Recursos naturais1(Sebenta de Geografia A)

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(continua) - 1 - 3. Os Recursos Naturais Disponíveis Ponto de partida: A importância dos recursos naturais Nesta terceira parte da Sebenta de Geografia A, vamo-nos dedicar aos recursos naturais. Se a população de um país é o seu principal recurso humano pouco poderia fazer para assegurar a sua própria existência se, a Natureza, não pusesse ao seu dispor bens utilizáveis. Ar e água são vitais para manter a vida. Com a descoberta da agricultura e a domesticação dos animais, o Homem inaugurou o seu papel de produtor e, progressivamente, o papel de delapidador de recursos naturais. Durante milhares de anos, este desempenho evoluiu de forma muito lenta. Porém, a partir da revolução industrial e a um ritmo cada vez mais acelerado, o aproveitamento que passou a fazer dos recursos naturais atingiu tais proporções que, a diferentes escalas geográficas, criou uma intricada rede de preocupações. O esquema da figura 1 mostra, de acordo com as respostas obtidas a nível mundial, a perceção dos riscos que mais se evidenciarão nos próximos 10 anos. Fig.1 - Pesquisa de Perceção dos Riscos Globais de 2015 Fonte: The Global Risks Report 2016 11th Edition, World Economic Forum

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3. Os Recursos Naturais Disponíveis

Ponto de partida: A importância dos recursos naturais Nesta terceira parte da Sebenta de Geografia A, vamo-nos dedicar aos recursos naturais. Se a população de um país é o seu principal recurso humano pouco poderia fazer para assegurar a sua própria existência se, a Natureza, não pusesse ao seu dispor bens utilizáveis. Ar e água são vitais para manter a vida. Com a descoberta da agricultura e a domesticação dos animais, o Homem inaugurou o seu papel de produtor e, progressivamente, o papel de delapidador de recursos naturais. Durante milhares de anos, este desempenho evoluiu de forma muito lenta. Porém, a partir da revolução industrial e a um ritmo cada vez mais acelerado, o aproveitamento que passou a fazer dos recursos naturais atingiu tais proporções que, a diferentes escalas geográficas, criou uma intricada rede de preocupações.

O esquema da figura 1 mostra, de acordo com as respostas obtidas a nível mundial, a perceção dos riscos que mais se evidenciarão nos próximos 10 anos. Fig.1 - Pesquisa de Perceção dos Riscos Globais de 2015 Fonte: The Global Risks Report 2016 11th Edition, World Economic Forum

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Mudanças climáticas, degradação ambiental, envelhecimento populacional, aumento da riqueza e agravamento das desigualdades e polarização crescente das sociedades são algumas das tendências identificadas e que, pela observação da figura 1, nos leva a admitir que são respostas a riscos de diferente natureza. Sejam riscos económicos, ambientais, geopolíticos, sociais ou tecnológicos, a sua apreciação é vivenciada a todas as dimensões e ascende à escala global. Casos de profunda instabilidade social, as migrações involuntárias a grande escala, o desemprego e o subemprego, as crises alimentares e as crises da água são exemplos de problemas que nos preocupam e podem, num efeito de dominó, afetar-nos mesmo se, o foco de origem, nos parece longínquo. A tão falada globalização, o encurtamento das distâncias, a liberdade de circulação, os variados palcos regionais de conflitos armados, abrem corredores por onde, com toda a facilidade, as interconexões são urdidas. Muitas vezes, ocupamos o lugar de marionetas num jogo de xadrez cujas pedras são movimentadas por interesses de quem parece dominar o poder. Daí, a necessidade imperiosa que cada um deve ter de se interessar por conhecer a realidade que o rodeia, discutir os problemas e criar uma consciência avisada. É conhecendo que se pode reivindicar e, para tal, não se pode assumir uma atitude passiva. Obviamente, que as tendências e os riscos mencionados não atingem de igual modo todos os países. Sabemos, pelo que estudamos no ensino básico, que o mundo se divide entre o conjunto de países desenvolvidos e o dos países em desenvolvimento. Uma dicotomia entre os que, não tendo os recursos necessários, os compram e transformam, e os que, detendo recursos, nomeadamente, minerais, os vendem a preços que lhes são impostos por quem lhos compram, sempre, a um preço muitíssimo inferior ao valor que hão de pagar pela aquisição dos produtos transformados por quem domina a tecnologia. Não é por acaso que, aos primeiros, se apelide de Primeiro Mundo, ricos ou tecnologicamente evoluídos. Trata-se de um grupo restrito de países que, com a revolução industrial, iniciaram um percurso de domínio do restante mundo. Passaram pela segunda revolução industrial, acolheram a terceira e “alimentam” a quarta revolução industrial. Depois da primeira revolução (com o aparecimento da máquina a vapor), da segunda (eletricidade, cadeia de montagem) e da terceira (eletrónica, robótica), surge a quarta revolução industrial que combinará numerosos fatores como a internet dos objetos ou a "big data' para transformar a economia.

http://www.dn.pt/dinheiro/interior/a-4a-revolucao-industrial-vai-destruir-5-milhoes-de-empregos-4987944.html

“... o caminho da indústria portuguesa passa por aproveitar, de forma mais eficiente, o potencial científico e técnico gerado no meio académico e no tecido empresarial para encontrar as melhores soluções para melhorar a sua capacidade concorrencial ... O trabalho já realizado por algumas das empresas nacionais permitiu-lhes competir no mercado global com um posicionamento completamente diferente do tradicional. Está, hoje, mais associado a estratégias de diferenciação e inovação de produto e de processo. Ou seja, não fazem apenas coisas novas. Também produzem de forma diferente.

Fig.2 - A fábrica da Siemens (na imagem) em Amberg, Alemanha, é um dos expoentes máximos da 4ª revolução industrial. D.R._ Expresso Economia, 07/05/2016

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O grupo mais numeroso de países, em contrapartida, integra situações muito diversas. De forma simplista são apelidados de Terceiro Mundo, pobres ou atrasados tecnologicamente. Porém, há, dentro deste extenso grupo, exemplos de países que, embora, tenham descolado tardiamente para a indústria, conseguiram, por razões variadas, emergir no contexto global sendo apelidados de, por exemplo, “Tigres asiáticos” ou BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). São países, pois, conhecidos como “emergentes” que, apesar de terem adotado práticas económicas próprias do Primeiro mundo, persistem com baixos níveis de desenvolvimento humano. No entanto, seja qual for o seu posicionamento, todos eles estão sujeitos a riscos que afetam todo o planeta. À escala regional, a perceção dos riscos revela, de forma mais contundente, diferenças quer nas categorias quer na dimensão que parecem atingir. Por exemplo, para o continente europeu, o problema maior com que se confronta é o da migração involuntária com uma expressão significativa. Desemprego e subemprego e crise fiscal são, de acordo com o planisfério da figura 3, os outros riscos que a Europa enfrenta.

