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99 Capítulo 1 - Educação Luzia Buzo - SEED Hilka Pelizza Vier Machado - UEM 1 Introdução Nos últimos anos, a gestão se destaca como tema básico nas discussões e nas proposições de medidas relativas ao projeto de modernização da administração pública brasileira. Nesse cenário, a descentralização é indicada como um requisito essencial à democratização. Da polarização Estado versus mercado ganham força a abertura econômica, a privatização de órgãos públicos e as reformas administrativas. O Estado brasileiro, que não vivenciou as políticas inerentes ao Estado de Bem-Estar Social, incorpora teoricamente as estratégias ligadas à redução de suas responsabilidades, principalmente no âmbito das políticas sociais. Com isso, a descentralização passa a ocupar uma posição de destaque nas mudanças, delineando políticas do modelo neoliberal na ação estatal. Nesse momento (a partir dos anos 80), o Estado incorpora a preocupação no sentido de modernizar as suas estruturas e os seus instrumentos de controle, objetivando a eficiência e a eficácia na prestação de serviços públicos, com qualidade (CABRAL NETO; ALMEIDA, 2005). Na repercussão e na acolhida desse novo ideário do Estado brasileiro, o setor de educação não poderia ficar imune. A política educacional, notadamente a partir da década de 90, aponta para o redimensionamento do sistema de ensino, através de novas formas de gerenciamento, com vistas ao aumento de sua produtividade (FRIGOTTO, 1985). A questão da descentralização, como caminho para democratizar a educação formal, vem sendo estimulada desde a década de oitenta, como mostram os planos educacionais gestados nesse período (80/90), cujas metas visavam à perspectiva de melhorar a produtividade do sistema. Meta essa, reconhecida pelos setores da sociedade, pelo caminho da implementação de novas formas de gestão educacional, privilegiando o eixo da qualidade e modernização da gestão, justificando-se pelo fato de ser a política educacional definida preferentemente pelo poder público, com o objetivo político de produzir mais e melhor, com menor custo. No desenrolar dessas mudanças da política educacional brasileira, presencia-se o discurso da maior participação da sociedade, inclusive com responsabilidade financeira. Além disso, o Estado passa a permitir e incentivar a coexistência de novas formas de gerenciamento escolar, aparentemente mais democráticas, dando espaço à maior participação da comunidade na eleição de diretores e na condução do nível de qualidade do processo educacional. São criados colegiados ou conselhos escolares com poder deliberativo e “autonomia” para tomar certas decisões no âmbito da escola com incentivo à ampla participação da comunidade local (MELLO, 1982). O processo democrático, frente aos avanços advindos do debate sobre a universalização da escola, marca a década de oitenta na defesa da especificidade pedagógica da instituição escolar, por meio de instrumentos, dentre os quais, a gestão colegiada, como forma de socialização do poder; ofertando autonomia para a escola, no sentido desta se organizar e definir as ações voltadas para o cumprimento da função social da escola pública, ou seja, a educação integral do cidadão. Com isso, condicionando-se à garantia da escola de boa qualidade para todos, possibilitando a permanência do aluno na escola, permitindo o acesso à escolarização nos diferentes níveis de ensino, assim como à unidade pedagógica e administrativa (MELLO, 1985). GESTÃO DEMOCRÁTICA ESCOLAR E A PARTICIPAÇÃO DO CONSELHO ESCOLAR: UMA REFLEXÃO

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99Capítulo 1 - Educação

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

Luzia Buzo - SEEDHilka Pelizza Vier Machado - UEM

1 Introdução

Nos últimos anos, a gestão se destaca como tema básico nas discussões e nas proposições de medidas relativas ao projeto de modernização da administração pública brasileira. Nesse cenário, a descentralização é indicada como um requisito essencial à democratização.

Da polarização Estado versus mercado ganham força a abertura econômica, a privatização de órgãos públicos e as reformas administrativas. O Estado brasileiro, que não vivenciou as políticas inerentes ao Estado de Bem-Estar Social, incorpora teoricamente as estratégias ligadas à redução de suas responsabilidades, principalmente no âmbito das políticas sociais. Com isso, a descentralização passa a ocupar uma posição de destaque nas mudanças, delineando políticas do modelo neoliberal na ação estatal. Nesse momento (a partir dos anos 80), o Estado incorpora a preocupação no sentido de modernizar as suas estruturas e os seus instrumentos de controle, objetivando a eficiência e a eficácia na prestação de serviços públicos, com qualidade (CABRAL NETO; ALMEIDA, 2005).

Na repercussão e na acolhida desse novo ideário do Estado brasileiro, o setor de educação não poderia ficar imune. A política educacional, notadamente a partir da década de 90, aponta para o redimensionamento do sistema de ensino, através de novas formas de gerenciamento, com vistas ao aumento de sua produtividade (FRIGOTTO, 1985).

A questão da descentralização, como caminho para democratizar a educação formal, vem sendo estimulada desde a década de oitenta, como mostram os planos educacionais gestados nesse período (80/90), cujas metas visavam à

perspectiva de melhorar a produtividade do sistema. Meta essa, reconhecida pelos setores da sociedade, pelo caminho da implementação de novas formas de gestão educacional, privilegiando o eixo da qualidade e modernização da gestão, justificando-se pelo fato de ser a política educacional definida preferentemente pelo poder público, com o objetivo político de produzir mais e melhor, com menor custo.

No desenrolar dessas mudanças da política educacional brasileira, presencia-se o discurso da maior participação da sociedade, inclusive com responsabilidade financeira. Além disso, o Estado passa a permitir e incentivar a coexistência de novas formas de gerenciamento escolar, aparentemente mais democráticas, dando espaço à maior participação da comunidade na eleição de diretores e na condução do nível de qualidade do processo educacional. São criados colegiados ou conselhos escolares com poder deliberativo e “autonomia” para tomar certas decisões no âmbito da escola com incentivo à ampla participação da comunidade local (MELLO, 1982).

