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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
A PSICOPEDAGOGIA ENQUANTO INSTRUMENTO POTENCIALIZADOR PARA A ALFABETIZAÇÃO DE
ALUNOS COM DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE
CINTIA COUTINHO DE SOUZA
ORIENTADORA
SIMONE FERREIRA
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
A PSICOPEDAGOGIA ENQUANTO INSTRUMENTO POTENCIALIZADOR PARA A ALFABETIZAÇÃO DE
ALUNOS COM DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE
Rio de Janeiro
2010
Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia. Por: Cintia Coutinho de Souza
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AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus por me
permitir e dar condições de fazer essa pós-graduação e
por consequência realizar este trabalho; a minha mãe
fonte de inspiração e exemplo para tudo em minha vida. A
professora orientadora Simone Ferreira por sua atenção e
compreensão e a meu namorado Marcelo pela paciência
e ajuda dadas durante o tempo de construção deste
trabalho.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha Mãe, Lourdes,
pessoa que mais amo no mundo, simplesmente por tudo.
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RESUMO
O presente trabalho procura mostrar a importância da
psicopedagogia que é a área do conhecimento que busca integrar conteúdos
de áreas distintas, para que possam ser utilizados de forma unificada na
atuação prática do profissional de Psicopedagogia, onde o foco é a
alfabetização de alunos que possuem distorção idade/série, problema que
agrava há muito tempo o ensino público do Município do Rio de Janeiro, e que
se intensificou/agravou ainda mais com o fim do ciclo de formação nas escolas
públicas, dentre outros fatores que também contribuíram para esta situação.
Além de tratar um pouco do caso da não alfabetização de crianças e jovens, e
dos motivos que possivelmente os desencadeiam e de fazer um traçado do que
é a Psicopedagogia, este trabalho também apresenta um conjunto de
programas e projetos que foram implantados na rede de ensino público para
tentar minimizar tais problemas, e auxiliarem no processo de alfabetização
favorecendo a diminuição da evasão escolar e a distorção idade /série.
Apresenta também alguns tipos de problemas, dificuldades e transtornos de
aprendizagem oferecendo algumas sugestões e estratégias para que o
Psicopedagogo possa atuar nestes aspectos.
Palavras chave: psicopedagogia; ciclo de formação; analfabetismo;
distorção idade/série; fracasso escolar.
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METODOLOGIA
O presente trabalho que trata da psicopedagogia como instrumento
potencializador do processo de alfabetização em crianças que sofrem de
distorção idade/série teve seu tema analisado no contexto das escolas
municipais do Rio de Janeiro com alunos que apresentam distintas idades, mas
que se encontram defasados com relação à idade e a série e no processo de
alfabetização.
Para a realização desta monografia foi desenvolvido um trabalho de
pesquisa bibliográfica descritiva embasada principalmente nos seguintes
autores: Nadia Aparecida Bossa, Maria Lúcia Lemme Weiss, João Beauclair e
Beatriz Scoz. Também foi feita uma pesquisa webgráfica em sites
especializados no tema como o psicopedagogia online e sites dos institutos
que organizam e promovem a maioria dos projetos implantados na prefeitura
do Rio de Janeiro como o do Instituto Ayrton Senna. Também foram utilizados
artigos a respeito do tema, disponibilizados por amigos psicopedagogos.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO 1 10
A PSICOPEDAGOGIA E OS PROBLEMAS E TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM.
CAPÍTULO 2 25
O QUE OCASIONA A DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE E O ANALFABETISMO?
CAPÍTULO 3 36
COMO A PSICOPEDAGOGIA PODE FAVORECER O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO EM ALUNOS COM DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE?
CAPÍTULO 4 42
PROJETOS QUE AUXILIAM NA POTENCIALIZAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM.
CONCLUSÃO 52
BIBLIOGRAFIA 54
ÍNDICE 57
8
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como tema a importância da atuação
psicopedagógica enquanto instrumento potencializador para a alfabetização de
crianças com distorção idade/série.
Para tratar deste assunto é importante pensar em como a
psicopedagogia pode favorecer o trabalho de alfabetização com alunos que por
quaisquer motivos não conseguiram se alfabetizar na idade estimada e
também por apresentarem algum tipo de alteração no processo de
aprendizagem.
No ensino público comumente são encontrados alunos que por
inúmeros motivos não conseguem se alfabetizar na época estimada, que varia
entre 5 e 7 anos de idade. Com o Ciclo de educação e a aprovação automática,
implantados na rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro, esses alunos eram
praticamente empurrados para as séries seguintes e boa parte dos professores
não se preocupavam com o fato destes alunos terem fracassado no processo
de alfabetização, agravando assim o problema.
O ciclo e a aprovação automática terminaram, mas esses
problemas ainda persistem e a questão do que ocasiona essa alteração no
processo de aprendizagem por parte do aluno continua preocupando. Muitos
chegam ao quarto e quinto anos do Ensino Fundamental sem saber ler ou
efetuar cálculos simples de adição e subtração, ocasionando um trabalho
redobrado para o professor, que necessita oferecer atenção diferenciada,
preparando material adequado, o que por muitas vezes, interfere na rotina do
restante da turma. Em contrapartida, encontramos aqueles que são deixados à
margem, sem oportunidade de recuperação, dando continuidade ao trabalho
com a turma e ocasionando um desempenho cada vez pior deste aluno.
Por essas razões o objetivo deste trabalho é fornecer um aparato
de informações, competências e estratégias a serem realizadas para
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potencializar a aprendizagem destas crianças com distorção idade/série e que
não são alfabetizadas, tentando descrever algumas das possíveis causas dos
seus problemas de aprendizagem e demonstrando como pode ser realizado o
trabalho psicopedagógico junto aos professores, para que estes não mais se
sintam perdidos na escolha entre o trabalho com a turma ou dar atenção
especial ao aluno com dificuldade.
Este trabalho também irá demonstrar como a implantação do
ciclo influenciou no processo de aprendizagem dos alunos da rede Municipal
de Ensino do Rio de Janeiro; a importância de projetos que auxiliam o processo
de aprendizagem numa esfera ampla, os quais tem conseguido, com sucesso,
amenizar estes problemas de distorção idade/série.
A psicopedagogia pode favorecer aos alunos que apresentam
dificuldades na aprendizagem, como também os que se encontram em
situação de distorção idade/série, proporcionando um ambiente mais propício
ao aprendizado, sugerindo atividades que se enquadrem a determinada
dificuldade, e desta forma fortalecer sua auto-estima para que sinta-se
motivado à superar suas limitações.
Tratando de crianças que apresentem alguma alteração no
processo de aprendizagem, o psicopedagogo pode intervir de forma a
potencializar as capacidades que possui, amenizando as dificuldades
encontradas, otimizando e potencializando seu aprendizado.
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CAPÍTULO 1
A PSICOPEDAGOGIA E OS PROBLEMAS E TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM
1.1. O que é a Psicopedagogia?
A psicopedagogia é a área do conhecimento que está situada na
interseção das teorias psicogenéticas, psicanalistas e psico-sociais. Surgiu da
necessidade de melhor compreender o processo de ensino-aprendizagem,
contribuindo na busca de soluções para os problemas de aprendizagem. No
Brasil passou a ser difundida a mais ou menos trinta anos com o objetivo de
prestar serviços especializados para resolver as mazelas do fracasso escolar e
os problemas de aprendizagem humana.
De acordo com João Beauclair a psicopedagogia é:
Uma área do conhecimento que se propõe a integrar, de modo coerente, conhecimentos e princípios de diferentes Ciências Humanas com a meta de adquirir uma ampla compreensão sobre os variados processos inerentes ao aprender humano. Enquanto área de conhecimento multidisciplinar interessa a psicopedagogia compreender como ocorrem os processos de aprendizagem e entender as possíveis dificuldades situadas neste movimento. Para tal, faz uso da integração de síntese de vários campos do conhecimento, tais como a Psicologia, a Psicanálise, a Filosofia, a Psicologia transpessoal, a Pedagogia, a Neurologia, entre outros. (BEAUCLAIR, 2009, p. 29)
A psicopedagogia possui como seu objeto central de estudo o
processo de aprendizagem humana, sua evolução moral e patológica e a
influência do meio em seu desenvolvimento. Seu papel, portanto, é mediar todo
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o mecanismo do processo de desenvolvimento e das aprendizagens
humanas, buscando nas variadas áreas e estratégias pedagógicas alcançar o
objetivo de se ocupar dos problemas que podem surgir nos processos de
transmissão e apropriação dos conhecimentos. Ao falar sobre o objeto de
estudo da psicopedagogia Beauclair afirma:
Ao se preocupar com o desenvolvimento dos sujeitos, a psicopedagogia possui como objeto de estudo as diversas complexidades dos processos de aprendizagem, focando a prevenção, o diagnóstico e os possíveis tratamentos quando, nestes processos, aparecerem as chamadas dificuldades. Assim, a psicopedagogia estuda as formas do não aprender, atuando com diagnósticos e tratamentos para com aqueles que, de um modo ou outro, apresentam dificuldades no que concerne ao ato humano de aprender. (BEAUCLAIR, 2009, P.31)
Contrariamente ao imaginado pelo senso comum, a psicopedagogia
não se restringe apenas ao estudo das dificuldades e dos distúrbios de
aprendizagem, ela engloba um universo muito mais amplo que é a
aprendizagem de maneira geral em seu âmbito patológico ou considerado
normal. Em qualquer faixa etária se pode fazer uso da psicopedagogia para
aprender de forma mais eficaz ou também compreender seu processo de
aprendizagem, pois desde o nascimento até a morte se está suscetível ao ato
de aprender. Corroborando essas ideias, Bossa (2007) afirma que ao
psicopedagogo cabe então “saber como se constitui o sujeito, como este se
transforma em suas diversas etapas de vida, quais os recursos de
conhecimento de que ele dispõe e a forma pela qual produz conhecimento e
aprende.”.
Uma característica marcante da psicopedagogia é seu caráter
interdisciplinar, o que significa obter uma especificidade enquanto área de
estudo, buscando conhecimentos em outros campos e criando por sua vez seu
próprio objeto de pesquisa. O que então irá caracterizar a atuação do
psicopedagogo será esta especificidade da atuação voltada para o processo de
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aprendizagem e seus fatores de intervenção, o que implica um corpo teórico,
constituído a partir da articulação dos diversos conhecimentos emprestados de
outras áreas.
Por sua principal preocupação ser com os problemas de
aprendizagem, inicialmente a psicopedagogia deve se ocupar então do
processo de aprendizagem, entender como ele acontece e se desenvolve ao
longo da vida do aprendente para poder também entender o que acontece
quando esse processo não ocorre muito bem, e assim ter a capacidade de
identificar onde surgiu a falha. Desse modo pode-se concluir que a
psicopedagogia estuda as peculiaridades da aprendizagem humana: a forma
como se aprende, como esta aprendizagem sofre modificações evolutivamente
e está condicionada por vários fatores, de que forma se produzem as
alterações na aprendizagem, como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las.
