Jornal SEDUFSM Abril 2016

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Publicação mensal da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES - Abril de 2016 ISSN 2177-9988 www.sedufsm.org.br ACOM PANHE A SEDUFSM NA INTERNET twitter.com/ sedufsm facebook.com/ sedufsm SEDUFSM JORNAL DA Universidade em meio à crise do país O Brasil vive o ponto mais alto na fervura que soma crise econômica e crise política. Debate-se qual a melhor saída, se é manter o atual governo ou aprovar o impeachment de Dilma. A reportagem especial deste mês procura mostrar que, muito além das disputas partidárias, já existem projetos do atual governo que atacam fortemente o setor público e os trabalhadores em geral. Embora silenciados pela mídia, esses pacotões vêm aprofundando o sucateamento da educação e a precarização da vida. Págs. e . 6 7 Ainda nesta edição: BNCC: que intencionalidade esconde-se no projeto? Conheça o Teatro Universitário Independente (TUI) Mais de 300 estudantes aguardam moradia na UFSM Docente aposentada da Faculdade de Educação da UFF, Ângela Siqueira veio a Santa Maria e opinou sobre critérios de avaliação da Capes, produtivismo, saúde docente e financiamento da educação. Com a Palavra, pág. . 4 No dia 2 de abril ocorreu a etapa municipal do II Encontro Nacional de Educação (ENE), com cerca de 80 pessoas, que debateram um projeto de educação democrático e classista para o país. Leia mais na pág. . 9 O ritmo do adoecimento Santa Maria debate projeto de educação Fotos: FRITZ NUNES

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Publicação mensal da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES - Abril de 2016 ISSN 2177-9988

www.sedufsm.org.brACOMPANHE A SEDUFSM NA INTERNET

twitter.com/ sedufsm facebook.com/ sedufsm

SEDUFSMJ O R N A L D A

Universidade em meio à crise do país

O Brasil vive o ponto mais alto na fervura que soma crise econômica e crise política. Debate-se qual a melhor saída, se é manter o atual governo ou aprovar o impeachment de Dilma. A reportagem especial deste mês procura mostrar que, muito além das disputas partidárias, já existem projetos do atual governo que atacam fortemente o setor público e os trabalhadores em geral. Embora silenciados pela mídia, esses pacotões vêm aprofundando o sucateamento da educação e a precarização da vida. Págs. e .6 7

Ainda nesta edição:

BNCC: que intencionalidade esconde-se no projeto?

Conheça o Teatro Universitário Independente (TUI)

Mais de 300 estudantes aguardam moradia na UFSM

Docente aposentada da Faculdade de Educação da UFF, Ângela Siqueira veio a Santa Maria e opinou sobre critérios de avaliação da Capes, produtivismo, saúde docente e financiamento da educação. Com a Palavra, pág. .4

No dia 2 de abril ocorreu a etapa municipal do II Encontro Nacional de Educação (ENE), com cerca de 80 pessoas, que debateram um projeto de educação democrático e classista para o país. Leia mais na pág. .9

O ritmo do adoecimento

Santa Maria debate projeto de educação

Fotos: FRITZ NUNES

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No dia 17 de abril, a Câmara dos Deputados aprovou o prosseguimento ao Senado da denúncia de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Todos os olhos e ouvidos da opinião pública brasileira estão concentrados nos embates institucionais, que, de tão acirrados, têm potencial para desbancar até mesmo enredos de seriados ficcionais. Mas, independentemente de finalizado ou não o processo de deposição da presidenta, já há, em curso, diversas medidas que representam verdadeiros ataques aos serviços públicos e aos direitos dos trabalhadores. Na reportagem especial (págs. 6 e 7), realizamos um breve dossiê dos principais projetos em vias de ser aprovados, bem como das mobilizações de resistência do funcionalismo público pelo país.

Já na editoria Educação (pág. 9), contamos como foi a etapa municipal do Encontro Nacional de Educação (ENE), um espaço que vem se afirmando como alternativa autônoma e classista a estudantes, trabalhadores e movimentos sociais propostos a lutar pela educação de caráter público, gratuito, classista e democrático. As páginas 10 e 11 trazem temáticas relativas às lutas hoje encampadas pelas mulheres trabalhadoras, com uma resenha do filme atualíssimo 'As Sufragistas' e uma reportagem com dados que explicitam as disparidades salariais e a violência originadas da opressão de gênero.

Pelo jornal, o(a) leitor (a) ainda encontrará o perfil de Suzane Marcuzzo, docente no curso de Tecnólogo em Gestão Ambiental (pág. 11), um resgate da 'Marcha do Agradecimento' em 17 de abril de 1964 (pág. 12) e as críticas de educadores à proposta da Base Nacional Comum Curricular (pág. 3), dentre outros assuntos.

Boa leitura!

02 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

Rafa

AO LEITOR

Lutar é a saída

ABRIL DE 2016

A diretoria da SEDUFSM é composta por: Presidente: Adriano Figueiró; Vice-presidente: Humberto Zanatta; Secretário-geral: Marcia Paixão; 1º Secretário: Gianfábio Franco; Tesoureiro-geral: Getulio Lemos; 1º Tesoureiro: Claudio Losekann; Suplentes: Maria Celeste Landerdahl e Hugo Blois Filho.

Jornalista responsável: Bruna Homrich Vasconcellos (MTb nº 17487) Equipe de jornalismo: Fritz R. Nunes, Ivan Lautert e Rafael Balbueno Equipe de Relações Públicas: Fernanda Brusius e Vilma Ochoa Demais funcionários: Dirleia Balensiefer, Maria Helena Ravazzi, Paulo Marafiga e Rossana Siega

Diagramação e projeto gráfico: J. Adams Propaganda Ilustrações: Clauber Souza e Rafael Balbueno Impressão: Gráfica Pale, Vera Cruz (RS). Tiragem: 1.600 exemplares.Obs: As opiniões contidas neste jornal são da inteira responsabilidade de quem as assina. Sugestões, críticas e opiniões podem ser enviadas via fone (55) 3222-5765 ou pelo email

[email protected]ções também podem ser buscadas no site do sindicato: A SEDUFSM funciona na André Marques, 665, cep 97010-041, em Santa Maria (RS). www.sedufsm.org.br

EXPEDIENTE

PALAVRA DA DIRETORIA

Na sequência das conferências gerais planejadas pela comissão pré-estatuinte, no dia 14 de abril realizou-se um importante debate acerca da relação existente entre a estrutura universitária, o controle da atividade acadêmica e a construção da democracia no interior da univer-sidade. Tomando como parâmetros a estrutura existente na jovem Univer-sidade Federal do ABC ou a experiên-cia realizada na década de 80 pelo CCSH da UFSM, um dos principais pontos de atenção do debate esteve centrado sobre o papel desempe-nhado pelos departamentos dentro da estrutura atual da universidade. Criação da reforma universitária de 68 promovida pelo regime militar em substituição ao modelo das cátedras, os departamentos acadêmicos foram pensados dentro do organograma institucional como um nível estraté-gico e burocrático de controle da atividade docente, potencializando, em alguns casos, muito mais os debates corporativos do que propria-mente as estratégias de qualificação

e inovação das atividades de ensino, pesquisa e exten-são.

É bem verdade que a lógica que agrega hoje os departamentos da institui-ção é bastante diversa, sendo que os mesmos, por vezes, representam recor-tes nitidamente identifica-dos com o perfil curricular de determinadas profissões e, em outros casos, este perfil cede espaço para a agregação dos docentes e técnico-administrativos em torno de áreas ou sub-áreas do conhecimento, o quê, de qualquer forma, dificulta sobremaneira o trânsito interdisciplinar do conheci-mento dentro da instituição. Assim, a eliminação dos departamentos poderá tra-

zer como benefício uma maior liberdade para a reorganização do fazer docente a partir de novas lógicas de agregação e troca acadêmica.

Não obstante, em que pese as intencionalidades existentes na sua criação, os departamentos acadê-micos, com todos os seus conflitos e contradições, têm servido como espaços importantes para a reflexão, discussão e produção do conheci-mento que nos trouxe até o padrão de qualidade que a UFSM tem hoje. A organização do trabalho docente e sua vinculação institucional (desde a garantia infra-estrutural para as atividades de ensino e pesquisa, os planos de capacitação e afastamen-to, as licenças e férias, etc.) parecem ser mais facilmente administráveis dentro das estruturas departamen-tais do que em experiências de estruturas mais flexíveis existentes em outras universidades brasileiras.

Não há dúvida de que o vício de origem criado pela centralização dos processos de planejamento, exe-cução e avaliação da atividade acadêmica sobre a mesma chefia e colegiado precisa ser combatido e modificado, a fim de permitir um arejamento democrático das estru-turas e decisões que são tomadas. A relação entre o administrativo e o acadêmico precisa ser melhor elabo-rada, a fim de que uma dimensão sirva de apoio e valorização da outra, mas precisamos ter o cuidado para que o novo, saudado apenas pela novidade, não represente uma aven-tura sustentada pela vontade de fazer diferente. Reformar a casa quando se está morando dentro, é um desafio bem mais complexo do que construir uma casa nova, e isso os debates da estatuinte estarão nos mostrando ao longo deste ano. Há muito para ser feito, e essa é a boa notícia para todos aqueles que acreditam que são as pessoas que movem a roda da história.

Estrutura da universidade e trabalho docente:

uma reflexão necessária

*Gestão Sindicato pela Base

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Em junho deste ano, o governo federal espera apresentar a versão final do documento intitulado Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que, se apro-vado, terá ingerência direta sobre currículos e práticas pedagógicas nas escolas básicas de todo o país. Isso ocorrerá porque, com esse projeto, pre-tende-se homogeneizar os conteúdos lecionados na Educação Básica, como propagandeia o site do Ministério da Educação (MEC): “Com a BNCC, ficará claro para todo mundo quais são os elementos fundamentais que precisam ser ensinados nas Áreas de Conheci-mento: na Matemática, nas Linguagens e nas Ciências da Natureza e Humanas”. Contudo, uma das perguntas que estu-dantes e educadores mais vêm se fazen-do é: por que a formalização, num país costurado por diversidades regionais que gritam para serem reconhecidas e detêm inegável potencial formativo, de um conhecimento uniforme, unilateral e gerador de um falso consenso?

