Revista Cult » Ismael, Um Brasileiro

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Interview with Ismael Ivo (Portuguese

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Ismael, um brasileiroO coreógrafo Ismael Ivo afirma que a dança é “um documento da atualidade” e diz que ?o futuro de sua arte estáno Brasil

TAGS: bienal de veneza, dança, ismael ivo

Ernane Guimarães Netofotos Claus Lehmann

Ismael Ivo está no terceiro paraíso. O dançarino que iniciou a carreira no Brasil dos anos 1970e deu seu primeiro pulo internacional em Nova York logo fincou pé na Europa, tornandose,há sete anos, diretor de dança da Bienal de Veneza.

Agora divide seu tempo entre sua base, Berlim, e o mundo: é também diretor do ImPulsTanz,em Viena, e tem projetos em Roma e outras cidades. No início do mês passado apresentou emSão Paulo e Santos seu mais recente espetáculo, Babilônia – Il Terzo Paradiso.

Última parte de uma trilogia, essa coreografia trata da possibilidade de comunicação em ummundo plural. A peça é um produto do projeto educativo Arsenale della Danza, em que aBienal de Veneza, em parceria com o ImPulsTanz e o Sesc, realizou oficinas com intérpretes dediversas nacionalidades.

No palco, a diversidade étnica do elenco é explorada em suas formas e cores, incluindo falasdos bailarinos em idiomas como grego e chinês.

Mas Ivo quer uma Babel harmoniosa, não uma apresentação “escolar”. A dança é repleta demovimentos sincrônicos – e o jovem elenco entrega um ritmo mais afinado do que a maioriadas companhias de dança contemporânea.

Ele recebeu a reportagem no hotel em que ficou hospedado, em São Paulo, e já foi logoexplicando: “O tema central de Babilônia é a confusão de línguas, de corpo. Mas [a sincronia]é uma questão de dramaturgia. É um harmonizar e, gradativamente, destruir. No Brasil éainda novidade a dramaturgia da dança”.

O teatro na dança

O cuidado teatral é uma das marcas do trabalho de Ivo. Inês Bogéa, diretora da São PauloCompanhia de Dança, destaca essa preocupação: “Ele põe na cena questões contundentes denosso tempo, e faz isso com uma dramaturgia da dança. Tem sempre dramaturgos oudiretores de teatro trabalhando com ele”.

Uma das principais influências que o coreógrafo gosta de listar é a do dramaturgo Heiner

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Müller (19291995), com quem se reuniu em 1989 para discutir a obra do francês AntoninArtaud. À época Ivo trabalhava com Johann Kresnik, pioneiro da dançateatro alemã.“Kresnik me disse: ‘Para falar de Artaud, você precisa de um dramaturgo’. De repente vejomena Berlim Oriental, diante de Heiner Müller.”

Outra colaboração frequentemente lembrada é a com o diretor Marcio Aurelio. Na Alemanha,os brasileiros produziram obras como O Beijo no Asfalto (1998) e Tristão e Isolda (1999).

Esta última foi em duo com Márcia Haydée, a quem Ismael chama de “a grande musa dadança no mundo”. “Ivo fez Márcia Haydée repensar a idadelimite da dança. Ela foi umagrande estrela da dança clássica e, com ele, encontrou uma nova carreira, quando estavapraticamente aposentada”, acrescenta Bogéa.

Ivo assume, desse modo, um papel de articulador internacional, em permanente diálogo com aarte e os profissionais brasileiros, mesmo estando há quase 30 anos fora do país.

Descoberto por Alvin Ailey no Festival Nacional de Dança Contemporânea, em Salvador, Ivofoi convidado para estudar na companhia norteamericana de mesmo nome em 1983. No anoseguinte, fundava o ImPulsTanz, na Áustria, mudandose no ano seguinte para Berlim. Suapronúncia acusa o “português com sotaque estranho”, a partir da influência de tantos outrosidiomas de trabalho (diz que fala seis línguas).

