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UNIVERSIDADE DE CUIABÁUNIC FACULDADE DE DIREITO CUIABÁ/MT TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA Autora: CRISTIANE CONCEIÇÃO VIEIRA DE SOUZA Cuiabá UNIVERSIDADE DE CUIABÁ UNIC Faculdade De Direito 2006.

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UNIVERSIDADE DE CUIABÁ­UNIC

FACULDADE DE DIREITO

CUIABÁ/MT

TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Autor a:

CRISTIANE CONCEIÇÃO VIEIRA DE SOUZA

Cuiabá

UNIVERSIDADE DE CUIABÁ­ UNIC Faculdade De Direito

2006.

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UNIVERSIDADE DE CUIABÁ­UNIC

FACULDADE DE DIREITO

TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Autora: CRISTIANE CONCEIÇÃO VIEIRA DE SOUZA

Or ientadora: MARLI TEREZINHA DEON SETTE

Monografia apresentada a Universidade de Cuiabá ­ MT, para obtenção do Título de Bacharel em Direito,

Cuiabá­2006. UNIVERSIDADE DE CUIABÁ­UNIC

FACULDADE DE DIREITO

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UNIVERSIDADE DE CUIABÁ – UNIC

Reitor Altamiro Belo Galindo

FACULDADE DE DIREITO

Diretor Antonio Alberto Schommer

.

VIEIRA, Cristiane Conceição TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA ­Cuiabá: UNIC ­ Faculdade

de Direito, 2006. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – UNIC – 2006.

1. DIREITO PROCESSO CIVIL 2. .DA TUTELA ANTECIPADA . 3 TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA Oriet.Marli Deon Satte.

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Aos meus pais e amigos que sempre dedicaram a grandeza de ter­me colocado em primeiro lugar em suas vidas muitas vezes em benefício dos meus projetos.

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“Se um dia já homem feito e realizado, sentires que a terra cede a teus pés, que tuas obras se desmoronam, que não há ninguém a tua volta para te estender a mão, esquece a maturidade, passa pela mocidade, volta a tua infância e balbucia entre lágrimas e esperanças as últimas palavras que te restaram na alma:

Minha Mãe...Meu Pai...”

Rui Barbosa

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................... 07

CAPÍTULO I – TUTELA

1.1 – Tutela Cautelar ................................................................................ 14

1.2 – Tutela Antecipada............................................................................ 19

1.3 – Diferença entre os Institutos........................................................... 27

CAPÍTULO II

TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA........... 29

CAPÍTULO III

POSIÇÃO DOS DOCENTES DA UNIC EM 03/09/2001..................... 47

CONCLUSÕES......................................................................................... 51

BIBLIOGRAFIA....................................................................................... 58

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INTRODUÇÃO

Em se tratando de antecipação de tutela, devemos distinguir medida

cautelar da antecipação de tutela.

Ao falar dos pressupostos básicos e fundamentais que balizam a

aplicação desses dois “remedium júris” , é comum verificarmos que em alguns julgados estar­se adotando, dentre alguns julgadores, a tendência de excessivo

tecnicismo para separar em compartimentos estanques e inflexíveis as hipóteses

de tutela cautelar e as de antecipação de tutela, quando a lei não vislumbrou isso,

tanto assim que não balizou tais compartimentos.

Faz­se necessário, urgentemente, que o operador do direito tenha

muita prudência no tratamento de matéria tão delicada, como é o caso da

prevenção em qualquer de suas modalidades, já que o rigor tecnicista pode, sem

qualquer dúvida, anular a conquista instrumental, trazendo com isso irreparáveis

males à efetividade da prestação jurisdicional, bem maiores do que os que

causava a falta do remédio inovador.

Convém seja lembrado que a antecipação de tutela, no direito

brasileiro, não foi adotada com a intenção de diminuir ou enfraquecer a tutela

cautelar. Ela foi inspirada, pelo contrário, na necessidade de suprir deficiências

que o sistema preventivo apresentava. Veio, assim, para somar e não para

subtrair, daí ser conveniente ponderar que, se resta bem claro no direito

brasileiro atual, a diferença técnica ou teórica entre a tutela cautelar e a tutela

antecipatória, o mesmo nem sempre ocorre nas situações práticas postas nas

mãos do julgador para solução judicial.

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A vida de cada um de nós, seres humanos, nem sempre se amolda

docilmente às previsões do legislador, como, do mesmo modo, não aceita a

rigidez de suas normas como fórmulas infalíveis de compreensão e solução da

complexa e multifacetária convivência humana numa sociedade cuja

característica dominante é o conflito acima de tudo e não a singela e espontânea

busca de comportamento individual pautado segundo o programa do direito

positivo.

Registre­se, por oportuno, que a pretensão de separar em campos

diametralmente diversos e bem delineados, as medidas cautelares e as de

antecipação de tutela, é tarefa que apenas o direito brasileiro, ambiciosamente,

almejou. No direito europeu – onde primeiro se sentiu e exaltou a necessidade

de incluir nos poderes do órgão judicial o de, em caso de urgência, permitir não

só a prevenção, mas também a satisfação provisória da pretensão cuja realização

se busca na tutela definitiva de mérito – o que se fez não foi criar uma nova

modalidade de prestação jurisdicional a par da cautelar. Entendeu­se,

simplesmente, que a lei poderia perfeitamente ampliar a tutela cautelar para

incluir, dentre as medidas de eliminação do periculum in mora, em certos casos, providências que satisfizessem antecipadamente o direito material do litigante,

desde que isso fosse indispensável ao atingimento da plena efetividade da

prestação jurisdicional, ficando resguardada a possibilidade de reversão, na

hipótese de eventual resultado adverso para o beneficiário na sentença definitiva

da lide.

Não podemos esquecer como é importante que conheçamos os

antecedentes históricos do art. 273 do nosso CPC, com a nova redação que lhe

deu a Lei nº 8.952/94, a fim de evitarmos atitudes de rigidez conceitual que não

condizem, de maneira alguma, com os objetivos que a ampliação da tutela

preventiva visou alcançar, dentro da perspectiva de uma prestação jurisdicional

que se afastasse do plano meramente formal para atingir o da realidade material

e do da plena efetividade da Justiça.

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O instituto da antecipação da tutela insculpido no artigo 273 do

Código de Processo Civil, permite que o juiz antecipe os efeitos buscados no

processo, desde que verifique para tanto a existência de prova inequívoca e da

verossimilhança do direito alegado e possibilidade de ocorrência de dano

irreparável ou do difícil reparação.

Muitos doutrinadores conceituam tutelar antecipada como tutela

satisfativa no plano dos fatos, já que realiza o direito, dando ao requerente o bem

da vida por ele pretendido com a ação de conhecimento.

O artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal, assegura a todo

cidadão brasileiro além do direito de postular em juízo, o direito Ter um acesso

ao judiciário que propicie a efetiva e tempestiva proteção contra qualquer forma

de denegação de justiça e de acesso à ordem jurídica justa.

Frederico Carpi, no XV Congresso Naacionalle, Bari, 1985, afirma

que a tutela jurisdicional dos direitos e dos interesses legítimos não é efetiva se

não obtida rapidamente.

Verifica­se que no direito europeu, onde se forjaram esses

antecedentes históricos e culturais, tudo se fez, em matéria de tutela

antecipatória, dentro do próprio conceito de poder geral de cautela, sem que a

tradição da ciência processual se sentisse compelida a entrever uma repugnância

entre a noção de prevenção cautelar e a de antecipação provisória emergencial,

quando ambas fossem geradas pela conjuntura comum do periculum in mora. A propósito, convém ressaltar que o direito comparado

contemporâneo admite tranqüila e maciçamente que o perigo obstaculável pela

tutela cautelar (periculum in mora) tanto pode afetar o processo pendente como o direito material subjetivo do litigante. Daí que a medida cautelar tanto pode

impedir a simples frustração da sentença como ato processual definitivo como

pode antecipar provisoriamente a mesma sentença para evitar a inutilização

irremediável do próprio direito material da parte que demanda a tutela

jurisdicional.

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O direito comparado, particularmente nas fontes européias, onde os

processualistas brasileiros mais buscam inspiração, não aponta nem se fixa no

rumo de uma diversidade essencial entre tutela cautelar e tutela antecipatória.

Pelo contrário, as reúne como simples espécies de um mesmo gênero de tutela

jurisdicional. A distinção entre "provvedimenti cautelari conservativi i provvedimenti cautelari antecipatori" é feita no plano eminentemente teórico para justificar as dimensões e os fundamentos da tutela em questão.

Como se verifica, longe de assinalar uma barreira intransponível

entre as medidas conservativas e as antecipatórias, o que se intenta no direito

europeu de hoje é harmonizá­las como integradas ambas dentro da sistemática e

do escopo geral da tutela cautelar.

O operador do direito, segundo entendimento da grande maioria da

doutrina, mui particularmente, entre nós, do mestre Humberto Theodoro, pois, não deve indeferir o pedido de tutela antecipada simplesmente porque a

providência preventiva postulada se confundiria com medida cautelar, ou,

rigorosamente, não se incluiria, de forma direta, no âmbito do mérito da causa.

Havendo evidente risco de dano grave e de difícil reparação, que possa,

realmente, comprometer a efetividade da futura prestação jurisdicional, não

cometerá pecado algum o decisório que admitir, na liminar do art. 273 do CPC,

providências preventivas que, com maior rigor, deveriam ser tratadas como

cautelares.

O que não é possível tolerar é a manobra inversa, ou seja,

transmudar medida antecipatória em medida cautelar, para alcançar a tutela

preventiva sem observar os rigores dos pressupostos específicos da antecipação

de providências satisfativas do direito subjetivo em litígio. Sem dúvida, em

assim acontecendo, estaríamos diante de um error in procedendo, com inegável prejuízo à parte.

Não se deve censurar o legislador por ter ampliado os poderes

cautelares do juiz permitindo­lhe, inclusive, conceder a antecipação da tutela de

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mérito, e isto pelo medo de que tais faculdades possam gerar abusos e

arbitrariedades. A verdade, porém, é que, universalmente, registra­se uma

evolução nas leis processuais civis exatamente na direção de agilizar a prestação

jurisdicional e de contornar as crises dos procedimentos clássicos mediante

expedientes expeditos, mais eficazes e comprometidos muito mais com a

garantia de justiça do que simplesmente com os ritos e sociedades que sempre

representaram, na ordem prática, mais embaraço do que incentivo à real tutela

aos direitos subjetivos violados ou ameaçados.

