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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS - CCJ PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO CONSTITUCIONAL

ANÁLISE DAS CONTRIBUIÇÕES NO SISTEMA FEDERATIVO BRASILEIRO

Valdana Lima Vidal Matr: 0411335-7

Fortaleza - CE Agosto, 2010

VALDANA LIMA VIDAL

ANÁLISE DAS CONTRIBUIÇÕES NO SISTEMA FEDERATIVO BRASILEIRO

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito Constitucional, sob a orientação de conteúdo da Professora Doutora Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça e orientação metodológica da Professora Jarisa Maria Medeiros Silva.

Fortaleza-Ceará 2010

___________________________________________________________________________

V648a Vidal, Valdana Lima. Análise das contribuições no sistema federativo brasileiro / Valdana Lima

Vidal. - 2010. 107 f.

Dissertação (mestrado) – Universidade de Fortaleza, 2010. “Orientação: Profa. Dra. Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça.” “Co-Orientação: Profa. Jarisa Maria Medeiros Silva.” 1. Federalismo. 2. Direito Tributário. 3. Ordenamento jurídico. I. Título. CDU 342.24 ___________________________________________________________________________

VALDANA LIMA VIDAL

ANÁLISE DAS CONTRIBUIÇÕES NO SISTEMA FEDERATIVO BRASILEIRO

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________

Profª Dra. Maria Lírida Calou Araújo e Mendonça - Orientadora UNIFOR

_____________________________________________________ Prof. Dr. Hugo de Brito Machado Segundo – 1o Examinador

CHRISTUS

_____________________________________________________

Prof. Dr. José Júlio da Ponte Neto – 2o Examinador UNIFOR

Dissertação aprovada em 19 / 08 / 2010.

Dedico este trabalho à minha filha, Milena Lima, por toda compreensão e carinho, pela sabedoria inocente e pelas horas sem brincadeiras...

AGRADECIMENTOS

Especialmente à Professora Maria Lírida Calou de Araújo e Mendonça pela paciência,

apoio e carinho dispensados na orientação e realização deste trabalho.

Às Professoras Jarisa Maria Medeiros Silva e Núbia Maria Garcia Bastos pela

orientação e supervisão metodológicas, que deram forma a esta pesquisa.

Aos professores José Júlio da Ponte Neto e Hugo de Brito Machado Segundo que

aceitaram participar da banca examinadora desta monografia de fim de curso de mestrado.

E finalmente à Vice-Reitoria de Pesquisa e Pós-graduação do Programa de Pós-Graduação

em Direito/Mestrado e Doutorado em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza.

RESUMO

No âmbito do Direito Constitucional Tributário, este trabalho se propõe a realizar um estudo sobre as contribuições no ordenamento jurídico brasileiro. A abordagem foi realizada com base em aspectos legais, doutrinários, jurisprudenciais e principiológicos, com o fulcro de demonstrar a compatibilidade do instituto com preceitos constitucionais fundamentais protetores dos cidadãos brasileiros. Também foram abordados alguns questionamentos sobre temas envolvendo as contribuições, tendo-se como principal parâmetro a Constituição Federal de 1988. Desta forma, faz-se, inicialmente, uma correlação entre o federalismo brasileiro e a discriminação constitucional de rendas tributárias (atribuição de competências e repartição de receitas) entre os entes federados. A partir desse exame, analisa-se a origem e a natureza jurídica particular das contribuições, bem como a competência da União Federal para instituí-las. Nesse tocante, vale ressaltar se a arrecadação obtida com a instituição das contribuições atende às finalidades sociais a que se destinam ou se servem apenas como mais uma fonte arrecadadora do Estado, sem respeitar a divisão constitucional de rendas tributárias e, consequentemente, o princípio federativo. Desta forma, faz-se uma análise de alguns temas controversos acerca das contribuições, levando-se em consideração os aspectos do pós-positivismo. Palavras - chave: Federalismo. Contribuições. Neoconstitucionalismo.

ABSTRACT

In the Constitutional Tax Law, this research conducts a study about contributions in Brazilian legal system. The approach based on legal, doctrinal, jurisprudential and principle, with the focus to demonstrate the compatibility of the institute with fundamental constitutional protectors of citizens. Also discusses some questions involving contributions, having as main parameter the 1988 Federal Constitution. Thus, makes initially a correlation between the Brazilian federalism and constitutional breakdown of tax revenues (allocation of powers and revenue sharing) among the counties. From this review, makes analyzes of origin and legal nature of contributions, and the competence of the Federal Government to institute them. In this regard, it is noteworthy that the revenue gained from the introduction of contributions to meet the social purposes they are intended or are simply used as a source of state tax office, without regard for the constitutional division of tax revenues and therefore the federal principle. Thus, it is an analysis of some controversial issues about the contributions, taking into account the aspects of post-positivism. Key - words: Federalism. Contributions. Neoconstitutionalism.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 9

1 O ESTADO FEDERAL .................................................................................................... 13

1.1 O Federalismo: breves considerações..................................................................... 13

1.2 A Federação Brasileira na Constituição de 1988 .................................................... 19

1.3 O princípio federativo e as características do federalismo brasileiro....................... 22

1.4 A autonomia dos entes federados........................................................................... 26

1.5 Rumos do federalismo constitucional brasileiro ..................................................... 31

2 A DISCRIMINAÇÃO CONSTITUCIONAL DE RENDAS NO BRASIL......................... 33

2.1 Competência.......................................................................................................... 33

2.2 Competência tributária........................................................................................... 34

2.3 Atribuição constitucional das competências tributárias no Brasil ........................... 39

2.4 Repartição de receitas tributárias na Constituição Federal de 1988......................... 44

2.5 Os limites jurídicos ao exercício da competência tributária no Brasil ..................... 48

3 AS CONTRIBUIÇÕES NO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO .......................... 56

3.1 Contexto histórico e origem das contribuições ....................................................... 56

3.2 Contribuições: Conceito e características ............................................................... 63

3.3 Contribuições: Classificação.................................................................................. 67

4 ANÁLISE DE TEMAS CONTROVERSOS ACERCA DAS CONTRIBUIÇÕES NO BRASIL ........................................................................................................................ 81

4.1 As contribuições sociais gerais e o princípio federativo ......................................... 81

4.2 A lei complementar nº 110, de 2001 ...................................................................... 87

4.3 Emenda Constitucional 33/2001 ............................................................................ 90

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 100

REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 103

INTRODUÇÃO

O tema das contribuições é de grande relevância e deve ser analisado não apenas por

uma perspectiva conceitual, doutrinária, rígida, mas é preciso contrastá-lo com os princípios

constitucionais, os direitos sociais, dentre outros. É o que este trabalho tentará demonstrar.

Ao analisar o instituto das contribuições, no ordenamento jurídico brasileiro, faz-se

necessário uma breve explanação dos conceitos inerentes, do contexto histórico em que estão

inseridas e como foram criadas. E o estudo de um determinado conceito indica a análise de

outro, que o complementa ou o torna viável.

Assim, no âmbito do Direito Constitucional Tributário, foram abordados alguns

aspectos acerca das contribuições, tendo-se sempre como parâmetro a Constituição Federal de

1988.

A instância máxima do Poder Judiciário brasileiro, o Supremo Tribunal Federal, tem

por competência precípua a guarda da Constituição Federal, na forma do caput do artigo 102

da Carta Magna. Esta disposição norteia o pensamento do Poder Judiciário, especialmente

daquela Corte, ou, pelo menos, deveria. O que se tem observado é o cunho político das

decisões da Suprema Corte, o que a desvirtua dos preceitos constitucionais, que protegem os

cidadãos.

Neste aspecto, percebe-se que a interpretação do texto constitucional empregada, não

raro, compromete a integridade do ordenamento, posto que distorce a realidade jurídica das

relações em conflito, como é o caso de muitos aspectos referentes às contribuições, objeto

deste estudo.

E assim, o Estado, mediante a criação de leis visivelmente ofensivas ao contribuinte,

recebe a chancela da mais alta Corte do país, dando um desfecho indigno de Guardião da

Constituição, a uma situação jurídica muitas vezes lesiva à população.

A força normativa da Constituição se vê bloqueada pelos representantes,

democraticamente, escolhidos pelo povo para defendê-la, mas isso é um reflexo da evolução

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política de um País que ainda não tem a consciência da importância dos princípios

democráticos inseridos na Carta Magna.

O STF acaba considerando constitucionais leis que violam, aberta e diretamente,

cláusulas pétreas, a exemplo da EC 20/1998, forçando o sistema jurídico a aceitar absurdos

legislativos.

Como se vê, o tema em apreço requer um estudo detalhado, a fim de possibilitar

maiores esclarecimentos e dirimir dúvidas quanto à caracterização das contribuições que

influem, diretamente, no cotidiano da população.

Neste contexto, o tema das contribuições é daqueles que provocam grandes discussões,

instigam a mente de grandes pensadores e acabam por produzir Direito, que será usufruído

por todos. E é por essas grandes questões que nasce o orgulho de estudar a ciência do Direito,

como diria o Professor Arnaldo Vasconcelos (2000, p. 39, 42): “[...] dada a relatividade da

condição humana, nenhuma teoria poderá, jamais, atingir a verdade plena, pois tal significaria

que o homem se havia tornado absoluto, dispensando, por isso, o conhecimento”. Por isso,

“produzir teorias que apresentem inovações e alargamento de conteúdo, é tudo o que o

cientista pode desejar”.

Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo geral demonstrar e caracterizar as

contribuições no ordenamento jurídico pátrio e, como objetivos específicos, realizar um

estudo sobre os fundamentos teóricos da criação desse instituto, analisando os princípios

constitucionais que legitimam a sua criação, além de fazer uma abordagem dos pontos

controversos que envolvem o tema, à luz do neoconstitucionalismo vigente.

A metodologia utilizada, nesta dissertação, realiza-se por meio de um estudo descritivo-

analítico, desenvolvido com pesquisa bibliográfica, com a utilização de livros, revistas,

publicações especializadas, bem como artigos e dados oficiais publicados na Internet;

documental, por meio do exame de sentenças, peças processuais dentre outros que abordem o

tema; é pura, à medida que tem como único fim a ampliação dos conhecimentos; e qualitativa,

à medida que se aprofunda na compreensão das ações e relações humanas; é descritiva, posto

que busca descrever, explicar, classificar, esclarecer e interpretar referido instituto; e

exploratória, uma vez que procura aprimorar idéias, buscando maiores informações sobre o

tema em foco.

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Como dito, o presente trabalho apresenta-se de forma a analisar algumas questões

relativas às contribuições no Brasil, mais especificamente, a relação entre o princípio

federativo e a competência constitucional da União para a instituição de contribuições.

Para tanto, é preciso entender quais as dimensões do princípio federativo no Estado

brasileiro, até onde vai a competência tributária de cada ente federado. A Constituição Federal

de 1988 adota o princípio federativo quando assegura, em seu artigo 1º, ser o Brasil uma

República Federativa, “[...] formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do

Distrito Federal [...]”, bem como, ao longo de toda a Carta Magna, trata de reafirmá-lo.

Assim, fazem-se, no primeiro capítulo, algumas considerações acerca do sistema

federativo, suas origens, características principais, bem como o federalismo, na Constituição

brasileira de 1988, com suas peculiaridades. Aborda-se ainda, a questão da autonomia

municipal, como um traço característico do federalismo no Brasil.

O segundo capítulo trata da discriminação constitucional de rendas no Brasil, abordando

temas como o da competência tributária, da atribuição constitucional das competências

tributárias no Brasil e a repartição de receitas tributárias na Constituição Federal de 1988.

Também, quais são os mecanismos jurídicos de controle do exercício do poder de tributar dos

entes federados. Verifica-se assim, em que medida o princípio federativo influencia o

exercício da competência tributária da União e dos demais entes.

No terceiro capítulo, trata-se, especificamente, das contribuições no ordenamento

jurídico brasileiro, suas origens, natureza jurídica, espécies e características, baseadas no

pensamento de grandes doutrinadores jurídicos e tributaristas, à luz da Constituição Federal

de 1988.

Como é do conhecimento de todos, o Poder Executivo, não só na esfera federal, tem

sede arrecadatória e, com isso, observa-se que nem sempre os objetivos governamentais se

coadunam com os objetivos do poder constituinte originário, surgindo, então, inúmeras

normas inconstitucionais, até mesmo Emendas Constitucionais, que, no âmago, são apenas

um disfarce dos abusos legislativos que violam, constantemente, o Estado Constitucional

brasileiro.

Questiona-se, então, se a arrecadação obtida com a instituição das contribuições atende

às finalidades sociais a que se destinam ou se servem apenas como mais uma fonte

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arrecadadora do Estado, sem respeitar a divisão de rendas tributárias traçadas pela

Constituição de 1988 e, consequentemente, o princípio federativo.

Diante disso, o quarto capítulo destaca alguns temas correlatos às contribuições, que

geram inúmeros questionamentos, tais como a existência ou não das contribuições sociais

“gerais”, no ordenamento jurídico brasileiro. Faz-se ainda, um paralelo, entre o princípio

federativo e a lei complementar nº 110. E, por último, uma análise da Emenda Constitucional

nº 33, de 2001, no que se refere à instituição das contribuições de intervenção no domínio

econômico no Brasil.

No quinto e último capítulo, faz-se uma breve análise do pós-positivismo e sua relação

com as contribuições no constitucionalismo brasileiro, visto que o principal fundamento da

instituição das contribuições no Brasil é a aplicação de seus recursos em certas finalidades

constitucionalmente definidas, com o intuito de efetivar direitos fundamentais de segunda e

terceira dimensões.

Diante destas notas introdutórias, pretende este estudo responder alguns

questionamentos acerca das contribuições no Brasil:

De que forma o princípio federativo se vincula às contribuições?

É possível a instituição de contribuições sociais “gerais” no Brasil? Por quê?

Seria necessária alguma mudança, na legislação vigente acerca das contribuições, para

se dirimirem as discussões que envolvem o assunto, ou apenas uma correta interpretação

constitucional sobre o tema seria suficiente?

Verifica-se a real efetividade das finalidades constitucionalmente definidas para as

contribuições, ou estas, são apenas mais uma fonte arrecadatória do Estado?

Na conclusão, à luz do que foi explanado, faz-se uma síntese dos conceitos gerais que

foram abordados e os posicionamentos tomados na pesquisa ora exposta, pelos quais,

atualmente, as contribuições se inserem no Ordenamento Jurídico Nacional.

1 O ESTADO FEDERAL

Diante da amplitude do tema, não há, aqui, o mínimo propósito de esgotá-lo, faz-se

necessário, entretanto, antes da análise do federalismo brasileiro, um breve relato dos pontos

mais importantes que cercam as origens do Estado Federal, algumas distinções e

considerações relevantes para que o estudo do caso brasileiro se torne mais objetivo.

1.1 O Federalismo: breves considerações

Entende-se que o Estado Federal moderno nasceu com a primeira constituição

federalista formulada pelos Estados Unidos da América, em 1787. Este é o pensamento de

José Afonso da Silva (2004, p. 99), embora, segundo Paulo Bonavides (1996, p.180), existisse

na Grécia antiga um federalismo “balbuciante”. Neste caso não há que se falar em federação,

mas em confederação, ainda segundo Bonavides (1996), a Antiguidade, a rigor, não conheceu

o fenômeno federativo com as características do Estado moderno. Corroborando com estas

afirmações está Dalmo de Abreu Dallari (1995, p. 215-216):

Etimologicamente, federação (do latim foedus) quer dizer pacto, aliança. O Estado Federal é, portanto, uma aliança ou união de Estados. Entretanto, em qualquer época da história humana encontram-se referências a alianças entre Estados, reconhecendo-se que só algumas constituíram federações, o que demonstra, desde logo, que essa união deve apresentar algumas peculiaridades importantes que a distinguem das demais. Na realidade, conforme se verá, o Estado Federal é um fenômeno moderno, que só aparece no século XVIII, não tendo sido conhecido na Antigüidade e na Idade Média. Sem dúvida, houve muitas alianças entre Estados antes do século XVIII, mas quase sempre temporárias e limitadas a determinados objetivos, não implicando a totalidade dos interesses de todos os integrantes. Alguns autores entendem que o primeiro exemplo dessa união total e permanente foi a Confederação Helvética, surgida em 1291, quando três cantões celebraram um pacto de amizade e de aliança. Na verdade, porém, essa união, que se ampliou pela adesão de outros cantões, permaneceu restrita quanto aos objetivos e ao relacionamento entre os participantes até o ano de 1848, quando se organizou a Suíça como Estado Federal. O Estado Federal nasceu, realmente, com a constituição dos Estados Unidos da América, em 1787. Em 1776 treze colônias britânicas da América declararam-se independentes, passando a constituir, cada uma delas, um novo Estado. Poucos anos depois celebraram entre si um tratado, conhecido como Artigos de Confederação, aliando-se para uma ação conjunta visando, sobretudo, à preservação da independência... (grifou-se)

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O principal traço distintivo entre federação e confederação refere-se à legislação

unitária existente na primeira e inexistente na segunda, que cria, indiferentemente, direitos e

obrigações imediatas para os cidadãos dos diversos Estados. É o que relata Bonavides (1996,

p.181):

No Estado federal deparam-se vários Estados que se associam com vistas a uma integração harmônica de seus destinos. Não possuem esses Estados soberania externa e do ponto de vista da soberania interna se acham em parte sujeitos a um poder único, que é o poder federal, e em parte conservam sua independência, movendo-se livremente na esfera da competência constitucional que lhes for atribuída para efeito de auto-organização.

A confederação consiste, portanto, na união de Estados-soberanos, por meio de um

tratado internacional dissolúvel, onde os Estados podem se desvincular a qualquer momento,

o que não ocorre na federação. Nesta não existe, portanto, direito de secessão, visto que, se

efetivada a adesão de um Estado, este não pode mais se retirar por meios legais. Em algumas

Constituições, é expressa tal proibição, mas ainda que não o fosse ela é implícita (DALLARI,

1995, p. 218).

Juntamente com a Constituição norte-americana, surgem os famosos escritos de

Madison, Hamilton e Jay, os chamados artigos federalistas, publicados nos anos de 1787 e

1788, sob o nome de Publius, que contribuíram, imensamente, para a interpretação e

consolidação do sistema federativo em vários países. E, de acordo com referidos autores, a

Constituição seria a Lei Fundamental dos Estados Federais, que, segundo eles, deve: “ser o

padrão para a interpretação das leis e, sempre que houver uma evidente contradição,

prevalecerá dispositivo constitucional” (MADISON; HAMILTON; JAY, 1984, p. 148).

Desta forma, Horta (2010, p. 273) assevera que o Estado Federal é criação jurídico-

política e pressupõe, na sua origem, a existência da Constituição Federal, para instituí-lo.

Segundo ele, há uma relação de causalidade entre Constituição Federal e Estado Federal.

Assim, pode-se afirmar que “é a Constituição, instrumento básico sem o qual nenhum

regime federativo há de vingar” (BONAVIDES, 1987, p. 358). Constitui-se a federação, uma

união de Direito Constitucional, baseada em uma única Constituição e a confederação, uma

união de Direito Internacional, baseada em vários tratados internacionais (BONAVIDES,

1995, p. 179).

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Horta (2010, p. 274) entende, como um dos pressupostos da organização constitucional

do federalismo, a existência de um duplo ordenamento. O da Federação ou da União, que é o

ordenamento central, e o ordenamento jurídico dos Estados-membros, que são parciais e intra-

estatais. O primeiro é unitário, com incidência nacional, atingindo o povo e o território do

Estado Federal; o segundo é plural, correspondendo ao número de Estados-membros. Tendo a

Constituição, a função de assegurar a coexistência entre esses múltiplos ordenamentos.

De acordo com o pensamento de Hugo de Brito Machado Segundo (2005, p. 20), com

relação ao federalismo norte-americano, do ponto de vista do Direito Internacional, surgiu um

Estado único, que “é integrado, internamente, por Estados-membros, estes invisíveis perante a

comunidade internacional, mas autônomos em relação ao poder central. Assegurou-se, com

isso, a unidade, preservando-se a diversidade relativa a cada colônia”.

Em continuidade a este pensamento, Tocqueville (2001, p.130) assevera que a União

tinha “a finalidade de satisfazer a algumas grandes necessidades gerais”, que foram definidas,

constitucionalmente, como as atribuições do governo federal, e “declarou-se que tudo o que

não estava compreendido na definição fazia parte das atribuições do governo dos Estados”.

Trata-se, aqui, do modelo clássico de repartição de competência, introduzido pela

Constituição Norte-Americana de 1787 – poderes enumerados à União e poderes reservados

aos Estados - (há também o modelo dito “moderno”, concebido a partir do constitucionalismo

do pós-guerra 1914/1918, que será analisado ao final deste capítulo). Nas palavras de Dallari

(1995, p. 219):

No Estado Federal as atribuições da União e as das unidades federadas são fixadas na Constituição, por meio de uma distribuição de competências. Não existe hierarquia na organização federal, porque a cada esfera de poder corresponde uma competência determinada. No caso norte-americano os Estados, que estavam organizando a federação, outorgaram certas competências à União e reservaram para si, conforme ficou expresso na Constituição, todos os poderes residuais, isto é, aquilo que não foi outorgado à União. Esta regra tem variado nas Constituições dos Estados Federais, havendo alguns que tornam expressa a competência dos Estados e outorgam à União os poderes residuais, havendo casos, ainda, de atribuição de poderes expressos à União e às unidades federadas. [...] A regra, portanto, no Estado Federal é a distribuição de competências, sem hierarquia.

Embora se tomando como base o federalismo norte-americano, para explicar o Estado

Federal, não significa inexistirem outros Estados Federados, há outros tantos, com suas

peculiaridades e traços distintivos que os diferenciam do modelo americano, mas que não

deixam de ser federados em sua essência. Segundo Carraza (2010, p.136-137):

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Olvidam-se de que Federação é apenas uma forma de Estado, um sistema de composição de forças, interesses e objetivos que podem variar, no tempo e no espaço, de acordo com as características, as necessidades e os sentimentos de cada povo. É por isto (e não por outras razões) que a Federação Norte-Americana difere da Argentina; a Venezuelana da Austríaca; a Mexicana da Brasileira; e assim por diante.

Fica claro, portanto, que “o Estado federal é um só perante o Direito Internacional, e

que a sua divisão federativa é obra de seu Direito interno, que há de se levar em conta

peculiaridades históricas e culturais [...]” (MACHADO SEGUNDO, 2005, p. 28).

Assim, segundo Manuel Garcia Pelayo (apud HORTA, 2010, p. 274) entende-se que, no

Estado Federal, há uma aliança entre forças opostas: o centralismo da União e o

particularismo dos Estados-membros, que dependem de uma série de fatores

extraconstitucionais de índole natural, econômica, social. E, de acordo com as características

de cada Estado, o federalismo apresentar-se-á de forma diversa em cada um deles, ora mais

centralizado, ora menos, sem, contudo, perder sua identidade federal.

Horta (2010, p. 275-276) assevera ainda que a construção normativa do Estado Federal

pressupõe a adoção de determinados princípios, técnicas e instrumentos operacionais.

Entretanto, tais requisitos são atendidos de forma diversa por cada Estado Federal, dando

origem a modelos múltiplos de federalismo:

1. a decisão constituinte criadora do estado Federal e de suas partes indissociáveis, a Federação ou União, e os Estados-Membros; 2. a repartição de competências entre a Federação e os Estados-Membros; 3. o poder de auto-organização constitucional dos Estados-Membros, atribuindo-lhes autonomia constitucional; 4. a intervenção federal, instrumento para restabelecer o equilíbrio federativo, em casos constitucionalmente definidos; 5. a Câmara dos Estados, como órgão do Poder Legislativo Federal, para permitir a participação do Estado-Membro na formação da legislação federal; 6. a titularidade dos Estados-Membros, através de suas assembléias Legislativas, em número qualificado, para propor emenda à Constituição Federal; 7. a criação de novo Estado ou modificação territorial de Estado existente dependendo da aquiescência da população do Estado afetado; 8. a existência no Poder Judiciário Federal de um Supremo Tribunal ou Corte Suprema, para interpretar e proteger a Constituição Federal, e dirimir litígios ou conflitos entre a União, os estados e outras pessoas jurídicas de direito interno.

Ressalta, entretanto, a repartição de competência constitucional, como um elemento

essencial do Estado Federal, ela definirá a fisionomia deste, se é mais ou menos centralizador,

ou se busca um equilíbrio entre o ordenamento central e os ordenamentos parciais. Segundo

este autor a repartição atende a um “princípio corporativo territorial”, de modo que

determinadas matérias passarão a ter incidência em todo o território federal, enquanto outras

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ficarão distribuídas aos Estados-Membros e Municípios. Por tudo isso, a repartição de

competências deve ser encarada como a grande questão do federalismo. E continua Horta

(2010, p. 310):

[...] A relação entre Constituição Federal e repartição de competências é uma relação causal, de modo que, havendo Constituição Federal, haverá necessariamente, a repartição de competências dentro do próprio documento de fundação jurídica do Estado Federal. Por isso, a repartição de competências é tema central da organização federal. Na avaliação dos publicistas que lidam diuturnamente com o tema, ora a repartição é qualificada de ‘la grande affaire du féderalisme’, ora de ‘key to the interfederal power structure’, evidenciando a essencialidade da repartição de competências e a razão de sua localização direta no documento constitucional, como parte ineliminável da Constituição Federal material. [...] A repartição de competências é a técnica que, a serviço da pluralidade dos ordenamentos do Estado federal, mantém a (unidade dialética de duas tendências contraditórias: a tendência à unidade e a tendência à diversidade). (grifo original).

Em conformidade com este entendimento Hans Kelsen (1998, p. 451) afirma que o que

caracteriza o Estado Federal é a repartição de competências entre a União e os Estados,

estabelecida pela própria Constituição Federal. É este aspecto do federalismo que deve

garantir aos Estados a participação na ordem jurídica central, bem como, segundo ele, a

existência de um órgão judiciário de cúpula capaz de garantir o primado do Pacto Federativo

estabelecido na Constituição.

Assim, tem-se como característica dominante a descentralização política baseada na

partilha de competências de acordo com os interesses da Federação. De acordo com Jair

Eduardo Santana (1998, p. 22): “O critério que deve ser levado em conta para presidir essa

divisão ou partilha de competências é assentado no princípio da predominância de interesses.

Ao órgão central destacam-se aquelas atividades de predominante interesse geral (interesse

nacional)”.

Bonavides (1996, p.181), por seu turno, defende também a existência de dois princípios

que, segundo ele, são a chave de todo o sistema federativo: a lei da participação e a lei da

autonomia. Na lei da participação, os Estados-membros intervêm no processo de elaboração

da vontade política federal, têm voz ativa nas deliberações de conjunto e contribuem para

formar as peças do aparelho institucional da Federação, participando da soberania. O que

basta para diferenciá-los das coletividades simplesmente descentralizadas, que compõem o

Estado unitário.

Através da lei da autonomia manifesta-se com toda a clareza o caráter estatal das

unidades federadas. Podem estabelecer uma constituição própria, a competência dos três

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poderes estatais (executivo, legislativo e judiciário) e exercer todos os poderes que decorram

do sistema federativo, observando sempre os princípios da Constituição Federal. Suas

palavras:

A participação e a autonomia são processos que se inserem na ampla moldura da Federação, envolvidos pelas garantias e pela certeza do ordenamento constitucional superior – a Constituição federal, cimento de todo o sistema federativo. Tanto a participação como a autonomia existem em função das regras constitucionais supremas, que permitem ver na Federação, como viu Tocqueville no século XIX, duas sociedades distintas, (encaixadas uma na outra), a saber, o Estado federal e os Estados federados harmonicamente superpostos e conexos.

Outro ponto que merece destaque é a diferenciação com relação ao Estado unitário,

citado anteriormente. Os Estados são considerados unitários quando têm um poder central,

que é a cúpula e o núcleo do poder político; e são federais, quando conjugam vários centros

de poder político autônomo (DALLARI, 1995, p. 215).

