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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X ARQUITETURA CORPO-A-CORPO: NOTAS A PARTIR DE LINA BO BARDI Diego Pontes 1 Resumo: Partindo do reconhecimento dos impactos suscitados pelas intervenções e rupturas estéticas promovidas pelo feminismo em sua pontual crítica aos ideais artísticos burgueses e masculinos, onde por meio da desconstrução de discursos e práticas naturalizadas e contadas pela “história oficial” da arte, podemos então passar a apreendê-la pela imbricação de diversas relações, pressões e limites, fazendo evocar as dinâmicas de criação, parcerias, produção, recepção, consumo cultural, regimes de representações e significados (Pollock, 2003). Desse modo, este trabalho propõe a tessitura de um olhar que elucide as mulheres na produção artística modernista no Brasil a partir da crítica feminista à história da arte (Couto, 2008), entendendo-a enquanto prática política e também como forma de construção de conhecimento epistemológico que possibilita que sejam repensadas as representações assimétricas das relações de gênero nos panteões das artes. Para tanto, quando pensamos os nomes de destaque da arquitetura modernista no Brasil, nos remetemos a renomados homens como Oscar Niemeyer, Lucio Costa e Afonso Reidy. Com isso, pela história da arte recriada pelo feminismo e pela denúncia ao sexismo que envolve o mundo das artes, abre-se espaço a reflexões a respeito da trajetória pessoal, política e metodológica da arquiteta Lina Bo Bardi por um caminho que considere as questões de gênero e as parcerias e relações sociais em que a arquiteta estava inserida no decurso de sua carreira. Palavras-chave: Arquitetura. Gênero. Lina Bo Bardi. “No fundo, vejo a arquitetura como serviço coletivo e como poesia” Lina Bo Bardi Renomada pela projeção de destacadas obras arquitetônicas como o Museu de Arte de São Paulo (MASP), o SESC Pompéia, a Casa de Vidro do Morumbi-SP e o Museu de Arte Moderna da Bahia (MAMB), a arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi (Acchilina di Enrico Bo) consolidou-se como um importante nome da arquitetura moderna no Brasil, para onde se mudou com seu marido, Pietro Maria Bardi, em 1946. Nascida em 1914, em Roma, e naturalizada brasileira em 1951, a trajetória profissional e intelectual de Lina Bo Bardi, marcada por momentos de exclusão e prestígio em sua carreira, especificamente no que diz respeito à produção do espaço político da arquitetura pela experimentação de novas formas, tem sido vastamente pesquisada por estudos no campo da Arquitetura e do Urbanismo, sobretudo os que têm se inclinado aos debates sobre modernismo no Brasil e na América Latina. (OLIVEIRA, 2008). Ademais, as lacunas presentes na produção acadêmica pela ausência de um aprofundamento de questões que tragam a dimensão política, pessoal e subjetiva de sua trajetória, marcada pela experiência da Segunda Guerra Mundial e resistência ao fascismo de Mussolini, e também pelo seu 1 Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais (UFSC). Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade (PGAU/UFSC). Mestrando em Antropologia (UFPR). Curitiba/PR, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

ARQUITETURA CORPO-A-CORPO: NOTAS A PARTIR DE LINA BO BARDI

Diego Pontes1

Resumo: Partindo do reconhecimento dos impactos suscitados pelas intervenções e rupturas estéticas promovidas pelo

feminismo em sua pontual crítica aos ideais artísticos burgueses e masculinos, onde por meio da desconstrução de

discursos e práticas naturalizadas e contadas pela “história oficial” da arte, podemos então passar a apreendê-la pela

imbricação de diversas relações, pressões e limites, fazendo evocar as dinâmicas de criação, parcerias, produção,

recepção, consumo cultural, regimes de representações e significados (Pollock, 2003). Desse modo, este trabalho

propõe a tessitura de um olhar que elucide as mulheres na produção artística modernista no Brasil a partir da crítica

feminista à história da arte (Couto, 2008), entendendo-a enquanto prática política e também como forma de construção

