TUTELA ANTECIPADA E A EFETIVIDADE DO PROCESSO · antecipação de tutela como garantia da...

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” TUTELA ANTECIPADA E A EFETIVIDADE DO PROCESSO AUTOR ROSÂNGELA CÓRI ORIENTADOR Prof.ª DAYSE SERRA RIO DE JANEIRO 2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

TUTELA ANTECIPADA E A EFETIVIDADE DO PROCESSO

AUTOR

ROSÂNGELA CÓRI

ORIENTADOR

Prof.ª DAYSE SERRA

RIO DE JANEIRO

2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

TUTELA ANTECIPADA E A EFETIVIDADE DO PROCESSO

Monografia apresentada à Universidade Cândido Mendes - Instituto a Vez do Mestre, como requisito parcial para a conclusão do curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito Processual Civil.

Por: Rosângela Córi

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho, especialmente, a uma

grande preocupação social: o valor da pessoa

humana como fundamento do direito, na busca

de realização de seus valores a serem

amparados através da tutela jurisdicional e o

efetivo acesso à Justiça. É o valor da pessoa

humana em função do qual todo direito gravita

e constitui sua própria razão de ser. Tenho a

esperança de poder alertar os conflitos de

interesses que transcendem as necessidades

individuais e são focalizados em imposições da

sociedade como pretensão de valores

superiores à vontade individual sobre os quais

as pessoas não têm disponibilidade, mas que

carecem de medidas necessárias à

manutenção e reparação de verem os seus

direitos efetivamente reconhecidos.

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AGRADECIMENTOS

Inicialmente, agradeço a Deus, força maior que

rege, ilumina e norteia minhas idéias, me

conduzindo ao ponto almejado. Minha irmã

Valéria, pedagoga, que contribuiu com a sua

didática de ensino, me orientando, em certos

momentos, na elaboração da presente

monografia. Ao meu pai, in memória, que, com

certeza, ilustrou a minha mente para a clareza

deste trabalho através da sua energia

espiritual. No mais, meus agradecimentos

àquelas pessoas que participam da minha

trajetória, e sabem o quanto contribuíram para

esta tarefa acadêmica.

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RESUMO

Este trabalho tem por objeto de estudo o instituto da tutela antecipada no contexto da efetividade do processo civil. Objetiva-se com o presente estudo proporcionar uma visão geral dos principais aspectos dessa medida de urgência, conceituando-a e identificando seus elementos peculiares, questionando acerca dos seus efeitos como garantia da efetividade do processo em sua função de instrumento a serviço da ordem constitucional e legal. Para discorrer com maior clareza sobre o assunto, primeiramente, se discute conceitos de efetividade e eficácia, em busca do adequado entendimento sobre o que vem a ser a “efetividade do processo”. Após são expostas e analisadas os principais fundamentos doutrinários acerca da tutela antecipada, enfocando, inclusive, a possibilidade da concessão deste instituto nos processos perante os Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais, tendo em vista os princípios informadores do processo desses órgãos especiais, e o objetivo de atuar nos conflitos de interesses com maior rapidez, imprimindo efetiva solução.

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METODOLOGIA

A metodologia utilizada no presente trabalho vincula-se a pesquisas em

diversas modalidades, nas espécies: orientações jurisprudenciais, doutrinárias, guias

jurídicos, destaques e enfoques de questões de direito sob quaisquer tipos de

publicações do gênero - revistas jurídicas, matérias, artigos e notas publicadas.

A pesquisa de base deu ênfase às bibliotecas mais seletivas pelo seu

conteúdo versado com conhecimento no mais avançado instituto do Direito

Processual dos nossos tempos, pela qualificação de seus autores e doutrinadores,

numa visão excepcionalmente clara do processo como instrumento de

transformação social.

Sol tal enfoque, o presente estudo buscou acrescentar um conhecimento

acerca do tema tratado, sem ostentar, sob qualquer hipótese, uma possível

deformação dos conceitos, já preconizados sobre a questão em pauta.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................ 08

CAPÍTULO I

A EFETIVIDADE DO PROCESSO E SEUS ASPECTOS GERAIS................ 10

2.1 A EFETIVIDADE DO PROCESSO............................................................ 10

2.2 A EFETIVIDADE DO PROCESSO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS

ESPECIAIS......................................................................................................

14

CAPÍTULO II

A EFETIVIDADE DO PROCESSO NA TUTELA ANTECIPADA.................... 18

2.1 HISTÓRICO, CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA E

CARACTERÍSTICAS......................................................................................

18

2.2 PRESSUPOSTOS..................................................................................... 22

2.3 PROCEDIMENTO...................................................................................... 27

2.4 CONCESSÃO, REVOGAÇÃO E MODIFICAÇÃO.................................... 28

CAPÍTULO III

A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NOS JUIZADOS ESPECIAIS..................... 31

3.1 A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NOS JUIZADOS ESPECIAIS

ESTADUAIS....................................................................................................

31

3.2 A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

FEDERAIS....................................................................................................

33

3.3 CONCESSÃO EX-OFFICIO DA TUTELA ANTECIPADA NOS

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS......................................................................

34

CONCLUSÃO........................................................................................................ 40

BIBLIOGRAFIA...................................................................................................... 42

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INTRODUÇÃO

Sabemos que o tempo se constitui em um dos óbices à efetividade da

tutela jurisdicional, em razão da prática de atos de natureza ordinatória e instrutória,

que fazem parte do desenvolvimento da atividade cognitiva do julgador.

Por outro lado, vale destacar que a visão instrumental que está no espírito

no processualista moderno transparece também, de modo bastante visível, nas

preocupações do legislador brasileiro da atualidade em relação às medidas

destinadas à efetividade do processo, de modo a aprimorar o serviço jurisdicional

prestado, dando efetividade aos seus princípios formativos (lógico, jurídico, político e

econômico), numa dinâmica do sistema almejando o aprimoramento do sistema

processual.

A antecipação da tutela se constitui na mais importante das modificações

introduzidas pela reforma do nosso Código de Processo Civil. De todas as

alterações processuais procedidas, foi a que maior e melhor impacto produziu no

meio jurídico em favor da sociedade, visto que veio ao encontro de uma

preocupação dos juristas contemporâneos voltada para a efetividade da prestação

jurisdicional, tomando-se por básico o acesso a uma ordem jurídica justa e a

celeridade na solução do litígio, isto porque emergiu em um contexto de morosidade

da Justiça e, conseqüentemente, de descrença nela.

O instituto, ainda considerado recente no Direito Brasileiro, com

fundamento no art. 273 do Código de Processo Civil, como garantia de uma

promoção efetiva dos direitos humanos na construção de um processo simples,

célere e efetivo, nos remete, a princípio, à garantia de uma promoção efetiva dos

direitos humanos na construção de um processo simples, célere e efetivo.

Entretanto, a efetividade desses direitos não é absoluta, diante da irreversibilidade

de seus efeitos, conforme prevê o § 2º do art. 273, na forma assim disposta: “não se

concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do

provimento antecipado”. Nesse sentido, questiona-se acerca dos efeitos da

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antecipação de tutela como garantia da efetividade do processo em sua função de

instrumento a serviço da ordem constitucional e legal.

A partir daí, extraímos que esta garantia não ocorre na sua totalidade em

razão da irreversibilidade da antecipação, tendo em vista o bem a ser protegido, sob

pena de perecimento de direitos. Considerando que a norma não pode ser

interpretada de maneira absoluta, colocando-se a questão na prática, poderá ocorrer

situações em que, mesmo em face da possível irreversibilidade dos efeitos da tutela

antecipada o juiz valendo-se do princípio da razoabilidade e até mesmo da

proporcionalidade deverá conceder a antecipação, tendo em vista o bem jurídico a

ser protegido, sob pena de perecimento de direitos.

Diante dessas considerações, esta monografia aborda os aspectos da

tutela antecipada levando-se em consideração não só a necessidade de conferir

efetividade ao processo, como também o questionamento em relação à sua função

de instrumento a serviço da ordem constitucional e legal, na medida em que

carecemos de uma cultura que favoreça a solução antecipada de procedimento

sumário no processo de conhecimento jurídico, para evitar dano aos direitos

fundamentais de todos os cidadãos.

