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94 RCPV (2014) 109 (591-592) 94-99 Resumo: Na atualidade, debates se intensificam sobre a ocorrên- cia de doenças de caráter epidemiológico no curso do desenvolvi- mento da apicultura brasileira. Este estudo de caso foca os fatores que conduzem às perdas apícolas, a partir de dados obtidos de levantamento regional, que abrangeu 34 municípios. O deline- amento segue a categorização dos municípios em duas regiões, conforme o nível de perdas de colmeias, ser alto ou aceitável. Para cada região, aplicou-se o Índice de Desempenho Apícola (IDApi) para caracterizar os fatores de heterogeneidade tecnológica nos apiários. O IDApi destaca notável deficiência nas práticas apícolas em ambas as regiões estudadas, que podem desencadear focos de doenças. O quadro singular na região com altas perdas sugere que há fatores endógenos que merecem estudos aprofundados, bem como exige melhorias da tecnologia apícola. Palavras-chave: Sanidade apícola; Perdas de colmeias; Índice de Desempenho; Produção. Summary: Nowadays, the debates intensify on the occurrence of an epidemic disease during the development of the Brazilian beekeeping. This case study focuses on the factors that lead the beekeeping losses; these data were obtained from regional survey, which covered 34 counties. The design follows the categorization of the counties in two regions, according to the level of losses of hives, in high or acceptable. For each region, we applied the Performance Index Beekeeping (PIBee index) in order to analyze the heterogeneity of technological factors in the apiaries. The PIBee index highlights notable low level of beekeeping practices in both regions, which may trigger outbreaks of disease. The par- ticular figure of the region with high losses suggests also the oc- currence of intrinsic factors, which demand carefully analysis, and requires improvement of beekeeping technology as well. Keywords: Bee health; Losses of hives; Performance index; Production. Introdução No Brasil, uma das alternativas de trabalho, obten- ção de renda e alimentos para as famílias rurais é a criação de abelhas melíferas (Apicultura), que se trata de uma atividade agrária de fácil implementação e que explora os recursos naturais de áreas cobertas por flora nativa e de cultivos. A Apicultura se destaca por produzir uma variedade de produtos como, o mel, pro- duto mais visado comercialmente, a própolis, o pólen, a cera, etc., além de servir à agricultura por meio do tra- balho de polinização das abelhas. Por décadas, o setor apícola brasileiro se restringiu ao comércio interno, consolidando em 1999, uma pro- dução estimada de 19 mil toneladas de mel; a partir de 2000, com a abertura do mercado mundial para os pro- dutos apícolas brasileiros, a produção de mel mais que duplicou ao atingir a cifra de 39 mil toneladas anuais em 2012, alçando o Brasil como o 11º produtor no ranking mundial e como 5º maior exportador (IBGE, 2013; FAO, 2009). Este resultado expressivo se deve a participação de mais de 350 mil apicultores, que permitiu 450 mil novas ocupações no campo e 16 mil empregos diretos no setor industrial. O impacto multiplicador dessa ati- vidade estende-se desde a produção no campo, ao seu processamento industrial até a logística na comerciali- zação e ao consumo. Apesar da magnitude do setor apícola, seu crescimento está em declínio (Koshiyama et al., 2012; IBGE, 2013) e seus indicadores de produção necessitam alcançar melhor patamar. Atualmente, a produção de mel média anual por colmeia mundial gira em torno de 25 kg e a brasileira não ultrapassa 15 kg (Koshiyama et al., 2012). O aumento da produtividade apícola só é possível por meio do monito- ramento dos fatores de produção e de medidas pontuais para deter os gargalos que se fazem presentes. Na elaboração de um planejamento conciso para se monitorar o setor apícola, busca-se dispor de um banco de dados, que provém de levantamentos sobre produtores e sua criação, que possam prover diagnoses sobre o setor em avaliação. No entanto, censos e levantamentos, costu- meiramente, são analisados usando distribuições de fre- quência dos fatores, as diagnoses são extensas, apresen- tam retorno limitado para o produtor, e por ser mais des- critiva do que inferencial não possibilita um diagnóstico Proposta de Diagnose Apícola, de sua Tecnologia e Sanidade por meio do indicador Idapi Proposal for Beekeeping Diagnosis, of its Technology and Health using Pibee Index Adriano S. Koshiyama * , João Soares-Neto, Wagner S. Tassinari e Maria C.A. Lorenzon Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Correspondência: [email protected] Rodovia BR 465 Km 7, CEP 23890-000 – Seropédica/RJ

