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PROJETO DE INDULTO NATALINO DE 2018 Subsídios por ocasião da Proposta do Decreto Presidencial Curitiba 2018 1

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PROJETO DE

INDULTO NATALINO DE 2018

Subsídios por ocasião da Proposta do Decreto Presidencial

Curitiba

2018

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Coordenação-geral:

Cláudio Rubino Zuan esteves (Procurador de Justiça/MPPR)

Supervisão e Revisão dos Trabalhos:

Alexey Choi Caruncho (Promotor de Justiça/MPPR)

André Tiago Pasternak Glitz (Promotor de Justiça/MPPR)

Ricardo Casseb Lois (Promotor de Justiça/MPPR)

Equipe de apoio técnico:

Liz Ayanne Kurahashi

Thalita Moreira Guedes

Curitiba, Agosto de 2018.

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MANIFESTAÇÃO N. 139/2018

Referência: Procedimento Administrativo n. MPPR-

0046.18.086880-7

Representante: Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciária (CNPCP/MJ)

Vínculo: Atividade 5.2

Objeto: Acompanhamento das diligências adotadas no âmbito

do Ministério Público do Estado do Paraná para fins do envio

de sugestões no processo legislativo afeto ao Decreto

Presidencial de Indulto Natalino/2018

1. Trata-se de Procedimento Administrativo instaurado em

decorrência do encaminhamento do Ofício Circular n. 018/2018/CNPCP/DEPEN-MJ,

expedido pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), à

Procuradoria-Geral de Justiça, no sentido de oportunizar a apresentação de

eventuais subsídios que possam contribuir na elaboração da proposta do Decreto

Presidencial de Indulto Natalino de 2018.

A título preparatório à apresentação oficial de sugestões ao

CNPCP, este Centro de Apoio Operacional oportunizou aos Membros do Ministério

Público com atuação na seara envolvida, o envio de suas ponderações a respeito do

tema (fls. 09/10).

É, em síntese, o quanto basta.

2. Os processos legislativos e o acompanhamento das

inovações normativas relacionadas ao tema do indulto vêm sendo objeto de

acompanhamento intenso por parte desta unidade desde, ao menos, o ano de 2016,

época em que passou a figurar como uma das iniciativas de seus sucessivos Planos

Setoriais de Atuação1.

1 Cf. aqui os Planos Setoriais de Ação de 2016, 2017 e 2018. Disponíveis em http://www.criminal.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1669.

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Justamente por força desta iniciativa é que, em prol de uma

maior objetividade nas propostas ora apresentadas, parte-se aqui do detalhado

Estudo realizado por esta Equipe no passado, por ocasião da publicação do Decreto

Presidencial n. 9.246/20172, bem como de apontamentos arguidos na Ação Direta de

Inconstitucionalidade n. 5.874/DF, então proposta pela Procuradoria-Geral da

República:

2.1 Da vedação à concessão do indulto e comutação de

penas no tocante à aplicação de sanção pelo Juízo competente em audiência

de justificação (Art. 4º, inc. I, §§ 1º e 2º)

O Decreto n. 9.246/2017 em seu art. 4º, inc. I e §§ 1º e 2º,

dispõe que:

Art. 4º. O indulto natalino ou a comutação não será concedido às pessoasque:I - tenham sofrido sanção, aplicada pelo juízo competente emaudiência de justificação, garantido o direito aos princípios do contraditórioe da ampla defesa, em razão da prática de infração disciplinar de naturezagrave, nos doze meses anteriores à data de publicação deste Decreto;[...]§ 1º. Na hipótese de a apuração da infração disciplinar não ter sidoconcluída e encaminhada ao juízo competente, o processo de declaraçãodo indulto natalino ou da comutação será suspenso até a conclusão dasindicância ou do procedimento administrativo, que ocorrerá no prazode trinta dias, sob pena de prosseguimento do processo e efetivação dadeclaração. § 2º. Decorrido o prazo a que se refere o § 1º sem que haja a conclusãoda apuração da infração disciplinar, o processo de declaração doindulto natalino ou da comutação prosseguirá.

Neste aspecto, é importante recordar que, até o ano de 2016,

havia divergência de posicionamento acerca da necessidade ou não de

homologação da falta grave dentro do período dos 12 (dose) meses anteriores à

publicação do Decreto.

