Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais – Teoria e ......2013/11/09  · Juizado Especial...

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Capa: Aurélio Corrêa

Produção digital: Ozone

Data de fechamento: 14.06.2019

CIP – BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE.SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

R573mRocha, Felippe Borring

Manual dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais: teoria e prática / Felippe Borring Rocha; prefácio Alexandre FreitasCâmara. – 10. ed. – São Paulo: Atlas, 2019.

Inclui bibliografiaISBN 978-85-97-02237-7

1. Processo civil – Brasil. 2. Juizados Especiais Cíveis – Brasil. 3. Procedimento sumaríssimo – Brasil. I. Câmara,Alexandre Freitas. II. Título.

19-57689 CDU: 347.994(81)

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Vanessa Mafra Xavier Salgado – Bibliotecária – CRB-7/6644

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MaterialSuplementar

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Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas, aotocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.

(Carl Gustav Jung)

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer:à minha família, em especial aos meus pais, Claudio e Maria Elena, e minha irmã, Anna

Claudia, por todo o apoio e o carinho recebidos;aos meus alunos e leitores, pelas reflexões e informações trocadas;aos meus estagiários e colegas defensores públicos, pelo auxílio nas árduas jornadas de

trabalho na Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro;ao Clube de Regatas do Flamengo, por todas as alegrias que já me proporcionou;ao irmão que a vida me deu, Eduardo Quintanilha Telles de Menezes, por sua preciosa revisão;à minha esposa Vanessa, por compartilhar esse sonho comigo; eao meu amigo Professor Alexandre Freitas Câmara, cujas lições inspiraram o nascimento deste

livro, por ter aceitado o convite para fazer o seu prefácio.Por fim, gostaria de dedicar este livro à minha filha, Paula, lembrando a musiquinha que tantas

vezes nós cantamos juntos:

“Querida do papai,Querida do papai,

É a coisa linda do papai,É o meu amor,

É a minha paixão,É a coisa linda do papai.”

O Autor

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PREFÁCIO À 7ª EDIÇÃO

A Escola Processual do Rio de Janeiro está em festa. Afinal, um de seus mais ilustresintegrantes, Felippe Borring Rocha, lança agora a obra Manual dos Juizados Especiais CíveisEstaduais. Coube a mim, uma espécie de decano dessa escola processual, a elaboração do prefáciodo livro, tarefa de que me incumbo com orgulho e prazer.

Orgulho porque Felippe foi meu aluno, dos mais destacados, e para minha alegria tornou-se umdos mais prestigiosos professores de Direito Processual Civil do Rio de Janeiro, sempre admiradopor seus pares e alunos, além de um dos mais dedicados Defensores Públicos de nosso Estado. É,além disso, membro fundador da já citada Escola Processual do Rio de Janeiro, uma escolaprocessual diferente, que não se reúne em uma instituição de ensino superior como as outras, mas quenasceu em um encontro na bela Itaipava, distrito de Petrópolis, na Região Serrana, e reúneprocessualistas cariocas e fluminenses (e alguns outros, de outros Estados, que a ela se agregaram,porque o Rio de Janeiro sempre foi muito mais um estado de espírito do que um lugar) com oobjetivo de permitir a constante troca de ideias e de angústias, de modo que cada um deles possaajudar os outros a desenvolver seus pensamentos e suas pesquisas, em um ambiente sadio e informal,sem hierarquia, na busca da construção de um processo mais humano e democrático.

Prazer porque a leitura de mais este livro de Felippe, que tive a oportunidade de receber aindano prelo, foi mais uma oportunidade de travar contato com o maravilhoso mundo dos JuizadosEspeciais.

Cabe, aqui, porém, uma explicação. Tenho, desde sempre, mantido uma relação difícil com osJuizados Especiais. Meu livro sobre o tema – tantas vezes citado por Felippe ao longo do seutrabalho – é, de certo modo, uma prova disso. Mas preciso deixar claro que para mim existem duasdiferentes realidades acerca dos Juizados Especiais Cíveis. De um lado, os Juizados Especiais dateoria. Estes são maravilhosos. Informais, com um processo marcado pela oralidade, proporcionandoum resultado célere e eficiente, num sistema de quase total gratuidade, os Juizados Especiais dateoria são perfeitamente adequados a cumprir a promessa constitucional de amplo e universal acessoà ordem jurídica justa.

Há, porém, de outro lado, os Juizados Especiais da prática. Estes são confusos, malaparelhados, completamente divorciados daqueles da teoria. Muitas vezes, quando se entra numJuizado Especial da prática, deve-se mesmo perguntar se aquilo é um Juizado Especial. Já tenho aténotícia de que em alguns lugares se abandonou completamente a oralidade determinada pelo art. 2ºda Lei 9.099/1995, admitindo-se contestação oferecida fora de audiência e julgamento antecipado dalide. Procedimento ordinário em Juizado Especial! Transformam-se os Juizados Especiais em Varas

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Cíveis mal aparelhadas, de baixa qualidade. E, com isso, as promessas constitucionais vão sendo,todas, descumpridas.

A obra de Felippe, que tem o bom senso (demonstrado no subtítulo) de reunir teoria e prática,mostra que é preciso analisar os dois aspectos. De nada adianta uma investigação teórica, científica,dos Juizados Especiais que desconheça a prática do processo que ali se tem desenvolvido. E de nadaserve descrever-se a prática sem que dela se faça uma análise crítica, o que só será possível a partirde dados científicos.

Este Manual é dedicado ao exame de quatro temas. Primeiramente, há uma exposição do queaqui se denominou Teoria Geral dos Juizados Especiais Cíveis. Aí, Felippe versa sobre temas, comoas características básicas dos Juizados Especiais, seus princípios fundamentais, competência, aatuação do juiz e de seus principais auxiliares, atos processuais e comunicações processuais. Emseguida, na segunda parte do volume, trata dos mecanismos voltados à prestação da tutelajurisdicional cognitiva. Ali, Felippe versa sobre a instauração do processo, o manejo da conciliaçãoe da arbitragem, a resposta do réu, as provas, a audiência de instrução e julgamento, a sentença e acoisa julgada nos Juizados Especiais.

A terceira parte do livro trata dos mecanismos voltados à prestação da tutela jurisdicionalexecutiva. Há, ali, toda uma exposição acerca de temas gerais da execução, como liquidação,competência e legitimidade, além de temas ligados às execuções em espécie, tratando o autor dedescrever os mecanismos postos à disposição do jurisdicionado e do Estado-juiz para promover aexecução das obrigações de pagar, de fazer, de não fazer e de dar. Trata, ainda, da execução fundadaem título extrajudicial.

A quarta parte do livro, por fim, é voltada ao estudo dos mecanismos de impugnação dasdecisões judiciais, tanto os que têm natureza recursal quanto as demandas autônomas de impugnação(como o mandado de segurança).

O livro é complementado pela disponibilização, na internet, de alguns modelos de peças, osquais serão, certamente, muito úteis aos profissionais que se iniciam na carreira, ainda mais quandosabem todos que hoje em dia muitos advogados começam sua atuação profissional pelos JuizadosEspeciais, e muitas vezes o fazem sem ter nem sequer a quem pedir auxílio na difícil arte de começara advogar.

Não é difícil afirmar que este livro de Felippe irá, como os anteriores, alcançar grande sucessoeditorial. Será, também, sem qualquer dúvida, um marco na produção doutrinária acerca dosJuizados Especiais. Parabenizo a Editora Atlas e o autor por mais este trabalho com que premiam opúblico jurídico.

Rio de Janeiro, maio de 2012.

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Alexandre Freitas Câmara

Desembargador no TJRJ. Professor de Direito Processual Civil na EMERJ(Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro). Membro do Instituto Brasi-leiro de Direito Processual, do Instituto Iberoamericano de Derecho Procesal e da

International Association of Procedural Law.

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NOTA DO AUTOR

Caro leitor,Este livro tem como principal objetivo tratar com clareza, objetividade e honestidade as

características dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais previstos na Lei 9.099/1995, por meio de umolhar crítico e voltado para a promoção do acesso à justiça, com vistas a fomentar, de um lado, oaprimoramento do seu funcionamento e, de outro, o estudo e a atuação das pessoas interessadas nestemodelo judicial. Como sempre, estou aberto para receber críticas e sugestões de todos aqueles quedesejarem trocar ideias sobre esse apaixonante tema. Esse contato pode ocorrer, entre outros meios,pelo meu perfil no Twitter (@felippeborring), no Instagram (felippe_borring) e no Facebook(Professor Felippe Borring), ou pelo meu blog Processo Civil em Movimento(<http://felippeborring.blogspot.com.br>).

Boa leitura!

Rio de Janeiro, maio de 2019.

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ABREVIATURAS

1º CDPJE – 1º Congresso de Direito Processual e Juizados Especiais, Santa Catarina, Florianópolis

1º ECJTRJE –1º Encontro de Coordenadores e Juízes das Turmas Recursais dos Juizados Especiais doRio de Janeiro

1ºEJECTRERJ

–1º Encontro de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e de Turmas Recursais do Estado doRio de Janeiro

1º EJJEC – 1º Encontro de Juízes de Juizados Especiais Cíveis da Capital e da Grande São Paulo1º EMJERJ – 1º Encontro dos Magistrados dos Juizados Especiais do Rio de Janeiro

1ºETRJECERJ

–1º Ementário das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio deJaneiro

2º EJJEEP – 2º Encontro de Juízes de Juizados Especiais do Estado de Pernambuco2º

ETRJECERJ–

2º Ementário das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio deJaneiro

AC – Apelação CívelACTJCOJES – Consolidação dos Enunciados (Aviso Conjunto 15/16 – TJRJ/COJES)

ADC – Ação Declaratória de ConstitucionalidadeADIN – Ação Declaratória de InconstitucionalidadeAgRg – Agravo Regimental

AI – Agravo de InstrumentoAIJ – Audiência de Instrução e Julgamento

ARE – Agravo em Recurso ExtraordinárioArt. – ArtigoCC – Código Civil

CDC – Código de Defesa do Consumidor

CEJCA –Consolidação dos Enunciados Jurídicos Cíveis e Administrativos em Vigor Resultantes dasDiscussões dos Encontros de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais doEstado do Rio de Janeiro (Aviso 23/08 – TJRJ)

CJF – Conselho da Justiça FederalCNJ – Conselho Nacional de Justiça

Coord. – Coordenador ou coordenadoresCP – Código Penal

CPC – Código de Processo Civil de 2015 (Lei 13.105/2015)CPC/1939 – Código de Processo Civil de 1939 (Decreto-lei 1.608/1939)CPC/1973 – Código de Processo Civil de 1973 (Lei 5.869/1973)

CPP – Código de Processo PenalEC – Emenda Constitucional Federal

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ECE – Emenda Constitucional EstadualED – Embargos de Declaração

FONAJE – Fórum Nacional dos Juizados Especiais do BrasilFONAJEF – Fóruns Nacionais dos Juizados Especiais FederaisFOREJEF – Fórum Regional dos Juizados Especiais Federais (2ª Região)

FPPC – Fórum Permanente de Processualistas CivisIRDR – Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas

IS – Incidente de Suspeição/ImpedimentoIUJ – Incidente de Uniformização da Jurisprudência

J. – JulgadoLC – Lei Complementar Federal

LCE – Lei Complementar EstadualLE – Lei EstadualLei – Lei Ordinária Federal

Op. cit. – Opus citatum (obra citada)P. – Página

PU – Pedido de UniformizaçãoPub. – Publicado

REsp – Recurso Especial (STJ)REXT – Recurso Extraordinário (STF)

RI – Recurso InominadoSTF – Supremo Tribunal FederalSTJ – Superior Tribunal de Justiça

TAC – Tribunal de Alçada CívelTJ – Tribunal de Justiça

TR – Turma RecursalTRF – Tribunal Regional Federal

V. – Volume

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1

22.1

2.1.12.1.22.1.32.1.4

2.1.5

2.1.62.1.7

2.22.32.4

33.13.2

3.2.13.2.23.2.33.2.4

3.33.43.53.63.7

SUMÁRIO

PARTE I – Da teoria geral dos Juizados Especiais Cíveis

Introdução: a contextualização histórica da gênese da Lei 9.099/1995

As características básicas dos juizados especiais cíveisA estrutura normativa

A base constitucional dos Juizados EspeciaisA delimitação da parte cível da Lei 9.099/1995A colocação dos Juizados Especiais na estrutura judiciáriaA competência legislativa para a organização judiciária dos JuizadosEspeciaisA competência legislativa para inclusão de causas para fins de composiçãonos Juizados EspeciaisA instalação dos Juizados EspeciaisA aplicação subsidiária do CPC à Lei 9.099/1995

O papel da Lei 9.099/1995 no “Sistema dos Juizados Especiais”A natureza jurídica dos Juizados Especiais CíveisO conceito dos Juizados Especiais

O sistema principiológico dos juizados especiais cíveisOs princípios fundamentais dos Juizados EspeciaisO princípio da oralidade

A concentração dos atos processuaisA identidade física do juizA irrecorribilidade (em separado) das decisões interlocutóriasO imediatismo

O princípio da simplicidadeO princípio da informalidadeO princípio da economia processualO princípio da celeridadeA diretriz da busca pela autocomposição

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4

55.1

5.1.15.1.1-A

5.1.1.15.1.1.2

5.1.25.1.2.15.1.2.25.1.2.3

5.1.35.2

5.2.15.2.25.2.3

5.2.45.2.5

5.35.45.4-A5.55.65.7

66.16.2

6.2.16.2.1-A6.2.26.2.3

O campo de atuação dos Juizados Especiais

A competência dos Juizados CíveisO critério objetivo

As pequenas causasA distinção entre pequenas causas estaduais, federais e fazendárias

A renúncia à parte excedente ao limite de 40 salários mínimosAs consequências da violação das regras sobre o teto de 40salários mínimos

As causas de menor complexidadeAs causas do rito sumárioA ação de despejo para uso próprioA ação de homologação de acordo extrajudicial

As pequenas causas de menor complexidadeO critério territorial

O foro do domicílio do réuO foro do local onde a obrigação deve ser cumpridaO foro do domicílio do autor ou o local onde ocorreu o fato danoso, nas açõesde indenizaçãoO foro de eleiçãoAs consequências da violação das regras sobre competência territorial

O critério funcionalA conexão e a continênciaA diversidade de causas fundadas nos mesmos fatosAs ações coletivasA celebração de acordos referendados pelo Ministério PúblicoO conflito de competência

As partes e seus representantesA capacidade e a legitimidade das partesAs limitações à capacidade processual

O incapazA capacidade do maior de 18 anosO presoA pessoa jurídica de direito público

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6.2.46.2.56.2.6

6.36.3.16.3.26.3.36.3.4

6.46.4.16.4.26.4.3

6.56.66.76.7-A6.7-B6.7-C6.8

77.17.2

8

99.1

9.1.19.1.29.1.2-A

9.29.2.19.2.29.2.3

A empresa pública da UniãoA massa falidaO insolvente civil

A legitimidade processual ativaAs pessoas físicasAs pessoas jurídicasA legitimidade ativa do condomínioA legitimidade do titular do direito de receber honorários fixados nosJuizados Especiais

A capacidade postulatóriaA atuação do advogadoA advertência quanto à conveniência do patrocínio por advogadoO instrumento do mandato

O prepostoA presença pessoal das partes nas audiênciasA vedação às modalidades ordinárias de intervenções de terceiroO incidente de desconsideração da personalidade jurídicaA intervenção do amicus curiaeA nomeação de terceiro para substituir o réuO litisconsórcio

A assistência judiciária gratuita e a Defensoria PúblicaA assistência judiciária gratuitaA Defensoria Pública

O Ministério Público

O papel dos juízes, dos conciliadores e dos juízes leigos nos Juizados EspeciaisO juiz

A atividade probatória judicialA aplicação do direito pelo juizO papel da equidade no julgamento das causas

O juiz leigoA condução da audiência de conciliaçãoA condução do procedimento arbitralA condução da audiência de instrução e julgamento

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9.2.49.2.5

9.3

1010.110.210.3

1111.111.211.311.411.511.611.6-A11.7

1212.112.212.312.412.512.612.712.812.912.10

13

13.113.2

A prolação do “projeto de sentença”O impedimento para o exercício da advocacia

O conciliador e o mediador

A estrutura procedimental dos Juizados EspeciaisOs procedimentos dos Juizados EspeciaisA natureza dos procedimentosA opção pelos procedimentos dos Juizados Especiais

Os atos processuais e os prazos nos Juizados EspeciaisA integração das regras sobre os atos e os prazosA publicidade dos atosA prática dos atos em horário noturnoO registro dos atos processuaisA manutenção dos autos do processoOs prazosA fluência dos prazos durante o recessoAs convenções processuais

As Comunicações processuais nos Juizados EspeciaisAs características particulares da citação nos Juizados EspeciaisO recebimento da citaçãoA citação por carta precatóriaA citação por carta rogatóriaA impossibilidade da citação por editalA citação por hora certaA intimaçãoA comunicação da mudança de endereçoA intimação dos defensores públicosA publicação das pautas de julgamento nas turmas recursais

As causas especiais de encerramento do procedimento sem resolução do mérito nosJuizados Especiais

A ausência do autor às audiênciasA inadmissibilidade do procedimento ou do seu prosseguimento após a etapa deautocomposição

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13.313.413.513.613.7

1414.114.214.314.3-A

1

2

33.1

3.1.13.1.2

3.2

3.33.3.13.3.23.3.33.3.43.3.53.3.63.3.73.3.83.3.9

3.43.4.13.4.2

A declaração de incompetência territorialA superveniência dos impedimentos do art. 8ºO falecimento do autorO falecimento do réuA dispensa da intimação das partes sobre o encerramento do procedimento

As despesas processuais nos Juizados EspeciaisO sistema de isençãoA gratuidade de JustiçaA litigância de má-féQuadro-resumo das despesas processuais

PARTE II – Da tutela cognitiva

Introdução: o estudo da tutela jurisdicional como novo paradigma do direito processual

A estrutura da fase cognitiva do procedimento sumaríssimo

A etapa de composiçãoA adequação das causas ao procedimento sumaríssimo

Os procedimentos especiais que já estão previstos na LeiOs procedimentos especiais que não estão previstos na Lei

A comparação entre as fases cognitivas do procedimento comum do CPC e doprocedimento sumaríssimo dos Juizados EspeciaisO “pedido” (petição inicial)

As características da petição inicialO pedido genéricoA cumulação de demandas e a cumulação de pedidosO valor da causaOs pedidos de tutelas provisóriasA distribuição e a autuação da petição inicialO juízo de admissibilidade da petição inicialO indeferimento da petição inicialA desistência da demanda

As técnicas de composiçãoA conciliaçãoA mediação

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3.4.3

44.1

4.1.14.1.24.1.34.1.44.1.5

4.24.3

4.3.14.3.24.3.34.3.44.3.54.3.64.3.7

4.3.7.14.3.7.24.3.7.3

4.3.84.3.9

4.3.9.14.3.9.2

4.3.104.44.54.64.74.8

4.8.14.8.24.8.34.8.4

A arbitragem

A etapa de instrução e julgamentoA resposta do réu

A apresentação da contestaçãoO ônus da impugnação específicaO pedido contrapostoA reveliaAs alegações de impedimento e suspeição

A réplicaA atividade probatória

O ônus probatórioA produção das provas em audiênciaA limitação quanto à produção das provasO registro da prova oralO depoimento pessoal e o interrogatórioA exibição de documento ou coisaA prova documental

A análise imediata dos documentos apresentados em audiênciaA juntada de declarações, laudos e orçamentosA alegação de falsidade documental

A prova testemunhalA prova pericial

A limitação quanto à prova pericialO perito

A inspeção judicialAs questões incidentesAs questões prejudiciais ao méritoAs alegações finaisO julgamento antecipado do mérito (total e parcial)A sentença

A dispensa do relatórioA fundamentação da sentençaA intimação da sentençaA liquidez da sentença

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4.8.54.8.64.8.7

4.94.10

1

22.1

2.1.12.1.22.1.32.1.42.1.52.1.62.1.72.1.82.1.92.1.102.1.112.1.12

2.22.2.12.2.22.2.3

2.2.3.12.2.3.2

2.2.42.2.4.12.2.4.22.2.4.32.2.4.4

2.2.5

A ineficácia parcial da sentença com condenação acima da alçada legalA designação de data para a leitura de sentençaO “projeto de sentença”

A reprodução da audiênciaA coisa julgada

PARTE III – Da tutela executiva

O modelo executivo dos Juizados Especiais

A fase executiva do procedimento sumaríssimoRegras gerais sobre a fase executiva

A natureza incidental da execuçãoAs regras executivas da Lei 9.099/1995A legitimidadeA competênciaO interesse de agirA liquidez da obrigação reconhecida na decisãoA elaboração de cálculos por servidor judicialA intimação para cumprimento da decisãoA execução provisóriaO poder geral de efetivaçãoA desistência da execuçãoA impossibilidade de localização do executado ou de bens penhoráveis

A execução pecuniáriaA postulação da execuçãoA penhora e a avaliaçãoA defesa do executado

Os embargos à execuçãoAs impugnações simples

A expropriação do bem apreendidoA adjudicação do bem penhoradoA alienação do bem penhorado por iniciativa particularA alienação do bem penhorado por leilão judicialA apropriação de frutos e rendimentos

O pagamento

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2.32.3.12.3.22.3.32.3.4

2.3.4.12.3.4.22.3.4.3

2.3.52.3.5.12.3.5.2

2.3.5.2.12.3.5.2.2

2.3.5.2.32.3.6

33.1

3.1.13.1.23.1.33.1.43.1.5

3.23.2.13.2.23.2.33.2.4

3.2.4.13.2.4.1.13.2.4.1.23.2.4.1.33.2.4.1.4

A execução mandamentalO regime jurídico da tutela específica nos Juizados EspeciaisA estrutura da tutela específicaA tutela inibitóriaAs técnicas da execução mandamental

A tutela específica stricto sensuA tutela equivalenteA tutela indenizatória

As medidas de apoioO rol de medidas de apoioA multa periódica (astreintes)

IntroduçãoO termo inicial da incidência dos preceitoscominatóriosA alteração do valor da multa

A defesa do executado

A ação de execução dos títulos executivos extrajudiciais até 40 salários mínimosConsiderações iniciais sobre a ação executiva extrajudicial

O regime jurídicoO objeto da execução: obrigações pecuniáriasAs condições da ação executivaA competênciaOs títulos executivos extrajudiciais

O procedimento executivoA natureza do procedimento executivoA postulação da execuçãoA audiência de conciliaçãoA defesa do executado

Os embargos à execuçãoA natureza jurídicaA interposiçãoO objeto dos embargos à execuçãoA “suspensão da execução” até o julgamento dosembargos

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3.2.4.2

11.11.21.3

1.3.11.3.2

1.3.2.1

1.3.2.2

1.3.2.3

1.3.31.3.4

1.41.5

1.5.11.5.1.11.5.1.21.5.1.31.5.1.41.5.1.51.5.1.61.5.1.71.5.1.81.5.1.91.5.1.10

1.5.21.5.31.5.4

1.5.4.11.5.4.1-A

A impugnação simples

PARTE IV – Do sistema recursal e dos meios impugnativos das decisões

O sistema recursal dos Juizados EspeciaisIntrodução: a convivência entre os sistemas recursais dos Juizados Especiais e do CPCA estrutura do sistema recursal dos Juizados EspeciaisA recorribilidade das decisões

A sentença proferida em primeiro grau de jurisdiçãoA decisão interlocutória proferida no primeiro grau de jurisdição

A impossibilidade absoluta de impugnação imediata das decisõesinterlocutóriasA impugnação imediata das decisões interlocutóriasexclusivamente por mandado de segurançaA recorribilidade imediata de determinadas decisõesinterlocutórias

A decisão monocrática preferida em segundo grau de jurisdiçãoA decisão colegiada proferida em segundo grau de jurisdição

A necessidade da atuação técnica na fase recursalAs espécies de recursos cabíveis no Sistema Recursal dos Juizados

O “recurso inominado”O cabimentoO prazo para interposiçãoO preparoO juízo de interposiçãoA petição de interposiçãoO “recurso inominado” adesivoO juízo de admissibilidadeOs procedimentosO efeito suspensivoA tutela antecipada recursal

O agravo de instrumentoO agravo internoOs embargos de declaração

O cabimentoOs embargos de declaração para prequestionamento

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1.5.4.1-B

1.5.4.1-C1.5.4.21.5.4.31.5.4.41.5.4.51.5.4.61.5.4.71.5.4.8

1.5.51.5.6

1.5.6.11.5.6.21.5.6.31.5.6.41.5.6.5

1.5.71.5.8

1.61.6.11.6.21.6.2-A1.6.31.6.4

1.6.51.6.6

22.1

2.1.1

2.1.2

Os embargos de declaração para suprimir omissãojurisprudencial ou de fundamentaçãoOs embargos de declaração com efeitos modificativosA interposiçãoA intervenção do advogadoOs procedimentosO efeito suspensivoO efeito interruptivoA aplicação de multa por embargos protelatóriosA correção de erros materiais

O recurso especialO recurso extraordinário

O cabimentoO juízo de admissibilidadeO procedimentoO efeito devolutivoO efeito suspensivo

Agravo em recurso extraordinárioO (vetado) recurso de divergência

A Turma RecursalA natureza jurídica da Turma RecursalOs incidentes processuais em segundo grauO incidente de resolução de demandas repetitivaA transcrição da gravação da audiênciaA aplicação do julgamento imediato do mérito em segundo grau (teoria decausa madura recursal)O impedimento do juiz nas Turmas RecursaisA técnica remissiva nos julgamentos em segundo grau

Os meios impugnativos das decisões judiciaisO mandado de segurança

O cabimento do mandado de segurança contra ato judicial dos JuizadosEspeciaisA competência para julgar o mandado de segurança contra ato do juiz doJuizado Especial

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2.1.3

2.22.32.4

2.4.12.4.22.4.2-A2.4.2-B

A competência para julgar mandado de segurança contra atos das TurmasRecursais

As ações anulatóriasO incidente de uniformização da jurisprudênciaA reclamação

A reclamação correicionalA reclamação jurisprudencialA reclamação por descumprimento de súmula vinculanteA reclamação por descumprimento de jurisprudência do STJ

Referências bibliográficas

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PARTE IDa teoria geral dos Juizados Especiais Cíveis

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1INTRODUÇÃO: A CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA

GÊNESE DA LEI 9.099/1995

Quando da entrada em vigor do “Monumento a Liebman”, como era chamado o Código deProcesso Civil de 1973, tamanha a presença dos ensinamentos do mestre italiano, muitos juristascomemoraram o início de uma nova era no Direito Processual brasileiro, que, acreditava-se, seriamarcada pela concretização do ideário do acesso à justiça.1 De fato, é preciso reconhecer que não setratava de um otimismo injustificado, uma vez que o anteprojeto do Código elaborado por AlfredoBuzaid era, sem sombra de dúvida, uma obra de primeira grandeza, especialmente considerando-se opanorama da época. A despeito disso, muitos objetivos almejados não lograram apresentar osresultados que deles se esperavam.

Alguns dos problemas apresentados pelo Código de 1973 tiveram o seu embrião na própriaconcepção da ciência processual então vigente. O excesso de solenidades, decorrente dos ideaisiluministas, sob o argumento de proteger as partes das possíveis arbitrariedades do julgador,transformou o processo num instrumento com limitada capacidade para atender aos seus escopossociais e jurídicos. Ao longo dos anos 1970, década marcada por crises e enfrentamentos políticos, asituação se agravou no ritmo do crescimento constante e geométrico das demandas, acabando porressaltar as limitações do Poder Judiciário, tais como a falta de juízes, de auxiliares e de recursosmateriais.2

Outro aspecto que precisa ser considerado nessa equação diz respeito à própria estruturaestatal brasileira. A centralização política, baseada num Estado onipresente, desde os temposcoloniais, associada às nossas raízes ibéricas, fizeram com que o ordenamento jurídico pátrio fossemarcado pela hipertrofia da função de substitutividade do Poder Judiciário. Com isso, duranteséculos, a prestação da tutela jurisdicional foi estruturada partindo-se da incapacidade das partes emlidar com interesses contrapostos em juízo, incutindo na consciência popular os valores desubmissão das vontades em confronto à manifestação estatal.

Nesse contexto, surgiu primeiro no Rio Grande do Sul3 um movimento de juristas queidentificavam na conciliação mais do que um incidente processual, um caminho para reduzir o fluxode litígios na Justiça. Para tanto, sublinhavam esses estudiosos, era preciso romper com uma tradiçãoem nosso País, em que, até recentemente, não havia um ambiente propício para a formação de umacultura de solução consensual dos conflitos.4

Destarte, uma das metas do movimento gaúcho foi justamente buscar o deslocamento do foco da

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discussão, até então basicamente direcionado às questões processuais, para as partes em conflito e obem jurídico deduzido em juízo.5 Ponderou-se que a conciliação poderia representar uma forma maisrápida de pacificação dos conflitos sociais, prescindindo de um longo caminho processual, e maisjusta, pois baseada na manifestação da vontade das partes. Assim, animados por esse espírito, emcaráter experimental, foram criados no Rio Grande do Sul, no início da década de 1980, osConselhos de Conciliação e Arbitramento, que “não tinham existência legal, não tinham funçãojudicante, com juízes improvisados, atuando fora do horário de expediente forense”.6

Simultaneamente, em São Paulo, foram implantadas Juntas Informais de Conciliação.7 Essasexperiências foram bem recebidas nos meios jurídicos e produziram resultados notáveis.8

Com base no sucesso dessas empreitadas, o Governo Federal, por meio do Ministério daDesburocratização,9 comandado pelo Ministro Hélio Beltrão, reuniu uma comissão de juristas10

dedicados a elaborar um anteprojeto de lei para a criação de um modelo de Juizado de PequenasCausas, focado na conciliação, nos moldes dos que já existiam em várias partes do mundo11 e que jáera previsto em nossas Constituições Federais desde 1934,12 sem nunca ter sido implantado.

O texto produzido pela comissão foi encaminhado ao Congresso Nacional por intermédio doPoder Executivo (Mensagem 313/1983) e se transformou no Projeto de Lei (PLC 1.950/1983), quefoi aprovado e convertido na Lei 7.244, de 07.11.1984. Esse diploma legal criava um Juizadocompetente para as pequenas causas, assim consideradas em razão do seu valor econômico,13

exatamente como ocorria com os modelos do direito comparado, pautado na informalidade,celeridade e oralidade, mas com grande ênfase na conciliação. Não por outro motivo, foi prevista noprocedimento a realização de uma audiência exclusivamente conciliatória (art. 22), conduzida,preferencialmente, por um conciliador (art. 23).

Criado o Juizado de Pequenas Causas, ele foi implantado em diversos Estados e funcionavabem, de forma célere e com custos reduzidos, atuando principalmente junto à população mais carente,que representava a maior parte dos seus usuários. Assim, em 1988, o legislador constituinte nãoapenas reiterou a conhecida previsão de implantação dos Juizados Especiais, mas também inseriu areferência aos Juizados de Pequenas Causas na Carta Magna. De fato, a Constituição da Repúblicade 1988 estabeleceu dois modelos diferentes de juizados: de um lado, os Juizados de PequenasCausas, que já existiam, com competência direcionada para causas cíveis com reduzido valor (incisoX do art. 24),14 e, de outro, os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, a serem criados por leiordinária, que teriam competência para a “conciliação, julgamento e execução”, respectivamente, das“causas cíveis de menor complexidade e das infrações penais de menor potencial ofensivo” (inciso Ido art. 98).

No início dos anos 1990, ansiosos por concretizar a novidade, alguns Estados--membrosconsideraram-se competentes para legislar sobre a criação dos Juizados Especiais em seusterritórios, com apoio no inciso X do art. 24 da CF. Assim, foram criados Juizados Especiais noMato Grosso do Sul (Lei Estadual 1.071/1990), no Rio Grande do Sul (Lei Estadual 9.442/1991) e

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em Santa Catarina (Lei Estadual 1.141/1993). Apesar da boa índole da iniciativa, o SupremoTribunal Federal, acertadamente, refutou essas leis, assinalando que a criação dos JuizadosEspeciais Cíveis e Criminais dependia da edição de lei ordinária federal.15

Paralelamente a essa discussão, foram apresentados diversos projetos no Congresso Nacionalpara finalmente regular o inciso I do art. 98 da Constituição Federal. Os projetos mais destacadosforam aqueles apresentados pelos Deputados Jorge Arbage (PL 1.129/1988), Michel Temer (PL1.480-A/1989), Manoel Moreira (PL 1.708/1989), Daso Coimbra (PL 2.959/1989), Gonzaga Patriota(PL 3.883/1989) e Nelson Jobim (PL 3.698/1989).

Em 1994, o Deputado Ibrahim Abi-Ackel apresentou um substitutivo que visava regular, numúnico texto, os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Na verdade, o substitutivo nada mais era doque a reunião do Projeto Jobim, que versava tão somente sobre os Juizados Especiais Cíveis, com oProjeto Temer, que tratava dos Juizados Especiais Criminais. Com isso, contrariando a nossatradição legislativa, o substitutivo reuniu num único texto regras de processo civil e processo penal.Vale salientar que a fusão dos dois projetos não foi precedida da devida harmonização legislativa.Na verdade, esses dois projetos foram simplesmente “costurados”, ficando o Projeto Jobim naprimeira parte e o Projeto Temer na segunda.16 Mesmo assim, o substitutivo foi aprovado e o textofinal foi sancionado pelo Presidente da República com um único veto (art. 47), vindo a se tornar, em26 de setembro de 1995, a Lei 9.099.

Uma das maiores surpresas contidas na Lei 9.099/1995 foi a revogação expressa da Lei7.244/1984 (art. 97), contrariando o entendimento então dominante de que as duas Leis poderiamconviver. De fato, na época, a visão prevalente era que Juizados Especiais, regulados pela matéria, eJuizados de Pequenas Causas, regidos pelo valor, eram órgãos diferentes.17 De fato, nem todas asações de pequeno valor são simples, nem todas as ações simples são de pequeno valor. A ação dedespejo, por exemplo, tem, via de regra, uma natureza simples, independentemente do seu valor.18 Aação de reconhecimento de paternidade, por seu turno, pode se apresentar de forma bastantecomplexa, embora tenha valor de alçada simbólico. Assim, cada modelo de Juizado teria que disporde regras próprias para atender adequadamente às suas características. O que se viu, no entanto, éque a Lei 9.099/1995 criou um modelo chamado de Juizados Especiais Cíveis e deu a ele dois tiposde competência: causas de pequeno valor econômico (40 salários mínimos – art. 3º, I e IV) e causasespeciais em razão da matéria (causas de menor complexidade – art. 3º, II e III). Trata-se, pois, deum único modelo de Juizado, abrangendo simultaneamente as competências previstas nos arts. 24, X,e 98, I, da Constituição Federal.19

De qualquer forma, analisando a Lei 9.099/1995 é preciso reconhecer que o texto referente aosJuizados Especiais Criminais representou uma verdadeira revolução no processo penal brasileiro,alterando não apenas o tratamento dos acusados pela prática de crimes de menor potencial ofensivo,mas também o papel da vítima e a forma de cumprimento das penas.20 Já a parte que trata dosJuizados Especiais Cíveis repetiu quase a totalidade dos dispositivos da Lei dos Juizados de

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Pequenas Causas, sem promover a sua devida atualização. Em suma, o Projeto Jobim, que foiapresentado no Parlamento em 1989, retirou boa parte de seus dispositivos de uma lei de 1984 (Lei7.244). A previsão da arbitragem judicial (art. 24) e a sistemática de interposição do recursoinominado (art. 42) são bons exemplos que essa defasagem deixou no texto legal.

As poucas inovações trazidas pela Lei 9.099/1995 em relação à Lei 7.244/1984 se encontramconcentradas basicamente nos dispositivos relativos à competência, à comunicação dos atos e àexecução.21 Em relação à execução, é preciso reconhecer, a Lei 9.099/1995 apresentou uma série deavanços que, dez anos depois, foram parcialmente incorporados ao CPC/1973 (Leis 11.232/2005 e11.382/2006). Assim, desde 1995 a execução da sentença proferida nos Juizados é sincrética (art.52, IV) e a expropriação dos bens penhorados pode ser feita por iniciativa particular (art. 52, VII),para ficar em apenas dois exemplos de regras dos Juizados que foram transferidas para o CPC/1973pelas “Minirreformas”.22

Depois de 1995, diante de seu evidente sucesso, apesar de inúmeras e procedentes críticas, omodelo dos Juizados Especiais foi reproduzido para a Justiça Trabalhista (Lei 9.957/2000),23 para aJustiça Federal (Lei 10.259/2001) e para o juízo fazendário de Estados, Municípios e DistritoFederal (Lei 12.153/2009). No CPC de 2015, pela primeira vez, os Juizados Especiais receberamreferência dentro de um Código, tendo sido objeto de tratamento específico nas disposições finais(arts. 1.062 a 1.066) e de menção no incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 985).

O ideal, no entanto, seria editar uma nova lei tratando não apenas dos Juizados EspeciaisCíveis, mas também dos Juizados Federais Cíveis e dos Juizados Fazendários, num único diploma,em sintonia com o CPC/2015. Nesse sentido, reproduzimos aqui a moção aprovada pelo FórumPermanente de Processualistas Civis, do qual tivemos a honra de participar:

“Os processualistas civis de diversos Estados da Federação presentes no V FórumPermanente de Processualistas Civis que ocorreu em Vitória, Espírito Santo, entre os dias 01e 03 de maio de 2015, manifestam-se no sentido de que é chegada a hora de ser elaboradauma nova lei de Juizados Especiais, dando-se aos Juizados Especiais Cíveis, aos JuizadosEspeciais Cíveis Federais e aos Juizados Especiais da Fazenda Pública tratamentocompatível com o CPC de 2015 e com as mais modernas conquistas do Direito ProcessualCivil brasileiro”.

Sobre esse ideal, ver, por todos, Acesso à justiça, de Mauro Cappelletti e Bryant Garth.A deficiência técnica do processo, sob seu aspecto eminentemente jurídico, e a carência derecursos materiais e humanos, de ordem administrativa, são dois lados da mesma moeda, ou seja,ambos são geradores da falta de efetividade do processo. Daí ser imperiosa a implementação deuma verdadeira reforma do Poder Judiciário, voltada para aspectos técnicos e orgânicos, de forma

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a prover uma organização judiciária funcional e eficiente, dotada de padrões modernos de gestãoadministrativa. Por outro lado, para otimizar a atuação do Poder Judiciário, é preciso investir naimplementação de mecanismos extrajudiciais de composição dos conflitos, especialmente aquelesrelacionados aos entes públicos.Sobre o pioneirismo do Rio Grande do Sul em matéria de conciliação e formação de Juizados dePequenas Causas, ver a introdução da obra de Ovídio Baptista da Silva, Juizado de pequenascausas.São muito interessantes as anotações sobre a cultura conciliatória na China, feitas por CaetanoLagrasta Neto, Juizado especial de pequenas causas no direito comparado, p. 47: “Os chinesesseguem o princípio da filosofia de Confúcio, segundo o qual o homem sábio consegue resolversuas diferenças de maneira amigável. A necessidade de se lançar mão de recursos judiciaissignifica, entre outras coisas, que as partes são destituídas de sensatez sendo, portanto, pessoasinferiores”.Ver, novamente, Mauro Cappelletti e Bryant Garth, op. cit., p. 15: “Sob esta nova perspectiva, odireito não é encarado apenas do ponto de vista dos seus produtores e do seu produto (as regrasgerais e especiais); mas é encarado, principalmente, pelo ângulo dos consumidores do direito e daJustiça, enfim, sob o ponto de vista dos usuários dos serviços processuais”.Luis Felipe Salomão, Roteiro dos juizados especiais cíveis, p. 27. A discussão sobre ofuncionamento desses Juizados foi objeto de debate no STJ, que concluiu pela sua validadeenquanto órgão extrajudicial: “O chamado Juizado Informal de Conciliação, constituído à margemda Lei 7.244/1984, não tem natureza pública. Os acordos, aí concluídos, valem como títulosextrajudiciais, só podendo ter força executiva nos casos previstos em lei, como na hipótese decorresponderem ao disposto no art. 585, inc. II, do CPC. Poderão adquirir natureza de títulojudicial, se homologados pelo juiz competente (Lei 7.244, art. 55), o que não se verificou nahipótese em julgamento” (STJ, 3ª Turma, REsp 6.019, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. em11.03.1991).Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de direito processual civil moderno, v. III, p. 772.Ada Pellegrini Grinover, Conciliação e juizados de pequenas causas, p. 135.O Ministério da Desburocratização foi criado na esteira do Decreto 83.740/1979, que instituiu oPrograma Nacional de Desburocratização, e foi extinto pelo Decreto 5.378/2005.A comissão de juristas responsável pela redação do anteprojeto de lei foi formada por CândidoRangel Dinamarco, Kazuo Watanabe, Luiz Melíbio Machado, Mauro José Ferraz Lopes, NilsonVital Naves, Paulo Salvador Frontini e Ruy Carlos de Barros Monteiro.Apenas para ilustrar o panorama internacional na época, citando os apontamentos feitos porCaetano Lagrasta Neto, op. cit., p. 17, tínhamos, na Itália, os Preture, Conciliatori e os ArbitratoRituale o Irrituale; na França, os Conciliadores de Vizinhança; na Alemanha, a Landgerich, com aconciliação baseada no Stuttgarter Modell; nos Estados Unidos, as Small Claims Courts e SmallPlea Courts; na Inglaterra, as chamadas de County Courts e Poor’s Man Court, também existentesem diversas partes dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha; na Rússia e nos demais países doantigo bloco socialista, as Comissões de Disputas Trabalhistas e as Cortes de Camaradas; naPolônia, as Cortes Sociais ou Comunitárias; na Bulgária, as Cortes Sociais; no Japão, as Cortes

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Sumárias e as Comissões de Conciliação; no México, os Juízos Verbais; na Colômbia, as Cortesde Mínima Cuantía; na Costa Rica, as Alcaldes; e na Guatemala, assim como no Uruguai, osJueces de Paz que julgam pequenas causas.Art. 113, item 25, da Carta Constitucional de 1934: “Não haverá foro privilegiado nem tribunaisde exceção; admitem-se, porém, juízos especiais em razão da natureza das causas”; art. 106 da CFde 1937: “Os Estados poderão criar juízes com investidura limitada no tempo e competência parajulgamento das causas de pequeno valor, preparo das que excederam da sua alçada e substituiçãodos juízes vitalícios”; art. 124, XI, da CF de 1946: “Os Estados organizarão a sua Justiça, comobservância dos arts. 95 a 97 e também dos seguintes princípios: [...] XI – poderão ser criadoscargos de juízes togados com investidura limitada a certo tempo e competência para o julgamentodas causas de pequeno valor. Esses juízes poderão substituir os vitalícios” (com a EC 16/1965, aredação do inc. XI ficou com a seguinte redação: “Poderão ser criados cargos de juízes togadoscom investidura limitada ou não a certo tempo, e competência para julgamento das causas depequeno valor. Esses juízes poderão substituir os vitalícios”); art. 136 da Carta de 1967: “OsEstados organizarão a sua Justiça [...] § 1º A lei poderá criar, mediante proposta do Tribunal deJustiça: [...] b) juízes togados com investidura limitada no tempo, os quais terão competência parajulgamento de causas de pequeno valor e poderão substituir os vitalícios”; art. 144, § 1º, b, da EC1/1969: “Os Estados organizarão a sua Justiça [...] § 1º A lei poderá criar, mediante proposta doTribunal de Justiça: [...] b) juízes togados com investidura limitada no tempo, os quais terãocompetência para julgamento de causas de pequeno valor e poderão substituir os vitalícios” (coma EC 7/1977, a redação do item b ficou assim: “juízes togados com investidura limitada no tempo,os quais terão competência para julgamento de causas de pequeno valor e de crime a que não sejacominada pena de reclusão, e poderão substituir os vitalícios”. Ver, também, na Lei Orgânica daMagistratura Nacional (LC 35/1979), o art. 17, § 4º: “Poderão os Estados instituir, medianteproposta do respectivo Tribunal de Justiça, ou Órgão Especial, juízes togados, com investiduralimitada no tempo e competência para o julgamento de causas de pequeno valor e crimes a que nãoseja cominada pena de reclusão, bem como para a substituição dos juízes vitalícios”.O valor máximo das causas perante este Juizado era de 20 salários mínimos, conforme estabeleciao art. 3º da Lei 7.244/1984.“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: [...]X – criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas”.Por todos, confira-se o julgamento realizado pelo Pleno do STF em 1994 no HC 71.713/PB, cujarelatoria coube ao Min. Sepúlveda Pertence.De fato, a junção dos projetos de lei foi feita sem qualquer preocupação técnica. O resultado é quea Lei 9.099/1995 tem duas disposições gerais e duas disposições finais: o recurso contra sentença,na parte cível, não tem nome, é chamado de apelação na parte criminal; o procedimento cível,também inominado, tem uma concepção diversa do procedimento criminal, chamado desumaríssimo etc.O Ministro do STF Paulo Brossard, relator da ADIn 1.127-8-DF, ajuizada pela Associação dosMagistrados do Brasil em relação à Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), ao conceder medidaliminar suspendendo a eficácia do art. 1º do Diploma Legal, salientou que os Juizados dePequenas Causas eram órgãos distintos dos Juizados Especiais.

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Trata-se de uma conclusão com respaldo legal. A Lei 8.245/1991 (Lei de Locações), em seu art.80, dispõe que, “para fins do art. 98, I, da Constituição Federal, as ações de despejo poderão serconsideradas causas cíveis de menor complexidade”. Por certo, tal previsão não está associada aovalor da causa.Ressalte-se, desde logo, que o entendimento prevalente no Brasil é que todas as causas cíveis daLei 9.099/1995 devem se submeter ao teto de 40 salários mínimos.Por todos, veja-se a introdução ao livro de Ada Pellegrini Grinover et al., Juizados especiaiscriminais.A execução, por sinal, sequer era tratada no texto original da Lei 7.244/1984 (Lei dos Juizados dePequenas Causas). Essa Lei dispunha que os Juizados de Pequenas Causas só seriam competentespara julgar processos de conhecimento, ou seja, de suas decisões era preciso extrair carta desentença para execução no juízo singular. Em 1993 houve uma alteração legislativa (Lei 8.640)que permitiu aos Juizados de Pequenas Causas o julgamento das ações de execução de suassentenças. No entanto, nesses casos, o procedimento adotado era o do CPC, o que acabou portrazer as deficiências que já existiam nas varas cíveis para os Juizados, sem promover uma efetivamelhora.As chamadas “minirreformas” do CPC/1973 começaram em 24.09.1993, com a edição da Lei8.710, e se protraíram até 2010, com a Lei 12.322.É recorrente a opinião na doutrina trabalhista de que a Lei 9.957/2000 não criou um modelo deJuizado Especial, mas introduziu um procedimento especial na CLT, chamado sumaríssimo. Nessesentido, Valentin Carrion, Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, p. 663.

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2.1

2.1.1

2.1.2

a)

b)c)

2AS CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DOS JUIZADOS

ESPECIAIS CÍVEIS

A ESTRUTURA NORMATIVA

A base constitucional dos Juizados Especiais

Apesar de existirem há décadas em nosso ordenamento jurídico diferentes modelos deJuizados, a consolidação dos Juizados Especiais em nosso País tem como marco a sua inserção naCarta Magna de 1988. A partir de então, não apenas a criação, mas também o funcionamento e ainterpretação das regras relativas aos Juizados Especiais passaram a ter como base, diferenciada, adisposição contida no art. 98 da CF, que diz:

“Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:I – juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para aconciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infraçõespenais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo,permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmasde juízes de primeiro grau”.

A delimitação da parte cível da Lei 9.099/1995

Como já dito, a Lei 9.099/1995 trata, simultaneamente, dos Juizados Especiais Cíveis e dosJuizados Especiais Criminais. A parte cível da Lei 9.099/1995 vai do arts. 1º ao 59. São essesdispositivos, além das “Disposições Finais Comuns” (arts. 93 ao 97), que vão reger os JuizadosEspeciais Cíveis.

Analisando o teor desses artigos, é possível identificar neles três funções básicas:

determinar que a União, especificamente no Distrito Federal, e os Estados criem umaestrutura judicial (Juizados Especiais), formada por dois tipos de órgãos – o JuizadoEspecial e a Turma Recursal;definir as regras e as características que serão observadas nessa estrutura judicial; edefinir as regras e as características dos procedimentos (ritos) que serão aplicadosnesses órgãos.

Assim, num único diploma legal, o legislador estabeleceu regras processuais, procedimentais e

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2.1.3

de organização judiciária.1 O art. 1º da Lei 9.099/1995 começa a cumprir a última das funções, aodefinir a competência legislativa para a implantação dos Juizados Especiais no País:

“Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serãocriados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação,processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência”.

Essa atribuição é complementada pelas regras contidas no art. 56, que versa sobre aimplantação de curadorias e de serviços de assistência judiciária, no art. 58, que permite aampliação da competência compositiva, no art. 93, que determina a edição de lei estadual para tratarda organização, composição e competência dos Juizados, e no art. 95, que prevê o prazo de seismeses para que os tribunais promovam a implantação dos Juizados Especiais.

As regras processuais, por sua vez, se concentram basicamente entre o art. 2º e o art. 13, quetratam dos princípios, da competência, dos participantes do processo (partes, juízes, conciliadores,juízes leigos, prepostos etc.) e dos atos processuais. Não obstante, algumas disposições processuaistambém podem ser encontradas na parte final do texto civil, que cuida das despesas processuais(arts. 54 e 55) e da proibição da ação rescisória (art. 59).

Por fim, as regras procedimentais estão enfeixadas entre os arts. 14 e 53 da Lei. Nessesdispositivos são delineadas as formas como a tutela de conhecimento, a tutela de execução e osrecursos serão manejados nos Juizados Especiais.

A colocação dos Juizados Especiais na estrutura judiciária

O dispositivo inaugural da Lei 9.099/1995 apresenta os Juizados Especiais como sendocomponentes da “Justiça Ordinária”, e, em seguida, assinala, repetindo o dispositivo constitucional(art. 98, I), que cumprirá à União, no Distrito Federal e nos Territórios, e aos Estados, a criaçãodesses Juizados. Assim, a primeira questão a ser enfrentada diz respeito ao significado da expressãoJustiça Ordinária, sobre a qual paira antiga divergência.

A ampla maioria da doutrina, corrente à qual nos filiamos, afirma que a Justiça Ordinária,sinônimo de Justiça Comum, é formada pelas Justiças Estadual, Distrital e Federal, enquanto asJustiças Especiais seriam a Militar, a Eleitoral e a Trabalhista.2 O critério adotado, nesse caso, seriaa especialização em razão da matéria. Outra vertente, no entanto, vaticina que a Justiça Federaltambém seria uma Justiça Especial, em decorrência da exclusividade desse foro às entidadesfederais. Apesar da mencionada prevalência doutrinária, a única conclusão a que se pode chegar éque no art. 1º da Lei 9.099/1995 o legislador adotou a corrente minoritária de pensamento. Issoporque afirmou que os Juizados Especiais são componentes da “Justiça Ordinária”, a serem criadosna Justiça do Distrito Federal e nos Tribunais de Justiça dos Estados. Portanto, na Lei, “JustiçaOrdinária” é sinônimo de Justiça Estadual e Distrital.

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Note-se que, apesar da clareza do dispositivo legal, parte da doutrina construída no final dosanos 1990 insistiu em defender a possibilidade da aplicação da Lei 9.099/1995 na Justiça Federal.3

Com o devido respeito, em que pese sempre termos defendido a criação de Juizados Especiais naJustiça Federal, nunca concordamos que isso fosse possível apenas com base na Lei 9.099/1995.Além da interpretação literal, entendíamos que a instalação de Juizados Especiais na Justiça Federalnão era possível em razão das prerrogativas processuais que tais entes desfrutavam. De fato, União,Estados, Municípios e Distrito Federal, quando presentes em juízo, têm prazo em dobro para semanifestarem, podem demandar a intervenção do Ministério Público e são representados porProcuradorias, que não tinham autonomia para fazer acordos.4 Mais grave ainda, as sentençasproferidas em face da Fazenda Pública podem ensejar reexame necessário e seu cumprimento,quando inclui uma obrigação pecuniária, é feito por meio de precatório.

Apesar dos motivos apresentados, a polêmica somente se encerrou com a edição da EmendaConstitucional 22, de 18.03.1999, que acrescentou parágrafo único ao art. 98 da CF, com a seguinteredação: “Lei federal disporá sobre a criação de juizados especiais no âmbito da Justiça Federal”.5

Com isso, ficou assente que a criação dos Juizados Especiais dependeria da edição de uma leiespecífica sobre o tema, retirando os obstáculos à efetiva participação dos entes federais nessesórgãos. Ainda assim, para viabilizar a iniciativa, foi necessária nova alteração no textoconstitucional, pois, como dito, o pagamento por meio de precatório, como regra, não era compatívelcom a sistemática célere e informal que se pretendia implantar. Assim, a Emenda Constitucional 30,de 13.09.2000, alterou a sistemática do pagamento dos créditos judiciais pelos entes federais,inserindo a seguinte redação no § 3º do art. 100:

“Art. 100 (...)§ 3º O disposto no caput deste artigo, relativamente à expedição de precatórios, não se aplicaaos pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor que a FazendaFederal, Estadual, Distrital ou Municipal deva fazer em virtude de sentença judicialtransitada em julgado”.6

Completando esse quadro, foi promulgada a Emenda Constitucional 37/2002, que incluiu o art.87 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, com a seguinte redação:

“Art. 87. Para efeito do que dispõem o § 3º do art. 100 da Constituição Federal e o art. 78deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias serão considerados de pequeno valor,até que se dê a publicação oficial das respectivas leis definidoras pelos entes da Federação,observado o disposto no § 4º do art. 100 da Constituição Federal, os débitos ou obrigaçõesconsignados em precatório judiciário, que tenham valor igual ou inferior a: I – quarentasalários mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal;II – trinta salários mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.Parágrafo único. Se o valor da execução ultrapassar o estabelecido neste artigo, o pagamento

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far-se-á, sempre, por meio de precatório, sendo facultada à parte exequente a renúncia aocrédito do valor excedente, para que possa optar pelo pagamento do saldo sem o precatório,da forma prevista no § 3º do art. 100”.

No ano anterior, já havia sido editada a Lei 10.259/2001, que instituiu os Juizados EspeciaisCíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal. Essa lei, como defendíamos, alterou profundamentea forma de atuação judicial da Fazenda Pública, permitindo a sua presença nos Juizados EspeciaisFederais. Não obstante, logo surgiram vozes sustentando a aplicação da Lei 10.259/2001 em face dosEstados, Municípios e do Distrito Federal.7 Da mesma forma que ocorreu em relação aos JuizadosEspeciais Federais, o debate somente teve fim com a edição da Lei 12.153/2009, que criou osJuizados Especiais da Fazenda Pública.

A competência legislativa para a organização judiciária dos Juizados Especiais

O art. 93 da Lei 9.099/1995 registra expressamente que as leis estaduais deverão regular aorganização judiciária dos Juizados Especiais, muito embora isso fosse dispensável, uma vez que,tratando-se de competência legislativa própria, não poderia ser de outra forma.8

Os projetos de lei sobre a organização judiciária serão necessariamente deflagrados pelorespectivo Tribunal de Justiça, sob pena de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa. Nãoé demais ressaltar que a legislação deverá ater-se, tão somente, à matéria afeta à organizaçãojudiciária, não podendo alterar as regras de natureza processual previstas na legislação federal.9

A competência legislativa para inclusão de causas para fins de composição nosJuizados Especiais

A Lei 9.099/1995 estabeleceu, como regra, que somente as causas submetidas à competênciados Juizados Especiais, independentemente do valor (art. 3º, § 3º), poderão ser levadas à sessão deconciliação. Permitiu, entretanto, que a atribuição conciliadora dos Juizados fosse ampliada pelosEstados e pela União, no Distrito Federal, por meio das suas regras de organização judiciária (art.58). Isso significa dizer que as leis estaduais e distritais de organização judiciária podem prever quedeterminadas causas, ainda que não enquadradas nos conceitos de menor complexidade ou menorvalor, possam ser levadas à sessão de conciliação ou mediação perante os seus respectivos JuizadosEspeciais.

Importante esclarecer que tais causas, derivadas da determinação contida no art. 58, podem serobjeto de composição nos Juizados Especiais, mas não de julgamento, da mesma forma que as causasacima de 40 salários mínimos (art. 3º, § 3º). Destarte, não havendo acordo, o procedimento deve serencerrado sem resolução do mérito. Entretanto, se for celebrado o acordo, qualquer que seja o seuvalor ou matéria, será homologado por sentença (art. 487, III, do CPC), passando a representar umtítulo executivo judicial, que deve ser executado no próprio Juizado, caso não cumprido

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2.1.7

espontaneamente pelo devedor (art. 52). Ao prever tal hipótese, entretanto, o ente federal não podedesconsiderar as limitações previstas no art. 8º da Lei, pois, mesmo na etapa conciliatória, nãopoderão ser partes nos Juizados Especiais o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direitopúblico, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.

A competência legislativa prevista no art. 58 não é residual, como pode parecer à primeiravista, mas plena, ou seja, somente as leis de organização judiciária poderão estabelecer hipótesessujeitas à conciliação fora do rol estabelecido pela Lei 9.099/1995. O legislador organizacional,entretanto, não pode reduzir nem ampliar o elenco de causas tidas como de menor complexidade oude menor valor, sob pena de invadir a esfera de atribuição federal.10

Portanto, o alcance da etapa conciliatória dos Juizados Especiais pode ser ampliado,transformando esses órgãos num fórum permanente de conciliação. Um exemplo dessa ampliação é aregra prevista no art. 10 da Lei 2.556/1996, do Estado do Rio de Janeiro, que dispõe que os“Juizados Especiais Cíveis, além da competência prevista no art. 3º da Lei 9.099/1995, deverãoconciliar os litígios regulados pela Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), que versemsobre matéria cível”.

A instalação dos Juizados Especiais

O art. 95 da Lei 9.099/1995 estabeleceu que os Juizados Especiais deveriam ser instalados nosEstados e no Distrito Federal em até seis meses após os dois meses de vacância prevista para a suaentrada em vigor (art. 96).11 Poucos foram os Estados que cumpriram tempestivamente adeterminação. De qualquer forma, o prazo não era peremptório e seu descumprimento não acarretouqualquer sanção para os Entes morosos. Assim, somente a partir de 1997 todas as unidades daFederação passaram a possuir diplomas legais instalando e regulando os Juizados Especiais.

No início, poucos órgãos foram criados no Brasil, e, mesmo assim, a maioria deles era“adjunto”, ou seja, era uma vara comum que se desdobrava no papel de Juizado, ou, ainda, fruto da“transformação” ou “reidentificação” dos antigos Juizados de Pequenas Causas ou de Varas Cíveis.Com o passar do tempo, premidos pelo aumento significativo na demanda, os Juizados adjuntosforam sendo transformados em verdadeiros Juizados Especiais e foram criados novos órgãos, paramelhor atender às suas funções. Em boa parte do País, entretanto, a oferta do serviço fica muitoaquém das necessidades da população, não apenas no que diz respeito ao número de Juizados, mastambém à sua estrutura e localização.12

A aplicação subsidiária do CPC à Lei 9.099/1995

Não há, na parte cível, um dispositivo genérico, determinando a aplicação subsidiária do CPCà Lei 9.099/1995, como se verifica na parte penal, em relação ao CPP (art. 92). Somente noregulamento do procedimento executório é que a Lei dos Juizados Especiais menciona expressamente

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a aplicação do CPC (arts. 52 e 53). No entanto, apesar da omissão, tal aplicabilidade é impositiva,não apenas por ser a Lei 9.099/1995 uma lei especial (art. 1.046, § 2º, do CPC), mas também pelaabsoluta inviabilidade do funcionamento dos Juizados Especiais sem o CPC.13 Não obstante, existemrespeitáveis vozes, ao nosso sentir equivocadas, que defendem que não haveria aplicação subsidiáriado CPC à Lei dos Juizados Especiais.14

Importante destacar que o Novo Código busca construir modelo cooperativo de processo, deíndole constitucional, voltado a preservar as garantias processuais das partes e aprimorar aqualidade da prestação da tutela jurisdicional. O seu texto traz inúmeros princípios e diretrizes quepromovem a consolidação do caráter plural, seguro, participativo, eficiente e democrático doprocesso, de modo que essas características fundamentais devem ser aplicadas ao Sistema dosJuizados, para que essa estrutura não fique dissonante dos demais componentes do Poder Judiciáriobrasileiro.

O PAPEL DA LEI 9.099/1995 NO “SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS”

A primeira referência à expressão “Sistema dos Juizados Especiais”, ainda na vigência da Lei7.244/1984, foi, provavelmente, de Rogério Lauria Tucci.15 Tal conceito, entretanto, somente foiincorporado ao direito positivo com a edição da Lei 9.099/1995, que dispôs no seu art. 93 que a “LeiEstadual disporá sobre o Sistema de Juizados Especiais Cíveis e Criminais, sua organização,composição e competência”.

Não obstante, apesar de o termo “Sistema” ter assento legal, o debate em torno do seu conteúdosempre passou ao largo dessa circunstância. De fato, somente com a sua inclusão no art. 1º da Lei12.153/2009, que trata dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, é que a questão passou a termaior relevo. In verbis:

“Art. 1º Os Juizados Especiais da Fazenda Pública, órgãos da justiça comum e integrantes doSistema dos Juizados Especiais, serão criados pela União, no Distrito Federal e nosTerritórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causasde sua competência.Parágrafo único. O Sistema dos Juizados Especiais dos Estados e do Distrito Federal éformado pelos Juizados Especiais Cíveis, Juizados Especiais Criminais e Juizados Especiaisda Fazenda Pública”.

Destarte, surgiu o debate nos meios jurídicos sobre o que seria o “Sistema dos JuizadosEspeciais” previsto na lei. Numa simplificação do debate, marcado por significativa dispersãoterminológica, é possível identificar três correntes de pensamento sobre o sentido da expressão“Sistema dos Juizados Especiais”.

A primeira possibilidade seria afirmar que a previsão contida na Lei dos Juizados Fazendáriosteria consagrado a chamada Teoria do Estatuto dos Juizados. Essa percepção sustenta o diálogo

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constante entre os três diplomas legais versantes sobre a matéria – Leis 9.099/1995, 10.259/2001 e12.153/2009 –, que formariam assim o arcabouço normativo dos Juizados Especiais,16 tal comoocorre na integração entre a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.247/1985) e o Código de Defesa doConsumidor (Lei 8.078/1990), no chamado de Estatuto das Ações Coletivas.

Com a Teoria do Estatuto, galgada na técnica do diálogo das fontes,17 seria possível superar avisão clássica da hermenêutica jurídica, promovendo uma interpretação legal sistemática (entre asLeis 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009) e focada na efetividade dos institutos, à luz das regrasconstitucionais. No modelo tradicional de interpretação, a integração entre os modelos de Juizadosse limita aos casos lacunosos e às remissões expressas na lei. Esta parece ser, claramente, a opçãodo legislador, que estabeleceu em diferentes passagens a aplicação subsidiária e pontual das regrasrelativas aos integrantes do sistema: arts. 1º e 20 da Lei dos JEF e 15, 26 e 27 da Lei dos JEFP. Arepresentação gráfica dessas duas formas de interpretação das regras dos Juizados Especiais seria aseguinte:

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Embora bastante louvável e afinada com o que há de mais moderno na ciência jurídica, porquebrar padrões de interpretação muito arraigados em nossa cultura jurídica, a tese do Estatuto dosJuizados não tem sido acolhida pela maioria dos estudiosos sobre os Juizados Especiais. É muitodifícil, num país de tradição positivista, defender que uma interpretação pode ser feita não pelaordem cronológica da lei ou pela sua natureza especial ou geral, mas pelos seus resultados, dentro deum contexto lógico e submisso aos comandos constitucionais.18

Ademais, a Lei 12.153/2009 é clara, no parágrafo único do seu art. 1º, ao afirmar que osintegrantes do “Sistema” nos Estados e no Distrito Federal são os Juizados Especiais Cíveis, osJuizados Especiais Criminais e os Juizados Especiais Fazendários, deixando de fora os JuizadosEspeciais Federais.19 Além disso, o art. 27 dispõe que o CPC, a Lei dos Juizados Especiais Cíveis ea Lei dos Juizados Federais são aplicados subsidiariamente, bem como faz referências específicas àLei 9.099/1995, no seu art. 15. De acordo com Alexandre Freitas Câmara,20 entretanto,independentemente do conteúdo dos mencionados dispositivos, já seria possível afirmar a existênciade um “Estatuto dos Juizados”, formado pela integração das Leis 9.099/1995, 10.259/2001 e12.153/2009. Essa é, pois, a nossa posição.

A segunda possibilidade seria dizer que a expressão “Sistema” teria consagrado outra teoria,bem mais antiga, chamada “Microssistema dos Juizados”. Apesar de bastante equívoca, com os maisdiferentes significados, a palavra “Microssistema” é utilizada por boa parte dos doutrinadores pararepresentar a autonomia, dentro da estrutura judiciária, dos Juizados Especiais. Segundo essavertente, os Juizados seriam um componente “separado” da estrutura judiciária, no sentido de quesuas decisões não estariam sujeitas a recursos e impugnações dirigidos a outros órgãos.21 Para essateoria, por exemplo, as decisões proferidas no âmbito dos Juizados não estariam sujeitas nem mesmoa recurso extraordinário.

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A toda evidência, não foi o desiderato da lei sufragar a Teoria do Microssistema. Antes mesmoda edição da Lei 12.153/2009, essa teoria já havia sido refutada pela doutrina e jurisprudência,exatamente por representar um estorvo dentro do ordenamento jurídico, além de limitar,irrazoavelmente, o acesso à justiça e o próprio funcionamento do Poder Judiciário. Não há, de fato,como sustentar que um Juizado Especial possa proferir decisões inconstitucionais e, ainda assim,ficar fora do controle dos órgãos de cúpula da esfera judicial. Nesse diapasão, foram editadosenunciados pelo STF afirmando o cabimento do recurso extraordinário (Súmula 640) e do agravocontra a decisão que não o admite (Súmula 727). A própria Lei dos Juizados Especiais Federais, de2001, já assentava a colocação do instituto na estrutura judiciária, ao expressamente tratar dainteração dos Juizados com o STJ e o STF (arts. 14 e 15). Interação esta que, registre-se, foi repetidana Lei 12.153/2009 (arts. 19, 20 e 21). Por todos esses motivos, não é possível emprestar aovocábulo “Sistema” o caráter de autonomia apregoado pelos defensores da Teoria do Microssistema.

Na esteira do que foi dito, o significado que vem sendo mais difundido para o termo “Sistemados Juizados” é o de “Estrutura Administrativa”, ou seja, de uma organização administrativo-judicial. Em síntese, a previsão do “Sistema” seria um comando para que os Tribunais do Paísadotassem, na instalação dos seus Juizados Especiais (Cíveis, Criminais e Fazendários), uma posturacoordenada e simétrica. Consoante, os Juizados devem ter a mesma lógica de funcionamentoestrutural, os integrantes (juízes e serventuários) devem ser preferencialmente removidos para outrosJuizados, as experiências bem-sucedidas devem ser compartilhadas, os encontros de trabalho epesquisa devem abordar todas as matérias, o treinamento dos conciliadores e juízes leigos deveseguir diretrizes comuns etc.

Apesar de ter um propósito louvável, entendemos que a visão orgânica da palavra “Sistema”não contribui para a busca de soluções para as questões jurídicas de seu funcionamento. Por isso,sem refutar o seu aspecto administrativo, defendemos mais uma vez a chamada Teoria do Estatuto.

É preciso ressaltar ainda que a previsão de um “Sistema”, qualquer que seja o seu sentido,retrata não apenas um avanço significativo no reconhecimento da importância e da peculiaridade dosJuizados Especiais, mas também na adoção de um modelo mais racional e coerente defuncionamento. Não se pode conceber a coexistência de dois Juizados, no mesmo seguimentojudiciário, com filosofias diferentes e sem sintonia.

Outro aspecto a ser sublinhado é que a espinha dorsal do “Sistema dos Juizados Especiais” é aLei 9.099/1995. Isso porque as leis que criaram os Juizados Federais e os Juizados Fazendários sãoincapazes de, isoladamente, regular os seus modelos. Ambos os textos, que são muito similares entresi, precisam visceralmente da estrutura criada pelos Juizados Especiais Cíveis para poderemfuncionar. O art. 1º da Lei 10.259/2001, por exemplo, diz que são “instituídos os Juizados EspeciaisCíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, odisposto na Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995”.

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De fato, é na Lei 9.099/1995 que se encontram os princípios fundamentais (arts. 2º e 13), asregras de interpretação (arts. 5º e 6º), a estrutura procedimental (arts. 21 e seguintes) e o sistemarecursal (arts. 41 e seguintes), entre outros comandos, de modo que toda interpretação feita sobre osJuizados Federais e os Juizados Fazendários deve necessariamente partir das regras contidas na Lei9.099/1995. Por outro lado, sempre que possível, os dispositivos das Leis 10.259/2001 e12.153/2009 deverão servir de fonte para complementar o regramento previsto na Lei 9.099/1995,integrando seus dispositivos nos pontos lacunosos, por analogia, independentemente da filiaçãohermenêutica que se adote.

A NATUREZA JURÍDICA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Muito se discutiu e ainda se discute sobre o que teria sido criado sob o nome de “JuizadosEspeciais”. Com efeito, objetivamente, os Juizados Especiais são uma estrutura que agrega órgãosjudiciais especializados em razão do procedimento,22 componente da primeira instância da JustiçaEstadual e Distrital (varas cíveis especializadas). Sobre essa definição, entretanto, duas colocaçõessão necessárias. Em primeiro lugar, importante esclarecer que, infelizmente, o legislador deu omesmo nome tanto à estrutura, como ao órgão que faz o primeiro grau de jurisdição.23 Com efeito, osJuizados Especiais representam o conjunto estruturado e integrado de órgãos judiciais que realizam oprimeiro grau (Juizado Especial) e o segundo grau (Turma Recursal) de jurisdição das causassubmetidas à Lei 9.099/1995. Assim, vistos em conjunto, Juizado Especial e Turma Recursal, fazemparte, com atribuições próprias, de uma mesma estrutura judicial, chamada de Juizados Especiais:24

Em segundo lugar, necessário frisar que apesar de desempenharem funções tipicamenteexercidas pelos órgãos fracionários dos tribunais, as Turmas Recursais não se confundem com eles,nem os integram.25 Com efeito, a divisão do Poder Judiciário em instâncias segue um padrãoadministrativo, sendo a primeira instância formada por juízes de direito, e a segunda, por tribunais(art. 92 da CF). Assim, como são formadas na sua totalidade por juízes de direito (art. 41, § 1º), asTurmas Recursais são órgãos judiciais de primeira instância (varas cíveis especializadas), emboratenham a atribuição de realizar o segundo grau de jurisdição (revisão da decisão proferida sobre acausa).26 Essa constatação, entretanto, não era pacífica quando da edição da Lei 9.099/1995. De fato,chegou-se a acreditar que os Juizados Especiais teriam criado um novo modelo de tribunal. Se issofosse verdade, o modelo seria inconstitucional, uma vez que o art. 96, II, c, da CF, atribuiprivativamente ao STF e aos Tribunais Superiores a iniciativa de projeto de lei para a criação detribunais inferiores. Dessa forma, o projeto de lei para criação dos Juizados Especiais, encaminhadoao Congresso Nacional pelo Poder Executivo, seria formalmente inconstitucional, por vício de

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iniciativa. No entanto, tal entendimento não vingou por estar dissociado da realidade técnica dodiploma legal.27

O CONCEITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Para se chegar a um conceito dos Juizados Especiais (conjunto de órgãos) é necessário alinharalguns elementos relativos ao instituto: a) o assento constitucional do instituto (art. 98, I, da CF) e asua inserção no Sistema dos Juizados Especiais (art. 1º, parágrafo único, da Lei 12.153/2009); b) aprevisão expressa de princípios fundamentais (arts. 2º, 5º e 13); c) o foco na promoção dacomposição não apenas das causas previstas na Lei 9.099/1995, mas também daquelas decorrentesdo acerto entre as partes (art. 3º, § 3º) e daquelas definidas pelo legislador regional (art. 58); d) adefinição da competência para julgamento das causas enquadradas como de menor complexidade ede pequeno valor (arts. 3º e 8º); e) a definição da competência para execução dos seus julgados (arts.3º, § 1º, I, e 52) e dos títulos executivos extrajudiciais no valor de até 40 salários mínimos (arts. 3º, §1º, II, e 53); f) a previsão de um sistema recursal próprio (arts. 41 a 46 e 48 a 50); e g) a previsão deritos específicos, sumarizados e orais (arts. 14 e seguintes e art. 53).

Assim, reunindo todas essas informações, podemos conceituar os Juizados Especiais Cíveiscomo o conjunto de órgãos judiciais, com assento constitucional e integrante do Sistema dos JuizadosEspeciais, estruturado para promover a composição e o julgamento das causas cíveis de menorcomplexidade e de pequeno valor, por meio de princípios e procedimentos específicos, previstos naLei 9.099/1995.

É muito tênue e controvertida a distinção entre regras processuais, procedimentais e deorganização judiciária. Numa apertada síntese, utilizando a classificação proposta por AdaPellegrini Grinover e outros, Teoria geral do processo, p. 82, pode-se dizer que as regrasprocessuais em sentido restrito regulam o processo como tal, atribuindo poderes e deveresprocessuais (tratando de temas como jurisdição, ação, competência, partes, atos etc.), enquanto asregras procedimentais dizem respeito apenas ao modus procedendi, inclusive a estrutura ecoordenação dos atos processuais que compõem o processo (ritos processuais). Finalmente, asregras de organização judiciária tratam primordialmente da criação e estrutura dos órgãosjudiciários e seus auxiliares. Tal diferenciação é muito importante, na medida em que aConstituição estabelece que o direito processual deve ser regulado pela União (art. 22, I) e que odireito procedimental e o de organização judiciária devem ser tratados pelos Estados (arts. 24, XI,e 125) e, na Justiça Federal e Distrital, pela União.Nesse sentido, Ada Pellegrini Grinover et al., Teoria Geral do Processo, p. 194; Michel Temer,Elementos de Direito Constitucional, p. 177; Cinthia Robert, Acesso à justiça: manual deorganização judiciária, p. 81; Vicente Greco Filho, Direito Processual Civil Brasileiro, v. I, p.196; e Eduardo Arruda Alvim, Curso de Direito Processual Civil, v. I, p. 259.

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Defendendo a criação dos Juizados Especiais na Justiça Federal com base exclusivamente na Lei9.099/1995, podem-se citar Pestana de Aguiar, Juizados especiais cíveis e criminais: teoria eprática, p. 43; Julio Fabbrini Mirabete, Juizados especiais criminais, p. 17; Fábio Bittencourt daRosa, Juizados especiais de pequenas causas da Justiça Federal, Walter Nunes da Silva Júnior,Juizados especiais na Justiça Federal; e William Douglas Resinente dos Santos, Os juizadosespeciais federais.Sobre as prerrogativas dos entes públicos em juízo, confira-se, por todos, Leonardo José Carneiroda Cunha, A Fazenda Pública em juízo.Posteriormente, a EC 45/2004 acrescentou um novo parágrafo ao art. 98 da CF e transferiu oconteúdo do mencionado parágrafo único para o parágrafo primeiro.Posteriormente, esse dispositivo foi alterado pela EC 62/2009, passando a dispor da seguinteredação: “§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não seaplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendasreferidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado”. Essa modificação foiacompanhada de outros pequenos ajustes na legislação infraconstitucional. Por exemplo, em 2001,o art. 475 do CPC/1973 foi alterado (Lei 10.352), para dispensar o reexame necessário dassentenças proferidas contra a Fazenda Pública até o limite de 60 salários mínimos.Por todos, veja-se Alexandre Freitas Câmara, Juizados especiais cíveis estaduais, federais e daFazenda Pública: uma abordagem crítica, p. 12.O legislador esqueceu-se de mencionar no art. 93 da Lei 9.099/1995 o Distrito Federal, cuja lei deorganização judiciária é editada pela União. Atualmente, a organização judiciária do DistritoFederal é regulada pela Lei 11.697/2008.Nesse sentido, confira-se o seguinte aresto: “Juizados Especiais Cíveis e Criminais: definição desua competência: exigência de lei federal. Os critérios de identificação das ‘causas cíveis demenor complexidade’ e dos ‘crimes de menor potencial ofensivo’, a serem confiados aos JuizadosEspeciais, constitui matéria de Direito Processual, da competência legislativa privativa da União.Dada a distinção conceitual entre os juizados especiais e os juizados de pequenas causas (cf. STF,ADIn 1.127, cautelar, 28/9/94, Brossard), aos primeiros não se aplica o art. 24, X, daConstituição, que outorga competência concorrente ao Estado-membro para legislar sobre oprocesso perante os últimos. Consequente plausibilidade da alegação de inconstitucionalidade delei estadual que, antes da Lei Federal 9.099, outorga competência a Juizados Especiais, jáafirmada em casos concretos (HC 71.713, 26.10.94, Pleno, Pertence; HC 72.930, Galvão; HC75.308, Sanches): suspensão cautelar deferida” (STF, Pleno, ADInMC 1.807/MT, Rel. Min.Sepúlveda Pertence, j. em 23.04.1998).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 3 do FONAJE: “Lei local não poderá ampliar a competênciado Juizado Especial”. Em sentido contrário, entendendo que os Estados podem fazer estaampliação, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 31.A Lei foi publicada em 27 de setembro de 1995, logo, entrou em vigor em 27 de novembro domesmo ano.De acordo com o CNJ relativo ao ano de 2016, a maioria dos Juizados Especiais encontra-seinstalada nos grandes centros urbanos. Como bem sublinham os autores da pesquisa condensada no

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livro Cartografia da Justiça no Brasil, p. 23, o ideal seria que a estrutura judiciária fossedesenvolvida de modo a promover a sua aproximação da população em todo o território, em vezde empregar critérios como o número de eleitores ou a arrecadação tributária, como normalmenteocorre.Nesse sentido, Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes, Comentários à Leidos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, p. 57; Pestana de Aguiar, op. cit., p. 57; e HumbertoTheodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, v. III, p. 466. Vejam-se, também, oEnunciado 1.1 do CEJCA: “Há aplicação subsidiária do CPC à Lei 9.099/1995 em tudo que forcompatível com as regras específicas ou princípios norteadores do microssistema dos JuizadosEspeciais Cíveis”, e o Enunciado 161 do FONAJE: “Considerado o princípio da especialidade, oCPC/2015 somente terá aplicação ao Sistema dos Juizados Especiais nos casos de expressa eespecífica remissão ou na hipótese de compatibilidade com os critérios previstos no art. 2º da Lei9.099/1995”.Nesse sentido, defendendo a inaplicabilidade subsidiária do CPC aos Juizados Especiais, FátimaNancy Andrighi e Sidnei Agostinho Beneti, Juizados especiais cíveis e criminais, p. 32.Manual do juizado especial de pequenas causas: anotações à Lei 7.244, de 07.11.1984, p. 23.Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 375.Conforme relata Claudia Lima Marques, no livro escrito em parceria com Antonio HermanVasconcelos Benjamin e Leonardo Roscoe Bessa, Manual de direito do consumidor, p. 90, ateoria do diálogo das fontes foi desenvolvida na Alemanha pelo Professor Erik Jayme, daUniversidade de Helderberg. De acordo com a professora gaúcha, a teoria defende a interpretaçãounitária do ordenamento jurídico, por meio da “aplicação simultânea, coerente e coordenada dasplúrimas fontes legislativas, leis especiais (como o CDC, a lei de seguro-saúde) e gerais (como oCC/2002), com campos de aplicação convergentes, mas não mais iguais”. Sobre a técnica dodiálogo entre as fontes nos Juizados Especiais, veja-se Alexandre Freitas Câmara, Juizadosespeciais cíveis e federais: uma abordagem crítica, 4. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.154.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 134 do FONAJE: “As inovações introduzidas pelo art. 5º daLei 12.153/2009 não são aplicáveis aos Juizados Especiais Cíveis (Lei 9.099/1995)”.Importante sublinhar que os chamados “Juizados da Violência Doméstica” (Lei 11.340/2006) e os“Juizados Especiais Trabalhistas” (Lei 9.957/2000) não se enquadram no conceito de Juizadosdefendido neste livro.Juizados especiais cíveis estaduais, federais e da Fazenda Pública: uma abordagem crítica, p.195 e ss.Nesse sentido, veja-se: “A jurisprudência do STJ considera que as Turmas Recursais de JuizadoEspecial não são órgãos vinculados ao Tribunal de Justiça, razão pela qual o conflito entre eles éconflito ‘entre tribunal e juízes a ele não vinculados’, o que determina a competência desta Cortepara dirimi-lo, nos termos do art. 105, I, d, da Constituição” (STJ, 1ª Seção, CC 41.742/RS, Rel.Min. Teori Zavascki, j. em 09.04.2008).Em termos de organização judiciária, os órgãos judiciais podem ser divididos em dois grupos: os

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especializados e os comuns (ou residuais). Comuns são aqueles que abraçam uma generalidade deações, ao passo que especializados são aqueles que têm atribuição funcional para processar ejulgar determinadas demandas, seja em razão do procedimento, da matéria, ou simplesmente dapolítica administrativa. Assim, os órgãos componentes dos Juizados Especiais, por teremcompetência para processar e julgar somente as causas submetidas aos procedimentosestabelecidos pela Lei 9.099/1995, são caracterizados como órgãos judiciais especializados.A utilização do mesmo nome para a estrutura e para o órgão causa dificuldades em diferentesníveis. Apenas para exemplificar, a Lei 9.099/1995 diz em seu art. 41 que da sentença caberecurso “para o próprio Juizado”. Neste caso, a palavra “Juizado” diz respeito à estrutura, pois orecurso cabível contra a sentença é interposto perante o órgão de primeiro grau (Juizado), masdirigido para o órgão de segundo grau (Turma Recursal). Já ao tratar da competência territorial, oart. 4º cita o “Juizado do foro”, referindo-se ao órgão de primeiro grau.Nesse sentido, Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil moderno, p. 811.Importante esclarecer que é comum chamar o conjunto das Turmas Recursais de um Tribunal deJustiça de “Conselho Recursal”.O Tribunal do Júri, por exemplo, embora tenha esse nome, não é um verdadeiro tribunal. É umavara criminal especializada, integrante da primeira instância do Poder Judiciário, com estrutura eprocedimento próprios para julgar e processar os crimes dolosos contra a vida.Como assinalou Luis Felipe Salomão (op. cit., p. 29), “o legislador federal não criou nenhum novoórgão judiciário, tampouco alterou sua organização ou divisão. Na verdade, o legislador federaldeterminou que outros entes políticos, em prazo fixado, criassem os novos órgãos integrantes daJustiça Ordinária [...] Nos Estados, ao contrário, somente por proposta do Tribunal de Justiçalocal é que as leis estaduais poderão receber vigência. Não procede a arguição deinconstitucionalidade por vício de iniciativa, portanto”.

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3.1

3O SISTEMA PRINCIPIOLÓGICO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

CÍVEIS

OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Sem sombra de dúvidas, a Lei 7.244/1984 (Lei dos Juizados de Pequenas Causas) foi um dosprimeiros diplomas legais brasileiros a prever expressamente seus princípios (art. 2º).1 Até então,somente as Constituições e alguns Códigos tinham estabelecido princípios em seus textos. Trata-se deuma tendência ainda hoje vanguardista, baseada no principiologismo e na consagração das chamadascláusulas gerais,2 que se multiplicou ao longo do tempo3 e serviu de inspiração para a confecção doCPC/2015.4

Foi, então, esse dispositivo da Lei dos Juizados de Pequenas Causas, com pequenas alterações,que serviu de base para a redação do art. 2º da Lei 9.099/1995, cujo teor é o seguinte:

“Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade,economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou atransação”.

Uma lástima que o legislador tenha perdido uma excelente oportunidade para corrigir umaimprecisão oriunda da Lei 7.244/1984, que utilizou no seu texto a expressão “critérios”. Oralidade,simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade são, a toda evidência, princípiosfundamentais5 dos Juizados Especiais e devem ser tratados como tais para que possam cumpriradequadamente seu papel de orientação exegética.6 Os princípios citados são, eminentemente, denatureza procedimental, ou seja, se voltam para disciplinar a integração e o desenvolvimento dosprocedimentos previstos na Lei 9.099/1995. De fato, o tema central dos princípios listados é o atoprocessual, sua realização, exteriorização e seu aproveitamento. Esses princípios, entretanto, servemtambém de base para a estruturação do órgão e para definir os contornos fundamentais do instituto.

Por certo, não se pode imaginar que esses cinco princípios possam esgotar o conjuntodogmático-principiológico da Lei 9.099/1995. Princípios como contraditório, fundamentação, devidoprocesso legal e ampla defesa, dentre outros, têm aplicação cogente aos Juizados Especiais, nãoapenas pela determinação constitucional, mas também pela imposição lógica do ordenamentojurídico. O que ocorre é que os princípios arrolados no art. 2º formam um filtro que, envolvendo osistema, permitem a passagem do que é compatível com seus institutos, dentro de uma lógica deponderação de valores. A estrutura dos Juizados, portanto, não é simplesmente preenchida pelas

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demais regras processuais, mas por elas integrada. A regra hermenêutica aplicável, nesse caso, não éapenas a especialidade, mas também a compatibilidade teleológica.7

O PRINCÍPIO DA ORALIDADE

A oralidade é, seguramente, o princípio mais importante da Lei 9.099/19958 e um dos maisimportantes do sistema processual pátrio,9 fruto do contraditório participativo. Um de seus maioresdefensores, no período moderno, foi o italiano Giuseppe Chiovenda,10 que sempre lutou por umprocesso oral, ou seja, com a predominância da palavra falada sobre a palavra escrita. É precisolembrar, no entanto, que para um processo ser oral não é necessário, nem desejável, abolir a formaescrita.11 Com efeito, processo oral é aquele que oferece às partes meios eficazes para praticarem osatos processuais por meio da palavra falada, ainda que esses atos tenham que ser registrados porescrito.

Em verdade, o princípio da oralidade pressupõe a convivência harmônica da palavra escritacom a palavra falada, servindo a primeira basicamente para registrar ou subsidiar a segunda. NosJuizados Especiais, a oralidade, normalmente presente apenas na etapa instrutória, estende-se portodo o procedimento cognitivo. De fato, desde a petição inicial até a prolação da sentença, a maioriados atos pode ser praticada pela palavra falada.12 O déficit de oralidade, no entanto, está presente noprocedimento do “recurso inominado” (art. 42) e ao longo dos procedimentos executivos (arts. 52 e53). Nessas etapas, por sinal, a aplicação subsidiária do CPC acaba por impor à boa parte dos atos aforma escrita.

Por outro lado, é preciso reconhecer que no processo oral o uso da palavra falada não é, via deregra, uma imposição inderrogável. Destarte, o conteúdo do princípio da oralidade não se presta aobrigar que os atos processuais somente possam ser produzidos sob a forma oral. Na realidade, aoralidade busca estabelecer mecanismos que possibilitem o uso da palavra não escrita, faculdadeessa que, ainda assim, pode ser dispensada pelas partes, quando lhes for conveniente, ou pelo juiz,quando julgar necessário e seguro. Em algumas situações pontuais, entretanto, a oralidade éimperativa, para permitir o funcionamento do procedimento especial. É o que ocorre, por exemplo,quando o parágrafo único do art. 29 determina que a parte se manifeste imediatamente sobre osdocumentos apresentados pela parte contrária na audiência de instrução e julgamento. Nesses casos,como veremos mais adiante, se não houver uma violação ao princípio da ampla defesa, a oralidadese impõe como uma obrigação, em razão da necessidade de preservar a unidade da audiência.

É preciso reconhecer, ainda, que o compromisso com a oralidade é muito maior em relação aomagistrado do que em relação às partes. De fato, no silêncio da Lei, só pode o juiz lançar mão dasformas escritas mediante decisão fundamentada, uma vez que a oralidade está associada não apenasaos princípios fundamentais dos Juizados, mas também aos princípios constitucionais do processo.Não obstante, é preciso reconhecer que os envolvidos no procedimento especial – juízes,

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serventuários, advogados e partes – têm relutado em adotar uma postura oral, preferindo utilizar,sempre que possível, a forma escrita. Trata-se de um aspecto da nossa cultura que ainda levará anospara ser modificado, até podermos afirmar que a oralidade do processo deixou de ser um ideal parase tornar uma realidade.

De maneira geral, tomando por fulcro o pensamento precursor de Chiovenda, quatro aspectospodem ser associados ao chamado processo oral: a) a concentração dos atos processuais; b) aidentidade física do juiz; c) a irrecorribilidade (em separado) das decisões interlocutórias; e d) aimediação.

A concentração dos atos processuais

A concentração dos atos processuais representa uma decorrência lógica da oralidade, pois, setais atos forem praticados de forma escalonada ao longo do procedimento, o uso da palavra oralperde seu sentido. Com efeito, se o procedimento for muito longo, sem a documentação tradicional,quando for o momento de se proferir a sentença, elementos importantes que foram expressos pormeio da palavra falada poderão ser esquecidos. Por isso, a Lei 9.099/1995 procura estabelecer queos atos mais importantes das partes e os atos decisórios deverão ser praticados nas audiências (arts.21 a 33 e 53).

A identidade física do juiz

Para que as partes possam usar a palavra falada, é preciso garantir que o juiz que as colherficará vinculado para proferir o julgamento. Se existe a possibilidade da prática do ato por meiooral, isso pressupõe um diálogo entre os agentes. Por isso, a identidade física é um componentenecessário da oralidade. A Lei dos Juizados Especiais, apesar de não falar em momento algum naidentidade física do juiz, estabelece que o juiz deve sentenciar ao final da audiência de instrução ejulgamento (art. 28). Assim, se essa determinação for cumprida, a identidade física estaráassegurada.

A irrecorribilidade (em separado) das decisões interlocutórias

Como a oralidade pressupõe a concentração dos atos em audiência e a identidade física do juiz,seria contraproducente admitir que a impugnação das decisões interlocutórias pudesse fracionarprocedimento.13 Assim, a irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias passou a figurarcomo uma característica própria da oralidade,14 para evitar que discussões incidentais possamcomprometer a utilização da palavra falada.15 Com isso, em regra, as decisões interlocutóriasproferidas nos Juizados Especiais são tidas como irrecorríveis em separado.16

O imediatismo

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Por fim, completando o conjunto de características da oralidade, temos o imediatismo. Trata-sedo dever que tem o juiz de coletar diretamente as provas, em contato com as partes, seusrepresentantes, testemunhas e peritos, visceralmente relacionado à identidade física.17 Apesar de aestrutura da lei facilitar o imediatismo, determinando que o debate, a produção da prova e ojulgamento sejam feitos perante o juiz (art. 28), tem-se que essa garantia é seriamente comprometidapela possibilidade da condução da audiência de instrução e julgamento ser feita pelo juiz leigo (art.37).

O PRINCÍPIO DA SIMPLICIDADE

Por mais paradoxal que seja, trata-se de tarefa extremamente complicada conceituar o princípioda simplicidade. Consoante, não há parâmetros anteriores na doutrina pátria ou alienígena, até ondese saiba, sobre esse princípio, que foi inserido sem qualquer justificativa no projeto de lei queoriginou a Lei 7.244/1984 (Lei dos Juizados de Pequenas Causas) e foi repetido na Lei 9.099/1995.

Diante desse ineditismo, a maioria da doutrina tem defendido que o princípio da simplicidadenada mais é do que um desdobramento do princípio da informalidade,18 do princípio dainstrumentalidade19 ou da economia processual.20 Data venia, mas tais afirmações não têm qualquerutilidade, pois dizer que uma coisa é desdobramento da outra acaba por lhe retirar a identidade. Se asimplicidade é, de fato, um desdobramento de outros princípios, não deveria ter sido arrolada comoprincípio autônomo. Desse modo, sabendo-se que a lei não deve ter palavras inúteis, é precisoestabelecer um sentido próprio ao princípio da simplicidade, capaz de diferenciá-lo dos demaisprincípios constantes do art. 2º.

Do ponto de vista literal, temos que simplicidade, conforme ensinam os bons dicionários, é aqualidade daquilo que é simples. Portanto, parece-nos que o legislador pretendeu enfatizar que todaatividade desenvolvida nos Juizados Especiais deve ser externada de modo a ser bem compreendidapelas partes, especialmente aquelas desacompanhadas de advogado. Seria, assim, a simplicidadeuma espécie de princípio linguístico, a afastar a utilização de termos rebuscados ou técnicos, emfavor de uma melhor compreensão e participação daqueles que não têm conhecimento jurídico. Umexemplo dessa concepção é o comando contido no § 1º do art. 14 da Lei, que estabelece que apetição inicial deverá ser feita “de forma simples e em linguagem acessível”.

Nunca é demais lembrar que linguagem é poder e quem domina uma linguagem pode subjugaros outros. O Juizado, apesar de todas as suas peculiaridades, é um lugar intimidador e complexo paraa maioria das pessoas que não têm formação jurídica, assim como é um hospital para quem não émédico, ou um canteiro de obras para quem não é engenheiro. Se a pessoa, além de tudo, nãoentender o que é dito, ficará tolhida para exercer a plenitude de seus direitos. De fato, a utilização deuma linguagem “complicada” (em contraposição à linguagem “simples” apregoada pelo princípio)tem como consequência alijar as partes leigas de uma efetiva participação no processo, o que é o

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3.4

oposto do que pretende a Lei. O princípio da simplicidade seria, nessa ótica, um corolário doprincípio democrático, buscando aproximar a população e os jurisdicionados da atividade judicial.

O PRINCÍPIO DA INFORMALIDADE

Pelo sentido literal, informalidade é a qualidade daquilo que não tem forma, padrão ouestrutura. No direito, entretanto, não se pode conceber um fenômeno jurídico despido integralmentede forma, pois é ela que delimita o seu conteúdo e o diferencia dos demais fenômenos. A formarepresenta, em última instância, a própria materialização de um elemento no mundo jurídico.Consoante, a informalidade jurídica deve ser entendida como a falta de regras específicas sobre aforma de um componente do universo jurídico. Destarte, o direito brasileiro adotou a diretrizsegundo a qual as manifestações de vontade não têm forma predeterminada, exceto quando a leiassim estabelecer (arts. 104, III, e 107 do CC e 188 do CPC). Não obstante, é inegável reconhecerque a cultura jurídica nacional é profundamente impregnada pela formalidade, muitas vezes gratuita epernóstica. E o processo, como elemento integrante do universo cultural, não poderia ficar imune aisso.

Nesse contexto, o princípio da informalidade defende que os atos processuais devem serpraticados com o mínimo de formalidade possível.21 Despido de formalidades, o ato se torna maissimples, econômico e efetivo. É preciso lembrar, entretanto, que existem formas que são essenciais(integrantes do conteúdo do ato) e formas não essenciais (circunstanciais ao conteúdo do ato).Afastar formas essenciais do ato, na maioria das vezes, pode comprometer o seu conteúdo e, emdecorrência, a sua validade. Portanto, o princípio da informalidade pode ser definido como a buscapela eliminação das formas não essenciais do ato para que ele possa ser mais bem praticado.

Ressalte-se, também, a inserção na Lei 9.099/1995 de dois princípios diretamente relacionadosà informalidade: o princípio da instrumentalidade das formas (art. 13, caput) e o princípio doprejuízo (art. 13, § 1º). Este estabelece que a declaração da nulidade de um ato dependerá dademonstração do correspondente prejuízo (pas de nullité sans grief – não há nulidade sem prejuízo)e, aquele, de que o ato processual é válido, ainda que praticado de forma diversa daquela previstaem lei, desde que atinja a sua finalidade. Por certo, tais princípios não se voltam para as chamadasnulidades absolutas, que, segundo a melhor doutrina, não se convalidam.22 Esses princípios estãodirecionados para aplicação em relação às nulidades relativas ou anulabilidades e para as merasirregularidades. Assim, concatenando esses princípios, tem-se que a informalidade é a possibilidadede se prescindir das formas não essenciais do ato, para melhor atingir seus objetivos, sem causarprejuízo.

Do mesmo modo que o princípio da oralidade, o princípio da informalidade, além de orientar aaplicação da Lei, serve de fundamento para vários de seus dispositivos, como podemos divisar naestrutura da petição inicial (art. 14, § 1º), do mandado de citação (art. 18, III), da intimação (art. 19),

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da sentença (art. 38), do acórdão (art. 46), da execução (art. 52, IV, VII e VIII), entre outros.

O PRINCÍPIO DA ECONOMIA PROCESSUAL23

De acordo com Devis Echandía,24 economia processual significa “obter o maior resultado como mínimo de emprego de atividade processual”. Tirar o máximo de proveito de um processo é torná-lo efetivo, ou seja, capaz de apresentar soluções para os problemas que são a ele submetidos. Desdeo início do século XX, Guiseppe Chiovenda já falava que o processo efetivo deve dar a quem temum direito, na medida do possível, tudo aquilo e precisamente aquilo a que ele tem direito, de modoque o princípio da economia processual pode ser definido como a busca pela racionalidade dasatividades processuais, para, assim, obter o maior número de resultados com a realização do menornúmero de atos.

De fato, em diversos pontos da Lei dos Juizados Especiais encontra-se a marca da efetividade,como, por exemplo, na possibilidade de realização imediata da audiência de conciliação (art. 17), naformulação de pedido contraposto na contestação (art. 31), na previsão de intimação da sentença naprópria sessão de julgamento (art. 52, III) etc.

O PRINCÍPIO DA CELERIDADE

O processo, em geral, no que tange ao seu andamento, deve se equilibrar sobre dois valores:rapidez e segurança. Quanto mais dilatado é um procedimento, mais profunda é a atividade cognitivado julgador e maiores as possibilidades de intervenção das partes na construção da decisão final.Assim, pelo menos em tese, quanto mais durador for um processo, mais seguro ele será. Ocorre que,não raras vezes, a demora, além de não produzir uma decisão mais correta, ainda coloca em risco opróprio bem jurídico deduzido em juízo. Diante desse dilema, surge o princípio da celeridadeapregoando que, sempre que possível, os atos processuais devem ser praticados de forma a permitiruma atividade processual mais rápida e ágil. Com isso, a segurança jurídica deve ceder espaço àceleridade, quando a causa não demandar uma proteção especial do ordenamento jurídico.25

É preciso que se diga, entretanto, que a segurança jurídica não pode ser afastada sem critérios.José Joaquim Calmon de Passos, em suas palestras, costumava dizer que o princípio da celeridade,sem rédeas, é atentatório à Justiça. Na sua visão, o processo precisa ter um tempo de maturação, poisé esse tempo que respalda e legitima a decisão nele proferida. De fato, existem processos de granderepercussão pessoal e social, em que não se pode abrir mão da segurança, como, por exemplo, nasações de investigação de paternidade. Há casos, porém, em que a segurança pode ser mitigada emfavor de uma tutela jurisdicional mais rápida, na qual a falta de certeza cause menos prejuízo do quea demora. Por exemplo, nos direitos de crédito, tempo é dinheiro, e uma decisão não tão justa podeter efeito idêntico ou até melhor do que uma decisão mais justa, porém vagarosa. Os JuizadosEspeciais, por sinal, foram construídos para atuar num campo propício à celeridade, pois, com as

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limitações contidas nos arts. 3º e 8º, o procedimento fica basicamente restrito às questõespatrimoniais disponíveis. Por outro lado, como a celeridade é da essência do procedimento, o autor,ao optar por essa via excepcional, implicitamente está abrindo mão da segurança jurídica que teriano juízo comum, em prol da presteza na resposta jurisdicional.

Nesse passo, importante salientar que não se pode confundir o princípio da celeridade com oprincípio da duração razoável do processo,26 apesar de ambos versarem sobre o mesmo tema: otempo processual.27 A duração razoável do processo, conceito mais amplo, determina que toda aatividade judicial, do início até o fim, seja feita no menor tempo possível, atendendo aos interessesem jogo e promovendo uma solução justa para a causa. Destarte, o princípio da duração razoávelrepresentaria o direito das partes de ver o mérito da causa julgado, incluindo a atividadesatisfativa,28 no menor espaço de tempo possível.29

A celeridade, por seu turno, é aferida permanentemente, ao longo do procedimento judicial, emrelação ao tempo em que os atos processuais produzem seus efeitos. Com isso, um mesmo processopode alternar momentos de celeridade e morosidade, conforme os seus atos vão sendo praticados.Exemplificando, imaginemos um processo em que o juiz deferiu no seu primeiro mês de tramitaçãouma tutela antecipada e, dez anos depois, a revogou, ao proferir uma sentença de improcedência. Odeferimento da tutela antecipada foi, inegavelmente, célere, mas o processo não teve uma duraçãorazoável, especialmente para o réu, que teve que suportar durante anos uma decisão que ao final semostrou equivocada.

Podemos, portanto, conceituar o princípio da celeridade como o comando normativo para quetodos os envolvidos no processo – partes, juízo, auxiliares etc. – atuem para que os atos processuaisproduzam seus efeitos o mais rapidamente possível.

A DIRETRIZ DA BUSCA PELA AUTOCOMPOSIÇÃO

A parte final do art. 2º da Lei 9.099/1995 faz menção expressa à conciliação e à transaçãocomo elementos norteadores dos Juizados Especiais. Tal previsão pode ser creditada, em boa parte,aos resultados positivos obtidos pelas experiências conciliatórias informais realizadas no final dadécada de 1970 e início da década de 1980.30 Ainda assim, a referência se mostrou à frente do seutempo, por antecipar um movimento de busca pela solução compositiva para os conflitos trazidos aoJudiciário, que somente ganharia força nas décadas seguintes.

Apenas para exemplificar, mais de 15 anos depois da edição da Lei 9.099/1995, o CNJ editou aResolução 125 para instituir políticas públicas de tratamento adequado dos conflitos. Maisrecentemente, essa vertente foi significativamente aprofundada com a edição do CPC/2015 (arts. 3º31

e 165 a 175) e da Lei 13.140/2015 (Lei de Mediação). De modo que, na nossa visão, o regime deautocomposição nos Juizados Especiais passou a ser integrado não apenas pela conciliação, mastambém pela mediação judicial.32

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Na atualidade, entretanto, a transação tem sido vista como uma modalidade específica deconciliação. Nessa linha de pensamento, a transação seria uma composição marcada pela ocorrênciade concessões mútuas entre as partes, enquanto a conciliação, mais abrangente, representaria toda equalquer forma de entendimento, ainda que uma parte se submeta integralmente à vontade da outra,33

seja pela desistência do pedido formulado pelo autor ou pelo reconhecimento da procedência dopedido pelo réu.

No caso da mediação, a busca da composição é conduzida por um terceiro imparcial, chamadode mediador, que auxilia as partes a restabelecer o diálogo e a construir um entendimento sobre aquestão.34 É importante sublinhar essa distinção, pois a atuação do mediador não se confunde com ado conciliador, embora ambas as técnicas sejam consideradas autocompositivas e possam seraplicadas num mesmo caso.35

A arbitragem, por sua vez, também prevista pela Lei 9.099/1995 (arts. 24 ao 26), écaracterizada pela intervenção de um terceiro imparcial – o árbitro –, que recebe poderes das partesem conflito para analisar e solucionar a questão conflituosa. Diferentemente da conciliação e damediação, na arbitragem as partes em conflito têm que se submeter à solução apresentada peloárbitro.36 Por isso, a arbitragem é considerada uma técnica de heterocomposição e não está abrangidapela diretriz contida no art. 2º.

Com o objetivo de fomentar a solução adequada dos conflitos, a Lei dos Juizados Especiaispreviu a realização de audiências exclusivamente voltadas para a conciliação, tanto no procedimentocognitivo (art. 21) como no procedimento executivo fundado em título extrajudicial (art. 53, § 1º).Note-se que ambas as partes podem expressamente exceder o limite da alçada dos Juizados aocelebrar um acordo (art. 3º, § 3º). Da mesma forma, regulou com destaque a função do conciliador(art. 7º) e previu severas sanções na hipótese de as partes deixarem de comparecer à audiência deconciliação (arts. 20 e 51, § 2º). Além disso, tornou irrecorrível a sentença homologatória de acordo(art. 40) e permitiu aos interessados a possibilidade de levarem à homologação nos Juizados osacordos celebrados extrajudicialmente (art. 57).

Embora a Lei tenha previsto momentos próprios para a busca da composição dos conflitos,nada impede que em qualquer etapa do procedimento, inclusive na instância recursal, possam aspartes compor seus interesses, com a participação do julgador, que tem o dever legal de buscarsempre essa convergência (art. 139, V, do CPC). Tal qual ocorre no CPC/2015 (art. 487, III, b), acomposição homologada por sentença tem o efeito de encerrar o procedimento, com resolução domérito (art. 22, parágrafo único).

Art. 2º da Lei 7.244/1984: “O processo, perante o Juizado Especial de Pequenas Causas, orientar--se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade,

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buscando sempre que possível a conciliação das partes”.Sobre a importância das cláusulas gerais para o funcionamento do ordenamento jurídico, veja-se oartigo de Fredie Didier Jr., Cláusulas gerais processuais.São exemplos de diplomas que adotaram expressamente princípios em seus textos o Código deDefesa do Consumidor (art. 4º da Lei 8.078/1990), a Lei de Combate à ImprobidadeAdministrativa (art. 4º da Lei 8.429/1992), a Lei de Licitações (art. 3º da Lei 8.666/1993), oEstatuto do Idoso (art. 49 da Lei 10.741/2003) e a Lei sobre o Sistema Nacional de PolíticasPúblicas sobre Drogas (art. 4º da Lei 11.343/2006).Apenas nos 11 primeiros artigos do CPC de 2015 é possível contar, ao menos, 15 princípios.Sobre a importância dos princípios na elaboração do Novo Código, veja-se Antonio Aurélio Abi-Ramia Duarte, “Os Princípios no Projeto do Novo Código de Processo Civil: visão panorâmica”,p. 47.Seguindo prestigiosa distinção traçada por José Manoel de Arruda Alvim Neto, Curso de direitoprocessual civil, p. 6, com apoio em Manzini, pode-se falar em princípios dividindo-os em duasmatrizes: princípios informativos e princípios fundamentais. Os princípios informativos sãoconsiderados verdadeiros axiomas, revestidos de universalidade e coesão, baseadoseminentemente na técnica e destituídos de conteúdo ideológico (igualdade, legalidade,razoabilidade etc.). Os princípios fundamentais, por sua vez, são fruto de opções político-jurídicas, dotados de diferentes cargas valorativas para interagir entre si e a malha legal. Por isso,a melhor classificação para os princípios elencados no art. 2º é de princípios fundamentais dosJuizados Especiais.Embora não caiba ao legislador a tarefa de doutrinar, não deixa de ser louvável a iniciativa detornar expressa a estrutura principiológica dos Juizados, notadamente num País como o nosso queainda não tem uma cultura sólida de interpretação e integração normativa fundada em princípios.Theotonio Negrão, Código de Processo Civil e legislação complementar, p. 989, e AlexandreFreitas Câmara, Juizados..., op. cit., p. 11.Sobre a importância do princípio da oralidade para o Sistema dos Juizados, consulte-se, portodos, Cristina Tereza Gaulia, Juizados especiais cíveis: o espaço do cidadão no PoderJudiciário, p. 79.Ver, sobre oralidade, os textos de Ada Pellegrini Grinover et al., op. cit., p. 67; HumbertoTheodoro Júnior, op. cit., v. I, p. 467; Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 40; e Pestana de Aguiar, op.cit., p. 35. No CPC/2015, entretanto, o princípio da oralidade somente foi previsto expressamentequando do tratamento dos princípios aplicáveis à conciliação e à mediação (art. 166).Instituições de Direito Processual Civil, v. I, p. 73. Como o próprio Chiovenda ressalta, oprocesso em seus primórdios era inteiramente verbal e com o passar do tempo foi se tornandoescrito.Importante não confundir processo oral com processo verbal. Processo verbal é aquele no qual aforma dos atos é essencialmente a palavra falada, ou seja, o próprio processo é falado. Tal tipo deprocesso só é encontrado, na atualidade, em tribos indígenas, em segmentos religiosos e emsociedades primitivas.

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São exemplos da oralidade na Lei 9.099/1995 a possibilidade de apresentação oral da petiçãoinicial (art. 14, § 3º), da contestação do réu (art. 30), da perícia (art. 35, caput), da inspeçãojudicial (art. 35, parágrafo único), do pedido executivo (art. 52, IV) e dos embargos à execução(art. 53, § 1º).Arruda Alvim Netto, Curso de Direito Processual Civil, p. 27. Sobre a origem dairrecorribilidade das decisões interlocutórias, veja-se Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 811.Sobre a irrecorribilidade das decisões interlocutórias, ver Nelson Nery Júnior, Princípiosfundamentais: teoria geral dos recursos, p. 150, e Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 40. Luiz Fux,Manual dos juizados especiais cíveis, p. 29, por seu turno, não identifica a irrecorribilidade dasdecisões como característica do princípio da oralidade.Por certo, a irrecorribilidade das decisões interlocutórias já havia sido implantada em outrossegmentos do direito processual, como se verifica na seara trabalhista (art. 893, § 1º, da CLT). Nopróprio CPC, existem situações em que a irrecorribilidade está expressamente prevista (art. 1.031,§ 2º), mas, nesses casos, não há relação com o princípio da oralidade.Como será visto mais adiante, entretanto, em situações excepcionais, a irrecorribilidade emseparado pode ser afastada, abrindo espaço para a utilização do agravo de instrumento.Julio Fabbrini Mirabete, Juizados especiais criminais, p. 23; e Humberto Theodoro Júnior,Curso..., op. cit., v. III, p. 467.Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 40; e Alexandre Freitas Câmara, Juizados..., op. cit., p. 20.Seguindo esta orientação temos Luiz Fux, Manual dos juizados especiais cíveis, p. 28; e CinthiaRobert, Acesso à justiça: manual de organização judiciária, p. 103.Sérgio Sérvulo Cunha, Dicionário compacto do direito, p. 112.A substância do processo, a nosso ver, é a relação jurídica processual, formada entre as partes e ojuízo. Assim, o formalismo do processo se materializa por meio dos atos jurídicos processuaispraticados ao longo do procedimento.Por todos, veja-se Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. I, p. 257.Apesar de o princípio da economia processual ser um componente tradicional de nossoordenamento jurídico, na atualidade a maioria dos doutrinadores prefere tratar do tema sob arubrica do princípio da efetividade, mais genérico e abrangente. Nesse sentido, Cândido RangelDinamarco, A instrumentalidade do processo, p. 310. Não por outro motivo, o CPC/2015 fala emprincípio da eficiência (art. 8º).Compendio de Derecho Procesal, p. 46, apud Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. I, p.30.José Carlos Barbosa Moreira, Temas de Direito Processual, p. 22.Apesar de ser pouco tratado, o princípio da duração razoável do processo já existia noordenamento jurídico brasileiro, inserido pelo Pacto de San José da Costa Rica (aprovado peloDecreto Legislativo 27/1992 e promulgado pelo Decreto 678/1992), que assinala que todos têmdireito a uma tutela jurisdicional prestada em tempo razoável (art. 8º, item 1º). A questão, noentanto, ganhou assento constitucional, por meio da Emenda Constitucional 45/2004, queacrescentou o inciso LXXVIII ao art. 5º da nossa Carta Magna. Diz o dispositivo que “a todos, no

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âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios quegarantam a celeridade de sua tramitação”.A maioria da doutrina, entretanto, prefere tratar os princípios como sinônimos. Nesse sentido,Fredie Didier Jr., Curso de Direito Processual Civil, v. I, p. 39.O art. 4º do CPC determina que as “partes têm o direito de obter em prazo razoável a soluçãointegral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.O CNJ, no entanto, prefere falar em duração razoável do processo tomando como referência operíodo de tempo compreendido entre a propositura da demanda e a prolação da sentença, comose pode verificar dos parâmetros contidos na chamada Meta 2. Sobre o tema, veja Marco FelixJobim, O direito à duração razoável do processo, p. 172.Sobre o tema, veja-se a introdução a este trabalho.Diz o art. 3º, § 3º, do CPC, que a “conciliação, a mediação e outros métodos de soluçãoconsensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos emembros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.Fernando Gama de Miranda Netto e Stela Tannure Leal, Tribunal multiportas e crises deidentidade: o judiciário como alternativa a si mesmo?, p. 14. Nos Juizados Especiais Federaisda 2ª Região, a aplicação da mediação vem sendo feita desde antes da entrada em vigor doCPC/2015. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 70 do FOREJEF: “Os Centros Judiciários deSolução Consensual de Conflitos, previstos no art. 9º da Resolução CJF 398/2016, podem realizara audiência do art. 11 da Lei 10.259/2001, no que concerne à conciliação e à mediação”.Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 142.A Lei de Mediação traz o seguinte conceito no parágrafo único do art. 1º: “Considera-se mediaçãoa atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceitopelas partes interessadas, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuaispara a controvérsia”. Sobre o tema, veja Tania Almeida, Samantha Pelajo e Eva Jonathan,Mediação de conflitos: para iniciantes, praticantes e docentes, p. 87.Humberto Dalla Bernardina de Pinho, Teoria geral da mediação à luz do projeto de lei e doDireito Comparado, p. 14.Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 142.

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4O CAMPO DE ATUAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Quando a Lei 9.099/1995 entrou em vigor, surgiu uma grande discussão nos meios jurídicos:seriam estes os novos Juizados Especiais ou os conhecidos Juizados de Pequenas Causas?1

Na verdade, entendemos que a referida Lei representou a união dos dois institutos (teoriadualista), ou seja, o legislador teria criado uma única estrutura com características tanto de JuizadosEspeciais (competência em razão da matéria) como de Juizados de Pequenas Causas (competênciaem razão do valor).2 Tratar-se-ia, portanto, de um único Juizado fundado em dois conceitosdiferentes: a menor complexidade e o pequeno valor.

Somos, assim, daqueles que compartilham o entendimento de que é possível processar e julgarcausas nos Juizados Especiais excedendo o valor de 40 salários mínimos, quando a competência forfixada exclusivamente em razão da matéria, nas chamadas causas de menor complexidade, previstasnos incisos II (causas submetidas ao rito sumário)3 e III (despejo para uso próprio) do caput do art.3º.4 As demais causas, entretanto, definidas pelo valor nos incisos I e IV do citado art. 3º, nãopoderiam ultrapassar o limite de 40 salários mínimos (pequenas causas).5 Vejamos, graficamente,como distribuir esses conceitos dentro da Lei 9.099/1995:

A – pequenas causas (competência em razão do valor): arts. 3º, I e § 3º, c/c 53.B – causas de menor complexidade (competência em razão da matéria): art. 3º, II e III.C – pequenas causas de menor complexidade (competência em razão do valor e da matéria):

art. 3º, IV.A + B + C = Competência dos Juizados Especiais Cíveis.

Ainda assim, em vários Estados vem predominando o entendimento de que todas as causaspropostas nos Juizados Especiais, inclusive as dos incisos II e III do art. 3º, devem se submeter aolimite de 40 salários mínimos. Com isso, os Juizados Especiais seriam verdadeiramente Juizados dePequenas Causas, com requisitos ligados à matéria, mas definidos essencialmente em razão do valor(teoria unitária).6 Argumentam os adeptos desse pensamento, numa mão, que a parte cível da Lei9.099/1995 é uma cópia da Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei 7.244/1984), e, na outra mão,

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que a interpretação conjugada do art. 3º com os arts. 15, 21 e 39 serviria para embasar a afirmaçãode que todas as competências dos Juizados Especiais estariam sujeitas ao patamar valorativo de 40salários mínimos. Na visão da teoria unitária, graficamente, teríamos o seguinte esquema:

A = pequenas causas (competência em razão do valor) – arts. 3º, I e § 3º, c/c 53.B = pequenas causas de menor complexidade (competência em razão da matéria e do valor) –

art. 3º, II, III e IV.A + B = Competência dos Juizados Especiais Cíveis.