Fig.3 – Os principais riscos identificados à escala regional. Por exemplo, fenómenos climáticos extremos, na América do Norte, crises relacionadas com a partilha da água, no Médio Oriente, catástrofes naturais, no Extremo Oriente, conflitos entre estados na Ásia Central e na Rússia.

À escala local, como é a situação do nosso país? Em termos de posicionamento internacional pertencemos ao grupo dos países ditos desenvolvidos. Se atendermos ao IDH ocupávamos o 43º lugar num total de 187 países, atrás da maioria dos países europeus. Somos, em termos de recursos, considerados como um país pobre.

Mas, será, que é tanto assim ou será que sofre de uma desadequada exploração do que a natureza lhe proporcionou? Por exemplo, no capítulo dos recursos do subsolo, já os

Fonte: The Global Risks Report 2016 11th Edition, World Economic Forum

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romanos se sentiram atraídos pelos minerais, nomeadamente, os metálicos, existentes no nosso território. Hoje, a maioria das nossas minas fecharam. Será porque entrou em desuso a matéria prima mineral metálica? Redondamente, diremos que não. Então como justificar a situação? Bom, às vezes, pode ter sido porque o filão esgotou ou está situado a tal profundidade que não compensa continuar a explorá-lo. Ou, o que tem sido a grande razão em muitas das decisões de encerramento, apenas porque o preço cotado internacionalmente baixou tanto que deixou de se justificar economicamente a continuidade da sua extração. Deixamos, por isso, de precisar deles? Também não. Sucede é que há os tais países ricos em recursos que vendem tão barato que, mesmo acrescendo os custos dos transportes, se justifica importá-los em vez de manter a sua exploração onde os custos da mão de obra, das regalias sociais e a menor produtividade não compensam segundo o princípio da pura racionalidade económica. Haverá, ainda, casos de potenciais recursos que o país possui, mas que carecem de identificação e se são ou não potencialmente exploráveis.

Olhemos, então, para os recursos naturais de que o país dispõe e que convém conhecermos: recursos do subsolo, do solo, da água, da floresta e do ar, respetivamente, geológicos, pedológicos, hídricos, biológicos e climáticos. Por comodidade de estudo iremos falar de cada um deles em separado. Na Natureza, contudo, todos eles estão interligados mantendo-se num “funcionamento sistémico” (fig.4).

Fig.4 – “O funcionamento sistémico dos recursos naturais” in OS RECURSOS NATURAIS EM PORTUGAL: INVENTARIAÇÃO E PROPOSTA DE UM MODELO GEOGRÁFICO DE AVALIAÇÃO – Ramos Pereira; J.L. Zêzere; P. Morgado

Os recursos naturais são bens susceptíveis de aproveitamento económico ou de utilização pela

Humanidade e que, por princípio, não são produzíveis pela acção

humana. A sua importância só recentemente

tem vindo a ser assumida, dado o seu papel reciclador,

decompositor e de filtro da água e do ar, num quadro em que o seu uso nem sempre tem sido feito de

forma sustentável. Essa consciência foi assumida no

Programa Ambiente das Nações Unidas (UNEP, 2002), ao

considerar a conservação dos recursos naturais como um dos três

principais desafios com que a Humanidade se confronta.

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“O conhecimento que tivermos da Base de Recursos que a Geologia e a História nos legaram e o modo como a soubermos explorar e aproveitar serão, como sempre foram, fatores determinantes de progresso e bem-estar social”.

Delfim de Carvalho in Passado e Futuro dos Recursos Naturais em Portugal. Façamos, agora, a pergunta óbvia: onde se localizam os recursos que temos? Os mapas seguintes vão dar-nos algumas respostas.

Fig.5 – Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Fig.6 – Grandes unidades geológicas e distribui- Inovação, IP ção dos principais depósitos minerais. (Delfim de Carvalho, obra citada)

Os mapas das figuras 5 e 6 complementam-se. Na carta geológica estão identificadas designações de períodos geológicos que ocorreram ao longo da formação da crosta terrestre. Nas grandes unidades geológicas podemos extrair que, no soco hercínico e proterozoico, se encontra a maior variedade de jazidas minerais. São 7/10 do território continental, a parte mais velha, a que se formou há mais tempo, aquela onde

“se localizam a quase totalidade das ocorrências metálicas e os principais depósitos minerais do País (...) formação do depósito de Moncorvo (Fe) e a dos importantes jazigos de sulfuretos polimetálicos da Faixa Piritosa, em especial Neves-Corvo (Cu, Sn, Zn, Pb, Ag, S) e Aljustrel (Cu, Zn, Pb, Ag, S)... Ligados ao vulcanismo há ainda a referir pequenos depósitos e ocorrências de Mn na Faixa Piritosa ..., os de Zn-Pb (Ag) -Cu ... e

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os de Fe ... o jazigo de volframite da Panasqueira (Fundão), mundialmente famoso por ser o primeiro produtor de tungsténio da Europa desde 1934 e também pela rara beleza e espetacularidade dos cristais. Juntamente com o W a Panasqueira produz também Sn e Cu como subprodutos. Além deste há a referir, entre outras: as jazidas de ouro e prata de Jales (Vila Pouca de Aguiar), de tungsténio (volframite e scheelite) da Borralha (Montalegre) - durante muito tempo o segundo produtor em Portugal - e ainda as de Argozelo (Sn-W), Montesinho (Sn), Vale das Gatas (W-Sn), todos em Trás os Montes, e a do Cercal (Fe-Mn-Ba), no Alentejo ... os jazigos de caulino que se formaram por alteração de minerais primários ... os pequenos depósitos de antracite da bacia carbonífera do Douro (Pejão, S. Pedro da Cova), os consideráveis jazigos de evaporitos (sal-gema e gesso) ... Para além destes recursos importa destacar a relevante importância económica das rochas ornamentais que advém das enormes reservas e boa qualidade de mármores, granitos e calcários , bem como a riqueza e variedade de águas minerais (38 termas) e de águas de nascente”.