Parece que temos aí, escondida por detrás de um discurso aparentemente fraterno, uma clara intencionalidade política, até mesmo porque a proposta da BNCC já iniciou viciada, visto que deriva de um Plano Nacional de Educa-ção (PNE) insensível às reivindicações de trabalhadores, entidades sindicais e movimentos sociais. Importante visuali-zar, também, que o projeto vem em consonância com outros em curso no país, tais como o 'Escola sem Partido' – iniciativa que, com a consigna 'Diga não à doutrinação', proíbe até mesmo a utilização da palavra 'gênero'.

Respondendo ao projeto de uma base curricular comum – e a outros tantos que vêm retirar a autonomia dos educadores e precarizar os locais de estudo e trabalho -, o Grupo de Trabalho de Políti-

(Entretítulo) ANDES-SN contrário à BNCC

Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES 03

PANORAMA

ABRIL DE 2016

Base Nacional Comum Curricularca Educacional (GTPE) do ANDES-SN formulou a cartilha 'Projeto do Capital para a Educação: análise e ações para a luta', disponível no site da Sedufsm.

Focalizando especificamente a BNCC, o Sindicato Nacional também lançou uma nota política contrária ao projeto, situando-o num contexto de neoliberalismo e neoconservadorismo. Em um dos trechos, afirma: “A BNCC proposta reforça as tendências interna-cionais de centralização curricular verificadas nos países centrais do capitalismo com o objetivo de controle político-ideológico do conhecimento, viabilizando a avaliação em larga esca-la, externa às unidades escolares, e, em consequência, responsabilizando os professores e os gestores pelos re-sultados da aprendizagem, desconsi-derando as condições efetivas da realização das atividades educacionais, como a infraestrutura disponível nas escolas e as condições de trabalho docente”. A íntegra da nota pode ser conferida em nosso site.

Quem também situa a BNCC num cenário político de neoliberalismo é o professor do departamento de História da UFSM e 2º vice-presidente da regional Rio Grande do Sul do ANDES-SN, Júlio Quevedo. Ele explica que, nessa fase do capitalis-mo, o objetivo é 'treinar' alunas e alunos para o mercado de trabalho, e a BNCC viria para sanar essa necessidade.

“No campo de disputas de concepções de mundo, a proposta de Base procura hegemonizar o pensamento, de forma acrítica, desconsiderando as multiplicidades culturais que perpassam o Brasil. Assim, reforça as tendências interna-cionais de centralização curricular. Trata-se de uma forma de ataque à construção da consciência da classe

trabalhadora. Na proposta para os conteúdos de História, a BNCC compromete o princípio de processo histórico e fere a lógica do estudo do tempo, com a retirada de conteúdos significativos como a questão da classe social”, diz o docente.

Na análise de Quevedo, a proposta da BNCC formula, também, conhe-cimentos voltados à competição, tendendo a premiar como melhor preparado aquele estu-dante que se submeter ao que é transmitido, sem questionar ou proble-

matizar os conteúdos. Outra crítica que vem sendo feita diz respeito ao aspecto meritocrático do projeto. O diretor do Sindicato dos Professores Municipais de Santa Maria (Sinprosm), Paulo Merten, diz que a BNCC faz coro a ideias já implementadas em outros países e cujo enraizamento não se dá no chão da escola.

“Essa base tem componentes fortemente ligados a uma educação meritocrática, autoritária, vinculada ao capital financeiro e que vai dar instrumentos para esses burocratas disciplinarem e cobrarem um modelo de educação em todo Brasil, perdendo as identidades culturais locais”, preocupa-se Merten, que também acredita ser a BNCC uma forma de intensificar as políticas de cobrança que vêm sendo feitas através das provas e dos exames.

Uma construção que se deu por dentro dos gabinetes do MEC e que, não obstante um verniz democrático –

(Entretítulo) Base Comum estimula competitividade

(Entretítulo) Política burocrática

Um falso consenso de conhecimento

BNCC tem forte

componente meritocrático

do que é exemplo a consulta eletrônica via web, promovida pelo governo e conclusa em 15 de março -, mostra todo o autoritarismo que a encharca. É o que pensa o diretor do Sinprosm, para quem os especialistas responsáveis por elaborar o texto-base da proposta foram escolhidos a dedo pelo MEC. “Estão querendo dar um ar de legitimidade a essa publicação, mas nós vemos com muita preocupação essa ingerência e burocratização. Quando colocamos a BNCC ao lado, por exemplo, da 'Escola sem Partido', vemos que está se tentando o controle social e político sobre o fazer pedagógico, tirando o protagonismo do educador, a riqueza do chão de escola e das relações de diálogo que temos com o conjunto dos mo-vimentos sociais”, reflete Paulo Merten. Ele ainda destaca que está em jogo o interesse editorial, pois novos livros terão de ser confeccionados para contemplar as novas diretrizes de conteúdo.

A universidade não deve passar longe desse processo de uniformizar as bases curriculares em nível nacional. Para Júlio Quevedo, conteúdos como História Antiga, Medieval, Arte, Ásia e Funda-mentos da Educação estão fadados ao desaparecimento, afinal, não estão contemplados na BNCC. “Por exemplo, na área de História, primeiro se aborda a Cultura Afro brasileira para depois estudar, e aliás com um longo hiato de tempo, a diáspora africana dos séculos XVI e XVII. Primeiro se estuda as resis-tências quilombolas e muito posterior-mente o processo de escravização na África. São fatos descolados do contexto”, problematiza o docente, informando que a própria Associação Nacional de Professores de História (ANPUH) já se manifestou contrária à Base.

( E n t r e t í t u l o s ) I m p a c t o n a s licenciaturas

Júlio Quevedo, 2º vice-presidente da Regional RS

Paulo Merten, diretor do Sinprosm

BRUN

A HO

MRIC

HARQUIVO/SEDUFSM

ANDES-SN contrário à BNCC

Base Comum estimula competitividade

Política burocrática

Impacto nas licenciaturas

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Sedufsm

Ângela

- Em 2009, a senhora escre-veu uma carta à Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Edu-cação da UFF. No documento, avisava sobre seu futuro desligamento do programa e tecia algumas críticas. Comente um pouco mais sobre o que a motivou a se desvincular da pós-graduação.

- Realmente, em 2012, meu desli-gamento ocorreu. Mantenho todas as críticas porque essa avaliação produtivista não leva em conta a qualidade do trabalho. Quer dizer, você não é avaliado pelo que faz, mas pela quantidade do que faz. Eu fui vice-coordenadora da pós em Educação e uma das grandes brigas que enfrentamos foi conseguir a introdução de livro, porque livro não pontuava nada na Capes. Fizemos essa briga junto a outros coordenadores de curso, principalmente das áreas de ciências sociais e humanas, para que o livro fosse considerado e pontuado. Para escrever um livro você pode demorar quatro, cinco, dez anos. Mas, ser produtivo para a Capes significa que você tem de publicar artigo todo ano. De 3 em 3 anos, você tem de ter 'x' publicações. Ninguém tem essa criatividade para fazer coisa nova todo ano. Você acaba se repetindo e fazendo autoplágios. Ou, ao invés de publicar um livro, faz 10 artigos. Aliás, se você publicar um artigo com qualis internacional, valerá mais pontos que um livro. Essa é a lógica da fragmentação do conhecimento, porque o livro tem um corpo, introdução, desenvolvimento, conclusão. Lógico que um artigo tem isso, mas é algo condensado e difere de um livro. Outro ponto: sempre participei de debates em sindicatos e associações, mas nada disso conta ponto na Capes. E, para mim, é muito mais importante e tem muito mais resultado do que publicar artigo no exterior. Tenho publicações nos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, mas, para o Brasil, para meus colegas e alunos, não conta, porque eles não vão ler. Isso na avaliação da Capes tem um peso enorme, mas para mim não tem

nenhuma referência social. Vi que muitas pessoas estavam começando a pautar suas atividades pelo que pontuava ou não na Capes. É uma inversão completa na forma de trabalhar na academia. Então essas coisas foram me cansando na pós.

- O movimento sindical do-cente vem apontando: a categoria está adoecendo física e psiquicamen-te. A que a senhora atribui tamanho desgaste?

- Com a demissão dos funcioná-rios e a não recontratação, os professores passaram a fazer funções que antes não eram suas, como cuidar da parte administrativa dos projetos. Agora você faz um projeto e tem de guardar tanta nota e tanta burocracia para a presta-ção de contas... É um pro-cesso muito complicado você participar do edital, receber os recursos e depois ter de fazer a prestação de contas. Então tem essa parte administrativa que tira seu tempo de pesquisa. Ao invés de você estar fazendo pesquisa, você está fazendo compra, licitação, prestação de contas, virando quase um burocrata. E hoje você não tem mais computador, cadeira, livro, papel ou cartucho de impressora se não fizer um projeto. Tem também a questão do aumento dos alunos na graduação a partir do Reuni. Pelo menos na UFF, há muitos anos, você tem de dar aula na graduação e na pós todos os semestres [incluindo a lato sensu], fora participar de colegiado. Por isso as pessoas ficam com Síndrome de Burnout, porque aumenta a carga de trabalho. Quer dizer, você dá aula na graduação, na pós lato sensu, na pós stricto sensu, eventualmente numa extensão, tem bolsistas de iniciação científica e orientandos de mestrado e

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Ângela

doutorado lato sensu. Tem professor to-mando remédio traja preta, tendo ataque cardíaco e derrame, por conta dessa intensificação e precarização do trabalho.

- Se formos pensar, a lógica empreendedora que adentra a universidade influencia o fazer acadêmico, de forma que os profes-sores têm de serem verdadeiros empreendedores se quiserem conquistar editais e recursos. Como a senhora vê essa questão?