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CAPÍTULO I

A EFETIVIDADE DO PROCESSO E SEUS ASPECTOS GERAIS

2.1 A EFETIVIDADE DO PROCESSO

No art. 5º, XXXV da Constituição Federal está presente o princípio da

inafastabilidade de jurisdição ou de amplo acesso ao poder judiciário, ou, ainda, da

proteção judiciária, que atinge a todos indistintamente, não podendo o legislador e

ninguém mais impedir que o jurisdicionado vá a juízo deduzir sua pretensão. Assim,

pelo princípio constitucional do direito de ação, o Estado não fugirá da

responsabilidade de tutelar o direito de seus jurisdicionados, independentemente do

que for pleiteado, dando a este a tutela jurisdicional adequada.1

Isto configura que o Estado não está simplesmente no dever-poder de

dizer o direito tutelado, mas sim no dever-poder de dizer este direito de forma célere

e eficaz, sob pena deste tornar-se inócuo, pois não tem sentido que o Estado, tendo

proibido a autotutela, não confira ao cidadão um meio adequado e tempestivo para a

solução de seus conflitos. Se o tempo do processo, por si só, determina um prejuízo

à parte que tem razão, é certo que quanto mais demorado for o processo civil mais

ele prejudicará alguns e beneficiará a outros, geralmente aqueles que não têm

interesse no cumprimento das normas legais.

Dessa forma, compete ao Estado dar uma resposta justa e decisiva ao

direito tutelado de forma tal que se o fato exigir uma tutela de urgência, uma

resposta rápida de forma a não desmantelar o direito pleiteado, cabe à Justiça dar

este remédio.2

1 NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 98-100. 2 SILVA, Cleuton Barrachi. A celeridade e a efetividade processual. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/artigos/2003/cleutonbarrachisilva/celeridadeprocessual.htm. Acesso em: 10 abr. 2010.

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Significa dizer que o processo deve dispor de instrumentos de tutela

adequada a todos os direitos que devem estar aptos a serem utilizáveis por quem

quer que se apresente como suposto titular desses direitos e a pacificação da lide

deve ser tal que permita ao vencedor o pleno gozo da utilidade específica

assegurada pelo ordenamento jurídico, sendo esse resultado atingido com um

dispêndio mínimo de tempo e de energia processual.

Isto porque, conforme aponta Humberto Theodoro:

(...) se o processo foi concebido para solucionar conflitos e fazer

atuar, em favor de quem tem razão, a vontade concreta da lei, será

tanto mais eficaz quanto mais rapidamente conseguir fazer com que

prevaleça, de maneira mais completa, o direito subjetivo da parte que

dele se vê injustamente privado ou que sofre ameaça de agressão

em sua esfera jurídica.3

Ressalta, ainda, o autor que:

Além do escopo geral de assegurar à parte o bem jurídico a que tem

direito, a idéia de efetividade envolve a de celeridade na restauração

do status violado. Justiça efetiva, nessa concepção, é a que se acha

aparelhada para propiciar ao titular do direito um provimento que seja

contemporâneo à lesão ou ameaça de lesão.4

Verifica-se, assim, que o processo será efetivo quando produzir seus

resultados, seus escopos, tal qual a máxima de Chiovenda, segundo a qual “o

processo deve dar na medida do que for praticamente possível a quem tem um

direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ele tem o direito de obter”,5 e, dessa

forma, a celeridade está intimamente ligada à efetividade processual.

3 THEODORO JÚNIOR, Humberto. O processo civil brasileiro no limiar do novo século. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 07. 4 Ibid., p. 07. 5 MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Tutela antecipada. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1998. p. 34.

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Conforme aponta Moniz de Aragão, o vocábulo efetividade, cuja raiz

provém do latim efficere, que corresponde a produzir, realizar, e significa “qualidade

do que está efetivo; estado ativo de fato. Relacionado ao processo, o vocábulo

traduz a preocupação com a eficácia da lei processual, com sua aptidão para gerar

os efeitos que dela é normal esperar”.6

Assim sendo, tem-se que a efetividade processual significa, antes de

tudo, o perfeito alcance da finalidade do processo visto como instrumento ativo da

distribuição da justiça e, mais do que isso, como forma de pacificação e modificação

social, garantindo soluções ao mesmo tempo jurídicas e legítimas. Como coloca Luís

Roberto Barroso:

A efetividade significa, portanto, a realização do Direito, o

desempenho concreto de sua função social. Ela representa a

materialização no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza

a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser

normativo e o ser da realidade social.7

Portanto, a efetividade pode ser entendida como o direito a um processo

rápido, seguro e eficaz, proporcionando às partes envolvidas no processo a tutela

jurisdicional adequada. Para tanto, Barbosa Moreira explicita cinco metas que

converteriam o processo civil num processo efetivo:

(...) primeiro, o processo deve dispor de instrumento de tutela

adequada a todos os direitos; segundo, tais instrumentos devem se

revelar praticamente utilizáveis por quem quer que se apresente

como suposto titular desses direitos, mesmo quando seja

indeterminado ou indeterminável o círculo de sujeitos; terceiro, é

necessário que se assegurem condições propícias à exata e

completa reconstituição dos fatos relevantes a fim de que o

convencimento do juiz responda, tanto quanto possível, à realidade;

6 MONIZ ARAGÃO apud AZEVEDO, Marcos. As reformas necessárias à celeridade processual e a efetividade da execução civil. Disponível em: http://www.pge.sp.gov.br/teses/marcos.htm. Acesso em: 15 abr. 2010. 7 BARROSO, Luis Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade de suas normas. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 84.

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quarto, o resultado do processo deve ser tal que permita ao vencedor

o pleno gozo da utilidade específica assegurada pelo ordenamento;

quinto, tais resultados devem ser atingidos com um mínimo dispêndio

de tempo e de energia processual.8

Sob o ponto de vista doutrinário a efetividade processual pode ser vista

sob dois aspectos: o técnico, que é garantia dada às partes do pleno exercício de

seus direitos, ou seja, um processo justo, adequado, com estrita observância das

garantias constitucionais; e o material, que o é aspecto da justiça, o conceito da

tutela jurisdicional plena, o reconhecimento do direito para quem propriamente o

tem.

Atualmente, verifica-se a existência de importantes instrumentos na busca

de maior efetividade no processo civil, tendo como idéias matrizes o acesso a uma

ordem jurídica justa com a conseqüente celeridade na solução do litígio, uma vez

que somente através de procedimentos ágeis e eficazes é que se realiza a

verdadeira finalidade do processo, exemplo disso é o instituto da antecipação da

tutela (art. 273, CPC), que consagra a necessidade da antecipação da realização

dos direitos nos casos de receio de dano e de abuso do direito de defesa.

Com essa finalidade, também foram introduzidas no ordenamento jurídico

as Leis nº 9.099/95 e 10.259/01, que instituíram os Juizados Especiais Estaduais e

Federais. Tais Juízos foram criados para “aproximar e distribuir a justiça às camadas

menos favorecidas, que por receio, ignorância, descrédito, ou simplesmente falta de

orientação, estavam à mercê da atividade jurisdicional do Estado em seus moldes

tradicionais”.9 Para se atingir essa democratização no “livre acesso ao Judiciário”, os

referidos diplomas legais instituíram os princípios informativos da oralidade, da

simplicidade, da economia processual e da celeridade.

8 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual. Terceira série. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 27-28. 9 SALOMÃO, Rafael Silveira. Juizados Especiais. Boletim Jurídico, ano V, nº 261, abr. 2005. Disponível em: http://www.boletimjurídico.com.br. Acesso em: 14 abr. 2010.

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2.2 A EFETIVIDADE DO PROCESSO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Dentro do panorama de crise na prestação da jurisdição pelo Estado -

necessidade de tutela efetiva (célere e eficaz) - surgiram os Juizados Especiais

Cíveis, com o objetivo de atuar nos conflitos de interesses com maior rapidez,

imprimindo efetiva solução.

