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    104 Revista Complejus - V.1. N.1 - jan./jun. 2010

    A ARBITRAGEM APLICADA AOS CONTRATOSINDIVIDUAIS DE TRABALHO NA ERA DA GLOBALIZAO

    Humberto Lima de Lucena Filho**

    Resumo:Aborda o presente trabalho a arbitragem aplicada aos contratosindividuais do trabalho na era da globalizao. Assume como premissa asmudanas provocadas por este fenmeno scio-econmico sobre as rela-es humanas, em especial as comerciais e, por reflexo, as trabalhistas. Nes-se sentido, a dinmica do intercmbio de informaes e operaes no setorprodutivo clama por mecanismos cleres e pacficos capazes de por termos possveis contendas jurdicas. Destacam-se, no cenrio delineado, os m-todos alternativos de soluo de conflitos, os quais tem tomado proporessignificantes e se revelam como ferramentas eficientes na harmonizao dasrelaes humanas. Dessa realidade no esto excludos empregados e em-pregadores. Expe, portanto, o presente escrito a incapacidade da prestao

    jurisdicional especializada a Justia do Trabalho em acompanhar o ritmoimposto pela globalizao e como a arbitragem atenderia tal demanda, bemcomo suas vantagens, notadamente o desafogamento do Poder JudicirioTrabalhista. Para tanto, conceitua a globalizao, a evoluo da arbitragem esua incidncia no direito individual do trabalho.

    Palavras-chave:Arbitragem. Contratos individuais de trabalho. Globalizao.Abstract:The current paper approaches the arbitration applied to the indivi-dual labor agreements in globalization era. It admits as premise the causedchanges by the referred social and economic phenomenon over the humanrelations, especially business ones and, by reflex, labors too. In this way, theinformation and operation interchange dynamics at the productive sector de-mands fast and peaceful mechanisms able to solve the judicial struggles. Itstands out, in the described scenario, de alternative conflicts resolution me-

    thods, which have taken significant proportions and come out as efficient toolin the human relations harmonization. Employers and employees are not ex-cluded from this reality. The paper exposes, thus, the incapacity of the spe-cialized jurisdiction the Labor Court to follow the rhythm inflicted by theglobalizations and how arbitration would help the relief of the Labor Branch.In order to achieve the aims, it defines the globalization, arbitration evolutionand its incidence over the individual labor law.

    Keywords:Arbitration. Individual labor agreements. Globalization

    **Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN, Especialista em Direito e Processo do Tra-balho pela Universidade Potiguar (UnP) / Laureate International Universities. Oficial de Justia Avaliador Federal do TribunalRegional do Trabalho da 21 regio. Professor do curso de Direito da Faculdade Maurcio de Nassau, campusNatal-RN.

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    SUMRIO

    1 INTRODUO2 O ADVENTO DA GLOBALIZAO3 ASPECTOS GERAIS DA ARBITRAGEM

    3.1 HISTRICO3.2 DEFINIO E ELEMENTOS:4 A ARBITRAGEM NOS CONTRATOS INDIVIDUAIS DE TRABALHO5 CONSIDERAES FINAIS REFERNCIAS

    DATA DE ELABORAO

    1 INTRODUO

    Os ltimos cento e cinqenta anos tm sido marcados por um acen-tuado intercmbio entre os povos - regidos sob os auspcios da revoluocientfica e tecnolgica - o que proporcionou o avano das prticas mercantise expanso dos mercados consumidores. Ao mesmo tempo, os sistemas deinformaes, devido massificao da mdia e ciberntica especialmente,crescem numa velocidade nunca antes experimentada. So apenas de al-guns efeitos da famigerada Globalizao.

    Diante de todo este processo de dinamicidade socio-econmico-cientfica, comum que as relaes humanas tambm sejam incrementadase nasam conflitos entre os agentes da nova ordem mundial. Posto que Direi-to e Economia so cincias interligadas, justificvel o aparecimento de umaglobalizao jurdica, dotada de caractersticas prprias.

    Nesse sentido, o Direito e Processo do Trabalho tambm so envol-vidos pelo novo modelo de pretenso resistida, haja vista, enquanto ramos

    jurdicos aplicveis essencialmente aos atores do sistema capitalista, seremafetados pela necessidade de uma maior rapidez e eficincia na sua aplica-o. Manifestao do novo sentido conferido ao trabalho o avano do DireitoLaboral, por meio de sua expresso supraterritorial o Direito Internacional doTrabalho (DIT) e a Organizao Internacional do Trabalho (OIT)1 na uniformi-zao das questes trabalhistas. o que dizem Paulo e Alexandrino2:

    O DIT persegue a uniformizao das questes trabalhistas, visando JustiaSocial, tentando evitar que razes econmicas suplantem em importncia a ado-o de normas que tenham como fim a dignificao do trabalho humano.

    1Organismo internacional criado pelo Tratado de Versalhes em 1919 com sede em Genebra, ao qual podem filiar-se todos ospases-membros da Organizao das Naes Unidas (ONU).2VICENTE Paulo, ALEXANDRINO, Marcelo. Manual de Direito do Trabalho. 12.ed. So Paulo: Mtodo, 2008. p.24.

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    Na atualidade, o trabalho da OIT tem cada vez maior importncia, especialmentesua atuao visando a promover a continuidade do processo de globalizao,mediante uma ao eficaz no plano nacional e internacional, compreendendomedidas para garantir equilbrio entre objetivos de desenvolvimento econmico

    e de bem-estar social.

    Tamanha preocupao em inserir o Direito Social no plano interna-cional sustenta-se na realidade de que no modelo globalizado de mercado,os acontecimentos na economia de um pas so refletidos em locais ondeno se imaginaria. O crescimento do mercado asitico tem influncia em re-laes comerciais e trabalhistas no Brasil, por exemplo. Uma crise mundialiniciada sob forma de especulaes no capital voltil de bolsa de valores capaz de dissipar inmeros postos de trabalhos, deixando como saldo milha-

    res de desempregados, os quais nem sempre tero as rescises contratuaisfeitas regularmente e que, por bvio, ho de procurar uma proteo estatalpara tanto.

    Contudo, o que se observa em mbito mundial como entrave glo-balizao jurdica so dois grandes problemas. De incio, a cultura de judicia-lizao exacerbada das relaes humanas tem sido propagada em escalasexponenciais. O Poder Judicirio assumiu um papel no apenas de aplicadorda lei abstrata e impessoal, mas de palco de rixas pessoais, ntimas e odio-

    sas, quando no uma verdadeira loteria jurdica, caso da indstria dos danosmorais.

    Em agravo a esta realidade, os rgos responsveis pela distribuiode justia no conseguiram acompanhar o processo de mundializao. En-quanto empresas, trabalhadores, consumidores e Estados interagem entre sinum ritmo assaz clere, potencializando o surgimento de lides, os tribunaisencontram-se afogados em milhares de processos e estes, por sua vez, ba-seados em legislaes processualistas truncadas e de cunho protelatrio.

    Ademais, h uma quantidade de magistrados, servidores e bens insuficientespara atender ao tratamento constitucional dado aos processos judiciais e ad-ministrativos3.

