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UNIVERSIDADE DE LISBOA

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti)

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti) - Imperialismo de J. A. Hobson

na Alvorada do Séc. XX

Ana Paula Lobato de Jesus

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

�2013�

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

UNIVERSIDADE DE LISBOA

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti)

Ana Paula Lobato de Jesus

Ana Paula Lobato de Jesus

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Júlio Carlos Viana Ferreira

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti) -Imperialismo de J. A. Hobson

na Alvorada do Séc. XX

Ana Paula Lobato de Jesus

Ana Paula Lobato de Jesus

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Júlio Carlos Viana Ferreira

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

�2013�

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

Imperialismo de J. A. Hobson

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Júlio Carlos Viana Ferreira

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

de Estudos Ingleses

i

O (Anti) - Imperialismo de J. A. Hobson na Alvorada do Séc. XX

Copyright © Ana Paula Lobato de Jesus, FLUL, UL 2013

A Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e a Universidade de Lisboa têm licença não

exclusiva para arquivar e tornar acessível, nomeadamente através do seu repositório

institucional, esta dissertação, no todo ou em parte, em suporte digital, para acesso mundial. A

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a arquivar e, sem alterar o conteúdo, converter a dissertação entregue, para qualquer formato

ou ficheiro, meio ou suporte, nomeadamente através da sua digitalização, para efeitos da sua

preservação e acesso.

ii

Dedicatória

Aos meus pais…

por tanto, sempre!

Aos meus filhos…

com amor e orgulho

iii

Agradecimentos

Ao meu orientador, Professor Doutor Viana Ferreira, pela imensa paciência e pelo empenho

demonstrados. A sua expressão “Nem pensar!” tantas vezes repetida, ecoará por muitos anos

na minha cabeça e dar-me-á o estímulo necessário perante as grandes tarefas. Graças ao seu

enorme conhecimento, competência e rigor, pude levar a cabo este trabalho tão árduo, que

ficava mais fácil a cada um dos nossos muitos encontros. Agradeço também a sua

compreensão pelas minhas dificuldades e obstáculos, bem como a sua constante

disponibilidade para esclarecer todas as minhas dúvidas e entender as minhas angústias.

A todos os Professores que lecionaram os seminários deste Curso de Mestrado, concorrendo

com o seu saber e entusiasmo para que eu o levasse a bom porto.

Ao meu pai, que ao longo da vida me incentivou a estudar e a saber cada vez mais,

rejubilando com os meus sucessos e ajudando-me a concretizar os meus sonhos.

Aos meus pais, filhos e nora, pela enorme compreensão pelas minhas ausências e

recolhimento, bem como pelo orgulho e interesse manifestados, incentivando-me a nunca

desistir.

Às minhas amigas Carla e Cristina por terem tornado os meus dias mais leves com o seu bom

humor e amizade quando o cansaço e a ansiedade se instalavam.

Aos meus alunos, pela curiosidade revelada durante a elaboração desta dissertação e pela

alegria demonstrada aquando da sua conclusão, também elas um enorme estímulo para o meu

trabalho.

iv

Resumo

Esta dissertação tem como propósito explorar o paradigma de imperialismo de J. A.

Hobson, tanto na essência e pressupostos como nas respetivas limitações. Por isso, tornou-se

necessário contextualizar Hobson histórica e politicamente nos finais do séc. XIX, período em

que fervilhavam as teorias darwinianas, convenientemente utilizadas como justificação para a

colonização britânica em África e para o racismo daí resultante, e em que o New Imperialism

se impôs como uma fase mais agressiva da política colonial da Grã-Bretanha. Políticos

conservadores como Disraeli e Joseph Chamberlain fomentaram no povo o orgulho pelo

império e a manifestação de sentimentos patrióticos exacerbados, conhecidos genericamente

por jingoísmo, atitudes que Hobson viria a deplorar por moldarem negativamente o carácter

britânico.

O presente estudo enquadra ainda Hobson na tradição liberal inglesa e realça o papel da

expansão do império britânico e do capital financeiro na evolução do seu pensamento radical

e anti-imperialista, bem como a influência que liberais como Cobden exerceram nos seus

ideais internacionalistas. Sublinha-se também a importância dos grupos de discussão liberais e

radicais, com os quais Hobson colaborou ativamente, e como a sua ida à África do Sul na

qualidade de repórter da guerra dos boers constituiu um ponto de viragem fundamental na sua

visão do imperialismo britânico e, em particular, das respetivas preocupações relativas ao

impacto do imperialismo a nível interno.

A investigação efetuada permite concluir que Hobson, apesar das inconsistências e

algum exagero na forma como expôs as suas teorias, foi um homem à frente do seu tempo,

com uma visão muito abrangente da realidade, que apresentou propostas muito concretas e

viáveis não apenas para a melhoria da qualidade de vida dos britânicos, mas ainda para

solucionar a problemática dos impérios.

Palavras-chave: Hobson, Imperialismo, Capitalismo, Liberalismo, Internacionalismo.

v

Abstract

This dissertation aims to explore the paradigm of imperialism of J. A. Hobson, both in its

essence, assumptions and limitations. Therefore, it was necessary to contextualize Hobson

historically and politically at the end of the19th century, when Darwinist ideas were stirring

and being suitably used as a justification for the British colonization in Africa and consequent

racism, and when New Imperialism imposed itself as a more aggressive phase of Britain's

colonial policy. Conservative politicians such as Disraeli and Joseph Chamberlain encouraged

English people to feel proud of the Empire and the expression of nationalist and patriotic

feelings, generally known as jingoism, attitudes that Hobson would deplore for shaping

British character negatively.

This study places Hobson into the British liberal tradition and emphasizes the role of the

expansion of the British Empire and the financial capital in the evolution of its radical and

anti-imperialist thought, as well as the influence that liberals like Cobden wielded in his

internationalist ideals. It also stresses the importance of liberal and radical discussion groups

in which Hobson took an active part and the way his trip to South Africa as a reporter in the

Boer War marked a turning point in his vision of British imperialism and, in particular, his

concerns regarding the impact of imperialism at home.

The undertaken research led to the conclusion that Hobson, despite inconsistencies and

some exaggeration in the way he expressed his theories, was a man ahead of his time, with a

far-reaching vision of reality and very specific and feasible proposals, not only for the

improvement of the British people, but also to solve the problems of Empires.

Key words: Hobson, Imperialism, Capitalism, Liberalism, Internationalism.

vi

Índice

1. INTRODUÇÃO ….. ...................................................................................................... .1

2. CONTEXTO SOCIOECONÓMICO E POLÍTICO ENTRE 1870 e 1914

2.1. ECONOMIA E SOCIEDADE ....................................................................................... ..5

2.2. POLÍTICA E IMPÉRIO ............................................................................................... 15

2.3. CRÍTICAS AO IMPÉRIO ............................................................................................ 32

3. J. A. HOBSON E O ESTUDO DO IMPERIALISMO

3.1. VIDA E EVOLUÇÃO IDEOLÓGICA ............................................................................ 38

3.2. IMPERIALISMO E LIBERALISMO ............................................................................. 45

3.3. O RADICALISMO SOCIAL ........................................................................................ 49

3.4. O ECONOMISTA HEREGE ....................................................................................... 52

3.5. ESTUDOS HOBSONIANOS ...................................................................................... 56

4. IMPERIALISM: A STUDY DE J. A. HOBSON

4.1. RECEÇÃO E IMPACTO DA OBRA ............................................................................. 65

4.2. RELEVÂNCIA ECONÓMICA DA OBRA ...................................................................... 66

4.3. HOBSON E A PAIXÃO IMPERIAL .............................................................................. 71

4.4. IMPERIALISMO E INTERNACIONALISMO ................................................................ 73

4.5. DA GUERRA DOS BOERS À 1ª GUERRA MUNDIAL – AS CONTRADIÇÕES DE HOBSON ......................................................................... 77

5. CONCLUSÃO ................................................................................................................... 83

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................ 87

SITIOGRAFIA .................................................................................................................. 90

vii

1

1. Introdução

Este estudo irá examinar o paradigma de imperialismo formulado por J. A. Hobson

no início do séc. XX, quer na sua substância e objetivos, quer nas suas limitações. Enquanto

tradicionalmente os académicos se têm dedicado ao impacto do império britânico no mundo,

Hobson analisou os efeitos do imperialismo sobre as instituições, a economia e a política

britânicas, e ainda a sua influência sobre a mentalidade e o caráter da nação. Tendo o séc.

XIX sido tão rico de acontecimentos históricos, sociais e económicos, optámos por limitar

este estudo ao período de entre 1870 e 1914, tanto pelas alterações geopolíticas mundiais nele

havidas, concretizadas na corrida a África, como por todo o desenvolvimento científico,

industrial e económico em que aqueles cerca de cinquenta anos foram férteis. A par da

democratização do sistema político e consequente alargamento do universo eleitoral, a

emigração para as colónias e a expansão do império nos trópicos inspiraram nessa época

inúmeros textos, artigos e discussões públicas. Foi igualmente um período determinante na

vida e produção literária de Hobson, com destaque para 1902, ano da publicação de

Imperialism, obra central no nosso trabalho de investigação.

O conceito de império transportou até aos nossos dias uma carga muito negativa,

comprovada em obras de ficção recentes em que mundos imaginários são normalmente

associados a impérios do mal, caso de trilogias célebres como Star Wars ou The Lord of the

Rings, nas quais as personagens maléficas controlam impérios e as bondosas governam

reinos. Quando o britânico J. R. R. Tolkien escreveu a famosa trilogia, o seu país possuía

ainda um vasto império, embora já numa fase decadente, sendo os heróis da obra retratados

como aventureiros e trabalhadores incansáveis em prol do bem-estar de outros,

metaforicamente considerados “construtores” do império, com uma imagem positiva e

suscetível de aprovação generalizada.

Ao longo do século XX a ideia de império perdeu muito do seu sentido heroico,

passando de uma quase total aceitação para a rejeição praticamente geral no mundo

democrático. Do mesmo modo o termo “imperialismo”, que Howe (2002: 22) distingue de

“império”, é considerado um processo, uma atitude, uma ideologia e até uma filosofia de vida,

de difícil definição, e que começou a ser amplamente usado apenas na segunda metade do séc.

XIX. O imperialismo reproduz não apenas o processo através do qual uns povos são

dominados por outros, mas ainda a natureza desse domínio, tendo os historiadores tornado o

tema bastante controverso, pelo facto de não chegarem a um consenso quanto à melhor

2

abordagem a uma análise do fenómeno e, consequentemente, considerarem que é muito difícil

estabelecer uma teoria única sobre o imperialismo, que revestiu formas diversas consoante o

espeço e o tempo em que ocorreu.

Do ponto de vista britânico, uma vez que o seu domínio colonial era considerado

civilizado e benéfico para os povos colonizados, o exemplo mais evidente de governo

despótico vinha de França, onde os apoiantes do Imperador Napoleão III eram denominados

“imperialistas”, mas muitos conseguiam também ver indícios de imperialismo britânico na

administração da Índia. Com o New Imperialism e para os conservadores liderados por

Disraeli passou a conotar-se imperialismo com patriotismo e orgulho imperial, enquanto os

radicais-liberais do final do séc. XIX recuperaram as conotações mais pejorativas de

despotismo e de patriotismo agressivo, substituindo por vezes o termo imperialism por

jingoism, pondo assim a tónica na atitude britânica em relação à posse de um império, e não

tanto no domínio, conquista ou expansão colonial em si, sendo então possível

simultaneamente opor-se ao imperialismo e aceitar o império.

O termo latino imperium, que está na origem dos conceitos de “império” e

“imperialismo,” denomina em termos gerais todo e qualquer tipo de relação estabelecida entre

um estado poderoso e outro menos poderoso. Para os Romanos imperium tinha o duplo

significado de fazer guerra e executar as leis, e o imperador era por norma um general

vitorioso. Ao longo do império o termo adquiriu nova conotação, passando a designar o

governo sobre os territórios distantes de Roma, sentido que se manteve durante séculos, vindo

na Inglaterra anglo-saxónica alguns reis a autoproclamarem-se “imperadores” e a

vangloriarem-se da sua “soberania absoluta” se não reconheciam a existência de qualquer

rival pretendente ao trono. Quando Henrique VIII de Inglaterra proclamou o seu império em

1530,teve como objetivos garantir que não prestaria qualquer vassalagem ao Papa nem

permitiria a sua interferência nos assuntos do país.

Embora no reinado da Rainha Vitória, sobretudo por volta de 1840, “império” pudesse

designar apenas as Ilhas Britânicas (Koebner & Schmidt1964: xxv), foi ela quem deu

respeitabilidade e fortaleceu o vasto império ao tornar-se imperatriz da Índia pela mão de

Disraeli. No início do século XX foi o radical liberal J. A. Hobson o primeiro a defender a

ideia de que o imperialismo britânico, mas também o europeu, estava associado à procura de

mercados e áreas de investimento do capital financeiro, tendo afirmado então que

imperialismo e capitalismo eram uma e a mesma coisa, teoria desenvolvida posteriormente

por Lénine. Atualmente falar de imperialismo é falar da política externa dos Estados Unidos,

que utiliza os mesmos métodos do colonialismo dos séculos XIX e XX, embora não

3

diretamente, mas antes através de um controlo económico, diplomático e cultural, não

hesitando porém em intervir militarmente se considerar que os seus interesses estão

ameaçados, como aconteceu no Vietname, Kuwait ou Iraque.

Apesar de o conceito de império se ter alterado ao longo da história e muitas terem

sido as formas de o tentar definir, citaremos a definição de Stephen Howe, que nos parece

muito concisa (2002: 14):

(…) an empire is a large political body which rules over territories outside

its original borders. It has a central power or core territory – whose

inhabitants usually continue to form the dominant ethnic or national group

in the entire system – and an extensive periphery of dominated areas. In

most cases the periphery has been acquired by conquest.

É nosso propósito nesta dissertação analisar o imperialismo britânico do ponto de

vista de alguém que, ao contrário de Disraeli, Chamberlain ou Kipling, homens que tanto se

orgulharam do “seu” império, o tivesse encarado como algo de intrinsecamente mau e

prejudicial ao país e, nesse sentido, Hobson surgiu-nos como a figura ideal.

Para levarmos a cabo este estudo, propomo-nos caracterizar primeiro o contexto

socioeconómico e político em que Hobson viveu e no qual desenvolveu as suas teses sobre o

imperialismo, com relevância para a revolução industrial, a expansão da alta finança e da City

como centro mundial dos negócios, e a luta política entre conservadores e liberais, liderados

respetivamente por Disraeli e Gladston. Discordando embora da importância e da

administração do império bem como da expansão colonial, liberais e conservadores

praticaram o New Imperialism que conduziu à partilha de África e à guerra dos boers, que

acabou por despertar algumas consciências e, no caso de Hobson, muito contribuiu para a

alteração da sua perspetiva sobre o império. Em segundo lugar, abordaremos a vida, obra e

evolução ideológica de Hobson, realçando o papel das sociedades éticas nas quais se reuniam

os grupos de intelectuais que nos finais do séc. XIX refletiam sobre a sociedade da época,

exigindo reformas sociais, e que tiveram um papel fundamental no radicalismo das suas

visões sobre o império e na sua relação com o imperialismo liberal. Dedicaremos ainda parte

importante desta dissertação ao estudo de Imperialism, obra na qual Hobson reuniu os textos

que escreveu enquanto correspondente na guerra dos boers, referindo a forma como a obra foi

recebida pela sociedade e pelos críticos, e analisando pormenorizadamente o seu conteúdo e a

questão da sua atualidade. Na parte final do trabalho e porque ele abarca ainda um período de

cerca de uma década após a publicação de Imperialism, destacaremos a evolução de Hobson e

4

as ligeiras alterações efetuadas na 2ª edição da obra, publicada em 1905, mas An Economic

Interpretation of Investment, de 1911, merecer-nos-á particular atenção, visto que nele

Hobson contradisse algumas das suas anteriores posições sobre o imperialismo, certamente

fruto de alterações políticas na Grã-Bretanha e ainda da natural evolução ideológica de um

pensador tão fecundo.

Dado que Hobson publicou cinquenta e duas obras e centenas de artigos e cartas,

para além de Imperialism, destacaremos também a sua autobiografia, Confessions of an

economic heretic, fundamental para perceber a sua evolução como pensador político e

económico, bem como The Psychology of Jingoism, no qual desmonta e analisa a influência

que o império teve no carácter dos britânicos, muito conseguida através da cooperação de uma

imprensa “amiga” dos que defendiam a manutenção e exploração económica das colónias,

inflamando as emoções e o fervor patriótico do povo e levando-o ao rubro com os sucessos

dos soldados do império.

5

2. Contexto Socioeconómico e Político entre 1870 e 1914

2. 1. Economia e Sociedade

A história da Grã - Bretanha do séc. XIX ficou marcada por duas realidades que

contribuíram de forma decisiva para uma modificação profunda da estrutura económica e

social do país e para o seu desenvolvimento interno, bem como para um claro domínio

externo: o Império e a sua expansão, sobretudo a partir da década de 1870, e a Revolução

Industrial, ambos numa relação de dependência, na qual a industrialização usou o Império

como forma de encontrar mercados para os novos produtos manufacturados em série e o

Império utilizou o dinheiro acumulado pelos magnatas da indústria para se expandir e

autojustificar. A Revolução Industrial levou a Grã- Bretanha a alterar o seu modo de vida

tradicional e a adaptar-se ao progresso trazido pela industrialização que, para o bem e para o

mal, transformou decisivamente a sociedade, contribuindo de igual forma para estimular o

debate intelectual e político.

Hobsbawm (1999: 12) escreveu: “the Industrial Revolution is not merely an

acceleration of economic growth, but an acceleration of growth because of and through,

economic and social transformation.” O aparecimento de novas máquinas, sobretudo têxteis,

contribuiu para a mudança de hábitos laborais, com implicações na vida económica e social

do país e da população. A partir dos finais do século XVIII até à segunda metade do XIX,

todo o sistema económico e social britânico se transformou, sobretudo nos setores industrial,

comercial e financeiro. Do mesmo modo, a tecnologia utilizada, toda a organização e práticas

laborais e novos modos de produção, bem como o crescimento demográfico e a deslocação de

parte da população das áreas rurais e do setor agrícola para as cidades, muitas delas

transformadas em grandes centros industriais, foram alterações evidentes e de grande

relevância social na época.

A indústria têxtil, sobretudo a do algodão, sofreu enorme expansão e, a par de fábricas

que empregavam centenas de trabalhadores em instalações pouco adequadas, proliferavam

muitas outras de menores dimensões, com menos trabalhadores, e uma produção artesanal,

em pequena escala, que apenas satisfazia o mercado interno. Tratava-se de pequenas

indústrias familiares, que controlavam o comércio local, instaladas em ruas escondidas e

operando de forma quase clandestina, que recorriam às poupanças familiares, mais do que aos

bancos, para se capitalizarem e para fazerem novos investimentos. (Hobsbawm, 1999: 50)

Durante décadas os produtos britânicos, manufacturados em série e de forma

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competitiva, dominaram o comércio mundial. O enorme crescimento da produção teve como

consequência uma queda acentuada dos preços e um aumento da procura interna e externa que

estimularam de forma decisiva a economia vitoriana, levando a que nenhum outro país no

mundo tivesse possibilidades de competir com a Grã- Bretanha, tornando-se esta a oficina do

mundo.

Mais determinante do que os têxteis para o desenvolvimento económico foi, sem

dúvida, a indústria pesada. A este propósito escreveu Hobsbawm (1999: 87): “Fortunately a

new phase of industrialization was about to take over, and to provide a much firmer

foundation for economic growth: that based on capital goods industries, on coal, iron and

steel.” A produção de energia a vapor, a construção de navios mais modernos e, sobretudo, do

caminho-de-ferro, impulsionaram de forma decisiva as comunicações e as deslocações de

pessoas e cargas. Segundo Anthony Wood (2002: 175) entre 1850 e 1870 construíram-se

62.700 Km de linha férrea e, em 1869, exportaram-se 300.000 toneladas de ferro para os

EUA, para a construção do caminho-de-ferro naquele país, correspondendo a um terço das

exportações anuais daquele minério. Na década de 70 a produção de aço atingiu as 486.000

toneladas por ano, passando a utilizar-se mais do que o ferro, por ser menos quebradiço.

A construção naval sofreu, de igual modo, enorme expansão neste período.

Construíram-se navios de cinco toneladas e desenvolveram-se caldeiras de aço e motores de

expansão tripla, para um consumo mais económico de combustível e uma navegabilidade

mais rápida do a que as velas permitiam. A abertura do Canal do Suez, em 1869, reduziu em

muito a duração das viagens para oriente, contribuindo para o aumento das exportações dos

bens que se produziam em grande escala. Apesar disso, segundo Anthony Wood, em 1875 as

importações suplantaram as exportações em 60 milhões de libras: “Thus the workshop of the

world never entirely paid its way.” (2002: 177)

Com o centro da atividade económica a transferir-se da agricultura para a indústria e

para o comércio, verificaram-se alterações significativas a nível social, com consequências em

todas as classes. A velha aristocracia rural continuou com peso institucional na sociedade,

mas com o declínio da agricultura por volta de 1870, perdeu influência, prestígio e poder

económico. Cain e Hopkins (2002: 115) escreveram a este propósito:

The landed aristocracy could mitigate their economic difficulties after 1870

only by reaching an accommodation with other forms of wealth. (…) And,

insofar as their political and social power was on the wane, their successors

were gentlemen from the service sector or from finance rather than

7

manufacturers from the industrial provinces.

As famílias proprietárias de estaleiros navais, empresas de navegação, campos de

minas e bancos contavam-se entre as mais abastadas do país mas, ao longo do século, viram-

se forçadas a formar sociedades, que elegiam órgãos diretivos para gerir as empresas. A classe

média foi, sem dúvida, a que mais cresceu e prosperou naquela época. Aumentou, de forma

significativa, o número de profissionais com um elevado rendimento, como advogados,

contabilistas, engenheiros, arquitetos ou médicos. Abaixo destes na escala social, surgiam

empregados bancários e de seguros, prósperos donos de lojas e de pequenas fábricas. As

mulheres passaram também a fazer parte da força de trabalho e, de acordo com Wood (1982:

182), havia em 1871 mais de 1.200.000 de empregadas domésticas.

Contudo, a nova riqueza nacional teve pouco impacto nas classes trabalhadoras. Em

1867 um trabalhador especializado ganhava £ 3 por semana e os aumentos salariais eram

sempre diminutos. Apesar de as condições de trabalho irem gradualmente melhorando, graças

às leis sucessivas que o Parlamento aprovava com esse objetivo, ainda assim, de acordo com

Wood (1982: 185), em 1875 morreram cerca de 800 trabalhadores do caminho-de-ferro e

anualmente morriam mais de mil mineiros, devido à dureza e ao perigo das suas profissões. A

análise que Rubinstein (1998: 296) faz desta classe é crua:

Apart from being crime-ridden (…) and full of disease, the East End and

other deprived areas were inhabited by tens of thousands of people who

spoke English with a different accent and were, to the wealthy, often

physically repellent. (…) Workers indeed often wore the same clothes for

months on end; (…) Drink and drunken behaviour, signs of domestic

violence, foul language and shouting, would also be unavoidable features of

any venture into the slums.

Até ao início da Primeira Guerra Mundial cerca de 10% da população londrina,

sobretudo desempregados ou operários indiferenciados, vivia na mais completa miséria, e no

final do séc. XIX 30% da população britânica vivia em pobreza crónica, segundo Rubinstein

(1998: 294).

No entanto, face à vasta oferta de produtos a preços mais baixos, as classes média e

trabalhadora puderam aceder ao consumo de tecidos, calçado, artigos para o lar, como

porcelanas, espelhos, relógios, mobiliário, e ainda diversos acessórios para vestuário.

Passaram, de igual modo, a comprar fruta, legumes, carne, leite e muitos outros alimentos,

8

que agora já não produziam. Com a vinda para as cidades à procura de trabalho e de melhores

condições de vida, muita gente que vivia da agricultura saiu das terras que antes cultivava,

perdeu os hábitos da vida rural e adaptou-se, como pode, à vida urbana. Foi, então, visível o

aumento do número de lojas, o uso de montras, o aparecimento de grandes armazéns a partir

de 1880, com a consequente utilização de publicidade em cartazes e nos jornais.

No período entre 1880 e 1900 o progresso social foi notório. Como afirmou Richard

Shannon(1976: 202): “Evidence of increasing well-being was indeed impressive.” O nível de

vida das classes trabalhadoras melhorou, muito devido aos aumentos de salários e à descida

dos preços dos bens de consumo. Ainda segundo Shannon (1976: 202): “Probably the gain in

real wages for the average worker in the period 1860-1900 was about 60%.” As condições

higiénicas melhoraram e as doenças contagiosas deixaram de ser uma ameaça social

constante. Nesse período muitos lares passaram a ter eletricidade, inventou-se o

cinematógrafo e massificou-se a cultura, até então privilégio de gente abastada e confinada a

salões privados. A taxa de mortalidade baixou, bem como a de natalidade, sobretudo no seio

das classes altas, o que alarmou alguns setores da sociedade, que encararam esse facto como

um sinal de decadência nacional, sugerindo que os filhos das classes baixas, menos capazes,

acabariam por ultrapassar os das classes superiores, considerados mais competentes para gerir

o país.

