Medidas cautelares diversas da prisão

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RELATÓRIO SINTÉTICO MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO Poder Judiciário

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RELATÓRIO SINTÉTICO

MEDIDAS CAUTELARESDIVERSAS DA PRISÃO

Poder Judiciário

2013 Conselho Nacional de Justiça

Presidente Ministro Joaquim Barbosa

Corregedor Nacional de Justiça Ministro Francisco Falcão

Conselheiros Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi José Roberto Neves Amorim Guilherme Calmon Nogueira da Gama Ney José de Freitas José Guilherme Vasi Werner José Lucio Munhoz Wellington Cabral Saraiva Gilberto Valente Martins Jefferson Luis Kravchychyn Jorge Hélio Chaves de Oliveira Emmanoel Campelo de Souza Pereira Bruno Dantas Nascimento

Secretário-Geral Juiz Fábio Cesar dos Santos Oliveira

Diretor-Geral Sérgio Pedreira

EXPEDIENTE

Projeto gráfico Eron Castro Capa Leandro Luna

Revisão Carmem Menezes

Brasília - 2013CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

Endereço eletrônico: www.cnj.jus.br

SumárioApresentação 5

1 Introdução 7

2 Notas metodológicas 11

3 A aplicação da Lei n. 12.403/2011: sentenças e medidas cautelares concedidas 15

4 Perfil dos juízes respondentes 19

5 Motivações e impedimentos para aplicação da lei: opinião dos juízes 23

6 Percepções sobre a monitoração eletrônica 27

7 Considerações Finais 31

Referências 33

Anexo 35

GráficoS, tabelaS e mapaS

Gráfico 1 – Crescimento da população carcerária e de presos provisórios 9

Gráfico 2 – Quantitativo de processos pelo valor da fiança arbitrada em

salários mínimos (SMs) 17

Gráfico 3 – Grau de escolaridade por anos na magistratura 20

Gráfico 4 – Sexo por anos na magistratura 21

Gráfico 5 – Legislador acertou ou não ao editar a Lei Federal n. 12.403/2011 24

Gráfico 6 – Motivos da não aplicação de ofício das medidas cautelares 24

Gráfico 7 – Responsabilidade na fiscalização do cumprimento das

medidas cautelares: Opinião X Realidade 25

Gráfico 8 – Conhecimento dos juízes a respeito da monitoração eletrônica 29

tabela 1 – Percentual de respondentes relativo ao universo de

magistrados e varas criminais 13

tabela 2 – Quantitativo de medidas cautelares aplicadas por tipo,

no período de 5/7/2011 a 5/7/2012 16

mapa 1 – Implementação do Monitoramento Eletrônico no Brasil 28

apreSentaçãoO Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é signatário do Acordo de Cooperação

Técnica n. 17, de 23 de novembro de 2011, visando à melhoria do Sistema Peni-tenciário Brasileiro e redução do déficit prisional, incluindo o estímulo à adoção de penas e medidas alternativas à prisão (cláusula primeira, §1º, inciso III).

Dentro dessa perspectiva e considerando o alto índice de presos provisórios no País, por intermédio do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), o CNJ apresenta um levantamento de informações acerca da atuação dos magistrados de primeiro grau na aplicação da Lei Federal n. 12.403/2011, que alterou dispositivos do Código de Processo Penal relativos à prisão processu-al e inseriu em seu contexto outras medidas cautelares alternativas.

Dois objetivos principais guiaram esta pesquisa: avaliar os níveis de utiliza-ção das medidas cautelares alternativas à prisão e as dificuldades na sua apli-cação no âmbito judiciário e, levantados os dados, propor a adoção de medidas para efetivação da referida Lei, especialmente como forma de minimizar um dos maiores percalços do Sistema Penitenciário, isto é, o elevado índice de presos provisórios.

