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Revista SÍNTESE Direito Administrativo ANO X – Nº 121 – JANEIRO 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Tribunal Regional Federal da 1ª Região – 610‑2 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – 1999.02.01.057040‑0 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 18/2010 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – 07/0042596‑9 Tribunal Regional Federal da 5ª Região – 10/07 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Mayara Ramos Turra Sobrane CONSELHO EDITORIAL Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, Fernando Dantas Casillo Gonçalves, Ivan Barbosa Rigolin, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Maria Garcia, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Misabel de Abreu Machado Derzi, Odete Medauar, Sidney Bittencourt, Toshio Mukai COMITÊ TÉCNICO Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Hélio Rios Ferreira, Luís Rodolfo Cruz e Creuz COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Gina Copola, Ivan Barbosa Rigolin, Leonardo Alves de Oliveira, Leonardo Carvalho Rangel, Paulo Soares Nora, Rafael Carvalho Rezende Oliveira, Romeu Bruno Mendes Molinari ISSN 2179-1651

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Revista SÍNTESEDireito Administrativo

Ano X – nº 121 – JAneiro 2016

repositório AutorizAdo de JurisprudênciA

Tribunal Regional Federal da 1ª Região – 610‑2Tribunal Regional Federal da 2ª Região – 1999.02.01.057040‑0

Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 18/2010Tribunal Regional Federal da 4ª Região – 07/0042596‑9

Tribunal Regional Federal da 5ª Região – 10/07

diretor eXecutivo

Elton José Donato

Gerente editoriAl e de consultoriA

Eliane Beltramini

coordenAdor editoriAl

Cristiano Basaglia

editorA

Mayara Ramos Turra Sobrane

conselho editoriAl

Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, Fernando Dantas Casillo Gonçalves,Ivan Barbosa Rigolin, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Maria Garcia,

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Misabel de Abreu Machado Derzi,Odete Medauar, Sidney Bittencourt, Toshio Mukai

comitê técnico

Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Hélio Rios Ferreira, Luís Rodolfo Cruz e Creuz

colAborAdores destA edição

Gina Copola, Ivan Barbosa Rigolin, Leonardo Alves de Oliveira, Leonardo Carvalho Rangel, Paulo Soares Nora, Rafael Carvalho Rezende Oliveira, Romeu Bruno Mendes Molinari

ISSN 2179-1651

2006 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação mensal de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos de Direito Administrativo.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec‑tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e‑mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista Síntese Direito Administrativo – v. 1, nº 1 (jan. 2006) Nota: Continuação da REVISTA IOB de DIREITO ADMINISTRATIVO

São Paulo: IOB, 2006‑.

v. 10, nº 121; 16 x 23 cm

Mensal ISSN 2179‑1651

1. Direito administrativo.

CDU 342.9 CDD 341.3

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

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Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

Carta do Editor

Caros leitores, para compor o Assunto Especial desta edição da Revista SÍNTESE Direito Administrativo escolhemos o tema “Controle Judicial nos Concursos Públicos”.

O controle do Poder Judiciário nos concursos públicos deve sem-pre respeitar a discricionariedade administrativa, ou seja, não pode adentrar ao mérito no certame. Sendo assim, é legítima a intervenção judicial quando houver flagrante ilegalidade ou desrespeito às regras constantes do edital, conforme recente jurisprudência do Supremo Tri-bunal Federal.

Para compor o Assunto Especial contamos com dois artigos, quais sejam: “Concursos Públicos, Separação de Poderes e Controle Judicial sob a Ótica do STF: Deferência Ou Ativismo?”, elaborado pelo Doutor em Direito, Procurador do Município do Rio de Janeiro, Rafael Carvalho Rezende Oliveira, e “Concurso Público e Ações Judiciais”, elaborado pela Advogada, Pós-Graduada em Direito Administrativo, integrante do nosso Comitê Técnico, Gina Copola; além do ementário e de uma ínte-gra do TJDFT.

Na Parte Geral, publicamos três artigos, destacando o artigo in-titulado “A Cura do Câncer, a Droga Experimental (Fosfoetanolamina Sintética) e Suas Implicações Legais e Jurídicas”, elaborado pelo servidor público do TJMT, Pós-Graduando em Direito Administrativo, Leonardo Alves de Oliveira, onde busca compreender melhor a legislação pátria e a sua interpretação, bem como traçar projeções acerca da novel medi-cação contra o câncer que foi idealizada no Brasil.

Publicamos, também na Parte Geral, oito acórdãos na íntegra (STJ, TRF 1ª R., TRF 2ª R., TRF 3ª R., TRF 4ª R. e TRF 5ª R. – uma para cada Tribunal, com exceção do TRF 3ª R., com três íntegras) e o ementário com os valores agregados.

Já, na Seção Especial “Estudos Jurídicos”, temos a segunda parte do artigo “O Que é Revisão Contratual? Comparação com o Reajuste e com a Repactuação”, elaborado pelo renomado Advogado, membro do nosso Conselho Editorial, Ivan Barbosa Rigolin.

Tenham todos uma ótima leitura!

Eliane Beltramini Gerente Editorial e de Consultoria

Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto Especial

Controle JudiCial nos ConCursos PúbliCos

doutrinas

1. Concursos Públicos, Separação de Poderes e Controle Judicial sob a Ótica do STF: Deferência Ou Ativismo?Rafael Carvalho Rezende Oliveira .............................................................9

2. Concurso Público e Ações JudiciaisGina Copola............................................................................................22

JurisPrudênCia

1. Acórdão na Íntegra (TJDFT) .....................................................................30

2. Ementário ................................................................................................36

Parte Geral

doutrinas

1. Foro por Prerrogativa de Função – Aspectos Constitucionais e Infraconstitucionais para Cargos Executivo e Legislativos MunicipaisPaulo Soares Nora e Romeu Bruno Mendes Molinari ..............................44

2. O Federalismo Brasileiro na Constituição de 1988Leonardo Carvalho Rangel ......................................................................73

3. A Cura do Câncer, a Droga Experimental (Fosfoetanolamina Sintética) e Suas Implicações Legais e JurídicasLeonardo Alves de Oliveira .....................................................................98

JurisPrudênCia

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça ..................................................................107

2. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .................................................127

3. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .................................................132

4. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................136

5. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................143

6. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................150

7. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .................................................158

8. Tribunal Regional Federal da 5ª Região .................................................164

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência de Direito Administrativo .........................170

Seção Especialestudos JurídiCos

1. O Que é Revisão Contratual? Comparação com o Reajuste e com a Repactuação – Segunda ParteIvan Barbosa Rigolin .............................................................................202

Clipping Jurídico ..............................................................................................210

Resenha Legislativa ...........................................................................................224

Bibliografia Complementar ..................................................................................227

Índice Alfabético e Remissivo ...............................................................................228

Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da SÍNTESE.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-

co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.a

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

Assunto Especial – Doutrina

Controle Judicial nos Concursos Públicos

Concursos Públicos, Separação de Poderes e Controle Judicial sob a Ótica do STF: Deferência Ou Ativismo?

RAFAEL CARVALHO REZENDE OLIVEIRADoutor em Direito pela UVA/RJ, Mestre em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela PUC‑RJ, Pós‑Graduado em Direito do Estado pela UERJ, Procurador do Município do Rio de Janeiro, Ex‑Defensor Público da União, Professor do IBMEC/RJ, da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) e dos Cursos de Pós‑Graduação da FGV/RJ e UCAM, Membro do Instituto de Direito Administrativo do Estado do Rio de Janeiro (IDAERJ). Autor de livros e artigos jurídicos. Consultor jurídico. Site: www.professorrafaeloliveira.com.br.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A evolução do controle judicial da discricionariedade administrativa; 2 Con‑cursos públicos, separação de poderes e controle judicial sob a ótica do STF: deferência ou ativismo?; Conclusões; Referências.

INTRODUÇÃO

O STF, no dia 23.04.2015, noticiou o resultado do julgamento do RE 632.853, quando a Suprema Corte, por maioria e com repercussão geral, decidiu que “os critérios adotados por banca examinadora de um concurso não podem ser revistos pelo Poder Judiciário”1.

O presente ensaio tem por objetivo efetuar uma análise crítica da posição assumida pelo Judiciário no controle de juridicidade dos con-cursos públicos.

1 A EVOLUÇÃO DO CONTROLE JUDICIAL DA DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA

O controle judicial da discricionariedade administrativa evoluiu ao longo do tempo.

Após o abandono da noção de imunidade judicial da discriciona-riedade, várias teorias procuraram explicar e legitimar o controle judicial

1 Notícias do STF do dia 23.04.2015. Disponível em: <http://stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=290101>. Acesso em: 24 abr. 2015. A decisão foi noticiada, posteriormente, no Informa-tivo de Jurisprudência do STF n. 782. Acórdão pendente de publicação na data da elaboração deste artigo.

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da atuação estatal discricionária, como: a) teoria do desvio de poder ou desvio de finalidade; b) teoria dos motivos determinantes; e c) teoria dos princípios jurídicos (juridicidade).

A teoria do desvio de poder (détournement de pouvoir) ou desvio de finalidade, oriunda do Conselho de Estado francês2, admite que o Judiciário invalide ato administrativo em desacordo com a finalidade da norma.

De acordo com a teoria dos motivos determinantes, a validade do ato administrativo depende da correspondência entre os motivos nele expostos e a existência concreta dos fatos que ensejaram a sua edição. Mesmo naquelas situações excepcionais em que a lei não exige a moti-vação (exteriorização dos motivos), caso o agente exponha os motivos do ato, a sua validade dependerá da correspondência com a realidade3.

Por fim, a teoria dos princípios jurídicos exige a compatibilidade dos atos administrativos com os princípios consagrados no ordenamento jurídico. A referida teoria ganhou relevância com o reconhecimento da normatividade dos princípios, no contexto da constitucionalização do direito administrativo e do pós-positivismo, abrindo a possibilidade do controle ampliado e dotado de maior efetividade do ato administrativo.

A partir do reconhecimento do papel central da Constituição e da normatividade dos princípios constitucionais, a legalidade deixa de ser o único parâmetro para verificação da validade da atuação administrati-va. Trata-se do princípio da juridicidade que não aceita a concepção da Administração vinculada exclusivamente às regras prefixadas nas leis, mas sim ao próprio Direito, o que inclui as regras e princípios previstos na Constituição.

A juridicidade, como se vê, amplia a margem de controle do ato discricionário levada a efeito pelo Judiciário. E isso não para permitir a apreciação do mérito administrativo propriamente dito, porque impor-

2 Costuma-se citar o arrêt Lesbats de 1864 do Conselho de Estado francês como a primeira hipótese em que se admitiu expressamente a teoria do desvio de poder como possibilidade de se analisar a validade do ato administrativo no âmbito dos recursos por excesso de poder. Vide: BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 56, nota 28.

3 O STJ tem aplicado a teoria dos motivos determinantes na invalidação de atos administrativos. Vide, por exemplo: STJ, RMS 9772/PE, 6ª T., Rel. Min. Vicente Leal, DJ 29.05.2000, p. 185; RMS 10165/DF, 6ª T., Rel. Min. Vicente Leal, DJ 04.03.2002, p. 294. No último julgamento citado, consta da ementa a seguinte afirmação: “Ao motivar o ato administrativo, a Administração ficou vinculada aos motivos ali expostos, para todos os efeitos jurídicos. Tem aí aplicação a denominada teoria dos motivos determinantes, que preconiza a vinculação da Administração aos motivos ou pressupostos que serviram de fundamento ao ato. A motivação é que é legítima e confere validade ao ato administrativo discricionário”.

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taria em inadmissível violação ao princípio da separação de poderes, mas para garantir que o mérito da atuação administrativa não seja um artifício ou escudo à violação, por via transversa, da ordem jurídica pelo administrador.

Contudo, com o intuito de evitar uma simples troca da arbitra-riedade administrativa pela judicial, é indispensável a justificação da decisão judicial, como elemento essencial para sua legitimidade, pois só assim há possibilidade do controle “final” pelos “donos do poder” (o povo).

É oportuno notar que o reconhecimento da existência do prin-cípio da juridicidade é uma via de mão dupla: ao mesmo tempo em que há um nítido incremento do prestígio da atividade exercida pela Administração Pública na concretização das normas constitucionais, a juridicidade gera necessariamente restrições mais sensíveis à atuação do administrador e acarreta a ampliação do controle judicial dos atos administrativos, uma vez que a atuação administrativa, para ser consi-derada válida, deve compatibilizar-se com os princípios consagrados na Constituição da República (moralidade, eficiência, razoabilidade etc.).

2 CONCURSOS PÚBLICOS, SEPARAÇÃO DE PODERES E CONTROLE JUDICIAL SOB A ÓTICA DO STF: DEFERÊNCIA OU ATIVISMO?

Conforme mencionado na introdução deste ensaio, o STF reiterou, recentemente, a tese, já consagrada na jurisprudência da própria Corte, segundo a qual o Judiciário não deve rever, em regra, os critérios ado-tados por banca examinadora de um concurso público, tendo em vista a interpretação tradicional do princípio da separação de poderes que impede a invasão judicial do mérito administrativo4.

Excepcionalmente, todavia, permite-se a invalidação de questões objetivas em provas de concursos públicos quando houver flagrante ile-galidade ou desrespeito às regras constantes do edital5.

Todavia, é interessante observar, nesse ponto, certa ambiguidade na atuação da Corte no tocante à interpretação do princípio da sepa-

4 Além da decisão noticiada no site do STF no dia 23.04.2015, vide: STF, RE 560.551-AgRg/RS, 2ª T., Rel. Min. Eros Grau, DJe-142 01.08.2008; AI 608.639/RJ, 1ª T., Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 13.04.2007, p. 96; RE 268.244/CE, 1ª T., Rel. Min. Moreira Alves, DJ 30.06.2000, p. 90.

5 No mesmo sentido: STJ, EREsp 338.055/DF, 3ª S., Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 15.12.2003, p. 179; RMS 19.353/RS, 1ª T., Relª Min. Denise Arruda, DJ 14.06.2007, p. 248, Informativo de Jurispru-dência do STJ n. 311.

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ração de poderes e do dogma da insindicabilidade do mérito adminis-trativo.

Isto porque o STF, em determinados casos, especialmente envol-vendo a efetividade de direitos fundamentais (saúde, educação etc.), adota posicionamento ativista no controle das ações e omissões estatais. Mencione-se, por exemplo, a decisão do STF que obrigou os Municí-pios a matricularem crianças de até cinco anos de idade em creches e em pré-escola, sob o argumento de que a intervenção judicial em caso de omissão estatal, na implementação de políticas públicas previstas na Constituição, seria legítima e não afrontaria o postulado da separação de poderes6.

O ativismo judicial pode ser demonstrado, ainda, por algumas decisões do Supremo Tribunal Federal relacionadas às grandes ques-tões jusfilosóficas. Assim, por exemplo, a Corte decidiu, em 2008, pela constitucionalidade da Lei nº 11.105/2005 (Lei de Biossegurança), que permitia pesquisas com células-tronco embrionárias. Em 2011, a Corte reconheceu a união homoafetiva como família, sujeitando-a ao mesmo tratamento jurídico dispensado às relações jurídicas heteroafetivas7. Pos-teriormente, a Suprema Corte decidiu que o aborto de feto anencéfalo não deve ser considerado crime8.

Da mesma forma, no campo dos concursos públicos, o STF tem relativizado, progressivamente, a discricionariedade administrativa das entidades federativas e administrativas na decisão sobre a nomeação dos candidatos aprovados em concursos públicos.

Com efeito, a jurisprudência do STF reduz a discricionariedade estatal e admite a interferência judicial com o objetivo de reconhecer o direito dos candidatos aprovados à nomeação e posse em três situações: a) inobservância, por parte da Administração, da ordem de classificação do concurso (Súmula nº 15 do STF); b) quando a Administração, durante o prazo de validade do concurso, efetua contratações precárias para o exercício das mesmas funções que justificaram a realização do certame9;

6 STF, ARE 639.337-AgRg/SP, 2ª T., Rel. Min. Celso de Mello, DJe-177 15.09.2011, p. 125.7 STF, ADIn 4.277/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ayres Britto, DJe-198 14.10.2011.8 STF, ADPF 54/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe-080 30.04.2013.9 STF, RE 273.605/SP, 2ª T., Rel. Min. Néri da Silveira, DJ 28.06.2002, p. 143, Informativo de Jurisprudência

do STF n. 265. No mesmo sentido: STJ, RMS 11.966/AM, 5ª T., Rel. Min. Felix Fischer, DJ 18.03.2002, p. 275, Informativo de Jurisprudência do STJ n. 123; STJ, RMS 19.924/SP, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 30.10.2006, p. 336, Informativo de Jurisprudência do STJ n. 300; STJ, MS 13.575/DF, 3ª S., Relª

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c) candidatos aprovados dentro do número de vagas previsto no edital do concurso10.

Em outros casos, todavia, a Corte atua de forma conservadora, com maior deferência aos demais Poderes, tal como ocorreu no caso objeto do presente estudo.

Ao lado da discussão tradicional sobre o papel do Poder Judiciário no âmbito da separação de poderes, existe uma crescente preocupação com a necessidade de diálogo institucional entre o Poder Judiciário e os demais Poderes.

O ativismo judicial (legislador positivo), de um lado, e a deferência judicial (legislador negativo), de outro lado, são teses antagônicas apre-sentadas pela doutrina tradicional a partir de considerações abstratas e, muitas vezes, ideológicas, sobre a separação de poderes e democracia, conforme será aprofundado adiante11.

Ao tratar do ativismo judicial a partir da capacidade institucional do Judiciário, Luís Roberto Barroso sustenta que “o Judiciário quase sem-pre pode, mas nem sempre deve interferir. Ter uma avaliação criteriosa da própria capacidade institucional e optar por não exercer o poder, em autolimitação espontânea, antes eleva do que diminui”12.

Ao invés da supremacia de um Poder sobre o outro, tem crescido a importância do diálogo constitucional, segundo o qual não cabe ao Ju-diciário a última palavra sobre a interpretação constitucional, revelando--se necessário o debate público com as Casas Legislativas que podem promulgar novas leis para superarem a decisão judicial13.

Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada do TJMG), DJe 01.10.2008, Informativo de Jurisprudência do STJ n. 367.

10 STF, RE 227.480/RJ, 1ª T., Relª p/o Ac. Min. Carmen Lúcia, DJe-157 21.08.2009, Informativo de Ju-risprudência do STF n. 520. No mesmo sentido: STJ, RMS 19.478/SP, 6ª T., Rel. Min. Nilson Naves, DJe 25.08.2008, Informativo de Jurisprudência do STJ n. 354; RMS 27.311/AM, 5ª T., Rel. Min. Jorge Mussi, DJe 08.09.2009, Informativo de Jurisprudência do STJ n. 411.

11 O debate sobre a postura do Judiciário no controle dos atos estatais (ativismo ou autocontenção) é célebre no Direito norte-americano. Vide, por exemplo: DWORKIN, Ronald. Taking rights seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1978; ELY, John Hart. Democracy and distrust: a theory of judicial review. Cambridge: Har-vard University Press, 1980; BICKEL, Alexander M. The least dangerous branch: the Supreme Court at the bar of politics. 2. ed. New Haven: Yale University Press, 1986; WALDRON, Jeremy. Law and disagreement. New York: Oxford University Press, 1999; SUNSTEIN, Cass R. One case at a time: judicial minimalism on the Supreme Court. Cambridge: Harvard University Press, 2001; KRAMER, Larry. The people themselves – Popular constitucionalism and judicial review. Oxford University Press: Oxford, 2004.

12 BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. In: COUTINHO, Jacinto Miranda et al. (Org.). Constituição e ativismo judicial: limites e possibilidades da norma constitucional e da decisão judicial. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 288.

13 As teorias dialógicas têm origem na Seção 33 da Carta de Direito Canadense de 1982, que autoriza o Le-gislativo a reeditar texto legal declarado inconstitucional pelo Judiciário (override clause ou notwithstanding

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Verifica-se, portanto, que o diálogo institucional ratifica a ideia de que o Judiciário não possui o monopólio da interpretação constitucio-nal e critica a concepção da supremacia judicial, em razão da suposta ausência de legitimidade dos juízes, com o objetivo de estabelecer um processo dialético entre os Poderes na interpretação das normas jurídi-cas.

Ao invés da visão idealizada das capacidades institucionais dos Poderes Legislativo (supremacia parlamentar) e Judiciário (supremacia judicial), a análise deve levar em consideração uma visão realista, enfa-tizando as virtudes e fraquezas nas capacidades institucionais dos refe-ridos Poderes.

Apesar de centralizado na interação entre o Judiciário e o Legisla-tivo, o debate sobre o diálogo institucional deve englobar, também, os atos do Executivo, o que sugere uma releitura da interpretação tradicio-nal do princípio da separação de poderes.

Conforme enfatizado anteriormente, evidencia-se certa ambigui-dade e falta de parâmetros claros na jurisprudência do STF acerca da interpretação dos postulados do mérito administrativo e do princípio da separação de poderes, sendo certo que, em alguns casos, a Corte adota posição ativista e, em outras situações, posição mais defensiva.

Não se pode olvidar que o controle judicial da discricionariedade administrativa sofreu profundas mutações ao longo dos tempos, com a intensificação do controle e valorização do papel do Judiciário.

Ao lado das tradicionais teorias do desvio de poder (ou de finali-dade) e dos motivos determinantes, atualmente a teoria dos princípios jurídicos, com o reconhecimento da força normativa primária dos prin-cípios constitucionais, abre caminho para o papel mais intenso do con-trole judicial.

Isto porque os princípios constitucionais, em razão da abertura textual e normativa de seus comandos, ampliam a dinâmica do controle judicial.

clause). Sobre o tema, vide: HOGG, Peter W.; BUSHELL, Allison A. The Charter dialogue between courts and legislatures (or perhaps the Charter of Rights isn’t such a bad thing after all). Osgoode Law Journal, v. 35, n. 1, p. 79-80, 1997; HOGG, Peter W.; BUSHELL THORNTON, Allison A.; WRIGHT, Wade K. Charter dialo-gue revisited – Or “much ado about metaphors”. Osgoode Law Journal, v. 45, p. 1-65, n. 1, 2007; DIXON, Rosalind. The Supreme Court of Canadá: Charter dialogue and deference. Chicago Public Law & Legal Theory Working Papers Series, n. 284, p. 4, 2009.

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Compreendido o mérito como “resultado do exercício regular de discricionariedade”, ele somente será considerado legítimo se respeitar a juridicidade (lei e o direito). O mérito, concebido como o “sentido político” da ação do Estado, ou seja, de atendimento do interesse pú-blico ou de “integração administrativa da legitimidade”, continua sendo considerado insindicável pelo Poder Judiciário. Todavia, o resultado da atividade discricionária (uso incorreto do mérito administrativo) pode e deve ser examinado pelo Judiciário para garantir o respeito aos limi-tes legais e constitucionais, especialmente a observância dos princípios constitucionais (“controle dos limites”). Por isso, a invalidação de um ato administrativo por violação ao princípio da razoabilidade, por exemplo, não enseja, em última análise, o exame do conteúdo do mérito pelo Ju-diciário, mas sim do limite imposto ao administrador na utilização desse mérito14.

Evidentemente, os princípios jurídicos não podem tudo e não de-vem ser utilizados para mera substituição de eventual arbitrariedade ad-ministrativa por outra judicial.

Por essa razão, revela-se fundamental o avanço na exigência jus-tificação e motivação da decisão judicial, exigindo-se do Magistrado a apresentação de fundamentos fáticos e jurídicos que demonstrariam a ilegalidade, em sentido amplo, da ação ou omissão administrativa.

Não é suficiente o manejo de argumentos exclusivamente metafí-sicos ou dogmáticos para resolução das questões da vida. Seria inacei-tável a decisão judicial que se limitasse a dizer: “Julgo improcedente o pedido, pois o Judiciário não pode adentrar no mérito administrativo”. Devem ser demonstradas as peculiaridades fáticas e jurídicas envolvidas no debate e que justificariam a deferência ou, eventualmente, o maior ativismo judicial.

Nesse sentido, o art. 489, § 1º, do novo CPC (Lei nº 13.105/2015) representa importante avanço na tentativa de garantir a fundamentação efetiva das decisões judiciais. A norma dispõe:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

14 Vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. A constitucionalização do direito administrativo. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 82-83. O STJ já teve a oportunidade de asseverar que o “mérito significa uso correto da discricionariedade, ou seja, a integração administrativa. Com observância do limite do legal e o limite do legítimo, o ato tem mérito. Caso contrário, não tem mérito e deixa de ser discricionário para ser arbitrário e, assim, sujeito ao controle judicial” (STJ, REsp 647417/DF, 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJ 09.11.2004, DJ 21.02.2005, p. 114).

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§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem iden-tificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

§ 2º No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.

De nossa parte, sustentamos uma posição “mais ativa” do Judi-ciário no controle dos resultados dos concursos públicos, com o objetivo de evitar a utilização de critérios arbitrários ou incorretos por parte das bancas examinadoras e, com isso, proteger os direitos dos respectivos candidatos à legalidade do procedimento concursivo, sem que isso sig-nifique, contudo, a substituição da Administração pelo Judiciário15.

A atuação do Judiciário no controle formal e material dos concur-sos públicos pode variar de acordo com o formato das avaliações.

Nas provas objetivas (“múltipla escolha”), o controle é facilitado de certa forma, pois os enunciados das questões restringem as opções dos candidatos e da banca examinadora. Nesse caso, por exemplo, se

15 Vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de direito administrativo. 3. ed. São Paulo: Método, 2015. p. 676-678.

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o enunciado exige a marcação da única resposta correta, mas existem duas ou mais alternativas corretas, a questão deverá ser anulada.

Frise-se que, em nossa opinião, a questão deve ser anulada com a atribuição dos pontos para todos os candidatos, e não apenas para o candidato que se socorreu do Judiciário, tendo em vista o princípio da impessoalidade.

Questão mais complexa, todavia, refere-se às provas discursivas, quando existe uma maior flexibilidade e subjetividade nos critérios de correção das questões.

O controle judicial, no caso, deve ser exercido com parcimônia e não pode o Magistrado reexaminar a conveniência e a oportunidade dos critérios adotados pelos examinadores do concurso, o que não impedi-ria, em casos extremos, a interferência quando evidenciada manifesta ilegalidade. Imagine-se, por exemplo, a hipótese em que o candidato, ao ser indagado sobre questão controvertida, apresenta, em sua resposta, opinião que coincide com a jurisprudência dos tribunais superiores, mas não obtém qualquer pontuação simplesmente pelo fato de o examinador possuir posição divergente e minoritária. Estaríamos diante de “flagrante ilegalidade ou desrespeito às regras constantes do edital”, ou seja, das situações excepcionais indicadas pelo STF que viabilizariam o controle judicial? Alguns diriam que não.

Ocorre que a ausência de interferência do Judiciário no sobre-dito exemplo desrespeitaria o próprio princípio da inafastabilidade do controle judicial nas situações de lesão ou ameaça de lesão a direito, especialmente pela ausência de proporcionalidade ou razoabilidade dos critérios de correção da banca examinadora.

A maior margem de liberdade na correção e na valoração das res-postas por parte da banca examinadora não afasta, contudo, a possibi-lidade de controle judicial, inclusive com o auxílio de perícia, quando houver violação aos princípios constitucionais, pois a discricionariedade não se confunde com o arbítrio16.

É por essa razão que as bancas examinadoras devem utilizar e de-monstrar os padrões de resposta e de pontuação que serão utilizados nas correções das provas, conferindo maior transparência ao resultado (pu-

16 Nesse sentido: SILVA, Almiro do Couto e. Correção de prova de concurso público e controle jurisdi-cional. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, n. 42, p. 5-18, abr./jun. 2003; TRF 1ª R., AC 1998.34.00.001170-0/DF, 5ª T., Rel. Fagundes de Deus, DJU 25.11.2003, p. 42.

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blicidade), isonomia no tratamento dos candidatos e controle posterior (administrativo ou judicial, inclusive sob a ótica da teoria dos motivos determinantes).

Aliás, a divulgação dos padrões de resposta e dos critérios de cor-reção decorre da própria exigência de transparência pública e do dever de motivação por parte do Estado. Em âmbito federal, por exemplo, o art. 2º, caput, e parágrafo único, I, IV, V, VII e VIII, e art. 50, III, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.784/1999 dispõem:

Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

I – atuação conforme a lei e o Direito;

[...]

IV – atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;

V – divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;

[...]

VII – indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;

VIII – observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados;

[...]

Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:

[...]

III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;

[...]

§ 1º A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo con-sistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.

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§ 2º Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados. (grifos nossos)

Infelizmente, algumas bancas insistem na prática de não disponi-bilizar aos candidatos os critérios de correção, o que dificulta o controle a posteriori, sem olvidar as práticas autoritárias que negam o direito de vista e de revisão por parte dos candidatos. É desastroso pensar que os candidatos recebam tratamentos diferenciados na correção das mesmas provas em razão, pura e simplesmente, das opiniões pessoais divergen-tes dos examinadores.

Ressalte-se, todavia, que o Judiciário não poderá substituir a ban-ca examinadora para atribuir a nota que entender correta, mas apenas decidir pela desproporcionalidade ou ilegalidade da nota atribuída. Na hipótese, após invalidar a atuação da banca, deverá o Judiciário opor-tunizar nova correção por parte dos examinadores com a atribuição de nova nota à questão.

Desta forma, o controle judicial dos critérios de correção da banca examinadora garantiria a efetividade dos direitos e princípios constitu-cionais, sem substituição da liberdade (e não arbitrariedade) da banca examinadora.

CONCLUSÕES

Em síntese, o ensaio pretendeu demonstrar que a jurisprudência do STF, no tocante ao controle judicial de juridicidade dos concursos públicos, não mantém a mesma linha de interpretação adotada pela pró-pria Corte em outras situações envolvendo o controle da discricionarie-dade estatal.

Ao contrário da postura ativista verificada em determinados casos de controle de ações ou omissões estatais na implementação de políticas públicas ou efetivação de direitos fundamentais, a Corte tem adotado posição de maior deferência (autocontenção) no controle dos atos prati-cados em concursos públicos.

Sustentamos que, além da legitimidade da intervenção judicial em casos de “flagrante ilegalidade ou desrespeito às regras constantes do edital”, como afirma o STF, o ideal seria a viabilização do controle judicial também nos casos em que restar comprovada, de forma indiscu-

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tível, a incorreção dos gabaritos e dos critérios de correção das bancas examinadoras.

Com isso, a intervenção judicial, em posição dialógica, corrigiria os atos contrários à lei e aos princípios constitucionais e, sem substituir a decisão administrativa, conferiria à Administração a oportunidade para efetuar nova correção respeitados os parâmetros fixados na decisão ju-dicial.

Evidentemente, o dogma do mérito administrativo e o postulado da separação de poderes não podem servir como argumentos casuísti-cos, utilizados, de forma estratégica e sem parâmetros, pelo Poder Ju-diciário, ora para adotar posição de deferência, ora para assumir papel ativista no controle da discricionariedade estatal.

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Assunto Especial – Doutrina

Controle Judicial nos Concursos Públicos

Concurso Público e Ações Judiciais

GINA COPOLA*1

Advogada Militante em Direito Administrativo, Pós‑Graduada em Direito Administrativo pela FMU, Ex‑Professora de Direito Administrativo na FMU.

I – Tema que tem ensejado relevante e propositada preocupação à Administração Pública é o relativo à quantidade de ações judiciais que têm sido frequentemente propostas por candidatos que se inscrevem em concursos públicos em todo o País.

Tais ações judiciais são cabíveis? Recebem fundamento legal? Es-tão agasalhadas pelo ordenamento jurídico brasileiro? O que a jurispru-dência tem decidido?

As indagações acima são reiteradamente formuladas e, por isso, precisam ser respondidas de forma fundamentada, e com arrimo na ju-risprudência existente sobre o tema.

II – É cediço em Direito que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”, conforme reza o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, e, portanto, com fulcro em tal preceito constitucional, todo aquele que sofrer qualquer lesão ou ameaça de di-reito pode recorrer ao eg. Poder Judiciário para resolver seu problema.

Trata-se do assaz de vezes invocado princípio da inafastabilidade da jurisdição, que, respeitosamente pode ensejar uma visão equivocada da questão.

Ocorre que determinados litígios, por sua própria natureza, ou, então, por disposição legal, não podem ser submetidos à apreciação do

* Autora dos livros Elementos de direito ambiental (Rio de Janeiro: Temas e Ideias, 2003), Desestatização e terceirização (São Paulo: NDJ – Nova Dimensão Jurídica, 2006), A lei dos crimes ambientais comentada artigo por artigo (Minas Gerais: Fórum, 2008, e 2. ed. em 2012) e A improbidade administrativa no Direito brasileiro (Minas Gerais: Fórum, 2011), e, ainda, autora de diversos artigos sobre temas de direito adminis-trativo e ambiental, todos publicados em periódicos especializados.

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eg. Poder Judiciário, como é o caso, por exemplo, do litígio com cláusu-la compromissória de arbitragem nos termos da Lei Federal nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.

Outro exemplo é o dos atos administrativos discricionários, cujo mérito – conveniência e oportunidade – não pode ser submetido à apre-ciação do eg. Poder Judiciário.

Os dois exemplos acima citados são de hipóteses que não se sub-metem à apreciação do eg. Poder Judiciário, assim como ocorre em algumas ações propostas contra o resultado ou o trâmite de concurso público.

Vejamos abaixo algumas ações.

III – O tipo de ação judicial mais comum envolvendo o tema con-cursos públicos é o mandado de segurança contendo pedido de exame da formulação e (ou) da correção de questões do concurso público.

Ocorre que não cabe ao egrégio Poder Judiciário adentar o mérito do concurso público.

É o que já decidiu o eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos do Agravo de Instrumento nº 0008299-15.2013.8.26.0000-Ilha Solteira (10ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Torres de Carvalho, J. 22.04.2013), com a seguinte ementa:

Concurso interno. Polícia Militar. Promoção a cabo. Reprovação na pro-va de português. Alegação de erro na formulação das questões. Inclusão em lista de promoção por ordem judicial. 1. Promoção. Antecipação da tutela. A promoção ora concedida é um caso de reclassificação e de aumento de vencimentos, que não podem ser antecipadas por força do art. 7º, §§ 2º e 5º, da LF 12.016/2009 e do art. 2-B da LF 9.494/1997. A inclusão em lista de promoção implica a promoção imediata ou no momento oportuno e não pode ser determinada antes da oitiva da Fa-zenda. 2. Concurso interno. Prova escrita. Questões. Não cabe ao juiz corrigir as questões da prova; prevalece, até robusta prova em contrário, a correção feita pela administração. Inexistência de demonstração, ade-mais, das respostas dadas pelo autor e do prejuízo decorrente da alegada inadequação das questões. Agravo provido para revogar a antecipação da tutela.

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IV – Ainda no mesmo diapasão é o r. acórdão também do eg. TJSP, nos autos da Apelação nº 0011230-06.2012.8.26.0362-Mogi-Guaçu (12ª Câmara de Direito Público, Relª Desª Isabel Cogan, J. 02.09.2013), com a seguinte ementa:

Mandado de segurança. Concurso público. Procurador do Município. Revisão, alteração e anulação de questões de prova objetiva. Impos-sibilidade. Em matéria de concurso público, a competência do Poder Judiciário se limita ao exame da legalidade das normas instituídas no edital e dos atos praticados na realização do concurso, sendo vedado o exame dos critérios de formulação de questões, matéria cuja responsabi-lidade é da banca examinadora. Precedentes jurisprudenciais. Sentença que denegou a segurança mantida. Recurso desprovido.

V – E também o eg. Supremo Tribunal Federal também já decidiu no mesmo sentido.

É o que se lê do r. acórdão proferido nos autos do Agravo Regi-mental no Recurso Extraordinário nº 405.964-Rio Grande do Sul (1ª T., Rel. Min. Dias Toffoli, J. 24.04.2012), com a seguinte ementa:

Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo. Concurso público. Anulação de questoes de prova pelo Poder Judiciário. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Teoria do fato consumado. Inaplica-bilidade. Precedentes.

1. Pacífica a jurisprudencia desta Corte de que o Poder Judiciário não pode se substituir a banca examinadora do concurso público para aferir a correção das questoes de prova e a elas atribuir a devida pontuação, consoante previsão editalícia.

2. Inadmissível, em recurso extraordinário, o reexame dos fatos e das provas dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF.

3. A jurisprudência deste Tribunal é no sentido da inaplicabilidade da teoria do fato consumado a casos nos quais se pleiteia a permanência em cargo público, cuja posse tenha ocorrido de forma precária, em razão de decisão judicial não definitiva.

4. Agravo regimental não provido.

Com efeito, o eg. Poder Judiciário não pode substituir a banca examinadora para aferir a correção das questões de prova de concurso público e a elas atribuir pontuação, conforme a jurisprudência pacífica proferida pelo eg. Supremo Tribunal Federal.

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E o r. acórdão aqui colacionado cita vasta jurisprudência no mes-mo exato sentido.

VI – Cite-se, por fim, e ainda no mesmo sentido, outro r. acórdão do eg. STF, nos autos do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 827001/RJ (2ª T., Rel. Min. Joaquim Barbosa, J. 01.03.2011), com a seguinte ementa:

Agravo regimental. Concurso público. Anulação de questões objetivas. Impossibilidade. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que ao Poder Judiciário não é dado substituir banca exami-nadora de concurso público, seja para rever os critérios de correção das provas, seja para censurar o conteúdo das questões formuladas. Agravo regimental a que se nega provimento.

A jurisprudência do eg. Supremo Tribunal Federal, portanto, é vas-ta no sentido de que o eg. Poder Judiciário não pode substituir a banca examinadora para aferir a correção das questoes de concurso público.

A única ilação possível, portanto, é que o mandado de segurança visando ao exame da formulação e (ou) da correção das questões de concurso público não tem cabimento, e não pode ser apreciado pelo eg. Poder Judiciário.

VII – Outra lide que tem sido frequentemente proposta é de can-didato em concurso público que, insatisfeito com o resultado, ou com o deslinde do certame – falha na inscrição, por exemplo –, ingressa com ação ordinária de indenização por danos materiais e morais, com fulcro no Código de Defesa do Consumidor e na teoria da perda de uma chan-ce.

Ocorre que a simples inscrição em concurso público não configu-ra uma chance real e séria, conforme já decidiu o eg. Superior Tribunal de Justiça, no Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1220911/RS (2ª T., Rel. Min. Castro Meira, J. 17.03.2011), com a seguinte ementa:

Agravo regimental no recurso especial. Processual civil e direito civil. Teoria da perda de uma chance. Pressupostos indenizatórios. Alegada violação do art. 159 do Código Civil. Dano material hipotético. Impossi-bilidade. Dano moral. Acórdão a quo baseado no conjunto fático-proba-tório. Revisão de fatos e provas. Súmula nº 07/STJ.

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1. Cuida-se, na origem, de ação ordinária por meio da qual pretende o agravante ser indenizado pela União, em face dos danos materiais e mo-rais sofridos em decorrência da sua reprovação no exame psicotécnico, com a consequente exclusão no concurso público destinado ao provi-mento de vagas para o cargo de Policial Rodoviário Federal.

2. O agravante logrou aprovação apenas na prova de conhecimento. Dessarte, ficaram pendentes as quatro fases seguintes da primeira etapa, compreendendo os seguintes exames: psicotécnico (considerando a ine-xistência de resultado válido), médicos, capacidade física e motricidade; e, ainda, a segunda etapa, de caráter eliminatório – Curso de Formação.

3. A pretensão não encontra amparo na “teoria da perda de uma chan-ce” (perte d’une chance) pois, ainda que seja aplicável quando o ato ilícito resulte na perda da oportunidade de alcançar uma situação futura melhor, é preciso, na lição de Sérgio Cavalieri Filho, que “se trate de uma chance real e séria, que proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação futura esperada” (Programa de respon-sabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, p. 92).

4. Ademais, não se admite a alegação de prejuízo que elida um bem hipotético, como na espécie dos autos, em que não há meios de aferir a probabilidade do agravante em ser não apenas aprovado, mas também classificado dentro das 30 (trinta) vagas destinadas no edital à jurisdi-ção para a qual concorreu, levando ainda em consideração o nível de dificuldade inerente aos concursos públicos e o número de candidatos inscritos.

5. De mais a mais, o próprio autor afirma que não pretendia a investidura no cargo de Policial Rodoviário Federal, em face da sua nomeação para o de Procurador Federal. A pretensão não encontra guarida na teoria da perda de uma chance, aplicada somente “nos casos em que o ato ilícito tira da vítima a oportunidade de obter uma situação futura melhor, como progredir na carreira artística ou no trabalho, arrumar um novo emprego” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Op. cit., p. 91-92), dentre outras.

6. Indevida indenização por dano moral, à míngua de efetiva compro-vação, eis que o reexame dos aspectos de fato que lastreiam o processo, bem como sobre os elementos de prova e de convicção, encontra óbice no enunciado da Súmula nº 7/STJ, pois não há nos autos informação que justifique a condenação nessa verba.

7. Agravo regimental não provido.

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Conforme consta do r. acórdão ora colacionado, a chance deve ser real e séria, e que proporcione ao lesado efetivas condições pessoais de concorrer à situação esperada, o que não é nem pode ser assegurado com a simples inscrição em concurso público.

VIII – Cite-se, ainda no mesmo diapasão, r. acórdão proferido pelo eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da Apelação nº 0001232-28.2009.8.26.0553 (3ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Amorim Cantuária, J. 02.09.2012), também afastando a incidência da te-oria da perda de uma chance a cidadão inscrito em concurso público.

Vejamos a ementa:

Apelação. Ação de reparação de danos. Concurso público para estágio em órgão público. Convocação para credenciamento. Alegação do autor de não ter sido convocado por email. Envio tardio da documentação por correio. Perda da oportunidade de ser convocado por não mais preencher os requisitos do edital e da legislação. Conduta ilícita da ré. Inexistência. Obrigação do candidato de acompanhar os trâmites do concurso público. Regra expressa do edital. Responsabilidade civil não configurada. Danos morais. Não cabimento. Sentença de improcedência mantida. Apelação desprovida.

Salta aos olhos, portanto, que, na simples inscrição em concurso público, não incide, de forma alguma, a teoria da chance perdida, con-forme tem decidido, de forma reiterada, a jurisprudência aplicável.

E consta ainda do v. acórdão:

Quanto ao pedido de indenização por danos morais, saliento que não fosse só a inexistência dos elementos imprescindíveis à configuração da responsabilidade civil, é importante destacar que dano moral não é fon-te de enriquecimento sem causa. É lenitivo para o sofrimento psíquico ou moral do ofendido, decorrente da conduta ilícita do agente quando atinge a esfera do direito da personalidade do ofendido. Logo, não cabe reparação, se não tiver sido fartamente demonstrado o fato que carac-terizaria a lesão moral que, aliás, não pode ser banalizada, e, por isso mesmo, cabe trazer à baila o v. precedente relatado pelo eg. Desembar-gador José Osório: “Convém lembrar que não é qualquer dano moral que é indenizável. Os aborrecimentos, percalços, pequenas ofensas, não geram o dever de indenizar. O nobre instituto não tem por objetivo am-parar as suscetibilidades exageradas e prestigiar os chatos...” (Revista do Advogado AASP n. 49, dez. 1996, p. 11, dano moral)

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A indenização por dano moral, conforme decidido, não pode ser fonte de enriquecimento sem causa, uma vez que não é qualquer dano moral que é indenizável, e não é cabível se não restar fartamente de-monstrado o prejuízo moral sofrido, conforme tem decidido a jurispru-dência.

IX – E no caso de falha na própria inscrição do candidato, já de-cidiu o eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos autos da Apelação Cível nº 0024581-03.2010.8.26.0011 (3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Donegá Morandini, J. 12.02.2012), com a seguinte ementa:

Ação de indenização por danos materiais e morais. Exclusão de candi-dato de concurso público. Erro no preenchimento da inscrição. Opção equivocada pelo preenchimento de vagas destinadas aos candidatos do sexo feminino. Autor que sempre teve conhecimento do equivoco. Ine-xigibilidade da constatação do erro pela Fundação ré. Nome do autor (Lindomar) também ajustável a pessoas do sexo feminino, sem dizer, ain-da, no número expressivo de candidatos inscritos. Culpa exclusiva da vítima reconhecida. Improcedência da demanda reconhecida. Sentença reformada. Apelo provido.

E consta do v. voto condutor:

Não pode reclamar reparação aquele que deu causa ao dano. O au-tor, às claras, deu causa a sua exclusão do certame, descabendo, via de consequência, a indenização pretendida. A culpa exclusiva da vítima, na doutrina de Arnaldo Rizzardo, “é causa que afasta a responsabilidade o fato da vítima, ou a sua culpa exclusiva. A sua conduta desencadeia a lesão, ou se constitui no fato gerador do evento danoso, sem qual-quer participação de terceiros, ou das pessoas com a qual convive e está subordinada” (Responsabilidade civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 103). Ainda: “[...] a culpa exclusiva da vítima elide o dever de inde-nizar, porque impede o nexo causal” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. Responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, p. 44).

A jurisprudência, conforme se lê, é cristalina ao afastar a incidên-cia da teoria da perda de uma chance em concursos públicos.

X – Concluindo, respondemos às indagações acima para afirmar que as ações que têm sido propostas com mais frequência em decorrên-cia de resultados ou trâmite de concurso público – mandado de seguran-ça para questionar a formulação e (ou) a correção de questões, e ação

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de indenização por danos morais e materiais com fulcro no CDC – não são cabíveis, e, corolariamente, tais duas referidas ações não recebem fundamento legal.

É o que a jurisprudência tem decidido reiteradamente.

Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Controle Judicial nos Concursos Públicos

7552

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e TerritóriosPoder Judiciário da UniãoTribunal de Justiça do Distrito Federal e dos TerritóriosÓrgão: 3ª Turma CívelClasse: ApelaçãoNº Processo: 20140111729489APC(0044107‑21.2014.8.07.0018)Apelante(s): Bruno Miguel de MoraesApelado(s): Distrito FederalRelatora: Desembargadora Fátima RafaelRevisora: Desembargadora Maria de Lourdes AbreuAcórdão nº 906982

ADMINISTRATIVO – CONSTITUCIONAL – APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA – REQUISI-TOS – CONCURSO PÚBLICO – POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL – EDITAL – PREVISÃO DE LIMITE DE IDADE – CANDIDATO QUE CONTAVA COM 22 DIAS ALÉM DA IDADE EXIGIDA – RAZOABILIDADE

1. O mandado de segurança é ação destinada a proteger direito líquido e certo violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuição do Poder Público, nos termos do art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal de 1988.

2. Não há razoabilidade no ato que exclui o candidato ao Curso de Formação por contar com 22 dias além da idade máxima exigi-da no edital na data da inscrição.

3. Apelação conhecida e provida. Unânime.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Desembargadores da 3ª Turma Cível do Tri-bunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, Fátima Rafael – Relato-

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ra, Maria de Lourdes Abreu – Revisora, Flavio Rostirola – 1º Vogal, sob a presidência do Senhor Desembargador Flavio Rostirola, em proferir a seguinte decisão: Conhecer e dar Provimento, Unânime, De acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasili a(DF), 11 de novembro de 2015.

Documento assinado eletronicamente Fátima Rafael Relatora

“Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por Bruno Miguel de Moraes em desfavor do Comandante Geral da Polí-cia Militar do Distrito Federal, requerendo o direito de participar do Cur-so de Formação para ingresso nos Quadros da Polícia Militar do Distrito Federal, suspendendo-se os efeitos doa atos administrativos praticados pela Administração da PMDF em exonerá-lo do cargo.

Em apertada síntese, alega o impetrante que restou aprovado no certame para Soldado da PMDF e que participou, regularmente, do Curso de For-mação durante 29 dias.

Aduz que foi excluído do referido Curso de Formação em razão de ter extrapolado a idade máxima, qual seja, 31 anos até o último dia de ins-crição para o Curso (no último dia de inscrição o impetrante possuía 31 anos e 22 dias).

Suscita que a Administração, ao permitir seu ingresso no Curso de For-mação e a respectiva participação durante 29 dias, com aquisição de ma-terial e pedido de exoneração do cargo anteriormente ocupado (Agente Penitenciário do Estado de Goiás), criou uma expectativa no impetrante, a qual foi tolhida em razão de um erro da própria Administração.

A petição inicial foi instruída com os documentos de fls. 17/52.

Por decisão judicial de fls. 57/59 houve o deferimento do pedido liminar e da gratuidade de justiça.

O Distrito Federal requereu o ingresso no feito e apresentou informações às fls. 68/82.

Não foram prestadas informações pela autoridade coatora.

O Ministério Público oficiou pela concessão da segurança (fls. 85/86).

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RELATÓRIO

Adoto o relatório da r. sentença de fls. 89-92, in verbis:

“É o relatório. Decido.

Defiro o ingresso do Distrito Federal no feito. Anote-se.

Comunique-se.

Analisa-se a preliminar de inadequação da via eleita sustenta pelo Distri-to Federal em suas informações.

No caso, verifica-se a existência dos requisitos essenciais à propositura da ação mandamental, pois o impetrante logrou ser aprovado no certame para Polícia Militar do Distrito Federal, chegou à fase denominada ‘curso de formação’, sendo que após a frequência de 29 dias foi desligado, por não contar com a idade limite para a realização do mesmo.

Assim, afasto a preliminar ventilada, tendo em vista que a presente ação foi instruída com os documentos necessários a sua propositura.”

Acrescento que foi denegada a segurança pleiteada, em razão de ter o Impetrante ultrapassado o limite de idade exigida para inscrição no concurso público referido.

Inconformado, o Impetrante apela da sentença.

Em razões recursais de fls. 95-112, o Apelante alega que foi des-ligado injustamente do Curso de Formação, por ter extrapolado a idade limite em 22 (vinte e dois) dias.

Argumenta que foi classificado e aprovado em todas as fases do concurso público, de modo que não é razoável a exigência do limite de idade, uma vez que esse quesito não impede o exercício das atividades necessárias ao bom desempenho do cargo.

Baseado em tais argumentos, requer o provimento do recurso para reformar a r. sentença e julgar procedente o pedido deduzido na petição inicial.

Contrarrazões às fls. 128-142.

Sem preparo, em razão do deferimento da assistência judiciária gratuita.

É o relatório.

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VOTOS

A Senhora Desembargadora Fátima Rafael – Relatora

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do Apelo.

Trata-se de Apelação interposta contra a r. sentença de fls. 89-92, que denegou a segurança pleiteada, em razão de ter o Impetrante ultra-passado o limite de idade exigida para inscrição no Curso de Formação.

Os autos revelam que o Autor se submeteu ao concurso para ad-missão no cargo de Soldado da Polícia Militar do Distrito Federal, na forma do Edital nº 4, de dezembro de 2012, no qual logrou aprovação em todas as etapas. Em seguida, foi convocado para se matricular no Curso de Formação de Soldado 1ª Classe, contudo, iniciado o Curso de Formação, foi desclassificado por não ter a idade máxima de 30 anos na data da inscrição.

Em síntese, argumenta o Apelante que foi desligado injustamente do Curso de Formação, por ter extrapolado a idade limite prevista no edital em 22 (vinte e dois) dias.

Argumenta que foi classificado e aprovado em todas as fases do concurso público, de modo que não é razoável a exigência do limite de idade, uma vez que esse quesito não impede o exercício das atividades necessárias ao bom desempenho do cargo.

Com razão o Apelante, pois não é razoável que, após ter logrado êxito em todas as fases do concurso e esteja no exercício da função, seja excluído da Corporação, por ter à época de sua inscrição no Curso de Formação ultrapassado apenas 22 dias da idade limite.

Cumpre, a princípio, ressaltar que o mandado de segurança é a ação destinada a proteger de direito líquido e certo violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exer-cício de atribuição do Poder Público, nos termos do art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal.

O Edital 41 – DGP/PMDF, publicado em 12 de dezembro de 2012prevê que o candidato deve ter a idade máxima de 30 (trinta) anos completos até o ultimo dia de inscrição no certame. Confira-se:

“3.2. DOS REQUISITOS GERAIS

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c) possuir a idade mínima de 18 (dezoito) anos completos, até a data de ingresso na PMDF, e a idade máxima de 30 (trinta) anos completos, até o último dia de inscrição no concurso (não ter completado 31 (trinta e um) anos de idade);”

Assim, o candidato deve contar, no ato da inscrição, com 30 anos, onze meses e 29 dias. No caso, o Apelante completou 31 anos de idade no dia 20.1.2013 (fl. 17), ou seja, durante o período de inscrições, que já se encontrava previamente definida no item 5 do referido Edital, no período de 7.1.2013 a 18.2.2013.

No caso, o Apelante se inscreveu em concurso público para pro-vimento do cargo de Soldado de Polícia Civil – Edital nº 04/2012 –, em que logrou aprovação na prova de conhecimento, no exame de aptidão intelectual, psicológica, exames médicos e nos testes físicos. Também foi recomendado na investigação da vida pregressa. Entretanto, ao ser convocado para o Curso de Formação, contava com 31 anos e 22 dias.

Não há vedação à previsão de idade máxima de 30 (trinta) anos para ingressar nos quadros da Polícia Militar, pois as atribuições que os policiais exercem exigem força e vigor físico.

Embora não exista qualquer ilegalidade ou abuso de poder no ato que excluiu o Apelante dos quadros da Corporação, não foram observa-dos os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, pois o mero fato de ter alguns dias a mais do que o previsto no edital não induz à conclu-são de que o candidato não terá vigor suficiente para desempenhar as tarefas afetas ao cargo.

Com estas considerações, conheço e dou provimento à Apelação, para reformar a r. sentença e conceder a segurança, a fim de assegurar a matrícula do Impetrante no Curso de Formação para o ingresso nos Quadros da Polícia Militar do Distrito Federal.

Sem honorários, nos termos do art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

É como voto.

Acompanho a eminente Relatora.

A Senhora Desembargadora Maria de Lourdes Abreu – Revisora

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Considerando a proximidade da data em que o apelante comple-tava 31 anos com a data prevista no edital, em razão da razoabilidade e as demais razões aduzidas pela eminente Relatora, acompanho S. Exa.

O Senhor Desembargador Flavio Rostirola – Presidente e Vogal

DECISÃO

Conhecer e dar provimento, unânime

Assunto Especial – Ementário

Controle Judicial nos Concursos Públicos

7553 – Concurso público – anulação de questão – gabarito e critérios de avaliação – ilega-lidade – ausência – controle judicial – intervenção – impossibilidade

“Administrativo. Agravo regimental em agravo de instrumento. Concurso público. Pretensão de reexame de questões de prova. Anulação de questão. Revisão de gabarito e de critérios de avaliação. Ausência de ilegalidade. Inadmissibilidade de controle judicial. Precedentes STJ e STF. Recurso improvido. 1. Nos termos da pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Fede-ral, ‘não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinado-ra para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas’ (STF, RE 632.853, Rel. Min. Gilmar Mendes, Publicado em 29.06.2015). 2. O controle judicial sobre atos de banca examinadora de concurso público cinge-se ao exame de legalidade. Não há razão para intervenção do Poder Judiciário se não houver comprovação de conduta ilegal ou inconsti-tucional da banca examinadora, tais como ausência ou deficiência na oportunidade de ree-xame, ferindo contraditório ou ampla defesa; tratamento não isonômico entre candidatos ou o controle de pertinência entre o conteúdo aplicado na avaliação e o previsto no edital, não podendo ser exigido do candidato o que deste não constar. 3. Agravo regimental conhecido e desprovido, mantendo-se inalterada a decisão monocrática lançada nos fólios processuais.” (TJCE – Ag 0627203-21.2015.8.06.0000/50000 – Relª Helena Lúcia Soares – DJe 19.10.2015)

7554 – Concurso público – candidato – prova de redação – desclassificação – legalidade

“Apelação cível. Ação ordinária. Direito administrativo. Concurso público. Eliminação do candidato. Prova de redação. Desclassificação do candidato. Legalidade. Inexistência de violação ao princípio da vinculação ao edital, de erro crasso na elaboração das questões da prova ou de ilegalidade praticada pela banca examinadora. Improcedência dos pedidos. Manutenção. O controle judicial dos atos administrativos não pode adentrar no seu aspec-to meritório, analisando critérios de conveniência e oportunidade, sendo permitido apenas controle de legalidade e do abuso de poder da autoridade administrativa. Em se tratando de questionamentos acerca de critérios de elaboração e de correção das provas aplicadas em concurso público, o controle de legalidade realizado pelo Judiciário somente é possível quando evidenciado o desrespeito às regras previstas no edital e, excepcionalmente, quando evidenciado erro crasso na elaboração das questões ou de seu gabarito, bem como quando constatada eventual ilegalidade praticada pela Banca Examinadora, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da separação dos poderes.” (TJMG – AC 1.0024.12.135775-0/002 – 8ª C.Cív. – Relª Ângela de Lourdes Rodrigues – DJe 10.12.2015)

7555 – Concurso público – edital – exigência não cumprida – controle judicial – vedação

“Apelação. Direito administrativo. Concurso público. Inca. Enfermagem. Graduação e resi-dência e/ou especialização. Exigência do edital não cumprida. Impedimento à nomeação no cargo. Improvimento. 1. Trata-se de recurso interposto contra a sentença que julgou impro-cedente o pleito autoral, relativo ao concurso público para o provimento de vagas e cadastro de reserva para cargos de nível superior e médio no Instituto Nacional do Câncer – Inca. 2. O edital é a lei do concurso, que deve estabelecer normas garantidoras do tratamento isonômico

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e impor a igualdade de condições para o ingresso no serviço público, sendo ato vinculante tanto para a Administração Pública quanto para os candidatos que se inscrevem no concurso e, por isso, passam a ter que observar as regras estabelecidas no ato convocatório do certame. Em se verificando qualquer violação aos princípios, valores e regras constitucionais, poderá haver o controle judicial. 3. In casu, a Administração agiu em perfeita consonância com a regra editalícia, impedindo a autora de tomar posse no cargo tendo em vista a ausência de di-ploma/certificado de pós-graduação na especialidade concorrida, conforme exigido no edital. 4. O concurso público busca a seleção dos profissionais mais capacitados para o cargo, de forma que as normas editalícias balizam o processo seletivo para garantir a escolha satisfatória dos candidatos. Assim, mostra-se arrazoada a exigência prevista no edital, em virtude de guar-dar estreita relação com o cargo pretendido e de se constituir em medida que permite maior precisão e confiabilidade no desempenho da atividade profissional. 5. É vedado ao Poder Ju-diciário reapreciar os critérios e requisitos estabelecidos no edital, sobretudo se foi observado o princípio da legalidade do procedimento administrativo e foi dado tratamento isonômico aos candidatos, o que ocorreu na hipótese dos autos. 6. Apelação conhecida e improvida.” (TRF 2ª R. – AC 0010165-54.2011.4.02.5101 – 6ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Guilherme Calmon Nogueira da Gama – DJe 17.11.2015)

7556 – Concurso público – professor universitário – prova de títulos – doutorado – descon-sideração – antiguidade – razoabilidade – ausência

“Concurso público. Cargo de professor universitário (direito). Prova de títulos. Doutorado. Desconsideração em face da antiguidade (mais de cinco anos). Falta de razoabilidade. Inva-lidação. 1. Trata-se de apelação e remessa oficial de sentença em que se julgou ‘procedente o pedido para declarar a nulidade da limitação contida no item 4.10 do edital, bem como da decisão administrativa que a aplicou, determinando seja realizada nova avaliação para a pro-va de títulos sem a limitação prevista no edital’. 2. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que a ausência de impugnação prévia ao edital não torna preclusa discussão (judi-cial) sobre ilegalidade/inconstitucionalidade de regramento do certame, v.g.: AMS 0002687-21.2006.4.01.3800/MG, Rel. Des. Fed. João Batista Moreira, 5ª T., DJ de 19.10.2007, p. 61; EIAC 2006.34.00.000671-3/DF, Rel. Juiz Fed. (Conv.) David Wilson de Abreu Pardo, 3ª Se-ção, DJ 21.07.2008. 3. Pacífico, também, o postulado de que o controle judicial dos atos da instituição de ensino superior, especialmente no que concerne à adequação aos ditames cons-titucionais, não fere o princípio da autonomia universitária. Confiram-se, v.g.: AMS 0020043-68.2002.4.01.3800/MG, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 6ª T., e-DJF1 de 18.05.2011, p. 22; AMS 0014872-84.2007.4.01.3500/GO, Rel. Des. Fed. Fagundes de Deus, Rel. Conv. Juiz Fed. Renato Martins Prates (Conv.), 5ª T., e-DJF1 de 29.04.2011, p. 194. 4. Conforme bem lançado na sentença, ‘ao excluir os títulos acadêmicos ou a experiência anterior aos úl-timos cinco anos para a prova de títulos, a administração não elegeu critério condizente com a finalidade a ser alcançada com o concurso público. Se o objetivo é recrutar pessoas mais preparadas para o ofício de professor, como se viu, a limitação não se sustenta uma vez que não há correlação lógica entre a finalidade e o critério eleito pela administração. Ao contrário, somente com a avaliação de toda a vida acadêmica e profissional do candidato é que se pode aferir suas qualificações’. 5. Se em favor dos detentores de títulos mais recentes há uma certa presunção de que estão mais atualizados, em relação aos detentores de títulos mais antigos deve-se presumir que acompanharam mais de perto a evolução do conhecimento científico. Bem expressa José Souto Maior Borges que, sem a física clássica não seria possível a física relativista. A revolução é, de fato, continuidade. Toda inovação tem uma dimensão conserva-dora. Já expressara L. Cabral de Moncada que as águas dos grandes rios tornam-se salgadas

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muitos quilômetros antes de desembocarem no mar, no que é seguido por Boaventura de Sousa Santos, quando diz, contra o desperdício da experiência, que ‘a morte de um dado paradigma traz dentro de si o paradigma que lhe há de suceder’. A metáfora da ‘transforma-ção progressiva de uma atmosfera úmida em zona chuvosa’ (Edgar Morin) também serve para ilustrar a continuidade evolutiva do conhecimento. Todos os trabalhos aqui citados (referên-cias completas no voto do relator), bem a propósito, têm mais de cinco anos. 6. Também não prospera a alegação de que, em face da teoria do fato consumado, o resultado do concurso deve ser mantido, incluídas nomeação e posse da litisconsorte. A posse da litisconsorte ocor-reu em 10 de setembro de 2009 e nos termos do art. 54 da Lei nº 9.784/1999, a administração pode (deve), no quinquênio, anular seus próprios atos eivados de ilegalidade. 7. Além disso, a litisconsorte foi exonerada do cargo em tela, o qual, a teor da petição da instituição de ensino, encontra-se (ou se encontrava, na data da petição – 23.10.2013) vago. 8. Apelação e remessa oficial não providas.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 0016136-68.2009.4.01.3500 – 5ª T. – Rel. Des. Fed. João Batista Moreira – DJe 12.02.2014)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido da autora para declarar a nulidade da limitação contida no item 4.10 do edital, bem como da decisão administrativa que a aplicou, determinando a realização de nova avaliação para a prova de títulos sem a limitação prevista no edital.

