Direito de Familia

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7/16/2019 Direito de Familia http://slidepdf.com/reader/full/direito-de-familia-5633899555337 1/89 ROTEIRO DE CURSO 2010.1 2ª EDIÇÃO DIREITO DE FAMÍLIA AUTOR: GUSTATAVO KLOH MULLER NEVES

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ROTEIRO DE CURSO2010.1

2ª EDIÇÃO

DIREITO DE FAMÍLIAAUTOR: GUSTATAVO KLOH MULLER NEVES

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Sumário

Direito de Família

APRESENTAÇÃO .................................................................................................................................................. 3

PRIMEIRO BLOCO DE AULAS: ..................................................................................................................................4

AULA 1. O QUE É FAMÍLIA? .....................................................................................................................................5

AULA 2. O CASAMENTO .........................................................................................................................................8

AULA 3: A UNIÃO ESTÁVEL: JUNTADO COM FÉ CASAD O É? ............................................................................................12

AULA 4: O BOM FILHO A C ASA TORNA... .................................................................................................................. 18

AULA 5: INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. ADMIRÁVEL MUNDO NOVO: A REPROGENÉTICA NAS RELAÇÕES DE FILIAÇÃO .............36

AULA 6. ADOÇÃO ............................................................................................................................................... 39

AULA 7. FAMÍLIA HOMOSSEXUAL? ......................................................................................................................... 48

BLOCO II DE AULAS ..................................................................................................................................54

AULA 8: PREVENÇÃO DE CONFLITOS E REGIME DE BENS ..............................................................................................55

AULA 9. DIVÓRCIO E SEPARAÇÃO EXTRAJUDICIAIS ....................................................................................................62

AULA 10: SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO JUDICIAIS ........................................................................................................... 77

AULA 11. ALIMENTOS .........................................................................................................................................80

AULA 12. 1ª PARTE – FAMÍLIA E DIREITO EMPRESARIAL .............................................................................................85

AULA 12. 2ª PARTE – CASAMENTO GLOBAL .............................................................................................................. 87

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APRESENTAÇÃO

O objetivo do nosso curso de direito de família consiste em apresentar a problemática da realidade familiar contemporânea, ao mesmo tempo em quemunicia você com ferramental para o entendimento dessas questões, e deum conhecimento de mecanismos preventivos e repressivos dos problemasocorridos nas relações familiares.

 As mudanças nas relações familiares são evidentes, saltam aos olhos, e nãoé possível que as discussões, e o próprio ensino do Direito de Família passemao largo dessas alterações.

 A ênfase na prevenção de problemas será sempre grande, uma vez que opreço pago, diante de um conflito familiar não resolvido, é muito caro. Para tanto, é necessário enfatizar o caráter multidisciplinar das relações familiares,e suas intersecções com os demais ramos do Direito Privado, e mesmo até doDireito Público.

Tudo o que foi dito, todavia, partiu de um pressuposto simples, até prosai-co: você sabe o que é uma família, pois vive em uma. Mas sabe mesmo? É cla-ro que a vivência por você acumulada é perfeitamente válida, e você conhececom detalhes a vida e a realidade de ao menos uma família. Mas nem todas as

famílias são e serão iguais, terão os mesmos problemas ou os mesmos anseios.Tosltói inicia seu célebre romance “Anna Kariênina” com a seguinte frase:

“Todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma a sua maneira.”

O conteúdo dessa frase não é mais capaz de ser considerado verdadeiro, aomenos em parte. Em verdade, todas as famílias são felizes e infelizes cada uma a sua maneira, e por isso a família é e será múltipla, diversa, rica em variaçõese vivências, e por isso demandará uma multiplicidade de alternativas para a resolução e prevenção de conflitos entre os seus membros.

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PRIMEIRO BLOCO DE AULAS:

ESTRUTURA DAS RELAÇÕES FAMILIARES (AULAS 1 A 7)

OBJETIVO

Compreensão da tipologia das relações familiares, com ênfase no direitopessoal das relações familiares.

Como vimos na apresentação, se a família é múltipla, tem origens distintas ecomporta uma pluralidade de realidades, devemos começar o estudo do direitode família por meio de uma prospecção das realidades familiares que vivemos eencontramos, para que se compreendam essas diferentes formas de viver.

 A ênfase será naquilo que se chama de “Direito Pessoal de Família”, ouseja, as relações que serão estudadas serão observadas pelo prisma do conví-vio, da estrutura e das responsabilidades. O patrimônio amealhado na família não será desconsiderado, mas o seu momento de foco será outro.

Por fim, esclarece-s desde logo que a tutela e curatela são temas estranhosao direito de família, não estabelecem relações familiares e não serão direta-

mente abordadas.

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1 Op. cit, p. 23.

2 Levi Strauss , Claude. As estruturas ele-mentares do parentesco, passim.

3 Schlüter, Wielried. Direito de Família,p. 56.

AULA 1. O QUE É FAMÍLIA?

EMENTA:

Família. Tipologia das relações familiares. A família na constituição de1988. Família eudemonista. O papel do afeto nas relações familiares.

TEXTO OBRIGATÓRIO

TEPEDINO, Gustavo – “ A disciplina civil constitucional das relações fami-liares ”, em Temas de Direito Civil, vol. I, Ed. Renovar.

TEXTO COMPLEMENTAR

DIAS, Maria Berenice – “ Manual do Direito das Famílias”, cap. 1, 2 e 3,ed. Livraria do Advogado.

Natureza das relações familiares

Para os autores de direito em geral, a Família se apresenta como constru-ção social, mas não há investigação mais profunda sobre por meio de quaiselementos essa construção se origina ou direciona.

Por exemplo, vejamos o que diz Maria Barenice Dias: “Mesmo sendo a vida aos pares um fato natural, em que os indivíduos se unem por uma quí-mica biológica, a família é um agrupamento cultural. Preexiste ao Estado eestá acima do Direito. A família é uma construção social organizada atravésde regras culturalmente elaboradas que conformam modelos de comporta-mento. Dispõe de uma estrutura na qual cada um ocupa um lugar, possuiuma função. (...) É a preservação do lar no seu aspecto mais significativo:

afeto e respeito.” 1

Essa referência, todavia, é completamente insuficiente. Em verdade, a ori-gem da família se centra em outros aspectos, todos distintos do acima citado:

• A proibição do incesto;2

• A preservação da integridade da  gens, como conseqüência da proibi-ção do incesto.3

Fundamentos jurídicos das relações familiares.

Como visto acima, o pensamento civilista atual centra o afeto como sendoo elemento caracterizador das relações familiares. Mas será mesmo?

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4 CÓDIGO CIVIL2002, art. 1694: “Podemos parentes, os cônjuges ou compa-nheiros...”

5 CÓDIGO CIVIL2002, art. 1521.

Essa idéia poderia, por exemplo, ser confrontada com a da responsabilida-de social especial como fundamento das citadas relações. Isso explicaria a visão

interessante trazida por Schlüter: que o Direito cuida de uma “grande” e deuma “pequena” família. Assim, por exemplo, o dever de alimentos se estendeaos avós,4 e as proibições de casamento até o terceiro grau de parentesco.5

 A família na constituição: art. 226. Dignidade da pessoa humana e direito de famí-

lia: a família eudemonista.

Como interpretar o papel da família na constituição? Vejamos os dispositivos:“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.§ 1º – O casamento é civil e gratuita a celebração.§ 2º – O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.§ 3º – Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estávelentre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei faci-litar sua conversão em casamento.§ 4º – Entende-se, também, como entidade familiar à comunidadeformada por qualquer dos pais e seus descendentes.§ 5º – Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exerci-dos igualmente pelo homem e pela mulher.§ 6º – O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia 

separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, oucomprovada separação de fato por mais de dois anos.§ 7º – Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do ca-sal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicospara o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva porparte de instituições oficiais ou privadas.§ 8º – O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência noâmbito de suas relações.”

O art. 226, §8º, determina a proteção dos membros da família na pessoa dos seus membros.

Quais as consequências da adoção dessa visão?

CASO

“Supremo decide que concubina não tem direito a receber a metade da pensão da viúva.

 A pensão por morte do fiscal de rendas baiano Valdemar do Amor DivinoSantos deve ser concedida apenas para sua esposa – Railda Conceição Santos

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– e não pode ser dividida entre a viúva e a mulher – Joana da Paixão Luz –com quem o homem manteve concubinato durante 37 anos.

 A decisão foi proferida ontem (3) pela 1ª Turma do STF, que deu provi-mento ao recurso extraordinário interposto na pelo Estado da Bahia.

O TJ baiano determinou o rateio da pensão entre as duas mulheres, porconsiderar que “havia uma união estável de Valdemar com Joana, mesmo queparalela com a de um casamento ´de papel passado´ entre Valdemar e Rail-da”. O julgado do tribunal estadual considerou que Joana e Santos tiveramuma união estável paralela ao casamento dele com Conceição. Com esta, eleteve 11 filhos e com Joana, nove.

O relator da ação ministro Marco Aurélio, afirmou em seu voto que a Constituição Federal, no parágrafo 3º do artigo 226, diz que a família é reco-nhecida como a união estável entre homem e mulher, devendo a lei facilitarsua conversão em casamento. Para o ministro, a união entre Valdemar e Joana “não pode ser considerada estável”.

O relator lembrou que o artigo 1.727 do Código Civil prevê que relações nãoeventuais entre o homem e a mulher – impedidos de casar – constituem concubi-nato. Segundo o voto, “a relação entre Valdemar e Joana não se iguala à união es-tável, e por isso não está coberta pela garantia dada pela Constituição Federal”.

Os ministros Carlos Alberto Menezes Direito, Cármen Lúcia AntunesRocha e Ricardo Lewandowski acompanharam o relator. Este lembrou que a 

palavra “concubinato” – do latim, ´concubere´ significa compartilhar o leito. Já união estável é “compartilhar a vida”, salientou o ministro.Para a ministra Cármen Lúcia, a Constituição se refere a um núcleo pos-

sível de união que possa se converter em casamento. “A segunda união deses-tabiliza a primeira”, salientou a ministra.

O ministro Carlos Ayres Britto votou no sentido de manter a decisão doTJ da Bahia. Segundo seu voto, “ao proteger a família, a maternidade e a in-fância, a Constituição Federal, em diversos artigos, não faz distinção quantoa casais formais – que ele chamou de ‘papel passado’ – e os casais impedidosde contrair matrimônio. Ele negou provimento ao recurso do Estado baiano,

por entender que” as duas mulheres tiveram a mesma perda, e estariam so-frendo as mesmas consequências sentimentais e financeiras”. O procuradordo Estado Antonio Ernesto Leite Rodrigues foi o subscritor do recurso extra-ordinário do Estado da Bahia. (RE nº 397762 – com informações do STF eda redação do Espaço Vital..1

Você é favorável ao reconhecimento da simultaneidade de relações familiares?Quais os valores constitucionais implicados?O conceito de família utilizado faz diferença?

1 – em http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?idnoticia=11443).

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AULA 2. O CASAMENTO

EMENTA

Fontes das relações familiares. O casamento. Características e deveres doscônjuges. Habilitação e impedimentos. Celebração e efeitos.

TEXTO OBRIGATÓRIO

DIAS, Maria Berenice – “Manual do Direito das Famílias”, 2ª ed, cap. 10.

Natureza do casamento

O casamento é ato, negócio, contrato ou instituição.Sentido do art. 1514 do Código Civil. Comunhão plena de vida e o sen-

tido do art. 1.566.Casamento civil e religioso com efeitos civis.

Inovações no Regime do Casamento

Dentre as diversas inovações trazidas pelo CÓDIGO CIVIL destacam-se as seguintes: a) gratuidade de celebração e, com relação à pessoa cuja pobreza for declarada sob as penas da lei, também de habilitação, regis-tro e da primeira certidão (art.1512); b) regulamentação e facilitação doregistro civil do casamento religioso (art.1516); c)redução da capacidadedo homem para casar para 16 anos (art.1517); d) previsão somente dosimpedimentos absolutos, reduzindo-se o rol (art.1521); e) tratamento dashipóteses de impedimentos relativamente dirimentes do CÓDIGO CI-VIL1916 não mais como impedimentos, mas como casos de invalidade

relativa do casamento (art.1550); f) substituição dos antigos impedimentosimpedientes ou meramente proibitivos pelas causas suspensivas (art.1523);g) exigência da homologação da habilitação para o casamento pelo juiz(art.1526); h) casamento por procuração mediante instrumento público,com validade restrita a 90 dias; i) consolidação da igualdade dos cônjuges,aos quais compete à direção da sociedade conjugal, com o desaparecimentoda figura o chefe de família (art.1565 e 1567) e j) oficialização do termosobrenome e possibilidade de adoção do utilizado pelo outro por qualquerdos nubentes (art.1565).

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Habilitação para o casamento

Consiste na apresentação de documento para o oficial de cartório do Re-gistro Civil de Pessoas Naturais. Agora é também necessário à homologaçãodo Juiz.

Os documentos necessários estão arrolados nos incisos do art.1.525 doCódigo Civil.

Impedimentos para o casamento

Os requisitos essenciais do casamento são diferença de sexo, consenti-mento e celebração na forma da lei. Faltando qualquer deles o casamento éinexistente. Porém, outros requisitos devem ser observados para a validade eregularidade do casamento. A sua inobservância fulmina de nulidade o ato.

a) Impedimento dirimente absoluto (público) – a penalidade aqui é a nulidade do casamento (art.1.521 do Código Civil);

b) Impedimento dirimente relativo (privado, particular ou relativo) –a sanção aqui é a anulabilidade do casamento (art.1.550 do CódigoCivil);

c) Causas Suspensivas – a sanção aqui consiste na perda do direito de

escolher o regime de bens, devendo se casar pelo regime da Separa-ção Legal Obrigatória de Bens (art.1.523 Código Civil)

Celebração do casamento

Deve ser pública e seguir os requisitos previstos no Código Civil. Quais osefeitos do descumprimento?

Efeitos do casamento

É necessário nesse ponto frisar dois institutos: o casamento putativo e a posse do estado de casado.

CASO

É possível o casamento de sobrinho e tia no Direito Brasileiro?Qual a constitucionalidade do exame previsto nos art. 1º e 3º do DL

3.200, de 1941? Este dispositivo é compatível com o art. 1.521, IV, do Novo

Código Civil?

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DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0418Período: 30 de novembro a 4 de dezembro de 2009.

Terceira Turma

REGIME MATRIMONIAL. SUCESSÃO

Trata-se de recurso interposto contra acórdão exarado pelo TJ que deferiupedido de habilitação de viúva como herdeira necessária. A questão resume-se em definir se o cônjuge sobrevivente – que fora casado com o autor da herança sob o regime da separação convencional de bens – participa da su-cessão como herdeiro necessário em concorrência com os descendentes dofalecido. No caso, a situação fática vivenciada pelo casal, declarada desde já a insuscetibilidade de seu reexame nesta via recursal, é a seguinte: cuida-sede um casamento que durou dez meses; quando desse segundo casamento, oautor da herança já havia formado todo seu patrimônio e padecia de doença incapacitante; os nubentes escolheram, voluntariamente, casar pelo regimeda separação convencional, optando, por meio de pacto antenupcial lavradoem escritura pública, pela incomunicabilidade de todos os bens adquiridosantes e depois do casamento, inclusive frutos e rendimentos. Para a Min.

Relatora, o regime de separação obrigatória de bens previsto no art. 1.829,I, do CC/2002 é gênero que agrega duas espécies: a  separação legal e a  se-paração convencional. Uma decorre da lei; a outra, da vontade das partes,e ambas obrigam os cônjuges, uma vez estipulado o regime de separaçãode bens, à sua observância. Não remanesce, para o cônjuge casado median-te separação de bens, direito à meação tampouco à concorrência sucessória,respeitando-se o regime de bens estipulado, que obriga as partes na vida ena morte. Nos dois casos, portanto, o cônjuge sobrevivente não é herdeironecessário. Entendimento em sentido diverso suscitaria clara antinomia entreos arts. 1.829, I, e 1.687 do CC/2002, o que geraria uma quebra da unidade

sistemática da lei codificada e provocaria a morte do regime de separação debens. Por isso, deve prevalecer a interpretação que conjuga e torna comple-mentares os citados dispositivos. Se o casal firmou pacto no sentido de nãoter patrimônio comum e se não requereu a alteração do regime estipulado,não houve doação de um cônjuge ao outro durante o casamento, tampoucofoi deixado testamento ou legado para o cônjuge sobrevivente, quando seria livre e lícita qualquer dessas providências, não deve o intérprete da lei alçaro cônjuge sobrevivente à condição de herdeiro necessário, concorrendo comos descendentes, sob pena de clara violação do regime de bens pactuado. Se

o casamento foi celebrado pelo regime da separação convencional, significa que o casal escolheu – conjuntamente – a separação do patrimônio. Não há 

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como violentar a vontade do cônjuge – o mais grave – após sua morte, con-cedendo a herança ao sobrevivente com quem ele nunca quis dividir nada,

nem em vida. Em tais situações, haveria, induvidosamente, a alteração do re-gime matrimonial de bens post mortem. Seria alterado o regime de separaçãoconvencional de bens pactuado em vida, permitindo ao cônjuge sobreviventeo recebimento de bens de exclusiva propriedade do autor da herança, patri-mônio, o qual, recusou, quando do pacto antenupcial, por vontade própria.

 Assim, o regime de separação de bens fixado por livre convenção entre a recorrida e o falecido está contemplado nas restrições previstas no art. 1.829,I, do CC/2002, em interpretação conjugada com o art. 1.687 do mesmo có-digo, o que retira da recorrida a condição de herdeira necessária do autor da herança em concorrência com os recorrentes. REsp 992.749-MS, Rel. Min.Nancy Andrighi, julgado em 1º/12/2009.

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AULA 3: A UNIÃO ESTÁVEL: JUNTADO COM FÉ CASADO É?

EMENTA

Fontes das relações familiares. União Estável. Regimes aplicáveis e carac-terísticas. Concubinato e união estável.

TEXTO OBRIGATÓRIO

DIAS, M. Berenice. op. cit, cap. 11.

É a união entre homem e mulher com o objetivo de constituição de fa-mília em relacionamento na forma livre, pública, duradoura e contínua. Oconcubinato (Artigo 1727 Código Civil) é diferente da União estável. Quemvive em com concubinato é impedido de casar, e é difícil a determinação dosefeitos jurídicos.

Vejamos o texto legal:

“Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar à união estável

entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituiçãode família.”

Características da união estável 

• Diversidade de sexos;• Objetivo de constituição de família;• Publicidade;• Coabitação;

• Continuidade no relacionamento;• Durabilidade.

 Aspectos eficaciais da união estável 

 Art. 1.724, Código Civil: APLICABILIDADE CONJUNTA COM O ART. 1.566. DISTINÇÃO ENTRE LEALDADE E FIDELIDADE:POSIÇÃO DE MARIA BERENICE DIAS.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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6 Retirado de http://www.consumi-

dorbrasil.com.br/consumidorbrasil/textos/modelos/amilia/contratoconvi-ventes.htm.

CASO

Contrato de convivência.6

 JOSÉ DOS ANZOIS, brasileiro, separado, industrial, portador da cédula de identidade de número MG –???????? expedida pela Secretaria de Segurança de Minas Gerais, e CPF de número?????????????, e MARIA DAS GRAÇAS,brasileira, divorciada, secretária, portadora da cédula de identidade de nú-mero M-??????????, expedida pela Secretaria de Segurança Pública de MinasGerais, e CPF de número???????????, com endereço comum de residência à 

 Avenida das abóboras, 000, apto. 0000, no Bairro Azul, em Belo Horizonte,ambos no pleno gozo de suas faculdades mentais e físicas, atendidos os ter-mos e a faculdade inserta no artigo 5º da Lei 9.278, de 10 de maio de 1996,desejando regular e definir os reflexos patrimoniais que possam advir da re-lação de convivência duradoura entre os contratantes, resolveram estabelecercláusulas e condições reciprocamente outorgadas e aceitas, a que se obrigarão,conforme a seguir articulam:

1. DO CONVIVENTE VARÃO

1.1. O Convivente Varão é separado, desde 32 de janeiro de l900, embora separado de fato há mais tempo, com averbação respectiva, assento nº 1111,folha 111, do livro 11, conforme certidão expedida pelo Cartório do RegistroCivil das Pessoas Naturais da Comarca de Nova York-MG,

1.2. O Convivente Varão é filho de José Pescador, falecido, e de Maria Ale-gria, possuindo 06 (seis) filhos maiores do antigo casamento e não possuindofilhos do atual relacionamento.

1.3. O Convivente Varão possui os seguintes bens e direitos patrimoniais:a) APARTAMENTO de número 1111, e sua respectiva fração ideal, sito

a Av. do Sol, nº 1.111, Bairro Paris, em Belo Horizonte, havido por compra 

e venda de Tereza dos Anjos, matrícula 11.111 do Cartório do 1º Ofício doRegistro de Imóveis desta Comarca;

b) CASA sito a Avenida do Sol, nº 222, Bairro Paris, em Belo Horizonte,havido por compra e venda de Tereza dos Santos, matrícula 22222 do Cartó-rio do 2º Ofício do Registro de Imóveis desta Comarca;

c) LOTE de terreno, de nº 333, da quadra 33, do bairro Bairro Paris, emBelo Horizonte, havido por compra e venda de Tereza de Deus, matrícula 333333 do Cartório do 3º Ofício do Registro de Imóveis desta Comarca;

d) VEÍCULO marca Ford, modelo Tatata, ano 1999, Placa KKK 4444,

 Adquirido de Jota Veículos, conforme certificado nº 4444444, expedido peloDETRAN – MG;

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2. DA CONVIVENTE VIRAGO

2.1. A Convivente Virago é divorciada, desde 13 de agosto de 1920, comaverbação respectiva, assento nº 55555, folha 55, do livro 555-B, conformecertidão expedida pelo Cartório do Registro Civil das Pessoas Naturais doQuinto Subdistrito de Belo Horizonte-MG.

2.2. A Convivente Virago tem quatro filhas do antigo casamento, to-das maiores, não tem ascendentes vivos e não tem filhos do atual relacio-namento.

2.3. A Convivente Virago possui os seguintes bens e direitos patrimoniais:a) APARTAMENTO de número 666 do Edifício Bibi, sito à rua Babá,

nº 666, matriculado sob o nº 66666, no Cartório do 6º Oficio do Re-gistro de Imóveis de Belo Horizonte, ora em fase de registro da compra e venda;

b) LOTE de Terreno de número 77, da quadra 777, do Bairro Kaka, emBelo Horizonte, registro em andamento, havida por herança de sua mãe,Marta de Tal, conforme partilha julgada por sentença, processo 7777777,que tramitou perante a 7a. Vara de Sucessões e Ausência da Comarca de BeloHorizonte;

c) JAZIGO do Cemitério do Bonfim, Quadra 88, Carneiro, 888, em BeloHorizonte, havida por herança de sua mãe, Marta de Tal, conforme partilha 

 julgada por sentença, processo 88888888, que tramitou perante a 8ª. Vara deSucessões e Ausência da Comarca de Belo Horizonte;

3. CONVÍVIO CONSORCIAL – INÍCIO

3.1. Os Conviventes uniram-se em convívio consorcial desde de 00 de janeiro de l900, e até a presente data o relacionamento não sofreu qualquerinterrupção.

4. RELAÇÃO DE INDEPENDÊNCIA

4.1. Os Conviventes têm atividades econômicas próprias, com renda satis-fatória, e não dependem econômico-financeiramente um do outro.

5. ADMINISTRAÇÃO DO LAR

5.1. Os Conviventes manterão conjuntamente a administração do lar co-mum, com a divisão harmônica dos encargos financeiros na proporção quemelhor atender os interesses das partes, considerada a situação econômico-financeira individual de cada um, sempre consensualmente mensurados eavaliadas à época.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 15

6. INCOMUNICABILIDADE DE BENS E RENDAS

6.1. Fica estabelecido que os bens e direitos que cada um dos Conviventespossui individualmente, e suas rendas respectivas, não se comunicarão emqualquer hipótese, razão pela qual, ainda, cada qual administrará diretamen-te seu patrimônio pessoal.

6.2. Os bens e direitos futuros que qualquer dos Conviventes vier a adqui-rir em seu nome, também não se comunicarão em nenhuma hipótese, razãopela qual, ainda, cada um dos Conviventes administrará, individualmente, oque vier a lhe pertencer a qualquer título.