    A Justia do Trabalho, como representao especializada do poderestatal, no est excluda da realidade ora em comento. bem verdade queos princpios que norteiam o Direito e Processo do Trabalho so de celeri-dade e eficincia, consagrados na instrumentalidade, economia processual

    3Art. 5 Constituio da Repblica Federativa do Brasil (CFRB) de 1988: Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquernatureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes: (...) LXXVIII a todos, no mbito judicial e administrativo, soassegurados a razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao.

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    e oralidade marcantes nos processos trabalhistas. Tambm inegvel quedentre os ramos do Poder Judicirio, no h outro com resposta to rpidaao jurisdicionado. Entretanto, ainda pouco. Para uma Justia em que osdemandantes so titulares de crditos de natureza alimentar, a prestaodesempenhada por seus rgos deixa a desejar. O fundamento para tal de-

    clarao so os dados divulgados pelo Conselho Superior da Justia do Tra-balho (CSJT), no Relatrio Geral da Justia do Trabalho (RGJT) do ano de2008, disponvel no stio do rgo referido.

    De acordo com o RGJT, h na Justia do Trabalho 1,75 juzes paracerca de 100.000 habitantes4, tendo cada um deles em mdia 1954 proces-sos durante o ano referncia. A taxa de congestionamento nas Varas do Tra-balho, isto , o percentual de processos no julgados em relao ao total a

    julgar (Resduo + Casos Novos) em 2008 foi de 33,69% na fase de conheci-

    mento e de 62,80% na execuo. Em outras palavras, h casos de proces-sos que da data de sua autuao at a audincia inicial demoram mais deum ano, o que beira o absurdo, principalmente quando se trata de autoresem sua maioria desempregados e necessitados de uma deciso rpida dasquestes submetidas ao Judicirio.

    A segunda problemtica reside na inexistncia de uma jurisdiouniversal de ordem pblica e dotada de poder coercitivo capaz de resolveros conflitos supranacionais, ou seja, um Poder Judicirio Internacional comcompetncia para dirimir questes de cunho econmico ou trabalhistas. Des-ta feita, conflitos transterritoriais no tm um foro especfico onde possam serdiscutidos5.

    Nesse contexto de conflito entre a globalizao das relaes jurdi-cas versus jurisdio tradicional, tornou-se imperiosa a presena mecanis-mos eficientes capazes de atender aos anseios sociais de celeridade e efi-cincia tocantes soluo dos processos judiciais. Foi, destarte, instigadoo (res)surgimento dos Mtodos Extrajudiciais de Soluo de Controvrsias

    MESCS, os quais abrangem a arbitragem, a mediao, a autocomposioe a conciliao.

    Tem este trabalho, considerando o atual momento econmico no qualo Direito do Trabalho est inserido, o escopo de tecer algumas consideraesacerca do instituto da arbitragem como mecanismo extrajudicial de soluode controvrsias tangentes aos contratos individuais de trabalho na era daglobalizao, apontando-o como uma alternativa vivel aos mtodos institu-

    4 3% a menos que em 2007.5Atualmente, existe a Corte Internacional de Justia, sediada em Haia (Holanda), destinado a resolver controvrsias entre Esta-dos. No entanto, um rgo competncia restrita. ROQUE, Sebastio Jos. Arbitragem: a soluo vivel. So Paulo: cone,1997. p. 127.

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    cionais, sem perder as peculiaridades da seara laboral. bem verdade que otema objeto de calorosas discusses na doutrina e jurisprudncia, no ten-do este escrito o objetivo de esgotar o assunto e sim de reavivar a discussona comunidade acadmica, que, sem dvida, tem como uma de suas funesapresentar solues viveis para os problemas existentes no seio social.

    Para tanto, far-se- uma rpida abordagem acerca da globalizao

    e, posteriormente, sero introduzidos os conceitos de arbitragem, razeshistrias e sua abrangncia em sede de direitos6. Num segundo momento,estudar-se- a possibilidade de aplicao da arbitragem nos contratos indi-viduais de trabalho e, posteriormente, sero tecidas as consideraes finais.Para a concretizao da proposta do presente trabalho, o estudo foi realizadodentro da metodologia terico-descritiva, fundamentado na melhor doutrinae jurisprudncia dominante do Tribunal Superior do Trabalho TST. Foram

    estudadas, ainda, normas internacionais e o que dispe a legislao ptria consubstanciada na Constituio Federal, Consolidao das Leis do Traba-lho CLT, Cdigo de Processo Civil e Lei da Arbitragem.

    2 O ADVENTO DA GLOBALIZAO

    O termo Globalizao no recente, como muitos afirmam. O dicio-nrio editado pela Universidade de Oxford j identificava o aparecimento emingls do termo global, h mais de quatrocentos anos. Porm, os processosidentificados com tal palavra so recentes, considerando que apenas nosltimos quarenta anos a globalizao passou a descrever um conjunto rela-tivamente indito de transformaes. Saindo de uma definio meramentegramatical e aplicando critrios mais tcnicos, possvel definir a globaliza-o como o processo de internacionalizao dos fatores produtivos, impul-sionado pela revoluo tecnolgica e pela internacionalizao de capitais7.Nela, as empresas transnacionais alargam suas atividades, difundem tcni-cas de produo e homogenizam paradigmas de produo e consumo. Tudoisto aliado a um gradual desaparecimento das fronteiras nacionais e largadifuso das informaes.

    Os indcios deste fenmeno encontram-se na civilizao egpcia, quemanteve o domnio de todo o continente africano; na Grcia, que apesar de suaorganizao em cidades-estado, encaravam a economia de forma macroestru-turada. Em Roma, com a expanso territorial, uma rede de estradas foi cons-truda, a qual possibilitou a comunicao e comercializao entre os diversospovos, sendo este um sinal de uma globalizao ainda embrionria.

    6Para fins de compreenso do instituto da arbitragem, adotar-se- os parmetros estabelecidos pela Lei n. 9.307 de 23 de se-tembro de 1996 Lei da Arbitragem (LA) e pelo Cdigo de Processo Civil Brasileiro.7BARRAL, Welber de. A arbitragem e seus mitos. Florianpolis: OAB/SC, 2000.

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    Indo da antiguidade para os sculos XIV e XV, percebe-se um des-compasso entre a capacidade de produo e consumo, o que provocava umaprodutividade baixa e falta de alimento para abastecer os ncleos urbanos,enquanto a produo artesanal no tinha um mercado consumidor. Era ur-gente ampliar os mercados que pudessem fornecer alimentos em trocas dos

    produtos artesanais europeus e sair dos limites nacionais para estabelecernovos contatos mercantis, por meio das grandes navegaes. Cinco sculosmais tarde, com a poltica neocolonialista, os pases europeus, os EUA e oJapo buscaram mercados para escoar o excesso de produo e capitais,transformando o continente Africano e Asitico em centros fornecedores dematria prima e consumidores de produtos industrializados, tracejando umquadro de dependncia econmica dos pases mais pobres em relao aosmais ricos. Ao longo nestes dois perodos, foram consolidados os elementosglobais de aumento do intercmbio comercial e a bipolarizao mundial entre

    naes desenvolvidas e subdesenvolvidas.Na segunda metade do sculo XX, a utilizao do vocbulo tambm

