Re Vista 2003

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ANO I, N. 1, ABRIL DE 2003 ISSN 1678-7234 Instituto Manchester Paulista de Ensino Superior Sorocaba, São Paulo, Brasil

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 1

ANO I, N. 1, ABRIL DE 2003

ISSN 1678-7234

Instituto Manchester Paulista de Ensino SuperiorSorocaba, São Paulo, Brasil

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2 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

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Os leitores podem contribuir com a RevistaCientífica do IMAPES, dando sugestões, apontando

falhas e sugerindo assuntos para artigos eentrevistas.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IMAPES

Revista Científica do IMAPES. - v. 1, n. 1 (2003) -Sorocaba, SP : IMAPES, 2003-

AnualISSN 1678-7234

1. Periódicos brasileiros. 2. Produção científica.3. Publicações científicas. I. Instituto ManchesterPaulista de Ensino Superior.

20. CDD - 001.42

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lançamento de uma revista científica é sempre umanotícia auspiciosa. Publicações do gênero têm uma

função extremamente importante, não só para o aprimoramentodas Instituições de Ensino, mas para a evolução do pensamentode toda a sociedade. Afinal, é nas revistas científicas que,geralmente, surgem as idéias e informações que, num futuropróximo, acabam provocando mudanças sensíveis na forma comoas pessoas vivem e se relacionam.

No caso do IMAPES, instituição que conta com um quadrode professores altamente preparados (em sua maioria, mestres edoutores), torna-se quase uma obrigação publicar, de formasistematizada e organizada, o produto das pesquisas, das leituras eda vivência destes profissionais.

É por essas razões que o Instituto lança, com este exemplar,mais um produto editorial: a Revista Científica do IMAPES.Esperamos que esta seja a primeira de uma série de publicaçõesnesta linha, de forma a estimular o debate das idéias e a promoverreflexões necessárias sobre temas que fazem parte do cotidiano dasociedade, em seus múltiplos anseios e perspectivas.

Boa leitura!

Nelson Raul da Cunha Fonseca Diretor Geral - IMAPES

EditorialEditorialEditorialEditorialEditorial

O

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SumárioSumárioSumárioSumárioSumário

MATERIAIS INTELIGENTES (SMART MATERIALS) Ataualpa Albert Carmo Braga e Silvio Luis Toledo de Lima

CONCEITOS DE SISTEMAS DE INFORMAÇÃO EABORDAGENS PARA AUTOMAÇÃO DE EMPRESAS Walter Masson

DIREITOS HUMANOS E DIGNIDADE DA PESSOA Potyguara G. Graciano

UTILIZAÇÃO DE ALGORITMOS GENÉTICOS PARAELABORAÇÃO DE GRADE HORÁRIA Maria das Graças J. M. Tomazela

GENERALIZAÇÃO DE DISTÂNCIAS VALORADAS EMÁLGEBRAS DE BOOLE EM ANÁLISE DE AGRUPAMENTOS Carlos G. González

MICROCRÉDITO: UMA SOLUÇÃO PARA A CRISE Adilson Rocha

A LIBERTAÇÃO PELA PALAVRA Miriam Cristina Carlos Silva

VIDRO: DO ARTESANAL AO BIOMATERIAL, UM BREVERELATO DE SUAS APLICAÇÕES Norberto Aranha

ESTABILIZAÇÃO DAS ANTOCIANINAS DA ACEROLA PORCOMPLEXAÇÃO COM FLAVONÓIDES DA PRÓPOLIS Maria do Carmo Santos Guedes

A GLOBALIZAÇÃO E A REFLEXIDADE SOCIAL José Carlos Moura

O ESPAÇO DA AFETIVIDADE NO AMBIENTE ESCOLAR Nadir Neves Nunes

O MUNDO ATUAL E O OBJETIVO DA EDUCAÇÃO Olívia Cristina Vituli Chicolami

TRATAMENTO DE EFLUENTES Marcelo Sartoratto, Aline Tatiane Andrade, Ricardo Carvalho Canatto, Sérgio dal Belo, Vinícius Monteiro Fonda

Normas para publicação de artigos

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1. Introdução

“Imagine por um momentomúsica, em sua sala ou carro, queemana das portas, chão ou teto; esca-das que alertam-nos quando elas es-tão sobrecarregadas, ou quando po-dem estar quebrando pela tensão; edi-fícios e pontes que reforçam-se a simesmos durante um terremoto e la-cram suas fendas sozinhas.” Estas sãoidéias de Craig A. Rogers (1995), di-retor do Centro para Materiais Inte-ligentes, Sistemas e Estruturas do Ins-tituto Politécnico e Universidade Es-tadual da Virginia (EUA), uma das

Materiais inteligentes(smart materials)

Ataualpa Albert Carmo Braga* e Sílvio Luis Toledo de Lima**

RESUMO

O desenvolvimento tecnológi-co que vivemos nos dias de hoje estáatingindo fronteiras que antes parece-riam impossíveis. O advento de novosmateriais é um dos maiores propulso-res desta tendência, apresentando-secomo destaque os chamados “mate-riais inteligentes”. Este trabalho enu-mera vários materiais, suas estruturasgerais, aplicações no mercado e futu-ras possibilidades, que fazem as pes-quisas químicas tomarem cada vezmais um lugar de destaque.

Como exemplo dos principaismateriais inteligentes, temos váriospolímeros, Shape Memory Alloys(SMAs), os fluidos electroreológicos,as fibras óticas, géis, nanoplásticos,entre outros. Suas aplicações são di-versas, desde controladores de ruídosaté o desenvolvimento de músculos ar-tificiais. O objetivo deste artigo é, prin-cipalmente, colocar o leitor pela primei-ra vez em contato com as fronteirasda química moderna, deixando claroque qualquer desenvolvimento tecno-lógico não ocorre sem a presença dosquímicos.

maiores autoridades do assunto. Masa importância dos materiais inteligen-tes para o advento de uma nova rea-lidade tecnológica é muito mais ani-madora. A ficção científica está cadavez mais próxima. Coloque-se em umambiente em que as cadeiras automa-ticamente ajustam-se em forma etemperatura a cada usuário, paredesmudam de cores e texturas segundoseus caprichos, e uma tela exibe ob-jetos que saem de sua superfície pla-na em sua direção. Os materiais in-teligentes apontam para a casa doamanhã, em que tudo é inteligente,adaptativo e auto-organizado.

Primeiramente, necessitamosde uma definição para identificar osmateriais inteligentes. Smart materialscompreendem materiais que têmuma ou ambas das seguintes funções:sensibilidade, processabilidade e ca-pacidade atuante. A função sensorialcompreende a capacidade de detec-ção de sinais do meio. A habilidadede processamento refere-se à percep-ção dos sinais do ambiente, memori-zando-os. Já a função atuante é ca-

racterizada por apresentar certos efei-tos para o meio externo, como resul-tados das informações detectadas ememorizadas pelas duas funções an-teriores. Os sinais que sentem ou queprovocam podem ser elétricos, mag-néticos ou óticos, além de um novoefeito, que está sendo estudado re-centemente: o efeito eletromecânicode grafite intercalado.

De maneira geral, podemosdescrever materiais inteligentes comoaqueles que, estimulados por fótons,outras moléculas, campos eletromag-néticos, por pressão ou temperatura,possam induzir um efeito útil. O efei-to pode ser absorver o fóton, uma rea-ção físico-química ou uma mudançaconformacional que pode ser usada,como alterações na cor, no índice derefringência, condutividade ou co-nectividade [(Omichi, 1995), (Salib,Petrou e Chung, 1997)].

Materiais inteligentes estãocriando um novo conceito em ma-teriais. Vêm sendo chamados pelospesquisadores até mesmo de “ma-teriais vivos” (Rogers, 1995), pois ossistemas biológicos apresentam altonível de inteligência, o que os tornapotenciais referências para a criaçãode materiais inteligentes (Omichi,1995).

Os sonhos dos alquimistas tal-vez não chegassem a tanto: materiaisatuantes e motores que se compor-tam como músculos; sensores que ser-vem como nervos e memória; e, nasredes de comunicação e computação,estes materiais representam o cérebroe a coluna espinhal. Em muitos as-pectos, os sistemas podem ter carac-terísticas que são consideradas supe-

De maneira geral,podemos

descrever materiaisinteligentes como

aqueles que,estimulados porfótons, outras

moléculas, camposeletromagnéticos,

pressão outemperatura, possaminduzir um efeito útil

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riores às funções biológicas — algu-mas substâncias podem ser duras efortes em um momento, agindocomo gelatinas no próximo (Rogers,1995).

O presente artigo tem por ob-jetivo não apenas provocar nossa ima-ginação para um futuro cada vezmenos distante, mas também escla-recer, do ponto de vista químico, osmateriais responsáveis por esta explo-são tecnológica. As aplicações paraestes novos materiais são muito vas-tas, sendo muita pretensão dizer quecitaremos todas. Algumas aplicaçõesjá foram mencionadas, outras serãoabordadas dentro da discussão relati-va ao material responsável, e aindaoutras estarão dentro do último tó-pico, “Tecnologia e Mercado”.

2. Desenvolvimento

Esta parte estará dividida em

o final dos anos 70, foi desco-berta uma nova classe de políme-

ros: polímeros estruturais capazes deconduzir eletricidade, por exemplo,polipirróles, politiofenos e polianili-nas (Lewis e Wallace, 1997). Estes re-sultados foram apenas o início de umamplo e frutífero campo de pesquisaque hoje estuda polímeros com fun-ções muito interessantes. Outroexemplo de polímero inteligente sãoas polisilaminas, estando estas intima-mente ligadas ao desenvolvimento de

oito tópicos. A discussão de cadamaterial será feita mediante uma pré-via conceituação e aplicabilidade, se-guindo-se aspectos estruturais e/ouexperimentais pertinentes. A ordemescolhida não reflete qualquer hierar-quia dentro dos materiais inteligen-tes, e sim sua freqüência na literatu-ra disponível.

2.1. Polímeros Inteligentes

As mais famosas propriedadesdos polímeros são sua força e peso –relativamente pequeno. São inertes eisolantes elétricos (Lewis e Wallace,1997). Polímeros como nós entende-mos estão mudando de significado.Eles não serão mais lembrados comograndes moléculas de enorme volu-me ou materiais baratos, mas comoindispensáveis componentes de sofis-ticados sistemas como fibras óticas emostradores de cristais líquidos, nos

quais as características dos polímerosganham um especial sentido, não sóquanto a suas propriedades mecâni-cas. Polímeros têm outras caracterís-ticas interessantes, como claridadeótica ou condutividade elétrica, o queos vem colocando como “polímerosfuncionais” e, subseqüentemente,como “materiais inteligentes” (Porter,1994).

Materiais inteligentes respon-dem às mudanças do meio em previs-tos e pronunciados caminhos (Gisseret al., 1994). Esta habilidade pode seraplicada a uma grande variedade deaplicações (tabela 1) (Galaev, Guptae Mattiasson, 1996). Nós não pode-mos mais ter tanta dificuldade emaceitar as possibilidades tecnológicasque se abrem com a revisão do con-ceito de polímeros. Não apenas comomateriais inteligentes, como é o en-foque aqui, mas como alternativaspara vários outros materiais.

músculos artificiais, dispositivos libe-radores de drogas e aparelhos analíti-cos (Nagasaki e Kataoka, 1997).

Os polímeros solúveis em am-bientes aquosos e hidrogéis mudamsua microestrutura pela alteração decaracterísticas do meio, como porexemplo pH, temperatura, força iô-nica, presença de uma espécie quí-mica determinada, luz e alterações nocampo elétrico e magnético. Estasmudanças microscópicas alteramtambém características macroscópi-

cas, sendo tais alterações reversíveis[(Galaev, Gupta e Mattiasson, 1996),(Day et al., 1997)].

O desenvolvimento dos polí-meros inteligentes depende do con-tínuo aperfeiçoamento da síntese decompósitos, apresentando uma espe-cial oportunidade para o aumento daresistência da tensão e aumento naexpectativa de vida útil (Porter,1994).

2.1.1. Precipitação por afinidade

Imobilizador de células vivas, biocatálise solúvel seletiva, controle porfeedback de biocatálise, aumento na transferência de massa+.

Músculos Artificiais.

Controle de liberação de drogas, liberação de drogas sítio-direcionada.

Sensores foto-, termo-, pH- e íon-seletivos; imunoanálise, biosensores.

Concentração macromolecular de soluções, controle da permeabilidadedas membranas.

Precipitação por afinidade, sistemas de partição em duas fases, cromato-grafia modulada, separação de células.

CAMPO DE ATUAÇÃO USO ESPECÍFICO

Biocatálise

Transdutor de Energia

Medicina

Análise

Separação tamanho-seletiva

Processo Downstream

N

Tabela 1. Aplicações de polímeros inteligentes

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(Galaev, Gupta e Mattiasson, 1996)

Polímeros inteligentes são degrande interesse para sistemas bioló-gicos. Uma das técnicas mais avança-das de isolamento é a precipitação porafinidade.

As técnicas de isolamento usa-das em produtos biológicos macro-moleculares apresentam um custo nasíntese de pequenas drogas orgânicasna ordem de 80% do produto final.Polímeros inteligentes podem serúteis em processos de separação, poiseles facilitam a partição preferencialdas proteínas entre duas fases, commudanças muito pequenas nas pro-priedades ambientais.

Tradicionalmente, a precipita-ção de proteínas é iniciada por adi-ção de sais, solventes orgânicos e al-guns polímeros, sendo a formação defase, durante a precipitação de umaproteína, relativamente lenta e mui-to pouco específica.

Basicamente, o processo deprecipitação por afinidade pode serresumido como uma exploração daspropriedades do polímero que, em es-tando ligado às moléculas de água,portanto estando solúvel, apresentauma afinidade por macroligantes. Ocomplexo resultante, sofrendo peque-nas alterações do ambiente, como porexemplo no pH, na temperatura, naforça iônica ou com a adição de al-gum reagente, precipita.

O polímero ideal para precipi-tação por afinidade deve ter algumascaracterísticas básicas, como:

• Conter grupos reativos paraduas ligações com diferentes espé-cies.

• Não interagir fortementecom ligantes ou impurezas.

• Permitir que a separaçãoocorra com uma pequena variação domeio.

• Promover precipitados com-pactos o bastante para permitir umaseparação facilitada, prevenindo queimpurezas sejam arrastadas junta-mente.

• Ser facilmente solubilizadoapós o precipitado ser formado.

• E, é claro, estar sempre dis-ponível e barato.

Vários polímeros vêm sendousados para estas finalidades. A litera-tura sugere, por exemplo, a EudragitS 100 como um polímero adequado.Uma característica em especial sa-lienta-se: a separação da Eudragit

ocorre dentro de um pH de 5,5 a 4,5,faixa na qual a maioria das proteínasnão é afetada, além de proporcionarum precipitado compacto e facilmen-te separado do sobrenadante.

O uso de polímeros inteligen-tes em biotecnologia tende a aumen-tar cada vez mais. Polímeros estão setornando alternativas mais eficientes,baratas e elegantes. A principal carac-terística destes novos materiais é amudança em suas propriedades paraum fim útil, por meios físicos, semque haja contaminação por sais oueluentes específicos, evitando a dis-pendiosa fase de separação. Esta téc-nica, rapidamente comentada, é umadas novas técnicas de purificação pro-téica, a mais forte tendência para umfuturo bem próximo.

2.1.2. Fibras de condução e comu-nicação [(Lewis e Wallace, 1997),(Porter, 1994)]

Compósitos reforçados comlongas fibras de carbono podem sur-gir como smart materials, sendo maisuma aplicabilidade dos polímerosconsiderados inteligentes.

Tradicionalmente, informaçõestêm sido transmitidas via cabos me-

tálicos. Nas décadas passadas, cien-tistas e engenheiros se empenharampara otimizar a qualidade do trans-porte de informações. Mais recente-mente, um dos responsáveis por tan-tos avanços é o uso de novos políme-ros orgânicos e fibras óticas.

Compósitos com fibras de car-bono podem ser colocados em circui-tos elétricos para monitoração de de-formações e rupturas nos sistemas.Uma realidade já em uso pela forçaaérea americana, que em seus dispo-sitivos aéreos de alta performance usauma camada de fibra de carbono/epó-xido especial que indica o apareci-mento de qualquer dano.

Os níveis de condução das fi-bras de carbono podem se aproximardos metais. Estas fibras podem tam-bém ser aplicadas como blindagemeletromagnética e contra a dissipaçãode carga estática. Fibras de carbonopodem exibir tanto alta condutivida-de térmica como elétrica, direciona-da ao longo de sua cadeia.

Estes polímeros apresentamainda uma série de funções, comoaplicação em músculos artificiais,como cristais líquidos, como contro-ladores de liberação de drogas, etc.

2.2. Shape Memory Alloys (SMAs)

SMAs são metais que possuemmemória de suas formas originais.São úteis como materiais que mudamsua forma, dureza, posição, freqüên-cia natural e outras característicasmecânicas em resposta à temperatu-ra ou campos eletromagnéticos(Rogers, 1995). O potencial uso paraSMAs tem-se tornado o corpo demuitos projetos de pesquisa. As di-versas aplicações para estes metais têmsido de incrível importância para omundo, tanto em nossos dias comono que esperamos do futuro.

O SMA mais usado dentro doatual contingente de espécies estuda-das é o metal constituído à base deníquel e titânio. Mesmo assim, ou-tros SMAs podem ser incluídos comoos metais de cobre-alumínio-níquel,cobre-zinco-alumínio e ferro-manga-

Compósitos comfibras de carbono

podem ser colocadosem circuitoselétricos para

monitoração dedeformações

e rupturasnos sistemas. Uma

realidade já emuso pela força aérea

americana

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nês-silício. O nome genérico para afamília das espécies de níquel-titânioé Nitinol. Em 1961 (ou 1965, de-pendendo da referência) (Wang,Buehler e Pickart, 1965), surge a des-coberta de um metal que possui pro-priedades de memória pelo laborató-rio Nickel Titanium Naval OrdnanceLaboratory (de onde vem o nome Ni-tinol). William J. Buehler, um pes-quisador da Naval OrdnanceLaboratory em White Oak,Maryland, foi um dos descobridores.Um fato interessante é que a desco-berta, como não raramente ocorre nahistória da Ciência, foi acidental.

Comumente, este metal eramoldado para outros fins, sobre umaforma curva. Uma das pessoas pre-sentes, dr. Daveid S. Muzzey, aque-ceu com seu isqueiro o metal e sur-preso percebeu que a liga níquel-ti-tânio voltava a sua forma original(Airoldo, Corsi e Riva, 1997). Des-de este momento os passos na dire-ção do desenvolvimento das proprie-dades desta classe de materiais foramimensos, com avanços tecnológicosincríveis.

Logo após a descoberta do Ni-tinol, levantou-se o questionamentosobre o que, exatamente, faziam es-tes metais lembrarem-se de suas for-mas originais. Dr. Frederick E. Wang(1965), um experiente físico especia-lizado em estruturas cristalinas, foi oresponsável pela determinação a ní-vel atômico das explicações para aspropriedades demonstradas por estesmetais.

Ele apontou para a presença demudança de fases do Nitinol, mes-mo no estado sólido. Estas fases cha-mam-se martensita e austenita, en-volvendo o rearranjo da posição daspartículas dentro da estrutura crista-lina do sólido. Abaixo da temperatu-ra de transição, o Nitinol está na fasemartensita. Esta temperatura variapara diferentes composições, e vaidesde -50 °C até 166 °C. Na fase mar-tensita, Nitinol pode ser moldadosobre várias formas. Para fixar a “for-ma parente” (como é chamada), ometal deve ser mantido em exposi-

ção ao aquecido por cerca de 500°C.Quando em altas temperaturas, ob-serva-se um rearranjo das partículasem uma estrutura cristalina mais or-ganizada e compacta possível, resul-tando em uma geometria cúbica rí-gida conhecida como fase austenita.Abaixo da temperatura de transição,Nitinol reverte da fase austenita paraa martensita, retornando para suasformas originais. Estes ciclos, que po-dem ser repetidos milhões de vezes,têm sido estudados com transforma-ções termoelásticas da martensita(TMT), o que está contribuindo so-bremaneira para a evolução dosSMAs (Airoldo, Corsi e Riva, 1997).

Assim como citado, o Nitinolé o mais usado, mas não é o únicoSMA. Outro exemplo interessante éo metal constituído por Cu-Zn-Al.Este permitiu que recentemente secaracterizasse muito bem o compor-tamento termomecânico dos SMAs(Isalgue et al., 1996).

Finalmente, descreveremos al-gumas das principais aplicações dosSMAs. Eles têm sido usados para apli-cações militares, médicas, em dispo-sitivos para segurança e no desenvol-

vimento robótico. Os militares vêmusando Nitinol em aeronaves F-14desde o final dos anos sessenta. Au-tomóveis movidos a diesel da Merce-des Benz têm SMAs que regulam ofluxo do fluido que passa pelo motorcomo função da temperatura [(Ro-gers, 1995), (Alam et al., 1997)].

Na medicina, o campo de atu-ação do Nitinol é bem vasto. Pinçaspara remover objetos por pequenas

incisões foram inventadas pela Nasa.Âncoras com ganchos de Nitinol paraprender os tendões ao osso foramusadas por Orel Hershiser’s em ope-rações cirúrgicas. Arames ortodônti-cos feitos com Nitinol reduzem anecessidade de manutenção e ajustedos arames. Estes arames tambémaceleram a correção dos dentes, re-vertendo suas orientações originais.Armações de óculos à base de Niti-nol podem ser entortadas totalmente— mesmo um nó é possível —, por-que depois tomam novamente sua an-tiga forma. Usando as propriedadesdo Nitinol, pode-se encontrar e mar-car a localização de tumores, sendo aindicação mais exata e menos trau-mática. Outra utilidade aplicada comsucesso no campo da medicina é ouso de um guia de Nitinol para cate-terismo, passando pelo interior devasos sangüíneos (Rogers, 1995).

Utensílios que possam ser usa-dos como aparelhos que salvem vi-das no futuro também podem serprojetados com o Nitinol. Anti-escaldante e extintores de incêndio jásão disponíveis no mercado. OsSMAs sensíveis a alterações na tem-peratura têm sido usados como cha-ves “liga-desliga” para cafeteiras. Asválvulas do anti-escaldante podem serusadas em torneiras de água e irriga-dores. Após uma certa temperatura,o aparelho automaticamente corta ofluxo. A principal vantagem dos ex-tintores com válvulas à base de Niti-nol é o decréscimo no tempo de res-posta [(Rogers, 1995), (Bechinger etal., 1996)].

Também na arte, existe o de-vido espaço para os smart materials.Eles vêm sendo usados para criar es-culturas com partes móveis. OlivierDeschamps projetou uma esculturaintitulada “Les trois mains” (As trêsmãos). Quando tem-se o inverno, asmãos de NiTi estão na fase martensi-ta, e apontam para o centro da escul-tura. Se temos um dia mais quente,o NiTi transforma-se, passando à faseaustenita, e as mãos dirigem-se paracima. Outra escultura do mesmo au-tor é de um esquiador que em dias

Armações deóculos à base de

Nitinolpodem serentortadas

totalmente — mesmoum nó é

possível —, porquedepois tomam

novamentesua antiga forma

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frios se agacha, ficando em pé quan-do está quente (Gisser et al., 1994).

2.3. Smart windows

Uma das principais atraçõesdesta classe de materiais são as jane-las inteligentes, conhecidas comosmart windows. Podemos definir ma-teriais fotocrômicos como aquelesque mudam de cor com a absorçãode luz, e materiais eletrocrômicoscomo aqueles que são induzidos ele-tricamente para mudar seu estado detransição. Ambas as classes de mate-riais são investigadas por suas poten-ciais aplicações em mostradores, apa-relhos que gerem imagens e as smartwindows (Bechinger et al., 1996).

A luz absorvida pelas células fo-toeletrocrômicas (PEC) tem comofunção induzir um sinal em um ele-trodo cor-sensível que produz umafotovoltagem suficiente para coloriro filme eletrocrômico depositado emcontato com o eletrodo. Cor-sensi-bilidade tem uma longa história deuso em fotografias coloridas e corren-temente existem estudos que apon-tam para uma potencial função naconversão de energia solar. Algunsdos mais conhecidos materiais eletro-crômicos são óxidos inorgânicoscomo o WO3 e MoO3 (Bechinger etal., 1996).

Observando por uma perspec-tiva básica, as janelas inteligentes de-vem permitir grandes alterações naspropriedades óticas durante um pe-ríodo da ordem de minutos, e estahabilidade deve persistir por muitosanos. Uma exigência menos óbvia,mas ainda muito importante, é que aluz espalhada deve ser insignificante.O espalhamento deve ser menos que1% da luz incidente na parte visíveldo espectro. Filmes de W-óxidos sãoconsiderados a mais viável opção parajanelas inteligentes eletrocrômicas(Kullman, Rönnow e Granqvist,1996).

Uma nova alternativa são os fil-mes de W-óxido e W-oxiflúor, osquais demonstram espalhamento aníveis muito menores que 10-2 atra-

vés do espectro luminoso. Filmes deóxidos cristalinos e eletroquimica-mente estáveis, que sofrem grande ir-radiação eletrônica, mostram signifi-cante espalhamento.

2.4. Músculos artificiais

Nos dias de hoje, máquinasmacroscópicas estão sendo minimi-zadas em suas dimensões, e nossa ca-pacidade intelectual está direcionadaao desenvolvimento de espécies quese aproximem de organismos vivos(HOCMP, 1997).

As últimas décadas mostraramdiferentes sistemas orgânicos capazesde transformar energia molecular emtrabalho mecânico (Jeong e Gu-towska, 2002). Assim como os com-ponentes principais dos músculos, asproteínas estão sendo cada vez maisestudadas como transdutoras da tem-peratura, pressão, potencial químico,potencial eletroquímico e radiaçãoeletromagnética para produzir forçamecânica (HOCMP, 1997).

Polímeros condutores comopolipirróles, politiofenos, polianilina,etc., podem ser oxidados eletroqui-micamente e reduzidos por um con-tínuo e reversível caminho. Mudan-ças simultâneas na condutividade,cor, volume, etc., são observadas. To-das estas propriedades são ligadas aomovimento de íons e solventes paradentro e fora de polímeros conduto-res (Sansiñena et al., 1997).

Estes movimentos são acompa-nhados por mudanças conformacio-

nais reversíveis ao longo das cadeiaspoliméricas. Músculos artificiais sãobaseados em gradientes reversíveis datensão ligadas a estas mudanças con-formacionais.

Engenheiros japoneses estãousando o Nitinol (item 2.2) em mi-cromanipuladores e dispositivos ro-bóticos que possam imitar os movi-mentos dos músculos humanos. Aforça controlada das propriedades doNitinol permite movimentos muitodelicados, como pegar um copo depapel cheio d’água. Fios de NiTi sãoembebidos em materiais compósitospara ter-se mudanças vibracionaiscaracterísticas. Eles alteram a rigidezdas estruturas, fazendo com que elaspossam responder a vibrações exter-nas bem definidas (Rogers, 1995).

Músculos artificiais apresen-tam algumas diferenças com relaçãoa sistemas naturais. Entre estas, po-demos citar duas como principais:

• A força propulsora em mús-culos é energia química produzidapela combustão, a temperatura cons-tante, de glicose, sendo os pulsos ner-vosos os controladores das ações. Aforça propulsora dos músculos arti-ficiais é o consumo de cargas elétri-cas; as reações de oxidação e reduçãodos polímeros são os mediadores.

• Músculos somente realizamtrabalho de contração devido a rea-ções químicas irreversíveis. O traba-lho de um segundo músculo é reque-rido para que o primeiro volte a suaposição original. Músculos artificiaisbaseados em polímeros condutorestrabalham sobre contrações e expan-sões por reações químicas reversas quesão dirigidas pela mudança do fluxode corrente.

Mas não apenas músculos es-tão sendo pesquisados como substi-tutos para tecidos vivos. As estrutu-ras de vários sistemas — músculos,ossos, vasos sangüíneos, peles, etc.(Menon, 2002), poderão serfabricadas em plásticos biodegradá-veis. Estas estruturas seriam como ascélulas para os novos sistemas artifi-ciais. As células dividem-se e o plás-tico degrada; finalmente, somente te-

Engenheiros japonesesestão usando o

Nitinol emmicromanipuladores

e dispositivosrobóticos que possamimitar os músculos

humanos commovimentos

delicados, como pegarum copo de papel cheio

d’água

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cidos adaptados restariam. Uma bom-ba mecânica poderia providenciarnutrientes e remover partes desgas-tadas (Langer e Vacanti, 1995).

Os avanços ainda continuam.Talvez não estejamos tão próximos,mas caminhamos cada vez mais afronteiras onde as séries televisivas denossa juventude tomarão forma e cre-dibilidade científica, e talvez esta novarealidade seja até mais cara que seismilhões de dólares.

2.5. Fluidos eletroreológicos (ER)

O T-1000, um robô indestru-tível que foi trazido à vida pelo filme“O exterminador do futuro II”(Terminator 2: judgment day) podiapassar de uma forma líquida para só-lida e vice-versa. Um fluido eletro-reológico é uma substância que pro-duz alterações em sua estrutura so-bre um campo elétrico. Dependen-do da força do campo, o fluido podeescoar como água, com a consistên-cia do mel, ou relativamente sólidocomo gelatina (Halsey e Martin,1993).

O efeito do ER é proporcio-nal ao campo aplicado, produzindotensões da ordem de 7kPa, produzi-das por um campo elétrico de 3 KVmm-1. Durante a ação destes cam-pos os ER agem segundo fluidos não-newtonianos (Bingham) (Hosseini-Sianaki et al., 1993).

Podendo passar de uma for-ma para a outra dentro de poucosmilissegundos, eles são feitos facil-mente, tendo em suas composiçõespartículas microscópicas suspensasem um líquido (Halsey e Martin,1993).

2.6. Géis inteligentes

Produtos industriais são geral-mente feitos de metais, cerâmicas ouplásticos. Engenheiros evitam com-ponentes “molhados” como líquidose géis. Líquidos são inteiramente in-capazes de manter sua forma; géis sãofracos e tendem a não suportar pe-quenas cargas, além de poderem ser

quimicamente instáveis, mudandosuas propriedades se (mesmo queparcialmente) forem secos.

Atualmente aplicam-se géisapenas como alimentos, absorventesde meios aquosos e como lentes decontato macias. Durante a últimadécada, pesquisadores por todo omundo têm desenvolvido novos géisque incham ou contraem em respos-ta a diferentes estímulos, como tem-peratura, pH ou campos elétricos —dependendo da composição químicado gel e do solvente (Osada e Ross-Murphy, 1993).

Recentes investigações têmmesmo usado água adsorvida dobreBSA (bobine serum albumin) e umasuperfície de sílica gel com funçõesinteligentes. Estes estudos confirmama ocorrência de mudanças estruturaisem sistemas biológicos aquosos, mu-dando a estrutura da água em altera-ções irregulares da temperatura, aque-cendo ou resfriando as amostras. Géistêm assim suas funções expandidas,como materiais inteligentes, cada vezmais (Huston e Fuhr, 1993).

Recentemente, Osada e seuscolaboradores (1993) desenvolveramum novo sistema quimiomecânicoque chamaram de “gel looper”. Quan-do uma voltagem é aplicada atravésdos eletrodos, moléculas surfactantes,que são positivamente carregadas,migram em direção a um eletrodonegativo. Neste caminho, eles encon-tram a superfície do gel carregada

negativamente e ligam-se a estas, ex-pulsando as moléculas de água (sol-vente), causando uma contração dogel. As moléculas surfactantes ficamalinhadas ao gel, preferencialmente,com o lado positivo. Quando o cam-po elétrico é revertido, as moléculassurfactantes são liberadas e o gel vol-ta a sua forma original.

Um gel derivado de poli(n-isopropilacrilamida) pode compri-mir-se cerca de 30 por cento de seuvolume original quando aquecidoacima de sua temperatura crítica.Outro gel, por uma mera mudançade meio volt por centímetro, induzuma compressão similar em um gelde poliacrilamida imerso em acetonaou água. Teoricamente, um campoelétrico de cinco volts por milímetropoderia comprimir uma coleção departículas de gel de cerca de um mí-cron em diâmetros de 4 por cento deseu volume original dentro de ummilissegundo. Estas características es-tão sendo dedicadas a futuras próte-ses humanas (Osada e Ross-Murphy,1993).

2.7. Fibras óticas

Fibras óticas embebidas em ummaterial inteligente podem prover da-dos por dois caminhos. Primeiro, elaspodem simplesmente fornecer umsinal luminoso fixo para um sensor,bloqueando o raio luminoso emitidoquando existe uma fenda na fibra. Osegundo, mais sutil: conseguem iden-tificar características-chaves da luz,como sua intensidade, fase e polari-zação. A Nasa (National Aeronauticsand Space Administration) e outroscentros de pesquisa têm aplicado fi-bras óticas para medir o estiramentoem compósitos. Sensores de fibra óti-ca podem também medir camposmagnéticos, deformações, vibraçõese acelerações. Resistência a ambien-tes adversos e imunidade a ruídoselétricos ou magnéticos são outrasvantagens dos sensores óticos[(Rogers, 1995), (Huston e Fuhr,1993)].

Estes sensores podem agir

Durante a últimadécada,

pesquisadores portodo o mundodesenvolveram

novos géisque incham ou contraem em

resposta adiferentes estímulos,

comotemperatura, pH oucampos elétricos

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 11

como “nervos” de vidro, refletindo a“saúde” do material. Mas a fibra óti-ca talvez não seja o limite. FBG (In-fibre Bragg) são um dos mais promis-sores candidatos à substituição dasfibras óticas. Estes sensores são des-critos como um segmento de um Ge-dopado, no qual uma modulaçãoperiódica do índice de refração donúcleo é formado pela exposição à luzultravioleta na região de 244-248 nm[(Amato, 1992), (Rao, 1997)].

3. Tecnologia e mercado

O desenvolvimento desta novatecnologia dos materiais inteligentesirá ocupar um papel muito impor-tante dentro do mercado. Entre estasfunções, podemos citar: ativo e semi-ativo controle vibracional de ruídos(SMAs e cristais piezoelétricos, porexemplo), aparelhos cromogênicos,sistemas de segurança, estruturas in-teligentes usando fibras óticas distri-buídas e discretos sensores (Gibbs,2003).

Ativos e semi-ativos aparelhoscontroladores de ruídos deverão sercomercializados dentro de dois anos.Eles irão encontrar aplicações na in-dústria, consumo, comércio aeroes-pacial, transporte e mercado automo-tivo, entre outros. Os produtos estãoem fase de implementação no mer-cado ou estágios demonstrativos dedesenvolvimento, para inibir vibra-ções em fábricas ou plataformas deTV, refrigeradores silenciosos e emdispositivos com hélices, silenciandoos ruídos das cabinas de aeronaves,permitindo motores de automóveismenos barulhentos, para suspensõesde automóveis, radares e sistemas desegurança (Gibbs, 2003).