Encontram-se dois tipos de práticas psicopedagógicas que podem
em determinados momentos se confundir ou até mesmo atuar juntas: a clínica
e a preventiva. Na prática clinica, o objetivo é diagnosticar e tratar os sintomas
emergentes no processo de aprendizagem com o intuito de melhorar e
potencializar as habilidades do indivíduo e para que sua dificuldade de
aprendizagem não se torne um obstáculo para todo o seu desenvolvimento.
Este diagnóstico busca investigar, pesquisar e averiguar, quais são os
empecilhos que levam o indivíduo a não aprender ou então a aprender com
lentidão.
Esta prática predominantemente curativa que possui como espaço
de trabalho o consultório e normalmente utiliza atendimentos individualizados
tem-se transformado em campo de estudos para investigadores interessados
no processo de construção do conhecimento e nas dificuldades que se
apresentam nessa construção, podendo ser vista em algumas ocasiões como
preventiva também, já que ao tratar de determinados problemas, pode prevenir
o aparecimento de outros. Corroborando esta ideia Dayse Serra em sua obra
“Conhecendo a psicopedagogia e sua aplicabilidade” nos diz:
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Ocorre uma reciprocidade muito interessante nessas duas modalidades de intervenção psicopedagógica. No que diz respeito a psicopedagogia clinica, quando um profissional desta área é procurado, normalmente quando o problema de aprendizagem já existe e é necessário uma intervenção curativa. No entanto, na medida em que essa intervenção ocorre e soluciona os problemas que ora se apresentam, tal procedimento evita que estes se avolumem ou se tornem mais complexos, deixando os alunos ou profissionais mais refratários às intervenções. Na mesma proporção, quando a psicopedagogia institucional atua, ela pretende, primeiramente, prevenir situações de dificuldades de aprendizagem e ou de adaptação ao ambiente escolar ou profissional; mas, uma vez que o problema de aprendizagem já exista e suas raízes estejam situadas não no sujeito, mas no ambiente escolar ou profissional, na prática pedagógica dos professores, nas práticas administrativas ou, ainda nos veículos afetivos, a intervenção curativa grupal deve ocorrer no ambiente institucional. (SERRA, 2004, p. 7)
A prática preventiva da psicopedagogia é normalmente a utilizada
nas instituições (escolas, empresas e hospitais). Ela apenas busca construir
uma relação saudável com o conhecimento, de modo que proporcione sua
construção de maneira mais fácil, não se caracterizando como um tratamento
de uma dificuldade de aprendizagem e sim como uma ação que pode prevenir
futuros problemas.
Bossa (2007) afirma que na instituição escolar podemos encontrar,
também, a prática clínica da psicopedagogia, pois: “O psicopedagogo pesquisa
as condições para que se produza a aprendizagem do conteúdo escolar,
identificando os obstáculos e os elementos facilitadores, numa abordagem
preventiva.”. Trabalho que requer uma atitude de investigação e intervenção.
Por se basear principalmente na análise e observação intensa de uma concreta
situação, o trabalho da psicopedagogia preventiva acaba, pois, também sendo
considerado clínico.
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1.1.1. Um pouco sobre a história da Psicopedagogia.
Foi na Europa, ainda no século XIX, que se originou a preocupação
com os problemas de aprendizagem. A partir desta época, profissionais da
área da saúde física e mental como médicos e psiquiatras e também alguns
filósofos iluministas deram inicio ao espólio que orientaria a prática
psicopedagógica durante muito tempo. A expressão “Psicopedagogia” hoje
muito usada e difundida teve sua origem em meados do século XX e possui
como primeira definição dada pelo psicanalista francês George Mauco (1954):
“utilização dos conhecimentos da psicologia, psicanálise e pedagogia para
auxiliar crianças que têm dificuldades de aprendizagem.”.
Os primeiros Centros Psicopedagógicos foram fundados na Europa, em 1946, por J. Boutonier e George Mauco, com direção médica e pedagógica. Estes centros uniam conhecimentos da área de Psicologia, Psicanálise e Pedagogia, onde tentava readaptar crianças com comportamentos socialmente inadequados na escola ou no lar e atender crianças com dificuldades de aprendizagem, apesar de serem inteligentes. (BOSSA, 2007, p.39)
A maior preocupação da época era distinguir os que não aprendiam
dos que aprendiam e por sua vez esses dois grupos dos que apresentavam
alguma deficiência mental, física ou sensorial. Assim pode-se dizer que o
caminho percorrido pela psicopedagogia foi muito significativo tendo primeiro
um caráter médico-pedagógico dos quais faziam parte do núcleo do centro
psicopedagógico médicos, psicanalistas, psicólogos e pedagogos.
Esta corrente européia influenciou significativamente a Argentina,
que baseada nos pensamentos e na literatura francesa desencadeou sua
própria forma de pensar e fazer a psicopedagogia, tendo como principais
nomes Jorge Visca, Alicia Fernandez e Sara Paín. Assim o curso de
psicopedagogia passou a ser oferecido tendo como pioneira a cidade de
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Buenos Aires, onde surgiram os primeiros Centros de saúde mental, no qual
psicopedagogos atuavam fazendo diagnósticos e tratamentos.
A Argentina apresenta uma visão diferenciada da psicopedagogia
brasileira, lá são comumente utilizados testes de uso corrente, que no Brasil
são de uso exclusivo dos psicólogos. Eles também se utilizam dos testes de
inteligência (Q.I.), de nível de pensamento, de nível pedagógico, avaliação
perceptomotora, testes projetivos, testes psicomotores, jogos pedagógicos, etc.
No Brasil a psicopedagogia foi introduzida baseada em modelos
médicos e a partir disto foram iniciados nos anos de 1980 cursos de formação
de especialistas em psicopedagogia na clinica médico-pedagógica com
duração de dois anos. Hoje o Brasil possui um quadro teórico de estudos
psicopedagógicos próprio, existindo inclusive a Associação Brasileira de
Psicopedagogia (ABPp) que orienta e busca a regulamentação da profissão de
psicopedagogo e é responsável pela organização de eventos, publicações de
temas relacionados à área e cadastro de profissionais.
No Brasil, importante ressaltar, a formação do psicopedagogo se dá
através de curso de especialização (pós-graduação Lato-sensu), enquanto na
Argentina o curso é de graduação. Apesar disso aqui no Brasil também se
pode atuar em diversos espaços educacionais, não necessariamente com a
função de psicopedagogo, já que a psicopedagogia ainda não foi
regulamentada como profissão por aqui, estando em tramite no congresso essa
questão, mas com o olhar e a postura psicopedagógica diante da
aprendizagem.
1.1.2. Áreas de atuação da Psicopedagogia.
A área de atuação da psicopedagogia abrange tanto a área da
saúde, quanto da educação, não podendo ser enquadrada somente em uma
das duas. Dessa forma carrega em seu bojo características de ambas as áreas
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possibilitando assim maiores chances de sucesso no trabalho de
potencialização das capacidades/habilidades do indivíduo.
A psicopedagogia pode ser clínica e institucional. Na modalidade
clínica, o campo de atuação do profissional (psicopedagogo) é o consultório,
local onde ocorrem intervenções de finalidades curativas de problemas
previamente diagnosticados. Para tal pode-se recorrer a aplicações de
questionários e/ou estratégias específicas visando esclarecer suspeitas já
levantadas, não sendo a princípio um trabalho preventivo.
Já a psicopedagogia institucional divide-se por sua vez em três
subáreas: escolar, empresarial e hospitalar. A psicopedagogia escolar é um
trabalho de prevenção que leva em consideração o planejamento e o professor,
fazendo um trabalho de acompanhamento, com o objetivo de sanar possíveis
focos de dificuldades de aprendizagem, que venham a resultar possivelmente,
em uma indicação para tratamento especializado. Nesta modalidade o
psicopedagogo não trabalha diretamente com conteúdos, e sim com as
habilidades dos aprendentes, visando potencializa-las, para que assim ele
possa ter uma maior apreensão do conteúdo. Aprender os conteúdos deve ser
uma consequência e não o objetivo direto da intervenção psicopedagógica.
Algumas das possibilidades de atuação do psicopedagogo escolar
são:
- Ajudar os docentes na elaboração do plano de aula para que este
seja mais eficaz ocasionando um melhor entendimento do conteúdo por parte
dos alunos;
- Ajudar na elaboração do Projeto Político Pedagógico;
- Orientar os professores para que, em sala de aula, melhor possam
ajudar seus alunos que possuem dificuldades de aprendizagem;
- Elaborar um diagnóstico institucional para constatar possíveis
problemas pedagógicos que possam estar prejudicando o processo ensino-
aprendizagem;
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- Fazer o encaminhamento de algum aluno para profissional
capacitado (psicólogo, fonoaudiólogo, neurologista, etc.) a partir de avaliações
psicopedagógicas;
- Orientar os pais e responsáveis;
- Auxiliar a direção da escola para que os profissionais da instituição
possam ter um bom relacionamento entre si;
- Conversar com a criança ou adolescente quando este precisar de
orientação.
Por sua vez o psicopedagogo empresarial atua no R.H. (Recursos
Humanos) de uma empresa e visa aperfeiçoar a relação entre os funcionários,
promovendo dinâmicas e atividades que possibilitem maior interação
interpessoal, como também, a progressão da carreira com o oferecimento e/ou
indicação de cursos capacitativos (formação continuada).
Esta modalidade de psicopedagogia institucional pode ainda
contribuir com profissionais que apresentem dificuldades de acomodação a
novas rotinas e funções, já que isso também é aprendizagem humana. Pode
ainda colaborar nos processos de seleção junto aos administradores e
psicólogos empresariais, planejando em equipe, processos de treinamento que
visem o desenvolvimento do funcionário e da equipe.
A psicopedagogia hospitalar é pouco conhecida e difundida aqui no
Brasil. Como o próprio nome já diz, trabalha nas dependências hospitalares,
tendo como foco de trabalho atender àqueles indivíduos (crianças e
adolescentes em sua maioria) que venham a ter necessidade de passar grande
parte de seu tempo no hospital e por isso estejam afastadas das unidades
escolares. Essa modalidade é a única que irá trabalhar com conteúdos, seu
principal objetivo é reduzir as defasagens que o afastamento da escola provoca
uma vez que esses indivíduos não poderão ter contato com esses conteúdos
nas instituições de ensino, por motivos de saúde.
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1.2. Problemas e transtornos de aprendizagem.
Os problemas e transtornos de aprendizagem afetam uma a cada
dez crianças em idade escolar e podem ser detectados a partir dos cinco anos
de idade constituindo uma grande preocupação para os pais por afetarem o
rendimento escolar e as relações interpessoais das crianças.
