Revista Síntese Direito Imobiliário #03

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Carta do Editor

A regularização fundiária é um processo de intervenção pública, sob os aspectos jurídico, físico e social, que objetiva legalizar a permanência de populações moradoras de áreas urbanas ocupadas em desconformidade com a lei para fins de habitação, implicando melhorias no ambiente urbano do assentamento, no resgate da cidadania e da qualidade de vida da população beneficiária.

O objetivo prioritário é legalizar a permanência de moradores de áreas urbanas ocupadas irregularmente para fins de moradia, além de promover melhorias no ambiente urbano e na qualidade de vida do assentamento. A participação da comunidade é muito importante, e, havendo a impossibili-dade da permanência no local, deve buscar-se o reassentamento próximo ao local original.

A regularização fundiária visa a estabelecer, com precisão, de quem é a posse da terra, para, depois, legitimá-la ou regularizá-la, garantindo segurança social e jurídica para pequenos agricultores e moradores de áreas urbanas, e a auxiliar os Municípios no dimensionamento da arrecadação de impostos e elaboração de planos diretores. Diante dessa celeuma, escolhemos como Assunto Especial desta edição o terma “Regularização Fundiária”, com dois importantes artigos: da Mestre Daniela Corrêa da Silva e da Mestre Cintia Maria Scheid.

Ainda no Assunto Especial trazemos, na Seção Com a Palavra, o Pro-curador, artigo das Procuradoras Simone Somensi e Vanêsca Buzelato Prestes sobre os instrumentos e os procedimentos atinentes à regularização fundiária, passíveis de serem utilizados no Brasil.

Na Parte Geral destacamos os artigos dos ilustres Juristas Luiz Antonio Scavone Júnior, Dráuzio Cortes Linhares, Walléria Barros Marques Linhares, Bruna Fernandes Coelho, Altino Ovando Júnior, Paulo Fernando Duarte Ramos e Antonio Plastina

Ainda nesta Edição você encontrará, na Seção Parecer Jurídico, artigo do Professor Eulâmpio Rodrigues Filho sobre a nova retificação de registro imobi-liário; e, na Seção Estudos Jurídicos, a 1ª parte do artigo sobre responsabilidade civil em condomínios edilícios do Mestre Tarlei Lemos Pereira.

Temos, ainda, acórdãos na íntegra e um ementário, criteriosamente se-lecionados, com comentários jurídicos que abordam o que há de mais rele-vante nos entendimentos jurisprudenciais.

Desejamos uma excelente leitura!

Liliana Vieira PolidoDiretora Editorial

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Sumário

Assunto Especial

REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA

DOUTRINAS

1. Regularização Fundiária: Benefícios e ObstáculosDaniela Corrêa da Silva ..............................................................................7

2. Regularização Fundiária Urbana: Algumas Considerações Acerca de Sua Evolução na Legislação BrasileiraCintia Maria Scheid ..................................................................................21

COM A PALAVRA, O PROCURADOR

1. Regularização Fundiária como Política Pública Permanente: Teoria e PráticaSimone Somensi e Vanêsca Buzelato Prestes ............................................38

JURISPRUDÊNCIA

1. Acórdão na Íntegra (STJ) ...........................................................................552. Ementário .................................................................................................65

Parte GeralDOUTRINAS

1. Equiparação da Transferência do Controle Acionário do Locatário à Cessão do Contrato de LocaçãoLuiz Antonio Scavone Junior ....................................................................71

2. A Interpretação do Artigo 108 do Código Civil em Face do Artigo 7º, Inciso IV, da Constituição Federal de 1988Dráuzio Cortez Linhares e Walléria Barros Marques Linhares ..................74

3. Enfiteuse e Laudêmio: Apontamentos HistóricosBruna Fernandes Coêlho ..........................................................................81

4. Política Habitacional: Erro GenéticoAltivo Ovando Júnior ...............................................................................86

5. Considerações sobre a Renúncia de Herança e a Doação entre Cônjuges, com Anuência dos Descendentes do DoadorPaulo Fernando Duarte Ramos .................................................................97

6. As Cautelas Necessárias para a Demonstração da Boa-Fé do Comprador de ImóvelAntonio Plastina .....................................................................................115

