordar um elemento tão típico, talvez o caso mais notável seja exemplificado pelo “tiê-tinga”, Cissopis leveriana (Gmelin, 1788), Thraupidae de plumagem branca e preta cujas retrizes alcançam cerca de 16cm, valor equivalente a 55% dos 29cm de comprimento de um exemplar adulto. Em virtude desta leve semelhança, Cissopis leveriana seria conhecido por “pega” ou “pega-do-norte” em certas partes de sua área de ocorrência (e.g. Rio de Janeiro e Pernambuco, fide A.L.S. FERNANDES et al., 1991; O.M. de O. PINTO, 1944; E. SANTOS, 1938; SICK, 1985), que no Brasil oriental abarca os estados de Pernambuco, Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Paraná e Santa Catarina (O.M. de O. PINTO, 1944; TEIXEIRA et al., 1987).

Conforme seria de esperar, a designação de “pega” terminaria sendo estendida a determinados Corvidae como Cyanocorax cristatellus (Temminck, 1823) e Cyanocorax cyanopogon (Wied, 1821), apesar de essas gralhas do Novo Mundo nada lembrarem a espécie européia (A.L.S. FERNANDES et al., 1991; O.M. de O. PINTO, 1944; F.A. de SAMPAIO, 1971). Mais inusitada, contudo, é a particularidade de a mesma palavra ser empregada em relação a certos Icteridae brasileiros, pois tais pássaros não guardam qualquer parentesco ou remota similaridade com Pica pica, detalhe insuficiente para impedir que Cacicus chrysopterus (Vigors, 1825) e Icterus cayanensis (Linnaeus, 1766) muitas vezes fossem tratados de “pegas” (fide CLEROT, 1959; A.L.S. FERNANDES et al., 1991; GOELDI, 1894; R. von IHERING, 1940; O.M. de O. PINTO 1944; C.O. da C. VIEIRA, 1936; WIED-

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NEUWIED, 1831-1833). Grosso modo, os colonizadores parecem ter visto uma estranha afinidade entre as pegas e ictéridas, tendên cia registrada pelo menos até meados do século XVII (TEIXEIRA, 1997, 1998a). Não deve causar surpresa, portanto, que O.M. de O. PINTO (1942) identificasse as enigmáticas “pegas” mencionadas por Caminha, “quase com absoluta segurança”, como Cacicus haemorrhous (Linnaeus, 1766), pois essa ave de plumagem negra com o uropígio vermelho possui um contrastante bico branco, característica assaz evi dente segundo o texto original.

Apesar de todas as diferenças consideráveis em termos de colorido e aspecto geral, o insigne ornitólogo paulista não estaria longe da resposta ao atribuir os comentários de Caminha a um Icteridae, embora a forma envolvida pareça ser Cacicus cela (Linnaeus, 1758), um segundo representante do gênero com o bico branco comum nas matas da Bahia (fide O.M. de O. PINTO, 1935). Com efeito, no sexto livro de sua “Histoire de la Nature des Oyseaux”, BELON (1555) fala da “pega do Brasil”, a qual é descrita como “toda negra, exceto por uma faixa amarela sobre a asa, que é como aquela [faixa] branca de uma pega, & também é toda amarela desde o meio do dorso até o uropígio, & parte da cauda ... possui um bico afilado, longo, & pontudo, branco & cinzento ... é uma ave muito bela, algo maior que um melro, que recorda bastante uma pega ... Nossos antecessores não a conheciam, pois apenas recentemente ela chegou do Brasil” (Fig.13). Na verdade, esse exemplar de Cacicus cela poderia ter sido levado para a França através do comércio paralelo de curiosidades e xerimbabos promovido pelos traficantes de pau-brasil (TEIXEIRA & PAPAVERO, 2003).

A maioria dos autores (e.g. ARROYO, 1963, 1976; CORTESÃO, 1943; J.M. GARCIA, 1983, NOMURA, 1996, 2005) faz eco às considerações de O.M. de O. PINTO (1942), enquanto outros preferem associar o relato de Caminha aos tiês-pretos, Tachyphonus coronatus (Vieillot, 1822), Thraupidae de pequeno porte que pouco se aproxima da narrativa original (e.g. M.A. Villela in CAMINHA, 1999b). Alguns se baseiam em verbetes de dicionários para listar vários Icteridae (e.g. D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996), havendo mesmo aqueles capazes de confundir os japus do Novo Mundo com as autênticas pegas européias (e.g. P.R. PEREIRA, 2002), definindo essas últimas como “semelhantes ao papagaio” em sua capacidade de “imitar a voz humana”.

Fig.12- Exemplar adulto de pega, Pica pica (desenho de Jorge Bruno Nacinovic), e a gravura da “pie” pertencente à “Histoire de la Nature des Oiseaux” de Pierre Belon, obra publicada em Paris no ano de 1555.

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3.3.3 Das pombas-seixas

“Outras aves entã nom vimos somente alguũas ponbas seixas eparecerãme mayores em boa camtidade caas de portugal” (“Outras aves então não vimos, somente algumas pombas-seixas e pareceram-me maiores, em boa quantidade, que as de Portugal”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 10r).

Até o momento, não foi possível precisar a qual elemento da avifauna lusitana deveria ser atribuído o termo “pomba-seixa”, substantivo capaz de inspirar dúvidas mesmo aos maiores estudiosos do assunto. De fato, grande parte dos autores contemporâneos limita-se a reproduzir os comentários de BLUTEAU (1712-1721), que não achou “noticias do passaro desse nome, senão no escudo das Armas dos Seyxas, que por curiosidade busquey no Cartorio de Alcobaça, & nelle vi hûas aves prateadas com bicos vermelhos, & do feytio de ganços ou adens pequenos”. Por conseguinte, as figuras descobertas pelo eminente dicionarista retratariam um pato qualquer (Anatidae) e não uma pomba (Columbidae), afirmativa incapaz de sustentar-se face um novo exame, pois as armas dos Seixas mostram claramente cinco pombas ornamentais, Columba livia Gmelin, 1789, em prata e membradas de vermelho (in BERGSTRÖM et al., 1935) (Fig.14). Mesmo levando em conta

eventuais mudanças introduzidas ao longo do tempo, parece mais adequado supor que um escudo abrigasse pombas ao invés de marrecos, haja vista o valor simbólico desses voláteis no imaginário do Cristianismo (CHARBONNEAU-LASSAY, 1997; IMPELLUSO, 2003). Perpetuado por seus numerosos seguidores, o equívoco de BLUTEAU (1712-1721) tanto poderia refletir o desconhecimento do observador quanto a extrema estilização dos animais típica da heráldica.

Conquanto não descarte a afirmação anterior, uma segunda vertente de especialistas toma “pomba-seixa” como um regionalismo alentejano empregado para distinguir uma certa “pomba brava” não identificada também chamada de “souza” ou “sousa” (e.g. L. FREIRE, 1954; BERGSTRÖM et al., 1935), designação tampouco registrada nas mais tradicionais contribuições relativas à ornitologia portuguesa. Na medida que Streptopelia turtur (Linnaeus, 1758) sempre foi considerada algo à parte (vide adiante), a fauna local só incluiria três “pombas” na acepção da palavra, das quais a “pomba-brava”, Columba livia, e a “pomba-torcaz”, Columba palumbus, Linnaeus, 1758 seriam as mais conhecidas (BOCAGE, 1862; MORAIS, 1897; REIS JUNIOR, 1930, 1935; TAIT, 1887, 1924; THEMIDO, 1952). Bem menos comum que suas duas congêneres anteriores e de distribuição restrita às regiões limítrofes com a Espanha, Columba oenas Linnaeus, 1758 receberia o nome de “pomba-brava” ou “sora”, provável corruptela do “zara” conferido pelos andaluzes para a espécie (TAIT, 1924). Como “sora” e “souza” quiçá

Fig.13- Exemplar adulto de xexéu, Cacicus cela (desenho de Jorge Bruno Nacinovic), e a gravura da “pie de Bresil” pertencente à “Histoire de la Nature des Oiseaux” de Pierre Belon, obra publicada em Paris no ano de 1555.

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constituam meras variantes desse último vocábulo, não parece de todo despropositada a hipótese de relacionar as enigmáticas “pombas-seixas” com a espécie em questão.

A possível identificação das “pombas-seixas” facilita sobremaneira a tentativa de descobrir qual dos colúmbidas brasileiros fora assim denominado por Caminha, pois as formas do Novo Mundo revelam-se bastante parecidas entre si nos traços mais gerais de seu aspecto externo (O.M. de O. PINTO, 1949, 1964). Podendo alcançar 33cm de comprimento e 300g de massa corporal, Columba oenas é uma ave de porte médio caracterizada pela plumagem de colorido acinzentado com a face ventral do pescoço e partes adjacentes do peito vináceas. Como as “rolas” também se fariam presentes no litoral recém-descoberto (vide adiante), seria razoável supor que o cronista pretendia mencionar uma pomba de tamanho maior e aspecto similar ao das “pombas-seixas” portuguesas, provavelmente um autêntico representante do gênero Columba (vide também O.M. de O. PINTO, 1942).

Ao contrário do que mostram as informações atuais, talvez apenas a pomba-trocal, Columba picazuro Temminck, 1813, a pomba-amargosa, Columba plumbea Vieillot, 1818 e a pomba-galega, Columba cayennensis Bonnaterre, 1792, ocorressem no litoral baiano nos idos de 1500, pois a asa-branca, Columba speciosa Gmelin, 1789, poderia estar ausente da região por ser uma ave invasora típica de paisagens abertas (O.M. de O. PINTO, 1935, 1938, 1949, 1964, 1978; SILVA-PORTO & TEIXEIRA, 1984; D. SOUZA, 1995; WILLIS & ONIKI, 1987). Com 34cm de comprimento e 310g de massa corporal, Columba cayennensis surge como a alternativa mais verossímil não só pelo porte avantajado, mas sobretudo por apresentar plumagem um tanto semelhante a de Columba oenas em termos do colorido vináceo da face ventral do pescoço e partes adjacentes do peito. Muito freqüente nos remanescentes florestais do sul da Bahia, a pomba-galega também habita as restingas da região, onde pode ser avistada com relativa facilidade (SILVA-PORTO & TEIXEIRA, 1984).

As incertezas em torno das misteriosas “pombas-seixas” deram margem a numerosas opiniões discordantes, não havendo sequer unanimidade quanto ao verdadeiro significado de semelhante expressão (compare ARROYO, 1963, 1976; CORTESÃO, 1943; J. RIBEIRO, 1910). Vários autores fazem alusões a “pombas bravas” ou “pombas selvagens” (e.g. AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; H.C. SIMÕES, 1999), enquanto outros estipulam que o texto de Caminha poderia dizer respeito a qualquer um dos membros do gênero Columba encontrados no sul da Bahia (e.g. NOMURA, 1996, 2005; O.M. de O. PINTO, 1942), inclusive variedades tão diferentes entre si como a “pomba amargosa” (i.e. Columba plumbea), a “pomba-trocal” (i.e. Columba picazuro) e a “asa-branca” (i.e. Columba speciosa) (e.g. P.R. PEREIRA, 2002; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996). Algumas fontes chegam mesmo a confundir essas “pombas-seixas” com as “picaçus” assinaladas por Gabriel Soares de Sousa (e.g. ARROYO, 1963; CARREIRO, 2001; CORTESÃO, 1943; J.M. GARCIA, 1983), cuja identidade não pode ser esclarecida até o momento253. 3.3.4 Das rolas

“Alguũs deziã que virã Rolas mas eu nõ as vy” (“Alguns diziam que viram rolas, mas eu não as vi.”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 10r).

Fig.14- O brasão dos Seixas, mostrando cinco pombas em prata membradas de vermelho (modificado de BERGSTRÖM et. al., 1935).

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Em todo o território português, o termo empregado por Caminha serviria para designar apenas Streptopelia turtur (Linnaeus, 1758), ave de cauda longa capaz de atingir 28cm de comprimento e 132g de massa corporal. Ostentando uma plumagem bastante conspícua graças ao dorso escamado de negro e pescoço listrado de branco e preto, essa espécie surge como o mais comum e melhor conhecido de todos os colúmbidas existentes em Portugal, onde bandos imensos podiam ser vistos deslocando-se ao longo da costa durante suas migrações outonais (BOCAGE, 1862; REIS JUNIOR, 1930, TAIT, 1887, 1924; THEMIDO, 1952). Na região do Porto, suposta cidade natal do cronista, esse fenômeno daria margem a uma frenética atividade de caça, intensa a ponto de haver relatos do final do século XIX sobre a diária e contínua fuzilaria ouvida entre o nascer do sol e as dez horas da manhã (TAIT, 1887, 1924).

Bastante preciso em termos conceituais, o presente registro revela-se quase impenetrável por constituir uma observação de terceiros destituída de qualquer elemento descritivo, pois essas “rolas” do litoral brasileiro sequer chegaram a ser avistadas pessoalmente por Caminha. Tal referência, portanto, deve ser entendida como mera alusão a um Columbidae incapaz de passar por uma “pomba” graças ao seu tamanho reduzido e cauda alongada, indicação demasiado vaga para permitir maiores considerações. Proposta por O.M. de O. PINTO (1942) e adotada sem restrições por diferentes seguidores (e.g. CORTESÃO, 1943; NOMURA, 1996, 2005), a tentativa de atribuir essa citação, “com toda a certeza”, a Columbina talpacoti (Temminck, 1811) ou Columbina minuta (Linnaeus, 1766) inspira certa reserva, uma vez que se baseia na tendência de tratar qualquer pomba mais franzina por “rola”, havendo desde uma “rola-azul”, Claravis pretiosa (Ferrari-Pérez, 1886), com 19cm de comprimento e 67g de massa corporal, até uma “rola” ou “rolinha-da-praia”, Columbina minuta, com não mais de 14cm e 33g (R. von IHERING, 1940; O.M. de O. Pinto, 1938, 1949, 1964, 1978). A tarefa torna-se ainda mais ingrata face à possibilidade de formas corpulentas também serem assim chamadas pelo vulgo, conforme atesta o fato de a pomba-trocal, Columba picazuro, ser conhecida por “rola-pedrez”, enquanto a juriti-piranga, Geotrygon montana (Linnaeus, 1758), receberia o nome de “rola-gemedeira” (CLEROT, 1959; O.M. de O. PINTO, 1938, 1949, 1964, 1978). Nada haveria de inusitado, portanto, se os marinheiros da frota pretendessem mencionar as nossas juritis, Leptotila spp. e Geotrygon spp., pois essas aves alcançam tamanho similar ao de Streptopelia turtur, variando entre os cerca de 27cm de comprimento e 157g de massa corporal de Leptotila rufaxilla (Richard & Bernard, 1792), e os 24cm e 98g de Geotrygon violacea (Temminck, 1810).

De difícil solução, a incógnita das “rolas” citadas por Caminha assume contornos bastante indefinidos pelos numerosos colúmbidas de menor porte assinalados para o sul da Bahia nos dias de hoje (fide O.M. de O. PINTO, 1935, 1938, 1949, 1964, 1978; SILVA-PORTO & TEIXEIRA, 1984; D. SOUZA, 1995). Composto por nada menos de 11 representantes pertencentes a cinco gêneros distintos, esse elenco inclui diversas “rolinhas”, “rolas” e juritis – Scardafella squammata (Lesson, 1831), Columbina talpacoti, Columbina picui (Temminck, 1813), Columbina minuta , Claravis pretiosa, Leptotila verreauxi (Bonaparte, 1855), Leptotila rufaxilla, Geotrygon montana e Geotrygon violacea – além de variedades tidas pela população local como pombas pouco encorpadas, caso da avoante ou pomba-de-bando, Zenaida auriculata (Des Murs, 1847), e da pomba-de-espelho, Claravis godefrida (Temminck, 1811). De acordo com os trabalhos de campo realizados em Porto Seguro e municípios vizinhos durante os anos de 1994 e 1995, Columbina talpacoti, Columbina minuta, Geotrygon montana e Leptotila verreauxi alinham-se entre as aves mais freqüentes e fáceis de observar nas matas e/ou restingas da região.

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3.3.5 Dos papagaios vermelhos

“Resgataram la por cascauees e por outras cousinhas depouco ualor que leuauã papagayos vermelhos mujto grandes e fremosos. e dous verdes pequenjnos” (“Resgataram lá, por cascavéis e por outras coisinhas de pouco valor que levavam, papagaios vermelhos muito grandes e formosos e dois verdes pequeninos”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 9r).

“Di sopra dal capo de Bonasperanza uerso garbi hanno scoperto una terra noua la chiamano de li Papaga: per esser gene di longeza de brazo .i. & mezo de uarii colori: de li quali ne hauemo uisto doi” (“Acima do Cabo da Boa Esperança, em direção ao ocidente, descobriram uma terra nova a que chamam dos Papagaios por [nela] haver alguns com braço e meio de comprimento, de várias cores, dos quais havemos visto dois”. Carta de Giovanni Matteo Camerini, “il Cretico”, datada de 27 de junho de 1501).

“Anno Rechato 2 papaghallj dj diversi cholorj e qua sono lunghj uno ghomito e ½ el quale e piu di b. 1 e ½ de nostrj” (“Trouxeram dois papagaios de diversas cores com o comprimento de um côvado e meio, o qual tem mais do que um e meio dos nossos”. Carta de Bartolomeo Marchionni, datada de 27 de junho de 1501).

“De sopra el Capo de Bona Speranza, verso garbin, hanno discoperto una terra nuova, chiamano la terra de li papaga, per esser li papaga longi uno brazo et più, de varij colori, de li quali hanno visto doy” (“Acima do Cabo da Boa Esperança, em direção ao ocidente, descobriram uma terra nova que chamaram Terra dos Papagaios por serem os [seus] papagaios maiores que um braço ou mais, de várias cores, dos quais viram dois”. Carta de Domenico Pisani, datada de 27 de julho de 1501).

Conforme estabelece O.M. de O. PINTO (1942), Caminha pretendia referir-se a araras-vermelhas, Ara chloroptera, espécie de vistosa plumagem escarlate capaz de alcançar 95cm de comprimento e cerca de 1,5kg de massa corporal (Fig.15)254. Com ampla distribuição em nosso território, esse Psittacidae foi originalmente assinalado da Amazônia ao nordeste extremo do Brasil, estendendo-se para o Sul até São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul (O.M. de O. PINTO, 1938, 1978; TEIXEIRA, 1992b, 1999, 2002). Todavia, sua extensa área de ocorrência parece ter passado completamente despercebida por grande parte dos autores contemporâneos, os quais insistem em não reconhecer a presença de Ara chloroptera no leste da Bahia e demais estados nordestinos (e.g. FORSHAW, 1978; HOYO et al., 1997; JUNIPER & PARR, 1998; D. SOUZA, 1995), havendo mesmo aqueles capazes de anunciar o “primeiro registro” dessas aves nas caatingas locais em data bastante recente (e.g. OLMOS, 1997). Não obstante, as araras-vermelhas poderiam ter habitado o sul da Bahia até os nossos dias, pois o antigo “Museu da Fauna” (Rio de Janeiro) abrigava uma fêmea coletada nos arredores da Reserva Biológica de Sooretama, norte do Espírito Santo (ca. 19o10’S, 40o15’W), em setembro de 1945 (Museu da Fauna n° 565, fide AGUIRRE & ALDRIGHI, 1983), localidade não muito distante das vastas matas baianas condenadas a desaparecer nas décadas seguintes (DEAN, 1996; SICK & TEIXEIRA, 1979).

O indisfarçável entusiasmo de Caminha por esses “formosos papagaios vermelhos” encontra paralelo em vários outros relatos de época, pois o colorido e o porte das araras do Novo Mundo superava, por larga margem, aquele dos psitácidas africanos e asiáticos até então conhecidos dos europeus. Em carta enviada a Colombo no ano de 1494, os Reis Católicos solicitavam ao navegador genovês o envio de “todos los más Halcones que allá hay y se pudiere enviar y de todas las aves que allá hay y se pudiere haber por que querríamos las ver todas” (JIMÉNEZ DE LA ESPADA, 1965; GARZA, 1983; GOLLÁN, 1963), presente digno da realeza caso se considere que animais exóticos desse tipo podiam custar quantias vultosas, muitas vezes equivalentes a vários meses de trabalho de um artesão especializado

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(TEIXEIRA, 1998b, 1999). Reflete tal prestígio o fato de as variedades neotropicais logo terem surgido em trabalhos de artistas do século XVI, cabendo ressaltar a arara-vermelha – talvez Ara macao (Linnaeus, 1758) – figurada no díptico de Lucas Cranach intitulado “Retrato do casal Cuspinian”, pintura concluída em Viena entre 1502 e 1503 (SICK, 1984).

Quase todas as fontes consultadas concordam em atribuir os “papagaios vermelhos” de Caminha a araras-vermelhas (e.g. CORTESÃO, 1943; J.M. GARCIA, 1983; NOMURA, 1996, 2005; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996) ou pelo menos a araras não identificadas (e.g. AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; M.A. Villela in CAMINHA, 1999b; GREENLEE, 1938; H.C. SIMÕES, 1999), havendo freqüentes alusões aos psitácidas representados no famoso “Planisfério de Cantino” (1502) e no chamado “Atlas Miller” de Lopo Homem (1519) (vide adiante). Entretanto, ao repetir os comentários de O.M de O. PINTO (1942) divulgados na obra de CORTESÃO (1943), certas publicações incidem no manifesto equívoco de considerar as araras-vermelhas como “ainda hoje existentes” ou “muito abundantes no sul da Bahia” (e.g. AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; H.C. SIMÕES, 1999), pois essas aves já teriam sido extintas da região atualmente.

Fig.15- Exemplar adulto de arara-vermelha, Ara chloroptera (desenho de Jorge Bruno Nacinovic), e a gravura de uma arara pertencente à “Historiae Animalium” de Konrad Gesner, obra publicada em Zurique entre os anos de 1551 e 1587.

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3.3.6 Dos papagaios pardos

“Mostrarã lhes huũ papagayo pardo que aquy ocapitam traz. tomarãno logo na maão e acenaram peraa terra como que os avia hy” (“Mostraram-lhes um papagaio pardo que aqui o Capitão traz, tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como que os havia aí”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 3r).

“Em quanto andauamos neesa mata acortar alenha atrauesauam alguũs papagayos per esas aruores deles verdes eoutros pardos grandes e pequenos dema neira que me pareçe que avera neesta terra mujtos pero eu nom veria mais que ataa ix ou x” (“Enquanto andávamos nessa mata a cortar lenha atravessavam alguns papagaios por essas árvores – deles verdes e outros pardos, grandes e pequenos – de maneira que me parece que haverá nesta terra muitos, peró eu não veria mais que até nove ou dez”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folios 9v e 10r).

As referências a “papagaios pardos” contidas na “Carta” tratam de duas aves diferentes, detalhe que parece ter prejudicado a infrutífera tentativa de identificação levada a cabo por O.M. de O. PINTO (1942). Trazida por Cabral como xerimbabo, a primeira seria um papagaio-cinzento, Psittacus erithacus Linnaeus, 1758, espécie africana de corpo acinzentado e cauda vermelha assinalado desde a Guiné e Serra Leoa até o norte de Angola e noroeste da Tanzânia (FORSHAW, 1978). Podendo alcançar 33cm de comprimento e 400g de massa corporal, esse psitácida era desconhecido na Europa durante a Antigüidade e a Idade Média, embora estivesse destinado a tornar-se um animal de estimação corriqueiro graças ao “périplo africano” promovido pelos portugueses no século XV (FERRONHA et al., 1993; LLOYD, 1971; POLLARD, 1977; TOYNBEE, 1973; YAPP, 1982). Por conseguinte, a reação manifestada pelos índios brasileiros deve ser entendida como o mero reconhecimento de um Psittacidae exótico não muito diverso daqueles encontrados em suas terras, pois essas aves constituem um grupo natural bastante homogêneo e inconfundível em termos morfológicos (BEDDARD, 1898; FORSHAW, 1978).

Ao contrário do caso anterior, a segunda menção aos “papagaios pardos” diz respeito a uma variedade nativa observada pelos encarregados de cortar lenha nas matas vizinhas. No entanto, a fauna nacional não inclui qualquer psitácida de plumagem comparável a Psittacus erithacus, cujo aspecto geral se afigura muito distante até mesmo dos representantes de colorido cinza-azulado como Cyanopsitta spixii (Wagler, 1832). Tampouco a pulverulência tantas vezes encontrada nas penas dessas aves seria suficiente para produzir semelhante resultado, ainda que boa parte dos indivíduos pertencentes a certas espécies possa apresentar conspícua aparência enfarinhada, conforme exemplifica o significativo nome de “moleiro” ou “papagaio-moleiro” atribuído a Amazona farinosa (Boddaert, 1783) (R. von IHERING, 1940; SICK, 1985). Na verdade, não seria de todo improvável que Caminha houvesse sido traído pelo jogo de luz e sombra das florestas tropicais, efeito insólito capaz de reduzir os mais berrantes padrões de coloração a um pardacento indefinido.

Como se não bastasse, o texto parece sugerir a existência de “papagaios pardos” “grandes” e “pequenos”, embaraço considerável mesmo se levarmos em conta apenas os Psittacidae de cauda curta à feição de Psittacus erithacus, premissa talvez bastante enganosa. Em vista dos registros disponíveis para o sul da Bahia (vide O.M. de O. PINTO, 1935, 1938, 1978; D. SOUZA, 1995), esse elenco estaria composto por Touit melanonota (Allen, 1889), Touit surda (Kuhl, 1820), Forpus xanthopterygius (Spix, 1824), Pionopsitta pileata (Scopoli, 1769), Amazona amazonica (Linnaeus, 1766), Amazona rhodocorytha (Salvadori, 1890), Pionus menstruus (Linnaeus, 1766) e Pionus maximiliani (Kuhl, 1820), além de Amazona vinacea (Kuhl, 1820) e do supracitado Amazona farinosa.

O fato de pelo menos dois “papagaios pardos” distintos estarem envolvidos nos comentários de Caminha parece ter passado por completo despercebido dos poucos

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autores interessados no assunto, sendo que alguns manifestariam estranheza quanto à presença de uma ave africana no Brasil (e.g. M.A. Villela in CAMINHA, 1999b; I.M. SANTOS, 2000). A maioria, contudo, limita-se a repetir as palavras de O.M. de O. PINTO (1942) de forma mais ou menos parcial (e.g. CORTESÃO, 1943; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996). 3.3.7 Dos papagaios verdes

“Resgataram la por cascauees e por outras cousinhas depouco ualor que leuauã papagayos vermelhos mujto grandes e fremosos. e dous verdes pequenjnos” (“Resgataram lá, por cascavéis e por outras coisinhas de pouco valor que levavam, papagaios vermelhos muito grandes e formosos e dois verdes pequeninos”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 9r).