de conhecimento epistemológico que possibilita que sejam repensadas as representações assimétricas das relações de

gênero nos panteões das artes. Para tanto, quando pensamos os nomes de destaque da arquitetura modernista no Brasil,

nos remetemos a renomados homens como Oscar Niemeyer, Lucio Costa e Afonso Reidy. Com isso, pela história da

arte recriada pelo feminismo e pela denúncia ao sexismo que envolve o “mundo das artes”, abre-se espaço a reflexões a

respeito da trajetória pessoal, política e metodológica da arquiteta Lina Bo Bardi por um caminho que considere as

questões de gênero e as parcerias e relações sociais em que a arquiteta estava inserida no decurso de sua carreira.

Palavras-chave: Arquitetura. Gênero. Lina Bo Bardi.

“No fundo, vejo a arquitetura como

serviço coletivo e como poesia”

Lina Bo Bardi

Renomada pela projeção de destacadas obras arquitetônicas como o Museu de Arte de São

Paulo (MASP), o SESC Pompéia, a Casa de Vidro do Morumbi-SP e o Museu de Arte Moderna da

Bahia (MAMB), a arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi (Acchilina di Enrico Bo) consolidou-se

como um importante nome da arquitetura moderna no Brasil, para onde se mudou com seu marido,

Pietro Maria Bardi, em 1946.

Nascida em 1914, em Roma, e naturalizada brasileira em 1951, a trajetória profissional e

intelectual de Lina Bo Bardi, marcada por momentos de exclusão e prestígio em sua carreira,

especificamente no que diz respeito à produção do espaço político da arquitetura pela

experimentação de novas formas, tem sido vastamente pesquisada por estudos no campo da

Arquitetura e do Urbanismo, sobretudo os que têm se inclinado aos debates sobre modernismo no

Brasil e na América Latina. (OLIVEIRA, 2008).

Ademais, as lacunas presentes na produção acadêmica pela ausência de um aprofundamento

de questões que tragam a dimensão política, pessoal e subjetiva de sua trajetória, marcada pela

experiência da Segunda Guerra Mundial e resistência ao fascismo de Mussolini, e também pelo seu

1 Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais (UFSC). Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade

(PGAU/UFSC). Mestrando em Antropologia (UFPR). Curitiba/PR, Brasil.

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contato e convívio com figuras centrais do Modernismo italiano e brasileiro, assim como

pontualmente por sua atuação profissional em um cenário pouco aberto às mulheres como o campo

da arquitetura (Grinover, 2010; Rubino, 2010), mostram-se caminhos interessantes a serem

explorados, uma vez que as abordagens sobre Lina Bo Bardi acabam muitas vezes restritas às

análises de suas obras arquitetônicas.

A antropóloga Silvana Rubino (2010), ao trazer fragmentos da trajetória de Lina Bo Bardi,

elucida acerca das relações entre gênero e produção cultural discorrendo sobre momentos onde as

marcas de gênero destacam-se como marcadores sociais da diferença e colidem em um espaço

majoritariamente ocupado por homens e pelas formas que os representavam, tornando, dessa

maneira, possível a abertura de uma reflexão considerando as demarcações de gênero em sua

trajetória profissional notável pela experimentação e criação de novas formas e maneiras de pensar

a função social da arquitetura e do espaço urbano, assim como a atenção aos corpos, à convivência

urbana, e seus contornos históricos e culturais. Ao discorrer sobre sua trajetória, a autora nos conta

que,

Para se formar em arquitetura em Roma, Lina Bo apresentou como trabalho final de curso, um

hospital-maternidade de arquitetura moderna. Além da nota relativamente baixa, foi desqualificada

pelo diretor da escola, Marcello Piacentini, que teria dito que uma bella ragazza como ela

terminaria se casando, e portanto estaria fora do exercício da arquitetura. (RUBINO, 2010, p. 348)

A eminente violência pela desqualificação de seu trabalho e direta afronta misógina a seu

lugar de mulher, sinaliza a norma de gênero imperativa no “mundo” da arte/arquitetura/academia,

assim como as assimetrias políticas entre homens e mulheres na constituição destes espaços, o que

permite a abertura de um olhar onde os percalços de uma trajetória “bem-sucedida” e de

visibilidade possam, então, ser pensadas por um caminho que considere o resgate das histórias de

mulheres, que comumente têm o acesso negado a certos espaços de prestígio, como meio para

sugestão de novos pontos de partida, novas posições de olhares, de lugares de fala, e do

estranhamento de narrativas produzidas sobre as mulheres pela ótica modernista masculina tal como

se apresentava.