Até onde se identificou, a orientação jurisprudencial vinha

sendo no sentido de que, se a falta grave cometida (no período dos 12 meses

anteriores ao Decreto) não fosse homologada naquele mesmo período, não haveria

óbice à concessão da benesse. Este entendimento, porém, já vinha sofrendo

2 Reportamo-nos, aqui, aos documentos disponíveis emhttp://www.criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/Estudo_Indulto_2017_versao_final.pdf ehttp://www.criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/Nota_Explicativa_sobre_o_Indulto_Natalino_2017.pdf.

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importante alteração pelo Superior Tribunal de Justiça que passou a entender que, o

simples cometimento da falta grave, durante o período indicado, já impediria a

concessão dos benefícios.

A redação do Decreto de 2016, neste sentido, disciplinou a

matéria, fazendo-o nos seguintes termos:

A declaração do indulto prevista neste Decreto fica condicionada à ausênciada prática de infração disciplinar de natureza grave, nos doze mesesanteriores à publicação deste Decreto, sendo que caso a infraçãodisciplinar não tenha sido submetida à apreciação do juízo deexecução, a declaração do indulto deverá ser postergada até aconclusão da apuração, que deverá ocorrer em regime de urgência (art. 9ºe parágrafo único, gn).

Por outro lado, já o Decreto de 2017, diversamente dos

anteriores, passou a condicionar o requisito subjetivo à ausência de sanção

aplicada pelo Juízo competente em audiência de justificação, em que tenha sido

garantido o contraditório e a ampla defesa em razão da prática de infração

disciplinar de natureza grave nos 12 (doze) meses anteriores à publicação do

decreto.

Assim, conforme a redação de 2017, para que o condenado

preencha o requisito subjetivo, será necessário que, no caso concreto, ele

efetivamente não tenha sofrido qualquer sanção aplicada em audiência de

justificação em decorrência do cometimento de falta grave.

Estas distintas previsões e possibilidades normativas, portanto,

demandam uma postura político criminal por parte do órgão idealizador do vindouro

Decreto.

Adianta-se vislumbrar-se aqui potencial polêmica que poderá

surgir3, pois o entendimento jurisprudencial majoritário é de que, em que pese ser de

competência do Juízo de Direito a aplicação de algumas das medidas sancionatórias

quando apurada a existência de falta grave cometida pelo apenado no curso da

execução (e também no caso de presos provisórios), estas sanções somente

poderiam ser aplicadas após o reconhecimento da falta grave através da regular

3 A título de exemplo, confira-se, o Estudo de Caso elaborado por este Centro de Apoio no passadoque enfrenta a matéria, intitulado “Instauração de PAD em decorrência de falta grave”, disponívelem: <http://www.criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/Estudo176.pdf>.

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instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) pelo Diretor do

estabelecimento prisional, por ser quem detém o exercício do poder disciplinar.

Em conformidade com essa vertente, há dois tipos e

procedimentos não se confundem, ou seja, enquanto o PAD se destina à apuração

da ocorrência ou não da própria falta grave (assegurando ao apenado o contraditório

e ampla defesa, bem como à aplicação das diversas sanções disciplinares pela

autoridade administrativa), a oitiva do apenado em juízo teria como único objetivo a

aplicação da sanção concernente à regressão de regime, exigindo-se, para tanto,

que já tivesse sido reconhecida a falta grave pelo diretor do presídio.

A Lei de Execução Penal dispõe em seu artigo 59 que,

praticada a falta disciplinar deverá ser instaurado o procedimento para a sua

apuração que será presidido pela autoridade administrativa.

Nesse sentido, a Súmula 533/STJ prevê que para o

reconhecimento da prática de falta disciplinar no âmbito da execução penal, é

imprescindível a instauração de procedimento administrativo pelo diretor do

estabelecimento prisional, assegurado o direito de defesa, a ser realizado por

advogado constituído ou defensor público nomeado.

Não se deve olvidar, ademais, que a questão referente à

instauração de PAD para apuração de falta grave ainda enfrenta contornos mais

complexos quando se trata de condenados que cumprem pena no regime aberto,

presos em delegacias de polícia, bem como de condenados que cumprem pena em

regime semiaberto harmonizado (ou seja, aqueles que não cumprem pena em

estabelecimento penitenciário).

No Estado do Paraná, por exemplo, apenas no que tange aos

presos em delegacias de polícia e condenados de regime semiaberto harmonizado

atinge-se um número próximo a 20 mil pessoas.