O processo democrático, frente aos avanços advindos do debate sobre a universalização da escola, marca a década de oitenta na defesa da especificidade pedagógica da instituição escolar, por meio de instrumentos, dentre os quais, a gestão colegiada, como forma de socialização do poder; ofertando autonomia para a escola, no sentido desta se organizar e definir as ações voltadas para o cumprimento da função social da escola pública, ou seja, a educação integral do cidadão. Com isso, condicionando-se à garantia da escola de boa qualidade para todos, possibilitando a permanência do aluno na escola, permitindo o acesso à escolarização nos diferentes níveis de ensino, assim como à unidade pedagógica e administrativa (MELLO, 1985).

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Entenda-se como qualidade educativa o acesso universalizado ao conhecimento básico capaz de garantir condições de participar e produzir, balizando-se como instrumento de cidadania com capacidade de organizar processos produtivos de conhecimento, valores, técnicas, comportamentos, arte, ou seja, SABER historicamente produzido (GENTILI, 2001).

O grande esforço dos gestores tem se dado no sentido de retomar e alargar espaços e processos democráticos, valorizando as discussões coletivas com ampla participação dos profissionais da educação e dos segmentos organizados da comunidade escolar. A exemplo disso, destaca-se a importante representatividade do Conselho Escolar, privilegiando a gestão colegiada como uma forma de gestão democrática, tendo, como centro do processo, a escola pública.

Com todas estas colocações, sabe-se que uma escola organizada por todos que nela atuam tem maiores chances de ser uma escola adequada aos interesses dos seus organizadores. Também é notório que trabalhar coletivamente é uma conquista muito difícil de ser realizada. Entraves pessoais e institucionais não faltam. Uma das dificuldades no trabalho coletivo está no confronto de expectativas e desejos dos sujeitos envolvidos, visto que a escola apresenta um papel social já definido – espaço de construção e transmissão de cultura, onde seus sujeitos deixam de se perguntar que tipo de escola desejam para si, seus alunos e filhos, uma vez que já têm implícito o desejo de se ter uma escola que realmente pertença ao público; um lugar, onde nele todos trabalhem para a realização daquilo que é de direito dos cidadãos,(VEIGA, 2004), de acordo com a legislação vigente, prevista na Constituição Federal/88 e da LDBEN/96. Mas sobre a construção e transmissão de cultura muito há por se dizer, desejar e esperar, principalmente no que diz respeito aos temas, objetivos, métodos e recursos a serem assumidos, assim como os valores a serem cultivados e praticados por toda a comunidade escolar.

Apesar desse quadro de incentivo à democratização, pouco se conhece sobre o papel do Conselho Escolar como instrumento de efetiva participação da comunidade, no exercício de confrontar as expectativas de cada um dos organizadores do Projeto Político Pedagógico (PPP)

da escola que exige a compreensão do trabalho coletivo como condição sine qua non (sem a qual não é possível). Portanto, o exercício de trabalhar coletivamente exige também a consciência de que é possível um aprofundamento, uma revisão, uma mudança para que se estabeleçam relações democráticas, a fim de que a Escola Pública possa cumprir o seu papel.

Desprendimento com relação às próprias convicções, atenção e respeito para com as convicções do outro e interesse para provocar as mudanças necessárias são exigências da organização que se pretende de qualidade (BRUNO, 1998).

No cenário apresentado, o problema circunscreve-se na interrogação de qual seria então, o papel do Conselho Escolar, como instrumento de representatividade máxima dentro da escola. Nesse contexto o foco deste estudo está direcionado para a real função do Conselho Escolar, em uma análise mais criteriosa da sua representatividade, na articulação dos problemas inerentes à escola e à comunidade escolar; ou seja, um Conselho Escolar concebido como local de debate e tomada de decisões. Como espaço de debates e discussões, permitindo que os segmentos que o compõem explicitem seus interesses, suas reivindicações, examinando com profundidade os múltiplos aspectos que envolvem a participação da comunidade na gestão da escola pública.

Para atingir a finalidade proposta, este artigo foi partilhado em tópicos, com a preocupação de abordar a consistência da gestão democrática na escola pública, mostrando sua finalidade enquanto espaço público de atendimento ao público. Apresentam-se, em seguida, considerações sobre a Gestão Democrática na trajetória de sua historização como um processo que a sociedade brasileira vem construindo, a partir da década de oitenta. Estão contemplados também, nesse estudo, a Democratização da Escola e os conflitos gerados nesse processo. E, por fim, para compreender as Relações Democráticas no interior da Escola, considerações sobre a Fundamentação Legal e o Histórico do Conselho Escolar, como expressão de implementação de mudanças, na prática social e política dentro do espaço escolar.

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2 Considerações sobre Escola Pública

A escola pública brasileira organiza-se de forma a atender, principalmente, as demandas da Educação Básica – que compreende a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio em todas as suas modalidades –, contando com um fundo de financiamento próprio, a partir da aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB (PEC 415/2005 aprovada em 29/09/2005).

Os governos dos Estados utilizam esse recurso do Fundo para financiar a educação em seus três níveis básicos, com o espírito de reconhecer que a Educação Básica é o nível constitutivo da cidadania

Com este propósito, apresenta-se o número de alunos matriculados na rede pública do Município de Maringá - PR, como forma quantitativa,

para todos e um direito de todos, de acordo com a Constituição Federal. Destacando a especificidade desse estudo, a Escola Pública no Estado do Paraná, conforme se visualiza nas tabelas 1 e 2, apresenta matrícula inicial da Educação Básica, em suas três modalidades de Ensino – Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio Regular – como base referencial para a organização escolar, trabalhar coletivamente de acordo com os pilares da gestão democrática; considerando que, a escola por ser pública, não poderá deixar de criar mecanismos para envolver a comunidade em seu dia-a-dia, levando-os a compartilhar das decisões e compreender a importância de sua participação nas decisões em que a escola precisa de sua presença.

Tabela 1 – Alunos matriculados na Rede Pública no Estado do Paraná

Rede de Ensino Pré-Escola 1.a/4.a séries 5.a/8.a séries Ensino Médio Regular Total Estadual 1.553 37.460 703.970 409.489 1.152.472 Municipal 180.973 749.290 24.553 44 954.860 TOTAL 182.526 786.750 728.523 409.533 2.107.332 Fonte: Censo Escolar –INEP – 2005.

fornecedora de dados concretos da realidade que faz parte deste estudo.

Tabela 2 – Alunos matriculados na Rede Pública no Município de Maringá - PR.