Os trabalhos de Lina Bo Bardi como pintora, artista plástica e cenógrafa, “ofuscados” por

pesquisas que destacam meramente seu reconhecimento por sua obra arquitetônica, são ainda pouco

pesquisados, como nos conta Oliveira (2008) pontuando que as parcerias com seu marido,

prestigiado jornalista e crítico de arte, “ainda não foram suficientemente avaliadas” e merecem

maior investimento analítico, podendo, desse modo, fazer emergir frutíferas reflexões e

preenchimentos de lacunas que argumentem sobre outras dimensões de sua carreira e dos lugares

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desiguais, “centrais” e prestigiados ocupados por homens e mulheres no Modernismo, e que

entendam ainda que, como nos conta Rubino (2010):

mais do que mulheres que ficaram à margem, aquelas que freqüentaram o centro de seus

respectivos campos podem dizer algo de novo a respeito da silenciosa divisão de trabalho por

gênero no interior da prática arquitetônica do século XX, assim como revelar um modernismo no

feminino. (RUBINO, 2010, p. 333)

Na pista destas considerações, outros possíveis olhares para a obra de Lina Bo Bardi, que

não especificamente focado à forma arquitetônica, podem ser pensados a partir de questionamentos

a respeito de sua trajetória, como destaca Rubino ao discorrer a partir da fotografia em que Lina

posa “anônima” sentada apresentando seu corpo como medida ergométrica para uma cadeira

projetada por ela mesma, em um contexto em que cadeiras eram produzidas para escritórios aos

moldes do “novo” homem moderno. (RUBINO, 2010)

Com as devidas ressalvas contextuais, a autora pontua ainda aproximações entre as

trajetórias diversificadas de Lina Bo Bardi e da designer francesa Charlotte Perriand, que em 1929

também havia, “anonimamente”, posado em uma cadeira projetada por ela própria, onde a autora,

na esteira dessa discussão, narra episódios que nos mostram as marcas de gênero colidindo com um

cenário dominado por homens e onde mulheres não eram bem-vindas: o episódio citado acima

vivenciado por Lina Bo Bardi em sua defesa monográfica de graduação, e o que Perriand ouvira de

Le Corbusier quando foi até seu ateliê, em Paris, em busca de trabalho: “aqui não bordamos

almofadas”. (RUBINO, 2010, p. 334)

Charlotte Perriand – 1929 – Fonte: RUBINO, 2010

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Cadeira Bowl Lina Bo Bardi – 1951 – Fonte: Internet

Lina, “anônima”, posando em sua cadeira. – 1951 – Fonte: Internet

Em diálogo com Mary McLeod e Vania Carneiro de Carvalho, Rubino (2010) chama

particular atenção para a ideia de “corpo como medida” pelas posições “atípicas” de Bardi e

Perriand a partir das regras encontradas em manuais de etiqueta um pouco anteriores à fotografia da

designer francesa. Como discutido por Carvalho, os manuais davam especial atenção às posições

dos pés e pernas femininas, e na medida em que as fotografias apontam para um embaralhar de

lugares e gestos generificados, desdobram-se, assim, em um apontamento para a própria presença

do corpo em desenhos técnicos e industriais sobre arquitetura, em croquis e interiores, “onde o

elemento humano é totalmente ausente”, nos mostrando, com isso, um cenário de (re)desenhos da

casa e do espaço doméstico, dos interiores, e da própria escrita sobre a modernidade, o modernismo,

e a arquitetura e pintura das relações de gênero.