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JURISPRUDÊNCIA

ACÓRDÃOS NA ÍNTEGRA

1. Superior Tribunal de Justiça ...................................................................121

2. Superior Tribunal de Justiça ...................................................................130

3. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios ..........................138

4. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais .......................................143

5. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná .................................................147

6. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ............................................155

EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

1. Ementário de Jurisprudência ....................................................................159

Seção EspecialPARECER JURÍDICO

1. A Nova Retificação de Registro ImobiliárioEulâmpio Rodrigues Filho ......................................................................183

ESTUDOS JURÍDICOS

1. Responsabilidade Civil em Condomínios Edilícios – Parte 1Tarlei Lemos Pereira ...............................................................................189

Clipping Jurídico ..............................................................................................221

Resenha Legislativa ..........................................................................................224

Bibliografia Complementar .................................................................................225

Índice Alfabético e Remissivo .............................................................................227

Normas Editoriais para Envio de Artigos ................................................................231

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Assunto Especial – Doutrina

Regularização Fundiária

Regularização Fundiária: Benefícios e Obstáculos

DANIELA CORRÊA DA SILVAMestre em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade do Vale do Paraíba, Advogada e Consultora em Planejamento Urbano, Professora Universitária.

RESUMO: A ilegalidade urbana deixou de ser uma exceção nas cidades para se tornar uma regra na política de desenvolvimento urbano. As causas dessa inversão são históricas e estruturais, passando pela política fundiária adotada no País, pela legislação elitista e excludente, pela política habitacional ineficaz, pela au-sência de planejamento, etc. Como consequência, assiste-se a produção ilegal de assentamentos como alternativa habitacional à maioria da população. Assentamentos estes carentes de equipamentos públicos básicos como água, luz, esgoto, escolas, etc. O tratamento dado pelo Poder Público a tais assentamentos tem variado ao longo do tempo. Recentemente, a regularização fundiária tem sido utilizada como estratégia da política habitacional e urbana brasileira. O presente artigo traz uma reflexão sobre a regularização fundiá-ria, ressaltando os benefícios e os obstáculos encontrados nos processos de regularização.

PALAVRAS-CHAVE: Assentamentos irregulares; ilegalidade urbana; cidade ilegal; regularização fundiária.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Assentamentos informais; 2 Regularização fundiária; 3 Benefícios e obstá-culos da regularização fundiária; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃOGrande parte das cidades brasileiras possui algum tipo de assentamento

precário, o que induz a um pensamento de que a cidade ilegal se tornou o modelo de desenvolvimento urbano no Brasil. Hoje, pode-se dizer que a ilega-lidade não é uma exceção, mas, sim, a regra nas nossas cidades, uma vez que um grande número de pessoas só consegue ter acesso à moradia em regiões pe-riféricas ou em áreas centrais desprovidas de infraestrutura urbana adequada.

Segundo Alfonsin (2002), milhões de brasileiros só têm acesso ao solo urbano e à moradia por meio de processos e mecanismos ilegais. As conse-quências socioeconômicas, urbanísticas e ambientais desse fenômeno têm sido muitas e graves, pois, além de afetar diretamente os moradores de assentamen-tos informais, a irregularidade produz um grande impacto negativo sobre as cidades e sobre a população urbana como um todo.

Por outro lado, os deslizamentos de terras ocasionados pelas chuvas têm sido cada vez mais constantes. A ocupação em áreas de risco tem causado mui-tas mortes, além das perdas materiais. Assim, os sucessivos desastres causados

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Assunto Especial – Doutrina

Regularização Fundiária

Regularização Fundiária Urbana: Algumas Considerações Acerca de Sua Evolução na Legislação Brasileira

CINTIA MARIA SCHEIDMestre em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul/RS – Unisc, Especialista em Direito Notarial e Registral pela Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul, e em Direito do Estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Registradora Civil e Tabeliã de Notas concursada do 1º Ofício de Registro Civil e 5º Tabelionato de Notas da Cidade e da Comarca de Maringá, Paraná.