6.3. Os saldos bancários, as aplicações financeiras e os créditos e débitosde qualquer natureza, presente e futuros, também não se comunicarão emnenhuma hipótese, ficando cada um dos Conviventes com a responsabilida-de individual de movimentação e administração de seus respectivos negóciosfinanceiros.

6.4. Na hipótese da aquisição de qualquer bem móvel ou imóvel, para oqual ambos os Conviventes hajam contribuído financeiramente, constará dodocumento respectivo, escritura ou promessa de compra e venda, o percen-tual de participação e propriedade de cada um. Tratando-se de bem móvel,em que não haja possibilidade de constar à proporção da participação decada um, os Conviventes o estabelecerão em documento à parte para que

seja registrado e arquivado no Cartório de Registro de Títulos e Documentosdesta Comarca.

7. DURAÇÃO DO PRESENTE CONTRATO

7.1. O presente contrato vigerá enquanto durar a união entre os contra-tantes, salvo a hipótese de aditamento ou alteração de suas cláusulas median-te instrumento escrito e, da mesma forma, livre e reciprocamente estipuladoe aceito.

7.2. As eventuais alterações do presente instrumento, depois de formaliza-

das e reconhecidas as firmas dos signatários, deverão ser registradas e arquiva-das no Cartório de Títulos e Documentos desta Comarca.

7.3. A eventual modificação ou revogação das leis que regem a matéria,ora vigentes, não alterarão os efeitos e objetivos da presente avença e mani-festação de vontade dos Conviventes.

8. FORO CONTRATUAL

8.1. Para dirimir eventuais dúvidas originárias da interpretação do pre-sente instrumento, se necessário, nomeiam os contratantes Conviventes oforo da comarca de Belo Horizonte, renunciando a qualquer outro por maisprivilegiado que seja e por estarem justos e contratados, resolveram mandar

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lavrar o presente Contrato Particular que estabelece condições patrimoniaisem face da relação de convivência duradoura prevista na Lei 9.278/96, que

assinam na presença das testemunhas abaixo nominadas, para que produza seus jurídicos e legais efeitos.

Cidade, José dos Anzóis, Maria das Graças e duas testemunhas.”

Pergunta-se: um contrato de convivência poderia regular aspectos não pa-trimoniais da relação de convivência, ou mesmo impedir a sua configuração,no chamado “contrato de namoro”?

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0418

Período: 30 de novembro a 4 de dezembro de 2009.

Terceira Turma

SOCIEDADE DE FATO, PROVA, ESFORÇO COMUM.

 A questão cinge-se em definir a qual figura jurídica corresponde o rela-

cionamento havido entre homem e mulher em que o primeiro se encontrava separado de fato da primeira mulher, considerado o período de duração da união de 1961 a 1984, ano em que cessou o vínculo de fato para dar lugar aocasamento sob o regime de separação de bens, que perdurou até a morte domarido, em 1991. Inicialmente, destacou a Min. Relatora que a peculiarida-de da lide reside no fato de que foram os filhos do primeiro casamento queajuizaram a ação de reconhecimento de sociedade de fato com a finalidadede obter, em autos diversos, a partilha dos bens adquiridos ao longo da uniãomantida pelo pai com a recorrente até a data do casamento. O TJ concluiupela existência, a partir de 1961, de concubinato, para, a partir de 1972, ou

seja, somente com o advento da separação judicial, estabelecer a existência de união estável, a qual cessaria em 1984, com a celebração do casamento.Em seguida, destaca que é comportável o reconhecimento jurídico da socie-dade de fato, já que a convivência em comum, por si só, gera contribuiçõese esforços mútuos. Para a Min. Relatora, a configuração da separação de fatoafasta a hipótese de concubinato e o reconhecimento da sociedade de fatoé de rigor. Todavia, ao estabelecer a caracterização de sociedade de fato, oTJ foi além e lhe emprestou os contornos da união estável. É pacífico o en-tendimento de que, além de sociedade de fato e união estável constituírem

institutos diversos, não se operam, em relação à sociedade de fato, os efeitosdecorrentes da legislação que deu forma à união estável, especificamente por-

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que, na hipótese em julgamento, a partir do casamento, em 1984, deixoude existir a sociedade de fato para dar lugar à sociedade conjugal e, nessa 

época, sequer a CF/1988, muito menos as Leis ns. 8.971/1994 e 9.278/1996estavam em vigência. Dessa forma, a Lei n. 9.278/1996, particularmenteno que toca à presunção do esforço comum na aquisição do patrimônio deum ou de ambos os conviventes, contida no art. 5º, não pode ser invocada para determinar a partilha de bens se houve a cessação do vínculo de fato –transformado em vínculo decorrente de matrimônio – em data anterior à sua vigência. Dessa forma, deve ser reformado o acórdão recorrido para declararunicamente a existência de sociedade de fato, da qual decorre a necessidadeda prova do esforço comum na aquisição do patrimônio para eventual par-tilha, o que não se efetivou na espécie, de modo que os bens adquiridos pela recorrente permanecem sob sua propriedade exclusiva. Diante disso, a Turma conheceu parcialmente do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento. Prece-dentes citados: REsp 147.098-DF, DJ 7/8/2000, e REsp 488.649-MG, DJ17/10/2005. REsp 1.097.581-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em1º/12/2009.

 

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7 Em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4752.

AULA 4: O BOM FILHO A CASA TORNA...

Fontes das relações familiares: Filiação. Formas de filiação. Direitos e de-veres pessoais decorrentes da relação de parentalidade. Parentalidade sócioa-fetiva e verdade biológica.

TEXTO OBRIGATÓRIO

Dias, Maria Berenice – “Manual do Direito das Famílias”, cap. 13, 19,20 e 21.

PARENTALIDADE 

Família Monoparental: proteção constitucional.Critérios de determinação de parentalidade: critério jurídico, biológico e

sócio-afetivo.Distinção entre parentalidade e direito ao conhecimento da herança gené-

tica. Os efeitos são distintos.

TEXTO

Paulo Luiz Netto Lobo7

“Direito ao estado de filiação e direito à origem genética: uma distinção necessária.” 

Elaborado em 08.2003

1. Introdução

Na tradição do direito de família brasileiro, o conflito entre a filiação bio-lógica e a filiação socioafetiva sempre se resolveu em benefício da primeira.Em verdade, apenas recentemente a segunda passou a ser cogitada seriamentepelos juristas, como categoria própria, merecedora de construção adequada.Em outras áreas do conhecimento, que têm a família como objeto de inves-tigação, a exemplo da sociologia, da psicanálise, da antropologia, a relaçãoentre pais e filhos fundada na afetividade sempre foi determinante para sua 

identificação.

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No direito, a verdade biológica converteu-se na “verdade real” da filiaçãoem decorrência de fatores históricos, religiosos e ideológicos que estiveram

no cerne da concepção hegemônica da família patriarcal e matrimonializada e da delimitação estabelecida pelo requisito da legitimidade. Legítimo era ofilho biológico, nascido de pais unidos pelo matrimônio; os demais seriamilegítimos. Ao longo do século XX, a legislação brasileira, acompanhandouma linha de tendência ocidental, operou a ampliação dos círculos de inclu-são dos filhos ilegítimos, com redução de seu intrínseco quantum despótico,comprimindo o discrime até ao seu desaparecimento, com a Constituição de1988. Com efeito, se todos os filhos são dotados de iguais direitos e deveres,não mais importando sua origem, perdeu qualquer sentido o conceito de le-gitimidade nas relações de família, que consistiu no requisito fundamental da maioria dos institutos do direito de família. Por conseqüência, relativizou-seo papel fundador da origem biológica.

 Ao mesmo tempo em que o direito de família sofreu tão intensas trans-formações, em seu núcleo estrutural, consolidou-se a refinada elaboração dosdireitos da personalidade, nas últimas décadas, voltados à tutela do que cada pessoa humana tem de mais seu, como atributos inatos e inerentes, alcan-çando-se o que Pontes de Miranda denominou “um dos cimos da dimensão

 jurídica”1. São dois universos distintos, pois o direito de família volta-se aosdireitos e deveres das pessoas, hauridos do grupo familiar, e os direitos da 

personalidade aos que dizem com a pessoa em si, sem relação originária comqualquer outra ou com grupo. A origem genética da pessoa, tendo perdidoseu papel legitimador da filiação, máxima na Constituição, migrou para osdireitos da personalidade, com finalidades distintas.

O estado de filiação desligou-se da origem biológica e de seu consectário,a legitimidade, para assumir dimensão mais ampla que abranja aquela e qual-quer outra origem. Em outras palavras, o estado de filiação é gênero do qualsão espécies a filiação biológica e a filiação não biológica. Daí é de se repelir oentendimento que toma corpo nos tribunais brasileiros de se confundir esta-do de filiação com origem biológica, em grande medida em virtude do fascí-

nio enganador exercido pelos avanços científicos em torno do DNA. Não há qualquer fundamento jurídico para tal desvio hermenêutico restritivo, pois a Constituição estabelece exatamente o contrário, abrigando generosamente oestado de filiação de qualquer natureza, sem primazia de um sobre outro.

Na realidade da vida, o estado de filiação de cada pessoa humana é únicoe de natureza socioafetiva, desenvolvido na convivência familiar, ainda quederive biologicamente dos pais, na maioria dos casos. Portanto, não podehaver conflito com outro que ainda não se constituiu.

Os argumentos a seguir expendidos prosseguem na mesma linha traçada 

em trabalhos anteriores, que publicamos2

. Nos últimos anos, divisamos doismarcos essenciais para a solução do eventual conflito entre filiação biológica e

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filiação não biológica: a Constituição de 1988 e a Convenção sobre os Direitosda Criança, adotada pela Assembléia Geral da ONU em 20.11.1989, e com

força de lei no Brasil mediante o Decreto Legislativo nº 28, de 24.9.1990,e o Decreto Executivo nº 99.710, de 21.11.1990. Da Constituição derivamo estado de filiação biológico e não-biológico e o direito da personalidadea origem genética e da Convenção a solução do conflito pela aplicação doprincípio do melhor interesse do filho, que significou verdadeiro giro de Co-pérnico, na medida em que a primazia do interesse dos pais foi transferida para o do filho.

2. Estados de filiação biológica e não biológica

Filiação é conceito relacional; é a relação de parentesco que se estabeleceentre duas pessoas, uma das quais é considerada filha da outra (pai ou mãe).O estado de filiação é a qualificação jurídica dessa relação de parentesco,atribuída a alguém, compreendendo um complexo de direitos e deveres reci-procamente considerados. O filho é titular do estado de filiação, da mesma forma que o pai e a mãe são titulares dos estados de paternidade e de mater-nidade, em relação a ele.

Na doutrina, o estado de filiação não tem merecido o tratamento devido,sem embargo de sua evidente essencialidade, salvo quando se cuida do estado

de fato, na modalidade de posse de estado, ou do reconhecimento voluntárioou forçado. Todavia, são situações que têm por fito comprovar a existência deestado de filiação, quando este seja objeto de dúvida ou litígio.

O estado de filiação constitui-se ope legis ou em razão da posse de estado,por força da convivência familiar (a fortiori, social), consolidada na afetivi-dade. Nesse sentido, a filiação jurídica é sempre de natureza cultural (nãonecessariamente natural), seja ela biológica ou não biológica.

No direito brasileiro atual, com fundamento no art. 227 da Constituiçãoe nos arts. 1.593, 1.596 e 1.597 do Código Civil, consideram-se estados defiliação ope legis :

a) filiação biológica em face de ambos os pais, havida de relação de casa-mento ou da união estável, ou em face do único pai ou mãe biológicos, na família monoparental;

b) filiação não-biológica em face de ambos pais, oriunda de adoção regu-lar; ou em face do pai ou da mãe que adotou exclusivamente o filho; e

c) filiação não-biológica em face do pai que autorizou a inseminação arti-ficial heteróloga.

Nessas hipóteses, a convivência familiar e a afetividade são presumidas,ainda que de fato não ocorram. Se qualquer forma, a convivência familiar e a 

afetividade constroem e consolidam diuturnamente os respectivos estados defiliação, passando a ditar-lhes os contornos. Em qualquer dessas hipóteses, o

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estado de filiação poderá ser substituído, em razão de adoção supervenientedo filho por outros pais.

Os estados de filiação não-biológica referidos nas alíneas b e c são irreversí-veis e invioláveis, não podendo ser contraditados por investigação de paternida-de ou maternidade, com fundamento na origem biológica, que apenas poderá ser objeto de pretensão e ação com fins de tutela de direito da personalidade.

3. Estado de filiação derivado de inseminação artificial heteróloga

 A inseminação artificial heteróloga, prevista no art. 1.597, V, do CódigoCivil, dá-se quando é utilizado sêmen de outro homem, normalmente doa-dor anônimo, e não o do marido, para a fecundação do óvulo da mulher. A lei não exige que o marido seja estéril ou que, por qualquer razão física oupsíquica, não possa procriar. A única exigência é que tenha o marido pre-viamente autorizado a utilização de sêmen estranho ao seu. A lei não exigeque haja autorização escrita, apenas que seja “prévia”, razão porque pode serverbal e comprovada em juízo como tal.

Por linhas invertidas, a tutela legal desse tipo de concepção vem fortalecera natureza fundamentalmente socioafetiva, e não biológica, da filiação e da paternidade. Se o marido autorizou a inseminação artificial heteróloga, nãopoderá negar a paternidade, em razão da origem genética, nem poderá ser

admitida investigação de paternidade, com idêntico fundamento, máximeem se tratando de doadores anônimos.Nos Estados Unidos, o Uniform Parantage Act, de 1973 e 1987, estabelece

que “se, sob a supervisão de um médico habilitado e com o consentimento domarido, a mulher for inseminada artificialmente com sêmen doado por um ou-tro homem, o marido é considerado legalmente como se fosse o pai natural da criança concebida. O consentimento deve ser escrito pelo marido e pela mulher”.Toda a documentação relativa à inseminação será mantida pelo médico responsá-vel, sujeita à inspeção judicial. O Uniform Status of Children of Assisted Conception

 Act , de 1988/1997, estabelece que o dador do sêmen ou do óvulo “não é parente

da criança concebida mediante concepção assistida”3. O art. 311-20 do CódigoCivil francês estabelece que o consentimento dado em procriação medicamenteassistida interdita toda ação de contestação ao estado de filiação decorrente.

Para Maria Helena Diniz, se fosse admitida a impugnação da paternidade,haveria uma paternidade incerta, devido ao segredo profissional médico e aoanonimato do doador do sêmen inoculado na mulher. 4

 A Corte de Cassação italiana já decidiu nessa linha de entendimento, que“o marido que tinha validamente concordado ou manifestado prévio consen-

timento à fecundação heteróloga não tem ação para contestar a paternidadeda criança nascida em decorrência de tal fecundação”. A decisão ressalta a 

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natureza de “pai de direito”, afirmando que o favor veritatis não é um valorabsoluto, pois não pode comprometer posições dotadas de tutela primária 5.

4. Posse do estado de filiação

 A posse do estado de filiação constitui-se quando alguém assume o papelde filho em face daquele ou daqueles que assumem os papéis ou lugares depai ou mãe ou de pais6, tendo ou não entre si vínculos biológicos. A posse deestado é a exteriorização da convivência familiar e da afetividade, segundo ascaracterísticas adiante expostas, devendo ser contínua.

Trata-se de conferir à aparência os efeitos de verossimilhança, que o direitoconsidera satisfatória. No direito anterior, a posse do estado de filiação ape-nas era admitida, para fins de prova e suprimento do registro civil, se os paisconvivessem em família constituída pelo casamento, ou seja, para a filiaçãoconsiderada legítima. Em virtude do art. 226 da Constituição Federal, outrasentidades familiares como a união estável e a família monoparental podemservir de fundamento para a posse do estado de filiação.

 Ainda que mantenha a redação do Código Civil de 1916, o art. 1.605 doCódigo Civil de 2002, por seu enunciado genérico, abrange todas as hipóte-ses existenciais que se apresentam nos arranjos familiares de posse de estadode filiação, ante a falta ou defeito do termo de nascimento. Essa norma não

se refere nem poderia se referir à origem biológica, bastando à aparência dospapéis sociais de pais e filho, “quando houver começo de prova por escrito”ou “quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos”.

 As presunções “veementes” são verificadas em cada caso, dispensando-seoutras provas da situação de fato. O Código brasileiro não indica sequerexemplificadamente, as espécies de presunção, ou a duração, o que nos pareceà orientação melhor. Por seu turno, o Código Civil francês, art. 311-2, na atual redação, apresenta as seguintes espécies não taxativas de presunção deestado de filiação, não sendo necessária à reunião delas:

a) quando o indivíduo porta o nome de seus pais;

b) quando os pais o tratam como seu filho, e este àqueles como seus pais;c) quando os pais provêem sua educação e seu sustento;d) quando ele é assim reconhecido pela sociedade e pela família;e) quando a autoridade pública o considere como tal.Na experiência brasileira, configuram posse de estado de filiação a adoção

de fato, em que muitas vezes se converte a guarda, os filhos de criação e a chamada “adoção à brasileira”.

Essa reconfiguração da posse do estado de filiação, no sentido do “nasci-mento da verdade sociológica” (dizemos socioafetiva), de um conteúdo afe-

tivo e social profundo, cuja ruptura prejudicaria o interesse do filho, foi bemdestacada na doutrina estrangeira:

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Ninguém estranharia que o conceito de posse de estado ganhasse um con-teúdo particular e dirigido à finalidade de que se trata. Em vez de um índice

de filiação biológica ela serviria para consolidar um vínculo meramente afec-tivo, sociológico, para exprimir a criação de uma família cuja estabilidade a lei resolveria proteger no interesso do filho e no interesse social.7

5. “Adoção à brasileira” e a verdade do registro civil

Questão delicada diz respeito ao que se convencionou chamar de “adoção à brasileira”. Dá-se com declaração falsa e consciente de paternidade e materni-dade de criança nascida de outra mulher, casada ou não, sem observância dasexigências legais para adoção. O declarante ou declarantes são movidos porintuito generoso e elevado de integrar a criança à sua família, como se a tives-sem gerado. Contrariamente à lei, a sociedade não repele tal conduta; exalça-a. Nessas hipóteses, ainda que de forma ilegal, atende-se ao mandamentocontido no art. 227 da Constituição, de ser dever da família, da sociedade edo Estado assegurar à criança o direito “à convivência familiar”, com “absolu-ta prioridade”, devendo tal circunstância ser levado em conta pelo aplicador,ante o conflito entre valores normativos (de um lado o atendimento à regra matriz de prioridade da convivência familiar, de outro lado os procedimentoslegais para que tal se dê, que não foram atendidos). Outrossim, a invalidade

do registro assim obtido não pode ser considerada quando atingir o estado defiliação, por longos anos estabilizados na convivência familiares. Alerta João Baptista Villela que se o registro diz que B é filho de A e A não

é efetivamente o procriador genético de B, o registro não conteria necessaria-mente uma falsidade, pois ele é o espelho das relações sociais de parentesco. Na Constituição se colheriam o compromisso da República Federativa do Brasilcom a solidariedade, a fraternidade, o bem-estar, a segurança, a liberdade, etc,estando essas opções axiológicas muito mais para uma idéia da paternidadefundada no amor e o no serviço do que para a sua submissão aos determinis-mos biológicos.

Verdade e falsidade no registro civil e na biologia têm parâmetros diferen-tes. Um registro é sempre verdadeiro se estiver conciliado com o fato jurídicoque lhe deu origem. E é sempre falso na condição contrária. A chamada verdade biológica, se for o caso de invocá-la ou fazê-la prevalecer, tem umdiverso teatro de operações: o das definições judiciais ou extrajudiciais. Para que chegue ao registro tem de converter-se em fato jurídico, o que, no tocan-te à natureza da filiação, supõe sempre um ato de vontade – pessoa, se for dodeclarante; política, se for da autoridade – e, portanto, um exercício de liber-dade. Um cidadão que comparece espontaneamente a um cartório e registra,

como seu filho, uma vida nova que veio ao mundo, não necessita qualquercomprovação genética para ter sua declaração admitida 8.

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6. Afetividade como direito e dever jurídicos

 A família, tendo desaparecido suas funções tradicionais, no mundo do terliberal burguês, reencontrou-se no fundamento da afetividade, na comunhãode afeto, pouco importando o modelo que adote, inclusive o que se constituientre um pai ou uma mãe e seus filhos. A afetividade, cuidada inicialmentepelos cientistas sociais, pelos educadores, pelos psicólogos, como objeto desuas ciências, entrou nas cogitações dos juristas, que buscam explicar as rela-ções familiares contemporâneas.

O afeto não é fruto da biologia. Os laços de afeto e de solidariedadederivam da convivência familiar e não do sangue. A história do direito à filiação confunde-se com o destino do patrimônio familiar, visceralmenteligado à consangüinidade legítima. Por isso, é a história da lenta emanci-pação dos filhos, da redução progressiva das desigualdades e da reduçãodo quantum despótico, na medida da redução da patrimonialização des-sas relações.

O desafio que se coloca aos juristas, principalmente aos que lidam como direito de família, é a capacidade de ver as pessoas em toda sua dimensãoontológica, a ela subordinando as considerações de caráter biológico ou patri-monial. Impõe-se a materialização dos sujeitos de direitos, que são mais queapenas titulares de bens. A restauração da primazia da pessoa humana, nas

relações civis, é a condição primeira de adequação do direito à realidade sociale aos fundamentos constitucionais.Como diz Eduardo de Oliveira Leite, as indagações doutrinárias mais re-

centes têm insistido, de forma cada vez mais freqüente e firme, que a filiaçãonão é somente fundada sobre os laços de sangue; o vínculo sangüíneo deter-mina, para a grande maioria dos pais, um laço fundado sobre a vontade da aceitação dos filhos. Logo, a vontade individual é a seqüência ou o comple-mento necessário do vínculo biológico9.

Homenageando a filiação socioafetiva, em promissora linha de tendência da jurisprudência brasileira, assim decidiu o Tribunal de Justiça do Paraná:

1. A ação negatória de paternidade é imprescritível, na esteira do enten-dimento consagrado na Súmula nº 149/STF, já que a demanda versa sobre oestado da pessoa, que é emanação do direito da personalidade.

2. No confronto entre a verdade biológica, atestada em exame de DNA, ea verdade socioafetiva, decorrente da denominada ‘’adoção à brasileira’’ (istoé, da situação de um casal ter registrado, com outro nome, menor, como sedeles filho fosse) e que perdura por quase quarenta anos, há de prevalecer à solução que melhor tutele a dignidade da pessoa humana.

3. A paternidade sócio-afetiva, estando baseada na tendência de personi-

ficação do direito civil, vê a família como instrumento de realização do serhumano; aniquilar a pessoa do apelante, apagando-lhe todo o histórico de

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vida e condição social, em razão de aspectos formais inerentes à irregular‘’adoção à brasileira’’, não tutelaria a dignidade humana, nem faria justiça ao

caso concreto, mas, ao contrário, por critérios meramente formais, proteger-se-iam as artimanhas, os ilícitos e as negligências utilizadas em benefício dopróprio apelado10.

7. Fundamentação constitucional e no Código Civil

Encontra-se na Constituição brasileira vários fundamentos do estado defiliação geral, que não se resume à filiação biológica:

Todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º);b) A adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da 

igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º);c) A comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes,

incluindo-se os adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucional-mente protegida (art. 226, § 4º); não é relevante a origem ou existência deoutro pai (genitor)

d) O direito à convivência familiar, e não a origem genética, constituiprioridade absoluta da criança e o do adolescente (art. 227, caput).

e) Impõe-se a todos os membros da família o dever de solidariedade, unscom os outros, dos pais para os filhos, dos filhos para os pais, e todos com

relação aos idosos (arts. 229 e 230).Em suma, a Constituição não oferece qualquer fundamento para a pri-mazia da filiação biológica, pois amplo é seu alcance. A primazia não está na Constituição, mas na interpretação equivocada que tem feito fortuna,como se o paradigma da filiação não tivesse sido transformado. Até mesmono direito anterior, a filiação biológica era nitidamente recortada entre filhoslegítimos e ilegítimos, a demonstrar que a origem genética nunca foi, rigoro-samente, a essência das relações familiares.

O Código Civil reproduziu, em seu art. 1.596, a regra matriz do § 6º do art.227 da Constituição, relativamente à igualdade entre filhos de qualquer natu-

reza, superando o paradigma discriminatório da legitimidade, fundado na con-sangüinidade e na matrimonialidade. Outra norma geral superadora e inclusiva é o art. 1.593, que refere ao parentesco natural ou de “outra origem”11. Uma dasregras especiais mais incisivas, no rumo da superação da consangüinidade, foi oinciso V do art. 1.597, destinado à inseminação heteróloga, antes referida.