No entanto, e paradoxalmente, enquanto a sociedade progredia a economia

desacelerava. A partir de 1870, com o desenvolvimento da Alemanha e dos Estados Unidos,

que possuíam reservas abundantes e mais baratas de energia e matérias-primas, setores como

a agricultura, os têxteis, o ferro, o aço e alguns bens de consumo entraram numa fase difícil.

O caminho-de-ferro chegava agora aos enormes silos da Rússia e a Europa era inundada pelos

cereais oriundos dos Estados Unidos. Para Hobsbawm (1999: 164-166) a tendência

continuada de redução de preços internacionais, por força das novas condições de

concorrência, exigiam que a economia britânica se reestruturasse. Para entrarem no jogo do

mercado, os industriais britânicos teriam de aumentar a produtividade e baixar os preços, o

que implicava a existência de grandes unidades fabris, ou aceder ao crédito fácil para

financiarem o desenvolvimento e a comercialização dos bens de consumo. Porém, o carácter

obsoleto da indústria britânica e alguma inércia do setor financeiro conduziram à perda de

competitividade da economia, face a atitudes mais arrojadas por parte dos Estados Unidos e

da Alemanha. Além disso, as políticas liberais da época impediam a intervenção estatal e o

protecionismo económico à agricultura e à indústria. Consequentemente, a economia britânica

sofreu, no último quartel do séc. XIX, uma recessão que ficou registada na História como

9

Great Depression, caracterizada por uma queda acentuada nos preços dos produtos agrícolas,

devido às importações de outros países e ainda a períodos de más colheitas, que conduziram

ao abandono das quintas por parte de muitos agricultores, que não retiravam qualquer

proveito da sua atividade. Da mesma forma, a indústria e o comércio sofreram quedas

acentuadas nas taxas de crescimento, nos lucros e no investimento estrangeiro. Hobsbawm

(1988: 70) sintetizou desta forma os mais de vinte anos de recessão económica mundial: “A

depressão da década de 1870 inaugurou uma nova era histórica, política e económica. (…)

Essa depressão minou ou destruiu as bases do liberalismo de meados do século XIX, que

parecera tão firmemente implantado.”

Para além dos motivos já referidos, pode também apontar-se o avanço tecnológico

como causa da queda dos preços de produção e distribuição mas, na época, as classes mais

altas recusavam qualquer ligação ao comércio e à tecnologia; no ensino destacava-se a

ausência de formação científica, se comparado com o de países como a França, Áustria,

Prússia, Bélgica ou Suíça, que ministravam cursos de gestão aos industriais, ou da Alemanha,

com o dobro dos estudantes universitários. (Wood, 1982: 279)

Apesar da industrialização e consequente modernização do país, a aristocracia rural

continuou a dominar os centros de decisão e o governo. Os interesses financeiros dos que

viviam de rendimentos, mais do que os dos novos empresários industriais, guiavam a política

nacional, muitas vezes às custas da indústria. Mesmo os magnatas industriais aspiravam ainda

a um estilo de vida rural. As segundas e terceiras gerações das dinastias industriais estudavam

em colégios privados e buscavam carreiras na lei ou na administração imperial, mais do que

nos negócios. Atitudes pouco entusiásticas em relação ao espírito empreendedor industrial

foram os calcanhares de Aquiles do sucesso britânico. Hobsbawn (1999: 166) apontou

algumas das falhas do sistema industrial britânico: incapacidade de modernização por parte

dos empresários, que não adotaram métodos mais avançados, persistindo em padrões

obsoletos e evitando investir os lucros em novas tecnologias. A desaceleração do crescimento

da economia no final da era vitoriana e a crescente competição dos concorrentes estrangeiros,

sobretudo a Alemanha e os Estados Unidos, podem ser considerados como o preço inevitável

a pagar pelo uso pioneiro de novas tecnologias, nunca antes experimentadas. As indústrias

rivais dos outros países aprenderam com o exemplo e os erros britânicos e receberam,

provavelmente, maior ajuda financeira e proteção por parte dos seus estados. A política de

seguir a liderança britânica tornou a sua industrialização mais vigorosa e rápida, para

conseguirem acompanhar o passo, já avançado, do rival. Segundo Porter (1984: 119-20):

The facts of the matter were simple and ominous. Economically Britain was

10

falling back in the world in the 1890s, as she had in the 1880s. (...)Year by

year the gap narrowed between Britain and her industrial competitors. In

foreign trade Britain was having to struggle to maintain even a moderate

rate of growth, while her rivals bounded ahead on theirs.

Na última década do séc. XIX a Grã-Bretanha era ainda uma das potências mais

industrializadas, porém, suplantada já pelos seus dois maiores rivais na produção de aço. Para

além disso, era um país com poucos recursos naturais para além do carvão, a sua indústria

têxtil dependia muito da importação de algodão e, dado o declínio agrícola, já referido

anteriormente, importava, nessa altura, cerca de metade dos bens alimentares e outros,

necessários a uma população que aumentava dia a dia. A solução era recorrer aos mercados

do Império, mais desprotegidos e de fácil exploração. A Grã- Bretanha tornara-se, não uma

economia competitiva, mas antes parasitária, nas palavras de Hobsbawm (1999: 170): “living

off the remains of world monopoly, the underdeveloped world, her past accumulations of

wealth and the advance of her rivals.” Dotada de bancos com muito capital acumulado, que

podia emprestar aos outros países, de boas seguradoras e de serviços financeiros de

excelência, para além de uma boa frota mercante, a economia britânica deslocou-se, nos finais

do século XIX, da indústria para o comércio e finanças, tornando-se então a City de Londres o

centro financeiro mundial. Banca, seguros e bolsa geraram fortunas bem maiores do que as

conseguidas na indústria, sendo, na época, os negócios da City conduzidos sob os princípios

do que Cain e Hopkins chamam de gentlemanly capitalism, cujos ideais, mais próximos dos

da aristocracia rural do que dos dos novos-ricos da indústria, estavam assentes numa rede de

contactos pessoais, na confiança mútua e em códigos de honra mais usuais nas zonas rurais ou

nos clubes privados da capital.

As atividades financeiras da City originaram elevados rendimentos, não só às

empresas já estabelecidas, mas ainda a pequenos negócios familiares, e as suas elites,

constituídas maioritariamente por famílias de origem judaica, para além de prestígio, viram

abrir-se-lhes as portas da política e do poder mais facilmente do que aos empresários

industriais. Da mesma forma banqueiros, financeiros e gente ligada ao comércio ficaram mais

reguardados na luta de classes, sendo os industriais forçados a sofrer a hostilidade dos

conflitos laborais que foram surgindo ao longo do século XIX, o que, de certa forma, minou a

autoridade que a riqueza adquirida, de contrário, lhes daria. Viam-se invariavelmente

encurralados entre a cultura cavalheiresca que inundou o mundo capitalista, que

simultaneamente desprezava a tecnologia industrial geradora da sua riqueza, e o sindicalismo

11

radical, que exaltava a produção mas condenava o lucro.

Cain e Hopkins afirmaram (2002: 47): “The Imperial mission was the export version

of the gentlemanly order. In some respects, indeed, the gentlemanly code appeared in bolder

format abroad in order to counter the lure of an alien environment”. O império foi também o

solo fértil para a cultura cavalheiresca gerar o bem, o progresso e os ideais de honra e de

cumprimento do dever.

Os financeiros da City, ao invés de apoiarem a indústria, intensificaram a exportação

dos capitais excedentários, motivados pelos lucros obtidos, levando a uma política

expansionista muito agressiva por parte da Grã-Bretanha que inaugurou uma nova fase da sua

política colonial, conhecida por New Imperialism, caracterizada pela divisão do mundo em

zonas preferenciais de atuação dos capitais nacionais. Sentindo-se ameaçada pelo crescimento

económico e pela crescente concorrência de outras potências europeias, sobretudo França e

Alemanha, para além dos Estados Unidos, que a destronaram do lugar de única potência

industrial, levando ainda a uma redução drástica do seu comércio mundial, a Grã – Bretanha

viu-se forçada a expandir o império formal principalmente em África, Oriente e zona do

Pacífico na defesa dos seus interesses económicos (James 1998: 201). Os políticos liberais,

nomeadamente Gladstone, habitualmente contrários a mais anexações, foram forçados a

reconhecer a importância para o país de esferas de influência ciosamente vigiadas, tal como

faziam as outras potências coloniais. Um dos maiores defensores do New Imperialism foi

Joseph Chamberlain, empresário de sucesso, mayor de Birmingham e político hábil, cujas

funções de Estado incluíram a de ministro de um governo liberal e posteriormente a de

Secretário Colonial de um governo conservador. Chamberlain acreditava profundamente na

unidade do Império, na figura da Rainha Vitória como símbolo máximo dessa unidade e

também na missão civilizadora da raça anglo-saxónica, cujos valores como patriotismo, fair

play, autodisciplina, altruísmo, coragem e ousadia (James 1998: 205-6) que Chamberlain

considerava vitais para o desenvolvimento e felicidade dos povos mais atrasados, eram

transmitidos nas escolas às futuras gerações de administradores do Império. Num discurso

proferido em Londres em 1987, ano do jubileu da Rainha, Chamberlain afirmou (Boehmer

1998: 213):

We feel now that our rule over these territories can only be justified if we

can show that it adds to the happiness and prosperity of the people, and I

maintain that our rule does, and has, brought security and peace to countries

that never knew these blessings before. In carrying out this work of

12

civilization we are fulfilling what I believe to be our national mission, and

we are finding scope for the exercise of the faculties and qualities which

have made us a great governing race.

A primeira colónia britânica no continente africano foi Cape Colony, na Áfirca do Sul,

adquirida em 1815 após o Congresso de Viena, mas a partilha de África (Scramble for

Africa), que caracterizou em grande parte o New Imperialism, começou para os britânicos em

1882 com a ocupação do Egipto, país anteriormente ocupado pela França durante as

campanhas napoleónicas e que estava, desde então, sob influência francesa em vários

domínios. M. E. Chamberlain (1999: 29) escreveu:

The Egyptian educational system, which was more advanced than that of

many parts of Europe, was modelled on the French system and Egyptian law

was codified according to Napoleonic practice. Some Egyptians became

interested in French philosophy and political thought. (…) At first those

Egyptians who wanted to change their country were by no means hostile to

European influence. On the contrary they saw Europeans as allies against

obscurantist elements in their own society.

Foi um francês, Ferdinand de Lesseps, a levar a cabo a construção do Canal do Suez,

inaugurado em 1869, que passou a ligar o Mar Vermelho ao Mediterrâneo, reduzindo para

metade o tempo de viagem para a Índia. Apesar da oposição inicial, por temerem que aquela

nova passagem fosse objeto da cobiça e de controlo por parte de outros países, o Canal acabou

por ser, para os britânicos, de vital importância comercial e militar, dada a sua presença na

Índia. Em 1875, o então primeiro-ministro Disraeli, comprou cerca de metade das ações da

Companhia do Canal do Suez, para conseguir um certo controlo sobre aquela importante via

de comunicação, mas a situação política e económica do Egito deteriorou-se muito no início

dos anos 80 e os interesses britânicos no país foram postos em risco. Em 1882 oitenta por

cento do tráfego marítimo no Canal era britânico (Chamberlain 1999: 31) e, temendo que o

Canal passasse para controlo estrangeiro, o primeiro-ministro Gladstone enviou ao Egito uma

expedição militar que em três dias derrotou o exército local, passando o Canal do Suez a ficar

sob controlo britânico e assumindo a Grã – Bretanha, quase em seguida, a administração das

finanças e do governo egípcios (Hill 1977: 137). Esta ocupação foi considerada desastrosa

para o governo britânico, muito criticada na Grã-Bretanha e causadora de atritos com a

França, com a qual houvera, até então, um bom entendimento. Ainda segundo Chamberlain

13

(1999: 39):

It has been contended by some historians, and strenuously denied by others,

that the Anglo-French estrangement over Egypt had repercussions all over

Africa, that indeed was the trigger that began an unexpected and unintended

chain reaction which resulted in the partition of tropical Africa among the

European great powers.

A partir de 1880 os britânicos passaram a um controlo mais formal de áreas do sul e

oeste do continente africano, sobretudo para salvaguardar as rotas comerciais do Oceano

Índico e defender interesses nacionais, postos em causa pela competição de outras poderes

europeus, como foi referido anteriormente. A posição dominante da Grã-Bretanha como

potência industrial e a prosperidade do país foram tão seriamente ameaçadas, que nem o

governo nem a população se sentiram desconfortáveis perante novas anexações, que mais não

foram que uma reação de pânico a uma situação de risco económico para o país.

(Chamberlain 1999: 57)

Entre 1878 e 1914 as potências coloniais europeias, Grã-Bretanha, Portugal, França,

Alemanha, Itália e Bélgica, repartiam entre si cerca de um sexto do mundo, tendo o Império

Britânico ganho mais 12,173.000 de quilómetros quadrados de extensão nesse processo. A

explicação mais convencional era a económica: o comércio seguia a bandeira. Porém, com o

decorrer do tempo, verificou-se que esse não era um motivo válido para explicar o

imperialismo expansionista.

Lawrence James (1998: 215) escreveu:

Britain entered the twentieth century as the world’s greatest imperial power

at least in terms of territory and population. The fact was widely trumpeted

by politicians and journalists, along with platitudes about dispensing

civilization to those who lacked it. There was also a steady stream of

reassuring propaganda which emphasized national greatness and the innate

strengths of the Anglo-Saxon character.

O séc. XIX terminou com a morte da Rainha Vitória, após um longo e impressionante

reinado, passando o trono ao filho, Eduardo VII, que reinou somente durante nove anos, não

tendo tido o tempo necessário para cunhar uma época, como a mãe conseguira. O historiador

G.M. Trevelyan (1975: 408) resumiu desta forma os sessenta e quatro anos de época

14

vitoriana:

(…) in those sixty years past, millions had come out of the house of

bondage and misery into which the unregulated advent of the Industrial

Revolution had plunged its victims. In the same years our people had spread

far over the face of the globe, carrying with them, on the whole, justice,

civilization, and prosperity where they went. Great men of genius in

literature, science, and thought had adorned an age when civilization

seemed for a while to be strong both in quantity and in quality, and had

helped to make common during her reign certain standards of intellectual

seriousness and freedom.

Apesar da imensidão de acontecimentos que tiveram lugar durante o séc. XIX,

verificou-se, ainda assim, uma continuidade ao nível da estrutura das instituições e do

governo. Rubinstein (1998: 334) afirmou: “The monarchy, the two Houses of Parliament, the

Cabinet government, the Established Church, the titled aristocracy, the common law, and

many fundamental British institutions appeared not to have changed in any formal sense

during the 19th century.” No entanto, as mudanças sociais e políticas foram evidentes,

sobretudo no que diz respeito aos direitos das classes trabalhadoras. O movimento sindical

impôs-se e, a partir de 1907 greves gigantescas tiveram lugar em todo o país, devido ao

declínio económico já anteriormente analisado. O extremismo e a violência tomaram conta do

país e atingiram todas as classes. Apesar disso, durante o breve reinado de Eduardo VII a

sociedade refinou-se, muito ao gosto do rei que, ao contrário da mãe, era mundano e

apreciava viajar, tendo já ao seu dispor os recursos tecnológicos necessários. Quando morreu,

em 1910, era um rei popular, em grande parte devido ao seu apoio às artes, mas o país

enfrentava já alguma decadência. Jeremy Paxman resume assim a situação do país no reinado

de Eduardo VII (2012: 217):

The Boer War had shown how the mightiest power on earth could be

brought low by a bunch of farmers, and recruitment for the army had

demonstrated the appalling physical condition of many of the slum-dwellers

who were supposed to defend the flag. The nation could no longer feed

itself, and the Germans were expanding their naval fleet. The upper classes

were infiltrated by arrivistes who cared more for money than for duty:

Trades unions were on the rise and industrial productivity was dropping.

15

O Império agitava-se já em várias frentes e muito rapidamente se viu envolvido em

nova guerra, a primeira e uma das maiores do séc. XX, que marcou definitivamente a entrada

no novo século. De entre os vários fatores que originaram o conflito, contam-se também os

económicos. Como Wood (1982: 415) afirmou:

Russia’s desire to prevent the development of a German economic empire in

the Balkans, the growing significance of the Middle East, the clash between

British and German business interests – all these were factors that had a

considerable bearing on the political scene (…).

2. 2. Política e Império

Se, como foi referiu anteriormente, a Revolução Industrial contribuiu de forma

decisiva para o progresso económico e social da Grã-Bretanha e para o reforço da sua posição

no mundo, a questão imperial esteve permanentemente no centro do debate político, quer no

Parlamento e na imprensa, quer em tertúlias liberais, em que grupos de intelectuais e políticos

analisavam à exaustão a legitimidade e o futuro do Império, tanto em termos políticos como

económicos.

O pensamento liberal invadira a Grã-Bretanha nos anos 30 do séc. XIX e dominara

toda a época vitoriana, englobando ideias, valores e conceitos que se disseminaram por uma

realidade política e social complexa e em constante evolução. A independência das colónias

americanas e a Revolução Francesa no final do séc. XVIII, e o processo de reformas sociais e

económicas na Grã- Bretanha, iniciado com a Lei de Reforma de 1832, a revogação das leis

dos cereais ou a adoção do comércio livre na década de 40 contribuíram para moldar o

pensamento político do século, sofrendo adaptações, reinvenções e incorporando outras

doutrinas, incluindo as teorias evolucionistas e económicas mais revolucionárias.

Para os liberais a sociedade era constituída por indivíduos com identidades e interesses

autónomos, que procuravam formar grupos ou organizações com o fim de progredirem nos

seus propósitos políticos e sociais. A base do liberalismo era o impulso reformista, dirigido

sobretudo contra a concentração e abuso do poder político. Michael Freeden escreveu a este

propósito (1986: 5):

16

The concern of liberals with problems of social reform was of course part of

a general movement of a progressive thought that had existed as an

undercurrent in the first half of the nineteenth century and gradually swelled

to become a dominant factor in social thought towards the end of the

Victorian era.

No centro das suas preocupações estavam problemas sociais como a pobreza, o

desemprego ou a doença, que constituíram verdadeiros desafios para os políticos da época e

para os quais os intelectuais liberais procuraram dar respostas, passando a encarar as questões

sociais do ponto de vista da filosofia, da religião, da ciência e do pensamento político e social

(Freeden1986: 6).

Cobden, Mill, Maine, Spencer, Hobson e Hobhouse foram pensadores e ativistas

liberais notáveis que influenciaram, de forma marcante, a cena intelectual e política do séc.

XIX. O Império era de uma forma geral apoiado, mas a diversidade de ideias expressas e

argumentos utilizados conferia ao debate imperial uma multiplicidade de discursos à medida

da sua dimensão. No final do século, no auge da expansão colonial, a discussão centrava-se na

natureza e objetivos do Império, abandonando as justificações éticas que haviam dominado o

discurso imperial do início do século, substituídas agora por um debate sociológico e

económico. Peter Cain, num ensaio incluído na coletânea Victorian Visions of Global Order

(Bell: 215) afirma:

Within the multiform and sometimes contradictory web of ideas labelled

‘liberalism’ in Victorian England there was an important strand of thinking

best described as popular radicalism. It emerged in the eighteenth century,

finding its first full expression in the work of Paine, and ended in the early

twentieth century, at which point it was subsumed in what passed in Britain

for Marxism.

Em 1870 este radicalismo estava, em grande parte, contido num Partido Liberal

emergente, uma força política que reunia comerciantes, pequenos industriais e sindicalistas

radicais e que teve como uma das principais figuras W. E. Gladstone, eleito primeiro-ministro

por quatro vezes. No lado conservador esteve o igualmente distinto Benjamin Disraeli, sendo

ambos os protagonistas centrais da cena política dos finais do século XIX, e tendo colocado o

Império no topo do debate político e social da época.

O Império Britânico que existia e prosperava há quase três séculos ocupava agora um

17

quinto do globo e governava, a partir de Londres, cerca de 400 milhões de súbditos de etnias e

credos diferentes, para além da Índia, com mais de trezentos milhões de pessoas. O controlo

exercido sobre esta enorme dispersão de territórios e povos era bastante flexível: uma certa

prepotência nuns locais e a colaboração voluntária dos governantes locais com a coroa

britânica noutros. (Johnson, 2003: 2)

O termo ‘império’ teve origem na palavra latina “imperium”, conotada com os

conceitos de comando e poder e significava a autoridade exercida por um monarca

habitualmente denominado imperador mas, para os britânicos dos finais do séc. XIX,

designava os territórios possuídos por um estado para além das suas fronteiras nacionais, cujo

governante poderia não ser chamado de “imperador” (Porter 1984: 1). É também este autor

que afirma (1994: 2):

Fundamentally the empire – true to its derivation – was a manifestation of

British power and influence, and whatever strange individual shapes they

took the colonies all shared this common characteristic, that they owed their

origins in some way to British economic, political and cultural

predominance in the world.

Para além dos territórios oficiais pertencentes e administrados pela coroa britânica,

havia o chamado “império informal”, fruto da expansão económica e do dinamismo

vitorianos. O sistema industrial precisava de cada vez mais matérias-primas, logo de locais

onde as adquirir, e ao transformá-las em bens transacionáveis, exigia cada vez mais mercados

para os vender. É ainda Porter quem afirma (1984: 4): “The way Britain prospered was by

manufacturing articles for sale abroad, which her customers paid for in raw materials and

food. (…) The ties of dependency therefore between Britain and her trading partners were

mutual. (…) ”

Essa forma de controlo informal era porventura mais favorável aos britânicos, já que

podiam exercer influência económica, sem custos políticos. Em 1953 John Gallagher e

Ronald Robinson escreveram o artigo “The Imperialism of Free Trade”, no qual chamaram a

atenção e, em simultâneo, criticaram a posição britânica nesta questão. Para eles a expansão

foi uma espécie de imperialismo barato, que se deu através do comércio. Na página 13 1escreveram:

British policy followed the principle of extending control informally if

1 Edição online

18

possible and formally if necessary. To label one method ‘anti-imperialist’

and the other ‘imperialist, is to ignore the fact that whatever the method

British interests were steadily safeguarded and extended.

A expansão do Império deu-se sobretudo devido a fatores económicos: a necessidade

de defender no estrangeiro os interesses económicos e financeiros britânicos, abrir os

mercados à exportação dos bens produzidos no país, bem como ainda adquirir, nessas

paragens, matéria-prima mais acessível. Sobre estas questões escreveu Hill (1977: 138):

What was the general economic importance of these new lands to Britain?

Most obviously they offered new markets for British manufacturers –

markets not only for consumers’ goods like cotton clothes, hardware and

metal goods, pottery and the like, but also for the heavy equipment (…)

rails, steamships, mining machinery and large –scale tools of various kinds.

New supplies of well-known materials, (…)

Os novos territórios ofereciam ainda a oportunidade de novos investimentos, outro

fator relevante para a economia britânica, muito embora a maior parte do capital investido em

negócios pelos empresários britânicos fosse para a Índia e a Austrália e não para as colónias

africanas. (Hill 1977: 139)

Outra questão crucial foi a emergência de novas potências, que rivalizavam com a

supremacia económica e imperial britânicas, casos da Alemanha, dos Estados Unidos e

também da França. Ao ameaçarem os interesses nacionais, aqueles países desenvolveram na

Grã- Bretanha um sentimento de insegurança, levando-a à ânsia pela defesa do Império. De

acordo com Porter (1984: 74): “In the last quarter of the nineteenth century British interests in

the world seemed to be threatened more and more, and people in Britain were becoming more

aware of this and more vigilant.”

A partilha da África, levada a cabo por diversos Estados europeus, esteve

precisamente relacionada com a necessidade de equilibrar o seu poder no mundo e, no caso

britânico, também a de impor ordem em zonas onde uma emergente instabilidade social

punha em risco empresas britânicas lucrativas.

O Império sobreviveu e prosperou durante três séculos graças à proteção da armada

mais poderosa do mundo, ao mérito de uma vasta marinha mercante, que transportava da Grã-

Bretanha para todo o globo, e vice-versa, os bens transacionáveis, e a um sistema financeiro

de sucesso, sediado na City de Londres. A sua administração esteve entregue a milhares de

19

funcionários civis, muitas vezes recrutados nas próprias colónias, e a homens de negócios

dinâmicos que, através de uma boa rede de transportes, com relevo para o caminho-de-ferro,

providenciavam a distribuição dos produtos manufacturados, com apoio dos bancos,

companhias de seguros e de navegação. O Império comunicava em inglês através do

telégrafo, correio e telefone. O governo controlava e o exército vigiava, com o apoio de uma

boa parte do povo britânico. (Johnson 2003: 5)

Como foi referido anteriormente, os dois políticos mais proeminentes da última fase

da época vitoriana foram Gladstone e Disraeli, ambos notáveis primeiros-ministros, de áreas

políticas diferentes e com visões completamente distintas da questão imperial. O primeiro,

com uma carreira longa ao serviço do Estado, iniciou funções governativas em 1830 num

governo conservador para, trinta anos mais tarde, se tornar líder do Partido Liberal, posição

que manteve durante um quarto de século e que lhe permitiu ser primeiro-ministro quatro

vezes, tendo angariado muito respeito pela forma moralista como abordou a política e pela

profunda fé cristã que sempre orientou a sua vida (Goodlad 2000: 14). Antes de aderir ao

Partido Liberal, Gladstone comungava das posições pacifistas e internacionalistas de Cobden.

