TRANSFORMA ÍES DAS NO ÍES DE TEMPO, ESPA O, SOM E … · Durante a mixagem, os eventos s o...

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A etapa atual do projeto aborda as transformações das noções de som e de tempo musicais proporcionadas pela prática de gravação e amplificação sonoras. Embora essas noções não sejam independentes das demais (espaço e obra, abordadas na etapa anterior), é possível encontrar situações onde suas transformações se manifestam claramente. No caso de se gravar um conjunto instrumental acústico, com todos os músicos tocando ao mesmo tempo, é necessário construir uma nova sonoridade da obra executada: a experiência mostra que, na maioria dos casos, a gravação caracterizada pelo ouvinte como uma "documentação" fiel dessa execução musical ao vivo envolve uma complexa estratégia de captação com diversos microfones, cujos "pontos de audição" individuais são então cuidadosamente mixados. A necessidade da construção de uma sonoridade específica para determinada obra também aparece nos processos de amplificação e de gravação de grupos musicais que contam com instrumentos e aparelhos eletro-eletrônicos e/ou com fontes sonoras de potência muito díspares. Por outro lado, as transformações da noção de tempo musical se evidenciam na comparação entre dois processos opostos de gravação: em um todos os músicos tocam ao mesmo tempo; no outro cada músico toca sua parte separadamente. O primeiro processo valoriza a flexibilidade temporal da execução coletiva; o segundo a precisão da execução solitária. No primeiro, escuta-se a música completa durante a gravação; no segundo, a música vai aos poucos tomando sua forma final. Em ambos os casos, o resultado deve soar como uma execução musical coletiva e simultânea. INTRODUÇÃO Com o surgimento da tecnologia digital, operou-se uma mudança substancial nos processos técnico-artísticos ligados à produção musical. Dentre essas mudanças destacam-se os processos de pós-produção, ou seja, aqueles que tomam lugar após a gravação. São eles a Mixagem, composta pela Equalização, Processamento e Espacialização, e a Masterização. Por estar codificado digitalmente, é possível alterar um som virtualmente sem que o original seja modificado. Não gostou do resultado? Basta desfazer e fazer de novo. Esse tipo de edição é não-linear, por não depender da seqüência cronológica da gravação, e não-destrutiva, por não alterar o objeto original. A CAPTAÇÃO / GRAVAÇÃO Sob um ponto de vista mais conservador e detalhista (qualidades de um bom engenheiro de gravação), a captação dos sons é a etapa crucial para a definição da sonoridade de uma gravação. A qualidade sonora final depende muito da escolha e posicionamento adequados de microfones. Numa gravação Ao Vivo, um bom posicionamento de microfones dá ao ouvinte uma melhor compreensão espacial e permite ao engenheiro de mixagem um maior controle de cada ponto de escuta no momento da edição. Numa gravação em camadas não simultâneas (Overdub), a forma de captação do sinal influencia o resultado final de forma significativa, por definir de antemão certos aspectos como a relação sinal/ruído, a proximidade e isolamento da fonte sonora, dentre outros. TRANSFORMAÇÕES DAS NOÇÕES DE TEMPO, ESPAÇO, SOM E OBRA MUSICAIS ATRAVÉS DA PRÁTICA DE AMPLIFICAÇÃO, GRAVAÇÃO, MIXAGEM E PÓS-PRODUÇÃO SONORA Programa Acadêmico Especial (PAE) 57 Coordenador/Orientador: Prof. Sérgio Freire Garcia (Colegiado de Graduação da Escola de Música da UFMG) Fernando Braga Campos (Formando – Licenciatura em Música) – PROGRAD-PAE O MICROFONE O microfone é um dos ouvidos do espectador final. Não podemos estar presentes em vários espaços simultaneamente. O conjunto de microfones nos transforma, então, num super-ouvinte, aquele onipresente. Cada ponto de captação nos traz nuances sonoras que m ocupar lacunas deixadas pelos sentidos ausentes quando escutamos música onde não há performance. Tal versatilidade tem também suas conseqüências negativas. O microfone, ao contrário de nós seres humanos, não seleciona entre o que ouvir e o que não ouvir. Isso faz com que seja necessária uma elaboração dos pontos de escuta para definir o papel que cada microfone desempenhará no resultado sonoro. Esse resultado é O SOM da gravação. A MIXAGEM Mixagem é o termo técnico para mistura, ou edição. Uma boa mistura sonora é aquela que tem a quantidade certa de cada elemento. Um pouco de guitarra aqui, um tanto de voz ali... A qualidade dos elementos e o momento em que são adicionados à mistura também são de grande importância e são