RESUMO: O presente trabalho objetiva abordar a regularização fundiária urbana no contexto da legis-lação brasileira, desde o seu surgimento, enquanto instrumento utilizado por alguns municípios para combater a irregularidade dos assentamentos urbanos, até a sua previsão normativa na legislação nacional, especialmente na Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009, alterada, recentemente, pela Me-dida Provisória nº 514, de 1º de dezembro de 2010. De fato, a carência de políticas públicas urbanas e habitacionais no Brasil levou à irregularidade fundiária urbana como a principal característica da urbanização brasileira, na qual os processos informais de ocupação do solo foram e seguem sendo o único meio de acesso à moradia para a população de baixa renda. Ocorre que essa ocupação informal e irregular do solo, para além do nefasto efeito sobre a cidade e sobre o meio ambiente, não garante uma moradia minimamente digna a essas pessoas, direito fundamental expressamente consignado na Constituição Federal de 1988, e alcança proporções alarmantes nos médios e grandes centros urbanos do País. Nesse contexto, a regulamentação da regularização fundiária dos assentamentos urbanos informais a fortalece como instrumento político e legal para o tratamento dessa problemática, com importantes reflexos no âmbito legislativo e, principalmente, no manejo dessas questões no âm-bito do Registro de Imóveis. Para tanto, o presente artigo, de maneira breve, aborda o surgimento dos assentamentos urbanos informais, analisa a regularização fundiária desde os assentamentos urbanos informais e, finalmente, apresenta um panorama da regularização fundiária na legislação brasileira.

PALAVRAS-CHAVE: Assentamentos urbanos informais; regularização fundiária urbana; legislação brasileira.

ABSTRACT: This work aims to address the urban land regularization in the context of the Brazilian legislation, since its emergence as a tool used by some municipalities to combat the irregularity of the settlements, until its normative prediction in national legislation, especially in Law nº 11.977, 7 July 2009 as amended recently by Provisional Measure nº 514, 1st December 2010. In fact, the lack of public urban and housing policies in Brazil led to irregularity urban land ownership as the main feature of urbanization, where the informal processes of land occupation were and are the only means of ac-cess to housing for the low-income population. It turns out that this informal occupation and uneven ground, beyond the harmful effect on the city and the environment, does not guarantee a minimally decent housing for these people, fundamental right expressly enshrined in the Federal Constitution of 1988, and reaches alarming proportions in medium and large urban centers of the country. In this

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Parte Geral – Doutrina

Equiparação da Transferência do Controle Acionário do Locatário à Cessão do Contrato de Locação

LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIORAdvogado, Administrador pela Universidade Mackenzie, Mestre e Doutor em Direito Civil pela PUC/SP, Professor e Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Direito Imobiliário pela EPD, Professor de Direito Civil e Mediação e Direito Arbitral nos Cursos de Graduação da Universida-de Presbiteriana Mackenzie e da FAAP. Autor de diversas obras, entre elas: Direito Imobiliário – Teoria e Prática e Comentários às Alterações da Lei do Inquilinato.

Sempre se entendeu, com fundamento no atual art. 13 da Lei nº 8.245/1991, que a cessão da locação depende de anuência do locador.

Aliás, a redação do referido dispositivo legal não deixa qualquer margem de interpretação:

Art. 13. A cessão da locação, a sublocação e o empréstimo do imóvel, total ou parcialmente, dependem do consentimento prévio e escrito do locador.

§ 1º Não se presume o consentimento pela simples demora do locador em mani-festar formalmente a sua oposição.

§ 2º Desde que notificado por escrito pelo locatário, de ocorrência de uma das hipóteses deste artigo, o locador terá o prazo de 30 (trinta) dias para manifestar formalmente a sua oposição.

A jurisprudência, inclusive, em respeito ao requisito legal, exige que a cessão do fundo de comércio seja precedida da anuência do locador, sob pena de ineficácia e conseguinte infração contratual:

Locação comercial. Cessão. Fundo de comércio. Anuência. Locador. A ausência de consentimento expresso do locador, pactuado no contrato, implica a clan-destinidade da sublocação da cessão do fundo de comércio celebrada entre lo-catárias-cedentes e cessionários, portanto não gera efeitos jurídicos em relação ao locador (LI, art. 13). (TJSP, Ap. sem Revisão nº 962280800, 35ª C., Rel. Des. Clóvis Castelo, J. 16.04.2007, registro em 18.04.2007)

Sabendo disto, expediente muito comum utilizado por locatários que buscam burlar a proibição de cessão do contrato de locação sem a anuência do locador é a cessão das quotas ou do controle da sociedade locatária.

