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RAFAEL MOREIRA VANAZZI DE SOUZA Particularidades da musicografia braille para o auxílio de novas metodologias de ensino UNICAMP 2014

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RAFAEL MOREIRA VANAZZI DE SOUZA

Particularidades da musicografia braille para o auxílio de novas

metodologias de ensino

UNICAMP

2014

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RAFAEL MOREIRA VANAZZI DE SOUZA

Particularidades da musicografia braille para o auxílio

de novas metodologias de ensino

Dissertação apresentada ao Instituto de Artes daUniversidade Estadual de Campinas, para obtençãodo título de Mestre em Música

Área de concentração: Musicografia Braille

Orientação: Prof Dr. Vilson Zattera

Coorientação: Prof. Dr. Claudiney Rodrigues Carrasco

CAMPINAS

2014

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, Carlos Roberto e Fátima Maria, por terem me criado e dadotodo o suporte necessário para a minha educação, além da oportunidade e incentivo parahoje eu ser um músico satisfeito com o que faço.

À minha esposa, Juliana Vergueiro, pelo seu carinho, amor e companheirismo.Juntos compartilhamos e unimos nossos sonhos e aspirações de vida. Com certeza o seuapoio e todas as conversas que tivemos me ajudaram a seguir em frente com essadissertação.

Ao meu orientador , Prof. Dr. Vilson Zattera, pelo apoio, confiança, paciência eamizade. Que ele continue sempre sendo o professor da sinceridade, da humildade e dobom humor. Grato por me orientar com discernimento, sabedoria e alegria.

Ao meu amigo, Raphael Ota, pelas conversas e produções acadêmicas sobre aMusicografia Braille. Com a sua ajuda eu pude compreender mais detalhes desse campo deestudo e acreditar na possibilidade de desenvolvê-lo em um mestrado; como se nãobastasse, Raphael ainda me aproximou da culinária japonesa.

À Prof. Dra. Lúcia Reily, pela perspicácia e habilidade com que pontuou meutrabalho na fase final, ajudando assim a lapidar o seu conteúdo; não posso me esquecer dosseus livros, onde me inspirei a buscar uma escrita prazerosa, direta e criativa.

Às professoras Dra. Adriana Mendes e Dra. Mariana Baruco, pela leitura atentado meu trabalho na fase de qualificação, me trazendo mais entendimento e confiança sobreas possibilidades da minha pesquisa.

Ao Centro Cultural Louis Braille pelo apoio que sempre ofereceu às minhasatividades musicais, e ao Cabeto Rocker pelo incentivo e suporte para que eu pudesse daras minhas primeiras aulas de Musicografia Braille.

Finalmente, a todos os meus amigos, que são muitos. São amigos de quandomorei em Barra Mansa, da época da graduação e das repúblicas, também aos amigos daCasa do Brilho do Amor e da Fraternidade do Coração. Todos vocês transformaram e aindatransformam o meu Ser, profundamente.

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“The best and most beautiful things in the world cannot be seen or even touched.

They must be felt with the heart”

“As melhores e mais belas coisas do mundo não podem ser vistas ou tocadas.

Elas devem ser sentidas com o coração”

Helen Adams Keller (1880 – 1968)

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RESUMO

Este trabalho busca oferecer ferramentas teóricas que possam auxiliar a elaboração de

metodologias para o ensino da Musicografia Braille, que pode ser considerado um campo

recente, e, por isso, com poucas pesquisas especializadas e muitos relatos de experiência.

Observações acerca da relação entre as partituras convencionais, as partituras em braille e

seus respectivos leitores são feitas nesta pesquisa, percorrendo fundamentos conceituais,

métodos musicais, processo de aprendizagem, a audição das pessoas com deficiência visual

e o acesso ao conhecimento teórico-musical aprofundado. Os fundamentos teóricos centrais

são baseados em Bonilha e Sloboda, que dão suporte às analises feitas diretamente sobre

partituras em raille, que buscam revelar como os desafios de aprendizagem da Musicografia

Braille se inter-relacionam na escrita. As análises visam supor os procedimentos lógicos

que o leitor das partituras em braille deve realizar para que a leitura seja correta. Os

resultados obtidos foram concordantes com os relatos de experiência desse campo,

corroborando o caminho tomado nesta pesquisa. A partir desse material, este trabalho

propõe classificar entre cinco Graus de Dificuldade as partituras em braille, de acordo com

os conceitos que ela contém, assim como apresentar etapas que delineiam o conteúdo que

compõe cada Grau de Dificuldade, apontando os conhecimentos ou as habilidades que

devem ser assimilados em cada fase do aprendizado da Musicografia Braille. Os resultados

desta dissertação objetivam beneficiar professores de música de pessoas com deficiência

visual, oferecendo-lhes diretrizes para a elaboração e o planejamentos de aula que incluam

o ensino de partituras em braille. Nesse sentido, também se beneficiam os cursos de

música, que aqui poderão encontrar fundamentação que os auxilie a remodelar seus

métodos, voltando-os ao acolhimento das necessidades de aprendizagem dos músicos

leitores de música em braille, e também para que possam elaborar provas de admissão que

ofereçam igualdade de condições para as pessoas com e sem deficiência visual.

Palavras-chave: educação musical, educação inclusiva, musicografia braille, deficiência

visual.

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ABSTRACT

This study seeks to provide theoretical tools to helpin developing methodologies for

teaching the new field of Braille Music Notation. Despite the limited number of specialized

research, several reports of practical experience have been published. The research covers

observations on the relationship between conventional scores and braille scores, and how

these are read. The studies also present conceptual bases, musical methods, the learning

processes, hearing skills of people with visual impairment and the access issues related to

in-depth music-theoretical knowledge. The central theoretical foundations,based on Bonilha

and Sloboda, support the analysis made directly over sheet music in braille that seek to

reveal how the challenges of learning Braille Music Notation relate to learning regular

music notation. The analyseses aim to anticipate the logical procedures that braille music

scores readers must do in order to achieve a correct reading. The results were in agreement

with the experiences reported in this field, corroborating the methodology chosen forthis

research. For this purpose braille scores were classified according to five difficulty levels

according to the concepts contained in each. Stpes were presentedto delineate the content

that composed each difficulty level, indicating the knowledge or skills that must be

assimilated at each stage of the Braille Music Notation learning process. The results of this

study intends to benefit music teachers for visually impaired persons by providing them

guidelines for developing lesson plans that include teaching Braille Music Notation. In this

sense, music courses are also benifitted, because this study provides support and motivation

enabling remodelling them in order to consider the learning needs of braille scores readers.

Furthermore, it provides arguments for the preparation of entrance exams with equal

conditions for people with and without visual impairments.

Key Words: Music notation; Music education; Inclusive education; Braille Music; Visual impaired.

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................... XII

INTRODUÇÃO............................................................................................................................................. 1

CAPÍTULO 1 - FUNDAMENTOS CONCEITUAIS.................................................................................. 41.1 PESSOA COM DEFICIÊNCIA VISUAL OU PORTADORA DE DEFICIÊNCIA VISUAL?........................................41.3 BREVE HISTÓRIA DA MUSICOGRAFIA BRAILLE...................................................................................... 8

1.3.1 A Musicografia Braille no brasil hoje..................................................................................... 10

CAPÍTULO 2 - ESPECIFICIDADES DA APRENDIZAGEM MUSICAL DA PESSOA COM CEGUEIRA................................................................................................................................................. 13

2.1 A RELAÇÃO ENTRE AS PARTITURAS CONVENCIONAIS E AS PARTITURAS EM BRAILLE............................132.1.1 Métodos diferentes para cada forma de escrita...................................................................... 18

2.2 OS MÉTODOS MUSICAIS DISPONÍVEIS................................................................................................... 202.2.1 Alguns materiais especializados............................................................................................... 23

2.3 EXPERIÊNCIAS E PESQUISAS SOBRE O ENSINO DA MÚSICA PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL: BREVE REVISÃO BIBLIOGRÁFICA................................................................................................................. 25

2.3.1 Considerações Parciais............................................................................................................ 272.4 MATERIAL DIDÁTICO ESPECIALIZADO................................................................................................... 282.5 DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA VISUAL................................................. 31

2.5.1 A construção do conhecimento............................................................................................... 332.6 A AUDIÇÃO........................................................................................................................................ 37

CAPÍTULO 3 - DESAFIOS NO ACESSO DE PESSOAS COM DEFICIECIA VISUAL AO CONHECIMENTO MUSICAL.................................................................................................................. 41

3.1 A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA VISUAL EM CURSOS DE MÚSICA........................................ 413.1.1 Direitos e realidade na inclusão.............................................................................................. 43

3.2 INSERINDO A MUSICOGRAFIA BRAILLE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MÚSICA...........................453.2.1 Formação musical dos alunos de música............................................................................. 473.2.2 Incluindo o aluno com DV em um curso para pessoas videntes........................................... 48

3.3 A TRANSCRIÇÃO DE UMA PROVA DE APTIDÃO MUSICAL PARA O SISTEMA BRAILLE..............................503.3.1 A prova escrita em braille....................................................................................................... 52

CAPÍTULO 4 - ANÁLISES DE PARTITURAS EM BRAILLE............................................................. 544.1 OS DESAFIOS DE APRENDIZAGEM......................................................................................................... 544.2 ANALISANDO PARTITURAS EM BRAILLE............................................................................................... 574.3 COMO SERÃO FEITAS AS ANÁLISES...................................................................................................... 584.3.1 ANÁLISE DO GRAU DE DIFICULDADE 1........................................................................................... 60

Análise 1............................................................................................................................................ 604.3.2 ANÁLISE DO GRAU DE DIFICULDADE 2........................................................................................... 64

4.3.3 Análise do Grau de Dificuldade 3.......................................................................................... 674.3.4 Análise do Grau de Dificuldade 4.......................................................................................... 724.3.5 Analisando o Grau de Dificuldade 5....................................................................................... 75

4.4 AS UNIDADES DE TEMPO................................................................................................................... 784.4.1 Espacialização das notas musicais relativas ao seu valor de tempo..................................... 79

4.4.2 UT ESTENDIDA POR INFORMAÇÕES ADICIONAIS................................................................................ 804.4.3 Fragmentação vertical de diferentes Unidades de Tempo..................................................... 81

CAPÍTULO 5 - DISCUSSÃO DOS RESULTADOS................................................................................ 855.1 SUBDIVISÃO DOS GRAUS DE DIFICULDADES EM ETAPAS..................................................................... 85

5.1.1 Etapas do Grau de Dificuldade 1............................................................................................ 865.1.2 Etapas do Grau de Dificuldade 2............................................................................................ 865.1.3 Etapas do Grau de Dificuldade 3............................................................................................ 89

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5.1.4 Etapas do Grau de Dificuldade 4............................................................................................ 915.1.5 Etapas do Grau de Dificuldade 5............................................................................................ 94

5.2 A LEITURA DE PARTITURAS EM BRAILLE............................................................................................. 945.2.1 A leitura de Agrupamentos Complexos nas partituras convencionais e em braille..............955.2.2 Experiências de um leitor com deficiência visual............................................................... 1005.2.3 Quadro das Etapas.................................................................................................................. 101

5.3 AS ETAPAS DO GRAU 5 SÃO CONTEÚDOS COMPLEMENTARES À TODO O ENSINO EM BRAILLE..........102

CAPÍTULO 6 - QUESTIONAMENTOS CONCLUSIVOS.................................................................... 1056.1 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................................... 110

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................................... 115

APÊNDICE I - INTRODUÇÃO À MUSICOGRAFIA BRAILLE........................................................ 1221 O SISTEMA BRAILLE........................................................................................................................... 1222 NOTAS MUSICAIS E PAUSAS.................................................................................................................. 1243 COMPASSO........................................................................................................................................... 1264 ALTERAÇÕES DE NOTA........................................................................................................................ 1275 ARMADURA DE CLAVE........................................................................................................................ 1276 PONTO DE AUMENTO........................................................................................................................... 128

Ponto duplo de aumento.................................................................................................................. 1287 FERMATA............................................................................................................................................. 1288 ANDAMENTOS...................................................................................................................................... 129

Andamento indicado por metrônomo............................................................................................. 1309 LIGADURAS.......................................................................................................................................... 130

Ligadura de prolongação para uma nota....................................................................................... 130Ligadura de expressão entre notas ou acordes............................................................................... 130Fim de uma ligadura e começo de outra sobre a mesma nota..................................................... 132Final e princípio de ligadura curta sobre uma nota....................................................................... 133

10 CLAVES............................................................................................................................................. 13311 QUIÁLTERAS...................................................................................................................................... 13412 ANDAMENTOS II E NUANCES............................................................................................................. 13513 INTERVALOS....................................................................................................................................... 13614 EM ACORDE TOTAL............................................................................................................................ 13915 EM ACORDE PARCIAL......................................................................................................................... 14016 NOTAS MÓVEIS.................................................................................................................................. 14016 SINAS DE NOTA DUPLA...................................................................................................................... 14117 LIGADURA DE PROLONGAÇÃO DE ACORDE......................................................................................... 14218 REPETIÇÕES CONFORME PARTITURAS CONVENCIONAIS........................................................................ 143

Casa 1 e Casa 2 (Primeira vez e segunda vez).............................................................................. 14319 REPETIÇÕES ESPECIAIS PARA PARTITURAS EM BRAILLE...................................................................... 144

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – DIAGRAMA DE COMUNICAÇÃO PROPOSTO POR NATIEZ................................. 14

FIGURA 2 – TRECHO DE UMA PARTITURA CONVENCIONAL.................................................. 16

FIGURA 3 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO DESENHO MELÓDICO DA PARTITURA CONVENCIONAL DA FIGURA 2, QUE É O MESMO DA PARTITURA EM BRAILLE DA FIGURA 26.................................................................................................. 16

FIGURA 4 – TRECHO MUSICAL ESCRITO EM BRAILLE COM INDICAÇÕES.........................17

FIGURA 5 – DIAGRAMA DE COMUNICAÇÃO CONFORME NATIEZ (1990, LOC. CIT.) COM

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ALTERAÇÕES..................................................................................................................... 19

FIGURA 6 – CELA BRAILLE COM OS PONTOS NUMERADOS................................................... 29

FIGURA 7 – NOTAS DÓ, RÉ, MI E FÁ EM BRAILLE, COM VALOR DE TEMPO DE COLCHEIA. GRAU DE DIFICULDADE 1....................................................................... 60

FIGURA 8 – NOTAS DÓ, SI, LA E SOL EM BRAILLE, COM VALOR DE TEMPO DE COLCHEIA. GRAU DE DIFICULDADE 1....................................................................... 61

FIGURA 9 – PRIMEIRA LINHA DO SISTEMA BRAILLE, FORMADA POR 10 CELAS SEM OS PONTOS 3 E 6..................................................................................................................... 62

FIGURA 10 – SEGUNDA LINHA DO SISTEMA BRAILLE, SENDO AS MESMAS CELAS PRIMEIRA LINHA MAS COM O ACRÉSCIMO DO PONTO 3.................................... 62

FIGURA 11 – TERCEIRA LINHA DO SISTEMA BRAILLE, SENDO AS MESMAS CELAS PRIMEIRA LINHA MAS COM O ACRÉSCIMO DO PONTO 3 E 6.............................62

FIGURA 12 – QUARTA LINHA DO SISTEMA BRAILLE, SENDO AS MESMAS CELAS PRIMEIRA LINHA MAS COM O ACRÉSCIMO DO PONTO 6.................................... 62

FIGURA 13 – QUINTA LINHA DO SISTEMA BRAILLE, SENDO AS MESMAS CELAS PRIMEIRA LINHA MAS COM OS PONTOS “REBAIXADOS”...............................63

FIGURA 14 – PONTOS DA CELA BRAILLE DIVIDIDA EM “NOME DA NOTA” E “VALOR DE TEMPO DA NOTA”................................................................................ 63

FIGURA 15 – PARTITURA CONVENCIONAL PARA A ANÁLISE 3. GRAU DE DIFICULDADE 2.............................................................................................................................................. 65

FIGURA 16 – PARTITURA EM BRAILLE PARA A ANÁLISE 3. GRAU DE DIFICULDADE 266

FIGURA 17 – PARTITURA CONVENCIONAL PARA A ANÁLISE 4. GRAU DE DIFICULDADE 3.............................................................................................................................................. 67

FIGURA 18 – PARTITURA EM BRAILLE PARA A ANÁLISE 4. GRAU DE DIFICULDADE 368

FIGURA 19 – PARTITURA CONVENCIONAL PARA A ANÁLISE 5. GRAU DE DIFICULDADE 3.............................................................................................................................................. 70

FIGURA 20 – PARTITURA EM BRAILLE PARA A ANÁLISE 5. GRAU DE DIFICULDADE 370

FIGURA 21 – PARTITURA CONVENCIONAL PARA A ANÁLISE 6. GRAU DE DIFICULDADE 4.............................................................................................................................................. 72

FIGURA 22 – PARTITURA EM BRAILLE PARA A ANÁLISE 6. GRAU DE DIFICULDADE 473

FIGURA 23 – PARTITURA CONVENCIONAL PARA A ANÁLISE 7. GRAU DE DIFICULDADE 5.............................................................................................................. 77

FIGURA 24 – PARTITURA EM BRAILLE PARA A ANÁLISE 7. GRAU DE DIFICULDADE 577

FIGURA 25 – PARTITURA EM BRAILLE, TRANSCRIÇÃO DA PARTITURA DA FIGURA 2..80

FIGURA 26 – PARTITURA CONVENCIONAL, TRECHO COM MUITAS INDICAÇÕES, DETALHADO A EXECUÇÃO SONORA E TÉCNICA DO PIANISTA........................81

FIGURA 27 – PARTITURA EM BRAILLE, TRANSCRIÇÃO DA PARTITURA DA FIGURA 27, COM INDICAÇÕES DOS SIGNIFICADOS DAS CELAS BRAILLE............................81

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FIGURA 28 – PARTITURA CONVENCIONAL, TRECHO COM DUAS VOZES PARALELAS.. .82

FIGURA 29 – PARTITURA EM BRAILLE, TRANSCRIÇÃO DA PARTITURA DA FIGURA 29, DEMONSTRANDO O USO DO “EM ACORDE TOTAL”.........................................82

FIGURA 30 – PARTITURA CONVENCIONAL, TRECHO COM DIVISI DE VOZ NA METADE DO COMPASSO................................................................................................................... 83

FIGURA 31 – PARTITURA EM BRAILLE, TRANSCRIÇÃO DA PARTITURA DA FIGURA 31, DEMONSTRANDO O USO DO “EM ACORDE PARCIAL”.....................................83

FIGURA 32 – AGRUPAMENTO DE SEMICOLCHEIAS NA ESCRITA EM BRAILLE.................88

FIGURA 33 – (A) SEQUENCIA DE FIXAÇÃO VERTICAL NA LEITURA PIANÍSTICA. (B) SEQUENCIA DE FIXAÇÃO HORIZONTAL NA LEITURA PIANÍSTICA. (C) EXEMPLO DE UMA SEQUENCIA DE FIXAÇÃO OBSERVADA EM PROGRESSÃO DE ACORDES NA MÚSICA PIANÍSTICA (EXTRAÍDO DE WEAVER, 1943). (D) EXEMPLO DE SEQUENCIA DE FIXAÇÃO OBSERVADA EM MÚSICA CONTRAPONTÍSTICA PARA PIANO (EXTRAÍDO DE WEAVER, 1943)...................96

FIGURA 34 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO DESENHO MELÓDICO DA PARTITURA CONVENCIONAL DA FIGURA 29, QUE É O MESMO DA PARTITURA EM BRAILLE DA FIGURA 30.................................................................................................. 98

LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – OS CINCO GRAUS DE DIFICULDADES COM A DESCRIÇÃO DO CONTEÚDO E TIPO DE PARTITURA.................................................................................................... 57

TABELA 2 – ETAPAS DO GRAU DE DIFICULDADE 1.................................................................. 86

TABELA 3 – ETAPAS DO GRAU DE DIFICULDADE 2.................................................................. 87

TABELA 4 – ETAPAS DO GRAU DE DIFICULDADE 3.................................................................. 90

TABELA 5 – ETAPAS DO GRAU DE DIFICULDADE 4.................................................................. 93

TABELA 6 - ETAPAS DO GRAU DE DIFICULDADE 5................................................................... 101

TABELA 7 – CONTEÚDOS COMPLEMENTARES.......................................................................... 103

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APRESENTAÇÃO

Meu primeiro contato com aulas de música foi aos três anos de idade no

Conservatório Barramansense de Música na minha cidade natal, Barra Mansa, no interior

do Rio de Janeiro. Aos cinco anos comecei a ter aulas de piano com minha professora

Norma Aragão, formando-me aos dezoito anos. Em seguida fiz a graduação em música,

bacharelado em composição, na Unicamp.

Durante a graduação fui convidado a substituir o regente de um coral formado

por pessoas com deficiência visual no Centro Cultural Louis Braille de Campinas.

Imediatamente comecei a buscar ferramentas que poderiam me auxiliar nessa nova tarefa e

encontrei a Musicografia Braille. Logo percebi que ela não ajudaria o coral, cujo qual

continuei regendo por quatro anos como voluntário, mas encontrei pessoas interessadas em

aprender as partituras em braille e que haviam poucas pessoas capazes de ensiná-la.

Com o Manual Internacional de Musicografia Braille em mãos, comecei a

estudar os seus fundamentos para poder ensinar aos alunos que queriam aprendê-la. Logo

me deparei com algumas dificuldades que eu não havia previsto, tais como: de que maneira

abordar os conceitos musicais; o que devo ensinar primeiro; como fazer exercícios e etc.

Muito do que descobri foi a partir de meus acertos e erros com os alunos, além de pedir

para que um aluno explicasse para o outro o que já havia entendido. Isso me mostrou um

pouco da forma como esses alunos construíam seu conhecimento.

Desde então eu reformulei a cada ano o meu planejamento de aula, pois sempre

havia alunos novos, alterando de acordo com as experiências do ano anterior. Assim fiz por

cinco anos, quando comecei a escrever artigos e publicá-lo em encontros da ABEM

(Associação Brasileira de Educação Musical).

Consequentemente, seguindo com os estudos que já vinham sendo desenhados,

a presente dissertação intitulada “Particularidades da Musicografia Braille para o auxílio de

novas metodologias de ensino” pretende auxiliar professores a elaborar métodos e

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planejamentos de aulas de música para ensinar a Musicografia Braille para pessoas com

deficiência visual. Para isso será necessário uma compreensão da teoria musical a partir do

referencial da escrita em braille.

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INTRODUÇÃO

O ensino de música para pessoas com deficiência visual geralmente é feito sem

o apoio de métodos ou estudos especializados porque esse é um campo de pesquisa

pioneiro, o que naturalmente faz com que os estudos desse campo sejam escassos e de

difícil acesso. São poucos os textos que tratam especificamente do ensino da Musicografia

Braille, e entre esses, muitos são relatos de experiências. Há uma minoria que trata apenas

desse ensino inclusivo e já nos revelam dados muito relevantes, mas mesmo assim, não é

possível que esses poucos trabalhos supram a carência desse campo. A revisão dessa

literatura será vista no capítulo 2.

Nesse contexto, essa pesquisa se dirige ao professor de música ou pesquisador

que se interessa em conhecer as particularidades dessa escrita musical. Pretendemos

contribuir para educação musical que tem como meta não só ensinar tocar um instrumento,

mas também ensinar a leitura de partituras em braille.

O objetivo dessa pesquisa é criar uma ferramenta que ajude na elaboração de

métodos para o ensino musical de pessoas com deficiência visual a partir de dados advindos

de observações sobre a Musicografia Braille. Tendo uma ferramenta dessa natureza como

apoio, esse ensino especializado poderá se voltar com mais segurança para as necessidades

de aprendizagem dos leitores desse sistema de escrita em relevo.

No entanto, não é do escopo desse estudo nos aprofundarmos no campo da

alfabetização em braille, que ensina como ler e escrever em braille. O aluno a que estamos

nos dirigindo é o aluno com deficiência visual que já conhece essa leitura tátil e se interessa

por aprender música por meio da Musicografia Braille.

As figuras que aparecem no texto são todas acompanhadas por uma descrição

da imagem para que o leitor com deficiência visual possa acompanhar o texto de forma

mais completa.

Todas as partituras em braille que constam nas figuras, estão disponibilizadas

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para download no site www.musicografia.net, passíveis de serem lidas por softwares

especializados ou impressas. Um caderno com todos essas partituras em braille deverá ser

impresso e ser incluído como apêndice ao ser disponibilizado para bibliotecas que

permitem a leitura digital desse texto para pessoas com deficiência visual. Se esse trabalho

tiver uma versão escrita em braille, essas partituras devem ser inseridas nos seus

respectivos lugares 1.

Ao longo da dissertação tentaremos esclarecer algumas dúvidas e crenças

errôneas no que diz respeito às pessoas com deficiência visual com relação aos métodos

musicais, habilidades musicais natas, audição superdesenvolvida, processo de

aprendizagem, direitos ao conhecimento e condições de igualdade no acesso aos

conhecimentos especializados.

Inicialmente apresentamos no capítulo 1 algumas questões pertinentes a esse

campo com o intuito de contextualizar brevemente o leitor no campo que essa pesquisa

discorre. São questões relativas à como se deve escrever a palavra braille, como se deve

chamar formalmente as pessoas com deficiência visual e um histórico da Musicografia

Braille relevando os esforços feitos desde a sua criação a até os dias mais recentes.

Buscamos revelar no capítulo 2 como a compreensão de particularidades das

partituras em braille pode influenciar diretamente no ensino musical inclusivo. Iremos ter

contato com estudos sobre o processo cognitivo e sobre a audição das pessoas com

deficiência visual, buscando ampliar a nossa percepção acerca de mitos que envolvem a

deficiência visual.

No capítulo 3 apresentaremos dados que demonstram como a falta de estudos

especializados sobre as partituras em braille pode impedir a inclusão em condições de

igualdade.

A partir de dados dos trabalhos de Bonilha (2010) e Sloboda (2008), no capítulo

4 iremos analisar diferentes partituras em braille, que serão separadas de acordo com sua

1Essa informação não irá aparecer novamente nesse texto, junto às figuras com partituras em braille

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complexidade. Essa classificação será feita conforme um esquema que nos permite verificar

quais conhecimentos teórico-musicais determinada partitura exige que seu leitor possua

para compreendê-la corretamente. Neste capítulo e no próximo é onde se encontram as

contribuições mais efetiva para o apoio à didática especializada da Musicografia Braille.

Discutiremos no capítulo 5 os resultados das análises feitas no capítulo anterior.

Com essa tarefa feita, veremos que é possível fazermos mais uma nova subdivisão das

partituras em braille, separando-as em Etapas além das classificações que já foram

realizadas.

Finalizando, no capítulo 6 responderemos a algumas perguntas, buscando dar

um panorama geral e breve das principais questões que surgiram ao longo desse texto. No

seu final temos uma exposição conclusiva sobre os dados dessa pesquisa, apontando

maneiras possíveis dela ser utilizada no campo da Musicografia Braille e dando indicações

para a realização de possíveis outros trabalhos.

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CAPÍTULO 1 - FUNDAMENTOS CONCEITUAIS

1.1 Pessoa com deficiência visual ou portadora de deficiência visual?

De acordo com a época as pessoas com DV (deficiência visual) foram

chamadas por nomes que hoje em dia já caíram em desuso. Um dos mais antigos se

encontra nas letras de leis, nomes de instituições, romances e mídia; referenciavam-lhes de

inválidos. Encontramos esse termo sendo usado por revistas de grande circulação ainda no

ano de 1999 (SASSAKI, 2013, p. 1). Esse termo denota falta de valor profissional,

dependência ou incapacidade social.

Segundo Sassaki (2013), no séc. XX a meados da década de 60, os termos

incapacitados (indivíduos sem capacidade) e incapazes (indivíduos que não são capazes)

passaram a ser usados após as guerras mundiais, comumente se referindo aos soldados que

voltavam da guerra com algum tipo de deficiência. Após esse período houve muitos outros

termos, revelando como essas pessoas eram vistas pela sociedade, tais como: os defeituosos

(indivíduos com deformidade), os deficientes (indivíduos com deficiência), os excepcionais

(indivíduos com deficiência mental). Vale citar que a ONU, pressionada por organizações

de pessoas com deficiência, fez do ano de 1981 o “Ano Internacional das Pessoas

Deficientes”. Isso ajudou a melhorar a imagem destas pessoas e nunca mais se utilizou a

palavra indivíduos ao invés de pessoas. A atribuição do termo “pessoa” foi uma conquista

histórica, fazendo com que a palavra deficiente deixasse de ser substantivo para se tornar

um adjetivo.

Após essa conquista a forma de chamar essas pessoas ainda sofreu mais

transformações. O seguinte a aparecer foi “pessoas portadoras de deficiência”. Por uso

corrente, o termo foi contraído para “portadores de deficiência”, no entanto, o termo pode

transmitir a sensação de que a pessoa porta a deficiência tal como portasse algum objeto,

podendo deixa-lo caso decidisse. Logo os próximos termos foram “pessoas com

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necessidades especiais” (substituindo a palavra deficiência por necessidade especial) e

“pessoas especiais” (sendo uma contração do termo anterior).

Finalmente em junho de 1994 a Declaração de Salamanca recomenda a

educação inclusiva para todas as pessoas, com ou sem deficiência, defendendo o direito de

todos que tiverem necessidades educacionais especiais e se encontram excluídas a fazer

parte de escolas e sociedades inclusivas. Assim ela define o termo para “pessoas com

deficiência”, apresentando uma nova forma de se relacionar com as pessoas que têm

necessidades especiais para obter educação, transporte, comunicação, etc.

Em maio de 2002 Frei Betto2 propõe em um artigo o termo “portadores de

direitos especiais” e a sigla “PODE”, argumentando que a palavra “deficientes” como

substantivo ou adjetivo incute falha ou imperfeição e a sigla “PODE” expressaria

capacidade. Quanto a isso Sassaki (2013, p. 4) questiona:

O termo e a sigla apresentam problemas que inviabilizam a sua adoção emsubstituição a qualquer outro termo para designar pessoas que têmdeficiência. O termo “portadores” já vem sendo questionado por suaalusão a “carregadores”, pessoas que “portam” (levam) uma deficiência.O termo “direitos especiais” é contraditório porque as pessoas comdeficiência exigem equiparação de direitos e não direitos especiais. Emesmo que defendessem direitos especiais, o nome “portadores dedireitos especiais” não poderia ser exclusivo das pessoas com deficiência,pois qualquer outro grupo pode reivindicar direitos especiais.