Delfim de Carvalho (obra citada) “Por outro lado, Portugal dispõe de uma das maiores zonas económicas exclusivas marítimas (ZEE) da Europa, com mais de 1 700 000km2, o que corresponde a cerca de 18 vezes a sua área terrestre. Existe, ainda, a possibilidade de vir a contar com espaços marítimos sob sua soberania ou jurisdição que poderão exceder, em muito, a atual área da ZEE. Este extenso espaço marítimo encerra recursos geológicos e minerais relevantes, cuja utilização importa investigar e dinamizar”.

LICENCIAMENTO DA ATIVIDADE MINEIRA EM PORTUGAL http://www.visaconsultores.pt/servicos.php?code=4

Como podemos deduzir dos dados anteriores, aparentemente, o país parece rico em recursos do subsolo. Todavia, não somos autossuficientes e estamos muito dependentes da conjuntura do momento e do contexto internacional. Isto mesmo é traduzido pelos gráficos disponibilizados pela “Informação Estatística nº17”, com dados de dezembro de 2015 de minas e pedreiras, publicada pela Direção Geral de Energia e Geologia.

O minério de cobre foi o mais explorado seguido das águas minerais e de nascente

Fig. 7- Principais substâncias produzidas em 2014

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Fig.8 – Minerais para construção (talco, gesso, quartzo...) e minérios metálicos (entre eles o cobre) são os que atingiram maiores valores de produção ao longo de oito anos. 2007 a 2014. Fig.9 – Estrutura do valor das saídas e das entradas dos recursos do subsolo em 2014

Fig.10 – O cobre é, atualmente, o mineral metálico que atinge a maior produção como, também, é o mais exportado. Seguem-se as rochas ornamentais (mármores, calcários e granitos).

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Fig.11 – Ao longo de uma década o setor das águas, de nascente e minerais, sofreu uma evolução irregular com os anos de 2011, 12 e 13, a registaram os maiores volumes de engarrafamento. As campanhas a favor de “se conduzir não beba” e o agravamento das penas nos casos de excesso de bebida alcoólica têm contribuído para um aumento das vendas do produto engarrafado. A qualidade das águas justifica o sucesso das suas exportações. A quebra registada em 2014 pode ser explicada pela conjuntura económica, quer nacional, quer nos países importadores.

Fig.12 – Até à década de 90 do século XX (a última mina de carvão na Bacia Carbonífera do Douro encerrou em 1994) Portugal explorou jazidas de carvão. Esta rocha sedimentar orgânica é, ainda, utilizada em centrais térmicas. Daí que, desde então, o país recorra à sua importação.

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Fig.13 – Neste gráfico é notória a redução do número de estabelecimentos em atividade entre 2005 e 2014, uma redução de 29% Recordados os recursos do subsolo, foquemo-nos, agora, nos recursos hídricos.

O texto evidencia um facto inquestionável, a água é vital para a nossa sobrevivência e, sem ela, nenhuma forma de vida será viável. Qual é o maior drama associado a este recurso indispensável? A sua escassez e a sua procura. Hoje, “transformou-se” numa autêntica causa de conflitos inter-regionais. É o chamado “ouro branco”. Apesar de ser o composto mais abundante no planeta, a água hoje é um bem escasso. Menos de 0,01% do volume total de água existente na Terra está disponível para ser usada pelo ser humano ... a maior parte da água não pode ser consumida pois é salgada ou encontra-se sob a forma de gelo, pelo que nos resta a água vinda dos rios, lagos e aquíferos subterrâneos. Além disso, 70% dessas águas subterrâneas encontram-se a grandes profundidades, dificultando a sua utilização económica. Pensando no ciclo natural da água, sabe-se que, do total de precipitação anual sobre os continentes, 65% volta à atmosfera e que, do restante, a maior parte é escoamento subterrâneo e que 30% é escoamento superficial. Ora, neste ciclo natural o ser humano foi introduzindo um elo que altera o equilíbrio global e que apresenta duas facetas: os níveis de consumo de água e

Endereço para consulta de um folheto informativo muito interessante http://www.lneg.pt/download/1446/folheto_minerais.pdf

– 1/6 da população mundial não tem acesso a água potável; – 40% dos habitantes do planeta não têm acesso a serviços de saneamento básico; – Cerca de 6 mil crianças morrem diariamente devido a doenças ligadas à água insalubre e a saneamento e higiene deficientes; – Segundo a ONU, até 2025, se os atuais padrões de consumo se mantiverem, duas em cada três pessoas no mundo vão sofrer escassez moderada ou grave de água.

http://brasildasaguas.com.br/educacional/a-importancia-da-agua/

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a poluição da mesma. Fatores como o estilo de vida dos cidadãos dos países desenvolvidos, tem levado à sobre-exploração de “depósitos” que podem levar muito tempo a recuperarem para, assim, reequilibrarem o ciclo da água (consumo médio de 200 m3/dia/per capita). Em regiões onde a situação de falta de água já atinge índices críticos de disponibilidade, como nos países do Continente Africano, a média de consumo de água por pessoa é de 19 m3/dia. Segundo a Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), menos da metade da população mundial tem acesso à água potável. A irrigação corresponde a 73% do consumo de água, 21% vai para a indústria e apenas 6% destina-se ao consumo doméstico. No nosso país, enquanto que a norte, o balanço entre as necessidades e os consumos ainda são positivos, da zona da Estremadura para sul, as necessidades e os consumos são maiores do que a disponibilidade de água. Estes consumos distribuem-se, a nível nacional, pelo sector agrícola, gastando a rega 74,5% de toda a água fornecida; pelo sector energético que consome 14%; a água para abastecimento residencial que ocupa 6,7%; a indústria com 4,4% e o turismo com 0,4% do total (Fonte: Relatório do Estado do Ambiente – 2001). Às modificações na quantidade de água disponível nos “depósitos” do ciclo da água soma-se a faceta desse elo relacionada com a poluição. A contaminação das águas que são devolvidas pelo ser humano ao meio recetor (rios, mar ou solo) tem tomado a formas de esgotos domésticos incluindo detergentes, poluição industrial (ex. produtos químicos vários) e agrícola, causada por práticas intensivas (ex. pesticidas e fertilizantes.