Para evitar tais situações, a Lei nº 12.112/2009 continha previsão de acrés-cimo do § 3º ao art. 13 da Lei do Inquilinato para equiparar a cessão de cotas à cessão da locação, tornando, também nessa hipótese, necessária a anuência do locador sob pena de infração legal e despejo, o que faria nos seguintes termos: “§ 3º Nas locações não residenciais, equipara-se à cessão da locação qualquer

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Parte Geral – Doutrina

A Interpretação do Artigo 108 do Código Civil em Face do Artigo 7º, Inciso IV, da Constituição Federal de 1988

DRÁUZIO CORTEZ LINHARESAssessor do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Fortaleza/CE, de 2005-2009, Assessor do 2º Ofício de Notas e Registro da Comarca de Pacatuba/CE, de 2007-2008, Especializando em Direito Imobiliário pela Universidade de Fortaleza – Unifor, Sócio do Escritório Bayas e Linhares Advogados Associados S/S.

WALLÉRIA BARROS MARQUES LINHARESEspecialista em Direito Processual Civil pela Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará – Esmec, Mestra em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza – Unifor, Graduada pela Universidade de Fortaleza – Unifor, Associada do Bayas e Linhares Advogados Associados S/S.

Para alguns negócios serem considerados válidos no mundo jurídico, faz- -se necessário o cumprimento de algumas regras impostas pela legislação. Sen-do o negócio jurídico uma espécie de fato jurídico que deve ser analisado enfo-cando os planos da existência, da validade e da eficácia.

Sendo o negócio jurídico uma espécie de fato jurídico, também o seu exame pode ser feito nesses dois planos. Entretanto, e essa é a grande peculiaridade do negócio jurídico, sendo ele um caso especial de fato jurídico, já que seus efei-tos estão na dependência dos efeitos que foram manifestados como queridos, o direito, para realizar essa atribuição, exige que a declaração tenha uma série de requisitos, ou seja, exige que a declaração seja válida. Eis aí, pois, um plano para exame, peculiar ao negócio jurídico – o plano da validade, a se interpor entre o plano de existência e o plano da eficácia. (Azevedo, 2010, p. 24)

Existem vários tipos de negócios jurídicos previstos pelo ordenamento jurídico brasileiro, e, em cada um deles, podem existir regras específicas para a sua validação no mundo jurídico, inclusive a constitucionalidade da norma que valida determinado negócio jurídico.

O Código Civil pátrio, atualmente em vigor, trouxe em seu art. 108 a regra de que “não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, mo-dificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País”.

Da interpretação da regra, entende-se que para negócios jurídicos ava-liados acima de 30 salários-mínimos a Escritura Pública é obrigatória, enquanto que para negócios jurídicos com avaliação abaixo de 30 salários-mínimos o instrumento particular estaria autorizado.

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Parte Geral – Doutrina

Enfiteuse e Laudêmio: Apontamentos Históricos

BRUNA FERNANDES COÊLHOBacharela em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (2007), Escrivã da Polícia Civil do Estado de Pernambuco, Especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Univer-sidade Cândido Mendes (Rio de Janeiro), Pós-Graduanda em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho (Rio de Janeiro), Pós-Graduanda em Direito Penal e Processual Penal Militar pela Universidade Cândido Mendes (Rio de Janeiro), Graduanda em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural de Pernambuco.

A enfiteuse, instituto jurídico que versa sobre uso e gozo de bens imó-veis, apresenta controvérsia em sua origem, se grega ou romana. Serpa Lopes afirma que no século V a.C. “foram descobertos vestígios da existência já de normas legais, em tudo análogas às da enfiteuse, tal qual ela nos aparece em sua fisionomia atual, como seja, o caráter de perpetuidade e a obrigação de efe-tuar melhoramentos”1. Já Maria Helena Diniz afirma que a enfiteuse tem como nascedouro a era helênica, é “oriunda da Grécia, por volta do século V a.C., de onde se trasladou para o direito romano”2. A fusão entre o jus emphyteuticon grego e o ager vectigalis romano se deu na era justiniana, com a finalidade de prender o lavrador à terra que este cultivava, mas que não lhe pertencia, e o proprietário, por ser pessoa indefinida (colégio, cidade ou corporação e só mais tarde pessoas particulares), não explorava ou cultivava a terra3. De qual-quer modo, afirma Lopes, “foi o Direito romano a fonte de onde emanaram os princípios básicos sobre os quais o instituto é modernamente apresentado”4. Entretanto, “nos aforamentos helênicos não havia pactos sôbre [sic] o direito de opção e sôbre [sic] o laudêmio, nem se previa nêles [sic] o comisso por falta de pagamento das pensões”5.