Para o referido autor, o federalismo é uma “aliança ou união de Estados”, baseada em

uma Constituição, e onde “os Estados que ingressam na federação perdem sua soberania no

momento mesmo do ingresso, preservando, contudo, uma autonomia política limitada”

(DALLARI, 1995, p. 218). Dessa forma, caracteriza-se o Estado Unitário como sendo

“rigorosamente centralizado, no seu limiar, e identifica um mesmo poder, para um mesmo

povo, num mesmo território", ou seja, possui uma centralização político-administrativa em

um só centro produtor de decisões.

Raul Machado Horta (2010, p. 273) defende, ainda, a existência do Estado Unitário com

descentralização regional (Constituição italiana de 1947 e Constituição espanhola de 1978)

que representaria uma nova forma estatal – o Estado Regional – que, segundo o autor,

localiza-se entre o Estado Unitário e o Estado Federal, sendo esta forma estatal uma tendência

do federalismo moderno.

Pode-se ainda destacar, levando-se em consideração todo o exposto até o momento,

como uma característica implícita de todo o sistema federativo, a questão da solidariedade,

presente em sua configuração desde as origens, como bem explicita Carl J. Friedrich (apud

HORTA, 2010, p. 426), que envolve, segundo ele, permanentes contatos entre a comunidade

central e as comunidades parciais.

Desta forma, sem a pretensão de definição, trata-se o Estado Federal, da união, de

direito constitucional, de vários estados (unidades políticas autônomas) em um Estado

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soberano, com um poder político único, mantendo, cada um deles, sua autonomia,

preservando as características locais e regionais (tradições, perfis sociais, culturais e políticos

locais), partilhando da soberania estatal, podendo criar sua própria constituição e exigir do

Estado-Federal determinadas obrigações. Ocorre uma contenção do poder do Estado,

assumindo este o papel de regulador e unificador nacional nos assuntos externos e de

segurança, bem como a manutenção do equilíbrio econômico, social e cultural entre as

unidades federadas; aparecendo, aí, o caráter de solidariedade do Estado federado. Tudo em

consonância com a Constituição Federal.

O Brasil adotou o federalismo, a partir da Constituição de 1891, proclamando a

indissolubilidade do vínculo federativo, naquela ocasião. Após as crises do federalismo

brasileiro, com os retrocessos das Cartas de 1937, da CF de 1967 e da Emenda nº 1 de 1969,

as Constituições de 1946 e de 1988 reafirmaram o Brasil como República Federativa. É o que

adiante se passa a expor.

1.2 A Federação Brasileira na Constituição de 1988

A Constituição Federal de 1988 promoveu a reconstrução do federalismo brasileiro,

estabelecendo a relação entre a Federação e os princípios e regras que individualizam essa

forma de Estado, no conjunto das formas políticas (HORTA, 2010, p. 413).

A Constituição brasileira de 1988, em seus artigos 1° a 18°, ao definir a organização

político-administrativa do país, adotou, como forma de Estado, o federalismo, que, segundo

Alexandre de Moraes (2003, p. 266), “gravita em torno do princípio da autonomia e da

participação política e pressupõe a consagração de certas regras constitucionais, tendentes não

somente à sua configuração, mas também à sua manutenção e indissolubilidade”. Desta

forma, o princípio federativo e o republicano, conforme definição expressa, constante em seu

artigo 1°, dão sustentação ao sistema constitucional brasileiro e orientam a interpretação dos

demais princípios constitucionais.

Com relação à repartição de competências, a técnica adotada, originalmente, pela

Constituição Norte-Americana, previa poderes enumerados à União e poderes reservados aos

Estados-Membros. Entretanto, com a passagem do estado liberal do século XIX ao Estado

intervencionista ou dirigista do século atual, houve uma centralização de poderes em torno da

União, o que acabou reduzindo a área de poderes reservados aos Estados-Membros, o que

20

aconteceu não só nos EUA, mas também nos demais Estados Federais (HORTA, 2010, p.

278).

No Brasil, a partir da Constituição de 1934, os Estados perderam substancial

competência legislativa, em favor da União. Apesar disto, baseado na Constituição de 1988, o

federalismo brasileiro caracteriza-se pela repartição de competências, feita

constitucionalmente, onde cada esfera governamental recebe uma parte da soberania estatal.

Horta (2010, p. 424) aduz que a Constituição Federal de 1988 modificou a repartição

das competências da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A clássica

distribuição dos poderes enumerados à União e dos poderes reservados aos Estados, técnica

adotada pela Constituição dos Estados Unidos, se incorporou ao federalismo brasileiro desde

1891, com os breves acréscimos das constituições de 1934, 1946 e 1967. E para admitir

legislação complementar dos Estados, recebeu nova configuração formal e material, a qual

conduziu a uma razoável ampliação dos poderes legislativos dos Estados e dos Municípios

Ainda segundo Horta, a repartição de competências serve para identificar as tendências

do federalismo constitucional, podendo ser este sede tanto da centralização, com o sacrifício

da autonomia, como fortalecimento desta mesma autonomia. E o Brasil seguiu o rumo do

fortalecimento, na Carta de 1988, distribuindo as competências em: competência geral da

União (artigo 21, incisos I a XXV); competência legislativa privativa da União (artigo 22,

incisos I a XXIX); competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios (artigo 23, inciso I a XII, § único); e a competência de legislação concorrente da

União, dos Estados e do DF (artigo 24, incisos I a XVI, §§ 1º a 4º) (HORTA, 2010, p. 414).

Segundo Jair Eduardo Santana (1998, p.138):

O mecanismo da divisão tripartida das competências faz com que a competência municipal não possa ser mutilada por obra de legislação da União ou dos Estados-Membros. Cria-se, assim, uma área onde somente o Município pode livremente transitar. Impede-se com isso qualquer interpenetração das demais esferas de governo na referida seara.

Agora, no que concerne aos entes federados, segundo Nelson Nery Costa (2006, p.

232), no modelo norte-americano de federação, existia, além da União e dos Estados, o

condado e a comuna. O condado era composto geralmente por várias comunas, que por sua

vez, possuía um peculiar sistema administrativo, conduzido, politicamente, por meio de uma

forma de democracia direta, e não representativa, que era utilizada apenas pelos governos da

União e dos Estados.

21

Desta forma, Tocqueville (1977, p. 54) entendia, exatamente, que, nas comunas, as

ações legislativas e governamentais estavam mais próximas dos governados, e, por isso,

valorizava e defendia sua existência. Para ele, a comuna constituía-se como o vetor

fundamental do federalismo norte-americano, capaz de assegurar as liberdades políticas:

Por isso mesmo, é na comuna que reside a força dos povos livres. As instituições comunais são para a liberdade aquilo que as escolas primárias são para a ciência; pois a colocam ao alcance do povo, fazendo-o gozar do seu uso pacífico e habituar-se a servir-se dela. Sem instituições comunais, pode uma nação dar-se um governo livre, mas não tem o espírito da liberdade. Paixões passageiras, interesse de um momento, o acaso das circunstâncias, podem dar-lhe as formas exteriores da independência, mas o despotismo encerrado no interior do corpo social cedo ou tarde aparece de novo à superfície. (TOCQUEVILLE, 1977, p. 54)

Deve-se notar, entretanto, que, no Brasil, além de uma valorização fática da figura dos

Municípios, a Constituição Federal de 1988 elevou-os à categoria de ente federativo (artigos

1° e 18 da CF/88), ao lado dos Estados-membros e da União, o que seria um ponto particular

ou diferenciador do federalismo original americano, conforme acentua Bastos (1988, p. 232):

Desde o momento em que a Constituição brasileira alçou o Município a entidade condômina do exercício das atribuições que, tomadas na sua unidade, constituem a soberania, não poderia, para ser conseqüente consigo mesma, deixar de reconhecer que a própria Federação estava a sofrer um processo de diferenciação acentuada, relativamente ao modelo federal dominante no mundo, que congrega apenas a ordem jurídica central e as ordens jurídicas regionais: a União e os Estados Membros.

Corroborando com este entendimento, está também Raul Machado Horta (2010, p. 413-

414), que, ao discorrer sobre o esforço de reconstrução e retificação do federalismo brasileiro,

tem como mérito inegável da Constituição de 1988, a inclusão do Município como ente

federativo, atribuindo-lhe o poder de auto-organização mediante a elaboração de sua lei

orgânica. São estas suas palavras:

[...] Projetou-se além da edificação reconstruída, para introduzir novos fundamentos e modernizar o federalismo constitucional brasileiro. Entre os novos fundamentos, sobressai a singular inclusão do Município entre os entes que compõem a união indissolúvel da República Federativa, no artigo inicial da Constituição (art. 1º). Essa eminência do Município não dispõe de correspondência nas anteriores Constituições Federais Brasileiras, nem tão pouco nas Constituições Federais dos Estados Unidos, do México, Argentina, Venezuela, Áustria, Alemanha, Canadá, Índia, Suíça e Austrália. A inovação da Constituição adveio da atração sugestionadora do movimento municipalista, que rompeu o quadro da lógica constitucional e erigiu o Município autônomo em componente da República Federativa.

Vale ressaltar que, apenas o Estado Federal brasileiro possui personalidade jurídica de

Direito Público internacional, a União possui personalidade jurídica de Direito Público

interno, sendo, portanto, autônoma em relação aos Estados e Municípios, competente para

22

exercer a soberania do Estado Brasileiro. Já os Estados-membros, os Municípios e o Distrito

Federal são entidades federativas dotadas de personalidade jurídica de direito público interno.

Tem-se ainda como mérito da Constituição de 1988, o favorecimento ao regionalismo,

ao facultar aos Estados a instituição de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

microrregiões, para tender a funções públicas de interesse comum. Também o fato de haver

diminuído o campo regulatório da intervenção federal (artigos 34, 35 e 36), sendo esta

permitida nos casos extremos de conduta lesiva ao equilíbrio federativo. Alargou-se, ainda, a

autonomia normativa dos Estados com o seu ingresso na legislação concorrente, bem como se

atribuiu às Constituições estaduais, a organização da sua justiça e a definição da competência

dos tribunais estaduais, obedecidos os princípios da CF/88 (HORTA, 2010, p. 415).

Assim, o federalismo constitucional de 1988 exprime uma tendência de equilíbrio na

atribuição de poderes e competências à União e aos Estados. Ofereceu mecanismos capazes

de assegurar o convívio entre os poderes nacionais-federais da União e os poderes estaduais-

autônomos das unidades federadas. Segundo Horta (2010, p. 416): “As bases do federalismo

de equilíbrio estão lançadas na Constituição de 1988”.

1.3 O princípio federativo e as características do federalismo brasileiro

A forma federativa do Estado brasileiro é configurada como uma garantia

constitucional, visto que o legislador constituinte, no artigo 60, § 4º, inciso I, da atual

Constituição, determinou expressamente a impossibilidade de qualquer proposta de emenda

constitucional tendente a abolir a Federação.

O artigo 1° da Constituição Federal afirma que a República Federativa do Brasil é

formada pela união indissolúvel dos Estados, Distrito Federal e Municípios; sendo

completado pelo artigo 18, que prevê que a organização político-administrativa da República

Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,

todos autônomos e possuidores da tríplice capacidade de auto-organização e normalização

própria, autogoverno e auto-administração. Conclui Moraes (2003, p. 268):

Dessa forma, inadmissível qualquer pretensão de separação de um Estado-membro, do Distrito Federal ou de qualquer município da Federação, inexistindo em nosso ordenamento jurídico o denominado direito de secessão. A mera tentativa de secessão do Estado-membro permitirá a decretação de intervenção federal (CF, art. 34, I), devendo sempre a Constituição ser interpretada de sorte que não ameace a organização federal por ela instituída, ou ponha em risco a coexistência harmoniosa e solidária da União, Estados e municípios.

23

O princípio federativo no Brasil foi consagrado nas constituições republicanas desde

1891 e tem duas finalidades básicas: a unidade nacional e a necessidade descentralizadora

(MORAES, 2003, p. 268). Corroborando com este entendimento está também Celso Ribeiro

Bastos (1989, p. 249), para o qual, o federalismo tornou-se a forma de organização

predominante do Estado democrático, devido à descentralização do poder, que, segundo ele, é

o meio fundamental para o exercício da democracia:

Quer dizer, quanto mais perto estiver a sede do poder decisório daqueles que a ele estão sujeitos, mais probabilidade existe de o poder ser democrático. Esse é um ponto fundamental: não teremos uma autêntica democracia no Brasil se não houver uma forte tendência descentralizadora. Urge, pois, abrir mão de certas velharias inseridas na Constituição, que confundem a federação com um mecanismo de convivência de Estados carentes de unidade nacional pra abraçar a federação como um instrumento de democracia.

Dentro desse contexto democrático, assume o Município papel essencial, pois além de

concentrar as atividades sociais e políticas de seus habitantes, é nas cidades onde vivem os

cidadãos, onde usufruem seus direitos e exercem seus deveres. Na federação brasileira, não

existe hierarquia entre os entes federados, entretanto diante desta descentralização política,

faz-se necessária uma delimitação de competências, para uma convivência pacífica. É o que

se verá no capítulo seguinte.

Carraza (2010, p.139) ao falar sobre a relevância jurídica do princípio federativo no

Brasil afirma o seguinte:

[...] por exigência do princípio federativo – que o diploma Máximo considerou um dos pilares sobre os quais se assenta o edifício jurídico nacional – nem a União pode invadir a competência tributária dos Estados, nem estes a da União. Do mesmo modo, aos Estados, porque, juridicamente iguais entre si, é defeso se apossarem das competências tributárias uns dos outros.

Complementando este entendimento, Horta (2010, p. 419) afirma que a forma federativa

de Estado é conceito complexo, que envolve um conjunto de elementos, bastando que a

proposta de emenda venha a ferir um deles, para incidir na vedação da irreformabilidade.

Desta forma, além do princípio da indissolubilidade do vínculo federativo, constante no

artigo 1° (entre a União, os Estados, os Municípios e o DF), a Constituição Federal de 1988

estabelece algumas características, modeladoras do federalismo brasileiro, que são peças

constitutivas e configuram a fisionomia da forma federativa de Estado constitucional, não

sendo passíveis, portanto, de reforma por meio de emenda. Somente o Poder Constituinte

24

originário, na elaboração de nova Constituição Federal, poderia alterar essa configuração

federativa. Dentre essas características estão as seguintes (HORTA, 2010, p. 420-421):

- pluralidade dos entes constitutivos (CF, artigo 18);

- possibilidade de criação de novo Estado ou Município, modificação territorial

dependendo da aquiescência da população afetada, mediante plebiscito (CF, artigo 18, §§ 3º e

4º);

- vedações constitucionais para todos os entes federativos (CF, artigo 19);

- soberania da União e autonomia dos Estados, Distrito Federal e Municípios (CF,

artigos 21, I, II, 25, 29, 32);

- repartição constitucional das competências entre os entes federados (CF, artigos 21,

22, 23, 24, 30, 32, § 1º);

- intervenção federal nos Estados e no DF (CF, artigo 34); intervenção estadual nos

Municípios (CF, artigo 35), para manutenção do equilíbrio federativo;

- organização bicameral do Poder Legislativo federal, assegurada a existência da

Câmara dos Deputados, órgão dos representantes do povo e do Senado Federal, órgão dos

representantes dos Estados e do DF (CF, artigos 44, 45, 46);

- a igualdade da representação dos Estados e do DF no Senado (CF, artigo 46);

- iniciativa dos poderes estaduais para propor emendas à Constituição Federal (CF,

artigo 60, inciso III);

- Poder Judiciário da União, com a existência de um Supremo Tribunal Federal, para

exercer a função de guarda da Constituição e do Poder Judiciário estadual (CF artigos 92, I,

102, 125);

- Ministério Público, na qualidade de instituição essencial à função jurisdicional do

Estado, de órgão da ação de inconstitucionalidade e da representação, para fins da intervenção

federal da União e da intervenção estadual nos Municípios (CF, artigos 36, III e 139, IV);

25

- poder e competência tributária da União, dos Estados, Distrito Federal e Municípios,

observada a particularização dos tributos atribuídos a cada um deles (CF, artigos 145, 153,

154, 155, 156);

- repartição de receitas tributárias, objetivando promover o equilíbrio sócio-econômico

entre Estados e Municípios (CF, artigos 157, 158, 159 e 161, II).

26

1.4 A autonomia dos entes federados

Diante desta dicotomia entre centralização e descentralização, existente na história

político-constitucional brasileira, verifica-se que esta dialeticidade deve ser absorvida, não

como um momento perturbador, mas sim, como um produto da realidade, evolutivo.

No Brasil, a evolução da autonomia dos entes federados, dentro do Pensamento

Constitucional Brasileiro, é evidenciada, desde o estudo do período colonial, período em que

não havia nenhuma autonomia, para os Municípios, por exemplo. Já na Constituição de 1946,

o federalismo brasileiro passou a dispensar tratamento sistemático ao desenvolvimento

regional, visando corrigir disparidades entre as regiões brasileiras (HORTA, 2010, p. 286).

Atualmente, vive-se o período de maior autonomia dos entes federados com a promulgação da

Constituição Federal de 1988 e suas emendas.

Pode-se conceituar a autonomia com a junção de vários pontos comuns, e todos

importantes, nas definições de inúmeros publicistas renomados, acerca do assunto. Ainda nos

dizeres de Horta (2010, p. 332):

A autonomia é, portanto, a revelação de capacidade para expedir as normas que organizam, preenchem e desenvolvem o ordenamento jurídico dos entes públicos. Essas normas variam na qualidade, na quantidade, na hierarquia e podem ser, materialmente, normas estatutárias, normas legislativas e normas constitucionais, segundo a estrutura e as peculiaridades da ordem jurídica.

No atual ordenamento jurídico brasileiro, tem-se a autonomia como uma prerrogativa

política outorgada pela Constituição a entidades estatais internas (Estados-membros, Distrito

Federal e Municípios), para compor seu governo e prover sua administração (artigo 18 da

CF/88). É a administração própria daquilo que lhe é próprio. Daí, porque a Constituição

assegura a autonomia dos Estados e Municípios pela composição do seu governo e pela

administração própria, em tudo o que concerne ao seu interesse local (CF, artigo 30, inciso I).

A autonomia do Estado-Membro constitui elemento essencial à configuração do Estado

Federal (HORTA, 2010, p. 329). Diante disto, como exposto anteriormente, o federalismo

brasileiro caracteriza-se pela repartição de competências, feita constitucionalmente, que dá a

cada esfera governamental autonomia política, administrativa e financeira, ou seja, distribui

competências administrativas, legislativas e tributárias para os governos locais, como bem

ensina Geraldo Ataliba (2001, p. 37):

27

Exsurge a Federação como a associação de Estados (foedus, foederis) para formação de novo Estado (o federal) com repartição rígida de atributos da soberania entre eles. Informa-se seu relacionamento pela (autonomia recíproca da União e dos Estados, sob a égide da Constituição Federal) (Sampaio Dória), caracterizadora dessa igualdade jurídica (Ruy Barbosa), dado que ambos extraem suas competências da mesma norma (Kelsen). Daí cada qual ser supremo em sua esfera, tal como disposto no Pacto Federal (Victor Nunes).

Pode-se dizer que possui autonomia aquele ente que possuir independência política,

financeira e administrativa, desde que obedeça ao ordenamento jurídico vigente, visto que o

poder de governo, o poder de autodeterminação pertence apenas à Nação e só encontra limites

na determinação do próprio Estado (na federação brasileira a soberania nacional é da União,

que a exerce interna e externamente). Assim, tem-se que os entes federados não têm soberania

(poder exclusivo e absoluto do Estado-Nação, de organizar-se e dirigir-se de acordo com sua

vontade incoercível e incontrastável, sancionada pela força), mas têm autonomia para

imprimir direção própria nos negócios que lhes são próprios (MEIRELLES, 1996, p. 83).

Já o Município deve ser entendido como a base da organização política democrática,

pois é nele que estão as relações mais estreitas do poder público com os governantes. Daí a

importância do interesse local dentro das decisões políticas estatais. Significativa a lição de

Celso Ribeiro Bastos (1989, p. 277), acerca da conformação do interesse local:

Cairá, pois, na competência municipal tudo aquilo que for de seu interesse local. É evidente que não se trata de um interesse exclusivo, visto que qualquer matéria que afete uma dada comuna findará de qualquer maneira, mais ou menos direta, por repercutir nos interesses da comunidade nacional. Interesse exclusivamente municipal é inconcebível, inclusive por razões de ordem lógica: sendo o Município parte de uma coletividade maior, o benefício trazido a uma parte do todo acresce a este próprio todo. Os interesses locais dos Municípios são os que entendem imediatamente com as suas necessidades imediatas, e, indiretamente, em maior ou menor repercussão, com as necessidades gerais.

A idéia de autonomia é o traço fundamental que o município precisa assumir para que

possa ser identificado como uma organização política e não apenas como um órgão da

administração (COSTA, 2006, p. 69).

A Constituição Federal de 1988 inscreveu a autonomia municipal como prerrogativa

intangível, capaz de autorizar até intervenção federal para mantê-la ou restaurá-la, quando

postergada pelo Estado-membro (artigo 34, inciso VII, alínea c), como citado no item

anterior. Assim, enumera alguns princípios, de forma não-taxativa, que assegurem essa

autonomia (artigos 29 e 30 da CF/88), tais como a autonomia política, administrativa e

financeira.

28

A Autonomia Política é o poder de auto-organização. Segundo José Nilo de Castro

(1992, p. 92-95) as Câmaras Municipais possuem diversas funções, que seriam: a função

fundamental organizante, a função legislativa, a função meramente deliberativa, a função

fiscalizadora e a função julgadora. Observa-se, então, que, ao legislarem, e atendendo a

preceito constitucional (CF/88, artigo 29), cada município promulga sua Lei Orgânica, sua

Constituição Municipal.

Costa (2006, p. 15-24) acrescenta, ainda, que a autonomia política se refere à

eletividade do prefeito, do vice-prefeito e dos vereadores; legislação sobre assuntos de

interesse local, ou seja, consiste na eleição dos seus dirigentes. Para ele, os vereadores são os

legisladores municipais, são agentes políticos investidos de mandato legislativo, pelo sistema

partidário de representação proporcional, por voto secreto e direto.

Já a Autonomia Administrativa refere-se à administração própria, relativa à polícia, à

organização dos serviços públicos locais (artigo 30, inciso V), obras e ordenação do território

municipal (artigo 30, inciso IV). E a Autonomia Financeira diz respeito à decretação de

tributos e aplicação das rendas municipais, ou seja, é a capacidade de receber tributos dos seus

habitantes (artigo 30, inciso III).

Assim, têm os entes federados, a tríplice autonomia: política, financeira e

administrativa, dada pela Constituição Federal de 1988 (MORAES, 2003, p. 717-719).

A Constituição da República de 1988 integrou o Município na Federação como entidade

de terceiro grau (artigos 1° e 18), por não se justificar sua exclusão, já que sempre fora peça

essencial da organização político-administrativa brasileira, como resta demonstrado.

Segundo Meireles (1996, p. 42), a característica fundamental da atual Carta é a

ampliação da autonomia municipal, no tríplice aspecto político, administrativo e financeiro,

de acordo com os artigos 29 a 31, 156, 158 e 159. Extinguiu também a nomeação de prefeitos

para qualquer Município, manteve a eleição direta para vereadores (artigo 29) e vedou a

criação de tribunais, conselhos ou órgãos de contas municipais (artigo 31, §4°).

A referida Carta, em seu artigo 30, deu competência privativa ao Município, para

algumas matérias, na qual está incluída a de “legislar sobre assuntos de interesse local” (inciso

I) (expressão que melhor definiu as atribuições privativas da municipalidade), em substituição

29

à tradicional expressão “peculiar interesse”, consagrada em todas as Constituições

Republicanas anteriores (MEIRELLES, 1996, p. 42).

No artigo 23, a Constituição da República trata da competência comum da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Esse traço da competência é definido por Silva

(1990, p.415), como “a faculdade de legislar ou praticar certos atos, em determinada esfera,

juntamente e em pé de igualdade, consistindo, pois, num campo de atuação comum às várias

entidades sem que o exercício de uma venha a excluir a competência de outra”.

Já a autonomia financeira municipal está prevista no artigo 30, inciso III. E, com relação

aos tributos, a Constituição vigente ampliou a sua competência impositiva (artigo156) e

aumentou a sua participação nos impostos partilhados (artigos 158 e 159, § 3°).

A posição atual dos Municípios brasileiros caracteriza-se, portanto, pela falta de

intromissão discricionária dos governos federal e estadual. São dotados de renda própria, para

prover os serviços locais; elegem, livremente, seus vereadores e prefeitos; e realizam o self-

government (tão defendido por Visconde de Uruguai, em 1834), de acordo com a orientação

política e administrativa de seus órgãos de governo. Deliberam e executam tudo quanto

respeite ao interesse local, sem consulta ou aprovação do governo federal ou estadual. São

palavras de Meirelles (1996, p. 43):

Decidem da conveniência ou inconveniência da todas as medidas de seu interesse; entendem-se diretamente com todos os poderes da República e do Estado, sem dependência hierárquica à Administração federal ou estadual; manifestam-se livremente sobre os problemas da Nação; constituem órgãos partidários locais e realizam convenções deliberativas; e suas Câmaras cassam mandatos de vereadores e prefeitos no uso regular de suas atribuições de controlo político-administrativo do governo local.

Importa, aqui, um breve comentário acerca do self-government, defendido pelo

Visconde de Uruguai, em 1834 (um contexto político, onde se debatia a centralização e a

descentralização no Brasil). Tratava-se de um princípio também defendido por Tocqueville (e

implantado nos Estados Unidos da América), enfatizando a importância dos usos e costumes

do povo, para sua organização política e administrativa. Ao falar sobre o Ato Adicional de

1834, Uruguai (2002, p. 218) aduz o seguinte: “Demais o self-government não é um talismã

que possa usar quem queira. O self-government é o hábito, a educação, o costume. [...]”. Ele

acreditava que a maior ou menor, centralização ou descentralização dependia das

circunstâncias do país, da educação, dos hábitos e caráter nacionais e não apenas da

legislação.

30

Assim, a sua aplicação no Brasil, segundo Uruguai, dependia de uma estratégia de

controle dos poderes locais e do interesse privado, o que, considerando as condições do país

naquele momento, só seria possível pela centralização política e administrativa, que pudesse

preparar o país para receber tal princípio e, assim, os indivíduos poderiam se autogovernar.

Ele acreditava que a descentralização, naquele momento, poderia levar o país a uma

oligarquia. Segundo ele:

É incontestável que a excessiva centralização, quando se juntam a governamental e a administrativa, não é das coisas mais favoráveis à liberdade dos cidadãos [...] Há muitos assuntos nos quais a ação do interesse particular ou local é mais ativa, mais pronta, mais eficaz, mais econômica que a do governo. A absorção da gerência de todos os interesses [...] pelo governo central, mata a vida nas localidades, nada lhes deixa a fazer, perpetua nelas a indiferença e a ignorância de seus negócios, fecha as portas da única escola em que a população pode aprender e habilitar-se praticamente para gerir os negócios públicos (URUGUAI, 2002, p. 441-442).

Pelo exposto até aqui, pela evolução do pensamento histórico e constitucional da

autonomia no Brasil, pode-se dizer que, há muito tempo, o Brasil tenta evoluir no campo

político, mas parece que, com a Constituição de 1988, atingiu-se o apogeu desta autonomia.

O conceito de Município, por sua vez, foi diversas vezes alterado, de acordo com os

regimes que ora o consideravam como corporação meramente administrativa, ora dando-lhe

liberdade política e financeira. De uma forma ou de outra, todas as Constituições brasileiras

inscreveram, em seus textos, a tão aspirada autonomia municipal. São as palavras de

Meirelles (1996, p.42): “Essa autonomia, entretanto, até a Constituição de 1946, foi apenas

nominal”.