O nosso legislador, sem dúvida, tomou conhecimento da dura

verdade de que o processo, tal como concebido em seu rito comum ou ordinário,

não estava suficientemente aparelhado para enfrentar os problemas de

emergência. Do mesmo modo como a medicina tem aperfeiçoado, cada vez

mais, as técnicas cirúrgicas de emergência, exatamente na busca incessante de

meios e técnicas mais ágeis para salvar pacientes em risco de vida, também o

direito processual tem de conceber expedientes capazes de tutelar, em caráter de

urgência, os direitos subjetivos que não podem deixar de ser prontamente

exercitados, sob pena de perecerem e de conduzir os respectivos titulares a um

profundo descrédito no processo judicial como um todo, o que, infelizmente,

muitos juízes teimam em não querer entender, como se fossem os únicos

senhores da verdade e do direito, postados até acima da lei.

Face à semelhança, bom lembrar Pajardi quando diz que as medidas

de tutela provisória, no campo processual, devem ser encaradas da mesma forma

com que se cuida, em medicina, das cirurgias de urgência, que não permitem ao

médico observar todas as cautelas e precauções de ordinário prescritas para os

tratamentos de rotina. Explica que o paciente em condições normais é colocado

em observação por tempo técnico, sob acurada análise e cuidadosa avaliação,

inclusive com opção de experiência de eventual alternativa clínica

farmacológica. Mas aquele que se apresenta em condições críticas,

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configuradoras de um estado de emergência, reclama uma intervenção cirúrgica

imediata, sob pena de a futura cirurgia tornar­se inútil, diante do risco iminente

do advento da morte do paciente. Há técnicas e cirurgiões para pacientes

normais e técnicas e cirurgiões de urgência, tal a especificidade desse último

tipo de cirurgia.

Sem nenhuma dúvida, o mesmo ocorre com a tutela jurisdicional,

onde há o processo normal, naturalmente lento e demorado, e há o processo de

emergência, para as situações de urgência. Em todos os casos de risco de dano

iminente e grave, o processo normal se apresenta como inútil, porquanto a parte

não dispõe de tempo para utilizá­lo de forma a impedir a consumação do grave

prejuízo que se avizinha.

Um juiz que não esteja provido de preparo técnico e de equilíbrio

pode, no uso do poder de criar medidas de urgência, provocar danos

incalculáveis e comprometer até mesmo o direito em litígio, ainda que isto se

concerte por meio de remédios de retificação e de recursos também eficazes e

rápidos, e não pela simples eliminação do remédio processual de urgência, com

sérios prejuízos ao jurisdicionado pela só demora na obtenção do remedium juris que afaste os danos causados por esse despreparo e falta de equilíbrio.

Digamos que do mesmo modo como não se recusa o bisturi ao cirurgião de urgência, por simples temor de vir a ser por ele mal utilizado, também não se pode negar ao juiz um amplo poder de antecipar providências e de tomar medidas preventivas, por temor ao despreparo técnico ou à falta de sensibilidade do julgador.

Ao tratarmos da Tutela Antecipada contra a Fazenda Pública, estamos a falar exatamente da sistemática voltada à segurança e proteção do interesse público, travando e impedindo a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, não se tratando, a toda evidência, de hipótese de vedação do acesso à

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justiça, mas sim de impedimento de acesso indiscriminado, porque contrário ao sistema legal vigente.

O reexame necessário se apresenta como o mais importante óbice à antecipação da tutela. O texto legal é expresso ao negar eficácia à sentença proferida contra a Fazenda Pública antes do desfecho da devolução obrigatória.

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CAPÍTULO I

TUTELA

1.1 Tutela Cautelar

A tutela cautelar se realiza mediante um processo cautelar, que, na

lição de Humberto Theodoro Jr.(1998; p. 360), constitui uma nova face da

jurisdição, um tertium genus que "contém a um só tempo as funções do processo de conhecimento e de execução, e tem por elemento específico a prevenção".

Com isso se percebe que se há um processo cautelar deve haver

também uma ação cautelar, pois processo e ação são noções indissociáveis. Essa

atividade cautelar, no entanto, como se disse, difere do processo de

conhecimento e do execução por ter características que lhe são próprias e

exclusivas. Aliás, já foi dito que a ação cautelar busca apenas preservar o

resultado útil do processo de conhecimento ou de execução, sendo a prevenção

seu elemento específico. Assim, embora seja ela uma ação, com todas as

características desta, incluindo a autonomia, mantém ela relação de

subsidiariedade com a ação de conhecimento ou de execução, que é por isso

chamada de principal. É nesse sentido o dispositivo contido no THEODORO

JR. (1992; p. 380), art. 796 do Código de Processo Civil que diz que "o procedimento cautelar pode ser instaurado antes ou no curso do processo principal e deste é sempre dependente".

Com esses dados já podemos chegar ao conceito fornecido por

THEODORO JR. Humberto (1998, p.362). pelo qual a

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Consiste, pois, ação cautelar no direito de provocar, o interessado, o órgão judicial a tomar providências que conservem e assegurem os elementos do processo (pessoas, provas e bens), eliminando a ameaça de perigo ou prejuízo iminente e irreparável ao interesse tutelado no processo principal; vale dizer: a ação cautelar consiste no direito de assegurar ´que o processo possa conseguir um resultado útil.

Sua função, portanto, é meramente auxiliar e subsidiária, de sorte

que não busca a composição do litígio, não procura satisfazer o direito material

dos litigantes, mas apenas garantir o direito a um resultado eficaz que será dado

pelo processo principal. Para o atendimento dessa função possui as seguintes

características peculiares:

a) Instrumentalidade ­ está significa que a cautelar não tem um fim

em si mesma, mas é apenas um meio para que se efetive o objetivo da prestação

jurisdicional que é a justa e útil satisfação do direito material, por isso é que

THEODORO JR (1998; p. 363) diz que "enquanto o processo principal busca tutelar o direito, cabe ao processo cautelar tutelar o próprio processo principal", já que não declara o direito nem o realiza, mas apenas atende, de forma provisória e emergencial, uma necessidade de segurança que possui

relevância para a futura solução do litígio.

b) Provisoriedade ­ indica que tem uma duração limitada no tempo,

que pode ter seu marco final na entrega da tutela definitiva, na perda do prazo de

ingresso para a ação principal, no caso de ser preventiva, ou mesmo na

revogação ou modificação pelo juiz.

c) Revogabilidade ­ isto porque não faz coisa julgada material, já

que não decide do mérito da lide, não gera uma situação estável para as partes,

antes existe enquanto é necessária, podendo ser modificadas ou revogadas a

qualquer tempo pelo juiz a requerimento da parte interessada.

Têm as cautelares dois requisitos específicos resumidos nos

seguintes brocardos latinos: fumus boni juris e periculum in mora, que compreendem respectivamente a probabilidade do direito material alegado

realmente existir e o fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da

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lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação (art. 798, CPC),

de modo que haja risco de ineficácia da futura tutela jurídica.

Com relação ao primeiro requisito, Theodoro Jr. observa que a

fumaça do bom direito, não implica na certeza do direito material, pois assim já

se poderia ter o julgamento definitivo e não uma simples cautelar e que, essa

plausibilidade do direito material não significa que os fatos que o fundamentam

serão profundamente analisados, mas apenas e tão somente que o autor da

cautelar tem direito ao processo de mérito com possível provimento favorável.

Assim, uma vez demonstrado que o autor da cautelar possui todas

as condições do direito de ação que lhe permitirão ingressar com o processo

principal, ou seja, que este é viável e não lhe será claramente adverso, terá ele

direito ao processo cautelar, pois o fumus boni juris consiste na existência do interesse que justifica o direito de ação, sendo que na prática só não existe

quando a pretensão do requerente configurar caso de inépcia da Inicial.

Quanto ao perigo da demora Theodoro Jr. esclarece que se refere ao

interesse processual na justa e eficaz composição do litígio, sendo que o dano

corresponde a uma possível prejudicial alteração na situação de fato existente ao

tempo da propositura da ação. Devendo o receio do autor da cautelar ser

demonstrado por algum fato concreto (fundado) que possa gerar dano durante o

processo principal (seja próximo) e que esse dano não permita uma reparação

específica e nem uma indenização, inclusive por falta de condições econômicas

da outra parte.

As cautelares podem ser instauradas antes do processo principal,

sendo que este deve ser proposto dentro de 30 dias (art. 808, I, CPC), quando,

então, serão precedentes ou preparatória, ou podem ainda ser ajuizadas no curso

deste, sendo então incidentes. Podem ainda ser inominadas, quando derivam do

poder geral de cautela concedido ao juiz pelo art. 798 do Código de Processo

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Civil, ou nominadas, quando especificadas por este, sendo subdivididas estas

nas que recaem sobre bens, sobre provas e sobre pessoas.

As medidas cautelares disciplinadas pelo art. 813 e ss., que são as

nominadas, não oferecem dúvidas, pois são cabíveis nos casos específicamente

determinados e seguem a disciplina desses artigos. Importa, porém ainda

observar a possibilidade de tutela cautelar ex officio, prevista no art. 798 do CPC, pelo qual é permitido ao juiz "determinar as medidas provisórias que

julgar adequadas", quando estiverem presentes os requisitos do periculum in mora e, apesar de não mencionar o artigo, também, é lógico, o fumus boni juris, pois a existência desses dois requisitos, de forma concomitante é que permite a

concessão da cautelar.

Entretanto, em vista do princípio da inércia da jurisdição que

informa nosso sistema processual, não se pode conceber que ao juiz seja

permitido intentar qualquer ação. Porém, no campo da tutela cautelar tal

princípio é abrandado, ou talvez adequado aos seus fins em nome da efetividade,

de sorte que aquela possibilidade de tutela cautelar ex officio, não compreende a possibilidade de o juiz abrir um verdadeiro processo cautelar, mas apenas lhe

permite tomar medidas cautelares avulsas dentro de um processo já existente,

mas isso em situações de expressa permissão legal, como o caso do arresto na

execução onde o devedor não é encontrado. Essas medidas são anômalas, não

formam um novo processo em autos apartados, mas são procedimentos

incidentais acessórios ao processo principal.

O poder geral de cautela também é algo de peculiar na tutela

cautelar, por ele, pode o juiz criar providências de segurança fora dos casos

típicos de cautelares determinados por lei, pois a tutela cautelar visa a evitar

situações de perigo que possam prejudicar a eficácia do processo principal e, por

vezes, demandam medidas específicas para o caso concreto. Essas medidas terão

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de ser requeridas pelo interessado que, como já dito, terá de demonstrar a

existência daqueles dois requisitos típicos de todas as cautelares.

