Notas 122 - Banco de Idéias 54

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    N 122 - Ano 2011

    ISSN 0103-8109

    A V A L I A O D E P R O J E T O S D E L E I

    ORAMENTO 2011omo ocorre todo ano, opresente nmero de Notas

    examina a proposta oramentriada Unio. Apesar de o Projeto deLei n 59/2010-CN ter seu

    relatrio final aprovado peloCongresso Nacional, a Lei Or-amentria Anual para 2011, at apresente data (meados de fe-vereiro), no foi ainda sancionadapela Presidente. As razes para taldemora so as negociaes refe-rentes a cortes de despesas queincorporam a fixao do salriomnimo e a correo das faixas derenda que definem as alquotas doimposto de renda. O Executivoestabeleceu um corte de despesasde R$ 50 bilhes, o qual atingir asemendas parlamentares em 86%de seu valor aprovado pelo Con-gresso Nacional, um corte nosrepasses ao BNDES e uma reduona taxa de crescimento do PIB para5%, como parmetro oramen-trio.

    Na discusso do atual ora-mento apresentaremos os proce-dimentos legais que caracterizamo processo oramentrio, mas noso efetivos, para, ento, apresen-tarmos como o processo efeti-

    vamente levado a cabo. A seguirexaminaremos a proposta de distri-buio da despesa pelas diversasfunes considerando o oramentoaprovado pelo Congresso, uma vezque aquele que incorpora os cortesnos gastos ainda no foi divulgado.

    O QUEDEVERIASER

    O oramento pblico o ins-trumento de ordenao das prio-ridades das decises coletivas,

    tanto no que se refere tributaoquanto s despesas pblicas. OOramento Geral da Unio resulta,teoricamente, de um processolongo e subordinado ao pblica

    de longo prazo. Assim, o processooramentrio da Unio requer umPlano Plurianual (PPA), diretrizesoramentrias (Lei de DiretrizesOramentrias LDO) e o ora-mento anual (Lei OramentriaAnual LOA).

    O PPA estabelece os objetivos emetas para os quatro anos de umaadministrao federal. Deve sersubmetido at 31 de agosto doprimeiro ano de cada novo go-verno. Desse modo, o primeiroano de uma nova administrao temsuas metas e objetivos definidospelo governo anterior. A justifi-cativa a manuteno de certacontinuidade nos programas go-vernamentais, independentementedo governo. Alm disso, como ooramento anual votado at 22de dezembro de cada ano anteriorao de sua referncia, o novogoverno herdar, tambm, umoramento para seu primeiro ano.

    Definidos os objetivos e metasdo governo em um PPA, at 15 de

    abril de cada ano o Executivoencaminha, ao Congresso Nacional,um projeto de lei estabelecendo asdiretrizes oramentrias (LDO)para a elaborao do oramento avigorar no ano subsequente. Ne-cessariamente, o Congresso deveaprovar a LDO at 17 de julho domesmo ano. Com base na LDOaprovada o Executivo deve sub-meter ao Congresso, at 31 deagosto do mesmo ano, um projetode lei oramentria (LOA) para o

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    ano subsequente. A LOA deve seraprovada pelo Congresso at 22 dedezembro.

    A LDO a essncia do ora-mento da Unio. O ambiente

    macroeconmico a vigorar no anode execuo do oramento a serproposto estabelecido por meiode um cenrio caracterizado porindicadores econmicos inti-mamente associados s previsesde receita tributria, tais comocrescimento do PIB, variaes nastaxas de cmbio e de juros bemcomo nos ndices de preos. Aindacom relao s receitas tributriasso especificados os benefciosfiscais a serem mantidos ou mesmoampliados. No caso das despesas,maior ateno dada s exignciasconstitucionais e s despesas denatureza obrigatria (sade, edu-cao, previdncia, seguro-desem-prego, juros da dvida pblica,pessoal). Desse modo, as metasfiscais so estabelecidas em termosdo supervit primrio (em geralcomo percentual do PIB, sendo quepara 2011 esse supervit foi fixadoem reais), das empresas estatais(excludo o Grupo Petrobras), daprevidncia social e da dvida

    pblica.Caracterizados os riscos ora-mentrios pela antecipao dasreceitas e a especificao dasdespesas j assumidas, assim comoo risco da dvida pblica, a LDOdefine possveis propostas dealterao na legislao tributria ena poltica de crdito das organi-zaes financeiras estatais, bemcomo despesas de capital, transfe-rncias a entidades pblicas eprivadas, despesas outras e es-tabelece que certas despesas nopossam sofrer contingenciamento.

