Hemocromatose 1
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António Pacheco
Projecto Tutorial
Hemocromatose Hereditária
1º Ano da Licenciatura em Bioquímica
2005/2006
Índice
Introdução .............................................................................................................................. 1
Hemocromatose Hereditária .................................................................................................. 2
Metabolismo do Ferro ............................................................................................................ 4
Toxicidade do Ferro ............................................................................................................... 7
Falhas no Metabolismo do Ferro ........................................................................................ 8
Hemocromatose neonatal .............................................................................................. 8
Hemocromatose tipo 1 ................................................................................................... 9
Hemocromatose tipo 2 ................................................................................................. 10
Hemocromatose tipo 3 ................................................................................................. 12
Hemocromatose tipo 4 ................................................................................................. 12
Conclusão/ Discussão ......................................................................................................... 14
Referências bibliográficas .................................................................................................... 15
1
Introdução
Este trabalho foi realizado no âmbito do curso de Bioquímica, 1º ano, no Instituto Superior
de Ciências da Saúde do Norte, sob a orientação do Prof. Doutora Elsa Cardoso. Tem como
tema, a Hemocromatose Hereditária.
Este é um tema que na minha opinião é interessante de ser estudado, quer pessoalmente,
quer como estudante de bioquímica que sou. E digo pessoalmente porque a doença implica,
por parte de todos aqueles que se dedicam ao seu estudo, uma grande disponibilidade para
a investigação e no meu caso especifico tive a oportunidade de aprofundar ainda mais as
minhas capacidades neste ramo. E enquanto estudante de Bioquímica, porque a minha
compreensão da hemocromatose hereditária e do metabolismo do ferro humano em geral,
ficou muito mais completa e despertou-me o interesse para futuras investigações ligadas a
esta área.
Neste trabalho pretendo, então, fundamentar o que é a hemocromatose hereditária e os
seus vários tipos existentes.
Neste sentido estruturei o meu trabalho essencialmente em três partes: começo por fazer
uma breve introdução à hemocromatose hereditária, onde apresento as principais
características da doença; depois procedo à descrição do metabolismo do ferro numa
perspectiva global e, por último vou fazer a análise de cada tipo de hemocromatose
separadamente.
Um aspecto que acho que devo focar tem a ver com a dificuldade que tive em encontrar
bibliografia diversificada sobre a doença.
Feita a referência a esta barreira, optei por me basear em alguns artigos de revisão que
abordavam o tema em questão.
Perante o exposto, apenas posso dizer que este foi um trabalho de grande interesse para a
minha experiência pessoal e de conhecimento alcançado nesta área.
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Hemocromatose Hereditária
O termo hemocromatose, do grego "haima" (sangue) e "chromatos" (cor), foi criado em 1889
por Von Recklinghausen, para designar o depósito de ferro em células do parênquima de
vários órgãos, principalmente o fígado, causando lesão celular e prejuízo funcional.
A Hemocromatose Hereditária (HH) é uma doença autossómica recessiva, afecta o
metabolismo do ferro, tendo como resultado, o excesso de absorção de ferro pelas células
que revestem o tracto gastrointestinal. O excesso de ferro absorvido pode levar a uma
acumulação de ferro em tecidos e órgãos (fígado, coração, pâncreas, glândula pituitária) e
consequente disfunção e insuficiência desses órgãos. Deste modo, a doença pode causar
complicações sérias como cirrose, hepatomas, diabetes, cardiomiopatia, artrite e
hipogonadismo gonadotrófico.
A Hemocromatose hereditária é uma doença com vários graus de severidade, enquanto
resultado da desordem e sobrecarga de ferro no organismo, em que pode resultar mutações
em vários genes, originando assim vários tipos de Hemocromatose Hereditária (Tabela 1).
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Tabela 1: Avaliação comparativa das desordens classificadas como Hemocromatose Hereditária.
Designação Hemocromatose
Neonatal Hemocromatose
Tipo 1 Hemocromatose Tipo 2 Hemocromatose
Tipo 3 Hemocromatose
Tipo 4
Gene (s) afectado (s) ? HFE HFE2 HAMP TfR2 SLC40A1
Proteína Afectada ? HFE Hemojubilina Hepcidina TfR2 Ferroportina
Localização cromossómica ? 6p21.3 1q21 19q13.1 7q22 2q32
Função ?