Para tentar compreender um pouco melhor o que são estes
problemas e transtornos de aprendizagem, suas causas, consequências e
possíveis intervenções, em um primeiro momento se faz necessário entender o
que é a aprendizagem e como ela se desenvolve no indivíduo. Vejamos o que
alguns autores dizem sobre a aprendizagem:
De acordo com Alicia Fernandez (2001) cada indivíduo possui seu
modelo de aprendizagem e seus meios de construí-los, o que significa uma
maneira subjetiva para se dirigir e construir o saber. Para ela esse processo
começa no nascimento e se constitui em molde ou esquema, sendo fruto do
nosso inconsciente simbólico. A vontade de aprender habita no inconsciente e
é fruto da história de cada indivíduo e das analogias que ele consegue
estabelecer com o conhecimento ao longo da vida.
Jean Piaget (1976) já apresenta outra visão buscando subsídios na
linha cognitivista para desenvolver uma caracterização do processo de
aprendizagem. Ele afirma: “A aprendizagem é um processo necessariamente
equilibrante, pois faz com que o sistema cognitivo busque novas formas de
interpretar e compreender a realidade enquanto o aluno aprende.”.
Para Sara Paín (1985):
A aprendizagem resulta da junção de fatores internos e externos do próprio sujeito, do desejo de aprender, das estruturas cognitivas e do comportamento em geral. Todos esses aspectos convergem para um mesmo objetivo que é o ato de aprender. (PAÍN, 1985)
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A aprendizagem é produto da história de cada indivíduo e das
relações que ele estabelece com o conhecimento ao longo da vida. Assim, em
se tratando de aprendizagem, não se pode relacionar o problema
simplesmente ao aluno, pois, a aprendizagem não é um processo individual,
não depende somente do esforço de quem aprende, mas sim de um processo
coletivo.
A família tem um papel de extrema importância na aprendizagem da
criança, já que os pais são os primeiros a ensinar os pequenos e os mesmos
determinam alguns modelos de aprendizagem dos filhos. Isto acaba nos
reportando também ao professor que é visto como autoridade pelo aluno e
exemplo a ser seguido, ocupando o lugar dos pais quando no ambiente
escolar. É no campo das relações que se estabelece entre o professor e o
aluno que se criam as condições para o aprendizado, seja quais forem os
objetos de conhecimento trabalhados.
Se tratando dos problemas de aprendizado ou atrasos de
aprendizado pode-se encontrar uma vasta quantidade de definições, uma delas
é a proposta por Marchesi (1995) “Qualquer dificuldade observável enfrentada
pelo aluno para acompanhar o ritmo de aprendizagem de seus colegas da
mesma faixa etária, seja qual for o fator determinante deste atraso.”. Essa
população abrangida pela definição de Marchesi certamente é de grande
heterogeneidade e não é simples encontrar critérios que a demarquem com
exatidão.
Problemas de aprendizagem não são a mesma coisa que
transtornos de aprendizagem. Os primeiros se transparecem em razão de uma
metodologia inadequada, métodos de alfabetização que não são compatíveis
com o nível da turma em aplicação, privação cultural e econômica, formação
docente deficitária, falta de planejamento das atividades e desconhecimento da
realidade cognitiva do indivíduo. Já os transtornos de aprendizagem são
disfunções neuropsicológicas que impedem o funcionamento integrado do
cérebro em desenvolvimento, sendo então um problema de maturação.
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A pratica psicopedagógica deve analisar o sujeito como um ser
integral, misto pelos aspectos orgânico, cognitivo, afetivo, social e pedagógico,
pois, cada um desses aspectos intervém de alguma maneira na compreensão
da dificuldade de aprendizagem. No aspecto orgânico, que diz respeito a
construção biológica do sujeito encontra-se a dificuldade de aprender de causa
orgânica que esta relacionada ao corpo. Já no aspecto cognitivo encontra-se
uma relação com o funcionamento das estruturas cognitivas, ou seja, os
problemas de aprendizagem se localizam nas estruturas de pensamento do
sujeito. Uma criança que está no estágio pré-operatório, por exemplo, tendo
que resolver atividades escolares que exigiriam que ela estivesse no estágio
operatório-concreto.
O aspecto afetivo que diz respeito à afetividade do indivíduo e de
sua relação com a vontade e o desejo de aprender, é embasada pela
psicanálise e trata dos aspectos inconscientes envolvidos no ato de aprender,
permitindo levar em conta a face emocional do sujeito. O aspecto social faz
referencia com a relação que o indivíduo tem com a família e a sociedade,
envolvendo um contexto social e cultural, podendo apresentar problemas de
aprendizagens aqueles indivíduos privados culturalmente em relação à
conjuntura escolar.
Por último o aspecto pedagógico, que se relaciona à forma como a
escola constitui o seu trabalho, ou seja, a metodologia, a avaliação, os
conteúdos programáticos, a forma de ministrar a aula, entre outros. Para Weiss
(2008) “a aprendizagem é a constante interação do sujeito com o meio.”
Podendo-se dizer também que é a interação constante dos aspectos
apresentados. Sendo a dificuldade de aprendizagem o funcionamento
inadequado, insatisfatório ou o não-funcionamento de um dos aspectos
apresentados.
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1.2.1. Alguns tipos de problemas e transtornos de aprendizagem.
São consideradas várias características para avaliar alunos com
problemas de aprendizagem: alunos que possuem padrões de
desenvolvimento aquém do esperado, ou ritmo de aprendizagem diferente dos
demais existentes em determinada turma. Alunos que possuem um raciocínio
lógico matemático lento, ou dificuldade na leitura e na escrita. Crianças que
apresentam pouco entrosamento com os colegas da escola, chegando a
apresentar comportamentos agressivos. Falta de interesse e concentração nas
atividades propostas pelo professor, dificuldade em aceitar regras, limites e em
memorizar sequências e fatos.
Alguns transtornos de aprendizagem mais comumente
diagnosticados são:
Disartria que é a alteração na expressão verbal causada por uma
alteração no controle da fala, compreendendo as disfunções motoras de
respiração, fonação, ressonância, articulação e prosódia, podendo ser flácida,
espástica, atáxica ou hipocinética.
Discalculia que é uma desorganização neurológica especifica que
compromete a habilidade que o indivíduo possui de compreender e manipular
números, podendo também ser causada por um déficit de percepção visual. Ela
pode, em alguns casos, aparecer associada a dislexia.
Disfasia que é uma perturbação da linguagem caracterizada pela má
coordenação das palavras, associada a uma lesão cerebral.
Disortografia que consiste numa escrita com erros excessivos não
sendo necessariamente disgráfica, manifesta-se assim que o indivíduo adquiri
os mecanismos da leitura e da escrita.
Disgrafia, que também é conhecida como letra feia, advém devido a
uma incapacidade de recordar a grafia da letra. Ao tentar lembrar-se, este
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grafismo escreve muito lentamente o que acaba unindo inadequadamente as
letras, tornando a letra ilegível. Pode aparecer associada à disortografia.
Dislalia que é um distúrbio da fala caracterizado pela dificuldade em
articular as palavras. Basicamente consiste na má pronúncia das palavras, seja
omitindo ou acrescentando fonemas, trocando um fonema por outro ou ainda
distorcendo os fonemas desordenadamente.
Dislexia que é a dificuldade de identificar, compreender e reproduzir
os símbolos escritos afetando a aprendizagem da leitura e da escrita. É um
problema de imaturidade neurológica, podendo aparecer falhas em uma, duas
ou todas as áreas ocasionando dificuldade e até incapacidade para a futura
aprendizagem da leitura e da escrita.
Transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (T.D.A.H.) que são
acréscimos frequêntes dos problemas de atenção, sua principal característica é
a falta de uma capacidade de concentração e de atenção.
Hiperatividade caracterizada por uma manifestação motora
constante e excessiva, tendo como pré-requisito para ser considerado um
comportamento inadequado interferir nas atividades rotineiras do indivíduo,
afetando assim a família a escola e a vida social. Para determinados autores a
hiperatividade trata-se de uma síndrome.
1.3. As intervenções psicopedagógicas.
São muitas as causas do não aprender, e com esta complexidade,
faz-se necessário reconhecer que não é tarefa simples para os educadores
abarcar toda essa pluricausalidade. Dessa forma as escolas acabam rotulando
e condenando esse grupo de alunos a repetência, como também os colocam
na berlinda, com adjetivos de alunos “sem solução” e vítimas de uma
desigualdade social.
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Dessa forma, ao se avaliar alunos que estejam apresentando
dificuldades de aprendizagem, se encontrarão diversas categorias, havendo
aqueles que necessitam da intervenção psicopedagógica ou psicológica e, até
mesmo, aqueles que o problema de aprendizagem pode ser resolvido dentro
do contexto escolar, com programas individualizados de ensino e práticas
pedagógicas diferenciadas. Isso tudo faz com que a avaliação se torne um
elemento muito importante para se traçar o caminho a seguir. Deve-se avaliar
para promover alternativas e não para classificar e rotular os alunos.
Para realizar o diagnóstico e a intervenção psicopedagógica, o
psicopedagogo pode usar como recursos: a entrevista com a família; averiguar
a causa da consulta; procurar a história de vida da criança através da
anamnese; entrevistar o cliente; fazer contato com a escola e outros
profissionais que atendam a criança; manter os pais informados do estado da
criança e da intervenção que está sendo realizada; realizar encaminhamento
para outros profissionais, quando necessário.
Outros recursos para o diagnóstico psicopedagógico que foram
citados por Bossa (2007), referem-se a Provas de Inteligência (Wisc); Testes
Projetivos; Avaliação perceptomotora (Teste Bender); Teste de Apercepção
Infantil (CAT.); Teste de Apercepção Temática(TAT.); também, refere-se a
Provas de nível de pensamento (Piaget); Avaliação do nível pedagógico ( nível
de escolaridade); Desenho da família; Desenho da figura Humana; H.T.P -
Casa, Árvore e Pessoa (House, Tree, Person); Testes psicomotores:
Lateralidade e Estruturas rítmicas. Bossa ainda sugere:
O uso de jogos considerando que o sujeito através deles pode manifestar, sem mecanismos de defesa, os desejos contidos em seu inconsciente. Além do mais, no enfoque psicopedagógico os jogos representam situações-problemas a serem resolvidas, pois envolvem regras, apresentam desafios e possibilita observar como o sujeito age frente a eles, qual sua estrutura de pensamento, como reage diante de dificuldades. Levando-se em conta que o sujeito possui poucos recursos (vocabulário, por exemplo) para se comunicar, expressar o que sente, o que deseja, pode fazer uso de jogos, desenhos e brincadeiras para manifestar o que sente. (BOSSA, 2007)
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A intervenção psicopedagógica então é a mediação que um
profissional, educador, psicopedagogo, etc. realiza sobre o processo de
desenvolvimento ou aprendizagem do indivíduo, o qual pode estar
transparecendo problemas de aprendizagem. Dessa forma a intervenção, o
procedimento adotado interfere no processo, com o objetivo de compreendê-lo,
explicitá-lo ou corrigi-lo, introduzindo novos subsídios para o indivíduo refletir, o
que acarreta na quebra do padrão anterior do relacionamento com o mundo
das pessoas e das ideias.
