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1 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Lúcia Thomé Reinert Defensoria Pública do Estado de São Paulo: Promoção da cidadania e governança democrática Mestrado em Direito São Paulo 2016

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Lúcia Thomé Reinert

Defensoria Pública do Estado de São Paulo: Promoção da cidadania e governança

democrática

Mestrado em Direito

São Paulo

2016

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Lúcia Thomé Reinert

Defensoria Pública do Estado de São Paulo: Promoção da cidadania e governança

democrática

Mestrado em Direito

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título de

MESTRE em Direito, efetividade do direito, sob

orientação da Professora Dra. Flávia Cristina

Piovesan.

São Paulo

2016

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LÚCIA THOMÉ REINERT

Defensoria Pública do Estado de São Paulo: Promoção da cidadania e participação democrática

Mestrado em Direito

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito, área de concentração

Efetividade do Direito, sob orientação da Professora Doutora Flávia Cristina Piovesan.

São Paulo

2016

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COMISSÃO EXAMINADORA

PRESIDENTE: _________________________________________________________________

Prof. Dra. Flávia Cristina Piovesan

1º EXAMINADOR: _____________________________________________________________

Prof.

2º EXAMINADOR: _____________________________________________________________

Prof.

São Paulo, ___ de _________________ de 2016.

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Aos meus pais, Cláudio e Cristina, por terem

me apoiado incondicionalmente na busca dos

meus sonhos.

À minha irmã, Lívia, por sempre acreditar e me

dar coragem para lutar por um novo mundo de

possibilidade.

Ao meu amor, Guilherme Feccini Gaona, por

despertar em mim o amor mais lindo que uma

pessoa pode sentir.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente aos meus pais e a minha irmã por estarem

do meu lado, na luta dos meus sonhos, sempre acreditando e me dando o integral apoio no

decorrer da minha vida. Sei que só cheguei onde estou por vocês, por termos uma família unida,

baseada no amor e na sinceridade.

Agradeço ainda ao Guilherme Feccini Gaona, presente mais

especial que a Defensoria Pública poderia ter me proporcionado, pois sem você eu nunca teria

conseguido “atravessar” o ano de 2015. Tenho certeza que Nossa Senhora de Fátima te colocou

na minha vida para que eu vivesse o mais lindo amor que uma pessoa merece sentir.

Agradecimentos especiais a minha querida orientadora, Flávia

Piovesan, a quem tive a honra de conhecer nos primeiros anos da faculdade e que inspira a mim e

a todos com esse ideal de justiça e amor pela causa. Muito obrigada por tudo!

Devo agradecer ainda, aos Professores Roberto Dias, Maria Garcia,

Vidal Serrano Nunes Junior e Marcelo Mathias Pereira, por fazerem parte desta trajetória. Muito

obrigada pelo aprendizado e toda a preocupação que tiveram comigo. Agradeço ainda a minha

madrinha, Liane Maria Busnello Thomé, que me apoiou na realização do Mestrado.

Agradeço a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, por ter

contribuído pela realização do Mestrado, em especial a ANADEP e a Ouvidoria-Geral da

Defensoria Pública, na pessoa da Cris Uchôa, que possibilitou o fornecimento atualizado de

dados da instituição, bem como atividades e conquistas realizadas pela Defensoria pública.

Agradeço também aos meus ex-chefes, que desde a época de estagiária despertaram o amor que

sinto pela carreira: Paula Navarro Murda e Marina Tedeschi, meu especial e carinhoso obrigada!

Por fim, agradeço aos usuários da Defensoria Pública, pois são eles

que me fortalecem para acreditar e lutar pelas injustiças. O meu sincero obrigada! Sem vocês eu

não teria conseguido realizar o meu sonho e acreditar que, apesar de tudo, ainda vale a pena!

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REINERT, Lúcia Thomé. Defensoria Pública do Estado de São Paulo: Promoção da Cidadania e

Participação Democrática. 170 fls. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional). Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2016.

RESUMO

A Defensoria Pública é a instituição constitucionalmente prevista para exercer a assistência

jurídica, integral e gratuita da população carente e vulnerável do Estado Democrático de Direito.

Sabe-se que a Constituição da República de 1988, fundada na dignidade da Pessoa Humana e na

Cidadania reforçam a importância da participação popular na construção do Estado Democrático

de Direito. Deste modo, imperioso que sejam assegurados a todos a cidadania necessária para

implementação do acesso à justiça. Por isso, a importância da Defensoria Pública como ente

constitucional previsto para servir de instrumento de cidadania, bem como para assegurar a todos

a efetiva participação no Sistema de Justiça.

Assim, com o escopo de assegurar a criação de um sistema de justiça inclusivo, plural e

igualitário, a Defensoria Pública, especialmente, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo,

prevê instrumentos facilitadores do acesso da população vulnerável ao sistema de justiça, eis que

reconhece a participação social como eixo estruturante do Estado Democrático de Direito.

Faz-se necessário o estudo do campo normativo que rege a viabilidade da atuação da Defensoria

Pública, seja na esfera nacional, quanto internacional, bem como estudos e pesquisas realizadas

no País que reconhecem a importância do papel da Defensoria Pública para a concretização da

participação social e na implementação da cidadania. Além disso, importante analisar o III

Diagnóstico de Defensorias Públicas no País, bem como decisões do Supremo Tribunal Federal

que reconhecem o papel da Defensoria Pública como elo essencial a propiciar o acesso dos

excluídos da sociedade ao Direito e à Justiça, ao contribuir para a criação de uma governança

democrática no âmbito do Sistema de Justiça.

Palavras-chaves: Defensoria Pública, Cidadania, Promoção de Dignidade, Governança

Democrática, Acesso à Justiça.

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REINERT, Lúcia Thomé. Public Defender of the State of São Paulo: Promotion of Democratic

Citizenship and Participation. 170 p. Master in Law (Constitutional Law). Pontifical Catholic

University of São Paulo. São Paulo, 2016.

ABSTRACT

The Public Defense is the institution constitutionally provided to exercise legal assistance, full

and free for the unfortunate and vulnerable population of the Democratic State of Law.

It is known that the Republic Constitution of 1988, founded on the principles of Dignity of the

Human Being and Citizenship, reinforce the importance of popular participation in building a

Democratic State of Law.

Consequently, is imperative to ensure to all the necessary Citizenship needed to implement the

access to justice.

It results in the importance of the Public Defense as a constitutional entity projected to serve as

an instrument of citizenship, as well as to assure everyone the effective participation in the justice

system.

As a consequence, with the aim of ensuring the creation of an inclusive justice system, plural and

egalitarian, the Public Defense, and especially the Public Defense of the State of São Paulo,

provides tools to facilitate the access of vulnerable people to the justice system, once its

recognizes the social participation as the basis of a Democratic State of Law.

It is necessary to study the legal field that governs the feasibility of operation of the Public

Defense, either at the national level, and internationally, as well as study and analyze research

carried out in the country which recognizes the important role of the Public Defense for the

realization of the social participation and implementation of citizenship.

Besides, it’s quite important to analyze the III Diagnostic of Public Defenses in Brazil, as well as

decisions of the Supreme Court that recognizes the role of the Public Defense as an essential link

to provide access of the socially excluded to Law and Justice by contributing to the establishment

of a democratic governance within the justice system.

Keywords: Public Defense, Citizenship, Dignity promotion, Democratic governance, Access to

Justice.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

p.11

1. NOÇÕES BÁSICAS DE CIDADANIA, JUSTIÇA E CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988

p.17

1.1. A Justiça no Pós-Positivismo p.17

1.2. Os fundamentos e objetivos da Constituição Federal de 1988 p.19

1.3. O Conceito de Cidadania p.23

1.3.1. A Cidadania e a Concepção contemporânea dos Direitos Humanos

p.24

2. A DEFENSORIA PÚBLICA

p.31

2.1. Breve histórico da Defensoria Pública no Brasil p.32

2.2. Previsões Legislativas p.40

2.3. Criação e Consolidação da Defensoria Pública: Heterogeneidade nos

processos de criação da Defensoria Pública nos Estados da Federação

Brasileira.

p.42

2.3.1. A Criação da Defensoria Pública no Estado de São Paulo p.48

2.4. O Papel da Defensoria Pública no Estado Democrático de Direito. p.56

2.5. Transmutação de Assistência Judiciária para Assistência Jurídica p.68

2.5.1. Sistema Judicare p.69

2.5.2. Sistema Misto( Combinado) p.70

2.5.3 Sistema de Advogado remunerado pelos cofres públicos p.71

2.6. O Modelo Público adotado pela Constituição Federal de 1988: Defensoria

Pública

p.71

2.7 A Assistência Jurídica Integral e Gratuita

p.74

3. A DEFENSORIA PÚBLICA E O ACESSO À JUSTIÇA

p.76

3.1. Obstáculo Econômico, Educacional e Temporal p.81

3.1.1. Possibilidade das Partes p.83

3.1.2 A questão dos Direitos Difusos p.85

3.2. Ondas Renovatórias de Acesso à Justiça como solução à universalização do

Acesso à Justiça

p.85

3.3. O Acesso à Defensoria Pública como Direito Humano Fundamental p.87

3.4. O Direito Internacional dos Direitos Humanos na América e a Defensoria

Pública

p.91

3.4.1. Tratados Internacionais de Direitos Humanos p.94

3.4.2 Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa

Rica

p.95

3.4.3 A Resolução da Organização dos Estados Americanos (OEA) e Soft Law p.98

3.5. O Defensor Público como Agente de Transformação Social p.101

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4. OS INSTRUMENTOS DE CIDADANIA E GOVERNANÇA

DEMOCRÁTICA

p.107

4.1. Educação em Direitos p.109

4.2. Momento Aberto e Participação Social na Definição de Teses Institucionais p.117

4.3. Pré-Conferências e Conferências Regionais e Estaduais p.118

4.4. Audiências Públicas p.127

4.5. Ouvidoria Pública p.129

4.5.1. A Ouvidoria-Geral: Lei Complementar n.º 80/94 e Lei Complementar n.º

988/06

p.139

5. DEFENSORIA PÚBLICA BANDEIRANTE: PRÁTICAS EXITOSAS

DE GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA E FORTALECIMENTO DA

CIDADANIA

p.146

CONCLUSÃO

p.152

REFERÊNCIAS p.157

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1. INTRODUÇÃO

A presente dissertação de mestrado tem como objetivo analisar os

instrumentos de participação social previstos na Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública,

Lei Complementar n.º 80/94, com as alterações provocadas pela Lei Complementar n.º 132/09,

bem como a Lei Complementar da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Lei

Complementar Estadual n.º 988/06, com o objetivo de analisar a importância e efetividade da

participação da sociedade no Sistema de Justiça.

Em que pese a Constituição Federal de 1988 estabelecer diversos

direitos e garantias fundamentais, observa-se um déficit de implementação de direitos, em

especial para o grupo de pessoas vulneráveis.

É certo que não se pode falar em um Estado Democrático de Direito

efetivo onde não existe um forte sistema garantidor dos direitos fundamentais necessários para

assegurar a existência de uma vida digna.

Nas palavras de Maria Tereza Sadek:

“os direitos são letra morta na ausência de instâncias que

garantam o seu cumprimento. O judiciário, deste ponto de vista,

tem um papel central. Cabe a ele aplicar a lei, e,

consequentemente, garantir a efetivação dos direitos individuais e

coletivos. Daí ser legítimo afirmar que o Judiciário é o principal

guardião das liberdades e da cidadania1”

Nesse contexto, a Defensoria Pública, como instituição

constitucionalmente designada para promover o acesso à justiça dos vulneráveis ganha

importância no Sistema de Justiça.

1 SADEK, Maria Tereza. Acesso à Justiça (org).São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2001,

p.7

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Observaremos que o sistema de Justiça atual não permite o acesso

efetivo e integral de todos, seja em razão do elevado número de processos, da burocratização, das

elevadas custas processuais ou do próprio desconhecimento dos direitos e mecanismos de

implementação.

Deste modo, imperioso que se reconheça a necessidade de

mudanças e aperfeiçoamento do sistema de justiça, para incluir a proteção e efetividade do direito

de todos.

O tema tem sido até agora objeto de pouca análise por parte dos

pensadores, talvez inclusive em razão da visão tradicional do sistema de justiça. Porém,

importante em um Estado fundado na Cidadania que se reconheça a importância da participação

social, para criação de um sistema de Justiça plural, inclusivo e aberto.

Essa relação integrada entre os diversos atores do Sistema de

Justiça ganha novos contornos na sociedade contemporânea, razão pela qual pode se afirmar que

o tema é extremamente atual, apto para promover o Acesso à Justiça e possibilitar o acesso de

todos, por intermédio da Defensoria Pública que servirá como instrumento garantidor da primazia

da Dignidade da Pessoa Humana, da afirmação do Estado Democrático de Direito e do respeito a

Cidadania.

A abordagem da dissertação será sobre o enfoque do Acesso à

Justiça, bem como da importância do fortalecimento da participação da sociedade na construção

de um sistema mais igualitário e que reflita os anseios da sociedade moderna.

A sociedade atual, marcada por injustiça e desigualdade, se defronta

com grupos de pessoas extremamente vulneráveis muitas vezes esquecidas pelo Estado, que

necessitam de meios para viabilizar os direitos. É perverso um sistema que somente considera

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cidadão aquele integrante da classe dominante, afastando-se de um modelo de solidariedade

constitucional e distribuição de justiça. 2

Nesse aspecto, analisaremos que o Estado Democrático de Direito não

pode abrir mão do compromisso ético de adotar uma política que traduza preocupações sociais

coadunadas com o interesse da maioria da população, nele compreendido não apenas um grupo

econômico, político ou social dominante.

Pretende-se ainda demonstrar que a participação social e o fortalecimento

dos mecanismos de integração com a sociedade, sejam por meio da educação em direitos,

realização de audiências públicas, conferências, criação de Ouvidorias externas, fomentam o

empoderamento3 da população e possibilitam a atuação mais ativa da sociedade.

Essa visão mais democrática e participativa, ganha relevância, quando se

vê que há uma instituição dentro do âmbito do Sistema de Justiça que pretende à inclusão social e

à representação dos interesses da sociedade perante o Estado e o Poder Judiciário, contribuindo

para a consolidação de um Estado Democrático de Direito.4

A Declaração e Programa de Ação de Viena de 199 , afirma que “a

democracia se baseia na vontade livremente expressa pelo povo de determinar seus próprios

2 CRISTO, Ismael Vieira. Acesso à Justiça e Participação Popular. São Paulo: Pulsar, 2000, p.11 3 O empoderamento legal pode ser entendido como um processo pelo qual a pessoa em situação de pobreza passa a

ser protegida e torna-se capaz de usar a lei a fim de fazer valer seus direitos e cuidar dos interesses junto às

instituições do Estado. A definição do empoderamento legal está na página 26 do Relatório elaborado pela Comissão

do Empoderamento Legal do Pobre, disponível em

http://www.unrol.org/files/Making_the_Law_Work_for_Everyone.pdf, último acesso em 08.12.2015. As condições

para o empoderamento legal de acordo com o relatório elaborado pela Comissão do Empoderamento Legal do Pobre,

subdividem-se em: 1) identidade como cidadão, como proprietário, como trabalhador ou “homem de negócios”; e 2)

voz conquistada por meio de informação, educação, organização e representação. Os detalhamentos em relação as

condições para o empoderamento podem ser verificadas nas folhas 25-29 do Relatório elaborado pela Comissão do

Empoderamento Legal do Pobre, Disponível em

http://www.unrol.org/files/Making_the_Law_Work_for_Everyone.pdf último acesso em 08.12.2015 4 Informações extraídas da notícia “ A Defensoria está mais próxima do chamado Humanismo Constitucional,

portanto, é imperioso prestigiá-la”, disponível em http://www.apadep.org.br/noticias/ayres-britto-ministro-stf-

defensoria-esta-mais-proxima-chamado-humanismo-constitucional-portanto-e-imperioso-prestigia-la/ último acesso

em 11.08.2015.

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sistemas políticos, econômicos, sociais e culturais e em sua plena participação em todos os

aspectos de suas vidas”.

Assim, a fim de demonstrar a importância da governa democrática e dos

instrumentos de participação social, o presente estudo estará divididos da seguinte forma.

O primeiro capítulo, com caráter introdutório, irá analisar brevemente o

conceito de justiça e cidadania no Pós-Positivismo. Passo seguinte, serão analisados os

fundamentos e objetivos do Estado Democrático de Direito criado em 1988, dando ênfase a

cidadania. O objetivo desde capítulo é estabelecer os valores éticos, políticos e jurídicos

pretendidos pela sociedade atual, principalmente da importância da necessidade de mecanismos

de implementação da cidadania e a concepção contemporânea dos Direitos Humanos.

O capítulo seguinte, por sua vez, irá analisar a Defensoria Pública, nele

compreendido a heterogeneidade nos processos de criação da instituição nos diferentes estados da

Federação; o papel e importância da instituição no Estado Democrático de Direito, não apenas do

ponto de vista legal, mas amparado na jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos, dos

julgados do Supremo Tribunal Federal e nos diplomas internacionais de proteção da pessoa

humana.

Será feito um estudo histórico, dando ênfase na Defensoria Pública do

Estado de São Paulo. A fim de possibilitar uma análise mais concreta da realidade da Defensoria

Pública utilizamos os estudos e dados numéricos obtidos por pesquisas realizadas pelo IPEA,

Ministério da Justiça, bem como outras instituições.

O terceiro capítulo, analisará a Defensoria Pública no acesso à Justiça.

Assim, analisaremos o “Projeto de Florença” de Mauro Cappelletti e Bryan Garth, com os

obstáculos e ondas renovatórias como possibilidade para a universalização do acesso à Justiça.

Nesse contexto, será feito um estudo em relação a Defensoria Pública,

bem como pelo reconhecimento de que o acesso a instituição pública merece ser visto como um

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direito fundamental que demanda efetividade e implementação. Nesse capítulo, ainda

analisaremos o direito internacional dos Direitos Humanos na América, bem como os diplomas

que versam sobre a importância e o papel da Defensoria Pública, tais como a Recomendação do

Mercosur/CMC/01/12, Resolução n.º 2656/11 e 2714/12 da OEA.

Além disso, demonstraremos como a atuação da Defensoria Pública

propicia transformação na sociedade, possibilitando a criação de um sistema mais participativo e

democrático.

O quarto capítulo, tratará dos diferentes instrumentos de cidadania e

participação social disponibilizados pela Defensoria Pública para fomentar a governança

democrática e um sistema mais igualitário e plural. Iniciaremos com a Educação em Direitos, eis

que base para possibilitar a conscientização dos direitos e os mecanismos de implementação. Será

analisada a relação entre educação em direitos e empoderamento, bem como a importância desse

processo para a transformação da realidade. Depois, será estudado o “momento aberto” como

espaço democrático de participação da sociedade no Conselho Superior da Defensoria Pública,

bem como a participação das teses institucionais, que irão nortear os Defensores Públicos no

desempenho das atividades. A importância das Pré-Conferências e a realização da Conferência

Estadual também serão esmiuçadas nesse capítulo.

O objetivo desta seção é demonstrar que há diversos instrumentos aptos a

fomentar maior articulação com a sociedade, bem como propiciar que haja uma atuação

integrada. Por conta disso, a importância da Ouvidoria-Geral e o caráter externo. Nessa temática

analisaremos os avanços e retrocessos trazidos pela Lei Complementar n.º 132/09, bem como a

importância deste órgão na consolidação do Estado Democrático de Direito.

No quinto capítulo serão relatadas algumas práticas exitosas realizadas

pelas Defensorias Públicas, a fim de demonstrar que a participação social exerce influência

significativa nos rumos da instituição pública e fomentam, ou deveriam fomentar, mudanças no

sistema de Justiça atual.

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Por fim, ao final deste estudo, pretendemos responder à questão central da

dissertação: em que medida a Defensoria Pública possibilita a participação social e fortalece a

cidadania para a criação de um sistema de justiça inclusivo, plural e igualitário?

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1. NOÇÕES BÁSICAS DE CIDADANIA, JUSTIÇA E CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE

1988.

1.1. A Justiça no Pós –Positivismo

A denominação do conceito de Justiça é muito mais ampla do que o

sentido literal da expressão. De fato, desde os primórdios da civilização, difícil a conceituação do

que é Justiça.

Nos dizeres de Maria Tereza Sadek:

“A justiça, enquanto valor, é um bem praticamente universal, sendo

difícil datá-lo historicamente. Não há povos que, de uma forma ou

de outra, não tenham se defrontado com uma concepção de justiça.

Pode-se, pois, sustentar que, desde tempos imemoriais, sempre se

elaborou uma ideia de justiça. Na sua concepção moderna,

contudo, tal como entendemos hoje, a justiça e sua distribuição

constituem um tema do Estado Moderno, um problema que nasce

com os direitos individuais. Efetivamente, apenas quando se

começou a acreditar que os direitos do homem constituíam uma

qualidade intrínseca ao próprio homem e que, como tal, nada se

devia à sociedade nem às autoridades constituídas, a questão da

justiça começou a ser enquadrada em um outro paradigma.”5

Assim, iremos analisar, de forma resumida, o conceito de justiça no

Pós- positivismo, em especial diante das mudanças sociais ocorridas Pós 2ª Guerra Mundial e a

valorização da pessoa humana como sujeito de direito.

Conforme afirma Hugo de Brito Machado Segundo, o conceito de

justiça acaba se afastando do âmbito de atuação do Direito:

“(...) preocupados apenas com a realidade sensível, vale dizer,

aquela que pode ser apreendida através dos sentidos, os

5 SADEK, Maria Tereza. Aprofundando Diálogo in Relatório Reforma do Judiciário, Organizador Paulo César

Carbonari,http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/carbonari/carbonari_relatorio_reforma_do_judiciario.pdf, p.26.

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positivistas não consideram possível o exame de valores, que

seriam subjetivos, decorrentes de meras emoções, etc. Daí não

considerarem possível o estudo da Justiça, afastando-a de suas

preocupações cientificas”.6

Isto porque o ideal de justiça, daquilo que seria adequado ao caso

concreto, efetivando o direito de quem a pleiteia, não era suficiente para assegurar o bem da vida

e concretizar uma justiça efetiva.

A partir desse contexto, e com a postura humanística e teleológica

do Direito, adveio a fase pós-positivista, já na segunda metade do século XX. 7

Paulo Bonavides8 afirma que:

“As novas constituições promulgadas acentuam a hegemonia

axiológica dos princípios, convertidos em pedestal normativo sobre

o qual assenta todo o edifício jurídico dos novos sistemas

constitucionais”

Conforme Luís Roberto Barroso e Ana Paula de Barcellos9:

“Se incluem a definição das relações entre valores, princípios e

regras, aspectos da chamada nova hermenêutica constitucional, e a

teoria dos direitos fundamentais, edificada sobre o fundamento da

dignidade da pessoa humana. A valorização dos princípios, sua

incorporação, explícita ou implícita, pelos textos constitucionais e

o reconhecimento pela ordem jurídica de sua normatividade fazem

parte desse ambiente de reaproximação entre o Direito e a Ética”.

6 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Fundamentos do direito. São Paulo. Atlas. 2010. p. 40. 7 “A justiça, na sua versão moderna, e também o tema do acesso à justiça, nascem imbricados nestas concepções de

indivíduo, de igualdade, de direitos individuais, de direitos iguais, de direitos de homens iguais e que tornam os

homens iguais.” SADEK, Maria Tereza. Aprofundando Diálogo in Relatório Reforma do Judiciário, Organizador

PauloCésarCarbonari,http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/carbonari/carbonari_relatorio_reforma_do_judicia

rio.pdf, p.28. 8 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. São Paulo. Malheiros. 2009. p. 264. 9 LEITE, George Salomão (organização). Dos princípios constitucionais: Considerações em torno das normas

principiológicas da Constituição. São Paulo. Método. 2008. BARROSO, Luís Roberto. BERCELLOS, Ana Paula de.

A nova interpretação Constitucional: ponderação, argumentação e papel dos princípios. p. 66.

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Os princípios, portanto, na era do pós-positivismo e da crescente

constitucionalização do Direito, não se resumem mais apenas a suprir as lacunas legais, mas se

desenvolvem como parte integrante das próprias normas constitucionais, sejam eles explícitos ou

implícitos, na medida em que se revelam como alicerce do próprio ordenamento jurídico.

Consolida-se, portanto, a importância dos princípios para o Direito.

Na busca pela sua conceituação, Celso Antônio Bandeira de Mello10

afirma que:

“(...) princípio jurídico é mandamento nuclear de um sistema,

verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia

sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de

critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por

definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe

confere a tônica e lhe dá sentido harmônico”.

Partindo assim desta nova sistemática de valorização da carga

principiológica a Defensoria Pública ganha espaço para ser um instrumento propiciador de

cidadania e participação social a fim de contribuir para uma sociedade mais justa e solidária.

Nos dizeres de Luciana Zaffalon: “Considera-se assim, a

participação popular como um instrumento para que as desigualdades aflorem na forma de

questão prioritária e possíveis soluções coletivas”11

Veremos a seguir, a cidadania como fundamento da Constituição

Federal de 1988.

1.2. Os fundamentos e objetivos da Constituição Federal de 1988

A Constituição prevê logo no 1º artigo que:

10 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo. Malheiros. 1994. p. 450. 11 CARDOSO, Luciana Zaffalon Leme. Uma Fenda na Justiça – A Defensoria Pública e a Construção de Inovações Democráticas. 1. ed. São Paulo: Hucitec, 2010, p.248.

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“A República Federativa do Brasil, formada pela união

indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal,

constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como

fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da

pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre

iniciativa; V - o pluralismo político”.

O Parágrafo Único assegura que “ Todo o poder emana do povo,

que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”

Percebe-se da leitura acima que a Constituição Brasileira se

apresenta como a Carta de Direitos de um Estado Democrático de Direito, pautado nos alicerces

da soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e livre

iniciativa, bem como no pluralismo político, afirmando-se como república, ou seja, “o governo

do povo, em favor do povo e para o povo”, consoante há tempos já colocado por Abraham

Lincoln.

Assim, para a concretização de um Estado Democrático, Aberto e

inclusivo necessário a estruturação de um sistema de justiça fundado na participação popular, eis

que imperiosa a atuação integrada da sociedade no aperfeiçoamento do sistema de Justiça.12

No artigo 3º a Constituição prevê os objetivos, in verbis:

“Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e

solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar

a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e

regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de

origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de

discriminação”.

A Constituição da República de 1988 contempla, então, como

princípios fundamentais, (i) os direitos políticos, civis e de liberdades individuais; (ii) direitos 12 O direito de acesso à justiça só se torna possível com o surgimento do Estado de Direito, de uma perspectiva ex

parte populi e não mais ex parte principi, da existência do cidadão que tem direitos e não mais do súdito que só tem

o dever de obediência. ALMEIDA, Guilherme de. Acesso à justiça, direitos humanos e novas esferas da justiça.

Contemporânea in Revista de Sociologia da UFSCar, v. 2, p. 83-102, 2012, p.4,

http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/viewFile/61/34 último acesso em 02.12.2015.

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sociais, econômicos e culturais; e (iii) direitos humanistas, ou seja, de integração dos povos e de

redução das desigualdades e das marginalizações.

Esse conjunto de princípios são normas fundamentais do Estado

Brasileiro e servem de sustentáculo para todo o ordenamento jurídico.

Nas palavras de Ruy Samuel Espíndola:

“Os princípios jurídicos como princípios constitucionais têm a mais

alta normatividade do sistema jurídico. Isto fez com a antiquíssima

postura que conferia aos princípios a mera posição subsidiária em

face dos atos de integração da ordem jurídica, fosse superada; ou

seja, antes, os princípios gerais do direito eram apenas elementos

de cumprimento de lacunas do sistema jurídico, segundo o

enunciado do art. 4º, da Lei de Introdução ao Código Civil, e art.

126, do Código de Processo Civil.Todavia, hoje constituem

verdadeiros parâmetros de aferição de constitucionalidade do

sistema jurídico; fazem dos princípios normas prenhe de direitos;

fazem dos princípios os principais sentidos hermenêuticos da

ordem jurídica; sumariam as estruturas básicas de justiça, que

estabelecidas na Constituição, pelos princípios constitucionais,

ganham vigor e materialidade.Na antiga e superada postura

positivista os princípios só assumiam importância quando houvesse

lacunas na ordem jurídica. Hoje esta posição não mais procede.

Contemporaneamente, houve uma completa revolução nas

concepções principialistas no Direito13”.

São através dos princípios jurídicos, portanto, e sobretudo dos

constitucionais, que são positivados os principais valores éticos, políticos e jurídicos ordenadores

das atuais sociedades.

E é justamente o que faz a Constituição Democrática e Cidadã de

1988, já nos seus primeiros dispositivos, como visto acima, que lhe permitem receber a conotação

de um Texto Democrático, alicerce de um Estado Democrático de Direito, no sentido atual dessa

13 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. A Constituição como garantia da democracia - O papel dos princípios constitucionais.

Novos Estudos Jurídicos. Ano IV. Nº 11. p. 51 - 69. 2000.

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concepção, ou seja, de representação de uma convivência comunitária estabelecida sob a égide

dos direitos humanos, na perspectiva de assegurá-los a todos os seres humanos.

Não basta a Constituição fazer menção a um Estado Democrático

para que ele seja democrático. De fato, é preciso que a democracia seja efetivada na realidade.

Assim, imperiosa a necessidade de efetivação dos princípios e valores constitucionais.

E isso é justamente o que defende Ruy Samuel Espíndola ao

comentar a realização do princípio da democracia:

“Nossa tese parte da premissa que a realizabilidade da Democracia

tem como exigência necessária e inarredável a efetividade da

Constituição, o respeito à Constituição, o acato da força normativa

de suas regras e princípios14,”.

Não se pode conceber que uma Constituição venha a prever

direitos, sem que tenha o viés de efetivá-los. Aliás, como já colocado pelo Supremo Tribunal

Federal, através das palavras do Ministro Celso de Mello:

“(...) nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que

elaborar uma Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir

integralmente, ou, então, de apenas executá-la com o propósito

subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se

mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos

governantes, em detrimento dos interesses maiores dos

cidadãos”.15

A Constituição Federal de 1988 reconhece a cidadania como base

fundamental do Estado Democrático de Direito. De modo que, pensar no Estado Democrático de

Direito sem que haja respeito à cidadania seria o mesmo que reconhecer que um corpo sobrevive

sem que haja um coração.

14 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. A Constituição como garantia da democracia - O papel dos princípios constitucionais.

Novos Estudos Jurídicos. Ano IV. Nº 11. p. 51 - 69. 2000. 15 STF. Segunda Turma. AG.Reg. no Recurso Extraordinário com Agravo 639.337/São Paulo. DJe-177 Divulg 14-

09-2011. Public 15-09-2011.Ement vol-02587-01 pp-00125.

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Passemos assim a compreender o que se trata a cidadania e a sua

importância não só como direito fundamental, mas como fonte garantidora do Estado

Democrático de Direito.

1.3. O conceito de cidadania

A noção de cidadania remonta à Grécia Antiga, período clássico,

sendo usado desde então para indicar os direitos relativos ao cidadão estando intimamente ligada

à participação ativa da vida em sociedade.

Conforme aponta Richard Pae Kim a cidadania pode ser

compreendida, em uma contextualização constitucional, como:

“Na análise do sentido constitucional de “cidadania”, observamos

que o texto maior manteve o sentido original usado na Grécia

clássica, este sob o sentido de “designar os direitos relativos ao

cidadão”, ou seja, os direitos do indivíduo que vive na sociedade,

hoje no campo ou nas cidades, onde participava ativamente de

negócios e das decisões políticas. Cidadania pressupõe, portanto,

todas as implicações decorrentes de uma vida em sociedade, em um

país 16,”.

Observa-se assim que a busca da participação ativa do cidadão na

vida social perdura até a atualidade. Ocorre que, na atualidade, a cidadania vai além da

titularidade de direitos políticos, civis ou sociais, para ser compreendida como o atributo que, nos

dizeres de José Afonso da Silva 17, “qualifica os participantes da vida do Estado, o

reconhecimento do indivíduo como pessoa integrada na sociedade estatal”.

16 MORAES, Alexandre de. PAE KIM, Richard (organização). Cidadania: o novo conceito jurídico e a sua relação

com os direitos fundamentais individuais e coletivos. São Paulo. Atlas. 2013. PAE KIM, Richard. O Conteúdo

Jurídico de Cidadania na Constituição Federal do Brasil. p. 26. 17 SILVA, José Afonsa da. Curso de Direito Constitucional positivo. São Paulo. Malheiros. 2009. p. 104.

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Percebe-se, assim, que o conceito de cidadania se relaciona com a

própria noção de soberania popular.18

Essa similaridade entre cidadania e soberania popular é confirmada

por Antonio Enrique Pérez Luño19, eis que o autor afirma que para assegurar a soberania popular,

faz-se necessária a implementação de instrumentos aptos para tutelar e garantir a participação das

pessoas e grupos nas decisões estatais.

É nessa seara que surge a Defensoria Pública como instrumento

concretizador da cidadania e da participação social, permitindo àqueles excluídos a possibilidade

de lutar pelos direitos e participar ativamente da vida em comunidade. Deste modo, importante é

a existência de mecanismos de participação popular que possibilitam uma atuação integrada e a

construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

1.3.1. A Cidadania e a concepção contemporânea dos Direitos Humanos.

Na atualidade, a compreensão do conceito de cidadania não pode

ser desassociada da internacionalização dos Direitos Humanos. Isto porque, uma conceituação

afastada da noção de Direitos Humanos e da busca da igualdade, não condiz com um Estado

Democrático de Direito.

Sabe-se que o processo de consolidação do Direito Internacional

dos Direitos Humanos surgiu em meados do século XX, em decorrência das barbáries e

atrocidades praticadas na 2a Guerra Mundial.20

18 Esta, por sua vez, também é reconhecida como fundamento da República Federativa do Brasil (artigo 1º, I, da

CF/88) e está relacionada a questão da autodeterminação dos homens, da autolegitimação de uma sociedade e do

poder dela emanado. 19 LUÑO, Antonio Enrique Pérez. Derechos humanos, Estado de Derecho y Constitución. Madrid. Tecnos. 2005. p.

206. 20 “A Era Hitler foi marcada pela lógica da destruição e da descartabilidade da pessoa humana, que resultou no

envio de 18 milhões de pessoas a campos de concentração, com a morte de 11 milhões, sendo 6 milhões de judeus,

além de comunistas, homossexuais e ciganos. O legado do nazismo foi condicionar a titularidade de direitos, ou

seja, a condição de sujeito de direito, ao pertencimento à determinada raça — a raça pura ariana. Para Ignacy

Sachs, o século XX foi marcado por duas guerras mundiais e pelo horror absoluto do genocídio concebido como

projeto político e industrial”. SACHS, Ignacy. O desenvolvimento enquanto apropriação dos direitos humanos,

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25

A ruptura ocorrida com o nazismo fomentou um movimento

voltado para internacionalização e proteção de direitos, razão pela qual inúmeros tratados

internacionais voltados à consagração da pessoa humana foram criados, ratificados e aderidos

pelos Estados e, em especial pelo Brasil.

Nota-se assim, que o homem passou a ser tratado como um“ ser

com dignidade, um fim e não um meio, um sujeito e não um objeto”. 21A dignidade da pessoa

humana passou a constituir o fio condutor das garantias, o fundamento do Estado Democrático de

Direito e a viga mestre de todo o arcabouço normativo e interpretativo o que ocasionou uma

reconstrução dos direitos humanos.

Nas palavras de Hannah Arendt, neste cenário mundial o que se

verifica é "o direito a ter direitos" ou seja " o direito a ser sujeito de direito".22

No mais, como realça Norberto Bobbio, os direitos humanos não

nascem todos de uma vez, nem de uma vez por todas23. Para Hannah Arendt, mais uma vez, os

direitos humanos não são um dado, mas um construído, uma invenção humana, em constante

processo de construção e reconstrução. 24

Isto porque a construção dos direitos não é linear, eles decorrem a

partir de um espaço de luta e ação social. No dizer de Joaquín Herrera Flores25, os direitos

humanos compõem uma racionalidade de resistência, na medida em que traduzem processos que

abrem e consolidam espaços de luta pela dignidade humana.

Estudos Avançados, 12 (33), p. 149. 21 KANT, I. Fundamentação da metafísica dos costumes. Editora Nacional: São Paulo: 1964, p. 90. 22 LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São

Paulo: Cia das Letras, 1988, p. 87. 23. BOBBIO, Era dos direitos, p. 32. 24 Hannah Arendt, As Origens do Totalitarismo, trad. Roberto Raposo, Rio de Janeiro, 1979. A esse respeito, ver

também: Celso Lafer, A Reconstrução dos Direitos Humanos: um Diálogo com o Pensamento de Hannah Arendt,

São Paulo, Companhia das Letras, 1988, p. 134. No mesmo sentido, afirma Ignacy Sachs: “Não se insistirá nunca o

bastante sobre o fato de que a ascensão dos direitos é fruto de lutas, que os direitos são conquistados, às vezes, com

barricadas, em um processo histórico cheio de vicissitudes, por meio do qual as necessidades e as aspirações se

articulam em reivindicações e em estandartes de luta antes de serem reconhecidos como direitos” (Ignacy Sachs,

“Desenvolvimento, Direitos Humanos e Cidadania”, in Direitos Humanos no Século XXI, 1998, p. 156). 25. FLORES, Joaquín Herrera. Direitos humanos, interculturalidade e racionalidade de resistência, p. 7.

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26

A partir da Declaração de 1948, começa a desenvolver-se o Direito

Internacional dos Direitos Humanos, mediante a adoção de inúmeros instrumentos internacionais

de proteção. A Declaração de 1948 confere lastro axiológico e unidade valorativa a esse campo

do Direito, com ênfase na universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos

humanos.

O processo de universalização dos direitos humanos permitiu a

formação de um sistema internacional de proteção desses direitos. Tal sistema é integrado por

tratados internacionais de proteção que refletem, sobretudo, a consciência ética contemporânea

compartilhada pelos Estados, na medida em que invocam o consenso internacional acerca de

temas centrais aos direitos humanos, na busca da salvaguarda de parâmetros protetivos mínimos

— do “mínimo ético irredutível”. 26

Não há direitos humanos sem democracia, tampouco democracia

sem direitos humanos. Vale dizer, o regime mais compatível com a proteção dos direitos

humanos é o democrático.27.

Note-se que o pleno exercício dos direitos políticos é capaz de

implicar o “empoderamento” das populações mais vulneráveis, o aumento de sua capacidade de

pressão, articulação e mobilização políticas. Para Amartya Sen, os direitos políticos (incluindo a

liberdade de expressão e de discussão) são não apenas fundamentais para demandar respostas

políticas às necessidades econômicas, mas são centrais para a própria formulação dessas

necessidades econômicas 28.

26 http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/flaviapiovesan/piovesan_dh_direito_constitucional.pdf último acesso

em 16.12.2015. 27. Atualmente, 140 dos quase 200 Estados que integram a ordem internacional realizam eleições periódicas.

Contudo, apenas 82 Estados (o que representa 57% da população mundial) são considerados plenamente

democráticos. Em 1985, esse percentual era de 38%, compreendendo 44 Estados. Consultar UNDP, Human Development Report 2002: Deepening democracy in a fragmented world. Citado em PIOVESAN, Flavia. Internacionalização dos Direitos Humanos e Humanização do Direito Internacional: Desafios Contemporâneos, p. 21. 28. Amartya Sen, prefácio ao livro Pathologies of power, de Paul Farmer. Citado em PIOVESAN, Flavia.

Internacionalização dos Direitos Humanos e Humanização do Direito Internacional: Desafios Contemporâneos, p.21.

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27

É dever dos Estados encorajar a participação popular em todas as

esferas como um importante fator ao direito ao desenvolvimento e à plena realização dos direitos

humanos.

De acordo com a carta do II Seminário da JusDH: O Potencial

Democrático dos Direitos Humanos para a Política Pública de Justiça, publicada em 22 de Julho

de 2013 é importante que a Justiça Brasileira não se limite a uma atuação estritamente restrita às

carreiras do sistema de justiça, mas que haja efetiva participação e controle social democrático e

responsável, in verbis:

“Identifica-se, portanto, a necessidade de participação da

sociedade civil no interior do sistema de justiça, através de

mecanismos transparência e participação social na gestão e

administração da justiça enquanto política pública, condição para

efetiva realização de mudanças no âmbito da justiça brasileira. À

revelia da resistência das suas instituições a estas transformações

democráticas, compreende-se que a instauração de ouvidorias

externas constitui importante mecanismo de acesso e

democratização da justiça, constituindo-se como canal de

interlocução para a incorporação do conteúdo dos direitos

humanos na cultura institucional, e como aliado na distribuição

horizontal do poder interno”29

Os Estados devem promover e assegurar a livre, significativa e ativa

participação de indivíduos e grupos na elaboração, implementação e monitoramento de políticas de

desenvolvimento. Neste contexto, os princípios da participação e da accountability 30são centrais

ao direito ao desenvolvimento.

29 O Seminário foi realizado nos dias 8 e 9 de Maio de 2013 em Brasília, com objetivo de apontar elementos

indispensáveis para a democratização da justiça. O documento foi elaborado pelas entidades integrantes da JusDh –

Articulação Justiça e Direitos Humanos, com movimentos e organizações de direitos humanos parceiras.