Essas medidas têm limites além dos comuns à qualquer ação, em

vista de sua função altamente específica. Assim, a necessidade da medida vai

estar presente no fumus boni juris e essa tutela nunca pode pretender ser definitiva ou satisfativa, pois, como o processo de liquidação, deve ser fiel ao

seu fim específico que é a mera conservação de um estado de coisas. Por isso

sua prestação não deve ter conteúdo igual ao da do processo principal, logo, não

deve influir no julgamento da lide, conforme dispõe expressamente o art. 810 do

CPC. Por ser processo, só pode se encerrar com uma sentença, mesmo que a

medida cautelar seja conferida em liminar é a sentença quem entregará a tutela

cautelar. Mas como se viu, a cautelar não decide sobre o mérito, por isso essa

sentença não fará coisa julgada material, só formal, logo, poderá ser revogada ou

modificada pelo juiz se depois ele a julgar inadequada ou inútil, por exemplo.

Apenas no caso de se acolher prescrição ou decadência é que pode a cautelar

fazer coisa julgada material.

Essa possibilidade de modificação está inclusa na fungibilidade das

medidas cautelares, pela qual pode o juiz determinar concretamente qual a

medida mais adequada ao caso, de sorte que o requerente não pode exigir a que

pediu se aquela diversa que o juiz determinou assegurar a eficácia do processo

principal, pois o requerente não têm, como no processo principal, o direito

subjetivo a uma prestação determinada, não há o direito à uma tutela específica.

Esse princípio da fungibilidade está fundamentado no art. 805 do CPC, que

prevê a possibilidade de substituição de ofício ou a requerimento da parte, da

medida cautelar por outra menos gravosa para o requerido.

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Por fim, a medida cautelar se extingue por revogação, falta de

ajuizamento da ação principal em 30 dias, falta da execução da medida deferida

em igual período, extinção do processo principal e por desistência do requerente.

1.2 Tutela Antecipada

Como já se disse de início, a existência da tutela cautelar não foi o

bastante para a efetividade do processo nos casos em que o direito reclamado só

pode ser satisfeito por uma prestação expedita,. é rápida, de forma que o

legislador processual ante essa realidade, na qual, apesar da existência de uma

hiperatividade do processo cautelar, os direitos urgentes não eram satisfeitos,

trouxe, em 1994, a figura da tutela antecipada através do novo art. 273 do CPC.

Assim, buscando acelerar os resultados do processo se permitiu a

antecipação dos efeitos da tutela definitiva por liminar satisfativa, que, diferente

das liminares de feição satisfativa já existentes, p. ex. nas ações locatícias, tem

caráter genérico, de sorte que é aplicável, em tese, a qualquer processo de

conhecimento.

Entende DINAMARCO (1995; p. 139), “como é satisfativa, por ela se concede o exercício, ainda que provisório, do próprio direito, de maneira que a decisão que a concede terá o mesmo conteúdo da sentença definitiva” , sendo que a diferença será a provisoriedade. Por ser provisória, não pode ser

confundida com a antecipação da própria tutela, o que representaria um

julgamento antecipado da lide. O que é antecipado são só os efeitos da tutela

definitiva, por isso é que a decisão concessiva da tutela antecipada não faz coisa

julgada material, podendo ser modificada depois em vista da própria

provisoriedade que deriva de uma cognição sumária.

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Há, desse modo, uma correlação com a demanda, conforme observa

Cândido Dinamarco, de sorte que os limites objetivos e subjetivos desta serão os

mesmos na tutela antecipada. Esta deve coincidir com o pedido do autor, porém,

isso se for total, de vez que pode ser parcial, quando então o juiz, dentro de seu

poder discricionário fixar­lhe­á os limites dentro do que entender possível ou

necessário.

A tutela antecipada não é uma ação, mas a lei não especifica o

modo de sua concessão, que poderá assim, se dar sob a forma de liminar, e

conforme o caso poderá também se realizar através de provimentos executivos,

inclusive o § 3º do art. 273 permite a aplicação dos procedimentos da execução

provisória, no que couber. Note­se, entretanto, que tal não significa que a

antecipação da tutela seja uma forma de execução, pois esta pressupõe o título

executivo. Pode até mesmo ser necessária a prévia liquidação, dependendo da

natureza da obrigação de direito material. Cândido Dinamarco ensina que, pelo

princípio da adaptabilidade da tutela jurisdicional, dependendo da finalidade, a

antecipação da tutela pode se dar por, DINAMARCO (1995; p. 143) "declaração, constituição, condenação, comandos judiciais e atos de satisfação ou de asseguramento".

Quanto ao âmbito da tutela antecipada esta não se coaduna com

todos os tipos de processo de conhecimento; quanto às ações condenatórias não

haveria dúvida em ser aplicável, mas nas ações declaratórias, não se poderia

antecipar a própria declaração, no máximo poder­se­ia antecipar alguns de seus

efeitos; nas constitutivas alega que não se pode constituir uma situação de forma

provisória, mas apenas suspender seus efeitos, o que é sede das cautelares, pois

essa suspensão é de natureza diversa da prestação definitiva, só é preventiva,

não satisfativa como a tutela antecipada exige. Acrescenta­se ainda que as ações

executivas latu sensu, como a de despejo, possuem mecanismos próprios para garantir a efetividade da decisão, de maneira que dispensam a antecipação da

tutela.

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Seus pressupostos, são os seguintes: requerimento da parte;

produção de prova inequívoca dos fatos arrolados na inicial; convencimento do

juiz em torno da verossimilhança do alegado; fundado receio de dano irreparável

ou de difícil reparação ou caracterização do abuso de direito de defesa ou o

manifesto propósito protelatório do réu; e, possibilidade de reversão caso

contrária à decisão final.

Com relação a exigência de prova inequívoca, Cândido Dinamarco

observa que deve ser entendida juntamente com a necessidade de que o juiz se

convença da verossimilhança da alegação, pois se entendida separadamente

chergar­se­ia a uma contradição, já que o que é inequívoco é certo e não apenas

verossímil, e, de outro lado, se o que é inequívoco é certo, deveria haver o

julgamento antecipado e não apenas a antecipação dos efeitos desse julgamento.

Assim, ensina o processualista que da junção desses dois pontos se obtém o

conceito de probabilidade, que é mais que a verossimilhança e menos que a certeza; é a situação decorrente da preponderância dos motivos convergentes à

aceitação de determinada proposição, sobre os motivos divergentes.

Outra questão a ser considerada é a possibilidade de reversão da

tutela pois, caso o requerido venha a sofrer com esta um prejuízo irreparável, ela

não se justifica, de vez que se funda em uma cognição sumária, que não conhece

a fundo os fatos e por isso não oferece a certeza que legitima a intervenção

estatal definitiva. Nesse ponto, MARINONI (1996, p. 107) ensina que o

princípio da probabilidade, na tutela antecipada, indica que

deve ser possível o sacrifício, ainda que de forma irreversível, em benefício de um direito que pareça provável. Do contrário, o direito que tem maior probabilidade de ser definitivamente reconhecido poderá ser irreversivelmente prejudicado.

Cândido Dinamarco, DINAMARCO (1995; p. 144) porém,

contrapõe­se dizendo que "o direito não tolera sacrifício de direito algum e o

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máximo que se pode dizer é que algum risco de lesão pode­se legitimamente assumir". Assim, não seria permitido ao juiz exigir sacrifícios irreversíveis do réu, mas ponderar as repercussões na vida e no patrimônio das partes para

conceder a antecipação da tutela, o que realiza o chamado "juízo equilibrado". Contudo, admite que nem sempre poderão ser eliminados do mundo dos fatos os

efeitos da antecipação da tutela, pois a reversibilidade é do provimento, nem

sempre será dos fatos, por isso sugere a exigência de caução e, de todo modo, o

requerente poderá ser responsabilizado civilmente por isso.

Há duas hipóteses de cabimento, conforme se vê dos dois incisos do

art. 273, a primeira que equivale aos casos onde há perigo de dano a um direito

plausível em virtude da demora da prestação definitiva, similar ao periculum in mora das cautelares, e o segundo é específico, que se relaciona à litigância de má­fé, dispensando a existência de perigo de dano. É uma forma de coibir a

utilização do processo para fins contrários aos que são seus, quais sejam a

pacificação com justiça e eficácia do litígio.

Como se disse de início, a antecipação da tutela não é uma ação,

logo, não será concedida por sentença, mas por decisão interlocutória, que não

forma um processo acessório ao principal, mas pode ser apenas um incidente

processual, embora não seja sentença a decisão deve ser devidamente motivada.

Modificado pela lei 8.952/94, o artigo 273 do Código de Processo

Civil passou a ostentar nova redação, onde se introduziu magnífica inovação: a

possibilidade do julgador antecipar, provisoriamente e mediante restritos

requisitos, aquilo em que poderá redundar a sentença. É inegável o avanço

advindo com tal modificação. Novo conceito foi introduzido na sistemática

processual, de forma a celerar o processo e sobretudo de limitar, tanto quanto

possível, o uso, por parte do réu, da dinâmica normalmente arrastada do

processo para prolongar por largo tempo a efetiva prestação jurisdicional.

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No entanto, o que se tem verificado, com frequência acima do

normal, é que muitos advogados, bem como juízes, têm aplicado mal esse

instituto. É comum vermos tutelas serem antecipadas como se fossem medidas

cautelares, ou ainda, e mais grave, a verdadeira mescla de procedimentos que se

tem admitido sob a égide da tutela antecipada.

A tutela antecipada não se confunde de forma alguma com o

processo cautelar elencado nos artigos 796 e seguintes do Código de Processo

Civil. Esse, como ressalta com peculiar brilhantismo Nelson Nery Jr., tem como

precípuo objetivo assegurar o resultado prático do processo principal. Ou seja, é

medida autônoma, provisória e pode ser deferida, além daquelas formas

especiais capituladas no CPC, de infinitas outras maneiras, sob o leque das

cautelares inominadas, sempre com vistas a garantir a eficácia da sentença,

quando esta seja proferida. Mas atente­se: não estão as cautelares

necessariamente vinculadas ao que será ou poderá ser concedido na sentença.

Assim, exemplificando, se as partes litigam sobre a propriedade de

determinada coisa, poderá o juiz determinar, em processo cautelar, seja esta

exibida, mesmo que se encontre em poder de terceiros, a fim de que as partes, ou

uma delas, aquilate o seu estado ou integridade. Vê­se que, nesse caso, a

cautelar não guarda relação com o que decidirá a sentença; esta necessariamente

cuidará de dar a quem de direito a propriedade da coisa, mas a medida deferida

no processo cautelar tão somente assegurará às partes a possibilidade de

verificar se lhes é conveniente discutir a propriedade de uma coisa que muitas

vezes já pode se encontrar irremediavelmente deteriorada. Ou seja, a cautelar, no

caso, somente teve o condão de evitar a inocuidade da sentença, ou como já se

disse, garantir a eficácia do que restar decidido pela sentença.