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RCPV (2014) 109 (591-592) 94-99

Resumo: Na atualidade, debates se intensificam sobre a ocorrên-cia de doenças de caráter epidemiológico no curso do desenvolvi-mento da apicultura brasileira. Este estudo de caso foca os fatores que conduzem às perdas apícolas, a partir de dados obtidos de levantamento regional, que abrangeu 34 municípios. O deline-amento segue a categorização dos municípios em duas regiões, conforme o nível de perdas de colmeias, ser alto ou aceitável. Para cada região, aplicou-se o Índice de Desempenho Apícola (IDApi) para caracterizar os fatores de heterogeneidade tecnológica nos apiários. O IDApi destaca notável deficiência nas práticas apícolas em ambas as regiões estudadas, que podem desencadear focos de doenças. O quadro singular na região com altas perdas sugere que há fatores endógenos que merecem estudos aprofundados, bem como exige melhorias da tecnologia apícola.

Palavras-chave: Sanidade apícola; Perdas de colmeias; Índice de Desempenho; Produção.

Summary: Nowadays, the debates intensify on the occurrence of an epidemic disease during the development of the Brazilian beekeeping. This case study focuses on the factors that lead the beekeeping losses; these data were obtained from regional survey, which covered 34 counties. The design follows the categorization of the counties in two regions, according to the level of losses of hives, in high or acceptable. For each region, we applied the Performance Index Beekeeping (PIBee index) in order to analyze the heterogeneity of technological factors in the apiaries. The PIBee index highlights notable low level of beekeeping practices in both regions, which may trigger outbreaks of disease. The par-ticular figure of the region with high losses suggests also the oc-currence of intrinsic factors, which demand carefully analysis, and requires improvement of beekeeping technology as well.

Keywords: Bee health; Losses of hives; Performance index; Production.

Introdução

No Brasil, uma das alternativas de trabalho, obten-ção de renda e alimentos para as famílias rurais é a criação de abelhas melíferas (Apicultura), que se

trata de uma atividade agrária de fácil implementação e que explora os recursos naturais de áreas cobertas por flora nativa e de cultivos. A Apicultura se destaca por produzir uma variedade de produtos como, o mel, pro-duto mais visado comercialmente, a própolis, o pólen, a cera, etc., além de servir à agricultura por meio do tra-balho de polinização das abelhas.

Por décadas, o setor apícola brasileiro se restringiu ao comércio interno, consolidando em 1999, uma pro-dução estimada de 19 mil toneladas de mel; a partir de 2000, com a abertura do mercado mundial para os pro-dutos apícolas brasileiros, a produção de mel mais que duplicou ao atingir a cifra de 39 mil toneladas anuais em 2012, alçando o Brasil como o 11º produtor no ranking mundial e como 5º maior exportador (IBGE, 2013; FAO, 2009). Este resultado expressivo se deve a participação de mais de 350 mil apicultores, que permitiu 450 mil novas ocupações no campo e 16 mil empregos diretos no setor industrial. O impacto multiplicador dessa ati-vidade estende-se desde a produção no campo, ao seu processamento industrial até a logística na comerciali-zação e ao consumo.

Apesar da magnitude do setor apícola, seu crescimento está em declínio (Koshiyama et al., 2012; IBGE, 2013) e seus indicadores de produção necessitam alcançar melhor patamar. Atualmente, a produção de mel média anual por colmeia mundial gira em torno de 25 kg e a brasileira não ultrapassa 15 kg (Koshiyama et al., 2012). O aumento da produtividade apícola só é possível por meio do monito-ramento dos fatores de produção e de medidas pontuais para deter os gargalos que se fazem presentes.

Na elaboração de um planejamento conciso para se monitorar o setor apícola, busca-se dispor de um banco de dados, que provém de levantamentos sobre produtores e sua criação, que possam prover diagnoses sobre o setor em avaliação. No entanto, censos e levantamentos, costu-meiramente, são analisados usando distribuições de fre-quência dos fatores, as diagnoses são extensas, apresen-tam retorno limitado para o produtor, e por ser mais des-critiva do que inferencial não possibilita um diagnóstico

Proposta de Diagnose Apícola, de sua Tecnologia e Sanidade por meio do indicador Idapi

Proposal for Beekeeping Diagnosis, of its Technology and Health using Pibee Index

Adriano S. Koshiyama*, João Soares-Neto, Wagner S. Tassinari e Maria C.A. Lorenzon

Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Correspondência: [email protected]

Rodovia BR 465 Km 7, CEP 23890-000 – Seropédica/RJ

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pleno dos entraves. Por outro lado, o uso de índices para avaliar o âmbito tecnológico na apicultura é uma propos-ta viável para reduzir custos e proporcionar uma acurada resposta para o gestor (Freitas, 2003; Matos, 2005; Khan et al., 2009, Soares-Neto, 2011; Koshiyama, 2011).