Desta forma, diante das atribuições políticas e de um poder de autogoverno, o

Município não é mais uma entidade meramente administrativa, como nas Constituições

anteriores, trata-se de um ente federativo, com todas suas prerrogativas.

José Nilo de Castro (2006, p. 34), em sua obra, de grande contribuição ao estudo do

municipalismo, peca, no entanto, quando não considera o Município como ente federado. São

estas suas palavras: “[...] nossos Municípios não são entes da Federação, nem gozam de status

federativo [...]”.

Também nesta linha de pensamento estão Silva (1998, p. 475) e Baracho (1982, p. 408-

409), que não consideram o Município como ente da Federação, principalmente, porque o

federalismo não pressupõe o Município como elemento essencial, não possui representação

31

no Senado Federal, não tem um Poder Judiciário próprio, não se lhe reconhece o poder de

apresentação de emendas à Constituição e não é passível de intervenção federal.

Entretanto, com o devido respeito aos referidos autores, ratifica-se que não é esta a

posição aqui adotada, principalmente diante da dimensão federativa dada ao Município pela

Constituição Federal, em seus artigos 1° e 18, sendo esta, pois uma realidade incontestável.

Corroborando com o pensamento de Hely Lopes Meirelles (1996, p. 44), posiciona-se este

trabalho no sentido de que o Município “é peça essencialíssima da nossa atual Federação”. O

que ele evidencia nesta passagem:

A Federação brasileira não dispensa nem prescinde do Município na sua organização constitucional. Segue-se, daí, que o Município brasileiro é entidade político-administrativa de terceiro grau, na ordem decrescente da nossa Federação: União – Estados – Municípios.

Meirelles (1996, p. 44, 45) cita então vários autores para confirmar esta posição, que

resumidamente afirmam ser o Município (brasileiro) entidade intra-estatal rígida, como a

União e os Estados; e ainda que o Município de hoje constitui uma ordem política e

administrativa inerente ao sistema federal brasileiro, inclusive porque a Constituição

estabeleceu entre outros pertinentes à matéria, o princípio da intervenção federal nos Estados

para e defesa da autonomia municipal.

1.5 Rumos do federalismo constitucional brasileiro

Como dito anteriormente, o Estado Federal, levando em consideração suas

características particulares, pode apresentar-se de maneira diversa, em determinado momento

histórico. Horta (2010, p. 274-275), citando Georges Scelle, diz que, se o constituinte se

inclinar pelo fortalecimento do poder federal, formar-se-ia um “federalismo contrípeto”, ou

por agregação; se, ao contrário, houvesse uma preservação maior do poder estadual, surgiria

um “federalismo centrífugo”, ou por segregação. Entretanto, o Estado poderia, optando pelo

bom senso, estruturar um equilíbrio, uma cooperação entre as forças da federação. Sendo este,

talvez, o caminho mais acertado nos rumos do federalismo atual. São as palavras de Horta:

Podendo ainda o constituinte federal voltar sua concepção para o equilíbrio entre as forças contraditórias da unidade e da diversidade, do localismo e do centralismo, concebendo um federalismo de cooperação, o federalismo de equilíbrio entre a União soberana e os Estados-Membros autônomos. A ênfase na supremacia da União fará predominar as relações de subordinação dentro do Estado Federal, enquanto a tônica no equilíbrio conduzirá a um razoável campo para o desenvolvimento das relações de cooperação, sem prejuízo do primado da União Federal nas questões de sua competência de Estado soberano.

32

É no federalismo de equilíbrio que se inspirou o constituinte federal brasileiro, de forma

que o indispensável exercício dos poderes federais não venha inibir os poderes dos Estados.

Os princípios constitucionais da Federação, sendo respeitados pelos Estados, preservam a

supremacia da Constituição Federal, que também é protegida pelo Poder Judiciário, de um

modo geral, e pelo Supremo Tribunal Federal.

Desta forma, o federalismo de equilíbrio preserva a integridade da Nação, a

indissolubilidade do vínculo federativo, o desenvolvimento da União e dos Estados e a

realização dos objetivos de um Governo democrático (HORTA, 2010, p. 287).

Horta (2010, p. 430-431) assevera, ainda, que, configurada a forma de Estado, a tarefa

da reforma constitucional consistiria no fortalecimento das linhas de sustentação do

federalismo de equilíbrio, que o texto de 1988 adotou:

Restaurando as características fundamentais da concepção federal e aperfeiçoando os instrumentos de sua manifestação, o constituinte de 1988 introduziu na formulação constitucional brasileira o federalismo de equilíbrio, que representa o modelo mais avançado de organização do Estado nas Constituições Federais contemporâneas. Por isso, a missão do constituinte da reforma constitucional, no âmbito da forma federativa de Estado, deverá consistir no aprimoramento do modelo, para consolidar na Constituição o federalismo apto a enfrentar os desafios tecnológicos e as soluções globalizantes que assinalarão, em movimentos coincidentes, o crepúsculo do século XX e o alvorecer de um mundo renovado no século XXI.

Assim, dentre vários assuntos passíveis de reformulação constitucional, pode-se

destacar o aumento da autonomia municipal, a preservação da técnica de repartição de

receitas federais e estaduais para os Municípios, bem como a ampliação da competência

comum no que diz respeito à regulação de assuntos de interesse comum, entre os entes

federados, que tenham repercussão interestadual e intermunicipal, tendo sempre em vista o

aprimoramento do federalismo constitucional brasileiro.

2 A DISCRIMINAÇÃO CONSTITUCIONAL DE RENDAS NO BRASIL

Como explicitado no capítulo anterior, um dos pontos caracterizadores do Estado

Federal é o fato de a repartição de competências entre os entes federados ser estabelecida pela

própria Constituição Federal.

Entretanto, esta competência refere-se ao sentido lato da expressão, abrangendo aí as

competências gerais dos entes federados, que estão no título III – Da Organização do Estado,

nos artigos 21 a 25 da CF/88. Cabendo, neste estudo, apenas uma análise da competência de

legislação concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal, tratada no artigo 24, inciso

I, da Carta Magna, no que se refere, especificamente, sobre o Direito Tributário. O que remete

esta pesquisa ao Título VI – Da tributação e do Orçamento, artigos 145 a 169, da CF/88.

Desta forma, para um melhor entendimento do tema, considera-se discriminação

constitucional de rendas expressão genérica, que compreende a atribuição de competência e a

distribuição de receitas tributárias, entre os entes federados (MACHADO, 2004, p. 48).

Assim, faz-se necessário o esclarecimento de alguns temas, tais como: competência e

competência tributária, para se chegar ao tema da atribuição constitucional de competências e

da repartição de receitas tributárias, no ordenamento jurídico brasileiro, propriamente dito. Ao

final, far-se-á uma breve explanação sobre os limites jurídicos estabelecidos aos entes

federados, para exercer a sua competência constitucional, em matéria tributária no Brasil.

2.1 Competência

A autonomia das entidades federativas pressupõe a repartição de competências

legislativas, administrativas e tributárias, sendo, pois, um dos pontos caracterizadores e

asseguradores do convívio no Estado Federal. Para Silva (1998, p. 413), competência é a:

"faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, órgão ou agente do Poder Público para

emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de que se servem os

órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções".

34

A própria Constituição Federal estabelecerá as matérias próprias de cada um dos entes

federativos, União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, e, a partir disso, poderá

acentuar a centralização de poder, ora na própria Federação, ora nos Estados-membros.

Segundo Moraes (2003, p. 287), o princípio geral que norteia a repartição de competência

entre as entidades componentes do Estado Federal é o da predominância do interesse.

Pelo princípio da predominância do interesse, à União caberão aquelas matérias e

questões de predominância do interesse geral; ao passo que aos Estados, referem-se as

matérias de predominante interesse regional, e aos municípios concernem os assuntos de

interesse local. Em relação ao Distrito Federal, por expressa disposição constitucional (CF,

artigo 32, § 1°), acumulam-se, em regra, as competências estaduais e municipais, com a

exceção prevista no artigo 22, XVII, da Constituição Federal de 1988.

2.2 Competência tributária

O estudo da competência tributária é um tema constitucional, na medida em que o

assunto foi amplamente discutido pelo constituinte. A competência tributária está toda

definida nos artigos 145 a 162, da Constituição Federal. É exercida pelas três entidades

políticas autônomas e independentes que compõem a Federação: a União, os Estados e os

Municípios, além do Distrito Federal.

Por inexistir, constitucionalmente, hierarquia entre os referidos entes estatais, a Carta

Magna, de modo explícito, estabeleceu um sistema de repartição de competência legislativa

de cada um. Esse quadro impositivo delimita a área de atuação dessas pessoas jurídicas de

direito público interno, impondo ordem no exercício dessa atividade, onde o contribuinte é

chamado para garantir, com seus recursos, as despesas obrigatórias do Estado.

O complexo da distribuição dessas competências é denominado, pela doutrina, como

discriminação constitucional de rendas tributárias. Em síntese, a discriminação de rendas

tributárias pode ser considerada como sendo um princípio constitucional de natureza absoluta

que, embora atribua o poder tributário a cada pessoa jurídica de direito público contemplada

pela Constituição Federal, impede que o exercício desse poder ultrapasse os limites fixados,

vedando, assim, a invasão de esfera de competência de cada ente federado.

35

O exercício da competência tributária está subordinado a todos os princípios

constitucionais explícitos, enumerados, e aos implícitos, decorrentes da forma republicana de

governo, do sistema federativo e do regime democrático.

* CONCEITO

É a atribuição ou o poder, diretamente haurido da Constituição, para editar leis que

abstratamente instituam tributos, observadas as normas gerais de Direito Tributário. Somente

têm competência tributária, no Brasil, as pessoas que possuem capacidade para legislar, ou

seja, as denominadas pessoas políticas ou entes federados: União, Estados, DF e Municípios.

Segundo Carraza (1986, p.146):

Competência tributária é a aptidão para criar tributos, descrevendo (ou alterando), por meio de lei (no caso, ordinária) seus elementos essenciais (hipótese de incidência, sujeito ativo, sujeito passivo, base de cálculo e alíquota). Noutro dizer, é a habilitação, a faculdade potencial, que a Constituição confere a determinadas pessoas, para que tributem.

Paulo de Barros Carvalho (2002, p. 116-117) conceitua competência tributária, como

“uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes de que são portadoras as pessoas

políticas, consubstanciada na faculdade de legislar para a produção de normas jurídicas sobre

tributos.” Ichihara (1994, p. 89), por seu turno, conceitua competência tributária "como o

limite do poder fiscal para legislar e cobrar tributos". Mas, a rigor, a competência tributária é

a aptidão não só para criar, cobrar e fiscalizar tributos, mas também para atingir outros fins,

como aumentar, parcelar, diminuir, isentar. Para Machado (2004, p. 260):

A atribuição constitucional de competência tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados, nas leis orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios e o que estabelece o Código Tributário Nacional (art. 6 do CTN).

Em razão do princípio Federativo adotado pelo Brasil, exige-se uma distribuição,

repartição ou mesmo discriminação de competências tributárias (artigo 145 da CF/88),

objetivando prevenir os conflitos e invasões de uma pessoa política por outra.

Somente as pessoas jurídicas de direito público, dotadas de poder legislativo, possuem

competência tributária exercida por lei. Na verdade, quem recebe tal direito, são as pessoas

jurídicas de direito público interno, nos termos dos artigos 153, 154, 155 e 156 da CF/88, uma

vez que os tributos devem ser destinados, exclusivamente, para fins públicos, e nunca

particulares.

36

Nenhuma outra pessoa jurídica possui competência tributária no ordenamento pátrio,

nem mesmo as autarquias (pessoas jurídicas de direito público com atribuições tipicamente

estatais). O que pode ocorrer é que algumas autarquias, como é exemplo o INSS, recebam da

pessoa política que detém a competência tributária (no caso do INSS, quem detém a

competência relativa às contribuições que ele administra é a União), por outorga, atribuições

relativas à arrecadação e fiscalização dos tributos, bem como a execução de atos normativos,

em matéria tributária e prerrogativas processuais.

A pessoa jurídica de direito público que receba da pessoa política competente tais

atribuições, passa a ter capacidade tributária ativa, ou seja, está apta a integrar a relação

jurídica obrigacional tributária no pólo ativo, como sujeito ativo da relação.

O fato de pessoas jurídicas de direito público, como o INSS, poderem ser sujeitos ativos

de relações jurídicas tributárias, não confere a elas competência tributária. A competência é

indelegável e somente a possui quem pode legislar, as pessoas políticas.

Assim, não se pode confundir capacidade com competência:

- Competência: atribuída a um ente estatal dotado de poder legislativo, pela

Constituição. Exercida mediante edição de lei.

- Capacidade: de ser sujeito ativo na relação tributária, atribuída pela Constituição ou

por uma lei, a um ente estatal, não necessariamente dotado de poder legislativo. Exercida

mediante atos administrativos.

O ente estatal dotado de competência legislativa pode ter ou não capacidade tributária.

Com edição de lei exerce a competência, e com a prática de atos administrativos, exerce a

capacidade. Nos dizeres de Machado (2004, p. 262):

[...] (a) a competência tributária é indelegável; (b) as funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, podem ser atribuídas a pessoas jurídicas de direito público; (c) a simples função de arrecadar, função de simples caixa, pode ser atribuída a pessoas de direito privado.

Outro ponto merece destaque, é o fato de que nenhum outro instrumento normativo

pode, no Brasil, estabelecer, limitar ou extinguir competências tributárias, salvo as emendas

constitucionais. Mesmo elas, entretanto, quando se trata de competência tributária, encontram

37

fortes limitações no § 4º, do artigo 60, da CF/88, parágrafo esse que enumera as cláusulas

pétreas.

Não significa, por outro lado, que não sejam possíveis alterações à distribuição de

competências rigidamente traçadas pelo constituinte originário. Prova de que alterações e até

supressões são cabíveis, é o caso da EC nº 3/93. Esta emenda determinou a extinção de

competência para a instituição de dois impostos que haviam sido originariamente previstos na

Carta de 88: o imposto adicional ao imposto sobre a renda (AIR), dos estados e DF; e o

imposto sobre vendas a varejo de combustíveis líquidos e gasosos (IVVC), dos municípios e

DF. Esta supressão de competências, todavia, não foi entendida como tendo colocado em

risco a federação, uma vez que a perda da arrecadação decorrente desses impostos não chegou

a prejudicar de forma importante a autonomia financeira dos entes federados.

Vale ressaltar que, a Constituição não cria tributos. Confere, sim, competência às

pessoas políticas para que estas o instituam por meio de lei, regra geral lei ordinária. Desta

forma, quem cria é a pessoa jurídica de direito público interno, titular da competência.

* CARACTERÍSTICAS

A competência tributária, no Brasil, tem como principais características: ser privativa,

incaducável, indelegável, inalterável, irrenunciável e facultativa. Como se expõe a seguir.

A competência tributária é privativa da União, dos Estados-Membros, do Distrito

Federal e dos Municípios, por expressa determinação constitucional. Ao se dizer privativa,

entenda-se exclusiva para instituir, cobrar e fiscalizar o tributo de sua competência. Ex.: a

competência que a União recebeu para instituir o Imposto de Renda exclui os demais órgãos

tributantes de instituí-lo (Estado, Município e Distrito Federal), ou seja, há uma proibição de

seu exercício, por quem não tenha sido consagrado com esse direito. (CARRAZA, 2010, p.

528).

A competência tributária, além de ser privativa, é incaducável, ou seja, não há prazo,

não há um lapso temporal para o seu exercício, ela perdura no tempo. Ex.: imposto sobre

grande fortuna – a União poderá exercer a competência a qualquer momento.

O não-exercício da competência tributária, ainda que prolongado no tempo, não tem a

propriedade de impedir que a pessoa política venha, ao final, criar o tributo que lhe foi

constitucionalmente deferido.

38

Competência tributária nada mais é que competência para legislar sobre tributos. A

competência legislativa tributária é competência legislativa incaducável. Não se pode

confundir incaducabilidade com imprescritibilidade. O que é prescritível é a capacidade

tributária ativa, ou seja, o direito de exigir o tributo, que prescreve em cinco anos, conforme o

disposto no artigo 174, do CTN, e não direito de legislar sobre tributos. (CARRAZA, 2010, p.

691).

Ainda de acordo com Carraza (2010, p. 682), a competência tributária é indelegável,

pois a pessoa política não pode transferi-la a outra, nem mesmo por força de lei. As pessoas

políticas tributam por delegação constitucional, portanto, não se pode delegar o que se

recebeu por delegação (delegatur, delegare, non protest) da própria Constituição Federal.

Admitir delegação de competência para instituir tributo é aceitar que a Constituição seja

alterada por norma infraconstitucional. Tal delegação só seria possível se a própria

Constituição o autorizasse. (MACHADO, 2004, p. 261).

Delegável é a capacidade tributária ativa, isto é, o direito de arrecadar o tributo (artigo

7º, do CTN). A pessoa jurídica de direito público interno poderá delegar a outra pessoa

jurídica também de direito público, mediante convênio, a função de arrecadar e fiscalizar

determinado tributo, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas, em

matéria tributária, sem, no entanto, perder a competência tributária para instituir tal tributo;

não constituindo, neste caso, delegação de competência. A referida delegação compreende as

garantias e os privilégios processuais da entidade que a delegou, podendo ser revogada, a

qualquer tempo, por ato unilateral, porquanto é sempre em caráter precário (CTN, artigo 7º,

§§ 1º e 2º).

Não constitui também delegação da competência tributária a arrecadação de tributo por

pessoa jurídica de direito privado (CTN, artigo 7º, parágrafo 3º). O fato de uma pessoa

jurídica de direito privado vir a arrecadar determinado tributo não caracteriza, para esta, a

transferência da competência tributária. É o que ocorre comumente com os bancos, as

instituições financeiras que recebem dos entes políticos a incumbência para arrecadar os

tributos de suas respectivas competências, trata-se da simples função de caixa (MACHADO,

2004, p. 262).

A competência tributária é inalterável por decisão unilateral da própria entidade

tributante, ou seja, a própria entidade tributante não poderá alargar a sua competência

39

tributária. É incontestável que a alteração de competência só será admissível por meio de

Emenda Constitucional, não se permitindo, assim, que o princípio da Federação seja abalado

por modificações advindas da vontade do legislador infraconstitucional.

De acordo com Carraza (2010, p. 696), a competência tributária é irrenunciável, porque

a pessoa política não pode abrir mão, por definitivo, de sua competência tributária, no todo ou

em parte, pelo fato de ela lhe ter sido atribuída pelo poder constituinte originário, ou seja, foi

dada, a título originário, pela Constituição. Uma lei que o fizesse estaria, também, atentando

contra o livre exercício da função legislativa e seria juridicamente ineficaz. Trata-se de uma

matéria de Direito Público Constitucional e, portanto, indisponível.

A pessoa política é livre para exercitar sua competência tributária, é livre para criar ou

não os tributos que a Constituição lhe outorgou. O não-exercício da competência tributária

pela pessoa política não a defere a outra ou outras pessoas políticas, ou seja, o fato de ela não

exercer sua competência tributária não permite que outra pessoa política possa exercê-la (art.

8º, do CTN).

O não exercício jamais implicará a perda da competência tributária, podendo vir a ser

exercida a qualquer momento. Da mesma forma, não é possível a outro ente vir a exercer uma

competência tributária que não é sua, sob a alegação de que o titular da competência não a

exercita.

A facultatividade do exercício da competência é um dos pressupostos da competência

tributária, “em razão do que a falta de seu exercício não lhes afasta o direito assegurado pela

Constituição, que não estabeleceu qualquer espécie de perda em razão de mera inércia

legislativa”. Assim, o fato de a União não ter instituído o Imposto sobre Grandes Fortunas não

lhe retira a faculdade de exercer a sua competência para tal, em qualquer oportunidade

(RAMOS, 2002, on-line).

2.3 Atribuição constitucional das competências tributárias no Brasil

Diante do exposto, pode-se dizer que o Brasil possui uma estrutura federativa própria,

em que os Municípios integram a Federação e onde a própria Constituição Federal garante

que os entes federados atuem com pleno exercício de suas competências, a partir da técnica de

repartição dessas competências por ela adotada, bem como há uma proibição de invasão de

competências uns pelos outros. É o que adiante se passa a expor.

40

A União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal receberam da Constituição um

campo tributário próprio. Segundo Carraza (2010, p. 520), para as pessoas políticas, a

Constituição Federal é a “Carta das Competências”. Ela indica o que podem, o que não podem

e o que devem fazer, inclusive, e principalmente, em matéria tributária.

Como explicado anteriormente, a atribuição de competência tributária compreende a

competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas

Constituições dos Estados e nas leis Orgânicas do DF e dos Municípios, e observado o que

estabelece o Código Tributário Nacional (CTN, artigo 6º). Os Estados, o DF e os Municípios

estão ainda obrigados a obedecer às normas gerais de Direito Tributário, que estão

estabelecidas em leis complementares, conforme o artigo 146, da CF. Também o próprio

legislador federal deve respeitar as estipulações das leis complementares, só podendo revogá-

las por meio de lei complementar (MACHADO, 2004, p. 260). Vale ressaltar que o próprio

CTN, embora tenha sido votado como lei ordinária, tem força de lei complementar e, como

tal, só pode ser alterado por outra LC, visto que regula matéria reservada a LC (CF, artigo

146).

Outro ponto que merece destaque é o fato de que a distribuição de receitas, objeto do

próximo tópico, não afeta a distribuição de competências, ora estudadas, ou seja, os tributos

cuja receita seja distribuída, no todo ou em parte, a outras pessoas jurídicas de direito público

não deixam de pertencer à competência legislativa daquela a que tenham sido atribuídas

constitucionalmente. É o que reza o parágrafo único do artigo 6°, do CTN.

Agora com relação à partilha constitucional das competências, vigora, no sistema

tributário brasileiro, o regime das competências privativas (MACHADO, 2004, p. 281), tanto

para os impostos como para os demais tributos.

Entretanto, com relação às taxas e às contribuições de melhorias, tributos vinculados a

uma atividade estatal específica, a competência tributária decorre da competência para a

realização do serviço, para o exercício do poder de polícia ou ainda para a realização da obra

pública, estando configurada a competência comum ou concorrente, que seria aquela atribuída

pela Constituição Federal aos três níveis de governo, para legislar sobre direito tributário,

consoante a dicção do artigo 24, inciso I.

De acordo com Ichihara (1994, p. 32), baseado no artigo 145, II e III, da Constituição da

República, competência concorrente é aquela atribuída genericamente a uma ou mais

41

entidades políticas, como, por exemplo, a que possibilita a cobrança das “taxas” e

“contribuições de melhorias” pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios,

evidentemente dentro das respectivas competências de atuação.

Hugo de Brito Machado (2004, p. 285), entretanto, não concorda com esta classificação.

Para ele, a competência tributária é privativa do ente estatal que exercita a atividade

respectiva, podendo este instituir e cobrar o tributo respectivo, não cabendo ao Direito

Tributário a questão de saber se tal ente político é competente para o exercício da atividade a

que se vincula o tributo, sendo esta uma questão de Direito Administrativo:

Indicar-se como de competência comum os tributos vinculados não nos parece adequado. Preferimos dizer que esses tributos são privativos de quem exerce a atividade estatal a que se ligam, sendo a competência para o exercício dessa atividade estatal matéria estranha ao Direito Tributário.

Resumindo, tem competência para instituir e cobrar taxas e contribuições de melhoria, o

ente estatal que é competente para o desempenho da atividade respectiva. Corroborando com

este pensamento está também Carraza (2010, p. 677), para ele, tanto a União quanto os

Estados, os Municípios e o DF podem criar taxas e contribuições de melhoria, mas não as

mesmas taxas, nem a mesma contribuição de melhoria, por isso não pode ser considerada

comum a competência dada aos entes políticos e sim, privativa. Segundo ele:

[...] a criação legislativa da taxa ou da contribuição de melhoria pressupõe a existência da competência administrativa da pessoa política tributante. Dito de outro modo, a competência para instituir tributos vinculados está ligada ao exercício da competência administrativa que a entidade tributante recebeu da Constituição para prestar o serviço, para praticar o ato de polícia ou para realizar a obra pública. Isto significa que se a pessoa política realiza a atuação estatal sem ter competência administrativa para tanto, não pode instituir e arrecadar nenhum tributo vinculado (CARRAZA, 2010, p. 680).

Com relação aos impostos, a Constituição Federal tratou de delimitar-lhes o campo de

incidência, dividindo a competência privativamente para cada ente federativo, visto que são

tributos não-vinculados a uma atividade estatal específica. Desta forma, é a Constituição que

determina quais os impostos que a União, os Estados, o DF e os Municípios podem criar,

sendo a atribuição constitucional de competência para instituir impostos considerada uma

forma de limitação ao poder de tributar no Brasil, pois a Constituição delimita o campo fático

de atuação das pessoas políticas, definindo o âmbito constitucional para a criação de cada

imposto respectivo.

42

Desta forma, não pode o legislador infraconstitucional, de cada pessoa jurídica de

Direito Público, ao criar um imposto, atuar fora dos ditames constitucionais, sob nenhum

argumento (CTN, artigo 110). Assim, a partilha constitucional das competências tributárias,

no Brasil, está elencada nos artigos 153 a 156 da Constituição Federal de 1988, estando a

competência privativa de cada ente disposta da seguinte forma:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: I - importação de produtos estrangeiros; II - exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados; III - renda e proventos de qualquer natureza; IV - produtos industrializados; V - operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários; VI - propriedade territorial rural; VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar. [...] Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos; II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; III - propriedade de veículos automotores. [...] Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: I - propriedade predial e territorial urbana; II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.

Esta é, portanto, a chamada competência privativa, ou seja, é aquela atribuída específica

e exclusivamente a um ente político. Neste caso, apenas uma pessoa política pode tributar

determinado fato, excluindo-o da competência dos demais entes.

O Distrito Federal pode, dentro de seu território, criar impostos estaduais (CF, artigo

155) e também impostos municipais (CF, artigo 147).

Com relação à União, esta pode ainda, instituir impostos extraordinários de guerra (CF,

artigo 154, II), empréstimos compulsórios (CF, artigo 148) e contribuições (CF, artigo 149)

(tema específico do terceiro capítulo).

Trata-se, no primeiro caso, da competência extraordinária ou excepcional, atribuída a

algum dos entes tributantes, diante de circunstâncias extraordinárias, que demandam maiores

recursos do erário público, para enfrentá-las. No caso, à União, e apenas diante de uma guerra

43

externa (guerra declarada pelo presidente da República – artigo 84, XIX, autorizado ou

referendado pelo Congresso Nacional – artigo 49) ou sua iminência.

Este imposto não se submete ao princípio da anterioridade, mas está submetido ao da

legalidade. Dispõe o artigo 154, inciso II, da CF: “A União poderá instituir na iminência ou

no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua

competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua

criação”.

O mesmo artigo 154, agora em seu inciso I, acolhe a chamada competência residual,

que é o poder de instituir outros tributos não previstos na Carta Magna. E teria como

propósito permitir a criação de um tributo em função de peculiaridades locais, devendo sua

instituição ter sido atribuída aos Municípios, por estarem mais perto das pessoas e terem

maior capacidade de medir sua capacidade contributiva (MACHADO, 2004, p. 284).

No Brasil, entretanto, somente a União detém a competência residual para instituir

impostos, mediante a observância de três requisitos (CF, artigo 154, inciso I): I - que seja por

meio de lei complementar, II - que obedeça ao princípio da não-cumulatividade e, III - que

não tenham fato gerador ou base de cálculo, iguais aos outros já discriminados

constitucionalmente (princípio da originalidade), evitando assim a bitributação.