Somado a isso, hoje temos um grande número de documentos escritos e

aprovados por organizações de pessoas com deficiência, que “estão chegando ao consenso

quanto a adotar a expressão “pessoas com deficiência” em todas as suas manifestações

orais ou escritas” (SASSAKI, 2013, p. 6). O autor ainda lista os princípios básicos que

2Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto1 , (Belo Horizonte, 25 de agosto de 1944) é umescritor e religioso dominicano brasileiro. Professou na Ordem Dominicana, em 10 de fevereiro de1966, em São Paulo. Adepto da Teologia da Libertação, é militante de movimentos pastorais esociais, tendo ocupado a função de assessor especial do presidente da República Luiz Inácio Lula daSilva entre 2003 e 2004. Foi coordenador de Mobilização Social do programa Fome Zero. FreiBetto recebeu vários prêmios por sua atuação em prol dos direitos humanos e a favor dosmovimentos populares. Assessorou vários governos socialistas, em especial Cuba, nas relaçõesIgreja Católica-Estado. Fonte: (http://www.ube.org.br/biografias-detalhe.asp?ID=1005)

5

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fizeram com que esses movimentos chegassem a esse termo.

1. Não esconder ou camuflar a deficiência;

2. Não aceitar o consolo da falsa ideia de que todo mundo tem deficiência;

3. Mostrar com dignidade a realidade da deficiência;

4. Valorizar as diferenças e necessidades decorrentes da deficiência;

5. Combater neologismos que tentam diluir as diferenças, como “pessoas com

capacidade especiais” ou “pessoas com eficiências diferentes”.

6. Defender igualdade de direitos, oportunidades entre as pessoas com ou sem

deficiência e lhes proporcionando mais dignidade;

7. Identificar as restrições de participação que as pessoas com deficiência

sofrem na sociedade.

Portanto, a forma “pessoa com deficiência visual” será usada ao longo deste

texto, respeitando o longo debate a respeito de como se referir as pessoas com deficiências.

O termo será usado em uma forma abreviada comum no campo da inclusão: pessoa com

DV.

Embora a leitura em braille seja feita apenas por pessoas cegas e não por

pessoas com baixa visão, nesse texto usaremos apenas o termo pessoas com DV3, termo

que engloba os dois casos citados acima. Geralmente as pessoas com baixa visão não

querem ler em braille, mesmo que isso lhes permita ler e escrever mais rapidamente, além

do que livros em braille são mais disponíveis do que em formato ampliado. Para o caso das

partituras em braille, uma pessoa com baixa visão que sabe ler partituras convencionais e

em braille, poderia se tornar um bom transcritor de partituras por compreender os dois

3Deficiência visual é uma categoria que inclui pessoas cegas e pessoas com visão reduzida. Nadefinição pedagógica, a pessoa é cega, mesmo possuindo visão subnormal, quando necessita serinstruída em braile; a pessoas com visão subnormal pode ler tipos impressos ampliados ou com oauxílio de potentes recursos ópticos (INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT, 2002).

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sistemas de escrita, supostamente tomando decisões mais precisas e de forma mais rápida

do que um transcritor vidente, ou seja, a intenção é não excluir essa possibilidade.

1.2 BRAILLE OU BRAILE? UM OU DOIS “L”?

Há divergências sobre a escrita de alguns termos, que serão padronizados neste

texto. Um tema que foi amplamente debatido é o uso da palavra braille ser escrito com um

ou dois eles, se é com letra maiúscula ou minúscula (CERQUEIRA, 2006), considerando

que o termo foi usado de diferentes formas em vários textos brasileiros. Contudo,

finalizando o debate, a Comissão Brasileira do Braille define: “Pelas razões históricas,

culturais, linguísticas e legais, anteriormente explicitadas, a Comissão Brasileira do Braille

recomenda que a palavra “braille” seja sempre grafada com dois “l”, segundo a forma

original francesa, internacionalmente empregada” (CERQUEIRA, 2006, p. 93).

Essa é a forma como a palavra braille será escrita nesta pesquisa. Quando

houver a escrita Braille em maiúsculo, será nos casos em que o texto se referir ao criador

desse sistema de escrita, Louis Braille.

Alguns argumentos a favor dessa decisão são relevantes de serem aqui

registrados, tais como:

-todos os países falantes da língua portuguesa adotam a grafia com dois “l”;

-o Formulário Ortográfico da Língua Portuguesa, aprovado pela Academia

Brasileira de Letras em 1943, define que “Os derivados portugueses de nomes próprios

estrangeiros devem escrever-se de acordo com as formas primitivas”;

-há 150 anos que textos brasileiros utilizam a palavra braille com dois “l”.

Esses e outros argumentos podem ser encontrados em Cerqueira (2006, p. 91).

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1.3 Breve história da Musicografia Braille

Louis Braille, nascido em 04 de janeiro de 1809, teve aos três anos de idade um

acidente com um instrumento perfurante na oficina de couro de seu pai. Nesse acidente ele

perdeu a visão de apenas um dos olhos e teve início uma infecção que o fez perder

completamente a visão do outro olho dois anos após o acidente. Esse processo é conhecido

por oftalmia simpática e hoje a perda da visão nesses casos é facilmente evitada pela

medicina atual (CERQUEIRA, 1995, p. 6).

Dos sete aos nove anos frequentou uma escola da comunidade de Coupvray

onde conviveu com crianças videntes (com visão normal), algo muito raro nessa época,

tendo apresentado um bom desempenho escolar. Aos dez anos entra para o Instituto Real de

Meninos Cegos (IRMC) de Paris. Nessa escola Braille tem contato com a sonografia, criada

por Charles-Marie Barbier de la Serre (1767-1841) (ibid., p. 29-30). Seu objetivo inicial era

dar suporte à comunicação entre soldados no escuro, evitando que acendessem luzes para

ler no campo de batalha, chamando a atenção dos inimigos. Como não foi concretizada essa

ideia, ele a apresentou ao IRMC em 1821 pensando ser útil.

Braille tinha nessa época doze anos de idade e foi um dos alunos que ficou

muito animado com essa escrita, que oferecia uma leitura mais fácil do que ler as letras do

alfabeto convencional ampliadas e em relevo, assim como era feito até então, além de

permitir com eles próprios escrevessem. O sistema de pontos salientes foi um avanço nesse

campo, usando até 12 pontos para representar 36 sons da língua francesa, mas as letras

eram muito extensas e não abrangiam pontuações no texto e nem números. A forma e as

possibilidades de representação ainda precisavam de melhorias. (ibid. p. 29-30)

Contudo, a partir desse invento Braille começou a desenvolver um modo mais

simplificado usando apenas seis pontos, criando assim a primeira versão do sistema de

leitura e escrita para cegos quando ele tinha apenas dezesseis anos idade. Esse

acontecimento foi em 1825, que é considerado como o ano em que foi inventado o sistema

braille (LEMOS & CERQUEIRA 2008).

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Tal sistema de escrita permite registrar todas as letras do alfabeto, substituídas

por combinações de pontos salientes em um papel lido com a ponta dos dedos. Esse sistema

permite não apenas escrever cada letra do alfabeto, mas também partituras musicais e

símbolos matemáticos.

Louis Braille também era músico, que tocava violoncelo e órgão, sendo

contratado com a ajuda do diretor do IRMC, Dr. François-René Pignier, que possuía

influência entre o clero, como organista de duas igrejas. Após essa contratação e a de outros

músicos cegos, tornou-se comum a contratação de organistas cegos pela França

(CERQUEIRA, op. cit., p. 8).

Provavelmente Louis Braille fazia uso de partituras em relevo nos seus

trabalhos como organista, o que lhe permitiu aprimorar cada vez mais esse sistema. A sua

grafia musical em relevo foi alterada várias vezes ao longo de sua vida, sendo que a sua

versão final é a base do que atualmente se utiliza em todo o mundo (SILVA, 2007). Ela foi

publicada em 1837 com o nome de “Processo para escrever as palavras, a música e o canto-

chão, por meio de pontos, para uso dos cegos, e dispostos para eles” (CERQUEIRA, op.

cit., p. 31).

Somente após sua morte, em 1852, que o uso do sistema braille foi amplamente

utilizado na França. Em 1871 foi publicado um compêndio desse sistema na Inglaterra, em

1879 foi publicado outro na Alemanha e depois uma segunda versão em 1885 em Paris;

havia discrepância entre todos eles. Nesse caso, uma comissão internacional dos países

citados, mais a Dinamarca, padronizaram o código em 1888, em conferência na cidade

alemã de Köln (Colônia). O Documento foi chamado de “chave de Colônia”, segundo Silva

(2007). O autor também comenta:

Foi-se divulgando por toda a parte a Musicografia Braille, pois, cada vezmais, os cegos se valorizavam e empenhavam na melhoria dos meiospostos ao seu serviço. Por assim dizer, em cada país e mesmo dentro dele,os usuários foram inventando e usando símbolos consoantes asnecessidades. Urgia pôr cobro a esta anarquia. George L. Raverat,secretário estrangeiro da American Braille Press, de Paris, tomou a seu

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cargo esta delicada missão, efectuando várias viagens entre a Europa e osEstados Unidos, até conseguir a realização de um congresso, que tevelugar em Paris a 22 de Abril de 1929, o "Congresso Internacional deEspecialistas em Notação Musical Braille", com o patrocínio da UniãoBraille Norte-Americana. Aí se adoptaram acordos importantes, queconduziram ao consenso da unificação da escrita musical dos cegos anível mundial.

Essa incompatibilidade inicial não favorecia a comunicação entre músicos com

DV de países diferentes no campo da teoria musical e nem a troca de partituras entre eles.

Assim sendo, as bibliotecas também eram prejudicadas, pois não havia interesse de público

em adquirir partituras que não poderiam ser lidas, impedindo o intercâmbio de partituras

entre acervos.

Consequentemente, uma nova conferência formada por vinte e nove países foi

convocada pela UNESCO, Conselho Mundial Braille e Conselho Mundial para o Bem-

Estar dos Cegos em 1954 em Paris. O seu objetivo era de reunir, padronizar e divulgar os

esforços de diferentes países para que a Musicografia Braille fosse mais aproximada

possível das partituras convencionais. Assim o leitor do braille poderia saber pela leitura

todos os sinais musicais que contém a partitura convencional original, permitindo uma

melhor comunicação com os músicos videntes.

Esse evento foi necessário, pois havia outro movimento que defendia que as

partituras em braille deviam primar pela clareza musical, mesmo que elas não contivessem

transcritos todos os eventos que ocorrem na partitura em tinta original. Se assim o fosse, o

diálogo entre músicos usuários de ambas as grafias se tornaria inviável, se tornando algo

subjetivo e complexo.

1.3.1 A Musicografia Braille no brasil hoje

A partir da década de 80, o Subcomitê para a Notação Musical no Sistema

Braille, de abrangência internacional, foi criado “para que não haja desvios aos acordos

estabelecidos e pugna para que prevaleça o consenso em todo o mundo” (SILVA, 2007).

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Após anos de estudos desse grupo, foi publicado o Manual Internacional de Musicografia

Braille em português (KROLICK, 2004), atualizando e validando as decisões tomadas nas

conferências desde a de 1888 em Colônia.

O objetivo desse Manual é favorecer o intercâmbio de publicações musicais em

braille entre diferentes países. Ele foi traduzido para várias línguas e está disponível em

português na internet como domínio público4, sendo uma contribuição da União Mundial de

Cegos e parceiros para “a inclusão escolar dos alunos com necessidades educacionais

especiais” (KROLICK, 2004, p. 5).

Assim se construiu a Musicografia Braille, que se tornou o método mais

conhecido e eficiente de grafia musical que não utiliza a tinta, mas sim o alto-relevo e,

portanto, permite a sua utilização por pessoas com deficiência visual. Vale ressaltar que o

Manual Internacional de Musicografia Braille não é um material pedagógico que auxilia o

seu ensino. Ele pode ser considerado como um compêndio de regras.

Nesse Manual não encontramos nenhuma preocupação didática ou exercícios

para ajudar na assimilação do aluno. A organização do seu conteúdo segue uma ordem que

geralmente confunde o leitor que desconhece a fundo o sistema, segundo a minha própria

experiência e o relato de outros professores que tive contato. O Manual não visa ensina-la

passo a passo, tendo um caráter próximo a um manual de instruções ou a um dicionário.

Infelizmente, esse Manual foi distribuído em diversas escolas e entidadesespecializadas, como se se tratasse de um material didático útil a quemquisesse aprender a notação musical em braille. Sabe-se, entretanto, que oaprendizado desse código requer um acompanhamento especializado, bemcomo uma metodologia apropriada aos alunos com deficiência visual e aseus respectivos professores (BONILHA, 2010, p. 180).

Nos casos em que a teoria musical é mais avançada, e por isso de difícil

explicação com poucas palavras, os exemplos são dados pedindo para o leitor comparar

entre os exemplos dados de uma partitura em tinta e uma em braille. Naturalmente que isso

é impossível de ser feito na versão em braille, como pode ser visto nas páginas 8, 79, 94,

4Disponível para download em: <portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/musicabraile.pdf>

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100 e 131 do Manual. Podemos supor que tais exemplos não são totalmente inteligíveis,

mas exigem muita dedicação e esforço mental para compreendê-los sem nenhum auxílio.

Afirmo isso, pois pude encontrar diversas pessoas com DV que mesmo sendo músicos e

conhecendo os fundamentos dessa escrita, não conseguiram usar o Manual e desistiram de

compreendê-lo sozinhos ou mesmo de consulta-los. A sua versão em braille conta com nove

volumes impressos em frente e verso, que geralmente são muito pouco consultados devido

a sua complexidade técnica.

Contudo, conhecer a Musicografia Braille atende as necessidades de autonomia

dos músicos com DV, permitindo-lhes escrever música e ler qualquer partitura sem ajuda de

músicos videntes. Esses músicos podem escrever suas próprias anotações e músicas, tocar

em conjunto e também permite o aprofundamento teórico necessário para o estudo em nível

de graduação e pós-graduação.

No entanto, o acesso a essas partituras é difícil por causa de sua complicada

produção. Mesmo com o auxílio de computadores e softwares, a tarefa de transcrever

partituras convencionais para o braille ainda necessita de um especialista vidente (com

visão normal) em algum momento dessa tarefa. A revisão comparando o original em tinta

com a versão em braille ainda se faz imprescindível para corrigir ou evitar erros de

transcrição. Alguns músicos com DV recorrem a amigos ou parentes que lhes descrevem a

partitura convencional que precisam estudar e então vão a escrevendo em braille, só assim

depois podem utilizar autonomamente a sua partitura em seus estudos. Reforçando isso

segue um trecho de uma entrevista de feita por Bonilha (2006, p. 173) a um músico com

DV:

Quando precisava de alguma coisa mais urgente, a professora, às vezes,escrevia a música toda por extenso com os nomes das notas, se tinha umasemínima, uma semibreve, punha a oitava e eu ia explicando para elacomo é o escrito Braille, ou então, ela ditava para mim.

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CAPÍTULO 2 - ESPECIFICIDADES DA APRENDIZAGEM MUSICAL

DA PESSOA COM CEGUEIRA

Buscaremos esclarecer alguns pontos acerca dos métodos musicais relacionados

com a Musicografia Braille, assim como verificar a veracidade de algumas crenças

populares sobre aptidões e dificuldades das pessoas com DV para a música.

No decorrer desse capítulo procurarei responder a algumas questões que julgo

serem importantes para reflexão.

-Como a ausência do sentido da visão influencia na aprendizagem musical daspessoas com DV?

-É fundamental desenvolver metodologias musicais diferenciadas para pessoascom DV? Não basta transcrever um método musical convencional para o sistema braille?

-Há métodos especializados nesse ensino?

2.1 A relação entre as partituras convencionais e as partituras em braille

Podemos considerar que a grafia musical consiste em compreender determinada

teoria musical e saber como registrar os eventos musicais. Tal registro deve ser claro o

suficiente para ser consultado e novamente se tornar música. Podemos fazer uma analogia

com a relação da Música/ Partitura com a Fala/Escrita.

Quando escrevemos uma fala ou um pensamento que contém uma ideia,

seguindo determinadas regras de escrita, tornamos possível que uma segunda pessoa leia o

que foi escrito e recrie no próprio pensamento as ideias que foram escritas pelo autor do

texto original. Para que essa comunicação aconteça é preciso que quem escreve e quem lê

conheçam as mesmas regras. Assim como a gramática está para a escrita, as teorias

musicais estão para a partitura.

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Há teorias do campo da semiologia sobre a transmissão de mensagens entre

duas pessoas que podem trazer novas percepções sobre a relação entre as partituras

convencionais com as partituras em braille. Natiez (1990, p.17) cria um quadro de

conceitos a partir da teoria semiológica de Molino recorrendo a um esquema clássico da

comunicação: o Produtor que gera uma Mensagem endereçada a um Receptor. Procurando

considerar que o processo de reconstrução da Mensagem que faz o Receptor é algo tão

complexo quanto a tarefa do Produtor em gerar a sua Mensagem, ele remodela esse

esquema clássico. Observe o diagrama abaixo:

Figura 1 – Diagrama de comunicação proposto por Natiez

Fonte: Natiez (1990, p. 17)

Descrição para pessoas com DV: No lado esquerdo da figura aparece a palavra Produtor,relacionada aos dizeres Processo Poiético localizados acima da palavra Produtor. Apartir dessa palavra há uma seta em direção ao centro do diagrama, onde temos apalavra Traço/Vestígio. No lado esquerdo aparece a palavra Receptor, relacionada àProcesso Estésico, escrito acima. Da palavra Receptor há uma seta em direção aocentro do quadro, onde temos a palavra Traço/Vestígio, sendo a mesma citadaanteriormente.

Nesse esquema o “Processo Poiético” é a ação complexa do “Produtor” de criar

a sua mensagem a partir de uma ideia. Essa mensagem aqui é chamada de “Traço/Vestígio”,

sendo considerada como uma parcela do conceito inicial que o Produtor quis comunicar. O

“Processo Estésico” é a ação complexa do “Receptor” de recriar o conceito inicial que o

Produtor quis comunicar por meio do “Traço/Vestígio”.

Esse esquema sugere que o Traço/Vestígio (que pode ser um poema, um filme,

uma sinfonia) não é apenas o intermediário de um processo de comunicação que transmite a

intenção do autor para uma audiência. Ele considera que o Traço/Vestígio é o resultado da

ação complexa do Produtor em cria-lo (o processo poiético), assim como é complexa a ação

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do Receptor em reconstruir o conceito original a partir do Traço/Vestígio (processo

estésico). O Traço/Vestígio é então considerado uma pequena amostra parcial do que o

Produtor tencionou transmitir, restando ao Receptor reconstrui-la a partir de seus próprios

conhecimentos. Quanto mais conhecimentos e capacidades o Produtor e o Receptor tiverem

em comum a respeito do Processo Poiético e do Estésico, melhor será a compreensão entre

ambos.

Se traçarmos um paralelo com uma partitura em tinta podemos considerar a

música escrita como um Processo Poiético, onde o Produtor tem como objetivo transmitir

uma música (um conceito) por meio de um sistema definido (Traço/Vestígio). A partitura

pode ser vista como Traço/Vestígio da música, sendo algo que existe antes da ação criativa

do Produtor. A partir dessa partitura o Receptor fará a sua interpretação, que neste caso é o

leitor da partitura.

Nesse sentido “partiturar” uma música é a tarefa de anotar no papel os

Traços/Vestígios de uma música de forma que possam ser compreendidos por um

Receptor/Leitor. Para tanto é necessário que existam regras definidas e conhecidas tanto

pelo Produtor quanto pelo Receptor. Essas regras são todas as formas de representação

musical que encontramos nas partituras ocidentais em tinta. Nelas há um padrão de escrita

para os eventos musicais fazendo uso da espacialização horizontal e vertical no papel, se

assemelhando a um “gráfico de linha” 5. Nesse gráfico o tempo da música está no eixo

horizontal; a altura da nota está no eixo vertical. Veja as figuras a seguir e as compare.

Figura 2 – Trecho de uma partitura convencional

Descrição para pessoas com DV: A imagem é de uma partitura convencional. Essa partiturapode ser compreendida na partitura em braille apresentada na Figura 26

5O gráfico de linha é composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, e por uma linha quemostra a evolução de um fenômeno ou processo.

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Figura 3 – Representação gráfica do desenho melódico da partitura convencional da figura 2,que é o mesmo da partitura em braille da figura 26

Descrição para pessoas com DV: Há cinco linhas representando uma pauta e ao invés dehaver notas musicais, conforme uma partitura convencional, há uma linha vermelhafazendo o desenho melódico da partitura em braille da figura 26. No alto está escrito“Desenho Melódico” e embaixo há uma pequena linha vermelha seguida do escrito“Linha melódica”, indicando o que representa a linha vermelha

Por sua vez, a Musicografia Braille é uma espécie de descrição do que acontece

na partitura em tinta7. É como se fosse um ditado que segue regras sobre como ditar e em

que ordem isso deve ser feito. Sendo assim, podemos afirmar que a grafia em braille é uma

interpretação (Processo Estésico) dos Traços/Vestígios que a grafia em tinta criou a partir

do evento musical (Processo Poiético).

Então entre ambas as partituras estão os mesmos Traços/Vestígio? Sim. Cada

detalhe contido nas partituras em tinta é escrito em braille. Uma partitura em braille poderia

facilmente ser uma gravação de voz que a narra minuciosamente, mas ao ser escrita ela não

se enquadra no esquema letra por letra, palavra por palavra. Ela é escrita através de letras

onde apenas uma delas pode significar uma ou mais informações ou mesmo conceitos

complexos que não podem ser explicados com poucas palavras. Por exemplo: apenas uma

letra braille informa musicalmente a oitava na próxima nota; a seguinte letra indica o nome

da nota e seu valor de tempo correspondente (duas informações na mesma letra); a próxima

indica o dedilhado correspondente; etc. Enquanto algumas letras contêm mais de uma

6As figura que não possuem a “Fonte” de origem foram feitas pelo autor dessa pesquisa, assimcomo os exemplos musicais em braille e na escrita convencional.

7Por isso, a descrição feita na figura 2 é totalmente compreensível para a pessoa com DV que lê essetexto por meios eletrônicos. Essa característica será esclarecida gradativamente ao longo dessapesquisa.

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informação, há casos em que é necessário duas letras juntas para apenas uma informação;

como é o caso da barra final, stacato, em acorde, entre outros. Veja o exemplo abaixo, onde

mostra como a partitura da figura 2 é escrita em braille

Figura 4 – Trecho musical escrito em braille com indicações.

Descrição para pessoas com DV: a mesma partitura descrita na figura 2 aparece aqui a sua versãoescrita em braille com indicações do que cada cela braille8 significa.

Todas as celas, que contém as informações musicais, estão cuidadosamente

organizadas. A comunicação entre as duas escritas musicais é muito estreita, não havendo

espaço para dúvidas na interpretação. É possível o leitor do braille saber exatamente como

a música está escrita no seu original em tinta.

O leitor da Musicografia Braille, embora não esteja lendo uma partitura em

tinta, precisa se apropriar dos mesmos conceitos teóricos que o leitor vidente precisa para

compreender a escrita dos eventos musicais. Por isso é importante manter a escrita em

braille sempre respeitando a maneira como a escrita em tinta foi feita, o que irá permitir

uma boa comunicação entre um músico leitor de partituras convencionais e o de partituras

em braille.

Contudo, mesmo com a partitura em braille compartilhando os mesmos

Traços/Vestígios da partitura em tinta, a partitura em braille os interpreta a sua maneira ao

8Cela braille é o grupo de 6 pontos que formam as 63 combinações possíveis do sistema braille.

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realizar o seu próprio Processo Estésico. Mas a relação entre elas é tão próxima que o

Processo Estésico do seu Receptor em braille parece ser o próprio Processo Poiético feito

sobre os eventos musicais da escrita convencional.

Nesse sentido, como a música é compreendida pela pessoa com DV de forma

aproximada ao que faz o leitor vidente, a Musicografia Braille pode ser considerada como

uma escrita inclusiva para músico com DV no meio musical. Isso não quer dizer que seria a

única possibilidade, mas sim que é a ferramenta que melhor atende as necessidades e

possibilidades de inclusão de seu usuário.

Houve outras tentativas de criar sistemas mais simples de escrita musical para

pessoas com DV, mas nenhuma delas alcançou essa qualidade ímpar, que só poderia ter

sido criada por uma pessoa com DV e não por um vidente que desconhece como eles

realmente se relacionam com o mundo.

2.1.1 Métodos diferentes para cada forma de escrita

A pessoa com DV pode ler uma música escrita em braille sem precisar conhecer

a grafia convencional, embora seja recomendado por professores com DV que o aluno

venha a conhecer ambas, mas em um segundo momento do seu aprendizado. Isso deve

garantir com que o aluno se comunique com um músico vidente (sem DV) que só conhece

a partitura em tinta, já que o objeto da comunicação é o mesmo (a música) e ambos têm o

mesmo conceito sobre os eventos musicais.

No entanto a comunicação se tornaria inviável caso uma dessas duas pessoas

não conheça a teoria musical. Seja o músico vidente ou o músico com DV. Para ilustrar

melhor a comunicação entre os dois tipos de músico, devemos considerar outra relação

dentro do quadro de Natiez (figura 1).

Se colocarmos as duas grafias musicais no lugar de Produtor e os seus

respetivos leitores no lugar de Receptor, logo teremos Traços/Vestígios diferentes

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provenientes de uma mesma música. A música é o objeto original cujo qual se quer

comunicar em ambas as vias de comunicação.

Figura 5 – Diagrama de comunicação conforme Natiez (1990, loc. Cit.) com alterações.

Descrição para pessoas com DV: Na esquerda do diagrama tem escrito Música Original, quetem uma seta saindo para a direita e bifurca terminando com uma ponta para cima eoutra para baixo, apontando para duas linhas que estão do centro até o fim dodiagrama. Essas linhas se assemelham ao diagrama da figura 1. No começo da linha decima temos a palavra Partitura em braille, com uma seta para a direita, onde temos apalavra Traços/Vestígios. No fim dessa linha temos a palavra Leitor, com uma seta paraa esquerda, em direção a palavra Traços/Vestígios. Na linha debaixo temos a palavraPartitura convencional, com uma seta para a direita, onde temos a palavraTraços/Vestígios. No fim dessa linha temos a palavra Leitor, com uma seta para aesquerda, em direção a palavra Traços/Vestígios. As palavras Partitura em braille ePartitura convencional estão relacionadas à palavra Produtor, escrita acima delas. Aspalavras Leitor de ambas as linhas estão relacionadas à palavra Receptor, escrita acimadelas.

Destacamos nesse segundo diagrama alguns pontos importantes:

a) não há semelhanças diretas entre os Traços/Vestígios;

b) mesmo sem os dois leitores compreenderem o Processo Estésico que o outroestá fazendo, ambos irão executar exatamente a mesma música;

c) após a interpretação correta feita pelos distintos leitores é que pode havercomunicação musical entre eles, seja na execução, seja no campo da teoria.

Portanto um método musical é algo fundamentado nos Traços/Vestígios do

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esquema acima e, por isso, um método para partituras em tinta não poderia ser traduzido

para o braille e utilizado para o ensino da Musicografia Braille. Para tanto é necessário

verificar quais são os Traços/Vestígios do braille e como isso pode influenciar na sua

metodologia, que é o que pretende essa pesquisa.

2.2 Os métodos musicais disponíveis

Para que o aprendizado musical ocorra podemos ter ou não um esquema

didático como apoio. Por exemplo, se uma pessoa se encontra em uma cultura falante de

uma língua que ela desconhece, ela aprenderá a se comunicar gradativamente cada vez

melhor a partir das interações com as pessoas desse lugar. Certamente, se há um professor

intermediando esse processo de aprendizagem, ou se tem em mãos um método, esse

processo será mais rápido e eficiente na mesma proporção em que o método utilizado é o

mais indicado para cada caso.

Poderíamos pensar que qualquer método musical seria bom para o ensino da

Musicografia Braille, mas como vimos anteriormente, isso não é verdade. Embora o

conteúdo principal seja sempre a música, a forma como ela é apresentada deve ser

específica. Como um exemplo hipotético, e exagerado para melhor ilustrar a situação, seria

como se um método de clarinete fosse utilizado para a aprendizagem do saxofone. Isso

seria melhor do que não usar nenhum método, no entanto, não é o mais adequado.

Constata-se que o ensino musical para pessoas com DV não foi pesquisado da

mesma forma ampla que foi pesquisada a educação musical para pessoas videntes. Temos

disponíveis diversos métodos de musicalização desenvolvidos a partir do começo do século

XX, todos elaborados para alunos videntes, tendo apenas algumas citações sobre a inclusão

de pessoas com cegueira. Dolores (2003, p.122) em sua dissertação aponta que há falta de

metodologias adequadas para as pessoas com DV, de material didático e de partituras.

Giesteira (2013, p. 27) afirma que, embora haja diversas instituições que trabalham com

inclusão de pessoas com DV, a bibliografia específica sobre ensino musical é mínima. Isso

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refletindo na qualidade da aprendizagem musical, especialmente nas etapas de iniciação.

Podemos considerar que a educação musical ocidental é fundamentada em

métodos de educadores musicais que trouxeram inovações para o posicionamento

educacional de suas épocas. As primeiras raízes desse movimento são encontradas já em

Rousseau e Rameau, no séc. XVIII. Ambos os autores são considerados precursores das

ideias que mais tarde culminariam na série de métodos da educação musical do séc. XX

(FONTERRADA, 2008, p. 59). Nesse período, a postura questionadora das tradições

seculares e os desafios da nova sociedade industrializada que surgia gerou a necessidade de

investir esforços na educação afim de que o indivíduo não se perdesse em meio ao

consumismo e sobrevivência urbana. Na educação musical o movimento dos “métodos

ativos” surgiu para atuar individual e coletivamente em direção ao aperfeiçoamento de

qualidades e da sensibilidade humana (ibid., p. 96). A educação musical se voltou para a

valorização da prática direta da música, deixando em segundo plano o ensino da teoria e

escrita musical.

No séc. XX se destacam quatro pesquisadores que podem ser considerados a

base da educação musical moderna: o austríaco9 Dalcroze; o húngaro Kodály; o alemão

Orff e o japonês Suzuki (ibid., p. 122). Seus métodos são utilizados até hoje em muitas

escolas de música e ainda influenciam inúmeros métodos musicais atuais. Outros

importantes autores podem ser considerados influenciados por esses, tais como o belga

Willems que foi aluno de Dalcroze; e o brasileiro Vila Lobos, que implantou nas escolas o

Sistema de Educação Musical através do Canto Orfeônico, inspirado pelo trabalho de

Kodály, ambos reforçando a identidade musical nacional e usando a voz como primeiro

instrumento musical.