SOBRE A IMPORTÂNCIA DE PRESERVARMOS A ÁGUA… http://ambiente.maiadigital.pt/

O texto adaptado de maiadigital.pt, alude aos contrastes na distribuição geográfica dos recursos hídricos entre o Norte e o Sul de Portugal continental, a que poderemos acrescentar os que existem entre o Litoral e o Interior. Contrastes que resultam da influência que diversos fatores naturais exercem sobre os elementos de clima.

Temperatura, humidade, precipitação atmosférica e vento foram estudados nas aulas, um a um, para melhor percebermos como atuam. Não podemos esquecer que, na origem de todos estes fenómenos, está o Sol e a atmosfera que envolve a Terra.

Se o Sol, considerado uma estrela pequena, não estivesse a uma distância que permite que a sua radiação leve só 8 minutos a chegar à Terra e se, antes dessa radiação incidir na superfície terrestre, não fosse sujeita a “cortes”, então não existiria vida neste planeta. A atmosfera terrestre protege-nos dos excessos da radiação. Perdas por reflexão, difusão e absorção são essenciais, particularmente, o desempenho de “filtro”estratosférico que absorve entre 15 a 19% de radiação ultravioleta, para que cerca de metade da radiação seja consumida antes de chegar à camada em contacto com a superfície terrestre – a troposfera. É, aqui, nos seus primeiros 4km de altitude, que todos os fenómenos meteorológicos conhecidos ocorrem. Daí, a instabilidade frequente observada e registada

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nesta camada. Por ação da gravidade, 75% da massa atmosférica e 80 a 90% da humidade concentram-se aqui onde a interação com a litosfera, a hidrosfera e a biosfera é de tal modo interdependente que, qualquer alteração num deles implica reajustamentos no conjunto.

De facto,condições meteorológicas, circulações oceânicas, modelação da crusta terrestre e fenómenos biológicos1, são processos físicos e químicos com uma única origem: a energia emitida pelo Sol e que, em parte, chega até à superfície terrestre, nela penetra e dela é irradiada para a atmosfera, um balanço de “perdas” e “ganhos” equilibrado que justifica a afirmação “A Terra está em equilíbrio térmico”.

De forma incessante, a atuação dos fenómenos físicos está na origem, por exemplo, do ciclo da água, cuja interpretação resume o essencial da interdependência dos fenómenos que ocorrem na atmosfera, hidrosfera, litosfera e biosfera. Recordemo-lo:

Fig.14 –O Ciclo da Água http://biologiacesaresezar.editorasaraiva.com.br/navitacontent_/userFiles/File/Biologia_Cesar_Sezar/Bio3_332.jpg Quando chove, parte dessa precipitação é retida pela vegetação, depressões e construções. Depois, por evaporação, retorna à troposfera, e/ou infiltra-se no solo. Seja porque vá alimentar a vegetação, toalhas freáticas ou, ainda, porque vá escorrer alimentando rios, lagos ou chegue atá ao oceano, escoando à superfície ou subterraneamente, esta água vai voltar à atmosfera e realimentar o ciclo iniciado. As próprias plantas desempenham o seu papel neste processo contínuo de reciclagem através da evapotranspiração. Pelas raízes absorvem água, pelas folhas devolvem-na pela

1 J. Pinto Peixoto, 1981: A Radiação Solar e o Ambiente. Secretaria de Estado do Ambiente, Lisboa.

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transpiração. Por ação do calor, a água em circulação sofre evaporação e vai contribuir para o reinício do ciclo. Tentemos, agora, num exercício de simulação, adaptar este ciclo a Portugal. Neste momento, são 23h do dia 18 de maio de 2016. Como está o tempo?

Fig.15 – IPMA - http://www.ipma.pt/pt/otempo/prev.localidade.hora/ Atendendo à previsão por localidade disponibilizada pelo IPMA – Instituto Português do Mar e da Atmosfera – às 23 horas, do dia 18 de maio de 2016, a temperatura do ar atingiu os 14ºC, valor a manter-se às 0h do dia seguinte, 19 de maio. O pico de temperatura será às 13h do dia 19 e, o valor da mínima, das 3 às 4 h do dia 19. Tal significa que, no dia 19, a amplitude térmica será de 11ºC (23º-12º=11ºC). Quer a 18 como a 19, não houve nem haverá precipitação, embora, em termos de nebulosidade, ao longo das 24 horas, possa haver formação de nuvens. Nos dias posteriores, a previsão mostra outros pormenores interessantes. Nos dias 21, 24, 25, 26 e 27 deverá registar-se precipitação. Comparemos os dados. Com uma temperatura máxima acima dos 20ºC nos dias de sol, o valor desce até aos 15ºC de máxima no dia 26, por coincidência, o dia em que a amplitude térmica é a mais baixa, 2ºC (15º-13º=2ºC). Aliás, a amplitude térmica, neste quadro de dados, é sempre de menor valor nos dias de precipitação do que nos dias secos. Reparemos, também, no rumo do vento. À exceção do dia 19 em que o vento soprará do quadrante Norte, nos dias de chuva é do lado do oceano que se desloca o vento: NW, SW e Sul. Como explicar tudo o que acabamos de extrair da informação do IPMA? Não esqueçamos que estamos a tratar dos recursos hídricos no nosso país!

Antes de mais lembremos a nossa posição geográfica e segundo valores aproximados:

uma latitude que se estende dos 37ºN aos 42º N – o que significa estar situado na Zona Temperada do Norte, isto é, entre a cintura de altas pressões atmosféricas subtropicais (à latitude do Trópico de Câncer) e a cintura de baixas pressões atmosféricas subpolares (à latitude do Círculo Polar Ártico), o mesmo será dizer,

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entre uma massa de ar tropical quente e seca, na origem, e uma massa de ar polar fria e húmida, na origem. Logo, será de esperar termos, genericamente, um clima temperado, mas com diversidade regional. Quanto mais a norte mais próximo do Círculo Polar Ártico, mais frio, mais húmido e menor capacidade de absorção do vapor de água, mais nuvens e mais precipitação. Quanto mais a sul, mais próximo do Trópico de Câncer, mais perto do Norte de África e do deserto do Saara, mais quente, maior capacidade de absorção do vapor de água e, por isso, ar seco.

uma longitude entre os 6ºW e os 9º W – o que quer dizer um contraste entre a faixa litoral ocidental, mais húmida com a proximidade do mar e, daí, mais chuvosa e a faixa interior oriental mais seca.

duas regiões autónomas, a R.A. da Madeira, a SW de Portugal continental, entre os paralelos de 30ºN e os 33ºN e, portanto, muito mais perto do Trópico de Câncer e da massa de ar tropical, quente e seca na origem, e a R.A. dos Açores entre os paralelos de 37ºN e os 42ºN, sujeitos às mesmas massas de ar principais que a parte continental.

