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3 Interatividade para os publicitários 3.1. A preparação para coleta de dados Há tempos vem se pensando e produzindo sobre o que define interatividade e o potencial interativo das tecnologias contemporâneas de informação e comunicação, como visto até aqui. Pode-se perceber que elas possuem um grande poder de evidente encantamento. Talvez isso justifique a roupagem com caráter de ineditismo que se associa ao termo a cada surgimento de nova mídia, suporte e possibilidades tecnológicas. Vive-se uma época em que a internet não é mais novidade, nem se encontra em estado embrionário, pelo contrário, suas práticas já não se esgotam mais em mera exposição e simples consulta. As possibilidades interativas dos processos comunicacionais que se estabelecem no ambiente virtual pairam em boa parte das atividades nesse meio. O surgimento de outras mídias, como por exemplo os aparelhos celulares que trazem mobilidade e instantaneidade no acesso à informação e comunicação, complexificam ainda mais o processo. Através desses diversos canais, marcas viram personas tangíveis, aproximam-se ainda mais do seu público e estabelecem vínculos de relacionamento com o mesmo. O acelerado processo de mudança é um dos principais fatores da dificuldade de compreensão da situação e adaptação às consequências e transformações deste tempo. Se, por um lado, é possível observar grandes marcas não mais utilizando o rótulo da interatividade como mero aspecto distintivo, ou ainda, elemento de classificação do que seriam os “setores de online e offline” da comunicação, percebendo, portanto, a necessidade de ir além e de integração de todo o processo; por outro, muitas ainda apostam tão somente no valor agregador que gera a utilização do termo e seus aspectos inerentes de novidade, experiência e encantamento, normalmente advindos das potencialidades tecnológicas das chamadas mídias interativas e do universo digital.

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3 Interatividade para os publicitários

3.1. A preparação para coleta de dados

Há tempos vem se pensando e produzindo sobre o que define interatividade

e o potencial interativo das tecnologias contemporâneas de informação e

comunicação, como visto até aqui. Pode-se perceber que elas possuem um grande

poder de evidente encantamento. Talvez isso justifique a roupagem com caráter de

ineditismo que se associa ao termo a cada surgimento de nova mídia, suporte e

possibilidades tecnológicas.

Vive-se uma época em que a internet não é mais novidade, nem se encontra

em estado embrionário, pelo contrário, suas práticas já não se esgotam mais em

mera exposição e simples consulta. As possibilidades interativas dos processos

comunicacionais que se estabelecem no ambiente virtual pairam em boa parte das

atividades nesse meio. O surgimento de outras mídias, como por exemplo os

aparelhos celulares que trazem mobilidade e instantaneidade no acesso à

informação e comunicação, complexificam ainda mais o processo. Através desses

diversos canais, marcas viram personas tangíveis, aproximam-se ainda mais do

seu público e estabelecem vínculos de relacionamento com o mesmo.

O acelerado processo de mudança é um dos principais fatores da dificuldade

de compreensão da situação e adaptação às consequências e transformações deste

tempo. Se, por um lado, é possível observar grandes marcas não mais utilizando o

rótulo da interatividade como mero aspecto distintivo, ou ainda, elemento de

classificação do que seriam os “setores de online e offline” da comunicação,

percebendo, portanto, a necessidade de ir além e de integração de todo o processo;

por outro, muitas ainda apostam tão somente no valor agregador que gera a

utilização do termo e seus aspectos inerentes de novidade, experiência e

encantamento, normalmente advindos das potencialidades tecnológicas das

chamadas mídias interativas e do universo digital.

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Diante disso, surge a necessidade de buscar, através de entrevistas com os

próprios produtores da comunicação publicitária, qual o sentido que esses

profissionais atribuem ao conceito da interatividade e a forma como ele vem

sendo aplicado nas práticas publicitárias. Ao deixar um pouco reservadas as

reflexões teóricas sobre o tema e partir para a busca da compreensão do termo

junto aos agentes envolvidos nas práticas cotidianas, especificamente aqueles que

elaboram e viabilizam as propostas de comunicação comercial, passa a se ter em

mãos os discursos, que se configuram como objetos mais concretos e delimitados,

podendo revelar a questão de forma também complexa, porém com pontos

esclarecedores.

Solicitada pelos próprios objetivos da pesquisa, a base metodológica

adotada para busca e coleta de informações junto aos profissionais é decorrente do

Método de Explicitação do Discurso Subjacente (MEDS)1, com suas etapas

nitidamente demarcadas. Tendo como pressuposto a importância da linguagem na

construção da percepção da realidade e, mais do que isso, a capacidade do

discurso de revelar o conjunto de valores e regras a partir do qual se dá essa

construção, em conformidade com o grupo ao qual o sujeito pertence, o MEDS se

apresenta ideal para explorar as complexidades, e possíveis contradições, que vêm

à tona na observação do discurso de um falante.

A primeira fase do MEDS é a seleção da amostra, em outras palavras, o

recrutamento dos participantes. Para esta pesquisa, foi selecionado um grupo de

profissionais com ampla visão e experiência em diversificadas práticas

publicitárias, na área de criação, planejamento estratégico ou marketing, de

agências ou produtoras do Rio de Janeiro e de São Paulo, que atuem ou tenham

atuado na realização de ações que considerem estimular algum tipo de

participação do consumidor. Quanto ao número de participantes, assim como

orienta o MEDS, não foi definido a priori, mas foi determinado pelo ponto de

“saturação da informação2” no decorrer do processo. Uma situação satisfatória foi

alcançada com o total de 10 entrevistas, que ocorreram no decorrer dos meses de

junho e julho de 2012.

1 Para conhecimento mais amplo do MEDS, ver Nicolaci-da-Costa, 2007 e 2009. 2 “Fenômeno que ocorre quando, após um certo número de entrevistas, o entrevistador

começa a ouvir, de novos entrevistados, relatos muito semelhantes àqueles que já ouviu, havendo uma rarefação de informações novas” (NICOLACI-DA-COSTA, 2007).

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O critério de homogeneidade da amostra foi buscado com o propósito de

verificação e ratificação dos conceitos que se apresentam relevantes para o grupo

específico analisado, de acordo com os objetivos da pesquisa. Apesar do esforço

na maximização desse critério, houve a necessidade de se levar em consideração,

na análise de determinadas respostas, as noções gerais que fazem parte do

contexto do entrevistado, seja pela área específica de atuação dentro da agência ou

produtora, o ramo de atividade e exigências dos clientes para os quais o

participante trabalha e/ou o foco de atuação da empresa.

Uma breve descrição do perfil de cada entrevistado com sua área de atuação

e empresa na qual trabalha é apresentada a seguir. É importante ressaltar que os

nomes dos publicitários são fictícios para preservar suas verdadeiras identidades,

assim como das empresas, sem deixar, no entanto, de destacar as características

relevantes para compreensão do contexto, “lugar” de fala e perspectivas que

possivelmente norteiam suas visões.

Bruna Rocha, 17 anos de profissão, é diretora geral e de criação de uma

agência de pequeno porte, que atua no mercado do Rio de Janeiro há 6 anos, com

foco, atualmente, voltado para endomarketing, material promocional, propaganda

e internet (comunicação digital). A agência conta com um diretor de marketing

digital, responsável por viabilizar a comunicação direcionada aos meios digitais –

desenvolvendo sites, ações em mídias sociais, campanhas no Google e Facebook,

além de peças digitais interativas. Mas não há, conforme explica a entrevistada,

uma demarcação clara da divisão online versus offline, pois toda a equipe

participa do processo de criação, pensando a comunicação de forma integrada,

com ações que funcionam de modo adequado às especificidades de cada meio.

“Não é simplesmente uma adaptação do impresso para o digital. É mais do que

isso, é pensar em como determinada campanha pode ser usada no digital de forma

criativa e interativa” (Bruna Rocha, diretora de criação, 08 jun. 2012).

Raphaela Lepau trabalha há 17 anos com publicidade e é diretora de

atendimento e planejamento de agência de grande porte, com mais de 40 anos no

mercado e atuação nacional, com matriz em São Paulo e filiais no Rio de Janeiro e

outros Estados. O foco da empresa é publicidade (comunicação em mídias de

massa), mas também atua na conceituação e, em alguns casos, na criação em

outros segmentos, como ações promocionais, campanhas online, storytelling,

entre outros. O departamento de criação incorpora também a elaboração das

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propostas para o ambiente online, com um gestor web coordenando e viabilizando

as ações desenvolvidas, mas a produção é externa. Para a equipe, a comunicação é

planejada e criada de forma integrada.

Toninho Cordeiro está há 15 anos no mercado e é executivo de contas e

planejamento de agência de médio porte, no Rio de Janeiro, cujo foco de atuação

é bellow the line (endomarketing, comunicação interna, marketing direto,

corporativo, ações promocionais, eventos e outros). Na agência, os departamentos

de criação para mídias online e offline são separados, mas os atendimentos são

únicos. Para suporte na criação e desenvolvimento para o universo digital,

dependendo da campanha, a agência conta com a parceria de outras empresas

especializadas.

Luíza Onório é diretora de criação de agência localizada no Rio de Janeiro.

Com filial em Curitiba, a agência é integrante de um grupo europeu em crescente

expansão no Brasil, nos últimos anos. Denomina-se uma agência de convergência

e interação criativa, online e offline. A incorporação de uma empresa de marketing

digital ao grupo tem possibilitado maior presença da agência também no universo

digital.

Maria Bertoni é diretora executiva e dona de uma produtora multimídia do

Rio de Janeiro, com foco em criação de soluções de interfaces e ferramentas para

utilização em eventos, ações promocionais, pontos de venda, entre outros, a fim

de encantar os consumidores e estreitar sua conexão com a marca, através dos

diversos aparatos tecnológicos interativos.

Nélio Rebento é consultor de comunicação, professor e palestrante. Com 40

anos de profissão, já trabalhou em diversas agências de São Paulo e Rio de

Janeiro, nas áreas de atendimento e planejamento. Desde 1999, é Diretor Geral e

dono da empresa na qual trabalha, cuja especialidade está voltada para consultoria

em gestão e planejamento estratégico de comunicação de empresas, ONGs e

instituições governamentais. Um dos principais objetivos da empresa está

centrado no desenvolvimento da comunicação nas organizações e reputação de

marcas, através de formas que estimulam o diálogo e a troca de experiências para

construção de soluções.

Daniela Tomasi tem quase 15 anos de experiência em planejamento, tendo

passado por agências de grande reconhecimento no mercado. Atualmente trabalha

como diretora geral de planejamento na sede – localizada em São Paulo – de uma

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das maiores e mais premiadas agências do país, com 22 anos de atuação no

mercado brasileiro. A agência apresenta-se com foco em soluções integradas de

comunicação e é pioneira como empresa com as especialidades digitais

completamente incorporadas na comunicação e no processo de construção de

marcas.

Felipa de Souza é diretora de planejamento de uma agência de publicidade,

localizada em São Paulo, considerada uma das 20 maiores do país. No mercado

desde 1995, com foco de atuação voltado para comunicação em mídia de massa, a

agência não estabelece separação de trabalho na equipe em função dos meios para

os quais se destinam as campanhas, todos os profissionais – criação, atendimento,

planejamento – lidam com as atividades comunicacionais de forma integrada.

Marcela Battan é gerente de planejamento em agência de publicidade de

grande porte, fundada na primeira metade da década de 90, colecionadora de

algumas das mais importantes premiações em eventos nacionais e internacionais,

com unidades em São Paulo, onde Marcela trabalha, e Rio de Janeiro. A agência

conta com especialistas no ambiente digital integrando a equipe para alguns

setores da empresa, com exceção na área de planejamento cuja estrutura é única

tanto para mídias online, como offline.

Por fim, Marta Reis Fion é analista de SEO e atua na área de marketing

digital de grande agência, cuja marca possui mais de 60 anos, pertencente a um

dos maiores grupos de comunicação do mundo. No Brasil, onde possui unidades

em quatro Estados, há quase dois anos, a agência decidiu incorporar o núcleo

dedicado à produção digital, um dos pioneiros no mercado – cuja marca levava o

termo “interactive” junto ao nome da agência – ao setor de publicidade e

marketing direto, tornando a atividade digital inerente a todas as disciplinas da

comunicação.

A segunda fase do método é a construção do roteiro, necessário para

realização das entrevistas. O roteiro é o instrumento que servirá de base para a

coleta e deve ser estruturado na sua concepção, no entanto aplicado de forma

flexível. Isso significa dizer que a ordem dos itens de questionamento pode ser

modificada para respeitar o fluxo de raciocínio do entrevistado e o bom

andamento da conversa, que deve ser natural, sem, no entanto, deixar de abordar,

rigorosamente, todos os itens. Entre outras diretrizes, o MEDS aponta que o

roteiro deve constar de perguntas abertas, que tragam qualquer tipo de resposta, e

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perguntas fechadas (de resposta “sim” ou “não”), estas sempre seguidas de

perguntas de aprofundamento (“como?”, “por quê?” ...), além de itens que gerem

respostas mais abstratas e outras mais objetivas sobre o mesmo tópico para que

possam ser contrastadas.