Dispositivos cromogênicos,como janelas inteligentes, provavel-

mente representam uma ótima opor-tunidade dentro do mercado. Custo,desempenho e durabilidade requeri-dos são excelentes. As tecnologiasdesenvolvidas estão competindo pormuitos bilhões de dólares em janelasarquitetônicas, instalações tanto co-

merciais como residenciais, vidros eespelhos automotivos, como vidrosaplicados na indústria aeronáutica.Espelhos com esta natureza têm sidocomercializados pela Gentex, comvendas na ordem de um milhão deunidades por ano. Todas as maioresfábricas de vidros do mundo estão seadaptando à nova realidade, ou ce-derão lugar a estabelecimentos de me-nor mercado, mas que já possuemposições tecnológicas de destaque(Gibbs, 2003).

Em sistemas de segurança po-demos citar a aplicação das fibras óti-cas, como os sistemas ERICA, ofere-cida pela Ericsson. Lembramos quefibras óticas não são propriamentemateriais inteligentes, mas apresen-tam-se como tecnologia marcantedentro das estruturas inteligentes,sendo assim incluídas com um papelmuito importante nesta área. Sua

aplicação vai também a sistemas desegurança domiciliares e industriais,sendo utilizadas também nas teleco-municações, com grande aceitação naEuropa. Um último exemplo é o daGoodyear™. Jeff M. Melzak e seugrupo, da Case Western ReserveUniversity, empregando sensores depressão de silicone em seus pneus,aumentaram em muito a economia,reduzindo a perda dos pneus (Gibbs,2003).

4. Conclusão

A apresentação de alguns mate-riais inteligentes surge como uma for-ma de nos defrontarmos com o queocorre de mais avançado na ciência.Não podemos falar em futuro semmateriais inteligentes, e não podemosfalar de materiais inteligentes semmencionar polímeros, SMAs, mate-riais piezoelétricos, géis inteligentes,fibras óticas, materiais eletrocrômi-cos, fotocrômicos, optomecânicos,nanotecnologias, etc., e qualquermenção a estes materiais inevitavel-mente depende de um longo traba-lho de pesquisa. A Química estámudando, e se nós, químicos, nãoprocurarmos acompanhá-la, nin-guém terá competência para tal.

*Ataualpa Albert Carmo Bragaé mestre em Química Analítica pelaUniversidade de Campinas e doutoran-do em Ciências, modalidade FísicoQuímica.

**Silvio Luis Toledo de Lima émestre em Química Analítica pela Uni-versidade de Campinas, professor deQuímica do Curso de Bacharelado emQuímica no IMAPES, e doutorandoem Ciências, modalidade QuímicaAnalítica.

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Todas as maioresfábricas de vidrosdo mundo estãose adaptando à

nova realidade dasjanelas inteligentes,ou cederão lugar aestabelecimentos

de menor mercado,mas que já possuem

posiçõestecnológicasde destaque

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12 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 13

1. Introdução

Para conceituar Sistemas de In-formação e analisar as abordagens em-pregadas nas aplicações de Automa-ção das Empresas, é importante re-ver os fundamentos da Teoria Geralde Sistemas e sua adoção na soluçãode problemas das Ciências Sociais,onde se enquadra a Administração deEmpresas.

O termo sistema, num concei-to amplo, é entendido como um con-junto de elementos (componentes ousubsistemas) — das mais variadas es-pécies — que atuam interligados ede maneira interagente para atingi-rem objetivos específicos: a finalida-de do sistema. Para isso, são necessá-rios mecanismos de retroação(feedback), visando garantir o perfei-to funcionamento dos subsistemas eque os resultados obtidos sejam con-trolados (comparados) com os resul-tados esperados para, se necessário,serem ativados mecanismos de ajusteou correção (regulagem), que atuamnas entradas e no funcionamento dossubsistemas.

As bases de conhecimento queapóiam os conceitos sobre sistemasforam estabelecidas formalmente apartir da década de 40, abrangendo

diversas especialidades e aplicações,entre as quais destacam-se: PesquisaOperacional, Teoria de Jogos e Filas,a Cibernética e a própria Teoria Ge-ral dos Sistemas como uma área es-pecífica. Ao final da década de 30 einício da de 40, surgiram importan-tes grupos de aplicação da PesquisaOperacional (métodos de cálculo paraotimização de resultados dos sistemas)nas questões militares (Socalschi,1993). Duas propostas contemporâ-neas contribuíram diretamente paraa formulação das bases teóricas sobreos sistemas: a Cibernética e a TeoriaGeral dos Sistemas, aqui apresenta-das.

De acordo com Churchman(1971), o enfoque “sistêmico” naque-la época foi adotado como resultanteda ampliação da perspectiva dos cien-tistas em relação à forma de exami-nar e conceber alternativas viáveispara a solução de problemas sociaiscomplexos, considerando que os pro-blemas (sistemas) desta natureza sãointerligados e se sobrepõem parcial-mente, não sendo claro, de modo al-gum, por onde se deve começar. Des-ta forma, a solução de um problematem muito a ver com a solução deoutro.

Este trabalho visa contribuircom um maior entendimento dosSistemas de Informação, descreven-do que sua evolução conceitual e apli-cações empresariais são resultados dodesenvolvimento científico e tecno-lógico das ciências exatas, sociais ehumanas, influenciando decidida-

Conceitos de Sistemas deInformação e abordagens para

automação de empresasWalter Masson*

RESUMO

O objetivo deste trabalho é apre-sentar conceitos sobre Sistemas de In-formação (SI) que contribuam para seumaior entendimento entre profissionaisque os operam no dia-a-dia das orga-nizações, o público usuário da auto-mação comercial e a comunidade aca-dêmica, que ainda absorve as mudan-ças que os bacharelados nessa áreado conhecimento têm promovido,substituindo e incorporando os antigoscursos de Análise de Sistemas e Tec-nologia de Informática. A conceituaçãose baseia em duas bases teóricas —a Cibernética e a Teoria Geral dos Sis-temas — que contribuíram diretamen-te para a evolução conceitual e as am-plas aplicações dos sistemas queconstituem a Sociedade da Informa-ção da atualidade.

Apresentam-se abordagens dosSistemas de Informação voltadas aaplicações de Automação das Empre-sas, com descrição dos seus compo-nentes e as implicações nas estrutu-ras organizacionais. Assim, são apre-sentados os Sistemas de InformaçãoAdministrativa e as abordagens atuaisde O’Brien e Alter. Embora voltadosaos sistemas informatizados, os recur-sos humanos são considerados com-ponentes dos SIs, operando-os atra-vés de outro componente: as práticasde trabalho. Nestas, consideram-sedesde os manuais de operação até aprópria estrutura funcional, o estilo deadministração e a cultura organizacio-nal. Assim, as práticas de trabalhocentralizam as conexões com todos osdemais componentes.

Descrevem-se, ainda, as diver-sas categorias dos Sistemas de Infor-mação e analisa-se sua eficácia comodependente do ajuste de seu foco aosobjetivos da organização, revisão das

práticas de trabalho e atividades do(s)processo(s) organizacional(is) supor-tado(s). Para tal, considera-se que aestruturação da empresa por proces-so é um grande facilitador para o su-cesso da automação das empresasproporcionada pelos SIs.

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mente as estruturas organizacionaisda atualidade.

2. A Cibernética

Norbert Wiener lançou as ba-ses da teoria sobre os sistemas em1948, através do livro-chave-defini-ção Cibernética ou Controle e Comu-nicação no Animal e na Máquina. Aseguir, em Cibernética e Sociedade: Ouso humano dos seres humanos (1950),Wiener apresenta a idéia mais am-pla, de um universo contingente, edesenvolve toda a sua abordagem sis-têmica. Este livro, segundo o próprioautor, teve como objetivo tornar asidéias da Cibernética mais acessíveisao público leigo, provavelmente emrazão da complexidade da publicaçãoanterior (Socalschi, 1993).

O núcleo da abordagem deWiener é a proposição de que a co-municação (a informação) e o con-trole (a regulagem), existentes natu-ralmente no indivíduo e na socieda-de para sua regulação e para seu de-senvolvimento, deveriam ser imita-dos pelas máquinas. Estas poderiam,assim, gerar condições para seu au-tocontrole e auto-regulação de fun-cionamento, independente da açãohumana externa.

De acordo com a conceituaçãoda Cibernética, um sistema é um con-junto auto-regulado de objetos inter-ligados, cujo funcionamento (proces-samento ou ação) tem a finalidade dealcançar resultados específicos.

Esses objetos tanto podem serfísicos — como as partes de uma má-quina, órgãos do corpo humano ouo fluxo de veículos de uma cidade —quanto abstratos, como uma equa-ção matemática, um programa decomputador ou os conceitos articu-lados de uma teoria científica(Socalschi, 1993).

Para Wiener, os sistemas têm aseguinte constituição conceitual bá-sica, independente de sua categoria(física ou abstrata), para cumprir suasfinalidades:

• As entradas, constituídas pe-los dados e informações comunica-

das com o meio externo;• A memória, que correspon-

de às combinações dos dados intro-duzidos no momento com os regis-tros obtidos de dados anteriormentearmazenados;

• As saídas, compreendendoos resultados alcançados pelo funcio-namento dos sistemas;

• A realimentação (feedback),que abrange o controle da compara-ção do desempenho efetivo (as saí-das), em relação ao desempenho es-perado (através de dispositivos sen-sores, detetores ou monitores). A rea-limentação tem a finalidade de acio-nar mecanismos de ajuste ou corre-ção do funcionamento para evitar aentropia (processo natural de desor-ganização interna) e alcançar os re-sultados esperados, por aproximaçõessucessivas.

3. A Teoria Geral dos Sistemas

A Teoria Geral dos Sistemas(TGS), como uma disciplina ou áreade estudo e conhecimento, foi pro-posta por Bertalanfy (1975), na suaafirmação, com uma visão mais ge-neralista, voltada para as ciências so-ciais e menos mecanicista do que avisão da Cibernética.

Para esse autor, nos organismosvivos percebe-se claramente a intera-ção e a integração dos seus elemen-tos (subsistemas) com vistas a atingirum objetivo bem definido, ou a fi-nalidade do sistema:

• As entradas (informação,energia ou matéria), importadas domeio ambiente, são processadas (pelofuncionamento dos subsistemas quecompõem o sistema) resultando nassaídas (informação, energia ou maté-ria transformada no processamento).

• O funcionamento do siste-ma é regulado pela retroalimentação(feedback): as informações sobre re-sultados da saída (resultados alcança-dos em relação aos resultados espera-dos) são enviadas para a entrada oupara o processamento, com o objetivode acionar mecanismos de ajuste oucorreção que atuam para manter o

equilíbrio (homeostase) do sistema eevitar irregularidades (entropia) nasentradas e no processamento.

Verifica-se que os conceitospropostos pela Cibernética e pelaTeoria Geral dos Sistemas não dife-rem substancialmente, a menos dasabordagens e amplitudes de interes-se. Toda a conceituação sobre siste-mas é semelhante, inclusive quantoaos seus elementos constitutivos.

A Cibernética preocupa-semais com os fluxos informacionais —os sistemas vistos como máquinas in-formacionais — e propõe, inclusive,que mesmo os sistemas biológicos esociais podem ser assim considerados.

A Teoria Geral dos Sistemasconcentra sua atenção particularmen-te no funcionamento dos sistemasbiológicos e sociais, embora genera-lize suas proposições para quaisquertipos de sistemas.

4. Sistemas de Informação

Os conceitos de Sistemas de In-formação (SI) derivam, sem grandesvariações, dos conceitos da Teoria Ge-ral de Sistemas, no seu sentido maisamplo de informação e comunicação:a sua obtenção, manutenção e apre-sentação.

Para os SI, prevalecem basica-mente os mesmos conceitos geraissobre entradas, saídas, processamen-to, memória e retroalimentação.

4.1. Sistemas de Informação Admi-nistrativa

Churchman (1971) discute aaplicação dos conceitos gerais sobresistemas nas ciências sociais, particu-larmente na Administração, propon-do, a partir daí, os Sistemas de Infor-mação Administrativa, que represen-tam a aplicação prática daqueles con-ceitos nas organizações.

Para esse cientista, “o enfoquesistêmico implica a construção de sis-temas de informação, que registrama informação importante para fins detomada de decisões e memorizam ahistória a respeito do uso dos recur-

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 15

Arquivo(memória de dados)

Arquivo(memória de dados)

Entrada de dadosEntrada de dados

Controle do desempenho do sistemaMecanismos de Retroação ( feedback )

ProcessamentoSaída de Produtos

de Informação

sos, inclusive as oportunidades per-didas pelas empresas” (Bio, 1987).

Toda essa abordagem é volta-da para as possíveis formas de atua-ção sobre os sistemas administrativos— os diversos elementos (subsiste-mas) que atuam de maneira integra-da e interagente — para que elescumpram sua finalidade (atingindoseus objetivos), orientados para asatividades organizacionais. A infor-mação destaca-se como o veículo parafuncionamento e como mecanismode controle ou retroalimentação dosistema.

Socalschi (1993) analisa as cin-co considerações, chamadas de “aná-lise do sistema”, propostas porChurchman:

4.1.1. Objetivos totais dos sis-tema e, mais especificamente, as me-didas de rendimento do sistema intei-ro. Os objetivos devem ser claramentedeterminados para distinguir seusobjetivos reais (o que o sistema efeti-vamente faz), seus objetivos declara-dos (o que o sistema se propõe a fa-zer) e seus objetivos legítimos (a mo-ralidade do sistema).

As medidas de rendimento de-terminam se o sistema e seus subsis-temas estão atingindo seus objetivosdeclarados.

4.1.2. O ambiente do sistema,que significa aquilo que está “fora”do sistema, mas que influencia no seufuncionamento, compreendendo,portanto, as variáveis sobre as quaiso sistema não tem controle. Signifi-ca, também, tudo aquilo que não estácontido na lista de requisitos — ouseja, as restrições — para que o siste-ma atinja seus objetivos, consideran-do seu funcionamento normal.

4.1.3. Os recursos do sistema,que representam os meios físicos, fi-nanceiros, intelectuais e outros, quese encontram dentro do sistema e queele utiliza para desempenhar suas ta-refas, e a partir dos quais podem sertomadas ações específicas.

4.1.4. A administração do sis-tema, que trata da criação dos planospara o sistema, isto é, da considera-ção de todos os aspectos anteriores,as finalidades globais, o ambiente, autilização dos recursos e os compo-nentes. A administração determina afinalidade dos componentes, proce-de a alocação dos recursos e controlao rendimento do sistema, através dasmedidas de desempenho do sistemae dos subsistemas.

4.1.5. Os componentes do sis-

tema correspondem à sua decompo-sição racional em partes menores(subsistemas), que contribuem parao seu funcionamento, portanto, parao seu o objetivo. Os componentes,de acordo com o enfoque sistêmico,devem ser entendidos separadamen-te, como outros sistemas e, portanto,analisados sob essas mesmas cincoconsiderações.

A subdivisão sucessiva do sis-tema em subsistemas tem pelo me-nos duas finalidades:

• Permite a análise da raciona-lidade da estruturação dos subsiste-mas (componentes);

• Possibilita obter as suas me-didas de desempenho, para avaliar suaefetiva contribuição para o todo.

4.2. A abordagem de O’Brien

O’Brien (1993) representauma evolução conceitual de Church-man, sendo mais direcionada aos sis-temas de informação que utilizamprocessamento eletrônico de dados,embora não seja uma condição ex-clusiva. São incorporados todos osconceitos anteriores, através da inte-gração dos seguintes recursos: pes-soas (peopleware), equipamentos(hardware), programas e procedimen-tos (software) e dados (data).

Controle do desempenho do sistemaMecanismos de Retroação ( feedback )

ProcessamentoSaída de Produtos

de Informação

FIGURA 1FIGURA 1FIGURA 1FIGURA 1FIGURA 1: Componentes de um Sistema de Infor: Componentes de um Sistema de Infor: Componentes de um Sistema de Infor: Componentes de um Sistema de Infor: Componentes de um Sistema de Informação, segundo O´Brienmação, segundo O´Brienmação, segundo O´Brienmação, segundo O´Brienmação, segundo O´Brien

RecursosRecursosRecursosRecursosRecursos: Pessoas;Equipamentos; Programase Procedimentos; Dados

s entradas são os dados sobre astransações de negócios e outros

eventos a eles relacionados, que sãoA obtidos e preparados para processa-

mento pelos usuários do sistema, atra-vés dos diversos meios: transcrição

(digitação) de formulários, transfe-rência de arquivos magnéticos ou óti-cos, imagens ou som, etc.

Entrada de dados

Arquivo(memória de dados)

Processamento Saída de produtosde informação

Controle do desempenho do sistema:mecanismos de retroação ( feedback )

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16 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

especialistas em sistemas de infor-mação:

• Usuários finais (também cha-mados clientes) são as pessoas queusam um sistema de informação ouinformação que ele produz;

• Especialistas em sistemas de in-formação são as pessoas que desenvol-vem e operam os sistemas de infor-mação para torná-los disponíveis aosusuários finais, incluindo-se nestegrupo: analistas de sistemas (ou en-genheiros de computação), progra-madores, operadores, técnicos emteleprocessamento e outras funçõestécnicas e gerenciais.

Os equipamentos (hardware)abrangem toda e qualquer espécie debens materiais usados no processa-mento da informação:

• Os sistemas computacionais,compreendendo as unidades centraisde processamento, a memória e todavariedade de dispositivos comple-mentares ao seu funcionamento;

• Os periféricos conectados aossistemas computacionais diretamen-te ou através de redes de telecomuni-cações, tais como teclados, mouses,meios de armazenagem (magnéticose óticos), impressoras, leitores de ima-gem, coletores de dados, etc.

• As redes de telecomunicações,que permitem a conexão física e ló-gica entre os equipamentos, incluin-

FIGURA 2FIGURA 2FIGURA 2FIGURA 2FIGURA 2: : : : : Componentes de um Sistema de Informação, segundo Alter

do-se modens, repetidores, divisores desinais, cabos e fibra ótica.

Os procedimentos e progra-mas (software) incluem todo o con-junto de instruções para o processa-mento das informações:

• Os procedimentos, que corres-pondem ao conjunto de instruçõespara o processamento das informa-ções para as pessoas; desta forma,mesmo os sistemas de informação quenão usam o computador (sistemasmanuais) requerem este recurso desoftware;

• Os programas, que corres-pondem ao conjunto de instruçõespara execução pelo computador e quepodem ser divididos em dois grandesgrupos: os programas básicos (ou ope-racionais) e os programas aplicativos.

Os primeiros possibilitam ofuncionamento do sistema compu-tacional e/ou de telecomunicação eos aplicativos processam os dados paraos usuários dos sistemas.

4.3. A Abordagem de Alter

A abordagem de Alter (1992),apresentada a seguir, é semelhante àde O’Brien, com a vantagem derepresentar o agrupamento doscomponentes dos sistemas de in-formação diretamente voltada para oenfoque da informática.

Arquivos ou memória de da-dos significam uma atividade, atra-vés da qual os dados, principal maté-ria prima dos SI, são mantidos numamaneira organizada para utilizaçãoposterior, tipicamente em: bancos dedados, que possibilitam seu processa-mento, bancos de modelos, que propi-ciam modelos conceituais, matemá-ticos e lógicos, que expressam re-lacionamento de negócios, rotinascomputacionais ou técnicas analíti-cas e bases de conhecimento, que pos-sibilitam conhecimentos numa varie-dade de formas, como fotos e regrasde inferência sobre diversos assuntos.

As saídas são as informaçõesdevidamente interpretadas, apresen-tadas em relatórios impressos ou emtelas de vídeo, ou ainda, a transfe-rência de arquivos de dados atravésdos meios digitais ou óticos para ar-mazenagem das informações.

A retroação ou controle(feedback) pode ocorrer sobre qual-quer uma das partes componentes oudas atividades do sistema, com o ob-jetivo de monitorar e avaliar se eleestá funcionando de acordo com ospadrões previamente estabelecidos.

As pessoas (peopleware) são ne-cessárias para operação de todos ossistemas de informação, incluindoneste recurso os usuários finais e os

Informação

Tecnologiade Informação:Equipamentose programas

RecursosHumanos

Práticas detrabalho

Objetivos doSistema de Informação,

orientados para osobjetivos da organiza-

ção

Informação

Tecnologiade Informação:Equipamentose programas

RecursosHumanos

Práticas detrabalho

Objetivos doSistema de Informação,

orientados para osobjetivos da organiza-

ção

Objetivos doSistema de Informação,

orientadospara os objetivos da

organização

Práticas detrabalho

RecursosHumanos

Tecnologiade Informação:equipamentose programas

Informação

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 17

Sob o ponto de vista do geren-ciamento, Campos (1994) conceituaque:

A Informação corresponde aoconjunto de dados (fatos, imagens ousons) cuja forma e conteúdo sãopertinentes e apropriados para uti-lização em uma tarefa ou atividadeparticular.

A Tecnologia da Informaçãodeve ser entendida como o conjuntode equipamentos (hardware) e progra-mas (software) que desempenha umaou mais tarefas de processamento dasinformações, tais como coletar, trans-mitir, armazenar, recuperar, manipu-lar e exibir dados.

Os Recursos Humanos corres-pondem às pessoas que coletam, pro-cessam, recuperam e utilizam os da-dos de acordo com as práticas de tra-balho – determinadas pela organi-zação ou pelas características indi-viduais de ação e decisão – e com adisponibilidade da Tecnologia daInformação.

As Práticas de Trabalho con-sistem nos métodos utilizados pelosrecursos humanos – as pessoas envol-vidas – para desempenharem suasatividades nos Sistemas de Informa-ção. Incluem-se aí os procedimentosdescritos pelos manuais de operação,ou seja, as linhas de ação nas quais osrecursos humanos coordenam-se,comunicam-se e tomam decisões, rea-lizam negócios ou serviços e desem-penham demais tarefas. Por isso, aspráticas de trabalho centralizam asconexões com os outros elementos dosistema de informação.

Nesse contexto, os Sistemas deInformação somente fazem sentidopara uma organização se estiveremalinhados aos objetivos organi-zacionais ou objetivos “do negócio”de determinada empresa ou organi-zação pública ou privada.

As práticas de trabalho são in-fluenciadas pela ambiência organiza-cional, conceituada por Socalschi(1993) como o conjunto de fatoresinternos e externos que interferem naorganização como um todo e em cadauma das suas partes, influem no seu

desempenho e no seu comportamen-to e exigem práticas gerenciais quegarantam sua estabilidade e cresci-mento.

Os principais fatores dessa am-biência são a estrutura organizacio-nal, o estilo de administração, a cul-

tura e o comportamento organizacio-nal. Estes fatores influenciam o nívelde burocracia comportamental e do-cumental, o grau de centralização oudescentralização administrativa e de-cisória, o estilo de comunicação e degerenciamento e, até, a própria éticaorganizacional. Esses fatores exerceminfluência nos valores e nas atitudesdas pessoas, com reflexos nas suas prá-ticas de trabalho e, conseqüentemen-te, nos sistemas de informação, queincorporam essas práticas e formamum círculo vicioso entre ambos.

5. Categorias dos Sistemas de Infor-mação

Os Sistemas de Informação(SI) podem ser classificados em Cha-ves (1993):

• Sistemas de Informação deApoio Operacional;

• Sistemas de Informação deApoio Gerencial;

• Sistemas de Apoio à Decisão;• Sistemas de Informação para

Executivos;• Sistemas de Apoio ao Desem-

penho;• Sistemas de Informação e Fer-

ramentas de Apoio à Pesquisa.

a) SI de Apoio Operacional

Tem como principal orientaçãoo processamento dos dados — regis-tro, alteração, controle e recuperação— das transações, gerados pelas ope-rações cotidianas e para seu apoio, demodo geral, no nível operacional daorganização.

Por sua natureza corporativa(registram e acumulam informaçõesde uso comum a diversas áreas deinteresse da organização), estes siste-mas tradicionalmente são centraliza-dos para possibilitar o acesso às suasinformações pelos vários usuários. Assuas principais subcategorias são:

a1. Sistemas de Processamen-to Transacional, que processam da-dos relativos às transações dos negó-cios, atualizam os bancos de dadoscom as ações, os fatos administrati-vos e geram formulários e relatóriospara acompanhamento e controle dasoperações. Exemplo: o sistema decontabilidade de uma empresa.

a2. Sistemas de Controle deProcessos, mais voltados para o mo-nitoramento e controle industrial,mas que também podem ser aplica-dos nos processos administrativosbem estruturados e altamente auto-matizados, especialmente na área co-mercial.

a3. Sistemas de Automação deEscritórios, que automatizam os pro-cedimentos e as ações administrati-vas, aumentando a produtividade e acapacidade de comunicação. Os sis-temas de e-mail podem ser enquadra-dos nessa categoria.

b) SI de Apoio Gerencial

Esses sistemas são voltados parao planejamento, coordenação e con-trole e, de modo geral, fornecem in-formações consolidadas dos Sistemasde Apoio Operacional à estruturagerencial das organizações. Atuam demaneira isolada ou combinando-asem mais de um deles, apresentando-as normalmente em formatos prees-

Sistemas deInformação somente

fazem sentidopara uma

organização seestiverem

alinhados aosobjetivos

organizacionais ouobjetivos “donegócio” de

determinada empresaou organização

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18 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

tabelecidos, através de relatórios outelas (displays) dos equipamentos.

c) Sistemas de Apoio à Decisão

Os DSS — Decision SupportSystems — possibilitam apoio para oprocesso de tomada de decisão, com-preendendo quaisquer tipos de recur-sos computacionais que possam ser-vir de instrumento de auxílio paraesta finalidade.

Estes sistemas envolvem geral-mente processamento interativo nãoestruturado ou pouco estruturado (addoc), dos quais se conhece apenas umaparte das relações de causa e efeito,que são utilizadas como base com-plementar para a tomada de decisão.Abrangem a análise e projeções esta-tísticas de série de dados, simulaçõesde alternativas que possam indicarintervenções necessárias nos proces-sos de negócios.

d) Sistemas de Informação para Exe-cutivos

Os EIS — ExecutiveInformations Systems — representamum passo à frente dos grupos ante-riores, pois consolidam informaçõesdas diversas fontes de conhecimento— internas e externas à organização— de acordo com as necessidades es-pecíficas dos mais altos níveis geren-ciais, com duas principais carac-terísticas:

• A flexibilidade para obtençãodas informações de maneira “trans-parente” para quem as utiliza;

• A apresentação de fácil com-preensão (geralmente através de re-presentação gráfica), em tempo reale de modo interativo e com “interfa-ces amigáveis”, para facilitar sua uti-lização.

e) Sistemas de Apoio ao Desempe-nho

Os PSS — Performance SupportSystems — são de aplicação geral, emqualquer área ou nível organizacio-nal, podendo ser subdivididos nas

seguintes funções específicas:e1. Sistemas de Informações

Estratégicas, que fornecem vantagemcompetitiva aos produtos e serviçosda organização, com informações in-ternas ou externas como apoio aosprocessos operacionais e decisórios daorganização.

e2. Sistemas Baseados em Co-nhecimentos ou Sistemas Apoiadosem Inteligência Artificial, que ma-nipulam conhecimento para o apoioeficiente e eficaz de problemas, comoum consultor especializado no assun-to. Por esta característica, podem seconfigurar como sistemas indepen-dentes ou estar contidos em sistemasde outras categorias às quais estãosendo agregados gradativamente.

e3. Sistemas de ComputaçãoColaborativa (Workgroup ou CSCW— Computer Supported CooperativeWork), que têm por objetivo melho-rar o desempenho das atividades dasequipes ou grupos de trabalho, inte-grando as atividades interpessoais,inclusive entre as unidades da orga-nização e com outras organizações.

e4. Sistemas de IntercâmbioEletrônico de Informações (EDI —Eletronic Data Interchange), que ligamas pessoas e as organizações entre si,num enfoque mais formal do que osSistemas de Informação Colaborati-va, para substituir a transferência deinformações contidas nos meios eveículos tradicionalmente usados nacomunicação de rotina (impressos,fax, disquetes).

Computação para o UsuárioFinal (EUC — End User Computing),que provê recursos para colocar acomputação e a comunicação ao al-cance dos usuários finais. Isso se tor-nou possível devido à evolução damicroinformática, associada à utili-zação das redes de comunicação, ex-ternas e internas às organizações.

A integração com a maioria dossistemas das demais categorias admi-te a possibilidade praticamente ilimi-tada de:

• capacidade de processamen-to autônomo, principalmente com re-cursos multimídia;

• provisão de acesso às infor-mações armazenadas em banco dedados corporativos, disponíveis nasredes de maneira isolada;

• integração total com os de-mais sistemas e usuários, na noção deempresa virtual, sem a noção limi-tante de espaço geográfico, dentro efora da organização.

f) SI e Ferramentas de Apoio ao En-sino e Pesquisa

Representam uma categoria es-pecial de aplicações voltadas ao ensi-no, treinamento e instrução e, por-tanto, também de apoio à aprendiza-gem e pesquisa. Até há alguns anos,não eram voltados para o interesse dofuncionamento organizacional, comoapresentado nesse estudo.

Atualmente, com a necessidadede aperfeiçoamento profissional cons-tante e a utilização cada vez maior daInternet e Intranets, as organizaçõestêm utilizado uma subdivisão dessesSIs, denominados Sistemas de Ensinoà Distância, baseados em gerencia-dores especializados em aulas, painéis,grupos de estudo, chats e tira-dúvidasvia web.

6. Processos e Sistemas de Infor-mação

A eficácia ou não da automa-ção nas empresas não pode ser atri-buída somente aos Sistemas de Infor-mação. Por mais que possuam os

Os DSS — DecisionSupport Systems —

possibilitamapoio

para o processode tomada de decisão,

compreendendoquaisquer tipos

de recursoscomputacionais

que possam auxiliarcom esta finalidade

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Referências Bibliográficas

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CHAVES, Eduardo. Introdução ao Gerenciamento de Sistemas de Informação - Notas de Aula do Mestrado GerenciamentoSistemas de Informação. PUC-Campinas, 1993

MASSON, Walter. Sistematização da Avaliação de Gerenciadores de Workflow para Aplicações de CRM - Dissertação de Mestra-do - PUC-Campinas, 2001.

estrutura funcional baseada nosprocessos favorece, ainda, a in-

corporação de melhorias, pois os pro-cessos de negócios são interfuncio-nais, ou seja, não estão delimitados auma certa unidade organizacional,tampouco a funções individuais.Conforme Popoff & Brache (1999):

• o conhecimento, ou a infor-mação existente para se fazer o negó-cio, tem que ser transferível por to-das as unidades envolvidas;

• a competitividade de uma or-ganização é determinada pela capa-cidade dos processos interfuncionaisatenderem às necessidades atuais dosclientes e se adaptarem às necessida-des futuras;

FIGURA 3FIGURA 3FIGURA 3FIGURA 3FIGURA 3: : : : : Nova abordagem sistêmica: do foco em tarefas para o foco em processos

componentes que concretizam a au-tomação desejada, os SIs devem serentendidos como o suporte básico aoprocesso organizacional em questão.Os processos constituem o foco, poisas organizações operam através dosprocessos, embora muitas não os pos-suam devidamente mapeados ou mo-delados.

Pensar o processo a ser auto-matizado, mapeando suas atividadesintegrantes, identificando seus recur-sos, suas práticas de trabalho e ajus-tando seu foco aos objetivos organi-zacionais, enfim, redesenhando-o, é

fundamental para alcançar o sucessoda automação. A própria abordagemsistêmica da empresa pode e deve serrevista. A visão sistêmica tradicionalé funcional, ou seja, as empresas sãoestruturadas por função. Os Sistemasde Informação “verticalizam” uma oumais funções, o que lhes dá uma vi-são de tarefas automatizadas. O as-pecto mais perceptível nesses casos éo pequeno grau de integração que ossistemas da empresa apresentam e adependência de determinado proces-so com determinada(s) pessoa(s) quea(s) executa(m) (Masson, 2001).

A Internet e os novos recursosde telecomunicações estão desenhan-do novos modelos organizacionais,com estruturas administrativas des-centralizadas, terceirização de servi-ços até pouco tempo inconcebíveis eum perfil profissional em todas asáreas muito focado na tecnologia.Uma nova estruturação funcional,baseada nos processos de negócio, se faz,então, necessária, contendo os facili-tadores para as exigências atuais: fle-xibilidade, agilidade para mudançase exploração eficaz dos novos recur-sos tecnológicos disponíveis.

• indivíduos e equipes não con-seguem ser melhores, a longo prazo,do que os processos em que têm quetrabalhar; uma organização é tão boaou ruim quanto forem seus proces-sos empresariais internos.

Administrar mudanças e intro-duzir aperfeiçoamentos aos processos,através dos Sistemas de Informação,não pode ocorrer somente com basena estrutura funcional. Embora sem-pre haja espaço para aprimoramen-tos dentro de qualquer função, estu-dos e avaliações de projetos de rede-senho de processos demonstram queas maiores oportunidades estão semprenas interfaces entre as funções (RBG,1997).

Ressalte-se ainda que a estru-turação ao redor de processospromove mudanças na ambiênciaorganizacional de muitas orga-nizações, pois se questiona a culturae os valores estabelecidos por seusfundadores e executivos. Promove,ainda, mudanças nas estruturas hie-rárquicas e nas práticas de trabalhoque compõem os Sistemas de Infor-mação.

* Walter Masson é formado emCiência da Computação pela Unicamp,mestre em Gerenciamento de Sistemasde Informação pela PUC-Campinas,professor e coordenador do curso deSistemas de Informação do IMAPES.

A

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POPOFF, Frank, BRACHE, Alan P. The Seven Deadly Sins of Process Improvement - Rummler-Brache Group, USA- Abr.1999

RBG - RUMMLER-BRACHE Group Brasil. Curso Gerenciamento de Processos Organizacionais - RBG Consultores Empre-sariais S/C, 1997, São Paulo

SOCALSCHI, Brasilio. O Contexto do Gerenciamento de Sistemas de Informação, Instituto de Informática, PUC-Campinas,1997.

No mundo ocidental, as idéiasdos direitos humanos foram difun-didas por pensadores como JohnLocke, Jean Jacques Rousseau e ou-tros. Por volta do fim do séculoXVIII, essas teorias passaram a seridéias mestras para os movimentosdas independências norte-americanae francesa, resultando, assim, na De-claração da Independência do Cida-dão (1789). Os direitos humanos ci-tados nessas declarações estão centra-lizados nas garantias da liberdade, masno início do século XX, e principal-mente após a criação da Constitui-ção de Weimar1, na Alemanha, os di-reitos individuais e sociais passaramrealmente a ser respeitados, e até re-gulados na Constituição de cada país.A garantia desses direitos humanosnão ficou apenas no nível esparso deum país ou de uma etnia, sendo am-pliada como um assunto de interesseuniversal de toda a raça humana, eadotada pela ONU, na DeclaraçãoUniversal dos Direitos Humanos(1948) e na Convenção Internacionaldos Direitos Humanos (1966)2. O sen-timento da dignidade humana e dosdireitos humanos cumpriu um papelde relevante importância na constru-ção da sociedade democrática domundo atual.

O fato é que o discurso dosdireitos humanos, que a Declaração

Direitos Humanos edignidade da pessoa

Potyguara G. Graciano*

proclama e institucionaliza, é um fa-tor do Século XX. Até então, a preo-cupação com os direitos e a dignida-de das pessoas, independentementede fronteiras, era presente somentena filosofia e na religião.

O sentimento religioso nãodispensa a moralidade e a dignidadereligiosa deve promovê-la. É o preçoda dignidade humana e da homena-gem prestada à verdade que iluminatodo homem.