Visto a esta escala de localização mista, absoluta e relativa, Portugal é um país com recursos hídricos relativamente abundantes, mas com contrastes territoriais – mais a norte e mais perto do mar mais chuva e mais água; mais a sul e mais afastado do mar menos chuva e menos água.

hídricos superficiais – mais abundantes no Maciço Antigo, a noroeste e na região centro2.

2 Mapas extraídos de OS RECURSOS NATURAIS EM PORTUGAL: INVENTARIAÇÃO E PROPOSTA DE UM MODELO GEOGRÁFICO DE AVALIAÇÃO – Ramos Pereira; J.L. Zêzere; P. Morgado

Fig.16

Nos mapas da figura 16, observamos os contrastes espaciais na distribuição dos recursos hídricos subterrâneos – mais abundantes na Orla ocidental, Bacia sedimentar do Tejo e do Sado e, em parte, da Orla meridional – e dos recursos

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A interpretação das irregularidades patenteadas nestes mapas da figura 16 implica que incluamos novos fatores explicativos: a composição geológica e mineralógica do território e a unidade geológica de formação.

Na unidade geológica mais antiga, onde há predomínio de rochas impermeáveis, relevo mais acidentado e chove mais, as águas escorrem, principalmente e abundantemente, à superfície. Implicações? Os cursos de água, embora de regime irregular ao longo do ano, são mais caudalosos e, por isso, foram escolhidos para a construção de numerosas centrais hidroelétricas, as quais deram origem a igual número de albufeiras. Produção de energia, rega, abastecimento de água para usos domésticos e industriais, navegação, recreio, aquacultura são, entre outros usos, possíveis graças a estes reservatórios de água, fulcrais, ainda, como reservas de água para os períodos de escassez de precipitação e de maior calor.

Nas unidades geológicas meso-cenozóicas – as Orlas Sedimentares Ocidental e Meridional – onde se encontram rochas impermeáveis como os calcários e permeáveis como as areias, por exemplo, predominam as águas subterrâneas. Como explicar isso nos calcários? Apesar de rochas sedimentares os calcários apresentam-se já fortemente consolidados e, aparentemente, deveriam ser impermeáveis. Acontece que, por serem formados por carbonato de cálcio, os calcários são facilmente solúveis nas águas das chuvas, dissolução facilitada pela existência de diáclases por onde se infiltram as águas gasocarbónicas. Deste modo, as fissuras vão sendo alargadas dando origem a formas típicas do relevo cársico. É devido a esta propriedade de se deixar dissolver que se desenvolvem grutas com as caraterísticas estalactites (colunas que “crescem do teto”) e estalagmites (colunas que “crescem” do chão) e, frequentemente, com lagos ou cursos de rios (uns têm circulação somente subterrânea, outros surgem das rochas à superfície – exsurgências – outros, ainda, desaparecem da circulação aérea e reaparecem noutro ponto da superfície – ressurgência. Na prática, o que podemos concluir é que, neste tipo de relevo, as águas circulam mais subterraneamente do que à superfície.

Fig.17 - http://portaldoprofessor.mec.gov.br/ Fig.18 - http://www.hotelrosamistica.com/ (Fátima)

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Na unidade geológica mais recente, a Bacia Sedimentar do Tejo e do Sado, o predomínio das rochas sedimentares soltas (areias, argilas) justifica a facilidade com que as águas se infiltram e a abundância de recursos hídricos subterrâneos (ver fig,16).

A Bacia Terciária do Baixo Tejo integra o maior sistema aquífero do território nacional, tendo os seus recursos hídricos subterrâneos constituído um importantíssimo factor de desenvolvimento, pois tem assegurado numerosos abastecimentos urbanos, industriais e agrícolas.

O USO DA ÁGUA E GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS NA BACIA TERCIÁRIA DO TEJO E DO SADO – Albino Medeiros

http://www2.geo.ua.pt/aih-gp/Eventos/Aguas/resumo_am.pdf Façamos o ponto da situação. As disponibilidades em recursos hídricos estão dependentes de um conjunto de fatores. À escala global, o ciclo da água não funciona em todas as latitudes. Nos desertos não existe água e nas regiões geladas o frio não permite a evaporação. Logo, para que se verifique a sucessão de fases descritas no esquema da figura 14, a radiação solar tem que proporcionar uma temperatura do ar suficiente para que, a partir das águas oceânicas, se dê a evaporação. À escala do nosso território, para entendermos as disponibilidades hídricas ao nosso dispor, igualmente, temos que conectar vários fatores que expliquem os contrastes existentes quando comparamos a informação que nos é transmitida pelos mapas da figura 16. Desde a nossa posição em latitude ao tipo de rochas e, consequentemente, às unidades geológicas a que pertencem, há um conjunto de caraterísticas do país que sustentam a afirmação de que, no seu todo, Portugal é, relativamente, rico em recursos hídricos. No Relatório nº1 do Plano Nacional da Água, publicado em fevereiro de 2015, podemos extrair que: (...) Os recursos hídricos nacionais podem caraterizar-se pela: - relativa abundância (precipitação média anual da ordem dos 950 mm) - irregular distribuição espacial - maior abundância no Norte de Portugal Continental e na vertente atlântica,

- maior escassez a Sul do rio Tejo e na vertente continental - acentuada sazonalidade (as precipitações estão concentradas entre o final do Outono e o princípio da Primavera) - irregularidade interanual, situação típica do clima atlântico/mediterrânico predominante condicionado pela hipsometria do território:

- as serras da Peneda-Gerês, Marão e Estrela, com os seus vales encaixados, a darem lugar aos principais polos pluviométricos

- as serras de Marvão, Grândola, Monchique e Caldeirão a assumirem ainda uma expressão pluviométrica não negligenciável, estas últimas a explicarem a maior abundância de recursos hídricos do Algarve comparativamente ao Alentejo, situado mais a Norte.

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No que toca aos arquipélagos dos Açores e da Madeira, os seus climas são tipicamente atlânticos, mais húmido no primeiro e mais temperado no segundo devido à sua proximidade ao continente africano e posição mais a Sul.