Nestes casos, as faltas cometidas nesse cenário não vêm

sendo apuradas diante da inexistência de um “diretor de estabelecimento”, fazendo

com que o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná venha anulando, em sede de

agravo em execução, as decisões de magistrados que realizam a regressão de

regime em decorrência de falta grave sem que tenha sido apurada através de PAD,

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ainda que tenha ocorrido audiência judicial de justificação4.

Diante de tal cenário, em sendo mantida a redação do Decreto

do Indulto Natalino de 2017 neste ponto, é possível prever que muitos condenados

serão beneficiados em decorrência de um impasse jurisprudencial dos Tribunais

Superiores ainda em curso. Esta circunstância, portanto, por si só já justificaria

evitar-se uma previsão semelhante no vindouro decreto.

Outrossim, não se pode esquecer que não raras vezes, mesmo

nos casos em que se apura a falta grave adequadamente, os Juízes têm

homologado a falta sem aplicar as devidas sanções, o que, ao que parece, não seria

óbice à concessão do indulto e da comutação, de acordo com a redação do Decreto

de 2017.

Justamente por isto, da forma como redigida a vedação, não

será de se estranhar a não aplicação do requisito delimitador, haja vista o contexto

fático e jurisprudencial no qual se insere.

Registre-se, finalmente, que o atual Decreto prevê, no § 1º do

art. 4º, que na hipótese da apuração da infração disciplinar não ter sido concluída e

encaminhada ao Juízo competente, o processo de declaração do indulto natalino e

comutação restará suspenso até a conclusão da sindicância ou do procedimento

administrativo, que ocorrerá no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de

prosseguimento do processo e efetivação da declaração.

Ao que parece, mantido o cenário referido, esta previsão

residual que tenderá a figurar como regra (e não exceção, tal qual desejado pela

norma).

Justamente por força de todas as circunstâncias, SUGERE-SE

que, no tocante ao cometimento de faltas graves (requisito subjetivo), seja

observado, em especial, os termos do quanto vinha disciplinado no Decreto n.

4 Registre-se que âmbito do Supremo Tribunal Federal, em 07/04/2017, no curso do julgamento doRecurso Extraordinário n. 972598/RS, que se discute se a oitiva do condenado em audiência dejustificação pelo juízo da execução penal, presentes o MP e o Defensor, supre a necessidade deprévio procedimento administrativo disciplinar, o Plenário Virtual do Tribunal, por unanimidade,reputou constitucional a questão e, ainda, por unanimidade reconheceu a existência derepercussão geral da questão constitucional suscitada. No mérito, o STF não reafirmou ajurisprudência dominante recente sobre a matéria, que será submetida a posterior julgamento noPlenário Físico.

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8.940/20165, muito mais simples e coerente com o atual cenário vivenciado.

2.2 Do indulto e comutação de penas relativas em casos de

aplicação de suspensão condicional do processo (Art. 8º, inc. III)

O art. 8º, inc. III, do Decreto de 2017, prevê que “os requisitos

para concessão de indulto natalino e da comutação de pena de que trata este

Decreto são aplicáveis à pessoa que tenha sido beneficiada com a suspensão

condicional do processo”.

Tal artigo, não é demais recordar, foi um daqueles impugnados

pela Procuradoria-Geral da República, quando da propositura da Ação Direta de

Inconstitucionalidade n. 5.874, sob o argumento de que:

A referência a “possível” infrator reside na rotunda inconstitucionalidade dese indultar até mesmo as situações de suspensão condicional do processo.Não há processo, não há condenação, mas há perdão. Trata-se de umavicissitude técnica, geradora de uma situação ilógica (perdão paraquem nem é processado) e marcadamente deficiente no plano daproteção jurídica. O indulto, em sua natureza jurídica, visa a mitigar osofrimento decorrente da pena, por vezes, como compensação peloexagero da reprimenda1. Todavia, em todas as hipóteses do art. 8º (fora ado inciso III, em que nem há condenação) já foram conferidos enormesfavores legais, mostrando-se exacerbada a benesse de promover um novobenefício. […] O indulto, nestas hipóteses, não produz nenhum efeito naquestão de lotação carcerária. O mote do desencarceramento, emrelação a estas situações, é errôneo”.