Certamente, ao proclamar osdireitos humanos para todas as pes-soas, estabelecendo-os como umameta a ser atingida por todos os po-vos e todas as nações, a DeclaraçãoUniversal dos Direitos Humanos semanifesta como uma construção quevem abrir o espaço para o tratamen-to universalizante das questões rela-cionadas aos direitos humanos e àssuas violações.

É com a Declaração que o dis-curso de direitos humanos toma for-

ma e conteúdo mais precisos, passan-do a transitar cada vez com maiorintensidade nos âmbitos político ejurídico. Por discurso de direitos hu-manos, quer-se designar aqui todo oconjunto de instrumentos, técnicas,princípios e normas que, tanto naesfera política como na jurídica, pos-sibilitam modificar pacífica e racio-nalmente a realidade existente para aconstrução de uma nova, em que asrelações entre as pessoas e entre elas eos Estados se dêem com a observân-cia dos elementos desse discurso.

Como um discurso novo,assentado no reconhecimento dadignidade inerente a todos osmembros da família humana e de seusdireitos iguais e inalienáveis, tendoesse reconhecimento como funda-mento da liberdade, da justiça e dapaz no mundo3, sua incorporação àpráxis política e social apenas se inicia.

A dificuldade dessa incorpora-ção explica-se pela natureza das rela-

1 Após a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, foi editada e promulgada, em 1919, umanova Constituição da Alemanha, pela assembléia geral realizada em Weimar. Essa Constituição deWeimar é tida como um “modelo” para a democracia moderna. Em 1933, com o regime nazista, ela foitotalmente extinta.

2 A falta do poder compulsório na Declaração dos Direitos Humanos, instituída em 1948, levou a ONUa criar esta Convenção, em 1966, visando a obrigatoriedade do seu cumprimento. Ela cita, por um lado,direitos humanos ligados a assuntos econômicos, sociais e políticos e, por outro, cuida de assuntosligados aos direitos do cidadão.

3 Patrícia Helena Massa Arzate; Potyguara G. Graciano, A Declaração Universal dos Direitos Humanos– 50 anos, Direitos humanos: construção da liberdade e da igualdade, São Paulo, Centro de Estudosda Procuradoria Geral do Estado, 1988, Série Estudos, Editora Páginas & Letras p. 245-268.

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ções de força que caracterizam as re-lações políticas atuais, que não sãoexatamente compatíveis com o res-peito irrestrito aos primados da liber-dade e da igualdade. Porém, devidoà incontestável relevância dos princí-pios contidos na Declaração para associedades, é certo que sua incorpo-ração no âmbito jurídico está conso-lidada em todo o mundo, estandopresentes em quase todas as Consti-tuições dos Estados.

Aproximação histórica

Os antecedentes remotos daDeclaração da ONU de 1948 sãoencontrados, de um lado, no direitointernacional e no direito humanitá-rio dos séculos XVIII e XIX e, deoutro, em dois documentos relacio-nados, um ao processo histórico demudança de poder da França, e ooutro, à instituição de poder ligada àformação do Estado norte-america-no, a saber, a Declaração de Direitosdo Homem e do Cidadão, de 1789,e a Declaração de Independência dosEstados Unidos, de 1776.

A época da Declaração France-sa de 1789 coincide com o períododa codificação das normas jurídicas,sendo pouco anterior ao Código deNapoleão. Elias Díaz recorda que éem fins do século XVIII que se operaa transformação do direito natural,universal e absoluto, em direitopositivo, vindo a criar um vazio valo-rativo, sob certo aspecto, visto queos ideais, uma vez positivados,tornam-se realidade (ao menosparcialmente) para, então, trans-formarem-se em ideologia4. A De-claração Francesa veio afirmar comodados aspectos culturais aindadeveriam ser construídos, quali-ficando como direitos naturais aliberdade, a propriedade e a igual-dade em direitos. Tais direitos nãoeram, de fato, naturais, e eramacessíveis a uma minoria, posto quea estruturação da sociedade em esta-mentos apenas acabara de ser abolida.

Diferentemente da DeclaraçãoUniversal dos Direitos Humanos, que

se estende a todas as pessoas, semcontudo possuir originalmente cará-ter vinculante, a Declaração dos Di-reitos do Homem e do Cidadão, de1789, efetivamente integra o direitopositivo francês — vigorando até aatualidade, ao lado da Constituição

francesa. Os seus traços comuns coma Declaração da ONU, como a afir-mação da liberdade, da propriedadee da segurança como direitos ineren-tes ao homem, o princípio da legali-dade, o princípio da reserva legal e oda presunção de inocência, a liber-dade de opinião e de crença, dentreoutros, são, sem dúvida, referênciasda linha comum que ligam os doisdocumentos. Deve-se, todavia, lem-brar, com o historiador EricHobsbawm, que as exigências doburguês é que foram delineadas nafamosa Declaração dos Direitos doHomem e do Cidadão, de 1789. Se-gundo afirma, “esse documento é ummanifesto contra a sociedade hierár-quica de privilégios da nobreza, masnão um manifesto a favor de umasociedade democrática e igualitária.‘Os homens nascem e vivem livres eiguais perante as leis’, dizia seu pri-meiro artigo; mas ela também prevêa existência de distinções sociais, ain-da que ‘somente no terreno da utili-dade comum’. A declaração afirmava

(posição contrária à hierarquia danobreza ou absolutismo) que ‘todosos cidadãos têm o direito de colabo-rar na elaboração das leis pessoalmen-te ou por meio de seus representan-tes’. E a assembléia representativa queela vislumbrava como órgão funda-mental de governo não era necessaria-mente uma assembléia democratica-mente eleita. Uma monarquia cons-titucional baseada em uma oligarquiapossuidora de terras era mais adequa-da à maioria dos liberais burguesesdo que a república democrática, quepoderia parecer uma expressão maislógica de suas aspirações teóricas. Demodo geral, o burguês liberal clássi-co de 1789 (e o liberal de 1789-1848)não era um democrata, mas um de-voto do constitucionalismo, de umEstado secular com liberdades civis egarantias para a empresa privada e deum governo de contribuintes e pro-prietários.”5 As palavras desse ilustrehistoriador permitem identificar queas intenções que nortearam a Decla-ração dos Direitos do Homem e doCidadão diferem em sentido e exten-são da Declaração Universal dos Di-reitos Humanos, mas, uma vez queo texto escrito se desprende de seucontexto, hoje lemos a DeclaraçãoFrancesa de 1789 com os olhos donosso tempo.

Se, por um lado, a DeclaraçãoFrancesa, a Declaração de Direitos daVirgínia e a Declaração de Indepen-dência Americana foram importan-tes para o desenvolvimento dessasidéias, especialmente dentro dos Es-tados, o mesmo não ocorre de ma-neira direta para o direito internacio-nal dos direitos humanos. A origemda proliferação dos documentos in-ternacionais de proteção de direitoshumanos está, principalmente, nostratados internacionais bilaterais emultilaterais para a abolição da escra-vatura e do comércio de escravos, as-sim como nas normas de direito hu-

4 Elias Díaz, Sociologia y filosofia del derecho, Madrid: Taurus, 1984, p. 286.

5 Hobsbawm, Eric, A revolução francesa, excerto de A Era das Revoluções, São Paulo: Paz e Terra,1996, p. 19-20.

A DeclaraçãoFrancesa veio

afirmar como dadosaspectos culturaisainda deveriam ser

construídos,qualificando comodireitos naturais a

liberdade, apropriedade e aigualdade em

direitos

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22 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

manitário para o banimento de ar-mas cruéis e para a salvaguarda deprisioneiros de guerra, de feridos ede civis6.

As normas de direito huma-nitário começam a surgir no séculoXIX, para disciplinar o tratamentodas vítimas em conflitos armados, aproteção humanitária aos militarespostos fora de combate (feridos,doentes, náufragos, prisioneiros) e àspopulações civis, declarando limitesao uso da violência em guerras.

A Liga das Nações, materiali-zada no tratado de Versalhes, de28.6.1919, ao fim da Primeira Guer-ra Mundial, veio abrir caminho paraa proteção, de forma mais ampla, aosdireitos de pessoas, prevendo, tam-bém, o direito de petição à Liga, re-conhecido às populações dos Estados-membros7. Segundo observa LouisHenkin, “com base nos precedentesdo século XIX, Estados dominantespressionam determinados Estados aaderir a ‘tratados de minorias’ garan-tidos pela Liga, nos quais os Estados-partes assumiram obrigações de res-peitar direitos de minorias étnicas,nacionais ou religiosas determina-das”.8

Esse é o período a partir doqual o direito internacional deixa deter por objeto, com poucas exceções,a relação somente entre Estados, pas-sando a tratar, também, das pessoas ede seus direitos relacionados à digni-dade humana. Observa-se, entretan-to, que os tratados sobre minoriascelebrados sob os auspícios da Ligadas Nações eram impostos seletiva-mente, em especial sobre nações der-rotadas em guerras e sobre Estadosrecém criados ou ampliados.

Tais documentos não previam,ao contrário do que se esperava hoje,normas gerais impondo o respeito àsminorias também por parte dos Es-

tados com maior poder, assim comonão exigiam que fossem respeitadasas pessoas que não pertenciam àsminorias especificadas ou as perten-centes à maioria.

Muitas vezes esquecida no seupapel de fixação e promoção dedireitos humanos, a OrganizaçãoInternacional do Trabalho — OIT,constituída também por ocasião dotratado de Versalhes, tem desem-penhado papel importante na defesae promoção de direitos relacionadosao trabalho, bem como de outrosdireitos econômicos, sociais eculturais, por meio de programasespecíficos e suas convenções,estabelecendo definições e padrõesmínimos sobre as condições deexercício dos direitos de que trata. Éno âmbito da OIT que se vêem osprimeiros documentos internacionaisde proteção à mulher, à criança, aos

indígenas e povos tribais, ao tra-balhador, documentos contra a discri-minação racial e de redução dos efei-tos do desemprego, dentre outros.

Vale notar que a introdução demecanismos internacionais de prote-ção de direitos humanos não se de-veu à “conscientização súbita” de re-

levância e necessidade de proteçãodesses direitos, ou de um comprome-timento ético dos Estados.

No caso da Liga das Nações,como visto, a proteção de minoriasestava voltada, via de regra, à prote-ção daquelas que foram incorpora-das a outros Estados ou que ficaramsem vínculo a um Estado, como oscurdos e palestinos, não significandoisso, por si, que outros grupos étni-cos, lingüísticos ou nacionais existen-tes estariam igualmente protegidos,como de fato não estavam. A exem-plo dos ciganos.

No âmbito da OIT, pode-sedizer que, ao tempo de sua criação, osocialismo estava em expansão naEuropa, justificando a implantação,nos Estados capitalistas, de medidasde proteção às condições do trabalho.Melhores condições sociais e de tra-balho em todos os Estados significa-vam, também, como ainda signifi-cam, melhores condições para a com-petição no mercado internacional,possibilitando minimizar os efeitos depaí-ses que, com menos direitos so-ciais garantidos, entram no mercadocom preços mais baixos.

Com a criação da Organizaçãodas Nações Unidas — ONU, na Car-ta de São Francisco, em 1945, a pro-teção e promoção internacionais dosdireitos humanos se converte emprincípio jurídico de direito interna-cional. A Carta de São Francisco, ouCarta das Nações Unidas, consiste emtratado internacional, vinculando ju-ridicamente, portanto, todos os Es-tados que devem dar cumprimentoao princípio do “respeito universal aosdireitos humanos e às liberdades fun-damentais para todos, sem distinçãopor motivos de raça, cor, sexo, idio-ma ou religião”. De fato, o artigo 1ºda Carta coloca como propósitos dasNações Unidas “conseguir uma coo-peração internacional para resolver osproblemas internacionais de carátereconômico, social, cultural ou huma-nitário e para promover e estimularo respeito aos direitos humanos e àsliberdades fundamentais”, sem qual-quer distinção. Tratam da questão da

6 Louis Henkin, International law: politics, values and functions – 216 collected courses of Hague Academyof International Law 13, v. 4, 1989, p. 208, apud Henry J. Steiner; Philip Alston, International humanrights in context: law, politics, morals, Oxford: Clarendon Press, 1966, p. 115-116.

7 Antonio Truyoul y Serra, Los derechos humanos, Madrid, 1977, p. 24.

8 Louis Henkin, apud Henry J. Steiner; Philip Alston, ob. cit., p.114.

As normas dedireito humanitáriocomeçam a surgirno século XIX,

para disciplinar otratamento das

vítimas em conflitosarmados, a

proteção humanitáriaaos militarespostos fora

de combate e àspopulações civis

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 23

proteção e promoção dos direitoshumanos os artigos 1º 9, itens 2 e 3,13, 55 e 56.

A importância dada pela Car-ta à matéria é revelada com especialforça no artigo 55, que diz: “Com ofim de criar condições de estabilidade ebem estar, necessárias às relações pací-ficas e amistosas entre as nações, basea-das no respeito ao princípio da igual-dade de direitos e da autodetermina-ção dos povos, as nações unidas favore-cerão: a) níveis mais altos de vida, tra-balho efetivo e condições de progresso edesenvolvimento econômico e social; b)a solução dos problemas internacionais,econômicos, sanitários e conexos; a coo-peração internacional, de caráter cul-tural e educacional; e c) o respeito uni-versal e efetivos dos direitos humanos edas liberdades fundamentais para to-dos, sem distinção de raça, sexo, línguaou religião.” Isso vem vincular o res-peito universal e efetivo dos direitoshumanos e liberdades fundamentaiscomo necessário à criação de condi-ções de estabilidade e bem-estar que,por sua vez, são necessárias às rela-ções fundadas no respeito ao princí-pio da igualdade de direitos e da au-todeterminação dos povos.

A Declaração Universal dos Direi-tos Humanos

Já quando da elaboração daCarta das Nações Unidas, gruposdefendiam que ela deveria trazer umadeclaração de direitos anexa. Isso nãoocorreu. Entretanto, apesar demencionar os direitos humanos demodo conciso e genérico, a Cartatrouxe a valiosa contribuição detornar a promoção dos direitoshumanos uma finalidade da ONU e,sobretudo, expande a relação entre osEstados e seus habitantes para esferainternacional. Merece ser observadoque “no seio da ONU, programou-se, a partir de 1947, uma Inter-national Bill of Human Rights, quedeveria ter sido constituída por umaDeclaração Universal, contendo aenunciação dos direitos humanos,por um convenant contendo compro-

missos específicos jurídicos dosEstados no que toca ao respeito dosmesmos direitos humanos e umsistema de controle Measures ofImplemation, voltado para a garantiadesses direitos. A realização desse pro-grama encontrou enormes garan-tias.”10

A própria Declaração poderiater tomado a forma de tratado, de

modo a, após sua adoção pela ONU,vincular os Estados que a ratificassemà obrigação de proteger e promoveros direitos humanos. Prevaleceu,entretanto, o entendimento de que acarta de direitos deveria tomar aforma de declaração, ou seja, de umarecomendação de maior solenidade,utilizada em raras ocasiões relacio-nadas a matérias de grande impor-

tância, em que se espera o máximocomprometimento moral e políticodos partícipes.

A Declaração vem constituir,então, a especificação dos direitos quea Carta de São Francisco mencionaapenas de maneira genérica, estabe-lecendo, como afirmado em seupreâmbulo, uma compreensãocomum do que sejam esses direitospara seu pleno cumprimento.

O esmiuçamento11 de direitoshumanos que a Declaração Univer-sal dos Direitos Humanos traz cons-titui a primeira iniciativa de enume-ração de direitos humanos no âmbi-to do direito internacional e institui,sobretudo, como aponta FláviaPiovesan, “extraordinária inovação,ao conter uma linguagem de direitosaté então inédita (...). Ao conjugar ovalor da liberdade com o valor daigualdade, a Declaração demarca aconcepção contemporânea de direi-tos humanos, pela qual esses direitospassam a ser concebidos como umaunidade interdependente e indivisí-vel.”12 A Declaração expressa, a umsó tempo, o discurso liberal dos di-reitos civis e políticos, nos artigos 3ºa 21, e o discurso social dos direitoseconômicos, sociais e culturais, nosartigos 22 a 28.

Veja-se:Artigo III. Toda pessoa tem

direito à vida, à liberdade e à segu-

A Carta das NaçõesUnidas trouxe

a valiosa contribuiçãode tornar a promoçãodos direitos humanos

uma finalidadeda ONU, expandindo

as relações entreEstados e seus

habitantespara o âmbitointernacional

9 Artigo 1°. “Os propósitos das Nações Unidas são: (...); item 2. Desenvolver relações amistosas entreas Nações baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direito, e de autodeterminação dos po-vos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal; item 3. Conseguir umacooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cul-tural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdadesfundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; artigo 13: item 1 “ A Assem-bléia Geral iniciará estudos e fará recomendações, destinados a: a) promover cooperação internacionalno terreno político e incentivar o desenvolvimento progressivo do direito internacional e sua codificação;b) promover cooperação internacional nos terrenos econômico, social, cultural, educacional e sanitário,e favorecer o pleno gozo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, por parte de todos ospovos, sem distinção de raça, língua ou religião. Art. 56: Para a realização dos propósitos enuneradosno artigo 55, todos os membros da organização se comprometem a agir em cooperação com esta, emconjunto ou separadamente. Vicente Marotta Rangel, Direito e Relações Internacionais, Editora Revis-ta dos Tribunais, 5ª edição, p. 49.

10 Paolo Mengozzi, Direitos Humanos II, Dicionário de política, org. Norbeto Bobbio et alli, 4. ed., Brasí-lia, UnB, 1992, p. 356.

11 Esmiuçamento. Vem do verbo esmiuçar = reduzir a porções muito pequenas. Tratar um assunto emtodos os seus pormenores. Silveira Bueno, Grande Dicionário Etimológico Prosódico da Língua Portu-guesa, 3° vol, ed. Saraiva, São Paulo, 1965, p. 1221.

12 Flávia Piovesan, Direitos humanos e o direito constitucional internacional, São Paulo, Max Limonad,1996, p. 156.

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rança pessoal;Artigo IV. Ninguém será man-

tido em servidão ou escravidão;Artigo V. Ninguém será sub-

metido à tortura, nem a tratamentoou castigo cruel, desumano ou degra-dante;

Artigo VI. Toda pessoa temdireito de ser, em todos os lugares,reconhecida como pessoa perante alei;

Artigo VII. Todos são iguaisperante a lei, e têm direito, sem qual-quer distinção, a igual proteção da lei;

Artigo VIII. Toda a pessoa temo direito de receber dos TribunaisNacionais competentes recursoefetivo para os atos que violem osdireitos fundamentais que lhe sejamreconhecidos pela Constituição oupela lei;

Artigo IX. Ninguém será arbi-trariamente preso, detido ou exilado;

Artigo X. Toda a pessoa temdireito, em plena igualdade, a umaaudiência justa e pública por partede um Tribunal independente e im-parcial, para decidir de seus direitose deveres ou do fundamento de qual-quer acusação criminal contra ela.

Artigo XI. Toda a pessoa acu-sada de um ato delituoso tem o di-reito de ser presumida inocente (...)

Artigo XII. Ninguém será su-jeito a interferências na sua vida pri-vada, na sua família, no seu lar ou nasua correspondência, nem ataque àsua honra e reputação.

Artigo XIII. Toda a pessoa temdireito à liberdade de locomoção eresidência dentro das fronteiras decada Estado.

Artigo XIV. Toda pessoa vítimade perseguição tem o direito de pro-curar e gozar asilo em outros países.

Artigo XV. Toda pessoa temdireito a uma nacionalidade.

Artigo XVI. Os homens emulheres de maior idade, sem qual-quer restrição de raça, nacionalidadeou religião, têm o direito de contrairmatrimônio e fundar uma família.

Artigo XVII. Toda pessoa temdireito à propriedade, só ou em socie-dade com outros.

Artigo XVIII. Toda pessoa temdireito à liberdade de pensamento,consciência e religião; (...)

Artigo XIX. Toda pessoa temdireito à liberdade de opinião e ex-pressão; (...)

Artigo XX. Toda pessoa temdireito à liberdade de reunião e asso-ciação pacíficas.

Artigo XXI. Toda pessoa temo direito de tomar parte no governode seu país diretamente por intermé-dio de representantes livremente es-colhidos.

Artigo XXII. Toda pessoa,como membro da sociedade, tem di-reito à segurança social e à realiza-ção, (...)

Artigo XXIII. Toda pessoa temdireito ao trabalho, (...)

Artigo XXIV. Toda pessoa temdireito a repouso e lazer, (...)

Artigo XXV. Toda pessoa tem

direito a um padrão de vida capaz deassegurar a si e a sua família saúde ebem estar, (...)

Artigo XXVI. Toda pessoa temdireito à instrução, (...)

Artigo XXVII. Toda pessoatem direito de participar livrementeda vida cultural da comunidade, (...)

Artigo XXVIII. Toda pessoatem direito a uma ordem social e in-ternacional em que os direitos e li-berdades estabelecidos na presenteDeclaração possam ser plenamenterealizados.

Não é demasiado lembrar quea invocação de direitos econômicos,sociais e culturais, como decorrentesdo princípio da igualdade, era politi-camente relacionada ao socialismo e,portanto, a movimentos políticos degrande apelo popular. Recorde-se quejá a Declaração Francesa de 1793, daRepública Jacobina do ano I, conse-qüência da segunda revolução, em1792, proclamava a igualdade pornatureza e perante a lei (art. 3º), pre-vendo o dever da sociedade de colo-car a educação ao alcance de todos(art. 22), proporcionar trabalho e se-guridade social aos menos favoreci-dos (art. 21)13, mas essa Declaração,forjada no período do Terror de Es-querda, vigorou somente por trêsmeses14.

Os direitos econômicos e so-ciais somente vêm tomar relevo jurí-dico no século XX, com a Constitui-ção mexicana, de janeiro de 1917, aDeclaração dos Direitos do Povo Tra-balhador e Explorado da URSS, dejaneiro de 1918, e a Constituição deWeimar, de agosto de 1919.

Sobre as condições que impul-sionam os direitos sociais, José Afon-so da Silva alerta que “o desenvolvi-mento industrial e a conseqüente for-mação de uma classe operária logodemonstram a insuficiência daquelas

13 Alguns exemplos de direitos econômicos e sociais previstos na Declaração dos Direitos do Homeme do Cidadão, de 24 de junho de 1973: “Artigo 5º - todos os cidadãos são igualmente admissíveis aosempregos públicos. (...); Artigo 17 - não se pode impedir que os cidadãos se dediquem a qualquer tipode trabalho, atividade ou comércio; Artigo 19 - qualquer pessoa pode contratar seus serviços e seutempo, mas não pode se vender nem ser vendido; sua pessoa não é propriedade alienável; a lei nãoadmite a escravidão; não pode haver mais do que um compromisso de serviços e retribuição entre ohomem que trabalha e o que lhe dá emprego; Artigo 21 - a beneficência pública é uma dívida sagrada.A sociedade deve assegurar a subsistência aos cidadãos menos favorecidos, seja proporcionando-lhes trabalho, seja garantindo-lhes os meios de existência aos que estão incapacitados para trabalhar.Artigo 22 - a instrução é uma necessidade para todos. A sociedade deve favorecer com todo seu poderos progressos da razão pública e colocar a instrução ao alcance de todos os cidadãos.” Para o inteiroteor da declaração, ver Maria José Añon Roig et alli, Derechos Humanos: textos y casos practicos,Valencia: Tirant Lo Blanch, 1996, p. 25-28.

14 Em 1795, instalado o Terror de Direita, foi implantada outra Constituição, que suprimiu os direitoseconômicos e sociais de 1793.

A invocação dedireitos econômicos,sociais e culturais,

como decorrentes doprincípio da igualdade,

era politicamenterelacionada ao

socialismo e, portanto,a movimentos

políticos de grandeapelo popular

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garantias formais, caracterizadorasdas chamadas liberdades formais, desentido negativo, como resistência elimitação ao poder. Pois a operaçãonão era, em relação a ela, apenas decaráter político formal, mas basica-mente econômico. Não vinha apenasdo poder político do Estado, mas dopoder econômico capitalista. De nadaadiantava as constituições e leis reco-nhecerem liberdades a todos, se amaioria não dispunha e ainda nãodispõe de condições materiais paraexercê-las. Sintetiza bem a questãoJuan Ferrando Badía, quando escre-ve: ‘A burguesia liberal aparenta con-ceder a todos a liberdade de impren-sa, a liberdade de associação, os di-reitos políticos, as possibilidades deoposição política: mas, de fato, taisdireitos e liberdades não podem serexercidos senão pelos capitalistas, quesão os que têm meios indispensáveispara que tais liberdades sejam reais.E, assim, no caso do direito ao sufrá-gio, este servia para camuflar diantedos olhos dos proprietários uma pa-peleta de voto, mas a propaganda elei-toral se encontra nas mãos das forçasdo dinheiro’.”15

Desse modo, os direitos eco-nômicos, sociais e culturais revelam-se essencialmente necessários paraque direitos civis e políticos possamser verdadeiramente efetivos, provan-do-se reciprocamente necessários.

Como visto, a Declaração Uni-versal dos Direitos Humanos se cons-titui numa construção, de matriz ilu-minista — a Declaração francesa de1789 se apresenta como sua fontemais evidente — e como construçãoreflete as disputas de poder no âmbi-to internacional. Os direitos ali plas-mados não se confundem com direi-tos naturais e absolutos que, segun-do os jusnaturalistas, acompanha-riam os seres humanos desde temposimemoriais ou, segundo Celso Lafer,não são um dado, externo à polis; sãoum construído, uma invenção ligadaà organização da comunidade políti-ca16. Consistem, sim, em resultado dedisputas entre grupos sociais e entreestes e o Estado, desenvolvidas no

tempo. Os direitos humanos, no di-zer de José Afonso da Silva, “são his-tóricos, como qualquer direito. Nas-cem, modificam-se e desaparecem.Eles apareceram com a revolução bur-guesa e evoluem, ampliam-se com ocorrer dos tempos. Sua historicidaderechaça toda fundamentação basea-

da no direito natural, na essência dohomem ou na natureza das coisas.”17

A dimensão histórica dos direi-tos humanos está ligada, como nãopoderia deixar de ser, à noção de pes-soa, em sua concreção social e histó-rica. Miguel Reale, ao tratar sobre oser pessoa, aponta que o “homem ésua história, mas também é a histó-ria por fazer-se. É própria do homem,da estrutura mesma de seu ser, essaambivalência e polaridade de ‘ser pas-sado’ e ‘ser futuro’, de ser mais doque sua própria história.” Reale arre-mata: “E note-se que o futuro não seatualiza como pensamento, para in-serir-se no homem como ato — casoem que deixaria de ser futuro — masse revela em nosso ser como possibi-

lidade, tensão, abertura para o proje-tar-se intencional de nossa consciên-cia, em uma gama constitutiva devalores.”18 Suas palavras permitemperceber como as pessoas não sãomeros pacientes da história, masagentes possíveis de agir de formaativa (o “projetar-se intencional daconsciência”) — participar criativa-mente da vita activa, como diziaHannah Arendt — constituindo no-vos valores.

Retomando a dimensão políti-ca da construção da Declaração Uni-versal dos Direitos Humanos que,nesse aspecto, coincide com a Decla-ração Americana dos Direitos Huma-nos, verifica-se que liberdade e igual-dade, no sentido que temos atual-mente, não se encontravam, em mea-dos do século passado, no mesmonível. Pugnar pela igualdade, muitasvezes, significava assumir-se comunis-ta ou socialista, ainda que não o fos-se. Defender liberdade, por outrolado, significava, muitas vezes, defen-der a liberdade de ação e, por via deconseqüência, a possibilidade de su-cesso dos melhores, dos mais capa-zes, em consagração ao liberalismo.

O tempo da Declaração é tam-bém o tempo da consolidação daGuerra Fria. Segundo Lindgren Al-ves, “durante esse período, a disputaideológica entre os dois sistemas an-tagônicos favorecia, pelo enfoque es-tritamente coletivista de um deles, aidéia de que a obtenção de condiçõeseconômicas adequadas teria priorida-de sobre o usufruto dos direitos civise políticos e das liberdades fundamen-

Os direitos humanos,no dizer de

José Afonso da Silva,“são históricos,como qualquerdireito. (...)”A dimensão

históricados direitos humanos

está ligada ànoção de pessoa

15 José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, 9ª edição, São Paulo, Malheiros, 1992,cit., p. 146.

16 Celso Lafer, A reconstrução dos direitos humanos – um diálogo com o pensamento de HannahArendt, São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 134. Pode-se afirmar, como esclarecimento, queentendemos a comunidade política como não adstrita simplesmente aos limites territoriais dos Esta-dos. A justaposição indevida entre Estado e comunidade política é atualmente destituída de consistên-cia material. Nestes tempos em que o capital é globalizado e graça sem regras, considerar os direitoscomo locais ou nacionais significa permitir a violação de todo o conjunto de direitos humanos.

17 José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, 9ª edição, São Paulo, Malheiros, 1992cit., p. 166.

18 Miguel Reale, Pessoa, “Sociedade e História”, em Pluralismo e liberdade, São Paulo: Saraiva, 1963,p. 71.

19 José Augusto Lindgren Alves, Os direitos humanos como tema global, São Paulo: Perspectiva,1994, p. 45 (Série Estudos).

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tais”19. Boaventura de Souza Santos,de outra parte, observa que “durantemuitos anos após a Segunda GuerraMundial, os direitos humanos foramparte integrante da política da Guer-ra Fria, e como tal foram considera-dos pela esquerda”20. A tensão entreo discurso liberal e o discurso socia-lista está presente na Declaração,quando se verifica que vinte e umartigos tratam dos direitos civis e po-líticos, dos quais vinte referem-se adireitos civis e um refere-se unica-mente a direitos políticos (a liberda-de de opinião e de expressão, bemcomo a liberdade de associação e reu-nião pacíficas são relacionadas simul-taneamente aos direitos políticos) eapenas seis estão relacionados aos di-reitos sociais. O artigo XXVIII já tra-ta, de forma especialmente genérica,da espécie de direitos que posterior-mente veio a ser denominada direi-tos de solidariedade, ao prever quetoda pessoa tem direito a uma ordemsocial e internacional em que os di-reitos e liberdades constantes da De-claração possam ser plenamente rea-lizados. Esse artigo não consubstan-cia, pois, quaisquer direitos civis, po-líticos, econômicos, sociais ou cultu-rais, tratando, sim, de um dos direi-tos de solidariedade.

Fábio Konder Comparato afir-ma que “tecnicamente, a DeclaraçãoUniversal de Direitos do Homem éuma recomendação que a AssembléiaGeral das Nações Unidas faz aos seusmembros (Carta das Nações Unidas,art. 10). Nessas condições, costuma-se sustentar que o documento nãotem força vinculante. Foi por essarazão, aliás, que a Comissão de Di-reitos Humanos concebeu-a, origina-riamente, como uma etapa prelimi-nar à adoção ulterior de um pacto outratado internacional sobre o assun-to. Esse entendimento, porém, pecapor excesso de formalismo. Reconhe-ce-se hoje, geralmente, que a vigên-cia dos direitos humanos independede sua declaração em constituições,leis e tratados internacionais, exata-mente porque se está diante de exi-gências de respeito à dignidade hu-

mana, exercida contra todos os po-deres estabelecidos, oficiais ou não.A doutrina jurídica contemporânea,de resto, sobretudo a germânica, dis-tingue os direitos humanos dos di-reitos fundamentais, na medida emque estes últimos são justamente osdireitos humanos consagrados peloEstado como regras constitucionaisescritas. É óbvio que a mesma distin-ção há de ser admitida no âmbito dodireito internacional.

“Já se reconhece, aliás, que apar dos tratados ou convenções, o Di-reito Internacional é também consti-tuí-do pelos costumes e os princípiosgerais de direito, como declara o Es-tatuto da Corte Internacional de Jus-tiça (art. 38). Ora, os direitos defini-dos na declaração de 1948 correspon-dem, integralmente, às exigências, o

costume e os princípios jurídicos queo Direito Internacional reconhececomo existência básica de respeito àdignidade humana.

“Inegavelmente, a DeclaraçãoUniversal de 1948 representa culmi-nância de um processo ético que, ini-ciado com a declaração de indepen-dência dos Estados Unidos e a De-claração dos Direitos do Homem edo Cidadão, da Revolução Francesa,levou ao reconhecimento da igualda-de essencial de todo o ser humanoem toda a sua dignidade de pessoa,

isto é, como fonte de todos os valo-res, independentemente das diferen-ças de raça, cor, sexo, língua, religião,opinião, origem nacional ou social,riqueza, nascimento ou qualqueroutra condição, como se diz em seuartigo II”21.

Direitos e deveres. A dignidade dapessoa

Todos os direitos e deveres con-tidos nas leis visam assegurar a digni-dade do homem. Esses direitos e de-veres, originariamente, são comoduas faces de uma mesma moeda.Jamais haverá a garantia dos direitos,se o Estado e o povo não cumpriremos seus deveres, para a sua concreti-zação. Os direitos fundamentais dohomem estão registrados na Decla-ração Universal dos Direitos Huma-nos, que patenteia em seus trinta ar-tigos que eles postulam, antes detudo, o cumprimento dos deveres.Devemos ressaltar também que “orespeito pelo homem antecede ao res-peito pelos direitos do homem”.Como se pode perceber, os direitos eos deveres estão intimamente relacio-nados entre si. Se temos algum direi-to, ao mesmo tempo, temos o deverde respeitar os direitos alheios. Emoutras palavras, enquanto não cum-prirmos os deveres e não respeitar-mos os direitos alheios, não teremosos mesmos direitos e as garantias su-ficientes. Portanto, é preciso que cadaum cumpra os seus deveres, para queo direito de cada um seja reivindica-do de forma justa e eficaz.

O direito fundamental dohomem é um direito soberanoadquirido por todo cidadão, cabendoà nação o dever fundamental deoferecer-lhe essa garantia. Na socie-dade democrática, a nação, em últimaanálise, significa todo o povo;portanto, o dever da nação passa aser um dever comum de todo o povo.

20 Boaventura de Souza Santos, Uma concepção multicultural de direitos humanos, Lua Nova – Revis-ta de Cultura e Política, CEDEC, n. 39, p. 105, 1997.

21 Fábio Konder Comparato, in Juízes para a Democracia, ano 5, n. XV, outubro/dezembro 1998, p. 09

Direitos e deveres,originariamente,são como duasfaces de uma

mesma moeda.Jamais haverá a

garantia dosdireitos, se o Estado

e o povo nãocumprirem os seusdeveres, para a sua

concretização

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Além disso, o povo tem o dever degarantir os direitos fundamentais decada cidadão. Assim, nós devemosparticipar desses deveres civis,comuns a todos, e cumpri-los. Ospagamentos de seguros sociais eprevidenciários, por exemplo, sãoprovas evidentes adotadas paragarantir a vida de cada cidadão.

Todo o direito de cidadão, de-terminado por força de lei, só é váli-do e assegurado quando há o cum-primento do dever legal. Podemosafirmar que, no fundo desse direito edever, reina a garantia e o espírito deprofundo respeito humano, para quecada um possa viver livremente.

Entretanto, na sociedade atual,as reivindicações dos direitos são mui-to mais acentuadas do que a cons-cientização da responsabilidade documprimento dos deveres. As reivin-dicações de nossos direitos sempre de-vem estar baseadas na consciência dosdeveres e das responsabilidades, pois,caso contrário, pode transformar-senuma tendência egoística aindamaior, e prejudicar o desenvol-vimento de uma democracia sadia.