A partir da metade do séc. XX, a música erudita ocidental teve novo impulso

com as experiências composicionais de Pierre Shaeffer na Radiotélévision Française, que

impulsionou a nova “música concreta”, além das propostas musicais do compositor John

Cage. Esse movimento, que ainda se somam outros compositores, representa a época em

9Dalcroze nasceu na Áustria e aos 10 anos passou a morar em Genebra, Suiça.

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que a sonoridade da música passou a ser o parâmetro principal a ser considerado,

geralmente explorando procedimentos aleatórios e utilizando grande diversidade de

recursos eletrônicos. Os educadores musicais dessa época foram influenciados por essa

tendência, se interessando “pelo som como matéria-prima da música, onde as explorações

sonoras são a base para as criações e interpretações” (BUENO, 2010, p.16). Ou seja, a

apreciação da sonoridade passou a ser prioridade, colocando em segundo plano a prática e a

escrita. Alguns dos principais educadores desse movimento citados por Bueno (2010),

chamado de “segunda geração”, são Schafer, Self, Paynter, Porena, Koellreutter e Zagonel.

No entanto, nenhum desses métodos aborda o uso da Musicografia Braille na

aprendizagem musical de pessoas com DV. Alguns desses métodos poderiam ser usados

nesse ensino especializado, mas essa ação iria exigir do professor conhecimentos da grafia

braille e de inclusão para fazer essa adaptação. Frequentemente esses conhecimentos não

são transmitidos de forma adequada nas formações de professores.

Uma das dificuldades encontradas na formação dos educadores, no estudode alguns fundamentos teóricos para o trabalho com alunos comnecessidades educacionais especiais, é o amplo leque de realidadessocioculturais existentes em nosso país. Para atender esta demanda tãodiversa, o material dirigido à formação tem se proposto oferecer umalinguagem suficientemente abrangente para ser acessível a todos. Porém,em alguns casos, se observa a excessiva simplificação dos conteúdospropostos, aliada a uma superficialidade que se distancia das situaçõesproblemáticas concretas de cada realidade (PAULON, 2005, p.21).

Desse modo, particularidades da grafia musical em braille e questões de

aprendizagem e socialização com pessoas com DV deveriam ser não só abordadas em

cursos de formação para professores de música, mas sim com aprofundamento no tema. O

objetivo seria capacita-los a dar aulas de música para alunos com DV com o apoio de

materiais didáticos especializados. Caso não tenham disponível tais materiais os próprios

professores seriam capazes de criar as adaptações para suas aulas, pois teriam

conhecimentos básicos no campo da inclusão.

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2.2.1 Alguns materiais especializados

Ota e Vanazzi de Souza (2011) relatam a experiência na confecção de um

material usado em aulas de música para pessoas com DV na Universidade Estadual de

Maringá em 2010. Na ocasião foi feito um material didático em borracha de E.V.A.10

correspondendo às letras em braille que formavam as notas musicais em diferentes valores

de tempo. Com esse recurso foi possível desenvolver atividades de musicalização e

introduzindo a leitura do braille de forma gradativa e lúdica. Algumas dessas atividades

foram chamadas de bingo de notas, jogo da memória, relógio braille, ditado e piano

invisível. A sequência na abordagem do conteúdo musical foi elaborada a partir de

experiências anteriores, procurando respeitar as particularidades da escrita em braille. Os

autores concluem:

Acreditamos ser importante a utilização de materiais didático-musicaiscom alunos cegos, porém isso requer preparação dos professores. Nessesentido é sensato elaborar um material didático para auxiliar o aluno comDV de modo a proporcionar dinâmicas relacionadas com a MusicografiaBraille, não com a grafia em tinta. Os materiais e dinâmicas criados pelaequipe certamente tornou a aprendizagem da Musicografia Braille maisprazerosa e eficiente para os alunos em nossas aulas (OTA E VANAZZIDE SOUZA, 2011, p. 272).

Temos encontrado pessoalmente outros professores que também

confeccionaram esse material braille com borracha de E.V.A. Tais professores têm obtido

resultados positivos no aumento da eficiência e qualidade na aprendizagem dos seus alunos.

Geralmente cada uma faz pequenas alterações com relação ao material original. Alguns

fizeram com que os pontos três e seis da cela braille sejam fixados com velcro 11, podendo

ser destacados e colocados quando necessário, já outros professores fizeram os pontos com

pequenos pregos arredondados, também dando a liberdade de retirá-los de acordo com a

atividade. No apêndice há uma introdução à Musicografia Braille para o leitor que

desconhece o sistema e queira conhece-lo, nele pode ser compreendido como essas

10A borracha E.V.A. é uma mistura de Etil, Vinil e Acetato.

11s.m. (marca registrada, do fr. velours croché) Tecido fabricado em tiras duplas, aderentes, usadocomo fecho ou para fixar, uma na outra, duas coisas diversas ou duas partes de uma mesma coisa.

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alterações citadas podem facilitar a aprendizagem e criar novos exercícios.

Giesteira (2013, p. 92) aponta dois materiais didáticos que se relacionam

diretamente com a teoria da Musicografia Braille: An Introduction to Music for the Blind

Student: A Course in Braille Music Reading, de Richard Taesch12, e How to Read Braille

Music de Betty Krolick13. Com relação à aprendizagem instrumental temos disponível An

Introduction to the Piano for the Blind Student, também de Richard Taesch14, assim como a

tese de Giesteira (2013) que desenvolve um moderno método de violão que leva em conta

características da Musicografia Braille. Giesteira também nos diz que existe uma grande

quantidade de métodos em tinta transcritos para o sistema braille, mas que essas

transcrições literais de métodos instrumentais só são eficientes para estudantes que já

dominam a Musicografia Braille.

Constata-se que em geral o ensino da música para pessoas com DV foi

abordado de forma superficial, sem haver preocupação direta com a Musicografia Braille.

Poucos trabalhos podem ser considerados como métodos musicais, embora sejam ainda

recentes e pioneiros se comparamos com as amplas pesquisas do ensino que se estrutura na

grafia em tinta.

No entanto, há boas referências em relatos de experiência fornecidos por alguns

pesquisadores/professores que ministraram aulas sem o auxílio de métodos musicais. Tais

relatos podem nos ajudar com novas ideias sobre esse ensino e expandir o nosso panorama

sobre esse campo de ensino.

2.3 Experiências e pesquisas sobre o ensino da música para pessoas com

12Taesch, R (2000). An Introduction to Music for the Blind Student. A Course in Braille MusicReading. (Part I, Lessons Phases one thought four). Pensilvania: Dancing Dots.

13Publicado por Opus Technologies, 1998, 52 pages, ISBN: 1-892195-05–4. Disponível em:<http://www.opustec.com/products/howto/howprint.html>.

14Taesch, R. (2001). An Introduction to the piano for the Blind Student. A progressive curriculum inbar-over-bar braille music reading. (Book II, Graded Studies). Pensilvania: Dancing Dots.

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deficiência visual: breve revisão bibliográfica

Bohn (2008), em um trabalho de conclusão de curso intitulado “O ensino de

violino voltado para deficientes visuais integrando o método suzuki e a musicografia

braille”, aponta a experiência que o próprio Shinishi Suzuki teve com um aluno com

cegueira. Ele adaptou peças no corpo do violino para educar os movimentos do arco com

relação às cordas, facilitando a aprendizagem dos gestos, tendo apresentado um bom

resultado. O método Suzuki presa pela memória musical, deixando a leitura de partituras e

a teoria em segundo plano. Relatos afirmam que essas adaptações têm funcionado muito

bem com os alunos com cegueira, mas esses estudos não abordam como a Musicografia

Braille seria inserida nesse ensino.

Em 1926 foi realizado o Primeiro Congresso de Rítmica Dalcroze em Genebra,

que entre suas atividades contou com uma demonstração do trabalho de Juan Llongueres

sobre a rítmica dalcrozeana com pessoas com cegueira (RODRIGUES, 2014). Llongueres

foi autor do livro “La Gymnastique rythmique dans l'éducation des aveugles”, infelizmente

não pude encontrar esse livro, datado do começo do séc. XX, apenas constatei sua

existência ao ser citado por Mata (2012, p. 82).

De todo modo, o método Dalcroze não se preocupa em reunir em um

compêndio séries de exercícios definidos para serem aplicados com todos os alunos de

forma padronizada. Ele busca fazer com que seus professores, credenciados pelo Instituto

Dalcroze da Suíça, tenham recursos pessoais para criar suas atividades de acordo com suas

habilidades musicais e adaptando-as com a realidade e necessidade de seus alunos.

Segundo Harasim (2002, p. 5), Dalcroze acreditava que, apesar de qualquer

deficiência que o aluno tenha, é preciso desenvolver a sua criatividade, autoconfiança e

percepção musical. Deve-se buscar apresentar a música não apenas como o resultado de um

processo intelectual, mas sim parte de um instinto vital.

Dessa forma, devido ao método de Dalcroze ter essa característica teórico-

filosófica sobre o ensino musical, definindo pouco a forma como a musicalização deve ser

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feita, esse método pode perfeitamente ser aplicado para pessoas com DV. A tarefa de

concretizar a filosofia educacional de Dalcroze na sala de aula é delegada ao professor que,

se esse possuir conhecimento no campo da inclusão, pode criar atividades muito

proveitosas e eficazes. No entanto, não temos notícias de que o músico Juan Llongueres

tenha ensinado Musicografia Braille por meio do método Dalcroze para os seus alunos, o

que seria de maior interesse para essa pesquisa.

No evento Actas de la IX Reunión de Sociedad Argentina para las Ciencias

Cognitivas de la Música, Chávez (2010, pág. 74) apresentou o artigo “Estrategias de

Estudo Utilizadas por Pianistas Ciegos”, vinculada ao Instituto Universitário Nacional del

Arte, de Buenos Aires. A autora entrevistou três pianistas com cegueira e descreve um

pouco de suas técnicas pianísticas e como seus professores lhe ensinaram. Cada um desses

pianistas tinha uma técnica diferente para resolverem saltos entre notas distantes. O

primeiro pianista entrevistado, Gabriel Bergogna, utiliza a técnica de arrastar as mãos pelo

teclado, pois assim ele consegue fazer saltos amplos entre duas notas. Ele também diz fazer

uso de memória motora, decorando o movimento dos braços e mãos para tocar o piano. Em

oposição, o segundo pianista, Osvaldo Guzmán faz no ar um caminho curvo entre as notas

saltadas, por cima do teclado, e também procura memorizar o gesto de cada trecho. O

terceiro entrevistado, a pianista Lourdes Castiñeira, diz que é apenas uma questão de

memória espacial e que não requer nenhuma técnica especial: apenas com muita repetição a

pessoa adquire essa habilidade, seja ela com ou sem visão. Observamos que o ponto

comum entre esses pianistas é o estudo de um gesto associado ao trecho musical em

questão, de forma que a execução seja correta no instrumento.

Silva e Araldi (2010) relatam como foi começar um trabalho de música para

pessoas com DV em um projeto de extensão da Universidade Estadual de Maringá.

Encontraram dificuldades e medos sobre como tratar, falar, se dirigir e conduzir seus alunos

com DV sem ofendê-los. Também aprimoraram a metodologia dessas aulas ao longo do

curso e afirmam terem enriquecido a própria formação profissional com essa experiência.

Junior (2010) nos apresenta como desenvolveu atividades musicais feita com

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um grupo de pessoas com DV usando instrumentos de percussão. Os alunos não conhecem

a Musicografia Braille e alguns ainda não leem em braille, o autor se ate apenas na prática

musical. O autor aponta que isso tem permitido aos participantes colherem benefícios em

diversas áreas de suas vidas, se revelando a cada dia “mais independentes e participativos,

apresentando uma melhora significativa no desempenho escolar e um refinamento discreto,

mas promissor no desenvolvimento da estética musical”.

Em uma pesquisa feita com crianças com e sem DV da mesma idade, Herrera

(2010, p. 93) aponta que a capacidade de relacionar a altura de nota com a verticalidade

(agudo é no alto e grave é embaixo) é praticamente idêntica para ambos os grupos.

Herrera defende que a percepção de subir e descer entre duas notas com alturas

diferentes é adquirida pela vivência pessoal, independentemente da deficiência visual.

Também diz que estes estudos reforçam a necessidade de discutir e repensar o modo que a

aprendizagem musical em geral faz uso desta correspondência. Isso deve ser especialmente

considerado no âmbito da Musicografia Braille, já que em parte ela ignora esta relação na

representação da altura do som. Esse assunto sobre a relação vertical e horizontal das

partituras em braille será vista com detalhes no capítulo quatro.

2.3.1 Considerações Parciais

O objetivo dessa pesquisa se restringe a levantar dados acerca das partituras em

braille com o intuito de criar uma ferramenta de apoio para o seu ensino. Portanto, questões

sobre como trazer as experiências de Suzuki, Dalcroze, entre outros, para a utilização das

partituras em braille será tarefa para outras pesquisas, que certamente serão beneficiadas

com os resultados desse estudo.

Por minha experiência e pelo contato com professores de música de alunos com

DV afirmo que os professores geralmente começam a lecionar sem terem nenhum apoio

metodológico especializado, criando suas adaptações livremente. Alguns utilizam partituras

em braille elementares e outros nem sequer chegam a mencioná-la devido ao

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desconhecimento. Outros fazem uso de partituras convencionais escritas de forma ampliada

ou em alto-relevo, usando fios de barbante colados no papel para representar as linhas da

pauta, fichas de borracha para as notas e etc. Há ainda casos raros em que o professor

inventa um sistema próprio de escrita em relevo, que não usa as celas braille, mas quando

esses são comparados à Musicografia Braille se mostram rudimentares além de

impossibilitar que o próprio músico com DV escreva a música.

De modo geral os professores acabam desenvolvendo métodos e exercícios para

auxiliar suas aulas de acordo com o que conhecem sobre inclusão e com o interesse dos

alunos com relação à música. No entanto, não chegam a publicar esses conteúdos de forma

a gerar material de apoio para outros professores.

2.4 Material didático especializado

Existem programas de computador de criam partituras em braille que poderiam

ajudar nessas aulas especializadas?

Há diversos programas de computador que fazem automaticamente a conversão

de textos digitalizados (".doc", ".txt", etc.) para o sistema braille. Tais programas permitem

ao usuário digitar as letras da forma tradicional ou alterando-o para que funcione como uma

máquina Perkins15 virtual, digitando cada cela braille diretamente pelos pontos que a

formam. Nesse caso apenas as letras f, d, s, j, k, l funcionam para escrever as letras,

correspondendo respectivamente aos pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 6. Veja a figura a seguir, que

representa o que é uma cela braille e o número dos pontos que a forma.

15As máquinas Perkins são máquinas que escrevem os pontos em relevo diretamente no papel, comuma gramatura maior do que um folha de caderno. A gramatura recomendada para a escrita emrelevo é de 120g a 150g, para os papéis normalmente usados para impressão em tinta tem gramaturade 75g.

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Figura 6 – cela braille com os pontos numerados.

Descrição para pessoas com DV: cela braille com o número correspondente a cada um dosseis pontos. Os três primeiros à esquerda e os três últimos à direita.

Esses programas então geram um arquivo que ao ser enviado para impressoras

especiais são impressos em alto-relevo. Elas usam papéis de gramatura maior do que

geralmente é usado para impressão em tinta para que não rasgue ou perca a informação

com o passar do tempo.

Dessa forma, com algum conhecimento de informática e treinamento para

formatar corretamente o texto braille no computador, qualquer pessoa pode gerar arquivos

para serem impressos em braille. O mesmo não ocorre com as partituras ou métodos

musicais com essa facilidade, pois exige maiores conhecimentos e especialidades técnicas.

Os melhores softwares não são gratuitos e tem custo muito alto, o que dificulta

o acesso não só pelos usuários interessados, mas também de pesquisadores para utilizá-los

em transcrições ou avaliar sua eficiência. Os programas gratuitos, como o MusiBraille16,

ainda não atendem a todas as necessidades de escrita e de transcrição, faltando abranger

recursos avançados da Musicografia Braille. Esse programa se mostra muito conveniente

para o usuário iniciante com DV e para músicos que queiram escrever apenas partituras

simples, carecendo de atender partituras mais complexas. A percepção das diferentes

complexidades das partituras em braille será vista no capítulo 3.

Contudo a participação de um transcritor especialista é importante para que

16Dolores Tomé, juntamente como professor Antônio Borges do Núcleo de Computação Eletrônicada Universidade Federal do Rio de Janeiro, lançaram um software gratuito chamado Musibraille, oprimeiro programa para computadores em língua portuguesa para escrita da linguagem musical emBraille. Disponível gratuitamente para download em: http://intervox.nce.ufrj.br/musibraille/.

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uma partitura seja transposta para o braille corretamente, mesmo com o apoio de programas

especializados. Algumas decisões de formatação, por exemplo, como o programa irá

escrever determinadas passagens ou trechos, podem ser feitos por alguns poucos

programas.

Nesse quesito, um programa que tem se destacado é o GoodFeel Music

Translator, que tem feito transcrições de partituras a partir do programa Lime Aloud Music

Notation, de partituras convencionais, com grande precisão. Os estudos desenvolvidos na

área de Musicografia Braille da Biblioteca de Acessibilidade da Unicamp com esse

programa têm encontrado algumas dificuldades, mas geralmente, depois de muitos testes,

os problemas têm sido resolvidos satisfatoriamente. O Goodfeel está sendo constantemente

aprimorado pelos seus criadores, suprindo necessidades e recebendo sugestões de usuários

de diferentes partes do mundo. Embora seja um programa de alto custo no mercado, ele é o

programa que mais tem se destacado e está em constante melhoria.

Contudo, esses programas podem ajudar no aprendizado, mas apenas como

ferramentas auxiliares. A pedagogia da Musicografia Braille é um campo diferente do

campo da transcrição computadorizada de partituras convencionais para o braille. Isso quer

dizer que não é possível passarmos um livro em tinta de musicalização para o sistema

braille por meio de softwares. A metodologia desses materiais, ou o modo como a música e

a grafia são ensinados, podem ser incompatíveis ou inadequados para o aluno que irá usar o

braille. Como vimos anteriormente na sessão 2.1 desse capítulo, um método especializado

deve considerar a maneira que o aluno com DV compreende e escreve os conceitos

musicais, pois certamente isso irá interferir no planejamento do aprendizado musical.

Nesse sentido, questões relativas ao processo de aprendizagem e compreensão

de conceitos abstratos das pessoas com DV e quais as diferenças na cognição entre as

pessoas com e sem DV serão vistas a seguir. O meio para isso será em torno da teoria

cognitiva e o construtivismo piagetiano.

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2.5 Desenvolvimento cognitivo da pessoa com deficiência visual

Os quatro estágios da teoria cognitiva de Jean Piaget (1987), sensório-motor,

pré-operacional, operatório concreto e operatório formal, foram levantados pelo autor

observando o desenvolvimento de seus filhos, que eram crianças videntes. Tais estágios

podem ser considerados os mesmos que uma criança com DV deve percorrer durante seu

desenvolvimento, o que significa que ambas irão passar e superar os mesmos quatro

estágios cognitivos, exceto quando houver deficiência cognitiva.

A diferença entre a criança com e sem DV está na via sensorial pela qual os

estágios cognitivos serão vivenciados e superados, pois os objetivos a serem alcançados

ainda serão os mesmos. “O desenvolvimento intelectual do cego é semelhante ao dos

videntes, o que difere é o caminho do desenvolvimento. Isso é por causa dos recursos

sensoriais diferentes que dispõem” (COLL et al, 1995, p. 196)

No primeiro estágio piagetiano, o sensório-motor, a criança até aos dois anos

desenvolve o controle motor e aprende sobre os objetos que a cercam. O bebe começa a

perceber como suas ações interferem com os objetos e o sentido da visão tem grande

participação no processo exploratório do mundo. A visão estimula o bebe a alcançar os

objetos que estão dentro do seu alcance, buscando com as mãos, depois engatinhando;

também imitando os gestos que observam de seus familiares e de outras crianças mais

velhas como sentar, andar, correr, bater, chutar, arremessar objetos, etc.

O bebê com DV deverá desenvolver essas mesmas percepções e habilidades

típicas de um bebê nessa fase, mas isso será feito por meio de uma estimulação externa

diferenciada. Esse estágio geralmente leva um tempo maior para ser vivenciado do que leva

uma criança vidente.

Na fase seguinte, a pré-operacional, que vai dos dois aos sete anos, a criança

desenvolve a chamada Inteligência Simbólica. Resumidamente, se entende que ela irá

perceber e se relacionar com o mundo por meio de abstrações, dando vida aos objetos,

sendo egocêntrica, pedindo explicações sobre o mundo, entre outras.

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Dessa forma, assim como a fase anterior, se a criança com DV não receber

estimulação adequada, pode levar mais tempo para vencer essa etapa ou mesmo pode

passar por ela sem superar de forma completa todos os desafios. Nesses casos onde houve

pouca estimulação, pode haver um erro diagnóstico ao atribuir o “atraso” natural da criança

a uma deficiência cognitiva, já que criança não venceu os desafios comuns às crianças

videntes de sua idade.

De forma geral, as crianças com ou sem DV devem entrar em contato com os

desafios cognitivos próprios de cada fase e também serem estimuladas a vencê-los.

Algumas posturas dos familiares de pessoas com DV também podem criar problemas

maiores do que esses buscam evitar. Segundo Louro (2012, p. 39), atitudes familiares de

negação da deficiência e superproteção podem dificultar para que os desenvolvimentos

cognitivos sejam plenamente vivenciados e superados. Quanto mais as pessoas com

deficiência ficam expostas aos desafios da convivência social e lhes é permitido resolverem

sozinhas suas limitações pessoais, melhor será sua forma de se posicionar no mundo e se

socializar.

Por exemplo, uma pessoa com DV pode andar sozinha pelas ruas, tomar ônibus,

fazer compras, com a ajuda de uma bengala e conhecendo previamente o trajeto que deverá

fazer. Isso é uma habilidade chamada de locomoção pelo meio inclusivo. Essa mesma

pessoa pode ler e escrever de forma autônoma em papel com uso do sistema braille e

aparelhos de escrita, tendo acesso a livros, jornais, podendo ter um diário pessoal ou

anotações de estudo. Essa pessoa também pode usar um computador e navegar na internet

como uma pessoa vidente, salvo restrições de modelos de sites que não são acessíveis,

assim como ler partituras musicais e escreve-las. Isso sem falar de pessoas com outras

deficiências. Para tanto a ajuda especializada é essencial, fornecendo os conhecimentos e

treinamentos necessários para fazer essas ações.

Portanto, recebendo capacitação adequada, uma pessoa com DV pode se incluir

na sociedade o suficiente para ter uma vida social e profissional comum a muitas pessoas,

mas desde que essa entre em contato com suas limitações, se empenhando em vencer seus

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próprios desafios.

Dessa forma, se um professor ou familiar impede ou evita constantemente que a

pessoa com DV entre em contato e sinta a sua real limitação, isso pode trazer mais

dificuldades para que ela aprenda e se relacione com o mundo de maneira eficiente e

independente. O desconhecimento das reais condições de aprendizagem da criança com

cegueira e a escassez de métodos especializados são problemas reais que devem ser vistos

com atenção. Consequentemente, a falta de capacitação e apoio aos professores e a

“dificuldade” de aprendizagem de alunos com DV é rapidamente atribuída a um atraso

cognitivo (CASTRO, 1996, p. 45) quando deveria apenas receber um estímulo diferenciado

por meio de métodos especializados e mais tempo de assimilação.

2.5.1 A construção do conhecimento

O construtivismo vê no aprendiz um papel ativo nesse processo, afirmando que

ele próprio é quem constrói o seu conhecimento. O foco do aprendizado sai do conteúdo

para o sujeito que aprende (BRANDOLI & NIEMANN, 2012, p. 5). Dessa forma há uma

atenção especial às facilidades de aprendizado do aluno e também às suas dificuldades,

fazendo com que cada experiência de ensino ganhe características únicas.

Andrade (2010), citando Piaget, afirma que as múltiplas ações que um

indivíduo realiza podem ser apontadas se encontramos a unidade básica comum entre as

várias tarefas que envolvem determinado grupo de ações. Ele busca definir uma unidade

básica, chamando de “esquema ação”. Cada um desse esquema “corresponde ao aspecto

organizativo de uma ação, a estrutura que permite que essa ação possa ser repetida e

aplicada com ligeiras modificações em situações distintas para conseguir objetivos

similares”.

Analogamente podemos pensar que a leitura de partituras, seja em braille ou

não, é um “esquema ação” que é constituída por grupos de ações. Cada ação pode ser

considerada como a habilidade de reconhecer a altura de notas, oitavas, valores de tempo,

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unidades de tempo, notas, vozes simultâneas, acordes, armaduras de clave, cadências

harmônicas, etc. Sendo que essas pequenas ações devem ser assimiladas de modo que

sirvam para o aluno ler partituras nunca antes lidas, mas com características próximas o

suficiente de alguma outra partitura que o aluno já teve contato.

Segundo Piaget (apud ANDRADE, 2010, p. 132) “denominam esquema de

ação aquilo que em uma ação é transportável, generalizável ou diferençável de uma outra

ou, dito de outra maneira, o que é comum às diversas repetições ou aplicações da mesma

ação”.

Assim sendo, a instrução é, conforme Piaget, bem vinda desde que permita ao

indivíduo transcender os limites da informação recebida, avançando para um novo estágio

do conhecimento onde só é possível quando há, por parte do receptor da instrução, uma

atitude de reconstrução, e não apenas de incorporação definitiva e inconteste do que lhe

fora exposto (ANDRADE, 2010). Segundo ZÓFILI (2002, p. 204):

Para professores construtivistas, é uma questão de equilíbrio: asestratégias e técnicas de ensino devem variar dentro de um amploespectro, que vai de uma completa liberdade para permitir a livreexpressão das concepções espontâneas trazidas pelos alunos até umarigorosa disciplina que caracteriza o trabalho intelectual.

Nesse sentido preparar aulas para pessoas com DV não quer dizer seguir um

manual ou mesmo as deixarem aprendendo sozinhas, por simples tentativas de acerto e

erro, mas sim o professor deve estar preparado para ser flexível de acordo com as

dificuldades e interesses de seus alunos sem perder de vista o seu objetivo em determinada

aula. Cada aula deve estar alinhada com o planejamento geral do conteúdo que será

assimilado, mas o seu percurso é livre e às vezes imprevisível. Essa perspectiva geral da

Musicografia Braille é o que pretendo chegar ao final dessa pesquisa quando será

classificado em Etapas diversas os conteúdos musicais pelos quais o aluno com DV deve

passar.

Segundo Hatano (apud FINO, 2004, p. 4), que aponta “características da

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aquisição de conhecimento que corroboram e complementam a conciliação entre o

construtivismo [de Piaget] e a teoria histórico-cultural [de Vigostky]”. Apenas os pontos

mais significativos para esse trabalho constam abaixo, seguidos por comentários meus

buscando os direcionar para o ensino especializado da Musicografia Braille.

a) “O conhecimento é adquirido através de construção e não apenas por

transmissão”, havendo habilidades que só podem ser construídas de maneira empírica;

b) “Qualquer aquisição de conhecimento envolve reestruturação, de modo que

uma nova aquisição não resulta apenas em aumento do conhecimento, mas implica na

reorganização do conhecimento anterior”. Assim quanto mais profunda é mudança na

forma como se compreende o mundo, mais ampla e profunda é a assimilação do novo;

c) “O processo de aquisição de conhecimento é condicionado, internamente,

pelo conhecimento já acumulado e, externamente, por artefactos culturais partilhados

(como a linguagem)”. Podemos pensar que a musicalidade do indivíduo é a condição

interna, tão importante quanto a compreensão teórica da música, que se torna a linguagem

comum entre os músicos;

d) um ou mais conhecimentos específicos podem ser usados para resolver

problemas nunca antes vistos, ao ser feito analogias ou abstrações. Musicalmente,

compreender trechos musicais novos está relacionado com o repertório musical prévio do

indivíduo, favorecendo aquele com maior número de informações conhecidas ou com as

informações mais semelhantes com a música a ser compreendida;

e) a aquisição de conhecimento não consiste apenas de “regras, leis, ou

fórmulas abstractas, sendo também composto de experiência pessoal” refletindo o modo

como foi adquirido e a maneira como tem sido utilizado. Quando o aprendiz se torna

especialista, o conhecimento se torna mais amplo passando “a ser menos dependente de

laços contextuais e menos ligado às características superficiais”.

De modo geral, todas essas características na construção de conhecimento são

comuns a todas as pessoas. O que varia entre uma pessoa com ou sem DV são apenas as

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vias sensoriais através das quais o conhecimento, ou as ações, são incorporados para

construir o “esquema ação” do indivíduo.

Portanto, a falta do sentido da visão faz com que os demais sentidos sejam

melhorados? Segundo (COLL et al, 1995, p. 191) o tato passa a ser o sentido principal para

assimilar as informações do ambiente, como texturas, temperaturas, tamanhos, formas, etc.

Em segundo lugar a comunicação verbal se revela fundamental para a compreensão e

relação com o mundo e a sociedade. O autor finaliza sobre o assunto dizendo:

A linguagem (sem dúvida muito relacionada ao pensamento abstrato,mesmo na teoria piagetiana) cumpre um importante papel nodesenvolvimento cognitivo das pessoas cegas. Possuir essa forma depensamento, fato que permite pensar em termo de hipótese, transforma-seem uma poderosa ferramenta, capaz de remediar os problemasapresentados no acesso à representação figurativa, na ausência da visão.Assim, as pessoas cegas são capazes de resolver as tarefas clássicas destetipo de pensamento, mas podem até mesmo vir a compreender, mediantehipótese, problemas para os quais não têm acesso perceptivo direto.

Vale ressaltar que a pessoa com DV adquire conhecimento a partir da interação

com outro indivíduo que por sua vez lhe apresenta o significado das palavras, sons, objetos,

etc, o assimilando por meio da linguagem e/ou da atribuição do tato. No caso da grafia em

braille, as informações táteis significam letras ou idéias musicais que uma outra pessoa lhes

ensinou, de forma que ao final do aprendizado o aprendiz compartilhará o mesmo sistema

de signos de outras pessoas, permitindo mais formas de comunicação e entendimento.

2.6 A Audição

Normalmente se acredita que as pessoas com DV possuem uma audição

superior a das pessoas videntes, possuindo uma forte inclinação para a música. Veremos a

seguir alguns estudos sobre a audição de pessoas com e sem DV de forma que possamos

tirar conclusões sobre o que de fato acontece com a sua capacidade de escuta em

comparação à de pessoas videntes e se há relação com fatores ligados à música.