Referida limitação consistia na consideração apenas dos títulos, entre eles, mestrado e doutorado, com menos de 5 anos.

A autora participou de concurso público para preenchimento de uma vaga de professor na Disciplina de Direito Tributário, e foi classificada em terceiro lugar, após prova escrita, didática e prova de título.

Ressaltou que a banca examinadora não pontuou vários de seus títulos, entre eles, mestrado e doutorado, por entenderem que só considerariam os títulos referentes a menos de 5 anos.

Diante da sentença, a Universidade Federal de Goiás (UFG) interpôs o recurso em estu-do alegando que, ao inscrever-se no concurso público, a autora estava consciente das exigências e critérios estabelecidos no edital para a avaliação de títulos, assim, aceitou os seus termos ao efetuar a inscrição.

Sustentou ser inaceitável que, ao final do certame, a autora venha apontar ilegalidade e arbitrariedades inexistentes a fim de favorecer-se, já que não foi a primeira classificada.

Enfatizou que o objetivo da limitação ora questionada é contratar professores que este-jam mais atualizados segundo a natural evolução da ciência do Direito.

A 5ª Turma do TRF 1ª Região acolheu a fundamentação da sentença afirmando que, se o objetivo é contratar pessoas mais preparadas, a limitação não se sustenta, já que não existe correlação lógica entre a finalidade e o critério eleito pela administração. Pois, somente com a avaliação de toda a vida acadêmica e profissional do candidato é que será possível aferir suas qualificações.

Em seu voto, o Relator assim se manifestou:

“[...] Na sentença, com muita propriedade, fundamentou-se:

[...] a litisconsorte alega que a norma tem o objetivo de valorizar produção científica mais recente dos candidatos e de não privilegiar professores com pouca participação no meio acadêmico.

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Se, de fato, esse foi o fundamento para o estabelecimento da limitação, não se pode deixar de reconhecer a nulidade do edital nesse aspecto.

De fato, ao excluir os títulos acadêmicos ou a experiência anterior aos últimos cinco anos para a prova de títulos, a administração não elegeu critério condizente com a finalidade a ser alcançada com o concurso público. Se o objetivo é recrutar pessoas mais preparadas para o ofício de professor, como se viu, a limitação não se sustenta uma vez que não há correlação lógica entre a finalidade e o critério eleito pela admi-nistração. Ao contrário, somente com a avaliação de toda a vida acadêmica e profis-sional do candidato é que se pode aferir suas qualificações.

Não se duvida que esse tipo de critério pode resultar no afastamento de candidatos com extensa produção acadêmica e científica, com importantes obras publicadas ou com importantes atividades profissionais pelo simples motivo de que foram realizados ou praticados há mais de cinco anos.

A questão é mais séria, no caso, em vista de ter sido excluído do cômputo o título mais valioso de toda a carreira acadêmica, isto é, o título de doutor, pelo simples fato de ter sido expedido há mais de cinco anos.

Se em favor dos detentores de títulos mais recentes há uma certa presunção de que es-tão mais atualizados, em relação aos detentores de títulos mais antigos deve-se presumir que acompanharam mais de perto a evolução do conhecimento científico. Bem expressa José Souto Maior Borges que, sem a física clássica não seria possível a física relativista. A revolução é, de fato, continuidade. Toda inovação tem uma dimensão conservadora. Já expressara L. Cabral de Moncada que as águas dos grandes rios tornam-se salgadas muitos quilômetros antes de desembocarem no mar, no que é seguido por Boaventura de Sousa Santos, quando diz, contra o desperdício da experiência, que ‘a morte de um dado paradigma traz dentro de si o paradigma que lhe há de suceder’. A metáfora da ‘transformação progressiva de uma atmosfera úmida em zona chuvosa’ também serve para ilustrar a continuidade evolutiva do conhecimento. Todas as obras em referência, incluída a tese de doutorado do relator, em que foram citadas, contam muito mais de cinco anos desde a primeira edição. [...]”

7557 – Concurso público – prova discursiva – revisão de notas – Poder Judiciário – atuação – limites

“Administrativo e constitucional. Concurso público. Edital Furnas nº 01/2002. Prova discur-siva. Revisão de notas. Limites da atuação do Poder Judiciário. Princípio da legalidade. Ape-lação desprovida. 1. Discute-se nos autos a procedência/adequação das notas atribuídas na correção da prova discursiva do concurso para o cargo de Advogado B de Furnas Centrais Elétricas S/A. Defende o apelante que comparada sua avaliação à de outra candidata resulta ofensa à legalidade e demais princípios norteadores da Administração Pública. A sentença, de improcedência, entendeu que não caberia ao Judiciário interferir nas opções da banca. 2. ‘É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário examinar os critérios de formulação e avaliação de provas e tampouco das notas atribuídas aos candidatos, ficando sua competência limitada ao exame da legalidade do procedimento administrativo, isto é, à verificação da legalidade do procedimento administrativo pela co-missão responsável’ (TRF1/T5, AC 000010081.2014.4.01.3400/DF, Rel. Des. Fed. Néviton Guedes). 3. Nos termos em que restou decidido pelo STF no julgamento do RE 632.853/CE, sob o rito da repercussão geral, ‘não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas’, sendo que ‘é permitido ao Judiciário juízo de compatibilidade do conteúdo das

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questões do concurso com o previsto no edital do certame’. 4. Limitada a atuação do Judi-ciário em demandas que envolvem provas de concurso público ao exame da legalidade, se não houver erro grosseiro ou fuga do programa, não se deve (pode) sindicar as opções eleitas pelos examinadores, pena de se ingressar no exame do mérito administrativo e se incorrer em sério risco de lesar a isonomia dos candidatos. O só fato de se buscar comparação com as notas recebidas por outra candidata, discutindo-se valoração em maior ou menor grau, denota intervenção de mérito, vedada ao controle judicial. 5. A fixação de honorários advocatícios sucumbenciais em R$ 1.500,00 antes de revelar afronta às diretrizes dos §§ 3º e 4º do art. 20 do CPC denota seu completo atendimento à vista das particularidades do caso e o traba-lho demandado do(s) advogado(s) da parte vencedora. 6. Apelação desprovida.” (TRF 1ª R. – AC 2007.35.00.019119-3/GO – Rel. Juiz Fed. Evaldo de Oliveira Fernandes Filho – DJe 14.12.2015)

7558 – Concurso público – questões – anulação – controle judicial – impossibilidade

“Apelação cível. Administrativo. Concurso público. Anulação de questões. Motivação dos re-cursos administrativos. Candidato aprovado para cadastro de reserva. Direito à nomeação. Ine-xistência. 1. O Supremo Tribunal Federal, em julgamento com repercussão geral reconhecida, firmou entendimento de que não compete ao Poder Judiciário substituir a banca examinadora para reapreciar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados, salvo ocorrência de ilegalidade e inconstitucionalidade (Plenário, RE 632.853, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 07.05.2015). 2. A afirmação de que o juiz não deve interferir na margem de apreciação das autoridades refere-se a situações em que o magistrado não tem habilitação ou não tem maior habilitação (em relação às autoridades) para controlar o conteúdo (de discricionariedade e de apreciação) das decisões administrativas (O devido processo legal administrativo e a tutela judicial efetiva. Um novo olhar? Revista de Processo, a. 40, v. 239, jan./2015, p. 313). Nesse sentido, deve-se reconhecer a impossibilidade de controle judicial do conteúdo das questões referentes a conhecimentos específicos da área de engenharia, pois, nesse caso, o juiz não tem conhecimentos técnicos superiores aos da banca examinadora para rever a correção das respostas por ela elaboradas. Precedente sobre a impossibilidade de o Poder Judiciário substituir a banca examinadora: TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 2013.02.01.016488-3, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 29.08.2014. 3. O fato de não serem disponi-bilizadas respostas individualizadas aos recursos administrativos interpostos pelos candidatos em face dos gabaritos das questões não significa que a banca pode simplesmente indeferir os recursos, sem externar a devida fundamentação, tendo em vista que os atos administrativos praticados durante o concurso público devem observar o princípio da publicidade e precisam ser motivados, por expressa determinação do art. 50, III e V, da Lei nº 9.784/1999. Assim, se a banca examinadora, no corpo de sua contestação, apresenta esclarecimentos a respeito da manutenção dos gabaritos das questões impugnadas pelo candidato, resta satisfeita a intenção autoral de saber os motivos do indeferimento de seu recurso, pois, ainda que essa não seja a forma ideal, houve a fundamentação do ato administrativo. 4. O BNDES, na condição de insti-tuição de fiscalização do exercício profissional, não tem entre suas finalidades a prestação de serviços jurídicos, devendo ser reconhecida a natureza acessória da atividade de advocacia dentro da sua estrutura, o que permitiria a sua terceirização sem que isso constitua preterição dos candidatos aprovados em concurso público para advogado. Precedente em caso análogo que envolvia a Caixa Econômica Federal: TRF 2ª R., 5ª T.Esp., Ap-Reex 201151010065412, Rel. Juiz Fed. Conv. Flavio de Oliveira Lucas, e-DJF2R 07.08.2014; TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC

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201051010013950, Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro, e-DJF2R 19.05.2015. 5. Apelação não provida.” (TRF 2ª R. – AC 0009926-50.2011.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Ricardo Perlingeiro – DJe 15.12.2015)

7559 – Concurso público – questões e critérios de correção de provas – controle judicial – impossibilidade

“Administrativo. Concurso público. Controle judicial de questões e critérios de correção de provas. 1. O autor pretende rever o ato administrativo de correção de questão de concurso. A sentença que julgou o pedido improcedente não merece reparos, ante a intelecção do STF, em sede de repercussão geral, de que o Poder Judiciário não dispõe de atribuição para substi-tuir a banca examinadora de concurso público com o propósito de avaliar as respostas dadas pelos candidatos e as notas a elas atribuídas (Tribunal Pleno, RE 632853, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 29.06.2015). 2. Apelação a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – AC 0033579-02.2013.4.01.3400 – Relª Juíza Fed. Maria Cecília de Marco Rocha – DJe 16.12.2015 – p. 2118)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RSDA nº 72, dez./2011, ementa nº 4584, no mesmo sentido.

7560 – Concurso público – seleção interna para graduação de cabo PM – cancelamento de questões – controle judicial – cabimento

“Apelação cível. Ação declaratória. 1. Policial militar. Participação em concurso interno de seleção para promoção à graduação de Cabo PM. Cancelamento de 4 (quatro) questões de português, com acréscimo dos pontos respectivos para fins de classificação em lista de apro-vados. Defeito na formulação dos Enunciados das questões. Opinião de 2 (dois) professores de português. Revisão do ato administrativo por força de controle jurisdicional. Cabimento. Hipótese excepcional de controle judicial do concurso público. Precedentes. Direito à re-classificação na listagem final. Procedência da demanda. Reforma da sentença. 2. Recurso provido.” (TJSP – Ap 0008585-43.2013.8.26.0242 – 12ª CDPúb. – Rel. Osvaldo de Oliveira – DJe 22.09.2015 )

7561 – Concurso público – soldado do corpo de bombeiros militar – candidato – inaptidão – controle judicial – possibilidade

“Mandado de segurança. Concurso para ingresso no cargo de soldado do corpo de bombeiros militar do Estado do Ceará. Candidato inicialmente considerado inapto na fase de exames médicos, por ausência de acuidade visual dentro dos padrões exigidos pelo edital. Cirurgia refrativa que afastou a situação incapacitante do candidato. Existência de direito líquido e certo. Possibilidade de controle judicial sobre o ato administrativo. Segurança concedida. 1. Mandado de segurança impetrado com o objetivo de afastar os efeitos do ato adminis-trativo que declarou o impetrante inapto na 2ª fase do concurso público para ingresso no cargo de Soldado da Carreira de Praças do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará. 2. Impetrante submetido à cirurgia refrativa, a qual foi bem sucedida, a ponto de ser emitido atestado médico no sentido de que foi elidido por completo a condição incapacitante. 3. No caso, não há que se falar em afronta aos princípio da isonomia ou da vinculação ao edital, tendo em vista que não se está dispensando um concorrente da exigência feita aos demais,

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mas apenas reconhecendo que o impetrante sanou sua inabilitação em tempo oportuno, vez que o fez ainda durante o trâmite do concurso. 4. É possível ao Poder Judiciário examinar os atos da administração pública, de qualquer natureza, mas sempre sob o aspecto da legalidade e da legitimidade do ato impugnado. 5. Segurança concedida para reconhecer a possibilida-de do impetrante submeter-se a novo exame de acuidade visual e, sendo considerado apto, permanecer nas demais etapas do certame.” (TJCE – MS 0877156-98.2014.8.06.0001 – Rel. Raimundo Nonato Silva Santos – DJe 27.11.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEDo voto do Relator destacamos:

“[...] Urge destacar que o Poder Judiciário pode examinar os atos da administração pública, de qualquer natureza, mas sempre sob o aspecto da legalidade e legitimidade do ato impugnado.

O controle judicial constitui, juntamente com o princípio da legalidade, representa um dos fundamentos do estado do direito. Afinal, de nada adiantaria sujeitar a adminis-tração pública às leis, mas impossibilitar que se seus atos possam ser controlados por um órgão dotado de garantias de imparcialidade, que possa apreciar e invalidar os atos ilícitos por ela praticados.

Nesse sentido, no presente caso, a decisão judicial contrária ao ato administrativo im-pugnado não se revela uma intromissão do Poder Judiciário no âmbito da administração, posto que, apenas, ateve-se a apreciar os aspectos de legalidade e legitimação do ato impugnado. Nesse sentido:

MANDADO DE SEGURANÇA – CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO DE SOLDADOS NA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DO PARANÁ – CANDIDATO REPROVADO NO EXA-ME DE ACUIDADE VISUAL – PEDIDO LIMINAR DEFERIDO PARA REALIZAÇÃO DAS DEMAIS FASES DO CONCURSO – REALIZAÇÃO DE CIRURGIA – CAPACIDADE VISUAL NORMAL – EXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO – CONTROLE JUDICIAL SO-BRE O ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO – POSSIBILIDADE – VULNERAÇÃO DO PRINCÍPIO DE INDEPENDÊNCIA ENTRE OS PODERES – INOCORRÊNCIA – RE-CURSO IMPROVIDO – Defeitos visuais, como miopia e astigmatismo, além de corrigí-veis pelo uso de lentes corretivas e por cirurgia, não impedem o regular exercício das atividades inerentes ao cargo. A necessidade de saúde normal para o desempenho da função não autoriza a exigência de requisitos, como o da acuidade visual mínima, não previstos em lei. O controle judicial constitui, juntamente com o princípio da legalida-de, um dos fundamentos em que repousa o estado do direito, pois de nada adiantaria sujeitar-se à administração pública à lei, se seus atos não pudessem ser controlados por um órgão dotado de garantias de imparcialidade que permitam apreciar e invalidar os atos ilícitos por ela praticados. Em face da nomeação do impetrante e do seu regular exercício do cargo, operou-se a teoria do fato consumado. (TJPR, Apelação Cível e Ree-xame Necessário nº 156510-2, Rel. Dilmar Kessler, Data de Julgamento: 15.09.2004, 4ª C.Cív.)

Conclui-se, portanto, pela possibilidade do impetrante submeter-se a novo exame de acuidade visual e, sendo considerada apta a permanência do mesmo nas demais etapas do certame.

Pelo exposto, concedo a segurança requestada para que, uma vez considerado apto em novo exame de acuidade visual, o impetrante permaneça no certame.

É como voto.”

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7562 – Concurso público – técnico de segurança do trabalho – candidato portador e es-pondilólise – impossibilidade do exercício da atividade – ilegalidade – ausência

“Concurso público. Petrobras. Técnico de segurança do trabalho. I – Candidato portador de espondilólise de L5 na coluna vertebral. Laudo pericial que atesta a impossibilidade do exercí-cio da atividade, pelo candidato, em plataformas e navios. Discricionariedade de a sociedade de economia mista escolher onde seus empregados exercerão suas atividades. Ausência de ilegalidade que permita o controle judicial. Improcedência do pedido. Sucumbência inverti-da. Apelo da Petrobras provido. Prejudicada a apelação do candidato.” (TJRJ – Ap 0019633-98.2006.8.19.0028 – 10ª C.Cív. – Rel. Bernardo Moreira Garcez Neto – DJe 03.08.2015)

Parte Geral – Doutrina

Foro por Prerrogativa de Função – Aspectos Constitucionais e Infraconstitucionais para Cargos Executivo e Legislativos Municipais1

PAULO SOARES NORABacharel em Direito, Presidente da Câmara de Vereadores de Cambé/PR.

ROMEU BRUNO MENDES MOLINARIMédico, Bacharel em Direito, Professor do Curso de Pós‑Graduação em Direitos Humanos: Etnias, Gênero e Diversidade Sexual – Unioeste/APP.

RESUMO: O presente trabalho tem como objetivos se analisar o instituto do foro por prerrogativa de função, denominado popularmente de “foro privilegiado”, seus aspectos históricos, suas disposições constitucionais e, especialmente, sua aplicabilidade no caso de cargos executivos e legislativos mu‑nicipais, analisando‑se o disposto na Constituição Federal, que estabeleceu, em seu art. 125, § 1º. O objetivo geral é delimitar‑se a aplicabilidade de tal instituto, analisar‑se a disposição constitucional sobre a aplicabilidade, verificar‑se a competência jurisdicional. Os casos que a Constituição Federal estabelece como sendo de competência dos Tribunais de Justiça dos estados para se julgar pessoas ocupantes de cargos executivos e legislativos municipais, dentre outros; verificar‑se se há conflito de jurisdição entre o Foro e o Tribunal do Júri, conforme disposto constitucionalmente. O instituto do foro por prerrogativa de função existe para se estabelecer a competência penal para julgar ações penais contra certas autoridades públicas, levando‑se em conta o cargo ou a função que elas ocupam, de modo a proteger a função e a coisa pública.

PALAVRAS‑CHAVE: Foro por prerrogativa de função; foro privilegiado; Constituição Federal; STF; STJ; Tribunais de Justiça; prefeito; vereadores.

ABSTRACT: This papper will analyze the juridical institution of the denominated Special Court for the ones that have public functions, it’s historical, constitutional and use, considering executive and legislative public functions, according to the constitutional disposals analyzing the article 125, § 1º, of the Brazilin Constitution. The main goal is to delimitate points as aplicabilitty, and jurisdictional competence. And to analyze the named jurisdictional conflicts between the main courts in these cases. As well IF there any kind of conflict between theses main courts and the jury. The Foro insti‑tute jurisdictional competence to judge penal subjects, when public persons are involved, with the objective to maintain protected the (res) “public thing”.

KEYWORDS: Constitution; main courts; jury; public functions; major; councilman.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Considerações sobre o foro por prerrogativa de função; 1.1 Competên‑cia, poder jurisdicional e outros poderes estatais; 1.1.1 Competência; 1.1.2 Poder jurisdicional;

1 O presente trabalho foi baseado na monografia de conclusão do Curso de Direito – Faculdades Pitágoras, Londrina/PR, de Paulo Soares Nora.

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1.1.3 Outros poderes estatais; 2 Aspectos históricos; 2.1 Antiguidade clássica; 2.2 Idade Média; 2.3 Era Moderna; 2.4 As origens do foro por prerrogativa de função; 3 Foro por prerrogativa de função na Constituição Federal; 4 Foro por prerrogativa de função na ordem infraconstitucional; 5 Jurisprudência dos tribunais; 5.1 O Supremo Tribunal Federal; 5.2 O Superior Tribunal de Justiça; 5.3 O Senado Federal; 5.4 O Tribunal do Júri; 6 Os julgados; 7 Posição doutrinária; 7.1 Argumentos favoráveis; 7.2 Argumentos contrários; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivos analisar o instituto do foro por prerrogativa de função, denominado popularmente de “foro privilegiado”, seus aspectos históricos, suas disposições constitucionais e especialmente sua aplicabilidade no caso de cargos executivos e le-gislativos municipais, analisando-se o disposto na Constituição Federal, que estabeleceu, em seu art. 125, § 1º, que “a competência dos tribunais [esta duais] será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de or-ganização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça”2 (Brasil, 1988. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp>).

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XXXVIII, d, conce-deu ao tribunal do júri a competência para o julgamento dos crimes do-losos contra a vida. Entendem-se estes como os previstos nos arts. 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123 a 127 do Código Penal, conforme o art. 74, § 1º, do Código de Processo Penal.

Sendo esse dispositivo de interpretação aberta, pois há decisões de se aplicar ou não o foro privilegiado, conforme o caso, nos cargos executivos e legislativos municipais, que variam de acordo com as Cons-tituições Estaduais, abrindo-se, assim, a possibilidade jurisprudencial de se aplicar ou não o foro, conforme o cargo ocupado e/ou a matéria en-volvida.

O objetivo geral é delimitar a aplicabilidade do foro privilegiado, conforme disposto na Constituição Federal, de acordo com o cargo e a matéria envolvidos, analisar a disposição constitucional sobre a aplica-bilidade do foro privilegiado, verificar a competência jurisdicional dos casos dispostos na Constituição Federal, verificar a “interpretação de cláusula aberta”, para os casos em que a Constituição Federal estabelece

2 Constituição Federal, comentada pelo Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/por-tal/constituicao/constituicao.asp>. Acesso em: 5 nov. 2014.

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como sendo de competência dos Tribunais de Justiça dos estados para se julgar pessoas ocupantes de cargos executivos e legislativos municipais, entre outros; verificar se há conflito de jurisdição entre o foro privilegia-do e o Tribunal do Júri, conforme disposto constitucionalmente.

1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO

O instituto jurídico comumente conhecido como foro privilegia-do, na verdade, é denominado juridicamente como foro especial por prerrogativa de função, e existe para se estabelecer a competência penal para julgar ações penais contra certas autoridades públicas, levando-se em conta o cargo ou a função que elas ocupam, de modo a proteger a função e a coisa pública3 (STF, HC 70581/AL, 2ª T., Rel. Min. Marco Au-rélio, J. 21.09.1993, DJ 29.10.1993; HC 69344/RJ, 2ª T., Rel. Min. Néri da Silveira, J. 22.09.1992, DJ 18.06.1993; HC 69325/GO, Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, J. 17.06.1992, DJ 04.12.1992).

Interessante observar-se que o foro privilegiado liga-se à função ocupada, e não à pessoa de seu ocupante, de forma que não acompanha a pessoa após o fim do exercício do cargo4 (GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Jus Navegandi, 2014).

Historicamente, sempre existiu vinculado aos sistemas jurídicos gregos, romanos, entre outros, mas, durante o absolutismo, começou a ter uma aplicabilidade como uma resposta à irresponsabilidade penal dos governantes, típica do absolutismo, e buscava garantir a responsabi-lização daqueles que exerciam altos cargos governamentais.

Deve-se observar que erroneamente se encontra associado com “privilégio”, o que, na verdade, deve se denominar como “prerrogativa”. A prerrogativa refere-se aos direitos transitórios direitos transitórios que uma função confere àquele que a ocupa, isto é, direitos que se ligam ao cargo e existem para permitir o seu melhor exercício, prerrogativa essa que tem como objetivo proteger a coisa pública, e não proteger a autoridade envolvida. Por isso as prerrogativas, de acordo com o cargo ou função, variam desde o Supremo Tribunal Federal até os Tribunais de Justiça Estaduais.

3 STF, HC 70581/AL, 2ª T., Rel. Min. Marco Aurélio, J. 21.09.1993, DJ 29.10.1993; HC 69344/RJ, 2ª T., Rel. Min. Néri da Silveira, J. 22.09.1992, DJ 18.06.1993; HC 69325/GO, Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, J. 17.06.1992, DJ 04.12.1992.

4 GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Critérios para fixação de competência penal sob o prisma constitucional. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 277, 10 abr. 2004. Acesso em: 10 fev. 2014.

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Vemos ainda que a Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXVIII, d, concedeu ao tribunal do júri a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida – o que é considerado como um dos pontos máximos de exercício de cidadania e democracia em vários sistemas jurídicos, como o brasileiro, uma vez que há aqui o exercício da justiça pelos cidadãos, de forma direta, sendo o indivíduo julgado por seus pró-prios pares, com amplo exercício de defesa e contraditório5.

Apesar de absoluto e disposto como direito constitucional abso-luto, e como clausula pétrea, a própria Constituição estabeleceu que há algumas situações de excepcionalidade, para o julgamento de certas pessoas, em razão das funções que ocupam, que têm direito a julgamen-to em foro privilegiado nos crimes comuns e/ou de responsabilidade. São normas de aplicabilidade imediata, “não apenas por sua natureza constitucional e processual, mas também por contemplar não o ocupan-te do cargo, mas a dignidade da função”6 (STF, HC 71654/MG, 1ª T., Rel. Min. Ilmar Galvão, J. 18.10.1994, DJ 30.08.1996).

1.1 COmpETênCIA, pODER JuRISDICIOnAL E OuTROS pODERES ESTATAIS

O foro por prerrogativa de função está diretamente relacionado à competência, ao poder jurisdicional e aos outros poderes estatais, todos dispostos de forma clara na Constituição Federal de 1988.

1.1.1 Competência

Importante discutir a competência. Competência (vocábulo advin-do do latim competentia – de competere: estar em gozo ou no uso de) possui, em Direito, duas acepções distintas, significando que é a esfera legítima de exercício de um determinado poder dado a uma autoridade pública pela lei.

1.1.2 Poder jurisdicional

O instituto do poder jurisdicional significa a limitação ao exercício do poder jurisdicional, disposto em um conjunto de regras que definem o órgão judicial responsável por este exercício da jurisdição. Objetivan-do a organização de tarefas e a racionalização do trabalho, exprime-se em critérios de lugar, do tipo da matéria (civil, penal, trabalhista etc.),

5 Constituição Federal, comentada pelo Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/por-tal/constituicao/constituicao.asp>. Acesso em: 5 nov. 2014.

6 STF, HC 71654/MG, 1ª T., Rel. Min. Ilmar Galvão, J. 18.10.1994, DJ 30.08.1996.

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em relação às pessoas que estão demandando ou sendo demandadas e em relação à organização funcional (divisão de tarefas entre órgãos de mesma abrangência). Definida em lei (ou seja, a lei fixa quais as regras que determinam a autoridade competente), a competência estabelece os limites dentro dos quais pode, legitimamente, um juiz julgar. Quando fora das situações expressas nessas regras, ocorre a incompetência, que torna o exercício do poder jurisdicional, em determinados casos, ilegí-timo.

Assim, liga-se ao princípio do juiz natural ao impedir a designação de juízes ad hoc, servindo para garantir independência e imparcialidade ao julgador.

1.1.3 Outros poderes estatais

Se, neste caso, para se referir ao exercício de qualquer poder de decisão ou atuação administrativa de uma autoridade pública. Assim, refere-se à atribuição do exercício de um poder específico, definida em lei. Neste sentido, pode-se falar em competência administrativa, legisla-tiva, tributária etc.

2 ASPECTOS HISTÓRICOS7

O foro por prerrogativa de cargo é uma instituição histórica do direito ocidental que existe desde as antiguidades greco-romanas como intuito de se proteger a coisa pública, estando arraigado ao conceito de democracia. O que se encontra disposto na Constituição Federal possui origens grega e romana, com passagem pelo sistema jurídico europeu e assim vindo com nossa colonização e existente desde a primeira Consti-tuição brasileira – que, na verdade, era portuguesa.

Logo, para se entender o conceito do foro, necessitamos analisar sua evolução histórica. As maiores dúvidas sobre a competência do foro vêm do fato de não sabermos que elas foram determinadas historica-mente – por isso essa análise histórica e evolutiva detalhada.

2.1 AnTIguIDADE CLáSSICA

Com o surgimento das cidades-estado gregas, temos o apareci-mento de diversas classes às quais correspondiam diversos privilégios,

7 WOLKMER, Antonio Carlos. Fundamentos da história do Direito. 4. ed. Rio de Janeiro: Del Rey, 2006. p. 71 a 103; 121 a 154; 178 a 247; 271 a 316 e 348 a 440.

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como: somente os cidadãos poderiam participar da vida política (o que excluía a maior parte da população) e a existência de certos benefícios para aqueles que ocupavam determinados cargos.

Em Roma, existiam privilégios associados às classes e, também, aos cargos, como: certas classes tinham preferência na ordem das vota-ções; somente certas classes podiam ocupar cargos públicos importantes como aqueles do Senado e as magistraturas; além do estabelecimento de tribunais especiais para o julgamento dos senadores e dos magistrados, como vemos na nossa constituição.

Com Constantino I e o Édito de Milão, o Cristianismo torna-se a instituição que mais cresce dentro do Império, passando seus membros a exercer outras funções públicas, entre os quais alguns membros do clero, com os bispos a oficializar as relações entre Estado e Igreja.

2.2 IDADE méDIA

Com Justiniano, tornam-se comuns instituições que durarão toda a Idade Média, como a forte separação em classes, levando a um con-junto de práticas que refletem essa separação. Surgem, então, leis que puniam de modo diferenciado as pessoas de acordo com a classe a que pertenciam.

A partir do século XII, com a dominação normanda, o poder dos monarcas na Inglaterra passou a encontrar resistência em diversos seto-res da sociedade, especialmente na nobreza e no clero.

Assim, com o passar do tempo, várias imunidades e privilégios foram concedidos aos funcionários reais frente à jurisdição papal, e as imunidades do clero frente à jurisdição real foram sendo abolidas.

2.3 ERA mODERnA

Com o advento da era moderna, os privilégios reais também foram sendo limitados e abolidos graças à atuação do parlamento. Sintomáticos são os seguintes diplomas: o Petition of Right de 1628, o Habeas Corpus Act de 1679, o Bill of Rights de 1689 e o Decreto de Estabelecimento de 1701, dispositivos dos mais importantes para o direito constitucional e para os direitos humanos, sendo marcos fundamentais utilizados até hoje. É possível, assim, concluir que as limitações aos privilégios tiveram

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uma influência decisiva no constitucionalismo inglês que se espalharia pelo mundo após as revoluções liberais.

Na península ibérica, os monarcas possuíam um poder maior den-tro de seu território, sem oposição de uma nobreza forte, mas com uma maior influência da Igreja, o que acabou por gerar uma situação bem diferente daquela existente na Inglaterra, mudando as relações entre os monarcas e o clero e facilitando o desenvolvimento de legislações pró-prias.

As ordenações traziam regras para efetivar a punição de modo dis-tinto de acordo com a classe social à qual as pessoas pertenciam, como nobres e clérigos. Assim como as regras romanas do período bizantino, as ordenações portuguesas traziam tanto regras de direito material como de direito processual. Com o passar do tempo, várias categorias adqui-riram privilégios além das de foro nas ordenações, como os “letrados” e outros funcionários reais de menor escalão.

Essas ordenações foram aplicadas no Brasil Colônia ficando em vigor até a edição dos primeiros códigos brasileiros durante o Império, em fins do século XIX, e na República Velha, no início do século XX.

2.4 AS ORIgEnS DO fORO pOR pRERROgATIVA DE funçÃO

A Revolução Americana foi a primeira a realizar uma revogação de todos os privilégios definidos a partir da origem das pessoas, isto é, levando-se em conta a classe à qual pertenciam. Algum tempo depois, a Revolução Francesa, também, teve o mesmo sentido de eliminação dos privilégios de nascimento. Assim, a igualdade foi a “pedra ângular” da Revolução Americana e também da Francesa. Entretanto, ambas as revoluções reconheceram o caráter natural da desigualdade ao funda-rem uma igualdade formal (baseada na aplicação isonômica da lei) e uma desigualdade material (baseada no mérito individual). Também es-sas revoluções perceberam a necessidade de cercar-se de determinados cargos de certas qualidades que tornassem possível o seu desenvolvi-mento independente, isto é, sem influências. Foi assim que apareceram as prerrogativas separadas dos privilégios: certos cargos precisavam de garantias que permitissem o seu bom exercício (como a vitaliciedade dos Magistrados, por exemplo).

A utilização da função ou do cargo para determinar o foro de jul-gamento como forma de substituir os privilégios pessoais, isto é, aqueles

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conferidos a pessoas em virtude da classe na qual nasceram, apareceu pela primeira vez na Constituição americana de 1787, no instituto do impeachment, funcionando apenas para os casos de responsabilidade política. Essa técnica foi muito ampliada pela Constituição espanhola de 1812 e a portuguesa de 1822. As constituições posteriores desses países mantiveram esse instituto até os dias atuais.

A Constituição brasileira do Império – claramente inspirada em outros diplomas liberais, como a Constituição francesa de 1791, a es-panhola de Cádiz e a portuguesa do Porto – expandiu grandemente o uso da prerrogativa de função como modo de definir o foro. Inicialmen-te, a Assembleia Constituinte de 1823 era praticamente dominada por elementos liberais que queriam uma monarquia constitucional limitada. Entretanto, isto se chocou com a vontade do imperador e a estrutura predominante no Brasil, senhorial e escravocrata. Com a dissolução da Assembleia e a outorga de uma Constituição pelo Imperador, surpreen-de a manutenção do fim dos privilégios de natureza pessoal, deixando apenas aqueles de natureza real (prerrogativas), isto é, aqueles relativos à res, às coisas (referindo-se aos cargos).

Assim, dividiu esta Constituição a prerrogativa de foro entre o Judi-ciário (Supremo Tribunal de Justiça) e o Legislativo (Senado). Entretanto, a total eliminação dos privilégios não foi alcançada, haja vista que a Igreja (seus membros) continuou gozando de imunidade em relação às Cortes – como vemos conceitualmente na nossa Constituição Federal de 1988.

A Constituição de 1891, a primeira da República no Brasil, promo-veu a efetiva eliminação dos privilégios, com a separação entre Estado e Igreja, e manteve o foro por prerrogativa de função, para garantir a responsabilidade dos governantes, reproduzindo, inclusive, o instituto do impeachment, de criação americana. As constituições brasileiras pos-teriores pouco fizeram além de manter o foro por prerrogativa de fun-ção e mudar o rol de cargos sujeitos a esta forma de determinação da competência, bem como dos órgãos responsáveis pelo julgamento. Por exemplo, a Emenda Constitucional nº 1, promulgada no regime militar, foi a primeira a incluir os membros do Congresso Nacional no rol de autoridades, aumentando enormemente o seu número.

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3 FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XXXVIII, d, conce-deu ao tribunal do júri a competência para o julgamento dos crimes do-losos contra a vida. Entendem-se estes como os previstos nos arts. 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123 a 127 do Código Penal, conforme o art. 74, § 1º, do Código de Processo Penal. Brasil, ano do Código Penal, como foi dito na nossa introdução.

Desde logo, observa-se que a competência por prerrogativa de função é estabelecida não em razão da pessoa, mas em virtude do cargo ou da função que ela exerce, razão pela qual não fere qualquer princípio constitucional, como o da igualdade (art. 5º, caput) ou o que proíbe os juízos ou tribunais de exceção (art. 5º, XXXVII). Aqui ninguém é julgado em razão do que é, mas tendo em vista a função que exerce na socie-dade8.

Contudo, a própria Carta Magna tratou de excepcionar algumas hipóteses em que certas pessoas, em razão das funções que ocupam, têm direito a julgamento em foro privilegiado nos crimes comuns e/ou de responsabilidade. São normas de aplicabilidade imediata, “não ape-nas por sua natureza constitucional e processual, mas também por con-templar não o ocupante do cargo, mas a dignidade da função”.

No art. 102, I, b e c, foi atribuído ao Supremo Tribunal Federal9 a competência para processo e julgamento, nas infrações penais comuns, do Presidente da República, do Vice-Presidente, dos membros do Con-gresso Nacional, dos Ministros de Estado e do Procurador-Geral da Re-pública, bem como, nas infrações penais comuns e nas de responsabili-dade, dos membros dos Tribunais Superiores, do Tribunal de Contas da União e dos chefes de missão diplomática de caráter permanente.

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guar-da da Constituição, cabendo-lhe:

I – processar e julgar, originariamente:

a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato

8 Constituição Federal, comentada pelo Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/por-tal/constituicao/constituicao.asp>. Acesso em: 5 nov. 2014.

9 Idem.

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normativo federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presi-dente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;”

[...]

No art. 105, I, a, ficou o Superior Tribunal de Justiça competente para processar e julgar, nos crimes comuns, os governadores de Estado e do Distrito Federal, bem como, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores de Tribunais de Justiça, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, dos Tribunais Regionais Fede-rais, Eleitorais e do Trabalho, dos Conselhos e Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais10.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I – processar e julgar, originariamente:

a) nos crimes comuns, os governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministé-rio Público da União que oficiem perante tribunais;

b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)

c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pes-soas mencionadas na alínea a, ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Elei-toral; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)

O art. 108, I, a, atribui competência aos Tribunais Regionais Fe-derais para processo e julgamento, nos crimes comuns e de responsabi-

10 Ibid.

54 �������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA

lidade, dos juízes federais, incluídos os da Justiça Militar e do Trabalho, bem como os membros do Ministério Público da União.

Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:

I – processar e julgar, originariamente:

a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Mili-tar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competên-cia da Justiça Eleitoral;”

[...]

E o art. 96, III, dá ao Tribunal de Justiça a competência para julgar os juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns.

Art. 96. Compete privativamente:

[...]

III – aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Fede-ral e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos cri-mes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.

Por fim, o art. 29, VIII, estabelece que o prefeito será julgado pelo Tribunal de Justiça. Como, neste caso, não é feita distinção entre cri-mes comuns e de responsabilidade, a jurisprudência tem entendido que abrange ambos, desde que sejam delitos submetidos à Justiça Estadual.

Observando-se aqui que o inciso VIII foi renumerado pela Emenda Constitucional nº 1, de 1992.

Capítulo IV

Dos Municípios.

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os prin-cípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

[...]

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VIII – inviolabilidade dos vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município; (Renumerado do inciso VI, pela Emenda Constitucional nº 1, de 1992)

IX – proibições e incompatibilidades, no exercício da vereança, simila-res, no que couber, ao disposto nesta Constituição para os membros do Congresso Nacional e na Constituição do respectivo Estado para os mem-bros da Assembleia Legislativa; (Renumerado do inciso VII, pela Emenda Constitucional nº 1, de 1992)

X – julgamento do prefeito perante o Tribunal de Justiça; (Renumerado do inciso VIII, pela Emenda Constitucional nº 1, de 1992)11

Compreendem-se crimes comuns, compreendem-se todas as mo-dalidades de delitos, desde que não se capitulem entre os crimes de responsabilidade. Logo, deve prevalecer o foro privilegiado previsto na Constituição Federal também para os crimes dolosos contra a vida.

Importante aqui se destacar que, em todas as situações elencadas acima, há conflito aparente de normas de idêntica hierarquia, pois am-bas provenientes da Constituição: uma, regra geral, que atribui a com-petência dos crimes dolosos contra a vida ao Tribunal do Júri; outra, específica, que concede foro privilegiado por prerrogativa de função a algumas autoridades.

Logo, fundamental se valer da questão da prevalência de conflito com a prevalência da regra especial sobre a geral.

São estas, e apenas estas, as hipóteses de afastamento da compe-tência do Tribunal do Júri previstas na Constituição Federal.

4 FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO NA ORDEM INFRACONSTITUCIONAL

É pacífico que os Estados-membros podem, no exercício de seu poder constituinte decorrente, estabelecer privilégios de foro para seus agentes políticos em suas Constituições Estaduais, em correspondência com os casos previstos na Constituição Federal.

A Constituição Federal estabeleceu, em seu art. 125, § 1º, que “a compe-tência dos tribunais [estaduais] será definida na Constituição do Estado,

11 Ibid.

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sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justi-ça”. (Brasil, 1988)12

Os arts. 86 e 87 do Código de Processo Penal estabelecem as pes-soas que, em razão do cargo, devem ser julgadas por órgãos superiores da Justiça, disposições estas que precisam ser relidas à luz da Constitui-ção Federal e das constituições estaduais, em consonância com o esta-belecido na Constituição Federal13.

Um dos critérios determinadores da competência estabelecidos em nosso Código de Processo Penal é exatamente o da prerrogativa de função, conforme está estabelecido nos seus arts. 69, VII, 84, 85, 86 e 87.

Evidentemente que essas disposições contidas no Código Pro-cessual têm que ser cotejadas com as normas constitucionais (seja pela Constituição Federal, seja pelas Constituições dos Estados) e pela juris-prudência, especialmente a do Supremo Tribunal Federal.

O ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso promulgou a Lei nº 10.628/2002 (publicada no Diário Oficial da União do dia 26 de de-zembro do ano de 2002), restaurando em parte a Súmula nº 394, a partir de uma modificação estabelecida no art. 84 do Código de Processo Pe-nal, acrescentando-lhe dois parágrafos, a saber:

§ 1º A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública.

§ 2º A ação de improbidade, de que trata a Lei nº 8.429, de dois de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prer-rogativa de foro em razão do exercício de função pública, observado o disposto no § 1º.

Seção VIII

Dos Tribunais e Juízes dos Estados

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.

12 Ibid.13 Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: <http://www.

planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm>. Acesso em: 13 nov. 2014.

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§ 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

Sendo este, como já dito, o objetivo principal deste trabalho.

A prática jurisdicional, contudo, muitas vezes vale-se da concor-rência de normas, para muitas vezes haver decisões diversas entre Tri-bunais e mesmo Magistrados de um mesmo Tribunal, como veremos a seguir.

5 JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS

Descrever-se-á, aqui, a função de cada Tribunal nos casos de foro por prerrogativa de função, sendo este o objetivo principal de trabalho, que, além de abordar a competência de cada Tribunal, focou-se no fato de que ainda alguns cargos ou funções públicas devem ser julgados pe-los Tribunais de Justiça, ou seu equivalente, o Tribunal Regional Federal, de acordo com a matéria – o que, na prática, é que há mais do que uma lacuna legal, uma jurisprudência dissonante, especialmente entre o STF e o STJ, nos casos de cargos como secretários de estado, prefeitos e vere-adores. Há, no entanto, disposto constitucional que determina os casos em que alguns cargos como Presidente da República serão julgados pelo Senado Federal, nos casos de crimes de responsabilidade, ou pela As-sembleia Legislativa, nos casos de impeachment.

Sendo de máxima importância se dizer que a Constituição Federal de 1988 deixou claro, em seu art. 125, que a competência nos casos de crimes cometidos por origem da função devam ser julgados junto aos Tribunais de Justiça de cada estado, sendo determinado pelas Constitui-ções Estaduais, e que, no caso de crimes comuns, a competência é dos Tribunais de Júri, como determinado tanto no art. 5º, assim como no próprio art. 125.

5.1 O SupREmO TRIbunAL fEDERAL

O Supremo Tribunal Federal (STF) é a mais alta instância do poder Judiciário brasileiro e acumula competências típicas de uma Suprema Corte (tribunal de última instância) e de um Tribunal Constitucional (que julga questões de constitucionalidade independentemente de litígios concretos). Sua função institucional precípua é de servir como guardião da Constituição Federal de 1988, apreciando casos que envolvam lesão

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ou ameaça a esta última. De suas decisões não cabe recurso a nenhum outro tribunal.

Criado após a proclamação da República, o STF exerce uma longa série de competências, entre as quais a mais conhecida e relevante é o controle concentrado de constitucionalidade através das ações diretas de inconstitucionalidade. O Tribunal também está aberto para o público assistir aos julgamentos.

Por representar um tribunal de jurisdição nacional e por ser com-posto por apenas onze ministros, só devem ser apreciadas aquelas ações em que o interesse da nação esteja em jogo. Sua competência está des-crita no art. 102 da atual constituição Federal brasileira, formulada em 1988.

As ações hábeis à realização da verificação da constitucionalidade das leis e normas em face da Constituição Federal são: (i) ação direta de inconstitucionalidade (ADIn), (ii) ação declaratória de constitucionalida-de (ADC) e (iii) arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). Em sede recursal, a constitucionalidade poderá ser apreciada pela via do recurso extraordinário, interposto em face de provimento jurisdicional que represente afronta à Constituição, mas que, para poder chegar ao Tribunal, passa por um rigoroso filtro, primeiramente realiza-do pelos Presidentes dos Tribunais de Justiça e Tribunais Federais, para que, após verificada a admissibilidade do recurso, possa lhe ser dado seguimento, com o envio dos autos à Suprema Corte. Caso os referidos presidentes de tribunais neguem seguimento ao RE, há a possibilidade de se interpor agravo de instrumento ao Supremo Tribunal Federal.

Compete ao STF processar e julgar, originariamente, nas infrações penais comuns, seus próprios ministros, o presidente da República, o vi-ce-presidente, os membros do Congresso Nacional e o procurador-geral da República; e nas infrações penais comuns e nos crimes de responsa-bilidade os ministros de Estado, os comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica (ressalvado o disposto no art. 52, I), os membros dos Tribu-nais Superiores e os do Tribunal de Contas da União, e os chefes de mis-são diplomática de caráter permanente (Constituição Federal, art. 102).

5.2 O SupERIOR TRIbunAL DE JuSTIçA

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) é um dos órgãos máximos do Poder Judiciário do Brasil. Descreve como sua missão zelar pela unifor-midade de interpretações da legislação federal brasileira.

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O STJ também é chamado de “Tribunal da Cidadania”, por sua origem na “Constituição Cidadã”. É de responsabilidade do STJ julgar, em última instância, todas as matérias infraconstitucionais não especia-lizadas, que escapem à Justiça do Trabalho, Eleitoral e Militar, e não tratadas na Constituição Federal, como o julgamento de questões que se referem à aplicação de lei federal ou de divergência de interpretação jurisprudencial. Na primeira hipótese, o Tribunal analisa o recurso caso um Tribunal inferior tenha negado aplicação de artigo de lei federal. Na segunda hipótese, o Superior Tribunal de Justiça atua na uniformi-zação da interpretação das decisões dos Tribunais inferiores; ou seja, constatando-se que a interpretação da lei federal de um Tribunal inferior é divergente de outro Tribunal (incluso o próprio Superior Tribunal de Justiça), o STJ pode analisar da questão e unificar a interpretação.

Como definidas no art. 105 da Constituição brasileira:

I – processar e julgar, originariamente:

a) nos crimes comuns, os governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministé-rio Público da União que oficiem perante tribunais;

b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal;

c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pes-soas mencionadas na alínea a, ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Elei-toral;

[...]

5.3 O SEnADO fEDERAL

Funçoes exclusivas

Segundo o art. 52 da Constituição Federal brasileira de 1988, cabe exclusivamente ao Senado Federal do Brasil

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processar e julgar, nos crimes de responsabilidade: Presidente da Repú-blica, Vice-Presidente, Ministros do Supremo Tribunal Federal, Membros do Conselho de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, Procurador-Geral da República, Advogado-Geral da União e, nos crimes conexos ao Presidente e Vice, Ministros de Estado, Comandantes das For-ças Armadas.

5.4 O TRIbunAL DO JúRI

No mais, sendo a norma do Tribunal do Júri norma da Lei Maior da Nação, pode ser afastada somente por norma de igual hierarquia que a excepcione, jamais por norma de hierarquia inferior, seja de Consti-tuição Estadual, de lei federal ou estadual. O Tribunal do Júri não é um direito subjetivo do acusado, renunciável: é um direito de cada membro da sociedade, de julgar diretamente os acusados de crimes dolosos con-tra a vida.

6 OS JULGADOS

O Supremo Tribunal Federal tem considerado constitucionais os dispositivos estaduais que atribuem ao Tribunal de Justiça o processo e julgamento de ações criminais contra certas autoridades locais (como deputados estaduais, secretários de Estado e vereadores).

A Constituição do Estado do Piauí – à vista do que lhe concede a Carta da República (art. 125, § 1º) – é expressa no dizer que compete ao Tribunal de Justiça processar e julgar, originalmente, nos crimes comuns e de res-ponsabilidade, os vereadores (art. 123, III, d, 4). Julgamento em primeira instância ofende a garantia do juiz competente (art. 5º, LIII). A decisão em grau de recurso não suprime o vício.14

Contudo, discute-se a possibilidade de este privilégio de foro abranger também os crimes dolosos contra a vida, tendo em vista a nor-ma da Constituição Federal que os atribui ao Tribunal do Júri.

Em 1981, o Plenário decidiu que

pode a Constituição do Estado-membro, com base no poder implícito que reconhece a este de atribuir a seus agentes políticos as mesmas prer-rogativas de função de natureza processual penal que a Constituição Fe-deral outorga aos seus que lhes são correspondentes, estabelecer que o

14 STF, HC 74125/PI, 2ª T., Rel. Min. Francisco Rezek, J. 03.09.1996, DJ 11.04.1997.

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foro por prerrogativa de função de deputado estadual é o Tribunal de Justiça do Estado, para todos os crimes de competência da Justiça desse Estado-membro, inclusive os dolosos contra a vida.15 (STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981)

Em decisão recente, relativa a dispositivo da Constituição da Para-íba que atribui foro privilegiado a Procurador do Estado, o STF decidiu que:

Embora seja permitido à Constituição de Estado-membro instituir foro es-pecial por prerrogativa de função (CF, art. 125, § 1º), ela não pode excluir a competência constitucional do Tribunal do Júri para o julgamento de crimes dolosos contra a vida (CF, art. 5º, XXXVIII, d), a não ser em relação aos agentes políticos correspondentes àqueles que a Constituição Fede-ral outorga tal privilégio. Com esse fundamento, o Tribunal, em face de habeas corpus impetrado em favor de procurador do Estado da Paraíba que fora condenado por crime de homicídio perante o Tribunal de Justiça Estadual em virtude de privilégio de foro, deferiu o pedido para anular o acórdão condenatório e o processo penal em que ele foi proferido, ab initio, determinando a devolução dos autos da ação penal à comarca de origem, por entender inaplicável aos crimes dolosos contra a vida atribuídos aos Procuradores do Estado a regra inscrita no art. 136, XII, da Constituição do Estado da Paraíba (“São assegurados ao Procurador do Estado: [...] XII – ser processado e julgado, originalmente, pelo Tribu-nal de Justiça do Estado, nos crimes comuns ou de responsabilidade”).16 (HC 78168/PB, Rel. Min. Néri da Silveira, J. 18.11.1998. Cf. Informativo STF 132)

O STF tem se manifestado neste sentido. Em 1981, o Plenário de-cidiu que

pode a Constituição do Estado-membro, com base no poder implícito que reconhece a este de atribuir a seus agentes políticos as mesmas prer-rogativas de função de natureza processual penal que a Constituição Fe-deral outorga aos seus que lhes são correspondentes, estabelecer que o foro por prerrogativa de função de deputado estadual é o Tribunal de Justiça do Estado, para todos os crimes de competência da Justiça desse Estado-membro, inclusive os dolosos contra a vida.17 (STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981)

15 STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981.16 HC 78168/PB, Rel. Min. Néri da Silveira, J. 18.11.1998. Cf. Informativo STF 132.17 STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981.

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Do voto do relator, Ministro Moreira Alves, extrai-se o seguinte trecho:

Essa extensão aos crimes dolosos contra a vida se impõe pela própria natureza do poder implícito que se reconhece ao Estado-membro de atri-buir aos seus agentes políticos as mesmas prerrogativas de função de natureza processual penal que a Constituição Federal outorga aos seus que lhe são correspondentes, não obstante não tenha o Estado-membro competência para legislar sobre processo penal. E se – como sucede no caso – a prerrogativa de função estabelecida na Constituição Fede-ral se sobrepõe à garantia individual do julgamento pelo Júri, o mesmo tem que ocorrer na esfera estadual que se adstringe ao modelo federal de modo integral, desde que circunscrito no âmbito dos poderes esta-duais constituídos.18 (STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981)

Em seu voto, o Ministro Cordeiro Guerra resumiu bem a posição da Corte:

A questão que se apresenta é saber se a Constituição Estadual, ao dar o foro do Tribunal de Justiça, é incompatível com o foro privativo do júri para julgamento dos crimes dolosos contra a vida. O Relator, seguido pelos demais ministros, entende que é perfeitamente compatível, e deve prevalecer a competência do Tribunal de Justiça, atendendo a que, como disse Pimenta Bueno, o foro especial visa a proteger a própria instituição parlamentar ou funções exercidas pelo titular do cargo. Acompanho S. Exa., mesmo porque o foro privativo do júri é uma garantia instituída no interesse individual, e, no caso, é o próprio deputado quem abre mão das garantias, para postular foro especial em defesa de suas prerrogativas, por considerá-lo mais isento e tranquilo para julgamento do crime que lhe é imputado.19 (STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981)

O STF adota, como era de se esperar, posição constitucionalista como ao julgar habeas corpus impetrado em favor de secretário de se-gurança pública do Distrito Federal que estava sendo processado por homicídio. Na ocasião, chegou a afastar norma local que, ao enunciar a competência originária do Tribunal de Justiça, ressalvava a do tribunal do júri. O Plenário do STF decidiu, no caso, que

18 Idem.19 Idem.

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deve prevalecer, como foro especial decorrente de prerrogativa de fun-ção, a competência originária do Tribunal de Justiça, em correspondên-cia com o disposto na Constituição Federal relativamente aos Minis-tros de Estado.20 (STF, HC 65132/DF, Pleno, Rel. Min. Octávio Gallotti, J. 12.08.1987, DJ 04.09.1987)

Essa decisão reflete claramente que o Supremo Tribunal Federal deixa claro que a Constituição Federal já estabelece, de forma clara, a competência dos Tribunais de Justiça e o instituto do Tribunal do Júri para julgar crimes decorrentes do cargo e os comuns de representantes do executivo e legislativos municipais.

Ressalte-se, da primeira oração do trecho supratranscrito, que o STF continua admitindo a exclusão do Tribunal do Júri quando se tratar de agentes políticos correspondentes àqueles que a Constituição Federal outorga privilégio semelhante. No caso acima, só foi admitida a compe-tência do Tribunal do Júri por não ser o caso do Procurador de Estado reprodução de norma análoga da Constituição Federal, uma vez que os advogados da União não dispõem de privilégio de foro.

Também o Superior Tribunal de Justiça já teve oportunidade de afirmar que

o foro especial por prerrogativa funcional não é privilégio pessoal do seu detentor, mas garantia necessária ao pleno exercício de funções públi-cas, típicas do Estado Democrático de Direito: é técnica de proteção da pessoa que o detém, em face de dispositivo da Carta Magna, significando que o titular se submete a investigação, processo e julgamento por órgão judicial previamente designado, não se confundindo, de forma alguma, com a ideia de impunidade do agente.21 (STJ, HC 99.773/RJ, 5ª T., Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho)

Logo, é pacífico o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Por exemplo, no julgamento do Habeas Corpus nº 91437, o Supremo Tribunal Federal lembrou a lição do Minis-tro Victor Nunes Leal de que

a jurisdição especial, como prerrogativa de certas funções públicas, é re-almente instituída não no interesse pessoal do ocupante do cargo, mas no interesse público do seu bom exercício, isto é, do seu exercício com alto

20 STF, HC 65132/DF, Pleno, Rel. Min. Octávio Gallotti, J. 12.08.1987, DJ 04.09.1987.21 STJ, HC 99.773/RJ, 5ª T., Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho.

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grau de independência que resulta da certeza de que seus atos venham a ser julgados com plenas garantias e completa imparcialidade. Presume o legislador que os tribunais de maior categoria tenham mais isenção para julgar os ocupantes de determinadas funções públicas, por sua capacida-de de resistir, seja à eventual influência do acusado, seja às influências que atuarem contra ele. A presumida independência do tribunal de supe-rior hierarquia é, pois, uma garantia bilateral – garantia contra e a favor do acusado.22 (STF, HC 91437, Rel. Min. Cezar Peluso)

Também no julgamento da Questão de Ordem levantada no In-quérito nº 2.010/SP, o Ministro Marco Aurélio salientou que “a prer-rogativa de foro não visa a beneficiar o cidadão, mas proteger o cargo ocupado”.

Logo, o STF entende que tanto nos privilégios de foro instituídos pela Constituição Federal, quanto nos baseados em norma da Consti-tuição Estadual que reproduza em seu âmbito norma da Constituição Federal, não há ressalva implícita da competência do Tribunal do Júri.

Assim, se a Constituição Estadual conceder foro privilegiado ao vice-governador, aos deputados estaduais ou aos secretários de Estado, estes não se sujeitarão à ressalva da competência do Tribunal do Júri, por analogia com o art. 102 da Constituição Federal. Da mesma forma, as correspondentes autoridades municipais, se forem igualmente referidas na Constituição Estadual: o vice-prefeito, os vereadores e os secretários municipais.

7 POSIÇÃO DOUTRINÁRIA

Há certa dissonância entre a posição adotada pelo STF, ou de al-guns de seus ministros, ou mesmo do Plenário, e a interpretação doutri-nária, como Júlio Fabbrini Mirabete:

Gozando o autor de crime doloso contra a vida de foro por prerrogativa de função estabelecido na Constituição Federal, a competência para pro-cessá-lo e julgá-lo será deste foro especial e não do júri, já que a própria Carta Magna estabelece a exceção à competência do Tribunal Popular. Entretanto, se foro especial for estabelecido pela Constituição Estadual, por lei processual ou de organização judiciária, o autor de crime doloso contra a vida deve ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri,

22 STF, HC 91437, Rel. Min. Cezar Peluso.

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uma vez que tais preceitos jurídicos não podem excluir a competência instituída pela Carta Magna.23

Nesse sentido, cita julgados antigos (anteriores a 1975) do STF: RTJ 14/63, 66/818, 67/579.

Mas não parece ser esta a posição hodierna do STF.

A maioria dos doutrinadores constitucionais tem a seguinte posi-ção, como Júlio Fabbrini Mirabete.

A Constituição Federal deixou claras as situações de normatização do foro por prerrogativa de função para certas autoridades estaduais e municipais.

Já para Maria Lúcia Karam, não há

propriamente uma prerrogativa, operando o exercício da função decor-rente do cargo ocupado pela parte como o fator determinante da atribui-ção da competência aos órgãos jurisdicionais superiores, não em consi-deração à pessoa, mas ao cargo ocupado.24 (Maria Lucia Karam)

Tourinho Filho diz que, enquanto

o privilégio decorre de benefício à pessoa, a prerrogativa envolve a fun-ção. Quando a Constituição proíbe o “foro privilegiado”, ela está ve-dando o privilégio em razão das qualidades pessoais, atributos de nasci-mento... Não é pelo fato de alguém ser filho ou neto de Barão que deva ser julgado por um juízo especial, como acontece na Espanha, em que se leva em conta, muitas vezes, a posição social do agente.25 (Tourinho Filho)

Assim, o STJ julgará os governadores, os desembargadores de Tri-bunais de Justiça, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal e dos Conselhos e Tribunais de Contas dos Municí-pios (art. 102 da CF); o Tribunal de Justiça julgará os juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, bem como os respectivos membros do Ministério Público (art. 96 da CF), bem como o Prefeito Municipal (art. 29 da CF).

23 MIRABETTE, Júlio Fabbrini. Direito constitucional. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 102-3.24 KARAM, Maria Lucia. Liberdade, presunção de inocência e direito à defesa. São Paulo: Lummens, 2010.25 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2014. p. 443.

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Logo, nesses casos, não há dúvida de que, como a Constituição não ressalva a competência do júri para os crimes dolosos contra a vida, também neles haverá privilégio de foro. Contudo, se a Constituição Fe-deral quisesse fazer o mesmo para outras autoridades estaduais e muni-cipais, teria assim feito expressamente.

No mais, sendo a norma do Tribunal do Júri norma disposta cla-ramente como direito e dever fundamentais e cláusula pétrea, em seu art. 5º, pode ser afastada somente por norma de igual hierarquia que a excepcione, jamais por norma de hierarquia inferior, seja de Constitui-ção Estadual, de lei federal ou estadual. O Tribunal do Júri não é um direito subjetivo do acusado, renunciável: é um direito de cada membro da sociedade, de julgar diretamente os acusados de crimes dolosos con-tra a vida.

Não é possível qualquer tentativa de excepcionar sua competên-cia além do já previsto na Constituição Federal, havendo ainda as proibi-ções inerentes das normas de direitos fundamentais e clausulas pétreas.

Controvérsias sobre o foro por prerrogativa de função

Atualmente, no Brasil, existe um acirrado debate, tanto no âmbito da academia quanto no corpo da sociedade civil, sobre os méritos do instituto do foro por prerrogativa de função, o chamado “foro privilegia-do”. Esse debate levou a diversas propostas no Congresso Nacional bra-sileiro para acabar com o instituto, especialmente após as manifestações no Brasil em 2013.

7.1 ARgumEnTOS fAVORáVEIS

Os argumentos daqueles que são favoráveis ao instituto do foro, ou que consideram que a mudança nessas regras de competência pouco afetaria a ocorrência de possíveis crimes nos altos escalões da república, concentram-se na duração do processo e na possibilidade de maiores pressões de natureza política e econômica nos julgamentos de primeiro grau.

Cláudio Weber Abramo, da ONG Transparência Brasil, diz que a possibilidade de recorrer a outras instâncias tornaria as condenações mais difíceis do que já são, já que, quanto mais alta a Corte, maior a

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sua eficiência no sistema judiciário brasileiro26 (Disponível em: <www.revistaforum.com.br/mariafro/2012/12/10/35471/>).

No mesmo sentido, Marcelo Figueiredo, ex-diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP, afirma que o fim do instituto só faria sentido se fossem garantidas condições de execução mais rápida das sentenças de primeiro grau.

Assim, também, David Rechulski, advogado especialista em di-reito penal, que acredita que o fim do foro especial por prerrogativa de função poderia aumentar a sensação de impunidade, já que os pro-cessos demorariam mais tempo27 (Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/sem-foro-privilegiado-impunidade-cresce-avaliam-especia-listas-9022096>).