8. O critério do melhor interesse do filho para solução do conflito entre filiação

biológica e não-biológica

No que concerne ao estado de filiação, deve-se ter presente que, além domandamento constitucional de absoluta prioridade dos direitos da criança e

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do adolescente (art. 227), a Convenção Internacional dos Direitos da Crian-ça, da ONU, de 1989, passou a integrar o direito interno brasileiro desde

1990. O art. 3.1 da Convenção estabelece que todas as ações relativas aosmenores devem considerar, primordialmente, “o interesse maior da criança”,abrangente do que a lei brasileira (ECA) considera adolescente. Por força da convenção deve ser garantida uma ampla proteção ao menor, constituindo a conclusão de esforços, em escala mundial, no sentido de fortalecimento desua situação jurídica, eliminando as diferenças entre filhos legítimos e ilegí-timos (art. 18) e atribuindo aos pais, conjuntamente, a tarefa de cuidar da educação e do desenvolvimento.

O princípio não é uma recomendação ética, mas diretriz determinante nasrelações da criança e do adolescente com seus pais, com sua família, com a sociedade e com o Estado. A aplicação da lei deve sempre realizar o princípio,consagrado, segundo Luiz Edson Fachin como “critério significativo na deci-são e na aplicação da lei”, tutelando-se os filhos como seres prioritários 12. Odesafio é converter a população infanto-juvenil em sujeitos de direito, “deixarde ser tratada como objeto passivo, passando a ser, como os adultos, titular dedireitos juridicamente protegidos”.13 O princípio está consagrado nos arts. 4°e 6° da Lei n. 8.069, de 1990 (ECA).

O princípio é um reflexo do caráter integral da doutrina dos direitos da criança e da estreita relação com a doutrina dos direitos humanos em geral.

 Assim, segundo a natureza dos princípios, não há supremacia de um sobreoutro ou outros, devendo a eventual colisão resolver-se pelo balanceamentodos interesses, no caso concreto. Nesse sentido, diz Miguel Cillero Brruñolque sendo as crianças partes da humanidade, “e seus direitos não se exerçamseparada ou contrariamente ao de outras pessoas, o princípio não está formu-lado em termos absolutos, mas que o interesse superior da criança é conside-rado como uma ‘consideração primordial’. O princípio é de prioridade e nãode exclusão de outros direitos ou interesses”. De outro ângulo, além de servirde regra de interpretação e de resolução de conflitos entre direitos, deve-seressaltar que “nem o interesse dos pais, nem o do Estado pode se considerado

o único interesse relevante para a satisfação dos direitos da criança” 14.Valério Pocar e Paola Ronfani15 utilizam interessante figura de imagem

para ilustrar a transformação do papel do filho na família: em lugar da cons-trução piramidal e hierárquica, na qual o menor ocupava a escala mais bai-xa, tem-se a imagem de círculo, em cujo centro foi colocado o filho, e cuja circunferência é desenhada pelas recíprocas relações com seus genitores, quegiram em torno daquele centro. Nos anos mais recentes, parece que uma outra configuração de família relacional está se delineando, em forma estelar,que tem ao centro o menor, sobre o qual convergem relações tanto de tipo

biológico quanto de tipo social, com os seus dois genitores em conjunto ouseparadamente, inclusive nas crises e separações conjugais.

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O princípio inverte a ordem de prioridade: antes no conflito entre a filia-ção biológica e a não-biológica ou socioafetiva, resultante de posse de estado

de filiação, a prática do direito tendia para a primeira, enxergando o interessedos pais biológicos como determinantes, e raramente contemplando os dofilho. De certa forma, condizia com a idéia de poder dos pais sobre os filhose da hegemonia da consangüinidade-legitimidade. Menos que sujeito, o filhoera objeto da disputa. O princípio impõe a predominância do interesse dofilho, que norteará o julgador, o qual, ante o caso concreto, decidirá se a reali-zação pessoal do menor estará assegurada entre os pais biológicos ou entre ospais não-biológicos. De toda forma, deve ser ponderada a convivência fami-liar, constitutiva da posse do estado de filiação, pois ela é prioridade absoluta da criança e do adolescente (art. 227, da Constituição Federal).

9. Pater is est – redirecionando da legitimidade para o estado de filiação em geral

 A mudança do direito de família, da legitimidade para o plano da afetivi-dade, redireciona a função tradicional da presunção pater is est. Destarte, sua função deixa de ser a de presumir a legitimidade do filho, em razão da origemmatrimonial, para a de presumir a paternidade em razão do estado de filia-ção, independentemente de sua origem ou de sua concepção. A presunção da concepção relaciona-se ao nascimento, devendo este prevalecer.

Essa é a orientação adotada em legislações que recentemente alteraram odireito de filiação, privilegiando o nascimento em detrimento da concepção,como a da Alemanha (1997), segundo a qual se um homem for casado coma mãe no momento do nascimento da criança, então ele é pai da criança semque deva haver outros requisitos. Deixaram de existir as presunções de coa-bitação e concepção. É decisiva somente a época de nascimento da criança.O homem casado com a mãe na época do nascimento é o pai mesmo quea criança tenha nascido durante a união conjugal, mas sido gerada antes docasamento. Ao contrário do § 1.591 al. 1 frase 2 BGB aF, ele é pai até mes-mo se, conforme as circunstâncias, seja obviamente impossível que a mulher

tenha concebido dele16. A contestação ou impugnação da paternidade são direitos personalíssi-

mos, que radicam exclusivamente na iniciativa do marido da mãe. Ninguém,nem mesmo o filho ou a mãe, poderá impugnar a paternidade. O art. 1.601do Código Civil, assim lido em conformidade com a Constituição, desloca a paternidade da origem biológica para o estado de filiação, de qualquer ori-gem. Note-se que o artigo equivalente do Código Civil de 1916 referia-se à contestação da legitimidade dos filhos e não da paternidade, em si. Por sua vez, a legitimidade dos filhos fundava-se em dois fatores conjuntos, a saber,

na família constituída pelo casamento (matrimonializada) e em terem-se ori-ginado biologicamente do marido da mãe.

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 A presunção pater is est reconfigura-se no estado de filiação, que decorreda construção progressiva da relação afetiva, na convivência familiar. Antes,

presumia-se pai biológico o marido da mãe. Segundo Anne Lefebvre Teillard,citada por João Baptista Villela, o adágio pater is est atuou, por séculos, man-tendo fortemente amarrado “o biológico ao institucional”, além de estar an-corado no pressuposto da fidelidade da mulher. Hoje, presume-se pai omarido da mãe que age e se apresenta como pai, independentemente de tersido ou não o procriador. Como ressalta Villela 17, no processo de refinamen-to cultural do matrimônio constitui traço fundamental o encapsulamentoda vida íntima na esfera interna da família. Assim, atribuir a paternidade aomarido da mulher não significa proclamar uma derivação biológica. (...) A família não tem deveres de exatidão biológica perante a sociedade, pelo que,se a mulher prevarica e pare um filho que não foi gerado pelo seu marido,isso, tendencialmente, é matéria da economia interna da família. Pode ser umgrave problema para o casal. Como pode não ser problema.

O pai biológico não tem ação contra o pai não-biológico, marido da mãe,para impugnar sua paternidade. Apenas o marido pode impugnar a pater-nidade quando a constatação da origem genética diferente da sua provocara ruptura da relação paternidade-filiação. Se, apesar desse fato, forem maisfortes a paternidade afetiva e o melhor interesse do filho, enquanto menor,nenhuma pessoa ou mesmo o Estado poderão impugná-la para fazer valer a 

paternidade biológica, sem quebra da ordem constitucional e do sistema doCódigo Civil.

10. Sobre a imprescritibilidade do exercício da contestação da paternidade e da

impugnação do estado de filiação

O Código Civil de 1916 estabelecia prazos prescritíveis curtos para queo marido da mãe pudesse contestar a paternidade, sendo de dois meses a partir do parto, se estivesse presente, e de três meses, se esteve ausente. A finalidade da lei era afirmar a presunção pater is est, no sentido de tutelar

a família legítima, pois apenas admitia essa exceção para impugná-la, desdeque a pretensão se exercesse em prazo curto. Sustentou-se na doutrina e na 

 jurisprudência que tais prazos eram decadenciais ou preclusivos, atingindonão apenas a pretensão, mas o próprio direito, e não apenas prescritíveis. OCódigo Civil de 2002 adotou orientação totalmente oposta e problemática,optando pela imprescritibilidade.

O marido da mãe, e somente ele, poderá a qualquer tempo impugnar a paternidade derivada da presunção pater is est. Provavelmente, o que moti-vou o legislador foi à orientação adotada no direito brasileiro de serem im-

prescritíveis as pretensões relativas ao estado das pessoas. Todavia, ainda queimprescritível, a pretensão de impugnação não poderá ser exercida se fundada 

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apenas na origem genética, em aberto conflito com o estado de filiação já constituído. Em outras palavras, para que possa ser impugnada a paternida-

de, independentemente do tempo de seu exercício, terá o marido da mãe queprovar não ser o genitor, no sentido biológico (por exemplo, com resultadode exame de DNA) e, por esta razão, não ter sido constituído o estado defiliação, de natureza socioafetiva; e se foi o próprio declarante perante o regis-tro de nascimento, comprovar que teria agido induzido em erro ou em razãode dolo ou coação.

 A família, seja ela de que origem for, é protegida pelo Estado e por sua ordem jurídica (art. 226 da Constituição). Se a exclusividade da prova deinexistência de origem biológica pudesse ser considerada suficiente para oexercício da impugnação da paternidade, anos ou décadas depois de esta serrealizada e não questionada, na consolidação dos recíprocos laços de afetivi-dade, com a inevitável implosão da família assim constituída, estar-se-ia ne-gando a norma constitucional de proteção da família, para atender impulsos,alterações de sentimentos ou decisões arbitrárias do pai.

Pelos fundamentos jurídicos que informam o atual regime brasileiro da paternidade, o exercício imprescritível da impugnação pelo marido da mãedepende da demonstração, além da inexistência da origem biológica, de quenunca tenha sido constituído o estado de filiação.

O argumento, tantas vezes manejado, da possível derrogação do art 362

do Código Civil de 1916 (estabelecia prazo decadencial de quatro anos para o filho impugnar o reconhecimento da paternidade, quando atingisse a maio-ridade), pelo art. 27 do Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA 18, perdeua consistência, pois o Código Civil de 2002 repetiu o mesmo conteúdo nor-mativo anterior.19 Em verdade, as duas normas são harmônicas, cuidando dematérias distintas. O art. 27 do ECA assegura o caráter de direito persona-líssimo “ao reconhecimento do estado de filiação” dos filhos havidos fora docasamento, qualquer que seja a origem (art. 26), ou seja, daqueles que ainda não tenham sido reconhecidos por ambos ou por um dos pais. O art. 1.614do Código Civil de 2002, ao contrário, disciplina a preservação do estado de

filiação dos que já foram reconhecidos, conforme consta do registro. Portan-to, o art. 27 do ECA nunca permitiu a impugnação do estado de filiação dosque já se encontravam reconhecidos, contra o qual só pode haver impugna-ção do próprio pai (art. 1.601) ou do filho, no prazo de quatro anos após a maioridade (art. 1.614).

11. Afinal qual é a verdade real da filiação?

 A verdade biológica nem sempre é a verdade real da filiação. O direito

deu um salto à frente do dado da natureza, construindo a filiação jurídica com outros elementos. A verdade real da filiação surge na dimensão cultural,

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social e afetiva, donde emerge o estado de filiação efetivamente constituído.Como já vimos, tanto o estado de filiação ope legis quanto à posse de estado

de filiação podem ter origem biológica ou não.Para o registro do filho, o declarante não precisa fazer prova da origem

biológica; nem seria obrigado a fazê-lo, pois impediria a filiação de outra natureza. O registro produz uma presunção de filiação quase absoluta, poisapenas pode ser invalidado se provar que houve erro ou falsidade (art. 1.604do Código Civil). A declaração do nascimento do filho, feita pelo pai, é ir-revogável. Ao pai cabe apenas o direito de contestar a paternidade, se provar,conjuntamente, que esta não se constituiu por não ter sido o genitor biológi-co e não ter havido estado de filiação estável.

Como diz Gerard Cornu, a verdade biológica não reina absoluta sobre odireito da filiação, porque esta incorpora, necessariamente, um conjunto deoutros interesses e valores. Para ele, confundir verdade real da filiação comverdade biológica, é um entendimento “reducionista, cego, demagógico edecepcionante”, engendrando “um direito biológico totalitário, além de umpseudo-direito subjetivo ilusório e nefasto”. 20

Esclarece João Baptista Villela que o registro não exprime um evento bio-lógico, pois compete ao oficial recolher uma manifestação de vontade. Eleexprime um acontecimento jurídico.

 A qualificação da paternidade ou a omissão dela dependerá, de um modo

ou de outro, de um fato do direito: estar ou não casada à mãe, sentença queestabeleça ou desconstitua a paternidade, reconhecimento voluntário, etc. Aoregistro não interessa a história natural das pessoas, senão apenas sua história 

 jurídica. Mesmo que a história jurídica tenha sido condicionada pela história natural, o que revela o registro é aquela e não esta 21.

Na Jornada de Direito Civil, levada a efeito no Superior Tribunal de Jus-tiça, nos dias 11 a 13 de junho de 2002, aprovou-se proposição no sentidode que “no fato jurídico do nascimento, mencionado no art. 1.603, compre-ende-se, à luz do disposto no art. 1.593, a filiação consangüínea e também a socioafetiva”.

Não pode o autor da declaração falsa vindicar a invalidade do registro donascimento, conscientemente assumida, porque violaria o princípio assenta-do em nosso sistema jurídico de venire contra factum proprium nulli conce-ditur. Sem razão o Tribunal de Justiça de São Paulo (AC 130.334-4 – Marília – 1ª CDPriv – Rel. Des. Guimarães e Souza – 14.12.1999), ao decidir que a existência de vício do ato jurídico pode ser alegada a qualquer tempo até mes-mo pelo autor da falsidade. A contestação, nesse caso, terá de estar fundada em hipótese de invalidade dos atos jurídicos, que o direito acolhe, tais comoerro, dolo, coação. Na dúvida deve prevalecer o estado de filiação socioafeti-

va, consolidada na convivência familiar, considerada prioridade absoluta emfavor da criança pelo art. 227 da Constituição Federal.

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No contexto atual, em conformidade com a Constituição Federal, o art.1.604 do Código Civil reforça a primazia do estado de filiação sobre a origem

genética. Nesse sentido, a norma deve ser interpretada em consonância com osartigos 1.596, 1.597, 1.601 e 1.614, todos do Código Civil. É quase absoluta a presunção da filiação derivada do registro do nascimento, pois apenas é afastada nas hipóteses de erro ou falsidade, não sendo admissível qualquer outro funda-mento. O registro do nascimento é a prova capital do nascimento e da filiaçãomaterna e paterna. No caso do pai, reforça a presunção pater is est. Não é total-mente absoluta porque pode ser retificada, por decisão judicial, ou invalidada em virtude de prova de erro ou falsidade. A norma é cogente ao proclamar queninguém poderá vindicar estado contrário ao que resulta do registro do nasci-mento. Refere ao estado de filiação e aos decorrentes estados de paternidade ematernidade. A vedação alcança qualquer pessoa, incluindo o registrado e aspessoas que constam como seus pais. No Código Civil de 1916 a norma equi-valente (art. 348) tinha por fito a proteção da família legítima, que não deveria ser perturbada com dúvidas sobre a paternidade atribuída ao marido da mãe. A norma atual, no contexto legal inaugurado pela Constituição Federal, contem-pla a proteção do estado de filiação e paternidade, retratada no registro.

12. Direito à origem genética como direito da personalidade, sem vínculo com o

estado de filiação

O estado de filiação, que decorre da estabilidade dos laços afetivos cons-truídos no cotidiano de pai e filho, constitui fundamento essencial da atri-buição de paternidade ou maternidade. Nada tem a ver com o direito de cada pessoa ao conhecimento de sua origem genética. São duas situações distintas,tendo a primeira natureza de direito de família e a segunda de direito da per-sonalidade. As normas de regência e os efeitos jurídicos não se confundemnem se interpenetram.

Para garantir a tutela do direito da personalidade não há necessidade de in-vestigar a paternidade. O objeto da tutela do direito ao conhecimento da ori-

gem genética é assegurar o direito da personalidade, na espécie direito à vida,pois os dados da ciência atual apontam para necessidade de cada indivíduo sa-ber a história de saúde de seus parentes biológicos próximos para prevenção da própria vida. Não há necessidade de se atribuir à paternidade a alguém para seter o direito da personalidade de conhecer, por exemplo, os ascendentes bioló-gicos paternos do que foi gerado por doador anônimo de sêmen, ou do que foiadotado, ou do que foi concebido por inseminação artificial heteróloga. Sãoexemplos como esses que demonstram o equivoco em que laboram decisõesque confundem investigação da paternidade com direito à origem genética.

Em contrapartida, toda pessoa humana tem direito inalienável ao estadode filiação, quando não o tenha. Apenas nessa hipótese, a origem biológica 

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desempenha papel relevante no campo do direito de família, como funda-mento do reconhecimento da paternidade ou da maternidade, cujos laços

não se tenham constituído de outro modo (adoção, inseminação artificialheteróloga ou posse de estado). É inadmissível que sirva de base para vindicarnovo estado de filiação, contrariando o já existente.

Como já tivemos oportunidade de afirmar alhures22, a evolução do direitoconduz à distinção, que já se impõe, entre pai e genitor ou procriador. Pai é oque cria. Genitor é o que gera. Esses conceitos estiveram reunidos, enquantohouve primazia da função biológica da família. Ao ser humano, concebidofora da comunhão familiar dos pais socioafetivos, e que já desfruta do estadode filiação, deve ser assegurado o conhecimento de sua origem genética, ouda própria ascendência, como direito geral da personalidade, como decidiu oTribunal Constitucional alemão em 1997, mas sem relação de parentesco ouefeitos de direito de família tout court 23. Nesse sentido, dispõe a lei francesa nº 2002-93, de 22 de janeiro de 2002, sobre o acesso às origens das pessoasadotadas e dos “pupilos do Estado” (filhos de pais desconhecidos ou que per-deram o poder familiar, enquanto aguardam inserção em família substituta).

 A lei francesa tem por fito a necessidade das informações sobre a sanidade,identidade e as condições genéticas básicas, no interesse dos menores, para que possam utilizá-los, principalmente quando adquirirem a maioridade, oude seus descendentes, para fins de saúde pública e dos próprios, sem qual-

quer finalidade de parentesco legal. O Direito espanhol, ao admitir excep-cionalmente a revelação da identidade do doador do material fecundante,expressamente exclui qualquer tipo de direito alimentar ou sucessório entre oindivíduo concebido e o genitor biológico.

Toda pessoa tem direito fundamental, na espécie direito da personalidade,de vindicar sua origem biológica para que, identificando seus ascendentes ge-néticos, possa adotar medidas preventivas para preservação da saúde e, a for-tiori, da vida. Esse direito é individual, personalíssimo, não dependendo deser inserido em relação de família para ser tutelado ou protegido. Uma coisa é vindicar a origem genética, outra a investigação da paternidade. A paterni-

dade deriva do estado de filiação, independentemente da origem (biológica ou não). O avanço da biotecnologia permite, por exemplo, a inseminaçãoartificial heteróloga, autorizada pelo marido (art. 1.597, V, do Código Civil),o que reforça a tese de não depender a filiação da relação genética do filho edo pai. Nesse caso, o filho pode vindicar os dados genéticos de doador anô-nimo de sêmen que constem dos arquivos da instituição que o armazenou,para fins de direito da personalidade, mas não poderá fazê-lo com escopo deatribuição de paternidade. Conseqüentemente, é inadequado o uso da açãode investigação de paternidade, para tal fim.

Os desenvolvimentos científicos, que tendem a um grau elevadíssimo decerteza da origem genética, pouco contribuem para clarear a relação entre pais

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e filho, pois a imputação da paternidade biológica não determina a paternida-de jurídica. O biodireito depara-se com as conseqüências da dação anônima 

de sêmen humano ou de material genético feminino. Nenhuma legislaçãoaté agora editada, nenhuma conclusão da bioética, apontam para atribuir a paternidade aos que fazem dação anônima de sêmen aos chamados bancos desêmen de instituições especializadas ou hospitalares. Em suma, a identidadegenética não se confunde com a identidade da filiação, tecida na complexidadedas relações afetivas, que o ser humano constrói entre a liberdade e o desejo.

13. Conclusão

O direito à filiação não é somente um direito da verdade. É, também, emparte, um direito da vida, do interesse da criança, da paz das famílias, das afei-ções, dos sentimentos morais, da ordem estabelecida, do tempo que passa (...)24

No estágio em que se encontram as relações familiares no Brasil, ante a evolução do direito, do conhecimento científico e cultural e dos valores sociais,não se pode confundir estado de filiação e origem biológica. Esta não mais de-termina aquele, pois desapareceram os pressupostos que a fundamentavam, a saber, a exclusividade da família matrimonializada, a legitimidade da filiação, ointeresse prevalecente dos pais, a paz doméstica e as repercussões patrimoniais.

O estado de filiação é gênero, do qual são espécies a filiação biológica e a 

filiação não biológica. Ainda que ele derive, na grande maioria dos casos, dofato biológico, por força da natureza humana, outros fatos o determinam,a saber, a adoção, a posse do estado de filiação e a inseminação artificialheteróloga. Assim, para abranger todo o universo de situações existenciaisreconhecidas pelo direito, o estado de filiação tem necessariamente natureza cultural (ou socioafetiva).

 A origem biológica presume o estado de filiação, ainda não constituído,independentemente de comprovação de convivência familiar. Neste sentido,a investigação da origem biológica exerce papel fundamental para atribuiçãoda paternidade ou maternidade e, a fortiori, do estado de filiação, quando

ainda não constituído. Todavia, na hipótese de estado de filiação não bioló-gica já constituído na convivência familiar duradoura, comprovado no casoconcreto, a origem biológica não prevalecerá. Em outras palavras, a origembiológica não se poderá contrapor ao estado de filiação já constituído por ou-tras causas e consolidado na convivência familiar (Constituição, art. 227).

O conflito entre pais biológicos e pais não biológicos do filho menor, nãomais se resolve pela primazia dos primeiros ou dos segundos. A solução do con-flito mudou o foco dos interesses, dos pais para os filhos. A Convenção Inter-nacional dos Direitos da Criança, de 1989, com força de lei ordinária no Brasil,

desde 1990, estabelece que todas as ações relativas às crianças devem conside-rar, primordialmente, o melhor interesse da criança, em face dos interesses dos

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8 Notas:

01. Tratado de Direito Privado. Rio deJaneiro: Borsoi, 1971, tomo 7, p. 6.

02. A repersonalização das relaçõesde amília. In: BITTAR: Carlos Alberto(Org.). O direito de amília na Consti-tuição de 1988. São Paulo, Ed. Saraiva,1989, p. 53-82; O Exame de DNA e oPrincípio da Dignidade da Pessoa Hu-mana. Revista Brasileira de Direito deFamília. Porto Alegre, ano I, nº 1, p. 67-78, abr./jun. 1999; Princípio jurídico daaetividade na fliação. In: PEREIRA, Ro-drigo da Cunha (Org.). Anais do II Con-gresso Brasileiro de Direito de Família:A amília na travessia do milênio. BeloHorizonte: OAB-MG/IBDFAM, 2000, p.245-54; Código Civil Comentado:Direitode Família. Relações de Parentesco. Di-

reito Patrimonial. In: AZEVEDO, ÁlvaroVillaça (Org.). Código Civil Comentado.,São Paulo: Atlas, 2003, vol. XVI.

03. C. transcrição de WADLINGTON,Walter; O’BRIEN. Family law statutes,international conventions and uniormlaws. New York: Foundation Press,2000, p.135 e 148.

