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Caso clínico Leishmaniose visceral
Interno: Raquel B. AlencarCoordenadora: Elisa de CarvalhoEscola Superior de Ciências da
Saúde/Distrito Federal
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Caso Clínico
Identificação
Larissa Carla M. Farais, 3 anos e 6 meses. Naturalidade e procedência: Unaí- MG. Informante: mãe
Queixa principal: febre há 13 dias.
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HDAMãe refere que a criança iniciou quadro febril há 13 dias, em média de 3 episódios diários, não aferidos; associados a calafrios; com melhora após uso da dipirona. Refere também aumento de volume abdominal difusamente há 13 dias, associado à dor abdominal.Mãe procurou o serviço de saúde em sua cidade onde foi diagnosticada uma amigdalite, então tratada com amoxacilina por 5 dias.
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HDAA criança persistiu com febre diária, com volume abdominal aumentado e dor abdominal.
Antes do surgimento da febre, a mãe relata que notou o surgimento de máculas acastanhadas pela pele da criança, espalhadas no corpo e nos membros.
Nega diarréia, vômitos e tosse.
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Antecedentes pessoais
Nasceu a termo de parto cesárea, sem intercorrências.
Foi amamentada exclusivamente até 1 ano de idade.
Apresentou desenvolvimento neuropsicomotor normal.
Mãe refere vacinação em dia. (SIC)
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Antecedentes familiaresMãe tabagista, sem doenças crônicas.
Pai saudável.
Avó materna diabética.
Avô materno falecido por câncer de esôfago.
Avô paterno falecido por afogamento
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Antecedentes patológicos
Nega internações anteriores, cirurgias ou traumas.
Nega hemotransfusões.
Nega alergias.
Refere quadro de hepatite (SIC) há 6 meses, não esclarecida.
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Hábitos e condições de vida
Reside em área rural, em casa de alvenaria.
Consome água de poço. Não tem rede de esgotos e nem coleta de lixo na residência.
Possui criação de galinhas.
Relata casos semelhantes na região em que mora.
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Exame físicoBEG, hidratada, hipocorada 3+/4+, acianótica, anictérica, febril ao toque, eupnéica, ativa, orientada.
Orofaringe: sem alterações.
Cabeça e pescoço: sem adenomegalias
Ausculta cardíaca: FC: 192 bpm, BNF sem sopros, ritmo regular em 2 tempos.
Ausculta respiratória: MVF normal sem ruídos adventícios.
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Exame físico
Abdome: Globoso. Ruídos hidroaéreos presentes. Doloroso à palpação em hipocôndrios E e D. Fígado palpável à 5 cm do RCD. Baço palpável à 8 cm do RCE
MMII: Sem edema e boa perfusão. Presença de máculas acastanhadas e arroxeadas.
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Exames LaboratoriaisHemograma da admissão (02/02/06)
Ht 32 Leu 4900
Hb 10,5 Seg 2107(43%)
Hm 3,78 Bast 0%
VCM 84,65 Mono 0%
CHCM 32,81 Eos 1%
HCM 27,77 Linf 2646(54%)
Plaq 109 mil
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InterpretaçãoAnemia normocrômica normocítica.
Leucopenia com neutropenia.
Plaquetopenia.
Conclusão: PANCITOPENIA.
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Bioquímica 02/02/06
TGO 78 Uréia 22
TGP 66 Creat. 0,4
Na 136 BT 0,6
K 3,6 BI 0,4
Cl 100 BD 0,2
Ca 10,1
LDH 1304
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InterpretaçãoTGO aumentada (1,4x) e TGP aumentada (1,4x), indicando leve lesão hepatocelular.
LDH aumentada (2,6x), indicando que há morte celular.
Uréia discretamente elevada (1,2x) indicando possível comprometimento leve da função renal.
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Punção da medula óssea03/02/06
Medula óssea hipocelular com megacariócitos em vários estágios de maturação.Série granulocítica 50%Série eritrocitária 35%Presença de parasitas (leishmanias)Ausência de células neoplásicas e de depósito.
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Após confirmação diagnóstica, foi iniciada a administração de glucantime na dose de 3,6 ml/dia (291,6 mg/dia).
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Leishmaniose Visceral(Calazar)
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Histórico
Calazar é uma palavra de origem hindu e significa febre negra.
A primeira descrição do parasito foi feita por William Leishman em 1903 na Índia, ao realizar a autópsia em um cadáver de um soldado que estava com disenteria e hepatoesplenomegalia.
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Agente etiológico
Protozoário da Família Trypanosomatidae, gênero Leishmania e espécie donovani.