definidos nessa etapa. A edição (mixagem) consiste em agrupar vários segmentos de modo a formar um todo coerente. Neste processo, as várias partes gravadas em diferentes tomadas (takes) são colocadas em seqüência para formar uma única peça e o objetivo principal é criar a sensação de continuidade sem se deixar perceber os pontos de edição. Durante a mixagem, os eventos são divididos em canais e, embora novos formatos tenham surgido, o formato estereofônico (2 canais) é ainda o mais utilizado para gravação e reprodução de música. A MASTERIZAÇÃO Esse é o processo final da produção e antecede somente a prensagem da mídia final. Masterizar é colocar a informação musical no formato da mídia em que será gravada (e muitas vezes multiplicada) permanentemente. Isso significa que o conteúdo deve ser formatado para que a mensagem seja transmitida de forma coerente, sem perdas. O balanço espectral precisa ser uniforme para que todos os elementos sejam audíveis e o conteúdo dinâmico, do pianíssimo ao fortíssimo, seja aproveitado ao máximo. O SOM O som de uma gravação é definido pela soma dos seus componentes. Sendo a música um evento temporal, que ocorre de forma dinâmica e logo se dissipa deixando apenas impressões psico- sensoriais nos ouvintes, é imprescindível que os componentes sonoros de uma apresentação sejam captados de forma a representar todos os aspectos musicais envolvidos. Surge então uma questão: como registrar elementos musicais não sonoros? Verdade seja dita: somente em Áudio, não há como. Mas para suprir tais ausências, se utiliza a captação de elementos sonoros extras, ou seja, que também não seriam audíveis sob um único ponto de audição. Multiplicam-se os pontos de audição com a captação de acento em pontos definidos de acordo com o projeto musical a ser gravado. Essas novas perspectivas são somadas à ressonância do ambiente para a criação de um evento sonoro que represente, da forma mais aproximada possível, o evento musical que se gravou. O TEMPO Com o advento da gravação multipista, surge a possibilidade de se gravar eventos que não ocorrem simultaneamente. Sendo assim, pode-se construir, por meios tecnológicos, uma performance que na realidade não ocorreu de forma linear através do tempo e num espaço. Esse tipo de construção altera a forma e a dinâmica dos processos utilizados na pós-produção. Extinguindo-se a simultaneidade dos eventos, torna-se necessária a adição de espacialização aos trechos gravados, já que se tem como objetivo a construção de um todo coerente. Por meio da utilização de efeitos de simulação de ambientes virtuais, cada um e todos os eventos são inseridos em um contexto espacial. Isso se faz utilizando hardwares e/ou softwares chamados Reverbs, que simulam os efeitos de reflexão das ondas sonoras em um ambiente dado. Nesse tipo de produção, torna-se imprescindível a utilização de equalizadores nos diferentes trechos e instrumentos gravados para que cada um ocupe o espaço devido dentro do espectro sonoro do conjunto. CONCLUSÃO Cada música requer um projeto de gravação único. A seqüência de processos em cada projeto deve ser adequada ao que se está gravando para que as necessidades do mesmo sejam atendidas da melhor forma possível. Uma gravação é sempre uma representação e uma recriação do evento gravado. Essa transformação se faz com o intuito de melhor adaptar o evento musical a espaços nos quais este não acontece, exceto por reprodução. Devido à velocidade das transformações tecnológicas, um movimento constante de implementação/avaliação se faz presente e necessário. Há a necessidade de se definir objetivos consistentes para que a utilização dos meios disponíveis para a gravação e amplificação de música não venha a descaracterizar nocivamente a prática musical. Em suma, se alguém influi no resultado e suas escolhas devem respeitar critérios artísticos, esse alguém precisa, necessariamente, estar artisticamente envolvido com os projetos nos quais estiver trabalhando. Ele deve estar a par dos objetivos e ambições e manter um canal de diálogo sempre aberto com os músicos e/ou diretor musical desses projetos. É necessária uma vivência e o desenvolvimento de uma sensibilidade musical apurada para a realização de serviços anteriormente caracterizados como simplesmente técnicos (gravações ao vivo, em estúdio e de campo, sonorizações com exigências específicas etc.) e é justamente nesse sentido que o presente projeto se desenvolveu. Thespian ( Broken Arrows ) Gravação em Overdub Fernando Rocha ( Abertura para noneto) Gravação Ao Vivo

