A Mulher Reformada Na Política Reformada

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    PUBLICAÇÃO DO CENTRO DE PESQUISAS EM POLÍTICA REFORMADA

    RELATÓRIO Nº 2DEZEMBRO 2013

     A Mulher Reformadana Política Reformada A Mulher Reformadana Política Reformada

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    Ppolitica.reformada.org

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     Justiça Pública é o relatório periódico do Centrode Pesquisas em Política Reformada. Desde 2012,o Centro de Pesquisas tem se dedicado à divulgaçãoe discussão dos valores políticos cristãos pautados nainterpretação bíblica das confissões reformadas.

    O Centro de Pesquisas existe para informar, discutir,educar e propor ideias de governo limitado, pluralismopolítico, federalismo, liberdade econômica e pazinternacional. Fazemos parte de uma longa tradiçãocristã promovida por pensadores como Calvino,Althusius, Groen van Prinsterer e Kuyper.

    Entendemos que a fé reformada deve falar aos nossosdias e ao nosso contexto. Por isso, nosso projeto vaialém da reflexão teórica e passa também pela discussãoda sua relevância na situação brasileira sem, contudo,descartar a relevância da confessionalidade e da igreja.

    Expediente

    Lucas Grassi FreireElienai Bispo Batista, VDMKenneth Edward Wieske,VDMJackson SalustianoVinícius Silva PimentelMárcio Santana Sobrinho

    Endereço

    Rua São João, 473.50.020-150, Recife-PE

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    Ppolitica.reformada.org

    RELATÓRIO Nº 2DEZEMBRO 2013

     A Mulher Reformadana Política Reformada A Mulher Reformadana Política Reformada

    PUBLICAÇÃO DO CENTRO DE PESQUISAS EM POLÍTICA REFORMADA

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    Elizabeth I se dedicou bastante aosassuntos da religião e do governocivil, transformando a Inglaterra numagrande potência mundial através dadiplomacia e de proezas militares.

    Cercada de conselheiros leais ecompetentes, essa grande estadistanunca se casou e, portanto, não ocupouseu tempo e esforço na construção deum lar. Elizabeth I morreu solteira, semherdeiros, tendo feito seu país prosperarna chamada “Era de Ouro”.

    Existem aqui e acolá alguns que,

    inspirados por alguma leitura peculiarda fé reformada, desejam negar àsmulheres qualquer possibilidade departicipação no processo político.Nessa mentalidade, até mesmo Knoxestava equivocado, e voltouatrás na sua opinião.Sem contar Calvino,que o aconselhou a não

    publicar o panfleto emGenebra. De fato, éfácil extrapolar o que afé reformada confessasobre a autoridadedistinta do maridoe da esposa no lar e sobre os papéisdiferenciados de gênero na igreja para oâmbito cívico. Porém, essa extrapolação,talvez inspirada pelo pressuposto pagãode que existe uma hierarquia entre aesfera do lar e a esfera da política, éapenas isto: uma manobra especulativa.

    Para entender como a participaçãofeminina na vida pública não veta o que afé reformada confessa sobre a autoridadeeclesiástica e doméstica, basta

    compreender a noção de autoridaderelativa. Somente a autoridade deDeus é absoluta sobre toda a criação.Ele delegou aspectos limitados de Suaautoridade aos que governam no âmbitoterreno – o pai no lar, os presbíteros na

    igreja, os professores na escola, e assimpor diante. Portanto, toda autoridadeterrena é limitada e relativa. A autoridadenuma esfera é relativa à autoridade(também relativa) nas demais esferas:

    mesmo que sejam súditos ou cidadãos,os presbíteros da igreja ainda têm opoder de excomungar, com as chavesdo céu, um rei ou presidente que,sendo membro da igreja, viola semarrependimento a Lei de Deus. Aautoridade terrena é, além disso, relativatambém à autoridade absoluta de

    Deus, o único Soberano sobre todas ascoisas. Portanto, dependendo de comose argumenta, afirmar a participaçãopolítica da mulher não é necessariamentecolocar de cabeça para baixo toda equalquer autoridade nas demais esferas

    da vida, nem se trata deum atentado à estruturadessas outras esferas.