De outro lado, optar por umasociedade pluralista significa acolher“uma sociedade conflitiva, de interes-ses contraditórios e antinômicos”,cujo caráter plural se traduz no plu-ralismo das opiniões entre os cida-dãos, a liberdade de reunião, de asso-ciação, o pluralismo dos partidos po-líticos, pluralidade ideológica, enfim,significa reconhecer o direito do ho-mem pertencer a todas as comunida-des de ordem moral, cultural, espiri-tual, intelectual, que permitem o de-senvolvimento da pessoa.

Ao se falar da dignidade huma-na, coloca-se o ser como autônomo eindependente, como reflexo do seumodo de vida. Cada pessoa tem oconceito e o limite de sua dignidade,e que ela oferece ao outro no agir co-municativo.

A dignidade da pessoa humanareside em uma exigência ética. Estaacepção está em indissolúvel inter-conexão com o pluralismo político:o agir comunicativo reflete as pos-

turas éticas de cada um dos inter-locutores, posturas estas que espe-lham suas idéias, sem coação, numasituação de fala ideal.

As condições atuais para a efe-tividade dos direitos humanos, noâmbito da economia globalizada, sediscutem em termos estritamente ju-risdicistas, porém bastante nebulosose cinzentos. Efetuar interpretaçõesalternativas da realidade existente, apartir de perspectivas axiológicas in-tersubjetivas, como a que contempleo valor básico do princípio da reci-procidade, permite largar e ultrapas-sar os limites das concepções de cará-ter jurisdicista, que ainda hoje conti-nuam animando grupos e sentimen-tos dispostos a resistir quer à viola-ção e ao desmonte de garantias bási-cas dos cidadãos, quer ao impactodesmobilizador da racionalidade téc-nico-instrumental, inerente à trans-nacionalização dos mercados22.

O princípio da reciprocidadetraduz-se no reconhecimento dooutro como homem livre e igual,permitindo assim que as múltiplasformas de cidadania — a política, aeconômica, a social, a cultural — seconstituam como uma ordem coletivabaseada em valores de um padrãomínimo de respeito e confiança, e nãonos primados da competitividade eda produtividade levadas ao extremo,do individualismo sem freios e dadisseminação dos valores de mercadoem todas as esferas da vida, comoocorre hoje com o fenômeno daglobalização23.

A importância da reciprocida-de como processo que permite com-binar formas individuais com formascoletivas da cidadania, transforman-do e ampliando conceito ao criar con-dições para a formação de poderes so-

ciais capazes de se contrapor ao po-der privado e particularista do capi-tal, compensa, assim, a erosão dassoberania dos estados nacionais nanova ordem econômica intelectual24.

A Constituição Federal privile-gia os Direitos Humanos e assim res-guarda o valor da dignidade da pes-soa humana. Conduz, nesse passo, aFlávia Piovesan dizer que “o valor dadignidade da pessoa humana impõe-se como núcleo básico informador doordenamento jurídico brasileiro,como critério e parâmetro de valora-ção a orientar a interpretação e com-preensão do sistema constitucionalbrasileiro instaurado em 1988. A dig-nidade humana e os direitos funda-mentais constituem os princípiosconstitucionais que incorporam asexigências de justiça e dos valores éti-cos, conferindo suporte axiológico aosistema jurídico brasileiro. Os direi-tos fundamentais passam a ser dota-dos de uma especial força expansiva,projetando-se por todo o universoconstitucional e servindo como cri-tério interpretativo de todas as nor-mas de nosso ordenamento jurídi-co.”25

Desse modo, a dignidade dapessoa constitui elemento que qualifi-ca o ser humano como tal e dele nãopode ser destacado, de tal sorte quenão se pode cogitar da possibilidadede determinada pessoa ser titular deuma pretensão para que lhe sejaconcedida a dignidade. É a dignidadeque dá a direção, o comando a serconsiderado primeiramente pelointérprete.

* Potyguara Gildoassú Graciano é mes-tre em Direito, procurador do Estadode São Paulo e professor de Direito In-ternacional no IMAPES

22 Faria, José Eduardo. Os Direitos Humanos e o Dilema Latino Americano, às vésperas do século XXI.Novos Estudos. CEBRAP, São Paulo, n.° 38, 1974, p.75.

23 Faria, José Eduardo. Direitos Humanos e Globalização Econômica: Notas para uma Discussão.Estudos Avançados. São Paulo. N. 30, 1997, p.50.

24 Faria, José Eduardo. Op.Cit. p. 53.

25 Flávia Piovesan. Direitos Humanos e Direito Constitucional Internacional. São Paulo. Max Limonad.

1997, p. 315.

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Utilização de algoritmosgenéticos para elaboração

de Grade HoráriaMaria das Graças J. M. Tomazela*

RESUMO

Este trabalho apresenta anatureza do problema de construçãode Grade Horária em instituições deensino e as características da abor-dagem de algoritmos evolutivos paraencontrar soluções de boa qualidadepara este problema. É descrito tambémcomo é realizado o tratamento dasrestrições inerentes ao processo deelaboração destas grades. O cenárioé exemplificado a partir de três mode-los propostos na literatura que utilizamalgoritmos genéticos.

1. Introdução

São comuns aplicações em quehaja a necessidade de um escalona-mento entre Recursos Humanos e/uMateriais versus Tempo; como exem-plo podem ser citados o desenvolvi-mento de Logísticas que contemplemestoques mínimos, controle de fluxode veículos (aviões, ônibus, cami-nhões, etc.) dentro de um terminal,controle de processos em uma fábri-ca ou dentro de um computador, tur-no de funcionários e tantos outrosexemplos do cotidiano.

Este trabalho tem por objetivotratar de um caso específico desse es-calonamento: Grade Horária Escolar.Trata-se daquela tabela onde alunos/professores verificam os dias e horá-rios de cada “disciplina”. Na rea-lidade existem três usuários princi-pais: o Aluno, que tem sua vida esco-lar guiada pelos horários nela conti-dos, o Professor, que a tem como uma

agenda de compromissos, pois é a par-tir dela que sabe em que classe deveestar e que disciplina deverá ser mi-nistrada, e a Escola/Instituição, queadministra seus recursos humanos(professores, auxiliares, etc.) e mate-riais (salas de aula, materiais de apoio,etc.).

As dificuldades no desenvolvi-mento de uma Grade Horária Esco-lar são, principalmente, de três natu-rezas:

• Múltiplos Objetivos - paraatender a todos os usuários é necessá-rio pelo menos uma tabela específicapara cada um, pois ainda que as info-rmações tratadas sejam as mesmas, os“cenários” se diferenciam, já que cadaum busca respostas diferentes;

• Restrições de Graus Diferen-tes - um grande número de Restri-ções e que devem receber tratamentodiferenciado, tornando necessáriauma estratégia de “pesos” para cadauma;

• Número de Variáveis - quan-tidade de Alunos, de Professores, deDisciplinas, de Salas de Aula, de Sa-las Especiais (Laboratórios, Anfitea-tro, etc.), Material de Apoio, CargaHorária, etc.

Pelas características das dificul-dades descritas acima, pode-se perce-ber a explosão combinatória de can-didatos à solução. Na confecção deuma Grade de Horários, algumas es-colas vão adaptando ano a ano osmodelos anteriores, com pequenosajustes. Obviamente, nem sempreisto é possível, e provavelmente ao se

repetir soluções corre-se o risco de re-petir erros “viciados” no processo.Muitas vezes, a solução adotada de-sagrada a grande parte dos envolvi-dos. Somente se atende às Restriçõesde peso maior, como Carga Horária,Número de Salas, Número de Alu-nos por Sala ou outras sempre liga-das à Factibilidade da Solução, e nãoà sua qualidade.

Algoritmos genéticos, que fa-zem analogia com o processo evolu-cionário da natureza, são tidos comoapropriados para solução de proble-mas de otimização com alto grau decomplexidade, pois:

• Trabalham com múltiploscandidatos à solução de forma para-lela;

• Privilegiam melhores solu-ções candidatas na composição daspróximas gerações;

• São capazes de detectar re-giões promissoras no espaço de bus-ca e atingir soluções de boa qualida-de sem a necessidade de avaliar umgrande número de candidatos.

Neste tipo de algoritmo, abre-se mão de uma solução ótima masespera-se a obtenção de uma soluçãode boa qualidade para a resolução doproblema em questão.

Nos algoritmos genéticos umconjunto inicial de soluções (uma po-pulação — P0) é definido, geralmentede forma aleatória. Um indivíduo dapopulação é representado por umúnico cromossomo, que contém acodificação (genótipo) de uma pos-sível solução do problema. Os cro-

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 29

mossomos são geralmente implemen-tados na forma de listas de atributosou vetores, onde cada atributo é de-nominado gene. Os possíveis valoresque um determinado gene pode as-sumir são denominados alelos.

Novas populações (Pi+1 , i de0 a n) são definidas a partir dosoperadores genéticos de reproduçãoque definem um esquema de seleçãode indivíduos para a próxima geração,e os operadores de recombinação(crossover) e mutação que modificamindivíduos escolhidos randomica-mente. O objetivo destas transfor-mações é mover a população P paraáreas do espaço de solução comvalores mais altos de função deadaptação (fitness), que representamo efeito da pressão seletiva exercidapelo meio em processos naturais.

Apesar da aplicabilidade de al-goritmos genéticos a problemas comexplosão combinatorial, existem di-ficuldades na utilização deste tipo dealgoritmo em problemas multi-obje-tivo e com múltiplas restrições. Estasdificuldades residem, principalmen-te, na representação genotípica dassoluções candidatas e em como obternovas soluções candidatas que sejamfactíveis (atendam a todas as restri-ções simultaneamente) a partir daaplicação de operadores genéticos (7).

Nas próximas seções serãoapresentadas as principais caracterís-ticas do problema de elaboração deGrade Horária. A Seção 2 mostrauma possibilidade de classificaçãopara as restrições encontradas nestaclasse de problemas; a Seção 3 descre-ve as particularidades dos algoritmosgenéticos para utilização em proble-mas de otimização com restrições. NaSeção 4, três modelos de algoritmosgenéticos para elaboração de gradehorária são apresentados, e a Seção 5traz as conclusões deste trabalho.

2. Classificação das restrições paraproblemas de elaboração de GradeHorária

As restrições encontradas paraelaboração de Grade Horária variam

bastante entre as instituições deensino, muitas vezes até mesmo entredepartamentos de uma mesmainstituição. Este alto grau de varia-bilidade dificulta a aplicação de umasolução de propósito geral, e inúme-ros esforços são despendidos para adefinição de uma solução para cadaproblema específico.

Uma classificação dos tipos derestrições encontradas na elaboraçãode uma Grade Horária pode ajudarno processo de elaboração de um sis-tema de propósito geral, uma vez que,em geral, os algoritmos genéticos paraeste tipo de problema incorporam, nafunção de fitness, penalizações pro-porcionais ao grau da restrição quefoi violada (4, 5, 6, 8). As restriçõespodem ser classificadas em:

• Leves - geralmente ligadas àspreferências dos professores, dias ehorários pontuados de acordo comuma ficha preenchida pelos profes-sores classificando suas preferências.As penalizações associadas são baixas,tiradas diretamente da pontuação daspreferências;

• Médias - de complexidademaior, buscam soluções como distri-buição uniforme das aulas (para osalunos e para os professores), evitar

situações extremas, como o exemplodo professor que só dá cinco aulas porsemana, e, apesar de poder fazer issonum dia só, é obrigado a ir à escolatodos os dias das 22 às 23 horas; oualunos correndo de um lugar paraoutro pois o tempo para troca de salaé escasso; salas superlotadas; “janelas”

ou aulas vazias durante o período, etc.As penalizações envolvidas são depeso médio ou alto.

• Severas - são estas que verifi-cam a Factibilidade de uma solução,cuidando de regras como verificaçãode Carga Horária, Capacidade deSalas, Disponibilidades, etc. As pe-nalizações são altíssimas, ou até, emalguns trabalhos, servindo comoAgente Filtrador, descartando solu-ções não Factíveis.

As restrições descritas abaixo,por exemplo, são do tipo severas edevem ser atendidas em qualquer sis-tema de elaboração de Grade Horária:

• Cada professor e cada classedeve estar presente na grade horáriaem um número pré-definido dehoras;

• Não pode existir mais que umprofessor (professores de disciplinasdiferentes) na mesma classe em ummesmo horário;

• Nenhum professor pode estarem duas classes no mesmo horário;

• Não podem existir “horasdescobertas”, isto é, horas em que ne-nhum professor foi especificado parauma classe.

Em (1) são apresentados os re-sultados de uma pesquisa realizadaem diversas universidades, com o ob-jetivo de descobrir como diferem osrequisitos de elaboração de GradeHorária de cada universidade e se asdiferenças são suficientemente peque-nas para que um sistema de propósi-to geral possa ser produzido.

Nesta pesquisa foi considera-do elaboração de Grades Horáriaspara exames, que é um problema li-geiramente diferente de elaboração deGrades Horárias para cursos (disci-plinas), mas que tem diversas carac-terísticas em comum. Os autores pro-puseram um conjunto de treze res-trições e cada universidade respon-deu se cada uma das restrições era ounão pertinente ao seu contexto. Alémdisso, cada universidade produziu seuconjunto específico de restrições. Umtrabalho deste tipo, para definir oconjunto de restrições mais comunsna elaboração de uma de Grade Ho-

Uma classificaçãodos tipos derestrições

encontradas naelaboração deGrade Horáriapode ajudar no

processo deelaboração de um

sistema depropósito geral

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30 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

rária para cursos, pode ser bastanteinteressante para auxiliar na constru-ção de um sistema robusto.

3. Características dos AlgoritmosGenéticos para elaboração de Gra-de Horária

Em geral, soluções para elabo-ração de Grade Horária que utilizamalgoritmos evolutivos devem especi-ficar a codificação de um indivíduopor um cromossomo, uma funçãoobjetivo que deve ser maximizada ouminimizada, operadores genéticos deseleção, recombinação e mutação.Segundo Palmer1, citado por Concí-lio (6), uma codificação competentedeve ter as seguintes características:

• ao aplicar o operador de re-combinação (crossover) os descenden-tes gerados devem ser caracterizadoscomo soluções candidatas válidas(factíveis);

• a representação adotada devepermitir a exploração de todo o es-paço de soluções candidatas.

Manter os descendentes válidosapós uma operação de recombinaçãoem algoritmos de otimização comrestrições é um problema reconhe-cidamente complexo. Alternativaspara geração de indivíduos factíveissão (5, 6):

• descartar os descendentes in-válidos e repetir a seleção dos paisgerando novos filhos até que sejamfactíveis;

• atribuir um valor de adequa-ção baixo aos cromossomos que re-presentam soluções inválidas;

• transformar as soluções invá-lidas em factíveis aplicando rotinas defactiblidade (ex.: algoritmos repara-dores);

• utilizar operadores genéticosdedicados de modo que somente pos-sam ser gerados descendentes viáveis;

• mudar a representação da so-lução de forma que o crossover possaser aplicado de forma consistente.

Em (6) é proposta uma alter-nativa para contornar este problemada seguinte forma: utilização de umacodificação genética compacta aliada

a algoritmos de decodificação e repa-ração para a expansão do código, demodo que o código gerado seja sem-pre factível. Aplicação dos operado-res genéticos apenas sobre o códigocompacto produzindo descendentes

também factíveis. Por fim, empregode um procedimento de busca localpara aumentar a adaptabilidade dasolução factível gerada. A utilizaçãode busca local em combinação comalgoritmos evolutivos (denominadosalgoritmos meméticos), na elabora-ção de Grade Horária, é sugerida pordiversos autores (4, 5, 6).

Um ponto crítico na elabora-ção de algoritmos genéticos para a ela-boração de Grade Horária é a defini-ção da função de fitness. Consideran-do-se que esta função é utilizada paradirigir a seleção de indivíduos para apróxima geração, uma escolha é pri-mordial para o sucesso na obtençãode uma boa solução para o proble-ma. Esta função é definida, em ge-ral, atribuindo-se penalidades às vio-lações de restrições, proporcionais aograu da restrição que foi violada. Adefinição dos pesos de cada violaçãoé atribuída, normalmente, de formaad hoc, pelos responsáveis pela con-fecção da Grade Horária (5, 8). Esteprocesso intuitivo pode, portanto,não ser adequado ao problema emquestão.

A seção a seguir explicita alguns

modelos específicos de algoritmosevolutivos utilizados em elaboraçãode Grade Horária de diferentes insti-tuições de ensino.

4. Modelo de Algoritmos Evolu-tivos para elaboração de Grade Ho-rária

Vários modelos têm sido pro-postos na literatura para a elabora-ção de Grade Horária, envolvendoalgoritmos evolutivos (4, 5, 6, 8) ounão (2, 3). Nos modelos baseados emalgoritmos genéticos existe uma gran-de diversidade quanto à estrutura derepresentação dos cromossomos e àformulação da função de fitness, jáque estes são aspectos críticos na so-lução de problemas de otimizaçãocom restrições. A seguir, serão apre-sentados alguns modelos, a fim deevidenciar este cenário. Os modelosabaixo utilizaram crossover uniforme,algumas variações de mutação inver-siva e seleção elitista.

Exemplo 1Em (8), define-se um conjun-

to de eventos que requerem um agen-damento de lugar e horário - E = {e1,e2 ,.......ev}. Cada evento está associ-ado a uma duração li (length), umnúmero de estudantes si (size), umconjunto de agentes (agents) A ={a1,...at}, um conjunto de lugares(places) P = {p1,...pq}, um conjuntode tempos (times) T = {t1,...ts}. Umagendamento é uma tupla {a, b, c,d}, a ∈ E, b ∈ T, c ∈ P, d ∈ A, com aseguinte interpretação: “Um eventoa começa no tempo b no lugar c e éensinado pelo agente (professor, tu-tor, etc.) d.” A grade horária é umacoleção de n agendamentos, uma paracada evento.

A representação do cromosso-mo se faz através de um vetor de sím-bolos de tamanho 3v (v é o númerode eventos), dividido em blocos con-tíguos de 3genes. Os três alelos no i-ésimo bloco (1 <= i <= v ) represen-tam o tempo, lugar e agente assinala-do a este evento. O cromossomo“abcdef” , por exemplo, indica que o

1 PALMER, C.C.; An approach to aproblem in network design using GeneticAlgorithm; PHD Thesis, PolitechnicUniversity, New York, NY, 1994.

Nos modelosbaseados em

algoritmos genéticosexiste uma

grandediversidade quanto à

estrutura derepresentação doscromossomos e à

formulação da funçãode fitness

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 31

evento e1 começa no tempo a no lu-gar b, com o agente c e evento e2começa no tempo d no lugar e, como agente f.

A Função de Fitness é determi-nada a seguir:

C é um conjunto de restriçõesno problema, Pi é uma penalidadeassociada com a restrição i e vi(g) =1se a grade g viola a restrição i, casocontrário vi(g) = 0. Os pesos paracada restrição violada são atribuídosde forma ad hoc, e procuram refletira importância relativa de satisfazer osdiferentes tipos de restrições.

As restrições foram definidas afim de atender às características doprograma de mestrado do de-partamento de Inteligência Artificialda Universidade de Edinburgh e sãoespecificadas abaixo para exemplificaros diferentes tipos de restrições quepodem ser consideradas nos algorit-mos de construção de Grade Horária:

• Opções - Lições sobre o mes-mo tema não deveriam se sobreporna grade se há expectativa que estu-dantes desejam cursar simulta-neamente os cursos;

• Distribuição da carga horá-ria - deve ser dividida proporcional-mente durante a semana;

• Intervalo para locomoção -deve ser considerado o tempo de lo-comoção entre os prédios;

• Exclusão de períodos - perío-dos em que nenhum evento podecomeçar;

• Especificação de períodos -eventos que devem começar em umperíodo específico;

• Capacidade de ocupação dasala;

• Exclusão de salas - salas quenão podem ser alocadas a um deter-minado evento por não possuir os re-quisitos didáticos necessários;

• Especificação de salas - salasque devem ser alocadas a um eventopor possuir os requisitos didáticos

necessários;• Justaposicão - Ordenação re-

querida, por exemplo, entre aulas teó-ricas e práticas de uma mesma disci-plina.

Exemplo 2Em (5) o algoritmo de elabo-

ração de grade horária utiliza umamatriz para modelar o problema,onde cada linha corresponde a umprofessor e cada coluna correspondea um horário.

É definido um conjunto A comos trabalhos que os professores de-vem realizar. Este conjunto é defini-do da seguinte forma:

• Os caracteres 1,2,3,...,0 re-presentam as 10 classes onde as aulasdevem ser ministradas;

• O caracter D representa ashoras disponíveis para atendimentoa alunos;

• O caracter A representa as ho-ras para desenvolvimento profis-sional;

• O caracter S representa os ho-rários permanentes;

• O caracter w representa os ho-

rários que o professor não trabalha;• O caracter — representa os

dias em que o professor não traba-lha.

O conjunto A é, portanto,composto da seguinte forma: {1,2,3,4,5,6,7,8,9,0,D,A,S, w,—}. Cada ele-mento na matriz é um gene; o valordos alelos pode variar de acordo com

um subconjunto de A específico parao professor correspondente à linhacontendo o gene.

Este algoritmo apresenta trêsformas de manipular as restrições:

• Através da redefinição dosoperadores genéticos, de forma queo conjunto de horas de ensino de cadaprofessor, alocadas na fase de inicia-lização, não pode ser alterado pelosoperadores genéticos;

• Pelo algoritmo de filtro, queelimina total ou parcialmente as in-factibilidades geradas pelos operado-res genéticos, convertendo soluçõesinfactíveis em soluções factíveis.

A função de fitness (que deveser maximizada) de uma matriz R émapeada a partir da função objetivo(que deve ser minimizada).

O cálculo da função objetivo éa soma ponderada do número deinfactibilidades encontradas namatriz R, de uma medida da taxa deinsatisfação dos requisitos didáticosna matriz R, de uma medida da taxade insatisfação dos requisitos orga-nizacionais na matriz R e de umamedida da taxa de insatisfação dosrequisitos dos professores.

Os requisitos didáticos conside-rados no problema em questão foram:

• nenhum professor pode mi-nistrar mais que 4 horas-aula por dia;

• um determinado professornão pode ser sempre alocado para aúltima aula;

• deve haver uma distribuiçãouniforme de horas do mesmo assun-to durante a semana; alocação aos pa-res para trabalhos em classe.

Os requisitos organizacionaisconsiderados foram:

• não menos que 2 horas-aulapara cada professor, por dia;

• número mínimo de “janelas”no horário do professor.

Finalmente os requisitos dos pro-fessores são considerados da seguinteforma: é atribuído um peso ao con-junto completo de requisitos de cadaprofessor para sua grade específica,além disso é definida uma “classifi-cação” de professores (com base emseu tempo de casa, engajamentos ex-

As restrições,que recebem

pesos específicos,atribuídos

ad hoc, foramdefinidas a fim de

atender àscaracterísticas do

programa de mestradodo Departamento deInteligência Artificialda Universidade de

Edinburgh

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32 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

ternos, etc), para priorizar o atendi-mento aos requisitos.

Exemplo 3No trabalho apresentado em

(4) consideram-se que existam umconjunto de Classes e um conjuntode Professores. Cada Classe é umconjunto de Alunos que têm em co-mum um currículo escolar. Para cadapar <Classe, Professor> são definidasas disciplinas e respectivas CargasHorárias. Informações sobre “impos-sibilidades” de cada Professor devemestar presentes.

Cada dia da semana é divididoem 10 períodos de 60 minutos queresultarão num total de 50 períodosnumerados de 0 a 49.

O objetivo é agendar cada dis-ciplina de modo que atenda às regrasrequeridas. Essas regras serão dividi-das em duas categorias: Severas (têmque ser atendidas) e Leves (é desejá-vel que sejam atendidas).

A Grade de Horários será fac-tível se, e somente se, todas as regrasSeveras forem atendidas. Foram iden-tificadas como regras Severas as se-guintes:

• Carga Horária por Matéria;• Não se pode aceitar Classe,

nem Professor, alocado para mais deuma aula no mesmo horário;

• Outras restrições dos Profes-sores.

Em adição a essas condições,boas Grades Horárias também devematender às regras Leves sempre quepossível, tais como:

• Continuidade das disciplinas,pois professores e alunos preferem as-suntos sem interrupções;

• Deve-se reservar um períodopara o almoço entre 12:00 e 15:00horas;

• O número de aulas por diapor professor ou classe não deve ex-ceder a um limite preestabelecido;

• Aulas que tenham assuntoscomuns devem ser distribuídas uni-formemente ao longo da semana;

• Sempre que possível, osalunos deverão ter aulas de manhã eà tarde;

• Professores e alunos preferemuma carga maior de aulas em um dia(o que proporcionaria até dias semaulas) do que dias com poucas aulas.

Os cromossomos são consti-tuídos de genes que, dependendo da

sua posição, conterão dados relativosa cada aula por classe e professor. Operíodo (hora da aula) está duplica-do em dois genes que representamuma certa disciplina de um determi-nado par classe/professor; um é parao horário da Classe e o outro para ohorário do Professor. O Número degenes de cada cromossomo é, então,duas vezes o total de disciplinas detodas as classes.

Nesta proposta, ressalta-se aimportância de uma alta penalizaçãonos casos de não cumprimento dasregras Severas, para não se correr orisco de criar algoritmos genéticoscom geração de grande número deindivíduos infactíveis.

O algoritmo utiliza tambémuma função reparadora para transfor-mar cromossomos não válidos gera-dos, para cromossomos válidos.

Esta função encontra asposições livres (posições não ocupadaspor outras classes ou assuntos) co-muns à grade horária de ambos, classee professor. As posições livres maispróximas do valor do gene originalsão então escolhidas e removidas dalista de posições livres da classe e doprofessor.

5. Conclusões

Este trabalho apresentou as ca-racterísticas da utilização de algorit-mos genéticos na construção de Gra-de Horária para instituições de ensi-no. Procurou-se mostrar a complexi-dade dos problemas encontrados paraa definição de uma solução de boaqualidade na elaboração de GradeHorária, haja vista que existem múl-tiplos objetivos, múltiplas restriçõese um número grande de variáveis aserem ponderados.

Em decorrência da complexi-dade da resolução de problemas des-te tipo, considera-se que algoritmosgenéticos sejam apropriados para uti-lização na automatização do proces-so. Os autores de trabalhos na área(2, 3, 4, 5, 6) indicam ainda que al-goritmos de busca local devem serincorporados nos algoritmos genéti-cos para tornar mais eficiente a bus-ca pelas melhores soluções.

Dos modelos apresentadospode-se notar a grande variedade derepresentação cromossômica adotadanas diversas propostas. Ressalta-seainda que esta representação é um dosfatores de sucesso dos algoritmos ge-néticos (7).

Para a definição da função defitness, em geral, utiliza-se uma for-mulação que aplica penalidades àsrestrições que são infringidas. As res-trições podem ser severas (obrigató-rias), e neste caso não podem ser in-fringidas, ou leves (desejáveis), casoem que determinam a qualidade daGrade Horária. A classificação dasrestrições é realizada de forma ad hocpelos responsáveis em elaborar a Gra-de Horária, e este é outro ponto crí-tico para a obtenção de uma soluçãoadequada.

Apesar de existirem restriçõesque são comuns a qualquer institui-ção de ensino, existe um grande nú-mero de restrições que são específi-cas de cada instituição e este tipo derestrição pode dificultar o processode geração de um sistema de elabo-ração de grade horária de propósitogeral.

Apesar deexistirem restriçõesque são comuns a

qualquerinstituição deensino, existe

um grande númerode restrições

que são específicasde cada

instituição, o quepode dificultar acriação de um

sistema

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Referências Bibliográficas

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[8] ROSS P.; Corne D.; Fang H. L.; Successfun Lecture Timetabling with Evolutionary Algorithms.

Ainda em decorrência das res-trições, após a aplicação dos opera-dores genéticos de recombinação emutação, indivíduos infactíveis po-dem ser gerados. Foram apresentadasas formas como estas infactibilidadessão tratadas.

Em muitos casos (4, 5, 6) fun-ções reparadoras são utilizadas para

transformar soluções inválidas emsoluções factíveis.

Como trabalho futuro, pode-se sugerir, a exemplo de (1), uma pes-quisa entre diversas instituições deensino de forma a definir claramenteo escopo do problema, as caracterís-ticas das restrições, o grau de auto-matização existente e desejado do

problema e os aspectos requeridos deuma grade horária factível, de boaqualidade, gerada automaticamente.

*Maria das Graças J. M.Tomazela é mestre em Ciência da Com-putação pela USP de São Carlos e pro-fessora de Banco de Dados no Curso deSistemas de Informação do IMAPES

Generalização de distânciasvaloradas em Álgebras de Boole

em análise de agrupamentosCarlos G. González*

RESUMO

Continuando o trabalho de [5],[3] e [4], é apresentada uma generali-zação do conceito de medida valora-da em Álgebras de Boole. A parte cha-ve deste artigo consiste em resulta-dos matemáticos que caracterizamessas distâncias e justificam o seu uso,além de fundamentar sua aplicaçãoem análise de agrupamentos. Estadefinição geral de distância possibilitaparticionar a Álgebra de Boole de ma-

neira simples e, neste sentido, sãoapresentados resultados matemáticosque justificam a pertinência dessaspartições e originam técnicas simplesde aplicação.

1. Introdução

Os primeiros computadoresforam concebidos como supercalcu-ladoras, como máquinas capazes defazer uma quantidade enorme de

cálculos num período de tempo in-crivelmente curto. O próprio nome“computador” revela essa origem,pois computar significa calcular, fa-zer contas. Contudo, a partir, apro-ximadamente, da década de 1960,essa visão começou a mudar e os com-putadores começaram a ser vistoscomo máquinas capazes de processarinformação. Hoje em dia, os compu-tadores processam massas de infor-

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34 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

mação e, às vezes, de maneira consi-deravelmente sofisticada. Vejamos al-guns exemplos.

Na indústria e em outras ativi-dades, é utilizada cada vez mais visãode máquina, que é a combinação detécnicas, equipamentos e programasde computador que permitem reco-nhecer objetos ou características apartir da imagem gerada por umacâmera de televisão. Um uso cada vezmais generalizado da visão de máqui-na é o controle de qualidade, no qualuma câmera registra os produtos pas-sando por uma esteira para serem au-tomaticamente classificados em “acei-tos” ou “rejeitados”. Uma outra áreade crescente importância é o diagnós-tico médico auxiliado por computa-dor, que tem como finalidade pres-tar assistência aos médicos na elabo-ração de diagnósticos de pacientes.Programas de computador analisamdados provenientes de exames e pro-cessam de maneira automatizada ima-gens de tomografia computadoriza-da, raios X e ultrassom, eletrocardio-gramas, eletroencefalogramas, etc.,para propor possíveis diagnósticos.Reconhecimento gráfico de caracte-res (tanto letras de molde como ma-nuscritas), reconhecimento de voz,reconhecimento gramatical, etc., sãooutras áreas que usam um processa-mento sofisticado da informação.

Todos os campos científicosmencionados têm uma característicaem comum: utilizam uma família detécnicas conhecidas como reconheci-mento de padrões. Na máquina men-cionada, usada em controle de quali-dade, um padrão determinado é usa-do para classificar objetos como “acei-tos” ou “rejeitados”.

Quando uma imagem é anali-sada por um programa para auxiliarnum diagnóstico, primeiro são clas-sificados os pontos da imagem (ge-ralmente chamados de pixels) paraidentificar objetos, e logo são aplica-das técnicas para determinar, porexemplo, se um determinado objetoda imagem corresponde ou não como padrão de tumor, ou seja, classificaos objetos em “tumores” e “não tu-

mores”. O reconhecimento gráfico decaracteres decide se uma determina-da parte da imagem corresponde ounão ao padrão da letra “A”, etc., clas-sificando desta maneira os objetosgráficos como letras.

De maneira geral, as técnicasde reconhecimento de padrões con-sistem em usar um ou vários padrõespara classificar um conjunto de ob-jetos. Como pode ser deduzido dosexemplos assinalados, trata-se de umaárea que conta atualmente com umaquantidade enorme de pesquisa ecom aplicações das mais variadas. Nodesenvolvimento teórico desta área,os conceitos de similaridade e dissi-milaridade têm-se mostrado comoessenciais e a noção de distância comoa formulação matemática apropriadapara a apresentação rigorosa da maio-ria dos problemas a serem tratados.

A finalidade deste artigo é ex-por uma generalização da noção dedistância valorada em álgebras deBoole de uma maneira matemáticarigorosa, que sirva como fundamen-to para uma generalização de técni-cas introduzidas em [5], [3] e [4].

2. Distâncias

A pergunta fundamental é:“como classificar objetos?” A manei-ra mais natural seria colocar os obje-tos mais semelhantes no mesmo gru-po. Estas técnicas de classificação eagrupamento constituem a área depesquisa denominada “análise deagrupamentos” (cluster analysis). Nes-te contexto, classificar significa sub-dividir o conjunto de objetos em vá-rios outros conjuntos que reúnem osobjetos similares, quando considera-mos um padrão específico. Em ou-tras palavras, o padrão determina asimilaridade entre objetos e os obje-tos similares são agrupados no mes-mo conjunto.

Vejamos um exemplo. Temosuma imagem em preto e branco e ostons de cinza são o padrão que vaideterminar a classificação. Os agru-pamentos são os conjuntos de pon-tos (pixels) que têm cor similar. A

maneira mais radical de entender anoção de similaridade seria que doispontos são similares se têm exatamen-te o mesmo tom de cinza. Nesse caso,teríamos pontos iguais (ou seja, domesmo tom de cinza) e pontos dife-rentes. O mínimo necessário parauma classificação é uma relação queseja satisfeita pelos elementos de cadaagrupamento, ou entre os elementosde cada agrupamento e algum outroobjeto que não pertence a nenhumagrupamento. Nos casos nos quais ainformação é completa em relação aoproblema tratado, dados dois obje-tos quaisquer, temos de poder dizerse essa relação simples é ou não satis-feita por eles.

Uma análise matemática destecaso teria o seguinte desenvolvimen-to. Em primeiro lugar, temos umconjunto P de pontos. Logo uma re-lação S que vamos denominar seme-lhança: se dois pontos p1 e p2 são se-melhantes, então diremos que valeS(p1, p2). Então, se p1 pertence a umagrupamento A e S(p1, p2), temosque p2 também pertence ao agrupa-mento A. Uma outra formulaçãopossível consiste em definir uma fun-ção de similaridade s : A x A �{0,1} tal que toma o valor 1 quandoos objetos são similares e 0 no casocontrário. Uma função contrária a sseria uma função de distância d : A xA � {0 ,1} para representar o graude dissimilaridade, com valor 0 quan-do os objetos são similares e 1 no casocontrário. Essa função d que repre-senta uma medida de similaridadeentre objetos é denominada freqüen-temente função de distância.