Rede de Ensino Pré-Escola 1.a/4.a séries 5.a/8.a séries Ensino Médio Regular Total Estadual 381 7.093 14.271 12.172 33.917 Estadual 4.853 9.590 3.739 0 18.182 TOTAL 5.234 16.683 18.010 12.172 52.099 Fonte: Censo Escolar – INEP – 2005.

Numa escola que se pretenda democrática, dando cumprimento à função social e política da educação escolar – que é a formação do cidadão participativo, responsável, crítico e criativo – através da transmissão e socialização da herança cultural acumulada, implica, por sua vez, em dar suporte a esse processo de democratização, pressupondo a descentralização das estruturas de poder.

A Constituição Federal preconiza que a educação é um direito inalienável de todo cidadão, tendo, portanto, a escola de buscar, na realidade

presente, a transformação na perspectiva de sua democratização.

Para se compreender melhor a gestão da escola, toma-se por base o número de alunos que são matriculados na rede pública paranaense.

Um governo, no que se refere à administração pública, neste caso, o diretor da unidade escolar, ao propor implementar, através do PPP, políticas de melhoria, há que considerar a finalidade de visar a transformação da escola, na perspectiva de sua democratização, buscando na realidade existente, através do pessoal nela diretamente

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envolvido – diretor, professores, funcionários, pais ou responsáveis, alunos – como elementos de sua própria transformação.

Os alunos compõem a parcela de maior significado dentro da Escola Pública, em função de quem a gestão procura se organizar de forma colegiada, com uma perspectiva descentralizadora dos serviços públicos, que têm pregado a importância da autonomia a ser conquistada nos diferentes espaços de atuação do cidadão.

A Escola Pública é vista como uma instituição necessária à democracia da sociedade, com a condição de ser ela democrática internamente, na sua gestão, e externamente, na generalização do ensino. Na busca da democracia participativa é que ela se organiza para a construção de sua organização, tendo como base princípios constitucionais, como:

• Igualdade de condições para o acesso epermanência na escola, sendo vedada qualquer forma de discriminação e segregação;

• GratuidadedeEnsinocomisençãodetaxase contribuições de qualquer natureza;

• Liberdadedeaprender,ensinar,pesquisare divulgar o pensamento, a arte o saber;

• Valor ização dos prof i s s iona i s daEducação;

• GestãoDemocrática e colegiada comoforma de administração da instituição de ensino;

• Garantiadeumaeducaçãobásicaúnicaede qualidade.

2.1 Gestão Democrática

Como abordado anteriormente, a função primordial da escola – garantir, acima de tudo, a competência da prática educativa e a integração da prática pedagógica, uma vez que a escola é um espaço historicamente construído para a concretização da prática social da educação.

Na história da educação brasileira, verifica-se que o termo “gestão” é enfatizado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) como “um dos princípios que devem reger o ensino” (art.3 inc. VII). O artigo 14 define que os sistemas

de ensino devem estabelecer “normas” para o desenvolvimento da gestão democrática, e que estas, por sua vez, precisam estar de acordo com as peculiaridades de cada sistema.

Nesse contexto, é importante centrar atenção ao sentido social da educação, visto que a participação na gestão da escola implica no poder real de tomar parte no processo educacional, pois a gestão escolar pode “dar-se numa gama variada de possibilidades, quer no grau de integração dos grupos envolvidos, quer no grau de participação de cada um desses grupos (PRAIS, 1994).

Para que esse processo de fato aconteça de forma participativa, é necessário legitimar mecanismos que garantam a democratização na gestão, ou seja, é preciso refletir sobre a participação da comunidade dentro da escola pública. Nesse sentido, a criação de órgãos colegiados, ou conselhos escolares, associações de apoio à escola, agremiações de alunos é fundamental para a concretização do processo.

Considerando o já exposto, pode-se afirmar que a gestão da Escola (administração, supervisão, inspeção), não é a razão da existência da escola, mas sim ser o espaço-tempo da prática pedagógica em que a criança e o jovem relacionam-se entre si, com professores, idéias, valores, ciência, arte e cultura, livros e equipamentos, problemas e desafios, concretizando a missão da escola de criar as oportunidades para que eles se desenvolvam,construam e reconstruam o saber (VEIGA, 2004).

Não é possível pensar na participação da comunidade sem garantir os mecanismos de integração e envolvimento que possibilitem, de fato, que o poder de decisão e ação na escola seja compartilhado e a prática da gestão democrática experimentada por todos os integrantes da escola.

Essa prática não deve ser concedida, mas, sim, conquistada pelos segmentos da escola e, para isso, é necessário que professores, alunos, pais e funcionários sejam sujeitos de sua história e compreendam a importância de sua participação individual em prol do coletivo. Isso significa a ruptura do modelo tradicional de administração escolar e do modelo tradicional de participação, o que freqüentemente é confundido com presença de eventos e atividades eventuais. É preciso romper, sobretudo, com o modelo tradicional de educação.

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A gestão democrática exige o cultivo da cultura da participação, do trabalho coletivo, da ação colegiada, da realização pelo bem comum. Enfim, é preciso possibilitar momentos de experimentação da democracia na escola para se tornar uma prática efetiva, consolidada e possível de ser efetivamente vivenciada (PEREIRA; OLIVEIRA, 2006).

No entanto, ao lado dessa realidade complexa, própria de uma instituição que reúne diferentes dimensões do campo social, observam-se práticas, problemas e respostas inesperadas, que buscam construir soluções emergenciais para garantir a participação coletiva dos integrantes da escola e da comunidade que a serve e se serve dela; reconhecendo-se na diversidade, na luta contra os processos sociais excludentes, na aposta e na crença de tornar realidade a democratização da gestão escolar.

Diante do exposto, o enfrentamento da complexidade do processo democrático exige uma análise mais profunda, direcionada para a representatividade do Conselho Escolar, em sua real função, na articulação dos problemas inerentes à escola e à comunidade escolar, destacando-se a escola como um espaço comunitário que tem como tarefa a construção do seu PPP (Projeto Político Pedagógico), indicando que a educação precisa ser resolvida localmente, a partir das decisões do Conselho Escolar (LÜCK, 2000).