O relatório contém, entre outros, dados importantes sobre o quantitativo de medidas cautelares aplicadas por espécie; valores arbitrados sob o título de fian-ça; responsabilidade e dificuldades na fiscalização das medidas aplicadas; bem como sobre a aprovação da lei pela magistratura nacional.

Enfim, a pesquisa trouxe parâmetros que, com a análise técnica empreendida pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ), servirão para a proposição de medidas que possam auxiliar na efetividade e eficiência dessas cautelares alternativas à prisão, contribuindo para a redução do déficit carcerário.

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1Introdução

O presente estudo está inserido no âmbito do Acordo de Cooperação n. 17/2011, firmado entre os Po-deres Judiciário, Legislativo e Executivo, o qual possui, com uma de suas diretrizes, a melhoria do sistema penitenciário em relação ao déficit de vagas nos presídios. O sistema penitenciário brasileiro convive com a superlotação carcerária há anos. As deficiências são múltiplas e diversas e vão desde infraestruturas inade-quadas a custos elevados e, nesta direção, dados do Geopresídios (2013)1 registram que, aproximadamente, 41,5% da população carcerária são presos provisórios.

Diante desse cenário, em 4 de maio de 2011, foi promulgada a Lei Federal n. 12.403, que modificou o Título IX – Da Prisão e da Liberdade Provisória do Código Processual Penal (CPP) para Da Prisão, Das Medidas Cautelares e da Liberdade Provisória. A referida lei, com o propósito de atualizar, modernizar e fortalecer as garantias processuais do nosso ordenamento penal, inseriu nove medidas alternativas à pri-são, na perspectiva de diminuir o número de presos provisórios e possibilitar ao magistrado a decretação da prisão preventiva como medida excepcional e subsidiária.2

Nesses termos, entre as medidas apresentadas pelo novo texto legal como subsidiárias ou substitutivas à prisão preventiva, tem-se: o comparecimento periódico em juízo; a proibição de acesso ou frequência a determinados lugares; a proibição de manter contato com pessoa determinada; a proibição de ausentar-se de Comarca; o recolhimento domiciliar; a suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira; a internação provisória de imputável ou de semi-imputável; a fiança; e a monitoração eletrônica.3

É notável que a Lei n. 12.403/2011 promoveu alterações significativas na dinâmica das medidas caute-lares de natureza pessoal no sistema processual penal, pois, se antes o magistrado dispunha de duas opções – prisão ou liberdade provisória, com ou sem fiança –, hoje pode, atendendo aos pressupostos processuais do art. 282 do CPP,4 optar entre as várias medidas cautelares diversas da prisão já citadas. No entanto, apesar de legitimar a prisão preventiva como medida excepcional, o número de presos provisórios continua aumentando, proporcionalmente, ano a ano, em relação à população total no sistema penitenciário. Os da-dos do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (Infopen) apontam para uma taxa de crescimento média de 4% quando analisados os dados de dezembro de 2008 a dezembro de 2012.

1 Nos termos da Resolução CNJ n. 47, de 18 de dezembro de 2007, os Juízes de Execução Criminal devem inspecionar mensalmente os penais sob sua jurisdição e alimentar mensalmente o Cadastro Nacional de Inspeções nos Estabelecimentos Penais, fomentando o sistema Geopresídios.

2 Dispõe o art. 282, § 6º do CPP: A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar.

3 Dispõe o art. 319 do CPP: Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável e houver risco de reiteração; VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX – monitoração eletrônica.

4 Dispõe o art. 282 do CPP. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.

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Gráfico 1 – Crescimento da população carcerária e de presos provisórios

Quantidade de presos provisóriosPopulação carcerária

0

100.000

200.000

300.000

400.000

500.000

600.000

dez./12jun./12dez./11jun./11dez./10jun./10dez./09jun./09dez./08

Fonte: Infopen. / Elaboração: DPJ/CNJ.