    Contudo, aocontrário da RainhaElizabeth I, nem todas asmulheres têm o chamadopara deixar de ladoqualquer preocupação

    com seu papel nessas outras esferas parase dedicar principalmente aos assuntosde governo civil. No caso da mulhercristã que confessa a fé reformada eque, portanto, confessa um certo limitede atuação no âmbito eclesiástico efamiliar, é preciso considerar a seguintepergunta: estando em família e na igreja,será que a atuação política justifica anegligência à ordem confessada nessasdemais esferas?

     A resposta deve ser negativa. Isso,é claro, serve também aos homens,embora a resposta seja “não” por motivosde ordem variada. Ao “sair do lar”, porassim dizer, para exercer alguma função,a mulher reformada em geral é chamada

     Knox não pôdemanter a premissa de quenenhuma mulher fosseautorizada a governarcom legitimidade

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    a considerar o seu papel de esposa e mãe,ao passo que o homem reformado emgeral é chamado a considerar seu papelde marido e pai, que normalmente jáenvolve o pressuposto de que ele “sairá

    do lar”. Essa decisão quanto a “sair dolar” deve ser tratada sem dogmatismoexacerbado, embora seja importanteconsiderar que a qualidade dessa“saída” (ao menos para quem confessaa fé reformada) deve se pautar pelasinstruções bíblicas de ordem ética epessoal acerca dos papéis diferenciados

    de gênero.Outra consideração aqui é que amulher ou homem que, no momento,encontra-se sem obrigações deliderança no lar está mais livre paratomar a decisão a favor do envolvimentopolítico. ambém é óbvio que grandeparte das pessoas nessa condição levaráem conta o desejo de formar um lar a

    certa altura, embora seja verdade quehaja aqueles chamados especialmentepara se dedicar a uma ou outra vocação– para fazer mesmo a diferença ondeestiverem – sem que tenham esse planoem mente. Como Elizabeth I, Deuspode colocar cristãos paraserem sal e luz na vidapública, na nação, nahistória, com dedicaçãototal e exclusiva à igrejae ao seu chamado, semque venham a formar umafamília. Isso parece sermais exceção que regra.

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     A próxima pergunta que surge é arespeito do que “sobra” para a mulherreformada fazer na esfera pública,sendo que ela confessa a necessidadede expressar biblicamente a distinçãode gênero dentro do lar e, ao mesmo

    tempo, declara com o Catecismo queela também reina, profetiza e governacomo portadora dos três ofícios regidospelo Cristo. A resposta talvez lheparecerá surpreendente: “sobrar” na

     verdade é um termo errôneo e negativo– melhor mesmo é afirmar o dever damulher reformada de se engajar emdiversas causas de ordem pública eextremamente relevantes à construçãode uma nação mais justa e próspera.

    Considere, primeiro, a tarefa quea mulher reformada tem de confessar,

     junto com a igreja de Cristo, o que oCatecismo e as Confissões declaramsobre a autoridade civil. Esses credosdo cristianismo não falam que somenteos homens devem confessar tais

     verdades, mas conclamam toda a igreja,incluindo as mulheres em diferentessituações, a declarar em uníssono aquiloque a igreja afirma ser verdade bíblica

    sobre o governo civil limitado e suafunção de promover a justiça pública ea liberdade da igreja. Além de confessarsua fé com a igreja, a mulher reformadatem o dever do exercício da piedade,ao orar pelas autoridades civis. “Antes

    de tudo”, diz o Apóstolo, “recomendoque se façam súplicas,orações, intercessõese ações de graças portodos os homens; pelosreis e por todos os queexercem autoridade, paraque tenhamos uma vidatranquila e pacífica, com

    toda a piedade e dignidade”(1m 2). Para mencionar só mais um

    dever, a mulher reformada é chamadaa respeitar e a obedecer ao ofíciodo governo civil, dando assim seutestemunho para o bem do próprio povode Deus. “Sujeitai-vos a toda instituiçãohumana por causa do Senhor, quer

     A decisão quanto

    a ‘sair do lar’ deve se pautar pelas instruçõesbíblicas de ordem éticae pessoal 

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    seja ao rei, como soberano, quer àsautoridades, como enviadas por ele,tanto para castigo dos malfeitores comopara louvor dos que praticam o bem (...)ratai todos com honra, amai os irmãos,

    temei a Deus, honrai o rei”(1Pe 2).