25
CAPÍTULO 2
O QUE OCASIONA A DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE E O ANALFABETISMO?
2.1. O ciclo de aprendizagem.
Um motivo importante que colaborou para a distorção idade/série e o
analfabetismo foi o ciclo de formação que vigorou por muitos anos na rede
pública de educação do Rio de janeiro. Isto ocorreu em virtude da
implementação inadequada do programa, gerando dúvidas e questionamentos
que por não terem sido solucionados acabou por transformar o ciclo que
possuía uma proposta de progressão continuada, ou seja, proporcionar mais
tempo para o aluno se alfabetizar e aprender, em aprovação automática. Neste
tipo de “programa”, não importa se o aluno é alfabetizado ou sabe algum
conteúdo, ele será aprovado e no ano seguinte suas dificuldades não serão
levadas em consideração, oferecendo a este mesmo aluno, um programa
baseado apenas em conteúdo.
Foi a partir da década de 1980 que começou a ser implementada
nas redes de ensino, principalmente públicas, o modelo de organização de
ensino chamado Ciclo. Essa modalidade foi sendo implantada como uma
medida do governo para universalizar o Ensino Fundamental e acabar com a
multirepetência e a evasão dos alunos das unidades escolares. Em cada
localidade onde foi implantado, esse sistema recebia um nome semelhante,
como Ciclos de Aprendizagem; Escola em Ciclos; Ensino em Ciclos; Ciclos de
Desenvolvimento; Ciclos de Formação; Ciclo de Estudos, todos dando o
mesmo significante ao sistema, que era eliminar total ou parcialmente a
26
reprovação na mesma série. No Rio de Janeiro ficou conhecido como Ciclo
de Formação.
O termo “ciclo”, para designar políticas de não-reprovação, emergiu no cenário das políticas educacionais em meados dos anos de 1980, com a implantação do Ciclo Básico de Alfabetização, em diversas redes estaduais de ensino (São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Goiás, entre outras). A partir dos anos 1990, diferentes modalidades de ciclos foram implementadas no Brasil: Ciclos de Aprendizagem, Ciclos de Formação, Regime de Progressão Continuada e outras. Em termos gerais, a organização da escolaridade em ciclos tem sido considerada uma política inclusiva e como uma importante medida para a democratização da educação, uma vez que pode auxiliar a permanência e o sucesso escolar. (STREMEL, 2009, P. 2)
Esta forma de organizar o ensino foi defendida pelo ponto de vista
pedagógico porque supostamente melhoraria a possibilidade de organização
do tempo e do espaço escolar, respeitando os ritmos e os processos de
aprendizagem dos alunos, colaborando, pois, dessa forma para a diminuição
da cultura da repetência, que fora instalada na escola, e o consequente
aumento da autoestima dos mesmos.
Os governos Estadual, Municipal e Federal estimularam a
organização deste modelo educacional embasados na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB) número 9394 de 1996 e nos Parâmetros
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 1997. Notório se fez que
este estimulo não somente recaia na forma de organizar o ensino em seus
aspectos pedagógicos relacionados as fases do desenvolvimento humano,
mas também na eliminação da repetência, que também era sugerida no
modelo de ensino em séries, de acordo com o mencionado no artigo 32 da
LDB parágrafos primeiro e segundo:
§ 1º É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o ensino
fundamental em ciclos. § 2º Os estabelecimentos que utilizam progressão regular por
série podem adotar no ensino fundamental o regime de
27
progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino. (Artigo 32, LDB 9394/96)
A aprendizagem em ciclos não é nenhuma invenção da atualidade,
pois desde a antiguidade já existiam ensinamentos em forma de módulos
continuativos que permitiam ao educando aprender a seu tempo, pois ao
termino de cada módulo, poderia sanar suas dificuldades no módulo seguinte e
prosseguir seus ensinamentos.
Estes processos de ensino seguiam em seu início aos ciclos de
desenvolvimento, principalmente o biológico, e de forma natural se
relacionavam com a cultura do grupo. Pode-se afirmar então que desde os
primórdios da civilização a aprendizagem se estruturava a partir de ciclos de
desenvolvimento, que tinham como base estruturadora aquilo que havia para
ser aprendido em determinada época.
Dessa forma, passavam para o próximo ciclo aqueles que
aprendessem a se defender, a se abrigar e a obter sua própria comida impondo
o respeito ante o grupo. Alguns rituais de passagem adotados por
determinadas civilizações podem ser interpretados como promoção de um ciclo
a outro, como a passagem de uma fase de aprendizados à outra mais
complexa ou mesmo à “sua formatura”.
Na antiga Grécia a própria cultura era o eixo organizador do
conteúdo no sentido sociológico. Os valores sociais e econômicos vigentes
determinavam os fins, objetos, meios e os destinatários da educação que era
realizada em praça pública, lares, oficinas, campos e em poucos casos, na
escola formal. Com o aparecimento de um ensino mais formal e em função do
volume de conhecimentos a ser aprendido, impôs-se a necessidade de
selecionar este conteúdo e estruturá-lo de modo a facilitar sua absorção pelo
aprendente.
Já na era moderna, com o desenvolvimento desenfreado das
ciências e a industrialização, o ensino passou a ser organizado segundo a
28
lógica das matérias científicas e conforme os conceitos de produção em
série, no qual a excelência era buscada e, portanto voltada para resultados,
principalmente no ensino, local onde o futuro operário era ensinado e
capacitado para exercer sua função no sistema fabril.
Assim o conhecimento recebido na escola começou a se organizar
baseado nas disciplinas científicas, em decorrência da crescente
especialização exigida das áreas de conhecimento para distintas funções
operárias. Toda uma classe escolar passou a receber o mesmo conteúdo, o
qual era dividido em espaços e tempos distintos. Cada período letivo era
constituído de um subsegmento, fechado em tempos fixos, chamados de séries
e o processo de ensino-aprendizagem passou a ser norteado por resultados,
ou seja, as notas.
Os alunos que fugiam ao resultado esperado e não alcançavam as
notas determinadas repetiam todo o percurso, sistema que ficou conhecido
como Ensino Seriado. Este método em séries perdurou por tanto tempo que
acabou fazendo com que caísse no esquecimento o fato de nem sempre ter
sido desta forma o modelo de ensino sistemático e formal.
Recentemente se voltou a pauta de discussão entre os educadores
o modelo em ciclos para a educação brasileira. Isto se deu em virtude do
número exagerado de reprovações que causavam um congestionamento no
fluxo escolar. Medidas de ordem política provocaram propostas de ordem
pedagógica e novamente foram implantados os ciclos. Nele, o aluno cumpriria
um determinado caminho, desenvolvendo aquele mesmo conteúdo organizado
em disciplinas divididas pelo ano letivo. A diferença consistia em que ao final
do ano, o aluno teria promoção automática garantida, e poderia sanar suas
duvidas e dificuldades daquele ano, no seguinte.
O ensino em Ciclos concebe a escola como tempo/espaço de formação, comprometida com o desenvolvimento integral dos alunos, considerando as suas trajetórias de vida, os conhecimentos construídos histórico e culturalmente, a
29
apropriação dos instrumentos de mediação e também as vivências e saberes dos professores. Na proposta de organização do ensino em Ciclos, questões sobre a estrutura curricular, a avaliação, concepção de infância, de adolescência, competências profissionais dos pedagogos e dos professores, e a organização da instituição escolar necessitam ser retomadas constantemente, para que determinadas lógicas que se constituíram sobre a aprendizagem, ensino, tempo/espaço possam ser reformuladas. (HOÇA, 2009. p.3)
O recomendado na ocasião seria agrupar os alunos por idade
cronológica, porém, o eixo estruturador recaía nas matérias. A proximidade
etária se instalava, naturalmente, à medida que se impunha uma idade mínima
para o ingresso no processo de escolarização e, por não haver reprovações, a
tendência era o aluno se manter no grupo de sua faixa etária. A organização do
ensino resultava da transposição didática dos conhecimentos científicos a partir dos
seus aspectos epistemológicos. Tais conhecimentos continuariam fixos para cada ano
de estudos, os resultados é que seriam flexíveis.
Apesar de tal organização de ensino ter ficado conhecida como
ciclo, é possível propor que o ciclo assim organizado consista num ciclo de
estudos, pois a promoção de um grau a outro se daria independentemente dos
conhecimentos adquiridos, em outras palavras, automaticamente.
Este método produziu resultados distintos nos indivíduos que,
mesmo recebendo estímulos iguais, não chegavam ao mesmo resultado, pelo
contrário, era provável que chegassem a resultados diversificados. O que
traduzido para a sala de aula, significava que, se o desenvolvimento do
currículo seria idêntico para todos os alunos de um determinado Ciclo de
formação, os resultados mínimos esperados, ou seja, as aprendizagens
essenciais poderiam não ser garantidas a todo contingente de crianças e
adolescentes que frequentavam o Ensino Fundamental, o que caracterizaria
um Ciclo de Estudos com promoção automática. Nedbajluk (2006) fazendo
uma releitura das teorias de Vygotsky e Piaget mostra isso claramente quando
afirma que:
30
As aprendizagens não se dão ao mesmo tempo e do mesmo modo para todos. A idade cronológica é apenas um dos fatores a serem levados em conta. As teorias de Piaget e Vygotsky além de outras contribuições relevantes no assunto mapearam as principais conquistas cognitivas e indicaram que elas se dão no sujeito, mediante processos internos de construção e mediadas pelas interações sociais. Porém, os autores alertam que tais progressos não são iguais em todas as pessoas: estão em grande parte sujeitos às condições externas, ao meio, ao tipo de experiências vividas, às contribuições sociais e também às condições internas de cada pessoa, sendo muito particularizadas, às estruturas mentais que se estabeleceram. (NEDBAJLUK, 2006, p. 256)
Existe uma clara diferença entre a aprovação automática (forma
pela qual ficou conhecido o ciclo de formação no município do Rio de Janeiro)
e a progressão continuada (ideia original do Ciclo que não foi realizada e
entendida como deveria). Aprovação automática é quando se eleva de posto,
categoria, graduação ou emprego algo, ou alguém de forma automática e sem
o controle da vontade de um superior. Já a progressão continuada é um
desenvolvimento contínuo ou acréscimo de uma ação ou estado, elevação de
significado e alcance da experiência humana de forma ininterrupta.