O roteiro3 aplicado possui dois eixos principais de questionamento: o que os

profissionais entendem por interatividade e de que maneira(s) o processo

interativo se concretiza nas práticas publicitárias. A abordagem conceitual busca a

compreensão do entrevistado sobre a definição do termo, enquanto a abordagem

prática ajuda a ilustrar tal compreensão. Analisadas conjuntamente, uma

complementa a ideia da outra e contribuem para o entendimento do discurso como

um todo, colaborando também para verificar certas imprecisões nas falas, e o que

esses aspectos podem significar.

O itens encontram-se organizados em três blocos divididos de forma a

ordenar a estrutura de abordagem das questões. No primeiro bloco, o assunto é

introduzido ainda de forma abrangente, deixando que o entrevistado fale

livremente sobre a percepção do próprio em relação ao momento atual da

publicidade e os inúmeros aspectos envolvidos. No segundo bloco, o entrevistado

é solicitado a explicar conceitualmente a interatividade e sua relação com a

publicidade. Por fim, o terceiro e último bloco é voltado para a prática. Aqui, há

ainda uma subdivisão de dois momentos igualmente importantes. Primeiro, são

mostrados alguns exemplos, através de um pequeno vídeo4, de ações produzidas

com o enfoque da interatividade, para que o entrevistado apresente sua

opinião/análise. Em seguida, ele é solicitado a trazer seu(s) próprio(s) exemplo(s)

que considere relevante(s) e adequado(s) para ilustrar o que explanou

anteriormente (o que considera ser interatividade).

As entrevistas, terceira fase do método, foram realizadas seguindo o

pressuposto de priorizar o maior conforto e familiaridade do entrevistado,

considerando a maneira como pode ser executada, assim como o local de

preferência do participante. Sendo assim, uma foi feita de forma presencial, outra

pelo telefone, três delas em ferramentas de troca de mensagens instantâneas, em

3 O roteiro encontra-se, na íntegra, no Anexo 2. 4 O vídeo reúne uma variada gama de tipos de ações, peças e campanhas do que o mercado

tem produzido e veiculado com o rótulo da interatividade. Tem duração de pouco mais de dois minutos e está disponível no CD em anexo ou no link: http://www.youtube.com/watch?v=uvRT2QM0CbY

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sites como Facebook e Gmail, e outras cinco pelo Skype5, explorando essa

ferramenta que viabiliza uma simulação de presença somada à agilidade e

dinamismo que a internet propicia. Além de se apresentarem apropriadas ao

objetivo e tema abordado, as ferramentas que viabilizam a interação de pessoas

via ambiente online são familiares tanto ao entrevistador como, e principalmente,

aos entrevistados.

Novas ferramentas de comunicação, muitas vezes, impõem novas

gramáticas de convivência e maneiras de lidar com o meio e os outros. É

fundamental, portanto, que as regras que orientam o ambiente online sejam

conhecidas e respeitadas para que as conversas possam fluir o mais natural

possível, outro pressuposto fundamental do MEDS. Sendo assim, nos casos das

entrevistas por mensagens instantâneas, a formulação das perguntas seguiu o tipo

de linguagem e significações diversas que regem essa forma de comunicação

escrita que tem se apresentado de maneira bastante difundida nos dias atuais. Para

citar alguns exemplos, é preciso entender as palavras que são modificadas em

função da pronúncia ou de abreviações, além do significado dos símbolos que se

formam na junção de caracteres diversos, ou ainda, as representações de aspectos

exclusivos da fala como a escrita em letras maiúsculas significando a voz alta,

entre outros6.

As duas últimas fases do MEDS são a transcrição dos depoimentos,

reproduzidos na íntegra e de forma fiel à fala dos entrevistados, e a análise dos

discursos. Essa análise dividiu-se ainda em duas etapas: (1) a partir de uma

comparação sistemática de cada resposta dada pelos entrevistados em busca de

recorrências que permitam estabelecer categorias relevantes dentro de um

determinado grupo, chamada análise “inter-participantes”; (2) uma exploração

minuciosa dos depoimentos, de modo a confrontar as respostas apresentadas aos

itens abordados na entrevista de cada participante, de forma individual, chamada

análise “intra-participantes” (NICOLACI-DA-COSTA, 2007).

A seguir, são apresentados os pontos e considerações relevantes do

resultado das análises.

5 Software que permite a comunicação de voz e vídeo, de forma gratuita, entre usuários na

internet. 6 Todas as falas dos entrevistados destacadas nesta pesquisa foram reproduzidas na íntegra,

respeitando as características particulares tanto do discurso oral como escrito.

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3.2. O cenário contemporâneo da publicidade

O primeiro item abordado nas entrevistas trouxe a questão do cenário

publicitário contemporâneo. De forma geral, com uma pergunta aberta, os

entrevistados foram solicitados a falar sobre o que eles percebem como tendência

acontecendo na publicidade brasileira. Por se tratar de uma pergunta bastante

ampla, as direções de abordagem em algumas respostas seguiram caminhos

distintos, nitidamente norteadas pelas especificidades particulares que afetam cada

participante, apesar do rigoroso critério de homogeneidade, conforme mencionado

anteriormente. Ainda assim, alguns tópicos surgiram com relevante frequência.

A urgência de uma nova forma de se fazer a comunicação publicitária é uma

preocupação evidente. Acredita-se que o método tradicional de interrupção de um

conteúdo para inserção de uma mensagem comercial é cada vez menos desejado, e

aceito, principalmente pelo crescente número de consumidores com perfil de

comportamento – incluindo o consumo de mídia – modificado pelas

possibilidades trazidas pela tecnologia digital e a internet. Luíza aponta que há

uma grande probabilidade de os consumidores ignorarem, ou quase isso, a

comunicação tradicional, uma vez que a quantidade de estímulos brigando por

atenção é enorme e variada, e os receptores parecem desinteressados nos formatos

tradicionais.

De fato, o atual momento da sociedade configura-se em um quadro de

excessos, com uma quantidade exacerbada de informações disponibilizadas, com

inúmeras maneiras de acesso a elas, diversos estímulos sensoriais realizados

conjuntamente e um universo de tarefas executadas ao mesmo tempo. Os produtos

midiáticos e de entretenimento, distribuídos através das mídias, têm demandado

mais atenção, ao mesmo tempo que requerem mais participação dos

consumidores. Tudo isso vem reconfigurando e moldando esse “novo receptor”,

conectado, ativo e, segundo Gilles Lipovetsky (2000), também ávido pelo lúdico,

teatral e espetáculo. Diante de tantos estímulos sensoriais, demandas corporais e

excesso de informação, manter o envolvimento mental em certa atividade por

algum tempo tem sido um verdadeiro desafio. Nesse cenário, a atenção torna-se

elemento chave. Sua problemática ganha força e desperta as preocupações e o

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interesse, tanto de estudiosos, quanto de produtores midiáticos. De acordo com

Jeremy Rifkin, o controle do tempo é a nova forma de monopólio comercial, “o

tempo e a atenção se tornaram a posse mais valiosa e a própria vida de cada

indivíduo se torna o melhor mercado” (RIFKIN, 2001, p.9).

Como observa Virgínia Kastrup,

Quando se procura descrever como a atenção funciona nos dias atuais, o primeiro aspecto que sobressai é uma acentuada dispersão, que resulta da mudança constante do foco da atenção. [...] Há na sociedade contemporânea um excesso de informação e uma velocidade acelerada que convoca uma mudança constante do foco da atenção, em função dos apelos que se multiplicam sem cessar (KASTRUP, 2004, p.7).

A autora afirma ainda que há uma certa dificuldade de concentração devido

ao deslizamento constante da atenção entre fatos e situações. Na frequente busca

por novidade, a atenção salta entre focos distintos, com isso se torna passageira e

sujeita ao esgotamento em curto espaço de tempo, impedindo “a espessura

temporal e a consistência da experiência” (KASTRUP, 2004, p.8). A atenção, que

sempre vem acoplada a processos como a percepção e a memória, possui um

caráter seletivo fundamental diante do quadro excessivo e hiperestimulante dos

meios de comunicação contemporâneos, na medida em que direciona a percepção

e ação, além de possibilitar juntar as informações dispersas e amalgamar o

conteúdo.

Thomas Davenport e John Beck definem a atenção, de forma simplificada,

como envolvimento mental concentrado em determinada informação e apresentam

tipos de atenção em 3 pares opostos: “cativa ou voluntária, induzida pela aversão

ou induzida pela atração, frente da mente e fundo da mente” (DAVENPORT &

BECK, 2001, p.26). Os primeiros tipos estão relacionados à escolha. A “atenção

cativa” é dada a algo que se impõe, ao que se deve prestar atenção ou quando não

há alternativas, por imposição explícita ou implícita, como no caso dos intervalos

comerciais de uma programação na TV ou os trailers no cinema. Enquanto a

“voluntária”, como o nome já sugere, é da ordem do interesse, aquilo que se quer

prestar atenção. Os tipos “aversiva” ou “atrativa” referem-se a prestar atenção

para evitar experiências negativas ou esperar resultados positivos (castigo e

recompensa). Por fim, os tipos “frente e fundo da mente”. O primeiro trata-se do

foco da atenção, de forma direcionada e explícita. O “fundo da mente” lida com

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muitos assuntos em paralelo que só receberão o foco de atenção caso ocorra algo

inesperado. A aquisição de nova informação ou conhecimento exige a atenção da

frente da mente. Enquanto a automatização do processo, por exemplo a execução

de uma tarefa com total domínio de conhecimento, ocupa o fundo da mente,

liberando mais concentração às atividades desafiadoras. Segundo esses autores, a

máxima eficácia da captação de atenção depende da combinação dos seis tipos

citados.

Os recentes debates da “economia da atenção” ressaltam a necessidade de

gerenciar o potencial de captação da atenção diante dos obstáculos da capacidade

de concentração da mente humana do século XXI. Sob a perspectiva do cenário

midiático, a economia da atenção, conforme definem Vinícius Pereira e Andrea

Hecksher,

deve ser entendida como o modo como um espectador dedica sua atenção para acompanhar a uma narrativa qualquer (filme, novela, desenho animado etc) em um veículo de comunicação e, consequentemente, o modo como pode estar disponível para ser afetado por uma mensagem publicitária (PEREIRA & HECKSHER, 2008, p.2).

Como se sabe, a atenção sempre foi algo extremamente caro ao mercado

publicitário e se faz ainda mais necessária na atual conjuntura dos meios digitais,

dada a condição mais ativa propiciada pelos recursos tecnológicos. No geral, no

modelo de comunicação massiva, as mensagens publicitárias se apresentam sob a

lógica da invasão/intromissão, interrompendo determinada narrativa acompanhada

pelo receptor. Para despertar o interesse para suas mensagens, captando a “atenção

voluntária” do consumidor, a narrativa publicitária é recheada de estratégias

sedutoras na busca da persuasão de seus argumentos. De toda forma, a “atenção

cativa” é garantida pelo processo de quase passividade, no qual uma possível

reação se limita à incomum negação/rejeição – por exemplo, a troca de canal de

televisão – desse consumidor. No entanto, esse modelo parece cada vez mais

perder força, cedendo lugar a novos padrões de produção e consumo das

mensagens publicitárias, tendendo a uma forma de envolvimento ainda mais

persuasiva com grande direcionamento à individualização.

Conforme apontam Nelly de Carvalho, Rebeca Lins &, Rita Wanderley

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A comunicação das mídias tradicionais se configura através de discursos monológicos (televisão, imprensa e rádio), em que a participação dos destinatários ou sujeitos interpretantes está reduzida a sua posição de recepção, considerando-se normalmente seu perfil, expectativas e outros aspectos; mas não o colocando como participante direto no ato comunicativo, construindo mensagens no espaço interno do dizer (CARVALHO; LINS & WANDERLEY, 2010, p.11).

Luíza Onório ressalta, com ênfase, em sua fala:

CREIO QUE TEMOS QUE REMODELAR A FORMA DE PENSAR COMUNICAÇÃO. ESQUECER O VELHO MODELO E PENSAR EM COMO ATINGIR O CONSUMIDOR INDO PRA BALADA, PRO MERCADO, NA RUA, NO FACE E NA TV, MAS DE OUTRA FORMA DIFERENTE DA ATUAL, FEITA EM FORMATO DE COMERCIAL (Luíza Onório, diretora de criação, 26 jun. 2012)

O grande desafio atual, acredita Daniela Tomasi, é como vencer a

indiferença das pessoas, pois elas não querem ver publicidade. Felipa de Souza

complementa afirmando que “o público já prestou mais atenção na propaganda

das marcas. Com menos opções de consumo de mídia e de entretenimento, a

propaganda cumpria parte desse papel” (Felipa de Souza, diretora de

planejamento, 12 jul. 2012). A partir do momento que a internet passou a disputar

com a TV, trazendo inúmeras opções de consumo de informações, entretenimento

e produtos culturais diversos, tornou-se mais difícil, pelo menos da mesma

maneira, com os mesmos formatos, impactar o receptor das mensagens

publicitárias.