Com regulamentação assentada na Lei nº 9.099/95, os Juizados

Especiais Cíveis prevêem, a partir da constatação dos problemas sócio-judiciais

decorrentes da demora na prestação jurisdicional, como elemento deteriorador do

Direito Material que se discute (bem da vida) e como fonte de descrédito do

processo, novos procedimentos, dotados de técnica tendente a vencer os óbices

para uma prestação jurisdicional efetiva.

Trata-se de um mecanismo jurisdicional importante na incessante busca

de uma tutela jurisdicional mais funcional, adequada, célere e eficaz. Segundo Joel

Dias Figueira Júnior, os Juizados Especiais Cíveis

provavelmente, o último baluarte para a salvaguarda dos interesses

da grande massa populacional, que sem esse mecanismo, vê-se

acuada e impotente em face da crise do processo, como instrumento

de efetividade dos direitos e da pacificação social.10

Os Juizados Especiais têm supedâneo no resguarde do amplo acesso à

justiça, permitindo a igualdade constitucionalmente visada, no momento em que

permite que todos possam, em igualdade de condições, levar seus anseios ao

Judiciário, especialmente os mais “carentes”, expressão aqui entendida não apenas

a como a parcela menos favorecida economicamente da população, mas abarcando

aqueles que sintam-se desestimulados a recorrer ao Estado-Juiz para ver garantido

o seu direito, em face da dificuldade do acesso à justiça.11

10 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. São Paulo: RT, 2000. p.33. 11 Expressão talhada por MAURO CAPELLETI, CF. Acesso à Justiça. Porto Alegre: Fabris, 1988. p. 76-77.

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Esse acesso à justiça através dos Juizados Especiais (em causas que,

dificilmente, seriam levadas à Justiça Comum, pela demora na distribuição da

função jurisdicional) vem dar efetividade prática ao Direito, lhe aproximando da

sociedade que lhe incumbe proteger e regular.

No mesmo pensar, visualizando nos Juizados Especiais essa

aproximação com a comunidade, Ernâne Fidélis dos Santos, para quem “o direito

que não se realiza, nenhuma utilidade prática tem para a sociedade”.12

A pacificação social desses conflitos de menor complexidade, que, repita-

se à exaustão, vem a caracterizar-se em instrumento de igualdade entre os cidadãos

(corolário do estado democrático de direito), sem dúvida, é o alvo precípuo dos

Juizados Especiais Cíveis. Assim, constitui elemento fundamental de boa justiça.

Principalmente, por atingir, em primeiro plano, parcela considerável da população,

que, muitas vezes, não tem condições econômicas de pleitear em juízo, em face da

hipossuficiência.

Até mesmo porque se se impusesse aos interessados solucionar esses

conflitos menos complexos (pela natureza ou pelo valor da causa) nas vias judiciais

tradicionais, estar-se-ia impondo demasiado ônus, vez que o resultado da causa

estaria submetido a formalidades inaceitáveis, pela simplicidade da causa. Seria

desprover tais titulares de direitos de tutela jurisdicional eficaz, negando a eles, por

via oblíqua, o acesso à justiça e o direito de ação.

Ocorreria, um natural desestímulo ao processo pela oneração no direito

de ação e da demora na solução do conflito. No dizer de Luiz Fux, “impor a essas

pessoas o modo tradicional de solução dos conflitos é o mesmo que negar a elas o

direito de exigir do Estado que lhes preste jurisdição.”13

12 SANTOS, Ernâne Fidélis dos. Novíssimos Perfis do Processo Civil Brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 136. 13 FUX, Luiz et al. Juizados Especiais Cíveis e Criminais e Suspensão Condicional do Processo Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 09.

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Daí surgirem os Juizados Especiais Cíveis, buscando, através de regras

mais simples, prestar jurisdição em causas igualmente mais simples (pela natureza

ou valor da causa, que tem de corresponder ao interesse econômico perseguido na

causa), permitindo o acesso à justiça e a efetividade do direito. Até porque havia se

percebido “que as regras processuais comuns quase haviam se tornado um fim em

si mesmo, deixando muitas vezes de lado o direito material”.14

Nessa esteira, tem-se novo procedimento (que poderia ser nominado,

este sim, de sumaríssimo,15 porque mais célere e concentrado do que o próprio

procedimento sumário do Código de Processo Civil), mais simplificado, informal e

com concentração de atos processuais, visando prestar a jurisdição (efetivar o

direito material em jogo) com maior rapidez e agilidade.

Alguns doutrinadores chegam a vislumbrar que a lei não trata apenas de

um novo procedimento (sumaríssimo), mas “sobre um novo processo e um novo rito

diferenciado. Em outros termos, não é apenas um procedimento sumaríssimo, é

também, e muito mais, um processo especialíssimo”, é este o entendimento de Joel

Dias Figueira Júnior.16

A ratio de existência desse procedimento celerizado e simplificado tem

morada na busca da maior efetividade do processo (entendido este como

instrumento para a concretização do direito). De sorte que, poderia se mencionar

como modos mais efetivos a designação de data para a audiência no momento da

apresentação do pedido (art. 1º, Lei nº 9.099/95), a imediata conciliação com a

presença dos contendores (art. 17), a concentração de atos processuais em uma só

audiência, salvo se extremamente necessário (art. 28), a condução de testemunhas

sem adiamento de audiência (art. 34, § 2º), entre outras figuras simplificadas.

14 SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Lei dos Juizados Especiais Cíveis Anotada. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 4. 15 Nesse sentido, denominando-o de sumaríssimo: SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Op. Cit., p. 02; ALVIM, Eduardo Arruda. Curso de Direito Processual Civil. v. 1. São Paulo: RT, 2006. p. 646; NUNES, Elpídio Donizetti. Curso Didático de Direito Processual Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 162. 16 FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Op. Cit., p. 32.

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Atendendo expectativa de efetividade processual nas causas que

submete ao seu rito (ditas de menor complexidade), marcado pelos caracteres da

celeridade, informalidade e simplicidade, os Juizados Especiais Cíveis afirmam, com

excelência, que o direito ao processo não é simplesmente o direito a uma ordenação

de atos consecutivos visando uma tutela jurisdicional. Evidenciam que o direito ao

processo é, muito mais: é o direito a uma tutela efetiva e adequada, prestada num

lapso temporal mínimo, traduzindo a realidade dos fatos da vida, evitando que o bem

da vida controvertido não pereça pela demora em que o Estado diga o direito.

Por fim, conforme aponta Luis Guilherme Marinoni, os Juizados Especiais,

com o seu procedimento simples, ágil e barato, têm papel altamente significativo na

luta pelo efetivo acesso à ordem jurídica justa, tendo por fim atender ao justo anseio

de todo cidadão de ser ouvido em seus problemas jurídicos, revelando sua feição de

ampliar o acesso à justiça, dando efetividade ao direito controvertido.17

17 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas Linhas do Processo Civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 72.

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CAPÍTULO II

A EFETIVIDADE DO PROCESSO NA TUTELA ANTECIPADA

2.1 HISTÓRICO, CONCEITO, NATUREZA JURÍDICA E CARACTERÍSTICAS

A efetividade da prestação jurisdicional sempre foi uma preocupação da

doutrina processualista. Muito se discutiu sobre a necessidade de se evitar o perigo

de a demora do processo vir a fazer com que a providência dada ao final se

tornasse inútil para o fim que se almejava, qual seja, a atuação e defesa do direito

subjetivo material da parte.

Diante dessa necessidade, construiu-se a teoria das medidas cautelares.

Esta, todavia, apenas preservava o objeto do processo até o pronunciamento final,

invariavelmente demorado, o que não se mostrou suficiente, pois o instituto não

trazia em seu bojo a prestação jurisdicional satisfativa, conforme preleciona

Humberto Theodoro Júnior:

De início, lutava-se apenas pela preservação dos bens envolvidos no

processo lento e demorado, afastando-os de eventual situação

perigosa à sua conservação, para submetê-los, afinal, à sentença, de

forma útil para os litigantes. Com essa preocupação construiu-se

basicamente a teoria das medidas cautelares. Mas ficava fora do

campo demarcado para a tutela preventiva, um outro grave

problema, que era o da demora na prestação jurisdicional satisfativa,

o qual, em si mesmo, poderia configurar uma denegação de justiça,

ou uma verdadeira sonegação da tutela jurisdicional assegurada

entre as garantias fundamentais do moderno Estado Social de

Direito.18

18 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo Cautelar. 20. ed. São Paulo: Universitária de Direito, 2002. p. 394.