Considerava que os gastos em armamento eram um sorvedouro de impostos e um estímulo

para uma política externa agressiva (Goodlad 2000: 20). Imperialista relutante, acreditava que

a grandiosidade britânica residia no comércio, na indústria e nas instituições parlamentares e

não no Império, que aceitava apenas em termos económicos. Demonstrava pouco entusiasmo

pela expansão colonial e acreditava na autodeterminação de todos os povos. Num discurso

proferido em Edimburgo em 1879, afirmou (Goodlad 2000: 25):

Whatever we may say amidst the clash of arms and amidst the din of

preparation for warfare in time of peace – amidst all this yet there is going

on a profound mysterious movement, that whether we will or not, is

bringing the nations of the civilized world, as well as the uncivillised,

morally as well as physically nearer to one another, and making them more

and more responsible before God for one another’s welfare.

No entanto, foi obrigado a enviar tropas para zonas do Império fundamentais para os

interesses britânicos, caso do Canal do Suez. O imperialismo protecionista levado a cabo pelo

liberal Gladstone contrastava com as suas políticas governamentais de redução de despesas

(retrenchment).

Uma das questões mais polémicas entre os liberais, que chegou mesmo a dividir o partido

em várias fações, foi a do governo autónomo irlandês, que Gladstone sempre defendeu e tudo

20

fez para conseguir. A Irlanda, única colónia europeia, há séculos oprimida e humilhada pelos

britânicos, clamava por mudanças que lhe devolvessem a dignidade perdida. Apesar de

algumas reformas levadas a cabo pelos governos liberais, os irlandeses continuavam

insatisfeitos e em constante rebelião. Nasceram movimentos nacionalistas e um dos líderes,

Charles Stewart Parnell, exigiu um governo autónomo, que Gladstone admitiu conceder em

1886. O receio de contágio a outras colónias, sobretudo à Índia, levou à cisão do Partido

Liberal e à formação do Partido Unionista, liderado por Chamberlain, que se uniu aos

conservadores, vencendo as eleições seguintes. Em 1895 o Partido Unionista foi absorvido

pelo Partido Conservador.

Anthony Wood escreveu sobre Gladstone (1982: 343):

He believed in Free Trade and in democracy. Loathing war, he believed in

the Concert of Europe. It is easy to argue that Free Trade eventually

involved its own downfall, that democracy unleashed an unreasoning

Imperialist spirit, and to ignore the arms race after 1871 was unrealistic.

(…) The foundation of modern government was laid during his first great

administration.

Disraeli, pelo contrário, via o Império como um pilar da democracia, capaz de unir as

classes sociais sob a bandeira do orgulho imperial. Lawrence James afirmou “The Empire was

an asset to be cherished” (1998: 196). Para Disraeli, os britânicos tinham o dever de exercer a

sua influência civilizadora sobre os povos nativos, bem mais importante do que a mera defesa

de interesses económicos. Colocou a monarquia e o Império acima de tudo, apelando

continuamente ao patriotismo do povo britânico contra os ataques dos liberais que, quando no

poder, não protegiam convenientemente os interesses nacionais no estrangeiro. Num discurso

famoso proferido no Crystal Palace em 1872, sendo então líder da oposição ao primeiro

governo de Gladstone, Disraeli explicou a posição do seu partido sobre o Império:

Gentlemen, there is another and second great object of the Tory party. If

the first is to maintain the institutions of the country, the second is, in my

opinion, to uphold the empire of England. If you look to the history of this

country since the advent of Liberalism - forty years ago - you will find that

there has been no effort so continuous, so subtle, supported by so much

energy, and carried on with so much ability and acumen, as the attempts of

21

Liberalism to effect the disintegration of the empire of England. (…)

Well, what has been the result of this attempt during the reign of

Liberalism for the disintegration of empire? It has entirely failed. But how

has it failed? Through the sympathy of the colonies with the mother

country. (…) Therefore, gentlemen, with respect to the second great object

of the Tory party also - the maintenance of the Empire - public opinion

appears to be in favour of our principles.

Disraeli associou e identificou de forma muito clara o partido conservador com o

patriotismo, a monarquia e o império. Lawrence James cita um outro excerto daquele discurso

(1998: 196):

When I say ‘Conservative’, I use the word in its purest and loftiest sense. I

mean that the people of England, and especially the working classes of

England, are proud of belonging to a great country, and wish to maintain its

greatness – that they are proud of belonging to an Imperial country.

O Partido Conservador venceu as eleições de 1874 e Disraeli tornou-se primeiro-

ministro, tendo então a possibilidade de passar à prática a sua tenaz defesa do Império. Nos

seis anos que se seguiram, tudo fez para preservar a integridade do Império Otomano e a

segurança da Índia e ainda reforçar com vigor o império informal. Comprou ações da

Companhia do Canal do Suez para retirar aos franceses parte do controlo daquela via,

salvaguardando dessa forma o comércio britânico para o Oriente e em 1876 declarou a Rainha

Vitória Imperatriz da Índia, outorgando-lhe um estatuto igual ao dos monarcas da Rússia,

Alemanha e Áustria-Hungria, em termos de poder e prestígio. No entanto, a devoção pelo

Império levou-o a cometer erros que lhe motivaram críticas acesas, como a defesa da Turquia

no massacre dos cristãos búlgaros, situação que os Liberais e a opinião pública não aceitaram.

Envolveu ainda o país em hostilidades com os Zulus na África do Sul para proteger o

Transvaal e no Afeganistão para defender a fronteira noroeste da Índia contra as investidas da

Rússia. (Goodlad, 2000: 6). Nenhuma destas situações favoreceu Disraeli e, pelo contrário,

deu armas aos liberais para vencerem as eleições de 1880 e colocarem Gladstone, mais uma

vez, no poder. Goodlad escreveu também acerca de Disraeli (2000: 11)

It is not necessary to depict Disraeli as the prophet of a ‘new imperialism’ in

order to give him credit for a serious commitment to the British Empire. His

22

view of his country’s world role was an essentially traditionalist one. He

came to power with a determination to assert what he regarded as Britain’s

‘just position’ in Europe and in the wider world. This did not necessarily

entail the annexation of further territory, but it did require a determined

defence of existing positions. In that, at least, he remained consistent

throughout his career.

Os defensores de Disraeli justificaram a sua política imperialista invocando teorias

paternalistas e racistas, baseadas em interpretações erróneas da teoria de evolução de Darwin,

que viam o Imperialismo como uma manifestação do que Kipling chamou de “o fardo do

homem branco”, que fundamentava a existência do Império, não por uma questão estratégica

ou económica, mas para civilizar e cristianizar os povos nativos, inferiores e mais atrasados,

logo incapazes de se autogovernarem. Esta doutrina foi amplamente aceite e serviu para

legitimar a anexação de zonas da África Central. Homens como Disraeli e Chamberlain eram

considerados imperialistas pela constante defesa e apologia que fizeram do governo imperial

nas várias funções oficiais que desempenharam ao longo da vida.

O termo “imperialismo” surgiu na Grã-Bretanha associado, segundo os britânicos, ao

governo despótico e indigno do Imperador Napoleão III em França, em nada semelhante ao

governo imperial britânico que, em sua opinião, colonizava, mas não conquistava. Não

descrevia uma realidade objetiva, como “império”, mas antes a relação entre um poder

controlador e os que se encontravam sob o seu domínio. (Lichtheim 1971: 12) Foram os

romanos que cunharam o termo imperium para designar os conceitos de comando e poder. Em

plena República, imperium alargou o seu significado e passou também a ser conotado com

grandeza, designando, então, o governo sobre territórios extensos e longínquos, bem distantes

da pátria dos governantes. (Howe 2002: 13). O império romano, baseado em conquistas

militares, foi o maior império da história no que respeita ao controlo exercido sobre os seus

territórios. Para além da enorme força militar utilizada nas conquistas e na vigilância do

império, os romanos estabeleceram estruturas políticas, sociais e económicas uniformes,

construíram cidades, desenvolveram as artes e a educação, criaram milhares de empregos e

legaram à posteridade monumentos, pontes, canais e recintos desportivos admiráveis.

Acreditavam que haviam levado a paz aos territórios conquistados e que difundiam uma

forma elevada de civilização nesses domínios, considerando bárbaros todos os povos que não

aceitavam o poder romano (McDonough 1994: 4). O império britânico, embora estabelecido

através de conquistas militares, nunca se impôs aos povos colonizados de forma tão coerciva

23

como o romano, dependendo sobretudo da sua força naval para defender o comércio, principal

atividade económica e uma das justificações para a manutenção das colónias.

No início da época vitoriana o termo empire tinha duas interpretações: designava The

British Isles ou The United Kingdom e a influência natural que um país tão importante tinha

sobre o resto do mundo, mas também o domínio imperial sobre as dependências britânicas

(Koebner e Schmidt 1964: 37-8). Na segunda metade do séc. XIX o termo passou a designar o

governo imperial britânico, sobretudo na Índia, bem como toda a influência exercida pelos

britânicos sobre os povos colonizados. Com Disraeli ser “imperialista” era sentir orgulho no

império e na grandiosidade da nação; para os liberais “imperialismo” era sinónimo de poder

autocrático e militar, tendo assim sido utilizado como slogan contra Disraeli, e o termo

“jingoísmo” usado em sua substituição na propaganda liberal.

O termo surgiu por volta de 1876 para designar o fervor imperialista que dominava o

país, patente nas canções populares de music-hall, na imprensa e nas manifestações de apoio

ao Império. Howe afirmou (2002: 23):

The stress on attitudes is important here: for most late-Victorian users of the

word, imperialism did not mean the facts of dominance, conquest, or

overseas expansion, but a policy, a philosophy, or just an emotional attitude

of enthusiasm for such things. For some British critics, the label was

interchangeable with ‘jingoism’- a word adapted from a belligerent music-

hall song and used to mean thoughtlessly aggressive patriotism.

Considerado a fonte do patriotismo britânico, o music-hall foi identificado por

Hobson como a primeira forma de imperialismo popular, acusando-o de manipular a opinião

das classes trabalhadoras, infetadas pelo “jingoísmo”, favorecendo as políticas de exploração

imperialista (Mackenzie 1986: 17). Em The Psychology of Jingoism escreveu (2009: 3):

Among large sections of the middle and the labouring classes, the music-

hall, and the recreative public house into which it shades off by

imperceptible degrees, is a more potent educator than the church, the school,

the political meeting, or even than the press. Into this ‘lighter self’ of the

city populace the artist conveys by song or recitation crude notions upon

morals and politics, appealing by coarse humour or exaggerated pathos to

the animal lusts of an audience stimulated by alcohol into appreciative

hilarity.

24

Na última década do séc. XIX o termo era já usado pelos apoiantes e pelos opositores

das políticas de expansão colonial. O império britânico foi uma realidade tão complexa que

torna o conceito de imperialismo difícil de explicar, mas as palavras de Robert Johnson (2003:

12) parecem bastante adequadas a uma tentativa de definição:

British imperialism combined a host of peripheral, local and metropolitan

influences. It is a term that encompasses the desire of states to dominate for

reasons of national security, the exercise of direct power or the extension of

influence, or economic and military hegemony. Imperialism can also be

used to incorporate the imposition or spread of cultural values and ideas. It

can be used as a term to assess British power or influence, the process of

how the British Empire worked, and the impact it had on Britain and the

wider world.

O conceito de imperialismo teve uma maior aceitação por parte das classes média e

alta, com maior capacidade para se fazer ouvir e, desta forma, moldar a opinião pública. O

entusiasmo das massas pelo império foi, na opinião de Bédarida (1991: 146), muito

amplificado, já que grande parte da população rural e da classe operária nunca terá sido muito

atingida pelo fervor imperial. Em Londres e Birmingham, onde se sentia bastante a influência

de Joseph Chamberlain, era mais evidente o ardor imperialista expresso em paradas militares,

canções patrióticas ou nas festividades do jubileu da Rainha Vitória. Mas o facto de os

britânicos amarem o seu país e exultarem ante os seus feitos não fazia deles imperialistas

devotos. Porter afirmou (1984: 117): “Popular imperialism is usually associated with national

self-confidence. In the 1880s it could equally well be associated with national self-doubt.” Por

muito que os imperialistas mais proeminentes quisessem erguer o orgulho imperial, parte do

país estava deprimido e numa certa decadência, pelo que dificilmente aderiria àquele espírito,

a não ser pelo que ele exibia como espetáculo para as massas. Porter afirmou ainda (1984:

119):

From the impression she gave – the bragging of her favourite poets and her

press, the public celebrations of might and glory (…), Britain was weaker in

the world in the 1890s than she had been twenty years before, and that

despite the vast size of her empire and its recent expansion.

25

Citando o jornal Manchester Guardian na sua edição de 7 de Junho de 1884, Porter

escreveu (1984: 111): “It is not the habit of the English people to set out with their eyes open

on a career of conquest and annexation. The conquests which we make are forced upon us.”

Os liberais rejeitavam a febre de anexações, o crescimento do poder absoluto e a perda de

liberdade que isso acarretava para os povos colonizados, utilizando assim o termo

“imperialismo” em sentido pejorativo e como arma contra a política de Disraeli e do Partido

Conservador. Para Gladstone a ideia de um império era anti-cristã e anti-europeia e os

britânicos deveriam, acima de tudo, encorajar a independência e a liberdade de todos os

povos. Koebner e Schmidt afirmaram (1964: 147): “It was Imperialism, a word Gladstone

now hurled against his political enemies as an abuse which meant to characterize their

erroneous concept of Empire.” Apesar disso, muitos liberais, horrorizados, condenaram

Gladstone por persistir numa política colonial, a que a sua eleição supostamente deveria ter

posto termo. A justificação oficial era o interesse nacional, a necessidade de defender o

império ancestral e ainda a pressão de outras potências europeias na corrida à África. Não era

já possível garantir esferas de influência sem que estivessem assinaladas num mapa, mas

enquanto o império formal se expandia, o informal contraía, com perda clara de influência

política em zonas como a Turquia ou a Pérsia. Ainda segundo Porter (1984: 118), a expansão

do império na década de 80 não refletia o crescimento do poder britânico no mundo, mas

antes a antecipação do seu declínio.

Nos anos 90 os britânicos prepararam-se para defender o Império com armas, se

necessário fosse, considerando que poderiam fazer frente à França, Alemanha e mesmo à

Rússia e convictos do amplo apoio popular à guerra. Muitos imperialistas encaravam essa

possibilidade de forma leviana, mas os que detinham poder e responsabilidade, casos de

Chamberlain ou Lord Rosebery, tendiam a ser mais cautelosos por receio das consequências e

pela constatação da fragilidade do poder britânico na época. Porter escreveu (1984:

129):“Men of action and responsibility – the Roseberys, Curzons and Chamberlains – did not

relish the prospect of a European war, because they had the navy lords close to them to warn

them of the possible consequences.” No entanto, ambos concordavam que a Grã-Bretanha

deveria preparar-se para sobreviver na corrida das nações e que o verdadeiro imperialismo

deveria começar em casa. Sentiam-se aptos a governar um quarto do mundo, mas deviam

organizar-se para tal, dada a dispersão dos territórios imperiais.

Muitos imperialistas acreditavam convictamente na superioridade da “raça” britânica,

numa demonstração de grande autoestima patriótica. Afirmavam que os britânicos eram o

melhor povo do mundo, dotado de valores elevados, como decência, justiça, liberdade e paz e

26

quanto mais esses valores se disseminassem pelo mundo, tanto melhor para a humanidade.

Cecil Rhodes afirmou (Chamberlain 1999: 117):

I contend that we are the first race in the world, and that the more of the

world we inhabit the better it is for the human race. I contend that every acre

added to our territory means the birth of more of the English race who

otherwise would not be brought into existence. Added to this, the absorption

of the greater portion of the world under our rule simply means the end of

all wars…

Joseph Chamberlain, a propósito da expansão em África e durante o jantar anual do

Royal Colonial Institute em Março de 1897, afirmou:

But no doubt such a state of things, such a mission as I have described,

involves heavy responsibility . . . and it is a gigantic task that we have

undertaken when we have determined to wield the scepter of empire. Great

is the task, great is the responsibility, but great is the honor; and I am

convinced that the conscience and spirit of the country will rise to the height

of its obligations, and that we shall have the strength to fulfill the mission

which our history and our national character have imposed upon us.

Lord Rosebery, secretário para os assuntos estrangeiros do último governo de

Gladstone, escreveu no The Times em 1900 (Porter 1984: 130):

An Empire such as ours requires at first condition an Imperial Race – a race

vigorous and industrious and intrepid. Health of mind and body exalt a

nation in the competition of the universe. The survival of the fittest is an

absolute truth in the conditions of the modern world.

Uma parte da opinião pública apoiava a política imperial graças à propaganda

institucional que apelava a sentimentos patrióticos exacerbados, a que a imprensa da época

dava eco e apoiava em grande medida. Não era socialmente bem aceite ser anti-imperialista

ou, de alguma forma, criticar a política imperial dos sucessivos governos, mas Hobson atacou

de forma vigorosa a ideia de Chamberlain e de outros expansionistas de que a Grã-Bretanha

beneficiava com a extensão do seu controlo, contrapondo que eram os capitalistas financeiros

27

a tirar proveito do império e a utilizá-lo para obter maiores lucros em novos mercados. Em

Imperialism: a study (1975: 81) Hobson afirmou:

It is not much to say that the modern foreign policy of Great Britain has

been primarily a struggle for profitable markets of investment. (…) It is this

economic condition of affairs that forms the taproot of imperialism. If the

consuming public in this country raised its standards of consumption to keep

pace with every rise of productive powers, there could be no excess of

goods or capital clamorous to use imperialism in order to find markets.

Um dos aspetos mais sombrios do imperialismo foi a sua ligação com o racismo, que

alguns deploraram, pela ingerência na vida e dignidade de outros povos, mas que outros

verdadeiramente apoiaram, acreditando na superioridade da raça anglo-saxónica e na sua

capacidade e no direito de governar os povos considerados inferiores. (Johnson, 2003: 121)

A categorização das raças ajudou a justificar o domínio britânico: atribuíram-se

características de inferioridade às raças dominadas e de superioridade aos colonizadores.

Johnson (2003: 11) sugere que não havia um paradigma oficial de imperialismo imposto na

subjugação das outras raças, mas apenas diferentes formas de lidar com os nativos, utilizadas

pelas autoridades britânicas em cada área colonizada, de acordo com as exigências e

condições locais. Por um lado gerou-se a ideia de que os indivíduos de raças diferentes eram

incapazes de se desenvolverem e, por outro, justificava-se desta forma o colonialismo

britânico do final do séc. XIX como uma forma de ajudar ao seu desenvolvimento. A retórica

e a prática institucionais favoreciam a apologia da colonização, promovendo-a como algo de

intrinsecamente bom e benéfico para os povos colonizados que supostamente deveriam

subordinar as suas culturas e tradições à grande civilização britânica, e era essa a crença

profunda de grande parte do povo britânico: o Império era uma força positiva que contribuía

não apenas para o desenvolvimento económico e cultural do país, como também para o das

nações não civilizadas, tarefa considerada quase um imperativo moral dos britânicos.

Lawrence James afirmou (1998: 184): “There was, on the whole, general agreement that the

empire was a powerful force for the spread of civilization through trade and the imposition of

superior codes of behaviour on its ‘savage’ inhabitants.”

Para estas ideias megalómanas e racistas muito contribuíram as doutrinas dos

darwinistas, amplamente aceites no século XIX. Na sua obra The Origins of the Species,

publicada em 1859, Charles Darwin havia desenvolvido a teoria da origem da vida e da

28

evolução das espécies através da seleção natural. No final do Capítulo 3 Darwin escreveu2:

All that we can do, is to keep steadily in mind that each organic being is

striving to increase at a geometrical ratio; that each at some period of its life,

during some season of the year, during each generation or at intervals, has to

struggle for life, and to suffer great destruction. When we reflect on this

struggle, we may console ourselves with the full belief that the war of nature

is not incessant, that no fear is felt, that death is generally prompt, and that

the vigorous, the healthy, and the happy survive and multiply.

Darwin desenvolveu o conceito de que a evolução se dá pela interação de três

princípios: a variação, que está presente em todas as formas de vida; a hereditariedade,

entendida como a força que transmite uma forma orgânica semelhante de uma geração a

outra, e a luta pela existência, que determina as variações que serão vantajosas para um

determinado ambiente, deste modo alterando as espécies através da reprodução seletiva. O

facto de o evolucionismo ser ainda uma disciplina incipiente na época, levou a interpretações

erróneas das palavras e da teoria de Darwin, que os imperialistas aproveitaram muito

convenientemente. Theodore Hoppen afirmou (1998: 474):

Indeed, it was precisely because evolutionary ways of thinking had already

become so ubiquitous and elastic, that Darwin’s most original contribution –

natural selection – was itself rapidly absorbed into a range of ( not always

compatible) systems of thought.

Na realidade foi Herbert Spencer, filósofo e sociólogo contemporâneo de Darwin,

quem formulou muitas das teorias habitualmente consideradas darwinistas, tendo também

cunhado a expressão “a sobrevivência dos mais aptos”, mais tarde utilizada por Darwin.

Spencer conseguiu identificar aspetos comuns entre a zoologia e a economia e concebeu

teorias, segundo as quais a natureza e a sociedade obedeciam às mesmas leis e a evolução

explicava todos os fenómenos. Ainda segundo Hoppen (1998: 475): “What Spencer did was

to extend the so-called ‘laws’ of evolution to all spheres of existence – social, organic and

physical – and to inject into the whole affair the clear and unambiguous notion of ‘Progress’”.

A relação entre teorias evolucionistas e progresso era muito complexa e envolvia

questões científicas, filosóficas, religiosas e políticas. Acreditava-se que a superioridade

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britânica era baseada na moral, na lei, na religião e nas instituições políticas, enquanto fatores

como o clima e a ignorância determinavam o estado de subdesenvolvimento em que os não-

europeus se encontravam. Andrew Porter afirmou (1999: 24):

For the British, the explicit sense of racial distinctiveness that came to

predominate in the second half of the century also had positive aspects. It

helped to explain the Empire’s growth and justify the costs and exertions to

maintain it; it was held to excuse some of Empire’s destructiveness and

oppression.

Ignorou-se por completo os milhares de anos de história e cultura de muitos povos,

somente porque eram diferentes das dos britânicos e o facto de, por exemplo, as populações

aborígenes da Austrália ou maori da Nova Zelândia estarem em declínio numérico foi

utilizado pelos antropólogos para dar razão a Darwin e Spencer quanto à sobrevivência dos

indivíduos mais fortes e aptos de cada espécie. No final do séc. XIX muitas das teorias sobre

a superioridade dos europeus eram inseparáveis das provas da biologia e sobre esta questão

escreveu Johnson (2003: 109):

Europeans and Arians in particular, were associated with exemplary

standards of beauty, intelligence, physical strength, moral integrity and

courage. The savage was the antithesis of this civilization, the result of

stagnation in culture and development. Black skin was ‘evidence’ of being a

‘human fossil’ or ‘infantile’. The absence of literature or technology was

seen as evidence of ignorance. Rebellion or resistance to white rule, and

therefore to civilization, was used as proof of underdevelopment,

impulsiveness or immaturity.

A partir da segunda metade do séc. XIX, a mistura de raças foi desaconselhada em

absoluto, a segregação racial formalizou-se e os nativos, sobretudo os indianos, que

conviviam mais de perto com os britânicos, quer nos desportos, no exército ou nos serviços

públicos, eram ridicularizados quando tentavam comportar-se como os seus colonizadores.

Por outro lado, era inaceitável que um britânico se aproximasse demasiado de um nativo ou o

tratasse como igual.

Em 1871, cerca de dez anos após The Origins of the Species, Darwin publicou The

Descent of Man, onde defendeu a seleção natural para a evolução do homem mas indo mais

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longe, ao sugerir que as raças inferiores seriam eliminadas em breve e que só as mais

avançadas se desenvolveriam e teriam sucesso. No final do capítulo 213 afirmou:

The advancement of the welfare of mankind is a most intricate problem: all

ought to refrain from marriage who cannot avoid abject poverty for their

children; for poverty is not only a great evil, but tends to its own increase by

leading to recklessness in marriage. On the other hand, as Mr. Galton has

remarked, if the prudent avoid marriage, whilst the reckless marry, the

inferior members tend to supplant the better members of society. Man, like

every other animal, has no doubt advanced to his present high condition

through a struggle for existence consequent on his rapid multiplication; and

if he is to advance still higher, it is to be feared that he must remain subject

to a severe struggle. Otherwise he would sink into indolence, and the more

gifted men would not be more successful in the battle of life than the less

gifted.