Baseado nessa perspectiva, este estudo aprofunda a análise sobre a conjuntura apícola, neste caso aborda a apicultura de um Estado brasileiro, cujos gargalos foram apresentados por Lorenzon et al. (2008) e Pacheco et al (2007; 2009), com ênfase no alto índice de prevalência de perdas de colmeias (>20% a/a), abrangendo mais de 50 dos 72 municípios. As causas das perdas inclinam para a ocorrência de doenças (Pacheco, 2007), a con-tribuição de fatores de ordem tecnológica aplicados de forma deficiente e, ou de outros fatores.

Para estreitar estas hipóteses, este trabalho objetiva ava-liar as causas da heterogeneidade nas perdas de colmeias de certas regiões e sua provável relação com fatores de ordem tecnológica e sanitária, utilizando-se o índice de desempenho da Apicultura (IDApi), que se trata uma fer-ramenta de avaliação de gargalos técnicos presentes nas criações apícolas. Igualmente, os resultados do IDApi são validados por meio de um modelo de regressão.

Material e métodos

Área de estudo e base de dados

O banco de dados consultado foi proveniente do levantamento apícola realizado em 34 municípios do estado do Rio de Janeiro (22º54’23”S, 43º10’21”W) (Lorenzon et al., 2011), para obter dados de diagnose sobre perdas de colmeias por meio de um delineamen-to. Este delineamento categorizou os municípios em duas regiões: região A, composta por 27 municípios, que apresenta a prevalência de perdas maior ou igual a 20%; nesta região avaliaram-se 322 apicultores; e a re-gião B, composta por sete municípios, que reúne aque-les com prevalência de perdas menor que 20%; nesta região avaliaram-se 46 apicultores (figura 1).

Figura 1 - Nível de perdas, abaixo de 20%, considerado aceitá-vel (região B em azul) e nível alto, acima de 20% (região A em vermelho), dos municípios do estado do Rio de Janeiro, confor-me Lorenzon et al. (2008).

Índice de Desempenho da Apicultura

Para avaliar o desempenho da Apicultura adotou-se o IDApi, conforme propuseram Koshiyama (2011) e Soares-Neto (2011), que é definido a seguir:

(1)

Onde o (pi | Z

(ki)) é o peso p

i atribuído a uma prá-

tica ki realizada pelo apicultor Z; e respectivamente

o max[(pi | Z

(ki))] é o peso p

i máximo da prática k

i.

Deduz-se então que 0 ≤ IDApiZ ≤ 1; o que significa

que quanto mais próximo de 1 for o escore do apicul-tor melhor será seu desempenho, do contrário, este possui deficiências em sua produção.

Propôs-se a categorização do escore do IDApi em três classes para as localidades estudadas: fraca, quando 0 ≤ IDApi

Z < 0,50; regular, se 0,50 ≤ IDApi

Z <

0,75; e satisfatória, somente se 0,75 ≤ IDApiZ ≤ 1,00.

Este ferramental é usado como suporte na diferencia-ção entre os municípios e na elucidação de seus gar-galos em nível regional.

Na composição do IDApi são consideradas uma se-quência de variáveis que cerceiam a tecnologia apíco-la, relacionadas com a formatação dos equipamentos e instalações do criatório, a origem dos enxames do apiário e as técnicas envolvidas com a administração e produção do apiário, ditas como manejo. Esses três estratos básicos, a instalação, o povoamento e o ma-nejo, são as temáticas principais das variáveis que compõem o IDApi. A fórmula (2) descreve essa de-composição nos temas:

(2)

Onde a média aritmética da avaliação da instalação, do povoamento e do manejo, resulta na avaliação ge-ral da criação do apicultor. Baseado no levantamento apícola de 2009-2010 (Lorenzon et al., 2011), sele-cionaram 23 variáveis para a composição do IDApi, sendo nove de instalação, cinco sobre origem dos en-xames (povoamento) e nove de manejo de apiários.