“Em quanto andauamos neesa mata acortar alenha atrauesauam alguũs papagayos per esas aruores deles verdes eoutros pardos grandes e pequenos dema neira que me pareçe que avera neesta terra mujtos pero eu nom veria mais que ataa ix ou x.” (“Enquanto andávamos nessa mata a cortar lenha atravessavam alguns papagaios por essas árvores – deles verdes e outros pardos, grandes e pequenos – de maneira que me parece que haverá nesta terra muitos, peró eu não veria mais que até nove ou dez”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folios 9v e 10r).

“Diego dijaz e afonso Ribeiro o degradado aque ocapitã omtem mandou que em toda maneira la dormisem. volueranse ja denoute por eles nom quererem que la dormisem e trouuerã papagayos verdes” (“Diego Dias e Afonso Ribeiro, o degredado, a que o Capitão ontem mandou que em toda maneira lá dormissem, volveram-se já de noite por eles não quererem que lá dormissem. E trouxeram papagaios verdes”. “Carta de Pero Vaz de Caminha”, folio 10r).

As três passagens da “Carta” relativas aos “papagaios verdes” mostram-se muito ambíguas e quase despidas de elementos descritivos capazes de permitir a identificação das aves mencionadas. Como Caminha emprega o termo “papagaio” para designar desde exemplares medianos de cauda curta como Psittacus erithacus até corpulentas araras rabilongas (vide acima), suas alusões podem corresponder a qualquer psitácida local de plumagem verde, colorido dominante em grande parte das formas neotropicais (FORSHAW, 1978; SALVADORI, 1891). Além disso, o texto sugere a existência de “papagaios verdes” de vários tamanhos, inclusive aqueles “pequeninos” quando comparados a uma arara-vermelha, Ara chloroptera. Considerando o feitio dessas últimas, tal referência assume limitado valor prático, tanto sendo atribuível a um diminuto tuim, Forpus xanthopterygius, com 12cm de comprimento e 26g de massa corporal (fide O.M. de O. PINTO, 1942), quanto a um periquito-verde, Brotogeris tirica (Gmelin, 1788), com o dobro desse porte, ou mesmo a variedades bem maiores.

A impossibilidade de uma resposta conclusiva transforma em candidatos potenciais todos os Psittacidae de plumagem verde – ou com forte presença de verde – registrados para o sul da Bahia, o que supõe um conjunto de 22 espécies pertencentes a 10 gêneros distintos, entre os quais três maracanãs (Ara spp.), três jandaias (Aratinga spp.), cinco periquitos (Pyrrhura spp. e Brotogeris spp.), dois apuins (Touit spp.), duas maritacas (Pionus spp.) e quatro papagaios (Amazona spp.), além do cuiú-cuiú, Pionopsitta pileata, do sabiá-cica, Triclaria malachitacea (Spix, 1824), e do tuim, Forpus xanthopterygius (O.M. de O. PINTO, 1935, 1938, 1978; D. SOUZA, 1995)255. Ao menos nos dias de hoje, Aratinga aurea (Gmelin, 1789), Pyrrhura cruentata (Wied, 1820), Brotogeris tirica, Forpus xanthopterygius, Amazona rhodocorytha, Amazona amazonica e Pionus menstruus continuam sendo bastante comuns e razoavelmente fáceis de observar, conforme demonstraram os trabalhos de campo realizados em Porto Seguro e municípios vizinhos durante os anos de 1994 e 1995 (vide também SILVA-PORTO & TEIXEIRA, 1984).

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Por emularem as conclusões de O.M. de O. PINTO (1942), diversas fontes terminariam relacionando os “papagaios verdes pequeninos” de Caminha a Forpus xanthopterygius (e.g. AZEVEDO & ÁGUAS, 2000; CORTESÃO, 1943; J.M. GARCIA, 1983; NOMURA, 1996, 2005; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996; H.C. SIMÕES, 1999), enquanto os mais avantajados não despertariam atenção ou seriam vistos como representantes dos gêneros Amazona ou Pionus, por exemplo Amazona amazonica, Amazona farinosa, Amazona rhodocorytha, Pionus menstruus e Pionus maximiliani (e.g. M.A. Villela in CAMINHA, 1999b; NOMURA, 1996, 2005; D.G. Dias in MATTOS E SILVA, 1996). Menos ambiciosos, outros autores contentar-se-iam em caracterizar todos os “papagaios” citados como voláteis capazes de “imitar a voz humana” e “de bico adunco, curvo e com quatro dedos, dispostos dois para frente e dois para trás”, definição aplicável a qualquer Psittacidae (e.g. S.B. PEREIRA, 1964). 3.3.8 Dos outros papagaios

“& alcuno di nostri andorno a la terra: donde questi homini sonno: che seria .iii. miglia discosto dal mare e baratorno papagalli” (“E alguns dos nossos andaram até a terra de onde são estes homens, que estaria três milhas distante do mar, e obtiveram por troca papagaios”. “Relato do Piloto Anônimo” in MONTALBODDO, 1507; capítulo LXV).

“E hanno molti ocelli de molte sorte specialmente papagalli de molti colori: fra quelli ce ne e de grandi come galline e altri ocelli molto belli: e de la penna de dicti ocelli fanno cappelli e berette che portano loro” (“E há muitas aves de muitos tipos, especialmente papagaios de muitas cores, entre os quais existem alguns grandes como galinhas e outras aves muito belas. Das penas das ditas aves fazem chapéus e barretes que usam”. “Relato do Piloto Anônimo” in MONTALBODDO, 1507; capítulo LXVI).

De conteúdo muito vago, os comentários sobre “papagaios” existentes no “Relato do Piloto Anônimo” recordam sobremodo o episódio relativo aos “papagaios vermelhos” que tanta admiração parecem ter despertado em Caminha. Com efeito, ao destacar a existência de “papagaios de muitas cores, entre os quais alguns grandes como galinhas”, o autor poderia ter em mente as duas Ara chloroptera adquiridas por membros da tripulação, pois essa espécie robusta de contrastante plumagem vermelha, azul e verde seria o único psitácida assinalado na “Carta” capaz de permitir semelhante comparação. Já o segundo trecho fala apenas de “papagaios” adquiridos por homens em visita à “terra” dos selvagens (i.e. suas moradias no interior) durante o dia 27 de abril de 1500, data exata em que os tripulantes e degredados enviados por Cabral para “andar entre os indígenas” conseguiram, em troca de “cascavéis e outras coisinhas de pouco valor”, uns “papagaios vermelhos muito grandes e formosos e dois verdes pequeninos” (vide acima). Apesar de não ter chamado a atenção de nenhum dos autores interessados no “Relato do Piloto Anônimo” (e.g. J.M. GARCIA, 1983; GREENLEE, 1938; I.M. SANTOS, 2000; H.C. SIMÕES, 1999), o trecho em foco poderia referir-se a qualquer um dos espécimens obtidos nessa oportunidade, pois o termo empregado aplicava-se a todos os psitácidas do Velho ou Novo Mundo durante os séculos XVI e XVII. No entanto, as vistosas araras de grande porte e colorido variegado seriam bem mais atrativas que seus parentes verdes e franzinos, suposição reforçada pelo indiscutível sucesso alcançado por essas aves na Europa.

DISCUSSÃO Desprezadas as citações aos despojos empregados nos artefatos indígenas e na alimentação, os documentos trabalhados abrigam 14 referências de caráter zoológico, mencionando dois moluscos, um crustáceo, dois peixes, oito aves e um único mamífero aquático (vide Tab.1). Como o próprio Caminha reconhece não ter encontrado muitos animais durante suas deambulações em terra firme, esse limitado

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elenco poderia refletir a proverbial dificuldade dos leigos em observar determinados componentes da fauna sul-americana. Semelhante justificativa, porém, não explica a ausência de comentários sobre insetos, aranhas e outros pequenos artrópodes, lacuna que aponta para um maior interesse em seres vivos considerados relevantes ou de alguma utilidade.

Malgrado não pretendam descrever os animais de forma sistemática e abrangente, esses testemunhos contêm numerosas alusões implícitas a um sistema de classificação bastante simples e de cunho popular que apresenta vários pontos em comum com determinadas propostas aceitas nos meios eruditos da época (vide DELAUNAY, 1962). Categorias como “aves” e “peixes” estão bem estabelecidas, apesar de esta última seguir a tradição de incorporar os mamíferos aquáticos, crença mantida à revelia dos ensinamentos de Aristóteles durante quase todo o medievo e início da Idade Moderna (ARISTÓTELES, 1965-1991; PELLEGRIN, 1982), sendo contestada a partir estudos sobre os cetáceos vindos à luz já na segunda metade do século XVI (e.g. BELON, 1551).

Em virtude de seu caráter expedito, as informações disponíveis não permitem maiores considerações quanto aos moluscos e crustáceos, embora o relato de Caminha sobre os marinheiros terem saído para “buscar marisco” e voltado apenas com camarões e conchas roladas sugira que tal denominação poderia ser estendida a qualquer invertebrado aquático comestível. Junto com os verdadeiros peixes, cetáceos, focas e outras espécies diversas, esses “mariscos” compunham a vasta classe dos “animais aquáticos” ou “peixes” no sentido conferido ao termo por antigos naturalistas (e.g. RONDELET, 1554-1555). Sem embargo, inúmeros elementos dessa categoria parecem ser vistos sobretudo como alimento, refletindo tanto o irrestrito utilitarismo sempre presente nas relações do Ocidente com o chamado “mundo natural” (CROSBY, 1986; THOMAS, 1983; TURNER, 1983), quanto a necessidade de caracterizar as terras recém-descobertas como uma aquisição à altura da Coroa portuguesa. Nesse esforço, a “Carta de Pero Vaz de Caminha” chega a aproximar-se dos famosos “livros de viagem” tão apreciados no século XVI, louvando sem cessar a excelência dessas novas possessões e seus produtos (vide CAMPBELL, 1988; J.B. de CARVALHO, 1966; GIUCCI, 1992; MOLLAT, 1984).

Por outro lado, os originais em foco evidenciam os sérios problemas enfrentados pelos viajantes em nomear um vasto contingente de animais até então ignorados e bastante diferentes daqueles da Europa. Herdeiros da frágil tendência renascentista de unir a fidelidade aos clássicos e a atração pelas maravilhas do além-mar com um racionalismo precursor do futuro Século das Luzes, os quinhentistas muitas vezes articulariam as informações recém-adquiridas através de analogias, velho conceito familiar ao pensamento grego e medieval que lhes permitia divisar semelhanças – ou até mesmo uma identidade – entre os exóticos seres oriundos de terras distantes e as espécies conhecidas desde a Antigüidade sem demonstrar maior preocupação com o espaço geográfico, lapso destinado a produzir os efeitos mais inusitados ao longo dos séculos (TEIXEIRA & PAPAVERO, 1999).

Muito presente nesse corpo documental (vide também J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001), tal raciocínio propiciaria desde comparações adequadas até esforços bem menos felizes. Em geral, esse tipo de artifício mostrava-se eficaz para distinguir categorias mais abrangentes como “camarões” e “tubarões”, ou mesmo organismos de alguma forma similares a um modelo característico, fato bem exemplificado pelo uso de termos como “rola”, “bergigão” e “raposa” para designar indistintamente táxons do Novo Mundo, da África ou da Ásia (FERRONHA et al., 1993). No entanto, os animais mais estranhos aos olhos europeus inspirariam tentativas assaz vacilantes, como “pegas brasileiras” ou “aves pretas como pegas”, enquanto aqueles sem nenhum

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paralelo com a fauna corrente terminariam sendo descritos como “prodígios” além de qualquer compreensão, circunstância capaz de transformar os peixes-boi tropicais em espantosos “peixes providos de orelhas” (CÉARD, 1977; KAPPLER, 1999; LECOUTEUX, 1995). Com o passar do tempo, essas limitações seriam contornadas pela assimilação de vasto vocabulário autóctone, bem como pela criação de neologismos sem qualquer origem indígena.

Não deixa de ser curioso que os tupis de nosso litoral pareçam ter lançado mão de mecanismo idêntico ao lidar com as espécies do Velho Mundo introduzidas logo após a descoberta. Com efeito, um papagaio africano foi logo reconhecido pelos guerreiros embarcados na capitânia, enquanto uma simples galinha, Gallus gallus (Linnaeus, 1758), provocaria verdadeira comoção. Não deve causar surpresa, portanto, o fato de psitácidas africanos e asiáticos trazidos décadas mais tarde para o Brasil receberem dos habitantes locais os mesmos nomes de “tui” ou “ajuru” aplicados às formas nativas (TEIXEIRA, 1992b, 1995, 1999), enquanto o neologismo “arinhã”, mera corruptela de “galinha”, já existia por volta do terceiro quartel do século XVI, sendo aplicado tanto às galinhas (“arinhã-mirim”) quanto aos perus, Meleagris gallopavo Linnaeus, 1758 (“arinhã-açu”; fide LERY, 1578). Menos comuns durante os primeiros momentos da colonização, os carneiros, Ovis aries Linnaeus, 1758, e as cabras, Capra hircus Linnaeus, 1758, não teriam despertado o mesmo interesse, passando por um tipo peculiar de veado (“suasú”), batizado de “suasú-me” em função de seu balido (MARCGRAVE, 1648; MARTIUS, 1863; STRADELLI, 1929).

Conforme ressalta GREENLEE (1938), as exuberantes araras-vermelhas logo se afirmariam como a mais surpreendente de todas as “maravilhas” trazidas pela frota de Cabral, destacando-se a ponto de transformar a recém-descoberta “Terra de Santa Cruz” em “Terra dos Papagaios”, expressão vinda à luz pela primeira vez na carta de Giovanni Matteo Camerini, “il Cretico”, datada de 27 de junho de 1501. Além de copiosas citações em manuscritos e crônicas impressas, essas aves apareceriam nos mapas como elementos característicos da região, prática extensível a diversos representantes típicos de outras biotas ao redor do globo (teste GEORGE, 1969). Apesar de envolver figuras demasiado estilizadas, uma relação desse tipo pode ser percebida no chamado “Atlas Miller” de Lopo Homem (1519), atingindo sua plenitude com o belo trio de araras-vermelhas que ornamenta o litoral brasileiro no famoso “Planisfério de Cantino” (1502) (Figs.16-17). No entanto, essa última carta geográfica na verdade retrata três araracangas, Ara macao (Linnaeus, 1758), detalhe revelador da dificuldade do artista em discernir as duas araras de grande porte e plumagem escarlate existentes no Novo Mundo. Sedimentado no século XVII, tal engano deveria sustentar-se por mais de 300 anos, sendo desfeito com a descrição de Ara chloroptera como espécie independente em meados do século XIX (GRAY, 1859; TEIXEIRA, 1997).

Guardadas as devidas proporções, apenas os comentários sobre o peixe-boi, Trichechus manatus, do “Relato do Piloto Anônimo” alcançariam sucesso parecido, repercussão devida ao gosto europeu por narrativas fabulosas e ao destaque conferido a esse texto até o advento da “Carta de Pero Vaz de Caminha”. Exceto pelos trechos dedicados aos indígenas, nenhuma outra parte do “Relato do Piloto Anônimo” seria tão repetida pelos diversos cronistas do século XVI, perdurando na literatura relativa ao Novo Mundo e às viagens portuguesas por décadas a fio (e.g. CASTANHEDA, 1551; GOES, 1566). Ao fascínio dos “prodígios” viria somar-se uma perplexidade crescente face à descoberta de um número cada vez maior de animais sem paralelo com a fauna conhecida até então, evento importante o suficiente para levar Bartolomeo Marchionni a admitir que a frota de Cabral havia levado para Lisboa “muitas espécies de aves e animais por nós desconhecidos e jamais vistos, à maneira daquelas coisas que Plínio contava nas suas histórias, [as quais] eram consideradas mentirosas e – pelo que hoje se vê – pode-se dizer que tinham algo de verdade”256. Ao menos nos círculos mais

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cultivados, esse caudal ininterrupto de novidades terminaria por gerar profundas inquietudes, reforçando indiscretas conjeturas acerca da pluralidade da Criação e dúvidas heréticas sobre a cronologia exposta no Livro Sagrado, criando sérias indagações quanto à verossimilhança e pertinência de diversas passagens bíblicas (GERBI, 1978, 1993; PAPAVERO et al., 1997).

Fig.16- O Brasil no chamado “Planisfério de Cantino” (1502), com o detalhe das três araracangas, Ara macao, representadas. Original depositado na “Biblioteca Estense”, Módena.

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Fig.17- O Brasil no chamado “Atlas Miller” de Lopo Homem (ca. 1519), com o detalhe de alguns psitácidas representados. Original depositado na “Bibliothèque de France”, Paris.

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De pouca monta para o pensamento do século XVI, os documentos sobre a viagem de Cabral adquirem renovada importância para a História Natural nos dias de hoje, prestando-se à inequívoca demonstração de que numerosos animais tiveram suas áreas de ocorrência modificadas em tempos históricos. Na verdade, ao registrar a presença de peixes-boi, Trichechus manatus, e de araras-vermelhas, Ara chloroptera, para o sul da Bahia, os relatos de Pero Vaz de Caminha e do “Piloto Anônimo” oferecem uma forte evidência das grandes alterações observadas na distribuição de vários elementos da fauna brasileira ao longo dos últimos quinhentos anos, fenômeno cuidadosamente esquecido por boa parte dos biólogos contemporâneos (TEIXEIRA, 1999, 2002). No caso, essa lacuna constitui exemplo bastante eloqüente do desprezo conferido aos dados históricos pela bibliografia zoológica convencional, havendo trabalhos incapazes até mesmo de levar em conta publicações trazidas à luz há poucas décadas (compare DOMNING, 1981, 1982; G.B.A. da FONSECA et al., 1994; O.M. de O. PINTO, 1938, 1978; TEIXEIRA, 1992b, 1999; WHITEHEAD, 1977, 1978; WILSON & REEDER, 1992 versus EISENBERG & REDFORD, 1999; EMMONS, 1997; FORSHAW, 1978; HOYO et al., 1997; JUNIPER & PARR, 1998; OLMOS, 1997; D. SOUZA, 1995).

Apesar de bem menos conclusiva, a menção aos fura-buchos, Puffinus sp., também seria digna de nota, podendo constituir tanto mera referência a migrantes de Puffinus puffinus, quanto um indício de que representantes do gênero antes procriavam nas águas tropicais do Atlântico Sul, hipótese não de todo descabida caso consideremos o material de Puffinus pacificoides, bem como os enigmáticos casais reprodutores de Puffinus sp. assinalados recentemente em Fernando de Noronha e no litoral do Espírito Santo (EFE & MUSSO, 1994; SCHULZ NETO, 1995; SOTO & FILIPPINI, 2000). Ao invés de refletir as tão decantadas alterações climáticas (sensu SCHREIBER & SCHREIBER, 1989), tal descoberta talvez mereça ser entendida como vestígio de um conjunto de aves marinhas bem diverso do atual em termos de composição, estrutura e padrão de ocorrência (TEIXEIRA & NACINOVIC, 2002).

NOTAS 1 A extensa bibliografia disponível sobre o tema abrange desde estudos gerais relativos à expansão portuguesa até trabalhos específicos sobre o descobrimento do Brasil, além de biografias e até mesmo romances ou ensaios de caráter popular. No intuito de fornecer uma breve amostragem de todas essas tendências (vide também PEDROSO, 1912), destacaríamos as contribuições de ABREU (1900, 1928), ALMEIDA (1913), J. BASTOS (1900), BOXER (1969), CALMON (1939), CASTELLO-BRANCO (1974), CORTESÃO (1922, 1944, 1960), A.F. da COSTA (1937, 1938), C. COSTA (1896), COUTINHO (1940, 1943), COUTO (2000), J.S. da S. DIAS (1973), M.N. DIAS (1964, 1967), F. da FONSECA (1900), L.A. da FONSECA (1999a, 1999b, 2001), GALVANI (1999), J.M. GARCIA (1983), GREENLEE (1938), GUEDES (1975, 1997, 2003), HOLANDA (1992), JOHNSON & SILVA (1992), LEITE (1931, 1958-1962), LEONE (1969), LEY (1947), J.M. da S. MARQUES (1971), MORISON (1940), MOURÃO (2001), NEVES (1991), M.S. PEREIRA (1979), PERES (1949, 1971), PIMENTA (1942), PRESTAGE (1933), RADULET (2000), I.M. SANTOS (2000), J.M. de SOUZA (2001), T.O.M. de SOUZA (1944, 1946, 1956, 1958, 1964), L.H.D. TAVARES (1999) e VARNHAGEN (1927).

2 A saborosa descrição do “peixe monstruoso” pertencente ao “Relato do Piloto Anônimo” constitui um bom exemplo nesse sentido, tendo sido repetida – com maiores ou menores alterações – em numerosos textos referentes à viagem de Cabral, onde amiúde constitui o único informe sobre a fauna brasileira. De acordo com CASTANHEDA (1551), esse peixe “da grossura de um tonel”, com “três varas e meia de comprimento”, “era redondo, tinha a cabeça e os olhos como os do porco, as orelhas de elefante” e “não tinha dentes”, mas apresentava “o rabo do comprimento daquele de um cavalo”.

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Datada de 1561, a narrativa de Bartolomeu de las Casas menciona “um peixe mais grosso que um tonel, do comprimento de dois tonéis”, com “a cabeça e olhos de porco e as orelhas como as de elefante”, o qual “não tinha dentes” embora possuísse “dois buracos na parte de baixo”, “rabo de um côvado” com “outro tanto de largura” e o couro “como o de porco, com um dedo de gordura” (LAS CASAS, 1995). Da mesma forma, GOES (1566) fala de “um peixe mais grosso que um tonel e tão comprido como dois”, com “a cabeça e os olhos como os de porco, sem dentes, as orelhas da feição das de elefante, o rabo de um côvado de comprido e outro de largo, a pele como a de porco, da grossura de um dedo”.

3 Obter todas as edições da “Carta de Pero Vaz de Caminha” constitui tarefa das mais ingratas, superada apenas pela impossibilidade de reunir as incontáveis contribuições publicadas até hoje sobre o assunto. Para a realização do presente ensaio, foram consultados os textos de ABREU (1908), ABUD et al. (1968), AGUILAR (2000), ALBUQUERQUE (1989), ALMEIDA (1913), J. AMADO & FIGUEIREDO (2001), A.A.B. de ANDRADE (1970, 1972), ARROYO (1963, 1976), AZEVEDO & ÁGUAS (2000), BAIÃO (1940), BARRETO (1983), BURNS (1967), CAMINHA (1826, 1892, 1939, 1957, 1965, 1968, 1974, 1999a, 1999b, 2000, 2002a, 2002b), CARREIRO (2001), J.B. de CARVALHO (1966), M.B. de CARVALHO (1960), CASAL (1817), S. CASTRO (1984, 1985, 1996, 2003), CINTRA (1922), COELHO (1892), CORTESÃO (1943), A.F. da COSTA (1948), F.A.P. da COSTA (1900a, 1900b), C.M. DIAS (1921-1924), B. da FONSECA (ca. 1946), F. GARCIA (1900), J.M. GARCIA (2000), GREENLEE (1938), GRIECO (2002), GRUPIONI (2000), GUEDES (2003), INÁCIO & LUCA (1993), LEY (1947), J.F. LISBOA (1853), MAGALHÃES & MIRANDA (1999), MENDONÇA & VENTURA (1999), OLIVEIRA (1948), P.R. PEREIRA (1999, 2002), S.B. PEREIRA (1964), M. de S. PINTO (1933, 1934), PRADO (1998), PRADO & SILVA (1965), RADULET (2000), D. RIBEIRO & MOREIRA-NETO (1992), J. RIBEIRO (1910), M.A. RIBEIRO (2003), I.M. SANTOS (2000), SEABRA (2000), H.C. SIMÕES (1999), M. SIMÕES (1985), T.O.M. de SOUZA (1944, 1946), TEIXEIRA & PAPAVERO (2003), TUFANO (1999), UNALI (1983), VARNHAGEN (1877, 1927), VENTURA (1942), VILLELA (1999) e F.M. de S. VITERBO (1902). Já os diversos trabalhos de divulgação, livros de arte e títulos voltados para o público infanto-juvenil encontram-se bem exemplificados por BOCCHI (ca. 1964), BRAGA (1968), BRANDÃO (1999), BUENO (1998), OLIVIERI & VILLA (1998) e TERNI (2000).

4 Conforme o original. Trata-se de Dom Manuel I, “o Venturoso”, Rei de Portugal entre 1495 e 1521. Filho mais novo do infante Dom Fernando, Duque de Viseu, chegaria ao trono português graças à morte prematura dos irmãos e de vários acontecimentos políticos ocorridos nos primeiros anos do reinado de Dom João II. O marcado viés expansionista observado durante os 26 anos de seu governo levaria Portugal a empreender numerosas viagens marítimas e a construir dilatado império ultramarino (J.P. COSTA & THOMAZ, 1994).

5 Entre 17,97km e 23,97km, caso essa seja uma referência à antiga “légua marítima” utilizada pelos navegadores portugueses, equivalente a cerca de 5,992km (LAGARTO, 1994c).

6 Em latim no original, expressão que pode ser traduzida como “a saber”, “isto é” etc. (SARAIVA, 1927).

7 “Pero escolar” no original. Trata-se de Pero Escobar, piloto português dos séculos XV e XVI. Em 1471, durante uma das explorações organizadas por Fernão Gomes, Pero Escobar atingiria a costa da Mina na companhia de João de Santarém, encontrando as ilhas São Tomé, Ano Bom e Príncipe. Entre 1482 e 1485, acompanharia as viagens de Diogo Cão que levaram à descoberta da foz do rio Zaire. Anos depois participaria da primeira viagem de Vasco da Gama às Índias como piloto da “Bérrio”, embarcação comandada por Nicolau Coelho (LAGARTO, 1994b).

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8 “Se perdeo da frota vaasco datayde” no original. Segundo CASTANHEDA (1551), essa embarcação teria retornado a Lisboa após desgarrar-se da esquadra de Cabral durante uma tempestade, afirmativa negada pelo “Relato do Piloto Anônimo” (vide nota 176). Vasco de Ataíde talvez fosse aparentado com Pero de Ataíde, fidalgo que comandou a caravela “São Pedro” na frota de Cabral e participou da segunda viagem de Vasco da Gama às Índias em 1502, falecendo sete anos depois em Moçambique após naufrágio ocorrido durante a viagem de retorno de Dom Francisco de Almeida, Vice-Rei da Índia nomeado por Dom Manuel I em 1505 (J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; M.T. AMADO, 1994a).

9 “Naao” no original. A rigor, as naus portuguesas empregadas por Vasco da Gama e Cabral seriam embarcações de 100 a 200 tonéis com até dois pavimentos providas de castelos de proa e popa, estando armadas de três mastros com panos redondos no traquete e no grande, trazendo um latino na mezena (GUEDES, 1975; LEITÃO & LOPES, 1974). No entanto, os originais aqui examinados parecem aplicar o termo para qualquer navio, sobretudo os de maior porte.