    foi inserida no mbito da comunicao, meio ambiente e soberania dos Esta-dos. Nesse sentido, as barreiras comerciais entre os pases, gradativamente,passaram a ser dissolvidas com a consolidao de blocos econmicos e como incentivo dos governos atrao do capital estrangeiro. De igual modo fo-ram implantadas polticas de integrao econmica, privatizao e instalaode empresas de carter transnacional. Isto posto, se as relaes se intensifi-

    cam tambm potencializam-se as divergncias de interesses.No mbito do Direito do Trabalho, a globalizao e o neoliberalismo

    representam mais do que reflexo de acontecimentos internacionais sobre oscontratos de trabalho realizados nos territrios dos Estados Nacionais: a com-petio acirrada entre as empresas. Estas so movidas pela maximizao daprodutividade e minimizao dos custos de produo, o que inclui a remune-rao da mo-de-obra, sob a justificativa de possibilitar a concorrncia comcompanhias utilizadoras de empregados a baixo custo, tais quais as prove-

    nientes da China. Desde a dcada de 80, vrios movimentos posicionaram-se no sentido de conferir maior papel vontade das partes contratantes erelegar a lei ao segundo plano. Nesse cenrio, o Estado intervm ao mnimonas relaes de trabalho, deixando o prprio mercado e os contratantes es-colherem as clusulas contratuais. Para os defensores da desse novo papelestatal, a tendncia do mercado global a reduo de benefcios sociais comem troca da manuteno do emprego.

    Todavia, a resistncia chamada flexibilizao tem militantes aguer-

    ridos, tais como o jurista Srgio Pinto Martins, o qual se pronunciou a respeitodo assunto8:8MARTINS, Srgio Pinto. Direito do Trabalho. So Paulo: Atlas, 2005. 21.ed. p. 42-43.

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    O neoliberalismo prega que a contratao e os salrios dos trabalhadores devemser regulados pelo mercado, pela lei da oferta e da procura. O Estado deve dei-xar de intervir nas relaes trabalhistas, que seriam reguladas pelas condieseconmicas. Entretanto, o empregado no igual ao empregador e, portanto,necessita de proteo.

    nesse cenrio de choque entre capital e emprego atualmente vividopelo Direito do Trabalho em que o tema da arbitragem aplicado aos contratosindividuais trabalhistas ganha destaque. E destaca-se no porque o institutotome este ou aquele partido no que toca flexibilizao e desregulamentaodos direitos sociais e sim porque torna concreta a carga de (no) protetivida-de prevista no ordenamento jurdico nacional em tempo satisfatrio.

    Acrescente-se, ainda, que a aplicabilidade da arbitragem em sedetrabalhista pe termo lide sem o acirramento emocional das partes (uma

    vez que o rbitro e o direito escolhido pelas partes) e implica o cumprimentoda obrigao imposta pelo laudo arbitral, via de regra, sem a necessidadede um processo de execuo. Como vantagem reflexa tem-se o sigilo dosresultados, capazes de resguardar os direitos dos agentes envolvidos, semcausar-lhes prejuzos e faz-los perder operaes, oportunidade de trabalhoe negcios vantajosos no futuro.

    3 ASPECTOS GERAIS DA ARBITRAGEM

    3.1 HISTRICO

    Desde os tempos remotos, a humanidade sempre buscou caminhosprticos, visto que os negcios, sejam civis ou comerciais, exigem respos-tas rpidas (SZKLAROWSKY, 2004). Inicialmente, o mtodo do olho porolho, dente por dente era a regra. Com a evoluo dos conceitos de justia,atribuiu-se aos ancios as decises das dissenses entre os integrantes dogrupo social. Nesse perodo, ainda era ntida a ausncia de um Estado forteque assumisse a prerrogativa de dirimir os conflitos entre as pessoas. Logo,cabia aos bonus pater familiaea responsabilidade de decidir as controvr-sias que porventura surgissem 9. Era a semente que germinaria mais tardeno mtodo da arbitragem.

    Analisando a evoluo dos mecanismos de resoluo de disputas, perceptvel que entre os povos antigos tanto a arbitragem como a media-o j eram conhecidas. Na Grcia, especialmente no perodo clssico, hregistros de que as solues amigveis das contendas faziam-se por meioda arbitragem, a qual poderia ser a compromissria e a obrigatria. Os com-

    9LIMA, Cludio Vianna. A arbitragem no tempo: o tempo na arbitragem. In: A arbitragem na era da globalizao. Rio de Janeiro:Forense, 1999. p.6.

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    promissos especificavam o objeto do litgio, os rbitros eram indicados pelaspartes, o laudo arbitral era gravado em plaquetas de mrmore ou de metal esua publicidade ocorria pela afixao nos templos das cidades. H tambm aconhecida distino entre juiz e rbitro apontada por Aristteles e o caso daarbitragem na mitologia grega em que Paris atuou como rbitro entre Atenas,

    Hera e Afrodite na escolha de quem receberia a ma de ouro, presenteadapela deusa da discrdia.

    Muito embora, tenham sido os gregos os grandes estudiosos do con-ceito de justia, foram os romanos que a jurisdicizaram. No processo romano,a arbitragem se evidenciava nas duas formas sob a ordem da justia privada:o processo das legis actiones e o processo per formulas. Em ambas as esp-cies, existia a figura do pretor, o qual preparava a ao, primeiro mediante oenquadramento do caso concreto lei, depois, acrescentando a elaborao

    da frmula, e, posteriormente, o julgamento por umiudex ouarbiter.Este, porseu turno, no integrava o corpo funcional romano, mas era simples particu-lar, idneo, incumbido de julgar, como ocorreu com Quintiliano, gramtico deprofisso e inmeras vezes nomeado rbitro10.

    Haja vista o considervel progresso da jurisprudncia romana, o Es-tado migrou de uma esfera de justia privada para uma publicizao do poder

    jurisdicional na distribuio de justia. Nesse novo Estado, a figura do rbitrofoi suprimida e as fasesin jure e apud judicemse concentraram nas mos dopretor, enquanto representante do Poder Imperial. Da originou-se o perododa cognitio extraordinariae a figura do juiz como representante do soberano.A arbitragem, que em Roma se apresentava em sua modalidade obrigat-ria, antecedeu, assim, prpria jurisdio estatal. Vigoraram, destarte, emRoma, duas espcies de arbitragem: a facultativa, contratualmente estabe-lecidas pelas partes litigantes e a necessria, integrante da ordo judiciorumprivatorum.

    Tempos mais tarde, aps a invaso do Imprio Romano pelos br-

    baros e entrada no perodo conhecido como Idade Mdia, a arbitragem fun-cionava como meio de resolver os conflitos, entre nobres, cavaleiros, bares,proprietrios feudais e entre comerciantes. As ordenaes Afonsinas, Ma-nuelinas e Filipinas j disciplinavam este sistema de composio dos con-flitos. Cabe ainda destacar a influncia do Direito Cannico na utilizao daarbitragem durante esse perodo, uma vez que o poder jurisdicional da IgrejaApostlica Romana se fundava no juzo arbitral e o clero fazia uma apologiaa que seus fiis evitassem disputas judiciais.

    10ALVIM, Jos Eduardo Carreira. Tratado Geral da Arbitragem. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000.