Na maioria dos casos, a classi-ficação por igual ou diferente nãoresulta a mais apropriada, pois exis-tem freqüentemente nuances que re-querem uma classificação mais sofis-ticada. A maneira mais natural depensar isto é recorrer a algum tipo demedida da similaridade que tomevalores intermediários entre o igual eo diferente (ver, por exemplo, [7], p.357). A forma imediata de pensar essamedida de similaridade é como umamensurabilidade, ou seja, uma fun-

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ção que estabeleça uma quantifica-ção. Detalhadamente, se A é o con-junto dos objetos a serem classifica-dos, então uma mensurabilidade éuma função m : A x A � M, sendoM o conjunto imagem da mensura-bilidade. Nem todo conjunto é apro-priado para ser usado como base parauma mensurabilidade. Se um conjun-to tem uma ordem total e as opera-ções aritméticas definidas nele, entãoa imagem da função de mensurabili-dade permite um tratamento simplese intuitivo, e por isso é que são am-plamente utilizadas mensurabilidadesdefinidas sobre o conjunto dos núme-ros reais, e também mensurabilida-des discretas, em graus inteiros, defi-nidas sobre o conjunto dos númerosinteiros. Esta mensurabilidade forma-liza uma noção de proximidade, quesignifica que os objetos mais simila-res estão, num sentido abstrato, maispróximos. O contrário da noção deproximidade é a noção de distância,que representa o grau de dissimilari-dade entre dois objetos.

De acordo com esta represen-tação geométrica abstrata, cada carac-terística mensurada representariauma coordenada, de modo que to-dos os padrões possíveis constitui-riam um espaço de características(feature space). Neste sentido, pode-mos ler em [6], p. 271: “a mesure ofthe similarity between two patternsdrawn from the same feature space isessential to most clustering proce-dures”.

Voltando ao nosso exemplo declassificação dos tons de cinza de umaimagem, poderíamos considerar quedois pontos são similares se eles tive-rem tons de cinza semelhantes. Su-ponha que temos uma imagemcomputadorizada de modo que a cadaponto corresponde um tom de cinzaque vai desde 0 (preto) até 255 (bran-co). Poderíamos considerar agora, porexemplo, uma margem de 10 unida-des como a máxima distância, ou seja,menos que essas 10 unidades seriaconsiderado semelhante. Em primei-ro lugar, a conta que refere isto é ovalor absoluto da diferença, denomi-

nada distância de Hamming (ver [1],p. 131). Com o estabelecimento dafunção de distância apropriada o pro-blema está apenas começando. Amaneira mais simples de usar estadistância seria estabelecer uma gra-dação estática: primeiro grupo, ospontos com valores entre 0 e 9, se-gundo entre 10 e 19, etc. mas esteprocedimento pode não ser o adequa-do em muitos casos: por exemplo,uma imagem pode ter definidas cla-ramente duas áreas: uma com pon-tos com valores 9 e 10, outra comvalores 19 e 20. O correto seria clas-sificar os pontos dessa imagem emdois agrupamentos e não em três.

Para especificar esta medida desimilaridade, têm-se proposto dife-rentes noções de distância, começan-do pela distância entre dois pontosno espaço euclidiano, generalizada nanoção de distância de Minkowski:

até noções de distância procuradasnas mais diversas áreas. Por exemplo,em [1] é aplicada a noção de distân-cia originada nos espaços deHausdorff, na área de topologia deconjuntos de pontos.

Coloquemos, ainda, um exem-plo clássico para esclarecer este pro-blema. Suponha que temos duas co-res diferentes, e que ambas são des-critas com os valores do vermelho,verde e azul, o que se indica como osvalores RGB (do inglês). Se usarmosa distância de Hamming, que apare-ce como a noção mais simples, deve-mos realizar a diferença entre os va-lores de vermelho das duas cores, adiferença no verde e a diferença noazul, e depois efetuar a soma dos va-lores absolutos dessas diferenças. Porexemplo, se uma cor for (120; 30;65) e a outra (118; 28; 63), a distân-cia entre as duas cores seria:120 - 118+ 30 - 28 + 65 - 63= 6.

Porém, o mesmo valor teria adistância entre (120; 30; 65) e (120;30; 71), sendo que para a visão huma-na o valor maior do azul produz uma

mudança de matiz, muito mais visí-vel que a mudança de luminosidadedo primeiro par de valores. Por isso,utilizam-se funções de distância maissofisticadas. Usando simplesmente afórmula de distância no espaço eucli-diano de 3 dimensões, temos umamedida muito mais próxima das dife-renças percebidas pelo olho humano:

A distância euclidiana constitui “themost popular metrics for continuousfeatures” ([6], p. 271).

A definição geral das condiçõesque deve ter uma função para serconsiderada uma distância foi toma-da da topologia dos espaços métricos.Para isso, foram abstraídas as carac-terísticas fundamentais, que foram re-sumidas na Definição 2.1.

Definição 2.1 - Dado um es-paço de características E, uma fun-ção de d : E x E � R (onde R é oconjunto dos números reais) é umadistância se:a) d(x,x) = 0, "x ∈ E;b) d(x,y) = d(y,x), "x, y ∈ E;c) d(x,y) = 0 ⇒ x = y, "x, y ∈ E;d) d(x,z) ≤ d(x,y) + d(y,z), "x, y,z ∈ E.

A condição d) é chamada detriangularidade ou desigualdade tri-angular, porque na geometria eucli-diana tem o significado intuitivo deque a comprimento de um lado dotriângulo é sempre menor que a somados comprimentos dos outros dois.

Esta condição pode ser substi-tuída por uma mais forte (“sup” re-presenta o supremo):

d(x,z) ≤ sup (d(x,y), d(y,z))

que implica d) (ver [2], p. 52). Osupremo não parece ser no início umbom candidato para substituir asoma. Uma característica limitante éa proposição demonstrada por [2], p.62: “any triangle (i, j, k) is isosceles”.

Para uma discussão mais geralsobre noções de distância, observa-mos em primeiro lugar que pode-riam ser usadas noções diferentes de

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uma mensurabilidade sobre um con-junto de números. O que aparececomo realmente indispensável é queno conjunto imagem da função demensurabilidade possa ser definidauma relação de ordem, pois com au-xílio dessa relação podemos colocarlimites e considerar o conjunto deelementos dentro desses limites.

Neste sentido, em [2], p. 52,podemos ler: “The fundamentalpurpose of a distance similaritymeasure is to induce an order on theset of couples {Xi , Xq} for any i orq.” Se não existir tal relação, pode serdifícil ou impossível usar o conjuntoda imagem para gerar uma clas-sificação. Por exemplo, a utilização derelações que não são ordens podenecessitar de critérios adicionais paratomar conta de subgrafos cíclicos darelação.

A quase totalidade dos casosque alguma noção de distância temsido utilizada em reconhecimento depadrões, segue-se a Definição 2.1.Em alguns poucos casos, vê-se comomais pertinente uma função comimagem nos inteiros, devido a que oespaço de características é discreto,implicando que a noção mais apro-priada também seja discreta. Váriasnoções de proximidade foram defi-nidas, assim como também algunscritérios gerais. Uma noção de pro-ximidade é, em algum sentido, a no-ção contrária à de distância. Mas asnoções de distância definidas ou im-plícitas nesses casos ou são funçõescom imagem nos reais ou nos intei-ros, ou não satisfazem as condiçõesda Definição 2.1 (não seriam distân-cias de espaços métricos).

A questão que deve ser anali-sada a seguir é: será que podemossubstituir R por algum outro conjun-to que seja apropriado para fornecermedidas? A resposta a esta perguntarequer uma análise abstrata das con-dições da Definição 2.1, e nesta aná-lise é preferível falar de um conjuntoindeterminado A, em lugar de falarde R, e acerca de um elemento dis-tinguido d0, no lugar de 01. A con-dição a) estabelece que cada elemen-

to do espaço é idêntico a si próprio,ou seja, que a função de distância dtoma o valor d0, que denota o graumáximo de similaridade. Além dis-so, podem ser necessárias proprieda-des adicionais do objeto d0, porexemplo, com relação à operação +de d). A condição b) é somente a si-metria da função de distância. A con-dição c) é a clássica identidade dosindiscerníveis, ou seja, que os elemen-tos não indistintos devem ser o mes-mo elemento. Numa primeira visão,poderia parecer uma condição nãomuito importante, mas ela impedeque d seja trivial, no sentido "a, b ∈A d(a, b) = d0.

Enquanto as condições a), b) ec) não implicam propriedades estru-turais sobre o conjunto A; a condi-ção c) requer uma operação + e umarelação ≤. Assumiremos mais uma vezo ponto de vista abstrato e discutire-mos sobre uma relação r e a opera-ção «, em lugar de ≤ e +. Em pri-meiro lugar, analisaremos o seguin-te: quais devem ser as característicasda relação r? Nós queremos usar rpara agrupamentos. O mínimo paraesse propósito parece ser o fato de quer possa ser usada para fixar limites elogo poderíamos tomar os elementosdentro desses limites para selecionarum agrupamento. Por uma parte, ser tem subgrafos cíclicos2, não pode-ríamos tomar esses limites de umamaneira simples (isto pode ser inter-pretado como que r é uma relaçãoque contém conexões demais). Poroutra parte, se existem muitos pon-tos isolados com respeito a r em A,então r parece de novo que não éadequada para agrupamentos. Se r éuma ordem ou uma relação parecidacom uma ordem, então r parece queinduz uma estrutura em A apropria-da para tomar esses limites. Com aexpressão “uma relação parecida auma ordem” pensamos num tipo derelação que com pouco trabalho sejaconvertida numa ordem, por exem-plo, fazendo o fecho transitivo ou eli-

minando alguns pontos. Essa ordemrepresentaria o significado intuitivode “mais similar” de uma maneiranatural. Em síntese, o uso de umarelação r que não seja uma ordempode dificultar em muito o seu usopara selecionar agrupamentos.

Seja r uma ordem parcial. Aoperação « representa alguma classede condição acumulativa sobre o con-junto A, pois a condição d) impõeque « deve satisfazer "a ∈ A a ≤ a« a (no mínimo, na imagem de d).Podem ser necessárias outras proprie-dades de « para representar as pro-priedades acumulativas das distân-cias: por exemplo, "a, b ∈ A a « b =b « a, "a ¹ d0 "b b < a«b, etc. Sepretendermos que r represente o graude dissimilaridade, pode ser interes-sante que d0 seja o mínimo de A comrespeito a r, e que "a ∈ A a = a «d0. De uma maneira geral, a condi-ção d) implica a falta de atalhos quan-do usamos «. Em outras palavras,d(x, y) é o caminho mais curto entrea e b, ou seja, o significado intuitivoda desigualdade triangular. Na reali-dade, esta premissa pode gerar umadiscussão adicional, que está fora dospropósitos deste artículo.

Na realidade, as propriedades,relações e operações dos númerosreais são usadas na seleção de agru-pamentos. Por exemplo, a definiçãode distância euclidiana é largamenteusada em agrupamentos, e requer nãosomente a adição, mas também a dife-rença, o quadrado e a raiz quadrada.O propósito desta discussão não écomo eliminar medidas com imagemnos reais, mas em que casos algumoutro conjunto pode ser apropriadopara valorar medidas. Neste sentido,é apresentada uma definição maisgeral da função de distância:

Definição 2.2 - Seja E um es-paço de características, A um conjun-to, ≤ uma ordem parcial sobre A, «uma operação binária sobre A e d0um elemento distinguido de A. En-tão, d : E x E � A é uma função dedistância se:a) d(x, x) = d0, "x ∈ E;b) d(x, y) = d(y, x), "x, y ∈ E;

1 [7], 358, também usa d0, mas d0 ∈ R.2 Subgrafos cíclicos não triviais, ou seja,com mais de um elemento.

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c) d(x, y) = d0 ⇒ x = y, "x, y ∈ E;d) d(x, z) ≤ d(x, y) « d(y, z), "x, y,z ∈ E.

O uso desta definição abstrataestá limitado à escolha de A, ≤, «, ed0 apropriados.

3. Distâncias em álgebras de Boole

Uma álgebra de Boole pode serdefinida a partir de três operadoresou de uma relação de ordem. Segun-do a primeira definição, uma álgebrade Boole é uma seqüência sêxtupla⟨B, Ù, Ú, - , 0, 1⟩ onde ⟨B, Ù, Ú⟩ éum reticulado distributivo comple-mentado com mínimo 0 e máximo1. Na segunda definição, uma álge-bra de Boole é um conjunto ordena-do ⟨B, ≤ , 0, 1⟩ no qual ⟨B, ≤⟩ cons-titui novamente um reticulado dis-tributivo complementado com míni-mo 0 e máximo 1. A equivalência dasduas definições pode ser demonstra-da definindo x Ù y = x ⇔ x ≤ y.

Definição 3.1 - Seja B uma ál-gebra de Boole. d : B x B � B éuma distância se:a) d(x, x) = 0, "x ∈ B;b) d(x, y) = d(y, x), "x, y ∈ B;c) d(x, y) = 0 ⇒ x = y, "x, y ∈ B;d) d(x, z) ≤ d(x, y) Ú d(y, z), "x, y,z ∈ B.

Definimos a distância entredois elementos de uma álgebra deBoole como a diferença simétrica.

Definição 3.2 - Seja B uma ál-gebra de Boole e x, y ∈ B. Defini-mos d : B x B � B por:

d(x, y) = x D y = (x Ù -y) Ú (-x Ù y).

É bem conhecido que (x Ù -y)Ú (-x Ù y) = (x Ú y) Ù (-x Ú -y).Então temos:

Proposição 3.1 (Distância boo-leana) - Usando uma função de dis-tância d assim definida, temos:

a) A função d é uma distânciano sentido da Definição 3.1.

b) d(x, y) ≤ d(x, -x) = d(0, 1)= 1, "x, y ∈ B.

Demonstração: Para a), o úni-co que precisa de uma argumentaçãoé o item d), a triangularidade.

Devemos ver que:

x D z ≤ (x D y) Ú (y D z)

Escrevendo x D y como (x Ù -y) Ú (-x Ù y), devemos provar: (x Ù -z) Ú (-x Ù z) ≤ (x Ù -y) Ú (-x Ù y) Ú(y Ù -z) Ú (-y Ù z). Vemos que -x Ùz = (-x Ù z) Ù (y Ú -y) = (-x Ù z Ù y)Ú ( -x Ù z Ù -y). Como -x Ù z Ù y ≤-x Ù y ≤ (-x Ù y) Ú (-y Ù z) e -x Ù zÙ -y ≤ -y Ù z ≤ (-x Ù y) Ú (-y Ù z),temos -x Ù z = (-x Ù z Ù y) Ú (- x Ùz Ù -y) ≤ (-x Ù y) Ú (-y Ù z) ≤ (x Ù -y) Ú (-x Ù y) Ú (y Ù -z) Ú (-y Ù z),pois o supremo é o menor dos limi-tes superiores. Procedemos de manei-ra similar com x Ù -z, e temos o re-sultado desejado. A parte b) é de ve-rificação imediata.

Quando [2] prova “any triangle(i, j, k) is isosceles”, usa de maneirafundamental a ordem linear dos reais.Uma ordem linear num conjunto dedois elementos trivializa a operaçãobinária supremo, pelo fato que o sup(x, y) é sempre um deles: ou x, ou y.Em certa medida, as propriedadesanalisadas em [2] no que se refere a“ultramétricas”, como denominam asfunções de distância para as quais valea condição de supremo, implicamnuma simplicidade extrema quetermina por limitar as possíveisaplicações.

4. Particionando uma álgebra deBoole

Nesta seção introduziremosuma maneira geral de produzir par-tições em álgebras de Boole. Estaspartições são uniformes no sentido deque cada classe agrupa os objetos“próximos” segundo um limiar dedistância previamente determinado.

Definição 4.1 - Fixemos umaálgebra de Boole B e um limiar dedistância ε ∈ B. Para x ∈ B, defini-mos , a classe de x, como:

= {y ∈ B : d(x, y) ≤ ε}

Definição 4.2 - Dada uma ál-gebra de Boole B e um limiar de dis-

tância ε, D Í B é um conjunto com-pleto de representantes se:a) d(x, y) > ε, "x, y ∈ D, x ¹ y;b) "x ∈ B ∃y ∈ D d(x, y) ≤ ε.

A existência de um tal conjun-to de representantes é suficiente parainduzir uma partição do espaço emagrupamentos de objetos próximos.

Proposição 4.1 - Seja D umconjunto de representantes satisfazen-do as condições da Definição 4.1.Então D induz uma partição de B.

Demonstração: Devemos pro-var que P = { : x ∈ D} é uma par-tição da álgebra B. Em primeiro lu-gar, observamos que cada x ¹ Æ,poisx ∈ . Para ver que UP = B, sódevemos argumentar no caso B Í

UP, pois a outra inclusão segue-seda definição das classes . Seja x ∈B. Então ∃y ∈ D, por b) da Defini-ção 4.2, tal que d(x, y) ≤ ε, e portan-to x ∈ ∈ P. Para x, y ∈ D, x ¹ y,devemos ver que È = Æ. Para umraciocínio pelo absurdo, suponha queexiste um z, tal que z ∈ e z ∈ .Então, temos que d(x, z) ≤ ε e d(y, z)≤ ε. Fazendo o supremo dessas duasdesigualdades, temos d(x,z) Ú d(y, z)≤ ε Ú ε = ε. Usando b) e d) da Defi-nição 3.1, temos que ε < d(x, y) ≤d(x, z) Úd(z, y) = d(x, z) Úd (y, z) ≤ε, uma contradição.

A seguinte proposição caracte-riza as classes .

Proposição 4.2 - Fixemos B eum limiar de distância ε ∈ B, e se-jam x, y, z ∈ B e a máscara m = -ε.Além disso, sejam 0 = x Ù m e 1 =x Ú ε. Então valem:a) Se x ∈ , então y ∈ e = .b) Se y, z ∈ , então temos (x Ù -y)Ú (-x Ù y) Ú (z Ù -y) Ú (- z Ù y) Ú(x Ù - z) Ú (-x Ù z) ≤ ε.c) é um reticulado distributivo comas operações Ú e Ù restritas a .d) x Ù m ∈ e x Ú ε ∈ .e) Para y, z ∈ , temos y Ù m = z Ù m= 0 e y Ú ε = z Ú ε = 1 .f ) 0 é o mínimo de e 1 é o máxi-mo de .g) Se y ∈ , então y D ε é o comple-mento de y no reticulado .h) é uma álgebra de Boole.

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Demonstração: a) é de verifi-cação direta usando a Definição 4.1e triangularidade. Para b), usamosd(x, y) ≤ ε, d(x, z) ≤ ε e d(z, y) ≤ ε,que vale pela propriedade de trian-gularidade, e o fato de que o supre-mo é o menor dos limites superiores.Para c) temos de ver que d(x, y Ú z)≤ ε e d(x, y Ù z) ≤ ε. Para d(x, y Ú z)= (-x Ù (y Ú z)) Ú (x Ù -(y Ú z)) ≤ ε,vejamos primeiro que -x Ù (y Ú z) ≤ε. Por b), temos que -x Ù (y Ú z) = (-x Ù y) Ú (-x Ù z) ≤ ε. Por outrolado, como xÙ -z ≤ ε, temos que xÙ- (yÚ z) = xÙ -yÙ- z ≤ ε. Usandonovamente a propriedade menciona-da do supremo, temos que d(x, y Úz) ≤ ε. Para d(x, y Ù z) = (-x Ù (y Ùz)) Ú (x Ù -(y Ù z)) ≤ ε procedemosde maneira análoga. Para d), parti-mos de x Ù ε ≤ ε: x Ù ε = (x Ù -x )Ú (x Ù ε) = x Ù (- x Ú ε) = x Ù -(xÙ -ε) = (-x Ù (x Ù -ε)) Ú (x Ù -(xÙ -ε)) = d(x, x Ù -ε) ≤ ε.

Para d(x, x Ú ε) ≤ ε, procede-mos de maneira similar, partindo de-x Ù ε ≤ ε. Para e), sejam y, z ∈ .Por triangularidade, temos que d(y,z) = (y Ù -z) Ú (-y Ù z) ≤ ε, e (y Ù-z) Ú (- y Ù z) Ú y ≤ ε Ú y. Logo (yÙ -z) Ú (-y Ù z) Ú y = z Ú y ≤ ε Ú y.Como z ≤ z Ú y ≤ ε Ú y, temos z Ù -ε ≤ (ε Ú y) Ù -ε = y Ù -ε, ou seja, zÙ m ≤ y Ù m. Trocando z por y temosa outra desigualdade e z Ù m = y Ù m.Como x ∈ , temos y Ù m = x Ù m =0 (ou seja, 0 e 1 estão bem defini-dos). Usando z ≤ ε Ú y, temos z Ú ε ≤ε Ú y Ú ε e logo y Ú ε = z Ú ε = 1 .Para f ), é suficiente ver que para qual-quer y ∈ vale y ≥ y Ù m = x Ù m eque y ≤ y Ú ε = x Ú ε. Para g) nota-mos que (y D ε) Ú y = (y Ù -ε) Ú (-y Ù ε) Ú y = y Ú (-y Ù ε) = y Ú ε = xÚ ε = 1 e de maneira similar (y D ε)Ù y = y Ù m. Por último, h) segue-sedos anteriores.

Um limiar de distância ε e umamáscara m permitem obter de manei-ra muito simples conjuntos de repre-sentantes que particionam a álgebrade Boole. Fixemos mais uma vez B,ε e m.

Proposição 4.3 - Sejam R = {r∈ B : r ≤ m} e S = {s ∈ B : s ≥ ε}.

a) R = {0 : x ∈ B} e S = {1 : x ∈B}.b) VR = Vx∈B

0 = m e ÙS = Ùx∈B1

= ε.c) R e S são conjuntos completos derepresentantes.d) P = { : x ∈ B} é uma partição deB.

Demonstração: Para a), vemosque, se r ∈ R então r = r Ù m = 0 .Se x ∈ B, então x Ù m = 0 Ù m = 0 ,e m ≥ 0 ∈ R. Analogamente para S.O item b) é imediato, observandoque m ∈ R e ε ∈ S. Para c), vejamosprimeiro que dados r, rï ∈ R, temosque d(r, rï) > ε. Usamos um racio-cínio pelo absurdo: suponha que exis-tem r, rï ∈ R, tais que r ¹ rï e d(r,rï) ≤ ε. Então, = , 0 = 0 e r =rï, pois r = r Ù m = rï Ù m = rï.Agora vejamos que, para cada x ∈ B,existe um r ∈ R, tal que x ∈ . Comor = x Ù m = 0 , temos que r ∈ elogo x ∈ . Notemos que r = r Ù m ≤m e então r ∈ R. Procedemos de ma-neira similar com S. A parte d) se-gue-se imediatamente da Proposição4.1.

Seja B uma álgebra de Boole.Então temos as seguintes definições:

Definição 4.3 (Átomo) - Umelemento x ∈ B é um átomo se nãoexiste y ∈ B tal que 0B < y < x.

Definição 4.4 (Co-átomo) -Um elemento x ∈ B é um co-átomose não existe y ∈ B tal que 1B > y >x.

Definição 4.5 - (álgebra deBoole atômica) - Uma álgebra deBoole B é dita atômica se para todo x∈ B, tal que x ¹ 0B e x não é umátomo, existe y ∈ B, y átomo, tal que0B < y < x.

Vejamos na continuação algu-mas características bem conhecidassobre átomos em álgebras de Boole.

Proposição 4.4 - (Carateriza-ção de álgebras de Boole atômicas)a) Toda álgebra de Boole finita é atô-mica.b) Toda álgebra de Boole finita temcardinal 2n , n ∈ N, sendo n o cardi-nal do conjunto de átomos.c) Todo elemento numa álgebra deBoole atômica e o supremo de um

único conjunto de átomos e o ínfi-mo de um único conjunto de co-áto-mos.d) O máximo 1 de uma álgebra deBoole atômica é o supremo do con-junto de todos os co-átomos. O mí-nimo 0 é o ínfimo do conjunto detodos os átomos.

Proposição 4.5 - Seja B umaálgebra de Boole e C e D duas sub-álgebras que particionam B. Entãoexiste ε ∈ B tal que d(x, y) ≤ ε parax, y ∈ C ou para x, y ∈ D.

Demonstração: Como C e Dsão sub-álgebras e particionam B, oubem 0B = 0C, ou bem 0B = 0D. Su-ponha que 0B = 0C, pois em casocontrário procedemos analogamentetrocando C por D. Então temos que0C < 0D. Vejamos primeiro que 0Dé o complemento de 1C. Seja x = 1CÙ 0D. Temos então que x ≤ 0D. Nãopodemos ter x = 0D, pois então 0D ≤1C e C conteria todos os átomos, oque implica em C = B. Então x <0D. Mas como 0D é um átomo, te-mos que x = 0B = 0C. Procedemosda maneira dual para ver que 1C Ú0D = 1B. Como conseqüência, temosque 1C ¹ 1B, e portanto 1D = 1D.Vejamos agora que d(0C, 1C) = d(0D,1D) = 1C. Temos que d(0C, 1C) =(0C Ù -1C) Ú (-0C Ù 1C) = -0C Ù1C, pois 0B = 0C. Como 0C = 0B,temos que -0C = -0B = 1B, e entãod(0C , 1C) = 1C. Para d(0D, 1D) =1C, observamos que 0D Ù -1D = 0B,pois -1D = -1B = 0B, e que -0D Ù1D = 1C, pois 1D = 1B e 1C = -0D.Desta maneira, 1C = ε é o limiar dedistância procurado. Por último usa-mos b) da proposição 3.1 para obtera proposição.

Neste contexto, resulta interes-sante fazer um comentário sobrecomplexidade. Primeiro, precisamosde uma definição:

Definição 4.6 - Chamemos aum agrupamento G homogêneo seexiste ε tal que:a) d(x, y) ≤ ε, para todo x, y ∈ G;b) d(x, y) > ε, para todo x ∈ G, y ÏG.

Analisemos agora qual é a com-plexidade do problema: “Dado um

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limiar de distância ε, encontrar umagrupamento homogêneo num sub-conjunto A qualquer de um espaçode características.” Podemos pensarA como um grafo tal que seus ele-mentos são os vértices e existe umaarista entre x e y sse d(x, y) ≤ ε. Des-ta maneira o problema fica reduzidoa encontrar um subgrafo completoem um grafo dado. (Este problema éNP-completo?) Podem existir casosconcretos nos quais a complexidadeseja menor. Por exemplo, se a distân-cia é definida como 0 para elemen-tos iguais e 1 para diferentes, o pro-blema resulta trivial.

5. Construindo sub-álgebras

Uma questão de considerávelimportância prática em análise deagrupamentos é a construção de umasub-álgebra a partir de um subcon-junto de elementos de uma álgebrade Boole. O mais interessante é aconstrução de uma sub-álgebra e adeterminação do limiar de distânciaque a caracteriza. Mais precisamen-te, dada uma álgebra de Boole B eum A Í B, encontrar uma álgebra deBoole C, tal que A Í C Í B.

O problema que surge de ime-diato é qual deve ser o tamanho deC. Poderíamos pensar num primeiromomento que C deve ser a menorpossível, mas isto não parece ser umaboa idéia em análise de agrupamen-tos. Quando pretendemos selecionarum agrupamento, queremos reuniros objetos próximos, ou seja, delimi-tar uma região do espaço de carate-rísticas. Desta maneira, se um objetoz fica entre outros dois objetos x e yque pertencem a um agrupamento G,seria desejável que z também perten-ça a G. Por este motivo definimos:

Definição 5.1 - Dada umaálgebra de Boole B, dizemos que umasub-álgebra A Í B é densa sse para x,y ∈ A, se z ∈ B, x ≤ z ≤ y, então z ∈A. Neste sentido, procuramos pelamenor sub-álgebra C densa tal que AÍ C Í B. Continuamos interessadossó em conjuntos finitos e, por isso,vamos supor que B é finita. Por

conseguinte, também A é finito epodemos escrever A = {a0 , a1 , ...,an} . Existem duas maneiras fáceis derealizar esta construção. Na primeira,determinamos primeiro o limiar dedistância ε:

Ou seja, o limiar é o supremodas distâncias entre os elementos.Sejam A, B e ε como acima e defini-mos C = = {x ∈ B : d(a0, x) ≤ε}. Então temos:

Proposição 5.1a) C é uma sub-álgebra de B, tal queA Í C Í B.b) VA = 1C e ÙA = 0C.c) C é a menor sub-álgebra densa deB, tal que A Í C Í B.

Demonstração: para a), usa-mos a Proposição 4.2, e vemos queC é uma álgebra de Boole. Para verque A Í C, sejam x, y ∈ A e supo-nha, sem perda de generalidade, quex, y ¹ a0. Por definição de , te-mos a0 D x ≤ ε e a0 D y ≤ ε, peladefinição de ε. Portanto, temos quex, y ∈ = C.

Para b), precisamos de um ar-gumento por indução, mas só vamosindicar o raciocínio fundamental.Pela Proposição 4.2, temos que 1C =a0 Ú ε. Para cada termo disjuntivode ε temos a0 Ú (a0 D ai) = a0 Ú ((a0Ù -ai) Ú (-a0 Ù ai)) = a0 Ú ai. Serepetirmos este argumento para to-dos os termos da definição de ε, te-mos VA = 1C. Procedemos de ma-neira análoga para ÙA = 0C.

Para c), vejamos primeiro queC é densa. Se x, y ∈ C e z ∈ B, x ≤z ≤ y, temos que z = z Ú x e z = z Ùy. Por uma parte, temos a0 Ù -z = a0Ù -(z Ú x) = a0 Ù -xÙ -z ≤ a0 Ù -x, epor outra parte -a0 Ù z = -a0 Ù y Ù z≤ -a0 Ù y. Destas duas desigualda-des, temos a0 D z = (a0 Ù -z) Ú (-a0Ù z) ≤ (a0 Ù -x) Ú (-a0 Ù y) ≤ (a0 Dx) Ú (a0 D y) ≤ ε.

Para ver que C é a menor sub-álgebra densa, seja C´ sub-álgebradensa tal que A Í C´ Í B. Para umargumento pelo absurdo, suponhaque existe x ∈ C, x Ï C´. Por C´ ser

sub-álgebra, 0C, 1C ∈ C´. Como x∈ C, temos que 0C ≤ x ≤ 1C, e pordensidade de C´, temos que x ∈ C´,uma contradição.

A segunda construção começadeterminando os máximo e mínimoda sub-álgebras, em lugar do limiarde distância. Novamente, definimos

VA = 1C e Ù A = 0C e C = {x ∈ B :0C ≤ x ≤ 1C. Depois definimos ε =0C D 1C.

Com estas definições, temos:Proposição 5.2 - Se x, y ∈ C,

então x D y ≤ ε.Demonstração: Sejam x, y ∈

C. Por definição de C, temos x ≤ VAe y ≥ ÙA. Deste último, obtemos- y ≤ - ÙA e então x Ù -y ≤ VA Ù-ÙA. De modo análogo, temos -x Ùy ≤ -VA Ù ÙA e logo x D y ≤ VA DÙA = ε.

6. Aplicações

A motivação inicial deste de-senvolvimento foi a aplicação de ál-gebras de Boole produto para codifi-car seqüências de bits, mas a genera-lização apresentada aqui permite aformulação e aplicação de agrupa-mentos em outras álgebras de Boole.

Vejamos primeiro as aplicaçõesdiretas em álgebras de Boole produ-to codificando seqüências de bits. Osmétodos habituais de análise de agru-pamentos utilizam distâncias valora-das em reais, de modo que ou bemnão se procura pela distância, pois éestabelecida no início, ou esta pro-cura é muito simples, pois se trata deacrescentar ou diminuir um númeroreal. Quando usamos as distânciasvaloradas em álgebras de Boole a si-tuação é totalmente diferente. Nestecaso a procura pelo limiar de distân-cia deve ser feita em cada dimensão,de modo que representa o passo maiscomplexo no processo de agrupamen-to dos elementos. Em tal sentido se-rão apresentados dois exemplos: umem álgebras de Lindenbaum finitas eoutro em álgebra de conjuntos.

Para a aplicação dos resultadosobtidos em álgebras de Lindenbaumfinitas, observamos que essas álgebras

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40 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

têm sempre cardinalidade 2 , sendon o número de variáveis proposicio-nais da linguagem. Isto implica queteremos álgebras produto sem umaálgebra de Lindenbaum que seja iso-morfa. Para toda álgebra de Linden-baum finita existe um isomorfismocom uma álgebra produto que con-siste em atribuir a cada classe de fór-mulas a seqüência de 0 e 1 que resul-ta da sua tabela de verdade. Isto éaplicável, por exemplo, se possuirmosum conjunto inconsistente de pro-posições e querermos encontrar sub-conjuntos consistentes. Usando essatradução, podemos aplicar métodosde agrupamentos na álgebra produtopara encontrar esses subconjuntos.

Na realidade, o isomorfismoassinalado permite uma escolha en-tre métodos conhecidos de agrupa-mentos na álgebra produto e méto-dos dedutivos na álgebra deLindenbaum. Por uma parte, a im-plementação de agrupamentos emálgebras produto utiliza seqüências debits e, por isso, é muito simples, dei-xando as complicações do lado dosmétodos de agrupamentos. Por ou-tra parte, as álgebras de Lindenbaumpossibilitam o tratamento de proble-mas cuja complexidade implicaria umtempo de computação além das pos-sibilidades atuais. Por exemplo, num

caso de informação muito esparsa, onúmero total de seqüências pode nãoser muito grande, mas o comprimen-to das seqüências sim, de modo quea implementação dessas seqüênciasseja muito difícil ou até impossívelpara um tempo razoável de compu-tação. Entretanto, fazendo a tradu-ção para uma álgebra de Lindenbaumadequada, isto pode mudar drastica-mente: uma álgebra de Lindenbaumde 30 variáveis corresponde a seqüên-cias de, aproximadamente, um bilhãode bits. Eu penso que a conuência demétodos dedutivos e de agrupamen-tos pode apresentar logo resultadossurpreendentes.

O segundo exemplo corres-ponde às álgebras de conjuntos. Dadaqualquer álgebra de conjuntos fini-ta, construímos o isomorfismo damaneira habitual: a partir do conjun-to de átomos. Este tipo de álgebrasde conjuntos é usada, por exemplo,na classificação baseada em conjun-tos de objetos. Desta maneira pode-ríamos usar seqüências de bits para otratamento de agrupamentos formu-lados numa álgebra de conjuntos.

7. Conclusões

O uso de distâncias valoradasem álgebras de Boole parece esten-

der continuamente o seus horizon-tes, tanto no que se refere a aplica-ções, como na formulação matemá-tica rigorosa.

As álgebras de Boole nasceramcom a lógica matemática e parecemser o tipo de estrutura mais adequa-da para muitos problemas relaciona-dos ao tratamento da informação:começando por ser álgebras dos con-ceitos no trabalho original de G.Boole, parecem estar evoluindo auma matemática da informação. Nes-te sentido, a área de reconhecimentode padrões e de agrupamentos siste-matiza um enfoque de importânciacrescente no processamento de infor-mação e as álgebras de Boole nãopoderiam estar ausentes.

Comparadas com medidasvaloradas em reais, o desen-volvimento apresentado aqui apa-renta uma maior complexidade numprimeiro momento, mas logo mostrarelações matemáticas bem definidasque facilitam enormemente otrabalho. Os resultados mostradosaqui pretendem ser uma contribuiçãoneste caminho.