Apesar de significativos, os fundamentos apresentados pela posição unitária devem seranalisados de forma crítica. Efetivamente, a parte cível da Lei 9.099/1995 é uma cópia, quaseintegral, da Lei 7.244/1984. Ocorre que, nos dispositivos referentes à competência, a lei nova ésignificativamente diferente. O limite valorativo saiu do caput do art. 1º da lei antiga para integrar oinciso I do art. 3º da lei vigente. Não obstante, cabe indagar: por que os incisos IV do caput e II do §1º, ambos do art. 3º, fazem referência expressa ao teto de 40 salários mínimos? Por que este inciso IIfaz referência ao inciso II do art. 275 do CPC/1973, que diz “nas causas, qualquer que seja o valor”?

A resposta é que o legislador fez a sua opção pelo sistema dualista. Como dito na introduçãodeste livro, a Carta Magna menciona, de forma distinta, os Juizados de Pequenas Causas (art. 24, X)e os Juizados Especiais (art. 98, I). Assim, se o objetivo da Lei 9.099/1995 era regular o art. 98, I,da CF, como é dito na sua exposição de motivos, a menor complexidade é que deveria ter sido atônica desse sistema, e não o valor da causa. Além disso, essa interpretação se coaduna com osescopos sociais do instituto (art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e art. 8º doCPC). O problema é que o legislador, ao fazer sua escolha pela tese dualista, deixou de adaptar osdispositivos que copiou da Lei antiga. Isso, no entanto, não representa empecilho incontornável, mas,tão somente, um esforço hermenêutico.

Para tanto, basta direcionar os dispositivos referentes à limitação valorativa para as pequenascausas previstas nos incisos I e IV do art. 3º. Dessa forma, o art. 15 (cópia do art. 16 da Lei7.244/1984), que diz que se houver pedidos conexos a soma de ambos não pode ultrapassar 40salários mínimos, o art. 21 (cópia do art. 22 da Lei 7.244/1984), que determina que as partes sejamalertadas sobre a possibilidade de renunciar à parcela que exceder o teto de 40 salários mínimos, e oart. 39 (cópia do art. 39 da Lei 7.244/1984), que taxa de ineficaz a parcela da sentença queultrapassar o valor de 40 salários mínimos, somente devem ser aplicados às pequenas causas (art. 3º,

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I e IV).Reafirmamos aqui o que já havíamos dito antes: não vemos problema no fato de o legislador

reunir numa única estrutura Juizados Especiais e Juizados de Pequenas Causas (teoria dualista).Discordamos é que a Lei 9.099/1995, voltada para regular o art. 98, I, da CF e nominada de JuizadosEspeciais, tenha vinculado todas as causas, inclusive aquelas expressamente fixadas em razão damatéria, ao teto de 40 salários mínimos. Como bem sublinhou o STJ:

“Ao regulamentar a competência conferida aos Juizados Especiais pelo art. 98, I, da CF, a Lei9.099/1995 fez uso de dois critérios distintos – quantitativo e qualitativo – para definir o quesão ‘causas cíveis de menor complexidade’. A menor complexidade que confere competênciaaos Juizados Especiais é, de regra, definida pelo valor econômico da pretensão ou pelamatéria envolvida. Exige-se, pois, a presença de apenas um desses requisitos e não a suacumulação. A exceção fica para as ações possessórias sobre bens imóveis, em relação àsquais houve expressa conjugação dos critérios de valor e matéria. Assim, salvo na hipótesedo art. 3º, IV, da Lei 9.099/1995, estabelecida a competência do Juizado Especial com basena matéria, é perfeitamente admissível que o pedido exceda o limite de 40 salários mínimos”(STJ, 3ª Turma, MC 15.465/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. em 28.04.2009).

A esse respeito, ver a introdução ao presente trabalho.Perfilando este entendimento, Alexandre Câmara, Juizados, p. 31.Importante lembrar que as causas do rito sumário do CPC/1973 permanecem em vigor, para fins decompetência dos Juizados Especiais, por expressa determinação do CPC: “Art. 1.063. Até aedição de lei específica, os juizados especiais cíveis previstos na Lei 9.099, de 26 de setembro de1995, continuam competentes para o processamento e julgamento das causas previstas no art. 275,inciso II, da Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973”.Seguindo essa linha de pensamento temos Luiz Fux, op. cit., p. 48; Humberto Theodoro Júnior,Curso..., v. III, p. 470; Cândido Rangel Dinamarco, Instituições, p. 777; e Eduardo Arruda Alvim,Direito Processual Civil, p. 581. Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 51, por sua vez, acrescenta: “Opróprio Código de Processo Civil atribuiu o rito sumário para a causa, ora em razão do valor(inciso I do artigo 275, CPC), ora tendo em conta a matéria (inciso II). E ninguém sustenta que oinciso II do artigo 275 do CPC se subordina ao inciso I, até porque um inciso não pode subordinaroutro igual”. Na jurisprudência, vejam-se, “As causas compreendidas no art. 3º, II e III, da Lei9.099/1995, não se submetem ao limite de até 40 salários mínimos, definido no inc. I, do mesmopreceito (oitava conclusão da Seção Civil do TJSC, em face da Lei 9.099/1995). Idênticoentendimento prevalecia ao tempo da vigência da Lei estadual 1.141/1993, em se tratando decausas enumeradas no art. 275, II, do CPC. Logo inarredável a competência do Juizado Especial”(TJSC, Ap. Cív. 632-Criciúma, Rel. Juiz Jânio de Souza Machado, DJ 12.06.1996). “As ações dereparação de danos decorrente de acidente de trânsito de veículo terrestre são consideradas demenor complexidade pela Lei 9.099/95, independentemente do seu valor, de tal sorte que os

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recursos delas oriundos são da competência das Colendas Turmas de Recursos Cíveis” (TJSC,Ap. Cív. 52269-Palhoça, Rel. Des. Carlos Prudência, DJ 06.06.1997).Existem, ainda, aqueles que, como Eduardo Oberg, entendem que as causas previstas no inciso IIdo art. 3º se submetem ao teto, mas aquelas elencadas no inciso III do mesmo artigo, não (Osjuizados especiais cíveis: enfrentamentos e a sua real efetividade com a construção da cidadania).Na jurisprudência, veja-se o Enunciado 58 do FONAJE: “As causas cíveis enumeradas no art.275, II, do CPC admitem condenação superior a 40 salários mínimos e sua respectiva execução, nopróprio Juizado”.Assim, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 10; Paulo Lúcio Nogueira, Juizados especiais cíveis ecriminais, p. 11; e Alfeu Bisaque Pereira, Juizados especiais cíveis: uma escolha do autor emdemandas limitadas pelo valor do pedido, ou da causa. Na jurisprudência, veja-se o Enunciado2.3.1 da CEJCA: “Todas as causas da competência dos Juizados Especiais Cíveis estão limitadasa 40 salários mínimos” e a Ementa 179 do ETRJECERJ: “O Juizado Especial não temcompetência para apreciar causas em que o valor supera o limite expresso no art. 3º da Lei9.099/1995 e naquelas de maior complexidade, a exigir produção de prova incompatível com seusprincípios norteadores. Se a lide desatende a tais pressupostos, impõe-se a extinção do processo,sem exame do mérito”.

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5.1

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e)

f)

5A COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS CÍVEIS

De acordo com a clássica lição de Chiovenda,1 a competência pode ser fixada com base emtrês critérios: objetivo (em razão do valor e da matéria), territorial e funcional. Assim, analisando aLei 9.099/1995, verifica-se que as regras sobre fixação da competência estão assim divididas:

critério objetivo: arts. 3º, 53 e 57;critério territorial: art. 4º;critério funcional: arts. 3º, § 1º, II, 41, § 1º, e 52.

O CRITÉRIO OBJETIVO

A Constituição Federal, no seu art. 98, I, determinou que fossem criados Juizados EspeciaisCíveis, competentes, para a “conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menorcomplexidade”, sem traçar qualquer parâmetro sobre o tema.2 Assim, coube ao legisladorinfraconstitucional a função de identificar as causas que poderiam ser consideradas de menorcomplexidade. A Lei 9.099/1995, então, apresentou o seguinte elenco:

causas com valor até 40 salários mínimos (art. 3º, I);causas submetidas ao procedimento sumário em razão da matéria (art. 3º, II);ação de despejo para uso próprio (art. 3º, III);ação possessória sobre bem imóvel cujo valor não exceda a 40 salários mínimos (art.3º, IV);execuções fundadas em títulos executivos extrajudiciais cujo valor não ultrapasse 40salários mínimos (arts. 3º, § 1º, II, e 53);ação de homologação dos acordos extrajudiciais, versando sobre causas submetidas àcompetência dos Juizados Especiais (art. 57).

Como se pode perceber claramente, as escolhas feitas não se pautaram pela melhor técnica. Aprimeira crítica que salta aos olhos é que o legislador se utilizou indevidamente do valor para definir

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5.1.1

a complexidade da causa. Além disso, ao escolher as ações que seriam submetidas ao rito especial,elegeu as ações de despejo para uso próprio, possessória e executiva. A ação de despejo para usopróprio é, via de regra, mais complexa do que a ação de despejo por denúncia vazia, por exemplo. Aação possessória, por sua vez, envolve questões de importante relevância jurídica e social e podedemandar atividade probatória mais dilatada e profunda. A ação de execução possui a estruturasolene e escrita do CPC (art. 53). Portanto, nesse prisma, as únicas opções tecnicamente acertadasforam aquelas contidas no inciso II do art. 3º (causas submetidas ao procedimento sumário) e no art.57 (homologação de acordos extrajudiciais).

De fato, a escolha do legislador deveria ter recaído sobre procedimentos condensados e comlimitado campo probatório, com preferência às discussões centradas em questões jurídicas,considerando as causas não apenas no plano teórico, mas também do ponto de vista prático.Felizmente, o legislador consegue minimizar o impacto das escolhas equivocadas que fez ao excluirda abrangência da Lei 9.099/1995 as “matérias de maior complexidade” (art. 3º, § 2º) e as partescom especial proteção legal (art. 8º), bem como ao limitar a atividade probatória (arts. 28, 29,parágrafo único, e 33 a 37).3

Para que se possa melhor visualizar a incidência dessas regras, podemos dividir as causassubmetidas aos Juizados Especiais em três grupos:

pequenas causas;causas de menor complexidade;pequenas causas de menor complexidade.

As pequenas causas

As pequenas causas são aquelas, de natureza cognitiva (art. 3º, I) ou executiva (arts. 3º, § 1º, II,e 53), com valor até 40 salários mínimos. Assim, num primeiro momento, todas as causas que numavara cível adotariam o rito comum (art. 318 do CPC) ou o procedimento da execução por quantiacerta, contra devedor solvente, fundada em título executivo extrajudicial (arts. 824 e seguintes doCPC), poderiam ser classificadas como pequenas causas, desde que o valor não ultrapassasse o tetode 40 salários mínimos.

Para fins dos Juizados Especiais, entretanto, a pequena causa precisa passar por outros doisfiltros, antes de poder ser objeto de processamento e julgamento. Em primeiro lugar, a causa nãopode incidir nas vedações previstas no art. 3º, § 2º, da Lei 9.099/1995. Assim, não poderão serlevadas ao Juizado as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal, fazendária, acidentária e asrelativas a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas. Todas essas hipóteses desfrutam deespecial proteção do ordenamento jurídico, incompatível com a estrutura oral prevista para osegmento. As causas de natureza alimentar estão vetadas nos Juizados Especiais independentemente

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5.1.1-A

do fundamento jurídico que as impulsione (parentesco, obrigação contratual, extracontratual etc.).4

As causas fiscais também, seja uma declaratória de inexistência de débito fiscal, uma anulatória dedébito fiscal ou uma repetição de indébito fiscal, por exemplo. Por causas de resíduos devem--seentender aquelas que tratem de disposições de última vontade, tais como a abertura ou a anulação detestamento. As causas de estado e de capacidade são as que tratam do status civilis das pessoas,como nas ações de divórcio, de destituição do poder familiar, de interdição, de declaração deausência etc.

Em segundo lugar, a pequena causa não pode exigir uma atividade probatória incompatível comas regras previstas nos arts. 33 a 36, que limitam não apenas a amplitude das provas, mas também asua profundidade. De fato, a dilação probatória sempre foi identificada como uma característica quenão se coaduna com o conceito de pequena causa.5

A distinção entre pequenas causas estaduais, federais e fazendárias

Quando entrou em vigor a Lei 10.259/2001, instituindo os Juizados Especiais Federais, duasquestões polêmicas imediatamente surgiram nos meios jurídicos, acerca da compatibilidade dessediploma com a Lei 9.099/1995. Na parte criminal, a nova Lei tratou como infrações de menorpotencial ofensivo aquelas que tivessem pena máxima igual ou inferior a dois anos (parágrafo únicodo art. 2º), enquanto a Lei 9.099/1995 estabelecia, na sua redação original, que apenas os crimescom pena máxima não superior a um ano poderiam ser rotulados como infrações de menor potencialofensivo (art. 61). Por outro lado, na parte cível, a Lei dos Juizados Especiais Federais previa comopequenas causas aquelas com valor até 60 salários mínimos, ao passo que, nos Juizados Estaduais,essas causas não poderiam ter valor superior a 40 salários mínimos (art. 3º, I). A doutrina, então,passou a discutir se a Lei dos Juizados Federais teria derrogado a alçada cível e a alçada criminal defixação da competência nos Juizados Especiais Estaduais.

No que se refere à discussão na esfera penal, a solução sufragada pela doutrina foi aderrogação tácita do art. 61 da Lei 9.099/1995.6 Assim, passaram a ser considerados infrações demenor potencial ofensivo, tanto na esfera federal como estadual, os crimes e as contravenções penaiscom pena máxima não superior a dois anos.7 No âmbito cível, entretanto, o posicionamento adotadonão seguiu a mesma lógica. Com efeito, enquanto na ciência processual penal o princípio daigualdade, no que toca ao acusado, tem contornos absolutos, sobrepondo-se, inclusive, à coisajulgada, na processualística cível a igualdade é temperada pelos interesses do Estado sobre a formade se prestar a tutela jurisdicional. Por isso, a estruturação dos procedimentos cíveis deve atender,em primeiro lugar, aos escopos do Estado na busca pela satisfação das pretensões jurídicasdeduzidas em juízo, exceto nos casos em que o objeto mediato da jurisdição tenha tratamentodiferenciado (causas de estado, relativas à Fazenda Pública, de desapropriação etc.). Tais exceções,entretanto, nos Juizados Especiais Cíveis estão excluídas pela própria Lei (arts. 3º, § 3º, e 8º), que

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5.1.1.1

tem sua competência fixada, em geral, pelo valor da causa. Destarte, sendo o valor da causa umcritério de fixação da competência de natureza objetiva, fruto da discricionariedade do legislador,sua aplicação deve ser pautada pelo interesse público, afastando, assim, eventual aplicaçãoisonômica para atender aos interesses privados. Em resumo, do ponto de vista técnico, não háqualquer problema na fixação de diferentes parâmetros para a determinação da competência emrazão do valor.8

A questão foi tão bem sedimentada que na edição da Lei dos Juizados Especiais Fazendários,que prevê a alçada cível em 60 salários mínimos (art. 2º da Lei 12.153/2009), não houve quemdefendesse a ampliação do teto valorativo dos Juizados Especiais, mesmo sabendo que os doisinstitutos pertencem ao mesmo segmento judicial e fazem parte de um mesmo “Sistema” (art. 1º daLei 12.153/2009).9 Por isso, atualmente, tem-se que as pequenas causas se dividem em dois grupos:de um lado, aquelas relativas aos Juizados em que o Estado (União, Estados, Distrito Federal eMunicípios) figura no polo passivo (subdividido em pequenas causas federais e pequenas causasfazendárias), com teto de 60 salários mínimos,10 e, do outro, as pequenas causas estaduais, aplicáveisaos Juizados Especiais, com limite de 40 salários mínimos.

Apesar de ser possível a convivência de diferentes alças para as pequenas causas, seriapositivo que a Lei 9.099/1995 fosse alterada para atribuir aos Estados e ao Distrito Federalcompetência legislativa suplementar para fixar o valor da alçada dos seus Juizados Especiais, deacordo com o seu perfil socioeconômico, respeitando um piso máximo e um piso mínimo. O pisomáximo poderia ser de 60 salários mínimos e o piso mínimo de 20 salários mínimos, por exemplo.Com efeito, não há como sustentar que uma pequena causa tenha o mesmo valor no Piauí e em SãoPaulo, com realidades econômicas tão distintas.

A renúncia à parte excedente ao limite de 40 salários mínimos

Repetindo a redação existente na Lei dos Juizados de Pequenas Causas (art. 2º, § 2º, da Lei7.244/1984), o § 3º do art. 3º da Lei 9.099/1995 estabeleceu a possibilidade de renúncia ao valorexcedente ao teto de 40 salários mínimos, para que a parte possa se utilizar dos seus procedimentos:

“Art. 3º [...] § 3º A opção pelo procedimento previsto nesta Lei importará em renúncia aocrédito excedente ao limite estabelecido neste artigo, excetuada a hipótese de conciliação”.

A renúncia a que alude o citado dispositivo pode ser expressa ou tácita, em consonância com osprincípios da informalidade e da oralidade.11 Tácita, se o autor pratica atos que demonstraminequivocamente o seu propósito de renunciar; expressa, quando se manifesta diretamente nos autos,oralmente ou por petição. Pestana de Aguiar,12 por sua vez, entende que o juiz pode, de ofício,proceder à renúncia do crédito, em razão da lógica implementada pelo art. 39 (ineficácia parcial dadecisão superior ao teto leal). Ousamos divergir dessa orientação. Se o juiz tiver dúvidas quanto à

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compreensão do autor sobre o limite da alçada, deverá instar a parte, de preferência na própriaaudiência, a se manifestar sobre a renúncia, até que ela se apresente de forma clara.13 Caso contrário,deverá encaminhar a parte para a assistência jurídica (art. 9º, § 2º) ou, sendo inviável, encerrar oprocedimento, sem resolução do mérito.

A renúncia pode ser manifestada desde a petição inicial, mas somente no início da audiência deinstrução e julgamento é que ela se concretiza, no momento em que o juiz alerta as partes sobre asimplicações do prosseguimento da causa nos Juizados Especiais (art. 21).14 Uma vez renunciadadeterminada quantia, esta não poderá ser cobrada nem nos Juizados Especiais, nem em qualqueroutro juízo, em decorrência da estabilização da manifestação de renunciar.15

Por certo, a renúncia só pode ser aplicada nas ações cuja causa seja cindível. Se a causa forindivisível, não poderá ser feita a renúncia, e o procedimento terá que ser encerrado. Assim, porexemplo, o autor pode renunciar à parte excedente numa ação de compensação por danosextrapatrimoniais, mas não pode fazer o mesmo numa ação de despejo para uso próprio (art. 3º, III).Nesta, o valor da causa é determinado de forma objetiva, obtido pela soma de 12 meses de aluguel(art. 58, III, da Lei do Inquilinato).

Merece destaque ainda o fato de que, apesar da omissão legal, a manifestação do autor em nãorenunciar ao valor excedente implica a desistência da demanda, independentemente da anuência doréu. Afasta-se, aqui, a incidência do art. 329, II, do CPC. Trata-se de uma questão lógica, pois, se adesistência da ação dependesse da concordância do réu, bastaria que ele não a aceitasse para forçaro autor a renunciar, vindicando a prescrição legal contida no art. 3º, § 3º.16

As consequências da violação das regras sobre o teto de 40 salários mínimos

Pela sistemática prevista no art. 63 do CPC, a violação de um critério centrado no valor ou noterritório gera incompetência relativa, enquanto a transgressão de uma regra firmada em razão damatéria ou da função produz incompetência absoluta. Nos Juizados Especiais, entretanto, a violaçãodas regras ratione valoris (art. 3º, caput, I e IV) tem um regime próprio. Se for ajuizada uma causacom valor superior a 40 salários mínimos, haverá incompetência absoluta se tal valor não puder serobjeto de renúncia. Assim, por exemplo, se a causa for de reintegração da posse de um apartamentoavaliado em 50 salários mínimos, não há como afastar o excedente, porque o objeto da causa(apartamento) não pode ser desmembrado. De modo que essa causa não pode ser julgada nosJuizados Especiais.

Por outro lado, se a causa tiver valor superior a 40 salários mínimos, mas comportar renúncia(art. 3º, § 3º), o autor poderá abrir mão do que superar o teto legal e prosseguir com o feito. É ocaso, por exemplo, de uma causa que, com amparo no art. 3º, I, da Lei 9.099/1995, peça 50 saláriosmínimos como compensação por um dano material sofrido. Superada a etapa de autocomposição semacordo, basta que o autor renuncie a 10 salários mínimos e a causa poderá adentrar à etapa de

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instrução e julgamento.Importante lembrar que, mesmo que o autor não renuncie ao excedente, não haverá nulidade

processual, se a causa com valor superior a 40 salários mínimos julgada nos Juizados Especiaiscomportar divisão. Neste caso, ocorrerá apenas ineficácia parcial da decisão, naquilo que superar aalçada (art. 39). Se a causa não comportar divisão, entretanto, não apenas a decisão proferida, mastodo o procedimento será nulo, por incompatível com a sistemática dos Juizados Especiais.

É preciso registrar que, na hipótese de violação do limite para o valor da causa, aincompetência somente poderá ser declarada após o término da etapa de autocomposição, pois nestaé admissível a realização de acordos acima do teto legal (art. 3º, § 3º). Dessa forma, caso não sejarealizado o acordo, se o autor não puder ou não quiser renunciar à parcela excedente ao limite de 40salários mínimos, o procedimento terá que ser encerrado, sem resolução do mérito.

As causas de menor complexidade

As causas cíveis de menor complexidade são aquelas que, fixadas em razão da matéria, possamser instruídas por meio do sistema probatório oral e informal dos Juizados, observadas asprescrições contidas no § 2º do art. 3º e no art. 8º da Lei 9.099/1995.17 São elas:

as causas do rito sumário (art. 3º, II);a ação de despejo para uso próprio (art. 3º, III);a ação de homologação de acordo extrajudicial (art. 57).

As causas do rito sumário

A remição feita pelo inciso II do art. 3º ao inciso II do art. 275 do CPC/1973 foi, certamente, oponto mais próximo que o legislador conseguiu chegar daquilo que deveria ser considerado causasde menor complexidade. De fato, a maioria das hipóteses elencadas nesse dispositivo está emsintonia com os preceitos tradicionalmente considerados para definir as causas de naturezapatrimonial, com reduzido campo probatório e pouca repercussão fora da órbita privada das partes.A exceção fica por conta da ação de cobrança ao condômino de quaisquer quantias devidas aocondomínio (art. 275, II, b, do CPC/1973). Esta hipótese, apesar de se enquadrar no conceito demenor complexidade, esbarra na exigência de que o autor tenha personalidade jurídica própria (art.8º, § 1º).

Importante frisar que, em nossa visão, somente as causas expressamente previstas no corpo doinciso II do art. 275 do CPC/1973 é que podem ser propostas nos Juizados Especiais. Assim, não seaplica ao procedimento especial a alínea g do dispositivo, que diz que o procedimento sumário seráadotado “nos demais casos previstos em lei”. De fato, deve ser feita uma interpretação restritiva dotexto, para não criar uma referência dentro de outra referência. Com efeito, várias causas fora do

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CPC que se utilizam do procedimento sumário não se enquadram no conceito de menorcomplexidade, como é o caso da usucapião coletiva (art. 14 da Lei 10.257/2001) e dadesapropriação para fins de reforma agrária (art. 2º da LC 88/1996).

Por fim, necessário registrar que as causas do rito sumário do CPC/1973 permanecem em vigor,para fins de competência dos Juizados Especiais, por expressa determinação do CPC/2015:

“Art. 1.063. Até a edição de lei específica, os juizados especiais cíveis previstos na Lei9.099, de 26 de setembro de 1995, continuam competentes para o processamento e julgamentodas causas previstas no art. 275, inciso II, da Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973”.

A ação de despejo para uso próprio

A ação de despejo para uso próprio nos Juizados Especiais, apesar da omissão do legislador,somente deverá versar sobre locações residenciais, em decorrência da interpretação sistemática dodispositivo com a estrutura da Lei 8.245/1991 (Lei do Inquilinato). Com efeito, a ação de despejopara uso próprio está regulada na Lei de Locações na Seção I, que trata da locação residencial.Portanto, não seria razoável aplicar a interpretação extensiva ao dispositivo da Lei 9.099/1995, paranele incluir as locações comerciais.

Outro aspecto a ser considerado é que parte da doutrina e da jurisprudência vem entendendoque o dispositivo não é dirigido apenas para as ações de despejo para uso próprio, “mas tambémpara uso de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente quenão disponha assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio”, emhomenagem ao princípio da isonomia, já que o inciso III do art. 47 da Lei do Inquilinato possui essaredação mais ampla.18 Tal interpretação não nos parece ser a mais adequada, pois as regras relativasà competência devem ser interpretadas restritivamente.19 Ademais, não se pode desconsiderar que aLei dos Juizados Especiais, de 1995, é posterior à atual Lei do Inquilinato, editada em 1991.20

A crítica que se faz a esse dispositivo é que a Lei elegeu, como de menor complexidade, umacausa que vincula a retomada do bem a uma situação fática condicional: a futura utilização do imóvelpela própria pessoa. Deixou-se de fora, por exemplo, a ação de despejo por denúncia vazia, que é amais simples das ações de despejo.21 Uma possível explicação para essa postura restritiva seria nãoampliar ainda mais os poderes do locador em despejar imotivadamente seu inquilino, entregando-lheum procedimento célere, oral e informal.22 Na verdade, defendemos que nenhuma das ações dedespejo poderia ser qualificada como de menor complexidade, em razão da função social que odireito de moradia desfruta no nosso ordenamento jurídico.23

Não obstante, caso o interessado resolva propor a ação de despejo para uso próprio nosJuizados Especiais, não poderá com ela cumular o pedido de cobrança de aluguéis e encargos ematraso. Tal cumulação representaria uma burla à lei, que limitou de forma expressa o cabimento daação de despejo à necessidade de locador em utilização de seu imóvel.24 Sublinhe-se, ainda, que o

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locador pode obter o despejo do locatário inadimplente no juízo comum e sobre os valores atrasadosnos Juizados Especiais, desde que tal quantia se enquadre no conceito de pequena causa (art. 3º, I).

A ação de homologação de acordo extrajudicial

Desde a primeira edição deste livro defendemos que a regra contida no art. 57 da Lei9.099/1995, por ser uma regra de natureza processual geral, deveria estar inserida no CPC. Nãoobstante, defendíamos, minoritários, a sua aplicação fora do âmbito dos Juizados.25 O problema éque, como esse comando está no meio das disposições gerais dos Juizados Especiais, existiam fortes(e infundadas) resistências à sua aplicação no juízo comum.26 Felizmente, em 2005 o legisladoracolheu a ideia e incluiu no texto do CPC/1973 uma regra análoga à prevista no citado art. 57, no seuart. 475-N, V. O CPC/2015, por sua vez, não apenas manteve a disposição, como melhorou a suaredação (art. 515, III).

De fato, o caput do art. 57 prevê a possibilidade de qualquer acordo extrajudicial, numaquestão afeta aos Juizados, de qualquer valor, ser homologado no juízo correspondente, para setransformar em título executivo judicial. Assim, a ação de homologação de composição extrajudicialpode ser apresentada nos Juizados em petição, oral ou escrita (art. 14), desde que firmada por todosos interessados. Importante ressaltar que, para a demanda ser viável, pelo menos um dos interessadosdeve ostentar os atributos para figurar como autor nos Juizados Especiais (art. 8º), de modo que umapessoa física ou uma microempresa pode levar à homologação um acordo extrajudicial celebradocom uma grande empresa, mesmo que esta não possa demandar nos Juizados Especiais. O que nãopode acontecer é o pedido de homologação de um acordo cujo objeto seja uma obrigação contraídaexclusivamente por uma pessoa física em favor de uma grande empresa.27

Trata-se de procedimento de jurisdição voluntária, o pedido de homologação deve atender àsdiretrizes gerais fixadas nos arts. 719 e seguintes do CPC, à luz das regras gerais da Lei 9.099/1995.A petição inicial, por exemplo, poderá ser feita sem advogado, quando o valor do acordo for igual ouinferior a 20 salários mínimos (art. 9º). Assim, apresentado o pedido, o ajuste será homologado deplano, salvo se o juiz entender por bem determinar a realização de uma audiência, para sanar algumadúvida ou para ratificar os seus termos.28 A sentença que homologa o acordo deve ser líquida (art.38, parágrafo único) e não estará sujeita a recurso (art. 41). No caso de descumprimento doacordado, a execução será processada nos próprios autos, na forma do art. 52.

As pequenas causas de menor complexidade

A última hipótese de competência afeta aos Juizados Especiais diz respeito às açõespossessórias (reintegração, manutenção ou interdito proibitório – arts. 554 e seguintes do CPC)sobre bens imóveis no valor de até 40 salários mínimos. Trata-se de um caso de competência mista,ou seja, fixada em razão do valor (40 salários mínimos) e da matéria (posse), que não se enquadra

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adequadamente no conceito de menor complexidade. De fato, a posse de um bem imóvel temrelevante valor social e está usualmente relacionado com o direito de habitação. Ademais, a questãopossessória pode exigir uma dilação probatória incompatível com as características dos JuizadosEspeciais. Por isso, entendemos que, embora a Lei tenha procurado privilegiar o acesso à justiçapara as camadas mais carentes da população, o dispositivo do art. 3º, IV, da Lei 9.099/1995 viola ocomando constitucional do art. 98, I, da CF.

Ainda assim, caso se dê eficácia ao indigitado dispositivo, cabe ressaltar que o procedimento aser adotado é o sumaríssimo da Lei 9.099/1995 (rito sem a liminar possessória prevista no art. 558,parágrafo único, do CPC),29 sujeito às disposições gerais previstas pelo Código, compatíveis com osistema: a fungibilidade entre os procedimentos possessórios (art. 554 do CPC), a cumulação depedidos (art. 555 do CPC) e a proibição da discussão sobre domínio (art. 557 do CPC). Asdisposições sobre duplicidade do procedimento possessório (art. 556 do CPC), por sua vez, devemser interpretadas à luz das regras previstas na Lei 9.099/1995 para a formulação do pedidocontraposto (art. 31).

O CRITÉRIO TERRITORIAL

Trata o art. 4º dos critérios para fixação da competência em razão do território (ratione loci).Analisando o seu conteúdo, podemos dividi-lo em três partes:

o domicílio do réu (inciso I);o local onde a obrigação deva ser satisfeita (inciso II);o domicílio do autor ou do local do ato ou fato nos casos de indenização de qualquernatureza (inciso III).

O foro do domicílio do réu

O inciso I do art. 4º, reproduzindo tradicional regra processual (art. 46 do CPC), permite oajuizamento da demanda no foro do domicílio do réu. Esse dispositivo, entretanto, traz duasinovações em relação ao art. 46 do CPC. Em primeiro lugar, a utilização do domicílio do réu parafixação da competência nos Juizados Especiais se coloca como regra geral, incidente em todas ascausas previstas pela Lei (parágrafo único do art. 4º), inclusive em sede de execução (art. 53). Noregime do CPC, a regra do domicílio do réu somente pode ser aplicada nas ações pessoais ou reaissobre bens móveis, se não houver regra especial. Outra novidade introduzida pela Lei 9.099/1995 éo conceito de domicílio do réu, que foi consideravelmente ampliado, tendo em vista, inclusive, asdisposições pertinentes ao tema contidas no Código Civil (arts. 70 a 78). De fato, prevê o citadodispositivo que o domicílio do réu será considerado também no “local onde aquele exerça atividadesprofissionais ou econômicas ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou escritório”.

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Com isso, é possível demandar o réu no seu local habitual de trabalho, em se tratando de pessoafísica, e, ser for pessoa jurídica, na sua sede, filial ou representação.

Em relação à pessoa física, a possibilidade de demandar em seu local de trabalho é aplicável,ainda que a atividade profissional que determinou a competência não esteja relacionada ao objeto dademanda.30 Também é de salientar que o exercício a que se refere o dispositivo está atrelado a umlocal de referência da atividade profissional ou econômica, e não aos locais onde esse exercícioocorre. Assim, por exemplo, não é possível fixar territorialmente a competência de uma demanda emface de um taxista pelos locais por onde ele passa, mas é possível fazê-lo no seu ponto de praça ouna sua garagem.

Um tema polêmico diz respeito à possibilidade da aplicação da regra contida no parágrafoúnico do art. 4º às ações de despejo para uso próprio (art. 3º, III) ou às ações possessórias (art. 3º,IV), quando o domicílio do réu for num lugar diferente de onde se localiza o imóvel objeto dedisputa. Isso porque, conforme estabelece o art. 47 do CPC, nas ações reais a competência territorialé do lugar onde o imóvel se situa (forum rei sitae). Trata-se de regra de competência territorialabsoluta. Ainda assim, defendemos que a regra prevista no parágrafo único do art. 4º é aplicável atodas as causas, mesmo que referentes a direitos reais, por conta da sua natureza especial.

Outro assunto controvertido é a exigência que tem sido feita de que a demanda seja proposta nodomicílio do autor, no lugar onde a obrigação deva ser cumprida ou no lugar onde o serviço deva serprestado, quando o réu, pessoa jurídica, tiver diversos endereços no território da unidade judiciária.O objetivo desse entendimento é evitar que o autor, ao aplicar o parágrafo único do art. 4º, possaescolher o juízo onde vai demandar, violando o princípio do juiz natural.31 Com o devido respeito,mas tal exigência carece de base legal e promove uma indevida restrição ao acesso à justiça. Narealidade, toda vez que o autor tem diante de si a possibilidade de ajuizar a demanda em mais de umforo, ele estará escolhendo o juízo onde vai demandar. Essa escolha, no entanto, não importa emviolação ao princípio do juiz natural, exatamente porque prevista em lei. Portanto, do ponto de vistatécnico, não há como se sustentar tal limitação.

As questões subjacentes a esse debate técnico, no entanto, dizem respeito a outros fatores, quenão propriamente aqueles ligados ao princípio do juiz natural. Com efeito, alguns Juizados, porserem mais acessíveis aos jurisdicionados ou seus advogados, acabam recebendo um volume maiorde demandas que outros Juizados. Além disso, é comum, na prática forense, constatar que existemdeterminados Juizados que não aplicam o dano moral em situações típicas de lesão, que nãoreconhecem as sanções pedagógico-puni-tivas, que não deferem tutelas de urgência etc. EssesJuizados acabam sendo “evitados” pelos demandantes, gerando um desequilíbrio na distribuição defeitos entre os órgãos judiciais. Esses elementos, no entanto, não legitimam a limitação daprerrogativa legal prevista no parágrafo único do art. 4º, cujo escopo é exatamente ampliar o acessoà justiça. Ademais, se todos os Juizados tivessem o mesmo nível de acessibilidade e aplicassem a leide maneira uniforme, como apregoa o art. 926 do CPC, raramente seria verificada a migração do

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jurisdicionados. O que deve ser atacado são as causas do problema (dissídio jurisprudencial e faltade estrutura material, por exemplo), e não as suas consequências.

Por fim, importante frisar que as disposições contidas nos parágrafos do art. 46 do CPC sãoaplicáveis, subsidiariamente, aos Juizados Especiais, quando o réu tiver mais de um domicílio, seudomicílio for desconhecido, incerto ou fora do País, ou ainda quando houver mais de um réu.

O foro do local onde a obrigação deve ser cumprida

Traz o inciso II a regra segundo a qual, nos casos em que se busca a satisfação de umaobrigação, a competência é do foro do local onde a obrigação deve ser cumprida. Trata-se dedispositivo idêntico ao existente no art. 53, III, d, do CPC. Essa regra, entretanto, deve ser entendidade acordo com os preceitos fixados no art. 62 do CPC, que faz a ressalva quanto à convenção daspartes, à disposição da lei e à natureza da obrigação ou suas circunstâncias. Não obstante, se aobrigação puder ser cumprida em dois ou mais foros diferentes e a escolha couber ao credor, a açãopoderá ser ajuizada em qualquer uma das localidades. Caso contrário, recaindo a escolha sobre odevedor, deverá o autor lançar mão da regra geral do domicílio do réu, se não quiser provocá-lo aexercer sua escolha.

O foro do domicílio do autor ou o local onde ocorreu o fato danoso, nas ações deindenização

O inciso III do art. 4º da Lei 9.099/1995 ampliou consideravelmente a regra similar existenteno CPC. De acordo com o art. 53, IV, do CPC, nas ações de indenização, a competência é do juízo dolugar do ato ou fato, exceto no caso do dano sofrido em razão de delito ou acidente de veículos,quando então também será competente o foro do domicílio do autor (art. 53, V, do CPC). Portanto,enquanto no sistema comum a competência territorial depende da natureza das ações de reparação dedano, nos Juizados Especiais todas as ações indenizatórias podem ser propostas no domicílio doautor32 ou do local onde ocorreu o fato danoso.33 Essa regra vai ao encontro do preceito previsto peloart. 101, I, do Código de Defesa do Consumidor,34 que, a partir da noção de hipossuficiência, buscareequilibrar a situação processual das partes, criando vantagens para aqueles que estão em situaçãode vulnerabilidade. No caso da Lei 9.099/1995, verifica-se que aquele que busca uma indenizaçãode pequena monta, independentemente de suas características pessoais, provavelmente não teriacondições ou interesse em processá-la fora de seu domicílio. Assim, o dispositivo funciona como umverdadeiro facilitador do acesso à justiça, redirecionando ao réu o ônus de se defender no domicílioda parte adversa.

Em geral, quando demandando contra empresas e pessoas físicas com recursos, a regra é justa epromove um nivelamento das partes. Em determinadas hipóteses, entretanto, o comando podeinviabilizar o exercício do direito de defesa do réu, tanto do ponto de vista econômico como

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jurídico. Imagine-se uma ação de indenização movida no Rio de Janeiro em face de uma pessoaidosa e humilde, por conta de uma discussão de trânsito ocorrida em Olinda, onde ela mora. Essapessoa não apenas teria que despender uma significativa soma de dinheiro para se defender ecomparecer às audiências, como também teria que levar as provas a serem produzidas até o Juizado.Assim, necessário que se afirme que, em determinadas situações excepcionais, a causa não poderáser processada nos Juizados Especiais se a parte ré demonstrar que não terá condições para sedefender adequadamente da demanda. Nesse caso, o ideal será encerrar o procedimento, semresolução do mérito (art. 51, II).

O foro de eleição

De acordo com o caput do art. 63 do CPC, o foro de eleição retrata a possibilidade de aspartes, dentro de um negócio jurídico, fixarem territorialmente o juízo que irá resolver as discussõesdele decorrentes por meio de uma convenção processual. O problema é que o foro de eleição é uminstituto ligado à competência territorial relativa. Assim, como a maioria da jurisprudência entendeque a incompetência territorial nos Juizados Especiais é absoluta, não haveria espaço para o foro deeleição no seu âmbito. Data venia, mas, como veremos a seguir, a incompetência territorial nosJuizados Especiais é relativa e plenamente compatível com a fixação do foro de eleição, desde que acláusula contratual que o preveja não esteja eivada por alguma mácula (art. 63, §§ 3º e 4º, do CPC).

Outro aspecto que merece atenção diz respeito ao foro de eleição previsto em contrato deadesão. Theotonio Negrão,35 sobre o tema, assinala que não se aplica o foro de eleição a esses tiposde contratos, pois a manifestação das partes, elemento essencial para a aplicação da regra, não se fazpresente. Com o devido respeito, mas o fato de o contrato ser de adesão não impossibilita a previsãodo foro de eleição. Na verdade, a desconsideração do foro de eleição somente ocorrerá quando sedemonstrar que tal cláusula acarreta prejuízo para a parte aderente.36

As consequências da violação das regras sobre competência territorial

Na disciplina estabelecida pelo CPC, a incompetência territorial é tida, na maioria das vezes,como relativa (art. 63 do CPC), ou seja, passível de convalidação se não impugnada em momentooportuno pelas partes (art. 65 do CPC) e insucessível de declaração ex officio pelo juiz (Súmula 33do STJ). Somente em casos excepcionais, quando fixada por critérios de ordem pública, é que aincompetência territorial gera a nulidade absoluta, como ocorre, por exemplo, no art. 47 do CPC(forum rei sitae), insuscetível de prorrogação. Nos Juizados Especiais, entretanto, o reconhecimentoda incompetência territorial provoca o encerramento do procedimento sem resolução do mérito (art.51, III). Por conta de tal regra, a porção majoritária da doutrina e jurisprudência tem defendido que aincompetência territorial gera nulidade absoluta, passível de reconhecimento de ofício, em qualquertempo ou grau de jurisdição.37

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5.3

a)

b)

5.4

Com o devido respeito, mas as regras sobre a fixação da competência territorial nos JuizadosEspeciais são evidentemente de natureza dispositiva. Para comprovar isso, basta analisar o parágrafoúnico do art. 4º, que diz que “em qualquer hipótese poderá a ação ser proposta no foro previsto noinciso I deste artigo”. O inciso I do mesmo artigo, por sua vez, fala em “critério do autor”. De formaque, em nosso entendimento, a violação de tais regras só poderia ser conhecida mediante provocaçãoda parte ré, sob pena de preclusão.

Ressalte-se, ainda, que a circunstância da incompetência territorial permitir o encerramento dofeito sem resolução do mérito não basta para configurá-la como absoluta. De fato, o próprio CPCreconhece a existência de convenção de arbitragem como causa de encerramento do procedimentoque não pode ser conhecida de ofício (art. 485, VII, c/c art. 337, § 4º, do CPC). Consoante, se o réunão arguir, na contestação, a incompetência territorial, prorroga-se a competência. Parece-nos aposição mais afinada com os escopos dos Juizados Especiais.38

O CRITÉRIO FUNCIONAL

Como se sabe, o critério funcional serve para disciplinar a distribuição de funções que devemser exercidas num mesmo processo entre juízos diferentes (tanto no plano horizontal, como vertical)ou para estabelecer a competência decorrente de procedimentos que possuam vínculo jurídico.Destarte, é possível identificar a utilização de tal critério na Lei 9.099/1995 em relação a doistópicos:

a fixação no Juizado da competência para execução dos seus próprios julgados (arts.3º, § 1º, II, e 52);a fixação da competência para julgamento do “recurso inominado” pelas TurmasRecursais (art. 41).

Em ambos os casos, nota-se que o legislador procurou integrar o modelo, agrupando no âmbitodos Juizados as principais funções executivas e recursais. Esses temas serão estudados,respectivamente, na terceira e quarta partes deste livro.

A CONEXÃO E A CONTINÊNCIA

O fenômeno da reunião de processos por conexão ou continência deve ser analisado em doisplanos: quando todas as causas a serem reunidas estiverem tramitando nos Juizados e quando uma oumais causas dentre aquelas que se pretender reunir estiverem fora dos Juizados. Quando as causasconexas estiverem em curso nos Juizados Especiais de um mesmo segmento do Poder Judiciário, elasdeverão ser agrupadas perante o juízo prevento, nos termos do art. 59 do CPC.39 Na hipótese de duasou mais demandas conexas correrem em Estados diferentes, entretanto, em razão dos princípiosprevistos no art. 2º da Lei 9.099/1995, não será possível proceder à reunião. Nesse caso, havendo o

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5.4-A

risco de decisões contraditórias, o processo mais moderno deve ser suspenso para aguardar ojulgamento do outro processo (art. 313, V, a, do CPC).

No que toca à discussão sobre a conexão e continência entre causas em curso nos JuizadosEspeciais e nas varas cíveis, a porção dominante da doutrina tem entendido que, nesse caso, devemas causas ser reunidas no juízo comum.40 A nosso sentir, entretanto, não há como se deslocar as açõespropostas nos Juizados para outro juízo.41 Em primeiro lugar, a competência dos Juizados é fixadanum dispositivo constitucional (art. 98, I, da CF). Além disso, é preciso considerar que uma causaperfeitamente regular nos Juizados Especiais pode ser inválida numa vara cível, como ocorre quandoa parte atua sem advogado (art. 9º). Também é preciso considerar que o juízo comum é que temmelhores condições de absorver a suspensão de um processo. Por esses motivos, concordamos comDemócrito Ramos Reinaldo Filho,42 que assinala que, na “hipótese de conexão entre as demandas, ehavendo a possibilidade de grave incoerência dos julgados, estando a ação que tramita perante aJustiça pendente de julgamento, o Juiz deve suspender o processo até ser proferida a decisão na outracausa (que tramita no Juizado)”.43

Por certo, a reunião das demandas em curso nos Juizados somente pode ocorrer até a prolaçãoda sentença, conforme entendimento consagrado na Súmula 235 do STJ: “A conexão não determina areunião dos processos, se um deles já foi julgado”.

A DIVERSIDADE DE CAUSAS FUNDADAS NOS MESMOS FATOS

É perfeitamente possível admitir que o autor promova nos Juizados Especiais duas ou maisdemandas distintas, em face do mesmo réu e fundadas nos mesmos fatos. Assim, por exemplo, umapessoa que teve seu carro abalroado pode propor uma ação para obter a compensação pelos danosmorais sofridos e outra ação para ser indenizada pelos prejuízos causados ao seu veículo. Nessashipóteses, se houver reunião por conexão de pequenas causas, não haverá necessidade de renúncia,ainda que o somatório dos valores de cada ação supere o limite de 40 salários mínimos. Trata-se deações autônomas, postulando obrigações autônomas.

Por outro prisma, não nos parece possível que o autor fracione uma mesma obrigação emdiferentes demandas, para submetê-las ao teto de 40 salários mínimos.44 O problema maior, noentanto, ocorre quando a própria obrigação já é fracionada, como se verifica, por exemplo, numacompra em prestações. Imagine-se que o comprador deixou de pagar 50 salários mínimoscorrespondentes a 10 prestações do contrato. Nesse caso, em tese, o vendedor poderia cobrar aintegralidade da dívida propondo duas ações no Juizado, cada uma no valor de 25 salários mínimos,relativa ao período de inadimplência de cinco prestações. Entendemos, entretanto, que tal posturarepresenta uma fraude à limitação ratione valoris e que, portanto, não deve ser admitida. Assim, noexemplo dado, as duas ações deveriam ser reunidas e submetidas ao limite de 40 salários mínimos,se o credor não quiser desistir de uma delas. Caso uma das ações já tivesse sido julgada, a segunda

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deveria ser limitada ao teto, por meio da renúncia, ou encerrada, sem resolução do mérito, parapermitir que o credor possa cobrar essas parcelas no juízo comum.

AS AÇÕES COLETIVAS

Na visão de Luis Felipe Salomão,45 o CDC teria autorizado, implicitamente, a propositura deações coletivas versando sobre direitos do consumidor no âmbito dos Juizados Especiais, por meiodo Ministério Público (arts. 5º, 81 e 92 do CDC).

Data venia, mas nos parece ser inviável a interposição de demanda coletiva nos JuizadosEspeciais, qualquer que seja a matéria.46 Por um lado, as ações coletivas são, sempre, de maiorcomplexidade, o que colide com o comando contido no art. 98, I, da CF. Além disso, o procedimentodas ações coletivas é especial e dilatado, admite a habilitação no polo passivo e ativo, permite aconcessão de medidas liminares e sua suspensão pelo Presidente do Tribunal, dentre outraspeculiaridades. Tais elementos são incompatíveis com o sistema dos Juizados Especiais. Por outrolado, a causa coletiva teria que se submeter ao limite de 40 salários mínimos, previsto no inciso I doart. 3º.47 Ciente deste último obstáculo, Salomão48 defendeu que não se aplicaria às ações coletivas alimitação valorativa de 40 salários mínimos. Mais uma vez, não vemos como prosperar talinterpretação. De fato, o art. 3º da Lei 9.099/1995 é claro: o que não for causa de menorcomplexidade (incisos II e III) ou fruto do acordo entre as partes (art. 3º, § 3º) terá que se submeterao teto de 40 salários mínimos para estar nos Juizados Especiais.

Não há óbice, no entanto, para que uma causa, inserida no contexto de uma questão coletiva,possa ser individualmente levada aos Juizados Especiais, desde que se submeta aos filtrosestabelecidos pelos arts. 3º e 8º da Lei 9.099/1995. Com efeito, a natureza coletiva da questão nãopode servir, por si só, como obstáculo ao efetivo exercício do direito de ação por aqueles que são,em última análise, as vítimas diretas do evento danoso.49

A CELEBRAÇÃO DE ACORDOS REFERENDADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO

Da mesma forma que no caput, o parágrafo único do art. 57 também tem natureza da regra geralde processo civil inserida nas disposições finais dos Juizados Especiais. Diz o seu texto que “oacordo celebrado pelas partes, por instrumento escrito, referendado pelo órgão competente doMinistério Público” forma título executivo extrajudicial. Ocorre que, antes mesmo da edição da Lei9.099/1995, o CPC/1973 já tinha sido alterado pela Lei 8.953/1994 para incorporar ao seu texto umaversão ampliada da mencionada previsão. Com a modificação, a parte final do inciso II do art. 585do CPC/1973 passou a prever como título executivo extrajudicial “o instrumento de transaçãoreferendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores”.Posteriormente, a mesma regra foi repetida no art. 784, IV, do CPC/2015, que contempla, ainda, astransações referendadas pelos advogados públicos e pelos conciliadores e mediadores credenciados

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5.7

pelo tribunal.Pelas diretrizes tradicionais da hermenêutica jurídica (regra especial não é derrogada por regra

geral), seria possível dizer que o parágrafo único do art. 57 seria aplicável “apenas” nos Juizados,desconsiderando a condição de título executivo dos acordos referendados pelos demais personagenslistados no CPC em vigor. Esse raciocínio, no entanto, não é sustentável à luz dos modernosparâmetros de interpretação. Por ser dotado de maior carga de eficácia, o dispositivo do parágrafoúnico do art. 57 deve ser lido em consonância com a regra prevista no CPC, para se concluir que nosJuizados o acordo celebrado pelas partes e referendado pelo Ministério Público, pela DefensoriaPública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos transatores ou por conciliador ou mediadorcredenciado por tribunal é título executivo. É preciso reconhecer, no entanto, que o ideal seria que oparágrafo único do art. 57 da Lei 9.099/1995 fosse expressamente revogado ou que seu conteúdofosse alargado, nos moldes do que prevê o art. 784, IV, do CPC.

O CONFLITO DE COMPETÊNCIA

No âmbito dos Juizados Especiais, diante da falta de regras próprias, o conflito de competênciadeveria seguir as diretrizes previstas para os demais órgãos judiciais. Assim, o conflito decompetência entre dois Juizados, entre um Juizado e uma Vara, entre um Juizado e uma TurmaRecursal, entre duas Turmas Recursais e entre uma Turma Recursal e uma Vara, todos da mesmaregião, deveria ser resolvido no Tribunal de Justiça. Até mesmo o conflito de competência entre umJuizado ou uma Turma e o Tribunal de Justiça também deveria ser julgado por este último. Como jásublinhado anteriormente, os Juizados Especiais não representam uma estrutura “à parte” da JustiçaEstadual e Distrital, mas um conjunto de órgãos integrantes da primeira instância dessas Justiças. Emconformidade com essa linha de pensamento, embora voltada para os Juizados Federais, foi editadapelo STJ a Súmula 428, que diz que “compete ao Tribunal Regional Federal decidir os conflitos decompetência entre juizado especial federal e juízo federal da mesma seção judiciária”.

Infelizmente, entretanto, na prática, a situação é bem mais complicada.Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que o entendimento prevalente em nosso País é que o

conflito de competência entre Juizados pertencentes ao mesmo segmento do Poder Judiciário deveser julgado pelas suas Turmas Recursais.50 Isso é errado porque as Turmas Recursais são órgãos deprimeira instância, que têm como principal atribuição julgar recursos e questões a eles correlatas.Como a decisão sobre o conflito de competência envolve aspectos de ordem hierárquica, somente osTribunais poderiam definir a competência de seus juízes, como estabelece a Lei Orgânica daMagistratura Nacional (art. 101, § 3º, b, da LC 35/1979).

Não obstante a sedimentação da visão de que as Turmas Recursais podem julgar conflitos decompetência, a orientação, também majoritária, é que o mandado de segurança contra ato do Juizadodeve ser julgado pelo Tribunal de Justiça quando a matéria nele discutida for a competência daquele

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órgão.51 Da mesma forma, prevalece o entendimento de que, havendo conflito entre um Juizado e umaVara ou entre uma Turma Recursal e um Tribunal, a questão será resolvida pelo Tribunal de Justiça.52

Esse entendimento, no entanto, diverge de decisões proferidas pelo Pleno do STF, em que osJuizados Especiais são tratados como uma “Justiça” especializada dentro da Justiça Estadual eDistrital (teoria do microssistema). Assim, para o Supremo Tribunal Federal o conflito decompetência entre um Juizado e uma vara pertencentes ao mesmo tribunal deveria ser dirimido peloSTJ, porque retrataria um embate entre “justiças diferentes”:

“Sendo assim, havendo Conflito de Competência, entre Turma Recursal de Juizado Especial eTribunal de Alçada, deve ele ser dirimido pelo Superior Tribunal de Justiça, nos termos doart. 105, I, d, da C.F., segundo o qual a incumbência lhe cabe, quando envolva ‘tribunal ejuízes a ele não vinculados’. 4. Conflito não conhecido, com remessa dos autos ao SuperiorTribunal de Justiça, para julgá-lo, como lhe parecer de direito” (STF, Plenário, CC7.081/MG, Rel. Min. Sydney Sanches, j. em 27.09.2002).“Conflito de Competência. Turma Recursal de Juizado Especial e Tribunal de Justiça. Nãoinserção na competência originária do Supremo Tribunal Federal objeto do art. 102, I, o, daConstituição Federal. Decisões de Turmas Recursais de Juizados Especiais não estão sujeitasà jurisdição de Tribunais Estaduais. Jurisprudência iterativa do STF. Competência doSuperior Tribunal de Justiça, nos termos do art. 105, I, d, da CF. Não conhecimento doconflito de competência. Remessa dos autos ao STJ” (STF, Plenário, CC 7.774/MG, Min.Luiz Fux, j. em 19.04.2012).

Em nosso sentir, esses posicionamentos são inconciliáveis e desprovidos de base legal. Todasas decisões sobre a competência dos Juizados Especiais deveriam ser emanadas de um mesmo lugar,não apenas por uma questão lógica, mas também para preservar a uniformidade da jurisprudência(art. 926 do CPC). Como os Juizados Especiais (tanto o Juizado, como a Turma Recursal) estãoinstalados na primeira instância do Poder Judiciário Estadual e Distrital, o locus adequado para adefinição sobre os conflitos de competência é o Tribunal de Justiça. Somente na hipótese de oJuizado ou a Turma Recursal estar em conflito com um órgão de outra região ou de outra Justiça (emsentido estrito) é que a questão seria decidida pelo STJ, nos termos do art. 105, I, d, da CF.53

Instituições de Direito Processual Civil, p. 123.Trata-se, a toda evidência, de norma de eficácia contida na célebre classificação de José Afonsoda Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, p. 34.Apesar de existirem hipóteses em que o direito material poderia ser considerado de maiorcomplexidade, mesmo não estando incluído nas vedações do art. 8º da Lei 9.099/1995, a opiniãoprevalente é que apenas as questões probatórias devem ser objeto de análise para definição do queseja causa de menor complexidade. Veja-se, nesse sentido, a Ementa 36 do ETRJECERJ: “A

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questão de menor complexidade, aludida pelo art. 3º da Lei 9.099/1995, diz respeito à provapericial e ao valor, que suplanta os 40 salários mínimos, nas hipóteses em que a regra acimaindicada estabelece a competência, observando tal critério. A complexidade técnico-jurídica damatéria não afasta a competência dos Juizados. Assim, questão de maior complexidade é aquelaque exige maior dilação probatória em prova técnica ou que suplanta 40 salários mínimos, nahipótese de competência ratione valoris” e o Enunciado 54 do FONAJE: “A menor complexidadeda causa para a fixação da competência é aferida pelo objeto da prova e não em face do direitomaterial”. Em sentido contrário, sustentando que os únicos critérios para fixação da complexidadesão o valor e a matéria: “Aliás, na edição da Lei 9.099/1995, o legislador foi até mais enfático,estabelecendo, em seu art. 3º, dois parâmetros – valor e matéria – para que uma ação possa serconsiderada de menor complexidade e, consequentemente, sujeita à competência do JuizadoEspecial Cível. Há, portanto, apenas dois critérios para fixação dessa competência: valor ematéria, inexistindo dispositivo na Lei 9.099/1995 que permita inferir que a complexidade dacausa e, por conseguinte, a competência do Juizado Especial Cível esteja relacionada ànecessidade ou não de perícia” (STJ, 3ª Turma, RMS 30.170/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. em05.10.2010).Em sentido diverso, veja-se: “A postulação de alimentos, em sede de indenizatória, na hipótesedefinida no art. 1.537, II, do CCB, por versar sobre obrigação fundada em ato ilícito, não é causade natureza alimentar, cuja exclusão de competência é prevista no art. 3º, § 2º, da Lei 9.099/1995”(TJSC, CC 76-3, Rel. Des. Pedro Manoel de Abreu, DJ de 03.06.1996).Embora seja fluente o entendimento de que a complexidade da prova também deve ser consideradapara caracterização das pequenas causas, o STJ já teve oportunidade de se manifestar de formadiversa, assinalando que “não há dispositivo na Lei 9.099/1995 que permita inferir que acomplexidade da causa e, por conseguinte, a competência do Juizado Especial Cível estejarelacionada à necessidade ou não de perícia” (STJ, 3ª Turma, MC 15.465/SC, Rel. Min. NancyAndrighi, j. em 03.09.2009).Nesse sentido, Geraldo Prado, Lei dos juizados especiais cíveis e criminais: comentada eanotada, p. 176.A polêmica somente se encerrou em 2006, quando o art. 61 da Lei 9.099/1995 foi alterado pelaLei 11.313, passando a prever que infração de menor potencial ofensivo seria aquela a que a leicomine pena máxima não superior a dois anos.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 34. Veja-se, ainda, o Enunciado 87 doFONAJE: “A Lei 10.259/2001 não altera o limite da alçada previsto no artigo 3º, inciso I, da Lei9.099/1995”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 133 do FONAJE: “O valor de alçada de 60 salários mínimosprevisto no art. 2º da Lei 12.153/2009, não se aplica aos Juizados Especiais Cíveis, cujo limitepermanece em 40 salários mínimos”.Importante destacar que a uniformização da alçada federal e fazendária tem por base o comandocontido no § 3º do art. 100 da CF, que excepciona do regime do precatório o pagamento dasobrigações pecuniárias fixadas judicialmente em face da Fazenda Pública, quando enquadradascomo de pequeno valor.

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Em sentido contrário, defendendo que somente a renúncia expressa produz efeitos, MaurícioAntônio Ribeiro Lopes, Lei dos juizados especiais cíveis e criminais: Lei 9.099, de 26 desetembro de 1995, p. 20; e Theotonio Negrão, op. cit., p. 991.Op. cit., p. 43.Nesse sentido, veja-se: “A opção pelo Juizado Especial é do autor, sendo incabível oreconhecimento de ofício” (TACSP, 2ª Câmara, AC 469771, Rel. Juiz Melo Bueno, j. em25.11.1996).Em sentido diverso, veja-se o Enunciado 8 do 1º EJJEC: “A renúncia quanto ao valor superior a40 salários mínimos ocorre no momento da propositura da ação (art. 3º, § 3º, da Lei 9.099/1995)”.Na esteira desse posicionamento, Luiz Fux, op. cit., p. 59.A verdade é que o entendimento prevalente é no sentido de que a própria desistência da demandanos Juizados não depende da aceitação do réu, ainda que este esteja citado. Nesse sentido, veja-seo Enunciado 90 do FONAJE, ambos com a mesma redação: “A desistência da ação, mesmo sem aanuência do réu já citado, implicará a extinção do processo sem resolução do mérito, ainda que talato se dê em audiência de instrução e julgamento, salvo quando houver indícios de litigância demá-fé ou lide temerária”.Registre-se, desde logo, que defendemos, minoritários, que as causas de menor complexidade, porrepresentar uma competência fixada em razão da matéria, não deveriam se submeter ao tetoinsculpido no inciso I do art. 3º da Lei (teoria dualista).Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 38. Veja-se, também, o Enunciado 4 doFONAJE: “Nos Juizados Especiais só se admite a ação de despejo prevista no art. 47, inciso III,da Lei 8.245/1991”.Com esse entendimento, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 54; e Eduardo Oberg, op. cit., p. 175.Veja-se, também, o Enunciado 2.4.1 da CEJCA: “Somente a ação de despejo para uso próprio éadmissível nos Juizados Especiais Cíveis”.Na verdade, como já dito na introdução deste livro, a Lei 9.099/1995 foi feita a partir de umprojeto de lei de 1989, que ficou defasado em vários pontos no decorrer de sua longa tramitação,sem que tenha sido atualizado.Com esse entendimento, defendendo que a ação de despejo para uso próprio não se enquadra, emtese, no conceito de menor complexidade, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 27.Pestana de Aguiar, op. cit., p. 27.Apesar disso, a própria Lei do Inquilinato dispõe que, “para os fins do inciso I do art. 98 daConstituição Federal, as ações de despejo poderão ser consideradas como causas cíveis de menorcomplexidade” (art. 80).Nesse sentido, veja-se: “A ação de despejo por falta de pagamento, ainda que de valor inferiora 40 salários mínimos, não se enquadra no rol de competências do Juizado Especial, uma vezque tem procedimento próprio, previsto na Lei 8.245/1991” (2º TACivSP, AI 459.474, Rel. JuizEuclides de Oliveira, j. em 21.05.1996) e “o Juizado Especial não tem competência para oprocessamento da ação de despejo por falta de pagamento, não podendo ser incluída entre ‘ascausas cujo valor não exceda a 40 vezes o salário mínimo’ (Lei 9.099/1995, art. 3º, I), por se

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tratar de ação especial definida em lei também especial” (2º TACivSP, AC 500.358/0, Rel. JuizDiogo de Salles, j. em 07.01.1998).Confira-se um dos raros julgados sobre o tema admitindo a aplicação da regra prevista no art. 57da Lei 9.099/1995 fora dos Juizados Especiais: “Pedido de homologação de acordo extrajudicial.Possibilidade. Recurso provido para afastar a extinção do processo e homologar a transaçãofirmada pelos requerentes” (TJSP, 35ª Câmara de Direito Privado, AC 978510008, Rel. Des.Mendes Gomes, j. em 19.01.2009).Nesse sentido, refutando a aplicação do dispositivo fora do sistema dos Juizados, veja-se:“Processo civil. Transação extrajudicial. Homologação. Lei 9.099/1995. Art. 57. Impossibilidade.1. É imprescindível preservar o escopo da Lei 9.099/1995, criada para facilitação de acesso aoPoder Judiciário pelos titulares de direitos relacionados a lides de menor complexidade, comprocedimento simplificado e julgamento célere, desafogando-se, com isso, os Tribunais em causasde procedimento ordinário ou sumário. 2. O art. 57 da Lei 9.099/1995 tem, em princípio, eficáciatranscendente à Lei dos Juizados Especiais. Essa regra, contudo, teria o papel de regularprovisoriamente a matéria, até que ela encontrasse regulação específica nos diplomas adequados,a saber, o Código de Processo Civil e o Código Civil. 3. O CPC, nas sucessivas reformasocorridas desde meados dos anos 90, vem tendo alterada a redação de seu art. 584, III, de modo acontemplar, com maior ou menor extensão, a possibilidade de homologação de acordosextrajudiciais. 4. Na última alteração a que se sujeitou o código, contudo, incluiu-se o art. 475-N,que em lugar de atribuir eficácia de título executivo judicial à sentença que homologue acordo queverse sobre matéria não posta em juízo, passou a falar em transações que incluam matéria nãoposta em juízo. 5. Uma transação que inclua matéria não posta em juízo está claramente a exigirque a transação, para ser homologável, tem de se referir a uma lide previamente existente, aindaque tenha conteúdo mais amplo que o dessa lide posta. Assim, a transação para ser homologadateria de ser levada a efeito em uma ação já ajuizada. 6. É necessário romper com a ideia de quetodas as lides devem passar pela chancela do Poder Judiciário, ainda que solucionadasextrajudicialmente. Deve-se valorizar a eficácia dos documentos produzidos pelas partes,fortalecendo-se a negociação, sem que seja necessário, sempre e para tudo, uma chancela judicial.7. A evolução geral do direito, num panorama mundial, caminha nesse sentido. Tanto que há, hoje,na Europa, hipóteses em que ações judiciais somente podem ser ajuizadas depois de já terem aspartes submetido sua pretensão a uma Câmara Extrajudicial de Mediação, como corre, porexemplo, na Itália, a partir da promulgação do Decreto Legislativo 28/2010. 8. Ao homologaracordos extrajudiciais, o Poder Judiciário promove meramente um juízo de delibação sobre acausa. Equiparar tal juízo, do ponto de vista substancial, a uma sentença judicial seria algo utópicoe pouco conveniente. Atribuir eficácia de coisa julgada a tal atividade implicaria conferir umdefinitivo e real a um juízo meramente sumário, quando não, muitas vezes, ficto. Admitir que ojudiciário seja utilizado para esse fim é diminuir-lhe a importância, é equipará-lo a um merocartório, função para a qual ele não foi concebido” (STJ, REsp 1.184.151/MS, Rel. Min. NancyAndrighi, j. em 15.12.2011).Entendemos, inclusive, que o acordo a ser homologado pode conter obrigações recíprocas, mesmoque uma das partes não se enquadre nas diretrizes do art. 8º da Lei. O que não pode acontecer é opedido de homologação de um acordo cujo objeto seja uma obrigação contraída exclusivamente

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por quem poderia ser autor em favor de quem não poderia ser autor. Algumas decisões, no entanto,vêm sustentando que apenas obrigações contraídas em favor do eventual autor poderiam serhomologadas nos moldes do art. 57. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 14 do 1º EJJEC: “Não sehomologa, em Juizado Especial, o acordo extrajudicial que estabeleça obrigação de pessoa físicaem favor de pessoa jurídica (art. 57)”.Não obstante, é prevalente o entendimento de que a audiência de ratificação é obrigatória. Nessesentido, veja-se o Enunciado 14.8 da CEJCA: “O pedido de homologação de acordo extrajudicialdeverá ser ratificado, pessoalmente, pelas partes”. Em nosso sentir, entretanto, a audiênciaratificação é medida que pode ser dispensada, conforme o caso (ambas as partes assistidas poradvogados, por exemplo). Se o juiz perceber, por exemplo, que o acordo é desvantajoso para umadas partes ou que uma das partes é hipossuficiente, pode marcar a audiência para verificar se oajuste é fruto da sua liberalidade consciente.Como se sabe, a liminar possessória representa uma modalidade especial de tutela antecipada, denatureza satisfativa, que visa antecipar os efeitos de uma eventual sentença de procedência. Assim,embora a ação possessória perca a liminar possessória ao se submeter ao rito especial dosJuizados, nada impede que o interessado formule pedido de tutela antecipada, com fulcro no art.303 do CPC, para obter resultado semelhante.Em sentido contrário, defendendo que só se a causa versar sobre a profissão do réu é que elepoderá ser demandando no seu domicílio profissional, Alexandre Câmara, Juizados, p. 44.No Rio de Janeiro, esse entendimento foi sedimentado no Enunciado 2.2.5 da CEJCA: “Salvo noslocais onde haja órgão distribuidor para Juizados com a mesma competência, o juiz deverá, combase na violação do princípio do juiz natural, reconhecer de ofício a incompetência nos casos emque a ação for proposta no juizado de localização de um dos estabelecimentos de parte commultiplicidade de endereços, sem que se trate da sede ou sem que haja relação do estabelecimento:(i) com o domicílio residencial do autor; (ii) com o local onde a obrigação deva ser cumprida; ou(iii) com o lugar do ato ou fato lesivo ou serviço prestado”.O conceito de domicílio do autor, ao contrário do que ocorre em relação ao réu não recebeutratamento específico. Assim, são plenamente aplicáveis as regras gerais do CC e do CPC. Nessesentido, veja-se o Enunciado 2.2.3 da CEJCA: “Não há competência territorial pelo endereçoprofissional do autor, exceto se este for funcionário público civil ou militar (art. 4º, inciso III, daLei 9.099/1995), ou incidir a regra do artigo 72, do Código Civil de 2002”.Theotonio Negrão, op. cit., p. 992.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 2.2.1 da CEJCA: “Todas as ações ajuizadas em sede deJuizado Especial Cível, que envolvam relação de consumo poderão ser propostas no domicílio doautor, ao seu critério, interpretando-se extensivamente o disposto no art. 101, inciso I, do Códigode Defesa do Consumidor”.Op. cit., p. 992.Nesse sentido, veja-se a Ementa 207 do ETRJECERJ: “Não pode prevalecer cláusula de eleiçãode foro que dificulte o acesso à Justiça do cidadão comum” e “Foro de eleição. Exceçãoapresentada pelo réu, em ação de despejo proposta em seu domicílio. Ausência de prejuízo. Nocaso de eleição de foro, tal circunstância não impede seja a ação intentada no domicílio do réu, e

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com razão maior quando este, ao excepcionar o foro, não demonstrou a existência de prejuízo.Recurso especial não conhecido” (STJ, 3ª Turma, REsp 10.998/DF, Rel. Min. Nilson Naves, j. em04.02.1992).Nesse sentido, Theotonio Negrão, op. cit., p. 903; e Eduardo Oberg, op. cit., p. 175. Confiram-se,também, o Enunciado 2.2.4 da CEJCA e o Enunciado 89 do FONAJE, que têm a mesma redação:“A incompetência territorial pode ser reconhecida de ofício no sistema dos Juizados EspeciaisCíveis”.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados, p. 45; e Dinamarco, Instituições, p. 803. Najurisprudência, veja-se: “A competência prevista no art. 4º da Lei dos Juizados Especiais segue aregra geral, qual seja, a do foro do domicílio do réu, seguindo os moldes tradicionais do Códigode Processo Civil, prorrogando-se, todavia, quando não arguida incompetência pela partecontrária” (STJ, 2ª Seção, CC 30.692/RS, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. em 27.11.2002).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 73 do FONAJE: “As causas de competência dos JuizadosEspeciais em que forem comuns o objeto ou a causa de pedir poderão ser reunidas para efeito deinstrução, se necessária, e julgamento”.Joel Dias Figueira Júnior e Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 58.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 68 do FONAJE: “Somente se admite conexão em JuizadoEspecial Cível quando as ações puderem submeter-se à sistemática da Lei 9.099/1995”.Conexão de causas aforadas no juizado especial e em vara da justiça comum.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 46. Veja-se, ainda, o Enunciado 11.1.2da CEJCA: “O regime jurídico da competência na Lei 9.099/1995 e o entendimento doutrinário/jurisprudencial acerca da opcionalidade do acesso ao Juizado Especial Cível implicam nainadmissibilidade de declinação de competência entre Juízos Cíveis e Juizados Especiais”.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 173.Op. cit., p. 61Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 2.6 da CEJCA e o Enunciado 32 do FONAJE, ambos com amesma redação: “Não são admissíveis as ações coletivas nos Juizados Especiais Cíveis”. NosJuizados Especiais Federais (art. 3º, § 1º, I, da Lei 10.259/2001) e nos Juizados Especiais daFazenda Pública (art. 2º, § 1º, I, da Lei 12.153/2009), a vedação às ações coletivas é expressa.Portanto, em todos os integrantes do Sistema dos Juizados torna-se incabível a utilização de açõescoletivas. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 139 do FONAJE: “A exclusão da competência doSistema dos Juizados Especiais quanto às demandas sobre direitos ou interesses difusos oucoletivos, dentre eles os individuais homogêneos, aplica-se tanto para as demandas individuais denatureza multitudinária quanto para as ações coletivas. Se, no exercício de suas funções, os juízese tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil coletiva,remeterão peças ao MP para as providencias cabíveis”.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 35.Op. cit., p. 61.Nesse sentido, veja-se: “O STJ entende que, em se tratando de direito difusos, sua defesa pode sedar tanto por meio de ação coletivas como individuais, sendo competência do Juizado Especial da

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Fazenda Pública a defesa de direito individual” (STJ, 2ª Turma, RESP 1653288/MG, Rel. Min.Herman Benjamin, j. em 25.04.2017).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 91 do FONAJE: “O conflito de competência entre juízes deJuizados Especiais vinculados à mesma Turma Recursal será decidido por esta. Inexistindo talvinculação, será decidido pela Turma Recursal para a qual for distribuído”.Nesse sentido, veja-se: “Processo civil. Recurso em Mandado de Segurança. Mandamusimpetrado, perante Tribunal de Justiça, visando promover controle de competência de decisãoproferida por Juizado Especial Cível. Possibilidade” (STJ, Corte Especial, RMS 17.524/BA, Rel.Min. Nancy Andrighi, j. em 02.08.2006).Nesse sentido, vejam-se: “Conflito negativo de competência. Conflito entre Tribunal de Justiça eTurma Recursal do Juizado Especial. Competência do STJ. Recurso contra decisão de primeirograu. Competência do órgão de segundo grau ao qual o juízo sentenciante está vinculado.Competência do órgão recursal para apreciação do recurso, ainda que para possível anulação dosatos decisórios de 1º grau” (STJ, 3ª Seção, CC 52.536/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. em13.12.2006) e “Conflito negativo de competência. Indenização por dano moral. Parte autora.Incapaz. Juizado Especial da Fazenda Pública. Vara da Fazenda Pública. Art. 27 da Lei12.153/2009 c/c o art. 8º da Lei 9.099/1995. 1. No âmbito da competência do Juizado Especial daFazenda Pública, a pessoa incapaz não pode ser parte autora. 2. Exegese do art. 27 da Lei12.153/2009 combinada com o art. 8º da Lei 9.099/1995. Precedentes jurisprudenciais. Conflitode competência procedente” (TJRS, 9ª Câmara Cível, CC 049296-20.2019.8.21.7000, Rel. Des.Tasso Caubi Soares Delabary, j. em 01.03.2019).Nesse sentido, veja-se: “Compete ao STJ decidir conflito de competência entre Juizados Especiaisvinculados a Tribunais diversos (CF, art. 105, I, d)” (STJ, 2ª Seção, CC 30.692/RS, Rel. Min.Antônio de Pádua Ribeiro, j. em 27.11.2002).

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6.1

6.2

6.2.1

6AS PARTES E SEUS REPRESENTANTES

A CAPACIDADE E A LEGITIMIDADE DAS PARTES

A Lei dos Juizados Especiais foi estruturada pensando em atender as causas de menorcomplexidade e de pequeno valor (art. 3º). Assim, para evitar a tramitação de causas de maior vulto,o legislador traçou diversas limitações ao longo do texto da Lei 9.099/1995. Em relação àcapacidade das partes, no caput do art. 8º estabeleceu quem não poderia “estar” nos Juizados, emambos os polos da demanda, e, no parágrafo primeiro, quem poderia demandar, seja como autor(pedido principal), seja como réu (pedido contraposto – art. 31).

Resumidamente, têm capacidade para ser parte nos Juizados Especiais, em ambos osprocedimentos (cognitivo e executivo), a pessoa física, “livre” e capaz, a pessoa jurídica de direitoprivado1 e o ente despersonalizado dotado de capacidade processual. Dentre as partes que passampor esses filtros, apenas a pessoa física, a microempresa, a empresa de pequeno porte, a organizaçãosocial de interesse público e a sociedade de crédito ao microempreendedor podem propor umademanda nos Juizados Especiais ou, estando no polo passivo, formular pedido contraposto.

AS LIMITAÇÕES À CAPACIDADE PROCESSUAL

As proibições insculpidas no caput do art. 8º têm o condão não apenas de impedir que a partevenha a demandar perante os Juizados Especiais, mas também, caso alguma das hipóteses ocorra nocurso do processo, gerar o encerramento do feito sem resolução do mérito (art. 51, IV). Como regrade ordem pública, as possíveis violações ao seu conteúdo poderão ser discutidas a qualquer tempono procedimento, por iniciativa das partes ou do julgador. Nunca é demais ressaltar, entretanto, que apresunção opera em favor do demandante, obrigando que a impugnação quanto à capacidade sejafundamentada. A parte, em geral, demonstra sua aptidão para estar nos Juizados por intermédio dedocumentos e de suas declarações, incumbindo ao impugnante o ônus de provar o contrário. Peloóbvio, as restrições contidas no dispositivo devem ser analisadas em conjunto. Assim, por exemplo,nos Juizados um espólio não pode ser autor, mas pode ser réu, desde que não tenha entre seusherdeiros pessoa incapaz,2 insolvente ou presa. Da mesma forma, não podem tramitar nos Juizadosquestões relativas aos bens que estão sendo objeto de partilha pelas partes perante o juízo familiar.

O incapaz

Quando a lei fala em incapaz, devem ser compreendidas todas as hipóteses previstas no art. 3º

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6.2.1-A

6.2.2

ao 5º do CC, que tratam da incapacidade absoluta e da relativa, ou seja, os menores de 18 anos, osébrios habituais, os viciados em tóxicos, os que não puderem exprimir sua vontade, por causatransitória ou permanente, e os pródigos. A pessoa regularmente emancipada (art. 5º, parágrafoúnico, do CC), entretanto, pode estar em juízo, porque adquiriu a capacidade civil plena.

A capacidade do maior de 18 anos

Quando da edição da Lei 9.099/1995, o dispositivo do § 2º do art. 8º, que previa que o maiorde 18 anos poderia ser autor, independentemente de assistência, suscitou profunda discussãodoutrinária, acerca da sua constitucionalidade em face do sistema jurídico em vigor. Na época, oCódigo Civil estabelecia que a aquisição da maioridade ocorria aos 21 anos de idade (art. 6º, I, daLei 3.071, de 1916). Para agravar ainda mais a situação, o caput do art. 8º da própria Lei9.099/1995 dizia que incapaz não poderia figurar no procedimento estabelecido nos JuizadosEspeciais.

Com a edição do atual Código Civil, entretanto, a questão se dissipou. O novo Codexestabelece em seu art. 5º a aquisição da capacidade plena aos 18 anos de idade. Hoje, portanto, nãohá o que se discutir: o maior de 18 anos, civilmente capaz, pode demandar e ser demandado nosJuizados Especiais, independentemente de assistência. É preciso que se esclareça que o § 2º do art.8º não está revogado. Ele continua em vigor, já que seu conteúdo não conflita com a regra posteriortrazida pelo Código Civil. Apenas, tornou-se redundante.

O preso

A Lei 9.099/1995 não permite que participe dos seus procedimentos uma parte que esteja presa.Em primeiro lugar, é preciso sublinhar que no Brasil a pessoa pode ser privada da sua liberdade delocomoção por uma determinação civil, penal ou administrativa.3 Como a lei não fez distinção, nosparece que a prisão que veda o ingresso ou a permanência de uma pessoa presa nos JuizadosEspeciais pode ser de qualquer natureza.

Por certo, o principal fundamento da vedação prevista no art. 8º da lei é evitar que a parte, porestar presa, não possa participar diretamente dos seus procedimentos, marcados por intensaoralidade. Por isso, à luz do princípio do acesso à justiça, a interpretação do dispositivo deve serfeita de modo a direcionar a vedação para as situações nas quais a prisão promova uma limitaçãoefetiva na participação da parte nos atos praticados. Por isso, defendemos, por exemplo, que aproibição não se aplica ao “condenado a cumprimento de pena privativa de liberdade em regimeaberto”,4 bem como o beneficiado por sursis ou livramento condicional. Além disso, entendemos queo simples decreto de prisão, antes ou durante o curso processual, não é suficiente para determinar oautomático encerramento do procedimento, sendo necessário que a parte tenha sido efetivamentepresa, ou seja, que tenha sido submetida ao encarceramento, sem possibilidade de se locomover.

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6.2.3

6.2.4

6.2.5

Por fim, mesmo que a pessoa tenha sido presa, somos da opinião de que o fim do procedimentosomente deva ser declarado, em cada caso, quando a prisão impedir o seu regular desenvolvimento,a teor dos princípios que informam o sistema, notadamente daqueles consagrados no art. 13. Assim,se a sentença já foi proferida e o procedimento está em fase recursal, não vemos razão para aplicar oart. 51, II, no caso de o autor ter sido preso, uma vez que a sua presença não é mais necessária para ojulgamento da causa.5 Pelas mesmas razões, se a parte foi presa e agora está livre, não vemos razãopara o procedimento ser encerrado, se essa situação não causou reais prejuízos ao feito.Exemplificando, pense-se o caso de uma parte que passou um dia preso, seja por uma prisão emflagrante que foi relaxada ou por uma prisão por dívida alimentar que foi paga. Se ele for réu numprocedimento em curso nos Juizados Especiais, o encerramento do feito será um benefício para ele;se for autor, uma punição.

Destarte, em nome do mencionado princípio do acesso à justiça, acreditamos que o juiz possaconsiderar a possibilidade de sobrestar o procedimento, aguardando a soltura da parte, casoverifique que a sua prisão não tem caráter permanente. Trata-se de uma posição minoritária, mas quevisa evitar o fim anômalo do procedimento, sem a resolução do mérito da causa (art. 4º do CPC).

A pessoa jurídica de direito público

Não podem estar nos Juizados Especiais as pessoas jurídicas de direito público externo (paísesestrangeiros e organismos internacionais) e interno, sejam da administração direta (União, Estados,Distrito Federal, Municípios e Territórios) ou indireta (autarquias, fundações públicas e órgãosdescentralizados, criados por lei, com finalidade de atender ao interesse público).

A empresa pública da União

Apesar de ser uma pessoa jurídica de direito privado, a empresa pública da União não pode serdemandada nos Juizados Especiais, pois, por expressa disposição constitucional, a competência paraprocessar e julgar questões a ela referentes é da Justiça Federal (art. 109, I), de modo que a vedaçãoé redundante.

A massa falida

A massa falida representa o conjunto dos bens arrecadados e administrados pelo síndico numprocesso falimentar judicial. Essa universalidade de bens surge a partir da decretação da falência(art. 77 da Lei 11.101/2005) e pode atuar em juízo na defesa dos seus interesses. Nos Juizados,entretanto, após a decretação de falência, a empresa torna-se incapaz para estar naquele juízo, damesma forma que a massa falida que assume a sua administração. A interpretação, aqui, deve serrestritiva, não incluindo a empresa em liquidação extrajudicial ou em recuperação (judicial ouextrajudicial).6 As empresas nessas condições, se autoras, podem seguir com a demanda e, se réus,

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6.2.6

6.3

a)b)

6.3.1

6.3.2

podem ser processadas até a sentença, mas não na fase de execução, que deve ser realizada no juízouniversal.7

O insolvente civil

Muito embora o CPC/2015 não tenha regulado o procedimento de execução por quantia certacontra devedor insolvente, o complexo e ineficiente rito previsto no Título IV do Livro II doCPC/1973 continua em vigor por força do art. 1.052:

“Art. 1.052. Até a edição de lei específica, as execuções contra devedor insolvente, em cursoou que venham a ser propostas, permanecem reguladas pelo Livro II, Título IV, da Lei 5.869,de 11 de janeiro de 1973”.

Assim, caso a pessoa tenha sido declarada insolvente civil (art. 751 do CPC/1973), essaqualificação impedirá sua atuação perante os Juizados Especiais.

A LEGITIMIDADE PROCESSUAL ATIVA

Enquanto o caput do art. 8º da Lei 9.099/1995 trata da capacidade processual, o seu § 1º cuidada legitimidade processual ativa, ou seja, do universo de pessoas que podem não apenas figurar nospolos da relação jurídica processual dos Juizados Especiais, mas também podem neles demandar. Oslegitimados ativos podem ser divididos em dois grupos:

pessoas físicas;pessoas jurídicas.

As pessoas físicas

As pessoas físicas são o principal público-alvo dos Juizados Especiais, criados para atenderas chamadas demandas reprimidas, ou seja, causas que usualmente não seriam levadas ao PoderJudiciário. Para evitar a burla das restrições legais, o art. 8º, § 1º, I, proibiu que a pessoa físicademandasse nos Juizados discutindo direito que lhe foi cedido por uma pessoa jurídica despida delegitimidade ativa. De fato, sem esse dispositivo, bastaria, por exemplo, que uma empresaendossasse uma nota promissória para uma pessoa física de sua confiança para poder demandar nosJuizados. Por isso, ainda que tenham ocorrido várias cessões, se o direito foi titularizado, em algummomento da cadeia sucessória, por quem não pode demandar nos Juizados, os cessionários que lheseguiram ficam impedidos de utilizar o procedimento especial previsto na Lei 9.099/1995.

As pessoas jurídicas

Como já visto, quando foi editada, a Lei 9.099/1995 conferia legitimação processual ativa

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exclusivamente à pessoa física (§ 1º do art. 8º, em sua redação original). No entanto, a partir de1999, o legislador foi gradativamente atribuindo legitimidade ativa para diferentes pessoas jurídicas.Primeiro, foram as microempresas (art. 38 da Lei 9.841/1999 – Estatuto da Microempresa).8 Emseguida, com o advento da Lei dos Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2001),9 diversos autorespassaram a defender que também as empresas de pequeno porte poderiam demandar perante osJuizados Especiais Estaduais.10 Esse entendimento restou positivado em 2006, quando foi editada aLei Complementar 123 (Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte), queestabeleceu, em seu art. 74, a permissão para que tanto a microempresa como a empresa de pequenoporte pudessem demandar nos Juizados Especiais.11 Finalmente, em 2009, o art. 8º da Lei 9.099/1995foi alterado para permitir a legitimação ativa, não apenas das pessoas físicas, mas também dasmicroempresas, das organizações da sociedade civil de interesse público e das sociedades decrédito ao microempreendedor (Lei 12.126/2009). Como o art. 74 da LC 123/2006 não foi revogado,nesse rol se inclui também a empresa de pequeno porte.

Note-se que em 2011 o Código Civil foi alterado pela Lei 12.441, que criou uma novacategoria de pessoa jurídica de direito privado: a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada– EIRELI. Dispõe o art. 980-A do CC que a EIRELI será constituída por uma única pessoa, física oujurídica, titular da totalidade do capital social que não será inferior a 100 vezes o maior saláriomínimo vigente no país. Assim, o conceito de EIRELI também pode se submeter aos requisitos legaisprevistos para que seja considerada como microempresa ou de pequeno porte. De fato, diz o art. 3ºda Lei Complementar 123/2006 que se considera microempresa aquela que auferir, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00, e empresa de pequeno porte aquela queauferir, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 e igual ou inferior a R$4.800.000,00. Portanto, se a EIRELI se submeter aos tetos de receita bruta previstos na LC 123/2006,pode ser considerada microempresa ou empresa de pequeno porte para demandar como autora nosJuizados Especiais.

Para que as pessoas jurídicas possam demandar nos Juizados Especiais é necessária aapresentação, junto com a petição inicial, dos seus atos constitutivos.12 Importante sublinhar,entretanto, que a falta dessa documentação é vício sanável, de modo que o juízo deve intimar apessoa jurídica para corrigir o defeito, em prazo razoável, nos termos do art. 76 do CPC. NosJuizados, as pessoas jurídicas poderão ser representadas por seus diretores, pessoalmente ou pormeio de prepostos credenciados (art. 9º, § 4º).13 As regras sobre a capacidade postulatória sãoplenamente aplicáveis às empresas,14 que poderão, inclusive, obter a assistência judiciária (arts. 9º,§ 1º da Lei 9.099/1995, e 98 do CPC).15

Note-se que na jurisprudência é possível encontrar alguns julgados estabelecendo restrições àatuação das pessoas jurídicas.16 Na maioria das vezes, entretanto, tais vedações não têm amparolegal. Trata-se de um reflexo da percepção geral de que a inclusão de todas essas pessoas jurídicasfoi resultado não de uma evolução jurídica ou técnica, mas de um oportunismo legislativo. De fato,

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6.3.3

6.3.4

conforme noticia Eduardo Oberg,17 existem empresas que estão transformando os Juizados emverdadeiros departamentos de cobrança, acobertados pela isenção de custas e pela gratuidadeassegurada. Isso é um desvirtuamento do órgão, que foi concebido para atender ao hipossuficiente eao litigante eventual. No caso dessas empresas, as ações que propõem estão indissociavelmenteligadas à sua atividade comercial, o que as descaracteriza como destinatárias da estrutura montadapela Lei 9.099/1995. Com efeito, nós sempre defendemos que os Juizados foram criados para atenderàs pessoas físicas. Essa diretriz, inclusive, estava prevista expressamente no § 1º do art. 8º, em suaredação original. Por isso, apesar das opiniões em contrário, sustentamos, minoritários, ainconstitucionalidade dos dispositivos que atribuíram legitimidade ativa às pessoas jurídicas (art. 74da Lei Complementar 123/2006 e incisos II, III e IV do § 1º do art. 8º da Lei 9.099/1995), em relaçãoao comando contido no art. 98, I, da CF.

A legitimidade ativa do condomínio

Como já visto, os entes despersonalizados podem estar no processo dos Juizados Especiais,mas não podem propor a demanda, porque não se enquadram nas diretrizes fixadas no art. 8º, § 1º, daLei. Apesar disso, surgiu na jurisprudência divergência acerca da possibilidade de o condomíniopropor a ação de cobrança de cotas condominiais nos Juizados Especiais. Os julgados que atribuemessa aptidão ao condomínio têm como principal fundamento o fato de o inciso II do art. 3º da Leifazer remissão ao art. 275, II, do CPC/1973, que, na sua alínea b, prevê a submissão ao rito sumáriodas causas relativas às “cobranças ao condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio”.18

Ocorre que o § 1º do art. 8º da Lei 9.099/1995 é claro no sentido de que só as pessoas físicas epessoas jurídicas poderão propor ação nos Juizados Especiais. Dessa forma, por se tratar de umaregra especial e de interpretação restritiva, tem-se que o condomínio não pode deduzir pretensão nosJuizados Especiais.19

Em posição intermediária, Luis Felipe Salomão20 assinalou que somente os condomínios quenão tenham existência legal e que sejam regulados pelo Código Civil (arts. 1.314 e seguintes),quando representados por pessoas físicas, poderiam cobrar nos Juizados Especiais quantias devidasem favor do condomínio. Na visão desse autor, o condomínio de edifício, instituído de acordo com aLei 4.591/1964, ficaria fora desse dispositivo. Com o devido respeito, mas nenhuma forma decondomínio, ainda que representado por pessoa física, pode demandar nos Juizados, sob pena deviolação do preceito contido no art. 8º, § 1º, da Lei.

A legitimidade do titular do direito de receber honorários fixados nos JuizadosEspeciais

Embora não seja comum, é possível em quaisquer dos graus de jurisdição, em ambos osmódulos do processo (cognitivo ou executivo), serem fixados honorários advocatícios em favor de

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6.4

quem patrocina a parte vencedora (art. 55 da Lei 9.099/1995). Nesses casos, diz o art. 85, § 14, doCPC que os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmosprivilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em casode sucumbência parcial. Desse modo, pode o advogado postular nos autos do processo onde foramestabelecidos ou em processo autônomo (art. 85, § 18, do CPC) o valor dos honorários devidos.Caso os honorários não tenham sido arbitrados, a demanda terá que se limitar ao teto de 40 saláriosmínimos (art. 3º da Lei 9.099/1995). O advogado somente não poderá exigir a sua remuneraçãoperante os Juizados se esbarrar em alguns dos limites estabelecidos no art. 8º da Lei 9.099/1995.Assim, por exemplo, se o advogado for preso ou se tornar incapaz.

Se os honorários sucumbenciais forem fixados em favor da Defensoria Pública ou de sociedadede advogados (art. 85, § 15, do CPC), mesmo que não detenham capacidade processual parademandar nos Juizados, em caráter autônomo, podem essas pessoas jurídicas executar seushonorários incidentalmente, em razão da atribuição geral para execução de seus próprios julgados,prevista no art. 3º, § 1º, I, da Lei 9.099/1995.

A CAPACIDADE POSTULATÓRIA

Como já visto na introdução desta obra, na elaboração da Lei 9.099/1995, o legisladorprocurou afastar alguns dos entraves comuns aos procedimentos tradicionais, que poderiamcomprometer a eficácia dos Juizados. Ocorre que, entre os obstáculos identificados pelo legislador,está o advogado, justamente aquele que tem a missão constitucional de promover o acesso à justiça(art. 133 da CF). Assim, como não poderia proibir a atuação do advogado, a Lei dos JuizadosEspeciais criou uma distinção no que tange à capacidade postulatória: nas causas de valor até 20salários mínimos, atribuiu às partes, tanto no polo ativo como no passivo, a possibilidade de exercerdiretamente a capacidade postulatória, independentemente de sua capacidade técnica, enquanto nascausas de valor superior a 20 salários mínimos, estabeleceu a obrigatoriedade da assistência técnicado advogado. In verbis:

“Art. 9º Nas causas de valor até vinte salários mínimos, as partes comparecerãopessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência éobrigatória”.

Tal distinção gerou acalorados debates na doutrina, especialmente no que diz respeito à suaconstitucionalidade. O entendimento amplamente majoritário tem sido no sentido de que a dispensa écompatível com a Constituição Federal, pois a necessidade de intervenção do advogado não seriaabsoluta.21 Assim, concluem os defensores dessa corrente, a Lei dos Juizados Especiais, regraespecial e posterior ao Estatuto dos Advogados do Brasil (Lei 8.906/1994), poderia prescindir daatuação do advogado.22 Somos, entretanto, da opinião de que esse dispositivo viola o texto

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constitucional em dois planos:23 por ser a advocacia uma função essencial à Justiça (art. 133 da CF)e porque a distinção criada pela Lei 9.099/1995 é irrazoável.

De início, entendemos que o caput do art. 9º contraria o art. 133 da Carta Magna, que dispõeque o advogado é indispensável à administração da Justiça.24 Ora, se o advogado é figuraindispensável à administração da Justiça e os Juizados Especiais integram o Poder Judiciário, comoexpresso no art. 1º da Lei 9.099/1995, não poderia ser criada a aludida distinção.25 Os partidários dacorrente majoritária, no entanto, alegam que a expressão “nos limites da lei”, do art. 133, autoriza aolegislador infraconstitucional que dispense a presença do advogado. Destarte, a Lei 9.099/1995 seriaum caso em que o legislador teria usado dessa faculdade. Ocorre que, quando a Constituição Federaldiz “nos limites de lei”, ela está se referindo à lei que regulará a forma de atuação do advogado. Areferência, indubitavelmente, é em relação à Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), que tem comofundamento o próprio art. 133.

O problema é que o foco das discussões tem se centrado no aspecto corporativista da questão.A verdade é que o art. 133 da CF deve ser analisado à luz do papel constitucional atribuído àadvocacia, como função essencial à Justiça (Capítulo IV do Título IV da CF), em seu sentidolegítimo. Com efeito, nós entendemos que a presença do advogado deveria ser obrigatória não pelointeresse profissional da categoria, mas porque a maioria das pessoas não tem condições depromover adequadamente seus interesses em juízo. Não apenas as pessoas mais humildes, poismesmo aquelas que têm um nível cultural e social elevado não se sentem seguras para desempenharuma função que é própria de um técnico capacitado. Basta imaginar o autor que tem contra si aarguição de uma questão técnica, como uma questão preliminar, por exemplo. Como explicar a umleigo o que é uma questão preliminar? Como fazê-lo se defender adequadamente? Das duas, uma: ouo procedimento será encerrado sem resolução do mérito (arts. 29 e 51, caput, c/c art. 485, IV, doCPC), impedindo-se que o autor tenha acesso a um direito constitucionalmente garantido (art. 98, I,da CF), ou o procedimento será suspenso (art. 31, parágrafo único, c/c art. 76 do CPC) até que eleconstitua um advogado.

Se o objetivo é eliminar custos para que o interessado possa demandar, basta criar órgãos deatuação da Defensoria Pública junto aos Juizados Especiais. Com um investimentoproporcionalmente baixo, seria possível colocar defensores públicos patrocinando os interesses detodos os demandantes e demandados, que não possam constituir um advogado. Essa conclusão,inclusive, é corroborada pelo art. 56 da Lei 9.099/1995, que determina a implantação nos JuizadosEspeciais do serviço de assistência judiciária, e pelo art. 4º da Lei Complementar 80/1994, cujoinciso XIX dispõe que é uma função institucional da Defensoria Pública “atuar nos JuizadosEspeciais”.26

É preciso salientar que a intervenção do advogado representa não apenas um direito ou umafaculdade das partes, mas uma obrigação do Estado-Juiz na prestação efetiva da tutela jurisdicional.Portanto, tornar a assistência do advogado facultativa nos Juizados é o mesmo que garantir remédios

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gratuitos à população, mas tornar facultativa a sua prescrição por médicos nas “doenças de menorcomplexidade”.

Por outro prisma, acreditamos que o caput do art. 9º é inconstitucional por ferir o princípio darazoabilidade, reconhecido como inerente a todas as cartas constitucionais27 e que toda lei deveobservar. Num Estado de Direito como o nosso, não pode haver uma lei que não seja razoável. Defato, qual a diferença, em termos de complexidade, entre uma ação cobrando 20 salários mínimos euma ação cobrando 21 salários mínimos?

Trata-se, pois, de uma distinção sem qualquer fundamento lógico. Imaginemos que fossepossível excluir a atuação do advogado em determinadas causas perante os Juizados. Pelo óbvio, taldistinção somente poderia se fundar na complexidade da matéria. Assim, embora inconstitucional,seria razoável facultar a presença do advogado nas causas de menor complexidade (art. 3º, II e III).Em vez disso, a lei baseou-se no valor da causa para criar a diferenciação. Eis por que não há comose defender a constitucionalidade desse dispositivo, muito embora se trate de uma posiçãominoritária na doutrina e na jurisprudência.28

A atuação do advogado

Destarte, apesar de não concordarmos com a dispensa prevista no art. 9º, é inevitável analisaros contornos da atuação do advogado nos Juizados Especiais, na esteira do entendimento prevalente.

De plano, é preciso que se diga que, sendo a dispensa do advogado uma regra excepcional, suainterpretação deverá ser sempre restritiva, ou seja, fora das hipóteses legais deverá ser aplicada aregra geral da indispensabilidade de sua presença, de modo que a intervenção do advogado deve sedar em todas as etapas do procedimento, em ambos os graus de jurisdição, e somente quando a parte,nas causas cujo valor não ultrapasse 20 salários mínimos, assim desejar, é que a sua participaçãopoderá ser dispensada. Não obstante, se a parte ao longo do procedimento mudar de opinião, poderácontratar um advogado ou buscar a assistência jurídica vinculada ao órgão. Se a parte, entretanto,estiver assistida por profissional técnico, ainda que a causa seja inferior a 20 salários mínimos, nãopoderá falar diretamente nos autos. Com efeito, se a parte estiver com advogado, não se pode admitirque ela use das faculdades reservadas a quem está postulando diretamente, pois, assim, estar-se-iacriando um sistema misto, em que a parte e o advogado poderiam postular, simultaneamente, o que éinsustentável. Nesse caso, a parte terá que, primeiro, revogar a procuração para, em seguida,manifestar-se. Importante lembrar que, se o réu quiser fazer pedido contraposto em valoressuperiores a 20 salários mínimos, mesmo que a demanda original seja em valor inferior, ambos terãoque dispor de advogado.29

Também minoritários, defendemos que a intervenção do advogado nas causas superiores a 20salários mínimos é necessária desde o início do procedimento, inclusive na etapa deautocomposição.30 Na etapa recursal, a atuação do advogado é exigida por expressa previsão legal

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(art. 41, § 2º), para interposição ou resposta tanto do “recurso inominado” como dos embargos dedeclaração, independentemente do valor da causa: trata-se de um pressuposto recursal. Na fase deexecução da sentença (art. 52) ou na execução dos títulos extrajudiciais (art. 53), apesar da omissãolegal, entendemos, minoritários, que a intervenção do advogado é imprescindível, mesmo se aexecução for em valor inferior a 20 salários mínimos, uma vez que ambas são regidas pelo CPC, demaneira formal e técnica, o que inviabiliza a efetiva postulação direta.31 Prevalece também aqui queo patrocínio de advogado na execução, autônoma ou incidental, pode ser prescindido se o valorperseguido for inferior a 20 salários mínimos.

Por fim, nas hipóteses em que é necessária, a falta da intervenção do advogado leva àinvalidade do ato processual praticado, com as consequências daí advindas (art. 76 do CPC).Importante sublinhar que, se a falta do advogado ocorrer numa audiência, tal circunstância importará,para o autor, no encerramento do feito (art. 51, I),32 e para o réu, na revelia (art. 20). Nos demaiscasos, no entanto, é imprescindível conceder à parte prazo para a correção do vício narepresentação, nos termos do art. 76 do CPC.

A advertência quanto à conveniência do patrocínio por advogado

A advertência quanto à conveniência para a parte buscar o patrocínio de um advogado contidanos §§ 1º e 2º do art. 9º da Lei 9.099/1995 tem como objetivo efetivar o princípio constitucional daigualdade, tanto no seu aspecto material (assegurar a compreensão pela parte do fenômeno jurídicoprocessual em que está inserida e suas consequências) quanto formal (garantir que a parte tenha oacompanhamento de um profissional técnico na área jurídica). Assim, a advertência é cabível emduas situações: quando uma ou ambas as partes desacompanhadas de advogado não estejamentendendo o desenvolvimento do processo (art. 9º, § 2º) ou quando uma parte desassistida deadvogado esteja litigando em face de uma parte acompanhada de advogado (art. 9º, § 1º). Nesteúltimo caso, a recomendação deve ser feita sempre, uma vez que consubstancia um dever jurídico doEstado.33 No primeiro caso, ao contrário, a necessidade de fazer o aviso depende de um juízo devalor formado sobre a incompreensão da parte acerca do processo. Se não for dessa forma, estar-se-ia usando a premissa de que as partes não deveriam estar sozinhas em juízo, o que contraria a lógica(inconstitucional, em nossa visão) criada pela própria lei.

Embora o dispositivo fale somente no juiz, entendemos que as advertências a que aludem osparágrafos do art. 9º podem ser feitas também por qualquer componente do Juizado, desde orecebimento da petição inicial até a prolação da sentença. Se a recomendação de recorrer àassistência jurídica for acatada, mas não existirem profissionais disponíveis no momento, deve aaudiência ser remarcada e o advogado cientificado da nova data.

O instrumento do mandato

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Dispõe a lei, por aplicação do princípio da informalidade, que a representação judicial poderáser comprovada por simples manifestação oral, excetuada a atribuição de poderes especiais (art. 9º,§ 3º). De modo que basta que o advogado e a parte assinem a mesma petição ou compareçam juntosna audiência para estar caracterizada a representação.34 Trata-se de uma faculdade, o que significaque o advogado pode preferir juntar aos autos o instrumento do mandato, exatamente como faria nojuízo comum. No caso de a parte ser uma pessoa jurídica, entretanto, o ideal é que sempre sejaapresentada uma procuração escrita, juntamente com os atos constitutivos. Do mesmo modo, no casodo advogado que somente passa a atuar no feito após a audiência de instrução e julgamento, na faserecursal ou na fase executiva.

Apesar da informalidade prevista na lei, não se pode admitir que o advogado atue sem a devidae espontânea anuência do interessado. Infelizmente, isso tem ocorrido com alguma frequência nosJuizados Especiais, em razão da conduta de maus profissionais, que ficam nos corredores dosFóruns, “ajudando” as partes desassistidas. Já soubemos de casos de advogados que entraram na salade audiência junto com a parte que acabaram de conhecer para assinar a ata e depois cobraram umvalor pela audiência “feita”. Por isso, o ideal é que a representação seja ratificada pelas partes, deforma clara, durante as audiências, especialmente nas causas de valor inferior a 20 saláriosmínimos.35

Como dito, embora possa ser oral, o mandato nos Juizados Especiais precisará ser feito porescrito, quando deferir poderes especiais ao advogado. Nesse caso, é preciso que o advogadoapresente um instrumento completo, mesmo que já esteja atuando por força da procuração oral. Arelação meramente exemplificativa dos poderes especiais que o advogado pode receber está previstano art. 105 do CPC, que trouxe como inovação, em relação ao Código revogado, a possibilidade de oadvogado assinar a afirmação de gratuidade de justiça em nome da parte.36

O PREPOSTO

O preposto da pessoa jurídica ou do titular de firma individual deverá estar munido dedocumento hábil para comprovar os seus poderes (art. 9º, § 4º). Normalmente, esse documento tem aforma de carta de preposição, que deve ser acompanhado dos elementos constitutivos da pessoajurídica ou da firma individual. Os poderes conferidos ao preposto devem ser suficientes aoatingimento das finalidades dos Juizados Especiais, com menção expressa à possibilidade de realizaracordos. Caso o preposto compareça na audiência sem os documentos necessários, deverá serassinado prazo razoável para que os junte ao processo, sob pena de revelia,37 estando no polopassivo, ou encerramento do feito, estando no polo ativo.38 Alguns julgados, entretanto, não conferemao réu a possibilidade de juntar posteriormente à audiência a documentação da representação,especialmente quando relativos aos Juizados Eletrônicos.39 Trata-se de uma postura irrazoável e quedeve ser repudiada.

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Na jurisprudência, prevalece o entendimento de que nos Juizados Especiais não é possível aacumulação das condições de preposto e advogado na mesma pessoa, principalmente, por conta dosarts. 35, I, e 36, II, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB), do art. 25 do Código de Ética e Disciplinada OAB e do art. 3º do Regulamento Geral da OAB.40 Data venia, mas não concordamos com essaconclusão. De fato, a sistemática prevista na Lei 9.099/1995, pautada pela informalidade, que,inclusive, permite a dispensa do advogado, nos leva a concluir que essa acumulação pode ocorrer emqualquer circunstância.41 Note-se, ainda, que nos Juizados Federais (art. 10 da Lei 10.259/2001)existe regra que permite a cumulação da representação na pessoa do advogado. Além disso, muitasvezes, exigir que a empresa constitua um preposto e um advogado para atuar em juízo pode sereconomicamente inviável. Acrescente-se, entretanto, que na hipótese de acumulação de funções éimprescindível a outorga de poderes especiais42 e que, nesses casos, o advogado não poderá prestardepoimento.

Um tema que era bastante controvertido no âmbito dos Juizados dizia respeito à exigência deque o preposto tivesse vínculo empregatício com a pessoa jurídica acionada, para poder atuar. Parteda doutrina entendia que tal vínculo era essencial para que a representação fosse efetiva.43 Em nossoentendimento, entretanto, não havia razão para a imposição. Além de carecer de fundamento legal, adistinção contraria os comandos contidos no art. 2º da Lei. Como bem assinala Alexandre Câmara,44

o art. 932, II, do CC trata o preposto e o empregado de maneira diferente, o que leva a concluir que opreposto não precisa ter vínculo empregatício com a pessoa jurídica que representa. Ademais, épreciso reconhecer que o fato de o preposto ser empregado da pessoa jurídica em nada acrescenta àsolução do litígio, podendo, inclusive, inviabilizar a defesa, do ponto de vista econômico.

A discussão, entretanto, restou superada pela edição da Lei 12.137/2009, que, alterando aredação do § 4º do art. 9º, expressamente dispensou a necessidade de vínculo trabalhista entre opreposto e a empresa representada. In verbis:

“Art. 9º [...] § 4º O réu, sendo pessoa jurídica ou titular de firma individual, poderá serrepresentado por preposto credenciado, munido de carta de preposição com poderes paratransigir, sem haver necessidade de vínculo empregatício”.

A PRESENÇA PESSOAL DAS PARTES NAS AUDIÊNCIAS

A maioria dos estudiosos, seguidos pela jurisprudência, tem atribuído ao caput do art. 9º ocondão de exigir, nos Juizados Especiais, a presença pessoal das partes às audiências, nãoadmitindo, por conseguinte, a sua representação,45 nem mesmo pelo advogado constituído ou pelaapresentação de manifestação escrita.46 A razão de tal leitura seria, de um lado, a ideologiaparticipativa e oral do instituto, e, de outro, a menção no texto da expressão “pessoalmente”. Com odevido respeito, tal interpretação não nos parece ser a mais adequada. É preciso ponderar,inicialmente, que o entendimento restritivo tem como efeito prático a cassação do direito de acesso

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aos Juizados Especiais de um grande número de pessoas. Pense-se em pessoas com deficiênciafísica, com problemas de locomoção, que residam distante do foro da causa ou que não possamdeixar o trabalho durante o expediente.47 Ademais, a Lei somente fala da necessidade da presençapessoal das partes nas causas até 20 salários mínimos.

Na verdade, em nosso sentir, deveria ser dada uma interpretação restrita ao art. 9º da Lei, demodo a somente exigir a presença pessoal da parte nas causas de valor inferior a 20 saláriosmínimos, quando ela estiver sem advogado.48 Com efeito, a única razão plausível para se exigir apresença pessoal das partes é o fato de elas estarem exercendo a sua capacidade postulatória direta.

Note-se que na Lei dos Juizados Especiais Federais existe previsão expressa para que as partesnomeiem, “por escrito, representantes para a causa, advogado ou não” (art. 10 da Lei 10.259/2001).Assim, nesses Juizados é possível sustentar não apenas a possibilidade da representação da parte,mas também que ela seja feita por meio de advogado, que acumulará ambas as funções. Assim,defendemos que a parte só precisará estar pessoalmente nos Juizados quando, nas causas abaixo de20 salários mínimos, dispensar o patrocínio de um advogado. Nas demais, a parte poderá nomear porescrito representante para a causa, que poderá ser o seu advogado ou terceiro.

A VEDAÇÃO ÀS MODALIDADES ORDINÁRIAS DE INTERVENÇÕES DETERCEIRO

O art. 10 da Lei 9.099/1995 afastou expressamente a incidência das modalidades deintervenção de terceiro no âmbito dos Juizados Especiais. A toda evidência, o objetivo foi evitar quea sua utilização trouxesse complexidade para as causas sujeitas ao procedimento sumaríssimo. Aindaassim, persiste divergência na doutrina sobre o cabimento de alguma das formas de intervenção deterceiro, já que são institutos associados à economia processual, um dos princípios fundamentais dosJuizados Especiais (art. 2º). Maurício Antônio Ribeiro Lopes,49 por exemplo, só admite a assistêncialitisconsorcial. Theotonio Negrão,50 em seu magistério, aceita a assistência litisconsorcial, o recursode terceiro51 e os embargos de terceiro.52 Alexandre Câmara,53 por sua vez, defende a utilização dorecurso de terceiro prejudicado.

Antes de avançar na análise do dispositivo, é preciso esclarecer que existem modalidadesordinárias e extraordinárias de intervenção de terceiro. Na nossa visão, as intervenções ordináriassão a assistência (arts. 119 a 124 do CPC), a denunciação da lide (arts. 125 a 129 do CPC), ochamamento ao processo (arts. 130 a 132 do CPC) e o recurso de terceiro (art. 996 do CPC). Estasnão têm sido admitidas nos Juizados Especiais, em razão do impeditivo legal.54

Para os fins da Lei 9.099/1995, ainda assim, poderia ser feita pelo menos uma ressalva quantoà intervenção fundada em contrato de seguro. De fato, a maioria das demandas nos JuizadosEspeciais está relacionada com o direito do consumidor, logo, para harmonizar o procedimento coma regra prevista no art. 101, II, do CDC, seria justificável a admissão de intervenções baseadas em

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contratos de seguro (modalidade especial de denunciação da lide), aos moldes da regra que existiano procedimento sumário (art. 280 do CPC/1973). No entanto, sem uma previsão legal, somosforçados a reconhecer a impossibilidade de qualquer modalidade ordinária de intervenção deterceiro nos Juizados Especiais.

Além das modalidades ordinárias de intervenção de terceiro, o CPC/2015 previu no títulodedicado à intervenção de terceiros duas hipóteses especiais de intervenção:55 a desconsideração dapersonalidade jurídica (arts. 133 a 137) e o amicus curiae (art. 138). Por outro lado, transformou aantiga nomeação à autoria (arts. 62 a 69 do CPC/1973) num incidente da substituição do réu (arts.338 e 339). Vejamos como essas três figuras se inserem nos procedimentos dos Juizados Especiais.

O INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard theory) tem longa tradiçãona esfera dos Juizados Especiais, onde sempre foi utilizada sem maiores formalidades.56 Na maioriadas vezes, a pessoa atingida pela desconsideração era incluída no processo sem ser citada ou mesmoouvida, e somente tomava conhecimento disso quando seus bens eram apreendidos por alguma ordemjudicial. Essa falta de formalidade, decorrente da lacuna legislativa então existente, foi alvoconstante de críticas, por violar os preceitos do devido processo legal e do contraditório, entreoutros.57 O tema, no entanto, não passou despercebido pelo legislador, que resolveu enfrentar aquestão no CPC/2015 prevendo um incidente processual próprio para a aplicação dadesconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137). Além disso, para afastar controvérsias,o Código estabeleceu expressamente o cabimento dessa modalidade especial de intervenção deterceiros nos Juizados Especiais:

“Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processode competência dos juizados especiais”.

A novidade, portanto, reside no fato de que a desconsideração da personalidade jurídica teráque seguir nos Juizados Especiais as regras previstas no Novo Código. Esses dispositivos, emapertada síntese, preveem que a desconsideração será processada em apartado, por meio de umincidente processual que pode ser deflagrado em todas as etapas do procedimento, exceto no caso deser formulado na própria petição inicial (art. 134). Se o pedido de desconsideração for instauradopor meio de incidente, o processo é suspenso e a citação do sócio ou da pessoa jurídica édeterminada (art. 135). Em qualquer hipótese, o julgamento do pedido de desconsideração é feito pormeio de decisão interlocutória (art. 136), recorrível por agravo de instrumento (art. 1.015, IV).58

Acolhido o pedido de desconsideração, passa a ser presumida a fraude de execução, as alienações eonerações feitas (art. 137). Em razão do conteúdo de tais regras, que inegavelmente trazemcomplexidade ao procedimento, o ideal é que se exija que a parte sem formação jurídica esteja

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acompanhada por advogado para a instauração do incidente (art. 9º, § 2º, da Lei 9.099/1995).59

É preciso reconhecer, no entanto, que muitos Juizados Especiais pelo Brasil têm se negado aaplicar nos Juizados Especiais o procedimento previsto pelo CPC, sob a alegação deincompatibilidade com os seus princípios fundamentais (art. 2º).60 Diante da remissão literal da lei(não se trata de aplicação subsidiária), entretanto, parece inevitável defender a aplicação das regrasprevistas no CPC para reger a desconsideração da personalidade jurídica que, ademais, têmfundamento na defesa do contraditório e do devido processo legal.61

A INTERVENÇÃO DO AMICUS CURIAE

O amicus curiae, expressão latina que significa “amigo da corte” ou “amigo do tribunal”, é apessoa ou entidade que ingressa no processo para auxiliar o julgamento da causa, por iniciativaprópria ou por provocação, oferecendo esclarecimentos sobre questões controvertidas. O amicuscuriae não é um terceiro imparcial, como o Ministério Público. Ele deve demonstrar legítimointeresse na causa, em virtude da relevância da matéria e de sua representatividade quanto à questãodebatida. O papel dele é representar em juízo os interesses públicos ou privados que serãoreflexamente atingidos com o desfecho do processo.62

O amicus curiae foi introduzido no direito brasileiro com a edição da Lei 9.868/1999 (Lei daAção Direta de Inconstitucionalidade), que, em seu art. 7º, § 2º, prevê a sua intervenção nosprocedimentos de controle concentrado. Posteriormente, outros diplomas passaram a tratar tambémdo amicus curiae, como, por exemplo, o art. 3º, § 2º, da Lei 11.417/2006, que trata das súmulasvinculantes. Em 2001, o art. 14, § 7º, da Lei 10.259 (Lei dos Juizados Especiais Federais) previu aintervenção do amicus curiae no incidente de uniformização de jurisprudência, inserindo essa figurano Sistema dos Juizados. Regra similar também existia na Lei dos Juizados Especiais da FazendaPública (art. 19, § 4º, da Lei 12.153/2009), mas, infelizmente, foi vetada pela Presidência daRepública, sob a alegação de que traria complexidade ao procedimento.63

O CPC/2015, entretanto, trouxe a previsão expressa da figura do amicus curiae no do Título IIIdo Livro III, que trata da intervenção de terceiros, com cabimento amplo, para todos os processos eem todos os graus de jurisdição. Destarte, resta indagar se o amicus curiae seria cabível também noâmbito dos Juizados Especiais, para além das hipóteses de processamento do incidente deuniformização da jurisprudência, especialmente diante da proibição de intervenções de terceiro,prevista no art. 10 da Lei 9.099/1995.

