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Entrevistas Artigos Artigos As lições de um precursor do novo marketing João Batista Ciaco A propaganda precisa de mais QI e menos GRP Rafael Sampaio O desafio agora é como Golias vai vencer Davi Nizan Guanaes COMUNICA Ç ÃO DE MARKETING 10 ANOS DE MUDANÇAS REVISTA DA ESPM • ANO 23 • EDIÇÃO 106 • Nº1 • JANEIRO/FEVEREIRO/MARÇO 2017 • R$ 32,00 O mundo mudou. Mudou? Desafios contemporâneos para as arenas da comunicação O dilema do branding no Brasil de hoje As novas arenas da comunicação revisitadas: trade marketing e o crescente poder do varejo O grande desafio de reter a atenção dos consumidores ForCom debate na ESPM o futuro da comunicação Toda propaganda reflete o espírito do seu tempo A criatividade em tempos duros: “Água mole em pedra dura, tanto bate até que…” A criação de marcas nas novíssimas arenas de comunicação O papel da mídia programática no universo da comunicação Arenas da comunicação revisitadas: o novo contexto do marketing nos ambientes digitais contemporâneos Atenção: mobile marketing vai muito além da criação de um aplicativo Para onde vão os festivais?

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Entrevistas

ArtigosArtigos

As lições de um precursor do novo marketing

João Batista Ciaco

A propaganda precisa de mais QI e menos GRP

Rafael Sampaio

O desafio agora é como Golias vai vencer Davi

Nizan Guanaes

comunicação de marketing

10 Anos dE mudAnçAs

revista da espm • ano 23 • edição 106 • nº1 • janeiro/fevereiro/março 2017 • r$ 32,00

O mundo mudou. Mudou?

Desafios contemporâneos para as arenas da comunicação

O dilema do branding no Brasil de hoje

As novas arenas da comunicação revisitadas: trade marketing e o crescente poder do varejo

O grande desafio de reter a atenção dos consumidores

ForCom debate na ESPM o futuro da comunicação

Toda propaganda reflete o espírito do seu tempo

A criatividade em tempos duros: “Água mole em pedra

dura, tanto bate até que…”

A criação de marcas nas novíssimas arenas

de comunicação

O papel da mídia programática no universo da comunicação

Arenas da comunicação revisitadas: o novo contexto do marketing nos ambientes

digitais contemporâneos

Atenção: mobile marketing vai muito além da criação

de um aplicativo

Para onde vão os festivais?

Revista da esPM | janeiro/fevereiro/março de 201736

As novas arenas da comunicação revisitadas: trade marketing e o crescente poder do varejoNa última década, o mercado assistiu à consolidação da atividade de trade marketing nas empresas fabricantes de produtos de consumo. O momento agora é de outras categorias e diferentes canais. Confira o que mudou e quais as tendências da atividade no país

Por Ricardo Pastore

Trade

janeiro/fevereiro/março de 2017 | Revista da esPM 37

A s novas arenas da comunicação com o mercado, obra de 2008 produzida pelo professor Fran-cisco Gracioso, continua atual ao prever o aumento do poder do varejo nas estratégias

de marketing para a indústria de consumo. Este artigo reflete sobre o tema, fazendo uma breve contextualiza-ção e explorando possíveis caminhos para o futuro da atividade de trade marketing no Brasil.

Essa é uma atividade que vem se consolidando ao longo do tempo sob diversas perspectivas, a começar pelo lado econômico, ao movimentar investimentos cada vez maiores. No campo da administração, o trade marketing prevê estruturas organizacionais complexas e planejamento sofisticado. Na área financeira, desen-volve estruturas de apurações de resultados específi-cas e mais precisas. Do ponto de vista tecnológico, a atividade fornece ferramentas de gestão e operação inovadoras. Na logística, tal prática promove ganhos em recursos e satisfação de clientes. E, finalmente, no ambiente acadêmico, o desenvolvimento do trade marketing tem dado suporte teórico e conceitual aos

que desenvolvem modelos de gestão a serem aplica-dos e utilizados por gestores em suas rotinas diárias.

Convém ressaltar que o trade marketing tem a sua base conceitual na teoria de marketing. É o marketing prati-cado pelos fornecedores no seu relacionamento com o varejo e os demais canais de distribuição. É a prova de que a teoria do marketing é viva e evolui, fornecendo aos atores do mercado o suporte necessário para a constru-ção de novos conceitos.