Carlos G. González é professordoutor em Lógica pela Unicamp, autorde artigos em revistas internacionais eprofessor do IMAPES

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 41

No Brasil, atualmente, a gran-de dificuldade de se encontrar oumanter-se em um emprego, seja pelafalta de capacitação, redução nos qua-dros de funcionários de várias empre-sas e, muitas vezes, problemas com aidade — pois hoje quem tem 40 anosde idade já é considerado “velho” parao mercado de trabalho —, leva mui-tas pessoas a montar seu próprio ne-gócio. Contudo, é muito difícil con-seguir crédito junto aos bancos tra-dicionais no Brasil, principalmentequando o interessado é um micro oupequeno empresário.

Conforme informações do Ser-viço de Apoio às Micro e PequenasEmpresas (Sebrae), apenas 10% dosfinanciamentos concedidos são des-tinados às Micro, Pequenas e MédiasEmpresas (MPMES), representandomíseros R$ 3 bilhões de um PIB quesoma mais de R$ 1,1 trilhão.

Quando há abertura de crédi-to, principalmente, para as Micro ePequenas Empresas (MPEs), normal-mente exige-se algum curso de qua-lificação, como, por exemplo, o Bra-sil-empreendedor. O futuro tomadorde empréstimo deve fazer um cursono Sebrae e, após a conclusão, pode-rá dar entrada no seu pedido juntoao Banco do Brasil, pois a conclusãodesse curso é fundamental para par-ticipar do processo de concessão decrédito.

Os bancos relutam em conce-der créditos às MPEs, pois não con-seguem ter históricos desses tipos deempresas, dificultando sobremanei-ra a concessão.

Nesse momento, entra em cenao microcrédito, que é a concessão de

Microcrédito: umasolução para a crise

Adilson Rocha*

empréstimos de baixo valor a peque-nos empreendedores informais e mi-croempresas sem acesso ao sistemafinanceiro tradicional, principalmen-te por não terem como oferecer ga-rantias reais (penhor, hipotecas e alie-nação fiduciária). É um crédito des-tinado à produção (capital de giro einvestimento) e é concedido com usode metodologia específica.

O microcrédito teve início emBangladesh, a partir de 1976, quan-do o professor universitário Muham-mad Yunus comprovou ser possível erentável entregar pequenas quantiasa empreendedores, sob a forma deempréstimo bancário baseado apenasna confiança pessoal de cada toma-dor.

“O ano de 1974 marcou-mecomo nenhum outro. Foi o ano daterrível fome que se abateu sobreBangladesh.

“A impressa publicava reporta-gens terríveis, divulgando o númerode mortos e de desnutridos nas al-deias distantes e nas capitais regionaisdo norte (...)

“(...) Comecei, pois, a visitarfamílias de Jobra para ver se podiaajudá-las diretamente de algummodo...” (YUNUS, Muhammad &JOLIS, Alan. O banqueiro dos pobres,1997).

Após o professor Yunus con-versar com uma moradora da cidadede Jobra, Sufia Begum, ele vislum-brou que, com pouco dinheiro, amoradora e outras famílias poderiamcomprar insumos para produzir seuspróprios produtos, e conseguiriampagar esse pequeno empréstimo emdia.

Assim, o professor Yunus em-prestou US$ 27,00 para 42 pessoastrabalhadoras e saudáveis, e elas o re-embolsariam quando estivessem emcondições de fazê-lo.

Entretanto, ele percebeu quecom aquela atitude a solução era,apenas, pessoal, e que obedecia a umalógica puramente emocional.

Para tentar resolver esse proble-ma, o professor Yunus procurou ogerente de um banco comercial.

Contudo, o professor teveuma grande decepção, pois tanto ogerente quanto o diretor do bancoriram de tal pedido, alegando que obanco emprestava dinheiro pararecebê-lo de volta, acrescidos dos ju-ros, e não iriam emprestar para ospobres, pois eles não sabem econo-mizar, têm o hábito de consumir tudoe preferem trabalhar para o patrão.

O professor Yunus, então, ci-tou as mulheres como excelentescumpridoras dos seus compromissos.Porém, ainda sem êxito, e, “(...) con-forme o diretor do banco, a religião(muçulmana) e a tradição têm tanta

Microcrédito é aconcessão de

empréstimos debaixo valor a

pequenosempreendedores

informais emicroempresassem acesso ao

sistema financeirotradicional

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42 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

As micro,pequenas e

médias empresasrepresentam cercade 98% do total

de empresasexistentes

no Brasil, erespondem porcerca de 60%dos empregos

gerados

influência sobre os pobres (sobretu-do as mulheres) que os impedem deevoluir; as mulheres não poderãoconservar seu empréstimo ou sua ren-da, pois seus maridos as torturarãoaté a morte se for preciso, para lhesextorquir o dinheiro e, também, a ex-tensão do crédito para as mulheresperturbará o papel tradicional da mu-lher na família, como também a suarelação com o marido.” (Op. cit.).

Diante de todo esse panoramanegativo, o professor Yunus criou obanco Grameen.

“(...) foi então que tudo come-çou. Eu não tinha absolutamente in-tenção de me converter em credor;queria apenas resolver um problemaimediato. Até hoje considero quemeu trabalho e de meus colegas doGrameen tem um único objetivo: porfim à pobreza, esse flagelo que hu-milha e denigre tudo o que um serhumano representa.” (Op. cit.).

No Brasil, o Banco Nacionalde Desenvolvimento Econômico eSocial (BNDES)

tem como uma de

suas ações prioritárias promover ocrescimento das micro, pequenas emédias empresas do setor industrial,de infra-estrutura, de comércio eserviços e agropecuário, tendo emvista o seu papel na geração emanutenção de postos de trabalho(www.bndes.gov.br).

As micro, pequenas e médiasempresas representam cerca de 98%do total de empresas existentes noBrasil, respondem por cerca de 60%dos empregos gerados e participamcom 43% da renda total dos setoresindustrial, comercial e de serviços.

As micro e pequenas empresasrespondem por cerca de 2% do totaldas exportações do país. Em conse-qüência, e considerando que uma dasprioridades da economia é o incre-mento das exportações, o BNDESapóia a ampliação da base dessas em-presas voltadas à exportação. Em1998, o BNDES desenvolveu umametodologia para a formação de agen-tes de crédito, sistematizada ao lon-go de treze oficinas de capacitaçãodesses profissionais. A qualidade deste

produto obteve o reconhecimentogeral demonstrado por sua utilização,por diversas entidades, no treinamen-to de agentes para as instituições mi-crofinanceiras. A sistematização des-sa metodologia, que se encontra dis-ponível no Banco para quem se inte-ressar pelo tema, deu-se no âmbitodo Programa de Crédito ProdutivoPopular - PCPP, pelo qual, essencial-

mente, o BNDES atua como bancode segunda linha, provedor de recur-sos para aquelas instituições.

Um convênio de cooperaçãotécnica firmado entre o BNDES e oBanco Interamericano de Desenvol-vimento (BID) disponibilizou omontante de US$ 5 milhões, nãoreembolsável, para o fortalecimentodas microfinanças no Brasil, sendo60% desse valor para aplicação dire-ta em instituições microfinanceiras.Este convênio deu origem ao Progra-ma de Desenvolvimento Institucio-nal - PDI, pelo qual o BNDES — nalinha da metodologia para a forma-ção de agentes de crédito — está rea-lizando dois conjuntos de investimen-tos estruturantes no segmento micro-financeiro brasileiro.

O primeiro conjunto visa aapoiar o aprimoramento e expansãooperacional de instituições exempla-res, por seu histórico desempenho ouarranjo institucional que lhes deu ori-gem. O segundo conjunto tem comoobjetivo tornar disponível, para omercado em geral, instrumentos ge-renciais e operacionais necessários ao

desenvolvimento institucional dasmicrofinanças, sempre sob a perspec-tiva de sua inserção no sistema finan-ceiro nacional.

Assim, no âmbito do PDI, es-tão sendo desenvolvidos ou aprimo-rados sistemas de informações geren-ciais específicos para instituições mi-crofinanceiras, procedimentos deauditoria (operacional, financeira,contábil e de sistemas), sistemas declassificação (rating) institucional, sis-tema de pontuação de crédito (credit-scoring), além de metodologias, no-vos produtos e um site de microfi-nanças, que inclui vasta bibliotecavirtual.

A geração de trabalho e rendapara as famílias usuárias vem intro-duzindo um papel estratégico para omicrocrédito, com o favorecimentode formas alternativas de ocupação eo aumento da produtividade dos pe-quenos empreendimentos. Tambémé ferramenta importante no proces-so de combate à pobreza, na medidaem que o acesso ao crédito produti-vo contribui para a melhoria da qua-lidade de vida do segmento perten-cente à base da pirâmide econômicae social.

O microcrédito, atualmente, éconcedido no Brasil de várias formas,por meio de ações do Poder Público,da sociedade civil e da iniciativa pri-vada, apresentando diferentes dese-nhos institucionais.

O Poder Público vem atuandocom programas voltados diretamen-te para o tomador de microcrédito,por meio de Bancos oficiais com car-teiras especializadas, a exemplo doprograma Crediamigo do Banco doNordeste, Crédito de Confiança doBanco de Desenvolvimento do Esta-do de Santa Catarina (BADESC) ouatravés de programas conhecidoscomo “Bancos do Povo”, que traba-lham majoritariamente com recursosorçamentários. Há ainda os progra-mas públicos de fomento a institui-ções de microcrédito da sociedade ci-vil e da iniciativa privada.

O microcrédito adota uma me-todologia específica, que consiste,

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 43

primeiramente, na concessão assisti-da do crédito. Ao contrário do queacontece no sistema financeiro tradi-cional, onde existe uma postura rea-tiva (o cliente é que vai até o banco),nas instituições de microcrédito osagentes de crédito vão até o local ondeo candidato ao crédito exerce sua ati-vidade produtiva, para avaliar as ne-cessidades e as condições de seu em-preendimento, bem como as possi-bilidades de pagamento. Após a libe-ração do crédito, esse profissionalpassa a acompanhar a evolução donegócio.

Outro ponto essencial que di-ferencia o microcrédito do créditotradicional são os sistemas de garan-tias, importantes para a cobertura depossíveis inadimplementos. A práti-ca de concessão do crédito tradicio-nal é a exigência de garantias reais.O microcrédito adota sistemas degarantias mais próximos das condi-ções sócio-econômicas dos pequenosempreendedores, cuja ausência debens para oferecer como garantia realé compensada pelo capital social dacomunidade (relações de confiança,reciprocidade e participação).

Dessa forma, as garantias po-dem ser oferecidas: individualmen-te, com o tomador indicando umavalista/fiador; ou coletivamente, pormeio de aval solidário, que consistena formação de grupos, geralmentede três a cinco pessoas, em que cadaum é, ao mesmo tempo, tomador docrédito e avalista dos demais.

Atualmente, o microcrédito évisto como uma parte, a mais impor-tante, da nascente indústria microfi-nanceira, que se define como umconjunto de serviços financeiros pos-tos à disposição da população de bai-xa renda.

Conforme o Instituto Brasilei-ro de Geografia e Estatística (IBGE),existem hoje no Brasil cerca de 3,5milhões de empresas de micro e pe-queno porte, que representam 98%de todo o empresariado do país. Elasgeram, aproximadamente, 35 mi-lhões de empregos, entre os funcio-nários das MPEs e os de “conta pró-

pria” (indivíduos que possuem seupróprio negócio, mas não têm em-pregados). As MPEs voltadas paraatividades industriais de exportaçãosomam quatro mil empresas.

Para incentivar o crescimentode micro e pequenos empreendimen-tos, o Banco Central regulamentou aformação das Sociedades de Créditoao Microempreendedor (SCM). Oobjetivo é a concessão de crédito apessoas físicas ou jurídicas classifica-das como microempresas, cujo fatu-ramento anual seja inferior a R$ 244mil. O valor máximo a ser financia-do pelas SCMs é de R$ 10 mil.

Segundo pesquisa da consulto-ria americana Development Alter-natives Inc. (DAI), encomendada noâmbito do convênio do Banco Nacio-nal de Desenvolvimento Econômicoe Social (BNDES) com o Banco In-teramericano de Desenvolvimento(BID) para microfinanças, a regiãobrasileira mais atendida é o Nordes-te, com 5%. Em complemento à pes-quisa, também se conclui que o mi-crocrédito atende somente 2% dademanda no Brasil.

A DAI estima que haja 16,4milhões de microempreendedores no

Brasil, dos quais 8,2 milhões teriamcondições e interesse em fazer opera-ções de microcrédito.

Existem várias instituições demicrocrédito na maioria dos estadosbrasileiros. Em São Paulo, é chama-do de Banco do Povo Paulista.

Através da parceria entre o

Governo do Estado de São Paulo e asprincipais prefeituras municipais doEstado, surgiu o Banco do Povo Pau-lista, ainda na época do governadorMário Covas. O Banco do Povo Pau-lista é um programa de financiamen-to para microempreendedores, for-mais e informais, que têm dificulda-de para obter crédito.

O Banco do Povo Paulista fa-cilita o acesso ao crédito aos em-preendedores de micro e pequenosnegócios, com firma aberta ou não.Ele atua através dos agentes de crédi-to que coletam informações sobre osclientes e suas necessidades e enca-minham seus pedidos de financia-mento para um Comitê de CréditoMunicipal, composto por represen-tantes da Prefeitura Municipal, daSecretaria da Relação do Trabalho(SERT), da Comissão Municipal doTrabalho e da Nossa Caixa. Cabe aoComitê aprovar, ou não, as solicita-ções, segundo critérios técnicos.

Conforme os agentes de crédi-to do Banco do Povo Paulista de So-rocaba, os maiores problemas detec-tados são: grande quantidade de pes-soas, porém em busca, somente, dedinheiro para pagar dívidas; encon-trar avalistas com renda comprova-da; três orçamentos do bem deseja-do; nome constando na Centraliza-ção de Serviços dos Bancos (Serasa) eno Serviço de Proteção ao Crédito(SPC) e inadimplemento em tornode 1% ao mês — que é consideradoum pouco elevado, já que a média éde 0,40% ao mês nas demais insti-tuições de microcrédito, que tambémapresentam uma quantidade de to-madores maior.

Para ilustrar, segue abaixo aPolítica de Crédito sintetizada ado-tada pelo Banco do Povo Paulista eque, na maioria das vezes, é utilizadapelas demais instituições de micro-crédito, diferenciando-se por sua lo-calização e características peculiaresda praça.

A quem se destina o crédito

O crédito destina-se às pessoas

O microcréditoadota sistemasde garantias

mais próximosdas condições

sócio-econômicas

dos pequenosempreendedores,

valendo-se docapital social da

comunidade

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44 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

jurídicas e pessoas físicas que traba-lhem por conta própria ou tenhamalguma fonte que contribua para arenda familiar, e que tenham baixarenda, e às cooperativas ou órgãos deassociação que sejam legalmenteconstituídas e associem o trabalho aempreendimento.

Exigências

• Estar produzindo, no muni-cípio, há mais de seis meses, no setorformal ou informal;

• Residir ou ter negócios hámais de dois anos no município e terendereço fixo;

• Ter o nome limpo no Serviçode Proteção ao Crédito (SPC) ou noSerasa;

• Ter um ganho bruto menorque R$ 87.300,00 nos últimos dozemeses;

• Avalista (pessoa física sem res-trições no SPC ou Serasa);

• Garantias reais: alienaçãofiduciária de 100% dos bens finan-ciados.

O Banco do Povo Paulista foiinstituído no Estado de São Paulopela Lei nº 9.533, de 30 de abril, re-gulamentada pelo Decreto Estadualnº 43.283, de 3 de julho de 1998, eé composto pelos seguintes órgãos:

1. Conselho de Orientação doFundo - COF, onde são deliberadasas condições comerciais e administra-tivas do Banco do Povo Paulista, cons-tituído pelo:

• Secretário dos Negócios daFazenda - presidente;

• Secretário do Emprego eRelações do Trabalho - vice-pre-sidente;

• Secretária de Economia e Pla-nejamento do Estado de São Paulo;

• Banco Nossa Caixa S.A.;• Presidente da Comissão Es-

tadual de Emprego de São Paulo;• Sebrae/SP - Serviço Brasilei-

ro de Apoio às Micro e PequenasEmpresas de São Paulo;

• SIMPI — Sindicato das Mi-cro e Pequenas Indústrias.

• Grupo Executivo de Crédito

- GEC, encarregado de executar asdeliberações de crédito, constituídopor:

• Diretoria Executiva;• Diretoria Adjunta;• Gerência de Implantação;• Gerência de Controle Finan-

ceiro;• Gerência de Desenvolvi-

mento;

• Gerência de Operação;• Coordenadoria Adminis-

trativa.2. Unidades de Crédito Mu-

nicipais - UCM’s, que são os Bancosdo Povo dos municípios, constituí-dos pelos agentes de crédito e Comi-tês de Crédito Municipais.

Deveres da parceria

Estado:• 90% dos recursos do Fundo

para empréstimo;• Treinamento permanente dos

Agentes de Crédito;• Gerenciamento (implanta-

ção, supervisão, controle financeiro).

Município:• 10% dos recursos do Fundo

para empréstimo;• Cessão de funcionários para

exercerem a função de agentes de cré-dito;

• Infra-estrutura: local, mobi-liário, microcomputador, telefone,Internet e transportes. Agentes de

crédito para efetuar as visitas aosclientes; ações de divulgação doproduto no município.

Valores de financiamento (base de-zembro/2002)

• Pessoa Física ou pessoa jurí-dica: de R$ 200,00 até R$ 5.000,00;

• Cooperativas e Associações:de R$ 200,00 até R$ 25.000,00, li-mitado ao máximo de R$ 5.000,00por associado, se o total de sócios formenor que cinco;

• Os cheques do financiamen-to são nominais aos fornecedores dostomadores do microcrédito.

Encargos de financiamento

• Taxa de juros: 1,0% ao mês;• Juros pré-fixados cobrados

mensalmente sobre o saldo devedor.A taxa de juros pode ser alterada semprévio aviso, não afetando, porém, oscontratos de financiamento em vigor.

O que é financiável

• Capital de giro: compra demercadorias e matérias-primasindustrializáveis, e compra de máqui-nas e equipamentos;

• Investimento fixo: aquisiçãode máquinas, equipamentos e ferra-mentas.

O que não é financiável

• Aquisição de insumos para osetor agropecuário (sementes, fertili-zantes, animais, etc.);

• Pagamento de dívidas;• Aquisição de veículo de pas-

seio;• Atividades ilegais (por exem-

plo: comercialização de produtoscontrabandeados, fabricação e co-mercialização de produtos com mar-cas pirateadas, itens que firam as leisambientais, entre outros).

Prazos de financiamento

• Capital de giro: prazo de um

O Banco doPovo Paulista,instituído em

1998, facilita oacesso aocrédito aos

empreendedoresde micro epequenos

negócios, comfirma

aberta ou não

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 45

até seis meses, com prestações men-sais fixas;

• Investimento fixo: prazo deum até dezoito meses, com prestaçõesmensais fixas.

O que fazer para se candidatar a umfinanciamento

• O primeiro passo do candi-dato a um financiamento é verificarse atende aos itens “A quem se desti-na o crédito”, “O que é financiável”e “O que não se pode financiar”;

• O próximo passo é contatarum agente de crédito na UnidadeMunicipal de Crédito do Banco doPovo Paulista e solicitar uma visitatécnica;

• O agente de crédito irá até olocal de trabalho para conhecer me-lhor o candidato ao negócio e obteras informações necessárias para for-malizar a solicitação de crédito;

• Se a solicitação de crédito foraprovada pelo Comitê de CréditoMunicipal, a agência da Nossa CaixaS.A. do município irá processar ocontrato;

• O agente de crédito irácomunicá-lo sobre a data para assi-natura do contrato e a formalizaçãodas garantias na agência do BancoNossa Caixa S.A. (a partir daí o che-que nominal ao fornecedor será dis-ponibilizado rapidamente).

Documentos necessários

• Para empresas registradas

1. Contrato Social e alterações;2. Cartão CNPJ, Inscrição Es-

tadual e Municipal;3. Carteira de Identidade e

CPF dos sócios e dos cônjuges;4. Comprovante de residência

dos sócios;5. Três orçamentos do bem a

ser financiado.

• Para quem trabalha por conta pró-pria (negócios não registrados)

1.Carteira de Identidade e CPF

dos sócios e dos cônjuges;2.Comprovante de residência

dos sócios;3.Três orçamentos do bem a ser

financiado.

• Para Avalistas1. Carteira de Identidade e

CPF dos avalistas;2. Comprovante de residência;3. Comprovante de rendimen-

tos.

Contra a exclusão

Em 2001 foram destinados re-cursos de R$ 35 milhões (www.emprego.sp.gov.br).

O microcrédito ou crédito po-pular é, assim, uma das grandes al-ternativas para ajudar nesta luta con-tra o crescimento do número de ex-cluídos sociais. Permite diminuir ogrande número de pessoas que vivemà margem da economia formal, umdesafio que preocupa até mesmo na-ções como os Estados Unidos e, prin-cipalmente, os países em desenvolvi-mento.

Por todo o mundo multipli-cam-se as experiências bem sucedi-das com o microcrédito e, principal-mente, nos países do terceiro mundoe nos países desenvolvidos, que ain-da possuem camadas da população vi-vendo na pobreza.

Num país como o Brasil, emque aproximadamente 30% dos ha-bitantes possuem conta bancária,

uma ampla parcela da população estáao largo da produção e do consumo,o que faz com que pouco mais de20% dos brasileiros tenham acesso àslinhas de crédito tradicionais. Sãopessoas que, no entanto, não deixamde ter suas alternativas de renda, al-gumas das quais bons negócios quesó não se desenvolvem mais por faltade dinheiro para investir em equipa-mentos e outros fatores que um bomnegócio exige.

O microempreendimento noBrasil representa mais de 70% dosestabelecimentos de comércio e ser-viços.

Estima-se que 25% da popu-lação ativa, ou 12,5 milhões de pes-soas, tenham como fonte de traba-lho e renda o pequeno empreendi-mento. São projetos tocados com gar-ra por pessoas geralmente de baixaescolaridade que, por não conhece-rem a fundo as regras de mercado,correm o risco de quebrar.

Com os desafios e crises da eco-nomia atual, o microcrédito vem ga-nhando fôlego junto a esses empreen-dedores. Graças a esses financiamen-tos, empresas informais e trabalhado-res autônomos ganham garantias decontinuidade, com a perspectiva deinvestir no próprio negócio. Acabamgerando renda para si e levando con-sigo mais trabalhadores, pois cadapessoa que recebe o microcrédito,teoricamente, pode empregar pelomenos mais um trabalhador em seuprojeto. Entretanto, muitas pessoasdesconhecem ou até mesmo nem sa-bem, de fato, qual é a fundamentalidéia e a importância que o micro-crédito pode ter em suas vidas.

Enfim, acreditando na capaci-dade, perseverança e força do nossopovo brasileiro, pode-se vislumbrarum futuro mais próspero, restauran-do a dignidade, confiança e acima detudo, construindo um país mais jus-to para nós e nossos filhos.

* Adilson Rocha é mestre em Adminis-tração e leciona Teoria e Prática Cam-bial e Economia Internacional no cur-so de Comércio Exterior do IMAPES

Num paíscomo o

Brasil, em queaproximadamente

30% doshabitantes

possuem contabancária, umaampla parcela

da população estáao largo da

produção e doconsumo

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46 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

A libertação pela palavraMiriam Cristina Carlos Silva*

Escrever um texto, em qual-quer modalidade, desde uma redaçãopara um exame vestibular a um pe-dido de emprego, tem sido, para inú-meras pessoas, um enorme sacrifício.

É cada vez maior o número deestudantes que, mesmo recorrendo alivros, publicações alternativas, facil-mente encontradas em bancas de re-vistas, e até a professores particula-res, sem encontrar soluções efetivas,que não as “fórmulas” mágicas e es-quemas, acabam rendendo-se à incu-rável síndrome do pavor desencadea-da por uma folha branca.

O medo produzido pela inca-pacidade na escrita vem movimentan-do lucros razoáveis para editoras. Em-bora todo ano tenhamos uma enor-me série de títulos promissores, a es-crita não se desenvolve. Pouco terãoa dizer esses jovens, adultos, crian-ças? Tão pequeno será, assim, o seumundo, a tal ponto que não chegariaa preencher dois parágrafos? Nãoacreditamos.

O que poderia ser a causa des-sa enorme dificuldade de se expres-sar pela escrita? Arriscaríamos a apon-tar diversos fatores. Em primeiro lu-gar, a falta de duas práticas: a da pró-pria escrita e a da leitura. Tudo aqui-lo que é pouco praticado tende a atro-fia. Quanto mais escrevermos, me-lhor se tornará o nosso texto.

Por meio da leitura, tomamoscontato com a palavra em sua dimen-

RESUMO

A leitura e a escrita, muito maisdo que atividades obrigatórias e trau-máticas, podem e devem ser ativida-des prazerosas. Este texto procuraapontar para o aprendizado da escritacomo um instrumento comunicativoprático de sua dimensão e, especial-mente, na dimensão lúdica.

são gráfica, sendo a forma mais efi-ciente de incorporarmos a ortografiae a sintaxe oficial, desde que, é óbvio,realizemos boas leituras. Boa leituraseria aquela relativa aos autores quefazem um uso criativo e correto daLíngua Portuguesa e que, sobretudo,além de respeitarem as regras da gra-mática oficial, primam pela coesão ecoerência do texto.

Comunicar é o primeiro eprincipal objetivo da linguagem. Adificuldade está em conseguir umacomunicação da mensagem de forma,além de clara e eficiente, correta,considerando-se a norma padrão dalíngua, o que passa a ser mais um pro-blema ao analisarmos que a língua emquestão é marcada pelo mito de“difícil”, “quase impossível”, “com-plexa esfinge”, mito este criado emvirtude do “fosso entre aquilo quequerem impor de cima para baixocomo ‘português correto’ e o que opovo efetivamente usa, tanto oralquanto graficamente, tanto no casodas pessoas cultas quanto no dasanalfabetas” (Couto, 1986:8), ou seja,“a norma estabelecida pelos gra-máticos se distancia cada vez mais darealidade concreta lingüística do país”(ibidem).

Como tomar contato com anorma culta, já que não existe leitu-ra? E como estimular essa leitura, ins-trumento mediador entre a norma ea informalidade?

As escolas parecem contribuirainda mais para formar uma verda-deira aversão aos autores considera-dos “mestres da língua”, quando obri-gam a leitura de obras para as quaisos alunos não estão preparados, mui-tas vezes destruindo, através de umJosé Saramago solicitado para o ves-tibular, um futuro leitor de José Sa-ramago. Há, portanto, que se adequara indicação de leituras ao contextopessoal do aluno, que, em geral, é oúltimo que fala e o primeiro que apa-nha.

O ensino da gramática parecedificultar o aprendizado da língua eaumentar a distância entre o que sefala e o que se deveria escrever. A di-nâmica do cotidiano leva poucas pes-soas à procura de um livro, o quetorna essa distância ainda maior. Ostelejornais são mais procurados doque a imprensa escrita. Assistir a umfilme é mais cômodo e exige menostempo do que a leitura de um livro.As revistas privilegiam cada vez maisos aspectos visuais de suas publica-ções, em detrimento dos aspectos ver-bais. Podemos afirmar que, para a as-similação da gramática, é necessáriose criar um contexto para a sua apren-dizagem. Não podemos esquecer deque ela está naturalmente na língua,e não é uma criação de regras e nor-mas extralingüísticas.

Muitos esperam que o alunoparta do pressuposto de que a gra-mática serve para normatizar, mas es-quecemos de prever que a língua édinâmica, se transforma diariamentee ela é que faz surgir a gramática. Umagramática ditadora, que impõe regras

O ensino dagramática parece

dificultar oaprendizado da

língua e aumentara distância entre oque se fala e o que

se deveriaescrever. Além

disso, a dinâmicado cotidiano levapoucos à leitura

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 47

e mais regras, sem se instrumentali-zar e levar em conta a constante trans-formação do organismo vivo que é alinguagem, desconsiderando o uni-verso de interesses do aluno, só é vá-lida para as línguas mortas, e estamosensinando pessoas a escrever, não mú-mias, como alerta, em obra citadaneste artigo, analisando o texto “Ogigolô das palavras”, de Luís Fernan-do Veríssimo, professor Celso PedroLuft.

Além desses fatores, há ainda aquestão da “falta de leitura de mun-do”. Para escrever é necessário viver.O quanto temos vivido nós, seres pós-modernos? É evidente a corrida de-senfreada em busca de objetivos mui-tas vezes indefinidos e vagos. O tem-po parece encurtar mais e mais. Aobservação se torna cada vez maisescassa. Como escrever, se não obser-vamos? Através da escrita, colocamosa público nossas opiniões, nossa ima-ginação, frutos de nossa vivência.Como escrever sobre o que não vive-mos? Como escrever sobre o que so-mos incapazes de imaginar? Comoescrever sobre o que não ponderamos,obtendo diversas opiniões e confron-tando-as, a fim de formar as nossas?

Se é no ato de escrever que ex-ternamos nossas opiniões, nossa ima-ginação, nossas observações, como ofazer, se passamos pelo mundo semnos envolver com as experiências queele nos oferece? E como escrever se,ao invés de enxergar, apenas passar-mos o olhar pelas coisas, sem as ab-sorver e digerir?

Poderíamos juntar, ainda, a es-tes fatores básicos, uma série de mui-tos outros, evidentes, extremamentedebatidos entre educadores, mas atéagora não solucionados: a deficiên-cia da formação de professores e es-tudantes; a falta de modernização dasescolas e dos métodos de ensino; oenorme abismo entre a língua oral ea escrita, que é incapaz de acompa-nhar o dinamismo e as transforma-ções que os falantes imprimem à ora-lidade, modificações estas aceleradascom a intervenção das gírias, erros emodismos levados todos os dias à

grande maioria da população brasi-leira através da televisão. Diante des-tes apontamentos, dirão os céticos:não há solução. A escrita e os livrosestão fadados ao esquecimento. É aera do homem visual, do dinamismo,da linguagem dos gestos e das rou-pas. Expressar uma idéia já não re-quer a palavra. Será?

Acreditamos ser um poucocedo para dar nota de falecimento àlinguagem verbal.

É certo que as linguagens vi-suais e as linguagens intersemióticastêm atraído um número enorme dedefensores e adeptos. Diversos auto-res já não acreditam na linguagemescrita como a melhor forma de co-municação. Poetas como ArnaldoAntunes têm apelado para diversasformas alternativas de fazer poesia,buscando, com isso, atrair um públi-co quase indiferente. É certo que aslinguagens visuais, as sonoras e asintersemióticas são eficientes meiosde comunicação, e como toda lingua-gem, podem resultar na mais elabo-rada produção humana, que é a ma-nifestação da arte. Porém, emboracomuniquem, são processos únicos,que não substituem e nem podem ser

substituídos pela linguagem verbal.Os processos cognitivos gerados pe-las diversas linguagens são mecanis-mos que se acionam de maneiras di-versas em cada uma delas. Exem-plificando: não podemos considerarem hipótese alguma que ver ao filme

“O nome da Rosa” e ler a obra deUmberto Eco sejam a mesma ativi-dade. Não são. Ler Guimarães Rosaé uma experiência única, jamais com-parada ao ato de assistir ao seriado“Grande Sertão: Veredas”. Comocomparar a perplexidade, a surpresailimitada de desvendarmos uma Dia-dorim mulher, à grotesca masculini-zação de uma Diadorim que se sabesempre e todo o tempo Bruna Lom-bardi? No filme, temos a facilidadede encontrar personagens e situaçõesacabados, e a imaginação pode soltarasas, mas não voará tão alto quantono processo de construção de ima-gens, que é acionado através da lei-tura. A linguagem verbal nos dá essemaravilhoso privilégio de intervir naobra do autor. Construímos um diá-logo com aquele que pensou por pri-meiro a trama, que nos leva a viajarcom ele, interferindo nessa viagem,mesmo que esse autor não saiba. Atra-vés da leitura, dialogamos com a his-tória, a cultura, a forma de pensar eencadear idéias de diversos autoresdas mais diversas nacionalidades etempos. Essa é, além de todos os ou-tros fatores já citados, uma experiên-cia fundamental para o desenvolvi-mento da nossa capacidade de escre-ver. Isso é o que chamaríamos da di-mensão lúdica da linguagem verbal,ou seja, o poder que a linguagem ver-bal tem de desencadear a nossa ima-ginação, a nossa criatividade. É atra-vés dessa dimensão que podemos via-jar em variados universos, conhecerespaços e culturas, mesmo que nãofaçamos o menor esforço para sair dolugar. O único esforço está em virarpáginas e movimentar os olhos. Semcontar que o livro pode ser visto comoum objeto, íntimo, com característi-cas próprias, que pode ser tocado,cheirado e sofrer também ele a nossaintervenção. Escrever em um livro,destacar as partes mais interessantese acrescentar a ele os nossos comen-tários é, sem dúvida, principalmentepara aquelas pessoas que já possuemum hábito de leitura, uma atividadede extremo prazer.

O livro é algo que nos perten-

Como comparar aperplexidade, a

surpresa ilimitadade desvendarmosuma Diadorim

mulher, à grotescamasculinização

de uma Diadorimque se sabe

sempre e todo otempo BrunaLombardi?

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48 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

ce e a ele pertencemos quando nosdeliciamos em sua leitura. Há diver-sas relações travadas com os livros. Olivro emprestado, aquele que nos co-loca em uma tríade: o que se lê, e foipensado por um autor; o que pensa-mos, incitados por concepções deoutra pessoa; aquilo que imaginamoster pensado aquele que nos empres-tou a obra. Temos aqui um debateimaginário, mas estranha e extrema-mente real. Há ainda o livro de bi-blioteca: universo de cheiros e im-pressões digitais, quando paramos eanalisamos quantas mãos o apalpa-ram, quantos olhos deslizaram porsuas páginas, e quantas sensações elepode ter provocado, similares e di-versas às nossas. “Faz parte do ato deescrever o exercício de ler a dimen-são do mundo, a dimensão do eu nomundo, que se quer expressar. Porisso, podemos dizer que escrever é ummodo de viver, é uma liberdade pal-pável através da qual transformamosem algo legível — e assim transmis-sível ao outro, inclusive o que moradentro de cada eu — o conjunto defragmentos de que somos feitos” (Bar-bosa, 1994:11).

Resgatar a dimensão lúdica daleitura e da escrita é o único cami-nho a ser traçado para que estas ati-vidades proliferem e estejam ao ladodas outras linguagens. Para isso, énecessário que os educadores criem,em primeiro lugar, o gosto pela es-crita. Temas pouco atrativos, que setornem uma obrigação, podem frus-trar a vontade de escrever. É necessá-rio aprender a escrever sobre o quenos envolve, sobre tudo o que nosinteressa, para, só depois, escreversobre qualquer tema que nos for apre-sentado. “Quando escrevemos livre-mente estamos, então, esculpindo a

nossa vivência, a nossa experiênciahumana na trajetória de luzes e som-bras que nos vai desenvolvendo, nosvai comprometendo com tudo aqui-lo em que acreditamos” (Barbosa,1994:11). A mesmice de temas que

se repetem ano após ano também éfrustrante. A escrita necessita de umainstigação, não do aborrecimentocausado pelos temas desgastados comos quais o estudante, ainda em for-mação quanto a sua linguagem ver-bal, depara-se. Desenvolver a criati-vidade através de experiências libe-radoras, nas quais busquemos extra-ir o melhor de nós, livrando-nos dacrítica e da censura excessivas, parasó depois realizar um cotejo do tex-to, também pode ser consideradobom caminho. É necessário queaprendamos a brincar com as pala-vras, a jogar com elas, criando neolo-gismos, parafraseando textos e auto-res, colocando nossas emoções e ex-periências no papel.