Em nosso sentir, a resposta é afirmativa.64 Com efeito, além do papel salutar de trazer umacontribuição qualitativa para o julgamento das causas nos Juizados, o amicus curiae poderá auxiliarno controle da prestação da tutela jurisdicional e atuar nos incidentes de resoluções de demandasrepetitivas que tenham reflexos nos Juizados.65 Ademais, como já sublinhado, a intervenção doamicus curiae já era aceita nos Juizados Especiais Federais e, por maioria da doutrina, nos Juizados

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Especiais da Fazenda Pública, de modo que, pela interpretação sistemática, subsidiada pelo CPC, épossível concluir pelo cabimento do instituto.

Por certo, nos processos em que houver a intervenção do amicus curiae, a causa poderá sofrercom o acréscimo indesejável de complexidade. No entanto, os benefícios trazidos pela sua atuação,no plano geral, ponderados com a excepcionalidade de sua incidência, nos animam a sustentar queessa complexidade deva ser assimilada pelo Sistema dos Juizados.

A NOMEAÇÃO DE TERCEIRO PARA SUBSTITUIR O RÉU

O CPC/2015 acabou com a nomeação à autoria como forma de intervenção de terceiro (arts. 62a 69 do CPC/1973). No seu lugar, entretanto, abriu a possibilidade de o autor substituir o réu que, nacontestação, alegar ser parte ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo causado. Nessahipótese, o terceiro pode ser incluído no processo tanto por iniciativa do autor como por indicaçãodo próprio réu, que tem o dever jurídico de fazê-lo, se tiver conhecimento para tanto.

Trata-se, pois, de hipótese de correção do polo passivo da demanda, que pode ser aplicado nosJuizados Especiais, sem mácula à previsão contida no art. 10 da Lei 9.099/1995.66 Na hipótese de serdeferida a substituição, o procedimento deverá ser reiniciado, ou seja, o réu substituto deverá sercitado para comparecer numa nova audiência de conciliação (arts. 16 e seguintes da Lei 9.099/1995).

O LITISCONSÓRCIO

A segunda parte do art. 10 se limita a anunciar que é possível a formação de litisconsórcio nosJuizados Especiais. Por certo, a previsão abrange tanto o polo ativo como passivo. Também deve seradmitido o litisconsórcio ulterior, na hipótese prevista no parágrafo único do art. 115 do CPC. Épreciso sublinhar ainda que a pluralidade de partes no polo ativo somente poderá ocorrer quando aspretensões dos litisconsortes forem conexas. Essa conclusão decorre de uma interpretação extensivado art. 15, que estabelece que a cumulação de pedidos depende da conexão entre eles. O objetivo dalimitação prevista no art. 15 é evitar que causas menos complexas individualmente consideradaspossam, reunidas, tornar-se complexas. Por isso, a mesma lógica deve ser aplicada na formação dolitisconsórcio.

Por outro giro, advogamos a tese de que, em decorrência de suas características, não é possívela formação de um litisconsorte multitudinário nas demandas propostas perante os Juizados Especiais.Assim, havendo um grande número de sujeitos em um dos polos da relação jurídica processual, deacordo com um juízo de razoabilidade (instalações do Juizado, amplitude fática da causa, atividadeprobatória a ser desenvolvida, número de testemunhas etc.), deve o procedimento ser encerrado, semresolução do mérito, na forma do art. 51, I, da Lei 9.099/1995, exceto quando se tratar delitisconsórcio facultativo, quando então poderá ser aplicada a regra contida no § 1º do art. 113 doCPC. De fato, se o litisconsórcio multitudinário for facultativo, o juiz deverá limitar o número de

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participantes da demanda, aproveitando o processo.67

Existe ainda muita discussão sobre a possibilidade de se demandar em face de empresas públicase sociedades de economia mista (estaduais, distritais ou municipais), perante os JuizadosEspeciais da Lei 9.099/1995. A orientação majoritária e correta, dada a natureza jurídica dessespersonagens, é que tal postulação é plenamente viável. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 131 doFONAJE: “As empresas públicas e sociedades de economia mista dos Estados, do DistritoFederal e dos Municípios podem ser demandadas nos Juizados Especiais”.Theotonio Negrão, op. cit., p. 992. Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 148 do FONAJE:“Inexistindo interesse de incapazes, o Espólio pode ser parte nos Juizados Especiais Cíveis” e“Recurso inominado. Menor impúbere. Matéria discutida nos autos que afeta à dissolução de uniãoestável. Incompetência absoluta do Juizado Especial Cível. Vedação legal expressa nos arts. 3º, §2º, e 8º, caput, da Lei 9.099/1995. Extinção do processo que se impõe a teor do art. 8º da Lei dosJuizados” (TJRJ, 1ª TR, RI 2000.700.000507-5, Rel. Juíza Gilda Maria Carrapatoso, j. em23.03.2000).Um exemplo de prisão administrativa previstas no ordenamento jurídico brasileiro é a prisãoadministrativa disciplinar militar (art. 12, c, do Código de Processo Penal Militar).Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 24.Em sentido contrário, entendendo que em qualquer fase do procedimento a prisão impede acapacidade para ser parte, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 60.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 4.2.4 da CEJCA: “É possível ser proferida a sentença em açãode conhecimento em face da empresa em concordata ou em liquidação extrajudicial”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 51 do FONAJE: “Os processos de conhecimento contraempresas sob liquidação extrajudicial, concordata ou recuperação judicial devem prosseguir até asentença de mérito, para constituição do título executivo judicial, possibilitando a parte habilitar oseu crédito, no momento oportuno, pela via própria”.“Art. 38. Aplica-se às microempresas o disposto do art. 8º da Lei 9.099, de 26 de setembro de1995, passando essas empresas, assim como as pessoas físicas capazes, a serem admitidas aproporem ação perante o Juizado Especial, excluídos os cessionários de direitos de pessoasjurídicas”. A Lei 9.841/1999 foi revogada pela LC 123/2006.“Art. 6º Podem ser partes no Juizado Especial Federal Cível: I – como autores, as pessoas físicase as microempresas e empresas de pequeno porte, assim definidas na Lei 9.317, de 5 de dezembrode 1996”.Dinamarco, Instituições, p. 780; e Alexandre Câmara, Juizados, p. 63.“Art. 74. Aplica-se às microempresas e às empresas de pequeno porte de que trata esta LeiComplementar o disposto no § 1º do art. 8º da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, e no inciso Ido caput do art. 6º da Lei 10.259, de 12 de julho de 2001, as quais, assim como as pessoas físicascapazes, passam a ser admitidas como proponentes de ação perante o Juizado Especial, excluídos

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os cessionários de direito de pessoas jurídicas”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 135 do FONAJE: “O acesso da microempresa ou empresa depequeno porte no sistema dos juizados especiais depende da comprovação de sua qualificaçãotributária atualizada e documento fiscal referente ao negócio jurídico objeto da demanda”.Existem, no entanto, várias decisões exigindo outros requisitos para a atuação dessas pessoasjurídicas nos Juizados. Por exemplo, veja-se o Enunciado 135 do FONAJE: “O acesso damicroempresa ou empresa de pequeno porte no sistema dos juizados especiais depende dacomprovação de sua qualificação tributária atualizada e documento fiscal referente ao negóciojurídico objeto da demanda”.Como o art. 9º, § 4º, da Lei 9.099/1995 (alterado pela Lei 12.137/2009), quando fala em preposto,somente menciona a pessoa jurídica ré, alguns julgados passaram a sustentar que as pessoasjurídicas autoras não poderiam se utilizar desse expediente. Nesse sentido, veja-se o Enunciado141 do FONAJE: “A microempresa e a empresa de pequeno porte, quando autoras, devem serrepresentadas, inclusive em audiência, pelo empresário individual ou pelo sócio dirigente”. Nãocomungamos dessa posição, por violar a isonomia que deve existir entre as partes.Alexandre Câmara, Juizados, p. 66, entretanto, sustenta que a representação judicial das pessoasjurídicas deverá ser efetivada sempre por intermédio de advogado, ainda que a causa tenha valorinferior a 20 salários mínimos, esteja ela no polo passivo ou ativo da relação jurídica processual.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 48 do FONAJE: “O disposto no parágrafo 1º do art. 9º da Lei9.099/1995 é aplicável às microempresas e às empresas de pequeno porte”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 146 do FONAJE: “A pessoa jurídica que exerça atividade defactoring e de gestão de créditos e ativos financeiros, excetuando as entidades descritas no art. 8º,§ 1º, inciso IV, da Lei nº 9.099/95, não será admitida a propor ação perante o Sistema dos JuizadosEspeciais (art. 3º, § 4º, VIII, da Lei Complementar 123, de 14 de dezembro de 2006)”.Eduardo Oberg, op. cit., p. 179.Nesse sentido, veja-se a Ementa 238 do ETRJECERJ: “Procedimento sumário estabelecido pelaLei 9.245, de 26.12.1995, não alterou o art. 3º, inciso II da Lei 9.099/1995, cujo projeto foiencaminhado posteriormente ao Congresso Nacional, mas votado anteriormente, por equívoco detramitação no processo legislativo. O condomínio, pessoa formal, tem legitimação ativa paralitigar no Juizado Especial. Exegese do art. 8º, § 1º, da Lei 9.099/1995. Nulidade de sentença queindeferiu a inicial”, o Enunciado 9 do FONAJE: “O condomínio residencial poderá propor açãono Juizado Especial, nas hipóteses do art. 275, inciso II, item b, do Código de Processo Civil” e oEnunciado 111 do FONAJE: “O condomínio, se admitido como autor, deve ser representado emaudiência pelo síndico, ressalvado o disposto no § 2º do art. 1.348 do Código Civil”.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 180. Veja-se, também: “O condomínio da Lei4.591/1964, por ser uma comunhão de direitos e obrigações com personalidade judiciária não seequipara à pessoa natural, lhe sendo vedado o acesso como parte ativa do procedimento previstopara o Juizado Especial” (TACSP, 2ª Turma, AC 531.700-SP, Rel. Juiz Laerte Sampaio, j. em04.11.1998), o Enunciado 4.1.1 da CEJCA: “Somente as pessoas físicas capazes podem proporação perante os Juizados Especiais Cíveis, não podendo fazê-lo as pessoas jurídicas e formais”, aEmenta 162 do ETRJECERJ: “Vedando a lei específica que entidades condominiais figurem como

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autoras em processos dos Juizados Especiais Cíveis e ainda comprovada a quitação do débitoalegado, outra solução não se apresenta senão a confirmação do julgado terminativo”; a Ementa314 do ETRJE-CERJ: “O condomínio não é pessoa física capaz e assim sendo não pode ser parteno polo ativo da relação processual, em sede de Juizado Especial. Extinção do processo semapreciação do mérito”; e o Enunciado 4.3 da CEJCA: “O condomínio não pode demandar noJuizado Especial a cobrança de cotas condominiais”.Op. cit., p. 42. Com o mesmo entendimento, temos Luiz Fux, op. cit., p. 42; e Alexandre Câmara,Juizados..., op. cit., p. 64.Sobre o tema, veja-se: “Juizado Especial. Lei 9.099/1995, artigo 9º. Faculdade conferida à partepara demandar ou defender-se pessoalmente em juízo, sem assistência de advogado. Ofensa àConstituição Federal. Inexistência. Não é absoluta a assistência do profissional da advocacia emjuízo, podendo a lei prever situações em que é prescindível a indicação de advogado, dados osprincípios da oralidade e da informalidade adotados pela regra para tornar mais célere e menosoneroso o acesso à justiça” (STF, ADI 1.539/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. em 24.04.2003).Nesse sentido, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 62; Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit.,v. III, p. 477; e Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 785. Indo mais além e defendendo apossibilidade de qualquer parte, em qualquer juízo, atuar sem advogado, com ampla pesquisadoutrinária, confira Fernando Antônio de Souza e Silva, O direito de litigar sem advogado, emespecial nas p. 19 e seguintes.Nesse sentido, Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 25; e Alexandre Câmara, Juizados, p.66. No caso, a interpretação constitucional tem que buscar a mais ampla e efetiva tutela dosinteresses fundamentais em jogo. Veja-se, sobre os princípios da interpretação constitucional, JoséJoaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional e teoria da Constituição, p. 165.Sobre essa contrariedade, ver, de Rubens Approbato Machado, Indispensabilidade do advogado.De fato, a distinção reduz o espectro de efetividade de uma regra constitucional de índoleprotetiva. Sobre a busca da máxima efetividade na interpretação constitucional, ver WillisSantiago Guerra Filho, Processo constitucional e direitos fundamentais, p. 58.Ver ainda, sobre o papel da Defensoria Pública nos Juizados Especiais, o art. 134 da CF, o art. 1ºda Lei Complementar 80/1994, o art. 185 do CPC, e os arts. 5º, I, e 6º, VII e VIII, do Código deDefesa do Consumidor.Ver, sobre esse princípio, Carlos Roberto de Siqueira Castro, O devido processo legal e arazoabilidade das leis na nova Constituição, e Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho,Direito Processual Penal em face da Constituição, p. 71. O princípio da razoabilidade foiexpressamente previsto no art. 8º do CPC.Sobre a posição majoritária, merece destaque o fato de o STF ter considerado prejudicado opedido de declaração de inconstitucionalidade do inciso I do art. 1º da Lei 8.906/1994 (Estatutoda Advocacia) pela edição da Lei 9.099/1995. Esse dispositivo previa a atuação privativa dosadvogados nos Juizados Especiais. De acordo com a Corte Suprema, a superveniência da Lei9.099/1995, dispondo sobre o mesmo tema, teve o condão de revogar tacitamente a regraimpugnada (STF, Pleno, ADIn 1.127-8/DF, Rel. Min. Paulo Brossard, j. em 17.05.2006).Nesse sentido, veja-se os Enunciados 4.2.2 da CEJCA e 27 do FONAJE, com a mesma redação:

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“Na hipótese de pedido de valor até 20 salários mínimos, é admitido pedido contraposto, de valorsuperior ao da inicial, até o limite de 40 salários mínimos, sendo obrigatória a assistência deadvogado às partes”.Em sentido contrário, entendendo que a presença do advogado só é necessária a partir daaudiência de instrução e julgamento, inclusive para redigir a petição inicial, Eduardo Oberg, op.cit., p. 178. Na jurisprudência, vejam-se o Enunciado 7.1 da CEJCA: “A assistência obrigatóriaprevista no art. 9º da Lei 9.099/1995 tem lugar a partir da fase instrutória, não se aplicando para aformulação do pedido e a sessão de conciliação”, o Enunciado 8.6 da CEJCA: “No procedimentodos Juizados Especiais Cíveis é válido o acordo celebrado pelas partes, independentemente daassistência de advogado, mesmo nas causas de valor superior a 20 salários mínimos” e oEnunciado 36 do FO-NAJE: “A assistência obrigatória prevista no art. 9º da Lei 9.099/1995 temlugar a partir da fase instrutória, não se aplicando para a formulação do pedido e a sessão deconciliação”.Se os conceitos processuais presentes na fase cognitiva já são de difícil compreensão para o leigo,imagine os elementos da etapa executiva, tais como penhora, avaliação, expropriação e embargosà execução.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 8.5 da CEJCA: “A ausência de advogado na Audiência deInstrução e Julgamento (AIJ), em feito de valor superior a 20 salários mínimos permite que o Juizdispense a instrução e julgue a lide ‘no estado’”.Nesse sentido, confira-se a Ementa 29 do ETRJECERJ: “Assistência por advogado.Comparecendo uma das partes à audiência de instrução e julgamento, assistida por advogado,incumbe ao juiz observar o art. 9º, § 1º, da Lei 9.099/1995”.Enunciado 77 do FONAJE: “O advogado cujo nome constar do termo de audiência estaráhabilitado para todos os atos do processo, inclusive para o recurso”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 418 do ETRJECERJ: “A informalidade que se aplica nosJuizados Especiais permite apenas que os interessados possam pleitear sem a necessidade deconstituição de advogado nas causas de valor limitado até 20 salários mínimos, entretanto, atémesmo em tais causas, se o postulante se faz representar por advogado, indispensável é oinstrumento de mandato, principalmente quando se verifica que a autora não compareceu e neminterveio pessoalmente em qualquer dos atos do processo. Representação processual inexistente,propiciadora da extinção do processo sem apreciação do mérito”.Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 379.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 99 do FONAJE: “O preposto que comparece sem carta depreposição, obriga-se a apresentá-la no prazo que for assinado, para validade de eventual acordo,sob as penas dos artigos 20 e 51, I, da Lei 9.099/1995, conforme o caso”. Admitindo que a falta dadocumentação não inviabiliza o reconhecimento da representação, confira-se a Ementa 277 doETRJECERJ: “O fato de uma pessoa apresentar-se como síndico em Juízo, assistido poradvogado, sem a comprovação de sua nomeação, não legitima o decreto da revelia. A presunçãode veracidade de suas afirmações, quanto à qualidade de síndico, embasada no princípio da boa-fé, merece prevalecer até prova em contrário, podendo, quando muito, exigir-se a regularização no

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prazo de 10 dias, antes de se proferir sentença”.Nesse sentido, confira-se a Ementa 220 do ETRJECERJ: “Audiência de conciliação, instrução ejulgamento. Preposto presente, sem carta. Ânimo de defesa configurado. Advogado constituído, ecom poderes especiais. Revelia decretada. Cerceamento de defesa. Nulidade que se declara”.Nesse sentido, veja-se: “Na hipótese, o recorrente apresentou os atos constitutivos da empresa,procuração e carta de preposição de forma física, sem o prévio recolhimento de GRERJ comoexige o Ato Normativo TJRJ nº 01/2012, o que é vedado em processos judiciais eletrônicos (fls.32). A inicial não veio instruída com cópia da citação em que, via de regra, consta a advertênciade que aquele Juizado opera com o processamento digital. Conclui-se que a decretação da reveliafoi correta, inexistindo a possibilidade de abertura de prazo para regularização do ato” (TJRJ, 5ªTR, RI 0030432-46.2007.8.19.0068, Rel. Juiz Suzane Viana Macedo, j. em 10.05.2012).Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 8.2 da CEJCA: “É vedada a acumulação das condições depreposto e advogado, na mesma pessoa (arts. 35, I, e 36, II, da Lei 8.906/1994 c/c art. 23 doCódigo de Ética e Disciplina da OAB)”, a Ementa 76 do ETRJECERJ: “As condições de prepostoe de advogado não podem ser acumuladas em uma só pessoa, pois na primeira condição estariaobrigada a prestar depoimento, sob pena de confissão (art. 343, § 2º, do Código de ProcessoCivil) e na segunda lhe seria facultado recusar-se a depor (art. 7º, XIX, da Lei 8.906/1994)”, aEmenta 43 do 2º ETRJECERJ: “Revelia da Pessoa Jurídica. O comparecimento do advogado nãosupre a ausência do preposto, pela possibilidade de confessar. Exegese do artigo 20 da Lei9.099/1995” e o Enunciado 98 do FONAJE: “É vedada a acumulação simultânea das condições depreposto e advogado na mesma pessoa (arts. 35, I, e 36, II, da Lei 8.906/1994 combinado com oart. 23 do Código de Ética e Disciplina da OAB)”.Nesses termos, vejam-se a Ementa 243 do ETRJECERJ: “Advogado preposto. Embora eticamentepossa não ser recomendável, em não havendo impedimento legal, pode o advogado ser, ao mesmotempo, preposto e advogado de pessoa jurídica, uma vez que o ‘Código de Ética’ da OAB não élei” e a Ementa 136 do ETRJECERJ: “Preposto. Atuação simultânea como advogado.Possibilidade. O sistema instituído pela Lei 9.099/1995 não impede a atuação de uma só pessoanas qualidades de advogado e preposto, bastando apenas a apresentação da devida carta derepresentação e mandato procuratório, legitimando a interveniência do profissional no processo,afigurando-se irrelevante a existência de vínculo laboral entre o advogado e o preponente”.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 196 do ETRJECERJ: “Ausência do preposto na AIJ, comrepresentação do mandado por advogado sem poderes para transigir. Incidência da revelia, naforma do art. 20 da Lei 9.099/1995”, a Ementa 333 do ETRJECERJ: “Ausência de Preposto.Revelia. Efeitos. Assistência e Representação. A ausência da reclamada à audiência de instrução ejulgamento, desde que regular e pessoalmente intimada, caracteriza a revelia. O comparecimentodo Advogado à audiência não obsta a decretação da revelia, se não tem ele poderes expressospara representar, como preposto, a empresa para a qual advoga, prestando-lhe assistência” e aEmenta 236 do ETR-JECERJ: “Revelia. Preposto que comparece à AIJ, sem a carta depreposição. Aplicação do art. 20 da Lei 9.099/1995”.Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 62, e Eduardo Oberg, op. cit., p. 179.Juizados..., op. cit., p. 102.

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Humberto Theodoro Júnior, op. cit., p. 477; Oberg, op. cit., p. 178; Alexandre Freitas Câmara,Juizados..., op. cit., p. 102; e Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 806. Nesse sentido, vejam-seo Enunciado 8.1 da CEJCA: “A presença das partes – pessoas físicas e/ou pessoas jurídicas,representadas por preposto – é obrigatória nas audiências de conciliação, instrução e julgamento”,e da Ementa 48 do ETRJECERJ: “O comparecimento pessoal das partes litigantes nas audiênciasé obrigatório, permitindo a lei especial, contudo, que o réu, sendo pessoa jurídica ou titular defirma individual, seja representado por preposto credenciado, desde que mantenha vínculoempregatício com a representada. Nos termos do § 4º do art. 9º da Lei 9.099/1995, o que éfacultativo é a representação e não o comparecimento das partes litigantes. Aplicação do art. 20 daLei 9.099/1995” e do Enunciado 20 do FONAJE: “O comparecimento pessoal da parte àsaudiências é obrigatório”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 78 do FONAJE: “O oferecimento de resposta, oral ou escrita,não dispensa o comparecimento pessoal da parte, ensejando, pois, os efeitos da revelia”.Nesse sentido, Erick Linhares, Juizados especiais cíveis: comentários aos enunciados do Fonaje(Fórum Nacional de Juizados Especiais), p. 62.Em sentido intermediário, permitindo que familiares representem as partes, veja-se a Ementa 271do ETRJECERJ: “Autorização do Juízo, com aquiescência da autora, para que o filho do réurepresente o pai em audiência, por se encontrar aquele impossibilitado de comparecer ao ato, deacordo com atestado médico apresentado. Audiência válida porque não prejudicado o direito dedefesa do réu, o qual implicitamente concordou com a atuação do filho no ato judicial”.Op. cit., p. 25.Op. cit., p. 993.Várias decisões têm admitido o recurso de terceiro, quando o terceiro é reputado comolitisconsórcio necessário à demanda. Nesse sentido, veja-se a Ementa 405 do ETRJECERJ:“Reclamação formulada por morador de prédio fronteiriço visando compelir proprietário de cãesa adotar providências de ordem a evitar ruídos e ameaça de ataques dos animais. Prédio compostode mais de uma unidade residencial, tendo sido a reclamação proposta em face de apenas um dosproprietários, o qual concordou em vedar com folha de flandres as grades do portão. Comprovadoque o portão e a área de localização dos cães são de uso comum dos moradores do prédio, impõe-se a citação de todos os proprietários das unidades autônomas, configurado que se encontra olitisconsórcio unitário, nos termos do art. 47 do Código de Processo Civil. Prolatada sentença,sem a regular convocação citatória de todos os litisconsortes, admite recurso de outrosproprietários legitimados, na qualidade de terceiros interessados, para o fim de se determinar osaneamento do vício processual. Conhece-se e dá-se provimento ao recurso interposto pelosinteressados, restando cassada a douta sentença de fls. 25/26 e decisões supervenientes, a fim deque o Juízo Monocrático determine a citação dos referidos litisconsortes, seguindo o processo osseus ulteriores termos”.Importante esclarecer que não consideramos os embargos de terceiro modalidade de intervençãode terceiro. Assim, os embargos de terceiro não estão incluídos na vedação prevista no art. 10 daLei. O cabimento dos embargos de terceiro nos Juizados será tratado mais à frente, no item 3.1.2da Parte II.

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Juizados..., op. cit., p. 74.Nesse sentido, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 63; Humberto Theodoro Júnior, Curso, v. III, p.478; e Luiz Fux, op. cit., p. 44. Este último, entretanto, parece admitir o recurso de terceiroprejudicado.Existem outras modalidades especiais de intervenção de terceiro previstas no CPC, como, porexemplo, a habilitação do crédito deixado pelo falecido no procedimento de inventário e partilha(art. 642 do CPC). Esta e outras intervenções de terceiro, no entanto, não têm aplicabilidade aosJuizados Especiais, em razão das limitações legais (arts. 3º e 8º).Enunciado 60 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais – FONAJE: “É cabível a aplicação dadesconsideração da personalidade jurídica, inclusive na fase de execução”. Por todos, veja-seErick Linhares, Juizados especiais cíveis: comentários aos enunciados do Fonaje (FórumNacional de Juizados Especiais), p. 34.Apesar das críticas, em geral a jurisprudência endossava a aplicação desregrada do instituto.Nesse sentido, veja-se: “Segundo a jurisprudência do STJ, a desconsideração da personalidadejurídica, como incidente processual, pode ser decretada sem a prévia citação dos sócios atingidos,aos quais se garante o exercício postergado ou diferido do contraditório e da ampla defesa.Precedentes de ambas as Turmas que integram a Segunda Seção do STJ” (STJ, 3ª Turma, AgRg noREsp 1.523.930/ RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. em 16.06.2015).Conforme será visto mais à frente, defendemos que a edição do CPC/2015 reforçou a posiçãofavorável ao cabimento do agravo de instrumento nos Juizados Especiais.Sergio Luiz de Almeida Ribeiro, Hipóteses de cabimento do incidente de desconsideração dapersonalidade jurídica nos juizados especiais cíveis, p. 136, sustenta que apenas quando adesconsideração for requerida na petição inicial, cognitiva ou executiva, é que poderia serprocessada nos Juizados Especiais. Nas demais hipóteses, seria uma modalidade de intervençãode terceiro, o que seria vedado pela Lei 9.099/1995 (art. 10).Nesse sentido, Alexandre Chini e Rodolfo Kronemberg Hartmann, Os juizados especiais cíveis ea necessária flexibilização do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Veja-se,também, o seguinte julgado: “Ademais, como preleciona a melhor doutrina, o art. 1062 doCPC/2015 deve ser interpretado à luz dos princípios informativos previstos no art. 2º da Lei9.099/1995, especialmente os da celeridade e informalidade. Assim, deve-se interpretar aaplicação do incidente de desconsideração previsto nos artigos 133 e 137 do CPC/2015 no que forcompatível com a celeridade e informalidade preconizada para os Juizados Especiais Cíveis”(TJRJ, 1ª TR, MS 0001379-78.2016.8.19.9000, Rel. Juiz Paloma Rocha Douat Pessanha, j. em30.01.2017).Sobre o tema, veja-se nosso artigo Os impactos do Novo CPC nos juizados especiais, p. 1.070.Alexandre Freitas Câmara, O Novo Processo Civil brasileiro, p. 106.Desde a edição da Lei dos Juizados da Fazenda Pública, sempre sustentamos que o veto ao art. 19,§ 4º, da Lei 12.153/2009 não impediria a atuação do amicus curiae no incidente de uniformizaçãoda jurisprudência instaurado no seu âmbito de atuação, seja pela interpretação sistemática, sejapela aplicação das regras regimentais do STJ e do STF.

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Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 381.O art. 985 do CPC, ao tratar do incidente de resolução de demandas repetitivas, assentou que,“julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada: I – a todos os processos individuais oucoletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição dorespectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ouregião”. Por isso também é importante a atuação do amicus curiae no âmbito dos JuizadosEspeciais.Nesse sentido, o Enunciado 42 do FPPC: “(art. 339 do CPC) O dispositivo aplica-se mesmo aprocedimentos especiais que não admitem intervenção de terceiros, bem como aos juizadosespeciais cíveis, pois se trata de mecanismo saneador, que excepciona a estabilização doprocesso”.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., 74. Em sentido contrário, defendendosempre a interrupção do feito no caso de litisconsórcio multitudinário, vejam-se a Ementa 53 do 2ºETRJECERJ: “Ação de reparação de danos ocasionais. Ofensa ao Código do Consumidor. Poloativo conjunto com mais de cinquenta autores. Impossibilidade. Incompatibilidade com oprocedimento do Juizado Especial” e o Enunciado 139 do FONAJE: “A exclusão da competênciado Sistema dos Juizados Especiais quanto às demandas sobre direitos ou interesses difusos oucoletivos, dentre eles os individuais homogêneos, aplica-se tanto para as demandas individuais denatureza multitudinária quanto para as ações coletivas. Se, no exercício de suas funções, os juízese tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil coletiva,remeterão peças ao MP para as providências cabíveis”.

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7.1

7A ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA E A DEFENSORIA

PÚBLICA

A ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA

Apesar de a Lei 9.099/1995 não ter regulado especificamente a questão da assistênciajudiciária nos Juizados Especiais, em três passagens mencionou o tema: a) estabeleceu que, “sendofacultativa a assistência, se uma das partes comparecer assistida por advogado, ou se o réu forpessoa jurídica ou firma individual, terá a outra parte, se quiser, assistência judiciária prestada porórgão instituído junto ao Juizado Especial, na forma da lei local” (art. 9º, § 1º); b) dispensou opreparo do “recurso inominado” nas hipóteses de assistência judiciária gratuita (art. 54, parágrafoúnico); c) determinou que junto ao Juizado Especial deve ser implantado o serviço de assistênciajudiciária (art. 56).

Dessa forma, utilizando-se da literalidade das regras citadas, pode-se afirmar que o serviço deassistência judiciária gratuita, presente em todos os órgãos dos Juizados Especiais, deve atuarsempre que a parte interessada assim requerer, por ser hipossuficiente (econômico, jurídico outécnico) ou por estar litigando contra uma pessoa jurídica ou alguém patrocinado por advogado.Nesta segunda hipótese, defendemos que a atuação da assistência judiciária deverá ocorrer,independentemente da situação de hipossuficiência da parte interessada. Trata-se de aplicação doprincípio da isonomia dentro da lógica criada pelo regime de exceção dos Juizados Especiais. Comovisto, nesses órgãos, as partes podem atuar sem o auxílio de um advogado nas causas com valor até20 salários mínimos. Por isso, não sendo possível proibir que uma das partes tenha advogado, asaída foi deferir à outra, que esteja desacompanhada, o acesso à assistência judiciária. No casoespecífico da parte que litiga em face de uma pessoa jurídica, a assistência judiciária tem o objetivode atenuar a presumida hipossuficiência existente nesses tipos de litígios.

Na maioria dos Juizados, o serviço de assistência judiciária é prestado por advogados dativos,indicados pela OAB e nomeados pelos Tribunais. Esses advogados podem ou não ser remuneradospelos serviços que prestam e, em alguns Estados, tomam para si os honorários sucumbenciaiseventualmente aplicados (art. 55). O ideal, entretanto, em observância ao comando contido na CartaMagna (art. 134 da CF), é que esse serviço fosse integralmente prestado pela Defensoria Pública.Essa posição ganhou ainda mais força com a edição do CPC/2015, que dedicou um títulointegralmente à Defensoria Pública (Título VII do Livro III da Parte Geral), cujo artigo de aberturaassim dispõe:

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“Art. 185. A Defensoria Pública exercerá a orientação jurídica, a promoção dos direitoshumanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, em todos os graus,de forma integral e gratuita”.

A DEFENSORIA PÚBLICA

Conforme assinalado na introdução deste livro, a principal motivação para a criação dosJuizados Especiais foi a implementação dos ideários ligados à busca pelo acesso à justiça. Pois osmesmos ideais, especialmente aqueles tratados na Primeira Onda Renovatória do Direito,1 serviramde inspiração para a criação da Defensoria Pública e sua inclusão no texto constitucional (arts. 5º,LXXIV e 134 da CF). De modo que tanto a Defensoria Pública como os Juizados possuem a mesmabase filosófica e jurídica.2 Por essa razão, a Lei Complementar 80/1994 (Lei Orgânica da DefensoriaPública), reformada em 2009, previu expressamente a atuação da Defensoria Pública junto aosJuizados Especiais (art. 4º, XIX).3 O art. 56 da Lei 9.099/1995, entretanto, mencionou apenas acriação de um “serviço de assistência judiciária gratuita”, sem mencionar a Defensoria Pública. Talsituação tem uma explicação histórica: o art. 56 repetiu literalmente o art. 54 da Lei 7.244/1984 (Leidos Juizados de Pequenas Causas), que, por sua vez, foi redigido no início da década de 1980,período anterior à consolidação jurídica e política da Defensoria Pública em nosso País. Portanto, ainterpretação constitucional, teleológica e sistemática do art. 56 leva à conclusão de que é aDefensoria Pública que deve atuar junto aos Juizados Especiais, prestando não apenas o serviço deassistência judiciária, mas também a assistência jurídica4 na seara das causas de menor repercussão.5

Outro aspecto a destacar é que a orientação majoritária tem sustentado que a atuação daDefensoria Pública somente deve ocorrer quando a parte for hipossuficiente e solicitar a assistênciatécnica. Em nosso entendimento, entretanto, a atuação da Defensoria Pública deve sofrer uma leituraampliativa. Com efeito, nos Juizados Especiais os paradigmas são a gratuidade (art. 54) e a nãoimposição de honorários advocatícios (art. 55), independentemente da condição econômica. Por queentão a atuação da Defensoria Pública estaria vinculada à hipossuficiência? Na verdade, acreditamosque tendo afastado a incidência de ônus sucumbenciais para facilitar o acesso à justiça, deva oEstado arcar com os custos da atuação judicial das partes, nos termos do art. 56.6 Por essas razões,defendemos, minoritários, que todos aqueles que podem ser demandantes nos Juizados Especiais,sejam como autores ou como réus, independentemente da condição econômica, têm direito àassistência judiciária gratuita prestada pela Defensoria Pública naquele órgão.7

Importante lembrar, nesse passo, que a Defensoria Pública tem funções típicas, relacionadas àhipossuficiência econômica do interessado, e atípicas, independentes da condição econômica dosinteressados.8 A atuação em favor do réu criminal, da criança, do adolescente, do idoso, da pessoavítima de violência doméstica, dos direitos coletivos, dentre outros, são exemplos de atribuições queestão desvinculadas dos aspectos econômicos envolvidos, em razão de sua relevância jurídica esocial. Por isso, a referência específica à atuação junto aos Juizados Especiais, prevista na Lei

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Orgânica da Defensoria Pública, nos afigura como mais uma função atípica deferida a essaInstituição. Aliás, se não fosse uma função atípica, a referência seria absolutamente desnecessária.

Além disso, permitir que o autor ou o réu, mesmo que com condições econômicas, disponha daassistência jurídica da Defensoria Pública nos Juizados, além de promover o acesso à justiça, afastaa existência de demandas economicamente indefensáveis. Por exemplo, se uma pessoa é processadapor um suposto dano que causou, para se defender terá que constituir um advogado e remunerá-lo. Demodo que, mesmo que ela saia vencedora, por não haver, em regra, ônus sucumbenciais, todo o valorda remuneração do advogado que contratou terá que ser por ela suportado. Assim, se o pedido deindenização for inferior ao valor dos honorários advocatícios, temos que a demanda se tornaeconomicamente indefensável. Essa situação permite que sejam propostas nos Juizados Especiaisações absolutamente temerárias, mas que, por seu baixo valor, não compensam serem contestadas.Por isso é tão importante a intervenção sem restrições da Defensoria Pública.9

Note-se, ainda, que a Defensoria Pública, quando em exercício nos Juizados Especiais,permanece desfrutando de todas as prerrogativas e garantias que lhe são legalmente asseguradas,além da contagem diferenciada dos prazos e intimação pessoal dos atos. Como visto, a atuação daDefensoria Pública é tratada em diplomas legais específicos, que têm aplicação cogente sobre todo oordenamento jurídico, inclusive no sistema da Lei 9.099/1995. Existem inúmeros procedimentosprevistos fora do CPC e nunca se cogitou a inaplicabilidade a eles das regras previstas para aDefensoria Pública, em razão da sua especialidade. Mesmo porque, tal como ocorre em relação àsoutras leis especiais, a Lei 9.099/1995 não prevê regras relativas ao funcionamento da assistênciajurídica, o que obriga o intérprete a se socorrer dos diplomas gerais acerca do tema (art. 44, I, da LC80/1994 e art. 186 do CPC).10

Por fim, imprescindível assinalar que se a parte manifestar seu interesse pela assistênciajudicial e esta não for prestada, deverá o procedimento ser anulado, por representar violação deregra de ordem pública, consectário dos princípios constitucionais da isonomia e, em última análise,do contraditório.11

Sobre o tema, veja-se Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à justiça, p. 28.Nesse sentido, Fábio Costa Soares, Acesso do hipossuficiente à justiça: a Defensoria Pública e atutela dos interesses coletivos lato sensu dos necessitados, p. 74 e ss.O texto original da LC 80/1994 previa a atuação da Defensoria Pública nos “juizados de pequenascausas” (art. 4º, X).A assistência jurídica é mais ampla do que a assistência judiciária, que envolve apenas a atuaçãoprocessual. A assistência jurídica abarca a realização de acordos, mediações, notificaçõesobtenção de documentos e muitos outros atos extrajudiciais. Sobre o tema, confira-se Diogo

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Esteves e Franklin Roger Alves Silva, Princípios institucionais da Defensoria Pública, p. 96.Assim se posicionam Cândido Rangel Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 796; e HumbertoTheodoro Júnior, op. cit., p. 477, que diz que “para assegurar o equilíbrio entre as partes, a lei dáao autor que comparece pessoalmente o direito, se esse quiser, à assistência judiciária (defensoriapública), quando o réu for pessoa jurídica ou firma individual”.Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 785.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 67.Sobre a divisão entre as funções típicas e atípicas, inclusive com uma nova perspectiva sobre otema, veja-se Diogo Esteves e Franklin Roger Alves Silva, Princípios institucionais daDefensoria Pública, p. 97.Em sentido contrário, defendendo que a atuação da Defensoria Pública nos Juizados Especiaisdepende da concorrência de outras condições, tais como a hipossuficiência econômica ou anatureza consumerista da causa, temos o parecer do defensor público do Rio de Janeiro, CarlosMartins, mencionado por Guilherme Braga Peña de Moraes, Assistência jurídica, DefensoriaPública e o acesso à jurisdição no estado democrático de direito, p. XVI e XVII.Apesar disso, prevalece nos Juizados Especiais Federais o entendimento equivocado de que o art.9º da Lei 10.259/2001 teria afastado as regras específicas relativas à Defensoria Pública, no quetange à intimação pessoal e ao prazo em dobro. Nesse sentido, inclusive citando a regra contida nocitado art. 9º, que seria aplicável por analogia aos Juizados Especiais Estaduais, Dinamarco,Instituições..., op. cit., p. 790.Nesse sentido, veja-se: “É nulo o feito em que se não permite ao autor carente de recursos aassistência de defensor público estando a parte ré assistida de advogado” (TJRJ, 1ª TR, RI 1251-0, Rel. Juiz Marco Antônio Ibrahim, j. em 16.09.1998).

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8O MINISTÉRIO PÚBLICO

A atuação institucional do Ministério Público no processo civil pode ser genericamentedividida em dois planos: de um lado, como fiscal da ordem jurídica, do estado democrático e dosinteresses sociais e individuais indisponíveis (custos legis), e, de outro, como parte da demanda(dominus litis), nos termos do art. 129 da CF, art. 25 da LONMP, e arts. 176 e 177 do CPC. Assim,tendo em vista as limitações presentes na Lei 9.099/1995, especialmente aquelas previstas nos seusarts. 3º e 8º, podemos afirmar que não há espaço para a intervenção do Ministério Público nosJuizados Especiais, seja como custos legis ou como dominus litis, apesar de a regra contida no art.11 da Lei 9.099/1995 assinalar, de forma vaga, que o “Ministério Público intervirá nos casosprevistos em lei”.

Não obstante, é preciso reconhecer que a questão é controvertida. Para quem admite aimpetração do mandado de segurança nas Turmas Recursais, esta seria uma hipótese de atuação doMinistério Público (art. 12 da Lei 12.016/2009).1 Alguns autores defendem, também, que o MPpoderia atuar como fiscal da ordem jurídica nas causas em que a decisão pudesse gerar interessesocial2 ou quando uma das partes vier a falecer e for sucedida por pessoa incapaz.3 Em todas essashipóteses, entretanto, entendemos que o melhor caminho seria o encerramento do procedimento, semresolução do mérito (art. 51, II), e não de convocação do Ministério Público. Assim, apesar dasdivergências, como sustentamos que o mandado de segurança contra ato decisório dos Juizados deveser julgado pelo Tribunal de Justiça,4 entendemos ser incabível qualquer tipo de intervenção doMinistério Público em sede de Juizados Especiais. No entanto, se o mandado de segurança forimpetrado na Turma Recursal, entendemos que o Ministério Público deverá atuar como fiscal daordem jurídica.

Por fim, quando o réu estiver em recuperação judicial ou sob regime de liquidaçãoextrajudicial, entendemos que não há necessidade de intervenção do Ministério Público noprocedimento em curso nos Juizados Especiais, bastando que este órgão seja comunicado da decisãotransitada em julgado.

Oberg, op. cit., p. 179.Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 77.

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Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 786.O tema será tratado com maiores detalhes no item 2.1.2 da Parte IV.

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9.1.1

9O PAPEL DOS JUÍZES, DOS CONCILIADORES E DOS

JUÍZES LEIGOS NOS JUIZADOS ESPECIAIS

O JUIZ

Dentro do modelo adotado pela Lei 9.099/1995, o juiz deve ter uma atuação diferenciadadaquela que se vê nos juízos comuns. Em primeiro lugar, ele deve ter consciência de que as causasque vai julgar podem não ter grande repercussão social, econômica ou jurídica, mas, em geral, sãomuito importantes para as pessoas que estão ali. É preciso compreender, pois, que o fato de a causaser pequena não significa que ela seja irrelevante. Além disso, não raras vezes, um grande problemasurge a partir de pequenos conflitos, que não foram devidamente tratados.1 De modo que o papel dojuiz se revela na sintonia fina das relações sociais, aparando as pequenas arestas que surgem naatribulada vida cotidiana.

Em segundo lugar, ele deve ter em mente que seu trabalho somente pode ser considerado bem-sucedido quando os conflitos que lhe são apresentados são solucionados de maneira rápida, justa eeficiente. É óbvio que o atingimento desses objetivos não depende exclusivamente da vontade ou daatuação do juiz, mas essa tem que ser a meta perseguida e passada aos seus funcionários.

Em terceiro lugar, ele precisa saber que seu contato com as partes e os advogados deve ser omais próximo possível. Por certo, não se espera que o juiz fique na porta do Juizado, recebendo aspessoas, mas, em alguns órgãos, o que se vê são juízes encastelados e inacessíveis; audiências feitasexclusivamente por auxiliares; advogados que despacham com secretários, serventuários e atéestagiários. O juiz tem que estar presente e se fazer presente no Juizado.

Em quarto lugar, ele deve ter uma atuação focada na autocomposição das partes, enfatizando afunção subsidiária da jurisdição. Em quinto e último lugar, como as regras dos Juizados conferem aojuiz uma liberdade muito grande de atuação, ele deve ter enorme cuidado para que sua postura não setorne tirânica ou despótica.

Além dessas características, frutos da nossa opinião, a Lei 9.099/1995 também estabeleceualgumas regras sobre a atuação dos juízes nos Juizados. São basicamente regras de julgamento,concentradas nos arts. 5º e 6º da Lei.

A atividade probatória judicial

A regra contida no art. 5º da Lei determina que o juiz conduza o processo com liberdade paraproduzir as provas que entender necessárias. Trata-se, entretanto, de uma liberdade relativa, na

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medida em que a prova representa um direito fundamental das partes,2 derivado do princípio dodevido processo legal. Além disso, o juiz não é o único destinatário da prova. As partes, outrosjuízes e até mesmo a sociedade são também destinatários da prova, que serve de parâmetro elegitimador da decisão judicial. Além disso, a atividade probatória judicial deve se ater aos limitesda demanda e da Lei 9.099/1995.

O art. 5º da Lei 9.099/1995 conjuga a essência dos arts. 370 e 375 do CPC ao anotar que o juizdeve apreciar as provas de maneira racional e fundamentada, e, ao fazê-lo, pode se utilizar dediversos recursos, inclusive a experiência comum e a técnica jurídica.3 O dispositivo aqui tem umaconotação diversa da adotada pelo art. 335 do CPC/1973, que restringia a aplicação desses recursosà falta de regras jurídicas particulares. Com isso, a utilização de regras de experiência comum e datécnica no julgamento nos Juizados deve ter um escopo cooperativo, conforme desenhado peloCPC/2015.

Importante ressalvar, entretanto, que interpretação judicial deve sempre se pautar pelosprincípios da legalidade, de matriz constitucional.4 Por isso, de forma alguma pode-se pensar queesse dispositivo altera a condição de imparcialidade do juiz, que é elemento indissociável para sualegitimidade. O que ocorre é que esses recursos sempre foram subestimados pela noção deturpada deneutralidade do julgador, como se ele não fosse uma pessoa e não vivesse em sociedade. É inevitávelreconhecer que a percepção que o juiz tem do direito passa, necessariamente, pela sua formaçãocultural e social, amoldada ao longo de uma vivência tanto profissional como pessoal. Dessa forma,entendemos que a menção às regras de experiência comum ou da técnica tem, isso sim, o condão detrazer para a fundamentação da decisão aquilo que antes ficava aprisionado na consciência domagistrado.

A aplicação do direito pelo juiz

No art. 6º da Lei 9.099/1995 está dito que o juiz adotará em cada caso a decisão que reputarmais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum. Trata-se deregra já conhecida em nosso ordenamento jurídico pátrio. A atenção aos fins sociais da lei e àsexigências do bem comum na aplicação do direito são comandos idênticos aos contidos nos art. 5º doDecreto-lei 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), que, por sua vez,constavam da Lei de Introdução original, lançada juntamente com o Código Civil de 1916 e aindahoje em vigor. Na mesma linha, dispõe o CPC/2015 que, “ao aplicar o ordenamento jurídico, o juizatenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum” (art. 8º).

Por isso, o juiz, ao julgar as questões em curso nos Juizados Especiais, deve enfatizar aequidade e o bem comum, sem ultrapassar os limites do ordenamento jurídico vigente. Vale dizer, aequidade e a justiça foram alçadas à condição de fontes primárias da atuação judicial nos JuizadosEspeciais, mas isso não significa que o juiz pode julgar como quiser ou como ditar a sua

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“consciência”. O comando em tela tem caráter sistêmico e não moral ou subjetivo: a justiça e aequidade devem ser extraídas do ordenamento jurídico, e não da cabeça do julgador.

O papel da equidade no julgamento das causas

Discute-se na doutrina se teria o dispositivo do art. 6º autorizado o juiz a decidir sempre porequidade, em todas as situações. A interpretação sistemática da Lei, à primeira vista, parece indicarpela negativa, já que o art. 25 dispõe que o “árbitro conduzirá o processo com os mesmos critériosdo juiz, na forma dos arts. 5º e 6º dessa lei, podendo decidir por equidade”. Logo, a mençãoexpressa da equidade em relação ao árbitro levaria à conclusão de que o juiz não gozaria da mesmafaculdade.5 Entretanto, tal posicionamento não nos parece o mais indicado.

Em primeiro lugar, é preciso salientar que a arbitragem da Lei 9.099/1995 não teve comoparadigma o sistema previsto na Lei 9.307/1996 (Lei de Arbitragem), que lhe é posterior, mas sim aredação original dos arts. 1.072 a 1.102 do CPC/1973, que regulavam o juízo arbitral. Nessesdispositivos, o julgamento por equidade tinha que ser expressamente autorizado pelas partes parapoder ser aplicado pelo árbitro (art. 1.075, IV). Assim, se o legislador não determinasseexpressamente a possibilidade do julgamento por equidade nos Juizados Especiais, com asistemática processual vigente na época, a arbitragem teria que seguir as regras e formas de direito(art. 127 do CPC/1973).

Por outro lado, não parece adequado vetar a aplicação da equidade nas decisões dos JuizadosEspeciais. Seja pelo espírito da Lei, com seus princípios fundamentais (art. 2º), seja pela aplicaçãodos preceitos relativos ao Código de Defesa do Consumidor (arts. 7º e 51, IV), bem como pelautilização subsidiária dos princípios gerais do direito (art. 4º da LINDB). A equidade deve, sim,cumprir seu papel fundamental de orientar a realização das normas, da forma mais justa possível.6

Como ensina Cândido Rangel Dinamarco, o art. 6º contém uma regra de interpretação, que permite aojuiz buscar entre as teses juridicamente possíveis aquela que mais se harmonize com os ideais dejustiça e equidade. Assim, deve o magistrado interpretar os fatos “de modo inteligente, sem apegodesmesurado ao requisito da certeza e sem o comodismo consistente em dar seguidamente pordescumprido o ônus da prova”.7

O JUIZ LEIGO

Como já dito, o art. 98, I, da CF, inspirado pelo princípio democrático,8 previu que os JuizadosEspeciais seriam integrados por “juízes leigos”. Como a regra constitucional não traçou qualquercaracterística ao juiz leigo e tal figura não existia no ordenamento jurídico, coube ao legisladorinfraconstitucional determinar, de maneira inovadora, sua feição. Apesar do nome “leigo” indicarque o constituinte originário queria nos Juizados alguém “de fora da Justiça”,9 a Lei 9.099/1995optou por definir que o juiz leigo seria obrigatoriamente escolhido entre advogados (art. 7º). Além

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9.2.1

9.2.2

disso, estabeleceu que o advogado deveria ter, no mínimo, cinco anos de experiência, ou seja, cincoanos de exercício efetivo da advocacia, contados a partir da expedição da carteira da Ordem dosAdvogados do Brasil. Tal prazo é muito longo e afasta boa parte dos potenciais candidatos, já que adisponibilidade dos advogados para tal exercício, gratuito na maioria das vezes, é muito maior nosprimeiros anos da vida profissional. Ademais, o prazo de cinco anos é maior do que o prazo que umadvogado precisa ter para poder se tornar juiz de carreira (três anos – art. 93, I, da CF). Com efeito,não deixa de ser uma incoerência que alguém possa ser juiz “togado” e não juiz leigo. Uma sugestãoque fazemos é que se reduza o prazo ou que se permita que na contagem do referido prazo sejacomputado o período de estágio forense, devidamente reconhecido pela OAB.10

O juiz leigo é um auxiliar da Justiça e como tal deve ser nomeado, preferencialmente por meiode concurso de provas e títulos. Apesar disso, o seu exercício funcional não o transforma em agentepúblico, ao mesmo para fins civis.11 É imprescindível, ainda, que o juiz leigo seja devidamenteremunerado pelo seu trabalho, ainda que realizado sem vínculo empregatício.

De acordo com a Lei 9.099/1995, o juiz leigo pode desempenhar quatro atividades: a) conduzira conciliação (art. 22); b) conduzir o procedimento arbitral, atuando como árbitro (art. 24, § 2º); c)conduzir a audiência de instrução e julgamento (art. 37); d) proferir o “projeto de sentença” (art. 40).

A condução da audiência de conciliação

Embora ordinariamente afeta ao conciliador, a audiência de conciliação também poderá serconduzida pelo juiz leigo. Nesse caso, deverá ele atuar da mesma forma que o conciliador, buscandoajudar as partes a compor o conflito deduzido em juízo. Somente se o juiz leigo tiver formação emmediação é que poderá desempenhar também o papel de mediador (art. 166 do CPC), na hipótese deser instaurada uma sessão de mediação após a tentativa frustrada de conciliação. O recomendável, noentanto, é que o juiz leigo que eventualmente realizou a tentativa de conciliação deixe para outrapessoa a tarefa de conduzir a sessão de mediação.

Nos Juizados onde o juiz leigo também puder realizar a audiência de instrução e julgamento, asduas audiências podem ser concentradas num único momento, naquilo que a prática forense chama deaudiência de conciliação, instrução e julgamento – ACIJ. Assim, não haverá a necessidade de“convolar” a audiência de conciliação em audiência de instrução e julgamento. O juiz leigo, nessasituação, pode abrir a audiência oferecendo às partes a possibilidade de buscar um acordo e, nãohavendo interesse na composição, dar sequência imediata ao procedimento.

A condução do procedimento arbitral

Como veremos mais à frente, o procedimento arbitral não é utilizado nos Juizados Especiais.Ainda assim, caso venha a ser aplicado, a Lei 9.099/1995 estabelece que somente os juízes leigospoderão exercer a função de árbitros (art. 24, § 2º). Nos Juizados onde exista mais de um juiz leigo,

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9.2.3

caberá às partes escolher quem será o árbitro (art. 24, § 1º). O árbitro ficará responsável por realizara audiência de arbitragem e por proferir o laudo arbitral (art. 26), utilizando das mesmas regrasprevistas para a atuação do juiz (art. 25).

A condução da audiência de instrução e julgamento

A redação do art. 37 permite ao juiz leigo que conduza a audiência de instrução e julgamento,sob supervisão de um juiz togado. Esse dispositivo certamente nasceu de uma interpretaçãoequivocada do inciso I do art. 98 da Constituição Federal, que dispõe que serão criados “juizadosespeciais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, ojulgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade”. Aparentemente, o legisladorordinário entendeu que haveria um comando estabelecendo que o juiz leigo seria, junto com o juiztogado, competente para praticar atos de conciliação, instrução e julgamento, quando, na verdade, apalavra “competentes” faz concordância com “juizados” e não com juízes “togados e leigos”. Tanto éverdade que o dispositivo do inciso I do art. 98 da CF é reproduzido no art. 1º da Lei 9.099/1995,sem a referência aos juízes, para definir a competência dos Juizados Especiais.

Assim, diante do teor do art. 37, não nos resta opção senão defender a suainconstitucionalidade. Com efeito, acreditamos que somente um magistrado pode dirigir a audiênciade instrução e julgamento, não apenas em decorrência dos princípios da imediaticidade e daoralidade, mas especialmente em razão dos princípios constitucionais do devido processo legal, dainafastabilidade e do juiz natural. De fato, em nosso ordenamento jurídico, somente membros doPoder Judiciário podem exercer diretamente a atividade jurisdicional (princípio da jurisdição una).As exceções, como no caso dos jurados no Tribunal do Júri e do Senado Federal no julgamento decrimes de responsabilidade do presidente, não são inconstitucionais, porque são previstas pelaConstituição (arts. 5º, XXXVIII, e 86, respectivamente). Importante lembrar, ainda, que, ao contrárioda arbitragem, em que as partes aceitam se submeter ao procedimento, na audiência de instrução ejulgamento o juiz leigo estará atuando sem a anuência das partes, por imposição judicial.

Não obstante, apesar da solidez dos argumentos expostos, somos minoritários em nossoposicionamento sobre a inconstitucionalidade do dispositivo.12 Sobre o tema, a maioria da doutrina,13

seguida pela jurisprudência,14 alega que os atos dos juízes leigos são praticados sob a supervisão domagistrado, que terá que ratificá-los, para que tenham valor. Acrescentam também que a atuação dojuiz leigo estaria em consonância com os princípios democráticos e participativos do processo, alémde servir para desafogar o Poder Judiciário, promovendo a economia financeira, a celeridade e a altaespecialização, dentre outros benefícios.15

Ultrapassada a questão referente à constitucionalidade do art. 37, tem-se que o juiz leigo deveráconduzir a audiência de instrução e julgamento observando os mesmos parâmetros aplicáveis ao juiz“togado” (arts. 5º, 6º e 28), ciente de que terá que exercer seu mister sem ter poderes instrutórios.

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Assim, não poderá indeferir a oitiva de uma testemunha ou a juntada de um documento (art. 33, infine), nem resolver questões que surgirem durante a audiência (art. 29). Nesses casos, o juiz leigoterá que buscar o juiz togado “supervisor” ou, na sua ausência, terá que suspender a audiência. Poressas razões, entendemos que a parte deve ser expressamente advertida que está sendo julgada porum juiz leigo no início da audiência de instrução e julgamento. Assim, se ela não concordar com essasituação, deverá se opor à realização da audiência e exigir a presença de um magistrado.

Registre-se que, apesar de não concordarmos com a prática de atos instrutórios pelo juiz leigo,defendemos que ele deverá registrar por escrito todos os atos da audiência, para permitir asupervisão prevista no art. 40, e, se concluir a audiência, ficará vinculado para proferir o “projeto desentença”.16

Por outro lado, acreditamos que a Lei poderia atribuir ao juiz leigo outras funções, alémdaquelas já mencionadas. Ele poderia, por exemplo, sanear o processo, logo após o término da etapade autocomposição infrutífera. Assim, ficaria responsável por verificar a adequação da causa ao ritoespecial, a representação das partes e a regularidade da demanda. Ficaria também com o encargo defixar os pontos controvertidos e iniciar a organização da instrução probatória. Poderia, ainda,identificar a necessidade de concessão de tutelas provisórias, da realização de perícias informais ede atividades probatórias complementares. Atualmente, entretanto, quando a etapa deautocomposição se encerra sem que as partes tenham chegado a um acordo e não é possível aimediata instauração da audiência de instrução e julgamento, perde-se uma excelente oportunidade depreparar o processo e otimizar a atividade judicial.

A prolação do “projeto de sentença”

O art. 40 da Lei 9.099/1995 diz que o juiz leigo que tiver dirigido a instrução proferirá sua“decisão” e imediatamente a submeterá ao juiz, que poderá homologá-la, proferir outra emsubstituição ou, antes de se manifestar, determinar a realização de atos probatórios indispensáveis.Conforme já exposto, quando da análise do art. 37, entendemos que a possibilidade de um elementoestranho aos quadros da magistratura praticar atos instrutórios fere elementos basilares de nossoordenamento jurídico e é inconstitucional. A prolação do “projeto de sentença”, entretanto, vistoisoladamente, não contém qualquer afronta à regra constitucional. Trata-se de um ato processualpraticado por auxiliar do juízo que só adquire status decisório depois de homologado pelo juiz. Oproblema de tal ato repousa, como seu pressuposto lógico, no fato de o juiz leigo ter dirigido aaudiência de instrução e julgamento (art. 37). Portanto, o art. 40 da Lei 9.099/1995 é inválido nãopor violar a Constituição, mas por regular uma situação decorrente de uma regra inconstitucional.

Pois bem, de acordo com o mencionado art. 40, o juiz leigo deveria proferir sua “decisão” naaudiência de instrução e julgamento por ele presidida, para ser “imediatamente” homologada pelojuiz. De modo que o juiz “togado” deveria estar presente no encerramento da audiência de instrução e

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julgamento, para homologar o “projeto de sentença”. Na prática, entretanto, o juiz leigo encerra aaudiência intimando as partes da data em que o “projeto de sentença”, já homologado, estarápublicado. Esse procedimento é conhecido como “leitura de sentença”.

Portanto, em regra, a elaboração do projeto de sentença e a sua homologação ocorrem fora daaudiência de instrução. A razão para essa postura decorre do reconhecimento de que a chancela ao“projeto de sentença” representa uma atividade mais robusta que aquela normalmente verificada nosatos meramente homologatórios, como aqueles realizados em face de um acordo (art. 22, parágrafoúnico) ou de um laudo arbitral (art. 26). De fato, ao homologar o “projeto de sentença”, o juiz deveráanalisar a construção intelectual feita pelo juiz leigo, bem como os elementos probatórioscolacionados aos autos. Além disso, pode o juiz rejeitar o “projeto de sentença” ou determinar arealização de atos probatórios (oitiva de testemunhas, juntada de documentos, análise de laudos etc.).Por isso, a homologação não deve ocorrer na audiência de instrução e julgamento.

Necessário que se diga, por fim, que o juiz leigo não pode proferir decisões interlocutórias,dentro ou fora de audiência, nem intervir na fase recursal, por falta de previsão legal. Não obstante,tem-se admitido a atuação do juiz leigo no julgamento dos embargos à execução extrajudicial (art.53, § 1º).17

O impedimento para o exercício da advocacia

O parágrafo único do art. 7º determina o impedimento pelo juiz leigo para exercer a advocaciaperante os Juizados Especiais. Não se trata, como chegou a ser ventilado, de hipótese deincompatibilidade para o exercício da advocacia em geral (art. 28, II, da Lei 8.906/1994 – Estatutoda Advocacia). Na realidade, o preceito legal estabelece apenas um impedimento específico, paraevitar o comprometimento da imparcialidade do juiz leigo e a captação indevida de clientes. Apesarde a Lei não ser clara quanto à amplitude do impedimento, entendemos que a restrição é aplicável atodos os Juizados integrantes do Sistema, dentro da mesma unidade onde o juiz leigo atua, enquantodurar sua designação.18 De fato, seria no mínimo ilógico pensar que um juiz leigo estaria impedido deadvogar apenas perante o Juizado em que atua, mas o possa fazer em outro Juizado do mesmoTribunal.19

Da mesma forma que estabelecido para os conciliadores e mediadores (art. 172 do CPC), oideal é que o juiz leigo fique impedido de atuar em favor de qualquer das partes que integraram umprocesso no qual ele atuou, por pelo menos um ano. Especialmente se o juiz leigo conduziu aaudiência de instrução e julgamento e proferiu “projeto de sentença”.

O CONCILIADOR E O MEDIADOR

O conciliador é uma figura conhecida do nosso direito, que vem recebendo cada vez maisatenção, em razão da percepção renovada da sua importância na efetividade da prestação

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jurisdicional. Ainda assim, a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei 7.244/1984), predecessorada Lei dos Juizados Especiais, foi o primeiro regulamento processual a não apenas prever a figura doconciliador (art. 6º), mas também a criar um procedimento com uma audiência de aberturaobrigatória e inteiramente dedicada à conciliação (art. 22). A Lei 9.099/1995 manteve a mesmaestrutura, tratando do conciliador (art. 7º) e mantendo a audiência de conciliação, de caráterobrigatório e prévio à apresentação da defesa (art. 22).

Inspirado pela experiência dos Juizados Especiais, o CPC/2015 incorporou no rito comum aestrutura procedimental que prevê uma audiência de conciliação “obrigatória”20 e prévia aooferecimento da defesa (art. 334). A diferença fundamental é que no CPC de 2015 a audiênciapreliminar de autocomposição pode ser de conciliação ou de mediação. Além disso, o Novo Códigotambém estabelece expressamente a utilização da conciliação e da mediação nos procedimentosespeciais, como no rito possessório (art. 565) e nas ações de família (art. 694). Essas regrastrouxeram para os estudiosos o debate sobre a aplicabilidade da mediação em relação aoprocedimento sumaríssimo dos Juizados.21 A conclusão a que se chegou, com a qualcompartilhamos,22 é de que o modelo dual de autocomposição do CPC deve ser aplicado nosJuizados. Assim, passamos a defender que nos Juizados Especiais, após a realização da audiência deconciliação (art. 22), caso não seja obtido um acordo, as partes poderão ser encaminhadas para umasessão de mediação, se essa técnica de autocomposição for adequada ao caso.

Tanto o conciliador como o mediador são auxiliares da Justiça que têm como principal missãoconduzir a etapa de autocomposição, aplicando as técnicas mais apropriadas ao tratamento doconflito formado entre as partes. Os mediadores deverão atuar preferencialmente nos CentrosJudiciários de Solução Consensual de Conflitos – CE-JUSC, responsáveis pela realização de sessõesde mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular aautocomposição. O regulamento básico dos conciliadores e dos mediadores repousa nos arts. 165 a175 do CPC, na Lei de Mediação (Lei 13.140/2015) e na Resolução 125/10 do CNJ. Por certo, elesnão podem colher provas23 ou conduzir a audiência de instrução e julgamento.24 Sua função ficarestrita à condução da audiência de conciliação ou de mediação.

Na busca de um melhor aprumo teórico, o CPC/2015 estabelece que o conciliador e o mediadordeverão ter uma “capacitação mínima”, decorrente da realização de curso elaborado de acordo comos parâmetros curriculares do CNJ (art. 167, § 1º). Este, por sua vez, editou a Resolução 125/10, quedispõe sobre as diretrizes gerais dos cursos de capacitação, no seu Anexo I. Aqueles que lograremêxito no curso de formação serão inscritos em cadastro nacional e em cadastro dos tribunais, quemanterão o registro dos profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional. Efetivadoo registro, que poderá ser precedido de concurso público, o tribunal remeterá ao Juizado os dadosnecessários para que o nome do conciliador ou do mediador passe a constar da respectiva lista, paraefeito de distribuição alternada e aleatória, observado o princípio da igualdade dentro da mesmaárea de atuação profissional. Importante lembrar que, se as partes escolherem um conciliador ou

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mediador de comum acordo, ele não precisará estar cadastrado para atuar.Os conciliadores e mediadores judiciais cadastrados, sendo advogados, estarão impedidos de

exercer a advocacia perante os Juizados onde exerçam as suas funções. Como já dito em relação aojuiz leigo, entendemos que esse impedimento deva se estender a todos os Juizados inseridos naquelesegmento judiciário e não apenas ao próprio Juizado onde o conciliador e o mediador atuam. Dequalquer forma, caso o conciliador ou o mediador não se sintam aptos para atuar em determinadacausa para a qual foram designados, deverão comunicar o fato imediatamente, de preferência pormeio eletrônico, e devolver os autos ao juiz da causa, ou ao coordenador do centro judiciário desolução consensual de conflitos, para que seja feita nova distribuição.

Embora possa ser tido como trabalho voluntário, nos termos da legislação pertinente, via deregra o conciliador e o mediador deverão ser remunerados pelo seu trabalho, conforme parâmetrosestabelecidos pelo CNJ. A nossa sugestão é que essa remuneração não seja vinculada à obtenção deum acordo, como já ocorre em alguns tribunais. Caso contrário, o conciliador ou o mediador pode sesentir impelido a “forçar” um acordo, em detrimento das regras gerais da autocomposição, para terum retorno financeiro melhor. É claro que o número de acordos fechados deve ser considerado,dentro de um leque de outros elementos, como um fator de avaliação da sua atuação. Mas não deveser o único elemento para definir a sua remuneração.

Diante das peculiaridades da causa, poderá ser designado mais de um conciliador ou mediadorpara atuar numa determinada audiência de autocomposição. Isso poderá ocorrer, por exemplo, se acausa versar sobre temas distintos, como, por exemplo, direito de vizinhança e engenharia, comopode ocorrer num litígio entre vizinhos por conta da construção de um muro. Havendo um conciliadorespecialista em direito de vizinhança e outro com formação em engenharia, o mais adequado seria anomeação de ambos para conduzir os trabalhos de conciliação.

Em observância ao art. 7º da Lei 9.099/1995, qualquer um poderá ser conciliador,independentemente de possuir formação jurídica, havendo, tão somente, uma recomendação para quea escolha recaia sobre bacharéis em direito. Na realidade, existem apenas dois requisitos implícitospara que uma pessoa possa ser conciliador: gozar da capacidade plena, para poder praticar os atosque lhe são atribuídos, e ser alfabetizado, para poder reduzir a termo os acontecimentos da audiênciade conciliação. Apesar disso, a maioria dos Estados tem limitado em seus regulamentos aprerrogativa de desempenhar o cargo de conciliador aos estudantes e aos bacharéis em direito. Defato, parece-nos que a Lei 9.099/1995 deveria ter efetivamente reservado o exercício da conciliaçãoaos estudantes e advogados. Em que se pese a existência de pessoas sem formação jurídica comincrível ânimo conciliador, entendemos ser imprescindível o mínimo de conhecimento jurídico parao desempenho de tão relevante papel. Por exemplo, se as partes estiverem discutindo a validade deum contrato e o conciliador não tiver noções básicas sobre esse instituto, a conciliação poderá ficarcomprometida.25

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O conciliador, segundo os regramentos citados, atuará preferencialmente nos casos em que aspartes não tenham vínculo anterior, podendo sugerir soluções para o litígio, sem a utilização dequalquer tipo de constrangimento ou intimidação para atingir esse fim. Já o mediador atuarápreferencialmente nos casos em que exista um vínculo anterior entre as partes, cuja manutenção sebusca preservar. Ele auxiliará os interessados a compreender as questões e os interesses em conflito,de modo que possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluçõesconsensuais que gerem benefícios mútuos. Na maioria das vezes, o mediador não deve apontarsoluções, mas apenas estimular as partes a lidar melhor com o problema.

Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador, assim comoos membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundosda conciliação ou da mediação de que eventualmente tenham participado. Somente na hipótese deambas as partes concordarem é que elementos colhidos nas audiências de autocomposição poderãoser juntados aos autos. Caso contrário, somente a ata da sessão de autocomposição realizada seráanexada ao processo.

Essa construção parte da uma lógica bastante simular àquela consagrada, dentro da criminologia,pela chamada “Teoria das Janelas Partidas” ou “Teoria da Tolerância Zero”, desenvolvidaoriginalmente por George L. Kelling e Catherine Coles (Fixing broken windows: restoring orderand reducing crime in our communities, p. 23).O CPC/2015 segue essa diretriz ao vaticinar que “as partes têm o direito de empregar todos osmeios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, paraprovar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente naconvicção do juiz” (art. 369).Note-se que não é necessário que a parte esteja desassistida por advogado para que o juiz possaaplicar as regras do art. 5º. Em sentido contrário, entendendo que é a falta de assistência éessencial para a aplicação da regra, veja-se: “No rito comum ordinário e em especial no ritosumariíssimo dos Juizados Especiais Cíveis, quando a parte não se faz acompanhar de advogado,é dado ao juiz, na avaliação das provas, valer-se das regras de experiência comum ou técnica paraa formação da convicção. Art. 5º da Lei 9.099/1995 e art. 335, do CPC” (TJDF, 2ª TR, RI315389420098070007, Rel. Juiz Asiel Henrique, j. em 02.03.2012).Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 21. Por certo, a liberdade deferida pela Lei9.099/1995 não pode servir para justificar julgamentos pautados por convicções pessoais.Experiência comum não significa experiência pessoal ou opinião pessoal, mas o conjunto depercepções extraídas da sociedade.Theotonio Negrão, op. cit., p. 991.Nesse sentido, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 45. Confira-se, também, o Enunciado 9.1.1 da CE-JCA: “É cabível a inversão do ônus da prova, com base no princípio da equidade e nas regras de

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experiência comum, a critério do Magistrado, convencido este a respeito da verossimilhança daalegação ou dificuldade da produção da prova pelo reclamante”.Apud Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. III, p. 474.Como bem sintetizou Cândido Rangel Dinamarco (Fundamentos do processo civil moderno, p.1.427): “Tais novos sujeitos processuais, estranhos aos quadros da Justiça e não integrando oEstado, são um elo de ligação entre este e o indivíduo. Não exercem jurisdição, não sãoportadores do poder estatal como o juiz. São membros da comunidade, chamados a integrar aquela– participativa e pluralista preconizada por Kazuo Watanabe, num relacionamento muito menosformal com os litigantes”.A palavra “leigo”, proveniente do grego laikós, modernamente é utilizada para identificar aqueleque não domina determinada técnica ou conhecimento. Como no caso o referencial é jurídico, nãose pode dizer que o advogado seja um leigo. A conclusão a que se chega é que o legisladorinfraconstitucional não cumpriu adequadamente o comando contido no art. 98, I, da CF. Comefeito, o mais provável é que o legislador constituinte tenha pensado em figuras como o “juiz dobairro” (neighborhood judge) do Direito norte-americano, ou seja, alguém sem a necessidade depossuir formação jurídica, como ocorre com os nossos jurados, no tribunal do júri (art. 5º,XXXVIII, da CF e art. 426 do CPP).A Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, ao tratar dos juízes leigos, reduziu o prazo deexperiência para dois anos (art. 15, § 1º, da Lei 12.153/2009).“A função de Juiz Leigo é exercida pelo particular, como auxiliar da Justiça, em colaboração como poder público, não podendo seu mero exercício contínuo transformar o agente em servidorpúblico” (STJ, 5ª Turma, RMS 18.954/PB, Rel. Min. Gilson Dipp, j. em 07.08.2006).Acolhendo nossa posição, veja-se Vicente Greco Filho, Manual de processo penal, p. 138.Conforme assinala com toda propriedade Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 22: “Aprevisão de Juízes leigos, conquanto suas funções estejam referidas no texto constitucional (art.98, I), ofende ao princípio da jurisdição estabelecido ao longo da Carta de 1988 e suaconstitucionalidade é, no mínimo, duvidosa”.Defendendo a atuação dos juízes leigos, veja-se Cândido Rangel Dinamarco, Instituições, p. 811;e Alexandre Câmara, Juizados, p. 56.No Rio de Janeiro, o entendimento que prevaleceu foi o da validade da atuação dos juízes leigos,nos termos dos arts. 37 e 40 da Lei. Foi, inclusive, rejeitada a representação porinconstitucionalidade interposta pela OAB/RJ em face da Lei Estadual 4.578/2005, queregulamentou a atuação dos juízes leigos neste Estado (TJRJ, Órgão Especial, Representação porInconstitucionalidade 219/2005, Rel. Des. Leila Mariano, j. em 17.12.2007). Importanteesclarecer que a representação versava, tão somente, sobre o processo seletivo dos juízes leigos,mas é inegável o apoio do Poder Judiciário fluminenses aos juízes leigos.Nesse sentido, Felipe Machado Caldeira, Considerações sobre a função do juiz leigo e a lei(estadual) 4.578/05: contribuições para a aceleração do processo.Apesar de a maioria dos Tribunais estabelecer em seus regimentos que o juiz leigo que faz aaudiência de instrução e julgamento fica vinculado para elaborar o projeto de sentença, najurisprudência é comum dizer-se que não se aplica o princípio da identidade física ao juiz leigo.

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Nesse sentido, veja-se: “Indenização. Acidente de trânsito. Princípio da identidade física do juiz.Não é nula a sentença proferida por juiz leigo diverso daquele que presidiu a audiência deinstrução, tendo em vista que no Juizado Especial Cível o princípio da identidade física do juizsomente é aplicável em relação ao juiz togado e não no que diz respeito aos juízes leigos” (TJRS,2ª TR, RI 71001811264, Rel. Juiz Afif Jorge Simões Neto, j. em 18.02.2009).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 52 do FONAJE: “Os embargos à execução poderão serdecididos pelo juiz leigo, observado o art. 40 da Lei 9.099/1995”.A Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, ao tratar dos juízes leigos, assinalou que ficarãoimpedidos de exercer a advocacia perante todos os Juizados Especiais da Fazenda Públicainstalados em território nacional, enquanto no desempenho de suas funções (art. 15, § 2º, da Lei12.153/2009).Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 23. Esse entendimento, entretanto, não é sufragadopela jurisprudência. De fato, assinala o Enunciado 40 do FONAJE: “O conciliador ou juiz leigonão está incompatibilizado nem impedido de exercer a advocacia, exceto perante o próprioJuizado Especial em que atue ou se pertencer aos quadros do Poder Judiciário”.Uma das grandes polêmicas sobre o CPC/2015, iniciada antes mesmo de sua entrada em vigor, foia discussão sobre a obrigatoriedade da realização da audiência preliminar de conciliação oumediação (art. 334). Minoritários, sustentamos que essa audiência pode ser dispensada, além dashipóteses previstas no Código. Para ilustrar o nosso entendimento, basta imaginar o inconvenientede realizar uma audiência de conciliação numa ação de divórcio em que o marido tem uma ordemde restrição em relação à mulher, por conta de violência doméstica.Necessário sublinhar que, com o fim do procedimento sumário no CPC, a base para aplicaçãosubsidiária imediata do rito sumaríssimo dos Juizados passou a ser o procedimento comum (art.318, parágrafo único, do CPC).Para mais detalhes sobre esse debate, veja o nosso artigo Os Impactos do Novo CPC nos JuizadosEspeciais, p. 882; e o artigo de David Schlickmann, Klauss Corrêa de Souza e Sullivan Scotti, Aaudiência de conciliação e mediação do Novo Código de Processo Civil e os juizados especiaiscíveis, p. 166. Veja-se, também, o Enunciado 397 do FPPC: “A estrutura para autocomposição, nosJuizados Especiais, deverá contar com a conciliação e a mediação”.Existe na Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública previsão para que o conciliador, durantea audiência de conciliação, possa colher depoimento das partes e testemunhas (art. 16, § 1º, da Lei12.153/2009). Trata-se de regra evidentemente inconstitucional que, esperamos, não seja aplicadanem reproduzida nos demais integrantes do Sistema dos Juizados.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 8.4 da CEJCA: “É vedada a delegação da presidência daAudiência de Instrução e Julgamento (AIJ) ao Conciliador”.Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior, op. cit., v. III, p. 473. Em sentido contrário, defendendoque os conciliadores devem ser sempre leigos, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 58.

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10A ESTRUTURA PROCEDIMENTAL DOS JUIZADOS

ESPECIAIS

OS PROCEDIMENTOS DOS JUIZADOS ESPECIAIS

A Lei 9.099/1995 previu dois procedimentos especiais para tramitar nos Juizados Especiais: a)o procedimento sumaríssimo;1 b) o procedimento executivo dos títulos extrajudiciais até 40 saláriosmínimos.

O procedimento sumaríssimo retrata o rito a ser adotado nos Juizados nas “ações deconhecimento”, ou seja, nas ações que têm por objetivo principal e mediato obter uma tutelacognitiva, exclusivamente declaratória, constitutiva ou condenatória. Da mesma forma que oprocedimento comum do CPC, o procedimento sumaríssimo possui uma estrutura sincrética,composta por uma fase cognitiva (arts. 14 a 51) e uma fase executiva (art. 52). Assim, caso uma daspartes não cumpra voluntariamente a obrigação imposta pelo ato judicial, inicia-se a fase executiva,de forma incidental, dentro do mesmo processo.

Já o procedimento executivo serve para guiar nos Juizados as ações de execuções por quantiacerta, fundadas em títulos executivos extrajudiciais com valor de até 40 salários mínimos (arts. 3º, §1º, II, e 53), respeitadas as vedações impostas pelos arts. 3º e 8º. Esse procedimento segue aestrutura básica prevista pelo CPC (arts. 824 e seguintes), mas com a previsão de uma audiência deconciliação, em que o executado poderá apresentar, oralmente ou por escrito, seus embargosexecutivos (art. 53, § 1º).

A NATUREZA DOS PROCEDIMENTOS

Cândido Rangel Dinamarco,2 ao tratar do tema, afirma que a Lei 9.099/1995 criou processosdiferenciados e não procedimentos especiais. Com o devido respeito ao mestre, é preciso reconhecerque todo o processo diferenciado, enquanto instrumento de uma tutela diferenciada, importanecessariamente em um procedimento especial, ou seja, um procedimento com característicaspróprias, que se afastam substancial e formalmente do procedimento comum, que lhe serve de base(art. 318, parágrafo único, do CPC). Por isso, imperioso reconhecer que ambos os procedimentos –sumaríssimo e executivo – são procedimentos especiais, que aplicam as regras gerais do CPC com asalterações previstas na Lei 9.099/1995. Tal conclusão é dita de forma expressa pela Lei quando tratada fase de execução judicial (art. 52, caput) e da ação de execução extrajudicial (art. 53, caput). Noentanto, é aplicável para ambos os procedimentos.

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10.3 A OPÇÃO PELOS PROCEDIMENTOS DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Ainda hoje existe na doutrina divergência a respeito da possibilidade de o autor optar pordemandar no juízo comum quando a causa puder ser enquadrada como de menor repercussão, sejauma pequena causa ou uma causa de menor complexidade. O ponto inicial dessa questão é anterior àprópria Lei 9.099/1995. É que a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei 7.244/1984) dispunha,em seu art. 1º, que a demanda naquele juízo era uma faculdade do autor.3 Assim, era reconhecidaexpressamente a possibilidade de o autor ponderar entre o juízo comum ou o Juizado de PequenasCausas. Com a edição da Lei 9.099/1995, que repete a maioria dos dispositivos da Lei 7.244/1984, asupressão à referência da opcionalidade no seu art. 1º foi interpretada como um comando implícito àsua obrigatoriedade.4 Além disso, parte da doutrina assinala que a obrigatoriedade dos Juizadosdecorre da natureza da Lei 9.099/1995, que teria criado um novo componente dentro da JustiçaOrdinária (microssistema). Com isso, não se poderia falar em concorrência de competência entre“Justiças” de mesma hierarquia, mas de especialização em razão da matéria.5 Por isso, de maneirageral, num primeiro momento, prevaleceu na doutrina o entendimento de que, se a causa estivesseenquadrada como de menor complexidade, somente poderia ser processada nos Juizados Especiais.6

Assim, o ingresso, no juízo comum, de ações sujeitas ao procedimento dos Juizados Especiaisgeraria a incompetência absoluta, questionável a qualquer tempo, por requerimento das partes ouiniciativa do juiz.

Não obstante a prevalência inicial, ao longo do tempo essas posições foram se retraindo eperdendo espaço para a corrente de pensamento que defende a faculdade do titular do direitomaterial em ajuizar a demanda perante os Juizados Especiais. Athos Gusmão Carneiro,7 MaurícioAntônio Ribeiro Lopes8 e Alfeu Bisaque Pereira9 foram alguns dos primeiros partidários desseentendimento.10 Cândido Rangel Dinamarco,11 com muita propriedade, identifica a tese daobrigatoriedade como um “novo fantasma” a assombrar o sistema e ameaçá-lo de insucesso.Atualmente, destaque-se, a doutrina e jurisprudência dominantes são no sentido de que os JuizadosEspeciais, em sua inteireza, são opcionais.12

Os que ainda hoje refutam a possibilidade de escolha pelo ingresso nos Juizados Especiaisaduzem, em geral, não ser possível às partes escolherem o juízo em que vão demandar e que asregras que o fixam são de ordem pública, voltadas para regular a competência de natureza objetiva,em razão da matéria e do valor. Na verdade, o que está na esfera de disponibilidade das partes não éa competência judicial, mas o procedimento mais adequado às suas pretensões: o dos JuizadosEspeciais, calcado na celeridade, na oralidade e na informalidade, ou o do CPC, fundado nasegurança. É perfeitamente possível conferir às partes essa escolha, pois ela decorre doreconhecimento de que o sistema da Lei 9.099/1995 restringe de forma marcante alguns aspectos quedecorrem de garantias fundamentais, como, por exemplo, a imposição da produção de todas asprovas em audiência, ainda que não requeridas previamente, o limite de três testemunhas, a perícia

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técnica informal, o curto período em que se desenrolam as etapas, a impossibilidade de açãorescisória etc.13 Assim, o demandante, ciente dessas limitações pela advertência que o juiz (leigo outogado) está obrigado a fazer no início da audiência de conciliação (art. 21), admite a “redução” dasgarantias que lhe são conferidas em nome de outros benefícios (celeridade, isenção de custas,concentração dos atos etc.).14

Destarte, a opcionalidade nada mais é do que o reconhecimento, pelo Estado, daimpossibilidade de impor ao indivíduo a drástica mitigação das garantias processuais a que temdireito. É o mesmo que ocorre, por exemplo, com o procedimento monitório (arts. 700 a 702 doCPC). A parte que tem um documento sem eficácia executiva pode optar pela segurança jurídica doprocedimento comum ou seguir o caminho mais célere do procedimento monitório.15 Note-se, ainda,que, em todos os lugares do mundo onde existem modelos semelhantes ao nosso, inclusive nas SmallPlea Courts,16 a demanda perante os Juizados é fruto de uma liberalidade do autor interessado emevitar os danos marginais do processo, principalmente a demora e os altos custos. Isso porque osJuizados Especiais foram concebidos para representar um “atalho” à Justiça. Consoante, a opção fazparte da sua própria essência. Aquele que, podendo demandar perante os Juizados Especiais, o fazno juízo comum, deseja, a toda evidência, um processo mais complexo e seguro.

É preciso lembrar que existe nos Juizados um procedimento para a execução dos títulosextrajudiciais no valor de até 40 salários mínimos (arts. 3º, § 1º, II, e 53) e, até o presente momento,não se tem notícia de qualquer autor ou decisão que tenha sustentado a sua obrigatoriedade. Nenhumavara cível logrou extinguir um processo executivo fundado em título extrajudicial até 40 saláriosmínimos, por ser ele cabível, em tese, nos Juizados Especiais. Isso ressalta a incoerência dosdefensores da tese da obrigatoriedade.

Outro aspecto a se destacar é que, conforme a prática forense já demonstrou, existem casos emque a opção pelos Juizados Especiais pode representar uma maior demora na prestação jurisdicional.É o que ocorre, por exemplo, quando se pretende ajuizar uma demanda em face de uma pessoa que é,notória e sabidamente, “especialista” em fugir das citações que lhe são feitas. Dessa forma, nãosendo possível a citação editalícia do Réu (art. 18, § 2º), o procedimento poderá ser encerrado, semresolução do mérito (art. 51, caput, c/c art. 485, IV, CPC), e será necessário ajuizar uma novademanda perante o juízo comum.17 Não há a menor dúvida de que o procedimento dos JuizadosEspeciais é mais célere do que o procedimento tradicional, mas isso não significa que ele detenha omonopólio da efetividade. No exemplo apresentado, o procedimento mais efetivo, ou seja, mais aptoa materializar a tutela jurisdicional, é o realizado perante o juízo comum

Por essas razões, dificilmente se pode conceber a imposição dos Juizados Especiais.18

Apesar disso, nos Juizados Especiais Federais (art. 3º, § 3º, da Lei 10.259/2001) e nosJuizados da Fazenda Pública (art. 2º, § 4º, da Lei 12.153/2009), o legislador foi expresso em dizerque nos locais onde houver juizado instalado não haverá opção. A integração entre essas regras e a

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Lei 9.099/1995, entretanto, não se justifica, pois aqueles modelos são voltados exclusivamente paraas pequenas causas (60 salários mínimos) contra a fazenda Pública, enquanto que essa abriga tantopequenas causas como causa de menor complexidade, em face de pessoas físicas ou jurídicas.

A única hipótese em que não há opcionalidade é no caso do inciso I do § 1º do art. 3º, que tratada competência para executar as decisões proferidas pelo próprio Juizado. Nessa hipótese, acompetência é absoluta e improrrogável (competência funcional). Assim, competentes para executaras decisões dos Juizados Especiais são os próprios Juizados Especiais, não apenas porque o autor jáfez a sua opção quando escolheu o procedimento da Lei 9.099/1995 para a ação cognitiva, mastambém pelas características especiais que essas decisões possuem (arts. 38 e 52).

É preciso destacar ainda que a escolha feita pelo autor da via especial pode ser impugnadapelo réu, fundamentadamente,19 ou indeferida pelo juiz, de ofício, se desobedecer aos requisitoslegais e for impossível sua adequação. Em ambas as hipóteses, o procedimento será encerrado, semresolução do mérito (art. 51, II).

A Lei 9.099/1995, ao contrário do que ocorre na parte criminal, não conferiu nome aoprocedimento cível. A doutrina em peso, seguindo a regra constitucional (art. 98, I, da CF),emprega a nomenclatura “sumaríssimo” (por todos, veja-se Pestana de Aguiar, op. cit., p. 22),sendo igualmente frequente chamar-se este procedimento de “especial”. Na seara trabalhista, oprocedimento é expressamente chamado pela Lei de “sumaríssimo” (art. 852-A da CLT). Por essesmotivos, apesar de saber que, como bem notou Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 85, agrafia correta do superlativo de sumário é sumariíssimo, rendemo-nos ao fato de que o termo“sumaríssimo” foi incorporado ao idioma pátrio e passamos a adotá-lo.Instituições..., op. cit., p. 773.“Art. 1º Os Juizados Especiais de Pequenas Causas, órgãos da Justiça ordinária, poderão sercriados nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, para processo e julgamento, por opçãodo autor, das causas de reduzido valor econômico”.Nesse sentido, veja-se: “Mais reforça, ainda, o argumento da obrigatoriedade funcional, o fato deter constado do art. 1º da revogada Lei 7.244/1984, que aqueles ‘Juizados Especiais de PequenasCausas’ seriam adotados ‘por opção do autor, das causas de reduzido valor econômico’, o que nãoocorre, sob pena de se infringir dispositivos constitucionais. Intuitivo, portanto, tenha a nova lei(Lei 9.099/1995) omitido a inconstitucionalidade anterior da facultatividade, o que faz prevalecera regra da obrigatoriedade, atendendo o fim supremo que dela emerge e que se ajusta aosprincípios da Lei Maior” (TJSP, RI 814.776/4, Rel. Juiz Antônio de Pádua F. Nogueira, j. em28.01.1999).Assim, Theotonio Negrão, op. cit., p. 990; Weber Martins Batista e Luiz Fux, Juizados especiaiscíveis e criminais e suspensão condicional do processo penal: a Lei nº 9.099/95 e sua doutrinamais recente, p. 103, e Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 36.

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Nesse sentido, Horácio Wanderlei Rodrigues, Lei nº 9.099/95: a obrigatoriedade da competência edo rito; e J. S. Fagundes Cunha, A competência absoluta e a ausência do limite do valor da causanos juizados especiais cíveis.CARNEIRO, Athos Gusmão. Questões relevantes nos processos sob o rito sumário. Ajuris,67/173.Lei dos juizados especiais cíveis e criminais: Lei nº 9.099/95, de 26 de setembro de 1995 –Anotada, p. 19.Juizados especiais cíveis: uma escolha do autor em demandas limitadas pelo valor do pedido, ouda causa.Na jurisprudência, veja-se uma das primeiras decisões nesse sentido: “Com efeito, em se tratandode tipo de procedimento que se verifica tanto no Juizado Especial, como na Justiça Ordinária, aopção a um ou ao outro órgão de jurisdição compete ao Autor. Pois, no momento da propositura daação é que a lei faculta ao demandante a escolha da forma pela qual o autor pretende verimprimida ao seu litígio” (2º TACSP, AI 459.757, Rel. Juiz Melo Bueno, j. em 13.05.1996).Fundamentos do processo civil moderno, v. II, p. 1.429, e Instituições..., op. cit., p. 775.Nessa corrente, dentre outros, temos Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. III, p. 470;Câmara, Juizados..., op. cit., p. 27; e Pestana de Aguiar, op. cit., p. 37. Na jurisprudência, vejam-se: “Artigo 3º, § 3º, da Lei nº 9.099/95. O processamento da ação perante o Juizado Especial éopção do autor, que pode, se preferir, ajuizar sua demanda perante a Justiça Comum” (STJ, 4ªTurma, REsp 173.205/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. em 27.04.1999), “O procedimento doJuizado Especial Cível, previsto na Lei nº 9.099/95, é facultativo, podendo o autor exercitar o seudireito de ação pelos instrumentos normais previstos pelo CPC e legislação especial” (2º TACSP,AC 531.700, Rel. Juiz Laerte Sampaio, j. em 04.11.1998), o Enunciado 2.1 do CEJCA: “Acompetência em sede de Juizados Especiais Cíveis é opção do autor” e o Enunciado 1 doFONAJE: “O exercício do direito de ação no Juizado Especial Cível é facultativo para o autor”.Nesse sentido, veja-se: “Os Juizados Especiais Cíveis se colocam como uma via alternativa postaà disposição do autor para deduzir seu pedido, forma de facilitar o acesso à justiça. Afacultatividade quanto ao uso do regime instituído pela Lei, instituidora dos Juizados EspeciaisCíveis, decorre da previsão contida no próprio diploma, quando alude que a opção por eleimplicará renúncia ao crédito excedente ao limite previsto (Lei 9.099/1995, art. 3º, § 3º)” (TJRS,CC 21384-3, Rel. Des. Moacir Adiers, j. em 05.12.1996).Cinthia Robert, op. cit., p. 19; e Leonardo Greco, Os juizados especiais como tutela diferenciada,p. 44.Cândido Rangel Dinamarco, Fundamentos..., op. cit., p. 1.429.O modelo das Small Plea Courts foi substituído na maioria dos países anglo-saxões por versõesmais abrangentes dos Juizados de Pequenas Causas. Em 1997, por exemplo, surgiu no Canadá aSmall Claims Court, que resolve disputas com ou sem a ajuda de advogados, dando ênfase aosfatos e não às técnicas legais propriamente ditas, tendo como limite monetário para se ingressarcom a ação o valor de cinco mil dólares canadenses. Nesses órgãos, a primeira entrevista é feitapelo secretário da Câmara Municipal, que ajuda a parte a preencher o formulário com a devidareclamação, que será analisada pelo juiz, podendo este sugerir ou não uma emenda. Após essas

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providências preliminares, a parte ré é convocada para prestar esclarecimentos e defender-senuma audiência em que, não havendo conciliação, será proferida a sentença.Nesse sentido, veja-se: “A Lei 9.099/1995 assegura ao autor o direito de escolha pelo JuizadoEspecial. Conclusão, ademais, recomendada pelo fato de encontrar-se o réu em lugar incerto e nãosabido, pois não se permite a citação por edital no Juizado Especial, a teor do art. 18, § 2º, da Lei9.099/1995” (2º TACSP, AC 471699, Rel. Juiz Paulo Hungria, j. em 11.12.1996).Nesse sentido, veja-se: “3. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que ‘oprocessamento da ação perante o Juizado Especial é opção do autor, que pode, se preferir, ajuizarsua demanda perante a Justiça Comum’ (REsp 173.205/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, QuartaTurma, DJ 14.06.1999). A propósito: REsp 331.891/DF, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro,Terceira Turma, 21.03.2002; REsp 146.189/RJ, Rel. Min. Barros Monteiro, Quarta Turma, DJ29.06.1998.4. O art. 3º, § 3º, da Lei 9.099/1995 e o art. 1º da Lei Estadual 10.675/1996 permitemque a demanda seja ajuizada no Juizado Especial ou na Justiça Comum, sendo essa uma decisão daparte” (STJ, 2ª Turma, RMS 53227/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, j. em 27.06.2017).Nesse sentido, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 12.

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11OS ATOS PROCESSUAIS E OS PRAZOS NOS JUIZADOS

ESPECIAIS

A INTEGRAÇÃO DAS REGRAS SOBRE OS ATOS E OS PRAZOS

A Lei 9.099/1995 traça algumas regras especiais sobre os atos processuais e a fluência dosprazos. Parte dessas regras, entretanto, foi gradativamente inserida no CPC/1973, ao longo dasminirreformas, e consagrada no CPC/2015, o que acabou por torná-las redundantes. De qualquermodo, a metodologia adequada para tratar desses temas é aplicar os comandos previstos no CPC(arts. 188 e seguintes), com as poucas regras que permaneceram diferenciadas e com ascaracterísticas peculiares dos Juizados Especiais.

A PUBLICIDADE DOS ATOS

A primeira parte do art. 12, em consonância com os comandos inseridos no art. 93, IX, da CF eno art. 189 do CPC, estabelece que os atos praticados nos Juizados Especiais são públicos, de formaque qualquer interessado poderá acompanhar o processo. Ademais, em razão das características dosJuizados Especiais, na maioria dos casos não haverá espaço para a decretação do segredo de justiça(segunda parte do art. 189 do CPC).1

Importante lembrar, entretanto, que o segredo de justiça tem como um de seus objetivos aproteção da intimidade das partes. Assim, se uma causa se revelar lesiva à intimidade das partes, omagistrado deve decretar o sigilo, de ofício ou a requerimento.2 Um exemplo onde essa lógicapoderia ter sido aplicada foi o caso de um casal que ajuizou uma demanda num Juizado Especial doRio de Janeiro visando anular a multa que o condomínio onde moravam havia lhes aplicado. Aquestão, aparentemente prosaica, envolvia os sons que o casal emitia enquanto se relacionavasexualmente. Não houve decretação de sigilo e o resultado da demanda, com o nome das partes e onúmero do processo, foi parar na página principal do site do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.No mesmo dia, tornou-se o assunto mais comentado de determinada rede social e foi noticiado emvários veículos de comunicação. Apesar de terem vencido a demanda, acreditamos que o casal devater se arrependido profundamente por ter buscado os Juizados Especiais.

A PRÁTICA DOS ATOS EM HORÁRIO NOTURNO

No sistema do CPC, ressalvadas algumas hipóteses específicas, os atos processuais somente

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devem ser praticados nos dias úteis, das 6 às 20 horas (art. 212). Na Lei dos Juizados Especiais,entretanto, o art. 12 permite que os Tribunais definam, por meio de suas regras de organizaçãojudiciária, a prática dos atos processuais em horário noturno, ou seja, após as 20 horas. Comoressalta Salomão,3 é muito importante o funcionamento dos Juizados Especiais fora do horário deexpediente da maioria das pessoas, para permitir a sua participação nas audiências.

De fato, defendemos que os Juizados Especiais deveriam permitir que o demandante escolhesseo horário ou pelo menos a faixa de horário, dentre as opções disponíveis, para marcação daaudiência de conciliação. Seria uma espécie de agendamento, realizado no momento da distribuiçãoda petição inicial. Destarte, a parte não correria o risco de ter a sua audiência marcada para umhorário que inviabilizasse a sua presença na audiência.

O REGISTRO DOS ATOS PROCESSUAIS

Nos Juizados Especiais, em decorrência da celeridade e da oralidade, não há a obrigatoriedadeda redução a termo dos atos processuais praticados em audiência, mas, apenas, o registro resumidodaqueles considerados essenciais (art. 13, § 3º). Essa peculiaridade da Lei, embora justificável noplano dos princípios citados, cria uma situação, em tese, de falta de controle da atividade judicial.De fato, com o registro superficial dos atos, a decisão judicial poderia eventualmente deles sedistanciar, sem oferecer às partes subsídios para uma eventual revisão.

Ciente de que essa situação pode, em última análise, comprometer a aplicação dos princípiosdo contraditório, da ampla defesa, da publicidade e do duplo grau de jurisdição nos JuizadosEspeciais, previu o legislador a possibilidade de gravação das audiências (art. 13, § 3º, parte final)como forma de viabilizar o conhecimento pleno do que ocorreu pelas Turmas Recursais, durante ojulgamento do “recurso inominado” (art. 44).

É preciso esclarecer que, quando a Lei foi editada, o entendimento prevalente era de que agravação prevista no art. 13, § 3º, da Lei deveria ser feita, armazenada e descartada pelo própriojuízo, mediante requerimento das partes. Apesar disso, praticamente nenhum Juizado cumpria adeterminação de gravar as suas audiências, mesmo que oportunamente instado a tanto, sob a alegaçãode dificuldades técnicas. Assim, começou a ganhar força um movimento no sentido de que a própriaparte poderia gravar a audiência e, em seguida, depositar a gravação em cartório. Nesses casos, noentanto, a gravação dependia da anuência do magistrado, que poderia se opor ao registro, por falta deprevisão legal.

Com a edição do CPC/2015, no entanto, a divergência restou superada. De fato, o § 5º do art.367 do CPC prevê que a gravação da audiência poderá ser feita diretamente pelo juízo, em imagem eem áudio, por meio digital ou analógico, nos termos da legislação específica a ser editada por cadaente federativo. O art. 367, § 6º, do CPC, por sua vez, assegura às partes o direito de gravarem aaudiência “independentemente de autorização judicial”. Por certo, embora não precise ser

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autorizado, é de bom tom que a parte comunique aos presentes que irá gravar a audiência,especialmente se a gravação registrar a imagem da sessão de julgamento.

Na verdade, nós defendemos que todas as audiências deveriam ser filmadas por uma câmeraligada ao computador localizado na sala de audiências. Em Tribunais como o do Rio de Janeiro,onde todas as serventias são informatizadas e existe um sistema de Intranet, as gravações seriamsimultaneamente armazenadas pelo setor de informática, ao mesmo tempo em que ocorressem,praticamente sem custo. Assim, quando a Turma Recursal fosse julgar o “recurso inominado”,bastaria acessar a Intranet e localizar a gravação daquela audiência. A Turma poderia, assim, assistirà audiência e julgar com base no que efetivamente ocorreu nela, fazendo-se respeitar o princípio daoralidade na fase recursal. Além da utilidade para o julgamento do recurso, a mera ciência dagravação da audiência certamente faria com que todos os envolvidos no processo (partes, juízes,conciliadores etc.) tivessem maior comprometimento com seus escopos fundamentais.

A MANUTENÇÃO DOS AUTOS DO PROCESSO

O art. 13, § 4º, da Lei 9.099/1995 estabeleceu que as regras de organização judiciária deverãodispor sobre a conservação das peças do processo. Alguns Tribunais, no entanto, entenderam que aregra lhes permitiria regular sobre o descarte de autos, de forma diferenciada em relação aos demaisprocessos. Assim, como nos Juizados Especiais não cabe ação rescisória (art. 59), algunsregulamentos estabeleceram que os autos poderiam ser descartados meses depois do trânsito emjulgado das decisões neles proferidas (em geral, 180 dias). Isso é uma temeridade. Mais de uma vezjá nos deparamos com partes que queriam ter acesso aos seus processos e foram surpreendidas com aseguinte informação: “autos incinerados”. Mesmo com o arquivamento dos atos decisórios, odescarte prematuro dos autos pode causar prejuízo para as partes. Por questão de prudência,acreditamos que o melhor seria que os Juizados mantivessem seus autos por um período não inferiora dois anos.

Caso um interessado precise acessar os autos de um processo já descartado, pode ele, emúltima análise, ajuizar procedimento de restauração de autos, a ser processado e julgado no próprioJuizado, por intermédio do procedimento previsto nos arts. 712 a 718 do CPC.

OS PRAZOS

Dentre as inovações trazidas pelo CPC/2015 está a previsão de que os prazos processuais sãocontados em dias úteis (art. 219). Trata-se de uma medida absolutamente salutar, que tem comoprincipal objetivo densificar o princípio da isonomia. De fato, a iniciativa visa acabar com umadistorção presente na contagem dos prazos em dias corridos: o pressuposto de que todos osenvolvidos no processo trabalham de maneira ininterrupta, inclusive aos sábados, domingos eferiados. Isso, obviamente, não é ou, ao menos, não deveria ser uma verdade, uma vez que tais dias

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foram criados para descanso e têm proteção constitucional (art. 7º, XV, da CF). Com a contagem emdias úteis, não importa o dia em que o prazo começou a fluir, todos os personagens do processo têm àsua disposição o mesmo número de dias para praticar os atos processuais que lhes são atribuídos.

Não obstante a importância da contagem em dias úteis dos prazos, a jurisprudência construídaapós a entrada em vigor do CPC/2015 consolidou o entendimento de que os prazos nos JuizadosEspeciais deveriam permanecer sendo contados em dias corridos,4 apesar do disposto no art. 219 doCPC, em razão dos princípios da especialidade e da celeridade. Independentemente dos inúmerosequívocos presentes na fundamentação dessa corrente de pensamento,5 fato é que a questão restousuperada com a edição da Lei 13.728/2018, que acrescentou o art. 12-A na Lei 9.099/1995, com aseguinte redação:

Art. 12-A. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, para a prática dequalquer ato processual, inclusive para a interposição de recursos, computar-se-ão somenteos dias úteis.

De plano, importante sublinhar que o dispositivo incluído na Lei 9.099/1995 traz uma regradiferente daquela prevista no art. 219 do CPC. Isso porque no parágrafo único do art. 219 do CPCestá dito que somente os prazos processuais serão contados em dias úteis, ao passo que o art. 12-Adefine que todos os prazos serão contados em dias úteis. A conclusão que se chega é que nosJuizados Especiais todos os prazos, inclusive os prazos materiais, são contados em dias úteis.Apesar de entendermos que o melhor seria que a Lei 9.099/1995 tivesse adotado o mesmo critério doCPC, é inegável reconhecer que a regra contida no art. 12-A é muito mais objetiva e fácil de seraplicada. Evitam-se, assim, discussões sobre a natureza material ou processual dos prazos, temacomplexo e estranho às partes desacompanhadas de advogado.

Com relação à contagem dobrada dos prazos, porção majoritária da doutrina e jurisprudênciaassentada após a edição da Lei 9.099/1995 reconhecia essa possibilidade em apenas duas situações:no caso de litisconsortes com procuradores diferentes6 ou quando a parte era assistida por órgão daDefensoria Pública (art. 44, I, da LC 80/1994). Ocorre que ambos os entendimentos passaram a sercontestados, a partir da entrada em vigor da Lei 10.259/2001 (Lei dos Juizados Especiais Federais).Isso porque o seu art. 9º afirma que “não haverá prazo diferenciado para a prática de qualquer atoprocessual pelas pessoas jurídicas de direito público”.7 Assim, a regra teria acabado com aexistência de todos aos prazos diferenciados, tanto para a Defensoria Pública como para oslitisconsortes com advogados diferentes.8

Esses posicionamentos, data venia, nos parecem equivocados. Em primeiro lugar, defendemosque o art. 9º da Lei dos Juizados Especiais Federais teve como objetivo vetar exclusivamente osprazos diferenciados para a Fazenda Pública, pois, se quisesse acabar com todos os prazosespeciais, para ambas as partes, teria dito isso de maneira clara. O dispositivo, no entanto, é

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11.6-A

direcionado expressamente para as pessoas jurídicas de direito público. A Defensoria Pública, porsua vez, apesar de ser uma pessoa jurídica de direito público não se confunde com as partes queassiste. De fato, a contagem em dobro dos prazos existe como uma garantia institucional (art. 44, I, daLC 80/1994 e art. 186 do CPC), necessária ao adequado exercício de suas funções em juízo.9 Assim,retirar a dobra legal implicaria em prejudicar a parte assistida pela Defensoria Pública que é, emúltima análise, quem verdadeiramente se beneficia da dobra legal.10

Acreditamos também que a Defensoria Pública, quando no exercício da curadoria especial (art.72, parágrafo único, do CPC), permanece com a contagem em dobro dos prazos, exatamente porquenão está agindo em nome próprio, mas no interesse do seu curatelado. Se a Defensoria Pública, noentanto, estiver atuando em nome próprio nos Juizados, como parte da demanda, não deverá ter osprazos contados em dobro. O mesmo se diga em relação aos escritórios de prática jurídica dasfaculdades de direito, mencionados no art. 186, § 3º, do CPC. É o que acontece, por exemplo, se aDefensoria Pública ou o escritório de prática jurídica apresenta um pedido autônomo de execuçãodos honorários advocatícios fixados numa decisão proferida nos Juizados Especiais.

Como já visto, não se tem admitido a intervenção dos entes públicos e do Ministério Públiconos Juizados Especiais. Não obstante, se, por algum motivo, esses personagens vierem a semanifestar nos Juizados, entendemos que os seus prazos processuais não deverão ser contados emdobro. Entretanto, sustentamos que se o Ministério Público estiver atuando como fiscal da ordemjurídica (arts. 178 e 180 do CPC), a contagem dos prazos deverá ser dobrada.

Outro tema que merece destaque é o posicionamento jurisprudencial sobre o termo inicial dacontagem dos prazos, na hipótese de processo físico. O entendimento dominante afirma que acontagem do prazo correria da intimação das partes e não da juntada aos autos do respectivomandado, conforme preleciona o caput do art. 231 do CPC.11 Esse entendimento, em verdade,somente pode ser aplicado quando o ato a ser praticado for próprio da parte ou a parte estiveratuando nos Juizados Especiais sem assistência técnica, conforme estabelecido pelo art. 231, § 3º, doCPC.12 Se a parte estiver sendo patrocinada por advogado, no entanto, o prazo para a prática dos atosprocessuais somente será contado da juntada aos autos do mandado de intimação.

Da mesma forma, tem sido sustentado que os prazos recursais seriam contados da data dojulgamento pela Turma Recursal.13 Nesse caso, como o patrocínio técnico é obrigatório em todas ascausas na fase recursal (art. 41, § 2º), não há como defender o acerto de tal posição. Registre-se,igualmente, que somente depois da sessão é que o acórdão do julgamento é divulgado, com oconteúdo dos votos proferidos. Por isso, entendemos que os prazos somente começam a fluir após apublicação da decisão da Turma Recursal no órgão oficial (art. 1.003 do CPC).

A FLUÊNCIA DOS PRAZOS DURANTE O RECESSO

Theotonio Negrão14 e Cândido Rangel Dinamarco15 defendem, em nome da celeridade (art. 2º),

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que os processos em curso perante os Juizados Especiais não deveriam ficar suspensos durante orecesso forense (art. 220 do CPC).16 Afigura-nos ser, de fato, o melhor entendimento, embora nãopossa ser aplicado enquanto não for regulamentado por lei federal ou por lei estadual (arts. 24, X eXI, e 125 da CF), uma vez que é incabível a analogia extensiva em relações às regras de organizaçãojudiciária, notadamente em relação à fluência de prazos.17

AS CONVENÇÕES PROCESSUAIS

Tema de grande relevância, em razão de sua substancial ampliação promovida pelo texto doCPC/2015, é a previsão genérica para a celebração de convenções processuais, antes ou no curso doprocesso (arts. 190 e 191). Trata-se, segundo Leonardo Carneiro da Cunha, de uma cláusula geral denegociação processual fulcrada no princípio do respeito ao autorregramento da vontade das partesdentro do modelo cooperativo de processo adotado pelo CPC.18 Com o auxílio das convençõesprocessuais, os interessados podem firmar acordos sobre o procedimento, bem como sobre ônus,faculdades e deveres processuais. Podem também convencionar sobre o chamado calendárioprocessual, em que fixam, junto com o juízo, as datas e os prazos para a realização dos atosprocessuais. Para tanto, é necessário que o direito em jogo admita autocomposição e que as partessejam capazes e patrocinadas por advogado. Outros componentes essenciais para a validade daconvenção celebrada são a boa-fé dos convencionantes e o equilíbrio nas cláusulas convencionais.

Por certo, as convenções processuais são cabíveis no âmbito dos Juizados Especiais,19 muitoembora tenham um campo de atuação bastante reduzido, em decorrência da oralidade dosprocedimentos e das características particulares do Sistema. De plano, necessário afirmar que aspartes terão que estar acompanhadas de advogado para celebrar uma convenção processual ou paraaplicar uma convenção celebrada antes da instauração do processo, independentemente do valor dacausa. Isso porque a Lei 9.099/1995 dispensa a intervenção de advogado especificamente para aatividade postulatória, enquanto que a intervenção do advogado na elaboração das convençõesprocessuais tem por objetivo promover o apuro jurídico da vontade das partes. Da mesma forma, aconvenção processual não poderá modificar os limites traçados pela Lei 9.099/1995 nos arts. 2º, 3º,8º, 9º e 10, pois são eles que materializam os comandos contidos no art. 98, I, da CF.20 As partespoderão, por exemplo, alterar a ordem do procedimento, ampliar o número de testemunhas ou ajustara realização de uma perícia particular.

Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 391.Em sentido contrário, entendendo que não há segredo de Justiça nos Juizados Especiais, AlexandreCâmara, Juizados..., op. cit., p. 82.

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Op. cit., p. 65.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 164 do FONAJE: “O art. 229, caput, do CPC/2015 não seaplica ao Sistema de Juizados Especiais” e o Enunciado 165 do FONAJE: “Nos JuizadosEspeciais Cíveis, todos os prazos serão contados de forma contínua”.Apesar da prevalência jurisprudencial, sempre defendemos que os prazos processuais deveriamser contados em dias úteis. Nesse sentido, a Turma de Uniformização dos Juizados Especiais doTJDF editou, em 28.03.2016, a Súmula 4, que diz: “Nos Juizados Especiais Cíveis e de FazendaPública, na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somenteos dias úteis, nos termos do art. 219, do Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015)”. Da mesmaforma, o CJF editou a Resolução 393, em 19.04.2016, que modificou a Resolução 347/2015, queregula o funcionamento das Turmas Recursais Federais, das Turmas Regionais de Uniformização eda Turma Nacional de Uniformização, incluindo o art. 6º-A, que diz que “na contagem do prazo emdias, computar-se-ão apenas os dias úteis”. Por fim, vejam-se o Enunciado 415 do FPPC: “Osprazos processuais no sistema dos Juizados Especiais são contados em dias úteis” e o Enunciado416 do FPPC: “A contagem do prazo processual em dias úteis prevista no art. 219 aplica-se aosJuizados Especiais Cíveis, Federais e da Fazenda Pública”.No CPC de 1973, a contagem em dobro para litisconsortes com procuradores diferentes estavaprevista no art. 191. No CPC/2015, a regra está inserida no art. 229.Posteriormente, esta mesma regra foi reproduzida no art. 7º da Lei dos Juizados da FazendaPública.Nesse sentido, Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 790; e Marcia Cristina Xavier de Souza,Impactos do Novo Código de Processo Civil no sistema dos juizados especiais, p. 389. Veja-se,igualmente, o Enunciado 164 do FONAJE: “O art. 229, caput, do CPC/2015 não se aplica aoSistema de Juizados Especiais”Nesse sentido, veja-se: “É nesse cenário que devem ser analisados, constitucionalmente, asprerrogativas processuais da Defensoria Pública, ou seja, sob o alicerce do princípio na isonomiamaterial, pois se tem entendido que o tratamento diferenciado da Defensoria Pública constitui fatorde discrímen razoável, dadas as situações em que a parte, o hipossuficiente, também, está amerecer tratamento especial por sua condição social peculiar e pela fragilidade institucional,ainda, das Defensorias Públicas, que lhes presta assistência jurídica, em regra” (STF, REXT645.593/DF, Rel. Min. Carmen Lúcia, j. em 10.10.2011).Nesse sentido, Ana Beatriz Ferreira Rebello Presgrave e Jorge Bheron Rocha, Prazo em dobronos juizados especiais para defensorias públicas. Na jurisprudência, veja-se: “Juizadosespeciais da Fazenda Pública. Reclamação. Processo civil. Defensoria pública. Garantia de prazoem dobro. Art. 128, I, Lei Complementar 80/1994. Reclamação provida. Decisão cassada. 1 - Oart. 128, I, da Lei Complementar 80/1994, com redação dada pela Lei Complementar 132/2009, aoorganizar a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios, estabelece aprerrogativa do prazo em dobro para as Defensorias Públicas. 2 - O art. 7º da Lei 12.153/2009não se aplica à Defensoria Pública, mas às pessoas jurídicas de direito público elencadas no art.5º, II, da Lei 12.153/2009” (TJDF, 3ª Turma – Rcl 20120020060360, Rel. Juiz Hector ValverdeSantanna, j. em 08.05.2012).

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Nesse sentido, veja-se o Enunciado 11.9.3 do 1º CEJCA: “Nos Juizados Especiais os prazos sãocontados da data da intimação, e não da juntada do respectivo expediente aos autos”.“Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo: [...] § 3ºQuando o ato tiver de ser praticado diretamente pela parte ou por quem, de qualquer forma,participe do processo, sem a intermediação de representante judicial, o dia do começo do prazopara cumprimento da determinação judicial corresponderá à data em que se der a comunicação”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 85 do FONAJE: “O prazo para recorrer da decisão de TurmaRecursal fluirá da data do julgamento”.Op. cit., p. 989.Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 817.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 86 do FONAJE: “Os prazos processuais nos procedimentossujeitos ao rito especial dos Juizados Especiais não se suspendem e nem se interrompem”.Na ausência de regras determinando a fluência dos prazos nos períodos de suspensão, os prazosnos Juizados Especiais devem ser tidos como suspensos. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 269do FPPC: “A suspensão de prazos de 20 de dezembro a 20 de janeiro é aplicável aos JuizadosEspeciais”. Na jurisprudência, veja-se: “Dano Moral. Recurso interposto pela autora, que não érecebido pelo Juízo de Direito a quo, sob a alegação de intempestividade, ao argumento de que oprazo recursal teria corrido durante o recesso forense. Conhecimento do recurso da reclamante poresta Egrégia Turma Recursal Cível, porque todos os prazos processuais ficam suspensos em seusrespectivos cursos, durante o período de recesso forense, inclusive aquele para interposição dorecurso inominado em sede de Juizado Especial Cível, por força da regulamentação ocorrida naResolução 10/97” (TJRJ, 1ª Turma, RI 2000.700.007940-0, Rel. Augusto Alves Moreira Júnior, j.em 04.12.2000).Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p. 322.Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 387; e Diego Assumpção Rezende de Almeida, Acontratualização do processo das convenções processuais no processo civil, p. 193.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 413 do FPPC: “O negócio jurídico processual pode sercelebrado no sistema dos juizados especiais, desde que observado o conjunto dos princípios que oorienta, ficando sujeito a controle judicial na forma do parágrafo único do art. 190 do CPC”.