04. C. Curso de Direito Civil Brasileiro.São Paulo: Saraiva, 2002, vol. 5, p. 380.

05. C. POCAR, Valerio; RONFANI,Paola. La amiglia e il diritto. Roma:Laterza, 2001, p. 206-7.

06. Sobre o conceito de lugar, comoimportante contribuição da psicanálise,c. PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Família,Direitos Humanos, Psicanálise e inclu-

são social. Revista Brasileira de Direitode Família. Porto Alegre, n. 16, p. 5-11,

 jan./mar. 2003, p. 8): “A partir de LACANe LÉVI-STRAUSS, podemos dizer que a-mília é uma estruturação psíquica emque cada membro ocupa um lugar, umaunção. Lugar de pai, lugar da mãe, lu-gar dos flhos, sem, entretanto, estaremnecessariamente ligados biologica-mente. Tanto é assim, uma questão delugar, que um indivíduo pode ocupar olugar de pai e mãe, sem que seja o paiou a mãe biológicos.”

07. C. OLIVEIRA, Guilherme de. Cri-tério Jurídico da Paternidade. Coimbra:Almedina, 2003, p.445.

08. O modelo constitucional da f-liação: verdade e superstições. RevistaBrasileira de Direito de Família. PortoAlegre: Síntese, nº 2, jul./set. 1999, p.138-9.

09. C. LEITE, Eduardo de Oliveira.Procriações artifciais e o direito. SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 1995, p.203.

10. AC 108.417-9 - 2ª C.Civ. - Ac.20.110 - Rel. Des. Accácio Cambi - unân.- J. 12.12.2001.

11. Para FACHIN, Luiz Edson, “o teordesse novo dispositivo consagra situ-ações jurídicas conhecidas e tambémabre espaço para novas ormulações

 já em construção, especialmente a

socioaetiva cabível em ‘outra origem’”(Comentários ao Novo Código Civil: Dodireito de amília. Do direito pessoal.

pais. Essa norma, inteiramente conforme com a Constituição, foi absorvida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo Código Civil de 2002.

Questão relevante diz respeito ao estado de filiação constituído a partirde fatos ilícitos (por exemplo, seqüestro de criança, falsidade documental,troca consciente de recém-nascidos). Também nessas situações, não haverá automático predomínio da origem biológica, quando o estado de filiaçãoperdurar no tempo. A solução adequada considerará o caso concreto, comfundamento no princípio do melhor interesse da criança que, apesar da re-pulsa ao fato originário, poderá não coincidir com os dos pais biológicos.

Por fim, o direito ao conhecimento da origem genética não significa ne-cessariamente direito à filiação. Sua natureza é de direito da personalidade,de que é titular cada ser humano. A origem genética apenas poderá interferirnas relações de família como meio de prova para reconhecer judicialmentea paternidade ou maternidade, ou para contestá-la, se não houver estado defiliação constituído, nunca para negá-lo.”8

CASO: DIREITOS E DEVERES DECORRENTES DA FILIAÇÃO: O AFETO E APRESENÇA.

“RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS MORAIS.IMPOSSIBILIDADE.

1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, nãorendendo ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de1916 o abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária.

2. Recurso especial conhecido e provido.”

Pode o abandono moral ensejar tutela jurídica?

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0414

Período: 2 a 6 de novembro de 2009.

Quarta Turma

PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. REGISTRO.

Falecido o pai registral e diante da habilitação do recorrente como herdei-ro, em processo de inventário, a filha biológica inventariante ingressou com

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 35

Das relações de parentesco. In: TEIXEI-RA, Sálvio de Figueiredo. Comentáriosao Novo Código Civil. Rio: Forense,2003, Vol. XVIII. p.17).

12. FACHIN, Luiz Edson, Da paterni-dade: relação biológica e aetiva, BeloHorizonte: Del Rey, 1996, p.125.

13. PEREIRA, Tânia da Silva. O prin-cípio do “melhor interesse da criança”:

da teoria à prática. Revista Brasileira deDireito de Família. Porto Alegre, n. 6, p.31-49, jul/set. 2000, p.36.

14. BRUÑOL, Miguel Cillero, Inância,autonomía y derechos: una cuestión deprincipios. Inancia: Boletin del Institu-to Interamericano del Niño – OEA, n.234, p. 1-13, oct. 1997, p.8.

15. POCAR; RONFANI, 2001, op.cit.,p. 207.

16. C. SCHLÜTER, Wilried. CódigoCivil Alemão: Direito de Família.Trad.Elisete Antoniuk. Porto Alegre: Fabris,2002, p. 343.

17. VILLELA, João Baptista. O modeloconstitucional da fliação: verdade e su-perstições. Revista Brasileira de Direito

de Família. Porto Alegre, nº 2, p. 121-142, jul./set. 1999, p. 128.

18. Art. 27. O reconhecimento doestado de fliação é direito personalís-simo, indisponível e imprescritível, po-dendo ser exercitado contra os pais ouseus herdeiros, sem qualquer restrição,observado o segredo de justiça.

19. No STJ, as 3ª e 4ª Turmas, após di-vergências havidas entre elas, convergi-ram para o entendimento de somenteincidir o prazo decadencial previsto noCC-1916, se, quando da vigência do art.27 do ECA, o flho já não havia decaídode seu direito (4 anos posteriores àmaioridade) à impugnação. Todavia,

a Seção de Direito Privado do STJ mu-dou essa orientação decidindo que o“direito do flho de obter a declaraçãode sua real fliação é insuscetível dedecadência”, inclusive para as situaçõesanteriores ao advento do art.27/ECA, epor orça deste e da Constituição (nestecaso, sem dizer qual a norma). Como sevê, conunde “real fliação”com origembiológica. C. Resp 208.788/SP, DJU22.04.2003, p. 232.

20. CORNU, Gerard. Droit Civil: La Fa-mille. 8e. édition. Paris, Montchrestien,2003, p. 324-6.

21. VILLELA, 1999, op. cit., p. 140.22. LÔBO, O exame de DNA e o prin-

cípio da dignidade da pessoa humana,

1999, p. 72.23. C. SCHLÜTER, 2002, op. cit., p. 342.24. CORNU, 2003, op. cit., p. 325.

ação de negativa de paternidade, ao buscar anular o registro de nascimentodo recorrente sob alegação de falsidade ideológica. Anote-se, primeiramen-

te, não haver dúvida sobre o fato de que o de cujus não é o pai biológico dorecorrente. Quanto a isso, dispõe o art. 1.604 do CC/2002 que ninguémpode vindicar estado contrário ao que consta do registro de nascimento, salvoprovando o erro ou a falsidade do registro. Assim, essas exceções só se dãoquando perfeitamente demonstrado que houve vício de consentimento (erro,coação, dolo, fraude ou simulação) quando da declaração do assento de nas-cimento, particularmente a indução ao engano. Contudo, não há falar emerro ou falsidade se o registro de nascimento de filho não biológico decorredo reconhecimento espontâneo de paternidade mediante escritura pública (adoção “à brasileira”), pois, inteirado o pretenso pai de que o filho não é seu,mas movido pelo vínculo socioafetivo e sentimento de nobreza, sua vonta-de, aferida em condições normais de discernimento, está materializada. Há precedente deste Superior Tribunal no sentido de que o reconhecimento depaternidade é válido se refletir a existência duradoura do vínculo socioafetivoentre pai e filho, pois a ausência de vínculo biológico não é fato que, por sisó, revela a falsidade da declaração da vontade consubstanciada no ato dereconhecimento. Dessarte, não dá ensejo à revogação do ato de registro defiliação, por força dos arts. 1.609 e 1.610 do CC/2002, o termo de nasci-mento fundado numa paternidade socioafetiva, sob posse de estado de filho,

com proteção em recentes reformas do Direito contemporâneo, por denotaruma verdadeira filiação registral, portanto, jurídica, porquanto respaldada na livre e consciente intenção de reconhecimento voluntário. Precedente citado:REsp 878.941-DF, DJ 17/9/2007. REsp 709.608-MS, Rel. Min. João Otá-vio de Noronha, julgado em 5/11/2009.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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9 Art. 231. Aquele que se nega a subme-ter-se a exame médico necessário nãopoderá aproveitar-se de sua recusa.

Art. 232. A recusa à perícia médica

ordenada pelo juiz poderá suprir aprova que se pretendia obter com oexame.

AULA 5: INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. ADMIRÁVEL MUNDONOVO: A REPROGENÉTICA NAS RELAÇÕES DE FILIAÇÃO

EMENTA

Fontes das relações familiares: Reprogenética nas relações de filiação. In-seminação artificial homóloga e heteróloga e seus efeitos na investigação depaternidade.

TEXTO OBRIGATÓRIO:

DIAS, Maria Berenice. cap. 21.

 Ação de investigação de paternidade.

CARACTERÍSTICAS:

• Efeito declaratório;• Pedido negatório e afirmativo;

• Efeitos da coisa julgada.• Prova e recusa na realização de exame: interpretação do STF e STJ,em especial diante do texto do Código Civil.9

Reprogenética: art. 1597, Código Civil:

“Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:I – nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a 

convivência conjugal;II – nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução da sociedade

conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o

marido;IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentá-

rios, decorrentes de concepção artificial homóloga;V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia 

autorização do marido.”

Nesses casos, quais os efeitos da verdade biológica, no seio da ação de in-vestigação de paternidade?

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DIREITO DE FAMÍLIA

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10 http://pinaculos.blogspot.com/2007/01/soldado-morto-poder-ser-pai-por.html.

Critérios da parentalidade

• Jurídico;• Genético;• Sócio-afetivo: Lei nº 11.924/09 – sobrenome do padrasto ou madrasta.

CASO

E o que a lei não dá conta de regular? Vejamos o caso abaixo:Soldado morto poderá ser pai por inseminação artificial

 A utilização do esperma de um soldado morto para inseminar uma mulherque ele nunca conheceu foi hoje aprovada por um tribunal israelita, num de-cisão sem precedente, depois de um pedido formal formulado pelos pais domilitar A família do soldado Keivin Cohen, morto em 2002 por um tiro depalestinos, apresentou ao tribunal de Tel Aviv um pedido dando conta do de-sejo (do soldado) de poder fundar uma família”, indicou fonte judicial. Uma amostra do esperma do militar de 20 anos foi conservada pela mãe depois da sua morte e esta iniciou os processos judiciais para poder inseminá-lo, embora osoldado nunca tenha manifestado essa intenção. “Todas as vezes que eu visito a 

sua campa e lhe toco, recordo como é maravilhoso poder pegar numa criança”,declarou a mãe, Rachel Cohen, à cadeia de televisão Channel 10. Cohen contouque a família lançou um apelo às mulheres e mais de 200 candidatas comunica-ram que aceitavam ser inseminadas. “Há ano e meio que estamos em contactocom uma linda mulher”, que deverá ser a mãe de aluguel, salientou.10

Quem é o pai? Pode haver parentalidade de pré-morto?

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0407

Período: 14 a 18 de setembro de 2009.

Quarta Turma

INVESTIGAÇÃO, PATERNIDADE, EXAME, DNA.

Este Superior Tribunal reiterou o entendimento de que o laudo do examede DNA, mesmo realizado após a confirmação pelo juízoad quem da sentença 

que julgou procedente a ação de investigação de paternidade, é consideradodocumento novo para o fim de ensejar a ação rescisória (art. 485, VII, CPC).Precedentes citados: REsp 189.306-MG, DJ 25/8/2003; REsp 255.077-

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DIREITO DE FAMÍLIA

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MG, DJ 3/5/2004, e REsp 300.084-GO, DJ 6/9/2004. REsp 653.942-MG,Rel. Min. Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do

TJ-AP),  julgado em 15/9/2009.

Informativo nº 0405

Período: 31 de agosto a 4 de setembro de 2009.

Terceira Turma

INVESTIGAÇÃO, PATERNIDADE, POST MORTEM, HERDEIROS, DNA.

Cuida-se de recurso contra o acórdão que julgou procedente o pedido dereconhecimento de paternidade que se deu com base no conjunto probatóriodo processo, marcadamente no depoimento prestado pelo investigante e na oi-tiva das testemunhas por ele arroladas, bem como na prova emprestada recebi-da como documental e concernente a processo investigatório anterior. Sob essequadro, considerou-se a presunção relativa de paternidade que exsurge na recusa injustificada dos herdeiros do investigado de submissão ao exame de DNA. As-sim, a lide nesta ação de investigação de paternidade prende-se à peculiaridadede que os herdeiros do investigado falecido (tal como ele próprio, em ação ante-rior), negaram-se, de forma injustificada, a se submeter ao mencionado exame.

Há também petição atravessada por litisconsorte recorrente pleiteando a con-versão do julgamento desse recurso em diligência, para a realização do examede DNA, outrora veementemente recusado pelos demais recorrentes. Porém,a Turma conheceu do recurso, mas lhe negou provimento ao entendimento deque, diversamente do que pretendem fazer crer os recorrentes, não houve o ale-gado julgamento com base na presunção relativa de paternidade gerada a partirda recusa de se submeterem ao exame pericial pelo método DNA. Em razãoda negativa da produção da prova, o TJ fez preponderar, do conjunto de pro-vas do processo, os depoimentos do investigante e testemunhas, além da prova documental consistente na instrução de processo investigatório anterior. Assim

sendo, a declaração de paternidade reafirmada no acórdão impugnado com basena análise do quadro fático e probatório do processo não pode ser desconsti-tuída em sede de recurso especial. Assim, se o quadro probatório do processoatesta a paternidade, não há por que retardar ainda mais a entrega da prestação

 jurisdicional, notadamente em se tratando de direito subjetivo pretendido porpessoa que se viu privada material e afetivamente de ter um pai ao longo de 66anos, durante os quais enfrentou toda sorte de dificuldades inerentes ao ocaso da dignidade humana. Quanto ao pedido do litisconsorte recorrente, o exame doDNA só pode aproveitar à parte que não deu causa ao obstáculo para sua reali-

zação na fase probatória. Precedente citado: REsp 819.588-MS, DJe 3/4/2009.REsp 1.046.105-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 1º/9/2009.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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AULA 6. ADOÇÃO

EMENTA

 Adoção. Características jurídicas e regime do Estatuto da Criança e do Adolescente. Adoção Internacional.

TEXTO OBRIGATÓRIO

DIAS, Maria Berenice. “Manual do Direito das Famílias”, cap. 26.

CASO

ROLEPLAY: reprodução assistida x adoção.

Determinar os prós e contras jurídicos e sociais de se adotar uma criança,

ou, ao revés, adotar uma prática reprodutiva assistida.

Seguem alguns textos para reflexão e referência, o primeiro do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:

“A adoção é precipuamente um ato de amor.

Outrora tendo como escopo o interesse daqueles que queriam adotar, desdea Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do adolescente, de1990, a adoção passou a ser uma medida protetiva à criança e ao adolescente.Muito mais que os interesses dos adultos envolvidos, é relevante para a lei e para 

o juiz que irá decidi-la se a adoção trará à criança ou adolescente a ser adotadoreais vantagens para seu desenvolvimento físico, educacional, moral e espiritual.Sua finalidade é satisfazer o direito da criança e do adolescente à convivência familiar sadia, direito este previsto no artigo 227 da Constituição Federal.

 A adoção importa o rompimento de todo o vínculo jurídico entre a crian-ça ou adolescente e sua família biológica, de maneira que a mãe e o paibiológicos perdem todos os direitos e deveres em relação àquela e vice-versa (há exceção quando se adota o filho do companheiro ou cônjuge). O registrocivil de nascimento original é cancelado, para a elaboração de outro, onde irá 

constar os nomes daqueles que adotaram, podendo-se até alterar o prenomeda criança ou adolescente.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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 A adoção tem caráter irrevogável, ou seja, aquele vínculo jurídico com a família biológica jamais se restabelece, ainda que aqueles que adotaram vie-

rem a falecer.Por outro lado, a adoção dá à criança ou adolescente adotado todos os

direitos de um filho biológico, inclusive à herança.O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n.º 8.069/90) estabelece

regras e restrições para a adoção, quais sejam:• idade mínima para se adotar é de 21 anos, sendo irrelevante o estado

civil;• o menor a ser adotado deve ter no máximo 18 anos de idade, salvo

quando já convivia com aqueles que o adotarão, caso em que a idadelimite é de 21 anos;

• o adotante (aquele que vai adotar) deve ser pelo menos 16 anos maisvelho que a criança ou adolescente a ser adotado;

• os ascendentes (avós, bisavós) não podem adotar seus descendentes;irmãos também não podem;

• a adoção depende da concordância, perante o juiz e o promotor de justiça, dos pais biológicos, salvo quando forem desconhecidos oudestituídos do pátrio poder (muitas vezes se cumula, no mesmo pro-cesso, o pedido de adoção com o de destituição do pátrio poder dospais biológicos, neste caso devendo-se comprovar que eles não zelaram

pelos direitos da criança ou adolescente envolvido, de acordo com a lei);• tratando-se de adolescente (maior de doze anos), a adoção depende de

seu consentimento expresso;• antes da sentença de adoção, a lei exige que se cumpra um estágio de

convivência entre a criança ou adolescente e os adotantes, por umprazo fixado pelo juiz, o qual pode ser dispensado se a criança tivermenos de um ano de idade ou já estiver na companhia dos adotantespor tempo suficiente.

 Ao contrário do que muitos acreditam, o procedimento para se adotar ésimples e rápido, que na grande maioria das vezes termina em poucos meses(menos que um período gestacional). É salutar que as famílias procurem re-gularizar a situação daquelas crianças ou adolescentes que acolheram e porquais nutrem um sentimento filial.

Vale dizer, registrar filho de terceiro como próprio é crime, previsto noartigo 242, do Código Penal, pena que pode variar de 2 a 6 anos de reclusão.O registro falso será sempre falso, eis que jamais se convalida com o tempo.

Por fim, o processo de adoção implica na intervenção de uma equipe téc-

nica, formada por assistentes sociais e psicólogos, que auxiliará na preparaçãoda família no acolhimento de seu futuro filho ou filha.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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Institutos correlatos: guarda & tutela

 Além da adoção, a lei prevê duas outras formas de acolhimento de uma criança ou adolescente por uma família substituta: a guarda e a tutela. Nestescasos, não se acolhe a criança ou adolescente na condição de filho, mas de pu-pilo ou tutelado. Os vínculos jurídicos com a família biológica são mantidos.

 A guarda implica o dever de ter a criança ou adolescente consigo e prestar-lhe assistência material, moral e educacional, conferindo a seu detentor odireito de opor-se a terceiros, inclusive os pais. Destina-se a regularizar a posse de fato do menor, podendo ser deferida liminarmente nos processos deadoção ou tutela. Fora destes casos, o juiz pode deferir a guarda excepcional-mente para suprir a falta eventual dos pais.

 A tutela implica necessariamente o dever de guarda, somando-se ainda opoder de representar o tutelado nos atos da vida civil e o de administrar seusbens. Diferentemente da guarda, a tutela não coexiste com o pátrio poder,cuja perda (ou ao menos suspensão) deve ser previamente decretada. Normal-mente a medida se aplica à criança ou ao adolescente órfão, cujo referencialcom os pais biológicos falecidos não justifica a adoção pela família substituta que o está acolhendo.

COMO FAZER PARA ADOTAR? 

Brasileiros ou Estrangeiros Residentes no País

Procedimento

 A adoção se dá através de um processo judicial perante o juiz com compe-tência na área da infância e juventude. Aqueles que pretendem adotar devemse dirigir ao juiz da comarca onde residem.

Na Cidade do Rio de Janeiro, a adoção deve ser pleiteada perante a 1.ªVara da Infância e da Juventude, Praça Onze de Junho 403, Praça Onze (es-quina da Av. Presidente Vargas com o Sambódromo).

Vislumbram-se duas hipóteses em que se adota: ou a família já convivecom a criança ou adolescente que pretende adotar, visando legitimar um sen-timento filial já existente, ou a família está a procura de uma criança para quevenha a adotar.

Na primeira hipótese, devem os interessados ajuizar o pedido de adoçãoatravés de advogado ou defensor público, admitindo a Lei n.º 8.069/90 (Es-tatuto da Criança e do Adolescente) que o pedido seja formulado diretamen-te em cartório em petição assinada pelos requerentes, quando os pais foremfalecidos, tiverem sido destituídos do pátrio poder ou houverem aderido ex-

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11 http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/scpro-

0711.ns /e00a7c3c8652b69a83256cca00646ee5/65353aab22d433c832572 00782e74?OpenDocument

pressamente ao pedido. Como dito anteriormente, muitas vezes se cumula,no mesmo processo, o pedido de adoção com o de destituição do pátrio

poder dos pais biológicos, neste caso devendo-se comprovar que eles nãozelaram pelos direitos da criança ou adolescente envolvido, de acordo com a lei. Neste caso, os pais biológicos são citados para, querendo, contestarem opedido, julgando o juiz ao final de acordo com o interesse superior da criança e do adolescente.

Na segunda hipótese, os interessados devem requerer sua inscrição no ca-dastro do juízo de pessoas interessadas em adotar. A partir daí instaura-se umprocedimento no qual serão ouvidos pela equipe técnica do juízo (assistentessociais e/ou psicólogos) e, antes da decisão que deferir a inscrição, o Minis-tério Público dará seu parecer. Na Comarca do Rio de Janeiro, o interessadodeverá procurar a Divisão de Serviço Social – DSS da 1.ª Vara da Infância e da Juventude (2.ª à 6.ª feira, das 09 às 16 horas) para ser orientado sobreos procedimentos de habilitação para adoção. O mesmo será incluído emgrupos de habilitação para adoção, cujas vagas serão preenchidas de acordocom a ordem de ajuizamento do pedido de habilitação, respeitados os cri-térios estabelecidos na Portaria nº 07/2004. Os grupos de habilitação para adoção possuem duração prevista de 60 dias e visam auxiliar os interessadosem adotar. Habilitados e inscritos no cadastro, os interessados recebem umcertificado com validade de 2 anos e com o qual podem se apresentar às

instituições de abrigo ou simplesmente aguardar a indicação de uma criança pela própria DSS. O tempo de espera é bastante variável e está diretamenterelacionado ao perfil da criança desejada. São documentos exigidos para opedido de habilitação:

• carteira de identidade do(s) requerente(s) e CPF;• certidão de casamento ou de nascimento do(s) requerente(s) – se for

o caso;• comprovante de residência do(s) requerente(s);• comprovante de renda do(s) requerente(s);• atestado de sanidade física e mental do(s) requerente(s);

• declaração de idoneidade moral do(s) requerente(s) – apresentado porduas pessoas sem relação de parentesco com o(s) requerente(s).

Os processos de Habilitação para Adoção oriundos de outras comarcasdeverão vir instruídos com os respectivos estudos psicosociais e cópia do Cer-tificado de Habilitação para Adoção.

Salienta-se, uma vez mais, que todo o procedimento é isento de custas.”11

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DIREITO DE FAMÍLIA

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OUTRO TEXTO RELEVANTE – VEJAMOS O SEGUINTE PROJETO DE LEI:

“PROJETO DE LEI Nº 731/2007 – ALERJ.

EMENTA: INSTITUI, NO ÂMBITO ESTADO DO RIO DE JANEI-RO, A POLÍTICA ESTADUAL DE ATENÇÃO INTEGRAL EM REPRO-DUÇÃO HUMANA ASSISTIDA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

 Autor(es): Deputado DR WILSON CABRAL

 A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RESOLVE: Art. 1º Fica instituído, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, a Política 

Estadual de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida. Art. 2° Fica determinado que a Política Estadual de Atenção Integral em

Reprodução Humana Assistida seja implantada de forma articulada entre a Secretaria de Estado de Saúde e as Secretarias Municipais de Saúde, permi-tindo:

I – organizar uma linha de cuidados integrais (promoção, prevenção, tra-tamento e reabilitação) que perpasse todos os níveis de atenção, promoven-

do, dessa forma, a atenção por intermédio de equipe multiprofissional, comatuação interdisciplinar;II – identificar os determinantes e condicionantes dos principais proble-

mas de infertilidade em casais em sua vida fértil, e desenvolver ações transe-toriais de responsabilidade pública, sem excluir as responsabilidades de toda a sociedade;

III – definir critérios técnicos mínimos para o funcionamento, o monito-ramento e a avaliação dos serviços que realizam os procedimentos e técnicasde reprodução humana assistida, necessários à viabilização da concepção, tan-to para casais com infertilidade, como para aqueles que se beneficiem desses

recursos para o controle da transmissão vertical e/ou horizontal de doenças;IV – fomentar, coordenar e executar projetos estratégicos que visem ao

estudo do custo-efetividade, eficácia e qualidade, bem como a incorporaçãotecnológica na área da reprodução humana assistida;

V – promover intercâmbio com outros subsistemas de informações se-toriais, implementando e aperfeiçoando permanentemente a produção dedados e garantindo a democratização das informações; e

VI – qualificar a assistência e promover a educação permanente dos profis-sionais de saúde envolvidos com a implantação e a implementação da Política 

de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 44

 Art. 3º – Fica definido que a Política Estadual de Atenção Integral emReprodução Humana Assistida, de que trata o artigo 1º desta Lei, seja cons-

tituída a partir dos seguintes componentes fundamentais:I – Atenção Básica: é a porta de entrada para a identificação do casal infér-

til e na qual devem ser realizados a anamnese, o exame clínico-ginecológico eum elenco de exames complementares de diagnósticos básicos, afastando-sepatologias, fatores concomitantes e qualquer situação que interfira numa fu-tura gestação e que ponham em risco a vida da mulher ou do feto;

II – Média Complexidade: os serviços de referência de Média Complexi-dade estarão habilitados a atender aos casos encaminhados pela Atenção Bá-sica, realizando acompanhamento psicossocial e os demais procedimentos doelenco deste nível de atenção, e aos quais é facultativa e desejável, a realizaçãode todos os procedimentos diagnósticos e terapêuticos relativos à reproduçãohumana assistida, à exceção dos relacionados à fertilização in vitro; e

III – Alta Complexidade: os serviços de referência de Alta Complexidadeestarão habilitados a atender aos casos encaminhados pela Média Comple-xidade, estando capacitados para realizar todos os procedimentos de Média Complexidade, bem como a fertilização in vitro e a inseminação artificial.