10 “Ocapitam” no original, em outras passagens subseqüentes “capitam moor”. Trata-se de Pedro Álvares Cabral, nobre português nascido em Belmonte por volta de 1467, filho de Fernão Cabral e Isabel de Gouveia. Moço fidalgo na corte de Dom João II, seria agraciado no reinado de Dom Manuel I com o foro de membro do conselho, o hábito da Ordem de Cristo e uma pensão anual em dinheiro. Casou-se com Isabel de Castro, sobrinha do influente Afonso de Albuquerque e neta dos Reis Dom Fernando de Portugal e Dom Henrique de Castela, tendo quatro filhos. Sem qualquer envolvimento anterior com as navegações ultramarinas, Cabral parece ter sido escolhido para comandar a segunda viagem às Índias graças a influências políticas e sua inquestionável lealdade ao Rei, pois ao Capitão-Mor cabia o destacado papel de representante da Coroa. Não existem evidências que chegasse a receber qualquer outra missão importante em Portugal ou no além-mar, pois teria caído em desgraça pela perda de quase metade da esquadra e pelo desastroso conflito deflagrado em Calicute. Retirou-se para Santarém, onde morreu por volta de 1520 (J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; DANTAS, 1968; LEONE, 1969; NEVES, 1991; PERES, 1949, 1971).

11 “Easy segujmos nosso caminho per este mar delomgo” no original. Conforme destaca CORTESÃO (1943), a expressão arcaica “de longo” diria respeito ao rumo leste-oeste, refletindo a concepção da época de que as maiores distâncias estariam entre o ocidente e o oriente ou vice-versa. Proposta pelo menos desde o início do século passado (teste J. RIBEIRO, 1910), tal interpretação vem sendo acatada por numerosos autores contemporâneos, os quais soem encarar esse trecho como o mero registro do rumo tomado pela esquadra após a passagem pelo arquipélago do Cabo Verde, ponto de partida da famosa manobra da “volta do mar largo” efetuada pelos navegadores portugueses (vide COUTINHO, 1956-1957; GUEDES, 1975).

12 “Ataa terça feira doitauas de pascoa que foram xxj dias dabril” no original. Tratam-se dos oito dias compreendidos entre a Páscoa e o domingo seguinte, chamado de Pascoela. Como a Páscoa de 1500 foi celebrada em 19 de abril, a terça-feira das oitavas da Páscoa corresponderia ao dia 21 de abril e a Pascoela, a 26 de abril.

13 Entre 3.954,72km e 4.014,64km (vide nota 5).

14 “Botelho” no original. Certos autores (e.g. BUENO, 1998) cometem o equívoco de atribuir essa passagem a um fuco, Fucus vesiculosus, espécie não assinalada para a costa brasileira. Na verdade, a alga mencionada por Caminha parece ser um sargaço, Sargassum sp., conforme proposto pelos botânicos que estudaram o assunto (e.g. FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002; LIMA, 1984).

15 “Rabo dasno” no original. Provável referência a uma espécie do gênero Halodule, angiospermas marinhas que crescem sobre os rochedos mas podem se desprender e

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ser arrastadas pelas correntes. Tanto Halodule wrightii quanto Halodule emarginatus foram assinalados na praia de Coroa Vermelha (FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002).

16 “E neeste dia aoras de bespera” no original. Embora as horas canônicas variassem sobremaneira conforme a localidade e as estações do ano, parece razoável supor que as “vésperas” mencionadas por Caminha correspondessem ao período da oração da tarde, portanto entre cerca das 16:30 horas e o pôr do sol (vide também CORTESÃO, 1943).

17 Em torno de 44m, caso se trate da mesma “braça” usualmente empregada pelos navegadores portugueses do século XVI, a qual correspondia a “oito palmos” ou 1,76m (LEITÃO & LOPES, 1974; PIMENTEL, 1699).

18 Cerca de 35,95km (vide nota 5).

19 Cerca de 33,44m (vide nota 17).

20 “Aly jouuemos todaaquela noute” no original. De acordo com BLUTEAU (1712-1721) e J. de S.R. de VITERBO (1798-1799), “jouver” ou “jouvar” seriam verbos arcaicos equivalentes a “estar” ou “conservar-se em algum lugar”.

21 “Eos naujos pequenos diãte himdo” no original. Provável referência à naveta de mantimentos e/ou às três caravelas que integravam a frota, pois tais navios geralmente assumiam a dianteira em investidas desse tipo por serem mais rápidos e manobráveis (vide nota 108). Enquanto as navetas não passavam de pequenas embarcações armadas como as naus (vide nota 9), as caravelas alcançavam de 16m a 18m de quilha e possuíam uma ou duas cobertas, bem como castelo na popa, podendo apresentar dois ou três mastros com pano latino. Nas chamadas “caravelas redondas” como a “Nossa Senhora da Anunciada” (vide nota 108), o mastro de proa tinha pano redondo, enquanto os restantes largavam com o pano latino convencional (COUTINHO, 1956-1957; H.Q. da FONSECA, 1934; GUEDES, 1975; LEITÃO & LOPES, 1974).

22 Cerca de, respectivamente, 29,92m, 28,16m, 26,40m, 24,64m, 22,88m, 21,12m, 17,60m e 15,84m (vide nota 17).

23 Cerca de 2,99km (vide nota 5).

24 “Todos lancamos amcoras em djreito daboca dhuũ Rio” no original. Atribuída por certos autores ao rio Caraíva (o “Graminuam” de CÂNDIDO, 1900) ou ao rio Caí (e.g. C.M. DIAS, 1921-1924; GREENLEE, 1938), essa referência na verdade parece corresponder ao rio do Frade, conforme indica o conclusivo estudo de GUEDES (1997).

25 “Batees” no original. Conferia-se o nome de “batel” à maior e mais possante de todas as embarcações auxiliares levadas pelas naus e galeões. Eram geralmente transportados na primeira coberta e seu comprimento alcançava cerca de 1/3 da quilha do respectivo navio (LEITÃO & LOPES, 1974).

26 “Esquifes” no original. Atingindo entre 8m e 10m de comprimento, os esquifes não passavam de embarcações de pequeno porte com a forma de uma baleeira usadas em diversos serviços nas naus e galeões, estando armados com quatro ou seis remos (LEITÃO & LOPES, 1974).

27 “Njcolaao coelho” no original. Comandante de uma das naus da frota de Cabral, Nicolau Coelho já havia ocupado o posto de capitão da “Bérrio”, uma das três embarcações que participaram da primeira viagem de Vasco da Gama às Índias nos anos de 1497-1499. Em 1503, partiria de novo para o Oriente acompanhando os primos Afonso e Francisco de Albuquerque, morrendo durante o regresso no naufrágio da “Faial” (LAGARTO, 1994a).

28 “Comtinhas brancas meudas que querem pareçer daljaueira” no original. Vide nota 243.

29 “Anoute segujmte ventou tamto sueste cõ chuuaçeiros que fez caçar as naaos” no original. “Caçar” ou “ir à caceia” significa ser levado pelo vento ou pela correnteza arrastando os ferros de ancoragem no fundo (LEITÃO & LOPES, 1974).

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30 “Se achasem pouso seguro peraas naaos que amaynasem” no original. Por “amainar” entende-se o ato de arriar parcialmente as velas, de forma a manter a embarcação mais ou menos estacionária (LEITÃO & LOPES, 1974).

31 Cerca de 59,92km (vide nota 5).

32 “Huũ aRecife com huũ porto dentro muito boo e muito seguro com huũa muy larga entrada” no original. Apesar da insistência de VARNHAGEN (1877) em identificar essa localidade como a atual baía de Porto Seguro, quase todos os autores concordam que Caminha estaria se referindo à baía de Cabrália e ao recife – ou ilhéu – encontrado próximo à ponta da Coroa Vermelha (vide GUEDES, 1975).

33 Cerca de 5,99km (vide nota 5).

34 Cerca de 19,36m (vide nota 17).

35 “Afonso lopez” no original. Os comentários de Caminha desenham Afonso Lopes como piloto da nau capitânia. Embora não existam maiores informações a seu respeito, esse marinheiro parece ter sobrevivido à viagem de Cabral, sendo provavelmente o mesmo indivíduo mencionado em documentos na Torre do Tombo como “piloto d’El-rei Dom Manuel asy nas partes de Guiné como das Indias”. Responsável por uma certa nau “Santiago” carregada de especiarias, teria recebido uma tença anual de 5.000 reais concedida pelo monarca em 30 de março de 1504 (F.M. de S. VITERBO, 1898).

36 “Meteose loguo no esquife asomdar oporto demtro e tomou em huũa almaadia” no original. Referência às pirogas que certas tribos da costa africana escavavam em troncos ou construíam com cascas de árvores (CORTESÃO, 1943; FARIA, 1850). No entanto, as embarcações descritas no texto assemelham-se a pequenas jangadas, em nada recordando as famosas canoas de duas proas dos tupis (vide CÂMARA, 1937; MÉTRAUX, 1928; A. Métraux in STEWARD, 1948).

37 Conforme o original. Segundo M.A. RIBEIRO (2003), essa expressão arcaica muito utilizada por Caminha procura estabelecer uma relação distributiva dos moldes “um a cada um” ou “um em cada um”. Vide também HUBER (1986).

38 “De compridam dhuũa maão trauessa” no original. Essa “mão travessa” seria uma antiga medida equivalente a 45% do palmo comum, portanto alcançando cerca de 10cm (LEITÃO & LOPES, 1974). Nos dias de hoje, a mesma expressão refere-se à largura de um punho fechado.

39 “E oque lhe fica antre obeiço eos demtes he feito coma Roque denxadrez” no original. Esculpida em forma de uma grosseira meia-lua útil para sua fixação contra os dentes ou as gengivas, a porção basal dos adornos labiais utilizados pelos tupiniquins apresentava vaga semelhança com a extremidade apical do roque, peça de xadrez correspondente à torre dos nossos dias. Algo inusitada à primeira vista, a comparação feita por Caminha revela-se bastante apropriada se levarmos em conta, por exemplo, os tembetás dos tupinambás figurados por STADEN (1557), tanto mais que peças semelhantes têm sido descobertas em sítios arqueológicos do litoral da Bahia (H. von IHERING, 1904; MÉTRAUX, 1928; A. Métraux in STEWARD, 1948).

40 “Os cabelos seus sam coredios e andauã trosqujados de trosquya alta mais que de sobre pemtem” no original. Conforme mencionado por J. RIBEIRO (1910), a locução “sobre-pente” significaria “por alto” ou “de leve” (vide também CORTESÃO, 1943).

41 “E huũ deles trazia per baixo da solapa de fonte afomte pera detras huũa maneira de cabeleira de penas daue amarela” no original. Objeto de várias discussões resumidas por CORTESÃO (1943), essa passagem parece descrever que um dos indígenas trazia, de fronte a fronte sob as madeixas de seus cabelos, um basto adereço de penas amarelas. Todas as dúvidas giram em torno do real

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significado de “solapa” ou “cabeladura solapada”, expressão vista por determinados autores (e.g. FARIA, 1850; A. de M. SILVA, 1789) como sinônimo de um cabelo crescido e solto.

42 “Decompridam dhuũ couto” no original. O “couto” seria uma antiga medida de comprimento equivalente ao côvado (LEITÃO & LOPES, 1974), portanto alcançando cerca de 66cm (vide nota 192).

43 “Amdaua pegada nos cabelos pena e pena com huũa comfeiçam branda coma cera e nõ no era” no original. Da melhor maneira possível, essa passagem procura descrever o material com que os tupis colavam plumas no cabelo (vide MÉTRAUX, 1928; SOUSA, 1938), substância identificada por certos autores como a resina da almacéga ou breu, Protium sp., representante das Burseraceae muito comum nas matas litorâneas (FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002). O arranjo obtido seria comparado com uma espécie de “cabeleira” ou “peruca” não apenas por Caminha, mas também por outros cronistas posteriores como YVES D’ÉVREUX (1615).

44 “Sancho de toar” no original. Casado com a fidalga lusitana Leonor de Vilhena, Sancho de Tovar era filho de Martim Fernandes e pertencia a uma nobre família castelhana que passara a residir em Portugal. Ao retornar a Castela em 1500, seu pai acabaria sendo condenado à morte por haver tomado partido de Afonso V contra os Reis Católicos. Buscando vingança, Sancho de Tovar mataria o corregedor responsável pela degola e buscaria asilo na corte de Dom Manuel I, perdendo seus direitos à senhoria de Cevico. Viajou na esquadra de Cabral como segundo capitão, tendo sob o seu comando a nau “El-Rei”, sota-capitânia da frota (J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; N. de CASTRO, 1997; M.S. PEREIRA, 1979).

45 “Simam de miranda” no original. Responável por uma das naus da esquadra de Cabral, o fidalgo Simão de Miranda de Azevedo era filho de Diogo de Azevedo e neto de Martim Afonso da Charneca, arcebispo de Braga. Casou-se com Joana Correia, filha do feitor régio Aires Correia (vide nota seguinte). Em 1512, realizaria uma nova viagem à Índia comandando uma das embarcações da armada de Jorge de Melo. Morreu por volta de 1515 como capitão de Sofala (J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; N. de CASTRO, 1997; M.S. PEREIRA, 1979).

46 “Aires corea” no original. Rico e experimentado mercador de Lisboa, Aires Correia falava árabe fluentemente e já negociara em Marrocos. Viajava na frota de Cabral como feitor-mor da esquadra e feitor régio do futuro entreposto comercial de Calicute. Tal como Caminha, seria morto durante os combates travados nessa cidade em outubro ou dezembro de 1500 (GREENLEE, 1938).

47 “Confejtos fartees mel e figos pasados” no original. Os fartes não passavam de tiras de massa de farinha dobradas ao redor de um recheio composto por açúcar, cravo, canela, amêndoas pisadas e miolo de pão ralado (BLUTEAU, 1712-1721). Outras fontes, entretanto, descrevem esse doce como um bolo de massa envolto em farinha (e.g. M.A. RIBEIRO, 2003).

48 “Tã malaues” no original. Expressão arcaica não muito comum equivalente a “um tanto”, “um pouco” ou “alguma coisa” (vide ALI, 1971; BLUTEAU, 1712-1721; A. de M. SILVA, 1789).

49 “Albarada” no original. Segundo os comentários de BLUTEAU (1712-1721), as “albarradas” eram vasos de certo porte providos de duas asas.

50 “Suas vergonhas as quaaes nõ herã fanadas” no original. No caso, “fanado” deve ser entendido como sinônimo de “circuncidado” (vide também BLUTEAU, 1712-1721).

51 Entre 10,56m e 12,32m (vide nota 17).

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52 Entre 8,80m e 10,56m (vide nota 17).

53 “Bertolameu dijaz” no original. Escudeiro da casa real e um dos mais destacados marinheiros portugueses, Bartolomeu Dias foi o primeiro a alcançar o Cabo da Boa Esperança em 1488, participando da subseqüente viagem de Vasco da Gama às Índias em 1497-1499. Acompanhava a armada de Cabral como principal navegador e comandante de uma das duas embarcações incumbidas de estabelecer uma feitoria na cidade africana de Sofala (vide nota 110), mas desapareceu no dia 23 de junho de 1500 durante a forte tempestade que devastou a frota nas cercanias do Cabo da Boa Esperança (ALBUQUERQUE, 1987; L.A. da FONSECA, 1987; VASCONCELOS, 1942).

54 “Degradado” no original. Igualando-se ao desterro ou a trabalhos forçados para a Coroa, a pena de degredo era sistematicamente empregada tanto na perseguição de certos grupos sociais como os ciganos e os cristãos-novos, quanto na punição de indivíduos condenados pelos mais variados delitos, inclusive adultério, quebra de promessa, sodomia, feitiçaria, mendicância, prostituição, furto, agressão, homicídio e crime de lesa-majestade. A exemplo do que relata Caminha, esses infelizes eram deixados em terras distantes para aprender a língua e costumes locais, expiando seus crimes ao se tornarem úteis para o projeto de expansão colonial. Bastante ampliada após 1530, a prática do degredo terminaria servindo para eliminar os “elementos indesejáveis” da sociedade portuguesa, tornando-se uma ferramenta atuante no povoamento das terras brasileiras (E.V. da COSTA, 1956; PIERONI, 2000; VAINFAS, 2000).

55 “Dom joham teelo” no original. A julgar pelos termos utilizados por Caminha, este seria um fidalgo de projeção bem conhecido do Rei Dom Manuel I a ponto de nenhum esclarecimento adicional tornar-se necessário. Talvez fosse um dos Telos, Teles ou Telles de Menezes, mais especificamente Dom João de Menezes, 1o Conde de Tarouca, filho de Isabel de Castro e Dom Duarte de Menezes, 3o Conde de Viana do Alentejo. Governador de Tânger e membro da Ordem de São João, o personagem em foco viria a ser um dos nobres mais destacados de sua época, tendo ocupado os postos de mordomo-mor, vedor da fazenda real e alferes-mor da casa de Dom Manuel I. Nomeado Prior do Crato em 1508, morreria por volta de 1522 (A.B. FREIRE, 1930; GAIO, 1938-1941).

56 “Afonso Ribeiro” no original. Criado de João Telo (vide acima), Afonso Ribeiro foi condenado ao degredo na Índia por conta de um crime de morte do qual seria inocente, injustiça que parece ter levado sua noiva, uma certa Elena Gonçalves, a morrer de desgosto no convento de Enxobregas (PIERONI, 2000; M. de Vasconcelos in D. VIEIRA, 1903). Vide também nota 54.

57 “Epasarã huũ Rio que perhy core dagoa doce de mujta agoa que lhes daua pela braga e outros mujtos cõeles e foram asy corẽdo aalem do Rio antre huũas moutas depalmas” no original. A maioria das fontes consultadas identifica esse rio como o Mutari. Já as “moitas de palmas” foram atribuídas por LIMA (1984) a touceiras de piaçava, Attalea funifera, palmeira muito comum no litoral da Bahia.

58 “Manjlhas” no original, alusão a braceletes ou qualquer outro tipo de adorno em forma de pulseira ou argola (FARIA, 1850).

59 “Com aquela emcarna” no original. A rigor, “encarna” seria o sangue ou os despojos que o caçador atira aos cães como estímulo ou recompensa (BLUTEAU, 1712-1721). Caminha utiliza o termo no sentido de “engodo” ou qualquer outro artifício semelhante.

60 “Que lhes homẽ queriã dar” no original. Nesta e em outras passagens, Caminha emprega a palavra “homem” no sentido de “algum homem” ou “alguém” (vide nota 85).

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61 “Traziam huũs espelhos de paao que pareçiam espelhos de boracha” no original. Caminha trata os batoques de madeira existentes nos lábios de alguns tupiniquins como “espelhos”, termo aplicado às tampas desse mesmo material empregadas para fechar as “borrachas”, nome conferido aos odres de couro nos quais os portugueses armazenavam água ou vinho (CORTESÃO, 1943; J. RIBEIRO, 1910). A mesma comparação seria estabelecida por Gabriel Soares de Sousa no “Tratado descritivo do Brasil” de 1587 (SOUSA, 1938).

62 “E alguũs deles traziam tres daqueles bicos .scilicet. huũ na metade eos dous nos cabos” no original. A seu modo, Caminha pretende registrar o fato de alguns indígenas trazerem um adorno de osso no meio do lábio inferior e dois outros próximos a cada canto da boca. Mencionada por numerosos cronistas do século XVI, tal disposição encontra-se perfeitamente retratada nas gravuras de STADEN (1557) (Fig.4). Vide também MÉTRAUX (1928).

63 “Timtura negra maneira dazulada” no original. Clara referência à tinta preta extraída dos frutos do jenipapeiro, Genipa americana, muito empregada pelos indígenas sul-americanos (A.A. de ANDRADE, 1926; FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002; A.C. PINTO, 1995; C. Lévi-Strauss in STEWARD, 1950).

64 “E suas vergonhas tam altas e tã çaradinhas e tam limpas das cabeleiras que de as nos mujto bem olharmos nõ tijnhamos nhuũa vergonha” no original. Neste e em outros trechos, Caminha parece fazer um jogo onomástico em torno da palavra “vergonha”, a qual utiliza tanto para designar as pudendas femininas quanto no sentido usual do termo. Mais adiante, o cronista empregaria a expressão “não fazer vergonha” para elogiar a bela estampa de uma nativa.

65 “Aberberja” no original. De significado óbvio, o termo em questão reflete como os ouvidos europeus percebiam a incompreensível algazarra produzida pela multidão de indígenas (vide CORTESÃO, 1943).

66 “Pera dar la ao Senhor seo hy ouuese” no original. Portanto ao comandante, chefe ou senhor dos habitantes locais, embora não houvesse nenhum passível de ser visto como tal pelos portugueses.

67 “Afolgar pela baya acaram dapraya” no original. “A carão” tanto pode significar “junto” como “defronte” (A. de M. SILVA, 1789), não havendo como decidir qual seria o melhor sentido no caso.

68 “Amdando marinheiros cõ huũ chimchorro” no original. Vide item 3.2.1, que trata do “pescado miúdo”.

69 “Ao domjngo de pascoela” no original. Vide nota 12.

70 “E mandou atodolos capitaães que se corejesem nos batees” no original. Como “correger” não passava do ato de aprontar uma embarcação para determinado fim (LEITÃO & LOPES, 1974), a ordem emitida por Cabral determinava que os capitães se preparassem nos batéis para o desembarque.

71 “Mandou naquele jlheeo armar huũ esperauel” no original. Por esperavel entendia-se uma simples armação de pano estendida contra o sol e a chuva (BLUTEAU, 1712-1721).

72 “Padre frey amrique” no original. Frei Henrique Soares de Coimbra tinha como missão fundar o primeiro dos 12 mosteiros que Dom Manuel I pretendia estabelecer entre o Cabo da Boa Esperança e as Índias. Mesmo ferido, conseguiria salvar-se a nado da destruição da feitoria de Calicute, quando sucumbiram cinco dos sete franciscanos sob seu comando, grupo formado pelos pregadores Frei Gaspar, Frei Francisco da Cruz e Frei Simão Guimarães, pelo organista italiano Frei Maffeo, pelo cronista Frei Pedro Neto, por Frei Luis do Salvador e pelo irmão leigo Frei João Vitória. Bem conhecido na Corte como confessor e

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diretor espiritual do Convento das Clarissas fundado pela antiga ama-de-leite do soberano português, Frei Henrique Soares participaria de várias embaixadas diplomáticas, sendo nomeado Bispo de Ceuta em 30 de janeiro de 1505. Morreria em Olivença a 14 de setembro de 1532 (AMORIM, 2000; LOPES, 1973).

73 “Abandeira de christos” no original. Trata-se do estandarte vermelho e branco da Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo, vulgarmente conhecida como “Ordem de Cristo”. Herdeira parcial dos bens dos extintos templários, essa ordem militar seria instituída pelo Rei Dom Dinis em 1319, tendo desempenhado papel de relevo nas viagens ultramarinas.

74 “Corno ou vozina” no original. Vários cronistas do século XVI utilizariam os mesmos termos para designar as trompas de madeira e/ou conchas fabricadas pelos indígenas do nosso litoral, cujo aspecto básico pode ser observado nas ilustrações de STADEN (1557). Vide também MÉTRAUX (1928).

75 “E nos todos obra de tiro depedra tras dele” no original. Comum nos documentos da época, tal expressão faz referência ao alcance da boca de fogo vulgarmente conhecida como “pedreiro”, variedade de morteiro capaz de disparar projéteis de pedra a uma distância de 450m (LEITÃO & LOPES, 1974).

76 “Tjmto de timtura vermelha” no original. Clara referência à tinta vermelha extraída das sementes do urucum, Bixa orellana, muito empregada pelos indígenas sul-americanos (vide nota 88).

77 “Cabaaços dagoa” no original. Provável referência aos frutos da cabaceira, Lagenaria vulgaris, ou do coité, Crescentia cujete, ambos muito utilizados na confecção de cabaças (vide FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002).

78 “Tanjendo tronbetas e gaitas” no original. Conforme destaca CORTESÃO (1943), tratam-se de gaitas de fole, instrumento antiqüíssimo que formava par constante com o tamboril nas folias e bailes de terreiro (vide nota 93).

79 “Oqual nõ he mais ancho que huũ jogo demanqual” no original. Alusão ao espaço de 8m a 10m onde se disputa o jogo de malha (CORTESÃO, 1943; J. RIBEIRO, 1910).

80 “E o al todo dasua propia cor” no original. Caminha emprega a forma abreviada da expressão latina “alius”, que nesse caso deve ser traduzida como “restante” ou “resto” (SARAIVA, 1927).

81 “Palmas nõ muito altas em que ha mujtos boos palmjtos” no original. Provável referência à juçara, Euterpe edulis, palmeira muito comum no sul da Bahia (FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002; LIMA, 1984).

82 “Diego dijaz” no original. Nada se sabe da biografia desse Diego Dias, descrito por Caminha como um homem folgazão que havia sido almoxarife em Sacavém. Talvez fosse um dos funcionários da feitoria a ser fundada em Calicute.

83 “Mujtas voltas ligeiras e salto Real” no original. CORTESÃO (1943) identifica o “salto real” como algum tipo de salto mortal capaz de encantar e surpreender os nossos indígenas, interpretação seguida por quase todas as análises posteriores. Não obstante, como o qualificativo “real” podia ser atribuído a qualquer objeto grande ou bem trabalhado (BLUTEAU, 1712-1721), não é impossível supor que Caminha pretendesse mencionar apenas os grandes saltos ou elaborados volteios executados por Diego Dias.

84 “Toda aquela Ribejra do mar he apaulada per cjma” no original. “Apaulada” seria o mesmo que “paludosa”, “encharcada” ou “pantanosa” (BLUTEAU, 1712-1721; A. de M. SILVA, 1789).

85 “E homẽ nom lhes ousa de falar Rijo” no original. Neste e em outros casos, Caminha emprega a expressão “homem nom” no sentido de “homem nenhum” ou “ninguém” (vide nota 60).

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86 “Huũas choupanjnhas de Rama verde e de feeitos mujto grandes” no original. Embora alguns vejam em “feitos” uma referência a “obras” ou “construções” (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001), vários outros encaram tal palavra como mera variante de “fetos” (e.g. M.A. RIBEIRO, 2003), designação geral aplicada a diversas samambaias pertencentes à ordem Filicales (Pteridophyta). Essa última interpretação surge como a mais adequada, pois Caminha parece comparar a planta utilizada pelos indígenas com seus equivalentes portugueses. Talvez fosse uma das espécies do gênero Alsophila encontradas no sul da Bahia (FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002), embora tampouco seja possível descartar a possibilidade de os tripulantes terem tomado por fetos as folhas secas de palmeiras utilizadas na cobertura das habitações.

87 “Coma ẽ panos darmar” no original. CORTESÃO (1943) identifica os “panos de armar” como as coloridas tapeçarias muito em voga entre os portugueses durante os séculos XV e XVI. Outros autores, contudo, atribuem essa expressão a meros panos coloridos ou enfeitados (e.g. J. RIBEIRO, 1910).