    Esses são deveresgerais da mulher napolítica. Não se esqueça,porém, de que às vezes adesobediência será nãosomente válida, como

    necessária. Quandoo conflito está entredesobedecer a Deus e desobedecerqualquer autoridade humana, seja ela“política” ou não, “mais vale obedecera Deus”! Lembre-se da bravura ecoragem das parteiras hebreias noEgito, conforme lemos no Pentateuco,quando Faraó institucionalizou o

    infanticídio, ordenando a morte dos bebês. Correndo risco de vida, elas serecusaram a obedecer e escolherampreservar a vida. E veja que ironia:segundo relata o Evangelista, foi para oEgito que, séculos mais tarde, Maria e

     José encontraram abrigo com o nossoSenhor Jesus Cristo, recusando-se aentregar o bebê à política de infanticídioimposta pela autoridade de Herodes.

     Assim, como exceção à regra, o devercívico da mulher reformada podetambém ser o desobedecer a autoridadehumana para que possa obedecer ao PaiCeleste.

     A exceção de alguns lugares bárbaros em que o infanticídio não é

    somente permitido por aborto, masé por vezes obrigatório, hoje em dia amulher reformada tem desafios dessetipo em outra ordem: a vida física deseus filhos pode não estar em risco, masa vida espiritual está. emos no Brasil

    um governo que só não é totalitárioporque sua própria patetice na gestãode recursos públicos o impede de iradiante com seus planos malignos.Porém, ainda assim não desiste de

    colocar em risco a vida espiritualdas criancinhas, quandoignora a ordenança bíblicade responsabilizar os paispela educação dos filhos.

     Assim, os pais que juramdiante de Deus e da igrejaque haverão de ensinar

    seus filhos nos caminhosdo Senhor são obrigados,por lei e tirania, a enfiar goela

    abaixo das crianças da mais tenraidade todo o lixo do nosso sistemade adestramento, levando-as à escolaregulada pelo governo. Esposa, mãe eirmã reformada – você que está maispróxima às crianças no dia-a-dia: quanto

    mais intenso for o contato delas com o veneno do humanismo estatista, maiordeve ser o esforço de vocês no combatea essa força das trevas com o antídotoem casa. Se for preciso organizar umgrupo de mulheres para complementar(e, na verdade, suplantar) a doutrinaçãoque essas pobres vítimas têm sofrido,

     vocês devem ser as primeiras a semobilizarem. Com isso, mostrarãomais uma vez a preocupação históricada mulher bíblica e reformada com aproteção dos fracos e oprimidos. A lutasó começa aí: partindo de um grupopara promover um “antídoto” para o

     veneno, é preciso ir além e mobilizar umgrupo que militará pela desregulação

    do setor educacional, para que escolas verdadeiramente reformadas possamemergir – quem sabe, até mesmopara que os pais novamente tenham odireito à escolha do tipo de educaçãoque desejam dar aos filhos!

     Hoje, no Brasil,a vida física de seus

     flhos pode não estarem risco, mas a vidaespiritual está

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    S Até agora tenho falado de algunsdeveres: o dever da confissão, daoração, da submissão e da resistênciacom ordem e decência, se precisofor. Porém, a vida cívica está abertaa outras possibilidades opcionais.