Os resultados provenientes do IDApi foram apre-sentados por meio de análises exploratórias dos esco-res de cada apicultor nas diferentes localidades. Foi usada a análise de regressão, para se investigar a re-lação multivariada entre o IDApi, a produção de mel, a prevalência de perdas de colmeias e a presença ou ausência de doenças na criação.

A análise de regressão é destinada ao estudo da dependência de uma variável (variável exógena ou dependente, Y

i), em relação a uma ou mais variáveis

(variáveis endógenas ou independentes, X1, X

2, ...,

Xn), explicativas (Greene, 2003). Nesta modelagem,

não são consideradas somente variáveis quantitativas como regressores (produção de mel, nível de perdas, etc.), mas também são inclusas no modelo, variáveis

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que conferem um sentido de estado, como a ausên-cia ou presença de doença na criação (Montgomery e Hunger, 2003). Assim sendo, uma extensão do mo-delo de regressão linear é se usar variáveis dummies (Gujarati, 2000), que se apresenta a seguir:

(3)

Este modelo ajustado para a validação do IDApi usa como variáveis explicativas a produção média de mel por colmeia (X

i1), a taxa de perdas de colmeias

(Xi2), a existência ou ausência de doença na criação

(Zi1), todos estas em função da variável resposta

IDApi (Yi); ε

i é a perturbação estocástica distribuída

normalmente, com média nula e a variância constan-te e finita. Ressalta-se que a seleção de tais variáveis explicativas para compor o modelo são as que, teori-camente, tem seu desempenho afetado pelas variáveis que compõem o IDApi.

Todas as análises estatísticas foram realizadas no pacote estatístico R (R Development Core Team, 2012). E as análises espaciais foram feitas no sistema de informações geográficas TerraView (INPE/DPI, 2009).

Resultados e discussão

A deficiência técnica no setor apícola é básica e no-tória em ambas as regiões estudadas, que obtiveram escores na classe de regular (IDApi de 0,51 e 0,48 respectivamente) e não divergem entre si (p-valor > 5%). Verifica-se também uma ampla margem de dis-tância destes escores para o escore satisfatório (p-va-lor > 5%). Os boxplots mostram medianas próximas, dentro dos intervalos de 0,31 a 0,66 (figura 2A). Há ausência do escore (sobre os apicultores) satisfató-rio e alta presença de escores regular (62%) e fraco (38%) (figura 3A).

Essa análise geral evidencia as similaridades na estrutura de produção das regiões A e B (tabela 1), explicável pela alta lotação de colmeias por apiário (na condição local não deveria ultrapassar 20 por api-ário), que se inter-relaciona negativamente à produ-ção anual de mel por colmeia (p-valor < 5%), apesar da significativa dissonância entre as prevalências de perdas e de doenças em colmeias. Os indicadores de assistência técnica, associativismo e capacitação são mais expressivos na região B, o que sugere uma ação positiva sobre a redução nas perdas de colmeias. Certamente, o maior acompanhamento da criação, as trocas mútuas de experiências entre produtores e o interesse pela atividade são os responsáveis pelo me-lhor desempenho, mas ressalta-se que estes indicado-res não expressam por si um incremento significativo na produção média de mel.

Tabela 1 - Fatores de produção apícola nas regiões com nível de perda alto (A) e aceitável (B) de colmeias. ERJ. 2013.

Característica (em média) Região A Região B

Número de colmeias 26 31

Prevalência de perdas de colmeias 38% 19%

Prevalência de doenças 42% 18%

Produção anual de mel por colméia 12,4kg 12,2kg

Proporção de Apicultoråes que recebem assistência técnica

19% 30%

Proporção de Apicultores que são filiados à entidade de classe

34% 48%

Proporção de Apicultores que recebem capacitação básica

57% 78%

Para apurar a análise dos fatores que podem explicar a heterogeneidade endêmica entre as regiões estuda-das, segmenta-se a seguir o IDApi geral em vários es-tratos (figura 2).

Figura 2 - Box plot dos escores do IDApi das regiões com nível de perda de colmeias alto (A) e aceitável (B): A) IDApi Geral; B) IDApi Instalação; C) IDApi Povoamento; D) IDApi Manejo.