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    Com a expanso das navegaes e proliferao da mercancia, for-maram-se agrupamentos comerciais, denominados de feiras, dotadas de umgrande fluxo na circulao de riquezas e com durao temporrias. Foi en-to que os comerciantes agruparam-se para a defesa dos seus interesses erecorriam aos tribunais consulares (compostos por rbitros mercantis), que

    eram prticos, rpidos e fortes no emprego de meios no-contenciosos desoluo das querelas. O lema Navegar preciso no combinava com uma

    justia pblica, formalista e descompromissada com a versatilidade peculiars prticas comerciais.

    Apesar dos sinais da arbitragem perderem-se nas noites dos tem-pos, foi a partir da Revoluo Francesa (1789) com a difuso dos Direitos doHomem e do Cidado que o instituto tomou um verdadeiro impulso. O pen-samento de uma justia consentida era a mais correspondente ao eminente

    pensamento ideolgico da poca. Reflexo da valorizao do juzo arbitral noordenamento francs foi o fato do Cdigo de Processo Civil de 1806, adotara arbitragem facultativa e suprimir a arbitragem forada.

    Nos tempos hodiernos, os padres mundiais de indstria, comrcioe soberania foram alterados. A rpida mudana no alcance espacial da aoe da organizao social, que passou da esfera local ou nacional para o n-vel inter-regional ou intercontinental, aliada ao fortalecimento do capitalismofinanceiro, gerou uma massificao da arbitragem, principalmente nos con-tratos comerciais internacionais11. Diversos Estados abraaram a arbitragem,aderindo em nmero significativo s convenes internacionais e as ratifican-do nos seus ordenamentos jurdicos12.

    3.2 DEFINIO E ELEMENTOS:

    Segundo leciona Carreira Alvim, a arbitragem a instituio pelaqual as pessoas capazes de contratar confiam a rbitros, por elas indicadosou no, o julgamento de seus litgios relativos a direitos transigveis13. Clu-dio Vianna de Lima a define como14:

    Prtica alternativa, extrajudiciria, de pacificao de conflitos de interesses en-volvendo direitos patrimoniais e disponveis, fundada no consenso [...], atravsda atuao de terceiro, ou de terceiros, estranhos ao conflito, mas de confianae escolha das partes em divergncia, por isso denominado rbitros [...]

    11Atualmente, cerca de oitenta por cento dos contratos comerciais internacionais contm uma clusula compromissria. VICENTE,Drio Moura Vicente. Da arbitragem comercial internacional: direito aplicvel ao mrito da causa . Coimbra: Coimbra Editora,1990.12

    Nos ltimos anos, Bolvia, Brasil, Colmbia, Costa Rica, Guatemala, Peru e Venezuela aprovaram novas legislaes referentes resoluo alternativa de conflitos.13ALVIM, Jos Eduardo Carreira. Tratado Geral da Arbitragem. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000.14LIMA, Cludio Vianna. A arbitragem no tempo: o tempo na arbitragem. In: A arbitragem na era da globalizao. Rio de Janeiro:Forense, 1999. p.5.

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    Trata-se de modalidade de heterocomposio, na qual, segundo Fre-die Didier Jnior, esto inseridos os elementos do terceiro julgador, da solu-o amigvel e imparcial15. O rbitro, neste caso, pessoa de confiana daspartes e que, pela prpria funo que desempenhar, tende a ser um expert,profissional especializado na matria objeto de discusso16.

    A Carta Poltica de 1988 consolidou a adoo da arbitragem, ao pre-

    v-la no seu art. 114, 1 e 2, dispondo acerca de sua utilizao no DireitoColetivo do Trabalho17. Posteriormente, a Lei n. 9.307, de 23 de setembrode 1996, denominada Lei Marco Maciel, veio a disciplinar em termos infra-constitucionais os procedimentos a serem obedecidos quando da escolha daarbitragem pelas partes conflitantes. este diploma legal considerado umdos mais avanados do mundo e disponibilizou aos cidados mecanismoseficientes capazes de dar uma soluo rpida s questes que lhe so pro-

    postas e desafogar o Poder Judicirio.

    Quando do seu surgimento, o Estatuto da Arbitragem foi estranha-mento questionado como violador de princpios constitucionais bsicos aserem observados nos processos judiciais, tais como o acesso ao Poder Ju-dicirio, o devido processo legal e da ampla defesa. Argumentos de todanatureza tentaram desqualificar este instituto de expanso e respeitabilidadeinternacional j consolidada, sob a justificativa de que a periculosidade de sedelegar a funo jurisdicional a entes privados poderia trazer prejuzos irrepa-rveis aos jurisdicionados. Contudo, nos parece que no necessrio muitoesforo intelectual para constatar que a arbitragem escolha das partes, mo-tivadas por uma insatisfao com a distribuio de justia lenta e deficientedo Estado. Ademais, s partes no defeso recorrer ao judicirio quando osprocedimentos estabelecidos pelo legislador no forem observados.

    Em 12 de dezembro de 2001, os argumentos contrrios constitu-cionalidade do instituto foram dissipados pelo Supremo Tribunal Federal. Porvia incidental, o Pretrio Excelso no julgamento da homologao de sentenaestrangeira SE 5.206-7 (espanhola), declarou a constitucionalidade da Lei deArbitragem em todos os seus termos.

    No seu artigo 1, a lei arbitral dispe que as pessoas capazes decontratar podero valer-se da arbitragem para dirimir litgios relativos a di-

    15DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. Salvador:Editora Jus Podivum. 2008. v.1.p.79.16DELGADO, Maurcio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7.ed. So Paulo: LTr, 2008.17Art. 114. Compete Justia do Trabalho processar e julgar:

    (...) 1 - Frustrada a negociao coletiva, as partes podero eleger rbitros.2 Recusando-se qualquer das partes negociao coletiva ou arbitragem, facultado s mesmas, de comum acordo, ajuizardissdio coletivo de natureza econmica, podendo a Justia do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposies mnimaslegais de proteo ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.

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    reitos patrimoniais disponveis. Observe-se que dois so os elementos sus-tentadores do mtodo em estudo: a capacidade das partes em contratar e osdireitos patrimoniais disponveis. Logo, devero ser observadas as exign-cias estabelecidas pela legislao quanto capacidade civil para o negcio

    jurdico, nos moldes do art. 5 do Cdigo Civil Brasileiro, e observar se os

    direitos objetos do litgio possuem natureza de patrimonialidade disponvel.

    Entende-se por direitos patrimoniais disponveis como aqueles dota-dos de valor econmico e patrimonial, podendo ser livremente alienados (ven-didos, cedidos, doados) sobre os quais o seu proprietrio pode renunciar, tran-sacionar ou transigir, desde que tenha capacidade civil para isto. Por exemplo,um particular, maior e capaz, proprietrio de um terreno, pode dispor dele comobem entender: poder vend-lo, do-lo ou mesmo abandon-lo, permitindo queseja ocupado por terceiros. Estes direitos disponveis so os que podem ser

    objeto do processo arbitral. Conseqentemente, esto excludos da apreciaoda arbitragem aqueles direitos que versem sobre matrias de ordem pblica,como questes de Direito de Famlia18. Quanto aplicabilidade do conceito srelaes de trabalho, ser explanada em item especfico.