Todo o contexto citado acima leva a conclusão de que um ensino
organizado por Ciclos de Formação, por ter seu eixo estruturador embasado
nas fases de desenvolvimento cognitivo, deverá ter um currículo estruturado a
partir das ditas fases, e considerando as particularidades de cada aluno,
buscando levar em consideração os aspectos sociológicos envolvidos. Ainda
selecionar os conteúdos e métodos adequados do ponto de vista da psicologia
e da sociologia, sendo coerente sob o ponto de vista epistemológico de cada
disciplina, tendo assim uma Proposta Pedagógica que sirva como diretriz
curricular para os alunos nos diferentes ciclos.
As consequências causadas pelo ciclo de formação no Município do
Rio de Janeiro foram muitas, pois devido a interpretações inadequadas da
proposta inicial, que favoreceria o ensino respeitando o desenvolvimento
biológico e psicológico do aluno, passando a aprovar os alunos sem critérios,
baseados na aprovação automática que o programa previa. Não importava
31
mais ao professor, tanto quanto deveria a questão da boa educação. Por
outro lado, os alunos também não se interessavam em estudar, pois, ao final
dos bimestres não seriam avaliados por provas, e ao final do ano letivo todos,
sem exceção, seriam aprovados para o ano seguinte, mesmo sem saber nada.
Essa questão foi perpetuando ao longo dos anos em que o Ciclo
ficou em vigor. Nos três primeiros anos do ciclo (primeira fase) muitos alunos
eram aprovados sem sanarem suas duvidas e chegavam ao final do percurso
sem saber nada, causando o efeito “bola de neve”. Isso fez com que o nível da
educação no município caísse de forma considerável, o que só foi percebido
efetivamente com o fim da “aprovação automática”, quando inúmeros alunos
foram reprovados por não saberem ler, escrever, realizar cálculos simples etc.,
em todo o seguimento do Ensino fundamental (do primeiro ao nono anos), o
que em muitos casos formou analfabetos funcionais.
2.2. A falta de qualificação dos profissionais de educação
Outro fator determinante para ocasionar a distorção idade/ série e o
analfabetismo dos alunos de escolas públicas é o despreparo e o desinteresse
por parte de alguns profissionais de educação, que já não tem tanta dedicação
por sua profissão, e por falta de motivação e cansaço acabam não dando a
atenção necessária e merecida para os alunos que já sofrem de carências de
todos os tipos.
Os principais problemas encontrados nas redes de ensino
atualmente, principalmente no Rio de Janeiro, é o da falta de formação
continuada dos professores, sua formação inicial precária, e a baixa
remuneração, o que acaba levando à desmotivação na atuação em sala de
aula.
Um estudo realizado pela UNESCO chamado “Professores do Brasil:
impasses e desafios” chama atenção mostrando que a profissão de professor
32
ocupa o terceiro maior grupo ocupacional do país com 8,4% e que por esta
razão se faz necessária a valorização da figura do professor. Este estudo
também alerta para uma grande arritmia entre a formação teórica e pratica do
ensino. Para Cunha (2009) a formação do docente precisa estabelecer uma
espécie de ‘aliança’ entre o seu conteúdo e um projeto pedagógico, para que o
professor tenha condições de entrar em sala de aula. A pesquisa realizada
ainda recomenda, e defende, a implementação de um novo piso salarial para
os professores, e uma política de formação docente, o que pode ser visto como
um começo para a recuperação da profissão de professor no Brasil e um
incentivo a mais para os docentes.
Para atingir a qualidade necessária, a educação brasileira necessita
de inúmeras melhorias. O investimento nos profissionais é o primeiro passo
para essa mudança. Profissionais satisfeitos com sua situação, remuneração e
bem capacitados trabalham mais motivados e com maior empenho, o que fará
com que os alunos aprendam mais e melhor sentindo-se também motivados.
Atualmente acontece uma espécie de “envelhecimento precoce” dos
professores, que já cansados pela longa caminhada percorrida na educação,
ficam ainda mais desmotivados contando as horas para sua aposentadoria, e
por isso não se importam com seus alunos e com a qualidade do ensino que
oferecem a estes. Por outro lado estão os professores recém formados, ou com
poucos anos de magistério, que já iniciam suas carreias desinteressados e
desmotivados por saberem das dificuldades que irão enfrentar em seu percurso
e conhecerem a falta de apoio dos governantes e responsáveis.
A falta de dedicação pela profissão e de envolvimento com os alunos
também acaba por prejudicar o processo de ensino-aprendizagem tornando-se
uma forma de acarretar problemas de aprendizagem nos alunos. Quando o
professor apresenta segurança em relação ao tema de sua aula, demonstra
conhecimento sobre o conteúdo estudado, isso gera confiança e o aluno se
envolve na relação pedagógica sem medo. O outro fator é a relação que o
professor mantém com o tema estudado, quando o professor demonstra paixão
33
pelo seu objeto de ensino acaba contagiando o aluno. Weiss afirma que a
atuação do professor em sala de aula:
Pode levar a uma desastrosa desorganização mental e emocional do aluno. Nossas relações, nossa cobrança, muitas vezes incompatível com a maneira de ensinarmos, nossa linguagem e modo de explicar com frequência são os verdadeiros responsáveis pelo fracasso do aluno. (WEISS, 2008, Prefácio por SANTOS, Weliton Vieira).
Associados aos inúmeros problemas do magistério no Brasil
encontram-se a violência na escola, a indisciplina e a educação permissiva
recebida em casa, gerando grande dificuldade em praticar o respeito e a
cooperação. Grande parte das escolas públicas do município do Rio de Janeiro
está localizada em áreas consideradas “de risco” por estarem em comunidades
cercadas por favelas ou morros comandados pelo tráfico de drogas. Estas
também não possuem infraestrutura adequada que forneça aparelhagem
necessária, como mídias e recursos visuais, boas salas de leitura e bibliotecas,
salas de informática etc., isto é, espaço capaz de oferecer condições melhores
aos alunos e aos professores. Com materiais precários, e desestimulados pela
equipe pedagógica, pelos pais e principalmente pelos alunos, os professores
acabam por realizar um trabalho inadequado e insuficiente, que resultará numa
aprendizagem defasada, e consequentemente a repetição de série, e até a
evasão deste aluno.
Professores em escolas desestruturadas, sem apoio material e pedagógico, desqualificados pela sociedade, pelas famílias, pelos próprios alunos não podem ocupar bem o lugar de quem ensina tornando o conhecimento desejável pelo aluno. É preciso que o professor competente e valorizado encontre o prazer de ensinar para que possibilite o nascimento do prazer de aprender. (WEISS, 2008, p.17)
34
Para que o ensino público melhore de maneira geral será
necessário um grande e efetivo investimento por parte dos governantes e, de
uma forma geral da sociedade, incentivando e colaborando com os professores
para que seu trabalho não seja tão árduo e desvalorizado. Enquanto os
profissionais da educação forem tratados como meros profissionais sem
importância e não como os que podem fazer com que o futuro do país melhore
através do ensino das crianças, a situação do aprendizado como um todo não
apresentará a evolução tão esperada por todos.
2.3. A falta de afetividade nas salas de aula
A afetividade, de acordo com a psicanálise, é o conjunto de
fenômenos psíquicos demonstrados na forma de emoções ou sentimentos e
acompanhados da impressão de prazer ou dor, satisfação ou insatisfação,
agrado ou desagrado, alegria ou tristeza e afeto é o termo utilizado para
exprimir qualquer estado afetivo, penoso ou desagradável, vago ou qualificado,
quer se apresente sob a forma de uma descarga maciça, quer como tonalidade
geral.
Sisto e Martinelli (2006) já apresentavam que muitos dos estudos
feitos sobre aprendizagem ignoram as questões afetivas nos processos
cognitivos do indivíduo ou tratam a afetividade como fazendo parte da
socialização do aluno. Hoje pode-se perceber um interesse bem maior em
estudar e analisar o afeto e sua influência no processo de ensino-
aprendizagem.
Piaget em 1976 afirmava que a afetividade não modifica a estrutura
no funcionamento do processo cognitivo e da inteligência, porém é a energia
que impulsiona a ação de aprender. E essa ação, necessita de instrumentos
fornecidos pela inteligência para alcançar um objetivo, mas é imprescindível o
desejo, ou seja, algo que impulsione o sujeito em direção a este objetivo e isso
corresponde à afetividade.
35
Em se tratando de sala de aula, o afeto torna-se importante
ferramenta de atuação, pois transmite confiança aos alunos. As práticas
pedagógicas, as posturas e os conteúdos verbais do professor, são linguagens
que podem ser interpretadas e, portanto repercutem positiva ou negativamente
no aluno. Quase sempre aquilo que o estudante vivencia afetivamente de
forma positiva facilita o desenvolvimento cognitivo.
Existe a necessidade também de não interpretar de maneira
incorreta a palavra ‘afeto’, professor afetuoso não significa o mesmo que
professor ‘bonzinho’. Do ponto de vista das práticas pedagógicas, a dimensão
afetiva, transparece na organização da aula, no método adotado e no
planejamento das atividades, o que tem um efeito grandioso na autoestima do
aluno, pois irá perceber que o professor está interessado no seu progresso e
desenvolvimento. As aulas mal planejadas podem fazer com que o aluno
fracasse em seu processo de desenvolvimento e aprendizagem levando à
baixa autoestima.
Alguns autores reafirmam a influência do meio escolar na
constituição da individualidade da criança ou no desenvolvimento de toda a
personalidade. Segundo Martinelli (2006), por exemplo, é nessa primeira fase
do processo de escolarização que os conflitos básicos de esforço versus
inferioridade transparecem, tornando-se a escola e os amigos, nesse momento,
o centro das relações mais importantes da vida da criança.
As interações entre a criança, seu professor e seus colegas de
turma podem resultar em sentimentos de competência, segurança, frustração,
inferioridade, fracasso e incompetência. Nas relações sociais que se
estabelecem na escola, cabe ao professor o papel de destaque, pois ele
acreditando no potencial do aluno, irá dispor para este maior atenção,
demandando maior expectativa acadêmica. O professor que tem
comportamento avesso poderá causar em seu aluno, baixa expectativa, o que
poderá influenciar negativamente sua autoconfiança.
36
CAPÍTULO 3
COMO A PSICOPEDAGOGIA PODE AJUDAR NO TRABALHO DE ALFABETIZAÇÃO DOS ALUNOS COM
DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE?
Como o visto anteriormente, a psicopedagogia tem por definição o
trabalho com a aprendizagem, com o conhecimento, sua aquisição,
desenvolvimento e distorções, é, portanto uma prática que busca a melhoria
das condições de aprendizagem do indivíduo. Por apresentar um caráter
multidisciplinar, busca o conhecimento em diversas outras áreas além da
psicologia e da pedagogia, o que facilita seu entendimento a respeito de seu
objeto de estudo, a aprendizagem humana e suas peculiaridades,
corroborando por uma melhor atuação junto a crianças que apresentem
dificuldades para aprender.