     A mulher reformada piedosa tem aopção de ir à praça pública para criaruma outra espécie de antídoto ao

     veneno do totalitarismo. É verdadeque a mulher reformada, ao menos nahistória, tem decidido se encarregar

    primeiramente da organização do lar.Contudo, é justamente por esse motivoque a mulher reformada está bemqualificada para militar pela justiçapública em vários assuntos. Já temosfalado de certos deveres quanto àeducação das crianças, mas há tambémpossibilidades opcionais na peleja poruma educação reformada. Por exemplo,

    a mulher reformada pode, com suascolegas e amigas, organizar diversoseventos para ouvir e discutir maisa noção e prática de uma educação

     verdadeiramente reformada. Ela podeusar de vários meios para mobilizar umlevantamento de fundos.Pense na UniversidadeLivre de Amsterdã,que foi outrora umauniversidade reformada,e começada com o suordo rosto de várias irmãsdo passado que, mesmosendo pobres, aindaassim colocaram por anossua moedinha no cofre da família para

    doar o valor total para a criação de umauniversidade reformada. Com efeito, aHolanda, o Canadá, os Estados Unidostiveram seu momento em que váriasorganizações reformadas afloraram porcausa do zelo das mães, esposas e irmãs

    preocupadas com a situação social ecultural. Essas coisas não existem danoite para o dia – uma vida social ecultural reformada deve ser moldadacom cautela e planejamento. Mulher

    piedosa: seu esforço e mobilizaçãohoje, seu sacrifício e zelo, vai permitirque a próxima geração, com a graçado bondoso Deus, possa desfrutar deuma educação básica e superior dequalidade, pautada pela visão de mundo

     bíblica, aplicada em todas as áreas da vida. Que Deus lhe ajude a entender a

    opção e a possibilidade que tem diantede si, e que Ele lhe ajude a ser sábia efiel no apoio a essa nobilíssima causa!

    Estamos falando de algumassugestões ligadas à preferência históricada mulher reformada pelas coisas dolar, e a educação é uma delas. Existe umuniverso mais amplo que a educação:existe a própria convivência no lar. De

    onde sairão os grandes líderes cristãos,comprometidos com a confissão daigreja reformada, que ocuparão espaçosna nossa cultura e sociedade, inclusiveno âmbito político, na militância,no estudo da filosofia e ciênciapolítica, nos tribunais e na defesa aos

    desfavorecidos? alvez oseu irmãozinho mais novo,ou filho, seja uma dessaspessoas escolhidas peloodo-Poderoso para fazero bem e combater o malna vida pública. alvez

     você precise de dar maisatenção à esfera pública,

    pensando principalmente

    no mandamento de honrar pai e mãe –quer uma escola melhor de autoridade,legitimidade, obediência, justiça eética que a própria família? Porém, seessa obediência e honra ao pai e à mãenão servir de nada além da fronteira

     A Universidade Livre de Amsterdã foi começada com o suor do rosto de váriasirmãs do passado“

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    da família, a oportunidade terá sidoperdida! É diante do próprio Deusque prestaremos conta se o nosso lartiver sido um ambiente propício àcriação de mais um tirano violento,

    injusto, corrupto e autoritário. Comcerteza, os ‘homens dacasa’ têm grande culpanisso, quando abusamde seu papel, e cabeà mulher reformadaauxiliar no equilíbrio

     bíblico nos pequenos

    e grandes aspectos da vida cotidiana. Que aconvivência no lar nãoseja feita com uma mentalidademeramente privada, mas também coma mentalidade de que ela irá repercutirmais além, causando impacto sobre umamplo número de pessoas.

    Uma outra sugestão prática: no lar

    reformado, não é a mulher em geral quese encarregará de saber de onde procedeaquilo que é vestido e consumido? Nãodigo isso como norma, mas como o quetem sido praticado ao longo dos séculos.Não é a mulher reformada que estarámais perto da origem dos alimentos edas roupas no lar? Pois é exatamenteessa posição de acesso privilegiadoque deve ser usada em seu potencial napraça pública. De onde vem a carne queconsome? Da tortura desnecessária deanimais, numa operação gigantesca dedestruição do meio ambiente? De onde

     vem o leite? De onde vem o couro paraas roupas, e assim por diante? De umaindústria que, por conta de regulações

    governamentais, tem diluído o produtooriginal numa série de componentesquímicos prejudiciais à saúde? Umaindústria que se inflou e se concentrounas mãos de poucos por conta de tersido favorecida por essas regulações?