Segundo o diálogo travado por Rubino (2010), especificamente a respeito das fotografias

destacadas acima, as pernas cruzadas, os pés, o livro, o ato de sentar, o “anonimato”, as formas e

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posições confortáveis e em repouso, se apresentam como elementos “socialmente significativos”

capazes de “borrar as fronteiras entre gêneros”. (RUBINO, 2010, p. 360)

Dificilmente as fotos de arquitetura desse período mostram pessoas nos projetos construídos,

mostram usos. Mesmo nos espaços domésticos, salas e cozinhas parecem passíveis de ocupação,

ainda que dificilmente uma figura humana apareça sugerindo como fazê-lo. Nos desenhos

técnicos, o elemento humano é totalmente ausente, e nos croquis aparecem para dar sentido de

proporção, a conhecida “escala humana”. [...] Elas usaram corpos, seus corpos, como medida para

um móvel que elas redesenharam e que até então era classificado como um móvel masculino. A

cadeira Surrepos que pode ter servido de modelo para a chaise-longue tinha seu uso demonstrado

por um homem e suas primeiras cadeiras, como já foi dito, foram inspiradas em cadeiras de

escritório. Vania Carneiro de Carvalho mostra como poltronas são parte dos espaços masculinos

da casa, em oposição aos sofás, exatamente porque as primeiras permitiam apenas uma pessoa

sentada, o homem da casa, compenetrado ou se recuperando do trabalho no ambiente exterior, em

oposição ao sofá, cujas qualidades eram mostradas com uma mulher ali sentada com sua prole.

Lina Bo Bardi jamais desenhou um sofá e não havia um na Casa de Vidro, embora um croqui

mostrasse um móvel ou um degrau na sala onde estão sentados ela – de calças compridas –, Bardi,

uma terceira figura masculina e um gato. Estariam nessas fotos, Lina e Charlotte tomando posse do

móvel destinado ao homem, o repouso que remete ao trabalho no espaço público, revertendo a

teatralidade do espaço doméstico, propondo uma nova? [...] Elas se deixaram fotografar entregues

ao conforto repousante de suas cadeiras, ou ao enredo de um livro em uma foto onde não temos

sequer o rosto das leitoras. Não há rigidez muscular nas pernas de Lina e Charlotte, como

convinha (convém?) às mulheres. (RUBINO, 2010, p. 357-358)

Dito isso, os lugares percorridos por mulheres por estes espaços e a retomada de suas

histórias, “nos convida a observar as obras, a procurar nelas as tensões de gênero que marcaram

suas trajetórias, que, tudo parece indicar, conferiu às mulheres um lugar no menos valorizado

espaço doméstico e no âmbito das chamadas artes menores” (Rubino, 2010, p. 360), permitindo,

assim, a possibilidade de (re)escrita de uma historiografia sobre culturas urbanas modernas por

meio do olhar de uma mulher que, no caso de Lina, além de produzir uma reflexão crítica sobre o

papel político da arquitetura e da convivência urbana, nos revela ainda os percalços por uma “cena

intelectual que mostra, pouco a pouco, que houve vários modernismos”. (RUBINO, 2010, p. 360)

A respeito da produção de Lina Bo Bardi, que muitas vezes encontra-se esparsa ou mesmo

inacessível, segundo Rubino e Grinover (2011), pelos textos escolhidos de Lina Bo Bardi, torna-se

possível notar que seus escritos falam da convivência e das interações, de memórias e cultura

popular, de utopias e “homens livres”, assim como da possibilidade de uma arquitetura corpo-a-

corpo, onde no segundo pós-guerra passara, então, a manifestar “mais interesse pela madeira [e pelo

vernacular] do que pela industrialização e por cadeiras de metal.”. (RUBINO, 2010, p. 359)

Uma trajetória que percorria o design industrial, a arte popular/vernacular, a museografia, o

patrimônio, e também o teatro, o cinema e a edição de revistas, construindo, com isso, uma opinião

pública crítica na formação e reflexão sobre a cultura urbana nacional, tocando em pontos relativos