Disponível em http://www.jusdh.org.br/2013/07/22/carta-do-ii-seminario-da-jusdh-o-potencial-democratico-dos-

direitos-humanos-para-a-politica-publica-de-justica/ último acesso em 16.12.15. 30 De acordo com Antônio Semeraro Rito Cardoso, Fernando Cardoso Lima Neto e Elton Luiz da Costa Alcântara,

“Uma condição importante para avaliar o grau de autonomia destas instituições diz respeito ao modo como elas

incorporam práticas de accountability em suas ações. A noção de accountability está ligada fundamentalmente à

cidadania ativa, envolvendo tanto a responsabilização dos gestores quanto a participação da sociedade na

democratização das instituições. No âmbito das ouvidorias públicas, a questão da accountability diz respeito às

práticas de controle social que assegurem um canal eficiente de interação entre a sociedade e a gestão

governamental, como legislação democrática, facilidade de acesso para a população, tramitação transparente e

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28

Como explica Amartya Sen, “as liberdades políticas e os direitos

democráticos são componentes estruturais do desenvolvimento. (...) Democracia requer

participação política, diálogo e interação pública, conferindo o direito à voz aos grupos mais

vulneráveis”31.

A perspectiva de direitos endossa o componente da justiça social,

realçando a proteção dos direitos dos grupos mais vulneráveis e excluídos como um aspecto

central do direito ao desenvolvimento32.

Jaime Pinsky e Carla Bessanez Pinsky, tratando do tema, afirmam

que ser titular do direito à cidadania significa:

“(...) ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade

perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É também participar

do destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os

direitos civis e políticos não asseguram a democracia sem os

direitos sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo

na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário

justo, à saúde, a uma velhice tranquila. Exercer a cidadania plena

é ter direitos civis, políticos e sociais33”.

Da análise dessa concepção se verifica que a cidadania é elemento

indispensável para que os homens se tornem de fato titulares de direitos.

Assim, considerando a historicidade dos direitos, destaca-se a

chamada concepção contemporânea de direitos humanos, que veio a ser introduzida pela

impessoal das manifestações, disponibilização de dados etc”. CARDOSO, LIMA NETO E ALCÂNTARA. Ouvidoria

Pública e Governança Democrática in Boletim de Análise Político Institucional do IPEA que trata da “Agenda

Política e Desafios Institucionais: questões centrais para 2013”. Disponível em

http://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/book_bapi%203.pdf último aceso em 04.12.2015. Isto porque, é

essencial que as Ouvidorias possam ter instrumentos para exercer com plenitude as funções atribuídas. Neste caso, a

Accountability pode ser considerada um exercício de poder pelo cidadão. 31. Amartya Sen, The Idea of Justice, Cambridge, Harvard University Press, 2009, p. 347. 32. Sobre o tema, ver Mary Robinson, What Rights can add to good development practice. In: Philip Alston e Mary Robinson (ed.), Human Rights and Development: towards mutual reinforcement, Oxford, Oxford University Press, 2005, p. 37. 33 PINSKY, Jaime, e PINSKY, Carla Bessanez (organizadores). História da Cidadania. São Paulo. Contexto. 2003. p. 9.

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29

Declaração Universal de 1948 e reiterada pela Declaração de Direitos Humanos de Viena de

1993.

Esse novo ponto de vista, aberto a princípios e valores, com ênfase

no valor da dignidade humana, devem permear os conceitos de cidadania que aqui ambiciona-se

analisar.

Nessa concepção, verifica-se que não apenas no plano global há

uma importância em valorizar a cidadania, como a nível constitucional.

A Constituição Federal de 1988, ao estabelecer a cidadania como

fundamento da República reforça o caráter democrático do Estado Brasileiro. Nota-se ainda que a

cidadania também é inserida na ordem social, como se vê no artigo 205 da Constituição Cidadã

de 1988, in verbis:

“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da

família, será promovida e incentivada com a colaboração da

sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu

preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o

trabalho”.

Observa-se assim que a Constituição Federal assegura o direito

à educação como fomentador do próprio exercício de cidadania e de integração da pessoa em

sociedade.

Nessa seara verifica-se o importante trabalho da Defensoria

Pública por meio da educação em direitos, como instrumento que visa dar empoderamento as

pessoas, para que exerça um papel ativo na luta pela efetivação dos direitos, assumindo uma

postura crítica e participativa.

É evidente que em uma sociedade democrática as pessoas devem

participar ativamente das decisões. De modo que tal participação, não esteja apenas a

possibilidade de escolher os seus representantes (votar e ser votado).

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Assim é que a efetividade da cidadania, em conjunto com a

soberania popular e a dignidade da pessoa humana são essenciais para a construção de uma

sociedade livre, justa e solidária.

Nos dizeres de Gisele Cittadino:

“Uma cidadania ativa não pode, portanto, supor a ausência de

uma vinculação normativa entre o Estado de Direito e democracia.

Ao contrário, quando os cidadãos veem a si próprios não apenas

como os destinatários, mas também como os autores do seu direito,

eles se reconhecem como membros livres e iguais de uma

comunidade jurídica”34

A implementação da cidadania, portanto, através da atuação da

Defensoria Pública é medida essencial e constitucionalmente prevista no Estado Democrático de

Direito.

Aliás, a Defensoria Pública tem contribuído para a consolidação da

democracia e participação popular vez que atua em parceria com os movimentos sociais e

lideranças comunitárias, buscando por um atuar inclusivo e integrado.

Veremos ao longo de todo esse estudo, portanto, as diferentes

formas de contribuição da Defensoria Pública para a efetivação da cidadania e a participação

democrática de todas as pessoas, nela incluída parcela da sociedade marginalmente excluída.

34 CITTADINO, Gisele. Poder Judiciário, Ativismo Judicial e Democracia. Revista da Faculdade de Direito de Campos, 2004, p. 110.

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31

2. A DEFENSORIA PÚBLICA

Neste capítulo iremos analisar a Defensoria Pública, nele

compreendido os diferentes processos de criação da instituição, o papel constitucional, bem como

o modelo de assistência jurídica, integral e gratuita, criada com o advento da Constituição Federal

de1988.

Conforme refere Carlos Weis:

“Essa mudança do “adjetivo qualificador da ‘assistência ‘

reforçada pelo acréscimo ‘integral’, importa notável aplicação do

universo que ser quer cobrir. Os necessitados fazem jus agora à

dispensa de pagamentos e à prestação de serviços não apenas na

esfera judicial, mas em todo o campo dos atos jurídicos. Incluem-se

também na franquia: a instauração e movimentação de processos

administrativos, perante quaisquer órgãos públicos, em todos os

níveis; os atos notariais e quaisquer outros de natureza jurídica,

praticados extrajudicialmente; a prestação de serviços de

consultoria, ou seja, de informação e aconselhamento em assuntos

jurídicos”35

Também no entendimento de Cappelletti e Garth:

“a assistência jurídica significa mais do que a simples

representação perante os tribunais. Ela implica auxilio para tornar

as pessoas mais ativamente participantes das decisões básicas,

tanto governamentais quanto particulares, que afetam suas

vidas”36

Assim, a fim de fazer um traço evolutivo da Defensoria Pública e

das funções por ela realizadas, partiremos da análise das Constituições Federais anteriores a 1988

e os precedentes históricos da criação e fortalecimento da assistência jurídica no Brasil.

35 MOREIRA, Jose Carlos Barbosa. O direito à assistência jurídica : evolução no ordenamento brasileiro de nosso

tempo. São Paulo: Saraiva, 1994, p.59. 36 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002, p.143.

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Passo seguinte, analisaremos a autonomia e independência da

Defensoria Pública, com as alterações introduzidas na Constituição Federal.

2.1. Breve Histórico da Defensoria Pública no Brasil

Os precedentes históricos da assistência jurídica remetem-se ao

período das Ordenações, outorgadas em 1603. Nesse ordenamento foram previstas isenções para

os que comprovassem estado de pobreza, bem como para as hipóteses de nomeação de curador

para menores e loucos.37

Em 1841, o Código Criminal do Império previu a isenção de custas

do processo para os miseráveis.38

No ano seguinte, a Câmara Municipal da Corte do Rio de Janeiro

criou os chamados “advogados dos pobres” que eram profissionais responsáveis pela defesa

criminal daqueles que não tinham condições de arcarem com as custas de uma defesa. Esses

cargos teriam sido extintos em 1884.39

A Constituição Federal de 1891 tangenciou o tema, porém não

tratou especificamente da assistência judiciária. De fato previu apenas a garantia da defesa aos

acusados, com todos os recursos e meios essenciais inerentes.40 A redação do artigo 72, § 16º

previa: “ aos acusados se assegurará na lei a mais plena defesa, com todos os recursos e meios

37 RIBAS, Luciana Marin. Acesso à Justiça para a população em situação de rua: um desafio para a Defensoria

Pública. Dissertação de mestrado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC/SP, 201, p.46. Sobre o

tema ler OLIVEIRA, Rogério Nunes de. Assistência Jurídica gratuita. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2006, p 1-4. 38 Artigo 99 “sendo o réo tão pobre, que não possa pagar as custas, perceberá o Escrivão a metade delas do Cofre

da Câmara Municipal da Cabeça do Termo, guardando o seu direito contra o réo quanto à outra metade” 39 RIBAS, Luciana Marin. Acesso à Justiça para a população em situação de rua: um desafio para a Defensoria

Pública. Dissertação de mestrado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC/SP, 2014, p.46. 40 “Artigo 179, §16: aos acusados se assegurará na lei a mais plena defesa, com todos os recursos e meios essenciais

a ela, desde a nota de culpa, entregue em 24 horas ao preso e assinada pela autoridade competente com os nomes do

acusados e da testemunha”

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essenciais a ela, desde a nota de culpa, entregue em 24 horas ao preso e assinada pela

autoridade competente com os nomes do acusador e das testemunhas”41

A primeira Constituição brasileira a conferir status constitucional à

assistência judiciária foi a Constituição de 1934. Amparada pelos movimentos sociais, a

Constituição passou a prever a possibilidade do cidadão obter gratuitamente o acesso à justiça,

sem ainda tratar da Defensoria Pública como instituição prevista para esse mister. Criou um dever

do Estado em prestar a assistência judiciária. Vejamos:

“Artigo 113- a Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros

residentes no Brasil a inviolabilidade dos direitos concernentes à

liberdade, á subsistência, à segurança individual e à propriedade,

nos termos seguintes (...) 32) a União e os Estados concederão aos

necessitados assistência judiciária, criando, para esse efeito,

órgãos especiais e assegurando a isenção de emolumentos, custas,

taxas e selos”42

Nas palavras de Cléber Francisco Alves:

“uma guinada histórica nesse movimento ocorreu em 1934, quando

foi promulgada uma nova constituição para o Brasil em cujo texto,

pioneiramente no mundo ocidental em patamar constitucional,

ficou estabelecido como dever constitucional da União e dos

Estados o de prestar assistência judiciária aos necessitados,

prevendo-se a criação de órgãos públicos que seriam

especificamente encarregados de prestar tal serviço. Assim, a

assistência judiciaria deixava de ser um ônus legalmente imposto à

41 MORAES, Ana Carvalho Ferreira Bueno, A defensoria Pública como instrumento de Acesso à Justiça,

Dissertação de Mestrado em Direito na PUC/SP, 2009, p.26 42 No julgamento da ADI 3965, a Ministra Carmem Lucia Antunes Rocha, traçou um breve retrospecto da

constitucionalização da Defensoria Pública no ordenamento jurídico pátrio. Sobre o tema escreve Robson Flores

Pinto “ Cedo já se percebia, que uma coisa é dispensar o hipossuficiente de determinados pagamentos - com o que

apenas se priva da correspondente receita a entidade à qual se teria de pagar; outra coisa, é proporcionar-lhe a

prestação de serviços realizados, sob condições normais, por terceiros, mediante remuneração- para o que podem

torna-se indispensáveis no plano da organização administrativa, e não haverá como evitar o aumento de despesas.

Embora o ideal seja conjuga-las, em princípio concebe-se que qualquer dessas duas ordens de medidas se veja

implementada independentemente de outra” (PINTO, Robson Flores. A assistência jurídica aos hipossuficientes.

Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC/SP, São Paulo, 1994, p.106-107)

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classe dos advogados, passando a ser reconhecida como obrigação

do poder público”43

A Constituição de 1937 foi omissa, mas tanto o Código de Processo

Civil de 1939 quanto o Código de Processo Penal de 1941 trataram da “justiça gratuita” e da

figura do “advogado dativo”, respectivamente.44

A Constituição de 1946, por sua vez, voltou a tratar do tema no

artigo 141, §35, com a condição de que o direito à assistência judiciária fosse garantido, na forma

da lei45, in verbis: “O poder público, na forma que a lei estabelecer46, concederá assistência

judiciaria aos necessitados47”

A regra repetiu-se na Constituição Federal de 1967, no artigo 150,

§32: “Será concedida assistência judiciaria aos necessitados na forma da lei”. No texto de 1969,

a mesma redação foi adotada pelo constituinte, no artigo 153, §32.48

Por fim, foi com a Constituição Federal de 1988 a qual foi

denominada “Constituição Cidadã” por Ulisses Guimarães em razão da grande participação

popular no processo de elaboração, o tema da assistência jurídica ganha nova ênfase e contornos,

sendo disciplinada em diversos dispositivos. 49

43 ALVES. Cléber Francisco. Justiça para todos!, assistência jurídica gratuita nos Estados Unidos, na França e no

Brasil. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2006, p.242.

44 REIS. Gustavo Augusto Soares dos.; ZVEIBIL. Daniel Guimarães; JUNQUEIRA Gustavo. Comentários à Lei da

Defensoria Pública. São Paulo:Saraiva, 2013, p. 21. 45 A Lei responsável por regulamentar esse dispositivo constitucional foi a Lei 1060/50 que continua em vigor até

hoje. Observa-se que ela se restringe a representação processual, eis que fala de assistência judiciária e não jurídica,

tal como a CF/88. O novo Código de Processo Civil, ( Lei Federal n.13105/15) revoga expressamente os artigos

2º,3º,4º,6º,7º,11,12 e 17 da Lei 1060/50, conforme artigo 1072 do novo diploma legal. 46 No entendimento de Pontes de Miranda, a expressão “ na forma que a lei estabelecer” tratava-se de uma norma

autoaplicável, eis que já existia o Código de Processo Civil de 1939 que versava sobre a assistência judiciária, in

verbis “ a regra é bastante em si, ‘self-executing’, a despeito da alusão’ à forma que a lei estabelecer’ há direito

subjetivo à assistência” MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários à Constituição de 1967: com a

emenda n. I, de 1969.2.ed.São Paulo: Revista dos Tribunais, 1971, Tomo V, p.641)

47 Vale ressaltar que a Lei de Assistência Judiciária ( Lei Federal 1060/50), tratava genericamente do tema. Hoje

esta lei é utilizada para a gratuidade da justiça. 48 ROCHA. Amélia Soares da. Defensoria Pública: fundamentos, organização e funcionamento. São Paulo: Atlas,

2013.p. 57 49 “Artigo 5º, inciso LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem

insuficiência de recursos.“, Artigo 134 (antes da nova redação conferida pela Emenda 80/2014) 49.- A Defensoria

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A Constituição Federal de 1988 determina que a assistência

jurídica- e não apenas judicial — integral e gratuita a ser prestada pelo Estado aos que

comprovarem insuficiência de recursos fosse incluída no rol dos direitos e garantias

fundamentais.50

Fica claro a opção do constituinte por um modelo público de

assistência jurídica prestado pela Defensoria Pública. De fato, a Defensoria Pública tem a missão

constitucional de zelar pelos direitos dos excluídos, de parcela da população marginalmente

excluída, eis que direitos não podem ser confundidos com favores ou caráter meramente

assistencial.51

Trata-se da construção de uma nova era, da concretização da

cidadania e da participação efetiva das pessoas no acesso dos direitos.

Assim, a Defensoria Pública busca promover o empoderamento da

população, pois visa dar vozes aos excluídos, exercitando de maneira consciente a cidadania.

No mais, insta mencionar que a Constituição Federal de 1988

incumbiu apenas a União, Estados e Distrito Federal para prestar assistência jurídica integral e

gratuita, de modo que constitucionalmente esta prestação não deve ser feita pelos municípios.

Pública é instituição essencial à função jurisidicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em

todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º , LXXIV” 50 Conforme apontado na Dissertação de Mestrado de Ana Carvalho Ferreira Bueno Morais: “Assim, foi esse

diploma (a Constituição de 1988) que rompeu bruscamente com os artigos paradigmas, alterando de forma

substancial a questão da assistência aos hipossuficientes econômicos. Primeiro, por ter previsto tal instituto

expressamente como direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem

insuficiência de recursos (art. 5º, inciso LXXIV). Note-se que nas constituições passadas apenas previa-se a

assistência judiciária, não a assistência jurídica. Ademais, o texto atual utiliza a expressão “integral”, que possui

reflexos importantes(..) Segundo, por delegar tal função exclusivamente às Defensorias Públicas conforme pode ser

visto no caput do artigo 134 da CF” (MORAES, Ana Carvalho Ferreira Bueno, A Defensoria Pública como

instrumento de Acesso à Justiça, Dissertação de Mestrado em Direito na PUC/SP, 2009, p. 32). 51 Antes da Constituição Federal de 1988, a prestação do serviço poderia ser realizada pelo sistema judicare, misto

ou público. Ainda que o modelo público não tivesse sido realizado por alguns entes federativos (ex. Santa

Catarina,São Paulo), o Supremo Tribunal Federal decidiu em diversos julgados o modelo público de assistência

jurídica, declarando a inconstitucionalidade de outros sistemas. Vide. HC 70514-RS, RE 135328-7-SP, ADI 4163

(que restou conhecida como ADPF) e a ADI 4270.

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Desta forma, a Defensoria Pública surge como um instrumento

necessário para a efetivação dos direitos e não como uma mera vontade deliberada do Estado.52

Com a Emenda Constitucional n.º 45/2004, também denominada

Reforma do Judiciário, a Defensoria Pública Estadual passou a contar com independência

funcional, autonomia administrativa e iniciativa de proposta orçamentária (dentro dos limites

previstos na lei orçamentária e no disposto no artigo 99, §2º).

A referida emenda conferiu uma nova roupagem a Defensoria

Pública Estadual, eis que agora com autonomia, deu um passo importante de rompimento com a

estrutura do Estado e para a construção de uma instituição forte e independente.53

Nota-se que a autonomia das Defensorias Públicas da União, do

Distrito Federal e de Territórios, foi reconhecida apenas com advento da Emenda Constitucional

69/2012 e a Emenda Constitucional 74/2013 que acrescentou o §3º ao artigo 134 da CF/88

“aplica-se o disposto no §2º às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal”.

A Emenda 45/2004 passou a reforçar o caráter democrático da

Defensoria Pública Estadual e a função de instrumento de democratização do acesso à justiça.54 É

nesse sentido que a Ministra Carmen Lúcia se manifestou no julgamento da ADI 3965 perante o

Supremo Tribunal Federal, in verbis:

“A emenda constitucional 45/2004 garantiu autonomia funcional e

administrativa das defensorias estaduais, porque consideradas um

52 É nesse contexto que o Supremo Tribunal Federal determinou como obrigatória a criação da Defensoria Pública

no Estado de Santa Catarina, conforme ADIs 3892/SC e 4270/SC. 53 Manual de Mediação para a Defensoria Pública. Brasília-DF. Fundação Universidade de Brasília/FUB 2014, p. 33. 54 De acordo com o Relatório da Reforma do Judiciário, organizado por Paulo César Carbonari, disponível em

http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/carbonari/carbonari_relatorio_reforma_do_judiciario.pdf, último acesso

em 14.12.15, a Democratização do Acesso à Justiça é indispensável para a consolidação do Estado Democrático de

Direito. Assim, importante que haja atuação articulada entre os órgãos do Sistema de Justiça, entidades da sociedade

civil, de ensino, pesquisa, para que de forma articulada e interdisciplinar se alcance melhorias no Sistema de Justiça.

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dos alicerces do Estado Democrático de Direito, não podendo, por

isso, subordinar-se a órgão específico do Poder Executivo”55

O Supremo Tribunal Federal manifestou-se ainda em favor da

autonomia da Defensoria Pública Estadual em diversos julgados:

ADI 416356- proposta pelo Ministério Público Federal, teve por

Relator o Ministro Cezar Peluso. No julgamento, qual seja, 29 de fevereiro de 2012, o Supremo

Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da obrigatoriedade do convênio com a

OAB/SP. Foi priorizado que o “valor da Defensoria Pública está ligado à importância da

efetivação dos direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros”. Além disso, o convênio é

extremamente oneroso para os cofres da Defensoria Pública e é uma forma paliativa de

atendimento, enquanto a Defensoria não estiver devidamente estruturada e aparelhada para

prestar exclusivamente a assistência jurídica integral e gratuita. Cumpre ainda mencionar que há

inconstitucionalidade formal, eis que as regras relacionadas a Defensoria Pública devem ser feitas

por meio de Lei Complementar, bem como material, eis que a autonomia da Defensoria Pública

foi violada ao se exigir a obrigatoriedade do convênio.

ADI 3569- Reconheceu a inconstitucionalidade de vinculação da

Defensoria à Secretaria de Estado (Relator Ministro Sepúlveda Pertence, j. 2.4.2007. No mesmo

sentido, RE 599.620- AgR, Rel. Ministro Eros Grau, j. 27.10.200, 2ª Turma, DJE, 20.11.2009)57

ADI 3965- oriunda de Minas Gerais, sob relatoria da Ministra

Carmen Lúcia Antunes Rocha, que questionava normas do Estado de Minas Gerais (Leis

Delegadas Estaduais 112 e 117/2007) que subordinavam a Defensoria Pública ao Poder

Executivo Estadual. No voto a Ministra afirmou “a Defensoria Pública, qualificando-a como

instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a

55 Íntegra do acórdão disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1871030

último acesso em 16.12.2015. 56 Convertida em ADPF pelo relator já que os dispositivos impugnados ( artigo 109 da Constituição Estadual

Bandeirante e artigo 234 da Lei Orgânica Estadual da Defensoria Pública) são anteriores a Emenda 45/2004. 57 Íntegra do acórdão disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=452004

último acesso em 16.12.2015.

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defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do artigo 5º, LXXIV (artigo 134, caput, da

Constituição da República) constitucionalizou-se também a carreira do Defensor Público”.58

ADI 4056- de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski, que no

trecho do voto afirmou que a Emenda 45/2004 “buscou incrementar a capacidade de

autogoverno da Defensoria Pública, assegurando-lhe, ao lado da autonomia funcional e

administrativa, a financeira, conforme decorre de menções expressas feitas pelo texto magno à

iniciativa para elaboração de sua proposta orçamentaria”.59

Vale destacar ainda que tramita60 perante o Supremo Tribunal

Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADI 5296, ajuizada pela Presidente da República

contra a Emenda Constitucional n.º 74/2013, que estendeu às Defensorias Públicas da União e do

Distrito Federal autonomia funcional e administrativa conferida às Defensorias Públicas estaduais

na emenda à Constituição n.º 45/2004.61

Importante constatar que a autonomia assegurada as Defensorias

Pública representa uma conquista social, eis que possibilitou melhoras na prestação do serviço,

especialmente no que se refere a possibilidade de postular direitos em face do Estado. Logo, a

restrição ou o afastamento da autonomia, implicariam em retrocesso de direitos consolidados, em

desfavor de pessoas vulneráveis, o que não poderia ser admitido. 62

58 Íntegra do acórdão disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1871030

último acesso em 16.12.2015. 59 Íntegra do acórdão disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=2455183

último acesso em 16.12.2015. 60 Em 22 de Outubro de 2015, em razão de pedido de vista do Ministro Dias Toffoli foi suspenso o julgamento da

medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade, n.º 5296. Até o momento (Dezembro/15), foram proferidos

6 votos pelo indeferimento da cautelar (Os Ministros Teori Zavascki, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Luiz

Roberto Barroso e Edson Fachin e pelo deferimento (Gilmar Mendes e Marco Aurélio). Informações extraídas do

site oficial do Supremo Tribunal Federal. último acesso em 05.12.2015. Disponível na íntegra em

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=302393 61 Em 13 de abril de 2015, o Colégio Nacional de Defensores Públicos Gerais- CONDEGE e a Associação Nacional

dos Defensores Públicos- ANADEP manifestaram repúdio a propositura da ADI 5296, no sentido de que esta medida

caracterizaria um retrocesso ao Estado Democrático de Direito, uma vez que a autonomia e independência são

indispensáveis não apenas para as carreiras da Magistratura e do Ministério Público como também para as

Defensorias Públicas que zelam pela defesa dos vulneráveis. A íntegra da nota de repúdio está disponível em

https://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?id=22343 último acesso em 05.12.2015. 62 No ano de 2015, a Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP), elaborou uma carta aberta de

chamamento dos movimentos sociais para defesa da autonomia da Defensoria Pública, sob o título, "Por que a

Defensoria Pública precisa se manter autônoma?". A mobilização teve como objetivo aproximar os movimentos

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No âmbito constitucional, a Defensoria Pública sofreu diversas

alterações com o advento da Emenda Constitucional 80/14,63 conhecida no âmbito jurídico como

PEC das Comarcas64, “PEC das Defensorias” ou “PEC Defensoria para todos”.65 Esta emenda

acrescentou o artigo 98 e §§ ao ADCT estabelecendo, entre outras regras, que o número de

Defensores Públicos, na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda pelo serviço

da Defensoria Pública e à respectiva população.

A Emenda Constitucional n.º 80/14 reafirma a importância da

Defensoria Pública e prevê seção própria a instituição (Seção IV), no Capítulo IV do Título IV

da Constituição Federal de 1988, qual seja “Das funções essenciais à Justiça”, constitucionalizou

o artigo 1º da Lei Complementar 80/94, já com a alteração introduzida pela Lei Complementar

132/09, bem como os princípios da unidade, indivisibilidade e independência funcional, como

estabeleceu uma proporção de defensores públicos comparado à efetiva demanda e a respectiva

população. 66 Por fim, fixou um prazo legal de 8 anos, para que a União, Distrito Federal e

Estados tenham defensores públicos em todas as comarcas.67

sociais e destacar para a sociedade a importância da autonomia da Defensoria Pública para o acesso à Justiça, a

ampliação dos serviços oferecidos pela Instituição, a defesa dos direitos sociais e à cidadania. Até,Dezembro de

2015, a carta contava com mais de 170 assinaturas de apoiadores. Íntegra disponível em

https://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/25445/Por_que_a_Defensoria_P_blica_precisa_se_manter_aut_no

ma.pdf último acesso em 05.12.2015. 63 Após aprovação da PEC na Câmara dos Deputados (n.247/2013) e no Senado Federal ( n.4/2014). Disponível em 64 Diante da PEC das Comarcas que culminou no advento da Emenda à Constituição 80/14, podemos defender o

reconhecimento da Defensoria Pública como direito subjetivo capaz de obrigar o Estado a garantir o serviço. Nota-se

que este era o entendimento sustentado por Ana Paula de Barcellos que defendia ser plenamente possível que o

judiciário , por intermédio de uma ação coletiva fixasse prazo para que o Poder Público praticasse os atos necessários

para a estruturação e aparelhamento da instituição, sob pena de responsabilidade do agente por descumprimento da

decisão judicial. Nessa linha BARCELOS, Ana Paula de. A Eficácia Jurídica dos Princípios Constitucionais: o

princípio da Dignidade da Pessoa Humana.2.ed. Rio de Janeiro/São Paulo/Recife: Renovar 2008, p.325-331. 65Íntegra disponível em http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/20799/Opini_o_Legal_EC_80_2014_-

_final_.pdf , último acesso em 20.06.2015. 66 A alteração provocada no artigo 134, §4º da Constituição Federal, in verbis: “Art. 134. A Defensoria Pública é

instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento

do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em

todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos

necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal. (Redação dada pela Emenda

Constitucional nº 80, de 2014)§ 4º São princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, a indivisibilidade

e a independência funcional, aplicando-se também, no que couber, o disposto no art. 93 e no inciso II do art. 96

desta Constituição Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014)”. O caráter permanente

impressa a necessidade de atuação continuada, independente de disposição meramente circunstancial de um governo,

eis que reconhecida como instituição essencial ao regime democrático. 67 http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/20799/Opini_o_Legal_EC_80_2014_-_final_.pdf

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Assim, a Defensoria Pública deixou de ser de ser uma instituição

essencial a justiça para se transformar numa instituição essencial ao regime democrático.68

2.2. Previsões Legislativas

A Lei Complementar n.º 80/94, foi a primeira Lei Orgânica

Nacional da história da Defensoria Pública do Brasil. Dentre diversos aspectos relevantes ela teve

o condão de estabelecer um rol exemplificativo de atribuições institucionais com o viés de

assegurar e efetivar a assistência jurídica, integral e gratuita, constitucionalmente prevista na

CF/88.

Como esta lei sofreu alteração em 2009, com o advento da Lei

Complementar n.o 132/09, passaremos a analisá-la com as inovações, dando ênfase aos

mecanismos de controle e participação social na gestão da Defensoria Pública.

No plano legislativo, a Defensoria Pública também vem tendo as

atribuições institucionais reconhecidas:

Lei 11.448/2007-69 Passou a prever expressamente no artigo 5º,

inciso II, da Lei de Ação Civil Pública, a legitimidade da Defensoria Pública para propor ação

coletiva.70 Nota-se que o processo coletivo é importante instrumento na tutela coletiva sendo

68 Atualmente o que as Defensorias Públicas buscam é a compatibilização das Legislações locais à Constituição

Federal de 1988 e as alterações introduzidas pela Emenda Complementar 80/2014. Nota-se que Rondônia e Distrito

Federal foram as primeiras defensorias a encaminharem projeto de lei à Assembleia Legislativa propondo a devida

adequação. No Estado de São Paulo, o ano de 2015 foi marcado por diversas articulações entre a APADEP,

Administração e Sociedade Civil para elaboração do projeto de lei, porém estudos apontam que o projeto deve ser

encaminhado até o final de 2015.

69 Em que pese a Defensoria Pública ter sido constitucionalmente incumbida de exercer a assistência jurídica integral

e gratuita da população carente, podendo, a priori, manejar todo e qualquer instrumento necessário para a

concretização da missão constitucional, a legitimidade da Defensoria Pública para propor ação coletiva foi

questionada no Supremo Tribunal Federal, nos autos da ADI 3943. 70 Esse dispositivo teve a constitucionalidade questionada pela ADI 3943, proposta pela Confederação Nacional dos

Membros do Ministério Público (CONAMP). Em 7 de Maio de 2015, o STF reconheceu a legitimidade da

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imprescindível a atuação da Defensoria Pública. A importância é tamanha que a instituição

elaborou o I Relatório Nacional de Atuações Coletivas da Defensoria Pública. 71

Lei 11449/2007- Alterou o artigo 306 do Código de Processo Penal,

passando a prever expressamente, no Código de Processo Penal de 1940 a expressão Defensoria

Pública. Ficou estabelecido que a Defensoria Pública deveria receber a cópia do auto de prisão

em flagrante, em não havendo advogado constituído.

Lei nº 11.737, de 2008 72– Introduziu no Estatuto do Idoso a

possibilidade da Defensoria Pública referendar acordos de alimentos, com natureza de título

executivo. Tais técnicas de solução de conflito (mediação, conciliação, etc.) com atuação efetiva

da Defensoria Pública, visam solucionar um dos obstáculos do acesso à justiça desenhado por

Mauro Cappelletti e Bryant Garth no Relatório ao Projeto de Florença73.

Artigo 585, inciso II, do CPC74- Introduziu no Código de Processo

Civil como título executivo o acordo extrajudicial realizado perante a Defensoria Pública do

Estado.75 Esta inovação além de evitar o assoberbamento do Judiciário assegura a efetividade da

justiça, eis que as partes poderão de forma mais célere e efetiva aquilo que pretendiam obter ao

final de um longo processo. Tal alteração deu concretude aos princípios constitucionais e

Defensoria Pública para propor Ação Civil Pública. Conforme:

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=291085, último acesso em 28.08.15. 71 O Núcleo Especializado de Habitação e Urbanismo da Defensoria Pública de São Paulo, buscou garantir, por meio

de processos coletivos, a participação popular na construção de políticas públicas estaduais, em especial da ausência

de propostas apresentadas e aprovados pelo Conselho Gestor de ZEIS. 72 Art. 13. As transações relativas a alimentos poderão ser celebradas perante o Promotor de Justiça ou Defensor

Público, que as referendará, e passarão a ter efeito de título executivo extrajudicial nos termos da lei processual

civil. (Redação dada pela Lei nº 11.737, de 2008) 73 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002. 74 Art. 585 do CPC- São títulos executivos extrajudiciais:I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a

debênture e o cheque;II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento

particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo

Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores;. 75 Observa-se, todavia, que a Defensoria Pública deve buscar sempre a melhor alternativa ao usuário do serviço, de

modo que se o acordo não lhe for favorável o mesmo não deve ser formalizado, eis que inconcebível que uma

instituição publicada, voltada a defesa de hipossuficientes, aja contrariamente a missão constitucional.

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cumprimento ao II Pacto Republicano- Por uma Justiça mais Ágil, Célere e Efetiva elaborado

pela Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça.76

2.3. Criação e consolidação da Defensoria Pública: Heterogeneidade nos processos de

criação da Defensoria Pública nos Estados da Federação Brasileira

A criação e a consolidação da Defensoria Pública não ocorreu de

forma harmônica ou homogênea. Dotada de heterogeneidade, seja por determinação do Supremo

Tribunal Federal, seja por movimentos sociais e papel atuante da sociedade civil ou ainda de

transmutação de um serviço de assistência judiciária para uma assistência jurídica, integral e

gratuita, a Defensoria Pública ganha espaço no cenário brasileiro, sendo reconhecida socialmente.

Vejamos:

A primeira a ser criada foi a Defensoria Pública do Estado do Rio

de Janeiro, em meados de 1950,77 seguida pela Defensoria pública de Minas Gerais, do Mato

Grosso do Sul, do Pará e da Bahia.78

76 O II Pacto Republicano “Pacto de Estado em Favor de um Judiciáro mais Rápido e Republicano”, por uma Justiça

mais célere e efetiva relatou o descompasso existente entre os quadros da Defensoria Pública em relação às

necessidades da sociedade atual que é extremamente desigual e empobrecida. O próprio pacto observou que a

ausência de defensores públicos suficientes constitui embaraço ao acesso real à justiça. No mais, firmaram o

compromisso de criar meios capazes de garantir o acesso universa à justiça, especialmente aos maios necessitados.

http://www2.stf.jus.br/portalStfInternacional/cms/verConteudo.php?sigla=portalStfDestaque_pt_br&idConteudo=1

73547 Acesso em 2.12.2014. 77 De acordo com o Boletim da Defensoria Pública de Julho de 1985 os primeiros cargos de Defensor Público

criados no estado do Rio de Janeiro datam de 1950. Além disso, apenas em 8.12.1962, a Lei Complementar n. 6 de

12.05.77, dispôs sobre a organização da assistência judiciária do Rio de Janeiro. Maiores detalhes em RIBAS,

Luciana Marin. Acesso à Justiça para a população em situação de rua: um desafio para a Defensoria Pública.

Dissertação de mestrado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- PUC/SP, 2014, p.51. Além disso, nos

dizeres de Marco Aurélio Ruediger, Vicente Riccio e Luiz Eduardo Motta “A Defensoria Pública do antigo Estado

do Rio de Janeiro foi criada durante o governo Amaral Peixoto (1951/1955) pela lei n° 2.188 de 21 de julho de 1954,

e estabelecia os primeiros cargos de Defensor Público, que constituíram a semente da atual Defensoria Pública.(...) A

formação da Defensoria Pública não foi redutível ao plano da racionalidade legal, motivada pela lei 1.060/50, mas

pautada por outros condicionantes como voluntarismo caritativo e relações políticas e pessoais de âmbito local, que

embora sejam elementos exógenos, foram fundamentais na criação dessa instituição.” RUEDIGER, Marco Aurélio;

RICCIO, Vicente; MOTTA, Luiz Eduardo. Da caridade ao provimento institucional da justiça: o caso da Defensoria

Pública do Rio de Janeiro. Disponível em

http://www.anpad.org.br/diversos/trabalhos/EnANPAD/enanpad_2005/APS/2005_APSA626.pdf p. 125. Assim, a

Defensoria Pública do Rio de Janeiro consta com 61 anos de existência, conforme informação extraída do III

Diagnóstico de Defensorias Pública no Brasil, disponível em

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43

No Distrito Federal a Defensoria Pública só veio a ser criada em

2012, pós emenda constitucional 69/2012. Até então, havia um “Centro de Assistência

Judiciária”, denominado CEAJUR (Lei Complementar 828/10).

Em Santa Catarina, por sua vez, a Defensoria Pública só foi criada

após determinação do Supremo Tribunal Federal, eis que era prestada através de convênio com a

OAB-SC, em total descumprimento a Constituição Federal, que pregava um modelo público de

assistência jurídica.

No Paraná, o primeiro concurso para ingresso na carreira de

Defensor Público ocorreu apenas em 2012. Porém, a legislação estadual é bastante avançada,

coerente com as normativas nacionais e internacionais, por exemplo: prevê a nomeação do

Defensor Público Geral mais votado pela carreira, não cabendo ao Poder Executivo (governador),

órgão externo à instituição a decidir pela lista tríplice encaminhada ao governo do estado.79

Importante ainda observar que a criação da Defensoria Pública no

Paraná, que culminou com a edição da Lei Complementar Estadual nº 136/2011 (Lei Orgânica da

Defensoria Pública do Estado do Paraná), assim como a Defensoria Pública Bandeirante, contou

com grande participação popular para a sua criação e pressão política. No caso do Paraná, a

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf, último acesso em 10.11.15.

78http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAbl

ica%20no%20Brasil.pdf último acesso em 10.11.2015.

79 Cumpre observar que de acordo com o III Diagnóstico das Defensorias Públicas no Brasil, a escolha do Defensor

Público-geral a partir de uma lista tríplice obtida através de eleição realizada entre os integrantes da carreira continua

sendo majoritária, no entanto em número menor que o observado no Diagnóstico anterior. Os estados em que o

Defensor Público-geral é escolhido dentre os integrantes de lista tríplice são: alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão,

Minas gerais, Mato grosso, Mato grosso do Sul, Pará, Pernambuco, rio de Janeiro, Rondônia, Roraima, rio grande do

sul, são Paulo e Tocantins. Em comparação com o diagnóstico anterior, o estado do Alagoas agora integra este

grupo, no entanto, no estado da Paraíba que antes fazia parte deste grupo, agora a nomeação é livre pelo governador

do estado entre integrantes da carreira. Observa-se que a proporção de Unidades da federação cujo Defensor Público-

geral é nomeado pelo governador do estado a partir de uma lista tríplice aumentou significativamente, sendo que o

percentual que em 2003 e 2005 estava em torno de 36%, agora é de 57,69%. Dados extraídos do

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf último acesso em 10.11.2015. Além disso, o Colégio de Ouvidorias de Defensorias Pública

do Brasil realizou um estudo dos diferentes critérios para formação de listas tríplices e escolha dos ouvidores nas

Defensorias Pública, maiores informações disponíveis no site oficial da Defensoria pública do Estado de São Paulo:

,http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2012.06.12_EscolhaOuvidor_TabelaComparati

vaColegioOuvidorias.pdf, último acesso em 05.12.15.

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pressão popular foi fundamental para sua criação, a exemplo da nota pública intitulada “Criação

da Defensoria Pública: direito da sociedade paranaense, obrigação dos deputados estaduais”.80

Em 06 de Maio de 2014, por decisão do Superior Tribunal de

Justiça81, o Estado do Amapá foi obrigado a abrir concurso para o cargo de Defensor Público

estadual.

Em que pese a Constituição Federal de 1988 ter eleito o modelo

público de assistência jurídica, o Estado do Amapá tinha criado a Defensoria Pública, mas não

realizou concurso público, pois os Defensores eram livremente nomeados pelo governador.82

Nota-se que a decisão do Superior Tribunal de Justiça coaduna-se

com a Emenda à Constituição (PEC 247/13), aprovada em 12 de março de 2014, na Câmara dos

Deputados, que determina que todos os Estados tenham um quadro próprio de defensores

públicos.