    Outra caracterstica tpica da tcnica arbitral a possibilidade daspartes escolherem qual o lastro jurdico a ser utilizado pelo rbitro: o direito oua equidade (art. 2). Se eleita a arbitragem por direito, as regras positivadassero aplicadas pelo julgador como se juiz fosse, quais sejam o Direito Civil,o Direito do Trabalho, o Direito Empresarial, desde que no haja violao aosbons costumes e ordem pblica (art. 2, 1 e 2). Caso se decidam aspartes pela equidade, o rbitro abstrair o dogmatismo jurdico e aplicar oDireito na medida do caso, ou seja, ponderando as circunstncias da situa-o sob litgio e aplicar a justia de acordo com o que lhe justo. possvel,tambm, que as partes convencionem a realizao da arbitragem com basenos princpios gerais de direito, nos usos e costumes e nas regras internacio-nais de comrcio.

    ntida a opo da lei pelo termo conveno. Explica-se. Na condi-o de mtodo alternativo ao tradicional, prestigia-se a vontade das partesem estabelecerem os critrios a serem considerados na utilizao arbitral.Diferentemente da jurisdio estatal, aqui as partes so conscientes de que,independente da deciso a ser prolatada, no h de se falar em inconforma-o ou revolta uma vez que autor e ru tiveram participao ativa em todoo processo. Dentro dessa acepo, a arbitragem s pode ser instituda me-diante a conveno de arbitragem. Esta, por sua vez, compreende a clusula

    compromissria e o compromisso arbitral.18Muito embora, de acordo com a legislao brasileira, o Direito de Famlia, o Direito Penal e outros de ordem pblica estejamfora do rol dos direitos arbitrveis, em algumas legislaes, possvel tal hiptese.

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    A clusula compromissria consiste numa conveno inserida numcontrato pela qual as partes se comprometem a submeter qualquer questodivergente e futura arbitragem. Tem fora obrigatria entre os contratantes,de modo que caso surja algum conflito, dever ser integralmente observada. condio pr-estabelecida em contrato e largamente utilizada em negcios

    jurdicos vultosos, os quais no podem sofrer graves prejuzos se submetidosao ritmo processual comum. A guisa de exemplo, pode-se citar os contratosde concesso de explorao de petrleo e gs natural entre a Unio e asempresas concessionrias.

    O juzo arbitral pode ser exercido por qualquer pessoa civilmente ca-paz e que possua a confiana das partes, no sendo a profisso do rbitro orequisito essencial para que este seja nomeado o julgador da lide. O impor-tante que ele esteja em condies de entender e decidir a questo. bvio

    que sero necessrios conhecimentos a respeito do processo arbitral paraque a sentena seja eficaz e obedea aos requisitos legais.

    saliente a faculdade das partes preverem na clusula compromis-sria o nome do rbitro ou de entidades especializadas em arbitragem, talcomo as Cmaras de Arbitragem, assim como o direito de fundo aplicvel ao

    julgamento da divergncia. Na prtica comercial, as partes contratantes dopreferncia s entidades especializadas, pois estas possuem regimentos inter-nos bem elaborados que serviro para regular o processo arbitral de maneiraexpedita, bem como so dotadas de um aparelhamento capaz de assessoraras partes com a qualidade almejada. Nesse caso, materializada a pendenga,as partes interessadas devem dirigir-se ao rgo especializado nomeado naclusula, que indicar as providncias que se fizerem necessrias.

    Da em diante, sero obedecidas as regras fixadas pelos contratan-tes, pelos rgos arbitrais ou pelos rbitros. Entretanto, h limites que devemser respeitados. So aqueles entendidos como fundamentais a um verdadei-ro processo legal: contraditrio, igualdade das partes, imparcialidade e livreconvencimento do julgador. Estes princpios, se no observados, podem ei-var de nulidade da sentena arbitral. Por fim, o rbitro proferir a sentena, aqual tem fora de ttulo executivo judicial, passvel de processo de execuo,nos termos do artigo 475-N, IV, do Cdigo de Processo Civil19.

    O compromisso arbitral, por sua vez, a conveno atravs da qualas partes submetem um litgio arbitragem de uma ou mais pessoas, po-dendo ser judicial ou extrajudicial (art. 9). criado aps o surgimento da

    19Cabe ressaltar que o rbitro ou tribunal arbitral no tem competncia para proceder execuo de seus laudos. O processo deexecuo de titularidade do Poder Judicirio. De igual modo, segundo reza o art. 22, 4 da Lei de Arbitragem, no possvel aconcesso de provimentos de coero e cautelares pelo rbitro/tribunal arbitral, devendo as referidas medidas seres solicitadasao rgo judicial que seria originalmente competente para a causa.

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    contenda, configurando-se como verdadeira renncia atividade jurisdicio-nal, revestindo-se de condies especiais, as quais podem ser obrigatriase facultativas, de acordo com o art. 10. O compromisso arbitral judicial cele-brar-se- por termo nos autos, perante o juzo ou tribunal, onde tem curso ademanda e o extrajudicial ser celebrado por escrito particular, assinado por

    duas testemunhas, ou por instrumento pblico.

    Quanto tipologia, a arbitragem pode ser de dois tipos: ad hoc einstitucional. Na primeira espcie, as partes designam os rbitros e escolhemas regras a serem aplicadas no juzo arbitral. J a arbitragem institucionalconsiste na conduo da arbitragem por uma instituio permanente, dotadade regulamento e de uma organizao prpria.

    Aspecto deveras relevante o tratamento dispensado pela legislao

    aos rbitros. O Captulo III da lei de arbitragem traz diversas disposies acer-ca dos procedimentos e caractersticas aos julgadores eleitos pelas partes.As mais importantes so: a) as partes nomearo um ou mais rbitros, sempreem nmero mpar, podendo nomear, tambm, os respectivos suplentes20; b)Sendo nomeados vrios rbitros, estes, por maioria, elegero o presiden-te do tribunal arbitral. No havendo consenso, ser designado presidente omais idoso; c) No desempenho de sua funo, o rbitro dever proceder comimparcialidade, independncia, competncia, diligncia e discrio; d) Estoimpedidos de funcionar como rbitros as pessoas que tenham, com as partesou com o litgio que lhes for submetido, algumas das relaes que caracte-rizam os casos de impedimento ou suspeio de juzes, aplicando-se-lhes,no que couber, os mesmos deveres e responsabilidades, conforme previstono Cdigo de Processo Civil; e) As pessoas indicadas para funcionar comorbitro tm o dever de revelar, antes da aceitao da funo, qualquer fatoque denote dvida justificada quanto sua imparcialidade e independncia;f) Os rbitros, quando no exerccio de suas funes ou em razo delas, ficamequiparados aos funcionrios pblicos, para os efeitos da legislao penal; g)O rbitro juiz de fato e de direito, e a sentena que proferir no fica sujeitaa recurso ou a homologao pelo Poder Judicirio.

