O crisântemo e a espada: padrões de cultura japonesa - Ruth Benedict (Resenha)
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Transcript of O crisântemo e a espada: padrões de cultura japonesa - Ruth Benedict (Resenha)
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
MATHEUS FONTEBASSO RAMIRO MENIN
RESENHA:
BENEDICT, Ruth. 2011. O Crisântemo e a espada: padrões da cultura japonesa.
São Paulo: Perspectiva
SÃO CARLOS
2013
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MATHEUS FONTEBASSO RAMIRO MENIN
RA: 553808
RESENHA:
BENEDICT, Ruth. 2011. O Crisântemo e a espada: padrões da cultura japonesa.
São Paulo: Perspectiva
Profa. Dra. Catarina Morawska Vianna
Introdução à Antropologia
SÃO CARLOS
2013
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Em 7 de Dezembro de 1.941 o Japão executa uma operação aeronaval de
ataque à base estadunidense de Pearl Harbour, no Hawaii. Tal ataque ficou
conhecido como Bombardeamento de Pearl Harbor, ou, Ataque a Pearl Harborl.
Essa ofensiva foi parte de um vasto plano, que compreendia ataques simultâneos a
colônias inglesas, holandesas, além das estadunidenses. A investida rendeu aos
japoneses o controle sobre áreas importantes, onde havia seringais produtores de
látex, quinino, arroz e estanho, assim como petróleo e cromo. Afinal, os Estados
Unidos haviam cessado as relações comerciais com o Japão, que incluíam diversos
produtos importantes, principalmente o petróleo.
Esse ataque foi um dos principais motivos para a entrada dos Estados Unidos
na Segunda Guerra Mundial, ou talvez o pretexto esperado. No entanto, eles nunca
haviam enfrentado um inimigo tão distante geograficamente e, principalmente, com
costumes tão distintos. Por exemplo, os estadunidenses consideravam normais os
prisioneiros de guerra solicitarem pedidos para que suas famílias saibam que estão
vivos, e se recusarem a disponibilizarem informações a respeito de ações militares.
Soldados estadunidenses consideravam normal a rendição quando julgam que não
há escapatória nas batalhas, ao contrário dos japoneses que achavam tal ato
vergonhoso e preferiam explodir-se com uma granada de mão junto do inimigo.
Visando sanar esses problemas de choques culturais e de alguma maneira
obter informações que possam cooperar para as atividades militares. O governo
estadunidense buscou ajuda de especialistas, encomendando a Ruth Benedict,
renomada antropóloga cultural, que fizesse uma pesquisa sobre o Japão com a
finalidade já mencionada.
Inicialmente, em seu trabalho, ela apresenta o senso comum estadunidense a
respeito do povo japonês, que resumiu como “fantástica série de „mais também‟”, ou
seja, as opiniões sobre eles assumiam dois polos:
Quando um observador sério escreve a respeito de outros povos afora os japoneses, considerando-os de uma cortesia nunca vista, e pouco provável que acrescente “mas também insolentes e autoritários”. Quando disser que o povo de determinada nação e de uma incomparável rigidez de conduta, não há de acrescentar “mas também se adaptam prontamente a inovações extremas”. Quando considerar um povo submisso; não há de assinalar, além disso, que não se sujeita facilmente a um controle de cima. Quando os declarar leais e generosos, não advertira “mas também traiçoeiros e vingativos”. Quando disser que são verdadeiramente bravos, não discorrera sobre a
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sua timidez. Quando afirmar que agem sem atentar para a opinião alheia, não observara em seguida que tem uma consciência verdadeiramente terrificante. Quando descrever a disciplina de robôs do seu exercito, não se deterá a seguir sobre amaneira como os soldados tomam os freios nos dentes,chegando inclusive a insubordinação. Quando se referir a um povo que se devota apaixonadamente à cultura ocidental, não se expandira sobre o seu ardoroso conservadorismo. Quando escrever um livro sobre uma nação onde vigora um culto popular de esteticismo, que confere honrarias a atores e artistas, esbanjando arte no cultivo de crisântemos, tal obra não terá de ser completada por outra, dedicada ao culto da espada e a ascendência máxima do guerreiro.1
Concorda que todas essas contradições são verdadeiras. E reforça que há
enorme necessidade de compreendê-las, pois acredita que os hábitos japoneses
estendiam até o modo de agir na guerra. “Teria de observar a maneira como
conduziam a guerra, e considerá-la, por hora, não como um problema militar, e sim
como um problema cultural” (pág.12).