- A falta de financiamento da universidade – que, para mim, é

proposital-, obriga você a apresentar um edital e ter de cuidar dessas coisas burocráticas. Além disso, os editais, muitas vezes, são direcionados, então você tem de fazer um projeto que se encaixe naquele edital. Tem gente que pode estar se contra-riando nos seus princípios

para participar de algum edital. Tem gente que já faz direto financiamento com empresas privadas ou mesmo com empresas públicas. E isso significa que quem vai dar o norte na pesquisa não é mais o professor, mas quem está pagando, seja o setor público ou o privado. Isso é muito complicado. Há professores, principalmente nas áreas de engenharias, que fazem consultoria a torto e direito. Tem também professor que faz curso de pós-graduação lato sensu caríssimo – R$ 15 ou até R$ 25 mil reais - numa universidade pública. Estão aprovando um projeto de lei para tornar isso legal. Até agora é inconstitucional, mas vai sendo praticado. E tem professor que dá aula nesses cursos, mas não dá aula na turma de pós. São esses os professores contrários à greve e a qualquer movimento, porque se a universidade para, eles deixam de receber

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Ângela

do aluno que está pagando.

- Só entre 2010 e 2014, os gastos do governo com o Fies [Fundo de F inanciamento Estudant i l ] passaram de R$ 1,7 bilhão para R$ 12,2 bilhões. Em sua avaliação, que papel vem cumprindo o governo para o fortalecimento da educação superior privada?

- O crescimento da educação privada no Brasil vem desde o governo do Fernando Henrique Cardoso [FHC]. Ele deixou criarem um monte de instituições privadas, aumentou vaga, aí depois que deu problema, o Lula [Luiz Inácio Lula da Silva] criou o Prouni para salvá-las da crise. E, mais recentemente, foi criado o Fies. Quer dizer, há todo um direcionamento de fortaleci-mento do setor privado e enfraquecimento do público no Brasil. Isso está claro. Os empresários reclamam, vão à mídia, fazem chororô que a matrícula vai cair porque tem pouca bolsa de Fies. Eles fazem isso e, na semana seguinte, tem mais verba para o Fies. Os empresários da educação conse-guiram mudar o PNE [Plano Nacional de Educação], pois os 10% do PIB [Produto Interno Bruto] que vai entrar em 2020 ou 2025 será verba pública para educação, e não para educação pública. Daí essa verba vai toda para o Fies. E o Fies agora será estendido para os cursos técnicos, tecnológicos e para a pós. Os empresários estão pulando e sorridentes. Hoje, 40% da verba do Kroton – maior grupo educacional do mundo - vem do Fies, fora as isenções do Prouni. Antes era só abrir espaço para criar mais instituições, e no governo Lula e Dilma, há a transferência de recursos públicos para o setor privado via renúncia fiscal do Prouni e financiamento via Fies. Na verdade, tudo que você tem de projeto, de todos os ministérios aqui no Brasil - e com influência dos organismos internacionais - tem a ver com a perspectiva de educação como mercadoria. Isso é muito pernicioso.

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Ângela

04 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

COM A PALAVRA

ABRIL DE 2016

ÂNGELA SIQUEIRA

Um rompimento político com a pós

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“Hoje, 40% da verba

do Kroton vem do

Fies”

Ângela Siqueira, docente aposentada da Faculdade de Educação da Universidade Federal

Fluminense (UFF), veio a Santa Maria no dia 8 de março participar do debate 'Os desafios da

universidade pública brasileira frente às políticas de privatização', promovido pela Sedufsm. Na

conversa que o(a) leitor(a) confere abaixo, a docente qualifica algumas críticas ao avanço da

educação superior privada, aos critérios de avaliação da Capes e à impressão de um ritmo

produtivo que vem adoecendo a categoria.

Page 5: Jornal SEDUFSM Abril 2016

Cícero Nogueira – Administração do Colégio Politécnico da UFSM“Como aqui [Politécnico] funciona nos três períodos e, à noite, temos o maior número de alunos, temos preocupação com a questão da iluminação. Até um tempo atrás, a iluminação tanto na avenida principal – que vai em direção ao Hospital Veterinário – quanto na que passa em frente ao colégio e vai em direção à Fitotecnia, era escassa. Contudo, recentemente colocaram mais focos de iluminação e a situação melhorou. Mas os próprios vigilantes que circulam no local não conseguem ter controle de toda área. Outra situação que tem acontecido com frequência é a quantidade de animais soltos, que abordam as pessoas de uma maneira bastante agressiva em alguns momentos à noite. Animais que são abandonados dentro do campus, criando condições complicadas”.

Marina Demori Hackbarth – Estudante de Engenharia Química da UFSM“Moro na Casa do Estudante [CEU] e lá têm ocorrido problemas nos blocos onde o banheiro é fora do apartamento. Há casos de homens que filmam ou tiram foto das meninas tomando banho. Isso é uma coisa extremamente invasiva e elas passam muito medo. Também tem relatos de meninas que, quando estão voltando do CEFD [Centro de Educação Física e Desportos] para a CEU, passam por uma área extremamente escura. Quando tem festa no campus, vem muita gente de fora e percebemos vários grupos de homens nos arredores da CEU, o que também deixa as meninas da Casa extremamente desconfortáveis. Nos sentimos, de certa forma, ameaçadas. Semana retrasada um próprio morador da Casa bateu no nosso apartamento e perguntou se minha colega de quarto estava sozinha. Ele queria entrar. Esse moço foi expulso da União por assedio às meninas. Minha colega está com medo de abrir a porta à noite. Agora, ela só abre a porta lá em casa quando há mais pessoas no apartamento. A gente não sabe nem a quem entregar esse caso. Porque ele não fez nada físico, mas é uma situação de ameaça”.

Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES 05ABRIL DE 2016

OPINIÃO

JURÍDICO SEM DÚVIDAS

Ação coletiva cobra adicional noturno

*Por Assessoria de Imprensa do escritório Wagner Advogados Associados

A Sedufsm, por meio de sua assessoria jurídica, encabeça nova ação coletiva. Dessa vez, a reivindicação é pelo paga-mento do adicional noturno de 25% a todos os docentes da Carreira do Magistério Superior, cuja jornada estenda-se para além das 22h. A ação foi elaborada tendo em vista que determinadas instâncias da Administração Pública vêm negando a concessão desse direito, usando o argumento de que, aos professores com Dedicação Exclusiva (DE), deve se estender a interpretação extraída do artigo 19, §1º, da Lei n°. 8.112/90, destinado a regulamentar o regime de dedicação dos ocupantes de cargos em comissão ou confiança.

O artigo 19, §1º, da Lei n°. 8.112/90 diz que “o ocupante de cargo em comissão ou fun-ção de confiança submete-se a regime integral de dedicação ao serviço, observado o disposto no art. 120, podendo ser convocado sempre que houver interesse da Administra-ção”. Dessa forma, a Administração entende que a livre convocação dos ocupantes de tais cargos, desde que presente o interesse público, não demanda pagamento de hora noturna.

No texto da nota técnica que fundamenta a ação coletiva, escrita pelos advogados Heverton Padilha e Luciana Rambo, do escritório Wagner Advogados Associados, a equipa-ração entre docentes com DE e ocupantes de cargos de comissão ou confiança é caracteri-zada como falaciosa. “Ainda que se considere tal entendimento pertinente aos cargos em comissão ou funções de confiança, não há como estender aos docentes com dedicação exclusiva tratamento idêntico [...] A tentativa de equiparar os cargos em comissão ou funções de confiança com os docentes em regime de Dedicação Exclusiva, suprimindo direitos assegurados em lei, consiste em ato imoral que vai de encontro ao ordenamento pátrio”, aponta trecho do documento.

E, para corroborar essa análise, eles resgatam a Lei n°. 12.772/2012, que trata do regime de DE ao qual estão submetidos os integrantes da carreira do Magistério Superior. Segundo o texto da Legislação, fica claro que Dedicação Exclusiva significa a obrigação dos docentes em prestar quarenta horas semanais de trabalho, divididas em dois turnos diários completos. Também, esses trabalhadores ficam impedidos de exercer outra atividade remunerada, seja pública ou privada.

“À medida que os docentes em regime de Dedicação Exclusiva estão obrigados a prestar dois turnos diários e completos, tem-se por óbvio que não estão à disposição da Administração para convocações aleatórias, de acordo com a existência de interesse público. Ademais, a existência dos cursos noturnos é uma realidade bastante presente em nosso país, motivo pelo qual não se mostra razoável ou isonômica a vedação à concessão dos benefícios da jornada noturna aos docentes cuja incumbência é a de que um dos turnos seja laborado à noite”, conclui o documento.

Novos critérios orçamentários na UFSM

Em 2016, os critérios que serão utilizados pela reitoria para repasse de verba às unidades de ensino da UFSM devem ser similares àqueles que o Ministério da Educação (MEC) elenca como centrais para definir quanto cada universidade deve receber.

Até o último ano, preponderavam, por exemplo, no Índice de Participação nos Recursos (IDR), critérios como Produção Acadêmica de Graduação, Produtividade Acadêmica, Produção Acadêmica de Pós-Graduação, Disponibilidade de Espaço Físico, Produção Científica e Intelectual, Produtividade de Pesquisa e Produção de Extensão. Era o balanço desses indicadores que definia o quanto de recurso cada unidade da UFSM receberia. Agora, segundo a nova proposta, será ressaltado o cálculo do aluno equivalente, cuja fórmula, para graduação, considera o número de estudantes diplomados, a duração media do curso, o coeficiente de retenção, número de ingressantes, bônus por turno noturno, bônus por curso fora da sede e peso do curso. Frank Casado, pró-reitor de Planejamento, explica que o peso do curso refere-se, dentre outros aspectos, aos custos fixos que o curso demanda. Dessa forma, no exemplo dado pelo gestor, o curso de Medicina teria maior peso que uma graduação de Ciências Humanas.

A proposta foi homologada pelos diretores de centro, contudo, ainda tem de ser aprovada pelo Conselho Universitário. Casado salienta que ainda não é possível calcular o quanto de recurso, efetivamente, poderá ser destinado a cada unidade, uma vez que isso depende do orçamento a ser liberado à universidade. A nós, resta aguardar para ver o quanto, dessa vez, será contingenciado pelo governo às universidades.

E não é só no repasse da reitoria às unidades que serão feitas alterações, mas na própria distribuição orçamentária no interior das unidades de ensino. Agora, ao receber o recurso da reitoria, as unidades também devem ter novos critérios para distribuição interna das verbas. A diretora do Centro de Ciências Naturais e Exatas (CCNE), Sônia Cecchin, explica que vem se buscando aproximar os critérios internos daqueles utilizados pelo MEC.