Por outro lado, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes argumenta, em artigo publicado pelo jornal Folha de S. Paulo, que o foro especial não é um privilégio porque ele piora a situação do réu: pessoas não sujeitas ao instituto podem ter três ou até quatro revi-sões da primeira decisão; aqueles julgados pelo STF não podem recorrer a ninguém. Além disso, o debate é maniqueísta e hipócrita porque não percebe que o problema não é o instituto em si, mas a conjuntura do sistema judicial brasileiro. No fim, perigo maior do que a procrastinação dos processos seria a pressão e todo um jogo da pequena política nas menores comarcas brasileiras28 (Disponível em: <http://www.valor.com.br/politica/3759520/camara-entra-com-acao-no-stf-contra-julgamento--de-deputados-por-turmas>).

Com a mesma preocupação, o ex-Ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso, José Gregori, argumenta que, sem o foro por prerrogativa de função, teríamos mais possibilidades de influências e pressões políticas nos julgamentos29 (Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/sem-foro-privilegiado-impunidade-cresce-avaliam-es-pecialistas-9022096>).

26 Disponível em: <www.revistaforum.com.br/mariafro/2012/12/10/35471/>. Acesso em: 13 nov. 2013.27 Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/sem-foro-privilegiado-impunidade-cresce-avaliam-especialis-

tas-9022096>. Acesso em: 16 nov. 2014.28 Disponível em: <http://www.valor.com.br/politica/3759520/camara-entra-com-acao-no-stf-contra-julgamen-

to-de-deputados-por-turmas>. Acesso em: 16 nov. 2014.29 Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/sem-foro-privilegiado-impunidade-cresce-avaliam-especialis-

tas-9022096>. Acesso em: 13 nov. 2014.

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Também Reinaldo Azevedo acredita que o fim do instituto aumen-taria a chance de perseguição política e de venda de sentenças, já que são muitos os juízes de primeira instância e, portanto, mais difícil ficar atento a todos os casos.

7.2 ARgumEnTOS COnTRáRIOS

Para aqueles que são contrários à existência do foro por prerro-gativa de função, o principal argumento reside na incompatibilidade da estrutura dos tribunais de segundo grau, dos superiores, como do STF para fazer frente ao volume e ao tipo de trabalho gerado pelo instituto.

Assim, Luiz Guilherme Arcaro Conci, professor da Faculdade de Direito da PUC-SP, em artigo para a revista Carta Capital, acredita que a realização da instrução, a produção de provas, diretamente pelos tri-bunais de apelação ou por aqueles superiores, é problemática, porque estes órgãos não estão acostumados a realizá-la, já que, no sistema pro-cessual brasileiro, toda instrução é realizada nos juízos de primeira ins-tância, recebendo – os tribunais – o processo “pronto” para julgar. Logo, o julgamento pode tumultuar o funcionamento regular de um tribunal, dependendo do número de réus a serem julgados, o que pode ser verifi-cado no julgamento da “Ação Penal nº 470”, no STF. No mesmo sentido, Joaquim Barbosa, ministro do STF, entende que os tribunais superiores têm muitos outros processos para julgar, o que torna moroso o julgamen-to por essas instituições de uma ação penal30 (Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/sem-foro-privilegiado-impunidade-cresce-ava-liam-especialistas-9022096>).

O Professor de Direito Penal da Faculdade de Direito da Univer-sidade Federal de Minas Gerais, Túlio Vianna, em artigo para a Revista Fórum, concordando com este argumento, escreveu que a grande ques-tão do instituto não é quem julga, mas sim quem presidirá a instrução. A morosidade na coleta de provas, ou a sua coleta deficiente, ocasionada pela falta de estrutura dos tribunais de maior graduação para realizar essa tarefa, torna praticamente inviável qualquer condenação, já que, fa-talmente, ocorrerá a prescrição do crime. Ainda, critica a extensão do rol de autoridades submetidas a esse modo de determinação da competên-cia, o que não se justificaria em uma república: apenas a possibilidade

30 Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/sem-foro-privilegiado-impunidade-cresce-avaliam-especialis-tas-9022096>. Acesso em: 16 nov. 2014.

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de grande instabilidade política pode justificar o instituto, defendendo o autor a sua manutenção apenas no caso de crimes cometidos pelo Pre-sidente da República.

Neste sentido de limitação dessa regra, o ministro do STF Celso de Mello também defende o fim ou a limitação do instituto, de modo que ele atinja somente os chefes dos três poderes. Segundo ele, a estrutura da primeira instância permitiria um julgamento mais ágil dos processos31.

Também a Associação dos Magistrados Brasileiros32 posicionou--se pelo fim do foro especial, lançando campanha e um levantamento sobre o julgamento das ações penais iniciadas seguindo-se a regra da competência originária nos dois mais altos tribunais do Brasil. Segundo esse levantamento, os tribunais superiores recebem mais processos con-tra autoridades do que são capazes de julgar.

Apenas 4,6% das ações penais abertas no Supremo Tribunal Federal desde 1988 foram julgadas. No caso do Superior Tribunal de Justiça, o índice é ainda menor: 2,2%. Isto é, dos 130 processos desse tipo inicia-dos na mais alta Corte brasileira, seis foram concluídos, sendo que todos terminaram em absolvição dos réus. Treze deles, inclusive, prescreveram antes de ir a julgamento. No STJ, das 483 ações penais ajuizadas no mes-mo período, 16 foram julgadas. Houve condenação em cinco casos e ab-solvição em 11. Do total, 71 ações prescreveram antes do julgamento.33

CONCLUSÃO

A Constituição Federal deixou claras as situações de normatização do foro por prerrogativa de função para certas autoridades estaduais e municipais.

Assim, o STJ julgará os governadores, os desembargadores de Tri-bunais de Justiça, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal e dos Conselhos e Tribunais de Contas dos Municí-pios (art. 102 da CF); o Tribunal de Justiça julgará os juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, bem como os respectivos membros

31 Disponível em: <http://www.osconstitucionalistas.com.br/celso-de-mello-defende-fim-do-foro-privilegiado>. Acesso em: 16 nov. 2014.

32 Disponível em: <http://cc.bingj.com/cache.aspx?q=associa%C3%A7%C3%A3o+dos+magistrados+brasi -leiros+estat%C3%ADstica+foro+privilegiado&d=4843612096769204&mkt=pt-BR&setlang=pt-BR&w=MmOyjl1oGX6anualprsbysmmZ1jtTsRc>. Acesso em: 16 nov. 2014.

33 Idem.

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do Ministério Público (art. 96 da CF), bem como o Prefeito Municipal (art. 29 da CF).

Logo, nesses casos, não há dúvida de que, como a Constituição não ressalva a competência do júri para os crimes dolosos contra a vida, também neles haverá privilégio de foro. Contudo, se a Constituição Fe-deral quisesse fazer o mesmo para outras autoridades estaduais e muni-cipais, teria assim feito expressamente.

No mais, sendo a norma do Tribunal do Júri norma da Lei Maior da Nação, pode ser afastada somente por norma de igual hierarquia que a excepcione, jamais por norma de hierarquia inferior, seja de Consti-tuição Estadual, de lei federal ou estadual. O Tribunal do Júri não é um direito subjetivo do acusado, renunciável: é um direito de cada membro da sociedade, de julgar diretamente os acusados de crimes dolosos con-tra a vida. Somos que constitui burla à Carta Magna qualquer tentativa de excepcionar sua competência além do já previsto na Constituição Federal.

Além do que não há que se confundir foro por prerrogativa de função e foro privilegiado, o que causa confusão de interpretação e que vem desde a Idade Média, onde membros do clero e da nobreza real-mente possuíam privilégios como também passam a existir diferenças processuais (como uma hierarquia entre as testemunhas: a palavra do nobre valia mais que a palavra do homem comum) e tribunais ou foros especiais para certas classes, estabelecendo o princípio do julgamen-to pelos pares: nobres julgavam nobres e clérigos julgavam clérigos34 (Belém, 2008, p. 31-37).

O que existiu, advindo dessa prática, no Brasil, onde várias cate-gorias adquiriram privilégios (não só de foro) nas ordenações, como os “letrados” e outros funcionários reais de menor escalão. Essas ordena-ções foram aplicadas no Brasil Colônia ficando em vigor até a edição dos primeiros códigos brasileiros durante o Império, em fins do sécu-lo XIX, e na República Velha, no início do século XX35 (Belém, 2008, p. 55-67).

Tal prática somente deixou de existir com a Constituição brasileira do Império – claramente inspirada em outros diplomas liberais, expan-

34 BELÉM, Orlando Carlos Neves. Do foro privilegiado à prerrogativa de função. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008.

35 Idem.

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diu grandemente o uso da prerrogativa de função como modo de defi-nir o foro. Inicialmente, a Assembleia Constituinte de 1823 era pratica-mente dominada por elementos liberais que queriam uma Monarquia constitucional limitada. Entretanto, isto se chocou com a vontade do im-perador e a estrutura predominante no Brasil, senhorial e escravocrata. Com a dissolução da Assembleia e a outorga de uma Constituição pelo Imperador, surpreende a manutenção do fim dos privilégios de natureza pessoal, deixando apenas aqueles de natureza real (prerrogativas), isto é, aqueles relativos à res, às coisas (referindo-se aos cargos)36.

Art. 179. A inviolabilidade dos direitos civis, e políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Império, pela maneira se-guinte:

§ 16. Ficam abolidos todos os Privilégios, que não forem essencial, e inteiramente legados aos Cargos, por utilidade pública.

§ 17. A excepção das Causas, que por sua natureza pertencem a Juízos particulares, na conformidade das Leis, não haverá Foro privilegiado, nem Commissões especiaes nas Causas cíveis, ou crimes.

Logo, vê-se que o foro por prerrogativa de função não está rela-cionado a privilégios de qualquer espécie, e que a sua evolução reflete o verdadeiro espírito da democracia adotado na Constituição Federal de 1988.

REFERÊNCIASCONSTITUIÇÃO FEDERAL comentada pelo Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp>. Acesso em: 5 nov. 2014.

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BELÉM, Orlando Carlos Neves. Do foro privilegiado a prerrogativa de função. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008.

DISPONÍVEL EM: <www.revistaforum.com.br/mariafro/2012/12/10/35471/>. Acesso em: 13 nov. 2013.

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36 Belém, 2008, p. 114-120.

72 �������������������������������������������������������������������������������������������������������������� RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – PARTE GERAL – DOUTRINA

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GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Critérios para fixação de competência penal sob o prisma constitucional. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 277, 2010.

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HC 78168/PB, Rel. Min. Néri da Silveira, J. 18.11.1998. Cf. Informativo STF 132.

STF, HC 58410/RJ, Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, J. 18.03.1981, DJ 15.05.1981.

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TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2014.

WOLKMER, Antonio Carlos. Fundamentos da história do Direito. 4. ed. Rio de Janeiro: Del Rey, 2006.

Parte Geral – Doutrina

O Federalismo Brasileiro na Constituição de 19881

LEONARDO CARVALHO RANGELMestrando em Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Professor Livre‑Docente Luiz Alberto David Araujo.

Resumo: Este artigo apresenta um estudo sobre as características fundamentais do federalismo a partir de uma perspectiva histórica e crítica da ordem constitucional brasileira, com vistas a explicitar a forma da divisão do poder político pela repartição de competências imposta pela Constituição de 1988.

PALAVRAS‑CHAVE: Federalismo; repartição de competências; Constituição de 1988.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Conceitos fundamentais do federalismo; 1.1 Conceito de Estado; 1.2 Formas de Estado; 1.3 Estado Federal; 1.3.1 As origens e a evolução do Estado Federal; 1.3.2 Características fundamentais do Estado Federal; 1.3.2.1 Existência de uma Constituição Federal; 1.3.2.2 Soberania do Estado Federal e autonomia dos Estados‑membros; 1.3.2.3 Indissolubilidade do vínculo federativo; 1.3.2.4 Repartição constitucional de competências e rendas; 1.3.2.5 Formas de participação dos Estados‑membros na elaboração da norma geral; 2 O federalismo brasileiro; 2.1 Origem do federalismo brasileiro: o período monárquico e os antecedentes da proclamação da República; 2.2 Égide da Constituição da República de 1891; 2.3 Égide da Constituição da República de 1934; 2.4 Égide da Constituição da República de 1937; 2.5 Égide da Constituição da República de 1946; 2.6 Égide da Constituição da República de 1967 e Emenda Constitucional nº 1, de 1969; 2.7 Égide da Constituição da República de 1988; 2.7.1 Características principais; 2.7.2 Pontos tra‑zidos pela nova ordem constitucional de destaque no arranjo federativo: municipalismo, repartição constitucional de rendas e constitucionalização das regiões e consórcios públicos; 2.7.3 Repartição de competências na Constituição de 1988; 3 Considerações gerais sobre o federalismo brasileiro: crítica e possível horizonte de repactuação federativa; Referências.

INTRODUÇÃO

O objetivo deste artigo é explicitar as características fundamentais do federalismo a partir de uma perspectiva histórica da ordem constitu-cional brasileira.

Em um primeiro momento, elege-se o federalismo como plano principal de análise, na busca de seu conceito, suas origens e suas ca-racterísticas fundamentais, com destaque para a enumeração, a classifi-cação e as técnicas de repartição das competências constitucionais.

1 Este artigo faz parte da dissertação de mestrado intitulada “Federalismo e educação: repartição de competên-cias à luz da Constituição brasileira de 1988”.

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Como desdobramento do estudo realizado na primeira etapa, a análise exposta na segunda parte do artigo concentra-se na forma de divisão do poder político dentro do Estado federal brasileiro, seguindo--se, para tanto, um panorama histórico e crítico do plano constitucional desde o Império até os dias atuais.

1 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO FEDERALISMO

1.1 COnCEITO DE ESTADO

Uma vez descrito o propósito do presente estudo, circunscrito à forma de organização do Estado brasileiro – por meio da repartição de competências constitucionais –, é preciso primeiramente assentar o con-ceito de Estado na contemporaneidade a partir de um recorte epistemo-lógico voltado ao campo da ciência jurídica.

Tal escolha metodológica, longe de renegar a existência de outros enfoques possíveis sobre a concepção do Estado (v.g., político, socioló-gico, histórico), visa a situar o objeto de estudo a partir do conjunto de regras que estruturam a organização do poder por meio de uma Consti-tuição2.

Ao analisar o conceito de Estado, Manoel Gonçalves Ferreira reco-nhece que a doutrina tradicional o trabalha a partir da conjugação dos elementos de (i) aglutinação humana (povo), (ii) alocação em determina-da base especial (território) e (iii) afirmação de autoridade não sujeita a qualquer outra (poder soberano)3.

Para Hans Kelsen, os três elementos caracteres fundamentais do Estado conduzem a sua completa identificação com a própria ordem ju-rídica, na medida em que resplandecem a vigência de uma ordem coer-citiva da conduta humana que deve se estruturar de modo relativamente organizado em um determinado espaço e tempo.

Kelsen destaca que “o Estado, cujos elementos essenciais são a população, o território e o poder, define-se como uma ordem jurídica relativamente centralizada, limitada no seu domínio espacial e temporal

2 Adota-se o conceito de Kelsen, para quem a Constituição representa o escalão mais elevado do direito positivo e representa o fundamento de validade para produção de todas as outras normas (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Baptista Machado. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 247).

3 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 50.

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de vigência, soberana ou imediata relativamente ao Direito internacio-nal e que é, globalmente ou de um modo geral, eficaz”4.

Uma vez projetado e acolhido o entendimento kelseniano sobre a concepção jurídica do Estado, o presente estudo volta sua análise às tipologias do Estado segundo o grau de descentralização político-ad-ministrativa reservado a um ou vários órgãos de governo dentro de um território, as chamadas formas de Estado.

1.2 fORmAS DE ESTADO

Os Estados podem ser classificados de acordo com o grau de des-centralização político-administrativa, ou seja, a partir de uma diferen-ciação entre modelos de organização estatal segundo uma escala de projeção do poder político dentro da esfera territorial5.

De acordo com o critério acima enunciado, é possível identificar duas formas ideais: o Estado Unitário e o Estado Federal6.

O Estado Unitário pode ser caracterizado pela concentração da atividade legiferante em um único polo de poder. Neste tipo, a produção de normas advém exclusivamente de um único órgão que atrai o mono-pólio da ordem jurídica, não se admitindo a existência de mecanismos governamentais autônomos e, por consequência, a sobreposição de or-dens parciais dentro de um mesmo território7.

Por sua vez, o Estado Federal é marcado pela repartição de po-deres autônomos dentro de um mesmo território, capaz de permitir, de forma harmônica, a coexistência de ordens jurídicas parciais e de uma ordem jurídica central. Em contraposição ao modelo unitarista, a cono-

4 Ob. cit., p. 321.5 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e

atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 324.6 A exemplo do que pondera Fernanda Dias Menezes de Almeida em sua obra Competências na Constituição

de 1988 (ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 10), o propósito do presente estudo não se volta ao aprofundamento das diferenças entre outros modelos de organização do Estado situados entre o espectro dual do unitarismo e do federalismo. Como destaca a autora, há quem reconheça o “Estado Regional”, exemplo da Itália e Espanha, ora como Estado Unitário, ora como Estado Federal, ora mesmo como categoria autônoma. Como afirma Ferreira Filho, a esses Estados “constitucionalmente descentralizados”, por exemplo, não é reservado o atributo de formação de uma ordem parcial interna autônoma, já que sua organização é submetida à aprovação de uma lei nacional (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 54).

7 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 325; SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 98; FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitu-cional. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 52.

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tação federalista pressupõe o reconhecimento de uma pluralidade de órgãos estatais com legitimidade para produção de normas tendentes à regulação do convício social.

1.3 ESTADO fEDERAL

1.3.1 As origens e a evolução do Estado Federal

A doutrina registra, de modo pacífico, que a feição moderna do Es-tado Federal encontra suas raízes na primeira década seguinte à procla-mação de independência das antigas treze colônias britânicas situadas na América do Norte8.

O surgimento do Estado Federal foi marcado por um intenso de-bate entre os emancipadores dos noveis Estados independentes que reu-nia, de um lado, defensores da estrutura confederativa (defesa da manu-tenção da soberania9 para cada uma das treze entidades), e, de outro, idealizadores da estrutura federalista (abdicação da soberania de cada Estado para construção de um único governo central que garantisse a autonomia10 dos Estados-membros).

Desde a proclamação da independência no ano de 1776 até a realização de Convenção de Filadélfia em 1787, os Estados Unidos da América experimentaram uma feição de organização confederativa que redundou em claro acirramento das críticas de fragilidade inerentes a este modelo.

No modelo confederativo, todos os Estados preservam sua sobera-nia, o que conduz – a exemplo das acontecimentos históricos atinentes às Confederações constituídas na Europa durante o século XVIII – ao imi-

8 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 325-226; SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 99; MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 929; ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 3-9; MACHADO HORTA, Raul. Problemas do federalismo. In: Perspectivas do federalismo brasilei-ro. Belo Horizonte: Universidade de Minas Gerais, 1958. p. 16-17.

9 Segundo Paulo Gustavo Gonet Branco, “soberania é entendida como poder de autodeterminação plena, não condicionado a nenhum outro poder, externo ou interno” (MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 930).

10 Ainda de acordo com os ensinamentos de Gonet Branco, “autonomia significa capacidade de autodetermi-nação dentro do círculo de competências traçado pelo poder soberano” (MENDES, Gilmar Ferreira; COE-LHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 930).

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nente risco de rompimento dos laços associativos a partir da conjugação de interesses ou sentimentos voláteis.

A par da instabilidade decorrente da iminência de rompimento dos vínculos associativos, as críticas ao sistema confederativo estaduni-dense estavam direcionadas, por exemplo, à possibilidade de revogação dos poderes delegados ao Congresso central, à ausência de competência legislativa da União aos cidadãos (ausência de sanção para o caso de descumprimento das leis nacionais), à ausência de provisionamento de recursos próprios para a União, à falta de um tribunal supremo do Poder Judiciário capaz de solucionar conflitos entre decisões das judicaturas dos Estados ou mesmo de interpretar leis de modo uniforme em última instância ou mesmo à inexistência de poder atribuído à União para re-gular o comércio exterior ou interestadual.

A conjunção de todos esses inconvenientes conduziu a uma revi-são completa da forma de organização dos treze Estados independentes que resultou na instituição de um modelo federalista anunciado já no preâmbulo da Constituição de 1787 nos seguintes moldes: “Nós, o povo dos Estados Unidos, a fim de formarmos uma União mais perfeita [...], instituímos e estabelecemos esta Constituição”.

Segundo preceitua Machado Horta11, o federalismo norte-ameri-cano revelou originariamente uma conotação dual, em que se criavam duas ordens jurídicas internas, marcadas pelas expressas ressalvas pre-vistas no texto constitucional relacionadas às limitações dos Estados--membros, as quais delimitam a reserva da matéria da União em prerro-gativas de soberania dantes conferidas aos antigos estados confederados.

O federalismo dual (ou segregador), portanto, estabelece uma rígida divisão (segregação) de competências entre os órgãos estaduais e centrais, de forma a delimitar, com maior clareza, a legitimidade do exercício do poder político dentro das escalas governamentais federa-das.

Após o advento das Guerras Mundiais, no entanto, principalmente a partir das experiências austríaca (Constituição de 1920) e alemã (Lei Fundamental de Bonn de 1949), Machado Horta anota uma tendência de flexibilização nas formas de repartição de competência entre União e Estados-membros, prevendo uma política legiferante a partir de um

11 MACHADO HORTA, Raul. Problemas do federalismo. In: Perspectivas do federalismo brasileiro. Belo Horizonte: Universidade de Minas Gerais, 1958. p. 16-17.

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maior contato intergovernamental regulado por minuciosa regulação constitucional prévia12.

Nesse sentido, a previsão da “legislação concorrente” no art. 74, I-23, da Lei Fundamental de Bonn trouxe a possibilidade de uma atua-ção integrada entre os poderes central e regionais, tornando-se um im-portante mecanismo do que posteriormente se convencionou chamar de federalismo cooperativo.

1.3.2 Características fundamentais do Estado Federal

1.3.2.1 Existência de uma Constituição Federal

A forma federalista de Estado pressupõe a existência de uma Cons-tituição escrita e rígida, capaz de delimitar as competências de cada ente federado dentro da estrutura de organização estatal, bem como assegu-rar o caráter à intangibilidade do pacto federativo.

Segundo preceitua Paulo Gustavo Gonet Branco, a Constituição “atua como fundamento de validade das ordens parciais e central”13, conferindo unidade jurídica do Estado Federal e, como bem salienta Fernanda Dias Menezes de Almeida14, consolidando “o compromisso entre os interesses da unidade nacional e da autonomia regional”.

1.3.2.2 Soberania do Estado Federal e autonomia dos Estados-membros

Partindo da premissa de que o exercício da soberania (poder de autodeterminação plena, não condicionada por nenhum outro poder ex-terno ou interno) é exclusivo do Estado federal15, aos Estados-membros de uma estrutura federativa deve ser assegurada ampla autonomia, ou seja, como bem destaca Almeida, “capacidade de autodeterminação dentro do círculo de competências traçado pelo poder soberano, que lhes garante auto-organização, autogoverno, autolegislação e autoadmi-

12 Idem, p. 17.13 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito

constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 931.14 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Atlas,

2007. p. 12.15 A soberania do Estado Federal redunda na afirmação de sua unidade nos planos internacional (unidade na

representação enquanto pessoa jurídica de direito internacional público, com única nacionalidade e único território) e interno (ordenamento jurídico federal válido em todo o território, existência de um tribunal federal competente para resolução de conflitos de competência e possibilidade de intervenção federal no caso de circunstâncias que comprometam a sobrevivência da Federação). Nesse sentido: FERREIRA FILHO. Ob. cit., p. 60-61.

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nistração, exercitáveis sem subordinação hierárquica dos Poderes esta-duais aos Poderes da União”16.

Como se observa, a preservação da autonomia dos entes federados resvala na garantia de auto-organização por meio de uma Constituição própria, fruto do exercício legítimo do Poder Constituinte Decorrente, capaz de garantir a vontade parcial do Estado-membro a partir de uma carta fundamental que encontre amplo apoio nos princípios da Carta Federal.

Gabriel Ivo, em mais uma obra dedicada ao tema do Poder Cons-tituinte Decorrente17, defende que o poder constituinte decorrente deve ser entendido como a competência para feitura das Constituições dos Estados-membros – subconjunto de normas locais vigentes para parcela do território e criadas por órgãos distintos do órgão central – delimitada pela Constituição de um Estado que garanta, como conteúdo das cláu-sulas pétreas, a intangibilidade de sua forma federativa.

A competência para a elaboração da Constituição Estadual, por-tanto, encontra seus próprios limites e comandos na Constituição Federal e deve pressupor observância e obediência aos preceitos estabelecidos pela Carta Federal, o que, como bem salienta o autor citado, não cor-responde à mera reprodução de dispositivos constantes na Constituição Maior.

A concepção sistemática do direito fundada na superioridade da Constituição Federal e o reconhecimento das múltiplas relações decor-rentes dos elementos constitucionais conduzem, portanto, à conclusão de que a extrapolação da competência para a elaboração da Consti-tuição Estadual atinge a globalidade de princípios fundantes da ordem jurídica nacional.

1.3.2.3 Indissolubilidade do vínculo federativo

Outra característica de destaque do Estado Federal é a indisso-lubilidade do vínculo associativo entre os entes federados, devendo a Constituição prever expressa proibição ao direito de secessão.

O traço impeditivo é revelador da distinção entre Federação e Confederação, vez que, na segunda forma de organização associativa,

16 Ob. cit., p. 11.17 IVO, Gabriel. Constituição Estadual: competência para elaboração da Constituição do Estado. São Paulo: Max

Limonad, 1997.

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os Estados possuem ampla liberdade para desligamento do vínculo se-gundo seus próprios interesses.

1.3.2.4 Repartição constitucional de competências e rendas

Como antes destacado, a primazia da Constituição na estruturação do pacto federativo revela a forma de repartição das competências entre os entes federados como medida garantidora da harmonização das tare-fas outorgadas a cada ente federado.

Segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, o conceito de compe-tência – que se mostra adequado ao presente estudo – abarca “o círculo compreensivo de plexo de deveres públicos a serem satisfeitos median-te o exercício de correlatos e demarcados poderes instrumentais”18, os quais, por sua vez, são legalmente conferidos para a satisfação dos inte-resses públicos.

Segundo esse mesmo autor, a competência revela as seguintes ca-racterísticas:

a) obrigatoriedade de exercício: órgãos e agentes públicos com atribuição específica devem obrigatoriamente exercê-la, des-de que presentes os requisitos necessários para tanto;

b) irrenunciabilidade: seu titular não pode renunciá-la, enquan-to subsistir sua atribuição para tanto;

c) vedação à transferência: não podem ser transacionadas, po-dendo, contudo, ser objeto de delegação, desde que autoriza-do por lei;

d) imodificabilidade: seus limites não podem ser suprimidas ou acrescidas por vontade de seu titular;

e) insuscetíveis de prescrição: mesmo sem utilização, não pere-cem em face do tempo.

Embora sob nomenclaturas distintas, a maioria da doutrina19 clas-sifica genericamente as competências em dois grandes grupos, de natu-rezas legislativa e material.

18 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 37.

19 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 339; BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 305; SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 480.

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O primeiro agrupamento – competências legislativas – representa uma forma de poder jurídico consistente na capacidade de criar normas jurídicas, de acordo com limites previamente definidos.

O segundo agrupamento – competências materiais – corresponde “ao poder-dever de realizações de índole político-administrativa, e não à capacidade legiferante”, como preceituam Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes20.

Tercio Sampaio Ferraz Junior21, no entanto, defende que as nor-mas de competência dizem respeito apenas à atividade legiferante, uma vez que as normas relativas à ação político-administrativa, tratada pela maioria da doutrina como competência material, integram, em verdade, as denominadas normas de conduta.

As normas de competência são permissivas e suas diretrizes criam um poder heterônomo, cujo exercício é restrito a determinados sujeitos, sendo intransferível mas delegável em determinadas situação. Enquan-to as normas de competência implicam relação de subordinação e sua violação afeta sua eficácia, provocando a nulidade dos atos decorrentes, as normas de conduta implicam relação de coordenação e sua violação implica responsabilidade.

As normas de competência enunciam condições necessárias para seu exercício e podem ser consideradas a partir (i) do sujeito qualificado para realizar o ato criador da norma (competência pessoal), (ii) do pro-cedimento de elaboração (competência procedimental) e (iii) do alcance da norma criada com relação a seus subordinados, em face do tema e situação dos quais ocupam (competência material).

Em obra dedicada ao tema, Fernanda Dias Menezes de Almeida22 empreende uma análise histórica do federalismo norte-americano com o intuito de demonstrar como o processo de formação de identidades políticas autônomas foi decisivo para o ideário de formação e indissolu-bilidade do pacto federal.

20 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 339.

21 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Competência tributária municipal. Revista de Direito Tributário, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 54, p. 163, 1990.

22 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

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Ao eleger como características fundantes do Estado Federal a au-tonomia dos Estados-membros e a supremacia constitucional, Fernanda de Almeida justifica seu interesse em revelar a forma como se estruturam as competências federativas no plano jurídico-formal, com destaque às experiências comparadas de harmonização e equilíbrio entre os núcleos autônomos de produção de ordens jurídicas parciais que se encontram amalgamadas pela vontade central.

Historicamente, os critérios de repartição de competências levam em conta o caráter implícito, com destaque para um rol taxativo de com-petências da União e a consideração das competências estaduais pelo critério residual ou vice-versa (poderes dos Estados-membros expressa-mente definidos e da União remanescentes).

Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho23, tais técnicas caracterizam a repartição horizontal, de caráter excludente entre os entes federados.

Com o advento da forma cooperativa do federalismo, ganham des-taque as formas de fixação de competências concorrentes (União a cargo de normas gerais e aos Estados as normas específicas) e comuns (atuação concomitante de todas as ordens jurídicas – parciais e geral – em sistema de cooperação), técnicas que correspondem a uma repartição vertical norteada pelo princípio da predominância do interesse24.

A par da divisão de competências, o sistema federativo pressupõe a repartição de rendas de forma a garantir a suficiência de recursos para cumprimento dos encargos constitucionais delimitados a cada ente fe-derado, sem o que a autonomia dos Estados-membros ficaria seriamente comprometida.

1.3.2.5 Formas de participação dos Estados-membros na elaboração da norma geral

Como último traço característico do Estado Federal, ressalta-se a garantia de participação efetiva dos Estados-membros nos processos de-cisórios atinentes à elaboração da norma geral.

Exemplo dessa garantia é articulação do Poder Legislativo federal em escala bicameral, com consideração da representatividade paritária dos Estados-membros no Senado Federal, bem como as normas que ga-

23 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 51.

24 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 328.

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rantem o direito das Assembleias dos Estados nos processos de reforma constitucional.

2 O FEDERALISMO BRASILEIRO

Uma vez analisado o conceito, as origens e os principais carac-teres de configuração do Estado Federal, cumpre examinar o processo histórico de formação do federalismo brasileiro para compreender sua estrutura atual, bem como os reflexos atinentes à repartição de compe-tências entre os entes federados.

2.1 ORIgEm DO fEDERALISmO bRASILEIRO: O pERíODO mOnáRquICO E OS AnTECEDEnTES DA pROCLAmAçÃO DA REpúbLICA

Durante o período monárquico, que, em sua maior parcela, esteve sob a égide da Constituição outorgada no ano de 1824, o país vivenciou uma estrutura unitária, em que não se admitia a existência de ordens jurídicas parcelares autônomas, na medida em que os representantes máximos dos governos provinciais eram diretamente escolhidos pelo Imperador, a quem era reservado o poder de removê-los, quando bem entendesse, nos termos do art. 165 da Constituição Imperial.

Paulo Bonavides e Paes de Andrade relatam o contexto contur-bado vivido no último quarto do século XIX que levou ao colapso do sistema monárquico, dando destaque a uma série de fatores que levaram à proclamação do governo republicano: (i) crise militar existente à épo-ca, desde a Guerra do Paraguai, agravada pela crise de autoridade da titularidade civil da Pasta de Guerra sobre os militares; (ii) reivindicação pela separação entre o Estado e a Igreja; (iii) a dissolução da Câmara dos Deputados, em 1868; (iv) a insatisfação com o Poder Moderador e sua interferência nas formações partidárias do segundo reinado; (vi) a insti-tuição do regime federativo, (vii) a reformulação do Conselho de Estado; (viii) a extinção a Guarda Nacional; (ix) o ensino livre; (x) a abolição da vitaliciedade do Senado25.

Diante da crise e do consequente colapso do sistema monárquico, o qual, como acima explanado, carregava feição predominantemente unitarista e centralizadora, pode-se concluir que a formatação do fe-deralismo brasileiro é confundida com o próprio advento do período

25 ANDRADE, Paulo Bonavides Paes de. História constitucional do Brasil. Brasília: Paz e Terra, 1989. p. 206-208.

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republicano, ultimado pelo ato de proclamação ocorrido na data de 15 de novembro de 1889, sob a espada e o brado do Marechal Manuel Deodoro da Fonseca.

A forma transplantada com que os republicanos brasileiros impu-seram a forma federativa no País, sem qualquer aderência ao plano his-tórico ou cultural de formação do federalismo nas treze colônias ingle-sas, foi objeto de crítica pela doutrina26.

Nessa esteira, Maria Garcia sinaliza a impropriedade na conside-ração do modelo norte-americano sem qualquer adaptação à realidade de distribuição do poder político na estrutura estatal brasileira, ao enun-ciar o surgimento de um regime descentralizado, à semelhança do norte--americano, muito embora através do “mero transplante inadequado do sistema federativo daquele país”27.

Nesse mesmo sentido, Luís Roberto Barroso destaca que:

A forma federalista adotada, inspirada no modelo norte-americano, ig-norou o passado unitário e centralizador do país. Recorreu-se ao mesmo critério de repartição de competências lá adotado, como se a União es-tivesse subitamente recebendo poderes expressos, delegados por Estados que antes fossem considerados independentes, numa ficção que beirava a utopia.28

Uma vez delimitado o contexto histórico de formação do federa-lismo na realidade política brasileira, de rigor a análise dos contornos conferidos pelas Constituições brasileiras vigentes durante o período re-publicano e que dizem respeito à organização e à distribuição do poder estatal entre a União e os demais entes federados.

2.2 égIDE DA COnSTITuIçÃO DA REpúbLICA DE 1891

Seguindo o vetor de afirmação federalista enunciado desde os bra-dos da proclamação do governo republicano, a Constituição de 1891 instaurou, de forma definitiva, o modelo capitalista, liberal, republicano e federativo dualista.

26 Nesse sentido: FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 35. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 55.

27 GARCIA, Maria. Proudhon hoje: uma retomada de ideias. A federação, a autogestão comunitária e o município no Brasil. Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 74, jan. 2011.

28 BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 15.

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Como preleciona Fernanda Dias Menezes de Almeida, a primeira Carta Política republicana ainda seguiu a técnica dual de repartição de competências, por critério horizontal, típica do federalismo clássico, re-servando à União as matérias expressamente previstas no texto constitu-cional (competências enumeradas) e aos Estados todos as demais (com-petências remanescentes)29.

O art. 34 elencou competências federais privativas, ao passo que o art. 65, § 2º, atribui aos Estados em geral todo e qualquer poder ou direito que lhes não for negado por cláusula expressa ou implicitamente contida nas cláusulas expressas da Constituição.

O art. 68 determinou que os Estados deveriam se organizar de forma a assegurar a autonomia dos Municípios em tudo quanto respeite ao seu peculiar interesse.

No que tange à repartição de rendas, a Constituição de 1891 pre-servou a repartição dual, especificando os tributos que caberiam privati-vamente à União (art. 7º) e aos Estados (art. 9º).

O Poder Legislativo permaneceu composto por duas casas: a Câ-mara dos Deputados e o Senado Federal, sendo fixado, portanto, o sis-tema legislativo bicameral, com um Senado representativo dos Estados--membros.

A revisão judicial e o modelo de organização do Judiciário, com a Suprema Corte e a Justiça Federal, denotavam novamente a marcante influência dos EUA30.

Durante sua vigência, a Carta de 1981 “recebeu única revisão constitucional, em 1926, para introduzir no texto clássico do constitu-cionalismo brasileiro as emendas decorrentes da reforma promovida no quatriênio do Presidente Artur Bernardes”31. Referida “reforma constitu-cional tratou de centralizar o poder, alterou as hipótese de intervenção federal, modificou o processo legislativo e criou a Justiça Federal”32.

29 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes. Competência na Constituição de 1988. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 32.

30 CLÈVE, Clèmerson Merlin. Declaração de inconstitucionalidade de dispositivo normativo em sede de juízo abstrato e efeitos sobre os atos singulares praticados sob sua égide. Revista de Direito Constitucional e Inter-nacional, v. 19, abr. 1997.

31 MACHADO HORTA, Raul. Direito constitucional. 5. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. p. 26. 32 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 18. ed.

São Paulo: Verbatim, 2014. p. 133.

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As alterações denotavam um aumento e uma concentração signifi-cativas dos poderes do Presidente da República33, a confirmar a patente e contumaz assimetria decorrente do processo de formação do federalis-mo brasileiro, constantemente marcado pelos privilégios conferidos ao Poder Executivo e à União em detrimento dos demais poderes e entes federativos.

2.3 égIDE DA COnSTITuIçÃO DA REpúbLICA DE 1934

Com a eclosão do movimento revolucionário de 1930 e a conse-quente instituição de um governo provisório capitaneado por Getúlio Vargas, chega ao fim o período reconhecido como Primeira República, dando início a um período de grandes instabilidades políticas marcadas por forte pressão popular, voltada à defesa da promulgação de uma nova Constituição, fato que só vem ocorrer no ano de 1934.

No dia 16 de julho de 1934, foi promulgada a nova Carta repu-blicana, marcada pelo ideário da democracia social em detrimento do liberalismo clássico, sob clara inspiração da Constituição de Weimar.

Apesar do curto período de vigência, a Constituição de 1934 con-tribuiu significativamente para a consolidação da democracia no Brasil, mantendo os princípios vetores fundamentais de organização estatal: a república, a federação, a divisão de poderes, o presidencialismo e o re-gime representativo34.

A seguir a tendência de concentração do poder da União já anun-ciada com a reforma constitucional de 1926, a Constituição de 1934 reservou ao poder central competências referentes à ordem econômica e social (arts. 5º e 6º)35.

Além de enumerar alguns poderes aos Estados, a Carta de 34 ainda conferiu-lhes poderes remanescentes, nos arts. 7º e 8º, e, também, tratou sobre os poderes concorrentes entre a União e Estados, reservando um espaço de maior autonomia aos Municípios por conta da previsão de competência própria para organização de seus serviços (art. 13).

33 FUHRMANN, Ítalo Roberto. Traços fundamentais da história Constitucional no Brasil – do Império à Constitui-ção da República de 1988. Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 84/2013, p. 7, jul. 2013.

34 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 81.35 Idem, p. 81.

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Percebe-se, portanto, que a Constituição de 1934 ultrapassa o cri-tério clássico de repartição de competências, baseado no critério hori-zontal e dual de repartição de competências, e reconhece uma esfera de competências legislativas concorrentes, a partir de um critério vertical que pressuponha a reserva das normas de caráter geral à União, lógica que se manteve, em linhas gerais, nas constituições posteriores.

As importantes alterações no âmbito do Poder Judiciário con-cernem à criação da Justiça Eleitoral (arts. 82 e 83), da Justiça Militar (arts. 84 ao 87) e da Justiça do Trabalho (art. 122).

2.4 égIDE DA COnSTITuIçÃO DA REpúbLICA DE 1937

Na data de 10 de novembro de 1937, em um período de grande agitação política e social marcada pela disputa do poder político entre grupos de diferentes matizes ideológicas, sob a justificativa de salvaguar-dar os interesses da nação, foi outorgada uma nova Constituição no País.

Com forte e inegável vertente autoritária, a Constituição de 1937 restaurou no País o Estado unitário descentralizado, embora tenha nomi-nalmente – e formalmente – preservado a estrutura federativa nos termos de seu art. 3º, acentuando ainda mais a concentração de poderes no Poder Executivo central, ao impor completa submissão dos Estados e Municípios aos interesses da União.

A União poderia criar territórios nos termos do art. 6º, desmembrar Estados nos termos do art. 5º, parágrafo único, intervir nos Estados e no-mear interventores nos termos do art. 9º.

O Poder Legislativo era, de acordo com o art. 39 da Constituição, composto pela Câmara dos Deputados e Conselho Federal, pelo Conse-lho de Economia Nacional e pelo Presidente da República. Todos esses entes formavam o Parlamento Nacional, órgão de caráter absolutamente figurativo, vez que nunca se revê notícia de uma reunião sequer durante todo o período de vigência da Carta de 1937.

2.5 égIDE DA COnSTITuIçÃO DA REpúbLICA DE 1946

Durante a vigência do período de vigência da Constituição de 1937, conhecido como Estado Novo, as disposições políticas e o re-gramento institucional negavam vigência aos princípios de liberdade e democracia.

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A quarta Assembleia Constituinte brasileira foi instalada em 2 de fevereiro de 1946, e nova Constituição da República foi promulgada em 18 de setembro de 1946.

Pinto Ferreira, por sua vez, identifica a predominância do ideário social democrata, de inspiração weimariana, na Carta de 194636:

De um modo geral, ela repetiu os pontos de vista essenciais existentes na Constituição de 1934. Não aderiu ao socialismo tampouco se manteve na linha rígida do individualismo. Inspirou-se na técnica da democracia social weimariana. Por isso mesmo regulou diversos problemas alusivos à ordem social e econômica, à família, educação e cultura, permitiu téc-nicas mais amplas de intervencionismo, procurou combater a força eco-nômica dos trustes e mesmo estendeu ao trabalhador rural as garantias dadas aos operários, embora nunca se aplicassem tais medidas em pro-veito do campesinato.

Se comparada com as constituições anteriores, a Carta de 1946 foi a que mais garantiu autonomia aos Estados e Municípios, com expressa previsão de eleições livres e diretas para seus representantes diretos e de coleta e distribuição de rendas entre os entes federados.

2.6 égIDE DA COnSTITuIçÃO DA REpúbLICA DE 1967 E EmEnDA COnSTITuCIOnAL nº 1, DE 1969

Após o movimento de resistência contra o governo do Presidente João Goulart, marcado pelas medidas adotadas nos dias 31 de março e 1º de abril de 1964 que culminaram na assunção do poder pelos milita-res, houve um acentuado processo de fortalecimento da União em detri-mento dos entes federados, iniciado com o Ato Institucional nº 1, de 9 de abril de 1964, fecundado com a edição do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, promulgação da Constituição de 1967 e ultima-do com os atos praticados durante a vigência da Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969.

Para José Afonso da Silva37, “a emenda só serviu como mecanis-mo de outorga, uma vez que verdadeiramente se promulgou texto in-tegralmente reformulado”. Assim, uma precária e já muito retocada Lei Maior acabou cedendo espaço ao que se tem, na prática, como uma nova Carta Constitucional, ainda mais centralizadora e ampliadora dos

36 FERREIRA, Pinto. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 60. 37 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 89.

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poderes administrativos e legislativos do Poder Executivo, servindo de fundamento de validade aos anos porvir do regime de militar.

Em junho de 1978, dentro de um propagandeado processo de gra-dual abertura política empreendida pelo governo Geisel, foram suspen-sas as medidas que cassaram direitos políticos com base no Ato Institu-cional nº 5, de 13 de dezembro de 1968.

Em 1985, após o Congresso Nacional rejeitar a proposta de emen-da constitucional que permitia o voto direto para os candidatos à Pre-sidência da República, Tancredo Neves foi eleito para o cargo máximo do Poder Executivo central de forma indireta, marcando a volta dos civis ao comando do Poder Executivo e o fim do período militar. Antes de as-sumir o cargo, entretanto, Tancredo Neves faleceu, assumindo seu vice, José Sarney, que foi o responsável pela convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

2.7 égIDE DA COnSTITuIçÃO DA REpúbLICA DE 1988

Após mais de um século do revoltoso período republicano, marca-do pela verificação movimentos favoráveis e contrários à estruturação à estruturação do federalismo, a Constituição da República de 1988 inau-gura um novo arranjo federativo que se propõe a destacar um processo de desconcentração de poderes e de conquista de direitos e garantias fundamentais que haviam sido suprimidos pela ordem constitucional pretérita.

2.7.1 Características principais

Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Junior38 apontam as seguintes características da estrutura federativa do Estado brasileiro instaurada pela nova ordem constitucional:

a) existência de quatro entidades federativas, União, Estados, Municípios e Distrito Federal, entes formadores do Estado brasileiro a partir de um amálgama indissolúvel, que pres-supõe competências próprias a cada um deles, atribuídas de forma vertical e horizontal, sejam exclusivas, privativas ou comuns e concorrentes, nos termos do arts. 1º, 18, 21 a 25 e 30;

38 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 19. ed. São Paulo: Verbatim, 2015. p. 338.

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b) repartição constitucional de rendas, que abrange os aspec-tos de competência tributária, consistente na possibilidade de criar e arrecadar tributos (arts. 145, 148, 149, 153 a 156), de limitações para o exercício desse poder (arts. 145 e 150), bem como de sistemas de participação de quotas em fundos que possuem caráter redistributivo entre os entes federados (art. 159, I, a e b, e art. 34, § 2º, I, II e III, do ADCT);

c) elaboração de Constituições Estaduais, que refletem o poder de auto-organização dos Estados-membros nos termos do art. 25, como exercício legítimo do Poder Constituinte Decor-rente por meio das Assembleias Legislativas. Aos Municípios, cumpre a elaboração de Leis Orgânicas, discutidas e aprova-das pelas Câmaras Municipais nos termos do art. 29;

d) rigidez constitucional, marcada pela adoção de processos le-gislativos diferenciados para modificação da Constituição nos termos do art. 60, sendo defeso qualquer deliberação tenden-te a abolir as matérias discriminadas pelos incisos do § 6º, do referido dispositivo, como, por exemplo, a forma federativa do Estado;

e) indissolubilidade do pacto federativo, princípio constitucio-nal positivado pelo art. 1º, caput, que determina a formação federal do Estado brasileiro a partir da união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal;

f) representação pelo Senado Federal, que garante aos Estados--membros e ao Distrito Federal uma representação igualitária, com eleição de três senadores para cada qual nos termos do art. 46, §1º;

g) proteção constitucional exercida por um órgão supremo da estrutura judiciária, o Supremo Tribunal Federal, a quem compete a guarda da Constituição, dirimindo conflitos entre União, Estados e Distrito Federal e exercendo o controle con-centrado de constitucionalidade nos termos do art. 102;

h) intervenção nos Estados-membros e nos Municípios, nos ter-mos dos arts. 34 e 35, para a proteção de princípios politica-mente conformadores do Estado brasileiro, os quais balizam a forma de Estado, a forma de governo e a organização político--administrativa em geral.

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2.7.2 Pontos trazidos pela nova ordem constitucional de destaque no arranjo federativo: municipalismo, repartição constitucional de rendas e constitucionalização das regiões e consórcios públicos

Dentre as muitas inovações introduzidas no sistema federativo pela Constituição de 1988, a projeção do Município enquanto partícipe indissociável da federação aparece, sem sombra de dúvidas, com maior destaque.

Os arts. 18, 29 e 30 da nova Constituição, ao inserirem o Municí-pio na organização político-administrativa da República Federativa do Brasil, reforçam enormemente o aspecto de juridicidade de sua autono-mia, de modo a romper com a tradição dual do federalismo brasileiro (relação entre Estados, Distrito Federal de um lado e União de outro) preconizada desde a Constituição de 1891.

Outro aspecto de relevo do arranjo federativo da nova ordem constitucional diz respeito aos mecanismos adotados para a repartição de rendas entre os diversos entes federados, calcada no pressuposto – e aqui se apresenta o nó górdio de sobrevivência e desenvolvimento do federalismo – de que a efetiva autonomia depende da previsão de recur-sos suficientes para que cada ente realize as competências que lhe foram expressamente outorgadas pela norma fundante do sistema.

Se comparadas com as ordens constitucionais anteriores, a égide da Carta republicana de 1988 representou inegável avanço – no que, por ora, não adentramos em juízo valorativo sobre o caráter de suficiência – com relação à repartição constitucional de rendas, haja vista o signifi-cativo incremento nas receitas municipais e estaduais e intensificação de receitas através de fundos de participação.

Outro passo inovador do texto de 1988, como destaca Paulo Bo-navides39, foi a constitucionalização administrativa das regiões, com pre-visão expressa no art. 43 da Constituição, que reconhece a possibilidade de a União articular sua ação em um mesmo complexo geoeconômico e social, visando ao desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais.

A constitucionalização da regionalização ainda ganhou relevo com a expressa previsão constitucional, reservando competência dos Estados para criação de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

39 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2014. p. 369-371.

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microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum, nos termos do art. 25, § 3º.

Por fim, ainda no intuito de fortalecimento dos arranjos aplicáveis à lógica do federalismo cooperativo, houve expressa previsão da criação de consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, de forma a autorizar a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos nos termos do art. 241, com a redação já conferida pela Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998.

2.7.3 Repartição de competências na Constituição de 1988

Para Fernanda Dias Menezes de Almeida, em obra já referencia-da40, o sistema de repartição de competências adotado pela Constituição de 1988 pode ser entendido pela divisão entre os critérios horizontal (competências privativas dos entes federativos nos planos material e le-giferante) e vertical (competências concorrentes existentes nos planos material comum, legiferante concorrente e suplementar).

A cada ente foram distribuídas competências próprias, de natureza legislativa ou material, caso das competências privativas da União pre-vistas nos arts. 21 e 22 e das matérias que ficaram sob responsabilidade dos Estados e dos Municípios, nos termos dos arts. 25 e 30, respecti-vamente. Tais tarefas, por sua vez, foram aplicadas em cumulação ao Distrito Federal por força do art. 32, § 2º.

O art. 23 reservou uma série de matérias que devem ser objeto de realização conjunta por parte de todos os entes federados (União, Esta-dos, Distrito Federal e Municípios), ao passo que o art. 24 reserva ma-térias de competência concorrente da União, Estados e Distrito Federal.

Tendo em vista o quanto já exposto acima, as competências po-dem ser identificadas a partir de duas espécies fundamentais: competên-cias materiais e competências legislativas.

Diante da realidade normativa brasileira imposta pela Carta repu-blicana de 1988, no entanto, é possível acrescer à aludida classificação

40 ALMEIDA, Fernanda Dias Menezes de. Competências na Constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007.

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critérios quanto à forma, conteúdo, extensão e origem das competências constitucionais, seguindo a doutrina de José Afonso da Silva41.

Quanto à forma, podem-se dividir as competências entre (i) enu-meradas ou expressas, que são atribuídas de forma direta a uma pessoa política ou órgão (exemplo dos arts. 21, 22, 25, § 2º, e 30); (ii) reser-vadas, remanescentes ou residuais, que são relacionadas a atividades materiais ou legislativas não enumeradas (arts. 22, parágrafo único, 23 e 24); e (iii) implícitas ou resultantes, instrumentais decorrentes da neces-sidade de cumprimento dos poderes expressos ou reservados.

Quanto ao conteúdo, pode-se falar em competências de cunho (i) econômico, (ii) social, (iii) político-administrativo, (iv) tributária ou (v) internacional.

No que tange à extensão, distribuem-se as competências em: (i) ex-clusivas, que não podem ser objeto de delegação (art. 21); (ii) privativas, que podem ser objeto de delegação desde que expressamente previsto para questões específicas (art. 22, parágrafo único); (iii) comuns, que implicam a possibilidade de realização de determinada atividade por várias pessoas ou órgãos cumulativamente (art. 23); (iv) concorrentes, que pressupõem possibilidade de disposição de uma mesma matéria por diferentes entes, desde que preservada a primazia da União no que se refere à fixação de normas gerais, podendo, de acordo com Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano42, serem próprias – quando expressamente previstas (art. 24, §§ 1º e 2º) –, ou impróprias – quando implícitas na de-finição de competências comuns e necessárias a sua consecução; e, por fim, (v) suplementar, consistente na possibilidade de produzir normas como desdobramento do conteúdo já reservado a outro ente (art. 30, II).

Por fim, quanto à origem, as competências podem ser classificadas como: (i) originárias, atribuídas em caráter primário a uma determinada pessoa ou órgão; (ii) delegada, decorrente da transferência do exercício a outra pessoa ou órgão, desde que dentro dos limites e condições pre-vistos em lei.

À guisa de conclusão, considerados os aspectos gerais do federa-lismo e específicos da ordem constitucional brasileira vigente, verifica-

41 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 479-482.

42 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 17. ed. rev. e atual. São Paulo: Verbatim, 2013. p. 340.

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-se que o modelo federalista brasileiro delimitado pela Constituição da República de 1988 deve ser enquadrado dentro da estrutura do chama-do federalismo cooperativo, na medida em que permite a divisão de competências entre os entes federados pelos critérios horizontal (compe-tências exclusivas e privativas dos entes federativos nos planos material e legiferante – arts. 21, 22, 25, §§ 1º a 3º, 30, I) e vertical (competências concorrentes existentes nos planos material comum, legiferante concor-rente e suplementar – arts. 24, §§ 2º a 4º, 30, II).

3 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O FEDERALISMO BRASILEIRO: CRÍTICA E POSSÍVEL HORIZONTE DE REPACTUAÇÃO FEDERATIVA

Uma vez delimitada a formatação da organização estatal dentro dos moldes estabelecidos pela Constituição de 1988, oportuno consi-derar, a partir de um juízo de criticidade, o arranjo federativo brasileiro atual, bem como as propostas que se apresentam como alternativa à repactuação do modelo de repartição de competências e rendas consti-tucionais.

Nesse giro de análise, válido destacar a posição de Dinorá Adelai-de Musetti Grotti quanto à necessidade de estruturação do federalismo brasileiro a partir do vetor matriz da descentralização, que seja capaz de atender peculiaridades a partir da consideração dos níveis de complexi-dade, amplitude e generalização de cada esfera governamental. A autora defende que

[...] as relações entre as diversas instâncias deverão guiar-se pelo princí-pio da subsidiariedade inspirado na Constituição alemã, que preceitua que sempre que uma certa função puder ser exercida pela instância in-ferior, não deverá ser assumida pela que está acima. Ou seja, o governo federal não deve arcar com responsabilidades que os Estados estão pre-parados para desempenhar a contento; estes não deverão exercer fun-ções que o município seja capaz de exercer. Em outros termos, deve-se afastar a União de tarefas locais, cometendo-se aos Estados e Municípios.

Fernanda Dias Menezes de Almeida, ao concluir seu estudo sobre as competências federativas na Constituição de 198843, expõe critica-mente que, muito embora o texto constitucional de 1988 tenha avan-çado na conquista de maior equilíbrio entre as relações federativas com

43 Ob. cit.

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a elevação do Município ao patamar de autonomia na capacidade de auto-organização que lhe foi deferida, o constituinte não: (i) explicitou, de forma clara, de que forma se daria a suplementariedade legislativa no campo das competências concorrentes; (ii) abandonou a política de con-fluência centralista ao delimitar amplo plexo de competências privativas da União em hipóteses em que a guarda de especificidade às realidades regionais ou locais seria de maior utilidade; (iii) permitiu a delegação desigual de competências entre Estados, o que permitira desejável fle-xibilização para atender com maior atenção as disparidades estaduais.

Nessa mesma linha de raciocínio apresentada pelas autoras acima citadas, mesmo que reconhecido o avanço do arranjo federativo con-ferido pela Constituição republicana de 1988, nota-se que o passado centralizador e unitarista que marca a configuração do Estado brasileiro ainda revela grande impacto nos dias atuais e dá margem a uma grande assimetria na configuração de uma estrutura federativa em que a União é responsável por mais de 70% da arrecadação total tributária e reserva as principais competências legislativas em matérias de interesse público.

Nesses termos, a discussão sobre a necessidade de uma repac-tuação federativa ganha força, merecendo destaque a iniciativa recente adotada por quatorze Presidentes de Assembleias Legislativas (Amapá, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e São Paulo) e pelo Presidente da Câmara Legislativa do Distrito Federal no sentido de encaminhar uma proposta de emenda constitucional às Mesas da Câma-ra dos Deputados e do Senado Federal para, com fundamento no art. 60, § 3º, da Constituição da República, propor a alteração dos arts. 22, 24, 61 e 220 da Constituição Federal.

A Proposta de Emenda à Constituição nº 47, de 2012, atualmente em trâmite na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, após relatório e substitutivo apresentado pelo Senador Anto-nio Anastasia, procura retirar da competência legislativa da União (no art. 22) as normas sobre direito processual e agrário, bem como sobre licitações e contratos, propaganda comercial e trânsito e transporte, que passam a ser de competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal (art. 24).

No mais, a proposta acrescenta como matéria de competência concorrente (no inciso XII do art. 24) a assistência social, altera a reda-

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ção dos §§ 2º e 3º do art. 24, para definir que as normas gerais sobre as matérias de competência concorrente, a ser editadas pela União, res-tringem-se a princípios, diretrizes e institutos jurídicos e que aos Estados e ao Distrito Federal compete suplementar as normas gerais no que for de predominante interesse regional, renumerando os atuais §§ 3º e 4º, que passam a ser 4º e 5º, retira do texto constitucional a referência a diretrizes e bases da educação nacional (art. 22, XXIV) como compe-tência privativa da União e inclui novo parágrafo (que passa a ser o 2º, renumerando o atual 2º como 3º) no art. 61, para permitir à maioria dos membros das Casas do Congresso Nacional apresentar projeto de lei que verse sobre matéria de iniciativa privativa do Presidente da República, exceto quanto à organização interna do Poder Executivo e matéria or-çamentária.

Iniciativas como essa demonstram a dinamicidade do debate ju-rídico e político acerca da necessidade de estabelecimento de um novo pacto federativo que possa efetivamente contemplar as necessidades de atendimento das tarefas locais e regionais, abarcando hipóteses em que a guarda de peculiaridades focalizadas seria de maior utilidade, bem como permitindo a delegação de competências aos Estados, de forma a permitir que as ações governamentais atinjam com maior atenção as disparidades estaduais.

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Parte Geral – Doutrina

A Cura do Câncer, a Droga Experimental (Fosfoetanolamina Sintética) e Suas Implicações Legais e Jurídicas

LEONARDO ALVES DE OLIVEIRAServidor Público Estadual do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Pós‑Graduando em Direito Administrativo e em Direito Constitucional, Assessor de Gabinete da 1ª Vara de Família e Sucessões de Rondonópolis/MT.

PALAVRAS‑CHAVE: Cura do câncer, droga experimental, direito à saúde; implicações legais.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Desenvolvimento e análise do tema; 1.1 Entendendo o caso; 1.2 Polêmica; 1.3 Análise normativa; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Ao longo da história, muitas enfermidades já acometeram o ho-mem em todas as partes do mundo, desde priscas eras, sendo que o ser humano, sempre em constante evolução e buscando preservar sua sobrevivência, aos poucos foi encontrando soluções para suas moléstias.

Peste negra, cólera, tuberculose, varíola, gripe espanhola, tifo, fe-bre amarela, sarampo, malária, entre outras tantas doenças já mataram um sem-número de pessoas. Para todas descobriu-se um meio de pre-venção ou tratamento. A Aids permanece sem cura, manejando-se ape-nas um método anódino de controle. O câncer, por sua vez, em alguns casos, é passível de remoção com intervenção cirúrgica ou utilização de quimioterápicos para regressão dos sintomas, mas ainda, contudo, não se vislumbra um meio para sua prevenção, tampouco cura.

Entretanto, começa-se a vislumbrar uma fagulha de claridade em meio à escuridão, pois, talvez, um método de cura do câncer nunca te-nha parecido tão próxima do ser humano quanto nestes últimos meses.

Ao longo de muitos anos tem se debatido acerca do tema, contu-do, recentemente, ainda que de forma não concreta ou não comprova-da cientificamente, veiculam-se diariamente notícias referentes a uma promissora pílula, contendo um composto químico sintético (fosfoeta-nolamina) capaz de gradativamente regredir os efeitos e sintomas da

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malfadada enfermidade que assola o mundo, chamada, em sentido lato, de câncer.

Sabe-se que, por se tratar de substância ainda em fase de testes, sua livre comercialização é vedada, motivo pelo qual pacientes batem às portas do Poder Judiciário para ter acesso à medicação experimental.

Por isso, questionamentos surgem no sentido de verificar se o Ju-diciário poderia driblar etapas e mitigar a obscuridade dos efeitos desta droga experimental para permitir que enfermos a utilizem em seu trata-mento contra o câncer, uma vez que se trata de competência resguarda-da a um órgão do Poder Executivo.

Assim, com o fito de trazer a lume esclarecimentos no que toca ao caso em apreço, sobretudo sob o prisma da visão do direito constitucio-nal, apresentamos o presente artigo científico, no afã de compreender melhor a legislação pátria e sua interpretação, bem como traçar proje-ções acerca da novel medicação contra o câncer que foi idealizada no Brasil.

1 DESENVOLVIMENTO E ANÁLISE DO TEMA

1.1 EnTEnDEnDO O CASO

A droga foi desenvolvida e é produzida pioneiramente no Brasil, mais precisamente em São Carlos/SP, por um profissional brasileiro da área química, nos laboratórios da Universidade de São Paulo, e, por tratar-se de substância ainda experimental, não é livremente utilizada em tratamento de câncer, uma vez que, em teste, não há estudos clíni-cos que atestem de sua eficácia, nem de sua toxicidade, uma vez que a droga é enviada aos pacientes sem rótulo e sem bula.

Todavia, não obstante a situação de precariedade de testes, mui-tos pacientes portadores de câncer, sobretudo aqueles em estágio mais agravado da doença, procuram o Poder Judiciário postulando uma au-torização para utilizarem a aludida droga em sua terapia, o que divide opiniões.

Ocorre que todas as medicações e produtos químicos em geral, a priori, regulados pela Lei nº 6.360/1976, devem ter seu uso autorizado pela Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária, órgão regulador competente e responsável para tanto. Porém, o composto químico que

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aparentemente ajuda na luta contra o câncer ainda não possui a anuên-cia necessária do órgão.

Assim, a universidade apenas franqueava os medicamentos aos pacientes que conseguissem, por decisão judicial, uma ordem de autori-zação para utilização da droga em seu tratamento.

Contudo, o Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu todos os processos e todas as liminares já deferidas que postulavam o medica-mento, já que a expedição e distribuição de uma droga medicamentosa só poderia ser efetuada após a apresentação das licenças e registros das autoridades competentes.

Por ora, aproximadamente 820 (oitocentos e vinte)1 pacientes já obtiveram tutela jurisdicional para o fornecimento da medicação, que lhes seria via correio, na medida em que a substância vai sendo confec-cionada, o que foi paralisado por força da decisão emanada do Sodalício supracitado.