As dificuldades eram imensas, como um antropólogo cultural pesquisaria os
costumes culturais de um país sem a possibilidade de visitá-lo? Dilema expresso
logo nas primeiras páginas dos escritos de Ruth Benedict: “O fato de nossos dois
países estarem em guerra suscitava, inevitavelmente, uma séria desvantagem.
Simplesmente teria eu de abrir mão da mais importante técnica do antropólogo
cultural: o trabalho de campo” (pag. 13).
A alternativa que Benedict encontrou foi estudá-los por meio de sua literatura,
filmes, recortes de jornais, arquivos, textos acadêmicos escritos por ocidentais
(apesar de conterem informações limitadas, de acordo com ela), entrevistas com
japoneses que moravam nos Estados Unidos e entrevistas com prisioneiros de
guerra. Todavia, a percepção com que ela absorvia os escritos era ocidental, ou
seja, ela não podia compreender inteiramente o povo nipônico. “Li está literatura
como Darwin diz que leu, quando se achava elaborando suas teorias acerca da
origem das espécies, tomando nota daquilo que não tinha meios de compreender”
(pág. 14). Dessa forma, Benedict decide assumir a dificultosa tarefa de tentar
enxergar os costumes nipônicos através da perspectiva japonesa.
Ela estrutura seu texto a partir de uma dicotomia comparativa extensa entre
Japão e Estados Unidos, contudo, as nações comparadas são inseridas em uma
1 BENEDICT, Ruth. O Crisântemo e a espada: Padrões da cultura japonesa. 4. Ed. São Paulo: Perspectiva, 2011
p. 10
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homogeneidade cultural, ou seja, ela trata estes países com uma ideia de cultura
orgânica. Assumindo essa totalidade, ignora-se todos e quaisquer grupos sociais
que se enquadram em minorias, matando a rica diversidade cultural encontrada em
todas as nações.
Apesar de generoso, Dante Moreira faz a mesma ressalva a respeito dos
trabalhos de Benedict: “É com Ruth Benedict (1934) – discípula de Boas – que a
antropologia volta a pensar numa cultura global. Embora seja muito prudente em
suas afirmações, Benedict não tem muita dúvida em retomar a ideia de uma cultura
orgânica, isto é, que deva ser vista globalmente”.2
Ela sobrevoa as nações em suas análises comparativas, assumindo um tipo
de oniciência, mesmo que não intencionalmente: “Não é possível depender
inteiramente do que cada nação diz de seus próprios hábitos, de pensamentos e
ação. Os escritores de todas as nações tentaram fornecer uma descrição de si
próprios. Todavia, não é fácil. As lentes através das quais uma nação olha a vida
não são as mesmas que outra usa.” (pág.19) Se os escritores da própria população
em questão, não podem fornecer as informações corretas sobre seus costumes,
como uma antropóloga que nunca teve contato direto, o que exclui automaticamente
o cotidiano, com a rica cultura nipônica pode assumir tal conhecimento?