Deu assim argumentos aos que precisavam de provas da superioridade de uma “raça”

sobre outras e contribuiu para as teorias do darwinismo social, cujos principais cultores foram

Spencer e Francis Galton, e que se tornaram um meio através do qual racistas e imperialistas

legitimaram as formas mais agressivas de imperialismo. Transferindo e aplicando as leis da

natureza ao Homem, procuraram apresentar como natural a opressão dos fracos, dos pobres e

das chamadas “raças inferiores”, sugerindo ser esta a única forma de progresso para a

humanidade. Justificaram desta forma todas as injustiças perpetradas ao longo da história sob

uma suposta base científica.

Sir Francis Galton, primo de Darwin e muito influenciado pelos seus textos,

desenvolveu a noção de “eugenia” em 1883, que definiu como o estudo dos agentes que

podem aperfeiçoar ou enfraquecer as qualidades raciais das futuras gerações, seja física ou

mentalmente. Censurou a classe média pela baixa fertilidade, argumentando que se deveria

encorajar a reprodução dos mais capazes e controlar a dos menos válidos socialmente e

acreditava que a “raça” humana poderia ser melhorada se se evitassem cruzamentos

indesejáveis. Galton reconhecia ainda que as circunstâncias culturais influenciavam a

capacidade dos cidadãos de uma determinada civilização, considerando que a sociedade

britânica da época carecia de grandes talentos. Na obra Hereditary Genius afirmou (1869:

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362)4:

The best form of civilization in respect to the improvement of the race, would

be one in which society was not costly; where incomes were chiefly derived

from professional sources, and not much through inheritance; where every lad

had a chance of showing his abilities, and, if highly gifted, was enabled to

achieve a first-class education and entrance into professional life, by the liberal

help of the exhibitions and scholarships which he had gained in his early youth;

where marriage was held in as high honour as in ancient Jewish times; where

the pride of race was encouraged (of course I do not refer to the nonsensical

sentiment of the present day, that goes under that name); where the weak could

find a welcome and a refuge in celibate monasteries or sisterhoods, and lastly,

where the better sort of emigrants and refugees from other lands were invited

and welcomed, and their descendants naturalized.

Sobre a eugenia, numa conferência proferida na Sociological Society no dia 16 de

Maio de 1904, afirmou:

It has, indeed, strong claims to become an orthodox religious, tenet of the

future, for eugenics co-operate with the workings of nature by securing that

humanity shall be represented by the fittest races. What nature does blindly,

slowly, and ruthlessly, man may do providently, quickly, and kindly. As it

lies within his power, so it becomes his duty to work in that direction. The

improvement of our stock seems to me one of the highest objects that we

can reasonably attempt. We are ignorant of the ultimate destinies of

humanity, but feel perfectly sure that it is as noble a work to raise its level,

in the sense already explained, as it would be disgraceful to abase it. I see no

impossibility in eugenics becoming a religious dogma among mankind, but

its details must first be worked out sedulously in the study

O colonialismo foi, em parte, também justificado por todas estas teorias. Os

administradores coloniais procuravam legitimar a exploração das populações nativas com

base nas teorias de Darwin: era uma lei da natureza que as “raças inferiores” fossem mantidas

sob controlo das “raças superiores”. O darwinismo social foi um produto da expansão

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económica e política dos finais do século XIX e acabou por defender o imperialismo,

demonstrando que os poderes imperiais eram naturalmente superiores e que o controlo de

uma civilização superior sobre outras ocorria no melhor interesse da evolução humana. Sobre

esta questão afirmou Lawrence James (1998: 205):

Social Darwinism was now fashionable and its theories, a rough and ready

transfer of Darwin’s principles from the world of plants and animals to that

of men, suggested that certain races were better fitted than others. (…) there

was a common agreement that their assumed progeny, the British,

represented a super-race. (…) The fact that the Anglo-Saxons had dispersed

across the globe and mastered their environment added to the general

feeling that they were ideally qualified to rule.

2. 3. Críticas ao Império

Segundo Richard Shannon (1976: 16), em 1870 três grandes temas dominavam o

debate político: o primeiro, relacionado com questões internas, consistia em adaptar as

políticas públicas à sociedade em mudança, dotando-a de instituições e serviços capazes de a

fazer funcionar devidamente; o segundo tinha a ver com a posição dominante da Grã-

Bretanha no mundo e à necessidade de assegurar que toda a sua atividade comercial, baseada

no comércio livre, se desenvolvesse de forma rentável e, sobretudo, num mundo em paz; o

terceiro dizia respeito à eterna e, aparentemente, irresolúvel questão da Irlanda. Mas sem

dúvida que, acima de tudo, no pensamento político da Inglaterra do século XIX, o tema

dominante era o advento da democracia. A revolução americana e depois a francesa tinham

posto em causa uma estabilidade constitucional que vigorara até então, passando algumas

vozes a exigir reformas parlamentares.

Da mesma forma se exigia uma nova organização económica do país, para fazer face

aos problemas causados pela cada vez maior industrialização, designadamente a pobreza e o

desemprego. Uma nova conceção de sociedade ideal e uma diferente organização económica

determinaram, assim, o pensamento político do séc. XIX, em especial nas últimas décadas.

Um dos seus maiores paradoxos foi o da relação entre liberalismo e império, pela

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forma como um sistema de pensamento, baseado em princípios universais e democráticos, foi

capaz de gerar, em simultâneo, justificações éticas e políticas para o imperialismo. Desde as

origens do Império na Índia no séc. XVIII que os pensadores políticos britânicos se

esforçaram por dar sentido ao carácter anómalo do governo imperial naquele território e ainda

por legitimá-lo política e moralmente. Homens como Paine, Burke, Bentham, James Mill e J.

S. Mill enquadraram os debates de então em termos éticos, mais concretamente, os de um

elevado sentido de dever e responsabilidade, condizentes com o estatuto de povo livre e

civilizado do poder governante. Este modelo liberal de imperialismo, que aliava uma teoria de

legitimidade imperial com um projeto de progresso e civilização, foi a justificação ética do

império mais estruturada no séc. XIX, porém desafiado por formas diversas de rebelião,

resistência e instabilidade nas colónias, que puseram em causa a natureza e objetivo do

domínio imperial.

A existência e a expansão do Império dominaram desde cedo a cena política e

intelectual britânica, centrando-se os debates em questões como a da sua utilidade ou a dos

custos ou benefícios para a nação. Um dos primeiros críticos do colonialismo britânico foi

Adam Smith que, ainda no séc. XVIII, considerou desnecessária e pouco lucrativa a posse de

colónias, afirmando que o comércio colonial, só por si, era suficiente para trazer vantagens

económicas ao país. No final da obra The Wealth of Nations (pág.1668)5 Adam Smith

afirmou:

But if the empire can no longer support the expense of keeping up this

equipage, it ought certainly to lay it down; (…) The rulers of Great Britain

have, for more than a century past, amused the people with the imagination

that they possessed a great empire on the west side of the Atlantic. This

empire, however, has hitherto existed in imagination only. It has hitherto

been, not an empire, but the project of an empire; not a gold mine, but the

project of a gold mine; a project which has cost, which continues to cost,

and which, if pursued in the same way as it has been hitherto, is likely to

cost, immense expense, without being likely to bring any profit; (…)

The Wealth of Nations foi publicado em 1776, o ano da independência das colónias

americanas, acontecimento que originou profunda reflexão e muitos textos por parte de alguns

pensadores sobre os custos e benefícios económicos do império. Consideravam que, apesar do

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interesse nacional em jogo, a posse e governo de territórios longínquos e habitados por outros

povos era imoral e contrário à conceção de liberdade e de outros valores fundamentais do

povo britânico, sem menosprezar, evidentemente, os custos envolvidos. No final do séc.

XVIII Jeremy Bentham, filósofo utilitarista, escrevera textos panfletários e obras de carácter

económico, nos quais defendera argumentos contra a posse de colónias pela Grã-Bretanha e

por outros estados europeus. Em A Manual of Political Economy, de 1798, afirmou na página

56 do cap. III6:

If we proceed to consider the situation of colonies in detail, we shall not fail

to be struck by its disadvantages. (…) The evils suffered in these

establishments, from the ignorance, the weakness, or the insensibility of

European governments, exceeded everything that can be imagined. When

we consider the multitude of men destroyed, the fleets lost, the treasures

swallowed up, the establishments pillaged – we are astonished to hear

colonies spoken of as a means of enrichment.(…) The colonial system is

hurtful to Europeans, only because it is hurtful to the colonies.

Durante o século XVIII prevalecera o sistema mercantilista, que entendia o comércio

internacional como um jogo em que, se um país perdia, outro haveria de ganhar e em que os

governos intervinham para proteger as suas indústrias da competição estrangeira, evitando os

contactos e a partilha de informações. Estas práticas foram alvo de críticas por parte dos

liberais, para os quais a melhor forma de criar riqueza era permitir a competição económica

sem controlo governamental. Os franceses tinham inventado a expressão exata para o que

devia ser feito, laissez faire, laisser passer, em inglês algo como let it be, leave it alone.

Objetivamente os economistas liberais clássicos, como Adam Smith ou James Mill, exigiam

alterações importantes na organização económica britânica e também europeia: o fim das

restrições mercantilistas à indústria e ao comércio e a abolição de tarifas e restrições impostas

pelos governos sobre as importações com o fim de protegerem os produtores nacionais. No

início do século XIX foram, sobretudo, os economistas David Ricardo e John Stuart Mill

quem, perante a realidade da Revolução Industrial, afirmaram que ela geraria uma enorme

riqueza e tornaria o país a oficina do mundo, mas só o comércio livre lhe traria riqueza

generalizada. (Porter 1999: 691)

Durante a primeira metade do séc. XIX essa crítica era sobretudo de natureza

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económica, tendo evoluído, no seio dos liberais, para a crítica anti-imperialista do final do

século. Nessa fase, destacaram-se as doutrinas da Manchester School, defendidas por Richard

Cobden e John Bright, cujos discursos e textos mais tarde inspirariam os liberais mais

radicais, nomeadamente J. A. Hobson. As suas posições em meados do século podiam ser

consideradas contrárias aos interesses do Império, no entanto defendiam que os estados

civilizados tinham o direito de intervir em regiões menos civilizadas em nome do comércio.

Cobden argumentava que as vantagens de possuir colónias eram menores do que se defendia e

que o comércio colonial tinha efeitos muito negativos nas relações comerciais harmoniosas e

pacíficas que se desejavam entre a Grã- Bretanha e os Estados Unidos, que ele privilegiava

acima de tudo. (Porter 2008: 10) Cobden e Bright, considerados radicais na sua época, por

exigirem reformas profundas para o país, foram grandes nomes do liberalismo inglês,

defensores do comércio livre, lutadores vigorosos pela abolição das “leis dos cereais”, que

ocorreu em 1846, facilitando assim a entrada na Grã-Bretanha de milho oriundo do

estrangeiro, o que permitiu alimentar uma população urbana em crescimento e, em grande

parte, miserável. Para ambos, os princípios do comércio livre, da redução de despesas

militares e da paz (free trade, retrenchment and peace) estavam intimamente ligados e a

presença do exército e da marinha não defendia o comércio e, pelo contrário, os custos da sua

manutenção em territórios longínquos desviava fundos necessários à indústria britânica.

(Clayes 2012: 28). Num discurso proferido no Parlamento, Richard Cobden afirmou

(págs.362-3)7:

(...) I look further; I see in the Free-Trade principle that which shall act on

the moral world as the principle of gravitation in the universe, - drawing

men together, thrusting aside the antagonism of race, and creed, and

language, and uniting us in the bonds of eternal peace. ... I believe that the

effect will be to change the face of the world, so as to introduce a system of

government entirely distinct from that which now prevails. I believe that the

desire and the motive for large and mighty empires; for gigantic armies and

great navies (...) will die away; I believe that such things will cease to be

necessary, or to be used when man becomes one family, and freely

exchanges the fruits of his labour with his brother man.

Ainda de acordo com Clayes (2012: 28) as críticas de Cobden ao colonialismo eram

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controversas, considerando alguns que, na realidade, ele defendia a preservação do império e

o princípio da não-intervenção somente quando os interesses britânicos não estavam em risco.

Segundo Porter (2008: 10) a abolição das “leis dos cereais” não resolveu a questão imperial e

não impediu o regresso das medidas anteriormente utilizadas pelo mercantilismo e a que

Cobden e Bright se tinham oposto de forma enérgica. Em relação às colónias, consideravam-

nas um fardo que a nação não podia suportar. Koebner e Schmidt (1964: 69-70) afirmaram:

The nation, Cobden maintained, was asked to foot the bill for vast army and

navy expenditure on account of the colonies. If the idea was to build up a

vast Downing Street Empire governing and protecting Canada, Australia,

New Zealand, the Cape, and the West Indies, it would, no doubt, adversely

affect the house-keeping money at the disposal of every family in the United

Kingdom.

Para ambos o império constituía também uma ingerência nos assuntos internos de

outros países mas, apesar de deplorarem a pobreza e o sofrimento do povo indiano infligidos

pela administração britânica, não sugeriam alternativas, preocupando-se acima de tudo com o

interesse nacional e com a importância do algodão indiano para a indústria têxtil britânica.

O Cobdenismo, termo que designa as teorias económicas de Cobden, permeou o

liberalismo britânico do séc. XIX, influenciando gerações de anti-imperialistas, sobretudo nas

questões de política externa, onde prevalecia o princípio da não-ingerência noutros estados.

Para os radicais e liberais as atitudes imperialistas eram mais evidentes a nível interno,

através da propaganda e do jingoísmo popular do que nas colónias. Porter (2008: 93) afirmou:

To these same Liberals in the nineties, inheriting from Bright their pacifism

and from Gladstone their moralism, the New Imperialism, and especially its

popular ‘democratic’ aspect, threatened not only the peace of the world but

progress and social reform as well. (…) when Radicals talked about

‘imperialism’, they were referring more to a phenomenon in England than to

a policy in the colonies.

Um dos maiores críticos do imperialismo britânico foi J. A. Hobson, para quem a

formação e expansão do império aconteceram por força e no interesse do capitalismo.

Koebner e Schmidt afirmaram (1964: 227):

Imperialism was ‘unmasked’ by Hobson as a capitalist and Jewish

37

conspiracy to draw Britain into a fight for the benefit of Jewish financiers

and their ruthless British capitalist allies like Rhodes. The British people

were being held into a crime by capitalists for the sake of capitalist interests.

Hobson aceitava apenas uma justificação ética para o império: a do contributo para a

elevação da humanidade, propagando a civilização e educando as raças inferiores nas artes do

governo e do comércio, aumentando assim o nível de conforto material e de conduta moral no

mundo. (Clayes 2012: 238).

O seu livro Imperialism: a Study, publicado em 1902, foi considerado o ponto de

partida do pensamento anti-imperialista na Grã-Bretanha, mas sobre ele nos debruçaremos

mais adiante.

38

3. J. A. Hobson e o estudo do Imperialismo

3. 1. Vida e evolução ideológica

Antes de se tornar economista herege, como ele próprio se considerava, nada havia

no passado de Hobson que indicasse o caminho que haveria de seguir enquanto crítico

acérrimo do imperialismo e das suas consequências económicas para o país. Nascido em 1858

no seio de uma família da classe média alta de Midlands, filho do fundador e proprietário de

um jornal regional, politicamente ativo como liberal e mayor da cidade durante dois anos,

desde cedo Hobson questionou crenças e atitudes, tendo mesmo rejeitado a ortodoxia cristã

em prol de um tipo muito próprio de humanismo. Fez os estudos em Oxford, tornou-se

professor primário e casou com Florence Edgar, filha de um advogado de Nova Iorque, o que

lhe possibilitou um bom conhecimento dos Estados Unidos, país que visitou diversas vezes e

onde contactou com muitos intelectuais liberais. (Townshend 1990: 3)

Mudou-se para Londres em 1887 para se dedicar ao jornalismo e ao ensino

universitário. A este propósito escreveu P. J. Cain (2002: 17): “Hobson arrived in the capital

in interesting times. The 1880s were characterized by falling prices and pressure on profits in

both agriculture and in manufacturing. Provincial businessmen routinely complained of a

tendency to ‘overproduction’ (…)”. Uma das causas deste problema era o mercado livre que

permitia a concorrência estrangeira na importação de produtos agrícolas, muito facilitada pelo

caminho-de-ferro e transporte marítimo acessível.

Em Londres Hobson conheceu A. F. Mummery, homem de negócios e desportista

famoso, que o iniciou no caminho para o radicalismo, tendo colaborado com ele na escrita de

The Phyisiology of Industry em 1889, obra que chocou os economistas mais ortodoxos por

duas explicações inovadoras e polémicas da crise capitalista que se vivia: a instabilidade

motivava mais as pessoas a guardar o dinheiro e não a gastá-lo; e o impulso de acumular

lucros numa sociedade competitiva forçava os capitalistas a pouparem e reinvestirem em

demasia, o que resultava em sobreprodução, que acabava por não ser escoada pela falta de

consumo. Hobson e Mummery concluíram que numa sociedade saudável o consumo seria

estimulado, o peso dos impostos recairia sobre as poupanças e não sobre os bens de consumo

e que a classe operária deveria ter acesso a uma parte do “bolo” nacional (Cain 2002: 26).

Esta colaboração marcou o início de uma produção literária vasta por parte de Hobson, a par

de uma carreira intelectual atribulada. Na sua autobiografia Hobson escreveu a este respeito

(2011: 30): “This was the first open step in my heretical career, and I did not in the least

39

realize its momentous consequences”. Foi expulso da Universidade de Londres, em que

lecionava a cadeira de Economia Política e viu fecharem-se-lhe muitas portas, factos ainda

assim insuficientes para o considerar, na época, um radical convicto.

Jules Townshend afirmou (1990: 4): “So began, unwittingly, his long ambivalent

relationship with academic orthodoxy. He wanted academic recognition, but this was denied

him.” E mais adiante continuou (1990: 5): “Yet if he had been admitted into academia, he

may have become, for posterity at least, a far less interesting figure, he may have become less

politically active, and his radicalism more tempered.” Ao ser banido dos círculos académicos,

Hobson teve a possibilidade de se tornar um economista mais abrangente, sem uma área de

especialização, expondo ao mundo toda a sua dimensão intelectual. Ingressou então em dois

círculos de pensadores da época, o Ethical Movement e o Rainbow Circle, onde, pela primeira

vez, pôde contactar com as ideias dos Fabianos, e também com as ideologias americanas mais

progressistas. Acabou por abandonar o primeiro grupo e juntar-se a um outro, The South

Place Ethical Society, em 1896, em que se tornou um dos principais oradores por mais de

trinta anos, tendo conhecido, entre outros, L. T. Hobhouse, Bertrand Russell e Norman

Angell.

Porter (2008: 157) afirmou sobre estes grupos:

Each of these societies saw itself as a kind of avant-courier of the New

Radicalism, regenerating the Left and planting, perhaps, the seeds of a new

progressive party. (…) The new ideology of the turn of the century came

chiefly not from the Labour and Liberal parties, but from this intellectual

‘Lib-Lab’ group in the middle.

No Rainbow Circle, Hobson conviveu com intelectuais liberais, socialistas e

marxistas, com funcionários públicos e políticos abrangendo todas as áreas da esquerda, desde

o socialismo ao imperialismo liberal, centrando-se as suas discussões, sobretudo, na forma de

arranjar consensos para reformar e alargar as funções económicas e sociais do Estado.

Consideravam que o antigo radicalismo filosófico e a Manchester School já não davam

respostas satisfatórias à atual situação e planeavam a transição entre o velho modelo e o Novo

Radicalismo (Porter 2008: 164).

Foi também no Rainbow Circle que Hobson conheceu Ramsay McDonald e ainda

William Clarke, que tiveram uma profunda influência no seu radicalismo, tendo os três

colaborado na criação da Progressive Review que, apesar de ter sido publicada apenas entre

1986 e 1889, cumpriu o objetivo de propagar as ideias comuns dos diferentes membros do

40

grupo. O próprio Hobson afirmou (2011: 54): “We had here in the Review a first serious

attempt to draw the attention, not of a few intellectuals but of a wider thinking minority of

citizens, to the difficulties besetting the intrusion of the State, whether autocratic or

democratic, into new economic spheres of activity.”O artigo “Ethics of Empire”, publicado

sob o pseudónimo Nemo na Progressive Review em 1897, foi a primeira contribuição

substancial de Hobson para o debate sobre o imperialismo.

Clarke, o editor da revista, acusou a “sinistra” classe financeira de encorajar o

imperialismo e uma paz podre na Europa para seu próprio benefício, considerando o

capitalismo financeiro como elemento fulcral do imperialismo (Cain 2002: 64), teorias que

influenciaram Hobson na senda do radicalismo e o transformaram em pensador novo liberal.

A sua posição estava próxima da dos Fabianos, exceto na convicção em aplicar a sua análise

económica a uma conceção orgânica da sociedade, que o aproximava mais do idealismo

evolucionista e de Ruskin. Via a sociedade capitalista como um organismo doente. Cain cita-o

em The Social Problem (2002 -41): “The logical end of a society living on unearned incomes

would be death by overfeeding, or the inability to digest and assimilate their food.” Esta foi a

sua primeira obra de fôlego na área da filosofia social, revelando uma maturidade e um

pensamento muito estruturado na relação bem-sucedida entre o seu individualismo e o seu

papel ativo naquela sociedade.

Durante alguns anos, Hobson tentou aliar o seu radicalismo social ao entusiasmo pelo

império, chegando a defender que a sua expansão era vital para o emprego e o bem-estar dos

trabalhadores. No início da década de 90 contrariou a sua posição a favor do mercado livre,

defendendo a proteção aos negócios britânicos. Esta dualidade de posições que

constantemente manifestou ao longo da vida, mereceu de Cain as seguintes palavras (2002:

13): “ (…) Hobson not only contradicts himself at different points in his life but he was quite

capable of holding two opposed sets of ideas at the same time”. Em 1898 num artigo para a

Contemporary Review,“ Free Trade and Foreign Policy” (Cain 1979) 8 Hobson iniciou a

enorme tarefa de retratar o imperialismo como um produto direto do capitalismo financeiro,

rejeitando ainda o protecionismo como parte importante da política imperialista. Ao contrário

do que preconizava a Lei dos mercados de Jean Baptiste Say, segundo a qual a produção

criava a sua própria procura, Hobson defendia que, uma vez que a economia britânica sofria

de uma distribuição desigual dos rendimentos, não havia uma procura efetiva: os que tinham

o poder económico para procurar bens, não tinham o desejo de o fazer, já que as suas

necessidades estavam amplamente satisfeitas; os que tinham o desejo, não tinham poder

8 Edição online

41

económico para o conseguir e, sendo assim, os que possuíam demasiados bens produzidos,

tentavam encontrar no estrangeiro mercado para o excesso de produção. A resolução do

problema estava na correção do desequilíbrio entre o esforço produtivo e o consumo e isso só

seria possível com o restabelecimento de um controlo racional e democrático da economia

com fins sociais. Porter afirmou (2008: 197): “There was ‘an immense potential market’ for

commodities among our own people; and this market should increase proportionately to the

number of goods manufactured.” Hobson concluiu que o sistema económico em vigor era

uma barreira ao progresso social e passou a alinhar com a tradição anti-imperialista mais

radical.

Analisou o imperialismo de forma muito crítica, considerando-o um pretexto do

capitalismo para investir no exterior o capital excedentário, que poderia ser redistribuído

através dos impostos e investido socialmente na ajuda aos mais necessitados. Wood escreveu

(1982: 356): “To Hobson imperialism was merely a symptom of the inequitable distribution

of wealth within the United Kingdom”, e ainda: “The expansion of empire was the direct

consequence of their [financiers] search for more profitable areas in which to place it

[capital]”. Porter (2008: 207) afirmou que, em Imperialism, Hobson pretendeu demonstrar e

persuadir os britânicos de que o imperialismo, para além de irracional, lhes trouxera poucas

ou nenhumas vantagens e que o poder e a imprensa os levaram erroneamente a crer nos seus

benefícios. Hobson considerava que o excedente de capital acumulado pelos financeiros

deveria ser devolvido ao país e redistribuído internamente e não, como acontecia, investido no

estrangeiro, levando a uma progressiva expansão colonial, forçada pela necessidade de

conseguir novos mercados. Preconizava a subida dos salários e reformas sociais como

necessárias para transformar o capitalismo e acabar com o imperialismo. (Cain, 2007: 111-2)

Para Hobson (1975: 59) o capitalismo conduziu a uma política expansionista:

It is true that the motor-power of Imperialism is not chiefly financial:

finance is rather the governor of the imperial engine, directing the energy

and determining its work: it does not constitute the fuel of the engine, nor

does it directly generate the power. (…) An ambitious statesman, a frontier

soldier, an overzealous missionary, a pushing trader, may suggest or even

initiate a step of imperial expansion may assist in educating patriotic public

opinion to the urgent need of some fresh advance, but the final

determination rests with the financial power.

Mais do que explicar o impacto do Império no mundo, como outros fizeram, Hobson

42

preocupou-se em analisar as suas implicações nas instituições democráticas, na economia e na

política interna e externa da Grã- Bretanha, não tendo esquecido o papel do imperialismo na

mentalidade britânica.