Interage com o receptor
transferrina 1, provavelmente
facilita a captação de ferro;
possivelmente envolvido na
modelação da hepcídina
Desconhecida; possivelmente na
modelação da hepcídina
Baixa regulação de ferro através de enterócitos e
macrófagos.
Possível captação de ferro por hepatócitos.
Exportação de ferro dos enterócitos, macrófagos ou
hepatócitos.
Padrão de Hereditariedade ? Autossómica
recessiva Autossómica
recessiva Autossómica
recessiva Autossómica
recessiva Autossómica dominante
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Metabolismo do Ferro
Ferro é um elemento paradoxal, indispensável a todas as formas de vida, essencialmente
para assegurar o transporte de oxigénio e catalisar reacções de transferência de electrões,
de fixação de nitrogénio ou de síntese ADN, mas também tóxico, por causa de sua
capacidade para reagir com o oxigénio.
Os organismos vivos desenvolveram um grande número de proteínas que permitem
transportar o ferro dentro de fluidos biológicos ou através das membranas celulares, pelo
que, se encontra facilmente em reserva sob uma forma não tóxica. Ao contrário da ferritina,
uma proteína de armazenamento do ferro muito conservada, os sistemas de aquisição de
ferro evoluiu consideravelmente entre as espécies (Nelson, 1999).
O ferro ingerido através dos alimentos geralmente está no estado ferroso (Fe+2). Em
contacto com o ácido gástrico no estômago, ele é rapidamente oxidado, passando para o
estado férrico (Fe+3). Neste último estado, ele é mantido insolúvel pela acidez e por agentes
como, o ascorbato, para depois ser absorvido pelas células da mucosa intestinal na região
do duodeno e na região proximal do jejuno. Esse ferro absorvido é acoplado à transferrina
na circulação sanguínea e transportado para outras células do corpo. Quando a produção
de ácido gástrico é quebrada, parte do ferro pode não passar para o seu estado férrico e
consequentemente a absorção do ferro será reduzida. Além disso, o ferro, no seu estado
ferroso (Fe+2), é altamente tóxico devido à produção de radicais livres ao reagir com outras
substâncias.
A aquisição e o controlo de ferro no organismo é realizado nos enterócitos do (Figura 1).
O enterócito maduro da vilosidade do duodeno, absorve o ferro da comida e assegura a
transferência para o citoplasma. A ferri-redutase (Dcytb), uma membrana redutora, reduz o
Fe (III) em Fe (II) (Mckie et al, 2001), o ferro depois de reduzido, é transportado através da
membrana plasmática por Nramp2/DMT1 (Gunshin et al, 1997; Canonne-Hergaux et al,
1999; Fleming et al, 1997). Posteriormente, na parte basal do enterócito, o ferro é exportado
pela ferroportina para o plasma. Aqui, o ferro é novamente oxidado pela hefastina (Vulpe et
al, 1999) e ligando-se à transferrina plasmática (Apo Tf), que o transporta pela circulação
sanguínea até às demais células do corpo.
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O organismo de um ser humano adulto contém aproximadamente 4g de ferro do qual mais
de metade está associado à hemoglobina dos eritrócitos circulantes. A fagocitose dos
glóbulos vermelhos pelos macrófagos assegura uma reciclagem eficiente dos átomos de
ferro para o plasma (Knutson e Wessling-Resnick, 2003): assim, são aproximadamente
25mg de ferro diariamente. Este mecanismo atinge principalmente os macrófagos do baço e
da medula óssea e do fígado. Após o catabolismo do grupo heme, assegurado pela heme-
oxigenase, o ferro livre pode ser incorporado pela molécula de ferritina ou pode ser reciclado
para o protoplasma. Os mecanismos de reciclagem são pouco conhecidos, mas a proteína
ferroportina/IREG1/MTP1, uma proteína transmembranar, exporta o Fe (II), que tem um
papel importante neste processo (McKie et al, 2000; Abboud e Haile, 2000; Donovan et al
2000; Montosi et al, 2001; Devalia et al, 2002). O ferro ferroso é então oxidado pela
céruloplasmina (Harris et al, 1999) e fixado pela transferrina.
É provável que a ceruloplasmina esteja igualmente implicada nas trocas de ferro entre
vários tecidos.