Não há dúvidas que está se falando de um movimento em vias de

acontecimento. Ainda há, mesmo nos grandes centros urbanos brasileiros, forte

presença e predominância dos canais televisivos como principais veículos de

comunicação. E por isso, somado a um fenômeno exclusivo de comportamento

brasileiro de grandes audiências em determinados horários e programações –

como é o caso da novela ou do futebol na Rede Globo – muitos anunciantes ainda

apostam no formato dos anúncios televisivos e seu potencial de impactar pessoas.

Marcela ratifica:

Existe propaganda sendo feita, e bem feita, ainda nesse estágio, de só passar uma mensagem. Muito por conta de um fenômeno brasileiro, que é, dependendo do programa e do horário, concentrar em um canal talvez 50% da população ou mais (Marcela Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012).

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As pesquisas de mercado vêm apresentando, a cada ano, mudanças

significativas nesse quadro. De acordo com os resultados do estudo “2012 Brazil

Digital in Focus”, da comScore, o Brasil se tornou o sétimo maior mercado de

internet do mundo, alcançando um número de 46,3 milhões de usuários. O país

vem presenciando também um crescimento considerável no uso de conexão

móvel, com alta de 50% entre agosto e setembro de 2011. Sobre investimento por

parte das marcas, a pesquisa aponta as redes sociais e os blogs como boas

oportunidades7.

A proliferação de canais e formas distintas de se estabelecer a comunicação

com o consumidor se apresenta como outro grande desafio para os profissionais

de comunicação. Se por um lado significa mais chances de fazer contato com seu

público, por outro, exige que suas velhas fórmulas sejam reavaliadas. Para Maria

Bertonni “o momento é de descoberta, uma renascença da comunicação utilizando

novas ferramentas, [...] novas técnicas (Maria Bertoni, diretora executiva, 26 jun.

2012).

Outro fator de tendência ou, mais do que isso, de urgência, que apontam

alguns dos entrevistados é a integração entre as diversas áreas de comunicação.

Quem defende com mais afinco tal questão é Nélio Rebento. O publicitário conta

que, desde a década de 80, enfatiza a necessidade de se fazer uma comunicação

sistêmica, com um planejamento integrado, sem fragmentação. No entanto, apesar

dos avanços, continua-se acreditando, em alguma medida, que a comunicação

interna está separada e distante da externa. Nélio ressalta a importância da

reputação da marca nas redes de conversa, dentro e fora das organizações, que as

tecnologias permitem hoje. Vive-se um movimento rumo ao “interagir, agregar,

prover e trocar. Isso vai fazer o mundo novo” (Nélio Rebento, consultor de

comunicação, 09 jul. 2012).

Como reflexo desse cenário, apresentam-se também como tendência,

conforme mencionam os entrevistados, a interatividade, a socialização (entre

empresas/marcas e indivíduos), os crescentes deslocamentos de verba para o meio

digital, os investimentos em mídias sociais e ações digitais, o estímulo à

propagação de mensagens pelo próprio consumidor e a busca pelo verdadeiro 7 Informações retiradas de publicação no site Mundo do Marketing. Estudo traça o

comportamento do internauta brasileiro em 2011. Disponível em: http://mundodomarketing.com.br/ultimas-noticias/23264/estudo-traca-o-comportamento-do-internauta-brasileiro-em-2011.html Acesso em: 27 mar. 2012

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envolvimento desse com a marca. Uma forte tendência para os próximos

momentos da publicidade, para Raphaela, é a “personificação das marcas”, ou

seja, marcas com atitudes mais próximas do comportamento humano. A

publicitária acredita que esse é um movimento que já se iniciou timidamente há

algum tempo, mas que caminha para fortalecimento como fruto desse momento

socializador e da necessidade de aproximação e construção de relacionamento,

que as empresas estão percebendo atualmente.

3.3. A relação com o “novo” consumidor

Na construção da relação de marcas com os consumidores, é importante

compreender como eles são percebidos pelos publicitários e, a partir de então, de

que maneira as estratégias são direcionadas. A começar pelo próprio termo

consumidor, e os significados que o mesmo carrega, alguns apontam críticas, o

que mostra o reconhecimento de um processo de mudança comportamental do

público pelos publicitários e, ao mesmo tempo, da importância de acompanhar tais

mudanças, adequando-se a elas. Assim como Primo (2008) sugere compreender

os receptores não mais da mesma maneira, mas sim como “interagentes”, Nélio

propõe a resignificação do conceito de consumidor, que ele seja percebido e

tratado como “interlocutor”, para fazer lembrar e reforçar o potencial de fala do

público de uma marca. Os interlocutores lêem notícias, observam rótulos,

escolhem a origem dos ingredientes, decidem o tempo de TV para seus filhos, em

suma, são mais atentos e conscientes. Por conseguinte, Nélio também prefere

substituir a expressão público-alvo por “público de relacionamento”, algo mais

abrangente e coerente com as atitudes comunicacionais de uma empresa que

compreende a amplitude dessa relação, da circularidade das conversas, da troca.

A multiplicidade que compõe os indivíduos, suas atividades e focos de

interesse e atenção é lembrada por Daniela como elemento de extrema

importância a ser levado em consideração para compreensão do público e o

estabelecimento da comunicação com o mesmo. Daniela afirma que é preciso

olhar para o consumidor não mais entendendo-o como consumidor do seu produto

ou mero receptor das suas mensagens. É necessário percebê-lo como pessoa,

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indivíduo composto por uma complexa rede de tarefas, papéis, atividades,

vontades, satisfações e frustrações. E tentar falar de forma tão familiar quanto

tudo o que cerca suas zonas de interesse, o entretenimento que agrada, a

linguagem que prefere, os ambientes adequados....

Quando eu olho para uma pessoa, eu tenho que pensar o que pode interessar a esse indivíduo, e não só o que pode interessar a ele como comprador e usuário de produto de limpeza [por exemplo], ou seja, como consumidor. Por isso, olhar pessoas, e não consumidores, é bem importante (Daniela Tomasi, diretora geral de planejamento, 11 jul. 2012).

Conforme aponta boa parte dos entrevistados, o consumidor atualmente está

mais atento e exigente, não aceita ser enganado e tem mais ferramentas para

reivindicar seus desejos e opiniões. “A publicidade hoje está indo para as mãos de

todos”, afirma Nélio (Nélio Rebento, consultor de comunicação, 09 jul. 2012). O

potencial de propagação e construção da imagem de uma marca por parte do

consumidor é hoje muito mais latente e evidente, o que torna esse consumidor

também um gerador de conteúdo relevante, com capacidade de alcance de escalas

bem maiores do que seus círculos de convívio pessoal. O público se torna uma das

principais fontes de distribuição de mensagens. Os publicitários parecem atentos a

esse movimento. Alguns já perceberam isso como ferramenta importante a ser

explorada em prol da marca. No entanto, outros parecem bastante perdidos diante

das diversas formas de falar para o público e, principalmente, deixar que o público

fale, conforme relatos de alguns dos entrevistados.

Parte da dificuldade em lidar com esse novo padrão de comunicação com o

mercado baseado na troca e verdadeiro diálogo, que parece se estabelecer de

modo cada vez mais firme, parece fruto do receio de atuar diante do inesperado.

Cordeiro ressalta que a relação entre uma marca e seu público deve se basear na

transparência e credibilidade, uma vez que a resposta do público pode ser positiva,

mas também negativa, e repercute fácil e rapidamente.

A proliferação de mensagens entre consumidores em suas redes de contato e

relacionamento na web é fator de extrema importância para anunciantes. Segundo

recente pesquisa de confiança do Instituto Nielsen8, realizada entre agosto e

8 Informações retiradas de publicação no site do Instituto Nielsen. Consumidores da

América Latina são os que consideram mais relevante a publicidade

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setembro de 2011, com mais de vinte e oito mil internautas de diversos países,

92%, na média global, consideram as recomendações de pessoas conhecidas mais

confiáveis do que qualquer outra forma de publicidade e 70% confiam mais nas

opiniões de consumidores expostas na internet. Na América Latina, a

recomendação de conhecidos também encontra-se como forma mais confiável de

propaganda/recomendação. Já a confiança na opinião de outros consumidores na

internet tem um número mais modesto, ficando em 58%, perdendo para “websites

de marcas”, 73%, e “conteúdo editorial, tais como artigos de jornal”, 69%. Apesar

de apresentar números ainda bastante relevantes nos países latinos, a confiança

nas formas “tradicionais” de comunicação das marcas tem sido cada vez menor.

Cláudio Czarnobai, analista de mercado da Nielsen, acredita que esse movimento

comprova que os níveis mais altos de relevância são depositados nos meios de

comunicação nos quais o consumidor está ativamente buscando informações, seja

nos sites das marcas, nas opiniões de outros consumidores ou ainda em e-mails

solicitados. Para Joseph Jaffe (2008), os consumidores atuais são inteligentes, pois

se utilizam das diversas informações que têm acesso para conhecer

profundamente o que desejam consumir; mas também céticos, quer dizer, bastante

desconfiados e menos suscetíveis a serem impactados pela publicidade e mais

abertos à influência dos demais consumidores.

Uma das características mais evidentes desse “novo” perfil, pode-se inferir,

é a habilidade no aprendizado e uso das novas mídias e seus processos interativos.

Com um comportamento mais inquieto, os consumidores querem interferir,

participar mais ativamente e interagir. É um perfil de comportamento que rejeita

a “audiência passiva”9 que prevaleceu durante longas décadas de predomínio da

televisão como meio de comunicação mais representativo no cotidiano das

pessoas.

Em artigo publicado na revista Webdesign, Ricardo Figueira, na época,

diretor de criação da AgênciaClick, afirma que:

na internet. Disponível em: http://www.br.nielsen.com/news/PublicidadeInternet_Mai2012.shtml Acesso em: 10 mai. 2012

9 A expressão audiência passiva está sendo utilizada aqui para enfatizar a oposição ao comportamento mais atuante, passível de retorno direto e imediato ao emissor e/ou interferência no conteúdo emitido, sem desprezar a inquestionável importância da atuação e participação do receptor em todo processo comunicacional, conforme já exposto e analisado anteriormente.

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Na antiga propaganda, o consumidor era o ponto final de uma comunicação baseada numa relação emissor versus receptor, ou seja, as preocupações se encerravam com a assimilação da mensagem pelo consumidor. Na propaganda moderna, essa relação é só o começo da história. O consumidor é reconhecido como o principal potencializador e propagador da mensagem para outros grupos de pessoas (FIGUEIRA, 2006, p.58).

A citação acima foi apresentada aos entrevistados para que eles expusessem

sua opinião a respeito, com foco no papel do receptor/consumidor. De fato, os

publicitários participantes entendem que a transmissão de uma mensagem é

apenas uma parte do processo, bem como a assimilação é o primeiro passo para

que a comunicação seja efetivada. Além disso, também mencionam a importância

da continuidade do processo e o atributo circular da comunicação, em outras

palavras, falar e saber ouvir o consumidor.

Muitos deles reforçam o argumento de Figueira (2006) reconhecendo a

relevância do potencial de reverberação do público “interlocutor” – para utilizar

termo sugerido por Nélio, bastante apropriado aqui. Contudo, vale ressaltar que o

hábito de buscar recomendações sobre marcas e produtos é uma prática antiga

entre consumidores. Assim como a importância do “boca a boca” para a

construção da imagem de uma marca e, até mesmo, como influência na decisão de

compra de um produto, não é algo exatamente novo para a publicidade. Conforme

ressalta Daniela, não cabe a separação “antiga propaganda” e “propaganda

moderna” sob esse aspecto, pois o “boca a boca” sempre foi relevante. A

diferença, nos tempos mais recentes, está nas possibilidades viabilizadas pelas

ferramentas disponíveis e a capacidade de fazer uso desse riquíssimo recurso, ou

seja, a recomendação e defesa da marca por parte do consumidor, a favor da

comunicação e da imagem dessa marca.

O uso cotidiano das mídias digitais atribui novos aspectos a esse boca a

boca, como a rapidez na proliferação de uma mensagem, o alcance da

comunicação sem limites geográficos, a possibilidade de contato direto e

instantâneo com qualquer indivíduo, a qualquer momento e a capacidade de

propagação de uma mensagem para além do círculo de relacionamento daquele

que a transmite.

A estrutura de redes altera o circuito tradicional comunicativo, posicionando um sujeito concreto como enunciador da publicidade e, assim, tornando o fenômeno de identificação, persuasão e aderência ao produto muito mais provável. [...] A

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publicidade utiliza como ferramenta de persuasão o poder que há entre a estreita relação de dois “amigos”, ou pessoas que fazem parte de uma mesma rede e, de antemão, se identificam umas com as outras, podendo facilitar ou acelerar a aderência de uma ao discurso da outra (CARVALHO; LINS & WANDERLEY, 2010, p.14).