Ressalte-se, ainda, que a União deve respeitar o princípio da capacidade contributiva, o

qual originou sua competência residual, devendo descrevê-lo na hipótese de incidência dos

novos tributos. O que impede também a invasão de competência impositiva entre as pessoas

políticas União, Estados, Municípios (CARRAZA, 2010, p. 672-673).

Assim, com relação aos impostos, a competência residual é da União, como explicitado

acima. Entretanto, relativamente às taxas e contribuições de melhoria (tributos não

vinculados), a competência residual pertence aos Estados e ao Distrito Federal, conforme

indicam os artigos 25, §1º e 32, § 1º, ambos da CF.

Até o momento, falou-se apenas sobre o critério material de partilha das competências

impositivas dos entes federados, entretanto, apenas aqueles dispositivos mencionados não são

capazes de evitar conflitos de competência. Visto que “há, no Brasil, tantos impostos

estaduais, municipais e distritais quantas são as pessoas políticas autorizadas pela

Constituição Federal a instituí-los”. Desta forma respeitando os princípios federativos, da

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autonomia municipal e da autonomia distrital, a Constituição Federal adotou, também, o

critério territorial de repartição das competências impositivas, que determina que “a única lei

tributária aplicável seja a da pessoa política em cujo território o fato imponível ocorreu”. São

mais uma vez elucidativas as palavras de Carraza (2010, p. 675-677):

Ao atribuir competências impositivas aos Estados, aos Municípios a ao Distrito Federal, a Constituição valeu-se, além do critério material, também do critério territorial, com o quê inviabilizou eventuais usurpações, por parte destas pessoas políticas, no que atina aos impostos arrolados nos arts. 155 e 156 da Lei Maior. Enfim, a conjugação dos critérios material e territorial de repartição de competências impositivas reafirma que a União, cada um dos Estados, cada um dos Municípios e o Distrito Federal têm impostos privativos.

Como se pode observar, é a Constituição Federal quem atribui competência em matéria

tributária, traçando os contornos gerais do Estado nas suas três esferas de poder, cumprindo o

pacto federativo. “Como expressão pura desse pacto ela distribui as competências tributárias

entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, formando, juntamente com os

princípios e as normas de direito tributário, o Sistema Tributário Nacional” (RAMOS, 2002,

on-line).

2.4 Repartição de receitas tributárias na Constituição Federal de 1988

Como exposto no primeiro capítulo, o federalismo inicia-se com a Constituição norte-

americana de 1787, que traz um sistema baseado, principalmente, na manutenção de autonomia

dos Estados-membros, com a divisão de competências e de rendas, feitas constitucionalmente.

Daí sua importância, conforme ensina Amílcar de Araújo Falcão (1965, p.12):

A razão de ser da importância da discriminação de renda, na federação, é evidente e se consubstancia na circunstância mesma de constituir uma exaltação, um grau superlativo das autonomias, sobretudo as periféricas, cujo convívio equilibrado com a unidade central se quer assegurar. Por isso mesmo é que a discriminação de rendas, nas federações, costuma ser fixada no próprio texto constitucional. Só por exceção assim não acontece.

Com relação à repartição de receitas tributárias no Brasil, a regra geral é a de que a

União fica com o produto da arrecadação de seus tributos (impostos, taxas e contribuição de

melhoria) e da mesma forma ocorre com os Estados, Municípios e Distrito Federal. A União é

responsável ainda pelo produto da arrecadação dos Territórios Federais, dos impostos

estaduais e municipais (se ele não for dividido em municípios), de acordo com o artigo 147,

da CF/88.

45

A União arrecada ainda os empréstimos compulsórios (CF, artigo 148, incisos I e II), as

contribuições (CF, artigo 149) e os impostos extraordinários (CF, artigo 154, inciso II),

estando estes compreendidos, ou não, em sua competência impositiva ordinária.

Como dito no item anterior, relativamente aos impostos, a competência residual é da

União (CF, artigo 154, inciso I). Para as taxas e contribuições de melhoria, a competência

residual é dos Estados e do Distrito Federal (CF, artigos 25, §1º e 32, § 1º), tendo a mesma

divisão o produto da arrecadação respectiva.

De acordo com o § 1º, do artigo 149, da CF/88, os Estados, o DF e os Municípios ficam

com o produto da arrecadação das contribuições que cobrarem de seus servidores para o

custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social. Ficam também

com o produto da arrecadação do imposto da União sobre a renda e proventos de qualquer

natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas

autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem (CF, artigos 157, I e 158, I).

Os Estados e o Distrito Federal recebem ainda, 20% do produto da arrecadação dos

impostos que a União vier a instituir, com base em sua competência residual (CF, artigo 154,

I), de acordo com o artigo 157, II, da CF/88. Os Municípios recebem ainda 50% da

arrecadação do ITR (imposto territorial rural), incidente sobre os imóveis localizados em seus

territórios e a totalidade desta arrecadação, caso queiram, fiscalizá-lo e cobrá-lo, na forma da

lei, como lhes facultam os artigos 158, II e 153, § 4°, III, ambos da CF; o que não retira a

competência da União para instituir o ITR (CF, artigo 153, IV). O que se vê aqui é a

possibilidade de a mesma pessoa política, que partilha a receita tributária, participar

ativamente do lançamento e cobrança da exação, sendo esta uma novidade no sistema

constitucional tributário brasileiro (CARRAZA, 2010, p. 717).

A União deve, ainda, dividir o que arrecadar com o IR (imposto de renda) e com o IPI

(imposto sobre produtos industrializados) da seguinte forma: 21,05%, ao fundo de

participação dos Estados e do DF; 22,05%, ao fundo de participação dos Municípios; 3%,

para aplicação em programas de financiamento, ao setor produtivo das regiões Norte,

Nordeste e Centro-Oeste, por meio de suas instituições financeiras de caráter regional, de

acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semi-árido do

Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer; 1% ao

fundo de participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decênio do mês de

46

dezembro de cada ano (CF, artigo 159, I, a, b, c, d). Fica, entretanto, excluída desta divisão a

parcela da arrecadação do IR pertencente aos Estados, ao DF e aos Municípios, de acordo

com os artigos 157, I; 158, I e 159, § 1º, todos da CF/88.

A Constituição Federal, em seu artigo 153, § 5º, determina que incidirá o imposto sobre

operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativos a títulos ou valores imobiliários, sobre o

ouro, quando definido, em lei, como ativo financeiro ou instrumento cambial, devendo a

União dividir o produto de sua arrecadação da seguinte forma: 30% para o Estado, o DF ou o

Território, conforme a origem, e 70% para o Município de origem.

De acordo com o artigo 159, II, a União deverá entregar 10% da arrecadação do IPI aos

Estados e ao DF, proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos

industrializados, o que favorece os Estados exportadores de produtos industrializados, que,

segundo Carraza (2010, p. 719), seria para compensá-los da imunidade ao ICMS das

exportações de produtos industrializados, de acordo com o artigo 155, § 2º, X. Note-se que o

percentual de 10% é sobre o valor integral do IPI que a União vier a arrecadar, sem se

descontar a distribuição aos Fundos de Participação (CF, artigo 159, inciso I), visto que as

exportações de produtos industrializados estão imunes ao IPI (CF, artigo 153, § 3º, III).

A Constituição fixa um limite à partilha, pelos Estados, dos referidos 10% do IPI,

concretamente os Estados que mais exportarem produtos industrializados não poderão receber

mais do que 20% daqueles 10%, o valor que passar este limite será rateado entre os demais

Estados e o DF (CF, artigo 159, § 2º), o que faz com que os Estados que importem menos ou

não importem produtos industrializados recebam parte dos 10% de IPI arrecadado pela União,

ocorrendo aí uma verdadeira distribuição de renda entre os entes federados.

Ainda de acordo com o artigo 159, agora em seu inciso III, a União deverá entregar do

produto da arrecadação da CIDE, prevista no artigo 177, § 4°, 29% para os Estados e o DF,

distribuídos na forma da lei, observada a destinação dos recursos arrecadados para o

financiamento de programas de infra-estrutura de transportes.

Agora, com relação aos Estados, a Constituição Federal de 1988 manda que estes

também partilhem algumas de suas receitas tributárias com os Municípios localizados em seus

territórios. No artigo 158, inciso III, os Estados deverão repassar aos Municípios 50% do que

for arrecadado com o IPVA (imposto sobre a propriedade de veículos automotores), dos

veículos licenciados em seus territórios. Devem também entregar 25% do ICMS (imposto

47

sobre circulação de bens e serviços) arrecadado, aos Municípios localizados em seus

territórios (CF, artigo 158, IV).

O parágrafo único do artigo 158, da CF, delimita a forma de como estes 25%, do inciso

IV, serão creditados: I - três quartos deste valor correspondem ao valor adicionado, ou seja, ao

valor das mercadorias saídas, acrescido do das prestações de serviços, deduzido o das

mercadorias entradas, em cada ano civil (artigo 3°, § 1º, da LC 63/90); II - até um quarto dos

25% será creditado, segundo o que determinar a lei estadual.

Diante de todo o exposto, entende-se que o Município pode exigir dos Estados, a exata

quantia que lhe é devida, por força de mandamento constitucional e legal, com relação ao

produto arrecadado com o ICMS. É o que rege a súmula 578 do STF. Desta forma, tem-se

como claramente inconstitucional qualquer redução deste valor. É o que leciona Carraza

(2010, p. 724): “[...] o direito constitucional dos Municípios à participação no produto da

arrecadação do ICMS deve ser dimensionado pelo total da arrecadação, seja a que título for,

dos valores que ingressarem nos cofres estaduais”.

Por fim, estabelece o artigo 159, §3° da CF, que os Estados devem repassar aos

respectivos Municípios 25% dos recursos que receberem nos termos do inciso II, ou seja, 10%

do arrecadado com o IPI, proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos

industrializados, observados os critérios estabelecidos no artigo 158, da Carta Magna.

Ao contrário do que possa parecer, a discriminação constitucional de rendas tributárias

não interfere no exercício da tributação pelas pessoas políticas (CARRAZA, 2010, p. 727), os

artigos 160, 161 e 162 da CF, têm a finalidade, justamente, de facilitar esta repartição.

Conforme o artigo 160, da CF, é proibida a retenção ou qualquer restrição à entrega e ao

emprego dos recursos atribuídos aos Estados, ao DF e aos Municípios, neles compreendidos

adicionais e acréscimos relativos a impostos. Ou seja, não pode a União, sob qualquer

alegativa, deixar de repassar o valor exato que é devido aos demais entes federados.

Entretanto, o parágrafo único do respectivo artigo, considerado inconstitucional pela maioria

dos autores, diz que: “A vedação prevista neste artigo não impede a União e os Estados de

condicionarem a entrega de recursos: I – ao pagamento de seus créditos, inclusive de suas

autarquias; II – ao cumprimento do disposto no art. 198, § 2º, incisos II e III”.

48

Sendo os Estados, os Municípios e o DF conhecidos devedores da União e os

Municípios devedores dos Estados, na prática, o caput do artigo 160 estaria sem eficácia,

visto que a União e os Estados poderiam, simplesmente, não fazer o repasse devido aos

demais entes da Federação, com base no parágrafo único do mesmo artigo, condicionando-o

ao pagamento das dívidas, comprometendo suas autonomias políticas e jurídicas. Faz-se

necessário, portanto, a revogação do referido parágrafo, devendo a União e os Estados se

valerem de outros meios jurídicos para receberem o que lhes é devido, sem negar a

participação no produto de suas receitas tributárias (CARRAZA, 2010, p. 725-726), definidas

constitucionalmente. Já o artigo 161, da Carta Magna, determina que a lei complementar

deve:

I – definir valor adicionado para fins do disposto no art. 158, parágrafo único, I; II – estabelecer normas sobre a entrega dos recursos de que trata o art. 159, especialmente sobre os critérios de rateio dos fundos previstos em seu inciso I, objetivando promover o equilíbrio sócio-econômico entre Estados e entre Municípios; III – dispor sobre acompanhamento, pelos beneficiários, do cálculo das quotas e da liberação das participações previstas nos arts. 157, 158 e 159.

Na sequência, o artigo 162, da CF, diz que as pessoas políticas devem divulgar até o

último dia do mês subsequente ao da arrecadação, os montantes de cada um dos tributos

arrecadados, os recursos recebidos, os valores de origem tributária entregues e a entregar e a

expressão numérica dos critérios de rateio. Aduz ainda o respectivo parágrafo único que os

dados divulgados pela União serão discriminados por Estado e por Município; os dos Estados,

por Município.

Para finalizar, Hugo de Brito Machado (2004, p. 49) ensina, com propriedade que a

técnica de atribuição de competência é de grande importância, porque tem a virtude de

descentralizar o poder político, mas tem o inconveniente de não se prestar como instrumento,

para a minimização das desigualdades econômicas entre os Estados e os Municípios. Segundo

ele, “ao Estado pobre, em cujo território não é produzida, nem circula, riqueza significativa,

de nada valeriam todos os tributos do sistema. Por isto é que se faz necessária também a

distribuição de receitas tributárias”.

2.5 Os limites jurídicos ao exercício da competência tributária no Brasil

A Constituição Federal não é apenas um instrumento político de formação e

organização de uma sociedade institucionalmente constituída, mas é também um meio

49

jurídico, que por meio de suas regras e princípios, norteia e controla o exercício das atividades

estatais, garantindo a manutenção do Estado, a proteção dos cidadãos e a consecução de seus

objetivos.

Desta forma, verifica-se que o controle do poder de tributar, no Brasil, encontra seu

primeiro limite na observância das normas constitucionais. O respeito a tais normas é absoluto

e sua violação pela lei tributária torna esta imediatamente inconstitucional. Desta forma,

pode-se afirmar que “a Lei Maior Tributária – pelo menos no Brasil – é a Constituição”

(CARRAZA, 2010, p. 518).

O legislador encontra outro limite à tributação, nos princípios constitucionais,

comandos que garantem a harmonia e o equilíbrio, na relação jurídica tributária entre os entes

federados, conduzindo a tributação no país e que, por isso, também devem ser observados,

tais como o princípio republicano, federativo, da autonomia municipal e distrital, da

segurança jurídica, da igualdade, da reserva de competência, da anterioridade, etc.

As limitações à competência tributária estão previstas nos artigos 150, 151, 152 da

CF/88, e nos artigos 9º ao 11º, do CTN, e consistem em princípios e normas jurídicas, com a

finalidade de garantir o cidadão contra o abuso do poder de tributar do Estado. Tais

dispositivos da Constituição Federal constituem-se em vedações à entidade tributante, em

defesa do contribuinte. Existem, desta forma, dentre outros, diversos preceitos vinculantes que

limitam o exercício da competência tributária no Brasil, como adiante se passa a expor.

Pelo princípio da reserva de lei ou da legalidade estrita (CF, artigo 150, inciso I),

fica vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar

tributo sem lei que o estabeleça, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte.

Pode-se observar que este princípio garante outro também de suma importância, qual seja, o

princípio da segurança jurídica.

Desta forma, entende-se que, pelo princípio da legalidade, deve ainda a lei informar a

hipótese de incidência, o sujeito ativo, o sujeito passivo, a base de cálculo e a alíquota de cada

tributo, quando da sua criação. Deve-se também, observar se determinado tributo deve ser

instituído por meio de lei ordinária ou de lei complementar, conforme ditames constitucionais.

Existem algumas exceções ao princípio da legalidade, determinadas pela própria

Constituição Federal, desde que atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, é o

50

que diz o artigo 153, § 1º, da CF/88, que permite à União, alterar as alíquotas dos impostos

sobre importação e exportação, do imposto sobre produtos industrializados e do imposto

sobre operações financeiras. Da mesma forma acontece com a CIDE (contribuição de

intervenção no domínio econômico), relativa às atividades de importação ou comercialização

de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível, conforme o

artigo 177, § 4º, I, b da CF/88, incluído pela emenda constitucional nº 33, de 2001.

O princípio da anterioridade da lei está previsto no artigo 150, inciso III, alínea b, da

CF/88. Segundo este artigo, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos

Municípios, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, cobrar tributos no

mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.

O exercício financeiro coincide com o ano civil (1º de janeiro a 31 de dezembro). Desta

forma, exige-se que a lei que crie ou aumente tributos seja anterior ao exercício financeiro em

que o tributo será cobrado, visando à proteção do contribuinte.

Além do princípio da anterioridade, a eficácia da lei tributária se sujeita também ao

princípio da anterioridade mínima ou mitigada (CF, artigo 150, inciso III, alínea c),

introduzido pela emenda constitucional nº 42, de 2003, pelo qual o tributo instituído ou

aumentado só poderá ser cobrado após o prazo de 90 dias da sua publicação.

Desta forma, aplicando-se os dois princípios acima, tem-se que, se uma lei instituir um

tributo no mês de dezembro, por exemplo, esta só poderá valer no exercício seguinte, e ainda,

somente depois de decorridos os 90 dias; do contrário seria inconstitucional. Entretanto,

existem também algumas exceções a este princípio, quais sejam:

- os II, IE, IPI, IOF, além dos impostos extraordinários de guerra ou sua iminência

(artigo 150, § 1º, CF/88);

- os empréstimos compulsórios criados em razão de calamidade pública ou sua

iminência (artigo 148, I, CF/88);

- ato do poder executivo ou lei que alterar a alíquota da CIDE relativa às atividades de

importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e

álcool combustível (artigo 177, § 4º, I, b, CF/88);

51

- ICMS incidentes sobre combustíveis e lubrificantes, definidos em lei complementar,

sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade (artigo

155, § 4º, IV, c, CF/88).

Vale ressaltar que as contribuições (CF, artigo 149), em regra, obedecem ao princípio da

anterioridade, com exceção as de seguridade social, que estão regidas pelo artigo 195, § 6º, da

Carta Magna, obedecendo apenas à anterioridade de 90 dias.

Com relação ao parágrafo 4º, do artigo 177, da CF/88, introduzido pela EC nº 33/2001,

este será amplamente discutido no quarto e último capítulo deste trabalho, analisado como um

dos temas controversos acerca das contribuições no Brasil.

Em continuidade, tem-se o princípio da irretroatividade da lei tributária (CF, artigo

150, inciso III, alínea a). Segundo este princípio é vedado aos entes tributantes, cobrar tributo

em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver

instituído ou aumentado, garantindo assim, o estipulado no artigo 5º, inciso XXXVI, da CF/88

(o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada).

Desta forma, o tributo só poderá incidir sobre fatos geradores ocorridos após a vigência

da lei que o instituir, não cabendo à lei tributária alcançar fato gerador pretérito, sob pena de

ser declarada inconstitucional.

Verifica-se no artigo 150, inciso IV, da CF/88, mais um limite imposto à tributação no

país, como forma de proteger o direito de propriedade dos particulares contra eventuais

ingerências estatais: a Constituição elencou, ainda, o princípio da proibição de confisco. Ao

exercer sua competência tributária, a entidade tributante não pode cobrar do contribuinte valor

desproporcional ao seu patrimônio. Segundo José Afonso da Silva “o tributo não deve subtrair

mais do que uma parte razoável do patrimônio ou da renda do contribuinte”.

Ao lado do princípio da proibição de confisco está o princípio da capacidade

contributiva (CF, artigo 145, § 1º), segundo o qual, o legislador deve graduar a instituição do

tributo, levando em consideração a capacidade econômica do contribuinte, sendo facultado à

administração tributária, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o

patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

O princípio da igualdade tributária está inscrito no artigo 150, inciso II, da CF/88,

que assegura ser vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, instituir

52

tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, estando

proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,

independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos. Está,

portanto, o princípio da igualdade tributária diretamente ligado ao princípio da capacidade

contributiva. São as palavras de Ichihara (2002, p. 62):

Este salutar princípio, além de ser o ingrediente fundamental na implementação do princípio da isonomia ou da igualdade, aparece como instrumento de realização da justiça fiscal, que acabará por desembocar na realização da justiça social. [...] Tributar com maior ônus o detentor de maior capacidade contributiva, até no plano econômico, aparece como única forma para se buscar a melhor distribuição da renda e diminuir a desigualdade social.

Já o princípio da liberdade de tráfego de pessoas ou bens (CF, artigo 150, inciso V)

veda tributação ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais e

intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo

Poder Público. Este princípio busca ressalvar a unidade federativa, sem a imposição de

bloqueios à livre circulação de pessoas ou bens.

Também ligado ao princípio federativo, está o princípio da uniformidade da

tributação, constante no artigo 151, inciso I, da CF/88, que determina que os tributos

instituídos pela União sejam uniformes em todo território nacional, e que não implique

distinção ou preferência, em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em

detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promoverem o

equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do país. Sobre o

assunto, Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1990, p. 172) diz o seguinte:

[...] a preservação da unidade nacional recomenda que a União não distinga entre os que habitam o território brasileiro, em razão do Estado ou do Município a que se vinculam. Do contrário, a diferença de tratamento, ao privilegiar alguns em detrimento de outros, gerará forçosamente a discórdia e as dissidências que animarão propósitos secessionistas.

Ainda com base no artigo 151, agora com relação ao seu inciso II, é também vedado à

União, tributar a renda das obrigações da dívida pública dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, bem como os proventos e remuneração de seus agentes públicos, em níveis

superiores aos que fixar para suas obrigações e para seus agentes. Existe ainda, a vedação da

instituição pela União, de tributos de competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios

(CF, artigo 151, III).

53

Existe ainda, o princípio da não-discriminação tributária, previsto no artigo 152, da

Carta Magna, que dispõe: “É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios

estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua

procedência ou destino”. Desta forma, as unidades da federação não podem estabelecer

preferências a produtos ou serviços uns dos outros.

Até o momento, foram analisados apenas os princípios expressos na Constituição

Federal de 1988. José Afonso da Silva, entretanto, considera existir ainda o princípio da

universalidade, classificado como princípio geral da tributação, que, embora não esteja

expresso na CF, segundo ele, extrai-se da interpretação do artigo 19, inciso III, da Carta

Magna, que versa: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]

III– criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si”. Não devendo haver, desta

forma, nenhuma distinção com relação aos contribuintes, visto que, aos olhos da lei todos são

iguais, ou seja, basta que se pratique o fato gerador (a hipótese de incidência prevista na lei)

do tributo, para que haja a incidência deste. A CF prevê o princípio da universalidade

expressamente para o IR (imposto de renda), em seu artigo 153, § 2º, inciso I.

Existem ainda, alguns princípios, conforme prevê a CF, que são aplicáveis apenas em

relação a determinados impostos, são os chamados princípios específicos. São eles: princípio

da progressividade, princípio da não-cumulatividade e princípio da seletividade do imposto.

Não cabendo aqui, entretanto a análise de tais princípios, especificamente, porque não se

aplicam às contribuições.

Com relação às contribuições, objeto deste estudo, os princípios constitucionais

tributários aplicam-se da seguinte forma: as contribuições interventivas e corporativas seguem

os princípios da legalidade, da irretroatividade e da anterioridade; já as contribuições

previdenciárias (do empregador, sobre a folha de salários, sobre a receita ou faturamento e

sobre o lucro) não seguem o princípio da anterioridade nonagesimal, bem como outras fontes

destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, mediante lei

complementar (artigo 195, §§ 4º e 6º da CF). Entretanto, referidas contribuições serão

amplamente discutidas no próximo capítulo.

Além das já citadas, existem ainda outras limitações ao exercício da competência

tributária no Brasil. As imunidades tributárias, também determinadas pela Constituição

54

Federal, são instituídas por razões de privilégio ou de considerações de interesse geral, e

excluem determinados sujeitos da atuação do poder de tributar.

Faz-se necessária uma distinção entre a imunidade e a isenção. A primeira trata-se de

uma limitação do exercício do poder de tributar, prevista na CF, ou seja, é a exclusão

constitucional do poder de tributar, dirigida ao legislador, que impede o exercício da

competência tributária dos entes nos casos que especifica, sendo aplicável apenas aos

impostos. Inexiste, portanto, o fato gerador da obrigação tributária. Já a isenção é uma forma

de exclusão do crédito tributário que está no campo de incidência, ou seja, os fatos previstos

pelo legislador como necessários e suficientes à ocorrência do fato gerador existiram, mas há

lei que dispensa o pagamento do tributo, conforme se abstrai do artigo 175, do CTN, ou seja,

nesta, o fato gerador ocorre, porém o contribuinte é isento de pagar por determinação legal,

por meio de lei infraconstitucional.

As imunidades estão previstas no artigo 150, inciso VI, da CF/88, que estabelece ser

vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; b) templos de qualquer culto; c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

Conforme determina a Carta Magna, é ainda vedado à União instituir isenções de

tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, de acordo com

seu artigo 151, inciso III. Impede assim, a invasão de competência tributária pelos entes

federados e garante também, a possibilidade de isenção tributária, conforme as necessidades

particulares de cada um, atendendo assim, aos interesses estaduais ou municipais, sem a

intervenção da União. E, como forma de assegurar mais ainda esta independência federal, a

EC nº 3/93 alterou o § 6º, do artigo 150, da CF, que versa:

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155,§ 2º, XII, g.

Além dos casos de imunidade já citados, existem ainda, outros específicos que são

aplicáveis apenas a determinados impostos, nas hipóteses constitucionalmente indicadas.

55

Assim, não incidirá o IPI sobre produtos destinados ao exterior (artigo 153, § 3º, inciso III);

não incidirá o ITR sobre pequenas glebas rurais definidas em lei, quando as explore o

proprietário que não possua outro imóvel (artigo 153, § 4º, inciso II); não incidirá o ICMS nas

operações de mercadorias e produtos industrializados destinadas ao exterior; operações com

outros Estados, relativamente a petróleo, lubrificantes, combustíveis e energia elétrica; sobre

o ouro, como ativo financeiro, e nas prestações de serviço de comunicação, nas modalidades

de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita, baseados no artigo

155, § 2º, X; e ainda não incide o ITBI sobre bens e direitos incorporados à pessoa jurídica e

decorrentes de fusão, incorporação, cisão e extinção, salvo se esta for a atividade

preponderante do adquirente (artigo 156,§ 2º, I).

3 AS CONTRIBUIÇÕES NO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

Sobre o tema das contribuições, no Brasil, existem grandes discussões e algumas

divergências em relação a determinados aspectos, desde sua caracterização como espécie

tributária, quantas e quais são as contribuições identificadas, no sistema constitucional

tributário brasileiro, quais são as circunstâncias que justificam sua instituição. E uma questão

intrigante é a de se saber se é, constitucionalmente, possível a instituição de contribuições

gerais, ou seja, além das, expressamente existentes nos artigos 149, 195, 212, § 5º, 239 e 240,

se seria possível a instituição de outras mais, justificadas apenas pela necessidade do custeio

de atividades de cunho social, pela União, e se esta instituição estaria respeitando o princípio

federativo. Entretanto, esta questão será discutida no quarto capítulo, cabendo aqui, apenas

algumas elucidações acerca da origem, classificação e principais características das

contribuições, para um melhor entendimento do tema.

3.1 Contexto histórico e origem das contribuições

De acordo com Eduardo Rocha Dias (in: MACHADO, Hugo de Brito, 2003, p. 207),

“as contribuições são fruto do Estado social e interventor”. Diante desta afirmação, faz-se

necessária uma breve passagem pelos conceitos de liberalismo econômico e intervencionismo

estatal, chegando-se ao estado neoliberal, atual, no qual, as contribuições, ora estudadas, estão

inseridas.

Primeiramente, é preciso entender que o capitalismo se sujeita a um fenômeno cíclico, o

que pressupõe, portanto, altos e baixos em sua continuidade. Afinal de contas, trata-se de um

sistema econômico que acompanha a evolução da sociedade nos aspectos sociais e políticos.

O capitalismo moderno começa com a Revolução Industrial e as chamadas revoluções

"burguesas" liberais da Idade Moderna, marcadamente a Revolução Gloriosa inglesa (1640-

60), a Independência dos EUA (1776) e a Revolução Francesa (1789-99). Formou-se assim, o

arcabouço institucional de suporte ao desenvolvimento capitalista. Surgem as primeiras

teorias econômicas modernas: a Economia Política e o correspondente liberalismo.