Figura 1: Esquema de como funciona a aquisição e a reciclagem do ferro no organismo
(principalmente no baço e no fígado). [Figura adaptada de Beaumont, 2004].
Durante a migração ao longo das vilosidades do duodeno, as células da cripta diferenciam-
se e expressam as proteínas de transporte e de transferência de ferro, para um nível
Apo Tf Fe (III)
Fe (II)
Fe (III)
Ferroportina
Ferroportina
Hefastina
Fe (II)
Ferritína
Fe (III) – Tf
Glóbulos Vermelhos
Heme Oxigenase
Fe (II)
Heme Oxigenasse
Ceruloplasmina
Fe (II)
Fe (III) Apo – Tf Fe (III) – Tf
Enterócito
Macrófago
Medula
Óssea
Tracto Intestinal
Nramp2/DMT1
Dcytb
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variável de acordo com as necessidades assentes de ferro do organismo. Esta programação
depende de sinais, emitidos pelo organismo, cuja natureza molecular é ainda imprecisa.
A molécula de HFE interage com o receptor da transferrina e controla a quantidade de ferro.
Quando a proteína sofre uma mutação, como é no caso da hemocromatose, o duodeno
recebe um sinal de deficiência de ferro pelo que continua a manter elevada a absorção
deste metal. Um outro modelo propõe que, na ausência de HFE funcional, a normal
activação da síntese de hepcidina (no intestino) depois do aumento das reservas de ferro
não aconteça, originando o desenvolvimento de uma sobrecarga. A hormona sintetizada
pelo fígado que é segregada para o plasma e que regula a absorção do ferro.
Figura 2: Esquema simplificado do ciclo de ferro normal no corpo humano.
Aproximadamente 1 a 2 mg de ferro são absorvidos e perdidos pelo corpo diariamente. A
sua perda dá-se pela pele e pelas próprias células da mucosa do tracto gastrointestinal.
Como já referi acima, o corpo do homem adulto normal, o ferro total presente é da ordem de
4 g, sendo que aproximadamente 3 mg circulam pelo plasma acoplado à transferrina.
Consequentemente, uma pequena fracção desse ferro é utilizada pelo organismo, sendo
esse quantitativamente mais importante para o organismo que aquele absorvido pelo tracto
gastrointestinal (Cardoso, 2000).
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A transferrina plasmática é uma glicoproteína que tem domínios com N e C terminais, aos
quais o ferro é ligado. Em condições normais, um terço desses domínios é preenchido com
Fe+3. Aproximadamente 80% do ferro ligado à transferrina em circulação é transportado para
a medula óssea. O ferro hapático está presente nas células reticuloendoteliais e nos
hepatócitos. As células reticuloendoteliais adquirem ferro pela fagocitose e destruição das
hemácias ou glóbulos vermelhos. Estas células extraem o ferro da hemoglobina, e este
retorna para a circulação através da transferrina.
A produção de hemácias envolve o funcionamento coordenado dos rins e da medula óssea.
Nos primeiros são produzidos eritropoietina por hipóxia (baixo nível de oxigénio). Essa
hormona circula através da corrente sanguínea e na medula óssea, activa a produção de
hemácias.
Toxicidade do Ferro
Quando o ferro que circula pelo corpo se apresenta em sobrecarga, a transferrina, seu
principal veículo de transporte está saturada, ou seja, todos os sítios de ligação são
preenchidos com ferro. Neste caso, o excesso desse metal é transportado pela albumina,
citracto, aminoácidos e açúcar, que estabelecem ligações fracas com o ferro. Esses átomos
de ferro não ligados à transferrina são depositados nos tecidos não hematopoéticos,
particularmente o fígado, os órgãos endócrinos e, preferencialmente, o coração. É nessa
fase de saturação que o ferro passa a ficar tóxico para o organismo (Fosburg e Nathan,
1990).
O ferro tem um papel importante na reacção química que envolve o deslocamento de
electrões entre moléculas. Esse processo ocorre pela produção de energia gerada através
da oxidação controlada de hidratos de carbono, proteínas e lípidos. Daí a importância da
troca do metal ser bem regulada no organismo.
A capacidade de armazenamento do ferro na molécula de ferritina aumenta em pacientes
que recebem múltiplas transfusões de sangue, como os que sofrem de anemia crónica.