Também é importante reforçar que, enquanto estru-tura organizacional, o trade marketing tem atribuições bem claras nas empresas. Enquanto a área de marke-ting investe em branding e conhecimento sobre o com-portamento do consumidor, o trade marketing trata da adaptação do branding às características dos principais clientes e canais, além de compreender o shopper ou o consumidor no ponto de venda prestes a tomar a decisão de compra. Finalmente, para completar o tripé de sus-tentação que o mercado dá às empresas, encontra-se a área comercial que faz o relacionamento com os clien-tes — varejistas, atacadistas e distribuidores.

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Trade

Revista da esPM | janeiro/fevereiro/março de 201738

As empresas encontram, com certa restrição aos grandes centros do país, escolas que formam jovens profissionais em trade marketing. No caso da ESPM, essa formação começa nos cursos de graduação, que permitem ao aluno escolher a trilha do trade marketing. Nos programas de especialização, de curta e longa duração, incluindo o MBA, a ESPM oferece ampla gama de cursos com a disciplina específica de trade marketing e outras complementares, como gerenciamento de categorias, shopper marketing, comunicação in store e pricing.

Da mesma forma, assim como as escolas prepararam jovens profissionais com boa formação para atuarem na área de trade marketing, as empresas encontram fornece-dores de serviços para atender necessidades fundamentais na atividade. É o caso da realização de pesquisas especí-ficas como as de comportamento do shopper no ponto de venda, ou de outros que oferecem promotores equipados com aplicativos em seus smartphones prontos para for-necer uma ampla gama de informações coletadas diaria-mente em diversos pontos de venda espalhados pelo país.

Há ainda as consultorias especializadas, agências de comunicação, empresas de treinamento, fabricantes de equipamentos (como displays e demais acessórios para venda e prevenção de perdas) e associações de profissionais e de empresas. A atividade de trade marketing se institucio-nalizou ao promover a interligação entre todos os agentes acima citados, de maneira harmônica, fortalecendo a ati-vidade, a formação de especialistas, o desenvolvimento de novos modelos de negócios, além de atrair investimentos e satisfazer clientes e consumidores. Temos aqui um ciclo virtuoso que se amplia cada vez mais, chegando às empre-sas de médio porte em diversos segmentos de mercado.

Mas, como esse mercado gira, com que dinheiro se alimen-tam tantas novas atividades? Na última década, o consumi-dor se tornou mais exigente, passando a ter mais dinheiro para gastar com marcas que oferecem produtos mais ela-borados. O próprio mercado se ampliou exponencialmente. Enfim, há mais recursos para investir com os fabricantes.

Outros ganhos importantes surgiram de lá para cá. O que se gastava com descontos foi reduzido com o uso de

ações que resultam na fidelização do shopper e a introdu-ção de novos modelos de relacionamento entre indústria e varejo, que priorizam a parceria e os ganhos em con-junto. Ou seja, o dinheiro que alimenta o trade marketing vem de quem fabrica e detém a marca. Antes, o processo se resumia a pesquisa de mercado, desenvolvimento de produto, comunicação, distribuição em massa e política de descontos. Agora, investimento em pesquisa e desen-volvimento continua com muitas mudanças no processo, em decorrência da necessidade de inovação. Os investi-mentos em trade marketing arcam com as pesquisas sobre o comportamento do shopper, as verbas previstas em acor-dos comerciais com grandes clientes varejistas, atacadis-tas e distribuidores, a encomenda de material de ponto de venda (MPDV), os planos de relacionamento com o canal e as despesas de execução, a parte mais crítica.

Se antes grande parte do investimento seguia para campanhas de comunicação em mídias de massa com os devidos descontos, isso há muito que mudou. Hoje, são realizados investimentos cuidadosamente analisa-dos e baseados em retorno sobre investimento (R.O.I.), previstos em planos conjuntos entre fabricantes e vare-jistas — joint business plan (JBP) — e dispostos em perspec-tivas de, no mínimo, um ano. São comuns os contratos de fornecimento que custam entre 10% e 20% para o for-necedor de um grande varejista e, se esse acordo não for bem administrado, vira prejuízo na certa. Além desses

Medicamentos isentos de prescrição (MIPs) distribuídos em drogarias e produtos para pets vendidos em petshops estão descobrindo os benefícios do trade marketing

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Neste momento, a atividade de trade marketing se espalha por todo o território nacional e desperta interesse de empresas de médio porte

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recursos, há os custos da estrutura interna da área de trade marketing, mais os custos de execução.

A atividade de execução no ponto de venda é, também, a responsável para pôr em prática tudo aquilo que foi pla-nejado. Normalmente, isso custa muito para as empresas: treinamento do pessoal de campo; uso de softwares de planogramação, o que garante a máxima rentabilidade no espaço disponível para a exposição de produtos; equipes de promotores responsáveis pelo abastecimento, reposi-ção de produtos, organização e manutenção da exposição; utilização do material de comunicação MPDV; realiza-ção da pesquisa de preço que alimenta os softwares de pricing; estudo de sortimento; e planograma dos concor-rentes. Nessas atividades estão contidas as prioridades definidas pelo marketing para garantir o esforço de 360º de comunicação da marca.