Mas a pretensão cosmopolita é ?traída por uma forte brasilidade, que ele acaba abraçando:“Sou um bom filho da antropofagia”, diz.

Ao defender a intuição que o levou a boas escolhas na carreira, oscila entre o discurso doemigrante que nada tem a perder no exterior, vindo de família humilde da Zona Lestepaulistana, e a riqueza tupiniquim: “O Brasil já é uma Babilônia de raças e culturas. Não sepode viver aqui sem intuição; intuição a gente come com arroz e feijão”.

Mas é brasileiro o suficiente para ter sido agraciado pelo governo com a Ordem do MéritoCultural, em dezembro passado.

Outra imagem recorrente em seu discurso é a de que “brasileiro sempre pensa em fome”, parajustificar a voracidade com que se dedicou à arte no exterior. Alguns brasileiros preferem dizerque ele é que é extraordinariamente laborioso.

“Além de sensível e muito competente, Ismael é uma pessoa dedicada”, lembra a atriz ecoreógrafa Mariana Muniz, com quem ele dividiu a cena em Bolero, em 1983, sob a direção deEmilie Chamie. Ele e Mariana foram alunos de Ruth Rachou na mesma época.

Operáriopadrão

A força de vontade do aluno aparece também no depoimento de Ruth Rachou à reportagem:“Ele sempre se mexeu muito, não esperou as coisas chegarem”.

Apesar de dizer que não tinha dinheiro para fazer outra coisa em Nova York senão praticar,Ivo ecoa orgulhosamente a fama de certinho. Critica as novas gerações, que estranham quandodiz que é necessário entrar em aula já aquecido: “Eram cinco aulas por dia. Quem ajoelha temque rezar. Fui lá para isso. Fazia meu aquecimento antes e chegava fervendo à aula”.

Conta que, não contente, inscreveuse em aulas extras no fim de semana quando obteve umabolsa com a romena Gabriela Darvash. Seria, portanto, por causa da dedicação ao trabalho,seguindo as orientações de seus mestres e avaliadores, que ele venceria o preconceito por sernegro ou grandalhão.

Quanto ao projeto educativo desenvolvido em Veneza, ele apresenta como exemplo de suapedagogia submeter um grupo a uma sessão de cinco horas de improvisação num mercado depeixes.

Em outros momentos, o ensaio do caos em Babilônia pedia uma agressividade à qual osbailarinos não poderiam se furtar. “Senta a mão nele!” era uma de suas ordens, relembra odiretor.

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Outro exemplo de sua diligência ocorreu no Teatro Paulo Autran, em junho passado, quandomais de uma centena de adolescentes foi assistir ao espetáculo. Brilhando no escuro em seutraje branco, Ivo dirigiuse a um dos focos de algazarra, com o espetáculo já iniciado, e ralhoucom os meninos.

“Criança é assim mesmo. Você precisa só dar um toque. ‘Segurem as pontas e fiquem atentos.Não é hora do lanche.’ O espetáculo veio como uma martelada.”

Meio vazio, meio cheio

Os 160 ingressos reservados para escolas na segunda apresentação em São Paulo ajudaram adesfazer a impressão do dia anterior, pois o teatro de 1.100 lugares não ficou lá muito cheio.Para ele, isso é um sintoma da relação que a cultura brasileira tem com a dança, mantendoaisolada de outras manifestações culturais.

“Lá fora, os projetos vão além da dança. Há eventos de portas abertas, como a Bienal. NosEUA, há as interferências, desde Trisha Brown” [com suas performances fora do ambiente doteatro].

Inês Bogéa, cujo trabalho na instituição que dirige inclui difusão cultural e memória da dança,refuta a insinuação de que ele pudesse estar esquecido por aqui. “São Paulo é uma megalópole.Há muitas opções e nem sempre conseguimos sair do trabalho a tempo de ir a um espetáculo.”