Nesse caso, o ferro livre não ligado à ferritina é acumulado nos tecidos e no sangue e o livre
pode catalizar a formação de compostos que são prejudiciais ao organismo, como a
formação do radical hidróxido (•OH), a partir de compostos como o peróxido de hidrogénio.
O radical hidróxido é altamente reactivo e ataca lípidos, proteínas e DNA (Imlay et al, 1988).
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A reacção inicial com cada uma destas moléculas é a formação de peróxidos que podem
interagir com outras moléculas.
Quando o fígado está sobrecarregado de ferro, os hepatócitos (células do fígado que mais
armazenam ferro) são bombardeados por uma espécie de oxigénio reactivo, que os leva à
morte. O seu espaço é preenchido por fibroblastos que produzem colagénio, originando
fibrose e, eventualmente, cirrose. Dessa mesma forma, as células cardíacas também são
destruídas pela sobrecarga de ferro, levando a graves anomalias no funcionamento do
coração, como as arritmias.
Falhas no Metabolismo do Ferro
São descritas mudanças genéticas em diferentes tipos de hemocromatose como:
• Hemocromatose neonatal;
• Hemocromatose tipo 1;
• Hemocromatose tipo 2;
• Hemocromatose tipo 3;
• Hemocromatose tipo 4.
Hemocromatose neonatal
A hemocromatose neonatal é um distúrbio hereditário no armazenamento de ferro que
começa antes do nascimento. Como os outros tipos de hemocromatose, o ferro em excesso
é depositado no fígado, pâncreas, coração, glândulas endócrinas, e outros tecidos.
Hemocromatose neonatal progride rapidamente e é caracterizado pelo dano do fígado, que
é aparente ao nascimento ou no primeiro dia de vida.
Bebés com hemocromatose neonatal são frequentemente nados-mortos, prematuros, ou
com menor peso que outros bebés de termo. A doença do fígado é geralmente aparente ao
nascimento, até mesmo em crianças premaduras. Outros sintomas incluem baixo nível de
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açúcar no sangue e acumulação de fluído (ascites) no abdómen. É de salientar ainda não foi
descoberto o gene responsável por este tipo de hemocromatose.
Hemocromatose tipo 1
A hemocromatose tipo 1 é um dos distúrbios genéticos mais comuns e afecta
frequentemente Caucasianos. È a forma mais comum de hemocromatose.
Normalmente os sintomas da hemocromatose tipo 1, normalmente, começam nos anos
quarenta nos homens e depois de menopausa nas mulheres. Muitos pacientes não
apresentam qualquer sinal ou sintomas (assintomático) no início da doença. Os primeiros
sintomas podem incluir fadiga, dor abdominal e impotência. Sintomas posteriores incluem
artrite, doença do fígado, diabetes, anomalias no coração e pigmentação da pele (tonalidade
bronzeada).
O gene que está mutado na hemocromatose tipo 1 é o HFE, embora a sua função normal
não esteja ainda completamente entendida. O gene HFE está localizado no braço curto (p)
do cromossoma 6 na posição 21.3 (6p21.3). O produz uma proteína (HFE) que interage com
outras proteínas na célula, ajudando a controlar a quantidade de ferro que é absorvido pela
alimentação. Uma mutação produz uma proteína da HFE anormal que não pode interagir
correctamente com proteínas da superfície da célula, nomeadamente com o receptor de
transferrina. Assim, perde-se o controle da absorção férrea, originando um excesso de
depósitos de ferro, que podem levar à hemocromatose (Feder et al, 1996).
No gene HFE, foram descritas várias mutações, embora na maioria dos casos de
hemocromatose sejam apenas duas mutações responsáveis pela perda da função da
proteína e sobrecarga de ferro nesta doença. Estas duas mutações comuns causam uma
substituição incorrecta de um aminoácido (o material de construção de proteínas) que faz
com que a proteína da HFE não funcione de um modo normal. A mutação mais comum
substitui uma cisteína por uma tirosína na posição 282 na cadeia polipeptídica (C282Y ou
Cys282Tyr), outra substitui uma histidína por aspartato na posição 63 (H63D ou His63Asp),
como o representado na Figura 3. No caso da mutação C282Y, a proteína alterada não é
enviada para a superfície da célula (Feder et al, 1996). Foi sugerido que a proteína alterada
envie falsos sinais que o corpo tem baixos níveis de ferro, resultando numa absorção férrea
anormalmente aumentada que conduz a hemocromatose.