Três subespécies importantes:
L.(L.)donovani (Índia, África)
L.(L.)infantum (Mediterrâneo, Oriente Médio. Rússia)
L.(L.)chagasi (América Latina)
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Características do agente etiológico
Leishmanias são parasitas intracelulares obrigatórios.Seu desenvolvimento ocorre dentro do sistema fagocítico mononuclear dos mamíferos suscetíveis.No organismo de mamíferos, tem a forma de amastigota (não flagelada).No trato digestivo dos vetores (inseto flebótomo) assume a forma promastigota (flagelada).
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Leishmanias
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Ciclo de vida
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Vetor (inseto flebótomo)inseto Lutzomyia sp.
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ReservatórioEm áreas urbanas, o cão é a principal fonte de infecção.
Em ambientes silvestres, os reservatórios são as raposas e os marsupiais.
Estes animais quando doentes apresentam unhas compridas e pêlos eriçados.
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Epidemiologia
Era predominantemente uma zoonose de área rural.Na década de 80, passou a se expandir para áreas periurbanas das grandes cidades.Focos de grande endemicidade: Bahia, Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Maranhão.
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Epidemiologia
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Epidemiologia
No Brasil, é mais freqüente em crianças menores de 10 anos.
A maior freqüência em crianças deve-se:
ao estado de relativa imaturidade imunológica celular, agravado pela desnutrição.
à maior exposição ao vetor no peridomicílio .
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Período de incubação
Varia de 10 a 24 meses.
Média de 2 a 6 meses.
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FisiopatologiaA leishmania consegue escapar aos potentes mecanismos oxidativos dos macrófagos. Ocorrem alterações na imunidade celular e humoral. Há predomínio da produção de interleucinas do subtipo Th2 (IL-4,IL-10), com conseqüente ativação policlonal dos linfócitos B e produção de anticorpos.
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Fisiopatologia
A leishmania pode ser encontrada nos pulmões, no intestino e nos rins.
Ocorre principalmente nos órgãos que tem o sistema fagocítico-mononuclear proeminente (fígado, baço, medula óssea).
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Fisiopatologia
Fígado: Hipertrofia e hiperplasia difusa das células de Kupffer. Numerosas formas amastigotas de Leishmania nestas células. Moderada expansão dos espaços porta por infiltrado de linfócitos, plasmócitos e macrófagos. Hepatócitos com leve grau de tumefação e esteatose.
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Fisiopatologia
Medula óssea: Hipocelularidade da série granulocítica e bloqueio de granulócitos da linhagem neutrofílica. Hipercelularidade relativa da série vermelha proporcionalmente à série granulocítica, com predominância de microeritroblastos. A série megacariocítica é normo- ou hipocelular com redução das plaquetas. Os macrófagos estão aumentados de volume e parasitados pelas formas amastigotas.
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Fisiopatologia
Pulmão: presença de tosse seca e persistente, que surge com o início dos sintomas, prolonga-se durante o período de estado e desaparece com a cura. O quadro histopatológico pulmonar mais freqüentemente encontrado é o de pneumonite intersticial. É comum a presença de broncopneumonias como infecção secundária, caracterizando uma complicação da doença.
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Fisiopatologia
Rim: A principal alteração anatomo-patológica é a nefrite intersticial. Podem ocorrer manifestações clínicas de proteinúria e hematúria.
Linfonodos: Hiperplasia, hipertrofia e parasitismo dos macrofágos. Em geral, não estão aumentados de volume.
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Fisiopatologia
Baço: A reatividade do sistema fagocítico-mononuclear (SFM) e a congestão dos sinusóides esplênicos são responsáveis pela esplenomegalia.
Hiperplasia e hipertrofia das células do SFM, com macrófagos intensamente parasitados pelas amastigotas.
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Quadro clínicoNum extremo, o sistema micro e macrofágico é capaz de destruir as leishmanias e resolver o processo inflamatório reacional.No outro extremo, a doença se desenvolve com manifestações sistêmicas exuberantes.Existem formas intermediárias, são formas oligossintomáticas.
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Infecção assintomáticaOcorre na maioria dos indivíduos que vivem em área endêmica.Diagnóstico é feito pelos exames sorológicos (ELISA ou IFI) e pelo teste de intradermorreação de Montenegro.É necessário que o indivíduo seja de área endêmica, onde há evidências epidemiológicas e imunológicas da infecção.
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Infecção oligossintomática
Nas áreas endêmicas, esta é a forma mais comum de doença manifesta.
Sintomas inespecíficos: febre baixa, tosse seca, diarréia, sudorese, adinamia.