O crescimento significativo do número de presos provisórios foi uma das razões que motivou a publi-cação da Resolução n. 66/2009 do CNJ5 que cria mecanismo de controle estatístico e disciplina o acompa-nhamento, pelos juízes e Tribunais, dos procedimentos relacionados à decretação e ao controle dos casos de prisão provisória.

Com o intuito de investigar esse cenário, o Conselho Nacional Justiça (CNJ), por meio do Departa-mento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas So-cioeducativas (DMF), com apoio do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ), realizou levantamento de dados e de opiniões sobre a aplicação da Lei n. 12.403/2011. Os objetivos da pesquisa relacionam-se à aplicação da legislação, pelos magistrados, durante o primeiro ano de vigência. A pesquisa possui como recorte o período de 5 de julho de 2011 a 5 de julho de 2012.

Para isso, foi realizada pesquisa com magistrados com competência criminal – a fim de identificar breve perfil e suas opiniões referentes à lei e sua aplicabilidade – e também com servidores das varas com compe-tência criminal – a fim de mapear as formas e os usos da referida lei. Pretende-se, com isso, que sejam pen-sadas medidas a serem elaboradas para a garantia da aplicação da lei, bem como verificar entendimentos a respeito da fiscalização e do monitoramento de tais medidas. Os dados coletados foram encaminhados ao DPJ para a elaboração deste relatório.

5 Disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/atos_normativos/resolucao/resoluo%2066_27012009.pdf.

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2Notas metodológicas

Os dados ora apresentados referem-se a dois formulários6 elaborados pelo DMF com auxílio do DPJ. Esses formulários destinavam-se, separadamente, a magistrados e servidores de varas com competência criminal e foram disponibilizados para preenchimento por meio do Sistema de Controle de Acesso7 no período de 1.º de novembro a 31 de dezembro de 2012.

É fundamental entender o grau de representatividade que as informações possuem em face do universo a que se direciona a pesquisa. Considerando que o preenchimento foi feito de maneira voluntária, tem-se abaixo a distribuição de respondentes de cada um dos formulários.8

6 Vide anexo.

7 O Sistema de Controle de Acesso é um sistema interno do CNJ por meio do qual magistrados e servidores possuem cadastro pessoal para acesso a sistemas de coleta de informação elaborados pelo CNJ.

8 Foram excluídos do universo os formulários preenchidos por magistrados de varas federais, tendo em vista a concentração de respostas no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (25 magistrados e 9 varas), com algumas manifestações dos da 4ª Região (8 magistrados e 4 varas) e da 1ª Região (com apenas a manifestação de 1 magistrado) e nenhum registro dos Tribunais da 2ª e da 5ª Região.

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Tabela 1 – Percentual de respondentes relativo ao universo de magistrados e varas criminais

TRIbUNAL

TOTAL DE MAGISTRADOS

RESPONDENTES

TOTAL DE MAGISTRADOS CADASTRADOS NO

SISTEMA %

QUANTIDADE DE VARAS

RESPONDENTES

TOTAL DE VARAS E JUIzADOS ESPECIAIS

CRIMINAIS %

tJac 7 40 18% 2 29 7%

tJal 24 154 16% 1 50 2%

tJam 5 116 4% 1 56 2%

tJap 7 59 12% 10 27 37%

tJba 4 725 1% 6 161 4%

tJce 7 271 3% 5 151 3%

tJDft 15 228 7% 11 58 19%

tJeS 11 300 4% 0 84 0%

tJGo 65 354 18% 22 101 22%

tJma 43 286 15% 10 116 9%

tJmG 78 716 11% 30 353 8%

tJmS 1 144 1% 2 121 2%

tJmt 50 244 20% 24 137 18%

tJpa 18 212 8% 5 107 5%

tJpb 8 193 4% 5 97 5%

tJpe 105 263 40% 33 95 35%

tJpi 6 99 6% 3 46 7%

tJpr 74 428 17% 61 171 36%

tJrJ 48 696 7% 35 176 20%

tJrn 21 197 11% 12 92 13%

tJro 8 80 10% 6 41 15%

tJrr 7 33 21% 4 7 57%

tJrS 130 404 32% 136 181 75%

tJSc 74 325 23% 29 113 26%

tJSe 1 156 1% 0 24 0%

tJSp 431 1.999 22% 427 692 62%

tJto 6 137 4% 0 57 0%

total Geral 1.254 8.859 14% 893 3.343 27%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