57

O Liberalismo pode ser definido como um conjunto de princípios e teorias políticas, que

apresenta como ponto principal a defesa da liberdade política e econômica. Neste sentido, os

liberais são contrários ao forte controle do Estado na economia e na vida das pessoas. O

pensamento liberal teve sua origem no século XVII, por meio dos trabalhos sobre política,

publicados pelo filósofo inglês John Locke. Já no século XVIII, o liberalismo econômico

ganhou força, com as idéias defendidas pelo filósofo e economista escocês Adam Smith, além

de outros como Malthus, Ricardo e Mill. É o que ensina Paul Hugon (1995, p. 101):

A Escola Clássica propriamente dita consiste, portanto, naquela corrente científico-econômica iniciada, em 1776, com Smith, continuada particularmente com Malthus e Ricardo e completada, em 1848, por Stuart Mill e seus (Princípios de Economia Política). Todavia, não desaparece nos meados do século a influência exercida por essa escola, tal como a definimos, nem se circunscreverá apenas a Inglaterra. Continuará até nossos dias, sofrendo inflexões aqui e acolá. A autoridade da Escola impõe-se ao mundo: dará nascimento, na França, com Jean Baptiste Say, a importante corrente clássica, cuja expansão vai concorrer para a difusão das idéias de Smith por inúmeros outros países. A Escola Clássica deve a originalidade de suas concepções fundamentais a quatro homens: Adam Smith, Malthus, Ricardo e Stuart Mill.

Os princípios fundamentais do liberalismo são a defesa da propriedade privada, o

primado do indivíduo sobre o Estado, a prevalência da lei e do Direito, uma justiça

independente e eficiente, e uma democracia aberta, que permita a transparência das

instituições e o exercício do espírito crítico, além de uma ampla liberdade econômica (livre

mercado), e a consequente não intervenção do Estado, na economia (governo limitado).

Adam Smith era a favor das liberdades individuais, sem com isso desqualificar o Estado

como representante do bem comum, na ideia de que as ações individuais, movidas

exclusivamente pelo interesse próprio (pretendendo apenas sua própria segurança, seu próprio

ganho) seriam lideradas por uma “mão invisível”, a promover a realização do bem comum.

Ao seguir o seu próprio interesse, o indivíduo frequentemente, promove o da sociedade mais

eficazmente do que quando ele, realmente, tem a intenção de promover o interesse público.

Segundo Reginaldo Moraes (2001, p.13):

Smith afirma que o mundo seria melhor – mais justo, racional, eficiente e produtivo – se houvesse a mais livre iniciativa, se as atitudes econômicas dos indivíduos e suas relações não fossem limitadas por regulamentos e monopólios garantidos pelo Estado ou pelas corporações de ofício. Prega a necessidade de desregulamentar e privatizar as atividades econômicas, reduzindo o Estado a funções definidas, que delimitassem apenas parâmetros bastante gerais para as atividades livres dos agentes econômicos. São três as funções do governo na argumentação de Smith: a manutenção da segurança interna e externa, a garantia da propriedade e dos contratos e a responsabilidade por serviços essenciais de utilidade pública.

58

Porém, com a crise de 1930, houve um enfraquecimento no sistema capitalista, e a partir

do New Deal (1933-1937), o Estado passou a intervir na economia, regulamentando e

direcionando as relações e transações econômicas.

O New Deal foi uma política de intervenção estatal, criada com a finalidade de

recuperar e reformar a economia norte-americana, assistindo aos prejudicados pela grande

depressão, por meio de grandes obras estatais, subsídios a empresas, controle dos bancos e

pelo fordismo, que delimitava uma carga horária de trabalho de 8 horas diárias, para os

trabalhadores, e uma linha de montagem, na produção das indústrias. O que ocasionou uma

superprodução e uma redução dos custos, causando a queda dos preços das mercadorias.

Criou-se então, um pacto entre capital e trabalho, visto que era necessário um mercado

consumidor para aquela produção em grande escala, que foi efetivado pelo aumento dos

salários dos trabalhadores e a divisão do lucro das empresas. Isso que ocorreu também devido

a existência de fortes sindicatos.

Em 1944, ocorreu a conferência de Breton Woods, que estabeleceu regras para as

relações comerciais e financeiras, entre os países mais industrializados do mundo, criando um

gerenciamento econômico internacional, onde os EUA eram o líder. Tratava-se de um sistema

relativamente liberal, onde, primeiramente, vinha o mercado. Tentava-se portanto, uma

diminuição das barreiras ao fluxo de comércio e do capital privado. Foram criados o BIRD, o

FMI e o padrão dólar (ou paridade dólar-ouro).

Essa reforma, para o sistema, teve sustentação teórica e foi desenvolvida por John

Maynard Keynes. Embora defensor do capitalismo, ele afirma que o capitalismo é um sistema

socioeconômico essencialmente instável e tende para o desequilíbrio, necessitando assim, de

uma maior intervenção estatal. Essa nova doutrina originou o Welfare State, ou Estado de

bem estar social, baseado na noção de solidariedade e não mais na de liberdade.

O Estado tem agora maiores atribuições, passa a intervir, além dos temas sociais,

naqueles relacionados com a economia, aumentando a importância da atividade

administrativa, aumentando a atividade legislativa voltada para a disciplina econômica.

Muda-se a forma de agir do poder público, defende-se uma atuação positiva do Estado ligada

à solidariedade e à igualdade (GRECO, 2000, p. 101).

E é, neste contexto intervencionista, que surge a figura da contribuição, sofrendo a

tributação algumas modificações. Acrescenta-se aos impostos e taxas a figura das

59

contribuições sociais, trazendo a idéia da parafiscalidade ao Estado, destinado também, a

atender necessidades não apenas fiscais, mas as ditas "complementares", como a previdência

social e os interesses de categorias econômicas e profissionais. São as palavras de Eduardo

Rocha Dias (in: MACHADO, Hugo de Brito, 2003, p. 210-211):

Como características desta (parafiscalidade) aponta Antônio Theodoro Nascimento: a) delegação do poder fiscal a órgão oficial ou semi-oficial autônomo, de existência paralela ao Estado; b) destinação da receita a fins específicos; c) exclusão de referida receita do orçamento geral do Estado; d) subtração da cobrança e da aplicação de tais receitas à apreciação do Poder Legislativo.

As contribuições são, portanto, fruto do Estado social e interventor, sendo seu

aparecimento, decorrência direta do intervencionismo estatal, originado pelo Welfare State.

Ainda segundo o autor, “as contribuições se revelam um instrumento de intervenção do

Estado na economia e na ordem social” (Dias, in: MACHADO, Hugo de Brito, 2003, p. 211).

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 3°, adotando os novos fins que

passaram a orientar a atuação estatal, consagrou, como objetivo da República, a busca do

bem-estar social, como se pode observar nos incisos I e IV: construção de uma sociedade

livre, justa e solidária e promoção do bem de todos.

Têm-se como oportuno, entretanto, dar continuidade a este breve histórico. Após

atravessar a crise dos anos 70, países desenvolvidos passam a ter problemas como inflação,

recessão e desemprego, caracterizando a decadência da teoria keynesiana, para a economia, e

do Welfare State, originando a adoção do neoliberalismo ou Estado pós-social.

Na década de 1970, surgiu o neoliberalismo, com a Escola Monetarista, como uma

solução para a crise que atingiu a economia mundial, em 1973, provocada pelo aumento

excessivo no preço do petróleo, sendo, pois, impossível sustentar a conversibilidade do dólar

em ouro; e pela inflação resultante da grande quantidade de impostos, alta cobrança de taxas e

a diminuição da produção. Caracterizou-se assim, a quebra do pacto capital-trabalho, antes

estabelecido. Já não era mais possível manter os pesados investimentos, realizados após a II

Guerra Mundial, pois agora havia déficits públicos, balanças comerciais negativas e inflação.

Trata-se, agora, da aplicação dos princípios liberais, numa realidade econômica pautada

pela globalização e pelos novos paradigmas do capitalismo. Pode-se definir o neoliberalismo

como um conjunto de ideias políticas e econômicas capitalistas, que defende a mínima

participação estatal nos rumos da economia de um país. Pregam a diminuição do tamanho do

60

Estado, tornando-o mais eficiente, a abertura da economia para o capital internacional;

desburocratização do Estado; contra tributos excessivos; a favor do aumento da produção,

como objetivo básico, para atingir o desenvolvimento econômico e social.

Os críticos ao sistema afirmam que a economia neoliberal só beneficia as grandes

potências econômicas e as empresas multinacionais. Os países pobres ou em processo de

desenvolvimento (Brasil, por exemplo) sofrem com os resultados de uma política neoliberal.

Nestes países, são apontadas como consequências do neoliberalismo: desemprego, baixos

salários, aumento das diferenças sociais, monopólios e dependência do capital internacional.

Como contraponto às críticas, Milton Friedman (1984), em sua obra Capitalismo e

Liberdade, defende que o liberalismo enfatiza a liberdade como objetivo último e o indivíduo,

como entidade principal da sociedade. Segundo seu pensamento, a sociedade que coloca a

igualdade à frente da liberdade irá terminar sem igualdade e sem liberdade. Argumenta que a

liberdade econômica é uma condição essencial para a liberdade das sociedades e dos

indivíduos.

Para Nozick (1991) o bem-estar é maximizado, quando a coerção sobre a liberdade

individual, no exercício das escolhas, é minimizado. Seu trabalho enfatiza a importância da

liberdade, na medida do desenvolvimento econômico. Para ele, portanto, a liberdade tem

precedência na determinação do bem-estar. Desse modo, a contribuição dos bens e serviços

para o bem-estar deve ser condicionada à definição e à efetiva garantia dos direitos

individuais. Incluindo-se, a partir daí, a liberdade econômica, política e social, em estudos

sobre desenvolvimento econômico.

O liberalismo ou o neoliberalismo, embora preguem a mínima intervenção estatal e, por

isso, sofram duras críticas de autores preocupados com o os direitos humanos, sociais e a

necessidade da igualdade, deixam claro que o Estado Liberal não pode, nem deve, ser

considerado anárquico. Para isso, basta-se aprofundar a leitura e ver que, ao longo de suas

ideias liberais, vários autores sugerem medidas, propõem alternativas, para melhorar a vida

em sociedade, são abordados vários assuntos, tais como a distribuição de renda, o problema

da pobreza, a educação, a responsabilidade do capital e do trabalho, bem como diretrizes para

o bem-estar social.

Desta forma, não é o liberal, isento de qualquer sentimento social ou humano, é sim, um

defensor da liberdade, antes de tudo, que luta contra a opressão. Existe uma tentativa de

61

conciliar o livre mercado mundial ou a tendência global que é imposta ao países periféricos do

sistema capitalista, com suas reais necessidades, com os anseios sociais que são peculiares de

cada região do mundo. Neste sentido, Eduardo Rocha Dias (in: MACHADO, Hugo de Brito,

2003, p. 217), ao falar sobre o Estado pós-social, afirma:

Não deixou o Estado porém, no contexto da privatização e da regulação, de estar vinculado aos direitos fundamentais, inclusive os que asseguram o oferecimento de prestações aos cidadãos. A seguridade social segue sendo uma tarefa de responsabilidade estatal, muito embora se possa reconhecer um maior espaço a ser preenchido por esquemas privados de proteção social. O princípio da dignidade da pessoa humana impõe, portanto, que se mantenham com o Estado determinadas responsabilidades (assegurar uma proteção social mínima, integrar os desamparados, fiscalizar entidades privadas de previdência e outras) associadas a tal tarefa de prestação, as quais justificam a cobrança de contribuições. Isto principalmente em um país como o Brasil, marcado por grandes desigualdades sociais [...].

Ainda segundo esse autor (2003, p. 212), o reconhecimento e a proteção dos direitos

fundamentais constituem elementos indissociáveis do Estado de Direito, entendido em uma

perspectiva material e não apenas formal, como Estado Constitucional, em que a

normatividade não mais se restringe à lei, mas compreende também regras e princípios

decorrentes da Constituição. Assumindo, neste contexto, posição preeminente o princípio da

dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (inciso III, do

artigo 1°, da Constituição de 1988).

Dentro deste contexto social, surgem então as contribuições como o meio, pelo qual,

pode-se garantir a eficácia dos direitos fundamentais de segunda e terceira dimensões

(seguridade social, educação, intervenção na economia etc.), servindo para custear essa

atividade social e obrigando o Estado a assegurar tais direitos, pois do contrário não poderiam

ser validamente exigidas (MACHADO SEGUNDO, 2005, p. 85), em observância às suas

finalidades constitucionalmente definidas, que serão amplamente discutidas no próximo item.

Faz-se necessário questionar: que sistema é completamente perfeito, capaz de

desenvolver ao mesmo tempo o capital e o humano? Talvez esta seja a busca travada pela

maioria dos autores, levando em consideração que as teorias são estanques, mas a sociedade

não. Busca-se então, o melhor a ser feito. Entretanto, a resposta a este questionamento foge

aos objetivos deste trabalho, merecendo um estudo exclusivo acerca do tema, cabendo aqui,

apenas algumas considerações.

Robert Reich (2007, p. 12), em seu livro “Supercapitalism”, afirma que capitalismo e

democracia são os dois pilares ideológicos capazes de trazer prosperidade e liberdade sem

62

precedentes para o mundo. Visto que a democracia reflete o que a maioria quer para a

sociedade como um todo e o papel do capitalismo é apenas fazer o bolo econômico crescer,

nada mais.

Evidentemente, a democracia significa muito mais do que o processo de eleições livres

e justas. É um sistema para conseguir o que só pode ser alcançado por parte dos cidadãos,

quando se unem para promoverem o bem comum.

Mas, embora os mercados livres tragam prosperidade sem precedentes para muitos, têm

sido acompanhados do aumento das desigualdades de rendimentos e da riqueza, aumento da

insegurança no trabalho e riscos ambientais, como o aquecimento global. A democracia é

projetada para permitir que os cidadãos possam resolver estas questões de forma construtiva,

permite aos cidadãos debater, coletivamente, como as fatias do bolo devem ser divididas e

para determinar quais regras se aplicam a bens privados e a bens públicos.

Reich assevera que o capitalismo pode viver sem a democracia, contudo a democracia

pode não subsistir sem o capitalismo. Corroborando com este pensamento Norberto Bobbio

(1994, p. 43) afirma que há um encontro entre liberalismo e democracia. Para ele, o

liberalismo não só é compatível com a democracia, como esta pode ser considerada o

desenvolvimento natural do Estado liberal, se tomada não pelo lado do ideal igualitário, mas

pelo lado da sua forma política, que é a soberania popular. São suas estas palavras:

Existem boas razões para crer: a) que hoje o método democrático seja necessário para a salvaguarda dos direitos fundamentais da pessoa, que estão na base do Estado liberal; b) que a salvaguarda desses direitos seja necessária para o correto funcionamento do método democrático. O melhor remédio contra o abuso do poder é a participação direta dos cidadãos, do maior número de cidadãos, na formação das leis. Ideais liberais e métodos democráticos vieram gradualmente se combinando, de tal forma que hoje apenas os Estados nascidos das revoluções liberais são democráticos, e apenas os Estados democráticos protegem os direitos do homem: todos os Estados autoritários do mundo são ao mesmo tempo antiliberais e antidemocráticos (BOBBIO, 1994, p. 43).

O ideal liberal baseia-se no princípio fundamental de que, na relação do indivíduo com

o Estado, a liberdade do indivíduo é o bem supremo, que, enquanto tal, tem preponderância

sobre qualquer outro. Defender o liberalismo, ou neoliberalismo, portanto, é defender a

liberdade, é defender o humanismo.

A justiça social, na óptica liberal, constrói-se com a liberdade. A justiça social aumenta,

na mesma proporção que a intervenção estatal diminui, o que permite um desenvolvimento

63

mais eficiente das forças produtivas da sociedade. Para Hayek (1990) o mercado livre e a

ordem espontânea são as bases da prosperidade social e da democracia. É a liberdade

econômica que gerará riqueza, desenvolvimento e bem estar. Corroborando com este

entendimento está também Eduardo Rocha Dias (in: MACHADO, Hugo de Brito, 2003, p.

208):

O propalado absenteísmo estatal no período do liberalismo constitui, na verdade, um mito, por desconsiderar que Estado e mercado encontram-se intimamente entrelaçados: o Estado moderno é, em grande parte, decorrência do desenvolvimento do capitalismo e o capitalismo não pode prescindir do direito produzido pelo Estado. [...] A oposição entre Estado e mercado constitui, portanto, uma simplificação errônea, assim como a afirmação de um progressivo intervencionismo estatal na economia, na transição do século XIX “liberal” ao século XX.

Portanto, para o liberalismo ou o neoliberalismo, na sua designação atual, a liberdade de

mercado e a democracia andam de mãos dadas, por isso se faz necessária a participação

popular, democrática, no desenvolvimento social e econômico de um Estado.

Diante de todo o exposto, o Estado dito “ideal” seria aquele Estado Democrático de

Direito, que conseguisse conjugar em parcelas iguais liberdade e democracia, como pilares

fundamentais e tivesse um patamar mínimo de garantia de direitos sociais, tendo como base

uma sociedade homogeneamente constituída.

Para, no entanto, não fugir ao tema das contribuições, objeto deste trabalho, faz-se

necessário terminar este tópico e prosseguir, sem, contudo, esgotar esta discussão, mas sim

levantar mais questionamentos.

3.2 Contribuições: Conceito e características

As contribuições podem ser chamadas de paraestatais, sociais ou de previdência, por

não terem como função primordial, a arrecadação de recursos financeiros para o Estado. E

suscitam algumas discussões, por possuírem características ora de taxas ora de impostos.

Alguns autores questionam até mesmo o seu caráter tributário. Entretanto, com a Constituição

Federal de 1988, pôde-se conceituar e entender melhor as contribuições e os limites do poder

de tributar no Brasil, que devem ser respeitados pelos entes federados.

Confirmando o caráter tributário das contribuições, está Paulo de Barros Carvalho

(2005, p. 43), quando diz que o legislador constituinte, manifestamente, afirma que as

contribuições são entidades tributárias, estando subordinadas às linhas definitórias do regime

64

constitucional peculiar aos tributos. Neste sentido, está também Roque Carrazza (2010, p.

595), que, referindo-se ao artigo 149, da Constituição Federal, afirma que basta a sua leitura

para a percepção de que as contribuições têm natureza nitidamente tributária, devido à

expressa alusão feita, pelo legislador, aos artigos 146, III e 150, I e III, ambos da CF, ficando

óbvio que “deverão obedecer ao regime jurídico tributário, isto é, aos princípios que

informam a tributação, no Brasil”.

Já Marco Aurélio Greco (2000, p. 80-81), ao discordar dessa linha de pensamento,

sustenta que o texto constitucional aponta para uma natureza não tributária das contribuições:

De fato, se o art. 149 determina seja aplicada a disciplina típica do Direito Tributário, se manda aplicar as normas gerais de Direito Tributário, se impõe limitações da legalidade, anterioridade e irretroatividade para as contribuições, é porque elas não estão dentro do âmbito tributário. Não pertencem a este gênero. Se estivessem, não precisaria mandar observar tais ou quais regras e critérios; se a intenção fosse dar-lhes a natureza tributária, bastaria incluir um item IV ao art. 145 e toda a sistemática e regime tributário seriam automaticamente de observância obrigatória. Ou então, bastaria determinar a aplicação integral do regime tributário e prever as exceções que julgasse pertinentes, como faz com os impostos.

Não sendo esta, portanto, a posição predominante na doutrina pátria, e pela falta de

argumentos, posiciona-se este trabalho no sentido de que as contribuições têm natureza

eminentemente tributária, apoiadas no sistema constitucional brasileiro e na jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal, que já pacificou serem, a partir da Constituição de 1988, as

contribuições, tributos, entendendo que a CF/88 acabou com qualquer polêmica sobre o

assunto, in verbis:

De feito, a par das três modalidades de tributos (os impostos, taxas e contribuições de melhoria) a que se refere o art. 145 para declarar que são competentes para instituí-los a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, os arts. 148 e 149 aludem a duas outras modalidades tributárias, para cuja instituição só a União é competente: o empréstimo compulsório e as contribuições sociais, inclusive as intervenção no domínio econômico e de interesse de categorias profissionais ou econômicas. (STF, Tribunal Pleno, RE 146.733-9-SP, Rel. Min Moreira Alves, j. 29.06.1992, DJ 06.11.1992).

A partir daí, evidencia-se a relação entre o princípio federativo e a competência

constitucional da União para a instituição de contribuições no Brasil. A Constituição Federal,

em seu artigo 149, atribuiu, exclusivamente, à União Federal, a competência para a instituição

das contribuições, com a ressalva única da instituição de contribuições previdenciárias e de

assistência social pelos Estados, DF e Municípios, em benefício de seus servidores e deles

cobrada, prevista no atual § 1º desse artigo, in verbis:

65

Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo. § 1º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) II - incidirão também sobre a importação de produtos estrangeiros ou serviços; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) III - poderão ter alíquotas: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) § 3º A pessoa natural destinatária das operações de importação poderá ser equiparada a pessoa jurídica, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001) § 4º A lei definirá as hipóteses em que as contribuições incidirão uma única vez. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 33, de 2001)

Agora, faz-se uma tentativa de delimitação da natureza jurídica das contribuições, no

ordenamento jurídico brasileiro. De acordo com Marco Aurélio Greco (2000, p. 229) as

contribuições só podem ser instituídas, em função de determinadas finalidades

constitucionais. É o que acertadamente expõe:

Afirmar que a finalidade é o traço fundamental das contribuições também não significa que basta a existência de previsão de uma finalidade para que possam ser instituídas. Ao contrário, não podem ser criadas em função de qualquer finalidade. A criação de contribuições somente poderá ocorrer em relação a finalidades previstas constitucionalmente e relativamente às quais a própria constituição tenha autorizado a criação de contribuições.

Complementando este entendimento acerca das contribuições, Misabel Abreu Machado

Derzi, em nota à obra de Aliomar Baleeiro (2001, p. 68-69) afirma o seguinte:

[...] Mas ressalvas devem ser feitas ao art. 4° do Código Tributário Nacional, no ponto em que considera irrelevante, de forma generalizada, a destinação do produto arrecadado para a definição da espécie tributária. É que a destinação, efetivamente, será irrelevante para distinção entre certas espécies (taxas e impostos, p. ex.), mas é importante no que tange à configuração das contribuições e dos empréstimos compulsórios. A Constituição de 1988, pela primeira vez, cria tributos finalisticamente afetados, que são as contribuições e os empréstimos compulsórios, dando à destinação que lhes é própria relevância, não apenas do ponto de vista do Direito Financeiro ou Administrativo, mas, igualmente, do Direito Constitucional (Tributário).

66

Somente a União tem competência para criar contribuições ou empréstimos compulsórios, conforme estabelecem os artigos 148 e 149. Mas, enquanto o Texto Magno proíbe que o legislador vincule a arrecadação de impostos a órgão, fundo ou despesa (art. 167, IV), a afetação do produto a certas despesas ou serviços é requisito necessário para o exercício da competência federal, no que tange às contribuições e aos empréstimos compulsórios.

Ainda segundo Derzi as contribuições são tributos finalísticos afetados: “Assim, a

destinação assume relevância não só tributária como constitucional e legitimadora do

exercício da competência federal. O contribuinte pode se opor à cobrança de contribuição que

não esteja afetada ao fins, constitucionalmente, admitidos”.

Diante do exposto até o momento e da análise do artigo 149, pode-se dizer que as

contribuições sociais são, portanto, espécies tributárias definidas constitucionalmente, que se,

caracterizam por sua correspondente finalidade, diferentemente dos impostos e das taxas. É o

que ensina Machado (2004, p.397):

Isto significa dizer que essas contribuições sociais caracterizam-se pela correspondente finalidade. Não pela simples destinação do produto da respectiva arrecadação, mas pela finalidade de sua instituição, que induz a idéia de vinculação direta: a) do órgão do Poder Público incumbido da intervenção no domínio econômico; ou b) da entidade gestora dos interesses da categoria profissional ou econômica.

Desta forma, a natureza jurídica específica dessas contribuições, ou seja, a característica

que permite distingui-las como espécie tributária diversa das demais é determinada pelo fato

de estar o produto de sua arrecadação vinculado a fins específicos, como o custeio da

seguridade social, o exercício das atividades de fiscalização, pelos respectivos conselhos, de

profissões regulamentadas, ou, ainda, certas intervenções no domínio econômico.

Corroborando com este entendimento está também Hugo de Brito Machado Segundo (2002,

p. 171):

Nesse contexto, deve-se admitir que as contribuições são, sem dúvida, espécie tributária distinta, submetida a regramento em alguns aspectos diferente daquele aplicável a impostos e taxas. Não se pode esquecer, contudo, que não houve extinção da figura dos impostos e das taxas, que subsistem em nosso Sistema Tributário, e, especialmente, que a forma adotada pelo Estado Brasileiro continua sendo a federativa, a qual foi fortalecida, e não mitigada, pela Constituição Federal de 1988. Esses dois elementos são da maior importância no exame de quaisquer problemas relacionados às contribuições.

Conclui-se, assim, que não é o fato gerador ou a base de cálculo que conferem a

natureza jurídica específica dessa espécie de tributo. Em verdade, somente estão

expressamente previstas bases econômicas de incidência no texto constitucional, para algumas

67

das contribuições de seguridade social e para uma contribuição de intervenção no domínio

econômico (nos artigos 149, § 2º, II, e 177, § 4º – a CIDE dos combustíveis).

Como acima exposto, o critério de distinção de tributos em vinculados e não-

vinculados, baseado no fato de suas hipóteses de incidência descreverem, ou não, atividades

estatais especificamente relacionadas ao contribuinte, não é válido para a identificação dessas

contribuições. Observa-se que, tanto podem as contribuições ter por fato gerador atividades

estatais específicas, como podem suas hipóteses de incidência ser fatos econômicos relativos

ao contribuinte, desvinculados de qualquer atuação do Estado. Da mesma forma, o STF já

pacificou a possibilidade de possuírem as contribuições, base de cálculo idêntica à de

impostos (RE 228.321). O que realmente as diferencia é a vinculação do produto de sua

arrecadação a determinados órgãos, ou finalidades específicas.

Portanto, como tributos, o artigo 149, da CF, estabeleceu, ainda, que as contribuições

devem observar as normas gerais do Direito tributário, bem como os princípios da legalidade

e da anterioridade (artigos 146, III, e 150, I e III), ressalvada, quanto a este último, a regra

especial pertinente às contribuições de seguridade social (artigo 195, § 6º). Estando ainda

submetidas a todas as limitações constitucionais ao poder de tributar, ressalvados os casos de

limitações aplicáveis, restritamente, a determinada espécie tributária, como é o caso da

imunidade dos impostos prevista no artigo 150, inciso VI, da Carta Magna.

Desta forma, com base na vigente Constituição, pode-se conceituar a contribuição,

como espécie de tributo com finalidade constitucionalmente definida, a saber, intervenção no

domínio econômico, interesse de categorias profissionais ou econômicas e seguridade social

(MACHADO, 2004, p. 398).

3.3 Contribuições: Classificação

O artigo 149, da CF, enuncia três tipos de contribuições: as corporativas, as

interventivas e as sociais. Sendo esta, portanto, a classificação doutrinária, adotada com base

na Constituição, dividem-se as contribuições, em três espécies: (a) contribuições de interesse

de categorias profissionais ou econômicas; (b) contribuições de intervenção no domínio

econômico e (c) contribuições sociais. Essa divisão tripartite é também adotada pelo STF, em

votos de diversos julgados. Sem sentido, portanto está a idéia de denominar todas as

contribuições do artigo 149, como "contribuições sociais", como ainda insistem alguns

autores.