§ 1º A rede de atenção de Média e Alta Complexidade será composta por:a) serviços de referência de Média e Alta Complexidade em reprodução

humana assistida; e

b) serviços de Assistência Especializada – SAE que são de referência emDST/HIV/Aids. Art. 4º A regulamentação suplementar e complementar do disposto nesta 

Lei ficará a cargo do Poder Executivo.Parágrafo Único – Os componentes do caput deste artigo deverão ser re-

gulados por protocolos de conduta, de referência e de contra-referência emtodos os níveis de atenção que permitam o aprimoramento da atenção, da regulação, do controle e da avaliação.

 Art. 5º A capacitação e a educação permanente das equipes de saúde de to-dos os âmbitos da atenção envolvendo os profissionais de nível superior e os

de nível técnico, deverão ser realizadas de acordo com as diretrizes do SUS. Art. 6º – Fica estabelecido que, na definição dos quantitativos e na distri-

buição geográfica dos serviços de saúde que integrarão as Redes de atençãoem Reprodução Humana Assistida, o Poder Executivo deverá observar osseguintes critérios:

a) população a ser atendida;b) necessidade de cobertura assistencial;c) nível de complexidade dos serviços;d) distribuição geográfica dos serviços;

e) capacidade técnica e operacional dos serviços;f ) mecanismos de acesso com os fluxos de referência e contra-referência.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 45

Parágrafo Único – Para a organização dos serviços de atenção em reprodu-ção humana assistida na Média e Alta Complexidade devem ser observados

os quantitativos de serviços, onde a área de cobertura assistencial deve ser de01 (um) serviço para abrangência de no mínimo 6.000.000 de habitantes,para garantir a viabilidade econômica destes serviços;

 Art 7º – As redes para a atenção em reprodução humana assistida serãocompostas por serviços de saúde que contemplem ações de prevenção e recu-peração na Atenção Básica, na Média e Alta Complexidade.

§1º – Entende-se por serviços de referência em reprodução humana assis-tida na Média Complexidade, os serviços que ofereçam atenção diagnóstica e terapêutica especializada, acompanhamento psicossocial, com condiçõestécnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados aoatendimento dos casais com infertilidade, dos portadores de doenças gené-ticas e dos portadores de doenças infecto-contagiosas, em especial os porta-dores do HIV e das Hepatites virais, devendo estar articulados a uma centralde regulação que garanta a integração com o sistema local e regional, com-plementando as ações da Atenção Básica sendo facultativo e desejável a rea-lização, nestes serviços, de histeroscopia diagnóstica, histeroscopia cirúrgica,laparoscopia, microcirurgias, inseminação artificial e avaliação genética.

§2º – Entende-se por serviços de referência em reprodução humana as-sistida na Alta Complexidade, os serviços que ofereçam atenção diagnóstica 

e terapêutica especializada, acompanhamento psicossocial, com condiçõestécnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados aoatendimento dos casais inférteis, dos portadores de doenças genéticas e dosportadores de doenças infecto-contagiosas, em especial os portadores do HIV e das Hepatites virais, devendo estar articulados a uma central de regulaçãoque garanta a integração com o sistema local e regional, que complementemas ações da Atenção Básica e de Média Complexidade e, que ofereçam todosos procedimentos de Média Complexidade e realizem a fertilização assistida.

 Art. 8º – É considerado infertilidade conjugal, pára os efeitos desta Lei, a ausência de gravidez em um casal com vida sexual ativa, sem uso de medidas

contraceptivas, em um período de 1 ano ou mais.Parágrafo Único – A infertilidade conjugal será classificada em:a) Infertilidade primária: na ausência de gestação prévia.b) Infertilidade secundária: se a falha na capacidade reprodutiva se estabe-

leceu após uma ou mais gestações.c) Esterilidade: incapacidade definitiva em gestar.d) Aborto habitual: ocorrência de três ou mais interrupções espontâneas

consecutivas da gestação até a idade de 20 semanas. Art. 9º – O Poder Executivo remanejará recursos próprios do orçamento

da seguridade social para atender as despesas necessárias a aplicação da pre-sente Lei.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 46

 Art.10 – Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas asdisposições em contrário.“

DEPUTADO DR. WILSON CABRALLÍDER DO PSB

 JUSTIFICATIVA  A presente proposição considera a necessidade de estruturar no Estado do

Rio de Janeiro uma rede de serviços regionalizada e hierarquizada que permi-ta atenção integral em reprodução humana assistida e melhoria do acesso a esse atendimento especializado;

 A assistência em planejamento familiar deve incluir a oferta de todos osmétodos e técnicas para a concepção e a anticoncepção, cientificamente acei-tos, de acordo com a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996, que regula o §7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar;

Segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS e sociedades científi-cas, aproximadamente, 8% a 15% dos casais têm algum problema de infer-tilidade durante sua vida fértil, sendo que a infertilidade se define como a ausência de gravidez após 12 (doze) meses de relações sexuais regulares, semuso de contracepção;

 As técnicas de reprodução humana assistida contribuem para a diminui-ção da transmissão vertical e/ou horizontal de doenças infecto-contagiosas,

genéticas, entre outras, o que fortalece nossa convicção de que o Estado doRio de Janeiro necessita de uma política Estadual de Atenção Integral emReprodução Humana Assistida e que há necessidade de estabelecer mecanis-mos de regulação, fiscalização, controle e avaliação da assistência prestada aosusuários.

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0405

Período: 31 de agosto a 4 de setembro de 2009.

Quarta Turma

 ADOÇÃO, PATERNIDADE, ALIMENTOS.

Cuida-se de ação anulatória de registro público cumulada com investi-gação de paternidade/maternidade e alimentos. Enquanto prestava serviçosdomésticos a uma família, a contratada manteve relacionamento amorosocom o contratante, do qual resultou sua gravidez e o nascimento do ora re-

corrente, que não viu reconhecida sua paternidade. Anote-se que a genitora morreu devido a complicações no parto e o rebento foi acolhido por seus tios

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 47

que, posteriormente, adotaram-no sob o regime de adoção plena do revogadoCódigo de Menores. O conhecimento desse fato pelo recorrente, que deu azo

à propositura da ação, só se deu na adolescência. Contudo, o juízo de pri-meiro grau, sem apreciar o mérito, extinguiu o processo por impossibilidade

 jurídica do pedido. Então, o objeto do especial consiste, exclusivamente, na anulação da sentença e na consequente reabertura da instrução, afastando-sea pecha de impossível impingida aos pleitos. Quanto a isso, a jurisprudên-cia e doutrina mostram-se pacíficas em associar a possibilidade jurídica dopedido à ausência de v edação do pleito no ordenamento jurídico, daí que odecreto de carência da ação não deve subsistir. Muito embora caiba cogitara impossibilidade jurídica do pedido de anulação do registro, ao consideraros comandos insertos no art. 37 do Código de Menores vigente à época da adoção do recorrente e hoje melhor traduzido pelo constante no art. 48 doECA, ambos os quais determinam a irrevogabilidade da adoção, mostram-sesem vedação no ordenamento jurídico os demais pedidos feitos na inicial (a investigação de paternidade/maternidade e os alimentos). Antes de vedar, oordenamento até expressamente autoriza o pleito investigatório, conforme seextrai do teor do art. 27 do ECA. Vale ressaltar que este Superior Tribunal

 já firmou, numa interpretação sistemática e teleológica dos arts. 27, 41 e 48do ECA, que o adotado pode, a qualquer tempo, ver reconhecida a verdadebiológica referente à sua filiação. Já quanto ao pedido de alimentos, não há 

também vedação legal a, no caso, impedir sua apreciação, mesmo considera-da a irrevogabilidade da adoção do alimentando, tal qual já decidiu o STJ emassemelhado caso. Assim, há que devolver os autos à primeira instância para prosseguir o andamento do feito. Precedentes citados: REsp 254.417-MG,DJe 2/2/2009; REsp 127. 541-RS, DJ 28/8/2000, e REsp 813. 604-SC, DJ27/10/2006. REsp 220.623-SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em3/9/2009.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 48

AULA 7. FAMÍLIA HOMOSSEXUAL?

EMENTA

Família homossexual. Visões da jurisprudência. Efeitos da sociedade entreduas pessoas de mesmo sexo.

TEXTOS OBRIGATÓRIOS

DIAS, Maria Berenice – op. cit, cap. 12.ROUDINESCO, Elisabeth “Família em Desordem”, cap. 8, “a família do

futuro.”

 A condição constitucional do homossexual 

É evidente que a dignidade, da pessoa humana, consolidada nos art. 3º e5º da Constituição da República, autoriza plenamente as opções sexuais. Masexiste alguma relação entre opção sexual e família?

Visões da jurisprudência

Vejamos as seguintes decisões:

“PROCESSO CIVIL E CIVIL – PREQUESTIONAMENTO – AUSÊN-CIA – SÚMULA 282/STF – UNIÃO HOMOAFETIVA – INSCRIÇÃODE PARCEIRO EM PLANO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA – POSSIBI-LIDADE – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO-CONFIGU-RADA. – Se o dispositivo legal supostamente violado não foi discutido na 

formação do acórdão, não se conhece do recurso especial, à míngua deprequestionamento.

– A relação homoafetiva gera direitos e, analogicamente à união estável,permite a inclusão do companheiro dependente em plano de assistência médica. – O homossexual não é cidadão de segunda categoria. A opção oucondição sexual não diminui direitos e, muito menos, a dignidade da pes-soa humana. – Para configuração da divergência jurisprudencial é necessárioconfronto analítico, para evidenciar semelhança e simetria entre os arestosconfrontados. Simples transcrição de ementas não basta.”

(STJ, REsp 238715 / RS, REL. Ministro HUMBERTO GOMES DEBARROS)

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 49

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DISSOLUÇÃO DE SO-CIEDADE DE FATO.

HOMOSSEXUAIS. HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO. COMPE-TÊNCIA. VARA CÍVEL.

EXISTÊNCIA DE FILHO DE UMA DAS PARTES. GUARDA ERESPONSABILIDADE. IRRELEVÂNCIA. 1. A primeira condição quese impõe à existência da união estável é a dualidade de sexos. A união en-tre homossexuais juridicamente não existe nem pelo casamento, nem pela união estável, mas pode configurar sociedade de fato, cuja dissolução assu-me contornos econômicos, resultantes da divisão do patrimônio comum,com incidência do Direito das Obrigações. 2. A existência de filho de uma das integrantes da sociedade amigavelmente dissolvida, não desloca o eixodo problema para o âmbito do Direito de Família, uma vez que a guarda eresponsabilidade pelo menor permanece com a mãe, constante do registro,anotando o termo de acordo apenas que, na sua falta, à outra caberá aquelemunus, sem questionamento por parte dos familiares. 3. Neste caso, porquenão violados os dispositivos invocados – arts. 1º e 9º da Lei 9.278 de 1996, a homologação está afeta à vara cível e não à vara de família. 4. Recurso especialnão conhecido.”

(STJ, REsp 502995 / RN, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES)

Como visto, não há admissão propriamente da figura da “família entrepessoas do mesmo sexo”, conquanto sejam extendidos alguns efeitos.

Projeto de lei 

“Lei: PROJETO DE LEI N.º 1.151, DE 1995

Disciplina a parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo e dá outras providências.

O Congresso Nacional Decreta:

 Art. 1º É assegurado a duas pessoas do mesmo sexo o reconhecimento desua parceria civil registrada, visando à proteção dos direitos à propriedade, à sucessão e aos demais regulados nesta Lei.

 Art. 2º A parceria civil registrada constitui-se mediante registro em livropróprio, nos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais na forma quesegue.

§ 1º Os interessados comparecerão perante os Oficiais de Registro Civil,

apresentando os seguintes documentos:I. – declaração de serem solteiros, viúvos, ou divorciados;

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DIREITO DE FAMÍLIA

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II. – prova de capacidade civil absoluta, mediante apresentação de certi-dão de idade ou prova equivalente;

III. – instrumento público do contrato de parceria civil.§ 2º Após a lavratura do contrato a parceria civil deve ser registrada em

livro próprio no Registro Civil de Pessoas Naturais§ 3º O estado civil dos contratantes não poderá ser alterado na vigência do

contrato de parceria civil registrada. Art. 3º O contrato de parceria registrada será lavrado em Ofício de Notas,

sendo livremente pactuado e versando sobre disposições patrimoniais, deve-res, impedimentos e obrigações mútuas.

§ 1º Somente por disposição expressa no contrato, as regras nele estabele-cidas também serão aplicadas retroativamente, caso tenha havido concorrên-cia para formação de patrimônio comum.

§ 2º São vedadas quaisquer disposições sobre adoção, tutela ou guarda decrianças ou adolescentes em conjunto, mesmo que sejam filhos de um dosparceiros.

 Art. 4º A extinção da parceria registrada ocorrerá: I. – pela morte de umdos contratantes;

II. – mediante decretação judicial;III. – de forma consensual, homologada pelo juiz.

 Art. 5º Qualquer das partes poderá requerer a extinção da parceria re-

gistrada: I. – demonstrando a infração contratual em que se fundamenta opedido;II. – alegando o desinteresse na sua continuidade.Parágrafo único. As partes poderão requerer consensualmente a homolo-

gação judicial da extinção de sua parceria registrada. Art. 6º A sentença que extinguir a parceria registrada conterá a partilha 

dos bens dos interessados, de acordo com o disposto no contrato. Art. 7º É nulo de pleno direito o contrato de parceria registrada feito com

mais de uma pessoa ou quando houver infração ao § 2o do artigo 2o desta Lei.

Parágrafo único. Ocorrendo a infração mencionada no caput, seu autorcomete o crime de falsidade ideológica, sujeitando-se às penas do artigo 299odo Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

 Art. 8º Alteram-se os arts. 29, 33 e 167 da Lei no 6.015, de 31 de dezem-bro de 1973, que passam a vigorar com as seguintes redações:

“Art.29. Serão registrados no registro civil de pessoas naturais (...)IX – os contratos de parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo.

Parágrafo 1o. Serão averbados: (...)g) a sentença que declarar e extinção da parceria civil registrada entre pes-

soas do mesmo sexo. Art. 33. Haverá em cada cartório, os seguintes livros: (...)

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 51

III – E – de registro de contratos de parceria civil registrada entre pessoasdo mesmo sexo.

 Art. 167. No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:I – o registro:(...)

 Art. 35 dos contratos de parceria civil registrada entre pessoas do mesmosexo que versem sobre comunicação patrimonial, nos registros referentes a imóveis ou a direitos reais pertencentes a qualquer das partes, inclusive osadquiridos posteriormente à celebração do contrato.

II – a averbação:(...)

 Art.14 das sentenças de separação judicial, de divórcio, de nulidade ouanulação do casamento e de extinção de parceria civil registrada entre pessoasdo mesmo sexo, quando nas respectivas partilhas existirem imóveis ou direi-tos reais sujeitos a registro.”

 Art. 9. O bem imóvel próprio e comum dos contratantes de parceria civilregistrada entre pessoas do mesmo sexo é impenhorável, nos termos e condi-ções regulados pela lei 8.009, de 29 de março de 1990.

 Art. 10. Registrado o contrato de parceria civil de que trata esta Lei, o parceiroserá considerado beneficiário do Regime Geral de Previdência Social, na condiçãode dependente do segurado. Parágrafo único. A extinção do contrato de parceria 

implica o cancelamento da inscrição a que se refere o caput deste artigo. Art. 11. O parceiro que comprove a parceria civil registrada será conside-rado beneficiário da pensão prevista no art. 217, I, da Lei 8.112, de 11 dedezembro de 1990.

 Art. 12. No âmbito da Administração Pública, os Estados, os Municípiose o Distrito Federal disciplinarão, através de legislação própria, os benefíciosprovidenciarias de seus servidores que mantenham parceria civil registrada com pessoa do mesmo sexo.

 Art. 13. São garantidos aos contratantes de parceria civil registrada compessoa do mesmo sexo, desde a data de sua constituição, os direitos à suces-

são, nas seguintes condições:I. – o parceiro sobrevivente terá direitos, desde que não firme novo con-

trato de parceria civil registrada, ao usufruto da quarta parte dos bens do decujus, se houver filhos desde;

II. – o parceiro sobrevivente terá direito, enquanto não contratar nova parceria civil registrada, ao usufruto da metade dos bens do de cujus, se nãohouver filhos, embora não sobrevivam ascendentes;

III. – na falta de descendentes e ascendentes, o parceiro sobrevivente terá direito à totalidade da herança;

IV. – se os bens deixados pelo autor da herança resultar de atividade em quehaja a colaboração do parceiro terá o sobrevivente direito à metade dos bens.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 52

 Art. 14. O art. 454 da Lei 3071, de 1º de janeiro de 1916, passa a vigoraracrescido de § 3º, com a redação que se segue, passando o atual § 3º a § 4º:

“Art. 454. (...)§ 1º (...)§ 2º (...)§ 3º Havendo parceria civil registrada com pessoa do mesmo sexo, a esta 

se dará a curatela. Art. 15. O art. 113 da Lei 6.815, de agosto de 1980, passa a vigorar com

a seguinte redação:“Art. 113.(...)VI – ter contrato de parceria civil registrada com pessoa de nacionalidade

brasileira.” Art. 16. É reconhecido aos parceiros o direito de composição de rendas

para aquisição da casa própria e todos os direitos relativos a planos de saúdee seguro de grupo.

 Art. 17. Será admitida aos parceiros a inscrição como dependentes para efeitos de legislação tributária.

 Art. 18. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 19. Revogam-se as disposições em contrário.”

Quais seriam os eventuais problemas de constitucionalidade deste projeto?

Efeitos

• Seguros e previdência privada.• Previdência social.• Herança e meação.• Alimentos.

CASO

 ADPF 132, relativa aos funcionários públicos do estado do Rio de Janeiro,assinada pela Proc. Chefe e pelo Governador Sérgio Cabral

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0366

Período: 1º a 5 de setembro de 2008.Quarta Turma

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DIREITO DE FAMÍLIA

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UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA.

Em renovação de julgamento, após voto de desempate do Min. Luís FelipeSalomão, a Turma, por maioria, afastou o impedimento jurídico ao admitira possibilidade jurídica do pedido de reconhecimento de união estável entrehomossexuais. Assim, o mérito do pedido deverá ser analisado pela primeira instância, que irá prosseguir no julgamento anteriormente extinto sem julga-mento de mérito, diante do entendimento da impossibilidade do pedido. OsMinistros Antônio de Pádua Ribeiro e Massami Uyeda votaram a favor da possibilidade jurídica do pedido por entender que a legislação brasileira nãotraz nenhuma proibição ao reconhecimento de união estável entre as pessoasdo mesmo sexo. Já os Ministros Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Ju-nior não reconheciam a possibilidade do pedido por entender que a CF/1988e o CC só consideram união estável a relação entre homem e mulher comobjetivo de formar entidade familiar. REsp 820.475-RJ, Rel. originário Min.

 Antônio de Pádua Ribeiro, Rel. para acórdão Min. Luís Felipe Salomão, jul-gado em 2/9/2008.

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FGV DIREITO RIO 54

BLOCO II DE AULAS

Crise das relações familiares: prevenção e solução. Análise da problemática das relações familiares, com foco tanto no direito

pessoal quanto no direito patrimonial.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 55

AULA 8: PREVENÇÃO DE CONFLITOS E REGIME DE BENS

EMENTA

Prevenção de conflitos familiares: união estável x casamento: escolha doregime de bens. Regimes existentes e conseqüências jurídicas. Pactos antenup-ciais no direito brasileiro. Mudança de regime com o Novo Código Civil.

TEXTO OBRIGATÓRIO

DIAS, Maria Berenice – cap. 14.

Direito patrimonial de família

O direito patrimonial de família compreende a projeção dos efeitos decor-rentes do casamento/união estável sobre o patrimônio dos cônjuges.

Regime de Bens

Os regimes previstos no texto legal são quatro: comunhão universal, co-munhão parcial, separação universal e participação final dos aqüestos.

O Pacto Antenupcial é exigido por alguns regimes vejamos:• Regime da Comunhão Universal – antes da Lei 6.515/74 não exigia o

Pacto. Com o advento da Lei do Divórcio passou a exigir pacto.• Regime da Comunhão Parcial de Bens – antes a Lei do Divórcio exi-

gia pacto; com a LD dispensou-se o pacto.• Regime da Separação Total de Bens – sempre exigiu pacto.• Separação Legal Obrigatória de Bens – nunca exigiu pacto, é imposto

por lei.• Regime Dotal – exigia pacto, hoje não há previsão deste regime no

NCC.• Regime da Participação Final nos Aquestos – exige pacto, previsão

legal somente no NCC.

Realizado o Pacto, este será levado ao Oficial do Registro Civil de Pesso-as Naturais, para vista do MP e do Juiz. Pode-se estipular no pacto os bensque se comunicarão ou não. Se não for por escritura pública não será válido.

Está disciplinado no art.1.653 e seguintes do NCC. Além de registrado noRCPN, deverá também ser registrado no RGI.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 56

Obs: A outorga do cônjuge (marital ou uxória) pode ser dispensada nosseguintes atos de acordo com o que dispõe o art.1.642.

“Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quan-to a mulher podem livremente:I – praticar todos os atos de disposição e de administração necessáriosao desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecida no in-ciso I do art. 1.647;II – administrar os bens próprios;III – desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados oualienados sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;IV – demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invali-dação do aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do dispostonos incisos III e IV do art. 1.647;V – reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou trans-feridos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que osbens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiverseparado de fato por mais de cinco anos;VI – praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.”

Por outro lado, a vênia é obrigatória:

“Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjugespode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação abso-luta:I – alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;II – pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;III – prestar fiança ou aval;IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dosque possam integrar futura meação.”

Pelo CC 1916 era obrigatória a outorga qualquer que fosse o regime de bens. Agora a regra ainda é necessária exceto para o regime da separação total. Deacordo com o CC 1916, para a prática de determinados atos previstos nos arts.242 e 235, a outorga era indispensável independente do regime. O art.1647NCC, como regra, continua exigindo a outorga, porém há 2 exceções:

a) não se exige a outorga se forem casados pelo Regime da Separação Totalde Bens;

b) se forem casados pelo Regime da Participação Final nos Aquestos desde

que convencionado no pacto a dispensa da outorga para a alienação de imó-veis particulares.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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O art. 2.039 NCC dispõe sobre casamentos celebrados sob regime da separação total no Código Civil de 1916.

 Alteração do regime de bens

O Regime de Bens pode agora ser alterado desde que em jurisdição volun-tária conforme o §2º do art.1639 NCC.

“Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento,estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.§ 1º O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento.§ 2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização

 judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a proce-dência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.”

E quem já era casado pode mudar? 

 Art. 2.039. O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, é opor ele estabelecido.

Pactos antenupciais

Exemplos oriundos da projeção

CASO

– Aplica-se ainda súmula 377/STF?

Vejamos o texto abaixo:

Sônia Regina Negrão: APLICABILIDADE DA SÚM. 377.