A esse respeito, devem ser feitas algumas ponderações sobre as análises que serão apresentadas. Partiu-se do critério da competência criminal dos juízes respondentes (isso implica juízes que se encontram em varas plenas, mistas ou exclusivas), mas, por indeterminação da amostra, é possível que juízes sem compe-tência criminal tenham respondido o formulário. Tendo em vista a voluntariedade no preenchimento, em vez de construção de amostra aleatória, não há o que se falar em qualquer tipo de representatividade, seja ela nacional ou de cada tribunal. Sendo assim, todas as afirmações e análises serão restritas ao universo de respondentes e não podem, com isso, ser entendidas como um retrato dos magistrados e das varas criminais a respeito da aplicação das medidas cautelares.

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3A aplicação da

Lei n. 12.403/2011: sentenças e medidas

cautelares concedidas

Quanto às sentenças e medidas cautelares concedidas, as varas da Justiça estadual que responderam à pesquisa apontaram ter decretado um total de 64.975 prisões cautelares em contraste a 37.567 concessões de liberdade provisória (com ou sem fiança) no período entre 5 de julho de 2011 e 5 de julho de 2012, o que demonstra ainda a priorização da prisão em relação às demais medidas.

Com relação às medidas adotadas, há maior incidência da concessão de liberdade provisória sem fiança. Possivelmente, essa medida vem sendo mais amplamente aplicada por ser próxima ao ordenamento jurídico anterior referente à revogação das prisões em flagrante, não constituindo, portanto, impacto direto da nova lei.

Como segunda opção mais utilizada, está a proibição de ausência da Comarca; e a terceira, o compa-recimento periódico em juízo. Apesar de não poder ser confirmado pelos dados, sabe-se que é comum a utilização das duas medidas em conjunto, o que leva, portanto, seus quantitativos a se aproximarem.

Destaca-se, por outro lado, a tímida utilização da monitoração eletrônica, como consequência direta da baixa implantação por parte do Executivo estadual de instrumentos que viabilizem tal medida. Deve-se ter em mente, portanto, que a falta de implementação desse instrumento pode gerar, também, a pouca utilização de outras medidas, tais como a proibição de ausência da Comarca, a proibição de contato e o recolhimento domiciliar. Na tabela 2 que se segue, pode ser vista a distribuição das medidas cautelares utilizadas nas varas respondentes.

Tabela 2 – Quantitativo de medidas cautelares aplicadas por tipo, no período de 5/7/2011 a 5/7/2012

MEDIDAS CAUTELARES QUANTIDADE

liberdade provisória sem fiança 28.082

proibição de ausência da comarca 17.580

comparecimento periódico em juízo 13.764

proibição de contato 9.010

liberdade provisória com fiança 7.312

recolhimento domiciliar 5.335

internação provisória, em caso de inimputável ou semi-imputável 680

monitoração eletrônica 320

Suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira 51

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

Deve-se saber que as medidas cautelares podem ser aplicadas de forma isolada ou cumulativa.9 Por essa razão, o total das medidas cautelares (tabela 2) não corresponde ao total de processos.

Importante saber que, em apenas 1.213 das medidas cautelares concedidas, houve substituição da fiança arbitrada pela autoridade policial por qualquer uma das medidas cautelares previstas na Lei n. 12.403/2011.