Daí a importância de se tornar relevante e familiar no relacionamento com o

público, estimulando-o à troca, bem como tentando participar das suas conversas,

de forma interessante e adequada, sem interromper e/ou invadir, em suma, a

importância da interatividade, como aponta Daniela.

A aderência de um indivíduo a uma marca e/ou sua mensagem publicitária

tanto lhe acrescenta atributos simbólicos de classificação perante o(s) grupo(s),

como também acrescenta valor ao próprio produto e à marca em questão. Segundo

Vargo e Lusch (2004), isso significa dizer que o consumidor deve ser reconhecido

como co-produtor e o objetivo deve se voltar à maximização da participação do

mesmo. Nesse contexto de organização e comunicação em rede, propiciado pela

internet, em especial plataformas de redes sociais na internet, potencializam-se as

interações entre os consumidores, do mesmo modo que multiplicam-se as formas

de troca de informações e experiências, inclusive de consumo e relação com as

marcas.

3.4. O conceito de interatividade

Ao situar o panorama geral do cenário publicitário contemporâneo e as

transformações envolvidas, os publicitários abordam tópicos que cercam o tema

da pesquisa como: os questionamentos sobre a forma unidirecional de

comunicação da publicidade tradicional, as possibilidades de resposta e maior

participação do receptor no processo comunicacional, o potencial de propagação

do consumidor na construção da imagem e/ou mensagens de uma marca, a

contribuição das mídias digitais e a estrutura em rede para promover aproximação

e relacionamento entre os interlocutores (anunciantes e consumidores) da

comunicação de mercado e a interatividade como forma de comunicação

diferenciada, mais próxima e envolvente. Diante disso, resta tentar tornar evidente

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e esclarecida a visão dos publicitários sobre o conceito de interatividade e sua

aplicabilidade.

Conforme mencionado anteriormente, a definição de interatividade é

abordada de duas formas distintas: conceitual e prática. Três perguntas-chave

compõem o questionamento do conceito cujos conteúdos das respostas foram

analisados conjuntamente para inferência da definição: 1) O que é interatividade?

2) O que caracteriza uma ação/campanha como interativa? 3) Em três palavras, o

que define interatividade na publicidade? Já a abordagem prática foi realizada

com a apresentação do vídeo e a solicitação de um exemplo de interatividade na

comunicação publicitária, anúncio, ação ou campanha, que o participante

considere emblemático para o tema.

Assim como pode ser observado nos estudos teóricos do tema, a definição

do conceito de interatividade, por parte dos publicitários entrevistados, também se

apresenta de forma multifacetada, sem consenso e unidade, revelando grupos que

se aproximam basicamente pelos termos utilizados em suas definições e os

aspectos de uma compreensão mais restrita a uma extrema abrangência. Uma

classificação pode ser esquematizada da seguinte maneira (Tabela 1):

Termos encontrados nas definições do conceito

Compreensão do conceito Entrevistados Perspectiva

Consumidor envolvido com algum tipo de experiência promovida pela marca

Bruna Rocha Mais generalista

“Envolvimento” e/ou “relacionamento” Troca “na essência”,

proximidade e relacionamento “de fato”

Raphaela Lepau Nélio Rebento Maria Bertoni

Mais restrita

Ênfase na necessidade de coprodução no conteúdo da comunicação

Marcela Battan Mais restrita

“Participação” e/ou “via de mão dupla” Ampla gama de possibilidades

de retorno e atuação do receptor Toninho Cordeiro Felipa de Souza Luíza Onório Daniela Tomasi

Mais generalista

“Ação do receptor” Qualquer forma de reação: da assimilação da mensagem ao diálogo com a marca anunciante

Marta Reis Fion Extremamente abrangente

Tabela 1: Esquematização dos termos e conceitos apresentados pelos entrevistados.

A análise entre os participantes permite a verificação e demarcação de

categorias a partir do termos encontrados com maior frequência. Já a análise

aprofundada de cada discurso possibilita revelar os significados que permeiam as

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falas dos entrevistados. As descrições e reflexões a seguir destrincham com mais

detalhes a classificação apresentada na tabela, assim como o discurso de cada

publicitário.

Para Bruna Rocha, interatividade é envolvimento, é quando “o consumidor

vivencia determinada marca ou produto” através da comunicação publicitária do

anunciante. As ações têm como característica essencial a participação do

consumidor e podem ser realizadas tanto nas mídias online e offline, ou até

mesmo em ambas, num processo de continuidade e complementaridade.

O aspecto envolvente é essencial, mas é exclusivamente dependente da

criatividade, como explica a entrevistada. Em outras palavras, a interatividade por

si só não é garantia de “qualidade” e eficiência da mensagem. É preciso ser

criativo e oferecer algo mais do que o produto, seja conteúdo, entretenimento ou,

até mesmo, uma promoção para conquistar a atenção e o interesse do consumidor

em embarcar na proposta interativa da ação/campanha. Dessa forma, a marca cria

maneiras de conhecer o consumidor, colhendo e armazenando suas informações

através das ferramentas disponíveis, e envolvê-lo ainda mais. O consumidor se

relaciona com a marca e compartilha esse relacionamento, tornando-se um

propagador dessa experiência vivida. Em apenas três palavras, a publicitária

define a interatividade como: “envolvimento, entretenimento e conhecimento” –

esse último referindo-se à possibilidade de obter informações sobre o consumidor

participante da ação.

É com essa perspectiva que Bruna avalia os exemplos de campanhas

reunidos no vídeo apresentado na entrevista. Segundo a publicitária,

São todas ideias muito criativas de interatividade e, por isso, muito boas, que provocam um envolvimento do consumidor com a marca. [...] Mas tem que ser criativo, se não, não funciona (Bruna Rocha, diretora de criação, 08 jun. 2012).

A importância do envolvimento com a marca para caracterização de um

processo de interatividade é bastante reforçada, em diferentes momentos, pela

publicitária. No entanto, esse envolvimento, cuja concretização se dá na

participação do consumidor, é tratado de forma bem abrangente no que tange às

diferentes maneiras como pode ser alcançado: desde a personalização de uma

determinada mensagem publicitária, com a escolha de uma música, a ser

compartilhada via rede social, até o que a própria entrevistada chama de

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“envolvimento total”, ou seja, vivenciar alguma experiência através da marca,

com participação mais efetiva, construção de conteúdo, conversa, entre outros.

Cabe ressaltar a observação de Alex Primo (2000) sobre o que vem a ser

“envolvimento” para contribuição da compreensão de interatividade.

Envolvimento visto como forma de “seduzir”, “atrair” ou “encantar” é admitir que

uma interatividade plena pode se dar ao prender o receptor/usuário frente a uma

tela que envolve e encanta seus diversos sentidos, muitas vezes simultaneamente,

em uma cadeia de informações pré-definidas. Uma análise não muito profunda

poderia levar à conclusão que tal modelo já é predominante na linguagem

publicitária há tempos, com seu potencial mágico e envolvente. Para uma perfeita

noção de uma interatividade plena, envolvimento deve ser compreendido como

“tomar parte’, onde o interagente pode participar da construção do processo. Isto

é, necessita-se ultrapassar a noção de mero encantamento e trabalhar para que a

participação ativa e recíproca10 se torne regra e não exceção” (PRIMO, 2000,

p.13).

Nesta via seguem as conceituações de Raphaela Lepau, Nélio Rebento e

Maria Bertoni. Raphaela também compreende a interatividade sob o enfoque do

envolvimento, porém, diferentemente de Bruna, ressalta a necessidade de

construção de “relacionamento de fato” entre marca e consumidor. Isso significa

dizer que para se caracterizar como um processo interativo, a comunicação

publicitária precisa estabelecer uma relação de efetiva troca e conversa,

aproximando-se de uma relação humana. De acordo com as palavras de Raphaela,

a interatividade

vai além de um código que você aponta com o celular. Ela vai chegar num grau pleno, quando a gente conseguir que esse consumidor se relacione de fato com a marca, isso é interatividade. [...] É quando o cara começa a se relacionar com a marca de forma efetiva, quase visceral. E o cara se torna embaixador, um “avalizador” da marca junto com seu grupo. A gente se engana, às vezes, acha que a interatividade está ligada à tecnologia, [...] limita a interatividade a essa questão tecnológica. Acho que isso é muito pouco. O mercado faz isso. Mas a interatividade vai além dessa relação tecnológica. Interatividade tem que ser ligada a relacionamento (Raphaela Lepau, diretora de atendimento e planejamento, 21 jun. 2012).

10 Grifos do autor.

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A construção de relacionamento entre marca e consumidor é, ainda na

perspectiva da publicitária, uma espécie de ciclo vicioso fundamental para a

marca: o relacionamento gera aproximação, que possibilita melhor

relacionamento, o que significa estar mais aberto ao que a marca tem a dizer e

disposto a defender e proliferar a comunicação. “Essa amarração é muito

interessante. Quando as marcas conseguem ter esse tipo de postura e pensamento,

elas conseguem ter essa interação humana e não tecnológica” (Raphaela Lepau,

diretora de atendimento e planejamento, 21 jun. 2012).

É, também, bastante relevante, para Raphaela, a questão da construção de

um conteúdo que sensibiliza, porque é familiar e provoca emoções de alguma

maneira, e que pode “tomar vida própria”, se espalhando e gerando

desdobramentos, o que a publicitária chama de “conteúdo vivo”. É um aspecto

importante para gerar aproximação, interação e disseminação. A partir da

publicidade, as conversas se multiplicam e “viralizam” – termo comum utilizado

para referenciar o processo de propagação de um determinado conteúdo pela

internet. “Toda campanha que gera esse conteúdo [...], é o que mais me toca e que

mais tem esse poder de interação e reverberação” (Raphaela Lepau, diretora de

atendimento e planejamento, 21 jun. 2012).

Os exemplos reunidos no vídeo apresentado, segundo Raphaela,

demonstram a existência de processos de interatividade em graus e tipos

diferentes. Alguns puramente tecnológicos, enquanto outros geram mais conteúdo.

Para uma interatividade plena, as campanhas que humanizam e aproximam mais

ilustram melhor o conceito. Em consonância, apresenta as três palavras que

definem interatividade, no seu entendimento: “relacionamento” – que, para a

entrevistada, é o mesmo que aproximação – “transparência” e “humanização”.

De modo similar, Nélio entende interatividade como um processo através

do qual se cria e cultiva relacionamento. Segundo ele, tal processo reforça a

compreensão do próprio sistema comunicacional, não mais percebido de forma

linear, com um emissor de um lado e um receptor do outro, mas sim em desenho

de espiral, com movimento e constante troca de papéis entre os interlocutores.

Fundamentalmente, há na interatividade o aspecto conversacional que se

caracteriza no ato de falar e saber ouvir, essencialmente trocar. De forma

resumida, o publicitário define o conceito em “ouvir”, “respeitar” e “trocar”.

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Nélio pressupõe que interatividade é estar “inteiro em atividade” e ressalta a

importância do diálogo e do relacionamento interpessoal para a construção de uma

comunicação mais humana, com consumidores/interlocutores, mas também, e de

forma especial, nos ambientes corporativos, junto ao público interno e demais

envolvidos diretamente com a empresa. O comportamento de uma marca/empresa

deve se nortear no reconhecimento da importância de construção da sua reputação

através da “fantástica rede de conversas” que as tecnologias atuais possibilitam,

de acordo com Nélio. O publicitário complementa argumentando que, na sua

percepção, quanto mais a tecnologia avança, mais se torna impreterível e

desafiadora a conquista de uma comunicação face a face.

Mais do que saber explorar as ferramentas disponíveis, Nélio destaca a

importância de ouvir e conquistar a mente e o coração do “público de

relacionamento”. O entrevistado ressalta, em um texto de sua autoria, cuja

proposta é refletir sobre a resignificação do conceito de consumidor, a

impossibilidade de construir novos tempos pensando, agindo e falando da mesma

maneira. Segundo ele, não terá um futuro promissor, a empresa que não

reconhecer a importância do diálogo com seus “interlocutores”. Sendo assim,

morre também, junto com a ideia de consumidores, a expressão “público-alvo”,

dando lugar ao “público de relacionamento”. Um público que, através das

possibilidades trazidas pela tecnologia digital, tem se libertado do seu papel

passivo, conforme menciona Nélio.

De acordo com Maria Bertoni, atualmente, existem muitas técnicas que

permitem realizar uma “versão contemporânea” daquilo que seria um “modo

original” da interatividade, ou seja, formas de se estabelecer uma troca essencial,

buscando um envolvimento bastante persuasivo e eficiente do ponto de vista

publicitário. No senso comum, constituído principalmente pelos discursos do

mercado midiático, em especial as matérias jornalísticas, a interatividade é tida

como algo novo,

é qualquer coisa esquisita que você não conhece, que conecta duas pessoas e faz com que essas pessoas tenham respostas e tudo mais... [...] Mas obviamente, em uma leitura mais apurada tem outra abordagem. É a conexão que acontece do ponto de vista da troca, da forma mais ancestral possível que se possa imaginar, através dos meios que forem possíveis (Maria Bertoni, diretora executiva, 26 jun. 2012).