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A ausência da satisfatividade da tutela cautelar acarretava, em muitos

casos, o perecimento do direito levado à apreciação judicial, em razão da lentidão do

Poder Judiciário. Este fato levou muitos juristas a meditarem sobre a criação de um

instituto que conferisse à parte os mesmos efeitos da tutela jurisdicional final, porém

de forma antecipada.

Neste contexto surgiu, no âmbito do direito processual civil brasileiro, por

meio da edição da Lei nº 8.952 de 13 de dezembro de 1994, o instituto da tutela

antecipada, trazido do direito italiano, que consiste na antecipação dos efeitos do

pedido feito pelo autor na inicial, que seria concedido naturalmente através da

sentença final do processo.

O então novo art. 273 do Código de Processo Civil autorizou ao juiz

entregar ao litigante que requeresse o próprio bem jurídico sobre o qual recai o

litígio, de modo a antecipar os efeitos da prestação jurisdicional a ser emanada no

final do desenrolar processual da controvérsia. Esta a razão pela qual se denominou

“tutela antecipada”, que consiste, conforme já dito anteriormente, na concessão de

um provimento que, de regra, apenas seria dado após exaurida a apreciação de

toda a demanda e prolatada a sentença definitiva.

Posteriormente, com nova reforma no Diploma Processual Civil, qual seja,

a Lei nº 10.444 de 07 de maio de 2002, o § 3º foi substituído e acrescentados os

parágrafos 6º e 7º à redação original.

A inclusão do § 6º no art. 273, permite ao juiz, na hipótese de um ou mais

pedidos cumulados, ou mesmo parte de um deles mostrar-se incontroverso,

antecipar a tutela. O § 7º do art. 273, o legislador passa a admitir a fungibilidade das

tutelas de urgência, preceituando que se o autor requerer tutela antecipada e for

caso de medida cautelar, o juiz poderá concedê-la em caráter incidental desde que

presentes seus requisitos, de forma que a pretensão da parte seja atendida mais

rapidamente, evitando, assim, a instauração de um processo autônomo.

Conceitualmente, pode-se dizer que a tutela antecipada é o deferimento

do direito do autor antes da fase instrutória (geralmente). É a realização imediata da

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20

pretensão, de caráter precário, podendo ser modificada ou revogada de ofício a

qualquer momento, de execução apenas provisória, e cuja concessão depende do

preenchimento dos pressupostos e requisitos exigidos em Lei.

A situação que enseja a tutela antecipada é a que demonstra a

necessidade da imediata satisfação, total ou parcial, da pretensão aduzida, sob pena

de ulteriormente ela não mais poder ser efetivada, acaso acolhida no julgamento

final, ou, ainda, sob pena de o requerente sofrer dano maior do que aquele que já

lhe foi imposto, e que deu ensejo ao processo.19

Ou se antecipa a tutela, ou o processo perde a sua eficácia, por restar

inviabilizada a proteção do direito que posteriormente vier a ser reconhecido. Ainda,

ou se antecipa a tutela, ou se permite que a atividade jurisdicional seja causadora de

outros danos além daqueles já sofridos pelo autor, perdendo, então, a sua

adequação.

Nesse sentido, Luiz Guilherme Marinoni aponta ser a tutela antecipada

verdadeiro instrumento de efetividade:

A tutela antecipatória constitui instrumento da mais alta importância

para a efetividade do processo, não só porque abre oportunidade

para a realização urgente dos direitos em casos de fundado receio

de dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I), mas também

porque permite a antecipação da realização dos direitos nos casos

de abuso de direito de defesa (art. 273, II) e de parcela incontroversa

da demanda (art. 273, § 6º). Desta forma concretiza-se o princípio de

que a demora do processo não pode prejudicar o autor que tem

razão e, mais do que isso, restaura-se a idéia – que foi apagada pelo

cientificismo de uma teoria distante do direito material – de que o

tempo do processo não pode ser um ônus suportado unicamente

pelo autor.20

19 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). São Paulo: Malheiros, 2006. p. 307. 20 MARINONI, Luiz Guilherme. A antecipação da tutela. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 31.

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21

E prossegue o autor afirmando que:

A tutela antecipatória adotada por nosso sistema processual possui

uma importante função na efetividade do processo, que sendo

utilizada de forma correta, possibilitará que o processo atinja sua

função social, tutelando o bem da vida. A tutela antecipatória é um

instrumento imponderável como meio inibidor do abuso de defesa do

réu, contribuindo imensamente para a efetividade do processo, pois

sendo utilizada de forma correta, possibilita que o processo atinja sua

função social, tutelando o bem da vida, impedindo a morosidade

processual, evitando que o réu utilize-se de forma indiscriminada do

formalismo existente em nosso direito.21

A doutrina aponta as seguintes características para a antecipação dos

efeitos da tutela:

a) Urgência, que fica cristalina ante a necessidade de se evitar dano irreparável ou

de difícil reparação. O provimento é dado assim que requerido, se necessário for e

se preenchidos os requisitos legais.

b) Sumariedade formal e material, consistindo na obrigação do Estado de tutelar

com brevidade a prestação jurisdicional requerida. Formal refere-se ao

procedimento, que deve ser prestado de maneira rápida e material versa sobre a

cognição não exauriente.

c) Revogabilidade e a modificabilidade. A revogabilidade prevê o retorno ao status

quo ante. Já a modificabilidade consiste na possibilidade de o órgão jurisdicional

substituir a tutela já deferida por outra que julgar mais adequada. Leciona João

Batista Lopes que “a revogabilidade da medida está em perfeita harmonia com sua

provisoriedade e reversibilidade e pode ocorrer sempre que se modifique a situação

fática que justificou a providência ou novas provas forem apresentadas”.22

21 Ibid., p. 31. 22 LOPES, João Batista. Tutela antecipada no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 97.

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22

d) Satisfatividade fática, que é a concessão ao autor antecipadamente do

provimento que só seria dado ao final do processo. Conforme preceitua Teori Albino

Zavascki, a medida urgente proporcionará “a própria satisfação do direito afirmado e

tal medida, por certo, representará antecipação de um efeito típico da tutela

definitiva, própria da futura sentença de procedência”.23

e) Provisoriedade, que cinge-se ao fato de que a tutela antecipada não poderá durar

infinitamente. Tanto a decisão concessiva da medida, quanto a denegatória poderão

ser revogadas ou modificadas a qualquer tempo durante o iter processual, vide art.

273, § 4º, do Código de Processo Civil, sempre que a mudança do estado de fato ou

o aprofundamento do nível de cognição demonstrarem situação diversa da

anteriormente verificada.

No que tange a natureza jurídica do instituto em análise, esta é de

decisão interlocutória. Não é ação, haja vista que somente se concede tutela

antecipada na ação de conhecimento em curso. E é uma decisão interlocutória

porque a cognição para o seu deferimento é sumária e por isso ela não é medida

definitiva, mas provisória.

2.2 PRESSUPOSTOS

Da redação art. 273 do Código de Processo Civil pode-se concluir pela

existência dos seguintes requisitos autorizadores da concessão da tutela

antecipada:

a) Requerimento da parte - os efeitos tutela somente poderão ser antecipados acaso

este procedimento seja requerido pela parte. Não se admite a antecipação de tutela

ex officio. Não se trata de pedido exclusivo do autor, podendo também pode ser

postulada pelo réu, quando reconvinte.24 Ademais, vale ressaltar que a antecipação

de tutela pode também ser requerida pelo representante do Ministério Público,

quando atuando como demandante ou custus legis, ou do terceiro interveniente.

23 ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação de tutela. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 48. 24 LOPES, João Batista. Op. cit., p. 65.