O novo Código Civil, repisando o Código Beviláqua, contempla, dentreos regimes de bens, o da separação total, que se subdivide em duas espécies:o regime de separação total de bens convencional, de que tratam os artigos1.687 e 1.688, e o legal ou obrigatório estatuído no artigo 1.641. O primeiroencontra sua fonte geradora, seu engate lógico na vontade dos nubentes e,por isso, reclama pacto antenupcial; o segundo está assentado na própria lei,independendo da vontade das partes.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 58

O legislador, em algumas hipóteses, no propósito de proteger determina-das pessoas ou de impor uma sanção àqueles que viessem a se casar desres-

peitando causas suspensivas, conhecidas e tratadas no Código de 1916 comoimpedimentos meramente proibitivos, tornou, nesses casos, obrigatório oregime de separação total de bens.

Relativamente ao regime de separação convencional regulado pelo Códigode 1916, para que os bens adquiridos não se comunicassem e por força doestatuído no artigo 259 desse revogado Código Civil, no pacto antenupcialalém dos nubentes escolherem esse regime de separação total, era necessárioque eles expressamente consignassem no pacto que os aquestos não se comu-nicariam, pois se assim não o fizessem, os bens adquiridos na constância docasamento de maneira onerosa se comunicariam, o que, em última análise,implicava na aplicação das regras do regime de comunhão parcial de bens.

Isso, no nosso atual sistema jurídico, não mais existe porque o novel Códi-go Civil não traz nenhuma disposição semelhante àquela plasmada no artigo259 do Código Beviláqua, de sorte que basta aos nubentes elegerem o regimede separação total, contemplado nos atuais artigos 1.687 e 1.688, para quesejam incomunicáveis os bens cujo domínio pertencer a cada um deles, seja a aquisição levada a efeito antes ou durante o matrimônio. Nesse sentido,Silvio de Salvo Venosa ensina que o regime de separação de bens tem porcaracterística “a completa distinção de patrimônios dos dois cônjuges, não se

comunicando os frutos e aquisições e permanecendo cada qual na proprie-dade, posse e administração de seus bens” (1), e mais: “O novo Código es-tabelece verdadeiramente uma separação de patrimônios, pois no Código de1916, mesmo no regime de separação absoluta, havia necessidade de outorga conjugal para alienação dos imóveis” (2)

Idêntico raciocínio, entretanto, não se pode desenvolver em relação aoregime obrigatório da separação total de bens. É que o legislador de 1916, aoestabelecer esse regime de bens, objetivou proteger a mulher desavisada quese casasse sem o consentimento dos pais ou cuja idade núbil fosse suprida,supondo que seu consorte poderia estar iludindo-a para apropriar-se, por

intermédio do casamento, do patrimônio dela já adquirido ou que ela viessea adquirir após o casamento, especialmente por herança. Com certeza issoresguardaria os interesses das jovens ricas, de famílias abastadas.

Olvidou-se, entretanto, o legislador, de um fato notório, qual seja o de quea população brasileira era constituída, na sua maioria, por pessoas pobres,fato não alterado até os dias atuais infelizmente, porque temos hoje milhõesde brasileiros abaixo da linha da pobreza no nosso País.

Essa regra, de caráter protetivo, conseqüentemente passou a ter um efeitonegativo e prejudicial às pessoas que a lei visava proteger. É que durante a 

constância do casamento, no mais das vezes, os bens adquiridos ficavam sóem nome do marido, dada a influência do sistema romano-patriarcal, do qual

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 59

até hoje permanecem resquícios em nosso sistema jurídico, em especial nodireito de família. Rompido o casamento, aquela mulher, agora já de avan-

çada idade, não teria nenhum direito aos bens amealhados na constância docasamento. O revés também era verdadeiro. O marido não teria direito aosbens que teria contribuído para a aquisição durante a constância do casamen-to e que estivessem em nome da mulher. É claro, à toda evidência, que essa hipótese era de menor incidência.

Essa incomunicabilidade se estendia também nas hipóteses em que o casa-mento fosse levado a efeito quando a mulher se casasse com cinqüenta anosou mais e o homem com sessenta anos ou mais. O legislador, a meu ver, demaneira equivocada e preconceituosa, supunha que o homem sexagenário e a mulher cinqüentenária já teriam perdido os seus encantos e atributos físicos,de modo que seriam invariavelmente vítimas do denominado golpe do baú.Estabelecia, ainda, o legislador de 1916, o regime obrigatório de separaçãototal de bens para as hipóteses em que o casamento fosse realizado em desres-peito aos impedimentos meramente proibitivos, hoje denominados de causassuspensivas (3).

Por qualquer ângulo, entretanto, que se olhasse, era possível constatar queesse excessivo cuidado do legislador acabou sendo, no mais das vezes, prejudi-ciais aos cônjuges porque invariavelmente resultava em enriquecimento ilíci-to de um em detrimento do outro que saía do casamento sem nenhum bem,

enquanto o primeiro ficava com todo o patrimônio formado pelo casal.Para obviar essas distorções é que sobreveio a Súmula 377 do SupremoTribunal Federal, a qual, em última análise, estabelece as regras do regime da comunhão parcial para o de separação obrigatória, ou seja, determina a co-municabilidade dos bens adquiridos na constância do casamento sob a égidedo regime da separação legal obrigatória.

Nada obstante as injustiças geradas pela imposição desse regime de bens, olegislador continuou incidindo no mesmo pecado, uma vez que o atual Có-digo Civil traz as mesmas restrições (4), não permitindo que as pessoas acima mencionadas possam optar por um dos outros regimes de bens contemplados

em nosso ordenamento jurídico e nem possam elaborar um regime próprio,como se permite as outras pessoas (5).

Em outras palavras, tanto o homem como a mulher sexagenária, bemcomo aqueles que infringem, ao se casarem, as causas suspensivas do ma-trimônio e aqueles que dependem de autorização judicial para convolaremnúpcias são obrigados a adotar regime de separação total de bens (6).

Salta aos olhos o desacerto do legislador e, especificamente, no que tangeaos sexagenários, nos dias atuais, não é demais dizer que afronta o princípioda isonomia contemplado na nossa Lei Maior uma vez que se permite às

pessoas de dezoito, de trinta, de quarenta, de cinqüenta anos, enfim todasas pessoas com idade entre dezoito e sessenta anos, a possibilidade de ele-

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ger o regime que regulará as relações patrimoniais durante o seu casamento.Porque não atribuir idêntico direito ao sexagenário? Não teria ele a livre dis-

posição de seus bens? Não pode o sexagenário realizar todos os demais atosda vida civil? Porque não pode ele eleger o regime de bens que regerá suasrelações matrimoniais? (7)A intromissão do legislador, neste ponto, chega a ser imperdoável. Nem se argumente que haveria hipótese onde seria neces-sária tal imposição para proteger terceiros, tal qual se dá com os filhos doprimeiro matrimônio, ou do pupilo ou da pupila. É que tal proteção poderia como efetivamente pode, ser alcançada por outros meios mais eficazes e semcoartar o direito que se confere à maioria das pessoas de optarem livrementepelo regime de bens que melhor lhes aprouver e até de criarem espécie diversa daquelas expressamente existentes no Código Civil.

Por isso é que se torna forçoso concluir que as mesmas razões ensejadorasdo advento da Súmula 377 do Egrégio Supremo Tribunal Federal perma-necem nos dias atuais, de maneira que, a meu ver, ela permanece em vigor,sendo perfeitamente aplicável ainda hoje nos casamentos realizados a partirda entrada em vigor do novo Código Civil, assim como naqueles levados a efeito durante a vigência do Código Beviláqua, sendo a única forma de seevitar distorções e enriquecimento ilícito em favor de um e em detrimentodo outro cônjuge (8).

E mais se justifica também a aplicação da súmula sobredita, porque em

sendo ela desprezada, os cônjuges que se casaram ou vierem a se casar sob oregime de separação obrigatória de bens estarão numa situação inferior à dosconviventes, aos quais são asseguradas as mesmas regras do regime de comu-nhão parcial, o que implica na comunicabilidade ou na meação dos bens ad-quiridos na constância da união estável, não se podendo olvidar que, dentreas formas de constituição de família, o legislador constituinte deu preferência ao casamento em relação a união estável, tanto que permite a conversão des-ta naquele. E mais. O legislador infraconstitucional em harmonia com essa preferência, em vários pontos, inclusive em sede de direito sucessório, atri-buiu mais direitos ao cônjuge do que ao convivente. Basta ver que o cônjuge

supérstite, na ordem de vocação hereditária, prefere os parentes colaterais doautor da herança e o convivente com estes concorre (9).

E você, entende aplicável a súmula 377/STF?

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0409

Período: 28 de setembro a 2 de outubro de 2009.Quarta Turma

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DIREITO SUCESSÓRIO. VONTADE. TESTADOR.

Pacto antenupcial foi firmado na vigência do CC/1916 e, fixado o re-gime da separação de bens, em observância ao princípio da autonomia da vontade, não poderia ser alterado por ser ato jurídico perfeito. O art. 2.039do CC/2002 estabelece que o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do código anterior será o que foi por ele estabelecido. Assim, per-manece com plena eficácia o pacto nupcial, devendo, pois, ser respeitadosos atos subsequentes dele advindos, especialmente, como na espécie, o testa-mento celebrado por um dos cônjuges. A dissolução do casamento pela mor-te de um dos cônjuges não autoriza que a partilha de seus bens particularesseja realizada diversamente do que admitido pelo regime de bens adotado nocasamento, nem transforma o testamento, se estipulado por qualquer delesem conformidade com a lei e o pacto antenupcial adotado, em ato jurídicoinoperante, imperfeito e inacabado. Assim, ao prosseguir o julgamento, a Turma, por maioria, conheceu e deu provimento ao recurso para indeferir opedido de habilitação do espólio da viúva no inventário do cônjuge varão.REsp 1.111.095-RJ, Rel. originário Min. Carlos Fernando Mathias (Juizconvocado do TRF da 1ª Região), Rel. para acórdão Min. Fernando Gonçal-ves, julgado em 1º/10/2009.

Informativo nº 0399

Período: 15 a 19 de junho de 2009.

Quarta Turma

FGTS. PARTILHA. INCLUSÃO.

A Turma proveu o recurso ao entendimento de que as verbas recebidas por 

ex-cônjuge na constância de casamento sob regime de comunhão universal

devido à adesão a plano de demissão voluntária e recebimento de FGTS

devem ser partilhadas no divórcio, ex vi dos arts. 263 e 265 do CC/1916.Precedentes citados: EREsp 421.801-RS, DJ 17/12/2004, e REsp 355.581-

PR, DJ 23/6/2003. REsp 781.384-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior,

 julgado em 16/6/2009.

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AULA 9. DIVÓRCIO E SEPARAÇÃO EXTRAJUDICIAIS

EMENTA

Separação e divórcio extrajudiciais. Resolução pela via negocial. Lei11.441/07. Questões polêmicas.

TEXTO OBRIGATÓRIO

Separação e divórcio sem maiores burocracias, de GISELE LEITE, emhttp://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=401:

“Separação e divórcio sem maiores burocracias (comentários à lei11.441/2007)

14/04/2008 | Autor: Gisele Leite

O humanismo iluminista do século dezoito já propunha que o ser hu-mano e sua dignidade fossem o centro e o valor fundamental de todas asciências, impondo assim também que fosse a preocupação máxima de todo

ordenamento jurídico, de todo sistema jurídico.De fato, as normas são feitas para a pessoa, para sua plena realização exis-tencial e social, devendo garantir o mínimo de direitos fundamentais aptos a fornecer-lhe e manter a vida com dignidade.

Nesse sentido, andou bem o legislador pátrio ao substituir no CódigoCivil de 2002, a expressão “homem” pelo vocábulo “pessoa”. O que bem tra-duzir a repersonalização de todo o direito civil brasileiro e, porque não ousardizer de todo o direito privado.

Nesse particular ressalta a boa doutrina o quão marcante foi a ConstituiçãoFederal Brasileira de 1988, alcunhada de “constituição-cidadã” imprimindosignificativa alteração de valores e paradigmas. E efetivamente erguendo comovalor crucial o respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana provendouma releitura especial de todo o direito privado e quiçá do Estado Liberal.

Cuidou o legislador pátrio de garantir que qualquer violação ou ame-aça de violação de direitos reconhecidos tivesse direito de acesso amplo à ordem jurídica (art. 5º, XXXV da CF) que garante não apenas o acesso aoPoder Judiciário, mas efetivamente ao direito que deve ser socorrido portutela jurisdicional justa, adequada, eficaz e preferencialmente célere.

 Já clamava Rui Barbosa que justiça tardia, é nenhuma justiça.

Daí, o legislador infraconstitucional que não tardou em se preocuparcom a presteza dessa tutela jurisdicional passando até a provar as conhe-

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cidas tutelas de urgência, a tutela cautelar e o poder geral de cautela domagistrado.

 Aliás, na seara processual há alguns anos estamos sob fluxo das sucessivasondas reformistas do nosso CPC, principalmente desde 1994 tudo em prolde se reconstruir uma sociedade mais justa e solidária.

No meu modesto sentir, o garantismo é sem dúvida o ressurgimento dessehumanismo iluminista e que vem a fornecer caráter verdadeiramente instru-mental ao direito tanto material como processual.

O ideal constitucional vem em busca da liberdade de maneira que seja tãofácil casar como descasar, sem abandono de proteger a prole e o hipossufi-ciente na questão.

 A promoção da integridade e da dignidade humana se estende desde seuaspecto físico, psíquico ao intelectivo que devem corresponder aos direitosconcretizados. É certo que a separação e o divórcio não são um mal para a sociedade, mas veramente um” remédio para um mal”.

Infelizmente os procedimentos dissolutórios do casamento são lentos epenosos, principalmente quando temos o litígio entre as partes envolvidas.Veio então, a Lei 11.441 de 2007 retirar a intervenção do Estado do âmbitoda vida privada dos cônjuges, extinguindo uma indevida intromissão queatentava contra a dignidade humana.

 A nova planilha axiológica constitucional clama sempre por vigorosa atu-

alização legislativa que promova a restauração da liberdade, acabando com a obrigação de se permanecer casado contra a vontade, facilitando a dissoluçãoda sociedade conjugal.

Vem o Direito Civil brasileiro a materializar normas que efetivem as ga-rantias constitucionais, preservando a dignidade da pessoa humana e, emespecial, o direito à liberdade de autodeterminação.

Não pode o processo civil servir de entrave ao exercício desses direitosfundamentais e garantias que estão respaldadas expressamente na constitui-ção pátria. Desta forma, veio o direito civil disciplinar a ruptura da sociedadeconjugal no mesmo diapasão que disciplina a liberdade de casar.

Tanto o tempo mínimo exigido como a demora da prestação jurisdicional juntamente com a injuriosa burocracia são elementos perniciosos à pacifica-ção social e fere de forma fulminante o direito ao acesso à justiça.

Não deve o ser responsável pela demora na prestação jurisdicional a efetivi-dade do processo vez que deixa de garantir a entrega da solução judicial atravésda tutela adequada com a regulamentação da real situação social dos cônjuges.

Bem sábio se revelou o Desembargador Luiz Fux ao identificar “o tempoé um inimigo contra o qual o juiz luta desesperadamente, no afã de dar a resposta judicial o mais rápido possível”(...).

Garantir a maior efetividade aos direitos materialmente assegura-dos pelo sistema jurídico vigente, explicitando um caráter instrumental

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ao processo civil para promover a justiça de forma célere e adequada oquanto possível.

 A efetividade é fim primacial do processo civil mesmo em jurisdição volun-tária, pois que promove a entrega da tutela jurisdicional e a igualdade entre oscidadãos (não só a igualdade processual, mas, sobretudo, a substancial).

 A Constituição Federal do Brasil na qualidade de fundamento de validadede todo o ordenamento jurídico e que subordina todas as demais normas,sendo tal o sentido de sua supremacia, servindo, ainda, de garantia exter-na para execução dos preceitos das normas infraconstitucionais (cf. AnabelleMacedo Silva in Concretizando a Constituição).

Gustavo Tepedino assimila a revigoração dos institutos do Direito Civilque se encontrava defasado da realidade contemporânea, passa pela interpreta-ção civil-constitucional e pela revigorante dinâmica do “diálogo das fontes”.

 A simplificação do procedimento dissolutório conjugal e de inventárioque passou a vigorar com Lei 11.441/2007 fundamenta-se nas formas con-sensuais. E ganha providências administrativas através de escritura pública,quando as partes interessadas forem maiores e capazes e dês que estejamacordes as partes.

Frise-se, portanto, não se aplica a todas as formas de dissolução conjugal.Criticou Leonardo Greco ao afirmar textualmente: “parece claro que a re-

conciliação do casal deixou de ser o objetivo da intervenção do juiz na separa-ção matrimonial. Quando os cônjuges vêm à presença do juiz, já estão fazen-do um grande esforço de se comportarem com civilidade, criando obrigações

 jurídicas recíprocas inspiradas em princípios éticos ou religiosos de responsa-bilidade familiar ou em interesses econômicos relevantes. Será que o juiz devecriar dificuldade à consumação desses vínculos, insistindo na conveniência do restabelecimento da vida conjugal? Muitos juízes, muitas vezes instigadospor membros do MP inexperientes, opõem dificuldades à homologação deseparações consensuais que os advogados passaram meses negociando, embusca de redações ideais de determinadas cláusulas. Com isso, ou forçam o

casal a concordar com o que não quer e que não vai ser cumprido ou levam aoimpasse, que muitas vai ser desastroso para a parte mais fraca, porque o maisforte não transige e depois de dois anos está livre do casamento do mesmo

 jeito, pelo divórcio direto.” (cf. Jurisdição voluntária moderna).O atual CPC brasileiro sem dúvida tornou-se uma extensa “colcha de re-

talhos” o que nos faz vislumbrar a necessidade de nova codificação processualque seja harmônica, orgânica e sintonia com a tendência atual da CF e, osnovos paradigmas do direito material vigente.

 Assinala com veemência Alexandre Freitas Câmara que o CPC brasileiro

perdeu completamente sua identidade, perdeu a coerência e, isto não se res-gata por meio de reformas setoriais que atua como mero paliativo.

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 A construção de um direito mais justo, solidário e humano requer a sim-plificação procedimental principalmente para o direito da família. De modo

que “estar ou não casado” é opção exclusiva de cada um dos cônjuges, nãosendo necessária a interferência do Estado nessa vontade.

Nesse sentido é meritória a contribuição de certos doutrinadores entre elesa Des. Maria Berenice Dias, Jander Maurício Brum, Belmiro Pedro Welter,Cristiano Chaves de Farias e Marcelo Zenkner.

E, ante a rigidez do direito positivo anterior muitas decisões mitigavama dureza e a insensibilidade dos trâmites processuais. Não se pode esquecerque a nova lei em comento veio a superar a antiga exigência de homologação

 judicial das dissoluções conjugais.Representava naquela ocasião uma dentre tantas participações estatais

dentro da intimidade da vida privada do cidadão, a dita homologação era indispensável para a produção de efeitos da dissolução matrimonial.

Tal exigência por alguns era entendida como condição de eficácia da senten-ça que formalizava o acordo entre os cônjuges tinha como principal pressupos-to que o único modelo de família legalmente admitida era matrimonializada.

O declínio do paternalismo, a crescente participação e emancipação da mulher e os impactos da globalização sobre a família, a revolução sexual, a igualdade entre homem e mulher, pluralização das formas de família esculpi-ram o perfil pós-moderno contemporâneo.

O que nos leva a questionar sobre as reais fronteiras limítrofes do interessepúblico e o interesse privado na família pós-moderna. Também a elevação da criança e do adolescente como reconhecidamente sujeitos de direito, trouxe a baila o princípio do melhor interesse da criança.

O Estado se agigantou e ganhou tantos tentáculos acabando por projetarseu tamanho em seus interesses, tornando o cidadão em proporções lilipu-tianas e manipuláveis, ao ponto de ter seus interesses pulverizados ante doEstado.

Daí a enorme importância da efetivação do princípio da dignidade da 

pessoa humana no Direito de família brasileiro que vai repaginar conceitosde direito material e mesmo até procedimentos judiciais.

Há até quem cogite da inconstitucionalidade da imposição da limitaçãoà escolha de regime de bens no casamento de pessoa maior de 60(sessenta)anos (art.1.641, II CC) bem como o eventual efeito às uniões homoafetivasque ouso chamar de união dos iguais.

Dentre as garantias fundamentais constam expressamente a liberdade, a privacidade e a igualdade substancial. E o expresso reconhecimento da uniãoestável como fundadora de entidade familiar digna também da tutela que o

Estado tradicionalmente dedicou somente ao casamento e às demais formasde composição de família.

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Dentro desse garantismo constitucional a facilitação da dissolução con- jugal confere efetividade ao princípio da liberdade de autodeterminação. O

direito de constituir família através do casamento deve corresponder o direitode desconstituí-la com a mesma facilidade desde que atendidas as formalida-des exigidas pela lei.

 A suplantação definitiva da participação do estado nas relações familiaresmuito se coaduna com o princípio que proíbe intromissão ao planejamentofamiliar e restaura o respeito à vida privada do cidadão e das famílias.

 A expressão da liberdade é poder reconhecido aos cônjuges de decidiremsobre a direção da vida familiar interpretando as exigências de ambos da fa-mília. Assume os acordos entre consortes o papel de regra e de instrumentode realização do princípio de igualdade moral e jurídica.

 A nova lei consagra enfim o cidadão como sujeito ativo na formação da vontade coletiva, mas também titular de uma esfera de direitos invioláveis.Consagra-se como sujeito e jamais como objeto da História.

O Estado que respeita os legítimos interesses de seus cidadãos principal-mente o de determinar sua vida afetiva revela-se em ser Estado de Direito.

 Assim o vencedor, a pessoa humana revigorada pelo reconhecimento, emsede constitucional, de sua fundamental dignidade. Só se justifica a interven-ção estatal nas relações familiares para dirimir conflitos e desentendimen-tos deflagrados durante a convivência ou em face dos interesses especiais de

crianças e adolescentes.Resta debater sobre a intervenção do MP na área cível, afastando o parquede uma série de atos típicos da vida privada (habilitação para casamento, a atuação custo legis em ações tipicamente decorrentes da autonomia privada do titular, reconhecimento e dissolução de uniões estáveis, o pedido de alvará 

 judicial para levantamento de verbas pecuniárias deixadas pelo falecido, con-forme a Lei 6.858/80).

 Ademais é preciso frisar a imperiosa integração entre a atividade do MP na área cível como organismo de facilitação do acesso à justiça e na defesa dosinteresses sociais e individuais indisponíveis conforme o perfil do art. 127 da 

Lei Maior (usando efetividade, instrumentalidade e celeridade do processocivil contemporâneo).

Ratifica-se que a dissolução conjugal deve estar submetida somente um úni-co requisito a lídima e idônea vontade das partes, desatrelada de fatores outros(internos ou externos) tais como o lapso temporal ou perquirição anímica.

Concluindo: casar e não permanecer casado constitui direitos fundamentaise não podem sofrer restrições indevidas. É natural a efetividade e superioridadeda Constituição Federal que ocupa o ápice na hierarquia das fontes das leis.

 A supremacia normativa constitucional possui seus corolários: a) a ne-cessidade de releitura dos conceitos e institutos jurídicos clássicos (como o

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casamento, filiação, poder familiar e, etc.); a elaboração de novas categorias jurídicas (como entidade familiar); a interação estreita entre os diferentes

campos do conhecimento (reconhecendo a visão multidisciplinar do direito,buscando amparo na Psicologia, Antropologia, filosofia, História e na Socio-logia e Estatística).

Ocorre também a migração dos princípios gerais e regras atinentes às ins-tituições privadas, assim o texto constitucional assume seu papel reunificadordo sistema, passando a delinear um novo Direito Civil, inclusive no queconcerne à proteção dos núcleos familiares.

 A reconstrução da dogmática jurídica a partir da afirmação da cidadania como mola propulsora sendo cada vez mais sujeito de direito, seja idoso, seja criança, seja adolescente, ou seja, nascituro (um sujeito de direito exponen-cial ou virtual).

 A incontroversa supremacia da Constituição Federal brasileira traça uma peculiar arquitetura axiológica onde o respeito às garantias fundamentais en-contra lugar privilegiado (vide arts. 1º, 3º, 5º, e 7º da Carta Magna de 1988).

 Assim a Lei 11.441/07 promover a concretização da norma constitucionalatravés de procedimento administrativo de dissolução de casamento por mú-tuo consentimento bem como o inventário consensual.