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Figura 3: Representação da proteína HFE com as respectivas posições das mutações.
Este tipo de hemocromatose é herdada num padrão autossómico recessivo, ou seja,
significa que as duas cópias do gene em cada célula estão alteradas. Frequentemente, os
pais de um indivíduo com um distúrbio recessivo autossómico são transportadores de uma
cópia do gene alterado mas não evidência sintomas do distúrbio.
Hemocromatose tipo 2
A hemocromatose tipo 2 e causada por mutação no gene HAMP ou HFE2.
O gene HAMP e HFE2 parecem ter um papel regulador na absorção do ferro durante
digestão. Quando estes genes são alterados, absorção deste metal não é controlada
correctamente e é absorvido muito ferro. O ferro em excesso é armazenado nos órgãos e
tecidos que podem conduzir à lesão de órgão
O gene de HAMP (do inglês "peptide antimicrobial hepcidina") instrui células para produzir
uma pequena proteína chamada hepcidina, que foi identificada originalmente como tendo
propriedades antimicrobianas. Os investigadores descobriram recentemente que a hepcidina
tem um papel na hemeostase do ferro, ou seja, mantém os níveis de ferro nos seres
Membrana Plasmática
HOOC
Cys282 Tyr
α1 α2
α3
Região
Extracelular
Citoplasma
HOOC
His63 Asp Cadeia Pesada α
β2 - Microglobulina NH2 NH2
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humanos. Acredita-se actualmente que em situações normais, a hepcidina no sangue iniba
a absorção do ferro pelo intestino delgado em resposta ao elevado armazenamento de ferro
no corpo. Os investigadores propuseram que a produção da hepcidina no fígado aumenta
quando as células do fígado estão sobrecarregadas de ferro. Desta maneira, o
armazenamento de ferro é detectado e a absorção do ferro é ajustado para reflectir as
necessidades do corpo da pessoa.
A hemocromatose tipo 2, causada por mutações no gene HAMP, pode resultar numa
proteína não funcional da hepcidina. O gene HAMP está localizado no braço longo (q) do
cromossoma 19 na posição 13.1 (13q13.1). Os indivíduos que herdam mutações no gene
HAMP são afectados por um tipo severo de hemocromatose juvenil. Os sintomas deste tipo
do hemocromatose são exibidos mais cedo do que sintomas do tipo mais comum
hemocromatose (tipo 1). As pessoas com mutações HAMP são incapazes de inibir a
absorção do ferro e tornam-se assim sobrecarregadas de ferro no corpo, que pode conduzir
aos danos do órgão.
O gene de HFE2 codifica para uma proteína chamada hemojuvelina. O gene HFE2 está
localizado no braço longo (q) do cromossoma 1 na posição 21 (1q21). Esta proteína é
sintetizada no fígado, coração, e músculos usados para movimento (músculos esqueléticos).
Investigadores descobriram recentemente que a hemojuvelina mantém o equilíbrio do ferro
no corpo. Embora sua função exacta permanece obscura, a hemojuvelina parece regular os
níveis da hepcidina. Hepcidina como referi anteriormente, também tem um papel
fundamental que é manter os níveis de ferro no corpo.
Foram identificadas mais de 20 mutações HFE2 que podem causar o tipo 2 da
hemocromatose. A maioria destas mutações indica um único aminoácido na hemojuvelina. A
mais frequente é a substituída de uma glicínia por uma valina na posição 320 na cadeia da
proteína de aminoácidos (Gly320Val). Uma mudança nos aminoácidos pode alterar
propriedades da hemojuvelina, tal como a interacção com outras proteínas. Por outro lado,
as mutações no gene HFE2 produzem uma proteína alterada da hemojuvelina que deixa de
funcionar correctamente. Como consequência, os níveis de hepcidina da proteína são
reduzidos e os equilíbrios do ferro são perturbados. Muito ferro é absorvido durante a
digestão, conduz para que ferro sobrecarregue e danifique a tecidos e órgãos no corpo.