(Figuras 19 e 20; configuração do texto adaptada)

Fig.19 – Carta Hipsométrica de Portugal continental Fig.20 – Modelo Numérico da Precipitação, Rita Nicolau Continuando a fazer referência ao aludido Relatório, podemos retirar, ainda, que: O Continente beneficia ainda das contribuições de uma parte importante das precipitações que ocorrem sobre o território da vizinha Espanha, que aflui através dos rios comuns, o que faz com que o recurso per capita de Portugal, cerca de 6.500 m3/ano, seja superior à média europeia, que se situa na ordem dos 3.500 m3/ano. Estas caraterísticas da pluviometria são mais acentuadas quando passamos ao escoamento, com as assimetrias e as irregularidades sazonais e inter-anuais a serem mais marcadas (figura 21). Do regime hidrológico de muitos dos nossos rios, em particular dos seus afluentes, pode dizer-se que ele é torrencial, ou seja, que neles se assiste a grandes cheias na época das chuvas e caudal diminuto na época seca (...). Para compensar e contrariar estas características do regime de escoamento, e tendo em vista propiciar as atividades económicas que dependem mais fortemente deste recurso (a agricultura, sobretudo) assim como a produção de energia elétrica, foram sendo realizados ao longo dos anos aproveitamentos hidráulicos baseados em barragens de

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armazenamento com capacidade para a regularização anual e interanual dos caudais, a Norte do Tejo com predomínio para os aproveitamentos hidroelétricos, a Sul do Tejo para os aproveitamentos hidroagrícolas. Os grandes rios que atravessam e interessam a Portugal Continental são todos eles compartilhados com a vizinha Espanha: Douro, Tejo e Guadiana (o Minho não chega a entrar em Portugal e o Lima é um rio de média dimensão à nossa escala). Esta situação coloca Portugal na dependência dos usos que sejam ali realizados das suas águas, tanto do ponto de vista quantitativo como qualitativo, incluindo as modificações dos seus regimes hidrológicos (figura 22) Fig.21 – Escoamento Anual Médio

de Portugal Continental

Se tivéssemos de destacar um rio e uma bacia hidrográfica nacional esse destaque iria para o rio Zêzere, pela sua forte hidraulicidade (drena o Maciço da Serra da Estrela e as Serras da Gardunha e da Lousã) e pela sua posição geográfica, no Centro de Portugal Continental e na vizinhança próxima da capital do país e da sua área metropolitana onde se concentra parte importante da população ... e das atividades económicas cujo abastecimento de água assegura. O Zêzere será ainda o canal natural para qualquer transvase que se pretenda fazer do Norte húmido para o Sul mais seco (como já acontece, embora em pequena escala, através do túnel que interliga as albufeiras do Sabugal, no Alto Côa, e da Meimoa, na ribeira do mesmo nome, afluente do Zêzere na sua margem esquerda).

No plano ibérico cabe destacar o rio Tejo que separa as bacias do Douro e do Tejo, tanto em Portugal como em Espanha. Não sendo embora a maior bacia hidrográfica nem aquele rio de maior hidraulicidade, é ele que separa o Norte húmido do Sul mais árido.

Fig. 22 – Bacias hidrográficas dos rios peninsulares

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O rio Guadiana deve também ser destacado por ser a origem de água para a rega na sua bacia, tanto em Espanha como em Portugal, na bacia do Sado graças ao empreendimento de Alqueva. O seu mais importante afluente na margem direita, a ribeira de Odeleite, é ainda a origem de água para o abastecimento urbano e de água para rega no Sotavento algarvio. Do ponto de vista dos usos em Portugal, para além dos usos para o abastecimento urbano que podem encontrar-se em todas as bacias hidrográficas, as águas das bacias do rio Douro e as outras situadas a Norte deste rio, Minho, Lima e Cávado (com os rios Ave e Leça) são utilizadas fundamentalmente para fins hidroelétricos (e alguns regadios tradicionais), as águas das bacias dos rios a Sul do Tejo, Guadiana, Sado, Mira e ribeiras do Algarve para fins hidroagrícolas e as águas do Tejo, Mondego e Vouga para ambos estes fins. (texto adaptado)

Como constatámos pelo texto selecionado, Portugal não é dos países que se confronte com grandes carências de recursos hídricos. Contudo, as irregularidades que marcam a evolução intra e interanual e as diferenças regionais, são realidades suficientes para que, desde há muito tempo, se tomem medidas no sentido de um planeamento hidráulico.

Em 2000/2001, no dealbar do século XXI, os setores urbano, agrícola (cerca de 80% do consumo total) e industrial gastaram um volume de água estimado em 7 500 milhões m3. Como uma parte significativa da áfua captada é desperdiçada, quer por perdas no sistema de armazenamento, quer no transporte como na distribuição, foi elaborada a primeira versão do PNUEA – Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água. As medidas, entretanto adotadas, surtiram efeito registando-se uma redução na procura total de água de cerca de 43% no intervalo entre 2000 e 2009 (figura 23).

Em 2012,

Portugal iniciou o século XXI com uma procura anual de água no território continental estimada em cerca de 7.500 milhões m, no conjunto dos três setores: urbano, agrícola e industrial. O setor agrícola é, em termos de volume, o maior consumidor (>80%). Em termos de custos de abastecimento, o setor urbano é o mais representativo, uma vez que a água para consumo humano requer tratamento prévio.

Nem toda a água captada é realmente aproveitada, uma vez que existe uma parcela importante de desperdício associada: a perdas no sistema de armazenamento, transporte e distribuição; e ao uso ineficiente da água para os fins previstos.

Em junho de 2012, foi divulgado o PROGRAMA NACIONAL PARA O USO EFICIENTE DA ÁGUA - Implementação 2012 – 2020, do qual faz parte “Um Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNUEA), centrado na redução das perdas de água e na otimização do uso da água ... um instrumento de gestão imprescindível para a proteção dos Recursos Hídricos, principalmente num País onde a variabilidade climática gera frequentes situações de stress hídrico” – Assunção Cristas.

Fig.23

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Com este programa, para além de se procurar a melhor gestão da água, pretende-se preparar o futuro num“País onde o regime hidrometeorológico tem características torrenciais, tornando-o menos vulnerável à variabilidade climática, de costas voltadas para a cultura do desperdício e com padrões de eficiência exigentes e sustentáveis para os usos da água. - Nuno Lacasta”. (figura 24).