A quaestio da liberação de medicamentos sem o aval do órgão competente já há alguns anos está em trâmite no Supremo Tribunal Fe-deral2, sendo que o mais novo Ministro da Corte Constitucional, Luiz Edson Fachin, no dia 6 de outubro do ano corrente, concedeu um pedi-do liminar em petição (PET 5828) dirigida à Corte Constitucional, sus-pendendo a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que impedia uma paciente de ter acesso às pílulas contra o câncer.

Assim, a substância vem sendo utilizada no tratamento da doença mesmo sem ter sido aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sani-tária. Com a liminar (em que pese ter efeito apenas inter partes) proferida pelo Ministro do STF, o Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Desembargador José Renato Nalini, viu por bem reconsiderar sua deter-minação de barrar a droga e restabeleceu a distribuição da substância.

O tema foi veiculado pela mídia em âmbito nacional, inclusive em programas televisivos de larga difusão, em canais e horários de grande audiência no Brasil (parcialidades à parte), donde se pôde inferir, sob nossa ótica, que os profissionais da medicina país a fora, talvez por te-

1 Disponível em: <http://esaj.tjsp.jus.br/cpo/sg/search.do?conversationId=&paginaConsulta=1&localPesquisa.cdLocal=-&cbPesquisa=NUMPROC&tipoNuProcesso=UNIFICADO&numeroDigitoAnoUnificado=2194962--67.2015&foroNumeroUnificado=0000&dePesquisaNuUnificado=2194962-67.2015.8.26.0000&dePes-quisaNuAntigo=>. Acesso em: 22 out. 2015.

2 Recurso Extraordinário nº 657718.

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mer represálias do seu órgão de classe ou em conflito com seus princí-pios éticos, ainda se mostram relutantes quanto ao novel medicamento, apesar dos diversos relatos de seus benefícios.

Assim, em síntese, traçando-se um panorama visual, de um lado estão os pacientes cancerígenos e seus familiares, ávidos por uma subs-tância proibida, e, de outro lado, estão os médicos (alguns de mãos ata-das) e o órgão responsável pela autorização do tratamento com a medi-cação, que não consideram a utilização da fosfoetanolamina uma boa alternativa para tratar os pacientes de câncer, estando, por fim, entre estes, o Poder Judiciário, para sopesar e ponderar os conflitos principio-lógicos e normativos do tema.

1.2 pOLêmICA

Hodiernamente, nota-se, por meio de um senso comum, que o câncer manifesta-se de diversas formas, nas mais variadas partes do cor-po humano, bem como que possui alguns estágios, do mais leve (ini-cial) ao mais gravoso (terminal). Trata-se, também, de uma enfermidade silenciosa, que por vezes se torna sintomática somente em seu nível já avançado. Para estes últimos, muitas vezes, dada a gravidade do caso, já não há mais procedimentos médicos que possibilitem sua melhora, não havendo mais nada a se fazer a não ser, apenas, aguardar seu último suspiro.

Estima-se que no Brasil, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer, a cada ano surjam mais de 500.000 (quinhentos mil casos) no-vos casos cancerígenos3.

Nesse cenário é que acenderam meteoricamente notícias sobre a droga aviada nos laboratórios da USP de São Carlos/SP, que, apesar de já ter sido elaborada e ser estudada há muitos anos, somente nos últimos meses se difundiu acerca de sua existência (e de relatos de significativa melhor com sua utilização).

Em rápida consulta à internet, pode-se ter acesso a diversos relatos de pacientes de câncer que se curaram com a utilização da droga, al-cunhada de “fosfo”, sendo que muitos mostram seus exames clínicos de antes e depois no período sob uso do composto químico, comprovando

3 Disponível em: <http://www.inca.gov.br/estimativa/2014/tbregioes_consolidado.asp>. Acesso em: 22 out. 2015.

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a alegada melhora ou a redução substancial do tamanho dos nódulos cancerígenos.

Ressalte-se, novamente, que, de um lado, estão os médicos e a agência reguladora (Anvisa), preocupados com o uso indiscriminado de uma droga que ainda não foi devidamente testada, não havendo com-provação de resultados benéficos, complicações ou efeitos colaterais (já que a medicação não possui rótulo, bula, tampouco prescrição real), e, de outro lado, estão os pacientes e familiares, que veem na substância química como sendo uma real esperança para sua melhora física, psi-cológica e espiritual, aceitando e buscando todo e qualquer remédio ou tratamento, ainda que seja experimental, desde que prometa ajudar no seu combate ao contra o câncer. Eis o dilema.

Registre-se também, em arremate, que parecem existir interesses financeiros envolvendo a utilização ou não do remédio, haja vista a quantidade de pacientes que são acometidos pela enfermidade do cân-cer, o que pode atravancar a marcha para liberação do composto, uma vez que atualmente há outros métodos mais tradicionais de combate ao câncer. Além do mais, certamente, uma vez regularizada, a medicação deverá ser fornecida de forma gratuita pelo SUS – Sistema Único de Saú-de do Brasil, o que, para muitos, é interessante, mas, para uma minoria, talvez não seja.

Há também que se asseverar que todos os envolvidos com a do-ença possuem interesses. O dos pacientes é o de se curar e retornar para suas famílias e vidas normais, o dos laboratórios farmacêuticos é o de comercializar a substância e ajudar os necessitados, o dos médicos é o de ver seus doentes curados, isto é, todas as vontades, ainda que indire-tamente, deveriam convergir para um só fim: a cura do câncer.

O interesse do Brasil é (ou deveria ser) o de extirpar ou minimi-zar cada vez mais tal enfermidade que mata muitos brasileiros por ano, promovendo o bem-estar de sua população. Dessarte, por meio do ór-gão regulador competente, deve agir prioritariamente para regularizar as questões pendentes e realizar juntamente com hospitais e médicos os testes faltantes, com a máxima urgência, já que há relatos positivos de pessoas que já utilizaram a droga.

1.3 AnáLISE nORmATIVA

A doutrina até ironiza, fazendo sua hermenêutica normativa, adu-zindo que o direito à vida é tão fundamental por estar umbilicalmente

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ligado ao direito à vida, que nem precisaria de reconhecimento explícito no texto da Lex Legnun4.

Não poderia ser diferente, já que o direito à saúde é, inegavelmen-te, uma garantia constitucional consagrada ao indivíduo, que emana do direito à vida, tendo como panorama central a dignidade da pessoa hu-mana, que ocupa função nuclear da Lex Fundamentallis, já que é a base axiomática da própria Constituição.

É ululante, no texto da Carta Política de 1988, que a saúde é um direito consagrado, mormente ante o enunciado de seu art. 6º, dispondo que: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

De igual modo, ainda, em redação específica, a Magna Carta traz a saúde como imposição ao Estado, que deve buscar medidas para sua potencialização, por meio da prevenção de mazelas que atentem contra a saúde da população, conforme dicção de seu art. 196, asseverando que:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políti-cas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

É certo que a doutrina mostra a dupla vertente dos direitos sociais, sobretudo no que se refere à saúde, que ganha posição de destaque en-quanto direito social, no texto de 1988: a) caráter positivo: incentiva-se um Estado dirigente/prestacionista para implementar o direito social; b) caráter negativo: o Estado ou terceiros devem abster-se de praticar atos que prejudiquem terceiros5.

Nota-se, portanto, que a saúde é um direito social, mas que, por decorrer do direito à vida e da dignidade da pessoa humana, goza de cunho eminentemente fundamental, sendo uma norma constitucional de eficácia plena, que, desde a entrada em vigor da Constituição, pro-duzem todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, compor-

4 CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de direito constitucional. 7. ed. Salvador: JusPodivm, 2013. p. 731. 5 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 968.

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tamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativa-mente, quis regular6.

Não se pode olvidar, porém, que infindáveis são as ações em que o Judiciário, com um caráter ativista, determina que a União, os Esta-do e os Municípios solidariamente, por exemplo, forneçam remédios, realizem internação, cirurgias, coloquem próteses e tudo mais que o paciente necessitar para promover sua recuperação7, motivo por que seus recursos devem direcionar-se às ações suplementares de nutrição, habitação, saúde, reforço da renda familiar, dentre outros programas de interesse social, voltados para a melhoria da qualidade de vida8.

Tendo como norte tais prescrições, deve-se ter em mente, também, que o direito à saúde é, senão o principal, um dos direitos de prestação primordiais, consagrado pelo legislador constituinte, plenamente exercí-vel contra o Estado, que, embora esteja obrigado a propiciar inúmeros direitos à população que lhe são impostos pelo texto constitucional e pelas leis infraconstitucionais, fato inexorável é que a saúde é serviço público de primeira necessidade que deve sempre ter a preferência do gestor público.

Casos de extrema relevância, como é o tema sub análise, referente à liberação de um medicamento experimental aos pacientes em fase terminal (ou não) de uma doença gravíssima, acabam sempre nas mãos do Poder Judiciário, que não pode se esquivar de sua atividade típica de julgar, nem tardar em dirimir os conflitos e proferir sua decisão, moti-vo pelo qual não pode esperar morosidades ou burocracias dos demais Poderes, devendo, sim, ser ativista para atender ao clamor social (ainda que não seja o meio tecnicamente mais correto), evitando que maiores direitos sejam ceifados.

Dessarte, não se pode aceitar como razoável a atuação da Ad-ministração Pública que deixa averiguar com urgência a questão, não havendo se falar em equívoco por parte do Judiciário em atender ao que preconiza a Constituição e primar pela saúde, pelo tratamento e pela vida do indivíduo que sucumbe diante da chaga de que sofre, determi-nando a liberação da droga (ainda que experimental) para os pacientes

6 VICENTE, Paulo; ALEXANDRINO, Marcelo apud SILVA, José Afonso da. Direito constitucional descomplica-do. 14. ed. São Paulo: Método, 2015. p. 60.

7 PADILHA, Rodrigo. Direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Método, 2014. p. 608.8 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 814.

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onde os tratamentos convencionais já não possuem mais o poder para combater o câncer.

CONCLUSÃO

Pelo exposto e depois de realizado um estudo pormenorizado do tema, não se pretende aqui argumentar, de forma alguma, que a droga experimental em análise seja a real cura para o câncer em todas as suas acepções – neste ponto, por ora, nada é garantido. Todavia, diante dos aparentes resultados positivos que dela advieram, merece uma atenção especial do Estado. Cuida-se, em verdade, de uma grande esperança para todos os brasileiros.

Trata-se de um sonho pensar que algum dia haverá uma medica-ção (sobretudo se tiver origem brasileira) produzida e utilizada sem qual-quer embargo, gratuitamente, no tratamento do câncer, que seja mais forte, mais rápida e mais eficaz contra a doença do que os tratamentos convencionais, acarretando o mínimo de efeitos colaterais.

Trazendo este pensamento aos fatos que estão se desenrolando no cenário nacional nos últimos meses, assim como evidenciado em linhas propedêuticas, resta clarividente que esta droga produzida no Brasil e idealizada por pesquisadores pátrios reacende as esperanças de pacien-tes portadores de câncer.

Nada é mais avassalador negativamente do que receber um prog-nóstico médico estimando o tempo de vida de um paciente cancerígeno no patamar de três meses, um mês ou quinze dias, por exemplo. Assim, em casos tais, melhor pecar pelo excesso de tentativas, mesmo que seja com uma droga experimental, buscando sempre a conservação da vida e da saúde do enfermo.

Há uma infinidade de tipos de câncer e certamente a fosfoetano-lamina não deve ter efeito em todas; contudo, caso se comprove inques-tionavelmente seus efeitos benéficos ou até a cura (e ao que nos parece se chegará neste ponto) em face de alguns tipos de câncer, já haverá um ponto de partida para desenvolvimento de outros compostos químicos para atacar as demais formas em que a moléstia se apresenta.

Enquanto houver, ainda que ínfima, uma centelha de esperança ao paciente com câncer de que determinado tratamento pode lhe dar maior qualidade de vida ou alguma forma de melhora, deve-lhe ser garanti-do o acesso. O direito à vida e, consequentemente, o direito à saúde,

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juntamente com a dignidade da pessoa humana, são a viga mestra de tudo que a Constituição da Republica Federativa do Brasil preconiza e garante.

Posto isso, deve o Estado, da forma mais rápida possível, regula-rizar as fases ainda não iniciadas ou incompletas junto aos órgãos com-petentes para, enfim, aferir os efeitos do aludido composto químico e então liberar sua utilização no tratamento de pacientes cancerígenos, bem como sua prescrição por profissionais cancerologistas.

Nesse ínterim, o Judiciário, que deve analisar cada caso concre-to ponderando a relevância e gravidade do estado clínico do paciente com a alegada obscuridade da medicação postulada, continuará sendo acionado para conceder (ou não) sua chancela jurisdicional, possibi-litando aos pacientes o acesso à fosfoetanolamina sintética, sendo, de certa forma, ativista, mas sempre visando a um bem maior assegurado constitucionalmente, a vida e a saúde.

REFERÊNCIASBULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de direito constitucional. 7. ed. Salvador: JusPodivm, 2013.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

PADILHA, Rodrigo. Direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Método, 2014.

VICENTE, Paulo; ALEXANDRINO, Marcelo apud SILVA, José Afonso da. Direito constitucional descomplicado. 14. ed. São Paulo: Método, 2015.

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.368.935 – SC (2013/0043394‑3)Relator: Ministro Mauro Campbell MarquesRecorrente: Ministério Público FederalRecorrido: Marco Antônio Tessaroli ScireaAdvogado: João Paulo Tesseroli Siqueira e outro(s)Interes.: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Procuradoria‑Geral Federal – PGFInteres.: União

EmEnTAADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – IMPROBIDADE ADMINIS-TRATIVA – MÉDICO PERITO DO INSS QUE CUMPRE JORNADA INFERIOR ÀQUELA PARA A QUE FOI CONTRATADA – REGISTRO NO LIVRO DE PONTO DE CUMPRIMENTO INTEGRAL DA CARGA HORÁRIA – PRESENÇA DE MÁ-FÉ – RECONHECIMENTO DO CARÁTER ÍMPROBO DA CONDUTA – IMPOSIÇÃO DE PENALIDADES

1. As condutas imputadas ao ora recorrido diz respeito à even-tual ato de improbidade administrativa decorrente da atividade no serviço público – enquanto médico perito aprovado em concurso público para desenvolver suas atribuições junto ao INSS – em pe-ríodo inferior ao da jornada estipulada em lei, bem como àquela registrada no livro ponto de frequência. Em face destes fatos, o Ministério Público Federal – autor da demanda e ora recorrente – imputou-lhe a prática de atos subsumíveis aos caputs dos arts. 9º e 11 da Lei nº 8.429/1992.

2. O Tribunal Regional Federal a quo entendeu pela não confi-guração do ato de improbidade administrativa por entender pela ausência de elemento subjetivo a autorizar a sua tipificação nos termos da Lei nº 8.429/1992.

3. Não obstante, sem que seja necessária a realização de nova incursão no conjunto fático e probatório constante dos autos, esta conclusão não merece prosperar. Isso porque, o acórdão recor-rido constatou que, muito embora tenha havido expediente com carga horária semanal menor do que aquela prevista em lei, no livro ponto era registrada que teria trabalhado a jornada integral

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prevista em Lei. Vale dizer, além de ter havido o deliberado des-cumprimento da contratada jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas, a parte ora recorrida ainda praticava possível ato contra a Administração Pública constante no registro falso da carga horária efetivamente trabalhada, em ato que demonstra evidente má-fé.

4. Ainda, cumpre destacar que é forçoso reconhecer que o fato de ter sido avaliado de modo satisfatório pela então Gerente Execu-tiva não retira a má-fé da parte ora recorrida. Isso porque o cum-primento das condições de trabalho impostas ao servidor público por lei é exigência que atende o interesse público na prestação de serviço ao cidadão de forma adequada e eficiente. Assim o sendo, não há margem de liberdade para o agente público deixar de cum-prir quaisquer dos requisitos impostos, os quais, frisa-se, já era de conhecimento no ato de seu provimento ao cargo público.

5. Note-se, outrossim, que o próprio estatuto que rege as relações de trabalho referentes à carreira – Lei nº 10.876/2004 – prevê a possibilidade de o servidor cumprir jornada de 20 (vinte) horas se-manais, desde que com remuneração proporcional. Assim, have-ria demonstração de boa fé caso fosse cumprido o referido dispo-sitivo legal, ou seja, se a remuneração paga fosse proporcional ao tempo da jornada diária desenvolvida. Conforme bem destacado, não foi o que aconteceu, pois o registro no ponto de frequência não correspondia à jornada efetivamente trabalhada.

6. Assim o sendo, inegável a prática de ato de improbidade admi-nistrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/1992. Os elementos contidos no acórdão recorrido, no entanto, não permitem o re-conhecimento de violação do art. 9º da referida Lei de regência, tendo em vista não terem sido quantificados os danos ao erário público causados em face da conduta praticada, sendo que tal tarefa é inviável na via recursal eleita a teor da Súmula nº 7/STJ.

7. Por conseguinte, se houve ato de improbidade, e isso é fato incontroverso, deve haver sanção na forma do art. 12, III, da Lei de regência. Tendo em vista as circunstâncias presentes nos au-tos, e, ainda, as características da conduta praticada, tenho que é proporcional a aplicação das seguintes sanções: (a) perda da função pública; (b) suspensão dos direitos políticos de três anos; (c) o pagamento de multa civil no valor de 40 (quarenta) vezes a

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remuneração percebida pelo agente público à época da conduta investigada; e, (d) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou in-diretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

8. Recurso especial parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as aci-ma indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tri-bunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:

“A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos ter-mos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

As Sras. Ministras Assusete Magalhães (Presidente), Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região) e os Srs. Ministros Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Re-lator.

Brasília (DF), 1º de dezembro de 2015.

Ministro Mauro Campbell Marques, Relator

RELATÓRIO

O exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público Fe-deral, com base no art. 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, em face de acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Re-gião, nestes termos sintetizado (e-STJ fls. 644/648):

ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – AUSÊNCIA DE BENS DO AGENTE PÚBLICO – IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO – JURISPRUDÊNCIA DO STJ

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1. Inicialmente, registre-se que o autor ingressou no serviço público já na vigência da Lei nº 10.876/2004, conforme se infere do termo de posse acostado à fl. 45 dos presentes autos.

Tal diploma legal constitui-se na legislação especial de regência aplicá-vel aos médicos peritos do INSS, consoante se observa:

‘Cria a Carreira de Perícia Médica da Previdência Social, dispõe sobre a remuneração da Carreira de Supervisor médico-Pericial do Quadro de Pessoal do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e dá outras providências.’

[...]

Art. 1º Fica criada, nos termos desta Lei, a Carreira de Perícia Médica da Previdência Social, constituída pelos cargos efetivos de perito mé-dico da Previdência Social.

Art. 2º Compete privativamente aos ocupantes do cargo de perito médico da Previdência Social e, supletivamente, aos ocupantes do cargo de Supervisor médico- Pericial da carreira de que trata a Lei nº 9.620, de 2 de abril de 1998, no âmbito do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e do Ministério da Previdência Social – MPS, o exercício das atividades médico-periciais inerentes ao Regime Geral da Previdência Social de que tratam as Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, e 8.213, de 24 de julho de 1991, à Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993 – Lei Orgânica da Assistência Social, e â aplicação da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e, em especial:

Art. 3º São transformados em cargos de perito médico da Previdência Social da Carreira de Perícia Médica da Previdência Social os atuais cargos efetivos de médico do Plano de Classificação de Cargos – PCC, de que trata a Lei nº 5.645, de 10 de dezembro de 1970, ou de pla-nos de cargos correlatos do Quadro de Pessoal do INSS, de médico da Carreira Previdenciária, de que trata a Lei nº 10.355, de 26 de dezembro de 2001, e de médico da Carreira do Seguro Social, de que trata a Lei nº 10.855, de 1º de abril de 2004, cujos ocupantes estejam em efetivo exercício das atividades de perícia médica nas unidades do Instituto Nacional do Seguro Social e no Ministério da Previdência Social.

Parágrafo único. Serão enquadrados na Carreira de Perícia Médica da Previdência Social, mediante opção, os atuais ocupantes dos cargos mencionados no caput deste artigo, desde que sua investidura haja observado as pertinentes normas constitucionais e ordinárias anterio-

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res a 5 de outubro de 1988 e, se posterior a esta data, tenha decorrido de aprovação em concurso público específico para os cargos referi-dos no caput deste artigo.

Art. 4º Os cargos efetivos de perito médico da Previdência Social da Carreira de Perícia Médica da Previdência Social e os cargos de Su-pervisor médico-Pericial da Carreira de Supervisor médico-Pericial, de que trata a Lei nº 9.620, de 2 de abril de 1998, observarão a es-trutura de classes e padrões de vencimentos estabelecida no Anexo I desta Lei.

Art. 5º Os servidores ocupantes dos cargos efetivos de que trata o art. 4º desta Lei perceberão os valores da Tabela de Vencimento Básico de que trata o Anexo II desta Lei, observada a respectiva jornada de trabalho originária de 20 (vinte) ou 40 (quarenta) horas semanais.

[...]

Art. 8º O ingresso nos cargos da Carreira de perito médico da Previ-dência Social é condicionado ao cumprimento obrigatório da jornada de trabalho estabelecida no art. 19 da Lei nº 8.112, de 11 de dezem-bro de 1990.

Parágrafo único. Ficam mantidos para os ocupantes dos cargos de que trata o parágrafo único do art. 3º desta Lei as atribuições, os requisitos de formação profissional e a jornada semanal de trabalho dos cargos originários, conforme estabelecido na legislação vigente na data de publicação da Medida Provisória nº 166, de 18 de fevereiro de 2004, sendo assegurado o regime de 40 (quarenta) horas para aqueles que se encontravam no exercício de jornada de 40 (quarenta) horas, com base nos §§ 1º e 2º do art. 1º da Lei nº 9.436, de 5 de fevereiro de 1997, na data de publicação da Medida Provisória no 166, de 18 de fevereiro de 2004.

Ainda, transcreve-se o art. 19 da Lei nº 8.112/1991:

Art. 19. Os servidores cumprirão jornada de trabalho fixada em razão das atribuições pertinentes aos respectivos cargos, respeitada a dura-ção máxima do trabalho semanal de quarenta horas e observados os limites mínimo e máximo de seis horas e oito horas diárias, respecti-vamente.

Com efeito, conforme se depreende dos normativos reproduzidos acima, a carga horária de 8h (oito horas) diárias é extraída do art. 19 da Lei nº 8.112/1990, não porque se trata da lei geral mas porque há expressa

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remissão pela lei especial que rege o cargo do demandado. Tal previsão, inclusive, não encontra óbice na Constituição da República Federativa do Brasil, uma vez que não há direito constitucional à jornada diária de 4h para servidores públicos da área médica. O que há, isto sim, é a possibilidade de acumulação de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde (art. 37, XVI, c, da CF) quando houver compatibi-lidade de horários.

Sobreleva notar, outrossim, que a jornada de 40 horas semanais, ques-tionada no presente feito, restou confirmada pelos diplomas legais subseqüentes à Lei nº 10.876/2004, constando inclusive da novel Lei nº 12.269/2010, a saber:

‘Art. 35. É de 40 (quarenta) horas semanais a jornada de trabalho dos servidores integrantes da Carreira de perito médico Previdenciário.

Não merece acolhida a tese de que o demandante enquadrar-se-ia nos dizeres do Decreto-Lei nº 1 da Lei nº 9.436/1997, porque referida lei traz disposições de modo genérico, e não específico, como o diploma legal combatido.

Deste modo, é de se aplicar ao caso presente as disposições da Lei nº 10.876/2004, afastando-se, pois, os termos da Lei nº 9.436/1997, sen-do de 40 horas semanais a jornada de trabalho Médicos Peritos do INSS.

Da conduta Punível à Luz da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Ad-ministrativa) A atuação do agente publico deve ser pautada pela legalida-de, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, conforme ex-pressa determinação constitucional no art. 37, caput, cujo § 4º determina que os atos de improbidade importarão suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens e ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

São elementos constitutivos do ato de improbidade administrativa o su-jeito passivo, o sujeito ativo, o ato danoso e o elemento subjetivo (dolo). As hipóteses de ato considerado ímprobo estão elencadas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei de Improbidade, tendo, contudo, o autor, feito referência às condutas descritas nos arts. 9º e 11:

Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando en-riquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta lei, e nota-damente:

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[...]

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealda-de às instituições, e notadamente:

I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

[...]’

Imprescindível, para a procedência da ação, a demonstração de enrique-cimento ilícito, dano ao erário, e violação dos princípios que regem a administração.

Aplicáveis, então, as penalidades indicadas no art. 12 da norma.

Passa-se a análise dos elementos de prova constantes dos autos a fim de se averiguar a conduta tisnada de ímproba.

Sobremodo elucidativo o depoimento de Teresinha Corrêa Schlindwein, Gerente Executiva do INSS em Chapecó: É Gerente Executiva do INSS em Chapecó. Sabe que a jornada de trabalho do réu era de 04 horas diárias. Havendo uma memorando do INSS que determinava 24 perícias diárias.

O sistema marcava perícia de 10 em 10 minutos. Esse sistema era geren-ciado pelo Setor de Benefício por Incapacidade.

Os médicos peritos não tinham liberdade para interferir nesse sistema. Os demais médicos peritos da agência de Chapecó trabalhavam 04 horas diárias, em geral. A administração tinha conhecimento disso.

Ao ser indagada pela Advogada da União, respondeu:

Tem impressão de que o sistema já estava previamente programado para agendar as perícias de 10 em 10 minutos.

Supõem que os funcionários não pudessem fazer essa alteração.

A testemunha Célia Mella Zanette, prestou esclarecimentos convergentes ao já referido: Trabalhava no INSS desde 1983. Atualmente é Gerente da Agência da Previdência de Chapecó.

Não trabalhou no mesmo ambiente que o réu. A jornada do réu era de 40 horas semanais. Não sabe na prática qual era a jornada que o réu fazia, mas como regra, os médicos peritos não cumpriam a jornada de 08 horas.

E continuou: As perícias eram agendadas no Gebenin.

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O horário das perícias o próprio sistema agendava. O chefe do Gebenin estipulava os horários das perícias.

Os médicos peritos não tinham liberdade para operar esse sistema.

Oportunas também as informações da testemunha Vilmar José Nogara: Era chefe do Gebenin da Gerência de Chapecó. Não era a sua responsa-bilidade de marcar as perícias no sistema.

Era da chefia das agências. As perícias eram marcadas de 10 em 10 mi-nutos. Isso mudou há cerca de 3 meses.

Em todo Brasil a duração das perícias era a mesma. Isso acontecia no INSS desde os anos 80, quando o sistema não era informatizado. A Asso-ciação dos Médicos Peritos surgiu apenas há cinco anos.

As perícias do INSS já eram realizadas daquela forma desde muito antes.

[...]

Teve conhecimento do memorando de 2006, mas disse que ele estipula-va uma duração de até 20 minutos.

A maioria das agências não cumpriu o memorando.

Conversaram com a Administração do INSS e a conclusão foi de que cada agência adotasse o procedimento mais adequado no seu caso para atender o volume de trabalho exigido.

Na jornada remanescente dos médicos eles ficavam liberados para fazer outras atividades como exame de processos administrativos e visitas a empresas para liberação de nexo técnico. Mesmo após o memorando 74 de 2006 as perícias continuaram sendo marcadas de 10 em 10 minutos.

Do elenco probatório coligido aos autos extrai-se que o réu cumpria jor-nada de trabalho de 04 horas diárias.

Nada obstante, sobremodo relevante destacar que, os depoimentos tes-temunhais colhidos de servidores da Agência do INSS, de Chapecó, são uníssonos e apontam o seguinte cenário fático: a) o sistema de agenda-mento de perícias médicas seguiam as diretrizes de memorando do INSS, o qual determinava a realização de 24 perícias diárias; b) referido siste-ma de agendamento não era passível de controle por parte dos Médicos Peritos; c) as perícias eram previamente agendadas por meio do sistema respectivo, intercaladas em intervalos de 10 minutos; d) os demais Médi-cos Peritos trabalhavam 04 horas diárias, em geral e, finalmente – e não menos importante – e) a Administração da Agência tinha conhecimento da jornada de trabalho realizada pelos médicos.

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Com efeito, as provas orais colhidas revelaram-se convergentes e acenam no sentido de que, por ocasião do ingresso do demandado aos quadros do INSS, já existia uma rotina de trabalho estabelecida na Agência do INSS da cidade de Chapecó, realizada sob a supervisão da Gerente Exe-cutiva, a qual, em depoimento das fls. 230, confirmou que os Médicos trabalhavam 04 horas e que referida jornada era de conhecimento da Administração da Agência.

Ora, diante do aludido quadro fático restou sobejamente comprovado que a sistemática adotada pela Agência, no que diz respeito ao cumpri-mento da jornada de trabalhos dos Médicos Peritos, não foi articulada pelo demandado com o intuito de enriquecer ilicitamente.

Ou seja, não há nos autos qualquer elemento de prova que aponte à con-duta desonesta, passível de alguma das reprimendas cominadas na Lei de Improbidade Administrativa.

Imperioso que se ressalte que o réu, assim como os demais Médicos Peri-tos do INSS, cumpriam jornada de 04 horas, sob a autorização da Gerên-cia Executiva, que anuía, inclusive com o expediente de fazer anotação de 40 horas semanais no livro-ponto.

Merece destaque, ainda, o fato de o réu jamais ter sido submetido a pro-cedimento administrativo disciplinar em virtude da reduzida jornada de trabalho realizada – reitere-se – por todos os Médicos Peritos da Agência do INSS de Chapecó, tendo sido avaliado de modo satisfatório pela Ge-rente Executiva, conforme se dessume da avaliação de desempenho das fls. 113-115.

De todo o exposto, pode-se dessumir não ter o réu agido com intuito de enriquecer ilicitamente, de modo que sua conduta não pode ser tida como desonesta.

Desta forma, não há fundamento fático ou jurídico para a condenação por qualquer das condutas da Lei de Improbidade.

A condenação do agente depende do resultado de seu ato e da conduta cometida.

Ou seja, imprescindível configuração de conduta dolosa. A presença do elemento subjetivo é tanto mais relevante pelo fato de ser objetivo pri-mordial do legislador constituinte o de assegurar a probidade, a morali-dade, a honestidade dentre da Administração Pública. Sem um mínimo de má-fé, não se pode cogitar da aplicação de penalidades como a sus-pensão dos direitos políticos e a perda da função pública.

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A jurisprudência do STJ, aliás, de há muito orientou-se no sentido de que a punição, conforme os rigores da improbidade administrativa, exige a presença inequívoca do dolo do agente público.

2. Improvimento da apelação.

Nas razões do recurso especial, o recorrente sustenta a violação dos arts. 9º, caput, 11, caput e 12, incisos I e III, todos estes da Lei nº 8.429/1992, sustentando, em síntese, a prática de ato ímprobo pela parte recorrida, tendo em vista que, apesar de ter sido contratada para cumprir uma jornada de 40 (quarenta) horas, efetivamente prestava ser-viço tão somente pela metade do período (vinte horas semanais). Assim, considera ter havido enriquecimento ilícito, e, ainda, atentado aos prin-cípios que regem a administração pública, razão pela qual alega a pos-sibilidade de imposição das sanções descritas no art. 12 deste diploma normativo.

Adesão da União ao recurso especial (e-STJ fl. 681).

Contrarrazões às e-STJ fls. 689/695.

Decisão de admissibilidade do recurso especial (fls. 711/715).

O Ministério Público Federal, por meio do parecer de e-STJ fls. 735/748, opina pelo provimento do recurso especial.

É o relatório.

EmEnTAPROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – IMPROBIDADE ADMINISTRA-TIVA – MÉDICO PERITO DO INSS QUE CUMPRE JORNADA INFERIOR ÀQUELA PARA A QUE FOI CONTRATADA – REGISTRO NO LIVRO DE PONTO DE CUMPRIMENTO INTEGRAL DA CARGA HORÁRIA – PRÁTICA DE ATO VIOLADOR DE PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS – ART. 11 DA LEI Nº 8.429/1992 – RECONHECIMENTO DE DOLO GENÉRICO – RECURSO ESPECIAL PARCIAL-MENTE PROVIDO

1. A hipótese dos autos diz respeito ao ajuizamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, pelo Ministério Pú-blico Federal, em face de médico perito do INSS, sob o argumento de que este exercia jornada de trabalho inferior àquela estipulada em lei e registrada no livro ponto de freqUência. Em face destes fatos, o Ministério Público Federal – autor da demanda e ora recor-

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rente – imputou-lhe a prática de atos subsumíveis aos caputs dos arts. 9º e 11 da Lei Nº 8.429/1992.

2. O Tribunal Regional Federal a quo entendeu pela não confi-guração do ato de improbidade administrativa por entender pela ausência de elemento subjetivo a autorizar a sua tipificação nos termos da Lei nº 8.429/1992.

3. Não obstante, sem que seja necessária a realização de nova incursão no conjunto fático e probatório constante dos autos, esta conclusão não merece prosperar. Isso porque, o acórdão recor-rido constatou que, muito embora tenha havido expediente com carga horária semanal menor do que aquela prevista em lei, no livro ponto era registrada que teria trabalhado a jornada integral prevista em Lei. Vale dizer, além de ter havido o deliberado des-cumprimento da contratada jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas, a parte ora recorrida ainda praticava possível ato contra a Administração Pública constante no registro falso da carga horária efetivamente trabalhada, em ato que demonstra evidente elemento subjetivo doloso.

4. Destaque-se que esta Corte Superior tem entendimento no senti-do de que o dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa é a simples vontade consciente de aderir à conduta, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica – ou, ainda, a simples anuência aos resultados contrários ao Direito quando o agente público ou privado deveria saber que a conduta praticada a eles levaria –, sendo despiciendo perquirir acerca de finalidades específicas.

5. Note-se, outrossim, que o próprio estatuto que rege as relações de trabalho referentes à carreira - Lei nº 10.876/2004 – prevê a possibilidade de o servidor cumprir jornada de 20 (vinte) horas semanais, desde que com remuneração proporcional.

Assim, haveria demonstração de boa fé caso fosse cumprido o referido dispositivo legal, ou seja, se a remuneração paga fosse proporcional ao tempo da jornada diária desenvolvida. Confor-me bem destacado, não foi o que aconteceu, pois o registro no ponto de frequência não correspondia à jornada efetivamente trabalhada.

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6. Assim sendo, mostra-se inegável a prática de ato de improbi-dade administrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/1992. Os elementos contidos no acórdão recorrido, contudo, não permitem o reconhecimento de violação do art. 9º da referida Lei de re-gência, tendo em vista não terem sido quantificados os danos ao erário público causados em face da conduta praticada, sendo que tal tarefa é inviável na via recursal eleita a teor da Súmula nº 7/STJ.

7. Recurso especial parcialmente provido para reconhecer a práti-ca de conduta tipificada no art. 11 da Lei nº 8.429/1992 e determi-nar o retorno dos autos à origem apenas para que sejam aplicadas as sanções cabíveis.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator):

A hipótese dos autos diz respeito ao ajuizamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, pelo Ministério Público Federal, em face de médico perito do INSS, sob o argumento de que este exercia jornada de trabalho inferior àquela estipulada em lei e registrada no livro ponto de freqüência.

Em face destes fatos, o Ministério Público Federal imputou--lhe a prática de atos subsumíveis aos caputs dos arts. 9º e 11 da Lei nº 8.429/1992, os quais possuem a seguinte redação:

Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enrique-cimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta lei, e notadamente:

[...]

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

Tendo em vista a categorização promovida pela Lei de Improbi-dade Administrativa, bem como a interpretação jurisprudencial deste Sodalício, é certo que a imputação pretendida pelo Ministério Público

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Federal – ora recorrente – depende do cumprimento de alguns requisi-tos, quais sejam:

a) Atos que importem enriquecimento ilícito do agente (art. 9º da Lei nº 8.429/1992): demonstração de dolo (ainda que genérico), bem como do efetivo proveito patrimonial obtido pelo agente em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade; e,

b) Atos que importem lesão aos princípios da administração públi-ca (art. 11 da Lei nº 8.429/1992): demonstração de dolo (ainda que ge-nérico), sendo prescindível a comprovação de dano ao erário ou mesmo de enriquecimento ilícito.

A esse respeito, o seguinte precedente:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL E RE-CURSO ESPECIAL ADESIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDA-DE ADMINISTRATIVA – REALIZAÇÃO DE DESPESAS SEM OS PRÉVIOS EMPENHOS – ARTS. 10 E 11 DA LEI Nº 8.429/1992 – AUSÊNCIA DE JUÍZO DE VALOR QUANTO À EXISTÊNCIA, OU NÃO, DE PREJUÍZO AO ERÁRIO E DE EVENTUAL ATUAÇÃO DOLOSA DO AGENTE – RE-QUISITOS DO TIPOS – CONDUTA INSERIDA NO CAMPO DA MERA IRREGULARIDADE ADMINISTRATIVA

1. O STJ ostenta entendimento uníssono segundo o qual, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos arts. 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedentes: AgRg no AREsp 20.747/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 23.11.2011 REsp 1.130.198/RR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 15.12.2010; EREsp 479.812/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, DJe 27.09.2010; REsp 1.149.427/SC, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 09.09.2010; EREsp 875.163/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30.06.2010.

2. A leitura atenta do acórdão evidencia que o ex prefeito, ora recorrente, foi condenado pela violação dos arts. 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992 por ter efetuado o pagamento de despesas sem os prévios empenhos, sem que, no entanto, tenha sido realizado o juízo de valor quanto à ocorrên-cia, ou não, de prejuízo ao erário da Municipalidade de Tapejara/PR, bem como no concernente à sua eventual atuação dolosa. Logo, deve ser reformado o acórdão recorrido, pois, à toda evidência, não há a sub-sunção da conduta reputada ímproba aos tipos previstos nos arts. 10 e

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11 da Lei nº 8.429/1992, os quais reclamam, respectivamente, o efetivo prejuízo e a atuação dolosa do agente.

3. A conduta do ex-prefeito, ora recorrente, está inserida no campo da mera irregularidade administrativa. Tanto assim, que o próprio acórdão recorrido, a despeito de tê-lo condenado, tão somente asseverou que “[...] o ex-prefeito municipal desobedeceu o procedimento legalmente estatuído para a realização de despesas [...]” (fl. 5.947). Precedentes: REsp 1.179.144/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Tur-ma, DJe 02.12.2010; e REsp 1.036.229/PR, Relª Min. Denise Arruda, Pri-meira Turma, DJe 02.02.2010.

4. Recurso principal conhecido e, no mérito, prejudicado. Recurso ade-sivo conhecido e provido.

(REsp 1322353/PR, 1ª T., Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 27.08.2012)

Com efeito, acerca da conduta imputada ao recorrido – presença de indícios de ato de improbidade administrativa consistentes no fato de exercer jornada semanal de trabalho menor do que aquela estipulada em lei para o cargo de médico perito do Instituto Nacional do Seguro Social – a Corte quo se manifestou nos seguintes termos (e-STJ fl. 639):

Do elenco probatório coligido aos autos extrai-se que o réu cumpria jor-nada de trabalho de 04 horas diárias.

Nada obstante, sobremodo relevante destacar que, os depoimentos tes-temunhais colhidos de servidores da Agência do INSS, de Chapecó, são uníssonos e apontam o seguinte cenário fático: a) o sistema de agenda-mento de perícias médicas seguiam as diretrizes de memorando do INSS, o qual determinava a realização de 24 perícias diárias; b) referido siste-ma de agendamento não era passível de controle por parte dos Médicos Peritos; c) as perícias eram previamente agendadas por meio do sistema respectivo, intercaladas em intervalos de 10 minutos; d) os demais Médi-cos Peritos trabalhavam 04 horas diárias, em geral e, finalmente – e não menos importante – e) a Administração da Agência linha conhecimento da jornada de trabalho realizada pelos médicos.

Com efeito, as provas orais colhidas revelaram-se convergentes e acenam no sentido de que, por ocasião do ingresso do demandado aos quadros do INSS, já existia uma rotina de trabalho estabelecida na Agência do INSS da cidade de Chapecó, realizada sob a supervisão da Gerente Exe-cutiva, a qual, em depoimento das fls. 230, confirmou que os Médicos trabalhavam 04 horas e que referida jornada era de conhecimento da Administração da Agência.

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Ora, diante do aludido quadro fático restou sobejamente comprovado que a sistemática adotada pela Agência, no que diz respeito ao cumpri-mento da jornada de trabalhos dos Médicos Peritos, não foi articulada pelo demandado com o intuito de enriquecer ilicitamente. Ou seja, não há nos autos qualquer elemento de prova que aponte à conduta desones-ta, passível de alguma das reprimendas cominadas na Lei de Improbida-de Administrativa.

Do exposto, constata-se que o Tribunal de origem entendeu pela não configuração do ato de improbidade administrativa por entender pela ausência de elemento subjetivo a autorizar a sua tipificação nos termos da Lei nº 8.429/1992. Não obstante, sem que seja necessária a realização de nova incursão no conjunto fático e probatório constante dos autos, esta conclusão não merece prosperar. Senão vejamos.

Isso porque, o acórdão recorrido, com base nos elementos fáticos e probatórios constantes dos autos, concluiu que, muito embora tenha havido expediente com carga horária semanal menor do que aquela pre-vista em lei, no livro ponto era registrada que teria trabalhado a jornada integral prevista em Lei. Vale dizer, além de ter havido o deliberado des-cumprimento da contratada jornada de trabalho de 40 (quarenta) horas, a parte ora recorrida ainda praticava possível ato contra a Administração Pública constante no registro falso da carga horária efetivamente traba-lhada, em ato que demonstra evidente elemento subjetivo doloso.

Referida circunstância ficou devidamente demonstrada conforme se depreende do seguinte excerto do acórdão vergastado (e-STJ fl. 639):

Imperioso que se ressalte que o réu, assim como os demais Médicos Peri-tos do INSS, cumpriam jornada de 04 horas, sob a autorização da Geren-cia Executiva, que anuía, inclusive com o expediente de fazer anotação de 40 horas semanais no livro-ponto.

Merece destaque, ainda, o fato de o réu jamais ter sido submetido a pro-cedimento administrativo disciplinar em virtude da reduzida jornada de trabalho realizada – reitere-se – por todos os Médicos Peritos da Agência do INSS de Chapecó, tendo sido avaliado de modo satisfatório pela Ge-rente Executiva, conforme se dessume da avaliação de desempenho das fls. 113-115.

De todo o exposto, pode-se dessumir não ter o réu agido com intuito de enriquecer ilicitamente, de modo que sua conduta não pode ser tida como desonesta.

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Desta forma, não há fundamento fático ou jurídico para a condenação por qualquer das condutas da Lei de Improbidade.

A condenação do agente depende do resultado de seu ato e da conduta cometida.

Ou seja, imprescindível configuração de conduta dolosa. A presença do elemento subjetivo é tanto mais relevante pelo fato de ser objetivo pri-mordial do legislador constituinte o de assegurar a probidade, a morali-dade, a honestidade dentre da Administração Pública. Sem um mínimo de má-fé, não se pode cogitar da aplicação de penalidades como a sus-pensão dos direitos políticos e a perda da função pública. (Grifamos).

Note-se, outrossim, que o próprio estatuto que rege as relações de trabalho referentes à carreira – Lei nº 10.876/2004 – prevê a possibili-dade de o servidor cumprir jornada de 20 (vinte) horas semanais, desde que com remuneração proporcional.

Senão vejamos:

Art. 5º Os servidores ocupantes dos cargos efetivos de que trata o art. 4º desta Lei perceberão os valores da Tabela de Vencimento Básico de que trata o Anexo II desta Lei, observada a respectiva jornada de trabalho originária de 20 (vinte) ou 40 (quarenta) horas semanais.

No caso dos autos, haveria demonstração de boa fé caso fosse cumprido o referido dispositivo legal, ou seja, se a remuneração paga fosse proporcional ao tempo da jornada diária desenvolvida. Conforme bem destacado, não foi o que aconteceu, pois o registro no ponto de frequência não correspondia à jornada efetivamente trabalhada.

Cumpre destacar, ainda, que o dolo que se exige para a configu-ração de improbidade administrativa é a simples vontade consciente de aderir à conduta, produzindo os resultados vedados pela norma jurídi-ca – ou, ainda, a simples anuência aos resultados contrários ao Direito quando o agente público ou privado deveria saber que a conduta prati-cada a eles levaria –, sendo despiciendo perquirir acerca de finalidades específicas.

No sentido da presente fundamentação, vejamos o que foi decidi-do por esta Corte Superior em casos análogos:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IM-PROBIDADE ADMINISTRATIVA – FRACIONAMENTO DE COMPRAS –

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BURLA À LEI DE LICITAÇÕES – ART. 11 DA LEI Nº 8.429/1992 – CON-FIGURAÇÃO DO DOLO GENÉRICO – PRESCINDIBILIDADE DE DANO AO ERÁRIO – COMINAÇÃO DAS SANÇÕES – ART. 12 DA LIA – PRIN-CÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ

1. A caracterização do ato de improbidade por ofensa a princípios da administração pública exige a demonstração do dolo lato sensu ou gené-rico. Precedentes.

2. O ilícito previsto no art. 11 da Lei nº 8.249/1992 dispensa a prova de dano, segundo a jurisprudência desta Corte.

3. Modificar o quantitativo da sanção aplicada pela instância de origem enseja reapreciação dos fatos e da prova, obstado nesta instância espe-cial (Súmula nº 7/STJ).

4. Recurso especial não provido.

(REsp 1323503/SC, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJe 05.08.2013)

ADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE – ELEMENTO SUBJETIVO – CON-TRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE SEM LICITAÇÃO – ATO ÍMPROBO POR ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO – APLICAÇÃO DAS SANÇÕES

1. O Juízo de 1º grau julgou procedente o pedido deduzido em Ação Civil Pública por entender que os réus, ao realizarem contratação de serviço de transporte sem licitação, praticaram atos de improbidade tra-tados no art. 10 da Lei nº 8.429/1992. No julgamento da Apelação, o Tribunal de origem afastou o dano ao Erário por ter havido a prestação do serviço e alterou a capitulação legal da conduta para o art.11 da Lei nº 8.429/1992.

2. Conforme já decidido pela Segunda Turma do STJ (REsp 765.212/AC), o elemento subjetivo, necessário à configuração de improbidade admi-nistrativa censurada nos termos do art. 11 da Lei nº 8.429/1992, é o dolo genérico de realizar conduta que atente contra os princípios da Adminis-tração Pública, não se exigindo a presença de dolo específico.

3. Para que se concretize a ofensa ao art. 11 da Lei de Improbidade, revela-se dispensável a comprovação de enriquecimento ilícito do admi-nistrador público ou a caracterização de prejuízo ao Erário.

4. In casu, a conduta dolosa é patente, in re ipsa. A leitura do acórdão recorrido evidencia que os recorrentes participaram deliberadamente

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de contratação de serviço de transporte prestado ao ente municipal à margem do devido procedimento licitatório. O Tribunal a quo entendeu comprovado o conluio entre o ex-prefeito municipal e os prestadores de serviço contratados, tendo consignado que, em razão dos mesmos fatos, eles foram criminalmente condenados pela prática do ato doloso de frau-de à licitação, tipificado no art. 90 da Lei nº 8.666/1993, com decisão já transitada em julgado.

5. O acórdão bem aplicou o art. 11 da Lei de Improbidade, porquanto a conduta ofende os princípios da moralidade administrativa, da legalida-de e da impessoalidade, todos informadores da regra da obrigatoriedade da licitação para o fornecimento de bens e serviços à Administração.

6. Na hipótese dos autos, a sanção de proibição de contratar e receber subsídios públicos ultrapassou o limite máximo previsto no art. 12, III, cabendo sua redução.

As penas cominadas (suspensão dos direitos políticos e multa) atendem aos parâmetros legais e não se mostram desprovidas de razoabilidade e proporcionalidade, estando devidamente fundamentadas.

7. A multa civil é sanção pecuniária autônoma, aplicável com ou sem ocorrência de prejuízo em caso de condenação fundada no art. 11 da Lei nº 8.429/1992.Precedentes do STJ.

8. Consoante o art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa, a multa civil é transmissível aos herdeiros, “até o limite do valor da herança”, somente quando houver violação aos arts. 9º e 10º da referida lei (dano ao patri-mônio público ou enriquecimento ilícito), sendo inadmissível quando a condenação se restringir ao art. 11.

9. Como os réus foram condenados somente com base no art. 11 da Lei da Improbidade Administrativa, é ilegal a transmissão da multa para os sucessores do de cujus, mesmo nos limites da herança, por violação ao art. 8º do mesmo estatuto.

10. Recurso Especial parcialmente provido para reduzir a sanção de proi-bição de contratar e receber subsídios públicos e afastar a transmissão mortis causa da multa civil.

(REsp 951.389/SC, 1ª Seção, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 04.05.2011)

Assim sendo, mostra-se inegável a prática de ato de improbidade administrativa tipificado no art. 11 da Lei nº 8.429/1992. Os elementos contidos no acórdão recorrido, contudo, não permitem o reconhecimen-to de violação do art. 9º da referida Lei de regência, tendo em vista não

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terem sido quantificados os danos ao erário público causados em face da conduta praticada, sendo que tal tarefa é inviável na via recursal eleita a teor da Súmula nº 7/STJ.

Ante tudo quanto exposto, dou parcial provimento ao recurso es-pecial para reconhecer a prática de conduta tipificada no art. 11 da Lei nº 8.429/1992 e determinar o retorno dos autos à origem apenas para que sejam aplicadas as sanções cabíveis.

É o voto.

CERTIDÃO DE JuLgAmEnTO SEgunDA TuRmA

Número Registro: 2013/0043394-3 Proces-so Eletrônico REsp 1.368.935/SC

Números Origem: 200872020044865 50026121320114047202 SC-200872020044865

SC-50026121320114047202

Pauta: 01.12.2015 Julgado: 01.12.2015

Relator: Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Assusete Magalhães

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Sandra Verônica Cureau

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

AuTuAçÃO

Recorrente: Ministério Público Federal

Recorrido: Marco Antônio Tessaroli Scirea

Advogado: João Paulo Tesseroli Siqueira e outro(s)

Interes.: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Advogado: Procuradoria-Geral Federal – PGF

Interes.: União

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Atos administrativos – Improbidade administrativa

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CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos ter-mos do voto do(a) r(a). Ministro(a)-Relator(a).”

As Sras. Ministras Assusete Magalhães (Presidente), Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região) e os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Re-lator.

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoNumeração Única: 0007696‑92.2009.4.01.3400Apelação Cível nº 2009.34.00.007771‑2/DF Relator: Desembargador Federal Francisco de Assis BettiRelator Convocado: Juiz Federal Cleberson José RochaApelante: União FederalProcurador: José Roberto Machado FariasApelado: Alessandro Pombo dos Santos e outros(as)Advogado: Andre Luis Santos Meira e outro(a)

EmEnTAPROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL – PROCURADOR FE-DERAL DA FAZENDA NACIONAL – DIREITO À PARTICIPAÇÃO EM CONCURSO DE PROMOÇÃO – EXIGÊNCIA DE CONCLUSÃO DO ESTÁGIO PROBATÓRIO – INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL

1. A Lei Complementar nº 73/1993 concedeu ao Conselho Su-perior da Advocacia-Geral da União a legitimidade para fixar os Critérios objetivos para a promoção por merecimento, não im-pondo em momento algum, critério restritivo de direito. Assim, no exercício do poder regulamentar, não poderia o aludido Conselho restringir ou ampliar onde o legislador não o fez, vez que lhe com-pete apenas especificar o conteúdo da norma para permitir-lhe a execução.

2. Ao estabelecer que somente os Procuradores da Fazenda Nacio-nal com mais de três anos de exercício poderiam concorrer às va-gas existentes para promoção na carreira, conforme as condições de elegibilidade fixadas pelo Edital CS-AGU nº 39/2008, a Admi-nistração criou exigências limitativas de direitos, não previstas na legislação de regência. Precedentes.

3. Apelação e remessa oficial improvidas.

ACÓRDÃO

Decide a Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial.

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2ª Turma do TRF 1ª Região.

Brasília, 26 de agosto de 2015.

Juiz Federal Cleberson José Rocha Relator Convocado

RELATÓRIOExmo. Sr. Juiz Federal Cleberson José Rocha Relator Convocado:

1. Alessandro Pombo dos Santos e Outros impetraram mandado de segurança contra ato atribuído ao Conselho Superior da Advocacia--Geral da União, objetivando garantir a participação dos impetrantes no processo de promoção para a 1ª Categoria da carreira, bem como a de-claração da ilegalidade da condição de elegibilidade prevista no Anexo II Edital nº 39/2008 e art. 5º da Resolução nº 5/2005.

2. Da decisão de fls. 247/249 que deferiu a liminar, a União inter-pôs agravo de instrumento que teve o efeito suspensivo deferido.

3. Notificado, a autora coatora apresentou informações às fls. 281/294.

4. Sentença proferida pelo juízo a quo (fls. 310/312), concedeu a segurança vindicada assim concluindo: “[...] garantir a participação dos impetrantes no procedimento de promoção para a 1ª Categoria da carreira de Procurador da Fazenda Nacional, regido pelo Edital nº 39, de 21.11.2008, independentemente do cumprimento da condição de aprovação no estágio confirmatório de três anos...”.

5. A União, em suas razões recursais, sustentou a legalidade da exigência do conselho Superior da AGU e a necessidade do cumpri-mento do prazo de três anos para que se perfaça o estágio probatório. Pugnou pela reforma do julgado (fls. 322/337).

6. Recebido o recurso às fls. 33/38 e com as contrarrazões de fls. 340/345, subiram os autos a essa Corte.

7. Embora noticiado à promoção administrativa dos impetrantes, a partir de 01.01.2010, persiste o interesse vez que objetivam a promoção desde 11/2008 e os efeitos daí decorrente (fl. 432).

É o relatório.

VOTO1. A sentença não merece reparos.

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2. A controvérsia cinge-se sobre as condições de elegibilidade fi-xadas pelo Edital CS-AGU nº 39/2008, que estabeleceu a necessidade do cumprimento mínimo de três anos de exercício para os Procuradores da Fazenda Nacional participarem do concurso de promoção.

3. A Lei Complementar nº 73/1993 (Instituiu a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União), no tocante a promoção, assim dispõe:

Art. 24. A promoção de membro efetivo da Advocacia-Geral da União consiste em seu acesso a categoria imediatamente superior aquela em que se encontra.

Parágrafo único. As promoções serão processadas semestralmente pelo Conselho Superior da Advocacia-Geral da União, para vagas ocorridas até 30 de junho e até 31 de dezembro de cada ano, obedecidos, alterna-damente, os critérios de antiguidade e merecimento.

Art. 25. A promoção por merecimento deve obedecer a critérios objeti-vos, fixados pelo Conselho Superior da Advocacia-Geral da União, den-tre os quais a presteza e a segurança no desempenho da função, bem como a frequencia e o aproveitamento em cursos de aperfeiçoamento reconhecidos por órgãos oficiais. (grifei)

4. O Conselho Superior da Advocacia-Geral da União fixou no edital como condições de elegibilidade o seguinte (fls. 104/106): “so-mente poderão integrar as listas de promoção, por antiguidade ou por merecimento, os Procuradores da Fazenda nacional, devidamente apro-vados no estágio confirmatório de três anos, nos termos do Parecer AGU/AC-17, publicado no DOU de 16.07.2004, e aprovado pelo Presidente da República, ressalvadas as Decisões Judiciais que disponham de forma diversa”. Tal condição também foi fixada pela Resolução nº 05/2005 (fls. 109/114).

5. A Lei Complementar nº 73/1993 concedeu ao Conselho Su-perior da AGU a legitimidade para fixar os Critérios objetivos para a promoção por merecimento, não impondo em momento algum, critério restritivo de direito. Assim, no exercício do poder regulamentar, não po-deria o aludido Conselho restringir ou ampliar onde o legislador não o fez, vez que lhe compete apenas especificar o conteúdo da norma para permitir-lhe a execução.

6. Ao estabelecer que somente os Procuradores da Fazenda Na-cional com mais de três anos de exercício poderiam concorrer às vagas existentes para promoção na carreira, a Administração criou exigências

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limitativas de direitos, não previstas na legislação de regência, o que de-monstra o acerto da sentença que concedeu a segurança requerida. No mesmo sentido, cito os seguintes precedentes do egrégio STJ:

EMEN: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO RE-GIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – ARTS. 11, § 2º, V, DA LEI Nº 10.480/2002 E 20 E §§ 1º E 5º, DA LEI Nº 8.112/1990 – DISPOSI-TIVOS QUE NÃO GUARDAM PERTINÊNCIA COM A QUESTÃO SUB JUDICE – OFENSA REFLEXA – EXAME – IMPOSSIBILIDADE – MATÉ-RIA CONSTITUCIONAL – EXAME EM RECURSO ESPECIAL – IMPOS-SIBILIDADE – PRECEDENTES ORIUNDOS DE MANDADO DE SEGU-RANÇA, RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, CITADOS PARA FINS DE COMPROVAÇÃO DE DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL – IMPOSSIBILIDADE – ADVOGADO DA UNIÃO, EM ESTÁGIO PROBATÓRIO – DIREITO À PARTICIPAÇÃO NO CONCURSO DE PROMOÇÃO – ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTO-NIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ – AGRAVO REGIMENTAL IM-PROVIDO

[...]

V – A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que “o Edital nº 04/2010, do Conselho Superior da AGU, não pode exigir, para fins de promoção, a conclusão do estágio probatório, vez que a Lei Complemen-tar nº 73/1993 nada dispôs sobre o cumprimento de requisito temporal mínimo de exercício na carreira, não cabendo a Administração inovar no ordenamento jurídico criando exigência para as promoções dos pro-curadores, sobretudo em face da ausência de previsão legal” (STJ, AgRg--REsp 1.392.899/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe de 12.08.2014).

VI – Impossibilidade de se examinar a controvérsia à luz do art. 41, ca-put, da Constituição da República, uma vez que “não cabe a esta Corte, em sede de recurso especial, examinar suposta violação a dispositivos constitucionais, tendo em vista os precisos termos do art. 105, III, alíneas a, b e c, da CF/1988” (STJ, REsp 1.281.061/PB, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., DJe de 20.08.2013).

V Agravo Regimental improvido. [...] EMEN: (Ag-REsp 201301151139, Assusete Magalhães, 2ª T., DJe Data: 05.03.2015 ..DTPB:.)

EMEN: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMEN-TAL NO RECURSO ESPECIAL – SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL – PRO-CURADOR DA FAZENDA NACIONAL – DIREITO À PARTICIPAÇÃO EM CONCURSO DE PROMOÇÃO – EXIGÊNCIA DE CONCLUSÃO

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DO ESTÁGIO PROBATÓRIO – INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL – ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ – SÚMULA Nº 83/STJ – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO

1. O acórdão recorrido ao reconhecer a ilegalidade da orientação do Edital CSAGU nº 39/2008, no sentido de estabelecer que somente os Procuradores da Fazenda Nacional com mais de três anos de exercício poderiam concorrer às vagas existentes para promoção na carreira, já que “a Lei Complementar nº 73/1993, ao franquear ao CSAGU a fixação de critérios objetivos para a promoção, o fez apenas para a promoção por merecimento, e, ainda assim, não autorizou o estabelecimento de nenhum critério restritivo” e que “o Conselho Superior da AGU, portan-to, não possuía discricionariedade para estabelecer o critério restritivo impugnado nestes autos, por absoluta ausência de autorização legal” , o fez em sintonia com a jurisprudência do STJ, segundo a qual não é pos-sível condicionar a promoção dos Procuradores à aprovação em estágio probatório ante a falta de previsão legal.

2. “O Edital nº 04/2010, do Conselho Superior da AGU, não pode exi-gir, para fins de promoção, a conclusão do estágio probatório, vez que a Lei Complementar nº 73/1993 nada dispôs sobre o cumprimento de requisito temporal mínimo de exercício na carreira, não cabendo à Ad-ministração inovar no ordenamento jurídico criando exigência para as promoções dos procuradores, sobretudo em face da ausência de previsão legal. 2. O Advogado-Geral da União ao criar condição de elegibilidade infringiu o princípio da reserva legal, mormente quando as atribuições do órgão restringem-se à fixação de diretrizes procedimentais para a concor-rência promocional, e não a imposição de regras limitativas de direitos. [...]” (AgRg-REsp 1392899/PE, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 05.08.2014, DJe 12.08.2014)

3. No mesmo sentido: REsp 1.375.521/PE, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 07.05.2013; REsp 1.368.091/PB, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 03.04.2013.

4. Agravo regimental não provido. ..EMEN: (Ag-REsp 201402277834, Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe Data: 10.11.2014 ..DTPB:.)

7. Em face do exposto, nego provimento à apelação e à remessa oficial.

8. É o voto.

Juiz Federal Cleberson José Rocha

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoNº CNJ: 000140628.2002.4.02.5001Relator: Juiz Federal Convocado Alexandre Libonati de AbreuApelante: Realcafé Solúvel do Brasil S/AAdvogado: João Joaquim Martinelli (SC003210) e outrosApelado: União Federal/Fazenda NacionalOrigem: 1ª Vara Federal Cível de Vitória/ES (200250010014061)Órgão Atual: Subsecretaria da 3ª Turma Especializada

EmEnTAMANDADO DE SEGURANÇA – INEXISTÊNCIA DE DEMORA OU OMISSÃO INJUSTIFICADA – SO-BRECARGA DE ATIVIDADES POR PARTE DA SRF

1. A demora excessiva e injustificada do poder público na análise de processos administrativos legitima a intervenção do Estado-juiz para impor obrigação de fazer, de modo a assegurar ao adminis-trado a garantia de seu direito, não se devendo falar, nesses casos, em violação ao princípio da separação dos poderes.

2. Não há que se falar em omissão ou injustificada demora por parte da Administração Pública. Em verdade, o que há é uma so-brecarga de atividades, contrastada pela insuficiência de recursos humanos situação, portanto, que se encontra na ordem dos fatos, e não do direito.

3. Os pedidos estão na “fila de atendimento”, não se apresentan-do, in casu, qualquer razão que justifique tratamento diferenciado em relação aos outros que se encontram na mesma situação. Caso contrário, estaria configurada violação ao princípio da isonomia, bem como da impessoalidade.

4. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indi-cadas, decide a 3ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da Segunda Região, à unanimidade, negar provimento ao recurso de

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apelação nos termos do relatório e voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 24 de novembro de 2015.