9 Dispõe o artigo 282, § 1º do CPP: As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente.

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Os valores da fiança arbitrada apresentados pelas varas respondentes concentram-se na faixa entre um terço e um salário mínimo (55,7%). Pode-se depreender que o uso dessa medida vem sendo feito muito mais em caráter de garantia patrimonial – vinculando o indiciado ou acusado ao processo por motivos econômicos para evitar seu encarceramento e “assegurar o comparecimento aos atos do processo, evitar a obstrução processual [...] ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial”, como prevê a lei –10 que como instrumento punitivo.

Sob outro enfoque, se considerarmos o perfil hipossuficiente de significativa parte dos indiciados e acu-sados do sistema penal brasileiro, a fiança, em concreto, pode incidir em uma “pré-punição”.

Gráfico 2 – Quantitativo de processos pelo valor da fiança arbitrada em salários mínimos (SMs)

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

em mais de 10 SMde 6 a 10 SMde 3 a 5 SMde 2 a 3 SMde 1/3 a 1 SMmenor de 1/3 do SM

4%

56%

23%

10%

6%

2%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

10 Dispõe o art. 319 do CPP: São medidas cautelares diversas da prisão: VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial.

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4Perfil dos

juízes respondentes

O juiz com competência criminal é homem (69%), em média, tem 41 anos de idade e 11 anos de magis-tratura e tem pós-graduação (52%). Quanto aos dados referentes à escolaridade, é importante destacar que, entre os respondentes, há concentração grande de magistrados mais novos no nível de especialista. Quando analisada a quantidade de mestres que responderam à pesquisa, ela é muito mais equilibrada entre as faixas de tempo na magistratura. E, por último, os doutores, que estão em baixo número, também permanecem em equilíbrio ao longo do tempo na magistratura.

Isso significa dizer que é possível que haja incremento do nível de especialização nos recém-ingressados na magistratura e que essa busca por especialização diminua entre os magistrados com mais de 6 anos em exercício. A idade e a escolaridade não são indicadores definitivos, porém apontam para um tipo de forma-ção e experiência na interpretação e aplicação da legislação em comento.

Gráfico 3 – Grau de escolaridade por anos na magistratura

6 a 110 a 5 18+12 a 17

0%

5%

10%

15%

20%

DoutorMestreEspecialista

16,6%

11,3%

7,2%

5,2%

1,7% 1,7%2,3% 2,4%

0,3% 0,4% 0,5% 0,4%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

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Se, de um lado, os juízes recém-ingressados permitem aumento do nível de escolaridade dos magistra-dos, por outro lado, quando analisados os perfis dos respondentes a esta pesquisa, estes não demonstram que haja equilíbrio no quesito sexo dos magistrados. A predominância de homens é constante ao longo da trajetória na magistratura e, no grupo que está há menos tempo na magistratura, pode-se perceber o aumento da diferença entre a quantidade de homens e mulheres.

Gráfico 4 – Sexo por anos na magistratura

MasculinoFeminino

0%

3%

6%

9%

12%

15%

18+12 a 176 a 110 a 5

5,3%

12,9%

4,6%5,3%

8,5%

3,1%

9,5%9,8%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

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5Motivações e impedimentos

para aplicação da lei: opinião dos juízes

Excluída a hipótese de pouca abertura e capacitação dos magistrados, outras hipóteses poderiam ex-plicar o baixo índice de aplicação da lei em questão: desconfiança quanto ao real caráter preventivo das medidas; e ausência de controle e fiscalização das medidas. Com o propósito de verificar as reais motivações dos juízes quanto à lei e sua aplicação, foram feitas indagações sobre o tema.

Os juízes respondentes acima apresentados consideram, majoritariamente, que o legislador acertou na edição da Lei n. 12.403/2011 (74%). Isso é corroborado pelo baixo índice de respostas que apontam que a Lei não tem sido aplicada por necessidade de recrudescimento contra o crime (15%). O motivo apontado, portanto, para as eventuais resistências de concessão das medidas cautelares são: falta de mecanismos de fiscalização (43%) e falta de elementos no auto de prisão em flagrante (28%), o que em si já prejudicaria a prisão preventiva, por exemplo.