    O QUE

    O projeto de lei oramentriaencaminhado pelo Executivo re-presenta, na realidade, as intenesdesse poder e, por isso mesmo,ao ser examinado pelo Congressoo PLOA tende a incorporar aspreocupaes dos Congressistasna satisfao dos interesses de seus

    constituintes. Essa sistemtica deproposio, anlise e aprovao dooramento invalida as boas in-tenes refletidas no PPA e naLDO. Como a principal preo-

    cupao dos Congressistas asatisfao dos interesses de quempromove sua eleio, caso con-trrio sua vida poltica ser curta,tanto o PPA quanto a LDO perdemimportncia na orientao daconfeco do oramento. Por issomesmo as discusses sobre ooramento envolvem muita nego-ciao e um nmero elevado deemendas garantidas pelos proce-dimentos legais. Cada deputado ecada senador podem apresentarat 20 emendas. Alm disso, ha possibilidade de as bancadasestaduais apresentarem emendasque podem variar de 18 a 23,conforme o nmero de deputadosda bancada.

    Com tantas emendas que im-plicam maiores gastos, sistemati-camente o Congresso rev paramais a estimativa de receita apre-sentada pelo Executivo. Aindaassim, as emendas propostas soem valor muito superior aos re-cursos disponveis. Desse modo, a

    liberdade oramentria, isto , adeciso sobre como alocar osrecursos no contingenciados, exercida por intensa barganhapoltica, distante, portanto, do PPAe da LDO e de qualquer princpiode eficincia alocativa. Dessemodo, o PPA perde qualquersignificado como instrumento deavaliao do desempenho admi-nistrativo do Executivo, e a LDO,desenhada para definir o tamanhodo oramento e sua adequao aoPPA, fica sem funo.

    Entretanto, poder-se-ia ter aimpresso de que o processo deanlise e aprovao do oramentopelo Congresso Nacional, emboradesmantelando a lgica das insti-tuies oramentrias, estaria maisprximo aos anseios da populao.Pura iluso. As emendas propostase aprovadas refletem primei-ramente o desejo de reeleio docongressista, o que no significa queno tragam benefcios aos cidados

    comuns. Alm disso, no h ga-rantia de que uma emenda aprovadaseja efetivamente executada.

    O oramento autoriza despesas,mas no impositivo. Isso significa

    que uma despesa aprovada pode ouno ser feita, e essa deciso cabeapenas ao Executivo. Isso implicaque o processo de negociao dasemendas parlamentares no ter-mina aps o Presidente sancionar aLOA aprovada pelo Congresso.Liberao de recursos ou contin-genciamento de despesas prerro-gativa do Executivo, o qual a usaintensivamente ao longo do anopara conseguir aprovar matria deseu interesse. Todos esses proce-dimentos tornam o oramento daUnio um instrumento incuo paraa administrao da ao coletiva deresponsabilidade do setor pblico.Embora as decises coletivas sejamexaradas no sistema poltico, noh razo para no se avaliar seusimpactos sobre o cidado que asfinancia, assim como a racionalidadede seu processo decisrio.

    A escolha pblica um campohbrido de economia e cinciapoltica. As contribuies maisimportantes nesse campo esto

    associadas a Kenneth Arrow, JamesBuchanan, Duncan Black, AnthonyDowns, Mancur Olsen, RobertTollison e Gordon Tullock. A anliseda escolha pblica um ramo dateoria econmica que aplica seusprincpios metodolgicos na com-preenso do processo de decisocoletiva. Embora menos desen-volvida que a teoria que explica ocomportamento humano emsituaes de mercado, a anlise daescolha pblica desenvolve umateoria lgica e consistente que ligao comportamento individual aopoltica, analisa as implicaesdessa teoria e testa-a com relaoa eventos do mundo real. O pro-cesso de decises coletivas podeser visto como uma complexainterao entre eleitores, legisla-dores e burocratas. Examinando osincentivos produzidos pelo nossosistema poltico poderemos teruma melhor compreenso dos por-qus dos procedimentos utilizados

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    na administrao pblica, assimcomo da prpria legislao pol-tico-eleitoral.