Alexandre Libonati de Abreu Juiz Federal Convocado

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por Realcafé Solúvel do Brasil em face da sentença de fls. 127/131, que denegou a segurança, por não vislumbrar, no presente caso, ilegalidade ou abuso de poder na conduta da autoridade coatora. Não houve condenação em custas ou honorários advocatícios.

Em suas razões (fls. 156/175), alega a apelante, em suma, que seu direito referente aos pedidos de restituição e de compensação de crédi-tos de terceiro no âmbito do Refis é líquido, certo, e passível de aprovei-tamento, contudo, não se efetivou por absoluta inércia da SRF, a qual descumpriu o prazo estipulado pela Lei nº 9.784/1999, em seu art. 49, agindo contrariamente ao art. 37 da Constituição Federal.

Contrarrazões às fls. 181/186.

O Ministério Público Federal manifestou-se pela manutenção da sentença (fls. 201/202).

É o relatório do necessário.

Alexandre Libonati de Abreu Juiz Federal Convocado

VOTO

Conforme exposto, trata-se de apelação interposta por Realcafé Solúvel do Brasil em face da sentença de fls. 127/131, que denegou a segurança, por não vislumbrar, no presente caso, ilegalidade ou abuso de poder na conduta da autoridade coatora.

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É cediço na jurisprudência que a demora excessiva e injustifica-da do poder público na análise de processos administrativos legitima a intervenção do Estado-juiz para impor obrigação de fazer, de modo a assegurar ao administrado a garantia de seu direito, não se deven-do falar, nesses casos, em violação do princípio da separação dos poderes.

Contudo, conforme bem salientou o Ministério Público, não cabe ao Poder Judiciário “julgar sobranceiro a realidade das coisas”.

No caso em tela, não se havia de falar em omissão ou injustificada demora por parte da Administração pública, como configuração de ato ilegal ou abusivo da autoridade impetrada. Em verdade, o que havia era uma sobrecarga de atividades, contrastada pela insuficiência de recursos humanos situação, portanto, que se encontra na ordem dos fatos, e não do direito. Nas palavras da apelada, “há um total de 4.071 (quatro mil e setenta e um) processos na Seort desta Delegacia de Vitória. Dentre estes, 1.930 (um mil novecentos e trinta) tratam de pedidos de restitui-ção/compensação de tributos, o que corresponde a 47% do estoque de processo”.

Assim, consoante o alegado pela apelada, os pedidos estão na “fila de atendimento”, não se apresentando, in casu, qualquer razão que jus-tifique tratamento diferenciado com relação aos outros que se encon-tram na mesma situação. Caso contrário, estaria configurada violação ao princípio da isonomia, bem como da impessoalidade, os quais devem reger todo o proceder da Administração Pública.

Por fim, no que tange a alegação de que a atitude da apelada contraria o disposto nos arts. 48 e 49 da Lei nº 9.784/1999, tem-se que é improcedente. De acordo com o alegado pela apelada, trata-se de lei de caráter genérico, “porquanto regula o processo administrativo no âm-bito federal traçando normas, princípios e critérios a serem observados em qualquer processo, abrangendo, portanto, o processo disciplinar, de controle, punitivo, entre outros, inclusive o processo tributário, desde que, neste aspecto, as disposiçoes da referida lei sejam observadas sub-sidiariamente ao que dispoe a legislação própria”.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso. De se ressaltar, toda-via, que ao tempo deste julgamento já terão decorrido mais de 7 (sete)

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anos desde a decisão monocrática, o que justificaria a concessão da or-dem, caso a análise administrativa ainda não tenha ocorrido, informação esta que se desconhece nos autos.

É como voto.

Alexandre Libonati de Abreu Juiz Federal Convocado

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE Publicado em 21.12.2015Conflito de Competência nº 0024448‑90.2015.4.03.0000/SP2015.03.00.024448‑0/SP Relator: Desembargador Federal Baptista PereiraParte Autora: Discovídeo Fonográfica Ltda.Advogado: SP067417 Ilvana Albino e outro(a)Parte Ré: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECTAdvogado: SP028835 Raimunda Monica Magno Araujo BonaguraSuscitante: Desembargadora Federal Marli Ferreira – Quarta TurmaSuscitado(a): Desembargador Federal Nelton dos Santos – Segunda TurmaNº Orig.: 00045063819974036100 Vr. São Paulo/SP

EmEnTA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – DIREITO CIVIL – DIREITO ADMINISTRATIVO – CORREIOS – CONTRATO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – SERVIÇO DE TELEMARKETING – REGIME DE DI-REITO PRIVADO – COMPETÊNCIA DA 1ª SEÇÃO

1. As ações que têm por objeto contrato da Administração Pública em regime de direito privado são de competência das turmas da Primeira Seção ao passo que na hipótese de contratos administra-tivos, regime de direito público, a competência é das turmas da Segunda Seção.

2. A Suprema Corte, na ADPF 46, firmou entendimento sobre a natureza jurídica de serviço público do serviço postal prestado pe-los Correios, assim entendido como envio de correspondência ou objeto postal do remetente ao destinatário.

3. O caso concreto versa sobre serviço de telemarketing prestado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e, portanto, não se enquadra no conceito de serviço postal. Contrato da Adminis-tração Pública em regime de direito privado.

4. Conflito julgado procedente para reconhecer a competência do órgão fracionário da Primeira Seção.

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indica-das, decide o Egrégio Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, julgar procedente o conflito de competên-cia, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 09 de dezembro de 2015.

Baptista Pereira Desembargador Federal

RELATÓRIO

Trata-se de conflito negativo de competência que tem como susci-tante a Excelentíssima Desembargadora Federal Marli Ferreira, integran-te da 4ª Turma desta Corte, e suscitado o Excelentíssimo Desembargador Federal Nelton dos Santos, o qual integrava a 2ª Turma, nos autos da Apelação Cível nº 2007.03.99.019494-6.

O objeto do presente é a fixação da competência para o julga-mento de recurso de ação proposta pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ECT contra Discovídeo Fonografia Ltda. em que se discute a cobrança pela prestação de serviço de atendimento de telemarketing prestado pela ECT.

O Magistrado suscitado declinou da competência para julgamento do feito com fundamento de que se trata de serviço público pela ECT e que, portanto, sendo caso de contrato administrativo, deve ser reconhe-cida a competência da c. 2ª Seção.

Por outro lado, a Magistrada suscitante aduz que se trata de con-trato sob regime de Direito Privado, razão pela qual a competência para julgamento do feito é das turmas da Primeira Seção, nos termos do art. 10, § 1º, III do RI desta Corte.

A Eminente Desembargadora Federal suscitante foi designada, em caráter provisório, para resolver as medidas urgentes (fl. 222).

O Ministério Público Federal, em seu parecer, opinou pela impro-cedência do conflito, manifestando-se no sentido da competência da 2ª Seção deste Tribunal Regional Federal (fls. 233/237).

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É o relatório.

VOTO

Cuida-se de controvérsia na definição da competência interna des-te Tribunal entre membros de turmas pertencentes a Seções distintas, 1ª e 2ª, com relação ao processamento e julgamento de apelação em ação ordinária versando a cobrança de serviço prestado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

As razões dos magistrados suscitante e suscitado estão fundadas em precedentes deste e. Órgão Especial, a saber:

PROCESSUAL CIVIL – CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA EN-TRE DESEMBARGADORES FEDERAIS INTEGRANTES DA PRIMEIRA E TERCEIRA TURMAS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – EMPRESA BRASILEI-RA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – ECT – EXTRAVIO DE CORRESPON-DÊNCIA (SEDEX) – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – DIREITO PÚBLICO – COMPETÊNCIA DAS TURMAS DA SEGUNDA SEÇÃO

– A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT é empresa pública federal que presta serviço público, cuja manutenção é da competência da União, nos termos do art. 21, X, da Constituição Federal, de sorte que, dada essa condição especial, a jurisprudência e-STF lhe reconheceu natureza distinta das empresas públicas comuns – constituídas para o exercício de atividade econômica e sujeitas a regime jurídico de direito privado, conforme previsão do art. 173, § 1º, II, e § 2º da CF/1988 –, atribuindo-lhe caráter autárquico e equiparando-a à Fazenda Pública.

– Quaisquer dúvidas acerca da natureza jurídica da atividade da ECT e do serviço por ela explorado foram definitivamente dirimidas pela Corte Suprema no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 46/DF.

– O fato de a autora da ação ter fundado a sua pretensão à reparação na culpa da ECT, atribuindo-lhe a prática de ilícito civil, e não na teoria do risco administrativo, ou seja, de ter sido invocada na inicial a responsa-bilidade subjetiva do Estado e não a objetiva (art. 37, § 6º, da CF), não implica na restrição da matéria aos lindes do direito privado, pois trata-se da responsabilidade civil do Estado, que tanto pode ser objetiva como subjetiva.

– Versando a demanda sobre o ressarcimento de danos supostamente causados pela ECT, que integra o conceito de Estado e de Fazenda Públi-

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ca, a relação jurídica litigiosa refere-se à responsabilidade civil do Esta-do, matéria de competência das Turmas da Segunda Seção desta Corte.

– Conflito de Competência julgado improcedente, reconhecendo-se a competência da Segunda Seção deste Tribunal para o exame da matéria. Competência do Desembargador Federal suscitante declarada.

(CC 2010.03.00.029627-5, Órgão Especial, Relª Desª Fed. Diva Malerbi, Julgado em 29.06.2011, eDJF3 05.07.2011); e

PROCESSUAL CIVIL – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – DECISÃO MO-NOCRÁTICA – DESCABIMENTO – INEXISTÊNCIA DE POSICIONAMEN-TO FIRMADO PELO ÓRGÃO COLEGIADO – EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – NEGÓCIO JURÍDICO – DESCUMPRIMEN-TO CONTRATUAL – MATÉRIA DE DIREITO PRIVADO – COMPETÊN-CIA DA 1ª SEÇÃO DESTE TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

– Nas hipóteses em que o Órgão Especial deste Egrégio Tribunal ainda não tenha firmado jurisprudência, inexistindo, portanto, parâmetro para decidir-se de plano o Conflito de Competência, conforme permitido pelo parágrafo único do art. 120, do Código de Processo Civil, deve ser o mesmo processado e julgado pelo colegiado.

– A discussão a respeito de descumprimento de cláusula contratual prati-cada por empresa que efetuou negócio jurídico com a Empresa Brasileira de correios e Telégrafos – EBCT consiste em questão de índole contratual regida pelas regras de Direito Privado.

– Não se trata, ademais, de hipótese de contrato administrativo, o que corrobora a tese de que se trata de questão disciplinada pelo Direito Privado.

– Portanto, o feito encontra-se dentro da competência da Egrégia 1ª Se-ção desta Corte Regional, dado configurar, inequivocamente, matéria de Direito Privado, conforme o que dispõe o art. 10, § 1º, inciso III, do Re-gimento Interno.

– Conflito de competência julgado procedente.

(CC 2010.03.00.030065-5, Órgão Especial, Relª Desª Fed. Suzana Camargo, J. 08.062011, eDJF3 15.06.2001)

Como se vê os julgados destes conflitos de competência são con-temporâneos, mas resultam em conclusões diferentes. Contudo, a con-tradição é apenas aparente.

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Isto porque a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ECT ofer-ta ao mercado a prestação de uma série de serviços de natureza distinta, tais como: serviço postal, serviço financeiro como correspondente ban-cário, intermediação de emissão de documentos como CPF e certifica-ção digital, etc.

Cumpre esclarecer que, na ADPF 46, a Suprema Corte tratou es-pecificamente do serviço postal, assim entendido como o conjunto de atividades que torna possível o envio de uma correspondência ou objeto postal do remetente para o destinatário, firmando entendimento sobre a sua natureza de jurídica de serviço público:

EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDA-MENTAL – EMPRESA PÚBLICA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – PRI-VILÉGIO DE ENTREGA DE CORRESPONDÊNCIAS – SERVIÇO POS-TAL – CONTROVÉRSIA REFERENTE À LEI FEDERAL Nº 6.538, DE 22 DE JUNHO DE 1978 – ATO NORMATIVO QUE REGULA DIREITOS E OBRIGAÇÕES CONCERNENTES AO SERVIÇO POSTAL – PREVISÃO DE SANÇÕES NAS HIPÓTESES DE VIOLAÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL – COMPATIBILIDADE COM O SISTEMA CONSTITUCIONAL VIGENTE – ALEGAÇÃO DE AFRONTA AO DISPOSTO NOS ARTS. 1º, INCISO IV; 5º, INCISO XIII, 170, CAPUT, INCISO IV E PARÁGRAFO ÚNICO, E 173 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL – VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIVRE CONCORRÊNCIA E LIVRE INICIATIVA – NÃO-CARACTERI-ZAÇÃO – ARGUIÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE – INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO CONFERIDA AO ART. 42 DA LEI Nº 6.538, QUE ESTABELECE SANÇÃO, SE CONFIGURADA A VIOLA-ÇÃO DO PRIVILÉGIO POSTAL DA UNIÃO – APLICAÇÃO ÀS ATIVI-DADES POSTAIS DESCRITAS NO ART. 9º, DA LEI – 1. O serviço postal – conjunto de atividades que torna possível o envio de correspondencia, ou objeto postal, de um remetente para endereço final e determinado – não consubstancia atividade econômica em sentido estrito. Serviço postal é serviço público. 2. A atividade econômica em sentido amplo é gênero que compreende duas espécies, o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. Monopólio é de atividade econômica em sentido estrito, empreendida por agentes econômicos privados. A exclu-sividade da prestação dos serviços públicos é expressão de uma situação de privilégio. Monopólio e privilégio são distintos entre si; não se os deve confundir no âmbito da linguagem jurídica, qual ocorre no vocabulário vulgar. 3. A Constituição do Brasil confere à União, em caráter exclusivo, a exploração do serviço postal e o correio aéreo nacional [art. 20, inciso X]. 4. O serviço postal é prestado pela Empresa Brasileira de Correios e

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Telégrafos – ECT, empresa pública, entidade da Administração Indireta da União, criada pelo Decreto-Lei nº 509, de 10 de março de 1.969. 5. É imprescindível distinguirmos o regime de privilégio, que diz com a prestação dos serviços públicos, do regime de monopólio sob o qual, algumas vezes, a exploração de atividade econômica em sentido estrito é empreendida pelo Estado. 6. A Empresa Brasileira de Correios e Telé-grafos deve atuar em regime de exclusividade na prestação dos serviços que lhe incumbem em situação de privilégio, o privilégio postal. 7. Os regimes jurídicos sob os quais em regra são prestados os serviços públi-cos importam em que essa atividade seja desenvolvida sob privilégio, inclusive, em regra, o da exclusividade. 8. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente por maioria. O Tribunal deu interpretação conforme à Constituição ao art. 42 da Lei nº 6.538 para restringir a sua aplicação às atividades postais descritas no art. 9º desse ato normativo.

(ADPF 46, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/Ac. Min. Eros Grau, TP, J. 05.08.2009, DJe-035 Divulg. 25.02.2010, Public. 26.02.2010, Ement. v. 02391-01, p. 00020, RTJ v. 00223-01, p. 00011)

Nestes termos, a solução do presente conflito restringe-se ao en-quadramento ou não do serviço prestado pelos Correios, que é objeto de cobrança na ação em tela, ao conceito de serviço postal, ou seja, é preciso distinguir entre contrato da Administração Pública e contrato administrativo.

Isto por que em se tratando de contrato da Administração Pública em regime de direito privado a competência é das turmas da Primeira Seção ao passo que na hipótese de contratos administrativos, regime de direito público, a competência é das turmas da Segunda Seção.

O Contrato de fls. 08/13, celebrado entre as partes, assim dispõe quanto ao seu objeto:

“O presente contrato tem por objeto a prestação, pela ECT, à contratante, dos seguintes serviços:

1.1. A recepção, na cidade de São Paulo, através da Central de Aten-dimento ao Telemarketing, da ECT, de pedidos de compra de produtos comercializados pela contratante e fornecimento de dados relativos aos pedidos armazenados em disquete e/ou relatório impresso.”

As obrigações da ECT estão descritas da seguinte forma:

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“A ECT se compromete a:

3.1. Receber, por meio de sua Central de Atendimento ao Telemarketing, os pedidos de compra dos produtos comercializados pela contratante, diariamente em qualquer horário;

3.2. Armazenar, em arquivo, as informações correspondentes aos pedi-dos de compra;

3.3. Registrar na Central de Atendimento ao Telemarketing os produtos que serão comercializados pela contratante, assim como as alterações de preços e condições, de acordo com as condições previstas nos subitens 2.1 e 2.2;

3.5. Apresentar à contratante, para fins de pagamento, as faturas corres-pondentes à prestação dos serviços, de acordo com os preços e condi-ções definidas nas cláusulas Quarta e Quinta.”

Da leitura do contrato não se verifica a realização de atividade tí-pica de serviço postal, isto é, envio de correspondência ou objeto postal do remetente ao destinatário.

Ao contrário, o serviço de atendimento telefônico aos clientes da parte ré tem nítido caráter de Direito Privado. Trata-se de atividade eco-nômica em que a qualidade de ente público de um dos contratantes é irrelevante quanto à natureza jurídica da prestação do serviço.

Ocorre que as operações de central de telemarketing são realiza-das cotidianamente entre particulares ou entre entes públicos e particu-lares sem que haja alteração de sua substância num caso ou noutro.

Desta forma, deve ser reconhecido o regime de Direito Privado do contrato de fls. 08/13 e, consequentemente, a competência das turmas da Primeira Seção desta Corte.

Ante o exposto, julgo procedente o presente conflito de compe-tência, declarando a competência para o processamento e julgamento da apelação do magistrado suscitado, integrante da Segunda Turma, da Primeira Seção deste Tribunal.

É como voto.

Baptista Pereira Desembargador Federal

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE Publicado em 17.12.2015Apelação Cível nº 0011796‑79.2012.4.03.6100/SP2012.61.00.011796‑4/SP Relator: Desembargador Federal Marcelo SaraivaApelante: Conselho Regional de Técnicos em Radiologia da 5ª Região CRTR/SPAdvogado: SP239411 Ana Paula Cardoso DominguesApelado(a): Fabiano Henrique BarbosaAdvogado: SP203102 Leonardo Klimeika Zanutto e outro(a)Nº Orig.: 00117967920124036100 24ª Vr. São Paulo/SP

EmEnTAADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – CURSO DE TÉCNICO EM RADIOLOGIA REALI-ZADO CONCOMITANTEMENTE COM O ENSINO MÉDIO – INSCRIÇÃO NO CONSELHO PROFISSIO-NAL – POSSIBILIDADE – APELAÇÃO IMPROVIDA

1. A Lei nº 7.394/1985 estabelece no seu art. 2º que uma das con-dições para o exercício da profissão de Técnico em Radiologia é ser portador de certificado de conclusão de ensino médio, não fazendo nenhuma restrição acerca de eventual realização simul-tânea do ensino médio com o ensino profissional. Além disso, a Lei de Diretrizes e Base da educação (Lei nº 9.394/1996, com a nova redação dada pela Lei nº 11.741/2008), deixou claro em seu art. 36-C, inc. II, que a educação profissional técnica será desen-volvida “concomitante, oferecida a quem ingresse no ensino mé-dio ou já o esteja cursando [...]”.

2. A formação do impetrante atende as formalidades legais, não podendo ser indeferida sua inscrição, atento ao princípio da razo-abilidade e da norma expressa.

3. Apelação e remessa oficial, tida por interposta, improvidas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indica-das, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa

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oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fa-zendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 03 de dezembro de 2015.

Marcelo Saraiva Desembargador Federal Relator

RELATÓRIO

Trata-se de recurso formulado em face de r. sentença de fls. 80/82, pela qual o MM. Juiz Federal da 2ª Vara Cível da 1ª Subseção Judiciária de São Paulo, reconhecendo o impetrante como devidamente qualifica-do para a profissão de Técnico em Radiologia, concedeu a segurança para o fim de inscrevê-lo no Conselho Regional de Técnicos de Radio-logia da 5ª Região.

O Conselho Regional de Técnicos em Radiologia da 5ª Região, em suas razões de recurso de apelação (fls. 84/108), alega a impossibilidade de inscrição, tendo em vista que o impetrante realizou o curso de pro-fissionalização concomitantemente ao ensino médio e, nos termos do § 2º, do art. 4º, da Lei nº 7.394/1995, somente poderia matricular-se no referido curso o candidato que previamente comprovasse anterior con-clusão do 2º grau ou equivalente.

Com as contrarrazões do recurso (fls. 126/133), subiram os autos a este E. Tribunal.

O Ministério Público Federal em seu parecer nesta instância opina pelo desprovimento do recurso.

VOTO

A questão dos autos cinge-se acerca de eventual possibilidade do impetrante Fabiano Henrique Barbosa se inscrever perante o Conselho Regional de Radiologia, cuja solicitação foi indeferida pela autoridade impetrada sob o fundamento de que não foram cumpridas as exigên-cias da Lei nº 7.394/1985, do Decreto nº 92.790/1986 e dos Pareceres CNE/CEB nºs 09/2001 e nº 31/2003, porquanto o curso de profissionali-zação foi realizado concomitante com o ensino médio (fls. 24).

RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA �������������������������������������������������������������145

Inicialmente, convém citar a Lei nº 7.394/1985, que regula o exer-cício profissional de Técnico em Radiologia e dispõe:

“Art. 2º- São condições para o exercício da profissão de Técnico em ra-diologia:

I – ser portador de certificado de conclusão do ensino médio e possuir formação profissional mínima de nível técnico em Radiologia; (Redação dada pela Lei nº 10.508, de 10.07.2002)

[...]

Art. 4º. As Escolas Técnicas de Radiologia só poderão ser reconhecidas se apresentarem condições de instalação satisfatórias e corpo docente de reconhecida idoneidade profissional, sob a orientação de Físico Tec-nólogo, Médico Especialista e Técnico em Radiologia. Ver tópico (233 documentos)

§ 1º Os programas serão elaborados pela autoridade federal competente e válidos para todo o Território Nacional, sendo sua adoção indispensá-vel ao reconhecimento de tais cursos.

§ 2º Em nenhuma hipótese poderá ser matriculado candidato que não comprovar a conclusão de curso em nível de 2º Grau ou equivalente.[...]

[...]

Art. 6º A admissão à 1ª série da Escola Técnica de Radiologia dependerá:

I – do cumprimento do disposto no § 2, do art. 4º, desta Lei;

II – de aprovação em exame de saúde, obedecidas as condições esta-tuídas no parágrafo único, do art. 46, do Decreto nº 29.155, de 17 de janeiro de 1951.

[...]

Art. 8º. Os diplomas expedidos por Escolas Técnicas de Radiologia, de-vidamente reconhecidos, têm âmbito nacional e validade para o registro de que trata o inciso II, do art. 2º, desta Lei.

Parágrafo único. Concedido o diploma, fica o Técnico em Radiologia obrigado a registrá-lo, nos termos desta Lei.”

Já por sua vez, a Lei nº 9.364/1996 (Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional), Seção IV-A, da Educação Profissional Técnica de Nível Médio (Incluído pela Lei nº 11.741, de 2008), dispõe:

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“Art. 36-A. Sem prejuízo do disposto na Seção IV deste Capítulo, o en-sino médio, atendida a formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas.

Parágrafo único. A preparação geral para o trabalho e, facultativamente, a habilitação profissional poderão ser desenvolvidas nos próprios estabe-lecimentos de ensino médio ou em cooperação com instituições especia-lizadas em educação profissional.

Art. 36-B. A educação profissional técnica de nível médio será desenvol-vida nas seguintes formas:

I – articulada com o ensino médio;

II – subsequente, em cursos destinados a quem já tenha concluído o en-sino médio.

Parágrafo único. A educação profissional técnica de nível médio deverá observar:

I – os objetivos e definições contidos nas diretrizes curriculares nacionais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação;

II – as normas complementares dos respectivos sistemas de ensino;

III – as exigências de cada instituição de ensino, nos termos de seu pro-jeto pedagógico.

Art. 36-C. A educação profissional técnica de nível médio articulada, prevista no inciso I do caput do art. 36-B desta Lei, será desenvolvida de forma:

I – integrada, oferecida somente a quem já tenha concluído o ensino fundamental, sendo o curso planejado de modo a conduzir o aluno a habilitação profissional técnica de nível médio, na mesma instituição de ensino, efetuando-se matrícula única para cada aluno;

II – concomitante, oferecida a quem ingresse no ensino médio ou já o esteja cursando, efetuando-se matrículas distintas para cada curso, e po-dendo ocorrer: (Incluído pela Lei nº 11.741, de 2008)

a) na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis; (Incluído pela Lei nº 11.741, de 2008)

b) em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as oportunidades educacionais disponíveis; (grifo nosso)

No caso dos autos, verifica-se que a formação do impetrante en-contra suporte nos ditames legais, uma vez que comprovou ter cursado,

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inicialmente, o ensino médio no Instituto Educacional e Empresarial XV de Novembro, em 03 de agosto de 2001, conforme documento acostado às fls. 14, todavia, seu diploma foi invalidado por circunstâncias alheias à sua vontade, o que o levou a cursar novamente o ensino médio na es-cola Solução Supletivo, concluindo em março de 2012, posterior a sua conclusão no curso de Técnico de nível médio em Radiologia em 11 de março de 2011(fls. 18).

Pois bem, atendida a formação geral do educando, não poderia o Conselho Regional de Técnico em Radiologia indeferir seu pedido, uma vez que a Lei nº 9.364/1996 não impede que o ensino médio possa ser cursado concomitantemente com o ensino profissionalizante, ou seja, não existe proibição legal para que os dois cursos sejam realizados ao mesmo tempo, até porque a educação profissional não se desagrega do ensino médio.

Destarte, uma vez concluído o curso médio, simultâneo ao curso profissionalizante de Técnico em Radiologia, não retira do impetrante a possibilidade de inscrição perante o Conselho de Classe, ante o princi-pio da razoabilidade e da legalidade.

Sobre a questão, colaciono os seguintes julgados precedentes do C. STJ e desta E. Corte:

“ADMINISTRATIVO – EXERCÍCIO PROFISSIONAL – TÉCNICO EM RA-DIOLOGIA – CURSO TÉCNICO REALIZADO CONCOMITANTEMENTE COM O ENSINO MÉDIO – INSCRIÇÃO NO CONSELHO PROFISSIO-NAL – POSSIBILIDADE

1. O Decreto nº 5.154/2004, regulamentando os dispositivos referentes à educação profissional previstos na Lei nº 9.394/1996, determinou que a atividade técnica será desenvolvida de forma articulada com o ensino médio, articulação esta que se dará de forma integrada, concomitante ou subsequente.

2. O art. 2º da Lei nº 7.394/1985 impõe o porte do certificado de conclu-são do ensino médio para o exercício da profissão de técnico em radio-logia , de modo que nenhuma restrição traz quanto à realização conco-mitante do ensino médio e do ensino profissionalizante.

3. A propósito, a Lei nº 9.394/1996, com a inclusão do seu art. 36-C, inc. II, por meio da Lei nº 11.741, de 16 de julho de 2008, a fim de solapar qualquer dúvida a respeito da questão, passou a prever expressamente

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que a educação profissional técnica de nível médio poderá ser oferecida a quem ingresse no ensino médio ou já o esteja cursando.

4. Não seria demais consignar que não parece razoável exigir que o re-corrido realize novamente o Curso técnico para obter a inscrição junto ao Conselho Profissional em tela, tendo em vista a própria escola técnica ter aceito a matrícula daquele, que já concluiu ambos os cursos e, por-tanto, satisfez os requisitos exigidos à obtenção do registro. Até porque, as circunstâncias presentes na hipótese geram a presunção de que o re-corrido está tecnicamente habilitado a exercer regularmente a profissão.

5. Precedente: REsp 1244114/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, J. 26.04.2011, DJe 05.05.2011

6. Recurso especial não provido.”

(REsp 1402731/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 15.10.2013)

“ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – EXERCÍCIO PROFISSIO-NAL – CURSO DE TÉCNICO EM RADIOLOGIA REALIZADO CONCO-MITANTEMENTE COM O ENSINO MÉDIO – INSCRIÇÃO NO CONSE-LHO PROFISSIONAL – POSSIBILIDADE

1. É possível a obtenção de registro profissional de técnico em radiolo-gia na respectiva entidade de classe, não obstante tenha cursado con-comitantemente o ensino médio e o profissionalizante. Precedentes: REsp 1.244.114/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Tur-ma, DJe 05.05.2011; REsp 1.402.731/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 15.10.2013.

2. Aplicabilidade da Súmula 83 do STJ, segundo a qual ‘não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’.

3. Recurso especial a que se nega provimento.”

(REsp 1215486/DF, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 02.05.2014)

“MANDADO DE SEGURANÇA – PROCESSO CIVIL – APELAÇÃO – CONSELHO REGIONAL DE TÉCNICOS EM RADIOLOGIA – CURSO TÉCNICO E ENSINO MÉDIO – CONCLUSÃO CONCOMITANTE – INS-CRIÇÃO NO CONSELHO – POSSIBILIDADE

1. As condições para o exercício da profissão de Técnico em Radiologia são a apresentação de certificado de conclusão do ensino médio e diplo-

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ma de habilitação profissional obtido em Escola Técnica de Radiologia, com o mínimo de 3 (três) anos de duração, devidamente registrado em órgão federal. Art. 2º da Lei nº 7.394/1985.

2. A documentação juntada demonstrou que a apelada concluiu o curso técnico concomitante ao ensino médio, porquanto ambos os históricos escolares atestam a conclusão no ano de 2006.

3. O Conselho Regional de Técnicos em Radiologia exorbitou a maté-ria estabelecida pela Lei nº 7.394/1985, regulamentadora da profissão, tendo em vista, não haver qualquer exigência de início do curso técnico somente após a conclusão do ensino médio.

4. Apelação e remessa oficial improvidas.”

(AMS 00020867420084036100 – AMS – Apelação Cível nº 312326 – Relª Desª Fed. Consuelo Yoshida – TRF3 – Sexta Turma-e-DJF3 24.04.2014)

Portanto, não cabe ao Conselho de Fiscalização Profissional negar a inscrição de profissional habilitado em seus quadros, em razão da estar cursando o curso de técnico em radiologia concomitantemente com o ensino médio.

Ante o exposto, nego provimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta.

Marcelo Saraiva Desembargador Federal

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoPoder JudiciárioDE Publicado em 15.12.2015Apelação Cível nº 0002714‑15.2003.4.03.6108/SP2003.61.08.002714‑5/SP Relator: Desembargador Federal André NekatschalowApelante: Ivete dos Santos Costa e outro(a)

Clonirce dos Santos CostaAdvogado: SP159490 Lilian Zanetti e outro(a)Apelado(a): União FederalAdvogado: SP000019 Tércio Issami Tokano e outro(a)

EmEnTAADMINISTRATIVO – SERVIDOR – PENSÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO – PRESCRI-ÇÃO – RENÚNCIA TÁCITA – ATRASO NO PAGAMENTO – DISPONIBILIDADE ORÇAMENTÁRIA – IMPOSSIBILIDADE – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – SUCUMBÊNCIA DA FAZENDA PÚBLICA – ARBITRAMENTO EQUITATIVO – JUROS – CORREÇÃO MONETÁRIA

1. O reconhecimento administrativo do pedido deduzido por servidor público, consubstanciado em pagamento, impor-ta na renúncia tácita da prescrição por parte da Administração (STJ, AGA 1314774, Rel. Min. Humberto Martins, J. 14.09.2010, AGA 1218014, Rel. Min. Felix Fischer, J. 24.08.2010; AGREsp 967730, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, J. 18.05.2010).

2. Incontroverso o recebimento de vantagem ou direito reconhe-cido administrativamente, não se justifica a demora do adim-plemento da obrigação pela Administração, ao fundamento da necessidade de disponibilidade orçamentária ou pendências administrativas (STJ, AROMS 30359, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, J. 04.10.2012; AROMS 30451, Relª Maria Thereza de Assis Moura, J. 19.06.2012; REsp 551961, Rel. Min. Paulo Gallotti, J. 27.03.2007).

3. A União admitiu a existência de crédito a ser quitado em favor das autoras e apresentou planilhas dos valores devidos, impondo--se, portanto, o reconhecimento da renúncia da prescrição, em que pesem as preliminares de ausência de interesse de agir, do

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litisconsórcio com a RFFSA e a ocorrência de prescrição suscita-das pela ré na contestação. Nesse quadro, tampouco se admite a justificativa de falta de disponibilidade orçamentária e financeira para deixar de pagar crédito relativo a atrasados, de outubro de 1991 a dezembro de 1996, cuja existência e valores foram confir-mados em 17.08.2004, inexistindo informação acerca de eventual pagamento.

4. Tratando-se de causa em que foi vencida a Fazenda Pública e inexistindo motivo a ensejar conclusão diversa, os honorários advocatícios devem ser fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), à vista do disposto no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil e dos padrões usualmente aceitos pela jurisprudência (STJ, AgRg--AI 1.297.055, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 10.08.2010; ED na AR 3.754, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 27.05.2009; TRF da 3ª Região, AC 0008814-50.2003.4.03.6119, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, J. 21.05.2012; AC 0021762-42.2007.4.03.6100, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, J. 23.04.2012).

5. Tendo em vista a repercussão geral reconhecida no AI 842063, bem como o julgamento, nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil, do REsp 1.205.946, reformulo parcialmente meu entendimento acerca da incidência dos juros moratórios nas con-denações impostas à Fazenda Pública para pagamento de verbas remuneratórias a servidores e empregados públicos, que deverão incidir da seguinte forma: a) até a vigência da Medida Provisória nº 2.180-35, de 24.08.2001, que acrescentou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, percentual de 12% a. a.; b) de 27.08.2001, data da vigência da Medida Provisória nº 2.180-35/01, a 29.06.09, data da Lei nº 11.960/2009, percentual de 6% a. a.; c) a partir de 30.06.2009, data da vigência da Lei nº 11.960/2009, a remu-neração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (STF, AI 842063, Rel. Min. Cezar Peluso, J. 16.06.2011; STJ, REsp 1.205.946, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 19.10.2011, TRF da 3ª Região, 1ª Seção, AR 97.03.026538-3, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, J. 16.08.2012). A correção monetária deve incidir desde a data em que devida as parcelas, conforme os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal.

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6. Apelação das autoras provido, para julgar procedente o pedido de pagamento das parcelas atrasados do benefício, relativas ao período de outubro de 1991 a dezembro de 1996.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indica-das, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação das autoras e julgar procedente o pedido de pagamento das parcelas atrasadas do be-nefício, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integran-te do presente julgado.

São Paulo, 07 de dezembro de 2015.

Andre Nekatschalow Desembargador Federal Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por Ivete dos Santos Costa e outro contra a sentença de fls. 102/104, que julgou improcedente o pedido, em razão da prescrição, tendo em vista pleitearem as autoras o paga-mento de parcelas de rendas mensais vencidas no período abril de 1985 a janeiro de 1997, e terem ingressado com a ação em 27.03.2003. Fixa-dos os honorários em 10% sobre o valor da causa (R$ 500,00).

Apelam as autoras com os seguintes fundamentos:

a) objetivam o recebimento de parcelas atrasadas da pensão por morte, relativas a abril de 1985, quando faleceu o instituidor, a janeiro de 1997, início do pagamento do benefício; ou, alter-nativamente, o das parcelas do quinquênio anterior ao pedido administrativo, formulado em outubro de 1996;

b) ocorreu espontânea confissão da dívida, pois o Ministério dos Transportes admitiu caber a cada autora o valor de R$ 19.904,80 (dezenove mil, novecentos e quatro reais e oitenta centavos), esclarecendo que os valores seriam pagos quando houvesse dis-ponibilidade orçamentária e anexou planilha de cálculo;

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c) o art. 219 da Lei nº 8.112/1990 ampara a imprescritibilidade do direito deduzido, ademais a prescrição fora interrompida pelo requeri-mento administrativo formulado em 1996 (fls. 108/113).

A União apresentou as contrarrazões (fls. 118/122).

É o relatório.

VOTO

Servidor. Reconhecimento administrativo. Prescrição. Renúncia tácita. O reconhecimento administrativo do pedido deduzido por servi-dor público, consubstanciado em pagamento, importa na renúncia tácita da prescrição por parte da Administração:

[...] SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL – QUINTOS – INCORPORAÇÃO – POSSIBILIDADE – MATÉRIA PACIFICADA – RECONHECIMENTO AD-MINISTRATIVO – RENÚNCIA TÁCITA DA PRESCRIÇÃO – OCORRÊN-CIA – 1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no senti-do de que a Medida Provisória nº 2.225-45/2001, ao se referir aos arts. 3º e 10 da Lei nº 8.911/1994, autorizou a incorporação dos quintos ou décimos aos servidores públicos federais, decorrentes do exercício de funções de confiança, no período de 8.4.1998 a 4.9.2001. Precedentes. 2. O acolhimento de pleito formulado na esfera administrativa, bem como o pagamento de parte das parcelas reconhecidas, demonstram a ocorrência de renúncia tácita da prescrição. Precedentes. Agravo regi-mental improvido.

(STJ, AGA 1314774, Rel. Min. Humberto Martins, J. 14.09.2010)

[...] RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DA DÍVIDA – RENÚNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL – O reconhecimento administrativo do dé-bito importa a renúncia ao prazo prescricional pela Administração e deve ser considerado termo inicial para contagem da prescrição qüinqüenal prevista no art. 1º do Decreto nº 20.910/19632. Precedente: AgRg no Ag 894122/SP, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 04.08.2008. Agravo regimental desprovido.

(STJ, AGA 1218014, Rel. Min. Felix Fischer, J. 24.08.2010)

[...] SERVIDOR PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – RETIFICAÇÃO DO ATO DE APOSENTADORIA – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DÉBITO – RENÚNCIA DA PRESCRIÇÃO – TER-

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MO INICIAL – AJUIZAMENTO DA AÇÃO – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO – 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça está firmada em que o reconhecimento administrativo do débito é capaz de promover a renúncia ou a interrupção do prazo prescricional já trans-corrido, sendo este, portanto, o termo inicial a ser levado em considera-ção para a contagem da prescrição quinquenal. 2. Ajuizada a ação em data anterior ao termo final do prazo prescricional, a prescrição somente alcança as parcelas vencidas antes do quinquênio que antecedeu a pro-positura da ação, em conformidade com o acórdão recorrido. Preceden-tes 3. Agravo Regimental desprovido.

(STJ, AGREsp 967730, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, J. 18.05.2010)

Servidor. Vantagem ou direito. Reconhecimento administrativo. Atraso no pagamento. Disponibilidade orçamentária. Impossibilidade. Incontroverso o recebimento de vantagem ou direito reconhecido admi-nistrativamente, não se justifica a demora do adimplemento da obriga-ção pela Administração, ao fundamento da necessidade de disponibili-dade orçamentária ou pendências administrativas:

[...] SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – INCORPORAÇÃO DE QUIN-TOS – CORREÇÃO MONETÁRIA – DIREITO DECORRENTE DE LEI E RECONHECIDO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – RECUSA DE PA-GAMENTO – LIMITES ORÇAMENTÁRIOS – LEI DE RESPONSABILIDA-DE FISCAL – MOTIVAÇÃO INIDÔNEA – ATO ILEGAL E ABUSIVO – [...]. 1. O direito do servidor público do Estado de Rondônia à incorporação dos quintos e às respectivas atualizações monetárias foi reconhecido tan-to pela Administração Pública quanto pelo Tribunal local, mas a negativa de pagamento da mencionada vantagem pessoal foi baseada apenas na falta de dotação orçamentária, tendo sido realçado o caráter discricioná-rio do orçamento. 2. Este Tribunal Superior consagrou o entendimento de que os limites previstos nas normas da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – mormente os relacionados às despesas com pessoal de ente públi-co – não são aptos a justificar o descumprimento dos direitos subjetivos do servidor público, como é o recebimento de vantagens asseguradas por lei (cf. art. 22, parágrafo único, da LC 101/2000). [...]

(STJ, AROMS 30359, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, J. 04.10.2012)

[...] SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – ATUALIZAÇÃO DA VANTA-GEM PESSOAL DA LEI COMPLEMENTAR Nº 68/1992 – RECONHECI-MENTO ADMINISTRATIVO – RECUSA DE PAGAMENTO – DOTAÇÃO

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ORÇAMENTÁRIA – VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO – 1. Os limites previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, no que tange às des-pesas com pessoal, não podem servir de justificativa para o não cumpri-mento de direitos subjetivos do servidor público, como é o recebimento de direito assegurado por lei e já reconhecido pela própria Administração Pública. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido

(STJ, AROMS 30451, Relª Maria Thereza de Assis Moura, J. 19.06.2012)

ADMINISTRATIVO – AJUDA DE CUSTO – REMOÇÃO EX-OFFÍCIO – RESSARCIMENTO – EXERCÍCIO FINANCEIRO SEGUINTE AO DA MU-DANÇA – ART. 10 DO DECRETO Nº 1.445/1995

1. A determinação contida no art. 10 do Decreto nº 1.445/1995 não veda o pagamento de ajuda de custo, cujo pedido se deu no exercício finan-ceiro seguinte ao da mudança.

2. Estando comprovados todos os requisitos para o pagamento da ajuda de custo, não há que se alegar a inviabilidade do ressarcimento por falta de previsão orçamentária.

3. Sendo a ajuda de custo parcela de natureza indenizatória, inviável o empenho prévio da despesa.

4. Recurso a que se nega provimento.

(STJ, REsp 551961, Rel. Min. Paulo Gallotti, J. 27.03.2007)

Honorários advocatícios. Sucumbência da Fazenda Pública. Ar-bitramento equitativo. Tratando-se de causa em que foi vencida a Fa-zenda Pública e inexistindo motivo a ensejar conclusão diversa, os honorários advocatícios devem ser fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), à vista do disposto no art. 20, § 4º, do Código de Processo Ci-vil e dos padrões usualmente aceitos pela jurisprudência (STJ, AgRg-AI 1.297.055, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 10.08.2010; ED na AR 3.754, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 27.05.2009; TRF da 3ª Re-gião, AC 0008814-50.2003.4.03.6119, Relª Desª Fed. Ramza Tartuce, J. 21.05.2012; AC 0021762-42.2007.4.03.6100, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, J. 23.04.1202).

Servidor. Juros moratórios. Tendo em vista a repercussão geral reconhecida no AI 842063, bem como o julgamento, nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil, do REsp 1.205.946, reformu-lo parcialmente meu entendimento acerca da incidência dos juros mo-ratórios nas condenações impostas à Fazenda Pública para pagamen-

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to de verbas remuneratórias a servidores e empregados públicos, que deverão incidir da seguinte forma: a) até a vigência da Medida Provi-sória nº 2.180-35, de 24.08.2001, que acrescentou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, percentual de 12% a.a.; b) de 27.08.2001, data da vi-gência da Medida Provisória nº 2.180-35/2001, a 29.06.2009, data da Lei nº 11.960/2009, percentual de 6% a. a.; c) a partir de 30.06.2009, data da vigência da Lei nº 11.960/2009, a remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (STF, AI 842063, Rel. Min. Cezar Pe-luso, J. 16.06.2011; STJ, REsp 1.205.946, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 19.10.2011, TRF da 3ª Região, 1ª Seção, AR 97.03.026538-3, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, J. 16.08.2012).

Correção monetária. A correção monetária deve incidir desde a data em que devida as parcelas, conforme os índices previstos no Manu-al de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal.

Do caso dos autos. Relatam Ivete dos Santos Costa e Clonirce dos Santos Costa a condição de pensionistas, sendo instituidor o genitor, Le-andro Augusto da Costa, funcionário público civil, vinculado ao Minis-tério dos Transportes, como empregado aposentado da Rede Ferroviária Federal S/A, falecido em 29.03.85. Declaram ter solicitado a pensão em outubro de 1996, que passaram a receber a partir de fevereiro de 1997, embora a ré tenha concedido o benefício a partir de janeiro de 1991. Sustentam o direito de receber as parcelas vencidas a partir de abril de 1984 até janeiro de 1997 ou, alternativamente, a partir de janeiro de 1991 até janeiro de 1997. A ação foi ajuizada em 27.03.2003.

Juntaram as autoras cópias da certidão de óbito do genitor e com-provantes de rendimentos da pensão, com registro de início do benefício em 01.01.91 (cf. fls. 8, 11/12 e 16/17).

Contestou a União e alegou falta de interesse de agir em relação ao pedido de pagamento das parcelas atrasadas a partir de 1991, tendo em vista não ter sido demonstrada a resistência da Administração a tal plei-to. Aduziu o litisconsórcio com a Rede Ferroviária Federal S/A e também estar prescrito o direito, em razão da propositura da ação em março de 2003 e o início do pagamento do benefício a partir de 1997. No mérito, afirma que os atrasados são exigíveis a partir de outubro de 1991, pois requerida a pensão em outubro de 1996, prescritas estão as parcelas an-teriores aos 5 (cinco) anos (Lei nº 8.112/1990, art. 219). Esclarece que o

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início do benefício – 01.01.1991 – que consta dos comprovantes de ren-dimentos, refere-se à data que entrou em vigência a Lei nº 8.112/1990. Por fim, reitera a desnecessidade de provimento judicial pelo fato de o Despacho nº 1065/2004, de 17.08.2004, da Divisão de Cálculos de Aposentadoria e pensões do Ministério dos Transportes, noticiar que, efetivamente, as autoras possuem crédito a ser quitado tão logo haja disponibilidade orçamentária e financeira (fls. 43/54). Juntou o despacho no qual consta a existência de crédito no valor de R$ 19.904,80 (deze-nove mil, novecentos e quatro reais e oitenta centavos), para cada uma das autoras, bem como planilha financeira e de cálculos dos valores em atraso (fls. 56/85).

O Juízo a quo julgou improcedente o pedido pela ocorrência da prescrição tendo em vista pleitearem as autoras o pagamento de parcelas de rendas mensais vencidas no período abril de 1985 a janeiro de 1997, e terem ingressado com a ação em 27.03.2003.

Assiste razão às autoras, merece ser reformada a sentença.

É certo que a União admitiu a existência de crédito a ser quitado em favor das autoras e apresentou planilhas dos valores devidos, impon-do-se, portanto, o reconhecimento da renúncia da prescrição, em que pesem as preliminares de ausência de interesse de agir, do litisconsórcio com a RFFSA e a ocorrência de prescrição suscitadas na contestação.

Nesse quadro, tampouco se admite a justificativa de necessidade de disponibilidade orçamentária e financeira para deixar de pagar cré-dito relativo a atrasados, de outubro de 1991 a dezembro de 1996 (con-siderando-se prescritas as parcelas anteriores aos cinco anos do pedido do benefício, em outubro de 1996, e o início do pagamento, em janeiro de 1997) cuja existência e valores foram confirmados em 17.08.2004, inexistindo, até o momento, informação acerca de eventual quitação.

Ante o exposto, dou provimento à apelação das autoras, para jul-gar procedente o pedido de pagamento das parcelas atrasados do be-nefício, relativas ao período de outubro de 1991 a dezembro de 1996, com correção monetária e juros, Fixados os honorários advocatícios em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

É o voto.

Andre Nekatschalow Desembargador Federal Relator

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 5061291‑25.2014.4.04.7000/PRRelator: Fernando Quadros da SilvaApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSApelado: Engedat Construção Civil Ltda.Advogado: Nelson Beltzac Junior

EmEnTAADMINISTRATIVO – ACIDENTE DE TRABALHO – AÇÃO REGRESSIVA DO INSS – CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL – IMPOSSIBILIDADE

Segundo o art. 475-Q do CPC, a constituição de capital somente ocorre quando a dívida for de natureza alimentar. No caso, a con-denação da requerida não se refere a um pensionamento, e sim a uma restituição, e o segurado não corre risco de ficar sem a verba alimentar, cujo pagamento é de responsabilidade da autarquia.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indi-cadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 16 de dezembro de 2015.

Des. Federal Fernando Quadros da Silva Relator

RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS- em desfavor de Engedat Construção Civil Ltda., por meio da qual busca o ressarcimento dos valores despendidos, e por aqueles que ainda o serão, com o pagamento de pensão por morte de

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seus empregados/segurados João de Paula Cordeiro e Santos Capelim de Lara.

A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para conde-nar o réu a restituir ao INSS os valores pagos em razão da concessão da pensão por morte dos segurados João de Paula Cordeiro e Santos Capelim de Lara (NB 1565785395, 1565785387, 1431031604 e 1571608190), corrigidos monetariamente, bem como a restituir mensalmente os valo-res que se seguirem até a extinção dos referidos benefícios. Condenada a ré em honorários advocatícios de R$ 3.000,00.

O INSS alega que a constituição de capital requerida visa a garan-tir o pagamento da condenação. Refere que tem o intuito de assegurar o reconhecimento ao pagamento das parcelas vincendas. Requer a proce-dência da ação.

Sem as contrarrazões, vieram os autos para este Tribunal.

É o relatório.

Peço dia.

Des. Federal Fernando Quadros da Silva Relator

VOTOA questão em debate pertine à ação de regresso proposta pelo

INSS com fundamento no art. 120 da Lei nº 8.213/1991, que preceitua:Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de seguran-ça e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.

Trata-se, assim, de responsabilidade civil subjetiva, na qual, além dos pressupostos (a) da ação ou omissão do agente, (b) do dano expe-rimentado pela vítima e (c) do nexo causal entre a ação e omissão e o dano, deve ficar comprovada também (d) a culpa do agente, nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil, verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusiva-mente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a ou-trem, fica obrigado a repará-lo.

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A sentença de primeiro grau foi de parcial procedência, negando apenas a constituição de capital. O INSS entende que a referida renda deve ser concedida. Verifico, no entanto, a impossibilidade de sua con-cessão, eis que a causa não trata de dívida de natureza alimentar. Eis o teor do CPC:

Art. 475-Q. Quando a indenização por ato ilícito incluir prestação de alimentos, o juiz, quanto a esta parte, poderá ordenar ao devedor cons-tituição de capital, cuja renda assegure o pagamento do valor mensal da pensão.

§ 1º Este capital, representado, por imóveis, títulos da dívida pública ou aplicações financeiras, em banco oficial, será inalienável e impenhorável enquanto durar a obrigação do devedor.

§ 2º O juiz poderá substituir a constituição do capital pela inclusão do beneficiário da prestação em folha de pagamento de entidade de direito público ou de empresa de direito privado de notória capacidade econô-mica, ou, a requerimento do devedor, por fiança: bancária ou garantia real, em valor a ser arbitrado de imediato pelo juiz.

§ 3º Se sobrevier modificação das condições econômicas, poderá a parte requerer, conforme as circunstâncias, redução ou aumento da prestação.

§ 4º Os alimentos podem ser fixados tomando por base o salário-mínimo.

§ 5º Cessada a obrigação de prestar alimentos, o juiz mandará liberar o capital, cessar o desconto em folha ou cancelar as garantias prestadas.

Percebe-se, assim, que o comando visa à garantia da obrigação de alimentos, e não a de qualquer obrigação. Isso em razão de natureza fundamental da obrigação a ser prestada, em confronto com dívidas de outras espécies.

Destarte, estaria desvirtuada a finalidade do instituto, caso se o alargasse para qualquer obrigação. No caso concreto, deve o INSS pagar o benefício a quem de direito e a cada mês cobrar das rés o valor devido, administrativamente.

Nesse sentido é a jurisprudência desta Corte tanto para a respon-sabilização das empresas quanto para a negativa da constituição de ca-pital:

PROCESSO CIVIL – RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE DO TRA-BALHO – ART. 120 DA LEI Nº 8.213/1991 – CULPA DO EMPREGADOR – AÇÃO REGRESSIVA – POSSIBILIDADE – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL

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1. O fato de as empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho – SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.

2. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinaçoes e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsa-bilidade pelas consequencias quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada, afirmando de modo simplista que cumpriu com seu dever apenas estabelecendo referidas normas.

3. Demonstrada a negligencia da empregadora quanto a fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito a ação regressi-va prevista no art. 120 da Lei nº 8.213/1991.

4. Os fundos da previdência social, desfalcados por acidente havido hi-poteticamente por culpa do empregador, são compostos por recursos de diversas fontes, tendo todas elas natureza tributária. Se sua natureza é de recursos públicos, as normas regentes da matéria devem ser as de direito público, porque o INSS busca recompor-se de perdas decorrentes de fato alheio decorrente de culpa de outrem.

5. Quando o INSS pretende ressarcir-se dos valores pagos a título de pensão por morte, a prescrição aplicada não é a prevista no Código Civil, trienal, mas, sim, a quinquenal, prevista no Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932.

6. Não procede o pedido de constituição de capital em relação as parce-las vincendas do benefício, pois a aplicação do art. 475-Q do Código de Processo Civil destina-se a garantia de subsistencia de pensionista. Como o embargado não está sendo condenado a um pensionamento e sim a um ressarcimento das despesas relativas ao pagamento do benefício de pensão por morte, a beneficiária não corre risco de ficar sem a verba ali-mentar, cujo pagamento é de responsabilidade do INSS.

7. Em razão da interpretação de cláusula contratual do seguro, em que prevista a não cobertura específica em relação a ação regressiva promo-vida pelo INSS, improcede o pedido de condenação da seguradora em cobrir os custos da empregadora.

8. Apelações improvidas.

(AC 5007144-05.2012.404.7102, 3ª T., Rel. p/Ac. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DE 18.04.2013)

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DIREITO CIVIL – AÇÃO REGRESSIVA PROPOSTA PELO INSS – RESSAR-CIMENTO DE DANO – ACIDENTE DE TRABALHO – ART. 120 DA LEI Nº 8.213/1991 – PRESCRIÇÃO – PRAZO TRIENAL – ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL – TERMO A QUO – DESEMBOLSO – NEGLIGÊN-CIA DO EMPREGADOR – CONFIGURAÇÃO – CONSTITUIÇÃO DE CA-PITAL – NÃO-CABIMENTO

1. Consoante prescreve o art. 120 da Lei nº 8.213/1991, “nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social pro-porá ação regressiva contra os responsáveis”.

2. A ação regressiva para ressarcimento de dano proposta pelo INSS tem natureza civil, e não administrativa ou previdenciária. Precedentes do e-STJ.

3. O sistema previdenciário é securitário e contributivo, daí porque os valores que o INSS persegue não são produto de tributo, mas de contri-buições vertidas à seguridade social, pelo que, em sentido estrito, não se trata de erário, aplicando-se, quanto à prescrição, o art. 206, § 3º, V, do Código Civil, e não o Decreto nº 20.910/1932. Precedentes desta Turma.

4. “O pressuposto lógico do direito de regresso é a satisfação do paga-mento da condenação ao terceiro, autor da ação de indenização propos-ta contra o segurado. Não há que se falar em ação regressiva de cobrança sem a ocorrência efetiva e concreta de um dano patrimonial”. No caso, não operada a prescrição, pois não transcorreram três anos entre o de-sembolso pela autarquia e a propositura da ação.

5. Comprovado nos autos que a conduta negligente do empregador oca-sionou o acidente laboral do qual resultou a morte de seu funcionário, faz jus a autarquia previdenciária ao ressarcimento dos gastos efetua-dos com a pensão recebida pela viúva, nos termos do art. 120 da Lei nº 8.213/1991.

6. Indevida a constituição de capital no caso dos autos, nos termos do art. 475-Q do CPC, pois o dispositivo invocado não se destina a qualquer obrigação, mas apenas para o cumprimento de obrigação alimentar. Des-sa forma, seu deferimento no caso dos autos desvirtuaria a finalidade do instituto. Precedentes desta Corte.

(Apelação Cível nº 0008580-07.2009.404.7000, 4ª T., Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler, por maioria, DE 17.09.2010, publicação em 21.09.2010)

Mantida a sentença no tocante.

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Por fim, o prequestionamento quanto à legislação invocada fica estabelecido pelas razões de decidir, o que dispensa considerações a respeito, vez que deixo de aplicar os dispositivos legais tidos como aptos a obter pronunciamento jurisdicional diverso do que até aqui foi decli-nado, considerando-se aqui transcritos todos os artigos da Constituição e/ou de lei referidos pelas partes.

Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação.

Des. Federal Fernando Quadros da Silva Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16.12.2015

Apelação Cível nº 5061291-25.2014.4.04.7000/PR

Origem: PR 50612912520144047000

Relator: Des. Federal Fernando Quadros da Silva

Presidente: Marga Inge Barth Tessler

Procurador: Dr. Claudio Dutra Fontella

Apelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Apelado: Engedat Construção Civil Ltda.

Advogado: Nelson Beltzac Junior

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16.12.2015, na sequência 463, disponibilizada no DE de 03.12.2015, da qual foi intimado(a) Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Ministério Pú-blico Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.

Relator Acórdão: Des. Federal Fernando Quadros da Silva

Votante(s): Des. Federal Fernando Quadros da Silva Des. Federal Marga Inge Barth Tessler Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira

José Oli Ferraz Oliveira Secretário de Turma

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

7570

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoPoder JudiciárioGabinete do Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho (convocado)APel‑Reex 32426‑PB nº 32426‑PB (0007101‑33.2012.4.05.8200)Adv./Proc.: Vanessa Araújo de Oliveira Lima e outroOrigem: 3ª Vara Federal da Paraíba (Competente p/ Execuções Penais) – PBRelator: Des. Federal Ivan Lira de Carvalho (convocado)

EmEnTAADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – DEPARTAMENTO DA POLÍCIA FEDERAL – PERCEP-ÇÃO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE – PRETENSÃO DE CUMULAR O ADICIONAL DE PERI-CULOSIDADE – ART. 68, § 1º DA LEI Nº 8.112/1990 – IMPOSSIBILIDADE – JUSTIÇA GRATUITA

I – Apelação e remessa oficial de sentença que julgou procedente o pedido para restabelecer o adicional de periculosidade ao autor.

II – Apela a União alegando que o demandante não pode cumular os adicionais de periculosidade com o de insalubridade e que a prova colhida nos autos relativa ao adicional de periculosidade é imprestável, posto que fica claro que não existem materiais explo-sivos armazenados no local onde trabalha o autor/apelado.

III – O art. 68, da Lei nº 8.112/1990 e o art. 12, II, da Lei nº 8.270/1991, determinam que os servidores públicos que tra-balhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, fazem jus ao adicional de periculosidade ou insalubridade, calculado sobre a remuneração.

IV – No caso, o autor que é servidor público federal e pertence ao quadro administrativo do Departamento da Polícia Federal no Estado da Paraíba. Sustenta que percebia até setembro de 2008 o adicional de periculosidade, por trabalhar em local em que estão estocados grande número de armamentos e explosivos. Argumen-ta que o benefício foi cancelado com base no laudo de Avaliação Ambiental nº 006/2008-SIMED, emitido por médicos do trabalho.

V – Esse Tribunal já decidiu, com base no art. 68, §1º da Lei nº 8.112, que não se pode cumular o adicional de periculosidade

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com o de insalubridade, de sorte que quando o servidor fizer jus a ambos terá de optar por um deles. Como na hipótese dos autos o postulante já percebe o adicional de insalubridade, conforme evidenciado pelas fichas financeiras de fls. 31/40, carece-lhe inte-resse na pretensão de cumular o adicional de periculosidade.

Precedentes: Primeira Turma, APelREex 31048/AL, Rel. Des. Fe-deral Manoel Erhardt, unânime, DJe 25.09.2014 – p. 54; Quarta Turma, APel-REex/CE 08014661320134058100, Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, unânime, J. 18.02.2014.

VI – Em razão do demandante/apelado ser beneficiário da justiça gratuita, deixa-se de condená-lo em custas processuais e honorá-rios advocatícios.

VII – Apelação e remessa oficial providas.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação/Reexame Necessário, em que são partes as acima mencionadas.

Acordam os Desembargadores Federais da Segunda Turma do Tri-bunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, em dar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas que estão nos autos e que fazem parte deste julgado.

Recife, de de 2015.

Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho Relator Convocado

RELATÓRIO

O Exmo. Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho (Relator Convocado): Trata-se de apelação e remessa oficial de sentença que jul-gou procedente o pedido para restabelecer o adicional de periculosidade recebido pelo autor. Entendeu o Juízo originário que restou comprovado que o demandante continua exercendo suas atividades com risco de vida, trabalhando em contato com produtos armazenados que contém grande quantidade de pólvora que pode ocasionar uma explosão.

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Apela a União alegando que o demandante não pode cumular os adicionais de periculosidade com o de insalubridade e que a prova colhida nos autos relativa ao adicional de periculosidade é imprestável, posto que não existem materiais explosivos armazenados no local onde trabalha o autor/apelado.

Sem contrarrazões.

Subiram os autos, sendo-me conclusos por força de distribuição.

É o relatório.

Peço a inclusão do feito em pauta para julgamento.

VOTO

O Exmo. Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho (Rela-tor Convocado): O art. 68, da Lei nº 8.112/1990 e o art. 12, II, da Lei nº 8.270/1991, determinam que os servidores públicos que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, fazem jus ao adi-cional de periculosidade ou insalubridade, calculado sobre a remune-ração.

No caso, o autor que é servidor público federal e pertence ao qua-dro administrativo do Departamento da Polícia Federal no Estado da Paraíba. Sustenta que percebia até setembro de 2008 o adicional de periculosidade, por trabalhar em local em que estão estocados grande número de armamentos e explosivos. Argumenta que o benefício foi cancelado com base no laudo de avaliação ambiental nº 006/2008-SI-MED, emitido por médicos do trabalho.

Esse Tribunal já decidiu, com base no art. 68, § 1º da Lei nº 8.112, que não se pode cumular o adicional de periculosidade com o de insa-lubridade, de sorte que quando o servidor fizer jus a ambos terá de optar por um deles. Como na hipótese dos autos o postulante já percebe o adi-cional de insalubridade, conforme evidenciado pelas fichas financeiras de fls. 31/40, carece-lhe interesse na pretensão de cumular o adicional de periculosidade.

Segue a jurisprudência desta egrégia Corte sobre a matéria:

ADMINISTRATIVO – POLICIAIS FEDERAIS – ADICIONAL DE PERICU-LOSIDADE – ARMAZENAMENTO DE MUNIÇÕES E EXPLOSIVOS – PE-

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RÍCIA JUDICIAL – EXPOSIÇÃO ÀS CONDIÇÕES DE PERICULOSIDADE – APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL IMPROVIDAS

1. A sentença apelada julgou procedente o pedido do autor, condenando a União Federal a restabelecer o adicional de periculosidade dos subs-tituídos elencados à fl. 57 que têm lotação e exercício de suas ativida-des laborais na Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal em Alagoas, situada na Av. Walter Ananias, s/n, Jaraguá, CEP 57.025-510, Maceió–Alagoas, observado o percentual de 10% (dez por cento) sobre o vencimento do cargo efetivo (art. 12, inciso II e § 3º, da Lei nº 8.270/1991) e o disposto no item 56 deste decisum. Condenou, ainda, a ré a pagar os valores devidos a título do referido adicional desde a data da suspensão indevida, os quais deverão ser corrigidos até a data do efetivo pagamento, na forma do Manual de Cálculo da Justiça Federal.