O Programa Nacional para o Uso Eficiente da Água (PNUEA) é um instrumento de política nacional para um uso eficiente da água, cujas linhas orientadoras resultaram de um importante esforço interministerial e interdepartamental com a coordenação do extinto Instituto da Água (INAG), apoiado tecnicamente pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil.

Tem como principal objetivo a promoção do Uso Eficiente da Água em Portugal, especialmente nos setores urbano, agrícola e industrial, contribuindo para minimizar os riscos de escassez hídrica e para melhorar as condições ambientais nos meios hídricos, sem pôr em causa as necessidades vitais e a qualidade de vida das populações, bem como o desenvolvimento socioeconómico do país.

http://www.apambiente.pt/_zdata/consulta_publica/2012/pnuea/implementacao-pnuea_2012-2020_junho.pdf

Voltemos ao quadro da figura 15 e continuemos a falar das causas da irregularidade dos recursos hídricos disponíveis.

De facto, já referimos que existem variações nos volumes de água para uso das atividades humanas ao longo do ano e de ano para ano. Apontámos, também, algumas explicações. Estará na altura de associarmos, com mais pormenor, esta matéria com o que estudámos nas aulas sobre estado de tempo e clima.

Ambos os conceitos residem na mesma fonte: as massas de ar, enormes volumes de massa atmosférica que se deslocam na troposfera. O que as motiva? As diferenças de temperatura que, por sua vez, vão ocasionar variações nos valores da pressão atmosférica. Entre dois lugares, um sujeito a uma alta pressão, outro a uma baixa pressão, vai formar-se uma deslocação de ar, sempre, da alta para baixa pressão, isto é, vai formar-se vento. Este será tanto mais intenso quanto maior for a diferença de valor entre a alta e a baixa pressão (gradiente barométrico).

Fig.24 – Metas do PNUEA para 2020. PROGRAMA NACIONAL PARA O USO EFICIENTE DA ÁGUA. Implementação 2012-2020. Agência Portuguesa do Ambiente, IP

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Fazendo o “percurso” anterior ao contrário temos que: há vento, este tem origem nas diferenças de pressão do ar e, estas, resultam das variações térmicas. Então, porque há temperaturas desiguais?

Se a Terra, por hipótese absurda, fosse quadrada ou retangular, os raios solares incidiriam igualmente em toda a superfície. Porém, a Terra é esférica o que vai ocasionar ângulos de incidência diferentes entre o equador e cada um dos polos: quanto mais perto do equador maior é o valor daquele ângulo e, por conseguinte, menor é a inclinação dos raios solares, menor a área abrangida e maior a quantidade de energia que chega a cada ponto dessa área. Quanto mais perto dos polos, menor é o ângulo, maior é a inclinação, maior a área atingida e menor a energia recebida por cada ponto dessa área.

Resultado: quanto mais perto do equador, maior é o aquecimento do ar junto à superfície e mais elevada é a temperatura. Mais aquecido, o ar é mais leve e ascendente. Pelo contrário, quanto mais perto dos polos, menor é o aquecimento junto à superfície e menos elevada é a temperatura. Mais frio, o ar é pesado e descendente. E, se fosse apenas assim, as explicações ficariam relativamente fáceis de explicar. Mas, outro facto vais interferir nesta circulação meridiana: o movimento de rotação da Terra.

Ao rodar a Terra, o ar da atmosfera (como, aliás, como tudo o que nela existe) gira também. Se é fácil entender as baixas pressões equatoriais e as altas pressões polares por razões térmicas, a presença das altas pressões subtropicais e as baixas pressões subpolares são consequência do movimento rotativo do nosso planeta. Como ao girar há atrito entre a Terra e o ar outras consequências são os desvios que os corpos em movimento sofrem: para a direita no hemisfério Norte e para a esquerda no hemisfério Sul (figura 25).

Fig.25 - Distribuição da pressão atmosférica em latitude. As setas representam o sentido de deslocação do ar, sempre, das altas para as baixas pressões. http://fisica.ufpr.br/grimm/aposmeteo/cap8/cap8-2.html

A temperatura influi na pressão mas, igualmente, na humidade do ar. Se se verifica aumento de temperatura, o ar fica mais leve e a pressão que exerce baixa de valor. Mais

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leve, o ar sobe, afasta-se da fonte de aquecimento que é a superfície da Terra e vai-se tornar mais frio. Mais frio, o ar reduz a sua capacidade de absorção de vapor de água, o ponto de saturação é atingido mais rapidamente, formam-se nuvens que podem originar chuva, neve ou granizo (formas de precipitação). Tornando-se mais pesado, o ar desce, aproxima-se da fonte de calor, seca e origina bom tempo, isto é, tempo seco. Desta forma simplista, percebem-se as caraterísticas que estão associadas às massas de ar.

Considerando as caraterísticas térmicas e de humidade na origem e a latitude a que se localizam, diremos que:

a massa de ar equatorial é quente e húmida; as duas massas de ar subpolares são frias e húmidas; as duas massas de ar subtropicais são quentes e secas; as duas massas de ar polares são muito frias e secas.

No entanto, se considerarmos os trajetos posteriores e a desigual distribuição dos continentes (o que é sólido aquece e arrefece mais rápido do que é líquido), verificámos que as massas de ar sofrem alterações. Falámos em massas de ar secundárias que vão assumir caraterísticas de acordo com o seu trajeto a partira da sua origem. Por exemplo, falando de Portugal, tal como mostra o esquema da figura 26, o nosso território pode ser

Fig.26 – Os estados de tempo em Portugal, Eduardo Pequeno.

Se, voltamos a colocar uma hipótese, o eixo da Terra fizesse um ângulo de 90º em relação ao plano da sua órbita, os dias seriam iguais às noites em qualquer data do ano e em qualquer latitude, isto é, durariam 12horas cada. Mas, esse ângulo é de 66º 33´o que vai introduzir variabilidade na duração dos dias e das noites. Somente no equador o dia é sempre igual à noite. Sendo o equador um círculo máximo assim como o círculo de iluminação (separa o dia da noite) intersetam-se no centro da Terra dividindo-se ao meio, logo, 12 horas dia e 12 horas noite (não esqueçamos que estamos a falar de elementos geométricos da esfera terrestre!). Do equador para os polos, a duração do dia e da noite

Influenciado pela massa de ar tropical marítima menos quente e mais húmida do que a massa de ar tropical seca. A massa de ar polar pode ser mais fria e seca do que a massa de ar polar marítima menos fria mas húmida. Daí as diferenças de tempo e as variações regionais do clima em Portugal. A agravar estes cenários, há que acrescentar o que resulta da influência da inclinação do eixo de rotação da Terra.