Por fim, no Estado de São Paulo, o processo de criação da

Defensoria Pública partiu de movimentos sociais e da sociedade civil que, juntamente com um 80 Observa-se que o documento foi assinado, dentre outros grupos sociais: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem

Terra – MST, União de Negros e Negras Pelo Igualdade – UNEGRO/PARANÁ, Centro Brasileiro de Solidariedade

aos Povos e Luta pela Paz – CEBRAPAZ/PR, Sindicato dos Trabalhadores em Urbanização do Estado do Paraná –

SINDIURBANO/PR, Federação dos Trabalhadores em Urbanização dos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e

Mato Grosso do Sul – FSU/CUT, CPT – Comissão Pastoral da Terra, Sindicato dos Trabalhadores em Educação

Pública do Estado do Paraná – APP/Sindicato, Coordenação dos Movimentos Sociais – CMS, Associação

Paranaense da Parada da Diversidade – APPAD, União Brasileira de Mulheres, Federação dos Trabalhadores em

Urbanização dos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul – FSU/CUT Sindicato dos Jornalistas

Profissionais do Paraná – Sindijor- PR, Movimento Nacional da População de Rua (PR), Ação dos Cristãos para a

Abolição da Tortura – ACAT/Brasil, Rede Puxirão dos Povos e Comunidades Tradicionais, Centro de Pesquisa e

Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, Tribunal Popular: o estado brasileiro no banco dos réus. Sociedade se mobiliza

pela criação da Defensoria Pública no Paraná. Data da publicação: 10 nov. 2010. Disponível em

<http://terradedireitos.org.br/biblioteca/sociedade-se-mobiliza-pela-criacao-da-defensoria-publica-no-parana/>.,

último acesso em 17.11.2015. 81STJ, RMS 44065/AP, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 2013/0350879-2, Min. Ari Pargendler, 1ª

Turma, j.06.05.2014, DJE 13.05.2014. “ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DEFENSOR PÚBLICO.

Defensoria Pública do Estado do Amapá que desenvolve suas atribuições mediante terceirização, sem que os cargos

de defensor público tenham até hoje, decorridos vinte anos desde sua criação, sido providos. Omissão manifesta da

autoridade impetrada, que constitui ilegalidade flagrante porque a contratação, sem processo seletivo, de

advogados para exercerem as funções do cargo de defensor público implica a terceirização de serviços que, por lei,

constituem funções próprias do cargo de defensor público. Recurso ordinário provido”. Disponível a íntegra em

http://www.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp?newsession=yes&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&livre=amapa

+e+defensoria. Último acesso em 24.03.2015. 82 A nomeação por livre escolha do governador é temerária, eis que a Defensoria Pública como ajuizar ações contra o

Poderm Público, o que afronta a autonomia da instituição e dificulta a prestação de uma assistência jurídica integral,

nos moldes da Constituição Federal de 1988.

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grupo de Procuradores do Estado que integravam a antiga PAJ (Procuradoria de Assistência

Judiciária), clamavam por uma instituição democrática, autônoma, descentralizada e transparente.

O Manifesto pela Criação da Defensoria Pública Paulista tinha o

seguinte conteúdo:

“A Defensoria Pública que queremos em São Paulo, deve ser uma

instituição inovadora. Para tanto, deve ser democrática, autônoma,

descentralizada e transparente. Seus profissionais devem prestar

serviço exclusivamente aos cidadãos, não ao governo e, ter

compromisso com a proteção e promoção dos direitos humanos”83

Importante frisar que para a criação da Defensoria Pública no

Estado de São Paulo houve muita luta popular, participação de movimentos sociais e de

instituições da sociedade civil, havendo o Movimento Pela Defensoria Pública, conforme resume

Luciana Zaffalon:

“A sociedade politicamente organizada, através do Movimento

Pela Defensoria Pública, composto por mais de 400 representantes

de entidades e movimentos sociais, desempenhou importante papel

no cenário da criação deste novo órgão, essencial à efetivação do

Estado Democrático de Direito. (...). Capitaneado inicialmente pelo

Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana

(CONDEPE) e pela Comissão Teotônio Vilela de Direitos

Humanos (CTV), teve início o Movimento pela Defensoria, que

passou a empreender debates e promover a articulação de um

número cada vez maior de entidades politicamente organizadas e

movimentos sociais, que aderiram ao Movimento tanto no âmbito

dos debates quanto através da subscrição do “Manifesto pela

Criação da Defensoria Pública em São Paulo”84

83 Disponível em http://www.consciencia.net/2005/1216-sp-defensoria.html. último acesso em 15.12.2015. 84 CARDOSO, Luciana Zaffalon Leme, (2010): Participação Social: Inovações democráticas no caso da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Dissertação apresentada à Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. São Paulo disponível em http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/5233/62080100003.pdf.txt?sequence=2 último acesso em 18.11.15.

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46

Nota-se que o processo de elaboração da instituição foi tardio,

quase 18 anos após o advento da Constituição Federal de 1988. 85

A Média de idade das Defensorias públicas é de 16,73 anos, sendo

que metade das Defensorias Públicas tem menos de 15 anos de instalação, conforme dados

fornecidos pelo III Diagnóstico de Defensorias Públicas no Brasil.

A legislação bandeirante trouxe inovações democráticas

importantes, tais como a existência de um órgão superior externo denominado Ouvidoria-Geral

(muito antes da previsão contida na Lei Federal 132/09), um plano de atuação fundado em pré-

conferenciais regionais e na Conferência Estadual, bem como a presença do Momento Aberto nas

sessões do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado, que concretiza-se desde o mês de

Junho de 2006.

O modelo de assistência jurídica previsto pela Lei Complementar

acima é muito mais democrático e participativo, pois a sociedade civil atua cotidianamente nos

rumos da instituição.

A atuação do CONDEGE – Colégio de Defensores Públicos Gerais

e da ANADEP- Associação Nacional dos Defensores Públicos tem sido extremamente

fundamental para que a Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública seja cumprida, em especial

na construção e consolidação da Defensoria Pública nos Estados.

Analisamos a criação das últimas Defensorias Públicas no País e a

Defensoria Pública Bandeirante, que será analisada com mais atenção neste estudo.

85 Antes o atendimento era jurídico e realizado pela PAJ, órgão da Procuradoria do Estado, que, juntamente com o convênio da OAB prestava a assistência jurídica a população do estado. Porém, Em 14 de dezembro de 2005 o Projeto de Lei Complementar n° 18/2005, que cria a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, foi aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, sendo a Lei Complementar Estadual nº 988 de

2006, sancionada pelo Governador do Estado em 09 de janeiro de 2006.

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Notório apenas constatar que há ainda muitos cargos vagos de

Defensores Públicos no Brasil86, bem como ausência de defensores públicos em diversas

comarcas, tal como verificado na pesquisa realizada pela ANADEP e o Instituto de Pesquisa

Econômica Aplicada (IPEA) em 2013.87

No III Diagnóstico feito pela Associação Nacional dos Defensores

Públicos (ANADEP)88, o Poder Judiciário dos estados absorve 5,34% dos gastos totais, o

orçamento do Ministério Público 2,02% e a Defensoria Pública foi em média de 0,40% do total

de gastos pelas unidades da federação.89

Dados extraídos do Conselho Nacional de Justiça, denominado

“Justiça em Números”, vem produzindo e divulgando ao longo dos últimos anos relatórios

estatísticos anuais sobre o sistema judicial brasileiro apresenta o baixo investimento que é feito

no serviço de assistência jurídica. Os dados do Estado de São Paulo revelam que dos 4,4% dos

gastos na participação da justiça estadual paulista, apenas 0,01% corresponde ao serviço de

assistência.90

No tocante ao efetivo acesso à justiça, estudo realizado pelo IPEA e

pela ANADEP, em março de 2013, denominado “ Mapa da Defensoria Pública no Brasil”91,

86 Por exemplo, nos Estados do Paraná e Santa Catarina, diversos cargos não foram providos diante da alegação de

ausência de recursos financeiros pelo estado. No Paraná, o primeiro concurso foi realizado em Agosto de 2012, havia

uma expectativa para 197 vagas em todo o estado, porém apenas 95 pessoas foram aprovadas e destas apenas 76

foram nomeadas. Em Santa Catarina, por sua vez, o concurso ocorreu em novembro de 2012 e teve a nomeação de

apenas 45 defensores públicos. Tais informações foram extraídas de diversos fóruns de discussão na internet, sendo

destaque a notícia aqui utilizada, http://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2013/06/governo-do-parana-diz-que-nao-

pode-nomear-defensores-publicos-html, último acesso em 03.04.2015. 87 http://www.anadep.org.br/wtksite/mapa_da_defensoria_publica_no_brasil_impresso_.pdf 88 O III Diagnóstico teve como objetivo analisar os avanços e impacto das políticas públicas nas atividades

desempenhadas pela Defensoria Pública, o que diferem do primeiro diagnóstico voltado a estabelecer um retrato da

instituição e o II Diagnóstico que realizou um balanço dos avanços alcançados pela Defensoria Pública entre o

Primeiro Relatório (2004) e o Segundo (2006). Observa-se que na ocasião a Defensoria pública do Paraná participou

da colheita de dados, ainda que não tenha participado dos últimos diagnósticos. A Defensoria Pública de Santa

Catarina e Goiás, não participaram, pois a primeira ainda não tinha sido criada e a segunda, apesar de possuir lei

orgânica desde 2005, também não tinha implantado o serviço da Defensoria Pública. 89 Dados extraídos do 3º Diagnóstico das Defensorias Públicas do País, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%c3%b3stico%20Defensoria%20P%c3%bablica%

20no%20Brasil.pdf, último acesso em 24.03.2015. 90 Dados extraídos de http://cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacaoes/relatorio_jn2013.pdf, último acesso

em 14.02.2015. 91 Disponível em http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria último acesso em 03.04.2015.

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revelam que apenas 28% das 754 comarcas brasileiras são atendidas pela Defensoria Pública.

Ainda há mais de 1000 comarcas desprovidas de Defensoria Pública.92

2.3.1. A criação da Defensoria Pública no Estado de São Paulo

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo, criada em 09 de

Janeiro de 2006, a partir da Lei Complementar Estadual 988/0693, foi fruto de diversas

articulações com a sociedade civil organizada e movimentos sociais. O “movimento pela criação

da Defensoria Pública”94, movimento que se articulou em prol da aprovação de uma lei

transparente, ágil e atuou junto com diversos atores políticos.

Dentre as discussões que permearam o Projeto de Lei que criaria a

Defensoria Pública Bandeirante foram estabelecidas metas i) a prestação de forma

descentralizada de assistência jurídica integral, tanto no campo judicial como extrajudicial, com

adoção de políticas de prevenção e de solução alternativa de conflito, ii) a defesa dos interesses

difusos e coletivos, iii) o assessoramente jurídico por meio de núcleos especializados ( tivemos

núcleos criados, inclusive após a participação efetiva da sociedade civil e do pleito da

população), iv)prestação de atendimento interdisciplinar ( temos um Centro de Atendimento

92 Conforme Paulo Lemos “A Grosso modo, a Defensoria Pública seria o SUS do Sistema de Justiça. Porém,

diferente daquele, a Defensoria Pública não só enfrenta hoje (passados mais de 25 anos do advento da Constituição

Federal da República) o desafio de elevar a qualidade dos seus serviços e de se aproximar e interagir mais com a

sociedade civil, como ainda amarga esmagadora limitação geográfica, cobrindo apenas cerca de trinta por cento do

território brasileiro, tendo como parâmetro o total de comarcas existentes, segundo estudo realizado pela Associação

Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP) e também do Ministério da Justiça do Governo Federal. Portanto, os

serviços de assistência jurídica plena e gratuita ainda não são universais, coexistindo, lado a lado, quem tenha seus

direitos assegurados e quem tenha seus direitos fundamentais e essenciais para realização da vida negados. Há um

apartheid humanitário nessa questão. Um déficit de cidadania” LEMOS, Paulo. “ A Defensoria é de Quem?”.

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2014_02_21_Artigo_PauloLemos_ADefensoria

edequem.pdf último acesso em 06.12.2015 93 O artigo 24, inciso XIII, da Constituição Federal de 1988 prevê a competência concorrente da União, dos Estados e

do Distrito Federal legislar sobre assistência jurídica e Defensoria Pública. Assim, as normas gerais cabem a União e

aos Estados e Distrito Federal as questões específicas. A Lei orgânica Nacional da Defensoria Pública e a Lei

Complementar 80/94, com alterações significativas pela Lei Complementar 132/09. No âmbito estadual, a lei que

regulamenta a Defensoria Pública é a Lei Complementar 988/06. 94 O Comitê de Organização do Movimento pela Defensoria Pública contou com o Conselho Estadual de Defesa dos

Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE), Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos (CTV), Sindicato dos

Procuradores do Estado, das autarquias e das universidades públicas de Direito da USP, Centro Acadêmico XI de

Agosto da Faculdade de Direito da USP, Comitê Latino Americano e do Caribe par a Defesa dos Direitos da Mulher

(CLADEM-Brasil). http://www.apesp.org.br/publicacoes/j_procurador/procurador_19/perfil.htm último aceso em

3.4.2015.

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Multidisciplinar- CAM, com psicólogos e assistentes sociais) e v) promoção e difusão do

conhecimento sobre os direitos humanos e cidadania.95

Notório observar que o estado de São Paulo estava em déficit com o

acesso à justiça desde a Constituição Federal de 1988, eis que a criação da Defensoria ocorreu

apenas em 14 de Dezembro de 2005, quando a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo,

aprovou o Projeto de Lei Complementar n. 18/2005 que criou a Defensoria Pública do Estado de

São Paulo/SP. Este projeto, por sua vez, foi sancionado pelo governador do Estado em 9 de

Janeiro de 2006, promulgando-se a Lei Complementar Estadual n. 988/06.

No período compreendido entre os anos de 1935 até 1947, a

assistência jurídica era desempenhada por advogados assalariados e pagos pelo estado.

Posteriormente, com o Decreto Lei n. 17330/47 que criou a Procuradoria de Assistência

Judiciaria (PAJ), repartição não autônoma, vinculada à Procuradoria Geral do Estado que passou

a realizar a atividade.

Observa-se ainda, que a organização topográfica da Lei

Complementar n.º 988/06 prevê, no artigo 6º, os direitos dos usuários96 . Essa preferência,

demonstra a intenção do legislador em priorizar os direitos e interesses dos usuários da

Defensoria Pública.

Tal previsão legislativa demonstra uma mudança de visão do

serviço público que deve ser criado em prol dos beneficiários e não voltado apenas para o caráter

corporativista.

95 BRANDÃO, Juliana Ribeiro. Percepções sobre o acesso à justiça: olhares dos usuários da Defensoria Pública do

Estado de São Paulo. Dissertação de mestrado em Direitos Humanos da Faculdade de Direitos Da Universidade de

São Paulo, 2010, p.51-52. Além disso, na obra de RIBAS, Luciana Marin. Acesso à Justiça para a população em

situação de rua: um desafio para a Defensoria Pública. Dissertação de mestrado na Pontifícia Universidade Católica

de São Paulo- PUC/SP, 2014, p.72. 96 “Artigo 6° - São direitos das pessoas que buscam atendimento na Defensoria Pública: I - a informação; II - a

qualidade na execução das funções; III - a participação na definição das diretrizes institucionais da Defensoria

Pública e no acompanhamento da fiscalização das ações e projetos desenvolvidos pela Instituição, da atividade

funcional e da conduta pública dos membros e servidores” Disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=2939 último acesso em 11.12.15.

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Além disso, de acordo com o Manifesto pela Criação da Defensoria

Pública em São Paulo, os defensores públicos devem prestar um serviço público exclusivamente

destinado aos cidadãos, razão pela qual a Defensoria Pública anda na contramão das demais

carreiras jurídicas, uma vez que o compromisso com a proteção e promoção dos direitos humanos

propiciam diversas reinvindicações, inclusive contra o Estado.97

No entanto, a Defensoria Pública Bandeirante enfrentou inúmeros

desafios para firmar-se enquanto instituição, deparando-se com barreiras impostas ora pela OAB,

Ministério Público e até mesmo por alguns órgãos do Poder Judiciário. Vejamos:

O Projeto de Lei Complementar 65/201198 de autoria do

Deputado Estadual Campos Machado visava transferir da Defensoria Pública para a Secretaria de

Justiça e da Defesa da Cidadania a gestão do convenio da assistência judiciaria e seus recursos.

Com relação ao convênio, previu-se um convenio fixo pelo executivo, por intermédio da

Secretaria de Justiça e a OAB, na qual o credenciamento de advogados seria feito pela OAB

ficando a gestão do Fundo de Assistência Judiciária sob o controle da Secretaria.

A importância da gestão ser realizada pela Defensoria Pública

guarda pertinência com a autonomia administrativa e financeira constitucionalmente asseguradas

à instituição.

Além disso, a gestão do fundo de assistência judiciária tem previsão

tanto nos artigos 235 e 236 da Lei Complementar Estadual 988/06 quanto na Lei Complementar

80/94 no artigo 4º, inciso XXI, que versa sobre a possibilidade de execução e recebimento das

verbas sucumbenciais decorrentes da atuação da instituição e da destinação das verbas.

97 http://www.promenino.org.br/noticias/especiais/projeto-de-lei-de-criacao-da-defensoria-publica-do-estado-de-sao-

paulo. Último acesso em 26.07.2015. 98 Na ocasião, eu era estagiária da Defensoria Pública no Fórum Criminal da Barra Funda, Regional Criminal e

diversos defensores públicos, estagiários, funcionários, membros da sociedade civil se deslocaram até a assembleia

legislativa para manifestar contrariedade a aprovação do projeto de lei. Foi um momento emocionante, pois a

sociedade civil gritava “o Defensor Público é meu amigo, mexeu com ele mexeu comigo”.

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Vale ainda mencionar que o Supremo Tribunal Federal já declarou

na ADI 3569/PE a inconstitucionalidade da vinculação da prestação de assistência jurídica à

Secretaria de Justiça.

A discussão envolvendo a obrigatoriedade ou faculdade do convênio

OAB/Defensoria acarretou o ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade, ADI 416399.

A ADI buscou analisar se a previsão de convênio exclusivo – previsto no artigo 109 da

Constituição de São Paulo e no artigo 234 da Lei Complementar 988/2006 – vincularia a

Defensoria Pública do Estado de São Paulo ou se em razão da autonomia funcional,

administrativa e financeira prevista para as Defensorias Estaduais pelo artigo 134, parágrafo 2º,

da Constituição Federal poderiam ser analisados pela própria instituição. Em 29 de Fevereiro de

2012, o Supremo Tribunal Federal reconheceu não ser obrigatório o convênio celebrado entre a

Defensoria Pública Paulista e a OAB/SP, por força da autonomia institucional.

Nota-se que a própria Constituição Federal de 1988 estabelece o

modelo público de assistência jurídica, de modo que os convênios firmados são realizados

subsidiariamente, enquanto a Defensoria Pública não estiver devidamente aparelhada e

estruturada para absorver toda a demanda do Estado. Deste modo, os convênios devem ser

necessariamente temporários em razão de excepcional interesse público.

Carlos Ayres Britto afirma que:

“Numa frase, aparelhar as Defensorias Públicas é servir, sim ao

desígnio constitucional de universalizar e aperfeiçoar a própria

jurisdição como atividade básica do Estado e função específica do

Poder Judiciário. Daí o prestígio que a Emenda 45/04 conferiu a

todas as defensorias100”.

99 Importante mencionar que pelo voto da maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, a ADI foi convertida

em Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) por entender que este é o instrumento correto

para o debate, tendo em vista que os dispositivos questionados são anteriores à Emenda Constitucional n.º 45, que

atribuiu autonomia para as Defensorias Públicas estaduais. 100 No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3700/RN), DJE 6.mar.2009.

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É importante mencionar que o convênio realizado entre a OAB/SP e

a Defensoria Pública persistem em razão do número reduzido de Defensores Públicos no Estado e

o número elevado de atendimentos. Conforme dados extraídos pela Defensoria Pública

Bandeirante, entre janeiro e novembro de 2014, nas suas 65 unidades distribuídas por 43 cidades

do Estado, a Defensoria Pública realizou 1.231.415 atendimentos – uma média de quase 112 mil

por mês, em todas as suas áreas de atuação: cível, família, infância e juventude, criminal,

execução penal, além de direitos coletivos – que incluem defesa do consumidor, habitação e

saúde, entre outros.101

Além disso, a falta de Defensores Públicos, não é apenas um

problema regionalizado. O III Diagnóstico das Defensorias Públicas no Brasil, realizado em 2009

pelo Ministério da Justiça102, confirma que os atendimentos na Defensoria Pública aumentaram

45,17% entre os anos de 2006 a 2008, mesmo que no mesmo período o número de Defensores

Públicos na ativa tinha crescido apenas 4,48 %.103

De acordo com gráfico elaborado no III Diagnóstico, entre o período

compreendido de 2006 a 2008, houve um acréscimo em número de atendimentos. Vejamos.

101 Cumpre ainda mencionar no ano de 2014, a Defensoria Pública Paulista inaugurou dez novos prédios nas

cidades de Barretos, Guarujá, Itapetininga, Mauá, Limeira, Praia Grande. Foi um avanço da instituição, pois antes,

estas unidades estavam em funcionamento apenas nos fóruns locais. A existência de sedes próprias da Defensoria

Pública conferem maior autonomia à instituição, que pode estabelecer os seus horários próprios de funcionamento e

mecanismos de acesso à população. 102 O III Diagnósticos das Defensorias Públicas no Brasil está disponível na íntegra

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf último acesso em 07.12.2015.

103 Dados extraídos do III Diagnósticos das Defensorias Públicas no Brasil, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf , último acesso em 10.11.15.

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53

Ademais, na elaboração do “Mapa da Defensoria Pública do

Brasil”, realizado pelo IPEA constatou-se um104 déficit de Defensores Públicos no País. O

cálculo foi feito considerando a proporção de 10.000 pessoas com até 3 salários mínimos por

Defensor Público como um parâmetro que as Defensorias Públicas devem perseguir para prestar

um serviço público de qualidade. Vejamos as tabelas.

Para cada 10.000 pessoas com até três salários-mínimos

Fonte: ANADEP, 2013; IBGE, Censo 2010.

Para cada 10.000 pessoas com até três salários-mínimos

Fonte: ANADEP, 2013; IBGE, Censo 2010.

De acordo com o IPEA, cerca de um terço do déficit de defensores

públicos é referente a comarcas já atendidas pela Defensoria, pois 87,3% das comarcas com

Defensoria Pública ainda apresentam déficit de defensores.105

104 Disponível em http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria/deficitdedefensores último acesso em 10.11.15. 105 Figura extraída do “Mapa das Defensorias”, disponível em

http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria/deficitdedefensores disponível em 10.11.15.

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A figura abaixo, extraída da pesquisa denominada “Mapa do Brasil”,

destaca o déficit de Defensores Públicos. Na seguinte tabela, o ponto verde representa um

Defensor Público e o ponto vermelho indica onde deveria haver um Defensor Público (déficit).

Fonte: ANADEP, 2013; IBGE, Censo 2010.106

Observa-se assim que o número de Defensores Públicos, por ora, é

insuficiente, de modo que os convênios servem para minimizar a falta de defensores públicos e

propiciar o acesso ao judiciário, ainda de que de forma transitória, até que haja a devida

estruturação da carreira.107

106 Disponível em http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria último acesso em 18.12.2015. 107 No Estado de São Paulo, no ano de 2015, há 719 Defensores Públicos, sendo que ingressarão na carreira

aproximadamente 60 novos Defensores Públicos, com o 7º concurso que está previsto para encerramento em meados

de 2016. Juntamente com os Defensores Públicos há 793 Servidores, entre Agentes (profissionais de ensino

superior), Oficiais (ensino médio) e comissionados. A instituição chegará ao número de 900 Defensores Públicos até

2016, conforme prevê a Lei Complementar Estadual nº 1.189/2012, que criou 400 cargos na carreira, a serem

preenchidos gradualmente. Dados extraídos do site oficial da Defensoria Pública, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Noticias/NoticiaMostra.aspx?idItem=53381&idPagina=3086

último acesso em 10.11.2015. Cumpre ainda mencionar que de acordo com os dados oficiais levantados pelo

Ministério de Justiça, durante o III Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil, existem atualmente 5200

Defensores Públicos para atender dois terços da população Brasileira. Estes dados indicam que a média nacional é de

um Defensor para cada 32 mil usuários em potencial. Com relação ao orçamento executado pelo Poder Judiciário,

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Logo, impor com obrigatório um convênio específico i) viola o

modelo público, constitucionalmente tutelado, ii) ofende a autonomia funcional (livre de

ingerência e subordinação de qualquer outro órgão do Estado) e administrativa da Defensoria

Pública, iii) viola a separação de poderes a exigência de autorização legislativa prévia para a

celebração de convênios pelo Poder Executivo, iv) viola a natureza jurídica dos convênios que se

fundam na limitação temporal, necessidade temporária de interesse público e interesse público

excepcional108, vi ) viola a desvinculação do repasse dos recursos cabíveis a Defensoria Pública,

impedindo bloqueios( artigo 168 da Constituição Federal de 1988).

A ANADEP interviu como Amicus Curiae no julgamento da ADI

4163/SP perante o Supremo Tribunal Federal. Na petição assinada pelo então advogado Luís

Carlos Barroso 109 foi requerida a invalidade do artigo 109 da Constituição Estadual de São

Paulo e do artigo 234 da Lei Complementar 988/06 uma vez que :

“(i) desrespeitam o modelo constitucional estabelecido para a

Defensoria Pública Estadual, como instituição dotada de

autonomia funcional e administrativa, em violação ao § 2º do art.

1342; e (ii) impedem a Defensoria Pública Estadual de levar a

cabo a missão que lhe foi conferida pela Constituição, em violação

aos arts. 5º, LXXIV e 134, caput e § 1º3, que consagram,

respectivamente, o direito dos necessitados à assistência jurídica

integral, e a própria Defensoria, como carreira jurídica dedicada

exclusivamente a garantir esse direito”110

Ministério Público e Defensorias Públicas das unidades da federação no tocante ao orçamento total do estado,

observou-se que em média o Poder Judiciário dos estados absorve 5,34% dos gastos totais do Estado, enquanto que o

orçamento do Ministério Público foi de 2,02% do orçamento do estado e o da Defensoria Pública foi uma média

0,40% do total de gastos pelas unidades federativas. Em 2009, foi registrada uma média de produtividade anual de

2301 atendimentos por Defensor. Dados extraídos do III Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil, maiores

informações em http://dp-pa.jusbrasil.com.br/noticias/2769853/oea-recomenda-a-seus-paises-membros-uma-

defensoria-publica-autonoma-e-independente último acesso em 09.12.2015. 108 O Supremo Tribunal Federal já havia estabelecido estes requisitos para a formalização de convênios e contratação

temporária de advogados para exercer a assistência jurídica (ADI 2229/ES, Rel. Min. Carlos Velloso, DJU 25.07.04). 109 Disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/6442/ADI_4163_Defensoria_SP_amicus_24jun09__final__.pdf

último acesso em 15.04.15. 110 Disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/6442/ADI_4163_Defensoria_SP_amicus_24jun09__final__.pdf

último acesso em 15.04.15

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Deste modo, como a constituição Federal assegurou o modelo

público de prestação de atendimento jurídico à população vulnerável, bem como os convênios

são transitórios, até que haja a devida estruturação das Defensorias Públicas, importante

mencionar a Resolução AG/RES 2656 (XLI-/11)111 da OEA que recomenda aos Estados que já

disponham de assistência jurídica gratuita a adoção de medidas para assegurar a independência e

autonomia funcional das Defensorias, bem como incentivem a criação em locais ainda não

abrangidos pela Defensoria pública.112

2.3. O papel da Defensoria Pública no Estado Democrático de Direito

Partindo do pressuposto de que a República Federativa do Brasil é

fundada na Dignidade da Pessoa Humana e na cidadania, nela concebida não apenas no aspecto

formal porém material, bem como que o objetivo da Constituição cidadã é a erradicação da

pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, com o fim de construir uma sociedade

livre, justa e solidária, a Defensoria Pública ganha espaço no cenário brasileiro.

Nas palavras do Ministro Celso de Mello, no julgamento da ADI-

RJ, 3643-2, perante o Supremo Tribunal Federal:

“ A defensoria pública é o instrumento jurídico-institucional

concebido pelo Estado Brasileiro para permitir que as promessas

constitucionais, notadamente em tema de direitos civis, econômicos

e sociais, não se tornem proclamações retóricas, vãs e

inconsequentes”.113

111 Disponível em http://www.aidef.org/wtksite/cms/conteudo/247/AG_RES_2656_pt.pdf último acesso em

15.04.2015. 112 Tivemos como objetivo, ao fazer menção a esse julgado do Supremo Tribunal Federal, de demonstrar que a

Defensoria Pública conta com déficit de Defensores Públicos e que a realização de assistência jurídica ainda depende

de convênios e entidades privadas. A preocupação da manutenção destes convênios está associada ao afastamento

dos usuários do acesso à justiça, eis que não apenas o ingresso no judiciário possibilita o acesso efetivo à justiça. Os

mecanismos de participação popular e de fortalecimento da cidadania são essenciais para a busca de uma justiça mais

inclusiva e igualitária. 113 Íntegra disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=406334 último

acesso em 16.12.15.

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Renato Campos de Vitto afirma que :

“ Vários tem sido os estudos sobre o impacto da justiça na área

econômica, porém poucos abordam o tema sob a perspectiva da

Justiça e a distribuição de renda. Esse é um dos papéis

fundamentais da Defensoria Pública, vale dizer, defender o direito

a alimentos, à moradia, à saúde, a benefícios sociais, contra as

abusividades praticadas no mercado de consumo e de trabalho

(neste último caso a atuação da Defensoria Pública ainda é quase

inexistente, tendo em vista o reduzido número de Defensores

Públicos da União. A concretização do princípio constitucional da

solidariedade social”114

Sabe-se que desrespeito aos direitos básicos do ser humano

repercutem significativamente na criação da pobreza, eis que cada vez mais essas pessoas sofrem

discriminação e desemparo pelo Estado, nas palavras de Flavia Piovesan:

“ (...) a pobreza já foi vista como crime de vadiagem. Hoje há

projetos que tentam colocar a pobreza como violação aos Direitos

Humanos. Direitos Sociais devem ser vistos como direitos, não

como generosidade, compaixão ou caridade”115

Deste modo, a Defensoria instala-se como o instrumento facilitador

do acesso, de instituição imbuída com o mister de promover acesso aos desemparados, de

propiciar empoderamento e fortalecimento das pessoas para lutarem para uma sociedade mais

justa, livre e solidária, in verbis:

“carência de meios econômicos dificulta o acesso à educação, ao

emprego, à obtenção de dignas condições de moradia, terminando

por minar a confiança do ser humano em si mesmo, reduzindo-lhe a

114 De Vitto, Renato Campos Pinto; Castro, André Luís Machado. A Defensoria Pública como Instrumento de

Consolidação da Democracia, p. 3.

http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CB8QFjAA&url=http%3A%2F

%2Fwww.defensoria.ce.gov.br%2Findex.php%3Foption%3Dcom_phocadownload%26view%3Dcategory%26downl

oad%3D58%3Aa-defensoria-publica-como-instrumento-de-consolidacao-da-

democracia%26id%3D12%3Aartigos%26Itemid%3D52&ei=IA3AVM_1NYzsggTxz4HgBA&usg=AFQjCNHSblxk

lin2eQa5qkmdzj2ggjUfoQ Acesso em 21.01.2015 115 Entrevista realizada para o Revista Consultor Jurídico pelos jornalistas Maurício Cardoso e Alessandro Cristo ,

disponível em http://www.conjur.com.br/2009-abr-05/entrevista-flavia-piovesan-procuradora-estado-sao-paulo

Acesso em 21.01.2015

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auto-estima e confinando ao círculo vicioso da pobreza e da

ignorância. O desconhecimento dos direitos a que tem jus, ou os

meios de auferi-los, cega o homem, levando-o a caminhar

cabisbaixo e inseguro, temeroso de tropeçar e cair.Eis que se fez a

luz com o surgimento da Defensoria Pública no Brasil. Ciente de

que a mera previsão não garante a efetividade do direito, o

legislador constitucional inseriu a Defensoria Pública, ao lado do

Ministério Público, da advocacia pública e privada, no capítulo das

funções essenciais à Justiça, estabelecendo os parâmetros

distintivos do cargo e as atribuições que lhe são imanentes”116

Carlos Weis afirma que :

“ o Estado Democrático de Direito tem como uma de suas funções

essenciais a realização da justiça social, justiça esta que pressupõe

o conhecimento e realização dos direitos fundamentais pelos seus

titulares, sejam tais direitos individuais, coletivos ou difusos”. 117

Agora a questão é, quem são os destinatários dos serviços prestados

pela Defensoria Pública? Por clara leitura do texto constitucional dos artigos 5º, LXXIV118 e

artigo 134 da CF/88, verifica-se que são usuários da Defensoria Pública aquelas pessoas que por

insuficiência de recursos tenham necessidade de acessar a justiça.119

Não há uma definição unívoca da expressão constitucional de

assistência “integral” a ser prestada pela Defensoria Pública. Em que pese se defender pela

interpretação ampliativa, que possibilita a atuação da Defensoria Pública, em todos os graus de

jurisdição, seja no âmbito individual ou coletivo, a assistência jurídica integral e gratuita não é

um serviço universal que atinja todas as pessoas.

116 Trecho do discurso do Ministro Marco Aurélio de Melo, na posse da Defensora Pública Geral de São Paulo,

Daniela Sollberger Cembranelli, disponível em http://www.conjur.com.br/2010-jun-24/discurso-posse-daniela-

cembranelli-agradece-antecessora 117 WEIS, Carlos. Direitos Humanos e Defensoria Pública, Boletim IBCCRIM, ano 10, n. 115, p. 5. 118 A Constituição Federal de 1988 prevê no artigo 5º, LXXIV “ O Estado prestará assistência jurídica integral e

gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”. Logo, eleva a assistência jurídica como direito individual

fundamental.

119 É nessa esteira que a Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública se estabelece “a assistência jurídica integral e

gratuita custeada ou fornecida pelo Estado será exercida pela Defensoria Pública” e que “o exercício de cargo de

defensor público é indelegável e privativo e membro da carreira”, conforme artigos 4º, §5º e §10º da Lei

Complementar 80/94, respectivamente.

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De fato, a assistência jurídica é um direito constitucional

assegurado aos que comprovarem a “insuficiência de recursos”. Ocorre que, a Constituição

Federal não definiu o que seria “insuficiência”, nem mesmo precisou quais seriam os “recursos”.

A fim de esclarecer a abrangência prevista pela Constituição Federal, passou-se a estudar o

alcance constitucional.

De acordo com o I Relatório Nacional de Atuação em Prol de

Pessoas e/ou Grupos em condição de vulnerabilidade, organizado por Glauce Franco e Patricia

Magno, publicado em 2015 pelo Fórum Justiça e pela Associação Nacional dos Defensores

Públicos- ANADEP:

“A Defensoria Pública não é um fim em si mesma. Existe para

garantir direitos aos “necessitados” que comprovarem

“insuficiência de recursos”(artigo 134 e 5o, LXXIV da CF), e a

Constituição Federal em momento algum restringiu este público

àquele com dificuldades para obtenção de recursos financeiros

para fazer frente às despesas com sua subsistência- embora este

seja, por excelência, o destinatário primeiro da nossa atuação”. 120

Além disso, o artigo 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal de

1988, utiliza a expressão “insuficiência de recursos” enquanto que no artigo 134 utiliza o termo

“necessitado”. Observa-se assim a utilização de conceitos indeterminados, ou seja, “palavras ou

expressões indicadas na lei, de conteúdo e extensão altamente vagos, imprecisos e genéricos, e

por isso mesmo esse conceito é abstrato e lacunoso”121.

Esta distinção é importante para demonstrar que não houve

interesse constitucional em restringir a atuação da Defensoria apenas em favor dos

economicamente hipossuficientes, eis que a expressão “insuficiência de recursos” e

“necessidades” (artigos 134 e 5º, LXXIV da Constituição Federal de 1988), bem como a

120 I Relatório Nacional de Atuação em Prol de Pessoas e/ou Grupos em condição de vulnerabilidade. Org. Glauce

Franco, Patrícia Magno. Brasília: ANADEP, 2015, p.10. 121 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado.5.ed. São Paulo: Revista do

Tribunais, 2007, p.176.

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designação legal de “hipossuficiência” (artigo 4º, VII, da Lei Complementar 80/94) não podem

ser interpretadas restritivamente à dimensão econômica.

É esse, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

“(...) expressão “necessitados” deve ser interpretada de maneira

mais ampla, não se restringindo, exclusivamente, às pessoas

economicamente hipossuficientes, que não possuem recursos para

litigar em juízo sem prejuízo do sustento pessoal e familiar, mas

sim a todos os socialmente vulneráveis”122

Além disso, importante constatar que a gratuidade da justiça

assegurada pela Federal 1060/50 (hoje praticamente revogada, eis que o Novo Código de

Processo Civil, com vacatio legis até março de 2016 revogou expressamente diversos artigos da

referida lei) estava intimamente ligada a gratuidade das custas. Ou seja, apenas uma paradigma

econômico, que deve servir de parâmetro mínimo e não máximo de atuação da Defensoria

Pública.

Cabe destacar que em momento algum a Constituição Federal de

1988 restringiu a prestação da assistência jurídica integral ao aspecto meramente econômico. Até

porque, como dito, a Defensoria Pública deve zelar pelos direitos dos “vulneráveis” os

“hipossuficientes organizacionais”123. O olhar do constituinte não era o homo oeconomicus, mas

a pessoa em todas as suas vertentes, sejam econômicas, sociais, culturais, étnicas, familiar e

social, em atenção, inclusive, ao caráter democrático da Constituição.124

Nesse sentido o entendimento de Ada Pellegrini Grinover:

“ A exegese do texto constitucional, que adota um conceito jurídico

indeterminado, autoriza o entendimento de que o termo

122 Trecho da decisão do STJ no julgamento do ARESP 50212, do Ministro Herman Benjamin, do dia 24.10.2011.

Agravo em Recurso Especial n. 50.212-RS (2011/0135599-5) 123 Expressão utilizada por Ada Pellegrini Grinover, juntado no julgamento da ADI 3943. Disponível em

http://www.sbdp.org.br/arquivos/material/542_ADI3943_pareceradapellegrini.pdf p. 13. 124 Manual de Mediação para a Defensoria Pública. Brasília-DF. Fundação Universidade de Brasília/FUB 2014, p.38.

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necessitados abrange não apenas os economicamente necessitados,

mas também os necessitados do ponto de vista organizacional, ou

seja, os socialmente vulneráveis”125

Nas palavras de Amélia Soares da Rocha:

“o necessitado de justiça é, pois, quem, por sua condição de

vulnerabilidade, não tem acesso aos recursos necessários à sua

defesa. A missão constitucional da Defensoria Pública é garantir o

acesso à justiça aos necessitados, assim compreendidos como

aqueles que por circunstancias sociais, econômicas, sexuais,

étnicas, e/ou culturais, não tem acesso aos recursos para exercitar

com efetividade os seus direitos”126

A “Carta de Porto Alegre” documento criado pelas Defensorias

Públicas após o VIII Congresso Nacional dos Defensores Públicos menciona que os critérios de

atendimento devem respeitar as peculiaridades cada ente da federação para analisar as situações

de vulnerabilidades das partes127, porém, não poderão ficar adstritos unicamente à renda dos

usuários.

Assim, em razão dos próprios compromissos institucionais com a

proteção dos Direitos Humanos, a Defensoria Pública tem legitimidade para tutelar todo e

qualquer grupo vulnerável.

125 Parecer da Ada Pellegrini Grinover, juntado no julgamento da ADI 3943. Disponível em

http://www.sbdp.org.br/arquivos/material/542_ADI3943_pareceradapellegrini.pdf p. 13. 126 ROCHA. Amelia Soares da. Defensoria Pública: fundamentos, organização e funcionamento. São Paulo: Atlas,

2013, p. 84 127 Disponível em “Carta de Porto Alegre”, documento formulado pelos Defensores Públicos brasileiros, das

delegações dos Estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato

Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio

Grande do Sul, Rondônia, Roraima, São Paulo, Sergipe, Tocantins, do Distrito Federal e da União, bem como as

representações das Defensorias Públicas da Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, e os representantes da sociedade

civil organizada e de entidades civis dos Estados de Santa Catarina e Goiás, da Assembleia Legislativa do Estado do

Paraná, e acadêmicos de Direito, reunidos na capital do Estado do Rio Grande do Sul, durante a realização do VIII

Congresso Nacional de Defensores Públicos, no período de 03 de novembro a 06 de novembro de 2009,em conjunto

com as Defensorias Públicas representadas no VIII Congresso Nacional de Defensores Públicos, realizado entre os

dias 3 a 6 de Novembro de 2009 na cidade de Porto Alegre/RS, disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/10079/CARTA_DE_PORTO_ALEGRE__FINAL_.pdf último

acesso em 15.04.2015.