2. “[...] o Laudo (fls. 464/483) elaborado pelo Perito nomeado pelo Juí-zo, depois de demonstrar (inclusive ilustrando com fotografias) a grande quantidade de munições e explosivos armazenados de forma inadequada nas dependências da Superintendência Regional da Polícia Federal em Alagoas, concluiu pela exposição de todos os servidores nela lotados a situação de periculosidade.”

3. “O Expert ainda consignou no laudo sob enfoque a existência de 972,275 Kg de pólvora, computados a partir do somatório da referida substância, auferida a partir das munições estocadas, isso sem contar a quantidade de pólvora das granadas e munições recebidas da campanha do desarmamento e excluindo as espoletas. Nas informações adiciona-das ao laudo pericial (fls. 526/527), vindas à lume por provocação do au-tor, o Perito declinou o quantitativo dos produtos perigosos armazenados na SR/AL, a saber: a) munições – 126.740 unidades; b) granadas – 540 unidades; e c) sinais fumígenos flutuantes – 10 unidades”.

4. “De qualquer sorte, o fato é que da minuciosa análise do conjunto de elementos fáticos e jurídicos que dão substância aos presentes autos não há como olvidar que enquanto subsistirem as condições de periculosida-de retratadas na fundamentação deste decisum, especialmente no Laudo Pericial de fls. 464/483, fazem jus ao adicional de periculosidade, desde a data em que tal benefício foi cassado pela Portaria nº 368/2011-GAB/SR/DPF/AL, de 29.12.2011, os servidores representados pelo sindicato autor, relacionados à fl. 57 destes autos, que comprovadamente exerce-rem suas atividades laborais nas dependências do prédio onde funciona a Superintendência Regional da Polícia Federal em Alagoas, situado na Av. Walter Ananias, s/n, Jaraguá, CEP 57.025-510, Maceió-Alagoas”.

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5. “[...] não é exagero relembrar que, consoante a disciplina do art. 68 da Lei nº 8.112/1990, mesmo os servidores nesta ação representados pelo autor só farão jus a percepção do adicional de periculosidade propugna-do se não resultar em cumulação com eventual percepção de adicional de insalubridade, de sorte que quando o servidor fizer jus a ambos terá de optar por um deles (parágrafo 1º). Há que se observar, de igual modo, que o direito à percepção do adicional em tela cessará com a eliminação dos riscos que ensejaram sua concessão (parágrafo 2º)”.

6. Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF 5, Primeira Tur-ma, APel-REex 31048/AL, Rel. Des. Fed. Manoel Erhardt, unânime, DJe 25.09.2014, p. 54).

ADMINISTRATIVO – MÉDICA – SERVIDORA DA UNIVERSIDADE FEDE-RAL DO CEARÁ QUE OPERA APARELHO DE RAIO-X – GRATIFICAÇÃO DE RAIO-X E ADICIONAL DE IRRADIAÇÃO IONIZANTE – CUMULA-ÇÃO – POSSIBILIDADE – NATUREZAS JURÍDICAS DISTINTAS

1. Trata-se de remessa oficial e apelação em face da sentença que, ra-tificando a liminar, concedeu a segurança para garantir a concessão da Gratificação de Raio-X, cumulada com o adicional de insalubridade (que decorre da radiação ionizante), já recebido pela impetrante, servidora da UFC/CE, na função de médica.

2. É incontroverso que a servidora da Universidade Federal do Ceará, lotada no Hospital Walter Cantídio, na função de médica, opera apare-lho de Raio-X, por 36 horas da sua carga horária semanal e, ainda, que a alegação da universidade é a impossibilidade de percepção conjunta, em respeito aos princípios da legalidade e da razoabilidade.

3. O adicional por irradiação ionizante é retribuição genérica por risco potencial presente no ambiente de trabalho, sendo devida a todos os servidores, independente do cargo ou função que exerçam. Por sua vez, a gratificação de raio-X é retribuição específica, devida às categorias fun-cionais legalmente especificadas que, no exercício de sua atividade, se encontrem expostos ao risco de radiação, daí a natureza jurídica distinta entre elas.

4. A Lei nº 8.270/1991 e Decretos nºs 877/1993 e 81.384/1978, que cui-dam da matéria, em nenhum momento vedou o acúmulo do adicional de irradiação ionizante com a gratificação por trabalhos com raios X.

5. A vedação prevista no parágrafo 1º, do art. 68 da Lei nº 8.112/1990, atine, tão-somente, a opção por um dos adicionais a que, porventura,

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teria direito, quais sejam, o de insalubridade ou o de periculosidade. Não há, portanto, qualquer violação ao princípio da legalidade.

6. Precedentes, do STJ, desta Corte, de outros Regionais, no sentido de reconhecer a cumulação pretendida: AgREsp 201100521824, Benedi-to Gonçalves, STJ – Primeira Turma, DJe Data: 16.08.2011; APel-REex 00032203020124058400, Desª Fed. Joana Carolina Lins Pereira, TRF 5 – Terceira Turma, DJe Data: 25.04.2013 – p. 483; AC 200438030013938, TRF 1 – Primeira Turma, DJF1 Data: 30.03.2010, p. 372 e AC 200871020033865, Sérgio Renato Tejada Garcia, TRF 4 – Quarta Tur-ma, DE 15.03.2010.

7. Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF 5, Quarta Turma, APel--REex/CE 08014661320134058100, Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira, unânime, J. 18.02.2014).

Em razão do demandante/apelado ser beneficiário da justiça gra-tuita, deixa-se de condená-lo em custas processuais e honorários advo-catícios.

Diante do exposto, dou provimento à apelação e à remessa oficial.

É como voto.

Parte Geral – Ementário de Jurisprudência7571 – Ação civil pública – fauna – formalização de acordo – DNIT e DER/SP – responsa-

bilidade – possibilidade

“Processual civil. Direito ambiental. Fauna. Ação civil pública. Audiência de conciliação. Formalização de acordo. Possibilidade. Assunção de obrigações pelos DNIT e DER/SP no sentido de evitar atropelamento de animais silvestres entre os quilômetros 72 e 75 da Rodovia Fernão Dias. Homologado posterior com resolução do mérito. Ilegitimidade passiva dos réus. Não configurada. Não cumprimento do acordo por parte do DER/SP. Alegação de inexequi-bilidade das obrigações. Não subsistente. Perda de objeto da ação. Inocorrência. Transmu-tação de liminar em sentença homologatória. Cabimento. Ofensa ao pacto federativo. Não ocorrência. 1. Válido e eficaz o acordo ajustado na audiência de conciliação, porque agiliza a tomada de providências nessa área sensível que é a ambiental, notadamente no caso em que animais silvestres são atropelados ao cruzar a Rodovia Fernão Dias nos quilômetros 72 a 75, por ausência de alambrados e passarelas para a fauna. 2. O DNIT e o DER/SP são partes legítimas e solidárias para figurar no polo passivo da ação, mormente quando o primeiro concedeu a execução da duplicação da rodovia à autarquia estadual e ficou, por imposição legal, com a responsabilidade fiscalizatória. 3. O fato de a autoestrada ter sido concedida, em maio de 2008, à empresa privada não exime o DER/SP e o DNIT do cumprimento do ajustado em 2003, porque ambos têm o dever constitucional e legal de proteger o meio ambiente e preservar as florestas, fauna e flora, que é uma tarefa comum a todos os entes da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). 4. As obrigações assumidas pelo DER/SP resumem-se a estudos ambientais, os quais não sofreram qualquer limitação com a concessão da rodovia. Quanto ao acréscimo do alambrado de dois para três metros, as providências devem ser tomadas pelos réus junto à concessionária, se é que já não tenha sido objeto da concessão, dado que o problema já era evidente em 2003 e a assunção da rodovia pela empresa privada deu-se em 2008. 5. Não há que se falar em invalidade do pro-cesso, na medida em que a autarquia estadual esteve devidamente representada na audiência e o acordo foi firmado pela Procuradora estadual, pelo Superintendente do DER/SP e de-mais participantes, com a concordância do autor da ação. A Emenda Constitucional Estadual nº 19/2004, que determina a submissão do teor do acordo à avaliação do Procurador-Geral do Estado, é inaplicável ao caso, porquanto promulgada após a data da audiência de conciliação. 6. A suposição do recorrente de que a expedição da licença posterior (de operação) revalida a anterior (de instalação), mesmo que houvesse vícios ou irregularidades, não encontra suporte na legislação ambiental, de modo que não há esvaziamento da ação. 7. A homologação do acordo, ainda que tempo depois de firmado, nada mais fez do que por fim a uma ação que, com a inquestionável concordância das partes, nenhum outro conflito de interesse restava nos autos. Se as partes deliberaram livremente sobre o acordo, inexiste transgressão aos princípios do contraditório e da ampla defesa. 8. Se todo o objeto da pretensão do autor foi obtido com a assunção unilateral de obrigações pelos réus, não há que se falar em renúncia ou indisponibi-lidade do objeto pelo Parquet. 9. Também não incorreu o Magistrado em violação à preclusão pro judicato, na medida em que, constatado que o acordo firmado havia exaurido a pretensão resistida, reconheceu, por sentença, os termos ajustados entre as partes, já que desnecessária qualquer nova manifestação judicial. 10. A Carta Magna e a legislação ambiental atribuem aos quatro entes da federação competência comum para que possam exercer sem qualquer relação de hierarquia, mediante uma relação de cooperação, a proteção do meio ambiente e a preservação das florestas, fauna e flora, de modo que não há respaldo para a alegação de afronta ao pacto federativo. 11. Matéria preliminar rejeitada e agravos retidos e apelações não providos. 12. Deve ser retificada a autuação para excluir os indicados como réus e sucedido,

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à vista do desmembramento da ação de improbidade administrativa, determinado pelo juízo a quo.” (TRF 3ª R. – AC 0029546-46.2002.4.03.6100 – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Andre Nabarrete – DJe 09.09.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEPassamos a comentar o acórdão que trata da proteção à fauna na Rodovia Fernão Dias.

Consta dos autos, que o Ministério Público Federal interveio e requereu providências relacionadas ao cercamento de trechos da Fernão Dias entre os quilômetros 72 e 75 para proteger a fauna local.

O objetivo da ação era de condenar os órgãos a desenvolver estudos ambientais neces-sários e a pagar um programa de monitoramento da onça-parda, espécie ameaçada de extinção, pelo período de cinco anos.

Com base nas alegações, os dirigentes do DNIT (Departamento Nacional de Infraestru-tura de Transportes) e do DER/SP (Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo) foram acusados também de improbidade administrativa.

Foi realizada audiência de conciliação em 27 de fevereiro de 2003 e firmado acordo entre as partes. A ação de improbidade administrativa em razão do acordado entre as partes.

O DER/SP havia assumido as obrigações de complementar o alambrado entre os qui-lômetros 72 e 75 da rodovia para três metros, com dispensa judicial de licitação, já que o cercamento de dois metros de altura, previsto anteriormente, já estava em fase adiantada de construção.

Consta que o órgão havia se comprometido a apresentar orçamento do custo de passa-relas para a travessia segura de animais na pista, um plano de proteção à fauna com estrutura de resgate de animais feridos e uma proposta de estudo de impacto em relação aos ecossistemas naturais.

Com base no acordo, o DNIT deveria fazer quatro placas de sinalização, duas na ida e duas na volta, com os dizeres: “Cuidado, travessia de animais”.

Já o MPF havia se comprometido a apresentar as especificações técnicas para que o DER providenciasse o orçamento do custo da obra. Após isso, o Juízo decidiria e provi-denciaria meios e mecanismos jurídicos para implantar a obra.

Entendendo que teria ocorrido consenso entre as partes, o juiz de primeiro grau homo-logou o acordo e extinguiu o feito com resolução do mérito, mesmo assim, o DNIT e o DER/SP recorreram da sentença, alegando que atualmente a Rodovia Fernão Dias é explorada por empresa privada concessionária de serviço público, a quem cabe arcar com o passivo ambiental, e que não seriam mais partes legítimas do processo.

Ao analisar os recursos, o relator do processo, não acolheu as alegações dos réus.

Explicou em sua decisão, que há dois impactos principais na relação entre a rodovia e a fauna silvestre: a perda de espécies por atropelamento e a real possibilidade de risco à segurança do usuário.

Vale trazer trecho do voto do relator:

“Por qualquer ângulo que se examine a questão, sobressai a responsabilidade solidária entre os réus. O DER/SP como executor das obras e o DNIT por ineficiência na fiscali-zação no cumprimento do acordado são causadores direta e indiretamente pelos danos ambientais. A omissão do órgão federal foi flagrante, mormente quando deixou de tomar providências protetivas aos animais silvestres, ainda que soubesse que não havia passa-gem segura para eles nas áreas em que a rodovia cruza seu habitat natural.”

172 ������������������������������������������������������������������������RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA

[...]

“A Constituição Federal estatui que a proteção do meio ambiente e a preservação das florestas, fauna e flora são uma tarefa que compete a todos os entes da Federação, que é de natureza comum. Essa competência é distribuída à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, para que possam exercê-la sem qualquer relação de hierarquia entre eles mediante uma relação de cooperação.”

O relator também discordou da alegação do DER/SP de que a realização de obras na rodovia federal às custas do erário estadual afrontaria o pacto federativo. Ele explicou que a execução do convênio com o governo federal previa contrapartida financeira. Além disso, ressaltou que o DER/SP teve cinco anos para cumprir as obrigações assumidas na audiência de conciliação, em fevereiro de 2003, e somente após a entrega da rodovia à iniciativa privada, em maio de 2008, em desrespeito ao que ele próprio se comprome-tera, pediu a sua dispensa da incumbência.

Ao contrário do que afirma a autarquia, não se pode falar em afronta ao pacto federativo quando é o próprio que atribui competência aos quatro entes da federação para proteger o meio ambiente.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região negou provimento aos recursos do Depar-tamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT, anteriormente denominado DNER) e Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo (DER/SP) e confirmou que os órgãos devem cumprir providências de proteção à fauna na Rodovia Fernão Dias.

7572 – Ação civil pública – posto de gasolina – combustível adulterado – comercialização – dano moral coletivo – configuração

“Ação civil pública. Posto de gasolina. Comercialização de combustível adulterado. Dano mo-ral coletivo. Configuração. Indenização. Condenação mantida. 1. Ação civil pública instruída com a Representação nº 1.24.018.000092/2005-18 do Ministério Público Federal, originada de inquérito policial instaurado para apuração da prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.176/1991, pretendendo-se no presente feito a condenação do réu ao pagamento de in-denização por danos morais difusos, em razão da comercialização de combustível adulterado na cidade de Queluz/SP. 2. Legitimidade do Ministério Público Federal para promover a ação civil pública visando à proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, bem como no zelo pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição Federal, promo-vendo as medidas necessárias a sua garantia, decorre expressamente do art. 129, incisos II e III, da Constituição Federal e do art. 6º, inciso VII, alínea c, da Lei Complementar nº 75/1993, além da legislação específica que lhe assegura, de maneira categórica, legitimidade para ma-nejá-la (Lei nº 7.347/1985, art. 5º, I). A Lei nº 8.078/1990 (Código de Consumidor – arts. 81 e ss.) trouxe a lume disposições expressas acerca da legitimidade do Ministério Público para a defesa dos interesses e direitos dos consumidores, de forma coletiva, garantindo a utilização de todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada e efetiva tutela dos aludidos direitos. 3. A indenização por danos morais se assenta na ideia de defesa dos princípios e va-lores da pessoa, de natureza essencialmente axiológicas, valores esses que interessam a toda a sociedade, tendo a indenização o objetivo de proporcionar à vítima uma sanção, ainda que de caráter indenizatório, para que atos da mesma natureza não se repitam. A defesa de tais princípios encontra fundamento na Constituição Federal de 1988 (CF, art. 5º, V e X), na qual se verifica a preocupação dos Constituintes, na época, em assegurar os direitos fundamentais da pessoa, após um longo período de ditadura militar, no qual tais direitos foram preteridos.

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A lei fundamental, ao se utilizar da expressão ‘indenização’ pelos danos morais, atém-se à noção de compensação, própria do instituto da responsabilidade civil. 4. Para que o dano moral possa ser configurado e, consequentemente, ressarcido, necessária a demonstração de três requisitos: dano, culpa e nexo causal. 5. O dano dessa ordem tem por pressuposto a lesão de natureza subjetiva ou extrapatrimonial, vale dizer, o ato danoso que gera para a vítima um mal interior, na forma de dor, humilhação, angústia, entre outros. 6. O dano moral coletivo, além de encontrar previsão constitucional – já que o mencionado art. 5º, em seus incisos V e X, da Constituição Federal, não faz distinção acerca do direito à indenização, se por violação na esfera individual ou coletiva – possui supedâneo legal no art. 6º, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor, o qual dispõe acerca do direito à ‘efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos’. Portanto, configurada a hipótese de lesão aos valores e interesses fundamentais de um determinado grupo, resta assegurada a defesa de seu patrimônio moral e imaterial, porquanto ‘o dano moral coletivo é a lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de ordem coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à esfera extrapatrimonial de uma pessoa’ (in REsp 1397870/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 10.12.2014). 7. Desnecessária, na hipótese de dano moral coletivo, a comprovação por parte do autor da ação civil pública, da configuração de dor, de sofrimento e de abalo psicológico pelo ato praticado pelo réu, a exemplo do que ocorre na esfera individual, pois em se tratando de interesses difusos e co-letivos, avalia-se a lesão à esfera moral da coletividade, aquela que ocasiona intranquilidade social, ao iludir uma gama de consumidores, ou seja, ‘por violação a direitos transindividu-ais, é cabível, em tese, a condenação por dano moral coletivo como categoria autônoma de dano, a qual não se relaciona necessariamente com aqueles tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico)’ (in REsp 1293606/MG, Rel. Min. Luis Felipe Sa-lomão, 4ª T., J. 02.09.2014, DJe 26.09.2014). 8. Consoante disposição expressa do art. 12 da Lei nº 8.078/1990, o réu responde, independentemente de culpa – assim considerada a ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência – pela reparação dos danos causados ao consumidor. Trata-se de responsabilidade objetiva e dano in re ipsa. 9. O nexo causal se faz presente, pois da análise da argumentação esposada pelo MPF e pela documentação acostada aos autos, constatou-se, em diligência fiscalizatória realizada em 20.05.2002, possuir a gaso-lina comercializada pelo réu – posto revendedor de combustível – um percentual de 40% de álcool, superior aos 24% permitidos, superando em 66% o limite máximo permitido por lei. Apurou-se, ainda, comercializar o réu álcool etílico anidro combustível, ao invés de álcool etílico hidratado combustível, violando a legislação correlata, conforme aferido nos laudos elaborados e afirmado em depoimento em sede policial pelo responsável pela lavratura do auto de infração. 10. A conduta do réu encontra-se devidamente individualizada no auto de infração de fls. 21/23, lavrado em 20.05.2002, não havendo dúvidas quanto à adulteração procedida nos combustíveis por ele comercializados. De se ressaltar que a menção ao ‘Posto São José’ não tem o condão de invalidar a imputação ora versada, pois se refere a outra pessoa jurídica autuada concomitantemente. 11. Não prospera a alegação de falta de provas da adul-teração do combustível, pois consta do auto de infração terem sido realizados vários testes no tanque de armazenamento do réu, cabendo-lhe produzir provas do atendimento às normas da ANP, porém, instado a especificá-las, quedou-se inerte. Consta, de outra parte, da Repre-sentação acostada aos autos a existência de processo administrativo junto à ANP (fls. 19 e ss.), não logrando o réu demonstrar o alegado cerceamento de defesa. 12. Em ação civil pública de matéria consumerista, prevalece a inversão do ônus da prova em favor do Ministério Público.

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Precedentes do STJ. 13. O montante da condenação é adequado a reprimir a conduta descrita nos autos e indenizar o dano moral coletivo causado pelo réu, consubstanciado na comercia-lização do combustível adulterado, prática abusiva, causando prejuízos aos consumidores, iludindo a boa-fé da coletividade da região, especialmente considerando os documentos de fls. 160/168, os quais demonstram que no período fiscalizado as operações de saída do réu to-talizaram R$ 206.629,48 (duzentos e seis mil, seiscentos e vinte e nove reais e quarenta e oito centavos), bem como a receita dos 1º e 2º trimestres do ano de 2002, alcançaram o montante de R$ 220.463,53 (duzentos e vinte mil, quatrocentos e sessenta e três reais e cinquenta e três centavos) e R$ 80.894,03 (oitenta mil, oitocentos e noventa e quatro reais e três centavos), respectivamente. 14. Apelação improvida.” (TRF 3ª R. – AC 0000673-74.2005.4.03.6118/SP – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Carlos Muta – DJe 27.11.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEEm seu voto, o Relator citou os seguintes precedentes:

“[...] A questão ora em discussão já foi objeto de reiteradas decisões nas Cortes Regio-nais, in verbis:

‘DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ADULTE-RAÇÃO DE COMBUSTÍVEL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – SÓ-CIOS-ADMINISTRADORES – LEGITIMIDADE PASSIVA – FATOS INCONTROVERSOS E RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR – PRODUÇÃO DE PROVAS – DES-NECESSIDADE – VALOR DA REPARAÇÃO – HONORÁRIOS – 1. A sentença, em ação civil pública, acolheu pedido do MPF e da ANP em face de sociedade empresária de posto de combustíveis, declarada revel, e dois sócios, para condená-los solidariamente a publicar editais, no mínimo em três jornais de grande circulação do Município, um resumo da demanda e convocação dos consumidores lesados a comprovar os prejuízos pela aquisição de combustível adulterado com solvente, em liquidação de sentença, bem como a pagar R$ 80 mil ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, por danos morais coletivos, mais honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação. 2. Os fornecedores, no caso, os administradores do posto revendedor de combustíveis na data da fiscalização, são partes passivas legítimas na ação de ressarcimento de danos, constatada a adulteração do produto, a teor dos arts. 12 a 18 do CDC. 3. A solidariedade entre os sócios cedentes e cessionários do fundo de comércio não obriga o credor a demandar contra todos. Não fosse o bastante, trata-se de matéria preclu-sa, decidida por acórdão desta Turma no AI 2011.02.01.005547-7, com trânsito em julgado em 30.11.2011. 4. Não há cerceamento de defesa quando o juízo indefere a produção de provas em razão de matéria fática incontroversa e da responsabilidade objetiva dos fornecedores, na forma dos arts. 12, 18 e 23 do CDC. 5. A exposição à venda de combustível adulterado é prática abusiva que viola a boa-fé do consumidor, e a destruição do combustível interditado, antes da autorização pela ANP, infringe o art. 1º da Portaria DNC nº 7, de 25.03.1993 e a Lei nº 9.847/1999, art. 3º, XIV. 6. A mera alegação de serem os apelantes aposentados e sem mais desempenhar atividades empresariais não justifica, por si só, a diminuição do quantum dos danos morais coleti-vos e a verba honorária, mas sopesando todas as circunstâncias do caso concreto, à luz do princípio da proporcionalidade, reduzo a indenização pelos danos morais coletivos em favor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, fixada em R$ 80 mil, para R$ 50 mil. 7. A isenção das custas e honorários na ação civil pública é benefício da parte autora, exceto o Ministério Público, que não exerce advocacia, sendo curial também a redução dos honorários, na hipótese, para R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), exclusiva-mente a favor da ANP. Inteligência dos arts. 17 a 19 da Lei nº 7.347/1985. 8. Apela-

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ção parcialmente provida.’ (AC 201051010033443, Desª Fed. Nizete Lobato Carmo, TRF 2ª R., 6ª T.Esp., e-DJF2R Data: 29.04.2013)

‘APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO MO-RAL COLETIVO – ADULTERAÇÃO DE COMBUSTÍVEL – HONORÁRIOS – PARCIAL PRO-VIMENTO – 1. Cuida-se de apelação interposta pelo réu em face de sentença proferida em sede de ação civil pública movida pelo MPF, objetivando a condenação da empresa ré a ressarcir os consumidores que tenham abastecido veículos em seu estabelecimento durante determinado período, em razão de prejuízos causados pela comercialização de combustível em desconformidade com as imposições da ANP, bem como ao pagamento, a título de dano moral coletivo, ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. 2. O réu não pode se eximir da responsabilidade que lhe foi imputada, uma vez que comercializou o combustível em desconformidade com as exigências técnicas e legais. Tendo agido desta forma, incorreu em responsabilidade objetiva, consagrada para as relações regidas pelo Código de Defesa do Consumidor. In casu, pelo dano causado aos consumidores, houve configuração de responsabilidade pelo vício do produto e pelo fato do produto, conforme os arts. 12 e 18 do referido diploma legal. 3. A responsabilidade, conforme dispõe o CDC e o art. 18 da Lei nº 9.847/1999, é solidária, o que não impede o autor de acionar apenas um dos obrigados para fins de satisfação da integralidade da dívida. 4. A medida que viabiliza o ressarcimento de tais danos materiais (publicação em jornais de grande circulação), por sua vez, é necessária, devendo ser mantida também a sentença neste ponto. É que caberá aos lesados a liquidação e execução do presente acórdão, devendo, para isso, serem convocados. 5. Os danos morais coletivos são cabíveis, uma vez que houve violação do dever de confiança no mercado, e no dever de boa-fé objetiva, o que afetou diretamente os consumidores, causando-lhes dano efetivo, e não mero aborre-cimento. A comprovação do dano moral coletivo se dá apenas pela demonstração de sua efetiva ocorrência, uma vez que este tipo de dano existe in re ipsa. 6. Considero excessivo o valor arbitrado pelo juízo de primeiro grau a título de honorários advocatícios (R$ 10.000,00 – dez mil reais), a ser revertido em favor do Fundo de Defesa dos Direi-tos Difusos. Apesar da menção ao art. 20, § 4º, do CPC, a sentença não fez qualquer justificativa para arbitrar honorários em 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da condenação. Sendo assim, condeno o réu em honorários de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, § 3º e alíneas, do CPC. 7. Também é razoável o valor fixado a título de honorários advocatícios, a serem revertidos em prol do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. Os honorários são perfeitamente cabíveis em razão da aplicação subsidiária do art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil. 8. Apelação parcialmente provida.’ (AC 200751010283862, Des. Fed. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, TRF 2ª R., 6ª T.Esp., e-DJF2R Data: 03.04.2013.) [...]”

7573 – Autarquia – INSS – advogados – atendimento diferenciado – princípio da isonomia – ofensa – inocorrência

“Constitucional e administrativo. INSS. Atendimento. Advogados. 1. O Supremo Tribunal Fe-deral, no julgamento do RE 277.065/RS, firmou entendimento no sentido de que o atendimen-to diferenciado dispensado aos advogados nas agências do INSS não ofende o princípio da isonomia. 2. Precedentes: STF, RE 277.065/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª T., J. 08.04.2014, DJe 13.05.2014, e AgRg no Agravo de Instrumento nº 748.223/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª T., J. 09.09.2014, DJe 07.10.2014; TRF 3ª R., AI 2014.03.00.031881-1/SP, Relª Desª Fed. Marli Ferreira, 4ª T., J. 28.05.2015, DE 04.08.2015. 3. Apelação e remessa oficial a que se nega provimento.” (TRF 3ª R. – Ap-RN 0014349-31.2014.4.03.6100/SP – 4ª T. – Relª Desª Fed. Marli Ferreira – DJe 27.11.2015)

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Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos os seguintes julgados no mesmo sentido:

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – ATENDIMENTO DE ADVOGADO EM AGÊNCIA DO INSS – IMPOSIÇÃO DE AGENDA-MENTO E RESTRIÇÃO DE UM BENEFICIÁRIO POR VEZ – FUNDAMENTAÇÃO CONS-TITUCIONAL DO ACÓRDÃO – DESCABIMENTO DO RECURSO ESPECIAL – 1. A Corte a quo, ao decidir a controvérsia, o fez com suporte em dispositivos constitucionais, reconhecendo ao advogado o direito de liberdade profissional e a facilitação da defesa dos segurados. Quando a controvérsia é solucionada com argumentação dessa natureza, o recurso especial é inviável, sob pena de usurpação da competência reservada ao STF. 2. A Suprema Corte, por sua Primeira Turma, já reconheceu a natureza constitucional da matéria (RE 277.065, AI 748.223-AgR, AI 748.223-AgR). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 660.102 – (2015/0025030-5) – 2ª T. – Rel. Min. Og Fernandes – DJe 18.11.2015 – p. 5620) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 101000580593. Acesso em: 02 dez. 2015)

“ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – AGRAVO RETIDO NÃO CONHECI-DO – ADVOGADO – LIMITAÇÃO A CINCO ATENDIMENTOS POR SENHA EM AGÊNCIA DO INSS – ILEGALIDADE – ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA – NÃO CARACTERIZAÇÃO DE TRATAMENTO PRIVILEGIADO – 1. Não se conhece de agravo retido quando não requerido expressamente o seu exame no Tribunal, nas razões ou nas contrarrazões de apelação, nos termos do art. 523, § 1º, do CPC. 2. Segundo o art. 133 da Constituição Federal, o advogado é ‘indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei’. 3. A referida norma constitucional consagra o princípio da essencialidade da Advocacia e institui a garantia da inviolabilidade pessoal do advogado, além de demonstrar o papel funda-mental do advogado na manutenção do Estado Democrático de Direito, na aplicação e na defesa da ordem jurídica, bem como na proteção dos direitos do cidadão. 4. O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil – Lei nº 8.906/1994, por sua vez, ao tratar dos direitos do advogado, em seu art. 7º, dispõe de maneira clara sobre o livre ingresso destes profissionais em repartições públicas para ‘praticar ato ou colher prova ou infor-mação útil ao exercício da atividade profissional, dentro do expediente ou fora dele, e ser atendido, desde que se ache presente qualquer servidor ou empregado’. 5. No caso dos autos, pretendem as advogadas impetrantes que não lhes seja limitado o número de atendimentos por senha em agência do INSS, bem como que a autarquia realize consul-tas e forneça informações relativas aos segurados. 6. Os pedidos das impetrantes estão de acordo com o exercício do munus do advogado para a realização de suas atividades profissionais, não violando, assim, o princípio da isonomia nem conferindo tratamento privilegiado injustificado. Precedentes do STF: RE 277065/RS, 1ª T., Rel. Min. Mar-co Aurélio, DJe-090 Divulg. 12.05.2014, Public. 13.05.2014 e AI 748223-AgR/SP, 1ª T., Rel. Min. Dias Toffoli, DJe-195 Divulg. 06.10.2014, Public. 07.10.2014. 7. Apelação a que se dá provimento, para determinar que a autoridade impetrada aten-da as impetrantes na agência do INSS em Rondonópolis/MT, sem a limitação de 05 (cinco) atendimentos por senha.” (TRF 1ª R. – AC 0001022-69.2012.4.01.3602/MT – Rel. Des. Fed. Néviton Guedes – DJe 19.10.2015 – p. 233) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 107000752590. Acesso em: 02 dez. 2015)

7574 – Bem público – usucapião – impossibilidade

“Administrativo. Processual civil. Usucapião. Imóvel de propriedade da Caixa Econômica Federal. Art. 183, da Constituição Federal. Impossibilidade. Apelação não provida. 1. O autor

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ajuizou a presente ação de usucapião especial urbano, em desfavor da Caixa Econômica Federal, com o objetivo de adquirir a propriedade do imóvel citado na petição inicial. 2. O art. 183, da Constituição Federal de 1988 exige como requisitos à configuração do fenôme-no jurídica do usucapião: a) tratar-se de área urbana de até 250 m; b) evidenciar-se posse por no mínimo 5 anos; c) cuidar-se de posse ininterrupta e sem oposição; d) ser o imóvel utilizado para moradia do possuidor ou de sua família; e) não ser o interessado proprietá-rio de outro imóvel urbano, ou rural; f) não se tratar de bem público. 3. Verifica-se que a parte autora não preencheu os requisitos acima enumerados, para fazer jus à aquisição do imóvel via instituto do usucapião. 4. ‘Os imóveis integrantes do patrimônio da Caixa Eco-nômica Federal, destinados especificamente para utilização em projetos habitacionais, são submetidos a regime de direito público, sendo insuscetíveis de usucapião. Precedentes: AC 000128063.2008.4.01.3200/AM, Rel. Des. Fed. João Batista Moreira, 5ª T., e-DJF1 p. 37 DE 03.10.2012; AC 003791113.2002.4.01.0000/MG, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, 6ª T., DJ p. 118 DE 20.06.2005’ (AC 005514976.2011.4.01.3800/MG, Relator Juiz Fed. Conv. Marcelo Dolzany da Costa, 6ª T., e-DJF1 DE 01.03.2013, p. 670). 5. Apelação a que se nega provi-mento.” (TRF 1ª R. – AC 2009.34.00.018252-1/DF – Rel. Des. Fed. Kassio Nunes Marques – DJe 17.12.2015)

Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos os seguintes julgados no mesmo sentido:

“ADMINISTRATIVO – USUCAPIÃO – VILA DOMITILA – BEM PÚBLICO – IMÓVEL PERTENCENTE AO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) – IMPOSSI-BILIDADE – INDEFERIMENTO DA INICIAL – 1. O entendimento desta Corte é firme no sentido da impossibilidade jurídica de aquisição por usucapião de bem público (art. 183, § 3º, da CF). 2. Reconhecido que o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS é o legítimo proprietário dos imóveis localizados na ‘Vila Domitila’, em Curitiba/PR, não há como reconhecer o pedido de usucapião, sob pena de ofensa à Constituição Federal. 3. Indeferimento da inicial mantido.” (TRF 4ª R. – AC 5035444-89.2012.404.7000 – 4ª T. – Relª Desª Fed. Vivian Josete Pantaleão Caminha – J. 07.04.2015) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 110000393948. Acesso em: 17 dez. 2015)

“CONSTITUCIONAL – USUCAPIÃO – IMPOSSIBILIDADE – IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA AEROPORTUÁRIA – BEM PÚBLICO – ART. 183, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDE-RAL – APELAÇÃO IMPROVIDA – 1. Trata-se de apelação em face de sentença proferida que julgou improcedente o pedido do autor, que objetivava adquirir, por usucapião, a propriedade de um terreno localizado na Rua Ribeiro Leitão, 158, Jóquei Clube, Fortale-za/CE, incluso em área do antigo aeroporto de Fortaleza. 2. De acordo com as informa-ções emanadas da SPU (fls. 132-133), foi a empresa Panair do Brasil S.A. autorizada a promover desapropriações para fins de ampliação e melhorias do aeroporto de Fortaleza, através do Decreto-Lei nº 3.462/1941, prevendo ainda a reversão à União, mediante ressarcimento. Verificou-se, ainda, que a referida empresa registrou em cartório vá-rios imóveis em seu nome indevidamente, entre os quais o imóvel pretendido, e que a questão está sendo discutida no processo nº 2000.05.00.025011-0, em trâmite no STJ. 3. Desta forma, dada a natureza de bem público, em razão da previsão legal de sua reversão, não pode, por conseguinte, ser usucapido, incidindo o óbice do art.183, § 3º da CF. 4. Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 0009581-56.2013.4.05.8100 – (581657/CE) – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Edilson Pereira Nobre Júnior – DJe 30.07.2015 – p. 261) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 111000264067. Acesso em: 17 dez. 2015)

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7575 – Concurso público – empossamento – limite etário – possibilidade

“Recurso de apelação. Administrativo. Concurso público. Limite etário para empossamento. Possibilidade. 1. Autor, candidato ao cargo de soldado PM de 2ª classe, que almeja concessão da segurança para garantir seu direito de posse sua reprovação, alegando ilegalidade na exi-gência relativa ao limite etário. Sentença de improcedência mantida. 2. Viabilidade segundo jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Requisitos que devem ser aferidos na data da posse, não da inscrição. Data da posse consignada no edital que se trata de mera estimativa, não sendo apta para amparar pretensão judicialmente tutelável. Recurso e reexame necessário desprovidos.” (TJSP – Ap 1020697-75.2014.8.26.0053 – 5ª CDPúb. – Rel. Nogueira Diefen-thaler – DJe 25.11.2015)

Destaque Editorial SÍNTESE Colacionamos as seguintes ementas no mesmo sentido:

“APELAÇÃO CÍVEL – ADMINISTRATIVO – CONCURSO PÚBLICO – POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL – LIMITE DE IDADE – 30 ANOS – LEGALIDADE – PREVISÃO EDITALÍCIA – 1. A Constituição Federal expressamente atribui à legislação ordinária a possibilidade de limitação de idade para o ingresso na carreira militar, nos termos do seu art. 142, X. 2. Em decorrência de comando constitucional, a Lei nº 7.289/1984, alterada pela Lei nº 12.086/2009, fixou a idade máxima para o ingresso nos quadros da Polícia Militar do Distrito Federal, em seu art. 11, § 1º. Dessa maneira, é válida a disposição editalícia que prevê a respectiva limitação de idade. 3. Recurso conhecido e desprovido.” (TJDFT – AC 20140111535270 – (867518) – 6ª T.Cív. – Rel. Des. Hector Valverde Santanna – DJe 19.05.2015 – p. 373) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 142000386114. Acesso em: 30 nov. 2015)

“CONCURSO PÚBLICO – MILITAR – EDITAL – RESTRIÇÃO ETÁRIA FIXADA EM EDI-TAL – REQUISITO VÁLIDO – DECISÃO DO STF – MODULAÇÃO DOS EFEITOS – FATO CONSUMADO – INOCORRÊNCIA – 1. O Plenário do STF, no julgamento do recurso extraordinário representativo de controvérsia nº 600.885/RS, reconheceu, por unanimi-dade, a exigência constitucional de Lei para fixação de limite de idade como requisito de ingresso nas Forças Armadas. Todavia, modulou os efeitos da decisão para preservar a validade dos certames realizados até 31 de dezembro de 2012 e em cujos editais e re-gulamentos se tenha fixado limite etário. 2. Não há que se falar em fato consumado, vez que sentença recorrida, que revogou a liminar e denegou a segurança, foi proferida em fevereiro de 2013, antes mesmo da matrícula dos classificados no curso de formação de Sargentos, que somente ocorreu em abril de 2013. 3. A alegação de que ‘se prepa-rou durante meses para participar do concurso’ não socorre o autor, vez que dispensar muitas horas ao estudo (quiçá meses e até anos) é ônus de quem se presta a realizar concurso público. 4. Apelação desprovida.” (TRF 2ª R. – AC 2012.51.01.042223-7 – (597103) – 7ª T.Esp. – Rel. Des. Luiz Paulo da Silva Araújo Filho – DJe 03.06.2014 – p. 250) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 108000239547. Acesso em: 30 nov. 2015)

7576 – Concurso público – prova de títulos – título de especialista – validade

“Mandado de segurança. Administrativo e processual civil. Concurso público. Prova de tí-tulos. Validade de título. Especialista em direitos humanos. 1. Preliminares de ausência dos requisitos legais para a formação do processo e prejudicial de mérito da presunção de le-gitimidade e veracidade. Rejeitadas à unanimidade. 2. No mérito, título de especialista em direitos humanos em conformidade com a Resolução nº 01/2007, do Conselho Nacional de

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Educação, e em descompasso com item do edital. 3. O candidato não pode ser prejudicado por fato alheio, uma vez que não tem ingerência sobre a feitura do título pena entidade de en-sino, ainda mais, por regra limitadora e desarrazoada que o prejudica frontalmente. Conces-são da segurança, à unanimidade.” (TJPA – MS 00047916020148140000 – (153848) – C.Cív.Reun. – Relª Ezilda Pastana Mutran – DJe 26.11.2015)

7577 – Concurso público – vigência – contratação temporária – provisioriedade – desca-racterização

“Constitucional e administrativo. Mandado de segurança. Certame vigente. Necessidade temporária de excepcional interesse público. Provisoriedade descaracterizada. Contratação precária configurada. Candidato aprovado dentro do número de vagas. Mera expectativa de direito que se convola em direito subjetivo à nomeação. 1. Durante a vigência do respectivo certame, é defeso ao Poder Público contratar, à revelia do previsto no inc. IX do art. 37 da CF/1988, para cargo de provimento efetivo. 2. Descaracterizada, porém, a provisoriedade do vínculo firmado pela Administração, o candidato aprovado dentro do número de vagas e que logrou provar contratação precária, convola o que seria mera expectativa em direito subje-tivo à nomeação. Precedentes do STJ. 2. Segurança concedida à unanimidade.” (TJPI – MS 2013.0001.006736-8 – TP – Rel. Des. Raimundo Nonato da Costa Alencar – DJe 18.12.2015)

7578 – Ensino – Enem – aprovação – idade inferior a 18 anos – diretrizes básicas da educa-ção – observância

“Apelação cível. Constitucional e administrativo. Educação. Aprovação no Exame Nacional de Ensino – Enem. Ingresso no ensino superior. Idade inferior a 18 anos. Diretrizes básicas da educação. Observância. Princípios da legalidade, proporcionalidade e razoabilidade. Fases do ensino médio. Mitigação. Excepcionalidade máxima. Teoria do fato consumado. Inapli-cabilidade. 1. A aprovação de alunos em idade inferior a 18 (dezoito) anos, sem conclusão do ensino médio, no Exame Nacional de Ensino (Enem) deve ser analisado em consonância com os regramentos que permeiam a Educação no Estado Brasileiro, sem contudo malferir os princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade. 2. O direito à educação descrito na Constituição Federal de 1988, vem ratificado nas diretrizes básicas de educação nacional, fixadas na Lei Federal nº 9.394, de 1996, e cuja premissa maior é o pleno desenvolvimento do educando, ou seja, o processo educacional deve propiciar ao aluno condições de ensino que desenvolvam sua formação intelectual e o preparo para o ensino superior. 3. O Estado possibilita que alunos de 04 a 17 anos realizem o ciclo afeito à vida escolar – compreenden-do a fase pré-escolar, o ensino fundamental e a conclusão do ensino médio, este último com duração de três anos, e a partir de então, o aluno está apto à realização do exame nacional do ensino médio (Enem), e à disputa pelo ingresso no ensino superior através do Sisu. 4. A excepcionalidade cinge-se na possibilidade de alunos em idade superior a 18 anos, e que porventura não tenha na idade escorreita finalizado as fases do ensino médio, a chance de realização do Enem, para obtenção do certificado do ensino médio, e que não pode ser usado como subterfúgio a burlar a regra geral. 5. A aplicabilidade da Teoria do Fato Consumado, à luz do entendimento perfilhado, no âmbito dos Tribunais Superiores, somente cabível quando consolidada a situação fática com base em decisão judicial, a fim de resguardar o princípio da segurança e estabilidade nas relações sociais. 6. No caso, o aluno, ora apelado, encontra--se matriculado no 2º ano do ensino médio e tem idade inferior a 18 anos, portanto, não preenche os requisitos legais nem se enquadra nas situações excepcionais que viabilizariam

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a matrícula em curso de nível superior (matrícula no 3º ano do ensino médio e/ ou teoria do fato consumado). 7. Recursos providos.” (TJAC – Ap 0600019-79.2015.8.01.0081 – (2.653) – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Roberto Barros – DJe 15.12.2015)

7579 – Ensino – Enem – identidade vencida – prova – realização – possibilidade

“Administrativo. Enem. Identidade vencida. Edital que previa identificação em formulário pró-prio. Arbitrariedade da autoridade impetrada. Cuida-se de remessa necessária da sentença que concedeu a segurança para manter a liminar de fl. 104, que determinou à autoridade impetrada que oportunizasse à impetrante a realização da primeira parte da prova do Enem (Ciências Humanas e Ciências da Natureza e suas tecnologias). Conforme consignado pelo Magistrado de piso: ‘[...] em relação aos processos seletivos, a jurisprudência pátria se posi-ciona no sentido de que o Judiciário deve analisar apenas a observância, no caso concreto, dos princípios constitucionais, em especial a legalidade, isonomia e razoabilidade. Sendo as-sim, constitui matéria subsumível à avaliação judicial a legalidade do edital e o cumprimento de suas normas pela comissão responsável. Em relação ao tema objeto de apreciação no pre-sente processo, o Edital nº 12, de 08 de maio de 2014, assim dispunha: “11.5 O participante que apresentar documento de identificação original com validade vencida, com foto que não permita a sua completa identificação ou dos seus caracteres essenciais ou de sua assinatura, poderá realizar as provas, desde que se submeta a identificação especial, que compreende a coleta de dados e de sua assinatura em formulário próprio” (grifei). Verifica-se, portanto, que, de acordo com o edital, é possível a realização das provas, ainda que o candidato apresente o documento de identificação com validade vencida, bastando somente que se submeta à identificação especial. Segundo a impetrante, este procedimento foi regularmente realizado no segundo dia do exame. Entretanto, os prepostos deixaram de realizar o mesmo procedi-mento, previsto no edital, no dia anterior, impedindo a impetrante de realizar as provas do primeiro dia. Ademais, ainda que não houvesse previsão no edital, no caso de fundada dúvida quanto à identidade da candidata, poderia a organização do exame simplesmente sujeitá-la a outros meios de identificação, ainda que dependente de posterior confirmação. Pelo exposto, é possível concluir que a atitude da autoridade impetrada, através de seus prepostos, foi arbi-trária e violadora das normas dispostas no edital, razão pela qual, efetivamente, a impetrante faz jus à realização do exame em nova oportunidade’. Remessa necessária desprovida.” (TRF 2ª R. – REO 0170236-25.2014.4.02.5101 – 8ª T.Esp. – Relª Desª Fed. Vera Lucia Lima – DJe 02.12.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEEm seu voto, a Relatora citou o seguinte trecho da sentença:

“[...] Conforme bem consignou o Magistrado de piso (fls. 192/196), cujos fundamentos ora se adotam:

‘[...] em relação aos processos seletivos, a jurisprudência pátria se posiciona no sentido de que o Judiciário deve analisar apenas a observância, no caso concreto, dos princípios constitucionais, em especial a legalidade, isonomia e razoabilidade’.

Sendo assim, constitui matéria subsumível à avaliação judicial a legalidade do edital e o cumprimento de suas normas pela comissão responsável.

Em relação ao tema objeto de apreciação no presente processo, o Edital nº 12, de 08 de maio de 2014, assim dispunha: ‘11.5 O participante que apresentar documento de identificação original com validade vencida, com foto que não permita a sua completa identificação ou dos seus caracteres essenciais ou de sua assinatura, poderá realizar as

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provas, desde que se submeta à identificação especial, que compreende a coleta de dados e de sua assinatura em formulário próprio (grifei)’.

Verifica-se, portanto, que, de acordo com o edital, é possível a realização das provas, ainda que o candidato apresente o documento de identificação com validade vencida, bastando somente que se submeta à identificação especial.

Segundo a impetrante, este procedimento foi regularmente realizado no segundo dia do exame.

Entretanto, os prepostos deixaram de realizar o mesmo procedimento, previsto no edital, no dia anterior, impedindo a impetrante de realizar as provas do primeiro dia.

Ademais, ainda que não houvesse previsão no edital, no caso de fundada dúvida quanto à identidade da candidata, poderia a organização do exame simplesmente sujeitá-la a outros meios de identificação, ainda que dependente de posterior confirmação.

Pelo exposto, é possível concluir que a atitude da autoridade impetrada, através de seus prepostos, foi arbitrária e violadora das normas dispostas no edital, razão pela qual, efetivamente, a impetrante faz jus à realização do exame em nova oportunidade. [...]”

7580 – Licitação – documentos que comprovem a situação econômico-financeira – não autenticação – inabilitação – desproporcionalidade

“Direito administrativo. Mandado de segurança. Licitação. Inabilitação da impetrante. Não autenticação de documentos que comprovem a situação econômico-financeira da concorren-te. Sobrecarga no serviço de autenticação comprovada. Improvimento. 1. Trata-se de apela-ção cível interposta em mandado de segurança objetivando a anulação do ato administrativo que inabilitou a impetrante do processo licitatório desenvolvido com base no edital de Pregão Eletrônico nº PE.DAQ.G.0096.2012, no qual se sagrou vencedora a ré Coorptrans – Coopera-tiva Rio-Pretense de Serviços de Transporte, bem como permita sua permanência na licitação. 2. A atividade do Administrador no procedimento licitatório é norteada pelo princípio da vinculação ao ‘instrumento convocatório’, constituindo-se ato administrativo formal, utilizado como freio e contrapeso ao poder da autoridade julgadora. Assim, os requisitos estabelecidos no Edital de Licitação devem ser cumpridos fielmente, nos termos do inciso XXI, art. 37 da Constituição Federal. 3. No caso dos autos, a recusa da Administração em proceder à habili-tação da impetrante deu-se em razão dos documentos atinentes à situação econômico finan-ceira, quais sejam, o Balanço Patrimonial e demonstrativo do livro diário SPDE na Receita Federal em 29.06.2012, não se encontrarem devidamente autenticados pela Junta Comercial do Estado de São Paulo. 4. O Diretor do Departamento Nacional de Registro do Comércio publicou comunicado, em 21.09.2011, informando que ‘em função da grande quantidade de livros digitais enviados pelas empresas ao Serviço Público de Escritura Digital (Sped), e da concentração da remessa próxima ao vencimento ao prazo estipulado pela Receita Federal do Brasil, está com sobrecarga no serviço de autenticação de livros digitais das Juntas Comer-ciais’ e que ‘para fins de participação em licitações e cadastramento no Sicaf, a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI), do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão permitiu, até que a situação seja solucionada, que as Unidades Cadastradoras rece-bam o balanço patrimonial impresso e assinado pelo responsável da empresa e pelo contador e o protocolo que comprove o envio do balanço digital à Junta Comercial da unidade federal correspondente como forma das empresas comprovarem a sua situação econômico-financei-ra’. 5. Dessa forma, a decisão que inabilitou a impetrante em razão dos documentos atinentes a sua situação econômico-financeira, quais sejam, o Balanço Patrimonial e demonstrativo do livro-diário SPDE na Receita Federal não se encontrarem devidamente autenticados, afigura-

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-se altamente desproporcional, eis que a licitação deve ser o mais abrangente possível, a fim de possibilitar o maior número possível de concorrentes, tudo a possibilitar a escolha da pro-posta mais vantajosa. 6. Como se sabe, no controle de razoabilidade de um ato administrativo deve-se analisar a necessidade da medida adotada e se os fins por ela alcançados não podem também ser atingidos por outras medidas menos gravosas ao sujeito da norma. O rigorismo na aplicação de tal regra, na hipótese dos autos, prejudica sobremaneira a Impetrante, care-cendo de qualquer razoabilidade. 7. Em que pese a vinculação da Administração Pública e dos administrados aos termos da legislação, dos princípios e do edital de regência do certame público, a desclassificação de empresa impetrante afronta o princípio da razoabilidade quan-do amparada em mero formalismo, como no caso dos autos, em que sua eliminação deu-se tão somente por não possuir a declaração de capacidade econômico-financeira autenticada. 8. Apelação conhecida e improvida.” (TRF 2ª R. – AC-RN 0043070-78.2012.4.02.5101 – 6ª T.Esp. – Rel. Guilherme Calmon Nogueira da Gama – DJe 24.11.2015)

7581 – Licitação – prestação de serviços de transporte de carga para os Correios – rastre-amento eficiente – previsão – descumprimento

“Administrativo. Correios. Roubo de carga. Previsão de rastreamento eficiente no contrato de licitação. Descumprimento. Responsabilidade. 1. A sentença recorrida julgou improcedentes os pedidos de nulidade da cobrança decorrente de quebra do contrato de prestação de ser-viços de transporte de carga para os Correios. 2. A tese do apelante se sustenta na previsão contratual de que, na hipótese de caso fortuito ou força maior, não se aplicaria a penalidade. A empresa defendeu que, embora o roubo de carga seja um evento frequente em todo o país, o caso seria de inevitabilidade e não de previsibilidade. 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que o roubo mediante arma de fogo é fato de terceiro, equiva-lente à força maior, e exclui o dever de indenizar quando demonstrado que a transportadora adotou as cautelas que dela se poderia esperar. 4. A dinâmica do roubo de carga ocorrido no transporte fornecido pela autora, ora recorrente, demonstra a quebra da obrigação contratada mediante licitação, pela ineficiência do serviço de rastreamento. A tecnologia embarcada não foi capaz de sinalizar à Central de Monitoramento a situação agressiva, o desvio de rota e a abertura da porta em parada não prevista, assim, como não atendeu às especificações contratuais para tentar coibir o sinistro. 5. Afastada a alegação de nulidade do procedimento administrativo, por violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa. A defesa do recorrente foi fartamente oportunizada não restando apontado o alegado prejuízo. 6. Apelo conhecido e desprovido.” (TRF 2ª R. – AC 0015558-86.2013.4.02.5101 – 7ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. José Antonio Lisbôa Neiva – DJe 04.12.2015)

Comentário Editorial SÍNTESECuida-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de nulidade da cobrança decorrente da quebra do contrato de prestação de serviços de transporte de carga para os Correios.

A apelante sustenta que um dos veículos da contratada foi roubado, o que teria gerado um prejuízo de R$ 43.191,13 aos Correios, ora apelado, em virtude da indenização paga aos seus clientes. Ocorre que não teve acesso ao procedimento administrativo em que tais prejuízos foram apurados.

Afirma que todas as medidas de prevenção ao roubo foram tomadas pela empresa, porém tal evento foi inevitável.

Enfatizou que havia cláusula contratual que previa, na hipótese de caso fortuito ou força maior, a não aplicação da penalidade

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Por fim, sustentou que embora o roubo de cargo seja um evento frequente em todo o país, a hipótese seria de inevitabilidade e não de sua previsibilidade.

Na análise da apelação, a 7ª Turma Especializada do TRF 2ª R. negou provimento ao recurso, pois entendeu que houve ineficiência do serviço de rastreamento.

Do voto do Relator destacamos:

“[...] O exame da falta de cuidado da transportadora foi ressaltado pela sentença re-corrida:

‘Verifica-se, na decisão de fls. 300/303, que o indeferimento foi fundamentado, como se observa no trecho abaixo:

[...] Ratificamos que não houve acionamento do botão de pânico (Anexo IV – item 1.1). Tratando-se de um veículo rastreado, com gerenciamento de risco, embora a central de Monitoramento tenha detectado que a viatura foi desviada da rota não existe nenhum registro de que tenha atentado para o fato de que o veículo teve sua porta aberta em pa-rada não prevista para a entrada no interior do veículo de meliante (Anexo IV, itens 1.1, 2.9 e 2.10), adotando as medidas relativas necessárias à situação, o que não ocorreu. E, ainda, o descumprimento do item 1.6.7, do Anexo IV, que descreve os procedimentos de chegada e partida das unidades da ECT. Portanto, entendemos configurado o nexo de causalidade entre o ato omissivo e o resultado da ocorrência.

O Contrato nº 82/2009 prevê que os veículos sejam dotados de equipamentos de ras-treamento e serviço de gerenciamento de risco, conforme discriminado no Anexo IV. Era já de conhecimento da Transportadora, ao participar da Licitação que resultaria na contratação celebrada, que os veículos operariam com carga atrativa, em áreas de risco, cujo correspondente valor foi orçado na formação de custos da proposta apresentada e, por conseguinte, pago pela Contratante nos faturamentos mensais. [...].’ [...]”

7582 – Militar – curso de habilitação – seleção interna – número de cargos – aumento – legislação superveniente – impossibilidade

“Administrativo. Processo civil. Apelação. Seleção interna para a admissão ao curso de habi-litação de oficiais policiais militares de administração (Edital nº 02/2009 – PMDF/CHOAEM). Lei nº 12.086/2009. Aumento. Número de cargos. Legislação superveniente. Impossibilidade. Recurso desprovido. 1. As condições e disposições editalícias constituem lei entre as partes (princípios da legalidade e da vinculação ao edital), uma vez que regulam o concurso sele-tivo, sendo de obediência obrigatória tanto por parte da Administração Pública quanto dos candidatos. Em sendo assim, emoldurado o edital e iniciado o processo seletivo, as alterações legislativas que ocorrerem posteriormente a sua publicação não poderão atingi-lo, sob pena de ofensa ao ato jurídico perfeito. 2. No caso dos autos, indicando o instrumento convoca-tório (Edital nº 02/2009 – PMDF/CHOAEM) o quantitativo de vagas na Seleção Interna para a Admissão ao Curso de Habilitação de Oficiais Policiais Militares de Administração, ulterior regulamentação legislativa (Lei nº 12.086, de 6 de novembro de 2009) não tem o condão de alterá-lo automaticamente. 3. Somente em caso de nova publicação do edital do certame seria possível falar em modificação dos ditames inicialmente estabelecidos, para fins de adaptação ao preceito normativo superveniente, particularidade esta que não alcançou o número máxi-mo de vagas criadas, o que é plenamente possível dada a necessidade de organização admi-nistrativa para tanto. 4. O policial militar que postula promoção à graduação superior, deve ingressar no quadro de acesso preenchendo todos requisitos legais, inclusive, participação em

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curso de formação, cuja aprovação não garante a promoção, pois deve classificar-se no limite de vagas existentes. 5. Recurso não provido.” (TJDFT – PADM 20130111681395 – (911779) – 2ª T.Cív. – Relª Desª Leila Arlanch – DJe 16.12.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEDo voto da Relatora destacamos:

“[...] In casu, a Administração Pública aditou o respectivo instrumento convocatório, Edital nº 02/2010 PMDF/CHOAEM, ou seja, após o advento da Lei nº 12.086/2009, alterando-se o quantitativo de vagas, conforme se depreende do Edital nº 07/2010 (fl. 48), isto porque a simples publicação de norma que eleva o número de cargos na administração, não tem o condão de retificar edital convocatório já publicado.

Dessa forma, considerando que o edital em discussão fora publicado em momento ante-rior à alteração estabelecida pela Lei nº 12.086/2009 e existindo nova publicação a fim de ajustá-lo ao novel diploma legal, prepondera a regulamentação posterior do número de vagas disponibilizadas para 55 (fls. 28 e 48).

Nessa ótica, importa salientar que o apelante, embora tenha alcançado excelente média, não galgou a classificação necessária para se manter no número de vagas, posto que sua classificação ficou em 77ª.

Além disso, para Administração Pública é cogente a observância da conveniência e oportunidade dos atos administrativos praticados. A Lei nº 12.086/2009 de fato alterou o número de vagas para 132, o que não infirma a necessidade de preenchimento destas naquele momento, uma vez que sua implementação significa aumento de despesa.

Portanto, não estão presentes os requisitos ensejadores da preterição arguida, uma vez que o requerente não alcançou a classificação necessária para participar do certame.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso mantendo indene a sentença vergastada.

É como voto.”

7583 – Poder de polícia – auto de infração – esposa do infrator – penalidade – impossibili-dade

“Administrativo. Anulação de auto de infração. Ibama. Apreensão de lagosta na época do defeso. Penalidade imposta à esposa do infrator. Impossibilidade. 1. Caso em que se pretende a anulação de auto de infração decorrente de apreensão pelo Ibama de 68 Kg de lagosta du-rante à época do defeso, encontrada na residência da autora, sob alegação de que o produto não pertenceria à mesma, mas a seu esposo, pois ela seria apenas estudante e ele o pescador. 2. Sendo certo que a autoria da infração não recai sobre a postulante, mas sobre terceiro, ainda que cônjuge, não pode a primeira ser responsabilizada pelo o ato ilícito, sofrer a autua-ção e a imputação da respectiva penalidade, concernente ao pagamento de multa, devendo, neste caso, ser reconhecida a ilegitimidade passiva da postulante na Execução Fiscal relativa à cobrança daquela última, com a consequente desconstituição do título executivo. 3. Não há se falar em condenação ao pagamento de honorários advocatícios, por força do enunciado da Súmula nº 421, do STJ, segundo a qual ‘os honorários advocatícios não são devidos à De-fensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença’ (STJ, Súmula nº 421, 03.03.2010, DJe 11.03.2010). 4. Apelação parcialmente provida.” (TRF 5ª R. – AC 0005619-32.2012.4.05.8400 – (557762/RN) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Roberto de Oliveira Lima – DJe 07.12.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação em tela foi interposta pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente – Ibama contra sentença que julgou procedente o pedido da autora reconhecendo a ilegitimidade

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da mesma para figurar no pólo passivo da Execução Fiscal, já que a apreensão de 68 Kg de lagosta durante à época do defeso não pertencia a ela, mas a seu esposo.

Em suas razões, a apelante afirmou que a autora, ora apelada, além de seu marido, também teria responsabilidade na infração ambiental já que teria obrigação de saber da origem ilegal do produto que se encontrava na sua residência, principalmente porque o seu cônjuge já havia sido autuado decorrente de pesca ilegal anterior.

Ressaltou, ainda, que o sistema de proteção ambiental possibilitou a ampla responsabi-lização de todos aqueles que concorrem para a prática dos danos ambientais, podendo ser, portanto, qualquer um dos coautores responder solidariamente pelo ilícito.

Finalmente, caso seja mantida a sentença, requer a exclusão da condenação em ho-norários advocatícios, considerando que a apelada está representada pela Defensoria Pública, conforme preceitua a Súmula nº 421 do STJ, in verbis, e precedentes da mesma Corte.

“421 – Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença.”

A 2ª Turma do TRF 5ª Região, ao analisar o recurso, entendeu que deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva da apelada e o título executivo deve ser desconstituído. Quanto aos honorários, acolheu o pedido do apelante.