Nesse processo impõe-se a gestão democrática que, determinada pela Constituição Federal de 1998 e consolidada pela LDBEN (9394/96), se constitui na prerrogativa fundamental das políticas educacionais, colocando-se como um desafio para os administradores escolares, na medida em que enseja mudanças nas relações de poder – consolidando as políticas de descentralização administrativa do modelo global neoliberal, que reduzem os compromissos do Estado, passando as responsabilidades das decisões para a sociedade “Estado Mínimo” (GONÇALVES, 2002).

Com isso, passa a escola a se reorganizar em um modelo que requer a superação da verticalidade dos atos decisórios, a conciliação dos interesses coletivos como estratégia para superar a gestão tecnocrática ainda vigente na prática de organização escolar, devendo constituir-se no interior da escola, na correlação de forças

entre o instituído politicamente e o construído democraticamente, implicando uma nova visão e, conseqüentemente, em um novo processo político e cultural da escola.

Assim, a organização escolar, em que pese a descentralização administrativa, deverá ser resultante de reflexões e análises dos seus reais problemas, tendo como parâmetro, para as discussões/reflexões, o embasamento teórico construído no PPP, focando que tipo de aluno/sociedade temos e que tipo de aluno/sociedade queremos, repensando o processo de gestão, a distribuição do poder entre a equipe diretiva. Entenda-se como equipe diretiva o diretor da escola, o pessoal administrativo, os professores e os segmentos representativos da comunidade escolar, ou seja, alunos, pais e associações regulamentadas por estatuto próprio, existente na localidade jurisdicionada à escola.

Isto posto, impõe-se um repensar sobre a busca da transformação da escola na perspectiva da sua democratização, na mudança da sua realidade existente, através do envolvimento do pessoal nela diretamente envolvido (PEREIRA; OLIVEIRA, 2006).

2.2 Democratização da Escola

A nossa cultura política e a concepção de poder, ainda contaminadas pela origem e tradição patrimonialista, dificultam a efetiva implantação da gestão democrática na escola pública. Os dirigentes, embora afastados, às vezes distantes da sala de aula, também educam, ou deseducam, pelas suas atitudes. O ideal é que se dissemine a cultura democrática para efetivar a participação coletiva.

A democratização da escola perpassa também pela democratização dos seus processos pedagógicos, com a participação dos agentes educacionais nas decisões sobre o conteúdo e a prática educacional. Para viabilizar a democratização da escola é necessário que ela seja aberta à participação de amplos segmentos da sociedade, para que estes tenham voz e voto e sejam capazes de tomar decisões sobre o que acontece no ambiente da escola (MACHADO, 2004).

A estrutura da escola brasileira até então se apresentava hierarquizada e extremamente burocratizada, refletindo a organização de

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um sistema centralizador do poder, fazendo do Diretor um ente autoritário e único responsável pela tomada de decisões, exercendo o papel de preposto do Estado e da comunidade (PARO, 2005).

Já MELLO (1992) coloca a preconização de uma verdadeira revolução posicionando a escola como centro das preocupações educacionais, considerando a diversidade de suas formas de organização e propondo a descentralização do sistema escolar como estratégia para fortalecer a autonomia da escola. Conseqüentemente, abre espaços para diferentes identidades escolares em construírem projetos pedagógicos próprios. Com isso, o autor propõe que a organização e o funcionamento da escola sejam embasados no Regimento Escolar, nos processos de planejamento, no Conselho Escolar e processo de escolha de seus dirigentes – definindo e orientando o desencadear de suas ações.

Em síntese, observa-se que os elementos emanados de princípios democráticos possam constituir, no interior da escola, instrumentos eficazes da democratização de seu funcionamento cotidiano.

2.3 Conflitos Gerados no Processo de Democratização

Se se colocar como horizonte a transformação do esquema de autoridade, no interior da escola, com os reais mecanismos práticos de democratização, ver-se-á que a articulação com os interesses dos dominados e o processo de transformação se chocam (PARO, 1977).

A colegialidade tem sido vista, assim, tanto como estrutura descentralizada, como um processo consensual, com a ocorrência de um alto grau de influência dos membros do corpo docente no processo decisório e, ainda maior, do presidente do conselho escolar, no caso, o diretor da escola.

O grau de autonomia dos segmentos que representam a escola é maior que os demais; principalmente dos pais, por sentirem-se fora do processo do cotidiano escolar, configurando uma política de gestão de “mão única”.

Para delinear a compreensão da proposta de gestão democrática da escola pública, destaca-se a legalidade do Conselho Escolar.

2.4 Conselho Escolar: Fundamentação Legal/Histórica

A Constituição Federal, em seu artigo 205, expressa que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Ainda na Constituição Federal, no artigo 206, fica expresso que o ensino será ministrado com base em alguns princípios, entre eles a gestão democrática do ensino público, na forma da lei. Um dos objetivos e prioridades expressos no Plano Nacional de Educação (PNE), lei aprovada em janeiro de 2001, é a democratização da gestão do ensino público nos estabelecimentos oficiais, e uma de suas metas é a criação de Conselhos Escolares nas escolas de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em seu artigo 14, estabelece que os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola, participação das comunidades escolar e local e Conselhos Escolares ou equivalentes.

No Paraná, os Conselhos de Escola foram instituídos através da Deliberação 020/91, do Conselho Estadual de Educação, estabelecendo, no seu artigo sexto, que todas as escolas devem ter um órgão máximo de decisões coletivas - o Colegiado -, que deve abranger representação de toda a comunidade escolar, reforçando o princípio constitucional da democracia.

A Resolução 4839/94, da Secretaria de Estado da Educação, legitima as normas contidas na Deliberação 020/91-CEE, aprovando os regimentos escolares da Rede Pública Estadual, que normatizam o funcionamento dos Conselhos Escolares no Estado do Paraná, posteriormente revogadas e substituídas pela Deliberação 16/99-CEE e Resolução 2122/00-SEED em vigor. A construção do novo estatuto do Conselho Escolar vem ocorrendo desde 2004, através de discussões e consultas às escolas, em um processo de elaboração coletiva que busca reafirmar os princípios

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democráticos na Escola Pública, propondo que a gestão democrática seja vivenciada no cotidiano escolar em todo o seu fazer.