88 “Traziã alguũs deles huũs ourjços verdes daruores que casy na cor querjam parecer de castinheiros se nõ quanto herã mais e mais pequenos e aqueles herã cheos dhuũs graãos vermelhos pequenos. que esmagandoos antre os dedos fazia timtura mujto vermelhadaque eles amdauam timtos e quanto se mais molhauã tanto mais vermelhos ficauam” no original. Clara alusão ao fruto do urucum, Bixa orellana, matéria corante das mais comuns entre os indígenas do Brasil (vide A.A. de ANDRADE, 1926; EMMERICH & EMMERICH, 1993; FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002; A.C. PINTO, 1995; C. Lévi-Strauss in STEWARD, 1950).

89 Ao invés da “légua marítima” de 5,992km utilizada na navegação (vide nota 5), essa referência parece dizer respeito à medida terrestre empregada pela maioria da população. Embora muito variável, a “légua” portuguesa em questão totalizava cerca de 6,349km no final do século XV (fide M. da S. MARQUES, 2001), o que torna a “légua e meia” mencionada (“huũa legoa e mea”) igual a pouco mais de 9,5km.

90 “Jnhame” no original. Ainda que atribuído por vários autores (e.g. CORTESÃO, 1922; LIMA, 1984) aos verdadeiros inhames, Dioscorea sp., essa passagem provavelmente diz respeito às raízes da mandioca, Manihot esculenta, base alimentar de diversas tribos brasileiras (vide FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002).

91 “Especialmente lacam cozido frio” no original. Este “lacão” seria a perna de porco salgada e defumada, o tradicional presunto português (BLUTEAU, 1712-1721; A. de M. SILVA, 1789).

92 “Huũa armadura grande de porco montes bem Reuolta” no original. Provável referência aos caninos grandes e recurvados dos javalis, Sus scrofa Linnaeus, 1758, que tantas vezes eram conservados como pequenos troféus de caça. Poucas linhas abaixo, Caminha mencionará presentes mais convencionais como as camisas compridas e largas chamadas de “mouriscas” e aquelas curtas de uso comum (vide M.V. Guerreiro in CAMINHA, 1974).

93 “Ao soõ dhuũ tanbory nosso” no original. Muito popular nos bailes e festas das aldeias, o “tamboril” não passava de um pequeno tambor tangido com uma só baqueta (BLUTEAU, 1712-1721; A. de M. SILVA, 1789).

94 “Aires gomez” no original. Descendente de uma das famílias mais tradicionais do reino, Aires Gomes da Silva era filho de Pero da Silva e neto de João Gomes da Silva, alferes-mor de Dom João I. Comandava uma das naus da armada destinada a naufragar em 23 de junho de 1500 nas proximidades do Cabo da Boa Esperança (vide nota 176).

95 “Fomos pola +” no original. Nessa passagem, Caminha lança mão de um símbolo

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gráfico ao invés de escrever a palavra por extenso, artifício muito empregado na época (NUNES, 1981). Tal pormenor teria passado despercebido em algumas versões atuais da “Carta” (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001), comprometendo a leitura do trecho.

96 “Obra de dous tiros de beesta” no original. Cerca de 300m, já que um tiro de besta alcançava entre 140m e 150m (CORTESÃO, 1943).

97 “E quando leuantarom adeus” no original. Referência ao momento de elevação da hóstia.

98 “Tirou o padre a vestimenta decjma” no original. Trata-se da estola e da casula, conforme mencionado por M.V. Guerreiro (in CAMINHA, 1974) e M.A. RIBEIRO (2003).

99 “E ficou naalua” no original. Trata-se da veste talar de pano branco, conforme mencionado por M.V. Guerreiro (in CAMINHA, 1974) e M.A. RIBEIRO (2003).

100 “Preegou do auanjelho e dos apostolos cujo dia oje he” no original. Segundo CORTESÃO (1943), esses seriam os apóstolos São Felipe e São Tiago, escolha bastante adequada face à missão evangelizadora que compunha o pano de fundo da expansão portuguesa.

101 “Que lhe ficarom ajnda daoutra vijnda” no original. Passagem algo obscura, que tanto pode dizer respeito a um dos desembarques efetuados dias antes quanto à participação de Nicolau Coelho na primeira viagem de Vasco da Gama (compare com M.V. Guerreiro in CAMINHA, 1974). Vide nota 27.

102 “Pelos dous degradados que aquy ãtreles ficam os quaaes ambos oje tam bem comungaram” no original. Consta que tais infelizes teriam sido escolhidos entre os vinte condenados ao degredo na Índia embarcados na frota (GOES, 1566). Além do já mencionado Afonso Ribeiro (vide nota 56), Cabral teria abandonado no Brasil um certo João de Thomar, sobre o qual nada se sabe (fide D. VIEIRA, 1903). Apesar de acometidos por grande desespero na partida da armada (vide nota 119), esses homens parecem ter sobrevivido no Brasil por pelo menos 20 meses, conforme sugere o famoso “Ato Notarial” do tabelião régio Valentim Fernandes (in T.O.M. de SOUZA, 1946). Segundo carta escrita por Dom Manuel I a Fernando de Aragón no ano de 1505, pelo menos um desses degredados logrou retornar a Lisboa “sabendo a língua dos indígenas” (in PIERONI, 2000).

103 “Ficam mais dous grometes que esta noute se sairam desta naao no esqujfe em terra fogidos” no original. Não existem notícias adicionais, embora alguns autores especulem que ambos desertores teriam retornado aos barcos antes da partida (e.g. VARNHAGEN, 1927).

104 Não está claro se Caminha pretendia referir-se a léguas marítimas ou terrestres nesse trecho. Como tais medidas alcançam valores distintos (vide notas 5 e 89), as “20 ou 25 léguas” mencionadas (“xx ou xxb legoas”) seriam equivalentes a 119,84km e 149,80km no caso das léguas marítimas, ou a 126,98km e 158,72km na hipótese de léguas terrestres.

105 “Depomta apomta he toda praya parma mujto chaã e mujto fremosa” no original. “Parma” seria o mesmo que “lisa” ou “plana” (CORTESÃO, 1943).

106 Conforme o original, embora várias fontes prefiram referir-se a “Jorge de Osouro” ou mesmo a “Jorge de Osório”, entre outras variantes. Casado com a filha de Caminha, Jorge de Ozouro parece ter sido um autêntico rufião, pois desde 1490 existem registros de seu envolvimento em casos de extorsão armada, furtos, brigas e violências diversas. Desterrado na ilha de São Tomé, pode ter morrido antes de merecer a atenção do Rei que, porém, concederia a Rodrigo de Ozouro, neto de Caminha, o mesmo cargo de “mestre da balança” do Porto antes ocupado pelo avô (F.M. de S. VITERBO, 1902).

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107 “Chiamato Don Manuel” no original. Vide nota 4.

108 “In la qual armata erano .xii. naue: e nauili” no original. A contagem do autor exclui a naveta de mantimentos de Gaspar de Lemos, a qual efetivamente retornaria do Brasil levando a notícia das terras descobertas sem prosseguir viagem para o Oriente, fato reconhecido nos capítulos seguintes. As doze velas restantes compreendiam a nau capitânia de Pedro Álvares Cabral, a sota-capitânia “El-Rei” – uma nau de 600 “botte” comandada por Sancho de Tovar (vide nota 159) – e as seis naus de Simão de Miranda de Azevedo, Aires Gomes da Silva, Simão de Pina, Vasco de Ataíde, Nicolau Coelho e Diogo Dias. Completavam o conjunto de navios pertencentes à Coroa as duas caravelas redondas de Bartolomeu Dias e Pedro de Ataíde, esta última uma embarcação de 70 tonéis chamada “São Pedro”. Por fim, integravam a frota dois vasos de armadores privados, a “Nossa Senhora da Anunciada” – uma caravela redonda de 300 “botte” capitaneada por Nuno Leitão da Cunha – e uma nau mercante de nome desconhecido que navegava sob as ordens de Luís Pires. A primeira tinha como proprietários Dom Álvaro de Bragança e os italianos Bartolomeo Marchionni, Girolamo Sernige e Antonio Salvago, enquanto a segunda pertencia a Dom Diogo da Silva e Meneses, Conde de Portalegre, e outros comerciantes (vide GREENLEE, 1938; GUEDES, 1997).

109 “In Calichut” no original. Porto da costa de Malabar, Calicute era um importante centro de comércio de drogas e especiarias pelo menos desde o século XIV, sendo freqüentado por mercadores da Pérsia, China, Java, Ceilão e Iêmen (THOMAZ, 1994).

110 “Uno loco chiamato zaffale” no original. Localizada no atual território de Moçambique, essa povoação da costa oriental africana tornou-se muito conhecida nos séculos XV e XVI graças ao comércio do ouro, que era trazido do interior e vendido aos mercadores árabes vindos do Mar Vermelho (J.L. LISBOA, 1994b). Outros missivistas italianos denominariam esse sítio de “Mina Nova” (vide notas 144, 176 e 216), possivelmente para distingui-lo da fortaleza de São Jorge da Mina (vide nota 131).

111 Provável referência à “milha italiana” de 1.488m (“miglio”), unidade muito próxima da tradicional “milha romana” (“mille passus” ou apenas “mille”) de 1.479m. Portanto, as duas milhas mencionadas totalizariam cerca de 2,97km (vide M. da S. MARQUES, 2001; MONTEIRO, 1974).

112 “Uno loco chiamato rastello” no original. Distante do centro de Lisboa cerca de 6km, esse antigo cais na beira do Tejo situava-se em área hoje pertencente ao bairro de Belém.

113 Como o texto de Montalboddo sem dúvida alguma fixa para esse domingo a data de “7 do mês de março” (“vii. del mese di Marzo”), a segunda-feira seguinte não poderia corresponder aos “nove dias de março” (“ix. zorni di Marzo”), conforme pretende a passagem subseqüente (vide Fig.6). Aparentemente motivada por um erro de impressão, tal discrepância levaria diversos autores (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001; H.C. SIMÕES, 1999) a fixar o dia 8 de março em suas traduções, desconsiderando o original.

114 “El uento era sirocho” no original. Esse vento quente da África chega na Itália pelo sudeste, de onde se depreende que a frota teria sido atingida pelas fortes rajadas de sudeste tantas vezes observadas no litoral brasileiro.

115 Cerca de 4,46km (vide nota 111).

116 “Una radice chiamata igname che e el pane loro che manzano li arabi” no original. Nesse trecho obscuro, o autor parece considerar que a mandioca consumida por nossos indígenas não passaria do mesmo inhame usado como pão pelos negros

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d’África (vide nota 90), os quais eram chamados de “mouros” por vários autores dos séculos XVI e XVII (TEIXEIRA, 1997).

117 “Una rete de bambagio” no original. Provável referência ao algodão-mocó, Gossypium bardadense, espécie nativa do nordeste do Brasil (vide FILGUEIRAS & PEIXOTO, 2002).

118 “Non uedessemo animali alcuno” no original. As fontes da época muitas vezes empregavam “animal” como sinônimo de “quadrúpede”, aplicando essa palavra sobretudo aos mamíferos.

119 “Lasso doi homini banditi in lo dicto loco: li quali comenzorno a pianzere” no original. Na pena de diversos autores, o choro dos degredados descrito no “Relato do Piloto Anônimo” terminaria por adquirir contornos bem mais pungentes (e.g. VARNHAGEN, 1927), chegando mesmo a inspirar poemas de cunho dramático (in PIERONI, 2000). Vide nota 102.

120 Em torno de 7.190km, caso esta seja uma referência à antiga “légua marítima” de 5.992m utilizada pelos navegadores portugueses (LAGARTO, 1994c). Por conseguinte, uma “légua marítima” seria mais ou menos equivalente a quatro “milhas italianas” (vide notas 5 e 111).

121 Giovanni Matteo Camerini viria a ser mais conhecido como “Giovanni Matteo Cretico” ou Giovanni Matteo “il Cretico” (“o Cretense”) por haver passado sete anos na ilha de Creta (GREENLEE, 1938).

122 “Credo la Vostra Serenita” no original. A julgar pelo tratamento concedido e data fornecida, o destinatário desta carta seria Agostino Barbarigo, 74o Doge da Sereníssima República de Veneza eleito em 30 de agosto de 1486. Nascido por volta de 1419, Agostino chegaria ao poder com cerca de 66 anos, sucedendo seu irmão mais velho Marco Barbarigo. Dono de vitoriosa carreira militar e política, participou da chamada “Liga Santa” organizada por Fernando de Aragón, o Católico, contra Carlos VIII de França. Faleceu em Veneza no dia 20 de setembro de 1501, sendo substituído por Leonardo Loredan em 2 de outubro desse mesmo ano.

123 “Per lettere del Manifico Ambasiator” no original. Além de atuar como embaixador de Veneza na Espanha entre setembro de 1500 e setembro de 1502, Domenico Pisani di Giovanni também representaria os interesses da República junto à corte portuguesa pelo menos até a nomeação de Piero Pasqualigo di Fillipo, com o qual esteve em Lisboa entre março e abril de 1501 (vide nota 197).

124 “Questo Serenissimo Re” no original. Trata-se de Dom Manuel I, Rei de Portugal (vide nota 4).

125 “Sonno perse .vii. al uiazo” no original. Vide nota 176.

126 “Getulia” no original. Nome conferido em certos clássicos à região habitada pelos getúlios, povo que vivia ao sul dos mouros e númidas em um território correspondente ao do atual Marrocos (vide PLÍNIO, 1979-1984; PTOLOMAEUS, 1490).

127 “Capo Verde: el quale antiquitus se chiamaua experias: doue sonno le insule experide” no original. Desde tempos imemoriais, a imaginação humana mostrou-se capaz de povoar os mares com ilhas fabulosas repletas dos mais diversos horrores ou maravilhas, formando uma geografia fantástica de grande complexidade que confundia o real e o imaginário (BABCOCK, 1922; BARROSO, 1941; DELUMEAU, 1992; FERRAZ, 1939). Conforme as circunstâncias, o arquipélago do Cabo Verde seria associado com o paradisíaco jardim das Hespérides ou com um pretenso grupo de ilhotas situado a oeste da Bretanha onde os fenícios exploravam o estanho, as chamadas Cassitéridas de autores como HERÓDOTO (1949) e POMPONIUS MELA (1471). Outras fontes quinhentistas relacionariam o Cabo Verde com a tenebrosa ilha habitada pela Medusa, uma das górgonas da mitologia clássica, conferindo-lhe o nome

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de “Górgonas Medúseas”, “Górgadas Medúseas” e “Ilhas Górgonas”, entre diversas variantes.

128 “Ethiopia” no original. Ao longo dos séculos, semelhante denominação seria atribuída a várias regiões distintas da África, sobretudo aquelas muito pouco conhecidas e distantes do Mediterrâneo. No caso, o missivista chama de “Etiópia” todas as terras localizadas ao sul do Cabo Verde.

129 “Tantum che risponde per lineam a la Cicilia” no original. Passada as ilhas de Cabo Verde, o litoral africano vira para sudeste e depois para leste na costa da Libéria, prosseguindo nessa direção até o Golfo da Guiné, que se encontra situado mais ou menos no mesmo meridiano da Sicília.

130 “Dista dicta costa .ix. gradi tra la linea equinotiale” no original. Conforme destaca GREENLEE (1938), o missivista não se afasta muito da realidade ao estabelecer uma diferença de 9o entre as ilhas do Cabo Verde e a subseqüente porção da costa africana que corre para o Levante, pois essa última encontra-se localizada cerca de 5o ou 6o ao norte da linha do Equador.

131 “La mina di questo Serenissimo Re” no original. Referência à famosa fortaleza de São Jorge da Mina, concluída pelos portugueses em 1482 no litoral de Gana (BALLONG-WEN-MEWUDA, 1993).

132 “Dapoi distendi uno capo uerso ostro che excede el tropico del capricorno .ix. gradi: Questo capo se chiama di bona speranza” no original. Na verdade, o Cabo da Boa Esperança está localizado cerca de 10o53’ ao sul do trópico de Capricórnio (GREENLEE, 1938).

133 “Barbaria” no original. A exemplo de vários contemporâneos, o douto missivista procuraria ordenar as terras descritas por seus informantes conforme as referências de obras clássicas como a “Geografia” de Claudius Ptolomaeus, iniciativa destinada a produzir resultados bastante curiosos. Esta “Barbaria”, portanto, não guarda qualquer relação com o território do norte da África vulgarmente conhecido como “Berbéria” ou “Barbária”, correspondendo antes ao litoral do fabuloso “Sinus Barbaricus” imaginado pelo geógrafo grego, região que equivaleria, grosso modo, às costas da atual Somália (PTOLOMAEUS, 1490).

134 Cerca de 7.440km (vide nota 111).

135 “Uno capo chiamato da li antiqui Prasim promontorio” no original. Trata-se do famoso “Prassum Promontorium” que Claudius Ptolomaeus fixou como o ponto mais ao sul do litoral da África Oriental (Ptolomaeus, 1490).

136 “Trogloditia” no original. Referência à terra habitada pelos trogloditas, povo fabuloso que vivia em cavernas e buracos mencionado por diversas fontes clássicas. Como certos autores (e.g. ESTRABÃO, 1982-1989) localizam a pátria desses seres no território da Etiópia banhado pelo Mar Vermelho, não surpreende que diversas versões da “Geografia” de Claudius Ptolomaeus terminassem por chamar toda essa costa de “Trogloditica regio” (vide PTOLOMAEUS, 1490).

137 “La quale chiamano zaffala” no original. Vide nota 110.

138 “Mar Barbarico” no original. Claudius Ptolomaeus confere esse nome ao mar que banhava as costas de sua “Barbaria” formando o fabuloso “Sinus Barbaricus” (vide PTOLOMAEUS, 1490).

139 “Ariuano a Colochut” no original. Vide nota 109.

140 Cerca de 22.320km (vide nota 111).

141 “Ma trauersando lo scortano asai” no original. Na visão do missivista, os portugueses poderiam abreviar bastante seu caminho para a Índia se desistissem de acompanhar a costa africana e cruzassem logo o Índico.

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142 Cerca de 2.976km (vide nota 111).

143 “A la lor andata perseno .iiii. naue” no original. Vide notas 108 e 176.

144 “Mina noua” no original, referência à localidade de Sofala (vide nota 110).

145 “Ii. mandarono ala mina noua de le qual se iudicano siano perse” no original. Vide notas 108, 176 e 177.

146 “Le .vii. andorno Colochut” no original. Vide notas 108, 176 e 177.

147 “Per quel signore” no original. Referência ao “Samorim Rajá”, título conferido aos senhores de Calicute. Chamado Glafer ou Gnaffer, esse Rei era sobrinho do potentado que Vasco da Gama conhecera em sua viagem anterior, tendo assumido o trono ainda jovem como o 85o Samorim de sua dinastia (GREENLEE, 1938; SUBRAHMANYAM, 1997).

148 “El factore di questo Serenissimo Re” no original. Trata-se de Aires Correia (vide nota 46).

149 “El qualle e uno Judeo batezato” no original. Trata-se de Gaspar da Gama, o legendário mercador e lapidário nascido em Alexandria que viveu na Índia durante três décadas, sendo trazido para Lisboa após ter se incorporado à primeira expedição de Vasco da Gama (LIPINER, 1986).

150 Cerca de 59,52km (vide nota 111).

151 “Cuzin” no original. Um dos reinos independentes da costa de Malabar, Cochim tornar-se-ia o primeiro grande porto português na península, abrigando a capital administrativa do “Estado da Índia” até 1530 (M.T. AMADO, 1994b).

152 “Duno altro Re inimico de quello de Colochut” no original. Referência a Unni Goda Varna, Soberano de Cochim, que veria os portugueses como fortes aliados potenciais em suas disputas com o Samorim de Calicute (BASTO, 1892; GREENLEE, 1938; SUBRAHMANYAM, 1997).

153 “Hanno hauto uno canter di Canella per ducato uno e meno” no original. A julgar por certos comentários (e.g. LEITÃO & LOPES, 1974), a existência de diferentes “quintais” levaria a Fazenda Real, já no começo do século XVII, a ordenar que as cargas de pimenta e de outras especiarias fossem adquiridas no Oriente pelos chamados “quintais de peso grande” e vendidas em Portugal pelos “quintais de peso pequeno”, os quais perfaziam 58,752kg e 44,982kg respectivamente. O missivista, portanto, parece referir-se ao fato de um “quintal de peso grande” de canela (i.e. 58,752kg) ter custado o preço irrisório de “um ducado ou menos”, pois essa moeda de ouro criada em Veneza usualmente não continha mais de 3,56g de metal precioso (GODINHO, 1985). Vide também nota 163.

154 “Mando sui ambasiatori cum queste naue a questo Serenissimo Re & etiam do ostai a cio che tornano securamente” no original. Vide nota 187.

155 “Se miseno di la borina che loro non sanno andar” no original. Conjunto de manobras que permitem à embarcação navegar contra o vento (LEITÃO & LOPES, 1974). Desenvolvida pelos europeus em suas viagens de alto mar, essa técnica não era conhecida pelos marinheiros do Oriente.

156 “Sancto Thomaso apostolo” no original. Os navegadores portugueses do século XVI aceitavam como verdade inconteste o mito de São Tomé ter sido enterrado em Meliapur, cidade indiana da costa de Coromandel. Não obstante, o missivista se equivoca em seu comentário, pois o trecho em questão diz respeito à passagem da frota de Cabral por Cananor, porto situado no litoral de Malabar (SUBRAHMANYAM, 1994).

157 “El signor di epsa li fece asai careze” no original. Referência ao Kolattiri Rajá, Soberano de Cananor (SUBRAHMANYAM, 1997).

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158 “Laltra deti in una secha: de la quale sonno salue le zente questa era di botte .dc. & circha” no original. Trata-se da “El-Rei”, a sota-capitânia da frota de Cabral que navegava sob o comando de Sancho de Tovar. Vide notas 108 e 176.

159 “Ancor non e riuato qui saluo che una di botte .ccc.” no original. Antiga medida de capacidade italiana sobre a qual pairam várias dúvidas. Quando aplicada à tonelagem de um navio, podia ser equivalente ao tonel português de 1,5m3 ou oscilar entre 3/5 e 1/3 desse mesmo volume (compare GUEDES, 1997 versus GREENLEE, 1938). Pela estimativa mais modesta, a “El-Rei” de Sancho de Tovar teria a capacidade de 600 “botas” ou 200 tonéis, enquanto a embarcação mencionada nesse trecho – a “Nossa Senhora da Anunciada” de Nuno Leitão da Cunha – não ultrapassaria 300 “botas” ou 100 tonéis (vide nota 108).

160 “Questa intro la sera di san Joanne” no original. Considerado o navio mais veloz da frota, a caravela “Nossa Senhora da Anunciada” teria sido a primeira embarcação a concluir viagem, chegando no cais do Restelo em 23 de junho, véspera de São João. Como a “Anunciada” seguiria para Lisboa no dia seguinte, parece provável que o missivista pretenda referir-se a esta segunda atracação.

161 “Bartholomio Fiorentin” no original. Trata-se do Bartolomeo Marchionni, rico banqueiro florentino que viveu em Lisboa entre o último quartel do século XV e o primeiro quartel do século XVI. Atuava como financiador da expansão marítima e do comércio ultramarino português desde o reinado de Dom João II (1481-1495), tendo sido um dos armadores da “Nossa Senhora da Anunciada” (vide nota 108).

162 “Piper Cantera .ccc” no original. Referência às bagas secas da trepadeira vulgarmente conhecida como pimenta-do-reino, Piper nigrum, que podem assumir um colorido negro ou branco conforme tenham sido colhidas e preparadas antes ou depois de sua completa maturação. Desde a Antigüidade, a pimenta-do-reino era uma das especiarias mais caras e apreciadas pelos europeus, alcançando preços apenas comparáveis com os da canela (vide adiante). Esse carregamento corresponderia a cerca de 17.625kg, volume confirmado pela carta de Bartolomeo Marchionni (vide notas 153 e 188).

163 “Canella Cantera .cxx.” no original. Trata-se da casca seca e preparada do caneleiro-do-ceilão, Cinnamomum zeylanicum, uma das especiarias mais cobiçadas pelos europeus desde a Antigüidade. Segundo Giovanni Matteo, a “Anunciada” teria trazido 120 quintais de canela, volume correspondente a cerca de 7.047kg (vide nota 153), ao passo que Bartolomeo Marchionni menciona uma carga de “160 quintais” dessa mesma especiaria (vide nota 189).

164 “Laccha Cantera .l. in .lx” no original. Excreção resinosa produzida por determinados insetos – particularmente as fêmeas e larvas de um pulgão, Kerria lacca (Kerr, 1782) – utilizada como corante para os mais diversos fins (vide CLAUSEN, 1954; COWAN, 1865). Já em 1563, Garcia d’Orta caracterizaria a “lacca” ou “lacre” como uma “goma” extraída dos ramos de certas árvores por uma “formiga grande” que “lavra o pau como a abelha faz o mel” (ORTA, 1563). Segundo Giovanni Matteo, a “Anunciada” teria trazido de 50 a 60 quintais de laca, portanto entre 2.937kg ou 3.525kg (vide nota 153), enquanto Bartolomeo Marchionni menciona uma carga de “60 quintais” dessa mesma substância (vide nota 190).

165 “Benzui Cantera .xv.” no original. Resina aromática de coloração usualmente amarelada extraída do estoraque, Styrax benjoin, substância conhecida na Europa pelo menos desde a Idade Média (Conde de Ficalho in ORTA, 1891). Segundo Giovanni Matteo Cretico, a “Anunciada” teria trazido 15 quintais de benjoim, volume correspondente a cerca de 881kg (vide nota 153), ao passo que Bartolomeo Marchionni menciona uma carga de “14 quintais” desse mesmo material (vide nota 191).

166 “Garoffoli” no original. Trata-se do botão floral do craveiro-da-índia, Caryophilus aromaticus, que é comercializado seco e seria conhecido na Europa pelo menos desde o século IV.

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167 “Zenzari” no original. Trata-se do rizoma do gengibre, Zingiber officinale, conhecido na Europa desde a Antigüidade.

168 “Esser uenuto di qui li Ambasiatori di uno Re de Ethiopia chiamato Re de Vbenam” no original. Conforme destaca GRENLEE (1938), tal episódio não guarda nenhuma relação com a viagem de Cabral, dizendo respeito à embaixada que um rei da costa da Guiné teria enviado a Portugal.

169 “Etiam nasce prima non e compito como laltro” no original. De acordo com GREENLEE (1938), um erro qualquer teria levado a substituição de “piper” por “prima”, sugestão bastante razoável tendo em vista a passagem similar existente na carta de Domenico Pisani di Giovanni (vide nota 241). Na verdade, as “pimentas” encontradas pelos portugueses na África Ocidental compreenderiam a malagueta, Afromomus malagueta, a pimenta-da-Guiné, Xylopia aethiopica, e a chamada “pimenta-de-rabo”, Piper guineense (MARGARIDO, 1994). Na opinião do missivista, todas seriam muito inferiores à verdadeira pimenta trazida do Oriente, Piper nigrum, que se tornaria conhecida no Brasil pela significativa denominação de “pimenta-do-reino” (vide nota 162).