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Todas as técnicas utilizadas para envolver, persuadir ou trocar pertencem a

esse universo, como acredita a publicitária. Ouvir o consumidor e tentar cultivar o

relacionamento com ele não é uma prática recente. A publicitária exemplifica

citando as técnicas intuitivas que o “Seu Zé”, dono da padaria próxima da sua casa

na época da infância, usava para tentar conhecer e se envolver com a sua família

ao oferecer biscoitinhos produzidos ali mesmo, pela manhã, para degustação. Era

uma atitude positiva que buscava a aproximação com as pessoas que

frequentavam o estabelecimento comercial. No contexto atual, tais técnicas são

implementadas com as tecnologias, as ferramentas disponíveis, que unem a

possibilidade de escala com a capacidade de processamento, formando o grande

tripé da interatividade: “sentir, processar e atuar/responder”. São técnicas que

viabilizam conhecer o consumidor e, a partir daí, criar “proximidade” e

“familiaridade”, duas “palavrinhas mágicas”, como diz a entrevistada,

fundamentais, anteriores ao universo da tecnologia. Relacionar-se com o público

para saber o que lhe agrada ou faz parte do seu mundo e oferecer de volta em

forma de mensagem é uma maneira de criar envolvimento bastante persuasiva.

Na medida em que você tem um repertório na mão, quer dizer uma caixa mágica de ferramentas, você permite que essa coisa fundamental, anterior a tudo, que é gerar proximidade e familiaridade com as pessoas, possa acontecer. [...] A gente só está trabalhando agora com novas ferramentas (Maria Bertoni, diretora executiva, 26 jun. 2012).

Sob essa perspectiva, Maria Bertoni avalia o vídeo de exemplos como “uma

colagem de piadas antigas nos seus formatos contemporâneos [...]. A gente sente

um pouco do nosso tempo” (Maria Bertoni, diretora executiva, 26 jun. 2012).

Criar maneiras de se estabelecer essa troca, esse envolvimento, com proximidade

e familiaridade, através do meio que for possível, é essencial para fazer a

diferença. Infere-se que envolvimento, proximidade e familiaridade são atributos

importantes para a configuração de um processo interativo, para a entrevistada.

Ainda de acordo com Maria Bertoni, o modelo de visualização já não é mais

suficiente, o consumidor quer, além de ver e ouvir, tocar, atuar e modificar. E a

interatividade pode proporcionar tudo isso. A questão da participação do

receptor/consumidor sobressai em diversas entrevistas. Para Marcela, esse é um

fator primordial que caracteriza a interatividade. Fundamentalmente, para ser

considerada interativa, uma ação/campanha depende da participação das pessoas,

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sem a qual a comunicação não se completa, não acontece. Por participação,

Marcela entende a coprodução no conteúdo. Apesar de reconhecer a existência de

diferentes formas de participação, a publicitária reforça a importância e

necessidade de envolvimento na produção e avaliação de conteúdo da

comunicação da marca para caracterizar a interatividade em sua essência.

Sendo assim, a entrevistada define interatividade como uma via de mão

dupla, a concretização de um diálogo com possibilidade de atuação e interferência

de todas as partes envolvidas.

É quando a marca fala e ao mesmo tempo tem como ouvir o consumidor, ou seja, não existe uma via de mão única. Interatividade não é só você dar a escolha para o consumidor. Isso é um pequeno passo, o que era permitido quando não existia tanta tecnologia ou tantas possibilidades. Mas acho que o principal é você transformar essa via de comunicação, que era única, em uma via de duas mãos, que de alguma forma o consumidor possa responder. O fundamental da interatividade é ter uma comunicação em que a participação dos dois lados é importante, ou seja, que sem o outro lado participando ela não se completa. [...] Interatividade é isso, pressupor que tão importante quanto o eu falar, é o outro ouvir e responder alguma coisa (Marcela Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012).

Marcela diz não saber dizer se é possível definir níveis de interatividade,

contudo questiona: escolher um final ou brincar em um anúncio, “até que ponto

isso virou uma resposta da pessoa?” E acrescenta pontuando que o importante é

não ficar no básico. “O digital ajuda muito. [...] Hoje com as ferramentas que

temos, tão mais sociais, é possível fazer essa interatividade de formas mais

interessantes. É fácil falar, mas ainda é um desafio” (Marcela Battan, gerente de

planejamento, 16 jul. 2012). Cada vez mais, as marcas precisam abrir espaço para

as pessoas falarem, criticarem, participarem, em suma, interagirem.

A argumentação é reforçada na avaliação dos exemplos do vídeo. Nas

palavras da entrevistada:

A gente acaba falando mais e menos interativo, mas... o que eu defino é: o quão importante para a construção da mensagem é a participação das pessoas, o quão na mão dessas pessoas está essa mensagem e o quanto isso realmente é fundamental para a comunicação existir (Marcela Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012).

Em três palavras, para a publicitária, a interatividade é: “troca, futuro e

perigosa, ou seja, é saber trocar, é o que vai ser, mas tem riscos.” De maneira

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geral, Marcela acredita ser aplicável o conceito nas práticas publicitárias, no

entanto, atenta para a questão do controle total sobre a comunicação da marca,

lembrando que a publicidade não é arte, mas sim, artifício – fazendo referência ao

livro “Publicidade: arte ou artifício?”, de Luiz Celso Piratininga11. Sempre há, em

toda comunicação publicitária, um objetivo a se cumprir com a mensagem, um

caminho interpretativo desejável para assimilação conclusiva da ideia apresentada,

acredita Marcela. A condução de uma conversa passada para as mãos dos

consumidores de forma não controlada pode resultar em uma grande ameaça e

problemas para a marca.

É um caminho que vai ser sempre assustador para as marcas porque você vai deixar de ter controle total do que está sendo falado. Então, a interatividade vai poder participar da propaganda, mas ela não vai poder ser 100% plena (Marcela Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012).

Marcela complementa sua argumentação:

Por isso, para ser um pouco mais controlado, o que cada vez mais vai se oferecer são esses comerciais que você brinca, seja alguma coisa que você interaja com o comercial, ou joguinhos, programas, serviços que são interativos de uso... cada pessoa usa da forma que quiser (Marcela Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012).

Cordeiro menciona a importância de ser transparente e ágil na relação e

comunicação da marca com o consumidor, visto a capacidade de resposta rápida

do público. Em consonância com Marcela, o publicitário ressalta o risco, para a

imagem da marca, de promover ou permitir uma interatividade em nível pleno.

“Você precisa desses níveis de interatividade. [...] Não pode deixar a coisa tão

solta assim. De alguma forma a interatividade tem que ser mediada” (Toninho

Cordeiro, executivo de contas e planejamento, 25 jun. 2012).

Como interatividade, o entrevistado define o processo comunicacional

realizado em mão dupla, aberto à troca de informações e experiência, uma

mensagem que não termina na transmissão e favorece o retorno. Tal processo

caracteriza-se com a participação do consumidor, interagindo com a campanha e,

11 Marcela explica: “Eu defendo o que fala nesse livro, na arte, o artista quis passar alguma

coisa, mas cada interpretação é bem vinda. O que é diferente na propaganda” (Marcela Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012). Referência bibliográfica: PIRATININGA, Luiz Celso. Publicidade: arte ou artifício? São Paulo: T. A Queiroz, 1994.

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posteriormente, disseminando-a. Mais uma vez o papel proliferador do

consumidor é ressaltado, mas sem deixar de mencionar os riscos de uma reação

negativa à marca e/ou sua comunicação. Dito isso, as três palavras que sintetizam

o conceito são assim definidas: “participação, experiência (positiva) e agilidade”

(Toninho Cordeiro, executivo de contas e planejamento, 25 jun. 2012).

Ao avaliar os exemplos, Cordeiro ressalta a grande contribuição das mídias

interativas para a publicidade promocional, uma vez que facilitam e agilizam

bastante o processo, consequentemente estimulam a aderência e participação dos

consumidores. “Os meios digitais, a internet principalmente, facilitam algo que já

era possível” (Toninho Cordeiro, executivo de contas e planejamento, 25 jun.

2012). De forma similar, Felipa observa que as novas tecnologias aumentam a

chance da interatividade se concretizar pela característica “real time, mas é

possível em ‘mídias antigas” (Felipa de Souza, diretora de planejamento, 12 jul.

2012). Os argumentos reforçam a ideia de que a interatividade não é fruto das

mídias digitais, tal como se apresenta o conceito no senso comum, conforme

ressalta Maria Bertoni.

Em sua definição de interatividade, Cordeiro menciona a importância da

troca, do canal de mão dupla, de falar e ouvir o receptor, entendendo a

participação do consumidor como elemento crucial para caracterização do

conceito. No entanto, essa participação se apresenta de forma demasiadamente

ampla, englobando também a simplória utilização da campanha e/ou manuseio do

suporte. Dessa forma, a compreensão de interatividade é alastrada para além da

relação de troca com o anunciante/emissor. Outros entrevistados também

trouxeram, em seus discursos, a expressão “via de mão dupla”, referindo-se à

possibilidade de resposta e enfatizando a importância da participação efetiva do

consumidor, com a sua fala e retorno. Contudo, assim como Cordeiro deixam

evidente, no decorrer do seu discurso, o aspecto abrangente ao qual se referem

com o termo participação e sua vasta gama de possibilidades.

Nesse caminho, também é possível identificar Felipa de Souza, Luíza

Onório e Daniela Tomasi. As três publicitárias mencionaram em suas definições a

comunicação em duas direções, a possibilidade do consumidor se expressar,

manifestar-se de volta e contribuir de alguma forma. Resumidamente, um

processo no qual ambas as partes são emissores e receptores. Como palavras-

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chave apresentaram: “conversa”, “resposta”, “participação”, relacionamento”,

“proximidade”, “intimidade” e “confiabilidade”.

Para se caracterizar como interativa, segundo Felipa, uma ação/campanha

precisa permitir que o consumidor brinque com ela, utilize de algum modo. Para

exemplificar, a entrevistada cita um anúncio que estimulava os consumidores a

utilizar os saches de lenços umedecidos, anexados à revista, para economizar água

no planeta. Conceitualmente, a publicitária admite a necessidade do

estabelecimento de uma conversa entre partes que se alternam entre emissão e

recepção, no entanto também atrela à caracterização de um processo interativo

práticas publicitárias que se limitam ao manuseio do suporte, à participação na

brincadeira proposta e atuações similares.

Daniela Tomasi observa que o desafio maior, atualmente, não é mais como

criar formas interativas para a publicidade, mas sim como fazer os consumidores

se interessarem em participar. A interatividade já é um conceito totalmente

assimilado na área. Em suas palavras: “já se sabe como fazer coisas interativas. A

dificuldade, para mim, não está nem no interativo, está na atenção. [...] O difícil é

fazer as pessoas se interessarem por isso, quererem entrar na conversa” (Daniela

Tomasi, diretora geral de planejamento, 11 jul. 2012). Desde os tempos do “Você

Decide12”, tentava-se lidar com esse movimento de participação do público de

algum modo, aponta Daniela. Hoje, as possibilidades e os processos estão ficando

cada vez mais complexos.

Segundo Daniela, a interatividade não possui um fim em si mesma, não é,

por si só, uma estratégia eficaz para o resultado da ação publicitária. O bom

resultado, a adesão do público e o interesse em participar dependerão de inúmeros

outros fatores que envolvem a comunicação que ali se estabelece. Para Daniela, o

que faz uma comunicação publicitária ser melhor ou pior “não é o quanto é

interativo, mas o quanto faz diferença, é legal, é divertido. Interativo é só um jeito,

uma parte da coisa. O que faz ser boa ou não, é o quanto é legal e útil” (Daniela

Tomasi, diretora geral de planejamento, 11 jul. 2012). Como exemplo, a

entrevistada compara duas ações apresentadas no vídeo.

12 Programa da Rede Globo, em exibição de 1992 a 2000, no qual o telespectador votava,

através de ligação telefônica gratuita, em uma das opções de desfecho para a história apresentada. Informação retirada do site: http://memoriaglobo.globo.com/TVGlobo/Comunicacao/Institucional/memoriaglobo/CDA/Pop/tvg_cmp_memoriaglobo_pop_descricao_subtema/0,35985,22913,00.html Acesso em: 10 ago. 2012.

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No “Fashion Like”, o cara vai lá aperta um botão no facebook e acabou. Já o de “Sprite” você tem que criar uma música que vai aparecer no comercial. É mais interativo. “Fashion Like” tem um nível de interação bem baixo, superficial, por exemplo, mas é legal e fez super sucesso (Daniela Tomasi, diretora geral de planejamento, 11 jul. 2012).