“Há uma nova matriz de distribuição do recurso que vem para a UFSM, que é a Matriz Andifes. Mas nós, internamente, ainda temos um modelo antigo. Queremos fazer ajustes de modo que as pessoas se incorporem na ideia de trabalhar alinhadas com esses critérios que são usados pelo governo para traçar o orçamento da universidade. Por exemplo, como iremos distribuir recursos para os departamentos?”, diz Sônia.

O campus da UFSM recebe, diariamente, milhares de pessoas que para lá se deslocam tendo as finalidades mais diversas. Não é possível, dado seu caráter público, o cerceamento do acesso a esse espaço. Contudo, vêm sendo relatados problemas relativos a furtos, assédios e outras situações desconfortáveis que nos fazem

questionar: o campus é seguro o suficiente? Fotos: BRUNA HOMRICH

Otacílio Neto – Técnico-administrativo em Educação da UFSM“A universidade cresceu demais, então os problemas também cresceram. Dentro do campus, percebo que falta iluminação em vários setores. A vigilância não é suficiente para cuidar tudo e as câmeras também não são lá muito eficientes, principalmente à noite. Às vezes acontecem brigas nas festas dentro do campus, com pessoas que vêm para festejar, mas enchem o pote e causam confusão. É muita gente, é um universo, só o Restaurante Universitário serve mais de 3 mil almoços todo dia, para você ter uma ideia do quanto de pessoas circulam dentro da universidade. Não podemos censurar ninguém

direito de comemorar, aí não pode”.

de vir aqui. Mas precisaríamos de mais pessoas circulando pelo campus para botar um pouquinho de ordem – não chegar descendo a porrada em todo mundo, nada disso. A liberdade do acadêmico tem de ser preservada, mas chega um ponto em que o cara extrapola no seu

Você considera o campus seguro?

Page 6: Jornal SEDUFSM Abril 2016

FERVE,

06 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

REPORTAGEM ESPECIAL

ABRIL DE 2016 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES 07ABRIL DE 2016

Paulo Rizzo: PLP 257/2016

é ataque de proporções inéditas aos direitos dos servidores

Comissão especial da Câmara votará relatório de deputado favorável à prisão de José Ivo Sartori, governador do Rio Grande do Sul, por crime de parcelamento salarial contra os trabalhadores. Oposição acusa de criminoso o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257/2016, que prevê a destruição da previdência social, congela salários e suspende concursos. Na Avenida Paulista, gigante pato inflável é levado por milhares de manifestantes que protestam contra corte de R$ 6,4 bilhões no orçamento da Educação.

O leitor deve ter estranhado que as manchetes iniciais de nossa reportagem não condizem com aquelas a que viemos assistindo, lendo ou ouvindo nos últimos meses. É que projetamos, aqui, um cenário ideal, provido, por que não, de certo realismo mágico. Pensar em ver a grande mídia, hoje, noticiando questões como as colocadas acima parece tão possível quanto sentarmos para debater negócios com um gorila engravatado. Alguns podem acusar de demasiado pessimista tal analogia, mas o cerne do debate é que, enquanto frações da classe dominante digladiam-se 'lá em cima', a educação, o serviço público e seus trabalhadores passam longe do jogo institucional.

Talvez não queiramos nos prender aqui às diversas concepções e consignas em disputa no momento. Talvez esse seja o espaço onde possamos levar para o centro do debate aquilo que hoje tem sido arrastado para a periferia da opinião pública: em meio a uma crise política e econômica, próprias de um sistema capitalista, que futuro é reservado à universidade e aos serviços públicos? Está certo que ninguém aqui tem o dom da futurologia, mas há coisas que parecem materiais o suficiente para serem analisadas.

Independentemente de se concretizar ou não o processo de impeachment, o orçamento da Educação já foi reduzido em mais de R$ 6,4 bilhões só nos três primeiros meses desse ano. E essa foi apenas uma das áreas afetadas pelo duro ajuste fiscal que, nesse início de semestre, já cortou R$ 44,6 bilhões das mais diversas áreas sociais, como se pode ver abaixo:

Com o argumento de atingir a meta fiscal de 2016 e garantir o superávit primário, um governo que se autoproclama porta-voz dos trabalhadores impôs a esses uma dura política de austeridade e encontrou, para isso, justificativas que mascaram, por exemplo, sua submissão ao sistema da dívida pública – responsável por abocanhar, todos os anos, quase metade do Orçamento da União.

Engana-se, contudo, quem acha que a deposição desse governo é garantia para melhores condições de vida. No afã da cadeira presidencial, o PDMB lançou, no final do ano passado, um texto intitulado 'Uma ponte para o futuro', em que defende a autonomia dos entes públicos para alterar anualmente o orçamento da União, tendo por objetivo o equilíbrio das contas. Para isso, a sociedade e o Congresso Nacional teriam de eleger prioridades para o país, de acordo com os 'recursos e as necessidades'. Levando-se em conta que dificilmente governantes e trabalhadores conseguem obter um consenso na definição do que é prioritário, o governo pode até mudar, mas tudo leva a crer que o ajuste fiscal permanecerá firme e muito bem, obrigado.

Estudantes e sindicalistas vêm alertando: a educação é a bola da vez, e isso não é nada bom. Como já feito e bem-sucedido – para o empresariado – em outras áreas sociais, a estratégia, aqui, é precarizar para privatizar. E exemplos disso podem ser vistos já há algum tempo na universidade através da inserção e alastramento das parcerias público-privadas, da ingerência de empresas privadas na produção científica e da própria

Em 2016, mais tesouradas na Educação

A privatização pede passagem

privatização dos hospitais universitários via Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). Problemas oriundos da falta de financiamento são tratados como tropeços de gestão, e aí vêm se cristalizando, país afora, propostas que visam entregar a administração a Organizações Sociais (OS), algo que, embora ainda apenas espreite a universidade, já vem sendo efetivado nas escolas básicas, vide o estado de Goiás.

Para além dessa diluição mais sutil do público no privado, projetos escancaradamente benéficos à iniciativa privada avançam a toque de caixa. Em 2016, o governo federal pretende investir R$ 18,7 bilhões no Programa de Financiamento Estudantil (Fies), que, com a propaganda de ampliar o acesso de jovens ao ensino superior, cria uma situação de endividamento aos trabalhadores.

E o cenário está ruim a ponto de ter mobilizado até mesmo aqueles que ainda não adentraram a universidade: os estudantes secundaristas. Tendo iniciado em São Paulo, as ocupações de escolas se alastraram para Goiás e Rio de Janeiro. Nesse último estado, especificamente, milhares de servidores estaduais estão em greve geral contra o desmonte dos serviços públicos e o ataque aos direitos. Entre as pautas da greve estão a contrariedade ao parcelamento e à alteração do calendário de pagamento dos salários, às mudanças na Previdência – que preveem aumento da contribuição dos servidores de 11% para 14% -, ao parcelamento do 13º salário e ao não reajuste salarial.

Para as bandas da Bahia, a possibilidade de uma greve geral do funcionalismo público também não é descartada. Em constante mobilização, os servidores – com presença expressiva de docentes federais – manifestam-se contra o descaso do governo estadual em negociar a pauta de reivindicações protocolada pelo Fórum das Associações Docentes das Universidades Estaduais da Bahia (Fórum das ADs), em dezembro de 2015, e contra os ataques aos direitos trabalhistas da categoria docente e do conjunto dos servidores públicos do estado.

E não vamos para muito longe: na UFSM, o semestre iniciou evidenciando problemas nada pequenos na assistência estudantil. Mais de 300 estudantes que ingressaram nesse primeiro semestre necessitam de moradia, contudo, ainda se encontram em alojamentos provisórios e com estrutura precária, visto a não disponibilidade de vagas nas Casas do Estudante.

Esses exemplos – apenas alguns no universo de greves, paralisações e manifestações de rua – dão conta de nos mostrar que a situação das universidades, dos serviços públicos e dos trabalhadores já não está tranquila, e muito menos favorável. Mais que isso, mostram que, para além da política institucional e de suas tentativas de se impor como problema central de nosso tempo, existem trabalhadores fazendo lutas autônomas e classistas.

Paulo Rizzo, presidente do ANDES-SN, ressalta que “é momento de muita atenção e compreensão dos projetos que estão em curso. É momento de manter a resistência contra essas medidas. Nós estamos sujeitos a mais coisas e é isso que os colegas, professores e servidores, precisam compreender. Não está garantido sequer os 5,5 % que o governo concedeu e que não repõe a inflação para agosto desse ano, não estão assegurados concursos, as alíquotas da previdência podem subir de 11 pra 14%”.

De tão nefasto, esse projeto deveria estampar as capas dos maiores jornais do Brasil e ser pauta de um Globo Repórter. Por ora, no entanto, cabe aos meios comunicacionais sindicais jogar um pouco de luz sobre as consequências que virão sob os ombros dos trabalhadores caso o Projeto de Lei Complementar nº 257/2016 seja aprovado. Hoje, tramita em caráter de urgência constitucional na Câmara dos Deputados. Ao problematizar o conteúdo político dessa investida, Rizzo diz que o projeto é revelador de uma consonância entre governo e oposição quando o assunto é corte de direitos.

“Estamos numa situação com a edição, pelo governo, do PLC 257/2016, que demonstra que não há divergências de fundo entre situação e oposição, porque todos estão de acordo com o ajuste fiscal e se unindo para cortar as despesas em benefício do pagamento da dívida. Por exemplo, esse projeto que o governo mandou para o Congresso já tem o apoio de 25 governadores e é um projeto para congelar folhas de pagamento e aumentar contribuição previdenciária”, opina o dirigente.

PLP 257/2016

Jogo político ANDES-SN

Recentemente, o ANDES-SN divulgou documento em que analisa os principais ataques contidos no PLP 257/2016, entre esses, suspensão dos concursos públicos, congelamento de salários, não pagamento de progressões e outras vantagens (como gratificações), destruição da previdência social e revisão dos Regimes Jurídicos dos Servidores.