à modernidade e a convivência em espaços públicos, e contribuindo, dessa forma, para qualificar e

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também divulgar a arte e a arquitetura no Brasil, assim como com a discussão no campo da

arquitetura sobre o espaço urbano para além das formas. (RUBINO; GRINOVER, 2011)

Desse modo, o caráter metodológico do exercício da arquitetura e das formas de Lina Bo

Bardi, fortemente marcado pela ideia de “presente histórico” e pela “prática social intrínseca ao

projeto”, se orienta por um método que vai além da dimensão meramente morfológica, inclina-se ao

popular e vernacular, apresentando-se, assim, como um diferencial em sua maneira de projeção e

criação de novas formas e olhares para patrimônio, a cidade, os corpos e os usos da arquitetura, nos

fornecendo pistas para pensar as peculiaridades e (des)continuidades de contextos sociais e

históricos específicos de distintas culturas urbanas e de uma ideia universalizada de “modernidade”.

Josep Maria Montaner (1997), refletindo sobre La modernidade superada: arquitetura, arte

y pensamiento del siglo XX, narra as transformações ocorridas em finais do século XIX e início do

XX que refletiram a diluição de tradicionais representações da realidade e buscas por novas formas

de expressão no “mundo das máquinas” e das formas geométricas à la Bauhaus, e destaca Lina Bo

Bardi como importante nome na construção de uma crítica a noção “oficial” de modernidade e de

uma arquitetura positivista.

Inserida em um contexto de estímulos a uma produção artística e arquitetônica voltada ao

progresso, aos avanços tecnológicos, e a produção do espaço métrico, e ainda assim pontuando

críticas a tais preceitos, Lina Bo Bardi que, ainda sem romper com os princípios básicos de

objetividade, racionalidade e funcionalidade, propunha uma experimentação corpo-a-corpo com a

realidade, superando as imposições lógicas e os limites da arte/arquitetura moderna, acrescentado,

com isso, toques poéticos, irracionais e irrepetíveis às novas formas. (MONTANER, 1997)

Lina Bo Bardi, por meio da proposta de um envolvimento corpo-a-corpo com o entorno e o

“presente histórico”, oferecia alternativa às regras vanguardistas repensando a ideia de modernidade

universal e indo de encontro à noção de arquitetura vernacular, que, aliás, expressa um caminho

específico na constituição da arquitetura latino-americana, como também descreveu Marina

Waisman (2013) ao analisar as conexões entre modernidade e arte popular e tradicional na América

Latina pela sua historiografia arquitetônica.

Com isso, os efeitos produzidos por reflexões que abordem outras dimensões de Lina Bo

Bardi, sobretudo a respeito do contexto social e político no qual estava inserida, podem fazer

emergir novos caminhos, olhares, questionamentos e percepções a seu respeito e à historiografia da

arte e da arquitetura, assim como às narrativas produzidas a respeito das mulheres, onde pela

atenção à questão de gênero como um marcador social da diferença em seus panteões, podemos, por

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este caminho, pensar sobre as ambivalentes relações das mulheres com a Modernidade e o

modernismo brasileiro e latino-americano em seus distintos e específicos contextos culturais.

Por este caminho, podemos então pensar e estranhar que quando nos perguntamos sobre os

“grandes nomes” da arquitetura modernista no Brasil, nos remetemos a prestigiados homens como

Oscar Niemeyer, Lucio Costa e Afonso Reidy, e, pela história da arte recriada pelo feminismo e

pela denuncia ao sexismo que envolve o “mundo das artes”, mostra-se necessária à retomada de

lacunas e abordagens rasas a respeito da trajetória pessoal e intelectual de Lina Bo Bardi (e de

outras mulheres “esquecidas”), abrindo, assim, espaço a uma olhar interseccional como

possibilidade de exercício de uma prática científica que dê voz aos sujeitos invisibilizados, e que

permita a escrita de histórias outras, onde se reconheça que a constituição da ciência e da arte vai

além do glamour da história positivista e modernista. (SPIVAK, 2010)

Casa de Vidro do Morumbi, São Paulo – Lina Bo Bardi – Fonte: Internet

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Equipe do Concurso do Anhangabaú - Francisco Fanucci, André Vainer, Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz, Paulo

Fecarotta, Guilherme Paoliello, Bel Paoliello, Marcelo Suzuki e Ucho Carvalho. Fonte: FERRAZ, Marcelo Carvalho.