    Perceba que não estou defendendoa abolição da indústria pecuária, esim pedindo que reflita sobre como oabuso desses elementos são facilitadoshoje por causa da regulação extensa e

    intrusiva do governo civil , e como nossasaúde, nutrição e bem-estar – sem

    contar nossa mordomiasobre a criação de Deus!– têm se prejudicado.Perceba, além disso, quea solução não é aindamais regulação ambiental,

    agrária, industrial emédica: a solução é vocêse preocupar mais com

    essas coisas, começandono próprio lar. Quem sabe, auxiliar naformação de organizações cristãs queirão monitorar se a indústria se conformacom o nosso chamado de cuidar

     bem da criação. Quem sabe, levantar

    fundos e participar ativamente de umaorganização desse tipo. Quem sabe, boicotar certas marcas com práticasescusas e organizar um movimento dedenúncia. Isso não serve somente paraesses “grandes” assuntos da saúde edo meio ambiente, mas também paraproblemas “pequenos” e particulares,como os direitos do consumidor. Umcolega certa vez compareceu à reuniãodas donas de casa do bairro. Elasestavam se mobilizando para boicotarum certo biscoito cuja embalagem émal desenhada e sempre quebra duas outrês unidades na hora de abrir. emposdepois, a embalagem foi redesenhada.Essa vitória foi obtida sem recorrer ao

    Estado-babá, e meramente com o usode associações intermediárias. Políticanão é só o uso, ou a demanda do uso dopoder de coerção e compulsão estatal.Só que cabe a você ajudar a demonstraresse ponto na prática.

    Cabe à mulherauxiliar no equilíbriobíblico nos pequenose grandes aspectos da

    vida cotidiana

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     AQuero concluir esta sequência deideias. Nós tratamos do acesso que amulher reformada tem ao processopolítico. Discutimos alguns deveres ealgumas sugestões de atuação cívica.

     Agora deixo aqui um apelo às mulherespiedosas. A fé reformada em todo omundo tem deixado claro que a visão

     bíblica deve ser aplicada a todos osaspectos da vida. Este é um chamadopara ir além do âmbito da família e daigreja: é um chamado para não cruzar

    os braços e deixar “o mundo” – sejalá o que isso for – controlar as outrasesferas sociais. Quer ver uma culturamais de acordo com a fé cristã? Cruzaros braços não é o caminho! Quer vermuitas escolas reformadas emergiremna nossa terra? Passividade não é ocaminho! Quer ver uma sociedade queincentiva o cuidado adequado daquilo

    que Deus nos deixou em Sua criação?Quer ver um mundo em que as pessoasse preocupam mais com os pobres, comas viúvas e os idosos? Orar e estudar apalavra de Deus é certamente mais doque meio caminho andado. Cultivaresses valores no lar cristão e na igrejainstitucional tambémnão é má coisa. Contudo,é preciso deixar quea piedade pessoal setraduza numa verdadeirafilosofia e prática deatuação pública. Cadamulher piedosa é tambémuma eleitora, cidadã comdireitos e deveres, e com obrigações

    éticas para com Deus e o seu próximo.Chegou a hora de agir. O respeito à fé eprática histórica da mulher reformada,longe de ser um convite à passividade, éum convite à obediência bem informadaaos preceitos de Deus.

    Uma sociedade e uma culturareformada não se constroem numpiscar de olhos. Seria ilusão pensar ocontrário. ambém é ilusão pensar queisso será construído quando algum

    crente “sequestrar” o governo civile tentar impor valores corretos decima para baixo. Absolutamente! É de

     baixo para cima que isso acontecerá– e não necessariamente no governo,e sim através da construção de váriosgrupos e associações. Do voto beminformado. Da militância bíblica.

    É claro que o evangelho precisa decrescer e transformar pessoas emtoda parte. Porém, é preciso que esseevangelho comece, desde já, a darfruto entre aqueles que já são crentes,nascidos de novo, e chamados para

     viver biblicamente em cada área da vida. Lembre-se: a mulher reformadaé mulher em casa e na igreja, mas seu

    chamado vai muito além dessas duasgloriosas esferas que Deus criou. Queela não enterre o talento dado peloMestre para ser investido e cultivado,com medo de o desperdiçar!