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O I Relatório Nacional de Atuação em Prol de Pessoas e/ou Grupos

em Condição de Vulnerabilidade afirma que o que se sustenta é que a Defensoria Pública tem

como foco de atuação institucional prioritária as pessoas em situação de pobreza. Porém não

apenas os economicamente pobres, eis que a vulnerabilidade pode ou não ter como causa isolada

a pobreza. 128

A questão da vulnerabilidade já foi analisada implicitamente pela

Corte Interamericana, qual seja pela função consultiva, por meio da Opinião Consultiva 18/03, de

17 de Setembro de 2003, que trata dos Direitos dos Imigrantes:

“Generalmente los migrantes se encuentran en una situación de

vulnerabilidad como sujetos de derechos humanos, en una

condición individual de ausencia o diferencia de poder con

respecto a los no-migrantes (nacionales o residentes). Esta

condición de vulnerabilidad tiene una dimensión ideológica y se

presenta en un contexto histórico que es distinto para cada Estado,

y es mantenida por situaciones de jure (desigualdades entre

nacionales y extranjeros en las leyes) y de facto (desigualdades

estructurales). Esta situación conduce al establecimiento de

diferencias en el acceso de unos y otros a los recursos públicos

administrados por el Estado.113. Existen también prejuicios

culturales acerca de los migrantes, que permiten la reproducción

de las condiciones de vulnerabilidad, tales como los prejuicios

étnicos, la xenofobia y el racismo, que dificultan la integración de

los migrantes a la sociedad y llevan la impunidad de las violaciones

de derechos humanos cometidas en su contra.”129

As 100 Regras de Brasília, documento aprovado na XIV Cúpula

Judicial Iberoamericana130, realizada em Brasília, em 2008, com a participação de Cortes

128 I Relatório Nacional de Atuação em Prol de Pessoas e/ou Grupos em condição de vulnerabilidade. Org. Glauce

Franco, Patrícia Magno. Brasília: ANADEP, 2015, p.11. 129http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=4&ved=0CDMQFjAD&url=http%3A%

2F%2Fwww.corteidh.or.cr%2Fdocs%2Fopiniones%2Fseriea_18_esp.doc&ei=bjXAVOzyL8LEggTvzICoAw&usg=

AFQjCNHx1Iy8_3mqbEt4NJ0yU-HlA2q1LQ&bvm=bv.84116906,bs.1,d.eXY (p. 119 e 120) 130 A Cumbre Judicial Iberoamericana é uma articulação das instâncias máximas do poder judiciário da região ibero-

americana. Reúne os presidentes dos Tribunais e Cortes Superioes de Justiça e dos Conselhos de Magistratura dos

países ibero-americanos e tem por um dos objetivos promover o desenvolvimento de políticas que tendam a facilitar

o acesso à justiça. Além disso, tem como principal destinatário os poderes públicos, os servidores e todos os

operadores do sistema de justiça, para que possam propiciar as pessoas vulneráveis um tratamento adequado.

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Superiores de Justiça dos Países Iberoamericanos, Associação Iberoamericana de Ministérios

Públicos (AIAMP), Associação Interamericana de Defensorias Públicas (AIDEF), Federação

Iberoamericana de Ombudsman (FIO) e União Iberoamericana de Colégios de Advogados

(UIBA), estabelece um rol exemplificativo de vulneráveis, nele compreendidos todos aqueles

vítimas de descriminação racial, mulheres, crianças, presos, etc.131

Logo, facilmente perceptível que no entendimento consensual das

Corte Ibero-Americanas, o conceito de hipossuficiência não se restringe ao viés econômico.

Assim, a pobreza é apenas uma das causas de vulnerabilidade, porém não a única.132

Observa-se que as 100 Regras de Brasília foram difundidas pelos

países envolvidos, de modo que o MERCOSUL, por meio da Recomendação MERCOSUR/CMC

01/12 sobre “Defensa Pública Oficial Autónoma e Independiente como garantía de acceso a la

justicia de las personas en condiciones de vulnerabilidad” (XLIII CMC – Mendoza, 29/VI/12), no

artigo 2º determina que cabe a Defensoria Pública:

“a fomentar “la cooperación entre las Defensorías Publicas

Oficiales a fin de promover la adopción de medidas de protección

de las personas que, por razón de su edad, género, estado físico o

mental, o por circunstancias sociales, económicas, étnicas y/o

culturales, se encuentran en una situación especial de

vulnerabilidad para ejercer con plenitud los derechos reconocidos

por los ordenamientos jurídicos133”.

informações extraídas de http://www.cortenacional.gob.ec/cnj/index.php/cumbre-judicial-iberoamericana Acesso

em 20.01.2015 131 www.anadef.org.br/.../638-seminario-analise-das-100-regras-de-brasilia. Acesso em 28.11.2014. Importante ainda

constatar que foi o modelo da Defensoria Pública Bandeirante, fundada na participação popular que contribuiu para a

criação do Fórum Justiça. Vejamos: “A partir da boa prática implementada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o Fórum tem estimulado a discussão de mecanismos democráticos como as conferências públicas, ouvidorias externas e outras formas adequadas a transpor as demandas populares para o patamar da política judicial. Busca-se levantar e problematizar experiências dessa natureza no Brasil, observando, ainda, práticas similares implementadas em países ibero-americanos”. Disponível em http://www.anadep.org.br/wtksite/LIVRO_ID6.pdf , p.836, último acesso em 18.11.15. 132BRASIL, Manual de Mediação para a Defensoria Pública. Brasília-DF. Fundação Universidade de Brasília/FUB

2014, p. 39. 133http://www.mpd.gov.ar/noticia/index/noticia/reunion-especializada-de-defensores-publicos-oficiales-del-

mercosur-redpo-438 Acesso em 10.01.2015

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64

Tendo em vista que o Brasil é um País extremamente extenso, com

diversas peculiaridades regionais, não há uma normativa nacional única sobre os critérios de

atendimento.

Partindo dos dados constantes no III Diagnóstico da Defensoria

Pública no Brasil (2009), realizado pelo Ministério da Justiça e o Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento (PNUD)134, podemos observar os seguintes critérios adotados pelas

Defensorias Públicas Estaduais para que a pessoa possa ser atendida pela Defensoria: ACRE-

renda de até 4 salários mínimos, ALAGOAS- patrimônio familiar, patrimônio pessoal, valor e

natureza da causa, AMAZONAS- até 3 salários mínimos e declaração do interessado que pagar

as custas processuais e honorários advocatícios trará prejuízos ao sustento próprio e de sua

família, AMAPÁ- renda familiar até 2 salários mínimos, patrimônio pessoal, patrimônio familiar,

valor e natureza da causa e patrimônio familiar, CEARÁ - renda familiar até 6 salários mínimos,

patrimônio pessoal, patrimônio familiar, valor da causa, natureza da causa, valor e natureza da

causa e isenção do imposto de renda, DISTRITO FEDERAL- Declaração do interessado,

ESPÍRITO SANTO- renda até 3 salários mínimos, renda familiar até 3 salários mínimos, valor da

causa e valor e natureza da causa, MINAS GERAIS- renda até 3 salários mínimos, renda familiar

até 5 salários mínimos, patrimônio pessoal e valor e natureza da causa MATO GROSSO DO

SUL, renda familiar até 5 salários mínimos, patrimônio familiar e isenção do imposto de renda,

PARÁ, Declaração do interessado, PARAÍBA Declaração do interessado, PERNAMBUCO

Declaração do interessado mais avaliação do defensor, PIAUI renda de até 4 salários mínimos,

PARÁ renda familiar até 3 salários mínimos, patrimônio pessoal, patrimônio familiar, natureza

da causa e isenção do imposto de renda, RIO DEJANEIRO Declaração do interessado e análise

de documentos, RORAIMA valor da causa, natureza da causa e valor e natureza da causa, RIO

GRANDE DO SUL renda de até 3 salários mínimos, SERGIPE patrimônio familiar, SÃO

PAULO, renda familiar até 3 salários mínimos, patrimônio familiar, valor da causa e natureza da

causa, TOCANTINS Declaração do interessado e critérios subjetivos, MATO GROSO renda de

até 3 salários Mínimos, DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO isenção do imposto de renda.

134 http://www.anadep.org.br/wtksite/mapa_da_defensoria_publica_no_brasil_impresso_.pdf último acesso em

10.12.2015.

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65

De acordo com o III Diagnóstico de Defensorias Públicas no Brasil,

realizado no ano de 2009, o critério de atendimento era baseado na renda individual, conforme se

verifica no seguinte gráfico.135

Ocorre que, há uma tendência a fixarem em até 3 salários mínimos

o critério de renda para ser atendido pela Defensoria Pública, sendo que tal critério é de renda

familiar. Vejamos.136

Com relação a renda familiar, percebe-se um percentual maior de

unidade da federação que adotaram até 3 salários mínimos, além disso, 8,7% deles adotarem a

renda familiar de até 5 salários mínimos, conforme tabela extraída do III Diagnóstico das

Defensorias Públicas:

135 http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf último acesso em 05.12.2015. 136 Tabelas extraídas do III Diagnóstico de Defensorias Públicas no Brasil, nas fls. 182, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf acesso em 10.11.15.

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No Estado de São Paulo, para atendimento à população carente,

adota-se os critérios de atendimento previstos pela Deliberação 89, de 8 de Agosto de 2008 do

Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado137, com as alterações feitas pela

Deliberação CSDP nº 282, de 06 de setembro de 2013138, Deliberação CSDP nº 247, de 23 de

março de 2012139 , Deliberação CSDP nº 137, de 25 de setembro de 2009,140 quais sejam :.141

“I – aufira renda familiar mensal não superior a três

salários mínimos federais; (Inciso alterado pela

Deliberação CSDP nº 137, de 25 de setembro de 2009.)

137http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Materia/MateriaMostra.aspx?idItem=2485&idModulo=5010

Acesso em 26.11.2014 138http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Materia/MateriaMostra.aspx?idItem=48004&idModulo=5010

Acesso em 26.11.2014 139http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Materia/MateriaMostra.aspx?idItem=39027&idModulo=5010

Acesso em 26.11.2014 140http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Materia/MateriaMostra.aspx?idItem=5951&idModulo=5010

Acesso em 26.11.2014 141 Cumpre ainda mencionar que os critérios estabelecidos neste artigo não excluem a aferição da hipossuficiência no

caso concreto, através de manifestação devidamente fundamentada. (Redação acrescentada pela Deliberação CSDP

nº 137, de 25 de setembro de 2009).Além disso o artigo 20, §16, prevê que o Defensor Público deve verificar, em

cada situação, se há elementos que permitam concluir não ter acesso o usuário, mesmo que transitoriamente, aos

recursos financeiros próprios ou da família, hipótese em que deverá ser prestado o atendimento, notadamente nos

casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, pessoas idosas ou com deficiência e transtorno global de

desenvolvimento e outras categorias de pessoas socialmente vulneráveis. (Redação acrescentada pela Deliberação

CSDP nº 247, de 23 de março de 2012). Importante mencionar que no ano de 2015, foi pautado no Conselho

Superior da Defensoria Pública proposta para revisão do critério econômico, porém até Dezembro de 2015, não

havia qualquer alteração aprovada pelos membros do Conselho.

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II - não seja proprietária, titular de aquisição, herdeira,

legatária ou usufrutuária de bens móveis, imóveis ou

direitos, cujos valores ultrapassem a quantia equivalente

a 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais do Estado de São

Paulo - UFESP´s.

III - não possua recursos financeiros em aplicações ou

investimentos em valor superior a 12 (doze) salários

mínimos federais.” (artigo 2º)

Os requisitos são cumulativos e serão auferidos conforme a renda

familiar.142 Além disso, esses critérios também se aplicam para a aferição da necessidade de

pessoa natural não integrante de entidade familiar.

Observa-se ainda que a Deliberação 89/08, a fim de assegurar maior

igualdade entre as pessoas, prevê um limite do valor da renda familiar de quatro salários mínimos

federais, quando houver fatores que evidenciem exclusão social, tais como:

a)entidade familiar composta por mais de 5 (cinco)

membros;

b) gastos mensais comprovados com tratamento médico

por doença grave ou aquisição de medicamentos de uso

contínuo; (Redação dada pela Deliberação CSDP nº 282,

de 06 de setembro de 2013)

c) entidade familiar composta por pessoa com deficiência

ou transtorno global do desenvolvimento. (Redação dada

pela Deliberação CSDP nº 282, de 06 de setembro de

2013)

d) entidade familiar composta por idoso ou egresso do

sistema prisional, desde que constituída por 4 (quatro) ou

mais membros.

No mais, nas hipóteses de divórcio ou reconhecimento e dissolução

de união estável, com colidência de interesses de membros de uma mesma entidade familiar, a

renda mensal e o patrimônio líquido deverão ser considerados individualmente.143

142 Renda familiar é a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pela totalidade dos membros da entidade

familiar, maiores de dezesseis anos, excluindo-se os rendimentos concedidos por programas oficiais de transferência

de renda e de benefícios assistenciais, bem como o valor comprovadamente pago a título de contribuição

previdenciária oficial. (artigo 2º, §3º da Deliberação 89/08). 143 Artigo 2º,§5º e §6º da Deliberação 89/08 do CSDP.

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Além disso, de acordo com o §19º do artigo 2º da deliberação

89/08, o único bem imóvel destinado à moradia ou subsistência, ainda que tenha valor superior

ao previsto no inciso II (não seja proprietária, titular de aquisição, herdeira, legatária ou

usufrutuária de bens móveis, imóveis ou direitos, cujos valores ultrapassem a quantia equivalente

a 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESP´s), não poderá ensejar, por

si só, a denegação em razão da situação econômico-financeira. (Redação acrescida pela

Deliberação CSDP nº 282, de 06 de setembro de 2013)

2.4. Transmutação de assistência judiciária para assistência jurídica

A Constituição Federal de 1988 trouxe alterações relevantes para as

funções da Defensoria Pública, eis que a assistência jurídica é muito mais ampla que a mera

assistência judiciária.

Nos dizeres de Carlos Weis:

“ passa-se da idéia de assistência judiciária para o acesso à

justiça; de assistencialismo público para serviço público essencial;

de extensão da advocacia privada aos financeiramente carentes à

promoção de direitos humanos; de mera promoção judicial de

demandas privadas à identificação dos direitos fundamentais da

população e sua instrumentalização, eventualmente pela via

judicial”.144

Nas palavras de Kazuo Watanabe:

“ tem o sentido de assistência jurídica em juízo e fora dele, com ou

sem conflito específico, abrangendo inclusive serviço de

informação e de orientação, e até mesmo de estudo crítico, por

especialistas de várias áreas do saber humano, do ordenamento

jurídico existente, buscando soluções para sua aplicação mais justa

e, eventualmente, sua modificação e inclusive revogação. Mais

144 WEIS, CARLOS. As Defensorias Públicas e a promoção dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Revista da

Defensoria Pública, Ano 1, n. 1, jul/dez 2008, p.328.

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adequado seria chamar-se de semelhante amplitude de “assistência

jurídica”, ao invés de assistência judiciária”145

Nota-se assim que o constituinte optou pelo modelo público de

assistência jurídica, de modo que não é mais admitido aos Estados e a União a faculdade de

eleger o sistema judicare, público ou misto, três sistemas diferentes de assistência jurídica146:

Vejamos.

2.5.1. Sistema Judicare

Este modelo é adotado na França, Holanda, Alemanha ocidental,

Inglaterra, Austrália.147 Por meio deste sistema a assistência jurídica é desempenhada por

advogados particulares remunerados pelo Estado que optem por prestar a atividade em prol dos

litigantes de baixa renda.

Nota-se que antes da ADI 4163 (que restou conhecida como

ADPF) e a ADI 4270 o Estado de Santa Catarina realizava a prestação da atividade jurídica por

meio de advogados conveniados pela OAB/SC.

Uma das principais críticas a esse sistema está relacionada à

dificuldade ou quiçá impossibilidade de propiciar a conscientização dos direitos das pessoas

vulneráveis, a orientação e educação em direitos, bem como as técnicas extrajudiciais de

resolução de conflitos. Isto porque pressupõe o conhecimento das pessoas para que estas

busquem auxilio e reconheçam os próprios direitos. Além disso, este sistema deixa de propiciar a

utilização das tutelas coletivas, eis que não estão aparelhados para transcender os remédios

individuais.148

145 WATANABE, Kazuo. Assistência judiciário e juizado especial de pequenas causas. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1985, p.161. 146 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002, p.35/49. 147 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002, p.35. 148 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002, p.39.

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2.5.1.Sistema Misto (Combinado)

É o sistema adotado no Canadá e na Suécia149. Neste sistema o

usuário poderá optar entre o advogado particular que presta assistência jurídica ou o membro da

instituição pública responsável por prestar assistência jurídica.

Em razão do escasso número de Defensores Públicos, a Defensoria

Pública Bandeirante ainda depende dos convênios para a prestação da atividade jurídica em todas

as comarcas. Há previsão constitucional para a implementação do modelo da Defensoria Pública

em todas as comarcas do País. Porém, até que o modelo público seja efetivamente instalado e

aparelhado a prestação da atividade jurídica depende dos parceiros, sejam eles as faculdades de

direito ou a OAB.

2.5.2. Sistema de advogado remunerado pelos cofres públicos

Nesse sistema, pretende-se solucionar a ausência de conhecimentos

dos direitos pelas pessoas vulneráveis, por meio da prática de “escritórios de vizinhança”,

atendidos por advogados pagos pelo governo e encarregados de promover o acesso da população

carente.150

Além disso, os escritórios conseguiriam estar mais próximos das

comunidades pobres o que facilita o acesso e a comunicação. Uma vantagem seria a possibilidade

de atuação coletiva, em processos contra litigantes organizacionais, quanto a informação jurídica.

Como desvantagens podemos identificar a dependência do governo para o pagamento dos

advogados, o que pode influenciar na propositura de ações em face do Estado, restringindo a

liberdade de atuação do profissional, em prol do melhor interesse do usuário.

149 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002, p.43. 150CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie. Porto Alegre:

Sergio Antonio Fabris, 2002, p.40.

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2.6. O Modelo Público adotado pela Constituição Federal de 1988: A Defensoria Pública.

Como visto, a Constituição Federal optou por um modelo público

de assistência jurídica. De modo que os operadores desta atividade, os Defensores Públicos, serão

concursados e remunerados pelo Estado.

Além disso, não se trata de uma atuação assistencialista151 ou

meramente judiciária. Pelo contrário, apenas uma instituição constitucionalmente prevista para

tutelar os direitos das pessoas vulneráveis é que se torna possível atingir os objetivos amplos de

assistência jurídica integral.

Conforme Boaventura de Souza Santos:

“a construção de uma Defensoria Pública, nos moldes como está

prevista sua actuação no Brasil, acumula diferentes vantagens

potenciais: universalização do acesso através da assistência por

profissionais formados e recrutados especialmente para esse fim,

assistência jurídica especializada para a defesa de interesses

colectivos e difusos, diversificação do atendimento e da consulta

jurídica para além da resolução judicial dos litígios, promovendo a

conciliação e a resolução extrajudicial dos conflitos e ainda

actuando na educação de direitos. A concepção de justiça

democrática que tenho defendido tem especial consideração o

papel da Defensoria Pública na construção de uma nova cultura

jurídica de consulta, assistência e patrocínio judiciário” 152

Desse modo, diante da escolha constitucional, não há uma outra

forma estatal de prestação de serviço que não seja realizada pela Defensoria Pública, ainda que

151 Carlos Weis, assim menciona “ao criar uma nova instituição jurídica, a Constituição atribuiu-lhe a função a de

concorrer para o acesso à justiça social, especialmente no que diz respeito à orientação jurídica da população, algo

inalcançável pela advocacia privada, seja em razão de sua estrutura pulverizada, seja pela natural finalidade

lucrativa que envolve a atividade do profissional liberal”, disponível em

http://www.sbdp.org.br/arquivos/material/289_WEIS,_Carlos__DH_e_DP__IBCCrim_.pdf último acesso em

4.4.2015. 152 SANTOS, Boaventura de Souza. O papel da Defensoria Pública na democratização do sistema de Justiça. In:

Apadep em notícias, Ano 1, nº 07, Janeiro/Fevereiro 2009, p. 6 disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/13137/DOUGLAS_TADASHI_MAGAMI_._ANA_CARVALHO_

FERREIRA.pdf último acesso em 04.04.2015.

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72

haja momentaneamente uma delegação deste serviço em razão da impossibilidade estrutural de

realização, tal como os convênios realizados com a OAB e Faculdades de Direito.

A existência de um advogado dativo é apenas admissível em razão

da ausência da estrutura da Defensoria Pública, eis que a Lei Complementar 80/94 assegura o

princípio do Defensor Público Natural no artigo 4º, A, inciso IV, in verbis:

“Art. 4º-A. São direitos dos assistidos da Defensoria Pública, além

daqueles previstos na legislação estadual ou em atos normativos

internos: (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009). IV – o

patrocínio de seus direitos e interesses pelo defensor natural;

(Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009)”. 153

O II Diagnóstico da Defensoria Pública, realizado pelo Ministério

da Justiça, no ano de 2006, revela que o Brasil conta com 1,43 defensor público para cada

100.000 habitantes, sendo que para o mesmo número de habitantes há 7,7 juízes e 4,22 membros

do Ministério Público.154

O III Diagnóstico da Defensoria Pública, realizado no ano de 2009,

revelou que a autonomia das Defensorias Públicas no Brasil cresceu e vem aumentando nos

últimos anos:

“Em 2005, 84% das instituições possuíam autonomia; em 2008,

esse percentual saltou para 92%. Também aumentou o número de

defensores públicos. Segundo o estudo, na comparação 2005/2008

houve aumento de 9,16% no número de cargos existentes,

totalizando 7177 cargos de defensor público. Entretanto, a

defasagem de pessoal persiste: praticamente metade das

Defensorias Públicas está com menos de 60% de preenchimento

das vagas de defensores públicos. O número de atendimentos

cresceu: em 2003 foram 4.523.771; em 2005, 6.565.616; no ano

seguinte foram 6.46.477.930, em 2007, 8.086.880 e, finalmente, em

2008, 9.656.161. Verifica-se que em cinco anos o número de

atendimentos realizados mais que dobrou. A produtividade dos

153 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp80.htm último acesso em 16.12.15 154 O Estudo está disponível em http://www.anadep.org.br/wtksite/downloads/Diag_defensoria_II.pdf último acesso

em 04.04.2015.

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defensores públicos também aumentou, passando de 1.689

atendimentos em média por defensor em 2005 para 2.301

atendimentos em média em 2008”.

Em 2009, 93% das Comarcas do Estado de São Paulo não tinham

atendimento da Defensoria Pública Estadual.155

Diante da ausência de defensores públicos em todas as Comarcas,

bem como da escassez de defensores para a prestação dos serviços públicos a adoção de

convênios vem minimizando os prejuízos da população carente.

Assim, ainda que haja convênios com Faculdades de Direito, o

maior convenio existente na Defensoria Pública é o convênio com a OAB. Porém, a Defensoria

Pública deve estar aparelhada e estruturada para exercer por si só a prestação da assistência

judiciária.

2.7. A Assistência Jurídica Integral e Gratuita

A expressão “integral” aponta uma característica importante, eis

que “ não é suficiente que o Estado assegure, apenas , o direito à assistência judiciária, sendo

necessário que garanta, também, os instrumentos necessários ao seu efetivo exercício”156

Além disso, a Constituição Federal ao estabelecer que incumbe à

Defensoria Pública a assistência jurídica, revela que não se trata de atuação “casuisticamente

realizada pelos diversos membros da Federação”, mas a necessária institucionalização das

funções inerentes à prestação da assistência jurídica.

155 Em Dezembro de 2015, conforme dados fornecidos pela Defensoria Pública Geral da Defensoria Pública do

Estado de São Paulo, há 719 Defensores Públicos, 818 Servidores, distribuídos em 43 comarcas no Estado de São

Paulo/SP. 156 MORAES, Humberto Penã de. A assistência judiciária pública e os mecanismos de acesso à justiça, no Estado

Democrático. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo (Coords.).

Participação e Processo, SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 235.

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Como dito em outras passagens, o direito à assistência jurídica

possui previsão em tratados e diplomas internacionais.

Sobre o tema disserta Carlos Weis:

“ o direito de ser assistido juridicamente insere-se no rol dos

direitos econômicos, sociais e culturais, uma vez que corresponde

a uma contraprestação ativa por parte do Estado, responsável por

prover o serviço público correspondente ou, como ocorre em

alguns países, custear advogados privados a quem não possa pagá-

los. Curiosamente, porém, foi no Pacto Internacional dos Direitos

Civis e Políticos que tal direito acabou reconhecido, o que explica

por sua evolução histórica. De fato, a ideia de que todos tem direito

a se defender perante um tribunal guarda relação com o

estabelecimento do “due processo law” e suas garantias inerentes,

como contrafação ao poder estatal de privar o ser humano de um

de seus mais caros bens, a liberdade de locomoção”157

Cumpre ainda mencionar que a Convenção sobre os Direitos da

Criança de 1989, ratificada pelo Brasil em 12 de Setembro de 1990158, trata expressamente da

assistência jurídica no artigo 37, que assim dispõe: “A criança privada de liberdade tem o direito

de aceder rapidamente à assistência jurídica ou a outra assistência adequada e o direito de

impugnar a legalidade da sua privação de liberdade perante um tribunal ou outra autoridade

competente, independente e imparcial, bem como o direito a uma rápida decisão sobre tal

matéria.”( grifos nossos)

O artigo 40, itens II e III, na sequência, preveem tanto o direito de

ser informado do direito de ter assistência jurídica, quanto de ter uma causa jurídica decidida

conforme a lei, in verbis:

“ii)A ser informada pronta e directamente das acusações

formuladas contra si ou, se necessário, através de seus pais ou

representantes legais, e beneficiar de assistência jurídica ou de

157 WEIS, Carlos. Direitos Humanos e Defensoria Pública. Boletim IBCCRIM, ano 10,n.115, p.5, jun. 2002. 158 Informações extraídas do http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhuniversais/dc-conv-

sobre-dc.html Ultimo acesso em 4.4.2015

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outra assistência adequada para a preparação e apresentação da

sua defesa; iii) A sua causa ser examinada sem demora por uma

autoridade competente, independente e imparcial ou por um

tribunal, de forma equitativa nos termos da lei, na presença do seu

defensor ou de outrem assegurando assistência adequada e, a

menos que tal se mostre contrário ao interesse superior da criança,

nomeadamente atendendo à sua idade ou situação, na presença de

seus pais ou representantes legais” ( grifos nossos)

O Estatuto de Roma também prevê no artigo 55, 2, alínea c, a

necessidade de assistência judiciária ao necessitado, vejamos:

“A ser assistida por um advogado da sua escolha ou, se não o

tiver, a solicitar que lhe seja designado um defensor dativo, em

todas as situações em que o interesse da justiça assim o exija e sem

qualquer encargo se não possuir meios suficientes para lhe

pagar;”159 (grifos nossos)

No âmbito da OEA também há diversos diplomas específicos, mas

os mesmos serão tratados em momento oportuno, eis que será dada ênfase a cada um dos

instrumentos normativos, em especial as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

159 Informações disponíveis em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4388.htm ultimo acesso em

4.4.2015.

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3. DEFENSORIA PÚBLICA E O ACESSO À JUSTIÇA

Em um Estado Democrático de Direito, fundado na Dignidade da

Pessoa Humana, com o objetivo de construir uma sociedade livre, justa e solidária, reduzir as

desigualdades sociais, falar em acesso à justiça como sinônimo de ingressar no Judiciário é

incompatível com a Constituição

Para Mauro Capelletti e Bryant Garth:

“A expressão “acesso à justiça” é reconhecidamente de difícil

definição, mas serve para determinar duas finalidades básicas do

sistema jurídico – o sistema pelo qual as pessoas podem reivindicar

seus direitos e/ ou resolver seus litígios sob os auspícios do estado.

Primeiro o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo,

ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente

justos”.160

Analisaremos a importância da participação popular no sistema de

justiça, como mecanismo de inclusão e fortalecimento de um sistema de Justiça mais igualitário e

efetivo.Luiz Guilherme Marinoni afirma que “ o acesso à ordem jurídica justa é, antes de tudo,

uma questão de cidadania”161.

Para Guilherme de Almeida:

“direito de acesso à justiça é um elemento constitutivo do próprio

exercício da cidadania, pois é esse direito que possibilita o

exercício da cidadania quando o cidadão é arbitrariamente

impedido de fruir determinado direito por causa do Estado.”162

160 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e revisão de Ellen Gracie Northfleet. 1. ed.

Porto Alegre: Fabris, 2002 c 1988, p. 8. 161 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas Linhas do Processo Civil: o acesso à justiça e os institutos fundamentais do

direito processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, p. 25. 162 ALMEIDA, Guilherme de. Acesso à justiça, direitos humanos e novas esferas da justiça. Contemporânea in

Revista de Sociologia da UFSCar, v. 2, p. 83-102, 2012, p.88, disponível em

http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/viewFile/61/34 último acesso em 02.12.2015.

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De todo modo, ainda que aparente ser algo fácil, as pessoas

vulneráveis acabam sendo excluídas do sistema do sistema de Justiça, eis que o desconhecimento

da lei, a falta de mecanismos e recursos para custear as custas e os honorários advocatícios

afastam do âmbito do Judiciário notória parcela da população.

Porém como solucionar o problema? Como permitir que

significativa parcela da população brasileira tenha acesso aos mais básicos dos direitos? Como

tornar as portas do Judiciário abertas para todos?

O Projeto de Florença, realizado por Cappelletti e Garth na década

de 70, demonstram que o acesso à justiça deve ser considerado com um direito humano e, mais

do que isso, como o “ mais básico dos direitos humanos”, eis que possibilitará o acesso aos

demais direitos.163

Porém, ainda que se pense que passados 40 anos a solução estaria

pacificada tal afirmação não procede.

Ainda se verifica desigualdade no sistema de acesso à justiça,

especialmente para as pessoas vulneráveis, que carecedoras do acesso à informação, da existência

dos direitos e mecanismos de implementação deixam se obter os direitos tutelados pelo

ordenamento jurídico.

Além disso, ainda que a Constituição tenha criado a Defensoria

Pública como a instituição publicada voltada a promoção dos direitos humanos, orientação

jurídica e defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos,

de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da

163 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e revisão de Ellen Gracie Northfleet. 1. ed.

Porto Alegre: Fabris, 2002 c 1988, p. 67/68.

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Constituição Federal, a Defensoria Pública ainda não recebeu o reconhecimento e fortalecimento

necessários para exercer o papel fundamental no sistema de Justiça.164

Também merece destaque a dificuldade, na prática, de se

implementar nas diferentes Defensorias Públicas do Brasil, a autonomia prevista na Constituição

Federal, em especial diante de um Poder Executivo Estadual que tenta manter a Defensoria

Pública, vinculada ao Poder Executivo para que haja controle e ingerências na instituição, em

claro prejuízo à democracia e aos interesses da maioria da população.

Nos dizeres de Renato Campos de Vitto e André Luis Machado de

Castro:

“A sociedade clama pela adequada implementação de um interface

entre o Estado e a afirmação dos direitos humanos da camada da

população mais vulnerável. A sociedade clama, por conseguinte,

pela estruturação de uma Defensoria apta a desincumbir-se de se

seu papel com excelência. Bem por isso, se afigura acertada a

concessão das autonomias antes referidas, como instrumento de

estruturação da instituição, a fim de que as demandas sociais sejam

acolhidas e encaminhadas por corpo de advogados públicos, imune

a toda sorte de contingências e pressões políticas”.165

Percebe-se assim que o problema do acesso à justiça ainda perdura

na sociedade moderna.

164 O III Diagnóstico das Defensorias Públicas no País, realizado em 2009 pela Reforma do Judiciário no Ministério

da Justiça, aponta entre as conclusões a necessidade de criação de mecanismos de valorização do Defensor Público,

uma vez que dada a falta de estrutura e a questão salarial, muitos Defensores ainda que vocacionados, frustrados pela

falta de prestígio que a instituição tem frente às demais instituições, buscam outras carreiras.

No mais, a Defensoria Pública, assim como os seus usuários não são prioridades estatais, em que pese tendo sido

reconhecido pelo III Diagnóstico das Defensorias Públicas no Brasil que para ampliar e aprimorar o acesso à justiça,

faz-se necessário o fortalecimento da Defensoria Pública e a valorização da carreira de Defensor Público. 165 DE VITTO, Renato Campos Pinto, CASTRO, André Luis Machado de. Defensoria Pública como instrumento

de consolidação da democracia in Slakmon, Catherine; Machado, Maíra Rocha; Bottini, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p.237. Disponível em http://www.esteio.rs.gov.br/documents/SMSMU/governanca%20na%20seguranca%20-%20material%20do%20MJ.pdf último acesso em 18.11.2015..

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No “Projeto de Florença”, marco teórico referencial no estudo do

acesso à justiça, os autores afirmam ainda que ocorreu uma transformação importante no conceito

teórico de acesso à justiça, eis que antes, nos Estados Liberais era adotada uma filosofia

individualista de direitos, na qual o acesso à justiça apresentava uma conotação meramente

formal, pela possibilidade virtual de propositura ou contestação da ação. Naquela época o Estado

assumia uma postura passiva.166

Ocorre que esse modelo não atingia a finalidade básica do sistema

de justiça, qual seja a i) o dever do sistema ser igualmente acessível à todos, e ii) o sistema

produzir resultados que sejam individual e socialmente justos.167

Assim, o Estado passou a ter de atuar positivamente para assegurar

os direitos mais basilares da população, como saúde, educação e acesso à Justiça.

A necessidade de uma atuação mais efetiva e positiva do Estado

está intimamente ligada com o Estado Democrático de Direito, eis que a simples inclusão do

acesso à justiça no rol dos direitos fundamentais (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal

de 1988) não é suficiente para assegurar a sua efetividade, o que transforma esse tema em um dos

mais discutidos na atualidade. 168

No contexto atual, o acesso à Justiça, como dito, não pode ser

resumido ao mero acesso ao Poder Judiciário. Nas palavras de Kazuo Watanabe é o “acesso à

uma ordem jurídica justa”.169

166 CAPPELLETTI, MAURO; GARTH Bryant. Acesso à Justiça. trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:Sergio

Antonio Fabris Editor, 1988, P.9 167 CAPPELLETTI, MAURO; GARTH Bryant. Acesso à Justiça. trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre:Sergio

Antonio Fabris Editor, 1988, p.8 168 MORALES, Luciana Camponez Pereira. Acesso à justiça e princípio da igualdade.Porto Alegre: Sergio Antonio

Fabris Editor, 2006, p.52. 169 WATANABE, Kazuo. Acesso À Justiça e sociedade moderna. In:Grinover, Ada Pellegrini; DINAMARCO,

Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo. (Coords.) Participação e Proceso. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988,

p.128.

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E esse acesso à Justiça, nem sempre estará vinculado a questões

processuais, pois o acesso à informação, a conscientização de direitos e a orientação jurídica, bem

como o acesso a todos os mecanismos alternativos das resoluções dos conflitos (mediações,

conciliações, arbitragem, etc.) compõem o acesso à Justiça.170

Isto porque, com o mínimo conhecimento dos direitos, dos

instrumentos existentes para sua concretização e da possibilidade de efetivação dos direitos que a

pessoa tenha acesso ao bem da vida pretendido, de forma célere e efetiva, concretizando os

valores constitucionalmente tutelados, tal como a construção de uma sociedade mais justa, livre e

solidária.

De acordo com Rodolfo de Camargo Mancuso171 é preciso

“dessacralizar o acesso à justiça”, entendendo que nem todo conflito deve ser resolvido pelo

Poder Judiciário e que devem ser estabelecidos “equivalentes jurisdicionais” como as formas

alternativas de solução de conflitos.

No plano internacional, a Resolução da OEA, AG/RES.2656 (XLI-

0/11) destaca que o acesso à Justiça não se esgota com o ingresso das pessoas na instancia

judicial.172

Porém o que impede que o acesso à Justiça seja igual para todos? O

que torna o judiciário tão distante da população brasileira?

170Nas palavras dos colegas Renato Campos Pinto de Vitto e André Luis Machado Castro: “ A tendência de adoção

dos meios alternativos de resolução dos conflitos deve ser tido como um complemento ao sistema formal de justiça e

não de substituição sob pena de precarização do serviço e consagração da máxima de que as “portas dos tribunais

estão fechadas para os pobres”” DE VITTO, Renato Campos Pinto ; CASTRO, André Luis Machado. A Defensoria

Pública como instrumento de Consolidação da Democracia. Disponível em http://www.apadep.org.br/artigos/a-

defensoria-publica-como-instrumento-de-consolidacao-da-democracia/ p. 5. Ultimo acesso em 15.04.2015. 171 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. A resolução dos conflitos e a função judicial no contemporâneo Estado de

Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p.62. 172 Disponível em http://www.aidef.org/wtksite/cms/conteudo/247/AG_RES_2656_pt.pdf ultimo acesso em

15.04.2015.

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Na obra clássica “Acesso à Justiça” de Mauro Cappelletti e Bryant

Garth foram identificados três obstáculos para o efetivo acesso, bem como criados mecanismos

para solucioná-los: as denominadas “ondas renovatórias”. Os obstáculos são os seguintes:

3.1. Obstáculo Econômico, Educacional e Temporal

O primeiro obstáculo seria a ausência de recursos para arcar com as

elevadas custas processuais e os honorários advocatícios. Além disso, a parte deve arcar com as

despesas do oficial de justiça, citações e intimações, bem como verbas de sucumbência. Assim,

resta evidente que o alto valor das custas e honorários torna-se um obstáculo ao acesso à Justiça,

especialmente quando se trata de causas de pequeno valor, pois os gastos processuais podem

extrapolar o benefício patrimonial que se auferiria com o sucesso da demanda.

O fator econômico é o obstáculo mais óbvio para o acesso à Justiça,

eis que diante da extrema desigualdade social existente em nosso País, a população mais pobre

fica excluída do sistema.173

Outro fator significativo é o tempo. Assim, o processo possui uma

sequência de atos e prazos processuais que demandam um determinado tempo para a

concretização. Porém, estes prazos não podem ser tão extensos que inviabilizem a efetividade da

tutela jurisdicional.

Nota-se que a preocupação com a efetividade é tamanha que a

Emenda 45/04, denominada Reforma do Judiciário, passou a prever a duração razoável do

processo (artigo 5º, inciso LXXVIII, da CF/88),174 compatibilizando com a Convenção

Americana de Direitos Humanos que tratava da duração razoável. No mais, o II Pacto

Republicano por uma Justiça mais ágil, célere e efetiva também tinha como objetivo a duração

razoável.175

173 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, v.I, p.185. 174 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc45.htm 175 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Outros/IIpacto.htm

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Esse cenário da Reforma traz novas oportunidades de ação para

aqueles atores que há muito vêm pautando o sistema de justiça, bem como desperta o olhar de

outros atores que se encontram fora do sistema. Isto é, com a participação popular da sociedade,

seja por meio das conferencias, ouvidorias externas, dentre outros mecanismos para a

institucionalização de direitos, surgem expectativas quanto à aplicabilidade de tais ferramentas no

sistema de justiça.

Importante contatar que cresce a necessidade de inclusão dos

destinatários do sistema de justiça no aprimoramento do acesso à Justiça, eis que o diálogo

permite a democratização. Além disso, ao ouvir as pessoas passa-se a buscar mecanismos

alternativos de resolução de conflitos, afastando-se da visão estritamente judicial.

Assim, vislumbra-se a possibilidade de novos arranjos políticos

dirigidos ao referido sistema de justiça com a participação tanto de atores do próprio sistema

quanto os de fora deste sistema com o fim de almejar a cidadania e o efetivo acesso à justiça de

todos.

3.1.1. Possibilidade das Partes

Este obstáculo está relacionado diretamente à parte, qual seja a

possibilidade financeira de arcar com as custas e honorários advocatícios, suportando a demora

das lides176, como a capacidade de reconhecer um direito e a dele fazer uso de outras medidas

judiciais.

Constata-se que parcela da população, nela compreendida

especialmente o público alvo da Defensoria Pública desconhece a existência dos direitos e os

mecanismos de proteção e salvaguarda.

A insuficiência de conhecimentos jurídicos básicos afasta-os ainda

mais do Judiciário.

176 CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio

Antonio Fabris Editora, 1988, p. 21-22.

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Nesse sentido, manifesta-se Fernando de Castro Fontainha:

“é lamentável que, de um lado, a ignorância sistemática afaste

tantas pessoas deste mundo construído do direito, e, de outro, este

próprio mundo seja construído sobre lógica alheia à realidade da

vida social mantendo tal afastamento sustentado por dois vetores

de direções opostas (...) o que faz o cidadão carente de justiça

teme-la ainda mais e sentir-se verdadeiro corpo estranho ao seu

metabolismo social”177

Nessa linha de pensamento, bem como baseado nas desigualdades

econômicas e sociais, no analfabetismo, na pobreza e nos diversos fatores de exclusão social,

Donaldo Armelim afirma “ em certas regiões do país o acesso à justiça não chega sequer a ser

reclamado por desconhecimento de direitos individuais ou coletivos”178.

Essas pessoas desprovidas de informação muitas vezes nem

percebem a violação de direitos, pois desconhecem quais são os direitos que possuem.

Há ainda outra barreira, qual seja a desconfiança em relação aos

profissionais do direito, ao ambiente intimidador dos fóruns e tribunais, dos procedimentos

complicados, etc.179

Para Boaventura de Souza Santos, por sua vez, existem três tipos de

obstáculos que impedem que as classes populares tenham acesso à justiça: econômicos, sociais e

culturais. 180

Do ponto de vista econômico, as classes populares não têm

condições de arcar com os altos custos do litígio e, especialmente em demandas de cujo valor da

177 FONTAINHA, Fernando de Castro. Acesso à Justiça: da contribuição de Mauro Cappelletti à realidade brasileira.

Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.43 178178 ARMELIM, Donaldo. Acesso à Justiça. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo: São Paulo,

n.31, p.181, jun. 1999. 179 MORAES, Ana Carvalho Ferreira Bueno, A defensoria Pública como instrumento de Acesso à Justiça,

Dissertação de Mestrado em Direito na PUC/SP, 2009. 180 SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução à sociologia da administração da justiça. Revista de Processo, São

Paulo, n.37, jan-mar, 1985.