Há diversos estudos sobre a audição de pessoas com diferentes tipos de

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cegueira. Bezerra (2011) fez amplo levantamento bibliográfico na pesquisa intitulada

“Avaliação da Percepção de Alturas em Adultos Cegos” e afirma que “os resultados de

pesquisas a respeito da ativação do córtex visual em pessoas cegas congênitas e de cegueira

adquirida são confusos e controversos” ao testarem as habilidades auditivas e táteis.

Segundo o autor, tal posicionamento é baseado nos estudos de Kujala et al (2000), Amedi et

al (2005), Théoret, Merabet & Pascual-Leone (2004), Melzer et al (2001).

Bezerra (2011) aponta que a prática musical, sendo definida como treinamento

auditivo, é uma atividade que melhora a percepção de sinais acústicos complexos, ou seja,

melhora a capacidade do indivíduo em obter informações através do sentido da audição

(SONCINI & COSTA, 2006).

Outro estudo levantado é de Oxenham et all (2003), que afirma que a simples

prática musical promove o desenvolvimento da percepção melódica e harmônica, a partir

do treinamento de intervalos e ritmos.

Assim, Bezerra (2011, p. 80) afirma que o domínio de habilidades musicais

poderia facilitar a execução de tarefas auditivas complexas no quotidiano das pessoas com

DV. Em outras palavras, quando a pessoa com DV possui habilidade musical desenvolvida,

ela possui maior capacidade de extrair informações dos detalhes de sons e vozes. A mesma

informação está sempre disponível para todos os ouvidos, no entanto, para os ouvidos

treinados e atentos, variações no timbre, reverberação, eco, harmônicos, são percebidas e se

tornam informações significativas sobre o mundo exterior.

Desse modo, a pessoa com DV, pode possuir um melhor aproveitamento do

sentido da audição porque ela precisou usar mais esse sentido do que uma pessoa vidente

precisou para superar os desafios cognitivos do desenvolvimento “piagetiano”, desafios

comuns a todas as pessoas.

Por isso, julga-se que os indivíduos cegos desenvolvem habilidades superiores

no uso de seus sentidos remanescentes, a fim de compensar a perda da visão (AMEDI et

all., 2005). No entanto, alguns estudos têm encontrado resultados que limitam o número de

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vantagens auditivas do cego frente aos videntes, conforme Fisher (1964), Starlinger, &

Niemeyer (1981), Weaver & Stevens (2006), Yates, Johnson, & Starz (1972) 17.

Nesse sentido, podemos compreender que a aptidão natural para a música das

pessoas com DV é um mito. “A observação de que muitos cegos atingem níveis muito

elevados no aspecto da proficiência musical levou à impressão popular de que a cegueira

pode ser associada com habilidades perceptuais auditivas especiais” (HAMILTON,

PASCUAL-LEONE, & SCHLAUG, 2004). O aluno com DV precisará vencer todos os

desafios cognitivos musicais comuns a todos os músicos, com ou sem metodologia

especializada, culminando em uma habilidade de excelência construída por vias sensoriais e

de entendimento diferentes das pessoas videntes.

Voltando a Bezzera (2010), sua pesquisa sugere que a cegueira congênita (de

nascença) não causa alteração da discriminação de notas musicais em adultos cegos,

comparados com adulto videntes. A autora indica estudos que comprovam a ocorrência de

plasticidade neural em pessoas com DV, quando comparados com o funcionamento cerebral

de pessoas videntes, mas isso não significou alterações diretas de habilidades musicais.

Portanto, afirmações como de Vygostky em “The Fundamental Problemas of

Defectology”, de 1929, que influenciou muito a educação inclusiva no séc. XX, ganham

outra perspectiva. Ele afirma que quando há “falta de um órgão, o próprio corpo encarrega-

se de substituí-lo, desenvolvendo outro mais consolidadamente. No caso dos olhos, as

pessoas cegas acabam por ter a audição e o tato mais desenvolvidos” (apud Santos, 2010).

Sob a ótica das recentes pesquisa acima citadas, a forma como entendemos “ter a audição

mais desenvolvida” ganha outra dimensão, que não necessariamente relacionam-se com

aptidão musical nata ou uma audição melhorada.

“Todas as teorias contemporâneas sobre o desenvolvimento psicológicoressaltam que é através da ação sobre o ambiente e da comunicação socialque esse [estudante com DV] alcança o domínio das habilidades mentaisque possibilitam o conhecimento da realidade. Não é, pois, de se estranharque o desenvolvimento dessas habilidades tenha que se ajustar às

17Esses autores são citados por Bezerra (2011, p. 81).

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possibilidades de representação e ação que os canais sensoriais permitem.Isso faz com que o desenvolvimento cognitivo do cego siga um caminhoque não tem porque ser coincidente com o dos videntes” (COLL et al,1995, p. 184).

Uma pessoa com DV pode conhecer uma realidade, um objeto ou uma

abstração (como uma partitura) com o mesmo domínio que uma pessoa vidente. Mas para

isso ela precisa ter uma postura ativa e trocar informações sobre as impressões de outras

pessoas, videntes ou não, por meio da comunicação. Quanto maior for a diversidade de

dados sobre um conhecimento, melhor será o seu domínio e a capacidade de lidar com as

suas variáveis.

Conclui-se que a forma como uma pessoa com DV compreende o que é uma

coisa, como uma cadeira, um carro, uma nuvem, uma emoção, etc., possui bases cognitivas

diferentes das de uma pessoa vidente. No entanto, considerando que a construção do

conhecimento a respeito desse objeto tenha sido bem fundamentada, essa pessoa será capaz

de se relacionar com esse objeto de forma natural e simples como qualquer outra pessoa

que também tenha tido um processo bem fundamentado.

“A gente naturalmente, por não enxergar, acaba sendo mais atento ao som.Não é nada assim de... tem gente que pensa assim: o cego tem o domnatural pra música. Não tem nada disso. É na verdade natural que a gente,não enxergando, a gente precisa do som, né. Então a gente está sempremais atenta aos sons do ambiente. E isso facilita a nossa concentração,assim, pra estudar música” (OLIVEIRA, 2013, p. 53).

Esse trecho faz parte de uma entrevista feita por Oliveira (2013) em seu

trabalho a respeito da importância da música na vida das pessoas com DV e das

problemáticas enfrentadas quanto ao acesso à aprendizagem musical, seja atuando tratando

a música como atividade lazer ou profissionalmente.

Oliveira (op. cit., p. 62) conclui que o amparo da família e/ou rede social são

fundamentais para que a pessoa com DV tenha uma identidade sonora bem estruturada,

além de um ambiente rico culturalmente. O ensino formal de música desde criança, irá lhe

proporcionar maior desenvolvimento global e musical, trazendo “um leque de

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oportunidades e campo de atuação profissional mais amplo: instrumentista, compositor,

pesquisador, professor de música”. Além disso, fatores socioeconômicos e a constelação

familiar do indivíduo também influenciam no seu desenvolvimento, pois atuam diretamente

sobre o tipo e qualidade de ajuda que recebem, já que pela via pública essa ajuda é ainda é

muito precária educacionalmente.

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CAPÍTULO 3 - DESAFIOS NO ACESSO DE PESSOAS COM

DEFICIECIA VISUAL AO CONHECIMENTO MUSICAL

A seguir serão apresentados estudos que corroboram que a falta de

conhecimento especializado no campo do ensino da Musicografia Braille afeta diretamente

a inclusão, resultando em condições desiguais no acesso ao conhecimento entre pessoas

com e sem DV.

Neste capítulo observaremos as oportunidades de estudos musicais disponíveis

para as pessoas com DV que se interessam em entrar em cursos de graduação em música,

assim como relatos de experiência com relação a essa questão. Veremos algumas iniciativas

de aulas de música inclusivas em universidades, pessoas com DV que cursaram a

universidade, a transcrição de uma prova de aptidão musical para o braille e a preparação

dos alunos para essa prova.

Assim poderemos ter uma visão geral das condições atuais que uma pessoa com

DV tem para estudar teoria musical e se preparar para fazer uma prova de vestibular para

música.

3.1 A inclusão da pessoa com deficiência visual em cursos de música

Para entrar em um curso de graduação em musica é necessário passar por uma

prova de aptidão musical, além da prova de vestibular comum para todos os cursos. O

objetivo dessa prova musical, segundo as normas do vestibular da UNICAMP para 2015, é

“avaliar a aptidão e o potencial dos candidatos para o curso superior em que pretendem

ingressar”18.

18 Conforme Artigo 1º, III, em Normas do Vestibular - Vestibular 2015. Acessado dia 20/07/2014:https://www.comvest.unicamp.br/vest2015/manual/normas.html

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Tal aptidão e conhecimentos teóricos musicais podem ser incorporados por

alunos videntes frequentando escolas de música ou fazendo aulas particulares, pois são

relativamente simples para um professor de música ensinar. De acordo com a dedicação nos

estudos e a vivência musical do aluno é possível ter um bom resultado em uma prova de

aptidão em música. Ou seja, o acesso do aluno vidente a esse conhecimento de forma

didática é facilitado por professores e métodos musicais.

Conforme já foi citado no capítulo anterior, tais métodos não foram formulados

para atender leitores de partituras em braille. Além disso, os professores de música

normalmente não conhecem a Musicografia Braille o suficiente para ensiná-la.

Segundo Bonilha (2010, p. 36), “uma vez que os educadores musicais

desconhecem os mecanismos da leitura braille, eles não são aptos para desenvolverem as

habilidades necessárias para a aquisição de fluência no uso da musicografia”. Essas

habilidades são diferentes das habilidades dos leitores de partituras em tinta, simplesmente

porque são duas grafias distintas. Na partitura em tinta o evento musical é escrito em duas

dimensões, horizontal e vertical, se assemelhando a um gráfico de linha. Na partitura em

braille o evento musical é descrito de forma linear, como se fosse uma narrativa onde há

regras para posicionar cada informação.

Portanto, os educadores musicais não podem desenvolver as habilidades

musicais necessárias em seus alunos com DV se eles não conhecem quais habilidades são

necessárias. Podemos até considerar que o músico vidente não possui as habilidades

necessárias que o músico cego precisa desenvolver pelo simples fato de serem versados em

outra grafia.

A maioria deles [educadores musicais] possui formação para lecionar aosalunos que aprendem a ler em tinta, e por isso a metodologia de trabalhopor eles adotada se baseia nas especificidades desse código. Os livrosdidático-musicais são também estruturados de acordo com ascaracterísticas peculiares da escrita musical utilizada por quem vê(BONILHA, 2010, p. 17).

Por isso se torna comum a recusa de alunos com DV pelas escolas e quando os

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aceitam, os professores tendem a confeccionar partituras convencionais em alto-relevo.

Embora haja relatos de professores que se empenharam nessa inclusão, como de Silva &

Araldi (2009), Ota & Vanazzi de Souza (2011), a escassez de estudos ainda é uma barreira

que dificulta que esse campo se desenvolva e se consolide.

Essa falta de estudos pode ser considerada natural porque esse campo, o ensino

da Musicografia Braille, é recente. O material que temos a disposição é fruto da experiência

pessoal de um ou mais professores, e que geralmente não tiveram nenhuma referência

anterior. Contudo a escrita braille já é adotada mundialmente e até hoje tem se mostrado a

melhor forma de proporcionar independência musical para as pessoas cegas, não sendo

vantajosa a criação de outras formas de escrita especial.

Nesse cenário, a pessoa com DV que pretende fazer essa mesma prova de

vestibular se depara com dificuldades relacionadas à falta de métodos especializados e

professores capacitados nesse ensino especial.

3.1.1 Direitos e realidade na inclusão

De forma geral, observando o histórico de alunos em diversos cursos de

universidades, encontramos um “crescente número de alunos deficientes no ensino

superior” (CAIADO, 2003, p. 30). Atualmente temos casos de pessoas cegas que cursaram

ou ainda cursam a graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado em música nas

universidades públicas brasileiras. Mesmo com a falta de professores especializados neste

campo, esses músicos conseguiram superar problemas de inclusão de forma particulares a

cada um. A maioria conseguiu com ajuda inestimável de parentes, amigos e alguns

professores, em outras palavras, com ajuda não especializada, mas que por fim

conseguiram obter os conhecimentos necessários e receber titulações acadêmicas. Como

exemplos dessa inclusão em universidades, citaremos alguns casos.

A Universidade Federal do Rio Grande do Norte previa para o primeiro

semestre de 2009 a “criação da primeira turma de Musicografia Braille na Escola de

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Música” dessa universidade (OLIVEIRA, 2008, p.4) após o ingresso de um aluno com DV

Em 2010. A Universidade Estadual de Campinas aprovou o doutorado da pesquisadora,

pessoa com cegueira congênita, Fabiana Bonilha. Ela também cursou nessa mesma

universidade a graduação em piano erudito e o mestrado.

Em 2011 o Phd. em Ethnomusicology pela University of Washington-USA,

Prof. Dr. Vilson Zattera, ingressou no pós-doutorado na Unicamp na área de acessibilidade

computacional para pessoas com DV e Musicografia Braille. Desde então desenvolve um

trabalho sobre educação para pessoas com DV e iniciou um grupo de pesquisa em

Musicografia Braille, do qual eu venho participando.

Na Universidade Estadual de Maringá, em 2010, pude desenvolver aulas

preparatórias para pessoas com DV prestarem a prova de aptidão de música em braille. O

aprendizado foi satisfatório dentro da relação conteúdo e tempo disponível, mas não foi o

suficiente para a aprovação dos alunos. Constatei que seria necessário mais frequência e

mais tempo de aula, além de metodologia mais alinhada com as particularidades da

Musicografia Braille. Essa última necessidade vem de encontro com os objetivos da

presente pesquisa.

No âmbito das leis, sendo as pessoas com DV cidadãos e com direitos de

educação, o poder público tem o dever de atender à demanda existente de alunos cegos e de

se preparar de acordo com a crescente demanda19 (COLOMBO, 2004, p. 44). Mas esse não

é o ambiente que encontramos no ensino público, pois é comum casos de escolas que

rejeitam a matrícula de alunos com alguma deficiência e os encaminham para outra

instituição. Questões de escassez de verbas, poucos especialistas atualizados e disponíveis e

o desconhecimento das necessidades reais dessa parcela da população contribuem para que

esse direito não seja garantido.

A emenda número 12 de 1978 da Constituição Brasileira cita pela primeira vez

a educação especial, onde diz que: “é assegurado aos deficientes a melhoria de sua

19 “A Lei de Diretrizes e Bases (LDB) obriga o poder público a ampliar o atendimento aos alunos comnecessidades especiais na rede pública regular de ensino” (art. 60, parágrafo único).

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condição social e econômica, especialmente mediante educação especial e gratuita”

(CAIADO, 2003, p. 99).

Certamente a educação especial, e principalmente gratuita, são realidade

distantes no Brasil, não havendo nenhuma seguridade dessa implementação. Ao menos as

conquistas por leis tem sido ampliadas e chamado a atenção de sua importância e urgência.

Segundo CAIADO (2003, p. 31) “na legislação atual, a pessoa deficiente ganhou o status

de cidadã. Hoje, olha-se para ela como alguém com direitos e capacidades”. O que ainda

está em grande defasagem é a sociedade atingir o patamar da efetivação desses direitos.

Ao mesmo tempo, as pessoas com DV precisam de muita dedicação,

perseverança e ajuda para conseguir entrar em se formar nas universidades brasileiras de

música. Mesmo com tantos empecilhos, algumas experiências nos contam que essa ação é

possível, no entanto, poderia ser em condições mais iguais à de pessoas videntes.

3.2 Inserindo a Musicografia Braille na formação de professores de música

As universidades são polos que formam profissionais de diversas áreas, entre os

quais estão os músicos com habilitação em licenciatura. Nesses cursos, o conteúdo relativo

à inclusão geralmente é superficial ou não é abordado, proporcionando pouco ou nenhum

contato e informações sobre o tema para seus alunos (cf. BRUNO, 2007 e SILVA, 2009).

Geralmente, os professores universitários desconhecem até mesmo a existência da

Musicografia Braille. Se a grafia em braille e questões relativas ao ensino musical inclusivo

fossem contempladas na grade curricular desses futuros professores de música, eles seriam

capazes de dar aulas para pessoas com DV com certa autonomia, mesmo sem terem à

disposição um material didático especializado e sem precisarem se tornar especialistas.

Além disso, essa ação iria incentivar a pesquisa nesse campo dentro da própria

universidade, beneficiando diretamente a inclusão em aulas de música.

Essa questão é mais ampla se considerarmos a arte não apenas como uma

terapia ocupacional para as pessoas com DV, mas sim como uma habilidade possível de ser

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desenvolvida a nível profissional.

As pesquisas acadêmicas nesse campo podem contribuir para gerar:

a) materiais didático-musicais especializados;

b) estudos teóricos aprofundados;

c) capacitação de professores;

d) observações críticas de experiências de ensino;

e) transcrição de partituras em braille;

f) promoção de ações inclusivas na sociedade.

Com os resultados de algumas dessas ações poderíamos até mesmo imaginar

que o campo do ensino musical convencional poderia se beneficiar ao incluir ou enfatizar

algumas habilidades musicais próprias de músicos com DV. Algumas dessas habilidades

serão delineadas ao final dessa pesquisa.

Com essas ações seria favorecida uma parcela de cidadãos que também têm

direito a acessar os bens culturais e intelectuais desenvolvidos nas universidades e que não

é a nossa realidade, conforme foi apresentado anteriormente. Quanto à formação de

professores, Caiado (2003, p.30) aponta “a necessidade da formação de pessoal

especializado em educação especial, em níveis de graduação e pós-graduação. Tarefa

especialmente indicada às universidades públicas”.

Mesmo as universidades não estando preparadas para a inclusão de alunos com

DV em um curso de música ou aulas de extensão, há certa mobilização para recebê-los. No

entanto, essa mobilização só acontece a partir do momento em que é recebido entre seus

alunos um aluno especial, e não antes disso. Um caso que exemplifica essa situação é

encontrado em Simão et all (2009), onde um grupo de estudos da Universidade Estadual de

Maringá ofereceu aulas para pessoas com DV desenvolvendo vivenciais musicais para

trabalhar a percepção, notação musical, leitura e escrita de partituras convencionas

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ampliadas e da Musicografia Braille. A ação perdurou até 2011, sofrendo alterações

positivas a cada ano, findando por falta de pessoas interessadas nesse campo (cf . OTA e

VANAZZI DE SOUZA, 2012). Devido às características da educação especial, “é

necessário que haja oferta permanente de serviços de apoio especializado na escola regular

para que esse alunado possa se incluir na escola” (CAIADO, 2003, p. 23).

O ideal seria a universidade pública estar preparada para receber um aluno com

qualquer tipo de deficiência. No caso da música, na minha opinião, para incluir

satisfatoriamente um aluno cego entre seus alunos em um curso de música a universidade

deveria oferecer disciplinas exclusivas para esse aluno, elaboradas de acordo com a

Musicografia Braille e ministradas por especialistas. Tais disciplinas extras, naturalmente,

teriam um conteúdo dispensável para os alunos videntes.

3.2.1 Formação musical dos alunos de música

A respeito da situação hipotética apresentada acima, podemos pensar que: se o

aluno vidente teve que estudar para entrar nesses cursos, porque com o aluno com DV seria

diferente? Ele irá estudar como se lê partituras em braille durante o curso? Responderemos

a essa pergunta a seguir.

A diferença principal está no acesso a informação que os alunos com ou sem

DV têm, devido a falta de conhecimento do braille por parte de professores de música.

Assim sendo, a habilidade de se ler partituras não pode ser exigida da mesma forma que se

faz com aluno videntes. A prova de aptidão deveria selecionar os alunos com DV que

demostraram ter potencial musical para apreender os princípios avançados da música em

braille.

Isso não quer dizer que deveríamos pensar em uma prova totalmente

diferenciada para os alunos com DV. Embora pareça inviável, idealmente para se escrever

essa prova deveria ser verificado as oportunidades oferecidas de se aprender a Musicografia

Braille na sua cidade ou região e o que se pretende que o aluno assimile ao final do curso.

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Contudo, muitas outras questões podem ser feitas, mas nenhuma será bem

respondida e compreendida pelo leitor se não verificarmos mais a fundo sobre o que

estamos falando: as partituras em braille. Essa tarefa será realizada nos capítulos que

seguem, ao analisar e comparar as suas características com a das partituras em tinta.

Ainda no nível da inclusão em sala de aula, essas adaptações de currículo são

coerentes porque a educação musical tradicional é alicerçada em cognições relacionadas às

partituras convencionais, ou seja, em princípios visuais. “Os educadores musicais tentam

aplicar aos alunos cegos as mesmas estratégias de trabalho utilizados com alunos dotados

de visão e, ao fazerem isso, constatam que algumas dessas práticas se mostram

ineficientes” (BONILHA, 2010, p. 17). Assim sendo, os desafios enfrentados pelos

aprendizes da notação musical em braille seriam contemplados em um curso de música.

Deve-se ressaltar que o ensino de música para deficientes visuais só sedifere do ensino para demais pessoas, no que diz respeito ao método deleitura e escrita utilizado. Desse modo, para que o aluno com deficiênciatenha acesso aos mesmos conhecimentos musicais disponíveis aos outrosalunos, faz-se necessário que eles contem com um atendimentoeducacional especializado (BONILHA, 2006, p. 20).

Portanto, é necessária a criação de métodos de ensino musical que abordem os

conceitos musicais da Musicografia Braille, tornando possível um curso formar um músico

com DV com a mesma qualidade e autonomia que forma um músico com visão normal.

3.2.2 Incluindo o aluno com DV em um curso para pessoas videntes

Quando não for possível a inclusão imediata do aluno com DV na mesma sala

de uma universidade junto com alunos videntes devido ao conteúdo de determinada

disciplina, se faz necessário atendimento especializado para preparar o aluno com DV ao

contexto da aula ou fornecer um acompanhamento paralelo as aulas.

Muitas das disciplinas de um curso de graduação em música podem ser

acompanhadas por alunos com DV se o material usado pelo professor for disponibilizado

com antecedência para impressão em braille, seja ele um texto ou uma partitura. Sendo uma

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partitura, o seu estudo prévio deve ser feito em casa, e não no momento da aula.

Geralmente as pessoas com DV que estudam música escrevem seus exercícios

em braille e depois narram o que está escrito para o professor poder corrigi-los. Algumas

vezes um colega vidente escreve na partitura convencional o que esse aluno diz o que

escreveu em braille, o que permite o professor corrigir o exercício pela escrita

convencional.

Seria conveniente que o professor conhecesse a leitura em braille para entender

diretamente o que o aluno escreveu na sua grafia de pontos e corrigir seus exercícios, assim

como faz com os alunos videntes. Além de poder ajudá-lo a aprimorar sua escrita musical o

professor poderia, ao dialogar entre as duas grafias, enriqueceria o processo de

aprendizagem do aluno. Sendo casos como esse muito raros, uma alternativa satisfatória

seria a presença de um transcritor para acompanhar esse aluno, intermediando aluno e

professor. COLOMBO (2004, p. 44) afirma que “quando necessário, as escolas deverão

contar com serviços de apoio especializados, para atender os alunos da educação especial”.

Contar com o serviço de estudantes bolsistas pode ser uma boa alternativa para

suprir essa demanda no atendimento inclusivo, seja na transcrição de partituras ou

acompanhamento do aluno com DV em disciplinas específicas.

Existe o software Musibraille, criado pela UFRJ, que permite ao músico

escrever uma linha melódica com as celas braille no computador. Simultaneamente o

programa apresenta usando a escrita de partituras convencionais o que está sendo escrito

em braille. Certamente isso facilitaria muito o trabalho de um professor em aula ao ter

disponível um computador portátil.

No entanto, algumas formas avançadas de escritas em braille, como intervalos,

vozes paralelas e pauta simultâneas ainda não são compreendidos pelo programa20 quando

mostra seu correspondente na escrita convencional ou quando executa o áudio do trecho. A

versão atual desse programa se mostra muito útil para o uso de alunos iniciantes,

escrevendo apenas uma voz. Contudo tal programa ainda está sendo aperfeiçoado nos

pontos citados acima e também na interface “MusicXml”, que é um formato de arquivo

20 Sinais braille para intervalos (erro apenas na escrita convencional e na execução MIDI), em acorde total eparcial, nota móvel, pautas simultâneas escritas em linhas diferentes, são exemplos a que me refiro.

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comum entre todos os softwares de edição de partituras convencionais.

Independentemente do software usado, problemas na impressão dos arquivos

em braille são muito comuns quando se imprime partituras. Alguma celas braille podem

aparecer trocadas ou em branco, sendo muito trabalhoso resolver questões de informáticas

para o não especialista. Por essas questões, as vezes se torna preferível escrever a partitura

em programas de texto, conferindo depois se tudo foi impresso corretamente, já que

geralmente há menos erros na escrita das letras. Alguns professores, quando há pouco a ser

escrito ou para maior agilidade, preferem escrever diretamente no papel usando uma

máquina Perkins.

3.3 A transcrição de uma prova de aptidão musical para o sistema braille

Como algumas universidades tem lidado com a questão da inclusão quando um

aluno com DV busca entrar em seus cursos música? Quais as questões e problemas que

emergem nessas situações?

Em 2009, tive a oportunidade de transcrever pela primeira vez a prova do

vestibular de música para o braille da UEM (Universidade Estadual de Maringá).

A UEM teve entre seus inscritos de 2009 um aluno com DV para a prova de

aptidão musical. Nenhum dos professores esperavam essa inscrição, surpreendendo a todos.

A primeira alternativa pensada pela comissão de vestibular e pelos professores do curso de

música foi fazer a prova de forma oral. Uma pessoa vidente iria ler a prova e escrever as

respostas do aluno na prova em tinta.

Foi levantado se isso realmente seria uma prova justa e se não haveria outras

formas de se realizar essa avaliação. A Musicografia Braille foi indicada por uma

professora, que resolveu entrar em contato com um especialista dessa área. Tirada algumas

dúvidas e confirmado que o aluno inscrito conhecia a Musicografia Braille, optaram pela

transcrição integral da prova, que seria aplicada pelo próprio transcritor da prova para a

escrita braille.

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A transcrição automática de partituras em tinta para o braille de forma

computadorizada atualmente é bastante complexa de ser realizada de modo integral e fiel,

como já foi dito anteriormente. Há decisões que precisam ser tomadas no que tange à

formatação e à forma de abordagem dos conteúdos, algo que apenas um especialista

poderia executar. Por exemplo, questões que envolvem a leitura de pentagramas na prova

original, precisam ser repensadas para a transcrição pois não há pentagramas em braille.

Essas e outras particularidades poderão ser melhores observadas nos próximos capítulos.

Portanto, uma questão da prova que envolva o conhecimento de diferentes

claves é prejudicada, podendo ter um nível de dificuldade inferior ao cobrado na prova em

tinta. Por esse motivo, nos anos seguintes, os elaboradores da prova de música retiraram

esse tipo de questão ao saberem com antecedência que a prova seria novamente transcrita

para o braille. Essa adaptação não prejudicou em nada a qualidade da prova, mas a tornou

um pouco mais inclusiva.

Em contrapartida, outros exercícios que são simples de se realizar em tinta

quando são transcritos para o braille se tornam mais complexos. Alguns deles até poderiam

ser considerados avançados devido à maneira como são apresentados ou pela resposta que

se espera do aluno. De um modo geral, todas as questões que fazem uso de duas pautas

simultâneas, vozes paralelas e sinais de dinâmica, se tornam avançadas em braille.

Uma questão que utiliza acordes abertos escritos em duas pautas (sistema de

piano) para serem classificados, se torna muito mais complexa do que quando escrito em

tinta. Isso porque “as partes [pautas diferentes] são lidas em diferentes momentos, cabendo

ao músico realizar, mentalmente, a junção entre elas” (BONILHA, 2010, p. 48). Se exige

do leitor noções teóricas complexas que veremos no capítulo 5.

No entanto, as questões que utilizam as pautas simultâneas não foram alteradas

pelos elaboradores da prova, como foi no caso das claves, pois desconheciam essa

particularidade da escrita em braille. Caso fizessem, seria necessário uma alteração

cuidadosa de todo o conteúdo da prova, demandando um tempo maior para a elaboração da

prova. Isso fez com que o entendimento de determinadas questões em braille tivessem um

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grau de dificuldade maior do que sua original na escrita musical convencional.

Houve casos em que o enunciado sofreu alterações em benefício do

entendimento e coerência com a grafia braille. Todas as alterações foram feitas com o

consentimento dos elaboradores da prova que foram constantemente consultados durante a

transcrição.

A título de informação, na prova de instrumento o aluno obteve nota máxima,

pois o candidato tem sua musicalidade muito bem desenvolvida por causa da vida prática

com a música. Contudo, a nota da prova teórica não foi suficiente para sua aprovação pois

os seus conhecimentos em Musicografia Braille eram muito rudimentares.

3.3.1 A prova escrita em braille

Por fim, as questões da prova em braille foram apresentadas em um caderno

onde cada questão ocupava sozinha uma página, buscando assim facilitar o manuseio da

prova pelo aluno. A prova foi escrita diretamente no software Braille Fácil21 e impresso por

impressoras braille22. As respostas eram escritas pelo aluno em uma segunda folha,

utilizando uma máquina Perkins, sendo também uma folha individual para cada questão.

Para a prova de leitura à primeira vista foram preparadas quatro frases para o

solfejo em braille, sendo que o aluno sorteou apenas uma delas para ser lida e solfejada.

Nesse momento ficou claro que a habilidade de solfejar em braille exige mais

conhecimento musical do aluno do que quando solfejo em tinta. “Ler uma partitura em

braille não significa apenas decodificar um conjunto de símbolos e executar a peça lida ao

instrumento, mas pressupõe compreendê-la em profundidade, sob o ponto de vista estético

e musical” (BONILHA, 2010, p. 14). A rapidez e qualidade da leitura musical varia de

acordo com a profundidade dos conhecimentos musicais e a maturidade do aluno como

21 Software gratuito lançado pelo Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Riode Janeiro.

22 Impressora que imprime em relevo no papel as celas braille.

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músico prático e teórico. Tal cobrança em uma prova, envolvendo dificuldades avançadas

de leitura, parecia desproporcional com relação aos seus concorrentes videntes. Os

examinadores sentiram a dificuldade do aluno mesmo com o tempo extra para ler e decorar

seu solfejo, direito assegurado por lei.