Nas garantias constitucionais jaz a dignidade humana, a liberdade e multi-plicidade nas formas de constituição de família e facilitação da dissolução do

casamento, resguardando de forma inequívoca as posições jurídicas em quese inventem as partes.O constitucionalismo contemporâneo está encharcado da ênfase ao prin-

cípio da dignidade humana onde a proteção evidente da pessoa humana su-blinha nitidamente que o Direito foi feito pelo homem e para o homem.

 A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da facilitação da dissolução do casamento atuando concretamente: diminui o lapso tempo-ral para o divórcio por conversão, precedido de separação judicial (fixado oprazo: criou nova modalidade dissolutiva do casamento, o divórcio direto),cumprido os dois anos de separação de fato do casal; permitiu mais de um

divórcio por pessoa, superando o limite de uma única dissolução matrimo-nial por pessoa.

Portanto, resta impossibilitada a discussão em ação divorcista a culpa con- jugal, pois após a CF de 1988 o objeto da cognição restringe-se a ser o lapsotemporal. Afora isso, o limite ao número de divórcio gerava uma obtusa situ-ação: se uma pessoa divorciada que se casou como outra que era solteira, nãoseria possível a dissolução deste casamento, violando frontalmente a liberda-de daquele que nunca havia se divorciado antes.

O STJ chegou mesmo a confirmar o entendimento de que a exigência do

lapso temporal para decretação do divórcio conduz, inclusive à desnecessida-de da prévia partilha patrimonial para dissolução conjugal, vindo a estabele-

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cer a Súmula 197 que in verbis aduz: “o divórcio direto pode ser concedidosem que haja prévia partilha de bens”.

O que veio mais tarde se consolidar na lei civil através do art. 1.581 doCC de 2002. Nesse sentido o novo codex  facilitou a separação consensualreduzindo o tempo mínimo exigido para um ano (art. 1.574 CC).

Com a Lei 11.441/07 acrescentou-se ao CPC Brasileiro o art. 1.124-A onde é possível o procedimento cartorário para a dissolução conjugal ami-gável, não havendo filhos menores ou incapazes, observados os prazos legaisexigidos, e mediante escritura pública que deverá forçosamente proceder a partilha de bens comuns, dispor sobre eventual pensão alimentícia e ainda, oacordo quanto ao nome adotado em razão do casamento.

Tal ato só deverá ser lavrado se os cônjuges forem assistidos pro advogadocomum ou, advogados de cada um, cuja qualificação assinatura constarão doato notarial. Serão gratuitos tais atos aos declaradamente pobres.

Dá-se o desfazimento do casamento sem a intervenção judicial e sem a atuação do MP, através de simples manifestação de vontade dos cônjuges. Seas pessoas podem casar-se mediante a simples declaração de vontade, igual-mente podem se descasar.

O que sugere a confirmação da natureza negocial do casamento cedendovez à vetusta tese canonista quanto à natureza jurídica do casamento. Mas, ra-

tifique-se que é a tese eclética ou mista a que melhor identifica a natureza docasamento, como sendo uma instituição quanto ao conteúdo e um contratoespecial quanto à formação. Tal corrente é defendida pelos notáveis Eduardode Oliveira Leite, Flavio augusto Monteiro de Barros, entre outros.

Em apertada síntese, e pela dicção do doutrinador de clareza solar, Cristia-no Chaves de Farias eram três as teses que contornam a celeuma da natureza 

 jurídica do casamento:

a) a natureza negocial (baseado no consentimento);b) a natureza institucional (de origem sociológica) e demonstrando a ade-

são a um conjunto de regras impostas pelo Estado e, por fim:c) a tese eclética que considera o casamento um ato complexo impregnado

dualmente de características tanto contratuais como institucionais. Assim com a nova sistemática da dissolução conjugal, por mútuo consen-

so, vem a confirmar as predominantes concepções filosóficas, legais e socioló-gicas acerca da natureza jurídica do casamento, como negocial.

O que não significa a livre determinação de seu conteúdo pelos nubentes,mas de sua formação por acordo livre e espontâneo de vontades. Convémlembrar que o Código Civil lusitano em seu art. 1.577 ousou fixar assim: “o

casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas de sexos diferentes quepretendem constituir família mediante plena comunhão de vida”.

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 A escritura pública é instrumento público que serve de prova documentale é título hábil registrável (no civil e imobiliário). Embora seja anulável e não

rescindível porque a decisão judicial as hipóteses do art. 171 CC (defeitosdo negócio jurídico) através de ação anulatória, sob o procedimento comumordinário dentro do prazo decadencial de quatro anos (art. 178 CC).

 A referida escritura goza de presunção relativa de autenticidade tanto queadmite prova em contrário seja por falsidade ideológica, seja por falsidadematerial. Nesse sentido, o Enunciado 158 das Jornadas do Direito Civil/DF onde consigna que “prova plena” importa somente presunção relativa acerca dos elementos indicados nos incisos do § 1º do art. 215 CC devendoser conjugadas com o disposto no parágrafo único do art. 219 do mesmodiploma legal.

Reforce-se que o uso do vernáculo pátrio que é a língua portuguesa que éidioma oficial da República federativa do Brasil conforme impõem §§ 3º e 4ºdo art. 215 do Código Civil. Sendo exigível a presença de tradutor públicocaso seja versado em diferente idioma.

 A exigência da presença de um advogado ou advogados é um reforço doque já consta no art. 133 da Lei Maior que expressamente reconhece a indis-pensabilidade do advogado na administração justiça.

Conveniente é relembrar que o STJ tem ratificado mesmo após o adventodo CC de 2002 em seu polêmico do art. 1.707 que admite a renúncia aos

alimentos entre cônjuges e companheiros e, uma vez homologada essa renún-cia, inadmissível ulterior pleiteá-los.Relevante aludir que a lei não exige a presença do advogado e a necessi-

dade das partes serem assistidas por advogado. Todavia, entende CristianoChaves de Farias que é fundamental a presença do advogado.

Não resta dúvida que são, portanto devidos os respectivos honoráriosajustados por contrato de prestação de serviços, sendo negócio jurídicoautônomo.

No caso de pessoas declaradamente pobres, será devida também a atuaçãoda Defensoria Pública (art. 134 CF). Não há pedido logo é desnecessário

mandato ao advogado bastando sua assistência na elaboração do teor da es-critura pública.

Na sua ausência poderão os cônjuges apresentar procuração ad negotia  sendo necessário o reconhecimento de forma do signatário outorgante para conferir a devida validade ao ato.

Lavrada a escritura pública para dissolução matrimonial pelo tabelião quegoza de fé pública independentemente da presença de testemunhas. Por ana-logia também é aplicável o mesmo procedimento administrativo atinente a extinção da sociedade conjugal para a dissolução da união estável.

 Ao fixar o legislador pátrio a facilitação para conversão de união estável emcasamento, desejou tornar menos solene e complexo o matrimônio daquelas

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pessoas que já conviviam maritalmente, estando notoriamente na posse deestado de casado.

 Apesar de que pesa em doutrina a controvérsia acesa se existe ou não hie-rarquia entre os dois institutos: união estável e casamento.

 Ao se inserir no procedimento administrativo extrajudicial de dissoluçãoconjugal o tabelião não exerce poder jurisdicional daí não se cogitar de com-petência ou não deste. Sendo livre a escolha em qual cartório deverá se pro-mover a dita dissolução descomplicada, não há privilégio de foro da mulhere nem se pretende a regra do domicílio do casal.

 A retomada da vida conjugal conforme estatui os arts. 46 ao 48 da Leide Divórcio após a separação ocorre por simples petição sem necessidade denovas núpcias, exceto no caso do divórcio.A reconciliação seja qual for a mo-dalidade de separação é possível desde que antes do divórcio.

Dispensada a homologação judicial dessa reconciliação sendo passível deproceder-se extrajudicialmente, ocorrendo seus efeitos a partir do efetivo re-gistro. Diferentemente se trata de divórcio consensual, nesse caso a reconci-liação só é viável pela convolação de novas núpcias.

O cônjuge que vier a falecer após a celebração do negócio jurídico disso-lutório, mas antes de sua lavratura cartorária deixará o cônjuge no estado deviuvez, afastada a possibilidade de registro post mortem.

O que efetivamente aponta para o caráter personalíssimo do negócio jurí-

dico da dissolução consensual da sociedade conjugal.Há a indispensável necessidade do registro do casamento estrangeiro para admissibilidade de sua dissolução cartorária, inclusive através de escritura pú-blica. A separação ou divórcio consensuais por essa via quando celebrados noexterior se realiza sua aceitação sem o crivo do STJ.

Há a impossibilidade de dissolução conjugal cartorária por escritura pú-blica quando um dos cônjuges for mentalmente incapaz. E nesse caso, terá que ser judicial e ser o incapaz representado processualmente por curador,ascendente ou irmão conforme a Lei do divórcio em seu art. 3º.

Nada impede, todavia que o representante processual promove acordo ex-

tinguindo o casamento por separação ou divórcio consensuais devidamentefiscalizado pelo MP e homologado judicialmente.

Mas se plenamente capazes forem os cônjuges a desburocratizada dis-solução matrimonial se dará sem a necessária intervenção do MP. É curialfrisar a facultatividade do uso do procedimento administrativo conforme a Lei 11.441/2007 logo se mantém a possibilidade da via judicial e, toda vezque não preenchidos os requisitos basilares (a inexistência de filhos menoresou incapazes e, ainda os prazos legais exigidos para a pretendida dissoluçãomatrimonial).

 A situação, verbi gratia da fixação de verba alimentícia para um dos côn- juges pode se justificar a atuação forçosamente judicial até para viabilizar

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futura execução especial. Evidente que há falta de interesse de agir nas açõespropostas de separação e divórcios consensuais, sendo carecedores de ação

seus requerentes.Bem nos recorda Marinoni e Arenhart que o interesse de agir repousa sobre

o binômio “necessidade + adequação” entendendo por “necessidade” quandoseu direito material não pode ser realizado sem a intervenção do juiz.

 A via judicial dissolutória restringe-se quando há conflito de interessesentre as partes ou da existência de interesses de incapaz. Do contrário, caberá ao juiz extinguir o feito sem resolução do mérito, ex vi o art. 267, VI do CPCpor carência de ação, mais precisamente interesse de agir ou processual. Oque não viola a ampla garantia de acesso ao Judiciário.

Portanto, oportuno esclarecer que fazer o registro deve ser admissível, nãosendo necessária a designação da audiência para a tentativa de reconciliaçãodo casal chamada de “ratificação de acordo” em razão da simplificação doprocedimento dissolutório conjugal.

O primeiro parágrafo do art. 2º da LICC está integralmente revogado ouab-rogado, e também o art. 3º, §2º da Lei 6.515/77. E parcialmente derro-gado o art. 1.122 do CPC.

 A obtenção da separação consensual é possível pelo requerimento dos côn- juges ou por meio de transação extintiva celebrada no curso da separaçãolitigiosa. Abre-se a possibilidade de transformar o rito litigioso em consensual

e a bem da celeridade e efetividade processual, poderá nesse caso o juiz dissol-ver o feito sem resolução do mérito.Entendendo que o caráter consensual não significa, todavia reconciliação

do casal. E, sim, a conversão ao procedimento consensual. A tentativa detransação entre as partes continua a ser necessária.

Quanto à gratuidade para as pessoas que não podem pagar as despesas car-torárias temos ainda o ditame do parágrafo único do art. 2º da Lei 1.060/50que estabelece que é possível averbar que se considera necessitado “todo aque-le cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas processuais e oshonorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”.

Deve-se ler então o significado de pessoa necessitada à luz da valoriza-ção humanitária bem presente no texto constitucional vigente. Dispensa-sea prova da necessidade de gratuidade com o procedimento administrativo,cabendo somente a parte alegá-la expressamente conforme aduz o art. 4º da Lei 1.060/50.

Havendo a descabida exigência da prova de pobreza ou miserabilidade porparte do tabelião, caberá seguramente, a impetração de mandado de seguran-ça (na vara de registros públicos) pelo particular prejudicado pela exigência ilegal e abusiva da autoridade pública (art. 198 da Lei 6015/73).

Há extensão da gratuidade aos inventários consensuais apesar da omissãoda Lei 11.441/07 basta uma interpretação sistemática. Devem os cônjuges

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comparecer ao cartório do domicílio de qualquer um dos consortes, e assisti-das por advogado (comum ou não) e lavrar a escritura.

Poderão as partes declarar diretamente as suas vontades, ou por meio deprocurador munido de poderes especiais e específicos para o negócio dissolu-tório conjugal. Havendo, pois mera representação privada.

Não é demais registrar que a atuação do representante conflitar com in-teresses do representado o ajuste será anulável no prazo decadencial de 180dias, contados da conclusão do negócio conforme o art.119 do CC.

 A natureza negocial da extinção da sociedade conjugal por escritura públi-ca dá azo à representação privada por uma ou ambas as partes interessadas,desde que exigida a outorga de poderes especiais e específicos para o ato.

 Aliás, por pura analogia entenderíamos do mesmo jeito, pois é perfeita-mente possível o casamento por procuração (art. 1.535CC) assim tambémpara a referida dissolução.

Não se admite, todavia, o que a doutrina chama de autocontrato ou negó-cio consigo mesmo apesar dos termos do art. 117 CC onde o representanteatua em nome de outrem e, em nome dos próprios interesses.

Mesmo a atuação do representante voluntário não dispensa a atuação ne-cessária do advogado e, não deve o causídico acumular funções, exercendo na mesma ocasião a representação das partes e seu ofício conjuntamente.

É importante não confundir representação com mandato, pois este é ape-

nas uma das diversas formas que aquela pode assumir. A representação resta livre do servilismo obediente do mandato. Sendo plenamente possível havera representação sem mandato e mandato sem representação.

Podem os cônjuges extinguir o matrimônio pela via cartorária por meiode escritura pública com atuação direta de advogado desfrutando quandomaiores e capazes de liberdade negocial nas cláusulas dissolutórias.

Não há necessidade de se apontar a causa do fracasso conjugal e, é proi-bida a menção a culpa conjugal. Não é preciso a ratificação de vontade para posterior homologação judicial. Podendo regulamentar os efeitos advindosda dissolução conjugal, porém existem limitações como a inserção do pacto

sucessório nas escrituras públicas dissolutórias.E serão nulas de pleno direito (art. 166 do CC) bem como efeitos de cono-

tação sexual ou a fixação de milionárias indenizações por situações exóticas. Após a lavratura do conteúdo da escritura pública é inalterável, salvo para 

fins de correição de erros materiais. Não pode haver retratação do acordocelebrado após a referida lavratura.

Mas a presença de defeito do negócio jurídico (erro, coação, lesão) torna anulável a avença pleiteada por meio de ação anulatória dentro do prazo de-cadencial de quatro anos (art. 178 CC).

 A nova tábua axiológica erguida pelo texto constitucional brasileiro emvigor esforça-se em recuperar a prevalência da pessoa em relação ao patri-

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mônio, surtindo uma despatrimonialização das relações jurídicas. Mas a proteção do patrimônio mínimo vem colocar em primado a pessoa e suas

necessidades fundamentais.É a garantia do mínimo patrimonial indispensável à dignidade da pessoa 

humana. As cláusulas obrigatórias de acordo com a lei em comento, a des-crição dos bens quanto à partilha de bens comuns, a pensão alimentícia, a retomada ou não ao nome de solteira da mulher.

Uma apressada leitura da lei nos levaria a crer que a ausência dessas cláusu-las acarretaria invalidade do negócio dissolutório, mas isso não ocorre. A mi-nudente partilha de bens deve se referir tanto aos bens móveis ou imóveis.

Mas, a ausência dessa cláusula não embarga a validade e nem a eficácia doacordo dissolutório conjugal. Poderá a referida partilha ser desigual da qualnão escapará da incidência tributária.

Também é admissível a renúncia integral à meação por um dos cônjugesatravés de expressa disposição. Se inexistir bens a serem partilhados, é precisoque haja a declaração nesse sentido.

Havendo omissão poderá o bem ser futuramente partilhado (art. 1321CC) ou mesmo por nova escritura pública. Não ocorrendo tal fato, perma-necerão os bens em condomínio e composse de ambos os cônjuges.

Deverão tratar ainda do uso do nome de caso. Mas, não havendo tal dis-posição, não se vicia a escritura. A ausência só gera a presunção que foi man-

tido na íntegra o nome de casado.Não custa lembrar que o nome é direito da personalidade, sendo indis-ponível relativamente. Não poderá ser retirado o nome de casado da mulhercaso isso redunde em prejuízos financeiros, profissionais ou materiais a esta.

Conclui-se que a perda do sobrenome do casado nas separações e divór-cios consensuais dependerá de expressa manifestação de vontade do titular. A regra geral é pela manutenção do nome de casado.

Mesmo diante de litigiosidade ou de culpa conjugal a obrigação alimentarpersiste. Assim essa pode ser alvo de renúncia válida (se decorre de vício deconsentimento). E, no futuro, o ex-cônjuge poderá pedi-los de seus parentes

próximos conforme o art. 1694 do CC.Se há renúncia aos alimentos gera-se a certeza de que no futuro os mesmos

não serão cobrados, desta forma, não se permite posterior petição de alimen-tos, pois seria um venire contra  factum proprium.

É possível a estipulação de alimentos transitórios (de cunho resolúvel, vi-gendo por um prazo fixo) que concretiza a boa-fé objetiva exigida entre aspartes nas relações privadas.

Vige a possibilidade de inserção de outras cláusulas assumindo obrigaçõese reconhecendo direitos recíprocos. Sendo possível realizar doações (puras ou

não) entre si ou a terceiros, instituir usufruto, uso ou habitação em favor dooutro, de filhos ou a terceiros.

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Estipular cessão de bens, comodato ou locações, assumir o dever de inde-nizar, comprometer-se a pagar dívidas, outorgar procurações e assumir obri-

gações de fazer e de não-fazer.É possível, outrossim, realizar doações gravadas com inalienabilidade,

impenhorabilidade e incomunicabilidade (vide art. 1911 CC). Assinale-se a relativização das cláusulas restritivas, sendo plausível o levantamento de sub-rogação em excepcionais situações como em caso de perigo de perecimentoda coisa, para garantir utilidade do bem ou a dignidade humana do titulardo patrimônio.

Permitidas as cláusulas condicionais, a termo ou com encargo (modais)desde que respeitem o limite da disponibilidade do direito dos respectivostitulares. Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves de Farias aponta a teoria doabuso do direito que redunda numa concepção relativista dos direitos, e veiocom a introdução no direito pátrio vislumbrar uma via intermediária entre opermitido e proibido.

Retoma assim a finalidade social do direito e penetra em seu âmago aoponto de ser reconhecido por todo o ordenamento jurídico. Para tanto é for-çoso admitir que a jurisprudência obrou bons contornos leais aos institutosdo abuso de direito.

Como no caso de conta-corrente coibindo a prática do banco em lançarmão do numerário do devedor. (vide STJ, AC, 4ª. T., Resp 25052-3/SP,

rel, Min. Ruy Rosado de Aguiar Jr., v.u., 19/10/2000, DJU 18.12.2000,p.203).É bom recordar que para plena tipificação do abuso de direito é preciso o

elemento “motivo legítimo” que é extraído das condições objetivas nos quaiso direito foi exercido.

Merecer crítica o uso da expressão contida no art. 187 do CC “exercê-lo”dando a falsa idéia de que a conduta omissiva não pode tipificar também oabuso, o que não é vero.

Desta forma, a teoria do abuso de direito serve de espécie de freio na estipulação de cláusulas convencionais em acordos dissolutórios funcionan-

do como séria advertência para as separações e divórcios consensuais, porescritura pública. Daí abstenham-se de impor cláusulas que extrapolem olimite do regular exercício de seu próprio direito, deve respeitar as garantiasconstitucionais.

Vige a proibição de comportamentos contraditórios (venire contra factum propium) que é uma das materializações do abuso de direito, avinda da viola-ção da confiança e da boa-fé objetiva (art. 422 do CC).

Vale lembrar que o venire contra factum proprium pode derivar de com-portamento comissivo, omissivo do contratante. Há a total impossibilidade

de o tabelião recusar-se a lavrar a escritura pública dissolutória apenas pordiscordar do conteúdo das cláusulas do negócio jurídico.

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Convém lembrar que é negócio jurídico bilateral decorrente da autono-mia privada dos cônjuges, não comportando objeção ou questionamentos

do Estado. E o art. 1.124-A do CPC é explícito em apontar que a referida escritura independe de homologação judicial.

E, é valorada como título executivo e, mesmo com vício de vontade, nãocaberá ao tabelião ou escrivão discuti-lo. Com a inovação temos o afastamen-to (diante do consenso e da plena capacidade das partes e, ainda ausência defilhos menores ou incapazes) do juiz da esfera íntima da pessoa humana.

 A comprovação do prazo de um ano de casamento para separação consen-sual diminuindo o período mínimo de casamento exigido pela Lei Divorcista que era de dois anos (art. 4º).

 A facilitação da comprovação do prazo exigido para o divórcio direto, oprazo mínimo de dois anos de separação de fato, vem confirmar a tendência dedescomplicar o processo de dissolução da sociedade conjugal e do casamento.

Normalmente deve ser o prazo ininterrupto e contínuo (biênio) de sepa-ração de fato ainda é possível provar por meio de simples declaração de teste-munhas com firmas reconhecidas apresentadas ao tabelião no ato da lavratura da escritura pública.

Seria inadequado formalismo exigir a presença física das testemunhas no car-tório. Pode-se recorrer a outros meios de prova admissíveis em Direito conformeaduz o art. 332 do CPC até por decisão judicial de separação de corpos.

E, outros documentos que consignem a “ruptura da vida em comum”. Odivórcio-conversão ou indireto decorre de prévia separação judicial ocorrida há mais de um ano. Impõe-se provar o lapso temporal exigido.

Em regra, é demonstrável através da certidão de casamento devidamenteaverbada devido à sentença separatória ou da certidão de trânsito em julgado.

No divórcio por conversão consensual (incluindo o litigioso) não se dis-cutirá a eventual retomada da vida em comum pelos divorciandos, sendoirrelevante.

Há a possibilidade de se converter em divórcio a separação obtida ad-ministrativamente por escritura pública. Assim, com a Lei 11.441/2007 há 

necessidade de nova interpretação do art. 226, sexto parágrafo do CF, enten-dendo-se que o divórcio por conversão pode ser obtido pela comprovação deum ano de separação judicial ou extrajudicial, harmonizando todo o sistema 

 jurídico pátrio.Constam já fundados pareceres doutrinários que contam o prazo não ape-

nas da separação dos corpos, mas também da concessão de outras medidascautelares que evidenciem a ruptura de vida conjugal em comum.

Seja sentença que fixa alimentos ou que deferiu arrolamento de bens, re-gulamentou direito de visitação aos filhos. Não comprovado cabalmente o

lapso temporal exigido para a separação e divórcio extrajudicial restará obs-tada a dissolução pretendida. O mesmo ocorrerá se as partes não tiverem

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12 Gisele Leite é proessora, mestre edoutora em Direito. Mestre em floso-fa. Pedagoga. Conselheira-chee do

Instituto Nacional de Pesquisas jurídi-cas. Contato:[email protected]

capacidade, ou se não assistida por advogado ou versar sobre interesses deincapazes.

Convém lembrar que para manejo da ação de separação litigiosa com im-putação de culpa conforme o art. 1.572 CC que não exige nenhum lapsotemporal.

Deixou a lei em comento de mencionar a realização de divórcio-conversãopor escritura pública, mas em rude operação hermenêutica pode se admiti-lo. Pode então, o pedido ser formulado tanto no âmbito judicial como nocartorário.

Poderão as partes alterar as cláusulas pactuadas ou simplesmente mantê-la na lavratura da conversão dissolutória matrimonial. O direito intertemporal,a obrigatoriedade da norma jurídica não começa com a sua publicação, salvoexpressa disposição em contrário.

Pode-se ainda ter um tempo de espera (vacatio legis ). Mas, a Lei 11.441/2007entrou em pleno vigor na data de sua publicação. O comando inserido noart. 8º da Lei Complementar no 95/98 fora sacrificado, o novo procedimen-to pode ser utilizado por qualquer interessado desde o dia 04 de janeiro de2007 em todo território nacional.

Podendo as partes, já demandantes desistirem de sua ação proposta e, op-tarem pelo procedimento extrajudicial. ”12

CASO

 Análise de escritura de divórcio.

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AULA 10: SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO JUDICIAIS

EMENTA

Separação e divórcio judiciais. Papel da culpa na separação.