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23

b) Existência de prova inequívoca - a parte, ao requerer a antecipação da tutela

jurisdicional, deverá carrear aos autos prova inequívoca de seu direito pois, caso

contrário, lhe faltará a ocorrência obrigatória de um requisito indispensável à

concessão parcial ou total dos efeitos de mérito da prestação jurisdicional final. Para

J. E. Carreira Alvim, a prova inequívoca seria aquela que apresentasse alto grau de

convencimento, afastando qualquer dúvida razoável.25

Tem-se que a prova inequívoca, aludida no art. 273 do Código de

Processo Civil, é aquela prova consistente e capaz de oferecer ao juiz base

suficiente de sua provisória admissão da existência do direito alegado pela parte,

podendo ser documental, testemunhal, pericial e outros meios probatórios. Poderá

ainda, o requerente, pugnar pela oitiva de testemunhas ou do próprio réu nos dias

subseqüentes ao pedido de tutela antecipada.

c) Verossimilhança da alegação – em seu conceito jurídico-processual, a expressão

verossimilhança, conforme leciona Athos Gusmão Carneiro, significa mais do que o

fumus boni iuris exigível para o deferimento de medida cautelar, mas não dispensa a

necessidade de uma evidência indiscutível. Para o autor, “o juízo de verossimilhança

repousa na forte convicção de que tanto as ‘quaestioni facti’ como as ‘quaestioni

iuris’ induzem a que o autor, requerente da antecipação de tutela, merecerá

prestação jurisdicional em seu favor”.26

Assim sendo, não basta, para a concessão da tutela, a simples fumaça do

direito, mais sim que o juiz se convença de que o direito alegado pela parte, de

acordo com sua interpretação, esteja patente e lhe pertença. Deve ocorrer mais do

que a plausibilidade do direito, exige-se a sua clara probabilidade.

d) Fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou abuso do direito de

defesa ou manifesto propósito protelatório do réu – “fundado receio” significa um

temor justificado, que possa ser demonstrado objetivamente e concretamente

25 CARREIRA ALVIM, J. E. A antecipação da tutela na reforma processual. Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 67. 26 CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 27-28.

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através de fatos e circunstâncias que demonstrem que a não concessão da tutela

dará margem à ocorrência do dano, e que este será irreparável ou difícil de ser

compensado.27

Dano irreparável é aquele que, uma vez produzidos seus efeitos, estes se

tornam irreversíveis, ou seja, é impossível o retorno ao status quo ante. Dano de

difícil reparação, além daqueles em que haja manifesta dúvida na determinação

exata de seu valor, dúvida na forma de quantificá-lo ou individualizá-lo, são também

aqueles que se acredita não poderem ser efetivamente reparados, em função de

precária condição econômica do réu.

O abuso do direito de defesa se caracteriza quando o réu apresenta

resistência totalmente infundada ou contra texto expresso de lei, ou, ainda, quando

emprega meios escusos para forjar sua defesa, como por exemplo, a prática de atos

processualmente inúteis, a apresentação de alegações impertinentes, o

questionamento de fato incontroverso, ou a alteração deliberada da verdade dos

fatos, ou a produção de provas inúteis ou desnecessárias ao exercício da jurisdição

reclamada no processo.

O manifesto intuito protelatório do réu proporciona ao andamento do

processo aquela demora entendida “não razoável” - uma vez que há demoras

razoáveis, ditadas pelo caráter formal inerente ao processo, e há demoras

acrescidas pelo comportamento desleal do demandado. Tais demoras são aquelas

provocadas pelo réu na tentativa de ver arrastado o processo para aproveitar-se da

tardança. Ocorre quando, por exemplo, o réu procura evitar a consumação de

intimações, ou retenha em seu poder os autos por tempo excessivamente

prolongado.

e) Reversibilidade do provimento antecipado – a concessão da tutela antecipatória

condiciona-se à inexistência do perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

O objetivo do legislador, nesse caso, foi o de preservar o direito do demandado à

ampla defesa e ao contraditório. Segundo Teori Albino Zavascki:

27 Ibid., p. 42.

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25

antecipar irreversivelmente seria antecipar a própria vitória definitiva

do autor, sem assegurar ao réu o exercício do seu direito

fundamental de se defender, exercício esse que, ante a

irreversibilidade da situação de fato, tornar-se-ia absolutamente inútil,

como inútil seria, nestes casos, o prosseguimento do próprio

processo.28

O objetivo do legislador, nesse caso, foi o de preservar o direito do

demandado à ampla defesa e ao contraditório. “A necessidade de valorização do

princípio da efetividade da tutela jurisdicional não deve ser pretexto para a pura e

simples anulação do princípio da segurança jurídica”, pois ao demandante não é

facultado transferir para a esfera da parte contrária um perigo que ameace direito

seu.29

Entretanto, a irreversibilidade do provimento antecipatório não deve ser

interpretado com absoluto rigor, posto haver situações em que o juiz se depara com

a alternativa de prover ou deixar perecer o direito da parte que, naquele momento,

mostra-se amparado apenas em um juízo de verossimilhança.

Nesses casos, conforme leciona Ovídio Baptista da Silva, se o grau de

plausibilidade do direito for suficientemente consistente para o magistrado – entre

permitir sua irremediável destruição ou tutelá-lo como simples aparência –, esta

última solução torna-se perfeitamente legítima:

O que, em tais casos especialíssimos, não se mostrará legítimo será

o Estado recusar-se a tutelar o direito verossímil, sujeitando seu

titular a percorrer as agruras do procedimento ordinário, para depois,

na sentença final, reconhecer a existência apenas teórica de um

direito definitivamente destruído pela sua completa inocuidade

prática.30

28 ZAVASCKI, Teori Albino. Op. cit., p. 100. 29 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela antecipada. Revista Júris Síntese, Rio de Janeiro, nº 232, Fev/97. p. 198. 30 SILVA, Ovídio Baptista. A “antecipação” da tutela na recente reforma processual. Aspectos Polêmicos da Antecipação da Tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 142.

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26

Nesse sentido é também o entendimento de Moniz de Aragão:

Admitir que o juiz não pode antecipar a tutela, quando a antecipação

é imprescindível para evitar um prejuízo irreversível ao direito do

autor, é o mesmo que afirmar que o legislador obrigou o juiz a correr

o risco de provocar um dano irreversível ao direito que justamente

lhe parece mais provável.31

A esse respeito, anota Guilherme Tanger Jardim:

Em outros termos, a pura e radical proibição de concessão da tutela

diante do perigo de irreversibilidade do provimento antecipado

poderá significar, para o autor, o perecimento de seu próprio direito,

ou seja, a perda do objeto da demanda. Mister se faz, portanto, que

se encontre o equilíbrio, a via do meio, através da aplicação do

princípio da proporcionalidade e dos sistemas de freios e

contrapesos, na busca da decisão justa, capaz de evitar o que

chamaríamos de “um mal menor”, tendo-se sempre presente a

imprescindível proibição de excessos em face da distribuição

adequada dos direitos (bens da vida) litigiosos.32

Dessa forma, nas situações em que haja conflitos entre dois bens

jurídicos, o juiz deverá nortear-se pelo princípio da proporcionalidade, concedendo a

tutela antecipatória de forma a evitar que o bem maior seja sacrificado pelo bem

menor, dentro de uma escala racional de valores.

Vale lembrar que a concessão da antecipação não se trata de mera

faculdade do juiz, mas de um direito subjetivo processual. Desta maneira, presentes

os pressupostos autorizadores trazidos pela lei, é dever do juiz deferir à parte a

tutela antecipada.

31 Moniz de Aragão apud MARINONI, Luiz Guilherme. Op. cit., p. 248. 32 JARDIM, Guilherme Tanger. Unificação dos requisitos à antecipação da tutela. In: AMARAL, Guilherme Rizzo; CARPENA, Márcio Louzada (coords). Visões críticas do Processo Civil brasileiro: uma homenagem ao Prof. Dr. José Maria Rosa Tesheiner. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 111.

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27

2.3 PROCEDIMENTO

O requerimento de tutela antecipatória formulado pela parte será feito no

âmbito da própria ação em que é demandada a tutela definitiva que se quer ver

antecipada, tão logo verificados os requisitos que a ensejam, inclusive na própria

petição inicial. No curso do processo é formalizado em petição escrita dirigida ao juiz

da causa. Pode fazê-lo, inclusive, em audiência, ocasião em que deduz seu pedido

oralmente.