Já em relação à tutela antecipada, acontece diferente. Esta se

encontra sempre viceralmente ligada ao que poderá redundar a sentença e dessa

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possibilidade não se afasta nunca. Novamente nos valendo de um exemplo,

suponhamos que alguém intente contra outro ação de depósito a fim de reaver

coisa guardada por este. Se atendidos os requisitos do artigo 273 do Estatuto

Processual, deverá o julgador determinar antecipadamente, sempre atentando

para a possibilidade de reverte­se a medida, se necessário, que aquele que

guarda a coisa devolva­a ao pleiteante mesmo antes da sentença. Aí está a

grande diferença: nesse exemplo, o que o juiz determinou foi que se fizesse,

antecipadamente, o que muito provavelmente a sentença iria determinar.

NEGRÃO, Theotônio (1996, p. 570), argumenta, citando

referências jurisprudenciais que a medida cautelar não pode

antecipar a prestação jurisdicional pleiteada no processo principal, pois isso equivaleria a dar­lhe o caráter de execução provisória de uma sentença que não existe". E completa: "Diversamente, a tutela específica pode ser concedida exatamente como antecipação da prestação jurisdicional.

Daí porque o legislador foi mais rigoroso ao elencar os requisitos

determinantes para a concessão da tutela antecipada. No processo cautelar, é

cediço, bastam dois requisitos para a concessão da cautela: o fumus boni juris, ou a "fumaça" do bom direito, e o periculum in mora. Na tutela antecipada não. Além do perigo da demora, não se exige apenas que a parte seja detentora de um

indício de bom direito, mas que haja, dentre outros requisitos, a "prova inequívoca" do alegado e seja verossímil essa alegação. Agiu acertadamente o legislador ao exigir pressupostos mais consistentes para a concessão da tutela

antecipada. O que se está antecipando é justamente o que, anteriormente à

modificação do artigo 273, só se obtinha com a sentença. Os efeitos dessa

antecipação são, dessa forma, sobremaneira potencialmente mais contundentes

que aqueles oriundos de uma decisão proferida em medidas cautelares.

É importante lembrar que o processo cautelar continua em pleno

vigor e não foi revogado com o advento do instituto da tutela antecipada,

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embora muitos juízes venham, sistematicamente ­ e equivocadamente, frise­se ­

aplicando a tutela antecipada como se medida cautelar fosse. É comum nos

depararmos hoje, em ações em que se discute a nulidade ou revisão de cláusulas

contratuais, com liminares concedidas sob o manto da tutela antecipada, para

impedir que se possa promover a retomada do bem objeto do contrato até que se

decida a validade das cláusulas deste contrato. Sem querer adentrar no mérito da

eficácia ou não de tais cláusulas, a concessão da tutela nesses casos é

absolutamente contrária à regra insculpida no artigo 273. Ora, o que visa a ação

é a obter­se a declaração de nulidade ou a revisão das cláusulas contratuais.

Logo, somente isso poderá ser decidido na sentença. Não é lícito, portanto, que

se defira o depósito do bem em mãos do pleiteante, se isso não é o objeto da

ação. Obviamente, se a sentença não decidirá a respeito do depósito do bem,

para resguardar a aplicação prática da ação que intenta, evidentemente deve se

valer da medida acautelatória correta, que certamente encontrará na lei

processual. Se lhe assistir razão, ser­lhe­á concedida.

Contudo, mais grave ainda, como se ressaltou ao início, é que

muitos juízes vêm concedendo ainda nas ações referidas no exemplo acima,

possa o promovente consignar em juízo os valores devido que reputa corretos.

Veja­se o problema: além de confundir tutela antecipada com medida cautelar,

muitos magistrados vêm reunindo, num único processo, ações de procedimento

totalmente divorciados. Ora, a permitir tal situação, novamente sob a égide da

tutela antecipada, os juízes vêm aceitando a cumulação de uma ação de

procedimento ordinário com aquela de procedimento especial, qual seja, a

consignação em pagamento. Imagine­se a dificuldade, ou até mesmo a

impossibilidade de defesa em um caso desses: sabe­se que na consignação em

pagamento, é lícito ao réu promover o levantamento da quantia depositada, incontroversa, e continuar a demandar pelo restante que entende ainda lhe ser devido.

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Lembre­se, novamente, a tutela antecipada foi instituída pelo

legislador para somar­se às demais regras ínsitas no Código de Processo Civil.

Não teve o condão de revogar qualquer outro procedimento. Quem quer, assim,

depositar determinada importância em dinheiro, a fim de não sucumbir aos

efeitos da mora, deve valer­se da ação própria que se encontra estabelecida no

artigo 890 e seguintes do Estatuto Processual. Da mesma forma que em relação

às medidas cautelares, a ação de consignação em pagamento continua a valer e

para esse fim deve ser utilizada.

Vê­se, portanto, que, a despeito de promover, quem sabe, a

economia processual, esses juízes acabam por causar barafunda processual de tal

sorte que somente contribui para sobrecarregar os Tribunais com um incontável

número de recursos visando trazer o processo para o seu norte certo.

É preciso que os magistrados fiquem atentos para não permitir que

situações de tal ordem continuem ocorrendo. Mais ainda, imperioso se torna o

indeferimento de tais pretensões, que não encontram qualquer respaldo na

norma processual.

Mas é necessário também que os advogados façam sua parte. Para

cada pretensão que queiram deduzir, podem estar certos, encontrarão o

procedimento correto na lei processual. Claro é que terão mais trabalho, posto

que muitas vezes será necessário a propositura de duas ou três ações distintas

para resguardar o direito de seus constituintes. É preciso, porém, resistir à

tentação de pretender reunir numa única petição todas as vertentes de uma

situação de litígio. Até mesmo porque assim o determina a lei e a sistemática

processual. Afinal, é consagrado, para cada pleito existe uma ação própria.

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1.3 Difer enças entre os institutos

De posse das noções gerais acima expostas, pode­se traçar um

quadro objetivo das diferenças dos dois institutos, nunca se perdendo de vista

que o ponto central reside na diferença de função e de objetivos, que redunda na

diferença de naturezas, de sorte que todos os outros pontos diferenciadores são

decorrências destes e estão intrinsecamente relacionados.

De início se pode observar que a tutela cautelar é preventiva, tendo

como função única e específica garantir o resultado útil do processo principal,

de modo que não decide o mérito da lide, não podendo influir nessa decisão. Já a

tutela antecipada realiza de imediato a pretensão, não se limita a assegurar a

viabilidade da realização do direito afirmado como a cautelar, mas satisfaz esse

direito.

A tutela cautelar tem como características a instrumentalidade, a

referibilidade a um processo principal e a dependência, que não estão presentes

na tutela antecipada.

A cautelar é uma ação, com todas as características desta, é

autônoma, pressupões a existência das condições da ação, possui custas, termina

com uma sentença, da qual cabe recurso ordinário; pode ser intentada antes

mesmo de existir um processo principal e forma novos autos. A antecipação da

tutela se dá mediante uma simples decisão interlocutória que resolve um

incidente processual, não se formando autos apartados e, dessa decisão cabe

agravo.

A tutela cautelar tem como pressupostos específicos o fumus boni juris e o periculum in mora, enquanto que na tutela antecipatória a probabilidade de existência do direito material é mais forte que a mera plausibilidade desse

direito, que na prática reside no próprio direito ao processo principal e na

simples aparência de que poder­se­á dele sair vencedor. Além dessa, abriga

ainda a hipótese de abuso de direito de defesa e de manifesto propósito

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protelatório do réu, independente da existência de perigo na demora da prestação

definitiva. Assim, como ação autônoma, a cautelar pode ocorrer na execução,

sob a forma de incidente ou mesmo de forma preparatória e a tutela antecipada

só ocorre no processo de conhecimento.

A tutela cautelar pode ser concedida de ofício ou a requerimento de

qualquer das partes e a antecipatória somente com requerimento do autor.

A tutela cautelar não deve ter a mesma natureza que a tutela do

processo principal, não deve ter o mesmo objeto para não ter caráter satisfativo,

concedendo justamente aquilo que se pede, inclusive não incide o direito à tutela

específica. A antecipação da tutela tem a mesma natureza da decisão definitiva,

incidindo sobre todo ou parte do objeto da lide, pois seu caráter é satisfativo,

logo, incide o direito à tutela específica, sendo que o que ficará a cargo do juiz é

apenas a "escolha" dos atos que se mostrem mais adequados, à semelhança do

que permite o art. 620 do CPC com relação à execução.

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CAPÍTULO II

TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA

Uma das principais alterações havidas no sistema processual

brasileiro, por conta da Reforma Processual foi, sem dúvida, a adoção do

instituto da antecipação de tutela.

A antecipação de tutela, conquanto solução de grande importância

para a efetividade do direito, merece cuidadosa interpretação, para que não

venha a se transformar em verdadeira panacéia, em prejuízo das relações

jurídicas e do sistema processual vigente.

Ilustrativo do tema é a abordagem da sua aplicabilidade contra a

Fazenda Pública em confronto com os dispositivos garantidores de privilégios

processuais.

Desde logo convém ressaltar que o sistema especial não fere o

princípio da isonomia, na medida do relevo do interesse público, que goza de

supremacia à frente do particular, porque diz respeito a todos, inclusive ao

demandante.

Há inúmeras passagens no Codex e em outros textos legais que revelam a preocupação do legislador, como, e.g., no caso do parágrafo 4o. do artigo 20, que exclui a Fazenda, na condenação, do limite mínimo na fixação dos

honorários advocatícios ou ainda nos casos em que dilata prazos, como os da

contestação e dos recursos (art. 188); de ineficácia da sentença sujeita ao

reexame necessário (art. 475) e da sujeição da execução ao rito dos artigos

730 do CPC e 100, da CF; do procedimento para a

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execução fiscal (Lei 6830/80), do arresto independente de justificação judicial

(art. 816, I); da reintegração de posse (art.928); entre outras.

Exatamente essa sistemática voltada à segurança e proteção do

interesse público, impede a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, não

se tratando, a toda evidência, de hipótese de vedação do acesso à justiça, mas

sim de impedimento de acesso indiscriminado, porque contrário ao sistema legal

vigente.

O reexame necessário se apresenta como o mais importante óbice à

antecipação da tutela. O texto legal é expresso ao negar eficácia à sentença

proferida contra a Fazenda Pública antes do desfecho da devolução obrigatória.

Trata­se, portanto, de condição de eficácia da sentença, o artigo 475

do Código de Processo Civil, afirma que nesse caso, estamos diante da sentença

de eficácia pendente, isto é, pendente de uma confirmação no tribunal.

O tema vem ganhando campo na jurisprudência dos tribunais. O II

Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, por exemplo, em inúmeras

oportunidades tem negado eficácia a sentenças que decretam o despejo de

repartições públicas, antes do reexame necessário, inobstante reconhecido que,

como locatário, o Estado se submete às regras de direito privado, tanto que tais

demandas estão submetidas ao rito da Lei 8245/9, pois, na hipótese, prevalece a

regra geral do artigo 475 do Código de Processo Civil.