Por direcionar o foco de trabalho nas potencialidades do aluno, o
que este consegue fazer, e não se importar com as coisas que ele não
consegue fazer, a psicopedagogia pode ajudar e muito o aluno que sofre de
distorção idade/série e que por diversos motivos não foi alfabetizado. O
psicopedagogo deve atuar junto à família com o objetivo de conhecer o
histórico pessoal daquele aluno, e assim entender um pouco melhor sobre sua
vida e passado, visando ajudar o mesmo. Ele também pode atuar junto ao
professor, trocando conhecimentos e participando da elaboração de um plano
de aula mais adequado as necessidades de determinado aluno sem que isso
prejudique o restante da turma. Atuar diretamente junto a este aluno que
apresenta dificuldades de aprendizagem, e desta forma aumentar sua
autoestima, sempre procurando utilizar o diálogo e a atividade lúdica.
37
Para tanto o psicopedagogo precisa estar bem preparado e
gabaritado para poder atuar de forma que favoreça seu aluno, ajudando-o a
aprender de maneira eficaz. E por este motivo, não é qualquer profissional que
estaria apto ao trabalho psicopedagógico.
O exercício da psicopedagogia não é para quem quer; é, sobretudo, para quem pode. Não basta o domínio teórico, já que seu exercício é metateórico e supõe, por parte do profissional, uma percepção refinadamente seletiva e crítica. Mais ainda, a capacidade de juntar e processar saberes, na medida de cada caso, para dar conta de cada um. A isto há que se somar a saúde emocional do psicopedagogo, sua capacidade de transitar entre as complexas relações familiares, muitas vezes em famílias em processo de reorganização, e identificar as possíveis saídas. (WEISS, 2008, Prefácio por SANTOS, Weliton Vieira)
O trabalho realizado pelo psicopedagogo não produz resultados
apenas na formação de conteúdos internos do aluno, também leva em
consideração os desejos deste sempre respeitando a sua subjetividade.
Quando realizado junto a professores e profissionais da educação, o trabalho
do psicopedagogo visa promover mudanças significativas em sua postura,
como também na sua forma de abordar e atuar. Oferece suporte para que
possa ministrar aulas mais dinâmicas e atrativas, prendendo a atenção do
aluno e despertando seu interesse. Isso contribui muito para que o professor se
torne um elemento facilitador que levará o educando ao desenvolvimento de
seu autoconhecimento.
O aluno defasado é aquele que apresenta dois ou mais anos de
distorção em relação à série em que deveria estar, e é importante ressaltar que
quanto maior a distorção, pior é o desempenho escolar deste aluno. Sendo
assim, por se encontrar em situação vista pelo próprio aluno como inferior aos
colegas de sala, que são mais novos e menores em muitas das vezes, e que
parecem saber mais, esse aluno necessitará de uma atenção especializada e
sensível. Esta atuação deverá focar no fortalecimento da autoestima deste
38
aluno, e assim, fazê-lo voltar a acreditar que ele pode aprender, e que é tão
capaz quanto todos os outros alunos da turma. É neste momento que a
atuação do psicopedagogo será imprescindível, sempre com a preocupação de
buscar “inspiração” na realidade deste aluno e nos seus interesses pessoais.
Sendo assim, as atividades lúdicas são as mais indicadas para que o
profissional possa atingir diretamente o processo de aprendizagem,
potencializando-o.
É mais comum encontrarmos alunos com problemas de defasagem
idade/série em escolas públicas do que em escolas particulares. As escolas
públicas muitas vezes, com raras exceções, não permitem que as crianças se
apropriem do conhecimento, pois não criam as condições mínimas necessárias
para que isso aconteça. Em muitos casos as escolas que atendem a população
mais desfavorecida economicamente são de qualidade muito baixa, assim
como ocorre também com outros serviços que são destinados a esta clientela.
Isso contribui muito para que o fracasso escolar exista e para agravar ainda
mais a situação, muitos profissionais tentam simplificar a questão colocando
sobre a criança a responsabilidade da não aquisição de determinados
conhecimentos, rotulando esta de incapaz. Rotulo que poderá ser levado para
o resto da vida.
Dessa forma os alunos das escolas públicas mais carentes que não
conseguem aprender e vão ficando para trás em relação a sua turma, são
rotulados como possuidores de algum tipo de deficiência metal que os impede
de aprender e por isto acabam sendo colocados em “turmas especiais” para
que recebam um tratamento diferenciado e consigam finalmente aprender.
Porém o problema está em que na maioria dos casos estes alunos não
possuem nenhum tipo de deficiência mental, eles apenas não possuem
estímulos adequados e por conta disso não conseguem desenvolver todo o seu
potencial de aprendizagem.
Assim, alunos de escolas públicas brasileiras provenientes das camadas de mais baixa renda da população são
39
frequentemente incluídos em “classes escolares especiais”, considerados pertencentes ao grupo de possíveis “deficientes mentais”, com limites e problemas graves de aprendizagem. Na realidade, faltam-lhes oportumidades de crescimento cultural, de rápida construção cognitiva e desenvolvimento da linguagem que lhes permita maior imersão num meio letrado, o que, por sua vez, facilitará o desenvolvimento da leitura e da escrita. (WEISS, 2008, p.16)
Pode-se observar esta situação com poucas exceções,
principalmente no ensino de alunos das séries iniciais, como a de
alfabetização, mas também a encontramos em séries superiores. Nas séries
iniciais o fracasso escolar é bem mais frequente, principalmente quando se
trata de alunos de camadas sociais menos abastadas, e as escolas não
conseguem ou não querem enxergar que suas precárias condições de ensino é
que são na realidade as responsáveis pelo fracasso do aluno.
A alfabetização possui uma conotação muito ampla e é um processo
que tem sempre que considerar a formação do indivíduo em sua totalidade
visando à autonomia do mesmo. Neste sentido requer dentre outros aspectos
uma postura de desprendimento do conhecimento como verdade absoluta por
parte do educador, que deve ir além destas concepções teóricas embora
obviamente não possa ignorá-las. Alfabetizar é um trabalho que se baseia na
diversidade e na contradição para o desenvolvimento do ser global.
Neste sentido com a ajuda de um psicopedagogo as escolas e os
profissionais da educação podem se organizar de maneira mais adequada para
proporcionar uma educação de maior qualidade para seus alunos. A
psicopedagogia pode proporcionar uma melhoria para que haja uma
alfabetização e educação mais eficientes nas escolas públicas, pois, auxiliam
os professores a verem que é de extrema importância valorizar a bagagem
cultural e social que o aluno já carrega, e o ensina a utilizar isso como ponto de
partida para que o ato de alfabetizar não seja somente a transmissão de
conteúdos, mas um direito ao qual cada aluno tem e deve ser respeitado em
seu ritmo de desenvolvimento.
40
O psicopedagogo quando se propõe a trabalhar em uma escola
deve se informar corretamente dos objetivos da mesma, para que possa atuar
com eficácia. Isto é de extrema importância para o profissional que irá
desempenhar na escola a função de articulador entre o ensino e a
aprendizagem de todos os elementos dessa instituição, provocando mudanças
e ajudando no processo evolutivo individual e coletivo.
Outro fato de extrema importância e que deve ser sempre avaliado
pelo psicopedagogo é a relação professor-aluno. Em muitos casos, esta
relação pode estar acontecendo de maneira negativa pelo fato do professor
não conhecer o aluno e por isso estar muito distante de suas reais
necessidades, ou até mesmo por não saber identificar a fase de
desenvolvimento cognitivo/afetivo do aluno ou por não conhecer o histórico
familiar do mesmo.
É obrigação do psicopedagogo escolar participar da reunião de pais,
com o objetivo de esclarecer o que está acontecendo com a criança na escola,
e dessa maneira, ensinar aos pais a reconhecerem as verdadeiras
necessidades de seus filhos. O psicopedagogo pode até mesmo orientar os
pais a estimular seus filhos para aprendizagens escolares em casa. Quando
necessário o psicopedagogo pode marcar um horário de atendimento
individualizado com alguns pais, de alunos que eventualmente estejam
apresentando maiores dificuldades, para melhor orientá-los e assim conhecer
melhor o ambiente familiar da criança que está com problemas.
O trabalho psicopedagógico dentro da instituição escolar também
abrange participar da avaliação dos processos didáticos metodológicos, onde
poderá oferecer conhecimentos sobre métodos a ser aplicados para
determinada classe ou para ajudar o professor na implantação de uma nova
sistemática de ensino, oferecendo assim um suporte instrumental mais eficaz e
produtivo aos professores. O psicopedagogo também pode oferecer suporte
emocional para professores que não se sintam muito seguros quanto a sua
capacidade para aplicação de um método novo ou que estão com alunos com
problemas de aprendizagem. Na medida em que o psicopedagogo ouve as
41
dificuldades dos professores, esclarece sobre suas dúvidas, este se sentirá
mais tranquilo, ganhará mais confiança e proporcionará melhores condições
para a aprendizagem.
A aprendizagem de um conteúdo requer interesse por aquele objeto,
requer desejo, e para que isso seja despertado no aluno é preciso que a escola
faça sentido na vida deste e que ele não pense que alguns nasceram para
estudar e outros não. Afinal só se consegue desejar aquilo que possui algum
significado para nós. É nesta situação que o papel do professor se faz
importante na hora de eleger as oportunidades de aprendizagens significativas,
e para tanto, para um trabalho eficaz e para uma atuação precisa a presença e
a ajuda do psicopedagogo é de extrema importância. Ele ajudará o professor a
mostrar para seus alunos o sentido da educação e seus benefícios, através de
atividades lúdicas que proporcionam prazer aos alunos e tornam o aprender
uma atividade prazerosa.
O psicopedagogo também pode orientar o professor e a escola
como um todo para oferecer um número maior de atividades diferenciadas para
apresentar um mesmo conteúdo, dando oportunidade para as diferenças dos
modelos de aprendizagem operarem. Com as atividades diferenciadas o
professor tem a condição de dar maior atenção aos grupos de alunos com
dificuldades.
42
CAPÍTULO 4
PROJETOS QUE AUXILIAM NA POTENCIALIZAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
4.1. O que são e quais são esses projetos?
Encontrar crianças não alfabetizadas com a idade de sete anos ou
ainda mais, é um problema que parece ser sem solução no Brasil. Os
resultados apresentados nas escolas são deploráveis, as orientações oficiais
são desatualizadas e equivocadas com relação à realidade encontrada no país,
e, a maioria das autoridades em educação, e os professores compartilham
essas ideias e ignoram os avanços acadêmicos sobre o assunto.
Para tentar acabar com os problemas educacionais, o analfabetismo
e o fracasso escolar, os governos Federal, Estadual e Municipal criaram
inúmeros projetos, alguns em parcerias com institutos privados como o Instituto
Ayrton Senna e o Instituto Alfa&Beto que potencializam e auxiliam no processo
de aprendizagem da criança em diversos níveis e idades.