No estrato instalação de apiários há considerável ho-mogeneidade nas regiões A e B, com escores de 0,68 e 0,72, respectivamente (p-valor > 5%), devidos a pre-sença de apicultores posicionados nos escore regular (67%) e satisfatório (29%) (figuras 2B e 3B). Há atri-butos deste estrato (três variáveis) que foram obede-cidos corretamente pela maioria dos apicultores (per-to de 75%) em ambas as regiões. Contudo, os efeitos benéficos podem ser anulados com atributos de efeito contrário (três variáveis) de similar importância, utili-zados por menos de 50% dos apicultores. Dentre eles, ressaltam-se as condições insatisfatórias de higiene das instalações apícolas, segundo a opinião do técnico recenseador (tabela 2).

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Tabela 2 - Indicadores assertivos da instalação de apiários. Estado do Rio de Janeiro (BR). 2013.

Variável Região A Região B

O tipo da caixa de criação é padrão Langstroth

99 % 99%

Não há vizinhos apicultores num raio menor do que 5 km

30% 49%

Os cavaletes que suportam as colmeias são individuais

82% 92%

Uso de cobertura sobre as colmeias 97% 97%

Não há cultivo agrícola em um raio menor do que 5 km*

35% 33%

Compra da caixa de criação 73% 69%

Estado de conservação satisfatório das caixas e materiais**

61% 92%

Estado de conservação satisfatório das instalações **

39% 62%

Higiene satisfatória dos apiários e do apicultor**

60% 77%

* supõe-se que há aplicação de agrotóxicos prejudiciais às colmeias **Opinião do técnico recenseador.

O estrato povoamento de apiários destoa dos re-sultados apresentados no estrato anterior (instalação de apiários). Há alta dispersão dos valores, devido a presença de escores extremos, desde 0,71 a 0,33, das classes regular e fraca. Apesar da dispersão, o esco-re médio das regiões A e B são próximos (p-valor > 5%). (figuras 2C e 3C).

Neste estrato, a atividade apícola é designada pra-ticamente como extrativista (tabela 3). O comércio de enxames, que seria o mais recomendável, pode oferecer ao criador maior segurança e impulsionar o seu negócio, caso o produto seja de qualidade atestado pelo fornecedor. A coleta de enxames na natureza, que é a mais adotada, incorre em vários riscos por não ser possível saber sobre a origem do enxame. Enxames capturados podem ser produtos de fugas por doenças, por enxameação, fatores estes que se estabelecidos no plantel, predispõem à baixa produtividade. A base de dados deste estudo revela que a compra de enxames está estritamente relacio-nada com a ausência de doenças na criação (p-valor < 5%).

Tabela 3 - Lotação dos apiários e origem dos enxames de abe-lhas melíferas adotadas de forma assertiva. Estado do Rio de Janeiro (BR). 2013.

Variável Região A Região B

Lotação menor ou igual a 20 colmeias por apiário

91 % 91%

Evita a coleta de enxames na natureza 37% 31%

Evita a coleta de enxames por caixa isca 42% 40%

Não faz divisão artificial de colmeias* 77% 80%

A compra enxames ocorre dentro do Estado 8% 2%

* medida correta para apiários com baixa lotação.

No estrato manejo de apiários, que representa os es-cores mais baixos dos três estratos avaliados, o IDApi médio das regiões A e B são 0,31 e 0,29, sendo simila-res (p-valor < 5%). A categoria de apicultores de escore fraco é máxima (100%) e não há apicultores com escore regular, nem satisfatório; destaca-se que um apicultor melhor ranqueado (da região A) obteve escore de 0,49 e, o pior (da região B), com escore de 0,11 (figuras 2D e 3D). Das nove variáveis avaliadas neste estrato (tabela 4), sete pertencem a níveis de concordância abaixo de 50% pelos produtores, um evidente indicador de defici-ência no uso da técnica básica apícola.

Tabela 4 - Aspectos assertivos no manejo de colmeias. ERJ. 2013.

Variável Região A Região B

Periodicidade quinzenal na revisão de apiários 32 % 24%

Revisão dos apiários é matinal 31% 36%

Temperamento dos exames é tolerável 91% 94%

Uso da tela excluidora de ninho é feita na época de produção

13% 4%

Não usa agrotóxicos ou pesticidas próximos ao apiário

96% 97%

Produtos apícolas são inspecionados 12% 27%

Troca de peças da colmeia com revestimento de própolis

28% 3%

Produção anual de mel por colmeia está acima de 10 kg

46% 58%

Prevalência de perdas de colmeias está abaixo de 20%

44% 49%

Figura 3 - IDApi médio dos municípios do estado do Rio de Janeiro (BR). A) IDApi Geral; B) IDApi Instalação; C) IDApi Povoamento; D) IDApi Manejo.