A instabilidade que se fazia sentir em várias regiões da África do Sul e o Jameson

Raid de 1895 tiveram um papel determinante na mudança de perspetiva de Hobson em

relação ao imperialismo britânico. Na sua autobiografia (2011: 59) afirmou: “The Boer War

was both a turning-point in my career and an illumination to my understanding of the real

relations between economics and politics which were to occupy so large a place in my future

work.” Condenou com muita firmeza a cobiça capitalista de Cecil Rhodes, que instigou o raid

inglês contra o governo afrikaner legítimo do Transvaal, com o fim de se apoderar das minas

de ouro existentes no território. Hobson considerou que este era o início de uma fase de

imperialismo financeiro, de que beneficiavam sobretudo os investidores da City, muitos deles

estrangeiros, mas com forte influência política no país. Afirmou (2011: 60): “The outbreak of

the Boer War in 1899 will, however, rank as the simplest and plainest example of the

interplay of political and economic motives in Imperialism.”

Assim, na passagem para o séc. XX o país estava em guerra na longínqua África do

Sul. Pela segunda vez em vinte anos, tropas inglesas confrontaram os Boers para evitar a

independência das Repúblicas do Transvaal, após a descoberta de ouro e diamantes no seu

solo. A guerra durou três anos, mobilizou cerca de 300.000 soldados e custou ao país £200

milhões de libras, terminando com a anexação forçada das repúblicas boers pela colónia

britânica. Internamente a guerra desencadeou diferentes reações, desde apoio incondicional à

defesa do Império, até ao repúdio pela violência usada sobre mulheres e crianças e sua

detenção em campos de concentração, atitudes desumanas que os britânicos deploraram e a

opinião pública internacional condenou. Mais de vinte mil soldados morreram, grande parte

por doença e falta de condições de higiene, num total de setenta e cinco mil baixas num

conflito que indignou muitos setores da sociedade, que viram na guerra uma defesa

musculada por parte do Império dos interesses económicos existentes naquela colónia

africana. (Porter 1999: 618)

Hobson, na época correspondente do Manchester Guardian na África do Sul, tomou o

partido dos Boers, através de relatos fidedignos dos acontecimentos e de artigos onde

expressou os seus pensamentos e visões sobre o conflito, sem temer qualquer censura por

parte do jornal. Considerou os testemunhos de outros jornalistas insuficientes ou incorretos e

manifestou-se contra a imprensa que, segundo ele, branqueava o conflito, enganando os

leitores. Passou a ver na guerra uma alegada conspiração capitalista, liderada por judeus

43

europeus, sobretudo alemães, os Randlords, que controlavam as minas de ouro e a imprensa

britânica de Joanesburgo. Porter (2008: 201-2) reproduz parte de uma carta que Hobson

escreveu ao seu editor C. P. Scott, onde apontou claramente os culpados da situação na África

do Sul:

The bulk of the Uitlanders excepting the actual miners I believe to be Jews […]

German Jews who have been in England and figure as British subjects. Many of

them are the veriest scum of Europe. The entire mining industry, with the

partial exception of the Consolidated Gold Fields (Rhodes) is in their hands, the

Dynamite Monopoly, the illicit Liquor Traffic are theirs, they and Rhodes own

or control the press, manipulate the slave market, and run the chief commercial

businesses both in Johannesburg and Pretoria. These men will rig the politics

when they have the franchise. Many of them have taken English names and the

extent of the Jew power is thus partially concealed.

Para além dos judeus alemães, Hobson considerava Cecil Rhodes o paradigma do

capitalista descarado e oportunista, que utilizou a política para atingir os seus objetivos

económicos. Chamou-lhe mesmo “sham-hero” do Império. No artigo “War of Races” escrito

em Outubro de 1899, afirmou: “The Boers have a good working comprehension of the ways

of Mr. Rhodes and the ways in which capitalism is handling British Imperialism, though they

see the history not in its abstract “isms” but in hard, concrete deeds and persons.” Durante a

estadia na África do Sul Hobson visitou as principais cidades e contatou todos os políticos

envolvidos no conflito, desde o Alto-comissário Sir Alfred Milner até aos presidentes boers

Kruger e Steyn, e o próprio Cecil Rhodes. Na sua opinião, tanto os líderes britânicos como os

boers eram manipulados pelos financeiros judeus, que não se limitavam a dirigir a economia,

mas também a política sul-africana.

A análise de Hobson às causas da guerra teve grande impacto e provocou diferentes

reações na Grã-Bretanha: os radicais consideravam-no um herói e dessa forma foi recebido

aquando do regresso a casa; os britânicos em geral e a imprensa londrina, maioritariamente

controlada pelos Conservadores, criticaram-no de forma enérgica. A visita à África do Sul foi

marcante para a sua mudança de atitude em relação ao imperialismo. Antes da guerra, via-o

como o produto de um sistema económico injusto, que obrigava os industriais e os capitalistas

a exportar o que, estivesse a sociedade organizada de forma diferente, poderia ser consumido

internamente, mas considerava ainda os capitalistas como simples peões de um sistema errado

e do qual não eram responsáveis. A partir de 1900, já regressado da África do Sul, passou a

44

identificar o imperialismo com a guerra, na qual os soldados britânicos haviam sido obrigados

a defender os financeiros judeus, a quem passou a apontar as armas, já que os via como

autores de uma conspiração contra os interesses do povo britânico. (Porter 2008: 206). Ainda

sobre esta questão afirmaram Koebner e Schmidt (1964: 226-7): “Hobson introduced a strong

note of anti-Semitism into his attempt to compromise imperialism in the eyes of his British

readers.”

Em 1900 Hobson escreveu uma série de artigos, publicados no ano seguinte com o

título The Psychology of Jingoism, nos quais analisou o desenvolvimento e a manipulação das

massas em relação ao espírito de guerra. A esse respeito afirmou (2009: 138):

This conjunction of the forces of the press, the platform, and the pulpit, has

succeeded in monopolizing the mind of the British public, and imposing a

policy calculated not only to secure the interests of the British Empire, but

to advance the private, political, and business interests of a small body of

men who have exploited the race feeling in South Africa and the Imperialist

sentiment in England.

Neste capítulo analisou-se a evolução ideológica de Hobson, sobretudo a sua posição

relativamente ao imperialismo que, desde 1889, oscilou entre a defesa do comércio livre e a

preocupação pelo que a perda do comércio internacional teria na vida dos trabalhadores,

chegando a admitir a necessidade de encontrar novos mercados para os produtos britânicos,

ainda que à custa da expansão colonial e, até 1896, acreditou que o imperialismo era

compatível com um programa de reformas sociais radicais. Foi a sua fase de imperialista

social, cujas preocupações se centravam no bem-estar da população mais pobre. Mas todas

estas ideias foram abandonadas a partir de 1897, quando passou a criticar de forma enérgica a

expansão colonial. (Cain 2002: 80). Nessa fase associava o imperialismo à necessidade de

expansão do capitalismo, pela acumulação excessiva de capital. A partir da guerra dos boers,

identificou e acusou de forma explícita os especuladores financeiros, sobretudo judeus,

responsáveis pela guerra e pela exploração de mão-de-obra barata, que conseguiram controlar

a economia, a imprensa e a política da África do Sul, graças à conivência das autoridades

britânicas.

Porém, nesta fase ainda não referia nos seus textos a relação entre o subconsumo e o

investimento estrangeiro, cerne da sua teoria económica, que viria a acontecer apenas com a

obra Imperialism.

45

3. 2. Imperialismo e liberalismo

O liberalismo do séc. XIX nasceu a partir da coesão ideológica do pensamento social e

económico de homens como Cobden e J. S. Mill e não de um partido liberal organizado.

Gladstone liderou o partido por vários anos, tendo conseguido reconciliar as várias tendências

internas, que tinham a ver com a diversidade dos seus membros, desde aristocratas,

comerciantes e industriais da classe média, muitos deles com posições radicais, e ainda

operários, pequenos lojistas e artesãos, que comungavam dos ideais de liberdade, de

desenvolvimento pessoal e de progresso social. (Goodlad 2000: 14). Muitos liberais

aceitavam a existência do império, como escreveu Rubinstein (1998: 243):

(…) the late Victorian Liberal Party also contained an influential group of

leaders who accepted British imperialism as a good thing, a progressive and

uplifting extension of British government and democracy to Britons

overseas in the white colonies, and of British civilisation to the non-

European Empire.

No entanto, o apoio de Gladstone a um governo autónomo irlandês, os problemas

relacionados com a invasão do Egito e ainda a guerra dos boers levaram à cisão do partido,

sobretudo quanto às questões externas e imperiais. Enquanto uma fação mais tradicional, os

unionistas liberais, liderada por Joseph Chamberlain, exigia a defesa intransigente dos

interesses britânicos, os liberais mais idealistas preferiam que a Grã-Bretanha evidenciasse a

sua superioridade moral na promoção do direito dos povos à autodeterminação (Goodlad

2000: 15). Uma outra fação, os imperialistas liberais, casos de Rosebery, Haldane ou Grey,

defendiam a manutenção do império como necessária à “exportação” do excesso de

população e como forma de desenvolver o comércio, para além da necessidade de expandir a

evangelização (Koebner e Schmidt 1964: 194) e, pelo contrário, homens como Morley ou

Lloyd George, considerados pró-boers e little-englanders, viam na guerra mais uma ameaça

britânica à independência da pequena colónia boer. No final do século XIX o imperialismo

tinha sobretudo a ver com os acontecimentos em África, dividida pelas potências coloniais

europeias em esferas de influência, administrada por funcionários coloniais e defendida por

exércitos, unidos na missão de civilizar e desenvolver aquele continente.

Passada a expansão, era agora tempo de consolidar e tirar o máximo do império

existente e os próprios liberais reconheciam essa necessidade. Entre 1880 e 1890 as

46

importações aumentaram 11% e as exportações apenas 3%, mas dez anos depois as

importações registaram um aumento de 31% e as exportações de 32%, assim continuando até

1914. Porter (1984: 197) afirmou: “Nothing had changed since the 1890s to loosen the bonds

between Britain and her empire”.

Ao retomar o poder em 1905, o Partido Liberal herdou um império vasto e bem

organizado economicamente, mas a humilhante guerra dos boers revelara a fragilidade do

seu controlo militar que, na realidade, nunca fora apanágio da política imperial dos vários

governos britânicos, preferindo estes uma colaboração subtil com os súbditos das diversas

colónias, o que tornou, em grande medida, esse controlo tolerável e, nalguns casos, bem

aceite. Porter escreveu (1984: 202):

To this extent – and it was a considerable extent – she did not in fact control

the empire which in theory she was sovereign over; she could not do

anything she liked it, with or for it. And the limitations to her imperial

power, in the first decade or so of the new century, were as important

determinants of her colonial policy as was the power itself.

Enquanto os Conservadores exultavam com os sucessos imperiais, desde as

celebrações do jubileu da Rainha Vitória, a reconquista do Sudão ou a vitória na guerra dos

boers que elevaram, na sua perspetiva, o sentimento de orgulho nacional (Claeys 2012: 3), a

questão da Irlanda, a invasão do Egito ou a morte do general Gordon no Sudão manchavam

ainda a imagem dos liberais, apelidados de little-englanders pelos seus opositores políticos,

que os consideravam antipatrióticos e negligentes em relação ao império. No entanto, o novo

governo liberal, liderado por Campbell-Bannerman, foi um dos mais bem-sucedidos e

memoráveis da história da Grã-Bretanha, não só por ter aberto o caminho para o futuro Estado

Social, mas também por ter conduzido o país à primeira guerra mundial. (Rubinstein 1998:

256).

Richard Shannon (1976: 218) analisou desta forma a visão liberal do imperialismo:

‘Imperialism’ had already been identified as a particularly virulent political

evil, and there was no doubt that it was becoming, from the Liberal point of

view, a dangerous social anodyne, a focus of patriotic sentiment, of comfort

and reassurance to the reactionary classes, and in its more vulgar and

jingoistic aspects, an occasion of unseemly popular misbehavior egged on

by deplorable populist journalists (…)

47

No início do séc. XX as posições políticas em relação ao império divergiam entre uma

visão mais nacionalista e imperialista de Chamberlain e dos Conservadores, que

ambicionavam um império poderoso, unido economicamente por tarifas e ligado por laços

políticos e militares cada vez mais estreitos, e a visão da “esquerda”, para a qual o império

consumia os meios necessários ao desenvolvimento do país e desviava a atenção dos

governantes das tão prementes reformas sociais. Como se referiu anteriormente, Hobson foi

um dos primeiros e mais influentes críticos aos métodos e espírito do imperialismo, tendo

combatido a ideia de que “o comércio seguia a bandeira”, tão cara a Chamberlain, e

apresentado números que provavam que a Grã-Bretanha mantinha maior volume de negócios

com as potências rivais do que com as próprias colónias, daí o contestar a sua existência e

valia e considerar que o imperialismo era incompatível com o progresso e as reformas sociais.

(Koebner e Schmidt 1964: 221)

Em 1902, finda a guerra dos boers e perante as atrocidades cometidas, o termo

imperialismo passou a ter uma conotação muito negativa para os liberais mais radicais que, de

um modo geral, eram contra a expansão colonial britânica, considerando-a uma falácia que

avaliava a grandiosidade e o progresso britânicos em termos quantitativos de território e

população. Numa série de artigos publicados na revista liberal de inspiração cristã New Age,

sob o título Liberalism or Imperialism, Hobson descrevia a política imperial do partido liberal

como hipócrita e defendia que o fardo do Império deslocava o centro de gravidade do Estado

e absorvia as energias dos governantes, que reduziam à insignificância as questões internas,

quando comparadas com as questões imperiais sendo, assim, o imperialismo inimigo de um

governo popular, identificando-se, pelo contrário, com um governo autocrático e centralizado,

logo antidemocrático (Claeys 2012: 241). Hobson via ainda com preocupação o militarismo

associado aos interesses imperiais e o aumento da despesa com armamento. Todos estes

fatores contribuíam para que os liberais em geral, e Hobson em particular, vissem o

imperialismo como incompatível com políticas de reforma e foi este um dos maiores dilemas

que os liberais tiveram de enfrentar no início do século XX. Shannon (1976: 218) escreveu:

The younger generation of Liberals was becoming aware of the need for

revised intellectual explanations as to why things had gone wrong since

1880. Mill of course no longer sufficed; nor indeed did Morley or Green.

They hardly provided anything fundamentally beyond Gladstone himself at

Midlothian.

Impunha-se a necessidade de novas doutrinas e práticas que defrontassem os

48

problemas mais urgentes da época e, nesse sentido, grupos de indivíduos oriundos da classe

média, alguns dos quais licenciados em Oxford e Cambridge, que se movimentavam nos

mesmos círculos intelectuais e comungavam das mesmas ideias, reuniam regularmente e

analisavam os muitos problemas sociais da cidade de Londres, dos quais falavam com

conhecimento e autoridade, exprimindo as suas visões da sociedade em periódicos radicais de

pequena circulação. Chamados de novos liberais, conseguiram ser eleitos para o Parlamento

nas eleições de 1906. Dos vinte e cinco membros do Rainbow Circle, dez foram eleitos. As

questões mais importantes que tinham pela frente prendiam-se com a harmonia entre a velha

tradição liberal e as novas necessidades sociais ou até que ponto o novo liberalismo seria uma

ideologia coerente e persuasiva; uma outra questão era a da real importância e diferença que

os políticos novos liberais conseguiriam imprimir na política britânica e, por último, se o seu

conceito de reforma social seria bem aceite no seio dos trabalhadores ou apenas visto como

uma teoria paternalista. (Freeden 1990: 175-6) Os seus objetivos eram os de uma reforma

social radical da sociedade britânica, pois acreditavam, tal como os velhos liberais, que o

liberalismo tinha o dever de elevar todos os membros da sociedade a uma condição desejável

de civilização e que o estado e os indivíduos não podiam estar em lados opostos.

Barker escreveu (1978: 13):

(…) a difficulty existed for those who sympathized with the call for social

reform but who also as traditional political radicals believed in voluntary

rather than coerced action. For them the state was an inherently oppressive

institution whose activities, beyond a certain necessary minimum for the

preservation of life and property, should be restricted in order to give full

and free play to the life of the individual.

Estas eram questões importantes que os novos liberais tinham de clarificar, a da

relação entre o estado e o indivíduo e até que ponto a interferência daquele colidia com a

liberdade e os interesses individuais. Barker(1978: 14) cita palavras de T. H. Green, filósofo

novo liberal, numa conferência em 1881: “Freedom (…) was not the ability to do whatever

one liked, but a positive power or capacity of doing or enjoying something worth doing or

enjoying something worth doing or enjoying and that, too, something that we do or enjoy in

common with others.” Para se atingir tal estado de liberdade seria necessário muito empenho

e trabalho em prol da melhoria das condições das pessoas que, de outro modo, seriam

impedidas de agir livremente.

49

3. 3. O radicalismo social

Na sua autobiografia (2011: 52) Hobson define desta forma o termo “Novo

Liberalismo”: “New Liberalism differed from the old in that it envisaged more clearly the

need for important economic reforms, aiming to give a positive significance to the ‘equality’

which figured in the democratic triad of liberty, equality, fraternity.” Foi nos círculos politicos

e literários liberais, nomeadamente o Ethical Movement, o Rainbow Circle ou The South

Place Ethical Society, que Hobson clarificou e consolidou as suas posições relativamente às

questões sociais. A este respeito afirmou (2011: 56): “My close connection with this liberal

platform, lasting continuously for thirty-six years, was of great help to me in clarifying my

thought and enlarging my range of interests in matters of social conduct.”

Importa nesta altura explicitar o conceito de sociedade para Hobson. Como muitos dos

pensadores do seu tempo, desde conservadores a marxistas, também ele foi “contaminado”

pelas teorias darwinistas, que tudo explicavam e justificavam através da evolução biológica.

Para Hobson a sociedade era um organismo vivo e só assim a contradição entre produção e

consumo, custo e utilidade, bem-estar físico e espiritual encontrariam forma de se reconciliar,

dando resposta à crise do liberalismo do final do séc. XIX. (Townshend1990: 27).

A abordagem progressista e novo-liberal de Hobson à sociedade e às reformas sociais

baseou-se naquela analogia, não se limitando ele a adotar as doutrinas do darwinismo social,

mas ainda o conceito de organismo social de Herbert Spencer, que transformou no móbil das

reformas sociais liberais. (Long 1996: 8) Segundo este autor, o termo “orgânico” foi utilizado

por Hobson para referir a natureza dos seres humanos como organismos biológicos, rejeitando

a teoria dualista cartesiana de corpo e espírito ou outras teorias separatistas das ciências

sociais. Realçou a unidade da personalidade humana e da sociedade, encorajando a criação de

uma ciência, a Sociologia, que refletisse essa unidade e fosse um guia para o progresso social.

Sendo o homem um animal racional, a razão era parte do desejo por uma vida melhor e mais

completa, conseguida através de um controlo crescente sobre o meio ambiente e Hobson via-a

como um instrumento científico, utilizada para satisfazer interesses e desejos humanos. (Long

1996: 9)

Para Hobson a estrutura orgânica da sociedade não era constituída pela soma de

utilidades individuais, mas a utilidade social ou orgânica necessitava ser alcançada como um

fim em si mesma. Assim, o organicismo como argumento liberal era a favor da necessidade

de garantir o bem-estar individual, sem o qual a sociedade não poderia desenvolver-se

50

Freeden (2010: 122). Sendo a sociedade um “organismo” no qual as partes eram mutuamente

dependentes, nenhuma instituição poderia ser entendida apenas como um meio racionalmente

concebido para um fim único e específico. Os fenómenos sociais e políticos deveriam ser

vistos em termos das suas funções em relação a todo o complexo tecido social. (Porter 2008:

145). Para Hobson, como para os liberais idealistas, o Estado devia estar moralmente ao

serviço da promoção do bem comum e da elevação de todos os membros da sociedade a uma

condição civilizada, sendo para isso necessária uma intervenção estatal positiva, embora os

liberais discordassem quanto à medida desejável dessa intervenção. O Estado deveria dedicar-

se à proteção da vida, haveres e liberdade dos indivíduos, isto é, ao seu bem-estar, e poderia

fazê-lo muito melhor do que cada membro da sociedade por si, provendo às necessidades

coletivas.

O Estado podia ser encarado, em termos políticos e económicos, e do ponto de vista da

analogia orgânica, como o núcleo social central imprescindível para controlar os poderosos

interesses setoriais da indústria, quer de empresários, quer de trabalhadores, que haviam

emergido como forças políticas da sociedade moderna. Esta visão do papel do Estado na

economia e na política social contrastava grandemente com a condição do Estado laissez-faire

do velho liberalismo (Long 1996: 23).

John Ruskin, sobre quem Hobson escreveu, tendo publicado John Ruskin: Social

Reformer em 1898, abordara a sociedade de uma perspetiva económica e uma das suas

intenções foi definir o conceito de “riqueza” de forma mais profunda do que os economistas

clássicos haviam feito. Na economia política de Ruskin, uma dada quantidade de riqueza

objetiva podia produzir níveis de satisfação subjetiva, dependendo de como aquela era

produzida e consumida. Riqueza não era na essência o mesmo que bem-estar. Na sua

autobiografia Hobson cita Ruskin (2011: 39):

There is no wealth but life. Life, including all its powers of love, of joy, and

of admiration. That country is the richest which nourishes the greatest

number of noble and happy human beings; the man is richest who, having

perfected the functions of his own life to the utmost, has also the widest

influence, both personal and by means of possessions, over the lives of

others.

Para Ruskin a riqueza não tinha qualquer valia se não fosse aproveitada por alguém, se

não lhe fosse atribuído valor, mas Hobson considerava que ele esquecera os custos humanos

para a aquisição dessa mesma riqueza. A diferença entre Hobson e Ruskin reside no facto de

51

que, enquanto para Ruskin a sociedade seria essencialmente um conceito económico, para

Hobson ela era também uma estrutura política, mas foi dele que Hobson extraiu a base do seu

pensamento económico para produzir as obras que se seguiram. Afirmou (2011: 43): “From

him [Ruskin] I learned the necessity of going behind the current monetary estimates of

wealth, cost, and utility, to reach the body of human benefits and satisfactions which give

them real meaning”. Para Hobson o “valor” real de uma coisa não era o preço pago por ela

nem a quantidade de satisfação que produzia no consumidor, mas antes o serviço inerente ao

seu uso (Porter 2008: 172). Comparando Hobson e Ruskin, Porter afirma:

But the important point is that Hobson had been brought up to believe that

economics was inviolable and the pursuit of ‘wealth’ universally beneficial,

and now Ruskin had come to tell him that this was not so. The implications

of this to Hobson were profound. The belief that there was no need to

regulate the economic system, because it worked better on its own, was

discredited. Economics could now come within the scope of policy. And

that policy should recognize the primacy of social and moral values over

impersonal economic ones.

Segundo David Long (1996: 26) o novo liberalismo de Hobson, assim como as suas

ideias sobre a racionalidade humana, a ciência social e o bem-estar, inspiraram-se na

terminologia orgânica. Foi uma tentativa de compromisso entre o laissez-faire do liberalismo

do séc. XIX e o tom autoritário do socialismo da esquerda mais radical. O seu conceito de

organização social e a necessidade de intervenção estatal foi também influenciado pela sua

teoria da mais-valia (surplus value) de que falaremos mais adiante. Com a sua analogia entre

a sociedade e um organismo, conseguiu demonstrar as deficiências do individualismo

metodológico que analisa a ação humana a partir de agentes individuais, em detrimento de

uma visão holística da sociedade, segundo a qual o ser humano é indivisível e não pode ser

entendido através de uma análise separada de suas diferentes partes.

Rodney Barker escreveu (1978: 23):

(…) he argued that the common interests and functions which identified

society had a distinctive claim, and one which was made through the central

organizing intelligence represented by the state. The organic analogy was

employed also to assert the rights of the community as a whole, by destroying

the individual claim to property or to the creation of the value of property.

52

Mas ao mesmo tempo que afirmava a primazia da sociedade sobre os seus membros

individuais, Hobson avançava também com uma série de exigências para esses indivíduos,

baseadas nas necessidades da comunidade orgânica vista como um todo. Os argumentos a

favor do sufrágio universal são um bom exemplo da necessidade de envolver nos assuntos do

governo todos os que por ele eram afetados.