TEXTO OBRIGATÓRIO

Dias, Maria Berenice – cap. 17. SEPARAÇÃO JUDICIAL (Artigo1571 NCC)

SEPARAÇÃO JUDICIAL

 A separação conjugal põe fim à sociedade conjugal e não ao casamento(finda apenas com o divórcio, viuvez ou anulação). A separação conjugal põefim ao regime de bens, mas continuam alguns deveres recíprocos.

Consensual: há uma modificação no NCC, antes eram 2 (dois anos) decasado, agora é de 1 (um) ano (Artigo 1574 NCC). Deve haver o acordo

entre os cônjuges: guarda dos filhos, alimentos que serão pagos por quemnão tem a guarda e o regime de visitação; uso do nome, alimentos entre oscônjuges, arrolamento dos bens do casal.

O uso do nome do cônjuge é de livre acordo de ambos.Os alimentos entre cônjuges: a lei agora proíbe a renúncia, admite-se o

exercício ou desistência diferente renúncia porque, na desistência a pessoa étitular do direito subjetivo, mas não o exerce. Na renúncia a pessoa abdica dodireito subjetivo.

Os cônjuges podem estipular entre si os alimentos.

Litigiosa:a)Por culpa de um dos cônjuges: é a chamada separação– sanção, quan-

do um dos cônjuges violar o dever conjugal, cometer conduta desonrosa ouqualquer um dos atos do Artigo 1573 NCC. A legitimidade ativa é exclusiva do cônjuge enganado. O réu contesta e apresenta reconvenção. As sanções da separação por culpa são:

a.1) Cônjuge culpado só perderá o nome de casado se isto for requerido na inicialpelo outro cônjuge; na sua defesa, se restar provado as circunstâncias do Artigo 1578NCC, poderá o cônjuge culpado permanecer com o nome de casado,i. e, só perderá 

nome de casado se a perda for requerida expressamente e se não acarretar alguns dosfatos dos incisos do Artigo 1578 NCC.Deve haver pedido expresso na inicial.

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O cônjuge inocente tem direito a receber alimentos civis (côngruos) senecessitado. Já o culpado apenas os necessários.

Dependendo do motivo, o culpado poderá perder a guarda (Por exemplo;conduta desonrosa, tentativa de homicídio etc.). O culpado poderá pagarindenização por danos morais ao inocente (Vara Civil – depois do trânsitoem julgado da separação litigiosa entrará no civil com a sentença da vara da família para, no civil, discutir o valor).

 A separação judicial tem rito comum ordinário e competência da Vara deFamília e não tem tempo determinado como requisito (Artigo 1572 NCC).

b) Sem culpa:b.1) Artigo 1572 § 1º NCC (Separação Falência) exige-se a ruptura da vida 

em comum (podem estar morando na mesma casa até) há mais de 1 (um ano).Quem pede a separação pagará alimentos civis ao réu.b.2) Separação litigiosa sem culpa – separação remédio (Artigo 1572 § 2º

NCC) A doença mental é a única que permite a separação, nenhuma outra permite.

Observação: O Artigo 1.573 NCC é exemplificativo (ver § único).

Mas existe um papel para a culpa???

Efeitos da Separação: (Artigo 1.576 NCC).Restabelecimento da sociedade conjugal – Artigo 1.577 NCC.

 Art. 1.576. A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação efidelidade recíproca e ao regime de bens.

Parágrafo único. O procedimento judicial da separação caberá somenteaos cônjuges, e, no caso de incapacidade, serão representados pelo curador,pelo ascendente ou pelo irmão.

 Art. 1.577. Seja qual for a causa da separação judicial e o modo como esta 

se faça, é lícito aos cônjuges restabelecer, a todo tempo, a sociedade conjugal,por ato regular em juízo.

Parágrafo único. A reconciliação em nada prejudicará o direito de terceiros,adquirido antes e durante o estado de separado, seja qual for o regime de bens.

DIVÓRCIO

Há 2 (duas) espécies: direto ou por conversão. Ambos podem ser consen-

suais ou litigiosos. A natureza da sentença de divórcio é desconstitutiva ouconstitutiva negativa.

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DIREITO DE FAMÍLIA

FGV DIREITO RIO 79

Há uma novidade no Artigo 1581 NCC: o divórcio pode ser concedidosem a prévia partilha de bens em (qualquer tipo de divórcio). O fundamento

está em que, se a CR só exigiu decurso de prazo, não pode o legislador infra-constitucional exigir outros requisitos.

1) Divórcio direto consensual: A CR exige apenas mais de 2 (dois)anos de separação de fato. Exige-se o acordo com as mesmas esti-pulações da separação judicial com sensual. È jurisdição voluntária depende da averbação no Registro De Pessoas Naturais.

2) Divórcio direto litigioso: Há uma única tese de defesa que é o nãodecurso do prazo de separação de fato. O divórcio é direito potesta-tivo de quem requer.

3) Divórcio por conversão consensual: Podem ser mantidas as cláusula da separação judicial ou alterá-las. O prazo conta-se de transitadoem julgado da separação consensual em mais de um ano. Ou da separação de corpos.

4) Divórcio por conversão litigiosa: Só há uma defesa que é o não de-curso do prazo. Importante: Não existe divórcio sanção.

Obs: Não é possível reconvenção no divórcio porque não se discute “cul-pa” no divórcio. Não se discutindo culpa não há divórcio sanção.

CASO

O cônjuge culpado pela separação pagará danos morais?

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AULA 11. ALIMENTOS

EMENTA

 Alimentos. Procedimento judicial. Fixação de quantum, com discussãode diferentes critérios admissíveis. Alimentos transitórios: critérios jurispru-denciais.

TEXTO OBRIGATÓRIO

Dias, Maria Berenice – cap. 27.

Conceito

Tudo aquilo que uma pessoa necessita para sua sobrevivência (alimentação,habitação, vestuário, assistência médica, transporte; e se menor educação e lazer).

Característica da obrigação de alimentar: É uma obrigação personalíssima (só quem é credor recebe, e só quem e devedor pode pagar). Por ser perso-nalíssima, a obrigação alimentar é inalienável, impenhorável e incedíveis que

visam à sobrevivência do credor. São também irrepetíveis A obrigação alimentar é também imprescritível quanto AO DIREITOEM SI. Entretanto, a pretensão executória tem prazo de dois anos (Artigo206 § 2º NCC).

 A obrigação alimentar também é irrenunciável tanto para o cônjuge,quanto para o companheiro.

Os alimentos são também incompensáveis, i.e, não pode haver compen-sação de créditos.

Não há solidariedade ativa e passiva na obrigação alimentar. A solidarie-dade é imposta pela lei ou pelo contrato. (Pai e mãe devem alimentos aos

filhos, não pode o pai pagar tudo e cobrar em regresso pela mãe). A obrigaçãoalimentar é sempre calculada com base no binômio: possibilidade/necessida-de (possibilidade de quem paga, necessidade de quem recebe). Quanto aosfilhos menores a necessidade é sempre presumida. (persiste enquanto estiverfazendo curso de graduação até 24 anos).

EXCEÇÃO: ALIMENTOS DEVIDOS EM RAZÃO DA LEI 10.741(ESTATUTO DO IDOSO).

Credores e devedores de alimentos: Cônjuges, companheiros, parentes (des-cendentes ascendentes e colaterais até o 2º grau). (Arts. 1.696 e 1.697 NCC).

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 Alimentos Suplementares ou Obrigação Sucessiva: Sempre se pede ali-mentos ao parente mais próximo, se os alimentos forem insuficientes poderá 

pedi-lo aos de grau imediato (Artigo 1.698 NCC). Na parte final do Artigo1.698 NCC a lei permite o litisconsórcio, mas esta é facultativa. – i.e, não há solidariedade.

 Alimentos quanto aos cônjuges: Antes só o inocente podia ser credor,com o Novo Código Civil, podem o inocente e o culpado serem credores.Para o culpado ser credor os requisitos são cumulativos não ter parentes para prestar os alimentos e estar incapacitado para o trabalho. Agora há tambéma possibilidade do “parente culpado” (Artigo 1.694 § 2º NCC). i.e, em tese,se o parente dá causa à necessidade de alimentos (por exemplo: pai gasta tudo e depende dos alimentos do filho), terá direito aos alimentos necessárioe não os civis.

 Alimentos civis: alimentos que possibilitam manter o padrão que a pessoa levava (côngruos).

 Alimentos necessários: alimentos indispensáveis à sobrevivência. Alimentos gravíticos: durante a constância da gestação, previstos na Lei

nº 11.804/08.Obs.1: Art. 1.708 § único – “comportamento indigno”: atentado contra a 

vida, calúnia, injúria difamação.Obs. 2: Só se pode pedir majoração ou redução de alimentos quando

houver sentença de alimentos (revisional de majoração ou redução). Pede-sea modificação de cláusula quando há acordo.Quanto ao cônjuge os alimentos podem ser fixados em separação consen-

sual, divórcio consensual ou na ação de alimentos. Quanto aos companheirosnão há prova pré-constituída. Deve-se produzir provas para demonstrar /instruir inicial quanto à união estável.

 Ações que podem versar sobre alimentos:• Ações de alimentos pelo rito especial;• Cautelar de alimentos provisionais;

• Separação consensual;• Divórcio consensual;• Requerimento de homologação de acordo de alimentos;• Modificação de cláusula;• Ação de oferecimento de alimentos;• Ação de alimentos suplementares;• Ação de majoração de alimentos;• Ação de redução;• Ação de exoneração;

• Ação de execução pelo pedido de penhora;• Ação de execução com pedido de previsão.

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Não caso de pedido de alimentos, o juiz pode fixar os alimentos acima ouabaixo do que foi pedido. Pode o juiz também fixar de ofício os alimentos (co-

mum na ação de investigação de paternidade). Os alimentos provisórios,sãofixados na Ação de alimentos pelo rito especial (onde já há o fato gerador)(Lei 5.478/68). Os alimentos provisionais são fixados quando se discute uma dada ação principal que discute o fato gerador (visam manter a pessoa duran-te o processo). Os alimentos fixados “initio litis” nas Ações pelo Rito Especialsão os chamados provisórios. Nesta ação o autor, na inicial, deve fazer a prova pré-constituída do fato gerador da obrigação alimentar (exemplo: prova deparentesco). Já os provisionais são aqueles fixados em Cautelar porque há uma ação principal em que se discute o fato gerador (basta o fumus boni iures  e o periculum in mora ) (exemplo: nulidade do casamento como ação prin-cipal e medida cautelar de alimento provisionais por dependência – para a subsistência da pessoa durante o processo).

CASO

Pode haver renúncia aos alimentos? Com quais efeitos?

DECISÃO(ÕES).

Informativo nº 0418

Período: 30 de novembro a 4 de dezembro de 2009.

Corte Especial

REPETITIVO. PRISÃO CIVIL.

 A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em seu art. 7º, § 7º,vedou a prisão civil do depositário infiel, ressalvada a hipótese do devedor

de alimentos. Contudo, a jurisprudência pátria sempre admitiu a constitu-cionalidade do art. 5º, LXVII, da CF/1988, o qual prevê expressamente a prisão do depositário infiel. Isso em razão de o referido tratado internacionalter ingressado em nosso ordenamento jurídico na qualidade de norma in-fraconstitucional, porquanto, com a promulgação da Constituição de 1988,inadmissível seu recebimento com força de emenda constitucional. A ediçãoda EC n. 45/2004 acresceu ao art. 5º da CF/1988 o § 3º, estabelecendo novopanorama nos acordos internacionais relativos a direitos humanos em terri-tório nacional. A CF/1988, de índole pós-positivista e fundamento de todo

o ordenamento jurídico, expressa, como vontade popular, que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos estados, municí-

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pios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito etem como um dos seus fundamentos a dignidade da pessoa humana como

instrumento realizador de seu ideário de construção de uma sociedade justa esolidária. O Pretório Excelso, realizando interpretação sistemática dos direi-tos humanos fundamentais, promoveu considerável mudança acerca do tema em foco, assegurando os valores supremos do texto magno. O órgão pleno da Excelsa Corte, por ocasião do histórico julgamento do RE 466.343-SP, Rela-tor Min. Cezar Peluso, reconheceu que os tratados de direitos humanos têmhierarquia superior à lei ordinária, ostentando status normativo supralegal, oque significa que toda lei antagônica às normas emanadas de tratados inter-nacionais sobre direitos humanos é destituída de validade, máxime em facedo efeito paralisante dos referidos tratados em relação às normas infralegaisautorizadoras da custódia do depositário infiel. Dessa forma, no plano mate-rial, as regras provindas da  Convenção Americana de Direitos Humanos, emrelação às normas internas, são ampliativas do exercício do direito fundamen-tal à liberdade, razão pela qual paralisam a eficácia normativa da regra interna em sentido contrário, haja vista que não se trata aqui de revogação, mas deinvalidade. Precedentes citados do STF: RE 253.071-GO, DJ 29/6/2001;RE 206.482-SP, DJ 5/9/2003; HC 96.772-SP, DJe 21/8/2009; do STJ: RHC26.120-SP, DJe 15/10/2009; HC 139.812-RS, DJe 14/9/2009; AgRg no Ag 1.135.369-SP, DJe 28/9/2009; RHC 25.071-RS, DJe 14/10/2009; EDcl no

REsp 755.479-RS, DJe 11/5/2009; REsp 792.020-RS, DJe 19/2/2009, eHC 96.180-SP, DJe 9/2/2009. REsp 914.253-SP, Rel. Min. Luiz Fux, jul-gado em 2/12/2009.

Informativo nº 0416

Período: 16 a 20 de novembro de 2009.

Terceira Turma

 ALIMENTOS, PAGAMENTO, DESPESAS.

Constata-se dos autos que o agravante tem obrigação alimentar para coma ex-companheira e seus filhos, que foi fixada de forma provisória para paga-mento em pecúnia. Alega ter adimplido a obrigação pelo pagamento diretodas despesas dos alimentandos, valores sobre os quais divergem as partes,não tendo sequer o Tribunal a quo os quantificado. Quanto a isso, vê-se que,apesar de existir julgados nos quais se decidiu que, em certas circunstâncias,pode ser permitida a prestação de alimentos mediante pagamento direto decontas, essa modalidade é excepcional, diante dos nítidos efeitos prejudiciais

aos alimentandos. Em regra, a prestação de alimentos deve ser feita em pe-cúnia, para evitar indevida intromissão do alimentante na administração das

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finanças dos alimentandos. É certo que a exceção a essa regra vem claramentedefinida no art. 1.701 do CC/2002, que permite a prestação de alimentos de

forma alternativa, mas em circunstâncias totalmente diversas dos autos. Nemmesmo o parágrafo único desse artigo dá suporte à prestação de alimentosque se alega adotar, pois é uma faculdade do julgador, e não do alimentan-te, determinar a forma alternativa de prestação. Mostra-se inadmissível, ade-mais, pela lógica, interpretar o referido parágrafo para possibilitar o controlepelo alimentante dos atos praticados pelo alimentando. Dessarte, afasta-sea justificativa apresentada para o inadimplemento do alimentante, seja pela indefinição dos valores que alega quitados em forma alternativa de prestaçãode alimentos, o que é impossível de revisão na via de habeas corpus , seja pela impropriedade do meio que se alega utilizado para saldar o débito alimentar.

 Anote-se, por último, que cabe a prisão civil do devedor de alimentos,  in-dependentemente de sua natureza (provisionais, provisórios ou definitivos).

 AgRg no EDcl no HC 149.618-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em19/11/2009.

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13 Código Civil, Art. 1.390: “O usuruto pode recair em um ou mais bens, móveisou imóveis, em um patrimônio inteiro,ou parte deste, abrangendo-lhe, no todoou em parte, os rutos e utilidades.” 

14 STJ, REsp 64403-SP, Relator MinistroWALDEMAR ZVEITER:

“PROCESSUAL E CIVIL - INVENTÁRIO- CAPACIDADE SUCESSÓRIA PROVADAPOR DOCUMENTOS - DEVIDO PROCESSOLEGAL - DISSOLUÇÃO DE ADOÇÃO – USU-FRUTO DE AÇÕES DE SOCIEDADE.

(...)III - Renda do usuruto de Ações de

 S.A tem seu termo a quo, a partir da Assembléia que determinou a liberaçãode dividendos.

IV - Pensão vidual à viúva herdeiraincabível, se aquinhoada esta com usu-ruto de renda de alto valor e provenientede ações da companhia.(...)” 

15 Op. cit, p. 8.

AULA 12. 1ª PARTE – FAMÍLIA E DIREITO EMPRESARIAL

EMENTA

Prevenção dos conflitos familiares: família e direito empresarial. Meaçãode cotas e ações. Resolução de conflitos mediante cessões, usufrutos e acordosde acionistas e cotistas. Criação de fundações e sociedades como prevenção.

TEXTO OBRIGATÓRIO

 Wald, Arnoldo – “Do regime de usufruto de cotas de sociedade de respon-sabilidade limitada e de ações das sociedades anônimas”, em RDM 77/7.

Interface entre família e empresa

Projeção dos regimes de bens sobre a quota

Quem vota se houver usufuto sobre a quota? Vejamos este texto meu publicado na

Revista de Direito Mercantil nº 142:

Também é perfeitamente admissível, no Direito pátrio, o usufruto de co-tas ou de ações, pois é típico do usufruto que possa recair sobre os maisvariados tipos de bens, desde os mais determinados até sobre universalida-des.13 É extremamente comum a sua utilização nestes termos em acordos deseparação, bem como a sua instituição por via testamentária, como forma degarantia de renda ao herdeiro, ou mesmo por ato inter vivos.14

 A primeira dúvida a se avizinhar sobre o usufruto de cotas é se há neces-sidade de autorização prévia do contrato social para a sua realização. Quantoàs sociedades anônimas, consta a previsão expressa no art. 40 da Lei das S.A.

 Arnoldo Wald,15 ainda sob a égide do Código anterior, defendeu a aplicaçãosubsidiária da Lei das S.A. às limitadas. O Atualmente, não é mais tão sim-ples a questão, pois o art. 1053, parágrafo único, do Código Civil, estabeleceque o contrato social poderá prever a regência supletiva pela Lei das S.A; a contrario, se nada prever, não se pode aplicar o art. 40 da Lei das S.A.

Entretanto, não concluímos ab initio pela impossibilidade de constituiçãode usufruto sobre a cota no silêncio do contrato social. Se o direito do usufru-tuário for encarado tão-somente no seu caráter frutuário, é possível a consti-tuição do usufruto no silêncio do contrato, não se caracterizando, contudo,

o usufrutuário como administrador dos bens, sendo inaplicável no caso o art.1394 do Código Civil. Entendemos que o controle, como regime de gestão

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16 TJ-RJ, AC 1993.001.00618, Rel. Des.GUSTAVO KUHL LEITE:

“SOCIEDADE LIMITADA. USUFRUTODAS COTAS. POSSIBILIDADE. RESERVADO DIREITO DE VOTO QUE NÃO PODE SER USADO CONTRA OS INTERESSES DO USU-FRUTUÁRIO, EX-EMPREGADO A QUEM SE CONCEDEU USUFRUTO DOS DIREITOS ÀPERCEPÇÃO DOS LUCROS DURANTE PE-RÍODO CERTO EM CONTEMPLAÇÃO DOS TRABALHOS REALIZADOS EM FAVOR DAEMPRESA.

1. A possibilidade de a quota social  ser gravada com usuruto esta’ previstano art. 40 da Lei 6.024 (lei das socieda-des anônimas) que se aplica a limitada, subsidiariamente, por orca do art. 18do Dec. 3.708/19. Reconhece-se quemedram na doutrina e na jurisprudên-cia divergências quanto à possibilidadede ser dada em usuruto, em penhor ou ser penhorada quota de sociedade limi-tada. Todavia, considere-se que pode ser objeto de usuruto tanto bens corpóreos,como incorpóreos, dai’ porque se admiterecaia esse direito real sobre o própriolucro societário que decorre das quotasem poder do únicos sócios.2. Todavia, constitui-se abuso do exercí-

cio do direito de voto, que fcou reserva-do aos sócios, impedir-se a distribuiçãodos lucros, capitalizando-os, com ofm claro de prejudicar o empregado-usurutuário.” 

17 O Direito de Voto de Ações Gravadas comUsuruto Vidual, em RTDC 14, p. 240.

18 o p. cit, p. 13.

contratual e patrimonial, é exceção natural ao princípio da livre disposiçãopatrimonial – ademais, usufrutuário não é sócio, e não será portanto sujeito

do controle, a não ser que motivo outro o justifique. Apenas é necessário res-salvar que o exercício do controle não pode embaraçar os direitos frutuáriosdo usufrutuário, sob pena de abuso dos direitos decorrentes do controle.16

Outra questão diz respeito ao exercício do direito de voto: entendemosque permanece com o acionista. Usufrutuário, como vimos, não deve exercercontrole, de modo que a situação do usufruto de ações representa exceção aoart. 1394 do Código Civil. Ressalva-se apenas que o exercício desse direito écondicional, nos termos do art.114 da lei das S.A, que impõe o prévio acordoentre o nu-proprietário e o usufrutuário.

 Aprofundando a questão, Luiz Gastão Paes de Barros Leães17 defende que“o poder de administrar não corresponde necessariamente ao poder de voto, já que o estatuto pode deixar de conferi-lo, ou conferi-lo com restrições a certa espé-cie de ação, e nem por isso priva o usufrutuário do direito de administrá-la. Por outro lado, o voto proferido em assembléia pode ultrapassar, e freqüentemente ultrapassa a administração ordinária, afetando a estrutura da sociedade e modi-

 ficando o conteúdo da ação, em desacato à sua substância, que remanesce com o proprietário.” 

Consideramos o argumento de grande definitividade; o poder de votorealmente tem abrangência muito distinta da mera administração; o que o

legislador tentou evitar, mesmo que de modo em nosso entender imperfeito,foi o exercício do direito de voto que viesse a esvaziar os direitos do usufrutu-ário. Por isso a necessidade de acordo.

 Arnoldo Wald, por outro turno, defende que o direito de voto deve serexercido pelo usufrutuário, posição da qual discordamos. O autor, em ilaçõessobre a natureza do controle, conclui que o usufrutuário deve ser equiparadoao verdadeiro controlador, sendo o titular da ação um portador de direitofuturo.18 Entendemos sua afirmação de que o controle é uma situação defato; todavia, o controle não se confunde com o direito ao voto, que existeindependentemente dele. Demais disso, o direito de voto, como brilhante-

mente observou Barros Leães, importa em jus abutendi, em direito de dispor,modificando o conteúdo da ação, o que é incompatível com o instituto dousufruto.

CASO

Roleplay: simulação de separação de cotista, com formulação de soluçõespelos discentes.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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AULA 12. 2ª PARTE – CASAMENTO GLOBAL

EMENTA

prevenção de conflitos familiares. Casamento e regime de bens no direitointernacional. Regime de bens e pactos antenupciais, como recebidos peloDireito Brasileiro.

TEXTO OBRIGATÓRIO

 Jacob Dolinger, “Casamento e Divórcio no Direito Internacional, cap. 4,ed. Renovar.

 Análise do art. 7º da LICC.

Casamento e ordem pública no Direito Internacional Privado.

Teoria dos níveis da ordem pública.

 Algumas questões jurisprudenciais.

CASO

 Análise de “prenup” norte-americano.

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DIREITO DE FAMÍLIA

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GUSTAVO KLOH MULLER NEVESMestre e doutorando em Direito Civil pela UERJ.Proessor da FGV Direito Rio.Advogado.

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DIREITO DE FAMÍLIA

Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

FGV DIREITO RIO

 Joaquim FalcãoDIRETOR

Fernando PenteadoVICE-DIRETOR DA GRADUAÇÃO

Sérgio GuerraVICE-DIRETOR DE PÓS-GRADUAÇÃO

Luiz Roberto AyoubPROFESSOR COORDENADOR DO PROGRAMA DE CAPACITAÇÃO EM PODER JUDICIÁRIO

Ronaldo LemosCOORDENADOR CENTRO DE TECNOLOGIA E SOCIEDADE

Evandro Menezes De CarvalhoCOORDENADOR DA GRADUAÇÃO

Rogério Barcelos AlvesCOORDENADOR DE METODOLOGIA MATERIAL DIDÁTICO

Lígia Fabris e Thiago Bottino do AmaralCOORDENADORES DO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA

Wania TorresCOORDENADORA DE SECRETARIA DE GRADUAÇÃO

Diogo PinheiroCOORDENADOR DE FINANÇAS

Milena BrantCOORDENADORA DE MARKETING ESTRATÉGICO E PLANEJAMENTO

FICHA TÉCNICA