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causa seja baixo, eis que o custo de arcar com os honorários e custa judiciais seriam

proporcionalmente mais altos do que o valor da causa propriamente dito.

Do ponto de vista social e cultural, Boaventura de Souza Santos

afirma que quanto mais baixo é o estrato social, maior é a probabilidade que desconheçam os

direitos. E mais, ainda que possam ter consciência de seus direitos, os socialmente desfavorecidos

hesitam mais em procurar a solução dos conflitos, seja por insegurança e temor de represálias.

Dessa forma, para Boaventura de Souza Santos, os estudos revelam

que a discriminação social no acesso à justiça é complexa, pois além de fatores econômicos, há

condicionantes sociais e culturais envolvidas.181

3.1.2. A questão dos Direitos Difusos

A fim de promover os direitos difusos, importante a previsão legal

da Defensoria Pública como ente legitimado para ajuizar ação civil pública quando o resultado da

demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes, seja por intermédio da criação da

Lei n◦ 7347, de 24 de julho de 1985, que tratou da Ação Civil Pública, bem como da Lei n◦ 8078

de 11 de setembro de 1990, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor.

Destarte, a Lei Complementar 132/09 passou a prever (artigo no

artigo 4°, inciso VII, da referida lei, a legitimidade da Defensoria Pública para a propositura da

ação civil pública.

Não iremos adentrar na legitimidade ou ilegitimidade da Defensoria

Pública para o ajuizamento do referido instrumento de acesso à justiça, eis que embora

aparentemente de simples constatação de que a ampliação de legitimados favoreceria a população

carente, assegurando o mais amplo acesso à justiça, tais questionamentos acarretaram inclusive o

ajuizamento de uma ADI 3943 perante o Supremo Tribunal Federal, que em Maio de 2015,

181 SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução à sociologia da administração da justiça. Revista de Processo, São

Paulo, n.37, jan-mar, 1985.

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reconheceu a legitimidade da Defensoria Pública. Interpretação diversa afrontaria diretamente a

Constituição Federal de 1988, eis que flagrante situação de restrição ao acesso à justiça.

Nos dizeres de Ana Luisa Zago de Moraes e Beatriz Lancia

Noronha de Oliveira:182

“A Defensoria Pública exsurge, pois, como importante canal de

acesso ao Poder Judiciário, mas não somente a este senão ao

próprio Poder Público, de forma levar as reivindicações dos

movimentos e conseguir avanços não apenas através de decisões

judiciais favoráveis a causas ambientais, humanitárias, ações

afirmativas, habitacionais, dentre outras, mas também fomentando

políticas públicas em prol dos movimentos sociais”.183

3.2. Ondas Renovatórias de Acesso à Justiça como solução à universalização do Acesso à

Justiça

Iniciaremos a análise do presente capítulo com as palavras de

Cappelletti e Garth:

“ O direito ao acesso efetivo à justiça tem sido progressivamente

reconhecido como sendo de importância capital entre os novos

direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos

é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva

reinvindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado

como requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos-

de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretende

garantir, e não apenas proclamar direito de todos” 184

De uma maneira extremamente reduzida, as ondas renovatórias

poderiam ser divididas da seguinte forma: 1) Primeira Onda Renovatória, a representação

182 DE MORAES, Ana Luisa Zago; OLIVEIRA, Beatriz Lancia Noronha de; Defensoria Pública da União e

Movimentos Sociais e Populares: novos caminhos traçados na concretização do direito de acesso à

justiça/Organizado por Amélia Rocha (Et.al) Dedo de Moças Editora e Comunicação Ltda: Fortaleza, 2013, p.7 183 CAPPELLETTI, MAURO; GARTH Bryant. Acesso à Justiça. trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio

Antonio Fabris Editor, 1988, p.11 184 CAPPELLETTI, MAURO; GARTH Bryant. Acesso à Justiça. trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio

Antonio Fabris Editor, 1988, p.11.

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processual e a assistência judiciária. A segunda onda pretende atuar na representação dos direitos

metaindividuais, neste campo podemos destacar a Legitimidade da Defensoria Pública para o

ajuizamento de Ações Civis Públicas (expressamente reconhecida na Lei 11448/07), o advento do

Código de Defesa do Consumidor, a Lei dos Juizados, etc. A 3ª Onda, por sua vez, pode ser

denominada “novo enfoque de acesso à justiça”, em outras palavras métodos alternativos à

resolução dos conflitos. Nesta onda renovatória a Defensoria exerce um papel significativo, pois

tem como prioridade institucional a solução extrajudicial dos conflitos. Seja por meio da

mediação, conciliação, atendimento multidisiciplinar realizado pelos Defensores Públicos com

participação do CAM- Centro de Atendimento Multidisciplinar.185

Cumpre ainda mencionar, conforme exposto, pós Constituição

Federal de 1988, que a assistência dever ser jurídica, muito mais ampla que a judiciária. Assim, a

Defensoria Pública também participa na primeira onda renovatória ao realizar palestras,

conferencias, distribuição de cartilhas, orientação jurídica, etc.

Por fim, repetindo as palavras de Renato de Vitto “ no Brasil o

movimento de acesso à justiça tem apresentado, a partir de meados do século passado avanços e

retrocessos, sendo possível afirmar que não consolidou sequer o seu primeiro ciclo”186

3.3 O Acesso à Defensoria Pública como Direito Humano Fundamental

Primeiramente, insta mencionar que prevalecem duas correntes

sobre o conceito de direito fundamental. Alguns doutrinadores, entendem que o conceito se

assemelha aos direitos humanos. Outros, por sua vez, entendem que os conceitos não se

confundem.

185 A Defensoria Pública do Estado de São Paulo realizou o primeiro concurso para psicólogos e assistentes sociais

em fevereiro de 2010, tendo implementado o Centro de Atendimento Disciplinar em abril de 2011. Os assistentes

sociais e psicólogos selecionados no concurso de 2010 estão distribuídos em três diferentes espaços: os CAMs, os

Núcleos Especializados e a Assessoria Técnica Psicossocial. Além disso, o CAM atua em três principais direções,

quais sejam o 1) mapeamento e articulação da rede de serviços; 2) apoio ao atendimento inicial nas regionais da

defensoria e 3) educação em direitos humanos e resolução extrajudicial de conflitos. 186 VITTO, Renato Campos Pinto de; CASTRO, André Luís Machado. A Defensoria Pública como instrumento de

Consolidação da Democracia. Disponível em http://www.apadep.org.br/artigos/a-defensoria-publica-como-

instrumento-de-consolidacao-da-democracia/ p.4. Ultimo acesso em 15.04.2015.

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De todo modo, dentro de uma ótica garantista e protetora dos

direitos das pessoas vulneráveis, partiremos do entendimento de que os direitos humanos são

tanto os direitos fundamentais, expressos na Constituição Federal e na Legislação Pátria, quanto

aqueles oriundos de princípios, tratados, conforme a cláusula de abertura prevista na Constituição

Federal de 1988.

Como visto, a Defensoria Pública é a instituição

constitucionalmente prevista para tutelar os direitos das pessoas vulneráveis a fim de que haja

concretização dos direitos e proteção do Estado Democrático de Direito.

Muito embora esteja incluída constitucionalmente como instituição

essencial à justiça, o objetivo maior187 é a primazia da Dignidade Humana, a afirmação do Estado

Democrático de Direito e a prevalência e efetividade dos direitos.. Assim, muito mais essencial

do que à função jurisdicional, a Defensoria Pública é instituição salutar para a inclusão social,

redução das desigualdades sociais e acima de tudo a consolidação do Estado Democrático de

Direito.

Além disso, como exporemos em outros capítulos, a Defensoria

exerce uma atuação jurídica diversa das outras instituições, eis que sua atuação não se restringe

ao âmbito estritamente formal (justiça formal), mas a práticas extra-processuais de educação de

direitos e efetivação e resolução de conflitos (meios alternativos das resoluções de conflitos),

justamente com o escopo de propiciar alternativas ao acesso à justiça e a implementação dos

direitos da pessoa humana.

Isto porque o mero acesso ao poder Judiciário não é suficiente para

assegurar a promoção e efetivação de direitos. Assim, interpretar o direito de acesso à justiça de

187 Artigo 3º-A , da Lei Complementar n.º 80/94, in verbis: “Art. 3º-A. São objetivos da Defensoria Pública:

(Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).I – a primazia da dignidade da pessoa humana e a redução das

desigualdades sociais; (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).II – a afirmação do Estado

Democrático de Direito; (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).III – a prevalência e efetividade dos

direitos humanos; e (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).IV – a garantia dos princípios

constitucionais da ampla defesa e do contraditório. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009)”.

Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp80.htm último acesso em 15.12.15.

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forma ampla, incluindo também os mecanismos facilitadores, seria uma interpretação coerente

com os valores constitucionais e com a máxima proteção da igualdade real.

Porém, como dito, os usuários da Defensoria Pública desconhecem

a existência dos seus direitos, de modo que a ampliação do Acesso à Justiça, permite a inclusão e

a realização da Dignidade da Pessoa Humana.

Assim, ao nivelar a diversidade da sociedade, nela compreendida

especialmente o conhecimento dos direitos, pode-se buscar a promoção de direitos e a efetividade

da justiça.

O acesso à Justiça não pode ser visto apenas como mero acesso ao

órgão do Judiciário e sim a concretização dos direitos e valores constitucionalmente previstos

para todos, em outras palavras, um acesso à Justiça de forma igualitária e universal.

Conforme Earl Johnson Jr:

“As pessoas pobres têm o direito de contar que os defensores

públicos aos quais compete prestar-lhes assistência jurídica: são os

“seus” advogados, plenamente leais a si e a seus interesses, e não

aos (interesses) do governo ou de quem quer que seja que tenha

influência sobre os governantes. Quando são satisfeitas tais

expectativas, a Justiça igualitária/isonômica é efetivada, e o

contrato social resta intacto. Porém, quando essas expectativas não

são correspondidas, a Justiça é desigual, e o contrato social está

sob ameaça”.188

Nesse passo, quando a Constituição Federal de 1988 intentou

garantir a todos, sem qualquer exclusão ou discriminação, o acesso à justiça, como forma de

188 JUNIOR, Earl Johnson. A essência do acesso igualitário à Justiça: patronos verdadeiramente independentes para

os pobres, traduzido pro Cleber Francisco Alves, disponível na íntegra em

https://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?id=25261 último acesso em 06.12.2015

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concretização do Estado Democrático de Direito, de nada adianta elencar um rol de direitos

humanos fundamentais se, em caso de violação, eles não puderem ser assegurados.189

Observa-se que a Reforma do Judiciário, destacou a importância da

Defensoria Pública e da autonomia institucional, especialmente em razão da necessidade desta

instituição exercer com plenitude os poderes conferidos constitucionalmente, eis que qualquer

redução ou impedimento das prerrogativas, em especial da autonomia, afetará o acesso à Justiça e

repercutirá na concretização dos direitos das pessoas.190

Nas palavras de Renato de Vitto e André Luis Machado de Castro:

“A concretização do acesso à justiça deve ser encarado como um

passo necessário para a efetiva consolidação da democracia no

Brasil, vez que se trata de direito fundamental de inegável

expressão em nosso sistema constitucional, não havendo como se

falar em exercício de cidadania sem que se instrumentalize a

salvaguarda de todos os outros direitos previstos em nosso sistema,

baseado na igualdade” 191

Nesse sentido, o papel da Defensoria Pública é primordial no

processo de construção de cidadania da população carente e excluída socialmente, eis que a

garantia constitucional do acesso ao Poder Judiciário nem sempre é assegurada a todos

igualmente.

Nas palavras do Ministro Celso de Mello:

189 FELISMINO, Lia Cordeiro. A Defensoria Pública como Instrumento de Efetivação do Direito Fundamental

de Acesso à Justiça. Trabalho publicado nos Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em São

Paulo – SP nos dias 04, 05, 06 e 07 de novembro de 2009. 190Disponível em

http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/carbonari/carbonari_relatorio_reforma_do_judiciario.pdf, último acesso

em 14.12.2015. 191 DE VITTO, Renato Campos Pinto, CASTRO, André Luís Machado de. Defensoria Pública como instrumento de

consolidação da democracia in Slakmon, Catherine; Machado, Maíra Rocha; Bottini, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas

direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p.237.

Disponível em http://www.esteio.rs.gov.br/documents/SMSMU/governanca%20na%20seguranca%20-

%20material%20do%20MJ.pdf último acesso em 18.11.2015.

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“ a Defensoria Pública é o instrumento jurídico-institucional

concebido pelo Estado Brasileiro para permitir que as promessas

constitucionais, notadamente em tema de Direitos civis,

econômicos, sociais, não se tornem proclamações vãs, retóricas e

inconsequentes”.192

O próprio acesso à Justiça é um direito, eis que através dele será

possível a efetivação dos demais direitos. Porém, o desconhecimento dos direitos, afasta as

pessoas da justiça. Assim, o acesso à Defensoria Pública também pode ser reconhecido como um

direito, eis que as pessoas vulneráveis necessitam de um órgão para orientá-las e defendê-las, seja

judicial ou extrajudicialmente.

Igualmente, a Defensoria Pública por exercer o papel de promover o

acesso à justiça dos vulneráveis, torna-se instrumento essencial para um sistema de justiça

igualitário.

Logo, o papel da Defensoria Pública é indispensável para a

concretização do acesso à Justiça de todos. De modo que não se pode analisar a Defensoria

Pública sob a ótica de política pública assistencialista, mas política pública de justiça. Isto porque

não apenas integra o papel constitucionalmente previsto de inclusão social como é essencial a

função jurisdicional do Estado.

Colocá-la apenas no caráter assistencialista, seria enfraquecer a

importância da Defensoria Pública como instituição necessária a promoção e efetivação dos

direitos dos vulneráveis,193 enfraquecendo o caráter democrático e o Sistema de Justiça.

Assim sendo, como a Defensoria Pública é uma instituição

essencial ao sistema de justiça e o acesso ao Judiciário é um direito fundamental, pode-se afirmar

que o acesso à Defensoria Pública também é um direito. Isto porque, se a pessoa necessita

192 ADI 3643-2 STF. 193 De acordo com as “100 Regras de Brasília”, os beneficiários das regras são “ aqueles que por razão da idade,

gênero, estado físico ou mental, ou por circunstâncias sociais, econômicas, étnicas e/ou culturais, encontram

especiais dificuldades em exercitar com plenitude perante o sistema de justiça os direitos reconhecidos pelo

ordenamentojurídico”.http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/100%20Regras%20de%20Acesso%20%

C3%A0%20Justi%C3%A7a.pdf p.5.

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ingressar no Judiciário para a efetivação de um direito, ela também faz jus ao instrumento

facilitador do acesso, qual seja a Defensoria Pública.

Além disso, se a pessoa necessita da Defensoria Pública para

ingressar no Sistema de Justiça, importante que esta instituição seja dotada de autonomia e

independência. Logo, o fortalecimento da Defensoria Pública como instituição essencial ao

sistema de justiça é um direito da pessoa humana, que deve ser implementado e efetivado pelo

Estado.194

Porém como dar cumprimento aos direitos fundamentais dos

vulneráveis? Como torná-los efetivos?

É nessa seara que surge a Defensoria Pública como instrumento de

concretização do direito e do acesso igualitário de justiça, eis que direito humano a ser exigido

nacional e internacionalmente.

3.4. O Direito Internacional dos Direitos Humanos na América e a Defensoria Pública

Neste tópico, serão analisados os documentos internacionais que

asseguram o acesso à justiça e identificam normativamente a Defensoria Pública como o

instrumento estatal necessário para a concretização e consolidação do acesso à justiça das pessoas

em condições de vulnerabilidade. 195

194 Corroborando com esse entendimento podemos indicar a Emenda Constitucional n.º 80/14 que determinou, em 8

anos, a criação da Defensoria Pública em todas as comarcas do Brasil. Tal medida, representou uma vitória no

sistema de justiça, eis que com a extensão da Defensoria se reconhece o importante papel que a instituição exerce no

acesso à justiça. 195 As “Regras de Brasília sobre Acesso à Justiça das Pessoas em Condição de Vulnerabilidade” (Décima Quarta

Conferência Judicial Ibero-Americana, Brasília, República Federativa do Brasil, 2008), que visam a garantir o acesso

afetivo à justiça das pessoas em condição de vulnerabilidade, sem discriminação alguma, para que essas pessoas

possam usufruir plenamente dos serviços do sistema judiciário; e que promovem, ademais, a implementação de

políticas públicas destinadas a proporcionar às pessoas assistência técnico-jurídica ( vide

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/11698/AG_RES_2656_pt.pdf)

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É notório observar que muito embora a Declaração Universal dos

Direitos Humanos e a Declaração Dos Direitos do Homem e do Cidadão sejam da década de 40,

apenas em 2011 é que foram publicadas as Resoluções 2.656-OEA-2011 e 2.741-OEA-2012,

bem como a Recomendação MERCOSUR/CMC/REC n. 01/12 que tratam formalmente do

acesso à justiça.

É claro que a previsão internacional fortalece o papel de atuação da

Defensoria Pública, porém, a efetivação e cumprimento ainda carecem de plenitude.196197

Percebe-se um esforço exitoso do CONDEGE – Conselho Nacional

de Defensores Públicos Gerais e da ANADEP – Associação Nacional de Defensores Públicos,

bem como da AIDEF- associação interamericana de Defensorias Públicas e do Bloco de

Defensores Oficiais do Mercosul, para uma atuação integrada e complementar.

O mesmo se verifica nos trabalhos desempenhados pelo Colégio

Nacional de Corregedores Gerais- GNCG, pelo Colégio de Ouvidorias de Defensorias Públicas

do Brasil198 e pelas Comissões Temáticas do CONDEGE.

196 Verifica-se, por exemplo, o estudo realizado pela Defensoria Pública Bandeirante, no relatório “ o Uso do Habeas

Corpus pela Defensoria Pública de São Paulo”, Disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/RELAT%C3%93RIO%2022112012%20vers%C3%A3o%20fin

al%20sem%20revis%C3%A3o%2023112012.pdf. Último Acesso em 28.08.15. 197 A realidade da instituição ainda é muito heterogênea no Brasil. Há Estados que apresentam uma estrutura mais

adequada e outros bastantes deficitária, tal como explicado em capítulo próprio. De todo modo, já há significativas

mudanças entre 2004 e 2009, conforme se verificam nos 3 Diagnósticos da Defensoria Pública Brasileira, nos anos

de 2004, 2006 e 2009, realizados pelo Ministério da Justiça com apoio da PNUD- Programa das Nações Unidas para

o desenvolvimento, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf último acesso em 28.08.2015. 198 O Colégio de Ouvidorias possui entre os objetivos institucionais a promoção e divulgação de estudos sobre o

funcionamento das Ouvidorias Públicas, a defesa dos princípios, prerrogativas e funções institucionais da Defensoria

Pública, a promoção de estudos e ações que permitam a construção de indicadores de demandas a partir da

perspectiva do cidadão usuário da defensoria, movimentos sociais e populares. Ademais, tem como objetivo

fortalecer as ouvidorias externas das Defensorias Públicas. Atualmente, a diretoria do Colégio de Ouvidorias tem a

seguinte composição: Diretora Presidenta: Ana Virgínia Ferreira Carmo (Ouvidora-Geral da Defensoria Pública do

Ceará); Diretora Vice-Presidenta: Tânia Maria Gonçalves Palma Santana (Ouvidora-Geral da Defensoria Pública da

Bahia); Secretária-Geral: Maria Lourdes “Santa” de Souza (Ouvidora-Geral da Defensoria Pública do

Paraná); Secretário Adjunto: Paulo Rogério Lemos Melo de Menezes (Ouvidor-Geral da Defensoria Pública do Mato

Grosso); Diretora Jurídica: Núbia Fernanda Greve de Musis (Ouvidora-Geral da Defensoria Pública do

Acre); Diretor de Assuntos Legislativos: Bruno Pinto de Freitas (Ouvidor-Geral da Defensoria Pública do Rio

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3.4.1. Tratados Internacionais de Direitos Humanos

Após a 2ª Guerra Mundial o mundo passou a preocupar-se

efetivamente com a dignidade da pessoa humana e a proteção internacional dos direitos humanos.

Diversos instrumentos internacionais de direitos humanos, ainda que implicitamente, passaram a

sustentar a obrigação do Estado de prestar assistência jurídica integral e gratuita a pessoa em

condição de vulnerabalidade, de forma independente e eficaz.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, em diversos artigos

prevê o acesso igualitário aos serviços públicos e o direito à plena realização de direitos.199

O Pacto dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, prevê no

artigo 2º a garantia da não discriminação, o que esta intimamente relacionado com o papel da

Defensoria Pública: de instituição e instrumento de viabilização do acesso à justiça e da

concretização de direitos.

O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, por sua vez,

prevê expressamente nos artigos 14 e 26 o direito de ser defendido por um defensor e, na falta de

recursos financeiros de ter conhecimento da possibilidade de ter um defensor nomeado pelo

Estado.

Além disso, o direito de acesso à justiça foi reafirmado no artigo 6º,

inciso 1º e demais da Convenção Europeia de Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais

(1950), no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966) no artigo 14º, § 1º e seguintes,

bem como, no âmbito do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, no artigo

XVIII da Declaração Americana de Direitos Humanos e Deveres (1948) e no artigo 8º, inciso 1º e

seguintes da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José de 1969).

Grande do Sul). Dados extraídos do http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=5485 último

aceso em 11.11.15. 199 Artigos, 6, 7, 11.1, 21.2, 28 da DUDH.

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Nota-se assim, que a normativa internacional tratou do acesso aos

direitos e da existência de um mecanismo para efetivá-los “num contexto em que se reconhece

que o Estado Democrático de Direito tem como uma de suas funções essenciais a realização dos

direitos fundamentais pelos seus titulares, sejam tais direitos individuais, coletivos ou

difusos’”200

3.4.2. A Convenção Americana de Direitos Humanos

O Pacto de São José da Costa Rica, também denominado

Convenção Americana de Direitos Humanos, integra o Sistema Interamericano de Direitos

Humanos é bastante claro sobre o direito à assistência jurídica integral e gratuita.

No artigo 8º que trata das Garantias Judiciais o diploma

internacional é expresso :

“ direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser

assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se,

livremente e em particular, com seu defensor;’ e “direito

irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo

Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o

acusado não se defender ele próprio nem nomear defensor dentro

do prazo estabelecido pela lei.

É importante lembrar que o Sistema Interamericano de Direitos

Humanos é um sistema regional existente para garantir a implementação dos direitos consagrados

na Convenção Americana de Direitos Humanos. Porém, nada o impede de buscar a concretização

de direitos consagrados no Sistema Global, eis que os direitos humanos “ não são um dado, mas

um construído”.201

200 Carlos Weiss. “As Defensorias Públicas e os direitos econômicos, sociais e culturais”. Revista da Defensoria

Pública do Estado de São Paulo, Ano p.78-79) 201 Hannah Arendt, As origens do totalitarismo. A respeito, ver também Celso Lafer, A reconstrução dos direitos

humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt, p. 134. No mesmo sentido, afirma Ignacy Sachs: “Não

se insistirá nunca o bastante sobre o fato de que a ascensão dos direitos é fruto de lutas, que os direitos são

conquistados, às vezes, com barricadas, em um processo histórico cheio de vicissitudes, por meio do qual as

necessidades e as aspirações se articulam em reivindicações e em estandartes de luta antes de serem reconhecidos

como direitos” (Ignacy Sachs, Desenvolvimento, direitos humanos e cidadania, in Direitos humanos no século XXI,

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Nas palavras de Flávia Piovesan:

“o conteúdo normativo de ambos os instrumentos internacionais,

tanto o global como o regional, devem ser similares em princípio,

refletindo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que é

proclamada como um código comum a ser alcançado por todos os

povos e todas as nações”. 202

Além disso, a Corte de Direitos Humanos, no exercício da

atribuição consultiva, pode emitir parecer relacionados à interpretação da convenção ou de

qualquer outro tratado relativo à proteção dos direitos humanos nos Estados- Americanos. É o

que ela fez com a edição da Opinião Consultiva n.º 18/2003 proposta pelo México sobre a Não

discriminação de imigrante ilegal.

Nesse contexto de acesso à Justiça prestado pelo Estado à pessoa

em condição de vulnerabilidade, relevante a análise das seguintes decisões da Corte

Interamericana.

12 de Novembro de 1997- Caso Rafael Iván Suárez Rosero

versus Equador- a Corte entendeu, entre outras violações, que o artigo 8ª da Convenção

Americana de Direitos Humanos teria sido violado, eis que Suárez não foi avisado do direito de

ter acesso a um defensor pago pelo Estado, como também não teve acesso a ele203

p. 156). Para Allan Rosas: “O conceito de direitos humanos é sempre progressivo. (…) O debate a respeito do que

são os direitos humanos e como devem ser definidos é parte e parcela de nossa história, de nosso passado e de

nosso presente” (Allan Rosas, So-called rights of the third generation, in Asbjorn Eide, Catarina Krause e Allan

Rosas, Economic, social and cultural rights, p. 243). 202 PIOVESAN. Flavia. Introdução ao Sistema Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos: a convenção

americana de Direitos Humanos. In: Gomes, Luis Flavio. Piovesan, Flavia. O sistema interamericano de proteção aos

direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p.24. 203 A sentença na íntegra está disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_35_esp.pdf. Nota-

se que a questão de fundo foi o desconhecimento do direito, o que está intimamente ligado com o papel da

Defensoria Pública de educação em direitos, eis que não basta o Estado disponibilizar o serviço, mas informar a

todos da existência deste direito.

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30 de Maio de 1999- Caso Castillo Petruzzi y otros versus Perú-

a Corte entendeu, entre outras violações, pela ausência de disponibilização de um defensor deste

a data da detenção.204

7 de Setembro de 2004- Caso Tibi versus Ecuador- a Corte

entendeu que há violação da convenção quando não foi conferido ao Tibi o direito de ser

assistido por um defensor de sua escolha ou um defensor nomeado pelo Estado205.

17 de Novembro de 2009- Caso Barreto Leiva Versus

Venezuela- a corte, por sentença, entendeu que o fato do órgão de acusação estar presente não

justificava a ausência do Defensor. 206

Por fim, importante constatar a existência de uma normativa

estrutural da Defensoria Pública, quais sejam as Resoluções 2656/2011- OEA, 2714/2012-OEA e

2801/2013-OEA, bem como a recomendação MERCOSUR/CMC/REC n. 1/2012.

Cumpre ainda informar que a Corte Interamericana de Direitos

Humanos, no ano de 2010, firmou um acordo de entendimento com a Associação Interamericana

de Defensorias Públicas (AIDEF) para que nos casos em que a vítima for desprovida de

condições econômicas e de representação processual perante a Corte, a AIDEF seja acionada, por

intermédio da Coordenação Geral, na qual no prazo de 10 dias, irá designar gratuitamente207 um

Defensor Público Interamericano para assumir a defesa e representação processual, para que os

direitos sejam efetivamente garantidos208

204 A íntegra da decisão está disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_52_esp.pdf 205 A íntegra da decisão está disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_114_esp.pdf 206 A íntegra da decisão está disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_206_esp.pdf 207 O Defensor Interamericano poderá ser sustentado com o “Fundo de Assistência Jurídica do Sistema

Interamericano de Direitos Humanos”. Além disso, em 4 de Fevereiro de 2010 emitiu-se o Regulamento da Corte

sobre o funcionamento do Fundo de Assistência Jurídica as vítimas , o qual entrou em vigor em 01 de Junho de 2010

. Assim, toda pessoa que carece de recursos econômicos para saldar os cursos que origina um processo perante a

corte poderá acolher-se do fundo. Disponível em http://www.corteidh.or.cr/sitios/informes/docs/POR/por_2010.pdf

p. 16 e p. 18. 208O Brasil, indicou representantes à AIDEF. Na primeira seleção, como titulares, tivemos os Defensores Públicos

Antonio José Maffezoli Leite (SP) e Roberto Tadeu Vaz Curvo (MT). Na segunda seleção, o Defensor Público

Antonio José Leite Maffezoli Leite foi reconduzido e o Defensor Público Carlos Eduardo Barros da Silva (PA)

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Esse acordo tem como objetivo dar concretude ao artigo 2º do

regulamento atual209 da Corte Interamericana de Direitos Humanos, aprovado no LXXXV

Período Ordinário de Sessões realizado em São José, Costa Rica, de 16 a 28 de Novembro de

2009, in verbis:

“ Artigo 2. Definições para os efeitos deste regulamento: 11. A

expressão “Defensor Interamericano” significa a pessoa que a

corte designe para assumir a representação legal de uma suposta

vítima que não tenha designado um defensor por si mesma”“Artigo

37. Defensor Interamericano, Em casos de supostas vítimas sem

representação legal devidamente credenciada o tribunal poderá

designar um Defensor Interamericano de ofício que as represente

durante a tramitação do caso”

Nota-se assim, que há, no sistema Regional um diploma normativo

e jurisprudencial voltado a efetivar a autonomia e importância da Defensoria Pública no acesso

à justiça.210

3.4.3 A Resolução da Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Soft Law

Na seara dos Direitos Humanos deve-se buscar a maximização dos

direitos. Assim, em que pese haver corrente doutrinária sustentando que a força normativa de

determinadas normas (Resoluções e Recomendações da OEA e da ONU) não seja legalmente

vinculante (“soft Law”), eis que desprovidas de força vinculativa formal e de grande eficácia

interpretativa material, capazes de provocar sanções morais e políticas, filiamo-nos ao

entendimento de que a força cogente destes documentos é evidenciada pela interpretação

autentica que representam.

eleito. No caso brasileiro a eleição foi feita por meio de um edital conjunto entre a ANADEP ( Associação Nacional

de Defensores Públicos) e CONDEGE ( Conselho de Defensores Públicos Gerais) estabelecendo critérios objetivos

para a seleção, dando como prioridade a qualificação técnica e os conhecimentos práticos e teóricos sobre o Sistema

Interamericano de Direitos Humanos ( ROCHA. Amélia Soares da. Defensoria Pública: fundamentos, organização e

funcionamento. São Paulo: Atlas, 2013) 209 Em 1º de Janeiro de 2010 entrou em vigor o novo regulamento da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Disponível em http://www.corteidh.or.cr/sitios/informes/docs/POR/por_2010.pdf 210 “Afirmar que o acesso à justiça, como direito humano fundamental, é, ao mesmo tempo, o meio que possibilita

que se restabeleça o exercício dos direitos que tenham sido ignorados ou violados”. Extraído da Resolução da OEA

que tratou da Defensoria Pública. http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/11698/AG_RES_2656_pt.pdf

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Assim, ainda que não integrem formalmente a categoria de “hard

law” devem ser cumpridas justamente em razão do conteúdo material.

No caso das Resoluções 2656 e 2714-OE e a Recomendação

MERCOSUR/CMC/Rec. N. 1/12, tais documentos tratam da interpretação do artigo 14 do Pacto

dos Direitos Civis e Políticos e do artigo 8º da Convenção Americana de Direitos Humanos como

direito à Defensoria Pública. Vejamos.

RESOLUÇÃO 2656/2011 da OEA- aprovada por unanimidade de

todos os países presentes durante o 41º Período de sessões ordinárias da Assembleia Geral da

Organização dos Estados Americanos- OEA. Aborda o tema “do acesso à justiça como um

direito autônomo, que permite exercer e proteger outros direitos, e ainda impulsiona o papel da

Defensoria Pública oficial como ferramenta eficaz para garantir o acesso à justiça das pessoas

em condição de vulnerabilidade, resultando um avanço transcendental para o fortalecimento das

Defensorias Públicas nos países da região”211

Estabelece ainda que devem ser eliminados os obstáculos que

afetem ou limitem o acesso à defensoria pública, de maneira que seja assegurado o livre e pleno

acesso à justiça.

A Resolução enfatiza a importância da autonomia e independência

da Defensoria Pública para a concretização do acesso à justiça e consolidação da democracia.212

211 Matéria disponível em http://www.apadep.org.br/news/2011/0ea-organizacao-dos-estados-americanos-aprova-

historica-resolucao-sobre-independencia-e-autonomia-da-defensoria-publica” 212 A Resolução 2656/11 da OEA resolve também: 1. Afirmar que o acesso à justiça, como direito humano

fundamental, é, ao mesmo tempo, o meio que possibilita que se restabeleça o exercício dos direitos que tenham sido

ignorados ou violados. 2. Apoiar o trabalho que vêm desenvolvendo os defensores públicos oficiais dos Estados do

Hemisfério, que constitui um aspecto essencial para o fortalecimento do acesso à justiça e à consolidação da

democracia.

3. Afirmar a importância fundamental do serviço de assistência jurídica gratuita para a promoção e a proteção do

direito ao acesso à justiça de todas as pessoas, em especial daquelas que se encontram em sSituação especial de

vulnerabilidade. 4. Recomendar aos Estados membros que já disponham do serviço de assistência jurídica gratuita

que adotem medidas que garantam que os defensores públicos oficiais gozem de independência e autonomia

funcional. 5. Incentivar os Estados membros que ainda não disponham da instituição da defensoria pública que

considerem a possibilidade de criá-la em seus ordenamentos jurídicos. 6. Instar os Estados a que promovam

oportunidades de cooperação internacional para o intercâmbio de experiências e boas práticas na matéria. 7.

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RESOLUÇÃO 2714/12 da OEA-213 214 Aprovada por

unanimidade no 41º Período de Sessões Ordinárias da Assembléia Geral da OEA, reunida nos

dias 4 e 5 de Junho, na cidade de Cochabamba, na Bolívia. Tal resolução enfatiza a importância

da independência dos Defensores Públicos, da integração da Defensoria Pública, bem como

reforça o cumprimento pelos estados-membros da Resolução 2656/2011.215

Incentivar os Estados e os órgãos do Sistema Interamericano a que promovam a celebração de convênios para a

oferta de capacitação e formação dos defensores públicos oficiais. 8 Apoiar o trabalho da Associação

Interamericana de Defensorias Públicas (AIDEF), no fortalecimento da defesa pública nos Estados membros. (vide

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/11698/AG_RES_2656_pt.pdf)

213 A Resolução 2719/12 da OEA resolve: Afirmar que el acceso a la justicia, en tanto derecho humano

fundamental es, a la vez, el medio que permite restablecer el ejercicio de aquellos derechos que hubiesen sido

desconocidos o vulnerados. 2. Apoyar el trabajo que vienen desarrollando los Defensores Públicos Oficiales de los

Estados del Hemisferio, el cual constituye un aspecto esencial para el fortalecimiento del acceso a la justicia y la

consolidación de la democracia. 3. Afirmar la importancia fundamental que tiene el servicio de asistencia letrada

gratuita prestada por los Defensores Públicos Oficiales para la promoción y protección del derecho de acceso a la

justicia de todas las personas, en particular de aquellas que se encuentran en una situación especial de

vulnerabilidad. 4. Reiterar a los Estados Miembros que ya cuentan con el servicio de asistencia letrada gratuita que

adopten acciones tendientes a que los defensores públicos oficiales gocen de independencia y autonomía

funcional.5. Alentar a los Estados que aún no cuenten con la institución de la defensa pública, que consideren la

posibilidad de crearla en el marco de sus ordenamientos jurídicos. 6. Exhortar a los Estados a promover

oportunidades de cooperación internacional para el intercambio de experiencias y buenas prácticas en la materia.

7. Alentar a los Estados y a los órganos del sistema interamericano a promover la celebración de convenios para la

realización de capacitaciones y formación de los defensores públicos oficiales. 8. Solicitar al Consejo Permanente la

realización de una sesión especial en la Comisión de Asuntos Jurídicos y Políticos de la OEA sobre el intercambio

de buenas prácticas y experiencias, en el primer trimestre del año 2013, con la presencia de los Estados miembros,

integrantes de la Asociación Interamericana de Defensorías Públicas (AIDEF), expertos del sector académico y de

la sociedad civil, así como de las organizaciones internacionales. 9. Solicitar a la Secretaría General de la OEA a

que, a través del Departamento de Derecho Internacional de la Secretaría de Asuntos Jurídicos, informe sobre la

implementación de los mandatos de la resolución AG/RES 2656 (XLI-O/11) y elabore una compilación de buenas

prácticas sobre acceso a la justicia y defensa pública en la región durante el segundo semestre de 2013, con base en

la remisión de aportes que los Estados realicen por escrito sobre la temática y también, con base en los resultados

de la sesión especial para el intercambio de buenas prácticas y experiencias a realizarse el primer trimestre de ese

año. 10. Felicitar la iniciativa de realizar el V Congreso de la Asociación Interamericana de Defensorías Públicas

(AIDEF), a realizarse los días 15, 16 y 17 de Agosto del año 2012, en la ciudad de Fortaleza, República Federal del

Brasil, en el cual disertarán expertos nacionales e internacionales sobre el rol de la Defensa Pública en la

efectivización de los derechos humanos. En este evento se dará especial tratamiento a los avances y desafíos de la

región en la aplicación de las disposiciones de la Resolución AG/RES. 2656 (XLI-O/11) “Garantías para el acceso a

la justicia. El rol de los defensores oficiales”.

11. Solicitar al Consejo Permanente que informe a la Asamblea General, en su cuadragésimo tercer período

ordinario de sesiones, sobre la implementación de la presente resolución, cuya ejecución estará sujeta a la

disponibilidad de recursos financieros en el programa-presupuesto de la Organización y otros recursos. Disponível

em http://www.aidef.org/wtksite/cms/conteudo/246/RES._2714.pdf.

214 A Resolução nº 2714 de 2012 é o segundo documento normativo aprovado pela Assembleia Geral da OEA que

aborda diretamente a questão da importância da Defensoria Pública para a promoção do acesso à justiça. Na

Resolução n. 2656, a OEA, pela primeira vez, recomendava a todos os Estados membros a instalação de Defensorias

Pública dotadas de autonomia e independência funcional. (vide

http://www.anadep.org.br/wtksite/grm/envio/1396/index.html 215 Esta resolução da OEA, além de “reiterar aos Estados Membros que já contam com o serviço de assistência

jurídica gratuita, que adotem ações tendentes a que os Defensores Públicos Oficiais gozem de independência e

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RECOMENDAÇÃO DO MERCOSUR/CMC/01/12- reitera o

entendimento da OEA e tem como objetivo “promover e aprofundar, em conformidade com os

ordenamentos jurídicos internos, o modelo de Defesa Pública oficial gratuita e integral nos

Estados-partes, em âmbito nacional, provincial, estadual e/ou departamental, segundo

corresponda; com órgãos independentes, com autonomia funcional e financeira, com fins de

fortalecer o acesso à justiça das pessoas em condição de vulnerabilidade”216

3.5. O Defensor Público como Agente de Transformação Social

A Constituição Federal de 1988 comprometeu-se com a

transformação social para a construção de uma sociedade mais livre, justa e solidária

Além disso, por meio da cláusula de abertura possibilitou que os

Tratados Internacionais de Direitos Humanos ingressassem no ordenamento jurídico pátrio,

ampliando o leque de proteção dos direitos da pessoa humana.

Não obstante a nova Constituição garantista de 1988 persistem

flagrantes violações de direitos humanos.

Sabe-se que o Judiciário está sobrecarregado de processos judiciais

e que não atende à crescente demanda de ações.

Além disso, quando a Constituição Federal de 1988 assegurou o

acesso à Justiça reconheceu não apenas o acesso formal, mas um acesso célere e efetivo.

Assim, a fim de que os direitos dos indivíduos sejam atingidos, necessária a observância de

mecanismos facilitadores de acesso.

autonomia funcional”, dá um grande passo no sentido de cobrar uma resposta efetiva dos Estados membros sobre o

cumprimento da da Resolução AG/RES. 2656, de 2011.

(vide http://www.anadep.org.br/wtksite/grm/envio/1396/index.html) 216 Nas palavras proferidas pela colega Amélia Soares da Rocha ( Defensora Pública ) na obra: Defensoria Pública,

fundamentos organização e funcionamento.

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101

Não se está aqui querendo afastar a tutela jurisdicional da pessoa

vulnerável, mas resguardar uma prestação efetiva, quando o Judiciário não puder consagrar

aquele direito dentro de um prazo razoável. Nesse contexto surgem os mecanismos

alternativos à resolução dos conflitos e acima de tudo investimento na mudança de cultura da

população.

Nas palavras de Cândido Rangel Dinamarco:

“acesso à justiça não equivale a mero ingresso em juízo. A própria

garantia constitucional da ação seria algo inoperante e muito

pobre caso se resumisse a assegurar que as pretensões das pessoas

cheguem ao processo, sem garantir-lhes também um tratamento

adequado”.217

Além disso, os custos ainda são obstáculos para o acesso à justiça,

de modo que se deve buscar políticas de garantia de acesso que ultrapassam a mera atuação

perante o judiciário. Deve-se buscar a redução das desigualdades sociais e o favorecimento da

coesão social.