Para solfejar o aluno com DV precisa ter dominado: a escrita em paralelo à

leitura; a ordem dos sinais musicais em braille; o reconhecimento de padrões rítmicos e a

conciliação do código com a teoria musical. Esses são quatro dos sete desafios enfrentados

no aprendizado da Musicografia Braille, apontados por Bonilha (2010, p. 45), que serão os

fundamentos teóricos dos próximos capítulos. Tal desembaraço musical não é exigido da

mesma forma que para os candidatos videntes. Uma forma justa de aplicar essa prova seria

avaliar separadamente a capacidade do aluno em lidar com cada um dos desafios do

aprendizado em braille.

Deveria haver um controle sobre o que estaria sendo cobrado do leitor em

braille ao utilizar cada formato de partitura ou regra de escrita. Vale afirmar que o ato de

uma pessoa com deficiência visual ler e escrever uma partitura em braille significa que

provavelmente ela seja um músico maduro, que teve acesso à uma formação sólida e

consistente (BONILHA, 2010, p. 16).

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CAPÍTULO 4 - ANÁLISES DE PARTITURAS EM BRAILLE

A partir dos diferentes desafios de aprendizagem que os alunos com DV

encontram para assimilar a Musicografia Braille, apontados por Bonilha (2010, p. 45 et

seq.), classificarei as partituras em braille em cinco Graus de Dificuldade. Cada um desses

Graus, exceto o quinto, serão analisados conforme a Teoria Sistêmica usada por Sloboda

(2008) para observar os procedimento mentais de um músico. O quinto Grau será

observado por meio de comparações com as partituras convencionais.

Dessa forma procuramos saber quais os conhecimentos que determinada

partitura musical escrita em braille exige que o leitor tenha para poder compreende-la. Isso

deve permitir que o professor de música avalie o quanto seu aluno superou cada desafio da

aprendizagem musical em braille, lhe permitindo remodelar seu planejamento de aula de

acordo com o desenvolvimento do aluno.

4.1 Os desafios de aprendizagem

Daldegan (2005, p. 140) traça um interessante paralelo entre a aprendizagem

musical e a teoria cognitiva desenvolvida por Piaget, segundo a qual:

[...] a criança primeiro aprende conceitos e depois adquire palavras paranomear tais conceitos. As ideias mais simples são então expressas antesdas mais complexas mesmo que sejam gramaticalmente maiscomplicadas.

Analogamente, a estruturação da metodologia em sala de aula pode ser

orientada para assimilar conceitos musicais mais simples seguidos dos mais complexos,

independentemente se sua grafia em braille é mais ou menos complexa, já que o “nomear”,

ou grafar, seria uma tarefa posterior à compreensão de seu respectivo conceito musical. Por

esse motivo apresentaremos os Conteúdos Complementares no capítulo 5, que devem ser

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lecionados de acordo com os objetivos musicais do aluno e da pretensão do curso ou

professor na formação do seu aluno desde as primeiras aulas.

Neste ponto, é importante afirmar que “todas as informações de uma partitura

em tinta são perfeitamente transcritas em Braille, contudo, o que é vertical dentro de um

mesmo pentagrama em tinta, é inteiramente representado de forma horizontal quando em

Braille” (VANAZZI DE SOUZA, 2010a). Na escrita Braille, todas as informações

aparecem em uma ordem definida, como se fosse um ditado minucioso e organizado do

trecho musical.

Tendo em vista essa particularidade, encontramos no trabalho de Sloboda

(2008) algumas possibilidades para análises das partituras em Braille. O autor afirma que a

aprendizagem musical pode ser analisada em etapas, nas quais se adquire, de forma

sequencial, novas habilidades e estruturas cognitivas.

Bonilha (2010, p. 52 et seq.) apresenta um delineamento do aprendizado da

Musicografia Braille em sete tópicos, baseados nos principais desafios desse aprendizado

especializado, que são:

a) “Apreensão de notas musicas”. Compreender as notas musicais e suas

relações de altura, sem apresentar a informação do valor de tempo (fazendo uso apenas das

celas de colcheia);

b) “Assimilação de padrões rítmicos”. Reconhecer os diferentes valores de

tempo e, em seguida, os agrupamentos rítmicos. Num primeiro momento fazer o

reconhecimento de forma isolada, depois dentro das fórmulas de compasso.

c) “Assimilação dos sinais de oitava”. Compreender os sinais de oitava e a

Regra de Uso das Oitavas. Caso o aluno não saiba contar os intervalos entre as notas, é

necessário estudar isso primeiramente nessa etapa.

d) “Representação da armadura de clave”. Conhecer a formação das

tonalidades, sustenidos e bemóis, trabalhando com escalas de diferentes tons.

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e) “Leitura de acordes”. Compreensão dos sinais de intervalo para formar

tríades, tétrades e suas inversões.

f) “Leitura de obras/trechos polifônicos”. Familiarização e entendimento com a

leitura polifônica, fazendo uso da regra do “em acorde” total e parcial.

g) “Representação de sinais acessórios”. “Dentre esses sinais, se destacam:

nuances, ligaduras, dedilhados, dinâmica, ornamentação. Há também que se destacar

variadas formas de abreviações comumente utilizadas em braille, incluindo: repetições

parciais, abreviação de sequencias, duplicação de símbolos” (ibid., 58).

Note que esse esses desafios são atribuídos para o leitor de uma partitura em

braille completa, que é usada para instrumento como piano e violão. Partituras para

instrumentos melódicos dispensam o uso da leitura de vozes paralelas e acordes (itens “d” e

“e” ). Partituras para percussão dispensam alguns desses itens também e outros, como o

ítem “a”, mas isso varia com o instrumento e complexidade da escrita.

Considerando esses tópicos podemos inferir a dificuldade de um trecho musical

de acordo com o número de desafios de aprendizagem superados que é requerido de seu

leitor. Um trecho musical escrito para alunos iniciantes deve abranger uma ou mais dos

tópicos expostos acima. Se um trecho determina o entendimento de muitos desses tópicos,

certamente podemos o considerar como um trecho mais difícil. Isso pode nos permitir

classificar a dificuldade de um trecho musical em braille de acordo com a sua abrangência

dentro desse quadro.

Por exemplo, portanto podemos considerar que a partitura em braille mais

simples possível é escrita apenas em colcheias, que ainda permite ser apresentada para o

aluno iniciante sem atribuição do valor da nota, sendo essa a etapa 1 do aprendizado

sugerido. O estudo dos valores de tempo, incluindo o reconhecimento de grupos rítmicos,

pertence à etapa 2. A etapa 3 segue com o conceitos das oitavas. O nível de dificuldade da

etapa 3 já possibilita escrever melodias para instrumentos melódicos, pois não necessitam

de acordes ou polifonias, etc. As etapas podem ser cumulativas em alguns casos.

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Baseado nesses tópicos, proponho um quadro que classifica as partituras em

braille conforme os conceitos que a compõe. Os tópicos “d)” e “g)” não foram incluídos

pelos motivos que mais adiante serão apresentados. Segue abaixo um quadro convencional

para indicar qual tipo de partitura é lida em cada uma das etapas.

Tabela 1 – Os cinco Graus de Dificuldades com a descrição do conteúdo e tipo de partitura

Grau de Dificuldade Descrição do conteúdo / Tipo de partitura

1 As notas musicais e suas alturas / Partitura com notas sem valor de tempo e oitava

2 Valores de tempo / Partitura com notas e valores de tempo, com uso de compasso, sem oitava

3 Sinais de oitava e Regra de Uso das Oitavas / Partituras que fazem uso das celas de oitava

4 Escrita de tríades, tétrades e suas inversões / Partituras que fazem uso das celas de intervalo

5 Vozes simultâneas e escrita com mais de duas pautas / Partituras que usam “em acorde total”, “em acorde parcial” e/ou pautas simultâneas

Com a classificação de trechos musicais conforme proposta acima, cada Grau

de Dificuldade será analisado/observado em separado.

4.2 Analisando partituras em braille

Sloboda afirma que quadros usados pela psicologia para tentar interpretar a

aprendizagem musical são muitos, alguns chegando a ser conflitantes entre si. O autor

apresenta em seu livro “A Mente Musical: A Psicologia Cognitiva da Música” alguns

desses quadros e afirma que a Teoria Sistêmica de Produção pode ser empregada para

fundamentar “generalizações amplas acerca de questões de ensino e aprendizagem” (2010,

p. 285).

A Teoria Sistêmica foi inicialmente empregada para o estudo sobre aquisição de

habilidades por Anderson (1981, 1982 apud. Sloboda, 2010, p. 285). Ela enquadra o

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raciocínio humano em procedimentos que operam de acordo com postulados estabelecidos.

O autor reconhece que tais Sistemas não fazem parte da mente humana, mas que podem ser

análogos formais dos processos mentais, nos permitindo adentrar e organizar conteúdos que

seriam insondáveis apenas pela observação.

Se aplicarmos os princípios da Teoria Sistêmica sobre diferentes trechos

musicais em braille, poderemos observar como os desafios da aprendizagem se inter-

relacionam na escrita ao supor os procedimentos lógicos do leitor. Após a leitura de cada

cela braille, pretendemos apontar o que o leitor deve concluir para que a leitura seja correta.

Mesmo classificando as partituras musicais em Graus de Dificuldades e uma

subdivisão e Etapas que será feita no próximo capítulo, não pretendo estabelecer uma

metodologia, mas sim proporcionar reflexões para o professor de música e para os músicos

com DV a respeito da Musicografia Braille.

As considerações que seguem analisam os Graus 1 ao 4 com base na Teoria

Sistêmica. No Grau 5 foi necessário usar uma análise comparativa entre as partituras em

braille e as convencionais.

4.3 Como serão feitas as análises

A análise que segue pode ser feita apenas com a partitura em braille e não com

a sua versão na escrita convencional. Isso se deve à característica linear da primeira, seu

modo descritivo de grafar a música. Podemos compará-la com uma fala que dita a partitura

em uma ordem definida por regras, exigindo do ouvinte memória, conhecimentos musicais

e experiência nessa tarefa, em outras palavras, ela pode ser considerada uma descrição

ordenada da partitura convencional, que é a sua verdadeira matriz. Como essa linearidade

descritiva não é realidade na partitura convencional, ela não pode ser analisada da mesma

forma que será feita a seguir com a escrita em braille.

Todas as partituras em braille nestas análises serão acompanhadas pela sua

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versão em tinta, o que também permite ao músico que não conhece o braille acompanhar as

análises.

Cada balão desenhado nas partituras em braille está circundando uma ou mais

celas braille que correspondem às informações escritas ao seu lado.

Nessa análise chamaremos de “Cela” a própria cela braille, seguida pelo

número de seu posicionamento dentro da partitura, por exemplo: Cela 1, Cela 2. Após cada

“Cela” são indicados entre parênteses os números dos pontos que formam a cela em braille,

buscando permitir a leitura desse textos por pessoas com DV conhecedoras da Musicografia

Braille. Por exemplo, “Cela 1 (1, 4, 5)” significa: primeira cela do trecho, formada pelos

pontos 1, 4 e 5. Reveja a Figura 6.

Entre algumas celas será incluído o “Procedimentos Mental”, que se refere ao

raciocínio lógico que o leitor do braille deve fazer para compreender corretamente a

partitura até aquele ponto. Embora cada procedimento esteja descrito como frases

padronizadas, isso não quer dizer que seja exatamente dessa forma que o leitor do braille

pensa. Isso é uma tentativa de observar o que esse leitor precisa ter de conhecimento após

se deparar com cada cela braille e tornar essas informações em música. Os Procedimentos

também são enumerados e geralmente contém várias ações que passa por diferentes Graus

de Dificuldade. Esse será o padrão de todas as análises usando a Teoria Sistêmica.

As análises a seguir foram feitas do ponto de vista de quem lê a partitura. No

entanto, se as analisássemos do ponto de vista de quem escreve, a análise se tornaria mais

abstrata e com mais variáveis. As habilidades pessoais desse suposto indivíduo que escreve

uma partitura podem influenciar significativamente esse tipo de análise no que tange os

Procedimentos Mentais, tais como: O quanto é desenvolvida sua percepção musical ou

musicalidade? O quanto domina o sistema braille? Toca bem algum instrumento? Tem um

bom solfejo? Etc. Também poderia influenciar a análise as diferentes situações em que essa

escrita estaria sendo feita, por exemplo: é uma composição própria? É uma música já

existente? É um exercício de ditado musical? Com todas essas variáveis impossíveis de

serem medidas ou definidas se a análise fosse sobre a pessoa que escreve, analisar trechos

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do ponto de vista de que lê se mostrou mais eficiente e suficiente para os nossos objetivos.

Após serem apresentada as análises dos Graus de Dificuldades, teremos um

quadro resumindo os resultados de cada uma delas. São quadros onde teremos um

panorama geral dos tópicos do ensino da Musicografia Braille dispostos de forma a auxiliar

o professor na tarefa de planejar o ensino e estruturar avaliações sobre os conhecimentos do

aluno com DV nessa área do conhecimento.

4.3.1 Análise do Grau de Dificuldade 1

Neste Grau temos escritas apenas as notas em tempo de colcheia, são partituras

básicas para o aluno iniciante. Essa partitura é rudimentar, faltando ainda as informações

que a tornam musicalmente mais precisa.

No apêndice há uma tabela com a correspondência da Musicografia Braille com

as partituras convencionais. Seguem abaixo duas análises conforme esse Grau:

Figura 7 – Notas dó, ré, mi e fá em braille, com valor de tempo de colcheia. Grau deDificuldade 1

Descrição para pessoas com DV – conforme as celas na Musicografia Braille: do colcheia,espaço, ré colcheia, espaço, mi colcheia, espaço e fá colcheia.

Análise 1

Cela 1 (1, 4, 5): dó

Procedimento Mental 1:

- Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille (válido para todas as celas)

Cela 2 (1, 5): ré

Procedimento 2:

Grau 1. Reconhecer que o ré é mais agudo que o dó

Cela 3 (1, 2, 4): mi

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Procedimento 3:

Grau 1. Reconhecer que o mi é mais agudo que o ré

Cela 4 (1, 2, 4, 5): fá

Procedimento 4:

Grau 1: Reconhecer que o fá é mais agudo que o mi

Figura 8 – Notas dó, si, la e sol em braille, com valor de tempo de colcheia. Grau deDificuldade 1

Descrição para pessoas com DV – conforme as celas na Musicografia Braille: do colcheia,espaço, si colcheia, espaço, lá colcheia, espaço e sol colcheia.

Análise 2

Cela 1 (1, 4, 5): dó

Procedimento Mental 1:

- Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille (válido para todas as celas)

Cela 2 (2, 4, 5): si

Procedimento 2:

Grau 1. Reconhecer que o si é mais grave que o dó23

Cela 3 (2, 4): lá

Procedimento 3:

Grau 1. Reconhecer que o lá é mais grave que o si

Cela 4 (1, 2, 5): sol

Procedimento 4:

Grau 1. Reconhecer que o sol é mais grave que o lá

Nesta análise observamos dois procedimentos mentais distintos: reconhecer a

cela de cada nota musical e perceber se a melodia está subindo ou descendo. Sendo assim,

23 Nestas análises do Grau 1, a busca pela próxima nota se deu pela mais próxima, por isso o “si” foiencontrado abaixo do “dó”.

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no Grau de Dificuldade 1 podemos dizer que o conteúdo que o aluno deverá aprender é:

quais celas braille correspondem a quais notas musicais e qual a relação de altura entre elas,

se a melodia sobe ou desce em determinado ponto.

É unânime entre os professores que encontrei que se deve ensinar as notas

começando pelas colcheias, mas sem revelar o valor de tempo. Essa preferência se deve

porque as colcheias fazem parte do grupo de dez celas fundamentais do Sistema Braille

(figura primeira linha), conhecidas por “primeira linha do sistema braille”. Elas não

possuem os pontos 3 e 6, pois o acréscimo de um ou dois desses pontos fará com que a cela

seja enquadrada em cima das próximas linhas. Veja as figuras abaixo.

Figura 9 – primeira linha do sistema braille, formada por 10 celas sem os pontos 3 e 6

Descrição para pessoas com DV – não necessário

A partir dessa linha fundamental, a primeira linha, as demais celas são formadas

ao receberem o acréscimo dos pontos 3 e/ou 6 na sua parte inferior.

Figura 10 – segunda linha do sistema braille, sendo as mesmas celas primeira linha mas como acréscimo do ponto 3

Descrição para pessoas com DV – não necessário

Figura 11 – terceira linha do sistema braille, sendo as mesmas celas primeira linha mas com oacréscimo do ponto 3 e 6

Descrição para pessoas com DV – não necessário

Figura 12 – quarta linha do sistema braille, sendo as mesmas celas primeira linha mas com oacréscimo do ponto 6

Descrição para pessoas com DV – não necessário

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A quinta linha é formada pela transposição da primeira linha para a posição

inferior dos pontos na cela.

Figura 13 – quinta linha do sistema braille, sendo as mesmas celas primeira linha mas com ospontos “rebaixados”

Descrição para pessoas com DV – não necessário

Por sua vez cada linha é associada a um valor de tempo. A primeira é a

colcheia, a segunda é a mínima, a terceira é a semibreve ou semicolcheia e a quarta é a

semínima. As notas musicais de “dó” a “si” se encontram a partir da quarta cela até a

décima (ver o apêndice Introdução à Musicografia Braille). Observe que os pontos 1, 2, 4 e

5 informam o nome da nota, são os pontos superiores e centrais da cela braille. Os pontos 3

e 6 informam o valor de tempo da nota, são os pontos inferiores da cela. Veja o desenho

abaixo:

Figura 14 – Pontos da cela braille dividida em “nome da nota” e “valor de tempo da nota”

Descrição para pessoas com DV – Uma cela braille é cortada horizontalmente ao meio,separando os pontos 1, 2, 4 e 5 na parte de cima, tendo escrito ao lado “nome da nota”,e na parte de baixo do corte ficando os pontos 3 e 6, tendo escrito ao lado “valor detempo da nota”

Em conversas com usuários desse sistema, pude constatar que a leitura das

notas musicais geralmente é feita começando pela parte superior e depois inferior da cela.

Logo verificamos que essa sequência se assemelha ao modo como falamos a nota musical.

Por exemplo, de acordo com os dados pessoais, quando se lê a nota dó semínima, primeiro

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se lê a parte superior da cela (dó) e depois a parte inferior (semínima). Assim seria o mesmo

procedimento para qualquer outra nota. Podemos dizer que a parte superior da cela

corresponde ao Grau de Dificuldade 1 (nome da nota) e a parte inferior ao Grau de

Dificuldade 2 (valores de tempo).

A partir dessa mesma percepção sobre a cela braille, que a divide em uma parte

superior e outra inferior, Garmo (2005, p.13) recomenda que o transcritor faça o seguinte

procedimento para revisar a sua transcrição:

1. Conferir somente a parte superior das celas, os nomes das notas, ignorando a

parte inferior da cela24.

2. Conferir somente a parte inferior das celas, os valores de tempo e conte as

batidas por compasso.

A autora aconselha que a correção seja feita duas vezes em cada partitura, sendo

que a primeira se preocupe apenas com o nome das notas, e na segunda vez, com os valores

de tempo e a contagem dos compassos.

Esse cuidado com pequenos erros é essencial pois uma nota ou ritmo escrito

errado pode afetar todo um trecho musical e fazer com que o músico com DV decore um

trecho ou a música inteira de forma errada. Conferir a “Regra de Uso das Oitava” (será

vista adiante) também é muito importante que seja feito, devendo ser visto logo no primeiro

passo da revisão. Um erro com apenas uma cela de oitava pode afetar o desenho melódico

do todo um trecho.

4.3.2 Análise do Grau de Dificuldade 2

Ao passarmos para o Grau de Dificuldade 2, incluímos na leitura das partituras

em braille o valor de tempo. Nesse Grau podemos ter contato com o conceito de compasso,

fórmula de compasso e a percepção dos agrupamentos rítmicos. Considero que um24Tradução livre

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Agrupamento Simples seja um pequeno grupo de notas que formam uma célula rítmica, um

padrão sonoro; já um Agrupamento Complexo, considero como sendo as estruturas formais

internas de uma obra, assim como define Sloboda (2008, p. 203). No Grau 2 apenas o

Agrupamento Simples são trabalhados, o Agrupamento Complexo estará associado ao Grau

5.

Sinais como barra final e ligadura também podem ser vistos aqui, pois também

ajudam a desenvolver mais exercícios que trabalham com os valores e tempo. Note que

apenas os conteúdos mais centrais serão destacados nas análises, pois os conteúdos mais

“periféricos” devem ser usados pelo professor para garantir que o conteúdo principal seja

bem trabalhado e atinja seus objetivos de aula.

Vamos analisar apenas o segundo compasso do exemplo abaixo, que pertence

ao Grau de Dificuldade 2. Portanto não será analisada as celas que indicam a oitava, pois

essas fazem parte do Grau 3. O estudante que vai ler essa partitura pode ser informado que

a tessitura ficará sempre dentro de determinada oitava ou região de seu instrumento.

Seguindo corretamente a Regra de Uso das Oitavas, não se deve usar celas de

oitava nesse trecho, exceto pela primeira nota, devido aos saltos intervalares feito pela

melodia (veremos essa regra adiante). Segue a análise:

Figura 15 – Partitura convencional para a análise 3. Grau de Dificuldade 2

Figura 16 – Partitura em braille para a análise 3. Grau de Dificuldade 2

Análise 3: segundo compasso

65

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Cela 1 (1, 2, 5, 6): sol semínima

Procedimento Mental 1: valido para todas as celas:

Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille

Grau 2. Reconhecer o valor de tempo da nota

Procedimento 2: reconhecer que:

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a primeira UT

Cela 2 (1, 2, 4, 5): fá colcheia

Procedimento 3: reconhecer que:

Grau 1. O fá está abaixo do sol

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e essa ocupa a primeira parte da segunda UT

Cela 3 (1, 2, 4): mi colcheia

Procedimento 4: reconhecer que:

Grau 1. o mi está abaixo do fá

- se a colcheia dura meio tempo, então:

Grau 2. Essa ocupa a segunda parte da segunda UT

Grau 2. As duas colcheias juntas completam a segunda UT (conceito de

agrupamento )

Cela 4 (1, 2, 4, 5): fá colcheia

Procedimento 5: reconhecer que:

Grau 1. O fá está acima do mi

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e essa ocupa a primeira parte da terceira UT

Cela 5 (1, 2, 4): mi colcheia

Procedimento 6: reconhecer que:

Grau 1. O mi está abaixo do fá

- se a colcheia dura meio tempo, então:

Grau 2. Essa ocupa a segunda parte da terceira UT

Grau 2. As duas colcheias juntas completam a segunda UT

- a terceira UT é idêntica a segunda (percepção estrutural)

Cela 6 (1, 5, 6): ré semínima

Procedimento 7: reconhecer que:

Grau 1. O ré está abaixo do mi

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a quarta UT

Cela 7: cela em branco: mudança de compasso.

66

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Naturalmente neste Grau de Dificuldade já existem mais conceitos musicais

envolvidos do que no anterior. Podemos destacar a presença do conceito de escala, do Grau

de Dificuldade 1, e do conceito de valor de tempo nas notas, Unidade de Tempo, Unidade

de Compasso e Agrupamento Simples, que fazem parte do Grau de Dificuldade 2.

4.3.3 Análise do Grau de Dificuldade 3

No Grau de Dificuldade 3 o conteúdo a ser assimilado são os conceitos e celas

de oitavas e a “Regra de Uso das Oitavas”. A análise a seguir foi feita apenas sobre o

primeiro compasso, adiante outro trecho desse mesmo Grau também será analisado. Vale

apontar aqui que a “terceira oitava” das partituras convencionais corresponde a chamada

“quarta oitava” em braille, portanto, nas analises que seguem as oitavas serão chamadas

conforme a orientação em braille.

Figura 17 – Partitura convencional para a análise 4. Grau de Dificuldade 3

Figura 18 – Partitura em braille para a análise 4. Grau de Dificuldade 3

Análise 4 - primeiro compasso

Cela 1 (5) oitava 4

Cela 2 (1, 4, 5, 6) dó semínima

Procedimento Mental 1: valido para todas as celas:

Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille

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Grau 2. Reconhecer o valor de tempo da nota

Procedimento Mental 2: reconhecer que:

Grau 2. O dó está da quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a primeira UT (unidade de tempo)

Cela 3 (1, 5): ré colcheia

Procedimento Mental 3: reconhecer que:

Grau 3. O ré está da quarta oitava

Grau 3. A colcheia dura meio tempo e ocupando metade da segunda UT

Cela 4 (1, 2, 4): mi colcheia

Procedimento Mental 4: reconhecer que:

Grau 3. O mi está na quarta oitava

Grau 2. A colcheia dura meio tempo, ocupando a segunda metade da segunda UT

Grau 2. As duas colcheias juntas completam a segunda UT

Cela 5 (1, 2, 4, 5, 6): fá semínima

Procedimento Mental 5: reconhecer que:

Grau 3.O fá está na quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a terceira UT (unidade de tempo)

Cela 6 (1, 2, 5, 6): lá semínima

Procedimento Mental 6: reconhecer que:

Grau 3. O lá está na quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a quarta UT (unidade de tempo)

Cela 7: cela em branco

Procedimento Mental 7: mudança de compasso

Outras entendimentos poderiam ser inseridos nos Procedimentos Mentais,

principalmente no que se refere à compreensão das estruturas musicais do trecho. A

compreensão musical por estruturas geralmente é tarefa feita por músicos com certo grau

de amadurecimento. Isso é defendido por determinados experimentos sobre leitura a

primeira vista (SLOBODA, p. 93) que atestam que a habilidade de bons leitores de

partituras em tinta está relacionada com a capacidade de identificar, a primeira vista,

estruturas musicais em unidades maiores do que conseguem leitores iniciantes de partituras.

Questões relacionadas à estrutura, ou aos Agrupamentos Complexos, serão abordadas no

68

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Grau de Dificuldade 5 onde será usada outra forma de análise no lugar da Teoria Sistêmica.

O resultado da Análise 4, a anterior, poderia ser similar ao de uma partitura

convencional caso fizermos uma análise análoga. Mas essa aproximação só existe porque

não foi necessário o conhecimento da Regra de Uso das Oitavas, mas sim apenas o

reconhecimento das celas de oitavas e sua localização em um instrumento.

Resumidamente, a Regra de Uso das Oitavas se resume a três pontos:

a) se a melodia saltou o intervalo diatônico de uma segunda ou terça, mesmo

que a segunda nota esteja em uma oitava diferente da primeira nota, não se coloca sinal se

oitava na segunda nota;

b) se a melodia saltou o intervalo de quarta e quinta, só se deve colocar sinal de

oitava se a segunda nota está em uma oitava diferente da primeira nota, caso esteja na

mesma oitava, não se repete o sinal de oitava;

c) se a melodia saltou intervalos de sexta e sétima, mesmo que a segunda nota

esteja na mesma oitava que a primeira, sempre se deve colocar sinal de oitava. Saltos a

partir da oitava sempre usarão sinais de oitava.

A seguir veremos a análise de uma partitura do Grau 3 que exige o

conhecimento da Regra de Uso das Oitavas. Nessa análise iremos perceber como uma

melodia com vários saltos maiores do que o intervalo de terça já implica em um novo

desafio para o aluno com DV. A análise foi feita apenas sobre o terceiro compasso.

Figura 19 – Partitura convencional para a análise 5. Grau de Dificuldade 3

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Figura 20 – Partitura em braille para a análise 5. Grau de Dificuldade 3

Análise 5 - terceiro compasso

Cela 1 (4, 6): oitava 5

Cela 2 (1, 4, 5, 6): dó semínima

Procedimento Mental 1:

Grau 1. Reconhecer a nota escrita em braille (válido para todas as celas)

Grau 2. Reconhecer o valor de tempo da nota (válido para todas as celas)

Procedimento Mental 2: reconhecer que:

Grau 3. O dó está na quinta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a primeira UT

Cela 3 (4): oitava 4

Cela 4 (1, 2, 5): sol colcheia, com oitava indicada.

Procedimento Mental 3: reconhecer que:

Grau 3. Só se usa sinal de oitava em intervalos de quarta e quinta quando houver

mudança de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o dó5, o intervalo será de quarta descendente

- Então: o sol está na quarta oitava;

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e essa ocupa a primeira metade da segunda UT

Cela 5 (2, 4): lá colcheia, sem indicação de oitava.

Procedimento Mental 4: reconhecer que:

Grau 3. Não se usa sinal de oitava quando o intervalo for de segunda ou terça,

mesmo que mude de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o sol4, o intervalo será de segunda ascendente

- Então: o lá está na quarta oitava;

Grau 2. A colcheia dura meio tempo e essa ocupa a segunda metade da segunda UT

- Então: as duas colcheias juntas completam a segunda UT (agrupamento de nota)

Cela 6 (5): oitava 4

Cela 7 (1, 4, 5, 6): dó semínima, com indicação de oitava

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Procedimento Mental 5: reconhecer que:

Grau 3. Sempre se usa sinal de oitava quando o intervalo for de sexta e sétima,

mesmo que não mude de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o lá 4, o intervalo será de sexta descendente

- Então: o dó está na quarta oitava;

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a terceira UT

Cela 8 (1, 2, 5, 6): ré semínima, sem indicação de oitava

Procedimento Mental 6: reconhecer que:

Grau 3. Não se usa sinal de oitava quando o intervalos for de segunda ou terça,

mesmo que mude de oitava (Regra de Uso das Oitavas)

- Sendo: a nota anterior o dó 4, o intervalo será de segunda ascendente

- Então: o ré está na quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a quarta UT

Cela 9: cela em branco: mudança de compasso.

A cela de oitava só tem função quando está associada a uma nota musical,

portanto, embora fizesse sentido, achei desnecessário incluir um Procedimento Mental após

a leitura de cada uma dessas celas.

Com essa análise podemos perceber que a Regra de Uso das Oitavas deve ser

constantemente observada na leitura de uma partitura em braille, o que exige do leitor

familiaridade com tal regra e rapidez na contagem dos intervalos diatônicos.

O mesmo conhecimento não é exigido do leitor vidente que lê esse mesmo

trecho escrito em uma partitura convencional, pois o aluno irá ler cada nota da melodia sem

precisar considerar a anterior, podendo começar sua leitura pelo meio da melodia. Por

exemplo, na Musicografia Braille é preciso acompanhar os sinais de oitavas desde o início

da melodia. Outro ponto importante é que o aluno vidente não precisa contar o intervalo

formado entre cada nota da melodia escrita.