    Ao inserir tais disposies, o legislador buscou aproximar a figura dorbitro ao mximo do magistrado, seja nos seus impedimentos, suspeies,deveres funcionais e desnecessidade de homologao de suas decises. Des-ta forma, h garantia para os convenientes de que a causa a ser decidida noser simplesmente entregue a um terceiro sem preceitos a zelar, porm a rbi-tro comprometido com a prolao de laudo revestido de credibilidade e legitimi-

    dade conferida pelo sistema jurdico. Por razes lgicas, no se pode conferir20A quantidade de julgadores em nmero mpar tpica dos rgos jurisdicionais colegiados, evitando empates nas decises eimprimindo maior credibilidade ao processo

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    ao rbitro todos os poderes tpicos da magistratura, sob pena de se atribuirjurisdio a quem dela no titular e se incorrer em inconstitucionalidade doinstituto. A esse respeito, clara a lio de Maurcio Godinho Delgado21:

    Evidentemente que o rbitro no pode ser o juiz, no exerccio da funo judican-te sob pena de confundir-se com a jurisdio. Fora da funo judicante, o juizpoderia, em tese, exercer a funo de simples rbitro desde que autorizado pornorma jurdica, claro. Contudo, este no seria o mais adequado caminho de im-plementao do instituto (nem o mais usual, esclarea-se): que a arbitragemobjetiva cumprir o papel de efetivo concorrente jurisdicional [...]

    4 A ARBITRAGEM NOS CONTRATOS INDIVIDUAIS DE TRABALHO

    Ao lado do Direito Civil e Econmico, o Direito do Trabalho tem sidoreceptor do instituto da arbitragem, nos limites de suas peculiaridades. No

    plano Internacional, a OIT tem desempenhado um importante papel ao esti-mular a prtica de solues extrajudiciais para os litgios advindos das rela-es de emprego. Exemplo disto a edio da Recomendao n. 92/51, de06 de junho de 1951, que versa sobre conciliao e arbitragem voluntria eda Conveno n. 154/81, a qual incentiva a negociao coletiva.

    A partir de ento, vrios Estados tem utilizado a arbitragem na so-luo dos conflitos trabalhistas de seus nacionais. Nos Estados Unidos, fenmeno raro o uso de arbitragem para a deciso de dissdios coletivos. Na

    maior parte dos casos, esto-se a dirimir conflitos individuais de trabalho22

    .Na Alemanha, por sua vez, a arbitragem tem aplicao mais difundida noscontratos coletivos de trabalho. Em Portugal, ainda segundo o autor mencio-nado, a arbitragem tem natureza facultativa, onde empregados e empregado-res nomeiam um rbitro cada e ambos nomeiam o terceiro rbitro em comum.Na Frana, est disciplinada nos art. 525 e seguintes do Cdigo de Trabalhofrancs. Na Itlia, desde 1992, diversos projetos sobre arbitragem passarama ser elaborados por rgos estatais, com o fim de fomentar a negociaocoletiva, fato este que reduziu a sobrecarga de trabalho do Judicirio daquele

    pas. H tambm manifestaes consolidadas de utilizao da arbitragem noDireito do Trabalho na Austrlia, Mxico, Inglaterra, Canad, Nova Zelndia,Argentina, Bolvia, Chile, Colmbia e Blgica.

    Percebe-se a importncia que a matria tomou na ordem interna-cional, demonstrando um nvel de maturidade jurdica razovel, na medidaem que se abandona o excesso de paternalismo jurisdicional e se confia aoscidados resolverem seus conflitos.

    No Brasil, a realidade neste aspecto ainda incipiente. Praticamente21DELGADO, Maurcio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7.ed. So Paulo: LTr, 2008.p.1448.22DINIZ, Jos Jangui Bezerra. Atuao do Ministrio Pblico do Trabalho como rbitro. So Paulo: LTr, 2004.

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    toda a carga de soluo de conflitos concentra-se no Poder Judicirio. Noh uma cultura slida de mtodos alternativos, mas as poucas manifesta-es existentes revelam resultados animadores. No final de 2001 havia 95instituies de arbitragem privada no Brasil, mas apenas 20 atuavam na realaboral. Entre 1998 e 2001, tais instituies, dentre 14 mil lides recebidas,

    solucionaram 11 mil casos, em prazo curto23.

    Conforme j apontado, tanto empregados como empregadores sodirecionados s cortes judiciais. Infelizmente, quando se trata de Direito So-cial no Brasil, o que se v um Direito do Trabalho dos desempregados. quase nula a quantidade de aes de empregados na Justia do Trabalho eisto se d em essncia pelo pouco dilogo estabelecido entre empregado-res e empregados durante o contrato de trabalho. O fruto desse quadro osurgimento de uma massa de trabalhadores oprimidos e espoliados em seus

    direitos, os quais suportam condies de trabalho e remunerao claramentevioladoras por vezes do mnimo existencial. O resultado? Conflituosidade naresciso do contrato de trabalho e uma Justia do Trabalho assoberbada comreclamaes24, o que se revela como um processo caro aos cofres pblicos e,por via reflexa, aos contribuintes25.

    Portanto, a arbitragem desponta como uma alternativa no somenteao empregado, mas tambm ao empregador, ao modelo atualmente existen-te, tendo como ncora as respostas rpidas, baratas e eficientes. Saliente-seque no est se pregando aqui o fim da Justia do Trabalho; pelo contrrio,seu desafogamento e prestao de qualidade ao cidado.

    Embora se veja tantas vantagens na tcnica at aqui comentada,h uma clara resistncia por parte da doutrina e jurisprudncia em acatar aarbitragem nos contratos individuais de trabalho responsveis pela esma-gadora maioria das reclamaes trabalhistas que abarrotam a JT. A inaceita-bilidade parte, inicialmente, do prprio Tribunal Superior do Trabalho, que noRecurso de Revista n 1599/2005-022-02-00.8, de 16 de setembro de 2009decidiu pela inaplicabilidade da arbitragem ao Direito Individual do Trabalho.Eis a ementa do acrdo:

    RECURSO DE REVISTA. 1. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. A de-terminao ou o indeferimento da produo de prova constituem prerrogativasdo Juzo, com esteio nos arts. 130 e 131 do CPC e 765 da CLT. Logo, no h

    23Jos Pastore (2002) apud Jos Jangui Diniz (2005.) No estudo desenvolvido pelo Prof. Pastore, enquanto na JT a audinciainicial marcada, em mdia, para 6 meses aps a distribuio; no procedimento arbitral o prazo de 10 dias. Enquanto na Justi-a do Trabalho o lapso de tempo entre a reclamao inicial e o trnsito em julgado da sentena de 2 a 7 anos; no procedimento

    arbitral a mdia de 30 dias.24No ano de 2008 foram 1.904.718 reclamaes trabalhistas propostas perante as Varas do Trabalho, 4,4% a mais que em 2007(RGJT 2008).25Segundo o RGJT de 2008, a despesa da Justia do Trabalho para cada habitante do Pas foi de R$ 50,99. Em 2004, essevalor era de R$ 33,93.