    PRINCIPAISPARMETROSEINDICADORESECONMICOSA Tabela 1 apresenta os principais

    indicadores econmicos extradosda LDO e que orientam a elabo-rao do Oramento Geral daUnio. Esses indicadores no seroobjeto de discusso.

    importante destacar que osupervit primrio do setor pblicotem sido modificado segundo aconvenincia do Executivo, tor-nando o conceito inteiramentedesprovido de qualquer significado,especialmente para comparaesao longo do tempo. Para 2011 essesupervit no implica qualquercompromisso fiscal, uma vez quea LDO no determina os valoresque podem ser excludos dooramento para a fixao dessameta. A indicao de que naexecuo oramentria as reduesno supervit podero advir damanuteno das despesas com oPAC, segundo as dotaes auto-rizadas e restos a pagar referentes

    ao exerccio de 2010. Assim comono ano anterior, as operaes doGrupo Petrobras so desconsi-deradas no estabelecimento e naposterior apurao desse supervit.

    DESPESASPORFUNO

    A apreciao do OramentoGeral da Unio ser feita segundoas despesas aprovadas pelo Con-

    gresso para as diversas funesconforme plano de contas. Asdespesas propostas pelo Executivoimplicam um aumento nominal decerca de 5% em relao ao totaldas despesas aprovadas para o anoanterior, sendo que o total dasdespesas aprovadas pelo Congressoimplica, em relao mesma base,uma elevao de aproximadamente6%. Isso poderia dar a falsaimpresso de que os gastos p-blicos federais no contemplaroem 2011 qualquer aumento real.Entretanto, levando-se em conta osvalores empenhados em 2010 eque no foram efetivamente pagos,mas que representam desembolsosno corrente ano, o aumento no-minal de despesas do GovernoFederal ser muito maior: 31%para a proposta do Executivo e33% para o total aprovado peloCongresso!

    Na melhor das hipteses, cercade 80% dos gastos especificadosno Oramento Geral da Unio j

    esto comprometidos com Ad-ministrao (1,16%), EncargosEspeciais (60,79%) e PrevidnciaSocial (17,88), isto , despesasque, no curto prazo, no podem

    ser reduzidas ou mesmo elimi-nadas. Isso deixa o Executivo comcapacidade de administrar apenas20% do oramento. Note que asmaiores parcelas dos Encargos

    Especiais se referem ao custo dadvida pblica, isto , gastosassociados a despesas realizadas nopassado. O mesmo vale para osbenefcios da Previdncia Socialoriginrios de contribuies queocorreram no passado.

    A Tabela 2 apresenta as despesastpicas de governo como porcen-tagem das despesas totais e dasdespesas administrveis pelogoverno. Sem qualquer consi-derao sobre a eficincia da aogovernamental e sem filtrar do total

    de cada funo gastos perifricose no essenciais s mesmas,classificamos como gastos essen-cialmente de governo as despesascom a administrao pblica, comas funes judiciria e legislativa,com as seguranas nacional epblica, com as relaes externase com direitos da cidadania. Assim,cerca de 5% dos gastos totais doGoverno Federal se referem sdespesas essenciais sua funo emuma sociedade democrtica de

    homens livres sob a gide doEstado de Direito. Considerando osrecursos sobre os quais o governopode exercer alguma funoalocativa, esses gastos corres-

    Tabela 1 - Principais parmetros e indicadores econmicos

    *Fixado em valor nominal de R$ 125,5 bilhes. Fonte: LDO 2011

    Parmetros e indicadores econmicos 2011 2012 2013

    Crescimento real do PIB (%) 5,50 5,50 5,50

    Variao do IPCA (%) 4,50 4,50 4,50Variao da massa salarial (%) 10,36 10,18 9,86

    Taxa de cmbio R$ / US$ 1,88 1,88 1,94

    Taxa Selic mdia (%) 8,71 8,71 8,79

    Supervit primrio do setor pblico no financeiro (%PIB) 3,30* 3,30 3,30

    Resultado nominal do governo federal (% PIB) -0,27 0,01 0,21

    Dvida lquida do governo federal (% PIB) 24,50 22,40 20,20

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    pondem a pouco menos de 20%do total desses recursos consi-derados livres.

