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Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) Florianópolis, Santa Catarina
XIV SIMGeo Simpósio de Geografia da UDESC
2º SEMINÁRIO NACIONAL DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
ÁREA TEMÁTICA: PLANEJAMENTO TERRITORIAL, GOVERNANÇA
DILEMAS DO FINANCIMENTO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS): um estudo dos recursos aplicados pela união, estado do paraná e municípios da região
metropolitana de curitiba
Vivian Patricia Raksa de Souza 1 Sérgio Tadeu G. Muniz 2
Resumo
Uma das preocupações permanentes do SUS é seu financiamento, pois garantir universalidade e integralidade com restrições orçamentárias e financeiras é um desafio. A definição das ações consideradas gastos em saúde e fixação da porcentagem de investimento na área foi regulamentada pela LC nº 141/2012, porém todos os níveis de governo tiveram dificuldades no cumprimento dos percentuais regulamentados. Este artigo se propõe a responder ao seguinte problema: No período de 2006 a 2013 a União, o Estado do Paraná e os Municípios da RMC aplicaram o percentual mínimo regulamentado pela LC nº 141 na área da Saúde? E possui o objetivo de analisar se a estratégia de financiamento foi aplicada e quais os dilemas relacionados. Foi desenvolvida uma pesquisa de abordagem quanti-qualitativa, descritiva e explicativa. Ficou evidenciado que a União e os Municípios aplicaram em saúde o percentual regulamentado e o Estado do Paraná não. Diagnosticou-se que os recursos destinados são insuficientes e que a boa governança na aplicação destes recursos é fundamental.
Palavras chave: Politica de Saúde, Sistema Único de Saúde, Financiamento.
Abstract
One of the main concerns of the SUS is the floating, because ensure universality and comprehensiveness with budgetary constraints and financial is a challenge. The definition of the actions considered health expenses and fixing the percentage of investment in the area was regulated by the LC number 141/2012, however every governments level had difficulty to perform the regulated percentage. This article aims to answer the following problem: In the period from 2006 to 2013 the Union, The Paraná state and the counties of the RMC have applied the minimum percentage regulated by the LC number 141in health area? And It has the objective to analyze whether the financing strategy was applied and what dilemmas related. It was developed a survey of quanti-qualitative, descriptive and explanatory approach. It was evident that the Union and the counties have applied in health the percentage regulated but Parana State didn’t applied. Diagnosed that the resources 1 Mestranda em Planejamento e Governança Pública da Universidade Tecnológica do Paraná. Enfermeira da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná. E-mail: [email protected] 2 Doutor em Engenharia de Produção - 2005. Universidade de São Paulo (USP). Doutorado-Sanduíche na Universitè Paris 13, França. Professor da Universidade Tecnológica do Paraná. E-mail: [email protected]
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allocated are insufficient and that good governance in the implementation of these features is essential.
Keywords: Health Policy, Single Health System, floating
1. Introdução
A política de saúde no Brasil até a Constituição de 1988 pode ser caracterizada
como fragmentada, residual e focalizada, pois o modelo de proteção social vigente
impunha a dicotomia entre a assistência médica previdenciária e as ações de saúde
coletiva. A primeira era financiada pelas contribuições previdenciárias dos trabalhadores, a
segunda era desenvolvida por instituições estatais e filantrópicas com escassos recursos
públicos destinados aos pobres não vinculados ao mercado de trabalho (QUEIROZ, 2013).
O Brasil institucionalizou o direito à saúde a todos os cidadãos brasileiros com a
promulgação da Constituição Federal em 1988, quando criou o Sistema Único de Saúde
(SUS), que estabeleceu que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, e que possui
como princípios: “universalidade, integralidade e equidade”, alicerçados em ações gover-
namentais submetidas ao controle social, pautada nas diretrizes de descentralização, com
comando único em cada esfera de governo, regionalização e hierarquização.
De acordo com o Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (CONASS), o SUS é
tido como uma das políticas de maior inclusão social implementada no Brasil e representa
em termos constitucionais uma afirmação política do compromisso do estado brasileiro
para com seus cidadãos (CONASS, 2011 A).
Os avanços do SUS são muito significativos, porém persistem problemas a serem
enfrentados para consolidá-lo como um sistema público universal e equânime.
Seguramente, muitos dos problemas que atormentam o usuário do SUS podem ser
equacionados mediante boas práticas de gestão. No entanto, para o CONASS é no
subfinanciamento que está o ponto frágil do sistema público de saúde e que impossibilita
os gestores municipais e estaduais de organizarem a oferta de serviços com qualidade,
visto que garantir a universalidade e integralidade diante de um cenário de restrições
orçamentárias e financeiras e alocar recursos de forma equânime em um país de tantas
desigualdades sociais e regionais é um grande desafio (CONASS, 2011 B).
O financiamento do SUS é marcado por um duplo movimento em seu caminho,
resultado de ação permanente e contraditória de dois princípios. Por um lado, destaca-se o
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princípio da construção da universalidade, viabilizando o acesso de todos, por meio da
defesa permanente de recursos financeiros seguros. De outro lado, identifica-se o princípio
da contenção de gasto, na qual a diminuição das despesas públicas é o instrumento-chave
para combater o déficit público, propiciado por uma política fiscal contracionista e pela
manutenção de alto superávit primário em todas as esferas de atuação estatal (MARQUES;
MENDES, 2009).
Ocorreram várias tentativas de equalizar essa dicotomia, e a definição das ações
que devem ser consideradas gastos em saúde e a fixação da porcentagem de investimento
na área pela União, Estados e Municípios foi introduzida pela Emenda Constitucional nº 29
de 2000 e regulamentada pela Lei Complementar nº 141 de 2012. Porém, de acordo com
Conceição, Cislaghi e Texeira (2012) um problema que vem sendo verificado é que todos
os níveis de governo tiveram dificuldades no cumprimento dos percentuais mínimos.