O Conselho Escolar, enquanto instância colegiada de representação da comunidade escolar, amplia as condições de exercício da prática participativa, com importante contribuição para a democratização da gestão. Sua primeira atividade, enquanto instância responsável pela execução, acompanhamento e avaliação do PPP, é discutir e delinear a educação a ser construída, ouvindo os diversos segmentos sociais e debatendo com eles os problemas que afetam o dia-a-dia da escola, na busca de soluções. Nesse sentido, sua função é política e pedagógica, pois estabelece as transformações necessárias para a prática educativa e para uma gestão conseqüente.

2.5 Compromisso do Conselho Escolar com a Gestão Democrática

O Conselho Escolar é um órgão colegiado, representativo da Comunidade Escolar, de natureza deliberativa, consultiva, avaliativa e fiscalizadora, sobre a organização e realização do trabalho pedagógico e administrativo da instituição escolar em conformidade com as políticas e diretrizes educacionais da SEED, observando a Constituição, a LDB, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Projeto Político Pedagógico e o Regimento da Escola para o cumprimento da função social e específica da escola.

Quanto à natureza do Conselho Escolar, pode ser:

• deliberativaquandorefere-seàtomadadedecisões relativas às diretrizes e linhas gerais das ações pedagógicas, administrativas e financeiras quanto ao direcionamento das políticas públicas, desenvolvidas no âmbito escolar.

• consultivaquandorefere-seàemissãodepareceres para dirimir dúvidas e tomar decisões quanto às questões pedagógicas, administrativas e financeiras, no âmbito de sua competência.

• a v a l i a t i v a qu ando r e f e r e - s e a oacompanhamento sistemático das ações

educativas desenvolvidas pela unidade escolar, objetivando a identificação de problemas e alternativas para melhoria de seu desempenho, garantindo o cumprimento das normas da escola, bem como a qualidade social da instituição escolar.

• f iscal izadora quando refere-se aoacompanhamento e fiscalização da gestão pedagógica, administrativa e financeira da unidade escolar, garantindo a legitimidade de suas ações.

Em síntese, o Conselho Escolar exerce papel específico na Gestão Democrática da escola, quer pela participação dos segmentos envolvidos, ou seja, professores, funcionários, pais e alunos, quer pelas funções que o caracterizam como sendo de natureza deliberativa, consultiva, avaliativa e fiscalizadora.

3 Procedimentos Metodológicos

A ciência e, conseqüentemente, a pesquisa têm como tarefa essencial descobrir e expressar as relações existentes entre os fenômenos, isto é, a relação entre as variáveis (CERVO; BERVIAN, 2002). Neste estudo, o fenômeno observado é a participação do Conselho Escolar, no contexto da Gestão Democrática.

Como um estudo exploratório utilizou-se de dados primários, destinados a dar base, principalmente para o estudo das relações democráticas, que se processam no interior da escola pública, o intuito de obter respostas concisas dos fatos, a fim de estabelecer relações entre os elementos componentes do processo, que se está focando nesse momento. Sendo um estudo qualitativo, seu propósito principal é a compreensão da efetividade da função do Conselho Escolar, como instrumento de democratização das relações de poder que se processam no interior da unidade escolar. Trata-se de “Estudo de Caso” de uma unidade escolar X, no âmbito da rede Estadual pública localizada no Município de Maringá, Estado do Paraná, que foi escolhida em função de facilitar a coleta de dados.

O método de estudo, além da pesquisa bibliográfica, utilizou-se de um questionário com perguntas abertas, visando obter declarações para

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investigação da organização e funcionamento do Conselho Escolar.

O questionário foi estruturado em duas partes: a primeira, sobre o perfil do entrevistado; a segunda, com questões abertas, sobre a democratização, considerando o desencadear das ações vividas na participação, ou não, das atividades realizadas pela unidade escolar. Os questionários, devidamente impressos, com linguagem acessível, encabeçado por uma carta simples, contou também com a argumentação verbal da proponente, foi entregue pessoalmente, no local de trabalho de cada um dos entrevistados, para serem preenchidos individualmente, com respostas livres, por dois integrantes de cada segmento que representam o Conselho Escolar da Escola X (professores, funcionários, alunos, pais, mães ou responsáveis e pedagogos representando a direção da escola), em um total de dez participantes.

Utilizou-se também de análise documental, com registros feitos em livro próprio da escola X, contendo informações mais detalhadas sobre a formação e constituição do Conselho Escolar. As atas estão compreendidas no período de 1995 até 2006, em reuniões específicas do Conselho Escolar e assuntos diversos que, de uma forma ou de outra, dizem respeito ao fazer do processo educacional.

Como elementos importantes para o estudo, na análise dos dados, verificou-se nos documentos que do ano inicial (1995) até o ano de 2003, os registros não apresentam uma ordem cronológica esperada para esse fim, deixando transparecer interrupções ou mesmo, omissão de fatos, que por ventura tenham sido realizados, tomando-se como base os registros realizados do ano de 2004 até 2006 onde os registros aparecem com certa regularidade, numa ordem lógica dos fatos.

Por fim, a análise dos dados foi efetuada de acordo com a análise do conteúdo documental e das respostas dos questionários, conforme BARDIN (1977), por questão, agrupando-as pela positividade, negatividade, semelhanças ou discrepâncias bastante evidentes.

BARDIN (1977) define como análise documental a operação ou conjunto de operações, visando representar o conteúdo de um documento sob uma forma diferente da original, a fim de

facilitar, em um estado ulterior, a sua consulta e referenciação.

A autora afirma, ainda, que toma-se consciência de que, a partir dos resultados da análise, pode-se regressar às causas, ou até descer aos efeitos das características dos fatos, levando em conta que a análise enriquece a pesquisa exploratória, aumentando a propensão à descoberta dos significados ou de fatos significantes.

Procurou-se agrupar as respostas em torno de dois núcleos:

i – compreensão da gestão democrática:

• O qu e s e e n t end e p o r Ge s t ã oDemocrática;

• FormacomosãoescolhidososmembrosdoConselho Escolar;

• Convocação do Conselho Escolar compauta pré-definida;

• Segmentosdebatemapautadasreuniõescom antecedência.

ii – importância do conselho escolar:

• Expectativa em torno do ConselhoEscolar;

• Principais assuntos debatidos nasreuniões;

• D i f i c u l d ad e s qu e p e r c e b em nofuncionamento do Conselho Escolar;

• Outras abordagens sobre a participaçãono segmento que representam dentro do Conselho Escolar.