De acordo com dados obtidos pela Fundação Getúlio Vargas, em

2013, o Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJ Brasil) confirmou que a situação pela

percepção do cidadão brasileiro continua negativa em relação ao judiciário. Dados do 2º

Semestre de 2013 revelaram que para 90% dos entrevistados, o judiciário é moroso e 82%

consideraram que os custos para acessar o Judiciário são muitos altos.218

Evidente, portanto, que o Estado não consegue monopolizar

satisfatoriamente a solução dos conflitos através dos processos, de modo que se tornam

necessários procedimentos alternativos e políticas públicas de acesso à justiça que

ultrapassam o mero ingresso no Poder Judiciário.

217 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito processual civil. 3.ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

P.115, .v . I. 218 Índice de Confiança na Justiça Brasileira. Relatório do 2º Semestre de 2013. FGV.p.23. In:

http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bistream/handle/10438/11575/Relat%c3%brrio%20ICJBrasil%20-

%202%c2%ba%20Semestre%20-%202013.pdf?sequence=1 último acesso em 14.04.2015.

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102

No ano de 2003, no âmbito do Poder Executivo foi criada a

Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça com o escopo de elaborar

políticas públicas para propiciar melhorias no acesso à justiça. A partir dela instrumentos

foram ratificados, entre os três poderes (judiciário, legislativo e executivo) buscando uma

justiça mais célere, ágil e efetiva: o I Pacto Republicano por um judiciário mais rápido e

republicano, o II Pacto (2009) por um sistema de justiça mais acessível.

Mais uma vez a Defensoria Pública surge como instrumento apto a

propiciar o acesso, trazer cidadania e fomentar uma mudança de cultura na sociedade, eis que a

consolidação desses direitos passa pelo aperfeiçoamento do sistema de justiça, bem como pela

defesa intransigente dos direitos.

Nota-se que as “100 Regras de Brasília”, instrumento normativo de

acesso à justiça reconhece a necessidade da promoção e divulgação de informações básicas

sobre os direitos da população.219 Reconhece ainda a assistência de qualidade, especializada e

gratuita; a simplificação do processo; a difusão e informação; a utilização de uma linguagem

mais acessível; a desnecessidade de comparecimentos dispensáveis (eis que relevante parcela da

população tem problemas no trabalho com faltas relacionadas as diversas idas aos órgãos do

sistema de justiça) entre outras medidas facilitadoras do acesso.

Nos dizeres de Renata Tavares da Costa Bessa:

“(...)Usuário da defensoria não é um assistido por uma autoridade,

da mesma forma que um colono era tratado pelos coronéis. È um

cidadão em busca de seus direitos. Tanto para colocar na cabeça

deste cidadão que deve defender seus direitos, deixar de ser

paternalista, deve assumir algumas posturas: usar uma linguagem

simples tratá-lo bem, com se estivera em casa, ter paciência e

219http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/100%20Regras%20de%20Acesso%20%C3%A0%20Justi%C

3%A7a.pdf p. 10

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escutar e tratar de identificar todos os problemas que possam ser

solucionados pela instituição”.220

Não é sem razão que o Supremo Tribunal Federal considera o

Defensor Público um agente de concretização do acesso dos necessitados à ordem jurídica.221.

Cumpre ainda mencionar que se não é possível a coexistência de uma

Defensoria Pública em um Estado Totalitário, deve se reconhecer que não existe democracia

(legítima) sem uma Defensoria Pública consolidada, forte e atuante.222

Logo, a atuação conjunta da sociedade civil com a Defensoria Pública

potencializa a transformação social e o exercício das necessidades fundamentais dos grupos mais

vulneráveis, o que contribui para que grande parcela da população seja realmente ouvida e tenha

os seus direitos garantidos e efetivados, colaborando para a construção de uma sociedade mais

livre, justa e solidária.

Nota-se que no II Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil,

promovido no ano de 2006 pelo Ministério da Justiça e o Programa Nacional das Nações Unidas

pelo Desenvolvimento (PNUD), o então Ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos refere que:

“As instituições sólidas são os instrumentos que as democracias

têm para se realizar enquanto tais. E as democracias, para

abandonarem o rótulo de democracias formais, se tornando

verdadeiras democracias de massas, devem construir instituições

que consigam garantir a todos, sem discriminação, os direitos

previstos nas constituições democraticamente escritas (..)Não mais

220 BESSA, Renata Tavares da Costa. Ser Defensor não é fazer caridade: Novos Paradigmas da Construção de uma

Sociedade Democrática, p. 380 disponível em http://www.anadep.org.br/wtksite/LIVRO_ID6.pdf último acesso em

08.04.2015 221 Leia mais no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade ( ADI 2903/PB), Min. Rel. Celso de Mello, j.

01.12.2005, íntegra disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=548579

último acesso em 08.04.2015 222 Manual de Mediação para a Defensoria Pública. Brasília-DF. Fundação Universidade de Brasília/FUB 2014,

p.32.

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podemos nos preocupar só com o Estado Julgador e com o Estado

Acusador, em detrimento do Estado Defensor”.223

É importante o fortalecimento de instituições que irão criar um

vínculo de cumplicidade e confiança com o povo. Assim, a Defensoria, mais uma vez aparece

como a instituição do sistema de justiça voltada a promover e aproximar o cidadão excluído

socialmente.

Nessa linha, já foi afirmado por Aluísio Ruggiei Ré que “a

Defensoria Pública, ontologicamente, deve estar mais próxima da sociedade que do próprio

Estado, considerado na sua totalidade, do Poder Judiciário, inclusive”, sendo a Defensoria

Pública a voz e a guardiã dos direitos do povo.”224

Nota-se, que a Lei Complementar 80/94, alterada pela Lei

Complementar 132/09 uma inegável ampliação do papel social da Defensoria Pública. Agora,

os objetivos institucionais se confundem com os compromissos do Estado Brasileiro, o que

revela o caráter social e democrático da instituição, in verbis:

“Art. 3º-A. São objetivos da Defensoria Pública:(Incluído pela Lei

Complementar nº 132, de 2009).I – a primazia da dignidade da

pessoa humana e a redução das desigualdades sociais;(Incluído

pela Lei Complementar nº 132, de 2009).II – a afirmação do

Estado Democrático de Direito;(Incluído pela Lei Complementar

nº 132, de 2009). III – a prevalência e efetividade dos direitos

humanos; e(Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009). IV –

a garantia dos princípios constitucionais da ampla defesa e do

contraditório.(Incluído pela Lei Complementar nº 132, de

2009)”.225

A Lei Complementar Estadual 988/06, ao seu tempo prevê no artigo

3º como fundamentos de atuação: “ a prevenção dos conflitos e a construção de uma

223 BRASIL. In: II Diagnóstico da Defensoria Pública no Brasil. Disponível em:

http://anadep.org.br/wtksite/downloads/Diag_defensoria_II.pdf. Último acesso em 25.03.2015. 224 RÉ. Aluisio Iunes Monti Ruggiei.Manual do Defensor Público- Teoria e Prática. Salvador: Jus Podivm, 2013,

p.100. 225 Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp80.htm. Último acesso em 04.04.15.

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sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e da marginalidade, e a redução

das desigualdades sociais e regionais”.226

Assim, por propiciar a Justiça Social, a Defensoria Pública exerce

um papel significativo de transformação social, promovendo a defesa judicial e extrajudicial,

os direitos individuais e coletivos227, mas também de atuação direta nas comunidades e nos

órgãos integrantes da Rede de Proteção, corroborando com a difusão de conhecimento e

orientação jurídica para organização comunitária e empoderamento da população.

Observa-se que a Constituição Cidadã de 1988, introduziu um

conteúdo democrático-social no conceito de acesso à justiça, uma vez que possibilitou, por

meio da cidadania, que as pessoas efetivamente reivindicam seus direitos ou resolvam seus

litígios, participando ativamente na transformação do acesso à justiça. Em outras palavras,

observa-se um movimento, cujo foco está em concretizar a Constituição através da valoração

dos compromissos sociais.228

Nos dizeres de Marco Aurélio Ruediger, Vicente Riccio e Luiz

Eduardo Motta:

“ ao se constituir como uma instituição distinta dos modelos prévios

de acesso à justiça , e de escopo emintentemente institucional ( e não

caritativo) a bem do princípio da igualdade, a origem da Defensoria

Pública está marcada pela processo em curso na sociedade

brasileira de (re) descoberta da cidadania de fato”229

Não é possível falar em cidadania sem que sejam instrumentalizados

mecanismos de participação e concretização de direitos.

226 Disponível em http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=2939 ultimo acesso em

15.04.2015. 227 VITTO, Renato Campos Pinto de; CASTRO, André Luis Machado. A Defensoria Pública como instrumento de

Consolidação da Democracia. Disponível em http://www.apadep.org.br/artigos/a-defensoria-publica-como-

instrumento-de-consolidacao-da-democracia/ p. 6. Ultimo acesso em 15.04.2015. 228BORGES, Felipe Dezorzi. A Legitimidade da Defensoria Pública para o Mandado de Segurança Coletivo, p.176.

disponível em http://www.anadep.org.br/wtksite/LIVRO_ID6.pdf último acesso em 17.11.15. 229 RUEDIGER, Marco Aurélio; RICCIO, Vicente; MOTTA, Luiz Eduardo. Da caridade ao provimento institucional

da justiça: o caso da Defensoria Pública do Rio de Janeiro. Disponível em

http://www.anpad.org.br/diversos/trabalhos/EnANPAD/enanpad_2005/APS/2005_APSA626.pdf último acesso em

17.04.2015. p. 10.

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Como pontua Dirley da Cunha Junior :

“ as Defensorias Públicas revelam-se como um dos mais importantes

e fundamentais instrumentos de afirmação judicial dos direitos

humanos e, consectariamente, de fortalecimento do Estado

Democrático de Direito, vez porque atua como veículo das

reinvindicações dos segmentos mais carentes da sociedade, junto ao

Poder Judiciário, na efetivação e concretização dos direitos

fundamentais”230

Conclui-se assim pela necessidade de mecanismos de participação

popular para a consolidação de um sistema de justiça mais igualitário e democrático. Os

instrumentos de participação serão analisados no capítulo seguinte.

230 CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Editora Juspodivm, 2008, p.979.

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4. OS INSTRUMENTOS DE CIDADANIA E PARTICIPAÇÃO SOCIAL

A Defensoria Pública Bandeirante é fruto de uma construção

democrática, participativa e coletiva, eis que criada com apoio da sociedade civil.

Percebe-se logo no advento da Lei Complementar 988/06 que a

Defensoria Pública Paulista inovou no sistema de justiça. Previu no artigo 6º os direitos das

pessoas que buscam a Defensoria Pública i) a participação na definição das diretrizes

institucionais da Defensoria Pública, ii) acompanhamento da fiscalização das ações e projetos

desenvolvidos pela instituição, da atividade funcional e da conduta pública dos membros e

servidores.

Além disso, a Lei preconiza a criação de uma Defensoria Pública

comprometida com a participação social e o combate a triste desigualdade social vivenciada pela

realidade brasileira, criando um novo modelo de justiça dentro do sistema de justiça: um modelo

participativo, democrático e voltado para o público.

Nas palavras de Renato Campos Pinto de Vitto e André Luis

Machado Castro:

“o acesso à Justiça é um dos direitos fundamentais de maior

expressão em nosso sistema constitucional, não havendo como se

falar em exercício de cidadania sem que o Estado se desincumba de

sua tarefa que consiste na provisão de meios para que suas

instituições, ligadas ao sistema de justiça, estejam devidamente

estruturadas para atender aos reclamos da população.”231 (grifos

nossos)

Cumpre ainda mencionar que o Momento Aberto do Conselho

Superior da Defensoria Pública, a Educação em Direitos, a definição de teses institucionais,

permitem a participação efetiva do cidadão. Estes instrumentos de participação contribuem para

231 VITTO, Renato Campos Pinto de; CASTRO, André Luis Machado. A Defensoria Pública como instrumento de

Consolidação da Democracia. Disponível em http://www.apadep.org.br/artigos/a-defensoria-publica-como-

instrumento-de-consolidacao-da-democracia/ p. 3. Ultimo acesso em 15.04.2015.

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que as desigualdades possam ser enfrentadas na forma de questões prioritárias, com auxílio da

coletividade, o que contribui para a ativação da cidadania.

Na definição de Pedro Demo:

“Participação, por conseguinte, não é ausência, superação,

eliminação do poder, mas outra forma de poder. (...) não se trata de

comparecer somente quando chamado, solicitado, requerido pela

comunidade ou pelos interessados, porque isto facilmente recairia

no imobilismo, até mesmo porque o fenômeno da participação na

comunidade também não acontece de graça. Trata-se de outra

forma de intervir na realidade, ou seja, uma forma que passa por

dois momentos cruciais: pela autocrítica, que sabe corajosamente

reconhecer suas tendências impositivas, e pelo diálogo aberto com

os interessados, já não mais vistos como objeto, clientela, alvo.232

Na esfera internacional de proteção dos Direitos da Pessoa Humana

o tema da participação é reconhecido como direito humano inalienável, tal como consagrado

expressamente na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, in verbis:

“artigo 1º- direito ao desenvolvimento é um direito humano

inalienável em virtude do qual toda pessoa humana e todos os

povos estão habilitados a participar do desenvolvimento

econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e dele

desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades

fundamentais possam ser plenamente realizados” enfatizando ainda

que “ artigo2o, 1, A pessoa humana é o sujeito central do

desenvolvimento e deveria ser participante ativo e beneficiário do

direito ao desenvolvimento”.233

No plano nacional também, eis que o Estado Democrático de

Direito tem entre os fundamentos a cidadania e o pluralismo político, de modo que se evidencia a

adoção de um “modelo de democracia representativa (..) com temperos de princípios e institutos

da participação direta dos cidadãos no processo decisório governamental”234 e que também

232 DEMO, Pedro. Participação é conquista. São Paulo: Cortez, 1998, p.20/21. 233 Disponível em http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/spovos/lex170a.htm último acesso em 15.04.15. 234 SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.16.ed.rev.atual.São Paulo: Malheiros, 1999,

p.149.

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incorpora princípios da justiça social e do pluralismo, razão pela qual José Afonso da Silva

conclui que “o modelo é de uma democracia social, participativa e pluralista”.235

É certo inda que o conceito de cidadania deve ser visto além da

mera cidadania formal (direito de votar e ser votado), mas abrange elementos essenciais como a

democracia material, dignidade da pessoa humana e cidadania participativa,236 eis que se

pretende concretizar a inserção dos sujeitos nos movimentos sociais por meio da participação

direta no campo da tomada de decisões políticas, como protagonistas da busca por um projeto

societário a ser construído.

Nos dizeres de Richard Pae Kim:

“ a noção ampla de cidadania implica na qualidade da pessoa de

ser titular e de ver reconhecidos os seus direitos humanos, que não

são mais localizados, mas que são e devem ser universais, razão

pela qual se sustentou ser necessário o reconhecimento, em

especial no Brasil, de que temos uma ‘cidadania universal’”.237

Passaremos a analisar os instrumentos previstos em lei para que a

Defensoria Pública possa assegurar a cidadania e a governança democrática.

4.1. Educação em Direitos

A educação em direitos é uma atividade indispensável para o

cidadão e necessária à Defensoria Pública prevista no artigo 4º, inciso III, da Lei Complementar

235 SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo.16.ed.rev.atual.São Paulo: Malheiros, 1999,

p.150. 236 CRUZ, Rafael Rocha Paiva. Educação em Direitos humanos: caminhos para a efetivação da democracia e dos

direitos humanos e o papel da Defensoria Pública. Tese de mestrado da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo/SP, São Paulo, 2014. p.74. 237 KIM, Richard Pae. O conteúdo da Cidadania na Constituição Federal do Brasil. In: Moraes, Alexandre de; KIM,

Richard Pae (Coord.)Cidadania: o novo conceito jurídico e a sua relação com os direitos fundamentais e individuais

coletivos. São Paulo: Atlas,2013, p.38.

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132/09 que prevê a promoção, difusão e conscientização dos direitos humanos, da cidadania e do

ordenamento jurídico.238

Além disso, se a Defensoria Pública tem o papel de concretizar os

objetivos da República Federativa do Brasil, previstos no artigo 3º da Constituição Federal de

1988, faz-se imprescindível que a população seja informada dos seus direitos, inclusive para que

conscientes dos direitos possa buscar a implementação deles. 239

Isto porque a Educação em direitos decorre do artigo 6º da

Constituição Federal que prevê o direito à educação como direito social fundamental. É uma

modalidade de educação popular240 que visa, por meio de um movimento psicológico e social

contribuir para o acesso à Justiça.

No mais, contribui para que as pessoas se sintam cidadãs, que sejam

responsáveis pelas escolhas e pela sociedade, que atuem como um ser social, um ator de mudança

na sociedade.

O artigo 6º da Constituição Federal que prevê o direito à educação

como direito social fundamental. Por sua vez, o Art. 205 determina a responsabilidade

compartilhada entre o Estado e a família no sentido de garantir o pleno exercício desse direito.

Além disso, de acordo com o texto constitucional, a Educação deve

ser “promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento

da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

238 Importante observar que a Lei Complementar Estadual 988/06 prevê no diploma estadual a atribuição da

educação em direitos, tal como ocorreu em outras leis estaduais que criaram a instituição, tal como os estados do

Pará, Bahia e Piauí. Nota-se ainda que esta atribuição foi explicitada na Lei Complementar 132/09, ampliando a

atribuição para todas as Defensorias Públicas. REIS, Gustavo Soares dos. Educação em Direitos e Defensoria

Pública: reflexões a parti da Lei Complementar 132/09. Revista da Defensoria Pública, ano 4, n.2, p.111-142, jul/dez

2011. 239 Observa-se que ainda que não haja obrigatoriedade, os Defensores Públicos deveriam realizá-la dentro do âmbito

de atuação, eis que se trata de instrumento concretizador de cidadania que deveria ser reconhecido como atividade

ordinária do Defensor Público. 240 Enciclopédia Contemporânea da América Latina e do Caribe, Coord. Emir Sader e Ivana Jinkings, Boitempo. Rio

de Janeiro: 2006, p.449.

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Pode-se afirmar, portanto, que a educação em direitos é uma

modalidade de educação popular241 que visa, por meio de um movimento psicológico e social

contribuir para o acesso à justiça e cidadania social.242

Nas palavras de Gustavo Reis “Na verdade a Defensoria Pública,

por ser uma instituição nova no Brasil e na América Latina, talvez seja uma das pioneiras a

consagrar normativamente a educação em direitos como uma atividade inerente ao ideal de

justiça social”243.

Cumpre ainda mencionar que em 10 de Dezembro de 2006 foi

anunciado o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, documento subscrito pela

Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação e Ministério da Justiça, que

traça metas importantes em torno da importância da educação em direitos humanos para o Estado

Democrático de Direito.

Isto porque, a educação em direitos representa muito mais do que a

mera explicação das leis, mas ajudar as pessoas a entenderem a razão do legislador, quais foram

os fundamentos e momento de criação da lei, da realidade, identificar as causas dos problemas,

procurar modificar atitudes e valores, até para poder possibilitar a crítica e questionamento e

mudar as situações de conflito.

Educar para os direitos humanos visa tornar o homem, a mulher, a

criança, o adolescente, todos, o protagonista de um projeto que visa a construção de um mundo

melhor e igualitário, com direitos assegurados para todos.

241 Enciclopédia Contemporânea da América Latina e do Caribe, Coord. Emir Sader e Ivana Jinkings, Boitempo. Rio

de Janeiro: 2006, p.449. 242 Nos dizeres de Carolina Ugarte “ um dos componentes do direito à educação é o direito à Educação em Direitos

Humanos e esta, por sua vez, consolida seu sentido pleno ao afirmar a dignidade da pessoa humana” UGARTE,

Carolina; NAVAL, Concepción. Propuestas metodológicas para la educación en derechos humanos en los textos de

las Naciones Unidas y la UNESCO. Comunicación presentada al IV Congreso Internacional de Psicología y

Educación, Almería, 2003, p.2. 243 REIS, Gustavo Augusto Soares dos. Educação em Direitos e Defensoria Pública: Reflexões a partir da Lei

Complementar 132/09 in Boletim da Defensoria Pública, n.3 jul/dez 2011, p.112/113.

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112

De acordo com Guilherme de Almeida, o conceito de

empoderamento legal inspira-se na idéia de “desenvolvimento como liberdade” de Amartya Sen:

“A proposta de Sen de desenvolvimento como liberdade é

virtualmente sinônima de empoderamento político, social e

econômico de pessoas fundamentado em direitos humanos.

Desenvolvimento assim entendido tanto como um imperativo moral

quanto, de acordo com Sen, como a rota para a prosperidade e

para a redução da pobreza”.244

Guilherme de Almeida ao citar Maurits Barendrecht e Maaike de

Langen:

“A proteção das pessoas e das suas propriedades é o primeiro

passo para qualquer espécie de desenvolvimento, e por esse motivo

o empoderamento legal começa com a proteção do que as pessoas

possuem. Então o empoderamento legal foca no direito não

somente como um meio de proteção, mas também como um meio de

criar oportunidades. Acesso à justiça a partir dessa perspectiva

implica igual acesso para remédios contra injustiças sofridas –

proteção – mas também igual acesso à participação na sociedade e

na economia – oportunidade” 245

É nesse processo de empoderamento246 que se constrói o

conhecimento necessário para a transformação da realidade, eis que permitirá a construção de

244 ALMEIDA, Guilherme de. Acesso à justiça, direitos humanos e novas esferas da justiça. Contemporânea in

Revista de Sociologia da UFSCar, v. 2, p. 83-102, 2012, p.91, disponível em

http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/viewFile/61/34 último acesso em 02.12.2015. 245 BARENDRECHT, Maurits e DE LANGEN, Maaike. Legal empowerment of the Poor: Innovating Access to

Justice. In: JORRIT DE JONG and GOWHER RIZVI, The State Of Access. Success and Failure of Democracies to

Create Equal Opportunities. Ash Institute For Democratic Governance and Innovation Harvard University/

Brookings Institution Press, Washington DC, 2008, pp.250 a 271, p. 263. É interessante a leitura de ALMEIDA,

Guilherme de. Acesso à justiça, direitos humanos e novas esferas da justiça. Contemporânea in Revista de

Sociologia da UFSCar, v. 2, p. 83-102, 2012, disponível em

http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/viewFile/61/34 último acesso em 02.12.2015. 246 Um estudo desenvolvido no âmbito da ONU , qual seja o relatório elaborado pela Comissão do Empoderamento

Legal do Pobre intitulado “Fazendo a lei trabalhar para todos”, define o conceito de empoderamento legal do pobre

da seguinte forma: “Empoderamento legal é o processo pelo qual o pobre torna-se protegido e é capaz de usar a lei

para proteger seus direitos e seus interesses, tanto em relação ao Estado como em relação ao mercado. Ele inclui o

pobre tornando expressos seus plenos direitos e consolidando as oportunidades que surgem a partir disso, por meio

de apoio público e de seus próprios esforços, assim como de esforços de apoiadores e de redes mais amplas.

Empoderamento legal é uma abordagem baseada no país e no contexto específico, que tem lugar tanto em níveis

nacionais como locais.”.MAKING THE LAW WORK FOR EVERYONE, volume I. Report on the Comission on

Legal Empowerment of the Poor and United Nations Development Program. New York, 2008, p.26. Disponível em

http://www.unrol.org/files/Making_the_Law_Work_for_Everyone.pdf último acesso em 05.12.2015. Disponível na

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113

uma sociedade mais livre justa e solidária, uma vez que promoverá a redução das desigualdades

sociais e a redução da pobreza, propiciando a consolidação dos objetivos da República Federativa

do Brasil, previstos no artigo 3º, inciso I e III da Constituição Federal de 1988.

Ademais, o empoderamento pode ser concretizado na gestão de

ações preventivas de violações dos direitos humanos em diferentes espaços; de articulação

política educacional, principalmente, pelos grupos vulneráveis; de difusão de conhecimentos que

possibilitem o exercício da cidadania e da democracia; e, na vivência cotidiana de uma postura

solidária com os outros247. Assim, deve ser coletivo, integrado ao meio onde acontece, e em

sintonia com as necessidades de quem dele participa.248

O que a Defensoria Pública pretende com a educação em direitos,

nela compreendida diversos projetos próprios de educação em direitos, é permitir que o cidadão

não seja defendido apenas pela Defensoria Pública, mas que aprenda a se defender com (através

da) Defensoria249.

Entre os diversos projetos desenvolvidos pela Defensoria Pública,

destaca-se pela notoriedade, duração e continuidade, o Curso de Defensores Populares,

desenvolvido pela instituição desde 2009, pela Defensoria Pública em parceria com a Escola da

íntegra em http://www.unrol.org/files/Making_the_Law_Work_for_Everyone.pdf último acesso em 05.12.2015. A

Comissão do Empoderamento Legal do Pobre é a primeira iniciativa global com foco na ligação existente entre

exclusão, pobreza e direito. Patrocinada por um grupo de países desenvolvidos e em desenvolvimento, entre eles

Canadá, Dinamarca, Egito, Finlândia, Guatemala, Noruega, Suécia, África do Sul, Tanzânia e Grã Bretanha,, foi

sediada no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) em Nova York. Maiores informações em

ALMEIDA, Guilherme de. Acesso à justiça, direitos humanos e novas esferas da justiça Contemporânea in Revista

de Sociologia da UFSCar, v. 2, p. 83-102, 2012, p.91, disponível em

http://www.contemporanea.ufscar.br/index.php/contemporanea/article/viewFile/61/34 último acesso em 02.12.2015 247 Disponível em Brasil. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Educação em Direitos

Humanos: Diretrizes Nacionais – Brasília: Coordenação Geral de Educação em SDH/PR, Direitos Humanos,

Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2013. in http://www2.uesb.br/pedh/wp-

content/uploads/2014/06/Diretrizes-da Educa%C3%A7%C3%A3o-em-Direitos-Humanos.pdf último acesso em

18.04.15. 248 Disponível em Brasil. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Educação em Direitos

Humanos: Diretrizes Nacionais – Brasília: Coordenação Geral de Educação em SDH/PR, Direitos Humanos,

Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2013. in http://www2.uesb.br/pedh/wp-

content/uploads/2014/06/Diretrizes-da Educa%C3%A7%C3%A3o-em-Direitos-Humanos.pdf último acesso em

18.04.15. 249 REIS, Gustavo Augusto Soares dos. Educação em Direitos e Defensoria Pública: Reflexões a partir da Lei

Complementar 132/09 in Boletim da Defensoria Pública, n.3 jul/dez 2011, p.112/113.

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Defensoria Pública, com a Defensoria Pública da União, o Escritório Modelo Dom Paulo

Evaristo Arns da PUC/SP e a Associação Paulista dos Defensores Públicos, com apoio dos

Movimentos de Moradia e do Centro Gaspar de Direitos Humanos.250

A educação em direitos apresenta algumas metas, partindo das

lições da pedagoga Vera Candau251 é possível concluir pela:252

i) Formação de Sujeito de Direito: a maior parte dos cidadãos

desconhecem e tem consciência dos direitos que lhe são

conferidos. Acreditam ainda que os direitos são distintos para

determinados políticos ou governos.

ii) Favorecer o processo de empoderamento: aqui o foco na educação

em direitos busca fortalecer parte da sociedade que foi excluída e

que tiveram menos poder de participação na sociedade.

iii) Processo de Transformação Necessários para construir uma nova

sociedade, concretizar a democracia e os objetivos constitucionais

de uma sociedade mais livre, justa e solidária. “Educar para o

nunca mais”, romper com a impunidade, assegurar a todos os

direitos.

No plano internacional253, podemos observar que em 23 de março

de 2011, o Conselho de Direitos Humanos aprovou a Declaração das Nações Unidas sobre

educação e formação em matéria de direitos humanos através da Resolução 16/1 e recomendou à

250 Para maiores informações sobre o curso de Defensores Populares realizado no ano de 2011, vale a leitura do

CARPANELLI, Fernanda Galhardo; SILVA, Mariana Lins de; ANTÃO, Renata Cristina do Nascimento. Cursos de

Defensores populares: relato de uma experiência emancipatória. In: Rocha, Amélia. Defensoria Pública, Assessoria

Jurídica Popular e Movimentos Sociais e Populares: novos caminhos traçados na concretização do direito de acesso à

justiça. Fortaleza: Dedo de Moças Editora e Comunicação LTDA., 2013, p.717-737. 251 CANDAU, Vera. Educação em Direitos Humanos: questões pedagógicas, in: Educação e metodologia para os

direitos humanos. Coord. Eduardo Bittar, Quartier Latin: São Paulo, 2008, p. 289/290. 252 REIS, Gustavo Augusto Soares dos. Educação em Direitos e Defensoria Pública: Reflexões a partir da Lei

Complementar 132/09 in Boletim da Defensoria Pública, n.3 jul/dez 2011, p. 136. 253 No plano interamericano foi aprovada pelo Conselho Interamericano de Desenvolvimento Integral a Resolução

2119 (XXXV-o/5) que trata da promoção e fortalecimento da democracia a partir da Educação em Direitos, por meio

do estabelecimento de diretrizes para elaboração de um programa interamericano sobre educação para os valores e

práticas democráticas.

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115

Assembleia Geral que adotasse a referida Declaração, o que ocorreu por meio da Resolução

66/137254 da Assembleia Geral das Nações Unidas em 19 de dezembro de 2011. Essa resolução

disciplina sobre atividades educativas voltadas para a promoção dos direitos humanos, nela

também compreendida também a educação popular.

O artigo 1º da referida Declaração bem sintetiza o espírito da

Declaração ao estabelecer que toda pessoa tem o direito de obter, buscar e receber informação

sobre todos os direitos humanos e liberdades fundamenta/is e de ter acesso à educação e

formação em matéria de direitos humanos, pois são essenciais para a promoção do respeito

universal e efetivo de todos os direitos humanos, em conformidade com os princípios da

universalidade, indivisibilidade e interdependência.

A Declaração considera que educação e formação em matéria de

direitos humanos significam o conjunto de atividades educativas, de formação, de informação, de

sensibilização e de aprendizagem que têm por objetivo promover o respeito universal pelos

direitos humanos e que engloba atividades de educação sobre os direitos humanos, educação

através dos direitos humanos e educação para os direitos humanos (artigo 2º).

De acordo com a Declaração, a educação em direitos humanos

pretende garantir empoderamento, desenvolvimento e permitir o exercício de todos, sem

discriminação, a todos os direitos (artigo 5º).

A Declaração reconhece que diversos atores sociais, como as

instituições educativas, os meios de comunicação social, as famílias, as comunidades locais, as

instituições da sociedade civil, incluindo as organizações não-governamentais, os defensores dos

direitos humanos e o sector privado podem contribuir, de maneira importante, para a promoção e

disponibilização da educação e formação em matéria de direitos humanos, sendo que tais atores

são encorajados a garantirem que seus funcionários recebam a educação e formação adequadas

em matéria de direitos humanos (artigo 10º).

254 Disponível em http://daccess-dds ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/N11/467/07/PDF/N1146707.pdf?OpenElement

último acesso em 18.04.15.

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Por fim, em 2012, o Ministério da Educação aprovou as Diretrizes

Nacionais para a Educação em Direitos Humanos (DNEDH). As diretrizes estão em consonância

com a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº

9.394/1996).255

Assim, pode-se concluir que a educação em direitos provoca ações

na sociedade e visa a transformação social, colaborando para a construção de uma sociedade mais

justa e cidadã.

Nas palavras de Rafael Rocha Paiva Cruz:

“ a partir do desenvolvimento da autonomia, da emancipação e do

empoderamento, a educação em direitos humanos deve procurar

desfazer a idéia de que alguns são mais capazes do que outros para

governar, idéia arraigada na sociedade e por vezes naturalizada

pelas escolas e instituições sociais.”256

A educação em direitos tem uma função pedagógica importante, eis

que permite a inclusão dos cidadãos na compreensão dos direitos e dos meios e mecanismos de

acesso.

A atuação extrajudicial da Defensoria Pública, por meio da

educação em direitos, constrói alicerces significativos para o exercício da cidadania, razão pela

qual o fortalecimento da Defensoria é importante para que ela consiga realizar o mandamento

constitucional de facilitador do acesso e efetive o acesso participativo de todos.

Desse modo, se a Defensoria é uma manifestação da democracia,

por muito mais razão deverá promover a educação em direito para fomentar o empoderamento da

255Disponível em Brasil. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Educação em Direitos

Humanos: Diretrizes Nacionais – Brasília: Coordenação Geral de Educação em SDH/PR, Direitos Humanos,

Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2013. in http://www2.uesb.br/pedh/wp-

content/uploads/2014/06/Diretrizes-da Educa%C3%A7%C3%A3o-em-Direitos-Humanos.pdf último acesso em

18.04.15. 256 CRUZ, Rafael Rocha Paiva. Educação em Direitos Humanos: caminhos para a efetivação da democracia e dos

direitos humanos e o papel da Defensoria Pública. Tese de Mestrado da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo/SP, PUC/SP, 2014, p. 167.

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população, eis que o acesso à justiça precisa ser visto de forma ampla e como instrumento de

acesso a outros direitos.

4.2 Momento Aberto e Participação Social na Definição de Teses Institucionais

Vale ainda destacar que as reuniões do Conselho Superior da

Defensoria Pública são semanais, públicas, sendo que qualquer pessoa pode fazer uso da palavra

em um momento específico denominado “Momento Aberto”, que abre uma comunicação direta

da população e entidades da sociedade civil com a administração superior da Defensoria Pública

e os conselheiros.257

Esse momento, é um espaço reservado nas reuniões semanais do

Conselho Superior da Defensoria Pública, em que existe a possibilidade de qualquer pessoa levar

ao conhecimento dos Conselheiros (natos ou eleitos) assuntos de interesse da sociedade civil e da

Defensoria Pública. 258

Tal ato democrático é conferido desde junho de 2006 e permite que

qualquer pessoa leve ao conhecimento dos Conselheiros assuntos de interesse dos atendidos, da

Defensoria Pública e da sociedade civil organizada. (artigo 29, §4º da Lei Complementar 988/06).

De acordo com a Lei Complementar 988/06 compete aos Núcleos

Especializados realizar e estimular o intercâmbio permanente entre os Defensores Públicos,

objetivando o aprimoramento das atribuições institucionais e a uniformidade dos entendimentos

ou teses jurídicas (artigo 53, III). A Escola da Defensoria Pública (EDEPE) é órgão auxiliar e fica

responsável pela organização do encontro anual dos Defensores Públicos para a definição de

teses institucionais, que deverão ser observadas por todos os membros da carreira, constituindo

257 Conforme informações fornecidas pela Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o

Momento Aberto da Defensoria Pública se mostrou como uma experiência inovadora, tendo sido replicado em outras

Defensorias Públicas do País, como no caso da Defensoria Pública da União que adotou o espaço aberto com o nome

de “Participação Cidadã”. Este espaço de diálogo também é observado na Defensoria Pública do Rio Grande do Sul

e Paraná. 258 Folder do II Ciclo de Conferências da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, material de circulação interna

da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

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parâmetros mínimos de qualidade para atuação. (artigo 58, XV da Lei Complementar n.º

988/06.).

A Sociedade Civil pode propor, por meio da Ouvidoria, teses

institucionais a serem debatidas na fase anterior ao Encontro Estadual, os “Pré-Encontros”

temáticos. Em cada Pré-Encontro, os participantes consolidam e aprovam um determinado

número de teses, que são levadas para votação no Encontro Estadual.

De acordo com Luciana Zaffalon Leme Cardoso:

“a participação social passou a ser contemplada a partir do II

Encontro Anual de Defensores Públicos, realizado em 2008. Por

iniciativa da Ouvidoria este mecanismo restou consolidado em

deliberação do Conselho Superior da DPESP que disciplina a

organização dos Encontros e prevê que, assim como os Defensores

Públicos e os Núcleos Especializados, também a Ouvidoria Geral

poderá propor teses relacionadas às atribuições da Defensoria

Pública do Estado”259

4.3 Pré-Conferências e Conferência Regional e Estadual da Defensoria Pública

A iniciativa de realização de Pré-Conferências e da Conferência

Estadual, previstas pela Lei Complementar n.º 988/06, realizada a cada 2 anos260, pela Defensoria

Pública, é um mecanismo de participação social, inédito em uma instituição jurídica, pois

propicia um espaço aberto, democrático e pluralizado instrumento de participação social na

gestão da instituição.

Os ciclos de conferencias visam possibilitar espaço para que os

destinatários do serviço de assistência jurídica gratuita participem das diretrizes institucionais e

do acompanhamento e fiscalização das ações e projetos desenvolvidos pela Defensoria Pública.

259 CARDOSO, Luciana Zaffalon Leme. Participação Social na Defensoria Pública: inovações democráticas na

esfera do sistema de justiça in Sousa, José Augusto Garcia de. Uma nova Defensoria Pública pede passagem:

Reflexões sobre a Lei Complementar 132/09, Lúmen Juris: Rio de Janeiro, 2011 p. 181. 260 No Estado de São Paulo, as Conferências foram iniciadas no ano de 2007 e realizadas a cada dois anos.

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Essas conferências são realizadas por meio da participação da

sociedade, em diferentes eixos temáticos, com a atuação conjunta de defensores públicos da

localidade e membros dos Núcleos Especializados da Defensoria Pública.

Dessas conferências são eleitos representantes da sociedade civil,

denominados “ delegados” que irão participar da Conferências Estadual. As temáticas e diretrizes

aprovadas na Conferências Estadual irão orientar o Plano de Atuação da Defensoria Pública,

aprovado pelo Conselho Superior da Defensoria Pública, o que demonstra a importância da

atividade, eis que os rumos da instituição são traçados em conjunto com a sociedade civil. Além

disso, a sociedade pode apresentar moções.

Como o presente estudo visa analisar a importância dos

mecanismos de participação social, iremos mencionar duas moções apresentadas nas últimas

conferências, em especial, diante do clamor da sociedade pela busca da efetividade e da

participação ativa da Defensoria Pública.

Assim sendo, podemos destacar as duas moções apresentadas na IV

Conferência Estadual realizada pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, em 2013:

1) Moção de esperança (aprovada na Conferência Estadual):

“A DPE foi criada em 2006 pela luta da sociedade civil. Já

estamos no 4ª Ciclo de Conferências e temos uma Defensoria em

franco crescimento. No entanto, o que se vê, infelizmente, é que a

maioria das propostas aprovadas pela sociedade civil, como, por

exemplo, a óbvia exigência de pedido de liberdade em todos os

casos defendidos pela Defensoria, não foi implementada. Tamanho

desrespeito às deliberações populares acarreta o esvaziamento das

conferências e o progressivo descrédito de instituição. Por essas

razões, com a esperança de que ainda é possível construir uma

Defensoria Pública norteada pela vontade do povo, exigimos que

as propostas aprovadas na presente conferência e nas conferências

anteriores sejam efetivamente implementadas”.

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Também foi aprovado, no ano de 2013, a Moção de repúdio, aprovada

na Pré-Conferência da Regional Central, Criminal e de Infância e Juventude da Capital, in verbis:

261

“A defensoria pública foi criada em 2006 pela luta da sociedade

civil. Já estamos no 4º ciclo de conferência e já temos uma

Defensoria em franco crescimento. No entanto, o que se vê é que a

maioria das propostas aprovadas pela sociedade civil não foi

implementada. Esperamos que a Defensoria não se encastele, que

ela não nos use, as Conferências, como mera propaganda para

dizer que a sociedade civil tem espaço nela. Aguardamos que as

propostas aprovadas nesta conferência sejam efetivamente

implementadas”.

Observa-se que as moções representam um importante alerta para a

Defensoria Pública, eis que demonstra um certo descontentamento com as medidas adotada pela

instituição.

Conforme o Relatório do I Ciclo de Conferências da Defensoria

Pública, constata-se que muitas propostas da sociedade civil dependiam de atuação conjunta com

outros órgãos, como por exemplo, criação de cargos de Defensores Públicos em presídios, ou em

delegacias especializadas. Tais propostas demonstram um desconhecimento do papel da

Defensoria Pública, bem como despertam a necessidade de elaboração de políticas de orientação,

conscientização e educação em direitos.

De todo modo, importante que a Defensoria Pública não se afasta

da sociedade civil, pois foi com a participação efetiva da sociedade que a Defensoria de São

Paulo foi criada em 2006 e é em prol da sociedade que a Defensoria Pública deve atuar.

Com o mesmo objetivo, qual seja a participação da sociedade e a

busca por implementação das propostas realizadas pela sociedade civil, importante mencionar a

261http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/Caderno%20de%20monitoramento%203%20Ciclos.pdf,

último acesso em 16.11.15.

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Diretriz de Política Institucional, apresentada na Pré-Conferência Regional Central, Criminal e de

Infância e Juventude da Capital no eixo de política institucional, a seguinte proposta:

“Promover audiências públicas trimestrais, com convocação

obrigatória dos delegados das Conferências da Defensoria Pública

de São Paulo - DPESP, para prestação de contas e monitoramento

da implementação das diretrizes aprovadas nos Ciclos de

Conferências, a contar do último dia da Conferência Estadual”.