Diante do exposto este artigo se propõe a responder ao seguinte problema de
pesquisa: No período de 2006 a 2013 a União, Estado do Paraná e os Municípios da
Região Metropolitana de Curitiba aplicaram o percentual mínimo determinado pela EC 29
e regulamentado pela Lei Complementar nº 141 de 2012 na área da Saúde?
Para tanto possui o seguinte objetivo geral: analisar se a estratégia de financiamento
regulamentada, enquanto uma das práxis do sistema de atenção à saúde, foi efetivamente
aplicada e quais os principais dilemas relacionados. E os seguintes objetivos específicos:
contextualizar o financiamento do SUS; descrever a estratégia de financiamento proposta
pela EC 29 e regulamentada pela Lei Complementar nº 141 de 2012; analisar se a União,
Estado do Paraná e Municípios da Região Metropolitana de Curitiba estão aplicando, em
saúde, o montante regulamentado; e descrever os principais dilemas do financiamento em
saúde.
A pesquisa se justifica uma vez que a questão do financiamento das ações e dos
serviços de saúde tem despertado atenção e preocupação crescentes nos mais diversos
segmentos da sociedade brasileira, devido a importância social da questão e pela
participação, cada vez maior, do setor na economia como um todo e em particular nas
contas públicas e nos orçamentos das famílias.
O artigo estrutura-se em seis partes incluindo essa introdução, na qual se sintetizou
a contextualização, o problema e os objetivos do estudo. A segunda seção aprofundará os
aspectos metodológicos para evidenciar o caminho percorrido pela pesquisa. A terceira
seção perfila o aporte teórico enquanto que a quarta seção dedica-se a discutir os resultados
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obtidos. As partes finais referem-se, respectivamente, as considerações finais e o
referencial bibliográfico.
2. Metodologia
Para atingir os objetivos propostos foi realizada uma pesquisa de abordagem
quanti-qualitativa, com objetivos descritivos e explicativos, que utilizou como
procedimento técnico revisão bibliográfica e pesquisa documental.
A etapa de levantamento de dados foi realizada na base de dados da BIREME
(Biblioteca Virtual em Saúde) e os indicadores foram obtidos no site da SIOPS (Sistema de
Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde). Os indicadores foram analisados com
a aplicação da técnica de comparação, e para a análise dos principais dilemas enfrentados
com o financiamento do SUS foi utilizado a técnica de análise de conteúdo.
3. Referencial teórico
Até outubro de 1988, o sistema oficial de saúde disputava recursos, na esfera
federal, em duas arenas distintas. Na primeira, situada na órbita previdenciária, a partição
dos recursos entre as três áreas (benefícios previdenciários, assistência social e atenção
médico-hospitalar) ocorria autonomamente. Na segunda arena, a do orçamento fiscal, os
programas a cargo do Ministério da Saúde concorriam com educação, justiça, transportes,
defesa nacional, previdência do servidor público e outras responsabilidades da União,
inclusive os Poderes Legislativo e Judiciário (CONASS, 2011 B).
O financiamento do gasto federal em saúde era atrelado em grande parte aos
recursos do Fundo de Previdência e Assistência Social, financiando 80% dos gastos com
saúde, indicando a extrema dependência do financiamento da saúde ao comportamento das
receitas do complexo previdenciário, o restante era subsidiado pela União (receitas de
impostos), grosso modo correspondendo ao orçamento do Ministério da Saúde, oscilando
entre 12,9% e 22,7% do total (DA SILVA; ROTTA, 2012).
Havia a mercantilização dos direitos à saúde, sob o comando da Previdência Social,
composta por uma rede de assistencialismo, contribuições trabalhistas e carnês de
contribuição. Lembrando que essas receitas são produzidas pela aplicação de alíquotas
sobre o salário, quantitativo de empregados no mercado, forma de trabalho e base salarial
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média. Isso significa que os recursos capitais para o financiamento da previdência e, por
decorrência, da saúde, entre 1980 e 1988, dependiam do movimento cíclico da economia.
Nesta lógica, qualquer variação do Produto Interno Bruto (PIB) desencadearia sobre o
valor monetário arrecadado para a previdência (DA SILVA; ROTTA, 2012).
O SUS foi criado quando a dívida externa e a inflação elevada eram um
constrangimento, e no plano mundial, quando o ideário neoliberal e a dominância da
valorização financeira começavam a dominar as relações econômicas e sociais. Desta
forma, o SUS teve que disputar recursos com outros ramos da Seguridade Social desde o
seu inicio. Mas, ao mesmo tempo em que isso ocorria, todos esses ramos enfrentavam a
área econômica do governo federal para fazer valer o disposto na Constituição
(MARQUES; MENDES, 2012).
Para garantir o financiamento das despesas de proteção social a Constituição
definiu que o financiamento da Seguridade Social seria realizado “mediante recursos
provenientes dos orçamentos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”
e das contribuições sociais dos empregadores, dos trabalhadores e 50% da receita de
concursos e prognósticos (loteria). A Constituição dizia, ainda, que os recursos da
Seguridade Social não integrariam o orçamento da União e sim o da Seguridade Social. A
incorporação das novas fontes visava tornar o financiamento menos dependente das
variações cíclicas da economia (MARQUES; MENDES, 2009).
Ainda que a Constituição de 1988 tenha determinado, em suas Disposições
Transitórias, que pelo menos 30% do total de recursos da Seguridade Social, com exceção
da receita do PIS/PASEP, deveriam ser destinados à área da saúde, com a aprovação da Lei
Orgânica da Saúde, em fins de 1990, foi possível, ao Ministério da Previdência Social,
reduzir o volume desse repasse. A transferência para o Ministério da Saúde, que
representava 33,1% da receita de contribuições em 1991, passou para apenas 20,9% em
1992. (MENDES; MARQUES, 2009) (CONCEIÇÃO; CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
A não observância da legislação vigente, irregularidade dos aportes financeiros e a
fragmentação dos recursos para com Previdência e Assistência Social, minimizaram todo e
qualquer recurso destinado à saúde. (DA SILVA; ROTTA, 2012).