Certamente esse mesmo trecho musical exposto acima exige mais

conhecimento teórico-musical para o leitor da Musicografia Braille do que para o leitor da

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partitura convencional. Para fazer uma leitura eficiente em braille o leitor precisa

memorizar qual foi a última nota e sua oitava e ficar atento à Regra das Oitavas antes de

prosseguir com segurança sem precisar retornar repetidas vezes às celas já lidas.

4.3.4 Análise do Grau de Dificuldade 4

Esse Grau de Dificuldade compreende a escrita de acordes, também conhecidos

pelos músicos videntes por “cachos de notas”. Na Musicografia Braille eles são escritos

usando um grupo especial de celas braille, possuindo regras específicas de utilização (mais

detalhes no apêndice Introdução à Musicografia Braille). No trecho musical abaixo, escrito

em braille e na forma convencional, veremos o uso de todos os intervalos e algumas

possibilidades de escrita. Isso deve permitir ao leitor compreender como os intervalos são

representados nas partitura em braille:

Figura 21 – Partitura convencional para a análise 6. Grau de Dificuldade 4

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Figura 22 – Partitura em braille para a análise 6. Grau de Dificuldade 4

Descrição para pessoas com DV – a partitura em braille em anexo possui círculos com linhasapontadas para textos que descrevem as celas que estão dentro do seu respectivocírculo.

Ao acompanharmos a descrição acima, comparando as escrita em braille com a

partitura convencional, poderemos ter uma noção aproximada do processo da leitura

musical em braille neste Grau de Dificuldade. Com isso podemos destacar alguns dados

relevantes para essa pesquisa:

a) a cela de intervalo é tratada como se fosse uma nota, pois pode receber sinais

de alteração, sinal de oitava25, ligaduras e dedilhado (dado externo à observação anterior).

b) o intervalo indicado pela cela braille é sempre diatônico, nunca intervalo

cromático. Isso faz com que se deva respeitar as alterações da “armadura de clave”

correspondente à tonalidade do trecho.

c) é preciso definir o sentido na contagem dos intervalos, se será ascendente ou

descendente. Nos nossos exemplos adotaremos sempre o sentido ascendente. A regra da

Musicografia Braille diz que as vozes com tessitura média acima do Dó 4 os intervalos

25Quando o salto for maior que uma oitava, já que não há sinais para intervalos a partir da nona.

73

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serão contados no sentido descendentes (contralto e soprano), se tiver tessitura média

abaixo do Dó 4, o sentido será ascendente (tenor e baixo).

d) os intervalos aparecem sempre do menor para o maior. Dessa forma, se for

lido uma quinta seguida pela terça, logo se saberá que a terça é na verdade um intervalo de

décima (ver compasso 3 do exemplo).

e) A celas de intervalo possuem o mesmo valor de tempo da nota que origina o

acorde.

Vamos analisar o primeiro compasso do trecho acima, de acordo com a Teoria

Sistêmica.

Análise 6 - primeiro compasso

Cela 1 (5): oitava 4

Procedimento Mental 1: Válido para todas as celas de oitava:

Grau 3. Reconhecer as celas de oitava (pode ser em um instrumento musical)

Cela 2 (1, 3, 5): ré mínima

Procedimento 2: reconhecer que:

Grau 3. O ré pertence a quarta oitava

Grau 2. A mínima dura dois tempos e essa ocupa a primeira e a segunda UT

Cela 3 (3, 4, 6): intervalo de terça (dif. 4)

Procedimento 3: válido para todas as celas de intervalos:

Grau 4. Reconhecer as celas de intervalos.

Procedimento 4: reconhecer que:

Grau 4. Esta cela está representando a nota fá # da oitava 4 (terça diatônica

ascendente)

Grau 4. Ele possui a mesma duração da nota ré mínima e devem ser tocadas juntas

Cela 4 (1, 5, 6): ré semínima

Procedimento 5: reconhecer que:

Grau 3. O ré pertence a quarta oitava

Grau 2. A mínima dura um tempo e essa ocupa a terceira UT

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Cela 5 (3, 5, 6): intervalo de sexta

Procedimento 6: reconhecer que:

Grau 4. Esta cela está representando a nota si da oitava 4 (sexta diatônica

ascendente)

Grau 4. Ele possui a mesma duração da nota ré semínima e devem ser tocadas

juntas

Cela 6 (1, 5, 6): ré semínima

Procedimento 7: reconhecer que:

Grau 3. O ré pertence a quarta oitava

Grau 2. A semínima dura um tempo e essa ocupa a quarta UT

Cela 7 (1, 4, 6): sustenido

Cela 8 (3, 4, 5, 6): intervalo de quarta

Procedimento 2: reconhecer que:

Grau 4. Esta cela está representando a nota sol #

Grau 4. Ele possui a mesma duração da nota ré semínima e devem ser tocadas

juntas

Nesta análise podemos verificar que o conceito musical que deve ser assimilado

pelo aluno será montar o acorde descrito pelos intervalos, seguindo as regras desse tópico.

Note que aqui também é imprescindível que o aluno compreenda bem a contagem dos

intervalos diatônicos, capacidade exigida já no Grau 3 ao ter que identificar o intervalo

entre duas notas dentro de uma melodia.

O fato de a escrita tratar a cela de intervalo como a própria nota musical a que

se refere, possuindo o mesmo valor de tempo da “nota base” e podendo receber sinais de

alteração e dinâmicas, parece reforçar a percepção de que as notas representadas pelos

intervalos estão agrupadas e devem ser tocadas juntas, com o mesmo valor de tempo.

4.3.5 Analisando o Grau de Dificuldade 5

O Grau de Dificuldade 5 se refere à leitura de vozes simultâneas. Poucos dados

relacionados a essa etapa do aprendizado foram encontrados na literatura disponível.

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Provavelmente isso se deve porque esse assunto tem um nível de abstração maior do que

uma simples apresentação da correspondência entre as duas grafias, algo semelhante ao que

se encontra no apêndice “Introdução à Musicografia Braille”. Tal conteúdo introdutório

também pode ser encontrado em alguns trabalhos acadêmicos publicado a alguns anos, tais

como o de Tomé (2003), sendo o mais popular.

Na partitura convencional a escrita de vozes simultâneas pode ser lida pelo

estudante iniciante sem grande dificuldade ou novas questões a serem assimiladas. Na

partitura em braille essa escrita compreende em vencer um novo desafio de aprendizagem,

pois irá exigir do aluno uma nova forma de ler a música (Grau de Dificuldade 5) e poderá

fazer uso das habilidades musicais compreendidas pelo Graus de Dificuldade 1 a 4.

Contudo, quais seriam os novos conceitos necessários para a leitura de

partituras do Grau 5? Qual é a nova percepção na escrita musical em braille deste Grau?

Devido às particularidades do Grau de dificuldade 5 a análise feita com a Teoria

Sistêmica não é a mais adequada; esse Grau requer mais abstração e técnica de leitura por

parte do músico com DV do que os Graus anteriores. O músico precisará ler duas vozes

consecutivas e compreender como ambas as vozes soam simultaneamente. Assim é feito

porque duas vozes com ritmos diferentes não podem ser escritas usando as celas de

intervalos, é preciso clareza e precisão na descrição de cada voz.

Observando as figuras abaixo veremos como acontece esse processo, que

aparentemente é muito distante da realidade das partituras convencionais.

O processo pode ser descrito da seguinte maneira: o leitor lê a primeira voz

durante todo o primeiro compasso. Em seguida há um sinal (chamado de “em acorde total”)

informando que tem uma segunda voz paralela a voz que ele acabou de ler. Então segue

com a leitura da segunda voz, correspondendo ao mesmo compasso. Ao final o leitor

precisa compreender como as duas vozes lidas soam. Quando houver mais de uma voz,

aparecerão outros sinais de “em acorde total” quantas vezes forem necessárias. Desde já

podemos imaginar que isso exige do aluno uma certa capacidade de solfejo e memória

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musical. Compare as duas escritas abaixo:

Figura 23 – Partitura convencional para a análise 7. Grau de Dificuldade 5

Figura 24 – Partitura em braille para a análise 7. Grau de Dificuldade 5

Portanto, podemos dizer que no Grau de Dificuldade 5 o aluno precisará

desenvolver a capacidade de relacionar dois trechos melódicos lidos consecutivamente,

sendo essa uma nova forma de se relacionar com a escrita musical. Podemos considerar

esse Grau como avançado por ele exigir o acúmulo de outros conhecimentos para que possa

ser plenamente compreendido e utilizado.

É possível analisar e observar partituras do Grau 5 de forma suficiente para

tirarmos conclusões que contribuam para essa pesquisa?

Sim. Primeiramente nesse Grau nos deparamos com a capacidade do leitor do

braille em associar dois ritmos diferentes lidos em momentos consecutivos, algo que na

partitura convencional não acontece porque todos os sons são organizados por Unidades de

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Tempo. Esse ponto de diferença poderá nos revelar dados interessantes.

A partitura convencional é alinhada por Unidades de Tempo, o que faz com que

haja uma espaço após cada nota, definido de acordo com o seu valor de tempo. Ao termos

contato com a Musicografia Braille logo notamos que as Unidades de Tempos não são

uniformes como são nas partituras convencionais. Portanto faremos comparações acerca

desse ponto, observando como as Unidades de Tempo se comportam na grafia em braille.

4.4 As Unidades de Tempo

A verticalidade na partitura convencional agrega as informações musicais que

devem acontecer no mesmo tempo, tais como acordes, notas de vozes diferentes e sinais de

expressão. De um modo geral os compassos são divididos em UT`s (unidades de tempo)26 e

visualmente isso organiza a distância horizontal entre as notas.

Vale reafirmar que todas as informações de uma partitura podem ser transcritas

para o braille, tudo o que é vertical dentro de um mesmo pentagrama convencional passa a

ser representado de forma horizontal quando escrito em braille. Certamente esse fato tem

consequências acentuadas nos métodos de ensino musical usados por professores videntes.

Nesse sentido, analisar a formatação das partituras em braille apresenta apenas

um dos possíveis caminhos para se iniciar uma busca por novos formatos de materiais

didáticos, explicações, exercícios e planejamento de aulas de música para alunos com DV.

A seguir apresento comparações entre o mesmo trecho musical escrito em

formato convencional e em braille. Com isso poderemos apontar três características

relevantes das UT`s em braille.

a) Espacialização das notas musicais relativas ao seu valor de tempo;

26UT será a abreviatura usada em todo esse texto para “unidade de tempo”. Unidades de tempo seráUT`s.

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b) UT estendida por informações adicionais;

c) Fragmentação vertical de diferentes Unidades de Tempo.

4.4.1 Espacialização das notas musicais relativas ao seu valor de tempo

Na formatação da escrita em tinta cada UT possui um espaçamento padrão e

quase idêntico entre si, independente do número de notas que o compõe. Após cada nota

musical, de acordo com seu respectivo valor de tempo, há um espaço em branco até a

próxima nota. Isso torna o compasso subdividido em partes quase iguais para cada UT. Veja

a Figura 2, perceba a variação nos espaços após cada nota relativa ao seu valor de tempo.

Figura 2 – (recapitulação) – Partitura convencional, explicitando a relação dos espaços apósas notas com o seu valor de tempo

Essa informação espacial certamente contribui nas leituras a primeira vista,

facilitando o solfejo e a execução musical. Abaixo segue a versão em braille desse mesmo

trecho apresentado.

Figura 25 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 2

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Podemos observar que não existe espaços relativos ao valores de tempo das

notas, assim como existe na partitura convencional. A subdivisão do compasso em UT`s do

mesmo tamanho é comum na escrita em tinta. Para um aluno com DV essa informação não

existe em braille.

4.4.2 UT estendida por informações adicionais

A cada informação que incide na mesma UT será necessário mais celas braille

para escrevê-la e consequentemente mais tempo será preciso para a sua leitura e

compreensão. Os itens que fazem com que uma UT se estenda são:

-Ocorrência do sinal de oitava (KROLICK, 2004, p. 22)

-Acorde (Ibid., p. 36)

-Acentuação e dinâmica (Ibid., p. 95)

-Alteração (Ibid., p. 28)

-Quiáltera (Ibid., p. 34)

-Dedilhado (Ibid., p. 65)

-Inicio ou fim de ligadura (Ibid., p. 49)

-Inicio ou fim de crescendo ou decrescendo (Ibid., p. 99)

Exemplo:

Figura 26 – Partitura convencional, trecho com muitas indicações, detalhado a execuçãosonora e técnica do pianista.

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Figura 27 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 27, com indicações dossignificados das celas braille

Como visto, todas as informações da partitura original estão escritas em braille.

Certamente a dificuldade em se ler esse trecho musical transcrito é grande devido a

quantidade de informações musicais que contém, fazendo-o ficar longo. Note que foi

preciso dez celas braille para a transcrever apenas a segunda UT do trecho acima.

4.4.3 Fragmentação vertical de diferentes Unidades de Tempo

Quando se escrevem vozes independentes na mesma pauta, a escrita em braille

pode usar o recurso chamado de “em acorde total” (KROLICK, 2004, p. 41). Com essa

técnica de escrita cada voz aparece sucessivamente, fazendo com que a mesma UT apareça

em momentos diferentes. Isso beneficia o entendimento do fraseado do trecho, em

detrimento do contraponto das vozes. Exemplo:

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Figura 28 – Partitura convencional, trecho com duas vozes paralelas.

Figura 29 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 29, demonstrando o uso do“em acorde total”

Note que as UT1 e UT2 aparecem em dois momentos diferentes dentro do

compasso braille, de forma fragmentada.

Também temos os recursos chamados de em acorde parcial (KROLICK, p. 43).

Nele, nem todas as UT se repetem, pois somente se escreve as notas que se encontram na

partitura. No Manual Internacional de Musicografia Braille encontramos:

O acordo internacional de se respeitar o original impresso em tinta,transcrevendo o material de texto como texto braille, ao invés de usarsinais específicos, tem permitido um consenso em matéria de notação paraa teoria. Esse acordo se revela especialmente útil quando músicos cegos enão-cegos estudam ou trabalham juntos (KROLICK, 2004, p. 112).

O “em acorde parcial” é ideal para grafar os casos em que o divisi das vozes

acontece em trechos do compasso, o que permite que os detalhes da partitura original

possam ser precisamente claros. O exemplo abaixo ilustra bem um caso desse tipo.

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Figura 30 – Partitura convencional, trecho com divisi de voz na metade do compasso

Figura 31 – Partitura em braille, transcrição da partitura da figura 31, demonstrando o uso do“em acorde parcial”

Note que a divisão das vozes começa na segunda UT. O uso do “em acorde

parcial” evitou escrever em braille a nota “dó semínima” duas vezes caso fosse utilizado o

“em acorde total”. Caso não fosse usado o “parcial” a escrita em braille poderia passar a

ideia de que o divisi melódico começou em um ponto diferente do que a partitura

convencional indica. Perceba também que a primeira UT apareceu uma vez na escrita,

enquanto que a segunda UT apareceu duas vezes.

No capítulo seguinte serão apresentadas considerações acerca dos dados aqui

levantados e alguns parâmetros que poderão auxiliar na metodologia de ensino da

Musicografia Braille.

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CAPÍTULO 5 - DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A partir das análises do capítulo anterior, apresentamos a seguir algumas

conclusões sobre cada Grau de Dificuldade. Para facilitar a compreensão dos resultados,

eles serão organizados de forma que teremos subdivisões para cada Grau, que aqui

chamaremos de Etapas.

Portanto, cada partitura pode ser classificada pertencente a um Grau e a uma

Etapa, embora isso não signifique que esses conhecimentos sejam pré-requisitos um do

outro. Isso será feito apenas para moldarmos uma ferramenta que pode auxiliar o

desenvolvimento de metodologias ou avaliações mais precisa quanto ao conhecimento que

é exigido do aluno com DV.

5.1 Subdivisão dos Graus de Dificuldades em Etapas

A partir das análises feitas sobre cada Grau de Dificuldade torna-se possível

subdividir cada um deles de acordo com o seu conteúdo. Assim podemos deixar mais claro

o que compõe as diferentes etapas de aprendizado em que o aluno pode estar em

determinado momento do aprendizado, também ajudando a avaliar seus conhecimentos

nesse campo e auxiliando metodologias a versarem sobre os principais tópicos de cada

desafio de aprendizagem.

Portanto os trechos analisados anteriormente ganham neste capítulo mais uma

categoria classificatória. Isso significa que o aluno precisará dominar bem todas a Etapas

para que se considere que determinado Grau de Dificuldade foi assimilado por completo.

Mas isso não necessariamente significa que as Etapas precisam ser vistas

consecutivamente, mas sim que podem servir como balizas para organizar a estrutura de

métodos de ensino, grades curriculares e provas avaliativas.

As Etapas que seguem servem principalmente para auxiliar o professor a

desenvolver exercícios e materiais didáticos, garantindo um aprendizado consistente do

84

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aluno. Essa pesquisa se limita a observar os conteúdo a partir das análises anteriores e

experiências pessoais.

5.1.1 Etapas do Grau de Dificuldade 1

Há dois conteúdos diferentes dentro desse Grau e que, se o tivermos com

clareza, é possível vencer esse desafio de aprendizagem de forma mais ampla. Um deles é a

assimilação da correspondência das celas braille com as notas musicais, o outro é a

percepção da disposição das notas dentro da escala. Veja a tabela desse Grau pode ser

formulada:

Tabela 2 – Etapas do Grau de Dificuldade 1

Etapas do Grau de Dificuldade 1

Descrição do conteúdo

1 Assimilar as notas musicais e suas celas braille

2 Compreender a relação das alturas das notas em braille

As duas etapas podem ser trabalhadas em separado ou em conjunto, servindo de

orientação para exercícios em sala de aula. Perceba que é possível apresentar ao aluno o

conceito de escala sem antes falar das celas braille, a ordem das etapas não é o ponto

principal nessa subdivisão, mas sim definir os conceitos que compõem cada Grau de forma

que ajude o professor na sua tarefa de ensinar essa matéria ainda nova para o campo do

ensino musical. De todo modo, as duas etapas são mutuamente complementares e

caminham juntas nesse grau de dificuldade.

A Etapa 2 foi separada da Etapa 1 porque em braille não temos a altura de nota

desenhada no papel conforme temos nas partituras convencionais. Então esse conceito deve

ser visto com atenção especial, não devendo ser negligenciado e pouco trabalhado com o

aluno iniciante.

5.1.2 Etapas do Grau de Dificuldade 2

85

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Como neste Grau o conteúdo central são os valores de tempo, ou seja, a

compreensão de como as notas ficarão dispostas dentro do tempo, as questões relativas às

figuras rítmicas ou Agrupamentos Simples de notas se mostram relevantes para organizar e

enriquecer esse ensino. Ao buscarmos por uma subdivisão do Grau 2, podemos nos basear

em Agrupamentos Simples e Complexos. Segue o quadro:

Tabela 3 – Etapas do Grau de Dificuldade 2

Etapas do Grau de Dificuldade 2

Descrição do Conteúdo

1 Compreender que o valor de tempo é dado pelo uso ou não dos pontos 3 e 6 e o que eles representam;Perceber os valores de tempo com relação entre si

2 Unidades de Tempo;Agrupamento Simples de notas dentro de uma UT

3 Agrupamento Simples de notas maiores que uma UT

4 Fórmula de compassos simples;Transposição de um trecho musical para outra fórmula de compasso

5 Fórmula de compassos compostos;Transposição de um trecho musical para outra fórmula de compasso

Neste Grau de Dificuldade observamos uma variedade maior de conceitos

musicais envolvidos, e como em todos os Graus de Dificuldade, as Etapas não devem ser

consideradas como independente ou pré-requisito de sua subsequente. Nenhuma das

subetapas dos Graus de Dificuldades pode ser considerada de forma isolada.

Consideremos que essas etapas devem se repetir ao longo da aprendizagem,

mas sempre que forem revisitadas, isso deve acontecer com um maior grau de

aprofundamento. Por exemplo: na Etapa 1 poderia ser visto apenas semínimas e colcheias,

seguindo pelas Etapa 2, 3 e 4. Depois o ensino retornaria para a Etapa 1 e seria explicado as

mínimas e a semibreve, retornando para as Etapas 2, 3 e 4. Depois retornaria novamente

para a Etapa 1, acrescentando as notas pontuadas e pausas, lembrando novamente que o

professor deve usar as Etapas adaptadas de acordo com o que julga ser mais vantajoso para

seus alunos ou com os seus objetivos de aula, passando e aprofundando cada Etapa de

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forma particular.

Os exercícios de transposição de um trecho para outras fórmulas de compassos

são ótimo para serem feitos em braille, já que isso pode ser bem simples para o aluno com

DV quando já assimilou os conceitos das Etapas 1 a 3. Nesse exercício o aluno precisa

apenas trocar a informação da parte inferior da nota, escrevendo o novo valor de tempo,

dobrando ou dividindo o valor de tempo de todas as notas que forem encontradas.

Os Agrupamentos Simples de notas, que constam nas Etapas 2 e 3, podem ser

compreendidos como a capacidade de o músico reconhecer padrões rítmicos durante a

leitura de uma partitura. Essa habilidade deve facilitar a memorização, o solfejo e a

execução do trecho musical. A percepção do agrupamento na escrita revela que o

agrupamento pode e deve ser feito no nível mental; ao se encontrar uma serie de notas, já é

possível “se lembrar” do ritmo e/ou do desenho melódico escrito.

Por exemplo, quando o leitor de uma partitura convencional encontra quatro

semicolcheias reunidas, ele rapidamente compreende sua execução rítmica. Isso deve valer

para qualquer outro Agrupamento Simples de nota igual ou superior à uma UT. Esse tipo de

agrupamento na escrita acontece em braille apenas no caso de termos quatro semicolcheias

consecutivas. Ao invés de aparecer quatro notas com o acréscimo dos pontos 3 e 6

(semicolcheias), esse acréscimo é feito apenas na primeira. A segunda, terceira e quarta

semicolcheias são escritas sem o acréscimo de pontos, como se fossem colcheias,

facilitando o reconhecimento desse agrupamento. Veja o exemplo na figura abaixo:

Figura 32 – Agrupamento de semicolcheias na escrita em braille

Note que para não haver confusão de leitura, o músico precisa estar atento ao

número de notas dentro do compasso, observando os seus valores de tempo. O leitor deve

reconhecer esse agrupamento para evitar confundir as suas três últimas semicolcheias com

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colcheias. Portanto, considerando o exemplo acima sendo de um compasso ternário (3 por

4), e já se conhecendo essa forma de agrupamento na escrita em braille, o leitor certamente

não cairá em erro. Casos em que há outras figuras rítmicas no mesmo compasso além das

citadas acima, o transcritor deve estar atento se as semicolcheias poderão ser escritas

agrupadas, de modo a não trazer dúvidas para o leitor.

A capacidade de reconhecer padrões rítmicos também pode ser considerada

para Agrupamentos maiores que uma UT, chegando a abranger um ou mais compassos.

Seria como se o aluno, ao ler uma semínima seguida por duas colcheias, percebesse

rapidamente que fazem parte de duas UT`s diferentes e como elas soam. Portanto, se o

aluno consegue reconhecer esses Agrupamentos Simples, subentende-se que o leitor já teve

bastante contato com essa figura rítmica anteriormente. Isso revela a necessidade de

exercícios que levariam gradativamente o aluno desenvolver essa “capacidade de percepção

estrutural”. Tal habilidade poderia ser desenvolvida não apenas no Grau de Dificuldade 2,

mas sim ao longo de todo o ensino da Musicografia Braille, sempre buscando compreender

as estruturas dessas partituras e proporcionar uma leitura mais eficiente do aluno.

5.1.3 Etapas do Grau de Dificuldade 3

Comparando as duas análises feitas no Grau 3 constatamos que, embora ambos

os trechos musicais sejam do mesmo Grau, há diferenças muito relevantes entre si. O

primeiro trecho é mais simples que o segundo porque não exige que o leitor conheça

perfeitamente a regra de uso das oitavas. Basta ele saber reconhecer a oitava em que a

primeira nota começa e ler as notas restantes, escolhendo tocar sempre a que estiver uma

terça ou segunda acima ou abaixo, sem se preocupar com a mudança de oitava. O segundo

trecho analisado já exige o conhecimento da Regra de Uso das Oitavas de forma que se o

leitor não a dominar suficientemente ele pode não compreender a melodia de forma correta.

Bonilha (2010) afirma que o uso de intervalos de segunda e terça na

melodia, já que nunca se utiliza sinais de oitava mesmo quando mudar de oitava, deve

facilitar a leitura para o aluno iniciante. Basta o aluno reconhecer a oitava da primeira nota

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e ler o restante da melodia. No caso das sextas e sétimas, sempre se usa sinais de oitava

mesmo que não mude de oitava. Isso também não deixa de ser simples para o aluno

iniciante, pois esses sinais serão usados invariavelmente. Porém seria interessante misturar

os quatro intervalos citados, antes de seguir com os próximos, até mesmo porque a inversão

dos intervalos de segunda e terça correspondem aos de sétima e sexta. Por último seria

usadas melodias com saltos de quarta e quinta, que recebem o sinal de oitava somente

quando mudam de oitava. Resumindo, o ensino da Regra de Uso das Oitavas deveria ser

iniciado pelos intervalos de segunda e de terça, tendo apenas a primeira nota da melodia

com a sua oitava indicada. Depois seriam abordados os saltos de sexta e sétima e, em

seguida, os de quarta e quinta.

Dessa forma como podemos desenhar o seguinte quadro com as Etapas do Grau

3.

Tabela 4 – Etapas do Grau de Dificuldade 3

Etapas do Grau de Dificuldade 3

Descrição do conteúdo

1 Contagem de intervalos diatônicos entre as notas

2 Apresentação do conceito de oitavas e suas celas braille correspondentes

3 Regra de Uso da Oitavas para os intervalos de segunda e terça

4 Regra de Uso da Oitavas para os intervalos de sexta e sétima

5 Regra de Uso da Oitavas para os intervalos de quarta e quinta

Assim os trechos analisados no capítulo anterior podem ser classificados de

uma forma mais precisa. O primeiro trecho (Figura 18) seria: Grau de Dificuldade 3, Etapa

1. O segundo (Figura 20) seria: Grau de Dificuldade 3, Etapa 5. As Etapas deste Grau

possuem um caráter cumulativo maior do que em outros Graus, de todo modo, considero

que isso não é suficiente para alterações nas tabelas, tendo em vista que a clareza na

visualização dos conteúdos é o mais importante aqui.

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No caso de o leitor desse mesmo trecho musical escrito em partitura

convencional, não faria sentido se fizéssemos essa mesma subdivisão. Nelas os saltos

melódicos não exigem que o aluno reconheça se mudou ou não de oitava e quais são os

intervalo entre as notas, tudo para que a melodia seja corretamente compreendida. Na

partitura em braille, se há muitos saltos, consequentemente a leitura se tornará mais lenta e

com mais regras a serem conferidas.

Nesse contexto imagine a mesma prova teórica de música escrita em tinta e em

braille. Será que a dificuldade de ambas seriam equivalente? O que se exige da prova em

braille também é exigido da prova em tinta? Penso que, dependendo dos saltos da melodia a

ser lida, essa prova pode pelo menos ser mais trabalhosa para o leitor em braille.

Principalmente porque o aluno com DV deverá reter na memória o trecho do exercício sem

o uso de um instrumento, o que exigiria também um bom nível solfejo. Seria interessante

fazermos analises de questões de provas de aptidão transcritas para o braille e compará-las

com sua versão original, mas essa tarefa foge do foco desse projeto.

Na minha opinião, o uso de um instrumento musical na aprendizagem seria

essencial para o bom entendimento do Grau 3. Não faria sentido aprender as oitavas apenas

teoricamente se o aluno não tiver contato com o que realmente isso significa sonoramente.

5.1.4 Etapas do Grau de Dificuldade 4

A pergunta para este Grau de Dificuldade seria: há alguma ordem didática para

que as celas de intervalo sejam apresentadas? A análise feita não foi suficiente para

responder a essa pergunta e, ainda assim, não me parece que funcionaria se a aplicássemos

em mais trechos musicais afim de levantarmos mais dados. Nesse caso, seguirei com o

relato de experiências de pesquisadores e professores a respeito desse assunto afim de

estabelecer as Etapas deste Grau.

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5.1.4.1 A aprendizagem de acordes

Bonilha afirma que compreender as bases do sistema tonal facilita o

aprendizado da leitura e escrita musical em braille, assim como a leitura de escalas e

acordes (2010, p.82). Esse conteúdo engloba os conceitos de tons e semitons que formam

as diferentes tonalidade, as suas armaduras de clave, a classificação dos acordes por graus,

cadências harmônicas mais comuns, etc. Mais uma vez nos deparamos com a necessidade

de o professor criar alternativas para explicar esse conteúdo de forma acessível, seja usando

o canto ou um instrumento, usando ditados, solfejos, jogos e materiais didáticos. A

percepção musical também deve ser trabalhada no que tange ao reconhecimento de

cadências harmônicas.

A partir dessas colocações a pesquisadora apresenta um relato de experiência

em que apresenta os conceitos do Grau 4 para um aluno. Primeiro foram apresentados os

intervalos de terça e quinta, permitindo escrever em braille uma tríade em estado

fundamental. Apenas com esse acorde já é possível fazer exercício em tons diferentes.

Depois apresentou os intervalos de quarta e sexta, podendo então escrever acordes na

primeira e segunda inversão. Os intervalos de segunda e sétima foram abordados apenas

quando houve a necessidade de se usar acordes com nona e sétima.

As classificações dos acordes como maiores, menores, diminutos e aumentados

não foram vistos nessa ocasião de ensino porque “não constituem um aspecto fundamental

para a leitura em braille” (BONILHA, 2010, p. 85). Para realizar essa classificação o aluno

precisará aprender os intervalos cromáticos, sendo algo que difere do conteúdo até então

estudado pois já não fazem uso das celas de intervalo.

Com a ajuda desse relato, mais a minha experiência pessoal em dar aulas de

Musicografia Braille, podemos subdividir o Grau de Dificuldade 4 em Etapas com base na

formação das tríades. Assim a assimilação dos acordes no estado fundamental, suas

inversões e o reconhecimento de arpejos na partitura se tornam referência.

Apresentar um conteúdo fazendo referência a um outro conteúdo, didaticamente

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se mostra mais eficiente do que apenas apresentar as celas de intervalos para serem

decorados e praticados. Fazer essa referência é apresentar as celas de intervalo fazendo uso

das tríades e tétrades sendo invertidas, arpejos escritos, escalas, etc. Se não for feito assim,

podemos pensar que houve pouca fundamentação na elaboração da didática de aula.