O E.Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo adotou o mesmo

entendimento, a respeito de decisão proferida em ação cautelar exibitória, sujeita

à devolução obrigatória:

Dispõe o artigo 475, inciso II, do Código de Processo Civil, que a sentença proferida contra a União, o Estado e o Município está sujeita ao duplo grau

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de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo Tribunal. À evidência a sentença que julgou procedente a medida cautelar proposta pelo ora requerido foi proferida contra a aqui autora, que restou condenada a exibir os documentos e a responder pelos encargos da sucumbência. Por isso, não há como subtrair a espécie da previsão do mencionado dispositivo legal. Irrelevante, outrossim, é que a exibição dos documentos seria necessária à eventual propositura da ação popular, já que a mera declaração de tal propósito não se afigura suficiente para afastar a aplicação de imperativos preceitos legais.

Posteriormente ainda, o E.Tribunal de Justiça reafirmou essa

posição, ao decidir que sem dúvida, o instituto da tutela antecipada é incabível

contra a Fazenda do Estado. E isso porque as sentenças, quando não favoráveis à

Fazenda, devem ser submetidas ao reexame obrigatório, só produzindo efeitos

após confirmação pelo Tribunal. Entendimento contrário burlaria a proteção

legal do artigo 475 do Código de Processo.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o artigo 475, II do

CPC, que trata do reexame obrigatório é providência imperativa na fase de

conhecimento. Ainda posteriormente, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que

sendo a decisão submetida ao reexame obrigatório, por força do disposto no

artigo 475 do Código de Processo Civil, são ineficazes os atos de liquidação

eventualmente praticados, devendo a expedição do ofício requisitório aguardar o

pronunciamento do Tribunal.

O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo decidiu ainda que

a natureza jurídica da antecipação de tutela é de decisão de mérito provisoriamente exeqüível, colidindo com o artigo 475 do CPC, que determina o reexame necessário das decisões proferidas contra as pessoas jurídicas de direito público. A supremacia do interesse público sobrepuja o partícular.

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Posteriormente, o E.Tribunal de Justiça emitiu decisões nas quais

firmou o entendimento a respeito da tutela antecipada, considerando a

impossibilidade de concessão contra a Fazenda Pública.

Ora, o que não se pode é barrar o direito da parte ir a Juízo, todavia,

impedir que uma medida contra o Poder Público seja deferida de pronto, isso,

jamais, poderá ser tido como vilipendiadora da Constituição Federal, desde que

exista razão de interesse social para esse empeço e, aqui, naturalmente merece

um parêntese: se as motivações forem meramente econômicas, financistas, ou

seja, vindas da pessoa do governante, aí não poderá um procedimento processual

ceder passo à tal ordem de idéias e, assim sendo, não seria justificável criar

óbice à concessão de medida liminar, seja de cunho satisfativo ou meramente

cautelar.

Unânimes doutrina e jurisprudência acerca da imperatividade da

regra disposta no artigo 475 do CPC, não pode ela ser mitigada, como sugerem

vozes contrárias, pois a interpretação por elas sugerida para o dispositivo

equivale à sua revogação.

Não se trata, portanto, de impor à regra processual do artigo 475,

trato de convivência com o novo instituto, porque são inconciliáveis os

interesses que fundamentam os dispositivos.

Cumpre abordar ainda a legislação federal recentemente editada a

respeito das medidas liminares contra o Poder Público. A Lei 8437/92 aborda a

hipótese referindo­se à ação cautelar e impedindo a concessão que esgote, no

todo ou em parte, o objeto da ação.

Desnecessária a preocupação do legislador, na medida em que as

ações cautelares não se coadunam com a satisfatividade.

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A sumariedade que caracteriza o processo cautelar não compreende

a inserção de medidas de cunho satisfativo, próprias dos processos de cognição

ou execução, que, com suas fases destacadas, permitem a segurança da exata

prestação jurisdicional.

Difere, pois, o processo cautelar daqueles em que se confere medida

liminar antecipatória ­ mandado de segurança, possessórias ­ por sua natureza

diversa.

THEODORO Jr. (1998; p. 28) afirma que a provisoriedade que

caracteriza as liminares concedidas em processos cognitivos constituem entrega

provisória e antecipada do pedido e já são decisão satisfativa de direito, embora

precária. Conclui a respeito o Autor que

já com as medidas cautelares, isso jamais ocorrerá, pois são neutras diante do processo principal, muito embora visem a resguardar coisas e pessoas do processo e a assegurar o êxito da futura execução.

A respeito das cautelares, definiu LIEBMAN (1954, p. 253) que

sua atividade é puramente instrumental de escopo da jurisdição, apresentando­se como remédio destinado apenas a assegurar ou garantir o eficaz desenvolvimento e profícuo resultado do desígnio último da jurisdição, realizável pela cognição ou execução.

Exatamente por estar despido de satisfatividade que, ao invés de

compor a lide, como só ocorrer nos processos de execução e cognição, o

processo cautelar objetiva tutelar o processo.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul concedeu segurança

para cassar medida cautelar ilegalmente deferida, porque antecipação de tutela e

não segurança para um direito em perigo.

Nessa linha de raciocínio, não podem prevalecer opiniões

doutrinárias que consideram revogada a Lei 8437/92, em razão da edição da Lei

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8952/94, quando os próprios Autores defendem, à exaustão, as diferenças entre

as ações cautelares e a antecipação de tutela, que em nada se confundem, sendo

intuitivo que esta foi inserida no ordenamento jurídico exatamente para devolver

àquela sua verdadeira finalidade, a de garantir o resultado final da ação

principal, que com ela não se confunde, pena de litispendência.

Não é porque o legislador não tenha distinguido ocasionalmente as

reais características de cada instituto, que o intérprete, a quem cabe a análise

sempre sistemática da lei, nunca literal, também o faça na aplicação da figura

jurídica.

A Lei 9494/97, a seu turno, estendeu à antecipação de tutela as

restrições antes indicadas, adaptando a Lei 8437/92 à inovação da Lei 8952/94

(reforma processual), cabendo afirmar, segundo o raciocínio dos próprios

doutrinadores avessos à tese aqui defendida, que referida lei veio a revogar,

quanto à Fazenda Pública, o disposto no art. 273, do CPC (veiculado pela Lei.

8952/94).

Não mais se discute a constitucionalidade das normas que

restringem ou impedem a concessão de liminares contra o Poder Público. O

Prof. J.J. CALMON DE PASSOS (1984; p. 178) opina a respeito, com

indiscutível clareza e juridicidade, que merece destaque:

Sempre sustentei que a garantia constitucional disciplinada no inciso XXXV do artigo 5o. da Constituição Federal (a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito) diz respeito, apenas, à tutela definitiva, aquela que se institui com a decisão transitada em julgado, sendo a execução provisória e a antecipação da tutela problemas de política processual, que o legislador pode conceder ou negar, sem que isto incida em inconstitucionalidade. Vetar liminares neste ou naquele processo jamais pode importar inconstitucionalidade, pois configura interferência no patrimônio ou na liberdade dos indivíduos, com preterição, mesmo que em parte, das garantias do devido processo legal, de base também constitucional. Daí sempre ter sustentado que a liminar, na cautelar, ou antecipação liminar da tutela em qualquer processo, não é direito das partes constitucionalmente assegurado. (...) Assim, nada impedirá, amanhã, que disposições especiais de lei eliminem ou restrinjam a antecipação de tutela em algum tipo de procedimento ou quando em jogo certos interesses.

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No julgamento da ADIN nr. 223 (Rel. Min. Sepúlveda Pertence),

constou do voto proferido que "já se anotaram precedentes brasileiros de vedação legal à concessão de liminar, sem resistência quanto à sua constitucionalidade” .

No mesmo julgamento, citando GALENO DE LACERDA, para

quem "desde que não vedado o direito à ação principal, nada impede coíba o legislador, por interesse público, a concessão de liminares", o Ministro

MOREIRA ALVES, em seu voto, firmou que

o proibir­se, em certos casos, por interesse público, a antecipação provisória da satisfação do direito material lesado ou ameaçado não exclui, evidentemente, da apreciação do Poder Judiciário, a lesão ou ameaça ao direito, pois ela se obtém normalmente na satisfação definitiva que é proporcionada pela ação principal, que, esta sim, não pode ser vedada para privar­se o lesado ou ameaçado de socorrer­se do Poder Judiciário.

Demonstrada a constitucionalidade da norma legal, há que ser ela

adequada ao sistema legal vigente. Desde logo insta ressaltar que a edição do

texto não significa o reconhecimento da aplicabilidade da tutela antecipada

contra a Fazenda Pública, ao contrário dos argumentos já enumerados, porque o

texto legal que reafirma o sistema vigente não tem essa extensão.

Após a edição da norma, ao contrário, tem decidido os tribunais

pela sua inteira aplicabilidade. O E. I Tribunal de Alçada Civil reafirmou essa

posição, em arresto que merece destaque:

A antecipação de tutela tem caráter de medida cautelar satisfativa, pois diz direta e frontalmente com o direito do autor e deve conter­se no dispositivo da sentença a ser proferida, assim, não será cabível contra atos do Poder Público, pois, conforme dispõe o artigo 1 o . da Lei 8437/92, é incabível medida liminar que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação.

Ainda mais recente, o E. Tribunal de Justiça considerou a

impossibilidade de concessão de medida liminar antecipatória contra a Fazenda

Pública porque não será cabível medida liminar contra atos do Poder Público, no

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procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou

preventiva, toda vez que a providência semelhante não puder ser concedida em

ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal, reproduzindo,

portanto, o expresso texto da lei 8437/92, artigo 1 o ., caput.

Aspecto importante no exame dessa questão reside na análise do

poder geral de cautela, invocado como fundamento no exame particular da

concessão de liminares.

Discute­se a natureza desse poder ­ se vinculado ou discricionário.

Entendemos irrelevante a distinção se considerado que, mesmo agindo

discricionariamente, o Magistrado está adstrito à lei, podendo exercer a opção

apenas nos limites das variantes oferecidas no texto normativo.

Exemplificando, ao conceder a tutela antecipada, o juiz estará

adstrito aos casos que reunam as condições cumulativamente previstas no artigo

273 caput e inciso I, além do que, deverá fudamentar a decisão, obviamente à luz dos requisitos legais (par. 2o.).

Referido princípio tem berço constitucional, a teor do disposto no

art. 93,IX da CF que tomou a medida como garantia fundamental.

TEREZA ARRUDA ALVIM WAMBIER aborda o tema,

concluindo que, na verdade, O juiz está vinculado à lei. E há de fundamentar,

portanto, todas as decisões na lei.