Gráfico 5 – Legislador acertou ou não ao editar a Lei Federal n. 12.403/2011

Sim74%

Não19%

Não possui opinião formada

7%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

Gráfico 6 – Motivos da não aplicação de ofício das medidas cautelares

Falta de elementos no auto de prisão em flagrante32%

Falta de mecanismospara fiscalização

50%

Necessidade de recrutamentocontra o crime

18%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

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Segundo os magistrados respondentes, atualmente, na jurisdição onde atuam, as medidas cautelares estão sendo fiscalizadas pelo Poder Judiciário (39%) ou em conjunto entre o Poder Judiciário e o Executivo (38%). O protagonismo do Judiciário não vem sendo visto como a melhor solução para efetivação do con-trole, pois, na opinião de grande parte dos magistrados respondentes (53%), a fiscalização do cumprimento das medidas cautelares deve ser realizada prioritariamente pelo Executivo.

A falta de mecanismos de fiscalização revela-se, de fato, como ponto fulcral para a ampliação e efetiva-ção da aplicação das medidas cautelares, pois o descumprimento sistemático de tais medidas faz que sejam desconstruídas as inovações do sistema penal perante a sociedade, difundindo-se, potencialmente, a asso-ciação entre medidas cautelares e impunidade.

Tendo isso em vista, levanta-se a questão sobre a quem recai a responsabilidade por desenvolver e monitorar sistemas de fiscalização do cumprimento das medidas cautelares. Aos magistrados foram feitas duas perguntas distintas sobre a responsabilidade na fiscalização do cumprimento das medidas: quem efe-tivamente a realiza em seu estado e quem deveria ser responsável. Diante das respostas a essas perguntas, pode-se depreender, pelo gráfico abaixo, que existe, entre os magistrados, certo consenso em entender que o responsável deverá ser sempre o Poder Executivo (barras em cinza claro no gráfico). Tal tendência só é ligeiramente invertida nos casos em que o responsável atual pela fiscalização já é o Poder Judiciário (se-gundo grupo de dados no gráfico) e, assim, para grande parte dos respondentes, esta configuração deverá permanecer (conforme mostram as barras cinza escuro do gráfico).

Gráfico 7 – Responsabilidade na fiscalização do cumprimento das medidas cautelares: Opinião X Realidade11

0%

5%

10%

15%

20%

25%

OutroPoder ExecutivoPoder JudiciárioPoder Judiciárioe Executivo

pelo Poder Executivo pelo Poder Judiciário pelo Conselho da Comunidade outro não tem opinião formada

25%

13%

9%

5%

8%

16%

1% 1%2%

3%

0%1%1%

2%1%

2%

4% 4%

0%1%

Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

11 Este gráfico diz respeito ao cruzamento das respostas a duas questões do formulário: a primeira referente à opinião dos magistrados sobre em quem deveria recair a responsabilidade pela fiscalização das medidas cautelares e a segunda sobre em quem recai tal responsabilidade na jurisdição daquele magistrado. Sendo assim, o gráfico aponta a variação da opinião dos magistrados de acordo com a realidade de fiscalização em que se encontra.