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12AS COMUNICAÇÕES PROCESSUAIS NOS JUIZADOS

ESPECIAIS

AS CARACTERÍSTICAS PARTICULARES DA CITAÇÃO NOS JUIZADOSESPECIAIS

Da mesma forma que o CPC (arts. 247 e 248, § 1º), a Lei 9.099/1995 prevê que a citação doréu seja feita preferencialmente por carta, com aviso de recebimento – AR (art. 18, I). A diferença éque, enquanto a Lei dos Juizados Especiais diz que o ato citatório será feito, “sendo necessário, poroficial de justiça” (art. 18, III), o CPC, nos incisos do art. 247, elenca as hipóteses em que a citaçãonão poderá ser feita pelo correio. Analisando os dois dispositivos em conjunto, verifica-se quesomente o inciso V do art. 247 do CPC é aplicável aos Juizados Especiais, pois os demais tratam desituações que não podem ocorrer nesse modelo judiciário, pelas limitações previstas no art. 8º:ações de estado, ações envolvendo incapaz ou pessoas jurídicas de direito público etc. Assim, emsíntese, a citação do réu, nos Juizados Especiais, deverá ser feita pelo correio, salvo se o autorfundamentadamente requerer que seja feita por outro meio. Assim, o autor pode alegar, por exemplo,que o local onde a citação deverá ser feita não é atendido pelo serviço de correio ou não temnumeração regular, para solicitar a atuação do oficial de justiça. O autor poderá, também, requererque a citação seja feita por meio eletrônico, na forma estabelecida nos arts. 193 a 199, 246, IV, doCPC e na Lei da Informatização do Processo (Lei 11.419/2006).

De qualquer modo, em sede de Juizados Especiais, além da via postal e do oficial de justiça,são aceitos como meios hábeis a viabilizar a citação o telefone e o fax, entre outros (art. 19),1 mesmose tratando de carta precatória. Os conceitos de citação do CPC (arts. 238 e seguintes) são aplicáveissubsidiariamente aos Juizados Especiais, sendo necessária a contagem do prazo mínimo para arealização da audiência de conciliação, que se dá a partir do efetivo recebimento da correspondênciae não da juntada nos autos do seu comprovante.2 Entendemos, conforme será melhor explanado maisà frente, que o prazo mínimo a ser observado deve ser de 15 dias, diferentemente do prazo de 20 diasprevisto no art. 334 do CPC.

Note-se que a Lei prevê que a citação dispensa a expedição de mandado, bastando a cópia dapetição inicial e das eventuais decisões liminares proferidas pelo juiz (art. 18, III). Cândido RangelDinamarco,3 com razão, critica essa previsão, pois, de fato, não há como dispensar o mandado, que éo instrumento da citação. Para que a citação seja feita de forma válida é preciso um documentocontendo todas as informações exigidas pela Lei. Por isso, o mandado pode até ser feito de modo

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informal, mas nunca dispensado. No mandado de citação, além dos requisitos gerais (art. 250 doCPC), deverá constar a advertência quanto à possibilidade de imediata convolação da audiência deconciliação em audiência de instrução e julgamento, caso não seja feito um acordo.4 Muito emboraesse fato já esteja previsto na Lei, o que, em tese, afastaria a necessidade de sua menção expressa nacitação, temos que essa é a melhor forma de evitar discussões e pedidos de adiamentos. Seriaimportante, também, que o mandado mencionasse a possibilidade de as partes serem encaminhadas àmediação, conforme as características da causa.

Necessário sublinhar que se o réu não for encontrado no endereço disponível e não for possívellocalizá-lo, em razão da proibição da citação editalícia (art. 18, § 2º), o juiz deverá encerrar oprocedimento sem resolução do mérito (art. 51, II), para que o autor possa, se quiser, recorrer aojuízo singular.

Por fim, como é sabido, a irregularidade na citação é matéria de ordem pública (art. 239 doCPC), que pode ser conhecida pelo juiz a qualquer tempo, inclusive em sede de embargos à execução(art. 52, IX, a). Por isso, o ato citatório deve ser feito com o máximo de cuidado, mitigando ainformalidade que deve incidir nas demais etapas do procedimento (art. 2º). Uma sugestão que se faz,à luz do princípio da simplicidade, é que os mandados de citação nos Juizados Especiais sejamredigidos numa linguagem mais clara e acessível, com orientações práticas, escritas em letras detamanho ampliado e com endereços e telefones para tirar dúvidas.

O RECEBIMENTO DA CITAÇÃO

O art. 18, II, da Lei dispõe expressamente que a citação pode ser feita por intermédio dorecepcionista, no caso de o réu ser pessoa jurídica ou firma individual.5 Essa regra deve serinterpretada em conjunto com o art. 248, § 4º, do CPC, que determina que as pessoas físicas tambémpoderão ser citadas por meio da recepção dos condomínios edilícios ou nos loteamentos comcontrole de acesso.6 Destarte, importante destacar que a escusa prevista na parte final dessedispositivo deve ser aplicada à citação prevista no art. 18, II: o responsável pelo recebimento decorrespondência poderá recusar o recebimento da citação se declarar, por escrito, sob as penas dalei, que o destinatário da correspondência está ausente.7 Se a recursa for considerada injustificada,no entanto, a citação será reputada válida e capaz de levar ao decreto de revelia.8

Com relação à citação da pessoa física, se a citação for feita num local que não seja umcondomínio ou loteamento com controle de acesso, entendemos que o recebimento da citação devaser feito em mão própria,9 para não gerar nulidades no processo. Não obstante, se a citação forrecebida por terceiro, deve ser reputada válida se o réu, acompanhado por advogado, comparecer naaudiência e não alegar a irregularidade do ato de comunicação. Se ele estiver desassistido deadvogado, no entanto, o ideal é verificar se ele está compreendendo a sua situação dentro doprocesso e se tem condições efetivas para se defender, independentemente de qualquer arguição (art.

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9º, § 2º).Por outro lado, se o réu for à audiência e se sentir apto a resolver a litígio, ainda que sua

citação tenha sido feita de maneira defeituosa, é possível proceder à conciliação ou à mediação, emhomenagem aos princípios fundamentais dos Juizados Especiais e, particularmente, ao princípio dainstrumentalidade das formas e do prejuízo – arts. 2º, 5º, 6º e 13, respectivamente. Nesse caso,importante registrar, não havendo acordo, entendemos que a audiência de instrução e julgamentodeverá ser marcada para outra data, se a sua imediata realização puder comprometer o direito dedefesa do réu (art. 27, in fine).

No caso da citação da pessoa jurídica ou da firma individual, conforme já sublinhado, não hánecessidade de o recebimento ser feito por seu representante legal ou por quem exerça poderes nadireção.10 Destarte, a comunicação por aviso de recebimento pode ser efetuada por meio derecebedor identificado, nada obstando, entretanto, que se faça por correspondência simples11 ouqualquer meio idôneo e por qualquer portador, desde que no local onde se encontra o citado.

A CITAÇÃO POR CARTA PRECATÓRIA

Ao contrário do que pode parecer à primeira leitura, o art. 18, III, da Lei 9.099/1995 nãoproibiu a expedição da carta precatória nos Juizados Especiais, mas, tão somente, criou apossibilidade para o juiz de determinar a realização dos atos de comunicação fora da comarca,dispensando a formação da carta precatória.12 Na prática, os Juizados só têm utilizado a cartaprecatória quando os outros meios não se mostraram eficazes, quando o juízo deprecante não foroutro Juizado ou o réu residir em local não atendido pela entrega domiciliar de correspondência (art.247, IV, do CPC). Além disso, é possível que a citação seja realizada em comarcas contíguas oupertencentes à mesma região metropolitana por meio de oficial de justiça (art. 255 do CPC).13

Por certo, nos Juizados Especiais a expedição da carta precatória não se submete aorecolhimento de custas.14 Aliás, uma prática muito frequente, nos casos em que a precatória énecessária, é a sua formação e cumprimento por ato da própria serventia, independentemente dadeterminação judicial.15

A CITAÇÃO POR CARTA ROGATÓRIA

Embora não exista qualquer vedação na Lei à utilização da carta rogatória (art. 237, II, doCPC), entendemos que ela não deva ter lugar nos Juizados Especiais, pela complexidade de se litigarcontra uma pessoa que esteja no exterior. De fato, o procedimento célere e informal da Lei9.099/1995 não se mostra apto a lidar com as características de uma contenda internacional.16

A IMPOSSIBILIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL

O § 2º do art. 18 determina que nos Juizados Especiais não se fará a citação por meio de

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editais. Essa vedação decorre da natureza oral do procedimento, uma vez que prestigia a presençadas partes e, ao mesmo tempo, evita que a causa se torne complexa pelas formalidades intrínsecas aoprocessamento de um réu citado por edital. Assim, havendo a necessidade da citação por edital, oprocedimento deve ser encerrado, sem a resolução do mérito (art. 51, II).

A CITAÇÃO POR HORA CERTA

Se o réu, ciente de que está sendo buscada a sua comunicação processual, esquiva-se, nadaobsta a que seja realizada a comunicação ficta por hora certa no âmbito dos Juizados Especiais, nostermos do art. 252 do CPC.17 Essa posição, entretanto, é combatida18 sistematicamente por trêsargumentos. Em primeiro lugar, aduz-se que o silêncio sobre o tema na Lei 9.099/1995 implicaria asua proibição. Em segundo lugar, afirma-se que a vedação à citação por edital levaria àimpossibilidade de outras formas de citação ficta, dentre as quais, a citação por hora certa. Emterceiro lugar, argumenta-se que a citação por hora certa levaria à intervenção do curador especial(art. 72, II, do CPC), tornando complexa a causa.

Rebatendo os dois primeiros argumentos postos, temos que a Lei 9.099/1995 não pretendeuregular exaustivamente a citação e a intimação, mas, apenas, traçar regras gerais compatíveis com osprincípios da informalidade e da economia processual e introduzir algumas alterações à estruturacriada pelo CPC, que é aplicada subsidiariamente. Assim, para que o silêncio da Lei implicassenuma vedação, as citações e intimações nos Juizados Especiais teriam que ter por base apenas osarts. 18 e 19, o que é inviável. De outra forma, imaginar que a proibição à citação por editalimplicaria a proibição de outras modalidades de comunicação ficta é contrário à interpretaçãosistemática da Lei. Na realidade, o legislador procurou fazer distinção quanto aos motivos quelevariam à comunicação presumida. Assim, se a parte for desconhecida ou incerta ou quando incertoou ignorado o local onde resida, em tese, essa circunstância independe da atuação da parte ré,inviabilizando a cientificação fictícia. Agora, se ela atua de forma dolosa, para fugir à aplicação dalei, a comunicação ficta torna-se plenamente válida, como ocorre no caso do art. 19, § 2º. De outromodo, seria legitimamente recomendável, embora moralmente reprovável, que todo réu fugisse dascitações feitas pelos Juizados Especiais.

Não obstante, ao se admitir a citação por hora certa, incontornável reconhecer a necessidade daobservância das regras previstas nos arts. 252 e 253 do CPC, inclusive no que tange à intervenção docurador especial.19 O entendimento majoritário, entretanto, tem sido pela consideração do réu comocitado apenas com base na certidão do oficial de justiça, sem formalidades legais (arts. 252 a 254 doCPC) ou a intervenção do curador especial.20 Com o devido respeito, entendemos que a falta deamparo legal inviabiliza essa interpretação. Ademais, como já sublinhado, a citação é um ato solenee importante dentro do processo, razão pela qual a sua realização deve privilegiar os princípios docontraditório e da ampla defesa.

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A INTIMAÇÃO

O caput do art. 19 da Lei 9.099/1995 determina que sejam aplicadas às intimações as mesmasregras previstas para a realização da citação. Com isso, a premissa é de que as intimações sejamfeitas pela via postal (art. 18). Se a parte estiver assistida por advogado, a intimação deverá serprocedida por meio eletrônico ou por publicação no órgão oficial (art. 273 do CPC).21 Talentendimento, contudo, somente deve prevalecer em relação aos atos que não tiverem naturezapersonalíssima. Assim, por exemplo, a intimação do executado para indicação dos bens penhoráveis,sob pena de multa (art. 774, V, do CPC), ou a intimação do autor, para dar andamento ao feito, sobpena de extinção do processo (art. 485, § 1º, do CPC),22 devem ser feitas diretamente à parte.

Da mesma forma que em relação à citação, está proibida a intimação por meio de edital. Se aintimação editalícia for necessária, o procedimento terá que ser extinto, sem resolução do mérito (art.51, II). Nesse caso, já existindo nos autos sentença com trânsito em julgado, o credor deverá extraircarta de execução de sentença, também chamada de “carta de crédito”, e promover uma ação deexecução judicial, no juízo cível competente, nos termos dos arts. 515, § 1º, e 516, parágrafo único,do CPC.

Por certo, a maioria das intimações, em razão da sistemática oral do procedimento, serárealizada em audiência. Nada impede, entretanto, que o advogado de uma parte intime o advogado daoutra (art. 269, § 1º, do CPC),23 embora as partes não possam se intimar entre si, por exigir umacapacidade técnica específica. No mais, as intimações podem ser feitas por qualquer meio idôneo,desde que a sua realização possa ser comprovada em juízo. Recentemente, por exemplo, os JuizadosEspeciais no Rio Grande do Sul, no Distrito Federal, no Paraná, em Goiás e em Minas Geraisregulamentaram o uso de um aplicativo de mensagens instantâneas para a realização de intimações.24

Necessário destacar que o CPC/2015 dispõe que o prazo para cumprimento da determinaçãojudicial corresponderá à data em que se der a comunicação, quando o ato tiver de ser praticadodiretamente pela parte, sem a intermediação de representante judicial (art. 231, § 3º). Por isso, se aparte estiver atuando sem advogado, ainda que esteja advogando em causa própria, as intimaçõesfeitas pessoalmente deflagram a contagem dos prazos para a prática do ato correspondente.25

A COMUNICAÇÃO DA MUDANÇA DE ENDEREÇO

A Lei criou, no § 2º do art. 19, um ônus processual para as partes.26 Elas estão obrigadas acomunicar aos Juizados Especiais eventuais mudanças dos seus endereços. Se a parte não sedesincumbe adequadamente desse ônus, as comunicações feitas no endereço fornecido em juízo serãoreputadas válidas, ainda que ela não esteja mais naquele local. Essa regra certamente serviu deinspiração para o parágrafo único do art. 238 do CPC/1973, incluído pela Lei 11.382/2006, ereproduzido no CPC/2015 no art. 274, parágrafo único. Nesse caso, o desconhecimento da lei não éescusável, de forma que a parte que não comunicar a sua mudança de endereço deverá arcar com as

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consequências dessa omissão até que essa falta venha a ser suprida com a sua manifestação. O ideal,entretanto, é que esse encargo seja esclarecido às partes, na primeira oportunidade em queintervierem no processo.

Frise-se que o fato de a parte contrária indicar o novo endereço da que se mudou sem a devidacomunicação ao juízo não desconstitui o ônus contido no § 2º do art. 19. É preciso, entretanto, fazeruma diferenciação: se nesse novo endereço for encontrada a pessoa, esse passará a ser o seu novoreferencial perante o juízo, caso ela mesma não indique outro; se a pessoa que se busca comunicarnão for localizada no novo endereço, valerá a intimação feita no endereço original. Ainda assim,para evitar futuras arguições de nulidade, é recomendável que se façam duas comunicações, uma noendereço original e outra no endereço fornecido pela parte contrária, assegurando o contraditório epreservando a competência dos Juizados Especiais.

A INTIMAÇÃO DOS DEFENSORES PÚBLICOS

Tem sido discutido, nos meios jurídicos, se a Lei 9.099/1995 teria alterado o regime deintimação das partes, quando assistidas por órgão de atuação da Defensoria Pública. Na visão dealguns julgadores, a existência de regras específicas acerca da intimação na Lei dos JuizadosEspeciais permitiria afastar a prerrogativa do defensor público de receber as intimaçõespessoalmente, como estabelecido no art. 44, I, da Lei Complementar 80/1994 (Lei Orgânica Nacionalda Defensoria Pública) e no art. 186 do CPC.27 Trata-se de evidente equívoco exegético, quedesconsidera o fato de que tais regras fazem parte de um regime jurídico próprio e aplicável a todasas situações. Mesmo que a Lei 9.099/1995 quisesse excepcionar o tratamento dedicado à DefensoriaPública, não poderia fazê-lo sem invadir a esfera de atribuição da citada lei complementar, incidindoem vício formal.

Por isso, necessário afirmar que o órgão de atuação da Defensoria Pública deve ser intimadopessoalmente dos termos e atos processuais,28 em todas as etapas do procedimento em curso peranteos Juizados Especiais. Caso não exista defensor público designado para atuar no órgão, deverá serintimado o Defensor Público Geral do Estado.

A PUBLICAÇÃO DAS PAUTAS DE JULGAMENTO NAS TURMAS RECURSAIS

É indispensável que, além da intimação das partes, seja efetuada a publicação da pauta dejulgamento nas Turmas Recursais. De fato, a publicação da pauta é necessária para tornar o feito aptoa julgamento, já que os recursos somente poderão ser julgados após cinco dias da publicação dapauta (art. 935 do CPC),29 com exceção dos embargos de declaração, que serão julgados na primeirasessão seguinte à sua interposição (art. 1.024, § 1º, do CPC).30

Importante lembrar que, se a parte recorrida não constituiu advogado para contra--arrazoar, asua intimação pessoal ficará dispensada, bastando a publicação da pauta no órgão oficial (art. 272 do

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CPC). De resto, as intimações na Turma Recursal seguem o estabelecido no art. 19 da Lei9.099/1995.

Reafirmando essa posição, veja-se a Ementa 61 do ETRJECERJ: “A comunicação dos atosprocessuais nos Juizados Especiais Cíveis pode ser feita por qualquer meio idôneo decomunicação, entre eles a telefônica. Inteligência do art. 19 da Lei 9.099/1995”.Note-se que, aqui, não é aplicável a regra do art. 231, § 3º, do CPC, mesmo nas causas com valorinferior a 20 salários mínimos, pois não se sabe de antemão se a parte ré irá lançar mão de suacapacidade postulatória direta (art. 9º).Instituições..., op. cit., p. 796.Existem julgados estabelecendo que no mandado de citação conste também a possibilidade deinversão do ônus da prova. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 53 do FONAJE: “Deverá constarda citação a advertência, em termos claros, da possibilidade de inversão do ônus da prova”. Datavenia, mas a referência parece redundante.A possibilidade de citação da pessoa jurídica por meio de sua recepção já era consagrada najurisprudência. Nesse sentido, veja-se: “Tratando-se a parte ré de pessoa jurídica, é válida acitação cuja carta com aviso de recebimento foi recebida por recepcionista da empresa, em razãodo que não há falar-se em obrigatoriedade do próprio representante legal da sociedade recebê-la”(TACPR, 4ª Câmara Cível, AC 1420064, Rel. Des. Clayton Camargo, j. em 07.03.2001).O cabimento da citação da pessoa física por meio da recepção era admitido pela jurisprudênciados Juizados Especiais antes mesmo da entrada em vigor do CPC/2015. Nesse sentido, veja-se aEmenta 242 do ETRJECERJ: “Citação. Entrega da correspondência. Revelia. Prazo para recurso.Comprovada a entrega da correspondência na recepção, considera-se válida a citação e suaausência na audiência produz os efeitos da revelia inclusive na contagem do prazo para o recurso,que corre independente de intimação”.O reconhecimento da recusa ao recebimento da citação pela recepção já existia na jurisprudênciados Juizados Especiais desde a década de 2000. Nesse sentido, veja-se a 401 do ETRJECERJ:“Citação. Invalidade. Pessoa Jurídica. Domicílio. Recusa justificada. Ausência de dados capazesde revelar que terceiro dispõe de poderes para receber tal ato. Dúvida acerca da validade dadiligência, que contamina decisão judicial”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 5.1.1 da CEJCA: “A citação postal de pessoa jurídicaconsidera--se perfeita com a entrega do A.R. ou notícia de recusa do seu recebimento peloencarregado da recepção ou qualquer empregado da empresa”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 97 do ETRJECERJ: “Citação Postal. Juizados Especiais. PessoaFísica. A citação por correspondência só é valida quando positivo o aviso de recebimento em mãoprópria. Nulidade de citação reconhecida para anular o processo”. Em sentido contrário,confiram-se o Enunciado 5.1.2 da CEJCA: “A citação postal de pessoa física considera-se perfeitacom a entrega de A.R. às pessoas que residam em companhia do réu ou seus empregados

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domésticos” e a Ementa 383 do ETRJECERJ: “Citação postal recebida por funcionário docondomínio. Citação pessoal recebida por empregada doméstica. Validade. Cobrança de encargosde locação. Procedência do pedido. Confissão ficta. Sentença mantida”.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 246 do ETRJECERJ: “Os princípios da simplicidade, daceleridade, informalidade e da economia processual, desobrigam que o recebimento da citaçãopostal seja feito por pessoa com poderes para recebê-la”.Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 392.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 33 do FONAJE: “É dispensável a expedição de cartaprecatória nos Juizados Especiais Cíveis, cumprindo-se os atos nas demais comarcas, mediantevia postal, por ofício do Juiz, fax, telefone ou qualquer outro meio idôneo de comunicação” e oEnunciado 6.1 da CEJCA: “Não é indispensável a expedição de carta precatória nos JuizadosEspeciais Cíveis, cumprindo-se os atos nas demais comarcas mediante via postal, ofício do juízo,fax, telefone ou qualquer outro meio idôneo de comunicação”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 6.2 da CEJCA: “Para atender aos princípios de informalidade,celeridade e economia processual dos JECs, os Oficiais de Justiça deverão cumprir diligênciasnas Comarcas contíguas e nas que se situam na mesma região metropolitana”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 44 do FONAJE: “No âmbito dos Juizados Especiais, não sãodevidas despesas para efeito do cumprimento de diligências, inclusive, quando da expedição decartas precatórias”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 6.3 da CEJCA: “O cumprimento das Cartas Precatóriasindepende de despacho judicial (art. 270, XII, da CNCGJ)”.Em sentido contrário, entendendo cabível a carta rogatória, veja-se Alexandre Câmara,Juizados..., op. cit., p. 81.Perfilando esse entendimento, na doutrina, podemos citar Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit.,p. 100.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 5.2 da CEJCA: “Não é cabível a citação por hora certa emsede de Juizados Especiais Cíveis”.Nesse sentido, Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 796.Nesse sentindo, Eduardo Oberg, op. cit., p. 183. Veja-se, ainda, o Enunciado 5.3 da CEJCA: “OJuiz poderá considerar o réu regularmente citado, se verificar, ante minuciosa certidão negativa doOficial de Justiça, que o mesmo se ocultou para evitar o recebimento da citação”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 7.2.1 da CEJCA: “A intimação do advogado, pessoalmenteou pela imprensa, para a prática de atos processuais, dispensa a da parte, inclusive paracumprimento de obrigação de fazer e não fazer” e o Enunciado 41 do FONAJE: “Acorrespondência ou contrafé recebida no endereço do advogado é eficaz para efeito de intimação,desde que identificado o seu recebedor”.Como veremos mais adiante (item 13.7 da Parte I), defendemos a inconstitucionalidade da regraprevista no art. 51, § 1º, da Lei 9.099/1995, que permite a extinção do processo sem a préviaintimação da parte.

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Nesse sentindo, Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil nosistema dos juizados especiais, p. 393.Em Minas Gerais, por exemplo, o tema é regulado pela Portaria 2/JESP-BH/2017. O próprio CNJreconheceu a possibilidade de os tribunais regulamentarem a utilização de aplicativos demensagens como meios de intimação, desde que sua adesão fosse facultativa: “Procedimento decontrole administrativo. Juizado especial cível e criminal. Intimação das partes via aplicativo.Regras WhatsApp estabelecidas em portaria. Adesão facultativa. Artigo 19 da Lei n. 9.099/1995.Critérios orientadores dos juizados especiais. Informalidade e consensualidade. Procedência dopedido” (CNJ – PCD 0003251-94.2016.2.00.0000, Rel. Cons. Daldice Santana, j. em23.06.2017).Marcia Cristina Xavier de Souza, Impacto do Novo Código de Processo Civil no sistema dosjuizados especiais, p. 389.Sobre a necessidade de se impor mais deveres às partes, ver, por todos, José Carlos BarbosaMoreira, Temas..., op. cit., p. 8.Nesse sentido, veja-se: “Alegada nulidade da decisão, por ter sido a parte, assistida pelaDefensoria Pública, intimada por carta para o comparecimento na audiência de conciliação.Alegação de nulidade que não procede, tendo em vista a existência de regras específicas na Lei9.099 sobre a intimação das partes” (TJRJ, 1ª Turma, RI 2003.700.033504-5, Rel. Juiz PedroRaguenet, j. em 13.02.2004).Nesse sentido, veja-se: “Litigantes que estão sendo assistidos por órgãos de atuação da DefensoriaPública, tendo prerrogativas imanentes à função de intimação pessoal das decisões e prazo emdobro, tendo havido omissão da Secretaria do Juizado quanto à realização do ato de comunicaçãoprocessual pessoal, sendo tempestivos, portanto, os recursos interpostos no decêndio dobrado quese seguiu à ciência das sentenças impugnadas, viabilizando assim o conhecimento de ambos”(TJRJ, 2ª Turma, RI 2004.700.017343-6, Juiz André Luiz Cidra, j. em 29.06.2004).Alguns tribunais, no entanto, têm se negado a aplicar o CPC. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 2do Aviso COJES/RJ 2/16: “As pautas de julgamento das Turmas Recursais poderão ser publicadascom a antecedência mínima de 48 horas ao dia da designação das sessões de julgamento”.Mantovanni Colares Cavalcante, Recursos nos juizados especiais, p. 41.

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13AS CAUSAS ESPECIAIS DE ENCERRAMENTO DO

PROCEDIMENTO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOSJUIZADOS ESPECIAIS

O art. 51 da Lei 9.099/1995 traz as formas de “extinção do processo sem julgamento do mérito”(no regime atual do CPC, preferimos falar em “encerramento do procedimento sem resolução domérito”), dirigidas, exclusivamente, para os Juizados Especiais. O rol, por certo, não é exauriente,como está a indicar a expressão “além dos casos previstos em lei”, fazendo-se necessária aaplicação supletiva do art. 485 do CPC. Em outras palavras, a lista de hipóteses que pode levar aoencerramento do procedimento sem resolução do mérito é composta pela combinação do art. 51 como art. 485 do CPC.

O grande número de situações que podem ensejar o término do procedimento decorre daespecialidade do procedimento e da necessidade de preservar o direito de ação e de defesa daspartes. De fato, a prolação de uma sentença terminativa nos Juizados via de regra não impede que aspartes possam buscar a tutela dos seus direitos no juízo comum. Não obstante, é importante salientarque o encerramento do procedimento sem resolução do mérito retrata um fim anômalo do processo eque deve ser evitado a todo custo, em homenagem aos princípios da efetividade, da primazia domérito e do aproveitamento dos atos processuais (arts. 4º e 8º do CPC).

Importante registrar que se o encerramento do feito ocorrer após o trânsito em julgado dasentença que julgou a fase cognitiva do procedimento sumaríssimo, não será necessário repetir talfase no juízo comum. Bastará ao interessado obter junto à secretaria do Juizado onde tramitou oprocesso a carta de execução de sentença,1 popularmente conhecida como “carta de crédito”, e levá-la à execução no juízo comum pelas regras do CPC (art. 515, § 1º).

A AUSÊNCIA DO AUTOR ÀS AUDIÊNCIAS

O inciso I do art. 51 prevê, como efeito automático, o encerramento do procedimento em razãoda ausência do autor a qualquer uma das audiências previstas nos procedimentos especiais.Entendemos, entretanto, minoritários, que a interpretação literal do dispositivo é inconstitucional.Isso porque mesmo que o autor tenha uma excelente justificativa, terá o procedimento encerrado e osefeitos da citação serão perdidos (art. 240 do CPC). A única consequência da apresentação de umajustificativa pelo autor faltoso é afastar a cobrança de custas processuais (art. 51, § 2º). Trata-se deinterpretação que viola os princípios da primazia do mérito (art. 4º do CPC), da razoabilidade, da

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eficiência (art. 8º do CPC) e da economia processual (art. 2º da Lei 9.099/1995). Se a pessoademonstra fundamentadamente a situação que levou à sua ausência, por que a punir? Por quedescartar todo o procedimento desenvolvido até então?

Na nossa visão, o autor que deixar de comparecer na audiência tem cinco dias para justificar asua ausência, a partir da data designada para sua realização (art. 334, § 8º, c/c art. 218, § 3º, doCPC), independentemente de intimação (art. 19, § 1º). Se o fizer, poderá pleitear a renovação daaudiência. Caso contrário, seria temerário para qualquer pessoa utilizar o procedimento da Lei9.099/1995. Basta imaginar que um motivo de força maior impeça a presença do autor no dia daaudiência, como um acidente, uma tempestade ou um apagão, por exemplo. Pelo óbvio, o juiz deveser rigoroso ao avaliar os argumentos da parte faltante, mas, se o interessado conseguir sedesincumbir desse ônus, o que não é fácil, deverá ter a audiência reproduzida.2

Se o autor, no entanto, não tiver uma justificativa plausível para ter faltado à audiência, acobrança de custas deverá ocorrer, ainda que ele esteja acobertado pela gratuidade de justiça. Defato, o CPC/2015 deixa expresso o que já era consolidado: a gratuidade não afasta o dever doassistido de pagar as penalidades processuais (art. 98, § 4º, do CPC).3 Nesse sentido, a ordem parapagamento de custas contida no art. 51, § 2º, da Lei 9.099/1995 é claramente identificada como umapenalidade. A maior prova disso é o fato de que ela pode ser afastada pela apresentação de umajustificativa.

A INADMISSIBILIDADE DO PROCEDIMENTO OU DO SEU PROSSEGUIMENTOAPÓS A ETAPA DE AUTOCOMPOSIÇÃO

A dicção do inciso II do art. 51 expõe de maneira clara uma peculiaridade procedimental dosJuizados Especiais, que é a relativa autonomia que a etapa compositiva desfruta dentro do rito. Oreferido dispositivo assinala que o procedimento somente será encerrado quando inviável seuprosseguimento “após a conciliação”. Destarte, essa ressalva deve ser lida à luz do art. 3º, § 3º, daLei, que permite às partes celebrar acordos em valor superior ao limite de 40 salários mínimos.Portanto, podemos concluir que, mesmo que a causa tenha valor superior ao teto de 40 saláriosmínimos, o encerramento do procedimento sem resolução do mérito somente deverá ser feito após atentativa de composição do litígio.

Por outro lado, se o autor quiser desistir da demanda, pode fazê-lo até na audiência deinstrução e julgamento, mesmo sem a anuência do réu.4 Essa afirmação decorre de dois fatores. Emprimeiro lugar, como já sublinhado, a etapa de composição tem natureza judicial-administrativa. Emsegundo lugar, tal faculdade se coaduna com a possibilidade de o autor renunciar ao valor excedenteao teto de 40 salários mínimos para prosseguir com a causa (art. 3º, § 3º). A partir desses preceitos,é possível concluir que a estabilização da demanda nos Juizados Especiais ocorre no início daaudiência de instrução e julgamento. Após o oferecimento da contestação, no entanto, a desistência

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do autor somente pode ser homologada pelo juiz com a aceitação do réu. De fato, embora o art. 329,II, do CPC fale em “saneamento”, tal preceito tem que ser ajustado à realidade dos Juizados, ondenão existe uma etapa destacada de saneamento.

Uma hipótese em que não será mais possível o prosseguimento do rito ocorre quando o réudemonstrar que as características dos Juizados Especiais não lhe permitem se defenderadequadamente, violando o princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF e art. 7º doCPC). É o que ocorre, por exemplo, quando for necessária a realização de uma perícia complexa ouda oitiva de grande número de testemunhas. Nesses casos, o juiz terá que ter muita atenção ao avaliaros fundamentos apresentados pelo réu, lembrando sempre que a presunção, iuris tantum, é em favorda competência dos Juizados Especiais, que é um direito constitucional subjetivo do demandante.

A DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL

Como já dito, no regime do CPC, a incompetência territorial é relativa (art. 63), mas, nosJuizados Especiais, é causa de encerramento do procedimento sem resolução do mérito (art. 52, III).Embora possa causar estranheza à primeira vista, a determinação legal possui dois fundamentos: deum lado, a sede constitucional do instituto (art. 98, I, da CF), e, de outro, a natureza especialíssimados procedimentos, que, em regra, inviabilizam o deslocamento da competência para o juízoterritorialmente competente, em razão de suas peculiaridades.5 Essa regra, em nosso sentir, deveriaser temperada pelo princípio da primazia do mérito, somente gerando o encerramento doprocedimento quando o juízo territorialmente competente for em outra unidade da Federação ou ondenão houver Juizado Especial. De modo que, havendo a incompetência territorial, se for possívelremeter os autos ao Juizado situado no foro competente, dentro da mesma unidade, não vemos razãopara pôr termo ao feito.

Necessário destacar que, minoritários, defendemos que o encerramento do procedimento sópoderá ocorrer mediante provocação do réu, por intermédio da contestação (art. 30), sob pena depreclusão. Isso porque, tratando-se de uma competência territorial relativa, fica vedado ao juiz agirde ofício (art. 65 do CPC e Súmula 33 do STJ). A maioria da doutrina, entretanto, amparada pelo art.51, III, afirma que a incompetência territorial representa matéria de ordem pública, podendo serconhecida de ofício, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição.6

A SUPERVENIÊNCIA DOS IMPEDIMENTOS DO ART. 8º

Na hipótese de alguma das partes incorrer nas vedações do caput do art. 8º ao longo doprocedimento, este deverá ser encerrado, a qualquer tempo ou grau de jurisdição (art. 52, IV). Defato, tratando-se uma mácula na capacidade processual da parte (pressuposto processual devalidade), verifica-se a ocorrência de nulidade absoluta. Desse modo, se alguma das partes, porexemplo, tornar-se incapaz, ausente, insolvente, se a empresa for estatizada, declarada falida etc., a

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solução será pôr fim ao procedimento sem resolução do mérito.

O FALECIMENTO DO AUTOR

De acordo com o art. 51, VI, morto o demandante, os seus sucessores têm o prazo de 30 diaspara fazer a habilitação incidental (arts. 687 a 692 do CPC), caso tenham interesse de prosseguir nacausa e o direito deduzido em juízo seja transmissível. Se já houver sido proposta a ação deinventário, o espólio poderá suceder o autor morto no polo ativo da demanda (art. 75, VII, do CPC).Há, entretanto, quem diga que o espólio não poderia assumir essa posição, por não ser pessoanatural.7 Na realidade, o espólio não pode “propor a ação” (art. 8º, § 1º), mas se a ação já estáproposta e o autor morre, pelo princípio da economia processual, deve ser admitida a sua inclusãono processo. Por certo, incorrendo o sucessor da parte autora em alguma das vedações do caput doart. 8º, o procedimento deverá ser encerrado sem resolução do mérito (art. 51, II). É o que ocorre,por exemplo, se um dos sucessores do autor falecido for incapaz8 ou insolvente.

A habilitação deve ser feita em 30 dias da suspensão do processo (art. 313, I, do CPC). Oobjetivo não é limitar a atuação do espólio, mas evitar que o rito se prolongue excessivamente. Oprazo de 30 dias, por ser um prazo processual, deve ser contado da intimação feita pelo juízo parapromover a sucessão processual e não do óbito propriamente dito. Nada obsta, outrossim, que o juiz,diante de um pedido fundamentado e dentro do lapso temporal, prorrogue esse prazo (art. 139, VI, doCPC), de forma a permitir o ingresso dos sucessores e evitar o fim anômalo do processo.

O FALECIMENTO DO RÉU

Se o falecimento ocorrer no polo passivo, ao autor cumpre realizar a citação dos herdeiros doréu para prosseguir na causa (art. 110 do CPC), se isso for possível (direitos transmissíveis). O autordeve ser intimado para agir quando da suspensão do processo (art. 313, I, do CPC), alertado de queterá o prazo de 30 dias para promover a sucessão processual, sob pena de encerramento doprocedimento (art. 51, VI). Se o réu tiver vários sucessores, o autor terá o pesado ônus de promovera citação de todos no exíguo período assinado. Também, por questão de coerência, admitimos que ojuízo possa prorrogar esse prazo, mediante pedido fundamentado e tempestivo (art. 139, VI, doCPC). Apesar do silêncio da Lei, entendemos, com os mesmos fundamentos expostos em relação aoinciso V do art. 51, que é possível a citação do espólio do réu, se este já estiver formado no prazoassinalado e não incidir nas mencionadas vedações do art. 8º.

O ônus de buscar a certidão de óbito do réu, quando esta não é trazida aos autos pelo autor oupor terceiros, deve ser atribuído ao juízo, notadamente quando o demandante não estiver assistidopor advogado. Isso porque não há como demonstrar o falecimento, senão por meio desse documento.Assim, se o autor for compelido a buscar a certidão de óbito, terá que suportar o valor de suaexpedição, em afronta ao paradigma adotado pela Lei 9.099/1995, que é a isenção de custas e taxas

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judiciais (art. 54).Promovida a citação dentro do prazo legal, que não poderá ser feita por edital (art. 18, § 2º), o

processo retoma o seu rumo, cabendo ao novo integrante da relação processual assumir tal papel noestágio em que o procedimento se encontrar.

A DISPENSA DA INTIMAÇÃO DAS PARTES SOBRE O ENCERRAMENTO DOPROCEDIMENTO

O art. 51, § 1º, prevê que as partes não precisarão ser previamente intimadas em qualquerhipótese para que se proceda ao encerramento do procedimento, sem resolução do mérito. Durante avigência do CPC/1973, defendíamos a inconstitucionalidade dessa regra. De fato, a celeridade quejustificaria a validade do dispositivo não poderia se sobrepor aos princípios constitucionais daampla defesa e do contraditório, notadamente num procedimento que não admite ação rescisória (art.59). Com a edição do CPC/2015, essa posição ganhou ainda mais força, especialmente à luz do quedispõe seu art. 10:

“Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento arespeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se tratede matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

A bem da verdade, os elementos necessários para retirar a validade do § 1º do art. 51 jáexistiam na Constituição Federal, antes mesmo da edição do CPC. O surgimento do Novo Código,entretanto, serviu também para refinar as interpretações jurídicas, sob o signo das normasfundamentais.9

A carta de execução de sentença é formada por um formulário emitido pelo Cartório do Juizado,com as informações básicas sobre o processo, instruído com cópias autenticadas dos autos.Por uma questão de isonomia, defendemos que o mesmo raciocínio se aplica ao réu que provarforça maior para sua ausência. Nesse sentido, veja-se a Ementa 298 do ETRJECERJ: “Revelia.Ausência de preposto justificada face a ocorrência de caso fortuito. Sentença que se cassa paraque seja dado ao Recorrente oportunidade de defesa em nova audiência”.Nesse sentido, Fredie Didier Jr. e Rafael Alexandrina de Oliveira, O benefício da justiçagratuita, p. 43; e José Fontenelle Teixeira Silva e Humberto Peña de Moraes, Assistência jurídicaaos pobres no Brasil, p. 78.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 90 do FONAJE: “A desistência do autor, mesmo sem aanuência do réu já citado, implicará na extinção do processo sem julgamento do mérito, ainda quetal ato se dê em audiência de instrução e julgamento”. Em sentido contrário, entendendo que adesistência depende da anuência do réu, Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 813.

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Nesse sentido, Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 784; e Oberg, op. cit., p. 177.Sobre o tema, veja-se nossos comentários feitos no capítulo referente à competência nos Juizados.Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. III, p. 490.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 148 do FONAJE: “Inexistindo interesse de incapazes, oEspólio pode ser parte nos Juizados Especiais Cíveis”. Em sentido contrário, admitindo que oespólio com incapazes possa prosseguir nos Juizados Especiais, Dinamarco, Instituições..., op.cit., p. 786.O entendimento da inconstitucionalidade do art. 51, § 1º, da Lei 9.099/1995 é minoritário. Noentanto, é possível encontrar decisões relativizando o seu comando. Nesse sentido, no regime doCódigo antigo, veja-se: “Necessidade de intimação pessoal para extinção do feito.Inaplicabilidade do art. 51, § 1º, da Lei 9.099/1995 ao caso concreto. Inobservância do dispostono art. 267, § 1º, do CPC, que determina a intimação pessoal da parte para que promova os atos ediligências necessárias ao andamento do processo, antes de promover a extinção” (TJRS, 3ª TR,RI 71005177654, Rel. Juiz Gisele Azambuja, j. em 29.01.2015).

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14.1

14AS DESPESAS PROCESSUAIS NOS JUIZADOS ESPECIAIS

O SISTEMA DE ISENÇÃO

O acesso aos Juizados Especiais, em primeiro grau, é gratuito para ambas as partes. Somentepara recorrer será necessário o pagamento de todas as despesas processuais, abrangendo não apenaso preparo do recurso, mas também do processo (citação, distribuição, taxas etc.), salvo nos casos de“assistência judiciária gratuita”. Trata-se de moderna técnica de desestímulo ao emprego dosrecursos pela cobrança de despesas processuais. Assim, somente as pessoas realmenteinconformadas com a decisão de primeiro grau é que irão utilizar as vias recursais.

Outro aspecto a ser sublinhado na Lei 9.099/1995 é que a sentença, em regra, não condenará aparte vencida em ônus da sucumbência. Busca-se, com isso, estimular a utilização dos JuizadosEspeciais como meio de solução dos conflitos. Desonerando as partes de arcarem com custas ehonorários, os Juizados tornam-se atraentes não apenas para o autor, mas também para o réu, o quefavorece a composição dos conflitos. É uma técnica já utilizada em outros diplomas, como, porexemplo, na Lei de Locações (art. 61 da Lei 8.245/1991).

O problema é que, se a parte ré tiver que contratar um advogado para se defender, mesmo quesaia vencedora, não será ressarcida, tendo que suportar o gasto feito.1 Mais do que uma “cortesiacom o chapéu alheio”, a Lei abriu as portas para uma série de situações que podem macular seunobre propósito. Basta pensar na pessoa que pede, sem advogado, uma indenização de 300 reais emface de uma empresa, por um aborrecimento banal. Para essa empresa será mais interessante fazer umacordo, mesmo entendendo sê--lo injusto, ou simplesmente não se defender, do que contratar umadvogado para atuar na causa. Como assinala Alexandre Câmara,2 “a total gratuidade do acesso aoJuizado Especial em primeiro grau de jurisdição é um verdadeiro incentivo à litigiosidade. Muitaspessoas têm se lançado em verdadeiras ‘aventuras processuais’, incentivadas pelo fato de que nadagastarão, ainda que saiam vencidas”. Com efeito, fazendo coro ao mestre carioca, passamos adefender que a Lei deva ser alterada, para prever a imposição de ônus sucumbenciais ao vencido,não apenas nas hipóteses de litigância de má-fé, como forma de responsabilizar a parte pelosprocessos de que deu causa e saiu derrotada. Note-se que, nesse caso, o valor dos honoráriossucumbenciais só deve ser entregue à parte vencedora quando tiver atuado com patrocínio deadvogado.

Não obstante, conforme estabelece o art. 55 da Lei 9.099/1995, a sentença deverá condenar aosônus sucumbenciais a parte com a conduta processual desvirtuada, em todas as etapas do

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procedimento, ainda que beneficiária da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 4º, do CPC).3 Aoaplicar a sanção, o julgador deve se utilizar dos dispositivos pertinentes do CPC (arts. 80 e 81),sendo que as custas devem ser recolhidas de acordo com o valor da condenação. Por certo, se a partevencedora atuou sem advogado (art. 9º), os ônus sucumbenciais não incluirão os honoráriosadvocatícios. Importante lembrar que os ônus sucumbenciais, quaisquer que tenham sido os motivosde sua aplicação, não se submetem ao teto de 40 salários mínimos (art. 39), nem se confundem comas multas devidas pela litigância de má-fé.

Necessário frisar que se o autor faltar injustificadamente a quaisquer das audiências, perderáparte da isenção inicial e terá que suportar o pagamento das custas processuais devidas em razão dapropositura da demanda (art. 51, § 2º). Aqui, entretanto, deve ser dada oportunidade para que elejustifique a sua ausência, antes de ser sancionado.4

No segundo grau, a Lei estabelece que aquele que recorrer e tiver o recurso improvido ouinadmitido5 arcará com ônus sucumbenciais em favor do recorrido. Tal condenação deve ocorrer,mesmo que a parte contrária não tenha apresentado contrarrazões.6 Diferentemente do que ocorriasob a vigência do CPC/1973,7 também haverá a condenação na hipótese de ser o recurso provido,porque o CPC/2015 estabeleceu como paradigma a condenação recursal (art. 85, § 1º).8 Isso porqueem sede recursal o paradigma não é a isenção, mas o pagamento de despesas processuais (art. 54,parágrafo único). Da mesma forma, no caso de provimento parcial do recurso, subsiste razão para acondenação da parte nos ônus sucumbenciais, nos termos do art. 85, § 14, do CPC.9 Como dito acima,se a parte vencedora não chegou a constituir advogado em etapa recursal, nos ônus sucumbenciaisnão se contarão os honorários advocatícios. Por fim, sendo a sentença anulada, não haverá aimposição de custas para qualquer das partes.10

Por outro giro, a cobrança de custas na execução, autônoma ou incidental, somente é possívelnas hipóteses expressamente previstas (art. 55, parágrafo único). A primeira causa de cobrança decustas é a litigância de má-fé (art. 55, parágrafo único, I). Ela se aplica tanto ao executado como aoexequente que durante o procedimento executivo venham a atuar de forma desleal (art. 81),11 sendocerto que os atos atentatórios à dignidade da Justiça praticados pelo executado poderão sersancionados com multa de até 20% do valor atualizado do débito em execução, a ser revertida emproveito do exequente (art. 774 do CPC).

A segunda causa diz respeito ao executado que teve seus embargos à execução rejeitados, comou sem resolução do mérito (art. 55, parágrafo único, II). A discussão surge com a possibilidade dequebra da isonomia entre as partes, uma vez que, sendo meio de defesa, a apresentação do embargoestá abrangida pelo princípio do contraditório, que não poderia sofrer limitações.12 Apesar daargumentação, nós preferimos fazer o raciocínio inverso, ou seja, o devedor que não embarga ou queembarga e sai vitorioso mantém a isenção originalmente prevista na Lei. Agora, o devedor queembarga e tem a sua defesa rejeitada perde a isenção legal, por ter prolongado indevidamente oprocedimento executivo.

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14.2

14.3

A terceira e última causa é o fato de a execução ter por base sentença que tenha sido objeto porparte do executado de “recurso inominado” improvido (art. 55, parágrafo único, III). Assim, aqueleque recorreu da sentença que formou o título executivo e perdeu, ao ser executado, deverá sercobrado da quantia referente às custas executivas.

A GRATUIDADE DE JUSTIÇA

Conforme estabelece o art. 54 da Lei, a utilização dos Juizados Especiais, em regra, não geraencargos econômicos para as partes. Apesar disso, em algumas situações específicas a Lei prevê aincidência de custas, taxas e ônus sucumbenciais (arts. 54, parágrafo único, e 55). Portanto, emqualquer etapa do procedimento podem as partes postular, com fulcro nos arts. 98 a 102 do CPC e naLei 1.060/1950, a gratuidade de justiça, que é expressamente mencionada na parte final do parágrafoúnico do art. 54 da Lei.

Destarte, se houver um pedido de gratuidade de justiça, o juiz deverá apreciá-lo, estabelecendose a concessão é total, parcial ou diferida (art. 98, §§ 5º e 6º, do CPC). Caso não o faça, serápossível atacar a omissão por meio de embargos de declaração (art. 48). Segundo entendimentoconsolidado, o juiz pode exigir a apresentação de documentos para corroborar a alegação dehipossuficiência, uma vez que a Constituição Federal fala que a assistência jurídica integral e gratuitaserá prestada “aos que comprovarem insuficiência de recursos” (art. 5º, LXXIV).13

A LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

A condenação por litigância de má-fé poderá ser aplicada a pedido da parte interessada ou deofício pelo juiz. A decisão, como não poderia deixar de ser, depende de fundamentação adequada,com a indicação dos atos que evidenciaram que a conduta do condenado foi pautada pela má-fé (art.55). Trata-se de responsabilidade civil processual com culpa comprovada, logo a condenaçãodepende da demonstração do elemento subjetivo por parte do sujeito apontado como litigante de má-fé.

A condenação por litigância de má-fé pode ser aplicada em todas as etapas dos procedimentosprevistos na Lei 9.099/1995, inclusive na seara recursal,14 abrangendo o pagamento de custas,honorários de advogado, multa e indenização.15 São aplicáveis subsidiariamente, aqui, os preceitoscontidos no CPC. Por certo, tal condenação não ficará afastada pela isenção decorrente da gratuidadede justiça (art. 98, § 4º, do CPC).16

Entendemos, outrossim, que a simples falta a uma das audiências, ainda que injustificada, por sinão deveria sustentar uma condenação por litigância de má-fé. Acompanhamos a doutrina modernaque tem reconhecido na ausência, em matérias dispositivas, uma forma de manifestação da parte, umdireito subjetivo de se quedar inerte, sem que se possa extrair desse comportamento o dolo naparticipação da relação processual.17 Ademais, já existem consequências suficientemente gravosas

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14.3-A

I –a)b)

c)d)

e)

f)

g)h)i)

II –a)

b)

c)

d)

e)

f)

para os que se abstêm de atuar no processo: a revelia, para o réu (art. 20), e o encerramento doprocedimento, para o autor, com o pagamento de custas (art. 51, I e § 2º).

QUADRO-RESUMO DAS DESPESAS PROCESSUAIS

Da conjugação das regras referentes às despesas processuais, podemos chegar ao seguintequadro:

Custas, taxas e despesaspara propor a demanda cognitiva: isenção (art. 54, caput);para interpor “recurso inominado”: pagamento, salvo no caso de gratuidade de justiça(art. 54, parágrafo único);para interpor embargos de declaração: isento (art. 1.023 do CPC);para interpor recurso extraordinário: pagamento (art. 54, parágrafo único), salvo nocaso de gratuidade de justiça;para interpor agravo de instrumento: pagamento (art. 54, parágrafo único), salvo nocaso de gratuidade de justiça;para interpor agravo interno: pagamento (art. 54, parágrafo único), salvo no caso degratuidade de justiça;para interpor agravo em recurso extraordinário: isento (art. 1.042, § 2º, do CPC);para impetrar mandado de segurança: isenção (art. 54, caput);para interpor reclamação (arts. 988 a 993 do CPC): pagamento (art. 54, parágrafoúnico), salvo no caso de gratuidade de justiça;

Custas executivaspara propor a demanda executiva, judicial ou extrajudicial: isenção (art. 55, parágrafoúnico);ao executado, na execução judicial ou extrajudicial: isenção, salvo quando se tratar deexecução de sentença que tenha sido objeto de recurso improvido do devedor (art. 55,parágrafo único, III);para apresentar embargos à execução, judicial ou extrajudicial: isenção (art. 55,parágrafo único);ao embargante vencido, na execução judicial ou extrajudicial: pagamento (art. 55,parágrafo único, II);ao autor que falta às audiências: pagamento, salvo se justificar a ausência (art. 51, §2º);ao litigante de má-fé na fase executiva: pagamento (art. 55, caput e parágrafo único, I).

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III –

a)b)c)d)

1

2

3

4

5

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7

8

9

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Ônus sucumbenciais (entre 10% e 20% do valor de condenação ou, não havendocondenação, do valor corrigido da causa)na fase cognitiva: isenção, salvo no caso do litigante de má-fé (art. 55, caput);na execução judicial: isenção, salvo no caso do litigante de má-fé (art. 55, caput);na execução extrajudicial: isenção, salvo no caso do litigante de má-fé (art. 55, caput);no “recurso inominado”: pagamento pelo recorrente vencido (art. 55, caput), salvo nocaso de gratuidade de justiça.

Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 53, censura a adoção dessa técnica, por entender queela inviabiliza a atuação do advogado.Juizados..., op. cit., p. 199.Com mesmo teor, veja-se: “Responde pelos prejuízos causados à parte contrária, aquele que litigade má-fé, mesmo que beneficiário da Justiça Gratuita” (2º TACSP, Ap. Cível 498.799-1, Rel. JuizCarlos Stroppa, j. em 03.12.1997).Veja, sobre o tema, o item 13.1 da Parte I.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 12.5 da CEJCA: “O não conhecimento do recurso ensejapagamento da sucumbência pelo recorrente” e o Enunciado 122 do FONAJE: “É cabível acondenação em custas e honorários advocatícios na hipótese de não conhecimento do recursoinominado”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 96 do FONAJE: “A condenação do recorrente vencido, emhonorários advocatícios, independe da apresentação de contrarrazões”.Humberto Theodoro Júnior, op. cit., p. 493, durante a vigência do CPC/1973 sustentava que oprovimento do recurso não dava ensejo à condenação à sucumbência recursal.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 12.4 da CEJCA: “Provido o recurso da parte vencida, orecorrido não responde pelos ônus sucumbenciais”.Nesse sentido, Walter dos Santos Rodrigues, Honorários advocatícios nos juizados especiais e osimpactos do Novo Código de Processo Civil, p. 175. Aplicação da regra do art. 20, parágrafoúnico, do CPC. Embargos de declaração rejeitados. Na vigência do CPC/1973, entretanto, oentendimento prevalente era de que o provimento parcial do recurso afastava a condenação. Nessesentido, veja--se o Enunciado 12.6 da CEJCA: “Não se aplica o disposto no Art. 55, caput, da Lei9.099/1995, na hipótese de provimento parcial do recurso”. A condenação somente era mantida seo recorrente ou o recorrido tivesse decaído de uma parte mínima do pedido recursal. Nessesentido, veja-se a Ementa 168 do ETRJECERJ: “Custas e honorários. Condenação da parterecorrente, embora provido parcialmente seu recurso, por ter a parte contrária decaído de partemínima do pedido”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 12.3 da CEJCA: “Não há imposição de ônus sucumbenciais nahipótese de anulação de sentença nas Turmas Recursais”.

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17

Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 202.Luiz Fux, op. cit., p. 15.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 116 do FONAJE: “O Juiz poderá, de ofício, exigir que a partecomprove a insuficiência de recursos para obter a concessão do benefício da gratuidade da justiça(art. 5º, LXXIV, da CF), uma vez que a afirmação da pobreza goza apenas de presunção relativa deveracidade”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 118 do FONAJE: “Quando manifestamente inadmissível ouinfundado o recurso interposto, a turma recursal ou o relator em decisão monocrática condenará orecorrente a pagar multa de 1% e indenizar o recorrido no percentual de até 20% do valor dacausa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivovalor”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 136 do FONAJE: “O reconhecimento da litigância de má-fépoderá implicar em condenação ao pagamento de custas, honorários de advogado, multa eindenização nos termos dos artigos 55, caput, da Lei 9.099/1995 e 18 do Código de ProcessoCivil”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 114 do FONAJE: “A gratuidade da justiça não abrange o valordevido em condenação por litigância de má-fé”.Rumando em sentido oposto, o Novo Código prevê multa para a parte que faltar injustificadamenteà audiência de autocomposição (art. 334, § 8º).

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PARTE IIDa tutela cognitiva

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1INTRODUÇÃO: O ESTUDO DA TUTELA JURISDICIONAL

COMO NOVO PARADIGMA DO DIREITO PROCESSUAL

Nos últimos dois séculos, o ponto nodal do estudo da ciência processual foi o processo. Oresultado é que o processo se tornou a base dogmática da processualística contemporânea. Ocorreque, recentemente, os estudiosos têm percebido o desacerto dessa visão.1 Isso porque se verificouque o processo representa “apenas” o lugar onde são exercidos dois poderes fundamentais da ciênciaprocessual: a jurisdição e a ação. Assim, de um lado, a jurisdição se traduz no poder-dever que oEstado-Juiz tem de prestar a tutela jurisdicional; de outro, a ação representa o poder-direitoconferido ao interessado de invocar a prestação da tutela jurisdicional. No centro dos dois conceitos,temos a tutela jurisdicional, atividade-fim do Poder Judiciário e objetivo maior das partes. É a tutelajurisdicional, portanto, que deve interessar em primeiro lugar aos estudiosos, e não o instrumentoonde ela é desenvolvida (processo).

A expressão “tutela jurisdicional” surge como um contraponto estatal à autotutela. Com efeito,se o Estado proibiu que as pessoas protegessem diretamente seus interesses, tornando crime oexercício arbitrário das próprias razões (art. 346 do CP), chamou para si a responsabilidade deproteger tais interesses. Tutelar significa, portanto, proteger. Nessa linha de pensamento, a tutelajurisdicional representa a proteção dada pelo Poder Judiciário aos bens jurídicos deduzidos emjuízo.2

De acordo com a estrutura concebida pelo CPC/2015, a tutela jurisdicional pode ser divididaem dois grupos: a) a tutela cognitiva, também chamada de tutela de conhecimento; b) a tutelaexecutiva. A tutela cognitiva visa promover o acertamento jurídico de uma questão posta em juízo,declarando o seu sentido e, eventualmente, impondo uma obrigação (tutela cognitiva condenatória) oucriando, modificando ou extinguindo uma relação jurídica (tutela cognitiva constitutiva). A tutelaexecutiva, por sua vez, visa satisfazer a obrigação reconhecida num título executivo, judicial ouextrajudicial.

À luz dessas premissas, vamos passar a estudar nesta parte do livro a forma como é exercida atutela cognitiva nos Juizados Especiais, através dos componentes previstos na primeira fase doprocedimento sumaríssimo da Lei 9.099/1995. Importante ressaltar que, assim como ocorre no CPC,em relação ao procedimento comum (arts. 318, parágrafo único, e 771, parágrafo único), as regras doprocedimento sumaríssimo servem também de base para a aplicação da tutela executiva, naquilo quecom ela for compatível.

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1

2

Nesse sentido, Flávio Luiz Yarshell, Tutela jurisdicional, p. 26, e José Roberto dos SantosBedaque, Direito e processo, p. 112.Nesse sentido, Cassio Scarpinella Bueno, Curso sistematizado de direito processual civil, v. I, p.261.

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a)

b)

2A ESTRUTURA DA FASE COGNITIVA DO PROCEDIMENTO

SUMARÍSSIMO

A fase cognitiva do procedimento sumaríssimo dos Juizados Especiais possui duas etapas:

etapa de composição (judicial-administrativa): nessa etapa, pré-jurisdicional, o queexiste basicamente é uma atribuição administrativa do Juizado para o recebimento dademanda, autuação do processo, formação da relação jurídica processual (citação) epromoção da composição dos interesses em discussão. Portanto, salvo nos casos emque houver providências urgentes ou imediatas a serem tomadas, somente depois deencerrada essa etapa é que o juiz “togado” irá intervir no feito;etapa de instrução e julgamento (jurisdicional): nesse percurso, o juiz abre a audiênciade instrução e julgamento, buscando mais uma vez promover a composição entre aspartes (art. 2º da Lei 9.099/1995 e art. 359 do CPC). Não sendo possível o acordo, ojuiz deverá receber a resposta do réu, colher as provas, ouvir as partes em alegaçõesfinais e julgar a causa.

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3.1

a)b)

3.1.1

3.1.2

3A ETAPA DE COMPOSIÇÃO

A primeira etapa do procedimento sumaríssimo tem como objetivo principal a busca pelacomposição dos interesses em conflito. Ela abrange: a) o oferecimento da petição inicial; b) adesignação de data para a realização da audiência de conciliação pela secretaria do Juizado; c) aimediata intimação do autor da data designada; d) a citação e a intimação do réu; e) a realização daaudiência de conciliação, com a possibilidade de sua convolação em audiência de mediação ouarbitragem.

A ADEQUAÇÃO DAS CAUSAS AO PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO

Para que se possa deflagrar o procedimento sumaríssimo, é preciso verificar quais as causasque podem ser processadas perante os Juizados Especiais. Trata-se da verificação dacompatibilidade procedimental entre determinada causa e o rito previsto na Lei 9.099/1995.

Dessa forma, se a causa não tem na lei processual rito especial, basta ser compatível com osrequisitos legais previstos nos arts. 3º e 8º para poder ser levada aos Juizados Especiais. São causasque se fossem propostas numa vara cível, seguiriam o rito comum (art. 318 do CPC), mas que, umavez propostas nos Juizados, seguirão o procedimento sumaríssimo.

Se a causa, entretanto, tiver um procedimento especial, duas situações podem ocorrer:

o procedimento especial já está expressamente previsto na Lei 9.099/1995;o procedimento especial não está previsto na Lei 9.099/1995.

Os procedimentos especiais que já estão previstos na Lei

A Lei 9.099/1995 prevê alguns ritos especiais que serão regidos pelo procedimentosumaríssimo nos Juizados Especiais. São eles o procedimento sumário do CPC/1973 (art. 3º, II, daLei 9.099/1995 e art. 1.063 do CPC), o procedimento de despejo para uso próprio (art. 3º, III) e oprocedimento possessório (art. 3º, IV).1 Em todas essas causas, o rito a ser adotado é aqueleestabelecido pela Lei 9.099/1995. Assim, por exemplo, uma ação possessória, quando submetida aosJuizados, não tem a etapa liminar inicial (arts. 562 e seguintes do CPC).

Os procedimentos especiais que não estão previstos na Lei

Via de regra, quando a causa tem um procedimento especial não previsto na Lei 9.099/1995, o

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3.2

entendimento majoritário é que ela não poderá ser proposta perante os Juizados Especiais.2 De fato,os procedimentos especiais do CPC e das leis extravagantes estão fora do regime da Lei 9.099/1995em decorrência de sua natureza especial (legi speciali per generalem non abrogatur).3 Assim,enquanto nas varas cíveis sem especialização procedimental é possível a tramitação de diferentesritos, nos Juizados, ao contrário, a Lei prevê a acolhida apenas dos procedimentos nela previstos(art. 1º).4 Assim, são incabíveis nos Juizados Especiais as ações monitórias,5 consignatórias,nunciativas,6 demarcatórias, populares, coletivas,7 locatícias8 etc.

Da mesma forma, não são cabíveis nos Juizados Especiais as ações cautelares de caráterantecedente, ainda que a ação principal se ajuste aos requisitos da Lei 9.099/1995,9 por serem elasdotadas de procedimentos especiais (arts. 305 e seguintes do CPC), diversos daqueles estipulados naLei. Destarte, em nossa opinião, a única forma possível para se obter uma medida cautelar nosJuizados Especiais é por meio de uma liminar cautelar incidental ao procedimento. Note-se que esseentendimento encontra eco nos textos da Lei dos Juizados Especiais Federais (art. 4º) e da Lei dosJuizados Especiais da Fazenda Pública (art. 3º), cujos procedimentos expressamente previram aconcessão, de ofício ou a requerimento das partes, de liminares cautelares. Dessa forma, se ointeressado, para propor sua ação, necessitar de uma ação cautelar antecedente, os Juizados nãoserão competentes para conhecer sua causa, devendo ele recorrer ao juízo comum

É preciso reconhecer, no entanto, que pelo menos dois procedimentos especiais, apesar de nãoprevistos na Lei, não podem ser afastados dos Juizados Especiais, por conta de suas peculiaridades:os embargos de terceiro (arts. 674 a 681 do CPC)10 e a restauração de autos (arts. 712 a 718 doCPC).11 De fato, negar aplicação de tais procedimentos obrigaria as partes a terem que recorrer aomandado de segurança para tutelar seus direitos, desvirtuando o uso do writ.12 Por outro lado, mesmoque as partes não tenham legitimidade adequada aos requisitos previstos no art. 8º da Lei9.099/1995, poderão propor tais demandas perante os Juizados Especiais.13

Apesar da ampla aceitação sobre a possibilidade de utilização desses procedimentos, têmocorrido divergências sobre o rito que tais medidas devem adotar dentro dos Juizados Especiais.Apesar das controvérsias, entendemos que, em observância ao princípio do devido processo legal,os procedimentos de embargos de terceiro e de restauração de autos previstos no CPC devem serrespeitados. A mesma lógica deve ser aplicada ao mandado de segurança, para quem aceita suatramitação nas Turmas Recursais.14

A COMPARAÇÃO ENTRE AS FASES COGNITIVAS DO PROCEDIMENTOCOMUM DO CPC E DO PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO DOS JUIZADOSESPECIAIS

A fase cognitiva do procedimento sumaríssimo dos Juizados Especiais é mais concentrada eoral que a fase cognitiva do rito comum do CPC (arts. 318 e seguintes). Em linhas gerais, noprocedimento dos Juizados Especiais, o autor propõe a demanda, postulando a citação do réu para

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3.3

3.3.1

comparecer a uma audiência de conciliação (art. 16). Essa audiência, se não for possível a obtençãodo acordo ou a realização da mediação ou da arbitragem, é imediatamente convolada em audiênciapara instrução e julgamento, exceto quando isso causar prejuízo para o pleno exercício do direito dedefesa15 (art. 27). Na audiência de instrução e julgamento, será apresentada a resposta, colhida aprova e proferida a sentença (art. 28).

No procedimento comum do CPC, o autor propõe a demanda postulando, via de regra, que o réuseja citado para uma audiência de autocomposição (art. 334 do CPC). Nessa audiência, se nãohouver acordo ou mediação, começa a fluir o prazo para o réu apresentar sua resposta. Nas situaçõesem que a audiência de autocomposição não é marcada, o prazo da resposta começa do protocolo peloréu do pedido de desmarcação ou da juntada aos autos do mandado de citação (art. 335 do CPC).Não sendo hipótese de julgamento imediato (arts. 332 a 356 do CPC), serão tomadas as providênciaspreliminares e será feito o saneamento do processo (arts. 347 e 357 do CPC). Após o saneamento,inicia-se a atividade probatória da instrução, com a realização da audiência de instrução ejulgamento (arts. 358 a 368 do CPC), se houver prova oral a ser colhida, para, em seguida, serproferida a sentença.

Portanto, o rito sumaríssimo dos Juizados Especiais, na sua fase cognitiva, é marcado pelarealização de no mínimo duas audiências – conciliação e instrução e julgamento. A essas duasaudiências podem se acrescentar, ainda, as audiências de mediação e de arbitragem, caso as partestenham interesse em buscar essa via de composição. Não obstante, para quem entende que a regracontida no art. 39 da Lei 9.099/1995, que permite ao juiz leigo conduzir a audiência de instrução ejulgamento, é constitucional, é possível que a audiência de conciliação e instrução e julgamentosejam concentradas em um único momento. Nesse caso, o procedimento terá apenas uma audiência,chamada de audiência de conciliação, instrução e julgamento. O ideal, no entanto, é que mesmoquando o juiz leigo for responsável pela realização da audiência de instrução e julgamento, aaudiência de conciliação seja conduzida exclusivamente por conciliador.

Em alguns Juizados, no entanto, tem-se admitido a dispensa da realização da audiência deconciliação.16 Trata-se, entretanto, de entendimento que viola o princípio do devido processo legal e,em especial, o princípio da oralidade. A realização da audiência de conciliação é obrigatória dentroda estrutura procedimental dos Juizados Especiais.

O “PEDIDO” (PETIÇÃO INICIAL)

As características da petição inicial

Para a instauração do processo é necessária a formação da relação jurídico-pro-cessual. Nodireito processual civil, o instrumento apto a deflagrar o processo chama-se petição inicial (art. 312do CPC). O art. 14 dos Juizados Especiais, entretanto, chama esse instrumento de “pedido”. Não éuma denominação das mais adequadas, pois pode gerar confusão com um dos elementos da demanda

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que também é chamado de “pedido”. Aliás, nesse art. 14 reina a imprecisão terminológica acerca dapalavra “pedido”: no caput, “pedido” é sinônimo de “petição inicial”; no § 1º, “objeto” tem osignificado de “pedido”; no § 2º, finalmente, “pedido” significa “pedido”; no entanto, no § 3º,“pedido” volta a ser sinônimo de “petição inicial”. Para não gerar maiores confusões, vamos adotara nomenclatura tradicional, independentemente do que diz a Lei 9.099/1995.

É muito comum encontrar quem afirme que a petição inicial nos Juizados Especiais não precisaseguir os requisitos do art. 319 do CPC.17 Ocorre que, em algumas hipóteses, essa aplicação éindispensável para a correta provocação da tutela jurisdicional. Por exemplo, a Lei não fala sobre anecessidade de indicar para qual Juizado a petição é dirigida (art. 319, I, do CPC), mas isso deve serfeito nos locais onde houver protocolo integrado. A Lei também não fala, mas a petição inicialdeverá ser instruída com os documentos indispensáveis à propositura da demanda (art. 320 doCPC).18 Sendo a causa no Juizado patrocinada por advogado, deverá ele indicar o endereço em quereceberá intimação (art. 77, V, do CPC). Assim, a interpretação do art. 14 deve ser feita à luz doscomandos dos arts. 77, V, 319 e 320 do CPC, naquilo que for compatível e necessário com o sistemados Juizados.

Da petição inicial deverá constar, portanto, a exposição resumida dos fatos, que permita aojulgador compreender a causa que se pretende ver julgada. As partes devem estar minimamenteidentificadas, seja por sua qualificação, características ou local onde possam ser encontradas. Adoutrina e a jurisprudência têm dispensado a exigência de indicação das provas que se pretendeproduzir, exceto no caso de testemunhas que precisem ser intimadas. Ainda assim, o art. 34, § 1º,prevê que as testemunhas podem ser indicadas nos autos até cinco dias antes da data designada paraa realização da audiência.19 O embasamento legal é plenamente dispensável na lavratura da petiçãoinicial, como sempre o foi (iura novit curia), à exceção do que for direito municipal, estadual,20

estrangeiro e consuetudinário (art. 376 do CPC).Importante destacar que a petição inicial pode ser apresentada por escrito ou oralmente. Neste

último caso, a secretaria do Juizado terá que fazer a redução a termo da demanda proposta, o quepode ser realizado por meio de formulários (art. 14, § 3º). Conforme já visto, a petição inicial podeser apresentada diretamente pela parte, nas causas de até 20 salários mínimos, mas se ela for feita,em qualquer hipótese, por advogado, deverá ser escrita. A oralidade da petição inicial é voltada paraatender ao interesse da parte e não do advogado. A maioria das secretarias dos Juizados oferece umserviço de apoio àqueles que peticionam sem advogado, orientando sobre as regras processuaisaplicáveis.21

A interpretação do pedido exordial deve ser feita de forma mais elástica possível quando aparte estiver demandando desacompanhada de advogado.22 Por exemplo, quando a parte pede adevolução das parcelas pagas num contrato, sem postular por sua rescisão. Nessa hipótese, diante docaso concreto, após a sua oitiva em audiência, pode o juiz concluir que o pedido de rescisãocontratual estaria implícito no pedido de devolução das parcelas pagas, para poder apreciá-lo, sem

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3.3.3

com isso macular o princípio da inércia (art. 141 do CPC). Essa possibilidade, entretanto, não podeser vista como uma autorização para que o juiz atue como auxiliar da parte. Com efeito, não rarasvezes, é possível observar nos Juizados Especiais decisões indo além ou até mesmo se distanciandodo pedido exordial, sob o argumento da informalidade do procedimento. Por isso, faz-se misterressaltar que os princípios norteadores da Lei 9.099/1995, especialmente a informalidade, não seprestam a permitir que o juiz decida sobre questão que não foi posta na petição inicial, sob pena deinvalidação do ato decisório.23

Por outro lado, diversas decisões judiciais vêm admitindo a emenda da petição inicial até aaudiência de instrução e julgamento.24 Em nosso entendimento, entretanto, após o oferecimento daresposta pelo réu, este terá que consentir com a alteração, ainda que não se faça presente à sessão dejulgamento (art. 28 da Lei 9.099/1995 e art. 329, II, do CPC). De fato, como o procedimento nãoprevê um momento próprio para o saneamento do processo, entendemos que a alteração do pedido,com a anuência da parte contrária, pode ocorrer dentro da audiência até a prolação da sentença.

O pedido genérico

No CPC existem três hipóteses em que é permitido ao autor formular pedidos genéricos: nasações universais; quando não for possível desde logo determinar o valor do pedido; quando adeterminação do objeto ou do valor da condenação depender de um ato a ser praticado pelo réu (art.324, § 1º). Na Lei 9.099/1995, quando o legislador previu a possibilidade de formulação do pedidogenérico, citou apenas a segunda situação: “quando não for possível determinar, desde logo, aextensão da obrigação”. De modo que, por exclusão, as outras hipóteses tratadas no Diploma Geralnão são aplicáveis aos Juizados Especiais. Realmente, as demandas relativas às ações universais e àprestação de contas não são cabíveis nos Juizados Especiais, por força das limitações contidas nosarts. 3º, § 2º, e 8º da Lei.

Importante lembrar, ainda, que nos Juizados Especiais o juiz está obrigado a proferir sentençalíquida, mesmo que o pedido seja genérico (art. 38, parágrafo único), diferentemente do que ocorreno juízo comum onde excepcionalmente é possível a prolação de decisões ilíquidas (art. 491 doCPC).

A cumulação de demandas e a cumulação de pedidos

Sempre que existir a cumulação de demandas, haverá uma cumulação de pedidos, mas ocontrário nem sempre é verdadeiro. Se o autor na petição inicial pede a indenização pelos danosmateriais e a compensação por danos morais, haverá cumulação de demandas e, para cada demanda,deverá formular um pedido. O mesmo se diga se o autor pede a rescisão do contrato e a devoluçãodas parcelas pagas. Agora, se o autor na exordial requer a entrega de um bem ou, subsidiariamente, oseu equivalente em dinheiro, existe apenas uma demanda, com dois pedidos. É a chamada cumulação

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imprópria de pedidos.De acordo com o art. 15 da Lei 9.099/1995, nos Juizados Especiais a cumulação de demandas

só é admitida quando entre elas houver uma conexão entre os pedidos ou as causas de pedir, além deidentidade de partes (conectividade objetiva e subjetiva), diferentemente do que ocorre no art. 327do CPC, que exige apenas a conexão entre as partes (conectividade subjetiva). Isso significa dizerque não basta que o réu seja o mesmo para que o autor possa cumular diferentes demandas no mesmoprocesso perante os Juizados Especiais, sendo necessário, ainda, que exista relação entre os pedidosou as causas destes. Assim, por exemplo, não pode o autor cumular um pedido de indenizaçãofundado em responsabilidade contratual com outro, baseado em responsabilidade extracontratual,mesmo que seja em face da mesma pessoa, se os fatos que tiverem gerado o dever de indenizar foremdiversos. Tal restrição está em sintonia com o preceito do art. 31 da Lei 9.099/1995, que limita autilização do pedido contraposto à identidade fática com a demanda principal. O objetivo presentetanto no art. 15 como no 31 é o mesmo: evitar que causas de menor repercussão possam, reunidas,transformar-se em causas complexas.

Outros dois requisitos imprescindíveis para a cumulação de demandas é que todas elas sejamadmissíveis nos Juizados Especiais e que, tratando-se de pequenas causas (art. 3º, I ou IV), a somadelas se submeta ao teto de 40 salários mínimos. Assim, por exemplo, se o demandante entender quetem direito à compensação de 30 salários mínimos por danos morais e de 30 salários mínimos pordanos materiais, em relação a um mesmo fato, deverá apresentar os pedidos separadamente, emações distintas, se não quiser renunciar ao valor excedente para pleiteá-los numa única ação.25 Poroutro lado, se a cumulação ocorrer entre uma causa sujeita ao critério ratione materiae (art. 3º, II ouIII) e outra, ratione valoris (art. 3º, I ou IV), apesar das divergências, entendemos que somentequanto a esta última é que se aplicará a limitação legal.

Sobre o tema, interessante lembrar que a Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Públicaprevia, no seu art. 2º, § 3º, que, se houvesse mais de um autor no mesmo processo, cada um poderiademandar até o limite do teto legal (60 salários mínimos). Esse dispositivo, entretanto, foi vetadopela Presidência da República, que entendeu que a permissão ali contida poderia levar ao JuizadoFazendário causas de maior complexidade. A lógica presente nesse veto também tem sido oposicionamento prevalente nos Juizados Especiais Estaduais. Assim, quando houver mais de umautor, a soma das demandas deduzidas por eles também ficará submetida ao teto de 40 saláriosmínimos, quando forem pequenas causas.26

O valor da causa

Nos Juizados Especiais, toda petição inicial deverá indicar o valor da causa (art. 14, § 1º, III,da Lei 9.099/1995 e art. 319, V, do CPC), sob pena de indeferimento (art. 330, IV, do CPC).27 Averificação da correção do valor da causa, entretanto, deve ser feita apenas na audiência de instrução

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e julgamento, quando se passa para a etapa jurisdicional do procedimento. Note-se, conforme jásalientado, que nos Juizados Especiais a conciliação não se submete ao limite de valor. Portanto, napetição inicial poderá constar como valor da causa aquele que se pretende obter na etapa decomposição, ainda que ultrapasse o teto de 40 salários mínimos. Nesse caso, não havendo acordo, ouo autor desiste da demanda ou renuncia ao excedente para que a causa possa se submeter ao teto legale prosseguir sob o rito especial (art. 3º, I e IV, e § 3º).

Ao estabelecer o valor da causa, o demandante deve verificar, quando necessário, se essaalçada o permite litigar sem advogado (20 salários mínimos) ou se ela se enquadra como pequenacausa (40 salários mínimos – art. 3º, I e IV). O valor da causa nos Juizados Especiais servirá tambémde parâmetro para a eventual fixação de multas (por exemplo, arts. 77, § 2º, 81 e 338, parágrafoúnico, do CPC), custas e honorários advocatícios (art. 55 da Lei 9.099/1995). Apesar disso, não hánecessidade de que o valor da causa seja fixado em salários mínimos na petição inicial. Basta,quando isso for necessário, que exista a correlação econômica entre o valor da causa e o valor dosalário mínimo28 no momento da propositura da demanda.29

Como a Lei 9.099/1995 não trouxe regras específicas sobre esse tema,30 a definição do valor dacausa segue os comandos previstos no art. 292 do CPC. Assim, se houver cumulação de demandas, ovalor da causa será obtido pela soma delas (art. 15 da Lei 9.099/1995 e art. 292, VI, do CPC); se ademanda tiver pedidos alternativos, prevalecerá o valor do pedido mais alto (art. 292, VII, do CPC);se interdependentes, o valor do pedido principal (art. 292, VIII, do CPC). Também é aplicável, poranalogia, o disposto no art. 292, § 1º, do CPC, quando houver prestações vencidas e vincendas. Poroutro lado, se o juiz verificar que o valor atribuído à causa não está correto, poderá, de ofício ou arequerimento das partes, determinar a sua retificação (art. 292, § 3º, do CPC).31 Se a parte adversaquiser arguir a inadequação do valor indicado para a causa, bastará que o faça como preliminar nacontestação (art. 30 da Lei 9.099/1995 e art. 293 do CPC).

Importante destacar que, sob a vigência do CPC/1973, vários juristas defendiam que o valor dacausa deveria ser sempre fixado pelo benefício econômico visado pelo autor, no momento dapropositura da demanda, ainda que o pedido fosse direcionado para modificar ou anular umcontrato.32 Esse entendimento, com o devido respeito, carecia de base legal na vigência do CódigoRevogado e o quadro não se alterou com a entrada em vigor do CPC/2015. Ainda assim, necessáriodiferenciar essa situação daquela prevista na parte final do art. 292, II, do CPC. Esse dispositivoestabelece que, nas hipóteses em que a demanda tiver por objeto a existência, a validade, ocumprimento, a modificação, a resolução, a resilição ou a rescisão de ato jurídico, o valor da causaserá o valor do ato ou o de sua parte controvertida. Assim, se o demandante quiser discutir apenasuma parte do contrato, por exemplo, o valor de uma multa contratual, o valor da causa deverácorresponder a essa parcela impugnada e não ao contrato.33 Se a pretensão do autor, entretanto, érescindir o contrato, o valor da causa deve corresponder ao valor do contrato.

Tratando-se de pedido de compensação pelo dano moral sofrido, deve o autor apresentar o

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valor que entende devido, nos termos do art. 292, V, do CPC. De fato, nunca concordamos com acorrente de pensamento que, na vigência do CPC/1973, defendia a possibilidade do pedido genéricode reparação pelo dano moral sofrido.

Por fim, o valor da causa, na hipótese de cobrança de dívida, é determinado pela soma do valorprincipal, atualizado à data da distribuição da demanda, mais multa e juros de mora e demaisencargos legais, em razão da aplicação do art. 292, I, do CPC.34

Os pedidos de tutelas provisórias

Como se sabe, as tutelas provisórias são modalidades de tutelas diferenciadas, de índoleconstitucional, especialmente desenvolvidas para combater os malefícios do tempo no processo. Sãotécnicas processuais utilizadas para garantir a efetividade da prestação da tutela jurisdicional, pormeio da redistribuição dos ônus processuais entre as partes do processo. Para tanto, as tutelasprovisórias têm como fundamento duas premissas diferentes: de um lado, a superioridade da posiçãojurídica de uma das partes, e, de outro, o risco iminente da ocorrência de um dano, seja para oresultado útil do processo, seja para o direito subjetivo das partes. Assim, de acordo com a novadisciplina instalada pelo CPC (art. 294), a tutela provisória se divide em tutela de evidência e tutelade urgência, sendo que esta última se subdivide em tutela cautelar e em tutela antecipatória. Épreciso considerar, ainda, que nos termos do parágrafo único do art. 294 do CPC, a tutela provisóriapode ser ventilada através de uma ação autônoma, requerida em caráter antecedente à ação principalcuja tutela jurisdicional se busca proteger, ou dentro da própria ação principal, por meio de umpedido formulado em caráter incidental.

Em nossa visão, a tutela provisória requerida em caráter antecedente, tanto cautelar comoantecipatória, não é compatível com a estrutura procedimental dos Juizados Especiais.35 Desse modo,a única forma de se obter uma tutela provisória nos Juizados Especiais é por meio de uma medidaliminar36 deferida dentro da ação principal. Por isso, vamos nos centrar o estudo do temaexclusivamente no plano das tutelas provisórias requeridas em caráter incidente.

Em alguns casos, a concessão de uma medida liminar pode estar expressamente prevista numprocedimento especial, como ocorre, por exemplo, na ação possessória (art. 562 do CPC), nomandado de segurança (art. 7º, III, da Lei 12.016/2009), na ação civil pública (art. 12 da Lei7.347/1985) e no rito dos Juizados Especiais Federais (art. 4º da Lei 10.259/2001). A principaldiferença entre as liminares presentes em procedimentos especiais e aquelas previstas genericamenteno CPC é o regime jurídico que cada uma dessas modalidades terá que observar. No caso da Lei9.099/1995, como não há um regramento próprio para a concessão de medidas liminares, salvo nocaso do deferimento de efeito suspensivo ao “recurso inominado” (art. 43),37 os pedidos deverãoatender aos requisitos previstos nos arts. 294 e seguintes do CPC.

Nesse passo, cumpre sublinhar que o tratamento das tutelas provisórias dentro do Sistema dos

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3.3.6

Juizados Especiais acompanhou a evolução da ciência processual ao longo do tempo. Com efeito, aLei 9.099/1995, elaborada na década de 1980,38 não cuidou do assunto. A Lei dos Juizados EspeciaisFederais, por sua vez, regulou apenas a liminar cautelar (art. 4º da Lei 10.259/2001), enquanto que aLei dos Juizados da Fazenda Pública previu tanto a liminar cautelar como a liminar antecipatória(art. 3º da Lei 12.153/2009). O novo paradigma sobre o tema, no entanto, está no Código deProcesso Civil, que deve servir de referência para todos os integrantes do Sistema dos JuizadosEspeciais, dentro da mencionada técnica de diálogo das fontes. De modo que não apenas nosJuizados Estaduais, mas também nos Juizados Federais e nos Juizados Fazendários, o regime dastutelas provisórias deve ser regido pelo CPC.

Destarte, são cabíveis todas as modalidades de tutelas provisórias, tanto de evidência como deurgência, desde que requeridas em caráter incidente à ação principal em curso naqueles órgãos. Defato, a experiência verificada durante a vigência da Lei 9.099/1995 demonstrou que as tutelasprovisórias estão inteiramente em sintonia não apenas com a estrutura do procedimento dos JuizadosEspeciais, mas também com seus princípios fundamentais, especialmente com o princípio daceleridade.39 Apesar de todo o aparato legal (e das boas intenções), na maioria dos Juizados do Paísos procedimentos levam em média dois anos para obter uma sentença com trânsito em julgado. Demodo que, se uma causa precisar de uma resposta judicial imediata, não se pode afastar a incidênciadas tutelas provisórias, sob pena de tornarem os Juizados Especiais em órgãos menos efetivos que ojuízo comum.

Ademais, importante lembrar que no regime do CPC/1973 as tutelas de evidência estavam, emboa parte, inseridas no rol das tutelas antecipadas (art. 273, II e § 6º, por exemplo). Por isso, nãohaveria sentido em restringir a aplicação das tutelas de evidência apenas porque houve uma mudançana nomenclatura legal.

A distribuição e a autuação da petição inicial

Mais uma vez, repetindo o erro já cometido no art. 14, a Lei 9.099/1995 fala no art. 16 em“pedido” quando quer se referir à petição inicial. Contornando o problema, diz o dispositivo que,recebida a petição inicial, a Secretaria do Juizado designará a audiência de conciliação,“independentemente de distribuição e autuação”. Isso não significa, como afirma notável juristabrasileiro,40 que nos Juizados Especiais o processo não seja autuado. A própria Lei 9.099/1995, porsinal, fala em “autos” no art. 52, IX. O que a Lei estabelece é que a designação da audiência deconciliação não fica dependente da distribuição e da autuação da petição inicial, mas apenas queesses atos podem ocorrer em momento posterior à propositura da demanda. No entanto, é claro queem algum momento a petição inicial terá que ser distribuída, onde houver protocolo integrado, eautuada, nos termos do art. 206 do CPC, sob pena de inviabilizar a organização e o funcionamento doórgão.

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3.3.7

3.3.8

3.3.9

O juízo de admissibilidade da petição inicial

No regime dos Juizados Especiais, o procedimento sumaríssimo possui uma etapa inicialvoltada para buscar uma composição do litígio, por meio da conciliação, da mediação ou daarbitragem, que tem natureza judicial-administrativa, porque não é feita diretamente pelo magistrado.Nessa etapa, os atos processuais (registro, distribuição e autuação da petição inicial, citação do réu,condução das audiências de composição etc.) são praticados pelos funcionários da secretaria doJuizado, independentemente de despacho. Por isso, em regra, não haverá a formação do juízo deadmissibilidade da demanda antes do início da etapa jurisdicional. De fato, o recebimento da petiçãoinicial, no sentido próprio, somente terá lugar na abertura da audiência de instrução e julgamento,quando finalmente o juiz irá tomar contato com a causa.

Existem situações, no entanto, em que a realização do juízo de admissibilidade pode serantecipada pelo juiz. Isso ocorrerá, por exemplo, quando houver na petição inicial um pedido detutela provisória ou quando o setor de protocolo não aceitar o recebimento da petição inicial e forsolicitada a presença do juiz encarregado da distribuição. Nesses casos, o julgador somente deveráse manifestar sobre a admissibilidade da demanda se verificar a ocorrência de algum vício queimpeça o regular andamento do feito.

O indeferimento da petição inicial

Não havendo necessidade da sua intervenção na etapa de composição, o juiz somente formará ojuízo de admissibilidade sobre a causa no início da audiência de instrução e julgamento, ou seja,após a citação do réu. Nesse caso, se o juiz entender que a demanda não tem condições mínimas parase desenvolver validamente e não há como sanar os vícios presentes no feito, deverá interromperimediatamente o seu seguimento (art. 51, II). Não se trata, pois, de hipótese de indeferimento dapetição (art. 330 do CPC), pois o réu já estará citado, mas em julgamento conforme o estado doprocesso (art. 354 do CPC).

Ocorre que, como dito, pode o juiz ser levado a analisar a demanda antes da citação do réu.Nessas situações, se o julgador entender presentes algumas das hipóteses previstas no art. 330 doCPC e no art. 51 da Lei 9.099/1995, poderá, desde logo, indeferir a petição inicial.41 O autor, por suavez, se quiser se insurgir contra tal decisão, terá que lançar mão do “recurso inominado”, na suamodalidade híbrida,42 aos moldes do regramento previsto no art. 331 do CPC.

A desistência da demanda

Não havendo a formação do juízo de admissibilidade antes da audiência de instrução ejulgamento, até esse momento, a desistência da demanda nos Juizados Especiais, qualquer que seja omotivo, pode ocorrer sem a concordância do réu, ainda que validamente citado.43 Depois de feita aapresentação da contestação, no entanto, a aceitação do réu é necessária para que a desistência possa

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3.4

se operar de maneira válida. Normalmente, a contestação somente é apresentada no início daaudiência de conciliação. Mas esse raciocínio também pode ser aplicado, ainda que a contestaçãotenha sido oferecida antes da audiência de instrução e julgamento, desde que o autor estejapatrocinado por advogado e seja inequívoco o seu conhecimento do conteúdo da defesa. Nestahipótese, mesmo que a desistência seja formulada antes da audiência de instrução e julgamento, oencerramento do feito dependerá da anuência do réu.44

AS TÉCNICAS DE COMPOSIÇÃO

A estrutura procedimental do rito sumaríssimo prevê, em sua etapa inicial, a realização de umaaudiência inteiramente dedicada à conciliação (art. 21). A Lei 9.099/1995 também faculta às partes apossibilidade de submeterem o litígio à arbitragem judicial, que deverá ser realizada dentro de umaaudiência especialmente designada para esse fim (arts. 24 a 26).45 Portanto, a princípio, a etapa decomposição do rito sumaríssimo foi concebida para oferecer às partes apenas dois tipos técnicas desolução dos conflitos: a conciliação e a arbitragem.

Ocorre que, com a edição da Resolução 125/2010 do CNJ, do CPC/2015 (arts. 3º, § 3º, e 165 a175) e da Lei de Mediação (Lei 13.140/2015), a Lei dos Juizados Especiais sofreu uma releitura,passando a abranger em sua etapa de composição, além da conciliação e da arbitragem, também atécnica da mediação.46 O resultado é que na audiência de conciliação, se não houver acordo, deveráser oferecida às partes a possibilidade de utilização da mediação ou da arbitragem para tratar dasquestões atinentes ao conflito deduzido em juízo. É preciso alertar, no entanto, que o encaminhamentodas partes para a mediação ou para a arbitragem dependerá das características do conflito, daestrutura do Juizado e da adesão das partes.

Atendendo ao comando da oralidade (art. 2º), caso as partes aceitem a proposta formulada peloconciliador, deverá ser instalada a audiência de mediação ou de arbitragem, em seguida ao términoda sessão de conciliação. Se a realização imediata dessa audiência não for possível, as partesdeverão ser, no mesmo momento, comunicadas da data designada para tanto. Por aplicação analógicado disposto contido no art. 16, essa nova audiência deverá ser marcada dentro do prazo de 15 dias.

Na audiência de conciliação, o conciliador deve atuar como um “maestro”, conduzindo ostrabalhos para, após ouvidas as partes, sugerir caminhos que levem à realização de um acordo (art.165, § 1º, do CPC). Desse modo, a conciliação se mostra mais adequada para tratar de conflitospontuais, como ocorre, por exemplo, na maioria das relações de consumo.

A mediação, por sua vez, é uma técnica voluntária e sigilosa, que preza a autonomia das partes.O grande diferencial da mediação é que essa técnica busca promover o protagonismo das partes, nadescoberta de soluções criativas para a resolução do conflito. Os esforços empregados pelomediador visam auxiliar as partes na construção de um desfecho capaz de contemplar os interesses eas necessidades de cada um, trazendo, assim, benefícios mútuos. Por isso, a via da mediação se

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3.4.1

mostra mais adequada e eficaz quando os conflitos em jogo estiverem relacionados com situaçõespessoais e sociais que se protraem no tempo, ou seja, de trato continuado (art. 165, § 3º, do CPC).Dentro dessa lógica, podemos apontar como exemplos adequados para a utilização da mediação osconflitos envolvendo vizinhos ou entre sócios de uma empresa.

Importante sublinhar que tanto a conciliação quanto a mediação representam técnicas em que aspartes, auxiliadas por um terceiro imparcial, buscam caminhos para superar as suas divergências.Por isso, são chamadas de técnicas de autocomposição. A diferença fundamental entre elas é que, naconciliação, o conciliador intervém diretamente na construção da solução, enquanto na mediação omediador atua para que as partes consigam reestabelecer um diálogo que o conflito comprometeu e,assim, possam superar seus atritos.47

No caso da arbitragem, as partes devem estar dispostas a colocar a resolução do seu conflito acargo de um árbitro – papel exercido nos Juizados Especiais exclusivamente pelo juiz leigo –, querealizará a instrução e proferirá sua decisão, conforme sua interpretação dos fatos e fundamentosapresentados. Na arbitragem, a legitimidade da solução adotada pelo árbitro decorre da opção que aspartes fizeram ao escolher essa técnica de solução do conflito. Por essa razão é que a arbitragem,diferentemente da conciliação e da mediação, é considerada como uma técnica de heterocomposição.

A conciliação

Embora possa ter lugar em qualquer etapa do procedimento, inclusive na fase recursal, omomento especialmente indicado para aplicação da técnica da conciliação é na audiência prevista noart. 21 da Lei 9.099/1995. A audiência de conciliação será marcada pela própria secretaria doJuizado, quando a petição inicial é apresentada pelo autor, que já fica imediatamente intimado dadata designada para sua realização. Ao contrário do que ocorre em relação à audiência deautocomposição prevista no rito comum do CPC (art. 334), nos Juizados Especiais não existe apossibilidade de recusa à designação da sessão de conciliação.48 Por via de consequência, as partesnão precisam dizer, em suas petições, se têm interesse na realização da audiência de conciliação.

A atuação das partes na audiência de conciliação deve ser feita com o acompanhamento dosseus respectivos advogados, nas causas com valor superior a 20 salários mínimos, conforme aposição majoritária49 (art. 9º da Lei 9.099/1995, c/c art. 334, § 9º, do CPC).

O caput do art. 17 da Lei 9.099/1995 assinala que, se ambas as partes se apresentarem juntasno momento da propositura da demanda, é possível instaurar imediatamente a audiência deconciliação, dispensados o registro prévio da petição inicial e a realização da citação. Essedispositivo tem por objetivo incentivar que as partes envolvidas num conflito de interesses busquemespontaneamente os Juizados Especiais para solucionar o problema. No entanto, se a instalaçãoimediata não for possível por causa do horário ou por falta de condições técnicas, a audiência serámarcada e ambas as partes saem do Juizado cientes da data designada, no prazo de 15 dias, por

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aplicação analógica do art. 16 da Lei. Embora o comparecimento espontâneo das partes possaocorrer em qualquer Juizado instalado, a medida tem como principal objetivo atender aos chamadosJuizados móveis ou itinerantes, previstos no art. 94 da Lei 9.099/1995.

Não se tratando da hipótese prevista no art. 17 da Lei 9.099/1995, a audiência de conciliaçãoserá realizada no prazo de 15 dias, contados da distribuição da petição inicial (art. 16). Emboracondizente com os princípios previstos no art. 2º da Lei, temos que a aplicação dessa regra, naprática, é inviável. Em primeiro lugar, o dispositivo não leva em consideração o tempo que serádespendido para efetivar a citação do réu. Isso pode fazer com que ele seja citado depois da datadesignada para a realização da audiência.

Em segundo lugar, não se preocupou o legislador em definir um prazo mínimo para o réureceber a citação antes da audiência, como ocorria no extinto rito sumário (art. 277 do CPC/1973).Na verdade, o réu precisa ter um tempo hábil para poder tomar ciência da demanda, buscar auxíliotécnico, reunir informações e se organizar para poder comparecer à audiência. É preciso considerar,ainda, que a audiência de conciliação pode ser convolada em audiência de instrução e julgamento(art. 27). Nesta situação, o réu terá também que preparar a sua defesa.

Em terceiro lugar, o prazo fixado no art. 16 não se mostra compatível com o prazo previsto noart. 34, § 1º, do mesmo Diploma. Neste, está dito que as partes poderão requerer a intimação dastestemunhas que tenham arrolado, desde que o façam em até 5 dias da data da audiência de instruçãoe julgamento. Com isso, para que a convolação prevista no art. 27 seja possível, o réu teria que sercitado com antecedência em relação à data da audiência de conciliação, para ter possibilidade derequerer tempestivamente a intimação das suas testemunhas.50 As testemunhas, por sua vez, terão queser intimadas respeitando o limite de 48 horas previsto no art. 218, § 2º, do CPC. A conclusão a quese chega é que o réu, mesmo que consiga ser citado nesse espaço tão curto de tempo, provavelmentenão terá condições de se preparar adequadamente para as audiências de composição ou para a etapade instrução e julgamento.

Por esses motivos, a nossa sugestão é que se estabeleça o prazo mínimo de 15 dias entre a datada citação e a data da audiência de conciliação. Note-se que o prazo de 20 dias previsto no art. 334do CPC não se ajusta com a determinação legal de que a audiência de conciliação seja designada nos15 dias subsequentes à propositura da demanda do art. 16 da Lei 9.099/1995.51 Assim, preferimosrecorrer à previsão de 15 dias, que passou a ser a regra na maioria dos prazos do CPC/2015, alémde servir de parâmetro para a realização da audiência de autocomposição nos procedimentos defamília (art. 695, § 2º, do CPC). Com essa precaução, a audiência de instrução e julgamento somentenão ocorrerá imediatamente após a tentativa frustrada de conciliação, em hipóteses muito restritas,como no caso de ser comprovado o prejuízo para o direito de defesa (art. 27 da Lei 9.099/1995).

Na jurisprudência, no entanto, após o desaparecimento do rito sumário, a maioria dos JuizadosEspeciais tem aplicado o prazo mínimo de cinco dias (art. 218, § 3º, do CPC), entre a citação e a

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realização da audiência de conciliação, para validar o procedimento, especialmente nas hipóteses emque a audiência de conciliação não será convolada em audiência de instrução e julgamento.52

Como já dito, embora seja judicial, a audiência de conciliação tem natureza administrativa, ouseja, configura-se como um ato processual não conduzido diretamente pelo juiz. Essa conclusão,embora consolidada há décadas na rotina dos Juizados Especiais, conflita com a expressão literal doart. 22 da Lei 9.099/1995, que diz que a audiência de conciliação será dirigida pelo magistrado oupelo juiz leigo, diretamente ou supervisionando o trabalho do conciliador. Na realidade, defendemos,num esforço de interpretação, que a intervenção do juiz ou do juiz leigo se limita à abertura da sessãoe ao esclarecimento inicial das partes, conforme dito no art. 21 da Lei. Mesmo assim, essa previsãoé, em nosso sentir, absolutamente desnecessária53 e prejudicial ao bom andamento do procedimento.

De fato, a primeira coisa que o conciliador diz, ao iniciar a sessão, é que ele não é juiz e queestá ali apenas para buscar um acordo, com todas as vantagens que lhe são inerentes. As partes entãoficam desarmadas e podem centrar os seus esforços na solução do problema. Na presença do juiz, aspartes se sentem na obrigação de expor suas razões e defender seus pontos de vista, colocando aconvergência de vontades em segundo plano. Não obstante, se o juiz entender por bem cumprir ocomando legal, deverá abrir a sessão, fazer os esclarecimentos e, em seguida, retirar-se, para que oconciliador conduza a audiência de conciliação, na esteira do que dispõe o CPC/2015 (art. 334, §1º).

Na abertura da audiência de conciliação, quando do esclarecimento feito às partes sobre asvantagens e desvantagens de submeter a demanda ao procedimento sumaríssimo (art. 21), necessáriotambém que seja explicado que o acordo, eventualmente celebrado, uma vez homologado, torna-seirrecorrível (art. 41).54 Apesar de parecer ser contraproducente fazer tal alerta, é preciso reconhecerque a recorribilidade das decisões tem um aspecto subjetivo muito forte em nossa cultura. Alémdisso, as partes mais simplórias e desassistidas podem ser “convencidas” a fazerem um mau acordo,acreditando que ele é provisório, mutável, renegociável etc. Por isso, ainda que não se diga, comtodas as letras, que o acordo se tornará irrecorrível, é importante deixar claro para as partes o seucaráter definitivo.

Se não houver no Juizado um conciliador disponível para conduzir a audiência de conciliação,a Secretaria deverá marcar nova data para a realização desse ato em homenagem às diretrizes fixadasno art. 2º da Lei. Se a indisponibilidade de conciliadores for permanente, no entanto, para nãoinviabilizar o funcionamento do Juizado, entendemos que a audiência de conciliação deverá sersuprimida, até que essa falha estrutural seja corrigida. Nesses casos, ao apresentar a petição inicial,o autor deverá ser alertado de que a audiência marcada será de instrução e julgamento, conduzidapelo juiz, que ficará responsável diretamente por buscar a conciliação do conflito, na abertura dostrabalhos (art. 359 do CPC). A mesma advertência deverá constar do mandado de citação.

Um aspecto importante a se considerar é que o CPC/2015, em seu art. 334, § 8º, estabelece que

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3.4.2

o não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado atoatentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até 2% da vantagem econômicapretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.55 No caso dos JuizadosEspeciais, entretanto, tal regra não deve ser aplicada. Isso porque já existe uma sanção própria eespecífica para o não comparecimento das partes à audiência de conciliação: o encerramento doprocedimento, com a imposição de custas, no caso do autor (art. 51, I e § 2º, da Lei 9.099/1995), e adecretação da revelia, no caso do réu (art. 20 da Lei 9.099/1995).

Sublinhe-se, nesse passo, que, conforme preceitua o art. 58, as normas de organizaçãojudiciária podem atribuir aos Juizados Especiais a competência para realização da conciliação decausas não incluídas no rol do art. 3º da Lei. Nessa hipótese, tratando-se de uma causa inserida nosJuizados Especiais apenas para a etapa de composição, se não houver acordo, o procedimentodeverá ser encerrado, sem resolução do mérito (art. 51, II).

A mediação

Uma vez aceita a proposta feita pelo conciliador de submeter o conflito à mediação, as partesdeverão ser encaminhadas para um centro judiciário de mediação (art. 165 do CPC), caso não existauma estrutura própria na sede dos Juizados ou não seja possível realizá-la imediatamente por meioeletrônico (art. 334, § 7º, do CPC). A audiência de mediação deverá ser conduzida por um mediadortreinado e, preferencialmente, sob a supervisão de outro mediador, que atuará como observador doprocedimento. Seguindo a orientação prevalente,56 as partes precisarão do acompanhamento de umadvogado, nas causas cujo valor seja superior a 20 salários mínimos.

No início da sessão, o mediador deverá fazer a sua apresentação pessoal e, em seguida,informar qual o objetivo da audiência, deixando claro que não tem interesse no desfecho do conflito.Deve, também, indagar às partes como elas querem ser chamadas e sublinhar que elas podem semanifestar livremente, sempre que entenderem necessário para contribuir com o debate. Ainda naabertura da sessão, o mediador deve informar que a mediação é regida pelo princípio daconfidencialidade, logo, nada do quer for dito poderá ser usado dentro do processo, salvo se aspartes pedirem que algo fique consignado.

Na audiência de mediação, o mediador poderá ouvir as partes em separado ou em conjunto,mais de uma vez. Também poderão ser ouvidas outras pessoas que, embora não inseridas noprocesso, possam contribuir para a construção do diálogo. Exatamente por isso, a audiência demediação poderá se desdobrar em mais de uma sessão, observado o prazo limite de dois meses (art.334, § 2º, do CPC). Ao longo do trabalho, o mediador deve buscar extrair dos participantes quaissão seus reais interesses e por que eles não estão sendo atingidos. Deve levá-los à reflexão sobre asrazões do conflito e a importância de resgatar os valores que ficaram obscurecidos pelasdivergências apresentadas.

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3.4.3

Ao final do procedimento, o mediador deverá lavrar um termo de mediação, no qual constará adescrição de como a mediação se desenvolveu (relatório) e quais as conclusões que foramalcançadas pelas partes. Esse termo será assinado pelo mediador e pelas partes e encaminhado aojuiz. Se as conclusões firmadas pelas partes conduziram à solução total do conflito, o juiz iráverificar sua regularidade formal e, em caso positivo, homologará o acordo por sentença (art. 22,parágrafo único, da Lei 9.099/1995). Se o ajuste celebrado resolver apenas parte do conflito ou se acomposição não for possível, o próprio mediador deverá inserir no termo de mediação a data em queserá realizada a audiência de instrução e julgamento. Em seguida, deverá fazer os autos conclusos aojuiz.

Na hipótese de ter sido feito um acordo parcial, o juiz deverá verificar a sua regularidadeformal e, se não houver vícios, homologá-lo por decisão interlocutória (art. 203, § 2º, do CPC).Nesse mesmo momento, deverá delimitar a parcela do conflito que será submetido a instrução ejulgamento. Tanto essa decisão, como a sentença prevista no art. 22, parágrafo único, da Lei9.099/1995 serão irrecorríveis (art. 41 da Lei 9.099/1995).

O juiz pode, ainda, determinar a repetição da mediação, se entender que ela não foi bemconduzida ou que não observou alguma formalidade essencial. Mas somente em casos excepcionaispoderá recusar a homologação das tratativas encetadas. A decisão que não homologar a mediaçãodeve não apenas ser fundamentada, mas também apontar quais os vícios que identificou e aimpossibilidade de se aproveitar qualquer elemento do procedimento. O que deve prevalecer, nestaseara, é a autonomia da vontade das partes.

Importante frisar que as partes podem desistir da mediação a qualquer tempo, antes de assinadoo termo de mediação. Nesse caso, o procedimento retomará o seu curso regular, rumo à etapa deinstrução e julgamento. Uma vez lavrado o termo, no entanto, o acordo considera-se pronto eacabado, não podendo mais ser desfeito, ainda que pendente de homologação judicial, salvo se ficarcomprovado algum vício. Por fim, a decisão que homologa a mediação tem status legal de títuloexecutivo judicial (art. 515, II, do CPC).

A arbitragem

Em 1989, quando foi elaborado o Projeto de Lei que originou a parte cível da Lei dos JuizadosEspeciais (PL 3.698/1989), a arbitragem prevista em seu texto era melhor regulada que a arbitragempresente no texto do revogado CPC/1973 (arts. 1.072 a 1.102). Portanto, o sistema previsto na Lei9.099/1995 representou, num primeiro momento, uma evolução, embora a doutrina especializadatenha criticado a iniciativa desde seu nascedouro. Ocorre que, quando os Juizados começaram a serinstalados, foi editada a Lei 9.307/1996, que revogou os arts. 1.072 a 1.102 do CPC/1973 e instaurouum novo modelo de arbitragem, de natureza extrajudicial (privada).57 Com isso, o procedimentojudicial arbitral recém-criado pela Lei 9.099/1995 também foi reputado como obsoleto e

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abandonado. De fato, na prática, não se tem notícias de algum Juizado Especial no Brasil que estejaaplicando a arbitragem prevista nos arts. 24 a 26 da Lei.58

Para entender melhor a razão dessa postura, vamos fazer uma breve comparação entre os doismodelos de arbitragem. A primeira diferença entre os institutos é que a Lei 9.099/1995, em razão doprincípio da informalidade, considera instaurado o juízo arbitral pela mera opção por esta via,independentemente de termo de compromisso (art. 24, § 1º). Na Lei 9.307/1996, ao revés, o art. 9ºdetermina que o juízo arbitral só se instaura com a assinatura do termo de compromisso. Outradiferença é que o árbitro, nos Juizados Especiais, será escolhido dentre os juízes leigos (art. 24, § 2º,da Lei 9.099/1995). É uma limitação em relação à Lei 9.307/1996, que em seu art. 13 estabelece quequalquer pessoa capaz poderá assumir a função de árbitro. Outro aspecto a ser sublinhado é que oárbitro, pelo procedimento da Lei 9.099/1995, sempre poderá decidir por equidade (art. 25),enquanto que, nos termos do art. 2º da Lei de Arbitragem, o árbitro só poderá decidir por equidadese as partes assim convencionarem expressamente. Por fim, o laudo arbitral nos Juizados Especiaisprecisa ser homologado pelo juiz togado para poder ter eficácia executiva (art. 26), enquanto que naLei de Arbitragem o laudo arbitral já nasce com tal eficácia (art. 31 da Lei 9.307/1996 e art. 515,VII, do CPC).

A estrutura do procedimento arbitral nos Juizados, como dito, inicia-se com a escolha doárbitro pelas partes, dentre os juízes leigos, na própria audiência de conciliação. O árbitro nãoprecisa ser nomeado pelo juiz para exercer a sua função. Basta aceitá-la. Se o juiz leigo escolhidonão estiver presente ou disponível no momento da escolha, a audiência arbitral é marcada e as partesjá saem cientes dessa data. Se o juiz leigo estiver presente e disponível, a audiência de conciliaçãodeve ser imediatamente convolada em audiência de arbitragem. Na hipótese de a causa ter valorsuperior a 20 salários mínimos, as partes deverão estar acompanhadas por advogado.59

No início da audiência arbitral, o árbitro deve tentar conciliar as partes, nos moldes do queprevê o art. 359 do CPC. Não sendo o acordo possível, deverá dar a palavra ao réu, para apresentarsua versão dos fatos na audiência arbitral, oralmente ou por escrito. Se não o fizer, essa oportunidadeestará preclusa. Isso não significa que o réu será considerado revel, mas, tão somente, que estaráindefeso. Em seguida, o árbitro deverá ainda colher a prova utilizando dos mesmos critériosprevistos na Lei 9.099/1995 para o juiz (art. 25).60 Assim, o árbitro poderá deferir a produção daprova oral, pericial e até realizar uma improvável inspeção, que no regime dos Juizados pode serfeita por “pessoa de confiança” (art. 35, parágrafo único).

A Lei 9.099/1995 é, pelo óbvio, anterior à Lei 9.307/1996 (Lei da Arbitragem). Por isso, comojá sublinhado, serviu-lhe de paradigma o antigo sistema arbitral do CPC/1973 (arts. 1.072 a 1.102).No regulamento contido no Código Revogado, havia duas formas de procedimento arbitral: de direitoe por equidade. Logo, fez-se necessária a determinação expressa no texto da Lei 9.099/1995 acercada possibilidade de utilização da equidade como meio de composição arbitral (art. 25). Nãoobstante, por imposição lógica, está o árbitro submetido aos preceitos legais de valoração da prova,

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busca dos fins sociais e às exigências do bem comum (arts. 5º e 6º). Deve, igualmente, pautar-sepelos comandos de imparcialidade e correção, agindo como se fosse o juiz natural da causa.Importante consignar que as partes podem desistir do procedimento arbitral até o início da audiência.Depois de iniciado o estágio probatório da instrução, no entanto, a desistência da arbitragem nãopoderá mais ser feita.

O art. 26 da Lei previu a possibilidade de o árbitro proferir o seu laudo arbitral ao término daaudiência de instrução arbitral ou fora dela, “nos cinco dias subsequentes”. Essa faculdade, que nãoexiste em relação ao juiz (art. 28), nos parece estar em desarmonia com o sistema criado para osJuizados Especiais, notadamente em relação ao princípio da oralidade (art. 2º). Por isso,condenamos a sua previsão. Não se trata, a toda evidência, de uma regra inconstitucional. Mas suaaplicação deve ser evitada.

Ao proferir seu laudo, o árbitro deve observar o limite de 40 salários mínimos, se a questãosubmetida à arbitragem estiver prevista no art. 3º, I e IV, da Lei 9.099/1995 (causa de pequenovalor). Apesar de a arbitragem ser uma técnica em que a solução decorre de um ajuste entre aspartes, ela não pode ser equiparada à conciliação ou à mediação, para fins de ultrapassagem do tetolegal (art. 3º, § 3º). De qualquer forma, não poderá o árbitro produzir decisão ilíquida (art. 38,parágrafo único).

É importante destacar que, obtido o acordo ou proferido o laudo arbitral, este somente teráeficácia executiva após a homologação pelo juiz (art. 515, II, do CPC), muito embora possa a partedevedora cumpri-lo voluntariamente desde a sua celebração. O que não se pode admitir é que ahomologação do acordo fique condicionada ao cumprimento prévio de seus termos. Nesse caso, tantoa parte credora como a devedora podem pleitear a intervenção do juiz para que o acordo lhe sejaimediatamente submetido à homologação.

O juiz, antes de chancelar o acordo realizado, deverá verificar a sua regularidade formal.61 Oresultado dessa avaliação pode levar ao encerramento do procedimento sem resolução do mérito, severificar a ocorrência de algum vício insanável, à realização de diligências, para corrigir víciossanáveis, ou à homologação do acordo por sentença (art. 22, parágrafo único).

Estabelece o art. 41 da Lei 9.099/1995 que o laudo arbitral, uma vez homologado, não admite“recurso”. Maurício Antônio62 defende que tal vedação seria inconstitucional por violar o princípiodo duplo grau de jurisdição. Com o devido respeito, mas, com apoio na doutrina majoritária,ousamos divergir desse pensamento. A irrecorribilidade no procedimento de arbitragem integra a suaprópria essência, qual seja, a submissão da vontade das partes à decisão do árbitro. Ademais, paraque fosse possível alguma forma de impugnação, por questão de coerência, o recurso teria que serdirigido a uma turma de árbitros, o que não existe. Por isso mesmo, autor e réu deverão estar cientesdessa circunstância no momento em que concordarem com a instalação da arbitragem (art. 24), sobpena de invalidação do procedimento.

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Não obstante, desta vez acompanhando o isolamento doutrinário de Maurício Antônio,63

defendemos que a decisão de homologação do laudo arbitral é passível de impugnação por embargosde declaração (art. 48). Nesse caso, ainda que a omissão tenha sido fruto da atividade do árbitro,quem julgará o recurso, por certo, será o juiz, que poderá, entre outras medidas, determinar arealização de novo laudo arbitral ou a complementação do anterior.