3. 4. O economista herege

De acordo com Richard Shannon, uma das tarefas do liberalismo foi associar o

imperialismo a uma crítica da situação interna, explicando-o como resultado de distorções e

injustiças económicas. A este propósito escreveu (1976: 218):

The owners of industry, out of reactionary opposition to social reform,

refused to make a possible social regeneration through economic re-

investment and reconstruction. The first mature formulation of this Liberal

theory would come from Hobson in 1902; but already by 1889 he had

developed a theory of domestic underconsumption which became the key to

the economic interpretation of imperialism [The Physiology of Industry,

with A. F. Mummery]

Esta teoria baseava-se no argumento de que era da natureza do capitalismo maximizar

os lucros, pagando salários baixos aos trabalhadores, pelo que estes nunca teriam capacidade

económica para adquirir os bens que produziam. Desta forma, os capitalistas não poderiam

investir os lucros no aumento da produção nem conseguiriam vender os bens aos seus

próprios trabalhadores, sem antes aumentar os salários. Preferiram rejeitar esta solução e

investir no estrangeiro, onde havia mão-de-obra mais barata e se abriam novos mercados, o

capital excedentário, que lhes daria a oportunidade de continuar a aumentar os lucros

(Shannon 1976: 219). E, segundo Hobson, isso deu origem ao imperialismo. Para se

conseguir novos mercados, usou-se o erário público em proveito de interesses privados e

reforçou-se a máquina militar para forçar as “raças inferiores” a consumir os bens produzidos

pelos trabalhadores britânicos, entretanto empobrecidos pela má distribuição da riqueza.

(Koebner &Schmidt 1964: 223).

Numa abordagem marxista, Hobson atribuiu o problema ao excesso de poupança

53

(over-saving), pelo qual a riqueza acumulada pelos ricos não encontrava investimentos

internos lucrativos, dada a falta de poder de compra da classe operária, pelo que era escoada

no império, sobretudo nas minas de ouro da África do Sul. Para Hobson essas poupanças

deveriam antes ser investidas ou consumidas internamente (Andrew Porter 1999: 692). Em

Imperialism (1975: 88-89) apontou as falhas do capitalismo na Grã-Bretanha industrial:

If the industrial revolution had taken place in an England founded upon

equal access by all classes to land, education and legislation, specialization

in manufacturers would not have gone so far … foreign trade would have

been less important, though more steady; the standard of life for all portions

of the population would have been high, and the present rate of national

consumption would probably have given full, constant, remunerative

employment to a greater quantity of private and public capital than is now

employed.

Na autobiografia Hobson defendeu a sua teoria face aos críticos, esclarecendo que esta

sua “heresia” não era dirigida aos que usavam de parcimónia (thrift) e se sacrificavam para

conseguir poupar. Afirmou (2011: 32-33):

So it came about that the theory of over-saving committed a deadly offence.

(…)I found, and still find, it idle to protest that my argument against over-

saving was not directed against individual thrift, that it left it open to any

thrifty individual to spend as little as he chose of his income and to save as

much.

Para Porter (2008: 191) a necessidade de escoar o excesso de produção e de

população, que os mais radicais identificavam com imperialismo, foi usado pelos

imperialistas como justificação para a expansão colonial, acabando por esvaziar a denúncia do

imperialismo pelos liberais, que não podiam deixar de a defender em termos económicos, mas

Hobson considerava esse argumento uma ilusão. Perplexo e indignado pelo apoio irracional à

política expansionista, afirmou em Imperialism (1975: 46):

Seeing that the Imperialism of the last six decades is clearly condemned as a

business policy, in that at enormous expense it has procured a small, bad,

unsafe increase of markets, and has jeopardized the entire wealth of the

54

nation in rousing the strong resentment of other nations, we may ask, ‘How

is the British nation induced to embark upon such unsound business?’

Rejeitou liminarmente os argumentos que defendiam a expansão para os trópicos

como solução para o problema do excesso de população britânica, e ainda os da importância

desses mercados para o aumento do comércio. Muito poucos emigraram para aquela zona,

dadas as condições climatéricas ali existentes, o comércio para essa zona foi sempre reduzido

e, pelo contrário, registou-se um enorme aumento da despesa militar para proteger esses

territórios. Para Hobson, mais importante que o comércio externo, era o comércio interno, que

representava um maior peso na receita nacional. Perder mercados fora do país não afetava

grandemente a economia nacional, segundo os seus cálculos. Afirmou (1975: 31): “There is

some reason to hold that Great Britain had, in 1905, reached an industrial level where external

trade, though still important, will be relatively less important in her national economy.” Se o

sistema funcionasse corretamente a nível interno, a oferta e a procura estariam equilibradas,

não havendo necessidade de mercados externos.

Para Hobson a expansão imperialista era, antes de mais, uma questão ética, devendo o

império ser questionado quer política quer economicamente em termos da sua utilidade social:

de que forma a Grã-Bretanha poderia utilizar o seu voluntarismo em prol do bem-estar

mundial; se seria mais útil limitar-se ao seu território e aí explorar os recursos existentes ou

expandir-se comercialmente para outras regiões do globo; quais as partes do mundo em que a

expansão desse voluntarismo seria mais benéfica e quais os elementos do imperialismo mais

significativos para a resolução dos problemas sociais britânicos. Embora numa primeira fase

Hobson considerasse absolutamente desnecessária e imoral a existência do império,

posteriormente, com o “contributo” dos darwinistas sociais, passou a considerar válida a

exploração de terras não aproveitadas pelos habitantes indígenas por parte de uma cultura

mais avançada, desde que isso não significasse a exploração e a civilização forçada das “raças

inferiores”. (Claeys 2012: 253)

Esta posição de Hobson assemelhava-se muito à de Kidd, doutrinário do darwinismo

social, que defendia um modelo iluminado de imperialismo, segundo o qual o controlo

imperial se justificava através da “ eficiência social”. Em 1908 numa conferência do Rainbow

Circle, dissertando sobre “National versus Individual Standards of Morality”, Hobson

defendeu que a lei suprema de uma nação era o seu interesse próprio e reconheceu que a

invasão de uma nação mais fraca por uma mais forte era injustificável se acontecesse entre

estados com o mesmo nível civilizacional, mas completamente aceitável se o estado mais

55

fraco fosse atrasado ou bárbaro, podendo assim beneficiar da civilização imposta e cujo

desenvolvimento fosse benéfico para o resto do mundo, mas defendia sanções por parte de

uma sociedade de nações, contra a ingerência de uma nação imperialista na vida de um povo

mais fraco. Afirmou Hobson (Freeden 1990: 178)9:

No nation can live to itself. This thought justifies interference with an

institution like slavery (…) A nation has the right to interfere when it has

been delegated by a Society of Nations to put a stop to some monstrous

custom. This is different from saying: “We are a superior nation, and must

send armies and administer in the name of humanity. It embodies the

remoralising policy that is characteristic of our day. We look forward to the

same moral relations now prevalent between nations as are now between

individuals.

Apesar do interesse da atitude filosófica e ética de Hobson em relação ao império, que

não pode considerar-se anti-imperialista, no sentido em que ele não rejeitava de todo o a

expansão territorial sob o pretexto da utilização de novas matérias-primas e aceitava a

justificação de Kidd e dos Fabianos, segundo a qual os recursos naturais eram património da

humanidade e deveriam, por isso, ser explorados de forma legal pelas nações mais capazes,

quer as menos capazes aceitassem ou não (Claeys 2012: 260), importa nesta fase do estudo

dar relevância às suas interpretações económicas do imperialismo que, como já se referiu

anteriormente, encaravam a expansão colonial como uma força de reação às reformas sociais

e à democracia. Tendo sidos referidos noutros capítulos os diferentes elementos da teoria

imperialista de Hobson, cabe agora realçar a importância e analisar tão profundamente quanto

possível a sua obra Imperialism: a Study, em que compilou muitos dos artigos escritos até

então acerca da questão imperial, acrescentando dados estatísticos relativos ao comércio e às

despesas militares.

9 Edição online

56

3. 5 . Estudos hobsonianos

As teorias de Hobson sobre o imperialismo foram ignoradas pelos historiadores

durante grande parte do séc. XX, tendo começado a despertar o seu interesse apenas a partir

dos anos 70, após a publicação em 1968 de Critics of Empire, um estudo no qual Bernard

Porter analisa em pormenor o pensamento político de Hobson e o coloca no contexto do

radicalismo do fim de século na Grã-Bretanha. Porter não só enunciou as justificações do

império, com relevo para as questões do capitalismo financeiro, como também referiu e

pormenorizou o nascimento de críticas severas ao colonialismo britânico, destacando os anti-

imperialistas radicais que defendiam uma reversão no processo da expansão colonial, pelo

facto de a considerarem imoral. Porter concentrou-se em Hobson e nos debates do final do

século sobre a importância e utilidade do império, assumindo-se como pioneiro na análise do

pensamento e textos de Hobson (Porter 2008: xvi):

J. A. Hobson (the main individual), (…) the ‘New Liberals’ and the

Rainbow Circle (…) The place of these people and groups in the evolution

of a new critique of imperialism in the 1890s and early 1900s is explained

below, (…) most of these, however, were almost totally unknown in the

1960s – the main exception was Hobson, and he was not known about much

– which is why I regard myself as their discoverer (a ‘pioneer’)

Bernard Porter (2002: 186) não considerou Hobson um anti-imperialista na plena

aceção do termo, já que este respeitava os motivos genuínos daqueles que defendiam a

expansão colonial, alinhando com a opinião dos liberais, para quem se deveria proteger ou

“civilizar” os mais fracos, além de que os povos “primitivos” deveriam ser governados por

outros povos de civilização mais avançada, durante algum tempo e para o seu próprio bem,

aceitando mesmo que os recursos dos territórios desses povos fossem explorados e

administrados pelos ocidentais, mesmo contra a vontade dos nativos. No entanto Hobson veio

a concluir que as nações imperiais não eram suficientemente confiáveis para tal tarefa e

apelou a uma supervisão internacional.

Para Porter, tal como para Hobson, o anti-imperialismo britânico manifestou-se de

forma mais visível durante e após a guerra dos boers, referindo os nomes dos maiores

“críticos” na época: John Morley, William Morris, Hobson e Herbert Spencer, oriundos de

57

áreas que iam desde a política à filosofia. Do mesmo modo, salientou que uma das

características mais importantes do sentimento imperial foi o jingoísmo, responsável pela

exaltação patriótica da direita e por muita da especulação de esquerda sobre o imperialismo.

Foi este sentimento nacional que muito indignou Hobson pelo efeito de ricochete que o

imperialismo acabou por ter na Gã- Bretanha.

A republicação de Critcs of Empire em 2008 justificou-se pela atualidade das questões

levantadas cem anos antes por Hobson e outros radicais aquando e devido à intervenção no

Iraque em 2003, entre outras por tropas britânicas, feita em nome de questões humanitárias,

segundo o primeiro-ministro Tony Blair, mas ainda assim considerada imperialista por muitos

setores. A teoria capitalista do imperialismo formulada por Hobson continua atual porque

embora o império britânico tenha terminado, o imperialismo não morreu com ele. Basta

substituirmos “Império Britânico” por “Estados Unidos” e “ouro” por “petróleo” e facilmente

constataremos que a crítica de Hobson no final do século ainda se aplica ao mundo de hoje.

Em 1990 Michael Freeden supervisiona a obra Reappraising J. A. Hobson: Humanism

and Welfare, para assinalar o 50º aniversário da morte de Hobson, na qual apresenta visões

diferentes e por vezes contraditórias do pensamento económico, político e social hobsoniano,

através de uma compilação de ensaios de diversos autores, que procuram não só atestar a

invulgar amplitude intelectual de Hobson, como também explicar os diferentes aspetos do seu

pensamento, com o objetivo de corrigir a injustiça da sua marginalização pelos académicos

dos finais do séc. XIX e ainda de o colocar no merecido lugar de criador da ideia de bem-estar

social para os britânicos. Freeden afirma que Hobson é um pensador progressista cuja

influência só se fez sentir a partir dos anos 70 do séc. XX (1990: 2):

This volume is intended to demonstrate, however, that Hobson’s claim to

distinction is now perceived as based on firmer and more extensive ground,

that his work was part of a broader and interrelated – or, as he would have

it, organic – concern with social, political, economic and ethical issues, and

that a reappraisal of the impact of his writings in those areas must confirm

the belated recognition of his continuous, if often unacknowledged, role as a

social theorist of consequence.

Não se trata de uma visão geral da obra de Hobson, mas os ensaios deitam um pouco

mais de luz sobre as áreas a que se dedicou, não cedendo à tentação de o analisar apenas como

autor de um livro mais ou menos famoso, Imperialism, ou o precursor de uma teoria polémica

como foi a do imperialismo económico que, como veremos adiante, tantas vozes críticas

58

levantou, mas mais como o fulcro de uma geração vibrante de indivíduos de esquerda e de

pensamento radical, devotados às reformas sociais e políticas pelas quais lutavam nos círculos

intelectuais que frequentavam, com consequências políticas nas eleições de 1905, que deram a

vitória aos liberais, e ainda como uma referência para as práticas do pensamento atual.

Dos oito ensaios que compõem a coletânea e que contam com a colaboração de nomes

como Bernard Porter, P. J. Cain, Peter Clarke, John Alett ou o próprio Michael Freeden, todos

autores reputados ligados às questões económicas e ideológicas do império, destacaremos o

de Cain “Variations on a famous theme: Hobson, international trade and imperialism, 1902-

1938”, no qual o autor analisa a evolução das teorias de Hobson ao longo das três publicações

de Imperialism, afirmando (Cain: 31) que ele se manteve firme quanto à ideia de que o

imperialismo era um dos frutos do subconsumo e do excesso de poupança, que gerava

enormes fluxos de capital internacional, cujos lucros apenas beneficiavam os financeiros

enquanto eram pagos por toda a nação. Para Hobson a única forma de eliminar o imperialismo

era através da transformação radical da natureza do capitalismo que havia sofrido uma

evolução perversa e desnecessária. Mais tarde, refere Cain (p. 32), Hobson encarava por vezes

o crescimento da economia internacional como uma força benigna, suscetível de elevar o

nível de vida da população e podendo mesmo tornar-se um meio para atingir a democracia

económica, considerando assim o imperialismo uma fase necessária na senda por uma

sociedade mundial próspera e pacífica. Cain considera a obra de Hobson um puzzle, mas não

aceita as críticas que a referem como inconsistente. Afirmou (p.51):

(…) he offered two different paths to progress at different times. When there

was peace and rapid growth, Hobson expected a steady drift towards reform.

The expansion of international trade was then an aid to progress because it

raised living standards and increased international interdependence,

eliminating imperialism along the way.

Durante a guerra dos boers, na segunda metade da 1ª Grande Guerra e nos finais dos

anos 30 do séc. XX, Hobson percebeu claramente que a economia estava demasiado

debilitada para gerar progresso, mas alimentou esperanças de que houvesse uma reação

interna de toda a nação que levasse à morte do imperialismo. Cain afirma que Hobson, mais

do que utópico, é “eucrónico” (P.52): “Hobson (…) projected the good place, good state of

consciousness and good constitution into a good future time (…)”. Uma sociedade de

mercado, livre das suas imperfeições, constituiria a base económica ideal para se atingir um

futuro risonho.

59

Um segundo artigo que destacamos foi “Hobson’s Evolving Conceptions of Human

Nature”, de Michael Freeden, responsável pela coletânea, no qual o autor descreve a evolução

do conceito de natureza humana para Hobson, através da análise dos seus escritos e das

conferências que proferiu o longo dos tempos, abordando as várias áreas do pensamento sobre

as quais se debruçou e que contribuíram em grande medida para a evolução dos seus

conceitos filosóficos e psicológicos. Partindo da observação empírica e objetiva, Hobson

conseguiu abranger vários aspetos do comportamento humano, incorporando os novos

desenvolvimentos da filosofia, psicologia, sociologia e fisiologia, relacionando-os com

convenções morais mais antigas e ligando-os à perspetiva evolucionista, com impacto

profundo nos seus argumentos. Para além disso os círculos radicais que frequentou,

desenvolveram-lhe uma forte visão social e coletivista, permitindo que, embora sem o rigor

que lhe daria um maior reconhecimento académico, conseguisse produzir em 1901 a sua

maior obra não económica, The Social Problem, que Freeden (2010: 54) considera uma das

mais importantes e originais de Hobson.

Para formular e desenvolver as suas conceções de natureza humana Hobson contou

com a influência de Ruskin, como já referimos anteriormente, e ainda do psicólogo social

Gustave Le Bon que o levou a considerar que a humanidade não era linear ou que uma nação

poderia civilizar outra considerada inferior. Freeden (p.61) cita-o em The Social Problem:

“(…) wide variations of natural environment and of race… [that] oblige us to conceive

civilisation as ‘multiform’”. Mais tarde Hobson abandonou esta ideia, afirmando que

nenhuma civilização era melhor que outra, mas sim diferente. Le Bon veio ainda a influenciar

Hobson na questão da irracionalidade humana e na psicologia das multidões, temas que este

acabou por desenvolver em The Psychology of Jingoism.

Ao longo da vida Hobson evoluiu de tal forma nas suas conceções que, aquando da 1ª

Grande Guerra, conseguia identificar várias camadas no ser humano: uma personalidade

única, um membro de uma classe ou grupo e um membro de uma comunidade mais vasta.

(Freeden 2010: 72). Pertencendo a uma geração com grande dificuldade em articular a ética e

a ciência e em que as novas descobertas sobre comportamento humano podiam abalar os

sistemas de conhecimento já existentes, a tarefa de Hobson foi a de defender um liberalismo

ético amparado na psicologia e sociologia modernas, na persecução do bem-estar humano.

Freeden afirmou (p.73):

Hobson continued in his attempt to diffuse a message whose ideological

content had changed but little, and his multiform ideas on human nature

60

helped to buttress his belief both in the white bases of the social sciences

and in the political programmes he persistently endorsed. Psychology

afforded insights into human nature that could partly replace the important

functions of questioning, exposition and criticism that philosophy had

provided in the past.

Um outro artigo merecedor de realce foi “Hobson and Internationalism” de Bernard

Porter, no qual o autor examina a afinidade de Hobson com as teorias internacionalistas de

Cobden. Porter destaca 1940 como sendo, para além do ano da morte de Hobson, o ano em

que a Alemanha ocupou a Bélgica, a Holanda e o norte de França e em que a Grã-Bretanha

entrou de facto na guerra, algo que desgostou tão profundamente Hobson, que sempre

abraçara as teorias pacifistas de Cobden segundo as quais, como já referimos noutro capítulo

deste estudo, o free trade conduziria à paz mundial e se isto se verificou até à morte de

Cobden em 1865, o mesmo não sucedeu durante a vida de Hobson que assistiu à expansão

colonial em África, à guerra dos boers, à 1ª Grande Guerra e ao início da segunda, o que lhe

provocou e a muitos liberais uma grande desilusão quanto a uma visão cobdeniana das

relações internacionais.

A nível interno Hobson via ainda muitas semelhanças entre a Grã-Bretanha atual e a

de Cobden, uma vez que a democracia aparentemente ainda não funcionava: a maioria não

tinha ainda direito de voto, os plutocratas haviam substituído os aristocratas no poder e

contavam agora com a imprensa para controlarem a opinião pública. Hobson via a democracia

como o meio para atingir uma ordem mundial racional e nesse sentido preconizava três

medidas chave para educar a população: uma imprensa verdadeiramente livre; escolas não

sectárias; e que o púlpito e o palco fossem veículos de transmissão do pensamento livre. (p.

174). A solução, segundo Hobson, era empenhar os internacionalistas liberais na tarefa de

libertar e depurar estes órgãos de opinião. A antítese de tirania não era, segundo Hobson, a

anarquia, mas antes a democracia e se o capitalismo internacional fora arrebatado por

interesses especiais, impunha-se que o “interesse geral” retomasse o controlo. Porter escreveu

(p.181):

Hobson’s internationalism was similar to Cobden’s in many ways. It saw the

salvation of the world in the peaceful and profitable exchange of goods

between men. It believed that that exchange should ignore national barriers

(…) It regarded economic and political liberty as essentially complementary,

so that there was no question of the former needed to be imposed.

61

Uma das obras mais completas sobre Hobson é Hobson and Imperialism: Radicalism,

New Liberalism, and Finance, 1887 – 1938 de P. J. Cain, publicada em 2002, na qual o autor

analisa a evolução das ideias de Hobson sobre a economia do império entre 1898 e 1914,

colocando-o na senda dos radicais e liberais que, a partir da Guerra da Independência

Americana, passaram a associar o imperialismo à aristocracia rural, então politicamente

dominante. Cain (45-46) identifica três fases no pensamento imperial de Hobson: até 1891 é

visto como um imperialista social, preocupado com o bem-estar dos mais carenciados, para os

quais antevia consequências desastrosas da política de free trade, favorecendo nesse período o

protecionismo e o imperialismo pela necessidade de novos mercados, vitais para o

crescimento da economia britânica. Após 1891, sob influência de Ruskin e da sua aversão aos

efeitos da política de laissez-faire, tornou-se ainda mais hostil ao free trade, que acreditava

promover o progresso da industrialização, que abominava. É nesta fase que, segundo Cain,

Hobson identificou pela primeira vez o imperialismo como produto direto do capitalismo,

baseado na má distribuição da propriedade, tendo como resultado o excesso de poupança

(oversaving) que só conseguia escoar-se no investimento e no comércio externos. A terceira

fase é já a de “anti-imperilista” convicto e autor de Imperialism: a study, que Cain analisa em

profundidade e que considera ser a maior contribuição de Hobson para o debate sobre as

causas da expansão colonial.

Para remediar a circunstância de ele ser conhecido sobretudo por esta obra, Cain

(p.166) examina e compara outras obras e artigos de Hobson sobre o imperialismo no

contexto do seu pensamento económico, social e político, revelando-nos a evolução das suas

ideias e atitudes relativamente ao império, à finança e ao comércio internacional, estudo que

considera ter sido muito descurado, até por si próprio. Cain pretende dar a conhecer a figura

algo “sombria” de Hobson: do homem pouco se sabe, mesmo após a leitura da sua

autobiografia; do intelectual é possível um maior conhecimento através dos textos e das

referências que dele fizeram outros autores. Ainda assim, Cain (p.13) considera que Hobson

pode ser visto como um intelectual já muito afastado do nosso tempo e com pouca influência

nos nossos dias: a sua filosofia baseada na busca racional por um bem comum está deslocada

na nossa época, na qual grande parte da satisfação das nossas necessidades é tomada por

certa; o seu anti-semitismo e alguns sinais de eugenismo são atualmente incómodos e podem

lançar muitas dúvidas sobre a autenticidade do seu liberalismo. Mas para além destas

constatações, Cain refere ainda as inconsistências e as limitações intelectuais de Hobson, bem

como alguma falta de rigor académico, mas elogia a amplitude do seu conhecimento que

poderá hoje em dia embaraçar qualquer estudioso ao abarcar áreas como a política, a

62

sociologia, a economia ou a biologia.

Apesar das inconsistências detetadas, Cain considera que Hobson, ao longo da vida, se

manteve firme na convicção de que a democracia económica e o internacionalismo acabariam

por vencer o elitismo e o imperialismo, apenas hesitando quanto ao modo e ao período em

que essa transformação ocorreria. Hobson buscava um mundo utópico de prosperidade e de

paz, ajustando muitas vezes os seus argumentos intelectuais a qualquer situação política e

económica interna ou externa. Cain afirmou (2002: 240):

The New Liberalism’s, and Hobson’s, great achievement was to identify

capitalist monopoly and inequalities as the major hindrance to the growth of

a pure capitalism and to campaign for its reform. But, in doing so, Hobson

came up against the dilemma that earlier radicals had faced: that the same

extension of international trade which offered the possibilities of spreading

the new moral world of industry could also, while the ‘classes’ remained

powerful, be a carrier of war and imperialism

A obra mais recente sobre Hobson e o imperialismo, e a última a que faremos

referência neste capítulo, é Imperial Sceptics, da autoria de Gregory Claeys e publicada em

2010. Devido a um maior distanciamento histórico, Claeys (2010: 7) desafia a narrativa

histórica dominante sobre as primeiras manifestações de anti-imperialismo na Grã-Bretanha

vitoriana, segundo a qual a oposição interna ao império surgiu como resposta à guerra dos

boers e que Imperialism: a study de J. A. Hobson foi a obra intelectualmente mais articulada

sobre a questão. Claeys vem nesta obra propor uma nova cronologia do anti-imperialismo,

situando-o nos anos 50 do séc. XIX, com o desenvolvimento de críticas positivistas ao

império, recuperando assim um aspeto muito descurado do anti-imperialismo. Revela ainda a

diversidade e ambivalência das reflexões socialistas sobre o império e reformula o

pensamento de Hobson e a relevância da sua obra à luz desta nova contextualização: as suas

explicações financeiras sobre o capital excedentário para a expansão colonial podem agora ser

vistas como versões metódicas e sistemáticas dos argumentos desenvolvidos pelos positivistas

e adotadas pelos socialistas durante as décadas seguintes.

Após vasta investigação realizada a relatos e documentos da época, Claeys (p.8)

conclui que o primeiro indício de oposição à expansão colonial se registou após o Indian

Mutiny de 1857, com a publicação de textos anti-imperialistas de uma dezena de positivistas

britânicos, sendo essa uma das razões que o levou a dedicar grande parte da obra à

reabilitação da corrente iniciada por Auguste Comte e ao contributo dos seus seguidores para

63

o debate sobre a rejeição do imperialismo. Claeys (p.8) considera ainda que a influência dos

socialistas no pensamento anti-imperialista era ambígua dado que, embora muitos fossem

verdadeiros Little-Englanders e defendessem o fim da expansão e mesmo a independência

dos territórios colonizados, outros assumiram atitudes claramente pró-imperiais e enalteceram

a missão civilizadora dos britânicos.