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Com relação à atuação do CNJ para auxiliar ou estimular a aplicação da Lei, podem-se encontrar opi-niões bastante divididas, não se apontando, entre os respondentes, entendimento predominante. Muitos (27%) entendem que o CNJ poderia promover cursos e seminários. Essa atuação poderia sensibilizar outros magistrados para a aplicação das medidas, mas também fomentar o debate entre os magistrados e permitir a busca de soluções para efetivação no cumprimento dessas medidas. Outro grupo (25%) entende que, na verdade, o CNJ não deveria atuar nessa questão. Pode-se explicar esta opinião considerando que parcela dos respondentes (16%), além de entender que não cabe ao CNJ qualquer tipo de atuação, acredita também que a fiscalização das medidas deve ser realizada exclusivamente pelo Poder Executivo. Um tercei-ro grupo (21%) acredita que o CNJ deveria estimular os tribunais a ter um sistema de controle de aplicação e concessão de medidas cautelares e este é o grupo em que se encontra maior proporção de respondentes que entendem que cabe exclusivamente ao Poder Judiciário a responsabilidade por fiscalizar o cumprimen-to das medidas. Outros (17%) entendem que, na verdade, deveria ser criado um sistema próprio de con-trole de aplicação e concessão das medidas cautelares, mas que, apesar do apoio do CNJ, ele não eximiria a responsabilidade de fiscalização do Poder Executivo. E, por último, alguns (11%) não possuem opinião formada sobre o papel do CNJ no auxílio da aplicação das medidas cautelares, sendo estes respondentes os que mais incidiram nas respostas de ausência de opinião a respeito das perguntas formuladas.

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6Percepções sobre a

monitoração eletrônica

A Lei n. 12.403/2011 incluiu a monitoração eletrônica no rol das medidas cautelares diversas da prisão e facultou a utilização da fiscalização eletrônica aos indiciados ou acusados, durante o procedimento processu-al penal, como alternativa ao cárcere. Utilizada há anos em vários países da Europa, dos Estados Unidos da América e do Canadá, a citada inovação tecnológica já havia sido incorporada no ordenamento jurídico brasi-leiro pela Lei n. 12.258/2010, para fins de Execução Penal, autorizando-se a utilização do monitoramento ele-trônico nos presos com saídas temporárias no regime semiaberto e naqueles com direito a prisão domiciliar.

É certo que sua utilização ainda desperta debates e polêmicas no âmbito jurídico, contudo sua adoção cumulativa com outras medidas cautelares pode melhorar a fiscalização do cumprimento das medidas alter-nativas à prisão impostas aos indiciados ou acusados,12 especialmente com as medidas previstas nos incisos II, III, IV e V do art. 319 do CPP.13

Sua implementação no Brasil enfrenta dificuldades de diversas ordens – orçamentárias, estruturais, ide-ológicas, geográficas, licitatórias e operacionais – e apenas sete estados da Federação (Acre, Alagoas, Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rondônia e São Paulo) adotaram o sistema e, na condição de medida cautelar, o monitoramento eletrônico vem sendo utilizado nos estados de Acre, Alagoas, Rondônia e Rio de Janeiro.14

Mapa 1 – Implementação do Monitoramento Eletrônico no brasil

Implementação do monitoramento eletrônico no Brasil

Implementação do monitoramento eletrônico no Brasiltambém na condição de medida cautelar

Fonte: AZEVEDO E SOUZA, 2013. / Elaboração: DPJ/CNJ.

12 SILVA JUNIOR, Walter Nunes da. Reforma tópica do processo penal: inovações aos procedimentos ordinário e sumário, com o novo regime das provas, principais modificações do júri e as medidas cautelares pessoais (prisão e medidas diversas da prisão). 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012. v. 1. p.658-660.

13 Art. 319 [...] II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

14 AZEVEDO E SOUZA, Bernardo de. O monitoramento eletrônico como medida alternativa à prisão preventiva. 2013. Dissertação (Mestrado em Ciências Criminais). Faculdade de Direito. Programa de Pós-graduação em Ciências Criminais. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Esta dissertação foi desenvolvida no âmbito do Programa CNJ-Acadêmico.

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Quanto ao conhecimento dos juízes sobre a implementação da monitoração eletrônica, este estudo ob-servou que um número considerável de magistrados respondeu desconhecer o andamento, no âmbito do Poder Executivo, da implantação da monitoração eletrônica.