Todavia, Benedict constatou que o Japão se organizava inteiramente de
maneira hierárquica, juntamente com valores espirituais; desde as relações
familiares, até as organizações bélicas. E chegou a conclusão de que o
expansionismo japonês se dava por conta disso, afinal, de acordo com ela, eles não
assumiam valores de igualdade, liberdade ou democracia. Sendo “natural” para eles,
acreditar que cada nação deva assumir seu devido lugar a partir de sua força. Para
sustentar seus argumentos, ela transcreve escritos japoneses, slogans de
propagandas japonesas, mensagens de rádio:
“Terminados os combates aéreos, os aviões japoneses regressaram à sua base em pequenas formações de três ou quatro. Num dos primeiros aparelhos, achava-se um capitão. Apeando-se, examinou o céu por meio de binóculo. Enquanto seus homens retornavam, ele contava. Parecia bastante pálido, porém, muito firme. Após o regresso o último avião, dirigiu-se ao Quartel General, onde fez um relatório encaminhando-o a seguir ao Oficial Comandante. Logo em seguia, porém, trombou e súbito ao solo. Os oficiais no local acorreram-lhe em auxílio, mas ele se achava morto. Examinando-lhe o corpo, descobriu-se que já
2MOREIRA, Dante. O caráter nacional brasileiro: história de uma ideologia. 6 Ed. UNESP, 2007 pag. 62
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estava frio, com um ferimento à bala, de consequências fatais. É impossível encontrar-se frio o corpo de uma pessoa recentemente morta. Entretanto, o corpo do capitão morto estava frio como gelo. Há muito que ele estava morto, fora o seu espírito que fizera o relatório. Um fato tão miraculoso deve-se sem dúvida o rigoroso senso de responsabilidade do capitão morto.”3
A devoção à espiritualidade é brutalmente explorada por Benedict, usando-a
como premissa para legitimar inúmeras atitudes japonesas. Acreditando que o povo
japonês submeteria a qualquer ordem do imperador sem nenhum tipo de
questionamento.
Outro ponto delicado são as comparações de regimes governamentais,
colocando o Império Japonês, que formava uma monarquia constitucional
contrapondo a democracia estadunidense. Aquela funcionando de maneira
hierárquica, e está, concebendo a igualdade a todos os cidadãos. No entanto, vale
ressaltar que essa democracia desconsidera qualquer relação de classes, e que,
ainda havia leis de segregações raciais em determinados estados, reafirmando e
fortalecendo o racismo contra negros. Analisando essa comparação com tais dados,
é possível perceber que trata-se de comparações rasas, e de certa forma,
distorcendo a alteridade japonesa e enaltecendo a posição estadunidense.
Os primeiros relatórios sobre a guerra foram entregues ao governo em 1.944,
no entanto, o livro completo só fora publicado em 1.946. Ou seja, posteriormente ao
bombardeamento a Hiroshima e Nagasaki, todavia, Benedict não toca no assunto
em página alguma, nos capítulos finais, dá atenção à considerada gloriosa atuação
do Capitão Mac Arthur e na capacidade que o povo japonês tem, de mudar seus
objetivos. “Os japoneses têm uma ética de alternativas. Tentaram conquistar a sua
“posição devida” na guerra e perderam. Poderão, agora, pôr de lado esse rumo, pois
toda a sua educação os condicionou para possíveis mudanças de direção”. (pág.
255). De fato, após a guerra, o Japão mudou em grandes proporções,
economicamente, socialmente, politicamente. Mas de forma alguma essas
mudanças foram uma simples transição pós-guerra. John Hersey escreveu sobre o
terror de alguns japoneses durante o bombardeamento.4
3 BENEDICT, Ruth. O Crisântemo e a espada: Padrões da cultura japonesa. 4. Ed. São Paulo: Perspectiva, 2011
p. 29 4 John Richard Hersey foi um escritor e jornalista responsável pelo trabalho “Hiroshima”, que consistia em uma
história para o The New Yorker sobre os efeitos da bomba atômica derrubados nessa cidade japonesa no dia 6 de
agosto de 1945. O artigo que conta a história de seis vítimas do bombardeio transformou-se depois em um livro.
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Apesar de não considerar que ela tenha alcançado o seu objetivo inicial como
antropóloga cultural, provavelmente, alcançou o objetivo de informar o governo
estadunidense sobre costumes e hábitos japoneses, mesmo de maneira total,
cooperando com a inteligência militar. E vale ressaltar que esse livro se tornou um
clássico da Antropologia, valendo a pena a leitura consciente e considerando o
contexto e, de maneira alguma, como principal fonte para conhecer e estudar a
cultura japonesa.
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Referências Bibliográficas
BENEDICT, Ruth. O Crisântemo e a espada: Padrões da cultura japonesa. 4.
Ed. São Paulo: Perspectiva, 2011
Bibliografia consultada
MOREIRA, Dante. O caráter nacional brasileiro: história de uma ideologia. 6
Ed. UNESP, 2007
HERSEY, John. Hiroshima. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. Sistema de governo Japonês. Disponível em:
<http://www.pucminas.br/imagedb/conjuntura/CES_ARQ_DESCR20070411125859.pdf>. Acesso em 13/07/2013