Este entendimento foi acompanhado na motivação da decisão

monocrática proferida na Medida Cautelar da citada ADI, em que o e. Ministro

Relator Roberto Barroso recordou que na suspensão condicional do processo

sequer existe uma pena que possa ser perdoada. Tanto que, tal qual referido, de

acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal6, o período de prova

relacionado a esta espécie de suspensão não deve ser computado para fins de

concessão de indulto, como efetivo cumprimento da sanção penal, por uma razão

lógica: se a pena está suspensa, não seria possível que, ao mesmo tempo,

5 Art. 9º. A declaração do indulto prevista neste Decreto fica condicionada à ausência da práticade infração disciplinar de natureza grave, nos doze meses anteriores à publicação desteDecreto. Parágrafo único. Caso a infração disciplinar não tenha sido submetida à apreciação dojuízo de execução, a declaração do indulto deverá ser postergada até a conclusão da apuração,que deverá ocorrer em regime de urgência.

6 Cf. HC 128846, Relª. Minª. Cármen Lúcia, Segunda Turma, j. 24.11.2005; e HC 129209, Rel. Min.Dias Toffoli, Segunda Turma, j. 11.12.2015.

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estivesse sendo cumprida.

Neste cenário, diante do quanto exposto, uma vez que tal

hipótese de cabimento do Decreto n. 9.246/2017 foi suspensa7 em virtude da

incompatibilidade com os fins constitucionais do indulto e por violação ao princípio

da separação dos Poderes, SUGERE-SE sua supressão da redação do decreto

vindouro.

2.3 Do Indulto e comutação de penas no tocante à pena de

multa (Art. 10)

O art. 10 do Decreto n. 9.246/2017 prevê apenas o alcance do

indulto e da comutação à pena de multa aplicada cumulativamente.

Art. 10. O indulto ou a comutação de pena alcançam a pena de multaaplicada cumulativamente, ainda que haja inadimplência ou inscriçãode débitos na Dívida Ativa da União, observados os valoresestabelecidos em ato do Ministro de Estado da Fazenda. Parágrafo único. O indulto será concedido independentemente dopagamento:I - do valor multa, aplicada de forma isolada ou cumulativamente; ouII - do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza.

Além disso, de acordo com o parágrafo único, inc. I, do

dispositivo citado, o não pagamento da pena de multa aplicada isolada ou cumulada

com pena privativa de liberdade não obsta a concessão do indulto referente à pena

privativa de liberdade.

Da mesma forma, nos termos do inciso II, independentemente

do pagamento do valor de condenação pecuniária de qualquer natureza, o indulto

será, em tese, concedido.

As disposições do art. 10 do Decreto de 2017, entretanto,

foram igualmente contestadas pela Procuradoria-Geral da República na Ação Direta

de Constitucionalidade n. 5.874, com requerimento de medida cautelar, sob o

argumento de que a pena de multa e a pena pecuniária não provoca qualquer

situação de desumanidade ou que fosse digna de benignidade. Trata-se, conforme

ressaltado, de atuação judicial que beneficia a sociedade sem agravar, em demasia

7 Por meio da decisão monocrática do Min. Relator Roberto Barroso relativa à Medida Cautelar naADI n. 5.874.

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ou excesso, a pessoa condenada.

Como bem lembrado pelo e. Ministro Relator Roberto Barroso,

a minuta de decreto apresentada pelo Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciária (CNPCP), inclusive, vedava expressamente o indulto da pena de

multa. Uma disposição que se alinha à orientação de combate à corrupção, já que

sanções pecuniárias costumam ser componente essencial da condenação nesse

tipo de delito.

Conforme exposto pelo referido Relator, o dispositivo seria

inconstitucional por quatro fundamentos:

i) A regra inviabiliza a função preventiva geral da pena de

multa, pois, conforme observado na inicial, “sem as repercussões patrimoniais,

considerando o beneplácito estendido às penas pecuniárias, […], o condenado não

tem mais ínfimo desestímulo de cometer novos crimes, e não teria mais nenhum

interesse em colaborar com a justiça, seja pela confissão, seja pela colaboração

premiada”;

ii) Deficit de legitimidade democrática, na medida em que a

norma contraria o forte consenso da sociedade brasileira acerca da necessidade de

sério enfrentamento da corrupção, fragilizando os mecanismos de reparação dos

prejuízos econômicos gerados pela criminalidade de colarinho branco;

iii) Desvirtuamento do instituto do indulto, seja na perspectiva

de ferramenta humanitária seja como mecanismo de política criminal. A extensão do

indulto ou comutação às penas de multa e condenações pecuniárias não beneficia a

maior parte da população carcerária. Pelo contrário, teria destinatários específicos,

ou seja, aqueles que se locupletaram do dinheiro público, que representam

percentual mínimo dos presos brasileiros e que possuem perfeitas condições de

saldar sua dívida (também financeira) com a sociedade; e

iv) Dissonância com a política criminal legislativa e a

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, pois sequer a progressão de regime –

benefício evidentemente menos generoso que o indulto – pode ser concedida sem o

adimplemento dessas obrigações. A título de exemplo, cita-se o quanto decido nas

Execuções Penais 16, 20 e 21 oriundas da Ação Penal n. 470.