Para saldar as despesas com saúde, outros arranjos e alternativas foram adotados a
partir dos anos 90. No primeiro momento, a Contribuição Provisória sobre a
Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direito de Natureza Financeira
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(CPMF) surgiu originalmente como solução temporária para o problema do financiamento,
porém foi prorrogada por anos, vigorando até 2007 (DA SILVA; ROTTA, 2012).
A situação de incerteza e indefinição dos recursos financeiros para a área da saúde
levou à busca de uma solução mais definitiva, qual seja: a vinculação dos recursos
orçamentários das três esferas de poder. A construção de uma medida de consenso no
âmbito da vinculação de recursos levou sete anos tramitando pelo Congresso Nacional até
a aprovação da Emenda Constitucional nº 29 de 2000 (MARQUES; MENDES, 2009).
3.1 Emenda Constitucional nº 29 de 2000
Diante de uma receita subfinanciada para atender às demandas do SUS, foi
aprovada, após várias reformulações, a EC 29/2000.
A EC 29/2000 estabeleceu o aumento gradual dos recursos financeiros vinculados à
receita tributaria dos estados e municípios no período compreendido entre o ano de 2000 a
2004. Os valores mínimos de 7% em 2000 deveriam, em 2004, atingir patamares de 12% e
15%, respectivamente, para estados e municípios. No caso da União, o montante
empenhado em ações e serviços públicos de saúde no exercício financeiro de 1999 foi
acrescido no mínimo 5% para ano subsequente (2000). Para período correspondente de
2001 a 2004, passou a vigorar o montante aplicado no ano anterior, corrigido pela variação
nominal do Produto Interno Bruto (PIB).
Com isso, o sistema de financiamento da saúde ganhou maior estabilidade, uma vez
que foram estipulados percentuais mínimos constitucionais de aplicação de recursos da
União, dos estados, Distrito Federal e dos municípios para reestrutura o SUS.
Apesar de representar um movimento de defesa do orçamento da saúde, por meio
da vinculação de recursos nas três esferas de governo, a EC 29/2000 não atendeu as
expectativas de um incremento mais expressivo de recursos ao SUS e não definiu qual é a
origem dos recursos. (CONCEIÇÃO; CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
De acordo com Cislaghi, Teixeira e Silva (2011) é importante registrar que
nenhuma das esferas governamentais cumpriu a vinculação prevista. Outro problema que
foi verificado é que em todos os níveis de governo, para burlar a EC 29, passou-se a
considerar ações de saúde uma série de gastos como saneamento básico, merenda escolar,
pagamento de inativos, entre outros, apesar da resolução 233/2003 do Conselho Nacional
de Saúde estabelecer o que são despesas de ações e serviços de saúde.
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A EC nº 29 de 2000 previu a edição de lei complementar para revisar os percentuais
de vinculação dos recursos destinados às ações e serviços de saúde por parte dos entes
federados. Porém, na ausência da referida lei complementar foram mantidas as regras
transitórias vigentes até 2004 (CONCEIÇÃO; CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
Em 2004, para sanar os problemas observados na implementação da EC nº 29,
começou a tramitar no Congresso Nacional o projeto de lei complementar nº 121/2007,
para regulamentar a EC 29, com apoio do Conselho Nacional de Saúde e vários setores da
sociedade, a fim de que os recursos aplicados na saúde não fossem desviados de sua
finalidade, e que fossem definidas suas bases de cálculo, já que a insuficiência e
instabilidade de recursos para esta política apresentavam-se como um de seus maiores
problemas (CISLAGHI; TEIXEIRA; SILVA, 2011).
No segundo semestre de 2011 o PLS 121/ 07 foi remetido a Câmara de Deputados
como PLP 306/2008. O PL original trazia dois avanços importantes: a fixação da
participação da União em 10% de sua receita bruta e a regulamentação do que são ações de
saúde limitando-as ao âmbito do SUS, excluindo gastos que maquiavam a aplicação dos
percentuais mínimos (CISLAGHI; TEIXEIRA; SILVA, 2011) (CONCEIÇÃO;
CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
Nesse processo uma das principais polêmicas foi uma emenda não aprovada, que
propunha a criação da Contribuição Social para a Saúde (CSS), que ressuscitaria a CPMF.
A emenda garantia que a totalidade dos recursos arrecadados com esse novo-velho imposto
iria para o Fundo de Saúde. À primeira vista, a criação dessa fonte de recurso específica
para a saúde significaria a possibilidade de aumento de recursos para essa política.
Entretanto, significaria, também, reforçar o caráter de especialização, e não de
diversificação, das receitas que financiavam as políticas de seguridade social. (CISLAGHI;
TEIXEIRA; SILVA, 2011) (CONCEIÇÃO; CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
Outra emenda, essa aprovada, tirou os recursos do Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação
(Fundeb) da base de cálculo dos percentuais mínimos. Isso significa uma perda de R$ 7
bilhões de reais anuais para a saúde. Com isso, os recursos arrecadados pela CSS serviriam
basicamente para repor os recursos perdidos com a retirada do Fundeb da base de cálculo
(CONCEIÇÃO; CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
3.2 Lei Complementar nº 141 de 2012
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A EC nº 29 de 2000 foi efetivamente regulamentada pela Lei Complementar nº 141
de 13 de janeiro de 2012, que definiu as ações que devem ser consideradas gastos em
saúde e a fixação da porcentagem de investimento na área pela União, Estados e
Municípios:
“Art. 5o A União aplicará, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde, o montante correspondente ao valor empenhado no exercício financeiro anterior, apurado nos termos desta Lei Complementar, acrescido de, no mínimo, o percentual correspondente à variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB) ocorrida no ano anterior ao da lei orçamentária anual. Art. 6o Os Estados e o Distrito Federal aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde, no mínimo, 12% (doze por cento) da arrecadação dos impostos; Art. 7o Os Municípios e o Distrito Federal aplicarão anualmente em ações e serviços públicos de saúde, no mínimo, 15% (quinze por cento) da arrecadação dos impostos.”