170 “Li oferse .xv.M. dobbe” no original. As únicas “dobras” portuguesas pertencem aos reinados de Dom Pedro I (1357-1367), Dom Fernando I (1367-1383) e Dom João V (1706-1750), não havendo qualquer moeda com essa denominação cunhada no país durante o século XVI. Entretanto, desde o final do século XV também circulava em Portugal a “dobra” castelhana (teste M.B.L. FERNANDES, 1856), antiga moeda de ouro com pouco mais de 27g mais valiosa que o cruzado (JUNGE, 1994; PRICE, 1980; VAZ & SALGADO, 1987).

171 “Ducati” no original. Vide nota 153.

172 Cumpre notar ser essa uma cópia da “Collezione Pietro Vaglienti” pertencente à “Biblioteca Riccardiana”, Florença. Quanto ao destinatário misterioso, a própria posição de relevo ocupada por Marchionni levaria certos autores a sugerir que tal correspondência estaria dirigida a um personagem de destaque no comércio e/ou na política florentina do século XVI, havendo mesmo ousadas especulações em torno do nome de Lorenzo Pierfrancesco dei Medici (e.g. J. AMADO & FIGUEIREDO, 2001).

173 “Ad di xxiij di questo arivo quj u’navilio che viene di chalichut deto per nome L’anunziata” no original. Trata-se da caravela “Nossa Senhora da Anunciada”, que chegaria ao cais do Restelo em 23 de junho de 1501 (vide notas 108 e 160).

174 “Ch’erano in loro chonserva” no original. “Fazer conserva” ou “navegar de conserva” são termos de marinharia utilizados para designar os navios que viajam em conjunto (LEITÃO & LOPES, 1974).

175 “Che ongni legha e 3 migle e ½ delle nostre” no original. Vide nota 120.

176 “E che alla loro andata in la si perdenno 5 navj di loro chomando quele andavano alla mina nuova del oro e a chalichut” no original. Com efeito, a Índia era o destino de quatro das cinco embarcações perdidas na viagem de ida, elenco formado pela nau de Vasco de Ataíde – que desapareceu misteriosamente nas cercanias do arquipélago do Cabo Verde em 23 de março de 1500 – e pelos navios de Aires Gomes da Silva, Luís Pires e Simão de Pina – todos naufragados próximo ao Cabo da Boa Esperança em 23 de junho de 1500. Nesta mesma ocasião, a tempestade que devastou a frota também levaria a nave de Bartolomeu Dias, uma das duas incumbidas de estabelecer uma feitoria na cidade africana de Sofala, chamada “Mina Nova” pelo missivista (vide nota 110). Em 12 de fevereiro de 1501, durante a viagem de volta, seria a vez da sota-capitânia “El-Rei”, sob o comando de Sancho de Tovar, encalhar em um baixio ao norte de Melinde, África Oriental, sendo abandonada pela tripulação.

177 “Funno 8 e giunti funno a chalichut” no original. O retorno da naveta comandada por

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Gaspar de Lemos e a perda de cinco embarcações fariam que apenas sete navios da armada lograssem transpor o Cabo da Boa Esperança, penetrando no Oceano Índico. Seis desses últimos alcançaram Calicute, ao passo que a desgarrada nau de Diogo Dias, cuja missão era a de estabelecer uma feitoria em Sofala, chegou até o Golfo de Ádem e enfrentou sozinha uma penosa viagem de volta, reencontrando a esquadra no arquipélago Cabo Verde em meados de 1501. A julgar pelo equívoco cometido, talvez faltasse ao missivista notícias acerca de Gaspar de Lemos e maiores informações sobre o restante da frota, pois o próprio Cabral só aportaria em Lisboa em 21 de julho de 1501.

178 “El fatore de rre inchominco s’abazarare chon loro” no original. Referência a Aires Correia (vide nota 46).

179 “Mare oceano” no original. Alusão ao conceito clássico que propunha a existência de um vasto “Mar Oceano” em torno das três massas continentais conhecidas na época. Os geógrafos humanistas usavam o termo quase como uma contraposição ao “Mar Mediterrâneo” (vide DAINVILLE, 1964; RANDLES, 1980).

180 “Un porto del mare oceano detto bizidem donde dipoj di quindi vanno a domascho” no original. Talvez uma referência a Baçaim, cidade então pertencente ao reino de Cambaia que desempenhava papel secundário no comércio do Mar Arábico (J.P. COSTA, 1994). Outra possibilidade seria a ilha de Barém ou Bahrein, importante entreposto comercial do Golfo Pérsico conquistado em 1521 por Antônio Correia (FARINHA, 1994).

181 “Per chonsiglo di uno indiano” no original. Trata-se de Gaspar da Gama (vide nota 149).

182 “E andonno a un altra terra” no original. Trata-se de Cochim, para onde os portugueses se dirigiram após o desastre em Calicute (vide nota 151).

183 “Uno Re nimicho di questo di cholochut” no original. Referência aos soberanos de Cochim e de Calicute (vide notas 147 e 152).

184 “El detto Re ca mandato uno anbascadore al nostro re chon infiniti presenti” no original. Vide notas 4, 152 e 187.

185 “Si misono del orza” no original. Mesmo que navegar à bolina (vide nota 155).

186 “Santo tomaxo apostolo” no original. Vide nota 156.

187 “E cj viene chon esse nave 4 anbascadorj di due isi signorj e tutti si voglono sotometere al nostro Re” no original. Cabral deixaria Cochim levando Idikkela Menon e Parangoda Menon, dois nobres súditos do suserano local, além dos padres nestorianos Matias e José da Igreja Tomista da Índia, dos quais apenas o último sobreviveria à viagem (vide GREENLEE, 1938; SUBRAHMANYAM, 1997). Como esse grupo seria posteriormente acrescido de um emissário do Soberano de Cananor ao Rei de Portugal, parece razoável supor que informações equivocadas tenham levado o missivista a considerar todos como embaixadores de potentados orientais.

188 “Pepe fine” no original. Segundo Bartolomeo Marchioni, a carga de pimenta da “Anunciada” seria de 300 quintais (“300 chantara”), o que perfaz cerca de 17.625kg (vide notas 153 e 162).

189 “Chanella” no original. Segundo Bartolomeo Marchioni, a carga de canela da “Anunciada” seria de 160 quintais (“160 chantara”), o que perfaz cerca de 9.400kg (vide notas 153 e 163).

190 “Laccha” no original. Segundo Bartolomeo Marchioni, a carga de laca da “Anunciada” seria de 60 quintais (“60 chantara”), o que perfaz cerca de 3.525kg (vide notas 153 e 164).

191 “Bongivj” no original. Segundo Bartolomeo Marchioni, a carga de benjoim da “Anunciada” seria de 14 quintais (“14 chantara”), o que perfaz cerca de 822kg (vide notas 153 e 165).

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192 “Anno Rechato 2 papaghallj dj diversi cholorj e qua sono lunghj uno ghomito e ½” no original. A rigor, o termo utilizado diz respeito ao “cúbito”, antiga unidade de medida linear muito variável conforme o período e a região geográfica considerada, oscilando entre os 45 e 55cm. Em Portugal, porém, o “cúbito” tomaria o nome de côvado e alcançaria 66cm, o que leva os “papagaios” de Marchionni a possuírem nada menos de 99cm de comprimento (vide nota seguinte).

193 “Uno ghomito e ½ el quale e piu di b. 1 e ½ de nostrj” no original. A julgar pelo comentário, o “cúbito” usual para o comerciante florentino não seria tão grande quanto aquele empregado pelos portugueses. Talvez se assemelhasse mais ao chamado “cúbito pequeno” dos romanos, que girava em torno dos 45cm.

194 “Sono chose mirabile e di moltj altrj e vari ucellj e animalj danno notizia” no original. Vide nota 118.

195 Pouco familiarizados com terras distantes, os europeus dos séculos XV e XVI muitas vezes reputavam como fantasiosos os relatos de antigos naturalistas que, como Plínio “o Velho”, tiveram a oportunidade de observar pessoalmente animais exóticos das mais surpreendentes procedências (vide TOYNBEE, 1973; WENDT, 1956).

196 “Vostra serenitá” no original. Trata-se do Doge Agostino Barbarigo (vide nota 122).

197 “Del magnifico ambasador, domino Piero Pasqualigo”. Trata-se de Piero Pasqualigo di Fillipo, diplomata e senador de Veneza que seria nomeado embaixador extraordinário da República junto à corte portuguesa em 12 de abril de 1501 (vide nota 123).

198 “Questo serenisimo re” no original. Trata-se de Dom Manuel I, Rei de Portugal (vide nota 4).

199 “Ma di 13 che furono son perse le 7” no original. Vide notas 108, 176 e 177.

200 “Getulia” no original. Vide nota 126.

201 “Capo Verde, che antiquitus si chiamava Hespeviceras dove sono le insule de le Hesperide” no original. Vide nota 127.

202 “Qui principia la Ethiopia, verso levante tanto, che coresponde per lineam rectam a la Sicilia” no original. Vide notas 128 e 129.

203 “La mina de questo serenisimo re” no original. Vide nota 131.

204 “Dapoi extende uno capo verso ostro in tanto, che excede el tropico de Capricornio 9 gradi. Questo capo chiamano Capo de Bona Esperanza” no original. Vide nota 132.

205 “Barbaria” no original. Vide nota 133.

206 Cerca de 7.440km (vide nota 111).

207 “Prason Promontorium” no original. Vide nota 135.

208 “Trogloditica” no original. Vide nota 136.

209 “Dove trovano una mina d’oro, la qual chiamano Cephala, dove li antiqui affermano esser mazor copia d’oro che in alguna altra parte” no original. Vide nota 110.

210 “Mar barbarico” no original. Vide nota 138.

211 “Coliqut” no original. Vide nota 109.

212 Cerca de 22.320km (vide nota 111).

213 “Ma transversando lo scurterano assai” no original. Vide nota 141.

214 Cerca de 2.976km (vide nota 111).

215 “A la lor andata perseno, per fortuna, 4 nave” no original. Vide notas 176 e 177.

216 “Mina nova” no original. Vide nota 110.

217 “Le qual si judicha, siano perse” no original. Vide notas 176 e 177.

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218 “Le sete andorono al Coliqut”, no original. Vide notas 176 e 177.

219 “Per quel signor” no original. Trata-se do Samorim de Calicute (vide nota 147).

220 “El fator del re de Portogal” no original. Referência a Aires Correia (vide nota 46).

221 “Bombarde” no original. Designação geral conferida a algumas das primeiras peças de artilharia conhecidas, as quais se apresentavam muito variáveis em termos de comprimento e calibre. De constituição grosseira, podiam ser carregadas pela boca ou por uma câmara posterior, sendo que as “bombardas grossas” atiravam grandes balas de pedra e as “miúdas” metralha ou projéteis de metal (LEITÃO & LOPES, 1974).

222 “Uno judeo batizato” no original. Trata-se de Gaspar da Gama (vide nota 149).

223 “Chucin” no original. Vide nota 151.

224 “Uno altro re, inimico dil re di Coloqut” no original. Trata-se de Unni Goda Varna, Soberano de Cochim (vide nota 152).

225 “Uno canter de canela per un ducato et meno” no original. Vide nota 153.

226 “Questo signor de Chucin manda soi ambasadori con queste nave a questo signor re, et etiam obstasi, a ciò che torniano securamente” no original. Vide nota 187.

227 “Messeno a la vela de la borina” no original. Vide nota 155.

228 “San Thomà” no original. Vide nota 156.

229 “El signor de quella” no original. Referência ao Kolattiri Rajá, Soberano de Cananor (vide nota 157).

230 “600 bote” no original. Vide nota 159.

231 “Una di bote 300” no original. Vide nota 159.

232 “La sera di San Zuane” no original. Vide nota 160.

233 “Bartolo Fiorentino” no original. Trata-se de Bartolomeo Marchionni (vide nota 161).

234 “Piper, cantera 300” no original. Esses 300 quintais de pimenta correspondem a cerca de 17.625kg (vide notas 153 e 162).

235 “Canela, cantera 120” no original. Esses 120 quintais de canela equivalem a cerca de 7.047kg (vide notas 153 e 163).

236 “Lacha, cantera 60” no original. Esses 60 quintais de laca correspondem a cerca de 3.525kg (vide notas 153 e 164).

237 “Benzui, cantera 15” no original. Esses 15 quintais de benjoim equivalem a cerca de 881kg (vide notas 153 e 165).

238 “Garofalli non hanno” no original. Vide nota 166.

239 “Zenzeri” no original. Vide nota 167.

240 “Uno re de Ethiopia, chiamato re Ubeam” no original. Vide nota 168.

241 “Li a presso etiam de quelli nasse piper, ma non é cussi compito come l’altro” no original. Vide nota 169.

242 “Li offerse 15 milia doble pro primo, che chadauna val più del ducato” no original. Vide notas 153 e 170.

243 Segundo Pero Vaz de Caminha, alguns indígenas possuíam fios “de continhas brancas, miúdas, que querem parecer de aljaveira”, observação confirmada mais adiante pelo comentário de outros trazerem “muitos arcos e continhas daquelas já ditas”. Todavia, o significado de “aljaveira” permanece incerto até os dias de hoje (teste CORTESÃO, 1943; GREENLEE, 1938; J. RIBEIRO, 1910; C.M. de Vasconcelos in C.M. DIAS, 1921-1924), havendo grande discussão se esses colares eram formados por matéria

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vegetal ou animal. Os defensores da primeira opinião (e.g. J. RIBEIRO, 1910) encaram “aljaveira” como mera variante de “aljofareira”, nome popular conferido a Lithospermum officinale, planta muito comum em Portugal cujas sementes recordam o aljôfar. Em contraposição, seus antagonistas (e.g. CORTESÃO, 1943) falam de “búzios”, “conchinhas brancas” e mesmo contas de madrepérola, evocando como prova o testemunho dos vários cronistas quinhentistas que descreveram os colares dos tupinambás (e.g. LERY, 1578; SOUSA, 1938; STADEN, 1557).

244 A perda das paisagens florestais do sul da Bahia constitui mero episódio da autêntica derrocada das matas do Brasil oriental consumada na década de 1970, quando mais de 50% dos remanescentes que haviam logrado subsistir até então foram aniquilados. Segundo resultados obtidos pela CEPLAC/New York Botanical Garden, os 405.000ha de matas atlânticas encontrados no sul da Bahia em 1974 (14,86% da área original coberta por essa formação) seriam reduzidos a 164.825ha em 1990 (6,04% da área original), configurando um decréscimo de 59,70% em apenas 17 anos (TEIXEIRA & ALMEIDA, 1997).

245 Esses “rastros” ou “dragas” não passavam de pesados aros de ferro parcialmente dentados providos de uma rede de couro e esparto com cerca de 2m de comprimento por 50cm de largura. Rebocados por canoas, arrastavam o fundo aprisionando os moluscos enterrados no sedimento, sendo usados para a captura tanto das amêijoas quanto dos berbigões (A.A.B. da SILVA, 1891).

246 Com cabos de 3 a 4m, tais instrumentos assemelhavam-se a grandes ancinhos de ferro nos quais se montava uma rede destinada a colher os moluscos capturados. Da borda de uma canoa ou mesmo com água até a cintura, o pescador revolvia o sedimento onde os mariscos estavam enterrados a pouca profundidade, fazendo com que suas presas caíssem dentro da bolsa anexa (A.A.B. da SILVA, 1891).

247 Podendo chegar a 50m de comprimento, 5m de largura e 23mm de malha, as “redes de tresmalho” possuíam de um a três panos e permaneciam de espera durante a noite, enquanto as chamadas “coas” alcançavam 3m de comprimento, 2m de largura e 6mm de malha, sendo manobradas por um ou dois homens vadeando a água rasa. Já as “tartaranhas” ou “redenhos” não passavam de sacos de malha fina com cerca de 2m de comprimento que eram rebocados por canoas e arrastavam o fundo do mar em seu trajeto. Por último, os “camaroeiros” ou “copos” apresentavam desenho muito semelhante aos dos nossos atuais puçás de apanhar siris, consistindo de uma rede com 8mm de malha em forma de cone provida de uma isca em seu interior (A.A.B. da SILVA, 1891).

248 Além de identificar tais camarões como pitus, Macrobrachium carcinus, autores como D.G. Dias (in MATTOS E SILVA, 1996) relacionariam a passagem em questão aos “potipemas” de Gabriel Soares de Sousa, crustáceos de “unhas curtas”, “barbas compridas”, “casca branda” e “feição aborrachada” parecidos aos “camarões de vila-franca” (SOUSA, 1938). Outras fontes, no entanto, prefeririam atribuir esse mesmo trecho do “Tratado Descritivo do Brasil” a uma tamburutaca, Cloridopsis dubia (Milne-Edwards, 1837), sem dúvida alguma influenciados tanto por aspectos morfológicos quanto pelo próprio nome empregado, que significaria “camarão chato” em tupi (P. da Silva in SOUSA, ca. 1945). Décadas mais tarde, entretanto, Margcrave chamaria os pitus (Decapoda, Palaemonidae) de “potipemas”, enquanto as tamburutacas (Stomatopoda, Squillidae) receberiam a designação genérica de “tamaru” até hoje presente na Bahia e em outras partes do nosso litoral (HOLTHUIS, 1980, 1991; MARCGRAVE, 1648; M.S. TAVARES, 1993; TEIXEIRA, 1995). De fato, a alegada semelhança entre os “potipemas” e os “camarões de vila-franca” sugere um autêntico Decapoda, pois a variante “camarão vila-franca” continua sendo utilizada no Brasil para denominar o camarão-verdadeiro, Litopenaeus schmitti (HOLTHUIS, 1980, 1991; VASCONCELLOS, 1938). Além disso, brasileiros e portugueses parecem não considerar os Squillidae verdadeiros camarões, tratando os vários representantes do grupo por “zagaias”, “galeras” ou “mães-de-camarão” (MELLO-LEITÃO, 1941; SANCHES, 1989).

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249 A julgar pelos comentários do Padre Gaspar Afonso (in BRITO, 1735), esses mamíferos aquáticos eram tão comuns que, por volta de 1596, as “Naus das Índias” de passagem na Bahia chegavam a levar “barris de peixe-boi salgado” em sua matalotagem. Algo semelhante continuaria ocorrendo no litoral da Amazônia no ano de 1658, haja vista o relato do Padre Antônio Vieira sobre os holandeses conseguirem carregar, todos os anos, “mais de 20 navios só de peixe-boi” graças ao comércio mantido com os índios no Cabo do Norte (A. VIEIRA, 1970). Tal abundância, porém, já teria declinado bastante no final do século XVIII, conforme sugere o famoso ensaio sobre a pesca das baleias de José Bonifácio (ANDRADA E SILVA, 1790).

250 Essa observação revela-se muito peculiar, pois os peixes-boi e as focas surgem como animais familiares ao autor em outras passagens de sua narrativa. Com efeito, ao descrever o litoral de Alagoas, Knivet assinala existir “grande cópia” de “peixes” no rio Santo Antônio, inclusive alguns “tão corpulentos como um boi” chamados “varaua”, mera variante de “goaragoá”, “guarabá”, “iuaraná” ou qualquer outro nome indígena parecido aplicado às espécies do gênero Thichechus (F. de A.C. Franco in KNIVET, 1947; R. von IHERING, 1940). Por outro lado, as focas (“seales” na versão de PURCHAS, 1626) teriam sido avistadas tanto ao sul do continente quanto no próprio litoral brasileiro, cabendo destacar a assertiva particularmente curiosa de haver “grande número” delas na ilha de São Sebastião, São Paulo, pois tais mamíferos chegam ao sudeste do país de forma bastante esporádica nos dias de hoje.

251 De acordo com a edição brasileira de 1940, o trecho pertinente poderia ser traduzido como “no rio São Mateus, cujo nome brasileiro original é Cricaré, encontra-se um animal raro que até agora só foi assinalado em muito poucos rios da costa oriental. Trata-se do manati ou ‘peixe-boi’ dos portugueses. A história natural desse curioso bicho é ainda obscura em muitos pontos; é bastante freqüente no rio em questão, dizendo-se que algumas vezes sai para o mar e se dirige, ao longo do litoral, para outros rios; assim, por exemplo, já foi capturado em Alcobaça. Em São Mateus, o refúgio preferido do manati é uma lagoa densamente coberta de caniços e outras gramíneas. O caçador, em um pequeno barco, rema atenta e silenciosamente entre os caniços e o capinzal; se vê o bicho com o dorso acima da água, o que acontece habitualmente quando está pastando, aproxima-se com cautela e arremessa-lhe um arpão ligado a uma corda. O manati fornece grande quantidade de gordura e a carne é apreciada. O osso timpânico do ouvido é tido como remédio poderoso pelo povo ignorante e comprado a alto preço. Embora fizesse, constantemente, grandes promessas, durante minha estadia de três a quatro meses nessas paragens, com o intuito de obter um desses animais, falharam minhas esperanças e fui obrigado a contentar-me em ver, ao voltar do Brasil, os manatis empalhados do gabinete de História Natural de Lisboa” (WIED-NEUWIED, 1940).

252 Olivério Pinto refere-se ao assunto nos comentários escritos para uma das traduções brasileiras da famosa “Reise nach Brasilien” do Príncipe Maximilian Wied-Neuwied (WIED-NEUWIED, 1820-1821), naturalista de sua especial predileção. Em dezembro de 1815, ao chegar a Vila Nova de Almeida (atual Nova Almeida, Espírito Santo; teste BOKERMANN, 1957), o viajante alemão teria ouvido “falar muito de um animal marinho, nunca antes visto aí, que uns índios mataram na praia havia pouco, a tiros de mosquete. Era grande e dizia-se possuir pés parecidos com mãos humanas. Extraíra-se dele grande quantidade de gordura. A cabeça e pés foram enviados ao governador. Todas as nossas tentativas para obter informações mais pormenorizadas sobre este animal foram inúteis, mesmo porque partiram e cozinharam o esqueleto, enterrando-o em parte. De tudo que soubemos, entretanto, parece que se tratava de uma foca ou manati” (WIED-NEUWIED, 1940). Em nota pertencente às páginas 147 e 148 dessa edição, Olivério Pinto pondera que “a presença de extremidades semelhantes a mãos humanas compromete a hipótese de estar em jogo aqui um sirênio como o peixe-boi, parecendo tratar-se antes de um pinípede, a menos que tenha havido erro nas informações colhidas pelo viajante naturalista.

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Seja como for, o peixe-boi, a que os tupis da costa oriental chamavam ‘goaragoá’, era nos primeiros tempos provavelmente comum em todos os grandes rios da vertente oriental do Brasil. O Padre Fernão Cardim deu-nos dele longa e pitoresca descrição, ao passo que sua ocorrência na Baía é testemunhada por Gabriel Soares de Sousa e no Espírito Santo por Anchieta. Sua existência ainda em nossos dias no alto rio Doce foi-me verbalmente asseverada por Pinto da Fonseca, bastante conhecedor da fauna daquela região. Admite-se geralmente que a espécie seja a mesma do Amazonas (Trichechus inunguis Pelzeln); faltam-nos entretanto elementos para afirmá-lo com segurança”. A princípio, tal possibilidade nada tem de inusitada, pois exemplares de Trichechus manatus muitas vezes sobem os rios, tendo sido registrados a 230km da costa da Flórida e a mais de 800km do litoral sul-americano (HUSAR, 1978; BEST & TEIXEIRA, 1982). De resto, vale observar existirem relatos quinhentistas sobre “monstros marinhos” não muito diversos daquele descrito por Wied na Baía de Guanabara, Rio de Janeiro (e.g. LERY, 1578).

253 Gabriel Soares de Sousa descreve a “picaçu” como uma pequena “pomba brava” de plumagem “cinzenta” e “pés vermelhos”, relato sucinto o suficiente para permitir interpretações assaz discordantes. Enquanto Varnhagen (in SOUSA, 1938) identifica essa ave como uma rolinha, Columbina passerina (Linnaeus, 1758), Pirajá da Silva (in SOUSA, ca. 1945) advoga a hipótese bem mais verossímil de tratar-se da pomba-galega, Columba cayennensis, uma vez que o texto original parece referir-se a um colúmbida de certo porte. Tampouco o nome utilizado revela-se de alguma valia, pois “picaçu” e suas variantes significam apenas “pomba-grande” em tupi, tendo sido empregado para designar espécies tão distintas como Columba plumbea, Columba picazuro e Columba cayennensis, embora diga respeito sobretudo a esta última (GOELDI, 1894; H. von IHERING & IHERING, 1907; T. SAMPAIO, 1914).

254 Vide nota 192.

255 A julgar pelas fontes consultadas (e.g. O.M. de O. PINTO, 1935, 1938, 1978; D. SOUZA, 1995), o elenco de psitácidas com plumagem predominantemente verde encontrado no sul da Bahia incluiria Ara severa (Linnaeus, 1758), Ara maracana (Vieillot, 1816), Ara nobilis (Linnaeus, 1758), Aratinga leucophthalmus (Müller, 1776), Aratinga auricapilla (Kuhl, 1820), Aratinga aurea, Pyrrhura cruentata, Pyrrhura frontalis (Vieillot, 1823), Pyrrhura leucotis (Kuhl, 1820), Brotogeris tirica, Brotogeris versicolurus (Müller, 1776), Forpus xanthopterygius, Touit melanonota, Touit surda, Pionopsitta pileata, Pionus menstruus, Pionus maximiliani, Amazona rhodocorytha, Amazona vinacea, Amazona amazonica, Amazona farinosa e Triclaria malachitacea.

256 “Anno rechato molte ragoni d’ucelli e animali a noi inchongniti e no mai piu visti in modo chelle chose rachontava Plinio nelle suo storie. Erano tenute bugie e per quello oggi di si vede si puo dire n’avasse qualche notizia” no original. Este é o único trecho a falar de animais na segunda carta de Bartolomeo Marchionni, que teria sido escrita em fins de julho de 1501 para o mesmo destinatário misterioso de sua primeira missiva. A íntegra do texto italiano pode ser encontrada, por exemplo, em T.O.M. de SOUZA (1946).

AGRADECIMENTOS Durante os estudos prévios e execução desse trabalho, contamos com a valiosa colaboração de Maria Carlota Rosa (Faculdade de Letras/UFRJ) e Arnaldo Campos dos Santos Coelho (Museu Nacional/UFRJ), cujas sugestões mostraram-se de grande valia para a compreensão de certas passagens dos originais. Nesse sentido, também gostaríamos de agradecer a Carlos Almaça (Museu Bocage, Lisboa) pelo apoio conferido às pesquisas efetuadas em acervos portugueses, a Tatiana Papavero e Daniel S. Fernandes (Museu Nacional/UFRJ) pela elaboração das figuras do texto, a Ricardo Eichler Bailly (Livraria Carioca Rio Antigo) pelos comentários referentes à numismática do século XVI, a Roberto Menezes de Moraes (Livraria Carioca Rio Antigo) pelas observações relativas à nobiliarquia lusitana e sobretudo a Gustavo

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Wilson Nunan (Museu Nacional/UFRJ), que gentilmente colocou ao nosso dispor resultados inéditos de pesquisas ictiológicas efetuadas no sul da Bahia durante o Programa REVIZEE (Levantamento dos Recursos Vivos da Zona Econômica Exclusiva). Cabe reconhecer ainda o imprescindível auxílio prestado por Vera de Figueiredo Barbosa, Antônio Carlos Gomes Lima (Biblioteca do Museu Nacional/UFRJ) e Margareth Elisabeth Cardoso (Livraria Carioca Rio Antigo) na reunião da bibliografia pertinente e/ou na análise das referências utilizadas. Por fim, cumpre destacar o apoio concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) às pesquisas realizadas pelos autores durante os últimos anos.