Estes projetos possuem como seu maior objetivo proporcionar uma
melhor aprendizagem por parte do aluno através de métodos específicos, que
visam potencializar e aperfeiçoar o processo de ensino-aprendizagem, além de
diminuir a evasão escolar e colaborar para a resolução do problema de
defasagem em todos os níveis (idade e aprendizagem) contribuindo assim,
para que o aluno se beneficie de uma educação global, e desta forma possa
dar, posteriormente, prosseguimento aos estudos no ensino regular, uma vez
que já terá sanado deu déficit inicial. Alguns desses projetos são: Fórmula da
Vitória, Alfa e Beto pré-escola e alfabetização, Se liga, Acelera Brasil,
Nenhuma Criança a Menos e Mais Educação.
43
4.1.1. Fórmula da Vitória
O projeto Fórmula da Vitória foi desenvolvido pela prefeitura do Rio
de Janeiro em parceria com o Instituto Ayrton Senna, e tem como objetivo
proporcionar aos alunos do sexto ao nono ano do Ensino Fundamental, que
apresentem dificuldades parciais ou totais na leitura/escrita, uma atenção
especial visando melhorar sua aprendizagem.
Trata-se de um projeto que conta com material específico de Língua
Portuguesa, organizado a partir de gêneros textuais, que despertam a
curiosidade, o interesse e o desejo de ler e escrever nos adolescentes e
facilitam a aprendizagem da leitura e escrita por se tornarem objetos reais de
comunicação. A proposta favorece a comunicação entre os alunos e o fácil
envolvimento da família e da comunidade. Além do Rio de Janeiro, este projeto
também acontece no município de São Roque na cidade de São Paulo.
4.1.2. Alfa e Beto
O programa Alfa e Beto é destinado a crianças da educação infantil
(pré-escola) e oferece materiais para duas séries, a educação infantil de quatro
anos e a educação infantil de cinco anos. O Manual de Orientação do
programa apresenta a fundamentação teórica, a proposta pedagógica, o
programa de ensino e descreve os materiais/estratégias para sua implantação.
O Programa inclui um conjunto rico e variado de materiais para o professor e
para as crianças. Cada criança recebe um livro de Grafismo e Caligrafia, um
livro de Artes e um Livro de Atividades. O Instituto Alfa e Beto oferece
capacitação e assistência técnica aos profissionais para a implantação do
Programa.
Este tem como objetivo promover o desenvolvimento da criança em
todos os seus aspectos, pessoal, social, cognitivo e psicomotor, identificando a
44
pré-escola como o espaço e o tempo para promover o desenvolvimento
integral da criança. Brincar neste programa não é meramente um fim, e sim um
meio privilegiado para se chegar ao objetivo maior, o aprender.
A proposta pedagógica baseia-se nas recomendações da Ciência
Cognitiva da Leitura e na análise das práticas dos países mais avançados, que
também se utilizam do sistema alfabético da escrita. Nos últimos trinta anos, as
novas descobertas permitiram um avanço considerável a respeito de como as
crianças aprendem a ler e de como devemos ensinar as crianças a aprender a
ler.
São utilizados diferentes materiais e métodos para o ensino das
competências da alfabetização no programa Alfa e Beto. Métodos estes
voltados para o ensino da competência central que é a decodificação, pois os
estudos científicos sobre o tema já concluíram que os métodos mais eficientes
são os métodos fônicos, que levam o aluno a fazer a correspondência entre
fonemas e grafemas de maneira sistemática e explícita, usando técnicas de
análise e síntese de fonemas para poderem identificá-los e fazerem
corretamente a correspondência com sua forma escrita.
4.1.3. Se liga
O Programa Se Liga foi criado em 1999, com um caráter
emergencial para ajudar a corrigir o fluxo escolar do Ensino Fundamental e
combater o analfabetismo nas primeiras séries, contribuindo também para a
diminuição da evasão escolar. Funciona como uma primeira etapa para tentar
corrigir o fluxo escolar de crianças que não foram alfabetizadas na idade
correta. Em um ano, as crianças que costumavam repetir de série porque não
sabiam ler nem escrever, são alfabetizadas, para que a partir de então possam
frequentar o Programa Acelera Brasil e, depois, retornar à rede regular de
ensino.
45
Este projeto foi criado para tentar sanar as dificuldades
apresentadas no processo alfabetização de alunos com distorção idade/série,
provocando mudanças na educação formal. Muitos destes, por terem
dificuldades de aprendizagem, eram encaminhados para o programa Acelera
Brasil, onde eram feitos testes diagnósticos para separar os defasados
alfabetizados dos defasados não alfabetizados. Essa triagem tornou-se
necessária pela constatação de que entre 20% a 40% do total de defasados
das quatro primeiras séries eram analfabetos, e, portanto, necessitavam ser
alfabetizados antes de ingressarem no programa Acelera Brasil, que pressupõe
que os alunos sejam capazes de ler e compreender o que lêem. A intenção é
que os alunos voltem a acreditar que são capazes de aprender.
Os alunos que possuem uma distorção idade/série e repetem uma
ou mais vezes de série são avaliados para checar seu nível de leitura e escrita
e, caso não alcancem o desempenho desejado, entram no Se Liga. Neste
projeto, um professor da rede previamente e devidamente capacitado aplica a
metodologia do programa, que além da ênfase na leitura, ainda oferece aos
alunos materiais específicos que facilitam e qualificam o aprendizado em
turmas de no máximo 25 alunos, além de seguir uma rigorosa rotina que
corrobora na formação da disciplina dos alunos, quesito fundamental para uma
aprendizagem plena.
Alguns lugares do Brasil onde o programa Se liga foi implantado e
tem apresentado bons resultados são: do Rio de janeiro, Paraíba, Pernambuco,
Piauí, Sergipe, Tocantins e Distrito Federal, entre outros.
Em 2009, 188.154 crianças foram assistidas por este projeto, sendo
mais de 10.154 educadores formados em 1.000 municípios abrangidos no país
somando um total de 579.032 crianças atendidas em dez anos de projeto. No
Piauí, o índice de alfabetização atingido pelas turmas das redes municipais que
adotaram o Programa ficou em 92,8%, em 2008 e a taxa de abandono dos
alunos de 1ª série que não participam do Programa, em Sergipe, é mais que o
dobro do índice de abandono no Se Liga, sendo no Tocantins o caso de maior
sucesso, no qual o percentual de alunos não alfabetizados caiu de 6,8% para
46
1%, ou seja, quase 100% dos alunos aprenderam a ler e a escrever e as
taxas de abandono foram zeradas.
4.1.4. Acelera Brasil
O programa Acelera Brasil foi criado em 1997 e também é um
programa de caráter emergencial, de correção de fluxo do Ensino
Fundamental. Ele combate a repetência que gera a distorção entre a idade e a
série que o aluno frequenta e, também, o abandono escolar. Seu objetivo é
contribuir para que o aluno, em um ano, alcance o nível de conhecimento
esperado para a primeira fase do Ensino Fundamental, de maneira que possa
avançar em sua escolaridade. Alunos do Acelera Brasil chegam a realizar
duas séries em um ano letivo, de acordo com seu aproveitamento, já que não
se trata de promoção automática.
Os alunos, que devem estar alfabetizados, provindos do programa
Se Liga, são agrupados em turmas também de até 25 crianças e
acompanhados por um professor da rede de ensino que passa por uma breve
capacitação inicial, com o objetivo de apresentar a sistemática operacional do
programa. Tanto os alunos como os professores têm acesso a material didático
específico, além de monitoramento e avaliação constantes. Durante o ano
letivo os professores recebem uma visita semanal de um supervisor e
participam de reuniões quinzenais de avaliação, troca de experiências e
planejamento das atividades, junto com outros professores assistidos pelo
mesmo supervisor.
As aulas são pensadas para cumprir 200 dias letivos com atividades
integradas à realidade dos participantes. Há lições de casa, trabalhos em
grupo, momentos voltados à leitura e um acompanhamento personalizado pelo
professor.
O Programa Acelera Brasil, embora integre esse conjunto de esforços e compartilhe objetivos e práticas comuns a outros
47
programas, diferencia-se de outras iniciativas pelas características listadas a seguir. A mais importante delas reside no compromisso explícito com a regularização do fluxo escolar, e não simplesmente com a aceleração de alunos, que é a atitude mais comum na maioria de programas que foram desenvolvidos no país desde 1995. Trata-se, portanto, de um programa de mudança de vetor na política educacional comprometido com resultados permanentes e não com uma mera inovação ou intervenção pedagógica. (Oliveira, 2002, p.178)
Ao longo do projeto são coletadas diariamente e consolidadas
mensalmente informações a respeito da assiduidade dos alunos e professores,
abandono dos alunos, registro das visitas dos supervisores, participação dos
professores nas reuniões quinzenais, andamento do ritmo do programa e
número de livros lidos pelos alunos. Esses dados são analisados pelos
professores, supervisores, coordenadores e pela equipe central que
proporciona assistência técnica ao projeto, visando à correção de rumos.
A expectativa do Programa é promover os alunos para a 5ª série ou
até para a 6ª ou 7ª séries. No entanto, quem decide pela aprovação e número
de “saltos” é o professor, ouvido o supervisor ou conselho de classe,
dependendo da escola, sem qualquer interferência ou pressão do projeto.
Em 2009, o programa atendeu 266.398 crianças, sendo 13.985
educadores formados em 876 municípios abrangidos de 26 Estados e Distrito
Federal incluindo Rio de Janeiro, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do
Sul, Sergipe, Tocantins, etc. Totalizando 601.424 crianças assistidas em doze
anos de programa. Em cinco anos, 52% dos alunos que estudaram no Acelera
Brasil na Paraíba saltaram de série, ajudando a rede a corrigir o fluxo escolar.
Já em Pernambuco, a taxa de abandono no Acelera (3,2%) é menor que a
média do Brasil (10,3%) e do Estado (14,8%) e no Tocantins, 99,5% dos alunos
que concluíram o Acelera Brasil foram promovidos em 2008.
48
4.1.5. Nenhuma Criança a Menos
O projeto “Nenhuma Criança a Menos", implantado pela prefeitura
do Rio de Janeiro através da Secretaria Municipal de Educação, é destinado
aos alunos que obtiveram notas baixas na prova Rio (Avaliação para medir o
nível e a qualidade do ensino no Município do Rio de Janeiro) do ano de 2009
quando cursavam o terceiro ano do ensino fundamental, além de alunos retidos
no terceiro ano e no Programa Se Liga. A proposta do projeto são aulas de
reforço para alfabetização, que são realizadas no turno contrário, com
atividades de sala de leitura e livros paradidáticos enviados pela Secretaria
Municipal de Educação, além de um Cd para ser utilizado no computador como
“Reforço digital" com questões de Português e Matemática.