São consideradas despesas com ações e serviços públicos de saúde (ASPS),
conforme a Lei Complementar nº 141 de 2012 , aquelas voltadas para a promoção, proteção e
recuperação da saúde que atendam, simultaneamente, aos princípios estatuídos na Lei nº
8.080, de 19 de setembro de 1990, e às seguintes diretrizes: sejam destinadas às ações e
serviços públicos de saúde de acesso universal, igualitário e gratuito; estejam em
conformidade com objetivos e metas explicitados nos Planos de Saúde de cada ente da
Federação; e sejam de responsabilidade específica do setor da saúde, sendo vedada a
inclusão de gastos com pagamento de aposentadoria e pensões, merenda escolar, limpeza
urbana, preservação ambiental e assistência social (BRASIL, 2012).
A regulamentação da Emenda Constitucional n.º 29, por meio da Lei
Complementar n.º 141/2012, tramitou como projeto de lei por 12 anos na Câmara dos
Deputados até ser aprovado pelo Senado em janeiro de 2012, e reafirmou que estados e
municípios deveriam destinar 12% e 15%, respectivamente, de suas receitas com saúde,
mas foi incapaz de definir 10% das receitas correntes brutas da União para o mesmo fim,
frustrando a expectativa de milhões de brasileiros. Sem alternativa, várias entidades, entre
elas o Conselho Nacional de Secretários de Saúde - CONASS, criaram o Movimento
Nacional em Defesa da Saúde Pública (Saúde + 10), com o objetivo de coletar 1,4 milhão
de assinaturas (1% dos eleitores do país, no mínimo, em cinco estados) para dar entrada no
Congresso Nacional em um Projeto de Lei de Iniciativa Popular que estabeleça essa
obrigação.
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Como este Projeto de Lei de Iniciativa Popular ainda não foi aprovado pelo
Congresso Nacional, esperasse que ao menos a Lei Complementar nº 141/2012 venha a
encerrar com o descumprimento do proposto constitucional para que se possa minimizar o
enorme déficit financeiro da saúde.
4. Resultados e discussão
Após uma breve revisão teórica e da legislação basilar sobre o tema, verificar-se-á,
nesta seção, se a União, Estado do Paraná e Municípios da Região Metropolitana de
Curitiba estão aplicando os percentuais mínimos regulamentados pela Lei Complementar
nº 141 de 2012. Para tanto foram levantados indicadores no site do SIOPS (Sistema de
Informações sobre Orçamentos Públicos em Saúde).
4.1 Recursos aplicados em saúde pela União
Primeiramente, antes da análise dos recursos aplicados em saúde, faz-se relevante
contextualizar algumas informações do orçamento público da União. De acordo com dados
fornecidos pela Auditoria Cidadã da dívida, utilizando 2010 como ano base, a maior parte
do orçamento federal está comprometida com o pagamento de juros e amortizações da
dívida pública, ou seja, 44,93%. Entre as políticas públicas, apenas a previdência social
representa uma parte significativa do orçamento, a política de saúde contou com 3,91% do
orçamento federal total, outras políticas como educação (2,89%) e assistência social
(2,74%, apesar dos gastos com o Bolsa Família) tiveram participação ainda mais ínfima no
orçamento, demonstrando que a prioridade do governo é o pagamento de juros da dívida ao
capital credor (CISLAGHI; TEIXEIRA; SILVA, 2011) (CONCEIÇÃO; CISLAGHI;
TEIXEIRA, 2012).
Estes dados refletem a disputa por recursos, principalmente dentro da seguridade
social. De acordo com Conceição, Cislaghi e Teixeira (2012) há uma escassez na
totalidade dos recursos do orçamento da seguridade se comparado com o pagamento de
juros e amortizações da dívida pública, apesar do governo ter ampliado a arrecadação de
tributos nesse período.
Quanto à análise dos recursos aplicados em saúde pela União, como a mesma só
passou a registrar os dados sobre financiamento em saúde no SIOPS a partir do exercício
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2012 (informação fornecida no site do SIOPS) só foi possível analisar se os recursos
aplicados pela União foram equivalentes ao valor apurado no ano anterior corrigido pela
variação nominal do PIB no ano de 2013.
Foram analisados os seguintes indicadores: despesa total com saúde pela União e
variação nominal do PIB. Sendo que a União apresentou variação do PIB de 2012 para
2013 de 6.01% e a variação de aplicação em saúde foi de 6.19%, desta forma,
considerando as despesas em saúde de 2012, o valor a ser aplicado em 2013 seria de R$
82,912 bilhões. A União aplicou R$ 83,053 bilhões, o que demonstra que neste ano houve
um saldo positivo de R$ 140,43 milhões entre o valor executado e o limite mínimo
estabelecido constitucionalmente.
Os dados acima demonstram que no ano de 2013 a União aplicou o montante
apurado nos termos da Lei Complementar nº 141/2012. No entanto, não podemos afirmar
que a União vem cumprindo historicamente com as suas obrigações, visto que análise dos
recursos aplicados pela União foi comprometida, pois o site do SIOPS não forneceu as
informações necessárias para a análise dos investimentos em saúde na série histórica
proposta.
De acordo com Conceição, Cislaghi e Teixeira (2012) o consenso estabelecido
entre os defensores do SUS era a necessidade de ampliar os R$ 71,5 bilhões do orçamento
de 2011 para R$ 83 bilhões, o que alcançaria cerca de 6% do PIB para o setor – percentual
usado como referência por ser aquele aplicado como média nos países desenvolvidos.