A estrutura interna, além de fazer o planejamento (canal e categoria), faz a rotina de acompanhamento dos indica-dores de desempenho dos diversos PDVs que, depois de analisados, promovem os devidos ajustes, e assim suces-sivamente. Esse processo alimenta um ciclo sem fim, produtivo, que garante ao shopper constante renovação de produtos e marcas, posicionamento e precificação, sortimento e exposição, de modo a fidelizá-lo à custa de outros atributos diferentes da velha tática preço-promo-ção, tão exaustivamente utilizada na época da comuni-cação de massa.

O estado da arteSe nos últimos dez anos houve a consolidação da atividade de trade marketing nas empresas fabricantes de produtos de consumo (como alimentos, bebidas, limpeza, higiene e beleza pessoal), o momento agora é de outras categorias e diferentes canais. É o caso de medicamentos isentos de prescrição (MIPs) distribuídos em drogarias, ou ainda produtos para pets distribuídos em petshops. Também estão aderindo à prática do trade marketing as empresas que distribuem seus produtos em home centers e lojas de material de construção ou em varejos especializados, como papelarias, lojas de conveniências e lojas de mate-rial elétrico e hidráulico.

Nesse momento, a atividade de trade marketing se espa-lha por todo o território nacional e desperta interesse de empresas de médio porte. Não se trata mais de uma estru-tura presente apenas em grupos globais, como os que deram início à atividade aqui no Brasil, ao mesmo tempo que a implantavam na Europa ou nos Estados Unidos. A crise pela qual o país passa desde 2015 é um fator que incentiva a busca por crescimento de mercado no varejo e ganhos de rentabilidade, o que posiciona o trade marketing como peça fundamental para se atingir tais objetivos.

A área de trade marketing é corresponsável pelos resul-tados de vendas obtidos pela área comercial. Essa, por sua vez, passa a compreender melhor e, consequentemente, respeitar as estratégias definidas por canal/cliente que, entre outras coisas, evitam a perda de valor das marcas pelo uso de práticas comuns nas negociações baseadas apenas em volume e preço.

Um caso recente, que ilustra bem o desenvolvimento das atividades de trade marketing no canal farma é o Guia Farma de Categorias (GFC). Trata-se de uma iniciativa do Núcleo de Varejo Retail Lab da ESPM em conjunto com Quintiles IMS e consultores especializados, que contou com o apoio institucional de associações e entidades do setor.

Nos últimos dois anos, o Retail Lab da ESPM passou a realizar encontros no formato de workshops entre as áreas de trade marketing de indústrias farmacêuticas líderes em suas categorias e os grandes varejistas nacionais, com o objetivo de discutir a criação de categorias de produtos para os medicamentos isentos de prescrição. Desses encontros surgiu a proposta de criar um guia que pudesse levar aos varejistas o conhecimento necessário para reorganizar a exposição e o mix de produtos, visando à fidelização do shopper e ao aumento da produtividade no ponto de venda.

Também estão aderindo à prática do trade marketing as empresas que distribuem seus produtos em home centers, lojas de material de construção ou em varejos especializados

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Trade

Revista da esPM | janeiro/fevereiro/março de 201740

No dia 26 de outubro de 2016, o Guia Farma de Catego-rias foi lançado na sede da Pós-Graduação da ESPM, em São Paulo, em um evento que reuniu as principais indús-trias de medicamentos isentos de prescrição, os grandes varejistas e as redes associativistas e entidades do setor. Tal iniciativa demonstra a importância que a indústria, o varejo e a academia atribuem à atividade de trade marke-ting e o potencial que o segmento oferece.

O projeto deu origem a quatro categorias de MIPs: dor e febre; gripes e resfriados; gastro e vitaminas; e minerais e suplementos. Cada categoria recebeu uma brochura com cerca de cem páginas ilustradas, contendo os conceitos fundamentais sobre trade marketing, a metodologia uti-lizada para a definição da categoria, as informações sobre o comportamento do shopper no ponto de venda, a seg-mentação e a valoração da categoria de acordo com dados Quintiles IMS e as instruções para exposição e utilização de material de ponto de venda.