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Hemocromatose tipo 3
Uma mutação no gene TfR2 causa a hemocromatose tipo 3. A proteína produzida pelo gene
TfR2 (receptora de transferrina 2) a sua função no metabolismo do ferro é alvo de
investigação científica (Camaschella et al, 2000). O gene TfR2 está localizado no braço
longo (q) do cromossoma 7 na posição 22 (7q22) (Kawabata et al, 1999). Estudos sugerem
que esta proteína transporta transferrina em células do fígado e contribui para detectar os
níveis de armazenamento do ferro no corpo. Existem duas formas de TFR2: uma proteína
na superfície da célula (alfa) e uma proteína a permanecer dentro da acumulação (beta). A
versão de alfa da proteína TFR2 é encontrada principalmente no fígado e nos glóbulos
vermelhos. Encontra-se também no baço, no pulmão, no músculo, e nos tecidos da próstata.
A forma beta é produzida em baixos níveis em todos os tecidos.
Na Hemocromatose tipo 3, foram identificadas diversas mutações diferentes no gene TfR2,
que podem afectar a produção da forma alfa ou beta, ou ambos. Às vezes as proteínas
estão completamente ausentes; noutros exemplos, as proteínas anormais que são
incapazes de funcionar correctamente são produzidas. Porque as mutações neste gene
conduzem para sobrecarga de ferro e os problemas de saúde associados com ela, é
provável que esta proteína tenha um papel na absorção do ferro no fígado e possivelmente
em alguns outros tipos da célula.
Hemocromatose tipo 4
A hemocromatose tipo 4 é clinicamente semelhante aos outros tipos de hemocromatose,
nomeadamente a presença de excesso de ferro nos tecidos do corpo e órgãos,
particularmente no fígado. A Hemocromatose tipo 4 é caracterizada por um padrão de
hereditariedade dominante, significa que, o distúrbio é encontrado em cada geração de uma
família. Um critério que distingue a hemocromatose tipo 4 é a acumulação prematura do
ferro em células especializadas, chamadas células de reticuloendoteliais (macrófagos)
dentro do fígado, baço, e medula óssea. O distúrbio é considerado raro, mas foi descrito em
vários grupos étnicos diferentes.
O gene característico deste tipo de hemocromatose é o SLC40A1. O gene SLC40A1 está
localizado no braço longo (q) do cromossoma 2 na posição 32 (2q32). Este gene produz
uma proteína chamada o ferroportina 1. Esta proteína tem um papel essencial no
regulamento do ferro no corpo. A ferroportina 1 é a proteína que transporta o ferro para a
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circulação sanguínea depois de ter sido absorvido no intestino. Na circulação, o ferro liga-se
a um outro transporte, a proteína chamada transferrina que o carregará até aos tecidos e
órgãos do corpo. A ferroportina 1 transporta também o ferro para fora das células
especializadas chamadas células reticuloendoteliais (macrófagos) que se encontram no
fígado, no baço, e na medula óssea. O equilíbrio do ferro no corpo é regulado pela
quantidade de ferro armazenado e libertado destas células.
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Conclusão/ Discussão
A Hemocromatose hereditária foi considerada como uma desordem monogenética que se
caracteriza pelo excesso de ferro depositado nos tecidos que inevitavelmente causam o
dano do órgão. Esta visão foi quebrada por uma identificação fenotípica semelhante,
associada a mutações em pelo menos cinco genes diferentes. No entanto ainda estão por
descobrir genes que descontrolam o metabolismo normal do ferro.
A natureza poligenética da hemocromatose hereditária tem sido exagerada pelas
nomenclaturas e classificações actuais. A divisão da doença em subtipos fundados
exclusivamente em critérios genéticos pode estar a substituir situações clínicas, uma vez
que esta aproximação obscura pode estar a unificar características clínicas e
patofisiologicas que definem a hemocromatose hereditária.
Estas características envolvem um acumulo progressivo no compartimento do ferro do
plasma, que aparentemente é causado pela libertação de ferro imprópria por enterócitos e
macrófagos; os depósitos progressivos do ferro parênquimal são um severo potencial para o
dano do órgão. As mutações subjacentes são largamente responsáveis por variações neste
tema, e alguns fenótipos são mais apropriados que outros, devido à influência de vários
factores.
Assim sendo, apesar da hemocromatose hereditária estar dividida em vario tipos, a
hemocromatose tipo 1 é a mais estudada, ficando todos os outros tipos de hemocromatose
um pouco esquecidos, apesar do conhecimento acerca desta doença estar a evoluir ao
longo tempo.
15
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