68

(a) Contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas: também

chamadas de contribuições corporativas, têm como função custear entidades (pessoas

jurídicas de direito público ou privado) que têm por escopo, fiscalizar, regular e representar,

coletiva ou individualmente, categorias profissionais ou econômicas, defendendo seus

interesses (CARRAZA, 2010, p. 624). Tem-se, como exemplo, as contribuições dos

advogados à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), dos médicos ao Conselho Regional de

Medicina (CRM), dos contabilistas ao Conselho Regional de Contabilidade (CRC), dentre

outras. Segundo José Eduardo Soares de Melo (2003, p. 270).

Com relação às contribuições à OAB, a jurisprudência afirma possuírem natureza sui

generis, não contributiva, entretanto, este trabalho se posiciona no sentido de que são

contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas, como adiante se passa a

expor.

São assim denominadas as contribuições sociais, arrecadadas, de seus filiados, pelos

sindicatos, quando se destinam à organização dessas categorias, fornecendo recursos

financeiros para a manutenção da entidade associativa. Entretanto, não se trata de destinação

de recursos arrecadados, é apenas uma vinculação da própria entidade representativa da

categoria profissional, ou econômica, com o contribuinte, sendo o sujeito ativo da relação

tributária a referida entidade. É o que explica Machado (2004, p. 401):

A esta conclusão se chega através da interpretação do art. 149, combinado com o art. 8º, inciso IV, da vigente Constituição. Realmente, este último dispositivo estabelece que a assembléia geral fixará a contribuição que , em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independente da contribuição prevista em lei. A contribuição prevista em lei, no caso, é precisamente a contribuição social a que se refere o art. 149, restando claro, portanto, que a ressalva está a indicar a entidade representativa da categoria profissional, ou econômica, como credora das duas contribuições. Uma, a contribuição fixada pela assembléia geral, de natureza não tributária. A outra, prevista em lei, com fundamento no art. 149 da Constituição, é a espécie de contribuição social de que se cuida.

Assim, a contribuição de que trata o artigo 8°, inciso IV (primeira parte), da CF/88 é de

natureza não tributária, ou melhor, trata-se de uma “figura de direito privado”, segundo

Carrazza (2010, p. 596), estando desprovida, portanto, de natureza tributária, principalmente

com o fundamento de que são devidas apenas pelos trabalhadores sindicalizados, ou seja, que

estejam filiados ao respectivo sindicato, não podendo ser cobrada de trabalhador não

vinculado ao sindicato. E entender de modo diverso é negar efetividade à liberdade que todo

69

trabalhador tem de filiar-se ou não a um sindicato (artigo 5°, inciso XX e artigo 8°, inciso V,

ambos da CF/88). (MACHADO, 2004, p. 402).

Neste sentido, está a decisão do Supremo Tribunal Federal (RE n° 198.092-3), que

decidiu que a contribuição sindical cobrada no interesse de categorias profissionais é tributo,

de acordo com o artigo 149 da CF, sendo uma contribuição corporativa, diferentemente da

contribuição confederativa, do artigo 8º, inciso IV, da CF/88, que não possui natureza

tributária, visto que não é compulsória, in verbis:

CONSTITUCIONAL - SINDICATO - CONTRIBUIÇÃO INSTITUÍDA PELA ASSEMBLÉIA GERAL: CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO – NÃO COMPULSORIEDADE - EMPREGADOS NÃO SINDICALIZADOS: IMPOSSIBILIDADE DO DESCONTO - CF, ART. 8º, IV - I. A contribuição confederativa sindical, instituída pela assembléia geral - CF, art. 8º, IV - distingue-se da contribuição sindical, instituída por lei, com caráter tributário - CF, art. 149 - assim compulsória. A primeira é compulsória apenas para os filiados do sindicato. II. RE não conhecido. (STF - RE 198.092-3-SP - 2ª T. - Rel. Carlos Velloso - J. 27.08.96).

Existe ainda, uma questão que merece destaque, com relação às contribuições de

interesse das categorias profissionais, ora estudadas. Para Carrazza (2010, p. 625), os

conselhos profissionais praticam “atos de polícia”, já que deliberam sobre inscrições em seus

quadros, decidem sobre assuntos relacionados à ética profissional, aplicam penalidades e

aferem a habilitação profissional. Todas estas atividades caracterizadoras de autêntico poder

estatal de polícia, razão pela qual teriam ditas contribuições a natureza de “taxa de polícia”.

Reafirmando seu entendimento de que as contribuições, “conforme as hipóteses de incidência

e bases de cálculo que tiverem, podem revestir a natureza jurídica de imposto ou de taxa”,

como dito anteriormente.

Diante do exposto, entende-se que as contribuições de interesse das categorias

profissionais ou econômicas são tributos, contribuições (com natureza jurídica de taxa -

referente aos conselhos profissionais), com a finalidade, constitucionalmente definida, de que

o sujeito passivo (contribuinte) seja integrante de uma entidade profissional ou econômica.

Sendo esta o sujeito ativo da relação tributária, ou seja, a contribuição especial será exigida e

destinada à referida entidade. São as palavras de Carrazza (2010, p. 625):

Evidentemente, as (contribuições de interesse das categorias profissionais) só poderão ser exigidas de quem efetivamente vier a beneficiar-se atuando num dado setor profissional. Noutras palavras, o legislador federal só poderá eleger o sujeito passivo de tais (contribuições) dentre os que estiverem diretamente envolvidos com a atividade profissional que se pretende disciplinar. Nunca terceiros estranhos à tal atividade. Estas idéias deverão ser levadas em conta, de modo especial, pelos aplicadores e intérpretes da legislação pertinente. Nenhuma analogia, dose de bom

70

senso, objetivo de ampliar a arrecadação, poderão ampliar o elenco de sujeitos passivos das contribuições de interesse das categorias profissionais.

(b) contribuições de intervenção no domínio econômico: ou contribuições

interventivas, caracterizam-se por serem instrumentos de intervenção direta no domínio

econômico. É certo que todos os tributos interferem no domínio econômico, até mesmo

aqueles com função predominantemente fiscal, pois a simples transposição de recursos

financeiros do setor privado para o setor público se configura como intervenção no domínio

econômico. Entretanto, as chamadas CIDEs (contribuições de intervenção no domínio

econômico) são instituídas com este fim específico, nos termos da lei, o de regular o domínio

econômico no país, sendo, portanto um tributo com função extrafiscal. (MACHADO, 2004, p.

399).

Carraza (2010, p. 606) entende que “domínio econômico” é o campo reservado à

atuação do setor privado, ou reservado ao desempenho da atividade econômica, em sentido

estrito. Para ele, a regra, no Brasil, é a não intervenção no domínio econômico, ou seja, o

Estado não deve desempenhar atividades econômicas, fato este evidenciado na própria

Constituição Federal, que reservou as atividades econômicas à iniciativa privada.

Trata-se, aqui, do liberalismo econômico ou neoliberalismo, amplamente discutido no

início deste capítulo, do qual o Brasil é adepto, onde se defende a completa liberdade de

mercado, ou mesmo uma redução da ação do Estado na economia, no qual o Estado se

preocupa apenas em preservar a ordem política e econômica, deixando as empresas privadas

livres, para investirem como quiserem. De acordo com esta doutrina, deve haver total

liberdade de comércio (livre mercado), pois este princípio garante o crescimento econômico e

o desenvolvimento social de um país. Pode-se definir o neoliberalismo como um conjunto de

ideias políticas e econômicas capitalistas, que defende a mínima participação estatal nos

rumos da economia de um país.

Entretanto, levando-se em consideração valores importantes, como a segurança nacional

e o interesse coletivo, nos casos em que a iniciativa privada falhar ou não se interessar em

atuar, hipóteses em que os maiores prejudicados serão o povo e o próprio Estado, nestes casos

excepcionais, é dado ao Estado, constitucionalmente, o dever de intervir na economia.

Sendo assim, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 173, dispõe: “Ressalvados

os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado

71

só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante

interesse coletivo, conforme definidos em lei”. Devendo, portanto, a União, ao instituir as

CIDEs, observar os princípios gerais da atividade econômica, dispostos nos artigos 170 a 181,

da CF/88, que tratam da “Ordem Econômica” e dizem respeito ao setor privado.

A intervenção se dará, portanto, para garantir os interesses coletivos e terá por objetivo

corrigir ou estimular determinados comportamentos econômicos, visando à proteção dos fins

relacionados nos citados artigos do texto constitucional. Assim, quando a atividade privada,

de acordo com os mecanismos de mercado que lhes são inerentes, for de encontro à

Constituição, configura-se a necessidade da intervenção estatal, conforme o § 4°, do artigo

173, da CF/88. Da mesma forma, baseado no mesmo artigo, o Estado poderá intervir na

ordem econômica, como agente normativo e regulador da atividade econômica, exercendo as

funções de fiscalização, incentivo e planejamento (artigo 174, da CF/88).

Desta forma, segundo Carraza (2010, p. 610), as contribuições interventivas podem ser

criadas e exigidas: “a) quando a União, disciplinando determinada atividade econômica, causa

especial benefício a dada categoria de contribuintes; ou, inversamente, b) quando dada

categoria de contribuintes, desempenhando determinada atividade econômica, causa especial

despesa à União”. Sendo, portanto, o sujeito passivo de tais exações a pessoa que,

diretamente, está envolvida com estes eventos, ou seja, quem explora, sob regime de direito

privado, a atividade econômica objeto da regulação estatal, a base de cálculo seria uma

medida desse especial benefício (ou dessa especial despesa), tendo como limite global, o

custo da atuação estatal.

Ainda segundo o referido autor, a intervenção no domínio econômico se dará, por

exemplo, para assegurar a livre concorrência, para defender o consumidor, para preservar o

meio ambiente, para garantir a participação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

no resultado da exploração, nos respectivos territórios, de recursos minerais, etc., devendo

toda esta intervenção ter bases constitucionais.

As contribuições interventivas têm como finalidade a ser seguida, além de serem um

instrumento de intervenção estatal no domínio econômico, como explicitado anteriormente, a

de que a destinação dos recursos, por ela arrecadados, só poderão ser aplicados no

financiamento da intervenção que justificou sua instituição. Trata-se, aqui, da destinação do

produto da arrecadação, que, conforme o artigo 4°, do CTN (que considera irrelevante para a

72

determinação da natureza jurídica específica do tributo), entretanto este dispositivo não tem

aplicação aqui, pois se trata de tributo inserido no ordenamento jurídico, pela Constituição

Federal (o CTN não trata das CIDEs). Desta forma, caracteriza-se sim, pela destinação do

produto de sua arrecadação, sendo esta, determinante da sua natureza jurídica específica,

prevista constitucionalmente. São as palavras de Machado (2004, p. 400):

Ocorre que a contribuição de intervenção no domínio econômico tem perfil constitucional próprio. Ela não se destina a suprir os cofres públicos de recursos financeiros necessários para o custeio das atividades ordinariamente desenvolvidas pelo Estado. Ela não é um instrumento de arrecadação de meios financeiros, simplesmente. É um instrumento de intervenção no domínio econômico. No Direito Brasileiro podemos dizer que todos os tributos têm os seus âmbitos constitucionais. Em face do âmbito constitucional de cada tributo é que ele se individualiza e se faz diferente dos demais.

Defende também Carraza (2010, p. 613) que as contribuições interventivas devem ter o

produto de sua arrecadação direcionado ao efetivo atingimento da finalidade que ensejou sua

criação in abstracto. Essa finalidade deve, pois, ser perseguida, sob pena de desvirtuamento

do tributo e cessação de sua exibilidade.

Desta forma, o artigo 149, da CF/88, determina competência exclusiva à União, para

instituir as contribuições de intervenção no domínio econômico no país. E que devem ser

interpretados juntamente com os demais dispositivos constitucionais atinentes ao tema, tendo

como função primordial, a regulação da economia brasileira e não apenas a arrecadação de

recursos financeiros aos cofres públicos.

Vale dizer, mais uma vez, que a definição das contribuições como espécies tributárias

definidas constitucionalmente e que se caracterizam por sua correspondente finalidade, ou

seja, a instituição das contribuições de intervenção no domínio econômico, pressupõe, uma

necessidade de intervenção real do Estado na economia, com razões concretas, para corrigir

falhas ou distorções, nos diversos setores da atividade econômica no país, e representam uma

possibilidade jurídica para implementá-la, tudo de acordo com a Constituição Federal. Não se

trata, portanto, de atividade rotineira, ordinária, permanente do Estado, mas sim atividade

excepcional, temporária. (MACHADO, 2004, p. 400). Dito isto, resta, portanto:

[...] incontornável a necessidade de correlação lógica entre as causas e fundamentos da intervenção no domínio econômico e a instituição do tributo ora em estudo. É que são justamente elas que justificam a própria instituição da contribuição interventiva. [...] Com efeito, quando desaparecidos ou superados as causas e os fundamentos invocados, desaparecida, ipso facto, estará também a possibilidade de seu lançamento e arrecadação. (CARRAZA, 2010, p. 612).

73

Assim, em regra, as contribuições interventivas são temporárias, deixando de ser

exigíveis, quando a finalidade que as motivou for atingida.

Desta forma, a lei que instituir esta contribuição deve definir sua hipótese de incidência

exatamente de acordo com a atividade econômica que vai atuar como instrumento de

intervenção estatal, bem como deve indicar, expressamente, a destinação dos recursos a serem

arrecadados. Estes não poderão ultrapassar o âmbito da atividade interventiva, visto que,

segundo Machado (2004, p.401):

Admitir a instituição de tributo sobre quaisquer fatos de relevância econômica com o nome de (contribuição de intervenção no domínio econômico) e sem essas características essenciais é admitir a total destruição do sistema constitucional tributário, com supressão das limitações constitucionais ao poder de tributar e da própria Federação. É admitir que a União fique liberada para substituir aos poucos os impostos que arrecada para partilhar com os Estados e Municípios por contribuições não sujeitas a essa partilha, e até para invadir a competência tributária daqueles, supondo contribuições ditas de intervenção no domínio econômico aos impostos estaduais e municipais.

Está aqui, mais uma vez, evidenciada a estreita relação existente entre as contribuições e

o federalismo no Brasil. Tal relação, entretanto, aqui se baseia em uma quebra ao princípio

federativo, visto que, com a emenda constitucional n° 33, de 2001, as contribuições de

intervenção no domínio econômico podem se transformar em um mero instrumento de

arrecadação de recursos financeiros para a União, com evidente prejuízo para o Estado

brasileiro. (MACHADO, 2004, p. 401). Resta aqui evidenciado o crescente interesse da União

por essa espécie tributária.

O artigo 149, da CF, alterado por referida emenda, possibilitou a criação de uma CIDE

incidente sobre operações com combustíveis, que será objeto de discussão no próximo

capítulo.

Finalmente, como exemplos de contribuição de intervenção no domínio econômico, no

Brasil, além da CIDE dos combustíveis, instituída pela lei n° 10.336, de 2001, tem-se o

Adicional de Tarifa Portuária – ATP, o qual, como firmou o STF, “possui a natureza jurídica

de contribuição de intervenção no domínio econômico (CF, art. 149), tendo em vista a

vinculação de sua receita a investimentos para melhoramento, reaparelhamento, reforma e

expansão de instalações portuárias.” (RREE 209.365-SP e 218.061-SP, Rel. Min. Carlos

Velloso, 04.03.99). Também, a lei nº 10.168, de 2000, instituiu uma CIDE devida pela pessoa

jurídica adquirente de conhecimentos tecnológicos, visando a “estimular o desenvolvimento

74

tecnológico brasileiro, mediante programas de pesquisa científica e tecnológica cooperativa

entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo”. O produto da arrecadação desta

contribuição será destinado ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

– FNDCT.

(c) contribuições de seguridade social: trata-se agora da terceira espécie de

contribuição social, as contribuições de seguridade social, destinadas à manutenção ou

expansão da seguridade social, onde o produto de sua arrecadação deve ser destinado ao

custeio dos serviços relacionados à previdência social, à assistência social e à saúde. Seu

regime jurídico está bem definido na Constituição Federal de 1988, especialmente nos artigo

195, incisos I a IV e §§ 4º, 6°, 9º, 12 e 13; artigo 165, § 5 ° e artigo 194, inciso VII, como se

passa a expor:

Art. 195 – A Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro; II – do trabalhador e dos demais segurados da Previdência Social, não incidindo a contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral da Previdência Social de que trata o art. 201; III – sobre a receita de concursos de prognósticos; IV – do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.

No caput deste artigo está presente o princípio da solidariedade social, segundo o qual a

Seguridade Social será financiada por toda a sociedade, estabelecendo, aqui, a CF/88, o dever

solidário de todos os integrantes da sociedade, para o financiamento do sistema de Seguridade

Social do país. Mostrando-se como uma característica particular desta espécie de

contribuição, a de que todos poderão ser chamados a contribuir, independentemente de

pertencerem a determinado grupo, diretamente relacionado com a atuação estatal (PAULSEN,

2003, p. 382).

Discute-se o fato de não haver uma ação estatal específica para o contribuinte, no caso

das contribuições ora estudadas, visto que se trata de uma espécie de contribuição também

regida pelo artigo 149, da CF (mesmo que parcialmente), tendo a característica de ser

finalisticamente afetada. Necessitando, desta forma, que, ao sujeito passivo desta

75

contribuição, esteja referida uma atuação estatal, mesmo que indiretamente ou

potencialmente.

Entretanto, admite-se que toda a sociedade pode, ainda que potencialmente, obter a

vantagem da atuação estatal, visto que todos teriam condições jurídicas de figurarem como

sujeitos passivos dessa exação, restando pois, resolvida tal controvérsia.

As contribuições de seguridade social, como dito anteriormente, também se submetem

às regras do artigo 149, da Constituição Federal, porém, têm características específicas por

estarem inseridas no capítulo da Seguridade Social, com regras e princípios próprios, como se

depreende dos artigos 194 e 195 da Carta Magna.

Desta forma, as contribuições sociais sujeitam-se às normas gerais de direito tributário

previstas no artigo 146, III, obedecem ainda ao princípio da legalidade (CF, artigo 150, inciso

I) e ao princípio da irretroatividade da lei tributária (CF, artigo 150, inciso III, alínea a).

Entretanto, distingue-se das demais contribuições, no que tange a não sujeição ao chamado

princípio constitucional da anterioridade (CF, artigo 150, inciso III, alínea b), obedecendo ao

§ 6°, do artigo 195, que estabelece regramento específico a respeito, no sentido de que só

poderão ser exigidas, após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver

instituído ou modificado. Obedecem, neste caso, as contribuições sociais, apenas à

anterioridade nonagesimal (CF, artigo 150, inciso III, alínea c).

Outra característica peculiar do regime jurídico das contribuições sociais de seguridade

social é a delimitação constitucional do seu âmbito de incidência, previstas no artigo 195, da

CF, que descreve a materialidade dos fatos geradores de cada uma das contribuições sociais,

em seus incisos, o que não ocorre com as demais contribuições do artigo 149. Ângela Maria

da Motta Pacheco (2003, p. 82-83) assevera:

As contribuições de custeio da Seguridade Social são as mais relevantes, pois tratam de todo o universo dos cidadãos brasileiros. As demais referem-se a categorias profissionais ou setores econômicos em particular. A Seguridade Social está intimamente ligada à segurança de cada indivíduo nas condições básicas para a sua sobrevivência: saúde, previdência e assistência social. Eis o porquê da sua importância. A solidariedade é o grande princípio que informa a Seguridade Social, compreensiva de um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da Sociedade. [...] Todos contribuem para a Seguridade Social. Os recursos provêm do Orçamento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e das contribuições do empregador e do empregado. [...] Assim, entende-se o cuidado do Constituinte em traçar, em completude, a sua regra-matriz de incidência tributária. Não há falhas. Não há dúvidas.

76

Realmente isto as distingue das demais contribuições. As outras, de intervenção no domínio econômico e do interesse das categorias profissionais não têm norma-matriz delineada na Constituição. Mas só se legitimarão se cumprirem o seu destino constitucional: realmente serem criadas de forma a realizar a intervenção naquele setor da economia ou se tratarem do interesse de categorias profissionais.

Sendo esta uma contribuição que está relacionada com uma atividade estatal referente a

toda a sociedade, o constituinte, para dar maior segurança e impedir eventuais abusos quando

da sua instituição, preferiu definir certas bases para a incidência das mesas, particularidades

que não descaracterizam sua natureza jurídica das demais contribuições do artigo 149, da CF.

De acordo com Machado (2004, p. 402), as contribuições de seguridade social

caracterizam-se pelo fato de ingressarem, diretamente, no orçamento a que se refere o artigo

165, § 5º, inciso III da CF: “o orçamento da seguridade social, abrangendo todas as entidades

e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou indireta, bem como os fundos e

fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público”. Ou seja, a receita decorrente das

contribuições sociais integra diretamente o orçamento do INSS (autarquia com status

constitucional), não fazendo parte do Tesouro Nacional ou da União Federal, por assim dizer.

Segundo este autor, o referido orçamento ganhou autonomia, visto que tal orçamento

não se confunde mais com o orçamento do Tesouro Nacional, e sua execução não constitui

atribuição do Poder Executivo, posto que a seguridade social há de ser organizada com base

em princípios constitucionalmente estabelecidos. Entre estes destaca-se o “caráter

democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com

participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos

colegiados” (artigo 194, parágrafo único, inciso VII). Desta forma, conclui Machado (2004, p.

403):

As contribuições, com as quais os empregadores, os trabalhadores e os administradores de concursos de prognósticos financiam diretamente a seguridade social, não podem constituir receita do Tesouro Nacional precisamente porque devem ingressar diretamente no orçamento da seguridade social. Por isto mesmo, lei que institua contribuição social com fundamento no art. 195 da Constituição Federal indicando como sujeito ativo pessoa diversa da que administra a seguridade social viola a Constituição. Ressalte-se que não se trata de saber qual o destino das contribuições de seguridade social. Não se trata, apenas, de um problema de Direito Financeiro. Trata-se de saber quem é o sujeito ativo dessas contribuições – e, a nosso ver, o sujeito ativo das mesmas é a entidade responsável pela gestão do orçamento a que se refere o art. 165, § 5º, inciso III, da CF. Em outras palavras, o INSS, autarquia que ganhou o patamar constitucional e que deve ser aperfeiçoada de modo a realizar completamente o preceituado no art. 194 da Constituição.

77

Outra questão que merece destaque neste trabalho é a respeito do exercício da

competência tributária da União, no que se refere ao § 4º, do artigo 195, da CF, segundo o

qual, a lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da

seguridade social desde que obedecido o disposto no artigo 154, inciso I, que trata da

competência residual e diz que a União poderá instituir, “mediante lei complementar,

impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato

gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição”.

Acontece que a União, quando lhe convém, cria contribuições baseadas no artigo 195,

inciso I da Constituição Federal, para integrar o Tesouro Nacional, o que viola os artigos 165,

§ 5º e 194, § único, inciso VII, que determinam tenha a seguridade social orçamento próprio e

gestão descentralizada, como explicitado anteriormente (MACHADO, 2004, p. 408). E ainda,

com o advento da EC 20/1998, ampliou-se a regra-matriz dos incisos I e II, do artigo 195, e

com a EC 42/ 2003, acrescentou-se o inciso IV e os §§ 12 e 13 ao mesmo artigo. Referidas

emendas são consideradas, especialmente em face de sua destinação ao orçamento fiscal da

União, por alguns autores, dentre eles Carraza (2010, p. 630), como inconstitucionais, visto

que, no que se refere ao § 4º do artigo 195 da CF:

[...] por meio do exercício do poder constituinte derivado, possibilitou-se a criação de novas contribuições sociais para a Seguridade Social sem observância do aludido § 4º. Com isto, atropelou-se direito constitucional subjetivo dos contribuintes, malferindo-se cláusula pétrea (art. 60, § 4º, IV, da CF).

Assim, segundo o referido autor, a EC 20/1998 pretendeu atribuir à União a

possibilidade de criar novas contribuições por meio de lei ordinária, sem observância do

princípio da não-cumulatividade, com eventuais hipóteses de incidência ou bases de cálculo

idênticas às dos impostos previstos nos artigos 153, 155 e 156, da Carta Magna, e sem

repartição das receitas obtidas (artigo 157, I, da CF), com os Estados e Municípios ferindo,

desta forma, o princípio federativo. Sobre este assunto, assevera Machado Segundo (2002, p.

120):

A previdência segue deficitária, sendo sua falência a justificativa para toda sorte de arbitrariedades e restrições de direitos aos que dela dependem, e o Tesouro Nacional obteve acréscimo de aproximadamente 100% de sua arrecadação. Acréscimo que, a propósito, não foi partilhado com Estados-membros, Distrito Federal e Municípios.

Para finalizar, Machado (2004, p. 409) questiona: “Como se pode acreditar que a

seguridade social esteja falida?” e em resposta afirma que seria mais fácil acreditar que suas

receitas, ora arrecadadas pelo Tesouro Nacional, com a chancela do STF, estejam sendo

78

desviadas para outras finalidades. E pior ainda é a criação de novos tributos com a desculpa

de que a seguridade está deficitária, principalmente a saúde pública.

Desta forma observa-se o cunho político das decisões da instância máxima do Poder

Judiciário brasileiro, que se desvirtua dos preceitos constitucionais que protegem os cidadãos,

como é o caso em questão, onde o STF acaba considerando constitucionais leis que violam

diretamente cláusulas pétreas. Percebe-se assim, que a interpretação do texto constitucional

empregada compromete a integridade do ordenamento jurídico, desvirtua a finalidade da

criação das contribuições, qual seja a garantia dos direitos fundamentais de segunda e terceira

gerações.

* Outras contribuições sociais

Utilizando a competência prevista no artigo 149, da CF/88, a União pode, ainda,

instituir outras contribuições sociais, não destinadas à seguridade, mas a algum outro serviço,

relacionado ao Título VIII, da Constituição, que trata “Da Ordem Social”.

Exemplo pacífico de contribuição social não destinada à seguridade é a contribuição do

salário-educação, prevista no artigo 212, § 5º, da CF. Essa contribuição é fonte adicional de

financiamento do ensino público fundamental, e a educação não integra o conceito de

seguridade social.

Também costumam ser apontadas como contribuições sociais não relacionadas à

seguridade as contribuições para os serviços sociais autônomos: SESC, SESI, SENAI. Esses

serviços atuam, comumente, nas áreas de educação e aperfeiçoamento profissional, e as

contribuições a eles destinadas encontram-se mencionadas no artigo 240, da Constituição. Há,

entretanto, quem classifique essas contribuições como contribuições do interesse de categorias

profissionais ou econômicas.

Seja qual for a classificação adotada, o certo é que as contribuições sociais não

destinadas à seguridade social não estão sujeitas ao regime jurídico específico do artigo 195,

da Constituição, mas ao regime jurídico tributário em geral, especialmente no que respeita ao

princípio da anterioridade. Ou seja, a contribuição do salário-educação, bem como as

contribuições para os serviços sociais autônomos estão sujeitas ao princípio da anterioridade,

descrito no artigo 150, inciso III, alínea b, sendo vedada a produção de efeitos, no mesmo

exercício de sua publicação, da lei que as institua ou aumente.

79

Vale ressaltar ainda, como mais uma contribuição destinada ao seu custeio da

seguridade social, a polêmica contribuição provisória sobre a movimentação ou transmissão

de valores e de créditos e direitos de natureza financeira – CPMF, instituída pelo artigo 74, do

ADCT, que, apesar das inúmeras prorrogações, atualmente encontra-se extinta, e por este

motivo não será objeto de discussão neste estudo.

* Contribuição de iluminação pública

A Emenda Constitucional n° 39/2002 acrescentou à Constituição Federal o artigo 149-

A, que atribuiu aos Municípios e ao Distrito Federal a competência para instituir a

contribuição para custeio do serviço de iluminação pública, in verbis:

Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III. Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica.