Esse erro eu cometi nas primeiras aulas de Musicografia Braille que eu

ministrei, quando apresentei as celas de intervalos para os alunos sem incluir a classificação

dos acordes. Apresentei os intervalos de dois em dois, começando pelos menores e fazendo

exercícios com todos eles. Eles compreenderam bem o assunto e faziam corretamente os

exercícios. Uma das alunas criou uma maneira simples de associar os intervalos ao número

de pontos que forma a cela, de modo que eu não havia pensado. Ela associou que o

intervalo de segunda é escrito com uma cela formada por dois pontos, os pontos 3 e 4. O

intervalo de terça é escrito com três pontos: 3, 4 e 6. O intervalo de quarta, por sua vez, é

escrito com quatro pontos: 3, 4, 5 e 6. Os demais intervalos acabam tendo outros tipos de

relação, que não convém aprofundarmos aqui.

Porém, quando apresentei os acordes no estado fundamental e suas inversões,

foi como se eu estivesse abordando um assunto completamente novo e tiveram muita

dificuldade. Naquele momento essa dificuldade dos alunos me surpreendeu, mas sob a

percepção do exposto acima, agora fica mais claro que por mais que as atividades de ler as

celas e compreender as tríades tenham como base as mesmas celas em braille, elas são

conteúdos diferentes.

Portanto, se no planejamento das aulas o conteúdo for estruturado relacionando

todos os conteúdos possíveis, supõe-se que o aprendizado se tornaria mais consistente e

eficiente. Isso permitiria ao aluno desenvolver uma percepção mais ampla acerca de um

conceito ao invés de ter que relacioná-lo com outros complementares após a sua

aprendizagem. Considerando essa questão, segue a abaixo as Etapas do Grau de

Dificuldade 4.

Tabela 5 – Etapas do Grau de Dificuldade 4

Etapas do Grau de Descrição do conteúdo

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Dificuldade 4

1 Intervalos de terça e quintaAcordes no estado Fundamental

2 Intervalos de quarta e sextaAcordes na primeira e na segunda inversão

3 Intervalos de segunda e sétimaAcordes de nona e sétima e suas inversões

5.1.5 Etapas do Grau de Dificuldade 5

Este Grau se revelou ser o mais complexo da escrita em braille recebendo um

tratamento diferente dos Graus anteriores. Vamos seguir com alguns dados novos advindos

de pesquisas e relatos de experiência, além dos assuntos apontados no capítulo anterior,

para a construção do quadro com as Etapas desse Grau.

5.2 A leitura de partituras em braille

A partir das comparações entre as UT`s da duas formas de escrita musical,

podemos perceber mais claramente que a Musicografia Braille é uma espécie de “descrição

dos eventos musicais” onde cada cela braille tem sua função e posicionamento dentro do

discurso musical. Aparentemente essa forma de escrever música é complicada, o que nos

faz questionar se não haveria outra forma mais simples de escrita para o músico com DV. O

músico vidente geralmente faz esse questionamento desde o primeiro contato já nas etapas

iniciais do braille e principalmente quando se deparam com a escrita de vozes múltiplas no

Grau 5, onde as UT`s são fragmentadas.

Ainda nesse contexto de incertezas, podemos nos fazer as seguintes perguntas:

-Como o leitor experiente do braille consegue compreender o paralelismo das

vozes a partir da escrita?

-Quais as técnicas de leitura e lógica às quais o leitor do braille geralmente

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recorre?

Para responder a essas perguntas vamos explorar mais a percepção de

Agrupamentos Complexos conforme Sloboda (2008) e como isso influencia na leitura a

primeira vista de músicos videntes. Veremos também como a leitura de músicos videntes

experientes é incrivelmente semelhante à forma como a Musicografia Braille descreve os

eventos musicais.

5.2.1 A leitura de Agrupamentos Complexos nas partituras convencionais e

em braille

Segundo Sloboda (2010, p. 89) a habilidade do músico em detectar um padrão

ou estrutura na partitura está diretamente relacionada com uma boa leitura a primeira-vista.

Em uma leitura fluente, os olhos do músico vidente retorna pouco ou nenhuma vez ao

mesmo ponto em uma partitura. Ele segue adiante sem necessidade de conferir o que já foi

lido.

Mas como essa varredura do olhar é feita? Embora o estudos sobre o

movimento dos olhos na leitura musical não tem sido muito amplamente pesquisado, há

informações muito relevantes advindas desse campo. O olhar humano consegue ler o que se

encontra dentro de um círculo de uma polegada (2,54 cm) de diâmetro (a altura de um

pentagrama) a uma distância média de 30 a 40 cm, a distância em que seguramos um livro

para ler. Fora desse pequeno espaço no papel os olhos precisam se mover para colher mais

informações (SLOBODA, 2010, p. 91). Se pensarmos na partitura convencional para piano,

com duas pautas, percebemos que é impossível a apreensão de todas as notas do compasso

com apenas um ponto de fixação do olhar, ou seja, os olhos precisam se mover.

Fazendo uso de métodos especializados, foi possível detectar o caminho que o

olhar do músico vidente percorre na partitura, encontrando diferenças de acordo com o tipo

de escrita. Segue um quadro sobre como os olhos de um músico com leitura fluente

percorre a partitura convencional.

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Figura 33 – (a) Sequencia de fixação vertical na leitura pianística. (b) Sequencia de fixaçãohorizontal na leitura pianística. (c) Exemplo de uma sequencia de fixação observadaem progressão de acordes na música pianística (extraído de Weaver, 1943). (d)Exemplo de sequencia de fixação observada em música contrapontística para piano(extraído de Weaver, 1943)

Fonte: Sloboda, 2008, p. 91

Descrição para pessoas com DV – (a) são duas pautas convencionais para piano, com trêspontos na pauta de cima e três pontos na pauta de baixo. Há uma seta saindo doprimeiro ponto da pauta de cima em direção ao primeiro ponto da pauta de baixo,numa linha vertical. A partir desse ponto há uma seta na diagonal em direção aosegundo ponto da linha de cima, que dele sai outra seta vertical para o segundo pontoda pauta de baixo, que dele sai outra seta em diagonal para o terceiro ponto da pauta decima, que dele sai uma seta vertical para o terceiro ponto da pauta de baixo. (b) Asmesmas duas pautas com os mesmos três pontos em cada, mas aqui a seta percorre saido primeiro ponto da pauta de cima em direção ao segundo e depois ao terceiro, desseponto a seta volta para o primeiro ponto da pauta de baixo, que vai para o segundoponto, que vai para o terceiro ponto. (c) São duas pauta para piano com quatro gruposde acordes no mesmo compasso. Há linhas fazendo um desenho semelhante ao descritoem (a), substituindo os pontos pelo acorde feito com cada uma das mãos. (d) São duaspautas para pano com uma melodia em cada mão. Há linhas fazendo um desenhosemelhante ao descrito em (b), substituindo os pontos pelas notas da melodia.

De acordo com pesquisas feitas por Weaver (1943 apud. SLOBODA, 2010, p.

91), constatou-se que em partituras com acordes nas duas mãos (c), os olhos leem uma UT

por vez, saltando entre as pautas (a). No trecho (d) há duas vozes paralelas e, considerando

a complexidade e a capacidade de memorização do leitor, dentro do mesmo compasso o

olhar percorreu toda a primeira voz dentro do compasso e depois toda a segunda voz.

Com isso podemos fazer um paralelo com escrita musical em braille, pois nos

dois casos acontece exatamente o mesmo tipo de “coleta de dados”.

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No primeiro caso, o caminho da leitura dos acordes feito pelo olhar do músico

vidente (a) se assemelha à narrativa musical que propõem as celas de intervalos (Grau 4) na

escrita braille. Como for dito antes, o foco da visão não abrange as duas pautas e por isso os

olhos precisam saltar entre as pautas. Sendo a escrita por acordes, a maneira mais eficaz de

se ler o trecho (c) é passar acorde por acorde, exatamente como faz a Musicografia Braille

nesses casos, embora ela também faça com acordes que estejam na mesma pauta. De todo

modo a comparação me parece válida.

No segundo caso a leitura das vozes paralelas (b) é feita lendo cada voz

consecutivamente pelo música vidente com leitura a primeira vista fluente, e não de forma

contrapontística. Como já vimos antes, é exatamente assim que acontece na leitura de vozes

simultâneas na escrita braille (Grau 5).

Assim sendo, podemos afirmar que a forma como a Musicografia Braille

descreve os eventos musicais é semelhante ao percurso que o olhar de um músico vidente

com leitura fluente de partituras faz para colher as informações.

Aparentemente, a estratégia geral consiste em identificar unidadesestruturais significativas em fixações sucessivas. Na música homofônica,essas unidades são acordes, então é necessário colher amostras de ambosos pentagramas em fixações sucessivas. Na música contrapontística, asunidades significativas são os fragmentos melódicos que se estendemhorizontalmente no curso de um único pentagrama. (SLOBODA, 2010,p.92)

Antes de assimilar o Grau 5 o aluno com DV precisará ser capaz de ler cada voz

com segurança. Isso não quer dizer que a técnica do “em acorde” não possa ser

compreendida pelo aluno iniciante, mas sim que o seu domínio exige amadurecimento

musical. Após conseguir ler bem melodias (Graus 1, 2 e 3) e acordes (Grau 4), o novo

desafio desse aluno será entender como duas vozes diferentes soam simultaneamente (Grau

5). Bonilha (2010, p.100) fala sobre essa dificuldade.

Considera-se que esse tipo de leitura polifônica requer um grau deabstração bastante grande por parte do leitor em braille, dada a ausênciade representação bidimensional na partitura. Por isso, este é um conceito

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que necessita ser bem trabalhado do ponto de vista auditivo.

Nessa perspectiva a percepção bidimensional é um fator importante para o

aluno com DV desenvolver, mesmo que essa não exista na Musicografia Braille. A escrita a

duas vozes nas partituras convencionais proporciona, por meio da visão, uma percepção

bidimensional da melodia e do ritmo quase que instantânea. Em braille, sendo uma partitura

descritiva, para o aluno com DV construir a percepção bidimensional de um trecho musical

ele passa por um processo mental diferente do processo do vidente.

Sendo assim essa percepção bidimensional em música pode ser considerada

relevante para uma leitura fluente em braille. Se compararmos a partitura convencional com

um “gráfico de linha”, a altura das notas iria corresponder à orientação vertical e o decorrer

do tempo à orientação horizontal. Por exemplo, reveja as Figuras 2 e 3, comparando-as.

Essa mesma transposição para o gráfico também pode ser feita com um trecho a

duas vozes.

Figura 29 - (recapitulação) - Partitura convencional, trecho com duas vozes paralelas.

Figura 34 – representação gráfica do desenho melódico da partitura convencional da figura29, que é o mesmo da partitura em braille da figura 30

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Descrição para pessoas com DV: Há cinco linhas representando uma pauta e ao invés dehaver notas musicais, conforme uma partitura convencional, há uma linha azul acima eoutra verde a abaixo. Elas fazem o desenho melódico da partitura em braille da figura30. No alto está escrito “Desenho Melódico” e embaixo há uma pequena linha azul eoutra verde, respectivamente seguidas do escrito “Voz 1” e “Voz 2”, indicando o querepresenta cada linha.

No segundo gráfico, cada ponto ao longo da linha corresponde ao tempo de

uma semicolcheia. Com isso se torna possível a observação do contraponto das notas das

duas vozes e em como esse delineamento é visível na escrita musical convencional, ou seja,

o músico vidente tem a informação bidimensional na própria escrita. Neste ponto da

pesquisa já temos a clara percepção de que o mesmo não acontece na escrita em braille. O

leitor com DV precisará construir mentalmente o desenho bidimensional da melodia a partir

de informações descritivas.

Para apoiar essa tarefa de aprendizagem, Bonilha (2010, p. 57) aponta que se

deve apresentar para o aluno obras polifônicas, como fugas e corais, com o intuito de

inseri-lo no campo da escrita musical de vozes. A aprendizagem de regras de contraponto

também favorece a compreensão da polifonia na leitura em braille.

Esses conteúdos teóricos fazem parte de um campo de estudo que Sloboda

(2008, p. 203) chama de “mecanismos primitivos de agrupamento em música”. Essa área

busca encontrar mecanismos e propensões naturais do sistema auditivo humano que podem

definir como ouvimos agrupados os sons musicais. Para a aprendizagem, os resultados

desses estudos demonstram a importância do desenvolvimento perceptivo quanto à relação

entre os sons, não de forma isolada, e também da identificação dos agrupamentos simples e

complexos mais significativos.

Sloboda (op. cit., p. 217) afirma que o ouvinte agrupa na memória frases,

melodias e estruturas a partir do reconhecimento de pequenos padrões sonoros ou células

rítmicas e do reconhecimento das estruturas internas da obra. “A percepção dos eventos

musicais requer do ouvinte atenção para os aspectos gerais do trecho e memória de eventos

passados que tem relações importantes com o material corrente.” Mas como o leitor com

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DV faz essa tarefa na prática?

5.2.2 Experiências de um leitor com deficiência visual

Perguntei para o músico pesquisador e orientador dessa pesquisa, Prof. Dr.

Vilson Zattera, algumas questões relativas à sua leitura pessoal. Ele é músico com

deficiência visual e conhece profundamente a Musicografia Braille, usada tanto para a

música erudita quanto para a música popular.

Primeiramente, o método de leitura é relativo à complexidade do trecho a ser

lido, que é variável de acordo com determinadas características da melodia e do ritmo. Por

exemplo, dependendo em que Etapa de cada Grau a partitura em questão se encontra, a

dificuldade em memorizar pode se maior ou menor. De acordo com essa complexidade e

com a capacidade pessoal de memorização do leitor, ele poderá ler uma UT por vez, mesmo

que elas estejam fragmentadas dentro do compasso (Grau 5), fazendo com o que um

mesmo trecho seja lido mais de uma vez para não se perder na partitura.

A necessidade de se ler o mesmo trecho musical mais de uma vez indo e

voltando na partitura é porque, embora haja o uso do “em acorde total”, foi preciso ler cada

UT por completo antes de seguir para a próxima. Casos assim acontecem quando, em cada

UT, o trecho musical tem notas com valores de tempo diferentes entre si e/ou entre as duas

vozes, além de informações adicionais de dinâmicas. Ou seja, quando a UT está

fragmentada e é mais rica em detalhes, a leitura é feita na primeira UT de cada voz para se

compreender como elas se relacionam apenas nesse tempo. Um trecho com poucas notas,

melodias com menos saltos intervalares (Grau 3) e uma boa memória musical são fatores

que facilitam ler mais UT`s “ao mesmo tempo”, dentro de um compasso em braille.

Nesse contexto, ter um bom solfejo e conhecer teorias sobre harmonia tonal

podem realmente contribuir para melhorar a leitura de vozes simultâneas em braille. O

solfejo permite o leitor ouvir o que está sendo lido sem a ajuda intermediária de um

instrumento e a harmonia permite reconhecer padrões de arpejos, escalas e cadências de

99

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acordes. Podemos presumir que quanto mais próximo de escalas e arpejos é a melodia

(questão relativa ao campo harmônico), mais simples deverá ser a memorização do trecho.

Detectamos que a memória mecânica/espacial do instrumentista também deve

ser incluída como uma capacidade que auxilia na leitura. Ao ler um trecho o músico com

DV pode imaginar o gesto físico que deverá ser feito para sua execução em seu

instrumento, assim como pode fazer o músico vidente, tarefa que pode ajudar na

memorização.

A percepção da polirritmia também é uma habilidade importante para ser

desenvolvida no aluno com DV, pois facilita o reconhecimento de como soaria a

superposição das vozes ainda na fase do solfejo.

Esses pontos foram levantados a partir de conversar com leitores de partituras

em braille e observações pessoais, mas tais pontos merecem ser aprofundados de forma

mais completa por outras pesquisas. Aqui nos limitaremos a apenas citá-los.

5.2.3 Quadro das Etapas

A partir desses dados podemos formar o quadro de Etapas do Grau 5. No Grau

5 as Etapas não possuem a intenção de propor uma progressão, mas sim de relacionar os

tópicos que o compõem.

Tabela 6 - Etapas do Grau de Dificuldade 5

Etapas do Grau de Dificuldade 5

Descrição do conteúdo

1 Percepção bidimensional da linha melódica

2 Agrupamentos simples (aprofundamento do Grau 2)

3 Agrupamentos complexos (estruturas musicais)

4 Contraponto (superposição de linha melódicas)

5 Polirritmia (superposição de linha rítmicas)

6 Harmonia tonal e polifonia

7 Memória mecânica/espacial em um instrumento musical

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8 Solfejo

Muito professores defendem que o contato do aluno com DV com a escrita

convencional deve ser feito porque ajuda na comunicação com os músicos videntes e ajuda

a compreender melhor a formação da Musicografia Braille, além de ir em direção à

curiosidade e conhecer esse sistema.

Contudo, na minha opinião, acrescento que o primeiro contato com os conceitos

musicais deve ser feito através do sistema braille, delegando prioridade secundária às

partituras convencionais. Dessa forma a cognição do músico com DV fica fundamentada

em conceitos próprios do sistema braille, e não do sistema convencional de “partituração”,

o que se supõe ser um contato mais direto com os conceitos musicais moldados de acordo

com a escrita braille.

5.3 As Etapas do Grau 5 são Conteúdos Complementares à todo o ensino em

braille

No entanto as Etapas do Grau 5 deveriam ser vistas gradativamente em

profundidade desde o Grau 1, onde haveria pequenas inserções desse conteúdo em

exercícios e nas explicações. Como esse conteúdo é complexo e envolve muita prática, ele

não deve ser introduzido de uma só vez após o Grau 4. Essas Etapas do Grau 5 também

poderiam ser chamadas de Conteúdos Complementares.

Encarar dessa forma essas Etapas como conteúdos gerais tem se revelado uma

alternativa natural para o ensino de conceitos teóricos mais complexos. Geralmente são

assuntos que podem ser aprofundados a medida em que são revisitados em sala de aula ou

simplesmente são inseridos na aula a medida que se torna necessária a sua utilização.

Há alguns tópicos que também podem ser incluídos nos Conteúdos

Complementares e que não se encontram nas Etapas do Grau 5. Eles se compreendem por:

“nuances, ligaduras, dedilhados, dinâmica, ornamentação. Há também que se destacar

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variadas formas de abreviações comumente utilizadas em braille, incluindo: repetições

parciais, abreviação de sequencias, duplicação de símbolos” (BONILHA, 2010, p.58).

Mesmo que o aluno aprenda formalmente todas essas técnicas e regras de

escrita, a compreensão real acontece de forma pessoal, exigindo tempo para adquirir

experiência e maturidade na escrita/leitura de partituras em braille.

Por exemplo, o dedilhado pode ser visto tanto no Grau de Dificuldade 1 quanto

no Grau de Dificuldade 2 ou 3. Isso vai depender dos objetivos e planejamento do

professor. O momento da sua abordagem deve ser escolhido de acordo com o

desenvolvimento das aulas e instrumento utilizado, com o intuito de facilitar ou criar novos

desafios para o aluno durante o seu aprendizado, enriquecendo e renovando o interesse do

aluno pelas aulas.

O assunto das tonalidades e armaduras de clave (Grau 5 - Etapa 6) também

pode ser tratado dessa forma. Ambos podem ser apresentados no decorrer das aulas, de

acordo com as partituras escolhidas pelo professor. O aluno não precisa conhecer de uma só

vez todas as armaduras de clave de todos os tons sustenidos e bemóis, elas podem ser

introduzidas gradativamente no decorrer dos diferentes Graus de Dificuldade.

Conforme os dados levantados até aqui, essa seria a tabela dos Conteúdos

Complementares:

Tabela 7 – Conteúdos Complementares

Tabela 7 – Conteúdos Complementares

Descrição do conteúdo

1 Nuances

2 Ligaduras

3 Dedilhados

4 Dinâmica

5 Ornamentação

6 Repetições

7 Abreviação de sequencias

8 Duplicação de símbolos

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9 TODAS AS ETAPAS DO GRAU 5

Vale salientar que as ligaduras, que são sinais expressivos importantes para os

iniciantes, mas que podem trazer certa complexidade para a escrita, podem ser introduzidos

nas aulas de forma lúdica sem a necessidade da escrita. Por exemplo, poderia ser

apresentado em uma aula o conceito das ligaduras em uma melodia, mas sem escreve-las

em braille, enfatizado musicalmente o fraseado existente nas músicas estudadas.

Esse mesmo procedimento poderia ser feito com as Nuances, Dedilhado,

Dinâmica e Ornamentação.

103

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CAPÍTULO 6 - QUESTIONAMENTOS CONCLUSIVOS

As perguntas a seguir estão presentes ao longo desse texto e aqui são retomadas

para serem respondidas sob a luz dos resultados dessa pesquisa. Essas respostas não devem

ser consideradas como definitivas, uma vez que esse campo é novo e muitos estudos ainda

devem ser formulados. Algumas questões até poderiam ser respondidas de outras maneiras,

mas aqui será dada uma visão geral sobre as inquietações que moveram esse trabalho e as

respostas obtidas através dos estudos consultados.

1) Como a ausência do sentido da visão influencia na aprendizagem musical

das pessoas com DV?

A capacidade de aprendizagem das pessoas com DV é realizada através do tato

e da capacidade da comunicação verbal, sendo essas as duas vias de maior importância para

o entendimento de novos conceitos ou ideias (cf. COLL et al, 1995).

Também percebemos que a audição não se torna mais aguçada ou

superdesenvolvida, mas sim que a pessoa cega é capaz de extrair mais informações das

variações sonoras do ambiente porque está mais atenta a essa via sensorial. Esses mesmo

sinais chegam para as pessoas videntes, mas essas não sabem reconhecer o que significam

porque nunca precisaram usar esse sentido dessa forma.

A capacidade musical ou a musicalidade também não é alterada, sendo mais

relacionada com a história de vida de cada pessoa com relação à música ou o fazer musical

(cf. OLIVEIRA, 2013 e HERRERA, 2010)

A diferença entre a aprendizagem entre as pessoas com ou sem DV está apenas

nas vias sensoriais pelas quais ela acontece, pois para ambas as pessoas essa assimilação

acontece através da experiência com o mundo, na relação com o outro. Dessa forma o

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ensino especializado deve atentar a transmitir informações valorizando os sentidos certos

para a construção do conhecimento nas pessoas com DV e não perder o objetivo final, que

deverá ser comum a todas as pessoas de forma suficiente para que a comunicação possa ser

estabelecida de forma natural e fluente. No nosso caso, esse sistema sígnico em comum são

os conceitos musicais grafados em braille.

2) É fundamental desenvolver metodologias musicais diferenciadas para

pessoas com DV? Não basta transcrever um método musical convencional para o sistema

braille?

As partituras convencionais são escritas musicais que se assemelham a gráficos

de linha, usando a orientação vertical para as alturas de notas e horizontal para o tempo,

entre outras indicações paralelas. As partituras em braille são explicitamente descritivas,

narrando os eventos musicais de forma organizada e precisa conforme as partituras

convencionais. Perceber isso deve ser suficiente para compreendermos a importância da

utilização de métodos musicais exclusivos para a Musicografia Braille, ou que ao menos a

considere para tornar um processo de aprendizagem musical inclusivo junto a alunos

videntes.

Por esse mesmo motivo, transcrever um método de música baseado nas

partituras convencionais para o sistema braille se torna inapropriado para o ensino

especializado que pretende adentrar a Musicografia Braille.

3) Há métodos especializados nesse ensino?

Por esse campo de estudo ser recente, temos disponíveis muitos relatos de

experiência, que geralmente não são referências entre si. Entre esses, poucos fazem uso do

ensino da Musicografia Braille, se restringindo a desenvolver atividades musicais ou a

prática de um instrumento sem a utilização de partituras em braille.

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Verificamos que os métodos musicais tradicionais não tratam do ensino de

partituras em braille. Encontramos nas experiências de Rodrigues (2014), Chávez (2010),

Silva e Araldi (2010), Junior (2010), Herrera (2010) e Bohn (2008) relatos de como lidaram

com a tarefa de ensinar música para pessoas com deficiência visual, mas nenhum deles trata

do ensino da Musicografia Braille.

Poucos materiais tratam diretamente desse assunto, havendo ainda muito que

ser experimentado e pesquisado.

4) Existem programas de computador que criam partituras em braille que

poderiam ajudar nessas aulas especializadas?

Os programas de computador podem auxiliar na parte prática das aulas,

ajudando a criar exercícios, fazer correções rápidas, ouvir o que está sendo escrito pelo

aluno, etc. Podem ser ótimas ferramentas para o aluno criar suas músicas, anotações em

aulas ou imprimir partituras em braille ou em formato convencional.

No entanto, os programas trabalham muito bem até determinado Grau de

Dificuldade. Por exemplo, o MusiBraille (programa gratuito já citado anteriormente)

atualmente abrange até o Grau 3 com qualidade. No Grau 4 ele consegue escrever em

braille e soar o que foi escrito, mas o visor que mostra a correspondência na escrita musical

convencional ainda não funciona corretamente. Isso diminui algumas opções de inclusão

em sala de aula, como permitir que o professor vidente não conhecedor do braille, possa ler

o que o aluno com DV escreveu. Esse programa ainda não rabalha com o grau 5 e alguns

dos Conteúdos Complementares são atendidos.

Já o Programa pago GoodFeel Music Translator atende até o Grau 5 com

precisão, transcrevendo partituras convencionais digitalizadas no Lime Aloud Music

Notation ou importadas para esse através do formato “MusicXML”. Há nele uma rica gama

de opções para transcrição. A edição ou escrita feita diretamente em braille pelo GoodFeel

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pode ser feita apenas pelo aparelho Braille Display27, de custo muito elevado. Esse

programa não transforma o teclado do computador na digitação Perkins (já dito

anteriormente), o que dificulta a correção após a transcrição de arquivos importados.

De todo modo, o uso de softwares especializados não interfere diretamente na

metodologia de ensino especializada. O planejamento atento às particularidades das

partituras em braille deve estar sempre orientando o uso das tecnologias, para que a

formação musical do aluno seja alicerçada nos principais conceitos e habilidades que a

Musicografia Braille exige de seu leitor.

5) Como universidades têm lidado com a questão da inclusão quando um aluno

com DV busca entrar em seus cursos música? Quais as questões e problemas que emergem

nessas situações de vestibular?

As universidades brasileiras não estão prontas para receberem alunos com DV

em seus cursos de música. Nelas não existem programas fixos de Musicografia Braille que

possam promover iniciativas para atrair pessoas interessadas nesses cursos e acompanhar

um graduando com DV ao longo de sua jornada. Apenas quando há a inscrição desses

alunos para o seu vestibular é que acontecem reflexões por parte dos professores sobre essa

questão ao tentar aplicar uma prova o máximo possível justa. Nessa prova se pretende

avaliar o potencial do aluno, se ele tem os conhecimentos e habilidades musicais mínimas

esperado de seus novos alunos.

Nesse momento surge uma questão para os professores, já que, se o aluno for

aprovado, eles não sabem como serão ministradas as suas aulas. Geralmente há duas

alternativas: cria-se um grupo especializado para dar assistência ao aluno, mas assim que

ele se forma, essas iniciativas tendem a se dissolver; cada professor procura incluir o aluno

27Aparelho que ao ser conectado no computador, mostra em uma linha de pontos salientes a linhaem que o cursor está na tela do computador. Permite ler e digitar em braille, assim como acessartodas informações do computador. Mais informações: https://www.humanware.com/en-usa/products/blindness/braille_displays.

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da maneira que é capaz ou acredita ser possível.

Algumas universidades possuem núcleos de apoio à acessibilidade que

geralmente facilitam essa tarefa, no entanto, especificamente para a música, é preciso o

apoio de especialistas em Musicografia Braille. Mas como esse campo é recente, existem

poucos profissionais disponíveis e poucas pesquisas com resultados efetivos.

Dessa forma é complicado pressupor se o curso facilitou ou dificultou a entrada

de alunos com DV devido a questões culturais, crenças errôneas, posturas pessoais,

preconceitos, etc. Tais variáveis pode fazer com que uma avaliação que pretenda ser

equânime com todos os candidatos se torne mais difícil ou mais fácil para as pessoas com

DV.

De modo geral, considerando uma prova que se tornou mais difícil, podemos

imaginar que a banca examinadora exigiu que o aluno demonstrasse estar preparado para

realizar a sua própria inclusão no curso, já estando apto para enfrentar os desafios

intrínsecos a esse campo. Se considerarmos uma prova que se tornou mais fácil, isso pode

transmitir a sensação de que foi dada uma oportunidade para que o aluno se forme da

maneira que for possível, já que não há como saberem o que de fato é importante para a sua

formação como músico com DV. Podem considerar “muito difícil” ler e ensinar partituras

em braille, delegando-lhe um papel secundário na sua formação, e por vezes facilitar a

oportunidade de estudos como uma aparente inclusão ou assistencialismo.

Nos dois casos apresentados acima pode ter havido um excesso na suposição,

mas são duas situações que poderiam coexistir num mesmo grupo de professores que

recebem em sua porta alunos com DV. Ao buscarem por alternativas para fazer uma prova

justa e demonstrar que valorizam a acessibilidade tratando todos iguais, excluem a

possibilidade de que o “tratamento igualitário” já não acontece na formação musical de

base e que uma “prova imparcial” é na verdade injusta socialmente.

Portanto, é necessário um estudo mais aprofundado da realidade da música na

vida das pessoas com DV para realizar uma real acessibilidade na própria formatação dos

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cursos de música. A atuação de especialistas desse campo nesse tipo de situação se torna

essencial e exige tempo de preparo e reformulação do curso, não podendo ser

legitimamente feito as vésperas de uma prova de vestibular.

6.1 Considerações finais

A classificação das partituras, conforme os cinco Graus de Dificuldade, foi

baseada nos sete tópicos apresentados por Bonilha (2010, p. 52 et seq.) ao buscar delinear o

aprendizado da Musicografia Braille. Então, com partituras atribuídas a cada um desses

Graus, fizemos análises alicerçadas na Teoria Sistêmica de Produção (ANDERSON,1981,

1982 apud. SLOBODA, 2010, p. 285) com o intuito de ressaltar os conceitos que estão

presentes em cada partitura em braille. O resultado obtidos das análises foram quadros com

a subdivisão de cada um dos 5 Graus de Dificuldade em Etapas, propondo um

encadeamento de conceitos que não são necessariamente contínuos.

Essa característica é conferida aos quadros aqui expostos se considerarmos a

notação musical em um plano inferior ao da musicalidade, de forma a permitir o professor

escolher o que deve ser ensinado ao aluno em determinado momento do aprendizado. Essas

tabelas devem lhe servir como “conselheiros” ao apontar os conteúdo que compõe cada

desafio de aprendizagem da Musicografia Braille.