Sinais: discreta visceromegalia. Em geral, somente o fígado está pouco aumentado.
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Doença leishmaniose visceral
Período inicialFebre com duração inferior a 4 semanas.Palidez cutâneo-mucosa.Hepatoesplenomegalia. Baço não
ultrapassa 5 cm do RCE.Estado geral preservado.Podem ocorrer tosse (seca ou pouco
produtiva) e diarréia.
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Período inicial
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Exames laboratoriaisHemograma revela anemia.Leucócitos sem alterações significativas e com predomínio de linfócitos.VHS elevado.Hiperglobulinemia.Sorologias são reativas.Teste de intradermorreação de Montenegro é negativa.Aspirado do baço e da medula óssea geralmente mostram as formas amastigotas do parasita.
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Período de estado
Febre irregular. Pode ocorrer febre diária com picos elevados.Emagrecimento progressivo. Palidez cutâneo-mucosa.Aumento da hepatoesplenomegalia. Baço pode atingir até a fossa ilíaca esquerda e/ou a cicatriz umbilical.Desconforto abdominal.Estado geral comprometido.
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Período de estado
Devido à anemia intensa, a criança pode apresentar dispnéia aos pequenos esforços e até desenvolver insuficiência cardíaca.
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Período de estado
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Exames laboratoriais
Pancitopenia.Inversão da relação albumina/globulina, com hipergamaglobulinemia.Elevação das aminotranferases (2 a 3x) Aumento das bilirrubinas, da uréia e da creatinina.Níveis de anticorpos anti-Leishmania elevados.Intradermorreação de Montenegro negativa.Encontro de amastigotas em aspirado de medula óssea, de baço, de linfonodos e fígado.
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Período final
Em casos de não diagnóstico, há febre contínua e comprometimento mais intenso do estado geral.
Pode se instalar quadro de desnutrição.
Outras manifestações: hemorragias, icterícia e ascite.
Infecções bacterianas secundárias.
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Diagnóstico
Imunológico: Mais utilizado é a IFI. Expressa em diluições. Valores maiores que 1:80 são positivos.
Intradermorreação de Montenegro é sempre negativo durante o período da doença. Torna-se positivo após cura clínica.
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Diagnóstico
Parasitológico Punção aspirativa do baço tem a maior
sensibilidade (90-95%), seguida pelo aspirado de medula óssea.
Por ser mais seguro, é preferível o aspirado de medula óssea.
Isolamento em meio de cultura: inoculação de amastigotas em meio de cultura especiais promovem transformação para promastigotas.
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Diagnóstico diferencial
Malária
Febre tifóide: anemia mais leve, esplenomegalia menor e globulinas normais.
Salmonelose
Esquistossomose mansônica: Leucocitose com eosinofilia.
Linfomas e leucemias agudas.
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Tratamento Antimoniais pentavalentes:
Antimoniato N-metil glucamina:
Inibe a atividade glicolítica e a via oxidativa dos ácidos graxos das amastigotas.
Tem vida média de 2 horas aproximadamente. Eliminação renal.
Dose recomendada: 20 mg/kg/dia EV ou IM; durante no mínimo 20 e no máximo 40 dias.
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Efeitos adversos e toxicidade do tratamento
Pode provocar distúrbios na repolarização cardíaca. Por isso, deve ser realizado ECG no momento do diagnóstico e após o 20° dia realizar semanalmente. Realizar ausculta diária cuidadosa. Em caso de arritmias utilizar drogas alternativas.
Outros efeitos: artralgia, adinamia, anorexia, aumento da diurese.
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Tratamento alternativo
Anfotericina B: droga leishmanicida.Atua no precursor do ergosterol, um componente da membrana celular do parasita.Deve ser utilizada na dose de 15 a 25 mg/kg em dias alternados.Efeitos adversos: flebite, desconforto respiratório, cianose, complicações renais.
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Critérios de curaDesaparecimento da febre no 5°dia.Redução da hepatoesplenomegalia nas primeiras semanas.Ao final do tratamento redução de 40% ou mais no tamanho do baço.Melhora dos padrões hematológicos na 2a semana.Ganho ponderal progressivo.Seguimento do paciente 3, 6 e 12 meses após o tratamento. Se estiver estável na última avaliação é considerado cura.
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Bibliografia
Veronesi, Roberto Focaccia. Tratado de Infectologia. Editora Atheneu 1996.
Manual de vigilância e controle da leishmaniose visceral/ Ministério da Saúde, 2003.
Marconde, Eduardo. Pediatria básica volume 2. Editora sarvier 1994.