Referida contribuição tem levantado alguns questionamentos, acerca de sua natureza

tributária, bem como se esta contribuição tem fato gerador próprio de outra espécie tributária

e ainda, sendo cobrada na fatura de energia elétrica, se seu pagamento seria condição para o

pagamento da tarifa correspondente. Outra questão é a de saber quais são os contribuintes

dessa exação, observados os princípios constitucionais da impessoalidade e da igualdade. Faz-

se, portanto, necessária, uma maior reflexão sobre o seu regime jurídico.

De acordo com o artigo 149-A, tal contribuição deve obedecer aos princípios da

legalidade, da irretroatividade e da anterioridade tributária. Diante disto, pode-se dizer que

possui natureza tributária a referida contribuição de iluminação pública, visto que, segundo

Carraza (2010, p. 660), tipifica uma obrigação compulsória de dar moeda, que não se constitui

em sanção de ato ilícito, instituída por meio de lei e cobrada em seus estritos termos,

ajustando-se em tudo ao conceito de tributo inscrito no artigo 3º, do CTN. Desta forma, deve

esta contribuição obedecer a todos os princípios, regras e limitações pertinentes ao sistema

constitucional tributário brasileiro.

Entretanto, apesar de ser considerada como um tributo, tal exação não cabe nos

contornos jurídicos das contribuições, de acordo com o pensamento de Hugo de Brito

Machado Segundo (2005, p. 101):

80

Não existe finalidade (social) a ser atendida, nem existe um grupo específico interessado no atendimento dessa finalidade (a ela indiretamente referido), que a rigor beneficia toda a sociedade. Não se trata, pois, de contribuição, mas de imposto atribuído ao Município, em total quebra à racionalidade do sistema tributário.

De acordo com este entendimento, está também Carraza (2010, p. 660). Segundo ele

trata-se de um imposto, já que tem por materialidade o fato de uma pessoa física ou jurídica

estar fixada no local (município ou DF) onde é prestado o serviço de iluminação pública, trata-

se de um tributo não vinculado a uma atuação estatal. Conclui, portanto, que a única

materialidade que se ajusta à referida “contribuição” é a propriedade, a posse do imóvel situado

no município ou no DF, verificando-se aí, o nascimento de um adicional do IPTU e do ITR. Um

absurdo jurídico, visto que, atribuiu-se competência aos Municípios e ao DF para criar e

arrecadar um adicional de um imposto federal (ITR), com destinação específica: o custeio do

serviço de iluminação pública, o que de qualquer forma resta inconstitucional a EC 39/2002.

4 ANÁLISE DE TEMAS CONTROVERSOS ACERCA DAS CONTRIBUIÇÕES NO BRASIL

Embora já esclarecidas, até o momento, várias questões que envolvem as contribuições

no Brasil e temas correlatos, restam ainda algumas considerações a serem feitas, tais como as

que envolvem as chamadas contribuições “gerais”, objeto de muita discussão doutrinária e as

contribuições “sociais” que foram instituídas pela lei complementar nº 110, de 2001, que, para

a maior parte dos autores, está eivada de inconstitucionalidades. Outro ponto que merece

destaque são as modificações introduzidas pela EC 33/2001, no âmbito do direito tributário

constitucional. É o que adiante se passa a expor.

4.1 As contribuições sociais gerais e o princípio federativo

As contribuições sociais gerais, pelo entendimento da doutrina atual sobre o assunto,

seriam as contribuições não citadas no texto constitucional, ou seja, além das já

expressamente existentes, alguns autores defendem a possibilidade da instituição de novas

contribuições, ditas “gerais”, sob o argumento de finalidade social diversa da

constitucionalmente exigida.

Como amplamente discutido, no capítulo anterior, as contribuições são espécies

tributárias, distintas dos impostos e das taxas, com características próprias e peculiares, mas

com capacidade de gerar grandes questionamentos.

De acordo com o artigo 149, da Constituição Federal, como dito no capítulo anterior, as

contribuições se dividem em três espécies: contribuições sociais, contribuições de interesse de

categorias profissionais ou econômicas, e contribuições de intervenção no domínio

econômico.

Entretanto, para alguns autores, entre eles, Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1994, p.

98), existem ainda as chamadas contribuições sociais “gerais”, que seriam aquelas

contribuições sociais destinadas ao financiamento de outras atividades sociais, que não sejam

o custeio da Seguridade Social, ou seja, não possuem uma finalidade social

82

constitucionalmente definida. Segundo o referido autor, as contribuições se dividem em

quatro espécies:

1) contribuições sociais de destinação não constitucionalmente determinada; 2) contribuições de intervenção no domínio econômico; 3) contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas; e 4) contribuições para a seguridade social. A primeira espécie é novidade. Fica assim a União autorizada a instituir as contribuições sociais que se justificarem, observadas as normas dos arts. 146, III, e 150, I e III.

As contribuições sociais do inciso I, do artigo 149/CF dividem-se em: contribuições

para o custeio da Seguridade Social e para outras atividades sociais. Ainda, segundo Manoel

Gonçalves Ferreira Filho (1994, p. 98), entre outros, deixa brecha para a discricionariedade da

Administração. Neste caso, basta apenas que se justifique a finalidade social, para que a

União possa instituir uma nova contribuição.

Outros autores também defendem esta linha de pensamento tais como José Eduardo

Soares de Melo (2003, p. 356) – (a), e Leandro Paulsen (2003, p.369-370):

(a) - [...] desde que haja observância aos elementos básicos, como, receita pública derivada, compulsoriedade, parafiscalidade, destinação específica dos seus recursos, e vinculação a determinado grupo. É o que ocorre com as contribuições ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (art. 7°, III), e a CPMF (EC n° 21-99 e37-02). (b) - Presta-se, pois, tal subespécie tributária (contribuições especiais sociais), como fonte de custeio para a atuação da União na área social, que é definida e delimitada pelos deveres e objetivos apontados pelo texto constitucional ao cuidar da Ordem Social, dentre as quais destaco, exemplificativamente: promover o acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde, organizar e manter a previdência social com vista a proteção das pessoas em situação de risco social como aposentadoria, invalidez ou desemprego involuntário, prestar assistência social com vista à proteção, dentre outros, dos portadores de deficiência e dos idosos, garantir o acesso as fontes da cultura nacional e incentivar a difusão das manifestações culturais, fomentar práticas desportivas, promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas, promover a educação ambiental e proteger a fauna e a flora, demarcar as terras e proteger os bens indígenas. Quaisquer deles podem ensejar a instituição, pela União, de uma contribuição que financie as respectivas ações.

Ainda segundo Paulsen (2003, p. 370), as possibilidades de instituição de contribuições

sociais estão atreladas aos deveres e objetivos, de cunho social, estabelecidos pela

Constituição. Segundo ele: “Trata-se, pois, de competência ampla, mas de modo algum, uma

carta em branco”. Conclui que a referência expressa, no texto constitucional, às contribuições

de Seguridade Social (artigo 195) e aquelas referidas nos artigos 212, § 5°, 239 e 240 não

impedem a instituição de novas contribuições sociais. Continuando com suas palavras:

83

[...] é fundamental observar que as contribuições sociais não se esgotam nas de Seguridade Social, tendo, sim, um espectro bem mais largo, eis que podem ser instituídas para quaisquer finalidades que forem na direção dos objetivos da ordem social, de maneira que se costuma subdividir as contribuições sociais entre as ditas gerais e as de Seguridade Social (PAULSEN, 2003, p. 371).

Corroborando com este entendimento, está também Ricardo Conceição de Souza (2003,

p. 115-116), que defende o fato de que o artigo 149/CF estaria vazio de sentido, se a União

não tivesse competência para instituir contribuições sociais gerais. Segundo ele:

Pensamos que a União tem competência para instituir contribuições como instrumento de sua atuação em qualquer segmento da ordem social, de que trata o Título VIII da Constituição da República. Se assim não fosse, o art. 149 da Carta Constitucional não teria sentido algum. Vale dizer, se a União tivesse competência apenas para instituir contribuições sociais discriminadas no próprio corpo da Constituição, como sucede em relação aos artigos 195, 212, § 5.º, e 239, o art. 149 seria desprovido de sentido jurídico, o que nos parece sem fundamento. Ora, se as contribuições são somente aquelas dos artigos supra citados, não haveria necessidade do constituinte preocupar-se na elaboração do art. 149, cujo conteúdo ou estaria esvaziado, ou seria mera redundância. Neste tipo de trilha, também não haveria como explicar as contribuições previstas no art. 240, já que o mesmo não indica nenhum signo presuntivo de riqueza, mas apenas uma finalidade. O fato é que o art. 149 é a regra-matriz, enquanto os outros dispositivos constitucionais citados têm função de especialização.

Embora respeitando a opinião dos referidos autores, esta não é a posição aqui adotada,

nem a predominante na doutrina. Entende-se que o rol de contribuições sociais, previsto

constitucionalmente, é taxativo, ou seja, as contribuições que não sejam para a seguridade

social, estão previstas constitucionalmente, em artigos diversos, ao longo da Carta

Constitucional, como o Salário-Educação (artigo 212, § 5°) e o PIS-PASEP (Programa de

Integração Social - PIS e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor - PASEP),

estando sujeitos ao regime constitucional tributário. Não cabe, aqui, nenhuma

discricionariedade por parte da União Federal, no que concerne à instituição de contribuições.

Sendo, desta forma, apenas três as divisões ou subdivisões das contribuições sociais no

sistema constitucional tributário brasileiro.

As contribuições têm natureza jurídica de tributo e, para diferenciá-las dos demais

tributos, faz-se necessário que elas tenham uma finalidade específica, determinada,

constitucionalmente, senão não se estaria falando de contribuições. É o que acertadamente

expõe o pensamento de Hugo de Brito Machado Segundo (2002, p. 171):

[...] a limitação constitucional à criação e à cobrança de contribuições é, por excelência, a vinculação destas a uma finalidade específica e determinada na própria

84

Carta Magna. Ao dizer-se isto, pressupõe-se que essa finalidade seja certa, de sorte a distinguir as contribuições dos demais tributos, e também distingui-las entre si. O que é, então, uma contribuição social geral, sem finalidade determinada de modo específico na Constituição? Parece-nos, pura e simplesmente, uma enorme contradição, que serve de disfarce para a instituição de impostos inconstitucionais. Dizer-se contribuição sem finalidade específica é o mesmo que dizer contribuição que não é contribuição: absurdo que dispensa maiores comentários.

Desta forma, é preciso interpretar o artigo 149/CF, não literalmente, como fez Ricardo

Conceição de Souza, mas levando em consideração os demais dispositivos constitucionais

atinentes ao tema. Também se faz necessária uma interpretação conjunta de normas e

princípios, obedecendo ao neopositivismo vigente. (BONAVIDES, 2002, p. 237). É o que

aduz Machado (2004, p.397-398):

Pode parecer, da expressão literal do art. 149 da vigente Constituição, que tal dispositivo autoriza a União a instituir contribuições sociais que não são de intervenção do domínio econômico nem do interesse de categorias profissionais ou econômicas. Não nos parece, porém, que seja assim, porque a norma do art. 149 há de ser interpretada dentro do sistema no qual se encarta e sem implicar o amesquinhamento das demais normas que o integram. Admitir uma espécie de contribuições sociais para cuja instituição bastaria a justificativa de um fim social é um equívoco, pois todo e qualquer tributo tem sempre, ou deve ter, finalidade social, de sorte que a finalidade social não pode ser um elemento capaz de dar qualificação específica a uma contribuição. A finalidade social qualifica o gênero tributo. Não a espécie contribuições. Muito menos uma subespécie de contribuições.

Por isso, um aspecto que deve ser levado em consideração é em relação ao fato de que

não só as contribuições têm um aspecto social a ser seguido, mas todo o sistema

constitucional tributário. É o que afirma, com outras palavras, Hugo de Brito Machado

Segundo (2002, p. 171):

Nesse ponto, importa lembrar que as finalidades de cunho social não são encontradas apenas nos arts. 193 a 232 da Carta Magna, mas em todo o seu texto, sendo a CF/88, em muitas de suas dimensões, uma Constituição do Estado social. Assim, praticamente todas as atividades desenvolvidas pela União Federal envolvem aspectos sociais, e poderiam dar azo à instituição de contribuições sociais ‘gerais’. E, em face de contribuições gerais, que sentido teria o sistema de atribuição de competências e estabelecimento de limitações para a instituição de impostos e taxas federais? O espectro de tais contribuições seria tão amplo que tudo engolfaria, e todos os tributos federais poderiam com folga ser substituídos por contribuições, submetidas apenas aos arts. 146, III e 150, I e III. Perderia o sentido todo o Sistema Tributário Nacional. Enfim, não são apenas outras regras e princípios positivados na Constituição, mas a própria lógica formal que torna impossível a divisão de um gênero em três espécies, quando em uma delas se podem enquadrar todas as demais. A União jamais criaria contribuições com arrimo no art. 195, § 4.º, por exemplo, se lhe fosse possível atender às mesmas finalidades com contribuições ‘gerais’ instituídas nos moldes do art. 149. Aliás, todas as limitações estabelecidas ao exercício da competência residual, seja no âmbito das contribuições, seja na esfera dos impostos, seriam absolutamente desnecessárias. Com isso, malfere-se ainda o princípio da razoabilidade, tido como implicitamente positivado na CF/88, em seu art. 5.º, LIV [...]

85

O caráter desarrazoado de uma interpretação que vê em uma palavra contida em um artigo isolado a destruição de outras partes desse mesmo artigo, e ainda dos demais dispositivos que distribuem competências e limitam o poder de tributar, dispensa maiores explicitações.

Advoga-se, portanto, no sentido da não admissão de contribuições sociais gerais no

ordenamento jurídico brasileiro. Tal posicionamento é defendido, principalmente, com base e

em defesa do princípio federativo, bem como do princípio da razoabilidade, visto que, se a

União pode, sem base constitucional, instituir contribuições sociais, restaria configurada uma

violação à Federação, pois a autonomia dos entes federados estaria prejudicada, visto que toda

a arrecadação tributária estaria centralizada na União, tornando sem efeito a divisão de

competências tributárias feita pela Constituição de 1988. Estaria, portanto, desprovido de

razoabilidade, tal pensamento (MACHADO SEGUNDO, 2002, p. 171):

A demolição do Sistema Tributário causada pela admissão de contribuições sociais gerais, referida no item anterior, não traria malefícios apenas aos contribuintes, que seriam submetidos a uma tributação ainda mais imprevisível, incompreensível e irracional. Os maiores prejudicados seriam os Estados e os Municípios, com sérios abalos na forma federativa de Estado, alçada ao patamar pétreo da CF/88. É sabido que a autonomia de qualquer ente, desde a do jovem que pretende sair da casa dos pais, até a do Estado que não deseja submeter-se às determinações da União Federal, está diretamente relacionada com auto-suficiência financeira. Dependentes financeiramente do poder central, Estados e Municípios teriam – como às vezes têm – a liberação de verbas para suas necessidades locais condicionada ao atendimento das exigências feitas pelo poder central. A autonomia seria meramente ornamental. [...] Foi por essa razão que a CF/88 cuidou de dividir a competência tributária entre União, Estados e Municípios, redobrando seus cuidados no trato da chamada competência residual, cujos impostos com base nela criados hão de ter o produto de sua arrecadação partilhado entre Estados e Distrito Federal (CF/88, art. 157, II). Dito isto, nem precisamos entrar na questão de saber se as contribuições podem incidir sobre fatos pertencentes à competência impositiva de Estados e Municípios para termos por contrária à federação a existência de contribuições sociais gerais. De fato, o desequilíbrio gerado por essa espécie tributária, verdadeira brecha que se abre na competência residual da União, que se torna assim ilimitada e não partilhada, tornaria sem efeito a divisão de competências feita pela Constituição Federal. E, destaque-se, não são poucas as vozes que admitem a incidência de contribuições sobre fatos submetidos à tributação de Estados e Municípios, ou mesmo sobre fatos praticados por Estados e Municípios. Diante da possibilidade de criar contribuições gerais, a União teria formidável instrumento para subjugar todos os demais entes. A finalidade poderia ser determinada por lei, dentre as centenas ou mesmo milhares de possibilidades ofertadas pela Constituição, e as imunidades e demais restrições ao poder de tributar não lhe seriam aplicáveis. Seria mesmo o fim da federação.

Desta forma, estariam as contribuições sociais, ditas gerais, ferindo o princípio

federativo, violando os artigos 154, I, 157, II, e 195, § 4.º, da CF/88, que tratam da repartição

das competências tributárias e, por conseqüência, ferindo a autonomia dos entes federados.

Bem como a razoabilidade, prevista no artigo 5.º, LIV, da CF/88, visto que tornaria inócuos

vários outros dispositivos constitucionais tributários, pois as contribuições gerais poderiam

86

abranger qualquer espécie de tributo, por não terem uma hipótese de incidência pré-

determinada, estando fora do alcance de muitas das limitações constitucionais ao poder de

tributar (MACHADO, 2004, p. 404). Concentraria, desta forma, o poder de tributar apenas na

União Federal, onde esta teria a possibilidade de invadir a competência de qualquer outro

ente, desestabilizando todo o sistema tributário e constitucional. (MACHADO SEGUNDO,

2002, p. 171):

[...] a admissão de tal espécie, cujo âmbito constitucional de incidência é praticamente ilimitado, esvaziaria por completo a competência residual estabelecida no art. 195, § 4.º, da CF/88, além da própria competência para instituir impostos e taxas. Tudo poderia ser arrecadado através de ‘contribuições gerais’, com a ruína da racionalidade do Sistema Tributário e com uma concentração de poder tributário tamanha no âmbito do poder central que a autonomia de Estados e Municípios não resistiria. A força centrípeta esmagaria a federação.

A título de conclusão e corroborando com este entendimento está também a oportuna

lição de Geraldo Ataliba (2010, p. 202):

Se, pois, a União, criando contribuições, adota hipótese de incidência que pertence aos Estados ou Municípios, comete seu legislador inconstitucionalidade, por invasão de competência (Amílcar Falcão, Aliomar Baleeiro). Não se pode sustentar que as contribuições fogem a tal regime. Não cabe dizer, no nosso sistema que o legislador, ao criar contribuições goza da mais ampla liberdade e que, em conseqüência, pode adotar toda e qualquer hipótese de incidência, inclusive as reservadas constitucionalmente aos Estados e Municípios. Tal interpretação implicaria afirmar: a) que as competências tributárias não são exclusivas; b) que a repartição de competências não é rígida e que c)contribuição não é tributo. Não tem sentido admitir que a Constituição deu uma competência aos Estados e Municípios (nos arts. 155 e 156) e a retirou em outra disposição (art. 149). Seria desfigurar a Constituição entender que ela consente que a invocação da palavra ‘contribuição’ afaste todos os obstáculos à legislação da União, inclusive os circunscritos de seu campo material de competência. Logo, o legislador nacional, ao instituí-las, usa da competência de que dispõe, com as limitações que a caracterizam. Entender o contrário seria admitir que o sistema de partilha de competência não é rígido. Que modificável por legislação infraconstitucional. Seria admitir que as competências tributárias não são privativas, mas todas abertas à União. Seria atribuir estultice ao constituinte. Seria esvaziar o sistema constitucional tributário; torná-lo totalmente sem sentido, como um amontoado de preposições que nada obrigam, a ninguém dão vantagem, a ninguém direitos, de ninguém exigem nada.

Diante do exposto, entende-se que não existe lugar, no ordenamento jurídico brasileiro,

para as chamadas contribuições sociais gerais, visto que as mesmas são tributos e que se

caracterizam, especialmente, em função de uma finalidade específica, determinada

constitucionalmente. Fica claro, portanto, que as contribuições existentes são apenas aquelas

expressas no artigo 149, do texto Constitucional, e que as contribuições sociais do inciso I se

dividem em duas: para a seguridade social e outras contribuições sociais específicas, também

expressas na Constituição Federal de 1988.

87

4.2 A lei complementar nº 110, de 2001

Com a lei complementar nº 110, de 2001, foram instituídas duas novas contribuições, no

ordenamento jurídico brasileiro. Essas novas contribuições temporárias estão a cargo dos

empregadores e têm como fundamento o custeio do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

(FGTS), de acordo com seus artigos 1º e 2º:

Art. 1°- Fica instituída contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas. Parágrafo único. Ficam isentos da contribuição social instituída neste artigo os empregadores domésticos. Art. 2° - Fica instituída contribuição social devida pelos empregadores, à alíquota de cinco décimos por cento sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas as parcelas de que trata o art 15 da Lei n° 8.036, de 11 de maio de 1990. § 1° - Ficam isentas da contribuição social instituída neste artigo: [...] § 2° - A contribuição será devida pelo prazo de sessenta meses, a contar de sua exigibilidade.

No artigo 1º, a contribuição será devida em caso de despedida sem justa causa, à

alíquota de 10% sobre os depósitos referentes ao FGTS, alterando os 40%

constitucionalmente definidos. No artigo 2º, a contribuição também é devida pelos

empregadores com alíquota de 0,5% sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada

trabalhador, passando aquele a depositar 8,5% sobre o total da sua folha, ao invés dos 8% que

já é obrigado a recolher.

Entretanto estes valores não serão repassados aos trabalhadores, mas sim, ao governo

federal, por meio da Caixa Econômica Federal. Visto que estas contribuições foram criadas

para cobrir despesas com a indenização dos trabalhadores, pelas perdas nos rendimentos do

FGTS, decorrente das decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal

Federal (STF), acerca da correção monetária dos meses de janeiro de 1989 (Plano Verão) e

abril de 1990 (Plano Collor I) pelo Índice de Preços ao Consumidor (IPC). É o que determina

o artigo 4°, da LC 110/01:

Art. 4° - Fica a Caixa Econômica Federal autorizada a creditar nas contas vinculadas do FGTS, a expensas do próprio Fundo, o complemento de atualização monetária resultante da aplicação, cumulativa, dos percentuais de dezesseis inteiros e sessenta e quatro centésimos por cento e de quarenta e quatro inteiros e sessenta e quatro centésimos por cento e de quarenta e quatro inteiros e oito décimos por cento, sobre os saldos das contas mantidas, respectivamente, no período de 1° de dezembro de 1988 a 28 de fevereiro de 1989 e durante mês de abril de 1990, desde que: [...].

88

Desta forma, está o governo, dividindo suas obrigações com a sociedade, baseado em

normas ilegais e inconstitucionais, visto que estas contribuições estão em pleno desacordo

com os artigos 149 e 195, da Constituição Federal, e com os propósitos do FGTS.

O FGTS foi instituído pela Lei 5.107/66 e nasceu com o objetivo de proteger e

compensar o trabalhador pela perda do emprego, bem como arrecadar recursos para

programas de habitação popular, saneamento básico e infra-estrutura urbana. Está atualmente

regido pela Lei 8.036/90, e amparado na Constituição de 1988 (artigo 7º, inciso III) como um

direito social dos trabalhadores urbanos e rurais. Cabe ao governo, e não aos empregadores,

a sua administração. O Estado deve atuar apenas como fiscalizador, recolhendo os valores e

garantindo o direito dos trabalhadores constitucionalmente definido.

Trata-se de um direito social do trabalhador, baseado no artigo 165, inciso XIII, da

CF/88, e não um tributo. Também as contribuições criadas pela LC nº 110/01, não têm

natureza tributária. Não se aplica às contribuições ao FGTS o disposto nos artigos 173 e 174,

do CTN, ou seja, não se aplica o regime jurídico dos tributos, mas sim, o regime jurídico do

direito trabalhista. A este respeito, decidiu o Supremo Tribunal Federal, que tal exação nunca

teve natureza tributária (RE 100.249, Rel. Min. Néri da Silveira, DJ 01.07.88):

MANDADO DE SEGURANÇA. CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. CONTRIBUIÇÃO AO FGTS. DÉBITOS LEVANTADOS NO PERÍODO DE 02/67 A 11/91. PRESCRIÇÃO. PRAZO TRINTENÁRIO. INAPLICABILIDADE DO DECRETO Nº 20.910/32. I. O Colendo Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento de que as contribuições para o FGTS possuem caráter nitidamente social, não constituindo, pois, crédito de natureza fiscal ou parafiscal (RE 100.249/SP, Rel. Min. Néri da Silveira, DJ de 01.07.88, p. 16903). [...]

Sendo, pois, a contribuição ao FGTS um direito trabalhista, a contribuição referida no

artigo 1°, da LC nº 110/01, seria apenas uma majoração ao FGTS, uma majoração da

indenização a ser paga ao empregado, quando da despedida sem justa causa, e não uma

contribuição, com natureza tributária que se revestirá em renda para o Estado, como propõe a

LC nº 110/01.

As contribuições criadas por esta lei não podem, sob qualquer título, serem chamadas de

contribuições sociais, pois, como explanado anteriormente, as contribuições apresentam como

principal característica a respectiva destinação constitucional do produto de sua arrecadação,

sendo este um pressuposto de sua criação, condição esta que não é satisfeita no caso em tela.

89

Para a instituição de uma contribuição social, há que se ter a vinculação entre a

destinação da receita e a seguridade social, sob pena de inconstitucionalidade, entretanto as

duas novas contribuições não podem ser enquadradas no artigo 195 da CF/88, como

financiadoras da Seguridade Social. Estas contribuições não têm por objetivo assegurar

direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social, conforme o artigo 194, da

CF/88, mas sim, cobrir despesas do Estado. E, além disso, como tributos devem observar os

princípios do Sistema Constitucional Tributário, como o princípio da anterioridade, da

irretroatividade da lei, além da destinação específica, o que não é o caso.

Se considerados como impostos com base na competência residual da União (artigo

154, I, da CF/88), seriam da mesma forma inconstitucionais, pois, no artigo 2°, estaria

configurado o bis in idem , com a mesma base de cálculo do imposto de renda, vedada pelo

artigo 154, I. E ainda, têm sua arrecadação vinculada ao financiamento de despesas

específicas, estabelecida na própria lei, indo de encontro ao artigo 167, IV, da Constituição

Federal, que diz que uma receita de impostos não pode estar vinculada a órgão, fundo ou

despesa. E, no caso da LC nº 110/01, as novas contribuições, além de estarem vinculadas ao

FGTS, foram criadas para cobrirem uma despesa do Governo Federal.

Outro absurdo jurídico é o fato de o valor que seria arrecadado com a referida lei não

ser creditado na conta do trabalhador, constituindo apenas receita para a União. Ora, trata-se

aqui, de uma inconstitucionalidade latente, uma vez que não há, no texto constitucional,

nenhuma previsão da criação deste fundo acessório, principalmente com o nome de

“contribuição social”. E mais, a Constituição delimita que os depósitos ao FGTS sejam de

40%, não podendo este valor ser modificado por uma norma infraconstitucional.

Outra questão é o fato de não haver uma correlação entre o pagamento feito pelo

empregador e o respectivo ganho dos seus empregados, pois a contribuição é de caráter geral,

atingindo todos os empregadores. E o ganho seria apenas para aqueles trabalhadores que

foram prejudicados pelos planos Collor e Verão (artigo 4º, da LC nº 110/01), não sendo, pois,

legítima sua cobrança. Sobre este assunto ensina Geraldo Ataliba (1998, p.179):

Impõe-se destarte, reconhecer a necessidade – constitucionalmente postulada - de que haja, ainda que indiretamente (embora clara e objetiva), correlação entre beneficiários da ação do Estado e as pessoas chamadas a contribuir; ou seja: correlação entre os efeitos ou causa da ação estatal custeada pela ‘contribuição’ e seus contribuintes (sujeitos ativos e passivos).

90

Configura-se desprovida de razoabilidade a LC nº 110/01, visto que não pode a União

Federal, editar leis com fins arrecadatórios, confiscatórios ou com abuso do poder de legislar,

desrespeitando nitidamente a Constituição Federal (artigos 5º, inciso XXII e 150, inciso IV).