Foi na era justiniana que o instituto adquiriu caráter perpétuo, só então sendo classificado como direito real, vez que os arrendatários não mais eram obrigados a deixar a terra, desde que pagassem a renda convencionada6. Já nessa época, a enfiteuse era considerada o “direito de cultivar o campo alheio,

1 LOPES, M. M. de Serpa. A enfiteuse: sua natureza jurídica e seu futuro. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1956. p. 8.

2 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 19. ed. rev. e atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10.01.2002) e o Projeto de Lei nº 6.960/2002. São Paulo: Saraiva, v. 4, 2004. p. 348.

3 Idem, ibidem.

4 LOPES, M. M. de Serpa. Op. cit.

5 FERREIRA, Vieira apud OLIVEIRA, J. E. Abreu de. Aforamento e cessão dos terrenos de marinha. Fortaleza: Imprensa Universitária do Ceará, 1966. p. 28.

6 LOPES, M. M. de Serpa. Op. cit.

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Parte Geral – Doutrina

Política Habitacional: Erro Genético

ALTIVO OVANDO JÚNIORAdvogado e Arquiteto, Mestrando em Função Social do Direito, Especialista em Direito Am-biental, Presidente do Instituto Olho Vivo – Defesa de Direitos, Professor de Direito, Membro da Comissão de Direito Urbanístico da OAB/SP.

RESUMO: O Brasil convive há muitos anos com o sério problema da carência de moradias, especial-mente para a população de baixa renda. Planos habitacionais não faltaram. Este breve artigo procura apontar alguns dos prováveis problemas neles existentes, uma vez que não foram exitosos. Foram apelidados de “erro genético”. Isso porque um dos fatores que parecem estar na essência dos “fra-cassos” dos planos é a tentativa de fazer com que a iniciativa privada custeie a finalidade social que os programas habitacionais têm de conter.

PALAVRAS-CHAVE: Política habitacional; direito à moradia; vivenda popular; favelas; submoradia; Minha Casa Minha Vida.

ABSTRACT: Brazil live many years with the serious problem of lack of housing, especially for the low income population. Housing plans not missing. This short article tries to point some of the likely problems therein, as it was not successful. Were called “genetic error”. This is because one of the factors that appear to be the essence of “failures” of the plans is the attempt to make the private cost to the organization that the housing programs must contain.

KEYWORDS: Housing policy; housing rights; popular villa; slums; submoradia; My Home My Life.

INTRODUÇÃO

De tempos em tempos, o Brasil se depara com “novos” planos habita-cionais que prometem ser a solução definitiva para a recorrente carência de moradias em todo o País. As manchetes dos jornais de todos os Estados estam-pam otimistas visões de que o novo plano veio para acabar com o problema. Especialistas são ouvidos, sindicatos das construtoras, dos arquitetos, dos enge-nheiros, órgãos de classe e líderes do movimento de moradia opinam acerca do pacote habitacional recém-lançado. Veem-se, nos dias seguintes, eufóricas manifestações dos lojistas de material de construção, dos gerentes de bancos de crédito imobiliário e de um extenso universo de interesses, em uníssono apoiando o plano. Os anúncios palacianos sempre apontam números superlati-vos a serem alcançados “dessa vez”, e ganham voz e repercussão os inflamados discursos dos políticos que estão próximos ao “novo herói” da moradia popular do Brasil.

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Parte Geral – Doutrina

Considerações sobre a Renúncia de Herança e a Doação entre Cônjuges, com Anuência dos Descendentes do Doador

PAULO FERNANDO DUARTE RAMOSAdvogado, Mestre em Direito pela Unisc, Especialista em Direito Notarial e Registral pela Unisinos, Bacharel em Direito pela PUCRS.