Talvez a maior virtude dessa publicação seja o critério colaborativo adotado em prol do shopper. Durante dois anos, indústria, varejo, instituto de pesquisa e academia trocaram informações, conhecimentos e experiências de maneira iné-dita no setor, para juntos construírem um pilar de desenvolvi-mento sólido da atividade de trade marketing. Dessa forma, até mesmo um varejista independente, com sua drogaria localizada no interior do país, pode ter acesso ao Guia Farma de Categorias, por meio de parceria com a indústria ou distri-buidores, e utilizar métodos de gestão atualizados e em nível de igualdade com os modelos praticados pelas grandes redes nacionais. Isso é interessante para os clientes que ele atende, para o seu negócio, para a indústria que ali distribui seus pro-dutos, para os profissionais que terão acesso a novos conheci-mentos e para todo o mercado no âmbito institucional, pois este se fortalece com o crescimento de seus componentes.

E como o trade marketing é visto sob a ótica do varejista? Nesse momento, alguns varejistas estão estruturando suas áreas de trade marketing para captar mais recursos da indús-tria, mas procuram oferecer maior retorno ao investimento realizado por seus parceiros, com as ações promocionais

oferecidas. O varejista deve imaginar-se como o Google ou o Facebook, que oferecem oportunidades para que seus clientes vendam mais, porém com ferramentas tecnológicas desen-volvidas para isso. Se o varejista se contentar em vender ape-nas pontas de gôndola e pilhas promocionais ou em fechar acordos promocionais com parte de seus fornecedores, em breve poderá ser surpreendido por concorrentes bem diferen-tes daqueles que conhece ou possuem lojas nas redondezas.

O futuro do varejoNa edição de março/abril de 2006 da Revista da ESPM, escrevi um artigo sobre o futuro do varejo baseado no Future Store Iniciative, do Metro Group, da Alemanha. Na época, uma loja equipada com etiquetas de radiofrequência (RFID) pro-punha a evolução de uma série de processos operacionais, como passar pelo caixa sem ter que tirar todos os produtos

A crise incentiva a busca por crescimento e ganhos de rentabilidade no varejo, o que posiciona o trade marketing como peça fundamental para atingir tais objetivos

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do carrinho. Porém a maior revolução estaria na associação das compras realizadas a cada cliente, permitindo o cru-zamento do seu perfil de compras com as marcas adquiri-das. Para a indústria, algo inédito que permitiria a gestão da cesta de compras em cada grupo de shopper.

A tecnologia RFID tem sido utilizada, mas com restri-ções, pois depende de condições ideais de leitura pelo sinal de radiofrequência, e isso varia de acordo com o tipo de embalagem. Por exemplo, para a realização de controle de estoques no varejo de moda e confecções, seu uso tem sido ampliado. Vale ressaltar que logo em seguida houve uma explosão digital, com o surgimento dos smartphones, o que fez com que a indústria de tecnologia voltasse seus esfor-ços para outras soluções. O princípio é o mesmo: conhe-cer o comportamento do shopper para poder desenvolver estratégias mais precisas sobre definição do sortimento,

pricing e exposição com uso de comunicação interativa no PDV. A busca pelo wonderful word persiste e encontra na transformação digital o seu esteio.

A transformação digital provoca a inovação disruptiva no varejo. As lojas podem diminuir em quantidade e em tamanho, mas o lugar de muitas categorias continuará a ser o ponto de venda constituído por prateleiras, etiquetas de preço e material de PDV em sistema de autosserviço. Porém a quantidade de produtos aumentará, e o PDV, se já não é, tende a ser um misto entre PDV físico e virtual. Novas experiências de compra surgirão!

O momento é dramático. Estamos prestes a ver o desa-parecimento de alguns formatos de varejo e o surgimento de novos, mas não pelos mesmos players, e sim por novos entrantes. Os momentos de mudanças tecnológicas pro-vocam aumento da concentração de renda, ou seja, as empresas que investem em inovação permanecerão e sugarão o espaço deixado por aquelas que não vão conse-guir migrar para o varejo 3.0, apontado por Philip Kotler no livro Marketing 3.0 (Editora Campus, 2010).

Nesse cenário, a atividade de trade marketing deve ampliar sua atuação, servindo-se de análises e decisões automatizadas, produzidas por aplicativos que captam o fluxo de shoppers no PDV de maneira constante e os com-param com o desempenho das categorias.

Agora, a palavra de ordem é disrupção, e o papel do ges-tor de trade marketing é investir em inovação e encontrar caminhos antes de seus concorrentes.

Ricardo PastoreCoordenador e professor do Núcleo de Varejo – Retail Lab da ESPM

Até mesmo um varejista independente, com sua drogaria localizada no interior do país, pode ter acesso ao Guia Farma de Categorias e utilizar métodos de gestão de varejo

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