“Caso seja implementado, o PLP 257/2016 eliminará alguns dos poucos direitos dos servidores públicos ainda vigentes, como por

exemplo, a licença prêmio, a licença sabática, os quinquênios, a sexta parte, as progressões, as promoções e as vantagens de natureza transitória (como, por exemplo, gratificações). Além disso, considerando as ações previstas para cada estágio de implantação desse ajuste fiscal, teremos a suspensão da contratação de pessoal e da criação de cargos, empregos e funções, o impedimento de mudanças nas carreiras dos servidores que impliquem aumento de despesas, o congelamento dos salários dos servidores e das despesas de custeio, a limitação do reajuste do salário mínimo à inflação e a

instituição de 'programas de desligamento voluntário e licença incentivada de servidores e empregados'”, diz trecho do documento, que pode ser acessado, na íntegra, no site da Sedufsm.

Contra o projeto, uma intensa mobilização vem sendo articulada entre o funcionalismo público, que não descarta uma greve geral. No dia 13 de abril, representantes das oito centrais sindicais reuniram-se com o ministro-chefe da Casa Civil, Ricardo Berzoini, e pressionaram pela retirada do projeto da pauta da Câmara dos Deputados. O governo, contudo, foi impassível. “O ministro abriu a reunião informando que concordou em realizar a reunião com as Centrais Sindicais, mas que não está em discussão a retirada do PLP/257 da pauta do Congresso, ou seja, o governo reafirma que quer aprovar esse projeto”, contou Paulo Barela, representante da CSP-Conlutas na reunião.

“É importante mantermos a mobilização e pressionarmos o governo e os parlamentares pela retirada do projeto de pauta. Não podemos 'baixar a guarda' nesse momento e precisamos intensificar a luta contra esse projeto, que é mais um ataque, de proporções inéditas, aos direitos dos servidores públicos das três esferas”, disse Paulo Rizzo.

E justamente para manter a resistência a mais esse pacote de ataques, o 14 de abril foi chamado 'Dia Nacional de Lutas contra o PLP 257/2015', tendo reunido, tanto em Brasília quanto em diversas outras regiões do país, mobilizações contrárias ao projeto. Entre as cidades que tiveram manifestações estão Belém, Macapá, Teresina, Natal, Porto Alegre, Campinas, Feira de Santana, São Paulo, Florianópolis e Rio de Janeiro.

Os ataques descritos nesse texto demonstram que o futuro da universidade e dos serviços públicos está sob ameaça. Uma ameaça nada evasiva ou sutil, mas bem material e com elementos já concretizados em várias regiões do país. Em meio a um cenário instável e desagregado e a uma política institucional que faísca de tão quente, aos trabalhadores parece ficar a pergunta: quem vai pagar – ou já está pagando – a conta da crise?

Ato nacional em Brasília contra PLP 257/2016

* R$ Milhões** Nos limites para emendas estão consideradas as de execução impositiva (individual e bancada estadual)

Órgão

Valor previsto pela Lei Orçamentária

Anual (LOA)*

Valor previsto após os cortes

do ajuste fiscal*

4.476,4

713,3

1.755,6

36.649,9

855,1

358,2

93.313,5

2.881,3

14.779,6

256.784,4

3.298,8

506,7

1.223,3

30.156,4

582,3

214

87.983,5

2.040,4

9.264,5

212.166,5

Ciência, Tecnologia e Inovação

Cultura

Desenvolvimento agrário

Educação

Meio Ambiente

Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos

Saúde

Trabalho e Previdência Social

Emendas**

Total Geral

Seria impossível, embora não seja o foco principal dessa reportagem, analisar a conjuntura sem considerar os embates políticos institucionais que se dão no momento. O professor do departamento de Ciências Sociais da UFSM, Cleber Martins, traz algumas impressões: “Os setores que estão se mobilizando e se manifestando contra o governo, um dos pilares da crise política atual, mesmo que possuam antecedentes claros e vincula-ções, oportunistas ou não, com partidos de oposição e alguns descontentes que fazem parte da base do próprio governo, ainda não sistematizaram um projeto político, com um conjunto articulado de ideias sobre o papel do Estado, por exemplo, a ser submetido aos processos eleitorais. O projeto é afastar a presiden-te Dilma Rousseff. E, mais importante, um dos argumentos comuns nas mani-festações revela uma aversão ao sistema político e aos políticos”, diz o docente.

E continua: “Assim, há um governo que vem perdendo sua base de apoio, na sociedade e no parlamento, e uma oposi-ção, social e partidária, fragmentada e com um discurso basicamente moralista e não propositivo. O que não significa a inexis- tência de um projeto de governo. Apenas não está sendo dito de forma transpa-rente”. Para ele, a crise econômica leva o governo a perder ou reduzir sua capaci-dade de implantação de políticas públicas.

E é aí que reside talvez a maior fragilidade da situação, conforme aponta nota política elaborada pela diretoria do Sindicato Nacional. A crise econômica, segundo a entidade, “entre suas conse-quências, levou à falência o modelo de conciliação de classes, adotado pelos governos do PT, que buscava beneficiar os ricos e os pobres simultaneamente, e levou a burguesia a decidir pelo rompi-mento com o governo do PT. Ela age hoje forçando o impeachment ou a renúncia negociada de Dilma e, ao mesmo tempo, a inviabilização, por meio judicial, de possível candidatura de Lula em 2018 e é em torno desses embates que buscam se apresentar as alternativas políticas”.

Um complexo jogo institucional

universidade Em 2016, mais tesouradas na Educação

A privatização pede passagem

PLP 257/2016

PADECE

Page 7: Jornal SEDUFSM Abril 2016

O primeiro semestre letivo na UFSM já iniciou com problemas relativos à moradia estudantil no campus sede. Ocorre que há um descompasso atípico entre o número de novos ingressantes que necessitam do benefício socioeconômico em questão e o número de vagas de que a universidade dispõe para comportar os alunos. Hoje, as vagas já dispostas são as seguintes: 236 na Casa do Estudante Universitário (CEU) I, 1.601 na CEU II, 70 na CEU III, 36 em Frederico Westphalen, 36 em Palmeira das Missões e 22 em Cachoeira do Sul. Por definição da instituição, tem direito à moradia estudantil todo aluno da UFSM, regularmente matriculado em cursos presenciais, que se encontra em situação de vulnerabilidade social.

Este ano, mais de 10% dos cerca de 3 mil ingressantes necessitam de moradia, o que, em números exatos, corresponde a 376 alunos. É de praxe, e inclusive consta na resolução da CEU, que antes de ir para a moradia definitiva os estudantes passem pela União Universitária e lá aguardem até que sejam disponibilizadas as vagas nas Casas. A União consiste num prédio do campus central que se destina, especifica-mente, a cumprir o papel de moradia provisória. Nele, há 3 salões de alojamento coletivo, com 70 vagas no alojamento masculino, 70 vagas no feminino e 40 em alojamento misto.

Marjana Lourenço, integrante do Diretório Central dos Estudantes da UFSM (DCE), conta que o incomum ocorrido neste primeiro semestre de 2016 foi que a União começou a lotar rápido demais. “Uma semana antes do início das aulas, quando os estudantes começaram a chegar, foram sendo encaminhados para a União. Mas em 3 ou 4 dias a União lotou e a universidade se viu numa situação de 'bom, não temos para onde mandar esse pessoal'. Foi um dia em que teve muito tumulto e a universidade começou a mandar algumas pessoas à CEU I para ficarem alojadas nas salas de estudo, e outras para o Centro de Eventos, espaços sem estrutura nenhuma de alojamento”, explica a estudante. Desde que estourou o proble-ma, os estu-

08 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

DE OLHO NA UFSM

ABRIL DE 2016

Mais de 300 estudantes para fora de casa dantes vêm se organizando em plenárias e assembleias gerais para debater e pres-sionar por uma resolução.

Até final de março, existiam 188 alojados na União, 110 no Centro de Eventos e 88 nas salas de estudo da CEU I (centro da cidade). Marjana diz que apenas no dia 17 de março as beliches foram instaladas nas casas do Centro de Eventos, de forma que os estudantes passaram vários dias sem acesso à cama. “Também tiveram de correr para provi-denciar uma cozinha”, ressalta, opinando que essas moradias podem servir por um tempo, mas não são as ideais para abrigar os alunos.

Como uma saída para a problemática, a pró-reitoria de Assuntos Estudantis (PRAE) vem propondo a locação de alguns imóveis no entorno da UFSM, fora do campus. O objetivo seria abrigar esses estudantes temporariamente, enquanto o problema da superlota-ção persistir. Marjana, con-tudo, preocupa-se quando pensa que, no meio deste ano, devem entrar mais estudantes, e, entre esses, vários que necessitarão também do benefício, o que tenderia a intensificar o problema, tornando-o uma verdadeira bola de neve. Outra questão enfatizada pela estudante é a influência que a locação dessas casas terá na especulação imobiliária da cidade.

“Não queremos que essas casas locadas fora daqui, em caráter tempo-rário, acabem virando permanentes com o tempo, porque a nossa luta é para que haja mais moradia dentro do campus, e não fora dele. Até porque sabemos que pode acontecer como em outras universidades, que começam a distribuir bol-sa per-

manência, um valor ridículo que, aqui em Camobi, mal daria para pagar o aluguel de um kitnet. Fora que, num momento de crise, seria o primeiro benefício a ser cortado, deixando o pessoal na rua”, pondera Marjana, destacando, também, a importância da moradia situada dentro do campus para a organização do movimento estudantil.

A falta de moradia efetiva para centenas de estudantes, observada nesse início de 2016, requer da UFSM a construção de novos blocos nas CEUS's para dar conta do aumento da demanda. Em conversa com a Assessoria de Imprensa da Sedufsm, o pró-reitor de Assuntos Estudantis, João Batista Dias de Paiva, deu o seguinte panorama:

Com p r e v i s ã o d e conclusão para 2016, são 62 vagas em Santa Maria, 36 em Palmeira das Missões, 36 em Frederico Westphalen e 90 em Cachoeira do Sul. Já para 2017, está prevista a entrega de 280 novas vagas para o campus sede. Ao final de 2017, a

reitoria espera ter concluído 504 novas vagas nas moradias da UFSM.

Enquanto se espera pelo cumprimento desses prazos, os estudantes seguem nos alojamentos provisórios dentro do campus. Até porque, conforme disse Paiva, estão sendo levantadas questões

jurídicas sobre a possibilidade das moradias fora da uni-

versidade e sendo fei-tos acertos contra-

tuais entre pro-prietários e

imob i l i -árias.