Em qualquer caso, no entanto, o interessado deve declinar os

fundamentos da sua pretensão, indicando a situação de perigo de dano irreversível

ou de difícil reparação (art. 273, I, CPC), o comportamento abusivo ou protelatório

do réu (art. 273, II, CPC) ou, ainda, a existência de pedido incontroverso (art. 273, §

6º, CPC). Imprescindível, no mais, a exteriorização dos efeitos satisfativos que

pretende ver antecipados.

Antes de decidir acerca do pedido de antecipação da tutela, o juiz deve

ouvir a parte contrária, em obediência ao princípio do contraditório. Em tese,

portanto, o mesmo não poderia ser concedido inaudita altera parte. Referida

providência só poderá ser dispensada quando outro valor jurídico, de mesma

estatura constitucional que o direito ao contraditório, ficar comprometido com a

ouvida do adversário.33 Preserva-se, dessa forma, a própria efetividade da

jurisdição.

O §1º do art. 273 dispõe que a decisão que antecipar a tutela deverá ser

suficientemente fundamentada com as razões do convencimento do magistrado. O

mesmo dever prevalece quando indeferir o pedido, até porque o dever de

fundamentar as decisões judiciais é imperativo expressamente previsto no art. 93, IX

da Constituição Federal. A ausência de fundamentação acarreta nulidade.

33 Ibid., p. 117.

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28

Não é lícito ao juiz indeferir o pedido de concessão de tutela antecipatória

quando estiverem presentes todos os pressupostos do art. 273 do Código de

Processo Civil, por que:

o que está em jogo, em incidentes dessa natureza, são direitos

constitucionais fundamentais, cuja garantia não pode ficar sujeita

nem ser objeto de disposição arbitrária de quem quer que seja,

principalmente do juiz, cuja missão é a de zelar pela efetividade dos

direitos.34

Isto porque, ao decidir o incidente, o magistrado estará exercendo juízo

vinculado, e não discricionário. Nas hipóteses em que o juiz, antes da sentença

definitiva, julgar o pedido de antecipação da tutela, deferindo-o, ou não, caberá

agravo de instrumento, eis que referida decisão configura-se decisão interlocutória.

Ressalte-se que o agravo retido não teria utilidade nesses casos pela própria

natureza da medida pleiteada, já que só seria apreciado por ocasião do julgamento

de eventual recurso de apelação. Recebido o recurso, que será dirigido diretamente

ao Tribunal, o relator poderá, a requerimento da parte, suspender o cumprimento da

decisão agravada (art. 558, CPC).

2.4 CONCESSÃO, REVOGAÇÃO E MODIFICAÇÃO

A lei não impõe nenhum prazo preclusivo para a formulação do pedido de

tutela antecipada. Assim, conclui-se que pode ser pedida e concedida a qualquer

momento no curso do processo. Para Kazuo Watanabe a tutela antecipatória

fundada no inciso I do art. 273 do Código de Processo Civil poderá ser concedida

liminarmente, antes mesmo da citação do réu, sob pena de se tornar inútil o

provimento concedido posteriormente. Para o autor, presentes os pressupostos

exigidos em lei, a tutela antecipatória baseada no perigo de dano irreparável ou de

34 Ibid., p. 120.

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difícil reparação, poderá ser concedida em qualquer fase do processo, inclusive em

segunda instância.35

Nesse sentido é também o ensinamento do processualista Teori Albino

Zavascki, que entende ser a medida antecipatória possível ser deferida

liminarmente, nas hipóteses em que houver o perigo de dano irreparável ao direito

da parte. Entretanto, o juiz deverá obedecer o princípio da menor restrição possível,

segundo o qual a antecipação da tutela somente será legítima no limite estritamente

necessário à salvaguarda de outro direito fundamental, considerado, no caso,

prevalente.36

Contudo, a tutela antecipatória requerida com base tanto no inciso II

quanto no parágrafo 6º do art. 273 do Código de Processo Civil pressupõe a defesa

apresentada pelo réu; somente a partir da defesa do mesmo poderá o juiz

convencer-se da ocorrência do “abuso de defesa ou manifesto propósito protelatório”

ou ainda da “existência de pedido incontroverso” para a concessão da medida.

A modificação ou revogação da tutela antecipatória decorrem da própria

natureza provisória que a medida possui, eis que sua concessão não constitui

decisão final da causa, o que se dá somente por ocasião da sentença final. Assim

sendo, na hipótese de ter ocorrido mudança nas circunstâncias que determinaram o

deferimento da medida, a mesma pode ser revogada ou modificada. A revogação ou

modificação devem preceder a requerimento expresso da parte interessada, tendo

em vista que a concessão da tutela antecipatória é deferida mediante requerimento

de uma das partes para valer em face de outra. Assim, se não são concedidas de

ofício, tampouco podem ser revogadas ou modificadas ser dessa forma.37

A tutela passível de revogação ou modificação é aquela fundada em

cognição sumária. É que nesse caso o juízo é de mera probabilidade, sendo lícito ao

34 WATANABE, Kazuo. Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer. Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 36. 36 ZAVASCKI, Teori Albino. Op. cit., p. 76. 37 CARREIRA ALVIM, J. E. Op. cit., p. 74.

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magistrado, após a instrução do feito, concluir de maneira distinta com relação ao

direito alegado pela parte. Nesse sentido leciona Luiz Guilherme Marinoni:

O juiz, quando decide com base em cognição sumária, não declara a

existência ou inexistência de um direito; o juízo sumário é de mera

probabilidade. O juiz, quando afirma que um direito é provável,

aceita, implicitamente, a possibilidade de que o direito, que foi

reconhecido” como provável, possa não ser declarado existente ao

final do processo de conhecimento. Isso porque o desenvolvimento

do contraditório, com a produção de novas provas, pode fazer com

que o julgador chegue a uma conclusão diversa a respeito do direito

valorado sumariamente.38

Nas hipóteses em que existe cognição exauriente, por outro lado, há a

produção de coisa julgada material, não sendo possível sua revogação ou

modificação, nos moldes do § 4º do art. 273 do Código de Processo Civil. Assim,

quando existe o julgamento antecipado de parcela do pedido ou de um dos pedidos

cumulados, há o juízo de cognição exauriente, não sendo possível a revogação ou

modificação da tutela antes concedida.

38 MARINONI, Luiz Guilherme. A antecipação da tutela. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 203.

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CAPÍTULO III

A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NOS JUIZADOS ESPECIAIS

3.1 A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NOS JUIZADOS ESPECIAIS ESTADUAIS

A doutrina não é unânime quanto à possibilidade de ser aplicada a

antecipação de tutela nos Juizados Especiais Estaduais, a uma, porque inexiste

previsão na Lei 9.099/95 acerca de tal instituto, a duas, porque a aplicação

subsidiária do Código de Processo Civil ao rito instituído naquela lei, operou-se de

forma taxativa em determinados artigos (arts. 30, 50-53). Porém, considerando-se

que a Lei 9.099/95 estabelece uma espécie de subsistema processual, parte da

doutrina e da jurisprudência entende que disto decorreria a aplicação supletiva de

normas do Código de Processo Civil ao rito criado pela lei dos Juizados Especiais,

devendo, por isso, o juiz, na solução e condução do processo, adotar, sempre que

necessário e possível, os princípios e dispositivos previstos naquele diploma legal.

O art. 2º da Lei 9.099/95 dispõe que: “O processo orientar-se-á pelos

critérios da oralidade, simplicidade, economia processual e celeridade, buscando

sempre que possível, a conciliação ou a transação”.

Assim, não resta dúvida de que Lei 9.099/95 foi instituída para

proporcionar solução mais célere às lides trazidas ao Poder Judiciário. Com fulcro

nesse raciocínio, ganha força o entendimento de que nos Juizados Especiais não se

poderia admitir restrições a institutos inseridos no sistema processual (dentre eles a

antecipação de tutela) que se destinam, buscando maior efetividade, a fornecer aos

jurisdicionados o resultado rápido, útil e prático do processo. Seria, então, ofensivo

ao espírito da Lei 9.099/95, por limitar o acesso a uma justiça eficaz em favor

daqueles que buscam os Juizados Especiais Cíveis, proibir-se a concessão de tutela

antecipada nas ações processadas sob seu rito especial.