Estes valores foram efetivamente alcançados em 2013. Porém, se compararmos os gastos
nacionais em saúde com os países do Mercosul, estes destinaram 8,4% do PIB. Além disso,
do montante total investido em saúde no Brasil, apenas 41,6% foi investido em saúde
pública, ficando o setor privado com o restante da parcela, 58,4 %, bem atrás de países
como Argentina e Uruguai, com 50,8 e 74,0 %, respectivamente, de seus gastos em saúde
destinados ao setor público, além de ter o pior percentual entre os países do Mercosul (DA
SILVA; ROTTA, 2012).
Estas informações evidenciam a necessidade de ampliação dos recursos federais.
Porque sem os 10% da receita bruta, presentes no projeto original (recusado pelo
Congresso e pelo governo federal), com a retirada do Fundeb da base de cálculo e sem a
aprovação da CSS a saúde perdeu recursos federais com a regulamentação da EC 29. O
que enfatiza a importância do Movimento Nacional em Defesa da Saúde Pública (Saúde +
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10) para dar entrada no Congresso Nacional em um Projeto de Lei de Iniciativa Popular
que estabeleça essa obrigação.
4.2 Recursos aplicados em saúde pelo Estado do Paraná
Para analisar se o Estado do Paraná aplicou anualmente em ações e serviços
públicos de saúde o mínimo de 12% (doze por cento) da arrecadação dos impostos foi
realizado o levantamento dos indicadores de despesa total com saúde por habitante e
recursos próprios aplicados em saúde – EC 29, no período de 2006 a 2012, visto que os
dados referentes a 2013 ainda não foram disponibilizados no SIOPS.
Ao analisar a despesa total em saúde por habitante no Estado do Paraná evidencia-
se que houve aumento significativo de 2006 a 2012 nos investimentos em saúde por
habitantes, como está demonstrado no Gráfico 1.
Fonte: SIOPS
No período em análise houve um aumento de 59% no investimento em saúde,
aumento significativo quando analisado individualmente. Porém, quando analisamos a
porcentagem de recursos próprios investidos pelo Estado do Paraná encontramos o
panorama descrito no Gráfico 2.
Fonte: SIOPS
R$ 0.00
R$ 50.00
R$ 100.00
R$ 150.00
R$ 200.00
R$ 250.00
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
Gráfico 1 - Despesa Total Saúde/Hab no Estado do Paraná
6
7
8
9
10
11
12
2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
Gráfico 2 - % Recursos Próprios em Saúde-EC 29
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O aumento dos investimentos em saúde por habitante não foi acompanhado pela
porcentagem de recursos próprios aplicados em saúde no Paraná, na verdade houve até
uma redução de 2006 para 2007. Isso evidencia que o estado do Paraná no período de 2006
a 2012 não conseguiu aplicar o percentual mínimo regulamentado pela Lei Complementar
nº 141 de 2012 em saúde, além de ficar bem abaixo da média nacional dos estados que foi
de 12,68% em 2012.
De acordo com Marques e Mendes (2005), considerando que a maioria dos estados
destinava, até 2000, 6% de suas receitas de impostos e transferências constitucionais para a
saúde, a Lei Complementar nº 141 amplia significativamente a participação dos estados.
Contudo, nos anos que se seguiram à promulgação da EC 29 e da Lei Complementar nº
141/12, o cumprimento por parte dos estados tem sido difícil. No entanto com exceção
Piauí, Paraná e Rio Grande do Sul todos os demais estados conseguiram aplicar a
porcentagem regulamentada.
Além disso, há que salientar que, no período aqui tratado, corresse o risco do
Estado do Paraná ter incluído, como se fossem gastos em saúde, as despesas com inativos.
Isso porque, de acordo com Mendes e Marques (2009), para cumprir o disposto na Emenda
Constitucional nº 29, muitos estados incluíram indevidamente como despesas em ações e
serviços de saúde os gastos com inativos da área da saúde. Esses registros indevidos
ocorreram apesar de anteriormente terem sido estabelecidos parâmetros que definiam quais
ações e serviços poderiam ser considerados como gastos SUS e podem ainda permanecer.
4.3 Recursos aplicados pelos municípios da Região Metropolitana de Curitiba
A Região Metropolitana de Curitiba (RMC) é formada por 29 municípios e para
analisar se estes municípios aplicaram anualmente em ações e serviços públicos de saúde o
mínimo de 15% (quinze por cento) da arrecadação dos impostos foi realizado o
levantamento dos indicadores de despesa total com saúde por habitante e recursos próprios
em saúde – EC 29, no período de 2006 a 2012, visto que os dados referentes a 2013 ainda
não foram disponibilizados no SIOPS.