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A etapa atual do projeto aborda as transformações das noções de som e de tempo musicais proporcionadas pela prática de gravação e amplificação sonoras. Emboraessas noções não sejam independentes das demais (espaço e obra, abordadas na etapa anterior), é possível encontrar situações onde suas transformações semanifestam claramente. No caso de se gravar um conjunto instrumental acústico, com todos os músicos tocando ao mesmo tempo, é necessário construir uma novasonoridade da obra executada: a experiência mostra que, na maioria dos casos, a gravação caracterizada pelo ouvinte como uma "documentação" fiel dessa execuçãomusical ao vivo envolve uma complexa estratégia de captação com diversos microfones, cujos "pontos de audição" individuais são então cuidadosamente mixados. Anecessidade da construção de uma sonoridade específica para determinada obra também aparece nos processos de amplificação e de gravação de grupos musicais quecontam com instrumentos e aparelhos eletro-eletrônicos e/ou com fontes sonoras de potência muito díspares. Por outro lado, as transformações da noção de tempomusical se evidenciam na comparação entre dois processos opostos de gravação: em um todos os músicos tocam ao mesmo tempo; no outro cada músico toca sua parteseparadamente. O primeiro processo valoriza a flexibilidade temporal da execução coletiva; o segundo a precisão da execução solitária. No primeiro, escuta-se a músicacompleta durante a gravação; no segundo, a música vai aos poucos tomando sua forma final. Em ambos os casos, o resultado deve soar como uma execução musicalcoletiva e simultânea.

INTRODUÇÃOCom o surgimento da tecnologia digital, operou-se uma mudança substancial nosprocessos técnico-artísticos ligados à produção mus ical. Dentre essas mudançasdestacam-se os processos de pós-produção, ou seja, aqueles que tomam lugar após agravação. São eles a Mixagem, composta pela Equalização, Processamento eEspacialização, e a Masterização. Por estar codificado digitalmente, é possível alterarum som virtualmente sem que o original seja modificado. Não gostou do resultado?Basta desfazer e fazer de novo. Esse tipo de edição é não-linear, por não depender daseqüência cronológica da gravação, e não-destrutiva, por não alterar o objeto original.

A CAPTAÇÃO / GRAVAÇÃOSob um ponto de vista mais conservador e detalhista(qualidades de um bom engenheiro de gravação), acaptação dos sons é a etapa crucial para a definiçãoda sonoridade de uma gravação. A qualidade sonorafinal depende mui to da escolha e posicionamentoadequados de microfones. Numa gravação Ao Vivo,um bom posicionamento de microfones dá ao ouvinteuma melhor compreensão espacial e permite aoengenheiro de mixagem um maior controle de cadaponto de escuta no momento da edição. Numagravação em camadas não simultâneas (Overdub), aforma de captação do sinal influencia o resultado finalde forma significativa, por definir de antemão certosaspectos como a relação sinal/ruído, a proximidade eisolamento da fonte sonora, dentre outros.

TRANSFORMAÇÕES DAS NOÇÕES DE TEMPO, ESPAÇO,SOM E OBRA MUSICAIS ATRAVÉS DA PRÁTICA DE

AMPLIFICAÇÃO, GRAVAÇÃO, MIXAGEM EPÓS-PRODUÇÃO SONORA

Programa Acadêmico Especial (PAE) 57

Coordenador/Orientador:

Prof. Sérgio Freire Garcia (Colegiado de Graduação da Escola de Música da UFMG)

Fernando Braga Campos (Formando – Licenciatura em Música) – PROGRAD-PAE

O MICROFONEO microfone é um dos ouvidos do espectador final. Não podemos estarpresentes em vários espaços simultaneamente. O conjunto demicrofones nos transforma, então, num super-ouvinte, aqueleonipresente. Cada ponto de captação nos traz nuances sonoras quevêm ocupar lacunas deixadas pelos sentidos ausentes quandoescutamos música onde não há performance. Tal versatilidade temtambém suas conseqüências negativas. O microfone, ao contrário denós seres humanos, não seleciona entre o que ouvir e o que não ouvir.Isso faz com que seja necessária uma elaboração dos pontos de escutapara definir o papel que cada microfone desempenhará no resultadosonoro. Esse resultado é O SOM da gravação.