Tal proposta, aprovada pela sociedade civil, na Conferência

Estadual da Defensoria Pública do ano de 2013, expressa a importância da participação social na

fiscalização das atividades desempenhas pela Defensoria Pública, em especial, pela proposta de

um novo mecanismo262 de interação da sociedade, contribuindo ainda mais pela busca de um

sistema igualitário e democrático.263

Nota-se assim, que os Ciclos de Conferências previstos pela Lei

Complementar n.º 988/06 da Defensoria Pública do Estado de São Paulo são instrumentos de

participação social que contribui para o fortalecimento do diálogo perene com a sociedade,

afastando o risco da criação de uma instituição voltada apenas para questões corporativistas,

“encastelando-se”, como dito pela sociedade civil.

Nos dizeres de Renato Campos de Vitto e André Luís Machado de

Castro:

“a sociedade não mais se mostra receptiva à construção de

instituições jurídicas encasteladas, herméticas e distantes da

realidade social, pelo que a elevação do debate para um plano que

transcende os interesses corporativos, há de passar

262 De acordo com informações obtidas pela Ouvidoria-Geral, o monitoramento da implementação das 50 diretrizes

aprovadas nos Ciclos de Conferências da Defensoria recebeu atenção especial no IV Ciclo de Conferências da

Defensoria Pública, realizado em 2013, especialmente diante da aprovação da proposta no eixo de políticas

institucionais que se relaciona a esse processo participativo.Com o escopo de dar cumprimento a diretriz aprovada

pela sociedade civil, foram realizadas diversas tratativas com a Administração da Defensoria Pública e

coordenadores dos Núcleos Especializados da Defensoria Pública para a aprovação do Plano anual de Atuação, que

ocorreu em Junho de 2015. 263http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015%2005%2028_Parecer-VistaCSDP_060-

2015_PlanoAtuacao_CO.pdf último acesso em 05.12.15.

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necessariamente pela implementação de mecanismos de controle e

participação social na instituição”.264

Nessa seara, de participação social, importante o papel da

Ouvidoria-Geral, em especial para que haja o fortalecimento e aprimoramento da participação

efetiva da sociedade bem como no monitoramento de seus resultados, com devolutivas à

Sociedade Civil.

O V ciclo de Conferências da Defensoria Pública, por sua vez, ocorreu

no segundo semestre de 2015, sendo que a etapa estadual será realizada na primeira quinzena de

Dezembro do ano de 2015.

Nas palavras de Renato Campos Pinto de Vitto e André Luis

Machado Castro:

“é imprescindível que se atente para a necessidade de construção

de um novo paradigma de instituição, verdadeiramente próxima e

afinada com os anseios sociais, arejada e aberta não só ao controle

mas à participação da sociedade civil, destinatária de suas funções

e razão de sua existência.”265

Assim, o mais importante hoje é que a Defensoria Pública seja uma

instituição que presta muito mais do que um serviço público, mas um serviço para o público266,

com transparência e participação democrática.

264 DE VITTO, Renato Campos Pinto, CASTRO, André Luís Machado de. Defensoria Pública como instrumento de

consolidação da democracia in Slakmon, Catherine; Machado, Maíra Rocha; Bottini, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas

direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p.235.

Disponível em http://www.esteio.rs.gov.br/documents/SMSMU/governanca%20na%20seguranca%20-

%20material%20do%20MJ.pdf último acesso em 18.11.2015. 265 VITTO, Renato Campos Pinto de; CASTRO, André Luís Machado. A Defensoria Pública como instrumento de

Consolidação da Democracia. Disponível em http://www.apadep.org.br/artigos/a-defensoria-publica-como-

instrumento-de-consolidacao-da-democracia/ p. 7. Ultimo acesso em 15.04.2015. 266 Expressão “Serviço para o público” contida na “Carta de Porto Alegre”, documento formulado pelos Defensores

Públicos brasileiros, das delegações dos Estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo,

Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de

Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, São Paulo, Sergipe, Tocantins, do Distrito

Federal e da União, bem como as representações das Defensorias Públicas da Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, e

os representantes da sociedade civil organizada e de entidades civis dos Estados de Santa Catarina e Goiás, da

Assembléia Legislativa do Estado do Paraná, e acadêmicos de Direito, reunidos na capital do Estado do Rio Grande

do Sul, durante a realização do VIII Congresso Nacional de Defensores Públicos, no período de 03 de novembro a 06

de novembro de 2009,em conjunto com as Defensorias Públicas representadas no VIII Congresso Nacional de

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Para Luciana Zaffalon Leme Cardoso:

“a democratização dos processos existentes na Defensoria Pública

do Estado de São Paulo potencialmente implica a legitimação do

exercício de sua função de garantidora da cidadania dentro do

Poder Judiciário, à medida que, através da participação social,

passa a ser possível a compreensão do exato quadro de exclusão da

ordem jurídica que precisa ser superado, do que ser priorizado”267

É importante, que a Defensoria Pública efetive as propostas

formuladas pela sociedade civil, inclusive para demonstrar que não se trata apenas de um evento

formal, mas de um movimento de significativa relevância na organização e planejamento da

atuação institucional. 268

De acordo com Alderon Costa:

“mesmo a prática de alterar, sem necessariamente rejeitar

propostas, pode ser vista como um movimento que deslegitima esse

importante mecanismo de participação, à medida se coloca no juízo

da instituição pública a análise de pertinência sobre os anseios

apresentados pela Sociedade Civil”.269

Isto porque, a Defensoria Pública não pode ser vista pela sociedade

apenas como uma instituição pública, mas uma instituição que surgiu em razão da mobilização

Defensores Públicos, realizado entre os dias 3 a 6 de Novembro de 2009 na cidade de Porto Alegre/RS, disponível

em http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/10079/CARTA_DE_PORTO_ALEGRE__FINAL_.pdf último

acesso em 15.04.2015. 267 CARDOSO, Luciana Zaffalon Leme. Participação Social na Defensoria Pública: inovações democráticas na

esfera do sistema de justiça in Sousa, José Augusto Garcia de. Uma nova Defensoria Pública pede passagem:

Reflexões sobre a Lei Complementar 132/09, Lúmen Juris: Rio de Janeiro, 2011 p. 175. 268 Observa-se que no IV Ciclo de Conferências da Defensoria Pública, realizado em 2013, de um número de 50

diretrizes aprovadas, seis, ou seja, mais de 10% reiteravam expressamente diretrizes já aprovadas em ciclos

anteriores e que não tinham sido implementadas. Além disso, a proposta alterou de forma significativa as propostas

aprovadas pela Sociedade Civil no IV Ciclo, especialmente na redação na fase de transposição para a proposta de

plano de atuação. De acordo com a Ouvidoria- Geral 17 propostas de 50 foram alteradas na redação. Informação

extraída do Parecer da Ouvidoria Geral no Processo CSDP 60/2015 disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015%2005%2028_Parecer-VistaCSDP_060-

2015_PlanoAtuacao_CO.pdf último acesso em 11.11.15 269Parecer da Ouvidoria Geral no Processo CSDP 60/2015 disponível

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015%2005%2028_Parecer-VistaCSDP_060-

2015_PlanoAtuacao_CO.pdf último acesso em 11.11.15

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social, com demandas expressas pela efetivação do direito constitucional à participação e, que

atua para garantir uma participação contínua e efetiva.270

Importante destacar algumas propostas da sociedade civil que foram

implementadas pela Defensoria Pública Bandeirante:

1) Criação de um Núcleo Especializado de Cidadania e

Direitos Humanos, hoje o núcleo está em funcionamento,

tendo participado ativamente da promoção de cidadania e

proteção das pessoas em situação de Rua, no combate e

prevenção da violência policial, das graves violações de

direitos humanos ocorridas na “cracolândia” no ano de 2012, na

temática envolvendo a internação compulsória, bem como

diversos outros temas de salutar importância para a promoção,

proteção e efetivação do direito à dignidade da população

carente e vulnerável;271

2) Criação de um Núcleo Especializado para a Mulher para

atuar na prevenção, punição e erradicação da violência contra a

mulher ocorrida no espaço público ou privado e em todas as

suas formas: física, psicológica, moral, patrimonial, entre

outras, bem como atuação da Defensoria Pública na área da

violência doméstica e contra a mulher. O Núcleo da Mulher foi

criado e participa ativamente da promoção, proteção e combate

da violência contra a mulher, tendo desenvolvido importante

papel no combate da violência obstétrica, inclusive em conjunto

com o Núcleo dos Direitos do Idoso e da Pessoa com

270 Demais informações contidas no Parecer da Ouvidoria Geral no Processo CSDP 60/2015 disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015%2005%2028_Parecer-VistaCSDP_060-

2015_PlanoAtuacao_CO.pdf último acesso em 11.11.15 271 A proposta de criação do Núcleo ocorreu na I Conferência Estadual da Defensoria Pública, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/Monitoramento%20I%20Ciclo.pdf, último acesso em

16.11.2015.

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Deficiência da Defensoria Pública. No que se refere a violência

doméstica, importante destacar o termo de Cooperação com a

Prefeitura de São Paulo para fornecer atendimento jurídico às

mulheres vítimas de violência, usuárias das Casas e Centros de

atendimento à mulher (CCM), bem como Atuação no Juizado

Especial de violência doméstica do Fórum da Barra Funda,

Butantã, São Miguel Paulista e Santana, em prol das vítimas de

violência doméstica. O NUDEM, também exerce um papel

significativo na educação em direitos, com elaboração de

cartilhas e palestras, com vistas a informar a mulher em

situação de violência sobre seus direitos e explicar as medidas

de proteção previstas na Lei Maria da Penha.

3) Criação do Núcleo Especializado dos Direitos dos Idosos,

que teria como atribuições, dentre outras: fiscalização da

distribuição de verbas públicas destinadas aos interesses dos

idosos; acompanhamento das políticas públicas; garantia do

atendimento preferencial aos idosos na Defensoria Pública;

aperfeiçoamento na busca da efetivação dos direitos dos idosos,

via judicial; lutar pela criação de Delegacias dos Idosos. O

Núcleo dos Direitos do Idoso e da Pessoa com Deficiência foi

criado, sendo que desde 2014 a Defensoria Pública tem

estagiários de gerontologia que atuam no atendimento da

triagem na capital do Estado de São Paulo, contribuindo para

uma dinâmica interdisciplinar e integral, voltada a promover e

conscientizar os direitos da população idosa, inclusive com a

elaboração de cartilhas e projetos de educação em direitos.

4) Criação do Núcleo Especializado de Combate a

Discriminação, Racismo e Preconceito, que terá por

atribuições, entre outras: promover, assessorar, acompanhar,

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fortalecer, reivindicar e garantir os Direitos Fundamentais de

todos os povos discriminados. O Núcleo foi criado

5) Promover, em parceria com os movimentos sociais,272 a

continuação dos eventos da jornada em defesa da moradia

digna, a Defensoria Pública participa anualmente e ativamente

nas demandas e eventos voltados a promoção do direito

constitucional à moradia, nela compreendida a Jornada da

Moradia, com participação efetiva da Ouvidoria- Geral;

6) Discutir a possibilidade de ampliação do voto ao preso. A

Defensoria Pública, com o objetivo de assegurar cidadania a

população carcerária, protocolizou pedido junto ao TRE para

que os presos provisórios pudessem participar das eleições. 273

272 Nos dizeres de Renato Raul Boschi “ Os movimentos sociais, enquanto formatos específicos para expressar o

protesto e encaminhar demandas, são historicamente tão antigos quanto a própria política parlamentar. Nesse

sentido, os novos movimentos não excluem necessariamente os partidos e sindicatos, mas são formas

complementares de ação política e afirmação dos sujeitos coletivos em contextos democráticos” (BOSCHI, Renato

Raul. A arte da associação: Política de Base e Democracia no Brasil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987, p. 38).

Acrescenta, ainda, que “são espaços onde novas formas de solidariedade são constituídas e expressas coletivamente”.

((BOSCHI, Renato Raul. A arte da associação: Política de Base e Democracia no Brasil. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1987, p. 37). 273 Em março de 2010, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) publicou a Resolução nº 23.219, que prevê o

estabelecimento de seções eleitorais especiais em estabelecimentos penais e unidades de internação de adolescentes,

a fim de viabilizar o exercício do direito constitucional. A Resolução regulamenta os procedimentos de votação nesse

âmbito e fixa diretrizes para que os Tribunais Regionais Eleitorais a implementem. Em maio de 2010, o TSE firmou

um termo de cooperação técnica (nº 03/2010) com diversos órgãos do sistema de Justiça, com o objetivo de

promover “a conjugação de esforços entre os partícipes no sentido de assegurar o direito de voto dos presos

provisórios e adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação ou em situação de internação

provisória”. O termo foi assinado pelo Conselho Nacional de Justiça, Ministério da Justiça, Defensoria Pública da

União, Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Nacional do Ministério Público, Conselho Nacional dos Direitos

da Criança e do Adolescente, Conselho nacional de Política Criminal e Penitenciária, Conselho Nacional dos

Defensores Públicos Gerais, Conselho Nacional de Secretários de Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e

Administração Penitenciária e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Em 2008, por

exemplo, onze estados (Acre, Pernambuco, Sergipe, Amazonas, Amapá, Ceará, Maranhão, Rio Grande do Norte, Rio

Grande do Sul, Rio de Janeiro e Mato Grosso) permitiram que fossem instaladas seções eleitorais em presídios.

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Conteudos/Noticias/NoticiaMostra.aspx?idItem=39712&idPagina=1&flaDest

aque=V último acesso em 17.12.2015. Além disso, a Resolução nº 23.219, encontra-se disponível em

http://www.tse.jus.br/internet/eleicoes/normas_2010/arquivos/Original/23219.pdf e o termo de cooperação técnica

(nº 03/2010) em http://www.tse.jus.br/arquivos/normas-complementares-protocolo-de-cooperacao-tecnica-no-3-

2010-eleicoes-2010, ambos acessos em 17.12.15.

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127

As medidas acima, correspondem a alguns exemplos de propostas

realizadas pela Sociedade Civil274, confirmando o compromisso institucional com a construção

conjunta das diretrizes de atuação na prestação de assistência jurídica integral e gratuita.

É verdade que muito ainda precisa ser feito para que a Defensoria

Pública responda adequadamente aos anseios da sociedade, porém constata-se um esforço em

buscar mecanismos e formas de implementação da participação social.275

4.4 Audiências Públicas

As audiências públicas e a figura do Amicus Curiae também são

mecanismos de participação social de extrema importância para a construção de uma sociedade

mais justa, livre e solidária.276

No Estado de São Paulo, a Defensoria Pública atua com frequência

na realização deste importante instrumento democrático, eis que ao ouvir as pessoas envolvidas e

se aproximar da realidade pode participar ativamente na identificação dos problemas existentes,

bem como para que o direito das pessoas seja, de fato, efetivado.

A Defensoria Pública Bandeirante, promoveu diversas audiências

públicas, em diferentes áreas de atuação, tais como tais como 1) Política de Atendimento às

presas provisórias no ano de 2011; fornecimento de materiais de higiene em estabelecimento

prisionais (2012); implementação de cotas-énicas raciais na Defensoria Pública (2013); “vaga em

274 Conforme o Relatório do I Ciclo de Conferências da Defensoria Pública, disponível na íntegra em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/Monitoramento%20I%20Ciclo.pdf último acesso em

16.11.2015. 275 No V Ciclo de Conferências da Defensoria Pública, realizado no ano de 2015, a Defensoria pública constatou

redução da participação da sociedade civil, em especial de instituições parceiras. De acordo com a presença da

sociedade civil, no Momento Aberto do Conselho Superior da Defensoria Pública, a ausência de participação estava

intimamente ligada com a suposta falta de efetividade das propostas anteriormente pleiteadas pela sociedade civil.

Ocorre que, como dito anteriormente, muitas destas propostas ainda pendem de atuação integrada de outros órgãos,

tais como o Judiciário, Executivo e Legislativo. 276 Defensoria Pública, Assessoria Jurídica Popular e Movimentos Sociais e Populares: novos caminhos traçados na

concretização do direito de acesso à justiça / Organizado por Amélia Rocha [et al.] – Fortaleza: Dedo de Moças

Editora e Comunicação Ltda.: 2013.

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creche” (2013), Plano Estadual de Educação nas Prisões em 2015, “Saúde e Sistema Prisional”

(2015), “contaminação de alimentos por agrotóxicos”, “atendimentos a mulheres vítima de

violência”, “qualidade do atendimento à população de rua”, “justa indenização da posse”, “mães

em cárcere”, “crise hídrica” entre diversas outras realizadas no ano de 2015.277

Cumpre ainda mencionar que a atribuição da convocação de

audiências públicas não esteja prevista expressamente na Lei Complementar 988/06, porém a

mesma está sedimentada na Lei Complementar 132/09 que reconhece como função institucional

a convocação de audiências públicas.

Para Peter Haberle em uma sociedade plural e aberta, toda a pessoa

que vive a Constituição tem o legítimo interesse de interpretá-la e não apenas o poder judiciário,

in verbis:

“ se se quiser, tem-se aqui uma democratização da interpretação

constitucional. Isso significa que a teoria da interpretação deve ser

garantida sob a influencia da teoria democrática. Portanto, é

indispensável uma interpretação da constituição sem o cidadão

ativo e sem as potencias públicas mencionadas. Todo aquele que

vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este

contexto, é indireta ou, até mesmo diretamente, uma intérprete

dessa norma”278

A audiência pública tem como objetivo essencial a promoção da

cidadania e participação social, eis que através da oitiva dos representantes da sociedade civil,

movimentos sociais, especialistas, colaboram para ampliar o conhecimento da matéria e

desenvolver estratégias de aprimoramentos. Trata-se de instrumento de nítida participação social

e atuação multidisciplinar e inclusiva o que corrobora para a construção de uma sociedade justa e

solidária.

277 Informações obtidas pelo site da Defensoria Pública do Estado, na área de comunicação, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=3086, último acesso em 17.12.15. 278 HABERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição: contribuição

para a interpretação pluralista e “procedimental” da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002,

p.14-15.

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4.5 Ouvidoria Pública

A Ouvidoria exerce um papel significativo no desempenho das

atividades da Defensoria Pública, pois além de servir de canal permanente de comunicação com a

sociedade civil, eis que se apresenta como meio pelo qual a sociedade pode se manifestar e

participar de forma ativa da construção e avaliação dos serviços prestados pela instituição

pública. 279

No âmbito Constitucional, pode-se afirmar que as Ouvidorias

encontram fundamento na Cidadania e na Participação Popular, (artigo 1º da Constituição Federal

de 1988).280

É possível ainda inserir a Ouvidoria como um direito humano

internacionalmente tutelado, eis que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e

proclamada pela Assembleia Geral da ONU, em 10 de Dezembro de 1948, prevê no art. XIX,

que:

“Todo pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este

direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de

procurar, receber ou transmitir informações e idéias por quaisquer

meios e independentemente de fronteiras”.

279 Com o objetivo de colaborar na promoção da qualidade dos serviços prestados pela Defensoria Pública, a

Ouvidoria-Geral realiza pesquisas de satisfação dos usuários da Defensoria Pública. De acordo com o Relatório de

Atividades da Ouvidoria da Defensoria Pública de São Paulo, elaborado no período compreendido entre os meses de

Junho a Dezembro de 2014, foram realizados 1755 atendimentos aos usuários do serviço da Defensoria Pública, o

que corresponde a um aumento de 39,48% em relação ao mesmo período em 2013, cujo total de atendimentos foi

1259 usuários. Destes 1755 atendimentos, 1.004 consistiam em situações relacionadas a elogios, reclamações ou

sugestões a respeito dos serviços da Defensoria Pública de SP e/ou prestados por força de Convênio com a

instituição. Sendo que, 43% dos atendimentos realizados pela Ouvidoria Geral disseram respeito à prestação de

outras informações, entre elas orientações sobre como acessar a própria Defensoria Pública do Estado de São Paulo

para obter a prestação de assistência jurídica gratuita. O sistema de processamento de manifestações é feito por

intermédio da Ouvidoria-Geral ou Subouvidoria. A manifestação é encaminhada para esclarecimentos do órgão ou

unidade da Defensoria Pública, seja Defensor Público, Estagiário ou Servidor. A resposta do servidor público, por

sua vez, é encaminhada a Ouvidoria Geral que realiza um retorno sobre o resultado da manifestação para o usuário.

Todo esse ciclo deve acontecer no período de 20 dias, prorrogável por no máximo mais 10 dias, de acordo com a

Deliberação CSDP nº 281/20132 e a Lei de Acesso à Informação.

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015_06_Relatorio-OG-2014.pdf último acesso

em 12.11.15. 280 Importante constatar, que com o advento da Emenda Constitucional n.º 45/2004, também denominada Reforma

do Judiciário, a Constituição Federal de 1988 atribuiu status constitucional as ouvidorias, especialmente ao prever

nos artigos 103- B e artigo 130 –A, a criação de ouvidorias no âmbito do Ministério Público e do Judiciário.

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Logo, a Ouvidoria- Geral é espaço adequado para que o direito de

opinião e expressão possam ser concretizados.

O papel do Ouvidor-Geral poderia se assemelhar a figura do

Ombudsman. À título de esclarecimentos, interessante a leitura de Norberto Bobbio281 ao

apresentar as características do Ombudsman:

“[...] seu caráter apolítico e imparcialidade são considerados

requisitos fundamentais;

[...] a autonomia da ação do Ombudsman é reforçada pela

discricionariedade de que goza na organização do cargo, na

escolha dos colaboradores, na direção e desenvolvimento das

atividades”.

Porém, como ressalta Adísia Sá, co-fundadora da Associação

Brasileira de Ouvidores:

“o ouvidor, percebe-se, não assume por assumir uma atividade: ele

é o modelo do agente público, social e político, com uma carga de

obrigações acima de quaisquer pressões ou interesses”, enquanto

que “ombudsman é mais específico ao ouvidor de imprensa,

segundo a ONO (Organization of News Ombudsmen – Organização

dos Ombudsmen de Imprensa) e é assim que se usa no mundo”.282

Assim, observa-se que a importância do Ouvidor-Geral e da

autonomia assegurada a Ouvidoria, para que ela possa atuar com independência em prol dos

usuários, no caso, da Defensoria Pública.

Além da autonomia, importante que haja transparência no

desempenho das atividades do órgão, bem como ela exerça o controle externo, justamente para

assegurar o interesse da sociedade ainda que esse venha a colidir com o interesse da própria

Defensoria Pública.

281 BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de Política. 5 ed. Vol. 2. Brasília: UnB

2000, p. 838, 282 Adisia Sá em FILHO, A.; MACIEL, R.; VILANOVA, M. de F. V.; SÁ, A.; (Org.) Ombudsmen, Ouvidores:

transparência, mediação e cidadania. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2004.

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De forma resumida, podemos observar um avanço na criação das

Ouvidorias da Defensoria Pública no País, sendo que hoje a principal discussão está relacionada a

criação de uma ouvidoria interna ou externa.

No ano de 2006, o II Diagnóstico das Defensorias Públicas no

Brasil, constatou que eram apenas 6 estados que contavam com ouvidoria, quais sejam: Bahia,

Ceará, Distrito Federal, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. Sendo que em 4 Estados o Ouvidor-

Geral era formado por integrantes de carreira: Ceará, Distrito Federal, Rio de Janeiro e Piauí.283

Em 2009, com a elaboração do III Diagnóstico das Defensorias

Públicas no Brasil, 10 estados tinham ouvidoria: Bahia, Distrito federal, Minas Gerais, Mato

grosso, Mato grosso do Sul, Piauí, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo, Tocantins. De acordo com

o estudo, os estados de Minas Gerais, Mato grosso do Sul, Paraná e Tocantins implantaram as

ouvidorias e o estado do Ceará e Rio grande do Norte não mencionaram possuir uma ouvidoria.

Nota-se que nos estados do Distrito federal, Minas gerais, Mato grosso, Mato grosso do Sul,

Piauí, rio de Janeiro e Tocantins, esta função é exercida por um integrante da carreira, enquanto

que nos estados da Bahia, Paraná e são Paulo, são exercidas por pessoas externas aos quadros da

carreira.284

Importante analisar o quadro abaixo, extraído do III Diagnóstico

das Defensorias Públicas no Brasil que compara a composição e a criação da ouvidoria, entre

2005 e 2009.285

283http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BA

blica%20no%20Brasil.pdf último acesso em 10.11.15. O II Diagnóstico de Defensorias Públicas no Brasil está

disponível em https://www.anadep.org.br/wtksite/downloads/Diag_defensoria_II.pdf último acesso em 17.12.15. 284 Informações extraídas do III Diagnóstico de Defensorias Públicas no Brasil, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf último acesso em 17.12.2015. 285 Gráfico extraído do III Diagnóstico de Defensorias Públicas no Brasil, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/III%20Diagn%C3%B3stico%20Defensoria%20P%C3%BAblic

a%20no%20Brasil.pdf último acesso em 17.12.2015.

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132

Observa-se que no ano de 2009, apenas três Defensorias Públicas

estavam de acordo com o art. 105-b da Lei Complementar n.º 132/09, que prevê que o Ouvidor-

Geral não seja integrante da carreira.

No ano de 2015, observamos que há uma tendência das Defensorias

Públicas do Brasil em implantar o modelo de ouvidoria externa, de modo que por meio do

Colégio de Ouvidorias das Defensorias Públicas do Brasil, a Ouvidoria tem lutado pelo

cumprimento da Lei Complementar 132/09, com a defesa da implantação e do fortalecimento das

Ouvidorias nas Defensorias do país.286

Observa-se assim que contam com Ouvidoria externa: Acre( 2010)

Mato Grosso (2012), Rio Grande do Sul(2011) Paraná (2013) São Paulo (2006), Distrito Federal

(2010), Maranhão (2012), Bahia, Ceará(2011) e Rio de Janeiro(2015) e Piauí (2015).287

286 No final do ano de 2014, importantes mudanças ocorreram no Estado do Piauí e no Espírito Santo, em relação as

ouvidorias-externas. No primeiro, iniciou-se o processo eleitoral para a Defensoria do Estado, tendo culminado em

2015 na eleição do primeiro Ouvidor Externo da instituição, sendo que em relação ao Espírito Santo foi anunciada a

intenção de se criar uma ouvidoria “independente”. Disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015_06_Relatorio-OG-2014.pdf último acesso

em 12.11.2015. 287 Dados extraídos do site oficial da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/151201%20Carta%20do%20Piau%C3%AD%20

-%20Revisada.pdf último acesso em 03.12.2015. Observa-se ainda em pesquisa realizada pelo Colégio de

Ouvidorias de Defensorias Públicas do Brasil no ano de 2012, a Ouvidoria da Defensoria Pública do Acre possui um

Conselho Consultivo, sendo que a Bahia (possui um órgão similar denominado Grupo Operativo). Íntegra

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Em dezembro de 2015, a Defensoria Pública do Estado da Paraíba

instalou uma Ouvidoria interna, contrariando a orientação legal para que que as Ouvidorias da

Defensoria Pública sejam externas.288

Cumpre mencionar que não há previsão na Lei Complementar

80/94, alterada pela Lei Complementar n.º 132/09, para criação de ouvidoria externa na

Defensoria Pública da União.289

Analisaremos com mais detalhes a estrutura de organização e

funcionamento da Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, sem prejuízo

do estudo da Lei Complementar 80/94, alterada pela Lei Complementar 132/09. Além disso, será

estudado os avanços e retrocessos da criação da Ouvidoria-Externa pela Lei Estadual n.º 988/06 e

a Lei Complementar das Defensorias Públicas do Brasil.

No Estado de São Paulo, a Ouvidoria-Geral é órgão da

administração superior da Defensoria Pública do Estado (artigo 11, Lei Complementar Estadual

988/06) que deve participar da gestão e fiscalização da instituição, dos membros e servidores.

O Ouvidor-Geral é membro nato do Conselho Superior da

Defensoria Pública, com direito de assento e voz, porém não tem voto ou direito de veto (artigo

37, §2º da Lei Complementar Estadual 988/06). Além disso exerce um cargo em comissão, com http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2012.06.12_Estrutura_TabelaComparativaCol%

c3%a9gioOuvidoria.pdf último acesso em 05.12.2015. 288 Em razão do descumprimento da Legislação Federal e da Recomendação n.º 01/2015 elaborada pelo Colégio de

Ouvidorias de Defensorias Públicas do Brasil em 27.07.2015, foi emitida uma nota de repúdio em 01.12.2015 pelo

Colégio de Ouvidorias a fim de que a Ouvidoria do Estado da Paraíba revogue a nomeação de um Defensor Público

aposentado como Ouvidor-Geral, dando prosseguimento ao processo de nomeação do Ouvidor-Geral, conforme

indicação da sociedade civil. Íntegra da Recomendação disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015.08.21_Recomendacao-

ColegioOuvidorias01-2015.pdf último acesso em 05.12.2015. Íntegra da nota de repúdio em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/151201%20Carta%20do%20Piau%c3%ad%20-

%20Revisada.pdf último acesso em 05.12.2015 289 Importante salientar que a Resolução 59 do Conselho Superior da Defensoria Pública da União, de 8 de Maio de

2012, cria a Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública da União. Ocorre que, a mesma não foi implementada até o ano

de 2015 em razão da falta da respectiva contraprestação remuneratória do trabalho a ser desenvolvido pelo Ouvidor,

o que dificulta a estruturação da Ouvidoria-Geral. Informação extraída do site oficial da Defensoria Pública da União

disponível em http://www.dpu.gov.br/noticias-distrito-federal-slideshow/26772-dpu-recebe-representantes-do-

colegio-de-ouvidorias último acesso em 07.12.2015.

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jornada integral, vedada qualquer outra atividade remunerada, salvo o magistério. (artigo 37,§3º

da Lei Complementar Estadual 988/06 ).

No Estado de São Paulo, em 2006, a Lei Orgânica da Defensoria

Pública, n.º 988/06, previa um Ouvidor- Geral externo. O fato da Ouvidoria ser formada por

membros externos da carreira, dotados de autonomia, exerce uma função essencial para o

amadurecimento da democracia participativa, eis que ao exercerem um papel não apenas

fiscalizatório mas de canal permanente com a sociedade civil, possibilitam uma atuação menos

engessada e assim, com maior atuação em prol do destinatário do serviço.

A participação do Ouvidor Geral, ainda que sem direito de voto, no

Conselho Superior da Defensoria Pública, garante a participação social, o que potencializa a

efetividade e a qualidade do serviço público prestado, garantindo maior democratização a sua

atuação a partir de instrumentos que possibilitam a oitiva da sociedade.

A discussão quanto ao direito de voto do Ouvidor-Geral ainda é

incipiente, especialmente porque ainda há uma certa resistência de conferir a um membro externo

da Defensoria Pública o mesmo poder de voto conferido a um Defensor Público.

Acredita-se que o tema ainda necessite maior aprofundamento, eis

que apesar do Ouvidor-Geral ser membro nato do Conselho Superior da Defensoria Pública, o

mesmo não tem direito de voto, diversamente dos outros membros natos.

Poderia, portanto, se afirmar com base no Princípio da igualdade, de

que todos os membros natos deveriam ser dotados das mesmas prerrogativas, quais sejam exercer

o direito de voto. Em especial, o Ouvidor-Geral, uma vez que representa os interesses dos

vulneráveis e reflete a vontade da sociedade civil.

Porém, pode-se dizer que ter assento no conselho e direito de voz já

são avanços consideráveis para uma instituição pública que prima por uma sociedade mais

participativa e democrática.

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A Ouvidoria promove, ainda, o prêmio anual “Justiça para Todas e

Todos - Josephina Bacariça”290 criado pela Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do Estado de

São Paulo e desenvolvido em parceria com a Associação Paulista dos Defensores Públicos –

APADEP e a Frente Parlamentar de Apoio à Defensoria Pública da Assembleia Legislativa do

Estado, que destaca práticas exitosas em torno do tema “acesso à justiça”, realizado em favor da

população carente, reconhecendo experiências pioneiras e de grande relevância social

desenvolvidas na Defensoria Pública de São Paulo.291

No mais, a Lei Complementar n.º 988/06 prevê no artigo 4º que a

Ouvidoria também é legitimada para propor teses relacionadas às atribuições da Defensoria

Pública do Estado. Estas teses institucionais serão observadas pelos membros da Defensoria

Pública, constituindo parâmetro mínimo de qualidade (artigo 58, XV da Lei Complementar n.º

988/06).

Além disso, a referida lei prevê uma lista tríplice para escolha do

ouvidor. No mais esta lista será elaborada pelo CONDEPE, Conselho Estadual de Defesa dos

Direitos da Pessoa Humana, para mandato de 2 anos, permitida uma recondução. Cumpre

observar que a lei bandeirante prevê a nomeação do Ouvidor –Geral pelo Governador do Estado.

(artigo 37 da Lei Complementar n.º 988/06)

No Estado de São Paulo, a Ouvidoria-Geral compreende ainda o

Conselho Consultivo e o Grupo de Apoio Administrativo (artigo 38).

O Grupo de Apoio Administrativo tem por atribuição desenvolver

as atividades administrativas da Ouvidoria-Geral, em especial as relativas aos procedimentos de

290 Desde 2012, a premiação é feita em três categorias: órgãos da Defensoria Pública (que inclui as Unidades,

Regionais e Núcleos Especializados), Defensoras ou Defensores Públicos e Servidoras ou Servidores. A premiação é

decidida pelo Conselho Consultivo da Ouvidoria-Geral, composto por representantes da sociedade civil. Em 2014 o

Prêmio passa a homenagear, em seu nome, a militante Josephina Bacariça, que dedicou sua vida à promoção e defesa

dos direitos humanos.290 Disponível em http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Default.aspx?idPagina=3219 último

acesso em 11.11.15. 291 CARDOSO, Luciana Zaffalon Leme. Uma Fenda na Justiça. A Defensoria Pública e a Construção de Inovações

Democráticas.Editora Hucitec: São Paulo, 2010, p. 242.

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recebimento, registro e acompanhamento das queixas, denúncias e reclamações enviadas ao

órgão. (artigo 41 da Lei Complementar n.º 988/06).

O Conselho Consultivo da Ouvidoria-Geral do Estado de São

Paulo, por sua vez, é um conselho da sociedade politicamente organizada, fruto do movimento de

criação da Defensoria Pública Bandeirante, formado por pessoas voluntárias e externas aos

quadros da Defensoria Pública que imbuídas de buscar o diálogo com a sociedade civil e acima

de tudo com o objetivo de promover o debate comunitário, participam ativamente no

fortalecimento da cidadania ao propiciar maior participação popular.

Além disso, diferentemente do Ouvidor-Geral, as funções de

membro do Conselho Consultivo não serão remuneradas. Porém, a atividade desempenhada é

considerada serviço público de natureza relevante, por ser função de relevante interesse social

Como o conselho é formado por representantes da sociedade civil é

possível a sustentação de pautas populares o que ainda é incipiente no sistema de justiça. Além

disso, as pessoas que compõem o Conselho por terem notório saber, podem contribuir na

elaboração de pareceres.292 Nota-se que a indicação dos membros do conselho recairá sobre

pessoas e representantes de entidades notoriamente compromissadas com os princípios e

atribuições da Defensoria Pública do Estado.

Ademais, com o objetivo de ouvir os anseios da população mais

excluída e afastada dos grandes centros urbanos, o Conselho Consultivo passou a realizar

reuniões em áreas mais periféricas293, justamente para propiciar o acesso de todos. 294

292 Informação extraída do http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2015_06_Relatorio-

OG-2014.pdf último acesso em 11.11.15 293 Os espaços de realização das reuniões são divulgados com antecedência nas comunidades, para que a população

possa ser ouvida, seja informada da existência dos seus direitos, bem como do papel da Defensoria Pública e da

Ouvidoria-Geral. 294 Deste modo, em novembro de 2014, foi realizada uma reunião em Capão Redondo, área de extrema pobreza na

Região Sul da Capital do Estado de São Paulo; tendo a Ouvidoria-Geral realizado a mesma atividade em Abril de

2015 em Guarulhos/SP, em Julho/15 na Cidade de Campinas/SP e Novembro de 2015, na Região do Sapopemba,

Zona Leste da Capital.

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137

Logo, com essa nova prática de inclusão social, as pessoas que

residem em locais descentralizados geograficamente e, que por diversos motivos, econômicos,

sociais ou culturais, não poderiam participar das atividades realizadas em áreas mais

centralizadas, podem participar ativamente na construção de uma sociedade mais justa e

democrática.

De fato, trata-se de um espaço democrático, de notória participação

popular, em que há o levantamento de ideias para a elaboração de medidas propositivas para o

aprimoramento da Defensoria Pública e seus órgãos, bem como orientação e educação em

direitos, com distribuição de cartilhas elaboras por diversos órgãos da Defensoria Pública.

A educação popular, se utiliza de uma linguagem mais acessível

para as camadas empobrecidas da sociedade, o que está em consonância com as 100 Regras de

Brasília e a busca de inclusão social. Assim, esta metodologia utilizada pela Defensoria Pública,

em conjunto com os parceiros, permite melhor absorção pelas classes populares, vítimas das

desigualdades socioeconômicas e culturas, especialmente afetadas pela má distribuição de

acessos e serviços referentes aos direitos fundamentais e as políticas públicas de um modo geral.

A utilização do trabalho popular como metodologia está

intimamente ligada com o papel da Defensoria Pública de buscar o empoderamento, através da

troca de experiências

É importante que a Defensoria Pública, busque por meio da

educação popular e da conscientização de direitos, o fortalecimento da relação dela com as

comunidades carentes, garantindo-se uma atuação mais efetiva às demandas e necessidades

sociais e locais. Daí a importância de projetos e atividades itinerantes295, mais próximas das

295 A Defensoria Pública da União (DPU), realiza um projeto de significativa importância e que deveria ser copiada

pelas demais Defensorias Públicas do Brasil, o projeto denominado “Projeto DPU Itinerante” consiste no

deslocamento da atuação da DPU para onde não há Unidade instalada, principalmente em locais em que há uma

carência social organizado, com o intuito de deslocar Defensores Públicos e servidores para comunidades distantes

dos centros políticos. Na maioria dos casos, os mutirões contam com cooperações entre a Defensoria Pública e outros

órgãos, como Juizado Especial Federal, Defensoria Pública Estadual, Ministério Público, Prefeitura, Conselho

Municipal de Assistência Social, tudo no intuito de que a questão seja resolvida de forma eficaz e célere, muitas

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comunidades, para fomentar o diálogo e fortalecer o entrosamento com a sociedade civil,

possibilitando que eles sejam os protagonistas na luta social as quais estão envolvidos. 296

A importância da participação popular nos processos de tomadas de

decisão já foi internacionalmente previsto pela Convenção de Aarhus, 297no artigo 1º que :

“Para contribuir com a proteção de cada direito de cada pessoa

das gerações presente e futura de viver num ambiente adequado

para o seu bem-estar, toda parte deve garantir os direitos de acesso

à informação, de participação pública nas tomadas de decisão e de

acesso à justiça em casos ambientais de acordo com o disposto

nesta convenção”.

Vale ainda mencionar que em São Paulo, o Defensor Público-Geral

do Estado poderá designar membros da carreira, em efetivo exercício, para a função de

Subouvidor, mediante proposta do Ouvidor-Geral. (artigo 40)

Os Subouvidores serão defensores públicos que auxiliarão o

Ouvidor-Geral nos assuntos relacionados às suas unidades, constituindo um canal de

comunicação mais próximo com os usuários. A criação das SubOuvidorias se amolda com o

objetivo inicial da construção da Defensoria Pública Bandeirante, um atendimento

descentralizado, específico de cada unidade.

vezes sem a necessidade de ajuizamento de ações perante o Poder Judiciário. Exemplo de atuação foi no Município

de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, em que os atendimentos foram voltados às comunidades indígenas

locais, antes desprovidas de qualquer acesso ao Poder Judiciário e sem conhecimento de seus direitos, principalmente

previdenciários. Disponível em DPU Itinerante: um projeto da Defensoria Pública da União. Disponível em

<http://www. dpu.gov.br/pdf/Livreto _DPU.pdf>. último acesso em 17.11.2015 296 CARPANELLI, Fernanda Galhardo Carpanelli; SILVA,Mariana Lins de Carli Silva; ANTÃO,Renata Cristina do

Nascimento Antão. Cursos de Defensores Populares: Relato de uma Expriência Emancipatória in Defensoria Pública,

Assessoria Jurídica Popular e Movimentos Sociais e Populares: novos caminhos traçados na concretização do direito

de acesso à justiça / Organizado por Amélia Rocha [et al.] – Fortaleza: Dedo de Moças Editora e Comunicação Ltda.:

2013. Disponível em http://www.anadep.org.br/wtksite/LIVRO_ID6.pdf último acesso em 18.11.15. 297A Convenção de Aarhus adotada pela Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas (CEE/ONU) sobre

Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de

Ambiente, realizada em 25 de Junho de 1998, na cidade dinamarquesa de Aarhus, elaborada durante a 4ª Conferência

Ministerial "Ambiente para a Europa", que entrou em vigor em 30 de Outubro de 2001 Disponível em

http://www.unece.org/env/pp/welcome.html último acesso em 03.12.2015.

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139

Interessante seria a readequação da atividade, especialmente diante

da autonomia conferida a Ouvidoria-Geral e o modelo externo. Isso porque, ainda que a

Defensoria Pública cumpra o modelo legal, qual seja, o de que os Subouvidores sejam

Defensores Públicos, defende-se que sejam exercidos por pessoas da sociedade civil. Este novo

modelo, demandaria alteração legislativa, porém, representaria com mais precisão o caráter

externo da Ouvidoria, bem como facilitaria o contato direto com a sociedade civil.