O procedimento executivo fundado em título extrajudicial (arts. 3º, § 1º, II, e 53) será visto mais àfrente. Por outro lado, entendemos que os embargos à execução, fundados em execução judicial ouextrajudicial, têm natureza de impugnação à execução (art. 523 do CPC) e não de rito especial.Nesse sentido, assinala Cândido Rangel Dinamarco (Instituições..., op. cit., p. 775): “A espéciede processo que os juizados são encarregados de realizar é exclusiva destes, não sendo praticadapor nenhum órgão da justiça ordinária. Inversamente, nos juizados só existe essa espécie deprocesso de conhecimento, com procedimento que lhe é próprio, não sendo atribuído a essesórgãos judiciários especialíssimos nenhum outro tipo de processo nem havendo uma diversidadede procedimentos a serem praticados por eles”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 2.12 da CEJCA e o Enunciado 8 do FONAJE, ambos com amesma redação: “As ações cíveis sujeitas aos procedimentos especiais não são admissíveis nosJuizados Especiais”.Em sentido contrário, assinala Luiz Fux, op. cit., p. 50, que “qualquer tipo de ação, cujo valor nãoexceda ao teto legal, poderá ingressar no Juizado Especial, pois pouco importa o procedimentoque o código de ritos estabelece para essa ou aquela ação proposta no Juizado [...] Assim, todas asações propostas nos Juizados Especiais obedecerão ao rito estabelecido pela lei federal emcomento”. O mesmo autor, escrevendo em parceria com Weber Martins Batista, op. cit., p. 85,firmou que “os Juizados conhecem e julgam todas as espécies de ações subsumidas à suacompetência ratione materiae, a saber: ações condenatórias, constitutivas, declaratórias,executivas ou mandamentais, além dos processos de execução e cautelar, sem prejuízo dapossibilidade sempre presente de, em defesa da jurisdição, conceder antecipações de tutela denatureza cautelar ou satisfativa”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 2.7 da CEJCA: “Não são admissíveis as ações monitórias noJuizado Especial, em razão da natureza especial do procedimento”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 43 do ETRJECERJ: “Ação de nunciação de obra nova nosJuizados Especiais – incompatibilidade de ritos – impossibilidade. O rito estabelecido pela Lei9.099/95 é especial e específico dos Juizados Especiais, incompatível com as ações de ritoespecial previstas no CPC, que devem ser processadas e julgadas perante as Varas Cíveis”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 2.6 da CEJCA: “Não são admissíveis as ações coletivas nosJuizados Especiais Cíveis”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 2.4.1 da CEJCA: “Somente a ação de despejo para usopróprio é admissível nos Juizados Especiais Cíveis” e o Enunciado 2.4.2 da CEJCA: “É vedada a

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propositura de ação de revisão de aluguel nos Juizados Especiais Cíveis”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 14.5.2 da CEJCA: “É inadmissível a propositura de açãocautelar em sede de Juizados Especiais Cíveis”. Em sentido contrário, defendendo o cabimento deações cautelares nos Juizados, Luiz Fux, op. cit., p. 31, e Alexandre Câmara, Juizados..., p. 194.Nesse sentido, Theotonio Negrão, op. cit., p. 993, e Alexandre Câmara, Juizados..., p. 167.Nesse sentido, veja-se: “A execução, cujos autos originais extraviaram-se, somente poderáprosseguir com o trânsito em julgado da sentença que homologar ou julgar a restauração, sendonulos os atos executórios praticados antes de seu encerramento” (TJDF, 2ª TR, Rcl20060160008163, Rel. Juiz César Loyola, j. em 30.11.2006). A restauração é cabível, inclusive,“no caso dos autos terem sido descartados” (TJRJ, 4ª TR, MS 0000509-67.2015.8.19.9000, Rel.Juiz Luiz Alfredo Carvalho Junior, j. em 23.09.2015).Na jurisprudência, o entendimento é que “não cabe mandado de segurança quando a situação foradequada à utilização dos embargos de terceiros” (TJPR, 1ª TR, MS 0001013-91.2014.8.16.9000,Rel. Juiz Fernanda Bernert Michelin, j. em 26.11.2014).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 155 do FONAJE: “Admitem-se embargos de terceiro, nosistema dos juizados, mesmo pelas pessoas excluídas pelo parágrafo primeiro do art. 8º da Lei9.099/95”.Conforme será visto mais à frente, sustentamos, minoritários, que o mandado de segurança contraatos judiciais não deve ser proposto nas Turmas Recursais, mas no Tribunal de Justiça.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 107 do ETRJECERJ: “Preliminar de cerceamento de defesa porter sido AIJ realizada no mesmo dia designado para a audiência de tentativa de conciliação.Inteligência do artigo 27 da Lei 9.099/97. Se não houve protesto da defesa alegando prejuízodurante a realização da AIJ, com correta contestação moral, preclusa está a matéria, tendo o Juízoagido em consonância com a lei” e o Enunciado 8.3 da CEJCA: “É possível a realização deAudiência de Instrução e Julgamento (AIJ) no mesmo dia da conciliação, desde que o réu sejacitado e o autor intimado acerca de tal possibilidade, ou no caso de concordância das partes”.Nesse sentido, veja-se: “Inicialmente, não há que falar em nulidade ante a não designação daaudiência de conciliação, uma vez que o ato proferido pelo juízo singular buscou atingir afinalidade do processo segundo critérios especiais que regem a sistemática do juizado,especialmente os princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual eceleridade, bem como deve ser observado o princípio da instrumentalidade, conforme Lei9.099/1995” (TJPR, Primeira Turma, MS 00009847520138169000, Rel. Juiz Léo HenriqueAraújo, j. em 08.04.2016).Veja-se, nesse sentido, o Enunciado 3.1.1 da CEJCA: “A petição inicial deve atender, somente,aos requisitos do art. 14 da Lei 9.099/1995, ressalvando-se, em atenção aos princípios do art. 2ºdo mesmo diploma, a possibilidade de emenda por termo na própria audiência, devendo o Juizinterpretar o pedido da forma mais ampla, respeitado o contraditório”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 2.5.2 da CEJCA: “São admissíveis, em sede de JuizadosEspeciais Cíveis, ações objetivando a revisão de cláusulas contratuais que estabeleçam prestaçõesdesproporcionais ou se tornem excessivamente onerosas (art. 6º, V, do C.D.C.), desde que oconsumidor apresente, com a petição inicial, planilha discriminada do valor que considera devido,

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de modo a possibilitar a prolação de sentença líquida (art. 38, parágrafo único, Lei 9.099/1995)”.Essas questões serão mais bem analisadas na parte do livro referente ao direito probatório (item4.3.8 da Parte II).Apesar de a lei não fazer ressalva, em nossa opinião, minoritária, não pode o juiz alegar odesconhecimento do Direito do município ou estado do local onde atua. Nesse sentido, veja-se:“Tratando-se de norma legal editada pelo Poder Executivo do Distrito Federal, não pode oEgrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal deixar de decidir questão arguida, sob ofundamento de que não fora juntado aos autos o texto da referida norma” (STJ, 1a Turma, REsp98.377/DF, Rel. Min. Garcia Vieira, j. em 17.03.1998).No Rio de Janeiro, esses órgãos são chamados de “Núcleo de Primeiro Atendimento” e sãoformados por servidores judiciários, advogados e estudantes de Direito.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 3.1.1 da CEJCA: “A petição inicial deve atender, somente,aos requisitos do art. 14 da Lei 9.099/1995, ressalvando-se, em atenção aos princípios do art. 2ºdo mesmo diploma, a possibilidade de emenda por termo na própria audiência, devendo o Juizinterpretar o pedido da forma mais ampla, respeitado o contraditório” e o Enunciado 3.2 daCEJCA: “Em face dos princípios constitucionais vigentes e dos que constam da Lei 9.099/1995, oJuiz do Juizado Especial poderá dar uma real e mais ampla abrangência ao pedido inicial quecontenha expressões imprecisas, como por exemplo, perdas e danos, indenização, se a narraçãodos fatos na vestibular assim o permitir”.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 379 do ETRJECERJ: “Nula é a sentença que dispõe sobrepretensão surgida no curso do feito e não deduzida na inicial. O princípio da informalidade dosJuizados Especiais não autoriza a prolação de sentença extra petita”, “Sentença extra petita.Sentença nula. Os princípios informativos do procedimento em sede de Juizado Especial Cível,notadamente o da simplicidade, o da informalidade e o da celeridade, previstos no art. 2º da Lei9.099/1995, não autorizam o Julgador a decidir fora dos limites do pedido formulado pelo autorporque deve ser observado o princípio da congruência pelo Juiz de Direito, ainda que no JuizadoEspecial Cível, já que aqui também se aplicam os artigos 128 e 461, ambos do Código deProcesso Civil. Sentença que se anula” (TJRJ, Turmas Recursais, RI 0209146-79.2000.8.19.0001,Rel. Juiz Augusto Alves Moreira Júnior, j. em 13.11.2000) e “Entretanto, é defeso ao Magistradoproferir sentença de natureza diversa da pedida, nos termos do art. 460 do CPC” (TJRJ, 1a TR, RI2002.700.021323-5, Rel. Cleber Ghelfestein, j. em 10.03.2003).Na esteira desse pensamento, veja-se o Enunciado 3.1.1 da CEJCA: “A petição inicial deveatender, somente, aos requisitos do art. 14 da Lei 9.099/1995, ressalvando-se, em atenção aosprincípios do art. 2º do mesmo diploma, a possibilidade de emenda por termo na própriaaudiência, devendo o Juiz interpretar o pedido da forma mais ampla, respeitado o contraditório”.Nesse caso, as duas demandas são diferentes, porque, embora relacionadas ao mesmo fato,possuem pedidos diversos. Um demandante não pode ajuizar duas ações com o mesmo pedido e amesma causa de pedir, ainda que a soma de ambas se submeta ao teto de 40 salários mínimos, poisisso configura litispendência. Se isso ocorrer, a ação mais recente deverá ser encerrada, semresolução do mérito, e o autor poderá ser punido por litigância de má-fé. Nesse sentido, veja-se:“Ressalto que ambas as ações têm como causa de pedir o mesmo negócio jurídico, qual seja, a

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aquisição de cabelos. O que se verifica na espécie é que a autora, ao distribuir duas demandastendo como causa de pedir o mesmo negócio jurídico, pretende, na realidade, infringir a regraprevista no art. 3º, inciso I, da Lei 9.099/1995 que limita o valor da causa a quarenta saláriosmínimos (...) A conduta da autora, além de violar o limite de alçada, caracteriza, ainda,deslealdade processual porquanto ao demandar nos juizados, se exime do pagamento das custasjudiciais e também de eventual condenação em honorários advocatícios” (TJDF, 1º JuizadoEspecial Cível, Proc. 0734448-79.2016.8.07.0016, Juiz Josmar Gomes de Oliveira, j. em10.02.2017).Importante destacar que o STJ, julgando casos oriundos dos Juizados Especiais Federais e dosJuizados da Fazenda Pública, afirmou que havendo mais de um autor, o valor da causa deve serconsiderado individualmente. Nesse sentido, vejam-se: “Em se tratando de litisconsórcio ativofacultativo, para que se fixe a competência dos Juizados Especiais, deve ser considerado o valorde cada autor, individualmente, não importando se a soma ultrapassa o limite dos 60 (sessenta)salários mínimos” (STJ, 2ª Turma, RESP 1658347/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, j. em16.05.2017) e “A jurisprudência desta Corte firmou a compreensão de que, em se tratando delitisconsórcio ativo facultativo, a fixação da competência dos Juizados Especiais deve observar ovalor de cada autor, individualmente, e não o valor global da demanda” (STJ, 1ª Turma, AgRg noARESP 472074/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j. em 18.12.2014). Essas decisões e outras nomesmo sentido levam a crer que, se provocado a se manifestar sobre o tema em relação aosJuizados Especiais Estaduais, o STJ afirmaria a mesma tese.Por certo, o indeferimento da petição inicial somente pode ocorrer após a intimação da parteautora para corrigir o vício (art. 321 do CPC).O salário mínimo a que se refere o texto é o nacional. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 50 doFONAJE: “O valor da causa deve ser fixado considerando o salário mínimo de âmbito nacional”.Conforme assinala Cândido Rangel Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 778, a “relação entre opedido e os salários mínimos é aferida, para esse efeito, no momento da propositura da demanda,sem que tenham qualquer influência as elevações ulteriores do salário mínimo ou crescimento dovalor devido, em virtude de correção monetária e juros que se vencerem depois”.A Lei 10.259/2001 (Juizados Especiais Federais) e a Lei 12.153/2009 (Juizados EspeciaisFazendários) possuem regras próprias sobre o cálculo do valor da causa, respectivamente, nosarts. 3º, § 2º, e 2º, § 2º.Essa já era a orientação prevalente na jurisprudência antes mesmo da edição do CPC/2015. Nessesentido, veja-se o Enunciado 2.3.2 da CEJCA: “Na hipótese de não atribuição de valor à causa, oude discrepância entre o valor atribuído pelo Reclamante e o valor do pedido, o órgão judicialdeverá, respectivamente, fixá-lo ou retificá-lo, de ofício, para preservar a exatidão da base decálculo do recolhimento da taxa judiciária”. Importante ressaltar que o juiz não pode retificar ovalor da causa, mas, apenas, determinar que o autor o retifique, sob pena de indeferimento dapetição inicial. De fato, o juiz não pode alterar a petição inicial, em razão do princípio da inércia.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 170. Na jurisprudência, vejam-se o Enunciado 39 doFONAJE: “Em observância ao art. 2º da Lei 9.099/1995, o valor da causa corresponderá àpretensão econômica objeto do pedido” e o Enunciado 2.3.3 da CEJCA: “O valor da causa deve

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corresponder ao benefício econômico pretendido pelo autor, no momento da propositura da ação,independentemente do valor do contrato, mesmo quando o litígio tenha por objeto a existência,validade, cumprimento, modificação ou rescisão de negócio jurídico”.Esse entendimento já era sufragado pela jurisprudência. Nesse sentido, veja-se: “Se na açãorevisional o que se pretende é a redução do valor das prestações do contrato, o valor da causa nãopoderá ser o valor do próprio contrato, de acordo com as parcelas originais, mas sim um valorcompatível com a redução pretendida, que está diretamente relacionada ao conteúdo econômico dademanda” (STJ, 3ª Turma, REsp 674.198/RS, Rel. Min. Fatima Nancy Andrighi, j. em06.04.2006).Luis Felipe Salomão, Roteiro dos Juizados Especiais Cíveis, p. 49, e Theotonio Negrão, op. cit.,p. 901.Nesse sentido, Alexandre Flexa e Alexandre Chini, A Tutela de Urgência em Caráter Antecedenteno Sistema dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, p. 18. Veja-se, ainda, o Enunciado 163 doFONAJE: “Os procedimentos de tutela de urgência requeridos em caráter antecedente, na formaprevista nos arts. 303 a 310 do CPC/2015, são incompatíveis com o Sistema dos JuizadosEspeciais”.O termo “liminar” vem da expressão latina in limine litis, que significa “no limiar do litígio”, “nocomeço do processo”. Apesar disso, adotamos no texto um conceito mais amplo de “liminar”:liminar seria, assim, toda a decisão interlocutória que tenha como conteúdo uma tutela provisória,independentemente do momento em que ela seja proferida ou da existência de oitiva prévia daparte contrária.Como será visto mais à frente, o art. 43 da Lei 9.099/1995 diz que o efeito suspensivo serádeferido ao “recurso inominado” para afastar “dano irreparável à parte”. Esse regime jurídico, noentanto, é obsoleto e inadequado. De fato, por se tratar de um provimento cautelar, o dano a serobservado deve estar relacionado ao resultado útil do processo e não “à parte”, além de sernecessária também a presença da probabilidade do direito alegado (art. 300 do CPC).Sobre a elaboração da Lei 9.099/1995, veja-se a introdução deste livro.Na vigência do CPC/1973, a doutrina era inteiramente favorável à utilização das tutelasprovisórias nos Juizados Especiais. Nesse sentido, Luiz Fux, op. cit., p. 19, Alexandre Câmara,Juizados..., p. 24, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 25, e Joel Dias Figueira Júnior e MaurícioAntônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 58. No mesmo sentido, merecem destaque o Enunciado 14.5.1da CEJCA: “É cabível o pedido de tutela acautelatória ou antecipatória em sede de JuizadosEspeciais Cíveis, que deve ser apreciado de forma fundamentada (arts. 273, do CPC, e 84 doCDC)” e o Enunciado 26 do FONAJE: “São cabíveis a tutela acautelatória e a antecipatória nosJuizados Especiais Cíveis”. Já sob a vigência do Novo Código, a doutrina vem defendendo aaplicação integral do CPC/2015. Nesse sentido, Fernando Gama de Miranda Netto, Tutela deEvidência no Novo Código de Processo Civil: reflexos sobre o sistema dos juizados especiais, p.690. Veja-se, também, o Enunciado 418 do FPPC: “As tutelas provisórias de urgência e deevidência são admissíveis no sistema dos Juizados Especiais”.Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 789.O Enunciado 3.1.2 da CEJCA pode passar a impressão de que adota a posição de que não é

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possível o indeferimento da inicial nos Juizados Especiais. No entanto, esse enunciado somente éaplicável para as hipóteses em que os vícios presentes na petição inicial forem sanáveis: “Nãohaverá nos Juizados Especiais Cíveis pronta decisão de extinção do processo sem julgamento domérito por inépcia de inicial, devendo eventual vício da petição inicial ser suprido na abertura daaudiência de instrução e julgamento”.Como será visto no item 1.5.1.5 da Parte IV, o “recurso inominado” é regido subsidiariamente peloregramento previsto no CPC para a apelação. No CPC, a apelação pode ter três procedimentos: a)bilateral, quando a sentença é proferida após a citação do réu (art. 1.010 do CPC); b) unilateral,quando a sentença é proferida em procedimentos onde não há réu, como ocorre em algunsprocedimentos de jurisdição voluntária; c) híbrida, quando a sentença é proferida antes da citaçãodo réu (art. 331 do CPC). Nesta última modalidade, a relação jurídica processual é angularizadadentro do procedimento recursal, por meio da citação do réu para responder ao recurso.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 37, e o Enunciado 14.9 da CEJCA: “Adesistência do autor, mesmo sem anuência do réu já citado, implicará na extinção do processo semjulgamento do mérito”. Em sentido contrário, entendendo que a desistência depende da anuênciado réu citado, Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 813.Nesse sentido, veja-se: “Veja que na hipótese dos autos cuida-se de processo eletrônico em que aparte ré apresentou sua contestação antes da realização da audiência de conciliação, sendo certoque, ao comparecer ao referido ato processual, o autor, por força do disposto no § 1º do art. 19 daLei 9.099/1995, ficou cientificado de todos os atos anteriormente praticados, inclusive os termos edocumentos postos na contestação. Assim, a desistência formulada só poderia ocorrer com aanuência do réu” (TJRJ, 4ª TR, RI 0060276-19.2016.8.19.0038, Rel. Juiz Alexandre Chini, j. em06.12.2006).Conforme será visto mais à frente, apesar de prevista na Lei 9.099/1995, a arbitragem é malregulada e não é utilizada nos Juizados Especiais. Ainda assim, faz parte da chamada etapa decomposição.Nesse sentido, Humberto Dalla Bernardina de Pinho, Conciliação e mediação: impacto doCPC/2015 nos Juizados Especiais, p. 320, Fernando Gama de Miranda Netto e Stela TannureLeal, Tribunal Multiportas e Crises de Identidade: o judiciário como alternativa a si mesmo?,p. 14. Veja-se, também, o Enunciado 397 do FPPC: “A estrutura para autocomposição, nosJuizados Especiais, deverá contar com a conciliação e a mediação”. Em sentido contrário,sustentando a inaplicabilidade de mediação ao Sistema dos Juizados Especiais, Marcia CristinaXavier de Souza, Impactos do Novo Código de Processo Civil no sistema dos juizados especiais,p. 385.Nesse sentido, Alexandre Servino Assede e Larrisa Davidovich, A nova Lei de Mediação, p. 334.Nesse sentido, reconhecendo a impossibilidade de dispensa da audiência de conciliação nosJuizados Especiais, veja-se: “Nota-se que a Lei 9.099/1995 não trata da dispensa da audiência deconciliação e nos procedimentos dos Juizados Especiais, pelo contrário, o processo é orientadopelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade,buscando sempre que possível a conciliação” (TJPR, 1ª TR, MS 0000911-35.2015.8.16.9000,Rel. Juiz Aldemar Sternadt, j. em 07.07.2015). Não obstante, é possível identificar decisões que

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admitiram a dispensa da realização da audiência de conciliação. Nesse sentido, veja-se: “Assim,tendo em vista os princípios da informalidade, simplicidade e celeridade, que norteiam osJuizados Especiais, e o princípio da razoabilidade, em razão dos custos com deslocamento pararealização de ato com fortes indícios de que resultará ineficaz e infrutífero, defiro,excepcionalmente, a não realização da audiência de conciliação” (TJDF, 1º Juizado EspecialCível, Proc. 0734448-79.2016.8.07.0016, Juiz Josmar Gomes de Oliveira, j. em 16.01.2017).Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 31.Quando o CPC/2015 ainda estava em vacatio legis, chegamos a publicar um artigo defendendoque o réu teria que ser citado com 20 dias de antecedência, por aplicação subsidiária do art. 334do CPC (Os impactos do Novo CPC nos juizados especiais, p. 881). Posteriormente, no entanto,mudamos de opinião e adotamos o prazo de 15 dias, por entender que ele é mais adequado àestrutura procedimental da Lei 9.099/1995.A bem da verdade, mesmo antes da edição do CPC/2015, já existia uma parte da jurisprudênciaque sustentava a aplicação do prazo mínimo de cinco dias entre a citação e a audiência deconciliação (art. 185 do CPC/1973). Nesse sentido, veja-se: “Como é cediço, no microssistemados Juizados Especiais, a parte demandada não está obrigada a apresentar defesa na audiênciapreliminar, que tem o objetivo apenas de tentar a conciliação entre as partes sobre o objeto dademanda. Ademais, a aplicação subsidiária das regras do CPC está condicionada à suacompatibilidade com as peculiaridades do processo nos Juizados Especiais. É certo que a normaprevista no art. 272 do CPC não é compatível com as peculiaridades dos Juizados Especiais, porafrontar o princípio da celeridade e não levar em conta a simplicidade dos processos que nelestramitam (...) Comprovado que a empresa ré foi citada cinco dias antes da audiência, que tinha porúnico objetivo a conciliação das partes, e não tendo comparecido, nem justificado a ausência,correta a sentença que lhe decretou a revelia e resolveu a lide” (TJMS, 1ª TR, RI 0102200-80.2011.8.12.0005, Rel. Juiz Sandra Regina Artiolli, j. em 28.03.2012).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 6 do FONAJE: “Não é necessária a presença do Juiz Togadoou Leigo na Sessão de Conciliação, nem a do juiz togado na audiência de instrução conduzida porjuiz leigo”.Como bem sublinhado por Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 54, “o conciliador e o juizleigo, e até o próprio juiz de direito quando for homologar o acordo, devem deixar bem claro àspartes que aquela transação é imutável, mesmo porque, após a homologação do acordo, o mesmonão poderá mais ser revisto”.A maioria da doutrina entende que, apesar de o CPC de 2015 falar apenas em conciliação, a multaprevista no art. 334, § 8º, deve ser aplicada também se a parte falta à audiência de mediação.Nesse sentido, Eduardo Cambi, Breves comentários ao Novo Código de Processo Civil, p. 886.Em nosso sentir, entretanto, por se tratar de uma norma de restrição, temos que sua interpretaçãodeve ser limitada. Assim, a referida multa só deve incidir na hipótese de ausência à audiência deconciliação.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei

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9.099/1995 é inconstitucional.Mundialmente, a arbitragem é vista como um meio alternativo de composição dos conflitos quedeve ser realizado fora do âmbito judicial. Ver, sobre o tema, Alexandre Câmara, Arbitragem: Lei9.307/1996, p. 2.A arbitragem judicial já era prevista na Lei dos Juizados Especiais de Pequenas Causas (arts. 25 a27 da Lei 7.244/1984). Em relação à Lei dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, consigamoslocalizar uma decisão referente a um laudo arbitral homologado neste órgão: “Mandado desegurança. Juízo especial de pequenas causas. Laudo Arbitral. I – O juizado especial de pequenascausas, no caso, ao homologar laudo arbitral, não praticou ato ilegal ou arbitrário ensejador desegurança, cumprindo, ao contrário, seu dever de ofício. II – recurso ordinário desprovido” (STJ,2ª Turma, RMS 262/GO, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. em 02.09.1996).Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Nesse sentido, Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 35.Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. III, p. 475.Op. cit., p. 35.Op. cit., p. 35.

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4A ETAPA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO

Ao contrário da primeira etapa, marcada pela atuação administrativa da secretaria e dosauxiliares do Juizado, a segunda etapa do procedimento sumaríssimo é eminentemente jurisdicional,ou seja, conduzida pelo magistrado.1 Assim, dentro da lógica oral do procedimento dos JuizadosEspeciais, essa etapa foi projetada para ser inteiramente desenvolvida num único momento: aaudiência de instrução e julgamento.

A audiência de instrução e julgamento é, ao lado da audiência de conciliação, um dos pontosmais importantes do procedimento. É um ato que encerra um complexo de situações jurídico-processuais que definem a causa, concentrando as três atividades fundamentais do processo: apostulação, a instrução e o julgamento. Por isso, diferentemente do que ocorre no procedimentocomum do CPC (art. 357, V), a realização da audiência de instrução e julgamento no ritosumaríssimo não está condicionada à necessidade probatória da causa. Ainda assim, como já visto, ajurisprudência2 tem admitido a dispensa da audiência de instrução e julgamento quando o autor ou oréu não tiver comparecido na audiência de conciliação ou quando o réu já tiver apresentado a suaresposta e ambas as partes informarem na audiência de conciliação que não têm mais provas aproduzir.3 Nestas circunstâncias, é preciso registrar, entendemos que ainda assim a audiência deinstrução e julgamento deveria ser imediatamente instalada e a sentença, proferida (art. 27 da Lei9.099/1995), principalmente se as partes estiverem sem advogado. Não obstante, se isso não forpossível, excepcionalmente, o juiz pode julgar diretamente a causa, sem a necessidade de marcaruma audiência para tanto.

Importante reafirmar que a Lei estabeleceu de forma clara e direta que a audiência de instruçãoe julgamento deve ser realizada imediatamente após o encerramento da audiência de conciliação,caso as partes não tenham chegado a um acordo e não queiram recorrer à mediação ou à arbitragem(art. 27). A única hipótese contemplada no texto legal, a permitir a marcação de outra data para arealização da audiência de instrução e julgamento, é a alegação fundamentada das partes sobre adificuldade em exercer naquele momento a plenitude do direito de defesa.4 Nesta situação, diz o art.27, parágrafo único, as partes e testemunhas eventualmente presentes na audiência de conciliaçãoserão comunicadas da data em que a audiência de instrução e julgamento será realizada.

O que deveria ser uma exceção, no entanto, vem sendo usado como regra, de modo que, namaioria das vezes, não obtido o acordo, é marcada a audiência de instrução e julgamento para dataposterior, independentemente de ter sido alegado algum prejuízo ao direito de defesa. Isso tem

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ocorrido, principalmente, porque o juiz não tem como organizar sua pauta de audiências, em razão daimprevisibilidade sobre o número de audiências de instrução e julgamento que serão necessárias edas provas que nelas serão produzidas. Imagine-se o juiz que marca para um dia dez audiências deconciliação e, em todas, são fechados acordos. Ele passará o dia sem fazer uma única audiência deinstrução e julgamento. Se, no entanto, naquele mesmo dia não for feita qualquer composição, teriamque ser realizadas dez audiências de instrução e julgamento. O problema, portanto, é prático e nãoteórico.

Instalada a audiência de instrução e julgamento, o juiz deve convidar as partes a, mais uma vez,buscarem uma solução consensual para a causa, independentemente das técnicas de composição jáaplicadas (art. 359 do CPC). Caso isso não seja possível, deve o magistrado dar a palavra ao réu,para que apresente sua resposta (art. 30).5 Nesse momento, ainda que implicitamente, será realizada aadmissibilidade da demanda. Exatamente por isso, o ideal é que o juiz já tenha, ainda quesuperficialmente, analisado o pedido exordial antes do início da audiência.

Em seguida, o juiz deverá dar ao autor a palavra para se manifestar sobre a resposta do réu ecolher as provas orais pertinentes ao julgamento da causa, tendo como parâmetro, preferencialmente,a ordem estabelecida pelo art. 361 do CPC: a contradita dos documentos apresentados em audiência(art. 29, parágrafo único), a perícia (art. 35), o relato da inspeção judicial (art. 35, parágrafo único),os depoimentos pessoais e a oitiva de testemunhas. Antes, porém, se julgar necessário, o juiz podeinformalmente declarar saneado o processo e fixar os pontos controvertidos, discutindo com aspartes quais provas deverão ser produzidas (art. 357, § 3º, do CPC). Dando seguimento, caso tenhamsido produzidas provas naquele momento, deverá ser facultada às partes a apresentação de alegaçõesfinais orais (art. 364 do CPC). Por fim, deve o juiz concluir a audiência proferindo a sentença (art.28).

A RESPOSTA DO RÉU

A apresentação da contestação

A contestação, como visto, afigura-se como o ato primordial de manifestação do réu, devendoconter toda a matéria de defesa, exceto aquelas referentes ao impedimento e à suspeição do juiz, queserão arguidas na forma do art. 146 do CPC (art. 30 da Lei 9.099/1995). Certamente, esse modeloadotado pelos Juizados Especiais serviu de inspiração para a estrutura da contestação inserida noCPC/2015 (art. 335). No corpo da contestação poderá ser feito ainda o pedido contraposto (art. 31).Não cabem, entretanto, no sistema dos Juizados a reconvenção (art. 31) e as formas ordinárias deintervenções de terceiro (art. 10).

Embora a Lei não tenha dito isso de forma expressa, por certo o réu deverá apresentar suaresposta até a audiência de instrução e julgamento.6 Essa interpretação, que leva ainda emconsideração a estrutura do procedimento, decorre da redação do art. 28, que estabelece que na

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audiência de instrução e julgamento serão “ouvidas as partes, colhida a prova e, em seguida,proferida a sentença”. Como é dito que as partes serão ouvidas e, somente depois, colhidas asprovas, essa oitiva só pode estar se referindo à resposta do réu e à réplica do autor. Nada impede,entretanto, que o réu ofereça sua resposta antes da audiência, por escrito, por meio da secretaria doJuizado ou do protocolo integrado que o sirva. Da mesma forma, entendemos ser possível aapresentação da contestação perante o Juizado do foro de domicílio do réu, quando nela houver aalegação de incompetência, absoluta ou relativa (art. 340 do CPC).

Se a contestação for apresentada oralmente (art. 30), seu conteúdo deverá ser sintetizado nocorpo da sentença. No caso de o juiz decidir não proferir a sentença em audiência, como determina aLei (art. 28), o ideal é que reduza a termo a defesa oral do réu na assentada. De fato, sem a prolaçãoimediata da sentença em audiência, o comando da oralidade fica prejudicado e deve ceder espaçopara a segurança do registro escrito das manifestações orais das partes.

Necessário sublinhar que alguns regulamentos têm fixado o tempo máximo disponível para aspartes se manifestarem em audiência. Normalmente, esse tempo fica limitado a dez minutos,prorrogáveis por igual período. Nada impede que o juiz, diante das peculiaridades do caso,atendendo à razoabilidade, amplie o prazo eventualmente fixado na norma de organização judiciáriaregional. Um exemplo em que o prazo pode ser legitimamente ampliado é quando o réu tem queenfrentar pedidos cumulados (art. 15).

O ônus da impugnação específica

Em seus estudos, Dinamarco7 afirma que nos Juizados a falta de impugnação de algum ponto dapretensão autoral na contestação não leva, necessariamente, à incontrovérsia, como ocorre no juízosingular (art. 341 do CPC), notadamente quando a parte não estiver assistida de advogado. Apesar delouvável, tal posição fragiliza a estrutura lógica do processo, que é galgada no princípio dapreclusão. Na verdade, quem admite que a parte possa estar na audiência sem advogado (art. 9º daLei 9.099/1995) não tem como negar que as matérias não impugnadas pelo réu se tornamincontroversas.

Não obstante, tendo em vista as características dos Juizados, deve o magistrado procurar dar amaior amplitude possível à defesa feita diretamente pela parte sem formação técnica, considerando aimpugnação dentro de um contexto lógico. Além disso, eventualmente pode ocorrer que o juizentenda que a alegação autoral não se sustenta, apesar da presunção favorável formada pela falta deimpugnação específica. Nesse caso, não se está afastando a incontrovérsia, mas dando a corretaconotação jurídica aos fatos deduzidos em juízo (art. 341, segunda parte, do CPC).

O pedido contraposto

O art. 31 da Lei 9.099/1995, ao mesmo tempo em que veda a utilização da reconvenção,

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permite ao réu que formule nos mesmos autos pedido contraposto em face do autor. Pedidocontraposto é o nome que se tem dado ao pedido de tutela jurisdicional feito pelo réu em face doautor na contestação, dentro dos chamados procedimentos dúplices. O traço distintivo maisimportante entre a reconvenção e o pedido contraposto é que este se instaura na relação jurídicaprocessual já existente, enquanto que aquele cria uma nova relação jurídica dentro do mesmoprocesso. Por isso, se o autor desiste da demanda principal e o réu aceita a desistência, areconvenção, em regra, não é atingida (art. 343, § 2º, do CPC), enquanto que, se o autor desiste dademanda principal e o réu aceita a desistência, o pedido contraposto perderá o objeto. Outro aspectoque distingue o pedido contraposto da reconvenção é que nesta podem ser colacionados fatos novosou incluídos sujeitos estranhos ao processo, desde que a demanda reconvencional seja conexa com ademanda originária ou com o fundamento da defesa (art. 343 do CPC). No pedido contraposto,somente fatos tratados no pedido principal podem ser objeto da contraposição (art. 31). Além disso,não se admite ampliação subjetiva da demanda por meio do pedido contraposto.8

O objetivo da Lei ao reduzir o alcance do pedido contraposto é não permitir que a demanda demenor complexidade possa, com a contraposição, tornar-se complexa. Com efeito, a apresentação dopedido contraposto, pela limitação fática, não implica em qualquer ônus extra para o autor, que játem o dever, desde a petição inicial, de demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, que, emregra, representarão os fatos desconstitutivos, modificativos, impeditivos ou extintivos do direito doréu deduzido no pedido contraposto. Por isso, o autor não precisa necessariamente responder opedido contraposto (art. 17, parágrafo único).9 Note-se, entretanto, que se alguma parcela do pedidocontraposto não for refutada pelo pedido principal, necessária se faz a elaboração da contestaçãopelo autor, chamada pela prática forense de “resposta ao pedido contraposto”, sob pena de gerarincontrovérsia em relação ao ponto não impugnado.

Em geral, a resposta ao pedido contraposto deve ser feita de forma oral, dentro da réplica. Se opedido contraposto tiver sido formulado por escrito e juntado aos autos antes da audiência, pode oautor respondê-lo também por escrito, embora o ideal seja que as partes tentem ao máximo preservaras características orais do procedimento. Se o autor, no entanto, não tiver condições para responderao pedido contraposto em audiência, permite a Lei que seja postulada a redesignação da audiência deinstrução e julgamento, para que a contraposição seja adequadamente respondida (art. 31, parágrafoúnico).

A toda evidência, o pedido contraposto deverá conter os mesmos requisitos do pedidoprincipal, naquilo que for cabível. Além disso, o réu terá que observar os filtros existentes na Lei(arts. 3º e 8º). De fato, tem-se entendido que somente quem poderia ser autor poderá, quando for réu,formular pedido contraposto.10 Por outro lado, o valor do pedido contraposto não fica vinculado aovalor do pedido principal. Assim, nada obsta que ao pedido inicial seja oferecido pedidocontraposto, em valor superior ou inferior, desde que respeitado o limite de 40 salários mínimos nascompetências rationae valoris (art. 3º, I e IV). Note-se que se o pedido contraposto for em valor

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superior a 20 salários mínimos, mesmo que o pedido principal não o seja, deverão ambas as partesestar acompanhadas por advogado (art. 9º).11

A revelia

No procedimento comum do CPC, a revelia decorre da falta de contestação (art. 344). NosJuizados Especiais, de uma maneira geral, ela tem lugar tanto quando o réu deixa de responderoportunamente à demanda,12 como quando deixa de comparecer a qualquer uma das duasaudiências,13 seja de conciliação ou de instrução e julgamento (art. 20).14 Por outro lado, por falta deprevisão expressa, a ausência à audiência de arbitragem (art. 24, § 1º), de mediação ou qualqueroutra eventualmente marcada não poderá conduzir à revelia.

Nesse passo, importante esclarecer o contexto no qual se insere o art. 23 da Lei 9.099/1995,que diz que, “não comparecendo o demandado, o Juiz togado proferirá sentença”. Por estar inseridona Seção VIII da Lei, que trata da conciliação e do juízo arbitral, e por não haver preceito semelhantena Seção IX, que cuida da audiência de instrução e julgamento, poderia o intérprete ser levado apensar que a regra somente se aplicaria na ausência à audiência de conciliação.

Na verdade, o art. 23 tem um conteúdo meramente didático, já que a própria estrutura da Leilevaria à conclusão de que a falta do demandado a ambas as audiências, tanto de conciliação comode instrução e julgamento, pode acarretar a prolação imediata da sentença. De um lado, se odemandado falta à audiência de conciliação, não será possível a realização do acordo ou doprocedimento arbitral. Logo, deverá ser instaurada imediatamente a audiência de instrução ejulgamento, na medida em que o único motivo que poderia, em tese, levar ao seu adiamento – oprejuízo à defesa – não poderá ser alegado (art. 27). De outro lado, se o demandado falta à audiênciade instrução e julgamento, é porque a etapa de composição já foi ultrapassada. Nas duas hipóteses,seremos conduzidos ao mesmo ponto: uma audiência de instrução e julgamento sem a presença doréu. Em ambos os casos, portanto, pode o juiz proferir a sentença.

É preciso reconhecer, entretanto, que, na maioria dos Juizados, os juízes entendem que, com afalta do réu à audiência de conciliação, não é necessária a realização da audiência de instrução ejulgamento. Assim, na prática, se o réu deixa de comparecer à audiência de conciliação, os juízesdeterminam a abertura de vista dos autos para prolação de sentença. Não obstante, o ideal seria quenesses casos a audiência de instrução e julgamento fosse instaurada e a sentença proferida diante doautor, para preservar a oralidade do procedimento. Nessa audiência, inclusive, o juiz poderia, antesde julgar, ouvir o autor e saber se ele tem interesse na produção de outras provas, mesmo diante daprodução dos efeitos da revelia.15

De qualquer forma, se for marcada nova data para a realização da audiência de instrução ejulgamento, o réu que não comparecer na audiência de conciliação não precisará ser intimado danova data, salvo se tiver advogado constituído nos autos (art. 346 do CPC), mas, comparecendo, só

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poderá se manifestar sobre questões de ordem pública (art. 278, parágrafo único, do CPC) ou sobrequestões trazidas pelas provas produzidas. Note-se que, mesmo revel, o réu que se habilitar nosautos poderá requerer e produzir provas (art. 349 do CPC).

Por certo, para que a presença do réu possa afastar os efeitos de revelia, ela deve serqualificada. Assim, o réu ou seu representante legal deve portar documento de identificação,preferencialmente com foto. Em se tratando de pessoa jurídica, devem ser apresentados osdocumentos constitutivos, bem como a carta de preposição, se for o caso. E se a causa for acima de20 salários mínimos, o réu deve estar acompanhado por advogado.16

Conjugando essas informações, de acordo com o entendimento jurisprudencial prevalente, o réuestará revel se: a) deixar de comparecer às audiências (art. 20), mesmo que envie a contestaçãoescrita pelo protocolo17 ou que se faça presente por seu advogado;18 b) comparecer à audiência deinstrução e julgamento, mas não apresentar contestação (art. 28);19 c) comparecer às audiências semqualquer documentação pessoal;20 d) comparecer às audiências sem advogado, nas causas acima de20 salários mínimos (art. 9º),21 mesmo que apresente contestação feita por advogado; e) compareceràs audiências o representante da pessoa jurídica ou dos entes despersonalizados sem os documentosde sua representação.22

Nesse passo, importante registrar que entendemos, minoritários, que no prazo de cinco dias(art. 218, § 3º, do CPC), contados da audiência, poderá o juiz avaliar eventual justificativa sobre afalta de documentos ou a ausência do réu ou de seu advogado e, se for o caso, determinar a juntadade documentos ou a realização de nova audiência. Isso porque, apesar de todas as peculiaridades doprocedimento, não se pode mitigar excessivamente o princípio constitucional da ampla defesa e docontraditório. Se, no entanto, a sentença tiver sido proferida em audiência, o único caminho para oréu será interpor o “recurso inominado” para tentar reverter a situação inquinada.23 Embora não sejauma medida técnica, em alguns Juizados tem sido aceita a interposição pelo réu de embargos dedeclaração (arts. 48 a 50) em face da sentença que reconheceu a revelia, como instrumento paraapresentar a justificativa para a sua ausência na audiência.

Uma vez constatada, a revelia é capaz de tornar incontroversos os fatos alegados pelo autor. ALei 9.099/1995, no entanto, resolveu deixar expresso o que já era pacífico na doutrina, ou seja, que arevelia faz com que os fatos alegados sejam considerados verdadeiros, de acordo com oconvencimento do juiz (art. 20). Logo, a presunção de veracidade decorrente da revelia é relativa.De qualquer forma, o ato do juiz de afastar os efeitos da revelia deve ser feito a partir de um juízorobusto e devidamente fundamentado, à luz das diretrizes fixadas no art. 345 do CPC, para que não secaracterize uma medida discricionária.

Importante destacar que a revelia somente pode ser decretada pelo juiz togado, cabendo aosauxiliares do Juizado apenas certificarem o fato gerador da contumácia. Recomendável, inclusive,que esta constatação seja encaminhada junto com a informação sobre a efetiva realização da citação,

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para evitar que decreto de revelia seja posteriormente anulado em razão de algum vício nochamamento do réu ao processo.24

As alegações de impedimento e suspeição

Como mencionado, as únicas matérias de defesa do réu que deverão ser ofertadas fora dacontestação são as alegações de impedimento e de suspeição (art. 30). Na nossa opinião, entretanto,o fato de a alegação de impedimento ou de suspeição ser feita na contestação não inviabiliza o seuconhecimento. Nesse caso, basta que o julgador, ao não se reconhecer como impedido ou suspeito,determine a extração de cópias da contestação e dos documentos pertinentes para permitir ainstauração do incidente.

A razão da exigência para que a impugnação sobre a imparcialidade do julgador seja feita forada contestação reside no fato de que o questionamento deverá ser remetido ao Tribunal de Justiça,para julgamento, se não for reconhecido de plano pelo próprio juiz impugnado (art. 146, § 1º, doCPC). Nesse passo, importante sublinhar que as alegações de impedimento e suspeição têm apeculiaridade de colocar o juiz na condição de parte do incidente instaurado. Além disso, caso aalegação seja acolhida no Tribunal, o juiz terá que responder pelas custas eventualmente despendidas(art. 146, § 5º, do CPC).25 Por tais razões e em respeito ao princípio da hierarquia, as impugnaçõesopostas contra a imparcialidade dos juízes dos Juizados Especiais, tanto em primeiro como emsegundo grau, devem ser julgados pelo Tribunal de Justiça correspondente.26 Apesar disso, oentendimento majoritário tem sido no sentido de admitir o julgamento das alegações de suspeição ede impedimento nas Turmas Recursais.27 Um dos autores que sustenta essa posição, Cândido RangelDinamarco,28 afirma que os Juizados Especiais devem buscar uma autossuficiência, o que justificariaque o julgamento das alegações de impedimento e suspeição fosse realizado nas Turmas Recursais.Com a devida vênia, mas as Turmas Recursais, como o próprio nome diz, só têm competênciasrecursais. Não têm atribuição legal para julgar um incidente que está submetido à competênciaprivativa dos tribunais (art. 146, § 1º, do CPC). Além disso, não se pode desconsiderar que o art. 30da Lei 9.099/1995 diz textualmente que o incidente “se processará na forma da legislação em vigor”.

Importante registrar que as alegações de impedimento e de suspeição podem ser feitas porambas as partes a qualquer tempo ou em qualquer etapa do procedimento, por escrito ou oralmente,no prazo de 15 dias contados da data em que se tomou conhecimento do fato. No caso de aimpugnação ser feita de forma oral, durante a audiência de instrução e julgamento ou a sessão dejulgamento na Turma Recursal, deverá constar da ata, para permitir seu adequado processamento.Perante o Tribunal de Justiça, as partes deverão estar representadas por advogado, aos moldes doque estabelece o art. 41, § 1º, da Lei 9.099/1995, em relação ao “recurso inominado”.29 Os motivosque poderão dar ensejo aos incidentes são aqueles mesmos elencados nos arts. 144 e 145 do CPC. Aapresentação da alegação provocará a suspensão do processo, para que a questão seja julgada pelo

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4.2

4.3

Tribunal de Justiça, na forma estabelecida pelo art. 146 do CPC.30

A RÉPLICA

De acordo com o CPC, o autor só deveria ser chamado a se pronunciar em réplica quando oréu, em sua resposta, alegar alguma questão prévia – preliminar ou prejudicial – ou deduzir fatosimpeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor (arts. 350 e 351). Na sistemáticaprocedimental estabelecida pela Lei 9.099/1995, entretanto, a réplica deve acontecer sempre que oréu apresentar sua contestação (art. 28). Embora isso não esteja expressamente previsto na Lei, é oque se pode concluir da leitura do seu art. 29. De fato, à luz do princípio da oralidade, entendemosque independentemente do que seja alegado, deve a parte autora ser chamada a se manifestar, oral eimediatamente, sobre os termos da defesa apresentada e seus documentos.

A réplica deve ser feita na audiência de instrução e julgamento, ainda que o réu tenha ofertadodefesa por escrito, após a superação da nova tentativa de composição. Mas, se o autor teve ciênciados argumentos do réu antes da audiência de instrução e julgamento, poderá se manifestar tambémpor escrito. Nesse caso, uma vez apresentada a réplica, estará preclusa a sua oportunidade demanifestação.

Na réplica, além de rebater os argumentos defensivos, deverá o autor responder a eventualpedido contraposto formulado pelo réu, se assim for possível, sem prejuízo ao contraditório e àampla defesa. Se o autor, no entanto, apresentar elementos que demonstrem a existência prejuízo parao direito de defesa, por exemplo, a necessidade da oitiva de testemunhas ou da juntada dedocumentos, deverá alegá-lo na réplica, para requerer a remarcação da audiência, nos termos do art.31, parágrafo único, da Lei 9.099/1995.

A ATIVIDADE PROBATÓRIA

A produção da prova recebeu na Lei 9.099/1995 atenção especial, buscando compatibilizar aatividade probatória com as peculiaridades do procedimento. O art. 32, entretanto, deve ser lido àluz do novo paradigma consagrado pelo art. 369 do CPC: a prova é um direito subjetivo processualdas partes. De fato, o direito de ação é um direito formal que somente ganha conteúdo se exercidoconjuntamente com outros direitos, como o direito probatório. Por isso, a prova não pode mais servista como uma benesse dirigida às partes e voltada exclusivamente para atender à atividadejudicial. A prova é um direito das partes e seus destinatários são todos aqueles que participam doprocesso e da própria sociedade, que tem o dever de respeitar as decisões judiciais e fiscalizar oexercício da jurisdição.

O art. 32, em sintonia com o art. 369 do CPC, consagra o sistema probatório aberto, ou seja,receptivo não apenas aos meios previstos em lei (provas típicas), mas também àqueles que não forampositivados (meios atípicos). As limitações quanto à prova existem não apenas na Lei, que menciona

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a legitimidade moral, mas também na própria Constituição Federal, que, em seu art. 5º, LVI, veda ailicitude nos meios de sua obtenção.

O ônus probatório

Nos Juizados Especiais, o ônus probatório segue a regra geral prevista no art. 373 do CPC,segundo a qual cabe ao autor provar os fatos constitutivos do seu direito, e ao réu, os fatosmodificativos, impeditivos e extintivos do direito do autor. É conveniente lembrar, entretanto, apossibilidade de redistribuição do onus probandi diante da incidência de uma regra especial (art.373, § 1º, primeira parte, do CPC),31 da existência de uma situação em que uma das partes estiver emmelhores condições para produzir a prova (art. 373, § 1º, segunda parte, do CPC) ou existência deuma convenção processual celebrada entre as partes (art. 373, § 3º, do CPC).

Apesar da redistribuição do ônus da prova ser uma medida de grande impacto na atuação daspartes em juízo, o entendimento majoritário é que tal situação não precisa ser expressamentedeclarada pelo juiz nos procedimentos em curso perante os Juizados Especiais.32 Dentro dessa linhade pensamento, a redistribuição do ônus da prova somente precisaria ser revelada na sentença. Como devido respeito, mas esse entendimento não se coaduna com o princípio do contraditório,notadamente em relação à vedação à prolação de decisão surpresa (art. 10 do CPC).

Para tentar minimizar os danos decorrentes da visão prevalente, sugerimos que a advertênciaquanto à possibilidade de redistribuição do ônus probatório conste do próprio mandado de citação,quando a secretaria do Juizado verificar que a situação retratada na petição inicial já evidencia apresença dos requisitos legais,33 ou seja feito na audiência de conciliação, quando o conciliadorentender pertinente, após a frustação das vias compositivas.

Muito embora o lugar adequado para a manifestação judicial sobre a redistribuição do ônus daprova seja no saneamento do feito (art. 357, III, do CPC), nos Juizados isso deve ser realizado naprimeira oportunidade em que o juiz intervir no procedimento, especialmente durante a audiência deinstrução e julgamento, aos moldes do que foi previsto para o chamado saneamento compartilhado(art. 357, § 3º, do CPC). A omissão judicial no enfrentamento da questão pode ser objeto, inclusive,de embargos de declaração (arts. 48 a 50).

Declarada a redistribuição, deve ser dada oportunidade para que as partes se desincumbam doencargo extra que lhes foi atribuído. Assim, se a redistribuição foi determinada na audiência deinstrução e julgamento, as partes deverão se manifestar imediatamente sobre a questão. Caso nãotenha como se defender adequadamente, a parte que demonstrar o prejuízo para o seu direito dedefesa poderá requerer a redesignação da audiência (arts. 27 e 31, parágrafo único, da Lei9.099/1995 e art. 362 do CPC).

Em nossa visão, a decisão que tratar da redistribuição do ônus probatório, proferida no cursodo procedimento, tem natureza de decisão interlocutória (art. 203, § 2º, do CPC), sujeita a agravo de

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4.3.2

4.3.3

instrumento (art. 1.015, IX, do CPC), enquanto que, se a questão for tratada apenas no bojo dasentença, o recurso cabível será o “recurso inominado”. O entendimento majoritário, entretanto, sótem admitido o cabimento do “recurso inominado”, não importando em que momento a decisão tenhasido proferida.

A produção das provas em audiência

A primeira parte do art. 33 da Lei 9.099/1995, em consonância com o princípio da oralidade,assinala que “todas as provas serão produzidas em audiência”. Esqueceu-se, no entanto, da provadocumental. Assim, o dispositivo deve ser lido da seguinte maneira: com exceção dos documentosque devem acompanhar a petição inicial (art. 320 do CPC) e dos documentos novos (art. 435 doCPC), todas as outras provas devem ser requeridas e produzidas na audiência de instrução ejulgamento.

A segunda parte do mencionado art. 33, distanciando-se do modelo consagrado nos arts. 319,VI, e 336, do CPC, dispensou o prévio requerimento das provas. Desse modo, a parte simplesmentedeverá levar as provas ou suas fontes para a audiência de instrução e julgamento e requerer,fundamentadamente, a sua produção.

Importante ressaltar que a intensa oralidade prevista não pode ser justificativa para violaçõesdas garantias processuais constitucionais. De fato, nos Juizados Especiais, se a manifestação da partecontrária sobre a prova produzida puder ser feita imediatamente, realiza-se a audiência, enquantoque, ao contrário, se tal manifestação for inviável, a audiência deverá ser remarcada, desde quealegado pelo interessado o prejuízo relevante para seu direito de defesa (art. 27). É claro que essaremarcação somente deve ocorrer em hipóteses extremas, nas quais a atuação das partes fiqueprofundamente comprometida, especialmente quando desacompanhadas de advogado.

A limitação quanto à produção das provas

Na audiência de instrução e julgamento, logo após ouvir as partes, deverá o juiz organizar ainstrução probatória.34 Nesse momento, deverá formar dois juízos diferentes sobre a admissibilidadedas provas requeridas: um em relação à causa e outro em relação ao procedimento. Destarte, de umlado, o juiz deverá avaliar a pertinência e a necessidade da produção de determinada prova,eliminando, assim, as que forem impertinentes ou excessivas. A prova impertinente é aquela que nãodiz respeito aos fatos discutidos no processo, enquanto que a prova excessiva é aquela que visademonstrar um fato que não precisa ser demonstrado ou que já foi demonstrado por outras provas.Nessa análise, o juiz deve levar em conta a garantia constitucional ao devido processo legal e seudesdobramento, que é o direito à prova. Em outras palavras, somente quando for evidente que aprova não contribuirá para o julgamento da causa é que ela deverá ser indeferida.

Note-se, ainda, que a Lei, ao tratar do tema, além das provas excessivas e impertinentes,

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mencionou também as provas protelatórias (art. 33). A toda evidência, o legislador não foi técnico aoredigir esse dispositivo, pois misturou conceitos diferentes. Não se pode pensar numa provaprotelatória que não seja excessiva ou impertinente. Mas o contrário não é verdade. Destarte, umaparte pode querer produzir mais provas do que seria preciso, sem com isso visar a retenção damarcha processual, mas, apenas, buscar dar vazão ao desejo natural e humano de demonstrar as suasrazões. A protelação, portanto, depende de um elemento subjetivo do agente, qual seja, o propósitoconsciente e voluntário de atrasar o andamento do processo por meio da produção de uma provaimpertinente ou excessiva.

Em seguida, deverá o julgador aquilatar se a produção das provas necessárias ao deslinde daquestão se amolda ao procedimento especial e às suas características fundamentais.35 Nesse contexto,o aspecto mais sensível é a produção da prova pericial. Na grande maioria das vezes, quando ela sefaz necessária, os julgadores têm preferido encerrar o procedimento, sem resolução do mérito (art.51, II).36 O ideal, entretanto, é que se procure preservar o acesso ao Juizado, buscando formas derealizar a perícia informal prevista no art. 35 ou outros meios que possam substituir esse tipo deprova.

Por fim, importante lembrar que também o juiz poderá determinar de ofício a produção dasprovas que entender necessárias para o julgamento da causa (art. 5º). A atividade probatória judicial,nos Juizados Especiais, tem contornos muito próprios, na medida em que pode servir para suprireventual carência probatória daqueles que estão sem o patrocínio de advogado.37 A decisãoprobatória do juiz, no entanto, deve ser excepcional e não pode ultrapassar os limites da demanda,estabelecidos pela petição inicial e pela contestação, nem pôr em xeque a sua imparcialidade.

O registro da prova oral

O art. 36 prescreve que a prova oral não será reduzida a escrito, devendo o julgador tãosomente se reportar na sentença ao essencial do que foi dito. A mesma regra se aplica aoprocedimento arbitral (art. 24). Trata-se de postulado direto do princípio da oralidade, pois, se o juizestá presente e julga a causa em audiência, os registros deixam de ser relevantes. Essa determinação,entretanto, tem sido criticada pela doutrina, que aduz que a falta do registro escrito dos atospraticados em audiência inviabiliza o controle das decisões judiciais, violando o princípio do duplograu de jurisdição.38

Apesar de reconhecer que a falta do registro escrito efetivamente fragiliza o duplo grau dejurisdição, não somos contrários à regra. De fato, a oralidade representa elemento essencial dosJuizados Especiais, senão sua maior virtude, não sendo possível a sua formalização, ainda que emprol da segurança jurídica. Ademais, somos partidários de que a audiência de instrução e julgamentoseja gravada ou filmada digitalmente e que esse registro fique disponível para a análise da TurmaRecursal quando do julgamento das ações e recursos a ela dirigidos, nos termos do art. 44 da Lei

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4.3.6

9.099/1995. Com isso, será possível preservar a garantia constitucional ao duplo grau, sem anecessidade de retardar o andamento da audiência com a redução a termo dos atos. Não obstante,como já dito anteriormente, caso a sentença não seja proferida em audiência, como determina o art.28, os atos deverão ser registrados por termo. Isso também se aplica ao procedimento arbitral, quepermite ao árbitro produzir seu laudo fora da audiência (art. 26).

Nesse passo, importante ressaltar que se uma parte se sentir prejudicada por uma decisãointerlocutória proferida em audiência, deverá pedir que tal decisão seja reduzida a termo, paraviabilizar a revisão do ponto por meio dos recursos cabíveis ou do mandado de segurança. Imagine-se o caso em que a parte, sem prévio arrolamento, traz duas testemunhas para serem ouvidas naaudiência de instrução e julgamento e o juiz só permite a oitiva de uma delas. Se não for consignadoque o juiz indeferiu a oitiva da testemunha, essa questão ficará imune a qualquer tipo de impugnaçãopor não se ter registro dela.

O depoimento pessoal e o interrogatório

Não há qualquer impedimento para a tomada do depoimento pessoal (arts. 385 e seguintes doCPC) nos Juizados Especiais. Assim, na hipótese de uma das partes pretender ouvir a outra, deveráformular pedido de depoimento pessoal até o início da audiência de instrução e julgamento. Se o juizacolher o pedido, alertará o depoente sobre a pena de confesso, caso se recuse a responder ao quelhe for indagado (art. 385, § 1º, do CPC). Por outro lado, pode o juiz de ofício interrogar as partessobre os fatos da causa (art. 385, in fine, do CPC). A toda evidência, o depoimento da parte queresida em outra comarca poderá ser feito por videoconferência ou outro meio eletrônico (art. 385, §3º, do CPC), em sintonia com os princípios que orientam os Juizados Especiais (art. 2º).39

A exibição de documento ou coisa

Embora o art. 32 diga que todos os meios de prova são admissíveis nos Juizados Especiais, épreciso ter em mente que a produção da prova deve ser compatível com as características doprocedimento especial. Como a exibição de documento ou coisa não é regulada pela Lei 9.099/1995,o procedimento a ser adotado seria aquele previsto no CPC, que confere o prazo de cinco dias para orequerido responder ao pedido de exibição (art. 398) ou 15 dias, se o documento a ser exibidoestiver com pessoa estranha ao processo (art. 401). Nesse sentido, entendemos que a estrutura daexibição de documentos ou coisas não é conciliável com o procedimento oral dos JuizadosEspeciais. Nada impede, no entanto, que o juiz determine, de ofício ou mediante requerimento, pormeio de medida liminar incidental, a exibição de um documento ou de uma coisa, desde que aquiloque for buscado esteja na posse de uma das partes do processo e estejam presentes os requisitosgerais do poder geral de efetivação. É o caso da exibição parcial dos livros e documentos previstano art. 421 do CPC.

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4.3.7

4.3.7.1

4.3.7.2

4.3.7.3

4.3.8

A prova documental

A análise imediata dos documentos apresentados em audiência

Após a réplica, as partes deverão ser instadas a se manifestar imediatamente sobre osdocumentos apresentados em audiência (art. 29, parágrafo único), sob pena de preclusão.40 Trata-sede uma exceção à regra geral prevista no art. 437, § 1º, do CPC, que concede o prazo de 15 dias paraa parte se pronunciar sobre documentos juntados aos autos. Por certo, a determinação de imediatamanifestação deverá ser temperada diante de circunstâncias concretas que possam causar gravecomprometimento ao exercício do direito de defesa. Nesses casos, poderá o julgador se valer daregra contida na parte final do art. 27, para redesignar a realização da audiência.

A juntada de declarações, laudos e orçamentos

Diante da dificuldade em se produzir a prova pericial, vem se difundindo nos Juizados aapresentação pelas partes de um ou mais laudos técnicos, sob a forma de prova documental, ou,ainda, de planilhas contábeis.41 Muito embora a Lei 9.099/1995 somente mencione tais documentosquando trata da prova pericial (art. 35), a exemplo do que ocorre no CPC (art. 472), eles poderão serutilizados sempre que houver uma questão técnica a ser apreciada. É assim, por exemplo, quando oautor busca uma indenização por uma batida de carro e junta, na petição inicial, três orçamentosfeitos em oficinas mecânicas sobre o valor da reparação. Essa prática, embora possa dispensar anecessidade da perícia, não deve a ela ser equiparada. O técnico, nesse caso, foi escolhidounilateralmente e sem a corroboração do juiz. Por isso, esses pareceres técnicos não desfrutam damesma eficácia que uma perícia. Ainda assim, tais documentos são de extrema valia para que ojulgador possa aplicar as regras de apreciação das provas previstas no art. 5º da Lei.

A alegação de falsidade documental

No caso de uma parte arguir a falsidade de algum documento apresentado, o juiz terá que fazerem audiência uma avaliação quanto à admissibilidade da impugnação (art. 29, caput, da Lei9.099/1995). Na hipótese de formar um juízo positivo, o julgador deverá verificar se a falsidade éevidente ou se necessita da análise de um perito para ser reconhecida. Se for evidente a falsidade, ojuiz declara o documento como falso e prossegue o julgamento da causa, desconsiderando-o, semprejuízo das correspondentes medidas de natureza criminal. Caso seja imprescindível a análisetécnica do documento impugnado (arts. 430 e seguintes do CPC), e não havendo consenso entre aspartes sobre a sua retirada dos autos (art. 432, parágrafo único, do CPC), o juiz deverá encerrar ofeito sem resolução do mérito (art. 51, II).

A prova testemunhal

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No sistema dos Juizados Especiais, cada parte pode postular pela oitiva de até três testemunhas(art. 34). Assim, se forem três os réus, poderão ser ouvidas até nove testemunhas de defesa. Deacordo com Alexandre Câmara, entretanto, se o litisconsórcio for unitário, independentemente donúmero de réus, só poderão ser ouvidas três testemunhas.42 Apesar de coerente com os princípiosfundamentais dos Juizados, ousamos divergir desse entendimento, não apenas porque carece de baselegal e contém uma interpretação restritiva ao direito probatório, mas também porque isso poderialevar a uma “corrida” entre os litisconsortes pelo arrolamento de suas testemunhas. Imagine--se asituação do réu que oferece três testemunhas que não têm o preciso conhecimento do fato debatido emjuízo. Um segundo corréu ficaria sem espaço para arrolar as suas testemunhas, que melhorconhecessem o fato, porque o primeiro réu arrolou mal. É importante lembrar, ainda, que o juizpoderá limitar esse número, caso entenda que é excessivo ou impertinente (art. 33).

O art. 34 da Lei estabeleceu que a própria parte deverá levar as suas testemunhas ao Juizado,salvo se requerer tempestivamente a intimação delas. A Lei 9.099/1995, portanto, possui uma lógicasimilar àquela adotada pelo CPC/2015, que atribui ao advogado o ônus de informar ou intimar atestemunha (art. 455). No caso dos Juizados, se a parte estiver sem advogado,43 deve ser avisada deque as testemunhas que não forem arroladas e deixarem de comparecer na audiência serãodesconsideradas (art. 455, § 2º, do CPC) e que as testemunhas arroladas que não forem à audiênciade instrução e julgamento poderão ser conduzidas ao juízo na data designada para continuação daaudiência (art. 34, § 2º, da Lei 9.099/1995 e art. 455, § 2º, do CPC).

Importante frisar que o requerimento de intimação das testemunhas deverá ser depositado, porescrito, na secretaria do Juizado, com indicação do nome, qualificação e endereço, até cinco diasantes da data marcada para realização da audiência (art. 34, § 1º). O prazo é extremamente curto einsuficiente para se proceder à intimação. Note-se que as intimações somente obrigarão ocomparecimento depois de decorridas 48 horas de sua realização (art. 218, § 2º, do CPC). Assim, seo pedido de intimação for feito no último dia do prazo, no sexto dia anterior à data da audiência, teráa secretaria do Juizado exíguos três dias para cumprir a diligência. Por isso, o ideal é que a parteinteressada na oitiva das testemunhas junte o rol o quanto antes puder. Se a parte puder incluir no roloutros dados para identificação da testemunha e de seu paradeiro (art. 450 do CPC), isso facilitará asua intimação.

Existe, ainda, uma divergência sobre a necessidade de arrolamento prévio das testemunhas.Como já visto, a regra geral nos Juizados Especiais é que a parte interessada deverá requerer eproduzir a prova na audiência de instrução e julgamento (art. 33). Não obstante, ao tratar da provatestemunhal, o art. 35 assinala que a testemunha que não precisar de intimação será “levada pelaparte que a tenha arrolado”. Ora, arrolamento é o nome que tradicionalmente se dá ao pedido deprodução de prova testemunhal. Assim, por exemplo, nos arts. 146, § 1º, e 163, II, ambos do CPC,mencionam o arrolamento. Desse modo, fica a dúvida: a parte precisa arrolar previamente todas astestemunhas que pretende ouvir ou somente aquelas que quiser ver intimadas?

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4.3.9

A doutrina dominante tem entendido que a testemunha que irá comparecer sem intimação nãodepende de prévio arrolamento, bastando que a parte interessada as apresente no início da audiênciade instrução e julgamento, requerendo sua oitiva.44 A parcela minoritária, por sua vez, argumenta quea apresentação de uma ou mais testemunhas sem o prévio arrolamento, além de desconsiderar o textolegal, violaria o princípio do contraditório, pois dificultaria a contradita pela parte adversária.45 Noembate entre as duas correntes, filiamo-nos às razões daquela que hoje é predominante, ressalvandoque a parte que tiver dificuldade em contraditar as testemunhas que foram arroladas somente naaudiência de instrução e julgamento poderá, com fulcro na parte final do art. 27 da Lei 9.099/1995,requerer fundamentadamente a remarcação dessa audiência.

Por fim, necessário destacar que a colheita do depoimento da testemunha deverá ser feita deacordo com o regramento estabelecido no CPC, ou seja, o advogado ou a parte desassistida46 podemfazer perguntas diretamente ao depoente (art. 459). Trata--se do modelo de oitiva de testemunhasconhecido como cross examination, oriundo do direito norte-americano. Por certo, se a parte queestiver atuando sem o patrocínio de um advogado se sentir despreparada para desempenhar essafunção, o juiz deverá recomendar a busca pelo patrocínio técnico (art. 9º, § 2º, da Lei 9.099/1995)ou, como tem ocorrido na maioria dos Juizados, proceder ao interrogatório direto da testemunha (art.459, § 1º, do CPC).

A prova pericial

Ao contrário do que muito frequentemente se costuma dizer, é possível a produção da provapericial nos Juizados Especiais.47 Quem afirma em sentido contrário, dizendo que a inquirição doespecialista técnico prevista no art. 35 da Lei 9.099/1995 representa uma modalidade especial deprova testemunhal, na verdade, confunde a natureza da prova com a sua forma de produção.48 Comefeito, nos Juizados Especiais o legislador adotou o modelo norte-americano de perícia simplificada,mais precisamente o nova-iorquino (expert witness), em que o perito ou técnico de confiança do juizapresenta seu laudo e responde aos questionamentos oralmente, em audiência, como se fosse umatestemunha.49 O perito ou especialista, no entanto, não foi equiparado a uma testemunha. Apenas aforma de se colher a prova o trata como se fosse uma testemunha. Esse fato não altera a natureza daprova descrita no art. 35, que permanece sendo essencialmente pericial.

Outra diferença importante entre a perícia tradicional e a perícia informal dos JuizadosEspeciais é que esta não precisa ser necessariamente realizada por perito. Tal fato, entretanto, não semostra como um empecilho para definir a natureza desse tipo de prova.50 Com efeito, nos termos doCPC/2015, a perícia pode ser feita por perito (art. 156, caput), por órgão técnico ou científico (art.156, § 5º) ou por especialista com formação acadêmica (art. 464, § 4º). No caso da perícia dosJuizados Especiais, não existe a imposição de que o técnico tenha formação acadêmica (art. 35),bastando que tenha conhecimento suficiente para contribuir com a análise do objeto da perícia.

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Por certo, as partes poderão também ajustar, por meio de uma convenção processual (art. 190do CPC), a realização da chamada perícia consensual (art. 471 do CPC). Nesse caso, o laudopericial deverá ser apresentado, preferencialmente, de forma oral na audiência de instrução ejulgamento.

A perícia nos Juizados Especiais poderá ser requerida pelas partes ou determinada de ofíciopelo juiz. Caso a perícia seja determinada com antecedência, as partes poderão indicar assistentestécnicos para auxiliá-las e poderão formular quesitos e apresentar pareceres técnicos. Ainda assim, aapresentação do laudo e o debate sobre suas conclusões deverá ser feito em audiência, de forma oral.Desse modo, as principais conclusões apresentadas pelo técnico, bem como as questões levantadaspelas partes e seus assistentes, deverão ser mencionadas resumidamente no corpo da sentença, aolado das demais provas orais colhidas. Se, ao término da perícia, o juiz entender que o pontocontroverso não ficou sanado, não sendo possível a realização de nova perícia de imediato, deveráremarcar a audiência de instrução e julgamento.

Na prática, é muito rara a realização de um procedimento pericial nos Juizados Especiais,principalmente por três razões. Em primeiro lugar, o perito não é remunerado por sua atividade (art.54).51 Em segundo lugar, como o deferimento da prova pericial deve ocorrer durante a organizaçãoda instrução probatória, o perito tem que estar disponível, junto ao Juizado, no momento darealização da audiência. Por fim, o perito tem que analisar a questão e apresentar o seu laudoimediatamente, na própria audiência.52 Desse modo, na maioria das vezes, os juízes têm preferidoencerrar o procedimento, sem resolução do mérito (art. 51, II), se não for possível julgar a causa sema realização da prova técnica.

Por outro lado, interessante sublinhar que alguns juízes têm nomeado funcionários públicos comformação técnica para realizar a perícia e comparecer à audiência de instrução e julgamento. Nessesentido, já tivemos oportunidade de participar de um processo em que a discussão sobre o defeitoapresentado por um notebook foi sanada pela intervenção de um técnico de informática do próprioTribunal, que foi chamado durante a audiência para analisar o equipamento. Na cidade fluminense deNiterói, um Juizado nomeou um técnico em telecomunicações de uma universidade pública paraacompanhar as inúmeras audiências marcadas, em que a demandada era uma determinada empresaconcessionária de telefonia móvel. Na cidade do Rio de Janeiro, numa causa em que a autoraimputava ao imóvel vizinho o desrespeito às regras de silêncio, o juiz oficiou à Prefeitura, antes darealização da audiência de instrução e julgamento, para que enviasse um técnico ao local, com umaparelho medidor sonoro. Assim, no dia da audiência, o técnico compareceu e informou sobre asituação apurada.

Apesar dos exemplos citados, parece-nos que a prova pericial precisa, urgentemente, ser maisbem estruturada na Lei 9.099/1995, para viabilizar a sua realização de forma mais efetiva. Nessesentido, merece registro a solução que foi a adotada pelos Juizados Especiais Federais. Neles, aperícia é feita por escrito e apresentada até cinco dias antes da audiência (art. 12 da Lei

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4.3.9.1

10.259/2001). Os honorários periciais, por sua vez, são pagos pelo Tribunal Regional Federal, quesomente cobrará da parte ré se a causa for julgada procedente ou da parte autora, no caso delitigância de má-fé. Caso contrário, o próprio Tribunal arcará com o custo da perícia (art. 12, § 1º,da Lei 10.259/2001).

Não obstante, uma boa iniciativa, a curto prazo, seria que o Poder Público, por meio de seusórgãos técnicos de fiscalização, passasse a emitir pareceres oficiais sobre situações de granderepercussão social. Assim, por exemplo, no caso de uma queda de luz, se o Governo (por meio daAgência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL – ou do Operador Nacional do Sistema Elétrico –ONS) divulgasse à população um parecer técnico minucioso sobre o fato e suas causas, todosaqueles que se sentissem prejudicados teriam enorme facilidade de acionar os responsáveis,independentemente de perícia.

A limitação quanto à prova pericial

Existem autores que defendem não haver qualquer limitação quanto à produção de provapericial na Lei 9.099/1995.53 Existem, ainda, juristas que afirmam simplesmente que nos JuizadosEspeciais não cabe a prova pericial.54 Data venia, mas não vemos como acolher essas posiçõesextremadas. Por um lado, vetar qualquer tipo de prova pericial implicaria em reduzir drasticamente opapel constitucional dos Juizados Especiais. Por outro lado, permitir todos os tipos de provapericial, dentro da estrutura oral e informal dos procedimentos previstos na Lei, poderia inviabilizarseu funcionamento. Por isso, entendemos ser necessária a definição de critérios para que o juizavalie quanto à possibilidade da produção de determinada prova pericial no âmbito dos Juizados.55

Esses critérios, entretanto, não podem ser fixados aprioristicamente, sem considerar a realidadedo Juizado onde a causa será julgada. A nossa sugestão, para lidar com essa questão, é que ojulgador faça, a si mesmo, três perguntas: eu posso julgar, sem prejuízo às partes, prescindindo daprova técnica requerida? Eu posso realizar essa perícia com os recursos humanos e materiaisdisponíveis no Juizado? Existe algum outro meio idôneo e célere para que eu possa obter essaresposta técnica? Se todas as respostas forem negativas, melhor encerrar o procedimento, semresolução do mérito (art. 51, II).56 De fato, entendemos que a prova pericial deve ser admitida desdeque seja compatível com os preceitos orientadores da Lei 9.099/1995 e com a realidade do órgãojudicial onde a questão foi suscitada.57 Por outro lado, defendemos também que os juízes devemempreender todos os esforços possíveis para tentar realizar as perícias que se mostrem necessáriasao julgamento do mérito da causa, somente remetendo as partes para a via ordinária quando isso forinevitável.

Por outro lado, a prática forense demonstra que não raras vezes os réus, especialmenteempresas privadas e concessionárias de serviços públicos, alegam a necessidade de períciascomplexas como uma estratégia para tentar se desvencilhar das demandas que lhes são propostas nos

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4.3.9.2

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4.4

Juizados Especiais. Tais expedientes, quando desprovidos de base legal, devem ser rechaçados, comrigor (art. 80 do CPC), para desestimular a manobra e privilegiar o acesso à justiça.58

O perito

O art. 35 passa a impressão de que a perícia nos Juizados Especiais não é feita por perito, masapenas por técnico que goze da confiança do juiz. Na realidade, a Lei procurou criar umprocedimento menos formal para a realização da perícia, inclusive no que tange à pessoa queconduzirá a análise técnica. No caso da perícia dos Juizados Especiais, não existe a imposição deque o técnico tenha formação acadêmica, como ocorre em relação ao especialista designado pararealizar a perícia simplificada prevista no CPC (art. 464, § 4º). Basta que o escolhido tenhaconhecimento suficiente para contribuir com a análise do objeto da perícia. O art. 35, no entanto, nãocria uma obrigação, mas uma faculdade para o juiz, que pode, se entender necessário, lançar mão deum perito credenciado para a realização da perícia informal.

Necessário destacar que as partes poderão não apenas indicar ao juízo pessoas capazes deexercer a função de análise técnica, mas também poderão escolher de comum acordo quem vairealizar a perícia (art. 471 do CPC). Em qualquer hipótese, o técnico escolhido deverá aceitar suanomeação e se submeter às recusas ordinárias opostas pelas partes, fundadas em seu impedimento oususpeição (art. 156, § 4º, do CPC).

A inspeção judicial

No CPC, a inspeção judicial é cabível quando o juiz sente a necessidade de ter contato diretocom coisas, pessoas ou locais para decidir a causa (arts. 481 a 484). Nos Juizados Especiais,embora mantenha as mesmas características gerais, a inspeção judicial possui duas diferençasimportantes. Em primeiro lugar, ao contrário do que ocorre no sistema comum, a inspeção pode nãoser feita pelo juiz (art. 35, parágrafo único, da Lei 9.099/1995). Por exemplo, se o autor afirma que oacidente acabou com o seu carro, o juiz pode suspender a audiência e determinar a um serventuárioque vá examinar o veículo, incumbindo-o de, na volta, fazer um relato informal e oral daquilo que viu(esse relato pode ser ilustrado com desenhos e fotos – art. 484, parágrafo único, do CPC).

Em segundo lugar, a inspeção judicial no CPC pode ser feita em qualquer etapa doprocedimento (art. 481 do CPC), enquanto nos Juizados Especiais essa prova deve ser feita durante aaudiência de instrução e julgamento, sem a necessidade de interrompê-la. Isso fica claro no parágrafoúnico do art. 35 da Lei 9.099/1995, que diz que a inspeção judicial será feita “no curso daaudiência”. Por conta dessas características, na prática, são raríssimas as inspeções judiciais, pois ovolume de audiências não permite esse tipo de atuação.

AS QUESTÕES INCIDENTES

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4.5

4.6

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Como salienta Pestana de Aguiar,59 o art. 29 da Lei 9.099/1995 exige unicidade e acontinuidade da audiência. Assim, se for levantada uma questão incidente, o juiz terá que decidir deplano, dentro da audiência de instrução e julgamento. Dessa forma, se alguém arguir a incompetênciados Juizados para apreciar determinada causa, o prosseguimento da audiência dependerá da decisãodo juiz sobre a questão. Por outro lado, se a arguição for sobre questão incidente que não impeça oregular desenvolvimento da audiência, esta deverá ser resolvida na própria sentença.

AS QUESTÕES PREJUDICIAIS AO MÉRITO

As questões prejudiciais devem ser apreciadas pelo juiz de plano, na primeira oportunidade emque intervir no feito, ou na sentença (art. 29 da Lei 9.099/1995). Essas questões, entretanto, somenteirão integrar a parte dispositiva da sentença se forem afetas ao mérito da causa, se tiverem sidosubmetidas ao contraditório prévio e efetivo e se os Juizados Especiais forem competentes para seujulgamento como questão principal (art. 503, § 1º, do CPC).

De fato, entendemos que a restrição contida no § 2º do art. 503 do CPC não tem o condão deinviabilizar a integração das questões prejudiciais à parcela dispositiva da sentença nos Juizados. Naverdade, da mesma maneira que no juízo comum as limitações probatórias e cognitivas terão que serverificadas caso a caso, de acordo com a dinâmica processual operada e com a natureza da questãoprejudicial. Assim, por exemplo, se a questão prejudicial ao mérito for a validade de uma cláusulacontratual, em tese, as limitações probatórias existentes na Lei 9.099/1995 não são capazes decomprometer a profundidade da sua cognição.

AS ALEGAÇÕES FINAIS

A expressão literal do art. 28 da Lei 9.099/1995 pode levar o intérprete a concluir que, após otérmino da instrução probatória, deve o juiz proferir sentença, sem ouvir as partes.60 Ocorre, noentanto, que isso não retrata a melhor forma de condução de uma audiência, sob a ótica do princípiodo contraditório (art. 7º do CPC). Na realidade, se forem produzidas provas orais na audiência, nãohá razão para deixar de ouvir as partes sobre o que foi dito (art. 10 do CPC). Muito pelo contrário, éapós a colheita da prova que as partes terão a exata dimensão da solidez dos seus argumentos e daviabilidade de suas pretensões. Por isso, defendemos que, tendo havido a produção de provas naaudiência, devem as partes ser ouvidas, antes da prolação da sentença. Por outro lado, não havendo aprodução de provas orais em audiência, de fato, não se justifica a tomada de razões finais.61

O JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO (TOTAL E PARCIAL)

Via de regra, o julgamento da causa submetida aos Juizados Especiais deve ocorrer naaudiência de instrução e julgamento (art. 28). A jurisprudência, no entanto, tem admitido a dispensada realização da audiência de instrução e julgamento e o julgamento antecipado do mérito quando o

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réu não comparecer à audiência de conciliação ou quando o réu oferecer a resposta até a audiênciade conciliação e ambas as partes informarem que não têm mais provas a produzir (art. 355 doCPC).62 O ideal, no entanto, é que nessas hipóteses seja instaurada imediatamente a audiência deinstrução e julgamento, para preservar os escopos de oralidade do procedimento (art. 2º),63

especialmente se as partes estiverem desassistidas por advogados. Somente se não for possívelrealizar imediatamente a audiência de instrução e julgamento, é que entendemos ser viável ao juizjulgar antecipadamente o mérito da causa.

Por outro lado, se no curso do procedimento o juiz entender que parcela da causa está emcondições de imediato julgamento, não vemos óbice à sua efetivação no âmbito dos JuizadosEspeciais. Com efeito, entendemos que essa modalidade de julgamento está em sintonia com osprincípios da celeridade e da economia processual, previstos no art. 2º da Lei. Note-se, ainda, que apossibilidade do julgamento imediato de parte da causa não representa propriamente uma inovaçãono Direito Processual, já que a homologação da desistência de um dos pedidos ou de um doslitisconsortes sempre foi admitida, inclusive em sede de Juizados Especiais. A novidade repousa nofato de o CPC/2015 prever expressamente essa hipótese e dar um tratamento adequado à situação,afastando o dogma da unicidade do julgamento (art. 356). De fato, a decisão que julga parcialmente omérito, apesar de interlocutória, é capaz de formar coisa julgada material e permitir a execuçãodefinitiva (art. 356, §§ 2º e 5º, do CPC).64 Como essa decisão é galgada em cognição exauriente, nãoprecisará ser confirmada na sentença.

É preciso sublinhar que, assim como no caso de julgamento integral do mérito, sustentamos queo julgamento parcial deve ser feito, preferencialmente, na audiência de instrução e julgamento. Umexemplo dessa possibilidade tem lugar quando, instalada a audiência de instrução e julgamento, elatem que ser remarcada para intimação de uma testemunha, mas parte do mérito já pode ser julgadapor falta de impugnação específica pelo réu na contestação apresentada. Além desse exemplo, ojulgamento antecipado parcial do mérito também pode abarcar um acordo celebrado sobre parcela dacausa. Nessa última hipótese, entretanto, a decisão homologatória não será passível de agravo deinstrumento, em razão do disposto no art. 41 da Lei 9.099/1995. As demais decisões, proferidas comfundamento no art. 356 do CPC, poderão ser atacadas por agravo de instrumento.65

A SENTENÇA

De acordo com o art. 28 da Lei 9.099/1995, no final da audiência de instrução e julgamentodeverá o juiz proferir a sentença. É nesse momento que o juiz vai: a) formalizar a admissibilidade dademanda; b) resolver as questões incidentais que ainda não tenham sido apreciadas (art. 29); c)resolver o mérito da causa. Diz o art. 38 da Lei 9.099/1995 que a sentença “mencionará os elementosde convicção do Juiz, com breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado orelatório”.

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4.8.1

4.8.2

A dispensa do relatório

Como já ficou claro, o art. 38 da Lei 9.099/1995 incide em grave contradição. O citadodispositivo aduz que a sentença deve mencionar um “breve resumo dos fatos relevantes ocorridos emaudiência”, mas, em seguida, permite que o relatório seja dispensado. Ora, um breve resumo dosfatos ocorridos em audiência corresponde, indubitavelmente, a uma parte significativa do relatório(art. 489, I, do CPC). Para completar esse quadro, é preciso destacar que o art. 36 da Lei 9.099/1995diz que a “prova oral não será reduzida a escrito, devendo a sentença referir, no essencial, osinformes trazidos nos depoimentos”. Da mesma maneira que o “breve resumo”, tais “informes”também podem ser considerados como componentes daquilo que normalmente se identifica comorelatório. A questão central, portanto, é tentar definir qual o significado da dispensa do relatórioprevista no art. 38.

Uma interpretação restritiva dos artigos citados poderia ser feita no sentido de que, comexceção dos atos ocorridos em audiência e da prova oral colhida, os demais atos e fatos do processonão precisariam ser relatados na sentença. Desse modo, a dispensa do relatório somente se aplicariaaos atos praticados fora da audiência. Seguindo a lógica oral do procedimento, o único ato relevantea ser praticado fora da audiência seria a petição inicial. Essa interpretação, no entanto, não é a maisadequada. Antes de mais nada, é preciso sublinhar que o relatório existe na sentença como forma deo juiz provar que conhece o processo que está julgando, legitimando a sua atividade decisória. Porisso, a dispensa do relatório, ainda que limitada aos atos e fatos ocorridos fora da audiência, não semostra adequado para a construção do ato mais importante do processo, especialmente à luz dagarantia constitucional da fundamentação das decisões judiciais (art. 93, IX, da CF).

A nossa opinião é que o art. 38 deve ser interpretado como a possibilidade de o juiz deixar defazer na sentença um relatório formal e minucioso do processo, limitando-se a registrar de maneiraresumida os atos e fatos mais importantes do processo, inclusive aqueles ocorridos fora dasaudiências.66 Na prática, essa diretriz tem sido acolhida e a maioria das sentenças tem trazido, aindaque de maneira sintética, uma descrição do processo que pode ser identificada com o relatório, aindaque digam textualmente que estão dispensando o relatório.

Importante frisar que, sendo a sentença proferida fora da audiência, como frequentemente temocorrido, não poderá o juiz deixar de fazer o relatório “completo”. Com efeito, o que legitima adispensa do relatório é a oralidade do procedimento; assim, se o juiz sentencia fora da audiência,deverá observar as regras ordinárias relativas àquele ato. Ressalte-se que a dispensa refere-sesomente ao relatório, sendo imprescindível que a sentença apresente seus fundamentos67 e sua partedispositiva68 (art. 93, IX, da CF e art. 489, § 1º, do CPC).

A fundamentação da sentença

Uma das maiores conquistas do CPC/2015, em relação à garantia de um processo constitucional

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4.8.3

e democrático, foi a previsão da invalidade das decisões proferidas por meio de modelos deficientesde fundamentação (art. 489, § 1º). Esse dispositivo é um densificador do princípio constitucional defundamentação das decisões judiciais, previsto no art. 93, IX, da CF, de modo que a sua aplicaçãonos Juizados Especiais é cogente e inafastável, como alicerce do devido processo legal e docontraditório participativo.69

Não obstante, parte significativa da magistratura brasileira tem apresentado resistência àaplicação das regras contidas no art. 489, § 1º, do CPC. Nesse sentido, o FONAJE editou oenunciado 162, afirmando categoricamente que “não se aplica ao Sistema dos Juizados Especiais aregra do art. 489 do CPC/2015 diante da expressa previsão contida no art. 38, caput, da Lei9.099/1995”.

É claro que o procedimento nos Juizados Especiais deve se pautar pela celeridade,informalidade e oralidade. Mas isso não implica, de forma alguma, na autorização para que o juizdeixe de fundamentar adequadamente as suas decisões. É na fundamentação que o julgador demonstrao conhecimento sobre as questões discutidas e analisa as consequências jurídicas do debate travadonos autos, permitindo o seu controle e legitimando a sua observância. Nos Juizados, a fundamentaçãoé mais importante ainda, pois ela deve ser clara e inteligível para aquele que eventualmente estejaatuando sem o acompanhamento de um advogado (art. 9º da Lei 9.099/1995).70

De fato, como diz Humberto Theodoro Júnior:71

“Não podemos mais tolerar as simulações de fundamentação nas quais o juiz repete o textonormativo ou a ementa do julgado que lhe pareceu adequado ou preferível, sem justificar aescolha. Devemos patrocinar uma aplicação dinâmica e panorâmica dessa fundamentação quegere inúmeros benefícios, desde a diminuição das taxas de reformas recursais, passando pelamaior amplitude e profundidade dos fundamentos determinantes produzidos nos acórdãos echegando até mesmo a uma nova prática decisória na qual os tribunais julguem menos vezescasos idênticos em face da consistência dos julgamentos anteriores”.

Por esses motivos, é possível afirmar que a interpretação literal e isolada do art. 38 da Lei9.099/1995 é inconstitucional. Com efeito, não basta que o juiz registre os elementos de suaconvicção e um breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, para que a sentença sejaconsiderada adequadamente fundamentada. É preciso que analise juridicamente os argumentosventilados na pretensão autoral e na contestação, bem como as provas colhidas ao longo doprocedimento, dentro e fora da audiência, apresentando os motivos que o levaram a decidir daquelamaneira. Deve, ainda, contextualizar as regras e princípios eventualmente aplicados, bem como asbases jurisprudenciais pertinentes à causa (art. 926 do CPC),72 notadamente em relação aosjulgamentos fixadores dos padrões decisórios vinculativos (art. 927 do CPC).

A intimação da sentença

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O art. 19, § 1º, da Lei 9.099/1995 estabelece a presunção da intimação das partes em relaçãoaos atos praticados em audiência. Assim, mesmo que a parte falte à audiência, se a sentença for nelaproferida, estará intimada de seu conteúdo, iniciando a contagem dos prazos recursais. Necessário,nesse passo, registrar que a aplicação do dispositivo depende da demonstração de que a parte deixoude ir à audiência apesar de regularmente intimada para tanto.

Por outro lado, se a sentença não puder ser proferida imediatamente, o juiz deverá marcar naaudiência a data na qual a sentença estará disponível na secretaria do Juizado para sua leitura, numprocedimento conhecido como “leitura de sentença”. Caso contrário, terá que intimar as partes doteor da decisão (arts. 269 e seguintes do CPC), por seus advogados ou pessoalmente, quando nãotiverem advogado constituído nos autos.

A liquidez da sentença

Como dito no parágrafo único do art. 38 e no inciso I do art. 52, a sentença nos JuizadosEspeciais tem que ser necessariamente líquida e conter índice de conversão. Por isso, a sentençailíquida apresenta omissão que pode ser atacada por embargos de declaração (art. 48). Note-se quemesmo que não se tenha embargado a omissão, é possível levar a discussão à Turma Recursal,mediante “recurso inominado” (art. 41), uma vez que a falta representa um error in procedendo. Omesmo se diga em relação à sentença que homologa o acordo ou o laudo arbitral. Com isso, oconciliador e o mediador deverão sempre estimular as partes a acordar em termos líquidos e oárbitro terá que estabelecer o quantum das obrigações reconhecidas nos seus laudos (art. 25).

A ineficácia parcial da sentença com condenação acima da alçada legal

A alçada a que se refere o art. 39 é a estabelecida no inciso I do art. 3º da Lei, isto é, 40salários mínimos. Assim, esse limite nas competências ratione valoris não pode ser ultrapassadopelo juiz, seja em pedidos simples, cumulados ou contrapostos, sob pena de ineficácia parcial dadecisão judicial em relação ao excesso. Nesse caso, a parcela submetida à alçada não ficacomprometida pela violação do dispositivo e terá eficácia plena.73 A ineficácia mencionada pode serreconhecida de ofício ou arguida pelas partes a qualquer tempo ou grau de jurisdição, inclusive emfase de execução (art. 52, I).

Oportuno recordar, nesse passo, que como as partes não estão sujeitas a esse limite, temos quea sentença que homologa o acordo celebrado (arts. 3º, § 3º, e 57) está fora da restrição prevista noart. 39.

Apesar da omissão legal, entendemos que também ao laudo arbitral deve ser aplicado olimitador previsto no art. 39, quando a competência da causa for fixada em razão do valor (art. 3º, I eIV). Isso se dá porque, pela sistemática da Lei, somente as partes, de comum acordo, podemultrapassar o limite de 40 salários mínimos. Sendo, portanto, uma exceção, a sua interpretação

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restritiva afastaria igual possibilidade ao árbitro. Ademais, podemos dizer que o árbitro está sujeitoao art. 39 em razão do disposto no art. 25, que diz que ele “conduzirá o processo com os mesmoscritérios do juiz”.

A despeito das divergências existentes, entendemos que a multa (art. 52, V),74 os encargosdecorrentes da litigância de má-fé (art. 55, primeira parte), as custas, taxas, honorários advocatícios,os juros legais e a correção monetária (art. 55, segunda parte, da Lei 9.099/1995, art. 322, § 2º, doCPC e Súmula 254 do STF) são plenamente eficazes, ainda que, somados com o principal,ultrapassem o valor de 40 salários mínimos. Em suma, sustentamos que o dispositivo contido no art.39 se dirige à parcela principal da sentença, não incidindo sobre os seus acessórios.75

A designação de data para a leitura de sentença

Embora a Lei não preveja tal possibilidade, na prática, parcela significativa dos magistradostem determinado a abertura de conclusão dos autos para sentenciar no encerramento da audiência deinstrução e julgamento. Diante dessa realidade, fruto do acúmulo de trabalho, a própriajurisprudência se encarregou de estabelecer um mecanismo para reduzir os prejuízos gerados poressa rotina: o juiz que encerrar a audiência de instrução e julgamento sem proferir a sentença deveráimediatamente intimar as partes da data marcada para a leitura da sentença a ser proferida.76

Por certo, trata-se de um desvirtuamento do art. 28 da Lei 9.099/1995, que prevê que a sentençaserá proferida na audiência de instrução e julgamento.77 Na verdade, a fixação de data para a leiturade sentença foi inspirada na regra contida no parágrafo único do art. 271 do CPC/1939, que previa arealização de uma audiência de publicação da sentença quando o magistrado não se sentisse apto aproferi-la no final da audiência de instrução e julgamento.78 Na versão atual, entretanto, não haveráuma audiência para publicar a sentença, mas apenas a liberação dos autos, na própria secretaria doJuizado, para que as partes possam realizar a sua leitura. Sempre que a parte leiga estiverdesacompanhada de advogado, deverá o funcionário da secretaria auxiliar a sua leitura, esclarecendoos aspectos mais relevantes da decisão, o prazo para a impugnação e a necessidade de assistênciatécnica para o oferecimento dos recursos.

O “projeto de sentença”

Na maioria dos Estados brasileiros, o ato produzido pelo juiz leigo, apreciando a causa, nostermos do art. 40 da Lei 9.099/1995, é chamado de “projeto de sentença” ou “proposta de sentença”.Esse ato, no entanto, não pode ser considerado como um ato decisório, em seu sentido estrito. Comefeito, o ato decisório é composto por dois elementos essenciais do julgador: a inteligência e avontade. A inteligência retrata o trabalho intelectual desenvolvido para a análise e a solução daquestão posta em juízo; a vontade, por sua vez, decorre do poder que lhe é conferido para aplicarcoercitivamente a solução engendrada (imperium).

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Quando um juiz leigo profere um “projeto de sentença”, sem sombra de dúvida, está exercendoum ato de inteligência, mas não de vontade. Somente depois de homologado pelo juiz é que o projetose torna verdadeiramente um ato decisório. Cuida-se de situação diferente daquela observada novoto de um jurado, no procedimento do tribunal do júri. Nesse caso, o voto é um ato de inteligência ede vontade do jurado, ainda que o juiz tenha que homologá-lo, ao proferir a sentença. O voto dojurado constitui um verdadeiro ato jurisdicional, praticado por quem não é juiz. O “projeto desentença”, por seu turno, retrata apenas um ato processual praticado por auxiliar do juízo. Falta aojuiz leigo o poder decisório inerente à atividade jurisdicional.

A homologação judicial do “projeto de sentença” representa não apenas a manifestação volitivado juiz em atribuir força jurisdicional ao ato, mas também a concordância com a instrução probatóriafeita e o trabalho intelectual desenvolvido. Assim, apesar de não ser uma sentença, o “projeto desentença” deverá observar todas as regras mencionadas em relação à sentença a ser proferida pelomagistrado, no âmbito dos Juizados Especiais. Deve contar, ainda, com a data, a assinatura e aidentificação do juiz leigo prolator e um local próprio para o juiz lançar a sua chancela. Não épreciso que seja feita uma sentença só para homologar o “projeto de sentença”. O juiz ratifica o atoprocessual, tornando-o uma sentença, da mesma forma que faz quando homologa na ata da audiênciaum acordo celebrado pelas partes.

A REPRODUÇÃO DA AUDIÊNCIA

Se por alguma razão não for possível ao juiz que realizou a instrução processual prolatar asentença, deverá o magistrado que o substituir reproduzir a audiência de instrução e julgamento járealizada, se não houver nos autos registros suficientes das manifestações e das provas produzidasoralmente.

Apesar do silêncio da Lei, essa atitude é plenamente justificável pela sistemática por elaadotada, de intensa oralidade, em que os depoimentos e debates não são, via de regra, registrados nasua plenitude. Em último caso, pode-se pleitear a aplicação analógica da disposição expressa no art.40 da Lei, que permite a reprodução dos atos probatórios caso o juiz togado discorde da decisãoproferida pelo juiz leigo.

A COISA JULGADA

Como já afirmado, os procedimentos previstos na Lei 9.099/1995, embora decorrentes de umamodalidade diferenciada de tutela, são verdadeiros ritos especiais, cuja decisão final visa aestabilização da solução adotada no mundo jurídico. O problema é definir o tipo de estabilização quetal sentença pode alcançar. Sobre o tema, abalizado setor da doutrina79 afirma que o fato de oprocedimento sumaríssimo da Lei 9.099/1995 ter um “déficit garantista”, com limitações às garantiasfundamentais do processo, seria incapaz de viabilizar a formação da coisa julgada material. A

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cognição, nesses casos, seria sempre sumária e, portanto, não alcançaria a preclusão máxima. Deacordo com essa corrente de pensamento, seria contraditório sustentar que o procedimentosumaríssimo dos Juizados, despido de inúmeras regras de proteção e insuscetível de ensejar oajuizamento de ação rescisória (art. 59), pudesse atingir imediatamente após o trânsito em julgado umgrau de estabilidade que no juízo comum levaria dois anos para ser obtido.

A doutrina majoritária,80 entretanto, embora reconheça a existência de restrições garantistas noprocedimento, entende que elas não são capazes de obstar a formação da coisa julgada materialsobre as decisões proferidas nos Juizados Especiais. De fato, a formação da coisa julgada materialsobre determinada decisão retrata uma opção legislativa e a sua aplicação deve ser feita de acordocom os escopos da jurisdição. Ademais, se a sentença nos Juizados Especiais não formasse coisajulgada material, poderia comprometer todo o sistema, na medida em que abriria a porta para arevisão das decisões ali proferidas no juízo ordinário. Como veremos mais à frente, defendemos queo legislador errou ao proibir a ação rescisória, um dos aspectos que mais reforçam a orientaçãominoritária. No entanto, isso não autoriza a conclusão de que as sentenças simplesmente não fariamcoisa julgada material. Se assim o quisesse, o legislador teria dito, de forma expressa.

Como já tivemos oportunidade de sustentar, entendemos, minoritários, que o juiz leigo não poderiadirigir a audiência de instrução e julgamento e proferir o “projeto de sentença” (arts. 37 e 40).Portanto, na nossa visão, somente o juiz “togado” poderia dirigir a audiência de instrução ejulgamento e proferir a sentença.Nesse sentido, veja-se: “O rito de conhecimento da Lei 9.099/1995 é uno, de ordem pública, emque todos os atos se concentram obrigatoriamente na Audiência de Instrução e Julgamento (artigos27, 28 e 29, da Lei 9.099/1995). Só não haverá a audiência de instrução e julgamento em caso derevelia, de ausência do autor ou de acordo entre as partes” (TJRJ, 4ª TR, RI 0000340-66.2012.8.19.0050, Rel. Juiz Karenina Souza e Silva, j. em 28.02.2013).Trata-se, no caso de ambas as partes informarem que não têm mais provas a produzir, demodalidade atípica de convenção processual (art. 190 do CPC). Tal convenção, no entanto, nãoelimina a necessidade da audiência de instrução e julgamento, se ela puder ser realizadaimediatamente, mas, apenas, dispensa a realização de atos probatórios.O pedido de adiamento da audiência de instrução e julgamento pode decorrer, por exemplo, danecessidade da parte de ser assistida por um advogado (art. 9º) ou de produzir uma determinadaprova (art. 33). Esse pedido normalmente é feito pelo réu, como diz a Lei, mas nada obsta que sejaformulado pelo próprio autor, no caso de lhe ter sido formulado pedido contraposto (art. 31,parágrafo único).Se a contestação já foi apresentada, antes do início da audiência de instrução e julgamento, o juizdeve dar ciência do seu conteúdo ao autor e lhe franquear a palavra para se manifestar.Nesse sentido, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 49, e Marcia Cristina Xavier de Souza, Impactos do

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Novo Código de Processo Civil no sistema dos juizados especiais, p. 390. Retratando essepensamento, veja-se o Enunciado 10 do FONAJE: “A contestação poderá ser apresentada até aaudiência de Instrução e Julgamento”.Instituições..., op. cit., p. 801.Nesse sentido, veja-se: “Apelação cível. Ação de rescisão contratual. Locação residencial.Inclusão dos fiadores. Polo passivo. Ampliação subjetiva. Pedido contraposto. Litisconsórciofacultativo. Impossibilidade” (TJDF, 4ª Turma, AC 0002661-41.2014.8.07.0017, Rel. Des. SérgioRocha, j. em 22.02.2017).Nesse sentido, Joel Figueira Júnior e Maurício Ribeiro Lopes, op. cit., p. 159.Nesse sentido, Dinamarco, Instituições..., p. 792. Veja-se, ainda, o Enunciado 4.2.1 da CEJCA:“Não cabe pedido contraposto no caso de ser o réu pessoa jurídica ou formal; salvo amicroempresa ou a empresa de pequeno porte”. Em sentido diverso, entendendo que o réu semprepode formular pedido contraposto, Erick Linhares, Juizados..., op. cit., p. 55. Veja-se, também, oEnunciado 31 do FONAJE: “É admissível pedido contraposto no caso de ser a parte ré pessoajurídica”.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Como visto, a resposta deve ser oferecida até a audiência de instrução e julgamento (art. 28).Nesse sentido, confira-se a Ementa 53 do ETRJECERJ: “Revelia. Efeitos. Se a contestação não éoferecida por ocasião da audiência de instrução e julgamento, somente vindo para os autos,posteriormente, fora, portanto, do prazo legal, caracterizada se encontra a revelia, cujos efeitosdevem ser reconhecidos, com a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo Reclamante,cabendo ao Julgador fixar a condenação, dentro dos parâmetros legais cabíveis”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 8.1 da CEJCA: “A presença das partes – pessoas físicase/ou pessoas jurídicas, representadas por preposto – é obrigatória nas audiências de conciliaçãoe/ou julgamento” e a Ementa 364 do ETRJECERJ: “A presunção de veracidade quanto à matériafática não está relacionada exclusivamente com a ausência da contestação, já que tal também seaplica à hipótese de não comparecimento do Réu à audiência de conciliação ou à audiência deinstrução e julgamento, na forma do artigo 20 da Lei 9.099/1995”.Eduardo Oberg, op. cit., p. 182, tem sustentado, de forma minoritária, que a mera recusa norecebimento da citação poderia ensejar a revelia. Com o devido respeito, mas tal orientaçãocarece de base legal.Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 35. Em sentido próximo, veja-se a Proposição 1 do 2ºEJJEEP: “Verificada a revelia na audiência conciliatória, faculta-se à parte autora o prazo de 05(cinco) dias para juntar os documentos que disponha, reservada ao magistrado a possibilidade derealizar a instrução”.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 110. Na jurisprudência, veja-se oEnunciado 78 do FONAJE: “O oferecimento de resposta, oral ou escrita, não dispensa o

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comparecimento pessoal da parte, ensejando, pois, os efeitos da revelia”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 47 do 1º EJJEC: “Aplica-se a revelia com a mera ausência daparte, ainda que compareça o advogado com poderes”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 11 do FONAJE: “Nas causas de valor superior a 20 saláriosmínimos, a ausência de contestação, escrita ou oral, ainda que presente o réu, implica revelia”.Nós entendemos que o mandado de citação deverá alertar o réu sobre a necessidade de levar seusdocumentos pessoais, especialmente nas causas de valor inferior a 20 salários mínimos.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 8.5 da CEJCA: “A ausência de advogado na Audiência deInstrução e Julgamento (AIJ), em feito de valor superior a 20 salários mínimos permite que o Juizdispense a instrução e julgue a lide ‘no estado’”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 259 do ETRJECERJ: “Não havendo comprovação de que osubscritor da ata da audiência seja efetivamente o preposto da demandada, porquanto não veio aosautos a autorização escrita do réu para representá-lo, tal proceder equivale à falta de contestação,havendo de ser desconsiderada a argumentação formulada na audiência, impondo-se a decretaçãoda revelia, reputando-se verdadeiros os fatos alegados na inicial”. Ainda assim, o ideal é que ojuiz assine prazo para que o preposto junte aos autos a documentação da sua representação. Nessesentido, veja-se o Enunciado 8.9 da CEJCA: “O preposto que comparece sem carta de preposiçãoobriga-se a apresentá-la no prazo que for assinado, para a validade de eventual acordo. Não vindoa documentação do réu em tal prazo, incidem, de plano, os efeitos da revelia”.Nesse sentido, veja-se: “Não comparecendo o demandado à audiência designada, apresentandojustificativa não acolhida pelo magistrado, por inverossímil, impõe-se a confirmação da decisãode procedência da demanda, por seus próprios fundamentos” (TJRS, 2ª TR, RI 71001370428, Rel.Juiz Clovis Moacyr Ramos, j. em 26.09.2007).Nesse sentido, veja-se a Ementa 373 do ETRJECERJ: “Ausência da ré à audiência deConciliação. Impossibilidade da decretação da revelia se não há nos autos, na época, a provainequívoca da intimação. A juntada aos autos do AR comprobatório, posteriormente à audiência,que chegou, inclusive, a ser redesignada, não autoriza o julgamento de plano, com acolhimento darevelia. Cassação da sentença”.Apesar da regra, importante lembrar que a interposição da impugnação de impedimento ou desuspeição nos Juizados Especiais não está sujeita ao pagamento de custas, em razão da isençãoprevista no art. 54 da Lei 9.099/1995.Nesse sentido, veja-se: “Não cabe a Turma Recursal o julgamento da exceção oposta contra ummagistrado oficiante no Juizado Especial Cível, nos ter (sic). 2. Reconhecida, de ofício, aincompetência desta Turma Recursal para conhecimento e julgamento da Exceção de Suspeição 3.Extinção do processo nos termos do art. 52, da Lei 9.099/1995. Competência declinada para oTribunal de Justiça do Estado do Amapá” (TJAP, Turma, IS 0039353-93.2017.8.03.0001, Rel. JuizAntonio Ernesto Collares, j. em 08.02.2018). Este incidente, por sinal, foi remetido à Seção Únicado TJAP, que o julgou, de forma monocrática, por meio do relator desembargador GilbertoPinheiro, em 14.06.2018.Nesse sentido, vejam-se: “Juizado Especial. Exceção de suspeição. Artigo 135 do Código deProcesso Civil. Rol exaustivo. Impossibilidade de apreciação do acerto ou do desacerto das

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decisões judiciais proferidas na causa incidentada. Ato atentatório à dignidade da justiçacaracterizado. Exceção improvida” (TJDF, 2ª TR, IS 20080410033120, Rel. Juiz Romulo deAraújo Mendes, j. em 01.07.2008), “A Turma Recursal é competente para processar e julgarexceção de suspeição arguida em face de juiz monocrático atuante no âmbito do Juizado EspecialCível. Competência declinada de ofício” (TJMG, 12ª Câmara Cível, IS 10000130080617000, Rel.Des. Saldanha da Fonseca, j. em 03.04.2013) e “Trata-se de Incidente de Suspeição de magistradaem que o requerente alega haver relação de inimizade e animosidade latente entre as partes, vezque teria proposto ação disciplinar em face da referida juíza e do cartório. A d. magistradarejeitou o incidente de suspeição, determinando a remessa do feito a este Conselho Recursal”(TJRJ, 2ª Turma, IS 0010730-52.2018.8.19.0061, Rel. Juiz Eduardo Oberg, j. em 17.12.2018).Instituições..., op. cit., p. 803.O entendimento majoritário, entretanto, é que somente nas causas cujo valor ultrapasse 20 saláriosmínimos é que o pedido deverá ser formulado por advogado. Como já foi visto, entendemos,minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei 9.099/1995 é inconstitucional.Por isso, na nossa visão, o correto seria que na tramitação da impugnação à imparcialidade dojulgador as partes fossem representadas por advogado em todas as etapas.Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. III, p. 483.É o que ocorre, por exemplo, no caso da inversão do ônus da prova nas relações de consumo (art.6º, VIII, CDC) .Nesse sentido, veja-se o Enunciado 9.1.2 da CEJCA: “A inversão do ônus da prova nas relaçõesde consumo é direito do consumidor (art. 6º, caput, C.D.C.), não sendo necessário que o Juizadvirta o fornecedor de tal inversão, devendo este comparecer à audiência munido, desde logo, detodas as provas com que pretenda demonstrar a exclusão de sua responsabilidade objetiva”. Nessesentido, veja-se o Enunciado 53 do FONAJE: “Deverá constar da citação a advertência, emtermos claros, da possibilidade de inversão do ônus da prova”.Como será visto mais à frente, sustentamos, minoritários, o cabimento do agravo de instrumento.Para quem aceita que o juiz leigo possa conduzir a audiência de instrução e julgamento (art. 37),na medida em que ele não pode proferir decisões interlocutórias, parece mais adequadoestabelecer que ele deva permitir a produção de todas as provas que forem requeridas ou entãobuscar o juiz supervisor para organizar a instrução.No STF, é pacífico o entendimento de que a análise sobre a complexidade da produção da prova ématéria infraconstitucional, não dando ensejo a recurso extraordinário. Nesse sentido, veja-se:“Direito do Consumidor e Processual Civil. Juizados Especiais Cíveis. Telefonia móvel e internet.Danos morais. Produção de prova técnica. Complexidade da matéria. Não ocorrência. Âmbitoinfraconstitucional do debate” (STF, 1ª Turma, ARE 828127/SP, Rel. Min. Rosa Weber, j. em16.09.2014).Nesse sentido, veja-se: “Assim, a prestação, ainda que parcial, do serviço de esgotamentosanitário, atrai a necessidade de realização de perícia técnica para o julgamento da causa, o que aqualifica como de maior complexidade, impondo-se o reconhecimento de que a mesma não seencontra abarcada pela competência legalmente atribuída aos Juizados Especiais Cíveis, na formada Lei 9.099/1995, razão pela qual merece provimento parcial o recurso da Ré para julgar extinto

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feito sem julgamento de mérito à luz do artigo 51, II da Lei 9.099/95” (TJRJ, 1ª TR, RI00264624220128190204, Rel. Juiz Flávio Citro, j. em 10.02.2015).Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Nesse sentido, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 40.Nesse sentido, Marcia Cristina Xavier de Souza, Do processo eletrônico instituído.Nesse sentido, veja-se a Proposição 15 do 2º EJJEEP: “A juntada de documentos, por qualquerdas partes, pode ser feita no curso da audiência instrutória, desde que concedida à palavra à partecontrária para o devido pronunciamento, sem que haja caracterização da preclusão”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 2.5.2 da CEJCA: “São admissíveis, em sede de JuizadosEspeciais Cíveis, ações objetivando a revisão de cláusulas contratuais que estabeleçam prestaçõesdesproporcionais ou se tornem excessivamente onerosas (art. 6º, V, do C.D.C.), desde que oconsumidor apresente, com a petição inicial, planilha discriminada do valor que considera devido,de modo a possibilitar a prolação de sentença líquida (art. 38, Parágrafo único, Lei 9.099/1995)”e “Sentença que extingue o processo em razão da complexidade da causa. Matéria já por inúmerasvezes apreciada em sede de Juizados, sendo facultado às partes apresentarem pareceres técnicos.Competência do Juizado Especial Cível para a apreciação da causa. Inteligência do art. 35, in fine,da Lei 9.099/1995. Sentença que se anula” (TJRJ, Turmas Recursais Cíveis, Ap. 2000.700.007299-4, Rel. Gilda Maria Carrapatoso C. de Oliveira).Juizados..., op. cit., p. 118.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Com este pensamento, Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., v. III, p. 484. No mesmosentido, veja-se ainda a Ementa 11 do ETRJECERJ: “Na sistemática do Juizado Especial Cívelnão é indispensável o arrolamento prévio de testemunha. A não oitiva de testemunha trazida pelaparte sem intimação configura cerceamento de defesa. Sentença a anulada”.Nesse sentido, Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 29; e Alexandre Câmara, Juizados...,op. cit., p. 118.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Nesse sentido, veja-se: “Não há dispositivo na Lei 9.099/1995 que permita inferir que acomplexidade da causa – e, por conseguinte, a competência do Juizado Especial Cível – estejarelacionada à necessidade ou não de perícia” (STJ, 3a Turma, MC 15.465/SC, Rel. Min. NancyAndrighi, j. em 28.04.2009).Na realidade, é preciso reconhecer que essa confusão foi aprofundada pelo CPC/2015, que, aotratar da “prova técnica simplificada”, diz que ela substituirá a perícia e que o especialistaprestará depoimento (art. 464 do CPC). Essas concepções têm origem no fato de esse modelo tersido importado do direito norte-americano, em que é chamado de expert witness ou experttestimony (testemunha especialista). Não obstante, defendemos que o CPC de 2015 criou umanova forma de perícia, com estrutura simplificada, cujo laudo é apresentado oralmente, em

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audiência, por um especialista, exercendo função equiparada à de perito (art. 156 do CPC).Nesse sentido, vejam-se a Ementa 106 do ETRJECERJ: “A avaliação técnica facultada ao Juizpelo art. 35 da Lei 9.099/1995 não segue a sistemática da expertise ordinária prevista nos arts.145 a 147 do Código de Processo Civil. O Técnico a que se refere o aludido art. 35 é designadolivremente pelo Juiz, podendo as partes contraditar as conclusões do especialista, mediantepareceres de outros expertos. À falta de contra-argumentação técnica, prevalece a opinativa doespecialista eleito pelo magistrado, se este ao avaliar a prova, prestigia a opinião daquele”, oEnunciado 9.3 da CEJCA: “Não é cabível perícia judicial tradicional em sede de JuizadoEspecial. A avaliação técnica a que se refere o art. 35, da Lei 9.099/1995, é feita por profissionalda livre escolha do Juiz, facultado às partes inquiri-lo em audiência ou no caso de concordânciadas partes” e o Enunciado 12 de FONAJE: “A perícia informal é admissível na hipótese do art. 35da Lei 9.099/1995”.Alguns autores, entretanto, inserem no conceito de perícia a figura do perito. Nesse sentido, veja-se Fredie Didier Jr. e outros, Curso... op. cit., vol. II, p. 225: “[A prova pericial] é aquela pelaqual a elucidação do fato se dá com o auxílio de um perito, especialista em determinado campo dosaber, devidamente nomeado pelo juiz, que deve registrar sua opinião técnica e científica nochamado laudo pericial – que poderá ser objeto de discussão pelas partes e seus assistentestécnicos”.Humberto Theodoro Júnior (Curso..., op. cit., vol. III, p. 485) anota que alguns Juizados têmfacultado às partes a possibilidade de pagar a perícia, para que a prova pericial possa serrealizada. Na sua visão, seria melhor exigir tal pagamento do que remeter às partes as viasordinárias, em que, provavelmente, teriam que arcar com este e outros custos.Alexandre Câmara (Juizados..., op. cit., p. 120), entretanto, entende que o juiz deverá sempresuspender a audiência de instrução e julgamento quando deferir a produção da prova pericial.Assim, as partes teriam condições de formular quesitos e indicar assistentes técnicos e o peritoescolhido pelo juiz tem oportunidade de analisar o objeto da perícia.Nesse sentido, Salomão, op. cit., p. 37 e 71.Representando esse grupo, temos Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 41.Em sentido próximo, defendendo a fixação de critérios específicos para a realização da perícia,Humberto Theodoro Júnior, Curso..., v. III, p. 485.No sentido do texto, vejam-se Ementa 296 do ETRJECERJ: “Constitui questão de maiorcomplexidade e, portanto, fora do âmbito de incidência do art. 3º da Lei 9.100/1995), exigindo aprova pericial pelo sistema tradicional. Caracteriza-se como tal a verificação de eventual fraudeem medidor de consumo de eletricidade. Extinção do processo sem julgamento do mérito, nostermos do art. 51, inciso II, in fine, da Lei 9.099/1995”, Ementa 396 do ETRJECERJ: “A períciaque instrumentaliza o arbitramento é incompatível com o rito do Juizado Especial (Lei 9.099/1995,art. 35), daí a extinção do processo sem exame meritório, com arrimo no art. 51, II, da mesma lei,para viabilizar o conhecimento da questão em sede adequada”, “Em se tratando de períciacomplexa, envolvendo a definição do grau de incapacidade para o trabalho diante docomprometimento de uma das pernas, a par do dano estético, inaplicável é o disposto no art. 35,da Lei 9.099/1995, acarretando a incidência das normas do CPC” (TJSC, CC 11561-7-Blumenau,

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Rel. Des. Francisco Oliveira Filho, DJ 06.03.1997), “Complexidade proclamada pelo JuizadoEspecial. Havendo necessidade de perícia complexa, bem como inúmeras testemunhas a seremouvidas por precatórias, mostra--se adequado reconhecer a competência do juízo comum” (TJSC,CC 568, Rel. Des. Eder Graf, DJ 05.01.1994) e Ementa 387 do ETRJECERJ: “Perícia nãorealizada. Feito que comporta perícia de relevante complexidade. Inadmissibilidade de perícia degrande complexidade no JEC. Decisão reformada. Julgado extinto o processo, sem adentrar nomérito”.No STF, é pacífico o entendimento de que a análise sobre a complexidade da produção da prova ématéria infraconstitucional, não dando ensejo a recurso extraordinário. Nesse sentido, veja-se:“Direito do Consumidor e Processual Civil. Juizados Especiais Cíveis. Telefonia móvel e internet.Danos morais. Produção de prova técnica. Complexidade da matéria. Não ocorrência. Âmbitoinfraconstitucional do debate” (STF, 1ª Turma, ARE 828.127/SP, Rel. Min. Rosa Weber, j. em16.09.2014).Apenas para exemplificar, veja-se: “Competência. Juizados Especiais. Complexidade da causa.Esforços devem ser desenvolvidos de modo a ampliar-se a vitoriosa experiência brasileiraretratada nos Juizados Especiais. A complexidade suficiente a excluir a atuação de tais órgãos háde ser perquirida com parcimônia, levando-se em conta a definição constante de normaestritamente legal. Tal aspecto inexiste, quando se discute a subsistência de cláusula de contrato deadesão, sob o ângulo de ato jurídico perfeito e acabado, no que prevista a devolução de valorespagos por consorciado desistente e substituído, de forma nominal, ou seja, sem correçãomonetária” (STF, 2a Turma, REXT 175.161/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 15.12.1998).Op. cit., p. 48.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 187.Em sentido próximo, veja-se o Enunciado 35 do FONAJE: “Finda a instrução, não sãoobrigatórios os debates orais”.Nesse sentido, veja-se: “O Julgamento antecipado do mérito em sede de Juizados Especiais éperfeitamente viável e está em consonância com os princípios norteadores da Lei 9.099/95.Ocorre que, para o julgamento antecipado se aperfeiçoar, mister é que a audiência de conciliaçãose realize e, quedando-se inexitosa a composição, os reclamados apresentem defesa e, ainda, queas partes se manifestem pela desnecessidade da produção de provas, ou, que os demandados nãocompareçam na audiência de conciliação, com a consequente decretação de sua revelia” (TJPR, 1ªTR, MS 0000911-35.2015.8.16.9000, Rel. Juiz Aldemar Sternadt, j. em 07.07.2015).Nesse sentido, veja-se: “Julgamento antecipado da lide. Supressão da audiência de instrução ejulgamento. Nulidade relativa. Arguição do vício nas razões do recurso inominado. Procedimentoespecial adotado na Lei 9.099/1995 que, pelas peculiaridades características, não admite aredução a um modelo comum. Princípio da oralidade que no microssistema dos Juizados Especiaisemerge como dogma instransponível e não abre exceção para que o Juiz conheça diretamente alide, prolatando a sentença sem a designação da AIJ” (TJRJ, 2ª TR, RI 00141354320048190205,Rel. Juiz Andre Luiz Cidra, j. em 28.04.2005).Nesse sentido, José Carlos Van Cleef de Almeida Santos, Decisão interlocutória de mérito ecoisa julgada parcial, p. 449.