    Para terminar, gostaria de dar oexemplo positivo do Partido Reformado

    Holandês (SGP), um partidoconfessional, estritamentecristão, bem organizado e

     bem sucedido. Os membrosdo SGP precisam deassinar um compromissodeclarando que estão deacordo com as confissõese credos reformados. A

    plataforma política do SGP

    reflete os princípios bíblicos de governolimitado, livre empresa e denúncia aogigantismo estatal sobre a educação,cultura e economia. Não se trata de umaplataforma pontual e desconexa, e simfruto de uma série de pesquisas sobre

     É preciso deixarque a piedade pessoal setraduza em verdadeira

     flosofa e prática deatuação pública“

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    a ética cristã e como ela se aplica empolíticas públicas. O partido é apoiadopelo Instituto Guido de Brès, um órgãoindependente de pesquisa que contacom vários especialistas cristãos atuando

    em várias disciplinas acadêmicas. Opartido tem representação até mesmo noParlamento Europeu. ive recentementeo prazer de conversar com um de seuscandidatos, e de vê-lo, pela V, jurandolealdade ao Rei Willem Alexander, novorei da Holanda.

    Perceba: o SGP emergiu de

    círculos reformados que enfatizama piedade evangélica introspectivano lar e na igreja. Se quiser procurarpor “puritanos” na Holanda, é nessascomunidades que eles estarão. Mas essescrentes não ficaram só no lar e na igreja.Eles formaram uma verdadeira culturacristã. Leem um jornal diário reformado,escutam a rádio reformada, colocam os

    filhos em escolas reformadas e fazemcampanhas por uma cultura e sociedadecristã. Esse tipo de organização só épossível num ambiente que incentive ozelo pela aplicação da palavra de Deusem cada área da vida. O SGP mudourecentemente seu entendimento sobreo papel da mulher no processo político.

     Apesar de contar com o voto femininoe com toda sorte de ajuda informal porparte das senhoras piedosas das igrejasreformadas, o SGP ainda vetava qualquerparticipação formal e profissional nopartido, até essa mudança recente. Hoje,mulheres são bem-vindas na participaçãoem campanhas, mobilização em eventose propagandas políticas. No meu

    entendimento, isso reflete uma visãomais bíblica sem comprometer o que a féreformada confessa a respeito dos papéisde gênero. Não se engane: esses irmãosnão são milionários, nem são numerososo suficiente para terem criado todas essas

    instituições num estalar de dedos. udoisso tem sido construído por décadas edécadas, com muito esforço e dedicação.

    E nós? Creio que chegou anossa vez. Onde está nossa educação

    reformada? Nossas universidades?Nossas associações literárias? Nossosórgãos de defesa aos oprimidos? Deajuda aos pobres? Nossos grupos deleitura? Nossas cooperativas de famíliasrurais? Nossos grupos de advogados?Oficinas de arte e música? Projetossociais? Jornais? Revistas? Onde estão

    os políticos reformados e seus auxiliares?Onde estão os protestos reformadosdemandando o direito à escolha dospais na educação dos filhos? Ondeestão os eventos para levantar recursospara um instituto de aplicação da éticacristã às várias áreas da vida? Eu seionde há eleitores “crentes”, mas semqualquer orientação bíblica, votando

    por um governo mais paternalista,inflacionário, corrupto e regulador.Sei onde há políticos “evangélicos”que tornam o problema ainda pior! Euainda não vi o potencial de uma política

     verdadeiramente reformada: precisamosde um movimento. Precisamos depessoas que estudem e transmitam asideias da política reformada. Precisamosde pessoas que comuniquem emobilizem ações da política reformada.Sim: precisamos de salvação, e deentender melhor como ser crentesconfessionais e na igreja. Precisamosdisso antes de qualquer outra coisa. Mastambém precisamos de um movimento!E eu creio que a participação equilibrada,

    inteligente e ativa da mulher piedosaserá de importância crucial para que onosso movimento ganhe peso. Mulherreformada: que Deus seja glorificado ehonrado na sua espiritualidade política.

     Amém.

