Resenha - Solidariedade técnica: por uma formação crítica no desenvolvimento tecnológico

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LIANZA, Sidney; ADDOR, Felipe; CARVALHO, Vanessa F. Mendonça de. Solidariedade técnica: por uma formação crítica no desenvolvimento tecnológico. In: LIANZA, Sidney; ADDOR, Felipe (orgs.). Tecnologia e Desenvolvimento Social e Solidário. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2005, p. 26-38. Sidney Lianza é Graduado em Engenharia Civil pelo Instituto Mauá de Tecnologia (1975), mestre em Engenharia de Produção pela COPPE - Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991) e doutor em Engenharia de Produção pela COPPE - Universidade Federal do Rio de Janeiro (1998). É professor adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenador do Curso de Engenharia de Produção da UFRJ - gestão 2005-2007 - e Coordenador Geral do Grupo de Pesquisa Núcleo de Solidariedade Técnica. Felipe Addor possui graduação em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2004) e mestrado em Engenharia de Produção pela UFRJ (2006). Atualmente, é doutorando do Instituto de Planejamento Urbano e Regional (IPPUR/UFRJ), iniciado em 2008 com bolsa do CNPq, e pesquisador do Núcleo de Solidariedade Técnica - SOLTEC/UFRJ. Vanessa Ferreira Mendonça de Carvalho é graduando em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, atua na área de Treinamento e Desenvolvimento Responsável pela criação da Universidade Corporativa e já atuou como Professora de Organização do Trabalho na Escola Municipal de Pescadores de Macaé. Solidariedade técnica é a responsabilidade recíproca entre os atores da sociedade. Enseja o surgimento de inovações sociais e tecnológicas, visando ao desenvolvimento social e solidário. Toda escolha ou decisão técnica constitui-se num indicador das relações sociais e da cultura técnica vigentes num dado território. Em cada projeto está implícita uma ideologia, expressa em um modelo técnico, em uma concepção de tecnologia. Há uma relação biunívoca entre tecnologia e desenvolvimento nacional, deu um lado, e inclusão social, de outro. Mas há limites e possibilidades dessa utopia. Apenas uma parcela minoritária da população mundial pode usufruir dos bens e serviços produzidos pela indústria e empresas dinâmicas. O modelo de produção e consumo nesse sistema é excludente e degradador do meio ambiente. Há setores que caminham pela reversão desse quadro utilizando da heterodoxia metodológica e construindo o vetor de desenvolvimento tecnológico também a partir do olhar da “senzala”, afastando-se da exclusividade da paisagem vista da “casa grande”.

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LIANZA, Sidney; ADDOR, Felipe; CARVALHO, Vanessa F. Mendonça de.

Solidariedade técnica: por uma formação crítica no desenvolvimento tecnológico. In:

LIANZA, Sidney; ADDOR, Felipe (orgs.). Tecnologia e Desenvolvimento Social e

Solidário. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2005, p. 26-38.

Sidney Lianza é Graduado em Engenharia Civil pelo Instituto Mauá de

Tecnologia (1975), mestre em Engenharia de Produção pela COPPE - Universidade

Federal do Rio de Janeiro (1991) e doutor em Engenharia de Produção pela COPPE -

Universidade Federal do Rio de Janeiro (1998). É professor adjunto da Universidade

Federal do Rio de Janeiro. Coordenador do Curso de Engenharia de Produção da UFRJ

- gestão 2005-2007 - e Coordenador Geral do Grupo de Pesquisa Núcleo de

Solidariedade Técnica.

Felipe Addor possui graduação em Engenharia de Produção pela Universidade

Federal do Rio de Janeiro (2004) e mestrado em Engenharia de Produção pela UFRJ

(2006). Atualmente, é doutorando do Instituto de Planejamento Urbano e Regional

(IPPUR/UFRJ), iniciado em 2008 com bolsa do CNPq, e pesquisador do Núcleo de

Solidariedade Técnica - SOLTEC/UFRJ.

Vanessa Ferreira Mendonça de Carvalho é graduando em Engenharia de

Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, atua na área de Treinamento e

Desenvolvimento Responsável pela criação da Universidade Corporativa e já atuou

como Professora de Organização do Trabalho na Escola Municipal de Pescadores de

Macaé.

Solidariedade técnica é a responsabilidade recíproca entre os atores da

sociedade. Enseja o surgimento de inovações sociais e tecnológicas, visando ao

desenvolvimento social e solidário.

Toda escolha ou decisão técnica constitui-se num indicador das relações sociais

e da cultura técnica vigentes num dado território. Em cada projeto está implícita uma

ideologia, expressa em um modelo técnico, em uma concepção de tecnologia.

Há uma relação biunívoca entre tecnologia e desenvolvimento nacional, deu

um lado, e inclusão social, de outro. Mas há limites e possibilidades dessa utopia.

Apenas uma parcela minoritária da população mundial pode usufruir dos bens

e serviços produzidos pela indústria e empresas dinâmicas. O modelo de produção e

consumo nesse sistema é excludente e degradador do meio ambiente. Há setores que

caminham pela reversão desse quadro utilizando da heterodoxia metodológica e

construindo o vetor de desenvolvimento tecnológico também a partir do olhar da

“senzala”, afastando-se da exclusividade da paisagem vista da “casa grande”.

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Há de haver uma participação democrática dos atores sociais, visando ao

desenvolvimento local e regional sustentáveis. Assim, pode-se compreender a inovação

tecnológica como um conceito, como aprendizagem dos cidadãos e dos atores sociais,

visando a um desenvolvimento humano em equilibro com a natureza.