Selecionamos os seguintes julgados sobre a nulidade do auto de infração quando rece-bido por terceiro, que não o autor da infração:

‘ADMINISTRATIVO – AMBIENTAL – IBAMA – VEÍCULO UTILIZADO NA INFRAÇÃO – PROPRIEDADE DE TERCEIRO QUE O CONDUZIA – AUTO DE INFRAÇÃO INSUBSIS-TENTE – 1. Demonstrado que o autor não cometeu a infração ambiental descrita no Auto de Infração nº 214581/D – Visto que alienara o veículo utilizado na prática do ato infracional a terceiro, que o conduzia quando da imposição da penalidade –, correta a sentença que declarou a nulidade da autuação. 2. Remessa oficial improvida.’ (TRF 1ª R. – RN 2000.40.00.000858-9/PI – Rel. Juiz Fed. David Wilson de Abreu Pardo – DJe 18.05.2011 – p. 315) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 107000093065. Acesso em: 09.12.2015)

“ADMINISTRATIVO – AUTO DE INFRAÇÃO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE VIS-TORIA – NOTIFICAÇÃO RECEBIDA POR TERCEIRO – 1. APELAÇÃO EM FACE DE SEN-TENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PEDIDO PARA DECLARAR A NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO LAVRADO PELO CREA/RJ – 2. O Apelante não logrou comprovar tenha efetivamente levado a efeito a referida vistoria destinada a apurar a suposta rein-cidência. Não obstante, convém observar que o saneamento da irregularidade apontada pelo CREA-RJ, no auto de Infração nº 94301894, somente ocorrera em 10.12.1997, data em que o recorrido encaminhou à autarquia Anotação de Responsabilidade Técnica subscrita por arquiteto. 3. A imposição de nova penalidade não poderia dispensar a observância das garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. E, nesse particular, impende observar que a notificação do recorrido, conquanto encaminhada ao endereço constante da inicial, foi recebida por terceiro, o que torna imperfeita a oportunização de sua defesa. 4. Apelação a que se nega provi-mento.” (TRF 2ª R. – AC 2003.51.01.023851-6 – 8ª T. Esp. – Rel. Des. Fed. Raldênio Bonifacio Costa – DJe 14.09.2010 – p. 317) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 108000034027. Acesso em: 09.12.2015)

7584 – Políticas públicas – Programa ‘Morar Bem’ – renda familiar inferior a 12 salários mínimos – exigência

“Administrativo. Programa ‘Morar Bem’. Exigência de renda familiar inferior a doze (12) sa-lários mínimos. Renda bruta. Exclusão do recorrente. Critério objetivo. 1. A convocação para

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habilitação para recebimento de moradia no Programa ‘Morar Bem’ configura mera expecta-tiva de direito e não direito adquirido, haja vista se tratar de uma das fases do procedimento, o qual visa à aquisição do imóvel. 2. A legislação de regência estabelece critérios tanto para habilitação quanto de classificação, que serão analisados pelo ente público, conforme as normas regulamentares do programa. 3. Para participar de programa habitacional de interesse social, o interessado deve comprovar que não tem renda bruta superior a 12 (doze) salários mínimos (Lei Distrital nº 3.877/2006, art. 4º, caput, inc. V). 4. Não satisfeitos os requisitos, não é assegurado ao candidato participar do Programa ‘Morar Bem’. 5. Não cabe ao Poder Judiciário revisar os atos administrativos ou políticas públicas já existentes, exceto diante de ilegalidade, ou abuso, sob pena de ferir o princípio da separação dos poderes, constitucional-mente estabelecido. 6. Recurso conhecido e desprovido.” (TJDFT – PADM 20120110940567 – (909403) – 6ª T.Cív. – Rel. Des. Carlos Rodrigues – DJe 07.12.2015)

Comentário Editorial SÍNTESECuida-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido au-toral, em ação movida contra a Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal – CODHAB/DF, ao fundamento de que a autora tem salário bruto superior a R$ 9.000,00, mas somente poderá participar do programa habitacional o candidato com renda inferior a doze salários mínimos.

A apelante, em suas razões, enfatiza que muito embora a sua renda seja superior a 12 salários mínimos, seria desarrazoada e desproporcional ser agraciada com a justiça gratuita e não ter direito à casa própria do programa Morar Bem.

Sustenta que é solteira e que seu filho possui uma série de transtornos e deficiências em vários órgãos, necessitando de cuidados constantes e gastos consideráveis, comprome-tendo grande parte de sua renda. Afirma que o formalismo excessivo no que tange ao requisito econômico, afronta vários princípios constitucionais.

Com base nesses argumentos, pleiteia o conhecimento e provimento do recurso.

Ao analisar o recurso, a 6ª Turma Cível do TJDFT entendeu que a autora não satisfaz os requisitos pra ter direito à casa própria do programa Morar Bem.

Sendo assim, negou provimento à apelação.

Em seu voto, o Relator assim se manifestou:

“[...] Conforme se vê, a legislação prevê que o candidato, ainda que tenha sob sua guarda ou responsabilidade dependente portador de necessidades especiais, não estará isento de comprovar o atendimento aos requisitos exigidos – notadamente da renda fa-miliar –, para que lhe seja assegurado os benefícios decorrentes da política habitacional.

Na hipótese em apreço, a autora-apelante aufere renda bruta superior a doze salários mínimos, conforme contracheque de fl. 17, não preenchendo integralmente as exigên-cias objetivas para ser contemplada no programa.

Desse modo, não se afigura possível compelir a Administração Pública a deixar de ob-servar os requisitos que, amparados pelos princípios da legalidade e da isonomia, e em atenção ao direito constitucional à moradia e de especial tratamento às pessoas com deficiência, norteiam a política pública habitacional do Distrito Federal.

A fim de corroborar o entendimento acima perfilhado, colacionam-se os seguintes pre-cedentes deste e. TJDFT, verbis:

Programa habitacional ‘Morar Bem’. Requisitos. 1. Para participar de programa habi-tacional de interesse social, o interessado deve comprovar que não teve renda bruta superior a 12 (doze) salários mínimos (Lei Distrital nº 3.877/2006, art. 4º, V). 2. Não satisfeitos os requisitos, não é assegurado ao candidato participar do Programa ‘Morar

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Bem’. 3. Apelação não provida. (Acórdão nº 795699, 20120111666247APC, Rel. Jair Soares, Rev. José Divino de Oliveira, 6ª T.Cív., Data de Julgamento: 04.06.2014, Publicado no DJe 10.06.2014, p. 158) (grifos nossos)

APELAÇÃO CÍVEL – MANDADO DE SEGURANÇA – PROGRAMA MORAR BEM – REN-DA FAMILIAR BRUTA NÃO SUPERIOR A 12 SALÁRIOS MÍNIMOS VIGENTES À ÉPO-CA DA CONVOCAÇÃO – Segundo o art. 4º da Lei nº 3.877/2006, um dos requisitos para a participação no programa habitacional ‘Morar Bem’ é a percepção de renda familiar até 12 salários mínimos. De acordo com os decretos regulamentares da Lei nº 3.877/2006, a renda, para os fins do programa, é a mensal bruta. O salário mí-nimo a ser considerado, no entanto, é o vigente à época da convocação. O fato de ter havido aumento no salário mínimo em momento posterior não tem o condão de alterar a decisão administrativa. Os valores de referência a serem considerados são aqueles vi-gentes na época da análise do pleito, e não posteriormente. Recurso provido. Unânime. (Acórdão nº 789860, 20120111074875APO, Rel. Otávio Augusto, Rev. Silva Lemos, 3ª T.Cív., Data de Julgamento: 14.05.2014, Publicado no DJe 20.05.2014, p. 134) (grifos nossos). [...]”

7585 – Processo administrativo – afastamento preventivo – descrição do fato – ausência

“Constitucional e administrativo. Mandado de segurança. Servidor público. Processo adminis-trativo. Afastamento preventivo. Portaria. Ausência de descrição do fato. 1. Para concessão de liminar em mandado de segurança é necessária a concorrência dos requisitos da relevância da fundamentação e da irreparabilidade do dano (art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009). 2. Portaria de instauração de processo administrativo que não descreve os fatos imputados ao servidor. Afastamento das funções por prazo indeterminado. Concorrência dos requisitos legais. Limi-nar deferida. Admissibilidade. Decisão mantida. Recurso desprovido.” (TJSP – AI 2219108-75.2015.8.26.0000 – 9ª CDPúb. – Rel. Décio Notarangeli – DJe 26.11.2015)

7586 – Responsabilidade civil do Estado – concessionária de serviço público de manuten-ção e funcionamento de rodovia – acidente de trânsito – culpa exclusiva da vítima – indenização indevida

“Administrativo. Responsabilidade civil de concessionária de serviço público de manuten-ção e funcionamento de rodovia. Indenização por danos causados em acidente de trânsito. Colisão no entroncamento rotatório da rodovia BR-116 com a BR-282. Culpa exclusiva do motorista que ocasionou o acidente que causou lesões graves num dos autores e avarias na motocicleta do outro demandante. Desistência da ação em relação a tal motorista causador. Permanência apenas da concessionária no polo passivo da demanda. Inexistência de res-ponsabilidade de sua parte. Ausência de qualquer alegação de irregularidades nas rodovias envolvidas ou no local da ocorrência. Responsabilidade civil objetiva que não se estende à reparação de danos causados por terceiro sem qualquer participação da concessionária. Nexo de causalidade não comprovado. Improcedência mantida. Recurso desprovido. A responsa-bilidade civil objetiva de concessionária de serviço público não obriga esta à reparação de danos causados por culpa exclusiva de terceiro, se não for comprovado o nexo de causalidade entre os danos sofridos pela vítima e eventual falha na prestação do serviço representada pela participação daquela, na ocorrência, por conta de irregularidades que deveria ter sanado. Tal é o caso de acidente de trânsito em entroncamento de rodovia concedida, devidamente sinalizada e em boas condições, em que o motorista que deveria ter parado na rotatória pros-

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seguiu no trânsito e veio a colidir com motocicleta que transitava normalmente ocasionando avarias no pequeno veículo e lesões graves no condutor.” (TJSC – AC 2014.026153-9 – Rel. Des. Jaime Ramos – DJe 14.12.2015)

7587 – Servidor público – aposentadoria – contagem de tempo ponderada – tempo de serviço especial – ilegalidade

“Aposentadoria. Averbação de tempo de serviço em atividades insalubres antes e depois da publicação da Lei nº 8.112/1990. Mandado de injunção. Ilegalidade da contagem ponderada de tempo de serviço especial em aposentadoria comum. Negativa de registro. Apenas o ser-vidor público que exerceu, como celetista, no serviço público, atividades insalubres, penosas ou perigosas, no período anterior à vigência da Lei nº 8.112/1990 tem direito à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria. Para a averbação em períodos posteriores à publicação da Lei nº 8.112/1990, é absolutamente imprescindível a regulamen-tação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal. Determinação à diretoria do pessoal civil da marinha para que verifique, caso a caso, se os interessados, cujos atos foram apreciados pela ilegalidade, ainda preenchem os requisitos para a aposentadoria com base no mesmo fundamento legal ou outro vigente e, se afirmativo, emita novo ato e o submeta à apreciação deste tribunal, devendo promover o retorno à ativa do servidor que não houver completado os requisitos necessários à aposentadoria.” (TCU – Proc. 005.318/2015-7 – (4913/2015) – 1ª C. – Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues – J. 01.09.2015)

Comentário Editorial SÍNTESECuidou o presente julgado, de análise de atos de concessão de ex-servidores da Diretoria do Pessoal Civil da Marinha, submetidos, para fins de registro, à apreciação do Tribunal de Contas da União (TCU), de acordo com o art. 71, inciso III, da Constituição Federal.

Durante a análise dos atos de aposentadoria, constatou-se a ocorrência de períodos de exercício de atividade insalubre, tais períodos são automaticamente excluídos da contagem do tempo.

Também são excluídos da contagem outros períodos de tempo cujo cômputo a juris-prudência do TCU entende, a princípio, ser irregular. São exemplos os períodos de tem-po rural, aluno aprendiz, estágio, residência médica e aqueles obtidos por justificação judicial. Trata-se de vedações para as quais a jurisprudência do TCU também prevê exceções, mas, nesses casos, a verificação do atendimento dos requisitos exige-se a apresentação de documentação comprobatória. Portanto, na ocorrência de qualquer desses períodos, são eles excluídos da contagem.

Assim manifestou-se o Relator sobre o caso:

“[...] As averbações de tempo de serviço em atividades prestadas em condições insa-lubres antes de 12.12.1990 estão de acordo com o entendimento firmado no Acórdão nº 2008/2006-TCU-Plenário, no sentido de que apenas o servidor público que exerceu, como celetista, no serviço público, atividades insalubres, penosas ou perigosas, no perí-odo anterior à vigência da Lei nº 8.112/1990 tem direito à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria.

Situação de todo distinta é a averbação de tempo de serviço em atividades prestadas em condições insalubres, em períodos posteriores à publicação da Lei nº 8.112/1990, caso em que é absolutamente necessária a regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal, que definirá os critérios e requisitos para a respectiva aposentadoria (Acórdão nº 2008/2006-TCU-Plenário). Em aposentadoria comum, não é possível a contagem

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ponderada de tempo de serviço em atividades em condições insalubres exercido após a publicação da Lei nº 8.112/1990.

Esclareço que o Mandado de Injunção mencionado nos autos não se aplica às aposenta-dorias de tais servidores, mas, sim, àquelas em que os servidores se aposentaram pela regra do art. 40, § 4º, da Constituição Federal/1988, ou seja, com 100% de exercício em atividade especial, nos termos previstos no art. 57 da Lei nº 8.213/1991. Esse artigo trata exclusivamente de aposentadoria especial e não de conversão de tempo de serviço especial para fins de aposentadoria comum.

Nesse sentido, aliás, a jurisprudência deste Tribunal, a exemplo do Acórdão nº 874/2014-TCU-1ª Câmara, de que fui Relator. Na ocasião, assim me manifestei:

‘Concordo com os pareceres uniformes da Secretaria de Fiscalização de Pessoal e do representante do Ministério Público, no sentido de considerar legais os atos de alteração de aposentadoria nºs 10802592-04-2008-000086-7, de Emenegidio Pereira da Silva, e 10802592-04-2008-000209-6, de Maria Alves da Silva.

Ambos os atos, com averbações de tempo de serviço em atividades em condições insa-lubres antes de 12.12.1990, estão de acordo com o entendimento firmado no Acórdão nº 2008/2006-TCU-Plenário de que o servidor público que exerceu, como celetista, no serviço público, atividades insalubres, penosas ou perigosas, no período anterior à vigência da Lei nº 8.112/1990 tem direito à contagem especial de tempo de serviço para efeito de aposentadoria.

Também concordo com os pareceres anteriores em julgar ilegais os atos de alteração de aposentadoria nºs 10802592-04-2011-000029-0, de Emenegidio Pereira da Silva, e 10802592-04-2010-000116-2, de Maria Alves da Silva, visto que, em ambos, consta averbação de tempo de serviço em atividades em condições insalubres em períodos posteriores à publicação da Lei nº 8.112/1990.

Para períodos posteriores à Lei, é necessária a regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição Federal, que definirá os critérios e requisitos para a respectiva aposentado-ria (Acórdão nº 2008/2006-TCU-Plenário). Em aposentadoria comum, não é possível a contagem ponderada de tempo de serviço em atividades em condições insalubres exercido após a publicação da Lei nº 8.112/1990.’

Isto posto, considero ilegais as aposentadorias em exame.

Com fundamento na Súmula/TCU nº 106/1976, dispenso a reposição das importâncias recebidas de boa-fé.

Nos moldes da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os atos em exame deram entrada no TCU em prazo inferior ao período de cinco anos, a eles não se aplicando o procedimento definido pelo Acórdão TCU nº 587/2011-Plenário.

A Diretoria do Pessoal Civil da Marinha deverá, pois, proceder à análise, caso a caso, dos processos, para verificar se os interessados, cujos atos foram apreciados pela ilega-lidade, ainda preenchem os requisitos para a aposentadoria, seja com base no mesmo fundamento legal ou em outro vigente e, se afirmativo, emitir novo ato e o submeter à apreciação deste Tribunal, devendo promover o retorno à ativa do servidor que não houver completado os requisitos necessários à aposentadoria; [...]”

7588 – Servidor público – auxílio pré-escolar – majoração pelo Judiciário – Súmula nº 338, do STF – aplicação

“Administrativo. Agravo regimental no recurso especial. Servidor público. Auxílio pré-escolar. Majoração pelo Judiciário. Aplicação da Súmula nº 339/STF. Omissão do aresto regional afas-tada. Revisão da verba honorária. Exorbitância. Súmula nº 7/STJ. 1. Afasta-se a alegada ofensa

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ao art. 535 do CPC, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos presentes autos, não se podendo, ademais, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. 2. O acórdão recorrido não destoa da Orientação Jurisprudencial deste Superior Tribunal que assentou entendimento segundo o qual, a concessão, pelo Poder Judiciário, de equiparação ou reajuste dos valores do auxí-lio pré-escolar dos servidores públicos encontra óbice na Súmula nº 339/STF, por implicar invasão da função legislativa (AgRg-REsp 1.325.113/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 11.10.2013). 3. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, em regra, não se mostra possível em recurso especial a revisão do valor fixado a título de honorários advocatícios, pois tal providência exigiria novo exame do contexto fático-probatório constante dos autos, o que é vedado pela Súmula nº 7/STJ. Todavia, o óbice da referida Súmula pode ser afastado em situações excepcionais, quando for verificado excesso ou insignificância da importância arbitrada, ficando evidenciada ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, hipóteses não configuradas nos autos. Não configurada, na hipótese vertente, a excepcionali-dade exigida pela jurisprudência desta Corte, não se mostra possível a pretendida redução dos honorários advocatícios. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.564.530 – (2015/0277894-0) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 07.12.2015)

Transcrição Editorial SÍNTESESúmula do Supremo Tribunal Federal:

“339 – Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar venci-mentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia.”

7589 – Servidor público – exoneração a pedido – processo administrativo – absolvição – demora na formalização – ilegalidade e abusividade – configuração

“Mandado de segurança. Servidora efetiva. Exoneração a pedido. Existência de processo ad-ministrativo disciplinar. Absolvição. Demora na formalização da exoneração. Ilegalidade e abusividade configurada. Exoneração pelo Poder Judiciário. Impossibilidade. Extração do pe-dido através de interpretação lógico-sistemática. Precedentes do STJ. Segurança concedida. 1. O pedido deve ser extraído não só do capítulo destinado aos requerimentos, mas da in-terpretação lógico-sistemática de todos os fatos e fundamentos lançados na petição inicial, devendo ser entendido como aquilo que se pretende com a instauração da demanda, não configurando julgamento extra petita a concessão de providência dentre as várias interpre-tações possíveis da pretensão deduzida na inicial. 2. Colhe-se da inicial que a impetrante busca com a presente impetração ver afastado ato omissivo em relação à formalização de sua exoneração, a pedido, de cargo efetivo, exoneração essa que estaria pendente de solução ao argumento de estar a servidora autora respondendo a Processo Administrativo Disciplinar. 3. Uma vez concluído o PAD com absolvição da impetrante, a omissão da autoridade impe-trada em providenciar a formalização da sua exoneração se mostra abusiva e ilegal, restando demonstrada a violação do direito líquido e certo de ser exonerada do cargo como solicitado, já que o óbice que impedia a edição do ato já estava há muito superado, revelando-se injus-tificável a demora na remessa do processo ao Governador para a homologação do pedido de exoneração com a consequente edição do respectivo decreto. 4. Segurança concedida para que a autoridade impetrada adote as providências necessárias à formalização da exoneração da impetrante, a pedido.” (TJAP – MS 0000619-47.2015.8.03.0000 – TP – Rel. Des. Raimun-do Vales – DJe 14.12.2015)

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7590 – Servidor público – gratificação natalina – verbas recebidas mensalmente – equipa-ração – impossibilidade

“Direito administrativo. Servidores públicos municipais. Pretensão de igualar o valor da gra-tificação natalina com as verbas remuneratórias recebidas mensalmente. Juntada das folhas de pagamento dos autores, onde se pode perceber que auferem, além do vencimento-base, gratificações. Inicial não instruída com a legislação que rege a relação de direito adminis-trativo com o município. Oferecimento de oportunidade para a prova do fato constitutivo. Prazo transcorrido. Preclusão. Princípio da legalidade estrita: art. 37, caput, da CF/1988. Im-possibilidade de aferir quais vantagens são de natureza permanente e quais possuem ca-ráter propter laborem. Improcedência dos pedidos. Sentença mantida. Recurso conhecido, porém desprovido.” (TJCE – Ap 0004671-14.2014.8.06.0170 – Rel. Jucid Peixoto do Amaral – DJe 14.12.2015)

7591 – Servidor público – licença remunerada – mestrado – conveniência e oportunidade – negativa – ilegalidade – ausência

“Mandado de segurança. Direito administrativo. Concessão de licença remunerada para fre-quência em mestrado. Ato discricionário. Conveniência e oportunidade. Ausência de ilega-lidade. Segurança denegada. I – A concessão de licença remunerada para os fins frequência em Mestrado encontra previsão em mais de um instrumento normativo Estadual, cabendo o destaque para o que preveem a Lei Complementar nº 46/1994, que institui o Estatuto dos Ser-vidores Públicos Estaduais e também a Lei Complementar nº 115/1998, que institui o Estatuto do Magistério Público Estadual. II – ‘A concessão de licença para capacitação de servidores públicos, ato discricionário, sujeita-se ao juízo do Administrador acerca da conveniência e oportunidade, tendo em vista o interesse público’ (AgRg-REsp 1258688/SC, Rel. Min. Be-nedito Gonçalves, 1ª T., J. 03.03.2015, DJe 11.03.2015). III – A negativa da Administração Pública encontra-se baseada no Decreto Estadual nº 3755-R, de 02.01.2015, que estabelece diretrizes e providências para a contenção de gastos do Poder Público no exercício de 2015, fundamento que tenho como absolutamente razoável e que certamente não está a ensejar qualquer espécie de abuso, desproporcionalidade ou desvio de finalidade, enfim, qualquer ilegalidade manifesta por parte do Administrador, passível de ser retificada no presente writ. IV – Segurança denegada.” (TJES – MS 0007940-95.2015.8.08.0000 – Rel. Jorge Henrique Valle dos Santos – DJe 09.12.2015)

7592 – Servidor público – magistério – gratificação de regência de classe – readaptação por motivo de saúde – supressão – impossibilidade

“Apelação cível. Administrativo. Servidor público municipal. Magistério. Gratificação de re-gência de classe. Readaptação por motivo de saúde. Supressão. Impossibilidade. Exegese do art. 23 da LCM 26/2002. Honorários advocatícios. Redução. Possibilidade. Recurso parcial-mente provido. A readaptação não importa em decesso remuneratório e, enquanto perdurar o afastamento do professor readaptado por motivo de saúde, impõe-se a continuidade do paga-mento da gratificação de regência de classe.” (TJSC – AC 2014.093200-9 – 3ª CDPúb. – Rel. Des. Pedro Manoel Abreu – DJe 09.11.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação em epígrafe foi interposta pelo Município de Curitibanos contra sentença proferida nos autos de ação de cobrança que julgou procedente o pedido da servidora

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pública, determinando o pagamento da gratificação por regência de classe suprimida por conta de período de readaptação por motivo de saúde.

Em suas razões recursais, o Município sustenta que referida gratificação é devida so-mente aos professores em efetivo exercício na sala de aula. Ou seja, enfatiza que tal verba não se estende aos servidores afastados da sala de aula a qualquer título, mesmo àqueles em licença médica ou readaptados, que é o caso da autora.

Ao analisar o recurso, a 3ª Câmara de Direito Público do TJSC ressaltou que o Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Curitibanos (Lei Complementar nº 26/2002) no seu § 2º do art. 23, in verbis, assegura aos servidores em readaptação a garantia de intangibilidade remuneratória.

Logo, concluiu que não há o que se falar em cessação do pagamento ou redução da gratificação de docência, devendo ser mantida a condenação do apelante.

Em seu voto, o Relator assim se manifestou:

“[...] Neste caso, ainda que a gratificação de docência prevista na Lei Complementar Municipal nº 24/2002, alterada pela Lei Complementar nº 132/2015, em seu art. 18-A disponha que aos professores ‘será concedida a gratificação pelo exercício em sala de aula’, esta Corte de Justiça, apreciando questão similar a dos autos, sedimentou que ‘a existência de norma própria regendo a gratificação de docência não tem o condão de excluir a aplicação de lei que disciplina o instituto da readaptação, ainda esta norma seja genérica. Na verdade, elas se complementam, cabendo uma interpretação sistemática do ordenamento. Portanto, mesmo em readaptação, a impetrante deveria receber a gratificação pela regência de classe no patamar de 30% e não de 15%’ (TJSC, ACMS 2014.021261-5, de Balneário Camboriú, Rel. Des. Subst. Paulo Henri-que Moritz Martins da Silva, J. 22.07.2014).

Ademais, convém ressaltar que a matéria não representa novidade alguma nesta Corte, sendo pacífico o entendimento de que a readaptação não importa em decesso remune-ratório, sendo devida a concessão de adicional de regência de classe. A título ilustrativo, colacionam-se alguns precedentes:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA – PROFESSORAS DA REDE PÚBLICA DO MU-NICÍPIO DE SÃO BENTO DO SUL – GRATIFICAÇÃO DE INCENTIVO À REGÊNCIA DE CLASSE SUPRIMIDA DURANTE O PERÍODO DE GOZO DE LICENÇA PARA TRATAMEN-TO DE SAÚDE – DIREITO À CONTINUIDADE DE SUA PERCEPÇÃO, MESMO ANTE OMISSÃO LEGISLATIVA – APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (LEI MUNICIPAL Nº 228/2001) NO TOCANTE À VEDAÇÃO DE DECESSO REMUNERATÓRIO NO CASO DE READAPTAÇÃO – PRECEDENTES DESTA CORTE – SENTENÇA MANTIDA NO MÉRITO – INSURGÊNCIA QUANTO AOS JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA – ADEQUAÇÃO CONSOANTE DECISÃO PROFERIDA PELA SUPREMA CORTE NA ADI 4.357 – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Ape-lação Cível nº 2014.090128-6, de São Bento do Sul, Rel. Des. João Henrique Blasi, J. 12.05.2015).

ADMINISTRATIVO – PROFESSORA DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE CAMBORIÚ – SUSPENSÃO DO PAGAMENTO DA GRATIFICAÇÃO DE REGÊNCIA DE CLASSE DU-RANTE O PERÍODO EM QUE ESTEVE AFASTADA LEGALMENTE PARA TRATAMENTO DE SAÚDE – ILEGALIDADE DO ATO – INTANGIBILIDADE REMUNERATÓRIA ASSEGU-RADA PELA LEI QUE DISCIPLINA O FUNCIONALISMO PÚBLICO LOCAL – ART. 64, CAPUT, DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 19/2008 – PRECEDENTES DESTA CORTE – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – MANUTENÇÃO DO QUANTUM ARBITRA-DO – REFORMA DA SENTENÇA TÃO SOMENTE PARA ISENTAR O ENTE PÚBLICO AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS – RECURSO VOLUNTÁRIO E REEXA-

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ME NECESSÁRIO PARCIALMENTE PROVIDOS – ‘A readaptação não importa em de-cesso remuneratório e, enquanto perdurar o afastamento do professor readaptado por motivo de saúde, impõe-se a continuidade do pagamento da gratificação de regência de classe’ (Apelação Cível nº 2010.027984-0, da Capital, Rel. Des. Pedro Manoel Abreu). (TJSC, Apelação Cível nº 2012.022469-0, de Camboriú, Rel. Des. Cesar Abreu, J. 18.02.2014).

AÇÃO AJUIZADA POR SERVIDOR PÚBLICO DO QUADRO DO MAGISTÉRIO DO MUNI-CÍPIO DE CHAPECÓ – GRATIFICAÇÃO DE REGÊNCIA DE CLASSE – PRETENSÃO DE PAGAMENTO DA VANTAGEM NOS PERÍODOS DE AFASTAMENTO EM LICENÇA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE E APÓS SOFRER READAPTAÇÃO – DIREITO RECONHE-CIDO – EXEGESE DOS ARTS. 24, 40 E 59 DA LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 130/2001 – IMPOSSIBILIDADE DE DECESSO REMUNERATÓRIO – RECURSO DES-PROVIDO – ‘Embora a Lei Complementar Municipal nº 130/2001 não preveja expressa-mente o pagamento da Gratificação de Incentivo à Regência de Classe durante o período de readaptação por motivo de doença (art. 59, § 1º), deve ela ser analisada sem o rigo-rismo da interpretação literal e, ao mesmo tempo, em consonância com a legislação e a jurisprudência acerca do assunto. Com efeito, de acordo com as decisões deste Tribunal, o professor afastado da sala de aula por motivo de readaptação, tem direito de continuar recebendo a gratificação de regência de classe, pois se trata de situação equivalente à licença para tratamento de saúde.’ (TJSC, Apelação Cível nº 2009.021852-5, de Chapecó, Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, J. 06.06.2009). (TJSC, Apelação Cível nº 2012.082082-5, de Chapecó, Rel. Des. Gaspar Rubick, J. 24.09.2013)

ADMINISTRATIVO – PROFESSOR DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL – GRATIFICAÇÃO DE INCENTIVO À REGÊNCIA DE CLASSE – PAGAMENTO SUSPENSO – DIREITO DE CONTINUAR A PERCEBER A VERBA RECLAMADA – RECURSO PROVIDO – ‘[...] de acordo com as decisões deste Tribunal, o professor afastado da sala de aula por mo-tivo de readaptação, tem direito de continuar recebendo a gratificação de regência de classe, pois se trata de situação equivalente à licença para tratamento de saúde’ (AC 2009.021852-5, de Chapecó, Rel. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, J. 17.06.2009). (TJSC, Apelação Cível nº 2009.040963-8, de São Bento do Sul, Rel. Des. José Volpato de Souza, J. 17.02.2011)

Com efeito, considerando-se a jurisprudência citada, deve ser mantida a decisão de primeiro grau que condenou o Município de Curitibanos ao pagamento da regência de classe desde a data da readaptação, qual seja, fevereiro de 2007 até o mês de fevereiro de 2012. [...]”

7593 – Servidor público – pensão por morte – filha divorciada – equiparação com solteira – impossibilidade

“Administrativo. Servidor. Pensão por morte. Filha divorciada, equiparação com solteira. Im-possibilidade. Dependência econômica. 1. O cerne da questão versa sobre pedido de restabe-lecimento de pensão temporária por morte, concedido à filha maior divorciada, desde a data do óbito do genitor, em 11.08.1990, cancelada em virtude da não comprovação, quando ins-tada administrativamente, da condição da autora de dependente economicamente do institui-dor. 2. Sobre o tema da pensão temporária concedida à filha maior de 21 anos, tem-se que a autora somente pode ser considerada dependente de seu falecido pai, para fins de percepção de pensão por morte, se ao tempo do óbito possuía a condição de filha solteira, dependente economicamente do instituidor, eis que está assentado na jurisprudência dos Tribunais Supe-riores que o direito à pensão é regido pelas normas legais em vigor à data do evento morte do instituidor, na hipótese, a Lei nº 3.373, de 12 de março de 1958. 3. A autora fora casada entre

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1983 e 1989. Portanto não é solteira, mas divorciada. O desfazimento do casamento não tem o condão de retornar a autora ao estado civil de solteira, a não ser que o seu casamento fosse anulado por uma das hipóteses ventiladas no Código Civil, o que não ocorre no caso sub examen. 4. A dependência econômica é o fator decisivo nesta querela, pois se a autora não tem profissão e/ou nunca trabalhou ‘fora’, ao casar sai da tutela paterna para a do marido, e, com a dissolução matrimonial, não volta para o seio econômico da família patriarcal, conti-nua dependente do ex-esposo. Nestas situações, se de verdade a filha retorna à dependência econômica paterna, tais fatos devem ser demonstrados em prova específica, o que, inexistiu neste caso. 5. Apelação desprovida.” (TRF 2ª R. – AC 0030733-23.2013.4.02.5101 – 6ª T.Esp. – Relª Salete Maria Polita Maccalóz – DJe 24.11.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEDiscute-se no caso em epígrafe se a filha divorciada pode se equiparar à filha solteira para fins de recebimento de pensão por morte do pai que era servidor público.

A apelação foi interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido autoral onde almejava que a União Federal restabelecesse imediatamente a pensão temporária por morte, cancelada por força da orientação do entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU) tocante ao não enquadramento da autora às hipóteses previstas na Lei nº 3.373/1958, vigente à época do óbito do seu genitor em 11.08.1990, em razão de não ostentar a condição de solteira, mas de divorciada.

Nas razões recursais, a autora, ora apelante, sustenta sua condição de solteira, mesmo estando divorciada à época do início do pagamento do benefício, em 01.09.1990, para fazer jus ao direito previsto no art. 5º da Lei nº 3.373/1958, in verbis, afirmando que jurisprudencialmente há embasamento para equiparação da condição de divorciada à de solteira, desde que comprovada a dependência econômica.

“Art. 5º Para os efeitos do artigo anterior, considera-se família do segurado:

I – Para percepção de pensão vitalícia:

a) a espôsa, exceto a desquitada que não receba pensão de alimentos;

b) o marido inválido;

c) a mãe viúva ou sob dependência econômica preponderante do funcionário, ou pai inválido no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo;

II – Para a percepção de pensões temporárias:

a) o filho de qualquer condição, ou enteado, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido, enquanto durar a invalidez;

b) o irmão, órfão de pai e sem padrasto, até a idade de 21 (vinte e um) anos, ou, se inválido enquanto durar a invalidez, no caso de ser o segurado solteiro ou viúvo, sem filhos nem enteados.

Parágrafo único. A filha solteira, maior de 21 (vinte e um) anos, só perderá a pensão temporária quando ocupante de cargo público permanente.”

Ao analisar a apelação, a 6ª Turma Especializada do TRF 2ª Região afirmou que a apelante não comprovou a sua dependência econômica, assim,negou provimento ao recurso.

Do voto da Relatora destacamos:

“[...] Ao revés, há nos autos cópia da sentença de separação consensual, à fl. 45, com-probatória de que ficará a autora como beneficiária de 20% do salário líquido do pai da filha do casal, descontado em folha salarial, é verdade, para o sustento da filha em

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comum, conquanto para seu próprio sustento também, nos idos de 1989, quando se divorciou, em data muito próxima, portanto, do óbito do instituidor.

Quanto instada regularmente pela administração a comprovar sua condição de de-pendente econômica do instituidor, o Ministério dos Transportes, por meio da Carta nº 99/2012, manifestou-se pela descaracterização da condição de dependência econô-mica, em virtude de ter sido encaminhado somente um dos três documentos solicitados para tal, às fls. 41/42.

Outrossim, conforme bem apontou a União Federal em suas contrarrazões, em momento algum nesses autos a apelante logrou êxito em comprovar a condição de dependente econômica do instituidor, ao revés, mesmo com o salário informado no montante de cerca de oitocentos reais pago por empresa privada, à qual presume-se ser empregada a autora, à fl. 11, fez prova de que trabalha para o próprio sustento, inexistindo neste caso, a condição econômica em debate.

[...]

Por fim, conceder-se a pensão à autora tal qual nestes autos pretendida é romper com as regras de previdência em pleitos individuais; é cometer a maior injustiça com todos aqueles que estão trabalhando e pagando o Instituto para a sua futura aposentadoria e dependentes, inclusive encurtar as suas possibilidades técnicas, fornecendo aos re-formistas os argumentos de redução de direitos e/ou extinção para todos os servidores.

Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.”

7594 – Servidor público – pensão temporária – dependente inválido – concessão – possibi-lidade

“Administrativo. Servidor público federal. Pensão temporária. Dependente inválido. I – O direito à percepção de pensão por morte de servidor público federal decorre da norma inserta no art. 217, II, d, da Lei nº 8.112/1990. Nesse ponto, concluindo a perícia que a autora pos-sui incapacidade total e permanente para atividades laborais, anterior ao falecimento de sua genitora, configurada está a invalidez exigida pela lei de regência. II – Concluindo a perícia que a incapacidade total e permanente para atividades laborais era anterior ao falecimento da genitora da autora, configurada está sua invalidez exigida pela lei de regência. III – A correção das parcelas em atraso e os honorários advocatícios foram fixados corretamente, não mere-cendo reparos. IV – É de ser concedida a tutela específica de que trata o art. 461 do CPC para determinar a implantação do benefício no prazo de 30 (trinta) dias, sob a pena de pagamento de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais). V – Apelação da autora parcialmen-te provida. Apelação da União Federal e à remessa oficial improvidas.” (TRF 3ª R. – Ap-RN 0018802-74.2011.4.03.6100/SP – 11ª T. – Relª Desª Fed. Cecilia Mello – DJe 18.12.2015)

7595 – Servidor público – posse – posterior anulação do certame – exoneração – prévio processo administrativo – ausência – impossibilidade

“Agravo interno. Remessa oficial. Mandado de segurança. Servidor público. Aprovação em concurso. Posse. Posterior anulação do certame. Exoneração. Ausência de prévio processo administrativo. Impossibilidade. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Súplica regi-mental. Alegação de perda do objeto do mandamus. Não ocorrência. Caso de prejudicialida-de no cumprimento da ordem mandamental. Matéria que deve ser submetida ao magistrado responsável pela execução do julgado. Manutenção da decisão monocrática. Desprovimento da irresignação regimental. A exoneração de servidor público, mesmo em estágio probatório,

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por ato unilateral do Prefeito, com base no seu poder de autotutela e em virtude da anulação de concurso também por ato daquela autoridade, depende da prévia instauração de proces-so administrativo, sob pena de nulidade. Precedentes do STJ. Cuida-se de writ impetrado contra ato administrativo da lavra do Ministro do Trabalho e Emprego que tornou sem efeito a nomeação da impetrante para o cargo de auditor-fiscal do trabalho, após mais de quinze anos da data da posse o do exercício; a motivação do ato impugnado é o cumprimento de decisão judicial na qual houve a reversão de provimento favorável quando da realização do concurso público. A Primeira Seção já apreciou o tema e acordou que é necessária a atenção aos princípios da ampla defesa e do contraditório no âmbito dos processos administrativos que ensejam restrição de direito, em casos idênticos ao presentes nos autos, de servidores re-lacionados com o mesmo concurso público (STJ. MS 15473/DF. Rel. Min. Humberto Martins. J. em 11.09.2013). ‘Conforme a jurisprudência do Pretório Excelso e deste Superior Tribunal de Justiça, é vedada a exoneração de servidor público em razão de anulação de concurso, sem a observância do devido processo legal’ (STJ, RMS 31312/AM. Relª Min. Laurita Vaz. J. em 22.11.2011). Se a ilegalidade (ausência de procedimento administrativo) só fora suprida após a impetração da ordem, em virtude de uma imposição judicial, não é o caso de perda superveniente do objeto do writ, e sim de prejudicialidade no cumprimento da ordem man-damental.” (TJPB – RN 0000182-15.2011.815.0581 – 1ª C.Esp.Cív. – Rel. Subst. Ricardo Vital de Almeida – DJe 09.12.2015)

7596 – Servidor público – promoção por produtividade – requisitos – presença – negativa administrativa – ilegalidade

“Mandado de segurança. Ofensa à legalidade. Direito à promoção por produtividade. Presen-ça dos requisitos. Negativa administrativa ilegal. Direito líquido e certo vislumbrado. Segu-rança concedida. Pelas disposições normativas da Lei Estadual nº 4.134/2011 e da Resolução nº 20/2013-PGJ, o direito funcional à promoção por produtividade não é mero ato discricio-nário da Administração, pelo contrário, se preenchidos os requisitos elencados pela lei, o ser-vidor tem direito à promoção. Se confirmado e comprovado o preenchimento dos elementos, há direito líquido e certo à promoção e, por via de consequência, o indeferimento caracteriza ofensa à legalidade e permite a intervenção judicial para afastá-la, sem ofender o princípio da separação dos poderes. Segurança concedida.” (TJMS – MS 1408654-59.2015.8.12.0000 – 2ª S.Cív. – Rel. Des. Marcelo Câmara Rasslan – DJe 16.12.2015)

7597 – Servidor público – remoção – discricionariedade administrativa – interesse público – ausência

“Administrativo. Servidor público. Remoção. Instrução normativa. Preenchimento de requi-sito não garante o direito. Discricionariedade da administração. Interesse público. Sentença mantida. 1. A remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, com ou sem mudança de sede, podendo ser, nos termos do art. 36 da Lei nº 8.112/1990, no interesse exclusivo da Administração (inc. I), a pedido, quando o interesse predominante é do servidor, a critério da Administração, quando esta não tem interesse, mas também a ela não se opõe (inc. II), ou independentemente do interesse da Administração (inc. III), quando a despeito do seu interesse a remoção ocorrerá, conforme hipóteses declinadas nesse inciso. 2. A edição de instrução normativa por parte do Departamento de Polícia Federal, estabelecendo as regras a serem observadas na remoção de servidores, não garante ao servidor o direito de ser removi-do, tendo em vista que a remoção é ato discricionário da Administração, devendo ocorrer no seu interesse, como previsto no art. 4º da IN 010/2006-DG/DPF, de 30 de novembro de 2006,

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e está condicionada à existência de vaga na localidade pretendida pelo servidor. 3. Apelação desprovida.” (TRF 1ª R. – AC 2009.34.00.042427-7/DF – Rel. Des. Fed. Jamil Rosa de Jesus Oliveira – DJe 15.12.2015)

7598 – Servidor público – remoção – permanência mínima de 60 meses – legalidade

“Administrativo. Servidor público. Participação no concurso de remoção. Permanência míni-ma de 60 meses. Legalidade. Requisitos do art. 36, III, da Lei nº 8.112/1990 não preenchidos. Interesse público. Situação fática consolidada. 1. A remoção de servidor público é ato discri-cionário da Administração, que pode ser concedida de ofício, a seu interesse, ou a pedido, observados os critérios por ela estabelecidos, sendo legítima a condição de participação em concurso de remoção de que o servidor nomeado deva permanecer pelo período mínimo de 60 meses no órgão em que tenha sido lotado originariamente. 2. Não sendo observado o período de permanência mínima nas unidades nas quais foram lotados, não têm direito à pre-tendida remoção, inexistindo qualquer ilegalidade nesse sentido, tendo em vista a prevalência do interesse público. 3. In casu, extrai-se que em decisão liminar, datada de 25.06.2008, foi deferida a participação dos autores no concurso de remoção, tendo ambos logrado êxito e sido transferidos de suas lotações. A sentença proferida nos autos, em 10.12.2009, confirmou a liminar anteriormente deferida. Dessa forma, não obstante o posicionamento esposado, verifica-se que há situação fática consolidada, não sendo conveniente a reversão. Preceden-tes desta Corte (Corte Especial, MS 2008.01.00.009946-4/DF, Rel. Des. Fed. Catão Alves, DJ 06.10.2008, p. 05; 1ª T., AC 0023802-71.2005.4.01.3400/DF, Relª Desª Fed. Ângela Ca-tão, e-DJF1 p. 49, de 07.07.2014) e do STJ (AgRg-AREsp 261.397/RN, Relª Min. Assusete Magalhães, 2ª T., J. 04.08.2015, DJe 19.08.2015). 4. Apelação da União e remessa oficial não providas.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 2008.37.00.004798-3/MA – Relª Desª Fed. Gilda Sigmaringa Seixas – DJe 01.12.2015 – p. 411)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 8.112/1990:

“Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.

[...]

III – a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:

a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;

b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial;

c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interes-sados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados.”

7599 – Trânsito – alienação de veículo – alienante – responsabilidade solidária após a tra-dição – inexistência

“Administrativo. 1. Alienante de veículo automotor não responde solidariamente pelas pena-lidades que venham a gravá-lo após a tradição, quando comprovado estreme de dúvida o co-

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metimento das infrações após a cessão do bem. Inteligência do art. 134 do CTB. 2. Alegados débitos de IPVA e multas lavradas pelo Detran que não se encontram comprovados nos autos. Ausência de direito líquido e certo no ponto. 3. Sentença parcialmente reformada. Recurso parcialmente provido.” (TJSP – Ap 1046819-28.2014.8.26.0053 – 7ª CDPúb. – Rel. Coimbra Schmidt – DJe 17.12.2015)

Transcrição Editorial SÍNTESECódigo de Trânsito Brasileiro:

“Art. 134. No caso de transferência de propriedade, o proprietário antigo deverá encami-nhar ao órgão executivo de trânsito do Estado dentro de um prazo de trinta dias, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade, devidamente assinado e datado, sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impos-tas e suas reincidências até a data da comunicação.

Parágrafo único. O comprovante de transferência de propriedade de que trata o caput poderá ser substituído por documento eletrônico, na forma regulamentada pelo Con-tran.”

7600 – Trânsito – licenciamento de veículo – restrição de circulação – impedimento

“Apelação cível em mandado de segurança. Administrativo. Licenciamento de veículo. Res-trição judicial de circulação. Impedimento. Recurso conhecido e não provido. 1. O apelante teve seus veículos gravados com restrição de transferência e circulação, realizada através do Renajud, nos autos da Execução Fiscal nº 0001541-17.2012.5.11.0002 em curso perante o Juízo da 2ª Vara do Trabalho da Comarca de Manaus/AM. 2. O art. 9º do Regulamento do CNJ prevê expressamente que a restrição total impede a realização de um novo licenciamento. Desta feita, há de se reconhecer que a decisão recorrida não merece reparo na medida em que a recusa do Detran em realizar o licenciamento anual ocorreu em virtude da decisão pro-ferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara do Trabalho da Comarca de Manaus/AM. 3. Qualquer irresignação quanto à restrição de circulação deverá ser discutida no Juízo que a decretou, em respeito à independência das jurisdições. Além do mais, tendo em vista que a decisão ataca-da não padece de teratologia, não afronta a Lei nem é manifestamente contrária à prova dos autos, deve ser mantida em sua integralidade. 4. Apelação conhecida e não provida.” (TJAM – Ap 0635529-55.2014.8.04.0001 – C.Reun. – Rel. Des. João Mauro Bessa – DJe 30.11.2015)

7601 – Trânsito – sociedade de economia mista – poder de polícia – delegação – multa –nulidade – impossibilidade

“Apelação. Ação anulatória de ato administrativo. Multa de trânsito. Delegação de poder de polícia (fiscalização e sanção) à sociedade de economia mista. Pretensão inicial voltada à declaração de nulidade de multas de trânsito lavradas por sociedade de economia mista. Impossibilidade. Delegação do poder de polícia administrativa à entidade integrante da Admi-nistração Indireta. Legalidade. Respeito aos critérios e termos da lei instituidora e de delega-ção. Ausência de impugnação do mérito das infrações de trânsito. Presunção de legitimidade do ato administrativo. Sentença de procedência reformada. Recurso da ré provido.” (TJSP – Ap 4002713-60.2013.8.26.0506 – 4ª CDPúb. – Rel. Paulo Barcellos Gatti – DJe 05.11.2015)

Comentário Editorial SÍNTESECuida-se de apelação interposta pela Transerp – Empresa de Transporte Urbano de Ri-beirão Preto S/A contra sentença que julgou procedente “ação declaratória de nulidade

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de auto de infração de trânsito com pedido de tutela antecipada” ajuizada em seu des-favor, por considerar inadmissível a delegação do poder de polícia a entidades privadas integrantes da Administração Pública, que é o caso da apelante.

A apelante sustenta que a pretensão anulatória não pode ser acolhida, já que suas atribuições – fiscalização e atuação de trânsito – foram-lhe delegadas por força de Lei Municipal, inexistindo qualquer impedimento constitucional à delegação do poder de polícia estatal às empresas integrantes da Administração Indireta para gerenciamento do trânsito municipal.

Na análise recursal, a 4ª Câmara de Direito Público do TJSP acolheu os argumentos da apelante e ressaltou que as atuações procedidas são revestidas de natureza de atos ad-ministrativos, logo, gozam de presunção de legitimidade, não apresentando ilegalidade manifesta ao ponto de ensejar o controle preventivo pelo Poder Judiciário.

Do voto do Relator, colhemos os seguintes precedentes:

“[...] Confiram-se os precedentes desta Egrégia Corte de Justiça em casos análogos:

‘APELAÇÃO CÍVEL – ANULATÓRIA DE MULTA DE TRÂNSITO – Pretensão de anulação de multas de trânsito impostas por infração aos arts. 281, inciso I, e 257, § 8º do Códi-go de Trânsito Brasileiro. Alegação de impossibilidade de delegação do poder de polícia e falta da dupla notificação para imposição das penalidades. Penalidades aplicadas por empresa pública. Delegação de competência pela Municipalidade de Bauru. Emdurb – Empresa pública municipal criada exclusivamente para exercer atividades de interesse da Administração e integrada ao Sistema Nacional de Trânsito. Possibilidade de dele-gação do poder de polícia. Aplicação de penalidade aos infratores que está implícita no poder de polícia delegado. Comprovada a expedição de notificação da autuação e de imposição de penalidade relativa à infração ao art. 281, inciso I, do Código de Trânsito Brasileiro. Infração ao art. 257, § 8º que tem natureza administrativa, não havendo ne-cessidade de dupla notificação (Resolução Contran nº 151/2003). Sentença reformada para julgar improcedente o pedido. Recurso provido.’ (Apelação Cível nº 0022840-05.2011.8.26.0071, Relª Desª Maria Laura Tavares, 5ª CDPúb., J. 16.12.2013)

‘AÇÃO DE NULIDADE DE AUTUAÇÕES DE TRÂNSITO – Sentença que não conheceu da legitimidade passiva do município e negou provimento ao pedido do autor. A delegação do poder de polícia à Sociedade de Economia Mista não afasta a qualidade de parte do município. Inteligência dos arts. 7º e 7º-A do CTB. Divergência jurisprudencial acerca do tema, STF reconheceu apenas a existência de repercussão geral, mas não julgou a ação. Interesse público na manutenção dos autos lavrados e multas impostas que se sobrepõe ao fato de a entidade fiscalizadora revestir-se na forma de sociedade de economia mista. Ação popular que não transitou em julgado em face do recurso de apelação interposto. Recurso em ação popular recebido no efeito suspensivo. Honorários advocatícios fixados de forma equitativa nos termos do art. 20 do CPC. Apelo não provido com observa-ção.’ (Apelação Cível nº 9001403-36.2010.8.26.0506, Rel. Des. Ronaldo Andrade, 3ª CDPúb., J. 08.10.2013)

‘APELAÇÃO – Ação anulatória de 16 autos de infração e imposição de multa de trân-sito lavrados pelos réus. Ausência de plausibilidade na alegação da autora de que não recebeu as notificações, cuja entrega ao correio foi comprovada. Presunção de veraci-dade e legitimidade do ato administrativo não afastada. Ausência de qualquer alegação do apelante no sentido de não teria praticado as infrações. Competência da CET para apurar as infrações. A possibilidade de delegação do poder de polícia vem assente na doutrina do mestre Hely Lopes Meirelles, que bem distingue o poder de polícia originário do poder de polícia delegado, nos seguintes termos: “Por fim, deve-se distinguir o poder de polícia originário do poder de polícia delegado, pois que aquele nasce com a entidade

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que o exerce e este provém de outra, através de transferência legal. O poder de polícia originário é pleno no seu exercício e consectário, ao passo que o delegado é limitado aos termos da delegação e se caracteriza por atos de execução. Por isso mesmo, no poder de polícia delegado não se compreende a imposição de taxas, porque o poder de tributar é intransferível da entidade estatal que o recebeu constitucionalmente. Só esta pode taxar e transferir recursos para o delegado realizar o policiamento que lhe foi atribuído. Mas no poder de polícia delegado está implícita a faculdade de aplicar sanções aos in-fratores, na forma regulamentar, pois que isto é atributo de seu exercício.” Sentença de improcedência mantida por seus próprios fundamentos. Recurso não provido.’ (Apela-ção Cível nº 0019064-17.2012.8.26.0053, Rel. Des. Oswaldo Luiz Palu, 9ª CDPúb., J. 04.09.2013) [...]”

7602 – Transporte – concessão de passe livre – pessoa portadora de deficiência – perícia médica – comprovação

“Administrativo. Transporte público. Concessão de passe livre. Preliminar afastada. Pessoa com deficiência mental. Perícia médica. Comprovação. Sentença mantida. 1. Não assiste razão à União quanto à alegada falta de interesse de agir, uma vez que negou administrativa-mente o pedido do autor, por considerar não comprovada sua condição de deficiente. Evidên-cia necessária para garantir-lhe o direito ao passe livre interestadual. 2. A Lei nº 8.999/1994 assegura a concessão de passe livre no sistema de transporte público coletivo interestadual à pessoa portadora de deficiência comprovadamente carente. 3. No caso dos autos, foi com-provado, por meio de perícia médica, que o autor ‘é portador de doença mental, análoga à deficiência mental e apresenta limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas’ (Decreto nº 3.298/1999, art. 4º, inciso IV). 4. Não merece prosperar, outrossim, a afirmação da União de que não foi demonstrado que a doença do autor tenha se manifestado antes de completar dezoito anos. Isso porque, não obstante o laudo pericial tenha afirmado não ser possível aferir o início de manifestação da doença, concluiu, contudo, que o histórico do autor indica que o consumo de álcool e de drogas ilícitas começou aos dezesseis anos de idade; Informação compatível, portanto, com o grave estado de saúde mental por ele apresen-tado nos dias atuais. 5. Comprovada pela perícia médica a condição do autor de deficiente mental, faz ele jus à concessão do Passe Livre previsto na Lei nº 8.999/94. 6. Apelação e re-messa oficial a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 2009.34.00.020702-9/DF – Rel. Des. Fed. Néviton Guedes – DJe 26.11.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEEm seu voto o Relator citou os seguintes precedentes:

“[...] CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – TRANSPORTE PÚBLICO – PASSE LIVRE – PESSOA COM DEFICIÊNCIA – COMPROVAÇÃO – RECO-NHECIMENTO DO DIREITO – 1. Comprovada a condição de pessoa com deficiência, a concessão de passe livre no sistema de transporte público interestadual, prevista na Lei nº 8.999/1994, é medida que se impõe. 2. Remessa oficial a que se nega provimento. (REO 0002405-09.2013.4.01.4100/RO, Rel. Des. Fed. Kassio Nunes Marques, 6ª T., e-DJF1 p. 1188, de 10.02.2015)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – PASSE LIVRE EM TRANSPORTE PÚBLICO INTERESTADUAL – PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA – COMPROVAÇÃO – RE-CONHECIMENTO DO DIREITO – I – Na espécie dos autos, considerando-se que a Lei nº 8.899/1994 assegurou a concessão de passe livre no sistema de transporte público interestadual aos portadores de deficiência, bem assim em razão do acervo probatório no sentido de que a autora apresenta limitação associada a duas ou mais áreas de

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habilidades adaptativas previstas no inciso IV do art. 4º do Decreto nº 3.298/1999, afigura-se razoável reconhecer-se sua condição de pessoa portadora de deficiência com vistas no referido benefício, medida esta que se encontra em sintonia com um dos objetivos fundamentais inseridos na Constituição Federal da República Federativa do Brasil, no sentido de se construir uma sociedade livre, justa e solidária (CF, art. 3º, I). II – Remessa oficial e apelação da União Federal desprovidas. Sentença confirmada. (AC 0016023-89.2011.4.01.4100/RO, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, 5ª T., e-DJF1 de 25.04.2014, p. 624). [...]”

Seção Especial – Estudos Jurídicos

O Que É Revisão Contratual? Comparação com o Reajuste e com a Repactuação – Segunda Parte

IVAN BARBOSA RIGOLINAdvogado em São Paulo

REAJUSTE

XIV – Se a revisão do contrato pela lei nacional das licitações se processa como foi resumido até aqui e na primeira parte deste artigo, quanto ao instituto do reajuste, ou reajustamento, as regras na mesma lei são diametralmente diferentes.

Está previsto esse instituto no art. 40 da Lei nº 8.666/1993, deste modo:

Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:

[...]

XI – critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;

[...]

Várias observações são necessárias a respeito deste texto acima.

XV – Em primeiro lugar, apesar de o caput dar a entender que tudo o que estiver previsto no art. 40 é obrigatório que conste do edital, essa é uma impressão falaciosa, e a generalização do caput (“O edital [...] indicará, obrigatoriamente, o seguinte”) indica pouca técnica do legis-lador – como se tal fosse novidade na lei das licitações. Nem tudo que

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consta do art. 40 deve obrigatoriamente constar do edital, por absoluta impossibilidade material e jurídica, ou ambas.

O reajuste de preços não é obrigatório em edital algum, de licita-ção alguma no Brasil, e jamais o foi.

Se por exemplo temos um contrato de locação por seis meses, e se a licitação se resolveu em um mês apenas, então qualquer reajuste de preços, nesse contrato que durou menos de um ano a contar da data de apresentação das propostas, é simplesmente proibido, porque já de há muitos anos em nosso país é proibido reajustar quaisquer contratos de menos de um ano de duração. É o que reza o art. 2º da Lei nacional nº 10.192, de 14 de fevereiro de 2001, hoje sendo tido pacificamente esse dispositivo como norma geral de contrato (cf. CF, art. 21, XXVII), de modo que se impõe à União, ao Distrito Federal, aos Estados e aos Municípios.

No caso de licitações, o prazo inicial deve desse ano é ou a data de apresentação das propostas ou, ainda, anterior a isso, a data do orça-mento do ente licitador, anexado ao edital, conforme a lei de licitações, art. 40, XI.

Outro exemplo da falácia do caput do art. 40 é o caso do seu inciso IV, que, à primeira vista, parece obrigar a que o edital contenha projeto básico, o que se sabe que apenas em certos casos de obras e de serviços acontece. Um edital de licitação para compras ou fornecimento não tem projeto básico, de modo que a aparente obrigatoriedade de o edital atender a todos os incisos do art. 40 outra vez fura, não dá certo. É sempre preciso esforçar sobremaneira o cérebro para decifrar as leis no Brasil, e não cair em cantos de Ossanha.

Recomenda-se que o edital de licitação de contratos longos, ou potencialmente longos, contenha o fator de reajuste, que será exercitado um anos após o denominado i0, ou índice zero, que é o marco inicial da contagem de tempo para o reajuste dos preços.

Não é justo obrigar o contratado a suportar a inflação sobre seus preços durante longos anos, sem a reposição devida do valor de compra da moeda que recebe. Ao forçar o irreajustamento de contratos longos, o que o Poder Público incautamente provoca é que o contratando já de antemão eleve artificialmente seus preços propostos, vez que não se ar-

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riscará a perder potencialmente muito dinheiro com aquele imobilismo de preços.

Não é atitude técnica nem inteligente denegar reajustes de preços em contratos longos, e nenhuma consequência proveitosa pode resultar dessa bisonha austeridade. Alguém desconhece o sentido da correntia expressão serviço porco?

XVI – Reajuste é assunto sério, próprio de pessoas e de institui-ções sérias, que precisa ser considerado a sério porque apenas repõe a inflação de determinado período havida sobre os preços contratados, enquanto a revisão nem sempre, e por vezes, em certos momentos e em certas áreas de negócios, quase nunca.

Revisão, por outro lado, muita vez já é havida antecipadamente como sinônimo de picaretagem da pior espécie, ato de banditismo, ma-nobra fraudulenta e criminosa de alterar o contrato para subir os preços de modo a gerar enriquecimento ilícito de alguém, em geral por conluio entre contratado e contratante, todos aquinhoados generosamente com atos de deslavada corrupção, sob a manta da necessidade. Não deve nem poderia ser assim, mas frequentemente é exatamente o que cerca episódios de revisão de contratos.

Vide, a respeito, contratos do recente (atual enquanto se escreve este trabalho) e ultravergonhoso episódio do petrolão, tido como o maior escândalo de corrupção governamental de todos os tempos na história da humanidade, e até o momento reprimido e condenado severamente pelo Poder Judiciário. Alguma revisão, ou alguma outra coisa qualquer naqueles contratos, poderia ser tida a sério?

Reajuste, ou reajustamento, é apenas o procedimento pelo qual se atualizam os preços contratados segundo a corrosão que a inflação, ou a alta de preços sobre os insumos do contrato, provocou em prejuízo do contratado. Dificilmente se imagina inflação negativa, a ponto de o reajuste funcionar contra o contratado, mas isso pode ocorrer.

Observe-se que não se fala de evento excepcional, extracontratual e aleatório, mas da simples e velha conhecida inflação de preços, praga da qual nosso país começa a se tornar vítima uma vez mais na história.

XVII – Sendo mera reposição da inflação, o reajuste não altera o contrato, como esclarece o § 8º do art. 65, acima transcrito. Registra-

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-se por simples anotação, apostilamento ou averbação, que pode ser no próprio contrato, o reajuste tão logo seja concedido, e o próprio gestor do contrato pode fazê-lo, sem autorização da chefia nem aditamento, nem maior formalismo.

Nem poderia o reajuste alterar o contrato, já que pelo mero rea-justamento do preço nada muda no objeto, mas apenas se repõe a perda inflacionária sofrida pelo contratado. Um reajuste de aluguel imobiliá-rio, ou em contrato de trabalho, ou em contrato de locação de equipa-mento, ou em contrato de consultoria ou de manutenção em nada altera o contrato: apenas se aplica o índice reajustador previsto no contrato, e o pacto segue igual ao que era antes, sem papéis novos nem termos aditivos quaisquer.

Existem índices gerais de preços, que refletem uma alta média de preços, e existem índices setoriais ou regionais de reajuste, que levam em conta apenas determinados fatores, produtos, serviços e outros insu-mos incidentes sobre uma especifica área, ou um específico objeto, ou um exclusivo setor. É o geral ante o específico.

É um índice geral oficial de preços, por exemplo, o IGP – Índice Geral de Preços, e é um índice setorial de preços o INCC – Índice Nacio-nal dos Custos da Construção. A atualização mensal e periódica desses índices é publicada desde na imprensa geral quanto em revistas e peri-ódicos especializados, e o seu acesso pela população é o mais amplo e fácil imaginável, até pela via da internet, que verdadeiramente alterou o mundo há mais de uma década.

Em sendo o objeto do contrato servido por índices setoriais, como uma obra o é, por exemplo, sempre é preferível que o contrato preveja o reajuste por um desses índices ao invés de por um índice geral, já que o setorial reflete apenas o incremento de valor dos insumos próprios do objeto, enquanto que o geral considera indiscriminadamente os preços mais variados do mercado, apurados sobre incontáveis insumos inapli-cáveis ao objeto que tem índice específico.

A adoção do índice específico, regional ou setorial propicia assim, tecnicamente, maior precisão e justeza ao reajuste, e por isso a lei o re-comenda ante o índice geral.

XVIII – Não é de boa técnica que o edital da licitação, ou o con-trato, estabeleça que o contratado deve requerer a cada novo período o

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reajustamento de seu contrato. Sendo o período aquisitivo previamente conhecido e predeterminado com exatidão, não existe motivo por que obrigar alguém a requerer o que o simples decorrer do tempo já lhe as-segura.

Tal qual no caso de adicional por tempo de serviço em favor dos servidores públicos, não precisa o reajustamento ser requerido pelo inte-ressado, bastando que o pagador, constatando o momento em que passa a ser devido, determine a sua incorporação ao preço devido no próximo pagamento ao contratado, apenas indicando em que percentual o índice saiu editado, conforme a fonte que seja também indicada.