(Entretítulo) Prazos para entrega de novos blocos

Locação de imóveis pela UFSM pode influenciar

especulação imobiliária

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“Tem todo um trâmite interno que neces-sita passar pela avaliação de mercado, pelo laudo de engenheiros da Pró-reitoria de Infraestrutura e pela avaliação da Procuradoria Jurídica da UFSM”, disse, não sabendo informar à nossa assessoria um prazo definido para a locação das moradias.

Ainda segundo o pró-reitor de Assuntos Estudantis, todos os estudantes que chegaram foram atendidos. “Não temos estudantes, sejam novos ou não, que têm direito a moradia por sua condição de vulnerabilidade socioeconômica e que tenham deixado de ser atendidos ou que tenham voltado para suas cidades de origem por falta de moradia”, disse.

Se para o pró-reitor a situação está amena, para os estudantes o cenário não é bem esse. Marjana conta que chegaram à UFSM pessoas com apenas R$ 70 reais para passar o mês. Pessoas que não poderiam ligar para casa e pedir mais dinheiro, pois suas famílias não tinham como contribuir. Até mesmo por isso ela diz que alguns estudantes não podem nem cogitar residirem no centro. “Conse-guimos, na primeira semana de aula, um transporte gratuito (ônibus pela universi-dade) até os estudantes fazerem a cartei-rinha da ATU e conseguirem o benefício transporte. Isso tudo para dar uma mão ao pessoal, porque eles não teriam condições de virem às aulas na primeira semana”, diz a estudante, referindo-se àquelas e àque-las que foram encaminhados para residirem provisoriamente nas salas de estudo da CEU localizada no centro da cidade.

Ainda segundo a estudante, esse aumento na demanda por moradia estudantil já deveria ter sido previsto quando a UFSM aderiu ao Sistema Integrado de Seleção Unificada (Sisu) e à proporção de 50% nas cotas raciais e sociais. “E não é só esse o problema. Tem a questão do Restaurante Universitário que já está em reforma há 3 anos e ainda não expandiu uma mesa. A fila já está chegan-do lá na reitoria e o pessoal está tendo dificuldade para conseguir almoçar. Pare-

ce que faltou um planejamento a longo prazo por parte da univer-

sidade para poder receber com qualidade essas pessoas”,

opina Marjana.

Prazos para entrega de novos blocos

União lotada

Semestre inicia com luta por moradia estudantil na UFSM

Alojamentos da União Universitária esgotaram nos primeiros dias desse ano

Page 8: Jornal SEDUFSM Abril 2016

II ENE e a construção de uma educação democrática

EDUCAÇÃO

PAINEL

Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES 09ABRIL DE 2016

Cerca de 80 pessoas participaram no sábado, 2 de abril, na Escola Cilon Rosa, da etapa municipal do II Encontro Nacional de Educação (ENE), em Santa Maria. O obje-tivo do encontro, que reuniu sindicalistas, estudantes, professores, integrantes dos movimentos sociais, é dar uma parcela de contribuição para o alvo mais amplo, que é a construção de um projeto de educação classista e democrático para o Brasil. A concretização disso passa pela etapa estadual do ENE (23 e 24 de abril, em Porto Alegre) e dias 16 a 19 de junho, em Brasília, fechando a etapa nacional.

Laura Souza Fonseca, professora da

A comissão pré-estatuinte na UFSM, composta por representações paritárias dos três segmentos, avança no processo para a realização de um Congresso Estatuinte. Os 300 delegados e delegadas que comporão esse Congresso de forma também paritária serão eleitos em três momentos: nas unidades da UFSM, num pleito junto às categorias e noutro pleito junto à comunidade.

Na reunião do dia 5 de abril, os membros da comissão estabeleceram as datas para o processo de escolha dos delegados que serão eleitos pelas unidades. O calendário faz parte do regimento eleitoral e prevê as seguintes datas:

- 8h às 17h, prazo para inscrição de chapas nas unidades;- homologação das chapas;- início da campanha eleitoral;

- eleição nas unidades.

23 a 25 de maio 30 de maio 2 de junho 22 de junho

Agenda 2016 O tema 'Personagens das histórias de luta do Brasil dos séculos XIX, XX e XXI' é o

destaque do livro-agenda 2016 da Sedufsm, que se encontra disponível aos docentes sindicalizados desde o mês de fevereiro. O material pode ser retirado na secretaria da Seção Sindical (Rua André Marques, 665), que tem expediente das 8h às 12h e das 14h às 18h. Para os professores que atuam nas unidades descentralizadas da UFSM ou que são aposentados e moram em outras localidades, o sindicato providenciará o envio das agendas desde que informado pelo docente.

Assim como nos anos anteriores, o material foi elaborado pela Sedufsm junto ao Núcleo Piratininga de Comunicação. Por isso, além de uma abordagem geral da história do Brasil, contada através de seus lutadores e lutadoras, o conteúdo traz um viés local, com a capa ilustrada pelo professor da UFSM, Sergio Pires, precursor dos movimentos universitário e docente em Santa Maria, que completaria 70 anos em 2016.

Estatuinte UFSM

As contribuições dos Grupos de TrabalhoA etapa municipal do II ENE teve nos Grupos de Trabalho

(GTs) o momento destinado ao debate de ideias e apontamento de perspectivas para a construção de um projeto de educação democrático e classista.

No grupo de Financiamento e Gestão (1), o sistema da dívida pública brasileira foi caracterizado como um dos mecanismos de ataque ao setor público, visto que quase 50% do orçamento da União é consumido, hoje, por juros e amortizações da dívida, ao passo que as áreas sociais vêm sofrendo constantes cortes.

Para além do ajuste fiscal, ressaltou-se no GT a rele-vância do processo de precarização e consequente privatização de escolas e universidades públicas que, não raramente, têm sido colocadas sob a gestão de Organi-zações Sociais ou se configurando um campo para parcerias público-privadas.

Além das ofensivas de caráter econômico – corte nas

verbas e sucateamento das condições de estudo e trabalho, também se apontou a ingerência do Estado na formação educacional, do que são exemplos as propostas da 'Escola sem Partido' e da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

O Grupo de Trabalho 2 (Avaliação, Trabalho e Formação Docente) destacou que a educação é a 'bola da vez', e tal expressão passa longe de ter sentido positivo, significando que a área vem sendo visada para também experimentar os duros ajustes fiscais já implementados na saúde e no bolso dos trabalhadores. Tais ajustes, segundo os participantes, estão sendo decretados de forma coesa nas esferas nacional, estadual e municipal, e desdobram-se em danos dos mais diversos. Dentre esses, a dificuldade de formação continuada dos professores, a perda de autonomia e de gestão democrática nas escolas, as avaliações meritocráticas e o esvaziamento de conhecimento crítico e

Faculdade de Educação da UFRGS e que atua há muitos anos também no movimento sindical docente, destacou na plenária de abertura que a construção de um novo projeto de educação não parte do zero. Ela elogiou o tema da conferência “Educação em debate: por um projeto classista e democrático”, e ressaltou que no período mais recente, o projeto de educação que se pretendia para o país se esfacelou nos governos Lula e Dilma.

Para a professora, a recuperação do que foi construído no passado, agora com a união em torno do ENE, passa por um

projeto de educação que rompa com a lógica priva-tista e autoritária, tendo como grande desafio trazer a sociedade para o debate. Segundo Laura, os sujeitos desse processo são estudan-tes, trabalhadores da edu-cação, mas, sobretudo, devem ser partícipes as pessoas da comunidade, pois elas têm demandas que precisam ser colocadas. Nesse contexto, ela cita alguns pontos, que fazem par te dos temas em apreciação pelos encontros

reflexivo (aqui, fez-se menção novamente à proposta da BNCC).

O GT 3 (Acesso e Permanência: inclusão, questões ético-raciais, diversidade sexual e gênero) trouxe à tona debates acerca da inclusão, da acessibilidade e das opressões específicas a que diversos grupos sociais estão submetidos no chão das escolas e universidades. Para os debatedores, é preciso que o ambiente escolar e universitário olhe com mais atenção e cuidado para o debate racial, bem como para aqueles que versem sobre LGBTfobia, machismo e visibili-dade Trans (Travestis e Transexuais), sendo necessária a instrumentalização dos educadores para trabalharem esse tema junto aos estudantes e às comunidades de pais.

Os principais encaminhamentos dos GTs da etapa municipal do II ENE serão condensados na 'Carta de Santa Maria' e servirão como base para o debate na etapa estadual do Encontro.

do ENE, entre os quais, a questão do acesso e permanência na escola, as políticas de inclusão e as questões de gênero.

Na conferência de abertura, junto com Laura Fonseca, também esteve presente a docente da rede estadual, Maíra Couto, e a estudante da UFSM, Luiza Duarte, que

também faz parte da Aliança Nacional de Estudantes Livres (Anel). Em sua exposição, Luiza frisou que a construção de um novo projeto de educação passa pela coletivi-zação das diversas lutas existentes na sociedade, como por exemplo, das mulhe-res, negros, juventude, acabando com a opressão a esses segmentos.

Cerca de 80 pessoas na Escola Cilon Rosa na etapa municipal do II ENE

GTs: encaminhamentos dos grupos de trabalho comporão documento

FRITZ NUNES

BRUNA HOMRICH

Page 9: Jornal SEDUFSM Abril 2016

10 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES

SEDUFSM

ABRIL DE 2016

“Mamãe, na segunda-feira, dia 21/03/2016, faremos uma salada de frutas para comemo-rarmos o início da estação do outono, por isso pedimos a doação de frutas. Atenciosamente, Tia Cristina (coordenadora)”. Até então não há nada de errado com o recado enviado recen-temente pela educadora de uma escolinha de Niterói (RJ). Quem nunca, nas séries iniciais, chegou em casa com um bilhete similar a esse e o entregou a sua mãe?