A despesa total em saúde por habitante por Municípios da Região Metropolitana de
Curitiba está descrita na Tabela 5:
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Tabela 5 – Despesa Total em Saúde/ habitante por Município da Região Metropolitana de
Curitiba
Despesa Total Saúde/Habitante por Município Municípios 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Adrianópolis 284,96 340,90 291,18 324,12 374,73 522,08 555,92 Agudos do Sul 206,80 215,48 242,15 267,72 292,04 339,04 391,26 Almirante Tamandaré 74,08 107,64 114,44 101,69 104,83 116,30 144,91 Araucária 351,61 500,08 614,79 643,59 726,08 896,52 1.037,43 Balsa Nova 345,58 373,83 375,44 333,52 415,89 489,38 580,28 Bocaiúva do Sul 132,74 158,13 234,58 285,48 360,06 419,40 479,58 Campina Grande do Sul 133,51 184,19 227,67 204,51 257,31 287,12 330,14 Campo do Tenente 288,35 305,91 337,88 363,94 388,28 396,82 418,21 Campo Largo 129,47 150,82 174,00 190,90 213,43 254,62 311,53 Campo Magro 207,39 282,95 299,09 246,88 342,83 360,20 416,04 Cerro Azul 129,29 185,24 253,45 267,47 238,58 298,02 386,40 Colombo 91,46 104,27 123,81 137,86 146,72 192,71 227,11 Contenda 201,30 193,66 213,95 230,35 246,32 270,84 350,92 Curitiba 317,60 350,04 384,41 433,51 458,44 540,06 637,34 Doutor Ulysses 184,36 265,93 226,90 323,67 322,60 397,20 528,59 Fazenda Rio Grande 101,92 151,85 180,56 180,00 193,94 228,48 296,25 Itaperuçu 95,23 127,11 151,42 148,31 169,65 198,84 269,34 Lapa 169,99 188,43 220,35 248,65 279,78 310,31 396,96 Mandirituba 162,59 204,24 236,25 311,61 356,68 386,19 434,62 Piên 214,10 276,02 291,03 316,86 367,14 467,46 520,45 Pinhais 82,16 114,60 135,84 176,46 250,77 303,05 322,70 Piraquara 93,80 134,88 148,01 176,41 159,56 213,43 198,92 Quatro Barras 200,00 226,92 269,13 338,80 380,28 447,83 441,14 Quitandinha 164,45 190,44 196,10 233,59 249,03 289,17 379,79 Rio Branco do Sul 203,15 200,48 274,16 294,75 323,11 349,80 404,80 Rio Negro 166,15 188,31 214,75 262,21 273,85 321,42 397,27 São José dos Pinhais 156,26 175,10 231,17 318,28 450,53 630,38 668,51 Tijucas do Sul 210,26 284,51 250,46 325,14 415,94 416,70 498,48 Tunas do Paraná 496,85 385,13 369,05 374,13 442,40 497,22 540,52 Média 238,86 276,71 310,89 351,82 387,59 465,95 541,37
Fonte: SIOPS
Ao analisar a despesa total em saúde por habitante nos Municípios da Região
Metropolitana de Curitiba evidencia-se que, mesmo com algumas exceções, os municípios
conseguiram ampliar os recursos em saúde per capita. No entanto, evidencia-se também
uma grande disparidade em uma mesma região metropolitana, visto que, por exemplo: em
2012, Araucária conseguiu aplicar R$ 1.037,43 per capita enquanto Almirante Tamandaré
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conseguiu aplicar somente R$ 144,91 per capita. Além disso, alguns municípios como
Almirante Tamandaré, Colombo, Pinhais e Itaperuçu não conseguiram aplicar durante todo
o período de estudo nem a menor média obtida que foi R$ 238,86 em 2006.
No entanto, quando analisamos a porcentagem de recursos próprios investidos
pelos Municípios da Região Metropolitana de Curitiba na saúde, encontramos que todos os
municípios com exceção de Doutor Ulysses no ano de 2008 investiram em ações e serviços
públicos de saúde o mínimo de 15%, conforme descrito na tabela 6.
Tabela 6 – Porcentagem de Recursos Próprios em Saúde – EC 29 por Município da
Região Metropolitana de Curitiba
% Recursos Próprios aplicados em Saúde-EC 29 Municípios 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Adrianópolis 15,8 21,3 18,8 16,5 15,1 18,1 17,4 Agudos do Sul 21,7 18,8 19,9 23,9 22,1 22,2 25,2 Almirante Tamandaré 19,6 19,9 19,7 16,1 15,8 16,2 17,9 Araucária 15,1 15,1 15,4 21,1 18,0 19,9 20,9 Balsa Nova 21,9 20,8 18,5 20,6 18,5 19,1 22,5 Bocaiúva do Sul 15,7 18,0 21,1 28,4 27,6 28,6 24,2 Campina Grande do Sul 16,2 18,1 19,1 17,9 18,9 18,0 17,7 Campo do Tenente 22,7 19,3 17,7 23,3 19,3 18,6 18,4 Campo Largo 17,3 21,2 20,0 21,8 23,5 23,0 25,7 Campo Magro 21,5 19,2 18,3 15,3 17,5 22,3 21,5 Cerro Azul 16,3 17,4 17,5 18,5 15,9 18,3 15,9 Colombo 22,0 20,7 19,6 21,1 21,3 24,8 26,1 Contenda 21,1 18,2 15,1 19,7 20,5 20,2 15,5 Curitiba 16,2 19,5 17,9 17,8 16,4 17,1 17,1 Doutor Ulysses 15,8 18,9 10,8 17,7 17,7 16,9 17,2 Fazenda Rio Grande 15,8 21,2 18,8 18,3 20,1 18,0 26,3 Itaperuçu 14,9 15,9 16,5 15,0 15,6 15,0 17,1 Lapa 21,5 19,1 17,7 20,7 23,1 18,8 23,9 Mandirituba 22,3 21,4 20,4 25,1 24,4 24,9 27,2 Piên 16,1 18,6 16,9 18,2 20,8 23,1 24,1 Pinhais 15,3 15,3 15,4 18,1 18,2 19,8 19,0 Piraquara 16,1 16,8 17,1 19,5 15,3 16,1 15,3 Quatro Barras 15,7 15,0 16,0 20,0 18,7 19,1 18,2 Quitandinha 17,1 18,7 16,6 19,3 20,0 17,4 20,2 Rio Branco do Sul 15,5 17,0 15,4 21,4 19,9 17,5 17,0 Rio Negro 15,1 20,5 21,4 24,6 23,7 22,0 27,4 São José dos Pinhais 20,9 19,4 19,0 26,7 28,5 30,0 27,9 Tijucas do Sul 23,0 25,9 20,1 21,2 26,2 24,9 29,1
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Tunas do Paraná 19,8 24,4 20,2 22,4 24,4 22,6 23,3 Média 16,9 18,9 17,8 19,6 18,7 19,5 19,7
Fonte: SIOPS
Para os municípios, tanto na capital como na região metropolitana, as informações
do SIOPS indicam que o cumprimento da EC 29 ao longo desses últimos anos tem sido
respeitado. No ano de 2006 o percentual médio destinado à saúde foi de 16,9% das receitas
de impostos e transferências constitucionais. Em 2012, esse percentual passou para 19,7%,
ou seja, os municípios estão aplicando em saúde um percentual maior do que o
regulamentado. De acordo com Ianni (2012) a falta de aporte financeiro e de infraestrutura
por parte do Estado sobrecarrega o município responsável pela atenção direta.