Uma das barreiras criadas pelaescola à escrita foi torná-la uma ati-

vidade extremamente séria, sisuda.Tudo aquilo que fazemos com pra-zer, fazemos melhor. Há, portanto,que se resgatar o prazer da escrita, oprazer da leitura, o prazer de se co-municar através da palavra, única saí-da para a preservação da linguagemverbal, dando asas a “uma prática semmedo, num ensino sem opressão: nomais íntimo terreno da vida huma-na, que é o da linguagem, onde es-truturamos o mundo em nosso inte-rior e nos ligamos a ele, isso se fazmais que necessário, é vital” (Luft,1984:11). Vital para a escrita. Vitalpara o homem. Assim como o pra-zer, extrema necessidade humana, énecessário promover “debates, estu-dos e pesquisas em busca de refor-mulações, por um ensino que faça oaluno desenvolver-se, não encolherconvencido de que nada sabe” (ibi-dem).

É necessário ter em mente que“a sintaxe é uma questão de uso, nãode princípios” (ibidem). Um ensinolibertador, a libertação pela palavra:será esse o grande objetivo a ser per-seguido em nossas aulas de línguamaterna. Liberto, e consciente de seuspoderes de linguagem, o aluno po-derá crescer, desenvolver o espíritocrítico e expressar toda a sua criativi-dade” (Luft, 1984:110).

Que esse seja o nosso maior ob-jetivo, professores, alunos, escritores:o resgate da dimensão lúdica da pa-lavra, o resgate da liberdade de ex-pressão, único caminho para a cons-trução da igualdade, da crítica, da to-lerância e da felicidade.

* Miriam Cristina Carlos Silvaé mestre em Comunicação e Semiótica,doutoranda na mesma área, graduadaem Letras e professora do IMAPES.

Referências Bibliográficas

BARBOSA, Severino Antônio M. Escrever é desvendar o mundo. Campinas,SP: Papirus, 1994, 9 ed..

COUTO, Hildo H.. O que é português brasileiro. São Paulo: Brasiliense, 1986.

LUFT, Celso Pedro. Língua & Liberdade. Porto Alegre: L&PM, 1985.

SANTAELLA, Lúcia. A assinatura das coisas. Rio de Janeiro: Imago, 1992.

Resgatar adimensão lúdica daleitura e da escritaé o único caminhoa ser traçado para

que estasatividades

proliferem eestejam ao lado dasoutras linguagens.

Para isso, énecessário

que os educadorescriem o gosto pela

escrita

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RESUMO

Falar sobre o vidro e suas apli-cações é sempre gratificante, pois oseu desenvolvimento está relacionadonão apenas com os aspectos tecnoló-gicos como também com boa parte dahistória da evolução do próprio homem.Neste texto, procurou-se destacar al-gumas aplicações importantes dos vi-dros, ressaltando suas característicase composições mais utilizadas.

Vidro: do artesanal aobiomaterial, um breve relato

de suas aplicaçõesNorberto Aranha*

A história do vidro nos remetea períodos anteriores à Era Cristã.Apesar de não se ter uma data espe-cífica do domínio da arte de traba-lhar o vidro pelo homem, pesquisasarqueológicas mostram que os egíp-cios já confeccionavam adornos edemais objetos feitos deste material.Alguns pesquisadores atribuem suaorigem aos chineses, exímios artesãos;outros aos mercadores fenícios, quedescobriram acidentalmente o novomaterial ao fazerem suas fogueiras naareia sobre a qual apoiaram blocos denitrato de sódio, que serviam parasustentar seus utensílios para prepa-rar os alimentos. O fogo, aliado àareia e ao nitrato de sódio, originouum líquido transparente que resfria-do formou o vidro.

Os romanos a 100 a.C. já pro-duziam vidro por técnicas de soproem moldes para confeccionar suas“janelas”. Comenta-se que em 300d.C. o imperador Constantino, per-cebendo a importância econômicaque os produtos fabricados com estematerial começavam a apresentar,

passou a cobrar taxas e impostos aosvidreiros. Entre 500 e 600 d.C., umnovo método possibilitou a produ-ção do vidro plano, por sopro de umaesfera e sua sucessiva ampliação porrotação em forno (até o século XIX,a maior parte da produção do vidrofoi feita por este sistema). O desen-volvimento de novas técnicas de fa-bricação de vidros com diferentescomposições deu-se ao longo no sé-culo XX.

O vidro, na sua concepçãomais simples, pode ser entendidocomo um material geralmente trans-parente, de colorações diversas, com

certa dureza e de fácil moldagem. Doponto de vista químico, este materialamorfo (estado da matéria que esta-ria entre o sólido e o líquido) é inter-pretado em termos de seus átomosconstituintes e das ligações químicasexistentes. Os diferentes tipos de áto-mos, ligações e arranjos estruturais é

que determinam as características ma-croscópicas do vidro.

No artesanato (Haden, 1986;Moretti, 1983; Leicester, 1969) ge-ralmente quer-se peças (vasos, cola-res e enfeites em geral) que apresen-tem colorações diversas e/ou alto bri-lho. A coloração (Sanderson eHutchings, 1987) pode ser obtidaatravés dos seguintes mecanismos(Fanderlik, 1983):

1. Incorporação de íons, oumoléculas, maiores do que 1 nm, naestrutura do vidro. Os elementos des-te grupo compreendem o níquel, co-balto, ferro, magnésio, cromo, cobre,vanádio, titânio, neodímio, cério epraseodímio, sendo este um dos mé-todos mais utilizados no artesanato;

2. Presença de partículas coloi-dais com dimensões entre 1 a 500nm. Geralmente são partículas deprata, ouro, cobre, etc.;

3. Presença de partículas mi-croscópicas, ou maiores, que se for-mam no interior do vidro durante seuresfriamento ou tratamento térmico;

4. Radiação do vidro com raioultravioleta, γ, β, raios-X, etc.

Quanto ao brilho, este aspectodiz respeito principalmente ao índi-ce de refração e à dispersão da luz nointerior do vidro. Uma das variáveisque elevam o índice de refração é apresença de íons de metais pesadosna sua estrutura. Elementos comochumbo, nióbio, telúrio, entre ou-tros, alteram de forma significativa oíndice de refração.

Em 300 d.C., oimperador

Constantino,percebendo aimportância

econômica que osprodutos em vidro

começavam aapresentar, passou

a cobrar taxase impostos

aos vidreiros

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50 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

Devido principalmente a suatransparência e dureza (resistênciamecânica), o vidro é amplamenteutilizado na fabricação de janelas evasilhames para acondicionamento dealimentos e líquidos, sejam eles be-bidas em geral ou fármacos, preser-vando as qualidades do produto ar-mazenado (Rawson, 1980). No casodos fármacos, em particular, além daresistência mecânica, também há aquestão da luz (determinadas faixasde comprimento de onda) que podevir a alterar suas características; porisso, em alguns casos, utilizam-se fras-cos escuros de modo a preservar a in-tegridade do medicamento.

As bebidas de uma forma geraltêm que ser acondicionadas emrecipientes que apresentem prin-cipalmente uma boa resistênciamecânica, de modo a não se que-brarem durante o processo de engar-rafamento e transporte, além de pre-servar seu sabor. Essa resistência a im-pactos mecânicos é conseguida devi-do ao alto teor de sílica presente nacomposição dos vidros utilizados noacondicionamento desses líquidos. Asílica (SiO2) além de ser formadorade vidro (a fusão do SiO2 sozinho re-sulta num vidro) tem como vantagemdar ao material uma maior dureza,proporcionando com isso maiorresistência mecânica (resistência aoimpacto) à garrafa (Rawson, 1980).

As composições utilizadas nafabricação dos diferentes tipos de vi-dros são classificadas conforme o “sis-tema vítreo” a que pertencem. Cadaum desses sistemas (os mais comunssão: “soda-lime”, “lead-glass” e “bo-rosilicate”) apresenta característicasparticulares (Doremus, 1973).

Nesta área de vasilhames, omais utilizado é o vidro denominado“soda-lime” (os termos “soda” e “lime”referem-se, respectivamente, à pre-sença dos óxidos de sódio e cálcio),que por ser inerte não contamina olíquido armazenado, preservando seu

sabor. Apresenta também boa resis-tência ao ataque químico provenien-te de soluções aquosas.

Um típico vidro “soda-lime”tem em sua composição de 71 a 75%de SiO2, 12 a 16% de Na2O, 10 a15% CaO, além de outros compo-nentes presentes em baixa concentra-ção, responsáveis por alterar algumaspropriedades específicas do vidro. Asmatérias-primas mais utilizadas nafabricação desses vidros são areia(SiO2), calcário — dolomita (CaO,MgO), barrilha — soda (Na2O) efeldspato (Na2O, K2O, Al2O3,SiO2). O vidro “soda-lime” tambémé utilizado na fabricação de janelas,devido à faixa de transmissão de luzque ele proporciona.

Outro sistema vítreo impor-tante é o “lead-glass” (vidro de chum-bo), assim chamado por conter em

sua composição elevados teores dechumbo. Sua composição típica estána faixa de 54 a 65% de SiO2, 18 a38% de PbO, 13 a 15% de Na2Oou K2O, além de outros óxidos emmenor concentração. O alto índicede refração desses vidros, devido àpresença do chumbo, e sua densida-de, aliados à facilidade de serem tri-turados, cortados ou moldados, tor-na-os ideais na produção de peçascomo: copos, vasos, cinzeiros, esfe-ras ou artigos de decoração em geral.O popularmente denominado “cris-tal”, por exemplo, nada mais é do queo vidro de chumbo contendo teoresmenores do que 18% de PbO.

No outro extremo, ou seja,com altas concentrações de PbO, sãoos vidros especiais utilizados no ar-mazenamento de rejeitos nucleares(Sales e Boatner, 1986; Hayward,1988), devido a características dochumbo em absorver principalmen-te os raios gama. Como exemplo te-mos o sistema vítreo com diferentescomposições na faixa de 41,1 a50,6% de PbO, 6,1 a 13,1% deFe2O3 e 32,2 a 42,3% de P2O5.

O terceiro sistema vítreo, de-nominado de “borosilicate glass” (vi-dro borosilicato), é composto por 70a 80% de SiO2, 7 a 13% de B2O3,além de pequenas quantidades deóxidos de sódio e potássio. Devido asua alta resistência à corrosão e alte-ração de temperatura, esse tipo devidro é muito utilizado na fabricaçãode utensílios de laboratório, vasilha-mes para acondicionamento de fár-macos, invólucros de lâmpadas de altapotência, etc. Alguns exemplos decomposições de vidros e suas aplica-ções são apresentados na tabela 1.

SiO2 Na2O K2O MgO B2O3 Al2O3 PbO CaO Nome / Aplicação

54 1 8 37 Sílex ótico / lentes óticas

96 4 Vycor / vidrarias de laboratório

81 3,5 13 2,5 Pyrex / vidrarias para fornos

72,2 13 0,7 4 1,9 8 Vidro plano* / janelas

* acrescido de 0,1% de Fe2O3 na sua composição

Tabela 1. Composições e aplicações de alguns vidros comerciais típicos

As composiçõesutilizadas na

fabricação dosdiferentes

tipos de vidrossão classificadas

conforme o “sistemavítreo” a que

pertencem. Cadasistema apresenta

característicasparticulares

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Referências Bibliográficas

BEALES, K.J.; DAY, C.R. A Review of Glass Fibres for Optical Communications, Physics and Chemistry of Glasses, v. 21, 5-21, february 1980.

DOREMUS, Robert H. Glass Science, London: John Wiley & Sons, 1973.

FANDERLIK, Ivan Optical Properties of Glass in Glass Science and Technology 5. New York: Elsevier, 1983.

GAMBLING, W.A. Glass, Light and the Information Revolution, Glass Technology, v. 7, n.6, 179-187, December 1986.

HENCH, Larry L.; Inorganic Biomaterials, in Materials Chemistry an Emerging Discipline, chap 21, 1995.

HENCH, Larry L., Splinter, R.J.M., Allen, W.C. and Greenlee, T.K.; J. Biomed. Mater. Res. Symp., 2, 117, 1971.

composta por uma casca e um nú-cleo, com valores de índice de refra-ção diferentes, por onde a luz é trans-mitida através de sucessivas reflexõesinternas, podendo ser feita tanto deplástico quanto de vidro, dependen-do de sua aplicação (Rawson, 1980).

As fibras óticas para comuni-cação são de vidro, sendo a casca ge-ralmente composta de SiO2 e seunúcleo contendo um vidro formadoa partir da mistura e fusão de elemen-tos como GeO2, P2O5, B2O3,Al2O3, etc.

Dependendo da aplicação, ascomposições dos vidros que forma-rão a casca e o núcleo da fibra sãoalteradas conforme as necessidades.

Por último, destaca-se a apli-cação do vidro na área médica(Hench, 1971), mais especificamen-te na substituição de partes ósseas porpróteses ortopédicas e dentárias(Hench, 1991). Ao longo de váriasdécadas, o metal, particularmente o

titânio e suas ligas (Long e Rack,1998), tem sido um dos biomateriaismais utilizados para esta aplicação.

Na busca de materiais alterna-tivos que apresentassem melhor per-formance, o vidro (Kokubo et al,1991), ou mais especificamente obiovidro — Bioglass® (Hench,1995), tem substituído com sucessoos metais em algumas situações espe-cíficas.

Uma das características princi-pais do biovidro é a formação de liga-ções químicas entre o material (vidro)e a parte inorgânica do osso (hidro-xiapatita), fortalecendo deste modoa fixação mecânica da prótese. Estevidro tem se demonstrado um bommaterial em implantes de mandíbulae restauração de ossos do ouvido (ta-bela 2); bem como na condição defilme fino sobre próteses metálicas,conjugando a rigidez mecânica dometal com a facilidade de ligação quí-mica do vidro com o osso.

pesar das composições apre-sentadas aqui terem basicamen-

te como constituinte principal a síli-ca (SiO2), é importante salientar queexistem vários sistemas vítreos que“não contêm” SiO2 em sua com-posição.

O SiO2, assim como o P2O5,B2O3 e GeO2, entre outros, são osdenominados “formadores” da redevítrea, uma vez que, sozinhos, apóssua fusão, resultam num vidro.

Os diferentes sistemas forma-dores de vidro, assim como os pro-

SiO2 Na2O K2O MgO CaO P2O5 Nome

45 24,5 24,5 6 Bioglass® 45S5

53 23 20 4 Biovidro S53P4

40 - 50 5 - 10 0,5 - 3 2,5 - 5 30 - 35 10 - 50 Ceravital® (vitro-cerâmica)

Tabela 2. Composições de vidros bioativos

cessos de síntese que existem, são te-mas que serão abordados oportuna-mente com mais detalhes.

* Norberto Aranha é professordoutor em Ciências e professor de Físi-ca no Curso de Química do IMAPES

Além dessas aplicações maiscomuns do nosso dia-a-dia, existemáreas específicas que requerem ma-teriais com outras características,como pureza, por exemplo. Uma des-sas áreas é a de comunicações, parti-cularmente na telefonia.

O uso de fibras de vidro comomeio de transmissão de freqüênciasóticas foi proposto em 1966(Gambling, 1986; Beales e Day,1980). A partir daí, vários centros depesquisa no mundo se concentraramno desenvolvimento de tecnologiasde fabricação de lasers, detectores ediferentes sistemas vítreos; com isso,houve uma vertiginosa ascensão nocampo das comunicações óticas.

No Brasil, o estudo e desen-volvimento dessas fibras tiveram iní-cio na década de setenta, quando foicriado, em 1975, o grupo de FibrasÓticas no Instituto de Física da Uni-camp, financiado pela Telebrás.

A fibra, na sua versão básica, é

A

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52 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

Estabilização das antocianinasda acerola por complexaçãocom flavonóides da própolis

Maria do Carmo Guedes*

RESUMO

A cor, ao lado de outros parâ-metros, influencia os consumidores emsua avaliação da qualidade de alimen-tos e bebidas. A tonalidade averme-lhada do suco de acerola é dada pelasantocianinas, presentes em elevadoteor nessa fruta. Entretanto, em razãoda presença de ácido ascórbico, a es-tabilidade das antocianinas é afetada.

A reação de complexação dasantocianinas (pigmento) com os flavo-nóides da própolis (copigmento) pro-moveu a estabilidade do pigmento,principalmente nas condições de pH2,5 e razão molar pigmento/copigmen-to de 1:10, na ausência da luz, comaumento do tempo de meia-vida de10%, 15% e 28% para os sucos co-mercial, pasteurizado e para o extratoda fruta, respectivamente, promoven-

do a extensão do tempo de prateleirados produtos.

Introdução

A fruta “acerola” (Malpighiaglabra) adquiriu importância mun-dial após a descoberta de seu elevadoconteúdo de ácido ascórbico (varian-do de 1028 a 4676 mg/100 g) (Oliva,Menezes e Ferreira, 1996). A frutatem sido amplamente consumida emfunção da reconhecida atividade an-tioxidante da vitamina C de seqües-trar radicais livres e contribuir naprevenção do câncer (Cintra e Man-cini, 1998). Entretanto, a cor verme-lha do suco, dada pelas antocianinas(Silva, Guedes e Menezes, 1998)

pode ser perdida, possivelmente pelaindireta interação induzida pelo áci-do ascórbico (Silva, 1999), tambémresultando em uma diminuição doteor de vitamina C. Além das anto-cianinas, a fruta possui carotenóides(fitoflueno, α- caroteno, β-criptoxan-tina e β-caroteno) (Cavalcanti,1991). Em nossos estudos, investiga-mos a adição de própolis como umafonte de flavonóides (Ghisalberti,1979) , (Bankova, Christov, Kujum-giev, Marcucci e Popov, 1995) ,(Mar-cucci, 1994), para estabelecer o efei-to da copigmentação/complexação,contribuindo ainda com seus efeitosbioquímicos e farmacológicos (Midd-leton e Kandaswami, 1994). O obje-tivo do trabalho é aumentar a estabi-

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 53

lidade do pigmento responsável pelacor, diminuindo o efeito da oxidaçãodo ácido ascórbico, o qual tem umefeito deletério sobre as antocianinasdo suco da fruta (Sondheimer eKertesz, 1953).

Material e métodos

1. Preparação de suco pasteu-rizado

A polpa extraída da acerola (1kg) foi termicamente tratada a 90° Cpor 15 minutos e refrigerada no mes-mo trocador até a temperatura de 25°C. O suco assim obtido foi envasadoem latas.

2. Suco comercialUm suco comercial pasteuriza-

do (marca A) foi adquirido no co-mércio local.

3. Preparação do Extrato deacerola

Frutas frescas de acerola (1 kg),colhidas de diferentes pés de acerolade uma mesma plantação na regiãode Campinas, foram maceradas comácido cítrico 0,5% em água, sob at-mosfera de nitrogênio, por 12 horas,a temperatura de 5° C. O extrato foidecantado, filtrado e concentrado emevaporador rotatório sob pressão re-duzida, a 30° C. O concentrado as-sim obtido (100 mL) foi parcialmentepurificado por resina de troca iônica(Amberlite IR-50) para remoção dosaçúcares solúveis.

4. Obtenção do extrato etanó-lico da própolis

Amostras de própolis bruta empó (2 g) foram pesadas em balançaanalítica e transferidas para tubos deensaio (25 x 180 mm). O materialfoi submetido à extração com etanol80% (200 mL) por 1 hora, em ba-nho-maria (Fanem) e sob agitaçãoconstante. O extrato resultante foifiltrado ainda quente, concentrado ediluído com água (10 mL) e entãoextraído com acetato de etila (3 x 50mL). O material parcialmente purifi-cado foi novamente submetido à eva-poração em evaporador rotatório e osólido resultante redissolvido em eta-nol 80% na proporção de 1:10 (v/v).

5. Determinação de flavonói-des totais do extrato

A determinação dos flavonói-des totais foi realizada conforme mé-todo descrito por Park, Koo, Sato eContado (1995). Preparou-se umamistura contendo 0,5 mL do extrato

etanólico da própolis, 4,3 mL de eta-nol 80%, 0,1 mL de nitrato de alu-mínio 10% e 0,1 mL de acetato depotássio 1M. O controle foi prepa-rado com água em lugar de nitratode alumínio. Após 40 minutos, a ab-sorvância foi medida em espectrofo-tômetro (Beckman DU) a 415 nm.A leitura final da absorvância foi ob-tida pela diferença entre a absorvân-cia da reação e a do controle, combase no padrão quercetina.

6. Experimentos de estabi-lidade

Os sucos comercial e pasteuri-zado foram usados após filtração, cen-trifugação e apropriada diluição. OspH adequados foram obtidos por adi-ção de solução de HCl. O extratoaquoso de frutas frescas foi liofiliza-do e redissolvido em soluções tam-ponadas de citrato-fosfato a pH 2,0e 3,0. Os flavonóides foram igual-mente liofilizados e redissolvidos emetanol 10%.

Para os experimentos de ava-liação da estabilidade da cor, as solu-ções tamponadas de antocianinas (2,6x 10-4 M) e os sucos comercial e pas-teurizado foram complexados com oextrato de flavonóides (copigmento)

em três diferentes concentrações (ra-zão molar pigmento/copigmento de1:1, 1:5 e 1:10). As soluções finaisobtidas (5 mL) foram distribuídas emtubos com tampa rosqueável (capa-cidade 15 mL) e submetidas a um flu-xo de nitrogênio por 10 segundos efechados. Metade dos tubos foi sub-metida à ação da luz de lâmpada fluo-rescente de 40 W, 2500 lux, tipodaylight, e a outra metade deixada noescuro. Soluções controle (sem adi-ção de copigmento) foram expostasàs mesmas condições.

Medidas de absorvância, noλmax , foram obtidas após intervalosde 24 horas, por um período de 336horas de exposição. O experimentofoi repetido pelo menos três vezes eos resultados representam a médiaaritmética de pelo menos dois valores.

As constantes de velocidade dereação (k) e tempo de meia-vida(t1/2) foram obtidos através das equa-ções de Arrhenius para a reação de1ª ordem, equação 1 e 2, respectiva-mente:

- 2,303 log Absorvância (t) = kt (1) Absorvância (t0)

0,693 = t 1/2 (2)

k

Resultados e discussão

A cor pode fornecer informa-ções sobre a qualidade e condição deum produto. Sua contribuição à apa-rência e a atratividade é um fato úni-co, uma vez que é esperado que osalimentos apresentem suas própriascaracterísticas de cor e aroma(Counsell, 1979). Neste sentido, amanutenção da cor de um produtotem sido um desafio e objetivo deestudos. A degradação de antociani-nas tem sido observada ocorrer simul-taneamente com a diminuição doteor de ácido ascórbico em sucos. Oexato mecanismo químico e bioquí-mico não é claro, mas tem sido apon-tada uma relação entre a velocidadede perda da cor das antocianinas e aconcentração de ácido ascórbico. Por

A cor pode fornecerinformações sobre a

qualidade e condição deum produto. Suacontribuição àaparência e a

atratividade é umfato único, uma vez

que é esperadoque os alimentosapresentem suas

próprias característicasde cor e aroma

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54 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

sistema

Extrato de acerola

Suco comercial

Suco pasteurizado

controle

300,0

102

96,0

Razãomolar

1:1

300,8

103,2

97,1

Razãomolar

1:5

304,0

104,2

98,0

Razãomolar1:10

316,0

104,5

98,7

controle

230,2

110,0

86,7

Razãomolar

1:1

231,3

110,6

87,0

Razãomolar

1:5

236,9

111,4

88,26

Razãomolar1:10

238,3

112,2

88,78

pH 2,5 pH 3,0

t 1/2 (hr)

Tabela 1. Valores de meia-vida (t 1/2 ) (hr) para as antocianinas presentes nos sucos comer-cial e pasteurizado e no extrato de acerola, com e sem adição de extrato de flavonóides, narazão molar pigmento / copigmento de 1:1, 1:5 e 1:10, a pH 2,5 e pH 3,0, sob exposição àluz, por período de 120 horas

sistema

Extrato de acerola

Suco comercial

Suco pasteurizado

controle

356,0

143,0

99,4

Razãomolar

1:1

403,2

145,0

109,5

Razãomolar

1:5

432,2

148,8

112,6

Razãomolar1:10

455,0

157,3

114,3

controle

276,5

124,1

88,7

Razãomolar

1:1

294,0

126,0

90,2

Razãomolar

1:5

334,6

131,1

94,3

Razãomolar1:10

339,6

133,4

99,4

pH 2,5 pH 3,0

t 1/2 (hr)

Tabela 2. Valores de meia-vida (t 1/2 ) (hr) para as antocianinas presentes nos sucos comer-cial e pasteurizado e no extrato de acerola, com e sem adição de extrato de flavonóides, narazão molar pigmento / copigmento de 1:1, 1:5 e 1:10, a pH 2,5 e pH 3,0, na ausência de luz,por período de 336 horas

os sistemas contendo flavonóidesda própolis e ácido ascórbico,

tanto nos sucos comercial e pasteu-

rizado quanto no extrato de frutasfrescas, a degradação das antociani-nas foi diminuída.

O extrato de flavonóides adi-cionado nas razões molares pigmen-to/copigmento de 1:1, 1:5 and 1:10

outro lado, flavonóides poderiam serempregados para complexar as anto-cianinas produzindo complexos maisestáveis que apresentam aumento naabsorvância, melhorando a estabilida-de e a extensão da vida de prateleirade sucos de frutas (Shrikhande eFrancis, 1974).

A escolha da própolis comofonte de flavonóides se deu em fun-

ção de sua composição e teor de fla-vonóides. O teor de flavonóides é umfator muito importante na análise daprópolis, pois são os principais com-postos fenólicos responsáveis pelassuas diversas propriedades. Em nos-so estudo, a análise colorimétrica pro-veniente da formação de complexoflavonóides - alumínio, em meio al-calino, resultou em um teor de 0,58

± 0,03 mg/g de flavonóides totais.A estabilidade foi avaliada pe-

la medida do tempo de meia-vida(t1/2), conforme equações 1 e 2, des-critas no item 6, dos sistemas duranteas reações de degradação ocorridas,cujos valores estão apresentados nastabelas 1 e 2, respectivamente paraos sistemas expostos à luz e em suaausência.

N

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 55

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exerceu efeitos protetivos, com au-mento no tempo de meia-vida dossistemas expostos à luz da ordem de41%, 28% e 25%, para os sistemasde suco comercial, suco pasteuriza-do e extrato da fruta, a pH 2,5, e de12%, 28% e 17%, para os sistemasde suco comercial, suco pasteuriza-do e extrato da fruta, a pH 3,0, res-pectivamente.

Para os sistemas preservados daluz, os aumentos no tempo de meia-vida foram levemente maiores, alcan-çando valores da ordem de 25%, 28%e 41%, a pH 2,5, e 12%, 28% e13%, a pH 3,0, respectivamente parao suco comercial, pasteurizado e ex-trato da fruta.

Para o suco comercial houverelativa maior proteção dos flavonói-des comparativamente ao suco pas-teurizado e ao extrato da fruta quan-

do os sistemas estavam expostos à luz,possivelmente em conseqüência damaior perda de ácido ascórbico du-rante seu processamento, responsávelpela indução da abertura do anel daantocianina, resultando em um com-posto incolor.

A adição de flavonóides da pró-polis na razão molar pigmento/copig-mento de 1:10, e a pH 2,0 e em au-sência de luz, foram as condições maisprotetoras para todos os sistemas ava-liados.

Conclusão

A perda de cor dos pigmentosantociânicos da acerola pode ser pre-venida ou diminuída mediante o usode flavonóides.

O emprego da própolis comofonte de flavonóides mostrou-se satis-

fatório para estabilizar as antociani-nas de sucos que sofrerão tratamentotérmico. A combinação de condiçõesde complexação pH 2,5, razão molarpigmento/copigmento de 1:10, pro-tegidos da luz, proporcionou aumen-tos do tempo de meia-vida de 10%,15% e 28% para os sucos comercial,pasteurizado e para o extrato da fru-ta, respectivamente, promovendo aextensão do tempo de prateleira dosprodutos. A própolis brasileira podeser considerada como tendo umacomposição de flavonóides que po-deria colaborar na estabilidade das an-tocianinas e na cor dos sucos.

* Maria do Carmo Guedes édoutora em Ciência de Alimentos, pro-fessora do IMAPES e pesquisadora deFlavonóides de fontes brasileiras e suaatuação com antioxidantes naturais.

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56 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

A globalização, sem dúvida,exerce uma influência cada vez maiorna vida da sociedade dos indivíduose especialmente das organizações.

Quando entendida não apenase nem primordialmente como fenô-meno econômico, como apontaAnthony Giddens (Para além da es-querda e da direita. São Paulo :Edunesp, 1996), a globalização efe-tivamente trata da transformação doespaço e do tempo. É definida peloautor como ação à distância que ex-plica sua intensificação nos últimosanos com o surgimento da comuni-cação global instantânea e o transpor-te de massa.

Para ele, a globalização não dizrespeito apenas à criação de sistemasem grande escala, mas também àtransformação de contextos locais eaté mesmo pessoais de experiênciasocial. As atividades cotidianas, nopensamento do autor, são cada vezmais influenciadas por eventos queacontecem do outro lado do mundo.Como conseqüência, hábitos de es-tilos de vida tornam-se globalmentedeterminantes; em outras palavras, aglobalização é um processo de mãodupla, no qual se recebem influên-cias e se exercem influências.

A globalização (Giddens, op.cit.) não é um processo único, masuma mistura complexa de processos,que freqüentemente atua de manei-ra contraditória, produzindo confli-tos, disjunções e novas formas de es-tratificação. Daí, por exemplo, a rea-lização do nacionalismo e a intensifi-cação de identidades locais estaremdiretamente ligadas e em oposição àsinfluências globalizadoras locais.

A globalização ea reflexidade social

José Carlos Moura*

Na área da Administração, ob-serva-se o apego ao tradicional, como retorno ao estabelecimento de re-gras, de padrões e controle rígidoscomo formas de sobreviver à compe-tição internacional no mundo econô-mico globalizado.

Como resposta a esta questão,Giddens (op. cit.) ressalta, como re-sultado direto da globalização, aemergência de uma ordem social pós-tradicional que, para ele, é uma mu-dança de status da tradição. As tradi-ções têm de explicar-se, têm de tor-nar-se abertas a interrogações ou aodiscurso. As tradições, segue o autor,em vez de serem desfeitas, devem serreformuladas, repensadas.

Este repensar da tradição pro-vocado pela globalização é o que oautor chama de reflexividade social.

Para ele, em uma sociedadedestradicionalizadora, os indivíduosdevem se acostumar a filtrar todos ostipos de informações relevantes paraa situação de suas vidas e atuar roti-

neiramente com base nesse processode filtragem.

O crescimento da reflexivida-de social é um fator fundamental queintroduz o deslocamento entre o co-nhecimento e o controle — uma fon-te primária de incerteza artificial.

Um mundo de reflexividadeintensificada, enfatiza Giddens (op.cit.), é um mundo de pessoas inteli-gentes. Os indivíduos têm mais oumenos que se engajar com o mundoem termos mais amplos, se quiseremsobreviver nele. As informações pro-duzidas por especialistas (incluindoconhecimento científico) não podemmais ser totalmente confiadas, restri-tas a grupos específicos, mas devemser interpretadas rotineiramente, tor-nando-se influenciadas por indiví-duos leigos no decorrer de suas açõescotidianas.

A emergência do “pós-for-dismo” nos empreendimentos in-dustriais é geralmente analisada emtermos de mudança tecnológica —em especial, a influência de tecnologiade informação. Mas o motivo básicopara o crescimento “produção fle-xível” e da “tomada de decisões debaixo para cima” é um universo dealta reflexividade, e conduz a umamaior autonomia de ação que o em-preendimento deve reconhecer e àqual deve recorrer.

Dentro do contexto destradi-cionalização, Giddens (op. cit.) cha-ma atenção para as questões do de-ver. O cumprimento de dever obrigaao seguimento rígido de normas, pro-cedimentos, enquanto a responsabi-lidade implica o detalhamento demotivos, as causas, as razões, a com-

A globalizaçãonão é um processo

único, mas umamistura complexa

de processos,que freqüentemente

atua de maneiracontraditória,produzindoconflitos,

disjunções e novasformas de

estratificação

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 57

preensão e não a lealdade cega. Poreste motivo ela tem força própria deimpulsão e motivação, uma vez queos comprometimentos assumidos demaneira livre (reflexiva) com freqüên-cia têm maior força do que os quesão simplesmente dados de modo tra-dicional.

Com a abertura do mercadonacional, as empresas brasileiras (na-cionais ou multinacionais) experi-mentam uma situação para a qualmuitas delas se dizem não prepara-das.

A competição internacional

vem exigindo a modernização rápidade suas estruturas e processos, soma-da à melhoria da qualidade de seusprodutos e serviços. Como agravan-te, enfrentam ainda as exigências in-ternacionais de qualidade que em al-gumas situações são usadas como bar-reiras às exportações de produtos bra-sileiros.

Tais fatores pressionam as em-presas a atender, a curto prazo, às de-mandas de padrões internacionais dequalidade, sem, contudo, analisar osmecanismos, estratégias e processospostulados como ferramentas adequa-

das da melhoria da qualidade.Parte-se do pressuposto de que

o controle através de normas e pa-drões preestabelecidos levará, auto-maticamente, aos objetivos definidosde melhoria da qualidade, criando ascondições de sobrevivência da empre-sa no mercado competitivo da Era daGlobalização.

José Carlos Moura é mestre emAdministração, especialista em Gestãode Qualidade e Gestão Ambiental,professor e coordenador dos cursos deAdministração do IMAPES.

O espaço daafetividade no ambiente

escolarNadir Neves Nunes*

Falar da relação entre afeti-vidade e trabalho pedagógico não éuma tarefa simples. Isto porque vi-rou senso comum acreditar que paraser professor de educação infantil eséries iniciais do ensino fundamentalé preciso apenas ter vocação e gostarde criança, principalmente quandotrata-se do atendimento das cliente-las menos favorecidas. A concepçãode que a criança pobre é carente eque precisa de uma educação muitomais centrada no amor e no carinho,do que na aquisição de conhecimen-tos, esteve muito em voga na décadade setenta, mas mantém-se viva ain-da hoje. Visão esta que acredito seruma das mais difíceis de ser transfor-mada no processo de formação deprofessores.

Neste contexto, a afetividadeassume três características básicas. Emprimeiro lugar, torna-se sinônimo decontato físico; basicamente, beijo e

Por fim, afeição é também a criaçãode uma suposta relação de inti-midade, expressa pela incorporaçãoda criança como membro da família:a professora se transforma em “tia”.

O equívoco está na formacomo a afetividade é vista. Pensa-senela apenas como manifestação deaspectos positivos, expressão desentimentos que auxiliam no processode aquisição de conhecimento, poisfacilitam a interação professor-aluno.Acredita-se que expressões como araiva, a birra e a agressão decorramde problemas cuja origem, geral-mente, está nas condições sociais dacriança. A escola sempre se percebecomo vítima, nunca como causadora;quando muito, se dispõe a ajudar afamília a buscar a solução dosproblemas.