Com base nas classificações de Grau de Dificuldade e suas respectivas Etapas,

esperamos que os dados apresentados nesta pesquisa sejam úteis para professores de

Musicografia Braille aos lhes fornecer parâmetros para estruturar seu planejamento de aula.

Isso deve favorecer para que suas aulas ganhem mais qualidade ao voltar-se para os

conceitos que compõe cada desafio de aprendizagem e para as habilidades mais importantes

para o leitor do braille, lembrando que alguns desses pontos não têm a mesma relevância

que têm para os músicos videntes.

Esse suporte teórico também pode favorecer cursos de música aos lhes oferecer

fundamentos para reestruturar sua grade curricular, ou criar um novo curso, de forma que

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pudesse atender às necessidades do músico que irá trabalhar com partituras em braille.

Assim como possibilitar a elaboração de provas de admissão com mais paridade de

condições entre as pessoas com e sem DV.

Nesse caso, por exemplo, uma universidade que queira ter um curso de

Musicografia Braille para pessoas com DV poderia oferecer para a comunidade local cursos

preparatórios de música para o vestibular em braille. Nessas aulas poderia ser ensinado até

o Grau de Dificuldade 3, sendo então razoável cobrar em uma prova de aptidão questões

que abordem os conceitos de até esse Grau. Nada impede incluir na prova questões que

avaliem a capacidade do aluno em compreender os Graus 4 e 5, desde que fossem avaliadas

apenas as suas capacidades cognitivas, sem envolver diretamente a leitura de partituras

desses Graus mais avançados, tendo em vista que esses Graus serão vistos dentro do curso.

Dessa forma, a parte teórica da grade curricular desse curso seria voltada para

aprimorar os Graus 1 ao 3, ensinar e aprofundar os Graus 4 e 5 e desenvolver ao longo do

curso os Conteúdos Complementares. A parte prática desse curso também poderia ter

relação com esse planejamento, mas de forma mais flexível.

Ao final desse curso, o aluno precisará ter assimilado e praticado todas as

Etapas que compõem cada um dos cinco Graus de Dificuldade e dos Conteúdos

Complementares para ter uma formação teórico-musical sólida. O curso deve lhe

proporcionar o contato gradativo e sistemático com todos os desafios de aprendizagem da

Musicografia Braille, ajudando-lhe a vencer cada um deles.

Verificamos que para o ensino da Musicografia Braille acontecer de forma

efetiva, é necessário que exista uma metodologia especializada por se tratar de um sistema

diferente do qual os músicos videntes alicerçam o seus conhecimentos teórico-musicais.

Claramente vimos que não basta fazer uma tradução para o braille dos métodos tradicionais

da educação musical sem a devida atenção e sem alguns conhecimentos do campo da

acessibilidade.

A confecção de partituras em braille também exige a participação de um

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especialista para que a partitura transcrita atenda às necessidades de seu objetivo, que pode

ser para uma prova, uma aula ou um método para estudantes de níveis diferentes. Para a

prova deve se considerar o que será avaliado no aluno, quais os pré-requisitos que se espera

que o aluno tenha e o que o curso pode oferecer para a sua formação final. As partituras de

uma aula devem estar de acordo com o conteúdo que já foi assimilado e o que se pretende

nesse ponto do ensino, assim como o instrumento musical que o aluno utiliza, a sua

compreensão dos Conteúdos Complementares e dos diferentes formatos possíveis de

partitura.

Questões sobre a formatação de partituras em braille não fizeram parte desse

estudo por tratar de outro tipo de complexidade, fugindo do escopo dessa pesquisa. No

entanto, poderíamos classificá-las como sendo do Grau de Dificuldade 5 porque tangem

questões relativas à das vozes paralelas. Esse assunto é importante para os estudos sobre

partituras de piano e o seu ensino, pois trabalham com duas pautas, e para análises de peças

com formações instrumentais diversas.

A progressão no uso das formatações de partituras em braille para pianistas

iniciantes é um tema para outro estudo dada a sua nova gama de possibilidades de

avaliações e observações. A análise de peças em braille escrita para mais de um instrumento

é tarefa para estudantes avançados de música, o que também requer novas pesquisas apenas

para esses temas. Dessa forma temos aqui duas sugestões de trabalhos que podem ser

desenvolvidos nesse campo de estudo.

Constatamos que esse campo de estudo é novo no Brasil e por isso os estudos

especializados no ensino da Musicografia Braille são poucos se comparado com o de outros

campos da educação musical. No entanto, já há um saber construído a partir de várias

experiências relatadas, conversas com professores brasileiros de Musicografia Braille com

e sem DV, retorno de alunos a respeito do seu aprendizado e comparações produtivas com

outros campos do conhecimento como o que fizemos nessa dissertação.

Atualmente estão surgindo pesquisas em diversas universidades brasileiras

sobre esse assunto. Em breve será producente fazer uma leitura e síntese de tudo o que tem

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sido feito com o intuito de encontrar os assuntos para o quais essas pesquisas ainda não se

voltaram, apontado onde novas pesquisas ainda podem nos trazer mais entendimento. O

desenvolvimento de métodos em braille para instrumentos musicais também é um campo

ainda muito vasto para ser expandido, seja para o nível iniciante, intermediário ou

avançado.

Além disso, é necessário criar ações de efeito prático dentro e fora das

universidades, divulgando a Musicografia Braille, ofertando cursos de musicalização para

pessoas com DV, cursos de instrumento para alunos iniciantes com partituras em braille e

estruturando cursos de conservatórios e de graduação para que possam formar músicos com

uma instrução consistente na utilização das partituras em braille.

A tendência internacional em abandonar o braille em prol do uso da voz

gravada ou sintetizada é um assunto muito debatido desde o advento das tecnologias

inclusivas. Esse assunto é extenso e não vou entrar em detalhes. Resumidamente, segundo

Souza (2001), se vê de um lado pessoas com DV que defendem veementemente o uso do

braille, sendo essas as pessoas com mais estudos e com melhores oportunidades de trabalho

e que geralmente atribuem o seu sucesso ao conhecimento do braille, e do outro lado

entusiastas da informática que desqualificam o braille e que por vezes geram mitos, tais

como: o braille é antissocial e segregador, não pode ser impresso em cores, não é atraente,

não pode representar gráficos, é difícil a sua descodificação para a leitura ocular, havendo

ainda outros mitos que revelam desinformação nesse campo. Segundo Souza (2001):

O sistema braille não é um sistema fechado e anti-social; fechadas são aspolíticas de produção do texto braille, que geralmente não providenciamlivros didáticos e outros em tempo real, trazendo à criança cega odesconforto de ser discriminada todos os dias, nas escolas regulares deensino, ou de ter acesso à escolarização de um modo muitas vezesdefasado, nos estabelecimentos especiais de ensino. O braille precisa serdescoberto em suas possibilidades estéticas; a pedagogia precisa inventarestratégias que recuperem na criança cega e nos professores, o amor poressa conquista. os livros precisam ser instrumentos que despertem oprazer da leitura e do manuseio. Finalmente, para os que acham o brailleintratável aos olhos, as novas tecnologias de impressão já permitem obraille a cores e também já é possível a ampliação dos pontos, para uma

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leitura ótica mais adequada.

A opnião de pesquisadores do campo sobre o Sistema Braille é que as

tecnologias devem ser incluídas na vida das pessoas com DV junto ou após a alfabetização.

Elas devem servir como apoio e não como substituto (ARAUJO, 2013). Segundo Moysés

Bauer, presidente da Organização Nacional dos Cegos do Brasil (CARDOSO, 2010) “A

tecnologia é um elemento de inclusão social no País”, diz. “Mas é preciso cuidado para que

não haja uma desbrailização por conta dá má utilização dessas inovações”.

Nesse sentido, para o campo da Musicografia Braille, a meu ver, as tecnologias

apresentam mais alternativas de registro e expansão de possibilidades de seu uso, isso é

além de viabilizar transcrições de partituras convencionais para o braille e vice-versa. Por

ser descritivo sistema de escrita musical em braille, como vimos ao longo dessa pesquisa,

se o colocarmos em um ambiente onde não se escreve em braille, a Musicografia poderia

ser transformada em um estudo sobre “como descrever uma partitura” ou

“Musicodescrição”.

Isso é plausível porque cada cela de uma partitura em braille pode ser narrada

ao invés de escrita, bastando manter a ordem original das celas e informando apenas o que

elas representam. Isso pode ser feito tanto a partir de uma partitura em braille quanto de

uma partitura convencional. Por exemplo, se neste momento gravássemos uma descrição de

uma partitura em braille, narrando as celas corretamente, um leitor de partituras em braille

poderia compreender perfeitamente o que está sendo transmitido.

Essa forma de trabalhar com as partituras em braille também poderia

desenvolver a capacidade do aluno com DV em ler partituras, como um exercício, pois traz

novas formas de perceber um assunto já conhecido além de permitir novas possibilidades

de utilização que no momento não podemos supor. Certamente que esse tipo de exercício

poderia ser feito com músicos videntes, proporcionando-lhes novas formar de perceber a

própria grafia convencional e desenvolvimento de novas técnicas de ensino musical.

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BONILHA, Fabiana Fator Gouvêa. Leitura musical na ponta dos dedos: o ensino da Musicografia Braille. ANPPOM, Brasília, 2006.

28 Baseadas na norma NBR 6023, de 2002, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)

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Apêndice I - Introdução à Musicografia Braille

Esse apêndice pretende apresentar os principais tópicos e questões sobre a

Musicografia Braille de forma breve, dando exemplos e referências para consultas no

próprio Manual Internacional de Musicografia Braille (KROLICK, 2004), que também

serviu de base para a elaboração desse texto e de onde foi tirado alguns dos exemplos

usados a seguir. Tais exemplos serão indicados pela sua página e número do texto original,

as imagens sem citação foram criadas pelo próprio autor do texto.

Não há aqui sugestão de exercícios para o desenvolvimento desses conteúdos e

nem a sua organização está de acordo com o ensino para pessoas com deficiência visual, se

concentrando apenas em servir para consultas por pessoas conhecedoras desse sistema ou

que queiram brevemente se inteirar da natureza dessa grafia.

Afirmo que o músico vidente que sabe ler partituras convencionais terá

considerável facilidade para compreender esse sistema. A sua tarefa será compreender

como as regras da escrita já conhecida serão transpostas para a escrita em braille,

consultando no texto a seguir a sua correspondência e regras de uso.

1 O Sistema Braille

O sistema baseia-se na formação de seis pontos em relevo que formam a cela

Braille, configurada e numerada da seguinte forma:

Estes 6 pontos formam 63 combinações diferentes, com as quais se repetem as

letras do alfabeto, os sinais de pontuação, os números, a notação musical e científica.

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A simplicidade do alfabeto Braille permite grande facilidade de aprendizagem.

Conhecendo-se dez sinais da primeira linha que estão colocados na parte superior da cela

(pontos 1, 2, 4 e 5) já se tem a base para 50 combinações.

a b c d e f g h i j

A segunda linha é derivada da primeira acrescentando-se o ponto 3.

k l m n o p q r s t

A terceira linha forma-se pelo acréscimo dos pontos 3 e 6.

u v x y z ç é á è ú

A quarta linha é formada pela primeira linha com o acréscimo do ponto 6.

â ê ì ô ù à ï ü õ ò ou w

A quinta linha é formada pela transposição da primeira linha para a posição

inferior dos pontos na cela.

, ; : . ? ! ( ) “ * ”

Celas além das cinco linhas:

í ã ó

Todas as letras são reconhecidas como minúsculas. Para maiúsculas uma cela

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com os pontos 4 e 6 é colocada anteriormente.

O Sistema Braille é empregado por extenso, isto é, escrevendo-se a palavra,

letra por letra; ou de forma abreviada, adotando-se o código especial de abreviaturas para

cada língua ou grupo linguístico. O Braille por extenso é denominado grau 1 ou integral. O

grau 2 é a forma abreviada, empregada para representar as conjunções, preposições,

pronomes, prefixos, sufixos, grupos de letras que são comumente encontrados nas palavras

de uso corrente. A principal razão de seu emprego é reduzir o volume dos livros em Braille

e permitir o maior rendimento na leitura e na escrita. Uma série de abreviaturas mais

complexas forma o grau 3, que requer conhecimento profundo da língua, boa memória e

sensibilidade tátil muito desenvolvida por parte do leitor cego.

No que se refere ao Sistema Braille abreviado, é importante ressaltar que, por

orientação da Comissão Brasileira de Braille Integral e Abreviado, com base nos resultados

obtidos na pesquisa sobre a aceitação ou não do Sistema Braille Grau 2 da Língua

Portuguesa pelos leitores cegos brasileiros, está totalmente abolido o uso desse sistema na

transcrição de quaisquer obras pelos centros de produção e imprensas Braille do Brasil, a

partir de 1º de janeiro de 1996. A Comissão Brasileira de Braille Integral e Abreviado

recomendou, ainda, a elaboração de um sistema padronizado de abreviaturas Braille da

Língua Portuguesa, para ser usado exclusivamente na escrita individual. Esse sistema está

sendo preparado por técnicos devidamente capacitados.

2 Notas musicais e pausas

Uma única cela braile indica a nota musical e o seu tempo, sendo que cada linha

do sistema braile remete à dois tempos musicais diferentes. Os valores conjugados são:

semibreve com semicolcheia, mínima com fusa, semínima com semifusa e colcheia com

quartifusa.

Para definir qual valor de tempo está sendo representado, deve-se observamos o

número de vezes que ele incide no mesmo compasso, geralmente isso já é suficiente. Nos

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casos em que a ambiguidade existir, haverá um símbolo especial indicando se o que vale é

o valor menor ou maior (cf. KROLICK, 2004, p. 19)

As notas correspondem da quarta a décima cela de cada linha, respectivamente

de “dó” à “si.” São elas:

- Colcheias - primeira linha braile a partir da quarta cela.

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

- Mínimas e fusas - segunda linha braile a partir da quarta cela (acréscimo do

ponto 3).

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

- Semibreves e semicolcheias - terceira linha braile a partir da quarta cela

(acréscimo dos pontos 3 e 6).

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

- Semínimas e semifusas - quarta linha braile a partir da quarta cela (acréscimo

do ponto 6).

Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si

As pausas seguem o mesmo compartilhamento de significado de tempo que as

notas.

Colcheia (pontos 1, 3, 4 e 6)

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Mínima / Fusa (pontos 1, 3 e 6)

Semibreve / Semicolcheia (pontos 1, 3 e 4)

Semínima / Semifusa (pontos 1, 2, 3 e 6)

3 Compasso

No braille, os números são indicados com as celas da primeira linha antecedidas

pela cela (pontos 3, 4, 5 e 6). Ou seja:

1 = 2 = 3 = 4 = 5 = 6 = 7 = 8 = 9 = 0 =

O sinal de compasso vem no começo da partitura, assim como na partitura

convencional. A Unidade de Tempo (UT) é o sinal numérico correspondente deslocado uma

linha abaixo na cela Braille. A Unidade de Compasso (UC) é escrita sem alterações.

Exemplos de compassos:

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A mudança de compasso é indicada pelo uso da cela em branco. Há casos de

partituras que após a indicação de compasso, há um espaço em branco e logo já é seguido

por notas. Outros casos, após a escrita do compasso, as notas começam na próxima linha. A

diferença é uma questão de escolha pessoal do transcritor ou do leitor quando pode optar

por essa formatação.

4 Alterações de nota

Aparecem antes das notas, assim como na partitura convencional. Os sinais

valem até o final do compasso ou até serem anulados ou trocados por outro sinal de

alteração ou acidente.

Sustenido (pontos 1, 4 e 6)

Bemol (pontos 1, 2 e 6)

Dobrado sustenido (duas celas de sustenido seguidas)

Dobrado bemol (duas celas de bemol seguidas)

Bequadro (pontos 1 e 6)

5 Armadura de Clave

É necessário o conhecimento da sequência dos sustenidos e dos bemóis.

Após a indicação do compasso se encontrará a armadura de clave.

Bemóis: si, mi, lá, ré, sol, dó, fá / Sustenidos: fá, dó, sol, ré, lá, mi, si

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Sol Maior Ré Maior

Lá Maior Mi Maior

Como visto no exemplo, acima de três alterações na armadura, usa-se indicação

de número antecedendo a alteração em questão.

Réb Maior Solb Maior

6 Ponto de Aumento

Usado logo após a nota pontuada: (ponto 3)

Ponto duplo de aumento

Usado logo após a nota pontuada: (ponto 3; ponto 3)

Ex:

7 Fermata

Inserir depois da nota a ser prolongada: (pontos 1, 2 e 6; pontos 1, 2 e 3).

Ex.:

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8 Andamentos

Toda palavra de uma partitura convencional deve ser escrita em braile.

Nesses casos as celas que representam letras deverão ser precedida pelo “Sinal de Palavra”

ou “Prefixo Literário”, representado pela cela: (pontos 3, 4 e 5).

Isso vale para letras isoladas, abreviaturas, palavras completas ou grupo de

palavras.

Para uma ou duas palavras se usa o Prefixo literário antes de cada uma. Caso

seja uma frase grande, usa-se o sinal antes da primeira palavra e novamente após a última.

Na continuação vem um espaço em branco e a nota que segue vem com indicação de

oitava.

A língua padrão para a escrita em partituras em tinta é o italiano, também

respeitada em braile.

-Allargando -Rallentando

-Ritardando -Ritenuto

-Accelerado -Affretando

-Stringendo

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Andamento indicado por metrônomo

9 Ligaduras

As ligaduras possuem funções diferentes de acordo com o instrumento. Para as

cordas significam mudanças no sentido arco; nos metais os lugares onde se respira, assim

como no canto e nas madeiras; no piano é uma questão sensível de sonoridade.

Ligadura de prolongação para uma nota

(ponto 4; pontos 1 e 4)

Usada entre notas de mesma altura para somar os seus valores. Estando

separadas por mudança de compasso, esse sinal aparece apenas sucedendo a primeira nota.

Para maiores detalhes cf. KROLICK (2004, p. 55). Ex.:

Ligadura de expressão entre notas ou acordes

(pontos 1 e 4)

É usado para ligaduras sobre até quatro notas. O seguinte sinal aparece depois

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de cada nota, exceto na última. Assim ele fica entre todas as notas que estão ligadas. Ex.:

Quando há mais de quatro notas dentro da mesma ligadura, temos duas

opções:

Ligadura de fraseio para mais de quatro notas ou acordes

A primeira opção é indicar duas vezes a cela anterior depois da primeira nota

ligada e uma vez antes da última nota ligada. Exemplo (KROLICK, 2004, p. 50, exemplo

6.3 (a) ):

Forma alternativa de expressar a ligadura anterior

A segundo opção são as celas (pontos 5 e 6; pontos 1 e 2) antes da nota onde

começa a ligadura e as celas (pontos 4 e 5; pontos 2 e 3) depois da nota onde termina a

ligadura. Exemplo (ibid., p. 50, exemplo 6.3 (b) ):

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Quando há uma ligadura maior e outras menores dentro dessa, usa-se a segunda

opção acima para a maior e a primeira (para a de até quatro notas ou mais de quatro)

representando as ligaduras menores Exemplo (ibid, p. 51, exemplo 6.4):

Fim de uma ligadura e começo de outra sobre a mesma nota

Usam-se as duas celas vistas anteriormente, as duas que iniciam e as duas que

terminam o período da ligadura, sem espaço e antecedendo a nota em questão. Exemplo

(ibid., p. 51, exemplo 6.5 (a) ):

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Final e princípio de ligadura curta sobre uma nota

Após a nota em questão, usamos as celas (ponto 6; pontos 1 e 4). Exemplo

(ibid., p. 51, exemplo 6.5 (b) ):

.

Ligaduras para acordes será vista adiante, após a escrita de acordes. Há outras

ligaduras para mudança de voz e de pentagrama, cf. KROLICK (2004, p. 59).

10 Claves

Devido à sinalização de oitava, o sinal de clave é dispensável para o

entendimento de uma partitura, no entanto, temos celas que as correspondem em braile

visando viabilizar a comunicação, aulas, estudos, entre músicos usuários de ambas as

grafias, a convencional e a em braille.

O sinal de clave aparece somente no começo do primeiro compasso da

partitura ou quando a original em tinta mudar de clave. Se a cela seguinte à clave tiver

quaisquer dos ponto pontos 1, 2 ou 3, deve-se usar uma cela com o ponto 3 no seu final

para não confundir o leitor com outras celas.

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Clave de sol na segunda linha.

Clave de sol na parte da mão esquerda.

Clave de fá na quarta linha.

Clave de fá na parte da mão direita.

Clave de dó na terceira linha; clave para viola e para as notas agudas de instrumentos graves.

Clave de dó na quarta linha; clave para tenor.

Clave de sol oitava acima.

Clave de sol oitava abaixo.

11 Quiálteras

São inseridas antecedendo o grupo de notas a que se refere.

Grupo de duinas ou quiáltera de dois.

Grupo de tercinas quiáltera de três. (Forma abreviada, mais utilizada: )

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Grupo de sestina ou quiáltera de sete.

Grupo de dez notas ou quiálera de dez.

Para indicar quiálteras dentro de outras quiálteras é necessário apenas indicar o

grupo antes da primeira nota.

12 Andamentos II e Nuances

Em continuação ao tópico de mesmo, apresentamos aqui outras grafias de

expressão.

Staccato Staccatissimo

Mezzo-staccato Acento agógico

Acento Acento invertido

Martellato

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Pianíssimo Piano

Mezzo Piano Mezo Forte

Forte Fortíssimo

Crescendo Início Fim

Diminuindo Início Fim

Exemplo de utilização:

Quando houver mais de um desses sinais sobre uma mesma nota, as celas

respectivas aparecem uma seguida da outra sempre antecedendo a nota em questão (cf.

KROLOCK, 2004, p. 99).

Observe que qualquer palavra ou letra pode ser escrita dessa forma, o que pode

ser útil para a escrita de músicas experimentais/contemporâneas.

13 Intervalos

Os trechos abaixo fazem parte do documento conhecido como “Cologne Key”,

que estabelecia as normas para a leitura e escrita dos acordes.

“Nos acordes formados por notas do mesmo valor escreve-se apenas uma delas

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em braile, na sua forma habitual (a mais aguda ou a mais grave). As demais são escritas

mediante os sinais de intervalo correspondentes, com relação à nota escrita”.

“Nos acordes do registro agudo (soprano, contralto, violino, viola, mão

direita do piano, órgão harpa...) escreve-se a nota mais aguda, representando-se as restantes

mediante intervalos descendentes relativos à nota escrita. No registro grave (tenor, baixo,

violoncelo, mão esquerda do piano e harpa...) escreve-se a nota mais grave, representando-

se as demais mediante intervalos ascendentes relativos à referida nota1”.

Segunda Terceira Quarta Quinta

Sexta Sétima Oitava

No caso do piano, há duas celas que indicam se a linha a seguir é para a mão

esquerda ou direita.

Parte de mão direita Parte de mão esquerda

Ex.:

Casos especiais:

-O uníssono é escrito com o intervalo de oitava antecedido pelo sinal da oitava,

que é o mesmo da nota indicada como ponto de referência do intervalo.

-Se houver mais de um intervalo sobre uma mesma nota, esses intervalos vêm

em ordem crescente de distância sem ser necessário indicar oitava, salvo distâncias maiores

1 Trechos extraídos de: Musical Notation for the Blind, British and Foreign Blind Assoc., Londres, 1888

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que oitava ou uníssono.

Ex.:

Ex.:

-Os intervalos sempre possuem o mesmo valor de tempo que a nota indicada,

sendo desnecessário repetir pontuações ou acentuações.

-Para três ou mais notas seguidas com o mesmo intervalo, usa-se a indicação

duplicada na primeira nota, sem necessitar aparecer nas intermediárias e terminando com

uma única indicação na última nota (KROLICK, 2004, p. 39).

-Os intervalos são referentes às notas diatônicas à nota em questão, não

representando se maior, menor, diminuto, aumentado ou justo. Caso haja alteração da nota

do intervalo, esse deve vir com o acidente em questão. Lembre-se que essa musicografia

preza sempre em manter as mesmas informações e as formas que existem na partitura em

tinta na medida do possível.

-Em oitavas, se essas forem alteradas com acidentes, não é necessário indicar

nos intervalos. Há países que indicam novamente a alteração, sendo preciso ter atenção ao

trabalho de transcrição consultado (ibid., p. 40).

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14 Em acorde total

Quando duas ou mais vozes não puderem ser representadas por intervalos

devido a diferenças de tempo entre elas, elas serão escritas sucessivamente e sem espaço,

unidas pelo sinal chamado “em acorde total”.

Em acorde total.

Há exemplos do seu uso disponível na própria dissertação, nas páginas 88 e 93,

a seguir teremos tópicos aprofundando esse assunto.

A nota que segue o sinal do “em acorde” sempre terá nova indicação de oitava,

assim como a primeira nota do compasso seguinte. A ordem da escrita das vozes segue o

mesmo princípio da ordem dos intervalos, com relação à escrever primeiro o mais agudo ou

o mais grave, ou seja, para os instrumentos agudos se escreve primeiro a voz superior; para

os instrumentos graves, a inferior.

Pode-se duplicar a indicação de intervalo para atingir várias notas, mesmo que

essas passem para outro compasso, mas desde que continue na mesma voz. Bastando

indicar novamente uma única vez na última nota que se usará o intervalo (ibid., p. 42,

exemplo 5.14).

As alterações escritas antes de um sinal de “em acorde” não afetam as notas

escritas depois, na segunda voz, sendo necessário reafirmar a alteração num mesmo

compasso. Se o sinal foi necessário ser escrito em braille por causa dessa regra, mas no seu

original na partitura convencional ele não aparece, o sinal de alteração deve ser precedido

por uma cela formada pelo o ponto 5. O mesmo caso de indicação vale para as pausas que

não aparecerem na partitura convencional, mas foram preciso incluí-las em benefício do

entendimento do trecho. (ibid., p. 42-43, exemplos 5.15 e 5.16).

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15 Em acorde parcial

Se for preciso usar “em acorde” para apenas uma parte do compasso,

empregam-se os sinais para “em acorde parcial”.

Em acrode parcial

Sinal de separação para ser usado no em acorde parcial.

Todos os casos citado para o “em acorde” são válidos para o “em acorde

parcial”. Exemplo (ibid., p. 44, exemplo 5.21):

16 Notas móveis

Quando duas notas ou a soma de três notas de igual valor se movem abaixo ou

acima de uma nota mais longa, poderão ser escritas como intervalos separados pelo ponto

6.

Sinal de nota móvel para um intervalo.

Exemplo (ibid., p. 45, exemplo 5.24):

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Quando dois ou mais intervalos se movem simultaneamente, tem-se o uso dos

ponto 5 e 6.

Sinal de nota móvel para dois ou mais intervalos.

Exemplo (ibid., p. 46, exemplo 5.24):

16 Sinas de nota dupla

Esses sinais são empregados em trechos que contêm notas escritas

convencionalmente com haste dupla, expressando dois valores simultâneos (iguais ou

diferentes) que não possam ser transcritos adequadamente pelo uníssono e nem pelo “em

acorde”. Quando as hastes representam valores diferentes, o menor deles é escrito como

nota, e o maior, com um sinal de nota dupla.

Nota dupla para semibreve. Nota dupla para mínima.

Nota dupla para semínima. Nota dupla para colcheia.

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Nota dupla para semicolcheia. Nota dupla parafusa.

São colocados depois das notas que modificam e não devem estar separados

pelo hífen musical. Tanto estes sinais quantos as notas escritas podem conter pontos, e

podem ser modificados por ligaduras de prolongamento, ligaduras de expressão e nuances.

Exemplo: (ibid., p. 48, exemplo 5.31)

17 Ligadura de prolongação de acorde

Emprega-se quando duas ou mais notas de um acorde se prolongam até o

acorde seguinte. Caso os dois acordes em questão sejam idênticos e com apenas algumas

notas ligadas, é preciso usar a ligadura de prolongação para cada uma das notas ligadas.

Exemplo (ibid., p. 56, exemplo 6.16):

Em uma série de acordes com intervalos duplicados um desses leva ligadura de

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prolongação, em todas as suas notas, não há necessidade de interromper a duplicação.

Exemplo (ibid., p. 56, exemplo 6.17):

Em alguns países a ligadura de acorde pode ser ligada com as seguintes celas:

( cf., ibid., p. 54, exemplo 6.8)

18 Repetições conforme partituras convencionais

Ritornelo – Barra dupla seguida de pontos; início de repetição (pontos 1, 2 e 6;

pontos 2, 3, 5 e 6):

Ritornelo – Barra dupla precedida de pontos; fim de repetição (pontos 1, 2 e 6;

pontos 2 e 3):

Esses sinais aparecem logo após a última nota do compasso a que se refere, sem

espaço. Caso haja mais informações para ser escrita em braile após a última nota, essa virá

após o ritornelo que será seguido do hífen musical (ponto 5) mais um espaço em branco.

Casa 1 e Casa 2 (Primeira vez e segunda vez)

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Acompanhe os exemplo a seguir:

Exemplo (ibid., p. 73, exemplo 9.7):

Símbolo para SEGNO na forma impressa em tinta -

Sinal para CODA na forma impressa em tinta -

Esses dois últimos sinais são precedidos e seguidos de um espaço em branco.

Expressões como “D.S.”, “coda”, devem ser escritos diretamente na partitura dentro do

compasso a que se refere.

A nota que segue a quaisquer dos sinais aqui apresentados levará sinal de

oitava. Os sinais de primeira e segunda vez terão o ponto 3, sempre que a cela braille

seguinte tiver quaisquer dos ponto 1, 2 ou 3. Além disso, devem ser renovadas as

“duplicações” vigentes, caso desejemos que elas continuem.

19 Repetições especiais para partituras em braille

A diferença mais notável entre a escrita musical em braile e a convencional são

os sinais de repetição, se mostrando muito funcionais. As repetições em braile, utilizadas

criteriosamente, têm como objetivo facilitar a leitura e a memorização, além de poupar

espaço na escrita.

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Repetição de compasso completo ou fração de compasso

É usado para indicar repetição de notas dentro de um mesmo compasso. Seu

uso exige intuição e boa formação musical. Exemplo (ibid., p. 76, exemplo 9.17):

Separação de repetições parciais com diferentes valores

Para indicar repetições parciais de valores diferentes e próximas. Exemplo

(ibid., p. 77, exemplo 9.19):

Para maior aprofundamento nessas questões, cf. Krolick (2004, p. 77-94).

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