Em avaliação dos exemplos do vídeo, Felipa de Souza e Daniela Tomasi

deixam claro que, embora entendam fazer parte do conceito de interatividade

atuações menos engajadas do consumidor – ou compreendidas como meramente

reativas, de acordo com alguns estudiosos, abordados na parte teórica desta

pesquisa –, há níveis que distinguem esse tipo de participação de outros que

estariam associados a uma interatividade, talvez, mais complexa e plena. De

acordo com as entrevistadas, o critério de definição de nivelamento, considerado

“forte e fraco” ou “mais e menos interativo”, depende do quanto se exige da

participação/atuação do consumidor – vale acrescentar a “liberdade criativa” para

enfatizar a diferença nessa participação – e o quanto isso foi relevante para ele.

Conforme aponta Felipa, há muito menos participação e relevância em apertar um

botão no Ipad do que gravar uma mensagem para ser veiculada no cinema, como

surpresa para a pessoa que estará sentada ao seu lado no momento da exibição.

Em posição absolutamente contrária, Marta Reis defende não ser possível

caracterizar níveis de interatividade. Para a publicitária, a interatividade “existe ou

não existe. Não existe algo mais interativo ou menos interativo. Existe a eficiência

da mensagem que um consegue a interação e outro não consegue” (Marta Reis

Fion, analista de SEO, 24 jul. 2012). A interatividade se realizaria, portanto, no

resultado da “eficiência” da mensagem, ou seja, na conclusão do próprio processo

de comunicação que se concretiza com a assimilação da mensagem emitida.

A compreensão do conceito de interatividade, para Marta Reis, é ainda mais

abrangente do que todas as demais definições dos outros participantes da

entrevista. Na perspectiva da publicitária, a interatividade está intrinsecamente

associada à comunicação, “é o estabelecimento de uma comunicação efetiva”. Na

publicidade, ela pode ser definida em três palavras da seguinte maneira: “ação,

reação e mensuração”. Sendo assim, pode-se dizer que todo tipo de reação, que

começa a partir da compreensão e assimilação da mensagem, é considerado um

processo de interatividade. Marta Reis exemplifica:

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A propaganda da Apple, em 84, falando de um conceito de liberdade usando uma máquina, gerou uma interação com o público, porque gerou desconforto. [...] Brigar com um personagem da novela, você já está interagindo. Talvez não haja uma “reinteração”, porque o personagem não vai falar contigo, mas se o autor matar o personagem pelo resultado do IBOPE, é uma resposta à interação. [...] [Na publicidade], quando você compra um produto porque foi motivado pela propaganda, significa que você interagiu com ela. [...] A interatividade está totalmente ligada à propaganda, você faz algo porque você quer uma reação. (Marta Reis Fion, analista de SEO, 24 jul. 2012).

A entrevistada parte do princípio que a interatividade não depende da

exposição da reação/resposta do consumidor/receptor, dito de outro modo, não

necessita ser expressada de forma que outros possam perceber e ter conhecimento,

nem mesmo o próprio emissor inicial da mensagem. A divulgação dessa resposta,

por exemplo, através de uma publicação na internet, é um segundo momento com

dupla vantagem: é uma maneira de verificação e mensuração do processo

interativo, ou seja, o feedback do receptor com relação ao produto midiático, e

uma possibilidade de estimular e gerar outras interações, quer dizer, outros

consumidores manifestando-se, seja pautando conversas entre os próprios

consumidores, ou ainda, redistribuindo o mesmo conteúdo.

Marta Reis segue seu discurso argumentando:

O conceito de interatividade está muito ligado à conectividade, à tecnologia. É uma exposição interativa, em que você pode tocar nas coisas, mas para mim qualquer exposição é interativa porque eu consigo observar, absorver e comentar. A culpa é da mídia que acabou construindo uma associação da palavra interatividade com modernidade e tecnologia. [...] De repente a gente nem tem tanta maior interatividade, mas tem mais ferramentas que possibilitem a interação. Interatividade não é algo novo (Marta Reis Fion, analista de SEO, 24 jul. 2012).

A respeito do vídeo, considera todos exemplos de interatividade, pois são

anúncios e campanhas que solicitam alguma reação. “Todos pedem para que as

pessoas façam algo. Isso inclui todo tipo de ação, até mesmo manusear o objeto.

O Ipad é naturalmente interativo, ele pede que você toque. O da Skol também”.

Complementa: “É isso que se busca, fazem uma ação, esperando uma reação. E

quando essa reação acontece, ela pode desencadear uma nova cadeia de ações,

como por exemplo, nomear alguma coisa, homenagear alguém” (Marta Reis Fion,

analista de SEO, 24 jul. 2012).

A compreensão de Marta Reis sobre o conceito do termo parece sugerir que

toda comunicação publicitária que estimula, de alguma maneira, o receptor,

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esperando dele uma reação, seja uma emoção, reflexão, gesto ou alguma atuação

mais efetiva, caracteriza-se como interatividade. Sob essa perspectiva, é possível

considerar a assimilação da mensagem e produção de sentido a partir da mesma

um tipo de reação – desejada ou não – provocada pela publicidade no seu público

consumidor. Esse entendimento vai ao encontro do pensamento de Braga (2000),

cuja visão abrange a relação entre o receptor e o produto midiático, além da forma

como este circula na sociedade, atribuindo menos – ou nenhuma – importância à

atuação conjunta entre produtores e receptores. Conforme observado

anteriormente, essa perspectiva é interessante, porém insatisfatória, uma vez que

torna o conceito extremamente frágil e difuso pela sua falta de delimitações claras.

Vale ressaltar ainda que toda mensagem publicitária é rica de aspectos

envolventes estrategicamente elaborados para “provocar” emocionalmente o

receptor da mensagem. Desse modo, tornam-se, também na publicidade,

demasiadamente amplos os limites que cercam a conceituação da interatividade.

3.5. A contribuição da interatividade: Por que ser interativo?

Quando questionados sobre o porquê da importância de apresentar propostas

interativas na comunicação com seu público, ou seja, a verdadeira contribuição da

interatividade para a publicidade, muitos entrevistados deixam evidente a estreita

relação das práticas interativas contemporâneas com as possibilidades abertas

pelas novas mídias e a tecnologia digital, como por exemplo a facilidade no

processo de propagação pelos próprios consumidores através de suas redes de

contato e as formas de mensuração da recepção e divulgação de uma mensagem.

Outros, porém, apontam a necessidade de fazer-se notável e interessante diante da

mudança de comportamento do consumidor que tornou-se mais exigente,

integrado e conectado.

De acordo com Bruna, campanhas publicitárias interativas possibilitam,

além de conhecer o público, viabilizar e estimular o compartilhamento, ou seja, a

propagação da marca e sua mensagem na rede de amigos de cada consumidor. De

forma similar, Raphaela, entende que busca-se realizar propostas interativas para

gerar aproximação e possibilitar a potencialização das mensagens do anunciante.

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Ambas observam que as novas tecnologias têm um importante papel, pois são

motivadoras desse tipo de comportamento. Para Raphaela, o meio digital

possibilita e facilita o estabelecimento de uma conexão e proximidade, além da

agilidade na transferência de conteúdo e troca de informações. No entanto, a

publicitária ressalta que a tecnologia não é determinante: “é um meio e não um

fim. O meio não pode ser um fim, tem que ser apenas uma plataforma para

expandir o conteúdo” (Raphaela Lepau, diretora de atendimento e planejamento,

21 jun. 2012). É possível estabelecer a interatividade em meios offline, bastando,

para isso, que a comunicação consiga construir o que a entrevistada considera

fundamental: a essência da interatividade, o envolvimento pleno, com atitudes,

por parte das marcas, mais humanizadas. É o movimento de personalização ao

qual Raphaela se refere em outro momento da entrevista, conforme exposto

anteriormente.

Também no discurso de Cordeiro, o “boca a boca digital” é enfatizado como

fator bastante relevante para a publicidade, razão pela qual a interatividade se faz

cada vez mais presente. Cordeiro afirma que, através dos meios com potencial

interativo, é possível proporcionar experiência positiva e, com isso, conseguir

fidelização e o compartilhamento da mensagem por parte do público.

Marta Reis Fion e Marcela Battan apresentam outro importante fator que

consideram de grande contribuição para a publicidade: a facilidade e maior

precisão na mensuração de impacto de uma mensagem. Segundo Marta, a

tecnologia digital oferece uma gama de ferramentas fundamentais que tornam

mais ágil, fácil e preciso o processo de mensuração, fator de extrema importância

para a publicidade na verificação da taxa de sucesso de uma campanha. “Você

mede a interatividade de uma campanha percebendo a reação que as pessoas

tiveram com ela” (Marta Reis Fion, analista de SEO, 24 jul. 2012). Para a

publicitária, essa é a maior razão pela qual busca-se realizar a comunicação

através das mídias com potencial de promover a interatividade.

Marcela complementa o argumento de Marta Reis quando afirma que os

números que representam os resultados da exposição de um anúncio televisivo,

por exemplo, são imprecisos e calculados em cima de uma média de pessoas

impactadas, em função dos registros de audiência do programa e a quantidade de

vezes que se emitiu a mensagem. Enquanto em uma proposta interativa, que só se

completa com a atuação efetiva do receptor, para além da “leitura” e assimilação

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da mensagem, é possível verificar, de fato, quantos participantes determinada

campanha sensibilizou. A interatividade na publicidade representa uma tentativa

de obter uma “real atenção” do público.

Daniela Tomasi também reconhece o papel de extrema relevância, ou mais

do que isso, de “total responsabilidade” – tal qual ela se refere – da tecnologia na

mudança de comportamento do público e dos mercados midiáticos e na

complexidade das formas comunicacionais contemporâneas13. Contudo,

diferentemente dos entrevistados apresentados acima, Daniela entende que, em

função desse comportamento, a publicidade busca se apresentar com propostas

mais atraentes e interessantes, que integram ainda mais o consumidor no processo

comunicacional. “É muito mais legal aquilo que você participa, que faz parte, do

que aquilo que você só assiste” (Daniela Tomasi, diretora geral de planejamento,

11 jul. 2012). Essa parece ser a grande contribuição da interatividade, para a

publicitária. Em consonância, Maria Bertoni afirma que ser interativo “não é mais

uma alternativa ou uma gracinha que você pode fazer, é o que você deve fazer,

porque precisa fazer diferença” (Maria Bertoni, diretora executiva, 26 jun. 2012).

A inserção das mídias com potencial interativo no cotidiano da sociedade

contemporânea, por certo, facilitam e estimulam esse tipo de comportamento. Os

publicitários estão atentos a esse movimento. É possível observar que a questão da

propagação de uma mensagem publicitária por parte do público consumidor,

através desses meios, é um fator relevante, uma vez que sobressai em vários

discursos dos entrevistados.

Infere-se que a busca pela interatividade se faz para tentar garantir atenção e

relacionamento do consumidor com a marca, através do engajamento na proposta

participativa da mensagem, e a propagação do conteúdo, ao oferecer formas

facilitadas de compartilhamento, além, ainda, da possibilidade de mensuração

desses processos. Observa-se aqui os aspectos mercadológico e social, a partir,

respectivamente, da interação com o anunciante e com os demais consumidores,

que estão envolvidos na interatividade nas práticas publicitárias.

13 Daniela cita uma pesquisa realizada pela agência DM9DDB, intitulada “Perfis

Digigráficos”, no qual são classificados e descritos os tipos de comportamentos dos indivíduos em relação ao uso que cada um faz da tecnologia digital, que pode ser vista em http://www.youtube.com/agenciadm9ddb Acesso em: 10 ago. 2012.

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3.6. A interatividade na prática

De forma a ilustrar a compreensão do conceito, os entrevistados

apresentaram exemplos de ações/campanhas que consideram, na prática,

representar de maneira adequada o que vem a ser interatividade na publicidade14.

Bruna cita a campanha criada pela agência F/Nazca para a Nike,

patrocinadora do Corinthians, em homenagem aos cem anos do Clube. Lançada

em agosto de 2011, a campanha consistia na criação da “República Popular do

Corinthians”, um país fictício, no qual os torcedores do time compunham a “nação

corinthiana” a partir do cadastro e emissão de documentos como RG, certidão de

nascimento, passaporte, entre outros, solicitados através do site e retirados em

lojas do Corinthians. Uma carreta personalizada itinerante, com produtos do time

e da “República”, como pôsteres de jogadores, a moeda do país e a carta magna,

representava a embaixada. A divulgação da campanha foi realizada através filmes,

anúncios impressos em revistas especializadas e jornais diversos, além da atuação

em redes sociais. Todas as diversas ações realizadas, inclusive a entrega da faixa

que empossou o presidente Lula, ganharam muita visibilidade, devido ao grande

número de consumidores que conseguiu envolver e à grande quantidade de mídia

espontânea que gerou.

Ainda como desdobramento, a página no Facebook da Nike Futebol

disponibilizou um espaço para perguntas dos torcedores e um concurso que

permitiu, aos autores das perguntas mais criativas, fazê-las diretamente aos

jogadores e participar da foto oficial do centenário. Outras redes também foram

exploradas para estimular maior aproximação e engajamento com o público15.

Na visão de Bruna, em coerência com sua definição de interatividade, o

exemplo citado representa “vivenciar a marca”. É possível identificar na

campanha os aspectos de “envolvimento” e “experiência com a marca”, de acordo

com sua definição, além de “entretenimento” e “conhecimento” (de informações

relevantes sobre o consumidor), conforme suas palavras-chave.