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Como será visto mais à frente, entendemos, minoritários, que o agravo de instrumento é cabívelnos Juizados Especiais.A posição amplamente majoritária afirma que a dispensa do relatório não fere a Constituição.Nesse sentido, veja-se: “Não há nulidade da sentença porque, no âmbito dos Juizados EspeciaisCíveis, o relatório pode ser dispensado, nos termos do art. 38 da Lei 9.099/1995. Não ocorreinconstitucionalidade da lei que faculta dispensa do relatório na sentença nos Juizados EspeciaisCíveis, porque não afronta o art. 98, inciso I, da Constituição Federal, ao prever procedimentooral e sumaríssimo” (TJDF, 2ª TR, RI 20050111468943, Rel. Juiz Fabio Eduardo Marques, j. em15.07.2008).Tem sido admitida a gravação da fundamentação da sentença ou do acórdão, quando proferidos deforma oral. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 46 do FONAJE: “A fundamentação da sentença oudo acórdão poderá ser feita oralmente, com gravação por qualquer meio, eletrônico ou digital,consignando-se apenas o dispositivo na ata”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 10.2 da CEJCA: “A expressão ‘mencionará’, constante doart. 38, da Lei 9.099/1995, significa que o Juiz deverá motivar sua decisão enfrentando, ainda quede maneira concisa, todas as questões de fato e de direito levantadas pelas partes”, Ementa 79 doETRJECERJ: “Sentença imotivada. Nulidade, por vulneração da norma decorrente do disposto noart. 93, IX, da Constituição, da sentença que afasta a validez da prova mediante a simplesafirmação de que a testemunha não merece fé. Anulação do processo, a partir do ato decisório,com determinação de prolação de outra sentença, ficando ao alvedrio do sentenciante o exame daconveniência de nova produção de prova oral”, Ementa 288 do ETRJECERJ: “Sentença. Ausênciade fundamentação. Artigo 458, II, CPC. Nulidade. I – O sistema dos Juizados Especiais dispensa ojulgador de apresentar relatório do processo, o que não implica em exonerá-lo de fundamentar suadecisão. II – A fundamentação deve levar em conta todos os argumentos de fato e de direito trazidopelas partes, acolhendo-os ou rechaçando-os através de análise das provas e dos princípios legaisinerentes a controvérsia. III – A desconsideração dos requisitos do artigo 458, II, do CPC enseja adeclaração de nulidade da sentença e retorno dos autos do Juízo monocrático para que decida alide como lhe aprouver”.Nesse sentido, Antonio Veloso Peleja Júnior, O procedimento dos juizados especiais naperspectiva principiológica do Novo Código de Processo Civil, p. 65; Augusto Vinícius Fonsecae Silva, Repercussão dos arts. 11 e 489, § 1º, do Novo Código de Processo Civil nas Sentençasdos Juizados Especiais, p. 509; e Nayron Divino Toledo Malheiros, A Aplicação integral do art.489, § 1º, do NCPC no sistema dos Juizados Especiais Cíveis. Veja-se, ainda, o Enunciado 309do FPPC: “O disposto no § 1º do art. 489 do CPC é aplicável no âmbito dos Juizados Especiais”.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Novo CPC: Fundamentos e Sistematização, p. 302.Nesse sentido, veja-se: “É certo que o Juiz deve decidir de acordo com a sua consciência jurídica.Mas não menos certo é que o Juiz deve ter consciência de que, no STJ a decisão não lhe compete,mas sim ao próprio STJ. E com isso ter consciência da importância da Jurisprudência e dasdecisões prolatadas pela Corte Uniformizadora da Jurisprudência Nacional, para a segurança

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jurídica, como forma de pacificar os entendimentos jurídicos divergentes e devolver aestabilidade jurídica ao direito positivo, atingindo desta forma a segurança jurídica. Só por isso,para manter a segurança jurídica baluarte do Estado Democrático de Direito, que ressalvo meuentendimento pessoal, e acato o posicionamento predominante firmado pela Corte Uniformizadorada Jurisprudência nacional quanto ao tema” (TJRJ, 1ª TR, RI 00009862020118190080, Rel. JuizFabio Ribeiro Porto, j. em 01.02.2012).Nesse sentido, entendendo que a ineficácia da sentença ocorre de pleno direito, AlexandreCâmara, Juizados..., op. cit., p. 127.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 97 do FONAJE: “A multa prevista no art. 523, § 1º, doCPC/2015 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, ainda que o valor desta, somado ao daexecução, ultrapasse o limite de alçada; a segunda parte do referido dispositivo não é aplicável,sendo, portanto, indevidos honorários advocatícios de dez por cento”.Nesse sentido, veja-se: “Valor da multa calculado em 40 salários mínimos, na forma do julgado, oqual deve sofrer atualização pela tabela do TJSP e incidência de juros moratórios até o efetivopagamento. Verbas que não estão sujeitas à limitação de alçada dos Juizados Especiais Cíveis porterem origem na inadimplência do principal” (TJSP, 4ª TR, RI 00166490220128260008, Rel. JuizPaulo Guilherme Toledo, j. em 09.04.2014).Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 186. Vejam-se, ainda, o Enunciado 10.4.1 da CEJCA:“O Juiz que realizar a Audiência de Instrução e Julgamento e não proferir sentença de imediato,deverá fixar na assentada, a data da leitura de sentença”, o Enunciado 95 do FONAJE: “Finda aaudiência de instrução, conduzida por Juiz Leigo, deverá ser apresentada a proposta de sentençaao Juiz Togado em até dez dias, intimadas as partes no próprio termo da audiência para a data daleitura da sentença” e a Proposição 11 do 2º EJJEEP: “Quando o Juiz não prolatar a sentença naaudiência deverá designar dia e hora para leitura e publicação da mesma”.Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior, Curso..., op. cit., vol. III, p. 483.Parágrafo único do art. 271 do CPC de 1939: “Se não se julgar habilitado a decidir a causa,designará, desde logo, outra audiência, que se realizará dentro de dez (10) dias, a fim de publicara sentença”.Nesse sentido, Leonardo Greco, Os juizados especiais como tutela diferenciada, p. 44.Nesse sentido, Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 115.

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PARTE IIIDa tutela executiva

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1O MODELO EXECUTIVO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

Quando foi editada a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei 7.244/1984), não haviaoriginalmente previsão nem para a execução de títulos extrajudiciais, nem para a execução dos seuspróprios julgados.1 Com isso, o credor que desejasse executar uma sentença proferida nos Juizadosde Pequenas Causas teria que fazê-lo perante o juízo ordinário. Somente em 1993 foi alterado o textolegal, que passou a prever que a execução da sentença seria feita no próprio Juizado, mas com oprocedimento do CPC.2

Com o advento da Lei 9.099/1995, esse quadro mudou sensivelmente, pois os JuizadosEspeciais foram dotados não apenas de competência executiva (art. 3º, § 1º), mas também de umregramento específico para executar seus julgados (art. 52) e de um procedimento executivo paracobrar os títulos extrajudiciais até 40 salários mínimos (art. 53).

Dentre as inovações presentes nas regras executivas, sem sombra de dúvida, a que mais chamoua atenção foi a integração das fases cognitiva e executiva. Em outras palavras, a Lei 9.099/1995adotou o chamado sincretismo processual, permitindo a execução do título executivo judicial fosserealizada em caráter incidente ao processo em que ela foi proferida (art. 52, IV), por meio de umprocedimento regido pelo CPC, com as alterações previstas na Lei. Outra novidade relevante contidano texto da Lei 9.099/1995 foi a previsão de que os embargos à execução fossem ventilados comouma modalidade incidental de defesa na fase de execução (art. 52, IX). A Lei dos Juizados Especiaistambém foi pioneira na estruturação tripartite da “tutela específica”, abarcando não apenas asobrigações de fazer e não fazer, mas também as obrigações de entregar, na previsão da venda porparticular do bem penhorado (art. 52, VII) e do pagamento parcelado da dívida.

Apesar desses acertos, que acabaram sendo incorporados ao regramento processual comum,3 osistema executivo dos Juizados Especiais também merece algumas críticas agudas. Em primeirolugar, a execução deveria ter sido melhor e mais extensamente regulada, para criar um modelo maisafinado com os princípios fundamentais do Sistema. Na prática, a falta de regras especiais faz comque a execução nos Juizados Especiais seja basicamente aquela mesma prevista no CPC, compequenas alterações. Com isso, quase não há espaço para a oralidade e a informalidade, que são asgrandes marcas da etapa de conhecimento do procedimento.

O maior defeito do modelo implementado pela Lei 9.099/1995, entretanto, é o procedimentoexecutivo previsto no art. 53, voltado para satisfazer as obrigações contidas nos títulos extrajudiciaiscom valor de até 40 salários mínimos. Esse dispositivo prevê a realização de uma audiência de

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conciliação, a ser designada após a efetivação da penhora, em que o executado poderá oferecerembargos à execução, caso não celebre um acordo. Trata-se de um rito executivo único no mundo,pois impõe a quem tem um título executivo a participação numa audiência de conciliação, com apenhora já efetivada. Desse modo, a defesa do executado fica vinculada à constituição da penhora eganha, por via reflexa, efeito suspensivo, até a audiência de conciliação, pois não poderão serpraticados atos executivos neste período.

O rito da Lei 9.099/1995, portanto, é mais moroso e extenso do que aquele estabelecido noCPC para a execução de títulos extrajudiciais (arts. 824 a 909). O resultado é que alguns juízespassaram a ignorar as determinações contidas no art. 53, para aplicar exclusivamente o rito executivodo CPC. Apesar de esse entendimento poder ser construído sobre uma ótica constitucional,4 não nosparece que o procedimento executivo previsto no art. 53 da Lei seja “suficientemente ruim” para serconsiderado inconstitucional. Na nossa visão, a ineficácia do procedimento, para levar à suainconstitucionalidade, deve ser tal ordem que comprometa a prestação da tutela jurisdicional. Alémdisso, o “defeito” do rito é decorrente da busca pela composição do conflito entre as partes, o que éda essência dos Juizados Especiais.

De qualquer forma, importante lembrar que a execução se desenvolve sobre o princípio dalegalidade estrita (devido processo legal executivo), por conta da gravidade que os atosexpropriatórios têm sobre o patrimônio das pessoas. Por isso, entendemos que a única maneira deenfrentar a questão, de forma técnica, é por meio de uma modificação legislativa.5 Com efeito, oideal seria reformular o art. 53, traçando regras especiais, adequadas à nova realidade implantada noCPC, mas que pudessem tornar o rito executivo dos Juizados mais informal, oral e célere. Enquantotais alterações não são efetivadas, o caminho único a ser seguido é aplicar as regras previstas no art.53 da Lei 9.099/1995.6

O art. 40 da Lei 7.244/1984 tinha originalmente a seguinte redação: “A execução da sentença seráprocessada no Juízo ordinário competente”.O art. 40 da Lei 7.244/1984 teve a sua redação alterada pela Lei 8.640/1993, passando aestabelecer o seguinte: “A execução da sentença será processada no juízo competente para oprocesso do conhecimento, aplicando-se as normas do Código de Processo Civil”.De fato, inegável reconhecer que as inovações executivas previstas na Lei 9.099/1995 foramprecursoras das regras que foram implantadas no CPC/1973 pelas Leis 10.444/2002, 11.232/2005e 11.382/2006. Essas mesmas regras foram mantidas e aperfeiçoadas no CPC/2015.Como bem resume Fredie Didier Jr., Curso..., vol. I, p. 73, o processo, para ser constitucional, temque ser eficiente. Assim, se um processo é ineficiente, ele perde a sua base constitucional e, porconseguinte, deixa de ter validade.A percepção da necessidade de reformar a tutela executiva nos Juizados Especiais surgiu logo

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após a entrada em vigor da Lei 9.099/1995. Já em 1997, várias propostas para aprimorar osistema executivo dos Juizados Especiais foram apresentadas por Adroaldo Furtado Fabrício aoColégio de Presidentes de Tribunais de Justiça do Brasil. Parte dessas propostas, inclusive, foiacolhida pelo Projeto de Lei da Câmara 4.348/1998, de autoria do Deputado Federal Ibrahim Abi-Ackel. Esse projeto, no entanto, foi arquivado em 31.01.2003.O entendimento amplamente majoritário é que as regras previstas no art. 53 da Lei 9.099/1995devem ser aplicadas. Nesse sentido, veja-se: “Os Juizados Especiais Cíveis têm um procedimentopróprio de execução, sendo subsidiária a aplicação das normas do CPC” (TJDF, 1ª TR, RI0014512-27.2011.807.0003, Rel. Juiz Demetrius Cavalcanti, j. em 10.04.2012).

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2A FASE EXECUTIVA DO PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO

REGRAS GERAIS SOBRE A FASE EXECUTIVA

A natureza incidental da execução

Como dito, a Lei 9.099/1995, antecipando-se às reformas do CPC/1973 e quebrando umatradição jurídica secular,1 transformou a execução da decisão judicial numa fase do mesmo processoem que foi instaurada a atividade cognitiva. A principal regra a respaldar essa conclusão reside noinciso IV do art. 52 da Lei 9.099/1995, que dispensa a realização de uma nova citação paradesencadear a execução.2 De fato, a citação é elemento essencial para a formação de uma novarelação jurídica processual e, sem ela, não há como desvincular a execução do processo em que sedesenvolveu a fase cognitiva do procedimento sumaríssimo. Outro indicativo dessa construção estáno inciso V do mesmo artigo, que fala que a multa poderá ser arbitrada na sentença ou na “fase deexecução”.

Por certo, existe uma única situação nos Juizados Especiais em que a instauração de uma novarelação jurídico-processual executiva, fundada em título judicial, é possível: a execução dacomposição civil celebrada nos Juizados Especiais Criminais (art. 74 da Lei 9.099/1995).3 Foradessa hipótese, entretanto, todas as decisões proferidas nos Juizados Especiais são executadasincidentalmente, de forma sincrética.

As regras executivas da Lei 9.099/1995

Como anunciado pelo caput do art. 52, a Lei 9.099/1995 não criou um rito próprio para aexecução de seus julgados, mas apenas estabeleceu regras especiais para serem aplicadas aosprocedimentos executivos do CPC. Assim, a execução nos Juizados Especiais deve seguir as mesmasetapas previstas no CPC, conforme a natureza da obrigação a ser satisfeita (art. 513): a) a execuçãoseguirá os ditames previstos nos arts. 536 e seguintes do CPC, chamada de “tutela específica”, se aobrigação for mandamental (fazer, não fazer ou dar); b) a execução seguirá os regulamentos previstosnos arts. 515 e seguintes do CPC, se for uma obrigação pecuniária (pagar).

A legitimidade

O legitimado para propor a execução da decisão judicial é aquele que restou afirmado comotitular de uma obrigação imposta judicialmente (art. 778 do CPC). Importante lembrar, nesse passo,

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2.1.4

que, por ser o procedimento dúplice (art. 31), qualquer das partes pode ser aquinhoada com umadecisão favorável, por meio dos seus respectivos pedidos. Por outro lado, ainda que não tenham sidoparte da demanda, têm legitimidade para executar seus honorários perante os Juizados Especiais oadvogado, a sociedade de advogados ou o órgão da Defensoria Pública que nela atuaram.4 Isso épossível porque, como já visto, a execução fundada em título judicial não é, via de regra, processoautônomo, mas fase do processo de conhecimento, logo, não haverá instauração de um processopropriamente dito, a ensejar os impedimentos previstos no art. 8º da Lei.

Como foi analisado anteriormente, o espólio, os herdeiros ou os sucessores do credor podemprosseguir com a execução sempre que, por morte deste, lhes for transmitido o direito resultante dotítulo executivo (art. 51, V e VI). Também não há óbice à promoção da execução pelo cessionário ousub-rogado.

No polo passivo da execução, além do devedor, podem figurar também o espólio, os herdeirosou os sucessores do devedor, bem como o novo devedor, que assumiu, com o consentimento docredor, a obrigação resultante do título executivo, e o garantidor (art. 779 do CPC). Em todos essescasos deverão ser observadas as restrições legais pertinentes previstas no art. 8º da Lei.

A competência

Nos Juizados Especiais, a competência para o processo de execução por título judicial érestrita aos seus próprios julgados (títulos judiciais homogêneos) e também àqueles proferidos nosJuizados Especiais Criminais (art. 74). Por outro lado, mesmo que a sentença tenha valor inferior a40 salários mínimos, se ela foi proferida no juízo ordinário, não poderá, em hipótese alguma, serexecutada nos Juizados.5 Nem mesmo as sentenças proferidas pelos Juizados de Pequenas Causaspoderiam ter sido executadas no sistema da Lei 9.099/1995, por falta de previsão legal, embora issotenha ocorrido inúmeras vezes.6 Essas execuções deveriam ter sido encaminhadas aos juízosordinários, já que são eles, na lacuna da lei, que recebem os processos oriundos de órgãos extintos.

Caso sobrevenha algum dos impedimentos previstos no art. 8º, que inviabilizem oprosseguimento da execução perante os Juizados Especiais (art. 51), o credor poderá requerer aextração de uma carta de execução de sentença, aplicando, no que couber, as regras previstas no art.522, parágrafo único, do CPC, para promover a execução perante o juízo ordinário competente, nostermos do art. 516 do CPC.

Por outro turno, não vemos obstáculo à aplicação, nos Juizados Especiais, da regra contida noparágrafo único do art. 516 do CPC, que permite que o exequente opte por executar a decisão peranteo Juizado onde ela foi proferida, onde tenha domicílio o executado, onde se encontrem os benssujeitos à execução ou onde deva ser executada a obrigação de fazer ou não fazer. Nesses casos, afaculdade pode ser exercida somente em relação às sentenças, pois as decisões interlocutóriasdeverão ser executadas sempre no Juizado que as proferiu. Outrossim, o deslocamento mencionado

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2.1.5

só pode ser feito se o juízo eleito for também um Juizado Especial Cível Estadual, em razão dascaracterísticas peculiares do procedimento.

Por fim, oportuno rememorar que a competência para a execução judicial tem naturezafuncional, e, portanto, sua violação acarreta em nulidade absoluta (art. 62 do CPC).

O interesse de agir

À luz das novas regras inseridas no CPC de 2015, podemos afirmar que o interesse depromover a execução de uma decisão proferida nos Juizados Especiais decorre da existência de umdispositivo que reconheça a exigibilidade de uma obrigação de pagar, fazer, não fazer ou entregar.Nesse sentido, importante sublinhar que o CPC/2015 substituiu o texto anterior do CPC/1973, quedizia que era título judicial a “sentença proferida no processo civil que reconheça a existência deobrigação” (art. 475-N, I), pela redação do art. 515, I, que fala que é título judicial a “decisãoproferida no processo civil que reconheça a exigibilidade de obrigação”. Trata-se de uma mudançasutil, porém muito significativa, já que a exigibilidade está relacionada com uma pretensão. Assim,passamos a entender,7 minoritários,8 que somente aquele que deduziu uma pretensão no processo éque pode executar as obrigações nele reconhecidas. Nessa linha de raciocínio, se o autor ajuíza umpedido de declaração de inexistência de dívida e este é julgado improcedente, apesar de declarar aexistência da dívida, o réu somente poderá executar a sentença se formulou pedido contraposto nessesentido. É preciso, portanto, que a decisão diga que uma pessoa tem que pagar algo para outra, paraque assim esteja presente o requisito da exigibilidade. E isso só é possível se o interessado formulouuma pretensão em juízo; caso contrário, essa imposição é nula (extra petita).

Apesar de a Lei 9.099/1995 falar apenas em sentença (art. 52), por certo, a execução pode terlugar também em relação às decisões interlocutórias eventualmente proferidas no âmbito dosJuizados Especiais.9 Um exemplo dessa hipótese ocorre quando o juiz defere, no curso doprocedimento, uma tutela antecipada. Note-se que a execução da decisão interlocutória normalmenteserá feita em caráter provisório (art. 297, parágrafo único, do CPC), mas quando seu conteúdoretratar um provimento de natureza exauriente, como ocorre em relação ao julgamento antecipadoparcial do mérito (art. 356 do CPC), a execução será definitiva.

Necessário frisar que, se a obrigação imposta for alternativa e a escolha couber ao credor, eledeverá indicar qual o objeto da sua pretensão, ao apresentar a execução. Se a escolha couber aodevedor, entretanto, este será intimado para exercer a opção e realizar a prestação no prazo de 10dias, se outro prazo não lhe foi determinado na lei, no contrato ou na decisão. Caso não o faça, aopção será transferida para o credor (art. 800 do CPC). Por outro lado, como bem determina o art.514 do CPC, quando o juiz decidir relação jurídica sujeita a condição ou termo, o credor não poderáexecutar a decisão sem provar que se realizou a condição ou que ocorreu o termo.

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2.1.6

2.1.7

2.1.8

A liquidez da obrigação reconhecida na decisão

O inciso I do art. 52, repetindo o parágrafo único do art. 38, estabelece que nos Juizados asentença deve ser necessariamente líquida. Acresce, ainda, que o valor da condenação deve serfixado em BTN10 ou índice equivalente. Na prática, o índice que tem sido usado é a UFIR,11 nãoobstante também se defenda a utilização do salário mínimo, do INPC ou da caderneta de poupança.12

É preciso alertar que a sentença que não traz alguma forma de conversão é passível, em tese, deembargos de declaração, por omissão (arts. 48 a 50).

Certamente, o objetivo do legislador ao redigir o inciso I do art. 52 foi evitar a existência deuma fase de liquidação de sentença ou discussões sobre a forma como deveria ser calculada acorreção monetária incidente sobre a obrigação reconhecida na decisão, o que não significa que aliquidação incidente não possa acontecer. De fato, a Lei regulamenta a liquidação incidente nahipótese de ser necessária a conversão de uma obrigação mandamental em perdas e danos (art. 52, V,segunda parte). Nesse caso, e nas demais situações de iliquidez (por exemplo, arts. 81, § 3º, 302,parágrafo único, e 356, § 2º, todos do CPC), o credor deverá requerer a liquidação incidente porsimples petição, indicando a estimativa do valor da obrigação, se esse valor não constar do contratoou do próprio título executivo. O juiz, então, depois de ouvir o devedor, deverá fixar o valor porarbitramento, nos termos do art. 6º. A mesma solução será aplicada, por exemplo, se uma sentençailíquida indevidamente transitar em julgado.

A elaboração de cálculos por servidor judicial

A Lei 8.898/1994 revogou do CPC/1973 a regra que previa a liquidação da sentença porcálculo do contador (art. 604 na sua redação original), redirecionando para o credor o ônus deelaborar e apresentar essa conta no pedido executivo. Essa regra atualmente encontra-se prevista noart. 509, § 2º, do CPC. A Lei 9.099/1995, entretanto, diz que os cálculos de conversão de índices, dehonorários, juros e outras parcelas deverão ser feitos por “servidor judicial” (art. 52, II). Apesar dea regra não fazer distinção, a doutrina,13 seguida da jurisprudência,14 vem reduzindo o alcance dessedispositivo.15 Assim, tem--se entendido que o juiz pode deferir a remessa dos autos ao contabilistado juízo, para elaboração de cálculos, quando o credor estiver atuando sem advogado ou quandoquiser verificar a sua correção (art. 524, § 2º, do CPC). Caso o credor tenha advogado, entretanto,caberá a ele apresentar a planilha da dívida, na forma do art. 509, § 2º, do CPC.

A intimação para cumprimento da decisão

Se uma obrigação mandamental (fazer, não fazer ou entregar) for imposta por meio de umadecisão interlocutória a uma das partes da demanda, ela terá que a cumprir no momento em que forintimada, se não for fixado um prazo para o seu atendimento (art. 498 do CPC). Isso porque taisdecisões não estão submetidas a recurso com efeito suspensivo. Assim, já nascem eficazes e

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vinculantes. Por outro prisma, tendo sido a obrigação mandamental estabelecida na sentença, a parteterá que a cumprir tão logo a decisão se torne efetiva, seja com o seu trânsito em julgado ou com orecebimento de recurso sem efeito suspensivo (art. 43).

Importante lembrar que o CPC/2015 se afastou do entendimento anteriormente consolidado nadoutrina16 e jurisprudência17 de que o cumprimento de uma obrigação mandamental dependia darealização de uma intimação pessoal do devedor, especialmente voltada para esse fim. De fato, o art.513, § 2º, I, do CPC prevê que o devedor será intimado para cumprir a decisão “pelo Diário daJustiça, na pessoa de seu advogado constituído nos autos”, de modo que a mesma lógica deve seraplicada aos Juizados Especiais. Por certo, se o devedor não tiver advogado constituído nos autos oufor patrocinado pela Defensoria Pública (art. 513, II, do CPC), deverá ser intimado pessoalmentepara o cumprimento da obrigação mandamental.

No que toca às obrigações pecuniárias, como se pode perceber da leitura do art. 52, III, da Lei9.099/1995, não seria necessária uma nova intimação para que começasse a fluir o prazo de 15 diaspara cumprimento do comando judicial (art. 523 do CPC). Bastaria que a decisão se tornasse efetivapara que o devedor tivesse o dever legal de pagar o valor estabelecido. Isso porque a parte final doart. 52, III, diz que, quando da intimação da decisão, o devedor será instado a cumpri-la, “advertidodos efeitos do seu descumprimento”.18 Não obstante, com a entrada em vigor do CPC/2015, oentendimento prevalente tem sido que mesmo nos Juizados Especiais também será preciso realizaruma nova intimação do devedor, para deflagrar o prazo de 15 dias para cumprimento da obrigação.19

Isso porque o art. 523 do CPC, encampando a decisão proferida em 7 de abril de 2010 pela CorteEspecial do STJ (REsp 940.274/MS, Rel. Min. João Otávio de Noronha), definiu ser necessário queos autos retornem ao juízo de origem para intimação do devedor, por meio do seu advogado oupessoalmente, quando não tiver advogado constituído nos autos ou for patrocinado pela DefensoriaPública (art. 513, II, do CPC), a partir da qual se iniciará o prazo de 15 dias para pagamento daobrigação reconhecida na decisão, sob pena de multa. Importante salientar, ainda, que a multa de10% do valor da obrigação prevista no art. 523, § 1º, do CPC será devida também na hipótese deexecução provisória. Nesse sentido, o CPC/2015 não adotou a orientação prevalente no STJ durantea vigência do CPC/197320 e estabeleceu essa possibilidade expressamente no art. 520, § 2º.

Para evitar surpresas e discussões, o ideal é que o julgador insira na decisão um texto paraesclarecer o devedor de que o descumprimento do comando imposto, tratando-se de uma obrigaçãomandamental, está sujeito a uma multa periódica, ou, na hipótese de uma obrigação de pagar, a umamulta fixa de 10% do valor da obrigação (art. 523, § 1º, do CPC). Conveniente, também, que alerte odevedor de que o pagamento parcial da obrigação pecuniária no prazo de 15 dias faz com que amulta de 10% incida apenas sobre o restante (art. 523, § 2º, do CPC).

Registre-se, por fim, que, se o devedor quiser cumprir voluntariamente a obrigação antes daincidência da multa, poderá efetuar o pagamento diretamente ao credor, juntando aos autos, emseguida, o correspondente recibo de quitação, ou promover o depósito judicial do valor que entende

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2.1.9

2.1.10

devido, acompanhado de memória de cálculo (art. 526 do CPC).21

A execução provisória

Quando trata da execução da sentença (rectus, decisão), nos incisos III e IV do art. 52, a Lei9.099/1995 menciona, expressamente, o trânsito em julgado. Esses dispositivos, analisados fora docontexto geral, poderiam levar o intérprete a concluir que não seria possível executarprovisoriamente as decisões proferidas nos Juizados Especiais. Na realidade, resta evidente que olegislador se equivocou ao mencionar o trânsito em julgado nos comandos citados. É impensável quea parte tenha que aguardar o trânsito em julgado para executar uma decisão interlocutória, uma tutelaantecipada, por exemplo, ou uma sentença sujeita a recurso sem efeito suspensivo.

De fato, o legislador deixou claro que a interposição do “recurso inominado” contra a sentençaproduzirá, em regra, somente o efeito devolutivo, salvo se o juiz entender necessário atribuir-lhetambém o efeito suspensivo (art. 43). A principal razão dessa medida, certamente, foi permitir aexecução provisória da sentença, aos moldes do que se vê no art. 1.012, § 2º, do CPC. Ademais,impedir a execução provisória seria contrário aos princípios fundamentais dos Juizados Especiais(art. 2º) e à própria sistemática prevista pelo CPC, tornando-os menos eficientes. Assim, a melhoralternativa é considerar que a Lei disse menos do que deveria dizer, e incluir, nas hipóteses decabimento da execução, o descumprimento da obrigação reconhecida judicialmente e submetida arecurso sem efeito suspensivo, nos termos do arts. 520 a 522 do CPC.22

A execução provisória também será cabível quando se tratar de uma decisão interlocutória queimponha à parte uma obrigação pecuniária ou mandamental. Pense-se, por exemplo, numa decisãoque defere um pedido de tutela de evidência. Nesse caso, a execução desse provimento se dará emcaráter provisório, nos termos do art. 297, parágrafo único, do CPC.

Na execução provisória, se a decisão executada for modificada pelo recurso, no todo ou emparte, o credor terá que ressarcir ao devedor os danos que este sofreu (arts. 520, I, e 776 do CPC).Trata-se de modalidade objetiva de responsabilidade civil processual que pode ser exercida nosmesmos autos, se o executado não incidir nas limitações previstas pelo art. 8º da Lei 9.099/1995, emvalor fixado de plano por arbitramento judicial, por aplicação analógica do art. 52, V, da Lei9.099/1995, ainda que superior ao teto de 40 salários mínimos.23 Por certo, se a apuração do danodepender da produção de prova complexa, a questão terá que ser levada ao juízo ordinário, paraliquidação e execução, nos termos do art. 515, § 1º, do CPC.

Necessário frisar que a execução provisória, usualmente, dependerá do caucionamento parapoder ser levada a termo (art. 520, IV, do CPC). Tal exigência, entretanto, poderá ser dispensada, nashipóteses previstas no art. 521 do CPC.

O poder geral de efetivação

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2.1.11

2.1.12

2.2

a)b)c)d)e)

O poder geral de efetivação representa um instrumento de flexibilização procedimental. Trata-se de uma evolução do poder geral de cautela, que já existia na vigência do CPC/1973, mas queagora abrange não apenas as tutelas cautelares, mas também as tutelas satisfativas. O poder geral deefetivação permite que a satisfação das obrigações relativas a um processo possa ser obtida atravésde meios típicos e atípicos, diante do caso concreto, flexibilizar os modelos executivos (art. 139, IV,do CPC). Por certo, a utilização desses meios deve guardar a proporcionalidade e a adequação, paraque a busca pela efetivação das obrigações não acabe por comprometer a dignidade da pessoa dodevedor.24

A desistência da execução

Da mesma forma que no sistema do CPC (art. 775), nos Juizados Especiais o exequente tem afaculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas. A desistência daexecução, por sinal, somente ficará vinculada à concordância do executado que tenha oferecidoembargos à execução alegando questões de ordem material (art. 775, parágrafo único). Aceita adesistência, o procedimento será encerrado sem resolução do mérito (art. 485, VIII, do CPC),cancelando-se os atos de apreensão eventualmente praticados.

A impossibilidade de localização do executado ou de bens penhoráveis

No sistema do CPC, se o executado não é localizado para ser citado pessoalmente, faz-se oarresto dos seus bens que forem encontrados e é determinada a sua citação por edital (art. 830 doCPC). Se não são encontrados bens penhoráveis, o exequente pode pedir a suspensão da execução(art. 921, III, do CPC). Nos Juizados Especiais, se não for possível localizar o devedor ou seus benspenhoráveis, encerra-se a execução sem resolução do mérito (art. 53, § 4º, c/c art. 51, caput).25

Nesse caso, o credor terá que pleitear a devolução dos documentos que instruíram a inicial edemandar pela satisfação do seu crédito no juízo comum.

A EXECUÇÃO PECUNIÁRIA

A estrutura executiva do procedimento vai depender do tipo de obrigação que se desejacumprir. Em se tratando de obrigação pecuniária (pagar), a fase de execução do procedimentosumaríssimo pode ser dividida em cinco atividades prioritárias:26

a postulação da execução;a penhora e avaliação;a defesa do executado;a expropriação do bem apreendido;o pagamento.

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2.2.1

2.2.2

A postulação da execução

Conforme estabelece o art. 52, a propositura da execução nos Juizados Especiais pode serescrita ou oral, sendo que a forma oral é reservada especificamente para as partes desacompanhadasde advogado.27 Nesse passo, importante frisar que, não obstante a Lei determine ao juiz que inste odevedor a cumprir a sentença (art. 52, III, da Lei 9.099/1995), isso não significa que a execuçãopossa ser iniciada de ofício.28 Consoante, o juízo deve aguardar a provocação da parte interessada(art. 513, § 1º, do CPC) antes de adotar as medidas executivas voltadas a cumprir o comando contidona decisão, tendo em vista não apenas o princípio dispositivo que rege o processo de execução, mastambém para não executar quem já tenha, por exemplo, cumprido voluntariamente a obrigação.

A Lei 9.099/1995 não estabeleceu os requisitos do pedido executivo. Assim, por aplicaçãosubsidiária do CPC (art. 524), podemos dizer que essa petição deve conter: a) o valor discriminadoque se pretende receber ou o pedido de remessa dos autos ao contabilista do Juízo, quando a parteestiver desacompanhada de advogado (art. 52, II); b) a individualização da pessoa do devedor; c) opedido de intimação para pagamento em 15 dias (art. 523 do CPC); d) o pedido de penhora eavaliação, caso não ocorra o pagamento no prazo assinado. Caso o pedido executivo não sejaadmitido em sua totalidade, o caminho para impugnar essa decisão será interpor agravo deinstrumento para o Conselho Recursal;29 sendo o pedido inteiramente rechaçado, o interessadodeverá apresentar “recurso inominado” para atacar essa sentença.

Após a admissão do pedido executivo, o próximo passo é a realização da intimação do devedorpara, em 15 dias, pagar o débito, com os acréscimos legais, se houver (art. 523 do CPC). Nãoocorrendo o pagamento no prazo assinalado, o débito será acrescido de multa de 10% e expedido omandado de penhora e avaliação (art. 523, §§ 1º e 3º, do CPC). Nesse passo, necessário registrarque, no âmbito dos Juizados Especiais, como já sublinhado, não haverá inclusão dos honoráriosadvocatícios ao pedido executivo (art. 54 da Lei 9.099/1995).

Antes mesmo de ser intimado, pode o devedor comparecer em juízo e oferecer o pagamento dovalor que entende devido, acompanhado de memória discriminada do cálculo (art. 526 do CPC).Nesse caso, ou na hipótese de pagamento tempestivo feito após a intimação executiva, o credor seráouvido e poderá impugnar o depósito, levantando a parcela incontroversa. Se o juiz concluir pelainsuficiência do depósito, aplicará a multa de 10% sobre a diferença faltante e determinará arealização da penhora.

A penhora e a avaliação

A Lei 9.099/1995 não dedica uma linha sequer à penhora, o instituto mais importante e maisconturbado da fase executiva. Assim, diante da falta de regras específicas, a penhora segue osdispositivos do CPC.30 No pedido de execução, poderá o interessado, desde logo, indicar os bens aserem penhorados (art. 524, VII, do CPC), observando preferencialmente o rol do art. 835 do CPC. A

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penhora on-line, por exemplo, pode ser requerida de plano pelo exequente, mas não pode serdeferida de ofício (art. 854 do CPC).31 Se forem bloqueados valores por meio eletrônico, deverá serlavrado o respectivo termo de penhora (art. 838 do CPC)32 para intimação do executado. Feita aintimação da penhora e da avaliação, começa a correr o prazo de 10 dias para que o executadorequeira a substituição da penhora (arts. 847 e 848 do CPC). O prazo de 15 dias para o oferecimentoda impugnação executiva flui, independentemente de intimação, do término do prazo paracumprimento da obrigação (art. 525 do CPC).33

Se o exequente não tiver condições de indicar bens para serem penhorados, poderá requererque o oficial de justiça, munido do mandado de execução, proceda à penhora e avaliação dos bensque encontrar em nome do executado, cuja intimação ocorrerá pessoalmente, se possível, no mesmoato, ou recairá na pessoa de seu advogado, ou, na falta deste, do seu representante legal.34 Aavaliação, em regra, só não ocorrerá no mesmo momento da apreensão se o oficial de justiça nãotiver os conhecimentos especializados para tanto, hipótese na qual o juiz, de imediato, nomearáavaliador, assinando-lhe breve prazo para a entrega do laudo (art. 870, parágrafo único, do CPC).

Se a penhora e a avaliação forem feitas dentro do prazo para oferecimento dos embargos àexecução, ambas podem ser impugnadas por meio desse instrumento (art. 52, IX, da Lei 9.099/1995).Se, no entanto, essas medidas forem realizadas após o oferecimento dos embargos executivos, airresignação poderá ser apresentada por simples petição nos autos, no prazo de 15 dias, contado dacomprovada ciência do fato ou da intimação do ato, nos termos dos art. 525, § 11, do CPC.

Note-se que existem decisões entendendo que, se o executado se mudou do endereço informadonos autos, não sendo possível localizá-lo, a fase executiva deverá ser encerrada e extraída carta deexecução de sentença, para que o exequente possa, se quiser, levar a execução ao juízo ordinário, poraplicação analógica do § 4º do art. 53 da Lei. Com o devido respeito, tal colocação não é adequada.Com efeito, o art. 19, § 2º, da Lei 9.099/1995, em sintonia com o art. 274, parágrafo único, do CPC,estabelece que “as partes comunicarão ao juízo as mudanças de endereço ocorridas no curso doprocesso, reputando-se eficazes as intimações enviadas ao local anteriormente indicado, na ausênciada comunicação”. Logo, se o executado não for localizado, isso não gera qualquer óbice aoandamento regular do processo, desde que ele tenha sido integrado ao processo na fase cognitiva.Nesse caso, havendo bens penhoráveis, a execução pode ser levada a termo, com as intimaçõessendo feitas no seu endereço original do executado, informado nos autos. Não será possível,entretanto, a realização do arresto de bens que, por prever a comunicação editalícia (art. 830, § 2º,do CPC), se apresenta como incompatível com procedimento especial (art. 18, § 2º).35

Por fim, importante notar que antes mesmo da edição do CPC/2015, a jurisprudência já vinhaadmitindo, mediante requerimento do exequente, a expedição de certidão da dívida para fins deinscrição junto aos cadastros de maus pagadores.36 Essa orientação agora encontra respaldo na regraprevista no art. 782, § 3º, do CPC, e independe da existência ou não de bens penhoráveis. Por outrolado, o exequente pode, desde a propositura da execução, obter certidão comprobatória do

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2.2.3

2.2.3.1

ajuizamento da execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação noregistro de imóveis, registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora (art. 828 doCPC).

A defesa do executado

Os embargos à execução

Ao tratar da defesa do executado, o art. 52, IX, da Lei 9.099/1995 elencou as matérias quepoderiam ser discutidas “nos autos da execução”, por meio dos “embargos”. Na época em que a Leifoi editada, a forma preferencial de defesa do executado com base num título executivo judicial erafeita por meio de uma ação chamada de “embargos à execução” (redação original do art. 741 doCPC/1973). Depois da Reforma do CPC promovida pela Lei 11.232/2005, entretanto, a resistênciado executado, no bojo de uma execução judicial, passou a ser apresentada por um incidenteprocessual chamado de “impugnação à execução” (art. 475-L), enquanto a defesa na execuçãofundada em título extrajudicial manteve a forma de “embargos à execução” (art. 736). Infelizmente, amesma dicotomia foi preservada no CPC/2015 (arts. 525 e 914, respectivamente), que perdeu aoportunidade de unificar os modelos.

De modo que a questão fundamental a ser enfrentada é saber quais dispositivos do CPC vãoreger a disciplina dos embargos à execução nos Juizados Especiais: os que tratam da impugnação àexecução judicial ou os que cuidam dos embargos à execução extrajudicial.

Em nossa visão, a regulamentação dos embargos à execução judicial nos Juizados Especiaisdeve ser feita pelos arts. 525 e ss. do CPC. De fato, como já salientado, o caput do art. 52 da Lei9.099/1995 é claro ao dispor que a execução da sentença segue o regulamento do CPC, com asalterações que a própria Lei prevê nos incisos daquele artigo. Assim, a defesa do executado nosJuizados Especiais, apesar do nome “embargos à execução”, deve seguir a estrutura prevista para aimpugnação à execução, com a natureza jurídica de incidente processual.37 Não por outro motivo aLei fala que os embargos serão oferecidos nos autos da execução.

O entendimento prevalente, entretanto, é de que os embargos à execução nos Juizados Especiaisdevem seguir o regramento previsto para a defesa da execução extrajudicial (arts. 914 e ss. do CPC),traduzindo-se numa verdadeira ação incidental ao processo.38 A consequência disso é que a decisãoque os julga tem sido identificada como uma sentença, ainda que não ponha fim à execução,recorrível por meio do “recurso inominado” (art. 41).39 Com o devido respeito, mas a posiçãomajoritária, além de ser incoerente com as regras em vigor, vai contra a informalidade dos JuizadosEspeciais (art. 2º). Sinceramente, acreditamos que o verdadeiro motivo a sustentar a posiçãomajoritária seja muito mais a resistência ao cabimento do agravo de instrumento nos JuizadosEspeciais do que propriamente uma questão técnica-jurídica.

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De modo que reafirmamos que os embargos à execução, dentro do sistema dos JuizadosEspeciais, têm a forma de impugnação à execução, incidental ao processo executório, e são julgadospor decisão interlocutória, submetida a agravo de instrumento,40 salvo quando seu acolhimentoimportar na extinção da execução. Nesse caso, os embargos serão julgados por sentença, atacávelpor “recurso inominado”.

Seguindo a nossa linha de pensamento, os embargos à execução deverão ser interpostos noprazo de 15 dias, contados do escoamento do prazo para cumprimento da decisão, sem que tenhahavido o pagamento do débito (art. 52, IX, da Lei 9.099/1995 e arts. 523 e ss. do CPC). Nãoobstante, a orientação prevalente tem sido no sentido de que o prazo para embargar permanece sendocontado da intimação da penhora e da avaliação feitas.41 Mais uma vez alertamos que não há baselegal para sustentar esse posicionamento após a edição do CPC/2015. Por outro lado, importantelembrar que o entendimento majoritário é que a contagem desses prazos se dá sempre a partir daintimação do devedor.42

A petição dos embargos é sempre escrita e não precisa ser instruída com cópias dos autos,embora possa trazer documentos necessários a embasar suas alegações. Entendemos, mais uma vezem posição minoritária, que a interposição dos embargos deve ser feita sempre por advogado, aindaque a execução tenha valor inferior a 20 salários mínimos ou que o réu tenha atuado sozinho na fasede execução.43 A posição majoritária, no entanto, é que somente quando a execução tiver valorsuperior a 20 salários mínimos é que será obrigatória a assistência técnica (art. 9º). Como já dito,entretanto, a regra que exclui o advogado é de exceção e, portanto, não poderia ser interpretadaampliativamente.

O regime de pagamento de custas e taxas judiciais em relação aos embargos serve paradesestimular a resistência infundada à pretensão executiva deduzida em juízo. Assim, o executadonão precisa recolher custas para embargar a execução, mas, se sair derrotado, será condenado arecolhê-las (art. 55, parágrafo único, II, da Lei 9.099/1995).44 O mesmo ocorrerá se agir com má-féou se já tiver sido derrotado no recurso interposto em face da decisão exequenda. Além disso,poderá sofrer condenações específicas, caso fique demonstrado o manifesto propósito protelatório(art. 918, parágrafo único, do CPC).

Necessário registrar que, no regime anterior, existiam decisões sustentando que os embargos doart. 52, IX, deveriam seguir a mesma estrutura dos embargos à execução fundada em títuloextrajudicial (art. 53, §§ 2º e 3º), ou seja, com oferecimento, por escrito ou oralmente, na audiênciade conciliação. Com o devido respeito, mas esse entendimento contraria o caput do art. 52, que dizque o procedimento será regido subsidiariamente pelo CPC. Além disso, essa seria a segundaaudiência conciliatória realizada no processo, contando a outra feita durante a fase cognitiva, o quenão é irrazoável. Por certo, no entanto, se o juiz verificar no curso do procedimento que existe umapossibilidade concreta de as partes chegarem a um acordo, pode marcar uma audiência especialexclusivamente para esse fim (art. 772, I, do CPC).45 Essa audiência, entretanto, não se confunde com

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a audiência prevista no art. 53 da Lei.Os embargos à execução não têm, em regra, efeito suspensivo.46 Para obter esse efeito, o

executado deverá formular requerimento expresso ao juízo, embora sua concessão possa ser feita deofício, em razão do poder geral de cautela. Esse pedido pode ser feito dentro dos embargos ou, apósa sua interposição, por simples petição, indicando a presença dos requisitos gerais da cautela (fumusboni iuris e periculum in mora), desde que a execução já esteja garantida (art. 525, § 6º, do CPC). Aconcessão do efeito suspensivo parcial, por sua vez, não impede o prosseguimento da execução emrelação à parcela não suspensa (art. 525, § 8º, do CPC) ou em relação ao coexecutado, quando ofundamento da suspensão não lhe aproveitar (art. 525, § 9º, do CPC). Note-se, ainda, que, na hipótesede ter sido atribuído o efeito suspensivo aos embargos, o exequente poderá prosseguir com aexecução se prestar, nos próprios autos, a caução a ser arbitrada imediatamente pelo juiz (art. 525, §10, do CPC).

O art. 52, IX, da Lei dos Juizados Especiais determina que o executado poderá oferecerembargos versando sobre falta ou nulidade da citação no processo, se ele correu à revelia (alínea a),com manifesto excesso de execução (alínea b), erro de cálculo (alínea c) ou causa impeditiva,modificativa ou extintiva da obrigação, superveniente à sentença (alínea d). É inegável reconhecerque o legislador foi muito infeliz na redação do dispositivo. Por exemplo, ao falar em “manifestoexcesso de execução”, passa a impressão de que o excesso “não manifesto” não poderia serembargado. Por outro lado, o elenco não traz questões fundamentais para a defesa do executado, taiscomo a inexigibilidade ou iliquidez do título, a impenhorabilidade do bem apreendido ou ailegitimidade das partes.

Por tais motivos, defendemos que o rol de matérias embargáveis nos Juizados Especiais éaquele constante no art. 525, § 1º, do CPC. Desse modo, além das hipóteses enumeradas no art. 52,IX, da Lei 9.009/1995, o embargante poderá alegar nos embargos à execução a ilegitimidade da parte(inciso II), a inexigibilidade do título ou da obrigação (inciso III), o defeito na penhora ou naavaliação (inciso IV), a cumulação indevida de execuções (inciso V), a incompetência do juízo (VI),o impedimento ou a suspeição do juiz (§ 2º). Por certo, no caso de alegação de excesso, deverá oembargante declinar o valor que entende correto, sob pena de rejeição liminar da defesa (§ 4º),exceto se estiver litigando sem advogado, quando então poderá solicitar o auxílio do contabilista dojuízo (art. 52, II, da Lei 9.099/1995). Da mesma forma, o embargante poderá alegar a inexigibilidadedo título executivo em razão da prolação de decisão reconhecendo a inconstitucionalidade de lei ouato normativo que o embasou (art. 525, § 12, do CPC).

Como defendemos a inconstitucionalidade do art. 59 da Lei 9.099/1995,47 sustentamos tambéma aplicação aos Juizados Especiais do § 15 do art. 525 do CPC, que prevê o cabimento da açãorescisória em relação à inexigibilidade do título executivo judicial em razão de decisão do STFproferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda. Por fim, sublinhe-se que a existência debenfeitorias deve ser alegada na fase cognitiva, em sede de contestação, de forma discriminada e

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2.2.3.2

com atribuição fundamentada do respectivo valor, sob pena de preclusão (art. 538, § 1º, do CPC).É preciso reconhecer, no entanto, que tem prevalecido a orientação de que as hipóteses

cabíveis dos embargos à execução são apenas aquelas previstas no art. 52, IX, da Lei 9.099/1995.48

Data venia, mas não é adequado sustentar que as regras previstas no CPC não poderiam seraplicadas nos Juizados Especiais por causa da especialidade do dispositivo. Da mesma forma comoocorre em relação à tutela específica (art. 52, V, da Lei 9.099/1995), o dispositivo do CPCatualmente é mais completo e efetivo, o que impõe sua aplicação.

Admitidos os embargos à execução, o embargado será intimado, na pessoa do seu advogado, oupessoalmente, se não tiver patrono constituído nos autos, para, em 15 dias, apresentar resposta àsalegações apresentadas. Embora o art. 525 do CPC não tenha regulado o tema, a necessidade deintimação do embargado e o prazo para sua manifestação são extraídos da lógica prevista nosprincípios do contraditório e da ampla defesa (arts. 7º e 9º do CPC) e por aplicação subsidiária aoart. 920 do CPC, como determinado pelo caput do art. 513 do CPC. Em seguida, depois depraticados os atos instrutórios pertinentes, o juiz deverá julgar a questão.

As impugnações simples

O CPC/2015, na busca pela informalidade, ampliou a possibilidade de as partes atacaremdiferentes atos processuais executivos por meio de manifestações feitas por “simples petição”, ouseja, sem outros requisitos específicos além do prazo para apresentação. Essas manifestações, namaioria das vezes, são chamadas pelo Código de “impugnação”. Por isso, o termo impugnação éusado genericamente, mesmo quando a lei não prevê expressamente a manifestação ou, prevendo, nãolhe dá nome. Por outro lado, existem manifestações que, embora também recebam o nome deimpugnação, possuem um regramento próprio. É o caso, por exemplo, da impugnação à execução (art.525 do CPC). Assim, optamos por chamar de impugnação simples as manifestações opositivas que,descritas na lei ou não, não têm outros requisitos além do prazo de interposição.

A regra geral sobre as impugnações simples está no art. 525, § 11, do CPC. Por meio desseartigo é possível concluir que durante a execução as partes podem apresentar impugnação àsquestões que surgirem, no prazo de 15 dias, contado da comprovada ciência do fato ou da intimaçãodo ato. Portanto, as impugnações que não estiverem estampadas no texto legal, devem ser ofertadasno prazo de 15 dias. Mesmo assim, o Código previu expressamente algumas impugnações simples, aserem opostas também no prazo de 15 dias. É o que acontece, por exemplo, com a impugnação àconcordata civil (art. 916, § 2º, do CPC) e com a impugnação à penhora (art. 917, § 1º, do CPC). Épreciso ter cuidado, no entanto, com algumas impugnações que têm prazos menores para seremofertadas. É o que ocorre com a impugnação à arrematação do bem penhorado (art. 903, § 2º, doCPC),49 cujo prazo de interposição é de 10 dias, e com a impugnação ao depósito (art. 526, § 1º, doCPC), a impugnação à penhora on-line (art. 854, § 3º, do CPC), a impugnação à avaliação (art. 872,

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2.2.4

2.2.4.1

§ 2º, do CPC) e a impugnação à adjudicação (art. 877 do CPC), em que o prazo é de cinco dias. Aimpugnação com menor prazo de todas é aquela feita em face do pedido de substituição, anulação,redução ou ampliação da penhora (art. 853 do CPC): apenas três dias.

Sem dúvida, a mais famosa impugnação simples é a chamada exceção de pré-execu-tividade.Em linhas gerais, a exceção de pré-executividade, cuja elaboração doutrinária é atribuída a Pontesde Miranda,50 representa a impugnação simples, oposta antes do início do prazo para oferecimento daimpugnação à execução (art. 525 do CPC), que ataca o direito de ação do credor. Assim, tendo emvista os escopos da Lei 9.099/1995, não vislumbramos obstáculos à sua utilização nos JuizadosEspeciais, sempre em hipóteses excepcionais, em que fica demonstrado evidente equívoco no manejoda execução.51 Necessário frisar que a exceção de pré-executividade somente é cabível para discutirquestão de ordem pública que prescinda de dilação probatória.52

A expropriação do bem apreendido

Se o bem penhorado for dinheiro, não haverá necessidade de avaliação ou expropriação. Nessecaso, após a penhora, o procedimento passa direto à etapa de pagamento, caso não tenha sidoapresentada alguma impugnação. Se o bem penhorado não for dinheiro, depois de superada a etapade apreensão e avaliação, com ou sem o oferecimento de defesa por parte do executado, passa-se àetapa de expropriação. A expropriação se dará pelas formas previstas no art. 825 do CPC(adjudicação, alienação ou apropriação de frutos e rendimentos), que são perfeitamente compatíveiscom as regras inseridas no inciso VII do art. 52 da Lei 9.099/1995. Nesses dispositivos, é dito que oJuiz poderá autorizar a adjudicação do bem penhorado ao credor ou sua venda pelas partes outerceira pessoa idônea, antes da realização da hasta pública. Elas também poderão acertar opagamento feito a prazo ou a prestação, sendo que, nessas hipóteses, poderá ser oferecida cauçãoidônea, em se tratando de bem móvel, ou hipoteca, no caso de bem imóvel.

A adjudicação do bem penhorado

Antes mesmo das Reformas no CPC/1973, a Lei dos Juizados Especiais já admitia apossibilidade da adjudicação imediata dos bens penhorados ao credor, depois de realizada aavaliação, de forma a tornar mais célere a satisfação do crédito executado.53 Essa previsão foiincorporada ao CPC/1973 em 2006 (arts. 685-A e 685-B) e mantida no CPC/2015 (arts. 876 e 877).

A única diferença de monta sobre a adjudicação, em comparação com o regramento do CPC, éque nos Juizados Especiais, havendo acordo, a adjudicação poderá ser feita por valor inferior ao daavaliação (art. 52, VII, da Lei 9.099/1995). Isso pode ser benéfico para ambos os lados: para ocredor, que adquire o bem por um valor mais em conta, e para o devedor, que não corre o risco de tero seu bem alienado em hasta pública por valores muito inferiores à avaliação.54 Fora dessa hipótese,se o valor do bem penhorado for superior ao da dívida, o bem somente poderá ser expropriado

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2.2.4.2

2.2.4.3

quando o credor depositar judicialmente a diferença (art. 876, § 4º, do CPC).55

Registre-se que, da mesma forma que no juízo ordinário, a fase de adjudicação, uma vezencerrada, poderá ser reaberta nos Juizados Especiais se as tentativas de alienação restaremfrustradas (art. 878 do CPC).

A alienação do bem penhorado por iniciativa particular

Seguindo a lógica implantada no CPC/1973 pela Lei 11.382/2006, caso o credor não aceiteadjudicar o bem penhorado pelo Juizado, deverá ser tentada a sua venda pelas próprias partes dademanda ou por qualquer pessoa idônea, num procedimento chamado genericamente de alienação poriniciativa particular (art. 52, VII, da Lei 9.099/1995 e art. 880 do CPC). Assim, por exemplo,penhorado um bem imóvel, o juiz, de ofício ou por iniciativa das partes, poderá chamar um corretorpara tentar vendê-lo. Se ele conseguir a alienação antes da data marcada para a realização da hastapública, cancela-se esta. Registre-se, no entanto, que, se as condições de pagamento, as garantias ouo preço oferecidos forem diferentes do estabelecido pelo juiz (art. 880, § 1º, do CPC), as partesterão que ser ouvidas para que a alienação possa ocorrer.56

A venda particular nos Juizados Especiais pode ocorrer, inclusive, por meio da Internet,independentemente da edição da regulamentação prevista no art. 882 do CPC. As regras previstas naLei 9.099/1995, portanto, são bem mais flexíveis do que aquelas dispostas no art. 880 do CPC, noqual a alienação por iniciativa particular só pode ser feita pelo próprio credor ou corretor/leiloeirocredenciado pela autoridade judiciária.

A alienação do bem penhorado por leilão judicial

O leilão judicial nada mais é do que um procedimento solene de licitação especialmentedesenvolvido para a venda de bens penhorados, por meio de um leiloeiro público, sob a supervisãodo juiz, realizado no âmbito de uma execução (arts. 886 e seguintes do CPC). De acordo com o art.882 do CPC, o procedimento preferencial para a realização do leilão é o meio eletrônico (Resolução236/2016 do CNJ). Assim, somente na hipótese de não ser possível a realização do chamado “leilãovirtual” é que será feito o leilão presencial. Trata-se de uma excelente iniciativa incluída no CPCpara afastar os males causados pelo ineficiente rito de alienação pública presencial.

A única peculiaridade do procedimento de alienação por leilão judicial nos JuizadosEspeciais57 é que a Lei dispensou a publicação de editais em jornais quando os bens penhoradosforem de “pequeno valor” (art. 52, VIII, da Lei 9.099/1995). O objetivo é tornar mais célere oprocedimento e baratear os seus custos. Necessário sublinhar que a Lei fala que a dispensa somenteocorrerá em relação a “bens de pequeno valor”, o que, acreditamos, deva ser entendido como bensavaliados em até 40 salários mínimos, à luz do art. 3º, I, da Lei 9.099/1995. Se o leilão for paraalienação de dois ou mais bens penhorados, deverá ser considerado, para fins do art. 52, VIII, da Lei

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2.2.4.4

2.2.5

2.3

2.3.1

9.099/1995, o valor mais elevado deles. Assim, se um lote com cinco bens penhorados for a leilão,se cada um deles tiver valor inferior a 40 salários mínimos, não haverá necessidade de publicaçãodo edital em jornais. Note-se que o art. 52, VIII, dispensa a publicação do edital em jornais e não alavratura do próprio edital. O edital, portanto, deverá ser lavrado antes da realização do leilão (art.886 do CPC).

Outro aspecto que merece ser destacado é que, no CPC/2015, a publicação do edital deverá serfeita preferencialmente por meio eletrônico (art. 887, § 1º, do CPC), de modo que, se o Juizadopuder fazer essa publicação por meio eletrônico, a publicação em jornais fica dispensada qualquerque seja o valor do bem a ser leiloado. Não havendo meio eletrônico, os editais deverão serpublicados no local de costume, bem como ter uma cópia afixada nesse local, além de divulgadospelas formas eventualmente designadas pelo juiz (art. 887, §§ 3º e 4º, do CPC).

A apropriação de frutos e rendimentos

A última forma de expropriação prevista pelo CPC é a apropriação de frutos e rendimentos decoisa móvel ou imóvel. Essa modalidade de expropriação poderá ser utilizada quando forconsiderada mais eficiente para o recebimento do crédito e menos gravosa ao executado (art. 867 doCPC). Para tanto, o juiz deverá nomear um administrador--depositário, que fará a administração dobem e o recolhimento dos frutos, perdendo o executado o direito de gozo do bem, até que o exequenteseja integralmente pago. O administrador-depositário, se houver acordo entre as partes, poderá ser oexequente ou o executado. Caso contrário, será nomeado um profissional qualificado para odesempenho da função. À medida que o administrator-depositário for repassando os frutos erendimentos, o exequente dará ao executado, por termo nos autos, quitação das quantias recebidas.

O pagamento

O pagamento nos Juizados Especiais se faz da mesma forma que previsto no CPC, ou seja, pormeio da entrega do dinheiro ou pela adjudicação dos bens penhorados (art. 904). Nos JuizadosEspeciais, no entanto, é possível que o pagamento a prazo ou parcelado seja ajustado pelas partes eadmitido pelo juiz (art. 53, § 2º, da Lei 9.099/1995). De comum acordo, podem, ainda, as partesestabelecer que o pagamento seja efetuado por meio de desconto em folha, por tempo determinado,desde que isso não comprometa a sobrevivência do devedor.58

A EXECUÇÃO MANDAMENTAL

O regime jurídico da tutela específica nos Juizados Especiais

O Brasil, por influência dos ideais liberais europeus, notadamente do Código CivilNapoleônico,59 não teve na base de sua formação jurídica a tradição de tutelar de forma específica asobrigações mandamentais (fazer, não fazer e entregar). A nossa postura diante do descumprimento de

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2.3.2

tais prestações, na maioria das vezes, era buscar a sua conversão em perdas e danos. Com aevolução do Direito e o intercâmbio de ideias com outras famílias jurídicas, foi crescendo a buscapela implementação de um modelo capaz de promover uma proteção mais adequada ao credor deuma prestação in natura inadimplida. Inicialmente, foram feitas alterações pontuais na legislação. Apartir da década de 1980, no entanto, essas modificações foram se ampliando60 até que, em 1994, oCPC/1973 foi modificado pela Lei 8.953 para prever, de forma genérica, a tutela específica dasobrigações de fazer e não fazer (art. 461). Nesse contexto, a Lei 9.099/1995, decorrente de umprojeto elaborado no final da década de 1980, não apenas regulou a tutela específica das obrigaçõesde fazer ou não fazer, mas também as obrigações de entregar (art. 52, V e VI), operando verdadeirarevolução para a época.

Em 2002, entretanto, o regime da tutela específica lato sensu prevista no CPC/1973 sofreu umasignificativa renovação, não apenas prevendo novos mecanismos, mas também incorporando asobrigações de entregar (art. 461-A). Só para citar um exemplo, antes da alteração promovida pelaLei 10.444/2002, a única medida de apoio prevista no Código era a multa. Com a nova redação do §5º do art. 461, o CPC/1973 passou a ostentar um extenso rol de medidas de apoio, elencadas deforma meramente exemplificativa. A mesma estrutura foi mantida e aperfeiçoada no CPC/2015, quetratou não apenas das regras sobre o julgamento das ações relativas às prestações de fazer, não fazere entregar (arts. 497 a 501), mas também regras especiais para cumprimento dessas obrigações (arts.536 a 538). O resultado é que, hoje, o regulamento previsto na Lei dos Juizados Especiais sobretutela específica se tornou obsoleto.

Por isso, a partir de uma leitura constitucional dos dispositivos, defendemos que ofuncionamento da execução das obrigações mandamentais nos Juizados Especiais deva ser feito apartir de uma interpretação sistemática das regras previstas na Lei 9.099/1995 com os dispositivoscontidos no CPC. De fato, se o intérprete utilizar com rigor o princípio da especialidade esimplesmente afastar dos Juizados Especiais as regras sobre tutela específica previstas no CPC, oresultado será prejudicial para a efetiva prestação jurisdicional nesses órgãos. Todo regramentosobre a tutela específica contida na Lei 9.099/1995 está concentrado nos incisos V e VI do art. 52 e,certamente, ele não é suficiente para tratar de tema tão relevante.

A estrutura da tutela específica

De uma maneira resumida, a regulamentação da tutela específica pode ser dividida em doisgrupos: de um lado, as regras sobre o julgamento das ações mandamentais e, de outro, as regrassobre a execução das decisões que contenham obrigações mandamentais. No regime anterior, a maiorparte do regramento sobre a tutela específica estava concentrada nos arts. 461 e 461-A do CPC/1973.No CPC/2015, essa regulamentação foi reordenada. Assim, o legislador decidiu reunir dentro de umaSeção as regras sobre o julgamento das ações mandamentais (arts. 497 a 501). Nesses dispositivos

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2.3.3

estão incluídas também as regras sobre o julgamento das obrigações de emitir declaração de vontade,que no CPC/1973 eram tratadas em separado (art. 466-A). Da mesma forma, foram alocadas nos arts.536 a 538 do Novo Código as regras sobre a execução das decisões que versem sobre obrigaçõesmandamentais.

Na Lei 9.099/1995, os incisos V e VI do art. 52 tratam apenas da execução das obrigaçõesmandamentais, de modo que as regras previstas no CPC/2015 referentes ao julgamento das açõesmandamentais (arts. 497 a 501) são plenamente aplicáveis aos Juizados Especiais.

A tutela inibitória

Uma das principais inovações do CPC/2015 foi o tratamento dado à tutela inibitória. Comefeito, o legislador procurou destacar que a tutela inibitória tem natureza satisfativa e não se ligainstrumentalmente a nenhuma ação “principal”. O escopo dessa tutela é essencialmente preventivo,ou seja, destinada a impedir a prática, a repetição ou a continuação de um ato ilícito. Ela decorre donovo perfil do Estado e da necessidade de proteger as novas situações de direito materialincorporadas ao ordenamento jurídico, especialmente aquelas de conteúdo não patrimonial. Nessepasso, inegável reconhecer que alguns bens jurídicos não podem ficar sem proteção prévia,submetidos apenas à tutela indenizatória. Direitos fundamentais como a honra, o nome e apropriedade intelectual, por exemplo, não podem simplesmente ser “protegidos” pela ameaça defutura ação indenizatória, em nome de um ideal liberal de autonomia da vontade.

Apesar de não dispor de uma estrutura procedimental genérica para postulação da tutelainibitória autônoma, além da vetusta ação cominatória (art. 287), o CPC/1973 previa pelo menosdois procedimentos especiais com esse propósito: o interdito proibitório (art. 932) e a nunciação deobra nova (art. 934). Curiosamente, ambos os ritos versavam sobre direitos reais de naturezapatrimonial. Ou seja, no regime anterior, nós admitíamos a tutela inibitória de determinados direitospatrimoniais disponíveis, como o direito de vizinhança e o direito possessório, mas não de direitosfundamentais, como o nome, a honra, a dignidade etc.

Esse quadro somente pôde ser alterado com a edição da Constituição Federal de 1988, que fezquestão de deixar claro que nenhuma lei excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou“ameaça a direito” (art. 5º, XXXV, da CF). De modo que o direito de acesso à justiça compreendetambém o direito à tutela efetivamente capaz de impedir a violação de um direito (tutela preventiva).Por isso, o CPC/2015 previu expressamente não apenas o princípio da inafastabilidade (art. 3º), mastambém a tutela inibitória para remoção do ilícito (art. 497, parágrafo único). O dispositivo, aliás,assinala de forma didática que, para a aplicação da tutela inibitória, “é irrelevante a demonstraçãoda ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo”.

No âmbito dos Juizados Especiais, a tutela inibitória tem fundamental importância, haja vistaque mais de 80% das demandas são de Direito do Consumidor e boa parte delas retrata situações em

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2.3.4

2.3.4.1

que o consumidor está sujeito a violações perpetradas por atos ilícitos praticados pelosfornecedores. O exemplo mais comum de tutela inibitória nos Juizados Especiais é o pedido para queo fornecedor de produtos ou serviços se abstenha de negativar o nome dos consumidores junto aoscadastros de maus pagadores.61

As técnicas da execução mandamental

De acordo com os arts. 536 e 538 do CPC, a obrigação de fazer, não fazer ou entregarreconhecida numa decisão judicial será executada incidentalmente, nos autos do processo em que adecisão foi proferida, seja ela uma sentença ou uma decisão interlocutória. No primeiro caso, seráiniciada uma nova etapa processual, de natureza eminentemente executiva, dentro de um modelosincrético; no segundo, a execução mandamental será feita dentro da mesma etapa cognitiva em quefoi proferida a decisão interlocutória. Em ambas as situações, a execução mandamental não tem umrito próprio previsto em lei. De fato, o Código se limitou a descrever as técnicas que devem serempreendidas para satisfazer as obrigações e seus respectivos mecanismos de funcionamento. Trata-se, pois, de um procedimento aberto, ou seja, desprovido de uma estrutura rígida.

Analisando os dispositivos relativos à execução mandamental, é possível identificar as trêsprincipais técnicas a serem empregadas para buscar a satisfação da obrigação reconhecida nadecisão judicial: a) a tutela específica stricto sensu; b) a tutela equivalente; e c) a tutelaindenizatória (ressarcitória). Importante lembrar que, diante do descumprimento da decisão, o credorpode postular a aplicação de qualquer uma dessas técnicas, conforme o seu interesse na satisfação daobrigação exequenda, mas o juiz deve sempre buscar primeiro a tutela específica ou a tutelaequivalente, somente podendo lançar mão da tutela indenizatória se as outras técnicas foremineficazes.

A tutela específica stricto sensu

A tutela específica stricto sensu representa a prestação jurisdicional voltada a compelir odevedor de uma obrigação mandamental a cumpri-la, de forma adequada e dentro de determinadoprazo, sob pena de ter que suportar a adoção de medidas de caráter coercitivo (art. 536 do CPC).Essa é a primeira via para a execução específica, porque o ideal é que a obrigação seja cumpridapor quem tinha o dever originário de fazê-lo. O cumprimento pelo devedor é a maneira mais rápida,econômica e eficaz de satisfazer o direito do credor. É preciso lembrar, ainda, que em determinadoscasos, nas chamadas obrigações infungíveis, somente o devedor é que pode cumprir a obrigação deforma efetiva. Além disso, se o devedor cumprir a obrigação, não será mais necessária a adoção deoutras medidas para satisfazer o direito do credor, desonerando a máquina judiciária. Um exemplocomum no dia a dia forense de tutela específica stricto sensu é quando o juiz ordena ao devedor queentregue ao credor um bem que está indevidamente em sua posse, em determinado prazo, sob pena de

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2.3.4.2

multa.

A tutela equivalente

Apesar de ser um dever do juiz buscar o cumprimento da obrigação pelo devedor, não pode atutela jurisdicional ficar indefinidamente aguardando por isso. De fato, se o magistrado constatar que,mesmo sob coação, o devedor não irá cumprir com a obrigação, deverá verificar se é possível aadoção de medidas capazes de obter um resultado análogo àquele que seria por ele produzido, caso ativesse cumprido (art. 536 do CPC). Sublinhe-se que a tutela equivalente pode ser direta ou indireta.No primeiro caso, o próprio juízo toma providências capazes de produzir o resultado práticoequivalente ao do adimplemento. No segundo, o juízo busca um terceiro para cumprir a obrigação emsubstituição ao devedor.

No regramento original do CPC/1973, para determinar o cumprimento da obrigação de fazer ounão fazer por terceiro, o juiz tinha que selecionar uma pessoa por meio de uma espécie de licitaçãopública (art. 634). Esse procedimento, entretanto, era sistematicamente dispensado pelos juízes, porser excessivamente lento e oneroso. Por isso, a Lei 9.099/1995 consagrou o que já era aplicado naprática forense, ou seja, a escolha direta pelo juiz da pessoa que iria realizar a obrigação no lugar dodevedor (art. 52, VI). Esse modelo foi o precursor da redação do art. 634 do CPC/1973, atribuídapela Lei 11.382/2006, e do art. 817 do atual CPC. Pela nova sistemática do CPC de 2015, oexequente, inclusive, tem a preferência para realizar diretamente a obrigação ou supervisionar a suaexecução (art. 820). Ambas as diretrizes são aplicáveis aos Juizados Especiais. Necessário assentar,também, que o juiz deverá sempre fixar o prazo e as características para o cumprimento da obrigaçãopelo terceiro, sendo certo que, no caso de eventual discordância sobre a execução da obrigação, seráaplicável o procedimento previsto no art. 819 do CPC.

Apesar de o inciso VI do art. 52 da Lei 9.099/1995 somente mencionar a tutela equivalente emrelação à obrigação de fazer, por certo ela é aplicável também à obrigação de não fazer e àobrigação de dar. À primeira vista pode parecer estranho alguém não fazer algo no lugar doexecutado. Mas é preciso lembrar que a forma de se cumprir uma obrigação de não fazer édesfazendo o que não deveria ser feito. Por exemplo, imagine-se que uma pessoa tem obrigaçãocontratual de não construir além de uma determinada altura. Se ela constrói, descumprindo aobrigação de não fazer, a aplicação da tutela equivalente indireta seria a determinação para que umterceiro destrua o que foi construído além da altura permitida. Se a obrigação de não fazer nãocomporta desfazimento, como no caso da obrigação de não revelar um segredo profissional, o únicocaminho possível é a tutela indenizatória. A mesma lógica se aplica à tutela equivalente em relação àobrigação de dar. Se o bem é fungível, basta ao juiz ordenar que se pegue outro bem, com as mesmascaracterísticas do bem original; se o bem é infungível, a questão se resolve em perdas e danos.

A maior vantagem no regulamento da tutela equivalente na Lei 9.099/1995, em comparação ao

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modelo adotado pelo CPC/1973, é que o juiz pode determinar que o executado deposite o valornecessário para custear o cumprimento da obrigação pelo terceiro, sob pena de multa periódica (art.52, VI). Com isso, o exequente somente terá que adiantar os honorários se o executado não osdepositar previamente, mesmo compelido pela astreintes. Até a edição do CPC/2015, essedispositivo era a única regra no Direito brasileiro, prevendo a aplicação de astreintes às obrigaçõesde pagar. O CPC de 2015, no entanto, generalizou essa possibilidade ao estabelecer que incumbe aojuiz “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessáriaspara assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objetoprestações pecuniárias” (art. 139, IV).

A tutela indenizatória

A tutela indenizatória, também chamada de tutela ressarcitória, retrata a atividade jurisdicionalvoltada para a fixação de um valor compensatório pelo descumprimento da obrigação de fazer, nãofazer ou dar. A Lei 9.099/1995 trata da questão ao prever a possibilidade da “transformação dacondenação em perdas e danos” (art. 52, V, segunda parte). Por certo, a conversão só poderá ocorrerquando o exequente expressamente a requerer ou se tornar impossível a tutela específica ou aobtenção do resultado prático equivalente (art. 499 do CPC). Nesse caso, a conversão será feita deplano e sem instrução pelo juiz, por meio de arbitramento (art. 52, V, da Lei 9.099/1995 e art. 510 doCPC), e a execução seguirá nos próprios autos, visando ao pagamento dessa quantia.

As medidas de apoio

O rol de medidas de apoio

Apesar de os incisos V e VI do art. 52 tratarem exclusivamente da astreintes, tem--se que, peladiretriz traçada no caput do mesmo artigo, é plenamente aplicável aos Juizados Especiais o rol doart. 536, § 1º, do CPC.62 De fato, para instrumentalizar tanto a tutela específica stricto sensu, como atutela equivalente, o CPC ofereceu uma relação, meramente exemplificativa, de medidas de apoioque o juiz pode utilizar, inclusive de ofício, além da multa: busca e apreensão, remoção de pessoas ecoisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva.63 Embora a multa seja de longe amedida mais utilizada, por sua praticidade e força coercitiva, o juiz deve avaliar, em cada caso, qualo mecanismo mais adequado para promover a efetivação da tutela jurisdicional. Para uma pessoacarente de recursos financeiros, por exemplo, a fixação de uma pena de multa pode ser ineficaz.

A multa periódica (astreintes)

Introdução

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O inciso V do art. 52 da Lei 9.099/1995 trata especificamente da astreintes, ou seja, da multaperiódica pelo descumprimento das obrigações reconhecidas judicialmente. Atualmente, a multaperiódica encontra-se prevista, de forma genérica e aprimorada, no art. 537 do CPC. A diferençaprincipal entre o regramento da Lei 9.099/1995 e o do CPC é que neste o juiz pode elevar ou reduziro valor da multa, mediante provocação ou de ofício, enquanto, nos Juizados Especiais, a Lei somentefala da elevação da multa e, mesmo assim, mediante provocação. Essa peculiaridade do art. 52 temsido ignorada pelos juízes, que sistematicamente aplicam as regras fixadas no CPC. Essa postura,contrária à visão tradicional da hermenêutica jurídica de que regra especial afasta regra geral (lexspecialis derrogat lex generalis), não deve ser repudiada, por se apresentar como a mais harmônicacom o princípio da efetividade.64 Destarte, nos Juizados Especiais o valor da multa poderá serelevado ou reduzido de ofício pelo juiz, nos termos fixados pelo art. 537 do CPC.

Por outro lado, importante destacar que a Lei 9.099/1995 traz no inciso V do art. 52 umaimportante regra sobre a fixação da astreintes. Diz o texto que a multa deverá ser fixada “de acordocom as condições econômicas do devedor”. Trata-se de uma referência notável, na medida em que oCPC traçou como únicos parâmetros para a fixação da multa a suficiência e a compatibilidade com aobrigação (art. 537). Seria muito importante que a condição econômica do executado fosseincorporada ao CPC, na medida em que promove salutar adequação da multa ao devedor. De fato, amulta não pode ser fixada no mesmo valor para um humilde lavrador e para um rico empresário.

Embora seja louvável que a Lei 9.099/1995 tenha tomado a iniciativa de tratar da condiçãoeconômica do executado como elemento para determinação do valor da multa, sentimos falta de maisum componente. O ideal é que o magistrado acrescente, em sua análise, o comportamento processualdo devedor diante das determinações judiciais, dentro daquele processo e em outros de queporventura tenha participado. Nesse sentido, algumas empresas concessionárias de serviços públicose instituições financeiras deveriam ter as suas multas fixadas não apenas pela sua capacidadeeconômica, mas também pelo seu histórico de descumprimento de decisões judiciais.

Num outro plano, importante ressaltar que, pela interpretação literal do inciso V do art. 52, quefala em “multa diária”, a astreintes somente poderia ser estabelecida para incidir dia a dia. Noentanto, não vemos razão para que o juiz não possa, em determinadas hipóteses, fixar o preceitocominatório em periodicidade menor ou maior que um dia. É o caso, por exemplo, de uma obrigaçãoque dependa, para seu cumprimento, de um maior lapso temporal, como construir um muro ou fazer aimpermeabilização de um telhado. Nessas situações, a fixação da multa em periodicidade semanalafigura-se como mais equânime e razoável. Exatamente por isso, o CPC/2015 não emprega mais otermo “multa diária”, mas, apenas, “multa periódica” (arts. 500 e 537).

A maior discussão que existe a respeito da astreintes nos Juizados Especiais, entretanto, estárelacionada à limitação do seu valor. Uma corrente de pensamento defende que a astreintes deve sesubmeter, juntamente com a obrigação, à alçada de 40 salários mínimos, pois, de outra forma,tornaria complexa a causa.65 Outra corrente de pensamento, entretanto, entende que, embora não

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submetida ao teto de 40 salários mínimos, a astreintes não poderia ultrapassar, per si, o valor daobrigação que busca efetivar, por aplicação analógica do art. 412 do CC.66 Uma terceira corrente,finalmente, advoga que o valor da multa periódica, sozinha, não poderia ser superior a 40 saláriosmínimos, porque faltaria aos juízes dos Juizados Especiais competência para imposição de valoresmaiores que este.67

Data venia, mas entendemos que não existem, a priori, tais submissões, devendo o juizverificar em cada caso qual o valor necessário e suficiente para compelir o devedor ao pagamento,independentemente do valor da obrigação ou do limite de 40 salários mínimos.68 Com efeito, a multanão existe em função do valor da causa que fixou a competência, mas como garantia da jurisdição,em seus aspectos de efetividade. Assim, não se pode dimensionar um instrumento de coerção a partirdo valor da obrigação que ele visa tutelar, pois, com isso, estar-se-ia admitindo a existência dedecisões judiciais que teriam mais autoridade do que outras. Num Estado Democrático de Direito,qualquer decisão judicial, independentemente do valor do bem jurídico que busca proteger,consubstancia--se num ato de Estado e numa manifestação da sua soberania, devendo ser dotada deeficácia jurídica e social. Essa é a posição prevalente na jurisprudência69 e na doutrina.70

O termo inicial da incidência dos preceitos cominatórios

O prazo para contagem de eventual preceito cominatório estabelecido para o descumprimentoda obrigação começa a correr da intimação realizada, nos termos do art. 19 da Lei, combinado com oart. 231 do CPC.71 Em nosso sentir, essa intimação poderá ser feita por meio do advogadoconstituído (art. 513, § 2º, do CPC),72 salvo se a parte não tiver advogado ou estiver sendo atendidapela Defensoria Pública ou advogado dativo, casos em que a intimação deverá ser feitapessoalmente.73

Em todos os casos, se a decisão fixar um prazo para o cumprimento da obrigação, somente apósescoar esse prazo é que a obrigação se torna exigível, e seu descumprimento, sancionável.Necessário frisar que, no caso de a astreintes ser fixada numa decisão liminar, o valor acumuladopelo descumprimento pode ser executado provisoriamente, devendo ser depositada em juízo,permitindo o levantamento após o trânsito em julgado da decisão que confirmar a obrigação. Essedispositivo representa uma evolução em relação à única regra que tratava do tema até a edição doCPC/2015: o art. 12, § 2º, da Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), que diz que a “multacominada liminarmente só será exigível do réu após o trânsito em julgado da decisão favorável aoautor, mas será devida desde o dia em que se houver configurado o descumprimento”.74 Entretanto,ainda está aquém do que gostaríamos, pois a execução deveria ser feita como qualquer outraexecução provisória.75 Na realidade, entendemos que a multa por descumprimento de uma ordemjudicial deva ser paga independentemente do resultado final da demanda. Isso porque, mesmo que odevedor saia vencedor, isso não justifica o descumprimento da determinação judicial, que deveria

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ser sancionado, em respeito à atividade jurisdicional. Trata-se, no entanto, de posição isolada.

A alteração do valor da multa

Ainda no regime do CPC/1973, consolidou-se o entendimento de que o valor apurado pelasmultas incidentes ao longo do período de inadimplemento poderia ser alterado pelo juiz, de ofício oua requerimento.76 Na época, afirmávamos que tal posição era desprovida de base legal e que violavao ato jurídico processual perfeito, uma vez que a multa já aplicada teria se incorporado aopatrimônio imaterial do credor. O CPC/2015, no entanto, alterou o estado dessa discussão, ao tratardo tema, ainda que de forma lateral. O art. 537, § 1º, dispõe que o juiz poderá alterar o valor e aperiodicidade da multa “vincenda”. Assim, entendemos que, ao direcionar o dispositivo para asmultas vincendas, o CPC consagrou a tese de que as multas vencidas não poderiam ser modificadas,por meio da técnica do silêncio eloquente.77

É preciso dizer também que não pode a multa se transformar num fator de enriquecimento ilícitopara a parte vencedora, nem de inércia, para o Poder Judiciário. Em outras palavras, não pode ocredor ficar de braços cruzados, contando os dias em que as multas se acumulam, nem pode o juizaplicar a multa e largar o processo numa prateleira. Tanto o credor como o juiz devem buscar outrosmeios de satisfação da obrigação além da multa, para que esta possa ter legitimidade. Isso porque aastreintes é um instrumento, e não um fim em si mesmo. Verificando-se que a cominação se desvioude seu objetivo, que é tão somente compelir o devedor ao pagamento, pode o juiz, medianteprovocação ou de ofício, reduzir o seu valor ou até mesmo suspender a sua incidência (art. 537, § 1º,I, do CPC), respeitando as multas que já tiveram incidência.

Para evitar distorções, defendemos que a aplicação da multa deve ser sempre delimitada notempo, no momento em que é fixada. Com isso, exequente e executado já sabem antecipadamente qualo valor máximo que a multa pode atingir e quando terá que ser feita a sua conversão em perdas edanos (art. 52, V, da Lei 9.099/1995), caso não seja possível a obtenção de resultado práticoequivalente.

A defesa do executado

Como já salientado, as execuções por obrigação de pagar são passíveis de oposição por“embargos à execução”. Na verdade, trata-se de impugnação à execução (art. 525 do CPC),modalidade incidental de defesa, que no regime dos Juizados recebe o nome de “embargos àexecução” (art. 52, IX). No caso da execução das obrigações de fazer, não fazer ou dar, como nem aLei 9.099/1995 e nem o CPC previram um nome para a defesa do executado, é possível chamá-la de“impugnação à execução mandamental”.

A impugnação à execução mandamental deve ser apresentada nos autos do processo, no prazode 15 dias, contados do escoamento do prazo assinado para o cumprimento da obrigação. Da mesma

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maneira que a própria execução mandamental, a sua impugnação não possui qualquer formalidade naLei, devendo ser feita por simples petição, observando, no que couber, as regras previstas no art. 525do CPC (art. 536, § 4º, do CPC).

As demais questões que surgirem ao longo da execução mandamental também poderão serimpugnadas, por simples petição, no prazo de 15 dias, nos moldes do que foi estabelecido para aexecução pecuniária (art. 525, § 11, do CPC). É o que acontece, por exemplo, com a impugnação àescolha feita sobre o bem a ser entregue (art. 812 do CPC). No entanto, necessário destacar que, emalgumas situações, o prazo para impugnar é menor do que 15 dias. No caso de a prestação ficar acargo de um terceiro, por exemplo, as partes terão o prazo de dez dias para ofertar impugnação aotrabalho realizado, alegando a ocorrência de algum defeito, sob pena de preclusão (art. 818 do CPC).

No Brasil, por mais de um século a execução da sentença foi feita, como regra, por meio de umaação autônoma, chamada de execução ex intervalo (ação de execução separada da ação deconhecimento). Sobre o tema, veja-se Enrico Tullio Liebman, Processo de execução, p. 45.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 13.1.4 da CEJCA: “A execução por título judicial prescindede citação, expedindo-se, desde logo, mandado de penhora (art. 52, IV, da Lei 9.099/1995)”.Importante destacar que, antes de expedir o mandado de penhora, o devedor terá que ser intimadopara cumprir a obrigação pecuniária fixada judicialmente, no prazo de 15 dias, nos termos do art.523 do CPC.Nesse caso, a execução do acordo será realizada nos Juizados Especiais Cíveis, com a citação doexecutado, nos termos do art. 515, § 1º, do CPC.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 48 do 2º ETRJECERJ: “Honorários advocatícios. Execução.Verba sucumbencial devida ao Centro de Estudos da Procuradoria-Geral da Defensoria Pública. OJuizado Especial Cível tem competência funcional para a execução dos seus julgados, consoanteas normas que decorrem do disposto no art. 98, I, da Constituição da República, no art. 52 da LeiFederal 9.099/1995 e no art. 575, II, do Código de Processo Civil, e ainda quando o exequente nãoforma pessoa jurídica, afastada, assim, a regra constante do art. 8º da Lei dos Juizados Especiais”e Enunciado 12.7 da CEJCA: “A pessoa jurídica, vencedora no recurso, pode executar as verbassucumbenciais em sede do Juizado Especial Cível”.Nesse sentido, veja-se: “Juizado Especial Cível. Incompetência funcional. Execução de certidãode crédito originária de Vara Cível” (TJRJ, 4ª TR, RI 52098320168190001, Rel. Juiz AlexandreChini, j. em 14.03.2017).Nesse sentido, Araken de Assis, Execução civil nos juizados especiais, p. 36. Na jurisprudência,veja-se: “Ocorrendo alteração legislativa ratione materiae, afastado fica o princípio daperpetuatio jurisdictionis firmado pelo ajuizamento da causa. Não tendo a lei ressalvado, osprocessos em curso se sujeitam à modificação, com incidência do art. 87, in fine, CPC,independentemente da fase em que se encontram” (STJ, 2ª Seção, CC 948-GO, Rel. Min. Sálvio deFigueiredo, j. em 14.03.1990). Em sentido contrário, sustentando que os Juizados Especiais

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poderiam ter executado as decisões dos Juizados de Pequenas Causas, Joel Dias Figueira Júnior eMaurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 221.É inegável que a orientação prevalente no período final da vigência do CPC/1973 era favorável aoreconhecimento da possibilidade de execução de sentenças declaratórias. Nesse sentido,interpretando as regras presentes no CPC/1973, assim se posicionou o STJ: “A sentença, qualquerque seja sua natureza, de procedência ou improcedência do pedido, constitui título executivojudicial, desde que estabeleça obrigação de pagar quantia, de fazer, não fazer ou entregar coisa,admitida sua prévia liquidação e execução nos próprios autos” (STJ, Corte Especial, REsp1.324.152, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 04.05.2016). A maioria da doutrina também jáassinalava nessa direção. Por todos, veja-se Teori Zavascki, Comentários ao Código de ProcessoCivil, p. 195. Essa também era a nossa posição até a edição do Novo Código.Praticamente todos os autores que escreveram sobre o tema afirmaram que a troca da palavra“existência” por “exigibilidade” no CPC/2015 não implicou na alteração do quadro observado noregime anterior. Nesse sentido, Luiz Dellore e outros, Processo de conhecimento e cumprimentode sentença: comentários ao CPC de 2015, p. 689.O CPC/2015 tentou corrigir o problema, como se pode ver da redação do art. 515, I, que agorafala em “decisão”. Apesar disso, o nome do Título II, que se inicia com o art. 513, permanecesendo “Do Cumprimento de Sentença”.O BTN (Bônus do Tesouro Nacional), criado pela Medida Provisória 57/89, foi extinto por forçado art. 3º, II, da Lei 8.177/1991.Diz o art. 1º da Lei 8.383/1991: “Fica instituída a Unidade Fiscal de Referência (Ufir), comomedida de valor e parâmetro de atualização monetária de tributos e de valores expressos emcruzeiros na legislação tributária federal, bem como os relativos a multas e penalidades dequalquer natureza”.Nos primeiros momentos de existência da Lei 9.099/1995, chegou-se a sustentar a aplicação daTR como índice de conversão das sentenças. Esse entendimento acabou sendo rechaçado pelajurisprudência dos tribunais superiores. Nesse sentido, veja-se: “Processual civil. Cálculo deliquidação. Correção monetária. TR. Inaplicabilidade. Não constituindo a TR índice de correçãomonetária, a teor do entendimento manifestado pelo STF (ADIn 493-DF) descabe utilizá-la noscálculos de liquidação. Embargos de divergência recebidos” (STJ, Corte Especial, EREsp64.712/ SP, Rel. Min. William Patterson, j. em 09.11.1995). Atualmente, prevalece a utilização daUfir e do salário mínimo. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 16 do 1º EMJERJ: “As sentençaslíquidas conterão conversão em Ufir ou em salários mínimos”.Nesse sentido, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 85.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 17 do 1º EMJERJ: “A realização de cálculos por servidorjudicial poderá ser substituída por apresentação de planilha de cálculo pelas partes”.Em sentido contrário, entendendo que o cálculo deverá sempre ser efetuado ao contador, Pestanade Aguiar, op. cit., p. 59, e Luiz Fux, op. cit., p. 68. Na jurisprudência, veja-se: “Determinação dejuntada de planilha do débito em execução de título extrajudicial contraria o disposto no art. 52,inciso II, da Lei 9.099/1995, que estabelece sejam os cálculos de atualização do débito efetivadospor contador judicial” (TJDF, 2ª TR, RI 10530920128070007, Rel. Juiz Flávio Augusto Leite, j.

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em 04.05.2012).Nesse sentido, Candido Rangel Dinamarco, Instituições... op. cit., p. 525.Nesse sentido, veja-se a Súmula 410 do STJ: “A prévia intimação pessoal do devedor constituicondição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou nãofazer”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 38 do FONAJE: “A análise do art. 52, IV, da Lei 9.099/1995,determina que, desde logo, expeça-se o mandado de penhora, depósito, avaliação e intimação,inclusive da eventual audiência de conciliação designada, considerando-se o executado intimadocom a simples entrega de cópia do referido mandado em seu endereço, devendo, nesse caso, sercertificado circunstanciadamente”.Nesse sentido, embora sob o regime do Código anterior, veja-se: “Na fase de cumprimento desentença é necessária a intimação do advogado da parte executada” (TJDF, 2ª TR, RI10530920128070007, Rel. Juiz Flávio Augusto Leite, j. em 04.05.2012).Nesse sentido, veja-se: “Ainda que a execução provisória realize-se, no que couber, do mesmomodo que a definitiva, na dicção do art. 475-O do CPC, é inaplicável a multa do art. 475-J,endereçada exclusivamente à segunda, haja vista que exige-se, no último caso, o trânsito emjulgado do pronunciamento condenatório, aqui não acontecido” (STJ, 4ª Turma, REsp 979.922/SP,Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. em 02.02.2012).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 106 do FONAJE: “Havendo dificuldade de pagamento diretoao credor, ou resistência deste, o devedor, a fim de evitar a multa de 10%, deverá efetuar depósitoperante o juízo singular de origem, ainda que os autos estejam na instância recursal”.Nesse sentido, Luiz Fux, op. cit., p. 65, e Alexandre Câmara, Juizados, p. 179. Na jurisprudência,vejam-se o Enunciado 14 do 1º EMJERJ: “À falta de ressalva, o efeito do recurso será odevolutivo (artigo 43 da Lei 9.099/95), possibilitando carta de sentença, com execuçãoprovisória”, “A execução provisória, no âmbito do Juizado Especial, não só é admitida, como é aregra. Isso porque o recurso inominado não tem efeito suspensivo normalmente” (TJRS, 1ª TR, RI71003233772, Rel. Juiz Ricardo Torres Hermann, j. em 27.10.2011), “A pendência de julgamentodo mandado de segurança impetrado pela reclamada contra decisão que não recebeu recursoinominado em fase de conhecimento não obsta a execução provisória” (TJPR, 1ª TR, RI 0012410-87.2013.8.16.0075, Rel. Juiz Fernando Swain Ganem, j. em 10.02.2015).Nesse sentido, veja-se: “Nos termos do art. 52 da Lei 9.099/1995, o Juizado Especial écompetente para a execução de seus próprios julgados, não importando que o valor exigidoextrapole o limite de 40 salários mínimos estabelecido no art. 3º do mesmo diploma legal, faixa aser observada somente no que se refere ao valor da causa fixado originariamente e aos títulosexecutivos extrajudiciais” (STJ, 4ª Turma, REsp 691.785/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, j. em07.10.2010).Na nossa visão, os limites ao exercício do poder geral de efetivação devem ser extraídos daanálise sistemática das regras e dos princípios presentes em nosso ordenamento jurídico. Por isso,como nosso ordenamento jurídico tem como característica básica a proteção da dignidade dodevedor (princípio da menor onerosidade, princípio da utilidade da execução, regras sobreimpenhorabilidade etc.), entendemos que o exercício do poder geral de efetivação não pode se

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afastar desse dogma. É inegável que o direito brasileiro, em diversos momentos, confere umaproteção exagerada ao devedor, mas isso não legitima a atuação do poder geral de efetivaçãocomo se fosse uma “válvula de escape” do sistema.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 192. Vejam-se, também, o Enunciado 1 do 1ºEJECTRERJ: “Na execução por título judicial, não havendo bens a serem penhorados, aplicar-se-á ao processo o disposto no § 4º do art. 53 da Lei 9.099/1995” e o Enunciado 75 do FONAJE: “Ahipótese do § 4º, do art. 53, da Lei 9.099/1995, também se aplica às execuções de título judicial,entregando-se ao exequente, no caso, certidão do seu crédito, como título para futura execução,sem prejuízo da manutenção do nome do executado no Cartório Distribuidor”.É importante destacar que esse rol de etapas da execução tem caráter didático. De fato, na prática,essas fases não são completamente estanques e podem não existir. Assim, por exemplo, oexecutado pode se defender por meio de simples petição, na fase de postulação ou na fase deexpropriação. A inércia do executado, por sua vez, dispensa a etapa de defesa.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei9.099/1995 é inconstitucional.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 28 do 1º EJJEC: “Não cabe execução de ofício, devendo sermanifestado o interesse do credor na execução, ainda que de forma simplificada”, e o Enunciado10.5 da CEJCA: “A sentença em sede de Juizados Especiais Cíveis não é autoexequível”.Como será visto mais à frente, sustentamos, minoritários, o cabimento do agravo de instrumento. Oentendimento majoritário, no entanto, é que a decisão que indefere parte do pedido executivo deveser atacada por mandado de segurança, dirigido para a Turma Recursal.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 18 do 1º EMJERJ: “No processo de execução, eventualpenhora seguirá as regras do processo comum. Ordinariamente, o exequente poderá ficar comodepositário dos bens, providenciando a remoção, excetuada a execução de título extrajudicial, quese regerá em conformidade com o dispositivo no artigo 53, § 1º, da Lei 9.099/1995”.Em sentido contrário, veja-se o Enunciado 147 do FONAJE: “A constrição eletrônica de bens evalores poderá ser determinada de ofício pelo juiz”. Apesar de sermos favoráveis à determinaçãode ofício da penhora on-line, principalmente nos casos em que a parte estiver sem advogados,entendemos que isso não é possível em razão da necessidade de interpretação restritiva das regrassobre a execução.Em sentido contrário, veja-se o Enunciado 140 do FONAJE: “O bloqueio on-line de numerárioserá considerado para todos os efeitos como penhora, dispensando-se a lavratura do termo eintimando-se o devedor da constrição”.Mesmo sem base legal, o entendimento majoritário é que a segurança do juízo representa umacondição à apresentação da impugnação. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 117 do FONAJE: “Éobrigatória a segurança do Juízo pela penhora para apresentação de embargos à execução de títulojudicial ou extrajudicial perante o Juizado Especial”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 112 do FONAJE: “A intimação da penhora e avaliaçãorealizada na pessoa do executado dispensa a intimação do advogado. Sempre que possível ooficial de Justiça deve proceder a intimação do executado no mesmo momento da constriçãojudicial (art. 475, § 1º, CPC)”.

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Nesse sentido, vejam-se: “1. O art. 653 do CPC preceitua que ‘O oficial de justiça, nãoencontrando o devedor, arrestar-lhe-á tantos bens quantos bastem para garantir a execução’. Já oart. 654 do mesmo diploma legal, em complemento ao aludido dispositivo, dispõe que compete aocredor, dentro de 10 (dez) dias, contados da intimação do arresto, requerer a citação por edital dodevedor. 2. No microssistema dos Juizados Especiais, quando não localizado o executado paracitação, hipótese que restou configurada pelas certidões do oficial de justiça colacionadas às fls.23 e 55, não é cabível o arresto eletrônico provisório para bloqueio de dinheiro via sistema BacenJud, visto que a vedação expressa à citação editalícia contida no art. 18, § 3º, da Lei 9.099/1995,obsta a medida subsequente estabelecida pelo art. 654 do CPC” (TJDF, 1ª Turma, Rcl20130020131986, Rel. Juiz Flávio Fernando da Fonseca, j. em 17.09.2013) e “Em sede deJuizado Especial não se aplica a suspensão do processo prevista no art. 791, III, do CPC. Damesma forma, neste Juízo, não tem aplicação a disposição do art. 653, do mesmo diplomaprocessual, que torna viável o oficial de justiça proceder o arresto de tantos bens do devedorquantos bastem para garantir a execução, na hipótese de não ter sido encontrado. Isso porque nãoexiste maneira de se adequar o prosseguimento do feito, nos termos do art. 654, ainda do CPC, àLei 9.099/1995, que não admite a citação por edital. Sem essa providência, não há comotransformar-se o arresto em penhora” (TJDF, TR, RI 352/98, Rel. Juiz Roberval Belinati, j. em26.03.1999). O entendimento majoritário, no entanto, é que o arresto pode ser feito, mesmo semque seja realizada a citação por edital. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 43 do FONAJE: “Naexecução do título judicial definitivo, ainda que não localizado o executado, admite-se a penhorade seus bens, dispensado o arresto. A intimação de penhora observará ao disposto no artigo 19, §2º, da Lei 9.099/1995”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 76 do FONAJE: “No processo de execução, esgotados osmeios de defesa e inexistindo bens para a garantia do débito, expede-se a pedido do exequentecertidão de dívida para fins de inscrição no serviço de Proteção ao Crédito – SPC e SERASA,sob pena de responsabilidade”.Desde a primeira edição deste livro já defendíamos, minoritários, que os embargos à execução nosJuizados Especiais seriam um incidente do processo e não um processo autônomo de impugnação.Nesse sentido, defendendo a autonomia dos embargos à execução, Araken de Assis, Execução...,op. cit., p. 167, e Eduardo Oberg, op. cit., p. 193. Apesar dessa orientação, na prática, raramentese exige do embargante que a petição dos embargos observasse os requisitos de uma petiçãoinicial (art. 14) ou que seja realizada a citação do embargado.Nesse sentido, Araken de Assis, Execução..., op. cit., p. 167. Veja-se, ainda, o Enunciado 143 doFONAJE: “A decisão que põe fim aos embargos à execução de título judicial ou extrajudicial ésentença, contra a qual cabe apenas recurso inominado”.Como será visto mais à frente, sustentamos, minoritários, o cabimento do agravo de instrumento.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 117 do FONAJE: “É obrigatória a segurança do Juízo pelapenhora para apresentação de embargos à execução de título judicial ou extrajudicial perante oJuizado Especial” e “Necessidade de garantia do juízo para apresentação dos embargos àexecução. Regra da lei especial que afasta a norma do art. 525 do CPC” (TJRJ, 4ª TR, MS 1092-18.2016.8.19.9000, Rel. Juiz Alexandre Chini, j. em 07.02.2017).

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Nesse sentido, veja-se: “O prazo para a interposição dos embargos à execução, nos JuizadosEspeciais, conta-se do primeiro dia útil subsequente à data da intimação ou ciência, peloexecutado, do ato respectivo” (TJDF, 1ª TR, RI 20030111143967, Rel. Juiz Esdras Neves, j. em16.05.2006).Nesse sentido, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 85.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 21 do 7º ECJEB: “Não são devidas custas quando opostosembargos do devedor. Não há sucumbência salvo quando julgados improcedentes os embargos” eo Enunciado 12.2 da CEJCA: “A oferta de embargos do devedor se faz sem o pagamento de custase os ônus da sucumbência só recaem no caso de improcedência dos mesmos”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 71 do FONAJE: “É cabível a designação de audiência deconciliação em execução de título judicial”.Em sua redação original, o CPC/1973 previa a existência de efeito suspensivo automático aosembargos à execução fundados em título judicial. Com a Reforma feita pela Lei 11.232/2005, foiestabelecido que a impugnação à execução não teria, de regra, efeito suspensivo (art. 475-M).Essa lógica já poderia ter sido aplicada simultaneamente nos Juizados Especiais, em razão docomando contido no caput do art. 52. Entretanto, somente com a edição da Lei 11.382/2006, quetambém retirou o efeito suspensivo dos embargos à execução extrajudicial (art. 739-A doCPC/1973), é que se passou a reconhecer que os embargos à execução previstos no art. 52, IX,não teriam mais efeito suspensivo ope legis.Sobre o tema, veja-se o item 2.2 da Parte IV.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 121 do FONAJE: “Os fundamentos admitidos para embargar aexecução da sentença estão disciplinados no art. 52, inciso IX, da Lei 9.099/1995 e não no artigo475-L do CPC, introduzido pela Lei 11.232/2005”.Por todos, veja-se o Enunciado 81 do FONAJE: “A arrematação e a adjudicação podem serimpugnadas, no prazo de cinco dias do ato, por simples pedido”.Nesse sentido, Geraldo da Silva Batista Júnior, Exceção de pré-executividade: alcance e limites,p. 2.Nesse sentido, veja-se: “Assim, concluo que a ordem deva ser concedida para que o juízoimpetrado conheça da exceção, determinado que o excepto se manifeste e profira decisão arespeito da matéria elencada, de forma que as instâncias não sejam suprimidas, mantendo-se oprincípio constitucional do juiz natural” (TJRJ, 4ª TR, MS 0002215-56.2013.8.19.9000, Rel. JuizLucia Mothé Glioche, j. em 22.05.2014). Em sentido contrário, não admitindo a exceção de pré-executividade: “Exceção de pré-executividade que sequer encontra amparo legal na lei de ritos epor ser instrumento processual criado pela doutrina somente deve ser admitidoexcepcionalissimamente em raras hipóteses e somente nos ritos do processo civil comum, nunca noespecial. Impossibilidade de sua aceitação em sede de JEC. Quebra dos princípios da celeridadee economia processual que informam o procedimento especial” (TJRJ, 1ª TR, MS2001.700.000641-0, Rel. Juiz Cristina Gaulia, j. em 08.02.2001).Nesse sentido, Geraldo da Silva Batista Júnior, op. cit., p. 32. Na jurisprudência, veja-se: “Aexceção de pré-executividade tem cabimento para discutir a violação da alçada do JuizadoEspecial porque isso encerra disposição de ordem pública, ou seja, matéria indisponível que diz

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com as condições procedimentais da execução” (TJRS, 1ª TR, MS 71000654533, Rel. Juiz JoãoPedro Cavalli Junior, j. em 17.03.2005).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 13.4 da CEJCA: “Antes de ordenada a alienação judicial dobem penhorado, poderá o Juiz abrir ao exequente a possibilidade de adjudicar-lhe o bem,autorizando também sua venda pelo próprio exequente, pelo executado ou por terceiro idôneo, porvalor não inferior ao da avaliação, depositando-se eventual diferença em Juízo (inciso VII, art. 52,Lei 9.099/1995)”.De acordo com o art. 891 do CPC, o bem penhorado pode ser vendido por até a metade do valorda avaliação, sem que isso seja considerado preço vil.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 13.4 da CEJCA: “Antes de ordenada a alienação judicial dobem penhorado, poderá o Juiz abrir ao exequente a possibilidade de adjudicar-lhe o bem,autorizando também sua venda pelo próprio exequente, pelo executado ou por terceiro idôneo, porvalor não inferior ao da avaliação, depositando-se eventual diferença em Juízo (inciso VII, art. 52,Lei 9.099/1995)”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 13.1.4 da CEJCA: “Antes de ordenada a alienação judicial dobem penhorado, poderá o Juiz abrir ao exequente a possibilidade de adjudicar-lhe o bem,autorizando também sua venda pelo próprio exequente, pelo executado ou por terceiro idôneo, porvalor não inferior ao da avaliação, depositando-se eventual diferença em Juízo (inciso VII, art. 52,Lei 9.099/1995)”.Apesar da falta de base legal para tanto, a jurisprudência tem procurado informalizar oprocedimento de leilão judicial nos Juizados Especiais. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 79 doFONAJE: “Designar-se-á hasta pública única, se o bem penhorado não atingir valor superior a 60salários mínimos”. A iniciativa, apesar da boa índole, esbarra na necessidade de se observar deforma rigorosa o devido processo legal executivo (princípio da legalidade executiva).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 59 do FONAJE: “Admite-se o pagamento do débito por meiode desconto em folha de pagamento, após anuência expressa do devedor e em percentual quereconheça não afetar sua subsistência e a de sua família, atendendo sua comodidade econveniência pessoal”.O princípio da intangibilidade da vontade humana foi consagrado no famoso art. 1.142 do CódigoCivil Francês de 1804. Nele, ficou estabelecido que toda obrigação de fazer ou não fazerdescumprida deveria ser resolvida em perdas e danos.Exemplos dessa ampliação podem ser vistos no art. 11 da Lei 7.347/1985 (Lei da Ação CivilPública) e no art. 84 do CDC.Nesse sentido, vejam-se: “Em relação a multa aplicada vale ressaltar que se trata de uma tutelainibitória, por esse motivo o valor deve ser alto, para inibir e obrigar o recorrido a se abster deinserir o nome de Salvador Pedro dos Santos no cadastro de inadimplentes, inexistindo motivopara concessão de prazo para tanto” (TJPR, 2ª TR, MS 1912-55.2015.8.16.9000, Rel. Juiz MarcoVinícius Schiebel, j. em 18.11.2015) e “É cabível a tutela inibitória para fazer cessar a cobrançairregular e abusiva que traz constrangimentos ao consumidor” (TJDF, 1ª TR, RI 20060110349528,Rel. Juiz James Eduardo Oliveira, j. em 31.10.2006).Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 178.

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Apesar de expressamente previsto no CPC/2015 (art. 536, § 3º), sustentamos que odescumprimento por parte do executado de uma ordem mandamental não configura o crime dedesobediência. Não cabe ao CPC tipificar condutas, e a resistência, nesses casos, pode estarrelacionada a uma forma de defesa de direito. Assim já se posicionava a jurisprudência, navigência do CPC/1973. Neste sentido, veja-se: “Criminal. HC. Desobediência. Trancamento daação penal. Ordem judicial descumprida. Pena de multa prevista. Atipicidade da conduta. Ordemconcedida” (STJ, 5ª Turma, HC 68.144/MG, Rel. Min. Gilson Dipp, j. em 04.06.2007).A moderna hermenêutica jurídica, guiada pela ótica constitucional, tem como compromissoprincipal a busca pela obtenção da maior carga de eficácia possível às regras jurídicas. Nessesentido, Luis Roberto Barroso, Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de umadogmática constitucional transformadora.Nesse sentido, ressalvado o caso de acordo entre as partes, Aguiar, op. cit., p. 59 e 61. Vejam-se,também, a Ementa 30 do ETRJECERJ: “Nas sanções pecuniárias fixadas em sede dos JuizadosEspeciais, deve-se balizar o quantum fixado pelo valor de alçada, estabelecido expressamente notexto da Lei 9.099/1995” e “A interpretação sistemática dos dispositivos da Lei 9.099/1995conduz à limitação da competência do Juizado Especial para cominar – e executar – multascoercitivas (art. 52, inciso V) em valores consentâneos com a alçada respectiva. Se a obrigação étida pelo autor, no momento da opção pela via do Juizado Especial, como de ‘baixa complexidade’a demora em seu cumprimento não deve resultar em execução, a título de multa isoladamenteconsiderada, de valor superior ao da alçada” (STJ, 4ª Turma, RMS 33.155/MA, Rel. Min. MariaIsabel Gallotti, j. em 28.06.2011).Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 25 do 8º ENCJEES: “A multa cominatória não fica limitadaao valor de quarenta (40) salários mínimos, embora deva ser razoavelmente fixada pelo juiz,obedecendo-se o valor da obrigação principal, mais perdas e danos, atendidas as condiçõeseconômicas do devedor”, o Enunciado 15 do 1º ECJTRJE: “Embora a multa cominatória fixada nafase de cognição não esteja sujeita ao limite de 40 (quarenta) salários mínimos, pode o Juiz na fasede execução e a partir daí reduzi-la, de tal sorte que a soma de seu valor não ultrapasse oquantitativo da obrigação principal mais perdas e danos” e o Enunciado 144 do FONAJE: “Amulta cominatória não fica limitada ao valor de 40 salários mínimos, embora deva serrazoavelmente fixada pelo Juiz, obedecendo ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos,atendidas as condições econômicas do devedor”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 39 do ETRJECERJ: “Astreintes. Sua fixação pelo Juiz, a contardo trânsito em julgado da sentença na fase de conhecimento, como meio de compelir o devedor asatisfazer o julgado, atendo-se, porém, aos limites de alçada da Lei 9.099/1995”.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 177. Confiram-se, igualmente, o Enunciado 14.2 daCEJCA: “A multa cominatória, cabível apenas nas ações e execuções que versem sobre odescumprimento de obrigação de fazer, não fazer e entrega de coisa certa, não sofre limitação dequalquer espécie em seu valor total, devendo ser estabelecida em valor fixo e diário, contado oprazo inicial a partir do descumprimento do preceito cominatório” e o Enunciado 97 do FONAJE:“A multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, aindaque o valor desta, somado ao da execução, ultrapasse o limite de alçada; a segunda parte doreferido dispositivo não é aplicável, sendo, portanto, indevidos honorários advocatícios de dez

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por cento”. Comentando esse enunciado, Erick Linhares faz as seguintes observações: “Oenunciado, seguindo sólida jurisprudência, deixa bastante claro que a multa cominatória não sesubmete ao teto legal do art. 3º, I, da Lei 9.099/1995, porque se destina a garantir, mediantecoerção, o adimplemento da obrigação. Em outras palavras, é com base no objetivo da multa quese dará a fixação de seu valor” (Juizados..., p. 45).Veja-se, por todos: “Nos termos do artigo 3º, § 1º, I, da Lei 9.099/2005, compete ao JuizadoEspecial a execução de seus julgados, inexistindo, no preceito legal, restrições ao valorexecutado, desde que, por ocasião da propositura da ação, tenha sido observado o valor de alçada(RMS 33.155/ MA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 29.08.11). 2. O fato de ovalor executado ter atingido patamar superior a 40 (quarenta) salários mínimos, em razão deencargos inerentes à condenação, não descaracteriza a competência do Juizado Especial para aexecução de seus julgados. 3. A multa cominatória prevista no art. 461, §§ 4º e 5º, do Código deProcesso Civil não se revela como mais um bem jurídico em si mesmo perseguido pelo autor, aolado da tutela específica a que faz jus. Sua fixação em caso de descumprimento de determinadaobrigação de fazer tem por objetivo servir como meio coativo para o cumprimento da obrigação.4. Dessa forma, deve o juiz aplicar, no âmbito dos juizados especiais, na análise do caso concreto,os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de não se distanciar dos critérios daceleridade, simplicidade e equidade que norteiam os juizados especiais, mas não há limite ou tetopara a cobrança do débito acrescido da multa e outros consectários” (STJ, Rcl 7.861/SP, Rel. Min.Luis Felipe Salomão, j. em 11.09.2013).Veja-se, nesse sentido, Luis Felipe Salomão, Roteiro..., p. 123: “O valor, que compreende oprincipal e acessórios (juros, correção monetária e outros acréscimos legais ou contratuais), éconsiderado à data do ajuizamento da ação, pouco importando a cifra atingida na sentença, parafins de execução. O limite vale apenas para a data do ajuizamento da ação de conhecimento comoexpressa o dispositivo. Se houver posterior condenação por litigância de má-fé ou outrosacréscimos estabelecidos na sentença, de modo a superar o teto, tal não poderá ser impeditivopara a condenação no âmbito do Juizado Especial”.Veja-se, nesse sentido, o Enunciado 22 do FONAJE: “A multa cominatória é cabível desde odescumprimento da tutela antecipada, nos casos dos incisos V e VI, do art. 52, da Lei 9.099/1995”.Nesse sentido, Joaquim Felipe Spadoni, Medidas de apoio à execução de obrigações de fazer ounão fazer no Novo CPC e seus reflexos nos Juizados Especiais, p. 548.Vejam-se, nesse sentido, a Ementa 90 do ETRJECERJ: “Multa por descumprimento da obrigaçãode não fazer fixada apenas no processo de execução. Necessidade de prévia citação ou intimaçãodo executado para ciência da multa estabelecida” e a Ementa 78 do ETRJECERJ: “Obrigação desatisfazer condenação sob pena de pagamento de multa diária. Necessidade de intimaçãoespecífica da obrigação. Recurso provido para reduzir o valor da execução, com exclusão daverba relativa à multa diária”.Nesse sentido, veja-se: “A multa diária prevista no § 4º do art. 461 do CPC, devida desde o diaem que configurado o descumprimento, quando fixada em antecipação de tutela, somente poderáser objeto de execução provisória após a sua confirmação pela sentença de mérito e desde que orecurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo. O termo ‘sentença’,assim como utilizado nos arts. 475-N, I, e 475-O do CPC, deve ser interpretado de forma estrita,

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não ampliativa, razão pela qual é inadmissível a execução provisória de multa fixada por decisãointerlocutória em antecipação dos efeitos da tutela, ainda que ocorra a sua confirmação porAcórdão. Isso porque, na sentença, a ratificação do arbitramento da multa cominatória decorre dopróprio reconhecimento da existência do direito material reclamado que lhe dá suporte, entãoapurado após ampla dilação probatória e exercício do contraditório, ao passo em que a suaconfirmação por Tribunal, embora sob a chancela de decisão colegiada, continuará tendo em suagênese apenas a análise dos requisitos de prova inequívoca e verossimilhança, próprios dacognição sumária, em que foi deferida a antecipação da tutela” (STJ, Corte Especial, REsp-Repetitivo 1.200.856/RS, Rel. Min. Sidinei Beneti, j. em 01.07.2014).Na vigência do CPC/1973, a jurisprudência admitia a execução provisória da multa fixadaliminarmente nos Juizados Especiais. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 120 do FONAJE: “Amulta derivada de descumprimento de antecipação de tutela é passível de execução mesmo antesdo trânsito em julgado da sentença”.Na jurisprudência nacional, consolidou-se o entendimento de que a aplicação da multa não fariacoisa julgada material e poderia ser alterada. Nesse sentido, veja-se: “Processual civil. Execução.Multa diária (CPC, art. 461, 4º e 6º). Coisa julgada material. Inexistência. Extinção de anteriorexecução pelo pagamento do pedido principal relativo à reparação por dano moral (CPC, art. 794,I). Sentença declaratória. Possibilidade de nova execução relativa ao pleito remanescente, demulta diária. Coisa julgada formal. Ação rescisória. Desnecessidade. Competência do JuizadoEspecial Cível para execução de seus próprios julgados” (STJ, 4ª Turma, REsp 691.785/RJ, Rel.Min. Raul Araújo, j. em 07.10.2010).Nesse sentido, Joaquim Felipe Spadoni, Medidas de apoio à execução de obrigações de fazer ounão fazer no Novo CPC e seus reflexos nos Juizados Especiais, p. 547.