XIX – Em breve e final resumo comparativo, temos que o reajuste se dá, portanto, apenas

a) se e como previsto no contrato;

b) por simples apostilamento pelo gestor; e

c) não altera o contrato.

Diversamente, a revisão

a) jamais é prevista no contrato;

b) se processa por termo aditivo, consensual entre as partes ou unilateralmente imposto pela Administração conforme o caso; e

c) se dá caso o interessado convença a outra parte de que aconte-ceu algum dos motivos fáticos previstos na lei como fundamen-to jurídico da revisão.

Alguém, por isso, dirá talvez que o reajuste é o primo pobre da revisão.

REPACTUAÇÃO

XX – Terceiro e último tema de nossa resenha, a repactuação é uma instituição do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, um misto de revisão e reajuste que vem sendo intensamente utilizado pelas enti-dades da administração indireta da União.

Consta a repactuação do Decreto nº 2.271, de 7 de julho de 1977, do qual é importante ter presentes as seguintes disposições:

Art. 1º No âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional poderão ser objeto de execução indireta as atividades mate-

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riais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que cons-tituem área de competência legal do órgão ou entidade.

§ 1º As atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, trans-portes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunica-ções e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta. [...]

Art. 5º Os contratos de que trata este Decreto, que tenham por objeto a prestação de serviços executados de forma contínua poderão, desde que previsto no edital, admitir repactuação visando a adequação aos novos preços de mercado, observados o interregno mínimo de um ano e a de-monstrarão analítica da variação dos componentes dos custos do contra-to, devidamente justificada.

Merece alguns comentários esse instituto, como estabelecido no decreto.

XXI – Em absoluto primeiro lugar, parece de questionável consti-tucionalidade a invenção, uma vez que não consta da lei nacional que veicula as normas gerais de licitação e contratos administrativos, a Lei nº 8.666/1993, a qual, boa ou ruim, ainda constitui o feixe das regras nacionais sobre esses dois temas, e enfeixa as possibilidades de revisão dos contratos administrativos.

Então, a lei de normas gerais de contratos, não contemplando a repactuação, indaga-se se sobraria espaço para um simples decreto pre-sidencial fazê-lo. Como, entretanto, levantar essa questão a esta altura dos acontecimentos lembra o que seria lidar com a quadratura do cír-culo, a teoria geocêntrica do sistema solar ou a da geração espontânea, sigamos em frente.

XXII – Pelo que se lê dos dois dispositivos transcritos, certos ser-viços continuados que o Poder Público contrata regular e assiduamente porque deles necessita em caráter permanente, enumerados no § 1º do art. 1º, caso o edital da respectiva licitação – ou caso os contratos dire-tos, não-licitados – haja previsto, podem sofrer repactuação de preços para readequá-los aos valores justos e correntes de mercado.

Não se trata bem de reajuste pelo que se lê do art. 5º, uma vez que depende de “demonstrarão analítica da variação dos componentes dos custos do contrato, devidamente justificada”, algo absolutamente estranho à regra do reajuste, que só depende do decurso do prazo esta-

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belecido no contrato, não inferior a um ano contado na forma do que acima se escreveu.

Mas também não se trata de revisão, porque precisa estar prevista a possibilidade de repactuação no edital ou no contrato, e ainda porque a sua concessão depende do decurso de um interregno de um ano – e o decreto se olvidou de informar a ser contado a partir de quando –, e a revisão não contém nada disso. Revisão nunca é prevista no edital nem no contrato, nem depende de interregno algum a partir de coisa alguma, pois que pode ser concedida um minuto após a assinatura do contrato, se a particular circunstância o exigir. O que apenas não se admite é a revisão anterior ao contrato...

E não se exige para a repactuação que ocorra algum daqueles fatos enumerados na alínea d do inciso II do art. 65 da Lei de Licitações (fato imprevisível etc.), simplesmente porque o Decreto nº 2.271/1997 não o exige, nem se refere sequer remotamente ao assunto – o que facilita operacionalmente a repactuação ante a ritualística da revisão, poupando discursos, falatórios e arengas, das mais sérias às menos sérias, que esse último instituto demanda.

Assim sendo, a repactuação hauriu inspiração tanto da revisão quanto do reajuste, sem, naturalmente, repetir nem um nem outro.

XXIII – Parecem estar claramente indicadas as atividades contra-táveis a terceiros pela administração direta, autárquica e fundacional da união, e cujos contratos admitem repactuação. O elenco do § 1º do art. 1º não deixa qualquer dúvida sobre isso.

Assim, sabido o serviço de que o Poder Público, indaga-se: aplica--se também ao Distrito Federal, aos Estados e aos Municípios a repactu-ação na forma do decreto federal dirigido expressamente à União?

A primeira e natural resposta é negativa, porque, de outro modo, seria desdenhar o que está escrito às claras no decreto, já no caput do art. 1º.

Ocorre que estamos no Brasil, e outra vez o que está escrito na re-gra legal, aparentemente rígida e estrita, quase sempre comporta leituras mais elásticas que a primeira mirada sugere, de modo que dificilmente – parece – será julgado irregular uma previsão e concessão de repactua-ção em editais e contratos estaduais e municipais.

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É comum o ato de Estados e Municípios, sobretudo estes últimos, encostarem em legislação federal, uma vez que ela já está pensada e já foi concebida, e em geral serve aos entes federados menores. Ainda fa-lando genericamente, não costuma existir resistência pelos entes de fis-calização locais ao emprego, por Estados e por Municípios, de leis e atos federais para os seus serviços locais. Assim é o caso da lei e do decreto do pregão, respectivamente presencial e eletrônico, ou o das concessões de serviço, entre muitos outros.

Não seria, portanto, de morder a nuca uma repactuação estadual ou municipal – ainda que, para nós e muito humildemente, não pareça recomendável.

XXIV – O rito e o processo de o interessado pleitear a repactuação parece similar ao processamento da revisão, apenas que não existirá a preocupação de se demonstrar fato imprevisível, ou previsível de con-sequências incalculáveis, ou a força maior, ou o caso fortuito, ou o fato do príncipe, qualquer destes a constituir álea econômica extraordinária e extracontratual, como é exigido para a revisão constante da alínea d do inciso II do art. 65 da Lei de Licitações.

A demonstração será apenas econômica, ante demonstrativos de preços de mercado e da oscilação que sofreram, supostamente indevida à vontade do requerente, e a ele desfavorável.

Não está escrito no decreto, mas parece claro que a repactuação constitui uma alteração do contrato, e exige a celebração de termo aditi-vo, consensual entre as partes, para o seu aperfeiçoamento.

Afinal, a repactuação altera a equação econômico-financeira do contrato, não constituindo mera reposição da inflação – papel do rea-juste. E, se reequilibra financeiramente o contrato, os preços passam a ser outros que não os iniciais, porque se modificam para se adequarem a novos valores de mercado, e isso constitui alteração do contrato.

Constituindo alteração, exige a celebração de um termo aditivo que a contemple, e, pela sistemática do decreto instituidor, esse termo é extraído da vontade conjunta e unívoca das partes, não podendo ser imposta ao contratado pelo Poder Público contratante.

Clipping Jurídico

Aprovado que teve a posse negada ganha direito de assumir o cargo

A 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, por unanimidade, deu provimento ao recurso do autor, reformou sentença de 1ª Ins-tância e determinou a posse do candidato. O autor ajuizou mandado de segurança no intuito de exercer seu direito a posse, com pedido liminar para reserva de sua vaga. Segundo o autor, ele teria sido aprovado em concurso para o cargo de Escri-vão de Polícia, da Carreira de Polícia Civil do Distrito Federal, mas foi impedido de tomar posse sob a alegação de que não teria apresentado seu diploma de curso de graduação em qualquer área de formação. O pedido liminar foi deferido e a vaga do autor ficou reservada até o julgamento final da ação. O Distrito Federal solicitou sua entrada no processo e defendeu que o autor não tinha direito. A Aca-demia de Polícia não se manifestou no processo. A sentença, proferida pelo Juízo da 6ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, negou o pedido argumentando que não haveria direito líquido e certo, nem ilegalidade ou abusividade no ato administrativo que impossibilitou a posse do autor. Portanto, se o impetrante não apresentou a formação específica de grau superior que poderia se fazer acompa-nhar da complementação a que alude o certificado de fls. 31, não preenche os requisitos do cargo. O impetrante não goza do direito líquido e certo de se ver nomeado e empossado no cargo de escrivão, pois não cumpre o requisito espe-cífico do grau de escolaridade exigido. O autor recorreu e os desembargadores entenderam por acatar seu recurso. Para os desembargadores, o autor demonstrou que possuía os requisitos necessários para assumir o cargo. Processo: APC 2014 01 1 102805-8. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Distrito Federal)

Justiça proíbe que OS seja contratada para gerir saúde do município do Rio

A Juíza titular da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, Maria Paula Gouvêa Galhardo, proibiu nesta quarta-feira, dia 16, a Prefeitura do Rio de Janeiro de con-tratar a Organização Social Instituto Unir Saúde para a gestão da saúde pública do município. Em caso de descumprimento da decisão judicial, a multa diária é de R$ 100 mil. A ação civil pública com pedido de liminar foi movida pelo Ministério Público, que constatou irregularidades na prestação do serviço e na contratação da OS pelo Poder Público. A entidade era responsável pela gestão da Coordenação de Emergência Regional (CER) Barra, anexo ao Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca, Zona Oeste. Na decisão, a Magistrada desta-ca a má qualidade do serviço prestado pela OS. “Não é lícito, moral e eficiente permitir que a 2ª ré, com o histórico aqui descrito, possa novamente contratar com a Administração Pública municipal. Vale registrar que constam dos autos pareceres elaborados pela Comissão Técnica de Avaliação que apontam não só para o elevado absenteísmo, como má qualidade do serviço prestado (mortalidade ajustada pela gravidade em UTI adulto, tempo médio de permanência na emer-

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gência, tempo médio de permanência na UTI, motivada por constantes ouvido-rias e pelas constantes queixas da direção do Hospital Lourenço Jorge, relativas à falta de médicos, principalmente de pediatras e constantes desabastecimentos na unidade...), além do mau emprego do dinheiro público”, justifica a Juíza Maria Paula Gouvêa Galhardo. Em outro trecho, a juíza ressalta que o Instituto Unir Saúde, antes denominado Estatuto Social da Associação Centro Científico Cultural J. Pires, não desempenhava qualquer atividade na área de saúde até julho de 2011, não preenchendo o tempo mínimo de dois anos de experiência no setor. Ainda segundo os autos do processo, a OS já foi desqualificada em 2011 para a gestão do Hospital da Ilha do Governador justamente por não demonstrar experiência na área. Processo:0489633-27.2015.8.19.0001. (Conteúdo extraído do site do Tribu-nal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro)

Justiça mantém quebra de sigilo bancário de empresa suspeita de improbi-dade

A 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) manteve liminar que determinou a quebra de sigilo bancário e a indisponibilidade dos bens do Escri-tório de Planejamento e Administração Municipal (Esplam). A empresa é suspei-ta de esquemas fraudulentos em contratos realizados com o Município de Bar-reira, a 90 km de Fortaleza. Além disso, foi proibida de contratar com o referido ente público. A decisão é da relatoria da Desembargadora Maria Vilauba Fausto Lopes. De acordo com a Magistrada, restou consignado que “a indisponibilida-de dos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que causa dano ao erário. Segundo os autos, o Ministério Público do Ceará (MP/CE) ajuizou ação contra a Esplam alegando a prática de improbidade administrativa em função de esque-ma fraudulento que resultou no recebimento de valores em contratos celebrados com a Secretaria de Administração do município. Ao analisar o caso, o Juízo da Vara Única de Barreira deferiu a liminar para determinar a quebra do sigilo ban-cário e a indisponibilidade dos bens móveis e imóveis da empresa. Para evitar a ocorrência de outras ilegalidades e prejuízos ao Erário, também foi proibida de contratar com o referido município. Inconformado, o Escritório de Planejamento interpôs recurso de agravo de instrumento (nº 0627715-04.2015.8.06.0000) no TJCE, argumentando que a decisão se encontra em desacordo com os referencias legais do ordenamento jurídico acerca do tema. Ao julgar o recurso, a 6ª Câmara Cível manteve integralmente a decisão de 1º Grau, acompanhando o voto da re-latora. A Desembargadora Maria Vilauba Fausto explicou que, existindo indícios mínimos da materialidade do fato ímprobo e da autoria, a decisão deve obriga-toriamente ser mantida para o fim de resguardar o interesse público. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Ceará)

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Concessão judicial de medicamento não está vinculada apenas ao risco de morte do paciente

A 6ª Turma do TRF da 1ª Região negou provimento às apelações interpostas pela União e pelo Estado do Amazonas confirmando sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara da Seção Judiciária do Amazonas, que condenou os entes públicos a realizarem exames e a fornecerem tratamento médico à parte autora, que possui “audição unilateral mista, de condução e neurossensorial, sem restrição de audi-ção contralateral e retardo mental não especificado”, além de a fornecerem medi-camentos e aparelho auditivo. A União recorreu ao TRF1 alegando, em síntese, ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação. Defendeu a impossibilidade de ser condenada a tratamento médico específico, bem como sustentou que o Poder Judiciário não pode adentrar na seara das políticas públicas. Por sua vez, o Estado do Amazonas argumentou que o autor já recebeu o tratamento médico vindicado. Argumentou também que a aquisição de medicamentos deve ser pre-cedida de procedimento licitatório e salientou que o demandante não corre risco de morte. “Não é possível o Estado fornecer todo tipo de medicamento solicitado. Além disso, o fornecimento de medicação sem previsão na lei orçamentária viola o art. 167 da CF/1988”, alegou. O Colegiado não acatou as razões das apelantes. O relator, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, destacou, inicialmen-te, que, sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) composto pela União, Estados e Municípios, qualquer deles tem legitimidade para figurar no polo passivo de demandas que versem sobre pedidos de concessão de medicamentos e de tra-tamento médico. O Magistrado salientou que “o pedido formulado encontra-se amparado por meio de relatório médico que indica a doença da qual o autor/apelado é portador, não tendo os réus se desincumbido do ônus de comprovar a desnecessidade do tratamento vindicado na exordial”. Asseverou que a concessão judicial de medicamento e/ou tratamento médico não está vinculada apenas ao risco de morte do paciente, mas, sim, “à necessidade do paciente, considerando seu quadro clínico”. Destacou, também, que medidas assecuratórias de concessão de medicamentos não violam o princípio da isonomia, não havendo que se fa-lar “em impossibilidade de condenação do Estado a tratamento específico, sendo certo que, comprovada a doença da qual o autor é portador e sua miserabilidade econômica, devido o fornecimento do tratamento médico pleiteado na origem”. O desembargador afirmou, por fim, que, em casos excepcionais, é possível a aquisi-ção de medicamentos sem o prévio procedimento licitatório, “não podendo ques-tões burocráticas impedir o exercício do direito à saúde quando comprovada a urgência do caso”. Nesses termos a Turma, por unanimidade, negou provimento às apelações e à remessa oficial, mantendo a sentença pelos seus próprios funda-mentos. Processo: 0000057-07.2010.4.01.3200. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

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União é condenada a indenizar em R$ 100 mil anistiada política torturada durante a ditadura militar

Por unanimidade, a 6ª Turma do TRF da 1ª Região confirmou a condenação da União ao pagamento de R$ 100 mil, a título de indenização por danos morais, em razão da tortura a qual a parte autora foi submetida durante o governo militar. A decisão foi tomada após a análise de recursos apresentados pelo Estado de Goiás e pela União contra sentença do Juízo da 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado de Goiás. Em suas alegações recursais, o Estado de Goiás pleiteou o au-mento do valor dos honorários de sucumbência. A União, por sua vez, requereu a anulação da sentença, uma vez que, mesmo tendo requerido o pagamento de indenização em parcelas mensais de maneira extra petita, o Juízo determinou o pagamento em parcela única. Sustentou, o ente público, também a falta de provas em relação às pretensões autorais, bem como a incompetência do Poder Judiciário para declaração de anistiado político, “uma vez que tal tarefa caberia ao Ministro da Justiça e à Comissão de Anistia”. O Colegiado discordou das razões trazidas pe-los recorrentes. “Reconhecida a condição de anistiada política da autora, caberá a reparação econômica, seja em prestação única ou continuada. Para ser deferida uma espécie ou outra, é preciso analisar o preenchimento de requisitos previstos nos arts. 4º, 5º e 6º da Lei nº 10.559/2002, não havendo que se falar em sentença extra petita se ocorrer concessão de indenização em parcela única em vez de pres-tação mensal pleiteada pela autora, já que ambas as modalidades prestam-se a in-denizar danos decorrentes de atos praticados durante a ditadura militar”, explicou o relator, Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian, em seu voto. O Magistra-do também ressaltou que, “diante do princípio da responsabilidade civil objetiva do Estado, é cabível indenização por dano, tanto material como moral, a anistiado político, a quem foi infligido tratamento que atingiu as esferas física e psíquica, resultando, daí, na violação de direitos constitucionalmente garantidos e protegi-dos. Assim, comprovado o nexo de causalidade entre o dano e a atuação estatal, incide a regra prevista no art. 37, § 6º, da CF/1988”. Por fim, quanto ao pedido de aumento dos honorários sucumbenciais feito pelo Estado de Goiás, o relator entendeu que, em razão de sua vitória quanto à denunciação da lide proposta pela União, R$ 500,00 estão em consonância com o disposto no art. 20, § 4º, do CPC, “razão pela qual devem ser mantidos”. Processo: 0018993-92.2006.4.01.3500. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

União não é responsável por destruição de laranjeiras afetadas por “cancro cítrico”

Decisão do Juiz Federal Miguel Di Pierro, convocado para compor a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), deu provimento a apelação da União e julgou improcedente o pedido de indenização de um agricultor pelos danos sofridos por conta da destruição de sua lavoura de laranja para erradicação da praga conhecida por cancro cítrico. O autor alegava que a União foi omissa

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no combate à doença, o que permitiu a infestação, obrigando muitos produtores a erradicarem sua plantação. Ele afirmava ainda que o Poder Público impôs a destruição de grande parte de suas árvores de frutos, sem lhe pagar qualquer inde-nização, violando o seu direito de propriedade. Ao analisar o caso, o relator des-tacou que a infestação que acometeu a lavoura do autor, provocada pela bactéria Xantomonas axonopodis pv. citri, não decorreu de conduta comissiva ou omissiva da União. “Trata-se de doença vegetal altamente agressiva e de fácil propagação, à qual estão sujeitos os produtores rurais, risco inerente às atividades do campo”, explicou o Magistrado. Para o juiz federal, não é possível responsabilizar a União pela praga sob o argumento de inércia do Estado ou ineficiência das políticas públicas de combate à doença. “Admitir a possibilidade seria carrear à União a responsabilidade objetiva pelos riscos da atividade econômica, em nítida privati-zação dos lucros e socialização dos prejuízos”, completou. A decisão observa que os prejuízos do autor decorreram da infestação da sua plantação e não da conduta atribuída à União. Além disso, o relator concluiu que as medidas administrativas, decorrentes do poder de polícia são consequências da infestação. “A depender do grau de comprometimento da lavoura, justifica-se, em tese, a destruição dos ‘pés’ como forma de erradicação, sobretudo à luz do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado”, escreveu Di Pierro. O Magistrado explicou que o Decreto nº 24.114/1934, que regula a defesa sanitária vegetal, determina que, verificado o surgimento de pragas nocivas às culturas e cuja disseminação possa se estender a outras regiões e constituir perigo para a lavoura nacional, o Ministério da Agricultura deverá imediatamente interditar a área contaminada e aplicar medidas de erradicação. Uma das medidas previstas na legislação para o controle de pragas é a destruição do plantio. Segundo a legislação, explica o relator, a indenização só ocorrerá para as plantas não contaminadas ou, embora contaminadas, ainda se mantiverem aptas ao seu objetivo econômico. Por isso, a União somente poderia ser condenada a indenizar o autor se fosse comprovado o excesso do Poder Público na implementação e execução do controle sanitário vegetal, o que, para ele, não aconteceu. Além disso, o juiz federal entendeu que a atuação da União ocorreu dentro dos limites da legalidade, realizada em de-corrência do poder de polícia da administração. “Nota-se que, no caso em voga, a atuação ocorreu dentro dos parâmetros exigidos pela legislação vigente, não existindo razão de se falar em indenização. Os autos de interdição e de destruição (fls. 35/48) demonstram que as plantas estavam contaminadas pela praga ‘cancro cítrico’, razão pela qual se justifica a atuação administrativa”, conclui. Processo: 0001581-74.2009.4.03.6124. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Fe-deral da 3ª Região)

ANAC não tem obrigação de fiscalizar comercialização de voo livre em praias de Florianópolis

A Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) não tem obrigação de fiscalizar a comercialização de voo livre nas praias de Florianópolis e região metropolitana. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) entendeu que o Poder Judiciário

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não pode interferir no âmbito da Administração Pública. A decisão da 3ª Turma, proferida na última semana, reformou a sentença de primeiro grau que determi-nava a fiscalização. No início do ano, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação solicitando que a ANAC fiscalizasse a atividade remunerada de voo livre nas praias da grande Florianópolis. Segundo o MPF, a atividade, que é vedada pela Lei nº 7.565/1986, estava sendo praticada livremente, colocando em risco a população que utiliza o serviço sem saber de sua proibição. A ação foi julgada procedente pela Justiça Federal da capital catarinense, que, além da fiscalização, determinou que a ANAC colocasse placas e avisos nas rampas de voo para adver-tir os visitantes e turistas sobre a ilegalidade da prática. A Agência recorreu contra a decisão no TRF4. A ANAC alegou que a prática de qualquer esporte aéreo impli-ca riscos e que o estabelecimento de níveis de segurança inviabilizaria o exercício da atividade. Salientou, por fim, que o serviço de asa delta, parapente e ultraleve não necessita de autorização, o que torna impossível fiscalizar e impor sanção. Em decisão unânime, a 3ª Turma do tribunal decidiu reformar a sentença liberando a ANAC da fiscalização da atividade. Segundo o Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, a interferência da Justiça na criação de políticas públi-cas envolvendo gestão de pessoal pode comprometer as receitas do Executivo. O Magistrado acrescentou que, “em situações excepcionais, o Poder Judiciário pode determinar que a Administração Pública adote medidas para garantir os direitos constitucionais sem que isso configure violação do princípio da separação dos poderes. No entanto, não há como se afirmar que a situação específica dos muni-cípios da região de Florianópolis é diferente da realidade das demais localidades do País”. Processo: 5000151-35.2015.4.04.7200. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

Município não pode designar enfermeiros para a tarefa privativa de farma-cêutico

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) confirmou sentença que impede o município gaúcho de Uruguaiana, na fronteira oeste do estado, de designar enfermeiros para fazer a dispensação de medicamentos em unidades de saúde locais. A decisão atende a um pedido feito em 2014 pelo Conselho Regional de Enfermagem do RS (Coren/RS). A entidade ingressou com a ação civil pública após a fiscalização constatar que profissionais de enfermagem estavam praticando a atividade. A dispensação é o ato de fornecer um ou mais medicamentos a um paciente, normalmente como resposta à apresentação de uma receita elaborada por médico ou dentista. A tarefa costuma ser realizada em farmácias e é vedada ao profissional de enfermagem, de acordo com a Lei nº 7.492/1986. Em liminar, a 2ª Vara Federal de Uruguaiana determinou, em maio de 2014, a imediata suspen-são da prática sob pena de multa diária de R$ 800,00. A decisão foi confirmada no julgamento de mérito do caso, levando a prefeitura a recorrer ao tribunal. Segundo o município, após a concessão da liminar, a atividade foi corrigida, o que dispen-

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saria a análise do processo, que deveria ser extinto sem resolução do mérito. A Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, responsável pela relatoria do processo no TRF4, reforçou em seu voto os argumentos da sentença. Para ela, o fato de o réu, por força da liminar ter comprovadamente retirado da enfermagem o papel de dispensação de medicamentos, não conduz à extinção do processo sem julgamento de mérito. Conforme a decisão de primeiro grau, “a prática daquela conduta pelo profissional ligado à área de enfermagem consubstancia, na prática, desrespeito aos termos da Lei nº 3.820/1960 e da Lei nº 5.991/1973, diplomas que estabelecem que tal atividade é privativa dos profissionais farmacêuticos”. Des-sa forma, a 3ª Turma manteve por unanimidade a sentença. Processo: 5001853-50.2014.4.04.7103. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

Mãe de criança vítima de choque elétrico deve receber mais de R$ 100 mil de indenização

A Juíza Ana Cleyde Viana de Souza, titular da 14ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza, condenou a empresa Cariri Produções Artísticas e, subsidiariamente, o Estado do Ceará a pagar indenização moral de R$ 100 mil à mãe de menino que faleceu vítima de choque elétrico. A Magistrada também determinou o pagamento de pensão mensal equivalente a 2/3 do salário-mínimo vigente, a partir da data em que o garoto faria 14 anos, até quando completaria 25 anos. Depois, será reduzido para 1/3 até o dia que atingiria 71,9 anos ou até que os pais venham a falecer. Segundo os autos (nº 0084608-13.2005.8.06.0001), a criança de apenas cinco anos morreu no dia 28 de agosto de 2005 em decorrência de descarga elétrica, no Município de Limoeiro do Norte. Na ocasião, acontecia o “I Encontro Mestres do Mundo”, promovido pela Secretaria de Cultura do Estado (Secult). O menino brincava em uma praça na companhia da avó. Em dado momento, pegou em tripé que dava sustentação ao aparelho de iluminação conhecido como “minibrut”, pertencente à empresa Cariri Produções, contratada pela Secult para cobertura do encontro. Ele foi levado a hospital, mas não resistiu e faleceu. A mãe alega que não recebeu a devida atenção do Estado, nem foi procurada pelos responsáveis do evento. Por isso ajuizou ação, com pedido de tutela antecipada, requerendo que o ente público, por meio da Secult, pagasse indenização. Na contestação, o Estado argumentou que não teve responsabilidade no ocorrido porque não houve atuação de agentes públicos que desencadeasse o fato. Também sustentou que o dever de preservar o equipamento, bem como o de realizar a devida manutenção era da Cariri Produções. Já a empresa defendeu que a culpa é dos familiares, que deveriam ter vigiado a criança naquela noite. Ao julgar o caso, a juíza destacou que, pela análise do laudo pericial, a empresa não procedeu com as devidas nor-mas de proteção e de segurança necessárias, razão pela qual deve reparar o dano. Também ressaltou que “a empresa sequer sinalizou o perigo de choque elétrico nos locais onde havia muita fiação, nem tampouco contou com a presença de um

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funcionário para permanecer olhando os minibruts nas laterais da área do evento, como medida de segurança que o próprio sócio da empresa narrou como necessá-ria”. Ainda de acordo com a Magistrada, mesmo quando o Estado transfere a pres-tação de serviço, não fica isento de sua obrigação de prestá-lo. Em consequência, se decorrer dano dessa prestação, também pode ser responsabilizado. “Assim, o Estado responde pelos danos causados por outra pessoa jurídica em segundo lu-gar, conforme a ordem de preferência: primeiro paga a pessoa jurídica que presta os serviços e, caso essa não tenha condições financeiras, o Estado é chamado à responsabilidade. Nessa hipótese, terá que indenizar a vitima por um ato de um agente de outra pessoa jurídica, agente que não faz parte de seus quadros, o que se denomina responsabilidade subsidiária”. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Ceará)

Estado deverá indenizar por omissão durante incêndio

Por unanimidade, os desembargadores 4ª Câmara Cível negaram provimento a um recurso interposto pelo Estado de Mato Grosso do Sul contra sentença que o condenou ao pagamento de R$ 19.861,56, pela perda de um imóvel, R$ 3.140,00 por móveis destruídos e R$ 20.000,00 por danos morais à autora A. A. S. S. por omissão durante incêndio em sua casa. Consta dos autos que a autora vivia com seus filhos no município de Bataguassu, quando, em setembro de 2009, a casa foi incendiada por causas desconhecidas. Na ocasião não havia pessoa na re-sidência, por isso os vizinhos acionaram o Corpo de Bombeiros. No entanto, a unidade de Bataguassu não possuía viaturas de combate à incêndio, e a viatura deslocada até Bataguassu chegou ao local do incêndio tarde demais, após destrui-ção total da moradia. Em suas razões, o Estado alega que não era possível evitar integralmente o dano, ainda que se contasse com todo o aparato para combate a incêndios concentrado apenas naquele município. Aponta que, além de não existir qualquer omissão por parte do Estado, os danos foram causados por culpa exclusiva de quem provocou o incêndio ou, caso o incêndio não possa ser atribuí-do a ninguém, os danos foram causados por um caso fortuito. Assim, entende que, caso a condenação seja mantida, o valor da condenação deve ser reduzido. Em análise do caso, o relator do processo, Desembargador Amaury da Silva Kuklinski, entende que não há razão ao Estado, pois percebe que a estrutura do Corpo de Bombeiros do Município de Bataguassu era realmente precária e inadequada para o desempenho de suas atividades. Tal fato era de conhecimento do Comando de Bombeiros do Interior (CBI) no município de Nova Andradina, que não deu a devi-da importância à grave situação relatada, tendo enviado apenas uma viatura para combate a incêndios em decorrência da grande repercussão dos fatos na impren-sa, em um momento em que nada mais poderia ser feito. Embora o Estado tenha alegado que o resultado teria ocorrido independentemente da atuação dos bom-beiros, entendeu o Magistrado que tal alegação deveria ter sido resolvida por meio de prova pericial, pois é imprescindível para avaliar o que foi alegado. Além disso,

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ao não requerer esta prova, e não tendo viabilizado a sua realização, o Estado deixou de cumprir seu dever de comprovar os fatos trazidos em sua contestação, frisou o desembargador. Além disso, o relator ressalta que o Comando de Bombei-ros do Interior (CBI) foi várias vezes comunicado sobre as deficiências, mas nada fez, originando daí o nexo causal entre o ato omissivo do Estado e o dano gerado à apelada, o que torna clara a culpa do apelante, gerando a obrigação de indenizar. Com relação ao valor da indenização pelos danos materiais, o relator entende que o valor fixado na sentença em R$ 19.861,56 deve ser mantido diante do prejuízo material experimentado pela apelada, uma vez que perdeu a casa e os móveis. Mantém também o valor dos móveis fixado em R$ 3.140,00. Já a indenização por danos morais danos morais, o desembargador entende que o valor fixado na sen-tença em R$20.000,00 é compatível com o sofrimento vivenciado pela autora e atende bem às finalidades deste tipo de indenização. Assim, por fim, “conheço do presente recurso de apelação, e nego-lhe provimento, mantendo intacta a senten-ça de primeiro grau”. Processo: 0800676-41.2011.8.12.0026. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul)

Falha na observância de regras do concurso não gera indenização

Juiz do 1º Juizado Especial Cível de Brasília julgou improcedente o pedido inicial do autor que pleiteava a condenação do Centro de Seleção e Promoção de Even-tos da UNB – Cebraspe ao pagamento de indenização por danos morais por negar sua inscrição preliminar no concurso público para provimento de cargos de Juiz de Direito Substituto e ainda a devolução da taxa de inscrição no certame. Para o juiz, de acordo com a prova colhida dos autos, não cabe indenização por danos morais ao autor, uma vez que não ficou comprovado a prática de ato ilícito por parte do Cebraspe, sendo que o autor não observou as regras contidas no edital do concurso, pois, conforme estabelece o art. 186 do Código Civil, o dano moral só resta configurado quando há a prática de ato ilícito. Considerando que, no caso em tela, não há comprovação do cometimento de qualquer ilicitude por parte do réu, não há que se falar em reparação a título de danos materiais e/ou morais, afirmou o juiz. Assim, no presente caso, não é possível atribuir ao Cebraspe falha na pres-tação de serviço, uma vez que todas as informações referentes ao certame foram devidamente prestadas ao autor; ao contrário, restou comprovado nos autos que o requerente não observou as regras contidas no edital. Segundo o Magistrado, é sa-bido que o edital de concurso público faz lei entre as partes, visando a resguardar a isonomia entre os candidatos, devendo as regras nele constantes serem obser-vadas tanto pela Administração quanto pelos candidatos. Ainda, de uma simples leitura do edital acostado aos autos, verifica-se no item 5.1.8.c que o candidato, no ato da inscrição preliminar, deveria entregar ao Cebraspe cópia autenticada em cartório de documento de identificação que comprove a nacionalidade brasileira e que contenha fotografia e assinatura. Igualmente, consta na inscrição preliminar recibo do candidato que a conferência/avaliação dos documentos apresentados

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será realizada exclusivamente pela banca avaliadora. Ainda, para o juiz, torna-se inviável o pedido de restituição da taxa de inscrição, em observância ao item 5.4.6 do edital, que dispõe: “O valor referente ao pagamento da taxa de inscrição preli-minar não será devolvido em hipótese alguma, salvo em caso de cancelamento do certame por conveniência da Administração Pública”. Portanto, a improcedência dos pedidos deduzidos na inicial é medida que se impõe, concluiu o Magistrado. Da sentença, cabe recurso. PJe: 0722650-58.2015.8.07.0016. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Distrito Federal)

Licitação por meio de pregão pode ser utilizada para concessão de área comercial em aeroportos

A 5ª Turma do TRF da 1ª Região confirmou sentença do Juízo Federal da 6ª Vara da Seção Judiciária da Bahia que negou o pedido da parte impetrante, pessoa jurí-dica, no sentido de vedar a utilização da modalidade pregão para a concessão de uso de área comercial no Aeroporto de Salvador. Na ação, a instituição impetrou mandado de segurança para impedir que o pregão fosse utilizado como modali-dade de licitação para a concessão de área comercial no Aeroporto de Salvador. Alegou a demandante, em síntese, (i) a impossibilidade de utilização da moda-lidade pregão para a concessão de uso da área, (ii) que o apelo econômico não pode se sobrepor à legalidade e à segurança jurídica, (iii) que o pregão presencial não atende ao interesse público nem ao interesse das empresas. Assim, pleiteia a reforma da sentença para declarar a ilegalidade da modalidade escolhida pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) para a concessão da área. Ao analisar o caso, o relator, Desembargador Federal Néviton Guedes, es-clareceu que a Lei nº 8.666/1993 estipulou que a venda de bens ou a concessão de direitos reais de uso se darão pela melhor oferta ou por lance, porém não es-tabeleceu qual o tipo de licitação deveria ser adotado. Destacou ainda que a Lei nº 10.520/2002 “não veda a utilização da licitação denominada pregão na hi-pótese de concessão de direito real de uso, evidenciando a existência de lacuna legislativa no que se refere à modalidade de licitação a ser adotada em casos de concessão de uso de área pública em aeroporto administrado pela Infraero”. Res-saltou que o Regulamento de Licitações e Contratos da Infraero “não extrapolou os limites de sua competência, uma vez que há previsão legal estabelecendo a utilização da modalidade pregão, do tipo maior lance, para a alienação de bens em leilão judicial”. Asseverou, também, que o Decreto nº 3.725/2001, que dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis da União, não elegeu, igualmente, nenhuma modalidade específica. Por fim, o Ma-gistrado afirmou que a modalidade de licitação pregão “vem sendo utilizada pelos diversos Tribunais Regionais Federais, bem como pelo Superior Tribunal de Justi-ça, para cessão de uso oneroso de área para fins de exploração comercial de ativi-dades de restaurante e lanchonetes, a exemplo do Ministério Público Federal/CE, no Pregão Presencial nº 03/2008, e do TRF da 4ª Região, no Pregão Presencial

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nº 09/2009”. Assim, o Colegiado negou provimento à apelação para manter a sen-tença que denegou a segurança pleiteada. Processo: 00022331320114013300. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Estado condenado a indenizar veranistas agredidos a chutes de coturno por policiais

A 1ª Câmara de Direito Público do TJ manteve condenação ao Estado no senti-do de indenizar seis jovens agredidos gratuitamente por forças policiais quando veraneavam em uma estância hidromineral na região Oeste do Estado. Apesar de o ente público insistir que não houve prova do alegado abuso de autoridade por parte de seus agentes, inexiste justificativa plausível para o modo com que estes atuaram, desferindo contra os autores chutes de coturno e violentos golpes de cassetetes – lesões estas devidamente demonstradas, anotou o Desembargador Luiz Fernando Boller, relator da apelação. Para ele, relevante registrar a ausência de qualquer denúncia de perturbação de sossego em desfavor das vítimas, ainda que, mesmo se existente, não legitimaria a força empregada. Escorreita se mostra a atribuição da responsabilidade civil pelo dano moral causado, concluiu. A câmara promoveu somente uma adequação no montante arbitrado a título de verba inde-nizatória, que passou de R$ 12 para R$ 5 mil para cada jovem, com os honorários fixados em 15% sobre o valor da condenação. A decisão foi unânime (Apelação Cível nº 2013.073118-1). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina)

Médicos devem ser mais bem remunerados em partos normais

A Justiça Federal determinou que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estabeleça a remuneração dos honorários profissionais a serem pagos pelas operadoras de planos de saúde particulares ao parto normal de, no mínimo, o triplo do montante atribuído à cesariana, valor que será estabelecido pela Agência segundo seus critérios técnicos. A decisão é do Juiz Victório Giuzio Neto, da 24ª Vara Federal Cível em São Paulo/SP, e tem abrangência nacional. Com a decisão, as operadoras e os hospitais deverão credenciar e possibilitar a atuação de enfer-meiros obstétricos e obstetrizes no acompanhamento de trabalho de parto, pos-sibilitando também a livre consulta por parte das pacientes gestantes. De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), autor da ação, a taxa de cirurgias cesa-rianas realizadas por meio de planos privados de saúde no Brasil está muito acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Afirma, ainda, que o Conselho Federal de Medicina (CFM) tem demonstrado que as complicações maternas são superiores na cesárea em comparação ao parto vaginal, sendo maior a necessidade de internação em UTIs, maior taxa de risco de morte materna e de intercorrências como hemorragias e/ou histerectomias. “Impossível afirmar que uma taxa de quase 90% de partos cirúrgicos (cesarianas) da totalidade dos partos realizados no setor privado de saúde, de maneira efetiva, ocorreu por necessi-

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dades médicas aferidas a partir da ponderação dos riscos entre as duas espécies de parto”, disse Victório Giuzio Neto. O juiz afirma que, “nesse quadro trágico, impossível deixar de ver como claramente necessária uma regulamentação mais adequada, pela ANS, visando a melhores alternativas na promoção da saúde da mulher e da criança”. A Procuradoria argumentou que é direito dos consumidores, usuários de plano de saúde privados, obter uma adequada informação e prestação de serviços médicos obstétricos, oferecendo às mulheres melhores condições de nascimento de seus filhos pela via normal, evitando a realização de cirurgias cesa-rianas contra a vontade e sem a presença de efetiva recomendação médica. O juiz considerou que, apesar de a remuneração não indicar isoladamente a reversão pela preferência na decisão do parto normal em relação ao cirúrgico, não se deve ignorar que o acompanhamento de um parto normal é muito mais minucioso e consideravelmente mais demorado, sendo necessária a presença do médico por muito mais tempo. “Diante da economia dos insumos hospitalares que obviamen-te não são utilizados no parto não cirúrgico e ausência da necessidade de outros profissionais como instrumentadores cirúrgicos e auxiliares de cirurgião, e, com relação à atenção e exames constantes a serem feitos na gestante e o período de tempo de atenção exclusiva a um único parto, possibilitando, inclusive, a possi-bilidade, a critério da paciente, de acompanhamento no parto do médico que lhe acompanhou no pré-natal, apresenta-se justo que estas verbas sejam revertidas aos profissionais (médico, enfermeiros obstétricos e obstetrizes)”, afirmou o Magistra-do. A ANS deverá ainda: 1) determinar às operadoras de planos de saúde que for-neçam a seus beneficiários, a pedido destes, os percentuais de cesarianas e partos normais efetuados pelos obstetras e hospitais remunerados pela operadora; 2) defi-nir um modelo de partograma obrigatório a ser utilizado em todos os nascimentos; 3) tornar obrigatória a utilização de cartão gestante; 4) criar indicadores e notas de qualificação para operadoras e hospitais específicos para a questão do número de cesarianas e adoção de práticas humanizadoras do nascimento. A resoluções normativas da ANS para a implementação das decisões devem ser apresentadas em juízo no prazo de 60 dias sob pena de multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento. Processo: 0017488-30.2010.4.03.6100. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 3ª Região)

Caixa é condenada a indenizar cliente por devolução indevida de cheque

A 5ª Turma do TRF da 1ª Região condenou a Caixa Econômica Federal (CEF) a indenizar em R$ 5 mil, a título de danos morais, um cliente que teve cheque de-volvido pela instituição financeira. Na decisão, a Corte entendeu que houve falha da CEF na prestação do serviço bancário de modo que deve ser reconhecida sua responsabilidade civil pela reparação dos danos materiais e morais sofridos pelo cliente em decorrência dos fatos. Consta dos autos que o autor informou que o cheque nº 900.338, no valor de R$ 457,56, emitido em 21.10.2011, foi devolvi-do pela Caixa quando ele já havia contestado perante a instituição o pagamento

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do cheque clonado nº 900.353, no valor de R$ 1.500,00, compensado no dia 14.10.2011. Em primeira instância, o pedido foi julgado parcialmente procedente para condenar a CEF em R$ 3 mil. O cliente recorreu ao TRF1 ao argumento de que, no caso, estaria provada a falha na prestação do serviço, sendo devida a repetição em dobro do que fora descontado indevidamente de sua conta para pagamento do cheque clonado, nos termos do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Afirmou que a sentença excluiu a responsabilidade objetiva da instituição financeira, “sendo ela responsável pela reparação dos danos de-correntes da má prestação dos serviços bancários”, razão pela qual o valor da indenização deve ser majorado para R$ 100 mil. As alegações do apelante foram parcialmente aceitas pelo Colegiado. Na decisão, o relator, Desembargador Fede-ral Néviton Guedes, ponderou que, na hipótese em apreço, a Caixa não procedeu à indevida cobrança de dívida, limitando-se a compensar cheque que parecia ter sido emitido legitimamente pelo autor e a repassar os valores ao portador/credor, “sendo, por isso, inaplicável a norma do art. 42 do CDC”. Além disso, de acordo com o Magistrado, a instituição financeira restituiu ao autor, no prazo de três dias, o valor que foi debitado da sua conta em decorrência da compensação do che-que clonado, “não havendo outro prejuízo patrimonial a ser reparado pela ré”. O relator acrescentou que a reparação de danos morais ou extrapatrimoniais deve ser estipulada “cum arbitrio boni iuri objetivando desestimular a ocorrência de repetição de prática lesiva e compensar a situação vexatória a que indevidamente foi submetido o lesado, sem reduzi-la a um mínimo inexpressivo, nem elevá-la a cifra enriquecedora”. Assim, o Colegiado, nos termos do voto do relator, majorou o valor da indenização a ser paga ao ora recorrente de R$ 3 mil para R$ 5 mil. Processo: 0000895-40.2012.4.01.3600. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Vítima de prisão ilegal deve receber R$ 25 mil de indenização

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) condenou o Estado a pagar R$ 25 mil de indenização moral para segurança que sofreu constrangimento ilegal ao ser levado por militares à delegacia de polícia. A decisão teve a relatoria do Desembargador Paulo Francisco Banhos Ponte. Para o Magistrado, o autor [segurança] estava cumprindo as determinações expedidas por seus superiores, com o objetivo de dar segurança aos clientes e funcionários, ao contrário dos po-liciais militares, que ignoraram a obrigação de portar e apresentar documentação funcional e tentaram forçar a entrada na agência bancária. Consta nos autos que os militares, trajados de policiais civis e armados, tentaram entrar na agência em que o segurança trabalhava. Eles informaram que estavam em uma ocorrência policial. O guarda, no entanto, solicitou a identificação deles, mas se recusaram a mostrar. Ele então avisou ao gerente sobre o fato e, após recusa da identificação novamente, foram autorizados a entrar no local. Em seguida, os agentes deram voz de prisão para o segurança e o gerente. Os dois foram algemados e levados

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para delegacia, onde foi lavrado Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) por constrangimento ilegal, sendo posteriormente arquivado. Em dezembro de 2008, o segurança ajuizou ação requerendo indenização moral sob o argumento de constrangimento ilegal. Na contestação, o ente público defendeu inexistir respon-sabilidade civil porque os policiais estavam cumprindo o dever legal. Ao julgar o caso, o Juízo da 8ª Vara da Fazenda Pública de Fortaleza condenou o Estado a pagar R$ 60 mil de indenização moral, por entender que os policiais constrange-ram moralmente o segurança com a prisão ilegal. Inconformado com a decisão, o ente público apelou (nº 0001350-03.2008.03.8.06.0001) no TJCE. Argumentou culpa exclusiva da vítima, que não cumpriu uma ordem legal. Ao analisar o re-curso nessa segunda-feira (30/11), a 1ª Câmara Cível deu parcial provimento ao apelo para fixar a reparação moral em R$ 25 mil. Para o desembargador relator, diante do dano causado por um agente do Estado, em atividade, evidencia-se a responsabilidade civil objetiva do Estado. Sobre o valor da indenização, ele levou em consideração os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Ceará)

Fechamento da Edição: 28�12�2015

Resenha Legislativa

LEIS

LEI nº 13.204, DE 14.12.2015 Altera a Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, “que estabelece o regime jurídico das parcerias voluntárias, envolvendo ou não transferências de recursos financeiros, entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público; define diretrizes para a política de fomento e de colaboração com organizações da sociedade civil; institui o termo de colaboração e o termo de fomento; e altera as Leis nºs 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de março de 1999”; altera as Leis nºs 8.429, de 2 de junho de 1992, 9.790, de 23 de março de 1999, 9.249, de 26 de dezembro de 1995, 9.532, de 10 de dezembro de 1997, 12.101, de 27 de novembro de 2009, e 8.666, de 21 de junho de 1993; e revoga a Lei nº 91, de 28 de agosto de 1935.

LEI nº 13.203, DE 08.12.2015 Dispõe sobre a repactuação do risco hidrológico de geração de energia elétrica; institui a bonificação pela outorga; e altera as Leis nºs 12.783, de 11 de janeiro de 2013, que dispõe sobre as concessões de energia elétri-ca, 9.427, de 26 de dezembro de 1996, que disciplina o regime das con-cessões de serviços públicos de energia elétrica, 9.478, de 6 de agosto de 1997, que institui o Conselho Nacional de Política Energética, 9.991, de 24 de julho de 2000, que dispõe sobre realização de investimentos em pesquisa e desenvolvimento e em eficiência energética por parte das em-presas concessionárias, permissionárias e autorizadas do setor de energia elétrica, 10.438, de 26 de abril de 2002, 10.848, de 15 de março de 2004, que dispõe sobre a comercialização de energia elétrica, e 11.488, de 15 de junho de 2007, que equipara a autoprodutor o consumidor que atenda a requisitos que especifica.

LEI nº 13.197, DE 01.12.2015Altera a Lei nº 9.264, de 7 de fevereiro de 1996, para transformar em cargos de nível superior os cargos da Carreira Policial Civil do Distrito Federal.

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DECRETOS

DECRETO nº 8.593, DE 17.12.2015Dispõe sobre a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista – CNPI e dá outras providências.

DECRETO nº 8.592, DE 16.12.2015Altera o Anexo ao Decreto nº 6.871, de 4 de junho de 2009, que re-gulamenta a Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas.

DECRETO nº 8.591, DE 16.12.2015 Altera o Decreto nº 8.133, de 28 de outubro de 2013, que dispõe sobre a declaração de estado de emergência fitossanitária ou zoossanitária de que trata a Lei nº 12.873, de 24 de outubro de 2013.

DECRETO nº 8.590, DE 15.12.2015 Aprova o Estatuto Social da Empresa Gestora de Ativos – EMGEA.

DECRETO nº 8.589, DE 15.12.2015 Altera o Decreto nº 8.579, de 26 de novembro de 2015, que aprova a Es-trutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão da Secretaria de Governo da Presidência da República.

DECRETO nº 8.588, DE 15.12.2015 Altera o Decreto nº 8.005, de 15 de maio de 2013, que dispõe sobre o remanejamento, em caráter temporário, de cargos em comissão para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN.

DECRETO nº 8.587, DE 11.12.2015 Dispõe sobre a execução do Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais – REHUF e altera o Decreto nº 7.082, de 27 de janeiro de 2010.

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DECRETO nº 8.586, DE 09.12.2015Altera o Decreto nº 6.754, de 28 de janeiro de 2009, que regulamenta a Lei nº 10.304, de 5 de novembro de 2001, que dispõe sobre a transfe-rência ao domínio do Estado de Roraima de terras pertencentes à União.

DECRETO nº 8.585, DE 08.12.2015 Altera o Decreto nº 57.654, de 20 de janeiro de 1966, que regulamenta a Lei nº 4.375, de 17 de agosto de 1964 – Lei do Serviço Militar, para dispor sobre certificados militares.

DECRETO nº 8.583, DE 04.12.2015 Altera o Decreto nº 7.974, de 1º de abril de 2013, que aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Defesa.

DECRETO nº 8.582, DE 04.12.2015Delega competência ao Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão para a prática dos atos que especifica.

Fechamento da Edição: 28�12�2015

Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

ARTIGOS DOUTRINÁRIOS• ControleJudicialdaSubstânciadoAtoAdministrativo:Ques-

tões Sobre Mérito, Discricionariedade e Conceitos Indetermi-nados

Tércio Aragão Brilhante Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• PrerrogativadeFunçãoeaEsquizofreniaLegísticanaAçãodeImprobidade Administrativa

Elói Martins Senhoras e Ariane Raquel Almeida de Souza Cruz

Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• Revisão JudicialdosContratoscomo InstrumentodeEquilí-brio Econômico Contratual

Carlos José Cordeiro Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINA

Assunto

Controle JudiCial nos ConCursos PúbliCos

•Concurso Público e Ações Judiciais (Gina Copola) ................................................................22

•Concursos Públicos, Separação de Pode-res e Controle Judicial sob a Ótica do STF: Deferência Ou Ativismo? (Rafael Carvalho Rezende Oliveira) ..................................................9

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

Controle JudiCial nos ConCursos PúbliCos

•Administrativo – Constitucional – Apelação – Mandado de segurança – Requisitos – Concurso público – Polícia militar do distrito federal – Edi-tal – Previsão de limite de idade – Candidato que contava com 22 dias além da idade exigida – Razoabilidade (TJDFT) ............................7552, 30

EMENTÁRIO

Assunto

Controle JudiCial nos ConCursos PúbliCos

•Concurso público – anulação de questão – ga-barito e critérios de avaliação – ilegalidade – ausência – controle judicial – intervenção –impossibilidade .........................................7553, 36

•Concurso público – candidato – prova de redação – desclassificação – legalidade ..................7554, 36

•Concurso público – edital – exigência não cumpri-da – controle judicial – vedação ................7555, 36

•Concurso público – professor universitário – prova de títulos – doutorado – desconsidera-ção – antiguidade – razoabilidade – ausência ..................................................................7556, 37

•Concurso público – prova discursiva – re-visão de notas – Poder Judiciário – atuação – limites .....................................................7557, 39

•Concurso público – questões – anulação – con-trole judicial – impossibilidade ..................7558, 40

•Concurso público – questões e critérios de correção de provas – controle judicial – impossibilidade .........................................7559, 41

•Concurso público – seleção interna para gradu-ação de cabo PM – cancelamento de questões – controle judicial – cabimento .................7560, 41

•Concurso público – soldado do corpo de bom-beiros militar – candidato – inaptidão – controle judicial – possibilidade ..............................7561, 41

•Concurso público – técnico de segurança do trabalho – candidato portador e espondilólise – impossibilidade do exercício da atividade – ilegalidade – ausência ...............................7562, 43

Índice Geral

DOUTRINAS

Assunto

direito à saúde

•A Cura do Câncer, a Droga Experimen-tal (Fosfoetanolamina Sintética) e Suas Im-plicações Legais e Jurídicas (Leonardo Alves de Oliveira) ................................................98

Federalismo

•O Federalismo Brasileiro na Constituição de 1988 (Leonardo Carvalho Rangel) .................................73

Foro Privilegiado

•Foro por Prerrogativa de Função – Aspec-tos Constitucionais e Infraconstitucionais para Cargos Executivo e Legislativos Muni-cipais (Paulo Soares Nora e Romeu Bruno Mendes Molinari) ................................................44

Autor

leonardo alves de oliveira

•A Cura do Câncer, a Droga Experimental (Fosfo-etanolamina Sintética) e Suas Implicações Legais e Jurídicas ............................................................98

leonardo Carvalho rangel

•O Federalismo Brasileiro na Constituição de 1988 ............................................................................73

Paulo soares nora e romeu bruno mendes molinari

•Foro por Prerrogativa de Função – Aspectos Cons-titucionais e Infraconstitucionais para Cargos Exe-cutivo e Legislativos Municipais ..........................44

romeu bruno mendes molinari e Paulo soares nora

•Foro por Prerrogativa de Função – Aspectos Cons-titucionais e Infraconstitucionais para Cargos Exe-cutivo e Legislativos Municipais ..........................44

JURISPRUDÊNCIA

Assunto

autarquia

•Administrativo – Acidente de trabalho – Ação regressiva do INSS – Constituição de capital – Impossibilidade (TRF 4ª R.) ......................7569, 158

RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �����������������������������������������������������������������������������������������������������229 Contrato administrativo

•Conflito de competência – Direito civil – Di-reito administrativo – Correios – Contrato da administração pública – Serviço de telemarke-ting – Regime de direito privado – Competência da 1ª Seção (TRF 3ª R.) ............................7566, 136

imProbidade administrativa

•Administrativo – Processual civil – Recurso es-pecial – Improbidade administrativa – Médico perito do INSS que cumpre jornada inferior àquela para a que foi contratada – Registro no livro de ponto de cumprimento integral da carga horária – presença de má-fé – Reconhecimen-to do caráter ímprobo da conduta – Imposi-ção de penalidades (STJ) ..........................7563, 107

ProCesso administrativo

•Mandado de segurança – Inexistência de demora ou omissão injustificada – Sobrecarga de ativida-des por parte da SRF (TRF 2ª R.) ...............7565, 132

registro ProFissional

•Administrativo – Mandado de segurança – Cur-so de técnico em radiologia realizado concomi-tantemente com o ensino médio – Inscrição no conselho profissional – Possibilidade – Apela-ção improvida (TRF 3ª R.) ........................7567, 143

servidor PúbliCo

•Administrativo – Servidor – Pensão – Reconhe-cimento administrativo – Prescrição – Renúncia tácita – Atraso no pagamento – Disponibilida-de orçamentária – Impossibilidade – Hono-rários advocatícios – Sucumbência da fazen-da pública – Arbitramento equitativo – Juros– Correção monetária (TRF 3ª R.) .............7568, 150

•Administrativo – Servidor público – Departa-mento da polícia federal – Percepção do adicio-nal de insalubridade – Pretensão de cumular o adicional de periculosidade – Art. 68, § 1º da Lei nº 8.112/1990 – Impossibilidade – Justiça gratuita (TRF 5ª R.) ...................................7570, 164

•Processual civil e administrativo – Servidor público federal – Procurador federal da fazen-da nacional – Direito à participação em con-curso de promoção – Exigência de conclusão do estágio probatório – Inexistência de pre-visão legal (TRF 1ª R.) ..............................7564, 127

EMENTÁRIO

Assunto

ação Civil PúbliCa

•Ação civil pública – fauna – formalização de acordo – DNIT e DER/SP – responsabilidade – possibilidade ...........................................7571, 170

•Ação civil pública – posto de gasolina – com-bustível adulterado – comercialização – dano moral coletivo – configuração .................7572, 172

autarquia

•Autarquia – INSS – advogados – atendimento diferenciado – princípio da isonomia – ofensa – inocorrência .........................................7573, 175

bem PúbliCo

•Bem público – usucapião – impossibilidade ................................................................7574, 176

ConCurso PúbliCo

•Concurso público – empossamento – limite etário – possibilidade ...............................7575, 178

•Concurso público – prova de títulos – título de especialista – validade .............................7576, 178

•Concurso público – vigência – contratação temporária – provisioriedade – descarac-terização ..................................................7577, 179

ensino

•Ensino – Enem – aprovação – idade inferior a 18 anos – diretrizes básicas da educação – observância ..........................................7578, 179

•Ensino – Enem – identidade vencida – prova – realização – possibilidade ........................7579, 180

liCitação

•Licitação – documentos que comprovem a situação econômico-financeira – não autenticação – inabilitação – despropor-cionalidade ..............................................7580, 181

•Licitação – prestação de serviços de transporte de carga para os Correios – rastreamento eficien-te – previsão – descumprimento ..............7581, 182

militar

•Militar – curso de habilitação – seleção interna – número de cargos – aumento – legislação su-perveniente – impossibilidade .................7582, 183

Poder de PolíCia

•Poder de polícia – auto de infração – espo-sa do infrator – penalidade – impossibilidade ................................................................7583, 184

PolítiCas PúbliCas

•Políticas públicas – Programa “Morar Bem” – renda familiar inferior a 12 salários mínimos– exigência ..............................................7584, 185

ProCesso administrativo

•Processo administrativo – afastamento preventi-vo – descrição do fato – ausência ............7585, 187

resPonsabilidade Civil do estado

•Responsabilidade civil do Estado – conces-sionária de serviço público de manuten-ção e funcionamento de rodovia – acidente de trânsito – culpa exclusiva da vítima – indenização indevida ..............................7586, 187

230 ������������������������������������������������������������������������������������������������������RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

servidor PúbliCo

•Servidor público – aposentadoria – conta-gem de tempo ponderada – tempo de serviço especial – ilegalidade ..............................7587, 188

•Servidor público – auxílio pré-escolar – ma-joração pelo Judiciário – Súmula nº 338,do STF – aplicação ..................................7588, 189

•Servidor público – exoneração a pedido – processo administrativo – absolvição – de-mora na formalização – ilegalidade e abusi-vidade – configuração .............................7589, 190

•Servidor público – gratificação natalina – verbas recebidas mensalmente – equipara-ção – impossibilidade ..............................7590, 191

•Servidor público – licença remunerada – mes-trado – conveniência e oportunidade – negativa – ilegalidade – ausência ...........................7591, 191

•Servidor público – magistério – gratificação de re-gência de classe – readaptação por motivo de saú-de – supressão – impossibilidade .............7592, 191

•Servidor público – pensão por morte – fi-lha divorciada – equiparação com sol-teira – impossibilidade .............................7593, 193

•Servidor público – pensão temporária – de-pendente inválido – concessão – possibi-lidade ......................................................7594, 195

•Servidor público – posse – posterior anu-lação do certame – exoneração – pré-vio processo administrativo – ausência –impossibilidade .......................................7595, 195

•Servidor público – promoção por produtivi-dade – requisitos – presença – negativa admi-nistrativa – ilegalidade .............................7596, 196

•Servidor público – remoção – discriciona-riedade administrativa – interesse público – ausência ..................................................7597, 196

•Servidor público – remoção – permanência mí-nima de 60 meses – legalidade ................7598, 197

trânsito

•Trânsito – alienação de veículo – alienante – responsabilidade solidária após a tradição – inexistência ...........................................7599, 197

•Trânsito – licenciamento de veículo – restrição de circulação – impedimento ..................7600, 198

•Trânsito – sociedade de economia mista – po-der de polícia – delegação – multa –nuli-dade – impossibilidade ............................7601, 198

transPorte

•Transporte – concessão de passe livre – pes-soa portadora de deficiência – perícia médica – comprovação ........................................7602, 200

Seção Especial

ESTUDOS JURÍDICOS

Assunto

Contrato administrativo

•O Que é Revisão Contratual? Comparação com o Reajuste e com a Repactuação – Segunda Par-te (Ivan Barbosa Rigolin) ....................................202

Autor

ivan barbosa rigolin

•O Que é Revisão Contratual? Compa-ração com o Reajuste e com a Repac-tuação – Segunda Parte ......................................202

CLIPPING JURÍDICO

•ANAC não tem obrigação de fiscalizar co-mercialização de voo livre em praiasde Florianópolis ................................................214

•Aprovado que teve a posse negada ganha di-reito de assumir o cargo .....................................210

•Caixa é condenada a indenizar cliente por de-volução indevida de cheque ..............................221

•Concessão judicial de medicamento não está vinculada apenas ao risco de mortedo paciente ........................................................212

•Estado condenado a indenizar veranistas agredidos a chutes de coturno por policiais .......................220

•Estado deverá indenizar por omissãodurante incêndio ...............................................217

•Falha na observância de regras do concurso não gera indenização ........................................218

• Justiça mantém quebra de sigilo bancário de em-presa suspeita de improbidade ...........................211

• Justiça proíbe que OS seja contratada para gerir saúde do município do Rio ................................210

•Licitação por meio de pregão pode ser utili-zada para concessão de área comercial em aeroportos .........................................................219

•Mãe de criança vítima de choque elé-trico deve receber mais de R$ 100 mil de indenização ..................................................216

•Médicos devem ser mais bem remunerados em partos normais .............................................220

•Município não pode designar enfermeiros para a tarefa privativa de farmacêutico ......................215

•União é condenada a indenizar em R$ 100 mil anistiada política torturada durante a ditadura militar ................................................................213

•União não é responsável por destruição de laranjei-ras afetadas por “cancro cítrico” ........................213

•Vítima de prisão ilegal deve receber R$ 25 mil de indenização ..................................................222

RSDA Nº 121 – Janeiro/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO �����������������������������������������������������������������������������������������������������231 RESENHA LEGISLATIVA

Leis

•Lei nº 13.204, de 14.12.2015 ...........................224

•Lei nº 13.203, de 08.12.2015 ...........................224

•Lei nº 13.197, de 01.12.2015 ............................224

Decretos

•Decreto nº 8.593, de 17.12.2015 ......................225

•Decreto nº 8.592, de 16.12.2015 ......................225

•Decreto nº 8.591, de 16.12.2015 .....................225

•Decreto nº 8.590, de 15.12.2015 .....................225

•Decreto nº 8.589, de 15.12.2015 .....................225

•Decreto nº 8.588, de 15.12.2015 .....................225

•Decreto nº 8.587, de 11.12.2015 .....................225

•Decreto nº 8.586, de 09.12.2015 ......................226

•Decreto nº 8.585, de 08.12.2015 .....................226

•Decreto nº 8.583, de 04.12.2015 .....................226

•Decreto nº 8.582, de 04.12.2015 ......................226