4 Análise dos Dados

Nessa fase preliminar, ao averiguar, com a devida permissão da atual diretora, os registros documentais, em livro-ata próprio, constatou-se que a escola X possui dois livros próprios para o mesmo assunto (Registro das Atas do Conselho Escolar) e para o mesmo período.

O Conselho Escolar foi constituído no ano de 1995. Os atuais integrantes foram eleitos em março de 2006 para o biênio 2006/2007.

Quanto às atas analisadas, no ano de 2006 percebeu-se relevantemente a organização, feita em ordem lógica, com seqüência de fatos. Todos os registros contêm assinaturas.

107Capítulo 1 - Educação

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

Para dar maior clareza, o conteúdo das atas foi reunido como se pode observar no anexo A, donde depreendeu-se que os assuntos tratados nos registros, prenderam-se entre outros pormenores, a quatro assuntos principais,ou seja:

• ComposiçãodoConselhoEscolar;

• AplicaçãodosRecursos(FundoRotativoePDDE);

• Problemasdisciplinaresdealunos;

• Assuntosdiversos–esporádicos(Avaliação,cedência, permanência ...).

Não há, em alguns casos, cronologia sincronizada das datas e dos fatos, como, por exemplo, a constituição do conselho escolar que caminha à deriva do Gestor daquele período.

Além dos registros da atas, apresentam-se, na seqüência, os resultados obtidos a partir dos questionários.

4.1 Perfil dos Entrevistados

Considerando o perfil dos entrevistados, percebe-se a predominância do sexo feminino (70 por cento), sendo 80 por cento, com mais de 25 anos. Portanto, conhecedores do processo de descentralização do poder, na esfera pública, que se desenvolveu, a partir dos anos oitenta, com a abertura política. Então, a partir de 1990, passa-se a lutar pelo direito de se ter uma escola pública, gratuita e democrática, passando também pelo ideário neoliberal dentro da lógica produtiva empresarial. Muitos deles até participando diretamente das lutas populares em favor de uma escola pública que reconhece a importância da gestão educacional, ou seja, da gestão escolar, como uma forma de concretizar a participação democrática na organização escolar, culminando com o movimento, onde a gestão escolar passa a ser objeto de atenção dos sujeitos envolvidos, direta ou indiretamente, com a educação (TEIXEIRA, 2005).

Quanto ao grau de escolaridade, a maior proporção é de pós-graduados (40%), chamando a atenção que os pais integrantes do Conselho Escolar têm elevada escolaridade.

4.2 Compreensão da Gestão Democrática

É importante salientar a relevância do processo de participação na discussão e implantação da gestão democrática, acreditando-se, ainda, que o processo de tomada de decisões no interior da escola não pode estar desvinculado da ação coletiva, democrática e integrada envolvendo a participação direta na elaboração do PPP, que representa a espinha dorsal do fazer no cotidiano escolar.

A relação com a comunidade é um fato importante para o redimensionamento da Gestão Escolar, ficando expressa nas respostas a participação dos integrantes do Conselho Escolar (Professores, Funcionários, Alunos, Pais/Mães ou Responsáveis).

Sobre a compreensão da Gestão Democrática, os depoentes ponderaram o seguinte:

a) Participação:

• “Decisões tomadas por vários segmentosescolares...”

• “que todos se unem emprol de uma sócoisa...”

• “éaparticipaçãodeumtodoemdiversosassuntos...”

• “direcionadaatodososindivíduos...”

• “tomadadedecisão,apartirdointeresseconjunto entre direção, equipe pedagógica, alunos e comunidade escolar...”

• “todospodemfalaroquepensam...”

• “participação consciente e ativa detodos...”

b) Organização:

• “Trabalhoemgrupoplanejando...sempreem grupo...”

• “quepriorizequestõesedecisões...”

• “discutirsobrealgodointeresseescolar...”

• “preservandoprioridades...”

• “processoqueorganizao funcionamentoda escola e que pressupõe uma tomada de decisões”.

108 Gestão Democrática Escolar e a Participação do Conselho Escolar: Uma Reflexão

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

• “discutirobemdenossaescola,oqueseriao próprio conselho escolar...”

c) Objetivos:

• “visando objetivos claros do bemcomum...”

• “objetivoqueatenda,nofinal,omáximodas expectativas...”

• “visandopromoveraqualidadedoensinona instituição...”

d) Gestão:

• “Éumprocessoqueseiniciacomaescolhados participantes...”

• “éjustamente,comaformadaescolar...”

• “administração descentra l izada edirecionada a todos os indivíduos em um processo...”

• “é um proce s so que o rgan iza ofuncionamento da escola...”

Nota-se assim, que o que predomina como compreensão da Gestão Democrática é justamente a participação de todos os integrantes do Conselho Escolar.

Além disso, quando citam a organização, os objetivos e a própria Gestão, em uma dimensão indicativa de um processo de desconcentração do poder decisório associado à co-responsabilidade, como proposta de delegação de tarefas, tornando o Conselho Escolar não só um mecanismo de

controle, mas uma atuação que busca dinamizar, na medida do possível, a melhoria do trabalho na escola.

Outro aspecto analisado foi a escolha dos membros do Conselho Escolar, com as seguintes declarações:

• “através de e le ições rápidas nossegmentos...”

• “são escolhidos pela supervisão edireção...”

• “atravésdeescolhadecadasegmento...”

• “emconversas...”

• “queeusei, são indicadospeladireçãoeconvidados...”

• “são escolhidos por eleição direta ouaclamação...”

• “mas são escolhidos justamente coma direção e supervisão, mas não como eleição...”

• “peladireção–nãoaeleição,masaescolhaé de acordo com o estatuto...”

• “faltam representantes para algunssegmentos da comunidade escolar...”

• “sãoeleitoserepresentamquasetodosossegmentos da escola...”

Para fechar esse primeiro bloco sobre a compreensão da Gestão Democrática, observe-se o Quadro 1, com as respectivas respostas.

Quadro 1 – Número de respostas sobre convocação e pauta de reuniões.

SIM NÃO ÀS VEZES DEVERIA EXISTIR• Háconvocaçãocompautapré-definidaeapresentadaatodos?05 03 01 01 • Apautaédebatidacomantecedência? 00 08 01 01 Fonte: Dados do questionário.