Assim, não pode vingar o entendimento de que, o texto legal

vigente e considerado constitucional (L. 9494/97), que restringe a medida contra

o Poder Público, possa ser mitigado à frente do caso concreto.

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Há que se abordar ainda o aspecto do artigo 188 do CPC, que

concede prazo em quádruplo para a apresentação de contestação e em dobro,

sendo o caso de recurso, pelo Estado. Esse privilégio tem em conta a burocracia

da máquina estatal e as dificuldades para a plena defesa, que deve ser

assegurada, também à vista da superioridade do interesse público.

Pois bem, a regra que se pretende seja imposta contra a Fazenda

Pública faz letra morta também esse dispositivo, cerceando ao Estado a

plenitude do direito de defesa, nos prazos especialmente assinalados, já que o

recurso contra a decisão antecipatória tem prazo bastante reduzido em relação

aos ordinariamente fixados para a contestação e apelação.

No que se refere, outrossim, à execução que envolva antecipação

financeira, o artigo 273, se aplicado contra a Fazenda, fere frontalmente o artigo

730 do CPC, que pressupõe sentença judicial condenatória para a instauração da

execução e ainda o artigo 100 da Constituição Federal, sem contar todos os

demais dispositivos constitucionais orçamentários.

Não fosse suficiente ainda que a irreversibilidade da providência a

coloca em posição sujeita à regra impeditiva do artigo 273, parágrafo 2º. do

CPC, aspecto reconhecido pelo Tribunal Regional Federal, verdade é que tão

gritante aberração não pode ser admitida, senão à conta da revogação de todo o

sistema processual instituído especialmente para a condenação judicial da

Fazenda.

THEODORO JUNIOR (1998; p. 354) examina esse aspecto na

leitura do direito italiano, afirmando que

evoluiu­se então, em todo o direito europeu, para o rumo de conceber a tutela provisória tanto para "conservar" como para "regular" a situação jurídica material das partes. Somente não se permitia a liberdade de interferir no relacionamento substancial litigioso, nos casos de emergência, quando a regulação provisória da lide fosse de tal modo a impedir a reversão no

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julgamento definitivo do mérito, caso se tornasse necessário julgar a causa, afinal, de modo diverso.

Esbarra ainda a pretensão antecipatória em problemas que surgem

diante da concessão no bojo da demanda declaratória e constitutiva, onde a

tutela sempre tem natureza inibitória e resulta ainda mais evidente a

impossibilidade de retorno ao statu quo ante.

Esse raciocínio aplica­se a toda e qualquer ação intentada contra a

Fazenda Pública, mesmo que considerada a prova inequívoca de

verossimilhança, ao contrário do que sugeriu CÁSSIO SCARPINELLA

BUENO, colacionando HUGO DE BRITO MACHADO, Juiz do TRF da 2a.

Região, ao defender o cabimento da medida nas ações de repetição de indébito

tributário.

Também na opinião do I.Magistrado relatada por SCARPINELLA

BUENO, o artigo 730 do CPC deve ser interpretado à luz do artigo 273,

sugerindo ­ data maxima venia ­ esdrúxula saída para o impasse: expede­se o precatório, com sustação do pagamento até decisão final. Transitada em julgado,

o valor será liberado. Essa operação denomina­se "instrumentação da execução.

O depósito judicial do valor sob condição de confirmação da

sentença, com expedição anterior e provisória de precatório, com a devida vênia,

é providência que beira o absurdo, porque fere a ordem cronológica, deixando

sem solução os pagamentos posteriores até o efetivo levantamento, já que a

referida sucessão diz respeito à requisição judicial e não a ato posterior que é a

disponibilização do montante depositado. Além disso, expedido o precatório,

torna­se ele exigível, devendo ser cumprido.

Por esse mesmo motivo, descabida a providência nas ações

desapropriatórias, como sugeriu LUIS RODRIGUES WAMBIER (1997; p.

125), sob o mesmo argumento.

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A respeito, tenha­se ainda em mira que o disposto no artigo 588,I

do CPC (que regula a responsabilidade do credor na execução provisória, por

conta da prestação de caução idônea) e que tem "o escopo de evitar o chamado risco processual, sobretudo quando os procedimentos executivos envolvem a entrega de bens ou dinheiro ao credor" resulta inaplicável ao instituto da tutela antecipada, na medida em que o artigo 273, II, parágrafo 3 o ., considera que serão

observados apenas os incisos II e III daquele dispositivo processual, colocando

sob condição inaceitável o interesse público que envolve as demandas contra o

Poder Público.

Não é só. Qualquer que seja a natureza da liminar, a título de

antecipação de tutela ou em ações de rito especial, o requisito do periculum in mora se apresenta exigível. É bom que se tenha em conta que, em qualquer caso, o objetivo do legislador, ainda que reconhecida a "verossimilhança do direito" não foi o de antecipar, pura e simplesmente, a decisão final, para que o

postulante não ficasse à mercê da morosidade da máquina judiciária, pois o

artigo 273 do CPC é expresso na exigência cumulativa, do fundado receio de

irreparabilidade, caso reconhecido o direito apenas ao final.

E, em se tratando da Fazenda Pública, o Erário estará sempre apto a

responder à demanda, restando insubsistente a alegação de ineficácia da decisão,

caso venha a ser proferida apenas ao final, com o que resulta absolutamente

insubsistente o argumento de necessidade de instrumentação do precatório, com

a finalidade exclusiva de preservar o demandante da demora da máquina

judiciária e do sistema legal de pagamentos da Fazenda Pública, à míngua dos

demais requisitos legais da antecipação de tutela.

A respeito da possibilidade de concessão de liminares em sede de

mandado de segurança, ação popular e ação civil pública, conquanto

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antecipatórias, em inúmeros casos, verdade é que não revelam o confronto do

exclusivo interesse privado contra o interesse público.

Em tais ações, o requisito específico da propositura envolve questão

que transcende a particularidade: (I) no mandado de segurança há o direito

líquido e certo frente a um ato ilegal de autoridade; (II) na ação civil pública

temos a defesa de interesses específicos tutelados pela norma legal com

destaque, como no caso do meio ambiente, do consumidor, etc..; (III) na ação

popular, revela­se a preocupação com a lesividade ao patrimônio público.

São todos indiscutíveis aspectos do mesmo interesse público que

inspira os privilégios processuais da Fazenda Pública.

Isto não significa que, presente esse fundamento em ações de

procedimento comum, deverá ser concedida a tutela antecipada. Em tais casos,

optou o Autor da demanda pela via comum, ao invés das ações de rito especial,

fazendo crer que não pretende relevo ao requisito específico de tais ações, como

fundamento da ação.

Melhor exemplificando, se no sistema anterior o Autor dispusesse

de ação cautelar, na qual pudesse requerer a concessão de medida liminar,

porque presentes o periculum in mora e do fumus boni iuri, mas, ainda assim, fizesse opção pela via do procedimento comum, não poderia nessa sede pleitear

a antecipação conservatória do direito, porque os requisitos específicos da

cautela, embora presentes, são fundamento de demanda própria, estando ele,

inclusive, dispensado de demonstrar referidos aspectos, ainda que evidentes,

quando no procedimento comum.

Finalizando, a se admitir a doutrina que considera o direito à

antecipação de tutela aplicável a todo e qualquer processo, se estará não só

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subvertendo todo o sistema processual vigente, como exaustivamente

demonstrado, como contrariando o próprio instituto, que certamente não foi

introduzido com o objetivo de resolver o problema da morosidade da máquina

judiciária, muito mais profundo e carente de medidas de cunho administrativo,

mas sim, de torná­la eficiente nos casos indicados, sujeitos à ordem legal.

Em pesquisas jurisprudenciais feitas acerca do tema “antecipação

de tutela”, chamou­me a atenção decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do

Rio Grande do Sul nos autos do agravo de instrumento nº 70000957696, de

2000 (julgado pela 2ª Câmara Cível, relatora Desembargadora Teresinha de

Oliveira Silva).

O acórdão do recurso acima referido restou assim ementado:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇAO ORDINÁRIA. ANTECIPAÇÃO DE

TUTELA. PODER PÚBLICO.

Vedada se mostra a antecipação de tutela contra atos do Poder Público. Exegese

do art. 1º da Lei nº 9494/97. AGRAVO IMPROVIDO.”

Dispensadas todas as vênias, no entanto, ouso discordar

completamente do aresto transcrito, dada a impropriedade de seus fundamentos

e do equívoco perpetrado em suas premissas.

Conforme facilmente se extrai do teor de sua ementa, considerou a

Corte de Justiça gaúcha vedada a antecipação de tutela contra quaisquer atos do

Poder Público.

No mesmo sentido dessa decisão, outras provavelmente devem

estar sendo proferidas Brasil afora, ante a falta de segurança jurídica, oriunda do

excesso de medidas provisórias e leis postas em vigor pelos poderes,

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respectivamente, Executivo e Legislativo nacionais, sem observância da melhor

técnica legislativa, de maneira a deixar os profissionais do Direito, por vezes,

desnorteados.

Desta feita, utilizar­se­á o acórdão gaúcho como paradigma para o

desenvolvimento das idéias adiante aduzidas, que podem muito bem ser

trasladadas para outros casos concretos em que se verifique a mesma situação.

De acordo com o relatado, trata­se de agravo de instrumento

interposto contra decisão que indeferiu pedido de antecipação de tutela, para que

fosse suspenso processo administrativo de imputação de multas de trânsito, sob

a alegação de que não foi respeitado o devido processo legal e a ampla defesa,

contrariando­se os dispositivos do Código de Trânsito (arts. 280 e 281).

Em voto vencedor, assim manifestou­se a relatora,

Desembargador a Teresinha de Oliveira Silva:

Sabe­se de sobejo, ser a tutela antecipada (como a própria denominação indica) a antecipação pelo julgador, de uma decisão de mérito, favorável aos Autores”. Outrossim, com a concessão da tutela, esgota­se, em parte ou no todo, o objeto da lide. E, ainda, o art. 1º da Lei nº 9494/97 impede a concessão da tutela contra ato do poder público. Por outro lado, havendo necessidade de produção de prova, não cabe a outorga de tutela antecipada. Por tais razões, mantenho a decisão guerreada, nego provimento ao presente agravo.”

Aos mais desatentos, tal decisum parece até se apresentar correto, uma vez que é propagada, ao sabor dos ventos, a idéia de que, após o julgamento

da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 04, pelo STF, restou impedida

toda e qualquer forma de antecipação de tutela em desfavor da Fazenda Pública,

nos termos do voto aludido.

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A exegese conferida à ADC nº 04, pelo TJRS, no entanto, não se

mostra verdadeira.