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ANEXO 1

LEITURA DIPLOMÁTICA DA CARTA DE PERO VAZ DE CAMINHA AO REI DOM MANUEL, DATADA DE 1o DE MAIO DE 1500

[Folio 1r] Senhor posto queo capitam moor desta vossa frota e asy os outros capitaães screpuam avossa alteza anoua do acha mento desta vossa terra noua que se ora neesta naue gaçom achou. nom leixarey tam bem de dar disso minha comta avossa alteza asy como eu milhor poder ajmda que perao bem contar e falar o saiba pior que todos fazer / pero tome vossa alteza minha jnoramçia por boa vomtade. aqual bem çerto crea que por afremosentar nem afear aja aquy de poer ma is caaquilo que vy e me pareçeo. / da marinha jem e simgraduras docaminho nõ darey aquy cõ ta a vossa alteza por queo nom saberey fazer e os pilotos deuem teer ese cuidado e por tamto Senhor do que ey de falar começo e diguo. que apartida de belem como vosa alteza sabe foy segunda feira ix demarço. e sabado xiiij do dito mes amtre as biij e ix no oras nos achamos antre as canareas mais perto dagram canarea e aly amdamos todo aquele dia em calma avista delas obra de tres ou quatro legoas. e domingo xxij do dito mes aas x oras pouco mais ou menos ouuemos vista das jlhas do cabo verde .scilicet. dajlha de sã njcolaao. segundo dito de pero escolar piloto. e anoute segujmte aasegunda feira lhe amanheçeo se perdeo da frota vaasco datayde com a sua naao sem hy auer tempo forte nẽ contrairo pera poder seer. fez ocapitam suas deligençias perao achar ahuũas e a as outras partes e nom pareçeo majs Easy segujmos nosso caminho per este mar delomgo ataa terça feira doitauas de pascoa que foram xxj dias dabril que topamos alguũs synaaes de tera seemdo da dita jlha segundo os pilotos deziam obra de bjc lx ou lxx legoas. os quaaes herã mujta cam tidade deruas compridas aque os mareantes chamã botelho e asy outras aque tam bem chamã Rabo dasno. / E aaquarta feira segujmte pola ma

[Folio 1v] nhãa topamos aves aque chamã fura buchos. e neeste dia aoras de bespera ouuemos vista de tera .scilicet. primeiramente dhuũ gramde monte muy alto. e Redomdo e doutras serras mais baixas ao sul dele e de terra chaã com grandes aruoredos. ao qual monte alto ocapitam pos nome o monte pascoal E aatera. atera davera cruz. mandou lamçar op rumo acharam xxb braças e ao sol posto obra de bj legoas de tera surgimos amcoras em xix braças amcorajem limpa. aly jouuemos todaaquela nou

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te. e aaquimta feira pola manhaã fezemos vella e segujmos djreitos aaterra eos naujos pequenos diã te himdo per xbij xbj xb xiiij xiij xij x. E ix braças ataa mea legoa de terra omde todos lancamos amcoras em djreito daboca dhuũ Rio e chegariamos aesta amcorajem aas x oras pouco mais ou menos e daly ouuemos vista dhomeẽs que amdauam pela praya obra de bij ou biij segundo os naujos pequenos diseram por chegarem primeiro../ aly lancamos os batees e esquifes fora evieram logo todolos capitaães das naaos aesta naao do capitam moor e aly falaram. e ocapitam man dou no batel em terra njcolaao coelho peraveer aquele Rio e tamto que ele comecou perala dhir acodirã pela praya homeẽs quando dous quando tres de maneira que quando obatel chegou aaboca do Rio heram aly xbiij ou xx homeẽs. pardos todos nuus sem nhuũa cousa que lhes cobrise suas vergonhas. traziam arcos nas mãaos esuas see tas. vijnham todos Rijos perao batel e nicolaao co elho lhes fez sinal que posesem os arcos. e eles os poseram. aly nom pode deles auer fala nẽ entẽ dimento que aproueitasse polo mar quebrar na costa. soomente deulhes huũ barete vermelho e huũa carapuça de linho que leuaua na cabeça e huũ sombreiro preto. E huũ deles lhe deu huũ

[Folio 2r] huũ sombreiro de penas daues compridas cõ huũa copezinha pequena de penas vermelhas epardas coma de papagayo e outro lhe deu huũ Ramal grande de comtinhas brancas meudas que querem pareçer daljaueira as quaaes peças creo queo capitam n manda avossa alteza e com jsto se volueo aas naaos por seer tarde e nom poder deles auer mais fala por aazo do mar. / anoute segujmte ventou tamto sueste cõ chuuaçeiros que fez caçar as naaos e especialmente e acapita na. Eaa sesta pola manhaã as biij oras pouco ma is ou menos per conselho dos pilotos mandou oca pitam leuamtar amcoras e fazer vela e fomos de lomgo dacosta com os batees e esquifes amarados perpopa comtra onorte peraveer se achauamos al guuã abrigada e boo pouso omde jouuesemos pera tomar agoa e lenha. nom por nos ja mjnguar mas por nos acertarmos aquy e quamdo fezemos vela seriam ja na praya asentados jumto cõ o Rio. obrra de lx ou lxx homeẽs que se jumtaram aly poucos epoucos / fomos de lomgo e mandou ocapitam aos nauios pequenos que fosem mais chegados aaterra e que se achasem pouso seguro peraas naaos que amaynasem. Eseendo nos pela costa obra de x legoas domde nos leuamtamos acharam os ditos nauios peqnos huũ aRecife com huũ porto dentro

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muito boo e muito seguro com huũa muy larga entrada e meteramse dentro e amaynaram. e as naaos aRibaram sobreles. e huũ pouco amte sol posto amaynarom obra dhuũa legoa do aRecife e ancoraramse em xb xj braças. / Eseendo afonso lopez nosso piloto em huũ daqueles naujos pequenos per mandado do capitam por seer homẽ vyuo e dee stro pera jsso meteose loguo no esquife asomdar oporto demtro e tomou em huũa almaadia dous daqueles homeẽs da terra mançebos ede boos cor pos. e huũ deles trazia huũ arco e bj ou bij seetas

[Folio 2v] e na praya amdauam mujtos cõ seus arcos e seetas e nom lhe aproueitaram. / trouueos logo ja de noute ao capitam omde foram Recebidos com muito pra zer e festa. / afeiçam deles he seerem pardos maneira dauerme lhados de boõs Rostros e boos narizes bem feitos. / am dam nuus sem nenhuũa cubertura. nem estimam n huũa coussa cobrir nem mostrar suas vergonhas. e estam açerqua disso com tamta jnocemçia como teem em mostrar oRostro. / traziam ambos os beiços debaixo furados e metidos por eles senhos osos doso bramcos de compridam dhuũa maão trauessa e de grosura dhuũ fuso dalgodam e agudo na põta coma furador. metẽ nos pela parte de dentro do bei ço e oque lhe fica antre obeiço eos demtes he feito coma Roque denxadrez. e em tal maneira o trazem aly emcaxado que lhes nom da paixã nem lhes tor ua afala nem comer nem beber. / os cabelos seus sam coredios e andauã trosqujados de trosquya al alta mais que de sobre pemtem deboa gramdura e Rapados ataa per cjma das orelhas. e huũ deles trazia per baixo da solapa de fonte afomte pera detras huũa maneira de cabeleira de penas daue ama rela que seria decompridam dhuũ couto. muy basta e muy çarada que lhe cobria otoutuço eas ore lhas. aqual amdaua pegada nos cabelos pena e pena com huũa comfeiçam branda coma cera e nõ no era. demaneira que amdaua acabeleira muy Redonda e muy basta e muy jgual que nõ fazia mjngoa mais lauajem peraa leuantar. / oca pitam quando eles vieram estaua asentado em huũa cadeira e huũa alcatifa aos pees por estrado e bem vestido cõ huũ colar douro muy grande ao pescoço. e sancho de toar e simam de miranda enj colaao coelho e aires corea e nos outros que aquy na naao himos cõ ele himos asentados no chaão [Folio 3r] per esa alcatifa. / acemderam tochas e emtraram e nõ fezeram nhuũa mençam de cortesia nem de falar ao capitam nem anjmguem. pero huũ deles pos olho no

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colar do capitam e começou daçenar cõ amaão pera aterra e despois perao colar como que nos dizia que avia em tera ouro e tam bem vio huũ castical de prata e asy meesmo acenaua peraa tera e entã perao castical como que avia tam bem prata. / mostrarã lhes huũ papagayo pardo que aquy ocapitam traz. / tomarãno logo na maão e acenaram peraa terra como que os avia hy. / mostraranlhes huũ carneiro nõ fezeram dele mençam. mostraranlhes huũa galinha casy aviam medo dela e nõ lhe queriam poer a maão edespois atomaram coma espamtados. / de ranlhes aly de comer pam e pescado cozido. confej tos fartees mel e figos pasados. nõ quiseram comer daquilo casy nada e alguũa coussa se aprouauam lamçauãna logo fora. trouueramlhes vinho perhũa taça. poseranlhe asy aboca tã malaues e nõ gostarã dele nada nem oquiseram mais / trouueramlhes agoa per huũa albarada tomaram dela senhos bocados e nõ beberam. soomente lauarã as bocas elam çaram fora. vio huũ deles huũas contas de Rosairo brancas. açenou que lhas desem e folgou muito com elas e lancouas ao pescoço e despois tirouas e enb rulhouas no braço e acenaua peraa terra e entã peraas contas eperao colar do capitam como que dariam ouro por aquilo. / Jsto tomauamonos asy polo de sejarmos / mas se ele queria dizer que leuaria as contas e mais ocolar. jsto nom querjamonos emtender por que lho nõ aviamos de dar edespo is tornou as contas aquem lhas deu e entã estira ranse asy decostas naalcatifa adormjr sem teẽr nhuũa maneira de cobrirem suas vergonhas as quaaes nõ herã fanadas e as cabeleiras delas bem Rapa das e feitas. ocapitã lhes mandou poer aas cabeças senhos coxijs e odacabeleira procuraua asaz polla nõ quebrar e lançarãlhes huũ manto ẽ cjma e eles cõ sentiram e jouueram e dormjram. /

[Folio 3v] ao sabado pola manhaã mandou ocapitã fazer vella e fomos demandar aemtrada aqual era muy lar gua e alta de bj bij braças e entraram todalas n naaos demtro e amcoraramse em b bj braças / a qual amcorajem dentro he tam grande e tã fre mossa e tam segura que podem jazer dentro neela mais de ijc naujos e naaos. e tamto que as naaos foram pousadas e amcoradas vieram os capitaães todos aesta naao do capitam moor. edaquy mandou ocapitã an njcolaao coelho ebertolameu dijaz que fo sem em terra eleuasem aqueles dous homeẽs eos lei xasem hir com seu arco e seetas. aos quaaes mãdou dar senhas camisas nouas e senhas carapuças ver melhas e dous Rosairos de contas brancas doso que eles leuauam nos braços e senhos cascauees e senhas canpainhas. e mandou cõ eles pera ficar la huũ

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mançebo degradado criado de dom joham teelo aque chamã afonso Ribeiro pera amdar la com eles e saber de seu vjuer e maneira e amỹ mandou que fose cõ nicolaao coelho. / fomos asy de frecha djreitos aa praya / aly acodiram logo obra de ijc homeẽs todos nuus ecõ arcos e seetas nas maãos. / aqueles que nos leuauamos acenaramlhes que se afastasem e posesem os arcos e eles os poseram e nom se afasta uam muito. / abasta que poseram seus arcos e em tam sairam os que nos leuauamos eo mançebo degradado cõ eles. os quaaes asy como sairã nom pararam mais nem esperaua huũ por outro se nõ aquem mais coreria epasarã huũ Rio que perhy core dagoa doce de mujta agoa que lhes daua pe la braga e outros mujtos cõeles e foram asy corẽdo aalem do Rio antre huũas moutas depalmas onde estauam outros e aly pararom e naquillo foy o degradado com huũ homẽ que logo ao sair do batel ho agasalhou e leuouo ataa la e logo ho tornaram anos e com ele vieram os outros que nos leuamos os quaaes vijnham ja nuus e sem carapuças. Eentam se começaram dechegar muj tos

[Folio 4r] e emtrauam pela beira do mar pera os batees ataa que mais nom podiam e traziam cabaacos dagoa e tomauã alguũs barijs que nos leuauamos eem chianos dagoa e trazianos aos batees. nõ que eles de todo chegasem abordo do batel. mas junto cõ ele lancauãno damaão e nos tomauamolos epe diam que lhes desem alguũa coussa. / leuaua nj colaao coelho cascauees e manjlhas e huũs daua h huũ cascauel e aoutros huũa manjlha. demaneira que com aquela emcarna casy nos queriam dar amaão. dauãnos daqueles arcos e seetas por son breiros e carapuças de ljnho e por qual quer coussa que lhes homẽ queriã dar. / daly se partirã os outros dous mançebos que nom os vimos mais / amdauam aly mujtos deles ou casy amaior parte. que todos traziam aqueles bicos doso nos beiços e alguũs que andauam sem eles traziam os beiços furados e nos buracos traziam huũs espelhos de paao que pareçiam espelhos de boracha e alguũs deles traziam tres daqueles bicos .scilicet. huũ na me tade eos dous nos cabos. e amdauam hy outrros quartejados de cores .scilicet. deles ameetade dasua pro pia cor e ameetade de timtura negra maneira dazulada e outros quartejados descaques. / aly am dauam antreles tres ou quatro moças bem moças e bemjentijs com cabelos mujto pretos comprjdos pelas espadoas e suas vergonhas tam altas e tã çaradinhas e tam limpas das cabeleiras que de as nos mujto bem olharmos nõ tijnhamos nhuũa

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vergonha. / aly por emtam nom ouue mais fala nẽ emtendimento cõ eles por aberberja deles seer ta manha que se nom emtendia nem ouuja njngẽ. / açenamoslhe que se fosem e asy o fezeram e pasa ranse aalem doRio e sairã tres ou quatro homeẽs nosos dos batees e emcherã nõ sey quantos barrijs dagoa que nos leuauamos e tornamonos aas naaos. [Folio 4v] e em nos asy vijndo acenarãnos que tornasemos. / tornamos e eles mandarom odegradado e nom quiseram que ficasse la cõ eles. / oqual leuaua huũa bacia pequena e duas ou tres carapuças verme lhas pera dar la ao Senhor seo hy ouuese. / nõ curarã de lhe tomar nada e asy omandaram com tudo e entam bertolameu dijaz o fez outra vez tornar que lhes dese aquilo. e ele tornou edeu aquilo ẽ vista de nos aaquele queo da primeira agasalhou e entam veosse e trouuemolo. / este queo agasalhou era ja de dias e amdaua todo por louçaynha cheo depenas pegadas pelo corpo que pareçia a seetado coma sam sabastiam. outros traziã cara puças depenas amarelas eoutros de vermelhas eoutros de verdes. e huũa daquelas moças era toda timta defumdo acjma daquela timtura aqual çerto era tã bem feita e tam Redomda e sua vergonha que ela nõ tijnha tam graçiossa que amujtas molheres de nossa terra vendolhe taaes feições fe zera vergonha por nom teerem asua comeela. / nhuũ deles nõ era fanado mas todos asy coma nos e com jsto nos tornamos e eles foramsse // aatarde sayo ocapitã moor ẽ seu batel cõ todos nos outros e com os outros capitaães das naaos em seus batees afolgar pela baya acaram dapraya mas njmguem sayo em tera polo capitã nom querer sem embargo de njnguem neela estar / soomente sayo ele com todos em huũ jlheeo gr grande que na baya esta que de baixamar fica muy vazio pero he detodas partes cercado dagoa que nõ pode njmguem hir aele sem barco ou anado. / aly folgou ele e todos nos outros bem hũa ora e mea e pescaram hy amdando marinheiros cõ huũ chimchorro e matarom pescado meudo nõ mujto. e entã voluemonos aas naaos ja bẽ noute. / [Folio 5r] ao domjngo de pascoela pola manhaã detremj nou ocapitam dhir ouujr misa e preegaçam na quele jlheeo. e mandou atodolos capitaães que se corejesem nos batees e fosem cõ ele e asy foy feito. / mandou naquele jlheeo armar huũ esperauel e dentro neele aleuantar altar muy bem core gido e aly com todos nos outros fez dizer misa aqual dise o padre frey amrique em voz entoa da e oficiada cõ aquela meesma voz pelos outros

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padres e sacerdotes que aly todos heram. / aqual misa segundo meu pareçer foy ouujda per todos cõ mujto prazer e deuaçom. aly era com ocapitam abandeira de christos com que sayo debelem a qual esteue senpre alta aaparte do auamjelho. / acabada amisa desuestiosse o padre eposese em huũa cadeira alta e nos todos lamcados per esa area e preegou huũa solene e proueitossa preega çom da estorea do avanjelho. e em fim dela. tra utou de nossa vijnda e do achamento desta terra cõ formandose cõ o sinal da cruz so cuja obediençia vĩjmos aqual veo mujto apreposito efez mujta deuaçom. em quanto esteuemos aamisa e aapregaçom seriã na praya outra tanta jente pouco mais ou menos como os domtem cõ seus arcos e seetas os quaaes amdauam folgando e olhando nos e asentaramse. e despois dacabada amisa aseẽ tados nos aapreegaçom aleuantaranse mujtos deles e tanjeram corno ou vozina e comecaram asaltar e dançar huũ pedaço. e alguũs deles se metiam em almaadias duas ou tres que hy tijnham as quaaes nõ sam feitas como as que eu ja vy. soomente sam tres traues atadas jumtas e aly se metiam iiij ou b ou eses que queriam nõ se afastando casy nada daterra se nõ quanto podiam tomar pee. / acabada apreegacõ moueo

[Folio 5v] moue ocapitã e todos peraos batees cõ nosa bandeira alta e enbarcamos e fomos asy todos contra a terra perapasarmos ao longo per ondeles estauam hj ndo bertolameu dijaz em seu esquife per mãdado do capitam diamte cõ huũ paao dhuũa almaa dia que lhes o mar leuara pera lho dar e nos todos obra de tiro depedra tras dele. como elles viram ho esquife de bertolameu dijaz chegarãse logo todos aagoa metendose neela ataa onde mais podiam. acenaranlhes que posesem os arcos e mujtos deles os hiam logo poer ẽ terra e outros os nõ punham. amdaua hy huũ que falaua mujto aos outros que se afastasem mas nõ ja que mamỹ parecese que lhe tijnham acatamẽto nẽ medo / este que os asy amdaua afastando trazia seu arco e seetas e amdaua tj mto de timtura vermelha pelos peitos e espadoas e pelos quadrijs coxas e pernas ataa baixo. eos vazios com abariga e estamego era da sua propia cor e a timtura era asy vermelha que aagoa lha nã comya nem desfazia / ante quando saya daagoa era mais vermelho. / sayo huũ homẽ do esquife de bertolameu dijaz. e andaua antreles sem eles emtenderem nada neele quanta pera lhe fazerem mal. se nõ quã

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to lhe dauam cabaaços dagoa e acenauã aos do esquife que saisem em terra. cõ jsto se volueo bertolameu dijaz ao capitam e viemonos aas naaos acomer tanjendo tronbetas e gaitas sem lhes dar mais apresam e eles tornaramse aasentar na praya Easy por entam ficarã /. neeste jlheo omde fomos ouujr misa epreegaçã espraya muito aagoa e descobre mujta area e mujto cascalhaao. forã alguũs em nos hy estã do buscar marisco e nõ no acharom. e acharã alguũs camaroões grosos e curtos. / antre [Folio 6r] os quaaes. vijnha huũ mujto grande camarã e muito grosso que em nhuũ tenpo ovy tama nho tam bem acharom cascas de bergoões e da meijeas mas nõ toparã cõ nhuũa peçay jnteira e tamto que comemos vieram logo todolos capi taães aesta naao per mandado do capitã moor com os quaaes se ele apartou e eu na conpanhia e preguntou asy atodos se nos pareçia seer bem mandar anoua do achamento desta terra avosa alteza pelo naujo dos mantijimentos peraa mjlhor mãdar descobrjr e saber dela mais do que agora nos podiamos saber por hirmos denosa viajem e antre mujtas falas que no caso se fezeram foy per todos ou amayor parte dito que seria mujto bem. e njsto comcrudiram. / e tamto que acomcrusam foy tomada. pregumtou mais se seria boo tomar aquy per força huũ par destes homeẽs. peraos mandar avosa alteza. e leixar aquy por eles outros dous destes degra dados. / aesto acordaram que nõ era necesa reo. tomar per força homeẽs. por que jeeral costume era dos que asy leuauom per força peraalgũa parte dizerem que ha hy todo oque lhe preguntam. e que mjlhor e mujto mjlhor enformaçom da terra dariam dous homeẽs destes degradados que aquy leixasem. doque eles dariam se os leuasem por seer jente que njmguem emtende nem eles tam cedo aprẽ deriam afalar perao saberẽ tam bem dizer que mujto mjlhor ho estoutros nom digam quando ca vossa alteza mandar. e que por tamto nom curasem aquy deper força tomar njmguem nem fazer escandolo peraos detodo mais amã sar e apaceficar. / se nom soomente leixar aquy os dous degradados quando daquy partisemos. / easy por mjlhor pareçer atodos ficou detremjnado /./ [Folio 6v] acabado jsto. dise ocapitam que fosemos nos ba tees em terra e veersia bem o Rio quejando era. e tam bem pera folgarmos. / fomos todos nos batees em tera armados e abandeira cõ nosco.

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eles amdauam aly na praya aaboca do Rio omde nos hiamos e ante que chegasemos. / do emsino que dantes tijnham poseram todos os arcos e acenauam que saisemos e tanto que os batees poserã as proas em terra pasarãse logo todos aalem do Rio oqual nõ he mais an cho que huũ jogo demanqual e tanto que desenbarcamos. alguũs dos nosos pasarom logo o Rio e foram antrelles. / e alguũs agua rdauam e outros se afastauam. pero era acousa de maneira que todos andauam mesturados / eles dauam deses arcos com suas seetas por sonbreiros e carapuças de linho e por quall quer cousa que lhes dauam. / pasaram aalem tamtos dos nosos e amdauam asy mestura dos cõ eles. que eles se esqujuauam e afasta uanse e hianse deles peracjma onde outros estauam e entã ocapitam fezese tomar ao colo de dous homeẽs e pasou o Rio e fez tornar todos. / ajente que aly era nõ serja mais caaquela que soya. / e tanto queo capitã fez tornar todos vieram alguũs deles aele nõ polo conhecerẽ por Senhor ca me pareçe que nõ entendem nẽ tomauã djsso conhecimento mas por que ajente nossa pasaua ja peraaquem do Rio. / aly falauã e traziam mujtos arcos e contjnhas daquelas ja ditas e Resgatauã por qualquer cousa. em tal maneira que tro uueram daly peraas naaos mujtos arcos e see tas e comtas e entam tornouse ocapitam aaquem do Rio e logo acodirã mujtos aabeira dele

[Folio 7r] aly verjees galantes pimtados depreto everme lho e quartejados asy pelos corpos como pelas pernas. que çerto pareciam asy bem. / tanbem andauam antreles iiij ou b molheres moças asy nuas que nom pareçiam mal antre aas quaaes amdaua huũa com huũa coxa toda do giolho ataa oquadril e anadega toda tjnta daquela tintura preta e o al todo dasua propia cor. outra trazia anbolos giolhos cõ as cur uas asy timtas e tam bem os colos dos pees. e suas vergonhas tam nuas ecom tamta jno çemçia descubertas que nõ avia hy nenhuũa vergonha. / tam bem andaua hy outra molher moça com huũ menjno ou menjna no colo atado com huũ pano nõ sey deque aos peitos. que lhe nõ pareçia se nõ as pernjnhas. / mas as pernas damay eo al nõ trazia nhuũ pano / / e despois moueo ocapitam peracjma ao longo do Rio que anda senpre acaram da praya e aly esperou huũ velho que trazia

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na maão hũa paa dalmaadia. / falou estãdo ocapitã com ele perante nos todos sem onũca njmguem emtender nem ele anos quanta cousas que lhomẽ pregumtaua douro que nos desejauamos saber seo avia na terra. / trazia este velho obeiço tam furado que lhe caberja pelo furado huũ gram dedo polegar e tra zia metido no furado huũa pedra verde Roim que çaraua per fora aquele buraco e ocapitã lha fez tirar e ele nõ sey que diaabo falaua e hia cõ ela peraaboca do capitam peralha meter. / esteuemos sobriso huũ pouco Rijmdo e entam enfadouse ocapitã e leixouo. e huũ dos nosos deulhe pola pedra huũ sonbreiro uelho nõ por ela valer algũa coussa. mas por mostra. e despois aouue ocapitam. creo pera cõ as outras cou [Folio 7v] sas amandar avosa alteza. / andamos per hy veendo a Ribeira aqual he de mujta agoa e mujto boa. / ao longo dela ha mujtas palmas nõ muito altas em que ha mujtos boos palmj tos. colhemos e comemos deles mujtos. / entã tornouse ocapitã perabaixo peraaboca do Rio on de desenbarcamos e aalem do Rio amdauã mujtos deles damçando e folgando huũs ante outros sem se tomarem pelas maãos e faziãno bem /. pasouse emtam aalem do Rio diego dijaz almoxarife que foy de sacauem que he homẽ gracioso edeprazer e leuou comsigo huũ ga yteiro noso cõ sua gaita e meteose cõ eles adançar tomandoos pelas maãos e eles folga uam e Riam e amdauam cõ ele muy bem ao soõ dagaita. despois de dançarem fez lhe aly amdando no chaão mujtas voltas lige iras e salto Real deque se eles espantauam e Riam e folgauã mujto. e com quanto os cõ aquilo muito segurou e afaagou. toma uam logo huũa esqujueza coma monteses e foranse pera cjma. Eentã ocapitã pasou oRio cõ todos nos outros e fomos pela praya delongo himdo os batees asy acaram de terra e fomos ataa huũa lagoa grande dagoa doçe que esta jumto com apraya por que toda aquela Ribejra do mar he apaulada per cjma e saay aagoa permujtos lugares e depois depasarmos oRio foram huũs bij ou biij deles amdar antre os marinheiros que se Recolhiã aos ba tees e leuaram daly huũ tubaram que bertolameu dijaz matou e leuaualho e lanço uo na praya. / abasta que ataaquy como quer que se eles em alguũa parte amansasem logo dhũa maão peraaoutra se esqujuauam