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    nulidade a ser declarada, com base no art. 5, LV, da Constituio Federal, quandoo indeferimento de prova encontra lastro no estado instrutrio dos autos. Recursode revista no conhecido. 2. ARBITRAGEM. INAPLICABILIDADE AO DIREITOINDIVIDUAL DO TRABALHO. 2.1. No h dvidas, diante da expressa dicoconstitucional (CF, art. 114, 1 e 2), de que a arbitragem aplicvel na esferado Direito Coletivo do Trabalho. O instituto encontra, nesse universo, a atuao

    das partes em conflito valorizada pelo agregamento sindical. 2.2. Na esfera doDireito Individual do Trabalho, contudo, outro ser o ambiente: aqui, os partcipesda relao de emprego, empregados e empregadores, em regra, no dispem deigual poder para a manifestao da prpria vontade, exsurgindo a hipossuficinciado trabalhador (bastante destacada quando se divisam em conjuno a globaliza-o e tempo de crise). 2.3. Esta constatao medra j nos esboos do que viria aser o Direito do Trabalho e deu gestao aos princpios que orientam o ramo jurdi-co. O soerguer de desigualdade favorvel ao trabalhador compe a essncia dosprincpios protetivo e da irrenunciabilidade, aqui se inserindo a indisponibilidadeque gravar a maioria dos direitos inscritos, quase sempre, em normas de ordempblica - que amparam a classe trabalhadora. 2.4. A Lei n 9.307/96 garante a ar-

    bitragem como veculo para se dirimir -litgios relativos a direitos patrimoniais dis-ponveis- (art. 1). A essncia do instituto est adstrita composio que envolvadireitos patrimoniais disponveis, j a se inserindo bice ao seu manejo no DireitoIndividual do Trabalho (cabendo rememorar-se que a Constituio Federal a elereservou apenas o espao do Direito Coletivo do Trabalho). 2.5. A desigualdadeque se insere na etiologia das relaes de trabalho subordinado, reguladas pelaCLT, condena at mesmo a possibilidade de livre eleio da arbitragem (e, depois,de rbitro), como forma de composio dos litgios trabalhistas, em confronto como acesso ao Judicirio Trabalhista, garantido pelo art. 5, XXXV, do Texto Maior.2.6. A vocao protetiva que d suporte s normas trabalhistas e ao processoque as instrumentaliza, a imanente indisponibilidade desses direitos e a garantia

    constitucional de acesso a ramo judicirio especializado erigem slido anteparo utilizao da arbitragem no Direito Individual do Trabalho. Recurso de revista co-nhecido e desprovido. (RR - 1599/2005-022-02-00.8, Relator Ministro: Alberto LuizBresciani de Fontan Pereira, Data de Julgamento: 16/09/2009, 3 Turma, Data dePublicao: 02/10/2009).

    Os argumentos utilizados pelo Colendo TST coincidem com os damaioria da doutrina contrria a utilizao da arbitragem no direito individualdo trabalho26.

    O primeiro fundamento da deciso acima prolatada a hipossuficin-cia do trabalhador.

    Ora, no tem a arbitragem o condo de flexibilizar, anular ou renun-ciar nenhum tipo de direito. Como j se foi explanado, a arbitragem podeser de direito e equidade, cabendo s partes decidirem qual tipologia seradotada pelo rbitro ou tribunal. O direito de fundo s decidido mediante aconsensualidade das partes. Caso o empregador entenda que o Direito doTrabalho no aplicvel, cabe ao empregado recusar se entender neces-

    26Contrrios arbitragem no direito individual do trabalho so Orlando Teixeira da Costa, Jorge Luiz Souto Maior, FernandoGalvo Mouta, Nelma de Sousa Melo, Paulo Emlio Ribeiro de Vilhena, Wilson Ramos Filho, Antnio Humberto de Souza Jniore Georgenor de Sousa Franco Filho.

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    srio a instituio da arbitragem. H de se entender que o instituto em focotem natureza de direito processual e no de direito material.

    evidente que em razo de haver ramo jurdico especfico que tratedas relaes trabalhistas, dificilmente h de se consensualizar a aplicao

    de direito diverso do laboral, at mesmo pela vedao legal em se burlar omanto protetivo do Estado para com o trabalhador. Ento, havendo a aplica-o (natural) do Direito do Trabalho, por lgica h de se aplicar tambm osprincpios prprios do Direito Processual do Trabalho27.

    A razo jurdica para o temor dos defensores do argumento acima a possvel violao do art. 9 e 444 da Consolidao das Leis do Trabalho.

    O art. 9 assim declara que sero nulos de pleno direito os atos

    praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicao dospreceitos contidos na presente Consolidao. O art. 444, por seu turno, aduzque as relaes de trabalho podem ser objeto de livre estipulao das partesinteressadas, desde que no contrariem as disposies de proteo ao tra-balho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicveis e s decises dasautoridades competentes.

    Pois bem. Alegar que a arbitragem seria mecanismo de fraude le-gislao trabalhista no mnimo negar validade a institutos ratificados peloEstado. Absurdo, por bvio. A tcnica em comento no tem o objetivo esprioalegado pelo douto ministro do TST. Ainda que mtodo extrajudicial, mas denatureza processual, a arbitragem zela pela isonomia real tambm aplicadaem mbito trabalhista28.

    Subscrevendo o entendimento acima, diz Jos Jangui Bezerra Diniz29:A isonomia buscada pela Lei de Arbitragem a isonomia real, tratando de formaigual os iguais, e desigualmente os desiguais.

    [...]

    Assim, sendo o princpio da proteo, bem como os demais princpios normal-mente utilizados em Direito do Trabalho, por coadunarem-se com esta lgica daisonomia real, manter-se-o ntegros e vivificados nos procedimentos arbitraislaborais.

    27MENEZES, Cludio Armando Couce de. Arbitragem, soluo vivel para o descongestionamento da Justia do Traba-lho? Dependeria o seu funcionamento de alterao em nosso ordenamento jurdico?Sntese Trabalhista, ano IX, N. 116,

    Porto Alegre, Sntese, p. 143, abril de 1998. p.55.28 Favorveis aplicao da arbitragem em sede de direito individual do trabalho tem-se Bento Herculano Duarte Neto, PauloCsar Piva, Renata Cristina Piaia Petrocino, Cludio Armando Couce de Menezes, Leonardo Dias Borges, J. E. Carreira Alvim,Cludio Vianna de Lima, Jos Jangui Bezerra Diniz e Maurcio Godinho Delgado.29 DINIZ, Jos Jangui Bezerra. Atuao do Ministrio Pblico do Trabalho como rbitro. So Paulo: LTr, 2004. p. 278.

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    Os clientes da arbitragem no so partes motivadas pelo ressenti-mento, tpico das demandas judiciais. As partes convenentes elegem rbitros

    justamente pela maturidade alcanada em adotarem um meio amigvel deresolver suas questes. O que se sucede na verdade uma tradio de pre-conceito e resistncia injustificada arbitragem, sempre vtima de maltratos

    da lei e do legislador.

    O segundo e mais enrgico argumento da doutrina gravita em torno daindisponibilidade dos direitos trabalhistas, o que iria de encontro ao art. 1 doEstatuto Arbitral. O assunto merece estudo mais aprofundado, seno vejamos.

    O art. 1 da Lei de Arbitragem claro ao permitir a aplicao do insti-tuto somente aos direitos patrimoniais disponveis. J se conceituou patrimo-nial disponvel. O momento agora de saber se todos os direitos sociais so

    indisponveis, se apenas alguns deles, se so ou no a depender do estadoem que se encontre o contrato de trabalho.

    A indisponibilidade dos direitos trabalhistas pode ser definida comoa inviabilidade tcnico-jurdica de poder o empregado despojar-se, por suasimples manifestao de vontade, das vantagens e protees que lhe asse-guram a ordem jurdica e o contrato30. Configura-se ato unilateral ou bilaterala ser praticado pelo empregado ou empregado/empregador.