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3.1

3.1.1

3.1.2

3.1.3

3A AÇÃO DE EXECUÇÃO DOS TÍTULOS EXECUTIVOS

EXTRAJUDICIAIS ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS

CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE A AÇÃO EXECUTIVA EXTRAJUDICIAL

O regime jurídico

O regramento da execução de título executivo extrajudicial nos Juizados Especiais obedece àmesma lógica vista no art. 52, ou seja, aplicam-se as regras do CPC, com as alterações previstaspelo art. 53. A diferença fundamental é que as regras contidas no art. 53 criam um novo procedimentoexecutivo. Esse procedimento executivo especial utiliza como base a estrutura do rito da execuçãopor quantia certa, prevista no CPC (arts. 829 e seguintes), mas com uma etapa própria: a audiênciade conciliação. Nessa audiência, diz o § 1º do art. 53 da Lei 9.099/1995, deverão ser apresentadosos embargos à execução.

O objeto da execução: obrigações pecuniárias

Apesar de a Lei 9.099/1995 não colocar isso de forma clara, entendemos que o interesse deagir para o procedimento executivo dos Juizados Especiais abrange somente o cumprimento dasobrigações de pagar, reconhecidas nos títulos executivos extrajudiciais, no valor de até 40 saláriosmínimos. De fato, analisando os dispositivos pertinentes (arts. 3º, § 1º, II, e 53, caput), verifica-seque as regras previstas são todas focadas nas obrigações pecuniárias e que o único critério utilizadopelo legislador para definir o procedimento foi o valor do título executivo extrajudicial. Por isso,não é possível levar aos Juizados Especiais a execução das obrigações mandamentais (fazer, nãofazer ou dar) firmadas em títulos extrajudiciais.1

Outro aspecto digno de nota é que podem ser acumulados na mesma execução diferentes títulos,desde que vinculados às mesmas partes e que seus valores, somados, não ultrapassem o valor de 40salários mínimos.

As condições da ação executiva

Todas as observações feitas em relação à execução judicial podem ser aplicadas aqui, além dasregras próprias, contidas no CPC. Embora não concordemos com a dispensa contida no art. 9º da Lei9.099/1995, o entendimento prevalente é que, se a execução for até 20 salários mínimos, as partesnão precisarão do patrocínio de advogado. Além disso, as partes terão que estar pessoalmente

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3.1.4

3.1.5

3.2

3.2.1

presentes às audiências que forem marcadas.

A competência

A competência objetiva da execução prevista no art. 53 é fixada pelo valor da causa, ou seja,pelo valor do título, que não pode ser superior a 40 salários mínimos, com seus acessórios (arts. 3º,§ 1º, II, e 53, caput). Ainda assim, mesmo que o valor do título seja superior a 40 salários mínimos,a execução pode ser proposta se houver a necessária renúncia ao valor excedente no momento dapropositura da execução. Aqui, ao contrário do que ocorre na fase cognitiva do procedimentosumaríssimo, a renúncia não poderá ocorrer na audiência de conciliação, em razão da necessidade dese proceder à penhora. De qualquer forma, na audiência de conciliação, as partes poderão acordaracima do teto legal, nos termos do art. 3º, § 3º, da Lei 9.099/1995.

Com relação à competência territorial, aplicam-se à execução por título extrajudicial as regrasestabelecidas pelo art. 4º da Lei 9.099/1995, com exceção do inciso III, que retrata uma regraespecífica para as ações de indenização.2 Premissa básica, portanto, é que a execução pode semprese processar no domicílio do executado, se o autor não quiser fazê-lo no local onde a obrigação deveser cumprida, no foro de eleição constante do título ou, ainda, no local onde estão os bens sujeitos àexecução (art. 781 do CPC).

Os títulos executivos extrajudiciais

Os títulos extrajudiciais exequíveis são, em tese, aqueles elencados no art. 784 do CPC, alémde outros que possam vir a ser criados (art. 784, XII, do CPC), quando versarem sobre obrigaçõespecuniárias. Ocorre que alguns desses títulos não podem ser levados aos Juizados Especiais, emrazão das limitações impostas pelo próprio sistema, no que toca ao cabimento da demandada e àlegitimidade. Assim, por exemplo, as certidões de dívida ativa da Fazenda Pública da União,Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios (art. 784, IX, do CPC) não podem ser levadas àexecução nos Juizados Especiais, por conta das vedações impostas pelo art. 8º. Da mesma forma, emrazão da regra contida no art. 3º, § 2º, uma confissão de dívida alimentar não pode ser executada nosJuizados Especiais.

O PROCEDIMENTO EXECUTIVO

A natureza do procedimento executivo

Como resta evidente, o procedimento previsto no art. 53 da Lei 9.099/1995 tem naturezaespecial executiva. Seu objetivo é ventilar uma ação de execução autônoma, apta a instaurar umanova relação jurídica processual. Os regramentos elementares dessa demanda, portanto, são aquelesestampados no Livro II da Parte Especial do CPC, com as especificidades do art. 53. Além disso, osaspectos previstos na Teoria Geral dos Juizados são aplicáveis à ação executiva, naquilo que couber.

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3.2.2

3.2.3

Assim, por exemplo, a parte pode propor a execução sem advogado, nas causas até 20 saláriosmínimos (art. 9º),3 a execução pode ser proposta de forma oral (art. 14) e não cabe a citação poredital4 (art. 18).

A postulação da execução

A petição inicial da ação de execução deve observar os requisitos do art. 798 do CPC, à luz doart. 14 da Lei 9.099/1995. Assim, a exordial deverá conter o nome, a qualificação e o endereço daspartes, além da descrição sucinta da dívida, seu valor e de todas as circunstâncias que a tornaramexigível. O exequente deve ainda apresentar o original do título executivo extrajudicial e odemonstrativo do débito atualizado até a data da propositura da execução, além da prova de que severificou a condição ou ocorreu o termo ou que adimpliu a contraprestação, quando for necessário.Os cálculos poderão ser elaborados por servidor do Juizado, caso a parte esteja atuando semadvogado, por aplicação analógica do art. 52, I, da Lei. Na petição inicial, o exequente poderátambém indicar bens a serem penhorados. O exequente deverá pedir a intimação de interessados,além da citação do executado, por oficial de justiça, para em três dias pagar o débito (art. 829 doCPC). Poderá, também, requerer medidas urgentes, como o arresto ou o sequestro, e a averbação emregistro público do ato de propositura da execução e dos atos de constrição realizados, paraconhecimento de terceiros.

Recebida a petição inicial pela secretaria do Juizado, será determinada pelo juiz a citação doexecutado para pagar o valor apontado, no prazo de três dias, sob pena de penhora. Não seránecessária a fixação de honorários advocatícios (art. 827 do CPC), em razão da isenção prevista noart. 55 da Lei. Por outro lado, se a petição contiver algum vício sanável, poderá ser determinada asua emenda (art. 801 do CPC). Da mesma forma, o juiz também poderá ser instado a se manifestar sefor necessária a adoção de alguma medida de urgência ou surgir alguma questão relativa à penhora.

Se o executado efetuar o pagamento, o procedimento será encerrado, sem a imposição de ônussucumbenciais. Não sendo efetuado o pagamento dentro do prazo de três dias, serão imediatamenterealizadas a penhora e a avaliação (art. 829, § 1º, do CPC). Em seguida, será designada a data para arealização da audiência de conciliação, em que o executado deverá apresentar seus embargos, casonão seja lavrado um acordo. Ultrapassada essa fase, os bens penhorados serão expropriados, senecessário, e o valor apurado usado para pagar a dívida.

A audiência de conciliação

Feitas a penhora e a avaliação, o executado deverá ser intimado desses atos e da datadesignada para a realização da audiência de conciliação,5 por meio de seu advogado, salvo se nãotiver advogado constituído nos autos ou for patrocinado pela Defensoria Pública. A intimação poderáser feita no endereço fornecido nos autos, mesmo se o executado não resida mais naquele local, se

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3.2.4

ele não tiver comunicado ao juízo a mudança (art. 19, § 2º). A Lei não fala, mas defendemos que, damesma forma que no procedimento sumaríssimo, entre a intimação e a realização da audiência deveráser observado um intervalo mínimo de 15 dias.6

A audiência de conciliação é obrigatória dentro da estrutura do procedimento executivo, porforça do § 1º do art. 53 da Lei.7 A audiência somente não será realizada se as partes fizerem umacordo para satisfazer o crédito ou se entabularem uma convenção processual para afastar este ato doprocedimento (art. 190 do CPC). Existe, entretanto, significativa divergência sobre como deve serestruturada a citada audiência. Nesse sentido, quatro entendimentos podem ser apresentados: a) aparticipação do conciliador na audiência de conciliação conduzida pelo juiz; b) a realização de umaaudiência de conciliação prévia, dirigida por conciliador, à audiência de instrução e julgamentodirigida pelo juiz togado; c) a realização de uma audiência conduzida pelo conciliador em que, nãohavendo acordo, ficaria responsável por fazer conclusos os embargos eventualmente interpostos; d) arealização de uma audiência de conciliação, instrução e julgamento, dirigida exclusivamente pelojuiz togado.

Embora não seja vista na prática, a proposta descrita na letra “a” é aquela que mais seaproxima do texto legal. A construção retratada na letra “b” também não tem sido aplicada nosJuizados Especiais, embora seja derivada da aplicação analógica da estrutura presente noprocedimento sumariíssimo (arts. 21 e ss. da Lei 9.099/1995). A letra “c” é majoritária, embora nãopreserve a oralidade do procedimento e se afaste do texto legal.8 Por isso, sustentamos, minoritários,que a audiência deveria ser conduzida pelo juiz togado e nela julgados eventuais embargos àexecução opostos (letra “d”).9

Qualquer que seja a sua estrutura, na audiência de conciliação deverá ser buscada acomposição dos interesses para satisfação do crédito. Se houver acordo, encerra-se o procedimento,salvo se for acertado o pagamento em parcelas ou a prazo. Nessas hipóteses, o processo deverá ficarsuspenso (art. 922 do CPC). Não havendo ajuste, o executado pode ficar inerte ou embargar aexecução. Importante assinalar que, se o executado faltar a essa audiência injustificadamente, nãopoderá mais embargar a execução.

Na hipótese de o executado oferecer os embargos, estando o juiz togado na condução daaudiência, estes serão julgados imediatamente, salvo se for necessária a realização de atosinstrutórios. Nesse caso, deverá ser designada uma nova data para continuação da audiência, se nãofor possível a imediata instrução do feito. Se os embargos forem rejeitados, os bens que estãopenhorados, salvo em se tratando de dinheiro, serão expropriados, nos termos do art. 825 do CPC.Por outro lado, se o embargo for acolhido, a execução será encerrada ou adequada, conforme oacolhimento seja parcial ou total.

A defesa do executado

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3.2.4.1

3.2.4.1.1

3.2.4.1.2

3.2.4.1.3

Os embargos à execução

A natureza jurídica

Importante reafirmar a nossa posição, minoritária, de que os embargos à execução devem seridentificados como um incidente processual e não como uma ação autônoma de impugnação, porconta da remissão constante na parte final do art. 53, § 1º, da Lei 9.099/1995. Assim, a decisão queos julga, de natureza interlocutória, se não puser fim à execução, fica submetida ao agravo deinstrumento (art. 1.015, parágrafo único, do CPC). A posição majoritária, entretanto, é de que se tratade uma ação autônoma de impugnação (art. 914 do CPC) e seu julgamento, sempre de naturezasentencial, fica submetido ao “recurso inominado”.

A interposição

Não sendo possível a realização de um acordo, o executado, se quiser resistir à pretensão docredor, terá que oferecer embargos à execução na própria audiência,10 por escrito ou oralmente, comadvogado, nas causas de valor superior a 20 salários mínimos.11 Trata-se de um prazo preclusivo,exceto na hipótese de o executado postular e ter deferido pelo juiz a designação de uma novaaudiência para realizar essa impugnação, com fundamento no princípio do contraditório e da ampladefesa (art. 27 da Lei 9.099/1995 e art. 7º do CPC).

Como já dito, a audiência de conciliação somente pode ser marcada após a realização dapenhora e da avaliação. Assim, minoritários, entendemos que a garantia do juízo é um requisito paraa realização da audiência e não para oferecimento dos embargos à execução.12 Na nossa visão, osembargos podem ser oferecidos, sem garantia (art. 914 do CPC), por escrito, a partir do momento emque o executado tenha sido citado. Antes da citação, o executado poderia oferecer apenas a exceçãode pré-executividade.

O objeto dos embargos à execução

O § 1º do art. 53 traz um comando de duvidosa aplicação. Ao falar dos embargos à execuçãopor título extrajudicial, cita o inciso IX do art. 52, que lista as matérias que podem ser tratadas nosembargos à execução fundada em título judicial. Isso pode levar o intérprete a pensar que nessesembargos somente aquelas matérias poderiam ser tratadas. Ocorre que aqui temos uma execução emque não houve cognição prévia. Seria inconstitucional, por restringir o direito de defesa, impedir oembargante de alegar toda e qualquer matéria de defesa (art. 917 do CPC). Na verdade, em nossaopinião, a remissão ao art. 52, IX, tem como objetivo único dizer que os embargos à execuçãofundada em título extrajudicial tramitam nos autos da execução. Na cabeça do dispositivo em questãoestá dito que o devedor poderá oferecer embargos “nos autos da execução”. Portanto, sustentamosque nos embargos à execução fundada em título executivo extrajudicial é possível alegar qualquer

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3.2.4.1.4

3.2.4.2

1

2

3

4

matéria de defesa.13

A “suspensão da execução” até o julgamento dos embargos

De acordo com o art. 919 do CPC, os embargos à execução fundado em título executivoextrajudicial não terão, em regra, o efeito suspensivo, salvo se o juiz o deferir, acolhendorequerimento do embargante. No caso da execução extrajudicial desenvolvida perante os JuizadosEspeciais, tal regra não tem aplicação. Isso porque, depois da penhora e avaliação, a execução jáfica suspensa, de qualquer maneira, até a realização da audiência de conciliação, quando entãodeverão ser oferecidos e julgados os embargos à execução. Por isso, se o procedimento for seguido,não há que se perquirir sobre efeito suspensivo nos embargos à execução no período anterior àaudiência de conciliação.

Por outro lado, se os embargos não forem julgados durante a audiência de conciliação, no casoem que a produção de uma prova for necessária para o julgamento da defesa do executado, porexemplo, poderá o juiz deferir efeito suspensivo, coso verifique presentes os requisitos legais (fumusboni iuris e periculum in mora).

A impugnação simples

Da mesma forma que na etapa executiva do procedimento sumaríssimo, as partes podemapresentar impugnações ao longo do rito executivo para resolver as questões que surgirem. Por isso,remetemos o leitor ao que foi dito, sobre o tema, no item 2.2.3.2, supra.

Em sentido contrário, defendendo o cabimento da execução de qualquer tipo de obrigação, dizAlexandre Câmara (Juizados..., op. cit., p. 181): “Todas as modificações previstas no art. 53dizem respeito à execução por quantia certa contra devedor solvente, o que significa dizer que aexecução para entrega de coisa diversa de dinheiro se faz, nos Juizados Especiais CíveisEstaduais, na forma prevista nos arts. 621 a 631 do Código de Processo Civil, enquanto aexecução das obrigações de fazer e não fazer se faz segundo o modelo estabelecido pelos arts. 632a 645 do mesmo Código, sem qualquer modificação”.Em sentido contrário, entendendo que em relação à execução por título extrajudicial somente seaplica o inciso II do art. 4º, Luis Felipe Salomão, op. cit., p. 82. Com todo respeito, o autor criouuma diferenciação que não existe na Lei e que contraria o ideário de acesso aos JuizadosEspeciais.Sempre ressalvando nosso entendimento minoritário de que a dispensa do advogado prevista noart. 9º é inconstitucional.Em sentido contrário, admitindo a citação editalícia, na hipótese de arresto executivo, veja-se oEnunciado 37 do FONAJE: “Em exegese ao art. 53, § 4º, da Lei 9.099/1995, não se aplica ao

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processo de execução o disposto no art. 18, § 2º, da referida lei, sendo autorizados o arresto e acitação editalícia quando não encontrado o devedor, observados, no que couber, os arts. 653 e 654do Código de Processo Civil”.Em sentido contrário, sustentando que a audiência de conciliação pode ser realizada antes deefetivada a penhora, vejam-se o Enunciado 145 do FONAJE: “A penhora não é requisito para adesignação de audiência de conciliação na execução fundada em título extrajudicial” e oEnunciado 13.3 da CEJCA: “É possível a realização de audiência de conciliação nas execuçõespor título extrajudicial antes de realizada a penhora”.Vejam-se, sobre o tema, as ponderações feitas no item 3.4.1 da primeira parte deste livro.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 346 do ETRJECERJ: “Embargos à execução. Lei nº 9.099. Ritoespecial. Audiência de conciliação. Necessidade. I – O executado tem o direito de ser intimadopara a audiência do artigo 53, § 1º, da Lei 9.099, quando terá oportunidade de propor as formas detransação relacionadas pelo legislador. II – Não abrir oportunidade para que as partes transijam éviolar direito público subjetivo delas, colidindo com as normas estruturais dos juizados especiaisdefinidas no artigo 2º da LJE”, o Enunciado 19 do 1º ECJEB: “A audiência de conciliação, naexecução de título executivo extrajudicial, é obrigatória e o executado, querendo embargar, deveráfazê-lo nesse momento (art. 53, §§ 1º e 2º)” e o Enunciado 19 do 8º ENCJEES: “A audiência deconciliação, na execução de título executivo extrajudicial, é obrigatória e o executado, querendoembargar, deverá fazê-lo nesse momento (art. 53, §§ 1º e 2º)”.Defendendo essa posição, Eduardo Oberg, op. cit., p. 178; Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op.cit., p. 50; e Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 186.Em sentido diverso, entendendo que também o juiz leigo pode conduzir essa audiência, veja-se oEnunciado 52 do FONAJE: “Os embargos à execução poderão ser decididos pelo juiz leigo,observado o art. 40 da Lei 9.099/1995”. Como já tivemos oportunidade de dizer, o juiz leigo nãodeveria conduzir a AIJ ou proferir projeto de sentença. Da mesma forma, não poderia conduzir aaudiência de conciliação executiva.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 13.2.1 da CEJCA: “Na execução por título extrajudicial, oprazo para oferecimento dos embargos é o da audiência de conciliação, ainda que já realizada apenhora ou conste dos autos o comprovante de depósito para garantia do juízo”.Sempre ressalvando nosso entendimento minoritário de que a dispensa do advogado prevista noart. 9º é inconstitucional.Nesse sentido, vejam-se: “Não obstante o art. 736 do CPC, com a redação dada pela Lei11.382/2006, dispense a garantia do juízo para oferecimento de embargos, tal regra não éaplicável aos Juizados Especiais, haja vista a disposição do art. 53, § 1º, da Lei 9.099/1995, quetrata a penhora como pressuposto para oferecimento de embargos” (TJDF, 1ª TR, RI 0014512-27.2011.807.0003, Rel. Juiz Demetrius Cavalcanti, j. em 10.04.2012) e o Enunciado 117 doFONAJE: “É obrigatória a segurança do Juízo pela penhora para apresentação de embargos àexecução de título judicial ou extrajudicial perante o Juizado Especial”.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 187.

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PARTE IVDo sistema recursal e dos meios impugnativos das

decisões

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1.1

1.2

1O SISTEMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

INTRODUÇÃO: A CONVIVÊNCIA ENTRE OS SISTEMAS RECURSAIS DOSJUIZADOS ESPECIAIS E DO CPC

O sistema recursal do processo civil brasileiro se encontra basicamente concentrado no CPC,que traz regras sobre a teoria geral dos recursos (arts. 994 a 1.008) e sobre os recursos em espécie(arts. 1.009 a 1.044), além de disposições sobre os procedimentos recursais perante os tribunais(arts. 929 a 946). Assim, uma vez que a Lei 9.099/1995 traz regras sobre a recorribilidade dasdecisões (arts. 26 e 41), sobre as espécies de recursos (arts. 41, 42, 43 e 48 a 50) e sobre um órgãorecursal (art. 41, § 1º) e seu procedimento (arts. 44 a 46), seria possível, dentro da teoria domicrossistema,1 concluir que a Lei teria criado um novo sistema recursal, autossuficiente em relaçãoao CPC.2

Como já dito, entretanto, é equivocado pensar que o sistema recursal dos Juizados Especiaispoderia existir de forma autônoma em relação ao sistema recursal do CPC. É completamenteinviável, por exemplo, acreditar que as decisões proferidas pelas Turmas Recursais poderiam ficarimunes ao recurso extraordinário, como se chegou a sustentar. Na verdade, ainda que a Lei9.099/1995 tivesse feito extensa regulamentação sobre os recursos, o seu sistema recursalcontinuaria integrado aos mecanismos gerais de controle das decisões judiciais. Isso ficou muitoclaro não apenas pelas construções jurisprudenciais realizadas nos últimos anos, mas também pelasleis editadas sobre Juizados Especiais Federais e Fazendários. De fato, ambas as Leis tratamexpressamente em seus textos da atuação do STJ no controle da lei federal (art. 14, § 4º, da Lei dosJuizados Especiais Federais e art. 19 da Lei dos Juizados Especiais Fazendários) e do recursoextraordinário para o STF (art. 15 da Lei dos Juizados Especiais Federais e art. 21 da Lei dosJuizados Especiais Fazendários).

Portanto, o primeiro passo para compreender as peculiaridades do sistema recursal da Lei9.099/1995 é perceber que o seu funcionamento depende de um criterioso processo de integração eharmonização com o sistema recursal do CPC. Trata-se, sem sombra de dúvida, de tarefa delicada ecomplexa, notadamente porque as regras recursais presentes na Lei dos Juizados Especiais foramdesenvolvidas na década de 1980, antes das reformas operadas no CPC/1973, que serviram de basepara o atual Código.

A ESTRUTURA DO SISTEMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS

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1.3

1.3.1

1.3.2

Depois de verificada a necessidade de convivência entre os sistemas recursais dos Juizados edo CPC, é preciso identificar as regras recursais existentes na Lei 9.099/1995 e sua aplicação. Comesse propósito, vamos dividir as regras regentes do sistema recursal dos Juizados Especiais emquatro tópicos: a) a recorribilidade das decisões; b) a necessidade da atuação técnica na faserecursal; c) as espécies de recursos cabíveis; e d) o órgão recursal e suas atribuições.

A RECORRIBILIDADE DAS DECISÕES

A sentença proferida em primeiro grau de jurisdição

A sentença proferida pelo Juizado Especial, definitiva ou terminativa (arts. 485 e 487 doCPC),3 pode ser impugnada pelo “recurso inominado” (art. 41) e pelos embargos de declaração (arts.48 a 50). O art. 41 da Lei 9.099/1995, entretanto, de forma inovadora, assinalou que da sentençahomologatória da conciliação e do laudo arbitral4 “não caberia recurso”.5 O objetivo seria revestirde maior proteção a decisão fundada na vontade das partes. Assim, a doutrina prevalente temassinalado que essas sentenças homologatórias seriam insuscetíveis de qualquer forma de recurso.6

Entendemos, no entanto, contrariamente à maioria, que as sentenças previstas na parte final doart. 41 da Lei 9.099/1995 admitem a interposição dos embargos de declaração.7 Com efeito, ao tratardos embargos de declaração, a Lei não faz qualquer restrição ao tipo de sentença sujeita a esserecurso (art. 48). O art. 41, por sua vez, não trata dos recursos de uma forma geral, mas,especificamente, do “recurso inominado”. Cuida-se, portanto, de um sistema de regra e exceção, ouseja, a regra é que da sentença cabe “recurso inominado”, e a exceção é que da sentençahomologatória do laudo arbitral e da conciliação não cabe essa modalidade de recurso. Assim, osembargos de declaração ficariam fora da vedação, sendo oponíveis em face de qualquer modalidadede sentença. O maior obstáculo a essa interpretação, no entanto, repousa no fato de que o art. 26 daLei diz expressamente que a sentença homologatória de laudo arbitral é “irrecorrível”. Como nãovislumbramos razão a justificar a diferenciação entre a sentença homologatória de acordo e a quehomologa a arbitragem, entendemos, num esforço de interpretação, que a menção feita no art. 26,quando fala em irrecorribilidade, é referente apenas ao “recurso inominado” previsto no art. 41.

Necessário frisar que o acordo ou laudo arbitral pode deixar de mencionar algum aspectorelevante da causa ou incidir em grave contradição, obscuridade ou erro material, capaz decomprometer a efetividade da solução adotada. Nessas situações, afastando o cabimento dosembargos de declaração em face da sentença homologatória do acordo ou do laudo arbitral, adecisão transitaria em julgado imediatamente e o vício existente não poderia mais ser atacado, dianteda proibição do manejo da ação rescisória (art. 59).8 Por isso é tão importante defender o cabimentodos aclaratórios em face das sentenças homologatórias mencionadas no art. 41.

A decisão interlocutória proferida no primeiro grau de jurisdição

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1.3.2.1

Ao contrário do que ocorre com a sentença, a Lei 9.099/1995 não previu um recurso específicopara atacar as decisões interlocutórias proferidas no primeiro grau de jurisdição. A razão dessapostura, por certo, foi evitar que a oralidade ficasse comprometida pela interposição de um recursoantes da prolação da sentença, vulnerando a concentração dos atos em audiência e a identidade físicado juiz. Além disso, de acordo com a Lei 9.099/1995, a fase cognitiva do procedimento sumaríssimofoi concebida para produzir uma sentença em, no máximo, 15 dias, contados da distribuição dapetição inicial, tornando desnecessária qualquer revisão sobre as pouquíssimas decisõesinterlocutórias que eventualmente pudessem vir a ser proferidas.9

A recorribilidade das decisões interlocutórias, no entanto, sempre gerou muitas controvérsias,pois, como se sabe, existem situações que inegavelmente causam graves e imediatos danos às partes.Por outro lado, ao longo do tempo, os procedimentos da Lei 9.099/1995 foram se dilatando paramuito além dos 15 dias imaginados pelo legislador, tornando imperiosa a revisão das decisõesproferidas fora da sentença. Note-se, também, que o legislador deixou de considerar que osprocedimentos executivos são repletos de decisões interlocutórias importantes e que a sentença, namaioria das vezes, é meramente declaratória sobre a satisfação do crédito. Por isso, várias correntesde pensamento surgiram para tentar definir o que poderia ser feito em relação às decisõesinterlocutórias nos Juizados Especiais que pudessem causar dano grave para as partes do processo.

Note-se que a questão debatida gravita basicamente em torno do cabimento do agravo deinstrumento ou do mandado de segurança em face das decisões interlocutórias, pois, em relação aosembargos de declaração, a posição majoritária é que eles são cabíveis em face das decisõesinterlocutórias proferidas nos Juizados Especiais.10

Analisando as diferentes opiniões sobre o assunto, podemos reunir as correntes de pensamentosobre a recorribilidade das decisões interlocutórias em três grupos: a) a impossibilidade absoluta deimpugnação imediata das decisões interlocutórias; b) a impugnação imediata das decisõesinterlocutórias exclusivamente por mandado de segurança; c) a recorribilidade imediata dedeterminadas decisões interlocutórias.

A impossibilidade absoluta de impugnação imediata das decisões interlocutórias

Diante do silêncio da Lei 9.099/1995, a conclusão que foi abraçada pela doutrina ejurisprudência foi que o legislador adotou, de maneira implícita, um dos consectários do princípio daoralidade: a irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias.11 Em razão disso, asdecisões interlocutórias proferidas ao longo do procedimento não sofreriam os efeitos da preclusão12

e, uma vez proferida sentença, passam a ser impugnáveis pelo “recurso inominado”,13 nos moldes doque agora prevê o art. 1.009, § 1º, do CPC. Com isso, parte da doutrina passou a sustentar que emface das decisões interlocutórias não caberia qualquer tipo de impugnação, seja por agravo deinstrumento ou por mandado de segurança. Wander Paulo Marotta Moreira14 foi um dos primeiros

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defensores dessa tese. Posições como essa, no entanto, acabaram ficando isoladas, pois nãoapresentaram soluções para os problemas existentes.

Não obstante, em 20.05.2009, o STF surpreendeu a comunidade jurídica nacional ao proclamar,de forma categórica, a prevalência da tese da impossibilidade absoluta de impugnação das decisõesinterlocutórias proferidas nos Juizados Especiais. Nesse dia, sob a relatoria do Ministro Eros Grau,o STF manteve o acórdão da 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Tribunal de Justiçado Estado da Bahia, que havia afirmado a inadmissibilidade do mandado de segurança contradecisão interlocutória dos Juizados Especiais. A posição foi tomada no julgamento do RecursoExtraordinário 576.847/BA, levado ao Plenário da Suprema Corte por iniciativa do seu relator.

De acordo com o voto vencedor, a parte que opta pelo procedimento dos Juizados Especiais jásabe de antemão que as decisões interlocutórias ali proferidas são irrecorríveis, não desafiandorecurso ou mandado de segurança, em nome da celeridade e informalidade. Assim, arrematou orelator, os prazos de 10 dias para agravar e de 120 dias para impetrar mandado de segurança “não secoadunam com os fins a que se volta a Lei 9.099”. Ademais, a admissão de mandado de segurançaampliaria a competência dos Juizados Especiais, o que só pode ser feito pelo Poder Legislativo. Porfim, observou que “não há, na hipótese, afronta ao princípio constitucional da ampla defesa, vez queas decisões interlocutórias podem ser impugnadas quando da interposição do recurso inominado”.Veja-se como ficou ementada essa decisão:

“Recurso extraordinário. Processo civil. Repercussão geral reconhecida. Mandado desegurança. Cabimento. Decisão liminar nos Juizados Especiais. Lei 9.099/1995. Art. 5º, LV,da Constituição do Brasil. Princípio constitucional da ampla defesa. Ausência de violação. 1.Não cabe mandado de segurança das decisões interlocutórias exaradas em processossubmetidos ao rito da Lei 9.099/1995. 2. A Lei 9.099/1995 está voltada à promoção deceleridade no processamento e julgamento de causas cíveis de complexidade menor. Daí terconsagrado a regra da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, inarredável. 3. Nãocabe, nos casos por ela abrangidos, aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, sob aforma do agravo de instrumento, ou o uso do instituto do mandado de segurança. 4. Não háafronta ao princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV, da CB), vez que decisõesinterlocutórias podem ser impugnadas quando da interposição de recurso inominado. Recursoextraordinário a que se nega provimento”.

Com o devido respeito, mas essa decisão é completamente absurda, não apenas por defenderuma tese tecnicamente frágil, mas também por partir de várias premissas equivocadas. Em primeirolugar, é falacioso dizer que a opcionalidade do procedimento legitimaria a exclusão do mandado desegurança. Quem estava recorrendo ao STF era o réu do processo originário, que não escolheu irpara os Juizados, mas foi para lá levado pela citação. Em segundo lugar, é errado assinalar, como fezo relator, que todos sabiam da impossibilidade de impetração do mandado de segurança nos JuizadosEspeciais. Dois meses antes desse julgamento, a Corte Especial do STJ havia editado a Súmula 376,

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1.3.2.2

tratando exatamente do mandado de segurança nos Juizados Especiais, com o seguinte enunciado:“Compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizadoespecial”. Note-se que o objetivo da súmula não era tratar do cabimento do mandado de segurança,pois isso não era controvertido, mas identificar o órgão competente para julgá-lo. O próprio STFtinha, até então, firme jurisprudência sobre o cabimento do mandado de segurança nos JuizadosEspeciais, desde a edição da Lei 9.099/1995.15 Em terceiro lugar, no caso concreto, o procedimentojá estava em fase de execução. Logo, aguardar a sentença para recorrer das decisões interlocutóriasde caráter executivo, como decisões sobre a penhora, a expropriação ou o pagamento, por exemplo,de nada adiantaria para o recorrente.

Posteriormente a esse julgado, entretanto, o STF voltou a reconhecer a possibilidade deinterposição do mandado de segurança nos Juizados Especiais, em vários arestos, inclusive por meiode seu Tribunal Pleno. Veja-se, neste sentido, o seguinte trecho de um acórdão:

“Competente a Turma Recursal para processar e julgar recursos contra decisões de primeirograu, também o é para processar e julgar o mandado de segurança substitutivo de recurso”.16

Portanto, a tese da irrecorribilidade absoluta voltou a ficar isolada na jurisprudência pátria,17

sendo a única corrente de pensamento a defender o não cabimento do mandado de segurança em facedas decisões interlocutórias dos Juizados Especiais. As outras teses admitem, em maior ou menorgrau, a utilização do remédio heroico naquela seara.

A impugnação imediata das decisões interlocutórias exclusivamente por mandado desegurança

O entendimento da irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias nos JuizadosEspeciais representa a orientação majoritária em nosso País. De acordo com os partidários dessacorrente, as decisões interlocutórias nos Juizados Especiais não seriam passíveis de agravo deinstrumento, por conta da oralidade e da celeridade do procedimento. Além disso, a falta de previsãoexpressa desse recurso na Lei 9.099/1995 serviria para reforçar essa orientação. Não obstante, osdefensores dessa corrente sustentam que essas decisões poderiam ser atacadas pelo mandado desegurança,18 quando presentes os requisitos legais.19

Apesar de concordarmos com a utilização do mandado de segurança nos Juizados Especiais,não podemos deixar de reconhecer que em determinados casos esse instrumento não é adequado paraventilar a legítima irresignação da parte interessada em face das decisões interlocutórias proferidasao longo do procedimento. Com efeito, algumas decisões podem ser péssimas e, nem por isso,violadoras de um direito líquido e certo da parte.20 O exemplo mais emblemático dessa questãoocorre quando o juiz indefere um pedido de tutela antecipada. No caso concreto pode ser muitodifícil demonstrar a existência de um direito líquido e certo à antecipação da tutela. No entanto, a

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1.3.2.3

irrecorribilidade dessa decisão pode não apenas frustrar as legítimas expectativas do interessado,mas também comprometer a efetividade da tutela jurisdicional final.

A recorribilidade imediata de determinadas decisões interlocutórias

A terceira e última tese é aquela que defende o cabimento do agravo de instrumento em face dasdecisões interlocutórias proferidas no primeiro grau dos Juizados Especiais. Com efeito, não se podesimplesmente negar o cabimento do agravo de instrumento, dentro de uma ótica constitucional doprocesso. Na mesma medida em que as decisões interlocutórias assumiram um papel essencial naforma da prestação da tutela jurisdicional no Brasil nas últimas décadas, o seu controle passou a serum desdobramento natural e indissociável para o adequado cumprimento das suas funções.

Para a parte requerente, por exemplo, tão importante como uma decisão que defere uma tutelaantecipada é a decisão que julga o recurso contra o seu indeferimento. A parte requerida, por sua vez,sem poder recorrer contra uma decisão que defere uma tutela antecipada, assume no processo umapostura de mero espectador. Do ponto de vista dogmático, dizer que cabe tutela antecipada, mas quenão cabe recurso sobre a decisão que trata desse tema, é uma contradição insuperável, uma vez queesse pronunciamento representa uma “sentença”, dada no curso do procedimento, de formaprovisória e fundada em cognição sumária. A situação fica ainda mais aguda na hipótese de umjulgamento parcial do mérito (art. 356 do CPC), realizado por meio de uma decisão interlocutória(art. 203, § 2º, do CPC), que transita em julgado e permite a execução definitiva. Nesse caso, semuma impugnação imediata, a questão não poderá mais ser revista, nem mesmo em sede de “recursoinominado”.

Tão grande é essa contradição, que, como vimos, a doutrina e a jurisprudência passaram aaceitar o mandado de segurança como sucedâneo do agravo de instrumento nos Juizados. E assim,caímos em nova contradição: negar o cabimento do agravo de instrumento, mas aceitar o cabimentodo mandado de segurança, com rito especial e uma série de particularidades, opera contra ainformalidade da Lei 9.099/1995. Essa postura faz com que o controle das decisões interlocutóriasse afaste dos princípios fundamentais dos Juizados Especiais (art. 2º), além de vulgarizar o uso domandado de segurança.

Por esses motivos, embora continuemos a aceitar a impetração do mandado de segurança, emcaráter excepcional, como ocorre no juízo ordinário, temos que é inevitável reconhecer o cabimentodo agravo de instrumento em face de determinadas decisões interlocutórias proferidas nos JuizadosEspeciais. Apesar de ser um entendimento minoritário,21 em alguns Estados a utilização do agravo deinstrumento é aceito de forma pacífica. Além disso, o STJ vem reiteradamente afirmando seucabimento. Nesse sentido, veja-se o seguinte aresto:

“Juizado Especial Cível. Decisão interlocutória. Agravo de instrumento. Competência. Turmarecursal. 1 – Cabe à Turma recursal e não ao Tribunal de Justiça julgar agravo de instrumento

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tirado de decisão singular do juiz que julga deserta apelação por insuficiência de preparo. 2 –Os juizados especiais e os colegiados recursais respectivos não têm relação de subordinaçãorecursal com os Tribunais de Justiça”.22

O grande desafio, no entanto, é definir quais são as decisões que estão sujeitas ao agravo deinstrumento. Nesse passo, importante destacar que a recorribilidade em separado das decisõesinterlocutórias foi construída dentro do Sistema dos Juizados Especiais, em primeiro lugar, pelaedição da Lei dos Juizados Especiais Federais, na qual o legislador previu o cabimento de recursoem face das decisões sobre tutelas cautelares incidentais (art. 5º da Lei 10.259/2001).23 Essa diretrizfoi seguida e ampliada, mais tarde, pela Lei dos Juizados Especiais Fazendários (art. 4º da Lei12.153/2009), que previu a recorribilidade em separado das decisões sobre tutelas de urgênciaincidentais.24 Portanto, hoje, entre aqueles que admitem o cabimento do recurso, o entendimentoprevalente é que, razão da aplicação analógica dos dispositivos presentes na Lei dos JuizadosEspeciais Federais e dos Juizados Especiais Fazendários, somente é possível a interposição deagravo de instrumento em relação às decisões sobre tutelas provisórias incidentais nos JuizadosEspeciais Estaduais.

Na nossa visão, entretanto, o agravo de instrumento não fica restrito às decisões sobre tutelasde urgência. Como visto, a execução na Lei 9.099/1995 segue a estrutura da execução prevista noCPC, por determinação do caput do art. 52. Logo, não há como afastar dos Juizados Especiais aaplicação da regra contida no parágrafo único do art. 1.015 do CPC, que prevê o cabimento doagravo de instrumento em face da decisão proferida na liquidação de sentença, na fase decumprimento de sentença e no processo de execução. Além dessas hipóteses, temos outras situaçõesque reclamam imediata revisão sob pena de causar prejuízos para as partes25 e para a efetivaprestação jurisdicional. Além disso, é preciso alinhar o tema com o tratamento dado à questão peloCPC (art. 1.015).

Por conta desses argumentos, defendemos que o agravo de instrumento é cabível para atacardecisões interlocutórias de primeiro grau sobre:26 a) tutelas provisórias; b) julgamento parcial domérito da causa;27 c) rejeição da alegação de convenção de arbitragem; d) inclusão ou exclusão delitisconsortes ou de réus; e) substituição de réus; f) aceitação ou rejeição do amicus curiae; g)concessão ou rejeição de efeito suspensivo; h) inadmissibilidade do “recurso inominado”;28 e i) aredistribuição do ônus da prova.29 Somem-se a esse rol todas as decisões proferidas ao longo daliquidação ou da execução.30

As demais decisões interlocutórias proferidas ao longo do processo, como já dito, poderiamser revistas pelo “recurso inominado”, após a prolação da sentença, diante da ausência de preclusão(art. 1.009, § 1º, do CPC), mas permaneceriam sujeitas ao mandado de segurança, pelo período de120 dias, contados da sua publicação (art. 23 da Lei 12.016/2009). Assim, por exemplo, se o juiznão permite a vista dos autos pelo advogado, pode ser impetrado o writ of mandamus para sanar a

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1.3.3

1.3.4

1.4

ilegalidade.

A decisão monocrática preferida em segundo grau de jurisdição

Como é sabido, o relator, num órgão colegiado de segundo grau, pode monocraticamenteproferir pronunciamentos ordinatórios, chamados genericamente de despachos, e decisórios (art. 932do CPC), que podem ser subdivididos em probatórios, homologatórios, liminares, incidentais,terminativos e definitivos. Pois bem, existe uma controvérsia sobre a possibilidade de o relatorproferir pronunciamentos decisórios de forma isolada nas Turmas Recursais, em razão da dicção doart. 41, § 1º, da Lei 9.099/1995. Nele está dito que o “recurso inominado” será julgado “por umaturma composta por três juízes togados”. Portanto, seguindo a expressão literal da Lei, o relator nãopoderia atuar monocraticamente, seja para proferir despachos ou mesmo pronunciamentosdecisórios.

Em nossa visão, entretanto, a regra contida no art. 932 do CPC é aplicável aos JuizadosEspeciais, de forma subsidiária, não apenas por estar em consonância com os seus princípiosfundamentais (art. 2º),31 mas também porque representa uma exceção à regra do pronunciamentocolegiado.32 Aliás, o próprio CPC também tem uma regra que diz que no “julgamento de apelação oude agravo de instrumento, a decisão será tomada, no órgão colegiado, pelo voto de 3 (três) juízes”(art. 941, § 2º). De modo que a redação do § 1º do art. 41 da Lei não representa obstáculo àaplicação do art. 932 do CPC nos Juizados Especiais.

Por outro lado, se o relator numa Turma Recursal profere uma decisão monocrática, tal julgadoserá recorrível por agravo interno (art. 1.021 do CPC)33 e embargos de declaração (arts. 48 e 1.024,§ 2º, do CPC). Nesse passo, importante lembrar que o fato de o art. 48 dizer que os embargos dedeclaração são cabíveis contra “sentença ou acór-dão” não inibe a sua utilização em face da decisãomonocrática do relator. Com efeito, a referência deve ser interpretada de forma ampla para abarcartambém a decisão do relator que substitui o acórdão que seria proferido pela Turma.

A decisão colegiada proferida em segundo grau de jurisdição

De acordo com o entendimento majoritário, o acórdão proferido pela Turma Recursal somentepoderia ser atacado por embargos de declaração (art. 48) e por recurso extraordinário para o STF(art. 102, III, da CF).34 Destarte, da decisão colegiada não caberiam recursos para o Tribunal deJustiça ou para o STJ. No primeiro caso, por não haver atribuição revisional; no segundo, pelo fatode a Turma Recursal não se enquadrar no conceito de tribunal para fins do art. 105 da CF.

A NECESSIDADE DA ATUAÇÃO TÉCNICA NA FASE RECURSAL

Conforme dispõe o § 2º do art. 42, a presença de um advogado é obrigatória em sede recursal,em todas as causas processadas nos Juizados Especiais, qualquer que seja a alçada. Mantovanni

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1.5

Colares Cavalcante35 afirma que tal exigência é inconstitucional, por ser “incompatível com oespírito da lei e do juizado especial que, repita-se, engloba não só o juizado em si como também aTurma Recursal”. E arremata: “Como a parte não dispõe de conhecimentos técnicos para alinhar asrazões do recurso, caberá à Turma Recursal analisar todo o julgamento, para verificar se realmenteaquela foi a decisão correta proferida pelo juiz do juizado especial”.

Data venia, mas não concordamos com a proposição apresentada por Cavalcante. Por um lado,como a dispensa da atuação do advogado é a exceção, a Lei não pode ser tachada de inconstitucionalpor aplicar a regra. Ademais, se assim o fosse, também seria inconstitucional a exigência deadvogado nas causas acima de 20 salários mínimos. Por outro lado, os mecanismos recursais sãoevidentemente mais complexos do que os necessários para o ajuizamento da demanda. Assim, nosparece acertado estabelecer a obrigatoriedade da assistência técnica em fase recursal,independentemente de defendermos a inconstitucionalidade da dispensa prevista no art. 9º. Registre-se, ainda, que não nos parece correto entregar para a Turma Recursal a tarefa de rever a decisão,como que numa modalidade especial de reexame necessário (art. 496 do CPC). De fato, temos quetal entendimento não se coaduna com princípios fundamentais do processo, tais como a inércia, aimparcialidade, a congruência, o tantum devolutum quantum appellatum etc.

De qualquer forma, a atuação do advogado se faz necessária em todos os recursos, desde ainterposição até o julgamento. Somente o profissional técnico pode fazer, por exemplo, a sustentaçãooral perante as Turmas Recursais ou a apresentação de contrarrazões. Assim, uma manifestaçãorecursal feita sem advogado deve ser reputada como inválida e ineficaz, da mesma forma queocorreria no juízo ordinário.

AS ESPÉCIES DE RECURSOS CABÍVEIS NO SISTEMA RECURSAL DOSJUIZADOS

Na Lei 9.099/1995 somente estão previstas duas espécies de recurso, os embargos dedeclaração (art. 48) e o “recurso” contra sentença (art. 41). Importante destacar que a Lei dosJuizados Especiais deixou de atribuir um nome para o recurso cabível contra sentença, preferindoidentificá-lo, apenas, como “recurso”. Colocar “recurso” como nome de uma espécie de recurso,além de atécnico, cria uma confusão desnecessária. Na prática, essa espécie de recurso vem sendochamada de “recurso inominado”,36 antonomásia que usamos a contragosto. De acordo com osdicionários, “inominado” é aquilo que não tem nome. Por isso, nomear algo de “inominado” nosparece uma contradição. Em nosso sentir, o “recurso” deveria ser chamado de apelação,37 comoocorre na parte criminal da Lei 9.099/1995 (art. 82).

Excluindo essas duas modalidades, existe grande controvérsia acerca de quais seriam os outrosrecursos cabíveis em face das decisões proferidas nos Juizados Especiais. O entendimento assente éque do acórdão da Turma Recursal cabe o recurso extraordinário para o STF (art. 102, III, da CF e

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1.5.1

1.5.1.1

arts. 1.029 e seguintes do CPC) e, da decisão que o inadmite na origem, agravo interno (art. 1.030, §2º, do CPC) ou agravo em recuso extraordinário para o STF (art. 1.042 do CPC). Igualmente,prevalece o entendimento de que, no caso de o relator proferir monocraticamente uma decisão (art.932 do CPC), caberia agravo interno para a Turma Recursal (art. 1.021 do CPC).38

Por outro lado, é amplamente majoritário o entendimento de que não cabe: a) agravo deinstrumento das decisões interlocutórias proferidas no primeiro grau (art. 1.015 do CPC); b) recursoespecial para o STJ (art. 105, III, do CPC); c) recurso ordinário em mandado de segurança julgadona Turma Recursal, ainda que denegatória a decisão (art. 105, II, b, da CF).39 Da mesma forma, nãosão cabíveis recursos das decisões proferidas pelas Turmas para o Tribunal de Justiça.40 Nestaúltima hipótese, além da ausência de previsão legal, não se deseja criar, dentro do regime dosJuizados Especiais, novas instâncias de julgamento, já que da decisão do Tribunal de Justiça caberiauma infinidade de outros recursos.

O “recurso inominado”

O cabimento

Nos Juizados Especiais, em face da sentença, seja definitiva ou terminativa, proferida antes oudepois da citação, cabe “recurso inominado”. Trata-se, pois, de recurso análogo à apelação (art.1.009 do CPC), que, por isso mesmo, deve servir de parâmetro para sua aplicação.41

Tal qual a apelação, o “recurso inominado” visa atacar os vícios contidos na sentença,decorrentes da interpretação jurídica ou fática. Alexandre Câmara,42 entretanto, afirma que o“recurso inominado” só poderia apreciar matéria de direito e não de fato, sob pena de violar oprincípio da identidade física do juiz. Segundo esse autor, como o procedimento é marcado porintensa oralidade, somente o juiz de primeiro grau poderia analisar os fatos deduzidos em juízo. Datavenia, mas não concordamos com a afirmação. Por um lado, os recursos de direito estrito são umaexceção em nosso sistema recursal e dependem de expressa previsão legal para ostentarem talcaracterística, em razão do princípio da taxatividade. Por outro lado, apesar de reconhecer que afalta de registro escrito dos atos corridos em audiência (art. 36) efetivamente fragiliza o julgamentorecursal das matérias de fato, isso não justifica a exclusão de sua apreciação. Nesse sentido,defendemos que sejam buscados mecanismos capazes de incrementar a aplicação do art. 44 da Lei,permitindo um maior contato dos integrantes da Turma Recursal com os fatos ocorridos emaudiência.

Além dos vícios contidos na sentença, o “recurso inominado” pode atacar também os defeitospresentes nas decisões interlocutórias proferidas ao longo do procedimento que não desafiaremagravo de instrumento, na esteira do disposto no § 1º do art. 1.009 do CPC. Por conta dairrecorribilidade em separado, tais decisões não sofrem preclusão e podem ser revistas por meio do

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1.5.1.2

1.5.1.3

“recurso inominado” ou das contrarrazões ao “recurso inominado”.O “recurso inominado”, por outro prisma, ostenta algumas diferenças significativas em relação

à apelação. Em primeiro lugar, o prazo para interpor e para responder é de 10 dias (art. 42),enquanto na apelação o prazo é de 15 dias (art. 1.003, § 5º, do CPC). Em segundo lugar, o preparo do“recurso inominado” deve ser feito em até 48 horas da interposição (art. 42, § 1º), enquanto opreparo da apelação deve ser demonstrado no momento da interposição (art. 1.007 do CPC). Emterceiro lugar, o “recurso inominado” tem, em regra, apenas o efeito devolutivo (art. 43), ao contrárioda apelação, que tem, ressalvados os casos expressos, duplo efeito (art. 1.012 do CPC). Por fim, o“recurso inominado” é dirigido para a Turma Recursal (art. 41, § 1º), ao passo que a apelação édirigida ao Tribunal correspondente (art. 1.011 do CPC).

O prazo para interposição

Como a Lei estabelece que a sentença será proferida em audiência (art. 28), é a partir dessadata que começa a contagem do prazo recursal, ainda que a parte não esteja presente ao ato (art. 19, §1º). A mesma lógica se aplica quando o juiz marca data para a leitura da sentença.43 Quando asentença é proferida fora de audiência ou quando foi impugnada por embargos de declaração,entretanto, o entendimento dominante tem sido no sentido de que a contagem do prazo parainterposição do “recurso inominado” inicia-se com o recebimento da intimação da parte e não com ajuntada nos autos do mandado de intimação cumprido.44 Apesar de se mostrar condizente com ospreceitos da celeridade e economia processuais que inspiraram o procedimento, somos forçados areconhecer que tal expediente não tem embasamento legal para se sustentar. Note-se que o § 3º do art.231 do CPC diz que o prazo para cumprimento da determinação judicial corresponderá à data em quese der a comunicação, quando o ato tiver de ser praticado diretamente pela parte. No caso em tela,entretanto, o ato a ser praticado – a interposição do recurso – só pode ser feito por meio deadvogado (art. 41, § 2º, da Lei 9.099/1995). Assim, deve ser aplicado subsidiariamente o dispositivocontido no art. 1.003 do CPC, que estabelece a data da intimação (art. 231, caput, do CPC) comotermo a quo da contagem do prazo para interposição dos recursos. Somente se a parte estiver atuandosem o patrocínio de advogado45 é que a contagem do prazo poderá ser feita a partir da comunicação.

No caso de o processo onde a sentença foi proferida tramitar por meio eletrônico, o prazo parainterposição do “recurso inominado” será contado da intimação eletrônica, nos termos do art. 231, V,do CPC, mesmo que a sentença tenha sido publicada anteriormente, por outros meios. De fato, nocaso de duplicidade, a intimação eletrônica deve prevalecer sobre a intimação feita pela publicaçãono Diário da Justiça.

O preparo

Conforme preceitua o parágrafo único do art. 54 da Lei, o preparo para o “recurso inominado”

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compreende “todas as despesas processuais, inclusive aquelas dispensadas em primeiro grau dejurisdição, ressalvada a hipótese de assistência judiciária gratuita”. O preparo, portanto, não serádevido pelas partes isentas de custas, conforme preceituado pela legislação específica, notadamentepela Lei 1.060/1950 (Lei de Gratuidade de Justiça) e pelos arts. 98 a 102 do CPC. Para que a partepossa desfrutar da isenção legal, deve ser formulado ao juiz um pedido de gratuidade, corroboradopela afirmação da sua necessidade.

No caso do “recurso inominado”, se o recorrente já não estava acobertado pela isenção, opedido de gratuidade deve ser formulado no corpo da petição de interposição recursal, paraapreciação pelo relator na Turma Recursal.46 Caso o relator não defira o pedido, deverá assinar oprazo de 48 horas para a realização do recolhimento (art. 99, § 7º, do CPC).47 Registre-se, como serávisto mais à frente, que o entendimento majoritário é que o próprio juízo prolator da sentençarecorrida é que deve analisar o pedido de gratuidade formulado no corpo da petição de interposiçãodo “recurso inominado”, ao formular o juízo de admissibilidade recursal. Na nossa visão, entretanto,somente o relator pode fazer tal análise, em razão do comando estabelecido no art. 1.010, § 3º, doCPC.

Outro ponto que merece ser destacado é o fato de o prazo para realizar o preparo ter sidofixado em horas (art. 42, § 1º). O sistema adotado pela Lei 9.099/1995 é melhor do que aquele queexistia na versão original do CPC/1973, em que o preparo era feito no prazo de 10 dias da intimaçãopara tanto,48 mas é defasado em relação ao modelo atualmente em vigor, em que a realização dopreparo é comprovada no momento da interposição, sob pena de deserção (art. 1.007 do CPC). Nadaimpede, entretanto, que o recorrente apresente o comprovante do pagamento do preparo no momentoda interposição do recurso. Como esse prazo é estabelecido em horas, sua contagem deveria ser feitaminuto a minuto (art. 132, § 4º, do CC), a partir da interposição do recurso.49 Assim, se o recorrenteinterpôs o “recurso inominado” às 15h23 de determinado dia, teria até as 15h23 do segundo dia útilsubsequente para efetuar o preparo. Note-se que, por não ser necessária a intimação, não haveráintervalo entre a interposição do recurso e o início da contagem do prazo.

Apesar da clareza do comando contido no art. 42, § 1º, alguns Estados não têm respeitado acontagem feita minuto a minuto do prazo para realização do preparo, adotando ora o término doexpediente forense, ora o término do expediente bancário do segundo dia após a interposição comotermo a quo para o preparo.50 Em que pese não concordarmos com a fixação desse prazo em horas,se a Lei assim previu, deve ser aplicada a regra do Código Civil que estabelece a contagem minuto aminuto (art. 132, § 4º). Por certo, se houver algum incidente processual e for determinada a intimaçãoda parte para realizar o preparo se der pela publicação da decisão no Diário da Justiça, o prazoserá contado como se fosse em dias.

Sublinhe-se, ainda, que, embora a Lei diga que o preparo tem que ser feito em 48 horas, naprática os juízes têm entendido que nesse prazo o preparo deve ser feito e comprovado. De modoque, na prática, o recorrente tem 48 horas da interposição do recurso para realizar o preparo e

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comprová-lo, juntando nos autos a petição com a guia de recolhimento paga (art. 1.007 do CPC).Não tendo sido feito o preparo ou tendo sido ele feito de forma incompleta, deve-se aplicar o

art. 1.007 do CPC, que determina o seu pagamento em dobro ou a sua complementação, em cincodias, sob pena de deserção.51 Na vigência do CPC/1973, entretanto, a posição majoritária najurisprudência assinalava pela inaplicabilidade nos Juizados Especiais da regra que previa acomplementação do preparo feito a menor.52 Isso significava dizer que a falta de um centavo norecolhimento das custas e taxas judiciais levaria à deserção do recurso, sem possibilidade decomplementação.53 Isso é injusto e ilógico. Trata-se, com efeito, de um formalismo que pode levar acausa até a mais alta corte do País, por conta de uns poucos dias que seriam despendidos para acomplementação.54 Por outro lado, não há como negar a aplicação subsidiária do CPC, uma vez que aquestão não é tratada pela Lei 9.099/1995. Não se pode olvidar que o preparo no sistema dosJuizados Especiais já representa uma exceção, que deve ser interpretada, portanto, de formarestritiva (arts. 54 e 55). Assim, não é razoável afastar as regras do CPC, pois nessas hipóteses orecorrente demonstrou seu interesse e a sua boa-fé em promover a impugnação.55

O juízo de interposição

A petição de interposição do “recurso inominado”, inclusive com suas razões, deverá serlavrada por advogado e entregue, no prazo de 10 dias, por escrito, na secretaria do Juizado onde asentença foi proferida ou no setor de protocolo correspondente. Embora possa parecer inusitado quea interposição do “recurso inominado” tenha que ser feita por escrito, quando até a petição inicialpode ser oral (art. 14), é preciso lembrar que uma das ideias centrais da Lei 9.099/1995 édesestimular a impugnação das decisões, por meio da formalização do recurso e da cobrança decustas e taxas judiciais. Além disso, a previsão de interposição oral do “recurso inominado” somentepoderia ser aplicada quando a sentença fosse proferida em audiência. Nesse caso, em razão doprincípio da dialeticidade, a interposição oral exigiria a oitiva imediata do recorrido, prolongandopor demais a audiência de instrução e julgamento.

A petição de interposição

A petição de interposição do “recurso inominado” deve seguir, no que for cabível, as regrasprevistas para a petição de interposição da apelação (art. 1.010 do CPC). Assim, deve conter o nomedas partes, as razões de fato e de direito para justificar a revisão da sentença recorrida e o pedidorecursal. Na petição pode ser formulado ainda pedido de gratuidade de justiça e de concessão deefeito suspensivo ao recurso, caso estejam presentes os respetivos requisitos legais.

O “recurso inominado” adesivo

A posição prevalente na jurisprudência construída sob a vigência do CPC/1973 não admitia a

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utilização da via adesiva de interposição do “recurso inominado”, por conta da aplicação dosprincípios fundamentais dos recursos, especialmente da taxatividade. Na visão da ampla maioria dosjulgadores, a falta de autorização expressa no art. 500 do CPC/1973, que tratava do tema, impediriao ajuizamento do “recurso inominado” adesivo.56

Apesar da qualidade dos fundamentos apontados, entendemos, tanto no regime anterior como noatual, ser cabível a interposição adesiva do “recurso inominado”. Por um lado, como já tivemos aoportunidade de salientar, a natureza jurídica do “recurso inominado” é de apelação. Aliás, sempredefendemos que esse recurso deveria ser chamado de apelação, como ocorre com o recurso previstopara atacar a sentença na parte criminal da Lei 9.099/1995 (art. 82). De qualquer forma, o nome queo recurso recebe não pode ser motivo suficiente para justificar o afastamento das regrasmencionadas. Ademais, nos afigura que a interposição adesiva, fruto da racionalização processual, éplenamente compatível com o sistema dos Juizados Especiais, em especial com os princípioscontidos no art. 2º da Lei.57

O juízo de admissibilidade

Na vigência do CPC/1973, a doutrina e a jurisprudência majoritárias tratavam aadmissibilidade do “recurso inominado” utilizando-se dos parâmetros então existentes em relação àadmissibilidade da apelação. Assim, afirmavam que o juiz deveria fazer o juízo de admissibilidadequando do recebimento de petição recursal e das contrarrazões do recorrente. Mesmo nesse período,nós já defendíamos que a admissibilidade do “recurso inominado” deveria ser feita exclusivamentena Turma Recursal, em razão da redação do art. 42 da Lei 9.099/1995, que atribui à secretaria doJuizado o papel de processar o recurso.

Com a edição do CPC/2015, entendemos que restou consolidado que o juízo deadmissibilidade do “recurso inominado” somente pode ser feito pela Turma Recursal.58 Isso porque oart. 1.010, § 3º, do CPC estabeleceu que a apelação não teria mais o juízo de admissibilidade naorigem. Assim, à luz dessa diretriz, no procedimento do “recurso inominado”, o juiz do Juizadosomente teria atribuição para corrigir erros materiais, formar o juízo de retratação, nas hipóteses emque ele é cabível, e julgar embargos de declaração (art. 494 do CPC).59 Dentro dessa lógica, após ainterposição do “recurso inominado”, a própria Secretaria do Juizado fica responsável por certificara regularidade formal do recurso (tempestividade, preparo, patrocínio de advogado etc.) e abrir vistaao recorrido. Em seguida, não havendo providências judiciais a serem tomadas, a Secretaria deveremeter os autos diretamente para a Turma Recursal, que fica encarregada de analisar a suaadmissibilidade.

A orientação construída após a entrada em vigor do CPC/2015, no entanto, preferiu ignorar asmudanças ocorridas no procedimento da apelação e decidiu manter o juízo de admissibilidade sendofeito pelo primeiro grau de jurisdição.60 Trata-se, pois, de um posicionamento desprovido de base

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legal e que atenta contra os princípios fundamentais dos Juizados Especiais (art. 2º). O resultadodisso é que o procedimento do “recurso inominado” ficou mais formal do que o procedimento daapelação. Pior, mantendo o juízo de admissibilidade na origem, cria-se a possibilidade do juizinadmitir o “recurso inominado”, situação que no regime do CPC/1973 permitia a interposição deagravo de instrumento. Como não existe mais no CPC/2015 a hipótese de cabimento do agravo deinstrumento em face da decisão que inadmite a apelação, o entendimento majoritário é que, em faceda decisão que inadmite o “recurso inominado”, cabe mandado de segurança.61

De acordo com o nosso posicionamento, cabe ao relator na Turma Recursal formar o primeirojuízo de admissibilidade do “recurso inominado”, quando da sua chegada no segundo grau. Se adecisão for positiva e não for possível o julgamento monocrático pelo relator (art. 932 do CPC), oprocedimento recursal deverá seguir em frente e o colegiado terá oportunidade de reavaliar aadmissibilidade feita; caso contrário, sendo o “recurso inominado” inadmitido pelo relator, caberáagravo interno para a Turma Recursal, para definir a questão de forma colegiada (art. 1.021 doCPC).

Os procedimentos

Após a interposição do “recurso inominado”, dois procedimentos podem ser adotados. Se asentença foi proferida antes da citação do réu, nos raros casos em que isso pode acontecer (art. 330do CPC), o procedimento é similar ao previsto para a apelação no art. 331 do CPC. De fato,recebido o “recurso inominado”, o juiz poderá, depois de admitir o recurso, reformar a sua decisão,no prazo de cinco dias. Caso contrário, deverá determinar a citação do recorrido para oferecercontrarrazões no prazo de dez dias e, em seguida, remeter os autos à Turma Recursal. Trata-se de umprocedimento híbrido, que se inicia de forma unilateral, e depois, com a citação do recorrido, torna-se bilateral. Se, entretanto, a sentença veio à tona com o réu já citado, o procedimento éintegralmente bilateral e segue o regramento previsto nos parágrafos do art. 42: após a interposição,o recorrido é intimado pela secretaria para apresentar em dez dias suas contrarrazões ao recurso,antes de os autos serem encaminhados para o Conselho Recursal.

O entendimento majoritário,62 entretanto, acrescenta a esses dois procedimentos recursais umterceiro, previsto nos parágrafos do art. 332 do CPC.63 Nesse dispositivo foi regulado oprocedimento da apelação interposta em face de uma sentença que julga liminarmente improcedente opedido, em causas que dispensem a instrução probatória. Trata-se, como no caso do recurso contra asentença que indefere a petição inicial, de um procedimento recursal híbrido. Desse modo, admitidoo recurso e não havendo juízo positivo de retratação, será o recorrido citado para apresentarcontrarrazões. Nessa resposta, o recorrido deverá sustentar a correção do julgamento liminar, seassim entender.

Em qualquer dos ritos recursais, depois de processado na origem, o “recurso inominado” é

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distribuído a uma das Turmas Recursais correspondentes, onde será sorteado um relator. Como jávisto, o relator do “recurso inominado”, ao recebê-lo, pode formular juízo de admissibilidade,deferir tutelas provisórias, bem como julgar seu mérito, por aplicação do art. 932 do CPC. Nãosendo caso de julgamento monocrático, o relator deverá lavrar o seu voto e pedir dia para julgamentoao presidente da Turma. O julgamento do “recurso inominado” será feito em sessão pública, comprévia publicação da pauta e intimação das partes (art. 45), da mesma forma que na apelação peranteo juízo ordinário (art. 934 do CPC), observado o regulamento interno, no que couber. O advogadopoderá fazer uso da palavra, por período previamente determinado, que não deve ultrapassar 15minutos, como orientam os princípios informativos do art. 2º.64 No julgamento, a Turma Recursaldeverá analisar a admissibilidade e o mérito do recurso, por meio de seu colegiado.

Na decisão que julgar o “recurso inominado”, deverá a Turma Recursal fixar os ônussucumbenciais decorrentes da inadmissibilidade ou da improcedência da pretensão recursal (art. 55da Lei 9.099/1995). Nesse caso, deverão ser aplicadas subsidiariamente as regras sobresucumbência recursal, previstas no art. 85, § 11, do CPC.

O efeito suspensivo

No direito processual civil brasileiro, a regra é que a interposição da apelação gere efeitodevolutivo e suspensivo, ressalvadas algumas hipóteses expressamente previstas no CPC (art. 1.012,§ 1º) e em outras leis especiais (art. 58, V, da Lei do Inquilinato, art. 3º, § 5º, da Lei da AlienaçãoFiduciária em Garantia etc.). É que o nosso sistema recursal adotou como regra a enumeração legaldos efeitos da interposição dos recursos (princípio da taxatividade).65 Nos Juizados Especiais,entretanto, de acordo com o art. 43 da Lei 9.099/1995, a interposição do “recurso inominado” sóproduzirá o efeito devolutivo,66 ressalvados os casos nos quais o juiz pode “dar-lhe efeitosuspensivo, para evitar dano irreparável à parte”.

Da leitura do art. 43 da Lei 9.099/1995 é possível concluir que a lei disse menos do quedeveria dizer. De fato, por se tratar de um pronunciamento cautelar, a concessão do efeito suspensivoao “recurso inominado” deve ser interpretado de forma integrativa com modelo previsto no art. 300do CPC. Assim, o dano a ser observado deve estar relacionado ao resultado útil do processo e nãoapenas ao interesse da parte (periculum in mora), além de ser necessária também a presença daprobabilidade do direito alegado (fumus boni iuri).

Apesar das deficiências presentes na redação do art. 43 da Lei 9.099/1995, é precisoreconhecer que a retirada do efeito suspensivo automático do “recurso inominado” é uma iniciativadigna de aplauso. Esse modelo é mais moderno que o existente no CPC (art. 1.012) e reflete umatendência mundial, em matéria de recursos, de acabar com a concessão do efeito suspensivo opi legis(previsto em lei) e se passar para o sistema opi judicis (motivado pelo juiz), como já acontece empaíses como a Itália e a Alemanha.

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É importante lembrar que, no juízo ordinário, a sentença já nasce suspensa e a apelação, salvonos casos previstos em lei, prolonga esse estado de suspensão. Nos Juizados Especiais, ao revés, asentença nasce suspensa, mas ao ser impugnada pelo “recurso inominado” começa a produzir efeitos,se não houver a aplicação do art. 43. Portanto, em regra, durante o julgamento do recurso, a sentençaestará produzindo todos os seus efeitos, principais e acessórios. Se houver uma multa periódica paracompelir o cumprimento de uma obrigação (art. 52, V), sua fluência será contínua e poderá chegar aum valor bastante significativo. Uma sugestão para a parte que quiser recorrer de uma sentença quefixou multa é pedir o efeito suspensivo e, alternativamente, pedir o arbitramento de caução (art. 300,§ 1º, do CPC) ou efetuar o depósito, seja do bem reclamado ou da quantia cobrada.

Questão complexa é determinar quem tem o poder de suspender os efeitos da sentença. Algunsautores, amparados pela interpretação literal do art. 43, têm defendido que compete apenas ao juiz doJuizado onde o “recurso inominado” foi interposto o papel de lhe atribuir efeito suspensivo.67 Oentendimento majoritário, entretanto, tem sido no sentido de que o efeito suspensivo pode serdeferido tanto pelo juiz do Juizado como pelo relator na Turma Recursal.68 Defendemos, entretanto,que somente o relator, na Turma Recursal, pode deferir o efeito suspensivo ao “recurso inominado”,nos moldes do que estabelece o art. 932 do CPC. Importante registrar que esse entendimento secoaduna com a nossa visão de que o juízo de admissibilidade do “recurso inominado” deve ser feitoexclusivamente pela Turma Recursal (art. 1.010, § 3º, do CPC). Por certo, se a decisão sobre opedido de concessão do efeito suspensivo for tomada pelo juiz do Juizado, o remédio para atacá-laserá, na nossa visão, o agravo de instrumento.69

A prevalecer a tese de que o juiz do Juizado não pode deferir efeito suspensivo ao “recursoinominado”, se a urgência da situação for contemporânea à prolação da sentença recorrida, épossível também formular o pedido de concessão de efeito suspensivo diretamente à Turma Recursal(art. 1.012, § 3º, do CPC). Assim, no período compreendido entre a interposição do “recursoinominado” e sua distribuição, será sorteado um relator especificamente para apreciar o pedido deconcessão do efeito suspensivo. Esse mesmo relator ficará prevento para julgar também o “recursoinominado” de onde partiu o pedido de concessão do efeito suspensivo.

De qualquer forma, como já dito, se não for deferido o efeito suspensivo ao “recursoinominado”, poderá o interessado, desde logo, promover a execução provisória da sentença, nostermos do art. 520 do CPC.

A tutela antecipada recursal

Da mesma forma que ocorre em relação ao efeito suspensivo, também é possível ao relator naTurma Recursal deferir o pedido de tutela antecipada em sede de “recurso inominado” (art. 932, II,do CPC). Os requisitos para a obtenção desse pronunciamento são os mesmos relativos à tutelaantecipada requerida em primeiro grau: a probabilidade do direito e o risco de dano (art. 300 do

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CPC). A diferença fundamental é que, na tutela antecipada recursal, o requerente tem que demonstrara existência do seu direito, em contraste com a decisão recorrida, o que torna sua tarefa muito maisdifícil. Não por acaso, na prática, são raros os casos de concessão dessa modalidade de tutela deurgência.

Por outro lado, a maioria dos relatores, quando concordam com as alegações recursais,preferem julgar monocraticamente o recurso do que deferir a tutela antecipada recursal.Tecnicamente, no entanto, o correto seria que o relator somente julgasse monocraticamente o “recursoinominado” quando a tese recursal nele ventilada estivesse amparada por padrões decisórios dotadosde eficácia vinculativa (art. 932, IV e V, do CPC). Assim, a tutela antecipada recursal seria deferidaapenas quando o relator concordasse com a tese defendida no recurso, mas ela não estivessefundamentada num padrão decisório vinculativo. Desse modo, após deferir a tutela antecipada, aquestão seria submetida ao crivo do colegiado.

O agravo de instrumento

Conforme assinalado, defendemos, minoritários, a tese da recorribilidade em imediato restrita,que admite a utilização do agravo de instrumento em face de determinadas decisões interlocutóriasproferidas em primeiro grau de jurisdição nos Juizados Especiais.70 Como esse recurso não estáregulado na Lei 9.099/1995, é preciso submetê-lo a um filtro principiológico para delinear o seufuncionamento dentro da estrutura judiciária especial. O primeiro grande desafio nesse sentido édefinir qual o prazo de interposição do agravo de instrumento nos Juizados Especiais.

Uma das diretrizes de estruturação dos Juizados Especiais, escorada nos princípios daceleridade e oralidade, é a redução de prazos ordinários para a prática dos atos processuais. Issopode ser visto em vários momentos na Lei 9.099/1995, como, por exemplo, no prazo para marcaçãoda audiência de conciliação (art. 16), no prazo para homologação da sentença (art. 26) e no prazo derequerimento para intimação das testemunhas (art. 34, § 1º). Nesse sentido, o prazo para ainterposição do “recurso inominado” também foi reduzido, em comparação com seu paradigma noCPC, a apelação. Tanto no CPC/1973 (art. 504) como no atual CPC (art. 1.003, § 5º), o prazo parainterposição da apelação é de 15 dias, enquanto na Lei dos Juizados, o prazo para interposição do“recurso inominado” é de 10 dias (art. 42). No regime do CPC/1973, no entanto, o prazo parainterposição do agravo de instrumento era de dez dias (art. 522), que o deixava em simetria com oprazo do “recurso inominado”. O CPC/2015, não obstante, ampliou o prazo para interposição doagravo de instrumento para 15 dias (art. 1.003, § 5º). Assim, aplicando essa regra aos JuizadosEspeciais, teríamos o recurso contra as decisões interlocutórias com um prazo maior parainterposição maior do que o prazo para interposição do recurso contra a sentença.

Por mais difícil que seja defender a redução de um prazo recursal, por meio de umainterpretação jurídica, parece-nos ser essa a melhor solução. De fato, discrepância dos prazos

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recursais, nesse caso, é inviável. A sentença é o ato mais importante do processo e o recurso que aataca, por conseguinte, é o componente mais importante do sistema recursal. Nenhum prazo recursalpode ser maior que o prazo para interposição do recurso contra a sentença. E essa lógica deveprevalecer nos Juizados Especiais.71 Por outro lado, ampliar o prazo da interposição do “recursoinominado” para 15 dias, para preservar a simetria, também não nos afigura correto. Estaríamos comisso invertendo a lógica de redução de prazos presente na Lei, além de desconsiderar o processonatural de assimilação das regras gerais pelo Sistema dos Juizados.

Por isso, sustentamos que o prazo para a interposição do agravo de instrumento nos JuizadosEspeciais é de dez dias, por aplicação sistemática do prazo previsto para a interposição do “recursoinominado” (art. 42).72

Outro ponto que merece ser debatido é aquele que diz respeito à necessidade de intervenção doadvogado na interposição do recurso. Nesse caso, parece claro que a petição de interposição doagravo de instrumento nos Juizados Especiais deve ser lavrada por advogado, independentemente dovalor da causa, em observância à regra prevista no art. 41, § 2º, da Lei 9.099/1995. A elaboração dorecurso em questão exige conhecimentos técnicos específicos, que fogem à compreensão geral deuma pessoa leiga.

A petição de interposição, feita exclusivamente sob a forma escrita, deve ser dirigidadiretamente para as Turmas Recursais73 e não para o Tribunal de Justiça,74 observando os requisitosgerais do art. 1.016 do CPC. Assim, a petição tem que identificar as partes75 e seus advogados e adecisão que está sendo impugnada, bem como apresentar as razões de fato e de direito que ensejam asua reforma ou invalidação. Necessário ainda que conste o pedido recursal, com as características dadecisão que se busca ver proferida, para substituir a decisão agravada.

De acordo com o art. 1.017 do CPC, junto com a petição de interposição, se os autos não foremeletrônicos ou o envio for feito por fax, deverão ser anexadas obrigatoriamente cópias da petiçãoinicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, dacertidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade e dasprocurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado. Caso não existam nos autosalguns desses documentos, tal fato deve ser expressamente declarado pelo agravante na petição deinterposição. O agravante pode, também, juntar outras peças que entenda úteis ou necessárias aodeslinde da questão. Importante destacar que a falta de algum documento na instrução do recurso, noregime do CPC, deve ser objeto de intimação do agravante, nos termos do seu art. 1.007, § 3º.

O agravo de instrumento deve ser devidamente preparado, se o agravante não estiveracobertado por alguma modalidade de isenção (arts. 41, § 2º, e 54, parágrafo único, da Lei9.099/1995). Isso porque o modelo de acessibilidade dos Juizados Especiais é voltado para atramitação do feito em primeiro grau. A utilização da via recursal, portanto, deve se submeter àsregras de preparo previstas no art. 1.007 do CPC. Nesse preparo, entretanto, não devem ser incluídas

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as “demais despesas processuais, inclusive aquelas dispensadas em primeiro grau de jurisdição”(art. 54, parágrafo único). De fato, tal regra somente deve ser aplicada em relação ao preparo do“recurso inominado”.

Feita a interposição, se os autos não forem eletrônicos, o agravante terá o prazo de três dias doajuizamento do recurso para juntar aos autos do processo em curso perante o Juizado cópia dapetição do agravo de instrumento, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentosque foram anexados (art. 1.018 do CPC). O objetivo dessa providência é não apenas cientificar ojuízo originário e as partes da interposição do recurso, mas também provocar o juízo de retrataçãopelo magistrado que proferiu a decisão agravada. De modo que, se o juiz comunicar que reformouinteiramente a decisão, o relator na Turma Recursal considerará prejudicado o agravo deinstrumento. Por outro prisma, se o agravante não cumprir a determinação contida no art. 1.018, § 2º,do CPC, o agravo será inadmitido, desde que arguido e provado pelo agravado, ao oferecer ascontrarrazões. Como já tivemos oportunidade de externar, esse regramento, também presente noCPC/1973 (art. 526), carece de boa técnica processual, na medida em que cria um pressupostorecursal que não pode ser conhecido de ofício pelo julgador.76

Uma vez recebido na Turma Recursal, o agravo de instrumento poderá ser julgadomonocraticamente pelo relator, que também tem a atribuição de analisar o pedido de concessão deefeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela recursal, total ou parcialmente, apretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão (art. 932 do CPC). Além disso, havendoagravado, o relator deverá intimá-lo para, querendo, oferecer contrarrazões ao recurso, no prazo de10 dias, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária (art. 1.019 do CPC).

Não sendo caso de julgamento monocrático, o relator solicitará dia para julgamento em prazonão superior a um mês da intimação do agravado (art. 1.020 do CPC). O agravante poderá fazersustentação oral, nos mesmos moldes do estabelecido para o “recurso inominado”, quando a decisãoagravada versar sobre tutelas provisórias (art. 937, VIII, do CPC) ou sobre o julgamento parcial domérito. Poderá também pedir a degravação do registro feito da audiência, nos termos do art. 44 daLei 9.099/1995.

O agravo interno

A maior parte das Turmas Recursais do Brasil tem preferido produzir suas manifestações deforma colegiada. Trata-se de uma opção derivada da interpretação literal da Lei 9.099/1995, que falaque o “recurso será julgado por uma turma composta por três Juízes togados” (art. 41, § 1º) e que nãoprevê regras para o julgamento monocrático ou um recurso contra sua prolação. É preciso lembrar,entretanto, que o projeto de lei que deu origem à Lei dos Juizados Especiais foi elaborado em 1989(Projeto de Lei da Câmara 3.698/1989), anos antes de o CPC/1973 ter expandido os poderes dorelator. Além disso, como já tivemos oportunidade de sublinhar, entendemos que as regras sobre o

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julgamento monocrático são compatíveis com os princípios fundamentais dos Juizados Especiais (art.2º) e, em particular, com o princípio da celeridade. Por isso, temos que o regramento previsto no art.932 do CPC é plenamente aplicável com a Lei 9.099/1995.

Na hipótese de ser proferida uma decisão monocrática pelo relator nas Turmas Recursais, elapoderá ser atacada por meio do agravo interno (art. 1.021 do CPC).77 Esse recurso deverá serinterposto, por escrito e com intervenção de um advogado, mediante o correspondente preparo,perante a Turma Recursal à qual pertence o relator que proferiu a decisão recorrida,78 no prazo dedez dias. Da mesma forma que defendemos a redução do prazo para interposição do agravo deinstrumento, entendemos que também esse recurso deve se submeter ao referencial temporal adotadopelo “recurso inominado” (art. 42 da Lei 9.099/1995).

Na petição de interposição do agravo interno, o recorrente deverá impugnar especificadamenteos fundamentos da decisão agravada (art. 1.021, § 1º, do CPC). Não se trata, pois, de um simplespedido de reconsideração, mas de verdadeira impugnação recursal. Além de atacar a decisão, em si,pode também o agravante demonstrar que o relator não tinha base jurisprudencial para realizar ojulgamento em caráter unipessoal. É o amparo jurisprudencial que legitima a atuação isolada dorelator como porta-voz do órgão colegiado ao qual ele pertence, dentro da chamada teoria dajurisdição equivalente.

Após receber o recurso, o relator deverá intimar o agravado para apresentar contrarrazões, noprazo de dez dias, em simetria com a limitação de prazo prevista para a interposição do recurso.Trata-se de uma boa novidade introduzida pelo CPC/2015, já que o CPC/1973 não previa aintervenção do agravado. O problema é que a Presidência da República, atendendo às pressões dostribunais, vetou a possibilidade de as partes fazerem sustentação oral no julgamento do agravointerno (art. 937, VII, do CPC). Uma lástima, que macula a série de avanços obtidos pelo NovoDiploma na implementação do contraditório efetivo, da oralidade e da democratização do processo.Nada obsta, entretanto, que o regimento interno das Turmas Recursais preveja tal sustentação (art.937, IX, do CPC).

Em seguida, não havendo retratação, o relator levará o agravo interno a julgamento pelo órgãocolegiado, com inclusão em pauta. O ideal seria que um novo relator fosse designado para conduzir ojulgamento, após a negativa da retratação. O CPC/2015, no entanto, manteve a mesma linha doCódigo anterior e permitiu que o relator originário ficasse à frente do procedimento recursal (art.1.021, § 2º). Por essa razão, diz-se que o agravo interno é um recurso no qual o recorrente já começaa votação no colegiado perdendo por um voto.

Talvez para atenuar a contradição que representa permitir que um julgador participe dojulgamento colegiado de um recurso interposto contra a sua própria decisão, o CPC expressamenteproibiu que o relator se limitasse à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgarimprocedente o agravo interno (art. 1.021, § 3º). De fato, não apenas o relator, mas todos os

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integrantes da Turma Recursal deverão enfrentar os argumentos apresentados pelo agravante em seurecurso (art. 489, § 1º, do CPC). Não se aplica aqui a questionável técnica remissiva, presente naparte final do art. 46 da Lei 9.099/1995 e dirigida para o julgamento do “recurso inominado”.

Sublinhe-se, por fim, que sustentamos que a multa por rejeição unânime do agravo interno (art.1.021, § 4º, do CPC) não é aplicável no Sistema dos Juizados Especiais, por conta da existência deregras próprias para o sancionamento das condutas processuais ilícitas (art. 55). Note-se, ainda, quea multa prevista no CPC está desvinculada do elemento subjetivo do recorrente (propósitoprotelatório, por exemplo), exigindo, apenas, que a derrota seja manifesta. É um modelo de sançãode constitucionalidade duvidosa, se for interpretado literalmente, visto que vindica o acesso àJustiça.79 Por certo, se ficar demonstrado que o agravante agiu com má-fé ao interpor o recurso,deverá ele ser punido, com os mecanismos correspondentes (art. 55 da Lei 9.099/1995 e art. 80 doCPC). Se o intérprete, entretanto, entender que a multa é aplicável aos Juizados Especiais, dispõe oart. 1.021, § 4º, do CPC que a inadmissibilidade ou a improcedência deve ser reconhecida de formaunânime. A própria aplicação da multa deve ser fruto de manifestação do colegiado nesse sentido,sempre que a rejeição for manifesta, ou seja, desprovida de argumentos, fáticos e jurídicos,válidos.80 Uma vez aplicada a multa, a interposição de qualquer outro recurso está condicionada aodepósito prévio do seu valor, exceto no caso de beneficiário de gratuidade da justiça, que fará opagamento ao final (art. 1.021, § 5º, do CPC).

Os embargos de declaração

A Lei dos Juizados Especiais regula em seu texto o recurso de embargos de declaração nos arts.48 a 50. Como se sabe, trata-se de uma modalidade especial de recurso em que os fundamentos sãolimitados aos vícios na correção ou na completude da decisão, examinado pelo próprio juiz ouTurma Recursal que a proferiu. Esse regramento, no entanto, sempre foi alvo de críticas por seafastar da regulamentação geral, prevista no CPC. Por esse motivo, defendíamos que a Lei9.099/1995, entre outros temas, deveria ser alterada no capítulo dedicado aos embargos dedeclaração. Ainda assim, fomos surpreendidos com o fato de a modificação ter sido feita noCPC/2015.

Com efeito, o CPC tratou, nas suas disposições finais, dos embargos de declaração nosJuizados Especiais nos arts. 1.064, 1.065 e 1.066, que, respectivamente, modificaram os textos dosarts. 48, 50 e 83 da Lei 9.099/1995. Com o devido respeito, temos que a inserção dessas regras noCPC não foi marcada pela mais correta técnica legislativa, especialmente à luz das orientações sobrea forma como devem ser editadas as leis em nosso País, prevista na Lei Complementar 95/1998.Nesse Diploma está expresso que “a lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este nãovinculada por afinidade, pertinência ou conexão” (art. 7º, II). De fato, não parece adequado incluir naparte final do CPC/2015 dispositivos alterando o texto da Lei 9.099/1995, tanto na parte cível como

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1.5.4.1

1.5.4.1-A

na parte criminal. Mesmo que as regras alteradas versem sobre direito processual, elas não poderiamestar num Código, que tem um objetivo extremamente específico. De qualquer forma, reconheça-se,foram modificações bastante positivas.

O cabimento

Originalmente, dizia o art. 48 que “caberão embargos de declaração quando, na sentença ouacórdão, houver obscuridade, contradição, omissão ou dúvida”. O texto consagrava, portanto, os trêsvícios básicos a ensejar o cabimento dos embargos de declaração – contradição, obscuridade eomissão81 –, mas acrescenta ao rol a “dúvida”. A “dúvida” também estava presente na redaçãooriginária do art. 535 do CPC/1973 e causou enorme polêmica nos meios jurídicos, em razão de nãoter um sentido preciso,82 até ser extirpada do Código pela Lei 8.950/1994.

Infelizmente, no ano seguinte, a Lei 9.099 ressuscitou a “dúvida” ao tratar do cabimento dosembargos de declaração. Isso se deve ao fato de que a parte civil da Lei 9.099/1995 foi baseada numprojeto de lei de 1989 (Projeto de Lei da Câmara 3.698/1989), que não foi atualizado ao longo dasua tramitação legislativa. De modo que o art. 1.064 do CPC corrigiu uma distorção histórica aoalterar o caput do art. 48 da Lei 9.099/1995, que passou a contar com a seguinte redação: “Caberãoembargos de declaração contra sentença ou acórdão nos casos previstos no Código de ProcessoCivil”.

Uma pena que o legislador deixou de acolher no Novo Código outra crítica que também semprefizemos ao mesmo dispositivo. Em nossos estudos, sustentamos que o art. 48 deveria dizer, apenas,“decisão”, como ocorre no art. 1.022 do CPC/2015, em vez de assinalar “sentença ou acórdão”. Issoporque é extreme de dúvidas que cabem embargos de declaração em face de decisõesinterlocutórias,83 inclusive no âmbito dos Juizados Especiais. Com efeito, por imposiçãoconstitucional (art. 93, IX), nenhuma decisão judicial pode ser desmotivada, inclusive asinterlocutórias. Não obstante, na fase executiva, por exemplo, em que a maioria dos atos é praticadafora da audiência, diversas situações podem gerar o interesse na utilização dos embargos dedeclaração. Por isso, defendemos que estes podem ser utilizados, também, em face de decisõesinterlocutórias.84 Ademais, diante da inadmissibilidade de tal recurso, abre-se caminho para aimpetração de outros recursos ou do mandado de segurança.

Com a nova redação atribuída pelo CPC (art. 48), os embargos de declaração nos JuizadosEspeciais são cabíveis em face de qualquer pronunciamento decisório ou omisso, para esclarecerobscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material85 (art. 1.022 do CPC).

Os embargos de declaração para prequestionamento

Desde a edição da Súmula 282 do STF,86 firmou-se na jurisprudência e na doutrina oentendimento de que, para a admissibilidade do recurso extraordinário, as questões constitucionais

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teriam que ser decididas em “última ou única instância” pelo órgão judicial inferior, de modo apropiciar o reexame da decisão recorrida em face da Carta Magna.87 É o chamadoprequestionamento. Ocorre que, a partir desse entendimento, surgiu uma grande dificuldade: as partesnão dispunham de um mecanismo para compelir o julgador a tratar das questões constitucionaisdiscutidas no processo. Com isso, se a decisão não mencionasse tais temas, não seria passível, emtese, do apelo extremo. Para contornar a limitação, foi necessário que a Corte Suprema editasse umanova súmula, de número 356,88 atribuindo aos embargos de declaração o papel de provocar aapreciação judicial das questões constitucionais tratadas no processo. Essa posição gerou, para osjulgadores em geral, o ônus de sempre mencionar as questões constitucionais do processo, sob penade suas decisões serem consideradas omissas e, portanto, embargáveis.

Não obstante, nos Juizados Especiais tem havido alguma resistência na utilização dos embargosdeclaratórios para efeito de prequestionamento. Parte da jurisprudência vem negando tal expediente,argumentando que a falta de previsão legal impediria o recurso.89 Data venia, entendemos que não háqualquer óbice para a aplicação da Súmula 356 do STF no sistema dos Juizados Especiais. Muitopelo contrário, diante da incidência do Enunciado 282 do Excelso Pretório, a falta desses embargoslevaria à rejeição vestibular do recurso extraordinário, cuja admissibilidade, por sua vez, já estáassentada (Súmula 640 do STF). Ademais, a nova redação do art. 48 da Lei 9.099/1995 faz remissãoexpressa ao CPC/2015, que, por sua vez, reconhece o cabimento dos embargos de declaração parafins de prequestionamento. Na verdade, o Novo Código vai além e positiva o chamadoprequestionamento implícito, afirmando estarem incluídos na decisão colegiada os elementos que oembargante suscitou, para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração sejaminadmitidos ou rejeitados (art. 1.025).

Os embargos de declaração para suprimir omissão jurisprudencial ou defundamentação

De acordo com o art. 1.022, parágrafo único, do CPC, considera-se omissa a decisão que deixede se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos (arts. 1.036 a 1.041 do CPC)ou em incidente de assunção de competência (art. 947 do CPC) ou que seja inválida, por deficiênciana fundamentação (art. 489, § 1º, do CPC). Por certo, tais normas são plenamente aplicáveis aoSistema dos Juizados Especiais.

Mesmo que o recurso especial repetitivo e o incidente de assunção de competência não tenhamaplicação direta aos Juizados Especiais, temos defendido desde a introdução deste livro que essemodelo judiciário está integrado à estrutura básica do Poder Judiciário e deve manter com eleharmonia e interação. Portanto, todas as decisões tomadas em caráter vinculativo – e ao rol doparágrafo único do art. 1.022 do CPC acrescentamos os componentes dos incisos do art. 927 do CPC– devem ser observadas pelos Juizados Especiais, para preservar a estabilidade, a integridade e acoerência da jurisprudência (art. 926 do CPC).

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1.5.4.1-C

1.5.4.2

Os embargos de declaração com efeitos modificativos

O CPC/2015 positivou aquilo que já era reconhecido pela doutrina90 e jurisprudência91 navigência do CPC/1973: a possibilidade de os embargos de declaração produzirem efeitosmodificativos, desde que respeitada a exigência de contraditório prévio.92 Nesse sentido, o art.1.023, § 2º, do CPC afirma que, na hipótese de o acolhimento dos embargos de declaração implicarna modificação da decisão embargada, o juiz intimará o embargado para, querendo, apresentarcontrarrazões no prazo de cinco dias.

Por certo, a utilização dos embargos de declaração com efeitos modificativos está em sintoniacom os princípios fundamentais da Lei dos Juizados Especiais e com suas limitações recursais.Importante lembrar, entretanto, que os embargos de declaração não podem se transformar numsucedâneo de outros recursos, devendo produzir efeitos modificativos somente quando a inovaçãodecorrer de um desdobramento lógico do acolhimento do recurso.93 Assim, se o juiz, na decisãoembargada, não fixa o valor da condenação, o acolhimento dos embargos de declaração opostos nãotem efeitos modificativos, mas apenas os efeitos regulares do suprimento da omissão. Agora,imagine-se que o juiz colocou na sentença que o réu estava dirigindo em alta velocidade eultrapassou o sinal vermelho, quando abalroou o veículo do autor, razão pela qual julgavaimprocedente o pedido de indenização. Nesse caso, se o autor apresentar embargos de declaraçãoapontando a contradição e seu pedido for acolhido, ao sanar o vício, o juiz poderá reverter oresultado da demanda. Estes, sim, serão verdadeiros embargos de declaração com efeitosmodificativos.

A interposição

Os embargos de declaração deverão ser interpostos no prazo de cinco dias da intimação dadecisão a ser embargada (art. 48 da Lei 9.099/1995 e art. 1.023 do CPC). Mesmo que as partesestejam presentes à sessão de julgamento, o prazo para interposição dos recursos começa a correr dadata da intimação do julgamento (art. 1.003 do CPC), não sendo aplicável, portanto, o art. 19, § 1º,da Lei.94

A interposição do recurso poderá ser feita por petição escrita ou oralmente95 (art. 49), sendoque, nesse caso, deverá ser registrada na ata da audiência (art. 13, § 3º). Por certo, a interposiçãooral dos embargos de declaração somente pode acontecer em face das decisões proferidas emaudiência, de forma imediata.96 A decisão proferida pela Turma Recursal, por sua vez, somentepoderá ser impugnada por embargos de declaração sob a forma escrita.

Ao formular a petição de interposição do recurso, o embargante deverá indicar o ponto dadecisão que entende inexato, as razões de sua irresignação e o pedido de integração, no caso deomissão ou erro material, ou esclarecimento, nas hipóteses de obscuridade ou contradição. Não será

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necessário realizar o preparo, por expressa previsão legal (art. 48 da Lei 9.099/1995 e art. 1.023 doCPC).

Digno de registro que o CPC/2015 previu expressamente a fungibilidade dos embargos dedeclaração em agravo interno, estando presentes os respectivos requisitos. Assim, o órgão julgadorconhecerá dos embargos de declaração como agravo interno se entender ser este o recurso cabível,desde que determine previamente a intimação do recorrente para, no prazo de cinco dias,complementar as razões recursais, de modo a ajustá-las às exigências legais (art. 1.021, § 3º).

Por outro lado, o CPC, muito acertadamente, corrigiu a distorção causada em todo o sistemarecursal pela interpretação literal da Súmula 418 do STJ.97 Determinou o Novo Código que, se osembargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, orecurso interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaraçãoserá processado e julgado independentemente de ratificação (art. 1.024, § 5º). Com isso, emboracontinue em vigor, a referida súmula só será aplicada na hipótese contrária à prevista na lei, ou seja,quando os embargos de declaração forem admitidos e modificarem a parcela impugnada pelo recursointerposto.

A intervenção do advogado

Apesar da necessidade de a assistência técnica ser tratada apenas na seção referente ao“recurso inominado” (art. 41, § 2º), defendemos que a diretriz deve ser aplicada em todos osrecursos, inclusive nos embargos de declaração. Na verdade, entendemos que a presença de umtécnico capacitado, público ou privado, deveria ser obrigatória em todo procedimento dos JuizadosEspeciais. Ainda assim, mesmo que se aceite a dispensa prevista no art. 9º, tem-se que a interposiçãode qualquer recurso deve seguir a lógica da assistência técnica, em razão das peculiaridadesprocedimentais inerentes ao sistema recursal.

Se a parte desassistida por advogado expressar sua incompreensão no bojo de uma audiênciade instrução e julgamento, pode o juiz, tomado pelo espírito da oralidade e da informalidade, recebertal manifestação como embargos de declaração. A forma escrita do recurso, entretanto, deve ficarreservada ao profissional técnico, especialmente quando a causa estiver tramitando no segundo grau.

Os procedimentos

Conforme estabelece o art. 1.023 do CPC, no processamento dos embargos de declaraçãoperante o primeiro grau, o próprio juiz prolator da decisão embargada julgará o recurso. Na TurmaRecursal, os embargos de declaração opostos em face de decisão colegiada terão o mesmomagistrado que relatou o feito no qual a decisão embargada foi proferida, salvo se não tiver maisatuando no órgão, caso em que será designado para o seu lugar o primeiro vogal, pela ordem deantiguidade. O relator fará então o relatório e apresentará os embargos em mesa na sessão

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subsequente, proferindo voto, e, não havendo julgamento nessa sessão, será o recurso incluído empauta automaticamente. Nesse julgamento, não haverá sustentação oral. Por outro lado, se a decisãoimpugnada for unipessoal, o próprio prolator da decisão embargada deverá julgar o recurso,monocraticamente.

O efeito suspensivo

A interposição dos embargos de declaração não tem efeito suspensivo previsto em lei (art.1.026, caput, do CPC). No entanto, por se tratar de um recurso de complementação, podem osembargos de declaração prorrogarem o efeito suspensivo do recurso principal a ser interposto contraa decisão embargada. Por exemplo, se o juiz profere uma sentença cuja apelação for dotada de efeitosuspensivo (art. 1.012, caput, do CPC) e ela for impugnada por embargos de declaração,permanecerá ineficaz até que ocorra o trânsito em julgado ou a interposição de outro recurso semefeito suspensivo.98 Se o juiz, por outro lado, profere decisão interlocutória submetida ao recurso deagravo de instrumento, que não tem efeito suspensivo estabelecido em lei, essa decisão começa aproduzir efeitos imediatamente após publicada e a eventual interposição de agravo de instrumentonão é capaz de suspender tal comando, ressalvada a hipótese de concessão do efeito suspensivo pelorelator (art. 1.019, I, do CPC).

Os embargos de declaração podem ainda ter efeito suspensivo se o juiz ou relator na TurmaRecursal o deferirem, diante da probabilidade de provimento do recurso (fumus boni iuris) e daexistência de risco ao resultado útil do recurso (arts. 300 e 1.026, § 1º, do CPC). Trata-se, como jámencionado, de pronunciamento de natureza cautelar.

O efeito interruptivo

O art. 1.065 do CPC corrigiu outro defeito que vínhamos apontando ao longo dos últimos anos.O art. 50 da Lei 9.099/1995 afirmava que, “quando interpostos contra sentença, os embargos dedeclaração suspenderão o prazo para recurso”. Da mesma forma que no caso do supracitado art. 48,o art. 50 reproduzia a equivocada redação original do art. 538 do CPC/1973, que, por seu turno,trazia a expressão “suspender” e, ainda por cima, indevidamente flexionada no tempo verbal dofuturo do presente. Durante anos, esse dispositivo foi alvo de debates sobre a forma como deveriaocorrer a contagem dos prazos dos demais recursos no caso de interposição dos embargos dedeclaração,99 até que a Lei 8.950/1994 alterou sua redação. Com a modificação, o art. 538 doCPC/1973 passou a dispor que os “embargos de declaração interrompem o prazo para a interposiçãode outros recursos, por qualquer das partes”.

Destarte, com a alteração promovida pelo CPC/2015, o art. 50 da Lei 9.099/1995 recebeu umaredação simétrica tanto ao antigo modelo (art. 538 do CPC/1973 reformado) como ao novo (art.1.026 do CPC): “Os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de recurso”.

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Assim, com a interposição dos embargos de declaração, o prazo para ajuizamento de outros recursosserá interrompido e retomará, por inteiro, com a intimação da decisão proferida.

A aplicação de multa por embargos protelatórios

Diferentemente do que sustentamos sob a vigência do CPC/1973, passamos a defender, com aedição do Novo Código, que a multa por embargos de declaração protelatórios, prevista no art.1.026 do CPC, é aplicável nos Juizados Especiais,100 desde que a parte embargante estejaacompanhada de advogado. Com efeito, no regime anterior, entendíamos que as regras restritivasprevistas na legislação ordinária somente poderiam ser incorporadas ao Sistema dos Juizadosquando este fosse omisso. Assim, como a Lei 9.099/1995 previa um regramento próprio de censuraàs condutas (art. 55), ele afastaria as regras específicas de litigância de má-fé.

Com o CPC/2015, o panorama mudou. A boa-fé foi erigida a um novo patamar dentro doprocesso (art. 5º), e a punição às condutas lesivas é uma decorrência lógica dessa cláusula geral.Nesse sentido, a interposição de recurso com propósito protelatório encontra-se encartada comomodalidade geral de litigância de má-fé (art. 80, VII, do CPC). Seria incoerente, pois, afastar a regraespecífica do art. 1.026 do CPC para condenar o recorrente em litigância de má-fé pelo dispositivodo art. 80, VII, do CPC. De modo que, no caso dos embargos de declaração, como defendemos quetal recurso somente deve ser manejado por meio de advogado, as justificativas finalísticas antesutilizadas para afastar a incidência da multa prevista no art. 1.026 do CPC ficaram vencidas.

A correção de erros materiais

A Lei 9.099/1995 optou por assinalar no parágrafo único do art. 48 que os erros materiaispoderiam ser corrigidos de ofício. Apesar de tal faculdade já ser assegurada a todos os magistrados,por força do art. 494, I, do CPC, existe uma diferença na redação desses dispositivos. A Lei9.099/1995 fala em “erros materiais”, enquanto que o inciso I do art. 494 do CPC menciona as“inexatidões materiais” e os “erros de cálculo”. Na verdade, o sentido desses dispositivos é omesmo, já que os “erros de cálculo” representam uma espécie do gênero “erro material”, que, porsua vez, é sinônimo de “inexatidão material”.101

Os mesmos erros materiais podem ser também atacados pelos embargos de declaração (art.1.022, III, do CPC), se a sua identificação pela parte coincidir com o prazo de cinco dias daintimação da decisão equivocada. Importante lembrar que, se a parte simplesmente alegar o erromaterial na decisão sem interpor os embargos declaração, o juízo poderá rejeitar o pedido e declarara preclusão do ato. No caso de uma sentença, por exemplo, isso pode implicar no trânsito em julgadode um erro num procedimento que, em tese, não admite ação rescisória (art. 59).102 Por isso, dentrodo prazo recursal, a utilização dos embargos de declaração é mais segura, pois se o reclamo não foratendido, com o efeito interruptivo, a via recursal principal permanecerá aberta.

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Importante lembrar que a autorização para corrigir os erros materiais não significa que ojulgador pode alterar, livremente, o conteúdo das decisões proferidas, especialmente aquelas jáestabilizadas. A correção do erro material deve se limitar aos elementos formais da decisão e não aoseu sentido. Assim, se a decisão corretiva ultrapassar os limites do comando judicial já proferida,deverá ser reputada como nula.

O recurso especial

De maneira amplamente majoritária,103 tem-se negado a possibilidade de interposição derecurso especial para o Superior Tribunal de Justiça em face das decisões oriundas das TurmasRecursais, pois não se trata de decisão proferida por Tribunal, conforme preceitua o art. 105, III, daCF. Não por outro motivo, o STJ editou a Súmula 203, afirmando ser incabível o manejo do recursoespecial no âmbito dos Juizados Especiais.104

Efetivamente, não há como pleitear a admissão do recurso especial diante do impeditivocontido no texto constitucional, pois regras relativas à competência recursal dos tribunais são deinterpretação estrita, não admitindo leitura ampliativa ou analógica. Assim, somente com umaemenda à Constituição Federal, alterando a redação do art. 105, III, é que seria possível ainterposição do recurso especial em face da decisão proferida pelas Turmas Recursais.

Apesar de concordarmos com posição majoritária, temos que o ideal seria que tal recurso fossecabível. De fato, o recurso especial é o instrumento de controle das decisões judiciais em face dodireito objetivo federal, para uniformizar a sua interpretação. Por isso, a sua aplicação nas TurmasRecursais teria enorme relevância para o funcionamento do modelo. Atualmente, entretanto, atendência é de que o legislador infraconstitucional venha a incluir na Lei 9.099/1995 um institutosemelhante ao pedido de uniformização existente na Lei dos Juizados Especiais Federais (art. 14 daLei 10.259/2001) e na Lei dos Juizados Especiais Fazendários (art. 19 da Lei 12.153/2009), capazde provocar a manifestação do STJ sobre a interpretação da Lei Federal pelas Turmas Recursaisdesses modelos.

O recurso extraordinário

O cabimento

Até meados do ano de 2003 existia divergência na doutrina sobre o cabimento do recursoextraordinário em face das decisões emanadas pelas Turmas Recursais. Minoritariamente, autoresdefendiam a inaplicabilidade do recurso constitucional, argumentando, por um lado, que a Lei8.038/1990 e o Regimento Interno do STF, ambos posteriores à Lei dos Juizados de Pequenas Causas(Lei 7.244/1984), não previram tal cabimento, e, por outro, que essa possibilidade lesaria osprincípios da celeridade e da economia processual.105 Afastando essas ponderações, temos que o

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RISTF não mencionava o cabimento do recurso extraordinário em face das decisões proferidas pelasTurmas Recursais por se tratar de competência em razão da matéria (art. 102, III, do CF).

A interposição do recurso extraordinário, no entanto, tem fundamento no controle difuso daconstitucionalidade dos atos judiciais. Nessa impugnação, o que se avalia é a compatibilidade dadecisão com a Carta Maior (controle do direito objetivo constitucional) e nenhuma decisão podeficar fora desse controle, sob pena de se atentar contra um dos pilares do nosso sistema jurídico: asupremacia constitucional. Assim, sempre defendemos, como a maioria da doutrina,106 ser possível ainterposição do recurso extraordinário.

Essa discussão, entretanto, encontra-se hoje superada, pois o Supremo Tribunal Federal editoua Súmula 640, sintetizando o entendimento sufragado em inúmeros julgados anteriores, com oseguinte teor: “É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro graunas causas de alçada, ou por turma recursal de juizado especial cível e criminal”. Portanto, o recursoextraordinário é cabível em face de todas as decisões proferidas pela Turma Recursal que contrariema Lei Maior, inclusive quando esta estiver julgando o mandado de segurança.107

Não obstante tenha reconhecido o cabimento do recurso extraordinário, o próprio STF assinalaque a sua utilização no âmbito dos Juizados Especiais é bastante limitada. Isso porque as causasdirigidas aos Juizados Especiais são, em regra, causas que não apresentam repercussão geral,requisito específico do cabimento do recurso extraordinário (art. 102, § 3º, da CF).108

Como se sabe, o recurso extraordinário visa atacar decisões que violem o direito objetivoconstitucional (arts. 1.029 a 1.041).109 As hipóteses de cabimento do recurso extraordinário estãoenumeradas na Constituição da República, no art. 102, III. Tal recurso só é cabível quando esgotadostodos os recursos “ordinários” (comuns) admissíveis em face de determinado pronunciamentojudicial. Por isso, a CF fala em decisões proferidas em “única ou última instância”. A razão é evitarque o julgamento do recurso extraordinário provoque a supressão de instâncias, ou seja, impedir queo STF tenha que intervir na causa antes de todas as possibilidades de manifestações nos órgãosinferiores terem sido esgotadas. Além disso, é indispensável que a questão constitucional tenha sidodevidamente prequestionada, de modo a possibilitar que as instâncias ordinárias expressamenteenfrentem a questão sobre a compatibilidade da decisão proferida com a Constituição Federal.

Conforme estabelece o art. 102, III, da CF, cabe recurso extraordinário nas causas decididas emúnica ou última instância, quando a decisão recorrida: contrariar dispositivo da CF (recursoextraordinário por violação direta à Constituição), declarar a inconstitucionalidade de tratado ou leifederal (recurso extraordinário em controle de constitucionalidade), julgar válida lei ou ato degoverno local contestado em face da Constituição da República (recurso extraordinário contradecisões fundadas em leis e atos locais inconstitucionais) ou julgar válida lei local contestada emface de lei federal (recurso extraordinário por conflito de competência legislativa).

O juízo de admissibilidade

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1.5.6.3

Fora do sistema dos Juizados Especiais, o recurso extraordinário é interposto e processado naPresidência ou Vice-Presidência do Tribunal de Justiça (art. 1.029 do CPC), a quem caberá fazer oprimeiro juízo de admissibilidade. Por isso, logo quando foram instaladas as Turmas Recursais, osrecursos extraordinários contra as suas decisões eram dirigidos para algum daqueles órgãos doTribunal. Com o passar do tempo, entretanto, surgiram vozes defendendo que a interposição e aprópria análise da admissibilidade dos recursos extraordinários deveriam ser feitas dentro doConselho Recursal.110 Assim, vários Tribunais passaram a delegar expressamente a atribuição para oprocessamento e conhecimento do recurso constitucional ao Conselho Recursal, fazendo com que aregra, atualmente, seja que a interposição do recurso extraordinário ocorra perante as TurmasRecursais.111

O procedimento

A petição de interposição do recurso extraordinário deve conter a demonstração do cabimentodo recurso, a qualificação das partes no recurso e seus advogados, a exposição fundamentada do fatoe do direito e o pedido de reforma ou invalidação da decisão recorrida. O recurso extraordinário,via de regra, deve ser preparado (art. 1.007 do CPC). Além disso, ao tratar do cabimento do recurso,é necessário que a petição de interposição demonstre de forma clara ter sido efetuado oportunamente(desde o momento em que surgiu a violação ao direito objetivo) o prequestionamento da matériaconstitucional (Súmula 282 do STF). Se a violação ao direito objetivo somente surgiu na TurmaRecursal, o recorrente pode utilizar os embargos de declaração para obter tal manifestação (Súmula356 do STF e art. 1.025 do CPC).

No plano do mérito, o recorrente deve enquadrar a sua causa de pedir recursal em uma dashipóteses previstas na Constituição (arts. 102, III, e 105, III). No pedido recursal, o recorrente deveindicar qual a providência jurisdicional que almeja e, ainda, o direito subjetivo que pretende vertutelado. Isso porque, em determinadas situações, além de proteger o direito objetivo, o STF e o STJpodem, em sede de recurso excepcional, avançar ao mérito da questão de fundo e julgar o própriodireito subjetivo. É o que ocorre, por exemplo, quando o STJ verifica que o acórdão recorridoviolou a norma infraconstitucional que veda o enriquecimento ilícito (art. 884 do CC) e, além decassar a decisão, avança ao mérito da causa, fixando o valor da indenização a ser paga (direitosubjetivo).112

Nos termos do art. 1.035, § 2º, do CPC (art. 102, § 3º, da CF), a alegação expressa darepercussão geral na petição de interposição representa um requisito específico de admissibilidadedo recurso extraordinário, em todas as suas modalidades, que visa destacar a importância da questãoconstitucional discutida, para o fim de tornar legítima a manifestação da instância máxima do PoderJudiciário. Com isso, busca-se atribuir ao recorrente o papel de agente ativo na efetivação dosistema de filtragem recursal previsto na Constituição. Por isso, a afirmação de repercussão geral

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deve constar da petição de interposição do recurso.Como já sublinhado, o recurso extraordinário deve ser apresentado no prazo de 15 dias perante

o juízo de interposição competente (art. 1.003, § 5º, do CPC). Diz o art. 1.030 do CPC que, uma vezrecebida a petição de interposição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimadopara apresentar contrarrazões, também no prazo de 15 dias. Em seguida, com ou sem ascontrarrazões, é feito um juízo de admissibilidade no tribunal de origem, dentro do sistema de duplafiltragem (art. 1.030 do CPC). Se o recurso for admitido, segue para o STF. Caso contrário, poderáser atacada a decisão de inadmissibilidade por meio de agravo interno (art. 1.030, do CPC) ouagravo ao STF (art. 1.042 do CPC).

Em determinadas circunstâncias, entretanto, pode não haver recorrido para ser intimado. Bastapensar nas hipóteses de jurisdição voluntária (quando todos os interessados já estiverem integradosao processo – art. 721 do CPC) ou no caso de decisão proferida antes da citação do réu. Nessescasos, autuado e certificado o recurso, a remessa para o STF deve ser feita logo após a confirmaçãode sua admissibilidade.

Chegando ao STF, o recurso extraordinário será distribuído a uma turma e, dentro dela, a umrelator, que ficará encarregado de fazer novo juízo de admissibilidade do recurso e dar a ele oprocessamento adequado, por meio de julgamento monocrático (art. 932 do CPC), colegiado (art.935 do CPC) ou repetitivo (arts. 1.036 a 1.041 do CPC).

Nesse passo, duas regras merecem destaque. O § 3º do art. 1.029 do CPC foi desenvolvidopara combater aquilo que ficou conhecido como jurisprudência defensiva,113 estabelecendo que oSTF poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde quenão o repute grave. Trata-se de regra inspirada nos princípios da instrumentalidade e doaproveitamento dos atos processuais, que deve se estender para todos os recursos, por aplicaçãoanalógica. De modo que, sob o império das novas regras, fica claro que a inadmissibilidade de umrecurso deve ser encarada como um fim anômalo do procedimento recursal, da mesma forma que umasentença terminativa, cabendo ao magistrado buscar o máximo aproveitamento do ato processual etentar todos os meios disponíveis para corrigir os vícios existentes, para evitar tal desfecho(princípio da primazia do mérito – art. 4º do CPC). As partes, por sua vez, não serão maissurpreendidas com filigranas e bizarrices como as narradas, fulminando seu direito recursal e, porvezes, o próprio direito material.

A segunda regra está no art. 1.033 do CPC. Esse artigo introduz uma salutar novidade noDireito Processual, que é a previsão da conversão do recurso extraordinário em recurso especial.Trata-se de hipótese legal de fungibilidade recursal.114 Assim, se o relator do recurso no STFconsiderar como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor arevisão da interpretação da lei federal ou de tratado, deverá remetê-lo ao STJ para julgamento comorecurso especial.115 Essa conversão, entretanto, não pode ser aplicada aos recursos extraordinários

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1.5.6.4

1.5.6.5

interpostos das decisões proferidas pelas Turmas Recursais, uma vez que em face dessas mesmasdecisões não cabe recurso especial (Súmula 203 do STJ).

O mérito do recurso extraordinário reside na análise da compatibilidade da decisão recorridacom o direito objetivo constitucional. Caso o tribunal superior entenda que a decisão viola oordenamento pátrio, deverá anular o julgado naquilo que trata da matéria recorrida e analisar aquestão de fundo. Nesse sentido, aduz o art. 1.034 do CPC/2015: “Admitido o recurso extraordinárioou o recurso especial, o Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça julgará oprocesso, aplicando o direito”.116 Em algumas circunstâncias, entretanto, o STF pode, depois de fazero controle do direito, determinar a remessa dos autos à origem para reanalisar a causa, sob o enfoqueadotado pela Corte. Tome-se o exemplo de uma demanda em que o autor pede pela realização daprova pericial. Se as instâncias ordinárias negam a realização da perícia e o STF entende que talpostura viola o direito constitucional, deverá anular o acórdão recorrido e determinar a realização daprova pericial no juízo de origem.

O efeito devolutivo

O recurso extraordinário tem o condão de devolver ao tribunal ad quem o conhecimento daquestão constitucional prequestionada e recorrida. No regime do CPC/1973 existia divergência sobreos limites da devolução produzida pela interposição do recurso, em relação aos fundamentosapontados pelo recorrente. Assim, para sanar a controvérsia, o parágrafo único do art. 1.034 doCPC/2015 positivou a orientação, segundo a qual, “tendo sido admitido o recurso extraordinário ouespecial por um fundamento, devolve-se ao tribunal superior o conhecimento dos demaisfundamentos para a solução do capítulo impugnado”.

O efeito suspensivo

A interposição do recurso extraordinário produz apenas efeito devolutivo (art. 995 do CPC),embora seja possível requerer a concessão do efeito suspensivo na petição de interposição ou aolongo do procedimento recursal (art. 1.029, § 5º, do CPC). Trata-se de pronunciamento de naturezacautelar, que demanda a presença dos requisitos gerais da cautela: fumus boni iuris e periculum inmora (art. 300 do CPC).

Se a urgência da situação for contemporânea à prolação da decisão recorrida, no entanto, épossível formular o pedido de concessão de efeito suspensivo diretamente ao STF, nos termos do art.1.029, § 5º, do CPC. Ainda de acordo com esse dispositivo, no período compreendido entre ainterposição do recurso e sua distribuição, será sorteado um relator especificamente para apreciar opedido de concessão do efeito suspensivo. Esse mesmo relator ficará prevento para julgar também orecurso extraordinário de onde partiu o pedido de concessão do efeito suspensivo. Se o pedido,entretanto, for formulado quando o recurso já estiver distribuído no STF, tal exame ficará a cargo do

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1.5.7

1.5.8

relator sorteado, exceto se o recurso tiver sido sobrestado na origem, quando então a atribuiçãoficará a cargo do presidente ou vice-presidente do tribunal local. Importante esclarecer, nessa últimahipótese, que o Código prevê que, mesmo estando sobrestado, um recurso extraordinário podereceber efeito suspensivo, para estagnar o comando emergente da decisão recorrida.