14 Todos os exemplos citados estão disponíveis no CD em anexo. Também é possível ter

acesso aos mesmos através dos links descritos em notas de rodapé ao longo do texto. 15 Filme publicitário de divulgação da campanha:

http://www.youtube.com/watch?v=53hcGXGDCcI. Video-case da campanha: http://www.youtube.com/watch?v=K-Scwfi7LmY. Site oficial da RPC (República Popular do Corinthians): http://republica.corinthians.com.br/ Acessos em: 13 ago. 2012.

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A criação de uma história com a proposta de um jogo de imaginação,

explorando seu potencial encantador e mágico, sempre esteve inerente ao discurso

publicitário. A participação do consumidor se dá no consentimento da fabulação.

Não há dúvidas que a campanha envolve, gera comentários e participação, além

de muita interação entre os consumidores. No entanto, no exemplo apresentado, é

possível dizer que o envolvimento de fato não ocorre com a marca anunciante, a

Nike, mas sim com o Corinthians. A participação do público é motivada pela

paixão do torcedor pelo time de futebol, cujo patrocinador garante a presença de

sua marca a reboque desse forte envolvimento.

Para Raphaela, interatividade deve ser entendida sob a perspectiva da busca

pela construção de relacionamento. Para ilustrar, a publicitária traz como exemplo

a ação realizada para a marca de cerveja Heineken, na Holanda. Em um curto

espaço de tempo, a marca atuou nas redes sociais, em especial em sua página (ou

fan page)16 do Facebook, gerando conteúdos relevantes e muita conversa com

seus consumidores. Como forma de agradecimento aos seus “novos amigos” que

permitiram chegar a um milhão de “likes17” no site da rede, a Heineken contratou

várias modelos que foram às ruas com camisetas exclusivas, para distribuir

abraços às pessoas que consumiam a cerveja, em bares de Amsterdam18.

A campanha conseguiu gerar grande exposição para a marca e aproximação

com o público consumidor. Segundo Raphaela, trata-se de um ótimo exemplo para

ilustrar o que se pode entender pela “essência da interatividade”, sendo alcançada

através de atitudes mais humanizadas por parte das marcas. Ainda de acordo com

a entrevistada, a campanha pode ter um apelo emocional ou divertido, o

importante é estabelecer um contato mais próximo e envolver o consumidor nesse

relacionamento de alguma maneira, gerando interação e disseminação, fazendo

com que as conversas se multipliquem.

16 Página no Facebook destinada a empresas, organizações e marcas, de modo que possam

compartilharem suas histórias e se conectarem com as pessoas, sendo possível, ainda, personalizá-las adicionando aplicativos, promovendo eventos e concursos, entre outros (https://www.facebook.com/).

17 Recurso do Facebook que permite estabelecer conexões, ou seja, ao clicar no botão curtir – ou like – de uma página, o usuário terá listado em seu mural (ou linha do tempo) todas as publicações de conteúdo daquela instituição (organização, empresa, marca, produto...), além de outras exposições e aplicabilidades. Disponível em: https://www.facebook.com/ Acesso em: 01 out. 2012.

18 Video-case da campanha: http://www.youtube.com/watch?v=amWypAwyF90 Acesso em: 13 ago. 2012.

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O aspecto envolvente contido nas ações publicitárias que buscam maior

proximidade com seus consumidores também está presente na exemplificação de

Maria Bertoni. Para ela, fazer uso, na comunicação da marca, de situações

cotidianas trazendo o consumidor à cena, para gerar familiaridade e proximidade,

consequentemente envolvimento e afetividade, é um bom exemplo do que

considera ser uma conexão do ponto de vista da troca, o que define a

interatividade. De acordo com a entrevistada, é o caso da campanha “Sem papel”,

criada pela agência África, para o Banco Itaú, veiculada no início do ano de 2012.

A agência transformou um viral19 – um vídeo caseiro com imagens de um bebê

dando risadas ao rasgar um papel, que alcançou mais de trinta e quatro milhões de

acessos no YouTube – em anúncio de televisão, para divulgar sua defesa pelo uso

consciente do papel, incentivando os clientes a cancelarem o recebimento dos

extratos via correio20.

Se apropriar de histórias que estão na internet e trazer isso para o ambiente do broadcasting, é um case muito interessante. Ele [o Itaú] foi muito feliz nessa sensibilidade de se “antenar” e se conectar com as histórias que estão rolando em outra plataforma, descobrindo que não tem fronteiras entre uma plataforma e outra, que aquela plataforma também funciona no broadcasting. É uma campanha próxima, familiar, divertida, verdadeira, improvável... muito legal. Há nela a essência da troca. (Maria Bertoni, diretora executiva, 26 jun. 2012)

Outra campanha publicitária que coloca o consumidor em foco, em suas

situações cotidianas, atribuindo à comunicação da marca um relacionamento

familiar com o receptor da mensagem, foi lembrada por Nélio21. O entrevistado

faz referência à campanha do supermercado Extra, baseada no conceito “Por uma

vida mais família”. De forma similar à anterior, porém com um fator de

diferenciação relevante neste caso, os consumidores foram convidados a mandar

seus vídeos, com momentos especiais em família, para participar de um concurso

no qual os vídeos selecionados iriam fazer parte do comercial da marca, veiculado

toda segunda-feira no intervalo da novela da Rede Globo, de março a junho de 19 Termo como é chamado um vídeo que adquire ampla circulação na internet, registrando

grandes números de acesso e compartilhamento. 20 Filme publicitário do Itaú: http://www.youtube.com/watch?v=p9Z9n0I8Dfo Site da

campanha: http://www.itau.com.br/sempapel/ Acessos em: 13 ago. 2012. 21 Nélio apresentou como exemplo um caso ocorrido em uma empresa, no qual foi

estimulada a participação, a troca e o estabelecimento de diálogo, a fim de trazer soluções para questões da comunicação interna. Como esse não é o foco da pesquisa, será utilizado aqui, para análise, outro exemplo apontado espontaneamente pelo publicitário, em outro momento do seu discurso, no decorrer da entrevista.

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201222. De acordo com Nélio, é o consumidor colaborando na construção da

imagem da marca.

A colaboração do consumidor para construção do conteúdo da comunicação

de uma marca parece ser um fator relevante para alguns dos publicitários

entrevistados. A necessidade de coprodução na comunicação do anunciante é

reforçada na compreensão de Marcela, conforme exposto anteriormente. Como

exemplo, Marcela apresenta a campanha promocional da Pampers, criada pela

agência F/Nazca, realizada entre maio e junho de 2012.

A Pampers convidou as mães a participarem de um concurso, no qual as

participantes deveriam enviar suas histórias de como receberam seus filhos, os

“pequenos milagres” como eram chamados. As melhores histórias, em diferentes

categorias, ganharam prêmios com produtos da marca e a grande vencedora foi

veiculada em um anúncio da revista Caras23.

A página da Pampers Brasil no Facebook24, canal oficial de relacionamento

entre a marca e suas consumidoras, onde aconteceu o concurso, tem conteúdo

bastante relevante para suas “fãs25”, abordando diversos assuntos que cercam o

tema da gravidez, das mães e dos filhos em crescimento. Além de trazer dicas e

curiosidades sobre esse universo e informações sobre os produtos da Pampers, as

publicações estimulam as conversas e trocas de experiências, tanto com a própria

marca, como entre aqueles que inserem seus comentários. O canal do anunciante

no YouTube26, além de vídeos com dicas, comerciais e produtos, tem uma seção

exclusiva de vídeos de histórias reais de pessoas comuns.

O exemplo apresentado pela publicitária parece bastante coerente com seu

discurso sobre o conceito. Apesar disso, a entrevistada afirma que o Brasil não

possui grandes e bons cases adequados para elucidar a questão. Marcela cita,

então, o filme global da Nike, intitulado “My times is now”, classificando-o como

22 Filme publicitário de divulgação da campanha: https://www.youtube.com/watch?v=y08-

xnkDSiQ Site da campanha: http://www.comercialemfamiliaextra.com.br/ Acessos em: 13 ago. 2012.

23 Página do concurso no Facebook: https://www.facebook.com/pampersbrasil?sk=app_420615584622731 Vídeo de divulgação da campanha promocional: https://www.youtube.com/watch?v=pR-bJ9sBNvA Acessos em: 13 ago. 2012.

24 https://www.facebook.com/pampersbrasil Acesso em: 13 ago. 2012. 25 Termo como são chamados aqueles que acompanham o conteúdo de uma página ou “fan

page” do Facebook. 26 http://www.youtube.com/user/PampersBrasil Acesso em: 13 ago. 2012.

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“um exemplo de interatividade muito bom” (Marcela Battan, gerente de

planejamento, 16 jul. 2012).

O anúncio foi criado pela Wieden+Kennedy de Londres e estreou,

primeiramente, nas redes sociais com um forte apelo inovador. Ao acessar o vídeo

do comercial pelo canal da marca no YouTube, era possível clicar em links que

direcionavam a outros conteúdos, como por exemplo, os nomes dos jogadores que

traziam informações sobre os atletas com um breve relato de como foi o início de

suas carreiras e conexões com as páginas oficiais dos atletas no Twitter. Havia

também os chamados “túneis” escondidos, ou seja, links para espaços secundárias

que os usuários precisavam encontrar para ter acesso a jogos, testes de

conhecimento e outros conteúdos27.

Vale lembrar que Marcela enfatiza que, para caracterizar a interatividade, é

importante “transformar essa via de comunicação, que era única, em uma via de

duas mãos, que de alguma forma o consumidor possa responder” e produzir

conteúdo. Escolher um final ou brincar com um anúncio é uma forma de

participação, mas “até que ponto isso virou uma resposta da pessoa?” (Marcela

Battan, gerente de planejamento, 16 jul. 2012). O principal exemplo da

entrevistada parece revelar evidente o encantamento com o potencial inovador da

tecnologia, além de oferecer uma participação limitada à utilização da ferramenta,

sem dispor de produção autônoma de conteúdo por parte do consumidor/receptor

da mensagem publicitária.

Apresenta-se da mesma maneira a ação publicitária da Volkswagen,

mencionada por Luiza Onório. Criada pela DDB México, foi realizada uma

interferência no espaço do maior mercado por atacado do mundo (Central de

Abasto, no México), onde mais de duas mil empresas atendem cerca de trezentos

e cinquenta mil clientes. Com o objetivo de demonstrar a capacidade de carga do

Volkswagen Crafter, foi montado, apenas com caixotes de madeira, um QR-code28

gigante. Para entender a mensagem que estava exposta, e compreender a ação, o

27 Vídeo no canal da marca no YouTube:

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=QMv8g8CO4cQ Acesso em: 13 ago. 2012.

28 O QR-code é um código de barras bi-dimensional (2D) utilizado para armazenar informações como textos, páginas da internet, SMS ou números de telefone. A leitura do código é realizada a partir da captura da imagem pela câmera do celular, que é decodificada através de software específico. Informação retirada do site: http://tecnologia.ig.com.br/noticia/2011/06/03/qr+code+o+que+e+e+como+usar+10433405.html Acesso em: 16 ago. 2012.

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consumidor deveria direcionar o celular e realizar a leitura do código através da

câmera do aparelho. Assim, era possível assistir ao filme publicitário, com

imagens que mostravam a pilha de caixotes sendo desmontada e colocada dentro

do carro da Volkswagen.29

De fato, a tecnologia digital tem forte presença e grande responsabilidade

nas transformações na produção e consumo comunicacional contemporâneo. Elas

são responsáveis por viabilizar, ou pelo menos facilitar bastante, inúmeras práticas

interacionais já existentes. A publicidade promocional é uma delas. Conforme

ressalta Cordeiro “o mundo digital é perfeito para a promoção [...], ele já oferece

todas as ferramentas, [...] ficou bem mais fácil (Toninho Cordeiro, executivo de

contas e planejamento, 25 jun. 2012). O publicitário cita dois exemplos:

campanha da empresa “Faculdades São José” para ampliar o número de usuários

conectados à sua página do Facebook e campanhas promocionais da

“Americanas.com”. O primeiro consistia no sorteio de um ipad entre os usuários

do Facebook que curtissem a página da faculdade30. Já no segundo, o consumidor

deveria cadastrar, no site da empresa, a nota fiscal de compras realizadas nas lojas

físicas para concorrer a diversos prêmios31.

Para Cordeiro, a interatividade é a comunicação em via de mão dupla, que

se concretiza na participação do consumidor. As diferentes formas de participação

definem os níveis possíveis de interatividade, sendo mais alto quanto maior a

possibilidade de construção criativa do participante. Dito isso, é possível inferir

que as promoções citadas se enquadram nos níveis mais baixos de participação.