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[Folio 8r] coma pardaaes deceuadoiro e homẽ nom lhes ousa de falar Rijo por se mais nom esqujuarem e todo se pasa como eles querem polos bem a mansar / ao velho cõ que ocapitam falou deu huũa carapuça vermelha e com toda a fala que cõ ele pasou e com acarapuça que lhe deu. tanto que se espedio que comecou de pasar o Rio. foise logo Recatando. e nõ qujs mais tornar do Rio peraaquem. / os outros dous queo capitã teue nas naaos aque deu oque ja dito he. numca aquy mais pareçeram. de que tiro seer jente bestial e depouco saber e por ysso sam asy esqujuos. / eles porem cõ tudo andam mujto bem curados e mujto limpos e naquilo me pareçe ajmda mais que sam coma aves ou alimareas monteses que lhes faz ho aar p mjlhor pena e mjlhor cabelo que aas mansas. / por que os corpos seus sam tam limpos e tam gordos e tam fremosos que nõ pode mais seer. ejsto me faz presumjr que nõ teem casas nẽ moradas em que se co lham eo aar aque se criam os faz taaes. / nẽ nos ajnda ataagora nom vimos nhuũas casas nem maneira delas /.. mandou ocapitã aaquele degradado afonso Ribeiro que se fosse outra vez com eles. oqual se foy e andou la huũ boõ pedaço e aatarde tornouse queo fezerã eles vijr e nõ oquiseram la consemtir e derãlhe arcos e seetas e nõ lhe tomarã nhuũa cousa do seu. / ante dise ele que lhe tomara huũ deles huũas continhas amarelas que ele leuaua e fogia cõ elas e ele se queixou eos outros foram logo apos eles elhas tomaram e tornaranlhas adar e emtam mã darãno vĩjr. / dise ele que nõ vira la antre eles se nõ huũas choupanjnhas de Rama verde e de feeitos mujto grandes coma dantre doiro e mjnho e asy nos tornamos aas naaos ja casy noute ador mjr

[Folio 8v] aasegunda feira depois decomer saimos todos ẽ tera atomar agoa. / aly vieram emtam mujtos. mas nõ tamtos comaas outras uezes e traziã ja muito poucos arcos e esteuerã asy huũ pouco afastados denos. e despois poucos epoucos mestu raranse cõ nosco. e abracauãnos e folgauam e alguũs deles se esqujuauam logo. / aly da uam alguũs arcos por folhas depapel epor al gũa carapucinha velha e por qual quer cousa Eem tal maneira se pasou acousa que bem xx ou xxx pesoas das nosas se forã cõ elles onde outros mujtos deles estauam com moças e molheres e trouueram dela muitos arcos e baretes depenas daues deles verdes e deles

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amarelos de que creo queo capitam ha de mãdar amostra a vossa alteza. e segundo deziam eses que la foram folgauam com eles. / ne este dia os uimos de mais perto e mais aanosa vontade por andarmos todos casy mesturados Ealy deles andauam daquelas timturas quartejados outros de meetades outros detanta feiçam coma ẽ panos darmar e todos com os beiços furados e mujtos cõ os osos neeles e deles sem osos.. / traziã alguũs deles huũs ourjços verdes daruores que casy na cor querjam pa recer de castinheiros se nõ quanto herã mais e mais pequenos e aqueles herã cheos dhuũs graãos vermelhos pequenos. que esmagandoos antre os dedos fazia timtura mujto vermelha daque eles amdauam timtos e quanto se ma is molhauã tanto mais vermelhos ficauam. / todos andam Rapados ataacjma das orelhas. e asy as sobrancelhas e pestanas. / trazem todos as testas de fonte a fomte timtas datimtura preta que pareçe huũa fita preta ancha de

[Folio 9r] dous dedos. Eo capitã mandou aaquele degra dado afonso Ribeiro e aoutros dous degradados que fosem amdar la antreles e asy adiego dijaz por seer homẽ ledo com que eles folgauam. e aos degradados mandou que ficasem la esta noute. / foramse la todos e andaram antreles e segundo eles deziam foram bem huũa legoa e mea ahuũa pouoraçom de casas em que averja ix ou x casas as quaaes deziã q erã tam conpridas cada hũa comeesta naao capitana. e herã de madeira e das jlhargas de tauoas e cubertas de palha de Razoada al tura e todas em huũa soo casa sem nhuũ Repar timento tijnham de dentro mujtos esteos e de steo aesteo huũa Rede atada pelos cabos ẽ ca da esteo altas em que dormjam e debaixo pera se aquentarem faziam seus fogos e tijnha ca da casa duas portas pequenas huũa ẽ huũ cabo e outra no outro. e deziam que em cada casa se colhiam xxx ou R pesoas e que asy os achauam e que lhes dauam de comer da quela vianda que eles tijnham .scilicet. mujto j nhame eoutras sementes que na terra ha que eles comem. e como foy tarde fezerãnos logo todos tornar e nom quiseram que la ficasse nhuũ e ajnda segundo eles deziam queriãse vĩjr cõ eles. / Resgataram la por cascauees e por outras cousinhas depouco ualor que leuauã pa pagayos vermelhos mujto grandes e fremo sos. e dous verdes pequenjnos e carapuças de penas verdes e huũ pano de penas de mujtas

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cores maneira de teçido asaz fremoso segundo vosa alteza todas estas cousas vera por que oca pitã volas ha de mandar segundo ele dise. e com jsto vieram. e nos tornamonos aas naaos /./ [Folio 9v] aaterça feira depois de comer fomos ẽ terra dar guarda delenha e lauar Roupa. / estauam na praya quando chegamos obra de lx ou lxx sem arcos e sem nada. / tamto que che gamos vieramse logo peranos sem se esquj uarem. / e depois acodiram mujtos que se riam bem ijc todos sem arcos. / e mestura ramse todos tanto com nosco que nos aju dauam deles aacaretar lenha e meter nos batees e lujtauam cõ os nosos e tomauam mujto prazer. / Eem quanto faziamos alenha. faziam dous carpenteiros huũa grande cruz dhuũ paao que se omtem pera ysso cortou. / mujtos deles vijnham aly estar cõ os carpenteiros e creo queo faziã mais por veerem afaramenta de ferro com que afaziã q por veerem acruz por que eles nõ teem cousa que de fero seja e cortam sua madeira e paaos com pedras feitas coma cunhas me tidas em huũ paao antre duas talas muy bem atadas e per tal maneira que andam fortes segundo os homeẽs que omtem asuas casas deziam por que lhas viram la. / era ja aconuersaçam deles com nosco tanta que casy nos toruauam ao que aviamos defazer. / Eo capitã mandou adous degra dados e adiego dijaz que fosem la aaldea ea outras se ouuesem delas nouas e que ẽ toda maneira nõ se viesem adormjr aas naos ajnda que os eles mandasem e asy se forã. / em quanto andauamos neesa mata acor tar alenha atrauesauam alguũs papa gayos per esas aruores deles verdes eou tros pardos grandes e pequenos dema [Folio 10r] neira que me pareçe que avera neesta terra mujtos pero eu nom veria mais que ataa ix ou x. outras aves entã nom vimos somente alguũas ponbas seixas eparecerãme ma yores em boa camtidade caas de portugal. alguũs deziã que virã Rolas mas eu nõ as vy mas segundo os aruoredos sam muy mujtos e grandes e djmfimdas maneiras nõ doujdo que per ese sartaão ajam muj tas aues. Eaçerqua danoute nos volue mos peraas naaos com nossa lenha. / eu creo Senhor que nõ dey ajnda aquy conta avosa alteza da feiçam de seus arcos e seetas. /./ os

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arcos sam pretos e conpridos e as setas cõ prjdas e os feros delas de canas apara das segundo vosa alteza vera per alguũs que creo queo capitã aela ha demujar. / aaquarta feira nõ fomos em terra por que o capi tam andou todo o dia no naujo dos mantimẽtos adespejalo e fazer leuar aas naaos jsso que ca dahuũa podia leuar. / eles acodiram aapraya mujtos segundo das naaos vimos que seriam obra de iijc segundo sancho detoar que la foy dise. / diego dijaz e afonso Ribeiro o degradado aque ocapitã omtem mandou que em toda maneira la dormisem. volueranse ja denoute por eles nom quererem que la dormisem e trouuerã papagayos verdes e outras aues pretas casy como pegas se nõ quãto tiijnham obico bramco eos Rabos curtos. e quãdo se sancho de toar Recolheo aanaao querianse vĩjr cõ ele alguũs mas ele nõ qujs se nõ dous mã [Folio 10v] cebos despostos e homeẽs deprol. / mandouos esa noute muy bem pemsar e curar e comeram toda vianda que lhes deram e mandoulhes fazer cama de lençooes e segundo ele disse e dormjram e folgaram aquela noute e asy nõ foy mais este dia que pera screpuer seja aaqujmta feira deradeiro dabril comemos logo casy pola manhaã e fomos em terra por mais lenha e agoa e em querendo ocapitam sair desta naao chegou sancho detoar com seus dous ospedes epor ele nõ teer ajnda comjdo poseranlhe toalhas e veolhe vianda e comeo. / os ospedes asentarãnos em senhas cadeiras e detodo oque lhes deram come ram muy bem. especialmente lacam cozido frio e aRoz. nõ lhes deram vinho por sancho detoar dizer queo nõ bebiam bem. / acabado ocomer metemo nos todos no batel e eles cõ nosco. / deu huũ grom ete ahuũ deles huũa armadura grande de porco montes bem Reuolta e tamto que atomou meteoa logo no beiço e por que se lho nõ queria tẽer. derã lhe huũa pequena de cera vermelha e ele corejeo lhe detras seu aderemço pera se tẽer e meteoa no bei ço asy Reuolta pera cjma evijnha tam comtente com ela como se teuera huũa grande joya. / e tamto que saymos em terra foise logo cõ ela que nõ pareçeo hy mais. / andariam na praya quãdo saymos biij ou x deles e dhy a pouco começaram de vĩjr. epareçeme que vijnriam este dia aapra ya iiijc ou iiijcL. / traziã alguũs deles arcos e seetas e todolos deram por carapuças e por quall quer cousa que lhes dauam. / comiam cõ nosco do que lhes dauamos e bebiam alguũs deles vinho e outros o nõ podiam beber mas pareceme que se lho ave

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[Folio 11r] zarem queo beberam de boa vomtade. / andauã todos tam despostos e tam bem feitos e galamtes cõ suas timturas que pareciam bem. / acaretauam desa le nha quamta podiam com muy boas uomtades ele uãuana aos batees e amdauam ja mais mansos e seguros antre nos do que nos andauamos antreles. / foy ocapitã com alguũs denos huũ pedaço per este aruoredo ataa huũa Ribeira grande e de muita agoa que anoso pareçer era esta meesma que vem tẽer aapraya em que nos tomamos agoa. / aly jouuemos huũ pedaço bebendo e folgamdo ao longo dela an antrese aruoredo que he tamto e tamanho e tam ba sto e de tamtas prumajeẽs que lhe nõ pode homẽ dar comto. ha antrele mujtas palmas deque colhemos mujtos e boos palmjtos. /./ quando saymos dobatel dise ocapitã que serja boo hirmos dereitos aacruz que estaua emcostada ahuũa aruore junto com o Rio perase poer de manhaã que he sesta feira e que nos posese mos todos em giolhos e abeijasemos pera eles veerem ho acatamẽto que lhe tijnhamos. e asy o fezemos. / Eeses x ou xij que hy estauam acenaramlhes que fezesem asy e foram logo todos beijala. / pareçeme jemte de tal jnoçencia que se os homẽ emtendese e eles anos. que seriam logo christaãos por que eles nõ teem nem emtendem em nhuũa creemça segundo pareçe. Epor tamto se os degradados que aqui am de ficar. aprenderem bem asua fala eos em tenderem. / nom doujdo segundo asanta tençam de vosa alteza fazeremse christaãos e creerem na nossa samta fe. aaqual praza anosso Senhor que os traga. por que çerto esta jente he boa e de boa sijnprezidade e enpremarsea ligeiramẽte neeles qual quer cru [Folio 11v] nho que lhes quiserem dar e logo lhes nosso Senhor deu boos corpos e boos Rostros comaa boos homeẽs. e ele que nos per aquy trouue creo que nom foy sem causa e por tanto vosa alteza pois tamto deseja acreçentar na santa fe catolica. deue emtender em sua salua çam e prazera adeus que com pouco trabalho sera asy / eles nõ lauram nem criam nem ha aquy boy nem vaca nem cabra nem ovelha nem galinha nem outra nhũa alimarea que custumada seja aoviuer dos homeẽs nẽ comẽ se nõ dese jnhame que aquy ha mujto e desa semente e fruitos que atera e as aruores desy lançam. e com jsto andam taaes e tam Rijos e tã nedeos. queo nõ somonos tamto com quanto trjgo e legumes comemos. / em quanto aly este dia am daram senpre ao soõ dhuũ tanbory nosso dançarã e bailharã cõ os nosos. / ẽ maneira que seos homẽ todos quisera comujdar sam muito mais nosos amj gos que nos seus. / se lhes homẽ acenaua se queriã vĩjr aas naaos fazianse logo prestes pera jsso ẽ tal maneira que seos homẽ todos quisera comujdar. /

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todos vieram. porem nõ trouuemos esta noute aas naaos se nõ iiij ou b .scilicet. ocapitã moor dous e simã de miranda huũ que trazia ja por paje e aires gomez outro asy paje. / os queo capitam trouue era huũ deles huũ dos seus ospedes que aa primeira quando aquy chegamos lhe trouuerã. oqual veo oje aquy vestido na sua camisa e cõ ele huũ seu jrmaão os quaaes forã esta noute muy bem agasalhados asy devianda como deca ma de colchoões e lençooes polos mais amansar. Eoje que he sesta feira primeiro dia de mayo pola manhaã saymos em terra cõsa nossa bandeira e fomos desenbarcar acjma do Rio contra osul [Folio 12r] onde nos pareçeo que serja mjlhor chantar a cruz pera seer milhor vista. e aly asijnou o capitã onde fezesem acoua peraachantar. Eem quanto aficarã fazendo. / ele com todos nos outros fomos pola + abaixo do Rio onde ela estaua. / trouuemola da ly cõ eses Relegiosos e sacerdotes diante cantã do maneira depreçisam. / herã ja hy alguũs de les obra de lxx ou lxxx e quando nos asy virã vĩjr/ alguũs deles se forã meter debaixo dela ajudarnos. / pasamolo Rio ao longo dapraya e fomola poer onde avia de seer que sera do Rio obra de dous tiros de beesta. / aly andando nysto vijnjram bem CL ou mais. / chentada acruz cõ as armas e deuisa de vosa alteza que lhe primeiro pregarom. armarom altar ao pee dela. / aly dise misa opadre frey amrique aqual foy cantada e ofeçiada per eses ja ditos. / aly esteueram cõ nosco aela obra de L ou lx deles asentados todos em giolhos asy coma nos e quã do veo ao avanjelho que nos erguemos todos ẽ pee cõ as maãos leuantadas. eles se leuantaram cõ nosco e alçarom as maãos. estando asy ataa seer acabado. / e entam tornaranse aasentar co ma nos. E quando leuantarom adeus que nos posemos em giolhos. eles se poserã todos asy co ma nos estauamos cõ as maãos leuantadas. / e em tal maneira asesegados que certefico avosa alteza que nos fez mujta deuaçom. / esteuerã asy cõ nosco ataacabada acomunhã Edepois dacomunham. comungaram eses Re legiosos e sacerdotes eocapitã cõ alguũs de nos outros. / alguũs deles por o sol seer grãde ẽ nos estando comungando aleuantarãsse [Folio 12v] e outros esteuerã e ficarom. / huũ deles homẽ de L ou Lb anos ficou aly cõ aqueles que fica ram. / aquele em nos asy estamdo ajumtaua aqueles que aly ficaram e ajnda chamaua outros. / este andando asy antreles falando

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lhes acenou cõ odedo perao altar e depois mostrou odedo perao ceeo coma que lhes dizia alguũa cousa debem e nos asy otomamos. / acabada amisa tirou o padre a vestimenta decjma e ficou naalua e asy se sobio junto cõ ho altar em huũa cadeira e aly nos preegou do auanjelho e dos a postolos cujo dia oje he trautando ẽ fim deste dapreegaçom deste voso prosegujmẽto tã santo e vertuoso que nos causou majs de uaçam. / eses que aapreegaçã senpre esteueram estauã asy comanos olhando peraele. / eaq le que digo. chamaua alguũs que viesem peraaly. / alguũs vijnhã eoutros hiamse e acabada apreegaçom. trazia njcolaao coelho mujtas cruzes destanho com cruçufiços que lhe ficarom ajnda daoutra vijnda e ouuerã por bem que lancasem acada huũ sua ao pes coço. / pola qual cousa se asentou opadre frey anrique ao pee da cruz e aly ahuũ ehuũ lançaua sua atada em huũ fio ao pescoço fa zendolha primeiro beijar e aleuantar as ma ãos. / vijnhã ajsso mujtos e lancarãnas to das que serjam obra de R ou L. / e jsto aca bado era ja bem huũa ora depois de meo dja. / vjemos aas naaos acomer onde ocapitã tro uue cõsigo aquele meesmo que fez aos outros aquela mostramça perao altar e perao ceeo e huũ seu jrmaão com elle ao qual fez mujta [Folio 13r] homrra e deulhe huũa camisa mourisca e ao outro huũa camisa destoutras. / e segundo oque amỹ e atodos pareçeo. esta jemte nõ lhes faleçe outra cousa peraseer toda christaã ca entende rẽnos. / por que asy tomauam aquilo que nos viam fazer coma nos meesmos. per onde pareçeo atodos que nhuũa jdolatria nẽ adoraçom teem. / Ebem creo que se vosa alteza aquy mandar quem mais antreles de vagar ande. que todos seram tornados ao desejo de vosa alteza. / e pera jsso se alguem vjer nõ leixe logo de vijr clerjgo peraos bautizar por que ja emtã teerã mais conhecimẽto de nossa fe pelos dous degradados que aquy ã treles ficam os quaaes ambos oje tam bem co mungaram. / antre todos estes que oje vierã nõ veo mais que huũa molher moça aqual esteue senpre aamisa. aaqual deram huũ pano cõ que se cobrise e poserãlho daRedor desy. / pero ao asentar nõ fazia memorea deo mujto estender perase cobrir. / asy Senhor que ajnocẽ cia desta jemte he tal que ada dam nõ seria mays quanta em vergonha. / ora veja vosa al teza quem em tal jnocemçea vjue. ensinam dolhes oque perasua saluacom perteeçe. se se cõ

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uerteram ou nom. / acabado isto. / fomos asy perante eles beijar acruz e espedimonos e vj emos comer. / creo Senhor que com estes dous degradados que aquy ficam. / ficam mais dous d grometes que esta noute se sairam desta naao no esquj fe em terra fogidos. / os quaaes nõ vierã majs e creemos que ficaram aquy por que demanhaã prazendo adeus fazemos daquy nosa partida / [Folio 13v] Esta terra Senhor me pareçe que dapomta que mais contra osul vimos ataa outra ponta que contra onorte vem de que nos deste porto ouuemos vista. / sera tamanha que auera neela bem xx ou xxb legoas per costa. traz ao lomgo do mar em algũas partes grandes bareiras delas vermelhas e delas bramcas e a terra per cima toda chaã e mujto chea de grandes aruoredos. / depomta apomta he toda praya parma mujto chaã e mujto fremosa. / pelo sartaão nos pareceo do mar mujto bem grande por que aestender olhos nõ podiamos veer se nõ tera earuoredos que nos pareçia muy longa tera. / neela ataagora nõ podemos saber que aja ouro nem prata nem nhuũa cou sa de metal nem de fero. nem lho vjmos. / pero aterra em sy he de mujto boos aares asy frios e e tenperados coma os dantre doiro e mjnho por que neste tempo dagora asy os achauamos coma os dela / agoas sam mujtas jmfimdas. E em tal maneira he graciosa que querendoa aproueitar darsea neela tudo per bem das agoas que tem. / pero omjlhor fruito que neela se pode fazer me pareçe que sera saluar esta jemte e esta deue seer aprincipal semente que vosa alteza em ela deue lamçar. / Eque hy nõ ouuese ma js ca tẽer aquy esta pousada pera esta naue gaçom de calecute. / abastaria / quanto majs desposiçã perase neela conprir e fazer oque vossa alteza tamto deseja .scilicet. acrecentamento danosa santa fe / . E neesta maneira Senhor dou aquy avosa alteza [Folio 14r] doque neesta vosa terra vy ese aalguũ pouco a lomguey. ela me perdoe. cao desejo que tij nha de vos tudo dizer mo fez asy poer pelo meudo. E pois que Senhor he çerto que asy neeste careguo que leuo como em outra qual quer coussa que de vosso seruiço for uosa alteza ha de seer de mỹ mujto bem seruida. / aela peço que por me fazer simgular merçee mã de vĩjr dajlha de sam thomee Jorge dosoiro meu Jenrro. o que dela Receberey em mujta merçee. / beijo as maãos de vosa alteza. /

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deste porto seguro da vosa jlha de vera cruz oje sesta feira primeiro dia demayo de 1500 // pero uaaz de camjnha

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ANEXO 2

LEITURA SEMIDIPLOMÁTICA DOS TRECHOS SOBRE O BRASIL EXISTENTES NO “RELATO DO PILOTO ANÔNIMO”, SEGUNDO VERSÃO PUBLICADA NO “PAESI

NOVAMENTE RETROVATI” DE FRACANZANO DA MONTALBODDO (1507)

Doue im persona Re Manuel consigno el Standardo Re/al al Capitaneo c .lxiii. In lo anno .M.ccccc. Mando il Serenissimo Re di/ portogallo per nome chiamato Don Manuel./ Vna sua armata di naue e nauili per le parte de india: in la qual/ armata erano .xii. naue: e nauili de la qual armata era per capitaneo/ generale Pedro Aliares :cabrile fidalco: le qual naue e naui/li partiron e bene apparechiate e in ordine de ogni qualmen/te cosa che necessario gli fusse per uno anno e mezo: de le quale/ .xii. naue ordino che desmontasse .x. in Calichut: & quelle altre/ due per Arabia: remaneseno ad effecto che fusseno uno loco chiama/to zaffale per uolere contractare merchante in dicto loco: el qual lo/co di zaffale trouase esser in lo camino di Calichut: & al fi/ le altre .x. naue caueno merchantie che per dicto uiazo gli fus/se necessario & a li .vii. del mese di Marzo del dicto Millessimo/ forono preste a quello di in di de dominica andorno larghi da questa cita/ de doi miglia in uno loco chiamato rastello donde e una chie/sia chiamata sancta Maria de Baller in lo qual loco il Serenissimo/ Re fu lui proprio in persona a consignar a lo capitaneo il Standardo Re/al per la dicta armata. Item el Lunidi: che fu a .ix. zorni di Marzo parti la dicta/ Armata cum bon tempo per suo uiazo. Item a di .xiiii. del dicto mese passo la dicta Armata per lisola/ di Chanaria. Item a di .xxii. passo per lisola di capo Verde. Item a di .xxiii. se partite una naue de la dicta Armata talmente/ che de essa mai si sentite noua fin aquesto di presente ne si po sapere.

Como scorreuano le naue per fortuna c .lxiiii. // A Di .xxiiii. de Aprile che fu el merchoredi in la/ octaua di pascha hebbe la dicta armata uista/ de una terra: di che hebbe gran piacere: & ari/uorno a terra per uidere che terra era: la qual tro/uorno terra molto abundante da arbore & gen/te: che per li andauano per lo litto del mare e gittorno anchora in/ la boccha di uno fiume piccolo: e dipoi di lanzatto dicte an/chore il Capitaneo mando gettare uno batello al mare per/ lo qual mando ueder che gente erano quelle & trouorno che/ eran gente de colore pardo: tra il biancho el nero: & ben di/sposti cum capilli longhi e uano nudi come nascerono senza/ uergogna alcuna e chadauno di loro portaua suo arco cum/ frize: come homini che stauano in deffensione de dicto fiu/me: a la dicta armata non haueua niuno che intendesse sua/ lingua e uisto cosi quelli del batello ritornono dal capitanio/ e in questo stante si fece nocte: in la qual nocte si fece grande/ fortuna. Item el di seguente per la matina alzamo anchora cum gran/de fortuna andauemo scorrendo la costa per la tramontana: el/ uento era sirocho: per uedere si trouauemo alcuno porto: per don/de stare ditta armata: finalmente trouoron un porto doue git/tamo anchore donde trouamo di questi annini che andauano/ in lor barchette peschando: e uno di nostri batelli fu donde/ questi tali homini stauano & pigliorno doi di loro e quili menorno/ al Capitaneo per sapere che zente errano e come e dicto: non/ se intendeano per fauella ne mancho per cenni e quella nocte il Ca/pitaneo quelli ritenni cum lui: il di sequente li mando uestiti cum/ una camisa e uno uestito & una beretta rossa per lo quale uestir/ restorno molto contenti e marauegliati de la cosa de quelli for//no mostrati: dipoi quili mando gittare in terra.

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Radice che ne fanno pane cum sui altri costumi c .lxv. ITem in quello di medemo che era la ocatua de/ pascha. a .xxvi. Aprile determino el Capita/neo magiore de aldire messa: & mando ad/ armare una tenda in quella spiaza donde man/do ordinare uno Altare e tuti quelli de la dicta/ armata andorno ad aldir messa: e la predicha: doue se gionto/rono molti de quelli homini ballando e cantando cum soi corni: & su/bito come fu dicta la messa tuti se partirno per la lor naue: e quel/li homini de la terra intraueno in mare fin sotto gli brazi cantan/do e facendoli piacere e festa: & dapoi hauendo el capitaneo di/snato tornorno in terra la giente dela dicta armata: piglian/do solazo e piacere cum quelli homini de la terra: e comenzorno a tra/ctare cum quelli de la armata: e dauano di quelli archi soi e frize per so/nagli: e fogli di charta e pezi de panno: essi tuto quello di piglior/no a piacer cum esto loro: & trouamo in questo locho uno fiu/me di acqua dolce: e tardi tornamo a naue. Item laltro zorno/ determino el Capitaneo mazor di tore acqua e legne e tuti/ quelli de dicta armata forno in terra: e quelli homini di quello loco/ ne ueniuano aiutare le dicte legna e acqua: & alcuno di nostri an/dorno a la terra: donde questi homini sonno: che seria .iii. mi/glia discosto dal mare e baratorno papagalli: e una radice chia/mata igname che e el pane loro che manzano li arabi: quelli de/ la armata gli dauano sonagli e fogli de charta in pagamento/ de dicte cose: in lo qual locho stessemo .v. o uero .vi. zorni./ El modo de questa zente loro sonno homini pardi: e uanno/ nudi senza uergognia e gli capilli loro sonno longi: e porto//no la barba pelata: e le palpebre de li ochi: e sopra li cigli era/no depenti come figure di colore bianchi e negri e azuri: e/ rosi portano le labra de la boccha: cio e quella da basso fora/ta: e in gli bucchi pongono uno osso grande come chiodo: e/ altri portano chi una petra azurra: e uerde: e longa: e calano/ per dicti bucchi: le donne il simel uano senza uergonia: e sonno/ belle donne di corpo: li capilli longi: e le sue case sonno de ligna/me coperte de foglie e rame darbori cum molte colonne de/ legno: in mezo de le dicte case e de le dicte colonne al muro/ metteno una rete de bambagio appicchata in che staua uno/ homo e intra una rete e laltra fanno uno foccho a modo che/ in una sol casa starano .xl. e .l. letti armati a modo di telari.