Lina Bo Bardi. Instituto Lina Bo e P. M Bardi.

Atravessamentos sob a ótica de gênero

A tessitura de um olhar que reconheça e resgate as mulheres na produção artística

modernista no Brasil a partir da crítica feminista à história “oficial” da arte, implica na consideração

desta enquanto prática social e política, assim como forma de construção de conhecimento

epistemológico que possibilita que sejam repensados os processos de criação, representação,

produção, recepção e consumo cultural, contados pela historiografia “legítima” da arte.

(POLLOCK, 2003; COUTO, 2008)

O reconhecimento dos impactos suscitados pelas intervenções e rupturas estéticas

promovidas pelo feminismo e pela crítica aos ideais artísticos burgueses e masculinos, fazendo com

que por meio da desconstrução de discursos e práticas naturalizadas e essencializadas sobre as

mulheres e os corpos, passando, com isso, a serem apreendidas em seu contexto e pela constituição

de diversas relações, determinações, pressões, limites e resistências, fazendo, então, evocar as

dinâmicas de produção, crítica, mecenato, influências, parcerias, mercado, regimes de

representações e significados.

As relações entre modernismo, modernidade e espaços de feminilidade, discutidas por

Pollock (2013), recompõem uma crítica a uma história da arte que vai celebrar uma gama de

práticas generificadas e, ao passo que pinta as formas de recreação burguesa sob uma ótima

pontualmente situada, narra as assimetrias históricas e sociais entre homens e mulheres

questionando, pela crítica feminista, como estas podiam então experimentar a modernidade tal

como ela se definia.

Podemos, a partir disso, perceber que ao recuperar histórias e dados de mulheres artistas

abafadas pela historiografia “oficial”, permite-se que os meios de acesso diferenciados ao espaço

público e à profissionalização artística, assim como a forma pela qual as mulheres eram pintadas

por homens, possam ser apreendidas não mais de maneira essencializada, mas sim pela

contextualização de uma estrutura social que coloca homens e mulheres em posições desiguais.

(CLARK, 2007)

Desse modo, distendendo estas ideias em dobras reflexivas a respeito do modernismo e das

relações de gênero no contexto brasileiro, Maria de Fátima Morethy Couto (2008) ao refletir sobre o

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“confronto” entre Anita Malfatti e Tarsila do Amaral, mulheres que ficaram consagradas como

importantes nomes da arte modernista no Brasil, pontua que:

Seu caso [o de Anita Malfatti] contrasta com o de dezenas de mulheres que expuseram suas obras

nos salões oficiais ao longo do século XIX e XX e durante as primeiras décadas do século XX.

Tais artistas parecem jamais ter existido, não possuem e não pertencem à história: seus nomes e

trajetórias são desconhecidos: suas obras são ignoradas e apenas muito esporadicamente

encontram-se presentes em exposições e em acervos de museus, os estudos sobre elas são exíguos.

Donas de um talento rapidamente reconhecido como ‘forte e original’, que violava os padrões

estabelecidos da chamada ‘produção feminina’ - “obra de moças prendadas que se dedicam à

pintura por passatempo ou para aplicá-la às almofadas de seda e aos vasos de barro” - Anita,

primeiramente, e Tarsila, em seguida, atraíram para si a atenção e o apoio de um grupo de críticos

e homens de letras que lançou as bases do debate em torno da arte moderna no Brasil. (COUTO,

2008, p. 126)

Como nos mostra a autora, as parcerias e relações que essas artistas estavam envolvidas

podem ser entendidas pelas condições que possibilitaram que esses nomes se estabelecessem como

símbolos do modernismo no Brasil. Claro que isso não implica questionar a “validade” e

legitimidade de suas obras, mas nos permite pensar a respeito das condições sociais as quais

algumas mulheres estavam inseridas e as relações que traçavam a partir do contato que dispunham

com a academia, com a Europa e também com o movimento modernista.