Acontece que, no dia seguinte, a criança retornou ao ambiente escolar com a seguinte resposta escrita em seu caderno: “Olá, Cristina, gostaria de sugerir que os bilhetes viessem direcionados aos 'respon-sáveis' e não somente à 'mamãe'. Entendo que muitas vezes é a mãe que se encarrega das tarefas domésticas e dos filhos, mas precisamos lembrar que os 'papais' também são responsáveis e que muitas crianças são criadas por outros membros da família, como avós, tios, tias, etc. Assim seria uma maneira de não repetirmos esse discurso que só responsabiliza a mãe/mulher pelo cuidado com a casa e filhos (as). Obrigada. Atenciosamente, Kate, mãe do Jorge”.

O episódio descrito acima vem gerando repercussão nas redes sociais e acaba por ilustrar que a divisão sexual do trabalho ainda impera e é reforçada, diariamente, nas mais diversas instâncias do convívio social. O privado mantém-se como o espaço considerado feminino. Segundo a diretora da Sedufsm e integrante do Fórum de Mulheres de Santa Maria, Maria Celeste Landerdahl, “o modo de produção vigente se utiliza do trabalho não remunerado das mulheres para sua manutenção. Em espe-cial o trabalho doméstico, chamado repro-dutivo, o qual tem como características o cuidado das pessoas e a manutenção da vida, exercido de modo invisível, posto que não tem valor de mercadoria e, como tal, é entendido e aceito como uma aptidão ou inclinação natural das mulheres”.

Embora o gênero feminino componha 51% da população brasileira, e em que pese as inegáveis conquistas historicamente já obtidas, as disparidades mantêm-se. E foi

Desigualdade e violência: duas faces da mesma opressão

para fomentar a reflexão acerca de tal balança tão desigual que o Dia Internacio-nal da Mulher, 8 de março, foi marcado na UFSM. A Sedufsm esteve presente na organização das atividades, que incluíram uma caminhada pelo campus central, um debate em frente ao Restaurante Univer-sitário (RU) e o show 'Mulheres (En)Canto e Poder'.

“Essa realidade, atravessada por questões de gênero, deve ser objeto de debates nas universidades, uma vez que a academia também é espaço de manuten-ção e reprodução de desigualdades que geram violências”, opina Maria Celeste.

Segundo dados de 2014, provenientes do Relatório Socioeconômico da Mulher, no que tange ao emprego formal – garantia de direitos mínimos -, 50,2% estão com os homens, ao passo que apenas 28,4% com as mulheres. E, a essas mesmas porcentagens, correspon-dem diferenças salariais desconcertantes: média salarial das mulheres em emprego formal, R$579,81; média dos homens, R$848,45. De forma geral, no que tange ao salário, as mulheres obtêm apenas 65% do valor pago aos homens, ainda que ocupem o mesmo cargo e exerçam as mesmas atividades.

Saindo da cidade em direção ao campo, a situação tende a se agravar. Segundo dados do Relatório, existem cerca de 3 milhões e 900 mil mulheres inclusas no trabalho rural, contudo, 72% delas não são remuneradas.

E se no chão de casa, das universidades e dos locais de trabalho mulheres são colocadas numa posição de inferioridade, muitas vezes invisibilizadas pelas próprias leis, no terreno onde as políticas sociais são formuladas, elas também são minoria. Em 2014, as mulheres ocupavam 39% dos cargos de direção e assessoramento superiores governamentais, enquanto

(Entretítulo) Mercado de trabalho faz largo uso da opressão

Marcha no dia 8 de março percorreu ruas do campus central61,2% desses espaços eram destinados aos homens. Na Câmara de Vereadores de Santa Maria, o gênero feminino ocupa menos de 20% das cadeiras.

Não é de se estranhar que um ambiente político assim tão hostil à participação das mulheres seja o mesmo a propor uma Reforma da Previdência que equipara a idade de aposentadoria entre homens e mulheres. Hoje, as trabalhadoras podem se aposentar cinco anos mais cedo que os homens, contudo, isso pode estar com os dias contados. A proposta desconsidera e invisibiliza, ainda mais, o trabalho domés-tico e as duplas, triplas ou até quádruplas jornadas de trabalho cumpridas pelo gênero feminino.

O panorama traçado anteriormente apontou que, em se tratando de gênero, a diferença é apontada como inferioridade e utilizada como elemento de justificativa para a não equidade entre homens e mulheres. Toda essa lógica que superex-plora as mulheres no mundo do trabalho, subjuga-as no espaço privado e inibe sua participação na esfera política é como um motor que alimenta, diariamente, a vio-lência de gênero. E, aqui, cabe salientar a importância de um entendimento mais ampliado de violência, pois essa pode vir travestida de diversas formas: psicológi-ca/moral, sexual, patrimonial, institucio-nal (praticada, por ação e/ou omissão, nas instituições prestadoras de serviço público), além da agressão física que, dada sua naturalização, não raramente tem levado ao extremo: o crime de feminicídio, quando mulheres são assas-sinadas por motivação de gênero. Quanto a esse último, o Brasil ocupa a nada gloriosa quinta posição no ranking mundial dos países mais mortais às mulheres.

Segundo o Mapa da Violência de 2012, entre 1980 e 2010, mais de 92 mil

(Entretítulo) Desigualdade alimenta violência

mulheres foram assassinadas no Brasil, sendo 43,7 mil só na última década. Numa escala de 100.000, as mortes passaram de 1.353 para 4.465, representando um aumento de 230% no assassinato de mulheres. Suas idades variavam de 20 a 29 anos e 41% das mortes foram ocasionadas dentro de casa. Não surpreende quando vemos que 83,8% dos agressores são companheiros ou ex-companheiros. Ou seja, o perigo mora ao lado, ou, como diz o título de uma reportagem veiculada no site Papo de Homem, 'O agressor dorme no homem comum'.

Quando nos referimos a mulheres negras, os números são ainda mais aterradores. O Mapa da Violência de 2015 aponta que, entre 2003 e 2013, as taxas de homicídio de brancas caíram de 3,6 para 3,2 por 100 mil habitantes, significando uma queda de 11,9%. Entre as mulheres negras, no mesmo período, as taxas passaram de 4,5 para 5,4 por 100 mil habitantes, o que indica um aumento de 19,5%.

Em Santa Maria, a situação não é nada diferente. A Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) da cidade divulga o número de ocorrências registra-das ao longo dos últimos anos: em 2011, foram 3.689; 2012, 4.563; 2013, 4.162; 2014, 3.377 e 2015, 3.505. Somente no último ano, entre prisão preventiva e prisão em flagrante, foram presos 77 homens e uma mulher, conforme informou a delegada da Mulher de Santa Maria, Débora Dias. Sobre os dados de 2016, até meados de março, quando a delegada conversou com nossa assessoria, haviam sido registradas 29 denúncias relativas à violência sexual e/ou doméstica.

Parece-nos, enfim, que as fogueiras de outrora podem ter se apagado, mas sua chama tóxica e punitiva segue ferindo, acuando e vitimando mulheres em todas as partes do mundo.

(Entretítulo) Mapa da violência em Santa Maria

BRUNA HOMRICH

Mercado de trabalho faz largo uso da opressão

Desigualdade alimenta violência

Mapa da violência em Santa Maria

Violência contra as mulheresRealidade Brasileira LIGUE 180 - SPM

Jan/Jun2013

• 306.201 registros

Risco • 46,3% são de risco de morte

• 83,8% companheiros/ex-companheiroAgressor

Filhos • 64% dos casos filhos e filhas presenciam

BRASIL, 2013

Page 10: Jornal SEDUFSM Abril 2016

DIVULGAÇÃO

Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDES 11ABRIL DE 2016

NA ESTANTE DA SEDUFSM

Suzane Bevilacqua Marcuzzo é relativamente nova na atividade docente, já que ingressou como professora na UFSM em setembro de 2013. Contudo, embora a sala de aula ainda seja, de certa forma, novidade para ela, sua trajetória anterior à universidade é longa e cheia de histórias.

Graduada em Engenharia Florestal, duas especificidades marcaram sua primeira aproxi-mação com a academia: enquanto o curso priorizava a área de produção, ela demonstrava interesse pela área de conservação dos recursos naturais; e, tendo recebido o diploma, ao contrário de vários colegas que preferiram adentrar a pós-graduação imediatamente após formados, ela mudou-se para Porto Alegre, onde começou a trabalhar na Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam). E lá ficou durante cinco anos, primeiro como técnica e, posteriormente, como gestora da região sul da capital gaúcha. Seus objetos de trabalho eram parques e arborização urbana e, hoje, ela encara aquele período como uma escola.

Tendo ganhado um certo fôlego com o fim da graduação e estando imersa, diretamente, em sua área favorita, realizou o mestrado no curso de Biologia e estudou restauração de ecossis-temas. Mais à frente, realizou concurso para o estado do Rio Grande do Sul e foi aprovada, assumindo o parque estadual da Quarta Colônia, em Agudo. Nesse mesmo período, ingressou no doutorado em Engenharia Flores-tal, onde fez da experiência profissional seu objeto de estudo, que virou uma tese sobre a restauração de áreas degradadas no parque em Agudo.

“Então surgiu a oportunidade, exatamente quando eu havia acabado de defender minha tese, de um concurso na área de conservação da natureza. Todo mundo dizia 'esse concurso é para ti, tu tens de fazê-lo'. E eu estava dividida, porque afinal de contas eu gostava do meu trabalho como gestora em Agudo, mesmo com

O bairro Nossa Senhora do Rosário abriga hoje o único teatro de bairro de Santa Maria. Trata-se do Espaço Cultural Victorio Faccin, um prédio pelo qual, desde a manhã até a noite, circulam homens, mulheres e crianças que têm a arte e a cultura como interesses e, especialmente, prezam por suas expressões mais populares e democráticas. Como um espaço aberto à comunidade, seu funcionamento data de 2007, quando foi conquistado o alvará e outras condições necessárias para receber plateias e construir uma agenda movimentada. Contudo, antes de abrir as portas ao público, a estrutura já era usada como sede do Teatro Universitário Independente (TUI) há, pelo menos, 20 anos.