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Constata-se, assim, que são atendidos os requisitos para a aplicação da

antecipação de tutela nos Juizados Especiais: lacuna ou omissão da norma

especial, já que a Lei 9.099/95, não a regula; compatibilidade das normas

associadas à antecipação de tutela estabelecidas no direito processual comum com

os princípios informadores da Lei 9.099/95 e, ainda, inexistência de expressa

vedação legal.

É lógico que para a concessão da tutela antecipada é necessário que seja

atendido os requisitos prescritos no art. 273 do Código de Processo Civil: existência

de prova inequívoca, verossimilhança da alegação, fundado receio de dano

irreparável ou de difícil reparação ou caracterização do abuso de direito de defesa

ou manifestação de propósito protelatório do réu, condicionados à inexistência de

perigo de irreversibilidade dos efeitos do provimento antecipado.

Assim sendo, preenchidos os requisitos acima mencionados, o

magistrado do Juizado, sob o fundamento dos arts. 5º e 6º da Lei 9099/95, deverá

conceder a antecipação da tutela, até porque ao apreciar esta tutela de urgência,

não exerce o magistrado poder discricionário, como bem acentua José Roberto dos

Santos Bedaque:

Na verdade, não se trata de poder discricionário, visto que o juiz, ao

conceder ou negar a antecipação de tutela, não o faz por

conveniência ou oportunidade, juízos de valor próprios da

discricionariedade. Se a situação descrita pelo requerente se

subsumir em qualquer das hipóteses legais, não restará outra

alternativa ao julgador senão deferir a pretensão. Tanto que dessa

decisão cabe recurso, providência destinada exatamente a

possibilitar o reexame da questão pelo órgão superior, que

modificará a decisão de primeiro grau, se entendê-la incorreta.39

Desta forma, tem-se que a tutela antecipatória é perfeitamente cabível

nos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, devendo a parte interessada fazer a

postulação, toda vez que haja o preenchimento dos requisitos legais.

39 BEDAQUE, José R. dos Santos. Op. cit., p. 352.

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33

Nesse sentido, tem-se o Enunciado 26 do Fórum Permanente de Juízes

Coordenadores dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil: “São cabíveis a

tutela acautelatória e a antecipatória nos Juizados Especiais Cíveis, em caráter

excepcional”.

3.2 A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

FEDERAIS

No que diz respeito à aplicação da antecipação de tutela nos Juizados

Especiais Federais, em raciocínio similar ao já apresentado, tem-se os seguintes

aspectos:

Primeiro, a Lei 10.259/2001 que dispõe sobre a instituição dos Juizados

Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal prescreve em seu art. 1º,

a aplicação subsidiária da lei 9.099/95. Pelos mesmos argumentos já expostos com

relação aos Juizados Especiais Estaduais, tem-se plenamente possível, também, a

aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, e, por conseqüência, a aplicação

do instituto da tutela antecipada.

Segundo, o art. 4º da Lei 10.259/2001 estabelece que o Juiz poderá, de

ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do

processo para evitar dano de difícil reparação. Uma posição seria a de que ao

estabelecer a possibilidade de medidas cautelares e nada determinar para a

antecipação de tutela, inclusive só permitindo recurso para decisões interlocutórias

naqueles casos, sinalizou o legislador no sentido de serem inadmissíveis tais

medidas. Numa outra posição, pode ser argumentado que como tais medidas -

antecipação de tutela e as cautelares - estão no sentido de permitir a efetivação da

justiça, de acordo com a Constituição Federal, sempre será possível entender as

mesmas são cabíveis independente de sua explicitação na lei especial, pois são

compatíveis e aderentes aos princípios constitucionais.

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Ocorre que, a interpretação jurídica da referida norma não pode ser literal

ou gramatical, mas sociológica, como exige o art. 5º da Lei de Introdução ao Código

Civil, atendendo aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Assim, a compreensão científica do referido texto legal é de que ele

permite no Juizado Especial Federal a concessão de tutela ou medida de urgência,

assim entendida tanto a medida cautelar como a antecipação de tutela prevista no

art. 273, I, do Código de Processo Civil, quando haja fundado receio de dano

irreparável ou de difícil reparação.

Além disso, na omissão das Leis nos 10.259/2001 e 9.099/95, cabe a

aplicação supletiva do Código de Processo Civil, como lei geral que rege o direito

processual civil brasileiro, como reconhecido pela jurisprudência e doutrina. Nesse

sentido, leciona Fernando da Costa Tourinho Neto e Joel Dias Figueira Júnior

(Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais, Revista dos Tribunais, 2002, p.63):

“Não se pode perder de vista que, nada obstante o silêncio da Lei nº 10.259/2001, o

Código de Processo Civil e o Código de Processo Penal são macrossistemas

instrumentais e, nesta qualidade, independem de quaisquer referências expressas

para encontrar ressonância e aplicabilidade.”40

Dentro deste panorama, tem-se, pois, perfeitamente cabível a

antecipação dos efeitos da tutela nos Juizados Especiais Federais como medida que

visa assegurar a máxima efetividade da tutela jurisdicional, corroborando um dos

princípios orientadores desta Justiça Especial, qual seja, o da celeridade processual.

3.3 CONCESSÃO EX-OFFICIO DA TUTELA ANTECIPADA NOS JUIZADOS

ESPECIAIS CÍVEIS

A tese da inadmissibilidade da antecipação da tutela ex officio é

perfeitamente sustentável no processo civil. Esse entendimento está calcado nos

princípios tradicionais do processo como o da demanda ou da iniciativa da parte, da 40 TOURINHO NETO, Fernando da Costa; FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.63.

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adstrição do juiz ao pedido e o princípio dispositivo, previstos, inclusive, na lei

processual civil (art. 2º, CPC: “Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão

quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e formas legais”; art. 128,

CPC: “O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso

conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte”).

Sustenta-se ainda que, se o juiz tomar a iniciativa de antecipar a tutela, sua

imparcialidade estará sendo comprometida. Além disso, argumenta-se que, como os

eventuais danos decorrentes da execução da medida deverão ser suportados pela

parte, tal como ocorre no processo cautelar (art. 811, CPC), somente ela - a parte -

deveria escolher se pretende ou não correr o risco de obter a antecipação da tutela.

Por todas essas razões, tanto a doutrina quanto a jurisprudência são praticamente

unânimes em reconhecer a impossibilidade de se antecipar a tutela sem que haja

requerimento expresso nesse sentido.

Ocorre que quando o legislador estabeleceu as alterações do Código de

Processo Civil em 1994, sequer poderia imaginar a entrada em vigor posteriormente

das leis instituidoras dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais tanto no âmbito da

Justiça Comum Estadual quanto da Justiça Comum Federal. Daí decorre que o

emprego da norma de processo civil em sede de Juizados Especiais deve ser

adaptada a esta realidade. E apesar da lei (art. 273, CPC) falar de requerimento da

parte, a norma legal não teria sentido e restaria mesmo inutilizada se fosse reiterada

a exigência em sede de Juizados Especiais, onde a presença do advogado não é

obrigatória.

Embora se possa considerar essa exigência, em abstrato, válida, em

certos casos específicos, pode vir ela a se mostrar desarrazoada e injusta no âmbito

dos Juizados Especiais, devendo o juiz, nestas situações, antecipar a tutela mesmo

sem pedido expresso, a fim de dar cumprimento à norma constitucional que garante

a efetividade do processo. Cite-se como exemplo as verbas alimentícias (p.ex., as

decorrentes de benefícios previdenciários ou assistenciais), no âmbito dos Juizados

Especiais Federais, as quais trazem sempre consigo um clamor de urgência na sua

obtenção.

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Desse modo, tratando-se de verbas dessa natureza, o pedido não precisa

fazer menção expressa à antecipação de tutela ou ao art. 273 do Código de

Processo Civil, pois está implícita a necessidade de sua concessão, sobretudo

quando se trata de pessoa humilde, desamparada, idosa, que, em regra, não tem

condições de contratar um bom advogado para representá-la. Nos casos de ações

de competência dos Juizados Especiais Cíveis, em que é possível peticionar sem a

representação técnica por advogado, também fica manifesta a desnecessidade de

requerimento expresso de antecipação de tutela, já que não seria razoável exigir que

o jurisdicionado saiba o que é a antecipação de tutela e, por conseqüência, venha a

requerê-la.