É, portanto, inconstitucional, por inobservância aos princípios da razoabilidade, da

proporcionalidade e da moralidade administrativa. Espera-se, portanto, que o julgamento das

ADINs nº 2.556-2 e 2.568-6 caminhem neste sentido.

4.3 Emenda Constitucional 33/2001

Com relação às contribuições de intervenção no domínio econômico, na legislação

brasileira, os fatos geradores necessários para a instituição de uma CIDE não se encontram

explicitados no texto constitucional, não há referência à materialidade das hipóteses de

incidência que podem ser eleitas pelo legislador, para a criação das CIDEs, em geral. O artigo

149, da CF/88, somente refere que as CIDE devem ser instrumentos de atuação da União na

área econômica.

Desta forma, sem estabelecer as respectivas hipóteses de incidência e os demais

aspectos a elas inerentes, o artigo 149, da CF, deixa ao legislador infraconstitucional a

possibilidade de estabelecer o aspecto material das CIDEs que vierem a ser criadas,

estabelecendo restrição apenas quanto à observância do disposto nos artigos 146, III e 150, I e

III, da CF/88.

Entretanto, após a edição da Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001,

passou a existir um único caso de fato gerador de CIDE, materialmente delineado no texto

constitucional brasileiro. O atual § 2º, inciso II, do artigo 149, e o § 4º, do artigo 177, da CF,

expressamente estabelecem ser possível instituir uma CIDE incidente sobre "importação ou

comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool

combustível".

A EC 33/2001 acrescentou importantes modificações à CF/88 e teve como principal

objetivo a criação de uma contribuição de intervenção no domínio econômico, incidente sobre

operações com combustíveis no Brasil.

Além de possibilitar a criação da CIDE dos combustíveis, a EC 33/2001 alterou

algumas regras relativas ao ICMS. As principais alterações foram a inclusão das pessoas

físicas como contribuintes do imposto em operações de importação e a previsão de uma forma

91

de incidência do ICMS, em etapa única, sobre combustíveis definidos em lei complementar,

afastando, nesses casos, a imunidade existente nas operações interestaduais com combustíveis

derivados de petróleo.

Também permitiu que a lei definisse as hipóteses em que as contribuições incidirão uma

única vez, evitando assim, a cumulatividade destas figuras exacionais, possibilitando que se

eliminem destes tributos, o “efeito cascata” (artigo 149, § 4º, CF).

Entretanto, cabe neste trabalho, apenas algumas considerações acerca da referida

emenda, principalmente no que se refere às contribuições interventivas. Primeiramente, tem-

se que a emenda 33 possibilitou a criação de uma contribuição de intervenção no domínio

econômico, que foi instituída pela lei n° 10.336, de 19 de dezembro de 2001. Surgiu assim a

CIDE dos combustíveis, incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus

derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível, cobrada do produtor, do

formulador, do importador, pessoa física ou jurídica, dos combustíveis mencionados,

conforme se aduz do artigo 1º da referida lei:

Art. 1º Fica instituída a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível (Cide), a que se refere os arts. 149 e 177 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001. § 1º O produto da arrecadação da Cide será destinada, na forma da lei orçamentária, ao: I - pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, de gás natural e seus derivados e de derivados de petróleo; II - financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás; e III - financiamento de programas de infra-estrutura de transportes. [...]

Como se vê no § 1º, tal contribuição tem a finalidade de pagamento de subsídios a

preços ou transporte de álcool combustível, de gás natural e seus derivados e de derivados de

petróleo, de financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e

do gás, bem como, de programas de infra-estrutura de transportes (conforme o inciso II, do §

4º, do artigo 177, da CF).

Com isto a EC 33/2001, com as alterações da EC 42/2003, estabeleceu novos tributos,

na medida em que permitiu que as contribuições sociais e de intervenção no domínio

econômico incidam também sobre a importação de produtos estrangeiros, o que tornou

possível a criação da CIDE dos combustíveis, in verbis:

92

Art. 149 [...] § 1º [...] § 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação; II - poderão incidir sobre a importação de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível; III - poderão ter alíquotas: a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro; b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada. [...]

Desta forma, com base no inciso III, as alíquotas de qualquer CIDE e de qualquer

contribuição social podem ser ad valorem ou específicas. Alíquota ad valorem corresponde à

definição própria de alíquota, ou seja, um percentual (fixo ou variável) incidente sobre um

valor (base de cálculo). Alíquota específica corresponde a um valor determinado em moeda,

pelo qual será multiplicada a base de cálculo expressa em unidade diversa de moeda. A lei

10.336/2001, que instituiu a CIDE dos combustíveis, adotou a alíquota específica.

Relativamente às imunidades, a EC 33/2001 criou uma nova situação de imunidade

quando estabeleceu que as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico não

incidirão sobre as receitas de exportação (artigo 149, § 2º, inciso I, da CF). Isto, segundo

Carraza (2010, p. 653), merece elogios, visto que atendeu a um anseio antigo dos

exportadores, de não onerar, nem mesmo por meio de “contribuições”, as operações que

levam bens ou produtos brasileiros ao mercado internacional.

Antes dessa Emenda Constitucional, somente existia uma hipótese expressa de

imunidade relativa às contribuições: a imunidade às contribuições de seguridade social, a que

fazem jus as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências

estabelecidas em lei, prevista no artigo 195, § 7º.

O parágrafo terceiro, do artigo 155, já teve sua redação original modificada duas vezes.

Primeiro, alterou-o a EC nº 3/1993, posteriormente, a EC nº 33/2001 modificou novamente

seu texto, reduzindo, significativamente, a abrangência da imunidade nele prevista, uma vez

que a expressão "nenhum outro tributo" foi substituída pela expressão “nenhum outro

imposto”. Portanto, hoje, a redação do § 3º, do artigo 155, da CF, é a seguinte:

§ 3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País.

93

Trata-se de hipótese de imunidade objetiva. Portanto, atinge a operação, não abrangendo

o lucro ou o faturamento da empresa, ou quaisquer outros elementos econômicos que

guardem vinculação apenas indireta com as operações enumeradas. Impede, por exemplo, a

incidência de IPI na produção de combustíveis. Não impede, entretanto, que a indústria de

combustíveis sofra incidência da contribuição social sobre o lucro (CSLL) e do imposto de

renda sobre seu lucro líquido.

O principal objetivo dessa alteração veiculada pela EC 33/2001 foi, sem dúvida,

permitir a existência da CIDE dos combustíveis, já que as contribuições previstas no artigo

149, da CF/88, configuram-se como espécie tributária autônoma. E, se o § 3º, do artigo 155,

trouxesse em sua redação a vedação de incidência de qualquer outro tributo, exceto o ICMS, o

imposto de importação e o imposto de exportação, sobre operações com combustíveis,

resultariam num problema de difícil solução, entre esse dispositivo e os artigos 149 e 177, da

CF/88.

Além disso, a EC 33/2001 inovou, excepcionando, parcialmente, os princípios da

legalidade e da anterioridade. Referida emenda acrescentou o § 4º ao artigo 177, da CF, que,

em seu inciso I, alínea b, permite que o poder executivo, mediante ato próprio, reduza e

restabeleça as alíquotas previstas na lei (exceção à legalidade), sem sujeição ao artigo 150,

inciso III, alínea b (exceção à anterioridade), in verbis:

Art. 177 [...] [...] § 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: I - a alíquota da contribuição poderá ser: a) diferenciada por produto ou uso; b) reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150, III, b;

A este respeito, afirma Carraza (2010, p. 657-658) que este dispositivo abre mais uma

exceção ao princípio da anterioridade, visto que “permite venha reduzida ou restabelecida por

ato do Poder Executivo a alíquota da contribuição de intervenção no domínio econômico

relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás

natural e seus derivados e álcool combustível”. Ainda segundo este autor os novos encargos,

criados pela EC 33/2001, são inconstitucionais:

94

De fato, é lição sempre repetida da doutrina que não compete ao constituinte derivado alterar as regras-matrizes constitucionais dos tributos, de modo a ensejar o agravamento da situação dos contribuintes. Também não lhe é dado amesquinhar direitos fundamentais destes mesmos contribuintes (como, v.g., o de verem observados os princípios da estrita legalidade e da anterioridade). O constituinte derivado, com todas as limitações materiais, formais e temporais que mapeiam seu agir, absolutamente não pode ser equiparado ao constituinte originário, que – este, sim – não se vincula a qualquer regime constitucional preexistente. Assim, independentemente da eventual conveniência ou oportunidade destes novos gravames tributários, temos para nós que ferem cláusulas pétreas e, decerto, merecerão frontal repúdio do poder Judiciário quando as controvérsias em torno destes assuntos forem levadas à sua apreciação. (grifo original).

Desta forma, entende-se que os novos tributos criados pela EC 33/2001, especialmente

os baseados nos artigos 149 e 177, da CF, são inconstitucionais, visto que ferem cláusulas

pétreas, colocando em cheque o sistema federativo brasileiro.

4.4 As contribuições e a interpretação das normas constitucionais no Brasil

Inicia-se este tópico com a seguinte premissa: a Constituição é o lócus hermenêutico do

Direito, é o “lugar” a partir do qual se define a amplitude dos significados possíveis dos

preceitos jurídicos infraconstitucionais. O que não poderia ser diferente diante do

constitucionalismo moderno, como modo de regulamentação da convivência política, bem

como da consagração do princípio da supremacia constitucional (PEREIRA, 2007, p. 177).

São as palavras de Pereira (2007, p. 179):

Ora, em consonância à afirmativa de que a Constituição é o locus hermenêutico do Direito, a conclusão a ser extraída é pela unicidade do fenômeno que leva, pois, à assertiva de que o processo de compreensão, interpretação e aplicação dos preceitos jurídicos (constitucionais e infraconstitucionais) é essencialmente unitário – processo esse que será descrito posteriormente como concretização. Há, em verdade, uma constitucionalização de toda interpretação jurídica; em outras palavras, uma absorção da Hermenêutica Jurídica Clássica pela Hermenêutica Constitucional.

Acerca dos princípios constitucionais e das concepções pós-positivistas Bonavides

(1996, p. 265) com excelência afirma:

Em resumo, a teoria dos princípios chega à presente fase do pós-positivismo com o seguintes resultados já consolidados: a passagem dos princípios da especulação metafísica e abstrata para o campo concreto e positivo do Direito, com baixíssimo teor de densidade normativa; a transição crucial da ordem jusprivatista (sua antiga inserção nos Códigos) para a órbita juspublicística (seu ingresso nas Constituições); a suspensão da distinção clássica entre princípios e normas; o deslocamento dos princípios da esfera da jusfilosofia para o domínio da Ciência Jurídica; a proclamação de sua normatividade; a perda de seu caráter de normas programáticas; o reconhecimento definitivo de sua positividade e concretude por obra sobretudo das Constituições; a distinção entre regras e princípios, como espécies diversificadas do gênero norma, e, finalmente, por expressão máxima de todo esse desdobramento

95

doutrinário, o mais significativo de seus efeitos: a total hegemonia e preeminência dos princípios.

Diante disso, a hermenêutica constitucional atual não pode ser utilizada de maneira

tendenciosa ou mesmo manipulada pelos mecanismos de poder vigentes, as normas

constitucionais já devem ser vistas pelo padrão do pós-positivismo, de maneira que as

garantias e direitos individuais previstos na CF devam ser considerados como normas de

conteúdo prático e providas de força normativa, não apenas como fatores informativos como

se definia antigamente, os princípios constitucionais.

Reconhecendo desta forma, a positividade dos princípios jurídicos, Humberto Ávila

(2004, p. 70) entende que os princípios estabelecem um fim a ser atingido, exprimindo uma

orientação prática a ser seguida, fixando um conteúdo como pretendido. Eles representam uma

“função diretiva” para a determinação da conduta. O referido autor define os princípios como:

Os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção.

Embora o STF tome em alguns casos decisões políticas, reinventando ou

reinterpretando os princípios constitucionais, percebe-se nestes casos que a interpretação do

texto constitucional compromete o ordenamento jurídico do país, como é o caso de alguns

aspectos ligados às contribuições, como anteriormente demonstrados.

A força normativa da Constituição se vê bloqueada por aqueles que têm por

competência precípua defendê-la, desta forma deve-se, atendendo ao positivismo moderno,

haver uma interpretação conjugada de princípios, com relação às contribuições no Brasil.

Isso acontece no Brasil, de acordo com o pensamento de Lenio Luiz Streck (2006, p.

265-320) porque há no país uma “baixa pré-compreensão” sobre a Constituição e sobre o

neoconstitucionalismo. Isso se dá pela baixa incidência da Constituição nas decisões judiciais

e pela despreocupação com o tema pelo ensino jurídico. Essa “baixa” é, pois, o desprestígio

da Constituição e do direito constitucional.

Ainda segundo o autor, a superação desse positivismo é tarefa problemática em países

de modernidade tardia como o Brasil. Isso se explica pela cultura jurídica positivista, pelas

decisões tribunalísticas e pela continuidade no uso da hermenêutica clássica (vista como pura

técnica de interpretação). Conclui Streck (2006, p.312), mais adiante que:

96

A interpretação do Direito é um ato de integração, cuja base é o círculo hermenêutico (o todo deve ser entendido pela parte e a parte só se adquire pelo todo), sendo que o sentido hermeneuticamente adequado (correto) se obtém das concretas decisões por essa integração coerente na prática jurídica [...]. Exatamente por superar o modelo interpretativo baseado na determinação abstrata dos significados dos textos jurídicos, e por superar os modelos procedimentais, é que a hermenêutica trata da realização concreta do direito, isto é, não há mais só textos; há normas, e nela, está contida a normatividade que abrange a realização concreta. È o caso concreto que será o lócus desse acontecer do sentido.

“O Direito não se reduz à singeleza de um único elemento”, esse é o pensamento de

Arnaldo Vasconcelos (2000, p.17):

O Direito se constitui de fato, de valor e de norma. Portanto, não pode o fenômeno jurídico ser apanhado, em sua integridade, senão através da visualização desses elementos em conjunto. A partir dessa tomada de consciência, afirma-se o trialismo ou tridimensionalismo jurídico, cujo teórico mais fecundo é Miguel Reale.

Ainda segundo Arnaldo Vasconcelos, o Direito estudado de forma parcial, será sempre

incompleto. Deve-se, sempre integrar, ao conceito de Direito as três dimensões axiológica,

fática e normativa, uma vez que a apreciação isolada de somente uma dimensão pode

conduzir a anomalias graves. Assim a adoção do trialismo jurídico pode superar posturas

isolacionistas e antinômicas.

São ainda pertinentes as palavras de Vasconcelos (2003, p. 148), que refere não se

poder entender plenamente o mundo jurídico se o sistema normativo (Ciência do Direito) se

separa da realidade em que nasce e na qual se aplica (Sociologia do Direito) e do sistema de

legitimidade que o inspira e que deve sempre favorecer sua própria crítica racional (Filosofia

do Direito). Assim, para que haja uma compreensão da realidade jurídica é necessária a

integração e interdependência dessas três esferas: científico-normativa, sociológica e

filosófica.

Por conseguinte, fala-se então numa metodologia dialética, que faria um estudo

interdisciplinar do Direito. Evitando-se, portanto estudos parciais do fenômeno jurídico, como

por exemplo, o normativismo kelseniano, amplamente debatido pela doutrina; bem como é

possível confirmar o tríplice aspecto referente ao fenômeno jurídico, o fato, o valor e a norma.

Lenio Streck (2006), ressalta, acerca do neoconstitucionalismo, que este tem como

ponto de partida a Constituição e principalmente a sua defesa; e que a interpretação da

Constituição deve servir para valorizá-la e consequentemente fortalecê-la. Em consonância

97

com este entendimento, Machado Segundo (2005, p. 135) ao falar sobre os métodos de

interpretação constitucional aduz o seguinte:

[...] os elementos, os métodos ou critérios ‘clássicos’ de interpretação são insuficientes, sozinhos, para indicar o significado correto da norma interpretada. Quando utilizados sem atenção aos valores às peculiaridades do caso concreto a se resolvido, podem sempre conduzir a vários significados possíveis. Em se tratando de normas contidas na Constituição, a insuficiência de tais critérios revela-se ainda maior. Com efeito, as normas da Constituição são dotadas de carga axiológica bem mais elevada. Têm natureza não apenas jurídica, mas também política. Por ser a Constituição o ato normativo supremo de um ordenamento positivo, nela são encontradas muitas disposições principiológicas, de maior grau de abstração, e que por isso mesmo ampliam as possibilidades exegéticas.

Como visto no terceiro capítulo as contribuições surgiram para efetivar direitos

fundamentais de segunda e terceira dimensões, por meio da concretização das finalidades

constitucionalmente definidas, quais sejam, a prestação de serviços sociais e a intervenção na

economia, por parte da União. Assim, os recursos arrecadados com as contribuições no Brasil

devem ser utilizados para efetivar essas finalidades sociais.

Entretanto, verificou-se que tais metas sociais, em alguns casos, devido à interpretação

do Supremo Tribunal Federal, não estão sendo atingidas, visto que a instituição das

contribuições vem sendo utilizada pela União Federal como um simples meio de arrecadação

de recursos, não observando os fins a que se destinam as normas constitucionais acerca das

contribuições, ferindo desta forma o princípio federativo, uma das bases do

constitucionalismo brasileiro.

O princípio federativo continua sendo lesado na medida em que a União desobedece a

divisão de rendas tributárias traçada na Constituição Federal, quando institui contribuições

sob o argumento de finalidades sociais, que na verdade não estão sendo atingidas, ou seja, os

valores arrecadados com as contribuições vem sendo aplicados em finalidades diversas das

que lhes determinaram a instituição e a cobrança. Vale aqui a lição de Machado Segundo

(2005, p. 145): “[...] não é certo que a destruição da federação seja adequada, nem muito

menos necessária ao prestígio de direitos sociais”. Ou seja, os valores sociais e coletivos não

são absolutos, não podem se sobrepor a outros resguardados pela forma federativa de Estado.

Assim, segundo Robert Alexy (1993, p. 34) toda ponderação de interesses, para ser

considerada racional na solução de uma colisão de princípios, deve ser, ao mesmo tempo,

adequada, necessária e proporcional. Em conformidade com este pensamento e relativamente

98

às contribuições no ordenamento jurídico brasileiro, Machado Segundo (2005, p. 146-148)

com maestria assevera:

A justificativa para a intensa instituição e majoração de ‘contribuições’, já se disse, é a ‘mudança no perfil’ do Estado. Essa mudança supostamente faz com que se ‘relativizem’ valores liberais, como o federalismo, para permitir a efetivação de valores sociais e coletivos. É verdade que o federalismo evoluiu. Hoje já não se fala em federalismo dual, mas sim em federalismo de equilíbrio, ou solidário, no qual se procura também propiciar a redução das desigualdades regionais. [...] Foi esta visão ‘parceirista’, como vimos, a forma adotada pela CF/88, mas é evidente que a adoção dessa forma não autoriza a própria extinção do federalismo, sob a justificativa de que, com essa extinção, serão assegurados direitos sociais e coletivos.[...] Note-se que, ao lado dos valores sociais, os quais justificam a cobrança das contribuições, a Constituição Federal de 1988 protege a livre iniciativa, a propriedade privada e a livre concorrência. Todos esses valores têm de conviver harmonicamente, não podendo uns suprimir os outros. Isso justifica que às contribuições sejam impostas limitações como a legalidade, a anterioridade e a irretroatividade, por exemplo. Justifica, ainda, e pelas mesmas razões, que o sistema tributário seja racional. O mesmo pode ser dito do respeito à forma federativa de Estado. Deve ser assegurada aos entes federados autonomia, a qual só se obtém com a disponibilidade de recursos financeiros. A competência da União federal para criar contribuições não pode ser exercida de modo tal que inviabilize – direta ou indiretamente – a competência tributária de Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. O princípio federativo, portanto, é outro com o qual os valores protegidos pelas contribuições têm de ser sopesados e conciliados, de modo que o prestígio exacerbado atribuído a um ou a alguns deles não estiole – como vem estiolando – os demais. [...] Enfim, e aplicando agora especificamente o postulado da proporcionalidade, não nos parece que a instituição de ‘contribuições sociais gerais’, sem âmbito definido, de ‘contribuições de intervenção no domínio econômico’, para qualquer finalidade, e de ‘contribuições de seguridade’ para custear o orçamento fiscal da União seja sequer adequado para a proteção de direitos sociais. (grifos originais).

Com o atual federalismo de equilíbrio ou solidário, adotado também pela Constituição

Federal de 1988, como estudado no primeiro capítulo, nada impede que os direitos sociais

buscados com a instituição das contribuições sejam também atendidos pelos Estados e

Municípios, até mesmo com maior eficiência e não apenas pela União Federal, visto que estão

mais próximos territorialmente das questões sociais, o que atenderia ou mesmo fortaleceria o

princípio federativo no Brasil.

Para finalizar este estudo, e antes de qualquer conclusão vale transcrever as palavras de

Rodolfo Viana Pereira (2007, p. 172):

[...] pode-se novamente apostar na possibilidade de convivência política pela renovação do respeito e da confiança no constitucionalismo. Em última instância, significa apostar na viabilidade do projeto humano de vida em comum, baseado não na desistência da autonomia individual, mas na capacidade de sua auto-realização em um ambiente em que a própria garantia do indivíduo é correlata à afirmação da solidariedade política, traduzida no respeito à alteridade.

99

Assim, a responsabilidade dos operadores jurídicos traduz-se em um permanente debate público das razões de decidir em um constante repensar os fundamentos da convivência política, pautada por um ato de respeito às distintas visões de mundo, como marca do caráter inclusivo da cidadania no postulado do Estado Democrático de Direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sem preocupações com o esgotamento do tema, haja vista uma grande quantidade de

normas legais, doutrina e jurisprudência sobre o assunto, tentou-se elucidar e discutir alguns

aspectos e até mesmo suscitar novos questionamentos sobre o instituto das contribuições no

ordenamento jurídico brasileiro.

Para um completo entendimento do assunto, fez-se mister uma análise consubstanciada

de algumas normas constitucionais e infra-constitucionais que envolvem o tema, buscando-se

chegar a um referencial teórico suficiente para definir a natureza jurídica de tal instituto.

O estudo das formas de Estado conduz ao Estado Federal, que, juntamente com o

Estado Unitário e a Confederação formam a estrutura espacial do Estado. Assim, analisou-se

o Estado Federal, o federalismo brasileiro e suas particularidades, a repartição de

competências como exigência da estrutura federal, para assegurar o convívio dos vários

ordenamentos que compõem o Estado Federal, bem como as garantias individuais presentes e

exigidas em um Estado de Direito.

Tem-se como as principais características do federalismo, de um modo geral, a união

indissolúvel de seus entes e suas respectivas autonomias constitucionais; a repartição

constitucional de competências; a existência de uma Corte Suprema, para interpretar e

proteger a Constituição Federal, e dirimir conflitos entre a União, os Estados e outras pessoas

jurídicas de direito interno.

Relativamente ao federalismo brasileiro e à Constituição Federal de 1988, vale

transcrever a idéia de Raul Machado Horta (2010, p. 418), que conclui:

A oscilação pendular, que percorre a evolução do federalismo constitucional brasileiro, marcada por fases de plenitude e períodos de queda e de negação, de alternância do federalismo hegemônico e centrípeto e do federalismo centrífugo e dualista atingiu, afinal, o seu momento de estabilização na Constituição Federal de 1988. Sob o ângulo da forma federal de estado, a Constituição de 1988 é o coroamento da evolução secular e assinala o ponto de equilíbrio que se atingiu no estágio do amadurecimento das instituições federais (grifo original).

101

Tem-se também como mérito da Constituição de 1988, a inclusão do Município como

ente federativo, atribuindo-lhe o poder de auto-organização mediante a elaboração de sua lei

orgânica, sendo este um fator diferenciador do federalismo original, norte-americano, o que

leva a um entendimento de que existem fatores outros que fazem cada sistema federativo se

adequar a suas reais necessidades, sem, contudo, se afastar dos ideais federais.

Abordou-se também, o contexto social e político em que surgiram as contribuições e

quais influências sofreu o ordenamento jurídico brasileiro com a introdução desse novo

instituto. Assim, fez-se um breve histórico que vai do Estado Liberal ao Estado Neoliberal,

sendo, as contribuições, fruto do Estado Social, e seu aparecimento, decorrência direta do

intervencionismo estatal, originado pelo Welfare State.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 3°, adotando os novos fins que

passaram a orientar a atuação estatal, consagrou como objetivo da República, a busca do bem-

estar social, como se pode observar nos incisos I e IV: construção de uma sociedade livre,

justa e solidária e promoção do bem de todos. Surgindo, assim, o instituto das contribuições

no ordenamento jurídico brasileiro.

Com o suporte da Constituição de 1988, verifica-se que as contribuições são espécie de

tributo autônomo, que possuem como traço distintivo, ou principal característica, a finalidade

constitucionalmente definida, o que as diferenciam dos demais tributos, e que, no entanto, não

as descaracteriza como tal.

Podem ser divididas em: contribuições sociais; contribuições de intervenção no domínio

econômico e contribuições de interesse de categorias profissionais ou econômicas. As

contribuições sociais dividem-se, ainda, em contribuições de custeio da seguridade social e

outras contribuições sociais, específicas, referidas, expressamente, na Constituição, a exemplo

das contribuições sociais ao PIS e ao salário-educação.

Uma questão de suma importância no bojo desse debate é a discussão, segundo a qual

existem ou não contribuições sociais “gerais”, sem finalidade constitucionalmente

determinada. Entende-se, que a instituição de uma contribuição sem finalidade determinada,

de modo específico, pelo Texto Constitucional, significa a total descaracterização de sua

natureza jurídica.

102

Mostra-se, portanto, um instituto insustentável no ordenamento jurídico brasileiro que,

além de inconstitucional, a admissão de tal espécie, cujo âmbito constitucional de incidência é

praticamente ilimitado, esvaziaria por completo a competência residual estabelecida no artigo

195, § 4º, da CF/88, além da própria competência para instituir impostos e taxas. Tudo

poderia ser arrecadado por meio de “contribuições gerais”, e com uma concentração de poder

tributário nas mãos da União Federal apenas, ferindo, desta forma, o princípio federativo, uma

das bases da Constituição de 1988.

Relevantes ainda foram as modificações introduzidas pela EC 33/2001, no âmbito do

Direito Tributário Constitucional. Essa emenda alterou, significativamente, o artigo 149 e o

artigo 177, da Carta Política, com o objetivo específico de possibilitar a criação de uma

contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE) incidente sobre operações com

combustíveis. Referida emenda estabeleceu uma nova hipótese de exceção parcial ao

princípio da anterioridade, especificamente aplicável à CIDE dos combustíveis, no caso do

restabelecimento de suas alíquotas por ato próprio do Poder Executivo, quando este as houver

anteriormente reduzido. O que se caracteriza como uma afronta direta aos preceitos

constitucionais, visto que ferem cláusulas pétreas, colocando em cheque o sistema federativo

brasileiro.

Já com a lei complementar nº 110, de 2001, foram instituídas duas novas contribuições,

no ordenamento jurídico brasileiro. Entretanto, configura-se inconstitucional a LC nº 110/01,

visto que não pode a União Federal, editar leis com fins duvidosos, desrespeitando a

Constituição Federal (artigos 5º, inciso XXII e 150, inciso IV), com clara afronta aos

princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da moralidade administrativa.

Assim, embora agindo o STF como um tribunal político, sua função precípua é a defesa

da ordem constitucional do país. Não pode ele, ficar omisso ou mesmo proferir decisões

contrárias à vontade constitucional, somente por motivos políticos e mantenedores de planos

governamentais alicerçados em normas legislativas forçadas e francamente inconstitucionais.

Como conclusão deste trabalho, tem-se, em suma, a necessidade da interpretação

constitucional baseada no neopositivismo, levando em consideração os princípios

constitucionais que regulam as relações e os direitos dos cidadãos afetados, previstos

constitucionalmente.

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