RESUMO: Os institutos jurídicos da renúncia de herança e da doação, de um cônjuge ao outro, com a anuência dos descendentes, apresentam tamanhas diferenças que não é admissível uni-los sob o mesmo instrumento contratual. Saber que essa construção “pseudojurídica” foi arquitetada em escritura pública (cujo registro fora inicialmente recusado e posteriormente determinado pela via judicial/administrativa, em sede de suscitação de dúvida) é motivo para analisar a natureza desses institutos de negócios jurídicos, suas normas, seus pontos de convergência e de divergência, como forma de encontrar justificativa legal para as decisões implementadas, ou para confirmar essa impos-sibilidade e, por conseguinte, a ineficácia dos negócios jurídicos correspondentes.

PALAVRAS-CHAVE: Renúncia de herança; doação inoficiosa; herança de pessoa viva; requisitos de eficácia do negócio jurídico.

RESUMEN: Los institutos jurídicos de la renuncia de la herencia y de la donación de cónyuge al otro con la concordancia de los descendientes, presentan enormes diferencias que no es admisible unir a ambos en lo mismo instrumento contratual. Saber que esa construción “pseudojuridica” fue elaborada en escriptura publica, la qual fuera recusada y despues determinado su registro por la via judicial/administrativa, en sede de provocación de duda, es razón para analizar la naturaleza de esos institutos jurídicos, sus normas, sus pontos de convergência y diferencia, como manera de encontrar justificación legal para las decisiones inculcadas, o para confirmar su imposibilidad y, por conseguien-te, la ineficácia de los negócios jurídicos correspondientes.

PALABRAS CLAVE: Renuncia de la herencia; donación inoficiosa; herencia de persona viva; requisitos de eficacia del negocio jurídico.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Da escritura pública em comento; 2 Da doação com reserva de usufruto entre cônjuges; 3 Da renúncia de herança e da herança de pessoa viva; Considerações finais; Refe-rências.

INTRODUÇÃO

À primeira vista, parece ser antagônico abordar no mesmo plano os insti-tutos jurídicos da renúncia da herança e da doação, haja vista existirem grandes diferenças entre eles e, especialmente, uma profunda separação entre seus ele-mentos fundamentais. Note-se que o primeiro decorre causa mortis e o segun-do por ato inter vivos. Por essa razão, é estranha a elaboração contratual que

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Parte Geral – Doutrina

As Cautelas Necessárias para a Demonstração da Boa-Fé do Comprador de Imóvel

ANTONIO PLASTINAProfessor de Direito Civil, Chefe do Departamento de Direito Privado da Universidade Federal Fluminense, Doutor em Direito.

RESUMO: O artigo analisa a responsabilidade civil aplicada ao notário, em relação à exigência das certidões de feitos ajuizados, na lavratura de escritura pública de compra e venda de imóvel. As referidas certidões revelam a boa-fé do comprador, além de evitar-lhe possíveis prejuízos, com as consequências do reconhecimento como o da fraude contra credores e fraude à execução. O ato de não se exigir a apresentação das certidões poderá ser interpretado como ausência de boa-fé, impe-dindo o comprador de se socorrer da evicção para reparação de seus danos.

PALAVRAS-CHAVE: Fraude à execução; boa-fé; certidão de feitos ajuizados; responsabilidade civil dos notários.

ABSTRACT: The article analyzes the civil liability applied to the notary in relation to the requirement of the certificate of filed deeds in the drafting of public legal document of purchase and sale of property. These certificates show the good faith of the purchaser, in addition to avoid possible harm to him, with the consequences of recognition as a fraud against the creditors and against the execution. The act of not requiring the presentation of the certificates may be interpreted as lack of good faith, thereby impeding the purchaser to protect himself of the eviction to repair his damages.

KEYWORDS: Fraud enforcement; good faith; certificate of filed deeds; civil liability of notaries.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Novos parâmetros para o reconhecimento da fraude à execução adotados pelo Superior Tribunal de Justiça; 2 Responsabilidade civil do notário na lavratura de escritura pública de compra e venda de imóvel; Conclusão.

INTRODUÇÃO

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça começou a definir quais devem ser os critérios para a caracterização de fraude à execução na venda de imóveis. Desnecessário tecer comentários a respeito da necessidade de segu-rança jurídica para o desenvolvimento das transações imobiliárias e financeiras em nosso país. Em uma nação carente de segurança jurídica, os investidores exigem uma “taxa de retorno” mais elevada para suas aplicações, proporcional aos riscos assumidos.

No que se refere à segurança jurídica, é necessário proteger tanto o com-prador de boa-fé, quanto o credor, e a eficácia das decisões judiciais. A juris-

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