Ademais, há que se ter em mente que o direito processual moderno

pauta-se no princípio da instrumentalidade das formas e, como decorrência da

instrumentalidade - corolário do princípio da efetividade e do acesso à justiça, o

magistrado é obrigado a sanar, sempre que possível, as técnicas cometidas pelas

partes hipossuficientes. Qualquer comportamento excessivamente formalista por

parte do juiz não seria legítimo, afinal a atenção à forma que não atenda ao ideal da

instrumentalidade, na imagem de Liebman, não passará da mais solene

deformação.

Nesse sentido, Rui Portanova afirma que:

Nestes tempos de preocupação publicística e social do direito em

geral e do processo em particular, o princípio da ação está a desafiar

o processualista moderno. Não se pode esquecer que o pobre, por

exemplo, desconhece seus direitos. Quando os intui, muitas vezes

têm dificuldade de expressá-los. Assim, conseguir ter acesso ao

Judiciário cível já é, para o pobre, uma grande conquista. Contudo,

infelizmente, acabam representados por advogados pouco

preparados ou ainda em preparação. Assim, seja por defeito de

forma ou por desconhecimento do fundo, muitas vezes o verdadeiro

direito do pobre só vai aparecer ao longo do processo. E é claro,

não raro estará fora do pedido inicial. Nesses casos, o jurista está

desafiado a informalizar de tal modo o processo e amenizar o

princípio a ponto de, iniciada a demanda, seja viabilizado chegar-se

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com sucesso ao atendimento do real bem da vida pretendido pelas

partes, independentemente dos limites do pedido.41

Vale ressaltar, também, no que pertine aos Juizados Especiais Federais,

que a própria Lei nº 10.259/2001, dispõe em seu art. 4º que “o Juiz poderá, de ofício

ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do processo,

para evitar dano de difícil reparação.” Entende-se que a melhor interpretação a ser

dada é a de que a antecipação de tutela e a cautelar são duas espécies do mesmo

gênero, qual seja, o da tutela de urgência, e ambas têm sua razão de ser fundada no

sentido de permitir a efetivação da justiça, de acordo com a Constituição Federal,

pelo que sempre será possível compreender o cabimento das mesmas

independentemente de sua explicitação na lei especial, pois são compatíveis e

aderentes aos princípios constitucionais. Nessa perspectiva, tem-se plenamente

possível a concessão de tutela cautelar ex officio nos Juizados Especiais Federais.

Invoca-se, ainda, o art. 461 do Código de Processo Civil, posto que a lei

10.444/2002, acrescentando o § 3º ao art. 273 da lei processual civil, determinou

que a efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua

natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4º e 5º, e 461-A. Dispõe o art.

461 e seu § 5º que:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação

de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da

obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que

assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

...

§ 5º. Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do

resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a

requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a

imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão,

remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento

de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

41 PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 247.

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Veja-se que não há qualquer exigência de prévio requerimento da parte;

pelo contrário, o § 5º do art. 461 do Código de Processo Civil, autoriza que o juiz,

mesmo de ofício, determine as medidas necessárias para a efetivação da tutela

específica ou para obtenção do resultado prático equivalente. É o caso, por

exemplo, de pedido de garantia de cobertura hospitalar formulado por usuário de

plano de saúde em risco de vida, objetivando manutenção de internação em UTI

durante o período necessário para o seu restabelecimento e não somente durante o

prazo fixado no contrato de assistência médica, por se tratar de obrigação de fazer

(obrigação natural do contrato), em que se tem possível a antecipação da tutela de

ofício, em conformidade com o art. 461 do Código de Processo Civil.

Ademais, a Lei 10.444/2002 adotou expressamente o princípio da

fungibilidade entre cautelar e antecipação de tutela, o que significa que se o autor, a

titulo de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o

juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em

caráter incidental do processo ajuizado; sendo assim, maior razão ainda para se

aceitar a antecipação de ofício dos efeitos da tutela, pois a medida cautelar também

pode ser concedida de ofício. Não seria lógico, portanto, que o juiz pudesse

conceder, incidentalmente, nos autos principais, uma medida cautelar de ofício e

não pudesse conceder a antecipação de tutela. Do contrário, e para satisfazer os

que ainda relutem na aceitação da tese ora defendida, basta ressuscitar a vetusta

“medida cautelar satisfativa”, que nada mais é do que a antecipação da própria

tutela final definitiva com a forma de uma tutela cautelar. Assim, o juiz, ao invés de

“antecipar a tutela de ofício”, poderia obter o mesmo resultado concedendo, de

ofício, nos próprios autos “principais”, uma medida cautelar satisfativa.

Por todas as razões expendidas, é perfeitamente defensável, que, em

nome do valor constitucional consagrador do direito à completa e efetiva prestação

jurisdicional, possa o juiz de ofício antecipar a tutela, sobretudo nas situações onde

se evidencia que: a) o feito tem natureza previdenciária ou assemelhada; b) o valor

do benefício é imprescindível para a subsistência do autor; c) a parte é

hipossuficiente, não só do ponto de vista econômico, mas também de conhecimento

de seus direitos; d) o direito postulado restou provado de forma induvidosa; e) a falta

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de prévio requerimento de tutela antecipatória, como motivo para não concessão de

antecipação da tutela, revela-se como flagrante injustiça contra a parte autora.

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CONCLUSÃO

De nada adianta a formal garantia de acesso do cidadão ao Judiciário, de

acesso à prestação jurisdicional, de apreciação de lesão ou ameaça a direito se dele

valendo-se não consegue alcançar resultado eficaz. A efetividade é o escopo

primordial do processo civil, eis que garante a entrega da tutela jurisdicional (dando

a cada um o que é seu por direito) e a igualdade entre os cidadãos - não só a

igualdade processual, mas, sobretudo, aquela preconizada constitucionalmente,

asseverando serem todos iguais perante a lei. A efetividade do processo permite,

ainda, que se lhe dê uma função social, como mecanismo concreto, viável e eficaz

de pacificação social.

Preza-se hoje pela celeridade e pela efetividade dos provimentos

jurisdicionais e sua compatibilização com a segurança jurídica. Prega-se um

processo civil de resultados, em que o direito material perseguido pela parte que

vem a juízo demandá-lo, deva ser entregue em tempo e maneira equivalentes a que

obteria, caso as disposições legais tivessem sido espontaneamente observadas. A

convivência harmoniosa entre estes princípios – segurança, efetividade e celeridade,

é que se denomina modernamente de processo justo.

A opção pela efetividade do processo pode ser visualizada no

procedimento célere dos juizados especiais e nas reformas processuais,

destacando-se neste último a modificação do artigo 273 do Código de Processo Civil

e a criação do instituto da tutela antecipatória.

A antecipação da tutela, ao exercer cognição sumária, promove uma

quebra no procedimento comum de rito ordinário, que devido à sua morosidade,

contribui para a inefetividade do processo. Assim, a tutela antecipada representa

uma forma alternativa de tutela capaz de realizar a adequação casuística das

diversas ações de direito material, pois, considerando o caso concreto, e à luz dos

seus requisitos, antecipa a satisfação que ordinariamente se daria após o tempo

necessário para a averiguação da existência do direito.

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Quanto aos requisitos da concessão da tutela antecipada, tem-se que não

se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do

provimento antecipado. Entretanto, o perigo de irreversibilidade dos efeitos fáticos

do provimento não pode constituir impedimento ao deferimento da tutela urgente.

Em se tratando de tutela antecipatória urgente, deve ser possível o sacrifício, ainda

que de forma irreversível, de um direito que pareça improvável em benefício de outro

que pareça provável.

Em suma, se não há outro modo para evitar um prejuízo irreparável a um

direito que se apresenta como provável, deve-se admitir que o juiz possa provocar

um prejuízo irreparável ao direito que lhe parece improvável. Nestes casos, deve

ocorrer a ponderação dos bens jurídicos em jogo, aplicando-se o princípio da

proporcionalidade, pois quanto maior for o valor jurídico do bem a ser sacrificado,

tanto maior deverá ser a probabilidade da existência do direito que justificará o seu

sacrifício.

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