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vai alterar-se de acordo com a latitude e a época do ano, sendo que o dia dura 24 horas durante seis meses e a noite 24 horas nos outros seis meses alternadamente em cada um dos polos. Quando é sempre dia no polo norte é sempre noite no polo sul e vice versa.

Se o ângulo de incidência dos raios solares varia, num mesmo lugar, ao longo do ano, algo semelhante sucede ao longo da duração do dia: do nascer do sol ao por do sol a inclinação dos raios solares é acentuada no início do dia e antes de anoitecer e é menor ao meio dia. Aliás, tanto podemos falar do ângulo de incidência como da obliquidade dos raios solares pois, ambos, são complementares, isto é, somados são iguais a 90º. Assim sendo, se falamos de ângulo de incidência fraco no início e no fim do dia temos que concluir que, a obliquidade, é grande; logo, ao meio dia, diremos que o ângulo de incidência é máximo e a obliquidade é mínima. Esta variação da inclinação dos raios solares vai, ainda, diferenciar-se conforma a época do ano. Por exemplo, voltando a Portugal, o dia é maior do que a noite entre o equinócio de março e o equinócio de setembro com um máximo de duração no solstício de junho. Daqui resulta temperaturas mais elevadas do que nos restantes meses (do equinócio de setembro ao equinócio de março), não só porque a obliquidade é menor como, devido à inclinação do eixo terrestre, as massas da ar estão todas deslocadas mais para norte. Após o equinócio de setembro, as massas de ar continuam a deslocar-se mais para sul. Por isso, no hemisfério norte será outono, inverno e primavera. No hemisfério sul será primavera, verão e outono. Esta sucessão repetir-se-á ano após ano podendo existir ligeiras mudanças, não só porque estes fenómenos são dinâmicos como as alterações climáticas estão, cada vez mais, a introduzir comportamentos menos habituais. Aqui reside a razão porque, para caraterizar um clima, sejam necessários 30 anos de recolha ininterrupta de dados (figuras 27, 28 e 29)..

Fig.27 – Precipitação total em janeiro Fig.28 – Precipitação total em Fig.29 – Precipitação acumulada de 2015 agosto de 2015 anual

Fonte – IPMA, Instituto Português do Mar e da Atmosfera

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De um modo aproximado, as diferenças na distribuição geográfica da precipitação anual verificaram-se nos meses de janeiro e de agosto de 2015 (escolhidos propositadamente). Em média os valores da precipitação são:

Mais elevados a norte do vale do rio Tejo – maior latitude e maior proximidade à massa de ar polar.

Menos elevados a sul do vale do rio Tejo – menor latitude e maior proximidade à massa de ar tropical.

Mais elevados a noroeste do que a nordeste – disposição do relevo discordante com a linha de costa e ventos predominantes do quadrante Oeste.

São máximos onde é maior o valor da altitude – quanto mais alto mais frio provocando chuvas orográficas.

São mínimos no Alto Douro vinhateiro e no Interior alentejano – no caso do Alto Douro devido à Barreira de Condensação e, no caso do Interior alentejano, pela sua latitude e continentalidade.

Obviamente, a disponibilidade em recursos hídricos é:

Maior a Norte do que a Sul – chove mais a Norte, a temperatura é mais amena, é mais frequente a influência da massa de ar polar, o relevo é mais elevado, as rochas dominantes são impermeáveis e as águas são superficiais.

Menor a Sul do que a Norte – chove menos a Sul do vale do Tejo, a temperatura é muito mais elevada no verão, a proximidade ao Norte de África e ao deserto do Saara é grande, e as águas infiltram-se facilmente nas rochas permeáveis da orla meridional e da bacia sedimentar do Tejo e do Sado.

Menor no Interior do que no litoral Norte e Centro – no Interior Norte devido à Barreira de Condensação é menor a influência dos ventos húmidos de Oeste. Na Terra Quente Transmontana (microclima de caraterísticas mediterrânicas no vale encaixado superior do Douro, abrigado dos rigores provocados pela altitude) a escassez é maior. Na Terra Fria Transmontana (coincidindo com os planaltos de altitude média à volta de 700m) a rede hidrográfica é densa e alimentada pela chuva, embora menos intensa do que no Litoral, e pelo degelo dos invernos rigorosos.

Estas conclusões assentam na interpretação dos mapas das figuras 27, 28 e 29 e respeitam, no caso do mapa da figura 29, à precipitação média que carateriza o clima português. Relembremos que, para as diferenças entre o Norte e o Sul do país e entre a precipitação em janeiro e em agosto, temos que associar a posição em latitude do país à influência que as massas de ar provocam ao acompanharem o Sol no seu movimento anual aparente (figura 30).

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Fig.30 – Para qualquer lugar da zona temperada do Norte, é acentuada a variação da inclinação dos raios solares nos dias solsticiais. Em 21 de dezembro, o dia é o mais curto e a noite é a mais longa do ano. O Sol incide perpendicularmente no trópico de Capricórnio, a obliquidade é máxima nesta época do ano. Portugal, localizado a norte do trópico de Câncer fica, portanto, mais exposto às massas de ar polares. No dia solsticial de junho, é o inverso: o dia é o maior do ano e a noite a mais curta; o Sol está mais de 12 h acima do horizonte, o ângulo de incidência é máximo e a obliquidade é mínima; como o Sol incide, neste dia, perpendicularmente, ao trópico de Câncer, as massas de ar polares estão mais deslocadas para Norte e as massas de ar tropicais afetam Portugal. Este jogo das massas de ar em latitude reflete-se, naturalmente, nos estados de tempo que se verificam ao longo do ano (figura 31).

Fig.31 – À esquerda, duas imagens de satélite, que mostram duas situações de tempo diferentes e, à direita, as cartas sinópticas correspondentes. Em 19 de maio de 2016 o país registava bom tempo por ação do anticiclone dos Açores. Em 1 de dezembro de 2010 o país observava uma forte nebulosidade e, provavelmente, mau tempo.