O principal desafio deste projeto é tentar diminuir o déficit de
aprendizagem agravado pelo modelo anterior de educação que utilizava a
progressão automática. Os alunos com maior dificuldade passam a ser
atendidos individualmente e em pelo menos três dias da semana, eles tem
tempo integral na escola e neste período, os estudantes participam de
atividades em salas de leitura, reforço escolar acompanhado por estagiários da
prefeitura e reforço digital, feito pela internet. Essas crianças ainda são
monitoradas quinzenalmente e fazem uma prova extra por mês, sendo também
acompanhadas por psicólogos e pedagogos que vão às instituições para
analisar questões sociais que possam interferir no desempenho dos
estudantes.
4.1.6. Mais Educação
O Mais Educação é um programa estabelecido pela Portaria
Interministerial n.º17/2007 e que compõe as ações do Plano de
Desenvolvimento da Educação (PDE), como uma estratégia do Governo
Federal para aumentar a jornada escolar e a organização curricular,
49
objetivando uma educação integral e uma diminuição das desigualdades
educacionais.
Sua proposta é corroborar com uma educação que procure superar
o processo de escolarização, muito centrado na figura da escola, que apesar
de ser o lugar ideal para a aprendizagem dos saberes curriculares e oficiais na
sociedade, não deve ser considerada como a única alternativa educativa,
retirando da família seu papel como formadora da moral de seus entes. Por
essa razão, se torna importante integrar diferentes saberes, espaços
educativos, pessoas da comunidade e conhecimentos com a intenção de
construir uma educação plena, o que pressupõe uma relação de aprendizagem
para a vida e não somente a aquisição de determinadas capacidades para a
entrada no mercado de trabalho, deixando de lado aspectos importantes tais
como a ética, a moral, e o respeito.
O ideal da Educação Integral traduz a compreensão do direito de aprender como inerente ao direito à vida, à saúde, à liberdade, ao respeito, à dignidade e à convivência familiar e comunitária e como condição para o próprio desenvolvimento de uma sociedade republicana e democrática. Por meio da Educação Integral, se reconhece as múltiplas dimensões do ser humano e a peculiaridade do desenvolvimento de crianças, adolescentes e jovens. (Mais educação passo a passo,2010 p. 7)
Por ser uma atuação intersetorial entre as políticas públicas
educacionais e sociais para a redução das desigualdades educacionais e a
valorização da heterogeneidade cultural brasileira, coloca em diálogo as ações
empreendidas pelos Ministérios da Educação, da Cultura , do Esporte , do Meio
Ambiente, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Ciência e da
Tecnologia e, também da Secretaria Nacional de Juventude e da Assessoria
Especial da Presidência da República, essa última por meio do Programa
Escolas-Irmãs, passando a contar com o apoio do Ministério da Defesa, na
possibilidade de expansão dos fundamentos de educação pública.
50
Essa estratégia proporciona o aumento de vários fatores que
permitem uma melhor aprendizagem global: tempos, espaços, oportunidades
educativas e o compartilhamento da tarefa de educar entre os profissionais da
educação e de outras áreas, as famílias e diferentes atores sociais, sob a
coordenação da escola e dos professores. É um programa que atende,
prioritariamente, escolas de baixo IDEB (Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica), situadas em capitais, regiões metropolitanas e grandes
cidades em territórios marcados por situações de vulnerabilidade social que
requerem a convergência prioritária de políticas públicas e educacionais.
O público alvo que o programa deseja atingir são os estudantes que
estão em situação de risco, vulnerabilidade social e sem assistência,
estudantes que congregam seus colegas – incentivadores e líderes positivos
(âncoras), estudantes em defasagem série/idade, estudantes das séries finais
da 1ª fase do ensino fundamental (4º / 5º anos), nas quais há uma maior
evasão na transição para a 2ª fase, estudantes das séries finais da 2ª fase do
ensino fundamental (8º e/ou 9º anos), nas quais há um alto índice de abandono
e estudantes de séries onde são detectados índices de evasão e/ou repetência.
4.2. Qual a importância desses projetos no problema de
distorção idade/série?
Como visto nas descrições dos projetos acima, todos objetivam a
correção do fluxo escolar e/ou o aprimoramento da alfabetização e da
aprendizagem de forma global. Dessa forma, na conjuntura que se encontra o
ensino do Brasil, mas especificamente do Município e do Estado do Rio de
Janeiro, a aplicação desses projetos e programas se faz muito importante e
necessária, pois colabora com a aprendizagem dos alunos utilizando-se de
técnicas diversificadas e planejadas, especificamente para aquele determinado
grupo que pretende atender, potencializando desta maneira as chances de
sucesso.
51
Assim, os grandes motivos que alarmam os governos, e que se
encontram em grande evidencia com o fim do ciclo, isto é, a evasão escolar, as
repetências e o analfabetismo, sofrem considerável melhoria nas escolas nas
quais os programas vigoram, o que contribui também para uma melhoria na
vida dos alunos, que se tornam mais confiantes, sabendo que podem e
conseguem aprender.
Outro quesito importante trabalhado é o ponto que trata do início do
processo de alfabetização e o letramento na educação infantil, proposta pelo
programa Alfa e Beto. A educação infantil era vista na rede pública de ensino
como fase de brincadeira sem preocupação com conteúdos e com o fato da
criança reconhecer as letras, reconhecer seu nome e conseguir escrevê-lo.
Assim estas chegavam ao primeiro ano sem saber praticamente nada, sem
reconhecer as letras e números o que dificultava bastante o trabalho do
professor e o desenvolvimento da turma.
Estes programas oferecem as ferramentas necessárias para a
construção do conhecimento que permite a quebra do círculo vicioso que são
algumas formas de ensinar, sem regras, sem rotinas etc. e a conseqüente
passagem para níveis mais elevados de saberes, promovendo a auto-estima e
o desenvolvimento pessoal.
Após o desafio de acabar com a aprovação automática no Município
do Rio de Janeiro em 2009, restou a Secretaria Municipal de Educação superar
as deficiências geradas por um sistema de ensino em que os alunos entendiam
que o estudo não era necessário, afinal a aprovação viria de qualquer forma. E
a implantação dos projetos descritos está corroborando em grande escala para
que a estatística de alunos não alfabetizados diminua consideravelmente o que
ocasiona por diminuir também o índice de reprovações nas unidades escolares.
52
CONCLUSÃO
Por ser a Psicopedagogia uma área que serve de instrumento
potencializador da aprendizagem em sentido amplo, ela pode contribuir
consideravelmente para auxiliar os professores e profissionais da educação no
difícil trabalho de alfabetização, principalmente em se tratando de alunos que
necessitam ser alfabetizados e que já passaram da idade considerada como
adequada. Isso decorre do fato da psicopedagogia estar apta a estruturar um
ambiente mais propício para o aprendizado, pois como ela parte das
habilidades que os indivíduos são capazes de realizar, consegue mais
rapidamente encontrar a(s) causas do não aprendizado, trabalhando assim, de
maneira lúdica e dinâmica tais dificuldades, problemas ou transtornos que
acabam sendo minimizados e/ou sanados.
Pela implantação inadequada do Ciclo de Formação, acabou
estabelecendo-se a aprovação automática e, desta forma, permitindo a
continuidade do processo à alunos que não tinham os conteúdos apreendidos
e por conseqüência, acumulando dúvidas e grandes dificuldade. Muitos destes
sequer sabem ler ou resolver cálculos básicos agravando de forma significativa
o problema. Foram necessários investimentos de órgãos privados e instituições
não governamentais que em parceria com as escolas públicas, proporcionaram
uma melhoria na aprendizagem através de técnicas únicas e baseadas na
rotina e disciplina obtendo excelentes resultados.
A utilização desses projetos que auxiliam na aprendizagem de forma
global e contribuem para o desenvolvimento global do aluno, suprindo as
necessidades e preenchendo as lacunas que foram deixadas durante os anos
de reprovação e da aprovação automática. E este processo de fortalecimento
apresenta alto grau de importância, pois favorecem o aprendizado,
recuperando a autoestima e a confiança.
53
É certo que alguns alunos não conseguem aprender em
decorrência de algum distúrbio, problema ou transtorno de aprendizagem, mas
em alguns casos, que não são poucos, os alunos não aprendem por falta de
estímulo por parte dos pais, pela precariedade da comunidade onde vivem e
principalmente pela falta de incentivo e afetividade dos professores. Estes, que
por também se sentirem desestimulados, cansados e até mesmo agredidos,
perdem a motivação para planejar e ministrar aulas dinâmicas e interessantes,
e acabam por fazê-lo de forma desinteressante e que certamente não atingirão
o objetivo maior de estimular os que se dispersam, pois estes alunos irão
perceber a falta de compromisso e interesse dos professores, e simplesmente
desistirão de investir em si mesmos por meio da aprendizagem.
Para que a vontade de aprender não se perca, é de extrema
importância que os professores tornem os conteúdos interessantes e mostrem
as aplicações diretas na vida do aluno deste ensinamento, para que aquele
conteúdo não fique apenas na abstração e por consequência seja esquecido.
É neste aspecto que o Psicopedagogo poderá orientar o professor na
estruturação de estratégias estimulantes.
O Psicopedagogo será o profissional primordial neste trabalho de
orientação de todos os envolvidos no processo de aprendizagem: professores,
responsáveis, equipe pedagógica e também profissionais das unidades
escolares, para que de forma unificada e consistente, possam trabalhar em
conjunto, proporcionando uma educação de qualidade visando uma formação
fortalecida da aprendizagem e cidadania.
54
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- www.portalsaofrancisco.com.br (20/06/2010)
ÍNDICE
57
AGRADECIMENTOS
DEDICATÓRIA
RESUMO
METODOLOGIA
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
CAPITÚLO 1 10
A PSICOPEDAGOGIA E OS PROBLEMAS E TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM
1.1. O que é a psicopedagogia? 10
1.1.1. Um pouco sobre a história da psicopedagogia. 14
1.1.2. Áreas de atuação da psicopedagogia. 15
1.2. O Que são os problemas e transtornos de aprendizagem? 18
1.2.1. Alguns tipos de problemas e transtornos de aprendizagem. 21
1.3. As Intervenções psicopedagógicas. 22
CAPÍTULO 2 25
O QUE OCASIONA A DISTORÇÃO IDADE SÉRIE E O ANALFABETISMO?
2.1. O ciclo de aprendizagem. 25
2.2. A falta de qualificação dos profissionais da educação. 31
2.3. A falta de afetividade nas salas de aula. 34
CAPÍTULO 3 36
COMO A PSICOPEDAGOGIA PODE FAVORECER O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO EM ALUNOS COM DISTORÇÃO IDADE/SÉRIE?
CAPÍTULO 4 42
PROJETOS QUE AUXILIAM NA POTENCIALIZAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
4.1. O que são e quais são estes projetos? 42
4.1.1. Fórmula da Vitória 43