A autora acentua que, no caso de Tarsila do Amaral, casada com Oswald de Andrade e

próxima aos influentes Paulo Prado e Olívia Guedes Penteado, destacados nomes da difusão do

movimento modernista em São Paulo, possibilitando o entendimento de que estes “foram fatores

igualmente decisivos para que ela estabelecesse as bases de seu novo vocabulário plástico,

incorporando preceitos da vanguarda cubista”. (COUTO, 2009)

Segundo Couto (2009), o retorno de Anita Malfatti à Europa em 1923, em virtude à bolsa de

estudos concedida pelo Pensionato do Estado de São Paulo e por intermédio de influentes nomes da

arte paulista como Mário de Andrade e o senador Freitas Valle, assim como o convívio de Tarsila

do Amaral com prestigiados nomes do “mundo das artes” parisienses podem, então, ser analisados

pelas condições que estas artistas dispunham e estavam inseridas a partir dos percalços de suas

trajetórias profissionais.

Os estigmas atribuídos à Anita Malfatti por suas “fragilidades afetivas” e a crítica que

recebera de Monteiro Lobato são questionados por Couto (2008) que, em diálogo com outr@s

historiador@s da arte, apontam para as discussões acerca do possível abalado de sua “vitalidade

nervosa” que, intimidada, teria recuado com suas formas e pretensões artísticas. Nas tramas desse

debate, em diálogo com Tadeu Chiarelli, Couto abre caminho a uma reflexão a respeito da

“polêmica” entre as artistas (Anita e Tarsila) pelo ponto de vista da desmistificação da figura de

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Anita Malfatti relacionada a uma suposta fraqueza emocional, insegurança e retraimento frente à

ascensão “da bela e aristocrática Tarsila”. Assim, Maria Couto (2008) questiona:

Mas estaríamos nós, mulheres, fadadas, por questões de gênero, a rivalidades em tais termos e a

misturar o campo pessoal e o profissional de forma tão emotiva? Dito de outro modo, poderíamos

utilizar esses mesmos parâmetros de análise para estudar a obra de pintores representativos de

nosso movimento modernista? Estabelecer, por exemplo, um confronto entre o “filho e neto de

modestos imigrantes italianos recém-instalados no interior paulista, coxo e de pequena estatura”

que foi Portinari e o boêmio Di Cavalcanti, confronto esse que explicasse suas idas e vindas no

campo artístico? Ou ainda entre o disciplinado e recatado Mário de Andrade e o irreverente

Oswald? (COUTO, 2008, p. 145- 146)

Cada uma a seu modo, a busca pela inserção dessas artistas no circuito artístico parisiense

nos anos de 1920, “valendo-se dos recursos (desiguais, de fato) de que dispunham”, permite, então,

um olhar sobre a relação de Anita com os postulados vanguardas do início do século, frisando, por

meio dessa discussão, a ideia da artista “como protagonista de sua própria vida, optando

conscientemente pelos rumos de sua trajetória artística, (…) e não como uma sensitiva

influenciável, sem vontade própria, incapaz de arbitrar sobre os caminhos de sua arte” (Couto, 2008

apud Chiarelli, 1995).

À guisa dessa discussão, Ana Paula C. Simioni (2008) pontua o “silêncio e esquecimento”

de mulheres artistas que tiveram ativa produção cultural e participação em exposições artísticas no

Brasil entre 1884 e 1922, e que foram invisibilizadas pela estética modernista masculina e “oficial”

que se impunha, visando, pelas elucidações destacadas, a retirada dessas mulheres do

“esquecimento coletivo” e sublinhar a importância do registro de suas histórias para a construção de

um outro olhar para a historiografia da arte brasileira.