Em outra análise deste arranjo experimental, aplica-se o modelo de regressão linear ajustado com variáveis dummies, tendo como variável resposta o IDApi geral e, como variáveis explicativas, a produção anual de mel por colmeia, a prevalência de perdas de colmeias e a ausência de doenças, cujos resultados se apresentam na tabela 5.

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Tabela 5 - Principais resultados da análise de regressão linear com variáveis dummies.

Variáveis Parâmetros

Intervalo de confiança (95%)

[Inferior; Superior]

Intercepto 0,4607* [0,4314; 0,4901]

Produção anual de mel por colmeia

0,0449* [0,0179; 0.0701]

Prevalência de perdas de colmeias

-0,0121 [-0,0542; 0,0301]

Ausência de doenças na criação

0,0258** [-0,0024; 0,0540]

R²-ajustado 8,44%

Teste-F p-valor < 5%

Teste de normalidade de Jarque-Bera

p-valor > 5%

* Significativo ao nível de 5% ** Significativo ao nível de 10%

O teste-F revela que o conjunto de variáveis selecio-nadas para compor o modelo está apropriado para ex-plicar a variação do IDApi. No entanto, este modelo re-vela-se pouco acurado em predições, com R²-ajustado relativamente baixo. Os resíduos do modelo se distri-buem de forma Normal (p-valor > 5%) e destaca-se a significância da variável produção anual de mel por colmeia e da ausência de doença na criação.

Ao analisar a relação das variáveis significativas do modelo, percebe-se que estas seguem positivamente o IDApi geral (tabela 5). Ou seja, os apicultores com maior produção de mel são os com melhores escores no IDApi geral, na relação de 1 kg de mel para elevar em 0,04 o escore do IDApi geral; de forma análoga, ocorre com os apicultores com ausência de doenças em suas criações. Flagra-se assim, que os apicultores com maior produção e ausência de doenças foram classifi-cados de forma satisfatória pelo IDApi geral.

Assim, se a diagnose das regiões envolvidas eviden-cia raras distinções no conteúdo tecnológico, este fato sinaliza outro agente causal para explicar a diferença no nível de perdas. A diferenciação da técnica apícola, mesmo que tênue, a favor da região B pode ser a respon-sável por isentá-la de doenças, já que nesta região hou-ve maior frequência na capacitação de seus apicultores, maior adesão ao associativismo e à assistência técnica.

Na busca por informações sobre a ocorrência de do-ença nestas regiões consultaram-se Marassi (2010) e Deveza (2010), que verificaram alta infecção nas col-meias por fungos entomopatogênicos em dois municí-pios da Região A. Este pode ser um viés para explicar as altas perdas, direcionado para os fatores endógenos do meio ambiente, que podem favorecer a contami-nação súbita e letal nas colmeias, hipótese que requer mais estudos direcionados para a sanidade apícola e no âmbito ecológico. Em um momento em que a apicultu-ra mundial debate altas perdas de colmeias, este estu-do de caso sugere que situações de impacto ambiental possam ser um importante fator impactante para a cria-ção das abelhas.

Conclusões

A diagnose apícola por meio de um indicador como o IDApi, que pressupõe a análise de banco de dados originários de levantamentos apícolas, auxilia na ob-servância da dinâmica tecnológica de forma local e temporal, para lograr projeções e cenários para a api-cultura. Neste estudo de caso, este índice se mostra apurado para caracterizar e avaliar os fatores de defici-ência da produção apícola entre regiões.

A alta mitigação de colmeias reforça o incremento de pesquisas para detecção de pragas e patógenos, além de investimentos em estratégias de gestão sanitária do setor apícola brasileiro, por meio de políticas públicas já estabelecidas no âmbito animal, conforme BRASIL (2009). Igualmente, devem ser promulgadas ações que ofereçam aos produtores orientações e incentivos à in-dústria para que desenvolvam suas próprias políticas e procedimentos a favor de sua produtividade. Paralela à essas ações, deve-se dispor de diagnósticos corren-tes, que mostrem a condição de partida e seus avanços, neste sentido o IDApi é uma ferramenta eficaz para os gestores do negócio apícola e pesquisadores. Não menos importante é a adoção de métodos e práticas que ajudem a sanar as deficiências tecnológicas apre-sentadas pelos produtores, que premiem em melhorias e condições de bem estar para as colmeias, que cer-tamente ocasionam melhores indicadores de produção na criação.

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