Diferentemente dos casos apresentados até aqui, que estão relacionados, de

alguma maneira, com as possibilidades trazidas pelas mídias digitais, Daniela fala

em uma “interatividade analógica”. A publicitária entende que a interatividade

não depende das novas tecnologias e reforça a ideia apresentando como exemplo a

campanha da Coca-Cola – “Quem foi o melhor? Maradona vs Biro Biro” – criada

pela JWT, lançada em abril de 2008. Foram produzidos cinco filmes com

diferentes versões, peças de mídias impressa, exterior e indoor, spot para rádio,

além de internet e materiais de pontos-de-venda com a proposta de uma 29 Video-case da campanha: http://www.youtube.com/watch?v=QVYODCjTup0 Acesso

em: 13 ago. 2012. 30 Página de relacionamento da marca no Facebook:

https://www.facebook.com/FacSaoJose Acesso em: 13 ago. 2012. 31 Site referente à campanha da páscoa:

http://www.cartaoamericanas.com.br/pascoa/index.html Acesso em: 13 ago. 2012.

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brincadeira: eleger quem foi o melhor jogador. A dinâmica consistia em depositar

a tampinha da garrafa de Coca-Cola nas urnas distribuídas em diversos bares pela

cidade. A votação era fictícia, a proposta não passava de um estímulo à

participação do consumidor em uma grande brincadeira, sem apuração real do

resultado32.

Ricardo Fort, diretor de marketing da Coca-Cola afirma que a ideia era levar

a polêmica sobre o melhor jogador para o cotidiano das conversas dos

consumidores33. Para Daniela, a campanha é um bom exemplo de interatividade,

pois, além de estimular a participação do público consumidor, também gerava

diversão e interação entre as pessoas a partir da proposta publicitária.

A compreensão da participação, como elemento crucial para caracterização

da interatividade, abordada de forma ampla faz com que os exemplos demonstrem

desde os tipos mais simplórios de atuação do consumidor até as formas mais

complexas de estabelecimento de diálogo entre as partes envolvidas – levando em

consideração os aspectos de níveis diferenciados apresentados pelos próprios

entrevistados.

Destacando-se dos demais, que também possuem uma perspectiva mais

generalista da interatividade e trouxeram exemplos de participação simplória,

Felipa apresenta um caso que representa, de fato, o estabelecimento de um

diálogo, uma conversa, escutando o consumidor e respondendo-o de volta, e vice-

versa, de acordo com sua definição do conceito. Felipa cita a campanha do portal

do iG, criada pela agência Lew’Lara/TBWA, que consistia na interação entre a

marca e os usuários do Twitter através de marcadores, também conhecidos como

hashtags34. Foi criada uma expressão e utilizada em forma de marcador para

estimular os usuários a “taguear” seus tweets e, com isso, obter respostas do iG.

Cada vez que um usuário “twittava”, sobre qualquer assunto, com a hashtag

#ihcomplicou, o iG sugeria um conteúdo contextualizado e relevante do seu

portal, sempre acompanhado de #iGdescomplica. Uma equipe exclusiva ficou

32 Filme publicitário da campanha: http://www.youtube.com/watch?v=M4NGf4t2McE

Acesso em: 13 ago. 2012. 33 Disponível em: http://gecorp.blogspot.com.br/2008/04/coca-cola-quer-saber-quem-

melhor-biro.html Acesso em: 01 set. 2012 34 Marcadores ou hashtags são palavras-chave ou tópicos marcados com o símbolo # antes

da expressão (sem espaço) com a finalidade de para categorizar um tweet e facilitar a sua localização em uma busca no Twitter. Informações retiradas do site: https://support.twitter.com/articles/255508-o-que-sao-os-marcadores-simbolos-de# Acesso em: 15 set. 2012.

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responsável por rastrear #ihcomplicou, buscar conteúdo no site e responder aos

respectivos usuários.

Além do incentivo cultivado na própria rede do Twitter, a agência também

fez uso das mídias tradicionais, para garantir mais visibilidade à campanha. Foram

feitos anúncios impressos e ação no programa Pânico na TV, que passou a utilizar

a expressão inserida no contexto do conteúdo de suas reportagens. Rapidamente, a

campanha ganhou mais relevância na rede, chegando ao Trending Topics

(Assuntos do Momento)35 do Twitter. Os resultados mostraram quase cem mil

usos da hashtag e mais 125% de seguidores da marca no Twitter.36

A publicitária ressalta: “isso é interatividade, a gente sugere algo, a pessoa

faz, a gente responde, ela agradece. Enfim, estabelecemos um diálogo, houve um

retorno” (Felipa de Souza, diretora de planejamento, 12 jul. 2012).

Por fim, Marta Reis entende a interatividade como uma cadeia de ações e

reações e, dessa forma, traz um exemplo, para ilustrar o conceito, pertencente à

sua área de atuação na agência. A entrevistada menciona uma possível

“interatividade reversa”, “é uma interação que parte do anunciante (no caso o

Google), mas que veio de uma situação que eu [o usuário] gerei” (Marta Reis

Fion, analista de SEO, 24 jul. 2012). A publicitária refere-se à ferramenta de

gerenciamento e publicação de anúncios da Google – remarketing37 – que permite

localizar usuários que passaram por um determinado site, enquanto ele navega em

outros sites, da própria Google ou dos seus milhões de parceiros da “Rede de

Display do Google38”, pela web. E, dessa maneira, são expostos os anúncios do

site anterior. É possível dizer que os rastros deixados com a navegação do próprio

usuário servem para que a ferramenta retorne anúncios considerados relevantes.

De acordo com a perspectiva de Marta, é uma ação do usuário retornando uma

reação do sistema informático39.

35 Ferramenta do Twitter que registra, uma lista com os temas e assuntos mais “tweetados”.

Informações retiradas do site: https://support.twitter.com/articles/268981-tudo-sobre-os-assuntos-do-momento# Acesso em: 15 set. 2012.

36 Video-case da campanha: http://www.youtube.com/watch?v=ZX1VC8aCw4I Acesso em: 13 ago. 2012.

37 Para informações acesse: http://www.google.com.br/ads/innovations/remarketing.html 38 “A Rede de Display Google é um grande grupo de websites e outros produtos, como

programas de e-mail e blogs, que têm parceria com o Google para exibir anúncios dos links patrocinados AdWords”. Disponível em: http://www.acaonet.com.br/blog/entenda-como-funciona-a-rede-de-display-do-google/ Acesso em: 01 out. 2012.

39 O exemplo apresentado pela publicitária não será analisado com profundidade, pois se distancia bastante do campo de abordagem do tema proposto nesta pesquisa.

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3.7. Uma compreensão multifacetada

De maneira geral, os exemplos evidenciam a vasta gama de maneiras

distintas, que os publicitários entendem possíveis, de se realizar a interatividade

nas práticas publicitárias. Em alguns casos específicos, a própria compreensão do

conceito já se apresenta abrangente e os exemplos reforçam a ideia de que, apesar

de uma definição que ressalta a importância da comunicação em duas vias, na

qual emissores e receptores falam e se escutam mutuamente, tendo estes a chance

de participar de forma mais efetiva no processo comunicacional, tais formas

podem abranger, além do real estabelecimento de conversas, outras possibilidades

que não parecem, necessariamente, representar o verdadeiro potencial de fala e

interferência do receptor, uma vez que limitam-se a cliques, disponibilização de

conteúdos, manuseio de objetos, utilização de aparelhos tecnológicos e

aplicativos, entre outros.

É possível observar também que alguns termos e expressões se repetem no

decorrer de muitos discursos, no entanto com significados distintos, como é o caso

de “envolvimento” e/ou “relacionamento”, citados em sete das dez entrevistas.

Apesar da recorrência, percebe-se que nem todas as falas referem-se ao mesmo

entendimento dos termos mencionados. “Gerar envolvimento” e “estabelecer

relacionamento” são expressões utilizadas que também podem representar tanto

ações que estimulam a participação através de um único clique em um link que

direciona para outro ambiente e conteúdo, até a construção de verdadeiro diálogo

e troca construtiva entre marca e consumidor. Isso reforça a necessidade de

esclarecer de que tipo de envolvimento está se falando e, se assim for possível,

qual melhor se alinha ao conceito de interatividade.

Sendo assim, torna-se clara a necessidade de uma proposta de reflexão sobre

a existência e definição de níveis de interatividade, de modo que estabeleçam uma

distinção qualitativa das possibilidades interativas na comunicação publicitária,

assim como o que abrange e diferencia as formas de participação. Conforme já

mencionado anteriormente, analisar a maneira como se dá o processo que ocorre

entre as partes envolvidas, buscando diferenciar onde há, de fato, construções e

contribuições criativas do consumidor na comunicação de uma marca anunciante,

apresenta-se como uma boa via para elucidação das questões.

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De acordo com os publicitários entrevistados, os níveis de interatividade

parecem estar, para alguns, relacionados ao grau de “permissão” dado ao

consumidor para participação no processo, enquanto outros entendem que as

diferenças se estabelecem conforme o grau de “exigência de atuação” do

consumidor e a “relevância dessa participação” para a comunicação proposta.

É interessante observar que a questão da permissão e controle da

participação na mensagem de uma marca aparece em alguns discursos dos

entrevistados. No entanto, cabe aqui ressaltar que para pensar a participação e a

interação do consumidor com a marca anunciante sob a esfera da publicidade, é

necessário compreender que tal atuação sempre ocorrerá dentro dos limites

mercadológicos que regem os objetivos da mensagem publicitária. Com práticas

mais flexíveis, outras menos, no entanto, de alguma maneira, sempre buscando

um controle da exposição da marca. O que não significa cercear a participação ou

controlar a liberdade expressiva dos consumidores, mas, talvez, mediar em algum

momento, de alguma forma. Muitos são os casos nos quais o consumidor é

convidado a fazer parte da construção da mensagem que será posteriormente

veiculada pela marca. E assim o processo seletivo e de edição dessa comunicação,

inevitavelmente, servirá como filtro, mantendo sob controle o que será

transmitido. De toda forma, isso não invalida o caráter interativo dessas propostas.

Vale lembrar que toda e qualquer prática publicitária sempre será realizada a

partir das intencionalidades mercadológicas da empresa anunciante.

Em se tratando de insatisfações com a postura ou a comunicação de uma

marca, sabe-se que a manifestação dos consumidores já não é mais uma questão

de controle e permissão nas mãos dos agentes emissores dessa marca. Ainda que a

empresa não disponibilize canais próprios abertos para troca e estabelecimento de

conversas – sites, blogs, perfis em redes sociais, campanhas diversas na internet e

afins –, outras vias independentes serão utilizadas para uma manifestação coletiva

e “viral”, com grandes chances de proliferação e adesão rápida de muitos

consumidores. Nesses casos, a única forma de “controle” que cabe às marcas é o

monitoramento, ou seja, tentar acompanhar o que os consumidores têm exposto

sobre a marca e/ou seus produtos – atividade que se tornou muito comum, nos

últimos tempos, e responsável pelo surgimento de uma nova prática profissional:

o monitoramento de mídias sociais. Parece, portanto, não fazer sentido o esforço

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de tentativa desse controle. O ideal é abrir os canais e agir com transparência e

respeito aos consumidores/interagentes.

Embora os diferentes níveis de interatividade tenham sido apresentados, em

alguns casos, como necessidade de controlar a interferência do receptor na

mensagem, o aspecto abrangente das possibilidades de participação mostra que o

elemento crucial da interatividade, ou seja, a efetiva troca de papéis entre

produtores e consumidores, não deixou de ser mencionado pelos participantes,

diferentemente da pesquisa de Galindo, junto aos publicitários que entrevistou,

cujos resultados apontaram:

Fala-se em um caminho de duas vias, contudo a bidirecionalidade surge aqui apenas no sentido de receber do receptor uma resposta ou uma reação, semelhante ao feedback, diferenciando-se apenas em relação à velocidade e ao imediatismo, ou seja, em “real time”. [...] Em nenhum momento foi comentada pelos entrevistados a possibilidade de o receptor alterar a mensagem ou a possibilidade de esta intervenção ser um sinal de interatividade [...]” (GALINDO, 2002, p.174, 183)

O autor faz saber que os profissionais participantes do estudo atribuíram à

“propaganda interativa” algumas características distintas daquelas que compõem a

“propaganda tradicional”, no entanto sem apresentar diferença nos mecanismos de

persuasão, “limitando-se apenas a mencionar a liberdade de escolha do receptor e

a sua possível participação na busca de maior quantidade de informações”

(GALINDO, 2002, p. 21)

No cenário contemporâneo, no qual se vivencia intensamente a

comunicação mediada por computador, as possibilidades de estabelecimento de

conexão, relacionamento e comunicação com o receptor/interagente se apresentam

ainda mais complexas. Tal complexidade aponta para a necessidade de, não

somente, rever a compreensão da interatividade, mas também analisar e distinguir

qualitativamente os diversos mecanismos utilizados sob esse viés. Como ressalta

Primo, tal urgência “está longe de ser mero capricho conceitual” (PRIMO, 2008,

p.231). Com foco voltado para as práticas publicitárias, é possível, dessa maneira,

verificar onde há participação do receptor, assim como os níveis que diferenciam

essas formas de atuação.

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