O destaque à noção de “genialidade e excepcionalidade” atribuída às artistas por críticos e

historiadores da arte é elucidada por Simioni (2008) por meio das condições sociais, políticas e

sociais as quais estavam inseridas, possibilitando uma reflexão a respeito da exclusão de mulheres

pela “história oficial” da arte no Brasil e a atribuição da categoria de “amadoras” às que não

alcançariam o reconhecimento, os meios para “profissionalização”, e o prestígio.

O domínio masculino, imperativo no campo das artes e expresso na inferiorização das

mulheres pela sua classificação como “amadoras”, reflete, segundo a Simioni, marcas de valores

sociais e científicos que, por meio da crítica a ideia de arte feminina universal, abre espaço a um

olhar sobre “a feminilidade” na produção artística, passando a encará-la como “um discurso, uma

fala produzida histórica e socialmente que, em alguns momentos, serve para julgar, para classificar

e mesmo subjugar a produção feminina” (SIMIONI, 2008, p. 27).

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

Simioni (2008) demonstra ainda que a classificação dessas mulheres enquanto artistas,

amadoras ou profissionais estariam, então, em intersecção e imbricada em outros marcadores

sociais da diferença, como “o nível educacional, a habilidade técnica, o capital social, as parcerias

afetivas, a sagacidade pessoal” (Simioni, 2008, p.26). Percebe-se, desse modo, que a visibilidade de

poucas, e, de maneira geral, invisibilidade, “esquecimento” e “inexistência” de mulheres

reconhecidas pela história oficial da arte, não estaria, dessa maneira, relacionada aos “talentos”,

“dons”, e “capacidades naturais”, mas às condições desiguais de acesso à educação artística, à

profissionalização, e às relações e diferenciações sociais que indelevelmente marcavam suas

trajetórias.

Assim, ao pensar os “espaços possíveis” no campo das artes plásticas no Brasil pré-

modernismo, Simioni nos leva a refletir acerca das condições de existência, mesmo que mínimas,

do exercício de ofícios profissionais de mulheres, questionando, no entanto, a respeito do restrito

acesso à educação artística e a exclusão das mulheres dos panteões das artes, mostrando, com isso, a

necessidade que sejam realizados estudos que tragam especificidades da realidade brasileira e das

hitórias de mulheres artistas pelas suas produções, biografias, e também pela conjuntura política e

parcerias travadas em suas carreiras, que seriam, então, fundamentais para maior entendimento

sobre suas trajetórias artísticas marcadas por condições desiguais de produção, acesso,

reconhecimento, visibilidade e profissionalização.

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WAISMAN, Marina. O interior da história: historiografia arquitetônica para uso de latino-

americanos. São Paulo: Perspectiva, 2013

Hand-to-hand architectura: notes from Lina Bo Bardi

Abstract: Starting from the recognition of the interventions and aesthetic ruptures promoted by

feminism in punctual criticism of bourgeois and masculine artistic ideals, where through the

deconstruction of discourses and practices naturalized and told by the “official history” of art we

can apprehend it by imbrications (Pollock, 2003). In this paper, we will analyze the dynamics os

creation, partnerships, production, reception, cultural consumption, regimes of representations and

meanings. Thus, this article proposes the tessitura of a view that elucidates the women in the

modernist artistic production in Brazil from the feminist critique to the history of the art (Couto,

2008), understanding it as a political practice and also as a form of construction of epistemological

knowledge that makes it possible to rethink the asymmetrical representations of gender relations in

the pantheons of the arts. To do so, when we think os the prominent names of modernist

architecture in Brazil, we refer to men like Oscar Niemeyer, Lucio Costa and Afonso Reidy. Thus,

through the history of art recreated by feminism and the denunciation of sexism involving the

“world of the arts”, there is room for reflections on the personal, political and methodological

trajectory of architect Lina Bo Bardi on a path that considers the gender issues and the partnerships

and social relationships in which the architect was inserted in the course of her career.

Keywords: Architecture. Gender. Lina Bo Bardi