A abrangência da vinculação em razão do julgamento da

constitucionalidade da Lei nº 9494/97 pelo STF não é tão ampla como quis

denotar o acórdão gaúcho. Limita­se a proibição da concessão de antecipação de

tutela contra a Fazenda Pública apenas quando versar o caso concreto analisado

sobre reclassificação ou equiparação de servidores públicos, concessão de

aumento e extensão de vantagens. No acórdão prolatado pelo TJRS, não restou

configurada a situação vedada pela Lei, de maneira que equivocada foi a decisão

tomada.

O melhor entendimento é aquele que restringe a amplitude da ADC

nº 04. Nesse sentido, mister se faz transcrever acórdão prolatado pelo TJDF,

que mais acuradamente interpretou a inteligência dada à Lei nº 9494/97, pelo

STF:

EMENTA: Processual Civil e Administrativo. Agravo de Instrumento. Antecipação de tutela em face da Fazenda Pública. Cabimento. Segurada. Auxílio­doença. Acidente de Trabalho. Distúrbios Osteomusculares relacionados ao trabalho – DORT. Fumus boni iuris e periculum in mora comprovados. Concessão da liminar. 1­ A decisão do Supremo Tribunal Federal, em sede da Ação Declar atór ia de Constitucionalidade nº 04, não impede per emptor iamente a concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública, só havendo vedação nos casos específicos insculpidos na Lei nº 9.494/97, ou seja, quando dizem respeito a reclassificação ou equipar ação de servidores públicos, concessão de aumento e extensão de vantagens, não se estendendo a ações em que o servidor público, litigando na condição de segurado, pleiteia a concessão de auxílio­doença.” (TJDF, 2ª T., AGI 2000.00.2.006309­5, rel. Des. Ana Maria Duar te Amarante) grifei.

Esta última exegese, em conclusão, é a que deve prevalecer em

nosso sistema jurisprudencial, por ser a mais correta, firmada em premissas

concretas, e em real conformidade com a interpretação dada à Lei nº 9.494/97

pelo STF. A afirmação de que toda e qualquer forma de antecipação de tutela,

em desfavor da Fazenda Pública, está vedada, é inverídica, apesar de ser esta

informação a que corriqueiramente se ouve pelos corredores de nossos

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Tribunais, e até mesmo em decisões por seus próprios órgãos proferidas, como a

exemplo do TJRS.

A regra genérica e ampla do art. 273 não exclui, em princípio, as

ações com a Fazenda Pública.

A possibilidade de medidas antecipatórias, satisfativas, conta a

Fazenda Pública, está no CPC, no art. 928, que nos elucida a possibilidade de

liminares possessorias, sujeitas tão somente a prévia audiência com o Poder

Público.

Não é de somenos importância salientar que, a antecipação de tutela

contra o Poder Público não pode ser dada de forma indescriminada, em razão do

procedimento especial de execução contra a funesta Fazenda Pública. Como nos

elucida jurisprudência exalada do STJ.: “Em se tratando de ação condenatória intentada por funcionário público para haver diferenças atrasadas de vencimentos, não se mostra viável a satisfação antecipada do direito,

pagamento imediato sem expedição de precatórios.” TJSP­2a C. ­ Ap. ­ Rel. Urbano Ruiz ­ RT 675/100

Tendo em vista que o processo de execução contra a Fazenda

Pública segue um procedimento próprio, bastante peculiar, em termos práticos,

devido as peculiaridades da execução, não vai haver a plena eficácia da

antecipação.

De qualquer forma, a outro benefício com a antecipação de tutela,

terá com a expedição de precatórios primazia na ordem cronologica.

Vale ressaltar que o art. 475 II, CPC, não constitui óbice a

antecipação.

Os grandes impeditivos para a antecipação da tutela em face da

Fazenda Pública são: o reexame necessário, art. 475 II, e o pagamento da

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execução contra a Fazenda Publica que será exarado através de precatórios, art.

100 CF.

Como solução para estes óbice legais da antecipação da tutela em

face da Fazenda Pública a doutrina nos elucida algumas soluções. A primeira é

fazer uma interpretação literal e declarativa do art. 100 CF, para excluir da

submissão à ordem dos precatórios requisitórios de pagamento as condenações

antecipadas, por força de aplicativo do artigo 273 do CPC.

Como nos ensina o professor Luiz Rodrigues Wambier, (1997;

255):

a interpretação que aqui se propõe ­ filosófica e declarativa, do art. 100 da CF e do art. 475 do CPC, em nada empobrece o sistema, na medida em que permite a criação de uma alternativa de soluções para um dos tormentosos problemas com que se tem defrontado os processualistas, que é justamente o de dar o máximo rendimento possível às regras constitucionais do amplo acesso à justiça e da efetividade da jurisdição, por sua “mão” infra constitucional que é a antecipação da tutela, o que aqui sustenta especificamente nos casos de desapropriação indireta. As antecipações de condenações contra o Poder Público podem ser cumpridas, mediante depósito à disposição do juízo (com liberação apenas em casos excepcionalissimamente considerando, porque a regra é que a execução de liminar antecipatória seja apenas provisória.

O que pode­se inferir é que, se adotar uma interpretação literal e

restritivas do texto normativo, porque tanto na Constituição como no Código de

Processo, o legislador se utilizou do vocábulo sentença, nenhum óbice

remanesce à antecipação da tutela diante da Fazenda Pública, pois a decisão que

se concede a medida antecipatória da tutela jurisdicional condenatória não se

consubstância em sentença, essa sim, sujeita aos efeitos do reexame necessário

do art. 475 CPCe a ordem dos precatórios do art. 100 CF.

Como nos ensina mais adiante o Professor Wambier, (1997;p. 257):

...convém deixar claro que temos consciência da insuficiência do método declarativo de interpretação da Lei. Todavia, é preciso dar efetivo rendimento aos dispositivos legais inovadores, como o art. 273 CPC, o que significa, ao nosso ver, interpretá­los em harmonia com o ambiente em que contemporaneamente se situa o processo civil. Esse novo momento histórico

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requer que se tenha em conta a necessidade de dar operatividade à garantia da efatividade da jurisdição.

É sabido por todos nos que muitas ações movidas contra o Poder

Público, há fundamento para a concessão da medida liminar de antecipação de

tutela com base no inciso II do 273, pois o indicativo do manifesto propósito

protelatório do réu não devem ter, necessariamente, ocorrido com o processo em

curso, isto é, não significa necessariamente atitude protelatória do réu ocorrida

depois de instaurado o processo, mas pode perfeitamente consubstanciar­se em

atitude que tenham sido tomadas pelo réu mesmo antes do processo, com o

objetivo de retardar a solução de direito material, inevitável para a situação

criada pelo legislador.

Para caracterizar o manifesto propósito protelatório do réu, basta

observar suas atitudes de afronta ao ordenamento, especialmente quando esta

conduta demonstra clarevidente intenção de postergar a solução de direito

material.

Pode­se afirma que antecipação da tutela com base no inciso II do

art. 273, é deferida sempre que a argumentação expedida pelo autor seja tão

robusta e consciente que ao réu nada reste senão oferecer defesa, que se poderá

entender como meramente protelatória.

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CAPÍTULO III

POSIÇÃO DOS DOCENTES DA UNIC EM 03/09/2001

Os docentes apresentaram, em palestras no Auditório na UNIC no

dia 03/09/2001, argumentos tendentes a aceitabilidade da tutela antecipada

contra a Fazenda Pública.

A Tutela Antecipada veio para resolver o problema da demora do

processo.

Para Marcos Machado – Tutela Antecipada – no SPC (chega ao

ordenamento atrasada). Fato político e fato jurídico. Tentativa de derrubar o

conservadorismo nos tribunais banalizou na imprensa. É salutar, respeitando a

ampla defesa. Há timidez do instituto.

Euclides – Carnelutti. Rui Barbosa – justiça tardia é injustiça

qualificada. Pressa é inimiga da perfeição. O direito corre para atender todo

mundo ou aguarda para cumprir todos os trâmites da justiça. Jurisdição de forma

efetiva. É o exato equilíbrio da antecipação da tutela. “tem que ser utilizada, nos

princípios da proporcionalidade e razoabilidade com parcimônia.

J enz – cultura – consciência histórica cultural CF/88. Para formar a

carta, os constituintes embasaram nas Constituições Federais passadas, o

conceito histórico dá esta consciência de cultura. A Tutela Antecipada já existia

no ordenamento jurídico, promana da Europa, Itália, Alemanha, França. Foi

instalado no Brasil em 84 na lei. A Tutela Antecipada é importante mas, não

consegue reduzir a demora no processo. A preocupação está na demora do

mérito porque esperar. Face a arbitrariedade do particular ou da fazenda pública

deve ser apreciado como

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medida de justiça. No terminar do processo é que irá haver o exaurimento do

processo. É admissível a tutela antecipada na Fazenda pública. Existem óbices

de natureza constitucional. Art. 100 CF. Forma de pagamento – por precatórios.

Lei 97/instrumento de coibir o acesso ao poder judiciário para reparar lesões do

cotidiano.impõe limite a leis infraconstitucionais. A norma hipotética

constitucional lei 4348 de 26/06/64. Proíbe a concessão de liminar para

recebimento de salário. Ação declaratória de inconstitucionalidade. Reajuste de

28% aos servidores público. Não baste a lesão, há o perigo que cause mais dano.

Euclides – é cabível a Tutela Antecipada contra a fazenda pública

para fazer pagar o direito. A lei 9494 o veda a concessão da T.A. art. 5 1º 5021.

Não se pode conceder: reclassificação ou equiparação, concessão de aumento.

No procedimento de processo cautelar. A vedação prevista é exclusiva para

vencimentos. Declaração incidental O poder executivo interfere no legislativo.

O STF diz o art. 1º não pode ser verdade. Erga ominis, ex tunc. É cabível. O STF veda em alguns casos. Qualquer análise contra a Fazenda Pública passará

pelo crivo infraconstitucional. Caberá ao magistrado ab literis postergar o contraditório e a ampla defesa para depois. O Estado de direito 5066 cada dia

procuram os governos Federal para impedir Tutela Antecipada contra a Fazenda

pública e a administração pública. Essa lei devem ser analisadas

constitucionalmente não afasta aos juízes. A lei é quem diz que não deverá ser

aplicada contra o poder público. A necessidade – preenche os pressupostos e

requisitos deverão ser concedida. O supremo diz que o STJ é mais técnico –

requer agravo de instrumento para concessão de T.A.. não se cassa pois os

pressupostos e sua concessão estão previstas. A L.C. 104/01 art. 151 Ctnacional

há a possibilidade da suspensão do crédito. Parágrafo 3º ­ é possível a aplicação

da tutela. Marcos – a T.A. surgiu para combater a litigiosidade contida. Excesso

de processo, dificuldade de acesso ao T.J. Não houver revogação de normas

processuais. A restrição contra a T. A. é restrita quanto a dinheiro. É uma

liminar com decisão de caráter interlocutória. Quando o impedimento é a

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entrega em dinheiro é contra. As obrigações de dar, fazer ou não fazer.