Nos municípios existem alguns aspectos a serem considerados, o primeiro deles é
que de acordo com Marques e Mendes (2005) as transferências fundo-a-fundo não
garantiram, na prática, a autonomia dos municípios na aplicação dos recursos, pois cada
vez mais o governo federal repassa recursos carimbados, destinados a programas definidos
previamente, que não podem ser designados para outros fins, impedindo os municípios de
discutirem localmente a melhor utilização dos recursos.
Outro aspecto importante é que a estruturação do SUS apresenta características
distintas em cada município, variando de acordo com as pressões dos movimentos sociais,
do perfil epidemiológico da região e do próprio comprometimento político-ideológico do
gestor. A opção pelo fortalecimento do SUS como política pública envolve uma série de
fatores que deverá ser investigada, a fim de compreender o porquê em alguns munícipios a
política apresenta-se mais avançada e em outros tão incipientes (QUEIROZ, 2013).
4.4 Os dilemas do financiamento em saúde
Como relatado no marco teórico, o SUS possui um histórico subfinanciamento, que
impossibilita a universalização do acesso e a qualidade na prestação dos serviços de saúde.
Esperava-se que com a regulamentação da EC 29/2000 por meio da Lei Complementar nº
141 de 2012 que o descumprimento do proposto constitucional estivesse cessado e que se
minimizasse o enorme déficit financeiro da saúde.
Este estudo evidenciou que a União aplicou os recursos regulamentados, porém há
necessidade de ampliação dos recursos federais. Destacou também que o estado do Paraná
descumpriu o proposto, pois não investiu em saúde o percentual determinado pela Lei
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Complementar nº 141/2012. A falta de aporte financeiro e de infraestrutura por parte do
nível estadual sobrecarrega os municípios que são os responsáveis pela atenção direta, fato
este que pode ser ressaltado no estudo, visto que os Municípios da Região Metropolitana
de Curitiba atingiram os percentuais regulamentos e alguns aplicaram um percentual maior
do que o estabelecido.
O principal ponto negativo da lei complementar nº 141 de 2012 foi a falta de
exigência para que a União elevasse os seus gastos com Saúde. A expectativa de aumentar
significativamente os recursos da Saúde, principalmente com contribuição da área federal,
foi frustrada. Isso reafirma que os recursos destinados para a saúde são insuficientes, além
é claro da importância de rever a governança na aplicação destes recursos.
Ademais o Estado Brasileiro investe pouco em saúde. De acordo com Queiroz
(2013) o gasto brasileiro em saúde é de igual valor ao americano, ressaltando que nos
Estados Unidos o modelo de saúde é liberal, não universal. O que permite concluir que os
baixos investimentos do Estado na política de saúde comprometem os princípios do SUS.
Além disso, segundo a Organização Pan-Americana da Saúde, embora o gasto total
em saúde tenha atingido valores próximos aos dos países desenvolvidos, quando se analisa
o gasto público em saúde como percentual do gasto total em saúde, o Brasil atinge o índice
de 41,6%. Tal percentual é considerado baixo e ao mesmo tempo inferior aos gastos dos
países latino-americanos em desenvolvimento.
A questão do subfinanciamento não se restringe apenas na ampliação do volume de
recursos destinados ao SUS, demanda também uma mudança na forma como o SUS está
organizado, ou seja, tem-se que superar a fragmentação do sistema, buscando a sua real
integração. Este processo é longo, devido à tradição de fragmentação das políticas sociais,
associada à falta de gestão e organização da rede de atenção em saúde que atua de forma
segmentada (QUEIROZ, 2013).
Qualquer que seja o diagnóstico, é crescente a percepção de que a área da saúde
enfrenta problemas no seu esquema de financiamento, inviabilizando a realização de uma
política mais efetiva. Em outras palavras, o quadro deteriorado do financiamento da saúde,
acrescido do agravamento das questões sociais no País, evidencia a crise da saúde
(MARQUES; MENDES, 2009). O cenário de restrições orçamentárias e financeiras não
permite ao SUS assegurar o cumprimento dos seus princípios basilares (DA SILVA;
ROTTA, 2012).
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A ampliação de recursos para a saúde passa necessariamente pelo questionamento
de prioridades da política econômica e de ameaças à privatização do SUS. Trata-se de
discutir a rigidez impressa às medidas econômicas, que consistem em comprometer metade
do orçamento com pagamento da dívida e adotar altos juros e demais mecanismos que
tendem a beneficiar majoritariamente o capital financeiro, bem como as medidas de
privatização camuflada da saúde. São medidas que em momentos agudos da crise do
capital têm no fundo público o caminho para socializar cada vez mais os custos e os
prejuízos, bem como aumentar a apropriação privada da riqueza (CISLAGHI; TEIXEIRA;
SILVA, 2011) (CONCEIÇÃO; CISLAGHI; TEIXEIRA, 2012).
A solução dos problemas da saúde pública no Brasil passa pela recomposição do
seu orçamento e pela efetiva implementação do SUS público e universal e não por mais
privatização e favorecimento do capital em detrimento das necessidades sociais da
população trabalhadora.
Embora a Carta Magna tenha assegurado à saúde como um direito universal, de
responsabilidade do Estado verificou-se a permanência de um setor privado robusto de
prestação serviços, além da manutenção e ampliação da oferta de planos de saúde privados.