Ela é responsável pela série de documentários Figuras da Dança, que já editou 15 DVDs sobrepersonalidades históricas da profissão no Brasil. Ismael Ivo é um dos cinco nomes do projetoneste ano. Ela o compara a Márcia Haydée, que figurou na série no ano passado: “Sãopersonagens internacionais, não ficam muito no Brasil, mas têm personalidade marcante”.

Pósexótico

Na escola de Ruth Rachou, Ismael ministrava aulas de dança afrobrasileira. Foi por causa demovimentos que reinterpretavam suas raízes que o jovem criador recebeu o convite paraingressar na escola de Alvin Ailey, cuja companhia ostentava a expressão “afroamericana” emsua proposta original.

A reportagem pergunta se o apelo étnico restringia suas ambições de artista universal. Por queficou tão pouco tempo nos EUA?

“Eu não conceituaria Alvin Ailey como um grupo ‘afroamericano’. Como companhia e comoescola, tem uma abertura e uma diversidade de informações pedagógicas e estéticas que mefavoreceu como jovem artista. Tive de estudar balé, Horton, Graham, dueto, jazz”, corrige.

E definese como um “pósexótico. Uma jornalista de Hamburgo escreveu sobre Phoenix[1985] e agradeceu por um espetáculo fascinante que não a fazia se sentir como ‘um estúpidoturista europeu’”.

Ivo lista entre suas influências o “butô do Brasil” de Takao Kuzuno, a dançateatro de PinaBausch e o trabalho do amigo William Forsythe.

Outra interpretação vem de uma geração mais nova, representada por artistas como DiogoGranato. “Há muitas linhas estéticas ao mesmo tempo. Algumas têm a unanimidade da crítica.Não posso falar especificamente do Ismael, pois o artista pode até ultrapassar os limites de suatécnica. Mas ele representa uma linha influenciada por Marta Graham, que já teve seu tempo.”

O coreógrafo de 34 anos, que mistura a técnica do parkour a sua dança, diz que a geraçãoinfluenciada por Graham e Pina Bausch pode ter estagnado em termos do que é vanguarda, oque explicaria o interesse mais limitado das novas gerações. “É difícil dizer o que é vanguarda,mas Graham não é mais. É uma dança forte, mas por isso mesmo melodramática, que poucointeressa à minha turma”.

A prisão formal é justamente uma das razões pelas quais o Brasil ainda não realizou opotencial que atribui ao país de liderar a produção artística no futuro próximo.

“No Brasil há uma ideia errada sobre dançateatro, a de que basta colocar cadeiras no palco eir de um lado para o outro”, parodia, com gestos, referindose ao clássico Café Müller, de PinaBausch. “Mas não posso generalizar porque há coreógrafos muito competentes, como LiaRodrigues. Penso que o futuro é o Brasil, a América do Sul e a Ásia. Talento não é suficiente; àsvezes as pessoas escolhem caminhos pouco profundos, copiados.”

Apesar da inveja que a técnica de seus bailarinos causa aos profissionais presentes na plateiabrasileira, Ivo diz que o problema não é técnico, é cultural. “Um bailarino não se faz sópegando na barra e fazendo plier. O artista deve ser curioso, informado sobre o mundopolítico, social. A dança é um documento da atualidade.”

Ivo conta que submete seus intérpretes à apreciação de obras de outras técnicas, como apintura de Francis Bacon ou a gastronomia dos países de cada um dos bailarinos.

Outra fonte de enriquecimento, evidentemente, é a leitura. O coreógrafo diz que está lendo ALeg to Stand on, do psiquiatra e neurologista Oliver Sacks, sobre a relação do indivíduo com opróprio corpo, mas guarda para si as conclusões que está tirando.

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Embora fale bastante e muito sobre si mesmo, Ivo evita respostas demasiado objetivas. Nãorevela a idade. “As pessoas associam uma imagem à idade. Prefiro o mistério. Estoutrabalhando minha própria eternidade”, brinca.

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