Claeys escolheu terminar a obra com Hobson, tendo afirmado (2010: 7): “This book

ends rather than beginning with Hobson, and attempts to define a much wider preexisting

spectrum of thought for contextualizing his contribution to the debate than has been identified

previously.” Analisa as origens da explicação de imperialismo associadas a Hobson,

concluindo que ele é um imperialista social. Claeys afirmou (2010: 260): “(…) firstly, the

imperialist component, namely the justification of continuing exploitation of tropical

resources by European nations, particularly by ‘coercive’ means; and secondly, the socialist,

that this exploitation was proposed to be undertaken in a ‘socialist’ manner.” Claeys explica

que a transição de Hobson de uma atitude imperialista para uma visão mais internacionalista

se deveu à influência de William Clarke, editor da Progressive Review, genuinamente anti-

imperialista e positivista. Frisa também a força desta corrente no pensamento e evolução de

Hobson, que nos círculos e grupos que frequentou, se relacionava com muitos dos seus

seguidores, sendo algumas das suas conceções sociológicas, como por exemplo a conceção

orgânica de sociedade ou o seu conceito de utilidade social, baseadas na filosofia positivista.

Feita a análise dos autores que nas últimas décadas mais se têm destacado no estudo

da personalidade e da obra de Hobson, cada um deles apresentando uma visão diferente dos

vários aspetos a que se dedicou, mas contribuindo todos para uma maior compreensão do seu

pensamento e para uma admiração crescente pela sua figura, importa finalmente integrar este

trabalho na âmbito dos estudos hobsonianos. Propusemo-nos estudar um homem do seu

tempo que soube apreender magistralmente a realidade política e económica, que estudou a

natureza humana à luz de novos conhecimentos, constituindo-se como um dos pioneiros da

sociologia, evoluindo e regredindo com as inevitáveis mudanças ocorridas em meio século,

formulando e reformulando uma série de teorias originais, permanecendo ao longo da vida um

pensador sistemático e inquieto, um “trouble-maker”.

Hobson foi um economista político e utilitarista liberal social que viveu durante o

declínio da ideologia liberal e a 1º Guerra Mundial, sendo muitos dos seus argumentos uma

reação à crise do liberalismo e a sua tentativa em alargar a análise para fundar uma economia

“moral” uma censura muito séria ao imperialismo que, ainda assim, constituiu um desafio

para o liberalismo, dada a incompatibilidade com uma mundivisão que privilegia uma cada

64

vez maior liberdade individual. Como liberal, Hobson optou por dar mais atenção aos

acontecimentos internos e lutar por reformas sociais, dados os prejuízos que, na sua visão, o

imperialismo provocou na Grã-Bretanha, afetando grande parte da população.

Cem anos passados sobre o período a que esta dissertação respeitou, pensamos ter

contribuído para a ideia de que Hobson, homem de grande visão, esteve sempre muito à frente

do seu tempo. As suas análises económicas e sociais, criticadas e ignoradas na época,

anteviam uma realidade que faz ainda todo o sentido nos nossos dias: o capitalismo domina

através de empresas multinacionais que manipulam os governos, conseguindo da parte destes

toda a proteção possível na sua busca do lucro, ainda que sacrificando as populações locais.

Embora essas corporações já não possam contar com a aquisição de novos territórios por parte

dos governos, exercem sobre estes uma enorme pressão e influência quando se trata de

proteger os seus interesses, ao ponto de, se necessário, os levar à demissão, substituindo-os

por outros que continuem a fazer o mesmo trabalho sujo contra as populações indefesas.

Nesse sentido, Hobson e Imperialism: a study transmitem uma mensagem hoje cada vez mais

evidente: a economia está na origem de todas as questões mundiais.

65

4. Imperialism: a Study de J. A. Hobson

4. 1. Receção e impacto da obra

Aquando da sua publicação em 1902, Imperialism recolheu críticas negativas por

parte de diversos setores, mesmo os liberais e radicais que, tal como Hobson, condenavam os

danos que a expansão imperial trazia à Grã-Bretanha, alinhando na sua defesa do free trade e

nos ataques ao imperialismo, mas não no seu reformismo de cariz novo-liberal, que

considerava o Estado como importante ator económico, optando por seguir a visão

gladstoniana, dominante no Partido Liberal até ao início da I Guerra Mundial. De uma forma

geral as críticas dirigiam-se sobretudo à forma excessiva e veemente como Hobson expunha

os seus argumentos.

Segundo Jules Townshend (1990: 32) o impacto de Imperialism terá sido diminuto e

sua receção muito diversa. Enquanto os Little Englanders e alguns socialistas, como Leonard

Woolf, que se opunham à guerra dos boers, o acolheram bem, os liberais mais tradicionais

mostraram-se avessos a teorias de imperialismo financeiro, ainda que partissem de um novo

liberal. De acordo com Cain (2002: 261-2), a maior discussão após a publicação da obra deu-

se na Edinburgh Review, para a qual contribuíram opiniões diversas dos seus colaboradores,

concordando com Hobson quanto aos poucos benefícios que as novas aquisições em África

haviam trazido à Grã-Bretanha e no facto de o imperialismo ser prejudicial à prosperidade do

país, mas discordando da forma como ele apresentou os seus argumentos, bem como da sua

análise de underconsumption, muito hostil ao capital. Foi ainda Cain quem afirmou (p.164)

que a influência que Imperialism poderia ter tido após a sua publicação foi muito

enfraquecida pela firme convicção de Hobson em relação à falta de capacidade britânica na

gestão do seu império e ainda quanto ao papel nefasto da Grã-Bretanha no contexto da

economia mundial, opiniões aceites apenas por uma pequena fação de liberais.

De acordo com Koebner & Schmidt (1964: 256) a partir das teorias de Hobson sobre

o imperialismo, o termo passou a ter uma nova conotação e a suscitar atitudes irracionais e o

impacto do seu pensamento fez-se sentir sobretudo na segunda década do século XX, não

tanto na Grã-Bretanha, mas na Alemanha e na Áustria, onde alguns socialistas enquadraram o

imperialismo de Hobson nas teorias marxistas. Na Suíca o exilado russo Lenin incorporou

também o pensamento hobsoniano e em 1914 associou o imperialismo ao capitalismo e à

guerra, tentando agitar as massas através de vários panfletos revolucionários. Atribuiu duas

funções principais ao imperialismo, segundo Koebner & Schmidt (1964: 269): “It became the

symbol of exploitation of the proletariat by the capitalists. It also became the symbol of the

66

oppression of small nations by the big Powers.” Em 1916 publicou, recuperando muito do

pensamento de Hobson, Imperialism, the Highest Stage of Capitalism.

4. 2. Relevância económica da obra

Por ocasião da morte de Hobson, ocorrida em Abril de 1940, o historiador G. D. H.

Cole escreveu um artigo, publicado no vol. 50 do Economic Journal em Julho desse ano, no

qual afirmou:10

(…) But Hobson was never mainly an economist in any narrow sense of the

term. He became an economist because he was already a social reformer,

seeking a solution to the problem of poverty; and when he had become an

economist in this way it became imperative for him to fit his economics into

the wider structure of his Liberal philosophy.

Tal afirmação parece indicar que as teorias de Hobson agradariam muito mais aos

historiadores económicos do que aos próprios economistas que, como vimos anteriormente, o

consideraram herege, por não seguir os cânones económicos da época e também por não ser

um dos seus pares. No entanto, Imperialism é a obra que consegue tirar Hobson do anonimato

e consagrá-lo entre os historiadores das ideias económicas. A importância de Hobson como

economista é ambígua: por um lado foi criticado e marginalizado pela ignorância

demonstrada ao analisar alguns conceitos essenciais na economia, como por exemplo os de

over-saving, underconsumption ou investment; por outro, formulou teorias notáveis, para

quem não era especialista na matéria, o que constitui uma atenuante à sua heresia. Michael

Freeden afirmou (2010: 3):

Hobson is worth examining precisely because he is no longer merely the

writer of a particular book, or the precursor of a particular theory, but a

focal point for the unraveling of an idea-set, for the decoding of the

prevalent assumptions, beliefs and purposes of an unusually active and

vibrant generation of individuals dedicated to social and political reform.

10

Edição online

67

E continuou na pág. 4:

(…) the nature of the Hobsonian enterprise was different from the one that

economists were and are expected to pursue. His ultimate guiding

framework was extra-economic, ethical and organic, concerned with the

quality of human production and consumption and with the generation of

non-quantifiable human welfare.

Vimos anteriormente que para Hobson, numa primeira fase, e em termos utilitaristas, a

expansão da civilização poderia justificar o império. Porém, ao longo dos anos foi escrevendo

uma série de artigos que prenunciavam já e seriam a base da sua obra mais famosa,

Imperialism, nomeadamente “Free Trade and Foreign Policy”, publicado em 1898, no qual e

pela primeira vez associou o excedente de poupança (over-saving) à competição pelo

investimento no estrangeiro e identificou de forma clara o atraso que o imperialismo havia

causado ao desenvolvimento económico, político e social do país. Condenou também o uso da

força para conseguir mercados externos que representaria uma violação dos princípios do free

trade, tão caros a Cobden e aos radicais.

Em Imperialism, publicado no outono de 1902, Hobson reuniu nas duas partes

principais da obra as abordagens e análises da questão do imperialismo feitas nos últimos

quatro anos. Na primeira parte explicitou a teoria das causas da expansão colonial: o excesso

de poupança (over-saving) ou o subconsumo (underconsumption) impulsionaram a procura

crescente de novos mercados, e o comércio veio a crescer, não com as colónias e

dependencies britânicas, mas com parceiros comerciais de países rivais, retirando assim

legitimidade e justificação económica ao império e à sua expansão. O argumento central de

Imperialism encontra-se neste excerto (Hobson 1975: 53-54)):

To a larger extent every year Great Britain has been becoming a nation

living on tribute from abroad, and the classes who enjoy this tribute have an

ever-increasing incentive to employ the public policy, the public purse, and

the public force to extend the field of their private investments, and to

safeguard and improve their existing investments.

Hobson defendeu que a expansão do Império Britânico fora sobretudo impulsionada

por um grupo de pressão, que dela beneficiaria, e que compreendia investidores e financeiros.

Apresentou números que demonstravam que enquanto a proporção de negócios levada a cabo

68

dentro do império era demasiado escassa para justificar os custos da sua expansão e

manutenção a partir de 1870, o investimento britânico no exterior crescera de tal forma que,

no final do séc. XIX, os lucros dos investimentos estrangeiros chegaram aos 120 milhões de

libras (1975: 62); Hobson continuou (1975: 63):

In other words, in 1893 the British capital invested abroad represented about

15 per cent of the total wealth of the United Kingdom; nearly one-half of

this capital was in the form of loans to foreign and colonial Governments; of

the rest a large proportion was invested in railways, banks, telegraphs, and

other public services, owned, controlled, or vitally affected by

Governments, while most of the remainder was placed in lands and mines,

or in industries directly dependent on land values.

Porém, Hobson não se limitou a visar o imperialismo britânico e, em Imperialism,

afirmou: “What was true of Great Britain is true likewise of France, Germany, the United

States, and of all countries in which modern capitalism had placed large surplus savings in the

hands of a plutocracy or of a thrifty middle class.” (1975: 54) Essas poupanças só

encontravam forma de aplicação através do investimento estrangeiro, uma forma de

possibilitar que o resto do mundo comprasse mais do que vendia, resolvendo desta forma o

problema do baixo consumo interno. Para Hobson o imperialismo foi um mau negócio para o

país, tendo declarado a propósito: “Although the new Imperialism has been bad business for

the nation, it has been good business for certain classes and certain trades within the nation

[who] usurp control of the national resources and use them for their private gain” (1975: 46).

Citando uma afirmação de James Mill sobre as colónias quase um século antes, “ a

vast system of outdoor relief for the upper classes” (1975: 51), Hobson dividiu os

beneficiários do New Imperialism em três grupos: o primeiro dizia respeito ao comercial

imperialism, mais concretamente empresas de transportes, construção naval, fábricas de

armamento e empresas de fornecimento de serviços à instituição militar, com imenso capital e

dirigidas por pessoas com poder para influenciar a política da época (1975: 47); o segundo

incluía os industriais, que produziam bens como têxteis, ferramentas, maquinaria, que

despachavam para os países que o imperialismo ia anexando, quer a procura fosse real ou não

e que competiam entre si para levar a civilização a zonas longínquas do mundo, tendo assim

muito a ganhar com a expansão colonial; o terceiro grupo compreendia os investidores, que

Hobson considerava os elementos fundamentais para se compreender o capitalismo moderno

e acerca dos quais escreveu (1975: 56):

69

Investors who have put their money in foreign lands, upon terms which take

full account of risks connected with the political conditions of the country

desire to use the resources of their Government to minimize these risks, and

so to enhance the capital value and the interest of their private investments.

The investing and speculative classes in general have also desired that Great

Britain should take other foreign areas under her flag in order to secure new

areas for profitable investments and speculation.

Hobson distinguia entre os investidores, em geral, e os financeiros que traficavam em

investimentos, caracterizando os últimos da seguinte forma (1975: 57): “(…) men of a single

and peculiar race, who have behind them many centuries of financial experience, they are in a

unique position to manipulate the policy of nations.” Eram estas dinastias financeiras, muito

bem organizadas, quem controlava a política imperial. Na pág. 59 de Imperialism, Hobson

escreveu:

The wealth of these houses, the scale of their operations, and their

cosmopolitan organisation make them the prime determinants of imperial

policy. They have the largest definite stake in the business of Imperialism,

and the amplest means of forcing their will upon the policy of nations.

Hobson culpabilizou os parasitas financeiros, como lhes chamou, (1975: 46) que

investiam em países subdesenvolvidos na expectativa do lucro que o investimento interno não

lhes traria, dado o fraco poder de compra da classe operária nessa época, atribuindo-lhes ainda

muitos dos danos que o imperialismo causava ao país, não negando porém a importância que

os fatores não económicos tais como o patriotismo, a busca de aventuras, as operações

militares, a ambição política e a filantropia desempenhavam na expansão imperial. Na pág. 59

de Imperialism afirmou:

It is true that the motor-power of Imperialism is not chiefly financial:

finance is rather the governor of the imperial engine, directing the energy

and determining its work (…) An ambitious statesman, a frontier soldier, an

overzealous missionary, a publishing trader, may suggest or even initiate a

step of imperial expansion, may assist in educating patriotic public opinion

to the urgent need of some fresh advance, but the final determination rests

with the financial power.

70

Devido à sua obsessão com os financeiros, segundo P. J. Cain (2007: 110), Hobson

pouco escreveu acerca do estado da economia até ao capítulo VI da obra. Aí reiterou o

argumento principal da expansão colonial: o excesso de produção de bens e de capital,

agravados pelo crescimento da competição internacional, tornou premente a existência de

novos mercados, mas reafirmou também a ligação já anteriormente estabelecida por si entre o

imperialismo e os erros do sistema capitalista: subconsumo (underconsumption), excesso de

poupança (oversaving) e distribuição desigual e injusta da riqueza (maldistribution) (Koebner

e Schmidt (1964: 254). Hobson constituiu estes fatores como a taproot do imperialismo e

explicou que a má distribuição da riqueza produzida e concentrada nas mãos de poucos os

levava a um excesso de poupança que investiam fora do país, criando deste modo pressão

para mais expansão colonial, na ânsia por novos mercados, o que seria evitado se houvesse

uma redistribuição do rendimento no mercado interno.

Segundo Porter (2008: 215) há em Imperialism duas teorias económicas: uma teoria da

“conspiração” e um “modelo” económico. A primeira, já referida anteriormente, surgiu na

sequência da visita de Hobson à África do Sul e sobre ela escreveu Porter: “This conspiracy

theory attributed to a financial clique the manipulation of imperial sentiment in the interests of

their own selfish greed.” Sem relação com esta, Hobson formulou ainda uma teoria original

que colocava o imperialismo no topo de um modelo económico, cuja raiz era a distribuição

desigual e injusta da riqueza. Embora os financeiros estivessem no centro da teia imperialista,

Hobson deixou-os de fora da sua teoria do subconsumo. Porter afirmou a este respeito:

When the ‘cosmopolitan Jews’ of the Rand forced Britain into war, they did

so because they wanted bigger profits, not because they needed fields for

investment. The financiers, therefore, Hobson could strongly condemn on

moral grounds; the industrialists and investors, forced into a course of action

by circumstances beyond their control, he had, to a certain extent, to

sympathise with.

Em Imperialism Hobson demonstrou como a política externa e colonial britânicas

lesavam o bem-estar do país: o comércio não beneficiou e foi claramente prejudicado por um

sistema protecionista que sacrificava os compradores em detrimento dos que obtinham lucro

(Porter 2008; 223). O imperialismo aumentava os impostos indiretos, estimulava a guerra e

tudo o que ela acarretava: despesas militares, competição de armas, militarismo, serviço

militar obrigatório e era inimigo mortal da paz e da economia. (Hobson 1975: 139)

71

Hobson foi um liberal social utilitarista e um economista político que viveu na época

do declínio do liberalismo, constituindo grande parte dos seus argumentos reações à crise da

ideologia liberal, cujos políticos não encontravam respostas para os muitos problemas que

afligiam a sociedade britânica, absorvidos que estavam pelas questões do império. Afirmou

Hobson (1975: 144):

It is not that Liberals have openly abandoned the old principles and

traditions, but that they have rendered them of no account by dallying with

an Imperialism (… ) [which] signifies that they have preferred the economic

interests of the possessing and speculative classes, to which most of their

leaders belong, to the cause of Liberalism.

4. 3. Hobson e a paixão imperial

Ainda antes da ida à África do Sul durante a guerra dos boers, já Hobson escrevera

acerca das causas da paixão imperial que invadiu a Grã-Bretanha durante o New Imperialism,

vindo a acentuar-se durante o conflito, tendo analisado as ideias mais populares na época,

desde a de “missão civilizadora” até à do manifest destiny, invocadas como causas para a

expansão imperial, com a vantagem de absolverem a nação de sentimentos de culpa (Cain

2007: 100-101). Por detrás destas ideias Hobson identificou emoções primárias e assustadoras

sintetizadas na palavra jingoism, que descreveu da seguinte forma (2009: 2): “primitive

passion, modified and intensified by certain conditions of modern civilisation.”

Numa obra de 1901,The Psychology of Jingoism, Hobson destacou o music-hall como

um dos impulsionadores do jingoísmo e a mais poderosa manifestação de força bruta e ódio

pelos estrangeiros, sobretudo por parte das classes trabalhadoras, para além de uma arma

política muito útil na manipulação da mentalidade do povo britânico, capaz de gerar paixões

patrióticas e glorificar até as atrocidades militares, desde que praticadas em nome do Império.

Para Hobson jingoísmo era uma espécie de patriotismo invertido. Sobre esta questão escreveu

(1901: 3):

Among large sections of the middle and labouring classes, the music-hall,

and the recreative public house into which it shades off by imperceptible

degrees, are a more potent educator than the church, the school, the political

meeting, or even than the press. Into this ‘lighter self’ of the city populace

72

the artiste conveys by song or recitation crude notions upon morals and

politics, appealing by coarse humour or exaggerated pathos to the animal

lusts of an audience stimulated by alcohol into appreciative hilarity.

Na coletânea Imperialism and Popular Culture, publicada em 1986, John Mackenzie

examinou o impacto do imperialismo e a sua penetração ideológica na cultura popular,

referindo Hobson e a sua manifesta aversão ao jingoísmo (p.1):

Contemporaries noted the popular excitements generated by (or

generating?) imperial expansion, but J. A. Hobson destroyed any

respectability a theory of imperialism rooted in them might have had by

linking them with his press and Rands magnates’ conspiracy in his pungent

book The Psychology of Jingoism of 1901.

No segundo capítulo da obra, Patriotism and Empire – Music-hall Entertainment

1870-1914, Penny Summerfield analisou o papel do music-hall como fonte de patriotismo e

importante manipulador das massas a favor do império, salientando a posição de Hobson em

relação a esta questão (1986: 17):

Nineteenth century music hall was known as the ‘fountain of patriotism’.

While some observers praised this development, others such as J. A.

Hobson condemned the music hall for manipulating working-class opinion

in favour of exploitative imperialist policies. Hobson was convinced, by the

absence of mass opposition to the boer war and by the working-class

celebrations of victories (…) that the working-class was infected of

jingoism.

Hobson acreditava que a vida nas cidades, para além da massa de desempregados,

alvos preferenciais da propaganda jingoísta, gerava também seres humanos de espírito fraco,

graças ao trabalho monótono e repetitivo que desempenhavam nas fábricas. Ambos os grupos

eram muitíssimo sugestionáveis e facilmente influenciáveis, constituindo por isso o terreno

perfeito para lavagens ao cérebro sobre domínio racial, o que poderia levá-los rapidamente a

odiar e a querer destruir povos que desconheciam por completo. Em Imperialism (1975: 215)

escreveu:

73

Jingoism is merely the lust of the spectator, unpurged by any personal

effort, risk, or sacrifice, gloating over the perils, pains, and slaughter of

fellow-men whom he does not know, but whose destruction he desires in a

blind and artificially stimulated passion of hatred and revenge.

Segundo Hobson, para exercerem controlo sobre a opinião pública, os financeiros

colocaram a imprensa ao seu serviço e em várias cidades europeias muitos dos jornais mais

influentes eram controlados pelas dinastias financeiras, que os utilizavam com o objetivo de

incutir crenças e sentimentos no espírito do povo e influenciar as políticas públicas.

O mais importante para Hobson era demonstrar como os impulsos imperialistas e

militaristas eram explorados pelos financeiros com o objetivo de alargar as fronteiras do

controlo britânico e provar que a manipulação da imprensa tornara o imperialismo tão popular

que, mesmo os jornais chamados independentes, eram sujeitos a pressões e forçados a

acompanhar a corrente, por receio de perderem receitas provenientes da publicidade. Hobson

continuou (1975:215):

(…) the spectatorial lust of Jingoism is a most serious factor in Imperialism.

The dramatic falsification both of war and the whole policy of imperial

expansion required to feed this popular passion forms no small portion of

the art of the real organizers of imperialist exploits, the small groups of

business men and politicians who know what they want and how to get it.

4. 4. Imperialismo e internacionalismo

Na segunda parte de Imperialism Hobson pôs de parte os argumentos económicos e

centrou-se na defesa do que apelidou de sane imperialism, que mais não era do que a

assunção de responsabilidade das potências ocidentais relativamente ao bem-estar dos povos

colonizados, sobretudo os dos trópicos, tendo contribuido com algumas propostas construtivas

em prol do desenvolvimento daqueles territórios. (Porter 2008: 230) Para além da ligação que

estabeleceu com o parasitismo económico e financeiro, Hobson denegriu ainda mais a

imagem do imperialismo ao associá-lo à guerra, uma vez que as guerras imperiais eram

essenciais à submissão dos povos “atrasados”, servindo para reprimir revoltas e reforçar ou

demarcar as fronteiras que separavam uns impérios de outros. Hobson via o imperialismo

74

como fonte de conflitos entre impérios rivais que poderiam mesmo gerar guerras, como veio a

verificar-se na primeira guerra mundial.

Perante tão severas críticas, poderia pensar-se que Hobson preconizava o fim do

imperialismo tout court como se de uma chaga política, económica e cultural se tratasse, o

que na realidade não se verificou. Ao invés, exigiu a sua reforma e internacionalização,

preferindo defender um modelo mais “são”, segundo o ideal do Império Romano. Em

Imperialism escreveu (1975: 365): “(…) the opportunity of a parasitic Imperialism which

should reproduce upon a vaster scale many of the main features of the latter Roman Empire

visibly presents itself.”

Assumindo a defesa ética do imperialismo, Hobson acreditava que a interdependência

global crescera de tal forma que os povos mais vulneráveis seriam sujeitos à exploração, a não

ser que se criasse uma forma ou um mecanismo de intervenção pública internacionalizada. Os

capitalistas ocidentais aproveitariam qualquer oportunidade para aumentar os lucros às custas

da população local, se não fossem regulados e fiscalizados de forma muito firme. Tal como

muitos liberais, Hobson considerava também que os povos oprimidos não conseguiriam

cuidar de si próprios e esta sua posição ambivalente, a da defesa dos povos “atrasados” face à

sua completa vulnerabilidade e dependência, foi a força impulsionadora da sua sugestão de

reforma internacional do imperialismo, baseada na ideia de que, sendo impossível eliminá-lo,

era no entanto necessário suavizá-lo de alguma forma. Escreveu Hobson (1975: 230):

If organized Governments of civilized Powers refused the task, they would

let loose a horde of private adventurers, slavers, piratical traders, treasure

hunters, concession mongers, who, animated by mere greed of gold or

power, would set about the work of exploitation under no public control and

with no regard to the future.