A tecnologia deve denotar a utilização da metodologia participativa e a

interação dos atores sociais na definição das resoluções dos problemas socioambientais.

Nesse contexto, como deve atuar a Universidade para atender às demandas que a

sociedade coloca a ela? Será que ela está, atualmente, cumprindo com sua

responsabilidade social de formação crítica?

Segundo Cristóvam Buarque, o objetivo da Universidade é “ampliar o

horizonte da liberdade dos homens e usar esta liberdade para o enriquecimento da

humanidade, especialmente para o enriquecimento cultural, espiritual e emocional de

cada indivíduo.” Ela deve buscar um “avanço técnico” que esteja “comprometido com

resultados distribuídos de forma justa.” (Buarque, 1994). Mas, infelizmente, atualmente,

ela se coloca com uma função fundamental de “transmissão de certezas” e “as dúvidas

parecem ser desenvolvidas no exterior”.

O processo de elitização do ensino superior, principalmente nas universidades

públicas, culmina na formação de profissionais alienados da realidade brasileira, prontos

para adentrar a vida capitalista e fazerem parte do sistema neoliberal vigente. “São o

próprio ensino, pesquisa e extensão que estão submetidos às necessidades impostas

pelas exigências de uma suposta mundialização de „ordem‟ neoliberal”.

A Universidade se distancia da sociedade que a criou, e fica cada vez menos

comprometida com o desenvolvimento social do país. Ela tem como dever procurar

contribuir com o desenvolvimento do Brasil. Deve conduzir-lo por um novo caminho

que represente a melhoria de qualidade de vida para toda a população, sem privilégios a

qualquer classe ou raça.

Um crescimento desenfreado não representa, necessariamente, uma melhoria

significativa para toda a sociedade, mas sim para uma pequena parcela desta. Inserido

nessa problemática, o engenheiro tem, cada vez mais, responsabilidades. Começa a

demandar dele uma visão de sociedade em seu trabalho, uma abordagem sociotécnica.

Mas essa alteração não se dá de uma hora para outra, e sim através de um

longo processo de conscientização. O engenheiro é o indivíduo que encontra-se

habilitado para realizar sonhos e os ideais em todos os setores da vida humana.

As grandes e espetaculares inovações tecnológicas são impulsionadas pela

exigência de acumulo ilimitado de capital. O engenheiro apresenta-se como um dos

protagonistas para alterar essa realidade, sem deixar de ser inovador. O foco das

inovações, nas engenharias, deve considerar, mais fortemente, o seu entorno,

procurando a “priorização das pessoas”.

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Além de mobilizar números enormes de recursos e pessoas para desenvolver

grandes projetos comercias, por que não mobilizar a mesma quantidade de pessoas e

recursos para desenvolver novas formas de construções populares? Afinal, não são dois

mundos separados.

As inovações tecnológicas devem ser direcionadas de acordo com as

necessidades encontradas na sociedade local. Devem ser buscadas as chamadas

“tecnologias da sustentabilidade” (Bartholo, 1999). As novas tecnologias não devem ser

avaliadas por serem “de ponta”, mas por estarem atendendo a demandas que o país

apresenta no momento. O meio de saber o que a população necessita é estando lá. E isso

se dá através de um consistente programa de apoio à extensão universitária.

A extensão é uma força importante no tripé fundamental do ensino

universitário. Porém, grande parte dos acadêmicos limita sua atuação ao ensino superior

e à pesquisa. Esses acadêmicos retiram-se da responsabilidade de estudar para entender

o mundo e agir nele. Desvirtuam plenamente a função e o sentido do saber.

O papel da extensão, portanto, é o de socialização dos conhecimentos

desenvolvidos na Universidade. Ele estava inserido no entendimento de que a

universidade possui a verdade e que esta deve ser transferida para a sociedade. Não se

considerava o que hoje conhecemos por “saber popular”. Mas, uma visão de extensão se

apresenta fortemente, a de que identifica esta interação com a sociedade como um

processo de duas vias, havendo, portanto, uma troca de conhecimentos e saberes, que se

beneficiam mutuamente. O estudo e a pesquisa agora passam a se basear na realidade,

na ação.

Por isso, a extensão não deve ser encarada como uma atividade à parte do

ensino e da pesquisa. O que é importante, nos projetos de extensão, é representar uma

continuidade das ações de ensino e pesquisa e trazer um retorno para essas.

O que se vê no texto é um profundo desconforto e descontentamento acerca do

papel e da atuação da universidade, e em parte dos engenheiros, no.

Certamente o que se têm em nossa nação, são profissionais preocupados com

suas carreiras e salários, ao invés de profissionais preocupados com o desenvolvimento

do país. E a Universidade, o que tem a ver com isso? É ela quem forma esses

profissionais. Então é a partir de lá que eles devem se tornar conscientes de seus papeis

como cidadãos, que fazem parte de qualquer passo que um país possa dar.

Não é só pelo motivo da elitização que boa parte dos formandos está

preocupada em gerar capital para seus contratantes, diga-se trabalhar para uma grande

empresa. Pessoas, que mesmo vindo de classes mais baixas, ainda estão motivadas em

formarem-se profissionais e poderem garantir seus altos salários de trabalhadores de

nível superior. O Brasil não tem a cultura de formar pesquisadores e profissionais que

alavanquem o desenvolvimento nacional de forma social e não econômica.

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A extensão tem um papel muito importante no que cerne a formação de um

cidadão capacitado, que possa mudar as condições sociais de um país. E é isso que um

aluno de ensino superior realmente deve olhar. Não é só pelo dinheiro que se deve

cursar o ensino superior, mas, também, pelo poder que tem nas mãos um profissional

que conhece as necessidades de sua nação.