Observou-se que há convocação para as

reuniões do Conselho Escolar, porém a participação

dos segmentos é parcial, além do que a pauta não

é discutida com antecedência, mostrando que o

processo de tomada de decisão no interior da escola

está desvinculado da proposta de ação colegiada,

democrática e integrada, comprometendo o

envolvimento e a compreensão da Gestão.

109Capítulo 1 - Educação

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

4.3 Importância do Conselho Escolar

Sobre a importância do Conselho Escolar, os entrevistados externaram as seguintes opiniões:

Quadro 2 – Demonstrativo da importância do Conselho Escolar.

Fonte: Dados do questionário.

FUNÇÃO

“otimizar o trabalho escolar...” “manter a escola em ordem...” “participar das decisões e práticas pedagógicas do estabelecimento de ensino...” “detectar os problemas que o aluno enfrenta em relação a sua aprendizagem...” “ajudar os alunos com problemas escolares...” “acompanhar o desenvolvimento da proposta pedagógica do colégio...” “auxiliar em todas as questões para tomar decisões bem pensadas...” “refletir em conjunto com diferentes segmentos da unidade escolar, sobre ‘situações problemas’ na escola...” “reunir seus membros com a participação de todos os segmentos da escola...” “ajudar os alunos com dificuldades...”

PRIORIDADES

“ações e decisões para o bem de toda comunidade escolar...” “ajudar a administrar a escola...” “responsabilidade de intensificar a participação social, promovendo a Gestão Democrática...” “procurar estratégias que levem o aluno a superar suas dificuldades...” “melhorar o comportamento dos alunos na escola, na sua própria casa...” “os pais (em especial) não participam ativamente...” “divide as responsabilidades da Direção com pais e envolve os profissionais ajudando a tomarem decisões mais corretas...” “busca de caminhos que possam resolver da melhor forma as ‘situações problemas’...” “discussão de assuntos importantes...”

DECISÕES

“deveriam ocorrer desta maneira...” “sim, a maioria, pois alguns assuntos não precisam ser debatidos pelo Conselho Escolar, através de reuniões periódicas...” “não.” “que eu saiba são registradas em ata.” “sim.” “ainda não participei de nenhuma decisão da escola...” “sim, através de reunião lavrada em ata.” “a maioria delas. Sim são registradas em ata, mas algumas coisas importantes não precisam ser tomadas pelo Conselho Escolar. Podem ser tomadas apenas pela sua direção e supervisão...” “sim. São registradas em livro ata próprio.”

Quando abordados sobre os três principais assuntos debatidos com mais freqüência no Conselho Escolar, concentraram-se as respostas

a três eixos: Gestão, Recursos Financeiros e problemas disciplinares com alunos.

110 Gestão Democrática Escolar e a Participação do Conselho Escolar: Uma Reflexão

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

Quadro 3 – Demonstrativo da participação no Conselho Escolar (assuntos debatidos).

Fonte: Dados do questionário.

• “falsaautonomiadaescola,emrelaçãoaosetor financeiro...”

• “falta de participação da comunidadeescolar nos assuntos da instituição...”

• “falta um cronograma de atividadesorganizadas pelo presidente do conselho e a participação ativa dos conselheiros.

Finalmente, na consulta sobre o que gostariam de abordar sobre a sua participação no Conselho Escolar, os entrevistados se restringiram a corroborar com as respostas dadas às demais perguntas do questionário, deixando, em alguns momentos, transparecer certo grau de insatisfação quanto à sua responsabilidade pelo que fazem ou pelo que não conseguem fazer, em face das dificuldades que relatam:

• sonhodesermaisatuante...

• dificuldade para reunir os pais para asreuniões...

• aluno acha importante participar doconselho por causa da parceria com outros alunos...

• gostariamdelevaraparticipaçãoasério...

• importanteficarpordentrodosassuntosescolares...

• maior envolvimento com a escolapública...

GESTÃO

Questões legislativas da escola. Transporte escolar. Organização interna da escola. Participação dos pais / comunidade escolar. Medidas para não ocorrer indisciplina. Qualidade de Ensino. Integração do aluno na escola como um todo. Problemas internos. O que fazer para melhorar esse assunto.

RECURSOS FINANCEIROS Recursos / Aplicações. Questões Financeiras. Reformas da parte física.

PROBLEMAS DISCIPLINARES

Questões Disciplinares com alunos. Alunos que se revoltam com colegas. Má conduta de alunos. Evasão do aluno. Comportamento de alunos.

Ao se posicionarem, quanto às dificuldades que vêem no Conselho Escolar para exercer a democracia, responderam:

• “devia havermais reuniões doConselhopara que haja mais discussão...”

• “presença e participação de todos nadiscussão dos problemas...”

• “para acontecer isso seria necessárioacontecer e existir na prática...”

• “envolvimento de todos os profissionaisda escola ; é di f íc i l conseguir ta l envolvimento...”

• “nem sempre são convocados para asreuniões, por isso fica difícil exercer uma gestão democrática perfeita...”

• “do interesse da comunidade escolarem relação aos assuntos pertinentes à escola...”

• “conhecimento e de uma formaçãocontinuada...”

• “falta de responsabilidade dosmembrosque fazem parte do Conselho Escolar...”

• “muitosnãocomparecemenãosesentemresponsáveis pelo cargo que aceitaram...”

• “ n ã o c on s e g u i rmo s n o s r e un i rfreqüentemente, com reuniões...”

• “osmembrosquasesemprenãocomparecem nas reuniões...”

111Capítulo 1 - Educação

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

E, sobre esse assunto, um último depoimento, na íntegra, traduz o ideário da participação, senão veja:

“... que podemos, através da participação ativa, consciente e democrática dos conselhos, mudar a realidade escolar, construindo uma educação cidadã e crítica por meio da participação ativa em discussões, decisões, problemas e resultados referentes à escola...”

Embora o Conselho Escolar não apresente uma atuação efetiva, de acordo com o pressuposto em seu Estatuto, foi possível observar indícios de uma participação mais ou menos engajada da comunidade escolar, o que representa uma gradativa mudança no nível de apropriação do espaço da escola, pela comunidade. Este é um importante sinal de que a cultura da participação vem sendo construída como condição do trabalho coletivo, influenciando positivamente a gestão (LÜCK, 2001).