4.5.1. A Ouvidoria-Geral: Lei Complementar n.º 80/94 e Lei Complementar n.º 988/06

No âmbito federal, a Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública passou

a ter previsão legal apenas com o advento da Lei Complementar n.º132/09 que provocou

inovações na Lei Complementar n.º 80/94, que prevê normas gerais para a organização da

Defensoria Pública nos Estados e disciplina a organização da Defensoria Pública da União

Ocorre que, o modelo de ouvidoria previsto pela Lei Complementar

132/09 é mais acanhado do que o modelo contido na Legislação Estadual da Defensoria Pública

do Estado de São Paulo.

Primeiramente, porque reconhece a Ouvidoria-Geral como “órgão

auxiliar” (artigo 105-A da Lei Complementar 132/09) e não “superior” conforme a Defensoria

Pública Paulista. Além disso não há conselho consultivo e subouvidorias. Destarte, a nomeação é

feita pelo Defensor Público-Geral do Estado (artigo 105- B da Lei Complementar 132/09) e não

pelo Governador do Estado, como era previsto na Lei Complementar Estadual 988/06.

Conforme Luciana Zaffalon Leme Cardoso:

“como vimos no caso de São Paulo, (o Conselho Consultivo)

aprofundou a participação social qualificada, permitindo a

estruturação de diálogo permanente tanto com a instituição quanto

com movimentos e organizações sociais, constituindo também,

espaços educativos e de fomento à participação”.298

298 CARDOSO, Luciana Zaffalon Leme. Uma Fenda na Justiça. A Defensoria Pública e a Construção de Inovações

Democráticas. Editora Hucitec: São Paulo, 2010, p. 240.

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Em relação as inovações trazidas pela Lei Complementar n.º

132/09, no que se refere as Ouvidorias, podemos afirmar que ocorreu um avanço, ao reconhecer a

obrigatoriedade da criação de uma ouvidoria externa no âmbito das Defensorias Públicas

Estaduais.299 Porém, no que se refere a Lei Complementar Estadual n.º 988/06, representou um

retrocesso dos direitos fundamentais300 eis que a Defensoria Pública de São Paulo reconhecia a

Ouvidoria-Geral como órgão superior e a Lei Complementar n.º 80/94 passou a reconhecê-la

como órgão auxiliar.

Sustenta-se assim, que a interpretação que mais se coaduna com o

Estado Democrático de Direito, fundado na participação popular, seria a que reconhece que a Lei

Complementar n.º 80/94, alterada pela Lei Complementar n.º 132/09, deve ser interpretada como

norma de parâmetro mínimo301 de obrigação. Ou seja, os Estados devem cumprir a referida lei ao

menos na criação de uma ouvidoria-externa e classificá-la como órgão auxiliar. De modo que a

previsão contida na Lei Bandeirante, por ser avançada, não poderia ser revogada, ainda que

anterior a Lei Complementar n.º 132/09.

Assim, por ter a Defensoria Pública do Estado de São Paulo

apresentado um modelo de Ouvidoria-Geral mais democrático e sensível aos pleitos da

299 Art. 105-A. A Ouvidoria-Geral é órgão auxiliar da Defensoria Pública do Estado, de promoção da qualidade dos

serviços prestados pela Instituição. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009). Parágrafo único. A

Ouvidoria-Geral contará com servidores da Defensoria Pública do Estado e com a estrutura definida pelo Conselho

Superior após proposta do Ouvidor-Geral. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

Art. 105-B. O Ouvidor-Geral será escolhido pelo Conselho Superior, dentre cidadãos de reputação ilibada, não

integrante da Carreira, indicados em lista tríplice formada pela sociedade civil, para mandato de 2 (dois) anos,

permitida 1 (uma) recondução. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009). § 1º O Conselho Superior editará

normas regulamentando a forma de elaboração da lista tríplice. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009). §

2º O Ouvidor-Geral será nomeado pelo Defensor Público-Geral do Estado. (Incluído pela Lei Complementar nº

132, de 2009). § 3º O cargo de Ouvidor-Geral será exercido em regime de dedicação exclusiva. (Incluído pela Lei

Complementar nº 132, de 2009). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp80.htm último

acesso em 17.12.15. 300 QUEIROZ, Cristina. O princípio da não reversibilidade dos direitos fundamentais sociais: Coimbra: Coimbra

Editora, 2006. 301 Esse entendimento é esposado pelo Ministro Celso de Mello no julgamento da ADI n.º 2903-7, do Estado da

Paraíba, publicada em 18.09.2008, in verbis: “As referidas normas gerais- que estabelecem padrões mínimos e

homogêneos a serem observados por todos os Estados-membros da Federação- definem requisitos destinados a

valorizar a carreira do Defensor Público e fortalecer a autonomia institucional (funcional e administrativa) da

Defensoria Pública Estadual, vindo a condicionar, por isso mesmo, como natural decorrência de tais constitucionais

( CF, artigo 134, §1º e §2º), o processo de investidura nos altos cargos de Defensor Público-Geral, de seu substituto

e de Corregedor-Geral da Defensoria Pública local”. Disponível a na íntegra em

http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=548579 último acesso em 15.12.2015.

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sociedade, sustenta-se manter a categorização de Órgão Superior da Defensoria Pública, bem

como servir de parâmetro para as demais Ouvidorias do País.

No parecer elaborado por Rafael Valim em 13 de Setembro de

2010, após consulta realizada pela Ouvidoria-Geral, o mesmo afirma “ A mudança da Ouvidoria-

Geral, no quadro da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, de órgão da administração

superior para órgão auxiliar, por si só, representaria evidente “derrota” dos valores que a

inspiram”. 302

Com base nas mesmas fundamentações, o processo de nomeação do

Ouvidor-Geral também deveria ter sido mantido no Estado de São Paulo. Isto porque, a Lei

Complementar n.º 988/06 previa que a nomeação do Ouvidor-Geral fosse feita pelo Governador

do Estado, enquanto que a Lei Complementar n.º 80/94 prevê o Defensor Público-Geral da

Defensoria Pública.

Ocorre que, diversamente do que ocorreu com o status da

Ouvidoria-Geral, (pela manutenção de órgão superior) a nomeação do Ouvidor-Geral, após o

advento da Lei Complementar n.º 80/94, alterada pela Lei Complementar n.º 132/09, passou a ser

feita pelo Defensor Público-Geral do Estado.303 Observa-se que o modelo contido pelo

Legislação Bandeirante era mais democrático, eis que ao prever a nomeação do Ouvidor-Geral

pelo Governador do Estado, estava prestigiando ainda mais o papel da sociedade, eis que o

governador foi eleito democraticamente pela sociedade civil.

302 O parecer está disponível na íntegra no site da Defensoria Pública do Estado de São Paulo,

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/PARECER_OUVIDORIA_RafaelValim.pdf

último acesso em 15.12.2015. 303 Conforme a seguinte previsão legal: Art. 105-B. O Ouvidor-Geral será escolhido pelo Conselho Superior, dentre

cidadãos de reputação ilibada, não integrante da Carreira, indicados em lista tríplice formada pela sociedade civil,

para mandato de 2 (dois) anos, permitida 1 (uma) recondução. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de

2009).§ 1º O Conselho Superior editará normas regulamentando a forma de elaboração da lista tríplice. (Incluído

pela Lei Complementar nº 132, de 2009).§ 2º O Ouvidor-Geral será nomeado pelo Defensor Público-Geral do

Estado. (Incluído pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp80.htm último acesso em 15.12.2015.

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142

Podemos observar, portanto, um retrocesso social, eis que a

nomeação feita pelo Governador do Estado, tal como previsto pela Lei Complementar Estadual

Bandeirante, visava assegurar a nomeação do Ouvidor-Geral, membro externo dos quadros

institucionais, por um representante eleito pelo povo, qual seja o Governador do Estado.

Cumpre ainda mencionar que o modelo previsto pela Lei

Complementar 132/09 não considera o Ouvidor-Geral como membro nato do Conselho Superior

da Defensoria Pública, tal como previsto no artigo 26, V, §1º da Lei Complementar Estadual

988/06.

Nota-se assim que a inovação benéfica se verifica em razão de ter se

exigido para todas as Defensorias Públicas Estaduais a criação de uma ouvidoria-externa. Porém,

o modelo sugerido pela Lei Complementar 80/94 acarreta retrocesso ao modelo paulista, eis que

modelo dotado de maior autonomia e independência.

Desse modo, pode-se dizer que a criação de uma Ouvidoria Externa

inserida em uma instituição jurídica é um inovador mecanismo de controle e participação social

que potencialmente propicia um novo referencial para as Defensorias e para o Sistema de Justiça.

O fato do Ouvidor Geral ser considerado membro nato do Conselho

Superior da Defensoria Pública, permite que a sociedade participe mais uma vez das decisões e

do rumo da carreira. Quanto ao direito de voto, importante mencionar que a Legislação poderia

assegurado ao Ouvidor-Geral o direito de voto, o que enriqueceria ainda mais a participação do

Ouvidor no Conselho. Porém a permanência naquele espaço político, com direito de voz já é um

embrião de uma atuação mais democrática e efetiva.

Cumpre ainda mencionar que em relação ao caráter externo da

Ouvidoria-Geral, tramita no Supremo Tribunal Federal, a ADI 4608304, que, com fulcro no artigo

304 A ADI 4608 foi proposta em 26 de maio de 2011 pelo Partido Social Liberal – PSL e tem por objeto os artigos

105-B, caput e 105-C da Lei Complementar Federal nº 80, de 12 da janeiro de 1994, com nova redação dada pelo

artigo 10 da Lei Complementar nº 132, de 07 de outubro de 2009, que organiza a Defensoria Pública da União, do

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24 XIII da Constituição Federal de 1988 pretende declarar inconstitucional os artigos da Lei

Complementar n.º 132/09 que impede que os Defensores públicos ativos ou inativos sejam

nomeados para o cargo de Ouvidor Geral.

A Ouvidoria Geral da Defensoria Pública, ingressou como amicus

curiae na ADI 4608, com fulcro na emenda 45/04, com a máxima da eficiência do judiciário,

alegando que por conta da natureza da atividade, o cargo de Ouvidor Geral estaria dissociado do

regime funcional dos Defensores Públicos e intimamente ligada a disseminação das formas de

participação popular no acompanhamento e fiscalização305 da prestação dos serviços realizados

pela Defensoria Pública.306

Além disso, como há interesse no contato permanente com os

vários órgãos do sistema de justiça, estimulando-os a atuar em permanente sintonia com os

direitos dos usuários, nada mais salutar que uma ouvidoria externa.

Em entrevista realizada pelo Conjur, Maria Tereza Sadek destaca a

importância da ouvidoria externa “Todas as instituições", pondera, "enfrentam um sério risco: o

desenvolvimento de mecanismos e práticas mais voltados para a defesa interna e de seus

integrantes, em detrimento de sua finalidade".307

Distrito Federal e Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados e dá outras previdências.

A Conectas Direitos Humanos em parceria com o Instituto Pro Bono foram admitidas no feito “Amicus Curiae.

Disponível em http://www.conectas.org/arquivos/editor/files/Resumo%20-%20ADI%204608(1).pdf, último acesso

em 11.11.2015. 305Nos dizeres de CARDOSO, LIMA NETO E ALCÂNTARA, “Às ouvidorias cumprem, portanto, a função de

atuar como mecanismo de correção democrática na medida em que instituem a possibilidade de os cidadãos e

gestores públicos questionarem o funcionamento das próprias instituições”. Em Ouvidoria Pública e Governança

Democrática in Boletim de Análise Político Institucional do IPEA que trata da “Agenda Política e Desafios

Institucionais: questões centrais para 2013”. http://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/book_bapi%203.pdf

último acesso em 04.12.2015. 306 Em que pese a ADI 4608 representar um retrocesso, eis que pretende afastar um terceiro, membro da sociedade

civil e alheio aos quadros funcionais da Defensoria Pública de exercer a função de Ouvidor-Geral, representou um

avanço ao admitir a Ouvidoria-Geral como Amicus Curiae. Esta intervenção na qualidade de “amigo da corte”

reconheceu a autonomia da Ouvidoria, o que fortalece a sua atuação. 307 Disponível em http://www.conjur.com.br/2011-set-24/defensoria-publica-sao-paulo-luta-supremo-controle-

externo último acesso em 11.11.15.

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No que se refere a ADI ajuizada para restringir a ouvidoria externa

da Defensoria Pública, importante demonstrar que a Conectas Direitos Humanos e o Instituo Pro

Bono ingressaram como amicus curiae, manifestando-se no sentido de que “para uma efetiva

gestão é necessário um Ouvidor-Geral não pertencente à carreira, preconizando assim os

preceitos do Estado Democrático de Direto brasileiro”. 308

Além disso, para as organizações, a existência de uma ouvidoria

externa visa “ampliar os atores no debate sobre os rumos de uma instituição essencial à justiça e

responsável pelo relevantíssimo serviço de assistência jurídica no Brasil, que permite o acesso à

justiça a milhares de pessoas’’.309

Isto porque, a participação de um membro da carreira neste cargo

não aparenta ser adequada, ao passo que muitas vezes poderá não desempenhar suas funções em

prol da população, não havendo a imparcialidade desejada.

Não se pode, portanto, inserir a Ouvidoria Externa como um

departamento interno da Defensoria Pública, passível de sofrer controle direto da instituição. 310

Assim, a autonomia da Ouvidoria-Geral é importante para o fortalecimento do órgão e atuação.

308 Informações extraída da http://www.conectas.org/arquivos/editor/files/Resumo%20-%20ADI%204608(1).pdf

último acesso em 11.11.2015. 309 Informações extraída da http://www.conectas.org/arquivos/editor/files/Resumo%20-%20ADI%204608(1).pdf

último acesso em 11.11.2015. 310 Importante salientar que ainda persiste no sistema brasileiro a tendência da criação de modelos internos de

ouvidoria, razão pela qual o caminho escolhido pela Defensoria Pública é inovador no sistema de justiça,

especialmente no Estado de São Paulo, por ser a única instituição estadual que conta com ouvidoria- externa. A fim

de ilustrar este pensamento, observa-se a na Proposta de Emenda Constitucional n.º 45/2009, que objetiva inscrever

no texto constitucional regras sobre a organização das atividades do sistema de controle interno da administração

pública, ao prever no artigo 37 da constituição Federal de 1988 o inciso XXIII, in verbis: “Art. 37. XXIII – as

atividades do sistema de controle interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a que faz

referência o art. 74, essenciais ao funcionamento da administração pública, contemplarão em especial as funções de

ouvidoria, controladoria, auditoria governamental e correição, e serão desempenhadas por órgãos de natureza

permanente, e exercidas por servidores organizados em carreiras específicas na forma da lei.”Íntegra disponível em

http://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/93534

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Dentro deste propósito de participação social democrática surgiu o

Colégio de Ouvidorias das Defensorias Públicas, com o fim de promover a integração,

intercâmbio e diálogo nacional entre as diferentes Defensorias Públicas do País.311

Deste modo, podemos afirmar que a Defensoria Pública é o

“passaporte para a cidadania”312, o “sal da terra”313 no mundo jurídico, atuando diariamente na

emancipação e efetivação dos direitos humanos e da cidadania da população, contribuindo para o

aperfeiçoamento de um sistema de justiça mais igualitário e democrático, que atenda os interesses

de todos.

311 ROCHA, Amélia Soares da. Defensoria Pública: fundamentos, organização e funcionamento. São Paulo: Atlas,

2013, p. 207. 312 Definição contida na “Carta de Porto Alegre”, documento formulado pelos Defensores Públicos brasileiros, das

delegações dos Estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato

Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio

Grande do Sul, Rondônia, Roraima, São Paulo, Sergipe, Tocantins, do Distrito Federal e da União, bem como as

representações das Defensorias Públicas da Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, e os representantes da sociedade

civil organizada e de entidades civis dos Estados de Santa Catarina e Goiás, da Assembléia Legislativa do Estado do

Paraná, e acadêmicos de Direito, reunidos na capital do Estado do Rio Grande do Sul, durante a realização do VIII

Congresso Nacional de Defensores Públicos, no período de 03 de novembro a 06 de novembro de 2009,em conjunto

com as Defensorias Públicas representadas no VIII Congresso Nacional de Defensores Públicos, realizado entre os

dias 3 a 6 de Novembro de 2009 na cidade de Porto Alegre/RS, disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/10079/CARTA_DE_PORTO_ALEGRE__FINAL_.pdf último

acesso em 15.04.2015.

313 Definição contida na “Carta de Porto Alegre”, documento formulado pelos Defensores Públicos brasileiros, das

delegações dos Estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato

Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio

Grande do Sul, Rondônia, Roraima, São Paulo, Sergipe, Tocantins, do Distrito Federal e da União, bem como as

representações das Defensorias Públicas da Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, e os representantes da sociedade

civil organizada e de entidades civis dos Estados de Santa Catarina e Goiás, da Assembléia Legislativa do Estado do

Paraná, e acadêmicos de Direito, reunidos na capital do Estado do Rio Grande do Sul, durante a realização do VIII

Congresso Nacional de Defensores Públicos, no período de 03 de novembro a 06 de novembro de 2009,em conjunto

com as Defensorias Públicas representadas no VIII Congresso Nacional de Defensores Públicos, realizado entre os

dias 3 a 6 de Novembro de 2009 na cidade de Porto Alegre/RS, disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/cms/conteudo/10079/CARTA_DE_PORTO_ALEGRE__FINAL_.pdf último

acesso em 15.04.2015.

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5. A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO PRÁTICAS EXITOSAS

DE GOVERNANÇA DEMOCRÁTICA E CIDADANIA

Como observado no decorrer deste trabalho, a Defensoria Pública,

apresenta instrumentos de participação social extremamente relevantes para a proteção da

cidadania e a inclusão social, sendo reconhecida como ator do sistema de justiça de extrema

importância para a construção de uma sociedade mais justa e solidária.

Neste capítulo serão analisadas algumas práticas exitosas realizadas

pela Defensoria Pública. A fim de estabelecer um critério exemplificativo, tomamos como

referência as atividades desempenhadas pela Ouvidoria da Defensoria Pública do Estado de São

Paulo, em especial, por ter sido a Defensoria Pública Bandeirante, a primeira instituição jurídica

que criou uma Ouvidoria externa e independente que dialoga permanentemente com a sociedade

civil.

No período compreendido entre Junho e Julho de 2014, durante a

Copa do Mundo de Futebol no Brasil, a Ouvidoria participou ativamente nos impactos

econômicos, sociais e culturais, ocasionados com a realização do evento na cidade de São Paulo

do evento, especialmente, no que dizia respeito aos movimentos de moradia, à higienização

social e às restrições a direitos e liberdades individuais, como as que impactariam vendedores/as

ambulantes ou manifestantes.

A atuação da Ouvidoria tinha como viés a atuação preventiva,

sendo que foi realizado em conjunto com a Defensoria Pública Geral e o os Núcleos

Especializados da Defensoria Pública um grupo especial para atuar no monitoramento de

manifestações de rua nos dias dos jogos da Copa do Mundo na cidade de São Paulo.

A atuação integrada com os núcleos da Defensoria Pública visou a

prevenção, justamente para evitar prisões ilegais, violações de direitos humanos e o recebimento

de denúncias de violações de direitos.

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Nesse sentido foram realizadas reuniões com as Secretarias de

Segurança Pública, com Movimentos Sociais, a realização de atividades de monitoramento por

meio da “equipe móvel” que ficou responsável pelo acompanhamento “in loco” das

manifestações, do “Fifa Fan Fest” no Vale do Anhangabaú, o acompanhamento do “movimento

passe livre” e “não vai ter tarifa” entre outras manifestações.

A importância deste acompanhamento da Defensoria Pública com a

Sociedade Civil possibilitou a orientação jurídica, o fortalecimento da missão de atuação em

conjunto com a sociedade na construção e efetividade de direitos, bem como constrangeu a

utilização de instrumentos desproporcionais ou abusivos contra os manifestantes, fomentando o

diálogo e a solução pacífica dos conflitos.314

No que se refere ao direito constitucional à moradia, importante

mencionar a realização da “Jornada da Moradia Digna”315, que de fato é mais do que um evento e

sim um espaço coletivo de formação, mobilização das forças sociais, populares e do poder

público para discutir e apresentar propostas para enfrentar os problemas relacionados à moradia e

ao Direito à Cidade, compreendendo atividades como atendimentos jurídicos coletivos que

buscam fomentar o acesso à habitação na cidade de São Paulo. 316

314 Ao final da atividade foi realizado um “Relatório sobre a Atuação da Comissão Especial da Copa do Mundo FIFA

2014”, de Junho a Julho de 2014, disponível em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/repositorio/0/Relat%C3%B3rio%20da%20Comiss%C3%A3o%20Especial%

20da%20Copa%202014.pdf último acesso em 17.12.15. 315 A atuação da ouvidoria do Estado de São Paulo é permanente, sendo que no ano de 2015 a Jornada da Cidadania

foi realizada na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, nos dias 4 e 5 de Julho de 2015. 316 No âmbito do Direito à moradia, podemos indicar a prática exitosa apresentada pelo Defensor Público Jairo

Salvador Souza, apresentada no Congresso Nacional de Defensores Públicos, realizado no Rio Grande Norte no ano

de 2011, com a “Defensoria Pública, Movimentos Sociais e Educação em Direitos: a experiência de fomento à

criação, democratização e fortalecimento de associações comunitárias em São José dos Campos, São Paulo”. Nesta

ação, a regularização jurídica das associações está concatenada com a luta pela democratização da terra urbana,

procurando reforçar a luta popular. Congresso Nacional de Defensores Públicos. Livro de teses e práticas exitosas:

erradicação da pobreza na atuação da defensoria pública; as várias dimensões do acesso à justiça. Rio Grande do

norte, 2011, p. .269

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Como prática exitosa no Momento Aberto do Conselho Superior da

Defensoria Pública, podemos indicar a massiva ocupação do colegiado durante a apreciação do

Processo do Conselho Superior da Defensoria Pública, Processo CSDP n.º 351/2013, iniciado por

proposta da Ouvidoria Geral, do Instituto Luiz Gama e do Núcleo Especializado de Combate à

Discriminação, Racismo e Preconceito da Defensoria, sobre a implementação de cota étnico-

raciais nos concursos da Defensoria Pública. A proposta retomava reivindicações históricas do

Movimento pela Defensoria, de Ciclos de Conferências e de manifestações no Momento Aberto

do Conselho Superior para instituir o mecanismo de cotas étnico raciais nos concursos da

Defensoria Pública.

Além disso, o Supremo Tribunal Federal tinha reconhecido no

julgamento da ADPF 186, ADI 3330 e Recurso Extraordinário n.º 597285, a legitimidade do

sistema de cotas. No âmbito da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, foi aprovada a

instituição de cotas com o percentual de 20%, que foi utilizado à partir do 7º Concurso de

Ingresso de Defensores Públicos na Defensoria Pública do Estado realizado no ano de 2015.

Como exemplo de audiência pública, podemos destacar a audiência

pública “Defensoria para quem? Por uma Defensoria Popular”, realizada em 10 de Dezembro de

2014 em conjunto com o Centro de Defesa de Direitos Humanos Campo Limpo, Movimento

Mães de Maio, Movimento Moinho Vivo, Movimento Nacional de População de Rua,

Movimento Passe Livre e Pastoral Carcerária. Neste espaço, foram discutidos a atuação da

Defensoria Pública e o papel das instituições públicas no contexto de violações de direitos

humanos praticados por agentes do Estado. Ao final da audiência, constatou-se a importância do

fortalecimento da participação popular na Defensoria Pública, entre outros papéis das instituições

envolvidas. 317

Quanto as consultas públicas, a Ouvidoria-Geral teve importante

participação na consulta realizada318 no âmbito do Processo CSDP n.º 314/2014, sobre a

317 Dados complementares em http://cdhep.org.br/audiencia-publica-defensoria-pra-quem-por-uma-defensoria-

popular.html último acesso em 17.12.15. 318 As informações solicitadas pela consulta Pública realizada pela Ouvidoria-Geral estão disponíveis em

http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/23/Documentos/2014.07.23_Comunicado_ConsultaPublica_NH

ABURB.pdf último acesso em 17.12.15.

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organização do Núcleo Especializado de Habitação e Urbanismo para atuação em demandas de

conflitos agrários no interior. A participação da Ouvidoria-Geral, embasada em demandas

apresentadas pela sociedade civil em Ciclos de Conferências da Defensoria Pública, passou a

realizar diversos contatos com os movimentos sociais e pessoas que atuam na área, reivindicando

um perfil mais comprometido com as pautas populares de reintegração de posse, bem como

mecanismo de monitoramento da atuação.

Em relação a participação da sociedade e atuação da Ouvidoria

podemos destacar a atuação no “Monitoramento de Raça/cor e Tortura em visitas Prisionais

realizadas pela Defensoria Pública”. A questão prisional, um dos temas de maior relevância da

Defensoria Pública, ensejou a construção de uma política efetiva voltada a atenção às pessoas em

situação de prisão provisória no Estado de São Paulo. Assim, diversos órgãos da Defensoria, tais

como a Assessoria Criminal, o Departamento de Apoio ao Preso Provisório (DAP) e o Núcleo

Especializado de Situação Carcerária (NESC), além da 2ª Subdefensoria Pública Geral, passaram

a estabelecer um cronograma fixo de visitas a estabelecimentos prisionais da capital, pautado nas

regras previstas na Deliberação CSDP nº 297/2014.

Em todas as visitas, os defensores públicos se utilizam de aplicado

um questionário padrão, proposto pelo NESC, sujeito a análise pelo Conselho Superior da

Defensoria. (Processo CSDP nº 229/2014). A Ouvidoria demonstrou a importância de perguntas

sobre perfil de raça/cor das pessoas atendidas, para aproveitar a atividade institucional das visitas

para obter dados atualizados para pautar atuações propositivas e de políticas públicas em face dos

diagnósticos obtidos.319

319 No âmbito prisional, importante também destacar a atuação na prevenção e controle da tortura no Brasil, em

especial diante da a criação de um Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, por meio da Lei

12.847/2013, vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, responsável pela prevenção e

combate à tortura e a outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes em estabelecimentos prisionais.

O objetivo do Mecanismo é manter um diálogo com a sociedade civil e as autoridades responsáveis, visando a

construção de uma agenda de prevenção à tortura no Estado. Observa-se que a Defensoria Pública do Rio Grande do

Sul também participou dessa ação. Disponível em http://www.defensoria.rs.gov.br/conteudo/24744 último acesso em

17.12.15.

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A Defensoria Pública de São Paulo, em parceria com a Defensoria

Pública da União e do Serviço Franciscano de Solidariedade (Sefras), criou em 2011, Projeto de

Assistência a Moradores de Rua e Albergados do Município de São Paulo, destinado ao

atendimento da população em situação de rua e ao encaminhamento das demandas ao Poder

Judiciário. 320

O projeto, visa possibilitar o acesso à justiça das pessoas em

situação de rua, adequando a prestação jurisdicional às necessidades específicas desse grupo

vulnerável, tais como ausência de documento de identificação pessoal. Além disso, possibilita a

orientação jurídica e conscientização de direitos inerentes à cidadania, bem como de diálogo, o

que também contribuí para a criação de políticas públicas voltadas à população de rua.321

Verifica-se assim que o projeto exerce uma função primordial no

acesso à cidadania do grupo vulnerável em situação de rua, conforme se constatou no relato do

coordenador do Movimento Nacional da População em Situação de Rua, Anderson Lopes

Miranda, “este projeto vem promover vida digna àquele que não tem nome, que é excluído, e que

clama para que entendamos seus anseios, suas dificuldades”.322

320 Observa-se que a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, também realiza projeto de assistência a pessoas

em situação de Rua, por exemplo em Belo Horizonte, a Defensoria Pública Especializada em Direitos Humanos,

Coletivos e Socioambientais em Minas Gerias- DPDH tem trabalhado em parceria com o Centro de Defesa de

Direitos Humanos de População em Situação de Rua e Catadores de Material Reciclável – CNDDH. Esse Centro é

fruto da iniciativa civil e nasceu de um Convênio da CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, com o

Ministério da Justiça e apoio de outros órgãos como o Ministério Público Estadual de Minas Gerais. O Centro tem

desenvolvido um excelente trabalho junto à população em situação de rua ao se aproximar da realidade vivenciada

por aquelas pessoas, bem como encaminhar as demandas diretamente ao Núcleo Especializado da Defensoria

Pública. É importante frisar que este público, em virtude de sua grave vulnerabilidade social não acessava, com

freqüência, os serviços da Defensoria Pública. Essa realidade tem sido modificada por meio da atuação da

Defensoria Pública de Minas Gerais, que contribui para promover acesso à cidadania, por exemplo para a obtenção

de documentos de identificação pessoal e registro de nascimento. Disponível em

http://www.anadep.org.br/wtksite/LIVRO_ID6.pdf último acesso em 17.11.15. 321 O Projeto foi implantado pela Defensora Pública Federal Viviane Ceolin Dallasta e oficializado em 25 de janeiro

de 2012 pela Portaria 42/12, que foi publicada no Diário Oficial da União, à seção 2, página 27. Disponível em:

<http://www.dpu.gov.br/index.php?option=com_conte nt&view=article&id=7340:oficializado-projeto-que-atua-

pelos-direitos-dos-moradores-de-rua&catid =79:noticias&Itemid=220> último acesso em 16.11.2015. 322No decorrer da palestra sobre “A situação da População de Rua em São Paulo e no Brasil”, no Seminário

destinado a discutir estratégias para o acesso à Justiça de pessoas em situação de rua, realizado na Sede do Tribunal

Regional Federal da 3a Região em 25 de novembro de 2011, com parceria da DPU, o coordenador salientou a

importância da cooperação entre Defensoria Pública da União e do Estado. Notícia veiculada em :

<http://www.dpu.gov.br/index. php?option=com_content&view=article&id=6653:ampliacao-de-direitos-a-morador-

de-rua-e-discutido-em-seminario&catid=79:noticias&Itemid=220>. Último acesso em 10.10.2015.

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Em relação a educação em direitos, importante destacar o Curso de

Defensores Populares323, ministrado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, em parceria

com a Defensoria Pública da União e apoio de diversos movimentos sociais.

Esse projeto, visa o empoderamento das lideranças comunitárias

em matéria de cidadania, cultura brasileira, política, direitos humanos e acesso à Justiça. O

objetivo é de capacitação das lideranças comunitárias, não apenas através da Defensoria Pública,

mas com a Defensoria Pública. Em outras palavras, pretende-se o enriquecimento técnico das

lideranças para que haja maior disseminação e conscientização dos direitos nas comunidades.

Os exemplos trazidos para estudo representam algumas práticas

exitosas realizadas pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em que o caráter democrático

e participativo da instituição foi comprovado.

É sabido que a Defensoria Pública exerce um papel fundamental na

consolidação do Estado Democrático de Direito e na busca de uma sociedade mais justa e

solidária. O Acesso à Justiça não pode ser reconhecido apenas sob a ótica judicial, razão pela

qual as práticas acima relatadas confirmam a relevância da atuação preventiva e extrajudicial na

solução dos conflitos e no empoderamento social.

323 Em razão da repercussão da atividade, diversas unidades da Defensoria Pública já realizaram Cursos de

Defensores Populares, tais como Itaquera, São Miguel Paulista e Taubaté.

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CONCLUSÃO

Em que pese a Constituição Federal estabelecer que a Dignidade da

Pessoa Humana e a Cidadania são fundamentos do Estado Democrático de Direito, estes não são

totalmente implementados, quiçá no Sistema de Justiça.

Sabe-se que a Participação Social permite uma atuação mais efetiva

e inclusiva, o que propicia maior governança democrática. Logo, em um Estado fundado na

Democracia e na participação social, o empoderamento da população merece ser incentivado para

que se construa um modelo de justiça igualitário e democrático. .324

Como a Defensoria Pública tem a missão constitucional de

concretizar o acesso à justiça e efetivar os direitos da população, contribuindo para a redução das

desigualdades, imperioso o reconhecimento do importante papel da Defensoria Pública na

construção de um sistema de Justiça inclusivo, plural e aberto a participação e diálogo com a

sociedade civil.325

Sabe-se que o Sistema de Justiça, sem a oitiva e participação

popular não está alcançando a finalidade constitucional pretendida pela Constituição Federal de

1988 e os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, qual seja, o de promover acesso à justiça

de todos.

Nessa seara, surge, o importante papel da Defensoria Pública como

instrumento essencial para assegurar a participação social, de modo que a sociedade não seja

mais vista apenas como destinatária do serviço de justiça, porém como protagonista.

324 O Relatório elaborado pela Comissão do Empoderamento Legal do Pobre afirma que “Reformar a legislação no

papel não é suficiente para mudar a experiência da pobreza no dia a dia. Mesmo as melhores leis não são mais do que

tigres de papel se as pessoas não podem usar o sistema de justiça para se alimentar”. Maiores informações

disponíveis nas folhas 31-32 do Relatório elaborado pela Comissão do Empoderamento Legal do Pobre, in,

http://www.unrol.org/files/Making_the_Law_Work_for_Everyone.pdf último acesso em 08.12.2015 325 Manual de Mediação para a Defensoria Pública. Brasília-DF. Fundação Universidade de Brasília/FUB 2014, p.

33.

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153

Em razão disso, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo,

reconhece que a participação deve ser o eixo estruturante do Sistema de Justiça, de modo que

deve criar não apenas um sistema de justiça para as pessoas, mas um sistema com a sociedade.

Em outras palavras, busca-se mecanismos para que o destinatário

do serviço prestado pela instituição assuma ativo protagonismo no sistema de Justiça, por meio

da participação (Conferências) e controle das atividades desenvolvidas na instituição (ouvidoria

pública)326

Esse contato direto com a sociedade, a promoção de audiências

públicas, a busca pelo fortalecimento da Ouvidoria como órgão autônomo e externo, bem como o

fomento da participação e controle social, propiciam a criação de um caminho para o

fortalecimento da cidadania e a busca de Justiça no Estado Democrático de Direito.

Essa atuação conjunta e ampla propicia a democratização do acesso

à justiça, pois propicia uma abertura democrática às opiniões dos diversos setores da sociedade à

efetiva participação, de modo que com a horizontalidade das partes, haja diálogo para a

construção coletiva de uma justiça mais efetiva e atenta aos anseios da sociedade, nela

compreendida também a parcela do grupo menos favorecido.

Além disso, reconhece-se que a ouvidoria externa é instrumento

para aproximação da Defensoria Pública com os movimentos sociais e populares, o que amplia o

espaço de gestão democrática na Defensoria Pública. Por conta disso, fomenta-se a criação de

Subouvidores externos, o direito de voto do Ouvidor-Geral nas reuniões do Conselho Superior da

Defensoria Pública, bem como a criação de mecanismo de participação popular descentralizada,

junto aos seios da comunidade, para a criação de um novo sistema de justiça.

326 Nas palavras do colega carioca Cleber Francisco Alves “ o futuro da Defensoria Pública depende, em grande

medida, da conscientização dos próprios membros da carreira, no sentido de que a eles cabe uma responsabilidade

decisiva na edificação permanente da instituição” (ALVES, Cleber Francisco. Justiça para todos – assistência

jurídica gratuita nos Estados Unidos, na França e no Brasil. Lúmen Juris. Rio de Janeiro, 2006, p.261.).

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Destarte, imperioso observar que a Defensoria Pública não pode

afastar-se dos destinatários dos serviços que é o seu alento natural. 327

É imprescindível que se atente para a necessidade de construção de

um novo paradigma de instituição, verdadeiramente próxima e afinada com os anseios sociais,

não só no que se refere ao controle e fiscalização da instituição pública, mas à participação da

sociedade civil, destinatária de suas funções e razão da própria existência da Defensoria Pública.

328

A Defensoria Pública, portanto, surge como um dos mecanismos

que permitirá a realização da justiça social,329 eis que propiciará o “direito a ter direitos”, o mais

básico dos direitos, à todos.

A justiça social, pretende a busca pelo reconhecimento de direitos

que a lei ainda não consagrou ou a luta pela efetivação de direitos já afirmados no âmbito

legislativo, mas carentes de efetividade e que não encontram políticas públicas ou realizações

estatais concretas para seu cumprimento.

Por conta disso, a atuação da Defensoria Pública, inclusive na

modalidade preventiva, como por exemplo a educação em direitos, são prova de que o

entrosamento entre Defensoria Pública e movimentos sociais é uma combinação que vem dando

327 Nas palavras de Amélia Soares da Rocha: “ tem a defensoria, justamente por ser a mais jovem dentre as

instituições jurídicas brasileiras, uma preciosa oportunidade de estruturar-se em bases verdadeiramente humanistas

e solidárias, capaz de buscar não apenas uma decisão técnica e processualmente irretocável mas aquela com força

capaz de conferir-lhe a efetividade necessária”. ROCHA, Amélia Soares da. Os direitos dos assistidos e a

imprescindibilidade da democratização (interna e externa) da instituição in Sousa, José Augusto Garcia de. Uma

nova Defensoria Pública pede passagem: Reflexões sobre a Lei Complementar 132/09, Lúmen Juris: Rio de Janeiro,

2011, p.121. 328 DE VITTO, Renato Campos Pinto, CASTRO, André Luís Machado de. Defensoria Pública como instrumento

de consolidação da democracia in Slakmon, Catherine; Machado, Maíra Rocha; Bottini, Pierpaolo Cruz (Orgs.). Novas direções na governança da justiça e da segurança. Brasília-DF: Ministério da Justiça, 2006, p.237. Disponível em http://www.esteio.rs.gov.br/documents/SMSMU/governanca%20na%20seguranca%20-%20material%20do%20MJ.pdf último acesso em 18.11.2015. 329 TAVARES, André Ramos. Reforma do Judiciário no Brasil Pós-88: (des)estruturando a justiça: comentários

completos à Emenda Constitucional n. 45/04.São Paulo: Saraiva, 2005.

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bons resultados e propicia maior acesso à justiça social, contribuindo para a consolidação da

cidadania.

Essa contrapartida da Defensoria Pública, com a criação e

participação de projetos sociais, fomentam um espaço mais cooperativo com as lideranças

comunitárias e a sociedade civil, o que fortalece o reconhecimento de que a Defensoria Pública

necessita de implementação e fortalecimento para adquirir o tamanho e a força política

necessárias para o cumprimento da missão constitucional.

A Defensoria Pública ao permitir o empoderamento da população,

seja por meio da orientação, educação em direitos ou participação social, permitirá que o cidadão

possa participar ativamente do sistema de justiça, propiciando não apenas o conhecimento dos

direitos, como a fiscalização e o aperfeiçoamento das atividades institucionais.

É importante observar que tanto o acesso à justiça propiciará o

empoderamento da pessoa vulnerável, como o empoderamento irá permitir uma participação

mais atuante no sistema de justiça. Uma vez que, de nada adiantaria, um sistema de justiça

efetivo, se a pessoa que faz jus a concretização de um direto desconhece a existência dele e dos

mecanismos para implementação.

Com essa participação mais efetiva, o empoderamento será feito

também de baixo para cima,330 ou seja, a partir dos anseios e objetivos da própria sociedade, o

que indica uma visão mais democrática e participativa.

Assim, essa troca constante de experiências e diálogos, possibilitará

que as pessoas não sejam apenas os destinatários dos serviços, mas efetivos agentes de

transformação na sociedade, o que propiciará um sistema de justiça mais efetivo, inclusivo e

igualitário.

330 O Relatório elaborado pela Comissão do Empoderamento Legal do Pobre segue essa linha de pensamento, na

qual o empoderamento político, social e econômico das pessoas também deve ser feito de baixo para cima .

Disponível em http://www.unrol.org/files/Making_the_Law_Work_for_Everyone.pdf último acesso em 08.12.2015.

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Observa-se que apesar da Defensoria Pública ser uma instituição

relativamente nova, ela tem se empenhado e contribuído com a estruturação de uma política

voltada não somente aos interesses jurídicos individuais das pessoas mais desfavorecidas, como

também à inclusão social, à cidadania e à representação dos movimentos perante o Estado e o

Poder Judiciário, contribuindo efetivamente para a consolidação do Estado Democrático de

Direito.

Nesse espaço, importante a atuação da Defensoria Pública, como

uma instituição, plural, aberta e democrática, a influenciar mudanças no Sistema de Justiça,

contribuindo para a uma governança democrática, “do povo” e “ para o povo”.

Esse modelo de instituição é inovador no Sistema de Justiça, pois

permite que haja maior engajamento social, propiciando-se uma atuação integrada e participativa

da sociedade.

Sabe-se que as mudanças são incipientes no cenário jurídico,

porém, vêm se consolidando nas diferentes Defensorias Pública do Brasil, como modelo de

instituição democrática e participativa atenta ao fomento de uma governança aberta à sociedade.

Conclui-se assim que a Defensoria Pública ao fomentar a cidadania

e a participação popular exerce um papel primordial no acesso à justiça igualitário e democrático,

pois ao atuar como elo entre a grande massa de excluídos e as demais instâncias de poder, atua

como porta-voz das necessidades da comunidade perante os poderes do Estado, propiciando

participação popular e assegurando uma governança mais democrática e inclusiva.

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