Os países mais avançados tinham assim o direito e o dever de intervir junto das “raças

inferiores”, mas apenas com o objetivo de servir o bem da humanidade e não para defender os

seus próprios interesses. Segundo Hobson as potências imperiais não mereciam confiança

depois de tudo aquilo a que se assistira durante a vigência dos impérios, em que subjugaram

os interesses económicos, culturais e sociais dos povos colonizados, interferindo de forma

muito negativa na sua vida diária e nas suas tradições. Hobson enumerou os males da

civilização ocidental impostos aos povos “inferiores” (loc. cit.):

(…) playing havoc with the political, economic, and moral institutions of

75

the peoples, instilling civilized vices and civilized diseases, importing spirits

and firearms as the trade of readiest acceptance, fostering internecine strife

for their own political and industrial purposes, and even setting up private

despotisms sustained by organized armed forces.

Assim, propunha um imperialismo sane segundo três condições, sempre com o

objetivo utilitarista do bem-estar global: em primeiro lugar, o governo imperial deveria

favorecer a humanidade em geral, maximizando os benefícios do comércio internacional e a

exploração dos recursos naturais, o que contrariava a ideia do comércio livre, por ele

defendido na linha de Cobden, enquanto nesta nova fase favorecia já a intervenção estatal

como forma de remediar as desigualdades do mercado e os males da distribuição capitalista.

Em segundo lugar, o governo imperial deveria beneficiar os povos submetidos, melhorando o

seu nível de vida, explorando os recursos naturais de forma eficaz, tendo como objetivo a sua

autonomia; a terceira condição era a formação de um governo internacional, para controlar a

ocupação imperial e inspecionar a população subjugada. Na pág. 280 de Imperialism Hobson

escreveu:

In setting forth the theory which sought to justify Imperialism as the

exercise of forcible control over lower races, by regarding this control as a

trust for the civilization of the world, we pointed out three conditions

essential to the validity of such a trust: first, the control must be directed to

the general good, and not to the special good of the ‘imperialist’ nation;

secondly, it must confer some net advantage to the nation so controlled;

lastly, there must exist some organization representative of international

interests, which shall sanction the undertaking of a trust by the nation

exercising such control.

Segundo Cain (2002: 154) Hobson exigia “uma representação organizada da

humanidade civilizada” que reconhecesse a “unidade orgânica” do mundo. Esse governo

desenvolveria África para benefício de todos, impedindo a posse de terras por europeus, a

atividade mineira e o trabalho escravo. Preservaria o mais possível as tradições sociais

indígenas e expô-las-ia aos europeus, dando liberdade aos nativos para procurar trabalho de

acordo com as suas necessidades e os seus novos níveis de consumo. Hobson resumiu assim

esta questão (1975: 279-80):

76

So far as Imperialism seeks to justify itself by sane civilisation of lower

races, it will endeavour to raise their industrial and moral status on their

own lands, preserving as far as possible the continuity of the old tribal life

and institutions… If (…) many of the old political, social and religious

institutions decay, that decay will be a wholesome process, and will be

attended by the growth of new forms, not forced upon them, but growing

out of the old forms, and conforming to laws of natural growth in order to

adapt native life to a changed environment.

De acordo com Porter (2008: 235), Imperialism começa e termina com um apelo ao

internacionalismo, em que Hobson manifestamente acreditava, esperando que a “seleção

natural” de imperialismos competitivos pudesse ser substituída por uma “seleção racional” de

cooperação internacional e assim encorajar não uma relação militar, mas antes intelectual, na

qual os “génios” não fossem encarados como propriedade de uma nação, mas atingissem um

estatuto de pertença internacional, em prol de uma humanidade civilizada. Hobson afirmou

(1975: 187): “the higher kinds of competition, the struggle of languages, literatures, scientific

theories, religious, political and social institutions, and all the arts and crafts which are the

highest and most important expressions of national as of individual life.” Só através das suas

atividades e sucessos se manifestava a eficácia social de uma nação.

Nesta linha de pensamento Hobson foi assim um defensor pioneiro de uma Liga das

Nações, mas muitos dos seus textos sobre este tema foram produzidos após o início da 1ª

Guerra Mundial, justamente como resposta ao conflito. Em 1915 delineou-se uma estrutura

daquele tipo em pequena escala, que envolvia políticos britânicos e americanos, com o

objetivo de manter a paz entre as nações, mas só em Janeiro de 1919, com o Tratado de

Versailles, se estabeleceu a criação de uma organização internacional, a Sociedade das

Nações, que teria como missão assegurar a paz, e cuja Carta foi assinada por quarenta e

quatro Estados. Ao subscreverem este pacto comprometiam-se a manter as relações

internacionais abertas e francas, a reduzir os armamentos e a submeter à análise da Sociedade

das Nações questões que pudessem gerar conflitos futuros.

No entanto eram muitos os obstáculos a uma paz duradoura: os países derrotados

foram excluídos dos tratados de paz e da Sociedade das Nações e alguns dos vencedores

mostravam-se insatisfeitos com os acordos conseguidos; os EUA não aprovaram o Tratado e

não integravam a Sociedade das Nações e os vencedores não tentaram procurar soluções

adequadas para a crise económica na Europa, preferindo exigir indeminizações aos países

77

derrotados. Por estas razões, a Sociedade das Nações acabou por se revelar incapaz de mediar

conflitos, o que comprometeu a sua existência e levou à sua extinção em 1946, passando as

suas responsabilidades à futura ONU.

Em Confessions of An Economic Heretic (2011: 113) Hobson afirmou:

The history of the post-War world has, however, shown that none of the

Great Powers is yet ready for this necessary surrender of its sovereign

rights. (…) But until the domination of class and economic interests within

each nation, which feeds and inspires this nationalism, can be recognized

and overcome by an enlightened classless nationalism, a League of Nations

will not be endowed with the authority and the power needed for world

peace and progress.

Após a guerra Hobson reforçou o seu compromisso com o internacionalismo, por

oposição ao imperialismo nacionalista de tipo protecionista, mas rejeitou o tipo de

organização entretanto criado, tendo afirmado (Hobson 1921: 232-3) 11: “ the disposal of the

mandated areas as war-spoils by the victors (…) the perversion of this great ideal of a League

of Nations into a present instrument for autocratic and imperialistic government will rank in

history as a treason to humanity as deplorable as the Peace Treaty with which it was so

injuriously bound.”

4. 5. Da guerra dos boers à 1ª guerra mundial – as contradições de Hobson

Como se referiu anteriormente, Hobson começou por escrever artigos que foi

divulgando em publicações de cariz político e económico, tendo posteriormente reunido esses

textos em Imperialism, obra inspirada sobretudo pela guerra dos boers e por uma série de

ideias muito radicais suscitadas pela observação direta do conflito e do funcionamento do

imperialismo capitalista na África do Sul, bem como pelos efeitos causados ao país pela

“aventura” imperialista britânica, em termos económicos e sociais. No entanto a sua

preocupação, quase obsessão, pelo tema não se esgotou em 1902, ano da publicação de

Imperialism, tendo continuado a reafirmar publicamente e em várias ocasiões o que escrevera

antes, inclusive na segunda edição da obra em 1905, na qual as alterações foram mínimas,

11

in Claeys, Gregory “Imperial Sceptics”, p. 259

78

tendo-se limitado a reforçar as ideias já expressas. Quando os liberais venceram as eleições de

1906, Hobson esperou que o novo governo estabelecesse por fim uma democracia industrial

na Grã-Bretanha, após ter conseguido lançar os alicerces do que viria a ser o estado

providência, mas os conservadores, mais tradicionalistas, atacavam essas pretensões de forma

sistemática. (Cain 2002: 166).

Uma década depois Hobson publicou An Economic Interpretation of Investment, um

livro estranho segundo Cain, baseado numa série de artigos escritos em 1910 para The

Financial Review of Reviews, um guia para investidores. Nele, Hobson abandonou muitas das

crenças expressas em Imperialism, tendo regressado à visão cobdenista, segundo a qual o

comércio externo era o caminho para a prosperidade e o protecionismo estava ligado ao

imperialismo (Cain: 1978: Economic History Review p.568-9) 12. Foi também Cain quem

afirmou (2002: 166):

Overall, his writings on international trade, foreign investment, and

imperialism appear to have a peculiarly schizophrenic quality at this

juncture, offering visions of a new world of democracy and internationalism

on the one hand while almost simultaneously presenting dramatic insights

into the strength and depth of the forces making for imperialism on the

other.

Dez anos depois de Imperialism Hobson alterava o seu pensamento acerca da relação

entre o crescimento económico e a extensão do comércio externo: a penetração económica em

territórios “atrasados” era agora encarada como um processo benéfico tanto para os países

industrializados como para os subdesenvolvidos, não ameaçando a sobrevivência da

industrialização e aprofundando a democratização do capitalismo. O imperialismo continuava

a existir, mas era agora apresentado como um fenómeno do mesmo processo económico

internacional que Hobson condenara de forma veemente em Imperialism. ( Freeden 1990: 33).

Hobson, seguindo a tradição de Cobden, defendia agora um mundo de nações

interdependentes, no qual o caminho para a justiça económica e para a paz internacional seria

tão mais fácil de percorrer quanto maior fosse a sua interação económica.

Esta mudança de atitude por parte de Hobson, que durante anos se manifestara

frontalmente contra a existência de colónias em termos económicos, que deplorara o

imperialismo como pretexto do capital financeiro para encontrar mercados externos que lhe

12

Edição online

79

permitissem investir e obter lucros à custa dos trabalhadores e dos povos “atrasados” já que

internamente tal não era possível, como já se referiu, tinha muito provavelmente a ver com as

mudanças políticas na Grã-Bretanha. Quando Hobson escreveu Imperialism, o país

recuperava ainda da guerra dos boers, que culminara duas décadas de expansão colonial em

África, numa época em que as reformas económicas e sociais pareciam impossíveis de

concretizar e Hobson pintou na altura um quadro exageradamente negro do imperialismo

como forma de agitar a consciência nacional e levar o país a reagir de alguma forma. Em

1911, o partido liberal governava há cinco anos e a febre pelo império abrandara, pelo que

Hobson acreditava que a humanidade iria finalmente aceitar a necessidade da sua

interdependência e que toda a irracionalidade imperialista daria lugar a um mundo

economicamente democrático e cooperante.

Tal como Cobden, Hobson considerava o comércio livre (free trade) um aliado

fundamental da democracia industrial, enquanto protecionistas como Chamberlain

acreditavam que ele minava a indústria britânica, levando a que o capital saísse do país. Ao

escrever sobre comércio internacional, investimento estrangeiro e imperialismo, Hobson

evidenciou os dilemas de alguém que já não condenava o imperialismo como uma doença do

capitalismo, antes o considerava uma fase inevitável no processo do desenvolvimento

mundial, benéfica para todos os intervenientes. Ao contrário do que escrevera em

Imperialism, mudou também a sua atitude em relação aos financeiros, cuja função era quase

indispensável. Em An Economic Interpretation of Investment Hobson (1911:10) afirmou: “(...)

However large the allowance for fraud and overreaching on the part of skilled middlemen, the

delicacy and importance of the services they render…are undeniable.” Da mesma forma, a

exportação de capitais era agora vista como natural na evolução económica de um país,

quando em Imperialism fora considerada destrutiva para os países destinatários. Escreveu na

pág. 89:

Foreign investment does not injuriously compete with home investments

robbing the latter of capital which it could put to advantageous use in

employing British labour but …they represent a use found abroad for a

surplus quantity of British saving which otherwise would either not exist at

all or would represent a wasteful oversupply of home capital... Foreign

investments, then, form in the first instance a safety valve against excessive

gluts of capital at home. They find a profitable use for capital which

otherwise could not economically fructify at all.

80

Nesta fase Hobson considerava que proibir a exportação de capitais significava que

alguns países ficariam com excesso de capital, enquanto outros não receberiam o suficiente

para o seu desenvolvimento, diminuindo desta forma a produção mundial. O fluxo de capital

do Ocidente era útil, não apenas para todas as classes do país credor, mas também para as

nações que dele beneficiavam, independentemente do seu estado de desenvolvimento (Cain

2002: 190). Hobson escreveu (1911: 90): “The development of a backward country by foreign

capital is always beneficial to the country itself, to the industrial world at large (by increasing

world trade) and to the investing country in particular.” Deste modo nasceria um mundo de

nações ricas, mutuamente benéficas e em parte donas dos bens umas das outras, podendo

então os novos países em desenvolvimento competir industrialmente com a Grã-Bretanha,

produzindo bens que os britânicos adquiririam de forma vantajosa. Nas páginas 106-7 de An

Economic Interpretation of Investment afirmou:

(…) as foreign trade and foreign investment advance it becomes a more

important and more useful function of every government to try to secure for

its citizens new markets for their goods and for their capital, and to employ

public diplomacy and force to improve the markets already got and the

capital already invested.

As posições adotadas por Hobson nesta obra foram centrais no seu pensamento até ao

início da 1ª Guerra Mundial e consistiam na tentativa de provar que a economia global

emergente poderia ser uma causa do imperialismo e simultaneamente impulsionar a harmonia

internacional. Porém, os seus pontos de vista mudaram radicalmente desde Imperialism (Cain

2002: 195) em questões como a importância do comércio internacional para o

desenvolvimento capitalista e a sua relação com o imperialismo e no papel dos financeiros no

desenvolvimento económico

Peter Clarke, num artigo publicado na Economic History Review em 1981, veio

criticar Hobson e refutar a ideia de que seria um pensador sistemático como defendia Cain,

afirmando que ele se limitara a desenvolver algumas ideias muito contraditórias. Afirmou

Clarke: “Instead, he proceeded by developing diverse insights which were sometimes deeply

original, sometimes embarrassingly trite, and not seldom at odds with [his] previous

approaches.” (Clarke 1981: Economic History Review p. 308-9)13. Clarke criticou ainda a

ligação que Hobson insistiu em estabelecer entre o imperialismo e o capital financeiro quando

13

Edição online

81

seriam, na realidade, os capitalistas a usar o império em seu proveito.

Muito embora Hobson tenha refletido sobre a sociedade britânica em termos

económicos e sociais durante várias décadas, contribuindo com ideias muito válidas para o

status quo da época numa linha de pensamento liberal radical, não podemos deixar de

assinalar algumas falhas na sua atitude perante a colonização, sobretudo numa primeira fase,

em que se aproximou muito das posições eugenistas. Escreveu ele em Imperialism, num

capítulo sugestivamente denominado Scientific Defense of Imperialism (1975: 153):

Others, taking the wider cosmic standpoint, insist that the progress of humanity

itself requires the maintenance of a selective and destructive struggle between

races which embody different powers and capacities, different types of

civilisation. It is desirable that the earth should be peopled, governed, and

developed, as far as possible, by the races which can do this work best, i.e. by

the races of highest "social efficiency"; these races must assert their right by

conquering, ousting, subjugating, or extinguishing races of lower social

efficiency. The good of the world, the true cause of humanity, demands that this

struggle, physical, industrial, political, continue, until an ideal settlement is

reached whereby the most socially efficient nations rule the earth in accordance

with their several kinds and degrees of social efficiency.

Hobson não assumiu claramente posições eugenistas ou sequer referiu o termo

“eugenia” em algum momento de Imperialism mas, para além do capítulo já referido,

escreveu outro com um título também bastante sugestivo, “Imperialism and the lower races”,

ao longo do qual se refere de forma sistemática aos povos colonizados como “lower races”,

aludindo à sua condição e à utilidade dos recursos naturais das suas terras para a civilização

ocidental do seguinte modo (1975: 227:

The European races have grown up with a standard of material civilisation

based largely upon the consumption and use of ...natural products of tropical

countries. The industries and the trade which furnish these commodities are

of vital importance to the maintenance and progress of Western civilisation.

(…)The inhabitants of these countries are not "progressive people"; they

neither develop the arts of industry at any satisfactory pace, nor do they

evolve new wants or desires, the satisfaction of which might force them to

labour.

82

Afirmações deste tipo tornaram-se hoje em dia muito controversas e não entendemos

facilmente como um homem que durante toda a vida condenou o imperialismo e a exploração

das classes mais baixas, possa referir-se assim a outros povos, colocando-os num patamar

inferior em relação aos ocidentais. A defesa feita por Hobson da exploração dos recursos

naturais dos novos territórios pelos “brancos”, admitindo a incapacidade e a falta de iniciativa

e empenho dos nativos, é altamente criticável e só pode justificar-se à luz das teorias dos

darwinistas sociais, às quais o espírito de Hobson foi sensível.

83

5. Conclusão

Nesta dissertação abordámos as teorias (anti)-imperialistas de Hobson, sobretudo

expressas a partir dos finais do século XIX até ao início da I Guerra Mundial,

contextualizando historicamente o homem e estudando a sua evolução ideológica através das

intervenções públicas e da vasta obra, particularmente Imperialism, publicado no auge do

fervor imperial por parte da maioria dos britânicos, muito manipulados pela propaganda

governamental e por toda uma série de atividades, apelidadas de “jingoístas” por Hobson e

outros liberais. Estas iam desde os espetáculos de variedades, onde se exaltava de forma

exacerbada os feitos e glórias do império, até alguma imprensa, cujos artigos e reportagens

contribuíam para a amplificação do ardor patriótico, ao propagarem o heroísmo dos soldados

na guerra dos boers ou a defenderem de forma inequívoca o Império, não esquecendo os

escritores “imperialistas”, como Kipling que, com o poema White Man’s Burden, justificou o

papel do império e a colonização de outros povos com a missão colonizadora da Grã-

Bretanha.

O objetivo deste estudo foi compreender as razões que levaram alguém nascido na

classe média de uma zona rural da Grã-Bretanha, com todas as probabilidades de se tornar um

simples mestre-escola, modesto jornalista regional ou porventura clérigo, aceitando e

conformando a sua vida aos modelos vitorianos do rigor e do trabalho, a converter-se ao

radicalismo e a pensar o imperialismo de forma tão antagónica ao espírito patriótico da época,

numa atitude contracorrente que o tornou famoso como pensador político e, acima de tudo,

como historiador económico. Para tal, começámos por caracterizar os anos que decorreram

entre a Grande Depressão de 1870 e o início da primeira grande guerra, tendo para o efeito

sido realizada, numa primeira fase, pesquisa alargada aos historiadores e pensadores que

escreveram sobre o século XIX britânico ou que o influenciaram a nível ideológico, político e

económico, casos de Trevelyan, Adam Smith ou J. S. Mill, chegando-se posteriormente aos

autores que se debruçaram mais especificamente sobre a figura de Hobson, com destaque para

Bernard Porter, P. J. Cain e Gregory Claeys, cujas obras se constituíram como contributos

essenciais para este trabalho. Fundamental se revelou também a autobiografia de Hobson,

inestimável na recolha de informações sobre o seu pensamento e postura ante o imperialismo.

Dado que Hobson dedicou grande parte da sua vida e obra às questões económicas que

na época atingiam o país e, em particular, os britânicos das classes mais baixas, relacionando-

as com o imperialismo, e não sendo a economia o âmbito deste estudo, houve o maior cuidado

em abordar-se esses temas de forma tão aprofundada quanto possível, sem no entanto resvalar

84

para uma pura análise económica, dadas as nossas limitações nessa área do conhecimento,

optando antes por tratá-los de uma perspetiva histórica e cultural.

Pelo que ficou exposto ao longo da dissertação pode concluir-se que Hobson foi uma

figura central na alteração da atitude moral em relação ao império e ao imperialismo no

mundo ocidental, ao associar o fenómeno à guerra, exploração e tirania, externa e

internamente, de uma forma que hoje se nos afigura normal e aceitável, mas que na época se

estabeleceu como algo de dramaticamente original. O que ele trouxe de novo foi provar como

o “imperialismo financeiro” se estava a impor, e relacionar o subconsumo

(underconsumption) e o excesso de poupança (oversaving) com o investimento externo,

dando-lhes uma centralidade no discurso radical, que sempre realçara a ligação estreita entre a

expansão imperial e os privilégios, os monopólios e os lucros obtidos sem esforço, mas a um

nível nunca antes atingido. Imperialismo era, para Hobson, o empenho nacional em encontrar

escoamento para o excesso de poupanças da classe endinheirada, cujo domínio era ampliado

pelo facto de estar cultural e socialmente integrada nos círculos que tradicionalmente

detinham o poder na Grã-Bretanha. Os seus membros estavam intimamente ligados a

financeiros, políticos, militares e administradores, que tinham um interesse direto em

expandir-se nas fronteiras do império. (Cain 2002: 244)

Hobson atacou o imperialismo britânico pelos efeitos causados ao próprio país, contra

as opiniões mais conservadoras da época e as dos “imperialistas sociais” como Chamberlain,

segundo as quais a expansão colonial poderia solucionar muitos dos males sociais internos ou

que a propagação da cultura britânica pelas “raças inferiores” constituiria a tarefa mais nobre

que alguém poderia desempenhar e um passo essencial para melhorar a condição dos povos

atrasados. Hobson considerou ainda o orgulho patriótico excessivo, o jingoísmo, um dos

maiores danos causados ao país, pela manipulação emocional que constituía. Mas no século

XIX os problemas sociais mais graves eram o desemprego que, segundo algumas opiniões,

conduzia à indolência, à miséria e ao descontentamento. Os desempregados eram

considerados socialmente inúteis e moralmente falhados e, nesse sentido, muitos

consideravam o império como uma espécie de válvula de escape para os trabalhadores

excedentários, podendo até levar a que os salários subissem na Grã-Bretanha pela escassez de

mão-de-obra restante. Porém, não foi isto que aconteceu e, pelo contrário, enquanto a classe

trabalhadora sofria, a classe endinheirada aplicava o dinheiro nas indústrias extrativas das

colónias africanas e não internamente, como Hobson defendia, com o objetivo de criar postos

de trabalho a quem deles necessitava e assim melhorar o nível económico e social das classes

mais baixas.

85

Em Imperialism Hobson veio contestar e propor a sua versão de imperialismo “são” e

utilitarista: a expansão colonial e a colonização só fariam sentido se fossem benéficas para

ambas as partes e para a humanidade em geral, em termos do comércio internacional e da

exploração dos recursos naturais; os povos colonizados não seriam submetidos pelos

ocidentais, mas antes apoiados no seu desenvolvimento, pois essa seria a concretização da

missão civilizadora dos britânicos. Para que isto fosse eficaz, deveria criar-se uma

organização internacional que gerisse e fiscalizasse os vários impérios, para evitar que se

tornassem rivais e esse facto pudesse conduzir à guerra. A este propósito referimos a

constituição da Sociedade das Nações, para a qual Hobson contribuiu com as suas ideias

sobre internacionalismo, muito na tradição de Cobden e Bright, como a antítese para o

imperialismo e todas as consequências negativas que acarretava à humanidade, em prol do

entendimento e da paz entre os estados. O seu sonho desvaneceu-se quando, vinte anos após a

criação da Sociedade das Nações, o mundo sofreu uma nova guerra mundial, que a

organização claramente não esteve à altura de evitar.

Referimos ainda que, desde a publicação de Imperialism até ao início da primeira

guerra mundial, Hobson mudou a sua posição relativamente ao papel do imperialismo

económico, acompanhando uma evolução ideológica natural, bem como alterações políticas

na Grã-Bretanha após a vitória dos liberais nas eleições de 1906, mudança que Cain analisou

de forma profunda, identificando contradições e reconhecendo-lhe exageros, sem porém lhe

negar o papel de maior crítico daquele fenómeno. Nessa fase Hobson passou a considerar o

imperialismo uma etapa natural e necessária do desenvolvimento económico dos países

menos desenvolvidos, que os mais ricos tinham obrigação de “amparar”, numa lógica de

progresso geral da humanidade, explorando os seus recursos naturais, algo para o que os

nativos não teriam conhecimentos, condições ou capacidade.

Se analisarmos a relevância de Imperialism nos dias de hoje, o facto mais evidente é

que os impérios sobre os quais Hobson escreveu começaram a ruir após a I Guerra Mundial,

desmoronando-se por completo após a segunda, daí que a obra tenha naturalmente perdido

algum sentido. No entanto, muitas das questões nela abordadas continuam presentes e

pertinentes nos debates atuais sobre o desenvolvimento da economia mundial: o mundo é

dominado e gerido por financeiros que controlam os negócios mundiais, por multinacionais

cujo único objetivo é o lucro e não a melhoria das condições de vida das populações,

contando com a cumplicidade dos governos para as suas atividades, muitas vezes

especulativas e criminosas. Neste sentido Imperialism continua atual e consideramos que

Hobson, apesar de algum exagero, conseguiu caracterizar o imperialismo e o

86

internacionalismo económico de tal forma, que o reconhecemos hoje como um precursor da

globalização que se instalou no mundo há várias décadas, Ao lermos muitos dos seus textos,

constatamos facilmente que muitas das teorias e ideias por ele formuladas prediziam o que

haveria de acontecer em termos económicos quase um século depois, pelo que Hobson

continua a ser lido e analisado por académicos em todo o mundo. O seu mérito reside

sobretudo na originalidade e na amplitude das ideias, mais do que no rigor ou exatidão com

que as expressou, sendo por vezes acusado de negligência, repetição e erros de análise, o que

poderá ser justificado pelo facto de não ser economista, mas sim um reformista preocupado

com questões extraeconómicas e éticas relacionadas com a qualidade de vida do ser humano,

procurando soluções para o problema da pobreza, mas também interessado nos direitos dos

trabalhadores e na democratização da indústria britânica.

87

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