A MIXAGEMMixagem é o termo técnico para mistura, ou edição. Uma boamistura sonora é aquela que tem a quantidade certa de cadaelemento. Um pouco de guitarra aqui, um tanto de voz ali... Aqualidade dos elementos e o momento em que são adicionadosà mistura também são de grande importância e são definidosnessa etapa. A edição (mixagem) consiste em agrupar váriossegmentos de modo a formar um todo coerente. Nesteprocesso, as várias partes gravadas em diferentes tomadas(takes) são co locadas em seqüência para formar uma únicapeça e o objetivo principal é criar a sensação de continuidadesem se deixar perceber os pontos de edição.Durante a mixagem, os eventos são d ivididos em canais e,embora novos formatos tenham surgido, o formatoestereofônico (2 canais) é ainda o mais utilizado para gravaçãoe reprodução de música.

A MASTERIZAÇÃOEsse é o processo final da produção e antecede somente aprensagem da mídia final. Masterizar é colocar a informaçãomusical no formato da mídia em que será gravada (e muitasvezes multiplicada) permanentemente. Isso significa que oconteúdo deve ser formatado para que a mensagem sejatransmitida de forma coerente, sem perdas. O balançoespectral precisa ser uniforme para que todos os elementossejam audíveis e o conteúdo dinâmico, do pianíssimo aofortíssimo, seja aproveitado ao máximo.

O SOMO som de uma gravação é definido pelasoma dos seus componentes. Sendo amúsica um evento temporal, que ocorrede forma dinâmica e logo se dissipadeixando apenas impressões psico-sensoriais nos ouvintes, é imprescindívelque os componentes sonoros de umaapresentação sejam captados de formaa representar todos os aspectosmusicais envolvidos. Surge então umaquestão: como registrar elementosmusica is não sonoros? Verdade sejadita: somente em Áudio, não há como.Mas para suprir tais ausências, se utilizaa captação de elementos sonoros extras,ou seja, que também não seriamaudíveis sob um único ponto de audição.Multiplicam-se os pontos de audiçãocom a captação de acento em pontosdefinidos de acordo com o projetomusical a ser gravado. Essas novasperspectivas são somadas àressonância do ambiente para a criaçãode um evento sonoro que represente, daforma mais aproximada possível, oevento musical que se gravou.

O TEMPOCom o advento da gravação multipista, surgea possibilidade de se gravar eventos que nãoocorrem simultaneamente. Sendo assim,pode-se construir, por meios tecnológicos,uma performance que na realidade nãoocorreu de forma linear através do tempo enum espaço. Esse tipo de construção alteraa forma e a dinâmica dos processosutilizados na pós-produção. Extinguindo-se asimultaneidade dos eventos, torna-senecessária a adição de espacialização aostrechos gravados, já que se tem comoobjetivo a construção de um todo coerente.Por meio da utilização de efeitos desimulação de ambientes virtuais, cada um etodos os eventos são inseridos em umcontexto espacial. Isso se faz utilizandohardwares e/ou softwares chamadosReverbs, que simulam os efeitos de reflexãodas ondas sonoras em um ambiente dado.Nesse tipo de produção, torna-seimprescindível a utilização de equalizadoresnos diferentes trechos e instrumentosgravados para que cada um ocupe o espaçodevido dentro do espectro sonoro doconjunto.

CONCLUSÃOCada música requer um projeto de gravação único. A seqüência de processos em cada projeto deve ser adequada ao que se está gravando para que as necessidades domesmo sejam atendidas da melhor forma possível. Uma gravação é sempre uma representação e uma recriação do evento gravado. Essa transformação se faz com o intuitode melhor adaptar o evento musical a espaços nos quais este não acontece, exceto por reprodução. Devido à velocidade das transformações tecnológicas, um movimentoconstante de implementação/avaliação se faz presente e necessário. Há a necessidade de se definir objetivos consistentes para que a utilização dos meios disponíveis para agravação e amplificação de música não venha a descaracterizar nocivamente a prática musical. Em suma, se alguém influi no resultado e suas escolhas devem respeitarcritérios artísticos, esse alguém precisa, necessariamente, estar artisticamente envolvido com os projetos nos quais estiver trabalhando. Ele deve estar a par dos objetivos eambições e manter um canal de diálogo sempre aberto com os músicos e/ou diretor musical desses projetos. É necessária uma vivência e o desenvolvimento de umasensibilidade musical apurada para a realização de serv iços anteriormente caracterizados como simplesmente técnicos (gravações ao vivo, em estúdio e de campo,sonorizações com exigências específicas etc.) e é justamente nesse sentido que o presente projeto se desenvolveu.

Thespian ( Broken Arrows )

Gravação em Overdub

Fernando Rocha ( Abertura paranoneto)

Gravação Ao Vivo