Atualmente, o Espaço Cultural é coordenado por artistas que se dividem em dois grupos teatrais: O Teatro Por Que Não? e o próprio TUI, mantendo-se, financeiramente, de forma autônoma e tendo, nos cursos de teatro ali ministrados, sua principal fonte de renda. Outras formas de financiamento são os espetáculos teatrais e o aluguel das salas para grupos independentes realizarem seus projetos. Quanto aos espetáculos, Felipe Martinez, diretor teatral e membro do Por que Não?, ressalva que, pelos princípios abraçados pelo Espaço, os ingressos são menos custosos. “Então os espetáculos geram uma baixa fonte de renda, primeiro porque temos uma capacidade baixa de público – 90 pessoas –, e segundo porque não temos a característica de cobrar valores altos pelos ingressos. Não queremos distanciar as pessoas. A ideia é manter valores mais acessíveis para democratizar. Não dá para fazermos sempre de graça, mas, quando cobramos, não pode ser abusivo”, explica Felipe, um dos gestores do prédio. Outra via de captação de recursos é a Lei de Incentivo à Cultura (LIC), contudo, pouco se tem conquistado dali.

Se sua menor estrutura obstaculiza a sede de espetáculos mais exigentes tecnicamente e a abrangência de maiores plateias, por outro lado, é esse um dos aspectos diferenciais do Espaço ressaltados por Felipe, já que, por se tratar de um teatro pequeno, possibilita maior proximidade com o público, sendo um fator positivo à dinâmica das apresentações. Além de espetáculos – mais frequentes aos finais de semana -, o espaço é usado, principalmente, para ensaios e aulas teatrais, ministradas pelos próprios gestores a turmas das mais variadas faixas etárias. As turmas abrem duas vezes ao ano e, no início de 2016, chegou-se a cerca de 90 matriculados. Agora, a próxima turma abre em julho deste ano.

Uma curiosidade interessante é acerca do último espetáculo do Teatro Por Que Não?, intitulado 'Say Hello para o Futuro', que, após ter sido apresentado diversas vezes na cidade – inclusive no Theatro Treze de Maio -, voou para ser apreciado também em terras portuguesas. Em março, o grupo viajou para Portugal e lá fez três apresentações da peça.

“O Espaço [Victorio Faccin] tem uma atividade cultural que ultrapassa o teatro. A importância dele se dá, principalmente, enquanto resistência de grupos e coletivos independentes que o utilizam para seus trabalhos”, diz Martinez.

CULTURAPERFIL

A docência como um desafio

As Sufragistas Apesar de contar uma história que se passa no século passado, o filme 'As Sufragistas' mostra uma realidade atual, na qual vozes indignadas de mulheres se rebelam contra a desigualdade que orbita em

todos os espaços onde vivem, trabalham e se relacionam. Mais do que tudo, o filme mostra o despertar de uma consciência crítica de algumas trabalhadoras como instrumento de resistência contra a humilhação, a violência e a opressão. Elas foram ridicularizadas, agredidas, ignoradas, ameaçadas; tratamentos que ainda continuam sendo dispensados a todas aquelas que resolverem contestar as normas culturalmente instituídas. A luta pela conquista do voto talvez seja apenas uma desculpa utilizada pela diretora Sarah Gavron para dar visibilidade a outras tantas lutas das mulheres contra desvantagens cotidianas sofridas e que passam batidas na naturalização mantida e reproduzida pela sociedade. Talvez a pretensão de Sarah tenha sido exatamente mostrar que, assim como a luta pelo voto foi uma atitude necessária naquele momento histórico, outras tantas lutas que continuam sendo travadas também devem ser consideradas como necessárias e, por isso, devem ser respeitadas e olhadas com a devida atenção pelo mundo. Talvez ela tenha tentado dizer: o direito ao voto somente não basta, é preciso ir além nas conquistas e mostrar que a resistência das mulheres é legítima. A indignação que tomou conta de tantas pessoas que assistiram ao filme deveria contaminar mulheres e homens em toda sua diversidade como um instrumento de luta por oportunidades iguais, por salários iguais, pela divisão igualitária do trabalho doméstico, pelo fim da violência doméstica e institucional contra as mulheres... Enfim, depois de assistir a este filme pode-se entender porque, em pleno século XXI, precisamos ir para a rua falar sobre o Dia Internacional das Mulheres.

todos os percalços, pois a condição que o Estado dá para seus funcionários é bem precária”, conta Suzane, que resolveu prestar o concurso e foi aprovada. Assim, há quase três anos, ela leciona no curso de Tecnólogo em Gestão Ambiental da Unidade Descentra-lizada de Silveira Martins (UDESSM), sendo titular da disciplina de Unidades de Conservação. Em seu plano curricular, temas como parques, reservas biológicas, Reserva Particular do Patrimônio Natural, dentre tantos tópicos bastante próximos do trabalho que ela desenvolvia antes de chegar à universidade.

“Quando eu ingressei na UFSM, trouxe essa bagagem comigo, e é muito bom poder passar isso aos alunos. Para mim, foi muito importante sair da graduação e poder desenvolver um trabalho na minha área, porque, quando tu voltas para a academia, tu trazes a experiência concreta, prática, real, aquilo que tem e aquilo que não tem dado certo. Tem coisas que quem está dentro da academia não consegue alcançar, pois nunca vivenciou”, reflete Suzane. E, mesmo estando hoje no chão da academia, ela tenta seguir a práxis em seu trabalho. Assim, ainda participa do Grupo de Trabalho do Corredor Ecológico da Quarta Colônia, embora não mais como gestora, e sim como docente.

Suzane vê a docência como um desafio. Um desafio cotidiano de despertar, em seus estudantes, uma paixão similar à que ela mesma cultiva pela conservação dos recursos naturais, área que, em sua análise, ainda é um tanto marginalizada nos cursos de graduação. “Eu me sinto desafiada todos os dias. E, para mim, é uma felicidade quando eu vejo que os meus alunos se integraram nos projetos, estão caminhando sozinhos, formaram-se e estão trabalhando na área. São vitórias diárias que a gente tem”, conclui a docente.

*Por Maria Celeste Landerdahl

BRUNA HOMRICHTE

ATRO

POR

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NÃO

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Cultura que pulsa

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12 Publicação da Seção Sindical dos Docentes da UFSM / ANDESABRIL DE 2016

MEMÓRIA

O dia em que Santa Maria agradeceu aos militares

EXPRESSÕES REINALDO PEDROSO – Docente aposentado do departamento de Artes Visuais

“Chegou, finalmente, o dia em que o povo de Santa Maria cumprirá um dever cívico e patriótico da mais alta significação histórica: o de envolver numa homenagem de reconhecimento as Forças Armadas Brasileiras pela corajosa decisão de destruir o comu-nismo em nossa cara Pátria”. Era assim que o jornal A Razão de Santa Maria iniciava uma matéria na edição de 17 de abril de 1964, data da Marcha do Agradecimento, evento já claramente caracterizado no trecho acima. E, dentre as personalidades santa-marienses de destaque que legitima-ram o movimento, lá estava José Mariano da Rocha Filho, o fundador da UFSM. Cabe dizer que já alguns dias antes do evento, o jornal citado apre-sentava, no rodapé de suas páginas, mensagens agitativas de convocação para a marcha.

O professor Humberto Gabbi Za-natta era, à época, um menino de 15 anos que cursava a quarta série do

Ginásio. Em seu colégio, de caráter diocesano, quem dava as cartas era o bispo Dom Luiz Victor Sartori, apoiador

público do golpe. “Fomos 'livremente coagidos', isto é, obrigados - e sem muita discussão, porque a obediência

na Igreja era cega - a participar da 'Mar-cha da Família com Deus pela Liberda-de' naquele abril, após concretizada a 'vitória' do golpe”, lembra o docente, contando que, passadas as manifesta-ções na Praça Saldanha Marinho, a marcha percorreu a rua Doutor Bozzano até a frente do então Quartel do 7º Regimento de Infantaria. Ali, fora montado um altar e celebrada, por Dom Luiz Victor Sartori, uma missa de agra-decimento "pelo Brasil não ter caído nas garras do comunismo ateu". Segundo informações do Jornal A Razão, cerca de cinquenta mil pessoas comparece-ram à manifestação.

O golpe empresarial-militar de 1964 completou 52 anos neste 2016. E, para que experiências como essa não conhe-çam um repeteco em nossa história, é importante mantermos viva a lembran-ça dos horrores cometidos num período em que a ditadura da classe dominante mostrou-se ainda mais escancarada e doída para a classe trabalhadora.

BRUNA HOMRICH

O como

charada

desenho Desenho inédito da nova série humorística de Pedroso

BRUNA HOMRICH/ACERVO A RAZÃO

Quando o docente aposentado do departamento de Artes Visuais da UFSM, Reinaldo Pedroso, elabora um desenho, seu objetivo é lançar uma proposta ao receptor: que ele decifre a charada contida na obra, de forma que possa haver um processo de comunicação efetiva, uma interação. “Eu codifico, ele decodifica”, explica. E talvez esse aspecto menos explícito e mais subjetivo tenha relação com características que o professor explica serem reservadas ao desenho de humor. Diferentemente do desenho que visa imitar a fotografia e busca reproduzir, fielmente, a realidade e as proporções de um objeto ou personagem humano, o desenho de humor insinua, provoca, instiga e anarquiza, propositadamente, as características reais daquilo que desenha. “O desenho de humor é um meio capaz de dizer coisas que jamais seriam veiculadas se fossem ditas diretamente”, observa Reinaldo.

Ele conta que iniciou sua carreira artística como a grande maioria das crianças, que lançam mão de um pedacinho de tijolo para rabiscar a calçada e de um lápis de cor para decorar uma folha ou, por que não, a parede de casa. Só que nele, essa relação artesanal e infantil com a arte ganhou o aspecto de profissão quando prestou vestibular para Artes (o professor tem bacharelado em Artes Gráficas e licenciatura plena em Desenho e Plástica), numa época em que o Centro de Artes e Letras (CAL) ainda era intitulado Faculdade de Belas Artes. Hoje, mesmo não estando mais em sala

“O desenho de humor

sugere e insinua”

de aula, segue produzindo. E seu mais novo projeto consiste numa série de bonecos construídos de forma híbrida, ou seja, são animais que apresentam partes ou funções anatômicas humanas. Reinaldo pretende expor sua nova série ainda esse ano.

Durante sua carreira, o professor já participou de dois livros de coletâneas e, em 2012, publicou seu livro chamado '40 anos de humor e outros delitos', tendo sido lançado pela Sedufsm.