4.4 Refletindo sobre os resultados da pesquisa

O estudo revela, através das respostas das questões abertas, a participação dos representantes do Conselho Escolar no processo de gestão, demonstrando claramente que há uma evidente indissociabilidade entre as práticas e as aspirações dos participantes.

Na prática, as contradições aparecem até mesmo entre os integrantes do interior da escola, ”que gostariam de participar”, mas não são convidados. Há certo “ar de descontentamento” de alguns membros do CE no desempenho de suas atribuições – não há uma visão de amplitude do trabalho, na dimensão dos princípios que conduziriam à gestão democrática, através da efetivação das ações que são tratadas pelo CE, muito embora os assuntos debatidos apareçam quase que os mesmos, em todas as respostas, restringindo-se a comportamento/disciplina dos alunos e problemas internos da unidade escolar, além dos aspectos financeiros.

Percebe-se que não há legitimação das ações levantadas nas discussões em reuniões do Conselho Escolar, por falta de fundamentação do discurso ou na condução das medidas tomadas, conforme preceitua o Estatuto próprio.

Aparece também o caráter neutralizador das ações, com a incompatibilidade de horários dos participantes para poderem efetivar sua participação nas reuniões.

Embora todos os entrevistados digam que são feitos registros, ao analisar documentos do arquivo da escola X percebemos que há, em alguns casos, lacunas temporais e os assentamentos feitos não dão o retorno para as ações discutidas. E de pouco adianta, como tem mostrado a prática, um Conselho Escolar, por mais deliberativo que seja, se a função política do colegiado fica prejudicada pela circunstância de que a autoridade máxima dentro da escola é um diretor que não depende das hipotéticas deliberações desse Conselho, e que tem claro que este não assumirá, em seu lugar, a responsabilidade pelo (mau) funcionamento da escola (PARO, 2005).

5 Conclusão

Em razão do estudo empreendido, não é possível afirmar que o Conselho Escolar, por si só, seja instrumento de efetivação da Gestão Democrática na escola X da Rede Pública Estadual, em que pese sua condição de elemento mais ou menos participativo pela comunidade escolar.

O que se pode inferir da análise é que, além da gestão ser ainda um processo pouco explorado, apresenta nuances de um “democratismo” disfarçado de ações aparentemente participativas na facção do PPP (Projeto Político Pedagógico) e nas atividades do cotidiano escolar.

A coleta de dados empíricos enseta a preocupação do Estado nas suas políticas públicas, intenção clara em oferecer abertura para que se realize uma gestão democrática participativa. Quando isso não acontece, o que se percebe é falta de planejamento, o que tem provocado uma estagnação na evolução do processo de construção da gestão.

Outra influência possível, a partir da análise da entrevista, é a percepção de que a democracia, de forma geral, ainda está em construção. De fato, é ainda um conceito incipiente, visto que a questão da participação é algo a construir e não a implantar (... como inferido nas entrelinhas das respostas abertas).

112 Gestão Democrática Escolar e a Participação do Conselho Escolar: Uma Reflexão

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

Em se tratando da relação “democratização da escola, através do Conselho Escolar”, uma expressão bastante expressiva –“não participo”, ”não tenho abertura para isso” - mostra a parcialidade, a incompletez, fazendo com que, apesar das pessoas terem claro aquilo que é necessário para uma gestão de qualidade, não se permitem participar ativamente desse processo que exige mentalidade politizada com disponibilidade de tempo e conhecimento.

Como proposição, reitera-se a necessidade de a instituição escolar X planejar, organizar práticas democráticas, por meio da formação continuada, com estudos documentais, elaborando critérios claros de oferecer ampla participação dos segmentos do Conselho Escolar, para, juntos, construírem a identidade da unidade escolar.

Na verdade, as mudanças na estrutura escolar nem sempre são suficientes para corresponder às exigências do contexto social.

A mudança pretendida, no que se refere à democratização das relações no interior da escola X, esbarra ainda no trabalho coletivo, em vista de que não se efetiva, conforme entendimento e comprometimento dos integrantes do Conselho Escolar, pois cabe a estes a implementação da mudança.

Nesse contexto, aparece, muitas vezes, a impotência dos dirigentes, quando observam na prática o descumprimento do idealizado, planejado, por falta de atitude dos integrantes do grupo de trabalho, depreedendo-se, pelos fatos apresentados, que não há legitimidade do Conselho Escolar, por si só, enquanto instrumento de democratização das relações escolares.

Percebeu-se que as políticas atuais demonstram que a escola deva possuir em sua imagem uma

nova dimensão, voltada à participação efetiva, principalmente com a estruturação do Conselho Escolar, na construção de uma verdadeira gestão, procurando reverter a realidade de o Conselho estar funcionando basicamente como um órgão de assessoria e fiscalização da Equipe Diretiva, com o propósito prioritário de fazer da participação da comunidade escolar um objeto de preocupação, de modo a aproximar todos os segmentos das questões de real interesse, objetivando uma maior integração.

Examinando com profundidade os múltiplos aspectos que envolvem a participação da comunidade na gestão da escola pública (Paro, 1995) constatou que, embora a participação de pais e alunos nas decisões do Conselho Escolar nem sempre se faça de forma intensa que muitos poderiam esperar, o fato de ser aí o local onde se tomam ou se ratificam decisões de importância para o funcionamento da unidade escolar tem feito com que este órgão se torne a instância onde se explicitam e procuram resolver importantes contradições da vida escolar .

Para isso, faz-se necessário aprofundar a reflexão, com estudos bem organizados, pelos setores responsáveis da SEED e NRE, com cronograma pré-estabelecidos em calendário escolar, no início de cada ano letivo. Para gerir uma unidade escolar, exige-se participação efetiva para que as relações democráticas possam emergir, na prática do cotidiano escolar, pautada numa visão de organização interna de gestão, em conjunto, capazes de consolidar a construção democrática do processo educacional, com coerência de idéias e transparência na execução dos projetos de interação das relações no interior da escola pública.

113Capítulo 1 - Educação

Gestão de Políticas Públicas no Paraná

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115Capítulo 1 - Educação

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Anexo A

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