Visualizar o procedimento ordinário de ações contra a Fazenda Pública. A

liminar sem a oitiva do representante do MP. O precatório existe para o

pagamento programado de um ano para outro. Tutela declaratória e tutela

constitutiva – não há ninguém que procrastine um processo. Formas de tutela a

consulta a audiência a oitiva.

A antecipação de tutela prevista no artigo 273 do CPC deve ser

interpretada à luz do sistema processual vigente, respeitadas, especialmente, as

normas que regem as ações em que figura como parte a Fazenda Pública.

Os principais óbices à tutela antecipada no sistema processual

brasileiro são os seguintes: ­ o reexame necessário, pois se antecipa a sentença e

esta não tem eficácia antes do desfecho da devolução obrigatória, nos termos do

artigo 475 do CPC; ­ nega vigência ao artigo 188 do CPC, pois reduz prazo de

defesa e de recurso. ­ contraria o artigo 730 do CPC e o artigo 100 da CF, bem

como os dispositivos orçamentários constitucionais, quando gera antecipação

financeira. A "instrumentação da execução", além de ferir a ordem cronológica

do precatório, esbarra no conjunto de requisitos cumulativos do artigo 273 do

CPC, especialmente o periculum in mora e a irreversibilidade.

A legislação federal editada a respeito das medidas cautelares e da

antecipação de tutela contra a Fazenda Pública Leis 8437/92 e 9494/97, apenas

reafirmam o sistema vigente, tendo sido julgadas constitucionais as medidas ali

insertas.

A antecipação de tutela contra a Fazenda Pública tem cabimento

nas ações civis públicas, populares e mandados de segurança, evidenciado o

conflito de interesses da mesma natureza.

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O poder do juiz, na concessão de liminares em sede de tutela

antecipada é vinculado, na medida em que todas as decisões devem ser fundadas

na lei.

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CONCLUSÕES

A antecipação de tutela prevista no artigo 273 do CPC deve ser

interpretada à luz do sistema processual vigente, respeitadas, especialmente, as

normas que regem as ações em que figura como parte a Fazenda Pública.

Os principais óbices à tutela antecipada no sistema processual

brasileiro são os seguintes:

O reexame necessário, pois se antecipa a sentença e esta não tem

eficácia antes do desfecho da devolução obrigatória, nos termos do artigo 475 do

CPC; nega vigência ao artigo 188 do CPC, pois reduz prazo de defesa e de

recurso.

Contraria o artigo 730 do CPC e o artigo 100 da CF, bem como os

dispositivos orçamentários constitucionais, quando gera antecipação financeira.

A "instrumentação da execução", além de ferir a ordem cronológica do precatório, esbarra no conjunto de requisitos cumulativos do artigo 273 do CPC,

especialmente o periculum in mora e a irreversibilidade.

A legislação federal editada a respeito das medidas cautelares e da

antecipação de tutela contra a Fazenda Pública ­ Leis 8437/92 e 9494/97, apenas

reafirmam o sistema vigente, tendo sido julgadas constitucionais as medidas ali

insertas.

A antecipação de tutela contra a Fazenda Pública tem cabimento

nas ações civis públicas, populares e mandados de segurança, evidenciado o

conflito de interesses da mesma natureza.

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O poder do juiz, na concessão de liminares em sede de tutela

antecipada é vinculado, na medida em que todas as decisões devem ser fundadas

na lei.

Em tais ações, o requisito específico da propositura envolve questão

que transcende a particularidade: (I) no mandado de segurança há o direito

líquido e certo frente a um ato ilegal de autoridade; (II) na ação civil pública

temos a defesa de interesses específicos tutelados pela norma legal com

destaque, como no caso do meio ambiente, do consumidor, etc..; (III) na ação

popular, revela­se a preocupação com a lesividade ao patrimônio público.

São todos indiscutíveis aspectos do mesmo interesse público que

inspira os privilégios processuais da Fazenda Pública.

Isto não significa que, presente esse fundamento em ações de

procedimento comum, deverá ser concedida a tutela antecipada. Em tais casos,

optou o Autor da demanda pela via comum, ao invés das ações de rito especial,

fazendo crer que não pretende relevo ao requisito específico de tais ações, como

fundamento da ação.

Concluímos, portanto, que, embora o ordenamento jurídico acoberte

a Fazenda Pública com várias prerrogativas louváveis, não há motivo para não

admitirmos a tutela antecipada contra a mesma, tanto porque a lei( nº 9.494/97)

a prevê, como porque a concessão da medida constitui evento excepcional,

devido às circunstâncias do próprio processo e da relação jurídica sub judice.

A jurisprudência corrobora nossa conclusão por isso transcrevemo­

la:

"PROCESSO CIVIL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONTRA A

FAZENDA PÚBLICA.RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.

SERVIÇO PÚBLICO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA DIÁRIA. DANOS

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MATERIAIS. É POSSÍVEL A ANTECIPAÇÃO DE EFEITOS DE TUTELA

CONTRA A FAZENDA PÚBLICA, AINDA QUE COM A IMPOSIÇÃO DE

PRECEITO COMINATÓRIO. TANTO QUE A LEI9.494/97 POSSIBILITA A

SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. NÃO RESTA AFETADA A IMPOSIÇÃO.

MAIORIA. RESPONDE OBJETIVAMENTE O ESTADO PELO SERVIÇO

PÚBLICO QUE PRESTA. OCORRIDA FALHA, DEVE PROCEDER AOS

REPAROS NECESSÁRIOS. DEFERIDA TUTELA ANTECIPADA, FIXADO

PRAZO DE 60 DIAS PARTA CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO, A

MULTA DIÁRIA APENAS INCIDE A PARTIR DO 61º DIA. A MULTA

COMINATÓRIA TEM O PROPÓSITO DE ESTIMULA O CUMPRIMENTO

DA OBRIGAÇÃO. DEVE SER FIXADA EM PATAMAR RAZOÁVEL, QUE

NÃO TORNE INÍQUA NEM PROPICIE RUÍNA DO DEVEDOR E O

ENRIQUECIMENTO DO CREDOR. POSSÍVEL AO MAGISTRADO, DE

OFÍCIO, FIXAR E REVER SEU VALOR( ARTS. 461, 644 E 645 DO CPC). O

VALOR DIÁRIO DE R$1.000,00 ERA MANIFESTAMENTE EXCESSIVO.

RAZOÁVEL O FINALMENTE ARBITRADO DE R$50,00 DIÁRIOS. NÃO

PROVADOS OS ALEGADOS DANOS MATERIAIS, REJEITA­SE O

RESPECTIVO PEDIDO. APELO E REMESSA OFICIAL DESPROVIDOS.(3)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE

INSTRUMENTO.ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM FACE DA FAZENDA

PÚBLICA.CABIMENTO.SEGURADA.AUXÍLIO­DOENÇA.ACIDENTE DE

TARBALHO.DISTÚRBIOS OSTEOMUSCULARES RELACIONADOS AO

TRABALHO­ DORT.FUMUS BONI IUIRIS E PERICULUM IN MORA

COMPROVADOS.CONCESSÃO DA LIMINAR. 1 – A DECISÃO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, EM SEDE DE AÇÃO DECLARATÓRIA

DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº04, NÃO IMPEDE

PEREMPTORIAMENTE A CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA

CONTRA A FAZENDA PÚBLICA, SÓ HAVENDO VEDAÇÃO NOS CASOS

ESPECÍFICOS INSCULPIDOS NA LEI Nº9.494/97, OU SEJA, QUANDO

DIZEM RESPEITO À RECLASSIFICAÇÃO OU EQUIPARAÇÃO DE

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SERVIDORES PÚBLICOS, CONCESSÃO DE AUMENTO E EXTENSÃO

DE VANTAGENS, NÃO SE ESTENDENDO A AÇÕES EM QUE O

SERVIDOR PÚBLICO, LITIGANDO NA CONDIÇÃO DE SEGURADO,

PLEITEIA A CONCESSÃO DE AUXÍLIO­DOENÇA.2­ RESTANDO

COMPROVADO O LIAME CAUSALIDADE ENTRE A DOENÇA DE QUE

FOI ACOMETIDA A SERVIDORA(DORT) E O EXERCÍCIO DA

ATIVIDADE LABORATIVA( FUMUS BONI IURIS), SOMADO AO

EVIDENTE RISCO CONCRETO, ATUAL E IMINENTE DE PROGRESSO

DAS LESÕES PROVOCADAS POR SEU OFÍCIO( PERICULUM IN MORA),

RESTAM EVIDENCIADOS OS REQUISITOS ESSENCIAIS PARA

CONCESSÃO DA LIMINAR EM MEDIDA CAUTELAR. (2ª Turma Cível,

Acórdão 139288. AgI de 26/03/2001, Rel. Ana Maria Duarte Amarante –

TJDF))

PROCESSO CIVIL. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.CRÉDITOS

CONTRA O ESTADO.PERICULUM IN MORA. O ESTADO,

ATUALMENTE, É UM DESCUMPRIDOR DAS DECISÕES JUDICIAIS. A

DIFICULDADE PARA UM SERVIDOR RECEBER QUALQUER CRÉDITO

DE QUE SEJA TITULAR, MESMO PORTANDO UMA SENTENÇA

TRANSITADA EM JULAGADO, REVELA­SE PELO AMONTOADO DE

PEDIDOS DE INTERVENÇÃO FEDERAL, O QUE CHEGA ÀS RAIS DO

PÚBLICO E NOTÓRIO. CONSEQUENTEMENTE, O PERICULUM IN

MORA, EM SE TRATANDO DE CRÉDITO CONTRA A FAZENDA

PÚBLICA, AINDA QUE PAREÇA JURIDICAMENTE UM ABSURDO, NA

PRÁTICA NÃO O É. E O PODER JUDICIÁRIO NÃO PODE FAZER DE

CONTA QUE NÃO VÊ, POIS O PIOR CEGO É EXATAMENTE AQUELE

QUE NÃO QUER VER. AGRAVO PROVIDO. UNÂNIME. (1ª Turma Cível,

Acórdão 108898. AgI de 24/08/1998, Rel. Válter Xavier ­ TJDF)

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Por fim para rechaçar completamente a posição doutrinária que não

admite a tutela antecipada contra a Fazenda Pública, exporemos a posição do

STF:

“Fazenda Pública. Cabimento. É admissível a tutela antecipada contra a Fazenda Pública”( STF, Pleno, ADC 4, rel. Min. Sidney Sanches, m.v.,

j.. 10.9.1997)

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