Nessa perspectiva, é irrefutável a importância da aproximação dos dois Poderes, para que tal medida possa alcançar os resultados esperados. Tal aproximação não diz respeito exclusivamente à responsabilida-de de quaisquer dos Poderes sobre a própria implantação ou a fiscalização do cumprimento, mas sim, e no mínimo, diz respeito à interlocução entre as instituições, a fim de que o Judiciário possa cobrar a atuação do Executivo e o Executivo possa esclarecer as possibilidades que estão disponíveis para serem utilizadas por parte do Judiciário.

Gráfico 8 – Conhecimento dos juízes a respeito da monitoração eletrônica

0 200 400 600 800 1.000

o equipamento não foi adquirido pelo Poder Executivo estadual/da União, mas já há previsão

orçamentária para esse fim

existe e é aplicado quando cabível

o equipamento não existe, mas está em fase de aquisição pelo Poder Executivo do Estado/União

não existe e o Poder Executivo estadual/da União sequer trabalha com a hipótese de aquisição

desse mecanismo

nada sei a respeito do andamento do tema no âmbito do Poder Executivo

844

205

119

88

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Fonte e elaboração: DPJ/CNJ.

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7Considerações Finais

A Lei n. 12.403/2011 alterou de forma significativa a dinâmica processual penal, pois, ao ampliar o rol das medidas cautelares substitutivas à prisão, conferiu ao magistrado várias possibilidades de atuação durante a persecução criminal, além do encarceramento provisório, reforçou a natureza de ultima ratio da prisão processual.

Nessa direção, os dados apresentados pelo presente estudo demostram que as inovações inseridas pela referida lei foram aprovadas por considerável número de magistrados criminais (74%), no entanto é fato que a prática jurídica penal ainda está em descompasso com a nova legislação.

Constatou-se que a pouca aplicabilidade das medidas cautelares decorre, sobretudo, da ausência ou insuficiência de mecanismos de fiscalização (43%). As três medidas mais amplamente utilizadas – a liber-dade provisória sem fiança, a proibição de ausência da Comarca e o comparecimento periódico em juízo – atestam o protagonismo do Poder Judiciário na fiscalização (39%). Por outro lado, na opinião de 53% dos magistrados, a fiscalização das medidas cautelares deveria ser realizada, prioritariamente, pelo Poder Executivo.

Essa constatação reforça o entendimento de que a aplicabilidade das medidas cautelares está condicio-nada a um efetivo controle e fiscalização e, portanto, a uma interlocução mais concreta entre os Poderes Executivo e Judiciário na perspectiva de implementar instrumentos viáveis para a fiscalização do cumpri-mento das medidas alternativas à prisão provisória.

Em síntese, este estudo comprovou que a Lei n. 12.403/2011 foi recepcionada de forma positiva pelos juízes de varas criminais, no entanto sua efetiva aplicação requer maiores investimentos nos mecanismos de controle e fiscalização.

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referênciaSAZEVEDO E SOUZA, Bernardo de. o monitoramento eletrônico como medida alternativa à prisão preventiva. 2013. Dissertação (Mestrado em Ciências Criminais). Faculdade de Direito. Programa de Pós-graduação em Ciências Criminais. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

BRASIL, lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011. Altera dispositivos do Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, relativos à prisão processual, fiança, liberdade provisória, demais medidas cautelares, e dá outras providências.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. (cnJ). resolução cnJ n. 47, de 18 de dezembro de 2007.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. (cnJ). resolução n. 66, de 27 de janeiro de 2009. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/323-resolucoes/12180>. Acesso em: 27 maio 2013.

SILVA JUNIOR, Walter Nunes da. reforma tópica do processo penal: inovações aos procedimentos ordinário e sumário, com o novo regime das provas, principais modificações do júri e as medidas cautelares pessoais (prisão e medidas diversas da prisão). 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012. v. 1.

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anexo

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