Agravo em recurso extraordinário

A admissibilidade do recurso extraordinário é feita seguindo as regras previstas pelo Tribunal,em seu regimento interno, à luz dos arts. 1.029 a 1.035 do CPC. Assim, se o recurso for inadmitidona origem, por quaisquer motivos que não sejam aqueles previstos no art. 1.030, I e III, do CPC,117

caberá o chamado agravo em recurso extraordinário, dirigido para o STF (art. 1.042 do CPC).118

O próprio Supremo Tribunal Federal já consolidou esse entendimento, por meio da Súmula727, que diz: “Não pode o magistrado deixar de encaminhar ao Supremo Tribunal Federal o agravode instrumento interposto da decisão que não admite recurso extraordinário, ainda que referente acausa instaurada no âmbito dos juizados especiais”.

O (vetado) recurso de divergência

Quando foi encaminhado para a sanção presidencial, o art. 47 do Projeto de Lei que deu origemà Lei 9.099/1995 tinha a seguinte redação:

“Art. 47. A lei local poderá instituir recurso de divergência desse julgamento ao Tribunal deAlçada, onde houver, ou ao Tribunal de Justiça, sem efeito suspensivo, cabível quandohouver divergência com a jurisprudência do próprio Tribunal ou de outra turma de juízes, ouquando o valor do pedido julgado improcedente ou da condenação for superior a 20 saláriosmínimos”.

Esse artigo foi vetado porque a Presidência da República entendeu que a previsão dosembargos de divergência para o Tribunal de Justiça poderia descaracterizar o instituto dos JuizadosEspeciais, principalmente no que toca à informalidade e à celeridade, bem como criar uma terceirainstância. Na época, a doutrina em peso aplaudiu o veto imposto ao art. 47, especialmente ospartidários da teoria do microssistema.

Ocorre que, com o passar dos anos, percebeu-se que a falta de controle nas decisões proferidasnas Turmas Recursais gerava uma série de situações absurdas e muitas vezes contraditórias. Umexemplo disso foi a questão referente à aplicação da pena de multa periódica (art. 52, V). Durante operíodo compreendido entre 1999 e 2001, as Turmas Recursais do Rio de Janeiro tinham quatroorientações diferentes sobre o tema, provocando enorme insegurança jurídica. Como essa matéria,via de regra, não estava adstrita à Constituição Federal, de modo a ensejar cabimento do recursoextraordinário, não havia como uniformizar estas posições. Assim, hoje, é cada vez maior o número

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1.6.1

de juristas que defendem a criação de um mecanismo apto a uniformizar as decisões proferidas pelasTurmas Recursais.119

Em nossa opinião, o mais coerente seria criar um pedido de uniformização aos moldes doinstituído no art. 14 da Lei 10.259/2001 (Lei dos Juizados Especiais Federais) e no art. 19 da Lei12.153/2009 (Lei dos Juizados da Fazenda Pública). Com esse escopo, tramita no CongressoNacional um projeto de lei sobre o “pedido de uniformização da jurisprudência” na Lei 9.099/1995(PL 4.723/2004, enviado pelo Poder Executivo). A única correção que se faz necessária, tanto nasleis citadas como no Projeto de Lei, é afastar a insustentável vedação à discussão de matériasprocessuais. De fato, em ambos os textos é dito que o recurso só é cabível em “questões de direitomaterial”. Como não há hierarquia nem escala de importância entre regras processuais e materiais,temos que a distinção é inconstitucional. Tanto assim que a Turma Nacional de Uniformização dosJuizados Especiais Federais vem apreciando vários pedidos de uniformização de naturezaeminentemente processual.120

A TURMA RECURSAL

A natureza jurídica da Turma Recursal

De forma coerente com seus objetivos, entendeu por bem o legislador, reproduzindo aexperiência oriunda da Lei dos Juizados de Pequenas Causas (art. 41 da Lei 7.244/1984), criar umórgão dentro da estrutura dos Juizados Especiais voltado para rever as decisões proferidas emprimeiro grau de jurisdição. De fato, não haveria sentido em montar um órgão com características tãopeculiares, como no caso dos Juizados Especiais, e deixar que os recursos fossem julgados pelasinstâncias revisoras ordinárias. Todo o investimento em oralidade, informalidade e celeridade ficariaseriamente comprometido. Por isso, a iniciativa de criar as Turmas Recursais, mais do que positiva,é vital para o adequado funcionamento do sistema.

As Turmas Recursais, por certo, não possuem natureza de tribunais, que gozam de autonomiaadministrativa, financeira e orçamentária dentro da estrutura judiciária. São, como ditoanteriormente, órgãos colegiados de primeira instância que realizam o segundo grau de jurisdiçãodas causas julgadas nos Juizados Especiais (competência funcional). Com isso, podem ser instituídosde forma mais rápida e econômica. Outra vantagem é a possibilidade de criação de TurmasRecursais fora da Comarca da Capital, incrementando o processo de descentralização da Justiça,para aproximá-la de seus jurisdicionados.121 As Turmas Recursais podem, ainda, organizar-se emregimentos internos, além de poderem editar enunciados e súmulas das suas posições prevalentes.122

Perdeu o legislador, entretanto, oportunidade de regular com mais detalhes a estrutura e ofuncionamento das Turmas Recursais, pois não lhe dedicou sequer um artigo próprio. Mesmo assim,nos poucos dispositivos em que cuidou do tema, o legislador utilizou-se de uma redação bastanteinfeliz. Nesse sentido, dois aspectos merecem ser destacados. Em primeiro lugar, não se pode

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confundir a Turma Recursal com o Juizado Especial, muito embora a Lei possa induzir o intérprete apensar o contrário, ao afirmar que “caberá recurso para o próprio juizado”. Cada Tribunal de Justiçapossui uma estrutura de primeira instância chamada de Juizados Especiais, que, por sua vez, possuidois setores: o Juizado Especial e a Turma Recursal, responsáveis, respectivamente, peloconhecimento da causa e pela revisão da decisão proferida.123 Em outras palavras, os JuizadosEspeciais (estrutura) são compostos por Juizados Especiais (órgãos de primeiro grau) e TurmasRecursais (órgãos de segundo grau).

Em segundo lugar, as Turmas Recursais são formadas por três juízes em exercício na primeirainstância e não “no 1º grau de jurisdição”, como diz o § 1º do art. 41.124 A mesma confusão foirepetida no art. 46 da Lei, que fala em “segunda instância”, quando deveria falar em segundo grau. ATurma Recursal é o órgão com atribuição para realizar o segundo grau dentro do sistema da Lei9.099/1995. Seus componentes são juízes de direito, integrantes do corpo de magistrados da primeirainstância.

Embora a Lei não tenha tratado da questão, na maioria dos Tribunais foram estabelecidoscritérios de antiguidade para composição das Turmas Recursais, privilegiando a experiência nojulgamento dos recursos.125

Os incidentes processuais em segundo grau

De uma maneira geral, do acórdão proferido pelas Turmas Recursais não são cabíveisincidentes processuais cuja competência esteja afetada aos tribunais. Assim, não são aplicáveis aosJuizados Especiais o incidente de assunção da competência (art. 947 do CPC), o incidente dearguição de inconstitucionalidade (arts. 948 a 950 do CPC) e o incidente de resolução de demandasrepetitivas (arts. 976 a 987 do CPC).

Nesse passo, importante lembrar que, por ser um órgão formado por juízes de primeirainstância, não há qualquer óbice para que a Turma Recursal declare a inconstitucionalidade de umalei ou de um ato normativo, na medida em que a vedação expressa no art. 97 da CF, conhecida comoreserva de plenário, só se aplica aos tribunais.126

Em relação ao conflito de competência (arts. 951 a 959 do CPC) e à alegação de impedimentoou suspeição (art. 146 do CPC), como tivemos oportunidade de esclarecer,127 entendemos,contrariamente à jurisprudência dominante, que eles não podem ser julgados pela Turma Recursal,especialmente por envolver questões de ordem hierárquica.

Por outro lado, entendemos que ao menos dois incidentes processuais devem ser admitidos nasTurmas Recursais, por estarem afetos às atribuições recursais desses órgãos: a) o incidente dedesconsideração da personalidade jurídica; b) o incidente de ampliação do colegiado. O cabimentodo incidente de desconsideração da personalidade jurídica decorre não apenas do deslocamento dacompetência funcional no plano vertical, mas também da previsão contida no art. 1.062 do CPC. Esse

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dispositivo determina que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica é aplicável aosJuizados Especiais. Assim, por força do art. 932, VI, do CPC, cabe ao relator do recurso emtramitação na Turma Recursal julgar o incidente instaurado perante aquele órgão.

O segundo incidente processual cabível nas Turmas Recursais não tem nome previsto na lei,mas é chamado de incidente de ampliação do colegiado (art. 942 do CPC). Trata-se de um incidentevoltado para permitir a aplicação da técnica que visa ampliar o número de julgadores participantesdo julgamento da apelação, do agravo de instrumento e da ação rescisória128 quando não houverunanimidade entre os integrantes da formação original do colegiado. Nos Juizados Especiais, oincidente de ampliação do colegiado tem importância fundamental, pois as Turmas Recursais sãoformadas, via de regra, por apenas três julgadores (art. 41, § 1º) e das suas decisões não caberecurso especial, um dos principais instrumentos uniformizadores da jurisprudência.129 Importanteainda assinalar que a técnica prevista no art. 942 do CPC possui uma construção lógica atrelada àcolegialidade dos julgamentos e não propriamente à instância julgadora.130

O incidente de resolução de demandas repetitiva

Embora não seja possível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas nasTurmas Recursais, uma vez que somente a estrutura de um tribunal pode absorver tamanhaatribuição,131, é preciso tecer duas considerações sobre os efeitos do IRDR nos Juizados Especiais.Isso porque o Novo Código estabeleceu no art. 985, I, que a tese jurídica originária do julgamento doIRDR será aplicada “a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idênticaquestão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles quetramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região”.

Em primeiro lugar, necessário esclarecer que, uma vez admitido o pedido de admissão doIRDR, o relator no Tribunal determinará a suspensão de todos os processos e recursos que tramitemnaquela jurisdição, tratando da questão objeto do julgamento (art. 982, I, do CPC). Assim, após aconclusão do IRDR, a tese jurídica acolhida será aplicada a todos os processos e recursos que foramsuspensos, que então retomarão seus cursos e serão analisados à luz daquela premissa. Portanto, orequisito para a aplicação da tese jurídica em um determinado feito, nos moldes do que prevê o art.985, I, do CPC, é que ele tenha sido suspenso, atendendo à determinação do relator no Tribunal.132

Desse modo, se o CPC diz que a decisão proferida no IRDR será aplicada aos processos e recursosem tramitação nos Juizados Especiais, isso significa que também a determinação de suspensãoproferida pelo relator do IRDR será aplicada aos Juizados Especiais.133

Em segundo lugar, o processo ou recurso, tramitando nos Juizados Especiais, que for suspensopela determinação do relator do IRDR, ficará vinculado à tese jurídica sufragada pelo Tribunal.Assim, caso o julgador não aplique adequadamente a tese jurídica, será cabível a utilização dareclamação prevista no art. 988, IV, do CPC, dirigida para o órgão que julgou o incidente (art. 988, §

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1.6.3

3º, do CPC). De fato, não haveria razão para prever a aplicação do julgamento do IRDR nosJuizados Especiais, se essa aplicação não tivesse a força vinculativa capaz de ensejar o cabimentoda reclamação. Nesse particular, importante lembrar que, se uma Turma Recursal proferir umjulgamento contrário ao entendimento sufragada numa súmula vinculante, caberá reclamaçãoconstitucional para o STF (art. 103-A, § 3º, da CF e art. 7º da Lei 11.417/2006).

Embora possa parecer contraditório que um incidente instaurado no Tribunal, que não temcompetência recursal sobre os Juizados Especiais, possa produzir teses a serem aplicadas neles, épreciso compreender que esses mecanismos visam conferir coesão e coerência ao sistemajurisprudencial (art. 926 do CPC). Além disso, não há propriamente um julgamento da causa fora doSistema dos Juizados Especiais, mas a aplicação de um padrão decisório vinculativo (art. 927 doCPC) pelos juízes e Turmas Recursais. Na realidade, como temos defendido ao longo deste livro, osJuizados Especiais integram a estrutura do Poder Judiciário e suas decisões devem estar em sintoniacom as posições consagradas pelo seu tribunal, sob pena de vulneração do princípio constitucionalda isonomia.

A transcrição da gravação da audiência

A transcrição da gravação da audiência prevista no art. 44 da Lei 9.099/1995 não tem sidovista na prática, pois os Juizados não têm cumprido a determinação de gravar suas audiências,conforme preceituado no § 3º do art. 13 da Lei. Se a gravação fosse feita, entretanto, à míngua deprevisão legal, a transcrição, chamada por alguns autores de “degravação”, deveria ser feita porserventuários do próprio Juizado ou por técnicos designados pelo Tribunal. Diante da omissãoestatal, entretanto, o que a parte pode fazer é, no início da audiência, comunicar ao juiz que irá gravá-la com seu próprio equipamento e, ao seu término, entregar o registro para que fique guardado naSecretaria (art. 367, § 6º, do CPC).

O procedimento de transcrição da gravação, para fins do art. 44, se gerar custo para o Tribunal,poderá ser cobrado daquele que o requereu. Com efeito, tratando-se de uma despesa recursal, nãoestá acobertada pela isenção geral, conforme estabelece o parágrafo único do art. 54. Como a Leifala que correm por conta do requerente as “despesas respectivas”, pode parecer que se refere àscustas da gravação e da transcrição. No entanto, optamos por defender que somente as custasrelativas à transcrição podem ser imputadas ao recorrente, já que a gravação é um dever doEstado.134 O momento para comprovar o pagamento dessas custas é no preparo do “recursoinominado”. Nada impede, entretanto, que tais gravações sejam solicitadas pela Turma Recursal exofficio, em sede de diligências, para instruir o julgamento.

Uma boa sugestão de Salomão135 é que, quando for viável, em vez de transcrever o registro,seja ele encaminhado com o processo diretamente ao relator para que ele, se desejar, a reproduza nasessão de julgamento.136 A nossa proposta, no entanto, é que as audiências sejam filmadas por uma

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câmera acoplada ao computador do juiz, que, por conexão em rede, as gravaria automaticamente namemória da central de informática do Tribunal. Assim, não seria necessária a transcrição dagravação e a Turma Recursal, quando fosse julgar, poderia acessar a memória do departamento deinformática para assistir a própria audiência.137

A aplicação do julgamento imediato do mérito em segundo grau (teoria de causamadura recursal)

Como é sabido, a Lei 10.352/2001 introduziu no CPC/1973 a possibilidade de o Tribunaljulgar imediatamente o mérito da causa, ao acolher a apelação interposta em face de uma sentençaterminativa (art. 515, § 3º). Tal possibilidade foi mantida no Novo Código e teve seu alcanceampliado (art. 1.013, §§ 3º e 4º). A doutrina tem identificado esse expediente pelo nome de “teoriada causa madura recursal”.138 Isso porque a aplicação de tal regra depende da verificação, nomomento do julgamento do recurso, da presença dos requisitos legais autorizadores do julgamentoimediato do mérito (art. 355 do CPC), ou seja, quando a causa estiver madura para julgamento, nãonecessitando de dilação instrutória para ser apreciada.

Pois bem, não vemos qualquer óbice à aplicação da determinação contida no art. 1.013, §§ 3º e4º, do CPC no sistema recursal dos Juizados Especiais. Muito pelo contrário, o procedimento emquestão, além de estar afinado com os princípios fundamentais expressos no art. 2º da Lei, se mostraadequado para apreciar causas em que a sentença é proferida, via de regra, após a realização dainstrução (art. 28).139

O impedimento do juiz nas Turmas Recursais

Por certo, o juiz não poderá participar do julgamento na Turma Recursal de recurso oriundo decausa onde tenha atuado (art. 144, II, do CPC). Se um dos fundamentos da existência do órgãocolegiado é evitar que o juiz prolator da decisão seja responsável pela sua revisão, permitir aparticipação desse julgador no julgamento do recurso seria conspirar contra o sistema.140

A técnica remissiva nos julgamentos em segundo grau

Orientado pelos princípios inseridos no art. 2º da Lei, entendeu por bem o legisladorsimplificar os trâmites para prolação das decisões nas Turmas Recursais. Assim, estabelece o art. 46que a decisão recursal poderia se limitar a dizer que está confirmando a decisão recorrida, porunanimidade ou maioria. É a chamada técnica remissiva ou fundamentação per relationem. Ainda navigência do CPC/1973, Maurício Antônio Ribeiro Lopes,141 em posição minoritária, já entendia queessa possibilidade ofendia o art. 93, IX, da CF, por subtrair da decisão a sua fundamentação.142 Defato, a sua posição se mostra correta e em sintonia com os novos paradigmas introduzidos pelo CPC,em especial, do art. 489, § 1º.

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Na nossa opinião, a técnica remissiva produz uma decisão vazia de conteúdo e sem elementosque possam comprovar que os julgadores analisaram adequadamente a questão recursal eenfrentaram seus argumentos. Tais fatores são essenciais para a produção de uma atividadejurisdicional hígida e democrática, dentro da lógica constitucional do processo (art. 1º do CPC). Porisso, defendemos que é preciso que a Turma Recursal analise o recurso e enfrente expressamentesuas alegações, apresentando de maneira clara e objetiva as razões pelas quais a decisão recorridadeve ser mantida, ainda que de maneira mais resumida.143

Note-se, ainda, que independentemente de estar ou não confirmando a decisão recorrida, adecisão recursal deverá conter relatório144 e a exposição dos fundamentos e dispositivos aplicados,ainda que de forma sucinta. Necessário salientar, também, que as Turmas Recursais devem fazer atascom todos os julgamentos realizados nas sessões, para a divulgação das decisões, na forma deementas (art. 943, § 1º, do CPC).145

Sobre a teoria do microssistema, veja-se o Capítulo 2 da primeira parte deste livro.Na jurisprudência, podemos encontrar várias decisões proclamando a autossuficiência do sistemarecursal dos Juizados. Nesse sentido, veja-se: “Juizados Especiais Cíveis. Agravo de instrumento.Inadmissibilidade. Recurso que não se conhece por falta de previsão na Lei 9099/1995,inadmissível a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, em matéria recursal. Rejeiçãoliminar” (TJRJ, 1ª TR, RI 2001.700.000360-3, Rel. Juiz Ana Maria Pereira de Oliveira, j. em24.01.2001).Importante lembrar que a Lei dos Juizados Especiais Federais contém uma regra, evidentementeinconstitucional, que afirma ser irrecorrível a sentença proferida sem resolução do mérito (art. 5ºda Lei 10.259/2001). De qualquer modo, tal regra não tem tido repercussão nos JuizadosEspeciais Estaduais.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 7 do FONAJE: “A sentença que homologa o laudo arbitral éirrecorrível”.Por certo, sentença que homologa um acordo celebrado durante a sessão de mediação também éirrecorrível.A sentença que homologa o “projeto de sentença” lavrado pelo juiz leigo, entretanto, não seenquadra no conceito de conciliação ou arbitragem previsto no art. 41, razão pela qual éperfeitamente recorrível.Nesse sentido, Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 33.Como será visto mais à frente, entendemos que o art. 59 da Lei 9.099/1995 é inconstitucional. Nãoobstante, diante da ampla aceitação da proibição ao manejo da ação rescisória nos JuizadosEspeciais, entendemos, também minoritários, que o caminho para sanar eventuais vícios contidosno acordo ou no laudo arbitral homologado é o mandado de segurança.

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Sobre a estrutura da fase cognitiva do procedimento sumaríssimo, veja-se o item 2 da segundaparte deste livro.Apesar de esse ser o entendimento majoritário, não são raras as decisões rejeitando o cabimentodos embargos de declaração em face das decisões interlocutórias. Nesse sentido, veja-se: “Nosartigos 41 e 42 da lei acima referida estão dispostos os recursos cabíveis no âmbito dos Juizados,quais sejam, o recurso inominado e os embargos de declaração, em nada indicado acerca darecorribilidade de despachos e decisões interlocutórias, pois sua ‘irrecorribilidade vê-secomtemplada, implicitamente, pelo art. 41, permissivo do recurso (inominado) apenas contrasentença’ (Rogério Lauria Tucci, Manual do Juizado Especial de Pequenas Causas, São Paulo,Saraiva, p. 48.). Isto decorre da intenção do legislador em limitar a quantidade de recursos,prevalecendo a simplicidade do procedimento e a agilidade no provimento da tutela jurisdicional”(TJPR, 1ª TR, AI 201500001213, Rel. Juiz Aldemar Sternadt, j. em 17.12.2015).A identificação da irrecorribilidade em separado das decisões interlocutórias com o princípio daoralidade foi explanada no item 3.2.3 da primeira parte deste livro.Sobre a questão, confiram-se: “Frente ao sistema da Lei 9.099/1995, não há preclusão da matériaprocessual dirimida no curso do procedimento, sendo as decisões interlocutórias irrecorríveis,devendo, em qualquer caso, serem reexaminadas pela via do recurso próprio ali previsto, em faceda adoção plena do princípio da oralidade” (TJSC, AI 320-7, Rel. Des. Pedro Manoel de Abreu,DJ 03.06.1996).Essa visão já era consagrada em relação aos Juizados Especiais de Pequenas Causas. Nessesentido, veja-se Rogério Lauria Tucci, Manual do Juizado Especial de Pequenas Causas:anotações à Lei nº 7.244 de 7/11/84, p. 247.Juizados Especiais Cíveis, p. 108. Nesse sentido, veja-se o Enunciado 13 do 1º EMJERJ: “Dasdecisões proferidas pelo Juizado Especial, somente são cabíveis os recursos previstos nos artigos41 e 48 da Lei 9.099/1995 (recurso inominado e embargos de declaração) (por maioria)” e aEmenta 142 do ETRJECERJ: “Na execução não deve o Juízo definir questões de mérito, de ofício,que podem ser suscitadas pela parte em embargos do devedor, uma vez que o procedimento na Lei9.099/1995, não oferece oportunidade de recurso de agravo de instrumento, nem o Mandado deSegurança é substitutivo dessa espécie de impugnação”.O Pleno do STF, em 2003, ao afirmar sua incompetência para apreciar mandado de segurançaimpetrado contra ato das Turmas Recursais, assinalou o cabimento do mandado de segurança paraa Turma Recursal (QO no MS 24.691/MG). Na verdade, a orientação favorável ao cabimento domandado de segurança em face das decisões interlocutórias já existia desde a década de 1980,quando vigia a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei 7.244/1984). Nesse sentido, veja-se:“Juizado Especial de Pequenas Causas. Ainda que o mandado de segurança impetrado contra atojudicial praticado no Juizado busque reconhecimento de incompetência daquele sistemajurisdicional, competente para conhecer o ‘writ’ e a Câmara Recursal do Juizado, órgão desegundo grau do sistema” (TJPR, 9ª Câmara Cível, MS 194182515, Rel. Des. Antônio GuilhermeJardim, j. em 22.11.1994).STF, Pleno, REXT 586.789/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. em 16.11.2011. A teseconsagrada nesse julgamento, por sinal, foi inserida no banco de jurisprudência do STF, em

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matéria de repercussão geral, como Tema 159: “Competência para processar e julgar mandado desegurança contra decisão de juiz federal no exercício de jurisdição de juizado especial federal”.Embora a causa julgada nesse recurso seja referente aos Juizados Especiais Federais, nada obsta asua aplicação aos Juizados Especiais Estaduais, como restou consignado no julgamento proferidoem 05.08.2014 pela 2ª Turma do STF, no agravo regimental interposto em face da decisãomonocrática prolatada pelo ministro Celso de Mello no MS 32.627/RJ.No STF, entretanto, ela ainda é eventualmente ventilada. Nesse sentido, veja-se: “Trata-se deagravo interposto de decisão que inadmitiu recurso extraordinário contra acórdão de TurmaRecursal que entendeu não ser cabível mandado de segurança contra decisão interlocutória noâmbito dos juizados especiais. Alega a parte ora recorrente, nas razões do recurso extraordinário,ofensa ao art. 5º, LXIX e LIV, da Constituição Federal. Não prospera o recurso. Esta Corte, nojulgamento do RE 576.847 (rel. min. Eros Grau, DJe de 07.08.2009), firmou o entendimento deque é incabível o mandado de segurança ou agravo de instrumento contra decisões interlocutóriasno âmbito dos juizados” (STF, Presidência, ARE 687.719/BA, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. em05.10.2012).Com esse pensamento, Luís Felipe Salomão, op. cit., p. 75; Mantovanni Colares Cavalcante, op.cit., p. 59; Eduardo Oberg, op. cit., p. 184; e Ada Pellegrini Grinover et al., Recursos no processopenal,160. Vejam-se, ainda, o Enunciado 62 do FONAJE: “Cabe exclusivamente às Turmas Recursaisconhecer e julgar o mandado de segurança e o habeas corpus impetrados em face de atos judiciaisoriundos dos Juizados Especiais” e a Ementa 71 do ETRJECERJ: “Mandado de segurança contradecisão concessiva de liminar. Possibilidade diante da falta de recurso contra decisõesinterlocutórias na Lei 9.099/1995. Interpretação a contrário senso da súmula 267 do STF”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 14.1.1 da CEJCA: “É admissível mandado de segurançasomente contra ato ilegal e abusivo praticado por Juiz de Juizado Especial” e o Enunciado 14.1.3da CEJCA: “Não havendo direito líquido e certo aferível de plano na inicial do Mandado deSegurança, deverá o mesmo ser apresentado para julgamento em mesa, indeferindo-se a inicial naforma do art. 8º, da Lei 1.533/1951”.Nesse sentido, veja-se: “No entanto, não cabe Mandado de Segurança, quando a parte apenas nãopode fazer uso do agravo de instrumento, utilizando-se do remédio para tentar reverter seuinconformismo com determinada decisão interlocutória, que se encontra em perfeita harmonia coma lei, mas que contraria seus interesses” (TJRJ, 2ª TR, MS 2003.700.004353-8, Rel. Juiz MariaCândida Gomes de Souza).Mesmo minoritárias, na doutrina, é possível encontrar significativas vozes defendendo ocabimento do agravo de instrumento nos Juizados Especiais desde o início da vigência da Lei9.099/1995, tais como Weber Martins Batista e Luiz Fux, op. cit., p. 238; Cândido RangelDinamarco, Instituições..., op. cit., p. 811; Nelson Nery Jr. e Rosa Nery, Comentários..., op. cit.,p. 765; e Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 156.STJ, 2ª Seção, CC 104.476/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. em 27.05.2009.Nesse sentido, veja-se: “A decisão oriunda de processo que tramita no Juizado Especial, somenteadmite recurso quando se tratar de deferimento de medida cautelar ou em face de sentença

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definitiva, consoante o disposto nos artigos 4º e 5º, da Lei 10.259/2001” (TRF3, 8ª Turma, AI2010.03.00.005326-3, Rel. Des. Marianina Galante, j. em 16.08.2010).Nesse sentido, veja-se: “Agravo de Instrumento. Recurso contra decisão interlocutória que deferiututela antecipada. Estado do Rio Grande do Sul. Parcelamento de salário. Valor da causa superiora 60 salários mínimos. Incompetência do Juizado Especial da Fazenda Pública” (TJRS, 2ª TR, AI71005769211, Rel. Juiz Mauro Caum Gonçalves, j. em 04.11.2015).No STF existem julgados admitindo o cabimento do agravo de instrumento apenas nas hipóteses dedano grave e de difícil reparação, nos termos do art. 522, segunda parte, do CPC/1973. Nessesentido, veja-se: “O cabimento do agravo de instrumento, no âmbito dos Juizados EspeciaisCíveis, é bastante restrito, sendo apenas admissível no caso de lesão grave e de difícil reparação;trata-se de posicionamento consagrado na doutrina e na jurisprudência, decorrente dos princípiosda simplicidade, da informalidade da oralidade (art. 2º da Lei 9.099/1995)” (STF, 1ª Turma, ARE774.996/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, j. em 16.12.2013).É praticamente a mesma lista defendida por Bruno Garcia Redondo no artigo “Da recorribilidadedas decisões interlocutórias nos juizados especiais cíveis federais e estaduais”, p. 202.Nesse sentido, veja-se José Carlos Van Cleef de Almeida Santos, Decisão interlocutória demérito e coisa julgada parcial, p. 479.Como será visto mais à frente, defendemos que o juízo de admissibilidade do “recurso inominado”deve ser feito exclusivamente pela Turma Recursal, na linha do que estabelece o art. 1.010, § 3º,do CPC. No entanto, diante do entendimento majoritário de que o juízo de admissibilidade deveser feito, também, pelo Juizado onde o recurso foi interposto, é inevitável concluir que dessadecisão, quando denegatória, caberá agravo de instrumento.Nesse sentido, admitindo o agravo de instrumento em face da decisão que dinamiza o ônus daprova nos Juizados Especiais, veja-se Lucas Buril de Macedo e Ravi Peixoto, A teoria dadinamização do ônus da prova, o Novo CPC e as adaptações necessárias para a sua utilizaçãono procedimento dos Juizados Especiais, p. 396.A fase executiva nos Juizados Especiais é basicamente formal e escrita. Além disso, váriasdecisões interlocutórias são proferidas fora da audiência. Por isso, existem algumas decisõesadmitindo o agravo de instrumento apenas na fase de execução. Nesse sentido, veja-se a Ementa39 do ETRJE-CERJ: “Agravo de instrumento. Seu cabimento no sistema dos Juizados EspeciaisCíveis, na fase de Execução”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 157 do ETRJECERJ: “De acordo com o art. 557 do diplomaprocessual, o recurso manifestamente inadmissível pode ser declarado como tal pelo relator, sem anecessidade de julgamento coletivo. Trata-se de norma simplificadora e que casa com osprincípios que norteiam os Juizados Especiais, dentre eles os da informalidade e da celeridadeprocessuais”.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 102 do FONAJE: “O relator, nas Turmas Recursais Cíveis,em decisão monocrática, poderá negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível,improcedente, prejudicado ou em desacordo com Súmula ou jurisprudência dominante das TurmasRecursais ou de Tribunal Superior, cabendo recurso interno para a Turma Recursal, no prazo decinco dias” e o Enunciado 103 do FONAJE: “O relator, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisão

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monocrática, poderá dar provimento a recurso se a decisão estiver em manifesto confronto comSúmula do Tribunal Superior ou Jurisprudência dominante do próprio Juizado, cabendo recursointerno para a Turma Recursal, no prazo de cinco dias”.Nesse sentido, veja-se: “Em preliminar, a Julgadora filiou-se a entendimento do STF exarado noRE 612.359/SP, que autoriza o Relator a decidir monocraticamente o recurso, desde que a decisãopossa ser submetida ao Órgão Colegiado, revelando-se, portanto, possível a interposição deagravo interno no âmbito dos Juizados Especiais” (TJDF, Rcl 20070111055000, Rel. Juiz GiselleRocha Raposo, j. em 29.11.2011).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 63 do FONAJE: “Contra decisões das Turmas Recursais sãocabíveis somente os embargos declaratórios e o Recurso Extraordinário”.Op. cit., 61.Humberto Theodoro Júnior, Curso, v. III, p. 487.Nesse sentido, também, Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 43, e Alexandre Câmara,Juizados..., op. cit., p. 141.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 15 do FONAJE: “Nos Juizados Especiais não é cabível orecurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC” e Enunciado 464 doFPPC: “A decisão unipessoal (monocrática) do relator em Turma Recursal é impugnável poragravo interno”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 124 do FONAJE: “Das decisões proferidas pelas TurmasRecursais em mandado de segurança não cabe recurso ordinário”.Pestana de Aguiar, op. cit., p. 54. Na jurisprudência, cabe destacar: “Não possui tribunal estadualcompetência originária, nem recursal, para rever a decisões do colégio recursal do juizadoespecial de pequenas causas” (STJ, 4ª Turma, RMS 2.906-/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, em18.05.1993).Sobre o tema, veja-se nosso artigo Os impactos do Novo CPC no recurso inominado dosJuizados Especiais, p. 651.Juizados..., op. cit., p. 148.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 11.9.2 da CEJCA: “Conta-se o prazo recursal a partir da datadesignada para a leitura da sentença, se esta vier tempestivamente aos autos, o que seráobrigatoriamente certificado pelo Escrivão; computar-se-ão os prazos, excluindo o dia do começoe incluindo o do vencimento”.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 160 do ETRJECERJ: “O prazo para interposição do recursocontra decisão proferida no Juizado Especial Cível é contado da data da ciência da sentença e nãoda juntada do instrumento intimatório aos autos. Recurso não conhecido”, o Enunciado 11.9.3 daCEJCA: “Nos Juizados Especiais os prazos são contados da data da intimação, e não da juntadado respectivo expediente aos autos” e o Enunciado 13 do FONAJE: “Os prazos processuais nosJuizados Especiais Cíveis, contam-se da data da intimação ou ciência do ato respectivo, e não dajuntada do comprovante da intimação, observando-se as regras de contagem do CPC ou do CódigoCivil, conforme o caso”.Como já foi visto, entendemos, minoritários, que a dispensa do advogado prevista no art. 9º da Lei

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9.099/1995 é inconstitucional.Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 189, e o Enunciado 11.8.2 da CEJCA: “O requerimentode gratuidade de justiça, que também poderá ser formulado quando da interposição do recurso,abrange, caso deferido, as despesas correspondentes aos atos processuais a eles anteriores,sempre sendo decidido pelo juízo monocrático”.Enunciado 115 do FONAJE: “Indeferida a concessão do benefício da gratuidade da justiçarequerido em sede de recurso, conceder-se-á o prazo de 48 horas para o preparo”.Dizia o art. 519, na redação original do CPC: “Dentro do prazo de 10 (dez) dias, contados daintimação da conta, o apelante efetuará o preparo, inclusive do porte de retorno, sob pena dedeserção. Vencido o prazo e não ocorrendo deserção, os autos serão conclusos ao juiz, quemandará remetê-los ao tribunal, dentro de 48 (quarenta e oito) horas”.Com esse posicionamento, vejam-se a Ementa 12 do 2º ETRJECERJ: “Prazo. Recolhimento decustas recursais. Muito embora o prazo fixado em horas se conte minuto a minuto, a teor dodisposto no art. 125, § 4º, do Código Civil, mesmo no âmbito da Lei 9.099 aplica-se o princípiosegundo o qual iniciado o prazo em dia em que não há expediente forense, a contagem se inicia noprimeiro dia útil subsequente” e a Ementa 349 do ETRJECERJ: “Recurso. Custas a menor. Artigo42, § 1º, Lei 9.099. Enunciado 26 do I EJTR. I – As despesas processuais devem ser recolhidasem 48 horas pelo recorrente independentemente de intimação. II – Este prazo conta-se minuto aminuto (artigo 125, § 4º, do Código Civil), tendo como termo a quo a entrada da petição recursalno protocolo do Juízo”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 11.9.4 da CEJCA: “O prazo para o pagamento do preparo dorecurso inominado vence no final do expediente bancário do dia em que se completam as 48(quarenta e oito) horas de que trata o Art. 42, § 1º, da Lei 9.099/1995”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 46 do 2º ETRJECERJ: “Direito processual. Intimação dorecorrente para complementação do preparo recursal. Deserção. Inocorrência. Transferência aterceiro de obrigação assumida contratualmente. Código do Consumidor. Nulidade. Multacominatória. Lei 9.099/1995. Limite. Não ocorre a deserção quando o recorrente, devidamenteintimado, efetua a complementação do preparo”.Nesse sentido, vejam-se a Ementa 74 do ETRJECERJ: “Recurso. Preparo. O artigo 511 do Códigode Processo Civil não se aplica ao sistema dos Juizados Especiais Cíveis, em face da normaespecífica contida no artigo 42, § 1º, da Lei 9.099/1995”, a Ementa 157 do ETRJECERJ:“Conforme se verifica da certidão de fl. 40, as custas não foram recolhidas integralmente. Opreparo constitui requisito objetivo de admissibilidade do recurso. O não recolhimento integralequipara-se a falta de preparo. Este enseja o não conhecimento do recurso”, “Deserção. A normado § 1º do artigo 42 da Lei 9.099/1995, é de ordem pública, afinada com o princípio da celeridadeque informa o processo em sede de juizado especial cível, não devendo ser relevada a penalidade,em face de recolhimento tardio de complemento de custas judiciais” (TJRJ, TR, Ap.2000.700.009871-5, Rel. Juiz Augusto Alves Moreira Júnior) e o Enunciado 80 do FONAJE: “Orecurso Inominado será julgado deserto quando não houver o recolhimento integral do preparo esua respectiva comprovação pela parte, no prazo de 48 horas, não admitida a complementaçãointempestiva (art. 42, § 1º, da Lei 9.099/1995)”.

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Nesse sentido, Eduardo Oberg, op. cit., p. 189.Nesse sentido, veja-se: “Deserção de recurso pela diferença de R$ 0,01 (um centavo) entre aconta e o preparo efetivado. Ao exigir da recorrente o cumprimento de condição impossível de sersatisfeita – recolhimento de valor não existente no sistema monetário brasileiro (L. 9069/95, art.1º, §§ 2º e 5º), a decisão recorrida, além de negar-lhe, na prática, a prestação jurisdicionaldemandada, cerceou claramente o seu direito de defesa, ofendendo o artigo 5º, XXXVI e LV, daConstituição” (STF, 1ª Turma, REXT 347.528/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em06.04.2004).Nesse sentido, admitindo a complementação do preparo, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit.,p. 145.Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 88 do FONAJE e o Enunciado 11.4 da CEJCA, ambos com amesma redação: “Não cabe recurso adesivo em sede de Juizado Especial, por falta de expressaprevisão legal” e “Recurso adesivo do autor. Não cabimento. Ausência e previsão expressa noSistema dos Juizados Especiais Cíveis” (TJSC, 4ª TR, RI 20144008405, Rel. Juiz Débora Zanini,j. em 11.08.2015).Como bem sublinhado por Luiz Fux (op. cit., p. 64), “a adesão conspira em favor da economiaprocessual e de uma ‘conciliação por meio de persuasão’, porquanto uma parte pode desistir dorecurso exatamente porque a outra recorreu, atingindo a verdadeira finalidade do recursoadesivo”. Também admitindo o recurso adesivo, Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 56, eAlexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 149.Neste sentido, veja-se o Enunciado 79 do FOREJEF: “Não há mais o juízo prévio deadmissibilidade do recurso inominado, aplicando-se o art. 1.010, § 3º, do NCPC no âmbito dosjuizados especiais federais”.Conforme será esclarecido mais à frente, defendemos que somente a Turma Recursal pode deferirefeito suspensivo ao “recurso inominado”, muito embora o art. 43 da Lei 9.099/1995 fale emdeferimento do efeito suspensivo pelo “juiz”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 166 do FONAJE: “Nos Juizados Especiais Cíveis, o juízoprévio de admissibilidade do recurso será feito em primeiro grau”.Nesse sentido, veja-se: “Ante o exposto, é cabível ressaltar também que cabe ao órgão recursalversar definitivamente sobre a admissibilidade do recurso, não havendo qualquer vinculação aojuízo de admissibilidade proferido na instância inferior, uma vez que tal juízo é meramenteprovisório, cabendo, portanto, mandado de segurança para impugnar esta decisão” (TJRN, 3ª TR,MS 20149012887, Rel. Juiz Rossana Maria Paiva, j. em 12.12.2014).Nesse sentido, veja-se o Enunciado 14.12 da CEJCA: “Aplica-se nos Juizados Especiais Cíveis oartigo 285-A do CPC”.Na nossa visão, o julgamento de improcedência liminar (art. 332 do CPC) não parece adequado aosistema dos Juizados Especiais, galgado na oralidade e busca pela conciliação. Por isso, seuprocedimento recursal não deve, igualmente, ser aqui aplicado.Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 46. No Rio de Janeiro, o prazo para a sustentação oralé de cinco minutos, prorrogáveis por igual período (art. 9º da Resolução 07/06, do Conselho da

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Magistratura).Sobre o tema, veja-se o nosso Teoria Geral dos Recursos Cíveis, p. 62.Reafirmando essa posição, Eduardo Oberg, op. cit., p. 189. Na jurisprudência, confira-se oEnunciado 14 do 1º EMJERJ: “À falta de ressalva, o efeito do recurso será o devolutivo (artigo43 da Lei 9.099/1995), possibilitando carta de sentença, com execução provisória”.Nesse sentido, Luís Felipe Salomão, op. cit., p. 77. Confira-se uma decisão em que o próprio juizprolator da sentença atribuiu efeito suspensivo ao “recurso inominado”: “Diante da relevância damatéria discutida na demanda, estando em análise a vigência de cobertura de plano de assistênciamédica, bem como diante dos graves prejuízos a que se encontra sujeita a autora recorrente, emvirtude da imediata cassação dos efeitos da tutela, resultante da prolação da sentença deimprocedência, acolho o requerimento da parte reclamante para reconsiderar a decisão de fl. 122,a fim de receber o recurso no duplo efeito (suspensivo e devolutivo), restaurando assim a eficáciada tutela deferida a fl. 41, até que a demanda seja julgado em definitivo” (TJRJ, 1º JuizadoEspecial Cível da Comarca da Capital, Proc. 2004.800.091376-4, Juiz Françoise Picot, j. em29.11.2004).Na doutrina, veja-se Humberto Theodoro Júnior, Curso, v. III, p. 488. Na jurisprudência,reconhecendo que o juiz do Juizado tem atribuição para deferir efeito suspensivo ao “recursoinominado”, veja-se: “Caracteriza erro in procedendo, quando a parte requer decisão judicial,mas o pedido é negado sem qualquer motivação. No caso em apreço, a pretensão era de concessãode efeito suspensivo ao recurso inominado, face à sentença que condenou a ré em obrigação defazer” (TJDF, 1ª TR, Rcl 20140020032906, Rel. Juiz Luís Gustavo de Oliveira, j. em 25.03.2014).Nesse sentido, veja-se: “Agravo de instrumento. Pedido de concessão de efeito suspensivo aorecurso inominado interposto pela agravante. A concessão de efeito suspensivo ao recursoinominado é providência excepcional (Lei 9.099/1995, art. 43), somente admissível em caso deevidente perigo de dano grave e irreparável ao devedor” (TJSP, 2ª TR, AI 3686, Rel. Juiz CarlosVieira Von Adamek, j. em 24.10.2008). A posição majoritária, entretanto, é que essa decisãodesafia mandado de segurança. Nesse sentido, veja-se: “Mandado de segurança. Concessão deefeito suspensivo a recurso inominado. Sentença indeferindo inicial de embargos de terceiro.Ausência de direito líquido e certo” (TJDF, 2ª TR, MS 20030560002441, Rel. Juiz João Egmont,j. em 28.06.2004).Trata-se, conforme já sublinhado, de entendimento minoritário. No sentido majoritário, vejam-se oEnunciado 15 do FONAJE: “Nos Juizados Especiais não é cabível o recurso de agravo, exceto nashipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC”, o Enunciado 11.5 da CEJCA: “No sistema de JuizadosEspeciais Cíveis, é inadmissível a interposição de agravo contra decisão interlocutória, anterior,ou posterior à sentença”, a Ementa 384 do ETRJECERJ: “Agravo de instrumento. Não cabimentoem sede de Juizados Especiais Cíveis, por ausência de previsão legal. Não conhecimento dorecurso” e “Juizados Especiais Cíveis. Agravo de instrumento. Inadmissibilidade. Recurso quenão se conhece por falta de previsão na Lei 9099/1995, inadmissível a aplicação subsidiária doCódigo de Processo Civil, em matéria recursal” (TJRJ, 1ª TR, Ap. 2001.700.000360-3, Rel. AnaMaria Pereira de Oliveira, j. em 24.01.2001).Importante lembrar que o prazo de 15 dias para a interposição do recurso extraordinário não

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merece reparo, na medida em que esse recurso é dirigido “para fora” do Sistema dos JuizadosEspeciais.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 74 do FOREJEF: “Aplica-se o prazo de 10 (dez) dias do art.42, da Lei 9.099/1995, para interposição do recurso contra sentença e decisão que defere ouindefere medida de urgência (art. 5º da Lei 10.259/2001)”.Nesse sentido, vejam-se os seguintes julgados: “Competência. Agravo de Instrumento.Impugnação. Excesso de execução. Ação de cobrança. Caderneta de poupança. Demanda quetramitou sob o rito do Juizado Especial Cível. Competência exclusiva do Colégio Recursal”(TJSP, AI 990102154572, Rel. Des. Spencer Almeida Ferreira, j. em 15.09.2010) e “Agravo deinstrumento. Processual civil. Decisão proferida no âmbito de Juizado Especial Cível.Incompetência do Tribunal de Justiça para apreciação do recurso. Atacando o agravo deinstrumento em exame, decisão proferida em sede de execução de sentença processada no âmbitodo Juizado Especial Cível, é inafastável a incompetência desta Corte para apreciação e julgamentodo presente recurso. Declinada a competência” (TJRS, 15ª Câmara Cível, AI 70015073653, Rel.Des. Angelo Maraninchi Giannakos, j. em 27.04.2006).Dentre os autores que defendem a aplicação do agravo de instrumento nos Juizados, com base noCPC, somente Pestana de Aguiar (op. cit., p. 38) o dirige ao Tribunal de Justiça.Se o agravo for interposto antes da citação do réu, não haverá agravado.Veja-se nosso artigo “Considerações iniciais sobre as últimas alterações no recurso de agravo”,p. 83.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 15 do FONAJE: “Nos Juizados Especiais não é cabível orecurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC”. O STF, em mais de umaoportunidade, reconheceu indiretamente o cabimento do agravo interno (chamado de agravoregimental) nos Juizados Especiais, ao afirmar que não poderia ser interposto REXT em face dedecisão monocrática do relator na Turma Recursal. Nesse sentido, veja-se: “Recursoextraordinário. Inadmissibilidade contra decisão individual do Juiz de Turma Recursal de JuizadosEspeciais, que liminarmente tranca o processamento de recurso a ela endereçado, não submetidamediante agravo ao seu reexame, cujo cabimento decorre da colegialidade do órgão, explicitadono art. 98, I, da Constituição” (STF, 1ª Turma, REXT 311.382/RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j.em 04.09.2001).Nesse sentido, vejam-se o Enunciado 102 do FONAJE: “O relator, nas Turmas Recursais Cíveis,em decisão monocrática, poderá negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível,improcedente, prejudicado ou em desacordo com Súmula ou jurisprudência dominante das TurmasRecursais ou de Tribunal Superior, cabendo recurso interno para a Turma Recursal, no prazo decinco dias” e o Enunciado 103 do FONAJE: “O relator, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisãomonocrática, poderá dar provimento a recurso se a decisão estiver em manifesto confronto comSúmula do Tribunal Superior ou Jurisprudência dominante do próprio Juizado, cabendo recursointerno para a Turma Recursal, no prazo de cinco dias”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 358 do FPPC: “A aplicação da multa prevista no art. 1.021, §4º, exige manifesta inadmissibilidade ou manifesta improcedência”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 359 do FPPC: “A aplicação da multa prevista no art. 1.021, §

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4º, exige que a manifesta inadmissibilidade seja declarada por unanimidade”.Por todos, veja-se Teresa Arruda Alvim Wambier, Omissão judicial e embargos de declaração, p.152.Por todos, veja-se José Carlos Barbosa Moreira, Comentários, p. 546.Por todos, veja-se Fredie Didier Jr., Curso, p. 183.Nesse sentido, veja-se Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, Comentários ao Novo Código deProcesso Civil, p. 1.512, e o Enunciado 475 do FPPC: “Cabem embargos de declaração contradecisão interlocutória no âmbito dos juizados especiais”.Por certo, a previsão do cabimento dos embargos de declaração para sanar erros materiais nãoimpede que tal providência seja tomada, de ofício ou a requerimento, a qualquer tempo (art. 48,parágrafo único, da Lei 9.099/1995 e art. 494, I, do CPC/2015). Nesse sentido, veja-se oEnunciado 360 do FPPC: “A não oposição de embargos de declaração em caso de erro material nadecisão não impede sua correção a qualquer tempo”.Súmula 282 do STF: “É inadmissível o recurso extraordinário quando não ventilada, na decisãorecorrida, a questão federal suscitada”.Por todos, Rodolfo de Camargo Mancuso, Recurso extraordinário e recurso especial, p. 42.Súmula 356 do STF: “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargosdeclaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito doprequestionamento”.Nesse sentido, veja-se a Ementa 244 do ETRJECERJ: “Embargos de Declaração. Não se destinamos embargos declaratórios a provocar o reexame da matéria já decidida, com óbvio fim deprequestionamento, só sendo eles cabíveis nas hipóteses previstas no art. 535 do CPC”. Assim,também, o Enunciado 125 do FONAJE: “Nos juizados especiais, não são cabíveis embargosdeclaratórios contra acórdão ou súmula na hipótese do art. 46 da Lei 9.099/1995, com finalidadeexclusiva de prequestionamento, para fins de interposição de recurso extraordinário”.Nesse sentido, Sandro Marcelo Kozikoski, Embargos de declaração: teoria geral e efeitosinfringentes, p. 198.Nesse sentido, veja-se: “Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos, paratornar sem efeito o acórdão embargado e a decisão agravada e prover o agravo de instrumento,admitindo o recurso extraordinário” (STF, 2ª Turma, AI 784.697/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa,j. em 15.05.2012).Nesse sentido, veja-se: “Padece de nulidade o acórdão que acolhe os embargos de declaraçãocom efeitos modificativos sem que se abra vista à parte contrária para oferecer impugnação.Embargos acolhidos para, emprestando-lhes efeito modificativo, anular a decisão anterior” (STJ,5ª Turma, ED REsp 331.278/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. em 18.10.2005).Com essa orientação, vejam-se a Ementa 115 do ETRJECERJ: “Embargos de declaração. Osefeitos modificativos dos embargos somente em casos excepcionais podem ser admitidos. Talrecurso não constitui forma de impugnação com o escopo de reforma integral do decidido, masapenas para sanar obscuridade ou contradição, inocorrentes no acórdão embargado” e Ementa 86do ETRJECERJ: “Embargos de declaração. Efeito modificado. Reexame da matéria.

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Inadmissibilidade. I – Admite--se efeito modificativo dos embargos de declaração apenas quandoda obscuridade, contradição ou omissão do julgado resultar em sua alteração. II – Os embargos dedeclaração é sede imprópria para a manifestação de inconformismo com o julgado, eis que carecede caráter infringente e, salvo as hipóteses específicas, nele não se devolve o exame da matéria àTurma Recursal”.Em sentido contrário, veja-se o Enunciado 85 do FONAJE: “O Prazo para recorrer da decisão deTurma Recursal fluirá da data do julgamento”.Defendemos que a interposição oral dos embargos de declaração deveria ter sido adotada peloCPC/2015, de modo a generalizar a regra, tão afinada com os escopos de efetividade e celeridadedo processo.Nesse sentido, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 56.A Súmula 418 do STJ foi cancelada logo após a entrada em vigor do CPC/2015. Seu texto dizia:“É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos dedeclaração, sem posterior ratificação”.Nesse sentido veja-se o Enunciado 218 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Ainexistência de efeito suspensivo dos embargos de declaração não autoriza o cumprimentoprovisório da sentença nos casos em que a apelação tenha efeito suspensivo”.Nesse sentido, José Carlos Barbosa Moreira, Comentários, p. 567.Defendendo a aplicação da multa do CPC por embargos protelatórios, Mantovanni ColaresCavalcante, op. cit., p. 68, e Humberto Theodoro Júnior, op. cit., p. 489. Na jurisprudência, veja-se: “No presente caso, os embargos de declaração possuem intuito manifestamente protelatório,haja vista se limitarem a reiterar as alegações veiculadas em embargos de declaração anteriores,com conteúdo idêntico, já rejeitados. Sendo assim, a conduta manifestamente protelatória enseja aaplicação da multa prevista no art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Embargosde declaração não conhecidos. Aplicada ao embargante a multa de 1% (um por cento) do valoratualizado da condenação, com fulcro no art. 538, parágrafo único, do CPC” (TJDF, 2ª TR, RI20140110074350, Rel. Juiz Antônio Fernandes da Luz, j. em 28.10.2014).Nesse sentido, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 56, e Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 813.Como será visto mais à frente, defendemos, minoritários, a inconstitucionalidade do art. 59 da Lei9.099/1995.Nesse sentido, Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 811. Por outro lado, defendendo o cabimentodo recurso especial em face das decisões da Turma Recursal, veja-se Ronaldo Botelho,Jurisprudência comentada, p. 256: “Se a Constituição fala em Tribunais é porque à época nãoexistiam as Turmas Recursais. Depois que estas vieram, com a missão de compor o Juízo de 2ºgrau, da mesma forma que os Tribunais, nada justifica o alijamento do recurso especial contra suasdecisões”.No STJ, o acórdão pioneiro nesse sentido foi o proferido em 1997: “Não é cabível esse recursodas decisões dos órgãos de segundo grau dos Juizados Especiais porque não se constituem emTribunais, como exigido pelo art. 105, III, da CF/88” (STJ, 3ª Turma, REsp 118.463/SC, Rel. Min.Eduardo Ribeiro, j. em 20.05.1997). Posteriormente, inúmeras decisões seguiram idêntico

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caminho, até a edição em 1998 da Súmula 203: “Não cabe recurso especial contra decisãoproferida, nos limites de sua competência, por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais”. Em2002, a Súmula 203 passou por uma revisão, que estabeleceu a seguinte redação: “Não caberecurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos juizados especiais”.Importante notar que a ressalva subtraída do texto original da súmula permitia que o STJ exercessefiscalização sobre causas que estivessem tramitando indevidamente nos Juizados Especiais,subtraindo a competência de outros órgãos. Nesse sentido, veja-se: “Juizado de Pequenas Causas.Inadmissibilidade, em princípio, do recurso especial que se pode ter, entretanto, como cabívelquando ultrapassados os limites postos para a competência daqueles órgãos, o que não ocorre naespécie. Recurso não conhecido” (STJ, 3ª Seção, REsp 123.166/RJ, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j.em 15.12.1997).Nesse sentido, Salomão, op. cit., p. 78, e Marcus Antônio de Souza Faver, Coluna Opinião, p. 4.Compartilhando desse entendimento, Pestana de Aguiar, op. cit., p. 55; Mantovanni ColaresCavalcante, op. cit., p. 80; Humberto Theodoro Júnior, op. cit., p. 487; Sylvio Capanema de Souza,Coluna Opinião, p. 4; e Dinamarco, Instituições..., op. cit., p. 811.O entendimento majoritário é que não cabe recurso ordinário constitucional em mandado desegurança. Nesse sentido, veja-se: “Consolidado o entendimento nesta Corte, no sentido de nãohaver previsão constitucional para que o STJ julgue recurso ordinário em mandado de segurançainterposto perante Turma ou Colégio Recursal de Juizado Especial. Assim, não cabe ainterposição do agravo previsto no art. 544 do CPC objetivando dar trânsito ao referido recurso”(STJ, 4ª Turma, AgRg AI 1.432.422/SP, Rel. Min. Luiz Felipe Salomão, j. em 11.03.2014).Nesse sentido, veja-se: “Como é da própria essência e natureza dos Juizados Especiais CíveisEstaduais previstos na Lei 9.099/1995, as causas de sua competência decorrem de controvérsiasfundadas em relações de direito privado, revestidas de simplicidade fática e jurídica, ensejandopronta solução na instância ordinária (...) Não se pode eliminar por completo a possibilidade deexistir matéria constitucional dotada de repercussão geral, mas isso não abala a constatação de quea quase totalidade dos milhares de recursos extraordinários interpostos nessas causas não trata dematéria constitucional com qualificado significado de repercussão geral a ensejar a manifestaçãodo STF” (STF, Pleno, AREXT 835.833/RS, Rel. Min. Teori Zavascki, j. em 29.10.2015).Para um estudo mais completo sobre a sistemática do recurso extraordinário no CPC/2015,remetemos o leitor ao capítulo do livro que escrevemos sobre o tema, com outros valorososjuristas: Curso do Novo Processo Civil, p. 835.Por todos, veja-se Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 85. Vejam-se, nesse sentido: “OTribunal, por unanimidade, determinou a remessa dos autos ao Juiz Presidente da Turma Recursalda Seção Judiciária do Paraná, nos termos do voto do Relator, para que este proceda ao exame deadmissibilidade ou não do recurso” (STF, Plenário, QO/RE 388.846, Rel. Min. Marco Aurélio, j.em 09.09.2004) e o Enunciado 84 do FONAJE: “Compete ao Presidente da Turma Recursal ojuízo de admissibilidade do Recurso Extraordinário, salvo disposição em contrário”.No Rio de Janeiro, apenas para exemplificar, a Resolução 07/2006, do Conselho da Magistratura,delegou ao Juiz Coordenador dos Juizados Especiais a tarefa de fazer juízo de admissibilidadedos Recursos Especiais e Extraordinários interpostos das decisões das Turmas Recursais (art. 5º,

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§ 2º, e).Nesse sentido, veja-se o seguinte aresto: “Civil e processual. Ação de indenização por usoindevido de imagem. Publicação não autorizada de foto integrante de ensaio fotográfico contratadocom revista especializada. Dano moral. Fixação em patamar excessivo. Redução. Possibilidade,in casu. 1. A redução do ‘quantum’ indenizatório a título de dano moral é medida excepcional esujeita a casos específicos em que for constatado abuso, tal como verificado no caso” (STJ, 4ªTurma, REsp 764.735/RS, Rel. Min. Honildo Amaral de Mello Castro, j. em 05.11.2009).A expressão tornou-se conhecida a partir do momento em que foi utilizada no discurso de posse doMinistro Humberto Gomes de Barros como presidente do STJ, em 7 de abril de 2008, em queanunciou que aquela Corte adotaria a “jurisprudência defensiva”, “consistente na criação deentraves e pretextos para impedir a chegada e o conhecimento dos recursos que lhe são dirigidos”.A fungibilidade recursal ocorre quando o julgador admite como correto um recurso erradamenteinterposto, constatando a presença da boa-fé e da dúvida objetiva sobre qual o recurso a serutilizado naquela circunstância. Nesse sentido, veja-se nosso livro Teoria geral dos recursoscíveis, p. 70.Como já tivemos a oportunidade de dizer no Curso do Novo Processo Civil, p. 852, a conversãodo REXT em RESP deveria seguir a mesma lógica estabelecida para a conversão do RESP emREXT (art. 1.032 do CPC), ou seja, deveria o relator no STF determinar a emenda do REXT pelorecorrente, no prazo de 15 dias, antes de determinar a remessa ao STJ, para julgá-lo como RESP.É a reprodução da Súmula 456 do STF: “O Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recursoextraordinário julgará a causa aplicando o direito à espécie”.Se o recurso extraordinário for inadmitido com base no art. 1.030, I ou III, do CPC, caberá agravointerno (art. 1.021 do CPC), nos termos do art. 1.030, § 2º, do CPC.Nesse sentido, veja-se Enunciado 15 do FONAJE: “Nos Juizados Especiais não é cabível orecurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC”.Nesse sentido, Eduardo Cambi, Uniformização das questões de direito nos Juizados EspeciaisCíveis Estaduais e Federais: a criação do recurso de divergência, p. 178, e Alexandre Câmara,Juizados..., op. cit., p. 159.Nesse sentido, veja-se: “O critério para determinação de competência não se confunde comcritério para determinar a via pela qual se realizará o pagamento do valor da condenação, se porprecatório ou por requisição de pagamento, questões submetidas a comandos legais imperativospróprios” (CJF, TNU, PU 2009.32.00.701806-4, Rel. Juíza Federal Rosana Kaufmann, DJ08.04.2011).Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., 17.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 113 do FONAJE: “As turmas recursais reunidas poderão,mediante decisão de dois terços dos seus membros, salvo disposição regimental em contrário,aprovar súmulas”.Nesse sentido, veja-se o Enunciado 11.1.1 da CEJCA: “A competência das Turmas Recursaisdecorre de a causa ter sido processada originariamente no Juizado Especial, inadmitida adeclinação de competência para o Tribunal de Justiça, por força da regra da perpetuação da

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jurisdição do art. 87 do CPC”.Nesse sentido, Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 23.Nesse sentido, defendendo que somente juízes mais antigos na carreira poderiam ocupar as TurmasRecursais, Damásio Evangelista de Jesus, Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada, p. 29, ePestana de Aguiar, op. cit., p. 54. Em sentido contrário, sustentando que os juízes mais modernosdevem ocupar as Turmas Recursais, desde que tenham experiência nos Juizados Especiais,Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 27.Nesse sentido, veja-se “Realmente, o art. 97 da Constituição, ao subordinar o reconhecimento dainconstitucionalidade de preceito normativo a decisão nesse sentido da ‘maioria absoluta de seusmembros ou dos membros dos respectivos órgãos especiais’, está se dirigindo aos Tribunaisindicados no art. 92 e aos respectivos órgãos especiais de que trata o art. 93, XI. A referência,portanto, não atinge juizados de pequenas causas (art. 24, X) e juizados especiais (art. 98, I), que,pela configuração atribuída pelo legislador, não funcionam, na esfera recursal, sob regime deplenário ou de órgão especial. As Turmas Recursais, órgãos colegiados desses juizados, podem,portanto, sem ofensa ao art. 97 da Constituição e à Súmula Vinculante 10, decidir sobre aconstitucionalidade ou não de preceitos normativos” (STF, 2ª Turma, AgRg AREXT 792.562, Rel.Min. Teori Zavascki, em 14.03.2014).Sobre a competência para julgar o conflito de competência e a alegação de suspeição ouimpedimento, vejam-se, respectivamente, o item 5.7 da primeira parte deste livro e o item 4.1.5 dasegunda parte deste livro.Importante lembrar que, minoritários, defendemos o cabimento do agravo de instrumento e da açãorescisória no âmbito dos Juizados Especiais.Nesse sentido, veja-se: “O Presidente da 4ª Turma, Juiz Alexandre Chini, suscitou de ofício aaplicação do art. 942, do CPC, uma vez que acompanhava a divergência aberta, razão pela qual,segundo o Presidente, o julgamento deveria prosseguir, com a colheita dos votos de todos osintegrantes do colegiado, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão doresultado inicial. Submetida a votação a questão referente aplicação do art. 942, do CPC, asistemática dos Juizados Especiais Cíveis. Por unanimidade dos integrantes da Turma, foideclarado a compatibilidade do referido dispositivo legal com o Sistema dos Juizados, uma vezque o art. 942, do CPC, conspira em favor da segurança jurídica e ajuda a diminuir os dissídios,além de uniformizar os entendimentos” (TJRJ, 4ª TR, RI 0013149-51.2016.8.19.0211, Rel. JuizLarissa Sally, j. em 03.04.2018).Em sentido contrário, veja-se: “O art. 942 do CPC, que dispõe sobre a aplicação da nova técnicade resultado de julgamento não unânime, é aplicável ao âmbito dos Tribunais. E a Lei 9.099/1995,que, aliás, contempla, no âmbito da Justiça Especializada, a hipótese exaustiva de recursoinominado e embargos de declaração, não sofreu os efeitos da aplicação da nova técnica dejulgamento não unânime consignada na nova regra processual civil (art. 942 do CPC/2015)”(TJMT, 2ª Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Privado, Rcl 0091924-56.2016.8.11.0000, Rel. Des. Guiomar Borges, j. em 02.03.2017).Nesse sentido, Antônio Pereira Gaio Júnior, “Breves Notas sobre Aplicabilidade de IRDR nosJuizados Especiais”. Não obstante, em alguns Estados já existem regulamentos prevendo o

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cabimento do IRDR nas Turmas Recursais. Nesse sentido, por exemplo, o TJES editou aResolução 23/2016, regulando processamento do IRDR, do IAC e da Reclamação no âmbito dasTurmas Recursais.Nem todos os doutrinadores entendem que a suspensão do processo é requisito para a aplicação datese jurídica estabelecida pelo IRDR. Nesse sentido, veja-se Antonio do Passo Cabral,Comentários..., op. cit., p. 1.464.Nesse sentido, o TJMG, em 27.03.2018, publicou o acórdão de admissão do IRDR 0622500-81.2017.8.13.0000, no qual se discute “se a necessidade de produção de prova pericial complexano processo é capaz de interferir na definição da competência dos Juizados Especiais da FazendaPública”.Maurício Antônio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 27.Luís Felipe Salomão, op. cit., p. 77.Nesse mesmo sentido, Luiz Fux, op. cit., p. 56. Veja-se, ainda, o Enunciado 12 do 1º EMJERJ: “Atranscrição de fita magnética contendo depoimentos de testemunhas fica condicionada à solicitaçãodos Juízes do colegiado recursal, que poderão preferir ouvir a fita original”.Adotando essa diretriz, desde março de 2004 todas as audiências realizadas pelo 2º JuizadoEspecial Cível de Boa Vista, em Roraima, são filmadas por meio digital (Projeto de RegistroEletrônico de Audiência apresentado ao III Prêmio Innovare pelo Juiz Estadual Erick CavalcantiLinhares Lima).Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior, Curso, v. 1, p. 535.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 149. Veja-se, ainda, o seguinte julgado:“Sentença julgou extinto o pedido por necessidade de prova pericial. Desnecessária a provapericial. Laudo informando a debilidade permanente. Aplicação do artigo 515, § 3º, do CPC”(TRRJ, RI 2007.700.20344, Rel. Juiz Eduarda Monteiro de Castro Souza Campos, j. em10.05.2007).Julio Fabbrini Mirabete, Julgados especiais criminais, p. 127. Em sentido contrário, MantovanniColares Cavalcante, op. cit., p. 25, inclusive citando Theotonio Negrão.Op. cit., p. 45.Em sentido contrário, veja-se a Ementa 394 do ETRJECERJ: “Embargos de Declaração. Nostermos do art. 46, in fine, não constitui decisão sem fundamentação, aquela que mantém a sentençapor seus próprios fundamentos”.Nesse sentido, Leonard Ziesemer Schmitz, Confirmar a sentença por seus próprios fundamentosnão é motivar, p. 523.A questionável dispensa do relatório, prevista no art. 38 da Lei 9.099/1995, é direcionadaexclusivamente para a sentença, em razão da determinação para que ela seja proferida emaudiência (art. 28). Em sentido contrário, dispensando o relatório também do acórdão, veja-se oEnunciado 92 do FONAJE: “Nos termos do art. 46 da Lei 9.099/1995, é dispensável o relatórionos julgamentos proferidos pelas Turmas Recursais”.Ressaltando a importância da ementa dos julgamentos realizados nas Turmas Recursais,Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 50.

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2.1.1

2.1.2

2OS MEIOS IMPUGNATIVOS DAS DECISÕES JUDICIAIS

O MANDADO DE SEGURANÇA

O cabimento do mandado de segurança contra ato judicial dos Juizados Especiais

Muito embora não se possa impetrar um mandado de segurança no Juizado Especial, aorientação amplamente majoritária é que o mandado de segurança é meio cabível para atacar aviolação de direito líquido e certo por atos dos juízes em exercício nos Juizados Especiais, tanto emprimeiro como em segundo grau. De acordo com essa linha de entendimento, o mandado de segurançaseria cabível não apenas em face de atos ordinatórios produzidos por todos os integrantes dosJuizados Especiais, mas também de pronunciamentos decisórios do juiz togado. O fundamento seria,a contrário senso, a Lei do Mandado de Segurança (Lei 12.016/2009), que, em seu art. 5º, II, dispõeque não caberá mandado de segurança “de decisão judicial da qual caiba recurso com efeitosuspensivo”.

Na verdade, não se pode negar o uso do mandado de segurança em face de pronunciamentosoriundos dos Juizados Especiais em razão do status constitucional de que esse procedimento desfrutaem nosso ordenamento jurídico. Trata-se, com efeito, de uma garantia constitucional e um remédioconstitucional, inscrito em cláusula pétrea (art. 5º, LXIX, da CF). Ademais, se no juízo singular, ondeexiste uma gama de recursos, o mandado de segurança é cabível, com muito mais razão deve-seaceitá-lo nos Juizados Especiais, que possuem uma estrutura recursal bastante limitada.

O mandado de segurança, entretanto, se for impetrado nos Juizados Especiais não poderá sesubmeter às regras procedimentais previstas na Lei 9.099/1995. Assim, a petição inicial terá que serescrita e assinada por advogado, independentemente do valor da causa. Ao receber a petição inicial,a Secretaria não deverá marcar audiência de conciliação, mas abrir vista ao juiz togado paraformular o juízo de admissibilidade e tomar as providências preliminares (art. 7º da Lei12.016/2009). Em suma, o procedimento do mandado de segurança interposto nos Juizados Especiaisserá regido pela Lei do Mandado de Segurança, com os mesmos parâmetros normalmente utilizadosno juízo ordinário.

A competência para julgar o mandado de segurança contra ato do juiz do JuizadoEspecial

Existia grande divergência nos meios jurídicos sobre qual seria o juízo competente paraapreciar o mandado de segurança impetrado contra ato do juiz de um Juizado Especial. O

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entendimento majoritário, tanto na doutrina1 como na jurisprudência, sempre foi no sentido de que talcompetência deveria ser exercida pela Turma Recursal.2 A questão, entretanto, somente restoupacificada com a edição da Súmula 376 do STJ.3 In verbis:

Súmula 376 do STJ: “Compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurançacontra ato de juizado especial”.

Nesse passo, é preciso fazer uma ressalva dentro da orientação majoritária. O próprio STJreconhece que a competência para julgar o mandado de segurança em face de pronunciamento dosJuizados Especiais é do Tribunal de Justiça quando o seu objetivo é discutir se a causa pode ou nãoser julgada naquele Sistema. Conforme restou assinalado por essa corrente de pensamento, adiscussão sobre a competência dos Juizados Especiais para apreciar uma causa envolve, em tese, acompetência de um outro órgão da Justiça Ordinária, fora do Sistema. Assim, somente o Tribunal deJustiça pode resolver essa questão. Nesse sentido, vejam-se os seguintes julgados:

“Processo civil. Recurso em Mandado de Segurança. Mandamus impetrado, perante Tribunalde Justiça, visando promover controle de competência de decisão proferida por JuizadoEspecial Cível. Possibilidade. Ausência de confronto com a jurisprudência consolidada doSTJ, que veda apenas a impetração de mandado de segurança para o controle do mérito dasdecisões proferidas pelos Juizados Especiais. Não se admite, consoante remansosajurisprudência do STJ, o controle, pela justiça comum, sobre o mérito das decisõesproferidas pelos juizados especiais. Exceção é feita apenas em relação ao controle deconstitucionalidade dessas decisões, passível de ser promovido mediante a interposição derecurso extraordinário. A autonomia dos juizados especiais, todavia, não pode prevalecerpara a decisão acerca de sua própria competência para conhecer das causas que lhe sãosubmetidas. É necessário estabelecer um mecanismo de controle da competência dosJuizados, sob pena de lhes conferir um poder desproporcional: o de decidir, em caráterdefinitivo, inclusive as causas para as quais são absolutamente incompetentes, nos termos dalei civil. Não está previsto, de maneira expressa, na Lei 9.099/1995, um mecanismo decontrole da competência das decisões proferidas pelos Juizados Especiais. É, portanto,necessário estabelecer esse mecanismo por construção jurisprudencial. Embora haja outrasformas de promover referido controle, a forma mais adequada é a do mandado de segurança,por dois motivos: em primeiro lugar, porque haveria dificuldade de utilização, em algunscasos, da Reclamação ou da Querela Nullitatis; em segundo lugar, porque o mandado desegurança tem historicamente sido utilizado nas hipóteses em que não existe, no ordenamentojurídico, outra forma de reparar lesão ou prevenir ameaça de lesão a direito. – Oentendimento de que é cabível a impetração de mandado de segurança nas hipóteses decontrole sobre a competência dos juizados especiais não altera o entendimento anterior desteTribunal, que veda a utilização do writ para o controle do mérito das decisões dessesjuizados” (STJ, Corte Especial, RMS 17.524/BA, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. em02.08.2006).

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2.1.3

“Recurso ordinário em mandado de segurança. Controle de competência pelo Tribunal deJustiça. Juizados Especiais cíveis. Mandado de segurança. Cabimento. (...) É possível aimpetração de mandado de segurança com a finalidade de promover o controle decompetência nos processos em trâmite nos juizados especiais” (STJ, 4ª Turma, ROMS27.935/ SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, j. em 08.06.2010).

Importante ressaltar, ainda, o teor da Súmula 428 do STJ:

“Compete ao Tribunal Regional Federal decidir os conflitos de competência entre juizadoespecial federal e juízo federal da mesma seção judiciária” (Súmula 428 do STJ)

De qualquer forma, minoritários, entendemos que a competência para julgamento do mandadode segurança contra ato do juiz dos Juizados Especiais, independentemente da matéria discutida, ésempre do Tribunal de Justiça.4 De um lado, temos que a Lei Orgânica Nacional da Magistratura (LeiComplementar 35/1979) dispõe, em seu art. 101, § 3º, d, que os mandados de segurança contra atosde juízes de direito devem ser julgados pelo Tribunal de Justiça. In verbis:

“Art. 101. Os Tribunais compor-se-ão de Câmaras ou Turmas, especializadas ou agrupadasem Seções especializadas. A composição e competência das Câmaras ou Turmas serãofixadas na lei e no regimento interno.(...)§ 3º A cada uma das Seções caberá processar e julgar:(...)d) os mandados de segurança contra ato de juiz de direito”.

Portanto, o dispositivo da LOMAN define claramente que a competência para julgar o mandadode segurança contra ato judicial é do Tribunal de Justiça. O fundamento dessa regra, por certo, épreservar o princípio da hierarquia.

Por outro lado, como o próprio nome já denuncia, as Turmas Recursais têm competência apenaspara julgar recursos. Logo, as Turmas Recursais são funcionalmente incompetentes para julgar omandado de segurança. É preciso lembrar, ainda, que o mandado de segurança tem rito especial,incompatível com o procedimento sumaríssimo, é ajuizado contra ente público, violando a proibiçãocontida no art. 3º, § 2º, e está longe de poder ser identificado como causa de menor complexidade,como determinam a Constituição Federal (art. 98, I) e a Lei 9.099/1995 (art. 3º). Por tais razões,insistimos em sustentar que o mandado de segurança contra ato judicial dos Juizados Especiais deveser julgado, sempre, pelo Tribunal de Justiça.5

A competência para julgar mandado de segurança contra atos das Turmas Recursais

A competência para o julgamento do mandado de segurança contra ato da Turma Recursal é um

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2.2

dos temas mais tormentosos a serem enfrentados dentro do Sistema dos Juizados Especiais. De fato,é possível imaginar quatro orientações sobre qual órgão teria essa competência. A primeira corrente,que apresenta o maior número de adeptos,6 defende que as próprias Turmas Recursais devam julgaresse remédio constitucional. Se já considerávamos errado que o mandado de segurança contra ato dejuiz do Juizado fosse julgado na Turma Recursal, remeter a um órgão dentro do próprio ConselhoRecursal a atribuição para julgar mandado de segurança contra ato de uma de suas Turmas Recursaisrepresenta um equívoco maior ainda.

A segunda corrente afirma que das decisões das Turmas Recursais cabe mandado de segurançapara o Tribunal de Justiça correspondente. Como já dito, adotamos este posicionamento minoritário,pelos motivos já expostos no item anterior.

A terceira corrente propugna pelo envio do mandado de segurança ao STJ, que, nesse caso,faria as vezes de tribunal revisor e uniformizador das decisões proferidas pelas Turmas Recursais. Opróprio STJ, entretanto, já deixou assente que não lhe toca tal competência por falta de previsãoconstitucional, na medida em que a Turma Recursal não pode ser equiparada a um tribunal.7

A quarta e última corrente sustenta que o mandado de segurança contra ato das TurmasRecursais deva ser julgado pelo STF. Da mesma forma que no caso da terceira corrente, carece essaposição de base constitucional. Ocorre, no entanto, que o mesmo STF vem reiteradamente admitindoa sua competência para julgar habeas corpus contra ato das Turmas Recursais Criminais, tanto emâmbito estadual como federal. Nesse sentido, editou o Excelso Pretório a Súmula 690, com oseguinte teor: “Compete ao Supremo Tribunal Federal o julgamento do habeas corpus contra decisãode turma recursal de juizados especiais criminais”. Assim, sabendo que o mandado de segurança e ohabeas corpus são ações do mesmo gênero, têm a mesma origem constitucional e os mesmosobjetivos gerais, torna-se lógico deduzir que ambos devessem ser julgados no mesmo tribunal. OSTF, entretanto, tem inúmeras decisões afirmando não ser competente para julgar o mandado desegurança contra atos das Turmas Recursais.8

Na nossa visão, o ideal seria que a Súmula 690 do STF fosse cancelada e o habeas corpuscontra pronunciamento das Turmas Recursais Criminais passasse a ser julgado, da mesma maneiraque o mandado de segurança, no Tribunal de Justiça correspondente.9

AS AÇÕES ANULATÓRIAS

De acordo com o art. 59 da Lei 9.099/1995, não se admitirá ação rescisória nas causas dosJuizados Especiais, qualquer que seja o motivo. Para se verificar a gravidade da situação gerada poresse dispositivo, basta imaginar uma ação julgada por juiz impedido, suspeito ou corrupto. Sem aação rescisória, essa decisão atingiria, imediatamente após o trânsito em julgado, status de coisasoberanamente julgada, imutável e indiscutível.

Em nosso entendimento, teria sido muito mais razoável, por exemplo, diminuir o prazo da ação

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rescisória ou seu campo de abrangência, mas não a suprimir. Isso pode gerar situações incompatíveiscom os ditames do devido processo legal. Por isso, minoritários, consideramos esse dispositivoinconstitucional e incapaz de afastar a utilização da ação rescisória no âmbito dos JuizadosEspeciais, dirigida para o Tribunal, nos termos do art. 966 do CPC.10 Por outro lado, importantefrisar que, se a questão oriunda dos Juizados Especiais for levada ao STF, por meio de recursoextraordinário, e lá transitar em julgado, não haverá qualquer óbice ao ajuizamento da açãorescisória naquele Tribunal, que não é alcançado pela proibição contida no art. 59 da Lei.11

Diante da regra contida no art. 59 e da posição prevalente no sentido da suaconstitucionalidade, é preciso perquirir qual seria a solução mais adequada para atacar as decisõesviciadas que tenham transitado em julgado nos Juizados Especiais. Humberto Theodoro Júnior12 eAlexandre Câmara13 defendem a possibilidade da interposição de ação anulatória, quandoconfigurada a sentença nula ipso iure ou a sentença inexistente. Essa posição, apesar de representaruma evolução no tratamento da questão, não nos parece correta. De fato, a ação anulatória somente écabível em face de decisões em que não há a formação da coisa julgada material (art. 966, § 4º, doCPC) e essa regra se aplica aos Juizados Especiais. Portanto, utilizar a ação anulatória não se mostraeficaz para resolver a situação das sentenças de mérito transitadas em julgado nos Juizados.14

É preciso destacar, ainda, que entre os que defendem o cabimento da ação anulatória existe umadivergência. Alguns sustentam que tal ação deveria ser proposta perante o juízo cível comum.15

Outros, entretanto, sustentam que o próprio Juizado seria competente para apreciar as açõesanulatórias de seus julgados.16 Em que pese não apoiarmos a utilização da ação anulatória comosucedâneo da ação rescisória, entendemos que o órgão competente para julgar essa medida é opróprio Juizado que proferiu a decisão impugnada. Ademais, já existe uma hipótese de açãoanulatória (querela nullitatis) expressamente prevista na Lei 9.099/1995: os embargos à execuçãoimpugnando a nulidade da citação (art. 52, IX, a). Somente se a decisão a ser anulada tiver sidoproferida pela Turma Recursal é que a ação anulatória poderia ser a ela dirigida.

Em nossa opinião, em suma, o art. 59 é inconstitucional e as decisões proferidas nos JuizadosEspeciais podem ser atacadas tanto por ação rescisória, como por ação anulatória, conforme tenhamou não formado coisa julgada material. No caso de ação rescisória, o órgão competente para apreciartal medida é o Tribunal de Justiça, ao passo que, em se tratando de ação anulatória, o juízocompetente é aquele que proferiu a decisão impugnada.

Não obstante, na impossibilidade de lançar mão da ação rescisória, entendemos que deve serutilizado o mandado de segurança com efeitos rescisórios, dirigido ao Tribunal de Justiça, paraatacar as decisões de mérito transitadas em julgado nos Juizados Especiais.17 Importante sublinharque, nesse caso, não haverá a incidência da vedação prevista no art. 5º, III, da Lei 12.016/2009 (Leido Mandado de Segurança)18 e na Súmula 268 do STF.19 Com efeito, tais enunciados somente fazemsentido no juízo ordinário, em que as sentenças transitadas em julgado podem ser objeto de açãorescisória. Apesar de ser uma posição minoritária, o cabimento do mandado de segurança com

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2.3

efeitos rescisórios já foi reconhecido em alguns julgados do STJ. Nesse sentido, vejam-se:

“Admite-se a impetração de mandado de segurança frente aos Tribunais de Justiça dosEstados para o exercício do controle da competência dos Juizados Especiais, ainda que adecisão a ser anulada já tenha transitado em julgado” (STJ, 3ª Turma, MC 15.465/SC, Rel.Min. Nancy Andrighi, j. em 28.04.2009).“Como exceção à regra geral que veda o manejo de mandado de segurança contra decisãojudicial com trânsito em julgado (artigo 5º, inciso III, da Lei 12.016/2009 e Súmula 268/STF), sobressai a orientação jurisprudencial desta Corte, segundo a qual se admite aimpetração do writ frente aos Tribunais de Justiça dos Estados, para o exercício do controleda competência dos Juizados Especiais, ainda que não mais caiba recurso em face doprovimento jurisdicional a ser anulado” (STJ, 4ª Turma, RMS 37.775/ES, Rel. Min. MarcoBuzzi, j. em 06.06.2013).

Em outros julgados, o posicionamento adotado foi que competia à Turma Recursal processar ejulgar o mandado de segurança interposto em face de decisão transitada em julgado. Nesse sentido,veja-se:

“Diante do exposto, voto no sentido de conceder a segurança, tornando nulo todos os atos apartir de fls. 66/81, a fim de que seja intimada a impetrante, pessoalmente, para oferecimentode contrarrazões” (TJRJ, 4ª TR, MS 00019583120138199000, Rel. Juiz Mabel Christina deVasconcellos, j. em 02.06.2014)

O INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA

A gravidade da questão do dissídio jurisprudencial nos Juizados Especiais, notadamente apartir da consolidação do descabimento do recurso especial (Súmula 203 do STJ), chamou a atençãodo legislador. Assim, quando da elaboração das leis sobre Juizados Especiais Federais e JuizadosEspeciais Fazendários, foi inserido nos textos um mecanismo especificamente voltado para combateresse problema: o incidente de uniformização da jurisprudência (IUJ). Previsto primeiramente na Lei10.259/2001 (art. 14) e, posteriormente, na Lei 12.153/2009 (arts. 18 e 19), o IUJ é cabível quando adecisão proferida por uma Turma Recursal contrariar o julgamento realizado sobre a mesma questão,proferida por outras Turmas ou pelo STJ.

O IUJ é julgado pelas Turmas de Uniformização ou pelo STJ, conforme a amplitude e a origemdo dissídio. Resumidamente, temos o seguinte quadro: a) se o pedido de uniformização, federal oufazendário, apontar a divergência entre Turmas Recursais da mesma Região ou Tribunal, o IUJ serájulgado na Turma de Uniformização formada pela reunião conjunta destas Turmas em dissídio;20 b) seo pedido de uniformização federal se basear em dissídio instalado entre Turmas Recursais dediferentes Regiões ou entre a Turma Recursal e o STJ, o IUJ será julgado na Turma Nacional deUniformização, integrada por juízes dos Juizados Especiais Federais de todo o país e instalada no

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Conselho da Justiça Federal; c) se o pedido de uniformização fazendário tiver por base divergênciaassentada entre Turmas Recursais de diferentes Tribunais ou entre a Turma Recursal e o STJ, o IUJserá julgado no STJ; d) se o pedido de uniformização federal tiver por base divergência assentadaentre a Turma Nacional de Uniformização e o STJ, o IUJ será julgado no STJ.

Um tema delicado diz respeito à natureza jurídica do pedido de uniformização dajurisprudência. Quando julgado pela Turma de Uniformização, o pedido se assemelha ao recurso deembargos de divergência (arts. 1.043 e 1.044 do CPC); quando julgado pelo STJ, parece um recursoespecial por dissídio jurisprudencial (art. 105, III, “c”, da CF). Não por acaso, quando da edição daLei 10.259/2001, chegamos a defender que o pedido de uniformização seria uma nova modalidaderecursal.21 Posteriormente, entretanto, revemos nossa opinião, diante da falta de amparo legal parasustentar a natureza recursal desse pedido (princípio da taxatividade dos recursos), de modo que opedido de uniformização da jurisprudência representa um meio impugnativo incidental, mas não umrecurso. No caso do IUJ julgado numa Turma de Uniformização, trata-se de um incidente deuniformização interno; na hipótese de julgamento pelo STJ, de um incidente de uniformizaçãoexterno.

Conforme dispõe o art. 13 do Regimento Interno da Turma Nacional de Uniformização dosJuizados Especiais Federais (Resolução CJF 345/2015), o prazo de interposição do pedido deuniformização federal é de 15 dias. No caso do pedido de uniformização fazendária, cada Estado-Membro tem competência para estabelecer o seu prazo de interposição. Em São Paulo, por exemplo,interposição deve ser feita no prazo de dez dias (art. 6º, § 1º, da Resolução TJSP 533/2011).

O pedido de uniformização da jurisprudência deve ser apresentado por meio de petição escrita,firmada por advogado, com os motivos da impugnação, contendo o cotejo analítico da divergência ea cópia dos julgados paradigmas. A petição deve ser dirigida ao Presidente da Turma deUniformização, mediante preparo, quando previsto na legislação pertinente. No caso do pedido deuniformização dirigido ao STJ, o prazo de interposição é de 15 dias. A petição deve ser endereçadaao Presidente do STJ (Resolução STJ 10/2007). Rejeitado liminarmente o pedido, cabe agravointerno para o colegiado (art. 1.021 do CPC). Porém, se o pedido for admitido, a parte contrária seráintimada para se manifestar no mesmo prazo dedicado à interposição, também por escrito e sob aassistência técnica de um advogado. Em seguida, será ouvido o representante do Ministério Público.Antes de julgar o IUJ, o relator poderá deferir medidas liminares, pedir informações, determinar osobrestamento de processos e recursos em que a questão sub judice esteja em debate, além deadmitir a intervenção de amicus curiae. Nesse passo, importante destacar que a intervenção doamicus curiae está prevista no art. 14, § 7º, da Lei dos Juizados Especiais Federais, mas odispositivo correspondente nos Juizados Especiais Fazendários foi vetado pelo Presidente daRepública (art. 19, § 4º). Tal veto, entretanto, não impede a intervenção do amicus curiae nosincidentes de uniformização da jurisprudência instalados nos Juizados Especiais Fazendários, sejapela aplicação sistemática do citado art. 14, § 7º, seja pela utilização da regra prevista no art. 138 do

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2.4

CPC.22

Uma vez julgado o IUJ, a decisão será aplicada ao feito em que foi apresentado o pedido deuniformização e também aos processos e recursos que ficaram suspensos por ordem do relator. Ojulgamento poderá, ainda, formar súmula a ser utilizada como orientação persuasiva para casosfuturos.

Como se vê, o IUJ tem função primordial dentro do Sistema dos Juizados, não apenas porcombater a ocorrência de dissenso jurisprudencial, mas também por abrir as portas para o controledo STJ. Durante anos, no entanto, a questão da divergência jurisprudencial nos Juizados EspeciaisEstaduais foi atacada exclusivamente por meio de controle externo do STJ, por intermédio dareclamação prevista na revogada Resolução STJ 12/2009.23 Esse instrumento, a par de sua duvidosaconstitucionalidade, se mostrou inadequado para tratar das divergências jurisprudenciais nosJuizados Especiais. Por um lado, o STJ fazia de tudo para não admitir as reclamações, por entenderque essa atribuição não lhe cabia; por outro, parte de suas orientações não era voltada para arealidade dos Juizados Especiais, na medida em que não admitia recurso especial das decisõesproferidas pelas Turmas Recursais (Súmula 203).

Por isso, há anos defendemos que, em vez da reclamação constitucional, deveria ser aplicadoàs Turmas Recursais estaduais, pela Teoria do Estatuto, o incidente de uniformização dajurisprudência, nos moldes do que está previsto na Lei dos Juizados Especiais da Fazenda Pública(arts. 18 e 19 da Lei 12.153/2009). Essa proposta, embora ainda minoritária na jurisprudência, vemganhando paulatinamente força nos Tribunais.

De fato, a divergência jurisprudencial, especialmente em relação às demandas de massa, podeinviabilizar a efetiva prestação da tutela jurisdicional nos Juizados Especiais estaduais. Por isso, éfundamental a aplicação imediata do IUJ nestes órgãos,24 independentemente de qualquer alteraçãolegislativa.25 O ideal, não obstante, é que o IUJ seja inserido no texto da Lei 9.099/1995, para evitarquestionamentos e impugnações.

A RECLAMAÇÃO

Dentre os meios típicos de impugnação das decisões judiciais, a reclamação sempre foi tratadano Brasil como um remédio “menor”, sem uma natureza jurídica muito clara ou um regulamento gerale sistemático. Esse quadro, no entanto, começou a mudar com a promulgação da Constituição Federalde 1988, que previu que a reclamação seria o instrumento adequado para a preservação dacompetência e da autoridade das decisões do STF (art. 102, I, l) e do STJ (art. 105, I, f).Posteriormente, este mesmo mecanismo foi estendido para o controle da aplicação das súmulasvinculantes (art. 103-A, § 3º, introduzido pela EC 45/2004) e para a observância da competência eda autoridade das decisões do Tribunal Superior do Trabalho (art. 111-A, § 3º, introduzido pela EC92/2016).

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Desse modo, a importância da reclamação no sistema de controle dos atos judiciais foi seavolumando, assim como sua participação nas pautas dos tribunais superiores. Não por outro motivo,o CPC/2015 dedicou um capítulo inteiro ao tema (arts. 988 a 993), visando não apenas unificar oinstituto, mas também promovendo a sua sistematização. Analisando os dispositivos presentes naConstituição Federal e do CPC, podemos chegar à conclusão de que existem dois tipos dereclamação: a) reclamação correicional; b) reclamação jurisprudencial.26

A reclamação correicional

A reclamação correicional representa uma medida administrativa e disciplinar que desempenhauma dupla função, tanto política como jurídica. De fato, a reclamação correicional visa preservar acompetência e a autoridade de um órgão superior, permitindo que atos judiciais tumultuários ouusurpadores sejam invalidados por meio de provocação das partes, de interessados ou do MinistérioPúblico (arts. 102, I, l, 105, I, f, e 111-A, § 3º, da CF e art. 988, I, do CPC). Exatamente por isso, acompetência para julgamento da reclamação correicional de decisão proferida por órgão de primeirodos Juizados Especiais é da Turma Recursal, quando é a sua autoridade que se busca preservar (art.988, § 1º, do CPC).27

O procedimento da reclamação correicional vai depender da regulamentação presente nosregimentos internos das Turmas Recursais. Devem ser observadas, no entanto, as regras geraisprevistas nos arts. 988 a 993 do CPC.

A reclamação jurisprudencial

A reclamação jurisprudencial, por sua vez, representa uma ação autônoma de conhecimento decompetência originária dos tribunais. Essa espécie de reclamação não depende sequer da existênciade uma ação principal, como ocorre no caso de desrespeito de súmula vinculante pela administraçãopública. Trata-se de uma garantia constitucional processual, voltada a preservar a integridade dosistema hierárquico judicial, promovendo a segurança jurídica (art. 926 do CPC). Seu cabimento estáatrelado à inaplicabilidade de alguns dos seguintes padrões decisórios (art. 103-A, § 3º, da CF e art.988, III e IV, do CPC): a) súmula vinculante; b) decisão do STF em controle concentrado deconstitucionalidade; c) tese jurídica decorrente de julgamento de incidente de resolução de demandasrepetitivas ou de incidente de assunção de competência.

A reclamação por descumprimento de súmula vinculante

A partir da promulgação da EC 45/2004, conhecida como “Reforma do Judiciário”, foramintroduzidas em nosso ordenamento jurídico as súmulas vinculantes (art. 103-A da CF). Com isso, oSTF passou a dispor de um mecanismo para impor aos órgãos judiciais e à administração públicadireta e indireta as teses jurídicas consolidadas em sua jurisprudência sobre a validade, eficácia e

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2.4.2-B

interpretação das normas em face da Constituição Federal. Para que a súmula vinculante pudesse sereditada, entretanto, foi necessária a elaboração de uma lei especificamente voltada para regular oprocedimento a ser adotado pelo STF. Esse papel foi cumprido pela Lei 11.417/2006. Assim, o STFpode, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, apósreiteradas decisões, aprovar súmula com eficácia vinculante.

Em razão da força vinculante da súmula, caso um órgão administrativo ou judicial deixe deaplicar ou aplique indevidamente a tese jurídica contida no seu enunciado, caberá reclamação aoSTF (art. 103-A, § 3º, da CF e art. 7º da Lei 11.417/2006). Importante registrar que o cabimento deoutros recursos não impede a utilização da reclamação em face de decisão judicial. No entanto, ainterposição da reclamação deve ser feita antes do trânsito em julgado da decisão (Súmula 734 doSTF). Isso porque, embora seja uma ação,28 a reclamação não tem efeitos rescisórios,29 salvo quandoo trânsito em julgado da decisão reclamada ocorrer após a sua interposição.

No caso dos Juizados Especiais, tanto a decisão do Juizado como a da Turma Recursal estásujeita à reclamação ao STF. O procedimento da reclamação a ser aplicado é aquele previsto nosarts. 988 a 993 do CPC, no art. 7º da Lei 11.417/2009 e nos arts. 156 a 162 do Regimento Interno doSTF. Assim, a reclamação deve ser ajuizada no STF por petição escrita, assinada por advogado, noprazo de 15 dias, independentemente de preparo. Rejeitada liminarmente, a decisão do relatorpoderá ser objeto de agravo interno, nos termos do art. 988 do CPC. Se for admitida, o relatorpoderá deferir medida liminar, pedir informações e ouvir o representante do Ministério Público(cinco dias) e a parte adversa (15 dias). Em seguida, não sendo o caso de julgamento monocrático(art. 932 do CPC), o relator submeterá a reclamação ao colegiado correspondente. Acolhida areclamação, o STF poderá anular o ato administrativo ou cassar a decisão judicial reclamada,substituindo-o por novo ato ou determinando que outro ato seja proferido pelo órgão competente.

A reclamação por descumprimento de jurisprudência do STJ

Exatamente um mês antes de a Lei 9.099/1995 completar 14 anos de idade, no dia 26.08.2009,o Pleno do STF, conduzido pela Min. Ellen Gracie, no julgamento dos Embargos de Declaração noRecurso Extraordinário 571.572/BA, proferiu uma decisão que acabou por alterar o contexto docontrole das decisões proferidas pelos Juizados Especiais. Em seu voto, a Min. Ellen Graciereconheceu a perplexidade30 causada pelo fato de o STJ não exercer controle sobre a interpretaçãoda lei federal no âmbito dos Juizados Especiais (Súmula 203 do STJ), especialmente após a ediçãoda Lei 10.259/2001, que instituiu os Juizados Especiais Federais, prevendo o pedido deuniformização da jurisprudência para aquela Corte (art. 14). Assim, determinou que, enquanto nãofosse criada a turma de uniformização para os Juizados Especiais Estaduais, medida perseguida,dentre outros, pelo Projeto de Lei da Câmara 16/2007, seria cabível “reclamação constitucional”para o STJ, sempre que a decisão colegiada proferida pelas Turmas Recursais contrastasse com a

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jurisprudência consolidada sobre a interpretação da lei federal envolvida. Veja-se a ementa dessadecisão:

“Embargos de declaração. Recurso extraordinário. Ausência de omissão no acórdãoembargado. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Aplicação às controvérsiassubmetidas aos Juizados Especiais Estaduais. Reclamação para o Superior Tribunal deJustiça. Cabimento excepcional enquanto não criado, por lei federal, o órgão uniformizador.1. No julgamento do recurso extraordinário interposto pela embargante, o Plenário destaSuprema Corte apreciou satisfatoriamente os pontos por ela questionados, tendo concluído:que constitui questão infraconstitucional a discriminação dos pulsos telefônicos excedentesnas contas telefônicas; que compete à Justiça Estadual a sua apreciação; e que é possível ojulgamento da referida matéria no âmbito dos juizados em virtude da ausência decomplexidade probatória. Não há, assim, qualquer omissão a ser sanada. 2. Quanto ao pedidode aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, observe-se que aquelaegrégia Corte foi incumbida pela Carta Magna da missão de uniformizar a interpretação dalegislação infraconstitucional, embora seja inadmissível a interposição de recurso especialcontra as decisões proferidas pelas turmas recursais dos juizados especiais. 3. No âmbitofederal, a Lei 10.259/2001 criou a Turma de Uniformização da Jurisprudência, que pode seracionada quando a decisão da turma recursal contrariar a jurisprudência do STJ. É possível,ainda, a provocação dessa Corte Superior após o julgamento da matéria pela citada Turma deUniformização. 4. Inexistência de órgão uniformizador no âmbito dos juizados estaduais,circunstância que inviabiliza a aplicação da jurisprudência do STJ. Risco de manutenção dedecisões divergentes quanto à interpretação da legislação federal, gerando insegurançajurídica e uma prestação jurisdicional incompleta, em decorrência da inexistência de outromeio eficaz para resolvê-la. 5. Embargos declaratórios acolhidos apenas para declarar ocabimento, em caráter excepcional, da reclamação prevista no art. 105, I, f, da CF, para fazerprevalecer, até a criação da turma de uniformização dos juizados especiais estaduais, ajurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na interpretação da legislaçãoinfraconstitucional”.

A “reclamação constitucional” contra decisão de Turma Recursal Estadual foi regulada, no STJ,pela Resolução 12/2009. Nela, ficou expresso que a reclamação seria cabível para dirimirdivergência sobre direito material31 entre acórdão32 prolatado por Turma Recursal estadual e ajurisprudência do STJ, consagradas em suas súmulas ou orientações decorrentes do julgamento derecursos especiais repetitivos (art. 1.036 do CPC).

Com a edição do CPC/2015, entretanto, parte da doutrina passou a sustentar que a ResoluçãoSTJ 12/2009 estaria “revogada” (invalidada) e a disciplina da reclamação passaria a ser feita peloseu art. 988.33 Não obstante, antes mesmo de o debate ser aprofundado, o próprio STJ revogou aResolução 12/2009 (art. 4º da Emenda Regimental 22/2016) e editou a Resolução 3/2016, quedeslocou para as Seções Especializadas ou Câmaras Reunidas dos Tribunais de Justiça acompetência para julgar as reclamações oriundas das Turmas Recursais (art. 1º).

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Com o devido respeito, mas a Resolução STJ 3/2016 não apenas desconsidera a determinaçãooriunda do STF (ED Rext 571.572/BA), como também viola a competência legislativa constitucionalpara legislar sobre direito processual (art. 22, I, da CF) e o art. 988, § 1º, do CPC, que regula acompetência para julgamento da reclamação. Assim, entendemos que a Resolução STJ 3/2016 éinconstitucional e ilegal. Em consequência desse posicionamento, sustentamos que as reclamaçõesreferentes à inobservância pelos órgãos dos Juizados Especiais dos padrões decisórios consagradosnos acórdãos proferidos pelo STJ em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivasou de incidente de assunção de competência deverão ser julgadas neste tribunal. Na esteira dessepensamento, alguns Tribunais de Justiça suscitaram conflito negativo de competência perante o STFdas reclamações declinadas pelo STJ, com fulcro na Resolução STJ 3/2016. Nesse sentido, veja-se oseguinte aresto:

“Direito processual civil. Direito constitucional. Reclamação contra decisão de TurmaRecursal por divergir de decisão proferida pelo STJ em sede de recurso especial repetitivo.Decisão do STJ declinando da competência para este Tribunal de Justiça, por força daResolução 3/2016 daquele Tribunal Superior. Impossibilidade de ampliação da competênciade Tribunal de Justiça por ato normativo infraconstitucional. Disposição contida naConstituição da República estabelecendo que as competências dos Tribunais de Justiça dosEstados devem ser estabelecidas pelas Constituições Estaduais. Expressa previsão, noCPC/2015, do cabimento de reclamação contra decisão que contraria tese firmada em REsprepetitivo, atribuindo ao STJ a competência para dela conhecer. Conflito de competência quese suscita, a ser apreciado pelo Supremo Tribunal Federal” (TJRJ, 2ª Seção Cível, Rcl0048611-23.2016.8.19.0000, Rel. Des. Alexandre Freitas Câmara, j. em 24.11.2016).

O STF, no entanto, ignorando o disposto no art. 102, I, o, da CF, que expressamente prevê oconflito de competência entre o “Superior Tribunal de Justiça e qualquer outro tribunal”, inadmitiutodos os incidentes instaurados, afirmando que não existiria conflito de competência entre o STJ e osTribunais de Justiça, porque aquele estaria numa posição hierárquica superior. Nesse sentido, vejam-se:

“A presente hipótese não faz surgir conflito passível de análise por esta Corte. É que inexisteconflito entre o STJ e os Tribunais dos Estados, conforme ressaltado pelo MinistroSEPÚLVIDA PERTENCE, ‘embora manifestado entre Tribunais, o dissídio, em matéria decompetência, entre o Superior Tribunal de Justiça e um Tribunal de segundo grau da justiçaordinária – não importando se federal ou estadual –, é um problema de hierarquia dejurisdição e não de conflito’” (STF, Pleno, CC 7.983/MG, Rel. Min. Alexandre de Morais, j.em 04.05.2017)

“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de ser incabívelconflito negativo de competência suscitado por Tribunal de Justiça em face do SuperiorTribunal de Justiça, diante da relação hierárquica entre os entes, inexistindo, diante de

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decisão prolatada por este último, controvérsia a ser dirimida nesta Corte” (STF, Pleno, CC7.879/BA, Rel. Min. Edson Fachin, j. em 14.12.2017)

“Não se revela processualmente possível a instauração de conflito de competência entre oSuperior Tribunal de Justiça, de um lado, e os Tribunais de Justiça, de outro, pelo fato –juridicamente relevante – de que o Superior Tribunal de Justiça qualifica-se,constitucionalmente, como instância de superposição em relação a tais Cortes judiciárias,exercendo, em face destas, irrecusável competência de derrogação. Precedentes” (STF,Pleno, CC 8.050/ MG, Rel. Min. Celso de Mello, j. em 07.12.2017)

Portanto, em razão do entendimento consolidado no STF, a reclamação contra a decisãoproferida por Turma Recursal, em contraste com padrões decisórios dotados de eficácia vinculativaeditados pelo STJ, deverá ser processada e julgada pelas Seções Especializadas ou CâmarasReunidas dos Tribunais de Justiça, nos termos da mencionada Resolução STJ 3/2016.

Nesse sentido, Luiz Felipe Salomão, op. cit., p. 75, e Pestana de Aguiar, op. cit., p. 39. A bem daverdade, esse entendimento começou a se consolidar ainda na vigência da Lei dos Juizados dePequenas Causas (Lei 7.244/1984). Nesse sentido, Ronaldo Frigini, Comentários à Lei dePequenas Causas, p. 358.No Rio de Janeiro, o entendimento prevalente desde a edição da Lei 9.099/1995 é que acompetência para julgar o mandado de segurança contra ato de juiz em atuação no Juizado é daTurma Recursal correspondente. Nesse sentido, a Resolução 02/1998 do TJRJ alterou o seuregimento interno para estabelecer que as Câmaras Cíveis não tinham competência para julgarmandado de segurança impetrado contra ato de juiz dos Juizados Especiais (art. 6º, I, a, doRegimento Interno do TJRJ). Por outro lado, a Resolução do Conselho da Magistratura 07/2006estabeleceu que os mandados de segurança seriam julgados pelas Turmas Recursais (art. 1º).Desde o início da década de 2000, o STJ já tinha consolidado esse entendimento. Nesse sentido,vejam-se: “Juizado Especial Cível. Mandado de segurança. Tribunal de Justiça. Inexiste leiatribuindo ao Tribunal de Justiça competência para julgar mandado de segurança contra ato daTurma Recursal do Juizado Especial Cível” (STJ, 4ª Turma, RMS 10.357/RJ, Rel. Min. Rosado deAguiar, j. em 01.07.1999) e “A competência para julgar recursos, inclusive mandado de segurança,de decisões emanadas dos Juizados Especiais é do órgão colegiado do próprio Juizado Especial,previsto no art. 41, parágrafo 1º, da Lei 9.099/1995” (STJ, 6ª Turma, RMS 10.334/RJ, Rel. Min.Fernando Gonçalves, j. em 30.10.2000).Neste sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 165, e Rodolfo Kronemberg Hartmann,Curso completo de processo civil, p. 751.Nesse sentido, veja-se Mantovanni Colares Cavalcante, op. cit., p. 91: “Não vejo como possa aTurma Recursal ter competência para julgar mandado de segurança impetrado contra ato do juiz dojuizado especial. Primeiro, porque a lei só previu para análise pela Turma Recursal o recurso

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cível, a apelação criminal e os embargos de declaração (...) Em segundo lugar, atente-se para ofato de que os membros das Turmas Recursais são, tal qual os juízes dos juizados especiais,magistrados de primeiro grau. Assim, como admitir que uma autoridade (membro da TurmaRecursal) tenha competência para rever ato de outra (juiz do juizado especial do mesmo grau)?[...] Ora, sabe-se que, sendo o ato judicial originado de um juiz de primeiro grau, a competênciapara julgamento do mandado de segurança contra si atacado é do Tribunal ao qual está vinculado ojuiz”. Nesse sentido, representando a corrente minoritária, vejam-se: “Os integrantes dos JuizadosEspeciais estão sujeitos aos Tribunais de Justiça, nos crimes comuns e de responsabilidade,conforme prevê a Constituição Federal no inc. III do art. 96. A decisão também tem por base o art.21, VI, da Lei Complementar 35/1979 – Lei Orgânica da Magistratura Nacional. O dispositivoprevê que compete originariamente aos tribunais julgar os Mandados de Segurança contra seusatos, os dos respectivos presidentes e os de suas Câmaras, Turmas ou Seções” (STF, Pleno, MS24.318, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 02.08.2002) e “Juizados Especiais. Colégios Recursais.Causas de menor complexidade. Preceito constitucional. Mandado de segurança. Ação originária.Incompetência. Os juizados especiais somente podem conhecer as causas de menor complexidadepor força de preceito constitucional. Os colégios recursais, porque recursais, somente temcompetência para conhecer de recursos das decisões dos juizados especiais, não secompreendendo entre estes as ações originárias, quais os mandados de segurança, ademais, açõesnaturalmente” (TJPE, 1ª Câmara Cível, MS 34.966-8, Rel. Juiz Etério Galvão, j. em 01.12.1997).Nesse sentido, veja-se: “Em razão da taxatividade da competência deste Supremo Tribunal emsede de mandado de segurança (alínea d do inciso I do art. 102), é da própria Turma Recursal acompetência para julgar ações mandamentais impetradas contra seus atos” (STF, Pleno, MS25.087-ED/ SP, Rel. Min. Carlos Britto, j. em 11.05.2007).Nesse sentido, veja-se: “O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de quecompete às Turmas Recursais processar e julgar o mandado de segurança impetrado contra ato demagistrado em exercício no Juizado Especial, assim como do Juiz da própria Turma Recursal”(STJ, 6ª Turma, AgRg no RMS 18.431/MT, Rel. Min. Og Fernandes, j. em 29.09.2009).Nesse sentido, vejam-se: “Competência. Originária. Mandado de segurança. Ato judicial.Impetração contra decisão de juiz de Colégio Recursal. Feito da competência da turma de origem.Incompetência absoluta do STF. Reconhecimento. Interpretação do art. 102, I, d, da CF.Precedentes. O Supremo Tribunal Federal não é competente para conhecer originariamente demandado de segurança contra decisão de juiz de Colégio Recursal” (STF, Pleno, MS-AgR24.858/SP, Min. Cesar Peluso, j. em 30.08.2007) e “1. Não é competente o Supremo TribunalFederal para o processamento de mandados de segurança contra atos de Turmas Recursais deJuizados Especiais. 2. Competência para o processamento de habeas corpus contra membrosdessas Turmas que não induz competência para conhecimento de mandados de segurança que osapontem como autoridades ditas coatoras” (STF, Pleno, MS 25.614/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j.em 02.03.2011).Dentro do próprio STF existem decisões rejeitando a Súmula 690. Nesse sentido, vejam-se:“Competência. Habeas corpus. Ato de Turma Recursal. Estando os integrantes das turmasrecursais dos juizados especiais submetidos, nos crimes comuns e nos de responsabilidade, àjurisdição do tribunal de justiça ou do tribunal regional federal, incumbe a cada qual, conforme o

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caso, julgar os habeas impetrados contra ato que tenham praticado” (Pleno, HC 86.834/SP, Rel.Min. Marco Aurélio, j. em 23.08.2006), “Compete ao Tribunal de Justiça do Estado processar ejulgar habeas corpus impetrado contra ato emanado de Turma Recursal. Com o entendimentofirmado no julgamento do HC 86.834/SP, fica superada a Súmula 690 desta Corte” (1ª Turma, HC89.378/RJ, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. em 15.12.2006).Pestana de Aguiar (op. cit., p. 13) defende, na eventualidade de uma causa de maior complexidadeser julgada perante os Juizados Especiais, que seria possível o ajuizamento de ação rescisória,dirigida para o Grupo de Turmas Recursais ou para as Turmas Recursais Reunidas.Nesse sentido, Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 162.Op. cit., p. 494.Juizados..., op. cit., p. 163.Com efeito, o entendimento majoritário é que não cabem nos Juizados Especiais nem açãorescisória, nem ação anulatória, mesmo em se tratando de decisões homologatórias. Nesse sentido,veja-se “Ação anulatória contra sentença do Juizado Especial Cível. Impossibilidade jurídica dopedido. Vedação à ação rescisória” (TJRS, 1ª TR, RI 71004127312, Rel. Juiz Carlos FranciscoGross, j. em 26.11.2013). Veja-se, ainda, a Ementa 422 do ETRJECERJ: “Em sede de JuizadoEspecial Cível, no tocante aos meios de impugnação de transação judicial homologada, descabemas ações previstas no arts. 485, VIII, e 486, CPC”.Nesse sentido, veja-se Alexandre Câmara, Juizados..., op. cit., p. 163.Nesse sentido, vejam-se: “Compete ao Juizado Especial Cível processar e julgar as demandasanulatórias de seus próprios julgados” (STJ, 2ª Seção, CC 120.556/CE, Rel. Min. Luis FelipeSalomão, j. em 09.10.2013) e “Ação anulatória de ato judicial cumulada com declaratória deinexistência de débito. Sentença julgada procedente. Acordo homologado em juízo. Ato praticadoperante Juizado Especial Cível. Ação de natureza acessória. Competência do Juizado EspecialCível” (TJSP, 28ª Câmara de Direito Privado, AC 0009720-55.2008.8.26.0084, Rel. Des. JúlioVidal, j. em 23.10.2012).Em sentido contrário, defendendo a posição majoritária, vejam-se a Ementa 408 do ETRJECERJ:“Mandado de segurança. Inviável a impetração para modificar sentença com trânsito em julgado” eEmenta 411 do ETRJECERJ: “O Mandado de Segurança não é meio próprio para impugnarsentença, acobertada pelo manto da coisa julgada ut Súmula 268, do Supremo Tribunal Federal”.O inciso III do art. 5º da Lei do Mandado de Segurança diz: “Não se concederá mandado desegurança quando se tratar: (...) III – de decisão judicial transitada em julgado”.Súmula 268 do STF: “Não cabe mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito emjulgado”.Na maioria dos Estados, no entanto, em vez de formar uma nova composição a cada pedido deuniformização da jurisprudência, os Tribunais de Justiça preferiram instalar um órgão, chamadogenericamente de Turma de Uniformização, com uma composição fixa, formada a partir derepresentantes das Turmas Recursais. É o que ocorre, por exemplo, no Rio de Janeiro (art. 41 daResolução TJRJ 14/12).Nesse sentido, veja nosso artigo “Notas Introdutórias sobre os Juizados Especiais Federais

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Cíveis”.Sobre o tema, veja-se o item 6.7-C da primeira parte deste livro.A Resolução STJ 12/09 foi revogada pela Emenda Regimental STJ 22/2016.O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (art. 11, VII, do Regimento Interno) e o Tribunal de Justiçado Rio de Janeiro (art. 41 da Resolução TJRJ 14/12) já estão aplicando o incidente deuniformização da jurisprudência às suas Turmas Recursais cíveis.Nesse sentido, Antônio Pereira Gaio Júnior, Breves notas sobre aplicabilidade de IRDR nosJuizados Especiais, e Alexandre Chini, Os Juizados Especiais Cíveis no Estado do Rio deJaneiro: a questão relativa às demandas de massa e o papel das Turmas Recursais naUniformização da Jurisprudência. Nesse texto, por sinal, Alexandre Chini vai além e propõe que oincidente de uniformização da jurisprudência nos Juizados Especiais estaduais possa serinstaurado de ofício, pelos juízes (p. 48).A reclamação jurisprudencial é mais conhecida como “reclamação constitucional”. Não utilizamosessa nomenclatura, entretanto, porque, por um lado, nem todas as reclamações dessa natureza estãoprevistas na Constituição, e, por outro, existem reclamações correicionais que estão previstas naConstituição.Nesse sentido, veja-se: “RECLAMAÇÃO CORREICIONAL. Decisão emanada de juizadoespecial. Competência da Turma Recursal. Aplicação analógica do enunciado de 376 da súmulade jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Precedentes” (TJRJ, 10ª Câmara Cível, Rcl0010342-12.2016.8.19.0000, Rel. Des. Patricia Ribeiro Serra Vieira, j. em 16.03.2016).Alguns autores entendem ser a reclamação constitucional um recurso, enquanto que outros aenquadram como um incidente processual. A posição majoritária, entretanto, capitaneada peloSTF, é que a reclamação constitucional, inserida no âmbito do direito de petição (art. 5º, XXXIV,a, da CF), retrata verdadeira ação de impugnação (STF, Pleno, ADI 2.212/CE, Rel. Min. EllenGracie, DJ 14.11.2003). Sobre a discussão, veja-se, por todos, André Ramos Tavares, Nova lei dasúmula vinculante: estudos e comentários à Lei 11.417, de 19.12.2006, p. 124.Nesse sentido, veja-se: “A Resolução 12/2009 não pretendeu dar à Reclamação uma exorbitanteeficácia de ação rescisória sui generis, com eficácia erga omnes e hipótese de cabimento maisampla que a prevista pelo art. 485 do CPC” (STJ, 2ª Seção, MC 16.568/TO, Rel. Min. NancyAndrighi, j. em 10.03.2010).Essa perplexidade já era objeto de estudo na doutrina, desde a edição da Lei 9.099/1995. Sobre adiscussão, veja-se, por todos, Eduardo Cambi, Jurisprudência Lotérica, p. 124.Nesse sentido, veja-se: “A expressão ‘jurisprudência consolidada’ engloba apenas questões dedireito material, excluindo questões processuais” (STJ, 2ª Seção, AgRg na Rcl 6.034/SP, Rel. Min.Nancy Andrighi, j. em 29.02.2012).Por certo, não cabe reclamação em face de decisão monocrática do relator. Nesse sentido, veja-se:“O art. 1º da Resolução 12, de 14 de dezembro de 2009, prevê que a reclamação por elaregulamentada destina-se a dirimir divergência entre acórdão prolatado por Turma RecursalEstadual e a jurisprudência desta Corte. Incabível em face de decisão monocrática do relator”(STJ, 2ª Seção, AgRg na Rcl 5.598/TO, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. em 25.05.2011).

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33 Nesse sentido, veja-se o artigo de Leonardo Carneiro da Cunha, Novo CPC: Reclamação contradecisões em Juizados Especiais Cíveis. Revogação da Resolução 12/2009-STJ.

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