Dessa forma, em consonância com a decisão monocrática do

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Ministro Roberto Barroso, proferida na Medida Cautelar na ADI n. 5.874-DF,

SUGERE-SE que, uma vez estendida a concessão de indulto às penas de multa e

prestações pecuniárias no Decreto vindouro, esteja referida extensão limitada

apenas àquelas hipóteses excepcionalíssimas, devidamente comprovadas perante

o Juízo da execução penal, restringindo-se aos seguintes casos:

i) quando restar identificado situação de extrema carência

material do apenado; e

ii) ou quando o valor da multa for inferior ao mínimo fixado em

ato do Ministro da Fazenda para a inscrição de débitos em Dívida Ativa da União 8,

nos moldes de como era previsto no Decreto n. 8.380/20149.

2.4 Do indulto e comutação de penas quando há recurso da

acusação de qualquer natureza após a apreciação em segunda instância (Art.

11, inc. II)

Por fim, é válido recordar a questão afeta à previsão de

concessão de indulto e comutação na pendência de julgamento de recurso da

acusação de qualquer natureza, após a apreciação em segunda instância, tal qual

previsto pelo Art. 11, inc. II, do Decreto n. 9.246/2017.

Trata-se de dispositivo que também foi objeto de impugnação

pela Procuradoria-Geral da República na ADI n. 5.874-DF, referindo que tal

dispositivo transformaria o processo penal em algo menor no ordenamento jurídico

brasileiro. Nos termos então lançados, perdoar uma pena independentemente do

que o Judiciário julgará – seja aumentando a pena ou mudando a capitulação

jurídica do delito – seria incorrer em típica proteção deficiente da norma, implicando

numa ostensiva ruptura da tripartição dos poderes e em violação expressa ao art. 5º,

inc. XLIII, da Constituição da República.

Nessa toada, o Relator Min. Roberto Barroso entendeu que

estaria em curso um desvirtuamento dos fins do indulto, usurpação da função

8 Conforme se encontra disciplinado na Portaria n. 75/2012 do Ministério da Fazenda, em seu art.1º, inc. I.

9 Art. 1º. Concede-se o indulto coletivo às pessoas, nacionais e estrangeiras: […] X - condenadas apena de multa, ainda que não quitada, independentemente da fase executória ou juízo em que seencontre, aplicada cumulativamente com pena privativa de liberdade cumprida até 25 dedezembro de 2014, desde que não supere o valor mínimo para inscrição de débitos na DívidaAtiva da União, estabelecido em ato do Ministro de Estado da Fazenda, e que não tenhacapacidade econômica de quitá-la.

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jurisdicional de individualização da pena e um esvaziamento do processo penal,

suspendendo a sua aplicação.

Justamente por isto, SUGERE-SE a exclusão desta hipótese

na redação do decreto em gestação.

3. Diante dos apontamentos referidos, DELIBERA-SE no

seguinte sentido de que:

3.1 Por primeiro, junte-se a presente manifestação aos autos físicos, bem como no

sistema Pro-MP, conforme registros de praxe, inclusive junto ao sistema Juraí;

3.2 Expeça-se ofício ao Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

(CNPCP), com cópia dessa manifestação, encaminhando-o no e-mail indicado

no Ofício Circular n. 018/2018/CNPCP/DEPEN-MJ ([email protected])

haja vista a proximidade do término do prazo então fixado;

3.3 Providencie-se a oportuna publicação deste material na página correspondente

do Centro de Apoio, em especial naquela vinculada à atividade de

acompanhamento legislativo de política criminal (Ativ. 5.2 do Plano Setorial de

Ação do CAOP), resguardando-se o material, ainda, para fins de inserção no

espaço CAOP Informa;

3.4 Por fim, proceda-se ao arquivamento do presente feito, haja vista os fins pelos

quais foi instaurado.

Curitiba, 09 de agosto de 2018.

Equipe do Centro de Apoio Operacional das

Promotorias Criminais, do Júri e de Execuções Penais

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