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    N:1. John Knox, Te First Blast of the rumpet against the Monstrous Regiment of Women (1558).

    2. Robert M. Kingdon, “Calvinism and Resistance Teory, 1550-1580,” in J. H. Burns (ed.) TeCambridge History of Political Tought  , 1450-1700 (Cambridge: Cambridge University Press), 194-200.

    3. Kingdon, “Calvinism and Resistance Teory,” 206-217.4. No início da Política de Aristóteles, a comunidade política ou Estado ( polis) é definida como o “todo”que engloba e organiza o restante da sociedade. Por implicação, a família é parte do Estado. A mulhernão governa o lar e, portanto, não tem qualquer papel a desempenhar fora do lar, na esfera pública. Jáo pensamento reformado amadurecido considera que a comunidade política é um todo em si, suaspartes são comunidades políticas menores (municípios, províncias). A família é um todo em si, bemcomo a igreja, a empresa, o sindicato, o clube, as escolas e assim por diante. ratar um tipo de associaçãocomo ‘parte’ do Estado é distorcer a missão e o papel dessa associação para servir à missão do ‘todo’.

    Um efeito colateral é que o tipo de autoridade limitada pelo tipo de associação passa a assumir umcaráter menos limitado e, portanto, mais autoritário. Um exemplo clássico é quando a escola é tratadacomo parte do Estado e distorce seu papel de educar para servir à função de ‘conscientizar cidadãos’ou coisa do tipo. Com isso, a autoridade intelectual do professor como especialista numa disciplinaacadêmica se transforma em autoridade doutrinária, que prescreve uma cosmovisão ao aluno. Essatarefa na formação de uma criança em geral cabe aos pais e só pode ser transferida por delegaçãopaterna e materna à escola selecionada pelos pais, e não por usurpação governamental.

    5. Abraham Kuyper, Souvereiniteit in Eigen Kring (Amsterdã: J. H. Kruyt, 1880) e Richard J. Mouw, Te

    Challenges of Cultural Discipleship: Essays in the Line of Abraham Kuyper  (Grand Rapids: Eerdmans), 33-57.

    6. Clarence Bouwman,  A Vow to Love: A Biblical Explanation of the Form for the Solemnization of Marriage(Winnipeg: Premier Publishing, 2008), 75-104.

    7. Ver Cornelius Hanko,  Leaving Father and Mother: Biblical Courtship and Marriage (Jenison: ReformedFree Publishing, 2001); Bouwman, Vow to Love, 102-103.

    8. Especialmente, o Catecismo de Heidelberg (Domingos 39-40; 42); Confissão Belga (art. 36);Confissão de Westminster (cap. 23); Breve Catecismo de Westminster (P63-69; P73-75); CatecismoMaior de Westminster (P45; P123-145; P183, P191-193).

    9. Esse juramento é uma promessa solene feita no batismo.10. Sobre a história da Universidade Livre, ver Arie van Deursen, Te Distinctive Character of the FreeUniversity of Amsterdam, 1880-2005: A Commemorative History (Grand Rapids: Eerdmans, 2008).

    11. Cristo foi ungido nos ofícios de Profeta, Sacerdote e Rei. odo cristão partilha dessa unção. Oofício de Rei inclui combater o mal. Ver Catecismo de Heidelberg (Domingo 12).

    12. Se bem que foi preciso um processo da União Europeia contra o SGP para desencadear essamudança. A primeira candidata do SGP afirmou ser uma vergonha que nenhum homem do partidono seu distrito tenha se disposto a concorrer ao cargo.

    Lucas Grassi Freire é pesquisador associado ao Instituto Kirby Laing de Ética Cristã(Cambridge, Reino Unido) e doutor em Política (Universidade de Exeter). É membro da

    Igreja Presbiteriana do Brasil e mora na Inglaterra com sua esposa Emma.

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    O relatório Justiça Pública é registrado via CreativeCommons.A reprodução e distribuição dos textos é livremente permitida,

    desde que a fonte e o nome do autor do texto sejam citadas,o nome do relatório claramente destacado

    e nenhum valor seja cobrado pelo material.