    Se considerarmos as funesassociadas gerao de exter-nalidades positivas e por isso possvel desenvolver-se umargumento favorvel ao estatal,a qual no precisa ser a de produzirtais bens ou servios teremos asseguintes funes: Cincia eTecnologia, Comunicao, Edu-cao, Habitao, Saneamento eSade. Sabemos que nem todos osgastos com essas funes estoassociados a externalidades posi-tivas, mas s nos foi possvel, com

    segurana, eliminar os gastos comeducao superior. Assim, do totaloramentrio cerca de 7% dasdespesas poderiam ser justificadascomo despesas pblicas para asociedade descrita acima.

    Essas despesas, com alto teor deexternalidades positivas, respon-deriam por quase 30% dosrecursos de livre alocao pelogoverno. Assim, do oramento totalapenas 12,3% dos gastos sereferem a gastos tipicamente degoverno, isto , apenas 12,3% do

    que o Governo Federal extrai doscidados consubstanciado emgastos que, em tese, deveriam serde sua responsabilidade. Comonem todo oramento est dispo-nvel para financiar as atividades dogoverno, tomando-se os recursoslivres, menos de 50% dessesrecursos so alocados em funestpicas de governo.

    Da parcela l ivre do ora-mento, os gastos com sadeabsorvem mais do dobro daquantidade de recursos dedi-cados s funes de educao(8,69%) e defesa nacional (8,08%).Isso no significa que os gastos

    com essa funo produzam efeti-vamente externalidades posi-tivas, uma vez que em grandeparte os gastos pblicos comsade se referem ao curativae no preventiva. Nesse sentido ilustrativa a pouca importnciaoramentria da funo sanea-mento (0,45%).

    OBSERVAES FINAIS

    Nossas observaes sobre aLOA 2011 deixam clara a neces-

    sidade de mudanas, no s noprocesso de elaborao do ora-mento do setor pblico, mas nadistribuio de seus gastos. Evi-dentemente possvel melhorara administrao pblica e, dessaforma, tornar o governo mais efi-ciente em seus gastos. En-tretanto, mais importante que aeficincia do setor pblico al iberdade do brasi le iro. Essaliberdade tem sido e ameaadapela ausncia de instituies quecaracterizem, inequivocamente, adiviso do trabalho entre oscidados e o setor pblico, eentre as trs esferas adminis-

    trativas de governo. Para tanto preciso deixar claro que tipo deorganizao social desejamos parans, nossos filhos e netos. Sequisermos uma sociedade depessoas livres e responsveis,precisaremos tornar nossa Cons-tituio um instrumento supremode proteo ao cidado contra aconcentrao de poder de qual-quer natureza, em especial dopoder a ser concedido ao go-verno em sua atividade de pro-mover decises coletivas.

    Tabela 2 - Oramento Geral da Unio: Importncia relativa das despesas tpicas de governo (%)

    *Excludos os gastos com o programa Brasil Universitrio. Fonte: LOA 2011.

    Funes Sobre o Total das Despesas Sobre o Total das Despesas Livres

    Essencialmente de governo

    Administrao 1,16 -Defesa Nacional 1,63 8,08Direitos da Cidadania 0,09 0,45Essencial Justia 0,29 1,46Funo Judiciria 1,13 5,59Funo Legislativa 0,34 1,68Relaes com o Exterior 0,10 0,49Segurana Pblica 0,41 2,03SUBTOTAL 5,15 19,78

    Com alto teor de externalidades positivas

    Cincia e Tecnologia 0,40 1,99Comunicao 0,07 0,33Educao* 1,75 8,69Habitao 0,04 0,18Saneamento 0,09 0,45Sade 3,63 18,01SUBTOTAL 7,15 29,65

    TOTAL GERAL 12.30 49,43