Papagalli in la terra di nouo discoperta c .lxvi. IN questa terra non uedessemo ferro: ne mancho al/tro metallo: e le legne tagliano cum pietra: e hanno/ molti ocelli de molte sorte specialmente papagalli/ de molti colori: fra quelli ce ne e de grandi come galline e altri/ ocelli molto belli: e de la penna de dicti ocelli fanno cappelli e/ berette che portano loro: la terra e molto abondante de mol/ti arbori e molte acque e meglio: e ignames: e bombaso: in que/sti lochi non uedessemo animali alcuno: la terra e grande e/ non sapiamo se gli e isola o terra ferma: an ci crediamo che/ la sia per la sua grandeza: terra ferma e ha molto bono aere/ & questi homini hano rete e sonno pischatori grandi & pe/schano de piu sorte pese intra quali uedessemo un pese che/ pigliorno: che saria grande come una botte: e piu longo: e to/ndo: e teneua el capo come porcho e gli occhi picoli e non ha/ueua denti e haueua orecchie longhe un brazo: e larghe me/zo brazo da basso del corpo haueua dui busi: e la coda era/ longa un brazo: e altra tanta larga: e non haueua piedi alcu/no in alcuni lochi: haueua pelle come porcho el cuoio era/ grosso un deto e le sue carne eran bianche e grasse come di/ porcho. Item in questi zorni che stemo que determino el capitaneo a fa/re a sapere al nostro serenissimo Re la trouata de questa terra: e de/ lassar in essa dui homini banditi e giudicati a la morte che haueua/mo in dicta armata a tal effecto: e subito el dicto capitaneo dispacio/ uno nauilio che haueuano cum loru cum uictuaglie e questo oltra/ le .xii. naue sopradicte: el qual nauilio porto le lettere al Re in la/ qual si contineua quanto haueuamo uisto e

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discoperto: e dispacia/to il dicto nauilio el capitaneo ando in terra e mando a fare una cro/ce molto grande di legno e la mando piantare in la spiaza/ e al fi come el dicto lasso doi homini banditi in lo dicto loco:/ li quali comenzorno a pianzere: e li homini di quella terra gli/ confortauano & monstrauano hauer di loro pietade.

Fortuna si grande che .iiii. naue perireno c .lxvii. ITem laltro zorno che fu a di .ii. de Mazo de dicto/ anno larmata fece uela per el camino per andare a la/ uolta del capo di bona Speranza: el qual camino/ seria di colso de mare: piu de .M.cc. leghe: che e .iiii. milia per/ legha ...

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ANEXO 3

LEITURA SEMIDIPLOMÁTICA DA CARTA DE GIOVANNI MATTEO CAMERINI, “IL CRETICO”, ESCRITA AO DOGE AGOSTINI BARBARIGO

EM 27 DE JUNHO DE 1501, SEGUNDO VERSÃO DO “PAESI NOVAMENTE RETROVATI” DE FRACANZANO DA MONTALBODDO (1507)

Copia de uno capitulo di lettere de .D. Creticho nontio de la/ Ilustrissima Signoria de

Venetia in Portugallo Data a di/ xxvii. Zugno .M.ccccci. c .cxxv. SErenissime Princeps &c. Credo la Vostra Serenita/ per lettere del Manifico Ambasiator habia in/teso questo Serenissimo Re hauer mandato naue a la/ uolta Dindia: le qual al presente sonno tornate:/ ma de .xiii. che furono: sonno perse .vii. al uia/zo. Et prima Serenissimo Princeps per la costa di la/ mauritania & getulia per ostro fino a capo// Verde: el quale antiquitus se chiamaua experias: doue sonno le insule/ experide: qui principia la Ethiopia e de qui auanti fu ignoto a li antiqui:/ de qui score la costa de Ethiopia uerso leuante tantum che risponde/ per lineam a la Cicilia: dista dicta costa .ix. gradi tra la linea equino/tiale .v. o uer .vi. gradi: & da mezo dicta costa e la mina di que/sto Serenissimo Re: & dapoi distendi uno capo uerso ostro che exce/de el tropico del capricorno .ix. gradi: Questo capo se chia/ma di bona speranza: che uene etiam larga la Barbaria: in questo lo/co piu de .v.M. miglia del litto intrinsicho uerso nui: a questo/ capo de li iterum se incolfa uerso uno capo chiamato da li an/tiqui Prasim promontorio: fino al qual fu noto ali antiqui da lal/tra banda: de qui iterum scorre quasi apreso leuante per lo troglo/ditia: doue trouano una altra uena doro: la quale chiamano/ zaffala doue li antiqui affermano esser mazor copia doro che/ in altra parte: de qui intrano in el mar Barbarico: & poi in quello din/dia: & ariuano a Colochut: qui e lor uiazo el qualle e piu de .xv./M. miglia: ma trauersando lo scortano asai: di sopra dal ca/po de Bonasperanza uerso garbi hanno scoperto una terra noua la/ chiamano de li Papaga: per esser gene di longeza de brazo .i. & me/zo de uarii colori: de li quali ne hauemo uisto doi: iudicando/ questa terra esser terra ferma perche scorseno per costa piu de do/ .M. miglia ne mai trouono fine: habitano homini nudi & for/mosi: a la lor andata perseno .iiii. naue .ii. mandarono ala mina no/ua de le qual se iudicano siano perse: le .vii. andorno Colochut: do/ue prima furono ben uisti & fu li dato la casa per quel signore: doue/ romaseno alcune de le naue: le altre erano in altri lochi uicini e da/poi zonse zerme del soldano li quali se sdegno che costori fuseno/ isi a tor linuiamento e uoleano prima cargare: el factore di questo// Serenissimo Re si lamenato cum el signore el qual iudicasse/ se intendesse cum mori & disse se costoro chargaueno le tolse/ le specie de che ueneno a le mane e tutta la terra fauorezaua/ mori & corsono a la casa designata a portogalesi & tagliorono/ a pezi tuti che erano in la terra quali furno da .xl. tra li quali fu el/ factore che se era butato in acqua per fugire intendendo questo le/ altre naue ueneno e brusorno le zente del Soldano che era/no .x. & cum le artelarie feceno grando dano a la terra: & abru/sono asai case: el forzo era coperto de paglia: per questo rumore/ se partirono da Colochut & furno conducti da lor guida: el/ qualle e uno Judeo batezato ad una altra terra circha a .xl./ miglia piu oltra chiamata Cuzin duno altro Re inimico de/ quello de Colochut el qualle li ha facto optima compagnia & ha ma/zor copia de specie che non e a Colochut: hanno cargo estiua/to per pretio che temo dirlo el perche lor laffirmano: hanno hau/to uno canter di Canella per ducato uno e meno: Questo signo/re de cuzin mando sui ambasiatori cum queste naue a questo Se/renissimo Re & etiam do ostai a cio che tornano securamente: nel/ ritorno mori & quelli di Colochut si misseno in ordine per pren/derle & armarono pui de .cl. nauili cum piu de .xv.M. homi/ni: Tamen costori siando cargi non uolse combater ne quelli/ li poteano offender

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perche questi se miseno di la borina che lo/ro non sanno andar: uenendo ariuorno a una isola doue le cor/po di sancto Thomaso apostolo: El signor di epsa li fece asai ca/reze & a li dati de le reliquie del dicto sancto li pregauano tolesseno/ specie da lui in credenza a retorno del uiazo: questi erano car/gi & non poteano piu torner sonno stati mesi .xiiii. in el uiazo:/ Ma nel ritorno solo quatro & dicono di qui auanti fare in// mesi .viii. o uer .x. al piu: nel ritorno de .vii. naue li sie sonno ue/nute a saluamento laltra deti in una secha: de la quale sonno salue le/ zente questa era di botte .dc. & circha: ancor non e riuato qui/ saluo che una di botte .ccc. le altre sonno propinque per quan/to dicono: questa intro la sera di san Joanne: io mi atrouaua/ dal Serenissimo Re el qualle me chiamo & disseme me con/gratulasse che le sue naue de India erano zonte carge de/ specie: & cosi me alegrai cum li debiti modi: fece fare festa/ quella sera in palazo & leticia di campane per tuta la terra:/ el sequente giorno fece processione solemne per tuto la ter/ra: dapoi iterum atrouandomi cum sua Maiesta ritorno a le/ sue naue & disse me douesse scriuere a uostra Serenita che/ mandadamo auanti le sue Galie a leuar specie di qui che li/ faria bona ciera & potriano iudicar esser in casa sua & el pro/hiberia al soldano non andaria specie: & uol meter a questo/ uiazo naue .xl. de le qual alchune uadino & altre ritornano/ demum tiene hauer lindia a suo comando: Questa naue la/ qual e intrata sie di Bartholomio Fiorentin insieme cum el/ cargo che sonno Piper Cantera .ccc. in circha Canella Can/tera .cxx. Laccha Cantera .l. in .lx Benzui Cantera .xv. Ga/roffoli non hanno perche Mori li haueuano leuati ne anche/ Zenzari: pero che doue hanno cargo non ne era ma ne nasse/ a Colochut: specie minute non e di niuna sorte dicono ha/uer perso asai zoglie in quel rumor di Colochut. Non pre/termetero etiam questo: esser uenuto di qui li Ambasiatori/ di uno Re de Ethiopia chiamato Re de Vbenam el qualle/ ha mandato presente a questo Serenissimo Re de schiaui/ & denti da uolio ben che simel cose sonno de questi zia asai// tempo apparso de quilli etiam nasce prima non e compito co/mo laltro: preterea questa naue in el suo ritorno scontro dui/ grosissimi nauilli partiti de la Mina noua & andauano uer/so lindia li qual haueano gran summa doro: & temendo costo/ro non li uolesse prendere li oferse .xv.M. dobbe per primo/ che chadaun ualea piu de ducati .ccccc.M. ma costoro non/ uolseno tore cosa alcuna simo li fece presenti & bona com/pagnia per poter nauigare in quelli mari.

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ANEXO 4

LEITURA DIPLOMÁTICA DA CARTA DE BARTOLOMEO MARCHIONNI ESCRITA A DESTINATÁRIO DESCONHECIDO EM 27 DE JUNHO DE 1501

[Página 1] Apresso chopia di una altre letera v enuta di lisbona da bertolomeo mar chionnj. soto dj 27 dj dgungno anno 15[01] Ad di xxiij di questo arivo quj u’na vilio che viene di chalichut deto per nome L’anunziata E chonta cho me L’altre charovelle ch’erano in Loro chonserva erano Restate a di Etro poche leghe che ongni Le gha e 3 migle e ½ delle nostre L a qual nave da infinite nuove e quj per questa te ne daro alchun E qual saranno piu a proposito Dice eser 4 mesi che di chonserva parti nno d’una terra a chonfinj di chal ichut tutte chariche di spezierie E che alla loro andata in La si perde nno 5 navj di loro chomando quele andavano alla mina nuova de L oro E a chalichut funno 8 E g iunti funno a chalichut fu fato Loro grande onore e buona R achoglenza E danendo misso in terra le loro merchatantie E L fatore de rre inchominco s’a bazarare chon loro e in detto [Página 2] in quel porto era da xxx navj di morj per charichare e portare a un porto d El mare oceano detto bizidem donde dipoj di quindi vanno a do mascho e volendo charichare pri ma e portoghalesi venono in tan ta diferenza che morj si levonno a romore e amazonno tuttj e porto ghalesj che ssi trovanano in terra in sino al fatore de rre e vedu to questo quellj delle navj portogh allesi si racholsono inave E andonno a metere fuocho nelle navj de mo rj E chominconno a bonbardare La terra E fruchasonno in essa molte ch ase E amazonno di molta gente E arsono da xv / di quelle navj de m orj e per chonsiglo di uno indiano si partino dindi e andonno a un altra terra d ove trovonno uno Re nimicho di

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questo di cholochut E fu fatto Loro g rande onore E grande E perfeta rachoglenza E quivj bazarorono t ute Loro merchantie E enpieno E navilj tuttj di spezierie e oltre a questo Re voleva dare Loro molte spezierie a chredenza a loro Ritorno sopra alla Loro fe le qualj non volsono piglare per ave re Loro el charicho abastanza pe’loro navilj e di quivi si partinno amici e pr Egho Loro per Lo avenire fare si no [Página 3] quivi schala per senpre El detto Re ca mandato uno anbascadore al nostro re chon infiniti presenti e preghato e rachomandato Loro che tornino in deto luogho E partiti che funno E m orj di chalichut avevano arma te 150 vele chon xv mila morj e venivano per investire E nostrj E per che le nostre erano chariche E av endo a chonbatere non erano a pro posito si misono del orza ellj Lascia mo per occhio di vento chome bestie e alla loro venuta anno trovato m olti Re e signorj e da tuttj anno auto buona Rachoglenza e presenti E anno trovato el chorpo di santo tomaxo apostolo el quale non ano potuto avere e molte altre E re Liquie di che n’anno Rechate quj in quantita a rre E cj viene chon Esse nave 4 anbascadorj di due isi signorj e tutti si voglono so tometere al nostro Re E molte a Ltre chose chontano le qua in foglj non sara abastanza a scchrivere io nonno tenpo e questo el charicho porta questa charovella E l’altre allo av enante ---------// ---------// ---------// ------ 300 chantara di pepe fine 160 chantara di chanella Codeste sono 60 chantara di laccha Le chose da 14 chantara di bongivj fare men zione E molte altre spezierie mj nute E che L’altre 7 navj lequi [Página 4] sono a dietro che ciaschuna a suo charicho alla venante di dete spezierie // ---------

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Anno Rechato / 2 / papaghallj dj diversi ch olorj E qua sono Lunghj uno ghomi to e ½ el quale E piu di b. 1 e ½ de nost rj sono chose mirabile e di moltj al trj e vari ucellj e animalj danno no tizia d’un modo che pLinio deto bu giardo mostrano eser pure vere Le sue storie --------- // --------- Bartolomeo marchionj in lis bona

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ANEXO 5

VERSÃO DA CARTA ESCRITA POR DOMENICO PISANI DI GIOVANNI AO DOGE AGOSTINI BARBARIGO EM 27 DE JULHO DE 1501,

SEGUNDO OS “DIARII” DE MARINO SANUTO (1879-1902) Credo, vostra serenitá, per letere del magnifico ambasador, domino Piero Pasqualigo, doctor, habia inteso quello ho per capitolo di una letera di misser Cretico, doctor, ch’è apud regem Lusitaniae, de 27 luio in Lisbona. Come questo serenisimo re havia mandato nave a la volta de India, le quale al presente son tornate; ma di 13 che furono son perse le 7. El lor viazo, serenisimo principe, é: prima per la costa de Mauritania et Getulia, per ostro, fin al Capo Verde, che antiquitus si chiamava Hespeviceras dove sono le insule de le Hesperide. Qui principia la Ethiopia, verso levante tanto, che coresponde per lineam rectam a la Sicilia. Dista dita costa de la linea equinoctiale 5 in 6 gradi; et a mezo dicta costa è la mina de questo serenisimo re. Dapoi extende uno capo verso ostro in tanto, che excede el tropico de Capricornio 9 gradi. Questo capo chiamano Capo de Bona Esperanza, che vien esser larga la Barbaria in questo loco più di 5000 mia, dal lito intrinseco verso nui ad questo capo de li. Iterum se incolfa verso uno capo, chiamato da gli antiqui Prason Promontorium, fino al qual fu noto a li antiqui. Da l’altra banda, de qui iterum scorre, quasi greco e levante, per la Trogloditica, dove trovano una mina d’oro, la qual chiamano Cephala, dove li antiqui affermano esser mazor copia d’oro che in alguna altra parte. De qui entrano nel mar barbarico, et poi nel mar de India et arrivano al Coliqut. Questo è il lor camino, ch’è più di XV milia miglia; ma transversando lo scurterano assai. De sopra el Capo de Bona Speranza, verso garbin, hanno discoperto una terra nuova, chiamano la terra de li papaga, per esser li papaga longi uno brazo et più, de varij colori, de li quali hanno visto doy. Judicano questa terra esser terra ferma, perchè corseno per costa 2000 mia e più, nè mai trovorono fin. Habitano homeni nudi et formosi. A la lor andata perseno, per fortuna, 4 nave, dove mandorono a la mina nova dicta, le qual si judicha, siano perse. Le sete andorono al Coliqut, dove furono prima ben visti et foli dato una caxa per quel signor; dove rimaseno alcune de le nave, le altre erano in lochi vicini. Dapoi soprazonse zerme X del soldan, li quali se sdegnavano che portogalesi fosseno andati ad torteli lo inviamento, et volevano cargar prima. El fator del re de Portogal se lamentó con el signor de Coloqut, et qual, judicano, se intendesse con mori, et disse che se gli cargavano, li tolesse le specie. De che venero a le mane, che tutta la terra favori a’mori, et corseno a la caxa designata a’portogalesi, et tagliorono a pezi tutti che erano in terra, per numero 40, tra li quali el fator del re, qual se à butato in aqua per fuzir. Inteso questo, le altre nave venero et abrusorono le zerme del soldan, che erano X, et le bombarde fecero gran danno a la terra et brusorono assai caxe, che el forzo è coperte de paglia. Per questo rumor si parti da Coloqut, et forono conduti de la lor guilda, ch’è uno judeo batizato, ad una altra terra più oltra, chiamata Chucin, de uno altro re, inimico dil re di Coloqut, el qual li ha fato optima compagnia et ha mazor copia de specie che al Coloqut. Hano cargà ad stiva per precio che me temo dirlo; et dicono comprano uno canter de canela per un ducato et meno. Questo signor de Chucin manda soi ambasadori con queste nave a questo signor re, et etiam obstasi, a ciò che torniano securamente. Nel retorno mori et quelli de Calicut se misseno in ordene per prenderli, et armarono 150 navilij con 15 milia homeni; tamen costoro, siando chargi, non volseno combater, né quelli li poteva offender, chè lusitani se messeno a la vela de la borina, che lore non sano andare. Bevendo, arivono in una insula, dove è el corpo di San Thomà. El signor de quella li ha fatto gran chareze et datoli de la reliquie de San Thomà: li pregava volessero tuor specie da lui et che le tolesseno in credenza a l’altro viazo; questi erano za cargi et non poteva tuor più. Sono stati mesi 14 sul viazo, ma nel ritorno solo 4; et dicono voler da mo avanti far questo viazo in 9 o ver 10 mesi al più. Nel ritorno, de 7

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OS ANIMAIS DO DESCOBRIMENTO

Publ. Avul. Mus. Nac., Rio de Janeiro, n.111, p.3-133, jul.2006

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nave, le 6 son venute salve, una dete in una secha, li homeni de le qual son salvi; et questa era de 600 bote et carga. Ma ancora non è arivate qui, salvo una di bote 300; le altre son propinque, per quanto dicono; e queste introno la sera di San Zuane. Io me ritrovava dal re, el qual me chiamò et diseme, me congratulasse, che le sue nave de India erano zonte cariche de specie; et cussi mi congratulai con li debiti modi. Feze far festa un palazo et litizia de campane per tutta la terra; el di sequente feze una procession solenne. Dapoi, iterum atrovandomi con sua magestà, me retornò a la nave et diseme dovesse scriver a vosta serenità, che mandi da mo avanti le galie a levar specie de qui, a le qual faria bona ciera, et poriano judicar esser in caza sua; et che omnino vuol prohibir che al soldan non va di specie; et voler meter a questo viazo 40 nave, de le qual algune vadi et algune torni; et demun tiene haver la India al suo commando. Questa nave intrata, in porto, è la nave et el cargo de Bartolo Fiorentino, el cargo de la qual è piper, cantera 300; canela, cantera 120; lacha, cantera 60; benzui, cantera 15; garofalli non hanno, perchè mori gli haveano levati; neanche zenzeri, perchè a Chuchin, dove hanno cargá non ne hè, ma nasce a Caliqut; specie minute non hanno di alguna sorte. Dicono haver perso assai zoglie in quel rumor de Chaliqut. Non preteriró etiam questo, esser venuti de qui ambasadori de uno re de Ethiopia, chiamato re Ubeam, qual à mandato presente a questo re, schiavi et denti de avuolio et altre cosse, et son de qui za assai. Li a presso etiam de quelli nasse piper, ma non é cussi compito come l’altro. Praeterea queste nave nel suo ritorno scontrarono do grosse nave, erano partite de la mina nova et andavano verso la India, li qual haveano gran suma di oro; et, temendo che costoro non i volesse pigliar, li offerse 15 milia doble pro primo, che chadauna val più del ducato; ma questi no hanno volito tuor cossa alguna; imo li hanno fato presenti a loro et bona compagnia per poter navegar quelli mari, nec alia.

Data Ulysiponi, die 27 julii 1501

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REFERÊNCIAS: Todas as fontes citadas no texto devem constar nas referências em lista própria, sem indentação, obedecendo a uma ordem alfabética de autor, e cronológica, quando do mesmo autor (quando do mesmo ano, diferenciá-las com letras minúsculas de “a” a “z”). O nome do autor deve ser repetido quando houver mais de uma referência do mesmo autor.

a) LIVROS AUTOR, iniciais dos prenomes, ano de publicação. Título (em negrito): subtítulo. Número da edição (a partir da segunda, seguido da abreviatura da palavra “edição” no idioma da publicação). Local (cidade) de publicação: Editora. Número total de páginas seguido da abreviatura “p.” ou de volumes, seguido da abreviatura “v.” (opcional). Ex:

NIETZSCHE, F., 1967. The birth of tragedy. London: Vintage Books. 144p.

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b) CAPÍTULOS DE LIVROS AUTOR DO CAPÍTULO, iniciais dos prenomes, ano de publicação. Título do capítulo. In: AUTOR DO LIVRO (com indicação, entre parênteses, da situação do mesmo, p.ex., Ed., Org.) Título (em negrito). Número da edição (a partir da segunda, seguido da abreviatura da palavra “edição” no idioma da publicação). Local (cidade) de publicação: Editora. Volume, capítulo, páginas inicial-final do capítulo. Ex.:

LIMA, D.A., 1982. Present-day forest refuges in Northeastern Brazil. In: PRANCE, G.T. (Ed.) Biological diversification in the tropics. New York: Columbia University Press. p.245-251.

c) TRABALHOS APRESENTADOS EM CONGRESSOS E OUTROS EVENTOS AUTOR, iniciais dos prenomes, ano de publicação. Título: subtítulo. In: NOME DO EVENTO (em caixa alta), número ponto, ano, local de realização. Título da publicação (em negrito): subtítulo. Local (cidade) de publicação: Editora. Volume e/ou página inicial e final.

VENTURA, P.E.C., 1985. Avifauna de Morro Azul do Tinguá, Miguel Pereira, Rio de Janeiro. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ZOOLOGIA, 12., 1985, Campinas. Resumos... Campinas: Universidade Estadual de Campinas. p.273.

d) TESES/DISSERTAÇÕES/MONOGRAFIAS AUTOR, iniciais dos prenomes, ano de apresentação. Título (em negrito): subtítulo. Número de páginas (seguido da abreviatura “p.”) ou volumes. Indicação do tipo de trabalho (indicação da área de concentração, entre parênteses) - (hifen), nome da faculdade, nome da universidade, cidade. Ex.:

LOVISOLO, H., 1982. Terra, trabalho e capital. 337p. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) - Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

e) ARTIGOS EM PERIÓDICOS AUTOR, iniciais dos prenomes, ano. Título do artigo. Título do periódico (por extenso e em negrito), local (cidade) de publicação (caso essa citação seja necessária para diferenciação entre periódicos homônimos), número do volume (em arábico e em negrito), seguido do número do fascículo (entre parênteses): primeira página hifen última página. Ex.:

MORA, O.A.; SIMÕES, M.J. & SASSO, W.S., 1987. Aspectos ultra-estruturais dos fibroblastos durante a regressão da cauda dos girinos. Revista Brasileira de Biologia, 47(4):615-618.

f) DOCUMENTOS EM FORMATO ELETRÔNICO AUTOR, iniciais dos prenomes, ano. Título do artigo (em negrito). Disponível em: <endereço eletrônico de acesso>. Acesso em: dia mês (abreviado) ano. Ex.:

POMERANCE, R., 1999. Coral mortality, and global climate change. Disponível em: <http://www.gov/topical/ global/envinon/99031002.htm>. Acesso em: 18 abr. 1999.

g) ARTIGO DE PERIÓDICO EM FORMATO ELETRÔNICO AUTOR, iniciais dos prenomes, ano. Título do artigo. Título do periódico (em negrito), número do volume (em arábico e em negrito), seguido do número do fascículo (entre parênteses): primeira página hifen última página. Disponível em: <endereço eletrônico de acesso>. Acesso em: dia mês (abreviado) ano. Ex.:

BARRETO, A.A., 1998. Mudança estrutural no fluxo do conhecimento: a comunicação eletrônica. Ciência da Informação Online, 27(2). Disponível em: <http://www.ibict.br/cionline>. Acesso em: 18 abr. 1999.

TABELAS E QUADROS: Numerados em arábicos; atendendo ao espaço útil do periódico, de maneira adequada para redução; com as respectivas legendas, sem linhas verticais. É aconselhável que não ultrapassem 16cm de largura e 22 de altura.

ILUSTRAÇÕES: Digitalizadas na extensão TIFF e designadas no texto como figura (Fig.1, Fig.2, etc.). Numeradas seqüencialmente, em arábicos, e providas de escalas (os valores, com unidades abreviadas, devem figurar na legenda - ver próximo item). De acordo com a conveniência, as figuras poderão ser montadas em estampas, obedecendo à técnica usual para redução, observando-se os tamanhos de letras, números e escala. Pranchas e/ou figuras isoladas não podem ultrapassar 16cm de largura e 22 de altura e poderão ser reduzidas a critério do editor.

LEGENDAS DAS FIGURAS: Digitadas ao final do texto principal, devendo conter escala ou o respectivo aumento, com unidades de medida abreviadas.

TÍTULO RESUMIDO: Sintetizar o título do artigo (máximo de 60 caracteres) para compor o cabeçalho.

As publicações do Museu Nacional têm tiragem de 650 (seiscentos e cinqüenta exemplares).

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