Este fato contribuiu para o enfraquecimento do SUS como política pública universal, pois
segmentou os usuários em duas categorias: aqueles que não podem pagar pela assistência
privada em saúde e recorrem ao SUS, os demais fazem planos privados de saúde na
expectativa de obter um tratamento diferenciado em caso de doença (QUEIROZ, 2013).
Hoje, o Brasil só fica atrás dos Estados Unidos na venda de planos privados de
saúde. Com o aumento da renda das classes C e D observa-se uma reconfiguração do
mercado na expectativa de abranger esse segmento. Esta situação remete uma questão
delicada, pois compromete o ideário do SUS como política pública universal e o
transforma em um sistema focalizado e destinado as pessoas pauperizadas (QUEIROZ,
2013).
Outro aspecto relevante a ser considerado é que o Estado possui uma baixa
capacidade de promover a integração entre as politicas sociais e a economia. Neste sentido,
Cohn (2009) ressalta que embora o governo apregoe que o desenvolvimento econômico
deva ser pautado com desenvolvimento social há uma enorme dificuldade de se reconhecer
investimentos na área social como geradores de dinâmicas econômicas virtuosas, quer do
ponto de vista de geração de empregos, quer do ponto de vista de geração nos novos
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círculos econômicos que não aqueles circunscritos ao grande capital, em particular ao
capital financeiro.
A escassez de recursos para a saúde é um problema crônico brasileiro, e ficou mais
evidente após a institucionalização do SUS. A indefinição constitucional sobre fontes de
recursos exclusivas do SUS, bem como vinculação mínima e tardia da EC 29, que não
atendem à demanda das ações e serviços do SUS e o escoamento do orçamento da saúde
para saltar os déficits da previdência, tornaram-se um problema significativo com o passar
dos anos (DA SILVA; ROTTA, 2012).
O subfinanciamento do SUS é atual porque sua contextualização parece não ter
ruptura com o passado; embora constitucionalizados, seus recursos ainda são escassos para
a efetivação dos princípios do SUS e ainda prevalecem os mesmos impasses de antes da
constituinte (DA SILVA; ROTTA, 2012).
Diante do exposto, evidencia-se que os dilemas relacionados ao financiamento do
SUS persistem e que o subfinanciamento é um dos pontos mais frágeis do sistema público
de saúde e, além disso, possui difícil solução. A regulamentação da Emenda Constitucional
29 pela Lei Complementar n° 141/2012, apesar de necessária não resolveu a situação da
insuficiência de recursos. Os problemas no esquema de financiamento inviabilizam a
realização de uma política mais efetiva e a solução desta problemática não se restringe
apenas na ampliação do volume de recursos destinados ao SUS, demanda também de
mudanças na governança deste recurso, ou seja, é importante definir quais são as ações
prioritárias de saúde, como o recurso será aplicado e como será o monitoramento de sua
aplicação.
5. Considerações finais
O SUS é tido como uma das políticas de maior inclusão social implementada no
Brasil e representa uma afirmação do compromisso do estado brasileiro para com seus
cidadãos. Porém persistem vários impasses a serem enfrentados para consolidá-lo como
um sistema público universal e equânime, sendo na falta de recursos um dos maiores
dilemas a ser enfrentado. Desde a criação do SUS seu financiamento não foi resolvido.
Durante os anos de sua existência, um de seus maiores desafios tem sido conseguir os
recursos necessários para preservar a universalidade, integralidade e equidade.
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Embora haja uma regulamentação (EC 29/2000 e Lei Complementar nº 141 de
2012) que determine o que são ações de saúde e os percentuais mínimos a serem investidos
pela União, Estados e Municípios, isto pouco tem auxiliado no déficit social da saúde,
ampliando a participação crescente do setor privado em relação ao público com os
cuidados da saúde.
O estudo evidenciou que a União aplicou os recursos regulamentados, no entanto
há necessidade de ampliação dos recursos federais. Os Municípios também cumpriram
com os percentuais regulamentos, porém o estado do Paraná não. Isso reafirma que os
recursos destinados para a saúde estão sendo insuficientes, além é claro da importância de
rever a governança na aplicação destes recursos.
Para que sejam garantidos recursos adequados para o financiamento de uma saúde
pública universal, tal como estabelecida na Constituição de 1998 é necessária à
reorientação das ações políticas na saúde, tendo como mediadoras a compreensão do
financiamento e a clareza da carência de recursos para gerir o SUS, isso faz com que o
tema “saúde” inclua-se ao social, estando diretamente relacionado com a forma de
sociedade e de Estado. (DA SILVA; ROTTA, 2012).
Enquanto o arranjo político necessário para isso não acontece, a luta por recursos
adequados, por mais necessária que seja, terá sempre alcance bastante limitado e fadado a
sofrer retrocessos. É o que atesta tanto o conteúdo das propostas de financiamento
discutidas durante a segunda metade dos anos 1990 e das atualmente em pauta, como seus
encaminhamentos. Seria necessário dobrar o gasto público em saúde, de modo a atingir
nível condizente com a média dos demais países que têm sistema similar, para tanto seria
preciso mais do que simplesmente obter aumento de recursos mediante barganha, seria
necessário elevar o SUS à condição de prioridade entre as políticas de governo.
(MARQUES; MENDES 2012).
Este estudo procurou descrever a estratégia de financiamento vigente e apontou os
percentuais aplicados em saúde pela União, Estado do Paraná e Municípios da Região
Metropolitana de Curitiba, além da descrever os principais dilemas relacionados ao
financiamento do SUS. Porém, algumas lacunas ficaram abertas e não se exauriu o assunto,
pois trata-se de um tema denso e com diversas vertentes. Desta forma, demonstra-se que o
assunto possui campo fecundo para inserções futuras sob os mais diversos enfoques.
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6. BIBLIOGRAFIA CITADA
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