    Eis que surge a pergunta: se os direitos trabalhistas so indispon-veis e irrenunciveis, como se qualificar os acordos homologados pela Justiado Trabalho diariamente31? A permissiva legislao celetista, cominada com aprtica de conciliaes por vezes aviltantes demonstram-se como verdadeirosviolentadores desse princpio. Pior. O que se v de forma clara uma violnciaqualificada s conquistas sociais, dado a dura realidade do Judicirio como r-go homologador de alijamentos de direitos trabalhistas, por meio de mtodosinstitucionalizados, e pior: tal fato ainda comemorado pela sua eficcia.

    Ressalte-se que no somos contra a conciliao, enquanto mtodopacfico de resoluo das contendas judiciais. Adotar este posicionamento no mnimo contraditrio para quem defende a aplicao de tcnicas no-con-flituosas e alternativas ao Poder imperativo estatal. O que se pe em questo a conciliao como instrumento de dilapidao de direitos ditos protegidos,ou seja, a distoro de um instituto legtimo para razes ilegtimas.

    Se os direitos trabalhistas fossem absolutamente indisponveis, de

    se ventilar a vedao dos mesmos serem transigidos ou (no caso de alguns30 DELGADO, Maurcio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7.ed. So Paulo: LTr, 2008. p.201.31 O RGJT 2008 trouxe o ndice de 44,1% de conciliaes sobre o total de demandas.

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    acordos) renunciados mesmo em sede judicial. No o que a legislao pre-v. Pertinente a lio de Diniz sobre o tema ao declarar que32:

    [...] o argumento de que os direitos trabalhistas so indisponveis despiciendo,haja vista que se indisponvel fosse o mesmo no poderia celebrar acordo emreclamaes trabalhistas.

    A doutrina mais atualizada defende que a disponibilidade/renunciabili-dade do rol de direitos trabalhistas varia de acordo com o momento do contratode trabalho. No momento da celebrao do contrato e vigncia do contratoseriam os direitos indisponveis em virtude da posio de hipossuficincia doprestador do servio, dado que h manifesta diferena no poder econmicocapaz de influenciar na subordinao de um sobre o outro, cabendo ao Estadoequilibrar esta relao. Por outro lado, aps a resciso, em face da no subor-dinao jurdica do (des) empregado para com o empregador, desnecessrio

    seria a proteo estatal vedando a disponibilidade dos direitos.

    Embora esse raciocnio no nos parea to razovel33, temos de re-conhecer que o entendimento majoritrio e utilizado nas prticas forenses.

    Por fim, h a discusso acerca da disponibilidade de direitos decor-rentes de norma de natureza dispositiva e a vedao da transao daquelesoriundos de ordem pblica (anotao da Carteira de Trabalho e PrevidnciaSocial, recolhimento das contribuies previdencirias, segurana e sadedo trabalho, etc). Ao nosso ver, a distino no to pragmtica como seaparenta. A ttulo de ilustrao, tomemos o exemplo do salrio do empregado

    nunca inferior ao mnimo legal por fora da CFRB. Suponha-se que numareclamao trabalhista estejam envolvidas diferenas salariais e frias ven-cidas e no pagas, dentre outros ttulos de natureza cogente. Na sentena

    judicial o empregador foi condenado a pagar ao demandante a quantia deR$ 5.000,00 (cinco mil reais). Durante a execuo, as partes conciliam emR$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Resta a pergunta: nesse caso, atmesmo os direitos supostamente nunca disponveis no foram transaciona-dos? Da, o nosso entendimento de que em sede de controvrsia a disponibi-lidade revela-se como absoluta.

    Diante do j exposto percebe-se que o argumento da indisponibilidadedos direitos trabalhistas frgil para fundamentar a resistncia da doutrina e

    jurisprudncia tangente arbitragem. Tem-se que se os direitos sociais so ple-namente transacionveis no foro judicial34, tambm o so pela via da arbitragem.

    32 DINIZ, Jos Jangui Bezerra. Atuao do Ministrio Pblico do Trabalho como rbitro. So Paulo: LTr, 2004. p. 278.

    33Entendemos que se h uma reclamao trabalhista em curso, porque o contrato no se exauriu em todos os seus efeitos eat o momento da quitao das verbas rescisrias, o reclamante fica vinculado ao seu ex-empregador, seja porque sua CTPSno foi dada baixa, porque as guias de seguro-desemprego no foram liberadas, por exemplo.34 Isto no revela que a instncia judiciria que os imprime a caracterstica de disponibilidade num ato de mutabilidade instantnea,mas sim o fato de se revestirem de tal natureza quando no esto sendo exercitados na sua plenitude, conforme doutrina majoritria.

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    Logo, conclui-se que aps a resciso do contrato de trabalho a cesso de direitos perfeitamente vlida, enquadrando-se no conceito do art. 1 da Lei Arbitral35.

    Diante do exposto, possvel depreender que o temor da violaodos direitos trabalhistas quando da aplicao da arbitragem desarrazoa-

    do. Se feito um estudo detalhado, constatar-se- que se h alguma insti-tuio procedendo flexibilizao e, por vezes, homologando verdadeirasrenncias direitos trabalhistas a Justia do Trabalho. Antes de combatera prticas supostamente atentatrias ao rol de protetivo laboral necessrioque o Judicirio e os guerreiros da jurisdio estatal observem suas prpriasprticas e reflitam sobre o que disse Jesus Cristo, no Evangelho de Mateus,captulo 7, versculo 5: Hipcrita, tira primeiro a trave do teu olho e, ento,cuidars em tirar o argueiro do olho do teu irmo.

    5 CONSIDERAES FINAIS

    Diante de tudo o estudado at aqui, quedou lmpida a importncia to-mada pela arbitragem em temos ps-modernos. A globalizao um fenmenolatente, irreversvel e avana a passos largos. O ritmo ditado pelas relaes co-merciais movidas pela produtividade mxima reflete no dualismo entre capitale trabalho. As relaes jurdicas acompanham tambm a globalizao, contudo, constatvel que os Poderes do Estado tm sido deficientes no desempenho desuas funes. Nesse contexto, a Justia do Trabalho est inserida.

    A arbitragem surgiu como um caminho alternativo tradicional mo-rosidade dos fruns e da conflituosidade reinante em suas prticas. Emboradotada de propagao teratolgica nos Estados desenvolvidos e com razesnobres, o instituto ainda encontra algozes no torro brasileiro.

    Todavia, foi visto que, do ponto de vista jurdico e conceitual, per-feitamente possvel sua aplicao ao direito individual do trabalho e que podese revelar como uma arma poderosa e potencializadora da efetividade doJudicirio. Como isto pode ocorrer? Atravs de campanhas patrocinadas peloprprio governo federal no sentido de incentivar a utilizao de tal tcnica,fortalecimento dos sindicatos, dada a necessidade de se consolidar o po-der de negociao dos empregados e, sobretudo, a divulgao e estudo daarbitragem nos bancos universitrios com o fomento da pesquisa/extenso.Aes como estas marcariam o incio de uma nova era na pacificao dasrelaes humanas e, sem dvida, refletiriam nas condutas dos trabalhadores,empregadores e na percepo destes e daqueles do sentido de pacificao

    de suas divergncias.35 A prtica da arbitragem no curso do contrato individual de trabalho deve obedecer aos ditames celetistas da proteo e irre-nunciabilidade, ao nosso entender.

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