Para compreendermos o que éafetividade, precisamos entender qualé o seu papel no processo de desen-

abraço. Beija-se automaticamente nasentradas e saídas, os gestos adotadosestão incorporados à rotina e nãoexpressam nenhum sentimento. Umoutro aspecto é “adoçar” o tratamentodado à criança com o termo “inho”,isto é, tudo o que se refere a ela estáno diminutivo: conta-se uma his-torinha, a tarefa está sempre boni-tinha, brinca-se no parquinho, etc.

A concepção de quea criança pobre é

carente e que precisade uma educação

muito mais centradano amor e no carinho

esteve muito emvoga na década de

setenta, masmantém-se viva

ainda hoje

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58 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

volvimento humano. Numa perspec-tiva psicogenética, a afetividade é vistacomo componente fundamental naconstrução da pessoa. Estamos aquiadotando como referencial HenriWallon, que apresenta uma visão dia-lética em relação à afetividade. Ela évista de uma forma não linear, predo-minando as contradições e os para-doxos. Neste caso, não imperam so-mente os aspectos positivos, mas tam-bém desagregadores da afetividade.

De acordo com Henri Wallon(1971), é pela afetividade que prin-cipia a vida psíquica, através da suaprimeira manifestação, as emoções.Isto porque o que caracteriza os pri-meiros meses de vida da criança é asua total inaptidão para realizar porsi só qualquer ação que possa satisfa-zer as suas necessidades. São as rea-ções emotivas do bebê que estabele-cem uma espécie de comunhão ime-diata entre ele e aqueles que o cer-cam. Esta simbiose afetiva garantirátoda ajuda de que ele necessita.

O valor funcional da emoçãoé, pois, a sua extrema contagiosida-de, ou seja, ela faz com que os indiví-duos que participam de uma mesmasituação não consigam manter-sealheios a ela. Isto não é uma verdadesomente na relação adulto-bebê, masnas mais variadas situações em que oadulto pode se deixar contagiar pelasmanifestações emotivas.

As emoções são ponto de par-tida do desenvolvimento humano,bem como a base para a construçãode conhecimentos. Isto porque sãoelas que estabelecem o vínculo entreo bebê e seu meio social, portanto,permitem o acesso ao mundo da cul-tura, o que possibilitará a construçãode conhecimento.

Um outro dado que não podeser esquecido é que a fonte das emo-ções é o tônus; elas representam, anível puramente orgânico, o aumen-to da tensão tônica ou sua redução.Neste caso, alteração emocional e al-teração tônica estão intimamente li-gadas, o que implica dizer que situa-ções que exijam esforço ou concen-tração muscular podem desencadear

descargas emotivas. Também é fatoque os efeitos da emoção geram mu-danças corporais, expressas através doaumento ou redução do tônus. Situa-ções prazerosas relaxam, bem comosituações como a raiva tornam a mus-culatura tensa. A ação direta sobre o

tônus pode diminuir as manifestaçõesda emoção, como, por exemplo, asmassagens e os produtos farmacoló-gicos.

Wallon denomina a emoção de“atividade proprioplástica”, isto por-que ela é capaz de modelar o corpo,sendo possível observar suas manifes-tações quer seja através de alteraçõesna postura corporal, na mímica facialou no descontrole motor.

Como dissemos anteriormen-te, as emoções fazem a transição en-tre o puramente orgânico e ocognitivo, através da intermediaçãoda cultura, permitindo, assim, o sur-gimento da razão. Elas, porém, sãoprogressivamente ultrapassadas pelasatividades psíquicas superiores con-troladas pelos centros corticais, quepoderão reduzi-las ou suprimi-las.Porém, devido à relativa autonomiados centros aos quais estão ligadas, asemoções continuarão sempre a serum componente da vida psíquica,podendo, muitas vezes, retomar olugar preponderante no comporta-mento. Isto ocorre principalmentenos momentos de crise, ou domina-dos por uma inaptidão diante de umatarefa nova, e faz com que tambémexista uma relação antagônica entreemoção e razão. O predomínio daemoção pode impedir a ação racio-

nal, tanto quanto a atividade racio-nal pode controlar ou suprimir as ma-nifestações da emoção.

Ao longo do processo de de-senvolvimento, a emoção passa porum processo de evolução, sob o efei-to da evolução da inteligência, que aintegra e a faz ir refinando-se,“espiritualizando-se”. De simplesmanifestações orgânicas, vai adqui-rindo tons ligados à sensibilidade in-telectual. Portanto, se é verdade quea atividade cognitiva pode diminuiros efeitos da emoção (portanto, dis-cutir as situações que geram medo eangústia pode servir para sua redu-ção), também é verdade que emoçõespodem ser desencadeadas através darepresentação, através da retórica oudo uso de imagens, por exemplo.

Esta evolução da emoção acon-tece tanto no processo de construçãoda pessoa quanto em termos de de-senvolvimento. No processo de cons-trução da pessoa há a alternância demomentos de dominância afetiva ede dominância cognitiva, que estãosempre em processo de integração.“Cada novo momento terá incorpo-rado as aquisições feitas no nível an-terior, ou seja, na outra dimensão.Isto significa que a afetividade depen-de, para evoluir, de conquistas reali-zadas no plano da inteligência, e vice-versa” (Dantas, H., 1992, p.90).

A afetividade deve ser enten-dida, portanto, como um processo di-nâmico do psiquismo humano, queevolui ao longo do desenvolvimento.Neste contexto, de acordo comHeloysa Dantas, poderíamos pensarem três momentos da afetividade:“afetividade emocional ou tônica; afe-tividade simbólica e afetividadecategorial” (1992, p.91).

O que percebemos na educa-ção da criança pequena é que afetivi-dade transforma-se em sinônimo decontato físico: o abraço, o beijo, opegar no colo, etc. Isto só é válido seestivermos lidando com criançasnuma fase de desenvolvimento emque predomina a afetividade emocio-nal, que exige uma troca direta entreos indivíduos.

Ao longodo processo de

desenvolvimento, aemoção passa por umprocesso de evolução,

sob o efeito daevolução da

inteligência, que aintegra e a faz ir

refinando-se,“espiritualizando-se”

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Referências Bibliográficas

WALLON, Henri - As Origens do Caráter na Criança. São Paulo: Difusão Européia do Livro. 1971. (1ª ed. 1934).

DANTAS, Heloysa et al. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus Editorial. 1992.

Devemos também considerarque o contato físico flui com maisnaturalidade em relação àqueles comos quais temos maior empatia. Assim,beija-se e abraça-se muito mais e commais prazer crianças que vão para es-cola melhor vestidas e mais cheiro-sas, evitando-se sempre que possívelaquelas mais desalinhadas. É muitaingenuidade pensar que as criançasnão percebem se são ou não preteri-das a seus colegas. Neste caso, o quealgumas professoras consideram a ra-zão do seu trabalho, que é ofereceramor àquelas crianças mais carentes,pode ser um fator de discriminação.

À medida que a criança cresce,suas necessidades mudam, algumasvezes sendo muito mais demonstra-tivo de carinho dar atenção às suasconfidências ou responder às suasquestões, do que beijá-las como au-tômatos. A afetividade simbólica re-quer um vínculo cognitivo. A lingua-gem torna-se uma ferramenta impor-tante na interação com a criança,podendo ser usada tanto para estimu-

lar quando para criar situações desa-gradáveis. Nesta fase, é importante,também, criar possibilidades para quea criança possa expressar-se das maisvariadas formas, o que vai contribuirpara o conhecimento de si e tambémpara que se aprenda a lidar com ossentimentos.

Na adolescência, a afetividade,em decorrência dos avanços alcança-dos no processo de construção de co-nhecimentos, apresenta-se mais racio-nal, isto é, pressupõe cooperação, re-ciprocidade, e está ligada aos valorescom os quais se identifica. Afetivida-de deve ser demonstrada através dorespeito às suas idéias e à sua pessoa.

Incorporar a afetividade comofator importante no trabalho peda-gógico requer a disposição para com-preender o que se passa com aquelescom os quais interagirmos. É precisoperceber qual o tipo de relação afeti-va deve ser estabelecida em cada fasedo desenvolvimento. A escola é umespaço importante no processo deconstrução da pessoa, o que passa ne-

O mundo atual eo objetivo da Educação

Olívia Cristina Vituli Chicolami *

Jamais considere os seusestudos como uma obrigação,mas sim como uma oportunida-de invejável (...) para aprender aconhecer a influência libertadorado reino do espírito, para o seupróprio prazer pessoal e para acomunidade, à qual seu futuro tra-balho pertencer.

Albert Eisntein

Estamos vivendo uma fase ím-par da história, de repentinas e dra-máticas mudanças, em decorrênciados avanços das descobertas científi-cas, dos meios de produção, alicerça-dos nos avanços tecnológicos, asso-ciados à rapidez com que se proces-sam as comunicações e informações,através da mídia, tais como jornal,

rádio, televisão — mas principalmen-te em decorrência dos meios de co-municação da web (internet), utili-zação de vídeos culturais e de entre-tenimentos e softwares educacionais,tudo isso culminando numa mudan-ça enorme nas relações humanas.

A educação, atenta a todas es-sas mudanças, tem como finalidade

cessariamente pelo avanço nas formascom as quais lidamos com a afetivi-dade.

Ajudar os alunos a lidar comsua afetividade requer que nós adul-tos também saibamos lidar com anossa, o que não é nada fácil, vistoque estamos constantemente sujeitosa ser dominados por nossas emoçõesou nos contagiar pelas manifestaçõesemotivas daqueles que nos rodeiam.Porém, na relação pedagógica, noscabe o papel de parceiros mais expe-rientes, portanto, aptos a lidar comos diferentes aspectos que envolvemo nosso dia-a-dia. É preciso, então,buscar caminhos que nos ajudem atrabalhar de uma forma coerente ecomprometida com o processo dedesenvolvimento dos nossos edu-candos.

Nadir Neves Nunes é pedagoga,mestre em História e Filosofia da Edu-cação pela USP e professora de Didáti-ca e Estrutura da Educação no Cursode Química do IMAPES

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60 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

que o indivíduo não só interaja nomundo atual, mas seja um sujeito his-tórico, consciente e decididor de seudestino, enfim, que exerça a sua ci-dadania de uma maneira efetiva. Paraque isto ocorra, o objetivo da educa-ção vai além da construção do conhe-cimento pelo aluno(a), atuando tam-bém no desenvolvimento de poten-cialidades e habilidades, imprescindí-veis em todas as áreas que ele venha aatuar: família, escola, trabalho, etc.

Tais mudanças na sociedadesão sentidas em todas as áreas e, deuma maneira mais notória, dentro dasempresas, através do novo perfil detrabalhador exigido pelas mesmas.Passou a ser primordial como pré-re-quisitos para a contratação de umfuncionário qualificações que ousa-mos chamar de qualidades pessoais,tais como: autonomia, capacidade dereflexão e crítica, poder de decisão naidentificação e resolução de situaçõesproblemas, relacionamento interpes-soal, etc.

O nosso propósito ao redigireste texto é ressaltar o objetivo prin-cipal da educação, que é a formaçãointegral do ser humano. Objetivo esteque é evidenciado dentro de um re-ferencial teórico, denominado Para-digma Educacional Emergente, queconsidera o indivíduo como um todo,constituído de corpo, mente, cérebroe espírito, uma vez que considera oaprendiz como um ser indivisivo, jáque não existe a separatividade entrecorpo e mente, cérebro e espírito.Segundo Maria Cândida Moraes: “Éo indivíduo visto e compreendidocomo uma totalidade integrada, in-divisível, que compreende o diálogoexistente entre a mente e o própriocorpo, que constrói o conhecimentousando não apenas o seu lado racio-nal, mas também as sensações e asemoções, vivenciando um processointegrado” (p. 138, 2000).

O desenvolvimento de todas aspotencialidades e capacidades do in-divíduo está diretamente associadocom o aprimoramento da inteligên-cia, conseguida através de uma me-lhor utilização do cérebro-mente, fato

este relevante num projeto didáticopedagógico.

Estudos mostram o cérebro co-mo algo fascinante e diferente de to-dos os demais órgãos. Ele desenvol-ve-se rapidamente na infância, mas éo único que pode ser melhorado por

meio de uso intenso até o fim da vida.Tarefas como leitura, resolução deproblemas matemáticos, aprendizadode uma nova língua, ou mesmo tare-fas rotineiras, estimulam o cérebro epodem esticar a longevidade de umapessoa e evitar que ela sofra de proble-mas típicos da velhice, como perdade memória, mal de Alzheimer, etc.

Estima-se que a herançagenética do indivíduo seja apenas de30%, representando a capacidadeintelectual inata. Os outros 70% vêmdo aprendizado e do conseqüente usodo cérebro. Isso significa que, assimcomo existem pessoas mais velozes oumais altas, existem pessoas com maiorcapacidade cerebral. É isto que dis-tingue uma pessoa mais inteligentede outra menos.

Estudos mostram que a inteli-gência não se limita à capacidade deraciocínio lógico, necessário para pro-por ou resolver uma complicadaequação matemática. A capacidadecerebral de uma pessoa já não podeser avaliada exclusivamente pelos tes-tes de QI (Quociente de Inteligên-cia), que surgiram no começo do sé-culo XX, em decorrência de uma pre-ocupação muito grande em se quali-ficar e, se possível, medir a inteligên-cia humana.

Na década de 1990, DanielGouleman divulgou numerosas pes-quisas, realizadas por vários neuro-cientistas e psicólogos, evidenciandouma segunda inteligência, tão impor-tante quanto a primeira, denomina-da inteligência emocional — o QE(Quociente Emocional). O QE dá-nos percepção de nossos sentimentose emoções e também os de outraspessoas, possibilitando que tenhamoscompaixão, empatia, motivações, esaibamos reagir apropriadamente àdor e ao prazer.

No final do século XX, atravésde numerosas pesquisas, cientistaschegaram a um terceiro Q, a Inteli-gência Espiritual — o QS (Quoci-ente Espiritual). Segundo relato dafísica e filósofa Danah Zohar e do psi-quiatra e terapeuta Ian Marshall: “PorQS refiro-me à inteligência com queabordamos e solucionamos proble-mas de sentido e valor, a inteligênciacom a qual podemos por nossos atose nossa vida em um contexto maisamplo, mais rico, mais gerador desentido, a inteligência com a qualpodemos avaliar que um curso deação ou caminho na vida faz maissentido do que outro.” (p. 18, 2000)

A respeito do funcionamentoneurológico do cérebro, foram reali-zadas inúmeras pesquisas, salientan-do-se o trabalho de Rodolfo Llinas eDenis Pare e seus colegas da Escolade Medicina de Nova York, sobre anatureza e as funções de oscilaçõesde 40 Hertz (Hz) em todo o cérebro,com a finalidade de compreender ointer-relacionamento existente entremente e corpo.

Tais pesquisas concluíram so-bre a natureza do QS, oscilações de40 Hz que percorrem todo o cére-bro, denominadas substrato neural.Da mesma forma que o processamen-to lógico racional de dados (o QI ca-racteriza-se por redes lineares — fia-ção neural serial), os processamentospré-consciente e inconsciente asso-ciativos de dados (QE) caracterizam-se por redes neurais paralelas. O QSestabelece que a experiência do serhumano pode ser aglutinada e

Tarefas como leitura,resolução de problemas

matemáticos,aprendizado de uma

nova língua, ou mesmotarefas rotineiras,

estimulam o cérebro epodem esticar a

longevidade de umapessoa e evitar que ela

sofra de problemastípicos da velhice

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 61

inserida em um marco de sentidomais amplo, através de oscilações de40 Hz de um lado a outro do cére-bro.

Pare-Llinas concluíram que aconsciência é uma propriedadeintrínseca ao cérebro, podendoadquirir configuração própriamediante estímulos advindos domundo externo e do próprio corpo,e chegar a uma consciência em si, quenos põe em contato com a realidade,um processo transcendente a simplesconexões e vibrações de algumascélulas nervosas.

A educação tem como missão,num mundo onde o conhecimentocresce de uma forma vertiginosa, fa-zer que o ser humano não só com-

preenda o mundo em que vive, masque, principalmente, nele interaja deuma forma plena e consciente. Umaposição de alguém que luta para nãoser apenas objeto, mas sim sujeito daHistória — considerando o indivíduocomo um ser inconcluso, em cresci-mento constante, que necessita edu-car-se permanentemente, desenvol-ver-se em direção à maturidade, nãosomente no crescimento físico, masprincipalmente num crescimento in-terior, multidimensional e qualitati-vo. Uma educação que faça uso detodas as potencialidades do cérebromente, uma vez que todos os aspec-tos que o compõem se influenciammutuamente.

“Gosto de ser homem, de ser

gente, porque sei que a minha passa-gem pelo mundo não é predetermi-nada, preestabelecida. Que o meu‘destino’ não é um dado mas algo queprecisa ser feito e de cuja responsabi-lidade não posso me eximir. Gostode ser gente porque a História em queme faço com os outros e de cujafeitura tomo parte é um tempo depossibilidades e não de determinismo.Daí que eu insista tanto naproblematização do futuro e recusesua inexorabilidade.” (Paulo Freire)

Olívia C. V. Chicolami é pós-graduada em Ensino de Matemática,mestranda em Educação e professora doCurso de Sistemas de Informação doIMAPES

Referências Bibliográficas

FREIRE, Paulo (1999). Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra S/A

MORAES, Maria Cândida (2000). O Paradigma Educacional Emergente. São Paulo: Papirus.

ZOHAR, Danah & MARSHALL, Ian (2000). Inteligência Espiritual. Rio de Janeiro: Record.

VEJA Revista. 19 de Agosto de 1998.

Tratamento de efluentesMarcelo Sartoratto* , Aline Tatiane Andrade**, Ricardo Carvalho Canatto**,

Sérgio dal Belo**, Vinícius Monteiro Fonda**

Introdução

Atualmente, a preocupação

RESUMO

A Iniciação Científica dentro deum curso de nível superior é uminstrumento que permite introduzir osestudantes potencialmente promis-sores à pesquisa científica. Dessaforma, o IMAPES possibilitou com esteprojeto o contato com a atividade decriação, discussão e organização dosaber científico, caracterizando o apoioteórico e metodológico para realizaçãodos projetos de pesquisa de interesseda Instituição e que contribuem parao aprofundamento e melhoria daqualidade do ensino de graduação.

O tema Tratamento de Efluen-tes foi escolhido para o estudo cientí-fico, para evitar o descarte inadequa-do dos materiais gerados nos labora-

tórios da Organização Sorocabana deEnsino (OSE-COC) e do Instituto Man-chester Paulista de Ensino Superior(IMAPES), além de visar a recupera-ção de reagentes, e principalmente aconscientização ambiental dos alunosda entidade, pois o conceito de trata-mento, recuperação e reciclagem é pri-mordial para a manutenção e preser-vação do meio ambiente, hoje grande-mente agredido pelas mais diversasfontes poluidoras.

Este artigo mostra todo o levan-tamento e tratamento desenvolvidospara os efluentes dos laboratórios quí-micos do IMAPES e da OSE-COC.

O tema Tratamentode Efluentes foiescolhido para oestudo científico

para evitar odescarte inadequadodos materiais gerados

nos laboratóriosda Organização

Sorocabana de Ensino(OSE-COC) e do

Instituto ManchesterPaulista de Ensino

Superior (IMAPES)

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62 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

mento da Instituição dentro das nor-mas aplicáveis. O nosso efluente en-quadra-se na categoria 2 para descar-te em rede de esgotos convencional.

Uma vez concluído esse levan-tamento, desenvolveu-se um traba-lho de divulgação do projeto entreprofessores e alunos do IMAPES e

da OSE-COC. O objetivo era infor-mar que, como participantes das ati-vidades de laboratório, todos seriamco-responsáveis pela coleta seletivadesses efluentes, único modo de tor-nar viável o trabalho prático do tra-tamento e recuperação de reagentes.

Para os professores, foi monta-do um manual com orientações e,para os alunos, foi feita uma palestracom material audiovisual.

Iniciada a coleta seletiva den-tro das categorias de efluentes já ci-tadas, a parte experimental do proje-to teve início.

Parte Experimental - tratamentos

Efluente inorgânico semmetais pesados

Caracteriza a maioria dosefluentes gerados nos laboratórios. OpH típico desse material é menor que7, qualificando-o como ácido. PelaLegislação Conama, esse tipo deefluente deve ser tratado de modo aacertar o pH na faixa de 5-9, per-mitindo o descarte direto na rede deesgotos.

Dessa forma, todo o materialcoletado dentro dessa categoria foidevidamente neutralizado com sodacáustica em escamas, onde o pontode neutralização era observado comindicadores coloridos (fenolftaleínamostrou-se um excelente indicadorpara esse controle). Volumes de 2-3Litros eram tratados individualmen-te, uma vez que a reação de neutrali-zação liberava calor em demasia.Acertada a concentração hidrogeniô-nica do meio e aguardado o resfria-mento do material à temperaturaambiente, descartava-se na rede deesgotos.

Efluente inorgânico commetais pesados

A Legislação Conama vigentedetermina que todo metal pesado sejasegregado e, posteriormente, tratado(por sistemas adequados), proibindoo descarte direto dos mesmos na redede esgotos.

Os efluentes dessa categoriaforam tratados com soda cáustica emescamas (bateladas de 2-3 Litros) atéatingir pH > 12 (o controle era feitocom papel de pH universal faixa 0-14).

Uma vez estabelecida essa con-dição, é característica desse meio rea-cional precipitar os hidróxidos dosmetais pesados, permitindo dessa for-ma a separação da solução sobrena-dante, sem os metais, do materialprecipitado.

Uma vez separadas as “fases”, alama recolhida foi seca para reduçãode volume e posterior tratamento.Todo esse material segregado estádevidamente identificado para nãoser descartado sem prévio tratamen-to.

Já a solução sobrenadante foitratada similarmente aos efluentesinorgânicos que não contêm metaispesados, só que agora acertando-se opH na faixa de 5-9 com uma solu-ção de HCl 6M.

Efluentes inorgânicoscontendo prata

com o meio-ambiente vem tornan-do-se assunto de destaque na mídia,visto que os recursos naturais, devi-do às enormes agressões praticadaspelo homem moderno, justificadaspela necessidade do progresso, podemnum curto espaço de tempo deixarde fornecer os subsídios básicos paraa sobrevivência humana. Dentre osrecursos naturais, o de maior impor-tância desse quadro alarmante é aágua potável.

Baseado nesse enfoque foi queo Projeto de Iniciação Científica doCurso de Bacharelado em Químicado Instituto Manchester Paulista deEnsino Superior resolveu escolher otema Tratamento de Efluentes dosLaboratórios Químicos do IMAPESe OSE-COC, com o propósito depromover a pesquisa de métodos detratamento e reciclagem de reagen-tes, mas também de criar a consciên-cia ambiental dos futuros profissio-nais da Química que essa instituiçãode ensino pretende formar.

Levantamento dos dados

O trabalho foi iniciado com apesquisa e levantamento de todos osreagentes do almoxarifado químicodos laboratórios, para que pudessemser avaliados e previstos os possíveisefluentes gerados, decorrentes daspráticas desenvolvidas pelos profes-sores. Foram consideradas quatro ca-tegorias principais de efluentes:

• Efluentes inorgânicos semmetais pesados

• Efluentes inorgânicos commetais pesados

• Efluentes Iinorgânicos con-tendo prata

• Efluentes com solventes or-gânicos (nessa categoria, os efluen-tes orgânicos gerados deveriam serguardados separadamente e devida-mente identificados para posteriorrecuperação através de destilação àpressão reduzida).

Além dessa avaliação inicial,um estudo da Legislação Conama vi-gente sobre descarte de efluentes foifeito para a verificação do enquadra-

Para os professores,foi montado um

manual comorientações. Para os

alunos, foi feitauma palestra com

materialaudiovisual.

Iniciada a coletaseletiva, teve início

a parteexperimental do

projeto

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Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003 63

Os sais de prata caracterizam-se pelo alto custo de aquisição entreos reagentes utilizados nas práticas delaboratório. Dessa forma, a recupe-ração da prata, permitindo a reutili-zação em novas práticas, representauma economia para a Instituição deEnsino, que pode assim investir emmelhorias para os próprios alunos.

O tratamento foi feito acertan-do-se o pH do efluente na faixa de 5-6 e adicionando-se, na seqüência,uma solução de cloreto de sódio a10% para a formação e precipitaçãodos respectivos cloretos.

Novamente, a solução sobrena-dante, isenta de prata, foi tratada con-vencionalmente (acerto de pH na fai-xa de 5-9) e descartada na rede deesgotos. A prata recuperada será ob-jeto de trabalho do Projeto 2003 daIniciação Científica do IMAPES, queirá desenvolver um método de con-versão desse metal para a forma denitrato de prata, sal convencional-mente utilizado nas práticas de labo-ratório.

Efluentes orgânicos

Esse tipo de efluente requerum cuidado especial. Uma vez queos solventes orgânicos possuem pon-tos de ebulição distintos das soluçõesaquosas, é possível recuperá-los atra-vés de destilação à pressão reduzida,com o uso de evaporador rotativo(rota-vapor). Entretanto, as diferen-ças de pontos de ebulição entre ossolventes orgânicos muitas vezes nãosão significativas. Essa característica

determina que os efluentes conten-do solventes orgânicos diferentes de-vem ser armazenados em frascos se-parados, devidamente identificados.

Uma vez coletados adequada-mente, os efluentes com solventes

orgânicos foram destilados (bateladasde 0,5 Litro ) no evaporador rotati-vo. O solvente reciclado, após a des-tilação, está pronto para reutilização.A pequena quantidade de materialresidual, contendo solução salina, foisegregada e identificada.

Esse procedimento também re-flete economia para a instituição deensino, uma vez que a compra de sol-ventes orgânicos deverá diminuirconsideravelmente com a aplicaçãorotineira desse método.

O evaporador rotativo aqui ci-tado foi uma das aquisições que oIMAPES fez, demonstrando totalapoio ao projeto.

Conclusão

A metodologia aplicada é viá-vel, permitindo a diminuição de des-carte dos efluentes na rede de esgo-tos, viabilizando a recuperação dereagentes e despertando a consciên-cia ambiental entre os alunos. O tra-balho teve a repercussão desejada,uma vez que permitiu a participaçãonão só do grupo que constituía aequipe de Iniciação Científica, masde todos os alunos, tanto dos cursostécnicos da OSE-COC como dos denível superior do IMAPES.

Agradecimentos

Todo o Grupo da IniciaçãoCientífica agradece o apoio dado pelaInstituição de Ensino, na pessoa dodiretor geral, prof. Nelson Raul daCunha Fonseca, da coordenadora doCurso de Bacharelado em Química,a profa Dra. Tânia Akiko Anazawa, ede todos os alunos do IMAPES e daOSE-COC que colaboraram no pro-cesso na coleta seletiva dos efluentes.

* Marcelo Sartoratto é professor orien-tador do Projeto de Iniciação Científi-ca do IMAPES, bacharel em QuímicaTecnológica pela Unicamp, encarrega-do do Laboratório de Análises Ambien-tais do Centro Tecnológico da Marinhaem São Paulo (CTMSP).** Aline Tatiane Andrade, RicardoCarvalho Canatto, Sérgio dal Belo eVinícius Monteiro Fonda são alunos do5º Semestre do Curso Bacharelado emQuímica do IMAPES.

Referências Bibliográficas

CETESB - Manual de Tratamento de Efluentes Químicos Gerados em Laboratório , 2000.

CETESB - Legislação Estadual - Controle da Poluição Ambiental do Estado de São Paulo, Março 1992.

CONAMA - Legislação Ambiental do Conselho Nacional do Meio-Ambiente, 1999.

O trabalho teve arepercussão

desejada, uma vezque permitiu a

participação nãosó do grupo

que constituía equipe

de IniciaçãoCientífica,

mas de todos osalunos

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64 Revista Científica do IMAPES - Abril de 2003

A Revista Científica do IMAPES destina-se, primordialmente, à publicação de artigos pro-duzidos no âmbito dos cursos mantidos pelo Ins-tituto, mas também está aberta às colaboraçõesexternas. Para facilitar a participação dos auto-res, facilitar a leitura e também padronizar as pu-blicações do ponto de vista formal, foram elabo-radas algumas normas, para as quais pede-se amáxima atenção.

1. Tipos de artigos

A Revista Científica do IMAPES destina-se à divulgação de textos de caráter científico ecultural produzidos por professores, grupos depesquisas e alunos desta Instituição, além de co-laboradores externos. Os temas e a forma deabordá-los são de livre escolha de seus autores.

Quanto à forma, os textos podem ser:• resumos de teses e dissertações acadêmi-

cas;• artigos de análise e opinião;• relatórios de projetos e experimentações

científicas;• resenhas de livros, artigos e trabalhos ci-

entíficos;• resumos de conferências.Não há limite mínimo ou máximo de es-

paço para os artigos, mas, por aspectos de ade-quação editorial, sugere-se entre 5 mil a 10 milcaracteres (com espaços) para artigos em geral, eentre 20 mil a 30 mil caracteres (com espaços)para análises de maior profundidade. (Como re-ferência, considerar que 5 mil caracteres equiva-lem a uma página A4, preenchida na fonte Arial,corpo 10, entrelinha normal).

2. Entrega dos textos

Os textos devem ser fornecidos em disque-te de 3,5" ou CD-Rom, ou, ainda, enviados pore-mail. O autor receberá um protocolo (impres-so, quando a entrega for feita pessoalmente; porfax, quando o envio for feito por Correio, oueletrônico, quando este ocorrer via internet), in-formando a data do recebimento do artigo, nomedo funcionário que o recebeu e um número dereferência.

Os textos, devidamente titulados, revisa-dos e atualizados, devem ser gravados em Wordfor Windows (formatos “doc” ou “rtf ”). O autordeve fazê-los acompanhar de uma declaração deautoria e cessão de direitos autorais para publica-ção (ver modelo abaixo). Quando o autor utili-zar-se de e-mail para enviar o artigo, esta decla-ração, devidamente assinada, poderá ser enviadapor fax ou pelo correio.

Fotos, tabelas, mapas e outras figuras de-vem ser fornecidos em arquivos que utilizem osistema de bitmap (tiff, bmp, jpg), com resolu-ção de 300 dpis.

MODELO: TERMO DE CESSÃO DEDIREITOS AUTORAIS

Eu, nome completo, RG, CPF, residente àrua, número, cidade, Estado, declaro para efeitode publicação na Revista Científica do IMAPESque sou o autor do artigo intitulado “Título do

artigo”, cuja publicação autorizo, sem que dissodecorra qualquer tipo de ônus para a Instituição.

Cidade, data.Nome e assinatura.

3. Endereço para entrega

Os disquetes devem ser entregues pessoal-mente ou pelo Correio ao:

Conselho Editorial da Revista Científicado IMAPES - Att.: Secretaria Executiva - Ruada Penha, 620, Centro, Sorocaba, SP - CEP18010-002.

Os arquivos digitais, via e-mail, devem serenviados para [email protected]. Caso o autor nãoreceba e-mail confirmando o recebimento em atécinco dias, pede-se que entre em contato pelofone (15) 233-0351.

4. Critérios de avaliação

Os artigos serão analisados pelo ConselhoEditorial, que selecionará os textos a serem pu-blicados de acordo com a importância e inova-ção do conteúdo, clareza e correção da lingua-gem. Também será considerado, como fator de-sejável, embora não obrigatório, o ineditismo dotexto. Os artigos não utilizados numa edição po-derão ser programados para outras edições, po-dendo o Conselho Editorial, neste caso, solicitara colaboração do autor em sua atualização.

Os editores reservam-se o direito de proce-der a pequenas adequações em parágrafos e grá-ficos, com vistas às necessidades da diagramação.Também serão corrigidos erros gramaticais e as-pectos de estilo, sem prejuízo do conteúdo. Ostítulos poderão ser modificados, para atender aaspectos de paginação, devendo, neste caso, serconsultado o autor sobre o novo título.

5. Sugestão para estruturação de texto

Os autores têm total liberdade para esco-lher a forma como apresentarão suas idéias. En-tretanto, para efeito de organização e padroniza-ção editorial, sugere-se que resumos de teses, dis-sertações e outros textos de maior profundidadeobedeçam à seguinte estrutura:

a. Título do trabalhob. Nome(s) completo(s) do(s) autor(es)c. Resumo de até 200 palavras.d. Texto.e. Informações sobre o autor (formação

acadêmica, fazendo constar sempre o título maiselevado, funções profissionais desempenhadas nomomento e outras referências importantes, comopesquisas e especializações).

f. Referências bibliográficas.g. Telefone para contato.Os textos poderão ser desenvolvidos por

tópicos, sendo desejável, mas não obrigatório, quepossuam uma introdução e considerações finais.

6. Convenções de texto

Veja, a seguir, exemplos de citações, notase outras convenções.

Citações trazem autor e data de publicação:

Os dados indicam que a população regio-nal cresceu 4% em 1998 (Smiths, 2002).

Citações literais vêm entre aspas e indicam apágina de onde foram extraídas:

“A população regional cresceu 4% em1998.” (Smiths, 2002, p. 142)

Sínteses de passagens literárias dispensam as-pas. Usa-se Cf. antes do nome do autor. Exemplo:

Em 98, o crescimento populacional da re-gião foi de 4%. (Cf. Smiths, 2002, p. 142)

Se o nome do autor estiver no corpo do texto,acrescenta-se apenas referência ao ano da publica-ção. Exemplo:

Smiths (2002) afirma que a população...

Caso a obra citada tenha até três autores,deve-se citar a todos:

(Smiths, Stevenson e Martinelli, 2001).

Se houver mais de três autores, deve-se no-mear a todos na primeira menção e, nas citaçõessubseqüentes da mesma obra, colocar apenas o nomedo primeiro autor, seguido da expressão “et al.”:

(Smiths et al., 2001).

A seção Referências Bibliográficas, ao finaldo artigo, deve conter informações sobre todasas obras citadas, conforme esquema abaixo.

Citação de livro:NÓBREGA, Augusto S. Estudos sobre ad-

ministração moderna; a empresa na nova econo-mia. 2a ed. São Paulo: Futura, 2002.

SMITHS, Paul L; STEVENSON, John;MARTINELLI, Luiz C. Novas técnicas de análi-ses químicas; perspectivas tecnológicas. 5a ed. San-tos: Exata, 1998.

Citação de artigo assinado incluem volume,número, páginas e data:

ALMEIDA, Antônio C. J. Sistemas de in-formação e o planejamento de marketing. Revis-ta do Administrador, São Paulo, v. 1, n. 2, 92-99,out. 1996.

Citação de artigo não assinado:CONJUNTO de medidas beneficiará eco-

nomia. Folha Regional, 31.10.2002, p. 8, c. 1.

Citação de artigo publicado na internet:SCHMIDT, Otto V. Critérios para avalia-

ção de trainées. http://www.empresavirtual.org.br/artigos/schmidt. Acessado em 23 out. 2001.

Se o autor preferir, pode numerar as notas dereferência bibliográfica, citando apenas o númerorespectivo no corpo do texto. Exemplo:

Em (3) vemos que...

Para um detalhamento dos exemplos aci-ma, bem como os casos omissos nestas normas,indicamos o livro Metodologia do Trabalho Cien-tífico, de Antônio Joaquim Severino (Cortez Edi-tora, 22a edição), págs. 106 a 132, disponível nabiblioteca do IMAPES.

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